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TCC20572021
TCC20572021
Fortaleza–CE
Junho, 2021
AUDISIO LÔBO DE MACÊDO NETO
Fortaleza – Ceará
2021
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Aos meus pais Vicente Lôbo Neto e Francisca Gomes Ferreira Lôbo, por me ensinar o
valor do trabalho, pelo apoio incondicional e por todo o esforço empreendido para tornar
possível a realização desse sonho e o desfecho de mais uma etapa da minha vida.
Ao meu irmão Saulo Ferreira Lôbo, pela amizade e companheirismo em todas as fases da
minha vida.
A minha cunhada, Virgínia Martins Macêdo, pelos conselhos, ajuda e por ter passado
juntamente comigo por várias etapas dessa graduação.
A minha namorada Gabriela Braide Romeiro, pelo companheirismo e por sempre estar
ao meu lado me apoiando e me fazendo lutar incessantemente pelos meus objetivos.
Aos advogados da Gestart Condomínios Dr. Matheus Texeira, Dra. Rafaella Pinto e Dra.
Luciana Lima, por todo o aprendizado e ensinamentos transmitidos no período de estágio, me
moldando como um profissional preparado e competente para enfrentar os desafios da vida e
da carreira profissional que se inicia.
Por fim, agradeço a todos meus amigos que ajudaram a tornar essa caminhada mais leve
e prazerosa.
“A menos que modifiquemos a nossa maneira de
pensar, não seremos capazes de resolver os
problemas causados pela forma como nos
acostumamos a ver o mundo”.
Albert Einsten
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivos investigar e traçar novas formas de relação entre os
aplicativos que oferecem o serviço de locação de curtas durações, a exemplo do Airbnb, e os
condomínios edilícios com natureza residêncial. Para isto, desenvolveu-se pesquisa
bibliográfica, de natureza qualitativa e com fins exploratórios, em que a problemática se
encontra em torno da natureza jurídica do negócio firmado através das plataformas digitais, que
encontra diversas divergências de entendimento, sendo vista em duas teses mais fortes e uma
terceira via sendo debatida com objetivo de encontra alternativas para viabilizar a situação sem
que haja tantas divergências. A primeira enxerga a natureza jurídica do contrato firmado como
locação por temporada. A segunda, por sua parte, como um contrato de hospedagem. A terceira,
no que lhe concerne, afirma a necessidade da criação legislativa que autorize e respalde o
sistema de locação por aplicativos criando uma nova forma de contrato. Neste passo, releva-se
que caso o entendimento por relação de hospedagem ou a criação de novo contrato, como por
exemplo o contrato de short-rental, como denominado por alguns doutrinadores, deve ser feito
através de disposição legislativa, em que far-se-á necessária a adaptação da convenção
condominial. Sendo relação locatícia por temporada, tal adaptação não será necessária. Para
remediar a situação, o Superior Tribunal de Justiça, estabeleceu que o condomínio pode proibir
tal prática nos casos em que a Convenção Condominial preveja a destinação residencial das
unidades, os proprietários não poderão alugar seus imóveis por meio das plataformas digitais,
por outro lado, a convenção pode autorizar a utilização das unidades nessa modalidade de
aluguel. Dessa forma, a decisão do STJ faz ressalvas de que deve existir a criação de novos
dispositivos legais que regulamentem a modalidade, com intuito de sessar a discussão do tema,
ficando, por quanto, decidido que será soberana a previsão contida na convenção condominial.
INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 8
1 AS ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO E O DIREITO DE PROPRIEDADE .......................... 12
1.1 Condomínio geral ...................................................................................................... 12
1.1.1 Condomínio necessário ................................................................................. 14
1.1.2 Condomínio voluntário ................................................................................. 15
1.2 Condomínio edilício .................................................................................................. 15
1.2.1 Convenção e regimento interno .................................................................... 18
1.3 Direito de propriedade sob a ótica do condomínio ................................................... 20
2 AS PLATAFORMAS DIGITAIS DE ALUGUEL DE IMÓVEIS E OS CONTRATOS
DE LOCAÇÃO ........................................................................................................................ 23
2.1 Contratos de locação residencial ............................................................................... 24
2.2 Contratos de locação por temporada ......................................................................... 25
2.3 Contrato de hospedagem ........................................................................................... 27
2.3 Contrato de short-rental ............................................................................................. 28
3 LOCAÇÃO EM CONDOMÍNIOS ATRAVÉS DAS PLATAFORMAS DIGITAIS E
AS ADEQUAÇÕES DAS CONVENÇÕES CONDOMINIAS ............................................... 30
3.1 Discussão referente ao desvio de finalidade do Condomínio Residencial
conforme previsão na Convenção Condominial ............................................................. 30
3.2 Entendimento dos tribunais e a legislação brasileira acerca do aluguel através
de plataformas digitais em condomínios residenciais ..................................................... 32
3.3 Sugestões de como os condomínios podem se adaptar as evoluções das formas
de locação ........................................................................................................................ 37
CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 39
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 42
INTRODUÇÃO
Não se pode discordar que a internet a cada ano vem aumentando exponencialmente o
número de usuários e os avanços tecnológicos que diminuem o tempo para a resolução de
questões e problemas presentes no cotidiano, sobretudo, no que se refere às relações comerciais
e de comunicação, se tornando, portanto, ferramenta imprescindível para mediar e dar maior
dinâmica as relações humanas.
Neste passo, se tratando do ramo de locação de imóveis, não foi diferente, as inovações
tecnológicas através dos aplicativos digitais, abriram diversas possibilidades e implementaram
formas para que houvesse uma comunicação mais rápida entre locador e locatário, assim como
a realização de pagamento por vias digitais através de cartão de crédito, por exemplo, agilidade
na reclamação e resolução de eventuais problemas entre locador e locatário, custo operacional
e de mão de obra mais baixo, refletindo diretamente no valor das locações, ou seja, valores mais
acessíveis quando comparados às diárias de hotéis convencionais.
Assim sendo, esta forma de locação de imóveis residenciais por curto espaço de tempo,
vem sendo discutida juridicamente e por alguns doutrinadores como se fosse uma hospedagem,
assim como, há outra corrente que afirma que essa forma de locação não passa de nada mais do
que uma locação por temporada, causando, portanto, os primeiros conflitos após a chegada das
plataformas digitais no mercado de locação de imóveis. Ademais, cumpre ressaltar que os
modelos de contrato de locação apresentado pelas plataformas digitais diferem dos modelos
convencionais de contrato de locação que comumente ocorriam nos condomínios edilícios
residenciais, uma vez que, costumeiramente celebravam-se contratos com períodos mais
longos, em que o inquilino tinha como finalidade do aluguel do imóvel para fim estritamente
residencial.
Destarte, deve se destacar que o condomínio edilício é um espaço em que reuni ambientes
privados e outros de uso coletivo. Portanto, o proprietário da sua unidade constitucionalmente
pode usar, gozar e dispor livremente, ou seja, existe a discriminação e individualização das
unidades de propriedade exclusiva, que diferem das partes comuns, isto é, que pertencente a
todos os condôminos através de fração ideal, na qual, o condômino deve exercer seu direito de
propriedade, desde que observada as regras estipuladas, através das assembleias, regimento
interno e convenção condominial.
Deste modo, em virtude da evolução tecnológica, omissão legislativa, bem como por
muito tempo a falta de um posicionamento jurisprudencial pacífico acerca do assunto, as
demandas são resolvidas individualmente buscando um equilíbrio no que concerne ao direito
de propriedade e o interesse comum do condomínio.
O presente trabalho aborda e discute os problemas causados pela evolução das formas de
locação de imóveis residenciais através das plataformas digitais em Condomínios Edilícios com
finalidade residencial devido às proibições das Convenções Condominiais e a discussão nos
tribunais para a interpretação das normas legislativas que versam acerca do tema.
Quanto aos resultados da pesquisa, tem como finalidade a ampliação dos conhecimentos
sobre a temática, por tanto se trata de uma pesquisa pura. No que se tange aos fins, classifica-
se a pesquisa como exploratória e descritiva, pois busca o aprofundamento e aprimorar as ideias,
descrevendo a situação quando se ocorre a investigação, classificando e interpretando os fatos.
Quanto à abordagem a pesquisa é qualitativa, enfatiza a compreensão e a interpretação do tema,
atribuindo significado aos dados e informações coletadas e analisado para estudar um fenômeno
num único trabalho, visto que, a interação entre tais metodologias fornece melhores
possibilidades analíticas acerca da problemática.
Por fim, no terceiro capitulo, o tema foi os novos meios de locação de imóveis residenciais
e as discussões geradas devido às interpretações do judiciário das normas legislativas
concernentes ao suposto desvio de finalidade do imóvel e a legalidade ou não da proibição de
algumas Convenções Condominiais para que ocorra essa forma de locação, trazendo algumas
sugestões de como os condomínios e as convenções podem se adaptar as evoluções
tecnológicas.
Desta forma, busca-se entender e apresentar as discussões acerca das novas formas que
se realiza a locação de imóveis em condomínios edilícios residenciais, bem como o fato da
legislação e as convenções condominiais não acompanharem a constante mudança e evolução
proporcionada pela internet através dos seus aplicativos de locação causando diversas
discussões e litígios acerca do assunto.
1 AS ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO E O DIREITO DE
PROPRIEDADE
Neste primeiro capítulo, será exposto um breve estudo acerca do instituo jurídico
condomínio, conceituando e demonstrando suas espécies, assim como, as principais
características, requisitos de validade, fundamentos legais e os institutos de cada espécie de
condomínio.
Por força dessa ideia, Venosa (2003), apresenta diversas formas de maneira histórica de
como se compreendia o condomínio. Em princípio o direito Romano era individualista de
maneira exacerbada, haja vista que, o inicio do condomínio em Roma não carece de muitos
adeptos, em razão, do forte controle do poder familiar. A comunidade familiar era o exemplo,
no qual, situava-se o instituto condomínio. O contraponto era que os mesmos existam mesmo
com diversas limitações, uma vez que, não se permitia que mais de um indivíduo
desempenhasse o direito sobre a mesma coisa. Entretanto, algumas causas alheias a aquele que
detinha o poder familiar, como sua morte, existindo, portanto, a sucessão hereditária, sendo
criado o condomínio, formando a teoria condominial intrínseca ao exercício da propriedade,
conforme as codificações de Justiniano a época demonstrava.
No entanto, com base nas lições de Caio Mario da Silva Pereira (2021), o condomínio no
Direito Romano em tese, não era um instituto desconhecido, apesar de todas as limitações
acerca da propriedade e sua importância à época para aquele que eram os detentores do poder
familiar. De acordo com Pereira (2021, p. 33) dispõe que “Não era, todavia, desconhecida, em
Roma, a superposição habitacional: ao contrário, conhecida e praticada”. Não era indiferente ao direito:
ao revés, observada e disciplinada.’’
De acordo com o autor Wald, citado por Venosa (2003), o direito brasileiro teria
preponderantemente enraizada a tradição romana do que se compreende o condomínio,
baseando e denominando o que seria a parte de cada proprietário como fração ideal. Contudo,
é de ser relevado que há traços e embasamentos na concepção germânica do que seria
condomínio, facilitando, portanto, a compreensão no regime matrimonial que acontece a luz da
comunhão universal de bens, no qual, não estabelece delimitações de cotas ou fração ideal entre
os cônjuges.
Nesse contexto, cumpre ressaltar que no ordenamento jurídico brasileiro existem espécies
diferentes de comunhão de duas ou mais pessoas sobre o mesmo bem formando o condomínio
comum, ou seja, maneiras diversas, nas quais, originam-se o condomínio, no qual, podemos
denominar de voluntário ou necessário.
Nas referidas hipóteses, o ‘proprietário que tiver direito a estremar um imóvel com
paredes, cercas, muros, valas ou valados, tê-lo-á igualmente a adquirir meação na
parede, muro, valado ou cerca do vizinho, embolsando-lhe metade do que atualmente
valer a obra e o terreno por ela ocupado’ (CC, art. 1.328; v. também art. 1.297). Não
convindo os dois no preço da obra, será ele arbitrado por peritos, a expensas de ambos
os confinantes (art. 1.329). ‘Qualquer que seja o valor da meação, enquanto aquele
que pretender a divisão não o pagar ou depositar, nenhum uso poderá fazer na parede,
muro, vala, cerca ou qualquer outra obra divisória’ (art. 1.330).’ (GONÇALVES,
2020, p. 162).
bens, todos os herdeiros são considerados titulares de cota parte ou fração ideal do montante
total da herança, (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 1075), sendo essa uma das
espécies de condomínio comum e suas modalidades previstas no ordenamento jurídico
brasileiro.
A espécie de condomínio denominado de voluntário tem sua origem a partir das vontades
das partes, constituindo-se uma propriedade conjunta, ou seja, mais de uma pessoa
convencionam e exercem o direito conjuntamente sobre a propriedade. Os proprietários têm em
sua titularidade que se denomina de quota-parte ou fração ideal, tendo que compartilhar a
utilização do bem ou propriedade com todos os titulares.
O ordenamento jurídico brasileiro reforça de maneira mais especifica em seu artigo 1.314
do Código Civil Brasileiro de 2002, que “Cada condômino pode usar da coisa conforme sua
destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de
terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.”.
Diante disto, não há dúvidas que neste tipo de condomínio possamos apresentar o
condomínio edilício como um exemplo de condomínio voluntário ou o formado em imóveis
através de frações ideais sobre o terreno conjugadas com as unidades construídas ao lado de
partes comuns, do uso e fruição de todos os condôminos, mas que recebe tratamento legal
específico (RIZZARDO, 2021). Sendo ao condomínio edilício e as relações com as locações
através de plataformas digitais o objeto do presente estudo.
De acordo com Arnaldo Rizzardo (2021), historicamente o condomínio edilício teve sua
existência mesmo que de maneira mais desorganizada ou com animus de exclusividade maior
devido os costumes da época desde os fracionamentos de prédios ou de casas na Babilônia. No
Egito antigo, bem como na Grécia já havia relatos de edificações com mais de um titular ou
com diversos moradores. Em Roma, a espécie de condomínio alvo estudo por diversos juristas,
caracterizava de maneira forte a capacidade de conciliar o individual e o coletivo frente os
múltiplos proprietários conforme exposto por Caio Mario da Silva Pereira (2018, p. 33).
Com a ocupação humana desenfreada nos grandes centros urbanos e com avanços nas
formas de construção imobiliária o condomínio edilício ganhou maior destaque e necessitou de
uma regulamentação mais especifica para que seja possível sanar problemas causados por
consequência da vida em condomínio.
O Código Civil de 1916 não se ocupou da matéria. [...] o direito pátrio promulgou o
Decreto no 5.481, de 25-6-28, que traçou as primeiras normas, de forma insatisfatória.
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Apenas em 1964 é promulgada a Lei no 4.591/64, que sofreu algumas alterações pela
Lei no 4.864/65, denominada de Condomínio e Incorporações, detalhando essa
modalidade de propriedade.
Assim sendo, é de ser relevado que com o passar dos anos o conceito de condomínio
edilício foi modificado até o que conhecemos atualmente, significando propriedades que se
firmam sobre quotas ideais, estabelecendo propriedades conjuntas sobre partes comuns,
existindo, portanto, direitos conjuntos de exercício dominial sobre a coisa, dando-se o exercício
da propriedade de todos sobre o todo (RIZZARDO, 2021), ou seja, há propriedades por quotas
ideais, bem como sobre a propriedade em geral. Carlos Roberto Gonçalves (2020, p. 165)
conceitua e aponta as características do condomínio edilício no ordenamento jurídico brasileiro:
vertical ou em planos verticais é aquele cujas unidades privativas são separadas por
planos virtuais verticais. Trata-se dos famosos condomínios de casas.
Igualmente, se faz interessante elencar que não existe um consenso no que diz respeito à
natureza jurídica do condomínio edilício, uma vez que existem duas espécies de direito de
propriedade no mesmo empreendimento, o individual e coletivo, não sendo pacifica entre os
doutrinadores se estamos defronte de uma pessoa jurídica ou um ente despersonalizado.
Dessa forma, a ideia defendida por alguns doutrinadores de que o condomínio edilício se
trata de uma pessoa jurídica encontra fundamento no Enunciado 144, da III Jornada de Direito
Civil, que aduz: “a relação das pessoas jurídicas de direito privado constante do art. 44, incs. I
a V, do Código Civil não é exaustiva”. Todavia, de acordo com o entendimento de Farias e
Rosenvald (2015), o condomínio edilício não sendo pessoa jurídica tampouco física, no entanto,
nos atos judiciais, estará apto para figurar no polo passivo ou ativo, uma vez que esteja
devidamente representado por sindico devidamente eleito, que pode ser pessoa física ou
jurídica, que esteja no momento exercendo a administração do condomínio.
Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento,
registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do
disposto em lei especial:
I - a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva,
estremadas uma das outras e das partes comuns;
II - a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno
e partes comuns;
III - o fim a que as unidades se destinam.
O código civil brasileiro com previsão no artigo 1.333, prevê expressamente a Convenção
do Condomínio como um dos atos de constituição do condomínio que contém de forma escrita
os direitos e deveres que os condôminos e subscrita por parte dos proprietários daquela
edificação, regulamentando a sua utilização. O documento da Convenção Condominial não se
assemelha aos contratos comuns, tendo em vista que a convenção condominial sujeita todos os
proprietários das unidades ou quantos sobre elas tenham posse ou detenção, atuais ou futuros,
conforme os ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves (2020).
O segundo ato de constituição se trata de do Regimento Interno, que segundo Silvio Salvo
Venosa (2003) deve conter nesse documento tudo aquilo que “não for essencial à constituição
e funcionamento do condomínio, mas de cunho circunstancial e mutável, deve ser relegado para
o regi- mento (ou regulamento) interno”. Portanto, o condomínio complementará a convenção,
bem como regulamenta-la sem que exista qualquer conflito de normas entre os documentos,
sendo assim o regimento uma terceira fase do condomínio edilício, sucessivamente a instituição
e convenção.
Por fim, deve ser observado que apesar do caráter normativo apresentado pelos
documentos de Convenção e Regimento Interno, há uma hierarquia no que se refere a as
normas, não podendo o Regimento Interno justapor a Convenção e este não pode se colocar ou
conflitar a legislação, sob pena de ser considerada uma clausula nula.
Posto isto, observa-se que nos dias atuais com o aumento explosivo do número de pessoas
que estão vivendo em condomínio ou dividindo edificações com salas comerciais, alguns
problemas surgem e discussões como a limitação do direito de propriedade pelas Convenções
condominiais se tornam mais comuns, necessitando do judiciário e dos princípios
constitucionais para a resolução desses conflitos.
O direito de propriedade é um dos mais amplos direitos reais, tendo um certo privilégio
no sistema jurídico nacional. Outrossim, não significa que o proprietário tem o direito e poderes
ilimitados, ou seja, não pode fazer o que bem entender. Atualmente se entende que a
propriedade tem deve ser utilizada como bem entender pelo proprietário, entretanto, não de
forma arbitraria, ou seja, encontra limitações no que diz respeito ao bem-estar social, limitações
estas reguladas pelo direito de vizinhança, utilizadas comumente para fundamentar restrições
em condomínios edilícios.
Assim, é nesse sentido que deve ser entendido o que procura dizer o artigo. O uso dos
poderes ou das faculdades inerentes à propriedade presume-se objetivamente pleno,
sob esse prisma. Subjetivamente, o direito de propriedade será pleno se houver apenas
um titular, apenas um proprietário. Se a coisa pertencer, concomitantemente, a mais
de uma pessoa, existente o condomínio, existe uma restrição subjetiva na propriedade.
O condomínio possui regras próprias tradicionais. Quanto às restrições objetivas ao
direito de propriedade, já nos referimos neste estudo: são de caráter constitucional,
administrativo e de direito privado, como nos direitos de vizinhança. A limitação à
propriedade também pode decorrer de ato voluntário, como imposição das cláusulas
de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade, em doações e
testamentos.
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Diante disto, fica evidente que o legislador se preocupou em que a função social da
propriedade não estivesse restrita somente aos cuidados de preservar os direitos individuais ou
coletivos, mas, além disso, fosse possível a proteção, por exemplo, do meio ambiente,
patrimônios históricos, fauna, flora e etc. “O direito de propriedade sobre bens móveis ou
imóveis, rurais ou urbanos, desloca seu foco do absolutismo e do individualismo para
consolidá-lo sobre o interesse social.” (DANELUZZI; MATHIAS, 2019, p. 9), portanto,
demonstra com isso, que interesses isolados e individualistas em contraposição ao coletivo,
exigindo-se que a propriedade exerça sua função social para o bem-estar comum.
A plataforma digital utilizada como exemplo no parágrafo anterior tem como objetivo ser
uma ponte entre os usuários, ou seja, uma conexão entre aqueles que está em busca de um local
para se hospedar e pessoas dispostas a oferecerem uma acomodação recebendo uma
contraprestação pecuniária. Diversas são as vantagens para os usuários na utilização do
aplicativo, preço na maioria das vezes mais barato que hotéis e pousadas, a facilidade de
utilização do sistema, bem como a rapidez para avaliar os imóveis anunciados e contar sua
experiência em tempo real se for preciso, aumentando um nível maior de confiança aos usuários
da plataforma.
Dessa maneira, muitos desses imóveis ofertados nessas plataformas digitais estão
localizados em condomínios edilícios, tal fato vem representando desafios e conflitos que
começam a ocorrer entre o direito de propriedade e o direito de vizinhança, disposições
estipuladas na convenção condominial. (SPERB, 2019). Além disso, cumpre ressaltar que os
problemas vão além da compatibilização com os condomínios edilícios, há dificuldades em
definir estes novos contratos, surgindo, portanto, diversos questionamentos acerca da natureza
jurídica, como compatibilizar com condomínios edilícios e suas convenções e etc.
Diante disso, podemos observar que os novos meios de locação de imóveis de maneira
digital desencadearam diversos questionamentos no âmbito jurídico concernente a qual forma
de contrato de locação. Alguns doutrinadores entendem que se trata de uma locação residencial
por temporada, regido pela Lei 8.245/91, todavia, outros juristas consideram como serviço de
hotelaria ou hospedagem, disposto pela Lei 11.771/08.
Neste contexto de indefinição doutrinaria quanto como enquadrar a forma de aluguel por
plataformas digitais em contratos de hospedagem, temporada ou se seria necessário a criação
de uma nova definição contratual para o instituto. Deve ser pontuado que atualmente existe
locação residencial de imóveis urbanos, são classificas por locação residencial, locação por
temporada, bem como, por outro lado existe o contrato de hospedagem e uma nova forma, até
o presente momento reconhecido por poucos doutrinadores, denominado de contrato de short-
term rental.
As locações denominadas como residenciais são pautadas pela Lei de nº 8.245/1991, que
é titulada como Lei do Inquilinato, tal diploma legal, de maneira expressa, afasta qualquer
possibilidade de legislar acerca de locações realizadas “em apart-hotéis, hotéis - residência ou
equiparados, assim considerados aqueles que prestam serviços regulares a seus usuários e como
tais sejam autorizados a funcionar” (art. 1º, §1º, alínea a, item 4).
De acordo com Sylvio Capanema Souza (2012, p 255), o referido artigo teve como
“objetivo evidente da lei dilatar o prazo inicial dos contratos de locação residencial”, ou seja,
assegurando o caráter residencial, uma vez que tal medida dar maior segurança ao inquilino de
que pode se estabilizar, desde que não esteja em desacordo com outras hipóteses previstas em
lei, naquele imóvel e localidade, sem temer que o imóvel vá ser solicitado a qualquer momento.
Dessa forma, sabendo como é disposto o contrato de locação residencial, sua estrutura, o
dispositivo legal responsável por disciplinar, e sua finalidade. Verifica-se que o negócio
jurídico advindos das relações entre os usuários das plataformas digitais para a locação de
imóveis que exigem uma rápida estadia, com tempo de permanência infinitamente inferior ao
prazo de 30 meses, por exemplo, no imóvel locado, não se encaixando nos requisitos, tampouco,
cumpre finalidade de um contrato de locação residencial.
Por outro lado, no que se refere à locação residencial, é importante que seja apresentado
outra espécie de contrato de locação, que os doutrinadores denominam de contrato de locação
por temporada. A referida espécie de locação residencial tem sua definição expressa no artigo
48 da Lei n° 8.245/1991, portanto, no que concerne a locação “[...] destinada à residência
temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de
obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão somente de determinado tempo [...]”
(BRASIL, 1991).
Assim sendo, observa-se que com intuito de dar maior dinâmica às locações por
temporada à legislação atual retiraram do rol de obrigatoriedade as condições de que o imóvel
estivesse localizado em orla marítima ou estação climática e que o locatário seja residente de
outra cidade, exigindo apenas que o prazo de duração não pudesse exceder os 90 dias, conforme
previsão da Lei do Inquilinato.
Todavia, cumpre ressaltar que existe uma corrente doutrinaria que entende que no que
concerne ao contrato de locação através das plataformas digitais não pode ser classificada como
uma modalidade de locação por temporada, uma vez que, é vista pelos locadores quanto como
os locatários como uma atividade predominantemente comercial que em regra a contraprestação
pela a estadia ocorre através da cobrança de diárias e, portanto, não são atividades que possam
ser regidas pela lei do inquilinato. Dessa forma, alguns doutrinadores classificam como
atividade de hotelaria ou considera que estaríamos defrontes a um contrato atípico, conforme
bem contextualizado pelas pesquisadoras Jenucy Espíndula Brasileiro e Renata Reis de Lima
(2017, p. 8):
[...] a referida atividade não pode ser considerada uma modalidade de Locação por
Temporada, haja vista não se tratar uma atividade de cunho residencial, mas sim em
característica eminentemente comercial (atividade de hotelaria), pautando-se em um
contrato atípico, em que as locações se pautam na cobrança de diárias e, portanto, não
são atividades que possam ser regidas pela lei do inquilinato.
Por fim, verifica-se que mesmo que não exista a intenção do locatário de tornar aquele
imóvel como residência conforme a finalidade do contrato de locação residencial, o contrato de
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locação por temporada também não pode ser confundido com o negócio jurídico celebrados na
rede hoteleira ou assemelhados, nos quais, são oferecidos serviços regulares aos hóspedes, “[...]
caracterizando, muito mais, o contrato atípico de hospedagem”. (SOUZA, 2017, p. 221).
Em vista disso, é de ser relevado que as características e a forma que é feita e conduzida
por todo o processo de estadia no formato de locação através das plataformas digitais, por muita
das vezes se distanciam do contrato de locação residencial e locação por temporada, sendo,
portanto, possível observar que em determinado momento o negócio jurídico é classificado por
alguns doutrinadores e pesquisadores como um contrato de hospedagem.
Por conseguinte, “Na locação apenas se transmite posse e com ela o uso da coisa. Na
hospedagem, são oferecidos serviços” (MIRAGEM, 2016, p. 528), isto é, não há uma espécie de
hierarquia no que concernem as opções de entregar a coisa e prestar o serviço. O hospedeiro “[...]
faz mais do que locar”, pois a entrega do bem é somente um dos elementos do contrato.
(MIRANDA, 2006)
Dessa forma, é possível observar diversos pontos daqueles que fazem a cessão da
propriedade através das plataformas digitais semelhantes com a hospedagem, como por
exemplo, “termos usados para o ingresso e saída do imóvel: check-in e check-out, a ocupação
temporária; remuneração e disponibilização de facilidade” (DANELUZZI; MATHIAS, 2019,
p. 20). Vale ressaltar que alguns municípios exigem que haja o recolhimento de impostos
referente à ocupação, entendendo-se, portanto, como atividade turística, ratificando a
similaridade com a hospedagem.
Igualmente, cabe registrar que o negócio jurídico realizado através das locações de imóveis
em plataformas digitais, por não ter uma definição em que formato se enquadra, vem trazendo
muitos problemas, principalmente, em condomínios residenciais, uma vez que, restrições daquele
empreendimento são dirigidas aos hospedes ou locatários “são de responsabilidade dos
condôminos-anfitriões em face do condomínio, independentemente da responsabilidade contratual
entre condôminos/anfitriões e hóspedes/locatários.” (DANELUZZI; MATHIAS, 2019, p. 20).
Sendo necessário ressaltar que as supostas violações, em sede condominial, dos deveres
poderão ensejar multa, cuja incidência, em virtude da violação, estiver previamente definida na
convenção condominial.
De acordo com Jenucy Espíndula Brasileiro e Renata Reis de Lima (2017, p.8), nota-se
que mesmo que a atividade de acomodação através das plataformas digitais de locação seja
considerada meio de hospedagem ou locação por temporada, consonante posicionamento do
Ministério do Turismo, se observa a necessidade da regulamentação dos aplicativos, com
melhor definição legal da atividade, dos direitos do consumidor, bem como a definir sobre se
haverá limitação de períodos, e qual tributação a atividade sofrerá.
Porquanto, com base nas considerações e diferenciações abordadas e expostas nos tópicos
anteriores é possível observar que o questionamento concernente a qual a espécie de contrato
melhor retrata a relação comercial da locação de imóveis através das plataformas digitais é alvo
de embate e entendimentos doutrinários diversos.
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De acordo com Betina Kirsch Mattes Sperb (2019, p.11), “o termo short-term rental
(locação por curto prazo) parece ser adequado para definir esta nova modalidade contratual,
que muito se assemelha à locação por temporada, mas com alguns critérios distintivos.”. A
utilização comercial dessa nova espécie de contrato afastaria da lei do inquilinato, guardando
semelhança, portanto, com a hospedagem, isto é, seu tratamento jurídico dependeria do mercado.
Dessa forma, é de ser relevado que o termo short-term rental não se trata de um termo
novo, uma vez que, em Portugal, por exemplo, sempre existiu a ação de moradores locais
arrendarem suas propriedades de maneira informal, alojamentos para turistas. Neste passo,
observa-se que a novidade estaria presente, portanto, não na forma de compartilhamento e sim
na facilidade tecnológica e as inovações trazidas pelos aplicativos digitais no compartilhamento
das propriedades.
Por outro lado, não se pode negar que a evoluções descritas, por vezes, nos casos
concretos, esbarram em costumes, direitos, deveres e legislação. A locação através das
plataformas digitais especificamente muitas das vezes, a depender do entendimento, contrariam
as convenções condominiais e os direitos e deveres do condômino naquele condomínio.
Por fim, cumpre ressaltar que com a rápida evolução, ocasionado quase em sua totalidade
em razão da internet, se faz possível observar que as novas formas existentes para que se realize
as locações dos imóveis vem causando divergências de opiniões acerca da natureza jurídica dos
contratos, direito de propriedade, direito de vizinhança e a possibilidade e viabilidade das
convenções condominiais proibirem ou não essa modalidade de locação, sendo necessário a
pacificação de entendimento, a intervenção do legislador e a adequação das convenções
condominiais as novas realidades presente na sociedade.
Por outro lado, no segundo capítulo conceitua-se e traz-se a discussão acerca das
diferentes vertentes no que concerne a natureza jurídica do contrato que viabiliza a negociação
entre aqueles que se utilizam das plataformas digitais para a realizar a locação de imóveis,
através do contrato de locação por temporada, natureza comercial do contrato de hospedagem,
bem como a vertente de um contrato atípico, denominado por alguns pesquisadores de short
rental. Dessa forma, verifica-se que existe entendimentos divergentes sobre o assunto, abrindo
margem para outras omissões, proibições e lacunas legislativas que culminam em processos
judiciais na tentativa de pacificar o assunto.
De certo, pode ser observado que o mercado de locação quase em toda sua totalidade é
ofertado através das plataformas digitais, formato este de locação que mais se aproxima da
hospedagem, maneira esta, que não está apta para ser exercida em empreendimentos
residenciais, haja vista que, de uma forma ou outra, mesmo que indiretamente, acabam
alterando a rotina dos moradores, bem como, algumas regras legislativas previstas para o caso
da utilização do imóvel como unidade hoteleira, diferente do que seria uma locação por
temporada, conforme bem contextualizado pelo pesquisador Sidney César Coelho Alves (2019,
p. 32):
É fato que a locação por temporada, com respaldo na Lei de Locações, poderia ocorrer
por períodos de tempo curtos sem desvirtuar a finalidade da edificação. Porém, o uso
das estruturas prediais e os serviços oferecidos desvirtuam sobremaneira a finalidade
de locação por temporada, se enquadrando muito mais na hospedagem.
bem como em desacordo com a convenção do seu condomínio, podendo sofrer sansões por tal
pratica.
O uso de imóveis sem a autorização da convenção pode ensejar que haja multas e
mesmo proibição por parte do síndico dessa hospedagem, iniciando uma litigância
judicial que irá afetar o bom convívio social. A locação por diária é entendida como
exclusiva para meios de hospedagem como hotéis, apart-hotéis e flats que são sujeitos
ao cadastro junto a órgãos dos entes federativos e órgãos de fiscalização e controle.
Com ênfase nos serviços hoteleiros e conforto aos hóspedes por meio de suporte à
estadia. (ALVES, 2012, p. 33).
Portanto, observa-se que para o proprietário da unidade, que desejar se utilizar dos
serviços dos aplicativos digitais ou dar finalidade semelhante à de hospedagem para a sua
unidade haveria a necessidade de adequação aos requisitos, tais como alteração da convenção
do prédio e regularização perante o poder municipal. (ALVES, 2019, p. 33).
Neste passo, será possível observar posteriormente nesta pesquisa que os entendimentos
que são a favor do uso das unidades com as plataformas digitais de locação, com fundamento
no Código Civil que garante o direito de propriedade em seu artigo 1.228, que faculta o direito
de “usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-lo do poder de quem injustamente a possua
ou detenha.”. (BRASIL.2002). Os tribunais pátrios tem seguido o entendimento de proteção ao
condomínio, isto é, nos casos concretos em que não houver previsão expressa na convenção
dispositivo que permita o uso das unidades daquele empreendimento como imóveis de aluguel
por compartilhamento ou nas hipóteses em que há permissão para a utilização exclusiva da
destinação residencial das unidades do condomínio, será impossível a sua utilização para a
atividade de hospedagem remunerada.
Posto isto, cumpre ressaltar que durante um período inicial em que estavam sendo
discutido o assunto, e por não ser um tema pacifico entre juízes e doutrinadores ou tema de
repercussão geral, existiam decisões que autorizavam o proprietário da unidade anunciar o
imóvel nas plataformas digitais na modalidade diária, como por exemplo o Airbnb,
fundamentando no direito à propriedade previsto na legislação brasileira. Vejamos:
etc. Locação por temporada encontra previsão legal no artigo 48 da Lei n.º 8.245/1991
e é aquela contratada por prazo não superior a 90 dias. Restringir ou limitar o direito
do proprietário de alugar seu imóvel por breves períodos de tempo é ir além do
previsto no ordenamento jurídico, desvirtuando a sistemática vigente nas relações
privadas. É cediço que, mesmo que a propriedade seja exclusiva de seus titulares, por
força do Código Civil de 2002, devem estes sempre utilizar e gozar dentro dos limites
da Convenção Condominial e da Lei. Nesse diapasão, o Código Civil instituiu no
inciso IV do art. 1.336 os direitos de vizinhança relativos ao condomínio, vedando o
uso da propriedade condominial com fins de prejudicar a saúde, o sossego e a
segurança dos demais. Entretanto, compulsando as provas adunadas aos autos, não
restou comprovado o uso indevido do imóvel, não havendo especificação de condutas
indevidas pelos locatários, tampouco qualquer situação inóspita ou comportamento
nocivo, criada no condomínio em função da locação do imóvel pertencente à apelante.
Por fim, não se desconhece a possibilidade de alteração da convenção e a mudança da
destinação das unidades, desde que observados os requisitos previstos no Código
Civil. Todavia, não há notícias de alteração da convenção do condomínio nesse
sentido. Ao contrário, em sua inicial sustenta que a cláusula - 3, como também da
cláusula IV - 1, da convenção condominial preveem que as áreas privativas de
propriedade dos condôminos destinam-se, exclusivamente, a atividades não
comerciais, industriais ou profissionais, nem qualquer outro fim diverso do
residencial. Repise-se, é vedada a locação comercial do imóvel em questão, mas não
a locação por temporada, até porque, analisa-se a destinação do imóvel pelo fim que
lhe é dado, que, no caso, é a moradia de turistas que visitam a cidade. Portanto, não
restou demonstrado nos autos qualquer ilegalidade no fato de a apelante realizar a
locação do seu apartamento a pessoas estranhas ao condomínio por curto período de
tempo. Desse modo, a pretensão autoral de condenar a parte ré a abster-se de locar o
imóvel por temporada, com fins residenciais, não merece prosperar. Sentença que se
reforma. PROVIMENTO AO RECURSO. (TJ-RJ - APL: 00024723320178190079,
Relator: Des(a). ANDRE EMILIO RIBEIRO VON MELENTOVYTCH, Data de
Julgamento: 06/10/2020, VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de
Publicação: 14/10/2020)
Da mesma forma, o entendimento dos magistrados em alguns tribunais era que apesar do
direito à propriedade assegurado ao dono da unidade, as regras adotadas no empreendimento,
no qual, a unidade estava localizada deveriam prevalecer, uma vez que as locações recorrentes
em um curto espaço de tempo traziam certa insegurança e perturbação ao sossego dos outros
condôminos, bem como estaria desviando a finalidade do empreendimento e consequentemente
em desacordo com a convenção condominial. Como por exemplo, no ano de 2019, a 42° Vara
Cível de São Paulo decidiu que o condomínio não teria a legitimidade de impedir que os
condôminos utilizassem as unidades para locação nos aplicativos de compartilhamento a não
ser que na hipótese de alteração da convenção condominial, dentre outras decisões no mesmo
sentido, senão vejamos:
pois essa interpretação é a única que pode ser dada ao conjunto das disposições
contratuais. Ao divulgar o imóvel para locação nas plataformas digitais, o locatário
descaracterizou a finalidade residencial da locação, pois na linha do entendimento
prevalente desse Tribunal a locação de imóvel em plataformas não tem caráter
residencial. Os anúncios colacionados ao processo dão a entender que todo o imóvel
era disponibilizado para locação, até para grupos relativamente grandes (15 pessoas),
e por tempo indeterminado, o que revela não estar recebendo pessoas, esporádica e
temporariamente, enquanto o locatário mantinha no imóvel sua morada habitual.
Apelação desprovida.
Com efeito, verifica-se facilmente a discussão nos tribunais pátrios sobre a legalidade ou
não dos casos em que se proibiam a locação através dos aplicativos digitais sempre tinham seu
mérito discutido na primeira e segunda instancia. No entanto, no ano de 2019, o primeiro caso
sobre o tema foi levado até o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no qual, o recurso analisado
36
foi um REsp nº 1819075 / RS (2019/0060633-3), que versava sobre um caso que ocorreu em
Porto Alegre/RS, no qual, os proprietários do imóvel não tiveram a autorização para praticar a
atividade hospedagem em seus imóveis que se localizavam em um condomínio com finalidade
residencial, tendo o condomínio, neste caso, o pleito atendido pelo poder judiciário.
Após aproximadamente dois anos em abril de 2021, com maior número de votos, a Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu diferente do relator, definiram, portanto,
que caso a convenção condominial tenha expressa previsão de finalidade residencial das
unidades, os proprietários não estão autorizados a realizar a locação dos seus imóveis por meio
de aplicativos de compartilhamento de imóveis, como por exemplo, Airbnb. Em contra partida,
ficou decidido que a convenção pode conter autorização das unidades nessa modalidade de
aluguel. (BRASIL. STJ, 2021)
Diante disto, verifica-se que para o colegiado, a forma de reserva de imóveis pela
plataforma digital é caracterizada como uma espécie de contrato atípico de hospedagem,
conforme bem explicado e conceituado no segundo capitulo do presente trabalho, ou seja,
distinguindo-se da locação por temporada e da hospedagem que contém legislação especifica.
A decisão do STJ manteve-o “acordão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que
determinou aos proprietários de duas unidades residenciais em condomínio que se abstivessem
de oferecer seus imóveis para locação pelo Airbnb” (BRASIL. STJ, 2021), isto é, seguindo a
corrente que fundamenta a proibição no desvio de finalidade, residencial, a que o
empreendimento foi construído.
Por fim, é de ser relevado que apesar do STJ pacificar o entendimento de que não havendo
previsão na convenção condominial dispositivo que permita o uso das unidades como imóveis
para locação por compartilhamento o condômino não pode realizar atividade. A
desembargadora Isabel Galotti, em determinado momento do seu voto afirma que se faz
37
necessário que o poder legislativo crie dispositivo legal, haja vista, estarmos diante de um
contrato atípico de hospedagem, que melhor regulamente o tema, prevendo os avanços
advindos da internet e da sociedade, para que as lacunas e omissões sejam efetivamente sanadas.
Nesse meio tempo, a 4° turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por hora, unificou
o entendimento acerca das locações de imóveis em condomínios residenciais através de
aplicativos digitais. No qual, se entende que os condomínios representados pelo sindico pode
proibir a locação por aplicativos digitais se a convenção condominial prevê expressamente que
a finalidade do condomínio é exclusivamente residencial.
No entanto, deve ser observado que a sociedade é mutável, ou seja, está em constante
evolução, os condomínios residenciais por ser um local de vida em sociedade, obrigatoriamente,
deve evoluir em consonância com a sociedade em geral, ou seja, se adaptar as novas formas de
relação social, de locação, de rotatividade em virtude da vida apressada que a maioria da
população vive, dentre outras evoluções.
Com a decisão proferida pelo STJ em abril de 2021, é de extrema importância que os
condomínios que desejam acompanhar a evolução trazida pela era digital, conforme exposto
por toda a pesquisa, estabeleça juntamente com seus condôminos novas regras a serem
seguidas, realizando a alteração da convenção caso exista o interesse daqueles que fazem parte
do empreendimento de usufruir dos aplicativos de compartilhamento e as unidades possam ser
alugadas sem problemas. Ademais, se faz necessário que limites sejam estabelecidos para a
locação ocorrer, como definir o número de pessoas por unidade, obrigatoriedade de
esclarecimento aos hospedes acerca das regras de convivência daquele condomínio, evitando,
portanto, problemas relacionados a perturbação e sossego dos demais proprietários, resolvendo
de maneira mais rápidas conflitos e diminuindo drasticamente. Sendo todos esses pontos
“decidido em assembleia e com a votação prevista no Código Civil, emitindo comunicado aos
38
condôminos sobre as condições estabelecidas para a recepção dos hóspedes.” (ALVES, 2019,
p. 33).
Por outro lado, é de ser relevado que somente a decisão proferida pelo STJ não é a solução
para o problema, uma vez que, devido ao quórum de 2/3 dos condôminos para que haja a
alteração da convenção, conforme art. 1.351 do C.C/2002, torna na pratica, quase que
impossível que condomínios que desejam realizar a mudança na convenção para que seja
autorizada a locação por aplicativos digitais.
Por fim, com intuito de sanar os conflitos é de extrema importância que o poder legislativo
debata acerca do tema e crie uma legislação especifica, uma vez que estamos defronte de uma
espécie de contrato atípico, como exemplificado no capitulo 02 como contrato de short rental.
A legislação da forma contratual supracitada citada seria responsável por delimitar as formas
de contrato de locação por um curto período de tempo. Desse modo, a legislação poderia
regulamentar as locações por plataforma digitais de maneira geral, autorizando essa espécie de
locação em condomínios residenciais, bem como, a necessidade de os novos empreendimentos
já constarem na convenção condominial a autorização da locação através dos contratos de short
rental ou curto período de tempo, para que seja possível que os empreendimentos acompanhem
as evoluções das relações sociais.
CONCLUSÃO
O presente trabalho pretende propor uma reflexão acerca das evoluções que ocorrem
diariamente na sociedade advindo principalmente por conta da internet e os aparelhos moveis
que constantemente trazem inovações na maneira de como as pessoas se relacionam, se
comunicam, se locomovem, dentre outras mudanças. Com a locação de imóveis não foi
diferente, surgindo os aplicativos de compartilhamento de imóveis, facilitando as formas de
comunicação, pesquisa e pagamento, bem como, a agilizando nas locações dos imóveis por
tudo ocorrer de maneira digital.
Entretanto, verificou-se que com a evolução na forma que as locações de imóveis estão
acontecendo uma crescente demanda judicial, de maneira mais especificas para imóveis
localizados em condomínios edilícios residenciais, acerca da natureza jurídica do contrato
firmado através das plataformas digitais, litígios com fundamentos no direito de propriedade e
o direito de vizinhança, desvio de finalidade das convenções condominiais, bem como, a
desatualização da convenção condominial a realidade social atual e a dificuldade dos próprios
condôminos de realizar alterações devido o quórum de votação.
À visto disso, para que fosse possível entender toda a situação e divergências que cercam
a locação através de aplicativos digitais e os condomínios residenciais, no primeiro capítulo do
presente trabalho foi exposto o instituto jurídico “condomínio”, conhecendo o que seria o
condomínio geral, condomínio edilício, pontuando a importância da convenção condominial e
regimento interno nessa espécie de condomínio, bem como, entendendo assim toda a evolução
histórica do instituto, seu conceito, requisitos para a sua validade, os fundamentos legais e os
institutos de cada espécie de condomínio. Junto a isto, foi abordado o direito à propriedade e
sua função social nos condomínios edilícios, sendo possível entender os direitos e deveres
daquele que detém a propriedade em um condomínio edilício com finalidade residencial.
Por fim, com base nos fatos expostos no presente trabalho, assim como, as decisões dos
tribunais pátrios e o recente julgamento do STJ sobre a temática, sugeriu-se que haja a
regulamentação dos contratos denominados de short rental, como por exemplo ao número de
dias mínimo ou máximo da locação do imóvel ou vezes que ocorre a locação para evitar a alta
rotatividade. Ademais, tendo em vista a dificuldade da alteração da convenção condominial
devido ao seu alto quórum de 2/3, que os novos empreendimentos desde a instituição e criação
41
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