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PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E INOVAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO


MESTRADO EM ARQUITETURA, URBANISMO E TECNOLOGIAS
MODALIDADE PROFISSIONAL

CARLA APARECIDA DA SILVA RIBEIRO

(SUB)URBANO NO CENTRO: Um Plano para a Cultura Hip-hop e a Gestão Participativa


em Campos Dos Goytacazes/RJ

Campos dos Goytacazes/RJ


2021
CARLA APARECIDA DA SILVA RIBEIRO

(SUB)URBANO NO CENTRO: Um Plano para a Cultura Hip-hop e a Gestão Participativa


em Campos Dos Goytacazes/RJ

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Arquitetura e Urbanismo do
Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia Fluminense, área de concentração
Tecnologias em Arquitetura e Urbanismo, linha
de pesquisa Tecnologia, Gestão e Produção,
como parte dos requisitos para obtenção do
título de Mestre em Arquitetura, Urbanismo e
Tecnologias

Orientadora: Dra. Aline Couto da Costa

Campos dos Goytacazes/RJ


2021
Biblioteca Anton Dakitsch
CIP - Catalogação na Publicação

Ribeiro, Carla Aparecida da


R484( (SUB)URBANO NO CENTRO: Um Plano para a Cultura Hip-hop e a
Gestão Participativa em Campos Dos Goytacazes/RJ / Carla Aparecida da
Ribeiro - 2021.
209 f.: il. color.

Orientadora: Aline Couto da Costa

Dissertação (mestrado) -- Instituto Federal de Educação, Ciência e


Tecnologia Fluminense, Campus Campos Centro, Curso de Mestrado
Profissional em Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias, Campos dos
Goytacazes, RJ, 2021.
Referências: f. 154 a 163.

1. Cultura urbana. 2. Hip-hop. 3. Ponte Leonel Brizola. 4. Gestão


Participativa. I. Costa, Aline Couto da , orient. II. Título.

Elaborada pelo Sistema de Geração Automática de Ficha Catalográfica da Biblioteca Anton Dakitsch do IFF
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).
Para aqueles que tiveram suas oportunidades
excluídas, seus talentos descartados e suas
vidas marcadas pelo descaso.
AGRADECIMENTOS

Àqueles que não só me deram a vida, mas me deram a oportunidade de viver o que sempre
sonhei, que foram meus braços e pernas ao caminho que trilho hoje. Aos meus pais, Carlos e
Angélica, o amor mais puro e eterno.

Ao meu irmão, Arthur, pela leveza do amor de criança, pelos dias que mesmo quando eu achava
que ninguém se importava, ele estava ali, interessado em tudo que me rondava.

Às minhas irmãs e à minha filha, minhas perdas mais dolorosas e aprendizados mais profundos.
(In Memorian)

Ao meu amigo e companheiro Italo, que aguentou choros, surtos e pedidos de socorro. Sabes
que mesmo se não for para ser, “Serás o meu amor, serás a minha paz. ”

À minha orientadora, Aline, não só por aceitar me orientar, mas por me acolher e me ensinar o
que sei hoje. Pela humanidade, simplicidade e cumplicidade nesses anos difíceis. Por ser, por
vezes, mais que orientadora, mas um ombro amigo onde pude compartilhar dores e sonhos,
obrigada por ser luz em minha vida e em minha caminhada.

À banca, composta por mulheres incríveis, agradeço pelo aceite para participar deste momento,
pelos acréscimos e ensinamentos tão importantes ao trabalho.

Às amigas Luiza e Bianca. A primeira, por ter dividido essa caminhada comigo, entre artigos,
prazos, sufocos, choros, esperanças e desesperanças. E a segunda, por sempre estar presente,
pelo apoio, por ouvir as lamúrias e por fazer a vida mais leve com boas gargalhadas.

Aos professores e funcionários do Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia


Fluminense pela excelência da qualidade técnica e pelas contribuições até aqui.

Aos amigos que fiz durante o curso, pelas trocas e por todo apoio, minha administração,
carinho.
Aos amigos da vida, obrigada por serem o refúgio e a leveza de todos os momentos.

A todos os entrevistados que aceitaram participar desta pesquisa, pela disponibilidade, pela
paciência e atenção.

À Manifestação Cultural de Rimas, seus organizadores e integrantes, por terem me abraçado e


me acolhido, por aguentarem extensas conversas, questionamentos e apontamentos. Vocês têm
mais do que a minha gratidão por terem confiado e compartilhado a vida comigo, vocês
possuem toda a minha admiração pelos seres humanos incríveis que são.
O corpo negro é elemento central na reprodução de
desigualdades.
Está nos cárceres repletos, nas favelas e periferias
designadas como moradias.
(FRANCO, Marielle, 2017)
RESUMO

RIBEIRO, Carla Aparecida da Silva. (Sub)Urbano no Centro: Um Plano para a Cultura Hip-
hop e a Gestão Participativa em Campos Dos Goytacazes/RJ. 2021. Dissertação (Mestrado em
Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias) - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
Fluminense, Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, 2021.

A cultura hip-hop no espaço urbano de Campos dos Goytacazes vem sendo ignorada e
estigmatizada por grande parte da população, segundo os próprios manifestantes. Em
contrapartida, ela é considerada um movimento social de resistência e reivindicação de direitos
de uma parte menos abastada da sociedade. A partir disso, o trabalho tem como objetivo geral
compreender como a cultura suburbana pode ser inserida no processo de gestão participativa
por meio do coletivo denominado Manifestação Cultural de Rimas (MCR), considerando a
importância da continuidade de seu movimento e respectivo espaço na cidade, de modo a propor
um plano de ação direcionado ao grupo. Como objetivos específicos, estabeleceu-se: traçar uma
abordagem teórico-conceitual sobre a cultura suburbana, o hip-hop e as políticas culturais;
delinear brevemente o trajeto da gestão urbana participativa, a fim de destacar a importância
desta para uma cidade mais justa, democrática e igualitária; analisar o movimento hip-hop em
Campos dos Goytacazes, identificando e caracterizando seus agentes, com enfoque no grupo
MCR e o espaço que ocupam sob a Ponte Leonel Brizola; e por fim, desenvolver e apresentar
um plano de ação para a organização e atuação do grupo. Como metodologia, utilizou-se:
revisão bibliográfica e documental; estudo de caso; pesquisas de campo, a fim de compreender
as dinâmicas do grupo e as narrativas urbanas; e desenvolvimento de um produto, que consiste
no documento do plano de ação. Ao final, espera-se incentivar a cultura local e instrumentalizar
seus agentes, de modo que possam se manifestar e serem incluídos no processo de gestão
participativa urbana, inclusive contribuindo para a cidade por meio da apropriação de espaços
subutilizados, da arte urbana, dentre outros.

Palavras-chave: Cultura urbana. Hip-hop. Ponte Leonel Brizola. Gestão Participativa.


ABSTRACT
RIBEIRO, Carla Aparecida da Silva Ribeiro. (Sub)Urban at the Center: A Plan for Hip-hop
Culture and Participatory Management in Campos dos Goytacazes/RJ. 2021. Dissertação
(Mestrado em Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias) - Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnologia Fluminense, Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, 2021.

Hip-hop culture in the urban space of Campos dos Goytacazes has been ignored and stigmatized
by a large part of the population, according to the protesters themselves. On the other hand, it
is considered a social movement of resistance and claiming the rights of a less affluent part of
society. From this, the work has as general objective to understand how suburban culture can
be inserted in the participative management process through the collective called Manifestação
Cultural de Rimas (MCR), considering the importance of the continuity of its movement and
respective space in the city, in order to propose an action plan directed at the group. As specific
objectives, it was established: to draw a theoretical-conceptual approach on suburban culture,
hip-hop and cultural policies; briefly outline the path of participatory urban management in
order to highlight its importance for a fairer, more democratic and egalitarian city; analyze the
hip-hop movement in Campos dos Goytacazes, identifying and characterizing its agents, with
a focus on the MCR group and the space they occupy under the Leonel Brizola Bridge; and
finally, develop and present an action plan for the organization and performance of the group.
The methodology used was: bibliographical and documental review; case study; field research
in order to understand group dynamics and urban narratives; and development of a product,
which consists of the action plan document. In the end, it is expected to encourage local culture
and equip its agents, so that they can manifest themselves and be included in the participatory
urban management process, including contributing to the city through the appropriation of
underutilized spaces, urban art, among others.

Keywords: Urban culture. Hip-hop. Leonel Brizola Bridge. Participatory Management.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Localização da Ponte Leonel Brizola 21


Figura 2 - Localização dos bairros Ururaí e Custodópolis 81
Figura 3 - Trecho do documentário mostrando os espaços onde os artistas conseguiam grafitar
82
Figura 4 - Trecho do documentário mostrando a repressão policial na primeira intervenção do
viaduto 83
Figura 5 - Banner do evento Open Run 85
Figura 6 - Evento Open Run 86
Figura 7 - Banner e imagem do evento Se Liga Aê 86
Figura 8 - Banner e imagem de eventos no SESC 87
Figura 9 - Evento no IFF 87
Figura 10 - Ações em escolas municipais 88
Figura 11 - Quadra de Esportes Hugo Oliveira Saldanha 91
Figura 12 - Evento de Skate na quadra 92
Figura 13 - Capa de CD do DJ Dizy Ragga 93
Figura 14 - Encontro do coletivo Rima Cabrunco 94
Figura 15 - Quadra grafitada 94
Figura 16 - Dique do Rio Paraíba do Sul 95
Figura 17 - Pista de skate na quadra 96
Figura 18 - Encontro da MCR 97
Figura 19 - Fluxo de Jovens na MCR em 2016 e em 2019 98
Figura 20 - A quadra no ano de 2021 103
Figura 21 - Publicação da consulta pública no Instagram do COMCULTURA 108
Figura 22 - Consulta Pública para o Plano Municipal de Cultura 109
Figura 23 - Divulgação da Lei Aldir Blanc em 2020 113
Figura 24 - Divulgação da Lei Aldir Blanc para a distribuição de recursos remanescentes em
2021 114
Figura 25 - Projeto Carolinas 118
Figura 26 - Etapas e desdobramentos de elaboração do PMC 123
Figura 27 - Etapas de elaboração do Plano de Ação 123
Figura 28 - Minuta do Plano de Cultura do Instituto Federal Fluminense 124
Figura 29 - Capa e Ficha Técnica do Plano de Ação 125
Figura 30 - Parte da apresentação do PMC de Campos dos Goytacazes 126
Figura 31 - Apresentação do Plano de Ação 126
Figura 32 - Introdução do Plano de Ação 127
Figura 33 - Introdução do Plano de Ação 128
Figura 34 - Introdução do Plano de Ação 129
Figura 35 - Diretrizes do Plano de Ação 130
Figura 36 - Objetivos do Plano de Ação 131
Figura 37 – Metas e Ações do Plano de Ação 132
Figura 38 - Metas e Ações do Plano de Ação 134
Figura 39 - Metas e Ações do Plano de Ação 135
Figura 40 - Metas e Ações do Plano de Ação 137
Figura 41 - Metas e Ações do Plano de Ação 138
Figura 42 - Metas e Ações do Plano de Ação 139
Figura 43 - Metas e Ações do Plano de Ação 141
Figura 44 - Metas e Ações do Plano de Ação 142
Figura 45 - Exemplo de indicadores de resultados 142
Figura 46 - Resultados e Impactos do Plano de Ação 143
Figura 47 - Monitoramento e avaliação de resultados do PMC de Campos dos Goytacazes 144
Figura 48 - Monitoramento do Plano de Ação 144
Figura 49 - Reunião do COMCULTURA 145
Figura 50 - Reunião do coletivo MCR com o poder público 146
Figura 51 - Reportagem sobre a reunião 147
Figura 52 - Postagem no Instagram da FCJOL 148
Figura 53 - Cronograma de Ações 149
Figura 54 - Cronograma de Ações 150
Figura 55 - Cronograma de Ações 151
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 19
2 A CULTURA (SUB)URBANA E O HIP-HOP 29
2.1 CULTURA, CULTURA URBANA E CULTURA SUBURBANA 29
2.2 “OS CIRCUITOS DOS JOVENS URBANOS” E A CULTURA COMO RECURSO 38
2.3 A CULTURA HIP-HOP: BREVE HISTÓRICO 43
3 GESTÃO PARTICIPATIVA E AS POLÍTICAS CULTURAIS 49
3.1 GESTÃO PARTICIPATIVA 49
3.2 POLÍTICAS CULTURAIS 56
4 HIP-HOP EM CAMPOS DOS GOYTACAZES 75
4.1 CENTRO X PERIFERIA EM CAMPOS DOS GOYTACAZES 76
4.2 DO INÍCIO DO HIP-HOP EM CAMPOS DOS GOYTACAZES AO SURGIMENTO DA MCR 80
4.3 O HIP-HOP COMO FERRAMENTA DE PARTICIPAÇÃO PARA OS GRUPOS MARGINALIZADOS
DE CAMPOS DOS GOYTACAZES 104
5 O PLANO DE AÇÃO COMO PRODUTO 121
5.1 PASSO A PASSO PARA O PLANO DE AÇÃO 121
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 152
REFERÊNCIAS 154
APÊNDICE A – ESBOÇO PARA ENTREVISTA COM OS MEMBROS DA
ORGANIZAÇÃO DA MANIFESTAÇÃO CULTURAL DE RIMAS 165
APÊNDICE B – ESBOÇO PARA ENTREVISTA COM OS MEMBROS
PARTICIPANTES DA MANIFESTAÇÃO CULTURAL DE RIMAS 167
APÊNDICE C – PLANO DE AÇÃO MCR 168
ANEXO A – OFÍCIO DE SOLICITAÇÃO 23/11/2021 200
ANEXO B – OFÍCIO DE SOLICITAÇÃO 25/11/2021 204
19

1 INTRODUÇÃO

O hip-hop pode ser considerado um movimento cultural e social norteado por ideologias
de resistência e valorização da juventude negra e periférica (ROCHA, DOMENICH,
CASSEANO, 2001). A respectiva arte urbana manifesta a exclusão econômica, educacional e
racial que esses interlocutores vivem, com o intuito de romper com as estruturas sociais que os
segregam e de afastá-los da violência do meio em que vivem.
Segundo Souza e Bernardes (2018), a manifestação emergiu nos EUA, na década de
1960 e é constituída por quatro elementos: o Rap1, o Break2, o Grafitti3 e o DJ4. No Brasil, a
cultura chegou, no início dos anos de 1980, nos espaços públicos de São Paulo e logo se
espalhou para o Rio de Janeiro e outras capitais. O hip-hop tem como característica a cultura
urbana, de rua, sendo esse um conceito utilizado pelos próprios manifestantes. A expressão
cultura urbana pode ser tomada num sentido descritivo como “conjunto de códigos induzidos
por e exigidos para o uso de equipamentos, espaços e instituições urbanas e desempenho das
formas de sociabilidade adequadas. ” (MAGNANI, 1998, p.2)
Em busca de estabelecer uma relação entre essa cultura e a sociedade atual, entende-se
que a segunda tem sido caracterizada pela individualidade e fragilidade, e concentra seus
esforços no consumo exacerbado (BAUMAN, 2001). Uma das consequências disso é a maior
separação do poder e da política, em que o Estado perde sua força, os serviços públicos se
deterioram e, assim, diversas funções que antes eram estatais, passam a ser feitas pelas
iniciativas privadas, ou simplesmente não são feitas. A vida para o consumo, segundo Bauman
(2008), leva as pessoas que não são capazes de consumir para a margem da sociedade, onde
fluem poucos recursos.
Harvey (2014) também afirma que o liberalismo econômico faz com que o urbanismo e
a vida urbana sejam definidos pelo poder de compra e, com isso, as pessoas que não o possuem
são configuradas como marginais, dos quais os indivíduos que possuem mais recursos
aquisitivos tentam se proteger.
Nesse contexto, o hip-hop surgiu, de acordo com Araújo (2008), como uma reação ao
tal modelo de segregação socioeconômica, cultural e espacial hegemônico, em tom de

1
Gênero musical urbano com versos por vezes improvisados, rimas simples, repleto de gírias e ditados populares
(ARAÚJO, 2008, p.4).
2
Dança urbana com movimentos acrobáticos.
3
Representações com aerossol de tinta, nas paredes, muros, monumentos de uma cidade.
4
Disc Jockey - artista ou profissional que seleciona e reproduz as mais diferentes composições musicais,
previamente gravadas.
20

resistência às condições de vida que as pessoas à margem da sociedade viviam, e como forma
alternativa de produzir o espaço urbano e de adquirir uma identidade coletiva por meio da
cultura.
Em suas origens, o movimento produzia a cultura urbana no contexto do bairro, da rua
e de espaços pelos quais tinham sentimento de pertencimento. Contudo, segundo Araújo (2008),
no final da década de 1990, o hip-hop, sobretudo o rap, saiu da periferia e chegou aos centros
urbanos. A comercialização da cultura hip-hip no país tomou força em 1997, com o disco
“Sobrevivendo no Inferno” do grupo Racionais MC’s, que vendeu um milhão de cópias e
chamou atenção tanto das gravadoras, quanto da mídia. Desde então, a cultura marginal, muitas
vezes criminalizada, começou a ser amplamente comercializada. (Araújo, 2008).
O rap passou a ser difundido pelo país, tendo nomes em evidência, como: Mano Brown,
Criolo e Emicida. Exemplo disso é o sucesso do rapper baiano Baco Exu do Blues, que venceu
o Grand Prix do festival Cannes Lions em 2019, com o curta-metragem "Bluesman", do seu
disco homônimo (PORTAL GLOBO.COM, 2019). O grafitti também vem sendo amplamente
reconhecido, ganhando espaço em locais nobres, com grandes painéis em áreas elitizadas, como
é o caso da Av. Paulista, em São Paulo, e do Pier Mauá, no Rio de Janeiro.
O município de Campos dos Goytacazes, localizado na região Norte do Estado do Rio
de Janeiro, com uma população de 503.424 (quinhentos e três mil quatrocentos e vinte e quatro)
habitantes (IBGE, 2018) e uma área de 4.032 km², tem o viaduto da Ponte Leonel Brizola como
o principal palco da cultura hip-hop em tempos mais recentes, sendo um dos ocupantes o
coletivo intitulado Manifestação Cultural de Rimas (MCR). A ponte está localizada na região
central do município, entre o Centro Histórico e dois dos bairros mais elitizados da região, o
Parque Conselheiro Tomaz Coelho e o Parque Avenida Pelinca, como se pode observar na
Figura 1. Não há registros precisos dos primeiros indícios do hip-hop na cidade; contudo, de
acordo com Gonçalves (2019), em 2004, começaram as ocupações no Centro do município.
21

Figura 1 - Localização da Ponte Leonel Brizola

Fonte: Google Earth, modificado pela autora, 2021

A cultura hip-hop na cidade, segundo discursos de seus manifestantes (RIBEIRO,


2019), possibilita aos jovens, que em grande maioria estão em vulnerabilidade social, espaço
para gerar e consumir cultura, reivindicar direitos, denunciar as mazelas de suas realidades,
além de ser um refúgio da violência, territorialismo do tráfico e da negligência do Estado.
Contudo, os membros do coletivo MCR discursam em seus encontros culturais sobre a
dificuldade em manter o movimento devido à indiferença e à falta de investimento do poder
público com o espaço e com a cultura urbana.
Atualmente, a área abaixo do viaduto sofre com a degradação do tempo, com a falta de
manutenção e de estrutura, além de ser estigmatizado por parte da população. Em entrevista
para Ribeiro (2019), João, um dos colaboradores da organização da MCR, comenta como ele
se sente no espaço e a relação com os residentes dos bairros elitizados da cidade: “A elite passa
de carro ali, olha pro lado vê um bando de gente, um barulho acontecendo com o vidro fechado
e vai embora. Somos invisíveis. ” (JOÃO, 2019, s.p. apud RIBEIRO, 2019, p.173). Assim, ao
mesmo tempo em que a cultura hip-hop é reproduzida e consumida por uma classe mais
22

abastada; em sua forma marginal, a linguagem continua a se desenvolver nos espaços públicos,
sendo estigmatizada e desprezada pela mesma classe que a consome nos espaços privados.
O que leva à reflexão de Certeau (1996) de que “Talvez não seja inútil sublinhar a
importância do domínio desta história ‘irracional’, ou desta ‘não história’, como o diz ainda A.
Dupont. O que interessa ao historiador do cotidiano é o Invisível...” (CERTEAU, 1996, p.31).
O autor traz à luz “o homem ordinário”, que através de suas práticas cotidianas e seus modos
de atuação social, definem sua singularidade e, ao mesmo tempo, uma pluralidade social que
surge de tal interação. Para ele, os indivíduos são determinados por suas relações sociais em
um processo individual-coletivo, de onde emerge uma cultura que, por meio de
microrresistências, formam microliberdades, deslocando assim as fronteiras de dominação.
Acrescentando ainda a discussão, destaca-se Serpa (2010), que ressalta que muitas
manifestações de grupos culturais permanecem absolutamente invisíveis, mantendo-se com o
apoio de organizações não governamentais; ocorrendo, muitas vezes, sem nenhum apoio
institucional ou financeiro; e representando, assim, um capital cultural desconhecido, invisível,
em que as cidades e seus habitantes poderiam (e deveriam) tirar mais proveito.
De acordo com a Lei no. 10.257, de 10 de julho de 2001, que institui o Estatuto da
Cidade, “Aqueles que estão engajados na transformação da cidade rumo à superação de uma
ordem urbanística excludente, patrimonialista e predatória podem ter no Estatuto da Cidade um
instrumento importante. ” (BRASIL, 2001, p. 23). Junto a isso, pode-se destacar as gestões
participativas, que, de acordo com Gohn (2001), tratam-se de canais de participação que visam
a interlocução entre a população e o poder público, que surgem nas cidades como instrumento
de democratização dos processos de gestão e administração entre estes atores ou setores da
sociedade, para que, assim, o Estado possa garantir a pluralidade e a diversidade que a formam.
Contudo, em muitos casos, a gestão participativa não passa de uma pseudoparticipação
(TENÓRIO; ROZENBERG, 1997), não atendendo as necessidades de toda a população,
principalmente daqueles que mais necessitam e menos têm voz. Unem-se a isso administrações
e políticas reduzidas à dimensão eleitoral, que, segundo Fernandes (2010), geram acordos e
decisões que abandonam a complexidade da vida urbana.
Em entrevista à revista Observatório Itaú Cultural (2008), que discorreu sobre o
seminário internacional “A Cultura pela Cidade – Uma Nova Gestão Cultural da Cidade”,
Alfons Martinell Sempere, professor da Universidade de Girona e diretor da AECID à época,
destacou a cultura como um dos eixos fundamentais para a promoção do desenvolvimento
social. Pode-se associar a isso, um dos principais consensos debatidos no seminário: o papel
central que a cultura deve ter na solução de demandas da sociedade.
23

Serpa (2010) traz a ideia da cidade como fenômeno cultural, que poderia ser traduzida
e sintetizada através da ideia de centralidade. Para o autor, pensar a cidade como centralidade
traz a possibilidade de pensá-la como “possibilidade de encontro, de aproximação, de
simultaneidade, de reunião, de intercâmbio e de relações. Então, a cidade como fenômeno
cultural é, sobretudo, uma cidade que centraliza as criações humanas. ” (SERPA, 2010, p.29).
Nesse contexto, faz-se o seguinte questionamento: como a cultura suburbana,
particularmente representada pelo movimento hip-hop em Campos dos Goytacazes/RJ, pode
ser inserida no processo de gestão participativa com a perspectiva de dar continuidade ao
movimento e seu espaço na cidade, além de ser porta-voz de uma parcela marginalizada da
sociedade, a fim de democratizar os processos participativos?
Como justificativa, traz-se a crença de que, como movimento cultural, o hip-hop pode
impulsionar a requalificação do espaço residual da Ponte Leonel Brizola, recuperando o sentido
de lugar de encontro da vida pública, além de trazer uma nova imagem identitária à cidade; e,
como movimento social, o hip-hop tem o poder de ser um meio de desenvolvimento de ações
políticas entre seus participantes, em maioria periféricos, através de práticas reivindicatórias,
tornando-se, assim, um recurso das classes menos abastadas para estabelecer uma gestão urbana
mais participativa.
De acordo com Bettina Heinrich (Observatório Itaú Cultural, 2008), é necessário pensar
em novas formas de cidadania e de se organizar a participação política local, pois, quanto mais
as sociedades urbanas se tornam diversificadas, mais limitados os instrumentos de decisão e de
gestão se mostram. Florence (2010) destaca que a identidade resultante de um processo de
produção na dinâmica de luta de política urbana concebe múltiplos laços de solidariedade que
unem forças sociais e políticas para a articulação de um novo tecido social urbano, conduzido
para a construção de cidades mais solidárias, justas e sustentáveis.
Tendo em vista o cenário exposto, o objetivo geral do trabalho consiste em compreender
como a cultura suburbana, no que tange ao movimento do hip-hop em Campos dos
Goytacazes/RJ, pode ser inserida no processo de gestão participativa urbana, por meio do
coletivo MCR, considerando a importância da continuidade de sua manifestação e respectivo
espaço na cidade, de modo a propor um plano de ação direcionado ao grupo.
Além disso, como objetivos específicos, estabeleceu-se: traçar uma abordagem teórico-
conceitual sobre a cultura suburbana, o hip-hop e as políticas culturais, destacando sua
relevância para a cidade, especialmente no que se refere aos espaços urbanos; delinear
brevemente o trajeto da gestão urbana participativa, afim de destacar a importância desta para
uma cidade mais justa, democrática e igualitária; analisar o movimento hip-hop em Campos
24

dos Goytacazes, identificar e caracterizar seus agentes e espaços, com enfoque no grupo MCR;
e desenvolver e apresentar um plano de ação direcionado ao coletivo, visando incentivar a
cultura local e instrumentalizar seus agentes, de modo que estes possam se manifestar e serem
incluídos no processo de gestão participativa urbana, inclusive contribuindo para a cidade por
meio da apropriação de espaços subutilizados, da arte urbana, dentre outros.
Diante do que foi explicitado, definiu-se que o desenvolvimento da pesquisa traz uma
abordagem qualitativa, procurando responder às questões a partir da compreensão da realidade
humana vivida socialmente, trabalhando com a vivência, com a experiência e com a linguagem
da prática (MINAYO, 2001).
De natureza aplicada e descritiva, o estudo busca reconhecer e caracterizar os espaços
utilizados por agentes formadores do movimento hip-hop em Campos dos Goytacazes,
elucidando o recorte na Ponte Leonel Brizola, local apropriado pela MCR como palco de seus
movimentos e, a partir disso, compreender como a cultura suburbana pode ser inserida no
processo de gestão participativa da cidade.
O método, segundo Gil (2008), é tido como o caminho a ser seguido para atingir o
conhecimento, buscando, assim, a validação da pesquisa e dos resultados a serem obtidos. Com
isso, iniciou-se o trajeto metodológico com a pesquisa bibliográfica, por meio de livros, artigos
científicos, dissertações e teses, a fim de compor a fundamentação teórica acerca das temáticas
aqui abordadas, como: a produção e gestão do espaço urbano; a contextualização da gestão
urbana participativa e possíveis instrumentos e planos de ação existentes; a cultura suburbana
e as políticas públicas culturais; e uma breve contextualização histórica da cultura hip-hop a
nível mundial, nacional e municipal.
Em seguida, a fim de respaldar e aprofundar a pesquisa acerca da gestão urbana, seus
instrumentos, políticas públicas e planos de ação, inclusive os culturais no contexto do
município; bem como da realidade do movimento hip-hop, foi realizada a pesquisa documental
por meio de documentos oficiais, leis, reportagens e fotografias.
Através de uma abordagem empírica, foi realizado um estudo de caso e pesquisa de
campo sobre o movimento hip-hop na cidade, particularmente em relação ao coletivo MCR.
Destaca-se que um estudo de caso visa “proporcionar uma visão global do problema ou
de identificar possíveis fatores que o influenciam ou são por ele influenciados. ” (GIL, 2002, p.
55). Assim, o trabalho busca apresentar o coletivo MCR, sua formação, trajetória,
manifestações, relação com os espaços da cidade, problemas, potencialidades, dentre outros.
Fez-se então, um contato intenso com o grupo, tendo sido possível analisar os afetos e
experiências urbanas em busca da aproximação com os anseios destes atores sociais.
25

Em março de 2020, contudo, foi declarada a pandemia do Covid-19 pela Organização


Mundial da Saúde (OMS). Devido à alta transmissibilidade do vírus, foi necessária a adoção de
medidas de isolamento e distanciamento social na tentativa de conter a disseminação da doença
em todo o mundo. Os países com melhor controle de disseminação do novo coronavírus
apresentaram, como fatores, maior obediência da população às recomendações governamentais
e o uso intensivo de tecnologia da informação e comunicação (POMPEU, SILVA, AVELINO,
FONSECA, 2020). No Brasil, tais medidas desencadearam a instabilidade em diferentes
contextos, como a saúde, a educação e a economia.
Neste cenário, em decorrência do rápido avanço da pandemia no Brasil e no mundo,
segundo Leipnitz (2020), em pouco tempo as pessoas e empresas precisaram se adaptar a uma
nova realidade, em um cenário em que a tecnologia se mostrou protagonista para a continuação
de diversas áreas. No setor cultural, as experiências passaram a acontecer de forma virtual,
limitando-se a eventos em formatos drive-in e transmissões pela internet.
Apesar de a tecnologia ser uma aliada na diminuição dos impactos da pandemia, ela não
é um recurso tangível a todos. De acordo com entrevista para o jornal G1 (2020), o pedagogo e
um dos coordenadores da organização cultural Rede Urbana de Ações Socioculturais (RUAS),
do Distrito Federal, Max Maciel, a população de baixa renda ficou à margem das opções de
lazer e o espaço urbano ainda sofre um impacto direto.

A cultura é, para alguns, apenas um passatempo. Mas, para a memória da


cidade, a memória histórica de um povo, é fundamental. Quando você rompe
esse contexto histórico, você está rompendo com muito mais que o
entretenimento [...] Drive-in não é pra todo mundo. A live é legal, mas não
tem o impacto do território. (MAX MACIEL, 2020, s.p. apud G1, 2020).

Uma condição importante é o acesso precário que esses indivíduos têm à internet.
Segundo o jornal Folha de São Paulo (2020), 85% dos cidadãos das classes mais baixas utilizam
a internet pelo celular com pacotes limitados, sendo um dificultador no acesso a materiais mais
elaborados nos formatos de download, streaming e vídeo chamadas.
A cultura hip-hop na cidade de Campos dos Goytacazes, segundo Ribeiro (2019), tem
como principais agentes formadores, jovens que estão em grande maioria em vulnerabilidade
social. Diante da pandemia, o munícipio, que teve seu primeiro caso confirmado na cidade no
dia 23 de março de 2020 (PORTAL OFICIAL DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CAMPOS
DOS GOYTACAZES, 2020), iniciou o processo de isolamento social a fim de diminuir o
contágio da doença; assim, os interlocutores da cultura urbana ficaram sem seu espaço de fala,
que se dava de forma presencial na Ponte Leonel Brizola.
26

Diante do contexto exposto, os procedimentos da pesquisa não se deram de formas


usuais, sendo pensados para ter um contato seguro com os manifestantes e com o espaço a ser
estudado.
Cabe esclarecer que a OMS (Organização Mundial de Saúde) e a OPAS (Organização
Pan-Americana da Saúde) (2020) orientaram a todos, para a prevenção do contágio da doença,
as seguintes medidas: higienização frequente das mãos até a altura dos punhos com água e
sabão, ou, utilização de álcool em gel 70%; manter distância de pelo menos 1m entre indivíduos
durante convívio social, evitando abraços, beijos e apertos de mão; utilização de máscara em
todos os ambientes públicos; priorizar ambientes onde o fluxo de ar e ventilação sejam maiores;
assegurar a limpeza e desinfecção adequadas das superfícies onde possa ter contato; evitar
contato com pessoas com sintomas de febre, tosse e/ou resfriado.
Diante disso, alguns cuidados foram tomados para a realização dos procedimentos desta
pesquisa, que se deram com: coleta de registros dos participantes da manifestação quando estas
ocorriam; visitas da pesquisadora a Ponte Leonel Brizola em diferentes dias e horários com
gravações periódicas e registros fotográficos; entrevistas não estruturadas com os organizadores
e participantes da manifestação; rodas de conversa com a organização do coletivo; e entrevista
com membros responsáveis pela elaboração do Plano de Cultura municipal.
A coleta de registros que os próprios manifestantes possuíam e a observação e registro
da área sob o viaduto e entorno, em diferentes momentos pela pesquisadora, visaram gerar
dados que foram documentados por meio de imagens, sendo possível um comparativo e a
identificação das mudanças em uma mesma ambiência, a partir dos diferentes usos e
apropriações, além da análise do impacto que a ausência da manifestação acarretou ao ambiente
estudado.
A entrevista não estruturada, segundo Rheingantz; Azevedo; Brasileiro; Alcantara;
Queiroz (2009), visou levantar aspectos afetivos e qualitativos das respostas, além de explicitar
os contextos sociais e pessoais. Nesta pesquisa, a entrevista não estruturada teve a intenção de
fazer os entrevistados se sentirem mais à vontade para se expressarem, criando maior elo entre
os entrevistados e a pesquisadora.
Diante do cenário de pandemia dado e prezando pela saúde e integridade física dos
voluntários da pesquisa, foi priorizado o contato inteiramente virtual. Contudo, em muitos
casos, o participante não pôde, ou por condição financeira, ou por questões geográficas, manter
essa comunicação online. Assim, o encontro físico foi necessário e se deu em local público,
aberto e arejado, com distância mínima de 1m entre a pesquisadora e o entrevistado. Além
disso, a pesquisadora ficou inteiramente responsável por providenciar álcool em gel 70% para
27

higiene das mãos do entrevistado e da própria, assim como a desinfecção adequadas das
superfícies onde ambos tiveram contato; bem como por ofertar máscara cirúrgica ao
entrevistado, para utilização obrigatória de ambos durante toda a entrevista.
As entrevistas não estruturadas foram realizadas com: 4 integrantes da MCR; 4
organizadores da MCR; 5 conselheiros do Conselho de Cultura do município; 2 artistas da
vertente do graffiti; 3 artistas da vertente do break; 1 representante do skate; e 2 representantes
do basquete, sendo que um desses faz parte da atual gestão pública municipal. Além das 21
entrevistas individuais, foram efetuadas 3 rodas de conversa com a organização do coletivo
MCR, no intuito de delimitar as metas, planos e ações, além de contato constante com esses por
meio dos aplicativos WhatsApp e Instagram. Destaca-se também que as entrevistas foram
devidamente autorizadas pelo Comitê de Ética.
Pelo fato de o trabalho de pesquisa estar vinculado a um curso de Mestrado Profissional,
em que a elaboração de um produto torna-se fundamental, como resultado da pesquisa, foi
estruturado um plano de ação direcionado ao coletivo MCR, para que este seja um instrumento
para a promoção e participação do grupo nos processos urbanos. Por isso é que, na atual
pesquisa, entende-se a necessidade de compreender a fundo a realidade e as necessidades dos
indivíduos que compõem o coletivo MCR, que, para além de serem os responsáveis pela
implementação do plano, sofrerão as consequências deste. Com isso, a construção do produto
de deu com participação direta dos manifestantes, contendo assim, as marcas, as raízes e os
costumes de tais, não sendo de forma alguma dissociado de seus interlocutores.
Quanto à organização, este trabalho está estruturado em seis capítulos, sendo o primeiro
a introdução e o sexto as considerações finais. O segundo capítulo apresenta uma análise
teórico/conceitual acerca das definições de cultura, cultura urbana e cultura suburbana, a fim
de embasar a pesquisa e introduzir ao breve histórico da cultura hip-hop, que consta também
neste capítulo inicial.
O terceiro capítulo objetivou estabelecer uma abordagem acerca das políticas públicas
culturais e da gestão participativa pública, trazendo uma breve contextualização histórica, os
objetivos, os instrumentos, os planos de ação, a importância desta para a sociedade e as
possíveis dificuldades em sua aplicação nos municípios.
O quarto capítulo, por sua vez, é dedicado à abordagem sobre o hip-hop em Campos dos
Goytacazes, além de elencar os polos e grupos que fazem parte da manifestação cultural na
cidade, introduzindo ao recorte aqui estipulado, o Viaduto da Ponte Leonel Brizola, e seus
agentes formadores, o coletivo Manifestação Cultural de Rimas. Neste capítulo, também foram
feitos o levantamento e a análise dos agentes municipais responsáveis pela gestão cultural da
28

cidade, com enfoque no Conselho Municipal de Cultura (ComCultura), responsável pelo Plano
Municipal de Cultura do município.
O quinto capítulo foi dedicado ao plano de ação desenvolvido, expondo, assim, uma
análise das demandas dos membros do coletivo, as referências utilizadas na construção do
plano, os conceitos e objetivos que esperam ser alcançados por este, além de sua construção e
a metodologia aplicada, através das pesquisas de campos que foram executadas.
29

2 A CULTURA (SUB)URBANA E O HIP-HOP

A ideia de cultura como conjunto de iniciativas que atendem a reivindicações


das diferentes linguagens e gêneros clássicos, numa clássica visão de cultura,
continua necessária. Mas impõe-se agora uma nova ideia de política cultural
firmada na hipótese da centralidade da cultura para as políticas públicas e que
trate de encontrar soluções culturais criativas para a vida em comum na
cidade. (COELHO, 2008, p. 9).

Em busca de um arcabouço teórico/conceitual acerca da cultura no âmbito urbano,


foram introduzidos neste capítulo: o entendimento sobre alguns dos multi conceitos de cultura
considerados relevantes para esta pesquisa; uma abordagem sobre a cultura urbana e cultura
suburbana; e, por fim, um breve histórico da cultura hip-hop, seus desdobramentos na cidade e
o seu papel sociopolítico.

2.1 CULTURA, CULTURA URBANA E CULTURA SUBURBANA

O conceito de cultura é amplo e complexo, muitas vezes divergindo entre autores. Em


um conceito geral e mais longínquo, Santos (1987) aborda cultura como tudo que caracteriza
uma população; dessa forma, a preocupação em estudá-la veio da necessidade em compreender
e relacionar os processos históricos de diferentes nações após o contato e conflitos entre estas.
O autor declara que a concepção e os pontos de vistas culturais de uma sociedade são
relativos, porque a cultura será subjugada sob os olhares de quem a observa. A história desse
estudo, assim, vem marcada por tentativas de hierarquização de uma cultura sob a outra, em um
contexto de dominação territorial.
Ele busca relacionar duas concepções básicas de cultura: a primeira foi o conceito já
abordado, que trata a totalidade das características de uma realidade cultural; e a segunda aborda
a cultura como o conhecimento que a sociedade, povo, nação ou grupo social tem da realidade
(SANTOS, 1987). Assim, cultura pode ser um conhecimento ampliado, que uma sociedade tem
sobre si mesma, sobre outras sociedades, sobre o meio material em que vive e sobre sua
existência.
Botelho (2001) traz à luz conceitos mais recentes, abordando duas dimensões da cultura:
a antropológica e a sociológica. Segundo a autora, a distinção entre as duas é fundamental para
a delimitação das estratégias de suas respectivas políticas culturais, que serão abordadas no
próximo capítulo.
Em sua dimensão antropológica, a autora explicita que a cultura é produzida através da
interação social entre os indivíduos, podendo ser determinada, assim, por sua origem regional,
interesses profissionais, econômicos, esportivos, culturais, étnicos etc. A “[...] cultura é tudo
30

que o ser humano elabora e produz, simbólica e materialmente falando. ” (BOTELHO, 2001,
p.74); com isso, a sociabilidade é fundamental para a sua formação.
Já a dimensão sociológica, trata-se de uma produção elaborada no intuito de construir e
alcançar sentidos e públicos através de formas específicas de expressão, envolvendo um
conjunto diverso de demandas profissionais, institucionais, políticas e econômicas, voltando a
visibilidade para si mesma. A dimensão sociológica, segundo Botelho (2001), é o que senso
comum entende por cultura, responsável por estimular, por variados meios, a produção, a
circulação e o consumo de bens simbólicos. É ela também que acaba por possuir um aparato
que visa propiciar o acesso às diversas linguagens, colaborando com o surgimento de um
público consumidor de bens culturais.
Dada a grande complexidade do conceito, Miguez (2002) pontua que:

[...] à volta do significado do termo cultura, armou-se um amplo arco de


interesses que inclui além da sociologia e da antropologia, áreas classicamente
dedicadas à problemática, os estudos de comunicação, a ciência política, a
história, a geografia, a crítica literária e, em anos mais recentes, também a
economia. Daí a abundância de significados atribuídos à palavra cultura, como
daí, também, a reconhecida escassez de consensos quanto ao que ela significa.
Em se tratando da noção de cultura, advertem estudiosos de várias tribos,
consenso mesmo só quanto à impossibilidade de chegar-se a um ... consenso;
a uma definição de cultura que possa ser considerada absolutamente
satisfatória. (MIGUEZ, 2002, p.25)

Diante disso, o conceito de cultura será brevemente tratado, a partir daqui, na tentativa
de se fazer um recorte que abranja a temática em que o trabalho se insere.
Abordaremos, assim, o conceito de culturas híbridas. Canclini (1997) defende a
necessidade de um instrumento de diagnóstico para tratar as transformações culturais que se
deram na contemporaneidade, em que, segundo ele, dificultaram o entendimento desses
fenômenos quando baseados em classificações do tipo: moderno e tradicional; culto e popular;
ou hegemônico e subalterno. O autor debate que as mudanças sociais, que acorreram a partir da
segunda metade do século XX, atingiram a cultura tradicional, modificando assim, as definições
de cultura erudita, cultura popular e cultura de massa.
Esta última, contudo, trouxe significativas atualizações para os processos culturais
globais, gerando novos meios de produção, circulação e consumo de tais culturas, que
reestruturaram as fronteiras entre o domínio das artes cultas e da cultura popular, definindo
assim um processo de descolecionamento, que seria um desagrupamento de grupos que antes
eram fixos e estáveis, dissociando, assim, a ideia de que ser ‘culto’ era advindo do
31

conhecimento de grandes obras, ou ser ‘popular’ por dominar os objetos ou mensagens que se
produziam na comunidade.
Outra colocação importante para se chegar ao entendimento de culturas híbridas é o que
Canclini (1997) descreve como desterritorialização e reterritorialização, ou seja, “a perda da
relação "natural" da cultura com os territórios geográficos e sociais e, ao mesmo tempo, certas
relocalizações territoriais relativas, parciais, das velhas e novas produções simbólicas.”
(CANCLINI, 1997, p. 295). De acordo com ele, esses processos combinados desestabilizaram
tanto a noção de comunidade, que define uma cultura a partir de sua ligação com um território
específico e delimitado, quanto a ideia que opõe centro e periferia.
Segundo o autor, é no âmbito urbano que se dissolvem os sistemas culturais, conforme
problematiza:

Essa dificuldade para abranger o que antes totalizávamos sob a fórmula


"cultura urbana", ou com as noções de culto, popular e massivo, levanta um
problema: a organização da cultura pode ser explicada por referência a
coleções de bens simbólicos? Também a desarticulação do urbano põe em
dúvida que os sistemas culturais encontrem sua chave nas relações da
população com certo tipo de território e de história que prefigurariam em um
sentido peculiar os comportamentos de cada grupo. (CANCLINE, 1997,
p.290)

Assim, ele pontua que o conceito seria insuficiente para designar o novo cenário. A ideia
de cultura urbana, construída a partir da oposição conceitual entre cidade e campo, bem como
pela separação entre espaços públicos e privados na própria urbe, já não é suficiente, de acordo
com o autor, devido ao impacto das transformações mencionadas sobre a estrutura das cidades.
Dessa forma, a cultura urbana é reestruturada ao conceder o protagonismo do espaço público
às tecnologias e, como consequência, as identidades coletivas se afastam do espaço urbano e de
seu palco construtivo (CANCLINI, 1997).
É neste contexto que Canclini (1997) chama de gêneros impuros, as práticas que desde
a sua criação abandonaram o conceito de coleção patrimonial, onde se intersectam o visual e o
literário, o culto e o popular, o artesanal e o industrial e a circulação massiva. Turenko (2009)
afirma que tais características são verificadas no rap, no grafitti e no break, elementos que dão
origem à cultura hip-hop.
Contudo, Magnani (1998), apesar de explanar a controvérsia do termo, o assume como
“[...] um sentido restrito, descritivo, como conjunto de códigos induzidos por e exigidos para o
uso de equipamentos, espaços e instituições urbanas e desempenho das formas de sociabilidade
adequadas.” (MAGNANI, 1998, p.2). E é esta conceituação que este trabalho adota, num
entendimento de toda cultura, seja ela da dimensão antropológica ou sociológica, produzida,
32

consumida e circulada no âmbito urbano, no espaço da rua, abraçando assim o próprio


entendimento que o grupo aqui pesquisado, que se autodenominam “crias da rua”, tem de suas
produções artística e sociais.
Sobre a relação entre cultura, cidade e políticas públicas, pode-se destacar a fala de
Coelho (2008) referente à importância de um entendimento desses em conjunto:

A cidade é a primeira e decisiva esfera cultural do ser humano. E para realçar


ainda mais seu papel está o fato de que hoje, pela primeira vez na história da
humanidade, mais da metade da população mundial vive em cidades. A cidade
é onde se nasce, se vive, se ama e se morre. É onde se gera o valor econômico
e onde se pagam os impostos. Nada mais é preciso para destacar o papel
central da cidade na definição das políticas públicas. (COELHO, 2008, p. 9)

Canclini (2008) também apresenta a cidade como os processos culturais e os


imaginários dos que a habitam, e não apenas por suas características físicas, “oposto ao campo,
ou um tipo de agrupamento extenso e denso de indivíduos socialmente heterogêneos. ”
(CANCLINI, 2008, p. 15). Com isso, ela não é mais entendida apenas como ocupação territorial
e construções de edifícios, ela é reconhecida pela organização social, vivência, trocas,
acontecimentos do espaço urbano.
Uma cidade produz e transmite cultura através de seu processo histórico, de suas
transformações, falas, escritos, construções. Por meio de estudo da cultura, segundo Santos
(1987), pode-se compreender como as nações, os povos e as sociedades particulares se deram.
Como foi citado anteriormente, procurou-se, no estudo da cultura, a hierarquização desta pelos
povos dominantes; assim, pode-se perceber, na formação das cidades, a proveniente
consequência disto.
Para compreender a cultura no âmbito urbano, é necessária uma análise da evolução
desta. De acordo com Harvey (2014, p.30), “A urbanização sempre foi, portanto, algum
fenômeno de classe”. O autor defende que a urbanização é fruto do capitalismo, que necessita
produzir excedentes de produção exigidos pelo aumento da urbe, a fim da obtenção de lucro, e
que o urbanismo precisa, assim, absorver tal excedente, fazendo com que ele e o capitalismo
cresçam ao mesmo passo. Contudo, é sabido que apenas uma pequena parcela, ou seja, aqueles
que detêm o capital são realmente beneficiados com esse sistema, tanto financeiramente, quanto
em relação à construção das cidades.
Em seu livro “Cidades Rebeldes”, Harvey (2014) coloca, como exemplo, a cidade de
Paris em 1848, durante o Segundo Império, onde uma das primeiras crises do capitalismo pôde
ser verificada. Na França, houve um excedente de capital e de trabalho que ocasionou o
desemprego de operários revoltosos, violentamente reprimidos pela burguesia republicana.
33

Como resultado, em 1851, Luís Bonaparte deu um golpe de Estado e, para solucionar o
problema do capital excedente, colocou em prática um amplo programa de investimentos em
infraestrutura no país. Na cidade de Paris, em 1853, isso significou sua reconfiguração urbana
implementada por Georges-Eugène Haussmann.
O plano, segundo Harvey (2014), configurou a cidade em uma escala muito maior,
absorvendo imensa quantidade de mão de obra e capital. Reformulação de bairros inteiros;
abertura e alargamento de ruas; e demolições de cortiços, que desabrigou e excluiu a população
mais pobre, antigos moradores do centro medieval, expulsos para os subúrbios, foram algumas
de suas intervenções (BOIS, 2008).
No Brasil, pode-se analisar o mesmo fenômeno de hierarquização nas cidades. Santos
(2010) explicita isso com a criação dos subúrbios cariocas, quando, no final do século XIX, a
capital brasileira buscava equiparar-se com os modelos internacionais, deixando de lado o
sistema colonial e incorporando os valores capitalistas, transformando a dinâmica e a aparência
da cidade.
Para essas transformações, de acordo com Santos (2010), foi colocada em prática a
reforma urbanística na cidade do Rio de Janeiro pelo prefeito Francisco Pereira Passos, com
apoio e incentivo do Governo Federal, que se espelhou na reformulação de Paris, realizada por
Haussman, entre 1853 e 1870.

Nesse sentido, o rápido crescimento da cidade em direção à zona sul, o


aparecimento de um novo e elitista meio de transporte (o automóvel), a
sofisticação tecnológica do transporte de massa que servia às áreas urbanas (o
bonde elétrico), e a importância cada vez maior da cidade no contexto
internacional não condiziam com a existência de uma área central ainda com
características coloniais, com ruas estreitas e sombrias, e onde se misturavam
as sedes dos poderes político e econômico com carroças, animais e cortiços.
Não condiziam, também, com a ausência de obras suntuosas, que
proporcionavam "status" às rivais platinas. Era preciso acabar com a noção de
que o Rio era sinônimo de febre amarela e de condições anti-higiênicas, e
transformá-lo num verdadeiro símbolo do "novo Brasil". (ABREU, 2006,
p.55)

De acordo com Abreu (2006), a Área Metropolitana do Rio de Janeiro se caracteriza por
uma estrutura com modelo núcleo-periferia “onde a cidade dos ricos se contrapõe àquela dos
pobres” (ABREU, 2006, p.7). O autor defende que tal modelo segregador foi estruturado
principalmente a partir do interesse do capital financeiro e legitimado indiretamente pelo
Estado, em que, através de políticas públicas (ou ausência destas), o poder público influenciou
a organização social da capital, tanto por ações quanto por omissões. Objetivando alcançar a
eficiência econômica, as políticas e investimentos públicos privilegiaram, assim, apenas os
34

locais onde teriam retorno financeiro, ou seja, as áreas mais abastadas da cidade, enquanto
pouco ou nada foi feito nas áreas suburbanas.
Abreu (2006) acrescenta que, na reforma de Passos, foi vedado o exercício da
mendicância e, como exposto anteriormente, foi demolida uma série de cortiços que haviam
sido proibidos de sofrer reparos por lei municipal de 10/2/1903. As intervenções da época
desapropriaram quarteirões de moradias, fazendo com que grande parte da população fosse
morar com outras famílias, a pagar aluguéis altos, ou migrasse para os subúrbios. Ademais, os
morros situados no centro da cidade, que até então eram pouco habitados, passaram a ser
exponencialmente ocupados, dando origem à favela (ABREU, 2006).
Anos mais tarde, por volta de 1930, surgiu a tentativa de implementação do Plano
Agache, em que a análise das favelas, como um problema social estético, emerge em diversos
discursos e a solução proposta é sua erradicação:

Em toda a parte existe o contraste, os morros, estes rochedos isolados que


surgem da planície central, desses bairros do commercio possuindo bellos
edifícios, com artérias largas ostentando armazéns movimentados, ás vezes
luxuosos, têm as suas encostas e os seus cumes cobertos por unta multidão de
horríveis barracas. São as favellas, uma das chagas do Rio de Janeiro, na qual
será preciso, num dia muito próximo levar-lhe o ferro cauterizador.
(SAMPAIO, 1924, p. 46-47 apud ABREU, 2006, p.84)

Nos registros do plano, de acordo com Abreu (2006), este não poderia aceitar a
permanência das favelas nas áreas nobres da cidade devido à proximidade das classes sociais
opostas, o que causaria insegurança e interferiria na qualidade de vida e manutenção da ordem
social da classe dominante. Materializando o horror ao pobre pelas classes abastadas, vale
ressaltar ainda uma preocupação interessante destes:

Pouco a pouco surgem casinhas pertencentes a uma população pobre e


heterogênea, nasce um princípio de organização social, assiste-se ao começo
do sentimento da propriedade territorial. Famílias inteiras vivem ao lado uma
da outra, criam-se laços de vizinhança, estabellecem-se costumes,
desenvolvem-se pequenos commercios. . . Alguns ('favelados) que fizeram
bons negócios, melhorem a sua habitação, alugam-na até, e estabellecem-se
noutra parte, e (eis pequenos proprietários capitalistas que se instalaram
repentinamente em terrenos que não lhes pertenciam, os quais ficariam
surprehendidos se se lhes demonstrasse que não podem, em caso nenhum,
reivindicar direitos de possessão. (PREFEITURA DO DISTRICTO
FEDERAL op. cit., p.189-1909 apud ABREU, 2006, p.85)

Pode-se perceber, a partir desse relato, que os moradores dos subúrbios já mantinham
uma relação de pertencimento com o espaço. De acordo com Santos (2010), os moradores que
foram excluídos para estas áreas misturaram-se com os que já se encontravam naquele local,
35

remanescentes da antiga zona rural, constituindo assim uma nova forma de expressão cultural:
a cultura suburbana.
Contudo, antes de adentrar a formação da cultura suburbana, vale ressaltar, no presente
trabalho, a divergência de alguns autores acerca do conceito de subúrbio. Para Domingues
(1994, p.4), “Os conceitos de periferia urbana e de subúrbio banalizaram-se de tal forma que é
hoje difícil encontrar uma definição clara e consensual desses conceitos”. De acordo com o
autor, a identificação do subúrbio provoca a ideia de fragmentação do espaço urbano:

a margem, o extra muros, o território impreciso e não consolidado do ponto


de vista urbanístico; espécie de reserva fundiária de um crescimento urbano
de tipo extensivo e submetido, ora a um processo de planeamento
extremamente regulado[...], ora a processos regulados por qualquer figura de
plano e, quase sempre, caracterizados por níveis muito baixos de
infraestruturação básica. (DOMINGUES, 1994, p.6).

Para Soto (2008), que se baseia nas ideias do sociólogo José de Souza Martins, o termo
subúrbio tem sido deturpado de seu sentido original, sendo confundido com periferia. Segundo
o autor: “O subúrbio representaria um espaço intermediário entre a cidade e o campo. A este
espaço corresponde uma consciência social híbrida e indefinida. Uma manifestação de
extremos e desencontros. ” (SOTO, 2008, p.114). Já a periferia, segundo o autor, é o extremo
da urbanização degradada, em que as habitações são precárias, inacabadas, provisórias, onde
não há uma infraestrutura básica (SOTO, 2008). Por outro lado, para Domingues (1994, p.7),
“o subúrbio é o lugar da exclusão, da marginalidade e da segregação sociais, da anomia, da
ausência de uma noção de pertença a um lugar, do défice de cidadania, etc.”.
Contribuindo com a discussão, Pallone (2005) traz que uma das características dos
subúrbios seria a baixa densidade de ocupação e que o termo traduziria a situação intermediária
entre cidade e campo, como dito anteriormente, e não uma condição socioeconômica. A autora
acrescenta que até o início do século XX, o termo era utilizado para designar todas as áreas
periféricas da cidade, mas com as reformas urbanas, o conceito passou a ser utilizado para
designar áreas servidas pela ferrovia.
Maia e Chao (2016) afirmam que antes da reforma urbana do Rio de Janeiro por Pereira
Passos, a criação das ferrovias já contribuía para a história da cidade, tanto na ordem econômica,
demográfica e cultural, como na política e social. Os autores colocam que foi, a partir dessa
criação, que surgiram os conceitos de subúrbio e periferia.
A ideia de subúrbio neste momento da história é tida como bairros distantes do centro
econômico e cultural, que nasceram nas proximidades das linhas e estações ferroviárias. O
conceito abrange ainda os condomínios de luxo, geralmente murados, onde seus moradores
36

procuram se afastar da insegurança das áreas centrais. Contudo, pontuam o constante


crescimento urbano para contrariar a definição de suburbano como aquilo que está à margem
do urbano (MAIA e CHAO, 2016).
Rolnik (2010) acrescenta a essa ideia que:

O conceito de periferia foi forjado de uma leitura da cidade surgida de um


desenvolvimento urbano que se deu a partir dos anos 1980. Esse modelo de
desenvolvimento privou as faixas de menor renda de condições básicas de
urbanidade e de inserção efetiva à cidade. Essa talvez seja sua principal
característica, migrada de uma ideia geográfica, dos loteamentos distantes do
centro. Mas é preciso lembrar que a periferia é marcada muito mais pela
precariedade e pela falta de assistência e de recursos do que pela localização.
Hoje há condomínios de alta renda em áreas periféricas que, claro, não podem
ser considerados da mesma forma que seu entorno, assim como há periferias
em áreas nobres da cidade. (ROLNIK, 2010, s.p)

Este trabalho, no entanto, abordará o entendimento de cultura suburbana como todo e


qualquer movimento cultural produzido por indivíduos à margem da sociedade, sendo esses
moradores de subúrbios, periferias ou favelas. O trabalho se apropria, assim, de duas
concepções abordadas, tomando o entendimento de cultura suburbana como cultura de
periferia, que de acordo com Nascimento (2011, p. 13) “pode ser descrita como um conjunto
simbólico próprio dos membros das camadas populares que habitam em bairros periféricos
quanto a alguns produtos e movimentos artísticos-culturais por eles protagonizados”.
De acordo com Santos (2010), através de feiras-livres, superstições, crenças, expressões
músicas, festas, entre outros, a população marginal5, mesmo sem financiamento do Estado,
expressava os aspectos singulares de sua cultura, de questões políticas, econômicas e sociais.
A cultura suburbana ou cultura da periferia, segundo Nascimento (2011), pode ser definida
então, como uma união do modo de vida, comportamento coletivo, valores, práticas, linguajares
e modo de se vestir dos indivíduos das classes populares dos bairros periféricos.
Maia e Chao (2016) acrescentam que, no Rio de Janeiro, o cenário permanente dos
processos de evolução urbana dentro dos subúrbios foi determinando hábitos, culturas e
costumes nestes territórios, que acolheram problemas e abrigaram soluções, surgindo novas
identidades para o carioca. O “[...] subúrbio se apropria de identidades particulares, fazendo
parte de uma representação social maior. [...] tornou-se acolhedor, não sendo indiferente nem
impessoal. ” (MAIA e CHAO, 2016, p.156)
Apesar desse marco cultural e identitário, há de se ressaltar o racismo, a ausência de
políticas públicas e a violência que marcam esses territórios (MAIA e CHAO, 2016). Carril

5
Considera-se aqui o sujeito que vive à margem da sociedade.
37

(2006) traz uma abordagem importante acerca da periferia neste sentido. A autora coloca,
baseada em uma letra de rap, a definição de periferia como quilombo urbano, fazendo, assim,
uma relação entre a alta densidade da população preta com as questões escravocratas. Segundo
ela, “No Brasil, a abolição não resolveu a questão da condição social do ser negro na sociedade
brasileira” (CARRIL, 2006, p.27).
O país é marcado por uma história escravocrata que durou 300 anos (LIMA, 2019) e
que teoricamente só teve fim há 132 anos. A pesquisa Retrato das Desigualdades de Gênero e
Raça (IPEA, 2011), produzida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apresenta
indicadores provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), do IBGE,
acerca dos diversos campos da vida social, como forma de disponibilizar para pesquisadores,
estudantes, ativistas dos movimentos sociais e gestores públicos um panorama das
desigualdades de gênero e de raça no Brasil. Em sua quarta e última edição, de 2011, mostrou
que o Brasil, em 2009, registrou mais de 191 milhões de residentes, e que 51,1% dessa
população era negra. Dentre outros apontamentos da desigualdade racial no país, a pesquisa
mostra que, entre 1993 a 2007, a periferia brasileira ganhou aproximadamente 2 milhões de
novos domicílios, destes, 66% eram chefiados por pretos, sendo 40,1% por homens negros e
21,3% por mulheres negras. Deve-se levar em conta que 10 anos se passaram desde que esses
dados foram apresentados.
De acordo com as estatísticas de raça e cor produzidas pelo IBGE (2019), em 2018, no
que diz respeito ao mercado de trabalho, pessoas de cor preta ou parda correspondiam a maior
força de trabalho no país, 25,2% a mais que os brancos. Porém, em relação à taxa de
subutilização, ou seja, trabalhos informais, 29% eram pretos e 18,8% brancos. Ao que diz
respeito aos cargos gerenciais, 68,6% eram ocupados por brancos, enquanto apenas 29,9% por
pretos. Tal padrão não teve alteração independentemente do nível de instrução.
Ainda de acordo com o IBGE (2019): 41,7% das pessoas abaixo da linha da pobreza
eram pretos, para 19% dos brancos; 36,6% dos analfabetos do país eram pretos, para 18% dos
brancos; a população negra ganhava em média menos R$ 1.244,00 do que a população branca;
das 1.835 crianças de 5 a 7 anos que já trabalhavam, 63,8% eram pretas; a taxa de homicídio
entre jovens de 15 a 29 anos era de 98,5% em relação aos jovens pretos, para 34% dos jovens
brancos.
De acordo com Marcio Pochmann (IPEA, 2011), presidente do Ipea no ano de 2011, a
desigualdade tanto de gênero quanto de raça, são estruturantes da desigualdade social no Brasil,
havendo inúmeras denúncias, algumas aqui apontadas, para piores condições de vida de
mulheres e negros. Segundo o professor Otair Fernandes, doutor em Ciências Sociais e
38

coordenador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas da Universidade Federal


Rural do Rio de Janeiro (Leafro/UFRRJ), em entrevista para a Agência IBGE Notícias
(GOMES; MARLI, 2018), “a realidade do Brasil ainda é herança do longo período de
colonização europeia e do fato de ter sido o último país a acabar com a escravidão”
(FERNANDES, 2018 apud GOMES; MARLI, 2018, s.p.). O professor enfatiza que, mesmo
após 130 anos de abolição, ainda há grande dificuldade para a população negra ascender no
Brasil.

A questão da escravidão é uma marca histórica. Durante esse período, os


negros não tinham nem a condição de humanidade. E, pós-abolição, não houve
nenhum projeto de inserção do negro na sociedade brasileira. Mesmo depois
de libertos, os negros ficaram à própria sorte. Então, o Brasil vai se estruturar
sobre aquilo que chamamos de racismo institucional. É preciso pensar em
políticas de afirmação do negro. Políticas de valorização daqueles que foram
marginalizados e excluídos. (FERNANDES, 2018 apud GOMES; MARLI,
2018, s.p.)

O movimento artístico-cultural da periferia também é constituído por maioria negra,


levando em conta que são o maior número populacional. Segundo D'Andrea (2013), o aumento
dos movimentos culturais suburbanos ocorre na década de 1990, com o crescimento do
Neoliberalismo e dos movimentos sociais nos bairros populares. Isso se deu devido à falta de
referencial de partidos políticos e movimentos sociais em prol de seus direitos, assim, passaram
a se agrupar ao redor da produção artística como forma de sociabilidade (D'ANDREA, 2013).

Nessa dinâmica histórica, o movimento artístico foi um dos que melhor


catalisou as impossibilidades da política, passando a fazer política por meio
da atividade artística, consolidando periferia como um modo compartilhado
de estar no mundo, um posicionamento político e um discurso
ressemantizador sobre o que venha a ser periferia. (D’ANDREA, 2013, p.45)

A cultura suburbana ou cultura da periferia, como se pode perceber, representa, além do


movimento cultural, um movimento social, na luta contra as desigualdades dos oprimidos,
levantando as bandeiras da desigualdade de classe, raça e gênero, principalmente entre os
jovens, que são os principais agentes estudados nesta pesquisa.

2.2 “OS CIRCUITOS DOS JOVENS URBANOS” E A CULTURA COMO RECURSO

Este subtópico procurou estabelecer um diálogo acerca da cultura praticada por jovens,
com base na conceituação de Magnani (2005) sobre o Circuito dos Jovens Urbanos, e a cultura
como recurso, abordada por Yúdice (2006), antes de introduzir o leitor a cultura hip-hop
propriamente dita.
39

Magnani (2005) apresenta um trabalho sobre os jovens e suas práticas culturais, de lazer,
redes de sociabilidade e relações de troca, assim como conflitos no contexto urbano da cidade
de São Paulo. Ele inicia sua arguição fazendo uma crítica ao termo “tribos urbanas”, expressão
divulgada principalmente pelo sociólogo francês Michel Maffesoli, atribuindo ao
comportamento dos jovens o nomadismo, a fragmentação e a um certo tipo de consumo. “O
ponto central era mostrar o lado “afetual” de microgrupos caracterizados como um tipo de
comunidade emocional: são efêmeros, de inscrição local, desprovidos de organização. ”
(MAGNANI, 2005, p.174).
De acordo com Magnani (2005), o autor francês coloca sobre os jovens o peso da
modernidade e da sociedade de massas, e que estes seriam pequenos grupos, voláteis,
diferenciados e que apresentavam uma negação a homogeneidade e ao individualismo. Para
Magnani (2005), tal conceituação se mostra limitada, sendo uma dessas limitações o uso
inapropriado do termo “tribos”, que em seu sentido etnológico significa “alianças amplas entre
clãs, segmentos, grupos locais etc.” (MAGNANI, 2005, p.175) e o uso do francês para
denominar jovens metropolitanos se contrapõe a esse sentido. O autor também destaca o
preconceito aferido ao termo.
Magnani (2005), no intuído de traçar linhas de interpretação diferentes, traz ainda o
termo “culturas juvenis” abordado pelo antropólogo espanhol Carlos Feixa, em que aponta que
a expressão busca apontar as formas em que as experiências juvenis se expressam
coletivamente, com estilos de vida distintos, tendo como principal referência o tempo livre. Tais
estilos podem ser identificados por meio do consumo de alguns dos produtos da cultura de
massa, como: roupas; música; adereços; formas de lazer; entre outros. Em uma dicotomia, essas
culturas remetem a subculturas; contudo, as experiências no interior delas podem ser vistas
como “rituais de resistência à dominação de uma cultura hegemônica” (MAGNANI, 2005,
p.176).
Na busca por outra alternativa que pudesse dialogar com os termos em contraposição
ou complementação, Magnani (2005) propõe a denominação de “circuitos de jovens” com outra
abordagem sobre o comportamento destes nos centros urbanos, dando maior importância a sua
inserção na paisagem urbana, por meio da etnografia dos espaços onde eles circulam, seus
pontos de encontro, conflitos, e os outros agentes com quem estabelecem trocas.

Mais concretamente, o que se busca com essa opção é um ponto de vista que
permita articular dois elementos presentes nessa dinâmica: os
comportamentos (recuperando os aspectos da mobilidade, dos modismos etc.,
enfatizados nos estudos sobre esse segmento) e os espaços, as instituições e
os equipamentos urbanos que, ao contrário, apresentam um maior (e mais
40

diferenciado) grau de permanência na paisagem – desde o “pedaço”, mais


particularista, até a “mancha”, que supõe um acesso mais amplo e de maior
visibilidade. (MAGNANI, 2005, p.177)

O autor busca, assim, mudar o foco para a sociabilidade e para as permanências entre os
jovens, em contraposição aos estudos que levantam as pautas de consumo, estilos de uma forma
geracional e a fragmentação dos grupos.
O termo circuito foi tomado pelo autor devido a sua abrangência, que, segundo ele,
possibilita a identificação e a construção de totalidades consistentes com o objetivo de análise,
proporcionado assim, recortes, ou categorias, que não sejam restritos a um território. Tais
categorias foram denominadas pelo autor como: pedaço; mancha; e trajeto.
Pedaço seria o espaço entre o privado, ou seja, a casa, e o público, onde os atores
desenvolvem uma sociabilidade básica, mais ampliada se comparada aos laços familiares;
contudo, mais densa, significativa e estável do que contatos ou relações formais.
Macha, por sua vez, seriam áreas adjacentes ao espaço urbano, com equipamentos
marcando limites e viabilizando atividades e/ou práticas preponderantes. Esta categoria é
considerada mais estável do que o pedaço, estando ligada diretamente às dinâmicas de um
grupo.

A qualquer momento os membros de um pedaço podem eleger outro espaço


como ponto de referência e lugar de encontro. A mancha, ao contrário,
resultado da relação que diversos estabelecimentos e equipamentos guardam
entre si, e que é o motivo da afluência de seu público, está mais ancorada na
paisagem do que nos eventuais freqüentadores. A identificação destes com a
mancha não é da mesma natureza que a percebida entre o pedaço e seus
membros. (MAGNANI, 2005, p.178)

A macha seria um local mais aberto e que acolheria um maior número e mais
diversificado de usuários, oferecendo a partir da oferta de bens ou serviços, espaço para
encontros. Contudo, na mancha, não há a certeza do que ou quem irá encontrar.
Trajeto, no entanto, seriam os fluxos rotineiros na cidade e no interior das manchas
urbanas. A necessidade no termo deu-se devido à extensão e, principalmente, à diversidade
dentro do espaço urbano que vai além do bairro, impondo assim, a necessidade de
deslocamentos mais longos.
O autor descreve ainda o circuito como uma categoria

que descreve o exercício de uma prática ou a oferta de determinado serviço


por meio de estabelecimentos, equipamentos e espaços que não mantêm entre
si uma relação de contigüidade espacial; ele é reconhecido em seu conjunto
pelos usuários habituais. A noção de circuito também designa um uso do
espaço e dos equipamentos urbanos – possibilitando, por conseguinte, o
41

exercício da sociabilidade por meio de encontros, comunicação, manejo de


códigos –, porém de forma mais independente com relação ao espaço, sem se
ater à contigüidade, como ocorre na mancha ou no pedaço. Mas ele tem,
igualmente, existência objetiva e observável: pode ser identificado, descrito e
localizado. (MAGNANI, 2005, p.178-179)

Para exemplificar, Magnani (2005) dá uma série de exemplos das etnografias já


formuladas por seus alunos e/ou orientandos na cidade de São Paulo. Não obstante, para este
trabalho, chamaram atenção três deles: as baladas black e rodas de samba; os pichadores; e os
B. boys e streeteiros na estação Conceição do metrô. Em comum, os três exemplos trazem atores
socioculturais pretos como protagonistas, de classe baixa, oriundos da cultura hip-hop, e que se
apropriam de manchas centrais.
Os B. boys e os streeteiros, por exemplo, se ocupavam do metrô Conceição, sendo um
local ideal para expor a manifestação, sendo este a mancha dos dois grupos. Fator importante
se dá pelo contato entre dois grupos de classe social, preferência estética e trajetos urbanos
completamente opostos. Os streeteiros são descendentes de japoneses, adeptos ao street dance6
e alunos de escolas de dança particulares, já os B.boys, eram formados por adeptos do break,
elemento do hip-hop, moradores da periferia da cidade, que já estariam no mercado de trabalho.
Mesmo com as diferenças de estilo, pedaço e trajeto, os grupos compartilham da mesma
mancha, entram em contato e estabelecem vínculos. A relação, de acordo com Magnani (2005),
é hierárquica, mas inversa ao que se esperaria: nesta dinâmica espacial, os denominados “japas”
reconhecem a superioridade técnica dos b.boys e aprendem com estes.
De acordo com Magnani (2005), as etnografias propostas mostraram não só as formas
de relacionamento entre os jovens, mas também destes com a cidade, permitindo, ainda, uma
análise de como diferentes atores sociais se apresentam na urbe, circulam, usufruem de
equipamentos e estabelecem padrões de troca e encontro na paisagem urbana, as experiências
que não se restringem ao interior de grupos fechados e a espaços guetificados, protegidos.
A análise de Magnani (2005) sobre os jovens traz uma perspectiva diferente daquela
que outros autores apresentam - quase como atores irrelevantes política e socialmente para a
cidade - e mostra a importância de seus circuitos, trajetos e manchas, e como estes podem alterar
a dinâmica dos espaços.
Trazendo ainda os jovens como protagonistas da discussão, vale ressaltar a abordagem
de Yúdice (2006) no que se refere à cultura como recurso, em que ele afirma que
“Consequentemente, o conceito de recurso absorve e elimina distinções até então prevalecentes

6
Apesar da tradução direta “dança de rua”, o estilo exige menos condicionamento físico e é formado por uma
dança mais coreografada e em sincronia com o grupo (MAGNANI, 2005)
42

nas definições da alta cultura, da antropologia e da cultura de massas” (YÚDICE, 2006, p.11).
O autor justifica que a globalização e o surgimento de uma nova economia acarretaram a
culturalização crescente da economia, assim como uma transformação da cultura em
mercadoria, ou como ele mesmo coloca, em recurso. Nesse sentido, a cultura é introduzida em
uma racionalidade econômica, no qual o seu gerenciamento, conservação e distribuição passam
a ser prioritários. A cultura, assim, se estabelece na base de uma nova divisão do trabalho.
As modificações históricas, que fizeram da cultura como recurso, não são dadas como
naturais, são tomadas como um processo cuidadosamente coordenado e com base fundada em
acordos comerciais e leis de propriedade intelectual determinadas por organizações
internacionais, em que os direitos autorais são colocados sob responsabilidade de produtores e
distribuidores de conglomerados de entretenimento. Contudo, foi desenvolvida uma nova
economia, que possibilitou as ideias de desenvolvimento cultural, cidadania cultural e política
da diferença. Assim, a cultural, entendida pela ótica do pertencimento, tornou-se uma condição
cada vez mais necessária para a formação da cidadania.
Nesse contexto, o autor ressalta o conceito de cidadania desenvolvido por Renato
Rosaldo no fim dos anos 1980:

Em contraposição às noções convencionais de cidadania, que enfatizam a


aplicabilidade universal, mesmo que formal, de direitos políticos para todos
os membros de uma nação, Rosaldo postulou que cidadania cultural implica
que grupos unidos por certos aspectos sociais, culturais e/ou físicos não
deveriam ser excluídos da participação nas esferas públicas de determinada
constituição política com base naqueles aspectos e características. Num
contexto jurídico que habilita a litigação contra a exclusão e um ethos cultural-
político que evita a marginalização do “não-normativo” (assim considerado
pelo ponto de vista da classe hegemônica), a cultura serve de base ou garantia
para fazer “reivindicações de direitos no terreno público” (Rosaldo, 1997: 36).
(YÚDICE, 2006, p.42)

Tem-se o entendimento, assim, de que a cultura como recurso tornou-se menos


relevante, direcionando os argumentos do autor para a conveniência desta enquanto instrumento
político e como poder cultural, capaz de repensar os acordos coletivos.
Yúdice (2006) apresenta, então, uma discussão sobre os movimentos sociais que
emergiram no Brasil, principalmente a partir da década de 1980, com o intuito de combater a
pobreza, a violência e o racismo, referindo-se a um tipo de ação social que pode ser
exemplificada com o surgimento dos blocos-afro na Bahia ou a chegada do movimento hip hop
nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.
Este tipo de movimento, após a década de 1990, transformou-se em centenas de
associações de bairro, organizações não governamentais e grupos comunitários instalados em
43

subúrbios por todo o país, tendo como principal ação política a produção e a difusão da cultura,
como modalidades ou trabalhos artísticos, como forma de inserção social.
Tais movimentos não estiveram obrigatoriamente ligados à dinâmica de uma política
partidária ou possuíam dependência com o poder público. As ações políticas ligaram-se em
forma de redes, que se interconectavam com diversos setores da sociedade, intervindo nos
espaços esquecidos pelo Estado. Os objetivos desses movimentos eram a constrição da
cidadania e a inserção socioeconômica da população mais pobre. O principal argumento de tais
organizações era a produção e a ação cultural como ferramenta para a mudança social.
Organizações como o Afro-Reggae e outras, apresentadas pelo autor, tem a ideia de cultura
como autoafirmação.
Neste contexto, pode-se entender o movimento hip-hop como movimento cultural e
social, que surge nas periferias contra a discriminação da sociedade e o abandono do espaço, e
transforma a falta de perspectiva em consciência de cidadania. Através do encontro, das práticas
reivindicatórias e da exposição da realidade enfrentada, o cidadão renegado e esquecido pela
sociedade, jogado às margens da “não cidade”, utiliza da cultura como enfrentamento contra a
violência, o territorialismo, o abuso policial, e a desigualdade social, de gênero e raça.

2.3 A CULTURA HIP-HOP: BREVE HISTÓRICO

A cultura e identidade negra são intrínsecas à experiência da escravidão e à herança


racial espalhada pelo Atlântico, de acordo com Gilroy (2002). O autor defende que o processo
de construção da identidade e cultura negra nasce na América, como resistência à escravidão e
na experiência do racismo que se sucedeu; assim, se formou politicamente a identidade cultural
dos negros no Ocidente. Gilroy (2002) enfatiza que foi através do Atlântico, no
desenraizamento, deslocamento e trocas culturais que ocorriam desde o tráfico negreiro até as
experiências em viagens e exílios entre América, Europa e África, que começou a se formar a
cultura negra que se conhece hoje: "o navio [continua] a ser talvez o mais importante canal de
comunicação pan-africana antes do aparecimento do disco long-play" (GILROY, 2002, p.54).

[...] a música e seus rituais podem ser utilizados para criar um modelo no qual
a identidade não pode ser entendida nem como uma essência fixa, nem como
uma construção vaga e extremamente contingente a ser reinventada pela
vontade e pelo capricho de estetas, simbolistas e apreciadores de jogos de
linguagem (GILROY, 2002, p.209).
44

O surgimento do hip-hop, de acordo com as pesquisas bibliográficas realizadas neste


trabalho, não tem precisão, variando de acordo com o autor. O que se verificou nas leituras, é
que a cultura teve uma formação coletiva, com diversos agentes importantes em sua história.
Segundo Souza e Bernardes (2007), o movimento teve início entre as décadas de 1960
e 1970, nos guetos de Nova Iorque, quando o jamaicano Clive Campbell rumou para os Estados
Unidos em busca de melhores condições de vida. Em suas viagens para o Caribe e África,
Campbell obteve contato com um estilo musical oriundo do Reggae, e levou o que era um canto
falado, para os guetos de Nova Iorque, onde o hip-hop ganhou popularidade.
O jamaicano chegou ao Bronx, bairro de Nova Iorque, em 1967, e ganhou o apelido de
Hércules ou Herc por sua estatura e garra nas quadras de basquete; assim, Campbell ficou
conhecido popularmente por DJ7 Kool-Herc. O Bronx, na época, estava em meio a uma
transformação urbana violenta e dolorosa, causada pela especulação imobiliária, devido à
conclusão da estrada Cross Bronx, em 1963, que provocou transformações no bairro, levando
milhares de moradores a emigração, principalmente os brancos. Com a desvalorização dos
imóveis, os proprietários ateavam fogo em suas próprias residências para serem indenizados
pelo seguro. Esse cenário contribuiu para a explosão de gangues juvenis violentas. Nessa fase,
Herc já havia conseguido uma maneira de realizar festas, às quais chamava de “block parties”,
sem que ocorressem brigas de gangue – os bailes, com isso, tornaram-se uma alternativa à
juventude do bairro (OPERA MUNDI, 2016).
Aos 16 anos, Herc foi responsável pela festa do dia 11 de agosto de 1973, aniversário
de sua irmã, que é considerado o marco-zero do movimento. O DJ se deu conta de que o público
das festas se animava mais quando ele tocava os chamados breaks8, assim, decidiu tirar a agulha
do toca-discos e voltar manualmente para o início do break e repetir o procedimento quantas
vezes ele considerasse necessário. Na festa, Herc utilizou dois discos iguais em dois aparelhos
distintos para reproduzir os sons, um após o outro, e conseguir o mesmo efeito que conseguia
manualmente para estender a parte rítmica da canção. Tal movimento ficou conhecido como
Break Beat. Segundo o site Opera Mundi, Kool Herc não tinha ideia do que estava sendo criado
por ele, sua única intenção era manter as pessoas dançando na pista.
O estilo de Herc foi incorporado por outras figuras consideradas precursoras do rap,
como Grandmaster Flash e Afrika Bambaataa, que seguiram com seu legado. Contudo, Herc
nunca se preocupou com o lado comercial da música.

7
Disc Jockey: artista ou profissional que seleciona e reproduz as mais diferentes composições musicais,
previamente gravadas.
8
Parte mais rítmica das canções de funk, com ausência de letra
45

Grandmaster Flash, denominado criador do scratch9, entregava um microfone para que


os dançarinos pudessem improvisar discursos acompanhando o ritmo da música durante suas
apresentações, caracterizando uma espécie de repete-eletrônico que ficou conhecido como Rap.
Estes improvisadores são chamados de Rappers ou MC (masters of cerimony10), de acordo com
Souza e Bernardes (2007).
Afrika Bambaata foi um dos principais precursores do movimento hip-hop. De acordo
com Gonçalves (2011), o nome verdadeiro de Bambaata é Kevin Donovam, que, aos 16 anos,
era líder de uma gangue, os Espadas Negras. A gangue chegou a dominar quase toda a região
do Bronx; mas, com o passar do tempo, Bambaata começou a buscar por outra perspectiva para
a região, tendo como inspiração e influência os movimentos pelos direitos civis nos Estados
Unidos e a inserção das ideologias políticas de líderes negros como Malcon X, Martin Luther
King e o grupo ativista dos Black Panthers. Com isso, após Bambaata ter conhecido a África e
a Europa, e tomar conhecimento do filme Zulu, ele, junto a alguns membros de sua gangue,
decidiu deixar a Black Spades e aderir à nova tendência que surgia das expressões artísticas nas
ruas do Bronx. Em 1973, Afrika Bambaata fundou a Universal Zulu Nation11, organização não
governamental voltada para articulação dos adeptos da cultura hip-hop.
A cultura hip-hop é constituída por quatro elementos: o Rap, o Break, o Grafitti e o DJ.
Bambaata foi responsável pela unificação desses elementos e denominou o movimento como
hip-hop em 1968. Os quatro elementos são expressões artísticas que sustentam o movimento
como bases fundamentais, segundo Gonçalves (2011). O rap e o DJ representam a música, o
DJ toca a batida e o MC compõe as rimas, com letras que podem ser de protesto ou expressões
da rotina periférica. O break é a dança com movimentos acrobáticos e o grafitti representa a
expressão material. O grafitti surgiu a partir das pichações, que eram uma forma de
comunicação da periferia com a cidade, através de pinturas em muros, becos, vielas, portas de
estabelecimentos, trens, viadutos ou qualquer espaço urbano onde as pinturas poderiam ser
vistas e a mensagem passada às pessoas, contudo, com uma estética estilizada, que apenas os
integrantes do movimento conseguiam distinguir.
O objetivo de Bambaata era que os jovens negros estivessem longe da criminalidade.
Com isso, ele considerava que era preciso concentrar as energias em coisas positivas. Daí,

9
A utilização da agulha do toca-discos arranhando o vinil em sentido anti-horário como instrumento musical
10
Mestres de Cerimônia
11
A Universal Zulu Nation, pregava os ideais de paz, unidade, amor e união. Que vieram a fundamentar os
princípios hip hop. Hoje ela é a maior organização de hip hop do mundo. (AZEVEDO, 2006 apud Gonçalves,
2011)
46

incluiu mais um elemento ao movimento, o conhecimento. A intenção do quinto elemento,


segundo Gonçalves (2011), era:

[...] saber viver, sobreviver e lutar contra o que é imposto pelo sistema, ou
seja, fazer o máximo para se manter fora dos veículos de dominação que,
segundo os ideais do movimento, representavam a exclusão social e racial, e
seus conseqüentes problemas como as drogas: tanto seu alto consumo quanto
ao tráfico; as gangues; a baixa escolaridade; a falta de emprego, a falta de
saúde pública. (GONÇALVES, 2011, p. 17).

O movimento começou a se propagar rapidamente. No fim da década de 1970, gangues


ligadas a ele ocupavam a maioria dos guetos de Nova Iorque. Esses jovens, com sentimento de
exclusão pela sociedade, enxergavam nessas gangues uma forma de socialização. O hip-hop
alcançou inúmeros territórios nos Estados Unidos e depois ganhou outros países.
Em 1980, o movimento chegou ao Brasil, em um período de recessão financeira e
instabilidade política, quando o país sofria com a ditadura militar. A maior parcela da população
encontrava-se nas cidades e a lotação destas acarretava o surgimento de periferias e de áreas
mais pobres. Foi nesse contexto socioeconômico e político que o hip-hop surgiu no país.
Contudo, assim como o surgimento do hip-hop mundialmente, autores divergem sobre a sua
chegada ao Brasil.
O Break, segundo Souza e Bernardes (2007), rapidamente popularizou-se e ganhou
espaço na cidade. O metrô de São Bento, em São Paulo, era palco para suas competições. O
espaço, que já era ocupado por punks e skatistas, começou a ser utilizada pelos b-boys12 e b-
girls13, termos usados pelo DJ jamaicano Kool Herc que deu esse nome a todos os dançarinos
do início dos anos 1970. B-Boy, segundo os autores, passou a ser uma designação a um grupo
mais especializado de dançarinos que participava nas festas organizadas por ele. A palavra
Break tem como tradução literal do inglês, quebrar, e remete ao gingado da dança, ou
“quebrada”.
As coreografias de Break começaram a ocupar os programas de TV da época. O
movimento começou a ser difundido no Brasil, primeiramente em São Paulo e, depois, no Rio
de Janeiro, por meio de toca-discos, vestimentas, encontros de crews14 e MC´s em locais
públicos. Posteriormente, espalhou-se pelas grandes cidades brasileiras. Personalidades que
surgiram na época, como Mano Brown, Chico Saise, Edi Rock, KL Jay, tiveram grande
importância na história do hip-hop nacional. O grupo Racionais, com o lançamento do disco

12
Abreviação para “Break Boy”, “Beat Boy” ou “Bronx Boy”
13
O mesmo significado de B-Boy para mulheres
14
Significa grupo, membro, integrante, podendo ser entendida como território que mantêm uma intervenção mais
ampla e coletiva (COSTA e MENEZES, 2009)
47

“Sobrevivendo no inferno”, estourou nas rádios da época e levou à população, o conhecimento


da existência do rap, que despertou o interesse principalmente dos moradores das periferias do
país.
O hip-hop desvinculou-se de seu local de origem por canais informais de comunicação
e chegou a diferentes territórios do mundo com realidades similares (LOPES; FACINA, 2010),
isto é, locais com experiências urbanas marcadas pelo racismo, pobreza e segregação espacial.
No Rio de Janeiro, o hip-hop da Flórida chegou nos subúrbios e nas favelas e recebeu o nome
de funk, conjugando a estética do hip-hop às práticas negras das favelas cariocas.

No funk encontramos várias performances que evidenciam essa mescla: a fala


cantada do rapper, muitas vezes, carrega a energia dos puxadores de escola de
samba, as habilidades do corpo do break são acentuadas com o rebolado e a
sensualidade do samba e o sampler vira batida de um tambor ou atabaque
eletrônico. (LOPES E FANINA, 2010, p.2).

O movimento hip-hop teve grande poder, através de sua cultura urbana, em disseminar
informações e ideologia. Após 40 anos de sua criação, ele saiu no âmbito periférico e começou
a se tornar midiático, “entrando” na casa de todas as pessoas e tornando-se objeto de consumo
da indústria fonográfica e cinematográfica (HERSCHMANN, 1997, apud SOUZA e
BERNARDES, 2007). Contudo, mesmo passando por massificação nos últimos anos, ainda se
caracteriza como um movimento cultural urbano: possuindo, como principais características, a
luta pelos direitos sociais de jovens das periferias das cidades; questionando a exclusão social
e as desigualdades presentes na sociedade; e sendo considerado um movimento social urbano
contemporâneo.
O hip-hop, quase cinquenta anos depois, foi massificado e incorporado à cultura pop
ocidental. O rap, principalmente, ainda representa uma das principais vozes de expressão
cultural, protestos contra as injustiças nas periferias das grandes cidades e a referência cultural
da juventude, particularmente nas comunidades de maioria negra e carente, mesmo o estilo
tendo aderido às grandes gravadoras.
Desde suas origens, o movimento está intimamente ligado ao contexto do bairro, da rua
e de espaços que levem, a seus manifestantes, o sentimento de identidade e pertencimento. De
acordo com Barbio (2011), o bairro constitui, para os manifestantes, o símbolo da sua exclusão
social, da desigualdade e da degradação das condições de vida de seus iguais.
A autora afirma que devido ao sentimento de exclusão, o movimento faz, do bairro e da
rua, um símbolo de união contra a sociedade que os discrimina. Assim, esses espaços públicos
surgem como uma “inversão simbólica”, ou seja, enquanto a sociedade e as culturas dominantes
48

enxergam a periferia negativamente; para eles, passam a ser elementos construtores de uma
identidade positiva.
Em contraponto a isso, no entanto, em 2004, segundo Turenko (2009), representantes
do movimento hip-hop de vinte estados da federação, bem como nomes reconhecidos no
movimento como MV Bill, integrantes do grupo Racionais MC’s, Rappin Hood, entre outros,
foram recebidos pelo então presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, levando com
eles uma pauta de reivindicações, onde muitas delas foram atendidas. Pode-se perceber com
este fato, que o hip-hop se fortaleceu, criando redes de trabalho, associações e organizações em
rede, que levaram o movimento a se relacionar com diversos setores da sociedade,
aproximando-se assim das políticas públicas culturais, as quais serão abordadas no próximo
capítulo.
49

3 GESTÃO PARTICIPATIVA E AS POLÍTICAS CULTURAIS

Uma outra simbiose íntima entre cultura e cidade precisa ser formulada, num
processo de reinvenção do cotidiano. A renovação e expansão dos recursos
culturais da cidade; o apoio às instituições culturais centrais; a criação de
recursos culturais de porte cotidiano criando uma malha cultural sólida; a
definição de modos culturais criativos de relacionamento com os
equipamentos e problemas urbanos; o estímulo à cidade culturalmente
diversa; a opção pelo desenvolvimento humano ainda mais que pelo
desenvolvimento econômico; o cuidado no respeito e na multiplicação dos
direitos culturais, renovados com criatividade; o apoio à ideia de uma nova
cidade transformada que com seu exemplo possa mover o mundo; a definição
do que podem ser os indicadores dessa nova gestão cultural da cidade; a nova
institucionalidade da cultura solicitada pelos novos desafios; a
sustentabilidade do processo cultural e, finalmente mas não em último lugar,
o papel da sociedade civil no novo arranjo da cultura na cidade que deve tornar
realidade uma política cultural de proximidade — esses são alguns dos vetores
da discussão que ora se propõe e que se pode resumir numa frase: traduzir a
cultura em vetor da vida cotidiana. (COELHO, 2008, p.9-10)

Diante deste entendimento acerca da importância da cultura na transformação das


cidades apresentado por Coelho (2008), este capítulo procurou trazer uma abordagem referente
à gestão participativa e como esta, em conjunto com as políticas culturais, são essenciais para
a construção da cidadania e inclusão.
Na primeira parte do capítulo, expõe-se um panorama conceitual sobre a gestão
participativa, importante para o entendimento desta na construção das políticas públicas. Já a
segunda parte deu-se com a apresentação, os desdobramentos ao decorrer dos anos e governos
e o atual momento das políticas culturais no país.

3.1 GESTÃO PARTICIPATIVA

A governança, de acordo com Costa e Favarão (2016), é o campo em que se efetivam e


se implementam as leis e os instrumentos da política urbana, mas a participação popular é o
mecanismo necessário para obtenção dos resultados, processos e experiências para que as
normas e instrumentos atinjam os objetivos plurais da população.
Segundo os autores (COSTA E FAVARÃO, 2016), a participação favorece gestões
transparentes e democráticas, efetivando o direito à cidade. Assim se fundamenta o Estatuto da
Cidade, em que uma agenda de direitos - à moradia, à infraestrutura urbana, à terra, ao trabalho,
à cultura, entre outros - deveria ser efetivada por meio de uma gestão urbana participativa,
envolvendo diferentes níveis sociais, além de agentes econômicos e políticos.
Souza (2006) defende que a gestão das cidades só obtém legitimidade quando submetida
ao controle e deliberação da coletividade. O autor afirma que o espaço é uma dimensão
50

relevante nesse processo, sendo um condicionante das relações sociais e, portanto, impossível
de dissociá-las. Ao analisar as cidades, Souza (2006) considera a segregação do tecido urbano,
a divisão das parcelas de população pobre e a auto segregação dos ricos, como aspectos
desafiadores à democratização da gestão e do planejamento urbano.
De acordo com Gohn (2019), as principais causas da desigualdade social, que pode ser
apontada como causa para a segregação socioeconômica citada, são: falta de acesso à educação
de qualidade; desemprego e baixos salários; política fiscal injusta e dificuldade de acesso aos
serviços públicos básicos como a saúde, ao transporte público, ao saneamento básico, a
segurança pública, ao lazer e a cultura; entre outros. A autora ainda afirma que o Brasil consta
na lista dos países mais desiguais do planeta.
Dentro deste cenário, Gohn (2019) busca trazer uma análise de como a participação tem
sido abordada quando o foco é a sociedade civil. A autora coloca que é possível observar a
participação em práticas cotidianas, em sindicatos, em movimentos ou outras organizações
sociais, bem como em discursos e práticas de políticas estatais, dentro de ações das instituições
participativas, e que, nesta esfera política, os sentidos e significados divergem completamente.
Assim, ela pontua e concorda com o entendimento de Milani (2008) quanto aos
processos participativos no campo social, de que a participação faz parte da realidade dos
indivíduos e que sua ação é relacional, construída no plano da transformação social; portanto,
as práticas participativas e as bases sociais evoluem e variam de acordo com cada contexto em
que está inserida.
Gohn (2019) traz ainda o conceito de participação segundo o Dicionário do Pensamento
Social do Século XX (1993), organizado por Outhwaite e Bottomore, em que o princípio da
participação é tão antigo quanto o conceito de democracia, porém, a participação tornou-se mais
difícil por conta da dimensão do governo moderno, assim como a necessidade de decisões
rápidas.
Segundo a autora, pode-se analisar a participação em três níveis: o conceptual, que pode
apresentar ambiguidades e variar com o paradigma teórico fundamentado; o político, associado
aos processos de democratização, mas também utilizado como discurso que busca a integração
social dos indivíduos, que resultaria em políticas sociais de controle; e o da prática social, que
trata ações concretas, elaboradas em lutas, movimentos e organizações, para realizar ou
participar dos espaços institucionais da esfera pública.
Com intuito a introduzir o leitor as políticas culturais, será abordado aqui o nível
conceptual, segundo as pesquisas de Gohn (2019), para discutir assim, a participação na
51

sociedade por meio de movimentos e coletivos sociais, visando a aproximação com o objetivo
deste trabalho.
De acordo com Gohn (2019), os primeiros autores a mostrarem interesse sobre o tema,
sob a ótica da atuação dos indivíduos em associações, foram cientistas e teóricos políticos
ingleses do início do século XX, como: G. D. H. Cole; H. Laski; J. N. Figgis; e Paul Hirst, na
década de 1990.
Cole (1920), de acordo com Gohn (2019), sugere que os homens deveriam atuar por
meio de associações para satisfazer suas necessidades, sustentando que apenas assim, em
âmbito local, os indivíduos poderiam aprender a democracia. Ele propôs ainda, a criação de
instrumentos de participação local, como: cooperativa de consumidores; conselhos de
utilidades; guildas cívicas, com intuito de cuidar da educação, saúde, entre outros; e uma
estrutura política para desenvolvimento de processos participativos, indo da comuna local até a
comuna nacional.
Gohn (2019) ressalta que as associações foram incluídas como direitos fundamentais do
ser humano no século XIII, tendo a burguesia utilizando desse direito, enquanto as camadas
populares tiveram que lutar para obtê-lo. Contudo, a Lei Chapelier, em 1791, na França, veio a
proibir tais associações, temendo a força de grupos subordinados, e, apenas no século XIX, o
direito foi incorporado nas várias constituições pelo mundo.
Trazendo a obra “A democracia na América”, de Alexis de Tocqueville, pensador e
político francês, Gohn (2019) acrescenta que o autor exaltava a comuna, remetendo a esta como
“a grande força dos homens livres” (GOHN, 2019, p.66), assim, nas lutas sociais, a participação
era um sistema representativo, indo da comuna ao poder central. Ele acreditava que a
democracia era uma forma de pertencer à sociedade e que o domínio do povo era visto como
forma de governo; assim, o estado social democrático era inevitável.
Segundo a autora (GOHN, 2019), até os anos de 1960, o tema da participação como
participação comunitária era forte, sendo encontrado como conceito. Já nos anos de 1970,
devido aos regimes político-militares em muitos países latinos, a participação voltou a ser
tomada em um sentido de participação popular por parte sociedade civil.
Contudo, no final da década de 1980, a participação passou a ser tida como uma medida
para a cidadania, sendo associada à exclusão social, ou seja, ela era tomada como integração,
enquanto a não participação era sinônimo de exclusão. Assim, o sujeito que aprendia a
participar era integrado. Nesse sentido, Gohn (2019) traz à luz Stassen, que nega este último
conceito e busca provar que existe a participação quando há o sentimento de valorização pelos
indivíduos, em que estes são considerados necessários e úteis e, assim, têm lugar na sociedade.
52

Sobre a participação política, a autora pontua que usualmente o entendimento desta é de


que o processo relacionaria-se ao número e intensidade de pessoas nas tomadas de decisões,
devido ao fato de que “desde o tempo dos antigos gregos, a participação consistiu, idealmente,
no encontro de cidadãos livres, que debatem publicamente e votam sobre decisões de governo.
Ela se articula com a questão da democracia em suas formas direta e indireta.” (GOHN, 2019,
p.66). No entanto, a autora traz outras visões, como “O Dicionário de Política”, organizado por
Bobbio, Matteucci e Pasquino, que reconhece na participação política uma variedade de
atividades, e que estas seriam também designadas como participação política.
Gohn (2019) traz ainda que a manifestação concreta mais valorizada pela ciência
política, até poucos anos, foi o voto, seguida pela participação em atividades político-
partidárias. Não obstante, aborda teóricos como: Giocomo Sani; Bobbio, Matteucci e Pasquino;
Almond e Verba; e Dahl, que trazem a participação política mais ampliada, levando em conta:
manifestos, protestos, marchas e ocupações; bem como a cultura política; e o pluralismo social,
que seria “definido como a impossibilidade de que algum grupo social possa dominar os demais
por meio do acesso exclusivo aos recursos existentes na sociedade, sejam eles econômicos,
sociais ou políticos” (GOHN, 2019, p.67).
Nesse sentido, pode-se perceber que, a partir desse momento, a participação teve como
objetivo o fortalecimento da sociedade civil visando uma nova realidade, com diminuição de
injustiças, exclusões, desigualdade, discriminações, entre outros, e que o pluralismo foi a marca
dessa concepção, em que os movimentos sociais e os agentes de organização sociais deveriam
ser considerados importante atores políticos.

A participação tem caráter plural em termos de classes, camadas sociais e


perfis político-ideológicos. Nos processos que envolvem a participação
popular, os indivíduos são considerados como “cidadãos”. A participação se
articula, nessa concepção, com o tema da cidadania, envolvendo também lutas
pela divisão das responsabilidades dentro de um governo. Essas lutas possuem
várias frentes, como a constituição de uma linguagem democrática não
excludente nos espaços participativos criados ou existentes, o acesso dos
cidadãos a todo tipo de informação que lhes diga respeito e o estímulo à
criação e ao desenvolvimento de meios democráticos de comunicação.
(GOHN, 2019, p.67).

Desta forma, a autora coloca que os principais sujeitos que compõem o processo
participativo são os sujeitos sociais, podendo ser grupos de jovens, de idosos, de moradores de
bairros, e que esta participação configura a concepção de cidadania.
Ela pontua que, nas ciências sociais, os tipos de abordagem sobre participação social e
política são inúmeras e seguem correntes teóricas diferentes. Gohn (2019) coloca em questão
53

uma análise importante para este trabalho, de como e porque os indivíduos participam por meio
de ações coletivas. A sua resposta são as desigualdades já apontadas aqui.
Para expor tais abordagens, ela traz dez das mais utilizadas acerca da participação
política dos cidadãos, sendo elas: a escolha racional; a proximidade dos centros de poder e da
posição social dos indivíduos na sociedade; a mobilização política institucional; a identidade
coletiva; a teoria crítica e reconhecimento de direitos; o engajamento militante ou neomarxista;
o decolonial; a abordagem relacional ou do cyberativismo; a de gênero, a partir de grupos de
mulheres; e os autonomistas.
Na primeira abordagem, da escolha racional, a participação seria entendida com a
participação dos indivíduos na esfera pública de acordo com os custos e benefícios que esta
poderia trazer. Gohn (2019) aponta que, no Brasil, a abordagem retomou e se modernizou em
algumas organizações movimentalistas, como o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Vem Pra
Rua (VPR). Tais organizações têm base em ideais neoliberais e conservadores, apresentando
pautas que retrocedem os direitos sociais e aumentam as desigualdades sociais.
A segunda abordagem seria um aprofundamento da primeira, que priorizaria a posição
social das pessoas em relação à estrutura de poder. Nela, o caráter econômico integra aspectos
sociais. Em uma vertente mais contemporânea dessa, a posição social das pessoas tornaria essas
propensas ou não à participação.
A terceira abordagem, da mobilização política institucional, surgiu devido críticas à
primeira, e foca em repertórios, ou seja, criações culturais aprendidas através da luta, de grupos
e indivíduos em suas articulações no plano macro, devido a estruturas e oportunidades políticas
existentes. Tais oportunidades, símbolos e códigos concebidos no processo de mobilização, são
considerados ferramentas. Assim, o principal motivador desta abordagem é o sistema político
institucionalizado, ou seja, a participação institucional. Gohn (2019) pontua que esta
abordagem tem sido muito usada no Brasil após a Constituição de 1988, por meio dos processos
de gestão participativa na fase de redemocratização.
Chama-se atenção para a quarta abordagem, da identidade coletiva, importante para este
trabalho. Nela, o fator principal seria a centralidade aos fatores culturais; de identidade dos
participantes; às redes de pertencimento e compartilhamento; e ao envolvimento militante,
institucional ou extrainsticional, tanto de indivíduos, quanto de grupos. A inclusão destes em
redes de solidariedade seria a justificativa para a participação, sendo suas relações sociais
também consideradas espaços de socialização política. Destaca-se, aqui, a consideração de que
os aspectos culturais levariam ao aprendizado em lutas e confrontos, assim como a concepção
54

de identidades e ampliação de forças sociopolíticas e culturais. Sobre identidade, Gohn (2019)


pontua:

Melucci conceitua a identidade coletiva como “uma definição interativa e


compartilhada produzida por um número de indivíduos (ou grupos em um
nível mais complexo) preocupados com a orientação de suas ações em um
campo de oportunidades e restrições nas quais a ação toma lugar. ” (Melucci,
1996, p. 70). Portanto, a identidade é relacional e construída, no tempo e no
espaço. Ela representa a identificação dos “nós” e do “outro”, e, dentro de um
conflito social, permite se autoidentificar e identificar o inimigo. (GOHN,
2019, p.70)

Ela retoma, desse modo, aos movimentos sociais, que tiveram grande reprodução no
Brasil, na década de 1980, quando surgiram novas manifestações da sociedade na cena pública.
Tais movimentos trouxeram para a discussão, as questões de gênero, raça, idade, entre outros;
assim, as desigualdades começaram a ser levantadas pelo ponto de vista de discriminações
sociais e não só sob o aspecto socioeconômico. É neste âmbito que são possíveis os avanços
das lutas de mulheres, negros e homoafetivos nas décadas de 2000 e 2010 no Brasil. (GOHN,
2019).
Pode-se chamar atenção também para a quinta abordagem, da teoria crítica e do
reconhecimento de direitos, em que a participação emerge em conjunto com a justiça social.
Ela destaca questões do reconhecimento, de direitos sociais de grupos e povos discriminados,
dividindo-os em dois grupos: das diversidades, desigualdades e injustiças sociais; e ao relativo
à redistribuição de bens ou direitos historicamente acumulados. Gohn (2019) ressalta a
conceituação de Habermas para tratar a ação comunicativa e a noção de esfera pública,
levantando que, para este autor, a democracia não deveria ser compreendida como o governo
da maioria, eleições livres, concorrência ou indicações do estado de direito, mas que na esfera
pública, os espaços de convivência deveriam ser considerados, pois são os espaços onde há
abertura para interação comunicativa. Portanto, ele defende a ampliação de participação civil
nos processos decisórios para o avanço de uma cultura democrática e propõe que o modelo
político deveria se dar entre as esferas informais e formais.
A sexta abordagem traz o engajamento militante, em que constam duas versões distintas:
uma baseia-se no interacionismo simbólico, que tem como meta avaliar o engajamento de
indivíduos nas carreiras militantes, e a outra traz uma abordagem com fundamento marxista,
sendo a mais antiga corrente apresentada. Nesta última, o conceito de participação está em
conjunto com as lutas de classes e com os movimentos sociais, sendo voltada para a
transformação de condições da realidade social, carências econômicas e opressão sociopolítica
e cultural. Na outra versão desta abordagem, os principais fatores seriam os macroeconômicos
55

e políticos, que, segundo Gohn (2019), é uma das poucas assinaladas no texto, que considera o
nível econômico com importância.
A descolonização ou decolonização trata-se de uma corrente que traz uma análise
histórica colonial, abordando as formas de exploração ocorridas na América Latina, assim como
na África, partindo da versão do colonizado. Nessa abordagem mais ampla, a colonialidade é
tida como “a face oculta da modernidade eurocêntrica, que impôs sentimentos de inferioridade.
” (GOHN, 2019, p.72), em que a modernidade era tida como civilidade, enquanto os nativos
eram bárbaros e atrasados. O problema da América Latina para os teóricos dessa abordagem
seria a “descolonização do saber e do ser” (GOHN, 2019, p.72), em que foram naturalizadas as
injustiças, a exploração e a pobreza, inibindo assim, o pensamento crítico da população.
A abordagem relacional está presente em estudos sobre redes e cyber ativismo. Segundo
Gohn (2019), as redes e mídias sociais nortearam rumos e abordagens diferentes na participação
social e política, tendo potencial para guinar relações entre grupos e indivíduos. Dessa forma,
as microrelações ganharam destaque em estruturações de ações coletivas tanto na esfera
pública, como na privada. Gohn (2019) pontua que “as comunicações virtuais acabaram
transformando profundamente a forma como as pessoas do século XXI se comunicam, se
organizam e interagem social, cultural, política e economicamente. ” (GOHN, 2019, p. 74), e
que isso influencia diretamente as formas de participação política e social, desenvolvendo assim
novas formas de uma cidadania digital.
A nona abordagem traz as mulheres como protagonistas. Segundo Gohn (2019), mesmo
que a igualdade de gênero não tenha sido alcançada em nenhum país e que a discriminação e
sub-representação política das mulheres seja enorme,

de todos os movimentos sociais que participaram da cena pública nos últimos


cinquenta anos, o das mulheres foi um dos que mais avançou, no sentido de
combate às desigualdades, talvez o que mais questionou as diferenças sociais
e exigiu respeito às diferenças culturais. [...] teóricos de algumas das
abordagens sobre a participação, tratadas acima, como Hobsbawm (1995) e
Touraine (2007), reconhecem que o século XX foi o século da mulher, e elas
são a grande esperança de avanços nas lutas pela igualdade. (GOHN, 2019,
p.75)

Este grupo de mulheres, denominadas feministas, tiveram, em sua luta, pautas, como: a
libertação das convenções sociais e a moral tradicional dos anos 60; a luta contra a
discriminação das mulheres no mercado de trabalho; discussões sobre o papel da mulher na
sociedade; a mulher no campo da educação; a questão de gênero; a mulher na política; a
violência contra as mulheres; as reivindicações do próprio corpo; o problema do re-
conhecimento com ética; a luta contra o assédio moral e sexual; entre outros. A grande
56

importância desse movimento dá-se também pela participação das mulheres além dessas pautas.
Ele também exigiu a igualdade de gênero para todas as alternativas de ser mulher, abrindo
caminhos para a participação de homoafetivos e para a luta pelas questões raciais.
A última abordagem, dos autonomistas, baseia-se em teorias e ideais do socialismo
libertário e do novo humanismo holístico. De acordo com Gohn (2019), a abordagem ressurge
em práticas coletivas, mas também é uma bandeira do movimento dos povos indígenas.
Gohn (2019), na finalização de seu texto, traz algumas reflexões. Entre elas, a autora
coloca que a maioria das abordagens e teorias não focou prioritariamente na questão da
desigualdade social gerada pela desigualdade econômica, e sim no plano sociocultural, de
inclusão social, confundindo diferenças com desigualdade.
Outro ponto importante para este trabalho foi sua análise quanto à população preta:

Na história do Brasil, embora os povos originários também fossem de nações


indígenas, a escravidão dos povos africanos foi muito forte e deixou marcas
profundas. As políticas de inclusão dos negros – cotas raciais, resgate de di-
reitos culturais, combate ao racismo, reconhecimento de identidades
originárias etc., – têm proporcionado avanços históricos. Entretanto, elas, por
si sós, não resolvem completamente as desigualdades sociais. Para um país
com população de maioria negra, essa especificidade não pode ser ignorada
ou subvalorizada. (GOHN, 2019, p.77)

Pode-se constatar, pela análise das abordagens, que os movimentos sociais e culturais
são de extrema importância para uma participação efetiva. No entanto, são necessárias
reformulações que visem formas de superação das desigualdades sociais, para que, assim, a
construção de uma cidadania inclusiva seja realidade.
O contexto da participação também deve ser incluído nas políticas públicas, inclusive
as culturais, conforme será abordado a seguir.

3.2 POLÍTICAS CULTURAIS

A democracia no Brasil, de acordo com Alves e Nascimento (2019), é ainda um regime


frágil. Desde 2016, o país sofre ainda mais com o enfraquecimento desta e os efeitos disso
afetam a área política e cultural, que vem sendo menosprezada e sucateada.
Os direitos culturais são fundamentais em qualquer sociedade (ALVES e
NASCIMENTO, 2019); por isso, a respectiva política deve almejar a todos os cidadãos e não
apenas a alguns. Nesse entendimento, a UNESCO (2002) por meio da Declaração Universal
sobre a Diversidade Cultural ressalta:
57

Artigo 5 – Os direitos culturais são parte integrante dos direitos humanos, que
são universais, indissociáveis e interdependentes. O desenvolvimento de uma
diversidade criativa exige a plena realização dos direitos culturais, tal como
os define o Artigo 27 da Declaração Universal de Direitos Humanos e os
artigos 13 e 15 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais. Toda pessoa deve, assim, poder expressar-se, criar e difundir suas
obras na língua que deseje e, em particular, na sua língua materna; toda pessoa
tem direito a uma educação e uma formação de qualidade que respeite
plenamente sua identidade cultural; toda pessoa deve poder participar na vida
cultural que escolha e exercer suas próprias práticas culturais, dentro dos
limites que impõe o respeito aos direitos humanos e às liberdades
fundamentais. (UNESCO, 2002, p.3)

Compreende-se, assim, que os direitos culturais são essenciais e que é necessário


implementá-los nas políticas públicas para a democratização do acesso e da produção destes.
Junto ao entendimento de que a cultura é um direito social garantido pelo Estado, a
cultura suburbana, segundo Alves, Oliveira e Chaves (2016), também é compreendida como
um elemento relevante no projeto de transformação social pelo significado de resistência que
ela possui junto às classes dominadas. A partir da perspectiva dos Estudos Culturais, a noção
de cultura está relacionada como um espaço de conflito, resistência e negociação que ocorre no
interior da estrutura de poder e divisão de classes.
Contudo, de acordo com Chauí (2009), o Estado brasileiro vem sendo movido por
tendências antidemocráticas. Nos anos de 1990, segundo a mesma autora, o governo da época
tentou tratar a cultura como um produto, sendo guiado pela lógica mercantilista de bens
culturais da indústria. A autora ainda coloca que não é papel do Estado produzir cultura, mas
dar aparato à sociedade de produzir e usufruir desta.

Se o Estado não é produtor de cultura nem instrumento para seu consumo, que
relação pode ele ter com ela? Pode concebê-la como um direito do cidadão e,
assim, assegurar às pessoas o direito de acesso às obras culturais produzidas,
particularmente o direito de fruí-las, de criar as obras, ou seja, produzi-las, e
o de participar das decisões sobre políticas culturais. (CHAUÍ, 2009, p.48)

A Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, assegura, no Artigo 215,


normas que garantem a democratização do acesso aos direitos culturais, assim como a
Declaração Universal dos Direitos do Homem (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,
1948), que coloca os direitos culturais como indispensáveis à dignidade humana e ao livre
desenvolvimento da personalidade.
Contudo, antes de adentrar aos atuais problemas culturais do país, buscou-se fazer uma
breve introdução sobre o histórico das políticas culturais no Brasil, para embasar a realidade
vivida atualmente.
58

Rubim (2007) resume pelo seu ponto de vista a história das políticas culturais nacionais
com as expressões: ausência, autoritarismo e instabilidade. O autor adota o conceito de Canclini
(2005) sobre políticas culturais:

Estudos recentes tendem a incluir neste conceito o conjunto de intervenções


realizadas pelo Estado, instituições civis e grupos comunitários organizados
com o objetivo de orientar o desenvolvimento simbólico, satisfazer as
necessidades culturais da população e obter consenso para um tipo de ordem
ou transformação social. Mas essa forma de caracterizar o campo das políticas
culturais precisa ser ampliada, levando em consideração o caráter
transnacional dos processos simbólicos e materiais na atualidade.15
(CANCLINI, 2005, p. 78)

Desta forma, Rubim (2007) assinala que as políticas culturais implicariam também em
intervenções conjuntas e sistemáticas, assim como coletivos e metas. Segundo o autor, as
políticas culturais no país sob essa conceituação tiveram caráter tardio e um difícil
desenvolvimento.
As políticas culturais surgiram no país com a entrada de Mário de Andrade no
Departamento de Cultura, em São Paulo, e com a fundação do Ministério da Educação e Saúde,
em 1930, com mais destaque para a passagem de Gustavo Capanema na liderança deste
ministério entre os anos de 1934 e 1945 (RUBIM, 2007). Neste contexto, estava a Revolução
de 30, apresentando o compromisso com a industrialização, urbanização, modernismo cultural,
construção do estado nacional centralizado, politicamente e administrativamente. De acordo
com o autor, as experiências municipais da cidade de São Paulo, com o conjunto de práticas e
doutrinas, ultrapassaram as fronteiras da cidade.
Rubim (2007) cita algumas das contribuições de Mário de Andrade, como: o
estabelecimento de uma intervenção estatal sistemática, que abrange diversas áreas da cultura;
o julgamento da cultura como “tão vital como o pão”; as propostas de uma definição abrangente
de cultura, ultrapassando as belas artes e considerando, entre outras, as culturas populares; o
reconhecimento do patrimônio não só material possuído pelas classes dominantes, mas também
assumindo a cultura imaterial, intangível e significativo aos diversos níveis sociais; e o
patrocínio de duas missões etnográficas nas regiões amazônica e nordestina, com intuito de
pesquisar as populações. Contudo, o autor acrescenta algumas críticas as iniciativas de Mário
de Andrade, como a imposição da cultura elitizada e a negligência com o analfabetismo no país.
Em simultaneidade, Rubim (2007) aponta que o ministério comandado por Gustavo
Capanema, que possuía o setor nacional da cultura em conjunto durante o governo de Getúlio

15
Tradução da autora.
59

Vargas, teve sua importância para esses primeiros passos das políticas culturais. Apesar da
estética moderna e da política conservadora, Capanema acolheu intelectuais e artistas
progressistas, mesmo após a implantação da ditadura do Estado Novo, em 1937.
Rubim (2007) afirma que, pela primeira vez, o país efetuava intervenções na área
cultural, articulando com uma atuação negativa, devido às opressões da ditadura, e uma atuação
afirmativa, por meio de formulações, práticas, legislações e novas organizações culturais.
Destaca-se, nesta época, o Departamento de Informações e Propaganda (DIP), instituição que
ao mesmo tempo reprimia e integrava o meio cultural. As políticas culturais da época, assim,
destacavam “o nacionalismo, a brasilidade, a harmonia entre as classes sociais, o trabalho e o
caráter mestiço do povo brasileiro. ” (RUBIM, 2007, p.104).
Neste período, o autor aponta as instituições criadas, como: a Superintendência de
Educação Musical e Artística; o Instituto Nacional de Cinema Educativo; o Serviço de
Radiodifusão Educativa; o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional; o Serviço
Nacional de Teatro; o Instituto Nacional do Livro; e o Conselho Nacional de Cultura. Destaca-
se ainda o Sphan, criado por meio de proposta de Gustavo Capanema e Mário de Andrade, que
não foi plenamente aceito, mas responsável posteriormente pela preservação de diversos
patrimônios. (RUBIM, 2007).
Entre 1945 e 1964, Rubim (2007) aborda a quase inexistência de políticas culturais no
país, com pequenas exceções, como: “a instalação do Ministério da Educação e Cultura, em
1953; a expansão das universidades públicas nacionais; a Campanha de Defesa do Folclore e a
criação do Instituto Superior de Estudos Brasileiros, órgão vinculado ao MEC. ” (RUBIM,
2007, p.105) O autor pontua também outras instituições importantes para a área cultural, como:
os Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes, no Rio de Janeiro em 1961,
que foram responsáveis por despertar sonhos culturais e políticos em jovens universitários; e o
Movimento de Cultura Popular, na cidade do Recife em 1960, tendo Paulo Freire com seu
método pedagógico conjugando educação e cultura, apesar disso, este último movimento foi
bloqueado pelo Golpe Militar.
Rubim (2007) divide o período da ditadura militar em três momentos. De 1964 a 1968,
o autor coloca que a ditadura atingiu os setores populares e militantes, e que apesar da repressão
e censura, ocorreram manifestações políticas contra o regime e um desenvolvimento cultural
pela esquerda, com audiência das classes médias. Nesse período, iniciou-se a passagem do
circuito cultural escolar-universitário para uma predominância de cultura midiática. Neste
sentido, ocorreram as instalações e criações de empresas de telecomunicação, implantando uma
60

indústria cultural, visando o controle do audiovisual e buscando integrar o país com a política
de segurança nacional.
No segundo momento, de 1968 a 1974, o regime foi brutal, representado por violência,
prisões, tortura, assassinatos e censura, bloqueando toda a dinâmica cultural que antecedeu.
Esta época, segundo o autor, foi marcada pelo vazio cultural.
O terceiro momento foi de 1974 a 1985, com o final do regime militar. A violência nesse
período diminui e começaram as iniciativas nas áreas políticas e culturais. Contudo, ainda em
um regime autoritário, buscando uma transição hegemônica, procurou-se incorporar os
profissionais da cultura por meio de investimentos da área. Nesse período, nasceu o primeiro
Plano Nacional de Cultura (PNC), em 1975, assim como várias instituições culturais, como:
“Fundação Nacional das Artes (1975), Centro Nacional de Referência Cultural (1975),
Conselho Nacional de Cinema (1976), Radiobrás (1976), Fundação Pró-Memória (1979).”
(RUBIM, 2007, p.106)
O autor destaca dois movimentos deste período: a criação e desenvolvimento da
Fundação Nacional de Artes (Funarte), com agenda de financiamento de projetos culturais; e
as mutações organizacionais, de pensamento e de ação com ligação a Aloísio Magalhães,
intelectual administrativo que criou e renovou órgãos como: “Centro Nacional de Referência
Cultural (1975); Iphan (1979); Sphan e Pró-Memória (1979), Secretaria de Cultura do MEC
(1981) até sua morte prematura em 1982. ” (RUBIM, 2007, p.107).
Rubim (2007) aponta que a conexão do autoritarismo com as políticas culturais levou a
transição para uma cultura midiática, visando padrões mercadológicos, sem interação com as
políticas culturais do Estado.
Com o fim da ditadura, criou-se o Ministério da Cultura, em um movimento de oposição
à ditadura, com secretários estaduais de cultura e setores artísticos e intelectuais, que
reivindicavam um novo governo democrático e que reconhecesse a cultura.
Entretanto, Rubim (2007) destaca a instabilidade da cultura na construção da
democracia nos governos de José Sarney (1985-1989), Collor de Melo (1990-1992) e Itamar
Franco (1992-1994), em que havia quase que anualmente a troca do responsável pelo
ministério. Unindo a isso, o mandato de Collor, com experimentos neoliberais, desmontou a
área cultural, acabou com o ministério, reduzindo-o a uma secretaria, e extinguiu diversos
órgãos como a Funarte, Embrafilme, Pró-Memória, Fundacem e Concine.
No ano de 1986, a primeira lei brasileira de incentivos fiscais surgiu pelo nome “Lei
Sarney”. Rubim (2007) ressalta que a lei contrariava todo o esforço feito até ali, devido à ruptura
com os meios de financiamento da cultura, com a proposta de que estes fossem buscados no
61

mercado, que ganhou, assim, poder de decisão. A Lei Sarney foi extinta no governo seguinte,
mas deu lugar à Lei Rouanet. Sobre as leis de incentivo, o autor pontua:

A lógica das leis de incentivo torna-se componente vital do financiamento à


cultura no Brasil. Esta nova lógica de financiamento — que privilegia o
mercado, ainda que utilizando quase sempre dinheiro público — se expandiu
para estados e municípios e para outras leis nacionais, a exemplo da Lei do
Audiovisual (Governo Itamar Franco), a qual ampliou ainda mais a renúncia
fiscal. Esta última legislação foi fundamental para a retomada do cinema
brasileiro (CAETANO, 2005). Com ela e com as posteriores mudanças da lei
Rouanet, cada vez mais o recurso utilizado é quase integralmente público,
ainda que o poder de decisão sobre ele seja da iniciativa privada. A
predominância desta lógica de financiamento corrói o poder de intervenção
do Estado nas políticas culturais e potencializa a intervenção do mercado, sem,
entretanto, a contrapartida do uso de recursos privados, nunca é demais
lembrar. (RUBIM, 2007, p.108-109)

Em 1995, iniciou-se o governo de Fernando Henrique Cardoso, que foi até o ano de
2002. Rubim (2007) destaca que o novo governo implementou, de forma mais enfática, o
modelo neoliberal no país, colocando o mercado acima do Estado. Na cultura, o autor apresenta
que, durante os oito anos, o Ministério da Cultura, com o slogan “Cultura é um bom negócio”,
pretendeu estimular ainda mais as leis de incentivo, estas sendo consideradas a única política
cultural do governo, onde o dinheiro público era gerido pela iniciativa privada.
As críticas à retirada do Estado nas decisões sobre as políticas culturais são inúmeras:

1. o poder de deliberação de políticas culturais passa do Estado para as


empresas e seus departamentos de marketing; 2. uso quase exclusivo de
recursos públicos; 3. ausência de contrapartidas; 4. incapacidade de alavancar
recursos privados novos; 5. concentração de recursos. Em 1995, por exemplo,
metade dos recursos, mais ou menos 50 milhões, estava concentrada em 10
programas; 6. projetos voltados para institutos criados pelas próprias
empresas (Fundação Odebrecht, Itaú Cultural, Instituto Moreira Sales, Banco
do Brasil, etc.); 7. apoio equivocado à cultura mercantil que tem retorno
comercial; 8. Concentração regional dos recursos. Um estudo realizado, em
1998-99, pela Fundação João Pinheiro, indicou que a imensa maioria dos
recursos da Lei Rouanet e da Lei do Audiovisual iam para regiões de São
Paulo e do Rio de Janeiro. (RUBIM, 2007, p.110)

Pode-se perceber, diante do exposto até aqui, que as políticas culturais no país foram
marcadas pela escassez, más formulações e pouca abrangência, visando um público específico
e sendo pouco inclusivas. Portanto, antes de adentrar aos governos do Partido dos
Trabalhadores (PT), que se deu entre 2003 a 2016, o trabalho focará nas arguições de Botelho
(2001), citada no Capítulo 2 deste trabalho, que auxiliará nas delimitações de estratégias para
as políticas culturais.
62

De acordo com Botelho (2001), para que a cultura na dimensão antropológica seja
atingida por políticas públicas, é necessária uma reorganização das estruturas sociais, além de
distribuição de recursos econômicos, dependendo assim de mudanças radicais para que esta
possa interferir na vida, nos hábitos e nas sociabilidades de cada indivíduo.
Na dimensão sociológica, devido à organização, o planejamento das políticas culturais
torna-se mais palpável, sendo as interferências mais viáveis e a busca por resultados mais
previsível. Nesse caso, por estar em um campo institucionalizado, a autora coloca que a
dimensão é privilegiada pelas políticas culturais, devido a sua visibilidade concreta, podendo,
assim, ter ação efetiva, permitindo elaboração de diagnósticos, visando resolver problemas e
carências, além de estimar recursos através de metas em curto, médio e longo prazos.
Na dimensão antropológica, Botelho (2001) destaca que apenas as políticas culturais
não são capazes de atingir o plano do cotidiano; para isso, são necessários dois tipos de
investimento. O primeiro deve ser de responsabilidade dos interessados, por meio de
organização e atuação na sociedade em um exercício real de cidadania, exigindo, então, a
presença do poder público em respostas a questões concretas:

Do ponto de vista estrito de uma política cultural, a dimensão antropológica


necessita penetrar no circuito mais organizado socialmente, característica
fundamental da outra dimensão, a sociológica. E isso só é possível a partir de
uma articulação das pessoas diretamente interessadas, unindo, pelos laços de
solidariedade, demandas dispersas em torno de objetivos comuns,
formalizando-as de modo a dar essa visibilidade ao impalpável, em torno de
associações de tipos diversos. (BOTELHO, 2001, p.75)

No segundo tipo de investimento, a autora refere-se ao aparato governamental. A cultura


deve ter uma articulação política com todas as esferas administrativas, demandando
comprometimento e atuação de todas, de forma harmônica, dependendo principalmente de
força política junto ao poder Executivo. A ação cultural nesta dimensão, ou seja, a ação
sociocultural deve estar próxima à administração municipal, devido à relação desta com os
indivíduos.
Botelho (2001) pontua que a área cultural, na maioria das vezes, é vista como acessória
dentro das políticas governamentais, sendo quase sempre os criadores, produtores e gestores da
área cultural, os únicos a defenderem que a cultura deve se desdobrar em todas as dimensões
da sociedade.
A autora coloca que a promoção desta dimensão depende de ação de várias esferas do
Estado na formulação de políticas públicas, visando o seu desenvolvimento. Contudo, ela
63

acrescenta, concordando com Rubim (2007), que a produção cultural no país depende
basicamente das leis de incentivo fiscal nas esferas federal, estadual e municipal.
Botelho (2001) destaca que o financiamento tomou o primeiro plano no debate sobre
políticas culturais, e que não se pode aceitar essa realidade imposta, de que o as políticas
culturais não podem ser analisadas independentemente do seu financiamento. Segundo ele, “o
financiamento é determinado pela política e não o contrário” (BOTELHO, 2001, p.77). Vale
ressaltar que passar a responsabilidade para o setor privado, não tira o papel regulador do
Estado, já que as renúncias fiscais são recursos públicos.
As políticas culturais precisam antever, por meio de planejamento, as fontes e
mecanismos de financiamento, tendo clareza quanto às metas a serem alcançadas em curto,
médio e longo prazo; podendo, assim, selecionar as estratégias adequadas para cada atividade
artística e cultural. Dessa forma, a política pública requer dos gestores, o conhecimento
adequado para prever problemas e os mecanismos ideais para resolvê-los (BOTELHO, 2001).
De acordo com a autora, os problemas relacionados à captação de recursos pelas leis de
incentivo fiscal, estão ligados tanto aos pequenos produtores culturais, quanto aos grandes, por
lutarem pelos mesmos recursos, em uma concorrência desequilibrada. Assim, os projetos que
visam os interesses das empresas são mais privilegiados, não tendo a qualidade da criação como
critério.
Não é exclusividade, contudo, das leis de incentivos fiscais, a capacidade de captar
recursos. Segundo Botelho (2001), deve-se considerar a combinação entre diferentes
possibilidades de uma legislação abrangente, assim como a distribuição de encargos por setores
de governo, como auxílio à área cultural.
A autora coloca que o público alvo fundamental para a captação de recursos privados,
seriam as pessoas físicas, devido sua visibilidade mais restrita, que podem beneficiar grupos
culturais em uma escala menor, pelo que é mais próximo dele e pelo que ele tenha identificação,
podendo não só investir, mas lutar por aquela cultura. Contudo, devido à baixa política
brasileira neste sentido, o investimento individual tem uma fraca tradição.
Eficazes políticas culturais exigem pesquisa e estratégia, em que a ação do poder público
não é substituível, sendo fundamental o planejamento, assumindo critérios sociais de
intervenção e definição de propriedades, assim como programas plurianuais, permitindo
estudos em médio e longo prazos.
Ao falar de democratização da cultura, a autora faz duras críticas, defendo que se deve
pensar nas avaliações das políticas culturais por métodos qualitativos, uma vez que são
necessários apontamentos aprofundados dos alvos. Segundo Botelho (2001), atualmente a
64

democratização cultural deve se dar pela inclusão de toda a população em determinada cultura,
mas pela oferta dos meios e possibilidades de escolha por qual cultura irá produzir ou consumir,
denominando assim a democracia cultural. Dessa forma, para se chegar a uma democracia
cultural, é necessário o favorecimento de subculturas, fornecendo aos excluídos de uma cultura
tradicional, formas de se desenvolverem de acordo com suas próprias necessidades.
A autora aponta a necessidade de uma tomada de consciência quanto às bases da
elaboração de políticas culturais, priorizando a diversidade e pluralidade cultural, possibilitando
aos atores sociais a escolha de viver sua própria cultura. A partir destes entendimentos, o texto
retorna ao breve histórico das políticas culturais no Brasil com os governos do PT.
Entre os anos de 2003 a 2006, deu-se o primeiro mandato do ex-presidente da República,
Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Já no ano de 2002, constava em seu plano de governo o
documento “Imaginação a serviço do Brasil”, em que o redimensionamento da cultura nas
políticas públicas era apontado. Tal programa dialogava com documentos e estudos
internacionais, considerando a cultura como direito básico e que as políticas culturais deveriam
estar focadas no desenvolvimento da democracia. Como ministro de seu primeiro mandato,
Lula selecionou o cantor Gilberto Gil para assumir o MinC. (CALABRE, 2019). No segundo
mandato do ex-presidente, de 2007-2010, Juca Ferreira assumiu o ministério.
Como proposta inicial, deu-se a reformulação da estrutura do ministério, onde as
secretarias foram reorganizadas para concentrar seus esforços na implementação de políticas, e
não apenas para as leis de incentivo. Dessa forma, segundo Calabre (2019), as desenvolvidas
secretarias de: Articulação Institucional; Políticas Culturais; Programas e Projetos Culturais;
Identidade e Diversidade Cultural; Fomento e Incentivo Culturais; e Audiovisual; tinham como
intuito aproximar as atividades do Ministério.
Logo no início da gestão de Gil, Calabre (2019) aponta que a reformulação da Lei
Rouanet, lei de incentivo citada anteriormente, foi colocada em pauta. Assim, para analisar e
captar subsídios, foram realizados os seminários “Cultura para todos”, nos estados do Rio
Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco e Pará. Tais seminários,
iniciados em 2003, tinham, como atividades, encontros com secretários de cultura municipais
e estaduais, bem como investidores privados e fundações, investidores estatais, e produtores
culturais independentes. Elas buscavam responder a duas questões: os principais problemas
para acesso ao financiamento público federal da cultura e quais mecanismos deveriam ser
adotados para a obtenção de transparência e descentralização do financiamento cultural.
Nesse sentido, o ministério teve como primeira contribuição, o diálogo com diversos
atores culturais, criando uma rede de interlocutores, além de tornar mais participativa a
65

construção das novas políticas públicas. Para além disso, os seminários obtiveram avaliação
dos problemas que poderiam ser resolvidos a curto, médio e longo prazo, assim como o
entendimento de que a reformulação da lei não deveria paralisar os projetos em andamento.
Outro importante passo, de acordo com Calabre (2019), foi o diálogo da Secretaria de
Políticas Culturais (SPC) com órgãos de pesquisas federais, como o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) e o Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), com objetivo de
produzir e sistematizar as informações no campo cultural. Tais informações, que eram quase
inexistentes, visaram permitir um conhecimento sobre a realidade da cultura para a criação das
políticas culturais. Vale ressaltar a importância dada a este conhecimento por Botelho (2001).
Entre 2004 e 2005, Calabe (2019) pontua a realização de vários encontros entre
membros do MinC e do IBGE, resultando em produtos e ações, tendo se destacado a publicação
do Suplemento de Cultura na Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic), lançado
em 2006, em que pesquisas anuais foram feitas em todos os municípios do Brasil, levantando
questões públicas municipais. As informações extraídas foram fundamentais para a elaboração
de políticas públicas, assim como para a estruturação do Sistema Nacional de Cultura (SNC).
De acordo com Calabe (2019), o SNC foi construído tendo, como elementos
fundamentas, as conferências e os planos de cultura. A 1ª Conferência Nacional de Cultura,
realizada em dezembro de 2005, foi uma das etapas de elaboração do Plano Nacional de Cultura
(PNC). Com um mecanismo participativo e consultivo, tinha como objetivo principal, o
recolhimento de sugestões para a elaboração de diretrizes para o PNC. No processo preparatório
para a conferência, foram realizados 1197 seminários municipais e 19 conferências estaduais,
estimando a realização de 53000 pessoas em todo país (CALABE, 2019).
O plano, segundo a autora, teve um processo longo de construção, ocupando
praticamente os dois mandatos do presidente, sendo aprovado em dezembro de 2010. O PNC
contém 5 capítulos, onde se distribuem 14 diretrizes, 36 estratégias e 275 ações. Sua execução
é acompanhada ainda de 53 metas, que tem como base o conjunto de diretrizes, estratégias e
ações previstas. Calabe (2019) acrescenta que o documento deve conduzir: a defesa e
valorização do patrimônio cultural brasileiro; a produção, promoção e difusão de bens culturais;
a formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões; a
democratização do acesso aos bens da cultura; e a valorização da diversidade étnica e regional;
devendo ser tido, portanto, como um grande exercício de democracia participativa.
A construção legal do SNC deu-se nesse contexto, objetivando a institucionalidade da
área e a busca pelo diálogo e execução de ações em conjunto com diversos níveis do governo,
66

colaborando, assim, para estruturação e consolidação de políticas culturais mais democráticas


e participativas (CALABE, 2019).
De acordo com a autora, pode-se destacar duas secretarias do governo Lula. A primeira
foi a Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural (SID), que integrou ações e pautas
culturais de grupos e culturais que antes eram excluídos, como: culturas populares; ciganas;
indígenas; idosos; a população LGBTQIA+; e a saúde. A segunda foi a Secretaria de Programas
e Projetos Culturais (SPPC), que posteriormente se transformou em Secretaria da Cidadania
Cultural (SCC), e foi responsável por criar o programa Cultura Viva, em 2004, tendo como
principais objetivos “ampliar e garantir acesso aos meios de fruição, produção e difusão
cultural, potencializar energias sociais e culturais, dando vazão à dinâmica própria das
comunidades, entre outros. ” (CALABE, 2019, p.69). A autora traz, ainda, que a base do
programa foram os Pontos de Cultura, que, em 2007, na primeira pesquisa do Ipea, consistiam
em 526 pontos no país, e em 2010, mais de 2500 unidades.
Em uma leitura crítica dos oito anos de gestão de Lula, Calabe (2019) coloca que muitas
das propostas só tiveram efetividade em seu segundo mandato, algumas ultrapassam esse
período, e que os objetivos propostos não foram completamente alcançados em muitos
programas. Entretanto, o MinC realizou ações que resultaram em avanços concretos na
estruturação das políticas culturais, torno-as mais democráticas, participativas e abrangentes.
Outro ponto crítico da gestão foi a territorialização das políticas públicas, onde a
distribuição desigual de recursos financeiros e humanos esteve presente nas gestões de Gil e
Juca. Traçando um mapa de acesso a esses recursos, Calabe (2019) pontua a concentração
desses no Sudeste, mais especificamente nos grandes centros urbanos.
A autora coloca, no entanto, que entre 2003 a 2010, importantes passos foram dados,
com proposição de programas, políticas e ações, alcançando um destaque na cena política
nacional, nunca contraído anteriormente. Contudo, foram enfrentados problemas e desafios,
necessitando, muitas vezes, alterações e reformulações nas políticas públicas culturais, além de
muitas lacunas terem ficado abertas, causando a ruptura de processos em curso, colocando,
assim, a efetividade do caráter participativo e democrático proposto em risco. Várias desses
problemas foram herdados pela gestão da presidente Dilma Rousseff, que tornou-se presidenta
posteriormente.
Rubim (2015) destaca que a amplitude que se assumiu pelo MinC no governo Lula, foi
um desafio de continuidade nos mandatos de Dilma, que se deram dos anos 2011 a 2014 e 2014
a 2016, sendo este último interrompido por um golpe de Estado - que será abordado mais à
frente -, exigindo assim, competência para estabelecer a centralidade do trabalho efetivado, bem
67

como, atingir as novas demandas da sociedade. Mesmo com a instabilidade entre as gestões de
Juca Ferreira, de 2008 a 2010, para a ministra Ana de Hollanda, de 2011 a 2012, e desta para a
ministra Marta Suplicy, de 2012 a 2014, algumas das políticas culturais tiveram continuidade.
Vale ressaltar que a gestão de Dilma ainda teve a substituição de Marta Suplicy, para Ana
Cristina Wanzeler, que ficou cerca de um mês no cargo, sendo assumido no dia 1 de janeiro de
2015 por Juca Ferreira.
O PNC foi revisto de forma participativa, focando nas 53 metas que deveriam ser
alcançadas em 10 anos, o que tornou sua implantação possível. O MinC, em parceria com
universidades federais da Bahia e Santa Catarina, apoiou estados e municípios na adoção de
entes federativos dos planos culturais. Contudo, algumas das temáticas não tiveram um
desenvolvimento satisfatório para alcance das metas, apresentando dificuldades na
implementação do PNC, que tem relação conjunta com o SNC, e apresentou sua
regulamentação e andamento conturbados (RUBIM, 2015). Segundo o autor, dissonância entre
o PNC e o SNC afetou o desenvolvimento de ambas, mantendo as políticas culturais instáveis.
Sobre as leis de incentivo, Rubim (2015) pontua que, na gestão de Dilma, a ausência e
esquecimento da adesão a uma nova política de financiamento desestabilizaram os projetos do
ministério, não deixando o Estado exercer um papel prioritário na cultura. Não houve, então, a
implementação de novos modelos de financiamento que estivessem em sincronia com as
políticas de diversidade cultural, com capacidade de atender as demandas da sociedade.
De acordo com Rubim (2015), o fomento à cultura deveria se dar por um novo sistema
de financiamento, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 150 para a consolidação do
desenvolvimento institucional da cultura, assim, renomeada como PEC 421/2014, que de
acordo com o site da Câmara dos Deputados, foi deferida em 2015, prevendo 2% do orçamento
federal para a cultura e 1,5% dos orçamentos estaduais e municiais.
Neste mesmo campo, Rubim (2015) destaca a continuidade do Vale-Cultura, que
representou uma nova modalidade de financiamento, na maioria das vezes voltando-se para a
criação e a produção, objetivando tornar as políticas de financiamento mais diversificadas. No
que diz respeito à Educação, alguns programas foram desenvolvidos com uma melhor
comunicação entre os dois ministérios, como o Mais Cultura nas Escolas e o Mais Cultura nas
Universidades.
Contudo, quanto à área de comunicação, Rubim (2019) aponta rupturas como:
engavetamento da ANCINAV; enfraquecimento do DOC-TV e Revelando os Brasis; além do
retrocesso das iniciativas de culturais digitais e dos direitos autorais.
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Assim, muitas das lacunas deixadas pelas gestões de Lula, não foram consistentemente
afrontadas. No entanto, não se pode deixar de assinalar a importância das gestões do PT, entre
os anos de 2003-2016 para a área cultural. Rubim (2015) aponta que “O diálogo com a
sociedade permitiu enfrentar os autoritarismos. Formular e realizar políticas culturais em
circunstâncias democráticas” (RUBIM, 2015, p.12). Grupos e culturas, antes excluídos, viram
pela primeira vez desenvolvimento nas áreas da diversidade. Tais fatos colocaram o Ministério
da Cultura em um lugar onde ele nunca esteve, alcançando políticas culturais, econômicas e
sociais.
No entanto, em 2016, a então presidente Dilma, sofreu o processo de impeachment, que
teve início em 2 de dezembro de 2015, segundo o site Agência Senado (2016), tendo duração
de 273 dias, encerrando-se em 31 de agosto de 2016, com a cassação de seu mandato e posse
do então vice Michel Temer. Dilma e parte considerável da população classificaram o evento
como golpe e conspiração entre Michel Temer e o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
(AGÊNCIA SENADO, 2016).
Esse acontecimento marcou a história nacional e sucedeu inúmeros eventos desastrosos
no país, contudo, não cabe a este trabalho destrinchar todos os pontos desse momento, mas
deve-se pontuar que tal acontecimento se inicia muito antes do dia 14 de abril de 2016, quando
os deputados votaram em maioria a favor do impeachment em nome da pátria, de Deus e da
família. 16
No dia 31 de agosto de 2016, Michel Temer, então vice-presidente, assumiu a
presidência da república. As ações para o extermínio dos direitos sociais foram quase que
imediatos, como colocam Freire et al (2016):

Aprovação do Projeto de Emenda Constitucional nº 241, que altera a


Constituição Federal de 1988, com o intuito de congelar as despesas do
Governo Federal, determinando que sejam corrigidas apenas pelos índices de
inflação, por até 20 anos; aprovação da medida provisória 746/16, que
determina a reforma no ensino médio, alterando de forma redutora sua
estrutura e mascarando essa redução com uma farsesca flexibilidade da oferta
de disciplinas; corte nas verbas de assistência do programa Bolsa Família,
projeto de apoio às famílias que vivem em situação extrema de pobreza; e

16
Uma sucessão de eventos desencadearam esse momento: em 2013, iniciaram as manifestações em todo o Brasil
contra o aumento da tarifa de transporte; em 2014, iniciou-se uma fase ostensiva da Operação Lava Jato, utilizada
pela mídia contra a ex-presidente; em 2015, Eduardo Cunha foi eleito para a presidência da Câmara dos Deputados
com apoio da oposição; manifestações movidas pelo MBL, Vem Pra Rua, Revoltados Online, partido
Solidariedade e SOS Forças Armadas, se uniram contra o governo; no dia 2 de dezembro Eduardo Cunha autorizou
a abertura do processo de impeachment em retaliação ao apoio do PT ao processo de cassação do seu mandato
devido as informações de contas não declaradas na Suíça (MATTOS, BESSONE, MAMIGONIAN, 2016).
69

revisão das metas do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). (Freire
et al, 2016, p.2)

Entre estas medidas de regressão, o Ministério da Cultura, que já vinha sofrendo


diversos ataques, lidou com a tentativa de sua extinção pelo governo Temer, que voltou atrás
após pressão da classe artística, com o movimento Ocupa MinC, segundo Alves e Nascimento
(2019). 17
O presidente que sucedeu Temer foi Jair Messias Bolsonaro, cujo mandato presidencial
está em andamento e tem gerado retrocessos em políticas públicas do país (RUBIM, 2021). O
atual governo, extinguiu assim, o Ministério da Cultura em Secretaria Especial de Cultura,
ficando subordinada inicialmente ao Ministério da Cidadania e, logo após, transferida para o
Ministério do Turismo, tomando a responsabilidade da política nacional de cultura, a regulação
dos direitos autorais e a proteção do patrimônio histórico, artístico e cultural. Em pouco mais
de um ano de governo, cinco responsáveis passaram pela secretária: Henrique Pires; Ricardo
Braga; Roberto Alvim; Regina Duarte; e Mário Frias. De acordo com Rubim (2021):

A gestão Messias Bolsonaro elegeu a cultura como inimiga, em conjunto com


educação, ciências, artes, universidades públicas e temas relativos às mal
denominadas minorias, em especial às suas manifestações de gênero, afro-
brasileiras, LGBT e dos povos originários. No caso da cultura, o governo se
caracteriza por agressões às liberdades de criação e de expressão, pelo retorno
da censura; pelo desmonte das instituições culturais; pela demonização da
cultura e das artes e pela deliberada atuação no sentido de asfixiar
financeiramente a cultura. (RUBIM, 2021, p.39)

Segundo autor, muitos são os atentados do atual governo contra a cultura, entre eles: o
insulto a Fernanda Montenegro por Ricardo Alvim, que logo após o ocorrido deixou a direção
da Funarte para tomar posse da secretaria de cultura; a reunião anual da Unesco, onde Ricardo
Alvin atacou os últimos vintes anos da cultura nacional; as constantes afirmações da existência
de uma guerra cultural; a nomeação de Sérgio Nascimento de Camargo para a Fundação
Cultural Palmares, este, que declarou que a escravidão foi benéfica para os africanos e o racismo
no Brasil é “Nutella”.
Rubim (2021) destaca a matéria do jornal El País, do dia 27 de dezembro de 2019, em
sua edição brasileira, onde demonstra o papel econômico da cultura, alegando que o setor
mantém 5 milhões de pessoas empregadas no país com empregos formais e informais, sendo

17
O enfraquecimento da democracia com o impeachment foi ainda mais alastrado com a prisão política do ex-
presidente Lula, devido às articulações na Lava Jato, o que impôs seu afastamento da disputa presidencial, sendo
substituído por Fernando Haddad. Mesmo com as campanhas “Lula Livre”, tais acontecimentos culminaram em
um governo de extrema-direita, tendo como chefe de Estado Jair Messias Bolsonaro, o que gerou retrocessos em
todas as políticas públicas do país. (RUBIM, 2021)
70

quase 6% da mão de obra brasileira. A Lei Rouanet era a responsável por 73% do suporte as
produções culturais a época.
Contudo, sob constante ataque, no dia 17 de janeiro de 2020, não só a cultura como o
país, se viu diante de um episódio estarrecedor. O então secretário de Cultura Roberto Alvim,
em discurso sobre o edital do Prêmio Nacional das Artes, surgiu ao som do compositor favorito
de Adolf Hitler, Richard Wagner, além de plagiar partes do discurso do ministro de propaganda
nazista. De acordo com Rubim (2021):

No vídeo, Roberto Alvim afirma: “A arte brasileira da próxima década será


heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento
emocional e será igualmente imperativa [...] ou então não será nada”. O líder
nazista havia dito: “A arte alemã da próxima década será heroica, [...], será
nacional com grande páthos e igualmente imperativa [...] ou então não será
nada”. A repercussão política de tal atitude ideológica explícita foi intensa.
Variados segmentos sociais e políticos reagiram, inclusive setores judaicos
que haviam apoiado a candidatura de extrema-direita, o que ocasionou a
demissão do secretário por Messias Bolsonaro. (RUBIM, 2021, p.41)

Rubim (2021) aponta que, além deste episódio, a sua tentativa de protagonizar a dita
guerra cultural contra a esquerda não teria agradado os setores ideológicos do governo, que tem
como conselheiro principal Olavo de Carvalho. Apesar de concordarem com os valores
fascistas, o governo, segundo o autor, provavelmente prefere não ser tão escancarado.
Seu cargo foi então ocupado pela atriz Regina Duarte, que teve 78 dias medíocres a
frente da secretaria, com sua gestão marcada por episódios como: o discurso de posse, onde
destaca-se o trecho “Cultura é aquele pum produzido com talco espirrando do traseiro do
palhaço. A cultura é assim, é feita de palhaçada” (REVISTA FÓRUM, 2020, s.p.); a demissão
de sete membros de órgãos relacionados a secretaria, todos indicados por Olavo de Carvalho,
que encarou a atitude como uma guerra, onde a ala olavista iniciou um longe repúdio; as
tentativas de indicação para ocupação dos cargos que foram vetadas pelo Palácio do Planalto;
a não moção de pesar pela morte de artistas no período, como a de João Gilberto, a de Aldir
Blanc e de Moraes Moreira; além das entrevistas dadas, como a da CNN, onde minimizou a
ditadura militar, e fugiu da entrevista antes de seu fim. Através de um vídeo de despedida,
Regina Duarte e Bolsonaro encenaram a saída da atriz da secretaria para um suposto cargo na
Cinemateca. (RUBIM, 2021)
Após quase um mês, Mário Frias, também ator, tomou posse da secretaria e se mantem
até os dias atuais, tendo suas ações mais visíveis as acusações ao PT em relação à política da
Lei Rouanet. De acordo com Rubim (2021), a Secretaria Especial da Cultura tende a
71

permanecer abandonada, mantendo o desmantelamento e a depressão do setor cultural, que


sofre com ataques.
Sobre a dita guerra cultural, ou a caminhada ideológica contra o “marxismo cultural”,
Rubim (2021) contextualiza trazendo o autor Iná Camargo Costa, para explicar a expressão,
que vem da década de 1990, “tendo como primeiros usuários cristãos fundamentalistas,
ultraconservadores e de extrema-direita dos Estados Unidos” (RUBIM, 2021, p.45). Rubim
(2021) aponta que a provável ligação da guerra cultural no país com a extrema-direita norte
americana é o pensamento de Olavo de Carvalho.
Rubim (2021) traz ainda a discussão de João Cezar de Castro Rocha, que aborda o livro
Orvil, concebido por militares no intuito de modificar as interpretações do livro Brasil: nunca
mais, que denunciava as calamidades da ditadura militar brasileira. Rubim (2021) acrescenta:

Conforme o autor, a guerra cultural bolsonarista, apesar de ter relações com o


que ocorre hoje no mundo, possui certas características peculiares: a fonte de
sua concepção de mundo deriva do Orvil (Rocha, 2020a, p.7) e sua técnica
discursiva se inspira na “retórica do ódio, ensinada nas últimas décadas por
Olavo de Carvalho” (Rocha, 2020b, p.2). Não resta dúvida que importa buscar
as raízes nacionais da guerra cultural bolsonarista, mas parece precipitado
desconsiderar ou mesmo depreciar potentes ideários internacionais, que
circulam e envolvem com grande sintonia com os tempos sombrios, que se
vive no mundo. (RUBIM, 2021, p.46)

Por trás dessa concepção, estão as ideias de destruição da cultura existente, tomando
como justificativa que esta está tomada pelo “marxismo cultural” e a criação de uma nova
cultura, autoritária, conservadora, terraplanista e com um inflexível fundamentalismo moral e
religioso. Esta cruzada, instalada em setores como de relações internacionais, culturais e
educacionais, não se concentra em uma área específica, ela mantém a destruição de liberdades,
políticas culturais e se insere em nas questões econômicas, sociais, políticas e ambientais
(RUBIM, 2021).
O autor coloca que a utilização da expressão guerra cultural, ao invés de “disputa pela
hegemonia político-cultural” (RUBIM, 2021, p.50), indica o seu real sentido, não para
desenvolver uma disputa democrática pelo poder, mas para viabilizar a violência física e
simbólica contra os adversários políticos-culturais.
E, para além disso, segundo Rubim (2021), o Brasil não está hoje em um ambiente
democrático, mas sim em um estado de exceção.18 O atual presidente, inclusive, nunca fez

18
Em que uma rápida contextualização, na democracia os direitos econômicos, sociais, políticos, ambientais e
culturais são assegurados, já no estado de exceção, o regime não é só autoritário, como totalitário.
72

questão de esconder a admiração pela ditadura militar de 1964 e a intenção da implantação de


uma em sua gestão.
Não bastando o pesadelo vivido pela democracia e pelos brasileiros com a gestão
Bolsonaro, no ano de 2020, foi declarada a pandemia da Covid-19 pela OMS, agravando ainda
mais a situação vivida, principalmente pelas minorias.
De acordo com Peixe (2021), a omissão, o boicote criminoso às medidas preventivas
indicadas pela OMS e os escândalos ligados às vacinas impulsionaram as mortes por Covid-19
no país, que, no momento em que esse texto é redigido, ultrapassam as 600 mil. 600 mil mortes,
600 mil famílias em luto, mães, pais, filhos, avós e amigos. Para além das mortes, a
desigualdade social e econômica tornou-se aguda, fazendo dos pobres, negros, indígenas as
principais vítimas, não só da pandemia, mas do governo.
No contexto cultural, a pandemia paralisou as ações e atividades, colocando os
fazedores culturais com sua sobrevivência comprometida (PEIXE, 2021). Foi neste quadro que
esses fazedores culturais, em articulação com parlamentares da Comissão de Cultura da Câmara
de Deputados, tendo como responsável a deputada Benedita da Silva (PT), conseguiram
formular e aprovar no Congresso a Lei 14.017/2020 de Emergência Cultural, a Lei Aldir Blanc,
em homenagem ao compositor que faleceu em 2020, vítima da Covid-19, e que foi símbolo de
resistência na luta contra a ditadura militar.
De acordo com Peixe (2021), uma grande mobilização com pessoas qualificadas e
experientes foi determinante para a criação da lei que teve como recurso o FNC, assim como a
importante relatoria de Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) na Câmara dos Deputados e de Jaques
Wagner (PT-BA), no Senado, para aprovação da lei, que foi sancionada pelo presidente.
Peixe (2021) ainda levanta o motivo que teria levado o presidente a sancionar a lei, em
vista dos seus constantes ataques à cultura. Em uma provocação, ele se questiona se teria sido
pela pressão da área cultural ou por saber das fragilidades da gestão cultural e que esta pode
falhar, e assim ele poderá responsabilizar os estados, municípios, governadores, gestores e o
SNC.
A Lei Aldir Blanc, contudo, foi uma vitória, injetando 3 bilhões de reais no setor cultural
nacional, sendo um estímulo a todos os que fazem e vivem de cultura no país. Peixe (2021)
ainda acrescenta que o uso devido do recurso “será vital para a cultura brasileira e para a
credibilidade dos gestores públicos da área cultural. É, sem dúvida, uma grande
responsabilidade e um enorme e difícil desafio que necessita ser vencido. ” (Peixe, 2021, p.29)
Não caberia neste texto os inúmeros retrocessos, escândalos e atrocidades do atual
governo, como: a submissão ao governo norte-americano e a Donald Trump; o negocionismo
73

a ciência; a homofobia, o racismo e o machismo escancarados; o abandono e os cortes


orçamentários da cultura; a paralização da demarcação de terras indígenas e quilombolas, assim
como as mortes destes; os incêndios e o desmatamento da floresta amazônica e do Pantanal; os
escândalos de investigação de corrupção ligando todos os membros da família Bolsonaro, bem
como seus assessores; a investigação sobre a ligação da família com a milícia do Rio de Janeiro;
o contato direto desses, sendo vizinhos e amigos dos assassinos de Marielle Franco, socióloga
e vereadora do Rio de Janeiro, defensora dos direitos humanos; a crise de oxigênio no
Amazonas; as Fake News; a orientação ao uso da cloroquina para prevenir a Covid-19, mesmo
sem comprovação cientifica; além dos escândalos de corrupção e atraso da chegada das vacinas
no país.
De acordo com Peixe (2021), a guerra cultural deflagrada não vai parar, o que exige das
forças partidárias ou não, dos movimentos sociais, das instituições democráticas e dos cidadãos
a união e a organização em um movimento antifascista. Rubim (2021) aponta a cultura como
movimento fundamental nessa luta.
Neste cenário, entende-se que um dos motivos para o Estado querer a diminuição do
acesso à cultura é que esta pode funcionar como recurso socioeducativo, que segundo Alves,
Oliveira e Chaves (2016), pode possibilitar a reflexão crítica de jovens sobre seus contextos
sociais, no processo de construção de identidade e formação cidadã, possibilitando ainda a
sensibilidade para a mudança social a partir de práticas comunitárias envolvendo processos de
negociação com o poder público na conquista de direitos sociais.
A conscientização, de acordo com Freire (1980), instaura no indivíduo a captação da
possibilidade de mudança social, possibilitando um juízo crítico em relação as alternativas
propostas pela elite. Assim, a cultura e a educação funcionam como eixos estruturantes na
consolidação de práticas sociais, promovendo discussões sobre diversidade cultural, identidade
e direitos de grupos vulneráveis.
Pode-se concluir, então, que não é de interesse do Estado e das classes dominantes que
a população tenha acesso à cultura, pois quanto mais bem informado é o seu povo, mais difícil
de manipulá-lo aos seus moldes.
O ex-secretário municipal da cultura de São Paulo, Carlos Augusto Machado Calil,
professor da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo, criticou o governo
em uma entrevista ao Jornal da USP (2019):

O sentimento que o atual governo federal reflete é de que a Cultura é inimiga


da religião, das instituições, da manutenção do poder constituído. A arte tem
de fato a capacidade de promover a emancipação do indivíduo que pode
74

incomodar um poder anacrônico, reacionário, expondo suas inconsistências e


falácias. (CALIL, 2019, s.p. apud JORNAL DA USP, 2019)

O ex-secretário protesta contra o atual governo e explica a guerra não declarada contra
a inteligência, a tolerância, o patrimônio simbólico nacional, que vai contra os princípios da
democracia, fortalecendo a ideia de que o processo de extinção do MinC e as políticas
anticulturais são ferramentas políticas de um governo autoritário, que fragiliza e limita as ações
culturais, tirando a autonomia e colocando a cultura em último plano, levando a população a
mais ignorância, falta de diversidade e inclusão.
Peixe (2021) coloca, assim, a necessidade de lutar para que a cultura possa ocupar um
papel fundamental em futuros programas de governo, considerando na melhor das hipóteses,
que após as eleições de 2022, outro gestor assumirá de forma democrática e pacífica. É
necessário, então, a avaliação das experiências trilhadas até aqui para compreender as
transformações culturais, tecnológicas, políticas, sociais, econômicas e ambientais, e que estas
pautas estejam inclusas e conectadas com o papel da cultura, a fim de formular novas propostas
de políticas públicas culturais.
Apesar de todos os apontamentos no presente capítulo, vale ressaltar que este foi escrito
durante a gestão do governo Bolsonaro, em que inúmeros desdobramentos podem vir a ocorrer.
Contudo, pode-se finalizar esta parte do trabalho em forma de apelo ao momento, com a frase
de Peixe (2021), ao falar da normatização da violência e da força policial com as minorias: “É
urgente reagir e parar o massacre de negros, jovens, favelados, mulheres, comunidade
LGBTQI+, trabalhadores rurais e povos indígenas! ” (PEIXE, 2021, p.34).
75

4 HIP-HOP EM CAMPOS DOS GOYTACAZES

fazendo rima pros menó na esquina

pra que eles tirem o sorriso da boca

pra que eles também possa fazer rima

talvez a rima tire os menó da boca

WN, Poesia de Quinta - Mãos Negras (produção e artista campista)

O município de Campos dos Goytacazes, localizado na região Norte do Estado do Rio


de Janeiro, se apresenta a uma distância aproximada de 279 km da capital estadual, Rio de
Janeiro, com uma população de 503.424 (quinhentos e três mil quatrocentos e vinte e quatro)
habitantes (IBGE, 2018) e uma área de 4.032 km², sendo o maior do Estado. A cidade tem o
viaduto da Ponte Leonel Brizola como o principal palco da cultura hip-hop em tempos mais
recentes, sendo um dos principais ocupantes o coletivo já citado, a MCR, sendo esses os objetos
de pesquisa de maior foco deste trabalho.
O presente capítulo se inicia com a introdução de um breve histórico da evolução das
periferias/subúrbios da cidade, para adentrar ao surgimento do hip-hop nesta. Posteriormente,
o texto dedica-se ao grupo MCR, as influências da Covid-19 nos movimentos culturais urbanos
e a contextualização das instituições de cultura municipais.
Vale ressaltar que, além da pesquisa bibliográfica sobre o hip-hop no município de
Campos dos Goytacazes, foi efetuada a pesquisa de campo com visitas a Ponte Leonel Brizola
em dias e horários diferentes, sendo registradas por meio de fotos e vídeos, além disso, foram
realizadas entrevistas não estruturadas com: 4 integrantes da MCR; 4 organizadores da MCR;
5 conselheiros do Conselho de Cultura do município; 2 artistas da vertente do graffiti; 3 artistas
da vertente do break; 1 representante do skate; e 2 representantes do basquete, sendo que um
desses faz parte da atual gestão pública municipal. Além das 21 entrevistas individuais, foram
efetuadas 2 rodas de conversa com a organização do coletivo MCR, no intuito de delimitar as
metas, planos e ações, além de contato constante com esses por meio dos aplicativos WhatsApp
e Instagram. Devido a pandemia da Covid-19, não foi possível presenciar as batalhas de rimas
do coletivo abaixo do viaduto, com isso, foram recolhidos fotos e vídeos dos entrevistados,
buscando captar e analisar as possíveis alterações no espaço. Destaca-se também que as
entrevistas foram devidamente autorizadas pelo Comitê de Ética.
76

4.1 CENTRO X PERIFERIA EM CAMPOS DOS GOYTACAZES

Elevada à categoria de cidade em 1835, o município foi formado sobre uma planície à
margem direita do Rio Paraíba do Sul, rodeado por brejos e lagoas, onde escolheu-se assim, a
parte mais alta para instalar a cidade, na Praça São Salvador e seu entorno (FARIA e QUINTO
JÚNIOR, 2017), sendo hoje popularmente conhecido como centro histórico.
O centro passou por diversas intervenções com o passar dos anos, desde a construção,
entre 1844 e 1872, de um extenso canal de navegação em suas proximidades, que liga os
municípios de Campos dos Goytacazes e Macaé (TEIXEIRA E VIEIRA, 2015), passando pela
construção do Jardim de Alah, em 1944, que posteriormente passou a se chamar Parque Alberto
Sampaio, até a implantação do viaduto da Ponte Leonel Brizola, em 2004.
A Ponte Leonel Brizola alinha-se com o Canal Campos-Macaé e, segundo gestores da
época, foi construído com o objetivo de facilitar a travessia e a mobilidade do centro ao
subdistrito de Guarus. Contudo, ele agravou ainda mais o sistema viário local, já precário. A
ponte passou a cortar o Centro e fragmentar o espaço existente. Entretanto, apesar de ter
potencializado os problemas urbanos centrais e proporcionado maior fluxo de veículos,
dificultando a mobilidade e o acesso dos pedestres, a parte debaixo do viaduto por ela formada
é utilizada como polo principal da cultura urbana hip-hop.
O capítulo 2 do presente trabalho abordou a relação entre o urbano e o suburbano, neste
capítulo, no entanto, será abordada a relação entre o centro e a periferia, ou o suburbano,
buscando analisar o hip-hop, cultura oriunda das favelas e o seu principal palco em Campos
dos Goytacazes, que se dá no centro da cidade.
Faria (2005) traz o entendimento de que estar mais próximo ao centro indica o fácil
acesso a bens e serviços, não só em um sentido concreto material, mas também a um domínio
simbológico, sendo estes centros, estratégicos para a dominação espacial.
O conceito de centralidade, de acordo com Roncayolo (1992), pode ser resumido a um
local de sociabilidade, permanência comum, estabilidade de mercado e na concentração de
órgãos institucionais, mas com sentido e simbolismos aliados. Faria (2005) aponta ainda que
no espaço urbano contemporâneo, a definição centro-periferia é de difícil entendimento,
existindo a segregação imposta, das classes mais pobres expulsas do centro urbano, e a auto
segregação, onde os mais abastados saem desses centros em busca de espaços mais seguros e
privatizados, como os condomínios fechados.
Sobre o município de Campos, Faria (2005) aponta sua importância para a economia
e para a política do país desde antes de sua elevação a cidade. As intervenções a partir do século
77

XIX, onde constaram: construções de canais; estrada de ferro; instalação de água e esgoto; e
luz elétrica; mostram a inserção do município na urbanização do país. Atualmente, ela é o
principal centro urbano da região Norte Fluminense, como polo de atividades comerciais.
Faria (2005) destaca os planos urbanísticos da cidade, chamando atenção para o projeto
do engenheiro sanitarista Saturnino de Brito, de 1902, que visou as questões de higiene e
saneamento. A partir desse período, o munícipio deu início as medidas higienistas no espaço
público, principalmente no centro da cidade. Pohlmann (2003) destaca a proibição de quitandas
nas ruas centrais, levantando a ideia de que a imagem do pobre era relacionada a desordem.
De acordo com Faria (2005), inicia-se assim a segregação sócio espacial na cidade,
tendo como aspectos fundamentais a supervalorização da área central, com as políticas voltadas
a burguesia, e a desvalorização das áreas periféricas, com a ausência de investimentos,
ocupação da classe mais pobre, além da construção de presídios, cemitérios e hospitais
especializados em doenças epidêmicas, afastando tudo o que era considerado ruim do centro
urbano modernizado.
Faria (2005) pontua diversas outras intervenções na área central do município, o que
acarretou ainda mais a sua valorização, enquanto a população mais pobre era deixada a margem
das melhorias da cidade, ficando nas áreas mais distantes onde eram tomadas por pântanos e
áreas alagadiças.
A expansão da cidade após as décadas de 1920 e 1930 se deram principalmente em
direção a oeste, devido ao investimento em equipamentos urbanos, como: a Praça do Liceu;
alinhamento da rua Alberto Torres; e a linha de bonde que ligava o centro a Estação da Estrada
de Ferro Leopoldina. De acordo com Faria (2005), tais intervenções e a posição geográfica ao
redor do Liceu, que está em um dos pontos mais altos da cidade, possibilitou o crescimento do
bairro Maria de Queiros, um dos mais privilegiados do município.
Faria pontua que a partir da década de 1940, começam a ficar claros os problemas da
realidade sócio espacial, que exigiu reformulações, principalmente por reivindicações das
populações menos abastadas. A imprensa da época apontava a existência de duas cidades, uma
que recebeu investimentos por 20 anos, e a outra que foi abandonada a margem e esquecida. Só
neste momento percebeu-se a necessidade por parte dos órgãos gestores de ligação entre esses
bairros e o centro da cidade. Faria (2005) acrescenta ainda, que os 40 anos relatados, desde o
plano de higienização, foram o início da expansão territorial em conjunto com os problemas de
mobilidade espacial.
Em 1944, o prefeito Salo Brand solicitou um empréstimo de vinte milhões de cruzeiros
no intuito de reorganizar e planejar a expansão urbana, tendo como entendimento de que os
78

problemas que a cidade enfrentava não eram apenas econômicos, mas também social e
urbanístico. Neste sentido, foi elaborado o plano conhecido como Plano Coimbra Bueno, de
1944, que visou reparar os erros dos planos anteriores e conduzir a expansão do município
integrando os bairros até então a deriva. Mesmo não tendo sido efetivado em sua totalidade, o
plano definiu o sentido da expansão urbana. (FARIA, 2005)
Nas décadas de 1950 e 1960, intensificou-se a segregação entre o centro e a periferia,
que segundo Faria (2005), derivou da falta de investimento nas áreas demarcadas pelo Plano de
Coimbra Bueno, em conjunto com a chegada de trabalhadores da zona rural a zona urbana,
como consequência do declínio da cultura do café e das novas leis trabalhistas. Neste momento,
Faria (2005) pontua ainda que na mídia da época encontravam-se o receio e a insegurança da
parte elitizada da cidade em relação aos grupos que começavam a demarcar novas áreas e as
ocupações irregulares, dando início ao processo de favelização.
Em 1979, o prefeito e arquiteto Raul David Linhares elaborou o Plano de
Desenvolvimento Urbanístico e Territorial de Campos (PDUC), tendo como base as leis do
Plano de 1944. O objetivo do PDUC foi corrigir os dados do tecido urbano, principalmente das
áreas mais carentes, visando as relações socioeconômicas, geopolíticas e culturais (FARIA,
2005).
A autora pontua ainda que, a partir de 1980, a favelização acentuou-se devido às
falências das usinas de cana-de-açúcar e os conflitos gerados pela expansão urbana. Ela conclui
que os planos elaborados, devido a não efetivação e ausência de intervenções nas áreas
periféricas, aumentaram a oposição entre o centro e a periferia.
Faria e Pohlmann (2020) indicam ainda o processo de urbanização espraiada que se deu
na cidade, espalhando-se desordenadamente pela planície. De acordo com as autoras, após
1970, ao mesmo tempo em que as atividades sucro-alcooleiras entravam em declínio, ocorria a
implantação do Proalcool e o começo da exploração e produção de petróleo e gás. Em 1985,
com a Lei 7.453 a União começou a dividir com os estados e municípios os recursos dos
royalties19. Contudo, devido ao êxodo rural, advindo da falência das usinas e com o aumento
da população urbana, o fenômeno de favelização se acentuou, passando de 4 favelas para 32,
de acordo com senso do IBGE de 1996. Faria (2005) coloca que ainda do início dos anos 2000,
o número de favelas se mantinha, no entanto, aumentavam os números de habitantes desses
núcleos.

19
Compensação financeira ofertada aos municípios produtores de petróleo, devido ao impacto ambiental causado
pela extração deste mineral
79

Pode-se ainda acrescentar para o processo, segundo Faria e Pohlmann (2020), a


construção de conjuntos habitacionais na cidade entre 1967 a 1985, contribuindo para o
surgimento de novos bairros em periferias. Assim, de acordo com as autoras, a expansão urbana
na cidade ocorre de forma espraiada e se manifestando com um crescimento urbano pouco
denso, se estendendo a partir da periferia, sendo marcado cada vez mais pela segregação sócio
espacial, apresentando: conjuntos habitacionais populares; condomínios horizontais fechados;
favelas; shopping center; hipermercados; e terminal rodoviário. Outros fatores também
marcaram a evolução urbana na atual década, como o Plano Diretor de 2008 e a construção do
Complexo Industrial Logístico Portuário do Açu, conhecido como Porto do Açu, localizado no
município vizinho, São João da Barra (FARIA E POHMANN, 2020).
As autoras destacam também o surgimento de novas centralidades, como é o caso do
Bairro Pelinca e Centro Histórico, assim como o bairro de Goitacazes e o centro comercial
deste, que é tomado como centro. Este último teve um aumento e valorização de sua área devido
à urbanização no acesso ao distrito e de sua avenida principal, “com a retirada dos quiosques,
ampliação de pista, padronização de calçadas, iluminação pública moderna e recuos para os
ônibus são melhorias que incentivam os comerciantes de Campos a fazerem investimentos no
comércio de Goitacazes. ” (FARIA E POHMANN, 2020, p.265).
O Censo 2010, último divulgado pelo IBGE em relação aos Aglomerados Subnormais,
ou seja, às favelas e periferias, contabilizou 27 favelas na cidade, com total de 15777 moradores.
A exclusão de 5 favelas desde o penúltimo censo deu-se pela evolução da renda da população.
Pode-se perceber que a acentuação de favelas/subúrbios na cidade se deu por uma
evolução urbana que visou e ainda visa, em sua maioria, a parcela mais abastada da cidade,
agora considerando as novas centralidades.
Em relação à ocupação urbana do hip-hop na área central do município por uma parcela
menos abastada da sociedade, entende-se pelo conceito de centralidade, que o fácil acesso, os
bens e serviços, assim como o domínio simbológico espacial foram determinantes para a
escolha do espaço. Contudo, tem-se a estigmatização da Ponte Leonel Brizola que abriga o
movimento citado. O “embaixo da ponte”, que na maioria das vezes acarreta em uma
vulnerabilidade social, traz um sentido de centralidade dúbio: mesmo estando no centro, esses
atores sociais e a sua cultura ainda são vistos como suburbanos.
80

4.2 DO INÍCIO DO HIP-HOP EM CAMPOS DOS GOYTACAZES AO SURGIMENTO DA MCR

O ponto inicial da cultura hip-hop na cidade de Campos dos Goytacazes não é preciso e
nem consensual entre os integrantes do movimento de acordo com a bibliografia consultada e
com as entrevistas executados para esta pesquisa.
Em entrevista Ribeiro (2019), Paulo Roberto Gonçalves, Mestre em Políticas Públicas
na UENF e rapper, comentou, segundo suas pesquisas e experiências, que os primeiros indícios
da cultura hip-hop na área central teriam surgido com o graffiti por volta de 2004. Já Victor
Almeida (2021), conhecido por seu nome artístico Lebron Victor, fundador da Nação Basquete
de Rua (NBR), integrante do movimento hip-hop através do basquete, empresário e atual
Diretor de Projetos da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo na atual
gestão, em entrevista a autora desta pesquisa, relata que, mesmo não tendo participado do início
do movimento na cidade, esteve presente em uma nova roupagem da cultura hip-hop no início
dos anos 2000, quando houve uma união entre os elementos, com ocupações no centro.
Almeida (2021) comenta ainda que por volta de 2002, ele se recorda que ocorriam rodas
de rimas em Ururaí e Custodópolis, periferias da cidade. Segundo o entrevistado, a roda de
Ururaí era a mais simbólica e conhecida e que ambas ocorriam há muito mais tempo, não
sabendo precisar uma data. Na Figura 2, pode-se perceber a distância dos bairros para o centro
da cidade, firmando sua tradição como cultura suburbana. Contudo, pontua-se que não há
registros ou documentos que comprovem tais acontecimentos e datas. Devido à escassez de
tempo e a situação pandêmica atual, não houve a possibilidade de procurar atores mais antigos
que pudessem elucidar este histórico inicial.
81

Figura 2 - Localização dos bairros Ururaí e Custodópolis

Fonte: Google Maps, 2021


Pontuando ainda mais a escassez de pesquisas, bibliografias e dados históricos sobre a
cultura hip-hop na cidade, em agosto de 2021, o coletivo de graffiti da cidade intitulado
Lamparones, lançou em sua página no Youtube o documentário, que foi dividido em duas
partes, Linha do Tempo do Graffiti em Campos dos Goytacazes. Segundo a arte educadora,
produtora cultural e membro do coletivo, Anna Franthesca Santos (2021), que também
concedeu entrevista para esta pesquisa, a necessidade do documentário veio quando ela
percebeu em suas pesquisas de especialização e pós-graduação, que a história, da qual ela faz
parte, estava retratada em trabalhos acadêmicos com datas, nomes e conclusões equivocadas.
De acordo com Anderson Santos, mais conhecido por seu nome artístico Andinho Ide
(LINHA, 2021), ele foi o pioneiro do graffite na cidade, dando início no ano de 1998, por meio
do xarpi20. No ano 2000, o mesmo recebeu um serviço na gráfica em que trabalhava, onde o
plano de fundo da imagem era um mural grafitado, iniciando assim uma pesquisa sobre a arte.
Segundo o artista, ele comprou algumas latas de tinta e foi para a rua tentar reproduzir as
imagens. Após esse período, amigos e outros praticantes do xarpi começaram a se unir a ele.
(LINHA, 2021)

20
Codinome do pichador, criado em uma estética própria, com letras estilizadas e sobrepostas (DIÓGENES, 2014)
82

Em 2004, o grupo de três amigos, Andinho Ide, Fabi e Endi 317, criaram o Progressivo
Art Crew. Ainda neste ano, organizaram o primeiro encontro de graffiti da cidade, onde
grafitaram a parede do Condomínio Chácara da Lapa, no bairro da Lapa, ganhando mais adeptos
que se interessaram pelo movimento.
Os artistas comentam no documentário sobre as dificuldades enfrentadas na época,
como a ilegalidade do xarpi, a ausência de recursos e tintas para a prática do graffiti e o pouco
conhecimento desta arte urbana, sendo esses, obrigados a grafitar em áreas pouco visadas no
município (FIGURA 3). De acordo com o grafiteiro Jhony Misterbod: “Tem gente que começou
a pouco tempo e não sabe dessas dificuldades que era, de pintar na rua. A gente tinha que pintar
em beira de valão, em lugar que tivesse muito abandonado, pra tá fazendo o nosso graffiti. ”
(LINHA, 2021).

Figura 3 - Trecho do documentário mostrando os espaços onde os artistas conseguiam grafitar

Fonte: Linha, 2021


Contudo, a crew21 começou a se desenvolver e, em 2005, ganhou reconhecimento no
Serviço Social do Comércio (SESC), com apoio para ações educacionais, culturais e esportivas.
Os grafiteiros ainda conquistaram espaço nas universidades, além de realizar mutirões em
comunidades e oficinas em escolas.
Em relação ao viaduto da Ponte Leonel Brizola, Jhony Misterbod destaca:

A primeira vez que a gente tentou pintar o viaduto, foi em 2007, inclusive tem
esse graffiti até hoje lá. Foi um domingo, um dia com os alunos, apareceu a
guarda, tentou apreender o nosso material. Apreendeu o meu caderno de
desenho, apreendeu tudo, mas a gente tinha conseguido uma autorização pra
tá pintando e conseguiu recuperar né, esse material. Inclusive, os próprios

21
Gangue ou grupo
83

guardas que apreenderam a gente, pediu pra tirar foto do graffiti com a gente.
Então isso também foi uma coisa muito marcante também, acredito que na
história de Campos. Mas depois a gente parou de pintar ali no viaduto né,
voltando só em 2014, a pintar de novo no viaduto, e a voltar a ter de novo a
mesma repressão. Mas aí a gente conseguiu um contato direto com a secretaria
de cultura, e conseguiu uma autorização. Hoje até, o graffiti em campos,
através do viaduto, existe uma autorização, assim, é, existe uma liberação pra
tá fazendo a arte em Campos. (LINHA, 2021, s.p.)

Pode-se concluir, pela fala do grafiteiro, que a repressão sofrida pela arte urbana no
centro da cidade antecede os dias atuais, e que o viaduto (FIGURA 4) foi um importante
instrumento para a mudança neste cenário, através da resistência dos artistas.

Figura 4 - Trecho do documentário mostrando a repressão policial na primeira intervenção do viaduto

Fonte: Linha, 2021


Apesar do hip-hop contar com os quatro elementos já mencionados, pode-se considerar
o skate e o basquete como importantes movimentos que foram incluídos nessa cultura, devido
ao seu caráter urbano, onde as práticas se davam principalmente nas ruas das periferias quando
o movimento hip-hop começava a emergir. Almeida (2021) aponta que a sua relação com o
basquete foi iniciada na escola, quando tinha 11 anos; contudo, ele começou a praticar o esporte
nas ruas, a partir de 2005, por influência de filmes norte americanos, como Space Jam.
84

O Diretor de Projetos cita, como importante início da trajetória do basquete na cidade,


o primeiro Fórum de cultura hip-hop no Norte e Noroeste Fluminense, que segundo ele ocorreu
em 2006 no CIEP Maestro Villa Lobos, localizado no Parque Fundão, em Guarus. Segundo
Almeida (2021), ele teria sido convidado para fazer parte do evento denominado Hip-Hop Inter
Rio, como representante esportivo, para fazer parte da diretoria de esportes radicais e urbanos.
Sobre o evento ele pontua:

O Hip-Hop Inter Rio, eram todos os municípios do Norte e Noroeste


Fluminense e alguns municípios da região Lagos, então era um projeto
maravilhoso, era o objetivo coletivo. Naquela época, coletivo tinha um outro
desenho do que a gente tem hoje, e a gente tinha a pretensão de se tornar uma
ONG, só que assim, acabou se tornando nossa torre de babel e foi nossa
primeira e única experiência de reunir várias lideranças, várias cabeças, vários
atores, até mesmo por uma questão de influência política. A gente tinha
projeto naquela época de se estruturar, de ganhar apelo político, de conseguir,
não necessariamente um projeto de poder, mas conseguir fazer pressão
política, para que os governos enxergassem as nossas pautas, enxergassem as
periferias, enxergassem a nossa população. (ALMEIDA, 2021, s.p.)

Almeida (2021) explica que os atores do projeto acabaram brigando e o fórum foi
extinto. Nesta circunstância, ele decidiu fundar a NBR, ainda em 2006, como um coletivo, com
o intuito de resgatar o que eles queriam atingir com o projeto iniciado. A NBR, segundo ele,
não era apenas um coletivo de basquete, como muitos achavam, ela foi criada com a intenção
de unir os elementos do hip-hop, expor à sociedade a importância da prática social da cultura,
visando a inclusão de jovens periféricos. Em 2009, a NBR foi legalizada como ONG. Em
postagens na página do BlogSpot do ano de 2009, é possível ver a apresentação da organização:

Tivemos oportunidades de conhecer o lado mais crítico de algumas


comunidades (tidas como áreas de risco), e até mesmo o resgate de alguns
jovens que estavam envolvidos com o tráfico. Estes jovens hoje, não
necessariamente seguiram o caminho do basquete, mas por ele, conheceram
outras vertentes da cultura hip hop, e hoje em dia seguem como b-boys (como
são chamados os que dançam break), grafiteiros, e até mesmo jogadores de
basquete que seguiam até bem pouco jogando conosco, deram sequência a
seus estudos e sempre lutando por um futuro, uma vida melhor, e por coisas
que já tinham desistido. (NBRSTREETBALL.BLOGSPOT, 2009, s.p.)

As postagens da ONG comentam sobre o resgate de jovens, o incentivo e a importância


dos estudos, além de projetos sociais realizados em parceria com o SESC e nas comunidades
carentes, como: Baleeira, Parque Nova Brasília, Pecuária e Parque Esplanada.
Ainda em 2009, Almeida (2021) comenta que eles conseguiram realizar o evento Open
Run, que, segundo ele, foi o maior evento de hip-hop que já ocorreu na cidade, acontecendo no
estacionamento do Super Bom da BR, onde hoje se encontra o Shopping Boulevard. O evento
85

reuniu rappers, b.boys, DJs, grafiteiros, além do basquete, capoeira, wheeling22 e BMX23, como
pode-se ver no banner do evento, na Figura 5.

Figura 5 - Banner do evento Open Run

Fonte: NBRSTREETBALL.BLOGSPOT, 2021


De acordo com postagem no Blog da NBR:

Os objetivos desta macro realização, consistiam em primeiro lugar, em trazer


para a população de Campos e região entretenimentos de grande porte, como
já é comum nas metrópoles ao redor do Brasil e do mundo, além de
desmarginalizar a questão da cultura D’RUA, mostrando a beleza e a magia
dos artistas do asfalto (por isso a escolha do estacionamento para o feito), tal
como mostrar que BASQUETE DE RUA, é acima de tudo arma de inclusão
social, resgate da cidadania e assistência social, onde recebemos ao longo do
dia, crianças dos internatos e projetos da Fundação Municipal da Infância e da
Juventude. (NBRSTREETBALL.BLOGSPOT, 2009, s.p.)

Almeida (2021) comentou sobre a dificuldade em organizar o evento, citando que ficou
durante um ano procurando meios para a realização do mesmo (FIGURA 6). Devido a esta

22
Acrobacias com motos
23
Esporte praticado com bicicleta, com inúmeras manobras, conhecido também como Bike Freestyle
86

dificuldade, ele buscou se especializar em Lei Rouanet, captação de recursos e produção de


projetos. O empresário, que iniciou sua formação em design, mas não chegou a concluir,
comenta que sua real formação e aprendizado atual se deram por meio do hip-hop e dos eventos
e ações que queria realizar.
Figura 6 - Evento Open Run

Fonte: NBRSTREETBALL.BLOGSPOT, 2021


Outro evento importante para o empresário foi o Se Liga Aê, realizado em maio de 2013,
na Praça São Salvador, em celebração aos 125 anos da abolição da escravatura, reunindo todos
os elementos do hip-hop, além do basquete e da capoeira, como pode-se ver no banner, na
Figura 7.

Figura 7 - Banner e imagem do evento Se Liga Aê

Fonte: Facebook NBR, 2021


Almeida (2021) ainda comenta a imponência da organização na época, que mantinha
um grupo de 82 pessoas. Outros eventos e parcerias que não foram citados na entrevista, mas
87

puderam ser constatadas na página da NBR na rede social Facebook, foram: Copa de Basquete
de Rua no SESC (FIGURA 8); eventos na quadra do IFF (FIGURA 9); e ações em escolas
municipais (FIGURA 10).

Figura 8 - Banner e imagem de eventos no SESC

Fonte: Facebook NBR, 2021

Figura 9 - Evento no IFF

Fonte: Facebook NBR, 2021


88

Figura 10 - Ações em escolas municipais

Fonte: Facebook NBR, 2021


Já as rodas de rap da cidade, de acordo com entrevistas cedidas por Gonçalves (2019) a
Ribeiro (2019), foram influenciados pelas batalhas de MC do Rio de Janeiro. Os pequenos
grupos periféricos organizaram-se e ocuparam a Praça São Salvador, segundo o rapper e
pesquisador, que já contava com o fluxo de cultura urbana, com skatistas e praticantes de BMX.
Devido a diversos fatores, como fácil acesso por transporte público e uma grande área aberta
com piso liso e resistente em granito, que possibilitava a prática de break, skate e BMX, a praça
tornou-se ideal para esses encontros e atraiu os praticantes do rap.
De acordo com Gonçalves (2019) apud Ribeiro (2019), a ocupação começou a causar
implicância do poder público. A praça, que estava sendo palco do movimento, tinha sido recém-
reformada no ano de 2005, e era considerada um espaço de disputa política, religiosa, urbana,
cultural e comercial. Os praticantes da cultura urbana começaram a fazer manifestações de
resistência com o objetivo de manter o uso do espaço para seus encontros; porém, a guarda
municipal, em uma das represálias, fez um cordão para retirar os manifestantes do local.
Tais expressões culturais no meio urbano carregam muitas vezes, o diálogo e o
confronto com o poder público, onde os manifestantes expressam a insatisfação de um grupo
em relação a gestão urbana e as desigualdades vividas diariamente por meio da arte, o que faz
com que os órgãos públicos se voltem contra as práticas. De acordo com Pallamin (2002):

Em meio aos espaços públicos, as práticas artísticas consistem em


apresentação e representação dos imaginários sociais. Sendo um campo de
indeterminação, a arte urbana adentra a camada das construções simbólicas
dos espaços públicos urbanos, intervindo nos modos diferenciais da produção
89

de seus valores de uso, sua validação ou legitimação, assim como de discursos


e formas sedimentadas de representação cultural ali expostas. Pode criar
situações de visibilidade e presença inéditas, apontar ausências notáveis no
domínio público ou resistências às exclusões aí promovidas, desestabilizar
expectativas e criar novas convivências, abrindo-se a uma miríade de
motivações. (PALLAMIN, 2002, p.57).

Questionado sobre os eventos e repressões da Praça São Salvador, Almeida (2021)


pontua que, além das batalhas de rimas e a prática do skate, também havia um uso intenso de
maconha e depredações ao espaço, o que causaram transtornos com a polícia, que começou a
intervir. Gonçalves (2019) destaca ainda o ponto de vista de Misterbod, skatista e grafiteiro:

[...] proibiram a gente de andar de skate na praça São Salvador tava tendo
muito atrito com a guarda então a gente andava vinha a guarda, a gente parava
voltava no outro dia e andava de novo e fomos insistentes nisso. [...] Ai
falavam para a gente ir para a rodoviária mas estava tendo muito roubo. Aí
falavam para a gente ir para o Jardim São Benetido, andar de Skate no Jardim
São Benedito, porém a galera do basquete, várias vezes rolou treta, quase
rolou briga. Porque o mesmo espaço que a galera joga basquete não dava para
se andar de skate. (MISTERBOD, 2019 apud GONÇALVES, 2019, p.55)

Percebe-se que, para além do conflito com a guarda e/ou a polícia municipal, também
havia um conflito territorial interno entre as linguagens da cultura hip-hop. Neste sentindo,
Gonçalves (2019) dando sequência ao relato de Misterbod, acrescenta que os skatistas da época
se organizaram para dialogar com o poder público para reivindicar a criação de novos espaços
para praticar o esporte, devido à degradação das pistas da cidade.

[...] fizemos uma manifestação pedindo uma pista de skate Plaza, uma pista
Plaza ao estilo pista de rua, tipo uma praça né para skate não transição que já
tinha na rodoviária com padrões de campeonatos de skate no estilo formato
street, então a gente estava fazendo este apelo na época, o Romeu Lins era
secretário de esportes radicais na fundação, esse apelo era diretamente com
ele primeiro [...] através disso tudo teve uma reunião, com o Romeu Lins lá
com o Magno que era presidente da fundação e esportes, então teve uma
reunião, chamou a gente, chamou a galera do basquete também, nós nem
sabíamos porque a galera do basquete estava lá, naquele momento, não
entendi [...] Aí com isso no dia da reunião falaram que fariam uma quadra de
basquete de rua, na qual a gente também poderia andar de skate. É foi isso que
aconteceu e nós também não ficamos satisfeitos com isso porque isso foi um
cala boca, tá ligado, não foi o que a gente pediu, foi um cala boca para a gente
para de encher o saco deles. (MISTERBOD, 2019 apud GONÇALVES, 2019,
p.55)

De acordo com Ribeiro (2019), em 2004, a “Ponte de Rosinha” começou a ser construída
quando Rosângela Barros Assed Matheus de Oliveira Garotinho, conhecida popularmente por
Rosinha Garotinho, Governadora do Estado do Rio a época, propôs a construção da mesma. A
obra tinha como objetivo a ligação viária entre as avenidas Hélio Póvoa, no centro, e Tancredo
90

Neves, em Guarus. O Diário Oficial publicou a liberação de recursos no valor de 42 milhões de


reais feita pelo Conselho Superior do Fundo Estadual de Conservação Ambiental e
Desenvolvimento Urbano (FECAM). Após 8 meses com as obras embargadas, em 2007, a ponte
foi inaugurada com o nome Ponte Rosinha Garotinho, contudo, por ordem do Ministério
Público, devido à Lei 6.454 de 1977, que proíbe a adoção de nomes de pessoas vivas a obras
públicas, a ponte foi renomeada de Ponte Leonel Brizola, ex-governador do estado do Rio.
Almeida (2021) conta que ele foi convidado por secretários da gestão da época, que
tinham como intuito a criação de um projeto que tivesse como referência o Viaduto Negrão de
Lima, conhecido como Viaduto de Madureira, onde ocorre o Baile Charme, que segundo o
próprio site do evento, é “um dos bailes mais antigos do Rio e Janeiro. Sempre com muito
Charme e Hip Hop com os melhores DJs do cenário Black carioca. ” (VIADUTO DE
MADUREIRA, 2021). O viaduto, conhecido como um centro de concentração popular, foi
responsável pela difusão da cultura negra no Estado do Rio de Janeiro, tendo o hip-hop como
protagonista. Os eventos acontecem todos os sábados, e é patrimônio imaterial da cidade.
Segundo o Almeida (2021), após reunião com os gestores, eles traçaram o projeto da
quadra, que foi inaugurada em 2011 com o nome Quadro de Esportes Hugo Oliveira Saldanha
(FIGURA 11), com a proposta de montar um espaço de referência, contudo, ele pontua:

E aí quando inaugura a gente se frustra, em algumas questões, com a gestão


da fundação, e a gente até discutiu muito isso com eles, porque as medidas da
tabela eram horríveis, a quadra ela não foi concebida da forma que ela deveria
ser ocupada, então, de imediato ela se vazia. A galera do basquete não culpa,
se a galera do basquete jogou ali, a galera assim, que eu digo, que movimenta
o basquete, se jogou umas 10 vezes foi muito. (ALMEIDA, 2021, s.p.)
91

Figura 11 - Quadra de Esportes Hugo Oliveira Saldanha

Fonte: Facebook NBR, 2021


Ainda de acordo com Almeida (2021), iniciou-se a ocupação do skate no espaço e de
algumas pessoas que não eram envolvidas de fato com o movimento do basquete de rua, mas
que ocupavam o espaço para jogar. Retomando o relato de Misterbod dado a Gonçalves (2019),
o skatista confirma a ocupação e comenta que no espaço tinha WI-FI e tomada, o que facilitou
outras atividades no local.
Para além da disputa territorial do skate com o basquete, durante as entrevistas efetuadas
para esta pesquisa, foi percebida uma animosidade entre os grupos de skatistas e de dançarinos
de break. O dançarino Jonas24, comenta que o break começou a ocupar o espaço com ensaios
da dança de rua, ficando inclusive com acesso a chave com a qual era trancada a quadra. O
processo de trancar a quadra, segundo o mesmo, não durou muito tempo, devido atritos com os
ocupantes do skate, que brigavam pelo uso do espaço.

24
Nome fictício para guardar o anonimato do entrevistado.
92

Já o skatista Fábio25 comenta que a ocupação do skate foi iniciada junto ao basquete e
que “Teve uma época que trancavam e essa chave ficava na nossa mão também, só que não
durou muito, gente abriu buraco ali e entrava. É um espaço público, não tem como privar a
gente de usar. ” (FÁBIO, 2021, s.p.) De acordo com ele, o primeiro evento da quadra foi feito
pelo grupo do skate, com patrocínio da loja Fluir, que é voltada para a venda de artigos
esportivos urbanos. Contudo, o entrevistado não soube dizer a data do evento, não podendo
comprovar se realmente foi o primeiro a ser realizado neste local.

Figura 12 - Evento de Skate na quadra

Fonte: Acervo pessoal de Fábio, 2021


Além da briga pelo espaço, a quadra passou por um processo de abandono e ausência
de manutenção por parte do poder público, acarretando, assim, na ocupação de pessoas em
situação de rua, que começaram a quebrar os mobiliários urbanos. (ALMEIDA, 2021)
Em entrevista para Ribeiro (2019), Luis Cláudio Ribeiro Silva, conhecido como
Sativamente, comenta sobre o surgimento do Rima Cabrunco, que faz referência à gíria popular
campista. O coletivo, que realizava batalhas de MCs, teve sua primeira roda cultural embaixo
da ponte Leonel Brizola em setembro de 2012, ganhando reconhecimento dos adeptos do hip-
hop (RIBEIRO, 2019). Contudo, Almeida (2021), pontua que o criador do Rima Cabrunco foi
o DJ Dizy Ragga, ou DJ DZ (FIGURA 13), “porque era desossado, porque ele dançava break.
Acredito que hoje ele não toque mais, mas ele é o verdadeiro pai do Rima Cabrunco. O Sativa
foi um dos que ele convocou pra começar. ” (ALMEIDA, 2021, s.p.)

25
Nome fictício para guardar o anonimato do entrevistado.
93

Figura 13 - Capa de CD do DJ Dizy Ragga

Fonte: Facebook NBR, 2021


Almeida (2021) acrescenta que o Rima Cabrunco (FIGURA 14) nasceu para dar outra
voz ao hip-hop na cidade, porque era a batalha do real, ou batalha do conhecimento, segundo o
mesmo, os MCs expressavam a realidade de suas vidas. Questionado sobre a ida da roda cultural
para a ponte, o diretor de projetos aponta que não foi apenas por repressão policial que a batalha
não se deu na Praça São Salvador, mas também por questões ambientais, por referências de
grandes capitais, a exemplo do Viaduto de Madureira, que mantinham suas batalhas embaixo
de viadutos.
94

Figura 14 - Encontro do coletivo Rima Cabrunco

Fonte: Facebook NBR, 2021


Contudo, Almeida (2021) informa que, com o tempo, a batalha começou a se
transformar em batalha de sangue, “Aonde a gente, pouco tempo depois tem um fatídico
episódio, você já deve ter ouvido falar, que o menino deu um tapa na cara de uma menina no
meio de uma roda de rap. ” (ALMEIDA, 2021, s.p.)
Apesar das críticas de Almeida ao rumo tomado pelo Rima Cabrunco, todos os
entrevistados que tiveram contato com as batalhas, comentam sobre a sua importância para o
espaço. Devido à ocupação dos rappers, o Progressivo Art Crew também começou a se
apropriar do espaço, como pode-se ver na Figura 15.

Figura 15 - Quadra grafitada

Fonte: Acervo Pessoal, 2019


95

O coletivo iniciou a ocupação dos pilares, transformando o espaço em uma galeria a céu
aberto. A identidade hip-hop apropriou-se da ponte. Para todos os entrevistados pertencentes à
cultura hip-hop, a área sob o viaduto é tida como palco da cultura urbana, sendo responsável
pela difusão do respectivo movimento na cidade, tornando-se assim, referência da cultura
urbana local. A quadra gradeada é chamada por alguns usuários de jaula cultural. “A cultura ta
presa aqui dentro, nos deram a chave pra entrar e não nos deixam sair” (GONÇALVES, 2019,
s.p. apud Ribeiro, 2021, p. 63).
A partir desse momento, movimentos como o Coletivo Cultural Resistência Goytacá,
Baile Charme e Mutirão de Grafite começaram a ocorrer no espaço. “É um polo onde acontece
tudo, nenhum espaço na cidade tem cultura urbana como nesse espaço aqui” (GONÇALVES,
2019, s.p. apud Ribeiro, 2019, p. 62)
O palco presente hoje na praça foi inaugurado no primeiro festival de graffiti organizado
pela Prefeitura de Campos, através da Fundação Municipal da Infância e da Juventude e da
Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, em 2016. De acordo com Almeida (2021), o
pedido do palco veio de um representante do passinho, em uma das reuniões para organizar o
evento em que ele estava presente, onde este teria alegado que precisava do palco para
apresentações.
O festival contou com a presença de vinte grafiteiros que contaram a história de Campos
no dique do Rio Paraíba do Sul, na Avenida XV de Novembro, entre as Pontes Barcelos Martins
e General Dutra (Figura 16). Teve como tema “História de Campos e Paz”. A festa de
encerramento ocorreu na quadra embaixo da Ponte Leonel Brizola e contou com apresentações
de hip-hop e break.

Figura 16 - Dique do Rio Paraíba do Sul

Fonte: Acervo Pessoal, 2019


96

De acordo com Almeida (2021), o basquete de rua teve seu momento de efervescência
no país entre os anos 2004 e 2008, contudo, em 2010 o movimento acaba perdendo força,
inclusive na cidade de Campos. Segundo o mesmo, hoje em dia não há coletivos de basquete
de rua no município.
O skate, de acordo com Fábio, também já teve apoio do SESC, que promovia eventos,
oficinas e estrutura. O skatista comenta ainda sobre uma pista (FIGURA 17) feita na quadra
abaixo do viaduto:

Um vereador, agora não lembro se era candidato, veio aqui e prometeu uma
pista, junto com um cara que se dizia representar a gente, lá de dentro. Dessa
pista, a gente não teve nem 5% dela, precisou que o IFF finalizasse todo o
projeto. Foi aí que a gente conseguiu alguma coisa aqui embaixo. (FÁBIO,
2021, s.p.)

Figura 17 - Pista de skate na quadra

Fonte: Acervo Pessoal de Fábio, 2021


Já o coletivo Rima Cabrunco, mantinha roda cultural, doações de livros, exposições e
produtos próprios para comercialização no espaço, com intuito de levar conhecimento para os
jovens periféricos. Contudo, começou a se desarticular, devido ao desligamento dos membros
organizadores, como foi o caso de Sativamente. O movimento não contava com apoio do
munícipio e, muitas vezes, sofria repressões de guardas municipais. Devido à necessidade dos
organizadores em buscar formas de se sustentar, eles começaram a sair, o que fez com que o
movimento terminasse. (RIBEIRO, 2019)
97

Com o término do Rima Cabrunco, alguns dos jovens que costumavam participar das
rodas, viram a necessidade de se unir para retomar as batalhas embaixo do viaduto, formando
assim, a Manifestação Cultural de Rimas (MCR) em 2015, como mostra a Figura 18. O coletivo
se mantém até os dias atuais.

Figura 18 - Encontro da MCR

Fonte: Facebook MCR, 2021


O movimento atualmente conta com cinco organizadores, sendo três homens e duas
mulheres. Dois deles deram início ao coletivo junto com o intitulado Mano 10 e mais três
amigos, que não fazem parte do movimento nos dias atuais, contudo, os demais organizadores
ressaltam importância do Mano 10, que segundo eles, alugava a caixa de som com seu próprio
dinheiro para dar continuidade às batalhas.
De acordo com Costa26, um dos organizadores que deu início a MCR, ocorreu um hiato,
que nenhum deles soube precisar, entre o fim do Rima Cabrunco e o início da MCR. Ele
comenta ainda que quando ele foi convidado a se juntar, deu a ideia de fazer em um dia fixo,
ocorrendo assim, todos aos sábados, de 15 em 15 dias. Atualmente, a MCR se tornou semanal,
ocorrendo todas as sextas-feiras as 19h.
Segundo os entrevistados, integrantes e frequentadores do coletivo, o movimento
contava com fluxo intenso de jovens, sendo eles rappers, skatistas, dançarinos de break,
grafiteiros, e DJs, contudo, eles comentam que com o tempo, a MCR foi perdendo
frequentadores. Os dançarinos pararam de frequentar o espaço para seus ensaios, menos
skatistas iam aos encontros para fazer suas manobras, assim como muitos MCs deixaram de
comparecer.

26
Nome fictício para guardar o anonimato do entrevistado.
98

De acordo com as falas coletadas, o motivo do abandono de muitos frequentadores deu-


se principalmente pela ausência de estrutura tanto do movimento, quanto do espaço, como se
pode confirmar pelas falas e pelas imagens do movimento em 2016 e em 2019, na Figura 19.

Se o viaduto tivesse tudo estruturado e tal. Mas rap é coisa de vagabundo, já


é mais difícil alguém entrar. (INTEGRANTE 1, 2021, s.p.)

É o lugar menos iluminado. É um atrativo para as pessoas de rua, e a gente tá


aqui pra ser visto. E parte elétrica, as vezes a gente quer fazer um evento
maior, colocar som e é precário. (INTEGRANTE 2, 2021, s.p.)

A falta de microfone bom, qualidade do som, querendo ou não é


entretenimento né. (INTEGRANTE 3, 2021, s.p.)

[...] Alguns pararam de ir. Não que isso seja culpa das pessoas, porque a gente
também não tem estrutura pra poder oferecer pra esses artistas também, a
gente acaba fazendo por amor, pra não deixar o movimento acabar.
(ORGANIZADOR 1, 2021, s.p.)

Figura 19 - Fluxo de Jovens na MCR em 2016 e em 2019

Fonte: Facebook MCR, 2021 e Acervo Pessoal, 2019


Das imagens, as duas primeiras são do ano de 2016, extraídas do Facebook da MCR, e
as duas últimas retiradas pela pesquisadora em visitas às batalhas no ano de 2019. Entre os
elementos visíveis, pode-se perceber a diminuição do público com o passar dos anos, assim
99

como a precariedade na iluminação. No ano de 2016, os refletores, em ambos os lados,


iluminavam toda a quadra, já em 2019, apenas dois refletores funcionavam, deixando o espaço
mais escuro.
A MCR, segundo a própria organização, nunca teve caixas de som e microfones
próprios. Todas as semanas eles conseguem os aparelhos emprestados, quase sempre com uma
qualidade ruim, causando ruídos e sendo quase que inaudível para o público. A viabilidade
também é posta como um problema a ser enfrentado, pois eles comentam que precisam
percorrer grandes distâncias com a caixa de som na bicicleta ou nas costas, o que muitas vezes
atrasa o movimento.
A tomada que existia na quadra também não funciona. Segundo um dos organizadores,
ele mesmo fez uma conexão com o poste de luz, puxando uma extensão para conseguir ligar a
caixa. Contudo, também relatou que já ocorreu uma explosão na ligação, e de chegar até o local
e não estar funcionando. Nesta última situação, segundo o organizador, uma das pessoas em
situação de rua, que divide o espaço com eles, foi ajuda-los. Em outras conversas, integrantes
comentam que já aconteceu da batalha ocorrer à capela, devido à ausência de som e/ou
eletricidade.
Em relação as pessoas em situação de rua, todos os entrevistados apontaram o cenário
não só como um problema social, mas também em relação ao convívio e a imagem
estigmatizada que acabam dando ao espaço.

As vezes a gente tem que fazer em um dia diferente, hora diferente e é


complicado pedir pra pessoa sair, é um espaço público. Antes era mais difícil
(a ocupação de pessoas em situação de rua), eram mais os jovens, skate, o hip-
hop, hoje o espaço tá dominado, a gente fica triste, com certeza. Mas a gente
não tem direito de pedir pra ninguém sair daqui, eles estão procurando um
lugar pra ficar, um abrigo. [...] As vezes eles não aceitam (dividir o espaço), e
a gente tenta entrar em um acordo com eles. Já tivemos problemas algumas
vezes, não foram poucas. Já gerou problemas bem difíceis. (INTEGRANTE
2, 2021, s.p.)

Entre os problemas apontados, um dos organizadores contou que em uma das tentativas
de dividir o espaço, uma pessoa em situação de rua ameaçou com uma faca a sua namorada,
que também faz parte da organização. Além disso, ele desabafou sobre eles próprios terem que
limpar o espaço, devido ao mal odor e fezes que essas pessoas deixam no local. Ademais,
acrescentam ainda a degradação do local, onde esses ocupantes cortaram as grades, quebraram
os bancos, o piso e os refletores. De acordo com um dos organizadores, em uma situação onde
eles pediram intervenção do município em relação a esses sujeitos, a guarda teria chegado com
jato d’água para expulsá-los. Dias depois eles teriam retornado à ocupação.
100

Pode-se concluir que a ausência do poder público na manutenção do espaço, além da


ausência de políticas públicas eficazes para abrigar essas pessoas em condições precárias seja
socioeconomicamente ou pelos problemas de dependência química, e reinseri-las na sociedade,
é um ponto crítico crucial que precisa ser revisto.
Sobre a saída do break do viaduto, Pedro27, dançarino que fazia parte do grupo que
dividia o espaço com os rappers e skatistas comentou que eles ficaram por 5 anos coexistindo
no local, sendo que no início eles contavam com 15 integrantes, que foram se dissipando e
saindo da cidade em busca de oportunidades na dança, o que o município não proporciona,
segundo o mesmo. De acordo com ele, 3 pessoas restaram e frequentavam a MCR, contudo, os
problemas com os skatistas retomaram.

A gente tinha muita ligação com uma rima, quando eles chegaram aqui a gente
tinha combinado com eles que como a gente dividia o espaço, a gente dançava
nos intervalos das batalhas, fazia rodinha de dança, e aí quando acabava a
batalha a galera toda da rima ficava toda sentado aqui em volta enquanto a
gente estava ensaiando. [...] A gente começou a ter alguns problemas. As
pessoas que andavam de skate aqui, não curtiram a gente vir aqui dançar, aí
ameaçavam a gente, tacavam o skate na gente. Eu morava em Guarus nessa
época e eu ia andando, porque eu morava logo ali do outro lado. E aí teve uma
época que 15 skatistas vinham atrás de mim. E aí vinha um andando atrás, na
ponte, querendo me colocar medo. E tudo isso era porque a gente dividia o
mesmo espaço. E aí quando começou a ter esses problemas assim, a gente
pegou e deixou de vir pra cá. (PEDRO, 2021, s.p.)

Um dos organizadores alegou que se recorda de uma briga entre os grupos, onde um
skatista teria achado ruim um dançarino olhar para ele. Segundo o organizador, ele teve que
intervir e pedir para que os dançarinos saíssem, porque estavam em menor número e não queria
que ninguém se machucasse. Questionado sobre o que ele achava que causava a animosidade,
o dançarino alega que provavelmente o territorialismo e a homofobia.

Teve até um dia, que um deles quis arranjar problema com um de nós. Um
amigo meu parou de frente pra galera, pra ver como estava a coreografia, aí o
moleque tava sentado aqui pra traz, começou a perguntar ‘porque você tá me
encarando? ‘ E aí começou a dar aquele bolo, e começou a taxar o cara de
viadinho, e deu um bolo doido. Depois desse dia, a gente até tentou vir uma
vez, a gente veio em um dia que ia ter roda de rima, aí eles estavam com o
grupo que ofendeu meu amigo, aí eles quiseram ameaçar. Aí a gente pensou
‘mano, vamos parar de ir pra lá, porque daqui a pouco vai ficar mal falado pra
caramba o lugar por causa de briga, e vão dizer que a culpa é nossa’. (PEDRO,
2021, s.p.)

27
Nome fictício para guardar o anonimato do entrevistado.
101

Questionado sobre a situação com os dançarinos, o skatista entrevistado falou que não
tinha conhecimento de nenhuma briga no espaço e comentou que os dançarinos nunca ajudaram
o movimento. “Tinha um grupo que vinha pra cá e dominava e fazia a dança deles, mas questão
de movimentar, nunca movimentaram. Sempre chegaram, mas não agregavam. ” (FÁBIO,
2021, s.p.) Apesar de falar que não há rixa com os dançarinos, percebe-se certo incômodo por
parte do skatista. “Não existe rivalidade, existe realidade. Não é que a gente tem repúdio, eu
quero é que eles venham, mas tem que ser justo, quem faz e quem não faz. ” (FÁBIO, 2021,
s.p.)
Outra questão levantada pela autora deste projeto é a pouca presença de figuras
femininas. Os integrantes entrevistados responderam que era realmente um problema, mas
aparentaram nunca ter pensado muito sobre o assunto, falando que todo o público é bem
acolhido. Contudo, a DJ residente, que faz parte da organização, comenta que no início houve
um estranhamento por ela ser mulher, o que causava desconforto.

[...] os meninos que chegavam, pra rimar, os MCs, meio que me estranhavam
assim, não sei se essa a palavra certa, mas as vezes chegavam, e
cumprimentavam os meninos e ficavam sem jeito de me cumprimentar. Ou se
pensava às vezes, se devia me cumprimentar ou não, aí não me
cumprimentava. Aí rolava essa parada assim “quem é essa garota? ”.
(ORGABIZADOR 2, 2021, s.p.)

Apesar desse estranhamento inicial, a DJ comenta que com o tempo eles começaram a
se sentir à vontade com sua presença. Os outros organizadores declaram ainda que a entrada da
DJ teria mudado completamente a batalha, por ela começar a levantar questões de machismos
nas rimas dos MCs.

Aí rolou tipo, deu chegar pro (Organizador) e falar ‘esses moleque estão
rimando umas parada nada ver, e vocês estão rindo à beça aqui, nós da
organização ‘. A reação da plateia é isso, a gente não tem o que fazer, mas a
gente, enquanto organização, tem que ter uma postura, porque perante
algumas paradas. Aí eu chegava junto pra conversar com os meninos, aí a
(Organizadora 2) colocava mais pilha comigo. Aí a gente começou a ter uma
outra postura em relação a isso, dependendo da rima ‘por que você está
falando da tia do maluco? Não é você e ele? Porque está colocando a mãe, a
irmã no meio? ‘ (ORGABIZADOR 2, 2021, s.p.)

Os próprios integrantes que foram entrevistados comentaram sobre a importância da DJ


na organização e que a sua figura seria a mais forte e respeitada.
Mesmo com todos os problemas estruturais do movimento e do espaço, além das brigas
internas, os participantes de todas as linguagens do hip-hop falam do local com pertencimento.
102

Rapaz, esse espaço aqui é da gente, do hip-hop em geral, porque esse espaço
é desde o Rima Cabrunco, desde a época do Sativamente, do Graveto, a galera
que é referência já passou por aqui. Grafiteiro, Misterbod, skatista, então, é
mais do que merecido a gente ter esse local, porque senão fica isso aí que
vocês estão vendo, abandonado, morador de rua, falta de segurança, e não é
isso que a gente quer, a gente quer cultura, desenvolvimento urbano e muita
arte pra favela e pro centro também. (INTEGRANTE 4, 2021, s.p.)

Aqui é foco do hip-hop na cidade. (INTEGRANTE 1, 2021, s.p.)

É um espaço totalmente de acolhimento, o movimento hip-hop trouxe isso pra


esse espaço, é só você olhar em volta. Tudo aqui é intervenção nossa, para
além da quadra, até a tomada, pra conseguir ter a batalha. (INTEGRANTE 3,
2021, s.p.)

Pode-se perceber, que mesmo com todos os problemas enfrentados e a diminuição do


público, muitos dos integrantes veem na batalha um ponto de refúgio, em que eles podem
expressar sua arte e falar sobre as realidades cotidianas por meio da música.
Contudo, diante da pandemia do novo coronavírus, que teve seu primeiro caso
confirmado na cidade no dia 23 de março de 2020 (PORTAL OFICIAL DA PREFEITURA
MUNICIPAL DE CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2020), o mundo se viu obrigado a praticar
o isolamento social a fim de diminuir o contágio da doença; assim, os interlocutores da cultura
urbana ficaram sem seu espaço de fala.
Os organizadores comentam que, devido a muitos integrantes não terem acesso direto a
internet, a continuidade do movimento não foi possível por vias virtuais. Assim, a última
ocupação do coletivo no viaduto se deu em março de 2020, completando quase 2 anos de
ausência.
A consequência da saída do movimento está estampada no espaço, que hoje se encontra
com um número muito maior de pessoas em situação de rua, sem nenhuma iluminação, sujo e
abandonado, sofrendo ainda mais com a falta de manutenção, como pode-se perceber na Figura
20.
103

Figura 20 - A quadra no ano de 2021

Fonte: Acervo Pessoal, 2021


Neste sentido, pode-se trazer Lefebvre (2001) que defende que a transformação da
cidade deve ser protagonizada pelo coletivo e o espaço público deve acomodar a diversidade
de atividades do cotidiano, dentre eles: trabalho, descanso, cultura, conhecimento, lazer, ócio,
troca, comércios etc. De acordo com o autor, a luta pelos espaços pode vir através da arte, de
atividades lúdicas comunitárias, festas e jogos no espaço público.
Jacobs (2000) também afirma que a pluralidade de usos é de extrema importância para
o sucesso do planejamento urbano. A autora coloca as ruas e as calçadas como órgãos vitais de
uma cidade, defendendo que estas devem ser amplas e de fácil acesso, pois a integração e a
convivência da sociedade se se dão a partir de seu uso e ocupação pelas pessoas. Ela defende
que o planejamento urbano requer uma análise macro e microurbana detalhada, buscando
sempre a percepção de como funciona a cidade e as necessidades mais urgentes da população.
Para Lerner (2003, p.46), “Quanto mais se entender a cidade como integração de
funções, de renda, de idade, mais encontro, mais vida ela terá”, com isso, se compreende que a
pluralidade no meio urbano, defendida também por Jacobs (1961), tem grande importância para
a vivacidade deste. Percebe-se, neste sentido, que o movimento cultural que se dava no espaço
é de extrema importância para a requalificação deste. Contudo, são necessárias intervenções
tanto no espaço, quanto na estrutura da organização, buscando também o diálogo com outras
culturas e com os órgãos responsáveis por este setor na cidade.
104

4.3 O HIP-HOP COMO FERRAMENTA DE PARTICIPAÇÃO PARA OS GRUPOS MARGINALIZADOS


DE CAMPOS DOS GOYTACAZES

Na intenção de introduzir o leitor, a princípio o tópico abordará brevemente os principais


instrumentos de gestão cultural do município. De acordo com Soares (2015), apesar de no
município já ter existido uma secretaria exclusiva para o setor de cultura, esta foi extinta e
incorporada à Secretaria de Educação, Cultura e Esporte. No entanto, hoje tem-se a Secretaria
Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia, a Fundação Municipal de Esportes e a Fundação
Cultural Jornalista Oswaldo Lima. Atualmente, a gestão e realização de políticas culturais
concentram-se na Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima (FCJOL).
A FCJOL, segundo Prosas (2021) foi fundado em 1978, com o intuito de gerir a cultura
no município. Atualmente, cabe a fundação: planejar, executar e acompanhar a política cultural;
mapear, difundir e reforçar a identidade cultural; desenvolver atividades de preservação do
patrimônio histórico cultural e artístico no âmbito municipal; promover a realização de eventos
e festejos populares culturalmente significativos; realizar atividades de incentivo ao folclore e
todas as formas de cultura popular; desempenhar ações de apoio às artes nos estágios de
formação, fomento e fruição; implantar a política de qualificação profissional na área artístico-
cultural; desenvolver estudos, projetos, propostas de trabalho que reforcem o turismo cultural
no Município; implantar a política de incentivos fiscais para financiamento de projetos culturais
no Município, atendendo à demanda dos artistas, empreendedores e produtores culturais;
atender e orientar todos que busquem informações referentes às intervenções a cargo da
Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima - FCJOL; exercer outras atividades previstas em
lei específica ou regulamento; realização de outras atividades correlatas.
Nesta breve introdução, vale ressaltar um feito importante para a cultura municipal, que
foi a 1ª Conferência Municipal de Cultura, realizada em 2006, após nove meses da 1ª
Conferência Nacional de Cultura. O evento que durou três dias, de acordo com Soares (2015),
foi o primeiro com caráter democrático participativo em relação as políticas culturais no
município. Entre os objetivos da conferência, estavam: contribuir na implantação do Sistema
Municipal de Cultura; elaborar um documento para orientação da formulação de políticas,
programas e projetos; fortalecer, ampliar e diversificar o acesso da sociedade civil aos
mecanismos de participação popular; propor a reestruturação do Conselho Municipal de Cultura
adequando-o à legislação vigente; entre outros (SOARES, 2015, p.78).
Ainda de acordo com Soares (2015), o maior destaque da conferência deu-se pela
retomada do Conselho Municipal de Cultura de Campos dos Goytacazes (COMCULTURA),
105

um órgão colegiado deliberativo e paritário, que passou a integrar a estrutura da FCJOL. O


conselho tem, como principais competências, propor e formular políticas públicas, assim como,
promover o diálogo entre o governo e a sociedade civil. Apesar do feito, segundo Soares (2015),
a composição dos membros foi nomeada apenas três anos após a realização da primeira
conferência.
Segundo a Lei nº 9.065, que institui o Plano Municipal de Cultura de Campos dos
Goytacazes (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021), o primeiro Conselho Municipal de
Cultura foi criado no ano de 1979, durante a ditadura militar, com a função de construir o
primeiro Plano de Cultura do município. A sua composição se deu por membros especializados.
Nesta fase, o Conselho mantinha o papel consultivo e de assessoria técnica. Com a
redemocratização do país, durante os anos de 1980, os Conselhos passaram a ser mais
democráticos e participativos, contudo, na cidade de Campos dos Goytacazes, a estrutura
permaneceu centralizada com a gestão pública, não havendo destaque da participação popular.
Já a 2ª Conferência Municipal de Cultura, que veio a ocorrer em setembro de 2012, seis
anos após a primeira, de acordo com Soares (2015), a novidade da conferência foi a inserção
do diagnóstico para o Plano de Cultura Municipal, não havendo avanços, nem continuidades
em relação a primeira conferência. Contudo, nesta, a eleição dos membros da sociedade civil
foi efetuada um mês após a realização da Conferência.
O COMCULTURA se divide em duas instâncias, sendo elas: o Plenário e Comissões
Temáticas e/ou Grupos de Trabalho. Ao plenário cabe a análise, aprovação de moções,
proposições e avaliação de execução de metas pertinentes ao Plano, Fundo e Sistema Municipal
de Cultura, assim como revisões e adequações. Apesar de, a princípio, a presidência do conselho
ser ocupada pela presidência da FCJOL, o que deixava a sociedade civil fora da liderança,
impondo assim que a gestão pública coordenasse e determinasse as decisões do
COMCULTURA, atualmente o modelo de gestão se dá com os dois primeiros anos de gestão
do governo com a presidência da FCJOL na presidência do conselho, e nos dois anos
subsequentes há a escolha de um representante e vice da sociedade civil para este cargo,
tornando assim, a gestão mais democrática e paritária (SOARES, 2015). Sendo assim, em 2019,
foi eleito pela primeira vez um membro da sociedade civil para a presidência, o professor e
historiador Marcelo Sampaio, e como seu vice, o advogado, graduando em letras e poeta,
Ronaldo Júnior.
Em relação às comissões temáticas ou grupos de trabalho, são parte integrante os
representantes do poder público e da sociedade civil. Tais representantes, denominados
conselheiros, tem mandato de dois anos, devendo fazer parte das reuniões ordinárias quinzenais,
106

e das reuniões extraordinárias, quando convocadas. A função dos conselheiros da sociedade


civil tem grande importância participativa e de interesse público, uma vez que cabem a eles,
também, o fornecimento de subsídios para as tomadas de decisão sobre as temáticas
relacionadas a cultura. Junto a isso, une-se a exigência de quórum para que as sessões sejam
consideradas deliberativas. Ronaldo Júnior, ex vice-presidente do COMCULTURA e atual
suplente da câmara de literatura, pontua a ordem democrática do conselho em entrevista para
esta pesquisa:

O COMCULTURA, assim como qualquer conselho, ele é fruto do estado


democrático de direito, porque ele parte do pressuposto de que, o político, o
gestor, ele não toma decisões sozinho, ele toma decisões a partir do conselho
gestor, do colegiado, uma série de questões. Daí o fato do COMCULTURA
ser um órgão paritário, ele é vinculado, mas não é da prefeitura, é órgão
consultivo. (JÚNIOR, 2021, s.p)

Soares (2015) acrescenta outro ponto importante do conselho: a abertura para que a
comunidade, ou seja, qualquer pessoa da sociedade pode participar e apresentar demandas, por
intermédio de um conselheiro. Júnior (2021) afirma que é por meio dessa dinâmica ser possível
levar à discussão, os diversos setores da cultura: “[...] eu sou do meio, então conheço algumas
pessoas, conheço a área. A intenção é que eu procure as pessoas pra elas explicarem as
demandas e a gente levar a discussão. ” (JÚNIOR, 2021, s.p.).
Desta forma, o COMCULTURA é composto por 24 câmaras técnicas, sendo elas 12 da
sociedade civil com as câmaras: Artes Urbanas; Artes Visuais; Audiovisual; Cultura Popular;
Coletivos Culturais; Dança; Gestão Cultural; Instituições de Ensino Superior; Literatura;
Música; Patrimônio Histórico; e Teatro. Além de 12 câmaras do poder público municipal, onde
os representantes e seus suplentes são indicações do poder público, sendo as câmaras: Fundação
Cultural Jornalista Oswaldo Lima; Sistema Municipal de Cultura; Sistema Municipal de
Bibliotecas; Arquivo Público Municipal "Waldir Pinto de Carvalho"; Teatro Trianon; Museu
Histórico de Campos dos Goytacazes; Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia;
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Turismo; Secretaria de
Desenvolvimento Humano e Social; Subsecretaria de Igualdade Racial e Direitos Humanos;
Procuradoria Geral do Município; e Câmara Municipal de Campos dos Goytacazes.
A VII e última Conferência Municipal de Cultura, realizada em 2021, foi efetuada de
forma virtual, em decorrência da pandemia. Na conferência, puderam se inscrever
representantes da cultura em três categorias: como eleitores, candidatos ou observadores. Os
interessados deveriam escolher uma das Câmaras Temáticas para participar, anexando
documento de identificação pessoal e comprovante de residência no município.
107

O Plano Municipal de Cultura de Campos dos Goytacazes, incluído nos objetivos da


segunda conferência de cultura em 2012 citado anteriormente, foi sancionado em maio de 2021.
O instrumento de planejamento e gestão visa orientar as políticas públicas culturais no
município nos próximos 10 anos. De acordo com a Lei nº 9.065, de 31 de maio de 2021, que
institui o Plano Municipal de Cultura de Campos dos Goytacazes, o COMCULTURA, que foi
responsável por sua elaboração, em conjunto com a FCJOL, devem acompanhar e
operacionalizar o monitoramento do plano, bem como a sua atualização nos anos de 2025 e
2029.
De acordo com a introdução da Lei nº 9.065, o documento foi elaborado mais
profundamente a partir de 2020, por um Grupo de Trabalho composto por seis conselheiros do
COMCULTURA, sendo eles três do poder público e três da sociedade civil. Contudo, de acordo
com Júnior (2021), o plano já estava sendo planejado pelos conselheiros ao que antecede esta
data.

O Plano, ele já um anseio do COMCULTURA desde antes de eu entrar no


conselho, e eu não vou saber nem precisar o momento disso, porque quando
eu entrei só pra você ter uma noção, quando eu entrei foram passados vários
tópicos pra mim já falando do Plano de Cultura. [...] Várias demandas
individuais e coletivas, e cada câmara tinha suas demandas ali anotadas desde
muito tempo. (JÚNIOR, 2021, s.p.)

Sobre a participação popular, a introdução da Lei nº 9.065 cita que “após efetivação de
consulta pública realizada pela página virtual do próprio Conselho, por 10 (dez) dias, obtendo
a colaboração de cerca de 25 (vinte e cinco) propostas de complementação ao texto apresentado
para análise pública. ” (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021). Ao decorrer deste trabalho,
houve o acompanhamento da pesquisadora durante as fases finais do plano, incluindo a consulta
popular. De acordo com a Figura 21 e com as falas dos conselheiros entrevistados, a consulta
pública, devido a pandemia, se deu de forma virtual, assim como a divulgação desta, que se deu
principalmente por meio das redes sociais do COMCULTURA e de coletivos e fazedores de
cultura mais ligados ao conselho.
108

Figura 21 - Publicação da consulta pública no Instagram do COMCULTURA

Fonte: Instagram COMCULTURA, 2021


No entanto, não foram encontradas informações no banner de chamada, nem na legenda
das postagens, ou no próprio link, que levava à consulta pública no site do Google Docs. No
site, eram solicitados o endereço de e-mail e nome completo para dar seguimento. Logo após,
encontrava-se a minuta do plano na íntegra e, nas metas e ações a opção de resposta, não havia
em nenhuma página, indicações do que deveria ser feito, como pode-se ver na Figura 22.
109

Figura 22 - Consulta Pública para o Plano Municipal de Cultura

Fonte: Google Docs, 2020


Questionada em entrevista para esta pesquisa sobre a consulta popular, Kátia Macabu
Soares, Presidente do Fórum Regional de Cultura e relatora do plano, explicou: “Então, o que
a gente fez, a gente jogou o plano, pra que a pessoa lesse e no próprio Google Docs, que foi a
forma mais fácil que a gente achou, pra que a pessoa pudesse fazer sua sugestão. ” (SOARES,
2021). Júnior (2021) acrescentou que:

O que aconteceu ali foi o seguinte, o plano, a sua redação, já estava em


andamento. Essa redação final, acredite, foi feita ao longo de um ano inteiro
praticamente. A gente tem diversas reuniões ordinárias e extraordinárias pra
chegar a redação final. E aí a gente pegou o texto do plano, se não me engano
já encaminhado pro final, depois dos cadastramentos, das demandas que já
haviam sido colocadas pelo conselho, e ai abriram essa plataforma, e a
intenção era buscar algo que não estava ali, detalhes. E aí era pra isso, pra
pessoa falar o que tava faltando, o que tinha que alterar, mas não tiveram
muitas alterações. Mas entendo que seja excludente, porque a leitura de um
texto de lei, infelizmente é feito pra ser excludente, é feito pra nem todo
mundo entender. Porque tem um rigor, desde um rigor gramatical, até um rigor
burocrático, pra você estruturar essa legislação. [...] Tudo isso contribui pra
menos pessoas participarem. Mas a participação se faz na reunião, pelos
conselheiros. (JÚNIOR, 2021, s.p)

Júnior acrescenta ainda que a principal consulta e participação popular foi feita por
intermédio dos conselheiros que captaram as demandas de suas devidas câmaras durante os
anos e levaram para a construção do instrumento. Contudo, questionados sobre o
110

COMCULTURA, sobre o Plano de Cultura e a Consulta Pública, os membros da organização


da MCR e os integrantes do coletivo alegaram que não tinham conhecimento do conselho e que
não sabiam do se tratava o plano.
Soares e Júnior (2021) afirmaram que infelizmente o COMCULTURA ainda não
consegue chegar a todos os atores culturais, mas que esta tem sido uma luta intensa do conselho
“Daí o fato de diversas vezes, diversos conselheiros saíram pra fazer pesquisa, nas
comunidades, de religiosidades especificas. Por diversas vezes a gente conseguiu acessar essas
camadas mais profundas.” (JÚNIOR, 2021, s.p.). No texto da lei, também é abordada a coleta
de dados:

As estratégias de trabalho começaram há cerca de um ano, após ter sido feita


a coleta de dados durante a realização de seis conferências de cultura ocorridas
nos anos de 2006, 2012, 2014, 2016 e 2018. (CAMPOS DOS
GOYTACAZES, 2021, s.p.)

Apesar disso, de acordo com Soares (2021), a arte urbana teria sido incluída no plano.
A presidente do fórum acrescenta ainda o fato de haver uma câmara específica para este público,
conquistada há pouco tempo, mas que apenas uma pessoa se candidatou na última conferência.
“Precisa haver uma conexão mais próxima com o poder público. [...] Por mais que a gente esteja
perto, a dialogar, por mais que o poder público possa criar alternativas, eu vejo que o trabalho
tenha que ser feito da forma que você está fazendo, indo até eles. “ (SOARES, 2021, s.p.)
A presidente acrescenta que o único elemento do hip-hop presente nas discussões e lutas
do COMCULTURA, é o graffiti. Percebeu-se nas entrevistas que a forte atuação do graffiti se
dá devido a produtora cultural e integrante do movimento, Anna Franthesca, entender a
necessidade de participação dos grupos não só nos editais, mas também nas discussões sobre
política pública cultural no município. Anderson Santos, conhecido como Andinho, marido de
Anna e grafiteiro, que também foi entrevistado, acrescentou ao tema:

A galera tem que ir aos conselhos, tem que conhecer as pessoas, saber qual o
contexto, pra depois brigar. [...] Pra galera é preciso, porque numa hora que
eles precisarem brigar, as pessoas tem que saber quem são eles pra ver com o
que que eles estão lidando. (SANTOS, 2021, s.p.)

Apesar da forte atuação do graffiti pelos dois atores mencionados, o atual conselheiro,
também grafiteiro e um dos fundadores do coletivo Lamparones, David Montezuma, conhecido
como Dom, não foi identificado em nenhuma das reuniões presenciadas pela pesquisadora no
ano de 2021. Questionado em entrevista concedida para este trabalho, o conselheiro comentou
sobre a ausência:
111

Com esse lance de reuniões pela internet, eu não me adaptei muito ainda, não
tive muito acesso. Mas eu tenho trocado ideias com as pessoas próximas do
conselho que eu tenho afinidade, que é o Fabrício, a Clarissa, então, eu tenho
buscado trocar ideias e apresentando ideias. Eu basicamente não interagi nas
lives pra não tomar tempo, as pessoas já tem tipo um roteiro, de fala, a gente
não consegue todo mundo falar ao mesmo tempo, se não vai tornar uma parada
muito grande, entendeu? (MONTEZUMA, 2021, s.p.)

Apesar da explicação do grafiteiro, tanto os conselheiros entrevistados, quanto os


integrantes do graffiti já citados, afirmaram que a ausência é negativa para a Câmara de Artes
Urbanas, que não tem um representante presente durante as discussões do conselho.
Durante a entrevista com a pesquisadora, contudo, o conselheiro se disponibilizou a
encontrar o coletivo MCR. A reunião foi feita no dia 04 de agosto, por intermédio da autora
deste trabalho. Entre os assuntos discutidos, o coletivo pontuou principalmente a dificuldade
com a estrutura do espaço, a ausência de manutenção e a ocupação por pessoas em situação de
rua no local. Apesar da reunião, com diversas trocas de ideias, entre elas, eventos que pudessem
reunir os elementos do hip-hop e mutirão para requalificar o espaço, o único contato que se
manteve, foi um grupo de whatsapp com o conselheiro, o principal organizador da MCR e a
pesquisadora deste trabalho. O grupo criado foi ideia do conselheiro, para que, após uma
segunda reunião, que incluísse integrantes de outras vertentes do hip-hop, para apresentar e
discutir ideias em conjunto, esses fossem adicionados ao grupo para que servisse de ponte direta
com o conselho. Contudo, a segunda reunião não foi marcada até a data em que este texto foi
redigido.
Outra questão importante a ser ressaltada, foi a implementação da Lei Aldir Blanc no
município. A Lei nº 14.017/2020, já abordada no capítulo anterior, visou estabelecer
mecanismos e critérios para a garantia de apoio aos trabalhadores da área cultural, além da
manutenção de espaços culturais que tiveram suas atividades interrompidas devido a pandemia.
O repasse da União, de acordo com a Confederação Nacional de Municípios (CNM) (2020), foi
de R$ 3.086.366,01 para atender ao município de Campos dos Goytacazes.
Para a distribuição dos recursos, o Fundo Municipal de Cultura (FunCultura), lançou
três editais. O primeiro visou a ajuda financeira para manutenção de espaços artísticos e
culturais de pessoas jurídicas, que possuíssem CNPJ/MEI, e entidades culturais, pessoas físicas,
sem CNPJ/MEI, que tiveram que interromper suas atividades devido as medidas de isolamento
físico decretadas durante a pandemia. Neste edital, de acordo com o site oficial da prefeitura,
25 entidades culturais cadastradas no Cadastro Municipal de Entidades de Natureza Cultura
(CEC) foram contempladas com valores que variaram de R$ 9 mil a R$30 mil, divididos em
três parcelas.
112

O segundo edital foi destinado a Produção de Bens e Atividades Artístico-Culturais. O


objetivo do edital foi promover a divulgação virtual dos agentes culturais, com a realização de
lives em redes sociais e publicações em outras plataformas digitais. De acordo com o site oficial
da prefeitura, das 134 entidades culturais cadastradas no CEC, 27 se inscreveram e 25 foram
selecionadas, tendo em vista que preencheram os requisitos exigidos no edital.
Já o terceiro edital buscou premiar entidades locais de alta relevância histórica, cultural,
social e humana, tendo como alvo Pessoas Jurídicas de Direito Privado e Entidades Culturais
sem CNPJ/MEI. Foram inscritas 54 entidades, tendo sido selecionadas 49. Os prêmios foram
divididos em três categorias, de acordo com o site da prefeitura, sendo que a primeira
contemplou 16 entidades culturais com R$ 50 mil cada, a segunda beneficiou 25 entidades com
R$ 22.345 cada e a terceira destinou a oito entidades R$ 14.050 cada uma.
Neste contexto, 98 agentes e entidades culturais foram beneficiadas pelos três editais da
Lei de Emergência Cultural no município. De acordo com o conselheiro da Câmara Técnica e
tesoureiro do FunCultura na época, Fabrício Simões, em entrevista para o site oficial da
prefeitura, o Comitê Gestor do Fundo teria homologado o cadastro de aproximadamente 500
artistas e entidades culturais. Dos R$ 3.089.409,03 disponibilizados, foram repassados apenas
R$ 2.212.820,00, “O número de beneficiados em Campos poderia ter sido ainda maior, se mais
agentes culturais locais tivessem se cadastrado, conforme exigência da própria lei. Os editais
foram amplamente divulgados” (Fabrício Simões apud PORTAL OFICIAL DA PREFEITURA
MUNICIPAL DE CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2020, s.p.)
Não obstante, apesar da fala do tesoureiro, o que se percebeu nesta pesquisa foi o
contrário. O coletivo MCR, por meio da autora deste trabalho, fez o cadastramento do grupo
pelo Centro de Informações e Dados de Campos (CIDAC), porém, devido à pouca divulgação
nos lançamentos dos editais, o coletivo não conseguiu participar de nenhum deles. Para
comprovar tal ausência nas divulgações, foi feita uma investigação nas redes sociais do
COMCULTURA, da FCJOL e da Prefeitura de Campos dos Goytacazes, tendo sido encontrada
apenas uma publicação, em relação ao segundo edital, somente no Facebook do
COMCULTURA, conforme mostra a Figura 23.
113

Figura 23 - Divulgação da Lei Aldir Blanc em 2020

Fonte: Facebook COMCULTURA, 2021


O recurso restante no valor de R$ 874.484,63 foi transferido para o Estado. Contudo, o
decreto publicado no Diário Oficial da União (nº 10.751/2021), modificou a regulamentação da
lei, o que permitiu que os municípios que fizeram a devolução de valores remanescentes,
pudessem solicitar a retomada do dinheiro. Com isso, em outubro de 2021, foram lançados mais
3 editais para destinar esses recursos a classe artística.
O primeiro edital visa selecionar bens e/ou produtos culturais para compor o acervo
cultural do município, a estimativa é que este contemple 74 fazedores de cultura ou entidades,
com valores de R$ 800,00 a R$ 8.000,00. O segundo edital pretende selecionar projetos
culturais que possam ser exibidos de forma online ou híbrida. Espera-se contemplar 33 artistas
com valores de R$ 4.000,00 e R$ 9.000,00. Já o terceiro edital, visa viabilizar a compra de
insumos culturais pelos selecionados, esperando contemplar 28 artistas com o valor de R$
4.000,00. Tais editais, ainda estão abertos enquanto este texto é redigido, contudo, percebe-se
que a gestão está muito mais empenhada em divulgar e esclarecer os assuntos que os envolvem,
como se pode perceber pela Figura 24, que mostra a página do Instagram da FCJOL.
114

Figura 24 - Divulgação da Lei Aldir Blanc para a distribuição de recursos remanescentes em 2021

Fonte: Instagram FCJOL, 2021


Além da melhoria na divulgação dos editais, outra medida importante foi tomada: o
oferecimento gratuito de um curso básico com o intuito de capacitar os fazedores culturais. O
curso de dois dias foi realizado presencialmente nos dias 17 e 18 de outubro de 2021, no Teatro
Municipal Trianon, e visou preparar os artistas para os editais da Lei Aldir Blanc. De acordo
com postagem no Instagram da FCJOL, mais de 300 fazedores de cultura participaram do curso.
Sobre a capacitação dos fazedores culturais, Santos (2021) ressalta:

E aí é outra briga, porque não temos artistas capacitados para fazer editais, não
temos. Na lei Aldir Blanc que todo mundo que falou ‘A’ ganhou. Isso é um
absurdo. Eu estudei pra cacete, pra pegar R$20.000 e dividir pra 10 artistas e
cada um ganhar R$1000,00 e ver um cara que fez um projeto bosta e ganhou
115

R$20.000, pra mim isso é uma ofensa, porque eu acho que se a pessoa quer
captar, ela tem que estudar. (SANTOS, 2021, s.p.)

Apesar de um dos organizadores da MCR ter participado do curso preparatório para a


construção dos editais, percebe-se que ainda há dificuldade no entendimento dos processos
necessários, principalmente para entrada em outros editais. Aline Portilho, produtora cultural
do IFF e representante da câmara de Instituições de Ensino Superior no COMCULTURA,
comentou por meio de entrevistas cedidas a pesquisadora, que a prefeitura tem tido iniciativas
para criar um programa de formação. Ela acrescenta ainda a importância dessa capacitação:

A elaboração dos projetos é um instrumento de poder muito importante, é uma


linguagem, então sendo uma linguagem, você precisa se dedicar aquilo e
entender como aquilo funciona. Aquilo tem uma lógica, muito específica, que
é uma lógica altamente burocratizada [...] Entender como movimentar essas
burocracias, eu penso, que é um instrumento de poder pros grupos culturais
importantíssimo. Porque a partir disso que você vai conseguir viabilizar os
recursos pra fazer as ações culturais. Inclusive disputar recursos com outros
grupos culturais que eventualmente não estão posicionados politicamente de
um jeito tão interessante. Então se a gente quer atrair recursos para outras
produções, de resistência, que colocam outras representações sociais na cena,
a gente tem que disputar o recurso financeiro também. Então pra disputar o
recurso financeiro a gente tem que se capacitar. [...] Campos tem uma
demanda grande por projetos de capacitação. (PORTILHO, 2021, s.p.)

Questionada sobre parcerias entre os grupos culturais com a universidade, a produtora


cultural colocou a ação como essencial, não só para o oferecimento de capacitação, como para
a disponibilidade de estruturas, entre outras demandas.
Apesar de todos os problemas e ausências em relação as ferramentas de políticas
culturais do município, a MCR permaneceu com seu movimento durante esses 6 anos, e sobre
isso, Soares (2021) ressalta que “não só a arte urbana está necessitando de atenção, mas a arte
popular em geral. Se houver dependência desses públicos do poder público, eles morrem. São
as pessoas desses grupos que não deixam morrer. ”
Em uma de suas ponderações, Soares (2021) remete a invisibilidade, levando novamente
ao conceito de Certeau (1996), já apontado no início deste texto:

É um pessoal que está invisibilizado porque diz o que tem que ser dito. [...]
Eu acho que é um papel social muito importante, que é dar voz a quem não
tem voz. E que acabam não tendo, exatamente porque estão falando aquilo
que não querem que eles digam. Entendeu? Ele é invisível exatamente porque
ele dá visibilidade aquilo que não deve ser dito num politicamente correto. [...]
Gostaria que eles estivessem em espaços mais suntuosos, no Trianon, no
Teatro de Bolso, no Museu. [...] Colocar não só nesses equipamentos, mas nas
outras praças, de outros distritos, porque dentro do nosso plano de cultura, nós
temos a descentralização das atividades culturais. (SOARES, 2021, s.p.)
116

Sobre descentralização da cultura, é possível conferi-la no plano como uma de suas


diretrizes:

Sua estrutura se compõe de 4 (quatro) diretrizes: descentralização;


democratização; desenvolvimento sociocultural e desenvolvimento
econômico; 2 (dois) objetivos gerais, que fundamentam 5 (cinco) objetivos
específicos: produzir; mapear; capacitar; gerir e descentralizar. A partir desses
objetivos, 25 (vinte e cinco) estratégias e 37 (trinta e sete) metas norteiam as
82 (oitenta e duas) ações, cada uma demonstrando os resultados esperados
com indicadores dos impactos alcançados por cada diretriz. (CAMPOS DOS
GOYTACAZES, 2021, s.p.)

Neste contexto, pode-se trazer à tona, a crítica de Almeida (2021) sobre o hip-hop no
município. Segundo o diretor de projetos “O hip-hop não está na periferia. [...] Se você pegar
hoje a periferia de Campos, o hip-hop não entra. ” (ALMEIDA, 2021, s.p.). Ele acrescenta ainda
que, apesar de encontrar sujeitos que ouvem músicas e bandas como Racionais, há a ausência
do diálogo e acesso, pois o consumo destes locais está baseado na produção da cultura de massa.
Vale ressaltar ainda a origem da cultura. Apesar de ser oriunda de espaços periféricos,
onde os jovens utilizavam desta para a superação de uma ordem social, o que aparentemente
está acontecendo hoje, é a evasão desses grupos para os centros urbanos. Ainda de acordo com
Almeida (2021):

Você não ouve falar, por exemplo, de uma manifestação da galera do rap, pra
ir numa favela e ensinar rap para as crianças que estão lá paradas, ou numa
escola, para se juntar, você não ouve falar disso. Você não ouve os grafiteiros
fazer uma ação social, eles querem pintar. Você não ouve falar dos B.Boys
pegar, e sei lá, ir pra pegar essas crianças, que hoje a gente tá cheio de criança
em situação de rua em Campos, e fazer uma aulão com elas, para poder
ensinar, parar com ela no meio do trânsito, pra poder ensinar. Você ouve a
galera do break querer ir para as escolas de dança para dar aula, você vê a
galera do graffiti correr atrás dos seus trampos comerciais, como artista
plástico, ou artista de audiovisual, você ouve a galera do rap querer gravar CD
e querer ficar famoso no TikTok e no Instagram. Não tô falando nada contrário
da galera querer progredir, eu tô dizendo que isso não é cultura hip-hop, isso
não é movimento hip-hop. (ALMEIDA, 2021, s.p.)

Para o empresário e diretor de projetos, não existe movimento hip-hop na cidade, porque
de acordo com ele, o movimento hip-hop deve ser composto dos cinco elementos, sendo o
principal deles o conhecimento. E acrescentou que não é necessário cantar, rimar, grafitar ou
dançar para ser hip-hop, é necessário estar ligado ao movimento, de acordo com as diretrizes
que a fundaram como uma cultura de resistência.

E isso era uma outra coisa, que aqui em Campos, as pessoas tinham uma
dificuldade de entender, para eles, ser hip-hop era quem rimava só. E isso
acaba contaminando. Os breakers, eles se entendem como street dancers e
117

não como hip-hop. E o hip-hop é uma filosofia, eu sou hip-hop. Você é hip-
hop, você, na arquitetura, mas você tá focada numa visão de cultura urbana,
isso é hip-hop. O hip-hop é uma essência, sabe? Como se fosse, como eu posso
dizer, uma doutrina. [...] O hip-hop ele existe, o que não existe é o movimento
hip-hop. Importante destacar isso. [...] Então o hip-hop, que antigamente
falava de realidade, de autoestima, de segurança e até de ostentação, ele passa
a falar de droga, de putarias, de coisas vazias, de se acabar com drogas, tipo
assim, de virar uma noite bebendo, cheirando, fazendo tudo completamente
antagônicos ao que o hip-hop prega. (ALMEIDA, 2021, s.p.)

Questionado sobre o que ele considerava ser o motivo por trás disso, ele respondeu que
seria a ausência do quinto elemento, o conhecimento. E acrescenta que se considera culpado,
assim como todas as pessoas que vieram antes da nova geração, por não ter repassado os
conhecimentos adiante. Ele comenta que o hip-hop, sendo de origem negra africana, tem uma
cultura ancestral, e que tal ancestralidade é passada pela oralidade, pela conversa, e que eles
teriam parado de fazer isso. O empresário e fundador da NBR afirma ainda que:

Em 2022, a gente vai voltar com força nesse cenário. A gente vai voltar a
intervir, se tudo der certo, com as coisas se caminhando, A gente vai voltar a
trabalhar diretamente nisso. Todo dia a gente tem tido algum movimento,
alguma reunião pra poder realmente voltar. Mas também a experiência nos
trouxe, que a gente não pode começar e não dar continuidade, como a gente
começou lá atrás e a gente não conseguiu continuar. As pessoas abriram mão
do que a gente tava fazendo, todas elas abriram mão do hip-hop. (ALMEIDA,
2021, s.p.)

A NBR, de acordo com Tamillys Lírio da Silva, psicóloga e membro fundadora da


ONG, trabalha em conjunto com sete favelas no município, mesmo já tendo trabalhado em
várias, as sete prioritárias atualmente são: Margem da Linha; Tapera I; Tapera II; Tapera III;
Novo Jockey; Parque Aeroporto; e Parque Eldorado. Segundo a psicóloga, a NBR procura o
diálogo com as lideranças já existentes nos bairros para ajudar no que eles precisam, para evitar
um tipo de “colonização”. “A gente só chega e soma com o que já tem lá. Não tem voluntário
em todas essas quebradas, mas temos pessoas que dialogam com a gente, e a gente ajuda a
fortalecer com o que eles já fazem. ” (SILVA, 2021, s.p.)
A psicóloga também é formada no Curso de Jovens Lideranças do Ministério da Saúde
e da ONU (UNAIDS, UNICEF, UNESCO, UNFPA), e atua desde 2015 no controle social da
epidemia do HIV/AIDS e outras IST's nas três esferas governamentais. Devido a essa atuação,
a NBR, com apoio da UNAIDS, lançou o Projeto Carolinas, como pode-se ver na Figura 25,
que tem como objetivo fortalecer, dar autonomia e visibilidade a novas lideranças na promoção
da saúde e prevenção contra o HIV entre mulheres jovens e moradoras de favelas.
118

Figura 25 - Projeto Carolinas

Fonte: Facebook NBR, 2021


Sobre as ações da NBR, a psicóloga acrescenta:

A NBR hoje em dia, ela atua muito mais como uma ponte entre essas
juventudes de favelas e periferias e seus direitos do que qualquer outra coisa.
E no meio do caminho a gente vai achando as formas de dialogar, as vezes é
o hip-hop, as vezes é o funk, as vezes é através de uma ação educativa, são
muitas outras possibilidades. Nós somos uma organização que entende que a
juventude é resposta. São a solução para os problemas que a gente tem. E a
nossa juventude está morrendo, está sendo exterminada. Então, se a gente não
encontrar formas que mantenham a juventude viva, pensando no futuro, e
pronto para esse futuro, ela vai continuar sendo exterminada. (SILVA, 2021,
s.p.)

Pode-se perceber assim, que mesmo o hip-hop sendo uma ferramenta para as
comunidades mais carentes, ele está cada vez mais distante da realidade da qual emergiu:

Ninguém está oferecendo hip-hop pra favela. Na favela, não tem uma favela
que não gosta que você cuide das crianças, ou não tem uma favela que não
tenha mulheres com problemas reais sabe? De violência de gênero, pobreza
menstrual, e o hip-hop pode ser a ferramenta que vai dar isso, e aí você está
fazendo hip-hop. (ALMEIDA, 2021, s.p.)

Apesar das críticas do diretor de projetos, em reunião com a organização da MCR para
coleta de dados e demandas, dois dos objetivos expressados por eles foram: a ida a escolas
119

municipais para levar o rap as crianças e adolescentes; e a ocupação de praças periféricas com
as batalhas de rima. Tais desejos foram colocados em pauta pelos próprios organizadores, sem
intervenção ou questionamento da pesquisadora. Percebe-se então, que há o desejo desses
jovens em levar o hip-hop para outros âmbitos, contudo, sempre são retomadas as problemáticas
financeiras e de ausência de estrutura.
O diretor de projetos da atual gestão e fundador na NBR, durante a entrevista com a
pesquisadora, propôs um encontro com o coletivo para conhece-los e inclui-los em planos
futuros da ONG. Contudo, até a escrita do presente trabalho, não foi possível criar a ponte entre
a organização e o coletivo.
Entende-se, com isso, a necessidade da união do coletivo com outras instituições, assim
como a união entre os próprios elementos do hip-hop, o que não foi constatado no município.
Além disso, acrescenta-se o fato de que, apesar de o movimento se apresentar como forte
ferramenta de voz e participação das classes menos abastadas em espaços institucionalizados e
que teriam vínculo com o poder público, este não apresenta ter ações, vínculo ou conhecimento
desses meios.
Questionada sobre a possível construção de um Plano de Ação para esse grupo, que
pudesse fomentar a cultura e ajudá-los na organização e cumprimento de metas, a Presidente
do Fórum Regional de Cultura, Kátia Macabu expressa que:

A partir dele você teria um material muito bom pra já pôr em prática e ajudaria
o município inclusive com essa proposta, no encaminhamento dessa proposta.
[...] Podemos apresentar para a Câmara de Arte de Rua, para que esta pessoa
solicite que na próxima reunião este tema seja incluído e dizendo que vai ter
uma convidada, que vai ter direito a voz e explicação. E o conselho pode
aprovar e encaminhar para a fundação, para mim, para a diretoria de artes
culturais, para que a fundação possa executar esse plano. (SOARES, 2021,
s.p.)

Entende-se, assim, que tal plano pode ser capaz de incluir o grupo em esferas
institucionais visando buscar uma cidadania cultural, em que as políticas culturais devem
atender aos anseios e às necessidades da população, e que só é possível chegar até esta por meio
da participação. A presidente ainda acrescenta sobre a importância dessa participação:

Eles não participam porque não tem conhecimento, e as vezes não participam
porque acham que é coisa da prefeitura. [...] A participação popular, a
participação da sociedade civil, ela é ceifada, e por conta disso, a própria
sociedade não se entende como imponderada, como pertencente aquele
núcleo. Então, o que você falou dos meninos embaixo da ponte, eles não se
sentem parte desse núcleo. (SOARES, 2021, s.p.)
120

A partir destas ponderações, o próximo capítulo buscará a explanação das análises e


demandas do coletivo MCR e a construção do Plano de Ação, desenhado para que o próprio
grupo possa colocar em prática metas e objetivos para que possam alcançar a participação
social, assim como a cidadania cultural.
121

5 O PLANO DE AÇÃO COMO PRODUTO

Devido ao que já foi exposto até aqui, ressalta-se a importância da manutenção, da


preservação e do incentivo à cultura urbana, representada neste trabalho pelo hip-hop, como
forma de uma participação mais democrática na gestão da cidade. Dito isto, este capítulo
apresentará um Plano de Ação para o coletivo MCR, visando o fomento e incentivo à cultura
urbana na cidade, além de instrumentalizar seus agentes, de modo que estes possam se
manifestar e serem incluídos no processo de gestão participativa urbana, inclusive contribuindo
para a cidade por meio da apropriação de espaços subutilizados, como é o caso da Ponte Leonel
Brizola.
Para a construção do plano, foram utilizadas referências de planos de cultura, além das
próprias demandas e fragilidades do coletivo, extraídos por meio de entrevistas 28 com
integrantes e do contato intenso da pesquisadora com a organização deste, tornando o objeto
uma elaboração não só da autora deste trabalho, mas uma construção coletiva, apresentando as
marcas, os afetos e os anseios dos atores sociais em questão.

5.1 PASSO A PASSO PARA O PLANO DE AÇÃO

Como pontapé inicial, tomou-se como referência as orientações oferecidas pelo MinC
em conjunto com a Universidade Federal da Bahia (UFBA), em 2017, para a elaboração dos
planos municipais de cultura, detalhadas no livro “Planos Municipais de Cultura: Guia de
Elaboração” (BRITTO, 2017). O guia funciona como uma cartilha, servindo como norteador
para as administrações municipais a fim de que estas executem programas para atenderem às
necessidades e especificidades de cada município.
Outra referência importante foi o Plano Municipal de Cultura de Campos dos
Goytacazes, sancionado em maio de 2021. Como dito anteriormente, a estrutura do PMC é
composta por 4 diretrizes, 2 objetivos gerais, 5 objetivos específicos, 25 estratégias, 37 metas
e 82 ações. A utilização deste se deu principalmente a fim de compreender as pretensões dos
rumos culturais no município, para que assim, o Plano de Ação do coletivo MCR possa
caminhar em conjunto com suas aspirações.
No entanto, o documento que este trabalho buscou desenvolver, não tem a magnitude
de um plano municipal, devido ao tempo para seu o desenvolvimento e por se tratar de um
plano de ação voltado para um recorte menor, estimando alcançar apenas um coletivo cultural.

28
As entrevistas realizadas foram não estruturadas, contudo, no Apêndice A e B pode-se conferir os esboços que
nortearam as conversas.
122

Neste sentido, uma referência estrutural importante foi a Minuta do Plano de Cultura do
Instituto Federal Fluminense, mesmo este se tratando de um documento que abrange uma
instituição extensa, com diversos campi e cursos, sendo composto assim, por 06 eixos
temáticos, 14 diretrizes distribuídas pelos eixos, 28 metas e 108 estratégias.
Sobre o PMC, como visto anteriormente, é importante ressaltar que este é o componente
essencial para o planejamento da cultura dos municípios a longo prazo, devendo ser elaborado
para realização em um panorama de dez anos, tendo que incluir: diretrizes; objetivos; metas;
ações; prazos de execução; e indicadores de resultados para acompanhamento.
O plano é um instrumento de políticas públicas e está inserido no SNC, construído como
consequência das orientações das Conferências Nacionais de 2005 e 2009. Parte de suas metas
deve ser alcançada a partir da participação municipal, visando, assim, a democratização ao
acesso à cultura e a promoção do desenvolvimento humano, social e econômico com base nos
direitos culturais. De acordo com o guia:

O SNC e o PNC sugerem que os estados e municípios criem os seus próprios


sistemas e planos de cultura. Os Planos Municipais de Cultura (PMC) são,
portanto, instrumentos de políticas públicas da base federativa brasileira, mas
de âmbito municipal, que devem refletir a autonomia dos municípios e, ao
mesmo tempo, a articulação programática do Sistema e do Plano Nacional de
Cultura. (BRITTO, 2017, p.12)

Apesar do plano de ação proposto neste trabalho não se tratar de uma Lei, como o PMC,
foram seguidas duas das cinco premissas e princípios metodológicos indicados no guia citado
anteriormente, como: a elaboração participativa, tanto por meio da organização do coletivo,
quanto dos integrantes, que participaram ativamente de sua construção; e o planejamento
técnico e político, onde no primeiro, foram utilizadas metodologias indicadas no guia para a
organização, sistematização e hierarquização das informações, e o segundo, visou a dimensão
e os rumos do PMC de Campos dos Goytacazes, envolvendo assim, diversos interesses e a
negociação com diferentes atores.
De acordo com o guia, é fundamental que os responsáveis pela elaboração de um plano
“se engajem em um processo dialogado buscando pluralizar e harmonizar suas visões distintas
da realidade: tanto sobre como ela é, quanto sobre o que precisa ser feito para que ela se torne
a desejada. ” (BRITTO, 2017, p.29) O PMC de Campos dos Goytacazes também reforça a ideia
de que não cabe apenas ao poder público “planejar e fomentar políticas públicas de cultura, esse
papel deve ser compartilhado com a sociedade civil na defesa dos valores democráticos de
participação e de colaboração. ” (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.6)
123

Em relação à estrutura do plano, no guia, são propostas etapas de elaboração, bem como
seus desdobramentos, a qual aderiu-se neste trabalho em partes, se adequando à realidade dos
agentes culturais do coletivo MCR e da cultura hip-hop. A Figura 26 mostra as etapas de
elaboração do guia, já a Figura 27, revela as adequações tomadas para o presente Plano de Ação
com a exclusão de alguns desdobramentos que serão explicados mais à frente.

Figura 26 - Etapas e desdobramentos de elaboração do PMC

Fonte: Britto, 2017

Figura 27 - Etapas de elaboração do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Como referência estética e também estrutural, destaca-se a Minuta do Plano de Cultura
do Instituto Federal Fluminense, como se pode observar na Figura 28, em que o produto surge
de forma mais artística. Entende-se, neste trabalho, que o documento aqui construído será
utilizado, seguido e gerido pelos próprios agentes culturais do coletivo MCR, não necessitando
apresentar um caráter formal. Optou-se, então, por uma linguagem mais acessível e prazerosa,
além de apresentar no plano as marcas destes atores culturais (FIGURA 29).
124

Figura 28 - Minuta do Plano de Cultura do Instituto Federal Fluminense

Fonte: Instituto Federal Fluminense, 2017


125

Figura 29 - Capa e Ficha Técnica do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


126

Seguindo como referência o PMC de Campos dos Goytacazes (FIGURA 30), iniciou-
se o Plano de Ação com uma breve apresentação do documento, contendo: período de execução
do plano; estratégias metodológicas e de coletas de dados; objetivos; além de sua organização.
Como se pode ver na Figura 31, a estrutura do documento foi composta por 4 diretrizes, 1
objetivo geral, 4 objetivos específicos, 16 metas e 60 ações. Além disso, foi feito um breve
resumo dos resultados e impactos que se pretende alcançar através deste. Tomando como base
os PMC, que devem ser efetivados em 10 anos, decidiu-se que o Plano de Ação adotaria metade
deste tempo, por se tratar de uma escala menor. Espera-se assim, que ele seja completamente
efetivado dentro de um período de 5 anos a partir de sua construção.

Figura 30 - Parte da apresentação do PMC de Campos dos Goytacazes

Fonte: Campos dos Goytacazes, 2021

Figura 31 - Apresentação do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


127

Nas etapas de elaboração do guia, como apresentado anteriormente, a primeira delas


trata-se de uma análise da situação atual, sob a égide do seguinte questionamento: “Quem
somos nós? ”, onde é essencial a partilha de dados, percepções sobre o local e suas condições.
Nesta fase, que foi organizada na Introdução do Plano de Ação, foi efetuada a caracterização
do coletivo MCR, onde fez-se o resumo de todo trabalho de pesquisa efetuado neste projeto de
dissertação, apresentando: os aspectos históricos do coletivo; os aspectos físicos da Ponte
Leonel Brizola; os aspectos demográficos, apontando o perfil dos manifestantes; os aspectos
econômicos; os aspectos sociais; e os aspectos administrativos.
Além disso, o guia sugere o diagnóstico cultural, onde a pergunta norteadora é “Como
estamos na área cultural? ”. Este também foi apresentado na Introdução, expondo tanto os
aspectos culturais, como as potencialidades, fragilidades e obstáculos que o plano visa superar,
como pode-se ver nas Figuras 32, 33 e 34.

Figura 32 - Introdução do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


128

Figura 33 - Introdução do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


129

Figura 34 - Introdução do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Na segunda parte do Plano de Ação, foram determinadas as diretrizes e os objetivos com
base nos levantamentos feitos por esta pesquisa. Britto (2017) define diretrizes como “linhas de
orientação que servem como elementos balizadores para o alcance de objetivos, metas e
execução de ações” (BRITTO, 2017, p.44), ou seja, elas são responsáveis por guiarem e darem
base ao desenvolvimento de planos. Ao redigir as diretrizes, de acordo com Britto (2017),
devem ser utilizados verbos no infinitivo, buscando alinhar os posicionamentos em frases
diretas e claras, que podem ser compreendidas sem explicações.
Neste sentido, ao sistematizar as problemáticas e demandas apresentadas até aqui,
chegou-se a quatro eixos principais, o desenvolvimento estrutural, o desenvolvimento
econômico, o desenvolvimento sociocultural e o desenvolvimento administrativo, que
formaram as seguintes diretrizes: Promover o desenvolvimento estrutural tanto físico, em
relação a Ponte Leonel Brizola, quanto organizacional, em relação ao coletivo MCR; Gerar o
desenvolvimento econômico do coletivo; Potencializar a democratização ao acesso à cultura
urbana e ao desenvolvimento sociocultural; e Reestruturar e formalizar a administração do
coletivo (FIGURA 35).
130

Figura 35 - Diretrizes do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


A partir das quatro diretrizes, foi proposto um objetivo geral e quatro objetivos
específicos que expressam onde se quer chegar com o Plano de Ação. Britto (2017) afirma que
tais objetivos devem ser os alvos e os resultados que se esperam, e que, assim como nas
diretrizes, deve-se utilizar os verbos no infinitivo, também em sentenças claras, diretas e
compreensíveis.
Como forma de estar em consonância com o PMC de Campos dos Goytacazes, que tem
como um de seus objetivos gerais “incentivar os fazedores de cultura a produzir, promover e
sensibilizar por meio da cultura. ” (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.22), e com os
objetivos específicos “[1] Produzir; [2] Mapear; [3] Capacitar; [4] Gerir e [5] Descentralizar. ”
(CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.22), estes foram considerados para a construção dos
objetivos do Plano de Ação (FIGURA 36).
131

Figura 36 - Objetivos do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


As metas e ações, segundo Britto (2017), permitem que os objetivos se concretizem. As
metas, de acordo com o guia, são alvos físicos quantificados e com tempo definido,
possibilitando assim, o monitoramento de resultados e acompanhamento do progresso do plano.
Entende-se, contudo, que não é possível a quantificação destas se não há recursos estipulados,
com isso, as metas no Plano de Ação que este trabalho construiu, não apresenta nem quantidade,
nem o tempo para o cumprimento de cada meta, devido à ausência de fontes de recursos seguras
para o coletivo.
Já a ação, corresponde a uma operação para que se possa alcançar a meta estipulada.
Cada ação precisa ter como resultado um produto, um bem ou um serviço. Assim, através das
ações, alcançam-se as metas e, por meio destas, concretizam-se os objetivos. Com isso, para a
estruturação desta etapa, foram destacados os objetivos específicos e, para cada objetivo, foram
estipuladas metas e ação, como se pode ver, na Figura 37, as metas e ações do primeiro objetivo
específico.
132

Figura 37 – Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


133

Para a elaboração das metas e dos objetivos demonstrados, como já mencionado, foram
sistematizados os dados extraídos pelas pesquisas de campo, bem como as próprias metas e
ações do PMC de Campos dos Goytacazes, como:

Estratégia1. Promover a produção de bens culturais locais no incentivo da


atividade cultural e da criatividade artística da população campista.

Meta1. Custear, pelo menos, 10 (dez) obras por ano, totalizando, no mínimo,
100 (cem) obras em 2031. [...]

VIII - murais urbanos, grafites e demais manifestações de arte de rua; [...]


(CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.23-24)

Estratégia4. Preparar os equipamentos culturais, com mediadores capacitados,


possibilitando que a comunidade entre em contato com a produção artístico-
cultural de artistas e fazedores de cultura locais.

Meta1. Realizar adequações nos equipamentos culturais públicos, em 2021,


para que a comunidade de modo geral possa ter acessibilidade a eles. [...]

Ação2. Preparar os equipamentos culturais, permitindo o acesso a todos que


desejarem realizar a visita, com total segurança e logística adequadas. [...]
(CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.25)

Além disso, no segundo objetivo, como se pode ver nas Figuras 38 e 39, tomou-se como
base principalmente as estratégias 6 e 7 do PMC:

Estratégia6. Manter o calendário artístico-cultural do município, sustentando


a fruição da produção local, para criar uma cultura de apreço à diversidade e
à pluralidade artístico-cultural de Campos dos Goytacazes em todo seu
território. [...]

Meta2. Publicar, ao menos, 2 (dois) chamamentos públicos ao ano e, no


mínimo, 20 (vinte) ao fim do decênio. [...]

Estratégia7. Incentivar a fruição e proteção da cultura assim como a


sensibilização para a arte do município.

Meta1. Publicar, anualmente, ao menos, 2 (dois) editais para que a população


apresente suas produções das manifestações artístico-culturais populares,
totalizando, no mínimo, 20 (vinte) em 2031. (CAMPOS DOS
GOYTACAZES, 2021, p.31-32)
134

Figura 38 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


135

Figura 39 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Para o terceiro objetivo foram criadas oito metas, entendendo que as maiores demandas
do coletivo necessitam da reestruturação deste, como podem ser analisadas nas Figuras 40, 41
e 42. Algumas das considerações retiradas do PMC de Campos dos Goytacazes foram:

Estratégia3. Planejar e executar ações de mediação cultural para ampliar o


acesso de discentes das redes pública e privada, assim como da comunidade.

Meta1. Estimular visitações anuais de, ao menos, 50% dos alunos das redes
pública e privada, bem como de grande parte da comunidade, aos
equipamentos e às manifestações das diversas expressões culturais. [...]

Ação4. Criar oficinas itinerantes integradas ao sistema de ensino formal,


visando incentivar a produção de saberes e fazeres das manifestações de
Cultura Popular nas escolas. (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.24-
25)

Estratégia7. Incentivar a fruição e proteção da cultura assim como a


sensibilização para a arte do município. [...]

Ação2. Transmitir e salvaguardar saberes e fazeres nas escolas públicas,


praças, associações de moradores e espaços culturais por meio dos respectivos
mestres de formação tradicional. [...]
136

Ação4. Promover apresentações dos segmentos da arte em escolas: artes


urbanas; audiovisuais; circenses; de dança; literárias; musicais; performáticas;
teatrais; visuais; entre outras.

Meta2. Assegurar a livre manifestação do artista de rua e a prática de sua arte


nas vias públicas do município.

Ação1. Liberar a atuação plena do artista de rua. [...] (CAMPOS DOS


GOYTACAZES, 2021, p.32)

5) Descentralizar

Estratégia1. Incentivar a produção e fruição dos bens e serviços artístico-


culturais, por meio de eventos públicos e periódicos, que englobem toda a
diversidade cultural do município possibilitando entretenimento, lazer e
cultura nas comunidades e distritos; acesso à arte e à cultura popular de modo
constante, sensibilizando a audiência para torná-la um público participativo.
[...]

Ação1. Realizar Festivais e Mostras Municipais de:

II - arte de rua.

II - aulas comunitárias de expressões artísticas como cinema, comidas típicas,


cultura popular, dança, escultura, fotografia, literatura, música, pintura, teatro
entre outras em distritos, bairros e comunidades;

III - Estúdio de gravação áudio visual comunitário.

Estratégia2. Realizar eventos e ações culturais de modo descentralizado, por


meio de atividades itinerantes, capazes de possibilitar a acessibilidade, tanto
ao bem cultural quanto aos meios físicos e ambientais, aos moradores dos
distritos e periferias. [...] (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.34)
137

Figura 40 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


138

Figura 41 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


139

Figura 42 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Já o último objetivo focou na formalização do coletivo (FIGURA 43 e 44), problema
que foi identificado em diversos âmbitos. Tomou-se, como referência, as seguintes pautas do
PMC:

2. Realizar licitação para aquisição de bens, preferencialmente móveis, para


promover itinerância e serviços públicos para ofertar acesso cultural e de
mobilidade à população em geral. [...]

6. Realizar cursos de formação e certificação de agentes culturais, de


empreendedores da Economia Criativa e de educadores patrimoniais. [...]

7. Promover cursos sobre fazeres e saberes da cultura popular. [...] (CAMPOS


DOS GOYTACAZES, 2021, p.22)

Estratégia2. Promover interação e construção de redes entre artistas,


produtores, fazedores de cultura, espaços, empresas, instituições públicas,
coletividades e territórios entre outros agentes do setor.

Meta1. Por meio de incentivo à realização de, pelo menos, 2 (dois) encontros
por ano na forma de seminário, fórum, congresso e de atividades de
intercâmbio totalizando, no mínimo, 20 (vinte) em 2031.

Ação1. Promover seminário anual no formato de palestras, oficinas e


apresentações culturais para os seguintes trabalhadores: artistas urbanos;
agentes, técnicos e profissionais do patrimônio histórico, cultural, material,
140

imaterial e ambiental; pesquisadores, profissionais, docentes e discentes


relacionados ao setor da cultura, interessados em vertentes artísticas, teorias e
metodologias da arte, ciências humanas, ciências sociais e belas artes.

Ação2. Realizar encontros de capacitação para os mais diversos grupos de


Cultura Popular com instruções que os orientem a participar de editais
municipais, estaduais e federais com serviço de apoio e acompanhamento para
fins de uma prestação de contas que não prejudique o trabalhador da cultura.
[...] (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.24)

3) Capacitar

Estratégia1. Certificar agentes de cultura no município, por meio de oficinas


e/ou cursos, para que possam atuar como referência na cultura e na arte em
seus distritos e/ou comunidades. [...] (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021,
p.27)

Estratégia5. Valorizar a dimensão econômica da produção artística e cultural,


não somente do próprio fazedor cultural, mas também da comunidade,
entendendo ser a cultura um importante vetor de desenvolvimento econômico
local.

Meta1. Capacitar, ao menos uma vez ao ano, 2 dois agentes em Economia


Criativa por distrito e/ou comunidade, totalizando, no mínimo, 20 (vinte) em
2031.

Ação1. Oferecer cursos permanentes em Economia Criativa por meio da


aquisição de aulas em formato de vídeo ou presencial. [...] (CAMPOS DOS
GOYTACAZES, 2021, p.29)

Estratégia8. Realizar a reestruturação geral dos equipamentos culturais do


município. [...]

Meta2. Estabelecer, permanentemente, que os prédios de caráter cultural


sejam de uso exclusivo da cultura. [...]

Ação2. Criar editais de ocupação para uso dos equipamentos públicos que
assim o permitirem. [...] (CAMPOS DOS GOYTACAZES, 2021, p.33)
141

Figura 43 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


142

Figura 44 - Metas e Ações do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Após a construção de todas as metas e ações, Britto (2017) coloca como importante
etapa a identificação de resultados, que são as consequências esperadas das metas, assim, as
informações de tais resultados estão no próprio enunciado dos objetivos, metas e ações, como
pode-se ver na Figura 45.

Figura 45 - Exemplo de indicadores de resultados

Fonte: Britto, 2021


143

Desta forma, delineou-se os resultados, baseando-se em todos os objetivos, metas e


ações propostas para este produto, como se pode ver na Figura 46.

Figura 46 - Resultados e Impactos do Plano de Ação

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


A última etapa trata da elaboração de um sistema para acompanhamento e avaliação, a
fim de obter os indicadores de resultados, para que assim, possa ser avaliado o que deu certo e
o que não deu, além do ajuste do plano ao longo do tempo de acordo com as informações
obtidas. Nesta etapa, foi tomado como referência o último capítulo do PMC de Campos dos
Goytacazes, que aborda este passo em formato de texto corrido, como pode-se observar nas
Figuras 47 e 48.
144

Figura 47 - Monitoramento e avaliação de resultados do PMC de Campos dos Goytacazes

Fonte: Britto, 2021

Figura 48 - Monitoramento do Plano de Ação

Fonte: Britto, 2021


Vale retornar ainda nas etapas de elaboração apresentadas anteriormente, em que o guia
de elaboração dos PMC tem como passo “Prazos e Recursos”. Neste, seria necessário elaborar
um cronograma que possibilitasse a estimativa de recursos para realização do que foi definido.
A princípio, este trabalho não executaria tal etapa, entendendo que seria necessária uma fonte
mínima de captação de recursos para essa estipulação, o que a MCR até então não disponibiliza.
145

O coletivo, contudo, entrou em contato com a autora deste projeto para que esta tentasse,
por meio de interlocução com o COMCULTURA, a reestruturação mínima do espaço para que
eles pudessem retornar com as batalhas ainda no ano de 2021. A fim de levar a pauta para o
conselho, a pesquisadora entrou em contato com o conselheiro de Artes Urbanas, para que este
pudesse incluir o assunto em uma reunião. Assim, no dia 16 de novembro de 2021 (FIGURA
49), o conselheiro abordou brevemente a proposta em assuntos gerais na reunião do
COMCULTURA. Como resposta, a Presidente da FCJOL e do COMCULTURA pediu que o
retorno fosse efetuado apenas em 2022, devido à pandemia da COVID-19. Em seguida, a fim
de mediar a discussão, a autora deste projeto pediu voz e defendeu o coletivo, ressaltando a
importância da manifestação e do espaço residual da Ponte Leonel Brizola que está em
abandono, não fazendo sentido a não realização do evento, tendo em vista que a própria
prefeitura já teria liberado a abertura de bares, bem como a realização de eventos, se respeitadas
as medidas de segurança. Após a fala da pesquisadora, a presidente da FCJOL informou que
marcaria uma reunião com o coletivo para tratar o assunto, reunião esta que foi agendada no
dia seguinte à solicitação.

Figura 49 - Reunião do COMCULTURA

Fonte: Acervo Pessoal, 2021


No dia 23 de novembro de 2021, às 10h30, reuniram-se no Teatro Trianon: a presidente
da FCJOL, Auxiliadora Freitas; o comandante da Guarda Civil Municipal (GCM), Wellington
Levino; o secretário de Desenvolvimento Humano e Social, Rodrigo Carvalho; o subsecretário
de Posturas, Jackson Souza; o subsecretário de Segurança Pública, Marcos Moreira; a diretora
146

executiva das Artes e Culturas da FCJOL, Kátia Macabu; o conselheiro de Artes Urbanas,
David de Oliveira Montezuma; responsáveis pelo Centro Pop; dois organizadores da MCR; e a
pesquisadora deste projeto. Na reunião (FIGURA 50), a pesquisadora apresentou brevemente a
trajetória do coletivo e da Ponte Leonel Brizola, bem como a importância destes para a arte
urbana da cidade.

Figura 50 - Reunião do coletivo MCR com o poder público

Fonte: Acervo Pessoal, 2021


O coletivo, por meio da pesquisadora, apresentou um Ofício de Solicitação29, que tinha
como demanda a aprovação do Plano de Ação MCR pela FCJOL, bem como o encaminhamento
deste para a Diretoria Executiva, de forma que a presente gestão e as próximas, se
comprometam a efetivar as ações que são cabíveis ao poder público. Para além disso, foram
solicitadas demandas urgentes, que já eram previstas no plano, para que a MCR pudesse
retornar com a ocupação do espaço, como: realocação e ressocialização das pessoas em situação
de rua; limpeza da quadra; reparo da iluminação; reparo das tomadas; e manutenção do espaço.
Como se pode observar na Figura 51, onde consta a reportagem sobre a reunião no Portal
Oficial Da Prefeitura Municipal De Campos Dos Goytacazes (2021), as partes integrantes da

29
Anexo A
147

reunião se comprometeram em realizar as demandas solicitadas, principalmente ao que diz


respeito à requalificação da parte inferior na Ponte Leonel Brizola.

Figura 51 - Reportagem sobre a reunião

Fonte: Portal Oficial Da Prefeitura Municipal De Campos Dos Goytacazes, 2021


148

A notícia também foi postada no Instagram da FCJOL, como se pode ver na Figura 52.

Figura 52 - Postagem no Instagram da FCJOL

Fonte: Portal Oficial Da Prefeitura Municipal De Campos Dos Goytacazes, 2021


Sobre o Plano de Ação e os prazos como etapa mencionado anteriormente, a Diretora
Kátia Macabu, solicitou que este fosse realizado para a apuração da mesma. Desta forma, foi
efetuado o Cronograma de ações anual, tendo como pressuposto o auxílio do munícipio nas
partes que lhe cabe (FIGURA 53, 54 e 55).
149

Figura 53 - Cronograma de Ações

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


150

Figura 54 - Cronograma de Ações

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


151

Figura 55 - Cronograma de Ações

Fonte: Desenvolvido pela autora, 2021


Após a atualização do Plano com as solicitações, este foi encaminhado por meio de um
novo Ofício30 para a diretoria executiva e para a presidência da FCJOL visando sua análise,
encaminhamentos e aprovação. Além do plano, o ofício contou com as informações sobre o
retorno do coletivo a Ponte Leonel Brizola.
Desta forma, o Plano de Ação MCR, que se apresenta completo no Apêncide C, foi
construído em conjunto com o coletivo, procurando refletir todos os problemas, deficiências,
potencialidades e demandas do grupo apresentados ao decorrer deste trabalho, buscando assim,
apresentar as marcas e raízes desses jovens atores. Com a apresentação do plano ao poder
público, tem-se a expectativa de que este seja inteiramente aprovado. Contudo, pode-se ressaltar
os passos largos que o coletivo já conseguiu alcançar a partir do instrumento, mesmo sem a sua
aprovação, mostrando o importante potencial do produto para possibilitar um recomeço para o
coletivo e seus integrantes, tornando-os mais ativos socialmente.

30
Anexo B
152

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No contexto urbano, deve-se destacar que a urbanização desordenada da cidade é fruto


do sistema capitalista que beneficiou apenas uma pequena parcela da sociedade, ou seja, aqueles
que detinham o capital e que eram (e ainda são) realmente beneficiados com esse sistema, tanto
financeiramente, quanto em relação à construção das cidades. Tal processo culminou no
surgimento das periferias/subúrbios, e com eles a cultura suburbana, ou seja, qualquer
movimento cultural produzido por indivíduos à margem da sociedade.
A cultura suburbana, ou cultura da periferia, representa, além de um movimento
cultural, um movimento social na luta contra as desigualdades dos oprimidos, levantando as
bandeiras da desigualdade de classe, raça e gênero, principalmente entre os jovens.
O hip-hop, como apresentado até aqui, é capaz de ser um importante instrumento para
a superação da segregação socioeconômica, cultural e espacial, além de alternativa para a
produção do espaço e aquisição de uma identidade coletiva de jovens em vulnerabilidade social.
Neste cenário, em 2016, emergiu a Manifestação Cultural de Rimas (MCR) na cidade de
Campos dos Goytacazes, devido à necessidade de suprir a ausência de movimentos culturais
que fossem voltados para tal público no município.
A manifestação ocupava o viaduto da Ponte Leonel Brizola, espaço público central da
cidade, considerado palco da cultura urbana, e ocorria todas as sextas-feiras, com batalhas de
rimas e apresentações individuais. Contudo, diante a pandemia da COVID-19, desde março de
2020, o coletivo está inativo, tanto no espaço físico, devido à necessidade do isolamento, quanto
por vias virtuais, devido à escassez de recursos.
Entende-se que este espaço público é de extrema importância para o movimento hip-
hop na cidade; porém, ele foi ao longo dos anos sendo abandonado pelo poder público e
degradado por pessoas em situação de rua.
Dessa forma, tomou-se como pressuposto neste trabalho, que o coletivo MCR,
representante do rap, um dos braços do hip-hop, pode impulsionar a requalificação do espaço
residual da Ponte Leonel Brizola, recuperando o sentido de lugar de encontro da vida pública,
além de trazer uma nova imagem identitária à cidade e, como movimento social, poder ser um
meio de desenvolvimento de ações políticas entre seus participantes, de maioria periférica, por
meio de práticas reivindicatórias, tornando-se, assim, um recurso das classes menos abastadas
para estabelecer uma gestão urbana mais participativa.
Com isso, desenvolveu-se o Plano de Ação MCR, direcionado ao coletivo, que visou o
incentivo da cultura local e a instrumentalização de seus agentes, de modo que estes possam se
153

manifestar e serem incluídos no processo de gestão participativa urbana, inclusive contribuindo


para a cidade por meio da apropriação de espaços subutilizados.
Por meio do plano, espera-se que o coletivo possa alcançar novos patamares, garantindo,
além do livre acesso para suas manifestações em qualquer espaço público da cidade, a aquisição
de bens próprios, uma administração eficiente, a obtenção de reconhecimento por parte dos
cidadãos e da gestão pública, além da ocupação de espaços suntuosos, como o Trianon e o
Teatro de Bolso, que costumam atender em grande maioria as culturas ditas eruditas.
Ademais, espera-se que a requalificação e a manutenção do espaço, propostos neste
trabalho, possibilitem além do fomento ao coletivo MCR, a criação de novos usos por outros
agentes culturais, fazendo com que o local seja utilizado não só pelo movimento hip-hop, mas
por toda a população, garantindo assim, a vivacidade deste, além de modificar a concepção de
estigmatização do local.
A partir da união dos elementos do hip-hop, tem-se a expectativa da aquisição de uma
voz ativa para os movimentos culturais e sociais, além de alcançar mais espaços e pessoas que
precisam do hip-hop como ferramenta para superação de problemas sociais, econômicos e
culturais. Anseia-se, também, a manutenção da MCR, fazendo deste um contínuo movimento,
evitando sua extinção, como ocorreram com outras manifestações, como o Rima Cabrunco.
Tendo em vista o que foi apresentado, destaca-se a importância deste trabalho para a
sociedade. Vale ressaltar ainda, a aproximação fundamental entre a academia e as práticas
culturais e sociais, onde a primeira pode executar um importante papel na solução de problemas,
se tornando um instrumento na superação de uma ordem social, econômica e urbanística
excludente. Assim, condira-se que o Plano de Ação desenvolvido neste trabalho, foi, não só
importante, como necessário para as conquistas do coletivo MCR.
Desta forma, acredita-se que o coletivo possa se tornar uma ferramenta mais ativa na
evolução cultural, social, política e econômica dos integrantes, possibilitando a transformação
da realidade dos jovens e a inclusão destes em processos de gestão participativas, garantindo,
assim, seu papel ativo como cidadão.
154

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165

APÊNDICE A – ESBOÇO PARA ENTREVISTA COM OS MEMBROS DA


ORGANIZAÇÃO DA MANIFESTAÇÃO CULTURAL DE RIMAS

1. Qual sua idade?

2. Onde você mora?

3. Você estuda?

4. Você trabalha?

5. Qual sua história no movimento? O que te trouxe até aqui?

6. Você acredita que a manifestação tenha importância para a cidade?

7. Como você enxerga a Ponte Leonel Brizola?

8. Qual a importância da cultura e do hip-hop para a sua vida?

9. Como funciona a organização da manifestação?

10. Quais são as principais deficiências da organização?

11. Quais as principais necessidades materiais do movimento?

12. Como você acha que a manifestação pode crescer na cidade?

13. Você tem ideias para melhorar a manifestação?


167

APÊNDICE B – ESBOÇO PARA ENTREVISTA COM OS MEMBROS


PARTICIPANTES DA MANIFESTAÇÃO CULTURAL DE RIMAS

1. Qual sua idade?

2. Onde você mora?

3. Você estuda?

4. Você trabalha?

5. Por que você frequenta a manifestação?

6. Qual seu vínculo com o hip-hop?

7. Você acredita que a manifestação tenha importância para a cidade?

8. Qual a importância a manifestação tem na sua vida?

9. Como você enxerga a Ponte Leonel Brizola?

10. Quais as principais deficiências da manifestação?

11. E qual a importância do hip-hop na sua vida?

12. Como você acha que a manifestação pode melhorar?


168

APÊNDICE C – PLANO DE AÇÃO MCR


PLANO DE
AÇÃO
MANIFESTAÇÃO CULTURAL DE RIMAS

Ficha Técnica
PLANO DE AÇÃO

Autoria: Carla Aparecida da Silva Ribeiro¹

Orientadora: Drª. Aline Couto da Costa²

Vínculo Institucional: Instituto Federal de


Educação, Ciência e Tecnologia
Fluminense

Produto proveniente do trabalho de dissertação do


Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia Fluminense, área de concentração
Tecnologias em Arquitetura e Urbanismo.

¹ Mestranda em Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias.


caarla.ribeiroarq@gmail.com
² Doutora em Arquitetura e urbanismo.
alinecoutoarquitetura@gmail.com
SUMÁRIO
1. Apresentação.....................................................4
2. Introdução.............................................................5
3. Plano de Ação MCR.......................................9
3.1. Diretrizes......................................................10
3.2 Objetivos.......................................................11
3.3. Metas e Ações..........................................12
4. Resultados e Impactos esperados....25
5. Cronograma de ações...............................26
5. Monitoramento................................................31

PLANO DE AÇÃO: MCR


4
1 APRESENTAÇÃO
entrevistas não estruturadas com artistas do
movimento hip-hop, além de gestores
Este documento, elaborado entre os anos de 2019 e culturais e membros do Conselho Municipal
2021, é fruto de um trabalho de dissertação de Cultura de Campos dos Goytacazes
intitulado "(SUB)URBANO NO CENTRO: Um Plano (COMCULTURA).
para a Cultura Hip-hop e a Gestão Participativa em
Campos Dos Goytacazes/RJ", de autoria da arquiteta O Plano de Ação trata-se de um documento
e urbanista Carla Aparecida da Silva Ribeiro, para guiar as futuras ações do coletivo MCR
desenvolvido no Mestrado Profissional em visando, por meio deste, incentivar a cultura
Arquitetura, Urbanismo e Tecnologias, do Instituto hip-hop, instrumentalizar seus agentes, além
Federal Fluminense, em conjunto com a de incluí-los no processo de gestão
organização do Coletivo Manifestação Cultural de participativa por meio da arte urbana.
Rimas (MCR).
A estrutura do documento está composta por:
Para sua construção, foram utilizadas estratégias 4 diretrizes; 1 objetivo geral; 4 objetivos
metodológicas como, a pesquisa bibliográfica e específicos; 16 metas; e 60 ações. Além disso,
documental. Contudo, pode-se destacar como traz-se um breve resumo dos resultados e
estratégia essencial a coleta de dados, em que foi impactos que se pretende alcançar através
possível a captação de demandas, fragilidades, deste. Espera-se, ainda, que este plano seja
potencialidades e demais aspectos por meio de completamente efetivado dentro de um
período de 5 anos a partir de sua construção.

PLANO DE AÇÃO: MCR


5
2 INTRODUÇÃO
A cultura hip-hop é constituída por quatro elementos: o Rap, o
Break, o Grafitti e o DJ. Tais elementos são expressões artísticas
que sustentam o movimento como bases fundamentais.
Contudo, a cultura ainda conta com um quinto elemento: o
conhecimento.

Afrika Bambaata, responsável por unificar tais elementos ainda


na década de 1960, tinha como objetivo que os jovens negros
estivessem longe da criminalidade, e com isso, considerava que
era preciso concentrar as energias em coisas positivas para saber
viver, sobreviver e lutar contra o que era (e ainda é) imposto pelo
sistema, ou seja, lutar contra a exclusão social e racial, e seus
consequentes problemas, como: as drogas, as gangues, a baixa
escolaridade, a falta de emprego e a falta de saúde pública.

O Rap representa uma das principais vozes de expressão


cultural deste movimento, protestando contra as injustiças das
periferias e se apresentando como referência para a juventude,
de maioria negra e carente.

Desta forma, o rap, como elemento fundamental do hip-hop,


pode ser considerado um movimento cultural e social, sendo
um importante instrumento para a superação do modelo de
segregação socioeconômico, cultural e espacial hegemônico,
além de alternativa para a produção do espaço e aquisição de
uma identidade coletiva de jovens em vulnerabilidade social.
PLANO DE AÇÃO: MCR
No município de Campos dos Goytacazes, localizado na região 6
Norte do Estado do Rio de Janeiro, destaca-se a Manifestação
Cultural de Rimas (MCR), coletivo de rap que surgiu em 2016
devido ao vazio deixado pela extinção do coletivo Rima
Cabrunco, que mantinha rodas culturais na cidade, mas que veio
ao término devido à desarticulação de seus membros.

A MCR emergiu, assim, da necessidade de suprir a ausência de


movimentos culturais que fossem voltados para o rap no
município e atendesse a esse público alvo. O movimento ocupa o
espaço residual sob o viaduto da Ponte Leonel Brizola, espaço
público central da cidade, considerado palco da cultura urbana,
ocorrendo todas as sextas-feiras, com batalhas de rimas e
apresentações de artistas locais.

Atualmente, a manifestação conta com cinco organizadores,


sendo três homens e duas mulheres. Inicialmente, a MCR
dispunha de fluxo intenso de jovens, entre eles: rappers; skatistas;
dançarinos de break; grafiteiros; e DJs; contudo, com o tempo,
foi perdendo frequentadores.

O motivo do abandono deu-se principalmente pela ausência de


estrutura, tanto do movimento, quanto do espaço. O coletivo
nunca teve caixas de som e microfones próprios, fazendo seus
eventos com aparelhos emprestados, muitas vezes em condições
precárias. Além da estrutura de áudio e som, a organização da
MCR enfrenta problemas com a parte administrativa, em divisões
de tarefas e cumprimento de metas.

PLANO DE AÇÃO: MCR


7

Para além disso, a estrutura da Quadra de Esportes Hugo Oliveira


Saldanha, espaço abaixo do viaduto, onde ocorrem as batalhas,
está degradada. As tomadas não funcionam, as luzes muitas
vezes estão apagadas e os mobiliários urbanos foram destruídos
por pessoas em situação de rua, que dividem o espaço com o
coletivo.

Destaca-se que esta ocupação é um dos principais problemas a


serem enfrentados, sendo, além de um problema social, que
reflete a desigualdade da cidade, um desafio em relação ao
convívio com os mesmos.

Outro fator importante a ser apontado é a necessidade de união


dos elementos do hip-hop na cidade. O rap, representado aqui
pela MCR, tem pouco vínculo com o graffiti, com o break, com os
skatistas que antes ocupavam o espaço, com o basquete de rua e
com o elemento DJ, sendo o único contato deste com a DJ
residente do coletivo. Tal desunião dificulta a principal
potencialidade da cultura hip-hop, que é a junção de forças a fim
de propagar ideologias de resistência e valorização entre a
juventude negra e periférica, principais atores sociais do
movimento.

PLANO DE AÇÃO: MCR


Em relação à situação econômica do coletivo, este não possui 8
fundos, captação de recursos ou qualquer auxílio municipal, nem
em relação à manutenção do espaço ocupado por ele, ficando a
cargo dos próprios membros da organização, retirar de seus bens,
os recursos necessários para a continuidade do movimento.

A ausência de capacitação dos organizadores impede que estes


consigam captar recursos para efetuar melhorias na estrutura do
espaço e do movimento. Contudo, mesmo com todos os
problemas apontados, além de divergências internas entre os
elementos, os participantes de todas as linguagens do hip-hop
demonstram grande pertencimento com a quadra abaixo do
viaduto da Ponte Leonel Brizola, onde estes veem na batalha um
ponto de refúgio, em que eles podem expressar sua arte e falar
sobre as realidades cotidianas por meio da música.

Neste sentido, pode-se trazer Lefebvre (2001) que defende que a


transformação da cidade deve ser protagonizada pelo coletivo e
o espaço público deve acomodar a diversidade de atividades do
cotidiano, dentre eles: trabalho, descanso, cultura, conhecimento,
lazer, ócio, troca, comércios etc. De acordo com o autor, a luta
pelos espaços pode vir através da arte, de atividades lúdicas
comunitárias, festas e jogos no espaço público.

Percebe-se, assim, que a MCR é de extrema importância tanto


para a requalificação do espaço que ocupa, quanto para a
superação de uma ordem social, econômica e urbanística
excludente de atores sociais ignorados pelo sistema.

PLANO DE AÇÃO: MCR


3 PLANO DE AÇÃO
MCR
10
3.1 Diretrizes

Promover o desenvolvimento estrutural

tanto físico, em relação a Ponte Leonel Gerar o desenvolvimento econômico do


Brizola, quanto organizacional, em relação coletivo
ao coletivo MCR

Potencializar a democratização ao acesso à


Reestruturar e formalizar a administração
cultura urbana e ao desenvolvimento
do coletivo
sociocultural
3.2 Objetivos

OBJETIVO GERAL
Fortalecer a cultura hip-hop, com foco no
coletivo MCR, e instrumentalizar seus agentes,
visando o incentivo e o fomento, de modo que
estes possam manifestar-se livremente e serem
incluídos no processo de gestão participativa.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Requalificar a Quadra de Esportes Hugo
Oliveira Saldanha, espaço onde a MCR
realiza suas manifestações;
Gerir e captar recursos financeiros;
Organizar o coletivo;
Capacitar a organização.

11
PLANO DE AÇÃO: MCR
OBJETIVO
REQUALIFICAR A QUADRA DE
3.3 METAS E AÇÕES ESPORTES HUGO OLIVEIRA SALDANHA,
ESPAÇO ONDE A MCR REALIZA SUAS
MANIFESTAÇÕES

META 1 Gerar um espaço com melhor qualidade ambiental para os frequentadores.

Realizar mutirão da cultura hip-hop na Quadra de Esportes Hugo Oliveira


AÇÃO 1 Saldanha, evento com: graffiti dos pilares; batalha de rimas; apresentações
individuais; e apresentação de break.

AÇÃO 2 Solicitar junto ao COMCULTURA a restauração da iluminação, tomadas e WI-FI.

Efetuar concursos de projetos com materiais reaproveitados, para a construção


AÇÃO 3 de mobiliários urbanos não efetivos, com a intenção de promover intervenções
pontuais e renováveis no espaço. Ex: Parklets.

Solicitar junto ao COMCULTURA a montagem de pista de skate com


AÇÃO 4
obstáculos móveis.

Adquirir: 2 caixas de som ativas 12 Ksr Pró; 1 mesa Ksr Pró; 2 tripés Ksr Pró; 2
cabos Xlr 5m Hayonik; 3 microfones sem fio VHF profissionais; 1 notebook;
AÇÃO 5
Suporte de Notebook e Controladora; Controladora Pioneer DDJ 200; e 1
câmera.
12
Confeccionar banner ou placa com a logo da MCR para utilização durante os
AÇÃO 6
eventos.
PLANO DE AÇÃO: MCR
OBJETIVO
REQUALIFICAR A QUADRA DE
3.3 METAS E AÇÕES ESPORTES HUGO OLIVEIRA SALDANHA,
ESPAÇO ONDE A MCR REALIZA SUAS
MANIFESTAÇÕES

META 2 Manter o espaço limpo e seguro para os manifestantes.

Criar vínculo com órgãos sociais e municipais como o Centro Pop e a Secretaria
AÇÃO 1 de Desenvolvimento Humano e Social, para acolhimento e ressocialização das
pessoas em situação de rua que ocupam a quadra.

AÇÃO 2 Solicitar junto ao COMCULTURA a manutenção e limpeza do espaço.

13

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


GERIR E CAPTAR RECURSOS

META 1 Captar Recursos financeiros

Participar de editais de fomento à cultura tanto no âmbito municipal, quanto


AÇÃO 1
estadual.

AÇÃO 2 Captar recursos por meio das Leis de Incentivo.

AÇÃO 3 Buscar por patrocinadores que se interessem em ter sua marca vinculada à
cultura urbana, como lojas de esportes urbanos, produtoras, entre outros.

14

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


GERIR E CAPTAR RECURSOS

META 2 Monetizar atividades culturais

Realizar eventos semestrais em locais privados, com cobrança de entrada, além


AÇÃO 1
de venda de bebidas para maiores de idade.

AÇÃO 2 Alugar os equipamentos de áudio e som para outros eventos.

AÇÃO 3 Fazer parceria com vendedores para garantir uma porcentagem de vendas em
dias de eventos privados.

AÇÃO 4 Produzir e vender artigos da MCR como: blusas; bonés; moletons; adesivos;
chaveiros; entre outros

15

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


GERIR E CAPTAR RECURSOS

META 3 Criar o Fundo de Cultura MCR

AÇÃO 1 Abrir conta bancária para a entidade cultural.

AÇÃO 2 Gerenciar o capital, garantindo a reserva para investir nas ações propostas.

16

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


ORGANIZAR O COLETIVO

META 1 Reestruturar a MCR

Realizar as batalhas de rimas quinzenalmente, garantindo uma melhor


AÇÃO 1 estrutura e organização prévia.

Melhorar a divulgação das batalhas, fazendo postagens no Instagram,


AÇÃO 2
Facebook e nos grupos de Whatsapp.

AÇÃO 3 Registrar todas as batalhas por meio de fotos e vídeos.

Fazer postagens dos registros marcando os participantes nas redes sociais


AÇÃO 4
possibilitando e facilitando o compartilhamento.

Realizar lives no Instagram durante as batalhas de rimas, possibilitando ao


AÇÃO 5
público que não está presente o acompanhamento.

Elaborar um sistema de premiação para todas as batalhas, estimulando a


AÇÃO 6
participação dos MCs.

Premiar, em parceria com produtoras, MCs vencedores de batalhas


AÇÃO 7
excepcionais, a gravação de clipe para fomentar o artista.
17
Oferecer aos MCs que se destacarem, por meio de evento excepcional, a
AÇÃO 8 participação em competições de batalhas de rimas regionais, estaduais e
PLANO DE AÇÃO: MCR federais.
OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


ORGANIZAR O COLETIVO

META 2 Atrair mais frequentadores e MCs

Realizar shows e batalhas de rimas em espaços suntuosos da cidade, como o


AÇÃO 1 Teatro Trianon e o Teatro de Bolso.

AÇÃO 2 Participar de eventos tradicionais da cidade.

META 3 Descentralizar as manifestações culturais

Promover as batalhas de rimas em outros bairros e espaços públicos da cidade


AÇÃO 1
pelo menos uma vez a cada 2 meses.

AÇÃO 2 Enviar MCs da MCR para outras batalhas da cidade.

META 4 Unir os elementos do hip-hop

Buscar aproximação com coletivos de graffiti, break, skate, basquete e DJ, com
AÇÃO 1
intuito de criar vínculo e projetos em parceria
18

AÇÃO 2 Realizar eventos unindo todas as linguagens do movimento hip-hop


PLANO DE AÇÃO: MCR
OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


ORGANIZAR O COLETIVO

META 5 Desenvolver socialmente os frequentadores das batalhas

Retornar com a biblioteca MCR, onde eram expostos livros para empréstimo
AÇÃO 1 durante as batalhas.

Realizar rodas de conversas sobre assuntos importantes para a realidade dos


AÇÃO 2
jovens.

Fazer parcerias com Instituições de Ensino Superior e Técnico para ofertar


AÇÃO 3
cursos de curto e médio prazo.

Anunciar ofertas de empregos que chegarem ao conhecimento da organização,


AÇÃO 4
por meio das redes sociais ou durante as batalhas.

Realizar campanhas de agasalho, alimentação, entre outras, para comunidades


AÇÃO 5
carentes.

Realizar vínculo com escolas municipais e estaduais para levar as batalhas de


AÇÃO 6
rimas e a cultura urbana até as crianças.
19

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


ORGANIZAR O COLETIVO

META 6 Buscar o diálogo com outras culturas

Fazer parcerias com artistas locais, como fotógrafos, artesãos, pintores, entre
AÇÃO 1 outros, para que estes realizem amostras no espaço, em dias de batalha ou não.

AÇÃO 2 Realizar oficinas de fotografia, graffiti, break, teatro, entre outros.

Conscientizar os manifestantes sobre a história do hip-hop a nível mundial,


META 7
nacional e municipal

Convidar artistas precursores do hip-hop em Campos dos Goytacazes para


AÇÃO 1
expor a história da cultura na cidade

Trazer artistas de outras cidades para eventos no viaduto, no intuito de trocar


AÇÃO 2
experiências e histórias

Realizar eventos, palestras e rodas de conversas para abordar a história do hip-


AÇÃO 3
hop com pesquisadores e artistas da área

Elaborar postagens no Instagram e no Facebook, com vídeos, fotos e


20 AÇÃO 4
informativos que abordem a história da cultura hip-hop

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


ORGANIZAR O COLETIVO

META 8 Fomentar a participação de mulheres e LGBTQI+

AÇÃO 1 Convidar artistas mulheres para participações especiais.

AÇÃO 2 Convidar artistas LGBTQI+ para participações especiais.

Realizar eventos com pautas sobre: machismo; homofobia; transfobia; pobreza


AÇÃO 3
menstrual; feminicídio; violência doméstica; entre outros.

AÇÃO 4 Realizar batalhas de rimas só com MCs mulheres.

21

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


CAPACITAR A ORGANIZAÇÃO

META 1 Profissionalizar a organização

Participar de cursos visando a produção cultural, a produção de editais, entre


AÇÃO 1 outros, por todos os integrantes da organização.

Realizar vínculo com as Instituições de Ensino Superior para a realização de


AÇÃO 2
cursos de capacitação cultural.

Efetuar vínculo com o Sistema S (Sebrae, Sesc, Sesi, Sest/Senat e Senai), em


AÇÃO 3 busca de capacitação para os organizadores e demais frequentadores do
coletivo.

22

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


CAPACITAR A ORGANIZAÇÃO

META 2 Realizar aproximação com o poder público

Escalar representantes da organização para a participação de todas as reuniões


AÇÃO 1 do COMCULTURA,

Levantar pautas sobre as políticas públicas culturais urbanas, além de levar


AÇÃO 2 demandas dos participantes e frequentadores do coletivo para as reuniões do
COMCULTURA.

Solicitar ao COMCULTURA um espaço físico público com intuito de atender a


AÇÃO 3 organização para: realizar reuniões; guardar materiais audiovisuais do coletivo;
efetuar oficinas; realizar palestras, entre outros

23

PLANO DE AÇÃO: MCR


OBJETIVO

3.3 METAS E AÇÕES


CAPACITAR A ORGANIZAÇÃO

META 3 Formalizar o coletivo MCR

AÇÃO 1 Realizar todas as ações, metas e objetivos presentes neste Plano de Ação.

AÇÃO 2 Atualizar o Plano de Ação quando houver demanda.

AÇÃO 3 Realizar a revisão do Plano de Ação de 5 em 5 anos.

Criar CNPJ, tornando a MCR uma Entidade cultural com CNPJ, sendo possível a
AÇÃO 4
participação em editais com essa exigência.

Elaborar o Regimento Interno da MCR, sendo este o documento que irá


AÇÃO 5 apresentar as normas para regulamentar a organização e o funcionamento do
coletivo.

Criar cargos, com funções específicas no regimento interno da organização,


sendo eles: Diretor Geral, responsável pela organização dos eventos; Diretor
Social, responsável pelo intermédio com outros agentes culturais; Diretor de
AÇÃO 6 Comunicação, responsável pelas mídias sociais; Diretor Cultural, responsável
pelos aparatos de som e áudio; e Tesoureiro, responsável pelo gerenciamento de
bens do coletivo.
24
Incentivar outros MCs e frequentadores do movimento a entrarem na
AÇÃO 7 organização da MCR, possibilitando o fluxo interno, a introdução de novas
PLANO DE AÇÃO: MCR ideias, bem como a manutenção do coletivo.
4 RESULTADOS E IMPACTOS ESPERADOS

Requalificação da Quadra de Manutenção e inclusão nos


Esportes Hugo Oliveira processos de gestão
Saldanha participavas
Entende-se que o espaço abaixo da Ponte Leonel Anseia-se que o coletivo, em união com outras
Brizola é de extrema importância para o culturas urbanas, seja ferramenta de evolução
movimento hip-hop na cidade, sendo considerado cultural, social, política e econômica dos
o palco desta cultura. Desta forma, espera-se que a integrantes, possibilitando a inclusão destes em
requalificação e a manutenção do espaço, processos de gestão participativas. Espera-se,
possibilitem novos usos por outros agentes ainda, que este plano permita a manutenção do
culturais, bem como por transeuntes e públicos coletivo, fazendo deste um contínuo
diversos, fazendo com que o local seja utilizado movimento, evitando o colapso, como
não só pelo coletivo, mas por toda a população, ocorreram com outras manifestações, em busca
garantindo assim, a vivacidade deste, além de de transformar a realidade dos jovens.
modificar a concepção de estigmatização do local.

Fortalecimento da cultura hip- Evolução da MCR


hop na cidade Espera-se, por meio deste plano, que o coletivo
possa alcançar novos patamares garantindo,
Com a união dos elementos do hip-hop, tem-se a
além do livre acesso para suas manifestações
expectativa de adquirir mais voz para os
em qualquer espaço público da cidade, a
movimentos culturais e sociais, além de alcançar
aquisição de bens próprios, uma administração
mais espaços e pessoas que precisam do hip-hop
eficiente, a obtenção de reconhecimento por
como ferramenta para superação de problemas
parte dos cidadãos e da gestão pública, além da
sociais, econômicos e culturais.
ocupação de espaços como o Trianon e o Teatro
de Bolso, que costumam atender em grande
maioria as culturas ditas eruditas. 25
5 CRONOGRAMA DE AÇÕES 26

AÇÕES 1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO


REALIZAR MUTIRÕES NA QUADRA
RESTAURAR ILUMINAÇÃO E
TOMADAS
REALIZAR CONCURSO DE
MOBILIÁRIOS URBANOS
MONTAR PISTA DE SKATE COM
OBSTÁCULOS MÓVEIS.
ADQUIRIR MATERIAIS DE ÁUDIO E
SOM E AUDIOVISUAIS
CONFECCIONAR BANNER OU
PLACA COM A LOGO DA MCR
CRIAR VÍNCULO COM CENTRO POP
MANUTER A ESTRTUTURA E
LIMPEZA DO ESPAÇO
PARTICIPAR DE EDITAIS
CAPTAR RECURSOS VIA LEIS DE
INCENTIVO

CRIAR PARCERIAS PRIVADAS


EFETUAR EVENTOS SEMESTRAIS
EM LOCAIS PRIVADOS
ALUGAR OS EQUIPAMENTOS DE
ÁUDIO E SOM
5 CRONOGRAMA DE AÇÕES 27

AÇÕES 1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO


CRIAR PARCERIA COM
VENDEDORES LOCAIS
VENDER ARTIGOS DA MCR

ABRIR CONTA BANCÁRIA PARA A


MCR
GERENCIAR CAPITAL, GARANTINDO
RESERVA DE RECURSOS
REALIZAR BATALHAS DE RIMAS
QUINZENAIS NA QUADRA
MELHORAR AS DIVULGAÇÕES DAS
BATALHAS
REGISTRAR AS BATALHAS POR
MEIO DE FOTOS E VÍDEOS
POSTAR OS REGISTROS NAS
REDES SOCIAIS
REALIZAR LIVES NO INSTAGRAM
DURANTE AS BATALHAS
REALIZAR SISTEMA DE PREMIAÇÃO
PREMIAR MC'S COM CLIPES EM
BATALHAS EXCEPCIONAIS
ENVIAR MC'S PARA BALHATAS
REGIONAIS, ESTADUAIS E
FEDERAIS
5 CRONOGRAMA DE AÇÕES 28

AÇÕES 1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO


REALIZAR EVENTOS NO TRIANON E
TEATRO DE BOLSO
PARTICIPAR DE EVENTOS
TRADICIONAIS DA CIDADE
PROMOVER BATALHAS EM
OUTROS BAIRROS
ENVIAR MC'S PARA OUTRAS
BATALHAS DA CIDADE
BUSCAR APROXIMAÇÃO COM
COLETIVOS DE GRAFFITI, BREAK,
SKEATE, BASQUETE E DJ

REALIZAR EVENTOS COM TODAS


AS LINGUAGENS DO HIP-HOP
RETORNAR COM A BIBLIOTECA
MCR
REALIZAR RODAS DE CONVERSAS
PARA OS JOVENS
FAZER PARCERIA COM INST. DE
ENSINO SUPERIOR
ANUNCIAR EMPREGOS

REALIZAR CAMPANHAS DE
AGASALHO, ALIMENTAÇÃO ETC.
5 CRONOGRAMA DE AÇÕES 29

AÇÕES 1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO


LEVAR A MCR PARA ESCOLAS
MUNICIPAIS E ESTADUAIS
FAZER PARCERIA COM ARTÍSTAS
PARA OCUPAÇÃO DA QUADRA
REALIZAR OFICINAS DE
FOTOGRAFIA, GRAFFITI, BREAK ETC
CONVIDAR PRECURSORES DA
CULTURA PARA AS BATALHAS
REALIZAR EVENTOS, PALESTRAS E
RODAS DE CONVERSA ACERCA DA
HISTÓRIA DO HIP-HOP

ELABORAR POSTAGENS NAS


REDES SOCIAIS SOBRE A HIST.
CONVIDAR ARTISTAS MULHERES
PARA PART. ESPECIAIS
CONVIDAR ARTISTAS LGBTQI+
PARA PART. ESPECIAIS
REALIZAR EVENTOS COM PAUTAS
COMO: MACHISMO, HOMOFOBIA,
TRANSFOBIA, FEMINICÍDIO, ENTRE
OUTROS

REALIZAR BATALHAS DE RIMAS SÓ 25


COM MULHERES
5 CRONOGRAMA DE AÇÕES 30

AÇÕES 1º ANO 2º ANO 3º ANO 4º ANO 5º ANO


PARTICIPAR DE CURSOS VISANDO
A PRODUÇÃO CULT.
CRIAR VÍNCULO COM INST. DE
ENSINO PARA CAPACITAÇÃO
EFETUAR VÍNCULO COM O SISTEMA
S
PARTICIPAR DE TODAS AS
REUNIÕES DO COMCULTURA
LEVAR PAUTAS AO COMCULTURA
ACERCA DAS POLÍTICAS CULTURAIS
URBANAS

SOLICITAR UM ESPAÇO FÍSICO


PARA A ORG. DA MCR
CRIAR CNPJ PARA A ENTIDADE
CULTURAL
ELABORAR REGIMENTO INTERNO
DA MCR
CRIAR CARGOS COM FUNÇÕES
ESPECÍFICAS NA ORG.
ESTIMULAR OS FREQUENTADORES
A ENTRAREM NA ORG.

REVISAR O PLANO DE AÇÃO 25


6 MONITORAMENTO

A avaliação destina-se ao acompanhamento dos resultados ao


decorrer do cumprimento das ações, possibilitando a
identificação das metas e objetivos atingidos.

Diante desta necessidade, fica a cargo da organização da MCR,


tanto da gestão atual, quanto as futuras, a análise constante e a
obrigação em cumprir todas a ações propostas neste
documento.

Ressalta-se também a importância de compartilhamento deste


com todos os integrantes do coletivo e frequentadores das
batalhas e eventos, para que, assim, o monitoramento, as
adequações e as avaliações sejam feitas por diversos olhos e
experiências, tornando o processo inteiramente participativo.

A cultura, as pessoas e a cidade estão sempre em constante


movimento. Por esse motivo, destaca-se a importância da
constante avaliação de demandas e a revisão deste documento
de 5 em 5 anos, garantindo assim, a manutenção deste
coletivo, o atendimento a mais jovens e a transformação de
mais realidades.
PLANO DE AÇÃO: MCR
200

ANEXO A – OFÍCIO DE SOLICITAÇÃO 23/11/2021


201
202
203
204

ANEXO B – OFÍCIO DE SOLICITAÇÃO 25/11/2021


205
206

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