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Konder. 37140 P. 303-328
Konder. 37140 P. 303-328
GUSTAVO TEPEDINO
Coordenação
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O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
E A RECONSTRUÇÃO
DO DIREITO PRIVADO
Ana Frazão . Anderson Schreiber . Antônio Carlos Mathias Coltro ' Ari Pargendler
' Arnoldo Wald . Arruda Alvim ' Bruno Lewicki . Carlos Edison do Rêgo Monteiro
Filho º Carlos Eduardo Pianovski Rusyk ' Carlos Nelson Konder ' Fábio Ulhoa
Coelho º Francisco Amaral º Francisco Paulo de Crescenzo Marino . Frederico
Henrique Viegas de Lima ' Gustavo Tepedino ' Heloisa Helena Barboza . Honildo
Amaral de Mello Castro º João Otávio de Noronha ' Judith Martins-Costa ' Luis
Felipe Salomão ' Luiz Edson Fachin . Maria Celina Bodin de Moraes ' Milena
Donato Oliva ' Paulo Lôbo ' Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer ' Rodrigo da
Cunha Pereira º Rose Melo Vencelau Meireles ' Ruy Rosado de Aguiar Júnior '
Sidnei Beneti ' Suzana Borges Viegas de Lima . Zeno Veloso
EDITORA m
REVISTA DOS TRIBUNAIS
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Comentários ao acórdão no REsp 985.531/SP
(rel. Min. Vasco Della Giustina — Desembargador
convocado do TJ/RS, DJe 28.10.2009)
Doutor e mestre em Direito Civil pela UERJ. Especialista em Direito Civil pela Universidade
de Camerino [Itália). Professor adjunto de Direito Civil da UERJ e da PUC-Rio. Professor dos
cursos de Pós—graduação lato sensu da UERJ, da PUC-Rio e da FGV.
humo: Dentro do vasto universo da conexão en ABsmAcr: Within the vast group of linked contracts
':e contratos e suas diversas implicações jurídicas, and its and legal implications, this paper highlights
:estaca-se a possibilidade de invocação da exceção the possibility of invoking the exceptio non
& contrato não cumprido com base na interde odimpleti contractus based on the interdependence
aendêneia entre prestações de contratos coliga between the obligations of related contracts, as
305. conforme apreciado pelo Superior Tribunal de considered by the brazilian Superior Tribunal de
.lastíça no julgamento do Recurso Especial 985331. Justiça in the trial of that special appeal 985331.
ªnalisa—se a evolução jurisprudencial nesta matéria The paper examines the evolution of jurisprudence
ate' este momento e os desafios que a ela ainda se in this area so far and the challenges that it still
"põem. imposes.
PALAVRAS-CHAVE: coligação contratual, exceção de KEYWORDS: linked contracts, exceptio non adimpleti
:ontrato não cumprido. contractus.
A)ACÓRDÃO
Ementa: Recurso especial. Embargos a execução. Ofensa ao art. 535 do CPC não
confgurada. Ausência de prequeslionamento. Súmulas 282 e 356 do STF. Dissídio
jurisprudencial. Cotejo analítico. Necessidade. Contratos coligadas. Unidade de in
teresses econômicos. Relação de interdependência evidenciada. Exceção de contrato
não cumprido. Titulo executivo. Inexigibilidade.
1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional nos embargos declara
tórios quando as instâncias ordinárias enfrentaram a matéria posta em debate na
medida necessária para o deslinde da controvérsia. A ofensa ao art. 535 do CPC
somente se conjgura quando, na apreciação do recurso, o Tribunal de origem insiste
A COLIGAÇÃO CONTRATUAL NA JURISPRUDÉNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 305
em omitir pronunciamento sobre questão que deveria ser decidida, e não foi, o que
não ocorreu na hipótese dos autos.
2. A luz dos enunciados sumulares 282/STF e 356/STF, e inadmissível o recurso
especial que demande a apreciação de matéria sobre a qual não tenha se pronunciado
a Corte de origem.
3. A demonstração do dissídio jurisprudencial pressupõe a realização de cotejo
analítico a demonstrar a similitude fática entre o acórdão recorrido e os julgados
paradigmas.
4. A unidade de interesses, principalmente econômicos, constitui característica
principal dos contratos coligadas.
5. Concretamente, evidenciado que o contrato dejnanciamento se destinou, ex
clusivamente, a aquisição de produtos da Companhia Brasileira de Petróleo Ipiran
ga, havendo sido finnado com o propósito de incrementar a comercialização dos
produtos de sua marca no R de S. I., obrigando-se o Posto revendedor a aplicar o
fnanciamento recebido na movimentação do P. de 5. l., esta conjígurada a conexão
entre os contratos, independentemente da existência de cláusula expressa.
6. A relação de interdependência entre os contratos enseja a possibilidade de ar
guição da exceção de contrato não cumprida.
7. Na execução, a exceção de contrato não cumprida incide sobre a exigibilidade
do titulo, condicionando a ação do exequente a comprovação prévia do cumprimento
de sua contraprestação como requisito imprescindível para o ingresso da execução
contra 'o devedor.
zentos e setenta e dois mil reais) ao recorrido “R C.". e a obrigação deste e dos
demais recorridos, na qualidade de fiadores, de pagar a quantia mencionada, na
forma avençada, a recorrente;
(b) a recorrente entregou a quantia de R$ 372.000,00 (trezentos e setenta e dois
mil reais) ao recorrido “P. C.” (...). O recorrido, após liquidar 24 (vinte e quatro)
prestações do financiamento. cessou o pagamento devido, gerando o vencimento
antecipado da dívida;
(c) as cláusulas 6.3, 6.4, 6.5 e 6.7 do contrato de fornecimento (que segundo o
voto vencedor seriam discutíveis) tratam tão somente de causas ensejadoras da res
cisão do contrato de financiamento e, por conseguinte, do vencimento antecipado
da dívida (...);
(d) as obrigações existentes no contrato de fornecimento e no contrato de finan
ciamento são absolutamente independentes (...)" (f.).
Da simples leitura, resulta evidente que a pretensão da ora recorrente, inserta
em seus declaratórios, tinha conteúdo meramente infringente. revelando o incon
formismo da mesma com as soluções encontradas pela Corte de origem, e não a
omissão desta acerca da apreciação das questões suscitadas.
De toda sorte, sobreleva destacar que o órgão julgador não está obrigado a se
pronunciar acerca de todo e qualquer ponto suscitado pelas partes, mas apenas
sobre os considerados suficientes para fundamentar sua decisão, o que foi feito.
E mais, a motivação contrária ao interesse da parte ou mesmo omissa em rela
ção a pontos considerados irrelevantes pelo decisum não se traduz em maltrato as
normas apontadas como violadas.
Nesse sentido:
“Civil e processual civil — Agravo regimental no agravo de instrumento — Res
ponsabilidade civil — Ação de indenização por danos morais — Inscrição em cadas
tro de inadimplentes — Cancelamento do registro — lnviabilidade — Súmula 323 do
STJ — Omissão. contradição ou obscuridade do acórdão recorrido — lnocorrência
— Falta de prequestionamento dos demais dispositivos elencados no recurso. l —
Não se pode confundir negativa de prestação jurisdicional com tutela jurisdicional
desfavorável ao interesse da parte. O Tribunal de origem decidiu corretamente o
feito, baseando-se, inclusive, na jurisprudência assente desta Corte sobre a matéria.
Assim, não há que se falar em violação dos arts. 458, 11 e lll, 515. && l.º e 2.º, 535,1
e II, do CPC. Os demais dispositivos não foram prequestionados. ll — O registro do
nome do consumidor nos órgãos de proteção ao crédito não se vincula a prescrição
atinente à espécie de ação cabível. Assim, se a via executiva não puder ser exercida,
mas remanescer o direito a cobrança da dívida por outro meio processual, desde
que durante o prazo de 5 (cinco) anos, não ha óbice à manutenção do nome do
consumidor nos órgãos de controle cadastral, em vista do lapso quinquenal (Súmu—
310 0 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E A RECONSTRUÇÃO 00 DIREITO PRIVADO
"Art. 615. Cumpre ainda ao credor: (...) lV — provar que adimpliu a contrapres
tação, que lhe corresponde, ou que lhe assegura o cumprimento, se o executado
não for obrigado a satisfazer a sua prestação senão mediante a contraprestação do
credor“.
A propósito, a lição de Orlando Gomes: “a exceção de contrato não cumprido
paralisa a ação do exceto, tornando seu crédito inexigivel” (Contratos. Rio dejanei
ro: Forense, 2009. p. 110).
A jurisprudência não discrepa desse entendimento. Veja-se:
“Execução. Título executivo. Contrato bilateral. Obrigação de dar. 1. O contrato
bilateral pode servir de titulo executivo de obrigação de pagar quantia certa, desde que
defnida a liquidez e certeza da prestação do devedor; comprovando o credor a cumpri
mento integral da sua obrigação.
2. Recurso conhecido, pela divergência, mas improvido, por desatendimento
da exigência de prova da prestação“ (REsp 81.399/MG, rel. Min. Ruy Rosado de
Aguiar, 4.ª T.,j. 05.03.1996, D] 13.05.1996 p. 15561).
Concretamente, a existência de discussão acerca do cumprimento das obriga
ções recíprocas pactuadas entre as partes afasta a força executiva do título, tornan
do-o inapto a aparelhar a presente execução.
Ademais, consoante ajurisprudencia desta Corte, “a apuração de fatos, a atribui
ção de responsabilidades, a exegese de cláusulas contratuais tornam necessário o
processo de conhecimento, e descaracterizam o documento como titulo executivo“
(REsp 39567/MG, rel. Min. Waldemar Zveiter, 3.ª T.,j. 15.12.1993, D] 07.03.1994,
p. 3663).
Assim, por todos os fundamentos ora externados, tenho que não se faz merece
dor de qualquer reparo o v. acórdão ora hostilizado, cujas conclusões, resumidas
por ocasião do julgamento dos embargos de declaração opostos contra o acórdão
recorrido, por derradeiro, ora se transcreve:
“0 v. acórdão já anotou que as partes celebraram um “contrato de fornecimento
de produtos e outros pactos" (f. dos autos da execução) e um “contrato de finan
ciamento" (f. dos autos da execução). No contrato de financiamento, na cláusula
n. 1, ficou estabelecido que “A I. concede ao revendedor um financiamento no valor
indicado no campo 14 que lhe e' entregue de acordo com o disposto no campo 15,
obrigando-se o revendedor a aplicar o financiamento recebido na movimentação do
P. de S. ]. situado no endereço indicado no campo 11.“ (f. dos autos da execução)
(grifo não original).
Tais fatos demonstram conexão dos contratos, que ainda pode ser analisada a
luz da manifestação de vontade das partes na cláusula n. 3, do contrato, em que se
estabelece que “O revendedor recebe o presente financiamento como meio de auxi
lio da I. para incrementar a comercialização dos produtos de sua marca no P. S. I.“
tf. dos autos da execução).
316 0 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
B) COMENTÁRIO
b e 2.» do RISTJ. q %
CPC: ªft- 1.092 dº CCÍ19152 Lªi consideração (com efeitosjuridicos) do conjunto
8.935/1994; e art. 255, 55 1.º. 0 e de contratos vinculados entre si no ual o ne o
cio objeto de exame encontra-se inserido. O con
trato, desta forma, deixa de ser examinado como
uma abstração e a atribuição de seus efeitos ju
rídicos passa a depender da compreensão de sua inserção na realidade concreta.
como regulamento de interesses contextualizado, em vista das características das
partes, da natureza e importância do seu objeto e de todas as demais'circunstãncias
que o cercam e que possam ter relevância juridica.
Assim, dentro da grande heterogeneidade do fenômeno da conexão entre con
tratos — que pode envolver dois ou mais contratos, as mesmas partes ou partes
diversas, estruturas lineares ou triangulares — observa-se um aspecto comum a to
das suas facetas: a insuficiência da tradicional analise puramente estrutural dos
negócios, presa ao modelo do contrato singularizado, colocando o desafio de como
lidar, de forma valorativamente adequada, com as implicações jurídicas das vincu
lações fãticas existentes entre os negóciosjuridicos.
Dentro deste atnplo universo, sobressai em importância a coligação contratu
al. São normalmente considerados coligados contratos cuja vinculação, alem de
repercutir na sua interpretação e qualificação, podem afetar sua eficácia.1 Isto e.
as vicissitudes de um, como a invalidade ou ineficácia por causa superveniente.
podem acabar por também tornar o outro ineficaz, conforme o aforisma latino.
siInul stabttnt, síInul cadent. Avaliar se isto ira efetivamente ocorrer vai depen
der da avaliação funcional dos contratos etn questão e também da ligação entre
2. Mencione-se. a titulo histórico, as manifestações pioneiras entre nós sobre o tema de GO
MES, Orlando. Contratos. 26. ed.. Rio de janeiro: Forense, 2008. p. 102 e ss. e os estudos
de MOREIRA,]ose' Carlos Barbosa. Unidade ou Pluralidade de contratos: contratos cone
xos, vinculados ou coligados. Litisconsõrcio necessário e litisconsórcio facultativo. 'Co
munhão de interesses“. “conexão de causas' e “afinidade de questões por um ponto comum
de fato ou de direto'. Revista dos Tribunais. v. 448. São Paulo. fev. 1973. p. 51-60; e ROSAS.
Roberto. Contratos coligadas. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial,
n. 3. São Paulo, jan./mar. 1978. p. 53. seguidos por MARQUES, Cláudia Lima. Contratos
no Código de Defesa do Consumidor, 4. ed. São Paulo: Ed. RT, 2002, p. 94-95, e WALD, Ar
noldo. Obrigações e contratos, 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 247. Mais recentemente,
devem ser mencionados os Ininuciosos estudos de LEONARDO, Rodrigo Xavier. Redes
contratuais no mercado habitacional. São Paulo: Ed RT. 2003; MARINO. Francisco Paulo De
Crescenzo. Contratos coligadas no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2009; e KATAOKA,
Eduardo Takemi. A coligação contratual. Rio de janeiro: Lumen Juris. 2008. além do rico
parecer de MARTINS-COSTA. Judith. O fenômeno da supracontratualidade e o principio
do equilíbrio: inaditnplemento de deveres de proteção (violação positiva do contrato) e
deslealdade contratual ein operação de descruzamento acionário. Revista "Trimestral de Di
reito Civil. vol. 26. Rio de Janeiro. abr./jun. 2006. p. 213-249.
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3. STJ, REsp 985531, 3ª T., j. 01.09.2009. rel. Des. convocado Vasco Della Giustina. Dje
28.10.2009.
4. STJ. RBp 419362, 4ª T.. j. 17.06.2003, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, rel. para o acórdão
Min. Ruy Rosado de Aguiar. Dj 22.03.2004.
322 O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
5. STJ, REsp 337040, 4ª T.,j. 22.05.2002, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar. D] 01.07.2002.
6. STJ, CC 34504, 2." S.. j. 12.03.2003, rel. Min. Nancy Andrighi, rel. p/ acórdão Min. Ruy
Rosado de Aguiar, DJ 16.06.2003, p. 256, RDDP 5/2” e RDR 27/252.
A COLIGAÇÃO CONTRATUAL NA JURISPRUDÉNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 323
relator, Min. Bilac Pinto, acompanhado pelo Min. Rodrigues Alckmin. Para o rela
tor, tratava-se de uma concessão de venda com exclusividade, contrato misto atípi
co, com núcleo na compra e venda mercantil mas com significativas diferenças. O
Ministro inclusive distinguiu o contrato misto da união de contratos. No primeiro,
as obrigações pertinentes a tipos diferentes de contratos encontram-se enlaçadas
pelo caráter unitário da operação econômica, enquanto, no segundo, tais obriga
ções estão simplesmente justapostas em um mesmo instrumento, sem o amálgama
da unidade econômica. Afirmou ainda que, em tais casos, a cada tipo se aplicam
as suas normas, mas apenas se não se chocarem com o resultado que elas visam
assegurar. Em razão disso, a extinção de um contrato importa a impossibilidade
do outro, mas sempre cabe ao judiciário analisar as multas, para avaliar eventual
excesso no caso concreto.
O caso gerou embargos de divergência, tendo em vista que julgados da 2.ª T.
relatados por Cordeiro Guerra aplicavam a multa da compra e venda, com base
na primazia deste contrato. No julgamento dos embargos, os Mins. Bilac Pinto e
Cunha Peixoto afirmaram que não havia divergência, pois caberia ao juiz avaliar,
com base no caso concreto, qual multa prevalecerá. O entendimento dominante,
contudo, foi o do Min. Cordeiro Guerra, para quem, seja considerado misto ou
coligado, a finalidade perseguida e' a compra e venda, razão pela qual a seu ver esta
e a multa que deve prevalecer. Foi acompanhado pelos Mins. Xavier de Albuquer
que e Moreira Alves. O voto deste último foi o mais elucidativo: um contrato seria
principal (com a multa a ser cobrada) c o outro e um contrato-meio, e o que deve
prevalecer e' a finalidade econômica. Não se trata de um contrato misto (como nos
casos ,de internato, em que ha ensino, alimentação, lavagem de roupa e hospeda
gem). Tratar-se-ia do que Enncccerus chama de contrato coligado com dependên
cia unilateral ou bilateral, isto e': unidade econômica, dualidadejuridica. E como o
descumprido foi o contrato principal, a multa deste e' que deverá incidir.
4. DESAFIOS E PERSPECTIVAS
Este panorama revela que grandes passos foram dados por pioneiras decisões
judiciais no sentido de ultrapassar o exame singularizado e abstrato do contrato
para reconhecer efeitos jurídicos às coligações contratuais, buscando soluções que
condigam com a proteção dos interesses juridicamente protegidos em jogo. No
entanto, ainda há neste âmbito dos contratos coligados pontos que permanecem
controversos e que demandam apreciação mais cuidadosa.
Tome-se o exemplo da coligação contratual com diversidade de partes, em que
os dois contratos vinculados entre si não foram celebrados pelas mesmas partes,
como no crédito ao consumo em que a instituição bancária que financia a aqui
sição não e' parte do contrato de compra e venda do bem. Surge aqui a figura do
“contratante-terceiro“, “simples parte“ ou “parte por equiparação“.
326 O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
9. Neste sentido, v. a análise de LENER, Giorgio. Profili del collegamento negoziale. Milano:
Giuffre, 1999, p. 177. Sobre o principio da relatividade e suas exceções, v. Caitlin Sampaio
ML'IHOLL-XND. O princípio da relatividade dos efeitos contratuais. III MORAES, Maria Celina
Bodin de (coord.). Princípios do direito civil contemporaneo. Rio dejaneiro: Renovar, 2006.
p. 255-280.
10. Sobre o tema, v. MORAES, Maria Celina Bodin de. A causa do contrato. Na medida da
pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 289-316; MARTINS-COSTA, Judith. O
fenômeno da supracontratualidade e o principio do equilíbrio: inadimplemento de deve
res de proteção (violação positiva do contrato) e deslealdade contratual em operação de
descruzamento acionário. Revista Trimestral de Direito Civil, vol. 26. Rio de Janeiro, abr]
jun. 2006, p. 213-249; RENTERÍA, Pablo. Considerações acerca do atual debate sobre o
principio da função social do contrato. ln MORAES, Maria Celina Bodin de (coord.). Pl'lllfl
pios do direito civil contemporaneo. Rio dejaneiro: Renovar, 2006, p. 281-313.
1 1. TJSP, Recurso n. 205/01, +.“ Colegio Recursal,Juizado Especial Civel,j. 26.10.2001, publ.
RTDC 8/171-173.
12. TJRS, Ap. Civ. 70001462845, 6." C.C., ]. 07.02.2001, rel Des. Carlos Alberto Álvaro de
Oliveira, publ. R1213/319.
A COLIGAÇÃO CONTRATUAL NA JURISPRUDÉNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 327
13. STJ, REsp 1014547. +." T., j. 25.08.2009, rel. Min. João Otavio de Noronha, publ.
07.12.2009.
H. Por exemplo, no ordenamento italiano, a Lei bancaria (DL 385/93). que reproduziu os
dispositivos da L. 142/92 (por sua vez inspirada na Diretiva 102/87/CEE). regula o crédito
ao consumo em seus arts. 121 a 125, e determina expressamente no art. 125.4: “Nos casos
de inadimplemento do fornecedor de bens e serviços, o consumidor que tenha efetuado
inutilmente a constituição em mora tem direito de agir contra o financiador no limite do
crédito concedido, contanto que exista um acordo que atribua ao financiador exclusivida—
de para concessão de crédito aos clientes do fornecedor."
328 0 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E A RECONSTRUÇÃO DO DIREITO PRIVADO
15. PERLINGIERI, Pietro. ln tema di tipicità e atipicità nei contratti. ll din'tto dei contraltijra
persona e mercato: problemi del dirilto civile. Napoli: ESL 2003, p. 397-398. Sobre o tema,
v. ainda MORAES, Maria Celina Bodin de. A causa do contrato. Na medida da pessoa huma—
na. Rio de janeiro: Renovar. 2010, p. 289-316; TEPEDINO, Gustavo. Questões controver
tidas sobre o contratos de corretagem. Temas de direito civil. 4. ed. Rio de janeiro: Renovar.
2008. p. 133—159; e KONDER, Carlos Nelson. Qualificação e coligação contratual. Revista
Forense, vol. 406. Rio de Janeiro, nov./dez. 2009. p.55-86