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Enfoque Globalizado e Pensamento Complexo
Enfoque Globalizado e Pensamento Complexo
ISBN 978-85-7307-808-4
CDU 37.012
REALIDADE
coloca
PROBLEMAS E QUESTÕES
dá respostas
CONHECIMENTO ESCOLAR
CONTEÚDOS
Conceituais Procedimentais Atitudinais
proporcionam de forma
transdisciplinar, interdisciplinar ou disciplinar
A B C D E F G H I J K L M N
Disciplinas
CONHECIMENTO CIENTÍFICO
ENFOQUE GLOBALIZADOR E PENSAMENTO COMPLEXO 61
Para dar resposta aos problemas que nos coloca a realidade, cada um
de nós dispõe de uma variedade de instrumentos de caráter diverso, con-
ceituais, procedimentais e atitudinais, que configuram o que, em uma visão
psicológica, podemos denominar estruturas cognoscitivas ou esquemas de
conhecimento e que, em uma tradição pedagógica, podemos denominar
simplesmente conhecimento. Nesse conhecimento, podemos distinguir en-
tre o conhecimento cotidiano ou também ordinário, tal como o denomina
Rozada (1997), e o conhecimento científico, no qual se diferencia o conhe-
cimento utilizado habitualmente para dar resposta a situações da vida real e
o conhecimento fundamentado pelo saber científico.
Realmente, o ensino tradicional de caráter propedêutico promoveu uma
desvinculação entre o conhecimento cotidiano e o científico, e vice-versa,
de maneira que a maioria de nós dispõe simultaneamente de dois tipos de
conhecimentos: o que nos serve em nossa vida diária e o que, apesar de
possuí-lo, sabemos utilizar somente em contextos acadêmicos (conhece-
mos uma lei física, ou uma regra morfossintática, e interpretamos e atua-
mos ante os fenômenos físicos sem relacioná-los com aquela lei, ou escre-
vemos sem lançar mão do conhecimento gramatical que possuímos).
Se entendemos que a função da escola deve ser a de prover os meios
para intervir na realidade, está claro que o único conhecimento que se deve
adquirir é aquele que seja capaz de facilitar tal intervenção. Trata-se, por-
tanto, do conhecimento “cotidiano”. Para essa finalidade, não tem sentido
a existência dos dois conhecimentos em uma mesma pessoa. Só podemos
falar de um conhecimento que nos sirva para compreender e atuar com um
maior grau de fundamentação científica, o que significa também com um
maior ou menor grau de reflexão sobre o próprio conhecimento. Ou seja,
um conhecimento com os conteúdos conceituais, procedimentais e atitudi-
nais que o configuram, elaborados a partir de parâmetros científicos; ela-
boração que será de distintos níveis, conforme as possibilidades de apren-
dizagem e dos níveis de auto-reflexão, e que, conseqüentemente, obriga-
nos a falar de diferentes graus de fundamentação. É por isso que, em um
sistema educativo que pretenda prover as pessoas de um conhecimento para
a vida, deveremos falar exclusivamente de conhecimento “cotidiano”, em-
bora possamos apreciar nele um maior ou menor grau de fundamentação e
de reflexão científica.
Se consideramos que nessa atuação para a vida também devemos in-
cluir a vida acadêmica, está claro que a coexistência dos dois conhecimen-
tos pode ter sentido. No entanto, devemos ter bem claro que, nesse caso,
estamos falando de outra finalidade educativa, quando então os conteúdos
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a ver com as antigas idéias de que os alunos e as alunas não são recipientes
vazios, ou tábula rasa que é preciso preencher. As pessoas trazem um co-
nhecimento sobre o qual se constrói a nova aprendizagem. Todos nós dis-
pomos de alguns conhecimentos que adquirimos ao longo da vida como
resultado de nossas experiências, que nos permitem dar resposta às dife-
rentes situações que a vida nos coloca. Não só devemos saber resolver
problemas e questões, como também dar explicações sobre o porquê des-
sas situações. Temos explicações de fenômenos sociais, interpessoais, físi-
cos, naturais, culturais e somos capazes de explicar os “segredos” de al-
guns dos instrumentos tecnológicos mais habituais. Temos um conheci-
mento que nos permite viver. Pois bem, esse conhecimento formado por
um conjunto mais ou menos estruturado de conteúdos conceituais, proce-
dimentais e atitudinais pode ser denominado conhecimento cotidiano, or-
dinário, comum ou vulgar, isto é, o conhecimento que utilizamos habitual-
mente em nossa vida cotidiana.
Ao mesmo tempo, em sua evolução histórica, a humanidade foi cons-
truindo um conjunto de saberes que, com modelos mais ou menos empíri-
cos, configuram o que podemos denominar conhecimento científico ou aca-
dêmico. Tal conhecimento é constituído pela soma dos saberes que dife-
rentes disciplinas tradicionais proporcionam e que formam um conjunto
organizado por matérias de fatos, conceitos, sistemas conceituais, méto-
dos, técnicas, etc. Ele permite explicar de maneira rigorosa muitos dos fe-
nômenos de desenvolvimento social, cultural e natural, e não serve apenas
para atuar, mas basicamente tenta explicar o porquê das coisas.
As diferenças básicas entre um e outro conhecimento são notáveis.
Um é o conhecimento pessoal, e o outro pode ser considerado universal;
um foi elaborado de maneira circunstancial e arbitrária e o outro deve se-
guir um processo histórico com um certo grau de linearidade; em um não
existe separação entre os diferentes âmbitos de conhecimento e o outro
está rigidamente parcializado; em um mal existe a reflexão sobre o próprio
conhecimento e, pelo contrário, tal reflexão é o que define o conhecimento
científico. No entanto, além dessas diferenças, a preocupação consiste em sa-
ber que papel o conhecimento científico há de desempenhar no desenvolvi-
mento das pessoas e como se relaciona com o conhecimento cotidiano.
O ensino tradicional permitiu a ruptura entre um conhecimento e o
outro, isso quando não o considerou como sua essência. Na escola se quis
transmitir o conhecimento científico a partir de uma hipótese que hoje po-
demos reconhecer como totalmente errônea. Considerou-se que se pode
aprender por acumulação; que saber consiste na verbalização mais ou me-
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