Você está na página 1de 3

A interface da proteção internacional e o direito nacional

As decisões proclamadas nas conferências das Nações Unidas e nos acordos internacionais têm influência
direta na estrutura jurídica e nos órgãos de governança ambiental nacional. Há uma simbiose entre direito
internacional e nacional na proteção ambiental. Isso se dá tanto pela incorporação dos tratados ambientais
na ordem jurídica brasileira quanto pela inspiração na elaboração de diplomas legais na legislação
brasileira. 

Inicialmente, a aprovação de um tratado pelo Brasil passa por estágios, como a negociação; a assinatura
pelo representante do Estado, no caso do Brasil, o Presidente da República; a aprovação pelas duas casas
do Congresso Nacional – Câmara dos Deputados e Senado Federal; a ratificação, ato pelo qual o país
assume a obrigação de cumpri-lo no plano internacional. Com essas etapas, o tratado é válido em nível
internacional. Contudo, para concluir a incorporação do tratado, o Presidente da República edita um
decreto com a sua promulgação na ordem jurídica brasileira. Com isso, o Brasil assume uma série de
obrigações para a implementação correspondente, de acordo com as disposições específicas de cada
convenção. Para exemplificar, no caso da Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima, o Brasil assumiu
o compromisso de reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa, o que implica uma série de medidas
e instrumentos para observar as prescrições da Convenção-Quadro, o que afeta todos os setores do país,
como o poder público, a esfera empresarial e a sociedade civil. O Acordo de Paris, decorrência da
Convenção-Quadro, também foi incorporado à ordem jurídica brasileira. A propósito, o Supremo Tribunal
Federal reconheceu recentemente o Acordo de Paris como um tratado de direitos humanos, ou seja, possui
um status especial, de supralegalidade, estando acima da legislação brasileira, mas abaixo da Constituição
(BRASIL, 2022). Isso significa que a legislação ordinária terá que observar as normas do Acordo de Paris
para a redução dos gases de efeito estufa. 
Figura 1 | Status dos Tratados de Direitos Humanos.

Outro exemplo de aplicabilidade dessa sistemática é Convenção sobre Diversidade Biológica, que, além
de incorporada internamente, proporcionou a edição do Decreto nº 4.339/2002, com os princípios e as
diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade. Esses são somente alguns
exemplos da dinâmica de relação entre as esferas nacional e internacional. Portanto, os compromissos no
âmbito internacional têm implicações diretas no direito brasileiro. Ser signatário de um tratado em
matéria ambiental é assumir obrigações perante a comunidade internacional e conferir a sua observância
na ordem jurídica doméstica. 

A partir da normatização internacional, temos reflexos na ordem jurídica brasileira, inclusive em nível
constitucional. Até mesmo instrumentos sem força jurídica vinculante, como as declarações, têm
influência. A Declaração de Estocolmo, de 1972, inseriu o meio ambiente no rol dos direitos humanos,
enquanto o Relatório Nosso Futuro Comum, de 1987, consignou que o meio ambiente deve ser protegido
para as presentes e futuras gerações. O art. 225 da Constituição de 1988, que é o coração da proteção
ambiental em nível constitucional, dispôs que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito
fundamental e que deve ser protegido para as presentes e futuras gerações (BRASIL, 1988). Essa
passagem demonstra a influência das discussões da ONU. Em nível infraconstitucional, o exemplo mais
significativo é a Declaração do Rio de Janeiro, de 1992, que trouxe princípios internacionais de proteção
ao meio ambiente, que são atualmente previstos na legislação brasileira, como os princípios da precaução,
poluidor-pagador, participação comunitária, informação e análogos. No mesmo sentido, a Agenda 21,
elaborada em 1992, que apesar de não ser obrigatória, serviu de parâmetro para muitas iniciativas nos
órgãos da Administração Pública brasileira e no setor empresarial.  

Com relação à legislação propriamente dita, o Brasil editou leis a partir das discussões originárias nos
documentos e acordos das organizações supranacionais. Como exemplos, a Lei nº 12.187/2009, que
instituiu a Política Nacional de Mudanças do Clima, e a Lei nº 13.123/2015, que disciplina conteúdo
atinente à biodiversidade e ao patrimônio genético. 

No que se refere à estrutura administrativa brasileira, ela é igualmente influenciada pelas conferências das
Nações Unidas. Após a realização da Conferência de Estocolmo, o Brasil criou, em 1973, no âmbito do
Ministério do Interior, a Secretaria Especial de Meio Ambiente da Presidência da República, como
primeiro órgão nacional de proteção ao meio ambiente, tendo como secretário o Sr. Paulo Nogueira Neto.
Em 1992, após a Cúpula da Terra (Rio-92), a Secretaria de Meio Ambiente se transformou no Ministério
do Meio Ambiente e Amazônia Legal, integrando a estrutura diretamente vinculada à Presidência da
República (MELO, 2017). Por todos esses elementos, evidencia-se a influência do domínio internacional
em face da legislação brasileira.  

Avalie este conteúdo


Escolha de 1 a 5 estrelas

Você também pode gostar