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REPUBLICA DE MOGAMBIQUE TRIBUNAL ADMINISTRATIVO, PLENARIO Processo n.° 33/2008 - P ACORDAO N.° /€ /2015 Acordam, no Plendrio, os Juizes Conselheiros do Tribunal Administrativo: CLINICA DA SOMMERSHIELD, Lda., anteriormente designada por POLICLINICAS DE MOGAMBIQUE, Lda., com os demais elementos de identificagéo constantes nos autos do processo & margem indicado, inconformada com 0 Acérdao n.® 36-2.8/2007, datado de 25 de Outubro de 2007, proferido nos autos do Processo n.? 7/98, que negou provimento ao recurso que havia interposto, contra a sentenga proferida pelo Tribunal de 1.* instancia do Contencioso das Contribuigées e Impostos do 1.2 Bairro Fiscal de Maputo, no Processo Fiscal n.° 552/97, veio, nos termos do disposto no artigo 138, n. 1 da Lei n.° 9/2001, de 7 de Julho, interpor recurso de apelagéo, com efeito suspensivo, ao abrigo das disposices conjugadas dos artigos 137, n.° 1 e 143, n.° 1, ambos da citada Lei n. 9/2001, de 7 de Julho, e, 734.°, n.° 1, alinea a) e 736.°, alinea a), ambos do Cédigo de Proceso Civil, apresentando, para 0 efeito, os seguintes fundamentos: - eae lol ef ) 1. © acérdao proferido pela Segunda Seco do Tribunal Administrativo devia ter dado provimento ao recurso apresentado pela Recorrente, porque, ao no fazé-lo esta a aplicar normas inconstitucionais, como é 0 caso do Decreto n.2 3/87, de 30 de Janeiro. 2. A Constituigdo da Republica de 1990 estipulava no seu artigo 50 que “Os impostos so criados por lei que os fixa segundo critérios de justiga social”. 3. Assim, a partir do momento da entrada em vigor da Constituiga0, no dia 30 de Novembro de 1990, todos os impostos existentes que tivessem sido criados e regulados por acto normativo que nao fosse uma lei passaram a ser inconstitucionais. 4.O Decreto n.° 3/87, de 30 de Janeiro, a partir de 30 de Novembro de 1990, esta ferido de uma inconstitucionalidade superveniente e, & sua luz, nenhum tributo € constitucionalmente devido e, consequentemente, a sua violacao também nao pode ser punida, pela simples razdo de que nao existe qualquer violagéo de normas constitucionalmente validas. 5. A folha numerada de 52 (i) ndo se encontra assinada, nao se sabendo quem a elaborou:; (ii) ndo se percebe se se refere aos presentes autos ou qualquer outro processo; (iii) a antecedé-la néo foi efectuada qualquer conclusdo; (iv) nem foi elaborado qualquer termo de juntada da mesma; 6. Assim, a folha numerada de 52 nao apresenta qualquer sentido para os presentes autos e, como tal, deve ser mandada desentranhar do processo. 7. Ainda que o Decreto n.® 3/87, de 30 de Janeiro, nao fosse um acto normativo inconstitucional, 0 que por mera hi admite, 0 acérdao recorrido sempre devia ter declarado a prescri¢ao dos presentes autos de transgressao da multa aplicada. 8. Com efeito, o artigo 79, n.° 2, do Decreto n.® 3/87, de 30 de Janeiro, dispunha que “Se o auto de transgresséo [para aplicagdo de multas] estiver parado durante cinco anos, ficaré extinto 0 procedimento para a aplicagdo das multas”. 9. Ora, 0 auto de transgresséo para aplicagéo da multa a Recorrente, que correu na Reparticao de Finangas do 1.° Bairro Fiscal de Maputo sob 0 proceso n.° 552/97 e na Segunda Seccao do Tribunal Administrativo sob o n.° 7/98, esteve parado entre os dias 16 de Setembro de 1998 (fls. 50) e 0 dia 14 de Julho de 2005 (fis. 53). 10. Ainda no que respeita 4 multa aplicada a Recorrente, se a mesma nao vier ser julgada inconstitucional ou o procedimento para a sua aplicagéo declarado extinto por prescrigéo, 0 que por mera hipotese se admite, sempre teré a mesma de ser julgada ilegal. 11. Com efeito, nos termos do artigo 181.2, n.2 1, da Lei n.° 2/2006, de 22 de Marco, “Sao infraccées tributarias os factos tipicos, llicitos e culposos declarados puniveis pelas Leis tributarias”. 12. A partir do momento da entrada em vigor da Lei n.2 2/2006, 0 que ocorreu no dia 20 de Junho de 2006, o contribuinte 56 pode ser condenado pelo cometimento de infracc6es fiscais previstas punidas por lei. 13. Este € 0 regime mais favordvel ao contribuinte do que aquele outro em que o contribuinte poderia ser condenado por infracg6es fiscais previstas e punidas quer em leis quer em qualquer outro acto normativo. 14, Ora, a Constituigéo da Reptiblica de 2004, no seu artigo 127, n.° 5, estabelece que “A /e/ fiscal ndo tem efeito retroactivo, salvo se for de contetdo mais favordvel ao contribuinte", o que significa Qn i i contrario, que a lei fiscal tem efeito retroactivo se for de contetido mais favordvel. 15. Deste modo, sendo o disposto no artigo 181, da Lei n.° 2/2006, mais favordvel 4 Recorrente, sempre esse regime deveria ser-lhe aplicado com a consequente absolvigio da recorrente da multa em que foi condenada. 16. Em parte alguma, a administragao fiscal invoca qualquer norma ou qualquer principio juridico que justifiquem a condenagao da recorrente no pagamento do imposto devido pelos médicos e por outros profissionais de satde que a recorrente supostamente tinha de liquidar, reter e entregar na Reparticao de Finangas. 17. Também nq acdrdao recorrido a deciséo proferida ndo é fundamentada numa qualquer norma jurfdica ou em qualquer principio juridico. 18. Nos tetmos do artigo 668.°, n.%1, alinea b), do Cédigo de Processo Civil, a decisio judicial € nula “quando ndo especifique os fundamentos de facto e de direitos que justificam a deciséo”. : 19. Assim sendo, 0 acérd4o € nulo, nos termos do disposto no artigo 668; n.° 1, alinea b), do Cédigo de Processo Civil, aplicavel por forga do disposto no artigo 1.2, da Lei n.? 9/2001. de 7 de Julho. 20. Nos termos do artigo 201, do Codigo de Proceso Civil, a omisséo de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, produz a nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame ou na decisio da causa. 21.Ora, nos termos do artigo 12.2, do Diploma Legislativo n.2 783, de 18 de Abril de 1942, com a contestagao podem ser// ¢ 5 Pfc ek indicadas testemunhas para serem ouvidas sobre os factos alegados. 22.Ao0 n&o serem ouvidas as testemunhas arroladas pela recorrente na contestagéo apresentada no dia 11 de Setembro de 1997 (fls. 7 e seguintes), foi omitida uma formalidade Prescrita por lei, que influi decisivamente no exame e na decisdo da presente causa. 23. Pelo que estamos perante uma nulidade de um acto processual que deve conduzir a anulagéo do acérddo_ recorrido, substituindo-se o mesmo por uma decisdo que ordene ao Juiz do Tribunal de 1.8 Instancia do Contencioso das Contribuigées e Impostos do 1.° Bairro Fiscal de Maputo a inquiricdo das testemunhas arroladas pela Recorrente e que nao o foram. 24. Apesar de tudo o que se deixa exposto, vejamos, em seguida, as raz6es que sempre deveriam ter conduzido a absolvigao da Recorrente e que teriam, com toda a certeza, sido tomadas em consideragdo se as testemunhas arroladas pela Recorrente tivessem sido inquiridas. 25. A Recorrente, os médicos eos demais profissionais de satide celebraram um contrato de locagao e de prestacao de servicos, em que a prestadora era a Recorrente e os destinatarios desses servigos eram os médicos e os demais funcionarios do Estado, que no eram trabalhadores da recorrente, actuando liberalmente por conta e risco préprios. 26.A Recorrente n&o tinha ao seu servigo os mencionados profissionais de satide ~ estes ndo eram seus trabalhadores. 27. A Recorrente nada pagava aos médicos e demais profissionais de satide, que utilizavam as suas instalagdes e os seus servicos, pelo que a recorrente jamais reteve qualquer quantia aos médicos e demais profissionais de satde. 28. Eram esses profissionais de satide que pagavam a recorrente a contrapartida pela utilizagéo das suas instalagdes e pelos servicos que esta Ihe prestava. 29. Os médicos e demais profissionais de satide é que tinham de entregar ao Estado 0 imposto devido pelos seus servicos. 30.A Clinica de Sommerschield tornou-se um 6rgéo complementar dos estabelecimentos sanitarios. do. sector ptiblico, como tal se comportando no rigoroso cumprimento &tico-profissional dos principios e condigdes impostos pela Lei 26/91, de 31 de Dezembro. 31.Por conseguinte, os profissionais de satide que eram simultaneamente funciondrios do Estado sempre gozariam da iseng3o pteconizada pelo artigo 176.2, n.2 1, alinea a), do Decteto n.° 3/87, de 30 de Janeiro. 32. Em concluséo, a Recorrente jamais pode ser condenada no pagamento de qualquer imposto relativo aos anos 1994 a 1997 que sempre seria de exclusiva responsabilidade dos profissionais de satide que os auferiam e, muito menos, numa multa pela sua nao liquidacao, retencao e pagamento”. Termina, requerendo a “procedéncia do presente recurso e, consequentemente a revogacaio do acérdao recorrido.” No mais dé-se, aqui, por integralmente reproduzidas as alegacées de recurso que constam de folhas 87 a 104, dos autos. Continuados, os autos, com vista ao Ministério Publico, o Dignissimo Magistrado junto desta Instancia, exarou o seguinte, a folhas 106: “Tudo visto: 1. E suscitado pelo mandatario judicial, nulidade decorrer omisséo de um acto processual prescrito na lei. 2. Considerando que influi no exame e deciséo da causa — art.® 201, do C.P.P. e art.2 12, do Diploma Legislativo n.° 783, de 18 de Abril de 1942. Promovo: * Aapreciacao da nulidade suscitada”. Em sede dos vistos legais, um dos Juizes Adjuntos exarou, também, o que consta de folhas 112 verso: “Visto. 1. A promogao do Dignissimo Magistrado do Ministério Publico a fls. 106 dos autos, quanto a apreciagao da nulidade suscitada pelo mandatério judicial, julgo que deve ser apreciada tomando em conta as testemunhas apresentadas, se so ou nao parte da questao em anilise, em particular como substitutos tributarios. 2. O Decreto n.° 3/87, de 30 de Janeiro é um regulamento da Lei n.® 3/87, de 19 de Janeiro, por isso o Cédigo do I.R.T. “A” nao € inconstitucional como o afirma a recorrente”. Tudo visto, cumpre apreciar e decidir. Mostram os autos que, por Acorddo n.2 36/2007-2.°, de 26 de Outubro, proferido nos autos do Processo Fiscal n.° 552/97, foi julgado improcedente © recurso interposto e mantida a deciséo tomada em primeira instancia pelo Tribunal do Contencioso das Contribuigdes e Impostos do 1.° Bairro Fiscal de Maputo, que condenou a recorrente ora apelante, no pagamento de imposto e multa no valor de 1.721.629.636,00 MT e 1.721.627.636,00 MT, respectivamente, por nao ter declarado os salérios pagos aos médicos e outros profissionais de satide, referentes aos exercicios econdmicos de 1994 a 1997. Para o efeito, o tribunal concluiu que o recurso interposto nao tinha fundamento, porque a isengéo do pagamento de imposto sobre o rendimento de trabalho, a que se refere a alinea a) do n.? 1 do artigo 176 do Cédigo de Impostos, aprovado pelo Decreto n.° 3/87, de 30 de Janeiro, beneficia aos funciondrios do Estado, neste caso, os médicos e outros profissionais de satide pelo vinculo laboral com o Estado, nao sendo extensiva aos honordrios que recebem na clinica, onde estao no exercicio de uma actividade privada e independente. Outrossim, a recorrente, ora apelante, ndo conseguiu provar, tanto na primeira, como, na segunda instancias, a existéncia do alegado contrato de cedéncia de instalacdes, que firmou com os médicos e outros profissionais de satide, tendo-se dado fé as informacées trazidas pela equipa de auditoria que esteve a trabalhar no local. No entanto, a apelante considera que o Decreto n.® 3/87, de 30 de Janeiro, esté ferido de inconstitucionalidade superveniente, face & entrada em vigor, a 30 de Novembro de 1990, da nova Constitui¢éo da Reptiblica (de 1990), que veio consagrar, no seu artigo 50, que “os impostos so criados por lei que os fixa segundo os critérios de Justiga social’, devendo, © tribunal julgar procedente o presente recurso, sob pena de estar a aplicar leis inconstitucionais. Com efeito, tal como ficou esclarecido em sede dos vistos legais, nao procede a alegada inconstitucionalidade, pois, o Imposto sobre o Rendimento de Trabalho foi criado pela Lei n.° 3/87, de 19 de Janeiro (alinea b) do n.2 1 do artigo 3), cujo regulamento foi aprovado pelo Decreto n.° 3/87, de 30 de Janeiro, continuando vilido, mesrno com a entrada em vigor da referida Constituigao. Relativamente ao pedido de desentranhamento da folha 52 dos autos, ndo pode ser atendido por a informagao nela constante, ser 0 parecer do Dignissimo Magistrado do Ministério Publico, emitido em sede do visto (vide a remissdo feita a folhas 50 verso). Outro argumento esgrimido pela apelante, 6 a extinggéo do procedimento para a aplicacdo da multa, nos termos do disposto no n.® 2 do artigo 79 do Decreto n.° 3/87, de 30 de Janeiro, pot 4 a NA | Qe il no seu entender, o auto de transgresséo para o pagamento de imposto esteve parado (na Reparticéo de Finangas do 1.° Bairro Fiscal e na 2.2 Secgéo do Tribunal Administrativo) entre 16 de Setembro de 1998 a 14 de Julho de 2005 (cerca de 7 anos). S6 que, na verdade, e conforme se constata dos autos, o tribunal fez, a 15 de Setembro de 1998, a entrega das guias para o pagamento de preparos e a 16 de Setembro a juntada do respectivo documento e de seguida os autos foram continuados com vista ao Ministério Publico, onde o Dignissimo representante deu visto a 5 de Setembro de 2002, quando passavam cerca de 4 anos (fls. 50, 50 verso, 51 e 52 dos autos), ndo procedendo deste modo, a alegada extincdo do procedimento para a aplicagéo da multa. Refere, ainda, a apelante, que com a entrada em vigor da Lei n.2 2/2006, de 22 de Marco, que define, no artigo 181, n.2 1, as infracg6es tributarias como sendo os factos tipicos, ilicitos e culposos declarados puniveis pelas Leis tributérias, o contribuinte sé pode ser condenado pelo cometimento de infraccées fiscais previstas na lei, devendo este regime ser aplicado no presente caso, por ser o mais favoravel para 0 contribuinte. Porém, compulsada a legislagdo fiscal; constata-se que tanto na Lei n.® 2/2006, de 22 de Marco, que estabelece os principios e normas gerais do ordenamento tributario mogambicano, aplicdveis a todos os tributos nacionais e autarquicos, no n.° 2 do artigo 181, como no Regime Geral das Infracc6es Tributarias, aprovado pelo Decreto n.2 46/2002, de 26 de Dezembro, no n.° 2 do artigo 2, as transgressdes constituem uma espécie de infracc6es tributérias. : A aplicagéo da multa a ora apelante, encontra o seu fundamento no artigo 190, n.2 1 do Cédigo de Impostos sobre Rendimentos, aprovado pelo Decreto n.® 3/87, de 30 de Janeiro, cuja punigao esta prevista no artigo 213.%, n.° 1 do mesmo Cédigo. ndo procedendo a nulidade arguida (vide folhas 3, 5, 17e 18). A falta de audi¢éo das testemunhas arroladas pela ora apelante, nao influiu na tomada da decisdo, por as mesmas nao figurarem no, presente proceso, como substitutos tributarios, mas, sim, prestadores de servigos por conta de outrem (neste caso do apelante) onde auferiam salarios correspondentes (folhas 21 dos autos). Assim sendo, a obrigacéo de reter o imposto devido por estes profissionais de satide incumbe a apelante, na qualidade de substituto tributario daqueles, enquanto prestadores de uma actividade privada, nos termos das disposiges legais acima citadas, cuja transgressdo é punida nos termos do artigo 213, daquele codigo. Concluindo, nao de vislumbra dos autos qualquer irregularidade que possa ditar a nulidade do acordéo impugnado, nao tendo, a recorrente, ora apelante, apresentado fundamentos que abalam a deciséo recorrida, que fez uma correcta interpretagao e aplicacdo da lei. Pelo exposto, os Juizes Conselheiros deste Tribunal decidem negar provimento ao recurso de apelagdo interposto pela CLINICA DA SOMMERSHIELD, LDA, por falta de fundamento legal, confirmando, assim, 0 Acérdao n.® 36/2007-2.*, de 26 de Outubro, prolatado pela Segunda Sec¢ao. Custas pela apelante que se fixam ém 50.000,00MT (cinquenta mil meticais). Registe-se e notifique-se. } 13 de ey de Ge Kvvanith see ey José Luts Chew iN Cardoso ~ Relator —~Janudrio Fernando Guibunda ~~ — An Emus wt \\ \\v-} Wenn 2 David ay ia Aboobatar Zaina Dauto Changa Paulo Daniel Comoane / i Z Neweccece | Lipud dt José Raith¥indo Manteiga 1Q Isabel Cristina Pedro Filipe Rufino Nofibora Pelo Ministério Publico Fui oe Edmundo A Alberto, Vice-Procurador-Geral da Reptiblica

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