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VOLI ALLANGEE ino (METICULOSA PESQUISA BIOBIBLIOGRAFICA) 17 — Rivail e o Magnetismo © magnetismo animal, também conhecido por mesmerismo, visto ter sido Franz Anton Mesmer, doutor pela Universidade de Viena, o seu mais célebre renovador nos tempos modernos, esteve em voga nos fins do século XVIII, adquirindo maior impulso na primeira metade do XIX. Na Franea, sobretudo, sumidades médicas e ilustres prelados confirmavam a veraci- dade dos fenémenos magnéticos, principalmente no que diz respeito a curas psiquicas, a diagnésticos e prescricées tera- péuticas fornecidos pelos sonambulos, com quem igualmente se observavam incontestveis fatos de clarividéncia ou lucidez, de visio a distancia, de visio através de corpos opacos, de previsio, etc. Ao proprio Pestalozzi nfo teriam passado despercebidos os relatos de extraordinarias curas conseguidas pelos “passes” dos magnetizadores. Assim é que em fins do. século XVII, numa carta enderecada ao seu filho Jakob — portador de doenga rebelde aos tratamentos médicos e sujeito a acessos \epilépticos desde a infancia —, Pestalozzi conta-lhe um curioso sonho que tivera, por ele mesmo nfo aceito como simples- mente um sonho, de tao real que lhe pareceu, e no qual um médico tomou-lhe as mios, consolou-o e deu-lhe o seguinte recado: procurasse o doente refugiar-se em Jesus e na prece, e seria aliviado. E nessa mesma carta, mais adiante, Pestalozzi lembraria ao filho: “Meu querido, venho achando que o magnetismo, do qual as vezes se abusa, tenha contribuido de certa forma, no ultimo ano, para paralisar o teu mal. Se tens 6 nesse ALLAN KARDEC 103 remédio, experimenta usd-lo de novo, e que Deus fortaleca a mo que te h de servir.” (51) Jakob, porém, jamais se recuperaria completamente da doenca, falecendo mais tarde, em 1801. Franz Anton Mesmer (1733-1815) ‘Ao que tudo indica, a Rivail seria desconhecida a simpatia do seu mestre Pestalozzi pelo mesmerismo, s6 sabida de alguns (51) “Pestalozzi et son temps” — Publié & l'occasion du cente- naire de sa mort par le Pestalozzianum et la Bibliothéque Centrale de Zurich, Bdition Berichthaus (Zurich), Librairie Payot & Cie. (Lausanne), 1928, pp. 27/28. 104 ZEUS WANTUIL E FRANCISCO THIESEN Poucos familiares e, talvez, de amigos mais intimos do educa- dor suigo, S6 depois que o jovem discipulo de Pestalozzi chegou a Pa- ris é que teve a sua curiosidade despertada para o magnetismo animal, a que o é égur, juntamente com d’Eslon, professor e regente da Faculdade de Medicina de Paris, e com © sabio naturalista Deleuze,.haviam_imprimido nova feicio, a0 modificarem.os-métodos. de. Mesmer, disso resultando_na_desco- is ado. Rivail refere-se elogiosa- mente a esses magnetistas franceses, colocando ao lado deles C5 nomes de dois outros grandes vultos: o barao Du Potet e 0 Sr. Millet. A iniciacdo de Rivail nesse novo ramo dos conhecimentos humanos deu-se aproximadamente em 1823, segundo ele pré- prio o afirmou (52). K nos anos que se seguiram aplicaria parte do seu tempo, mas sem prejuizo de suas tarefas educacionais, no estudo criterioso e equilibrado, teérico e pratico, de todas as fases ou graus do sonambulismo, testemunhando muitos Prodigios provocados pela aio do agente magnético, Suas leituras nao se circunscreveram as obras favordveis ao magne- tismo. No propésito de aquilatar o valor das objecées, leu, igual- mente, conforme frisou na pagina 277 da “Revue Spirite” de 1858, grande ntimero de livros contra essa ciéncia, “escritos por homens em evidéncia”. © bardo Du Potet, que mais tarde seria amigo dos espiri- tas, tornara-se desde 1825 0 chefe da escola magnética na Franga, tendo ido mais longe que seus predecessores na aplica- $0 do magnetismo 4 terapéutica. Este justamente o lado que mais impressionou a Rivail, que com o tempo péde inteirar-se bem da forca magnética que todos os seres humanos possuem em graus diversos, vindo a ser, ele préprio, “experimentado magnetizador”, segundo escreveu seu amigo pessoal discipulo Pierre-Gaétan Leymarie, na “Revue Spirite” de 1871. Este va- loroso espirita lembraria ainda, pela “Revue Spirite” de 1886, Pagina 631, que o mestre lionés conheceu as pesquisas do padre Portugués José Custédio Faria (0 abbé Faria dos franceses) (52) “Revue Spirite”, 1858, pp. 175/6; id., 1859, p. 134. — Allan Kardec: “Le Livre des Esprits”, Paris, 1857, p. 24; id. 1b., seconde édition (entigrement refondue et considérablement augmentée), Pa- ris, 1860, p. XXXVI. ALLAN KARDEC 105 e Ihe rendia as devidas homenagens. O padre Faria, iniciado nas praticas do Magnetismo pelo marqués de Puységur, a quem dedicou seu livro “De la cause du somneil lucide, ou étude de la nature de homme” (1819), considerando-o seu mestre, foi © precursor do hipnotismo de Braid, Lecionou em liceus e academias de varias cidades francesas. Despido dos preconceitos dominantes na época, o padre Faria pos por terra o carater sobrenatural com que a Igreja cercava 0 Magnetismo, iniciando em 1813 as suas concorridas conferéncias na rua de Clichy (Paris), seguidas de demonstra- codes praticas. “A Igreja condenava o Magnetismo. Tudo pro- yvinha da ac&o de fluidos de origem infernal. Um tedlogo francés escreveu que “o sonambulismo e 0 magnetismo eram sobrenaturais e diabélicos, anticristaos, anticatélicos e antimo- rais”. O padre Faria estudou as praticas magnéticas e con- venceu-se da inanidade de tais interpretagdes. Crente e padre, nio teve divida em afrontar as iras dos tedlogos do seu tempo, para afirmar que nada havia de sobrenatural em tais fend- menos e que o sono hipnético era, afinal, uma modalidade da sugestéo.” (“Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira”, Lisboa — Rio de Janeiro, vol. X, p. 919.) Diz Anna.Blackwell, no prefacio & sua tradugéo inglesa (1875) de “O Livro dos Espiritos”, que Rivail tomou parte ativa nos trabalhos da Sociedade de Magnetismo de Paris, a mais importante da Franca. Ele, porém, ficaria eqiiidistante das rivalidades doutrinarias que haviam surgido entre os mag- netizadores parisienses. Soube fazer amigos nessa e naquela corrente de idéias, e um deles, o magnetizador’Fortier, a quem conhecia desde muito tempo, foi quem, em 1854, Ihe falaria pela primeira vez das chamadas’ “mesas falantes”. Tendo, assim, adquirido_sélidos conhecimentos_de_magne- tismo, ciéncia que ele mais tarde, em diferentes ocasides, de- monstrou possuir.em_profundidade ao elaborar o corpo doutri- n&rio do Espiritismo, foi capaz de perceber, logo ao inicio de suas observacées pessoais junto as “mesas girantes e falantes”, a intima solidariedade entre Espiritismo e Magnetismo, o que © levaria a afirmar: “Dos fenémenos magnéticos, do sonambu- lismo e do éxtase as manifestagdes espiritas, nado hé senéo um passo; sua conexio é tal, que 6, por assim dizer, impossivel falar de um sem falar do outro.”

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