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SÍNDROME DO DESFILADEIRO TORÁCICO INESPECÍFICO: Relato de Caso

Brena Guedes de Siqueira Rodrigues¹

Inespecific Thoracic Outlet Syndrome: Report Case

RESUMO

Esse trabalho apresenta o quadro clínico de uma jovem de 18 anos, cujo diagnóstico clínico, baseado em
exames por imagem, foi de tenossinovite do flexor do carpo; porém, o acompanhamento fisioterapêutico
do quadro conduziu à suspeita de outra patologia associada, no caso, a Síndrome do Desfiladeiro Torácico
(SDT), embora não existissem evidências radiológicas que justificassem a suspeita. Partindo-se desse
princípio, o quadro é exposto em seus detalhes e comparado com o que é difundido pela literatura mundial
acerca da SDT, em relação aos sinais e sintomas, ao diagnóstico e as opções de tratamento utilizadas,
tendo como objetivo o fechamento do diagnóstico da jovem, definido, então, como SDT Inespecífico pela
ausência de alterações anatomo-fisiológicas evidentes em exames por imagem.

Palavras Chaves: Síndrome do Desfiladeiro Torácico, Compressão Neurovascular, Cervicobraquialgia.

INTRODUÇÃO

Profissionais da saúde se deparam com freqüência com situações clínicas que desafiam seus
conhecimentos clínicos, isto é, situações que podem ser consideradas fora dos padrões e que, portanto,
favorecem a constante busca por conhecimento.

Fato comum é a manifestação de um quadro clínico concreto, porém, não justificado por alterações morfo-
fisiológicas a serem desvendadas pelas modernas técnicas de exame por imagem. Nesse caso, o
diagnóstico e o tratamento devem ser baseados na história do paciente e em um criterioso exame clínico.

A Síndrome do Desfiladeiro Torácico (SDT) pode funcionar como uma dessas situações clínicas, pois,
embora na grande maioria dos casos exista um fator causador, ela pode acontecer sem que haja um fator
evidente.

CASO

Paciente do sexo feminino, 18 anos, estudante, relatou que há aproximadamente um ano e oito meses
começou a apresentar dor em punho direito, desencadeada inicialmente pelo ato de escrever. O quadro
evoluiu para algia incapacitante de todo o MSD, com presença constante de trigger points na face ulnar do
membro e edema por toda sua extensão.

Foi solicitada a realizar exames como: Tomografia Computadorizada (TC) da Cervical, Ressonância
Magnética (RM) da Cervical, Eletroneuromiografia e Ultra-som do túnel do carpo direito. Os resultados
obtidos indicaram tendência a retificação cervical e espessamento e hipoecogenicidade do tendão flexor do
carpo e escasso líquido ao redor da porção radial do carpo, sugerindo tenossinovite do flexor do carpo.

Diante do diagnóstico, foi instruída por seu médico a tomar antiinflamatórios, manter o punho direito em
imobilização por tala e procurar atendimento fisioterapêutico. As técnicas de fisioterapia utilizadas foram a
radiação infravermelha, o calor por convecção do Forno de Bier e a estimulação elétrica transcutânea
(TENS). Esta conduta foi mantida sempre que ocorria agudização do quadro. A paciente relata que tal
conduta resultava em alivio temporário da sintomatologia.

Ainda durante este período, foi aconselhada por seu então fisioterapeuta a associar o tratamento em
andamento à uma técnica de fortalecimento muscular, visto que seu tratamento não compreendia
exercícios. Foi, então, encaminhada à prática de musculação, porém, esta prática gerou incômodo e
aumento da sintomatologia. Dessa forma, foi encaminhada à prática do Método Pilates.

A paciente chegou ao estúdio de pilates no dia 24/10/07, queixando-se de dor e fraqueza em punho
direito, com irradiação para todo o membro superior e região cervical, fadiga de todo o membro e
sensação de resfriamento em extremidade, com comprometimento das atividades da vida diária (AVD’s).

Ao exame clínico constatou-se:

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 Discreto edema de punho e antebraço;


 Cianose e baixa temperatura de extremidades;
 Preservação da amplitude de movimento para os movimentos de ombro e cotovelo e limitação para
todos os movimentos de punho, especialmente extensão, com relato de dor;
 Reflexos biciptal e estilorradial preservados;
 Dor à palpação de trigger pointss localizados ao longo do trajeto do nervo ulnar;
 Déficit sensorial em face palmar de 4º e 5º artelhos (+++), regiões tênar e hipotênar (++) e face
dorsal da mão (++);
 Discreta atrofia da musculatura do antebraço direito;
 Déficit de força muscular em todo o MSD;
 Teste de Adson positivo para MSD.

Além disso, a avaliação postural indicou:

 Retificação cervical;
 Protusão de ombros;
 Escoliose dorsal dextro-convexa
 Rotação pélvica à esquerda
 Genovalgo (D ++/ E+)
 Tornozelo valgo (D ++/ E+)
 Antepé varo (D ++/ E+)

DISCUSSÃO

O acompanhamento da paciente indicou que o quadro clínico manifestado não era compatível
exclusivamente com o diagnóstico de tenossinovite dos flexores, encontrado no US do túnel carpal. A
investigação clínica sugeriu o diagnóstico associado de Síndrome do Desfiladeiro Torácico Inespecífico.
Trata-se de um tipo de lesão por esforço repetitivo (LER) caracterizada pelo conjunto de sinais e sintomas
que são decorrentes da compressão intermitente ou não de estruturas nervosas e/ou vasculares as quais
cruzam o espaço conhecido como desfiladeiro torácico (composto pelo espaço do peitoral menor, espaço
costoclavicular e o triângulo dos escalenos) (Scola et al, 1999; Paiva et al, 2001; Alvarez-Hernandez &
Ávila-Ocampo, 2002; Demondion et al, 2003; Matsuyama et al, 2003; Dourado, 2005; Watanabe et al,
2005), como o plexo braquial e/ou a artéria e a veia subclávia (Cruz et al, 2003; Urschel & Patel, 2007).
Sua incidência é de aproximadamente 2% da população entre 20 e 40 anos (Moro et al¸2005) e tende a
acometer duas vezes mais o sexo feminino do que o masculino (Cooke, 2003).

Denominam-se “inespecífico” aqueles casos em que não se encontram os achados clínicos clássicos nos
exames por imagem, como: alterações congênitas como costelas cervicais completas ou incompletas,
bandas fibrosas e processos transversos da sétima vértebra cervical (C7) alongados. Mais raramente,
hipertrofia do músculo escaleno, anormalidades claviculares e lesões adquiridas como trauma com fratura
de clavícula e primeira costela, pseudoartrose clavicular e lesão por esmagamento da região torácica
superior (Scola et al, 1999; Francisco et alli, 2006).

A forma inespecífica pode ocorrer por alterações posturais; por alterações do equilíbrio muscular (grupos
mais fortes em contraste com mais fracos); ou ainda por compressões diretas na região do plexo braquial
(Cruz et al, 2003).

Segundo a literatura, os sintomas típicos da SDT podem variar de acordo com as estruturas
neurovasculares envolvidas (Urschel & Razzuk, 1998). De maneira geral, os sintomas mais comuns são:
dor na região cervical e/ou membro superior e parestesias, especialmente na face ulnar do membro
superior, déficit sensitivo e motor, fadiga, fraqueza, sensação de frio, sudorese e o fenômeno de Raynaud
(Scola et al, 1999; Alvarez-Hernandez & Ávila-Ocampo, 2002; Cooke, 2003; Matsuyama et al, 2003).
Além disso, em alguns casos pode-se encontrar cefaléias, dispnéia e dor torácica (Özçakar et alli, 2005).
Os sintomas como dor e parestesias são justificados pela compressão do plexo braquial; enquanto que os
demais sintomas estão associados a um desequilíbrio dos músculos da região cervical, torácica e dos
ombros (Cruz et al, 2003) e/ou a fatores psicológicos (Moro et al¸ 2005). Contudo, nem sempre o
paciente apresenta a maioria dos sintomas mencionados, visto que, existem os casos de SDT que são
predominantes neurogênicos e aqueles que são predominantemente vasculares (Paiva et al, 2001; Cruz et
al, 2003; Dourado, 2005).

O diagnóstico clínico é difícil pois diversos fatores podem estar envolvidos. Dessa forma, é baseado na
história do paciente e nos achados do exame físico (Cooke, 2003) e auxiliado pelos exames por imagem,
como angiografia (Cruz et al, 2003), ressonância magnética (Demondion et al, 2003) e tomografia
computadorizada (Akal & Cangir, 2002). Testes clínicos, como o de Adson, o de Halstead e os demais que

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envolvem o movimento de abdução e a análise da pulsação radial, podem ser úteis, embora não possam
ser considerados patognomônicos (Alvarez-Hernandez & Ávila-Ocampo, 2002; Dourado, 2005).

O quadro clínico manifestado pela paciente mostrou-se compatível com aquilo que é descrito na literatura
a respeito da SDT. E foi caracterizado como “inespecífico” pela ausência de alterações morfológicas nos
exames por imagem. Dessa forma, sugere-se que os fatores desencadeadores do processo possam ter
sido: primariamente, a tenossinovite dos flexores do carpo e; secundariamente, as alterações posturais
identificadas, como: retificação da cervical por tensão de músculos escalenos, escoliose e protusão de
ombros, por ação dos músculos peitoral maior e menor (Bienfat, 1993).

As formas de tratamento sugeridas pela literatura para o tratamento da SDT se resumem basicamente a
eliminação do(s) fator(es) causador(es) da compressão, seja por cirurgia (ressecção da primeira costela,
escalenoretcomia, ressecção do ligamento costoclavicular) (Moro et al¸2005), embora nem sempre os
resultados sejam duradouros (Urschel & Razzuk, 1998); ou por fisioterapia, para liberação do espaço entre
a clavícula e a primeira costela, conquista de alongamento e/ou flexibilidade dos grupos musculares
possivelmente envolvidos, com o objetivo de promover uma biomecânica adequada, além da correção
postural ((Urschel & Razzuk, 1998; Scola et al, 1999; Dourado, 2005).

Uma vez que o tratamento voltado para o diagnóstico de tenossinovite não surtiu o efeito desejado, a
paciente foi, então, aconselhada a interromper o tratamento fisioterapêutico que vinha realizando, visto
que, a prática de calor ainda que superficial (como IV e FB) representam risco devido ao déficit de
sensibilidade apresentado pela mesma (Machado, 2001). A partir de então, o tratamento voltou-se para as
correções posturais que poderiam estar envolvidas no processo de compressão nervosa e venosa, como
retificação cervical (envolvimento de escalenos), da protusão de ombros (envolvimento de peitorais maior
e menor), abdução da escápula (rombóides), assim como da escoliose.

Essa intervenção foi dividida em duas etapas. A primeira etapa foi a utilização do Método Pilates, com o
objetivo de promover a correção dos desequilíbrios musculares envolvidos nos distúrbios posturais,
através do fortalecimento daqueles que se encontravam fracos e o alongamento daqueles que estavam
tensionados e oferecer estímulos proprioceptivos pela utilização das molas do método. A segunda etapa
consistiu em uma intervenção localizada na cintura escapular e em todo o MSD. Para tanto, foram
utilizadas técnicas de terapia manual, especialmente a de Pompage, descrita por Marcel Bienfat em sua
obra (Bienfat, 1993), com o objetivo de promover a liberação miofascial dos músculos envolvidos. E, por
fim, foi realizada estimulação sensorial em todo o MSD.

CONCLUSÃO

Merecem atenção especial os indivíduos que se queixam de alterações neurológicas e/ou vasculares em
membro(s) superior(es), visto que, uma variedade de entidades clínicas podem ser responsáveis por esses
sintomas, isoladas ou em conjunto. Dessa forma, a história e o exame físico devem ser a base do
profissional para sua impressão diagnóstica, sendo os exames por imagem tão somente um recurso
auxiliar na complementação do diagnóstico.

A mudança de tratamento, deixando uma linha predominantemente analgésica e localizada (região do


carpo, tendo como objetivo o tratamento da tenossinovite), caracterizada como “efeito”, para a busca do
fator “causador”, mostrou-se de fundamental importância para a condução do caso e melhora da paciente.

Após ser submetida às técnicas de correções posturais, liberação miofascial de músculos tensionados e
promoção de estímulos proprioceptivos, a paciente relatou melhora significativa do quadro, com redução
da intensidade da dor e melhora das AVD’s.

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