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G.S. KIRK © J.E. RAVEN © M. SCHOFIELD (5 FILOSOFOS PRESOCRATICOS Historia Critica com Seleccio de Textos 4.* Ediedo Traduedo de Cantos ALBERTO LouRo Fossrce SERVIGO DE EDUCACAO FUNDAGAO CALOUSTE GULBENKIAN | LISBOA NOTA INTRODUTORIA AS FONTES DA FILOSOFIA PRE-SOCRATICA A. CITAQOES DIRECTAS Os fragmentas dos pensadores pré-socritices que chegaram até nés conservamse como citagdes em autores antigas posteriores, desde Plato, rho século quarto a.C., até Simplicio, no séeulo sexta 4,C., ¢ ainda, em raros easos, em eseritores bizantinos tardios, como Jodo Tzetzss. A data da Fonte em que ocorre a citagdo nlio é evidentemente, um guia segura quanto & sua exnotidio, Assim, Platiio 6, como so sabe, negligeate nas citagdes que fz de todo 0 tipo de fontes; no raro mistura citagio com parirase, © sua atitude para com os predecessores no & frequentemente dobjectiva, mas jocosa ou irénica. Por outro lado. 0 neoplaténico Simpl que viveu um bom milénio depois dos Pré-Sozraticos, fez citagbes longas ¢ smanifestamente exactas, em particular de Parménides, Empédocles, Anaxii- goras e Didgenes de Apolénia: nlio por uma questi de adoro literirio, ‘mas porque nos seus comentirios & Fsiea e 20 De evelo de Ariststeles consi- derou necessirio, para expor as opinides de Aristeles a respeito dos predeces- sores, transerever as suns peprins palaveas. Por vezes, Simplicio levou este processo mais longe do que era necessirio, porque, confarme ele préprio declara, uma determinada obra antiga se tina tornado bastante rara Aristételes, como Plato, fez citagdes directas relativamente escassas © © seu principal merecimento reside 0s resumos © criticas que faz dos primeiros pensadores, Tirante Plato, Aristiteles e Simplicio, podemos Seleccionar, como dignas de mencio especial, es seguintes fontes de excertos verbatin () Plutareo, Mésofo acudémico, historindar ¢ ensaista do séoulo segundo 4.C., incluiu, nos seus extensos Ensaior Morais, centenas de citagses (muitas vezes por ele desenvolvidas, interpoladss’ou parcialmente refundidas) dos pensadores pré-socriticas. Gi) Sexto uEmpiricos, flésofo eéptico ¢ fisico dos finais do. séeulo segundo 4.C., expds as teorias de Enesidemo, que viveu uns dois séculos antes © que, por sua vez, se baseou, em grande medida, em Fontes helenisticas. xiv Sexto cit mumerosos passos artigos relativos ao conhecimento © A fidedigni- dade dos sentidos. (Gil) Clemente de Alexandria, chefe erudito da escola catequética, vivew na segunda metade do século segundo d.C. e nos primeiros anos do terceiro. Apesar de convertido a0 cristianismo, Clemente manteve, no centato, o sew interesse pela Iievatura grega de todos os géneros ¢ usou de lum amplo saber e de uma singular meméria para ilustrar as suas compara: {ges entre paganismo € cristianismo com frequentes citagdes de poctas ¢ filésofos gregos (mormente no seu Protrepticus ¢ nos ito livros dos Stromateis ou Misceléneas), iv) Hipélito, teélogo radicado om Roma no séoulo terceiro 4.C., esereveu uma Refitagdo de todas as Heresias em nove livros, em que ala- ‘cava as heresias cristis, acusmndo-as de serem reviveseéncias da flosofia pagh. A heresia noeciana, por exemplo, era, segundo ele, uma restauraglo a teoria de Heraclito sobre a coincidéncia dos contrévios —disputa que Hipdlito tentou fundamentar mediante a citagio de ndo menos de dezassete aforismos de Heraclito, muites dos quais teriam ficado, de outro modo, ddesconhecidos. (¥) Didgenes Laéreio compilou, provavelmente no séeulo tereeiro 4.C. as Vidas de Fildsofas Cétebres em dez volumes, obra superficial mas impor- tante para o nosso ponto de vista, Nas noticias biogrificas © doxogrificas, \erivadas sobretudo de Fontes helenisticas, incluiu ocasionais e broves citagdes. (vi) Joo Bstobeu, antologista do século quinto d.C., reuniu no seu Aurhologium excertos de cardeter educative provenientes de todos os géneros a literatura grega, mas com especial relevo para as miximas morais, Muitos fragmentos dos Pré.Soeritieos (nomeadamente de Demécrito) foram por ele conseryados, frequentemente numa forma um tanto adulterada, As principais Fontes de Estobeu foram os manuais ¢ compéndios que prok- feraram no perfodo alexandrino Aigm das principais Fontes scima indicadas, ocorrem esporadieamente citagdes dos Pré-Socriticos em outros autores: no epicurista Filodemo: em estgicos, como Marco Aurélio, 2 eelécticos. como Maximo de Tiros em esc ores cristios, além de Clemente © Hipdlito, por exemplo em Origenes; ocasionalmente em Ecio (vejase B, 4. B; as citagdes directas em Ecio sto raras); em autores téenicos, como 0 médieo Galeno, © gedgrafo Estrabio © © antologista de alimentos e bebidas Ateneu:; e, nilo menos importante, em xctitores neoplaténicos, desée Numénio, Plotinc, Porfirio e JAmblico (os dois iltimos esereveram sobre Pitigoras) até Proclo e, evidentemente © inestimavel Simplicio. Para concluir estas notas sobre as fontes de citagdes directas, forga é salientar que o autor de uma citagio directa ndo precisava de ter visto a obra original, porquanto epitomes, antologias © compéndios de toda a espéeie, xv cconltecidos desde Hipias (p. 93, n. 2) ¢ elaborados em larga escala nos trés séculos que se seguiram a fundacio de Alexandria, eram considerados como sucediineos adequados de grande mimero de ceiginais em prosa, de naturezs téenica 8, ‘TESTEMUNHOS (1) PLATAO é © mais antigo comenador dos Pré-Socriticos (se bbem que ja houvesse referéncias ocasionais em Euripides © Aristéfanes) s seus comentirios, contudo, s20 na maior parte apenas fortuitos e inspira- dos, como muitas das suas citacdes, pela ironia ou por intencdes lidicas. E assim que as suas referGncias a Heraclito, Parménides e Empédocles so na maioria dos easos despreocupados abirer dicta, alm de parciais ou exage- rados, em vez de sObrios © objectives juizos histéricos, Desde que reconhe- ‘9umos este facto, Plato tem para nds grande valor como fonte de infarmagao Um passo do Fédon (96 e ss.) fornece uma ail, ainda que breve, descrigao das preocupagdes do séeulo quinto relativas & natureza, Q) ARISTOTELES prestou aos seus predecessores em filosofia ume tengo mais séria do que Platio, ¢ prefaciou alguns dos tratados com exa- mes metédicos das suas opinides, nomeadaménte no livto A da Metafiscu Contudo, os seus juizos sZo frequentemente deformados pela visio que ‘inha da filosofia anterior, como um progresse vacilante em disecgio & ver- dade que 0 préprio Aristételes revelava nas suas doutrinas sobre a natureza, particularmente nas selativas & causalidade, E certo que na sua obra hi também numerosas eritieas sagazes ¢ valiosas, © uma grande provisio de informagoes Factuais @) TEOFRASTO meteu ombros & reducgtio da historia da flosofia anterior, desde Tales a Platio, como parte do seu contribute para a activi dade enciclopédiea organizada pelo seu mestre Aristételes — tal como Eudemo tomou a seu cargo a histéria da wologis, da astronomia © da ‘matemitica, e Ménon a da medicina. Segundo a lista das suas obras, elt borada por Didgenes Laércio, Feofrasto escreveu dezasseis (ou dezoito) liveos de Opinides de Fisiea (ou Opinides do: Fisicos; © genitive grego é Drawdy dobar), estes Foram mais tarde cendensados em dois volumes Apenas 0 iltimo livro, Sobre as sensapdes, subsiste na sua maior parte pporém, excertos importantes do primeiro livto, Sobre ax prineipios materia. foram transeritos por Simplicio nos scus comentitios & Fisica de Arist6tees, (Alguas destes excertos foram colhides por Simplicio nos comentirios, hoje perdidos, da autoria do importante comentagor poripatético Alexandre de Afrodisias.) Neste primeiro tivro, Teofrasto ccupava-se dos diferentes pen sadores, numa otdem cronolégica aproximada, acrescentand-Ihes nome xvI da cidade, o patronimico e, uma que outra vez, a date ou as relagdes mituas. [Nos demais livros, a ordem era eronolégica apenas dentro das principais divi- sBes logicas. Além da historia geal, Teofrasto esereveu obras especiais sobre ‘Anaximenes, Empédocles, Anazigoras, Arquelau e (em varios volumes) sobre Demécrito. Infelizmente, todas elas se perderam; é de supor que Teofrasto no se tenha poupade a esforges para consultar as fontes originais sobre estes pensadores. Contudo, a avaliar pels provas de que dispomos, 0s seus juizos, AE mesmo sobre cles, foram muito frequentementehaurides directamente em Aristteles, sem grandes esforgos para exercer uma critica nova e objectiva, (@) A TRADIGKO DOXOGRAFICA. (@) Suas caracteristicas ‘gerais, A prandiosa obra de Teofrasto veio a ser para o mundo antigo & utoridade-padrio sobre a filoxofia pré-socrética,¢ esté na origem da. maior parte das coleegtes posteriores de «opinides» (éEu, dpéoworra ou placita) Estas coleegdes tomaram diferentes formas. (i) Em reptodugdes cercanas do arranjo de Teofrasto, cada t6pico principal era considerado numa seocko parte, sendo os diferentes rensadores tratados sucessivamente dentro de cada seoqdo. Este foi o método seguido por Ecio e pela sua fonte, os Vemusia Placita (veja-se p. X¥i). (i) Os biodoxdgrafos consideraram con- jwotamente todas as opinides de cada fildsofo, fuzendo-as ecompanhar de Pormenores da sua vida-—fernecidos, em larga escala, pela imaginacio Febril de biégrafos e historiadores helenisticos, como Hermipo de Esmirna, Jersnimo de Rodes e Neantes de Cizico. © resultado encontra-se exemplifi- feado no emaranhado biogrifieo de Didgenes Laéreio. (il) Outro tipo de obra donogritien € vsivel nas 4aadazi, ou relatos de sucessdes de flésofes. O seu iniciador foi o peripatéico Sécion de Alexandria, que por volta de 200 aC. passou em revista os flésofos anteriores, ordenados por escolas. (0s pensadores conhevidos eran relacionados uns eom os outros numa finha descendente de mestre 8 diseipulo (neste ponto, Sécion nada mais fez que tmpliar e formalizar um proceso iniciado por Teofrasto;além disso, a escola Jiénica era claramente distinguida da itlica, Muitos dos eompéndios doxo- sgraficos da patristca (nomeadamente os de Eusébio, Ireneu, Amnébio, Teo- doreto — que, nio obstante, tembém fez uso directo de Ecio —c S.!¥ Agos- tinho) eram baseados mos breves relatos dos autores de sucessdes, (iv) © crondgrafo Apolodoro de Alexandria compas, no meado do século segundo a.C., uma relagio em verso das datas € opinides dos fildsofos. Esta apoiava-se, sob determinados aspectos, na divisio em escolas € mestres, de Séeion, sob outros, na cronologia de Eratéstenes, que judiciosamente atri- buira datas @ artistas, flésofes e eseritores, assim como a acontecimentos politicos. Apolodoro preencheu as lacunas deixadas por EratGstenes, segundo incipios muito arbitrarios: supés que a acme de um fildsofo, ou periodo culminante da sua actividade, ocorceria aos quarenta anos de idade, ¢ fazia-a coincidir 0 mais aproximadamente possivel com um niimero determinado de XVI épocas cronolégicas mais importantes, como, por exemplo, a tomadi de Sardes, em 546/5 a.C,, ou a fundagho de Tiris, em 444/3. Além disso, fee sempre um pretens disipalo quarenta anos mais novo do que o sea suposto mestre () Eeio e os «Vetusta Placitan, Do's zptomes doxogriticas, muito semelhantes entre si, foram independentemente derivados de urn mesino 0 ginal perdido —a colegio de Opinides elaborada por Ecio, um compitador proravelmente do séeulo segundo d.,enjo nome se conhede por ums ree- ‘Racin em Teodoreto © que, nio fora essa citcunsfncia, ser-nos-ia inti mente desconhecido, Os ditos compéndios sfo 0 Epliome de Opinides de Fisica, em cinco livros, que falsamenterevindia a autora de Plutatco; e os Exractos de Fisoa, que aparecem (oa su8 maior parte) no livro | do Antho- fogiim de Estobex. (Da primeira destas obras, cue teve uma ample divalgasio, provém algumas das informagdes do Pseudoga eno, de Atenigoras, Aqules © Cislo) Diels, nos seus monumentais Dosographi Graeci, dspbs estas duss Fontes em colunas paraleas, como sendo os Placita de Ecio, 0 que constitu 4 nosst ins extnsa, se nfo sempre a mais exacta, atoridade doxogrética 'A obra de Ecio baseavase nfo diretaments na histéria de Teotraso, mas num resuno intermedrio,elaborado, prevavelmente, na escola de Posi Génio, no século primero a.C. Esta obra, hoje perdida, foi chamada por Diels Vetusta Placita, Nela se aerescentavam a5 opines de Estsicos, Eph curses e Peripatéticos, as repistadas por Tearasto, © muito do gue fora hurido em Teofrasto, foi submetide a uma re‘ormulagio esties, O pr¥pio cio acrescentou opinioes estdicas ¢ epiurists suplementares, © bens assis umas quantis definigdes c comentarios introdtsrios. Uma utilizagao directa dias Verusta Placita foi feta por Varrio (xo de die naal! de Censorino), © fencontra-se também em Cleero, na breve dcxograia Academica priora W 37 118 (0) Ounras fones dosogricas importantes. (i) ipélte. piso livro da sua Refitagdo de todas ax Heresas, 0 chamado Pilosophouenc outrora aribuido a Origenes, € wma biodoxografia com informagdes dessit- radas dos principais fildsofos. As secgdes sobre Tales, Pitigoras, Empédocles, Henalito, os Eleatas © os Atomistas provém de umn resto biostieo banal « tém pouca valia, ao contario do que acontece com as seecdes dedivadas a Amaximandro, Anaximenss, Anaxagoras, Arquelan e Xenofanes, que deri wai de uma fonte bingrifea mais completa e muito mais valiosa. Ein muitos Pontos, os eomtentrios sobre o segundo grupo so mals ciunstanciados, © menos imprecisos, que os correspondentes en Ecio. (i) Os Siromateis do Peeudopiarco. Estas broves «Miscelineass (que convém distinguir do Fpitame, derivado de fio & igualmenteatrbido a Phutareo) Foram conser- sadas por Busébio; provi de uma fonte similar & do segundo grupo, em Tipit. Diferem no fasto de se concentarem sobre o conteido dos pr XVII imciros livros de Teofrasta, os que tratavam do principio material, da eosmo- gona © dos corpos eslestes; e zontéin muito de verbosidade e de interpreta- ses pretensiosas, Contudo, conservam uns quantos pormenores impor fantes que nao ovorrem em quaisquer outtas obras. (ili) Didgenes Laérelo. Afora as minudéncias biogritieas seleccionadas a partir de mumerasas Fontes, alguns dados cronotigicos tei, colhidos em Apolodoro, ¢ deploriveis epigramas saidos da pena do proprio Didgenes, as opinives de cada pensador so usualmente expostas em cuss notas doxogedficas distintas: a primeira (2 que Didgenes chamou zepniawhdje ou exposigio sumétia) provém de uma fonte biogréfica sem valor, semelhante 4 que foi utiizada por Hipdlito ‘no sew primteiro grupo, e a segunda (0 éxi jrégovs ou exposigao pormenori- zaga) procede de um epitome ais completo ¢ mais fidedigno, como 0 que foi usado por Hipélito para o seu segundo grupo. (3) CONCLUSAO. Importa recordar que muitos autores, que no dependiam da tradigio teofristica directa, consagraram, como 6 sabido, cobras especinis aos primeiros fildsofos. Por exemplo, o académico do quarto séeulo a.C., Heraclides POntieo, escreveu quatro livros sobre Heraclito, © outro tanto fez 0 estdieo Cleantes: uo passo que o discipulo de Aristétees, Aristéxeno, esereveu biografia, em que se ineluis uma de Pitigoras, Por i380 ‘mesmo, convém fazer uma concessto & possiblidade de aparecerem juizos isolados, nio-teoftasticos, em fontes eclécticas tardias como Plutarco ou Clemente: se bem que a maior parte desses juizos, que nas & possivel reco. nnhecer como tais, apresentem, no entanto, indieios de influsneia aristotsliea, ‘ou estdica, epicurista, ou eéptica. Teofrasto continua a ser a principal fonte de informacho, a sua obra énos eonhecida através dos doxégrafos, por intermédio de citagdes leitas por Simplicio, ¢ polo que ehegou até nds do desensu. Por isto, evidente se torna que Teofrasto foi profendamente influ ciado por Atistételes— que, conforme dissemos, niio teve em mira, come ‘Teoltasto devia ter ‘ido, uma extrema objectividade hist6rica, Teofraste fio foi mais bem sucedido do que & de esperar, na compreensio dos mobiles de um periodo anterior a0 seu © de um diferente mundo de pensamento; ‘um outo defeite seu consistiu no Facto de, uma vee isolada um modelo gerat de explicago, particularmente para Factos cosmolégicos, ele tender para impésto, talvez de uma maneira demasiado arrojada, em casos em que carecia dedocumentaciio completa, eascs que, segundo parece, néo foram infrequeates, Nestes termos, sti nos & dado ter plena confianga no nosso conhiecimento de tum pensador pré-socritico, quaido 1 interpretagio aristotélica ou teofristicg, mesmo nos easos em que elt possa ser reconstituida com exactidio, for con nada por excertos pertinentes e bem autenticados do fildsofo em questio, CAPITULO | OS PRECURSORES DA COSMOGONIA FILOSOFICA Neste longo capitulo preliminar, examinam-se certas ideias que no sto verdadeicamente «filos6ficas»; slo, iss0 sim, no seu contexto, mais propria ‘mente mitologieas do que racionslistas, mas pedem, no obstante, ser conside- radas como significatives prelidios das tentativas para explicar © mundo, tentativas essas que tiveram o seu inicio com Tales. ‘Nilo interessa aqui, a0 nosso propdsito, » mitologia pura, mas antes cconeeitas gue, apesar de expressos na linguagem do mito e por intezmédio das suas personagens, so o resultado de uma mais directa, emplrioa e nlo- -simbdlien maneira de pensar. Estes modos cuase-racionalistas de encarar 0 mundo dizem respeito, na miaioria dos easos, h fase mais recunda de sua hist6- Fla, e comesam verdadeiramente com o seu nascimento ou criagao, so mesmo tempo que coincidem com o esforgo (realizado da forma mais notivel por Heesiodo na Teogonia) para sistematizar as “niltiplas divindades da lends, fo fazé-las descender de umm antepassado conmum ou de um par de antepas- sados, nos comegos do mundo. Contudo, a investigagio activa acerca da ascendéncia do mundo, quer ela fosse principalmente mitica, como em Hesiodo, {quer sobretudo racional, como nos fil6sofos miésios, deve ter sido continuads apenas por uma minoris. A esirutura gerel do mundo presente, ambito ccomum de experiéneia, era de mais amplo interesse; © neste campo, parece ter sido largamente aceite uma perspectiva comum, simplista e extrovertida se bem que parcialmente mitiea, Ela surge, de tempos a tempos, em Homero. sumariamente descrita no § 1. Nos $§ 2¢ 3 examinam-se dois coneeitos 8 que os préprios Gregos alribuiram mais tarde importineia cosmogénica os de Okeanas © de Nyx (Noite), Os $$ 4, 5 © 6 ccupamse de tres temas especiais, todas de cardeter essencialmente nio-fllosdtico, mas que tra- fam de aspectos cosmogénicos: primeiro, as diversas ideias cosmogénicas: associadas a Orfeu: seguidamente, a Teogania de Hesiodo; depois, os intri- antes pontos de vista de Aleman e (numa extensiio decerto um tanto des proporcionada) de Ferecides de Siros. Por tItimo, no § 7 surge uma breve reflex sobre os passos que foram nevessirios dar para que se transitasse pata uma atitude mais inteiramente racional Em um ou outro ponto, faremos referéncia & mitologia comparativa de antigas culturas prdximo-orientais, particularmente da babilénica, da egipcia eda hilita. Ha profundas semelhangas entro algumas das histérias cosmogs- aicas dos Gregos e 0s mitos teozénicos das grandes civilizagées luviais e suas vizinbas; estas semelhangas ajudam-nos a esclarecer alguns pormenores das explicagbes dadas pelos Gregos até Tales, inclusive, As tradugdes dos prin- cipais textos nflo-gregos podem ser facilmente encontradas em ancient Near Eastern Texts relating to the Old Testanient, obra editada por J. B. Pritchard (Princeton, 3° ed., 1969), que seri referida por Pritchard, ANAT. ‘Tres restos iteis, todos na série Petican, sto: o de H. Frankfort e outros autores, Before Philosophy (Harmondsworth, 1949), originalmente publicado como The Intellectal Adventure of Ancient Man (Chicago University Press, 1946) 0 de O. R. Gumey, The Hitties (Harmondsworth, ed. rev., 1961); & 0 de G.S. Kirk, The Nature of Grek Myths (Harmondsworth, 1974), eap. xi Pouco se dita neste capitulo sobre 6 desenvolvimento do coneeito da alma. A nogiio homériea da psyehe 01 alma-sopro vital como uma imagem insubs- tancial do corpo, a que di vida = ao qual sobrevive numa existéneia miserdivel f exangue no Hades, & por demais familiar para carecer de descricio neste lugar. Obras como The Greeks and the Irrational (Berkeley, 1951), de E, R, Dodds, e o capitulo V da Theowgy of the Barly Greek Philasophers (Oxford. 1947), de Jaeger, dao-nos uma boa exposigio da ideia popular, pré-filosdtica, dda alma. Pitigoras foi possive mente o primeiro grego a encarar explicita. mente 8 alma como algo de moraimente importante, e Heraeito, 0 primeira a ‘mostrar com clareza que o conhecimento da alma era relevante para 0 conhe cimento da estrutura do cosmos. Contudo, a ideia de quea substincia de alma cra aparentada com o aither, ow com a substincia dos astros, existia ha ja algum tempo, segundo parece concluir-se de contextos poéticos do século quinto a.C., como parte de um conjunte complexo de erengas populares, a par da distinta coneepedo homerien de uma alma-sopro vital, Estes ante- ccedentes serio resumidos nas cxpitulos sobre Tales, Anaximenes e Heraclito, © principal objective dos mais antigos e deliberados esforgos para explicar ‘© mundo continuow & set o da deserigo do seu desenvolvimento a partir de ‘um comego simples ¢, por conseguinte, inteiramente compreensivel. As questhes atinentes & vida humaxa afiguravam-se como pertenga de um tipo Giferente de investigacdo — mais propriumente, da teadigio poética, em que as hipoteses herdadas do passado, apesar de por vezes inconsistentes, eram finda consideradas validas. Alem disso, 0 estado originério do mundo e o inétodo pelo qual se diversificou foram frequentemente concebidos antropemor. licamente, em termos de um progenitor ou par de progenitores, Esta tentativa de explicagio genealégica persistiu mesmo depois do eventual absindono, por parte dos fildsofos milésios, da esteutura mitolégica tradicional, discutida no §7 Parte da originalidade de Heraclito consist na total rejegio de uma tal atitude 1A VISKO INGENUA BO MUNDO. Uma concepgao popular da natureza do mundo, de que & possivel encon- trar vestigios, principalmente em referéncias dispersas em Homero, 6 apro- simadamente como se segue: 0 c&u ¢ um hemislério sélido, como uma tigela (i. XVI, 425 zdizcor osgardn, ef. Pindaco Nem. 6, 34: obgasiy és nolyuixoy na Tl V, 504, Od. TIL, 25 oubigeor obgardn na Od. XV, 329 © XVIL, 565. A nogio de solidez, assim como a de brilho, & transmitida, provavelmente, por estes epitetos referentes a metais). £ 0 eéu que cobre 1 terra circular © plana. A parte inferior do espaco entre a letra © 0 céu, alé is nuvens, inclusive, contém © djg ou bruma: a parte mais elevada (por vvezes também chamada odgard: propriamente dito) & © alia, aither, 0 ar superior, reluzente, que € concebido, uma que outra vez, como igneo. Na Il. XIV, 288, (dry) 0° siégos alée" tovex, «0 abeto, através do aer, chegava até ao aither», Por baixo da sun superficie, a terra estende-se até uma grande profundidade, e tem as suas raizes no, ou por cima do, Tértaro: 1 Momero 11, Vill, 13 (fala Zeus) 4) uur Eid» Syms ds Tdgragor jepierea “ifte wl, i. PiDroror ind zens Zor fegetoor, Srila bipeua ve Bian val pistons obd6s éo0ay S980 “Aide Saor obgarde Fox ded yas 2 Hesiodo Teogonia 726 (Téorao voy aor ydizxeor kozos Efierue iy reiororzel zkgore xeoi bagi adnig Dacovev Pig Gitax seqinet sat drqryerou tadéoars er be 1 Ou agarro nele e 0 precipito no brumoso Tartare, bem longe, onde se encontra o abismo mais profunde no interior da terra; ai esta os portBes de ferro € o limiar de bronze, Uo abaixo do Hades, quanto 0 .6u dista da terra 2 Ao seu [do Tartar} redor corre uma muralhs de bronze: a tod 4 volta, a Noite em triple fileia se derama, em torno da garganta: © por cima estio as raizes da terra © do mar esti © recinto do Tartare & pois, ade bror firme. ze» (@, por conseguinte, ‘nabalivel) como o eSu: a simetria reflecte-se também na equidistancia entre 0 cu ea superficie da terra, e a superficie desta ¢ 05 seus alicerces —- dade que lFladesy no tltimo verso de 1 parece uma variante i6gica de um original ‘terrap, como na Teogonia 720 rézoor Foro ind yiis Baov obgards tor dxt vans (ato no interior da terra, quanto o céu dista dela»), Havia uma certa 4 impreeisao no tocante & rolagie entre o Hades, 0 Erebo © o Tirtaro, muito embora 0 Tartaro fosse certanente a parte mais profunda do inframundo, A simetsia entse o inframundo e 0 supramundo aio era evidentemente com- pleta: a forma do Tirtaro ade era, normalmente, concebida como hemisté- rica, €a do céu surge frequentemente complicada pela ideia de que o Monte Olimpo a ele se une como morada dos deuses. Uma concepgao diferente fazin ‘a terea prolongar-se indefinidamente para baixo: 3. Xenofanes fr, 28 (= 180) pays jen dds ss dae agoamhiizon, 8 xkean 8 de dinesgow feveteas. (Ch Estrabio sp. 12 Cas.) in» nag nooniv dparae 3. Da terra & este © Limite superior que nés vemos aos nossos pés, em contacto com 0 ar: mas a sua parte inferior continua indefinidamente E esta uma formulagtio posterior, mas ainda mais popular que intelectual, Em tomo da orla do disce terrestre, segundo a visto simplista, corria © vasto rio Okeanos. Este conceito teve uma importincia considerivel no pensa- mento pré-cientifion grego, e & discutido na secedo imediatamente a seguir. 2, OKEANOS (Como rie que cireunds a terra, e fonte de todas as dquas 4 Homero sl, XVII, 607 (Hefesto) er Ae rifles sorapuo pipe oer ereyy hg updeye adixens sri moxjroto. ‘Quearcin 5 Herddoto IV, 8 rar 6# er Begone (se. “Ehigves) dex ‘llow davai dgsdgevov yiy me0} nian Stem, Foy BF aie doberrt (CE também fd, 1, 215 1h 23). 6 Homero Hl. XXt, 194 (Zeus) fi ubdé xgelon "Azehiuos inopagiter Bae fathnggetrun wey albinos “eeavoro. 25 of ney aves monapunl 2h stam Azone ai ia negra sai goriaee jet véowte 4 Sobre ele coloce a grande forga do rio Okeanos, ao longo du cerca dura extrema do escudo bem trabalhado. 5. [Os Gregos] sustentam com palavras que Okeanos, que tem a sua ‘origem nas regides onde o Sol se ergue, ui em redor de toda a terra ‘mas nito fornecem desse facto uma demoastragio concludente 6 A-cle nem mesmo se compara 0 nobre Aqueloo, nem a grande fo de Okeanos de profunda corrente, do qual, evidentemente, dimanam todos (06 ios e todo o mar e todas as nascentes © pogos profundos, Que Okeanos rodeia a superficie circular da tera, ainda que os Poemas Homéricos © nio declarem explicitamente, & © que nos sugerem os passos 4 (onde © escudo feito para Aquiles 6 obviamente considerada como sendo redondo) © 8, © alguns dos eptetos aplicades a Okeanos — especialmente diyéggo0:. «que corre para tris» (0 que provevelmente sigifies «que refu sobre si mesmo»). Passos hi em Furipides ¢ em outros autores que mostram, do mesmo modo que em Herédloto (5), que a idsia de um Okeanos circundante ¢ circular era amplamente accita; contudo, um emprego mais ive, como umn ‘vasto mar exterior, tina jé eomegado a aparece ocasionalmente em Homero, em especial na Ouisseia. © echo 4 descreve Okeanos como um 0, € esta ta também uma opin comummente accita; frequentes so as referéncias fs correntes, oat, de Okeanos. Assim send, era provavelmente eomposto de ‘igua doce; ¢ 6 desoreve-o como nascente de toeas as Aguas, tanto doces coma salgadas, que estio compreendidas dentro dé sua dzbita, & supeeficie ow debaixo da terra. A nogdo de que a dgua satgida & simplesmente gua doce de certo modo temperada pela terra foi geralmente defendida no. petiodo cient. A ideia do rio que rodeia « terra difere dos demas elementos da vsko popular do mundo no facto de se nio bascar iGo clatamente na experiéneia © eéu pareve hemistéricae, para eertos ells, impenetrivel: por esse motive chamaddo ade bronzes e considerado camo send semethante ao gelo ou ssi, mesmo por Anaximenes e Empédocles, A terra parece plans, 0 horizon, cit= cular. Contudo, a experiéneia nfo pode sugeri fo facilmente que 0 horizonte mais emoto sea delimitado por um rio de igus doce. & possivel que alguns viajantes tivessem trazido noticias de vastos mares para Ki do Mediterinco, mas esses mares seriam salgados. As Fontes a borbulhar da terra podem sugerir ries sublerrineos, mas esse facto no implica nocessarlamente a idoia dle um rio eircundante. orca € pois, admit a possibildade de esta eon- cepsio particular se fer originado nas grandes cvilizagbes Ruvias do Egipto € da Mesopotimia, © de ter sido de alguim modo introduzida na Grecia ‘onde recebou uma forma helénica especifea. Havemos de ver (P. 89 € 52) que a ideia que Tales favia da terran fuiar na agua foi, por conse uéncin, provavelmente importada: e as coincldéncias de pormenor entre as versbes gregas de certos mitos as versbes babildnicas ow hititas provam que coneepabes mio-autdctones, quer da dea egeia, quer de centros eulurais pe ximos de povos de lingua grega antes da sua entrada na Grécia, tinham ji ppenetrado no pensamento grego mesmo ao tempo de Hlesiodo, ¢ provavel- mente muito antes. Estas coincidéneias sfio discutidas de forma resumida a pp. 38 eS As referéncias homéricas isoladas a respeito de Okeanos como origem de todas as coisss aparceerio também (p. 10 es) como alu- so provavel a ideias mitoldgicas ndo-gregas. Nos relatos babildnicos e em algumas versoes egipcias, a terra era considerada como estando em vias de secar, ou a emergir, no meio das aguas primevas 1. Néo é de estranhar que uma tal ideia se tena desenvolvido na Mesopotimia, onde a terra se formara certamente a partir dos terrenos pantanosos existentes entre os dois ios nem no Egipto, onde a terra féctil emergia todos os anos, mal as cheias do Nilo baixavam. A terra que emerge de uma vastidao ilimitada de égua pri- ‘meva continuaré @ estar rodeada de Agua. Este facto parece fornecer um motivo plausivel, embora ado seguro, para a formagio do conetito grego de Okcanos.? Neste desenvolvinento popular do motivo da Agua primeva, a terra é considerada como solidamente enraizada, uma vez emersa, ¢ & vasti- ao itimitada da dgua (que parece ter sido sempre eoncebida com um limite superior, uma superficie) & reduzida a um rio, vasto mas no necessariamente ilimitado ° "GL popeia babilonca da eviaglo, que tee orgem, provavelente ne segundo milinio a.C.: tabuina 1, 1-6 (Pritchard, ANBT, 60 ¢ 3], «Quando nas alturas 0 su ainda ado tiaba reshide nome, Em baixo a tera firme aind nie tine silo ebamada pelo nome, Nads a no ser 0 primordial Apsu, ave thes det 0 sr &) Mummu-Tismat, aqucla que a todos dew & luz, Misturando-se as suas duns somo wn s6 corpo; Nenhuma choupana fora coberia de eolmo, nenfum pantane tinha surgida..» (Apa e Tiamat eram 06 princpios muicaling « feminine a Sta primeva. Por vezs, mas taler nfo aqui, simbolzam © peixe © « gua slgada, ree Dectivanente). No que rspein a0 Egipto, ef, eg. 0 texto do sé. XxIv aC. prove lente de Heldpol, NET, p. 3: « Aturcheper, tu estivas n0 alto sobre «colina (primeva) ..» (O ousceo grimevo fois primeira pongo de ters ast ‘das gas iiitadas; esavs stuado em ceateos de exlko wit diversos,«€simboi ‘uo pela piri). Veja-se ada ura outra verso, peocsdanta do Lisrd das Mortos (ra sun forma actual, da segtada motade do 11 mini): «Ew sou Atum, quando sta sozinho ert Nun; eu sou Re nas suas (pvimeiss) manifestgdes, quando omegou a governar aguilo cue fizer (am era 0 deustiador agorada in Heliopolis equiparads ao deussol Re. Nun é vast primeva das én. 2 Originulmeate,"Drsuris era tlver um terme desi, nlo-pesoal, pre sumivelmente aparentado com 0 hitita euginnay, que signifier canels, ou com c Sinsrito eagiyanash, que qtet dizer vaguilo que rodcl>. © sau desenvolvimento fem Jgura mitoldgica, como ozorre por vezes ei Homera « em Hesiod, deve tr sido relathamente faio. Vease tambéan ML, West, Hesiod. Theagnny (Oxford 1966), p. 201 2 Okesnos tem uma margm mais diane ne epitoaie (provavelmente ‘ardio) dos lnernos na Odie, © om Hesiod, onde spars alm da Okeanos- (Feog. 215, 274, 29) que dite «a weiso que nena omer cones (M. L. We) rio circundante estava implicito no mito do Sol, que, depois de atri- vessar 0 eu com os eavalos e o carro, voga numa taga de ouro em redar da corrente de Okeanos e, deste modo, chega de regresso ao oriente precisamente antes do raiar do dia: 7 Mimnermo fr, 10 Diehl Héinog pb pig wévow tidayer spusea sera, O8E Hor Hyermoos yiprevat obdeqia txnauclr re wal aint, éxel Gobabdecchos “Hs “Qrecrin xgohiosd abgavi elena réx guir yg duke wig pig solwjgat ott “Hipalarov egos @niauény ro0008 ryslerros, Endxreons, dgon by Bho elb0r0” doradin: yooov dey “Eoneoibor ay & AtBudru, ta 5) Bode Bop ei tn01 ove’, gg? "Hie jgeyéveua poy 00" énspijecoe0? fiir dian YVasgiowos vids 7A Hélio coube em sorte mourejar tod> o dia, sem jamais haver des- ccanso algum para os seus cavalos ou para si préprio, desde que a Aurora de réseos dedos, abundonando Okeanos, sobe a0 céu; pois a ele trans: porta-o através das ondas 0 leito encantador, céneavo e forjado pelas Indios de Hefesto, de ouro precioso ¢ alaso; velozmente 0 transporta a dormir superficie das aguas, desde a norada das Hespérides & terra dos Etiopes, onde 0 carro veloz ¢ 0s cavalos se detém até chegar a Aurora, fitha da manha: entlo sobe para o seu carta o filho de Hipérion Este pormenor (sobre ele veja-se tambéan Estesivoro fr. 8, 1-4 Page) nia € mencionado em Homero !, No Egipto, aereditava-se que o Sal viajava de ocidente para oriente num basco, através das fguas subterraneas, e esta renga pode ou nao ter estado na origem da versio grega. Contudo, & pos- sivel que a escotha de uma taga ou tigela se bascie na Forma redanda do proprio Sol, © sugira uma tentativa de explica;do mals empirica © no total mente mitopoiética, Em Heraclito (224), 0 priprio Sal é deserito como uma tigela céneava cheia de fogo, e fo} provavelmente uma explicayio popular este tipo que deu origem i concepeio mais pietdriea do Sol como aurign 0 Sol erguore de Oksanos (ex. Ml i, 422), ms io hi sugestio alguna dds qualquer especie de nave. O aperfeigoameny da iia do Sol » vosse em redor tte Okeanos pola ser posehomérica..Na Ou, 19, 0 Sel vai pore deta dt tera, ‘© que, provavelmente, apenas significa aque ek se pOen. As sites em Homers ‘randnese 00 Oksanos (6g, tk ¥, 6: Xv, 489); dfelimente podem todas eas ter Dareos, eset posivel conceber dela de ire através de Okeanos © passarem por ‘xo da tera, embors als pormenores no eargam de er sido visuals, i) Okeanos como fonte ou origem de todas as coisas Homero il. XIV, 200 (repetido em XIV, 301, Fala Hera) slut stig dpouéry xokopdopow meigura pains, ‘Dneavin ve Det yéveaw zal eyréon Tobin 9 Homero 11. XIV, 244 (Fale Hipnos) Gtkor wiv nev Earys Det ulerpeverdon Gia maxevrhoaypy, ani Ae norapoio bé2000 “Qusuvot, bz ep yhreos sxévceocs vévwxnue Anyis 8 obn tx Fywye Kgovlovos daaor ixoipme Of86 mareoniaay Gre wh aieds ye uehebos, 8 Pois eu vou ver os limtes da terra fecunda e€ Okeanos, progenitor dos deuses, © Tétis, sua mie 9 A um outro dos deuses sempiternos eu adormecé-lo-ia facilmente, ‘mesmo que das correntes do rio Okeanos, que tudo gerou, se tratasse: mas de Zeus, flo de Cronos, eu nto ousaria aproximar-me, nem ador- mecé-lo, a menos que ele mesmo mo ordenasse. Na seeciio anterior, apresentimos um esbogo da versio usual de Okeanos ‘em Homero, Nos dois iltimos trechos, a desericdo de Okeanos come origem dos deuses (8) ¢ de todas as coisas (9) &tiniea e inesperada, além de ulttapas- sat em muito © que estava impleito em 6 De notar & que, afora o epissdio Particular em que ocorrem estes dois passos. a dvds dizdry ow Zeus enganado por Hera (Ul. XIV, 133-360, © XV, init), quuse nada hid em Homero que possa ser razoavelmente interpretado como especificamente cosmogénivo 01 cosmoldgico, isto é, que wltrapasse a admitida linha-limite do que foi deno- tminado visio popular do mundo. Mesmo deste opisédio nao ha muito a extrair '. Efectivamente, desde que se admita uma ligeira singularidade de expresstio, pouco hi nele que azo possa ser explieado sem 0 recurso a inter DPretagdes cosmolégicas. Essa mesma concluste pode aplicat-se a Okewnos: 89 nao necessitam de ter uma implicagio maior que a de que o rie Okeanos 4a Fonte de toda a ‘gua doce (como em 6); 1 agua é necessitia vida, conse ‘quentemente, a vida deve terse originado, direota ou indirectamente, a partir de Okeanos, Tal facto ni explizaria a sua paternidade em relagdo aos deuses em 8, mas que podia ser uma ampliagio poéties, o que acarreteria também 4 restrigto da aplicagto de -edvreans, em 9, a08 sores vivos © vida das plantas. Contudo, poder-se-ia pressupor uma vez mais a mesma espécie de liberdade postica, Forga é admitir, no entanto, que as referéncias, se assim as interpre- tarmes, serim despropositadamente abreviadas e produziriam um efeito um tanto bizarto © Nomadsment, 14 (@ Noite); xv, 199.98 (a divsio do mundo entre Zeus, Posidan © Hades); Il. xv, 203 € s, 274 (~ xv, 228,279 (inions referencias homdricas a Cronos, aos Ttdse a0 Tetaeo, se esceptuemes dois importantes passes no eanto vat, vin, 13 © 58, © 478 e ss); ML sv, 271; xv, e's. (as das quatro Tefencias em Homero a Estige como juramento dos deuses), Os dos ilimos casos diam ser consderados como interpolagtes com afinades hesiédics, embora io procedam de nephum dos poemss de Hesodo que conhecemos, Para Plato e Aristételes, pelo menos, os trechos 8 ¢ 9 apresentaranse ‘ertamente com alguna relevincia casmolégea. 10 Patio Teeteto 152 E ... “Oprygos, sind «Qneards re Deir lve nad prion TyBiny done ean ieyora dons 1 ea sarfocn {ct também 12) IL Aristételes Mer. A 3, 983 b27 (contimazio de 85) eiai dé ro toils aauaainloos aid a0kd ag6 vis vi" yeréeam: zal zxodtovs Beohoyyiau taz otis oloveu (se. Gorey wht) reph vis arms éxodajtte~ “Qxeurdy te pig nai Tain éolqawr vig yevdoons anréous wal rar Soxoy wir Voir 1e. Uv nadowpérge sn aixion Deiya vie xoupnies tywbraror sev io 1h myeaiibraror, ozo: 66 x) ryudrerdr doer. (CL também 15), W_ ... Homero, que, uo dizer «Okeanos, progenitor dos deuses, ¢ & ine Tétisy, declarou que todas as coisas tm origem no Mluso e no movi- mento, 11 Ha quers suponha que os mais antigos ¢, por certo, primeiros ted- logos, muito anteriores & presente geragio, formularam mesma Nips tese (se, que Tales), pois fizeram de Okeanos ¢ de Tétis, progenitores do ‘que nasce, ¢ do juramento dos deuses, a agua — a que os proprios poctas cchamaram Estige: & que o que & mais antgo & 0 que merece maior vene- agile, © 0 que é mais venerdvel & enipregado como jurameato. E evidente que Platio, em 10 & em outros passos da sus obra, nfo fala inteiramente a sério a0 considerar Homero como precursor da ideia de fuxo, cconcepcio atribuida a Heraclito: por isso nfo sodemos ter a certeza do exacto valor por ele conferido ao passo homérico sobre Okeanos. Arist6leles, come é dbvio, levou-o a sério e a antiguidade posterior, confinda ma sua autotidade, Accitou Okeanos © Tétis como representatives de uma teoria cosmogénica primitiva, visto Eudemo ter citado 0 mesmo passo (evidentemente na esteira de Aristdteles em 11) na sua histéria peripatética da teologiaf "Segundo sabemas pel dscrepancla do esritor nsoplatinico Damscio nt ‘hima fase de 16, CT. Fllodemo em 17 © Atenigoras 18, p, 20 Schwarta (DK LB 13) Plutteo de Bef Osir. 34, 364, val ao ponte de admitir que Homer, bem come “Tales, deve ter receido a Klein do Eginto. ‘Tem-se admitido com frequéncia que hi uma outra e mais antiga eate- goria de testemunhos referentes & importancia cosmogénica de Okesnos, omeadamente a poesia srfica primitiva 12 Plato Crdtilo 4028 ... dexeg ai “Owjyos @ Quewrin ve Deirw péveabn oor wont popréga Tutor olyer 86 el" Halodos, idyer BE xov vai "Oppobe Bx "Rueasis oiirros xahbgyoos jose yay, 55 a muoryninyy Suopoheage. Pyke Enver 13. Plato Timew 40 D-E ... asorion 08 oie eigyaior by Deisr oiorr, Hs Egaaur, augtic 08 x00 tos Tijg te cad Obgavod zaides "Queavi: ve aai TyP¥: Eyeréadye. votrear D8 Dborees Kodvos ve nai “Pla wai aoe erie rasan juawoaites, Expire: 76 ara xaoyévavs elsboer 42... como diz Homere, uma vez mais, «Okeanos progenitor dos deuses, © a mie Tétis»; © penso que também Hesiodo. Também Ocfew afirma algures que «Okeanos de bela corrente foi o primeiro « iniviar os ‘easamentos, a0 desposar Tétis, sua irmi pelo lado maternon, 13... devemos acteditar waqueles que primeiro falaram, naqueles que foram, segundo as suas proprias palavras, progénie dos deuses, e que. suponho eu, devem ter couhecide bem os seus préprios antepassados: Okeanos © Tétis exam ilhos de Ge [terra] e de Urano foéu. e seus fithos foram Forcis, Cronos, Rein © seus companheiros Mas 08 dois versos drficos citados em 12, apesat de plonamente estabe: lecidos ao tempo de Plato, nem sequer devem remontar ao século sexto a.C (eja-se, contudo, mais adiante, pp. 24 e ss., pare noves festemunhos dé ‘crengas érficas» relativamente antigas). Em qualquer dos easos, 0 ponto de vista por eles expresso ndo apresenta necessariamente uma grande diferenga do da. Tengonia de Hesiodo — conforme Platio possivelmente se deu conta, Nesses versos, Okeanos. Tétis cos demais Tits naseeram de Gaia e Urano ‘numa fase rolativamente tardia Co ponto de vista da producdo cosmogsnica, ‘mas é no seu tempo que tem inicio a reprodugio regular, por meios bissexuais, de figuras inteisamente individualizadas (em oposigio aos componentes do mundo, como o Tirtaro ou o Ponto). O ttecho 13, cuja expresso «progénie dos deuses» mostra que Platdo esti 2 deserever uma ideia drfica, indica que, segundo esse visio, Okeanos e Tétis foram os pais dos Titas (entre os quais se inclui 0 par Cronos e Reta, teogonicamente fundamental) ¢ndo seus eoevos, como na Teogonia. E este, provavelmente, uma outta razio para 0 290 nos versos drficos de 12: Okeanos e Tétis consituem o primeiro par comple tamente antropomorfizado, anterior sequer a Cronos ¢ Reia, Hesiodo atti- bbuira menos importincia a Okeanos do que seria razoivel esperar, et visa, sobretuda, dos bem conhecidos passos homéricas 8 9; por isto, & provivel que as vers0es Stfieas tenham corrigide a versio hesiédica até ao ponto de situarem Okeanos e Tétis uma geragfio antes dos Titas, Nao hi provas que demonstrem a cxistincia na Grécia, numa data relativamente recuada, de uma doutrina sistematica referente @ prioridade cosmogénica de Okeanos, Hesiodo nil fornew indieagio alguma dela, ¢ as conjecturas posteriores baseiam-se, segundo parsce, em dois passos homé ricos excepcionais, que nos foram legados com> finica prova directa de qual quer teoria eosmogdniea do género. E possivel que esses passos nao prete essem significar mais do que a essencialidade da agua para a vida, muito ‘embora um tal concsito fosse bastante de estranhar. Vimos ja, na seegio (i), ‘que a fdeia de um tio Okeanos circundante pode bem ter sido adaptada de crengas egipcias ou babilénicas. Dessas crengas fazia também parte a ideia de que 0 mundo se originou a partir da gua primeva (veja-se a. | na p, 6): ‘6s passos hioméricos isolados podiam, por conseguinte, ser umma referéncia a esta suposigio bisiea, originiria do PréximoOriente, O conceit do rie citcundante tinha sido. evidentemente, assimilada pelos Gregos numa data muito mais antiga 3. A NOITE Wi) a Homero 14 Homero #. XIV, 258 (fala Hipnos) wal xi Wt dustor ce aithiges Enpaie miveyy (se, Zeb of pi, NES Ayre Bodin dadonse vd dbo tir fxdyoqe getjmr, 6 82 xavouro yadperds sg a wri Boh denalbinee Egbax era yg uh 14... € [Zeus] tersme-ia langado do aither ao mat, para longe da vista se-4 Noite, dominadora dos deuses © dos homens, me no tiveste salvo: para ela vim a fugis, © Zeus deteve-se, upesar de encolerizade: pois receava fazer alguma coisa que desagradasse & Noite velo E este 0 {inieo passo dos Poemas Homéricas em que a Noite surge com: pletamente personificada. Uma vez mais, tal como nos dois passos especiais respeitantes a Okeanos, também este ocorre no episédio do Engano de Zeus: uma vez mais hi uma invulgir implicagio de poder ou prioridade especiais centre 0s deuses. © respeito de Zeus para com a Noite, neste ponto, é certa- mente estranko e sem paralelo algum em Homero ¢ em Hesiodo. Em face de interpretagoes posteriores, tl faeto podia sugerir que o posta deste episddio conhecia alguma historia refe-ente a Nyx como figura cosmogénica. Nao obstante, a referéncia & isolada, © € possivel que niio seja mais do que um desenvolvimento poético da ela implicita na frase NOP dyjreiga Gace, a Noite, dominadora dos deuses»: até os deuses sfo vencidos pelo sono, por isso mesmo, 0 a bem dizer todo-paderoso Zeus hesita em ofender a Noite, mie do sono, com receio de que ela o possa subjugar nalguma ocasizo menos portuna, Gi) Um eonceto cosmoginico arcaico seguido Arisreles AS Aristételes Mer NA, 1001 64... of 08 nowprad of dazaloe rubry Sqoies, Yj fnacistees ual exe gaatv ob robs xgirovs olor Nizxa zai Obgavdy j} Xedos ij ‘Quounde, Akh vr cia, (Cle Met, AG, 10716 27 of Weoddyor vf bx Nuverde perntieres: e ainds thid, 1072 a 8) 15 ... Semethantemente, os antiges poetas, quando dizem que nin sio as primeiras figuras (coma por exemplo a Noite © Urano ou 0 Caos ‘ou Okeanos) que governam ¢ reinam, mas Zeus (CT, .. 0: tedlogos que fs fazem naseer da Noite.) Aristétles, pois, admits que tinh havido poetas e tedlogos que coto- cwvam a Noite ein primeiro ugar», ow que faziam dela a mie dos deuses FF bem possvel au ele tivesetido em mente o pesto homerigo, A; mas este por si ifclmente podria ter dado motivo «que ce tvese incl a Noite, { parece provivel ue no seu peasament estvessem em parte os verso «rficow» {sobre eles vejase 30, 2) e pp. 27 © 85) e também ns cosmogonias pév-hesi- dicas, compiladas sobretudo nos séeulos sexto e guiato, © que serio descritas em Gi) Nelas, @ Noite, que foi erada numa fase muito antiga (embors sem ser primers), segundo a versio eosmogéniea de Hesiodo (31), e que Foi associads # Gain, » Okeanes c a Urano, em outras efeténeins mas caso nais da Teogonia (20 & 106 ¢ s.), € clevada & primeira de todas as fases, ou sozinha. ox juntamtente com ontras entdades, 0 Ar ou o Tartaro, E natural 1B {que tanto o Dia como a Noite nascessem logo apés a separagio do Céu ¢ da Terra, para ocuparem o espago originado entre ambos. Gil) A Noite nas cosmogonias atribuidas « Orfeu, Museu e Epiménides 16 Damiscio de principits 124 (DK 1B 12) 5) 68 mgd x6 Meqexanyr: Esdiger domyeyoninéey is coo *Opplas ofou Veohoyia adr wh tir oun .. dts 86 viz Noxxds éxoufoaro ewe dein, Op sma "Opngos, i sal pi ovreg nexoigrar vip yeveatoyias, Tonya ob yin dmobexréor Bidiuow héyorcos Gre dexd “‘Qraavos vai Tythos dozer 17 Filodemo de pieiate 47 @ (DK 3B5) ev di tots cis “Bmyetyr (se, dnapepouéroes Eacow) a8” Adoos zai Nexis x xévea ovovie, < ate a> “Otojgos vee’ "Qneavdy én TyPb0s robe Beod: errr (Ct. também 27). 18 Filodemo de pietate 137, 5 bv jar cur eH Neweeds xai Taorigon Re yeraa nik adv, By BE twat €E “Acdow vat ATDbgos: 6 Hi vip Tecavoyayiae yodwas & AtDo0s gnair, "Axovotiuos 6° &x Xéove xysrrav rida be dé ‘rs donpegousoms sks Mowruton yéypacrrra Tégragor zocor Tempo, Xadeos, como igure cosmogOnika. prin derive da. hipSsase ianiana Ziman Akerane (impo ifindvel). Mas ete conceits iraniano encontra 0 seu mis antigo testeminho nima rlescia grega dos fins do século quarto aC, feta por Eudomo, segundo uma referéncia dé Danse, © nie hi razio para ponsar que trese sido formulada jé 0 periodo grego arcaco. No ‘Timea de Pato, 0 «Tempe & um conesito cosmogsnico slahorado; fi lem dss, Peroniisade, provuvsimente como etimologia de Cronos, por Ferecides de Sirot, ‘no s6eui0 sexo, emiors nse com um significado abstricto profunda {eeja-se n. 1 nap. 23¢n. 1 nap. $3). Asus proveniéneia oriental, nas verses Gries, ¢indicada, pee forma concrein que apresenta: uma serpent sada © polisfla, Tals monsros ‘wuhiparides,dstitos de favasis mais simples come o: centauros, Gm carscte ” Drineipalmente de origem serien, ¢ comegam a surge ns arte tera por voli de 700 a.C. Forsm, deero, extemamente populares come elemento ‘hoorativo durante © séeulo sétimo © primeira quartel do sexto. (Também a arte ‘indica tina tdo jé os seus monstros,sobrekudo divindades com cabega de cio oats eiagdestriomrfies relavamente simples) Que, nas suas representasdes teen, 2 eoaliguapio do Tempo como serpent alada & muito posteiar a0 peiodo Srientlizante da arte, & 0 que sugereprinipalvente a identieagHo de uma abstrac. ‘40 com tal forms. Ee fseto manifetta uma carta relaglo com formas orientais ‘de pensamento (em ardcular,assras e babilésicas) bastante complexes — algo de muito diferente do mero empréstimo de um mtivo pietrien, ou até da asinilago ‘de uma forma mica invelcamente coneteta, Senelbantes exavagancias de imag fo encontraram powce resondneia na mentalcado grege anterior a0 perio hele- Disc. ‘VERSORS NEOPLATONICAS DE COSMOGONIAS ORFICAS ‘03 Neoplaténicos tardios (séculos quarte a sexto d.C.), e em particular Damascio, com as suas longas e esquematieas alegorizagbes de narrativas rmitolégicas anteriores, silo a fonte mais copiosa das versbes Grficas respeitantes 4 formagiio do mundo. Estes eseritores so mais fidedignos do que parece & primeira vista, j& que uma grande parte das suas informagdes foram hautidas em compéndios da vultosa historia peripatéica da teologia, composta por Eudemo, Num que outro caso, € possivel trazer a colagiio fragmentos de poesia drfica tardia para confirmar pormenores das descrigbes neoplaténicas, fastidiosamente difusas——e que, por isso mesmo, esquematizamos mais adiante, em (i) ¢ (ii) —e expressas na terrinologia peculiar dessa escola Subsistem quatro versGes de uma cosmogonia especificamente designada de Srfia, ( erivagao a partir da Noite Damiscio, no excerto 16 (qxv.), declarave que, segundo Eudemo, «a teo- logia atribulda a Orfeu ... fez, da Noite, a origem das coisas». De acordo com as Rapsédias #, a Noite era filha de Fanes (vejase n. I na p. 140 n. 3 nna p. 19), ¢ este descendente de Chronos *. Foram-lhe concedidos por Fanes poderes profiticos, sucedewlhe como govemante © parece que, de uma maneira ou de outra, dew A luz, pela segunda vez, Gaia e Urano 2. O earic- ler secundisio e repetitive desta produgio do céu c da terra, ¢ a evidente intengdo de converter Fanes em eriador defin tive do mundo, sugerem que & Davide a ser impossvel disingui, mo ortgrofia porturnea vigeute, 0 X do Ke do alfbero ergo, remonas forcados a adopar esta grata para ditingulr Ngivo: (~ Chrowes} “Tenpor de Kosvos «Crono: ef, pie, 0-3 da p. 33. NT. is 9 prioridade cosmogénica da Neite (distinta da sua posigio incontestavel como figura veneranda entre os deuss) & neste caso prineipalmente o resultado do ccardcter derivative e sincrétice da teogonia érica GL 22 Raps. Ort. fH, 66 Keen (provesiente do Prodlo) Aitéon nev Nedros ves dpigues dpBeeduyes | yolmao, sel ney houarehigin Bru Eda. (Ese Chronos, que nto emveliece e cs designs io ingereiws, crow 0 Alter e un enorme «© prodigioso alamo aque alm.) Siriano (fe. 187 Kem) apresantotambémy 0 Air © 6 Caos come segunda fase, mas depois de wo Gnioo © bon como primeira © loa pique provém directumente de Hesiole Teoponia 740 (3). 2 Cl. 23 Reps. Ort r. 70 Ker (proseseate de Damisci) Ensera &° Frevbe dyn Xgéros aiDips ley cede dxpepan (il. (Sexuldament, 0 poderove Chron {Fes no dri ather um ova de pata). Sobre 0 ovo, va, inf, pp 2-24 2 Fans, relacionado pelos Oricos com gait, ete, & um desenvolvimento "As chamadas Repsovias Oricas (sot Aéyor de daypoding 3 segundo a Suda sw. ‘Oogess), de que sabssiem muitos fragmentos (Kern, fre. 38238), pin Sipalmente por inteemédio de ciapdes em obras neoplatSnieas, sto ume compilaglo tarda de hexdmeios, cua deta de composi € varive. A maior parte deles & rclenistca e muitos sto ainda mais tardios. Contudo, © papito Detvent (0) emonstra que slgans procstem do século guinto ou até mesmo do sexto aC. ‘io obstane, neu oueo autor, ames do plen pelodo exist, parece ter ouv wsclusivamente bec, elatvamente taro, do Eros cosmoginico de Hesedo (I). far da ior pte des, © parece amen provive qe 2 sa eiaborago numa | {avez tame, do ples engolido por Zeus, egindo 30, (6) ©). Aled, hernia Mads Sica nko sen sido enpreendisa ante dos acculos ttc ou guar We frit © auto, blanc, cle dk luz a peas eerapdes de dees certo gue crengas genuinanente arcaleus podem bem tr so incestaes en Ce 0 evidor supremo do couos guns desses verss, eompilados, que forint, tardameate. 220 Raps. Ort. fe. 109 Kern (proveniente de Hérmias) (8) 4 68 adi Pai ve und Oty eb dvoee | blsér¥ 5 apanivqarsgods of Yel yunt ne. Gil) A verso de Jerénimo & Helinico (E dla fa Note? de novo dave si lnz Guia e © vasto Urano, ede issivels or torno sie © reviow gem eles eam por natcinets). Mas Fans {tna erase © a Dn a ee eee Oligo,» So, a Lun © a Tera (er. 88,96, 91-3, 94 Ker, provencaes das, Pea on aa jis See ‘oan tevin se Bb e"Opyo Beaty” Uae oh be te cobras Eyer Song Hp, got, E doze wal Son, €F sg bay 7. Voja-se DK para uma deserigdo completa: a seguir damos apenas tm resume: (ii) «A teologia srfca usual» nas Rapsédias : a Adie 21 Damiscio de principe 123 (DK 1B 12) de yy rove vale gegoye eee gi orien vee dang radrats “Payeiats"Oupenits 5 Deohoyta ibe ce dare negl x8 vot, ‘iy — ra (uma serpenteslada, potittata,| “Bospos | -maros (com Wy sii ol pidooro Heegnrescoan, drei wiv ws pd win Slow doze xan bisexuada; também chamada asas e cabogas Xosvar riéres .. (a desctigto completa, que se pode ver em DK, ¢ longa e Héractes, ¢ acompanhada pela animaleseas) encontra-se expressa numa dificil terminologia neoplaténica, Dames a seguir, *Avdyen © por *Adgderceun) em. esquema, o essencial dela: a 24 A Teologia Orfca, que se diz ser conforme 2 versio de Jersnimo € Helinico (se é que nfo io uma mesina pessoa), & como se segue: a gua, [LMijs, firma ele, existiu desde 0 principio e bem assim « matéria. da qual, por “Howzexaios}) consolidagio, se formou a terra roweiry ain ¥, gory: “Optic, eazoyla Nodvoz Chronos que niio envethece! | Aither Heracles =| Caos | ovo um deus 21 Esta & pois, nestas Rapsédias Orfieas, tal como se conhecem, a aoe teologia referente ao intelegivel; também os filésofos a exptem, colo: Matéria ~» Terra { (com a Nevessidade | acer ando Chronos no lugar ce principio tnico de todas as coisas © Adrastcia) a Aither | . 1 No € posse idetiicar com seguraasa estas dois autores. B avidente (Chronos 1+ ovo? [ou tinicn alvinitente, - Fanes 3 swe Damasio suspeitou pode ratarse dena nesma ese, mos & mais provdve \ Caos ou maven} [- Métis, por exempo, ae um enha sido o epitomador de outro, Jeronimo tevez sia © ator Ericepeul) dias amiguidades teiess, mencionadas em Joss ant. L, 94; um simbolo lado de 1 Ta € a teologia érfica usual FLCronos aparece em wsanehuathons, Eussio DE. 1, 10. 36 (Lp. 36 m}). ‘Quanto a Hetinico talver ten sido © pa Ge. 4 3.C) de um tal Sind, prove 20 ‘elmente de Tatso,esetor éifico meacionado na Suda 0 que & mais provivel, ave teatar-se do logézrafo lésbio do século quinto a.C. 2 br voivons J Nadvos gen épivmaey, diz Damiscio— ie, no Alther, Caos «© rebo. uo se afitma expeitamente que «0 deus incorpéreo> proceda do ovo, ims ovo que asin sj; omparee 28, «went peoinn wo xs de (iv) Variante de (ii), de Atendgoras 25 Atenagoras pro Christians 18, p, 20 Schwartz (DK 1 B13)... ir ye Woo dort nav aide (se. Ougé) tots Brots, dz 62 vod Bavos this xaéory, bx 08 deactooy Eyernfn Zar, Soden xgoonepunvias tyr xapaiiy Réaveos, ‘a péoow 8 airy Beo8 agiawror, drown Hoawhis wal Nedvos. (AtE aqui ‘0 texto € quase idéntico & versio de Jerénimo e Helinico.) oftos 6°Hewzkis aydiigver tneouty bes Gdn, § ovjrdngotueror tind Blas coi yeyermdros dx aapnoipic el: 880 bogdyn. x6 pay ate zard xogupn wizod Odgards ebm erchéotn, 1 68 eos éve dev Tip xgoiide 68 xai O63 x13 badperos,* Odoavds 88 Dj mzbeis ysrrG Onasias sv KiwDes Adyear “Argonor (egue-se uma teogonia do tipo hesiédieo. | yp ib onceos ms; 2m. Lobeck, accep. Dies, Kranz; roles fy dinaroe ‘Th. Gomperz.—Em qualquer dos exsos ¢ Fanes que esth em east daduaros Saciuazos presiaresea uma ficilconfasto, © no & porivel terse a cetera de que fs exemplos do segundo voribulo no texto 24 ssjam necesariamente corectos Sino inmplica wdssoxuadn earacterisen de Fane; wineorpareos, tratando de um ser deserito como posiuider de mais do gue ast quota-pate de atzbtos Fiscos,e de um tipo muito seenliae, talver sain de extranhar msemo am Neoph 23 € que, segundo cc [Orfeu), « agua era a origem da totatidade das coisas, e da igua formou-se o limo, © de ambos gerouse um sor vivo, uma serpente com eabeca de lefo, no meio dees, o resto de um deus, d= nome Héracles © Chronos. Este Héracles gerou wm enorme ovo, que por estar completamente cheio da forga do sen progenitor se parti em dois por fregio. Asim, « parte superior aeabow por se con verter em Urano, ¢a parte inferior em Ger e surgiu também um deter rinado deus cor dois compos. E Urano, tendo-se unido a Ge, gore como peole feminina, Cloto, Laguesis © Atropos Destes quatro tipos de cosmogonia denominada érlica, a seccao (i) menciona um primeiro estadio, a Noite, que no ocorre nas demais. A impor- tincis atribuida & Noite no panteo Srfico dependia provavelmente, por via directa ou indirecta, de modifeagdes feitas no esquemu hesiddico da cosmo- gonia e da teogonin (vd. § 5). E possivel que Eudemo tenha conhecido nar | | rativas Gxficas semelhantes as anteriores vers6es, associadas a Epiménides © a Museu, ¢ 0 papiro Derveni (30, (2)) confirma que & Noite era conferida uma fungi cosmogdniea espectfica, na qualidade de progenitora secundaria de Urano € Gaia, A seogdo (i) € designada como exposigio drfica usual, porque, provavelmente, correspondia mais ou menos ao amplo quadro tragado nas Rapsédias tardias. A seogdo (iil) € uma claboracio de (ii). Nio pode, tal como se encontra, ser pré-helenistica: a deserigzo fantistica © concreta do abstracto Chronos, que nela se contém, & um sinal de origem tardia ou, pelo ‘menos, de uma remodelagio tardia. © excerto de (iv) ¢ eitado por um apo- logista cristo do século segundo, de pendor neoplat6nico; tal citagdo fornece tum pormenor significative, o da divisio do exo para formar o cfu e a terra, Facto que esti completamente ausente dos relatos neoplaténicos posteriores. AS seegtes (ji) © (iv) contm uma primeira fase, 0 fimo sob wna ou outra Forma, e que é, sem divida, uma ecléetica intrusio filosdfico-fisiea. Essa ideia podia bem ter sido recebida directamente de sistemas j6nicos, como 0 de Anaximandro, mas & mais proviwvel que tenhs vindo da cosmogonia estdien derivativa, (© OVO EM FONFES GREGAS PRIMITIVAS, NRO ESPECIFICAMENTE ORFICAS Atistofanes Aves 693 (fala 0 Coro das Aves) iv wai NOE "Boepbs ve péhav xesrror wai Téoragos « 1 8 088 “Ay 08 Odgavis ir *Bpiftoos 0° &v dneigne xéixorz xoimaror Ssypinor Nie yj pehandseeooe dbx, EF of xegrrediowéra: Goats EPiaveer “Bows 6 xodeurbs. riifion sirxoy xregtyou zyvaui, clade dveuceeat Sinus. 697 abros 88 Xda reper muyels vozin zack Téorapor ebobr arcdrtevoer yoros jnérsgor, xai apiror dnigayen & ges ngtregs 8 ob: ie ylv0s davdnne apis “Eyns Sorépenzen dewereer Eouneyrondven & Exboow Exton: yéree? Olgawds “veands re aii Ti mdivewr re Bethe purnciocon ylvos KpDoeor, «ide ev Foper nol’ speofiéraros mdveeo yuuzdnoor. 26 Primeiro que tudo, havia 0 Caos ¢ a Noite © 0 negro Erebo e 0 vasto ‘Tartaro, e no existia Ge nem Aer nem Urano; no seio ilimitado do Erebo, a Noite de negras asas gera, primeiro, un. ovo cheio de vento, de onde, com o volver das estagdes, brotou o almejado Eros, de dorso reluzente com ‘asas douradas, semelhante aos ventos curbilhonantes. Foi ele que, 0 unir-se 80 Caos alado © sombrio, nn vastidtio do Tértaro, chocou a nossa raga € primeira @ trouxe & luz. A principio [tradueao de xodtepor que 0 A. omite na versdo inglesa. N, T)] nko existia a raga dos imortais, antes de Eros ter unido todas as coisas; mas & medida que se uniam tumas &s outras, nasceu Urano, © Okeanos e Ge e a raga inextinguivel de todos 0s deuses bemaventurados. Assim, nés somos, de longe, os mais antigos de todos os bem-aventurados, 27 Damiscio de principtis 14 (DK. 3 8 5; peoveniente de Eudemo) réy dé “Bamueridyr B80 xoiiras doyis Fa0koDa “Aéga wai Miura... €8 dr perry Oijrat Tégtagoy .. &E div Blo Tixdeag |... civ pu Das... & of dds Biqy even sgaekiery Nérrav ABjlots Gav yeréan £0 manuserto tem aio rods, mas a emenda de Kroll para dio Teréims (accita por Krung em DK) € superida pela etimologiaimplicita no paréntese neo Diatinico que ver a seguir a0 vocibulo em questi, Tir rvchr sevdanra oft abéowr, dine 2° Gp “Seecved xb re Bagor wal tb fg. As outias oases 4 texto, tal como fol impreso em ein, sto pardrases neoplatriees que nenhums luz Langa sobre interpretcte. 27 _Epiménides postulou dois principios primordiais, o Ar ¢ a Noite dos quais. nasceu 0 Tiraro ... de todos cles aasceram dois Titds dda sua miitua unio nascew um ovo... do qual, por sua vez, proveia outra pro. 0s versos de 26 foram escritos em 414 a.C. ou um pouco antes. Quanto 40 contetde de 27, a finica coisa que podemos afiemar com seguranga que ele & anterior a Eudemo; mas em face da proliferagio de verses mito Idgicas em hexametros, respeitentes i genealogiae, por consequéncia, pedendo ‘comegar por uina teogonia, trovavelmente dos finais do século sexto a.C. ‘© seu contetido podia ser dataco, conjecturalmente, entre essa épova e meados do século quinto (sobre Epiménides, vejuse 17 © n. 2a p. 14). Assim, um ‘ovo como elemento da cosmagonia, nota caracteristica dos relatos érlicos tardios, conforme se conservaram na tradigio neoplaténicn, ¢ seguramente mencionado por volta dos fina's do século quinto e provavelmente antes dessa data, Tinham esses relatos mais antigos caracteristicas especilicamente “rficas? Nao hi necessariamente diferencas importantes, quanto ae modo de produgio do ovo, tanto nos relatos mais antigos come nos mais recentes, estes claramente rficos. Nestes i:imos, Chronos, numa forma tardia e bizarra Bera © ovO no Aithier ou no Althet-Caos-Erebo (23, 24), Em 26, a Noite pro- duz 0 ovo no Erebo: em 27 ele 6 gerado por dois Titis — provavelmente Cronos (ef. $22) © Reia—cue sio produto do Ar-Noite © do Tértaro, ‘Nio hi, evidentemente, referencia a Chronos, mas Ferecides de Siros (pp. 52: ~56) Linh j associado Crones s Chronos, e & possivel que hija neste ponto 23 uma relagdo com as verses posterior: veiase também 52 ¢ respectiva diseuso |. Hé uma nitida semethanga ente © que nasce do ovo na fale das aves © nos verses difias posteriores: Eros com asas douradas & um protétipo evidente do Fancs rico, Todavia, uma grande parte da cosmo: {gonia das aves em Aristéfanes é indubitveimente derivada da. Teagonia de Hesiodo, com modifiagbes adequadas as circinsténcias, O Caos, a Noite, 0 Erebo eo Tiara estiocomprometidos nas prneiras fases de amibas a Versbes: sé que Terra é posposta em Arissfanes, para ser erada (até certo ponto com mais I6gice) simultaneamente com 0 Céu. 0 ovo & «cheio de vestos, em parte pata fazer dele algo de mais conforme com as aves, em parte também por causa da tradicional ventuosdade do Tértiro (34), Deste modo, a Noite © Caos ¢ Eos sto todos alados, por se trem vista uma cosmogonia eaves Trata-se de uma parddia de um tipo tradicional de cosmogonia; contudo, © modelo de uma paréin deve ser reconheciel, e se bem que os elementos hesiicos sejam sufiientemente clatos, 0 ovo nko Shesiéico. Apesar de con- vir sobremancira a gerasio das aves, &poueo provivel que, por esse motivo, © expediente tenha sido precisamente inventedo por Aristéfanes. Deve ter sido familiar, como meio de produsio, nio necesariamente de uma figura cosmogsnien, mas pelo menos de uma divindade importante como Eros A idantifeagio Cronos — Chronos fo! igualment feta nos cirelos ofcs: fe, Procle In latio Chis 396 (Kern, 6). Ese facto nf significa que Fere= ies fose dren, ou que recebese as suis iets de fontes Gres antigas (ebora 4 Suda refra, devia provavelmente a esta semethangas, que cle «eligi as obras ‘de Orfeo); signif, antes, que os elecosorfostardioe wlaaram Ferecides como Tontepeincipal,precsamente como utlizaram Hesiod © ovteas obras rltologicas antiga. Em qualquer cas, 4 ssinilagio dos dols nomes foi um passo evidente 2 A linguagem da versio rapsédica esi, efectivamente, cheia €¢ reminis: incias de AnisOfanes: compurese zgovelas neeqiyiom yogeijaes &Ou vai fe (2. toy), eanes . vansportado de wn lado para @ eutto por ass do radaos (fr. 78 Kern) como verso 687 de 26, fvka val Sr no verso rfc, tal eome fem 22, embra Hesiodo Tengonia 742 (34), qus faz parte da desrigio do ventoso “Tararo; Hesiodo¢, cortamente, 0 principal moudo linguistico ¢ formal das Rapsédias 2» possivel que © nascimento de Helona @ partir de um ovo tena um sign fad especil neste ponta:relacionada com wm cult das Srvors,taver doesn rieénea (M. Nision, Geseh. dt grieoh. Religion I (Munigue, 967), 22 ¢ 211), ela € finn protegida © repesenante de Afroite-Eros em Homer. Uma razio para duvidar de um empresa srlica antigo do motivo do ‘ovo pode encantrar-se no facto de, se existiv um tal emprego, ser de esperar que aplicagbes posteriores concordassem con uma tradigio anterior, que uma seita com um livro sagrado, tern tendéoeia para ser considerada saeros- santa, Nao obstante, conhecem-se trés wtilizagdes posteriores desse motive totalmente diferentes. Primeiro, © ovo prodtz simplesmente Funes (21, 24). u Em segundo lugar, no trecho 25, « parte superior do ovo da origem wo eéu, 4 parte inferior, & terra: emerge também 0 equivalente de Fanes, © 0 céu a (erra unem-se eto, corto em Hesiodo ou na tradigio popular, Em teresiro lugar, Orficos houve que usaram o conjunto da easea ¢ da membrana (6, provavelmente, também da clara e da gema) como um anélogo do conjunto do céu (parte externa do firmamento) ¢ do aither 28 Aquiles Isdg. 4 (DK 1.012, Keen fe, 70) nijy 08 vdbw fe deddnaper opugiyats of Opp idyoust aaganhnolas clea fj éy cats Gots: bv ‘rig Exe Uyov 20 Hawgor & TH GG, rotea» br 16 mars d oteards, ral be Eijorytas x08 oteavat srehorehs 6 ali, obras: rob Lenkoow 6 Syn 28 Quanto i disposicdo por nds atribuida & esfera celeste, dizem os Grficos que & idéntica & que se encontra nos ovos: é que a relagto que casca tem no ovo, € a que o firmamenta tem no universo, ¢ assim como © aither esta circularmente ligado a0 eéu, assim também a membrana dere A casea, DESCOBERTAS RECENTES E CONCLUSOES PROVISORIAS As conclusdes que ‘odem tirar dos testemunhos até agora apresen- tados reveberam uma nova dimensio gragas a recentes deseobertas. Em Primeiro lugar, a série, bem conhecida, de Viminas de ouro com instrugses para os mortos, & que foram encontradas em sepulturas da Magna Grécia © de Creto, foi agora acrescida de um novo ¢ importante exemplo proveniente e Hipénion (moderna Vibo Yalentia), no sul da Tt, gravado por volta de 400 aC. Apés as habitusis instrugdes dadas ao morto— neste caso, luma muther— para nio bebe da nascente junto ao cipreste braneo, mas dda gua que corria, mais adiante, do Lago da Meméria (sobre este assunto, vd. G. Zuntz, Persephone (Oxford, 1971) 335 ss), © texto continua eomo se segue! 29 Lamina de ouro proveniente de Hipénion (segundo G. Pugliese Carra- telli, Parota det Passato 29 (1974), 108-26 e 31 (1976), 458-66), 10-16: slaor! bis Talus sal “Ogass drrensertos. 0 Biyua 9° ey aio vai dexdiiva dhe 850 Spea weqesv too xoonier ve Moewoobres dnd Ailes) vai BE tor édedo(er) I tnd Xowlon Bamtit, al 08 08 Séaore més ii: Mvapostvas anf] Auras. val 88 ai sopvin bode doyeuee, dv re val Ui séoran val jldzqon huegtn acelyore vicereere. 25 29 Diz; «{Eu sou] o filho da Terra e do Céuconstelado. Estou a arder ‘om sede © a morrer; por isso, dé-me depressa da ‘gua Fresca que corre do Lago da Meméria.» E os Reis inlernais terso compaixio de tie dar-te-io de beber do Lago da Meméria. E concorrdo é o caminho que percorres, ccaminho sagrado que também outros famosas iniciados © bacantes esto seguindo, No verso final, excatologia tipica dos crentes das laminas de ouro € creditada, pela primeira vez nos documentos que possuimos, aos «iniciados baquicos» — isto &, aas seguidores de Dioniso som erencas religiosas secretas. Priicas funeririas baquicas foram equiparadasas drficas por Herddoto u, 81, ‘que acrescentou, de um modo significativo, traiar-se, na realidade, de priticas pitagéricas e egipcias. G. Zuntz (op. cit) argumentou que as tabuinhas de ‘ouro so expecificamente pitagéricas, mas que a sua coneesiio com Dioniso neste ponto sugere antes uma associnglo Orfica. O eepticismo de Herédoto implica que niio havia divisdes sectarias bem delinidas, mas talvez seja sig Fientivo que Dioniso se viesse a converter na figura central do mito érlico patticular, respeitante & criagtio do homem a partir das einzas dos Titas, que tinham matado © comido 0 deus-menino, Para mais, hé também um novo lestemunho sobre este ponto, porquanto, em 1951, foram descobertas no san- sari central de Olbia, antiga colénia milésia, na Crimeia, tabuinhas de 0330; ‘numa delas foi rabiscado, provavelmente ne séeulo quinto a.C., 0 nome cOrphikoi» e também uma abreviatura de Doniso, nome que volta a apa recer igualimente em vérias outras tabuinhas; veja-se também p. 216, n. 1 «para uma mais aprofundada discussio sobre o assunto, 0 valioso artigo de M. E, West em ZPE 45 (1982) 17-29. Foi também em Olbia, segundo Heré- doto 1v, 78-80, que o rei Esciles se iniciou no culto extitico de Dioniso Bacante A alegagio «Eu sou 0 filo da Terra + do Céu constelado», que se censina a alma do morto em 29, 10, é em si mesma intrigante, se bem que pressuponba um elo de ligagio entre © norte © 0s deuses primevos. ‘Tal elo seria Fornecido pelo mito (possivelmeate posterior) de Dioniso © dos Title; mas um interesse érfico relativamente antigo pela sucessio dos pri- meiros deuses da natureza encontramorlo hoje num notivel rolo de papito, proveniente de Derveni, perto de Salonica, em 962, Este rolo, meia-queimado © que foi descoberto sobre uma sepultura do ano 330 a.C. aproximadamente, continha um comentario alegérico, da autoria de alguém versado em Anaxi- goras © Didgenes de Apolénia, 2 uma teogonis varias vezes atribuida a Orfev ‘0 comentiria nla contém qualquer indicio de influéncia platénica ou atisto- lélica, e Walter Burkert (e.g. em Griechiscke Religion der archaischen smd lassischen Epoohe (Estugarda, 197), 473) sugere unxa data provavel de com posigto sligeiramente posterior n 400 3,C.», 0 que situaria a propria teogonia 26 rfiea —composta ci heximetros, alguns deles citados — no século quinto a.C., ou presumiveliente até no século sexto, Alguns dos versos. citados sto idénticos, ou muito parecidos, 2 passos da compilagdo tard as chamadas Rapsédias Orfcxs (vd. nm. 1 da p. 18). Isto no altera o facto de ‘2 maior parte das Rapsédias ser da época helenistiea ow greco-romana, mas demonstra que os comesos das erengas que se podem denominat especitica- mente de riicas, ¢ que form registadas em versos sagrados, eram muito ‘mais antigas do que Wilamowitz ou Linforth teriam admitido. ‘A complete publicagio do papiro ja se arrasta por bastantes anos, mas esté agora a ser preparada pe os Professores Tsantsanoglow ¢ Parassoglou da Universidade de Satonica, Até a0 seu aparecimento qualquer discussio deve ter um caricter provisério: mas o Professor R. Merkelbach jé publicou & sua versio do texto mum apéndice (pp, I-12) a ZPE 47 (1982), e foi dai que colliemos os seguintes extractos, particularmente relevantes, do poema érfico. A sua aplicagao © aerescentos so por vezes parcialmente determinados pelo seu contexte no antigo comentario (extsemamente desordenado), € que aqui nfo citamos: 30 Seleeso de versos citados do «Orfeu» pelo comentador de Derveni (0s niimeros entre paréntesis sio meras referéncins para este livro: a nume- Tagdo romana ¢ arabe, que se Ihes segue, diz respeito a colunas e a linhas de cada coluna, respectivamente) ()_X,3- (Kedvos) 8: dy’ Eoeken (rin Odqurir) (ef. x, 7-8) Q)X,6 — Otgards Kigooritys, J: sedturep: fasthevacr G) x16 Gi Tod dy Kodens [a)iees, Exerra 86 jopriews Zev Gv, BE afdéeallo.. zofgas (se. hy Nera) wil, 10 86] Exonoer dure td of Blea we 13) 1 Zoic ee axel) aurgis fot dgy (Bjoyar dexnsoy (6) 1X4 aldoror earn idle Fxloge moiir0: (XM 3-6 xgorroydrow puskéens uidolon, rol 9 dua adrces ADiivuro1 xyccégor ndzges Yeoi jd Biaures ai norco ah ein Eigen Hh [love wér' ir yeyusr’, uitds & doe jovo: Eyerro. (8) NX, 166 "Qaourds sie]... Agoura ... eves eye. e690 Slaven, 2s se dvr pjaure 8 "Rxweie née oBbvo: ebb Géorres (esti, Burkert, at) ©) -XX.3- fovhiion, of. XX, 10), moddoic quiver egdnenn ex devote gore pias (HO) xX, 9510 payrede é yerényee.. Dédarre jyBiru, of. xxM, 1 woktalos .. bis, 2 se. gre qudérye (vestit. Burkert, ali) is FEZ puDiieonue be 27 30 (1) [Cronos] que cometen uma graide faganha [relativamente a Urano} @) Urano filo de Eutroné [Noite], que primeiro reinow @) depois dele, Cronos a seguir, ¢ d2pois o prudente Zeus que [a Noite} profetizou do seu impenetrivel santusrio € ela profetizou tudo © que era legal para (5) Zeus, mal ouviu os oréculos da boca de seu pa (6) engoliu o falo [dele] que primeito saltou para o ar (do Falo do rei primogénito: e dele fou do falo?] se geraram todos os deuses e deusas, imortas © bem-aventurados, ¢ oS rios © a5 apraziveis Fontes e tudo © mais que entio existia; mas ele nasceu sozinho (8) ele concebew o grande poder de Okeanos de amplas correntes, (9) [a Lua} que brilha para muitos mortais por sobre a terra ilimitada (10) desejando unir-se em amor com a mie Como seria de espernr, muito da teogonia érlica revelada pelas citagdes do comentador assemelha-se de perto a teogonia hesiddica, que analiss- femos no § 5; so as divergéncias com esta foste que interessam © tém, pos- sivelmente, significado. © primeiro rei do firmamento & Urano, 0 Céu; ele, porém, é filho da Noite (2) (ie. em 30), que, por conseguinte, ocupa a mesma posigdo que 0 Caos inieial de Hesfodo (31, 1) — 0 que vom 80 encontco da informagio de Aristételes em 18, Cronos obiém agora a realeza com uma vegrande (ou terrivel}facanlia» (1), provavelmente com a castragio de Urano, como em Hesiodo (39). O reia seguir 6 Zeus (2, que parece receber oriculos tanto do proprio Cronos (5) como da Noite noseu santustrio (4). Zeus nilo & engolido por Cronos, comio em Hesiodo (pp. 41-2), sendoele, antes, quem engole tum Falo (6), certamente 0 que foi cortado a Urano por Cronos (7, 1). Como resultado desse acto, di o ser a todas as coisas 4 partir de si mesmo — deuses © deusas, rios, nascentes, todas as coisas (7, 2-4), incluindo sem duvida 0 Ponto e (8) Okeanos (como num passo muita semethante das Rapsédias. Fr. 167 Kern), e bem assim a Lua (9). Por fim, comete incesto com a mie (10) —Reia, que é provavelmente identificada, também, tanto aqut como nas Rapssdias, com Deméter: neste easo, a descendéncia (como sugere Burkert) leria sido Perséfone, com a qual possivelmente se uniu depois, a fim de produzir a forma ct6niea de Dioniso, Em tudo isto estio presentes alguns elementos da versio rapsédica muito ‘mais tardia, mas outros foram excluides —romeadamente, o deus alado Fanes (vejaese n. 3 da p. 19). Mas Fanes foi engolido por Zeus nas profun- ddezas da Noite, segundo as Rapsédias (fr. 167 Kern), ¢ assim temese a impres- io de que um gosto, expurgado e mais tardio, levou & substituigtio do flo

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