Você está na página 1de 20

Anafilaxia:

conceitos, quadro clínico,


diagnóstico e tratamentos
Créditos
Coordenação do Projeto Validadora Técnica – UFMA
Ana Emilia Figueiredo de Oliveira Cadidja Dayane Sousa do Carmo

Coordenação Geral da DTED/ Validadoras técnicas – Ministério da Saúde


UNA-SUS/UFMA (DESF/SAPS/CGDEP/DAEVS/SVS/MS)
Ana Emilia Figueiredo de Oliveira Amanda Firme Carletto
Beatriz Zocal da Silva
Gestão de projetos da UNA-SUS/UFMA Michelle Leite da Silva
Amanda Rocha Araújo   Nathalie Alves Agripino
Coordenação de Produção Pedagógica Validadora técnica – Universidade de Brasília
da UNA-SUS/UFMA (UnB) – Departamento de Saúde Coletiva
Paola Trindade Garcia Cláudia Brandão
 
Coordenação de Ofertas Educacionais Validadoras Pedagógicas
da UNA-SUS/UFMA Lívia Anniele Sousa Lisboa
Elza Bernardes Monier Cadidja Dayane Sousa do Carmo
 
Coordenação de Tecnologia da Revisora Textual
Informação da UNA-SUS/UFMA Camila Cantanhede Vieira
Mário Antônio Meireles Teixeira
Designers Instrucionais
Coordenação de Comunicação   Samira Vasconcelos Gomes
da UNA-SUS/UFMA Steffi Greyce de Castro Lima
José Henrique Coutinho Pinheiro
Designers Gráficas
Professor-autor Jackeline Mendes Pereira
Carlos Eduardo Abbud Hanna Roque Agnes Milen Guerra

COMO CITAR ESTE MATERIAL


ROQUE, Carlos Eduardo Abbud Hanna. Anafilaxia: conceitos, quadro clínico, diagnóstico e
tratamentos. In: UNIVERSIDADE ABERTA DO SUS. UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO.
Cuidado nas queixas comuns no atendimento à demanda espontânea na atenção primária à
saúde. Cuidado em reações anafiláticas. São Luís: UNA-SUS; UFMA, 2021.

© 2021. Ministério da Saúde. Sistema Universidade Aberta do SUS. Fundação Oswaldo Cruz & Universidade
Federal do Maranhão. É permitida a reprodução, disseminação e utilização desta obra, em parte ou em sua
totalidade, nos termos da licença para usuário final do Acervo de Recursos Educacionais em Saúde (ARES).
Deve ser citada a fonte e é vedada sua utilização comercial, sem a autorização expressa dos seus autores,
conf. Lei de Direitos Autorais-LDA. (Lei n.09.610, de 19 de fevereiro de 1998).
Sumário

Apresentação .................................................................................................................... 4

1 ANAFILAXIAS ................................................................................................................. 5

1.1 Classificação .......................................................................................................... 5


 
1.2 Fatores Desencadeantes ....................................................................................... 7

2 QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO DAS REAÇÕES ANAFILÁFICAS .......................... 9


 
3 TRATAMENTO DA REAÇÃO ANAFILÁTICA .................................................................. 12

Considerações finais ....................................................................................................... 18


 
Referências ....................................................................................................................... 19

 
Apresentação
Olá, aluna(o)!

Dentre as queixas comuns no atendimento à demanda espontânea na Atenção


Primária à Saúde (APS), estão as Reações Anafiláticas, que se caracterizam por serem
uma reação alérgica súbita grave com potencial de evoluir para óbito. Dessa forma,
é de fundamental importância a compreensão do manejo adequado desses quadros
 
pela equipe da APS, principal porta de entrada do usuário ao Sistema Único de Saúde
(SUS), pois essas são emergências tratáveis que, se não cuidadas, ameaçam a vida das
pessoas.

 
Você sabe quais são as características clínicas das reações anafiláticas?
Quais os critérios para o seu diagnóstico e o tratamento adequado para esses casos?

 
Convidamos você a explorar este recurso educacional com o intuito de compreender
o conceito de anafilaxia, reconhecer o quadro clínico das reações anafiláticas e de
estabelecer o diagnóstico correto para iniciar o tratamento eficaz de forma imediata.
 
Bons estudos!

OBJETIVO
Ao final deste material, esperamos que você compreenda o conceito de anafilaxia,
reconhecendo o quadro clínico das reações anafiláticas e identificando o
tratamento adequado.
1. ANAFILAXIAS
Embora não haja um consenso sobre o seu conceito, de modo geral, compreende-se a
anafilaxia como1:

Reação alérgica grave e inesperada que tem um início rápido e pode ser fatal.

O diagnóstico da anafilaxia é essencialmente clínico, evidenciando o envolvimento de


vários sistemas, como o cardiovascular, o cutâneo, o respiratório e o gastrointestinal. O
seu reconhecimento e o tratamento oportuno, bem como o posterior estudo etiológico, são
essenciais para evitar novos episódios1.

1.1 Classificação

A anafilaxia pode ser classificada a partir dos mecanismos fisiopatológicos como


imunológica, não imunológica e idiopática1.

A anafilaxia imunológica é geralmente mediada por imunoglobulina E (IgE) específica,


que se liga a seus receptores de alta afinidade presentes em mastócitos e basófilos do
tecido circulante e a receptores de baixa afinidade presentes em linfócitos, eosinófilos
e plaquetas. A interação entre o alérgeno e a IgE induz a degranulação de mastócitos
e basófilos e a liberação de mediadores pró-inflamatórios, como histamina, triptase,
leucotrienos, prostaglandinas e fator ativador de plaquetas. Esses mediadores produzem
vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, contração da musculatura lisa
brônquica, hipersecreção glandular, e são responsáveis pelas manifestações clínicas1.

No entanto, a anafilaxia causada por mecanismos fisiopatológicos imunológicos pode


ser Não IgE Mediada, existindo outros mecanismos de ativação imune que podem induzir a
anafilaxia, como a produção de imunoglobulina G (IgG), a ativação do sistema complemento
ou a ativação direta do sistema imune inato1.

A anafilaxia não imunológica é produzida por fatores cujo mecanismo exato de indução
ainda não está bem elucidado, mas sabe-se que é desencadeada por alguns fatores
físicos, como exercícios, calor, radiação ultravioleta, álcool e alguns medicamentos, como
os opioides. Ainda é desconhecido o mecanismo responsável pelo quadro de anafilaxia
idiopática, sendo essa reação diagnosticada após a realização de um estudo alérgico em
que a causa não foi determinada1.

5
CLASSIFICAÇÃO DA ANAFILAXIA PELOS MECANISMOS FISIOPATOLÓGICOS

IgE Mediada
(Alimentos, venenos de insetos, látex,
medicamentos, contraste radiográfico)

Imunológica
(Alérgica)
Não IgE Mediada
(Derivados do sangue, agregados imunes,
contraste radiográfico, anti-inflamatórios
não hormonais)

Agentes Físicos
Anafilaxia (Frio, exercícios físicos, etanol)

Não Imunológica
(Não Alérgica)
Outros medicamentos
(Anti-inflamatórios não hormonais,
opiáceos, contraste radiográfico)

Idiopática

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance 2020. World
Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020.

6
1.2 Fatores Desencadeantes
Os principais fatores desencadeantes das reações anafiláticas são os alimentos,
picadas de inseto ou o contato com outros animais, e medicamentos2.

Os indivíduos com histórico de reações alérgicas e os portadores de asma são mais


propensos a apresentar quadros de anafilaxia2. A seguir, estão exemplificados alguns dos
principais fatores desencadeantes de reações anafiláticas:

PRINCIPAIS FATORES DESENCADEANTES DE REAÇÕES ANAFILÁTICAS

Fator Desencadeante Exemplos

Banana;
Frutas cítricas;
Chá de camomila;
Leite de vaca;
Alimentos Ovo;
Peixe e crustáceos;
Amendoim, amêndoa, nozes;
Glúten;
Trigo.

Abelhas;
Formigas;
Animais
Águas-vivas;
Serpentes.

Ácido acetilsalicílico;
Analgésicos;
Anti-inflamatórios;
Medicamentos Relaxantes musculares;
Antibióticos;
Quimioterápicos;
Inibidores de bomba de prótons.

Látex;
Contrastes radiográficos;
Outras Causas
Exercícios físicos;
Baixas temperaturas.

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance 2020. World
Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020.

O resultado e a gravidade de uma reação anafilática não dependem apenas do próprio


indutor e de sua dose, mas também da presença de cofatores, que podem afetar o início
e a intensidade de uma determinada reação. Esses cofatores incluem uma variedade de
circunstâncias endógenas e exógenas², conforme apresentado na imagem a seguir:
7
FATORES E COFATORES QUE INDUZEM A ANAFILAXIA

FATORES RELACIONADOS À IDADE

Crianças Adolescentes e Gestantes e Idosos


(Não conseguem Adultos Jovens Puérperas (Interação medicamentosa
informar sintomas) (Aumenta (Risco por uso de e maior risco de anafilaxia
comportamento medicamentos) por veneno de inseto)
de risco)

Rinite Alérgica
Eczema

Asma e
outras doenças Doença
respiratórias Psiquiátrica

COMORBIDADES

Doenças
Cardiovasculares Mastocitose

Betabloqueadores, INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS Etanol, sedativos,


AINE, inibidores / ETANOL / USO DE DROGAS hipnóticos,
da ECA antidepressivos

COFATORES QUE PREDISPÕEM A ANAFILAXIA

Exercícios Infecções Estresse Alteração Estado


Físicos Agudas da Rotina Pré-Menstrual

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance
2020. World Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020. Disponível em:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7607509/pdf/main.pdf.>. Acesso em: 06 maio 2021.
8
2 QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO DAS REAÇÕES
ANAFILÁFICAS
As reações anafiláticas apresentam manifestações clínicas mistas, sendo incluídos
diversos sinais e sintomas sistêmicos, que variam de leves a graves, podendo evoluir
brevemente para quadros muito graves, que se não tratados imediatamente podem
evoluir para óbito3.

Frequentemente, os sintomas têm início alguns segundos ou minutos após o contato


com a substância. No entanto, quando o quadro é desencadeado por substâncias orais ou
quando o início dos sintomas demora mais que 30 minutos, as reações anafiláticas podem
ser mais demoradas ou recidivadas3.

Em diversas situações, as reações alérgicas acometem apenas um sistema, com


manifestação clínica relacionada apenas às alterações dermatológicas, como a urticária e
o angioedema. A urticária atinge apenas a epiderme e a mucosa, com lesões polimórficas
que podem ocorrer em qualquer área do corpo. O angioedema apresenta acometimento
mais profundo da derme e da submucosa, caracterizado por edema localizado sem outros
sintomas, atingindo face, mãos, região genital e, raramente, órgãos abdominais3.

Para o diagnóstico da reação anafilática, é importante a realização de anamnese


sucinta e direcionada, seguida de exame físico focado na procura de sinais claros de
reação anafilática e, tão logo a hipótese diagnóstica seja feita, deve-se iniciar o tratamento
imediatamente3.

O diagnóstico de anafilaxia é altamente provável quando pelo menos um dos dois critérios
a seguir é atendido:

1. Início agudo (minutos a várias horas) com comprometimento da pele, mucosa ou ambos
(Ex.: urticária generalizada, prurido disseminado, edema em lábios, língua ou úvula).

Associado a pelo menos UM dos sintomas a seguir:


a. Comprometimento respiratório (dispneia, broncoespasmo, estridor laríngeo, hipoxia).
b. Comprometimento cardiovascular ou disfunção de órgão-alvo (hipotensão, tontura,
arritmias, hipotonia, síncope, incontinência).
c. Comprometimento gastrointestinal grave (dor abdominal intensa, vômitos persistentes),
especialmente após a exposição a alérgenos não alimentares.

2. Início agudo (minutos a várias horas) de hipotensão ou broncoespasmo ou


envolvimento laríngeo (estridor, alteração vocal, odinofagia) após exposição a um
alérgeno conhecido ou altamente provável para aquele paciente, mesmo na ausência
de envolvimento cutâneo típico.

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance 2020. World
Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020.
9
Quando a história de contato com as substâncias é evidente, o diagnóstico da reação
anafilática se torna óbvio. Porém, quando isso não acontece, é essencial que sejam
considerados diagnósticos diferenciais2. Os principais diagnósticos diferenciais envolvem
a agudização da asma, síncope, síndrome do pânico, urticária generalizada, obstrução
de via aérea por corpo estranho, espasmo laríngeo, infarto agudo do miocárdio (IAM),
tromboembolismo pulmonar, acidente vascular cerebral (AVC), convulsão, intoxicação
aguda, hipotensão, reação vasovagal, choque hipovolêmico e choque séptico2.

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DA ANAFILAXIA

Dilemas diagnósticos comuns Asma; Síncope; IAM; AVC; Convulsão.

Síndromes Pós-prandiais Intoxicação alimentar.

Doenças não orgânicas Síndrome do Pânico.

Choque Séptico; Hipovolêmico; Cardiogênico.


Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance 2020. World
Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020.

Em diversas situações, as reações alérgicas acometem apenas um sistema, com


manifestação clínica relacionada apenas às alterações dermatológicas, como a urticária e
o angioedema. A urticária atinge apenas a epiderme e a mucosa, com lesões polimórficas
que podem ocorrer em qualquer área do corpo. O angioedema apresenta acometimento
mais profundo da derme e da submucosa, caracterizado por edema localizado sem outros
sintomas, atingindo face, mãos, região genital e, raramente, órgãos abdominais³.

10
Nesses casos, o diagnóstico é clínico, não sendo necessária a realização de exames
laboratoriais, inicialmente, considerando a duração dos sintomas, histórico familiar,
comorbidades, utilização de novas medicações ou aumento de dose. Os diagnósticos
diferenciais dessas lesões envolvem tinea corporis, pitiríase, granuloma anular, hanseníase
e lúpus eritematoso subcutâneo³. Observe abaixo alguns casos de pessoas com urticárias
e angiodemas:

Fonte: Acervo pessoal do autor. Fonte: Acervo pessoal do autor.

Angioedema periorbital: reação Urticária em face: reação por


ao uso de antibiótico oral. uso de dermocosmético.

Fonte: Acervo pessoal do autor. Fonte: Acervo pessoal do autor.

Urticária: reação ao uso de anti- Urticária: agente causador


inflamatório não esteroidal. não identificado.

11
3 TRATAMENTO DA REAÇÃO ANAFILÁTICA
Após a identificação de um caso de reação anafilática, a equipe da Unidade de Saúde
da Família (USF) deve trabalhar de forma integrada, encaminhando o usuário para ambiente
adequado onde será possível prestar os cuidados iniciais, articular imediatamente junto à
Rede de Atenção à Saúde a remoção do usuário para unidade de urgência e emergência e
garantir as medidas de suporte necessárias até a chegada do Serviço Móvel de Urgência. No
entanto, vale ressaltar que a atuação da equipe da USF, no caso em questão, não se encerra
com a remoção do usuário. É necessário que o usuário seja monitorado pela equipe, através
de busca ativa e visita domiciliar pelo agente comunitário de saúde, e do compartilhamento
e discussão do caso na reunião de equipe e na reavaliação clínica após alta da unidade de
urgência e emergência, pois a longitudinalidade e a coordenação do cuidado são atributos
essenciais da APS.

IMPORTANTE

A reação anafilática é sempre uma condição de absoluta emergência, e o Serviço


Móvel de Urgência deve ser acionado imediatamente, enquanto a equipe presta
os cuidados iniciais e garante as medidas de suporte necessárias até a remoção
do paciente para unidade de urgência e emergência.

O objetivo do tratamento da reação anafilática é manter a oxigenação e a perfusão


dos órgãos vitais, sendo a adrenalina a droga de escolha, devendo ser administrada
imediatamente4.

A adrenalina é o medicamento mais eficaz para o tratamento da anafilaxia. Pode


prevenir ou reverter o broncoespasmo e o colapso cardiovascular, devendo ser administrada
precocemente, pois melhora a sobrevida. Possui rápido início de ação e meia-vida curta,
com estreita margem terapêutico-tóxica. A via intramuscular (IM) é a via de escolha para
administração da adrenalina no tratamento inicial da anafilaxia em qualquer situação,
preferencialmente na face anterolateral da coxa4.

A adrenalina é encontrada em solução aquosa a 1mg/ml. A dose administrada para


adultos é de 0,3ml a 0,5ml, por via IM, em dose única. Nos casos refratários, pode ser repetida
em intervalos de 15 minutos, de duas a três vezes. Para crianças, a dose recomendada é de
0,01mg/kg, com máximo de 0,5mg, por via IM, também em dose única, podendo ser repetida
em intervalos de 15 minutos nos casos refratários4.

A adrenalina por via IM apresenta mais rápida e mais alta taxa de concentração
plasmática do que por via subcutânea (SC), e apresenta maior margem de segurança do
que a administração por via intravenosa (IV)4.

12
IMPORTANTE

Até o momento, não existem estudos com elevado grau de evidência sobre o
uso da adrenalina IV na anafilaxia, devendo essa via ser utilizada apenas por
profissional médico experiente, em ambiente hospitalar e com monitoramento
cardíaco rigoroso, uma vez que apresenta maior risco de efeitos adversos graves,
como taquiarritmias e isquemia miocárdica, devido à dosagem inadequada ou
possível potencialização por outros medicamentos que o usuário está recebendo.
Desse modo, a via IV apenas será indicada em casos refratários após múltiplas
doses IM de adrenalina, parada cardíaca ou em pessoas hipotensas que não
respondem à reposição volêmica IV4.

Os efeitos terapêuticos da adrenalina envolvem ação agonista em receptores alfa-1


adrenérgicos, que promove o aumento da vasoconstrição e da resistência vascular periférica,
diminuindo o edema da mucosa; ação agonista nos receptores beta-1 adrenérgicos,
com efeito inotrópico e cronotrópico positivo; e ação agonista nos receptores beta-2
adrenérgicos, aumentando a broncodilatação e diminuindo a liberação de mediadores
inflamatórios dos mastócitos e basófilos4.

Os efeitos adversos comuns e transitórios da adrenalina podem ocorrer com o uso de


doses terapêuticas, e envolvem4:

Ansiedade Dor de cabeça

Medo Palpitações

Inquietação Palidez

Tontura Tremor

Os efeitos adversos raros geralmente ocorrem em caso de superdosagem, uso


concomitante de outros medicamentos ou comorbidade associada, na forma de arritmias
ventriculares, isquemia miocárdica, edema pulmonar, crise hipertensiva, e hemorragia
intracraniana4.

Mesmo nas pessoas que apresentam comorbidades ou maior risco de efeitos adversos
pelo uso de adrenalina, uma vez que não existe contraindicação absoluta ao seu uso, a
relação risco-benefício indica a utilização da medicação nos casos de anafilaxia, pois o
benefício é muito maior do que o risco das complicações5.

13
Vale salientar que a adrenalina pode apresentar interação com outras drogas. Os
betabloqueadores podem diminuir sua eficácia, os inibidores da enzima conversora de
angiotensina e os bloqueadores do receptor de angiotensina II podem concorrer com
seu efeito compensatório à hipotensão; os antidepressivos tricíclicos e os inibidores
da monoamina oxidase (MAO) dificultam a metabolização da adrenalina e promovem o
aumento da concentração sérica acima de níveis terapêuticos, e a cocaína e as anfetaminas
facilitam a toxicidade da adrenalina pelo aumento da sensibilização do miocárdio5.

IMPORTANTE

Deve-se estar atento aos quadros de anafilaxia em pessoas que fazem uso de
betabloqueadores, pois estão mais sujeitos às reações anafiláticas. Além disso,
a adrenalina pode ter ação limitada nesses pacientes4.

Nos casos em que há hipotensão, o usuário deve ser colocado em posição de


Trendelenburg (decúbito dorsal com elevação dos membros inferiores), devendo ser
realizada infusão rápida intravenosa de solução fisiológica. Nas situações em que
está presente o broncoespasmo, deve-se considerar o uso de broncodilatador, como o
salbutamol3.

Na fase aguda da reação anafilática, o emprego de corticoides orais (prednisona,


prednisolona) ou venosos (hidrocortisona) e anti-histamínicos (loratadina, prometazina,
dexclorfeniramina) não é útil, devendo ser reservados para
evitar uma evolução arrastada4.

Os corticoides e anti-histamínicos também podem ser utilizados nos quadros de reação


alérgica com manifestação dermatológica, pois a urticária e o angioedema geralmente são
autolimitados e apresentam boa resposta ao tratamento sintomático3.

14
MEDICAMENTOS UTILIZADOS NAS REAÇÕES ANAFILÁTICAS

Medicamento Dose – Criança Dose – Adulto

0,01mg/kg, até o
Adrenalina 1mg/ml 0,3ml a 0,5ml, IM.
máximo 0,5mg, IM.

Expansão de Volume 5-10ml/kg IV nos


Solução Salina primeiros 5 minutos e 1 a 2 litros IV.
Ringer Lactato 30ml/kg na primeira hora.

Hidrocortisona –
100mg a 500mg
Ampola com 100mg 4mg/kg IV ou IM.
IV ou IM.
ou 500mg

Prednisona 5mg (cp)


ou 20mg (cp)
0,5mg-1mg/kg/dia VO. 0,5mg-1mg/kg/dia VO.
Prednisolona 3mg/ml
(xarope)

Não deve ser usada


Prometazina 25mg/ml 25mg-50mg, IM.
em menores de 2 anos.
(Injetável) Dose máxima: 100mg/dia.
0,5 mg/kg/dose, IM.

Não deve ser usada


Loratadina 10mg (cp) em menores de 2 anos.
10mg/dia.
ou 1mg/ml (xarope) Abaixo de 30kg – 5mg/dia.
Acima de 30kg – 10mg/dia.

Não deve ser usada em


Dexclorfeniramina menores de 2 anos.
2mg (cp) ou 2mg/5 ml 2 a 6 anos – 1,25ml, 3x ao dia. 2mg, 3x ao dia.
(xarope) 6 a 12 anos – 2,5ml, 3x ao dia.
Acima de 12 anos – 5,0ml, 3x ao dia.

Salbutamol 100mcg/jato 50mcg/kg/dose. 4 a 8 jatos a cada


(Via inalatória) Dose Máxima: 10 jatos. 20 minutos.

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victòria et al. Guía de actuación en anafilaxia. Galaxia, 2016; BRASIL. Ministério
da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica nº
28 – Acolhimento a demanda espontânea: Queixas mais comuns na Atenção Básica. Volume II. 1 ed. Brasília:
Ministério da Saúde, 2012; SOLÉ, D. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de Alergia. Guia Prático
de Atualização. Anafilaxia. nº 1, 2016.

15
Após os cuidados iniciais na Unidade Básica de Saúde (UBS), os usuários
que apresentam quadro de anafilaxia devem ser removidos para unidade de
urgência/emergência para terapia e monitoramento contínuos, especialmente aqueles
com apresentação inicial de comprometimento respiratório ou circulatório significativo e
pacientes com anafilaxia refratária6.

As reações bifásicas podem ocorrer em menos de 5% das pessoas com diagnóstico de


anafilaxia e são definidas como a recorrência da anafilaxia dentro de 72 horas após a reação
inicial sem nova exposição ao alérgeno. O tempo de observação superior a seis horas após
a resolução dos sintomas anafiláticos pode excluir a recorrência de uma reação secundária
em mais de 95% das pessoas. Um período mínimo de observação de quatro horas apoia as
diretrizes atuais, com períodos de observação mais longos recomendados com base em
fatores individualizados, como reação bifásica anterior, gravidade da apresentação inicial,
tratamento com doses múltiplas de adrenalina, reação anafilática previamente prolongada,
desencadeamento anafilático desconhecido ou presença de fatores de risco para anafilaxia
grave ou fatal6.

16
ABORDAGEM INICIAL - ANAFILAXIA

1. Tenha um protocolo de emergência por escrito para reconhecimento


e tratamento da Anafilaxia. A equipe deve estar capacitada.

2. Afastar/Remover o agente causador da anafilaxia.

3. Avalie o paciente: vias aéreas, respiração, circulação,


nível de consciência, pele e peso corporal.

Imediata e simultaneamente, realize os passos 4, 5 e 6:


4. Peça Ajuda - Acione o Serviço Móvel de Urgência para remoção
do paciente.

5. Administre adrenalina (1mg/ml) por via intramuscular na face


anterolateral da coxa, na dose de 0,3ml a 0,5ml para adultos,
e 0,01mg/kg para crianças.

6. Coloque o paciente em posição de Trendelenburg (Decúbito


dorsal com elevação dos membros inferiores).

7. Quando indicado, administrar oxigênio suplementar de alto fluxo


(6-8 L / minuto), por meio de máscara facial ou via aérea orofaríngea.

8. Estabeleça acesso intravenoso, em caso de hipotensão administrar


volume (solução salina ou ringer lactato). 1 a 2 litros para adultos
e 10ml/kg para crianças.

Além disso:
9. Se indicado a qualquer momento, inicie a ressuscitação
cardiopulmonar com compressões torácicas contínuas.

10. Em intervalos regulares e frequentes, monitore a pressão sanguínea


do paciente, a frequência e função cardíaca, o estado respiratório
e a oxigenação (monitore continuamente, se possível).

Fonte: Adaptado de CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance
2020. World Allergy Organization Journal, v. 13, n. 10, p. 100472, 2020. Disponível em:
<https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7607509/pdf/main.pdf.>. Acesso em: 06 maio 2021.

17
Considerações finais

Como você pôde observar, as reações anafiláticas apresentam manifestações


clínicas mistas, sendo incluídos diversos sinais e sintomas sistêmicos, que variam
de leves a graves, e que podem evoluir em pouco tempo para quadros muito graves,
podendo levar o usuário a óbito. Sendo assim, a reação anafilática é sempre uma
condição de absoluta emergência e seu tratamento deve iniciar imediatamente. O
 
tratamento da reação anafilática tem o intuito de manter a oxigenação e a perfusão
dos órgãos vitais, sendo a adrenalina o medicamento mais eficaz para isso devido à
sua ação de início rápido, melhorando a sobrevida do usuário.

Neste material, foram apresentados  os quadros clínicos característicos de


reações anafiláticas, os critérios para seu diagnóstico e o tratamento adequado que
deve ser estabelecido nesses casos. Esses conhecimentos são relevantes para que
o diagnóstico e o tratamento possam ser feitos com agilidade em uma pessoa com
reação anafilática e, assim, salvar sua vida. Esperamos que você tenha compreendido
 
os pontos abordados aqui e que possa aplicar esses conhecimentos na sua prática de
trabalho.

Até a próxima!
 
Referências

1. TOCHE, P. Paola. Anafilaxia. Revista Médica Clínica Las Condes, v. 22, n. 3, p.


265-269, 2011. Disponível em: http://www.clc.cl/clcprod/media/contenidos/pdf/-
MED_22_3/265-269-dra-toche.pdf. Acesso em: 06 maio 2021.

2. CARDONA, Victoria et al. World allergy organization anaphylaxis guidance 2020.


  n. 10, p. 100472, 2020. Disponível em:
World Allergy Organization Journal, v. 13,
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC7607509/pdf/main.pdf. Acesso
em: 06 maio 2021.

3. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria


  de Atenção à Saúde. Departamento
de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica nº28 – Acolhimento a demanda
espontânea: Queixas mais comuns na Atenção Básica. Volume II. 1 ed. Brasília:
Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publica-
coes/acolhimento_demanda_espontanea_queixas_comuns_cab28v2.pdf. Acesso
 
em: 06 maio 2021.

4. CARDONA, Victòria et al. Guía de actuación en anafilaxia. Galaxia, 2016.


Disponível em: https://portal.guiasalud.es/wp-content/uploads/2018/12/GP-
C_556_galaxia_2016_SEAIC_compl.pdf.  Acesso em: 06 maio 2021.

5. DA SILVA, Elaine Gagete Miranda. Anafilaxia e uso de adrenalina. Arquivos de


Asma, Alergia e Imunologia, v. 2, n. 6, p. 223-226, 2014. Disponível em: http://aaai-
-asbai.org.br/detalhe_artigo.
asp?id=708. Acesso em: 06 maio 2021.

6. PFLIPSEN, Matthew C.; COLON, Karla M. Vega. Anaphylaxis: Recognition and


Management. American family physician, v. 102, n. 6, p. 355-362, 2020. Disponível
em: https://www.aafp.org/afp/2020/0915/p355.html. Acesso em: 06 maio 2021.

7. SOLÉ, D. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento de


Alergia. Guia Prático de Atualização. Anafilaxia. nº1, 2016. Disponível
em: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/documentos_cien-
tificos/Alergia-GuiaPratico-Anafilaxia-Final.pdf. Acesso em: 06 maio 2021.

Você também pode gostar