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REPUBLICA DE ANGOLA TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ACORDAO N.°330/2014 Processo n.° 409-B/2014 Fiscalizagao sucessiva abstracta de constitucionalidade Acordam, em conferéncia, no Plenario do Tribunal Constitucional: 1. RELATORIO A ORDEM DOS ADVOGADOS DE ANGOLA, OAA daqui por diante, vem, ao abrigo da alinea f) do n.° 2 do artigo 230.° da ConstituigSo e legistago consequente, requerer a fiscalizagao abstracta das seguintes normas da Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo, aprovada pela Lei n.° 34/11, de 12 de / Dezembro de 2011: . alinea g) do n° 2 do artigo 3.% artigos 4.° a 13. . artigos 15.° a 20. . artigos 29° @ 30.° Pepe tudo no que se refere as obrigagdes e deveres impostos aos advogados e a Ordem, e com os seguintes fundamentos: 1. Estes preceitos legais fazem recair sobre os advogados o dever de levar 20 conhecimento da Unidade de Informagao Financeira (UIF) sempre que se apercebam de razdes para suspeitar que teve lugar ou esta em curso ou foi 1 ‘tentada uma operagao susceptivel de estar associada a pratica do crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo ou de qualquer outro crime, A propria inclusdo dos Advogados no elenco, por recomendagao da Financial Action Task Force (FATF), nao tinha de ser seguida por Angola pois nao resulta obrigatoriamente das varias convengGes assinadas, dispondo Angola de um amplo espaco de manobra para os Estados melhor conformarem os ‘seus respectivos direitos internos com os objectives pretendidos no combate a criminalidade. Embora conhecendo excepgées, estas novas regras, importadas por via de Convengées Intermacionais, néo atentaram com a devida considerago na tealidade juridica e constitucional de Angola cuja Constituig&o reconhece a advocacia como uma instituigéo essencial a realizagao da justiga. Mostram-se, assim, ofendidos alguns dos principios basilares sobre os quals se acha estruturada a organizago politica, social, econémica e judicial, nomeadamente: a) © principio do Estado de Direito Democratico, incluindo os subprincipios da legalidade, da proteceao das expectativas e confianga; b) © principio da proporcionalidade na restrig&io de direitos, liberdades e garantias; ¢) 0 principio da independéncia do sistema judicial e dos seus agentes; d) © principio da autonomia deontolégica e estatutaria da OAA e dos Advogados no exercicio do mandato forense; €) 0 principio do acesso ao direito e a tutela jurisdicional efectiva, ¢ f) © principio a um julgamento justo e equitativo, Com efeito, a referida Lei e os seus dispositivos acima enunciados ao fazer recair sobre os Advogados deveres/obrigagdes prudenciais e de prevengéio que, em parte, so uma duplicagao de deveres e obrigagdes impostas pelo proprio estatuto dos advogados e a Lei da Advocacia e por isso intitels, vo desproporcionadamente mais além intrometendo-se indevida e gravemente no exercicio livre e independente da advocacia na sua acepeao constitucional de instituigo essencial a realizacdo da justiga. Nao se concebe um Estado de Direito sem que se assegure aos profissionais forenses total independéncia, autonomia e sigilo profissional no que se refere @s informagdes que Ihes s&o fomecidas e providenciadas, livre e voluntariamente, pelos seus clientes no 4mbito do respective mandato. Embora esse dever de informagéo se deva concretizar com a supervisdo e fiscalizagéo da OAA, & a0 Advogado que incumbe o referido dever de informac&o a UIF, entidade de competéncia ndo judicial, resultando em clara e evidente perda de autonomia e independéncia dos Advogados Considerando os artigos 49°, 174.°, 193.° e 194° da Constituicao. 10. 11. 12, 13. Ainda em reforgo desta autonomia ameagada, o Tribunal Constitucional num dos seus mais recentes Acérd&os reconheceu a OAA como integrando o poder auténomo determinando ser imperativo constitucional que a Ordem tenha, nas suas relagdes com os érgaos estaduais, a autonomia necesséria para poder gerir os assuntos e atribuigdes a seu cargo, significando uma efectiva garantia da democracia, da descentralizagao e da autonomia local Ora, as normas acima referidas da Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais vém chocar com as normas estatutarias dos Advogados, imiscuindo- se em matérias como a regulagzo do mandato afectando de forma fulcral as suas prerrogativas de independéncia e autonomia criando verdadeiras normas regulatorias da actividade forense. Ao estabelecer-se no artigo 13.°, n.° 1 e 2 da Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais a obrigatoriedade de comunicagao por parte dos Advogados a UIF relativamente a potenciais actos cujos montantes em causa atinjam o equivalente a USD 15.000.00 e bem assim, nos casos nao subsumiveis no disposto nos n.°s 1 e 2 do artigo 30.°(...) e artigo 15. (..) da Lei, as referidas disposi¢ées acabam por entrar e ferir o acervo de garantias constitucionais concedidas ao Advogado (n.° s 1 e 2 do artigo 193.° e 194.° da CRA). Na verdade, os advogados apenas se encontram dispensados do referido dever de informagao & UIF sempre que, tratando-se de uma operagéo que evidencia fundada suspeita de constituir crime e a referida constatagdo resulte de informagées obtidas no contexto da avaliagao da situagdo juridica do Cliente, no exercicio da sua missdo de defesa ou representagao do cliente num processo judicial, ou a respeito de um processo judicial, incluindo o aconselhamento relativo & maneira de propor ou evitar um proceso, bem como as informagdes que sejam obtidas antes, durante ou depois do proceso, nos termos do n.° 2 do artigo 30.°, e n.° 1, do artigo 13.°, da Lei n.° 34/11, de 12 de Dezembro. E evidente que um dever de informago como aquele a que os Advogados passam a ficar adstritos nas situagdes previstas na alinea g) do n.° 2 do attigo 3°, nos artigos seguintes até ao artigo 13.°, nos artigos 15.° a 20. e bem assim nos artigos 29.° e 30.° da referida Lei aniquila uma das mais Qopr x relevantes e sagradas garantias do Advogado e do Estado de Direito, nomeadamente o dever de guardar sigilo concernente a informagdes voluntariamente providenciadas confiadas pelos respectivos clientes no Ambito da relag&o de patrocinio estabelecidas com o seu cliente, verdadeiro principio de ordem publica. O sigilo profissional encontra-se regulado no artigo 65.° do Estatuto da Ordem dos Advogados (EOA) e dai decorre que esse dever se mantém, independentemente da propria vontade do cliente, podendo apenas ser objecto de revelacao a terceiros nos casos de necessidade de proteccéio da propria esfera de interesses do cliente ou do proprio advogado, nao sendo possivel a sua revelagdo incélume fora destes casos previstos nos Estatutos, wer vw % 7 ie 3 I G 14. 15. 16. 17. 18. No 6, pois, admissivel que o dever de informagéo consagrado na Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais e do Financiamento ao Terrorismo, nos termos do qual deve o Advogado fornecer a UIF informagdes e dados feferentes a determinadas operacées ou transacgdes dos seus clientes, coloque 0 profissional forense na forte probabilidade de vir a ser responsabilizado nao apenas civil e criminalmente mas igualmente do ponto de vista disciplinar, atendendo as regras deontolégicas a que se encontra vinculado. sigilo profissional encontra-se mesmo protegido de forma expressa na Constituicao, no n.° 2 do seu artigo 194.°, nao podendo esta disposigéo ter outra interpretagéo que nao seja a de limitar as situagdes de acesso a informago constante em quaisquer documentos ou qualquer outro tipo de informacéo em suporte documental revelada ou disponibilizada pelos respectivos clientes aos seus advogados. Esta garantia do Advogado a inviolabilidade dos documentos respeitantes ao exercicio da sua profisséo conexiona-se com o principio do Estado de Direito Cujos respectivos corolarios impéem a necessidade de ser assegurada uma tutela judicial efectiva e o direito a um processo justo e equitativo com respeito pela dignidade da pessoa humana ainda que estejamos perante outros interesses ou bens juridicos do Estado, como seja o da sua seguranca e a prossecug&o do interesse ptiblico da investigacao criminal. Esta garantia dos Advogados a inviolabilidade dos documentos atinentes ao exercicio da sua actividade profissional assume-se como um direito fundamental de natureza andloga aos direitos e liberdades e garantias devendo por conseguinte gozar do mesmo regime juridico-constitucional nos termos do artigo 27.° da Constituigao. Daqui decorre que a obrigag&o de informagao prevista nos preceitos acima citados da Lei em apreciacdo ultrapassou os limites constitucionalmente estabelecidos no disposto no n.° 1 do artigo 194.° e artigo 57.° ambos da Constituigao, reduzindo substancialmente o contetido intrinseco da referida garantia constitucional de tutela de direitos fundamentais. Ouvida a Assembleia Nacional para, nos termos do previsto no artigo 16.° n.° 1 da Lei 3/08 de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional, se pronunciar sobre o pedido, esta teferiu essencialmente o seguinte: 1. Ser verdade, como alega a OAA que a Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro foi influenciada pelo contexto normativo vigente no plano intemacional, designadamente pela legislagdo relativa a prevengdo da utilizagdo do sistema financeiro para efeitos do branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo. Contudo, nao poderia ser de modo diferente, ante a constatagéo da comunidade intemacional de que, por se tratar de um crime marcado pela nota da internacionalidade, 0 esforco isolado dos paises na sua prevencdo e repress seria init e de que os instrumentos legais de cada pals seriam por ‘si sds, incapazes de enfrentar esse novo fenémeno criminal. Assim se compreende que as recomendagies intemacionais em matéria de preveng&o e combate a lavagem de dinheiro j& tenham sido adoptadas por mais de 180 paises, incluindo Angola que foi admitida como membro observador do Grupo de Paises do Sul ¢ Leste de Africa contra a Lavagem de Dinheiro - 0 ESAAMLG — do qual se tornou, em Agosto de 2012, membro efectivo, Este ingresso foi o resultado de contactos iniciados pelo Governo de Angola (com a coordenagao do Banco Nacional de Angola), junto de organismos intemacionais, como o Grupo de Acgdo Financeira Internacional (GAFI), uma vez que Angola era considerada como uma jurisdigao pouco comprometida com © processo contra o Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo, tendo em conta as recomendagdes do referido GAFI. O GAFI nao sO promove avaliagdes mutuas dos paises como cria mecanismos de presso politica para aqueles que nao cumpram satisfatoriamente as suas recomendagées, relacionando os paises que nao cooperam e oferecem risco ao sistema financeiro internacional (estas listas podem consultar-se em www.fif-gafi.org), Além disso, podem ser adoptadas algumas providéncias, no plano politico sendo a mais grave a aplicagdo da Recomendago 19, dirigida a todas as instituigdes financeiras do mundo, propondo o emprego de medidas de diligéncia reforgada as relages com pessoas fisicas e juridicas e instituigdes financeiras do pais que nao cumpram as recomendagées, incluindo sangées 30 de relagdes comerciais e financeiras com os nacionais do pais em questéo. © fundamento central do presente pedido de fiscalizacdo da constitucionalidade de diversas normas da Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro esta especifica e directamente relacionada com o segredo profissional dos advogados, sendo certo que este, como qualquer outro direito fundamental, nao € absoluto, pois deve conviver com outros interesses constitucionalmente protegidos, nomeadamente com esse bem fundamental igualmente contemplado na Constituicao: o direito 4 seguranga. Os préprios normativos que regem a actividade dos advogados fazem certas ressalvas 20 direito de sigilo, em hipdteses de justa causa ou do estabelecimento de excepgdes por outra lei. A Lei n.° 34/11 limita-se a estabelecer determinadas ressalvas ao segredo profissional de certos profissionais entre os quais se consideram incluidos os advogados quando estes actuem no prosseguimento de algumas actividades, wulgarmente designadas por ‘advocacia de operagdes’ as quais se caracterizam pela colaboragéo material para consolidar operagdes financeiras, comerciais, tributarias ou similares, sem que essa actividade tenha relagdo directa com um ltigio ou um processo. 10. Nao atinge, pois, a Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro, a advocacia vinculada a administrago da justiga, caso em que, efectivamente se estaria atingindo o nécleo essencial dos principios do contraditério e da mais ampla defesa. 11. Oque a Lein.° 34/11 acautela, num exercicio de ponderagao de interesses, é que 0 advogado comunique determinadas operagbes sempre que houver fortes indicios do crime de branqueamento de capitals. 12. Os deveres de controlo estipulados na lei séo manifestamente compativeis com a garantia de um processo equitativo previsto no artigo 6.° da Convengao Europeia para a Protecgao do Homem e das Liberdades Fundamentais, ante a necessidade de lutar eficazmente contra o branqueamento de capitais, que tem a profunda influéncia na expanséo do crime organizado, o qual representa uma especial ameaga para as sociedades actuais. 13. A mesma argumentacdo é valida para afastar a alegada ofensa ao principio da proporcionalidade pois os advogados s6 esto sujeitos ao disposto na lei sempre que particigem em transacgdes financeiras ou empresariais, nomeadamente pela prestaoao de servigos de consultoria fiscal, em relagdo s quais prevalega um risco mais acentuado de os seus servigos serem utilizados de forma abusiva para efeitos de branqueamento do produto de actividades criminosas, financiamento do terrorismo, actividade criminosa ou evasdo fiscal agressiva ou se 0 advogado estiver ciente de que o cliente solicita os seus servigos para esses efeitos. 14. Os advogados, nos termos da Lei n.° 34/11, apenas tém o dever de garantir que os servigos que prestem néo seréo ufilizados para efeitos de uma estratégia subrepticia de branqueamento de capitais. 15. Assim, a imposigo de deveres de identificacdo € comunicagao relativamente @ operagées que sirvam par branqueamento de capitais, nao é inconstitucional. I. COMPETENCIA DO TRIBUNAL. O Tribunal Constitucional é o competente nos termos no s6 do n.° 2, alinea a) do artigo 180 como do n.° 1 do artigo 230.° ambos da Constituigéo e bem assim nos termos da alinea a) do artigo 16.° da Lei n.° 2/08, de 17 de junho, Lei Organica do Tribunal Constitucional e do artigo 19.° da Lei n.° 3/08, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional. Mi LEGITIMIDADE. Vem a Ordem dos Advogados de Angola requerer a fiscalizagéo abstracta sucessiva de varios preceitos da Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro. Tem a Requerente legitimidade nos termos da alinea f) do n.° 2 do artigo 230.° da Constituigéio que estabelece o elenco das entidades que podem requerer a declarago de inconstitucionalidade de qualquer norma legal. 6 OBJECTO presente processo tem por objecto apreciar a constitucionalidade das seguintes normas da Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro, Lel do Combate ao Branqueamento de Capitals e do Financiamento ao Terrorismo: alinea g) do n.° 2 do artigo 3. artigos 4.° a 13.°; artigos 15.° a 20° . artigos 29.° e 30°, Pere Como decorre da transcrigao destas normas adiante, estas disposides fazem impender sobre os advogados e outros profissionais determinadas obrigagdes € deveres no contexto do combate ao branqueamento de capitais e do financiamento ao terrorismo. Cabe a este Tribunal Constitucional determinar se os deveres ali estabelecidos estéo em desconformidade com alguma regra da Constituig&o por implicarem alguma restrigéo ao segredo profissional, um direito fundamental andlogo que, como tal sera merecedor de idéntica proteccdo. Colhidos os vistos legais, cumpre assim apreciar e decidir. APRECIANDO 4. As normas em apreciagéo ‘As normas em apreciacdo tém o contetido que adiante se transcreve: Alinea g) do n.°2 do artigo 3.° 2, Estéo ainda sujeitas a presente lei as seguintes entidades nao financeiras, que exergam actividade em territério nacional: 4g) Revisores oficiais de contas, técnicos de contas, auditores, contabilistas, conservadores de registo, notarios, solicitadores, advogados, e outras profissées independentes quando intervenham, por conta do cliente ou noutras circunsténcias nas seguintes areas: i. Compra e venda de iméveis e de participages sociais; ii. Gestéo de fundos, valores mobiliérios ou outros activos de natureza diferente; Gest&o de contas bancérias e contas poupanca; iv. Organizagao de contribuigdes destinadas @ criagéo, exploracéo ou gestéo de sociedades; \ v. Criagao, exploragéo ou gestéo de pessoas colectivas ou de centros de interesse s colectivos sem personalidade juridica e compra e venda de ‘estabelecimentos e de entidades comerciais; vi. Prestadores de servigos a sociedades, a outras pessoas colectivas ou a centros de interesses colectivos sem personalidade juridica que nao estejam abrangidas nas alineas g) e f). Artigo 4.° - Obrigagées das entidades sujeitas As entidades sujeitas estéo vinculadas, no desempenho da respectiva actividade, ao cumprimento das seguintes obrigagées gerais: a) Obrigagao de identificagao; b) Obrigagao de diligéncia; ¢) Obrigagao de recusa; d) Obrigacao de conservacao; ¢) Obrigagao de comunicagéo; ) Obrigagéio de abstengao; 4) Obrigagéio de cooperacéo; 1h) Obrigagéo de sigilo; i) Obrigag&o de controlo; J) Obrigagéo de formagéo. Artigo 5.° - Obrigacao de identificagao 1. As entidades sujeitas devem exigir identificagao e veriicar a identidade dos seus clientes, e se aplicével, dos seus representantes, @ do beneficiério efectivo, mediante a apresentagao de documento comprovativo vélido sempre que: a) Estabelecam relagdes de negocio; b) Efectuem transacgdes ocasionais de montante igual ou superior, em moeda nacional, ao equivalente a USD 15.000,00 (quinze mil Délares dos Estados Unidos da América) independentemente da transaccéo ser realizada através de uma Gnica operagéo ou de varias operagées que aparentam estar relacionadas entre si; Surjam suspeitas de que as operagées, independentemente do seu valor, estejam relacionadas com o crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo; Existam diividas quanto & autenticidade ou a conformidade dos dados de identificagao dos clientes. 9) d) 2. Caso o montante total das transace6es previstas na alinea b) do n.° 1 do presente artigo, nao seja conhecido no momento do inicio da operacao, a entidade sujeita, deve exigir a identificago, a partir do momento que conhega © valor em causa, e este for superar ao limite imposto na alinea mencionada. I / 1% 3. No caso de pessoas singulares, a verificagao da identidade deve ser efectuada mediante a apresentagéo de documento comprovativo valido em que exiba uma fotografia, do qual conste o nome completo, a data de rnascimento e a nacionalidade. 4. Tratando-se de clientes que sejam pessoas colectivas a identificagao faz-se mediante a apresentagéo de original ou fotocdpia autenticada dos seus estatutos ou certidao do registo comercial ou licenga valida emitida pela entidade competente e numero de identificagao fiscal. 5. No caso da pessoa colectiva ser néo residente em territério nacional a identificagao é feita mediante documento equivalente. 6. A identificagao de centros de interesses colectivos sem personalidade juridica constituidos de acordo com direito estrangeiro, ou instrumentos legais semelhantes, sem personalidade juridica, deve incluir a obtengéo e verificagéo do nome dos administradores (trustees), instituidores (settlor) beneficiérios. 7. Sempre que a entidade sujeita tenha conhecimento ou fundada suspelita de que © cliente ndo actua por conta propria, deve tomar medidas adequadas que Ihe permitam conhecer a identidade da pessoa ou entidade por conta de quem o cliente esta a actuar, nomeadamente dos beneficiarios efectivos. 8. As enfidades sujeitas devem também verificar se os representantes dos clientes se encontram legalmente habilitados a actuar em seu nome e representagao. 9. A obrigagao de identificagéo prevista no presente artigo deve aplicar-se aos clientes jé existentes e a verificagéo da identidade desses clientes 6 objecto de regulamentacéo emitida pelas autoridades de superviséo e fiscalizagéo. Artigo 6.° - Momento da verificagao da identidade 1. A verificagao da identidade do cliente, e se aplicavel, dos representantes e do beneficiario efectivo, deve ter lugar no momento em que seja estabelecida a relagao de negocio ou antes da realizagao de qualquer transac¢ao ocasional. 2. Sem prejuizo do disposto no nimero anterior, quando o risco de branqueamento ou de financiamento do terrorismo for diminuto, a verificagao da identidade pode ser completada apés 0 inicio da relagao de negocio, apenas nas situagdes que se mostrem indispensaveis para a execucao da operacdo, devendo tais procedimentos serem finalizados no mais curto prazo possivel. 3, No obstante o disposto no ndmero anterior, no caso de abertura de contas de depésito bancério, as instituigdes financeiras bancarias néo podem permitir a realizagéo de quaisquer movimentos a débito ou a crédito na conta subsequente a0 depésito inicial, disponibilizar quaisquer instrumentos de pagamento sobre a conta ou efectuar quaisquer alteragdes na sua ttuaridade, enquanto néo se mostrar verficada a identidade do cliente, de | u>> v acordo com as disposigdes legais ou regulamentares aplicaveis. 4. O disposto no n.° 2 néo & aplicével, ainda que o risco seja diminuto, sempre que surgir uma suspeita de que a operagéo estaja relacionada com o crime de branqueamento de cepitais ou de financiamento do terrorismo, caso em que se deve aplicar o disposto no n.° 1 do presente artigo. Artigo 7.° - Obrigacao de diligéncia Para além da identificagéo dos clientes, dos seus representantes @ dos beneficiérios efectivos as entidades sujeitas devem: ) Obter informagéo sobre a finalidade e a nefureza pretendida da relagéo de negocio; Obter informagéo relativa a clientes que sejam pessoas colectivas ou entidades sem personalidade juridica, que permita compreender @ estrutura de propriedade e de controlo do cliente; Obter informagéo, quando o perfil de risco do cliente ou as caracteristicas de operagéio o justifiquem, obre a origem e o destino dos fundos movimentados no ambito de uma relagéo de negocio ou na realizagéo de uma transacgao ocasional; Manter um acompanhamento continuo da relagao de negécio, a fim de assegurar que tais operagdes sao consistentes com o conhecimento que a instituigéo possui do cliente, dos seus negdcios e do seu perfil de risco, incluindo, se necessério a origem dos fundos; ) Manter actualizados os elementos de informagao obtidos no decurso da relagéo de negocio. Artigo 8.° - Adequacao ao grau de risco 5) 9) 9) |. No cumprimento das obrigagdes de identificacéo e de diligéncia previstas nos artigos 5.° a 7.° da presente lei, as entidades sujeitas podem adaptar a natureza e a extensdo dos procedimentos de verificagéo e das medidas de diligéncia em fungéo do risco associado de cliente, a relagao de negocio, ao produto, & transacedo e 4 origem ou destino dos fundos. . As entidades sujeitas devem estar em condig6es de demonstrar a adequagao dos procedimentos adoptados, nos termos do nimero anterior, sempre que tal Ihes seja solicitado pela competente autoridade de superviséo ou de fiscalizacéo. . As entidades sujeitas devem adoptar politicas ou medidas que se revelem necessérias para evitar a utilizagdo abusiva de novas tecnologias em esquemas de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. Artigo 9.°- Obrigagéo de diligéncia simplificada 1. Salvo quando existam suspeitas de branqueamento ou de financiamento de terrorismo, as entidades sujeitas ficam dispensadas do cumprimento dos deveres enunciados no artigo 5.° ¢ nas alineas a), b) e c) do artigo 7.2, da presente lei, nas seguintes situagdes: x a) Quando o cliente seja o Estado ou uma pessoa colectiva de direito piiblico, de qualquer natureza, integrada na administracéo central ou local; b) Quando o cliente seja uma autoridade ou um organismo piiblico sujeito a préticas contabilisticas transparentes e objecto de fiscalizaggo. 2. Nos casos previstos no ndmero anterior, as entidades sujeitas devem, em qualquer caso, recolher informagéo suficiente para verificar se o cliente se enquadra numa das categorias ou profiss6es, bem como acompanhar a relag&o negocial de forma a poder detectar transacgdes complexas ou de valor anormalmente elevado que néo aparentam ter objectivo econdmico ou fim licito. Artigo 10.° - Obrigagao de diligéncia reforgada |. Sem prejuizo do cumprimento do disposto nos artigos 5.° e 7.°, as entidades sujeitas devem aplicar medidas acrescidas de dlligéncia em relagéo aos clientes @ as operagées, atendendo a natureza, a complexidade, o volume, o caracter nao habitual, a auséncia de justificagéo econémica ou susceptibilidade de enquadrar ‘num tipo legal de crime. 2. Verificadas as circunstancias descritas no numero anterior, as entidades sujeitas devem procurar informagao do cliente sobre a origem @ destino dos fundos reduzir a escrito o resultado destas medidas, que deve estar disponivel para es autoridades competentes. . S80 sempre aplicaveis medidas acrescidas de diligéncia as operagées realizadas i distancia e especialmente as que possam favorecer o anonimato, as operacdes ‘com pessoas politicamente expostas, as operagdes de correspondéncia bancéria com instituig6es financeiras bancarias estabelecidas em paises tercelros e a quaisquer outras designadas pelas autoridades de supervisdo ou de fiscalizagéo do respectivo sector, desde que legalmente habilitadas para o efeito. Sem prejuizo de regulamentagao emitida pelas autoridades competentes, nos casos em que a operagao tenha lugar sem que 0 cliente, ou, caso aplicavel, o seu representante, ou o seu beneficiério efectivo estejam fisicamente presentes, a verificago de identidade pode ser complementada por documentos ou informagdes suplementares consideradas adequadas para verificar ou certificar os dados fornecidos pelo cliente. . Quantas as relagdes do negocio ou transacgées ocasionais com pessoas polticamente expostas, as entidades suspeitas devern: ) Dispor de procedimentos adequados e baseados no risco, para determinar se © cliente ou, caso aplicavel, representante ou beneficiario efectivo pode ser considerado politicamente exposta; Obter autorizagéo do érg4o de gestéo competente da entidade sujeita antes do estabelecimento de relagdes de negocio com tais clientes; >) uw ©) Tomar as medidas necessérias para determinar a origem do patriménio e dos fundos envolvidos nas relagdes de negocio ou nas transacgdes ocasionais; d) Efectuar um acompanhamento continuo acrescido da relago do negocio. :. O regime previsto no niimero anterior deve continuar a aplicar-se a quem, tendo deixado de ter a qualidade de pessoa politicamente exposta, continue a representar um isco acrescido de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, devido ao seu perfil ou & natureza das operagdes desenvolvidas Artigo 11° - Obrigacao de recusa Néo obstante as disposigées mencionadas no artigo 9.° da presente lei, caso os requisitos mencionados nos artigos 5.2, 7.° ou 10.° da presente lei néo possam ser cumpridos as entidades sujeitas deve: a) Recusar 0 inicio da relagao de negocio; b) Recusar a realizago da transacgao; ou ©) Extinguir a relagao de negocio. 2. Sempre que ocorram as situagées previstas no niimero anterior, as entidades sujeitas devem enalisar as circunstancias que a determinaram e, se suspeitarem que a situacéo pode estar relacionada com a pratica de um crime de branqueamento de capitals ou de financlamento do terrorismo, devem efectuar ‘as comunicagdes previstas no artigo 13.° da presente lei e, quando aplicével, ponderar por termo a relagéo de negocio. Artigo 12.° - Obrigacao de conservagao 2. As entidades sujeitas devem conservar por um periodo de dez anos a partir do momento em que for efectuada a transacgdo ou apés o fim da relagao do negocio no minimo os seguintes documentos: a) Cépias dos documentos ou outros suportes _tecnol6gicos comprovativos do cumprimento da obrigagao de identificagéo e de diligéncia; b) Registo de transacgdes que sejam suficientes para pemitir a reconstituigéio de cada operagao, de modo a fornecer se necessério, prova no Ambito de um processo criminal; 9 Copia de toda a correspondéncia comercial trocada com o cliente; d Cépia das comunicagées efectuadas pelas entidades sujeitas 4 Unidade de Informagéo Financelra e com as autoridades competentes. 2 A informagéo referida no numero anterior deve ser colocada & disposigéo da Unidade de Informacao Financeira e das demais autoridades competentes. 12 Artigo 13.° - Obrigacao de comunicagéo 1, As entidades sujeitas devem, por sua propria iniciativa, informar, de imediato, a Unidade de Informacao Financeira, sempre que saibam, suspeitem ou tenham raz6es suficientes para suspeitar que teve lugar, esté em curso ou foi tentada uma operagdo susceptivel de estar associada & prética do crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo ou de qualquer outro crime. 2. As entidades sujeitas devem ainda comunicar 4 Unidade de Informagéo Financeira todas as transacgées em numerério igual ou superior, em moeda nacional, ao equivalente a USD 15 000,00 (quinze mil Délares dos Estados Unidos da América), 3. As informagées fornecidas, nos termos dos ntimeros anteriores, penas podem ser utilizadas em processo penal, ndo podendo ser revelada, em caso algum, aidentidade de quem as fomeceu. Artigo 15.°- Obrigacao de abstencao 1. Sempre que se constate que uma determinada operagao evidencia fundada suspeita e seja susceptivel de constituir crime, as entidades sujeitas, para além da obrigagéo decorrente do artigo 5.° da presente lei, devem abster-se de executar quaisquer operagdes relacionadas com o pedido do cliente, e aguardar pela deciséo, comunicada por escrito, ou por qualquer outro meio, cuja informago seja posteriormente confimada por escrito, pela Unidade de Informagao Financeira, nos fermos dos niimeros seguintes, podendo esta autoridade determinar a suspenséo da respectiva execugao. 2. A decisdo da Unidade de Informagéo Financeira deve ser comunicada & entidade sujeita num prazo maximo de trés dias Uteis a contar da comunicago, findo 0 qual a operagao pode ser executada, caso a ordem de suspenséo ndo seja confirmada pela Unidade de Informagao Financeira. 3. Em caso de deciséo pela execugéio da suspensdo das operagdes suspeitas de branqueamento de capitais ou de financiamento de terrorismo, a Unidade de Informagao Financeira pode deferminar a execucéo da suspensao por um periodo maximo de vinte e oito dias. 4, A Unidade de Informagao Financeira deve requerer & Procuradoria Geral da Repiiblica a confirmagao da deciséo de execugéo da suspensdo, no prazo de dez dias iiteis a contar da decisao estabelecida no n.° 2 do presente artigo. 5. A Procuradoria Geral da Republica deve pronunciar-se no prazo de dez dias a contar da solicitagéo da Unidade prevista no niimero anterior, sendo que no caso de a Procuradoria Geral da Reptiblica néo se pronunciar no prazo referido, a deciséo de execugdo da suspenséo considera-se tacitamente deferida. 6. Se a Procuradoria Geral da Replica se pronunciar no sentido de néo confitmar a deciséo de execugdo da suspensao, a Unidade de Informagéo 13 Financeira deve comunica-lo a entidade sujeita para que esta prossiga com a operacao. 7. No caso da entidade sujeita considerar que a abstengo referida no n.° 1 do presente artigo nao é possivel ao que, apds consulta a Unidade de Informagao Financeira, possa ser susceptivel de prejudicar a prevengéo ou a futura investigagao do branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, a referida operagao pode ser realizada, devendo a entidade sujeita fomecer, de imediato, 4 Unidade de Informagao Financeira as informagdes respeitantes a operacao. Artigo 16.°- Obrigado de cooperagao 1 As entidades sujeitas devem prestar prontamente cooperago a Unidade de Informacéo Financeira e autoridades e supervisio e de fiscalizagéo mencionadas no artigo 35.° da presente lei, quando por estas solicitadas, fomecendo-lhes as informagdes sobre certas operagdes realizadas pelos clientes e apresentar os documentos relacionados com determinadas operagaes. 2 Apés inicio do processo de investigagao formal, as entidades sujeitas devem cooperar com as autoridades judiciérias ¢ policiais competentes. Artigo 17.°- Dever de sigilo As entidades sujeitas e os membros dos respectivos orgaos sociais, ou que nela ‘exergam fung6es de direceéo, de geréncia ou de chefia, os seus empregados, os mandatarios e outras pessoas que lhe prestem servigo a titulo permanente, temporario ou ocasional, néo podem revelar ao cliente ou a terceiros, que transmitiram as comunicagées legalmente devidas ou que se encontra em curso uma investigagao criminal Artigo 18.°- Proteccao na prestacao da informagao As informag6es prestadas de boa fé pelas entidades sujeitas no cumprimento das obrigagdes mencionadas nos artigos 13.° 15.° da presente lei ndo constituem Violagéo de qualquer obrigagéo de segredo, imposto por vie legislative, regulamentar ou contratual, nem implicam, para quem as _preste, responsabilidades disciplinar, civil ou criminal. Artigo 19.° - Obrigacao de controlo Todas as entidades sujeitas, incluindo as respectivas filais, sucursais, agéncias, ou qualquer outra forma de representagéo comercial, com sede em territorio | angolano devem dofar-se de politicas, processos e procedimentos, nomeadamente em matéria de avalia¢o ¢ gestéo de risco, auditoria e controlo intemo adequados para verificar 0 cumprimento dos mesmos, bem como procedimentos adequados para assegurar critérios exigentes de contratagao de \MA 14 ‘empregados, de forma a permitir-lhes que, em qualquer altura, estejam aptas a cumprir as obrigagées preconizadas pela presente lei. Artigo 20.° - Obrigago de formagao 1. Todas as entidades sujeitas devem garantir a formagéo adequeda aos seus empregados e dirigentes, visando 0 cumprimento das obrigagées impostas pela presente lei e requlamentagdo em matéria de prevengao e represséo do branqueamento de capitais @ de financiamento do terrorismo. 2. As entidades sujeitas deve conservar, durante um periodo de cinco anos, cépia dos documentos ou registos relativos 4 formagao prestada aos seus ‘empregados e dirigentes. Artigo 29.° - Obrigagdes das entidades nao financeiras As entidades néo financeiras estéo sujeitas 4s obrigagdes enunciadas no artigo 4°, com as espectiicagses previstas nos artigos seguintes e nas normas regulamentares emitidas pelas autordades de supervisio @ fiscalizagao mencionadas no n.° 2 do artigo 35.° da presente lei Artigo 30.° - Advogados e outras profissées independentes 1 No cumprimento da obrigagao de comunicagao, prevista no n.° 1 do artigo 13.° da presente lei, as entidades no financeiras comunicam as operagdes suspeitas 4 Unidade de Informagéo Financeira, sem prejuizo do disposto no numero seguinte. 2 Os Advogados e estando em causa as operagées referidas no n.° 1 do artigo 15. da presente lel, no so abrangidos pela obrigagéo de comunicagéo prevista no numero anterior, as informagées obtidas no contexto da avaliagéo da situagao juridica do cliente, no ambito da consulta juridica, no exercicio da sua misséo de defesa ou representagao do cliente num processo judicial, ou a respeito de um processo judicial, incluindo o aconselhamento relativo & maneira de propor ou evitar um processo, bem como as informagGes que sejam obtidas antes, durante ou depois do proceso. 2 Verificagao da conformidade das normas em causa com a Constituicao a) Fonte das normas em apreciagéo Todas as normas acima transcritas inserem-se, como se Ié no Preambulo da Lei ne 34/11, no cumprimento pela Repiiblica de Angola das Resolugées por si aprovadas e ratificadas, referentes as Convengdes das Nagdes Unidas contra 0 Tréfico Nicito de Estupefacientes e Substancias Psicotrépicas, a criminalidade transnacional e a supresséo do financiamento ao terrorismo, com vista a garantir a seguranga territorial e o normal funcionamento do sistema financeiro. Esta Lei revoga a Lei n.° 12/2010, de 9 de Julho - Lei sobre 0 Combate ao Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo, visando, como se refere no Preambulo, @ necessidade premente de proceder & reviséo do sistema de prevengSo e represséo do combate ao branqueamento de capitais ¢ do financiamento do terrorismo, no sentido de estabelecer a sua eficiéncia @ eficacia em conformidade com os padrées internacionais aditando também, aspectos fundamentais ao referido sistema que reforgam sobremaneira o exercicio das fungdes das autoridades angolanas na prevengéo ¢ represséo dos referidos crimes. b) Enquadramento sistematico das normas ‘As normas submetidas & apreciacao do Tribunal constitucional inserem-se em trés dos seus onze capitulos, nomeadamente: : Capitulo | Disposigdes Gerais ~ 0 artigo 3° que inclui os advogados no elenco das entidades sufeitas és obrigagdes estabelecidas; - Capitulo I Obrigagbes das Entidades Sujeitas - 0s artigos 4°, 5.2 13°, 152 a 20. - Capitulo IV Obrigagdes Especificas das Entidades Nao Financeiras ~ os artigos 29.° @ 30.. Ainda com interesse para a apreciaco da constitucionalidade das normas indicadas, as regras estabelecidas no Capitulo V - Da Supervisao e Fiscalizagao, muito particularmente a alinea d) do n.° 2 do artigo 35.° da Lei n.° 34/11 onde se estabelece que relativamente aos advogados, a superviséo e fiscalizagéo do ‘cumprimento das suas obrigagdes incumbe a Ordem dos Advogados. Interessam ainda as disposigdes dos Capitulos VIl (Regime transgression), Vill (Disposigdes processuais) e IX (DisposigSes penais), nomeadamente os artigos 422 (Aplicagéo no espago) em que se distinguem os factos praticados em territério angolano, fora do terrtério nacional e os praticados a bordo de navios ou aeronaves de bandeira angolana: 43.° (Responsabilidade) e 44.° (Negligéncia) em que 6 estipulado que “a negligéncia é sempre punivel’ embora graduada a pena consoante as circunstancias. No Capitulo IX sto definidos os tipos de crime previstos e punidos: . Violagéo da protecgao na prestagdo de informagées, com pena de WX. prisdo até 3 anos e multa - artigo 59.°; = Branqueamento de capitais, com pena de priso de 2 a 8 anos - artigo 60.%; = Organizagéo terrorista, com pena de priséo de 6 a 15 anos — artigo 61.%; - Terrorismo, com pena de prisao de 5 a 15 anos — artigo 62.°; 16 wer ZS ‘oe or V | ce G 2 Terrorismo intemacionel, com pena de priséo de 5 a 16 anos - artigo 63 - Financiamento de terrorismo, com pena de priséo de 6 a 15 anos - artigo 64°. c) A incluso dos advogados no elenco das entidades sujeitas Fica claro que toda esta legistagdo é fruto do impulso da legislagao internacional e que medidas idénticas foram adoptadas por mais de 180 paises. A Unica questo que se suscita neste pedido de fiscalizagdo da Lei n.° 34/11 de 12 de Dezembro tem exclusivamente a ver com a circunstancia de nela se imporem especiais deveres a0 advogado. Em sintese, impéem-se ao advogado o dever de identificagéo, ou seja, a verifiagao, registo e conservagSo da identidade dos clientes, e muito especialmente o dever de comunicagao das operagdes suspeitas , OU seja, a obrigagdo de dendincia de operagdes suspeitas ou de transaccdes: indiciadoras de branqueamento. O Estatuto da Ordem dos Advogados determina que o advogado é obrigado a quardar segredo profissional no que respeita a todos os factos cujo conhecimento Ihe advenha do exercicio das suas fungdes ou da prestagao dos seus servigos, tal como estatui o n.° 2 do artigo 65° do Estatuto da Ordem dos Advogados: “a obrigagao do segredo profissional existe quer o servigo solicitado ou cometido ao advogado envolva ou no representacéo judicial ou extrajudicial, quer deva ou n&o ser remunerado, quer 0 advogado haja ou néo chegado a aceitar e a desempenhar a representacao ou 0 servigo...” ‘A Lei ora em apreciago ao introduzir a obrigagao de deniincia estabelece uma excepodo relativamente a este principio geral que rege a deontologia propria da profissao e a ética do exercicio da advocacia. A questao fulcral a apreciar pelo Tribunal Constitucional é a de saber se estes deveres agora estabelecidos aos advogados, estéo em desconformidade com a Constituigo, especificamente com as garantias que ela estabelece para o exercicio da advocacia. d) Isengdo da obrigacao de informagao Em Angola, como na generalidade dos paises que se assumem como Estados de Direito, a Constituiggo © a Lei asseguram aos advogados as imunidades necessarias ao exercicio do mandato e regulam o patrocinio forense como elemento essencial 4 administragao da justiga sendo que a imunidade necessaria ao desempenho eficaz do mandato forense é assegurada aos advogados pelo reconhecimento legal e garantia de efectivacéo, designadamente do direito a protecgao do segredo profissional. \ Esta 6 a razdo pela qual as Convengdes deixam expressamente a0 arbitrio dos Estados signatarios a possiblidade de isentar os advogados de denunciarem os seus clientes, ainda que em circunstancias por todos atendiveis. Estas isengGes foram utilizadas pela Repiblica de Angola que no artigo 30.° n.°.2 acima transorito na integra deixou exarado que “os advogados... néo s&o abrangidos pela obrigago de comunicagéo prevista no nimero anterior, as informagées obtidas no contexto da avaliagéo da situagéo juridica do cliente, no @mbito da consulta juridica, no exercicio da sua misséo de defesa ou representagao do cliente num proceso judicial, ou a respeito de um processo judicial, incluindo 0 aconselhamento relativo @ maneira de propor ou evitar um proceso, bem como as informagdes que sejam obtidas antes, durante ou depois do processo’. Nao obstante esta notavel e essencial redugao do campo de aplicabilidade da Lei n2 34/ 11 aos advogados, a Requerente desvaloriza estas ressalvas da Lei, quando refere que “... os Advogados apenas se encontram dispensados do eferido dever de informacao a UIF, sempre que, tratando-se de uma operagéo que evidencia fundada suspeita seja susceptivel de constituir crime, a referida constatacdo resulte a partir de informagbes obtidas no contexto da avaliagdo da situagdo juridica do cliente, no exercicio da sua misséo de defesa ou representacao do cliente num processo judicial, ou a respeito de um processo Judicial, incluindo o aconselhamento relativo 4 maneira de propor ou evitar um processo, bem como as informages que sejam obtidas antes, durante ou depois do processo, nos termos do n.° 2 do artigo 30.° € n.° 1 do artigo 13.° da Lei n.° 34/11, de 12 de Dezembro. Reside, porém, aqui o fundamental para a decisdo desta questo, pois a Ordem dos Advogados nao pode ignorar que os actos acima indicados constituem o cerne da actividade advocaticia, tanto nos termos da Lei n.° 1/95 de 6 de Janeiro, Lei da Advocacia (artigo 2.°) como do Decreto n.° 28/96 de 13 de Setembro, Estatutos da Ordem dos Advogados (artigo 42.°). Com efeito, 0 que a Lei n2 34/11 dispde 6 que os advogados, quando intervenham em actos diversos daqueles e tal como indicados nos n.s 1 @ 2.0 seu artigo 13° (acima transcrto) ficam constituidos na obrigagéo de reportar tal como ai estabelecido. e) Campo de aplicabilidade pessoal da Lei aos advogados Como a propria Requerente o observa (ponto 14 da sua peti¢ao) “as bases pelas quais a FATF defendeu a incluso dos profissionais forenses, incluindo os Advogados nas regras de combate a0 branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo se encontram descritas no respectivo relatério de 2013, designado por Money Laundering and Terrorist Financing Vulnerabilities of Legal Professional, nos termos da qual, « com base no estudo realizado, se encontra devidamente descrito que a procura de profissionais forenses por redes criminosas pode ocorrer na medida em que (i) acabam por legitimar uma determinada transacgao, (ii) 0 envolvimento de um profissional forense permite dar uma imagem de credibilidade dissuadindo a possibilidade de suspei¢ao sobre 08 actos praticados e (i) 0 envolvimento de um profissional forense formece um obstaculo nas investigagdes atendendo as suas garantias e prerrogativas’. Esta constatagdo nao padece de diividas, pois, os advogados, por natureza da ‘sua profissao, so frequentemente procurados para aconselhamento e defesa de quem praticou actos delituosos. Nestes casos, com a referida ressalva da lei, ainda que o cliente tenha algum envolvimento com o crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, 0 advogado tem o direito de guardar sigilo profissional. O mesmo s6 n&o acontecera quando o cliente procura o advogado nao para ser aconselhado ou defendido, mas para obter a colaboragao profissional do advogado para levar a cabo alguma das operagées ja acima indicadas relativamente a alinea g) do n.° 2 do artigo 3.° da Lei n.° 34/11: i. Compra e venda de iméveis @ de participagées sociais; ii, Gestéo de fundos, valores mobiliérios ou outros activos de natureza diferente; tii. Gest&o de contas bancérias e contas poupanga; iv. Organizagéo de contribuigdes destinadas 4 criagéo, exploragéo ou gesto de sociedades; v. Criag&o, explorag&o ou gestéo de pessoas colectivas ou de centros de interesses colectivos sem personalidade juridica e compra e venda de estabelecimentos e de entidades comerciais; vi. Prestadores de servicos a sociedades, a outras pessoas colectivas ou a centros de interesses colectivos sem personalidade juridica que n&o estejam abrangidas nas alineas g) ef). Entende a Ordem dos Advogados que, mesmo nestes casos, se esta a violar a Constituigéo, nomeadamente o principio do Estado de Direito Democratico (artigo 2° da GRA), incluindo os subprincipios da legalidade, da protec das expectativas e confianga; o principio da proporcionalidade na restrigo de direitos (artigo 57.° da CRA): o principio da independéncia do sistema judicial e dos seus agentes (artigos 193.° e 194.° da CRA); o princfpio da autonomia deontologica e estatutaria da OAA e dos Advogados no exercicio do mandato forense (artigos 193.° e 194.° da CRA); 0 principio do acesso ao direito e a tutela jurisdicional (artigo 29.° da CRA) e até o principio do direito a um julgamento justo e equitativo (n.°4 do artigo 28.° e artigo 72.° da CRA). Entende ainda a OAA que as disposigdes citadas da Lei n.° 34/11 nao sé nao consideram a incluséo da Ordem dos Advogados entre as instituigdes reconhecidas como essenciais 4 Justiga, na Constituigao, como directamente ofendem 0 direito ao segredo profissional, um direito anélogo aos direitos fundamentais, consagrado na propria Constituigao no n.° 2 do seu artigo 194. segundo o qual ‘E garantida a inviolabilidade dos documentos respeitantes a0 exercicio da profissao, nos limites do previsto na lei, apenas sendo admissiveis buscas, apreensées, arrolamentos e diligéncias semelhantes ordenados por decisdo judicial e efectuadas na presenga do magistrado competente, do Advogaddo e do representante da Ordem dos Advogados, quando esteja em causa a pratica de facto punivel com priséo superior @ dois anos @ cujos indicios imputem ao Advogado a sua pratice’. Deve, todavia, notar-se, que igualmente decorre da qualificaggo constitucional da Ordem dos Advogados como instituigdo essencial realizacdo da Justiga, 0 seu especial dever de colaborar na atenuago do alastramento do crime internacional em que se apela a todas as entidades que de algum modo tenham potenciais conexGes com o mundo do crime organizado, Nestes casos, nao se trata de fazer dos advogados traidores dos clientes que neles confiaram, nem t&o pouco colaboradores da policia e do Ministério Pablico, porquanto, pela propria natureza das obrigacdes impostas, nem existe confianca que merega tutela nem a sua cooperacao com a realizacdo da Justiga é prescindivel. f) A Ordem dos Advogados como instituigéo de supervisao e fiscalizagao ‘As Convengées tendo como objecto o combate ao branqueamento de capitais e a0 financiamento do terrorismo tém deixado a liberdade aos Estados que adoptem as suas recomendagdes e as transponham para a sua legislacao interma, que relativamente a certas entidades nao financeiras sujeitas a obrigagbes de diligéncia e informac&o, para designar um organismo de auto- regulamentag&o adequado a profissdo em causa, como a autoridade a ser informada em primeira linha em vez da Unidade de Informagao Financeira. E assim que, relativamente aos advogados e ao cumprimento das suas obrigagées nela estabelecidos, a Lei n.° 34/11, na alinea d) do n.° 2 do seu artigo 35.°institul a Ordem dos Advogados como o érgao de supervisio e fiscalizacao. Assim, mesmo considerando aqueles actos praticados no ambito de operagdes ‘econémicas, em homenagem a qualidade de advogado de quem pratica tais operagées, a Reptiblica de Angola definiu a Ordem dos Advogados como 0 érgao de supervisao e fiscalizagao do cumprimento das referidas obrigagdes. Por conseguinte, atendendo a liberdade concedida pelas Convengies, no seguimento de sugest6es intemacionalmente apresentadas por diversas organizag6es representativas dos advogados, nomeadamente a posigo publica da CCBE (Council of Bars and Law Societies of the European Union) “on the requirements on a lawyers to report suspicious of money laundering (Novmber 2004), Angola, através da Lei n.° 34/11 deu pleno acolhimento & isengéo da obrigacao de informago de actos suspeitos que venham ao conhecimento dos 20 y ¢ — \vr pe yen advogados no exercicio da sua tipica actividade advocaticia, assim como instituiu a Ordem dos Advogados como o argo de fiscalizagao e supervisdo em todos os outros casos em que o advogado eventualmente actue. g) Restricéo proporcionada do direito de sigilo Como atras ficou dito, a imposig&0 aos advogados da obrigago de informacao e denuncia, constitui uma excepgdo ao direito dever do advogado ao sigilo profissional. Note-se, le logo, que a Constituigo, (artigo 194.° n.°1) estabelece que as garantias do advogado e as suas imunidades, como é 0 caso do direito ao sigilo profissional, n&o so valores absolutos e intangiveis, podendo a lei vir a estabelecer limites a tal direito com sucedeu com a Lei n.° 34/11 ora em apreciagao, ‘A questo de fundo que agora se coloca, no plano jusconstitucional, é a de saber se 05 limites impostos por esta Lei respeitam os principios da necessidade e da proporcionalidade estabelecidos no artigo 57.° da CRA para legitimar qualquer medida legal de restricao de direitos ou interesses constitucionalmente protegidos. Convém observar que 0 advogado que néo esteja a praticar um tipico acto de advocacia, como seja uma consulta, uma avaliago juridica, a preparagao de um processo oul em qualquer intervenc&o judicial, antes, durante e depois de um processo e tenha a suspeita de que é solicitado para de algum modo colaborar na pratica de um crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, tem o direito e o dever de se abster, de recusar e comunicar a sua fundada suspeita 4 OAA sob pena de se tornar ou climplice ou co-autor ou pelo menos encobridor de um crime grave, A distingo da natureza dos actos praticados por advogados referidos na Lei n.° 34/11 e 08 actos que judicial ou extrajudictalmente constituem os actos tipicos de advocacia é a questo que importa agora decidir. No fundo trata-se da questéo de saber se 0 segredo profissional pode servir de guarda-chuva a actos criminosos ou potencialmente criminosos. A Ordem dos Advogados manifesta as suas reservas, alias compreensiveis, na medida em que nem sempre aquela distingdo é clara, e por entender que tais obrigagées de deniincia irgo ser no futuro uma inibi¢o para se procurar o advogado, ou quando procurado, néo Ihe permitir o melhor aconselhamento por receio de revelago de todos os factos por parte do seu cliente. Mais uma vez deve atentar-se que as operagées que constituem 0 foco das obrigagdes impostas aos advogados nada tm que ver com processos judiciais, ‘ou mesmo com 0 aconselhamento juridico quanto a forma de evitar ou promover um determinado processo judicial, E nese 4mbito que a palavra é prata eo 21 siléncio ouro... 6 ai que o segredo 6 sagrado e sacramentado como tem sido proclamado. Ninguém pode duvidar que o dever de guardar sigilo seja a regra de ‘ouro da advocacia, honra e timbre da profisso, “condig&o sine qua non" da sua plena dignidade" Seria no entanto contraditério se esse dever sagrado fosse usado e abusado por quem precisamente se pretenda valer do advogado, nao para aconselhamento ou para sua defesa, mas para cometer crimes téo graves como aqueles que esto definidos na Lei n.° 34/11... sobre os quais 0 advogado no 6 procurado para aconselhar, evitar o cometimento, mas der-lhes cobertura. Circunstancia de que advogado pode até ndo se aperceber... 0 advogado ndo @ obrigado a reportar casos duvidesos, mas apenas os casos em que se aperceba de ciéncia certa, ou tenha raz6es suficientes para suspeitar que teve lugar, esté em curso ou foi tentada uma operac&o susceptivel de estar associada @ pratica do crime de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo ou de qualquer outro crime. E, volta a repetit-se, conhecimento ou suspeita fundamentada, no no Ambito de uma consulta ou avaliagSo juridica de um processo actual ou potencial, mas quando o advogado tenha sido solicitado para intervir (i) numa compra e venda de iméveis ou de participagdes sociais; (ii) na gestéo de fundos, valores mobiliérios ou outros activos de diferente natureza; (ii) na gestao de contas bancdrias e contas poupanga; (iv) na organizago de contribuigdes destinadas a criacdo, exploragao ou gestéo de sociedades; (v) na criagéo, exploragéo ou gestéo de pessoas colectivas ou de centros de interesses colectivos sem personalidade juridica e compra e venda de estabelecimentos e de entidades comerciais; (vi) na prestag&o de servicos a sociedades e outras pessoas colectivas ou a centros de interesses colectivos sem personalidade juridica, Em nenhum destes casos existe um mandato forense. Considera-se mandato forense 0 mandato judicial para ser exercido em qualquer tribunal, incluindo os tribunais arbitrais e os julgados de paz. O artigo 42.° dos estatutos da Ordem dos Advogados de Angola define o mandato judicial como “a representagéo @ assisténcie... nomeadamente para a defesa de direitos, patrocinio de relagbes juridicas controvertidas, composigao de interesses ou em processos de mera averiguacao, ainda que administrativa, oficiosa ou de qualquer outra natureza’. Também n&o se esté em nenhum destes casos perante uma consulta juridica igualmente no abrangida no dever de informago. Considere-se consulta juridica a actividade de aconselhamento juridico que consiste na interpretag3o @ aplicagdo de normas juridicas. Resulta com muita clareza a necessidade de distinguir este tipo de actividade da pratica pelo advogado como autor moral ou material, ou como cimplice, de factos Constitutivos do crime de branqueamento em qualquer das suas manifestagdes ou formas. Em casos como este ndo pode ser garantido o segredo profissional nem @ inviolabilidade dos documentos respeitantes a0 exercicio da profissdo, 22 = \er a admitindo a Constituigdo no jd citado no n.° 2 do artigo 194.° da Constituic&o que se efectuem buscas, apreensdes, arrolamentos e dlligéncia semelhantes 20 escritério de advogado, desde que ordenadas por deciséo judicial. De forma preventiva, e porque existe o risco de os advogados poderem vir a encontrar-se nessa situagao 6 que se Ihe impdem obrigagdes de diligéncia no sentido de no virem a ser envolvidos em crimes da natureza descrita na Lei n.° 34/11. Esses deveres prudenciais, como o dever de identificagao e outros ‘conexos com 0 mesmo esto minuclosamente previstos na Lei no sentido de uma cooperagao com a realizagao da Justiga. Acontece que o dever de comunicagiio baseado apenas no juizo subjective de ‘suspeita por parte do advogado 6 na pratica dificiimente sindicdvel. Apenas no Ambito de um concreto processo de branqueamento de capitais se podera avaliar ‘em que medida a intervengao do advogado foi delituosa, sendo certo que sempre sera punida a sua negligéncia, por violagdo dos referidos deveres de diligéncia explicitados na Lei n.° 34/11. A lei n° 34/11 & porém mais assertiva e no sentido de tomear essa subjectividade, como que cria no n.° 2 do artigo 13° um juizo objective de suspeita com base no valor da operagéo praticada. Assim se exige que os advogados devem comunicar a UIF todas as transacgdes em numerdrio de valor igual ou superior em moeda nacional, a0 equivalente a USD 15.000,00 (quinze mil Délares dos Estados Unidos da América). Nestes casos, tantos naqueles em que o advogado tem raz6es para suspeitar da prética do crime de branqueamento de capitais, como no reporte objectivo das operagées de certo valor determinado na lei, tem de se reconhecer que o segredo profissional néo é chamado a exercer o seu tradicional papel de blindagem. Nestes casos a obrigagdo de comunicagéo conforma-se com um uso limitado, proporcionado ao risco e ao perigo de cometimento de crimes graves, do segredo profissional. Nem se pe verdadeiramente a questo da quebra de confianga do cidadao ou cliente no seu advogado, porque no caso de suspeita séria ele ndo é merecedor dessa confianga, e porque no caso do reporte de operagdes acima de certo valor o cidadao sabe, a partida, que essa comunicagao deve ser efectuada Nos termos da lei. Entende o Tribunal Constitucional que 0 legislador ordinario se conduziu dentro dos limites constitucionalmente estabelecidos, seja porque a restricao 6 necessaria em face do interesse pliblico de adequado e eficaz combate 20 branqueamento de capitais e ao terrorismo, para salvaguarda da seguranca nacional (artigo 11.° da CRA), seja por outro lado porque respeitou a proporcionalidade, pois, as limitacdes impostas preservam o niicleo essencial do direito ao sigilo profissional quando o advogado esteja a praticar um acto tipico de advocacia. 23 h) Resumo e concluséo Assim, e em conclusdo, 0 advogado tem 0 estrito dever e o direito de reserva absoluta, isto 6, nao esta obrigado ao dever de comunicagdo, ou seja, esta isento da obrigag&o de participagéo ou n&o tem o dever de dentincia, bem pelo contrario, em qualquer das seguintes situagdes: 1. quando tenha obtido informagées, no contexto da avaliagéo da situacao Juridica do cliente ou no Ambito da consulta juridica, incluindo o aconselhamento relativo & maneira de propor ou evitar um processo, e 2. quando exerga a sua missdo de defesa ou representagao do cliente num processo judicial, ou a respeito de um processo judicial, isto quer as informagdes sejam obtidas antes, durante ou depois do processo. Ou seja, enquanto o advogado age como tal, enquanto pratica actos proprios da advocacia, tal como esto definidos na Lei n° 1/95, de 6 de Janeiro , nao esta Obrigado ao dever de comunicagaéo ou de deniincia, nem sequer ao Bastonario. Diferentemente, se 0 advogado no decurso da elaboragao de contratos ou da pratica de actos preparatérios tendentes a constituigo, alteragao ou extingo de negocios juridicos se apercebe ou tem a suspelta da prdtica de qualquer dos crimes previsto na Lei n.° 34/11, tem a obrigacéio de comunicar a sua suspeita & Ordem dos Advogados. Nestes casos, 0 advogado age, nao como advogado, mas - como mero consultor econémico, fora da previsdo dos servigos conexos com 0 aconselhamento, o patrocinio ou a defesa; ou - como titular, de direito ou de facto de érgdo de administragéio ou de gestéo de sociedade, ou n&o esta, nem pode estar, abrangido por tal isenco do dever de deniincia das operagées suspeitas. Ainda assim, e tendo em conta a sua qualidade pessoal de advogado, e nao propriamente qualquer acto praticado no exercicio da profisso, 6 terd o dever de dentincia das operagées suspeitas através da sua propria Ordem, dirigindo-se ao seu Bastonario que, em Unica ou ultima e definitiva instancia decidira. Embora se continue a poder dizer que 0 advogado deve respeitar a obrigagdo de guardar segredo relativamente a toda a informagao confidencial de que tome conhecimento no ambito da sua actividade profissional, o advogado deve reconhecer que a sua actividade profissional ndo forense, esta imbulda de riscos relativamente 24 208 quais devera estar continuamente vigilante. Acresce que a obrigagdo de segredo profissional no é estabelecida em beneficio directo de cada um dos clientes, pois vincula 0 advogado mesmo contra a vontade e 0 interesse do seu cliente. A obrigagéo de segredo profissional do advogado é um dever de ordem piiblica, s0 cedendo nos casos excepcionalmente previstos na lei, como é agora 0 caso das obrigagées que Ihe so impostas na Lei do Combate ao Branqueamento de Capitais e de Financiamento do Terrorismo. Por outro lado, nos proprios termos estatutarios, 0 advogado pode revelar factos abrangidos pelo segredo profissional, desde que tal seja absolutamente necessario para a defesa da dignidade, direitos e interesses legitimos do proprio advogado ou do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorizagéio do Presidente do Conselho Provincial respectivo, com recurso para o Bastonario (n.° 4 do artigo 65.° do Decreto n.° 28/96, de 13 de Setembro, Estatuto da Ordem dos Advogados). Afigura-se razoavel interpretar como atentatoria da dignidade e dos direitos ou interesses legitimos do advogado o aproveltamento do segredo profissional como uma cobertura para uma actividade gravemente delituosa. Este Tribunal nao adere a uma acepgao do segredo profissional dos advogados em qualquer circunstancia, mesmo quando o sigilo respeite a factos revelados pelos respectivos clientes e que, de forma directa ou indirecta, possam ter por objecto actos ‘ou operagées de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo. Ao contrario do que sustenta a Requerente, nesses casos 6 0 proprio principio do Estado de Direito Democrético e 0 interesse de garantia da seguranga nacional que prescindem do dever de segredo profissional para salvaguarda de outras garantias e liberdades consagradas na Constituigéo. De tudo © acima exposto decorre que o alcance do dever de deniincia pelos advogados se enquadra dentro dos limites nao sé legais como constitucionais. Longe de tornar os advogados em traidores dos clientes que neles confiaram e em colaboradores da policia e do Ministério Publico, é no ambito da realizagao da Justiga relativamente ao tipo de crimes a que a Lei n.° 34/11 se refere que a cooperacao ‘esperada dos advogados ¢ também essencial. Entende, assim, este Tribunal Constitucional que se mostra plenamente assegurado © sigilo profissional dos advogados nao havendo, consequentemente, qualquer desconformidade da Lei n.° 34/41 com a Constituicao. DECISAO. Tudo visto e ponderado, Mendava om Vee uakco a 4 Cra bores A. Titel Conttl bein?) tm ia Bclacen ~ Arn Atheism ahedecl, abrbacle, ee oie 7 2 APE AYA AE? |e 12 he Ahi Go. tat $2 4AS, e Zot aha mee 2b: Bales le be 34 4 Be pers Sem custas (artigo 15.° da Lei n.° 3/08 de 17 de Junho). Notifique-se, Tribunal Constitucional, dia 26 de Agosto de 2014. OS JUIZES CONSELHEIROS Américo Maria de Morais Garcia, Antonio Carlos Pinto Caetano de Sousa Luzia Bebiana de Almeida Sebastiao tet -hWSon LA bA— exe Onofre Martins dos Santos (Relator) Miguel Correia Raul Carlos Vasques Aratjo Teresinha Lopes. 26

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