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Órtese e Prótese

em Fisioterapia
Autora: Profa. Débora Pedrolo Parisi
Colaboradores: Prof. Cristiano Schiavinato Baldan
Profa. Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão
Professora conteudista: Débora Pedrolo Parisi

Graduada em Fisioterapia pela Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), em 1998, com residência clínica na
Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em 1999. Mestre em Bioética pela Universidade São Camilo
(USP), em 2007, e doutora em Patologia Experimental pela UNIP, em 2017. Docente da UNIP desde 2001 (professora
adjunta) das disciplinas de Controle Motor e Neurociências, Fisioterapia Pediátrica, Fisioterapia Neurofuncional e Órtese
e Prótese. Coordenadora do curso de pós-graduação em Fisioterapia Neurofuncional do Instituto Imparare desde 2016.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P234o Parisi, Débora Pedrolo.

Órtese e Prótese em Fisioterapia / Débora Pedrolo Parisi. – São


Paulo: Editora Sol, 2022.

124 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Amputação. 2. Reabilitação. 3. Órtese. I. Título.

CDU 616.711

U515.38 – 22

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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permissão escrita da Universidade Paulista.
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Reitor

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Vice-Reitora de Unidades do Interior

Unip Interativa

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático

Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Leonardo do Carmo
Jaci Albuquerque
Sumário
Órtese e Prótese em Fisioterapia

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 HISTÓRIA DAS AMPUTAÇÕES.........................................................................................................................9
1.1 Evolução das amputações................................................................................................................. 10
1.2 Etiologia das amputações.................................................................................................................. 15
1.2.1 Amputação secundária a alterações vasculares (vasculopatias).......................................... 16
1.2.2 Amputação secundária ao diabetes melito e à neuropatia vascular periférica............. 18
1.2.3 Amputações de origem traumática.................................................................................................. 22
1.2.4 Amputações associadas a quadros tumorais............................................................................... 25
1.2.5 Amputação secundária a infecções................................................................................................. 26
1.2.6 Anomalias congênitas e amputações.............................................................................................. 27
1.3 Condições gerais para a amputação e pós-amputação........................................................ 27
2 CLASSIFICAÇÃO DOS NÍVEIS DE AMPUTAÇÃO DOS MEMBROS INFERIORES.......................... 28
2.1 Amputação pododáctilas e metatarsais....................................................................................... 30
2.2 Desarticulação de Lisfranc................................................................................................................. 31
2.3 Desarticulação naviculocuneiforme e transcuboide............................................................... 31
2.4 Desarticulação de Chopart................................................................................................................ 31
2.5 Amputação tipo Syme......................................................................................................................... 32
2.6 Amputação de Pirogoff...................................................................................................................... 32
2.7 Amputação de Boyd............................................................................................................................. 32
2.8 Amputação transtibial......................................................................................................................... 33
2.9 Desarticulação de joelho.................................................................................................................... 34
2.10 Amputação transfemoral................................................................................................................. 34
2.11 Desarticulação de quadril................................................................................................................ 36
2.12 Hemipelvectomia................................................................................................................................ 36
2.13 Hemicorporectomia........................................................................................................................... 38
2.14 Desarticulação sacroilíaca............................................................................................................... 38
3 FASES DA REABILITAÇÃO.............................................................................................................................. 38
3.1 Preparo pré-cirúrgico (amputações eletivas)............................................................................. 39
3.1.1 Miniexame do Estado Mental (Meem)............................................................................................ 40
3.1.2 Avaliação Cognitiva de Montreal (MoCA)..................................................................................... 41
3.2 Protetização imediata......................................................................................................................... 42
3.3 Reabilitação pré-protetização.......................................................................................................... 42
3.3.1 Fase inicial do tratamento................................................................................................................... 43
3.3.2 Complicações no pós-operatório de amputação....................................................................... 44
4 ABORDAGEM DA EQUIPE DE REABILITAÇÃO NA FASE DE PRÉ-PROTETIZAÇÃO..................... 52
4.1 Avaliação funcional do paciente amputado.............................................................................. 52
4.2 Objetivos do tratamento fisioterapêutico: fase de pré-protetização.............................. 53
4.2.1 Auxiliar no processo de cicatrização e evitar aderência cicatricial..................................... 53
4.2.2 Praticar exercícios de dessensibilização para melhora do quadro de
hiperestesia, hiperalgesia e sensação de membro fantasma............................................................ 54
4.2.3 Modelar o coto e controlar o edema (preparo do membro residual)................................. 54
4.2.4 Treinar mudanças de decúbito, transferências e marcha com
dispositivos auxiliares........................................................................................................................................ 57
4.2.5 Fortalecer os músculos e o condicionamento cardiopulmonar........................................... 58
4.2.6 Treino de equilíbrio................................................................................................................................. 59
4.2.7 Evitar contraturas musculares e manter o alongamento muscular................................... 60

Unidade II
5 FASE DE PROTETIZAÇÃO................................................................................................................................ 67
5.1 Escala de funcionalidade nível K (K level)................................................................................... 68
5.2 Classificação dos tipos de próteses quanto a sua estrutura............................................... 71
5.3 Componentes protéticos.................................................................................................................... 73
5.3.1 Encaixes protéticos................................................................................................................................. 73
5.3.2 Tipos de joelhos protéticos.................................................................................................................. 79
5.3.3 Tipos de pés protéticos.......................................................................................................................... 82
6 ABORDAGEM FISIOTERAPÊUTICA NA FASE PROTÉTICA.................................................................... 85
7 DEFINIÇÃO E ASPECTOS GERAIS DAS ÓRTESES................................................................................... 87
7.1 Indicações, contraindicações e tipos de órteses segundo as doenças
e os objetivos a serem alcançados......................................................................................................... 89
7.2 Órteses para membros inferiores.................................................................................................... 90
7.2.1 Órteses para os pés................................................................................................................................. 90
7.2.2 Órteses pré-marcha................................................................................................................................ 94
7.2.3 Estabilizadores de pelve......................................................................................................................100
7.3 Órteses para coluna vertebral........................................................................................................101
7.3.1 Estabilizadores da coluna cervical..................................................................................................101
7.3.2 Órteses torácicas....................................................................................................................................102
7.3.3 Órteses toracolombares.......................................................................................................................103
7.4 Órteses para membros superiores................................................................................................106
8 DISPOSITIVOS AUXILIARES DE MARCHA..............................................................................................108
APRESENTAÇÃO

Caro aluno, bem-vindo à disciplina de Órtese e Prótese em Fisioterapia.

Neste livro-texto teremos uma visão atual do universo das próteses e órteses, com conhecimentos
específicos para reconhecer e compreender as indicações gerais e específicas de uma prótese ou órtese,
segundo as necessidades de seu paciente.

Outro objetivo será orientá-lo a conduzir uma abordagem fisioterapêutica específica, utilizando-se
destes recursos que são fundamentais para diversos pacientes.

Falaremos também o histórico das amputações das próteses, os aspectos gerais da cirurgia de
amputação, indicações e prevalência segundo a etiologia e idade, as complicações mais comuns até os
níveis de amputação. Em seguida, abordaremos o tratamento pré e pós-operatório do amputado até sua
protetização e os tipos de próteses de acordo com os níveis de amputação.

Outro tópico discutido, muito importante para os fisioterapeutas, será o uso e a indicação de órteses,
os tipos de órteses segundo as doenças e os objetivos a serem alcançados. Estudaremos as principais
órteses utilizadas (membros superiores, membros inferiores coluna cervical e tronco) para correção e
prevenção de deformidades, compensações e posicionamento, imobilização, melhora e auxílio da função
e sustentação.

Por meio da leitura dos conteúdos e resolução consistente dos exercícios, esperamos que você não
apenas compreenda a importância da abordagem do fisioterapeuta nos cuidados ao paciente amputado
e do uso e indicação de cada tipo de órtese, mas tenha também amplo conhecimento em todos os
processos da reabilitação.

Bons estudos!

INTRODUÇÃO

Na primeira unidade deste livro-texto, estudaremos a evolução das amputações. Veremos aqui como
esses procedimentos se desenvolveram ao longo do tempo.

Seguindo por esse caminho, abordaremos as principais causas de amputação no Brasil e no mundo,
a classificação dos níveis de amputação, o processo de reabilitação pré e pós-amputação, e o processo
de reabilitação na fase de pré-protetização, a qual seria antes de o paciente receber a prótese.

Na segunda unidade, abordaremos a fase de protetização em si, os tipos de próteses, das mais
simples aos modelos mais atuais, os tipos de próteses utilizadas por atletas de alto rendimento e os mais
convencionais. Outros pontos interessantes são os componentes que formam as próteses, as principais
indicações para cada nível de amputação, e também o papel importantíssimo do fisioterapeuta durante
todo esse processo. Por fim, abordaremos as principais órteses, suas indicações, finalidades e benefícios.

Lembre-se de que, além do conteúdo proposto, é importante que você consulte a bibliografia
complementar indicada.

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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Unidade I
1 HISTÓRIA DAS AMPUTAÇÕES

Neste tópico estudaremos a respeito da evolução das amputações. Você tem ideia de como eram
realizadas as amputações antigamente? Quais instrumentos eram utilizados? Como evoluíram estes
procedimentos?
Sabemos que as amputações de membros são um dos recursos terapêuticos mais antigos da medicina.
O termo amputação é utilizado para definir a retirada total ou parcial de um membro (por cirurgia ou
por acidente), sendo este um método de tratamento para diversas doenças. A palavra amputação deriva
do latim amputare, que significa cortar, podar, e foi usada, inicialmente, para descrever a remoção, com
uma faca, de partes de membros.
O membro artificial mais antigo conhecido era uma perna de cobre e madeira desenterrada em
Capri, Itália, em 1858, que supostamente foi feita por volta de 300 a.C. Infelizmente, foi destruído
durante um bombardeio de Londres na Segunda Guerra Mundial. Mãos artificiais feitas de ferro foram
usadas pelos cavaleiros no século XV. A mão Alt-Ruppin, mostrada junto com outras mãos do século XV
no Museu Stibbert, Florença, Itália, é um bom exemplo do trabalho daquela época (SMITH; MICHAEL;
BOWKER, 2004).
A figura a seguir ilustra uma cena de amputação antiga.

Figura 1 – Representação do século XVII de uma cena de amputação

Disponível em: https://cutt.ly/BShbmDe. Acesso em: 16 mar. 2022.

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Unidade I

As amputações ou remoções de membros, em diferentes níveis, têm sido realizadas desde os tempos
antigos, seja como parte de um ritual de sacrifício, punição, ou como forma de tratamento de tecidos
com graves lesões ou de causa tumoral.

A amputação de um membro não representa apenas a perda física e/ou estética; ela também
compromete mobilidade, autonomia, autoestima e a imagem corporal do indivíduo, podendo levar a
perdas funcionais importantes.

As amputações de membros inferiores correspondem a aproximadamente 85% do total, e causam


um grande impacto socioeconômico, com perda da capacidade de trabalho, da socialização e da
qualidade de vida do indivíduo. Além disso, podem evoluir com complicações tais como hematoma,
infecções, necrose, contraturas, neuromas e dor fantasma, demonstrando ser um importante problema
de saúde pública.

Os principais fatores de risco relacionados às amputações são diabetes melito, hipertensão arterial,
tabagismo, dislipidemia, idade avançada, insuficiência renal crônica, estados de hipercoagulabilidade
sanguínea, entre outros.

1.1 Evolução das amputações

Como dito anteriormente, as amputações de membros são uns dos procedimentos cirúrgicos mais
antigos, e as técnicas e instrumentos cirúrgicos vêm sendo constantemente aprimorados.

Registros históricos de amputações encontrados em manuscritos ou em artefatos arqueológicos


mostram que essas cirurgias são realizadas pelo menos desde 43.000 a.C. Há vestígios de amputações
em ruínas antigas do Egito, onde dedos protéticos primitivos foram localizados nos túmulos dos
faraós. No período da Grécia e Roma antigas, há registros de casos de amputações representados
em mosaicos.

Para os antigos povos indígenas da região do Peru (600–300 a.C.), as amputações eram realizadas
como forma de punição e castigo. Ladrões eram punidos, por exemplo, com a amputação de
uma das mãos.

Entre os séculos XVI e XVII, as amputações também eram realizadas em rituais com objetivos
de cura, por motivos jurídicos ou razões estéticas. As cirurgias curativas ocorriam no sítio doente
ou acima dele. Eram realizadas com grande velocidade e precisão, numa tentativa de diminuir o
sangramento e a dor.

Hipócrates (460–377 a.C.), considerado o pai da medicina científica, considerava a gangrena como
a única indicação de amputação, e o corte era realizado no tecido necrótico, de modo a evitar a
dor e a probabilidade de hemorragias; contudo, muitos pacientes acabavam morrendo exatamente
devido a quadros hemorrágicos ou infecciosos. Com relação à cirurgia, Hipócrates descreveu o uso
de ligaduras, mas essa técnica foi perdida durante a Idade das Trevas. Foi reintroduzido em 1529
por Ambroise Paré, um cirurgião militar francês. Como resultado, as amputações passaram a ser
10
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

empregadas cada vez mais como medida para salvar vidas, uma vez que a taxa de sobrevivência era
muito maior quando as ligaduras eram usadas (SMITH; MICHAEL; BOWKER, 2004).

Já no primeiro século, o enciclopedista romano Celsus descreveu a amputação de uma extremidade


gangrenada. Ele explicitamente apontou que deve-se cortar as partes moles na borda entre o tecido
saudável e o doente até chegar ao osso. Então deve-se puxar para trás as partes moles saudáveis do osso
e separá-los, então o osso nesta posição se torna visível. Por fim, deve-se serrar o osso o mais próximo
possível das partes moles saudáveis que ainda aderem ao osso.

Como citado anteriormente, Paré introduziu uma etapa importante no desenvolvimento da técnica
de amputação: a ligação de vasos. Isso possibilitou a redução da perda de sangue durante a amputação.
Para realizar a homeostasia dos membros amputados, o cirurgião conseguiu conter os sangramentos
conectando os vasos sanguíneos, por meio de pinças e fios, em vez de cauterizá-los, como se fazia
anteriormente, e aplicar nele substâncias hemostáticas (como óleo quente). Ele era especialmente
interessado na reabilitação do paciente pós-amputação, e desenvolveu e confeccionou dispositivos
semelhantes às próteses atuais para os membros, preocupando-se com a escolha adequada do local da
cirurgia, tendo em vista o uso futuro de próteses.

Figura 2 – Ilustração do século XIX de um amputado de guerra

Disponível em: https://cutt.ly/rShnfNA. Acesso em: 16 mar. 2022.

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Unidade I

Em 1674, o cirurgião francês Etienne J. Morel teria usado um torniquete na batalha de Besançon
(guerra franco-holandesa), que melhoraria a recuperação de pacientes amputados; os torniquetes são
dispositivos de contenção de hemorragias aplicados nos membros (inferiores e superiores), geralmente
para conter lesões de extremidades exsanguinantes. Morel introduziu o uso do torniquete, o que deu outro
impulso à cirurgia de amputação. Paré, em 1536, realizou o primeiro procedimento de desarticulação do
cotovelo. Por sua vez, Sir James Syme relatou em 1843 seu procedimento para amputação no tornozelo
(SMITH; MICHAEL; BOWKER, 2004).

O uso de torniquetes mostrou-se efetivo na realização de hemostasia temporária e na redução de


mortalidade por lesões de extremidades com risco mínimo de complicações relacionadas diretamente
a seu uso em campo de batalha.

Figura 3 – Uso do torniquete

Disponível em: https://cutt.ly/EShnBNJ. Acesso em: 16 mar. 2022.

Posteriormente, ocorreram avanços nas técnicas cirúrgicas que possibilitaram melhores resultados,
como a já mencionada introdução do torniquete por Morel, em 1674, e a assepsia por Lord Lister,
estudante e genro de Syme, em 1867. A introdução da técnica antisséptica por Lord Lister contribuiu
muito para o sucesso geral da cirurgia de amputação, assim como o uso de clorofórmio e éter na
mesma época.

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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Figura 4 – Modelo de torniquete de Morel

Disponível em: https://cutt.ly/EShQqwn. Acesso em: 16 mar. 2022.

Outro grande marco na evolução dos tratamentos cirúrgicos foi o advento da anestesia geral, no
século XX, e dos mecanismos de assepsia, os quais até então não existiam.

O conceito de cineplastia para energizar próteses de membros superiores diretamente por contração
muscular foi introduzido por Giuliano Vanghetti, em 1898, enquanto tentava melhorar a função de
soldados italianos que tiveram suas mãos amputadas pelos abissínios. Um associado de Vanghetti,
Antônio Ceci, realizou a primeira operação desse tipo em humanos em 1900. Na Alemanha, em 1916,
Ferdinand Sauerbruch e Carel ten Horn desenvolveram o túnel muscular forrado de pele, e Guillermo
Bosch Arana, na Argentina, realizou estudos clínicos desse procedimento na década de 1920 (SMITH;
MICHAEL; BOWKER, 2004).

Bier, por volta de 1900, em um esforço para tornar a extremidade distal do osso cortado capaz de
suportar peso, recomendou um procedimento osteoplástico no qual a extremidade cortada era coberta
com um retalho de osso cortical conectado por uma dobradiça periosteal. Este procedimento nunca
se tornou difundido, mas, no final da década de 1940, Ertl deu um passo adiante e desenvolveu um
procedimento para formar uma ponte óssea entre as extremidades cortadas da fíbula e da tíbia. Alguns
anos depois, Mondry combinou a técnica da ponte óssea com a miodese, ou fixação dos músculos
cortados uns aos outros sobre a extremidade distal do coto. Dederich, Weiss e outros adotaram e
popularizaram esses procedimentos em algumas áreas (SMITH; MICHAEL; BOWKER, 2004).

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Unidade I

Figura 5 – Ilustração realizada pelo artista Charles Bell (1774–1842)


de uma grande cirurgia de amputação

Disponível em: https://cutt.ly/7ShQGkH. Acesso em: 16 mar. 2022.

Figura 6 – Instrumentos de amputação usados nos séculos XVII e XVIII

Disponível em: https://cutt.ly/pShWruL. Acesso em: 16 mar. 2022.

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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

1.2 Etiologia das amputações

As possíveis causas que levam a uma amputação são as doenças infecciosas e parasitárias, doenças
do aparelho circulatório, diabetes melito, neuropatias periféricas, doenças do sistema osteomuscular e do
tecido conjuntivo, neoplasias, causas externas, doenças de pele e malformações congênitas.

As amputações dos membros inferiores são mais frequentes, principalmente quando associadas ao
envelhecimento populacional e a doenças crônicas, tais como o diabetes e as doenças vasculares.

Entre os fatores etiológicos das amputações, as causas mais prováveis são:

• vasculares;

• neuropáticas;

• traumáticas;

• tumorais;

• infecciosas;

• congênitas (malformação congênita);

• iatrogênicas.

Aproximadamente 80% das amputações de membros inferiores são realizadas em pacientes adultos,
com doença vascular periférica e/ou diabetes. As amputações por causas traumáticas prevalecem
em acidentes de trânsito e ferimentos por arma de fogo, sendo esta a segunda maior causa. Entre
as amputações não eletivas, o trauma é responsável por cerca de 20% das amputações de membros
inferiores, sendo 75% destas em indivíduos do sexo masculino.

Indivíduos diabéticos têm risco 15 vezes maior de serem submetidos a amputações, o que é mais
frequente na população diabética de baixo nível socioeconômico, com condições inadequadas de higiene
e pouco acesso aos serviços de saúde; isto costuma ocorrer porque, quando procuram atendimento
médico, as lesões geralmente estão em estágios avançados, requerendo tratamento cirúrgico, incluindo
as amputações.

Nos Estados Unidos, os pacientes diabéticos correspondem a cerca de 3% da população total, e mais
de 50% deles são submetidos à amputação de membros inferiores.

No Brasil, o Ministério da Saúde traçou o perfil da população quanto às doenças crônicas mais
incidentes no país: 7,4% dos brasileiros têm diabetes, 24,5% têm hipertensão e 20,3% estão obesos.
É o que aponta a pesquisa Vigitel 2019 – Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico. A pesquisa mostrou que, no período entre 2006 e 2019, a prevalência
de diabetes passou de 5,5% para 7,4%, e a de hipertensão arterial subiu de 22,6% para 24,5%
(BRASIL, 2020).
15
Unidade I

Veja a seguir alguns dos aspectos decisivos para a escolha da amputação:

• mecanismo de trauma;

• tempo de isquemia e pesquisa de sinais de isquemia irreversível;

• comorbidades com risco elevado de amputação secundária;

• condições de recuperação funcional;

• possibilidade e disponibilidade de reparo vascular;

• grau de contaminação e risco de infecção;

• estado hemodinâmico e cardiopulmonar que exigem salvamento da vida em detrimento


do membro.

Já entre os principais fatores de risco associados à amputação, podemos mencionar:

• diabetes melito e doença vascular periférica;

• neuropatia periférica e presença de ulcerações;

• hipertensão arterial sistêmica;

• tabagismo e alcoolismo;

• dislipidemia;

• idade avançada;

• insuficiência renal crônica;

• estados de hipercoagulabilidade sanguínea;

• fatores genéticos.

1.2.1 Amputação secundária a alterações vasculares (vasculopatias)

Como já dissemos, a maioria das amputações são causadas por doença vascular periférica: a
arteriosclerose combinada ou não com diabetes, ou algum outro tipo de patologia vascular, por exemplo,
a trombose venosa profunda (TVP).

16
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

As alterações vasculares podem ser de origem arterial, venosa ou linfática; e os principais fatores
predisponentes são a hipertensão arterial sistêmica, o aumento da taxa de triglicérides, o tabagismo e a
hipercolesterolemia, e apresentam maior incidência em idosos.

As doenças arteriais obstrutivas periféricas levam ao estreitamento da luz das artérias dos
membros inferiores; geralmente, estão associadas à doença aterosclerótica, e tendem a piorar com o
envelhecimento do indivíduo, podendo levar à alteração funcional dos membros inferiores, maior risco
para ulcerações e até mesmo amputações.

Outra patologia que pode ser responsável pelo risco de amputações é a tromboangeíte obliterante,
doença que afeta as artérias (de pequeno ou médio calibre), de caráter inflamatório; embora sua
causa seja desconhecida, ela está diretamente relacionada ao tabagismo, sendo considerada uma
doença trombótica. O principal tratamento dessa doença consiste na suspensão do tabagismo e o uso
de medicamentos como vasodilatadores e anticoagulantes; mesmo com o tratamento, há elevado
risco de amputação do membro afetado.

Figura 7 – Tromboangeíte obliterante

Disponível em: https://cutt.ly/1ShWJaN. Acesso em: 16 mar. 2022.

Se o paciente que tem tromboangeíte obliterante não suspender o tabagismo, o risco de


acometimento de mais artérias é aumentado, o que pode ocasionar amputações de um ou mais
membros, tanto superior como inferior.

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Unidade I

Figura 8 – Amputação de dedos secundária a tromboangeíte obliterante

Disponível em: https://cutt.ly/lShEgEg. Acesso em: 16 mar. 2022.

1.2.2 Amputação secundária ao diabetes melito e à neuropatia vascular periférica

O envelhecimento da população e o estilo de vida, associados a dieta inadequada, sedentarismo,


tabagismo e alcoolismo, são os fatores responsáveis por as doenças crônicas serem a principal causa de
mortalidade no mundo.

O diabetes melito tipo 2 está entre essas doenças crônicas que representam um grave problema de
saúde pública, pela alta prevalência no mundo e maior entre os idosos, pela morbidade e por ser um dos
principais fatores de risco cardiovascular e cerebrovascular.

O diabetes melito destaca-se, no Brasil e no mundo, por sua importância enquanto problema de
saúde pública. O impacto epidemiológico que produz é expresso nas crescentes taxas de morbidade
e mortalidade e nas consequentes sequelas de incapacidade, como a perda da acuidade visual,

18
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

retinopatia diabética, insuficiência renal e as amputações de extremidades inferiores, associadas a


neuropatia periférica.

A neuropatia periférica pode levar à lesão/ulceração do membro inferior e encontra-se presente em


cerca de 80% a 85% dos casos de diabetes melito crônico, podendo comprometer as fibras sensitivas,
motoras e autonômicas.

O acometimento das fibras sensitivas leva à perda gradual da sensibilidade à dor, percepção
da pressão plantar, temperatura e propriocepção. O acometimento das fibras motoras causa
atrofia e fraqueza muscular, hiporreflexia osteotendinosa, deformidades e alterações no modo de
caminhar. O acometimento das fibras autonômicas diminui a sudorese nos pés, deixando-os secos e
predispondo-os a rachaduras e fissuras, além de desencadear alterações arteriovenosas. Os pés são
os primeiros a serem afetados e as alterações progridem geralmente de forma simétrica e de caráter
ascendente, e posteriormente progridem em direção às pernas.

A seguir, listaremos algumas características clínicas da neuropatia periférica:

• pés frios;

• claudicação intermitente;

• dor em repouso;

• ausência de pulsos poplíteos/femorais;

• rubor e mudança na coloração da pele;

• tempo de enchimento capilar prolongado;

• diminuição da temperatura corporal;

• diminuição ou ausência dos reflexos osteotendinosos;

• secura da pele, diminuição ou ausência de sudorese, alterações tróficas da pele (pele descamativa,
unhas quebradiças, diminuição de pelos);

• diminuição da sensibilidade superficial (térmico-dolorosa e tátil) e profunda (proprioceptiva);

• fraqueza e hipotrofia muscular;

• feridas que não cicatrizam, infecções recorrentes e risco de necrose.

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Unidade I

Figura 9 – Úlcera plantar diabética

Disponível em: https://cutt.ly/yShEPd6. Acesso em: 16 mar. 2022.

Na presença de sinais clínicos característicos de pé diabético ou em pacientes com diabetes melito


devemos realizar orientações preventivas, evitando, assim, o risco para futuras amputações.

Figura 10 – Ferida em pé diabético

Disponível em: https://cutt.ly/JShE9bp. Acesso em: 16 mar. 2022.

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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Observação

Pé diabético é o termo usado para nomear as diversas alterações e


complicações que podem ocorrer, isoladamente ou em conjunto, nos pés e
nos membros inferiores dos pacientes diabéticos.

As principais orientações ao paciente e aos cuidadores devem englobar:

• Verificar os pés todos os dias (com auxílio de um espelho, observar entre os dedos) – se o paciente
tiver diminuição da acuidade visual (por exemplo, retinopatia diabética), a inspeção dos pés deverá
ser realizada pelo cuidador.

• Lavar diariamente os pés, com água morna e sabão, e enxugar bem entre os dedos.

• Usar diariamente creme hidratante (de preferência indicado pelo médico dermatologista).

• Usar calçados fechados e confortáveis, evitando áreas de pressão.

• Controlar a glicemia e adotar dieta adequada (acompanhada pelo nutricionista).

• Antes de calçar meias e sapatos, verificar se não há nada que possa pressionar e machucar os
pés, e, de preferência, usar meias de cor clara para verificar se não há sangramento ou saída
de secreções.

• Não andar descalço.

• Fazer exercícios para melhorar a circulação.

• Compreender os fatores de risco para lesões.

Saiba mais

Para informações mais detalhadas a respeito das orientações ao paciente


com diabetes, acesse:

BRASIL. Manual do pé diabético: estratégias para o cuidado da pessoa


com doença crônica. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. Disponível em:
https://cutt.ly/wSCHXVW. Acesso em: 24 mar. 2022.

21
Unidade I

Mas você sabe o que deve ser avaliado em relação ao paciente diabético? A seguir sugiro uma lista
de itens que devem ser verificados durante a avaliação física do paciente com neuropatia periférica
associada ao diabetes:

• Alterações dermatológicas (presença de ulcerações, bolhas, alterações tróficas da pele)

• Alterações circulatórias (temperatura, coloração, pulso podálico)

• Avaliação de sensibilidade superficial e profunda

• Avaliação de reflexo calcâneo

• Avaliação de força muscular

• Avaliação de tônus muscular

• Presença de deformidades nos pés

• Avaliação funcional

1.2.3 Amputações de origem traumática

As amputações de origem traumática acometem principalmente jovens do sexo masculino e estão


bastante relacionadas com acidentes de trabalho (queimaduras severas, corrente elétrica, máquinas
agrícolas), acidentes automobilísticos e atropelamentos. Em alguns países, devido ao conflito armado,
à violência e às guerras, há um número elevado de amputações traumáticas. Você já deve ter ouvido
falar que em Angola, Afeganistão, Camboja e outros países a presença de minas terrestres mata ou
fere milhares de pessoas, podendo levar a amputações. Inclusive, tal situação acomete elevado número
de crianças.

O tratamento inicial deve ser rápido pela gravidade da lesão e pela possibilidade de implante do
membro amputado. Importante frisar que o membro amputado deve ser preservado sempre que possível,
visando ao reimplante.

22
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Figura 11 – Amputação de membro superior em soldado

Disponível em: https://cutt.ly/0ShY4VL. Acesso em: 16 mar. 2022.

Figura 12 – Amputação de membro inferior em criança afegã, causada por mina terrestre

Disponível em: https://cutt.ly/uShOD1n. Acesso em: 16 mar. 2022.

23
Unidade I

Muitas amputações de origem traumática relacionam-se a acidentes de trabalho – tais como


descarga elétrica, amputações por avulsão – ou a acidentes domésticos, e impedem o planejamento
cirúrgico adequado.

Figura 13 – Amputação do pé por avulsão

Disponível em: https://cutt.ly/iShO7EM. Acesso em: 16 mar. 2022.

Figura 14 – Amputação parcial do pé causada por cortador de grama

Disponível em: https://cutt.ly/gShAbOa. Acesso em: 16 mar. 2022.

24
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

1.2.4 Amputações associadas a quadros tumorais

Os tumores malignos primários do sistema musculoesquelético são raros e correspondem a 1% de


todos os tipos de câncer, sendo que a cirurgia é o principal método de tratamento. Atualmente, em
80% dos casos é possível a preservação do membro. Há algumas décadas, o envolvimento de grandes
vasos pelos tumores era indicação de amputação. Entretanto, com o avanço das técnicas de imagem
e tratamento adjuvante, tornou-se possível usar técnicas de reconstrução vascular sem prejuízo na
recidiva ou disseminação metastática da doença, o que aumenta a taxa de preservação do membro sem
comprometer a sobrevida ou a recidiva da doença.

Figura 15 – Caso de metástase óssea em paciente com tumor primário em próstata

Disponível em: https://cutt.ly/4ShSwRI. Acesso em: 16 mar. 2022.

25
Unidade I

Saiba mais

Para complementar o conhecimento a respeito das amputações de


causa tumoral, sugerimos a leitura do artigo a seguir:

GARCIA FILHO, R. J. Tumores ósseos e sarcomas dos tecidos moles.


Einstein, São Paulo, v. 6, supl. 1, p. S102-S119, 2008. Disponível em:
https://cutt.ly/ZS4wLTu. Acesso em: 24 mar. 2022.

1.2.5 Amputação secundária a infecções

As meningites bacterianas agudas caracterizam-se por ser um processo infeccioso que acomete as
meninges e o espaço subaracnóideo, e são responsáveis por uma elevada taxa de morbimortalidade,
principalmente na infância. A meningite meningocócica pode acarretar lesão cutânea e levar a necrose
das extremidades ocasionando amputações.

As infecções também podem ser secundárias a traumas ou processos vasculares.

Figura 16 – Amputação dos quatro membros por meningite meningocócica

Disponível em: https://cutt.ly/9ShFlP4. Acesso em: 16 mar. 2022.

26
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

1.2.6 Anomalias congênitas e amputações

A ausência ou malformação parcial ou total de um ou mais membros logo ao nascimento pode


levar à necessidade de protetização. Algumas anomalias congênitas impossibilitam a protetização ou
dificultam a função do membro residual, e malformações apendiculares são a maior causa de amputação
em crianças.

Figura 17 – Malformação congênita bilateral de membros inferiores

Disponível em: https://cutt.ly/zShFPlF. Acesso em: 16 mar. 2022.

Em alguns casos de malformação congênita, a amputação pode ser bem indicada, permitindo, assim,
a protetização e o treino funcional da criança.

Tais alterações podem estar associadas a fatores genéticos e ambientais, tais como a exposição
a agentes químicos, uso de drogas (por exemplo, o medicamento talidomida), exposição à radiação,
alterações cromossômicas, síndromes, entre outros.

1.3 Condições gerais para a amputação e pós-amputação

Deve-se verificar a permeabilidade vascular no nível da amputação, a inspeção de tecidos lesados,


o estado geral do coto, a presença de contraturas e aderências cicatriciais, e de contraturas articulares.

Observe a seguir a terminologia geralmente utilizada pela equipe durante a avaliação do membro
residual (coto) pós-amputação:

27
Unidade I

• Mioplastia: fixação das extremidades dos músculos antagônicos e proteção do coto ósseo distal.

• Miodese: reinserção dos músculos e tendões seccionados à extremidade óssea amputada (permite
a contração do músculo).

• Hemostasia: cauterização dos vasos sanguíneos.

• Neurectomia: corte dos nervos, o coto nervoso deve ficar protegido pelos tecidos musculares
(evitar neuroma doloroso).

• Tecido ósseo: devem ficar arredondados, evitando o surgimento de espículas ósseas.

• Suturas: não devem ter aderências ou tensões exageradas.

• Posicionamento do coto: evitar retrações e encurtamentos musculares.

A mioplastia corresponde à sutura da musculatura seccionada recobrindo as extremidades ósseas e


ancorando os grupos flexores e extensores uns aos outros, como se fossem novas inserções. Essa manobra
permite que os músculos trabalhem, garantindo ao paciente um melhor controle dos movimentos do
coto, reduzindo o edema e acolchoando as extremidades ósseas.

2 CLASSIFICAÇÃO DOS NÍVEIS DE AMPUTAÇÃO DOS MEMBROS INFERIORES

A determinação do nível para a amputação pode ser extremamente difícil de ser definida pela equipe
médica, pois a necrose dos tecidos moles pode ser maior do que aparenta, apenas observando-se aspectos
externos do membro. Nas crianças, deve-se tentar, sempre que possível, preservar as placas de crescimento,
pois sua contribuição para o comprimento da extremidade ou do coto de amputação é muito importante,
minimizando as desigualdades dos membros.

Antes de iniciarmos a classificação dos níveis de amputação dos membros inferiores, faremos uma
breve revisão da anatomia do membro inferior.

O pé apresenta três segmentos funcionais: o antepé, formado pelas falanges e os ossos do metatarso;
o mediopé, formado pelos ossos navicular, cuboide e cuneiformes; e o retropé, formado pelos ossos
calcâneo e tálus.

28
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Vista superior (dorsal)

Base
Cabeça
Falanges
Corpo Distal
Base
Média
Distal Proximal

Corpo

Base Ossos metatarsais


Articulações
tarsometatarsais
Medial
Cuneiformes Distal
Distal Tuberosidade do 5º osso metatarsal
Tuberosidade do navicular
Navicular Cuboide
Cabeça Articulação transversa do tarso
Colo Seio do tarso
Tróclea Calcâneo
Tróclea fibular Vista inferior (plantar)
Tálus Sulco do tendão do
músculo flexor Distal
Processo longo do hálux
posterior Tubérculo medial "Corpo"
Média Falanges
Tubérculo lateral
Proximal
Base
Cabeça
Base Lateral
Ossos sesamoides
Cabeça Medial
Corpo Ossos metatarsais
Base
Articulações
Cabeça tarsometatarsais
Corpo
Medial
Base Intermédio Cuneiformes
Lateral
Tuberosidade do 5º osso metatarsal
Tuberosidade do
Cuboide navicular
Sulco do tendão do músculo fibular longo Navicular
Tuberosidade do cuboide Articulação transversa
Calcâneo do tarso
Tróclea fibular Cabeça
Sulco do tendão do músculo flexor longo do hálux Processo posterior
Sustentáculo do tálus
Tubérculo medial Tálus
Processo lateral
Processo medial Tubérculo lateral
Tuberosidade do calcâneo

Figura 18 – Anatomia do pé

Fonte: NETTER (2019, p. 627).

29
Unidade I

2.1 Amputação pododáctilas e metatarsais

Amputação parcial dos dedos: retirada de qualquer parte de um ou mais dedos do pé.

Figura 19 – Amputação parcial do primeiro e do quinto dedos do pé

Disponível em: https://cutt.ly/HShGBNO. Acesso em: 16 mar. 2022.

Desarticulação dos dedos: desarticulação da articulação metatarsofalangiana.

Transmetatarsal: amputação através da diáfise dos ossos metatarsais.

Observação

Geralmente as amputações de dedos são causadas por problemas


vasculares ou estéticos (associado a necrose tecidual), e levam a
problemas funcionais ou estéticos (a depender do dedo amputado) de
menor intensidade.

Desarticulação interfalangiana: geralmente não alteram o equilíbrio ou deambulação do indivíduo.


Geralmente tenta-se preservar a base da falange proximal, pois nela se encontra a inserção dos tendões
extensor e flexor curto dos dedos.

Desarticulação metatarsofalangiana: ocorre entre a falange proximal e o metatarso. Principais


causas são alterações vascular ou traumática. Se a amputação for do segundo ou terceiro podálico,
pode causar deformidade do hálux em valgo (alteração na fase de impulso da marcha), e pode levar
a úlceras plantares por ter maior descarga de peso na área. Quando a amputação é do hálux, ela não
inviabiliza um padrão de marcha, porém ocasiona perda da impulsão da marcha (percebe-se ao andar
rápido ou correr).

30
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Amputação transmetatarsiana: é realizada a secção óssea do primeiro ao quinto metatarso,


geralmente causada por alterações vasculares e traumáticas; pode ser total ou parcial; a maior descarga
ocorre de forma distal, e prejudica a marcha e o equilíbrio, principalmente na fase de desprendimento do pé.

2.2 Desarticulação de Lisfranc

Desarticulação de metatarsos com o osso cuboide e cuneiforme (antepé com o mediopé), causada
principalmente por alteração vascular ou traumática. Geralmente acarreta deformidades em flexão
plantar, dificultando a protetização, uma vez que a perda da inserção dos tendões dos músculos
dorsiflexores do tornozelo pode ocasionar deformidade em equino do tornozelo.

2.3 Desarticulação naviculocuneiforme e transcuboide

Não é muito descrita; encontra-se entre os níveis de Lisfranc e Chopart. Ocorre a manutenção do
osso navicular e secção parcial do osso cuboide ao nível da articulação naviculocuneiforme.

2.4 Desarticulação de Chopart

É a desarticulação entre os ossos navicular e cuboide com o tálus e o calcâneo (mediopé com o
retropé). Sua principal causa é a alteração de origem vascular; apresenta difícil protetização, devido ao
curto braço de alavanca, e o pé pode evoluir para a posição de equino. O cirurgião pode tentar rebater
o tendão do calcâneo para evitar o equinismo (flexão plantar).

A figura a seguir representa o local da desarticulação de Lisfranc (linha vermelha) e de Chopart


(linha verde).

Figura 20 – Linhas representativas dos locais da desarticulação de Lisfranc (vermelha)


e de Chopart (verde)

Disponível em: https://cutt.ly/qShHNwA. Acesso em: 16 mar. 2022.

31
Unidade I

2.5 Amputação tipo Syme

É a desarticulação do tornozelo, e pode-se incluir a remoção dos maléolos e retalhos distais da tíbia/
fíbula. Permite descarga de peso total no coto distal, com a colocação de um pé protético, faz-se a
secção óssea abaixo dos maléolos lateral e medial, conservando a sindesmose tibiofibular.

Permite a protetização precoce, porém é mais difícil de cicatrizar e protetizar. Atualmente, prefere-se
a amputação transtibial.

2.6 Amputação de Pirogoff

É uma técnica similar à amputação de Syme, porém é feita uma artrodese entre a tíbia e o calcâneo,
diminuindo o espaço entre o coto e o solo. Trata-se de uma técnica mais difícil e demorada.

Realizada a artrodese entre a tíbia e o calcâneo, o osso calcâneo é seccionado verticalmente,


eliminando sua parte anterior e realizando com a parte posterior uma rotação superior a 90° até ocorrer
um encontro entre as superfícies do calcâneo e da tíbia.

Figura 21 – Amputação pela técnica de Pirogoff (artrodese entre a tíbia e o calcâneo)

Disponível em: https://cutt.ly/fShJnD5. Acesso em: 16 mar. 2022.

2.7 Amputação de Boyd

Similar à amputação de Pirogoff, porém é feita a artrodese do calcâneo com a superfície distal
tíbiofibular. A osteotomia realizada no calcâneo é horizontal, e sua fixação com a tíbia/fíbula é realizada
após um pequeno deslocamento anterior.
32
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

2.8 Amputação transtibial

Secciona-se a fíbula e a tíbia, sendo mantida a articulação do joelho, importante para deambulação.
Independentemente do nível da amputação, a descarga de peso será realizada no tendão patelar, entre
a borda inferior da patela e a tuberosidade da tíbia, e no coto (parte medial, lateral e posterior); é
contraindicada a descarga de peso distal devido à transecção óssea e os tecidos moles.

Considera-se que o coto ideal deva ter em torno de 9-10 cm de comprimento abaixo da tuberosidade
da tíbia. A fíbula é sempre seccionada 1,5-2 cm mais curta do que a tíbia. Em casos de pacientes com
flexo residual de joelho, há a possibilidade de realizar a desarticulação do joelho.

Pode ocorrer a amputação transtibial no terço proximal, médio e distal. Se for no terço distal, o coto
será muito longo, e no terço proximal o coto será muito curto, de modo que ambos os níveis podem
dificultar a protetização.

Figura 22 – Amputação transtibial em terço médio

Disponível em: https://cutt.ly/kShK8KX. Acesso em: 16 mar. 2022.

As amputações transtibiais tendem à deformidade em flexão do joelho (principalmente nos cotos


curtos); a fíbula deve ser seccionada 1-1,5 cm acima da tíbia, sem saliências ósseas (espículas ósseas).

Os músculos agonistas e antagonistas são fixados para a formação do coxim (mioplastia), e os


músculos são reinseridos ao osso (miodese).
33
Unidade I

As amputações transtibiais apresentam algumas vantagens: ocorre a manutenção da articulação


do joelho; o paciente apresenta menor gasto energético durante a marcha; há maior facilidade para
colocação e retirada da prótese; e a marcha ocorre de forma mais simétrica, quando comparada com
uma amputação transfemoral.

2.9 Desarticulação de joelho

Não é mantida a articulação do joelho, e a coxa permanece íntegra. Por não ter a articulação do
joelho, durante o processo de protetização será necessária uma prótese com componente de joelho
protético, diferente das amputações transtibiais, nas quais é mantida a articulação do joelho. Nesse tipo
de amputação, a patela pode ou não ser removida.

As desarticulações de joelho são mais indicadas em casos de anomalias genéticas ou de amputação


traumática; geralmente preconiza-se a preservação da patela (para ter maior apoio da prótese). Suas
vantagens incluem uma boa alavanca de movimento, sem desequilíbrios musculares, o que, portanto,
diminui o risco de deformidades do joelho (pode haver leve encurtamento em flexão do quadril).

Figura 23 – Desarticulação de joelho

Disponível em: https://cutt.ly/zShLlki. Acesso em: 16 mar. 2022.

A desarticulação de joelho permite a descarga do peso distalmente e apresenta melhor suspensão


protética, além da facilidade de colocação e remoção da prótese.

2.10 Amputação transfemoral

As amputações transfemorais podem ser realizadas no terço proximal, médio ou distal do fêmur. As
principais causas destas amputações são decorrentes de alteração vascular, traumática ou neoplásica.
Torna-se necessário que o cirurgião realize tanto a mioplastia como a miodese.

34
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

No geral, o coto tende à deformidade em flexão e abdução do quadril, sendo que quanto menor o coto,
maior a tendência à deformidade, devido ao desequilíbrio muscular (músculo glúteo médio fica íntegro e
os adutores são seccionados). O encurtamento dos músculos flexores de quadril se deve, principalmente,
à manutenção da posição sentada por longos períodos.

Figura 24 – Amputação transfemoral bilateral em terço médio

Disponível em: https://cutt.ly/lShLDav. Acesso em: 16 mar. 2022.

Fêmur

Fêmur
Músculo

Tíbia

Fíbula

Figura 25 – Amputação transfemoral

Disponível em: https://cutt.ly/nShL9NG. Acesso em: 16 mar. 2022.

35
Unidade I

Nas amputações transfemorais, a descarga de peso não é feita na região distal, mas sim em apoio
isquiático e nas laterais do coto; quanto maior o coto, melhor será a fixação da prótese. Durante a
marcha, estima-se que o indivíduo com amputação transfemoral apresente um gasto energético 65%
maior se comparado à marcha de pessoas não amputadas. Além disso, o coto deve fornecer um braço
de alavanca tão longo quanto possível para o controle da prótese durante a marcha.

Observação

A amputação transtibial traz uma série de vantagens em relação às


amputações mais proximais (desarticulação de joelho ou transfemoral),
uma vez que a manutenção da articulação do joelho permite
menor gasto energético durante a marcha e maior facilidade para a
colocação/remoção da prótese, além de permitir uma marcha mais
próxima ao fisiológico.

2.11 Desarticulação de quadril

Trata-se da amputação a partir da articulação do quadril, mantendo a pelve intacta. Pode-se ou não
manter o colo femoral. Em alguns casos é retirado todo o membro inferior incluindo a cabeça femoral,
mais indicada para processos traumáticos e neoplásicos.

Nesse tipo de amputação, o paciente não apresenta coto ósseo, apenas cobertura do músculo
glúteo máximo e descarga de peso na tuberosidade isquiática. A protetização é mais difícil, devido a
aspectos importantes, como a ausência de um braço de alavanca e o gasto energético maior durante
a marcha – geralmente, a marcha será menos funcional. O mesmo pode ser considerado nos casos de
hemipelvectomia e desarticulação sacroilíaca.

2.12 Hemipelvectomia

Realiza-se a retirada total de uma hemipelve, e o paciente não apresenta membro residual. A
hemipelvectomia ocorre principalmente em casos neoplásicos e traumáticos.

36
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Figura 26 – Membro inferior direito com quadro de gangrena no pré-operatório

Disponível em: https://cutt.ly/WShZsyx. Acesso em: 16 mar. 2022.

Figura 27 – Operação de hemipelvectomia, em que paciente evoluiu a óbito

Disponível em: https://cutt.ly/DShZxjh. Acesso em: 16 mar. 2022.

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Unidade I

2.13 Hemicorporectomia

Realiza-se a retirada do hemicorpo; neste caso, as chances de sobrevivência do paciente são menores.
Geralmente é resultado de eventos traumáticos, e o paciente pode apresentar outras lesões associadas,
como perfuração pulmonar ou traumatismo cranioencefálico (TCE).

2.14 Desarticulação sacroilíaca

É retirada a metade da pelve, geralmente por neoplasia óssea com metástase ou traumática, e a
descarga de peso ocorre no ísquio contralateral e na região torácica.

3 FASES DA REABILITAÇÃO

Uma das maiores preocupações de um paciente amputado gira em torno da possibilidade de ser ou
não protetizado. Infelizmente não são todos os pacientes que poderão receber a prótese, porém todo
tratamento de reabilitação deve ser traçado com vistas à protetização. Vejamos um caso clínico.

Exemplo de aplicação

O fisioterapeuta vai atender a um paciente de 85 anos de idade, com quadro crônico de diabetes
melito (há 30 anos), hipertensão arterial sistêmica e quadro de arritmia cardíaca. O paciente foi
submetido à amputação transfemoral do terço proximal da perna direita. Apresenta retinopatia diabética
bilateral, com perda de 70% da acuidade visual. Devido à neuropatia periférica, apresenta diminuição
da sensibilidade profunda no pé esquerdo. Quais fatores podem influenciar de maneira negativa a
protetização deste paciente?

Neste caso vários fatores podem impedir a protetização deste paciente, incluindo a perda de
acuidade visual, a cardiopatia e a perda sensorial. Não é possível afirmarmos que o paciente não venha
a ser protetizado, mas, sim, que o processo será mais difícil e com menores chances de sucesso.

A seguir, estudaremos as fases que compreendem o processo de reabilitação pré e pós-amputação:

• preparo pré-cirúrgico (amputações eletivas);

• protetização imediata;

• reabilitação pré-protetização;

• fase de protetização;

• adaptação à prótese e independência funcional.

38
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

3.1 Preparo pré-cirúrgico (amputações eletivas)

Em alguns casos de cirurgias eletivas de amputação, pode-se iniciar o processo de reabilitação antes
da amputação; para isso, é possível realizar uma avaliação inicial do paciente, verificando fatores que
podem influenciar de maneira positiva ou negativa sua recuperação pós-amputação.

A equipe deve avaliar as condições cardiopulmonares do paciente e, em muitos casos, já iniciar um


programa de condicionamento pré-amputação.

Pode-se realizar uma avaliação prévia das condições musculoesqueléticas do membro contralateral
ao que será amputado, incluindo a amplitude de movimento, força muscular, equilíbrio postural,
alterações sensoriais etc.

A equipe também deveria avaliar as condições sociais e econômicas do paciente, a acuidade visual,
fatores psíquicos e emocionais, de modo que é necessária uma equipe multidisciplinar, que, além de
avaliá-lo, ofereça o suporte necessário ao paciente e seus familiares.

Outros fatores que devem ser avaliados são as funções cognitivas do paciente; para isso, pode-se
aplicar testes de rastreio de declínio cognitivo, uma vez que estes pacientes precisarão ter um bom
entendimento a respeito do processo de protetização, como a colocação e a retirada da prótese. Ainda,
deve-se realizar a triagem cognitiva antes de estabelecer metas de reabilitação, para avaliar a capacidade
e adequação do paciente à tecnologia protética apropriada.

Os testes de rastreio mais comumente utilizados são o Miniexame do Estado Mental (Meem)
e a Avaliação Cognitiva de Montreal (MoCA). O Meem avalia vários domínios de função cognitiva
(orientação espacial, temporal, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem, compreensão);
não é um teste de diagnóstico, mas, por ser rápido e de fácil aplicação, pode ser útil para o rastreio
de possíveis quadros de declínio cognitivo. O MoCA também é um teste de triagem breve que avalia
funções cognitivas (função executiva, habilidade visuoespacial, nomeação, memória, raciocínio
abstrato, orientação); ele apresenta alta sensibilidade para rastreio de declínios cognitivos, incluindo
quadros demenciais.

Devemos lembrar que grande parte das amputações decorre de complicações vasculares
associadas ao diabetes e à hipertensão arterial, e estas são um importante fator de risco para doenças
cerebrovasculares e de quadros demenciais.

Os declínios das funções cognitivas também estão diretamente relacionados à diminuição geral
do uso de dispositivos protéticos, redução da mobilidade, perda de independência e aumento da
incidência de quedas.

A seguir são apresentados os testes do Meem e de MoCA; vale lembrar que o tempo de aplicação de
cada um é cerca de 20 minutos.

39
Unidade I

3.1.1 Miniexame do Estado Mental (Meem)

Figura 28 – Ficha do Miniexame do Estado Mental

Adaptada de: Folstein, Folstein e Mchugh (1975).

40
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

3.1.2 Avaliação Cognitiva de Montreal (MoCA)

Figura 29 – Ficha da Avaliação Cognitiva de Montreal

Disponível em: https://cutt.ly/HJgT74j. Acesso em: 27 abr. 2022.

41
Unidade I

3.2 Protetização imediata

A prótese imediata é adaptada ao coto de amputação imediatamente após a cirurgia, ainda no


centro cirúrgico, e ela têm características de uma prótese normal.

Vários benefícios são alcançados com a protetização imediata, porém, nem todos os pacientes têm
indicação para esse tipo de protetização, e caberá ao cirurgião verificar a possibilidade de realizá-la.

Como a prótese imediata é colocada ainda no centro cirúrgico, o encaixe (soquete) é moldado com
gesso; já os outros componentes podem ser os que serão utilizados na prótese definitiva. Geralmente,
ela é indicada a pacientes jovens e amputações transtibiais, e em cirurgias programadas.

Observe, na lista a seguir, os benefícios da protetização imediata, quando bem indicada:

• controlar o edema;

• auxiliar na forma do coto (em cone);

• desenvolver estabilidade muscular;

• evitar perda de massa muscular (trofismo muscular);

• reduzir quadros álgicos e sensação de membro fantasma;

• auxiliar nas transferências;

• propiciar descarga de peso parcial e de forma precoce;

• viabilizar a deambulação precoce;

• potencializar a independência funcional;

• diminuir o tempo de internação;

• promover boas condições emocionais e psicológicas.

3.3 Reabilitação pré-protetização

Observe a seguir algumas condições clínicas que devem ser consideradas antes de iniciarmos a fase
de pré-protetização:

• avaliação e liberação cardiológica;

• avaliação da presença de comorbidades:


42
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

— hipertensão arterial sistêmica;

— diabetes melito;

— déficit visual;

— déficit sensorial;

— sequelas neurológicas associadas, como acidente vascular cerebral (AVC), TCE, demências;

— obesidade;

— idade;

— presença de cardiopatias e pneumopatias.

3.3.1 Fase inicial do tratamento

Antes de iniciar o tratamento, o fisioterapeuta deve saber que, após a amputação, podem surgir
algumas complicações, as quais dificultarão o processo de reabilitação.

Figura 30 – Segundo dia de pós-operatório em amputação devido a lipossarcoma

Disponível em: https://cutt.ly/fShXkrn. Acesso em: 16 mar. 2022.

No pós-operatório imediato alguns fatores devem ser considerados como primordiais, e eles estão
elencados a seguir:

43
Unidade I

Proteger o coto, favorecendo


a redução do edema

Pós-operatório Facilitar o fechamento


imediato da ferida primária

Manter a amplitude de
movimento, evitando
contraturas

Figura 31 – Fatores considerados no pós-operatório imediato

Algumas complicações podem ou não existir, e às vezes o paciente pode apresentar mais de uma
destas complicações. Na sequência, discutiremos quais são elas.

3.3.2 Complicações no pós-operatório de amputação

Hiperalgesia e hiperestesia

Como você já deve saber, o termo estesia é utilizado quando nos referimos à sensibilidade do
paciente; por exemplo, o termo anestesia significa a perda total da sensibilidade superficial e profunda,
e pode ser temporária ou permanente. Portanto, o termo hiperestesia é utilizado para nos referirmos
ao aumento da percepção sensorial, e isto é frequentemente percebido em indivíduos submetidos a
tratamentos cirúrgicos; na área cicatricial eles costumam referir uma hipersensibilidade ao toque, a qual
pode ou não melhorar com o passar do tempo.

Já o termo algia refere-se à sensibilidade dolorosa; portanto, o aumento da sensibilidade dolorosa


recebe o nome de hiperalgesia. Nos pacientes amputados, o aumento da sensação dolorosa pode estar
associado à presença de espículas ósseas, à sensação de membro fantasma, à sensação de dor fantasma
etc. A sensação dolorosa do pós-cirúrgico tende a desaparecer ao longo das primeiras semanas do
pós-operatório.

Um dos objetivos de tratamento do fisioterapeuta será realizar exercícios de dessensibilização do


coto e ensinar o paciente a realizá-los com frequência em casa, o que será abordado especificamente
mais adiante.

Neuroma doloroso

O termo neuroma refere-se a um tumor composto por células nervosas, que se forma após a
amputação. Quando o membro é amputado, os nervos periféricos são seccionados, mas, com o tempo,
os axônios destes nervos podem iniciar um processo de brotamento regenerativo, formando assim um

44
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

neuroma. O paciente refere uma dor em choque ao percutirmos com as pontas dos dedos o local do
neuroma, e muitos referem enorme dificuldade em descarregar seu peso no local afetado.

Este é um fenômeno natural de reparação que ocorre em qualquer transecção de um nervo


periférico. Durante a fase de reparo, o nervo cresce de modo desorganizado, formando um botão
terminal (neuroma).

A sensação dolorosa pode ser aliviada temporariamente com a injeção de anestésico local pelo médico
e auxiliar no diagnóstico.

Em casos mais severos, pode-se indicar a revisão cirúrgica para a retirada do neuroma (neurectomia
cirúrgica).

Sensação de membro fantasma

A sensação de membro fantasma é definida como a existência de sensações, que não dor, no membro
amputado. A maioria dos pacientes amputados referem esta sensação, a qual pode ser categorizada
como: sensação cinética (sensação de movimento); percepção cinestésica (noção do tamanho, do
formato e da posição da parte do corpo, que pode estar normal ou percebida de forma distorcida); e
percepção extereoceptiva (sensação de toque, pressão, temperatura e vibração).

Portanto, é comum o paciente amputado referir a presença de algumas sensações no membro


amputado, o que recebe o nome de sensação de membro fantasma. Na clínica é comum ouvirmos de
pacientes, principalmente nos casos de amputações recentes, que ele esqueceu que tinha o membro
inferior amputado e, durante a noite, ao levantar-se para ir ao banheiro, acabou caindo por ter-se
esquecido que não tinha mais aquela perna. Mas por que será que isto ocorre?

A percepção de sensações não dolorosas na parte amputada do membro é definida como sensação
fantasma.

Quando o paciente é submetido à amputação, devemos considerar que a representação da área


amputada continua existindo tanto no córtex motor como no córtex somestésico; ou seja, ao amputar
um membro, sua representação corporal continua presente na região cortical específica, tanto motora
como sensorial. Sabe-se que estas áreas de representação cortical não perdem seu funcionamento
após a amputação, mas passam a ser relacionadas ao funcionamento do membro residual ou de
áreas adjacentes.

Portanto, quando ocorre uma amputação, haverá uma reorganização dessa representação cortical
referente ao membro retirado, mas isto ocorrerá de maneira gradual.

A figura a seguir mostra a representação esquemática das áreas somestésicas e motoras corticais
(homúnculo de Penfield).

45
Unidade I

Figura 32 – Representação do esquema motor do corpo humano: homúnculo de Penfield

Disponível em: https://cutt.ly/qShCW0V. Acesso em: 16 mar. 2022.

Figura 33 – Área somestésica primária (giro pós-central)

Disponível em: https://cutt.ly/8ShCHoR. Acesso em: 16 mar. 2022.

Saiba mais
Acesse o artigo a seguir para saber mais sobre a reorganização cortical
após a amputação:
ALMEIDA, L. F.; CAMARGOS, G. V.; CORRÊA, C. L. Mudanças reorganizacionais
nos córtices somatossensorial e motor em amputados: revisão da literatura.
Revista Neurociências, São Paulo, v. 17, n. 2, p. 146- 155, 2009. Disponível em:
https://cutt.ly/HDEtqHs. Acesso em: 24 mar. 2022.

46
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Dor fantasma

A presença de sensação de dor no membro amputado é conhecida como sensação de dor fantasma,
que é a percepção de dor na área amputada. Essa percepção dolorosa pode tanto ser causada pelas
alterações patológicas prévias à amputação como ser potencializada pelo quadro emocional do
paciente. A explicação da sensação de dor fantasma não está totalmente esclarecida. A principal teoria
que explicaria a presença dessa dor seria uma desregulação do input sensorial do membro fantasma.

Não se sabe ao certo porque alguns pacientes apresentam essa sensação, porém alguns fatores são
citados como favoráveis para seu surgimento, como: a amputação de um membro inferior, etiologia de
origem vascular, amputação em um nível alto ou amputação bilateral, presença de sensação fantasma,
dor no membro residual e amputação na idade adulta.

Pode-se pensar, portanto, que a percepção da dor fantasma pode ser provocada pela confusão
causada ao córtex sensorial, que tentará se reorganizar após a perda do membro (vimos isto sobre a
sensação do membro fantasma).

Por outro lado, considera-se que os pacientes que referem sensação de dor fantasma prolongada
tendem a ter mais dificuldades no processo de protetização; porém, quando protetizados, há a tendência
de a sensação dolorosa diminuir.

Destaca-se que a presença de dor fantasma interfere de maneira negativa na qualidade de vida
do paciente.

O quadro a seguir elenca possíveis teorias que tentam explicar a origem dessa dor:

Quadro 1 – Teorias relacionadas ao surgimento da dor fantasma

Teorias Características
Estimulação de terminações nervosas no coto transmite informação ao
Teoria periférica sistema nervoso central, e este atribui essas sensações à parte do corpo
originalmente inervada, interpretando como dor fantasma
Disparos anormais (impulsos) pelos interneurônios do corno dorsal
Teoria centro medular da medula não regulados atingem o encéfalo e são percebidos como
estímulos dolorosos
Após a amputação, há uma reorganização das estruturas
somatossensoriais primárias, do córtex motor e das estruturas
Teoria central cerebral subcorticais; e áreas do córtex somatossensorial, que correspondiam
ao membro ausente, começam a receber informação sensorial de áreas
adjacentes ao local amputado
Matriz neuronal que integra aferências geradas em diferentes partes
Teoria da neuromatriz do corpo, incluindo o córtex somatossensorial e os sistemas límbico,
visual e corticotalâmicos
Fatores psicológicos/emocionais podem influenciar no curso e na
Teoria psicogênica severidade da dor

47
Unidade I

Lembrete

A dor fantasma é descrita como a presença de sensação dolorosa na


parte ausente do membro amputado.

A percepção de sensações não dolorosas na parte amputada do membro


é definida como sensação de membro fantasma.

Lembre-se de que o paciente amputado pode ter ou não a sensação do


membro fantasma e/ou a presença de dor fantasma.

Essa dor pode ser descrita pelas pessoas como dormência, sensação de queimadura, pontadas,
cãibras, sensação de estiramento, espasmos ou descarga elétrica etc.

Uma das técnicas utilizadas para tratar a sensação de membro fantasma e de dor fantasma é a
terapia de espelho, que é uma intervenção de baixo custo e fácil aplicabilidade. Ela é aplicada por meio
de um espelho que é posicionado entre o membro preservado e o membro amputado do indivíduo. Com
a intenção de reeducar o cérebro e promover uma ilusão visual e de cinestesia, o indivíduo realiza uma
série de movimentos com o membro saudável que são refletidos pelo espelho e interpretados como se
fossem realizados pelo membro amputado. Veja um exemplo na figura a seguir com o membro superior
do paciente.

Figura 34 – Terapia de espelho

Disponível em: https://cutt.ly/6GuTVAv. Acesso em: 22 abr. 2022.

48
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Saiba mais

Quer saber mais sobre o emprego da terapia de espelho no tratamento


da dor fantasma e da sensação de membro fantasma? Sugiro a leitura
do livro:

RAMACHANDRAN, V. S. O que o cérebro tem para contar: desvendando


os mistérios da natureza humana. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

Deiscência de suturas

O termo deiscência de suturas refere-se a quando ocorre a abertura da ferida operatória, antes da
cicatrização, o que demanda a realização de novo fechamento cirúrgico sobre a ferida (incisão cirúrgica).
A deiscência da sutura cirúrgica é uma complicação grave na qual as bordas da ferida, que estão unidas
por uma sutura, acabam abrindo e se afastando, aumentando o risco de infecção e dificultando a
cicatrização; ou seja, ocorre a perda da justaposição e alinhamento das bordas da ferida.

As causas da deiscência de sutura podem estar associadas a infecção local, técnica cirúrgica
inadequada, tensão excessiva das bordas da ferida e baixa perfusão sanguínea na área.

Figura 35 – Aspecto cicatricial sem deiscência de sutura

Disponível em: https://cutt.ly/iSWx3Nw. Acesso em: 16 mar. 2022.

Infecção cutânea pós-operatória

Após a amputação é preciso cuidar do membro residual e verificar se há sinais que indiquem a
presença de alguma infecção. Aumento da temperatura local, aumento do edema, saída de secreções
purulentas e dor local são alguns dos sintomas que podem indicar um quadro infeccioso. O paciente
deverá ser reavaliado e tratado adequadamente pela equipe médica.
49
Unidade I

A seguir, vejamos algumas orientações que o paciente e os cuidadores devem realizar para evitar ao
máximo possíveis infecções no membro residual:

• Lavar o membro residual com água e sabão neutro, depois enxaguar e secar bem.

• Lavar tudo o que entiver em contato com a pele (forros, meias, encaixe interno) com água e sabão
neutro, enxaguar e secar bem.

• Não usar loções à base de álcool na pele, pois ressecam e podem causar rachaduras, o que pode
provocar infecções.

• Usar cremes para evitar descamação da pele seca.

• Evitar áreas de pressão que possam ocasionar feridas.

Deve-se também atentar à avaliação periódica do membro contralateral ao amputado, verificando


se há presença de lesões cutâneas e, sendo assim, risco para novas amputações.

Figura 36 – Pé diabético com quadro de necrose e infecção

Disponível em: https://cutt.ly/1SWcdnk. Acesso em: 16 mar. 2022.

Espículas ósseas

As espículas ósseas são formações de pedaços de ossos pontiagudos que surgem após a amputação
ou em pacientes que ainda estejam em fase de desenvolvimento (ou seja, crianças e adolescentes).

50
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

As técnicas de amputações em crianças e jovens devem ser pensadas pelo cirurgião de modo a
favorecer a consolidação do osso em crescimento, evitando, assim, a formação de espículas ósseas e,
com isso, a necessidade de cirurgias futuras para a retirada de tal formação.

Encurtamento muscular e instabilidade postural

A amputação altera a amplitude de movimento, a força, a resistência, o controle e alinhamento


postural, o equilíbrio e a capacidade funcional do indivíduo; tal impacto se percebe principalmente no
membro amputado, mas também pode haver a sobrecarga do membro não amputado.

Podem surgir complicações secundárias, tais como quadros de osteoartrite no quadril e/ou joelho,
devido à sobrecarga no membro preservado. Por exemplo, após a amputação de um dos membros
inferiores, o paciente vai apresentar mudanças na marcha, sobrecarregando o membro preservado
(marcha com auxílio de andadores ou muletas), podendo ocasionar quadros de dor, desgaste muscular
e articular.

As contraturas musculares estão diretamente relacionadas ao posicionamento inadequado do coto,


com períodos prolongados na posição sentada ou deitada, e aos desequilíbrios musculares provocados
pela amputação.

Geralmente os amputados transtibiais tendem a desenvolver contraturas musculares em flexão


de joelho e de quadril (principalmente se mantidos sentados por longos períodos); já os amputados
transfemorais tendem a apresentar contraturas em flexão e abdução de quadril. Por isso, um dos meios
de prevenção destas contraturas será orientar o paciente e seus cuidadores a respeito do posicionamento
adequado, o que discutiremos posteriormente.

Muitos pacientes amputados podem apresentar alterações no equilíbrio postural e na locomoção, o


que interfere diretamente em sua independência funcional e em sua qualidade de vida, e quanto mais este
paciente ficar acamado ou inativo, maior será a perda de força muscular, resistência física e do equilíbrio
postural. As dificuldades na manutenção do equilíbrio estático e dinâmico elevam o risco de quedas e
possíveis fraturas; portanto, a avaliação do equilíbrio também é muito importante para que sejam tomadas
medidas preventivas e terapêuticas, evitando possíveis complicações.

Lembrete

O paciente que adquire posições viciosas do coto de amputação – as


quais podem ser decorrentes de desequilíbrios musculares devido ao nível
de lesão, posições inadequadas adotadas no período do pós-operatório,
demora no início do processo de reabilitação, uso incorreto das muletas ou
permanência prolongada na cadeira de rodas – pode apresentar contraturas
musculares/articulares e até mesmo deformidades, as quais prejudicarão a
fase de protetização.

Em alguns casos, pacientes que teriam grandes chances de serem


protetizados podem perder esta possibilidade.
51
Unidade I

4 ABORDAGEM DA EQUIPE DE REABILITAÇÃO NA FASE DE PRÉ-PROTETIZAÇÃO

Após a amputação o paciente deverá continuar sendo assistido pela equipe de reabilitação, a qual
deverá traçar estratégias de atendimento adequadas a cada indivíduo, incluindo apoio social, emocional
e de recuperação funcional.

Abordagem da equipe centrada na


recuperação do paciente

Maximizar a capacidade de
independência funcional e de
qualidade de vida

Auxiliar no processo de adaptação


pós-amputação, incluindo o manejo
da dor, escolha de próteses, treino de
AVDs, entre outros

Figura 37 – Abordagem da equipe de reabilitação

4.1 Avaliação funcional do paciente amputado

O fisioterapeuta deverá realizar uma avaliação minuciosa antes de iniciar o tratamento; quando
possível, é interessante que essa avaliação seja realizada antes da cirurgia de amputação e também
após a amputação. A seguir abordaremos alguns itens que devem ser verificados durante a avaliação do
paciente amputado.

• Anamnese: sexo, idade, profissão, data da amputação, presença de comorbidades.

• Amputação de urgência ou eletiva.

• Como se locomove (permanece na cadeira de rodas, uso de muletas, saltos).

• Avaliação do equilíbrio estático e dinâmico.

• Avaliação cardiorrespiratória (nunca iniciar o processo reabilitativo antes da liberação da equipe


de cardiologia).

• Associação de patologias (tais como cardiopatias, AVC, TCE).

• Condições musculoesqueléticas.

52
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

• Avaliação da parte visual e auditiva (muitos pacientes são idosos e apresentam elevado risco
de quedas).

• Risco de novas amputações (por exemplo, no caso de neuropatias periféricas).

Exame físico (ambos os membros)

1) Condições da pele e anexos da pele:

— hiperemia;

— escoriações, ulcerações, ressecamento, descamações: as cicatrizes não devem estar nas áreas
de apoio da prótese;

— coloração e temperatura: cianose indica déficit circulatório;

— verificação da cicatriz (aderências, hipertrófica, saída de secreções, deiscência de sutura).

2) Sensibilidade: presença também de dor e sensação fantasma.

3) Perimetria: estabilização do volume do edema é um requisito para a prescrição da prótese.

4) Força muscular do coto e do lado sadio.

5) Presença de encurtamentos musculares e deformidades ósseas (encurtamentos musculares,


atitude viciosa ou deformidades estruturadas).

6) Avaliação da força muscular dos membros superiores e do tronco.

7) Equilíbrio/resistência/condicionamento físico.

4.2 Objetivos do tratamento fisioterapêutico: fase de pré-protetização

Após minuciosa avaliação, o fisioterapeuta deverá traçar os objetivos a serem alcançados. Abordaremos
estes objetivos e quais condutas podem ser realizadas pelo fisioterapeuta.

4.2.1 Auxiliar no processo de cicatrização e evitar aderência cicatricial

Para auxiliar no processo de cicatrização pode-se utilizar o laser, quando indicado. Após a
cicatrização total, pode-se mobilizar a cicatriz e realizar massagem de fricção com intuito de evitar
possível aderência cicatricial – se forem bem orientados, o próprio paciente e os cuidadores podem
realizar esta massagem.

53
Unidade I

4.2.2 Praticar exercícios de dessensibilização para melhora do quadro de hiperestesia,


hiperalgesia e sensação de membro fantasma

As técnicas de dessensibilização definem-se como a aplicação de estímulos sensitivos realizados


na extremidade do coto, causando a acomodação dos receptores das vias aferentes (sensitivas), com o
intuito de normalizar a sensibilidade local. Estas técnicas reduzem a hipersensibilidade local, e devem
ser realizadas de forma gradual, utilizando diversos estímulos, de acordo com a tolerância do paciente.

Após a cicatrização, o terapeuta poderá realizar a dessensibilização do coto realizando massagem


terapêutica – com uso de bolinhas ou objetos de texturas diferentes –, ensinar o paciente a realizar
a automassagem, incentivar a descarga de peso corporal no coto e o uso de jatos de água durante o
banho, ou mesmo o uso do turbilhão. O enfaixamento também poderá auxiliar neste processo.

O paciente pode também massagear o coto com buchas ou toalhas, favorecendo a acomodação
sensorial.

4.2.3 Modelar o coto e controlar o edema (preparo do membro residual)

O termo membro residual ou coto é usado para designar a parte residual do membro amputado ou
segmento do membro, após uma amputação. O coto é responsável pelo controle da prótese durante o
ortostatismo e a deambulação, e deve reunir as condições ideais para o uso funcional de uma prótese.

O enfaixamento correto do membro residual será crucial para auxiliar na cronificação do coto,
na diminuição do edema após a amputação e na dessensibilização. Para isso, é necessário que o
enfaixamento seja realizado todos os dias, e que o paciente permaneça com o coto enfaixado o dia todo.

Porém, alguns cuidados devem ser tomados: primeiramente, é necessário certificar-se de que o
paciente e seus cuidadores saibam realizar o enfaixamento da maneira correta, evitando que ocorram
pregas cutâneas, ou o garroteamento do coto (impedindo a circulação sanguínea). Preconiza-se que o
paciente permaneça com o coto enfaixado o dia todo, porém, deverá realizar a inspeção periódica com
intuito de verificar possíveis lesões ou garroteamento.

Os cotos das amputações deverão ser cônicos, mais finos na ponta do que na base, facilitando o
encaixe na prótese; para o preparo do formato cônico são utilizadas faixas elásticas (enfaixamento
compressivo) e meias compressivas.

O enfaixamento auxiliará na prevenção e na redução do edema pós-amputação, uma vez que o


encaixe da prótese será moldado no formato do membro residual.

Há uma grande variedade de faixas elásticas no mercado, e geralmente é necessário solicitar ao


paciente que ele emende duas destas faixas com o intuito de aumentar seu comprimento, tornando
possível o enfaixamento de todo o coto, principalmente os mais globosos e volumosos.

54
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

O paciente e seus cuidadores também devem se preocupar com a higiene destas faixas, que devem
ser lavadas sempre, em especial nos casos em que há saída de secreções.

Figura 38 – Faixa compressiva utilizada para o enfaixamento do coto

Disponível em: https://cutt.ly/iJkURzn. Acesso em: 10 maio 2022.

Figura 39 – Faixas compressivas emendadas para cotos mais volumosos

55
Unidade I

Se o enfaixamento do coto for realizado de maneira inadequada, poderá causar alterações no seu
formato, dificultando o processo de encaixe da prótese. O paciente e o cuidador devem estar sempre
atentos ao enfaixamento do coto, evitando a formação de pregas cutâneas ou seu garroteamento.

Além disso a compressão da faixa elástica favorece a diminuição da sensação de membro fantasma
e de dor fantasma, as quais abordaremos a seguir.

Observe a seguir as principais características esperadas para o coto/membro residual adequado:

• nível de amputação adequado;

• coto estável sem deformidades articulares;

• presença de bom coxim com mioplastia e miodese (acolchoado);

• bom estado da pele (sem feridas e sensibilidade preservada);

• ausência de neuromas dolorosos ou de espículas ósseas;

• adequada circulação arterial e venosa;

• boa cicatrização (sem aderências ou deiscências de suturas);

• redução gradual do edema;

• adequada força e resistência muscular.

Lembrete

O enfaixamento deverá ter maior compressão na extremidade do coto,


e essa pressão deve ser gradativamente diminuída em direção proximal ao
segmento amputado. E o enfaixamento deverá abranger todo o segmento
do coto de amputação.

O enfaixamento das amputações transtibiais deve ser realizado da maneira descrita a seguir.

O paciente deve posicionar uma das pontas da faixa elástica um pouco abaixo do joelho, levar
para a parte posterior da perna; dar uma volta na perna com objetivo de prender a ponta da faixa;
descer na diagonal, dando pressão na região da ponta do coto, depois subir na diagonal pela parte
posterior, formando um X; repetir os movimentos nas diagonais formando desenhos de X, aliviando a
pressão na região próxima ao joelho. Deve-se finalizar o enfaixamento próximo ao joelho. Não se deve
garrotear o membro, e a pressão da faixa elástica deve ser maior na ponta do coto e menor na região
próxima ao joelho.
56
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

O enfaixamento de amputações transfemorais pode ser mais complicado, uma vez que o coto é
mais proximal, mais curto e mais globoso, e o paciente pode necessitar da ajuda do cuidador.

O paciente deverá posicionar uma das pontas da faixa elástica próximo à virilha (podendo prender
a ponta com o elástico da calcinha/cueca), descer até a ponta do coto e levar para a parte posterior da
coxa. Realizar movimentos nas diagonais formando desenhos de X, dando pressão na região da ponta
do coto, aliviando a pressão na região próxima à virilha. Lembrando que a pressão da faixa elástica deve
ser maior na ponta do coto e menor na região próxima à virilha. O enfaixamento deve ser realizado com
o quadril em extensão, evitando contraturas em flexão.

4.2.4 Treinar mudanças de decúbito, transferências e marcha com dispositivos auxiliares

O fisioterapeuta deverá treinar o paciente a realizar mudanças de decúbito constantemente, evitando


permanecer apenas deitado e sentado. Quando possível, estimular o treino de marcha com dispositivos
auxiliares (andador, muletas). Porém, para que isso seja viável, deverão ser considerados diversos fatores:
condição clínica geral, estabilidade hemodinâmica, estado de cicatrização do membro residual, controle
da dor, estado mental e risco de queda.

Os benefícios da mobilização precoce incluem a manutenção da força muscular, a aptidão


cardiovascular, a prevenção da perda de massa óssea e o treino da independência funcional. Além disso,
deve-se estimular a mobilidade do tronco e o alcance funcional.

No caso do uso da cadeira de rodas, ela deverá ser ajustada corretamente ao paciente, evitando
posturas viciosas que podem favorecer as contraturas musculares. Por exemplo, é comum o paciente
amputado transtibial sentar-se na cadeira de rodas e manter o coto em hiperflexão, podemos orientá-lo
a posicionar o apoio da perna em elevação favorecendo a extensão do joelho.

Devemos também estimular que o paciente impulsione a própria cadeira de rodas, favorecendo
assim o treino de condicionamento cardiopulmonar e de fortalecimento dos membros superiores, que
serão necessários na fase de protetização.

Se o paciente tiver condições físicas adequadas e boa compreensão dos comandos, o fisioterapeuta
poderá iniciar o treino de marcha em barras paralelas (paciente amputado unilateral), com o paciente
mantendo-se em pé com apoio dos membros superiores. Ao ser colocado em pé ele deverá se adaptar
à mudança do centro de gravidade (estabilidade postural), com transferência do peso corporal para o
membro residual. Posteriormente alguns pacientes podem conseguir caminhar com auxílio do andador
ou de muletas.

57
Unidade I

Figura 40 – Jogadores de futebol amputados, com auxílio de muletas canadenses

Disponível em: https://cutt.ly/9SWcS39. Acesso em: 16 mar. 2022.

Se o paciente fizer uso de muletas, devemos orientá-lo a não apoiar o coto na muleta forçando em
flexão, o que pode gerar contraturas.

Pacientes amputados bilaterais poderão apresentar maior dificuldade nas trocas posturais, e
impossibilidade de manter-se em pé. Outros fatores podem influenciar de forma negativa essas trocas
posturais, por exemplo, a presença de sequelas neurológicas pós-AVC ou TCE.

4.2.5 Fortalecer os músculos e o condicionamento cardiopulmonar

Recomenda-se que durante o treinamento de reabilitação sejam realizados exercícios de resistência


progressiva para melhorar marcha, mobilidade, força, treino cardiovascular e atividades da vida
diária (AVDs), a fim de maximizar a independência funcional.

O treino de fortalecimento muscular deverá incluir não apenas a musculatura do membro residual,
mas também os membros superiores, tronco e membro inferior contralateral, uma vez que estes serão
muito exigidos durante as transferências e durante a macha com a prótese.

O quadro a seguir mostra a evolução que pode ser realizada durante o programa de treino de força
muscular, porém, cabe ressaltar que tudo dependerá das condições clínicas do paciente.

Quadro 2 – Evolução do treino de fortalecimento muscular

Fase inicial Fase intermediária Fase tardia


— Exercícios de isometria e — Exercícios isotônicos — Exercícios resistidos graduais
mobilização passiva no sem resistência
membro amputado — Descarga de peso gradual
— Treino de transferências sobre o coto
— Treino resistido para membro — Treino resistido para membro
contralateral, membros — Treino de marcha com
contralateral, membros
superiores e tronco dispositivos auxiliares
superiores e tronco

58
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

A seguir mencionaremos alguns exemplos de atividades/condutas que podem ser realizadas durante
o treinamento:

• O fortalecimento de membros superiores poderá incluir o treino de push-up (elevar-se com


extensão dos cotovelos) para fortalecer o músculo tríceps braquial, o que será importante, como
exemplo, para os deslocamentos do paciente, como sair da cadeira de rodas para o tablado; deve‑se
fortalecer todos os grupos musculares, com aumento de carga e resistência de forma gradual.

• O fortalecimento do membro inferior contralateral poderá ser realizado com o paciente em pé


apoiando os membros superiores no espaldar, e realizando flexão e extensão do joelho (movimento
de agachar).

• O fortalecimento de extensores de quadril poderá ser realizado com a ponte; para isso o terapeuta
poderá colocar uma bola/cunha abaixo do coto com intuito de dar maior simetria pélvica, e
solicitar a extensão do quadril e estabilização da pelve.

• Treino de fortalecimento de musculatura adutora e abdutora de quadril, lembrando que, em


especial nos amputados transfemorais, mantendo o quadril em extensão.

• Treino de fortalecimento de flexores e extensores de quadril, e nos amputados transtibiais, o


fortalecimento de flexores e extensores de joelho.

• Fortalecimento de flexores e extensores de tronco em diversas posturas.

• Para o condicionamento cardiopulmonar, pode-se usar o cicloergômetro de membros superiores


para o treinamento aeróbico.

4.2.6 Treino de equilíbrio

Deverá ser estimulado o treino de equilíbrio estático e dinâmico em diferentes posturas, tais como em
decúbito lateral e sedestação, ajoelhado e em ortostase, de acordo com a capacidade de cada indivíduo.

Deve-se ter cautela ao colocar o paciente em terrenos muito instáveis ou, por exemplo, colocá-lo
sentado na bola, devido ao grande risco de quedas.

A fisioterapia aquática pode auxiliar no treino de estabilidade postural em ortostase, com menor
risco de lesão para o paciente, uma vez que a pressão hidrostática auxilia o paciente a ter maior tempo
de resposta, e conseguir recuperar seu equilíbrio. Na piscina é possível treinar deslocamentos de forma
mais fácil e ágil, treinar mudança de direção e até mesmo saltos.

59
Unidade I

Figura 41 – Fisioterapia aquática na reabilitação pós-amputação

Disponível em: https://cutt.ly/ESWvAl1. Acesso em: 16 mar. 2022.

4.2.7 Evitar contraturas musculares e manter o alongamento muscular

Um dos grandes fatores que favorece o surgimento de contraturas musculares é o imobilismo


prologado e o posicionamento inadequado do paciente. Cabe aos profissionais que atendem o paciente,
estimulá-lo de forma precoce a realizar as trocas posturas. Quanto mais idoso o paciente, maiores serão
as dificuldades em realizar estas mudanças de forma periódica.

Nas amputações do pé, as contraturas musculares mais encontradas são os pés em equino (flexão
plantar), nas amputações de dedos podem ocorrer deformidades em adução dos dedos remanescentes.

Já nas amputações transtibiais encontramos principalmente encurtamento de flexores de joelho


devido ao tempo prolongado sentado e ao braço da alavanca estar menor, favorecendo a flexão do
joelho. Outro problema comumente observado, é o paciente manter-se sentado com a perna amputada
cruzada sobre a perna preservada, favorecendo encurtamento de adutores de quadril.

Já nas amputações transfemorais as principais contraturas observadas são em flexão e abdução


de quadril.

O quadro a seguir elenca os principais encurtamentos encontrados nas amputações transtibiais e


transfemorais, e quais testes ortopédicos podem ser realizados para quantificar estas contraturas.

60
ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Quadro 3 – Principais encurtamentos encontrados em amputados

Amputação transtibial Amputação transfemoral


— Encurtamento de flexores de joelho — Encurtamento de flexores e adutores de quadril
— Teste do ângulo poplíteo e teste de Thomas — Teste de Thomas

A seguir vamos relembrar os testes que devem ser realizados nestes pacientes:

Teste de Thomas: avaliação do encurtamento dos músculos flexores de quadril, no qual o paciente
é colocado em decúbito dorsal, o terapeuta mantém seus membros inferiores em flexão de quadril e
joelhos (posição inicial) e, em seguida, realiza a extensão passiva do quadril do membro avaliado. Se
existir uma flexão residual, o teste será positivo para o encurtamento.

Figura 42 – Teste de Thomas

Teste do ângulo poplíteo: o paciente permanece em decúbito dorsal, com o quadril fletido a 90°,
e o examinador mantém a flexão do quadril, parte da flexão do joelho (posição inicial) e vai para a
extensão máxima do joelho (posição final), observando se existe flexão residual do joelho, ou seja, o
encurtamento muscular do membro avaliado.

61
Unidade I

Figura 43 – Teste do ângulo poplíteo

Devem ser realizados os alongamentos musculares, enfatizando os flexores de quadril e joelho,


adutores e abdutores de quadril. Devido à assimetria postural causada pela amputação devemos também
alongar a musculatura de tronco, e estimular a consciência corporal do paciente.

Uma observação geral: devemos ter uma atenção especial com os pacientes que estão acamados,
lembrar de orientar os cuidadores em relação ao posicionamento adequado no leito, estimular as
trocas de decúbito (evitando inclusive a formação de feridas), e em relação a possíveis complicações
respiratórias, também verificar e avaliar periodicamente as condições deste indivíduo. Além disso
devemos conscientizar o paciente e cuidadores, principalmente nos casos de amputações associadas ao
diabetes, que há o risco de ocorrerem novas amputações, e por isso a necessidade do acompanhamento
multiprofissional.

Para finalizar, elencamos algumas das principais orientações que devem ser transmitidas ao paciente
e seus cuidadores:

• Inspecionar os membros inferiores todos os dias, principalmente nos casos de perda sensorial.

• Posicionar corretamente o membro residual, evitando contraturas (manter o alinhamento).

• Realizar exercícios de fortalecimento, alongamento, trocas posturais regularmente.

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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Resumo

A amputação de um membro não representa apenas a perda física


e/ou estética, mas ela também compromete a mobilidade, autonomia,
autoestima e a imagem corporal do indivíduo, levando a perdas funcionais.

As possíveis causas de amputação são as doenças infecciosas e


parasitárias, doenças do aparelho circulatório, diabetes melito, neuropatias
periféricas, doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo,
neoplasias, causas externas, doenças de pele e malformações congênitas.

As amputações dos membros inferiores são mais frequentes, principalmente


quando associadas ao envelhecimento populacional e de doenças crônicas.

Uma das maiores preocupações de um paciente amputado gira em


torno da possibilidade de ser ou não protetizado. Infelizmente não são
todos os pacientes que poderão ser protetizados, porém todo tratamento
de reabilitação deverá ser traçado pensando na protetização. Vamos pensar
em um caso clínico.

Antes de iniciar o tratamento, o fisioterapeuta deve saber que após


a amputação podem surgir algumas complicações, as quais dificultarão
o processo de reabilitação, e são elas: hiperalgesia/hiperestesia, neuroma
doloroso, sensação de membro fantasma, sensação de dor fantasma,
deiscência de suturas, infecções e espículas ósseas.

Após a amputação, o paciente deverá continuar sendo assistido pela


equipe de reabilitação, a qual deverá traçar estratégias de atendimento
adequadas a cada indivíduo, incluindo apoio social, emocional e de
recuperação funcional.

Os principais objetivos de tratamento fisioterapêutico a serem


alcançados são: auxiliar no processo de cicatrização e evitar aderência
cicatricial; realizar exercícios de dessensibilização para melhora do quadro
de hiperestesia, hiperalgesia e sensação de membro fantasma; modelar o
coto e controlar o edema; treinar mudança de decúbito, transferências
e marcha com dispositivos auxiliares; fortalecer músculos e realizar
condicionamento cardiopulmonar; treinar equilíbrio; evitar encurtamento
e contraturas, entre outros.

63
Unidade I

Exercícios

Questão 1. Leia a imagem a seguir, que representa os cinco principais níveis de desarticulação da
extremidade do membro inferior.

Figura 44

Disponível em: https://cutt.ly/rSo5Pvt. Acesso em: 2 mar. 2022.

Com base na leitura, avalie as afirmativas a seguir e a relação proposta entre elas.

I – A desarticulação dos metatarsos com os ossos cuboide e cuneiforme, representada pela letra C,
acarreta dificuldades na protetização.

porque

II – Nesse tipo de desarticulação, ocorre a perda da inserção dos tendões dos músculos dorsiflexores
do tornozelo.

A) As afirmativas I e II são verdadeiras, e a afirmativa II justifica a I.

B) As afirmativas I e II são verdadeiras, e a afirmativa II não justifica a I.

C) A afirmativa I é verdadeira, e a II é falsa.

D) A afirmativa I é falsa, e a II é verdadeira.

E) As afirmativas I e II são falsas.

Alternativa correta: A.
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ÓRTESE E PRÓTESE EM FISIOTERAPIA

Análise das afirmativas

I e II – Afirmativas verdadeiras.

Justificativa: a desarticulação indicada pela letra C, também conhecida como desarticulação


de Lisfranc, ocorre entre os metatarsos e os ossos cuboide e cuneiforme. Trata-se, portanto, da
desarticulação entre o antepé e o mediopé. Ela geralmente acarreta deformidades na flexão plantar,
com o desenvolvimento de deformidade em equino do tornozelo, pois há perda da inserção dos tendões
dos músculos dorsiflexores do tornozelo. Como resultado, a protetização é dificultada.

Portanto, as duas afirmativas são verdadeiras, e há uma relação causal entre elas.

Questão 2. Leia o caso clínico a seguir.

A. V. M., 18 anos, feminino, sofreu amputação transtibial no membro inferior esquerdo em decorrência
de um osteossarcoma. A paciente recebeu uma prótese ainda no centro cirúrgico, o que foi possível
graças à moldagem, sob medida, do encaixe (soquete) em gesso.

Assinale a alternativa incorreta a respeito dos benefícios da protetização imediata da paciente A. V. M.

A) Observa-se aumento do edema no coto de amputação, o que melhora a mobilização das células
do sistema imunológico para o local.

B) A prótese, quando posicionada precocemente e de maneira correta, facilita a aquisição, pelo coto,
de formato adequado.

C) A deambulação ocorre mais precocemente, o que possibilita maior independência funcional.

D) Evita-se a perda de massa muscular, o que proporciona maior estabilidade nos movimentos.

E) A probabilidade de desenvolver quadros de dor fantasma diminui.

Alternativa incorreta: A.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: a protetização precoce promove a diminuição do edema no local da amputação, e não


o contrário. A pressão sobre o local é maior, e a recuperação da deambulação e dos movimentos em
geral ocorre de maneira mais rápida, o que favorece a drenagem do líquido que se acumula no local
da cirurgia.

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Unidade I

B) Alternativa correta.

Justificativa: a presença precoce da prótese favorece a aquisição de formato de cone pelo coto de
amputação, o que é propício para seu encaixe.

C e D) Alternativas corretas.

Justificativa: a prótese, de fato, possibilita um ponto de apoio que favorece a deambulação precoce
ao simular uma distribuição de peso corporal mais próxima da normal. Com o restabelecimento
precoce da deambulação, evita-se a perda de massa muscular do membro amputado.

E) Alternativa correta.

Justificativa: o estabelecimento de sensação de dor fantasma envolve estruturas do córtex


somatossensorial, dos centros da visão e do sistema límbico, entre outras. A percepção da prótese pela
paciente auxilia na regulação dessas estruturas, o que resulta em diminuição da probabilidade de se
desenvolver dor fantasma.

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