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Europa Regula o Mercado de Serviços Digitais - Migalhas
Europa Regula o Mercado de Serviços Digitais - Migalhas
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German Report
Europa regula o mercado de serviços digitais
Karina Nunes Fritz
terça-feira, 21 de março de 2023
Atualizado às 08:22
Por aqui, o tema está sob os holofotes, encontrando-se na pauta do Supremo Tribunal
Federal, que irá realizar audiência pública no próximo dia 28/3 para tratar de pontos da
Lei 12.965/2014 (Marco Civil da internet) que eximem as empresas de tecnologia de
responsabilidade sobre conteúdos compartilhados por seus usuários.
A audiência deveria ter sido realizada em março de 2020, mas acabou suspensa por
causa da pandemia. Centro da polêmica é o art. 19 do Marco Civil da Internet que só
obriga as plataformas a promover a remoção de conteúdo mediante decisão judicial.
Para se ter a dimensão dos riscos envolvidos nas atividades de mediação - leia-se:
seleção e recomendação personalizada - de conteúdo realizada pelas grandes
plataformas, basta lembrar o escândalo da Cambridge Analytics, a importância das
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fake news no processo de votação do Brexit, nas eleições de Donald Trump e Jair
Bolsonaro, além dos atos terroristas de 8 de janeiro.
Nos Estados Unidos, a Seção 230 da Lei de Decência das Comunicações - criada em
1996 a fim de fomentar o desenvolvimento da internet e que inspirou a legislação de
países como o Brasil (vide o malfadado art. 19 do Marco Civil da Internet) -
praticamente blinda as big techs de qualquer responsabilidade por publicações dos
usuários, reservando a elas apenas a função de "moderação" de conteúdo.
Uma das ações foi proposta pela família de Nohemi Gonzale, jovem americana morta
em um dos atentados realizados pelo Estado Islâmico em Paris, em novembro de 2015.
A família processou o Google, argumentando que algoritmos do YouTube
recomendaram a seus usuários vídeos de propaganda do Estado Islâmico, com o que
a empresa teria contribuído para a radicalização dos usuários da plataforma1.
Matéria do jornal O Globo, do dia 10/3, informa que em outro caso, empresas de
tecnologia como Twitter, Google e Facebook, recorreram à Suprema Corte após serem
derrotadas em ação que apontou haver cumplicidade das plataformas com atos de
terrorismo, já que hospedam o conteúdo de usuários que apoiam grupos que praticam
esses atos violentos.
Segundo o jornal alemão Die Welt, os juízes da Suprema Corte mostraram-se céticos
em relação à pretensão da família da jovem vítima de ataque terrorista. O justice
Clarence Thomas teria expressado dúvidas de que o algoritmo poderia ter contribuído
para os ataques terroristas, vez que se trata do mesmo algoritmo que recomenda
vídeos sobre a preparação de pratos com arroz3.
não mudaria a situação das plataformas, vez que, ao produzir textos, elas passariam à
situação de produtoras de conteúdo, não tuteladas pela Section 2304.
Independente da decisão da Suprema Corte, muita água ainda vai rolar até que os
Estados Unidos tenham uma lei tão moderna quando a europeia.
A regulação europeia
Com efeito, de olho na importância assumida pelas novas tecnologias digitais em
todos os aspectos da vida moderna, bem como nos riscos e desafios a ela inerentes, a
União Europeia decidiu intervir e regular o mercado.
Assim, em 2022, o Parlamento Europeu aprovou duas leis que devem aumentar a
fiscalização do mercado digital e trazer maior proteção aos usuários (consumidores e
comerciais): o Digital Services Act (DSA), a Lei dos Serviços Digitais e o Digital Markets
Act (DMA), a Lei dos Mercados Digitais.
Com isso, a União Europeia se torna a primeira jurisdição a submeter as big techs a um
amplo conceito regulatório. Ambos os regulamentos estabelecem normas claras para
o funcionamento do mercado digital e para a prestação de serviços digitais no
continente europeu em conformidade com os direitos e valores fundamentais da
União Europeia.
"As grandes empresas de plataforma estarão sujeitas a regras claras e duras e não
poderão mais determinar unilateralmente as regras do jogo. Durante muito tempo, os
grandes gigantes digitais como Google, Facebook, Amazon & Co dominaram o mercado,
tornando quase impossível aos novos concorrentes ganharem uma posição de
destaque. No futuro, um código de conduta claro será aplicado a todas as grandes
empresas digitais"7, disse ele.
O Digital Markets Act tem regras mais rígidas para os gatekeepers, como a vedação de
publicidade personalizada, que só poderá ser feita com o consentimento do usuário, o
que acaba restringindo o uso de dados pessoais pelas big techs (art. 5, inc. 2). A lei
obriga ainda as gigantes digitais a garantir uma maior interoperabilidade com os
produtos e serviços de terceiros, a oferecer mecanismos mais fáceis para
desinstalação de softwares e sistemas operacionais (art. 6, inc. 7), além de assegurar
uma maior portabilidade dos dados.
Os dos and don'ts impostos às grandes empresas de tecnologia são sancionados com
pesadas multas em caso de infrações (até 10% do faturamento) e reincidências das
obrigações legais impostas.
Para isso, a lei impõe uma série de obrigações legais a todos os fornecedores de
serviços digitais, que intermediam bens, serviços e conteúdos aos consumidores. A
ideia central que guiou a elaboração da lei foi a seguinte: o que é ilegal fora da
internet, deve ser ilegal no mundo virtual e quanto maior a empresa, maior a
responsabilidade.
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O DSA trata dos serviços digitais, com o que abrange uma gama de serviços online,
desde a disponibilização de simples websites até serviços de infraestrutura de internet,
plataformas online, serviços de hospedagem, etc.
As regras especificadas na Lei de Serviços Digitais são dirigidas a todos aqueles que
fornecem produtos, serviços ou conteúdos aos consumidores. O legislador europeu
teve em mira, porém, em primeiro lugar, os intermediários e plataformas online, como
mercados online, redes sociais, plataformas de compartilhamento de conteúdo, lojas
Compartilhar
de aplicativos e plataformas de viagens e acomodações online.
Dentre eles estão novamente os gatekeepers, ou seja, as grandes plataformas digitais
como Google, Facebook, Apple, Microsoft e Amazon, que têm um papel sistêmico no
mercado e funcionam como intermediários entre empresas e consumidores de
importantes serviços digitais. O art. 25, inc. 1 do DSA define as grandes plataformas
como aquelas que possuem pelo menos 45 milhões de usuários ativos por mês dentro
da União Europeia.
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Elas devem tomar medidas adequadas para mitigar os riscos e se submeter a auditoria
externa e independente que avaliará seus serviços e a adequação das medidas de
mitigação adotadas, além de se estarem sujeitas a diversas obrigações de prestação
de contas. Além disso, elas terão de facilitar o acesso a seus dados e algoritmos às
autoridades e aos técnicos habilitados.
Como a lei visa proteger os direitos fundamentais dos usuários de internet, as novas
regras para tutelar a liberdade de expressão dificultam a tomada de decisões
arbitrárias pelas plataformas na moderação dos conteúdos e oferecem aos usuários a
adoção de novas medidas contra a plataforma quando seus conteúdos forem
moderados.
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O Digital Service Act entrou em vigor em novembro de 2022, embora muitas de suas
normas só passarão a valer a partir de fevereiro de 2024. O diploma prevê pesadas
multas em casos de infrações, as quais podem chegar a até 6% do faturamento anual
da empresa infratora.
Resumo da ópera
Do exposto, conclui-se que a Europa deu passo importantíssimo na regulação da
internet com os dois diplomas legais: DSA e DMA. Ambos visam, em suma, disciplinar o
mercado digital e o poder das grandes plataformas de tecnologia, chamando-as a
assumir responsabilidades e a atuar em harmonia com os valores e os direitos
fundamentais dos usuários europeus. O que se almeja, em suma, é um mercado digital
mais ético e transparente.
Esses discursos, apesar do barulho, visam, no frigir dos ovos, tão somente impedir a
regulação do mercado digital, que fatura cifras astronômicas com a mineração e o
tratamento de dados e tem - além de asfixiado a concorrência - subtraído direitos e
poderes importantes dos usuários, nos lançando na era do chamado "feudalismo
digital", na qual os consumidores, tal como os vassalos medievais, detêm apenas a
posse de produtos digitais, vez que muitas das faculdades inerentes ao domínio
permanecem enfeixadas nos copyrights dos novos senhores feudais: as big techs.
O Brasil deve seguir o exemplo do continente europeu. Afinal, todos ganham com uma
regulação eficiente do mercado digital: as empresas de tecnologia, a concorrência, os
usuários consumidores... e a democracia.
__________
1 Julgamento da Suprema Corte dos EUA deve ditar rumos de big techs no Brasil e no mundo. Entenda
por quê. O Globo, 10/3/2023.
2 EMERJ discute fake news, discurso de ódio e liberdade de expressão - Parte I. Coluna German Report,
Migalhas, 23/8/2022.
5 Strengere Regel für Technologiekonzerne: EU-Parlament stimmt Digital Services Act zu. LTO, 5.7.2022.
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6 No original: "Mit dem Gesetz über digitale Dienste gibt es nun einen klaren Rechtsrahmen. Online-
Plattformen stehen im Mittelpunkt wichtiger Aspekte unseres Lebensalltags, unserer Demokratien und
unserer Volkswirtschaften. Es ist daher nur folgerichtig, dafür zu sorgen, dass sie ihrer Verantwortung im
Hinblick auf die Verringerung der Menge illegaler Online-Inhalte, die Minderung anderer Online-Schäden
sowie den Schutz der Grundrechte und der Sicherheit der Nutzer gerecht werden." Für ein besseres
Internet: Das Gesetz über die digitalen Dienste (DSA) tritt heute in Kraft. Disponível aqui. Acesso:
7/12/2022.
7 No original: "Die großen Plattformunternehmen werden klaren und harten Regeln unterworfen und
können nicht mehr länger einseitig die Spielregeln bestimmen. Zu lange haben die großen Digitalriesen
wie Google, Facebook, Amazon und Co den Markt dominiert, so dass es neuen Wettbewerbern fast
unmöglich war, Fuß zu fassen. Künftig gilt für alle großen Digitalunternehmen ein klarer Verhaltenskodex.".
Confira-se o comunicado publicado em 25/3/2022 no site oficial do Ministério da Economia e da Proteção
Climática (Bundesministerium für Wirtschaft und Klimaschutz), intitulado: Staatssekretär Giegold: "Mehr
Fairness und Wettbewerb auf digitalen Märkte".
Siga-nos no
ISSN 1983-392X
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