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3U4.965.3 $6792 FICHA CATALOGRAFICA (Preparada pelo Centro de Catalogacio-na-fonte, ‘Cimara Brasileira do Livro, $P) Sodré, Ruy de Azevedo, 1900- ‘A’ dca profisional’ ¢ 9 estatuto do advogado Ippr) Ruy’ devAseredo Sodré!” Sto Paulo, Li, ‘8663 1. Advogados — ftica Ordein ‘Gon Advogsdon do trast ly 'Tiulo, U-347.965:174(81) 1347/965.8(81) Indice para extélogo sistemético: 1. Brasil : Advogados : Estatutos $47.965.8(81) ‘ties profisional 3. Ordem dos Advogados do Brasil $47.965.8(81) a vi VEHSIDADE DE FORTA}! + BIBLIOTECA CENTR LET HG Dore 16-1-3 ———— (Céd. 456.7) ©Todos os direitos reservados Lis EDITORA LTDA. Rua Apa, 165 - CEP 01201 - Fones: (011) 826-2652 e 826-2740 - Sao Paulo 1984 Scanned with CamScanner Cariruto V O ADVOGADO © papel do advogado, desde tempos imemoriais. Razées que tornam obrigatéria ‘a presenga do advogado. A. advocacia em Roma. A advocacia em Portugal e os privilégios de que goravam os advogados. Aplicagdo do regime, entre nés, do adotado na metrépole. As Ordenagées. Os Cédigos entio ‘pro- miulgados. Os .advogados fazem viver o dircito. Definigio do advogado, segundo os maiores juristas, O advogado © o juris- consulto. A definigio de JEAN APPLETON e os comentérios sobre 0$ aspectos essenciais que ela encerra. O problema do conselho, de parecer emitido por quem nio est4 inscrito na ‘Ordem. 'A nossa definigio de advogado. O primeiro advogado no Brasil, © mau vero de atribuirse ao advogado epitetos ofen- sivos. A resposta de Ruy Barbosa. A apologia do adyogado por SS. 0 Papa Paulo, VI. “Desde PERICLES, primeiro advogado profissional que se conheceu em Atenas, até TITO, o Tibério Caruneaneo, primeiro pontifice plebeu ue viveu em Roma, trés séculgs antes de Cristo, e de quem se conta ter sido o primeiro a exercer a advocacia como profisso, por sua vez 0 pri- meito a ensinar publicamente a jurisprudéncia”, tem sido preponde- rantemente o papel do advogado no conglomerado social. ‘A prépria palavra indica que o advogado sempre foi em todos os tem- pos aquele profissional revestido de caracteristicas que o possibilitavam ser o defensor dos individuos contra as agtessdes de seus direitos. Para Ruy Barbosa (Novos discursos ¢ Conferéncias — pag. 58). “O pri meiro advogado foi o primeiro homem que, com a influéncia da razio e da palavra, defendeu os seus semelhantes contra a injustica, a violén- cia ea fraude”. ‘A nossa profissio vem de remotas “épocas, sendo impossivel precisar © tempo do seu aparecimento. Sebastigio de Souza (Honordrios do" Advogado, pig: 19) observa que “Se dermos & palavra o sentido que ela comporta € néo restringirmos ao sentido puramente profissional, veremos que, em verdade, Moisés foi advogado dos hebreus contra a opressio faraénica.” ‘A Histéria, porém, registra a sua existéncia. Nos primeiros tempos, segundo se expressa Dupim, a defesa era feita por um parente ou amigo “que emprestava a ignorancia ou & fraqueza o apoio de sua coragem ou de seu saber”, ~ Mais tarde, elucida J. M. Carvalho dos Santos em seu “Repertério Enciclopédico do Direito Brasileiro” apoiado na li¢io de LABORI, “As 267 Scanned with CamScanner necessidades da Justica exigiram que homens especializados, versados no conhecimento das leis, viessem colocar-se ao lado dos litigantes para assisti-los. na reivindicagao de seus direitos. Essa a origem da profissio do advogado”. Inicialmente, 0 advogado, embora leigo, estava a servigo de interesses privados, uma vez que a demanda era um duelo entre as partes, ¢ 0 Estado era um mero espectador. passivo. O triunfo era alcancado, por via de conseqiiéncia, pelo mais forte, pelo mais astuto, pelo mais esperto. Com a evolugio da’sociedade, o Estado assumiu a funcio de julgar, dado 0 interesse publico que passou a ter na aplicagao das leis. Com a intervencio do Estado, assegurando o cumprimento das suas leis através da administragio da justia, o comparecimento do advoga- do, no processo, tornou-se obrigatério, Ha diversas razdes que sempre tornaram obrigatéria a presenga do advogado, constituindo, por assim dizer, monopélio a sua atuacio em juizo. A parte lesada em seu dircito apresentae sempre, diante da peson incumbida de reparélo — o juiz, chefe ou rei — com forte dose de p: xAo; a defesa dos seus interésses torna-os maus juizes de seus proprios direitos, confundindo estes com aqueles; a falta de conhecimento da lei, da doutrina e da jurisprudéncia torna-lhe dificil e complexa a adequa- do dos fatos A norma a ser aplicada. $6 0 advogado, com a sua cultura, com a técnica juridica, pode extrair das circunstancias que envolvem o caso, o que interessa a0 julgamento, apresentando a defesa com mais seguranca. Ele transforma os fatos em Iégica e o juiz transforma a légica em justica. ‘O advogado passou a integrar a organizacao judi um intermedidrio entre o juiz e a parte. ‘Numa ligeira sintese histérica, foi na Grécia que a defesa feita pelos oradores tornou-se uma famosa arte, A oratéria teve o seu periodo dureo, chegando-se a afirmar que Atenas foi o bergo da advocacia. Deméstenes, Péricles, Sdcrates e tantos outros foram os grandes ora- dores helénicos, que enchem as paginas da histéria da advocacia. £ conhecido 0 julgamento de Phryné, em que Hyperides, ao defen- déla do crime de lesa majestade divina, fé-la aparecer sem véu e des- composta perante os juizes para os seduzir com as gracas de sua formo- sura. “Este acontecimento, relata Montezuma, no discurso da instalagio do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, em 7/9/1843, ‘“‘verdadeiro abuso do direito de defender, marca uma época notdvel na histéria da elogiiéncia grega, sendo entao proibido fazer preambulos patéticos para mover 4 piedade ou a indignacio. A oratéria perdeu muito de sua forca, mas a Justica, indubitavelmente, ganhou.” Olavo Bilac, o principe da nossa poesia, consagrou um belo soneto a esse célebre julgamento. “ Foi em Roma que a advocacia se apresentou com um cardter mais técnicojuridico, Se a princfpio a mais importante missio era a das 268 ia, atuando como — Scanned with CamScanner armas, logo a seguir, com o progresso das instituigdes juridicas, sur- giram 0s patronos, dominando o cendrio politico-social romano, sobre. pujando o prestigio dos guerreiros. Em Roma, as partes podiam constituir mandatério “ad litem”, o cognitor. Sé este representava € agia em nome da parte. procurador “ad litem” era parte no processo € assumia todos os encargos da “actio judicati.” Essa dupla representagao fundiu-se, mais tarde, assimilandose as fun- gées de cognitores e procuradores “‘ad. litem.” Na Roma antiga nfo se confundiam as fungdes do procurador ou re- presentante das partes contendoras. ‘Jéao tempo da Republica, havia duas espécies de advogado: o “patro- nus" ou “causidicus”, que debatia as causas e como orador defendia em juizo os direitos de seus patrocinadores, ¢ o “advocatus,” que assessorava e instruia a parte ou seu patrono sobre a questdo do dics Cab tempo ¢ a especializacao de fungdes — ésclarece JOAO BONUMA, em seu “Direito Processual Civil” — os “advocatus” foram retirando-se do pretério para o recolhimento de seus gabinetes e transformaramse nos grandes jurisconsultos que iluminaram o mundo, e os “‘causidicus” ¢ os “patronus” foram tornando-se os homens da lei, os juristas patrios, os profissionais da representacao judicial, e finalmente eles passaram a ser os “advocatus”, Em alguns povos, ainda ha esse trago-de dualismo de representagao do processo romano: Em Franga, ao lado dos “‘advocats” — que néo séo procuradores dos litigantes, mas tm 0 monopélio da defesa diante das jurisdigées de direito comum, e 0 direito de dar consultas, orientar as partes e completar os tribunais, na falta de “quorum” — hd os “avoués”, que sao oficiais ministeriais, que representam as partes diante das cortes de Apelagio e dos tribunais civis. Aos “avoués”, na qualidade de manda- tdrios das partes, incumbe dirigir e acompanhar 0 processo, apresentar 05 pedidos e conclusdes de seus constituintes. Na Inglaterra, ha os “barrister” e “solicitors”, Na Franca, jé os capitulares de Carlos Magno, no comeco do século IX referiam-s¢ a profissio do advogado. Desde Carlos Magno até S. Luis — relata Mario Guimaraes de Souza; “O Advogado”, 1935, pag, 21 — tornase dificil seguir as transformagies que vieram trabalhando a profissio do advogado em Franga. Foi S. Luis quem organizou regularmente a profissio, abolindo o combate judicidrio, reconhecendo 0 corpo dos advogados, decretando certas regras para o exercicio da advocacia, : 4 Em Portugal, ainda segundo 0 relato do nosso monografista Mario Guimaraes de Souza, vamos encontrar vestigios da existéncia do advoga- do em alguns forais do século XIII em diante. Numa proviséo de D. Afonso III fala-se em vozeiros ou arrazoadores ¢ permite-se que os liti- gantes os escolham no prazo de 8 dias, se o escolhido morar no Conse- tho, ou em maior prazo, se morar distante. 269 Scanned with CamScanner 6 com as Ordenagées Afonsinas foi que se delineou a organizacio da advocacia em Portugal. Com as Ordenagées Manuelinas maiores foram as exigéncias para advogar na Casa de Suplicagio ¢ na Casa do Civil. Nas Ordenagées Filipinas, as regras disciplinadoras da profissio sio mais completas. © advogado que nio fosse probo, prossegue 0 relato de Mario Gui- mares de Souza, era riscado da lista e para assegurar essa probidade, exigiam as Ordenagdes que 0s advogados falassem a verdade ¢ emitis- sem com franqueza a sua opiniao; impunham-lhes o dever dé guardar © sigilo profissional para 0 que dispensavam-nos de ser testemunhas, responsabilizavam-nos pelos danos causados aos constituintes por culpa, desleixo ou ignorancia; proibiam demorar o feito, deixando-o sem anda- mento, levantando incidentes em prejuizo dos clientes, bem como aban- donar as causas sem justo motivo ou licenga do juiz, alterar, diminuir ow acrescentar qualquer coisa nos libelos, artigos ou razées, sem licenga do juiz e audiéncia da parte contraria, sob pena de degredo por dois anos e privagio' do oficio. ‘Aos advogados era ainda defeso procurar os juizes em suas casas, para Ihes falar nos pleitos, ou aconselhar ou alegar contra as Orde- nagoes. ‘Segundo Silva Ribeiro — “A Profissio do Advogado”, 2.* edicao, 1935 — citado por Mario Guimaries de Souza, a pagina 7 da sua citada obra: “A par desses deveres, gozam os advogados de privilégios. E assim que tinham foros de nobreza, gozavam da homenagem estabelecida pelos usos do foro; nao eram obrigados a jurar fora de sua casa, além de pri- vilégios militares; no pagavam impostos aos conselhos, nfo estando obrigados também a aboletar em sua casa a soldados; tinham acesso & magistratura, podendo os da Casa de Suplicagio ser nomeados desem- dores no Porto, no fim de quatro anos.” (Silva Ribeiro, ob. cit.) No Brasil, como colénia que foi de Portugal, teve inteira aplicagio 0 regime adotado na metrépole em rélagio ao advogado. Proclamada a Independéncia, um dos primeiros atos do Império foi a lei de 20 de outubro de 1823 mandando aqui vigorar as ordenag6es, leis, regimentos, alvards, decretos € resolugdes promulgados pelos reis + de Portugal, até que fosse organizado um novo Cédigo, ou fossem espe- Gialmente alterados. _A Constituigéo Imperial de 1824 prometia iovos Cédigos: Criminal; seguindose, em 1882, o de Processo Criminal; em 1850, 0 Comercial, acompanhado do Regulamento 787, que disciplinava o Processo Co- mercial. Em 1858, por no se poder ainda elaborar 0 Cédigo Civil, foi encarregado Teixeira de Freitas de consolidar 0 nosso Direito Civil, 0 que fez de forma magistral, Em 1875, igua} incumbéncia, quanto as leis do Processo Civil, foi dada ao Conselheiro Ribas, que apresentou obra satisfatdria. $6 em 1917 pudemos ter um Cédigo Civil. Se para Jean Cruet — “A Vida do Direito‘e a Inutilidade das Leis”, pag. 162 — “Os intimeros profissionais que vivem do direito fazem tam- 270 a Scanned with CamScanner bém viver 0 direito. ..”, nessa vivencia do direito é.0 advogado que, no entrechoque da vida cotidiana, restaura ¢ assegura os postulados que governam a convivéncia social”. s classicos definiam 0 advogado como “homem bom, perito em direito”. © bom se enquadra na drea dos sentimentos, na qual se inclui as nor- mas éticas, com a predominancia das virtudes profissionais, que inte- gram aquilo que se chama dignidade do advogado. Jaa pericia, subordinada & drea da inteligéncia, se constitui da soma de conhecimentos técnico-juridicos, que armam o profissional da advo- cacia. Para A. Parry, ~ “E, de'la Etica”, cap. II, pag. 26 —, “O advogado que, em toda sociedade organizada ¢ 0 defensor da eqiiidade e da justiga, em cujas maos estd a defesa da liberdade, dos bens e até da dignidade dos homens, no pode deixar de ser o mais poderoso suporte dos ‘prin- ‘ipios eternos em virtude dos quais ha que viver honestamente, dar a cada um o seu e nao lesar aos demais”, © advogado nao é um mero técnico, um simples aplicador da lei a causa do cliente. Ele € quem o orienta, manejando com o direito, me- diante um trabalho de sintese de seus conhecimentos especializados. Como muito bem acentua Astolfo de’ Resender — Revista de Juris- prudéncia Brasileira, 42/239 —, “Advogado nao é mero postulante; plei- teando, ele nao faz simplesmente a defesa de um individuo; exerce, na realidade, uma misséo mais alta: esclarece o debate e prepara a decisao. £ um defensor e formador do direito. Os romanos chamavain-no legum magister, mestre das leis, miles legalis, soldado da lei, O exercicio da advocacia é eminentemente util a ordem da sociedade, porque influi poderosamente sobre a distribuigéo da justica”. Esclarecendo o debate e preparando a decisio, 0 advogado, como j4 dissemos, transforma em légica aquilo que o cliente Ihe’expés, para que © juiz, por seu turno, transforme essa Idgica em sentenca. Intimeras so as definig6es que os autores dao a figura do’ advogado, déntre as quais, destacam Denisart — “Repertoire de Jurisprudence, V —. Advocat”, — IV, n.9.4 define o Advogado, na acep¢ao atual do vocabulo, como sendo o homem que se entrega ao estudo das leis para,.com elas, ajudar as pessoas que a ele recorrem e defender seus direitos. Para Teixeira de Freitas: te “Advogado a pessoa do juizo que, por seus conhecimentos de juris- prudéncia, instrui e patrocina seus constituintes” Mario Guimaraes de Souza: ne “Advogado € 0 profissional diplomado, legalmente habilitado, a acon- selhar, representar terceiros e promover a defesa de: seus direitos ¢ interesses em juizo”. Aureliano Gusmio define o advogado como a 3 “pessoa versada em direito, que exerce a fungio de orientar ¢ patro- a7. Scanned with CamScanner ‘cinar aquele que tem direitos ou interesses juridicos a pleitear ou de- fender em juizo”. ‘Nao € definicio satisfatdria, porque nfo basta que a pessoa seja ver- sada em direito; é preciso que essa versagio seja comprovada por um diploma, e que este esteja registrado na Ordem dos Advogados. Assim, também, fungio de orientar nao é especifica do advogado; qualquer um, versado ou nao em direito, poderd fazé-lo. J& Roscoe Pound, que qualifica o advogado de “engenheiro social”, define-o, mais sob 0 ponto de vista sociolégico, como “aquele a quem se requer para que preste sua assisténcia na admi- nistragéo da justica, para que promova e mantenha, num processo, a relacao ideal que existe entre os homens, assinalando suas relagées ¢ ordenando sua conduta, por meio de uma aplicagio adequada e siste- matica das normas pelas quais se rege a sociedade politicamente orga- nizada”. Jodo Monteiro define 0 advogado como sendo o “jurisconsulto que aconselha as partes litigantes, esclarece os juizes € dirige a causa, alegando de fato e de direito, 0 quanto convenha aos interesses do constituinte”. £ definigao restrita, mas que merece ser citada, somente para deixat saliente que o advogado, hoje em dia, nao € necessariamente juriscon- sulto. Este, via de regra, se limita ao estudo do direito, objetivando esclarecé-lo por meio-de pareceres, raramente assumindo o patrocinio de causas, da primeira a ultima insténcia. Comentando.a defini¢io de Jodo Monteiro, escreve C. A. A. Carva- lho Pinto: “Hoje esse conceito do grande processualista jé se distancia da rea- lidade, especialmente 2o qualificar 0 advogado como jurisconsulto. Realmente, a especializagio profissional crescente ja tornou bem viva essa diferenciacio entre 0 advogado € 0 jurisconsulto, modalidades que podem coexistir no mesmo individuo, mas que, em regra, se destacam em profissionais distintos. Alids, nao constitui novidade esta selecéo atual das duas atividades: entre os préprios romanos havia uma abso- Iuta distingéo de fungdes entre o jurista e 0 advogado, exclusivas umas das ‘outras, como bem demonstra Cogliolo, na sua ‘Filosofia del Diritto Privato. Jurisconsulto, na definigio de Pereira e Souza, “€ 0 versado na ciéncia das leis, que faz profissio de direito e de aconselhar”. ~-Hé jurisconsultos que advogam, mas em geral s6 exercitam a pro- fissio em segunda instincia, porque o estudo do direito em tese, € a aplicagao desse direito ao fato, aliado A prova € ao rito processual, di- ferenciam as duas atividades: a do advogado € a do jurisconsulto. O advogado, no processo, é parcial e, além do mais, na defesa de seu cliente, tem que ser combativo, Jé 0 consultor, além de prudente € cauteloso, tem que ser imparcial. ‘seu papel € esclarecer a yerdade ao seu cliente. 272 Scanned with CamScanner No tocante & definicao, que vimos analisando, ela nos sugere observar que se restringe 0 advogado ao papel estritamente processual de pos- tular em juizo, quando o advogado atua tanto em juizo como fora dele. Alids, sobre esse assunto, jd de longa data vimos externando nossa opinigo de que deve ser ato privativo do advogado nao somente pos- tular em juizo, como a pratica de certos atos, preparativos uns e pre- ventivos ‘outros, todos porém inerentes ao exercicio da profissio. Na Convencio Nacional de Advogados, realizada nesta Capital, em 1954, tratamos novamente do assunto, retomando o fio da velha polé- mica sobre a crise da advocacia. Largamente apreciado, foi-ele afinal aprovado, Consagrou, por fim, o Estatuto tal principio, estatuindo no seu art.,71 que: “A advocacia compreende além da representagio em qualquer juizo ou tribunal mes: ino administrativo, 0 procuratério extrajudicial, assim como os traba- ies juris icos de consultoria € assessoria ¢ as fungdes de diretoria ju- ridica”. Para APPLETON, o grande tratadista da profissio, “Advogado, é 0 profissional diplomado, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados, habilitado a aconselhar sobre questées de ordem jurfdica ou contenciosa, e de defender na Justica, oralmente ou por’ escrito, a honra, a liberdade, vida e os interesses de seus clientes, que ele assiste ou representa”. £ definica longa, mas que citamos porque ela abrange diversos as- pectos essénciais, que caracterizam a figura do advogado. Em outros capitulos abordaremos a diplomacio e os requisitos para a inscrigéo na OAB.. (art. 48). Examinemos, agora, a referéncia feita na definigio a “habilitado a aconselhar sobre quest6es de ordem juridica ou contenciosa”. ‘Aqui surge uma radical diferenca entre.o nosso sistema ¢ 0 francés. Pelo nosso Estatuto, s6 é privativo do advogado o postular em juizo. £ o que dispde 0 § 8.° do art. 71, nos seguintes termos: ‘Compete privativamente aos advogados elaborar e subscrever pe- tigdes iniciais, contestagdes, réplicas, memoriais, razées, minutas e contraminutas nos processos judiciais, bem como a defesa em qualquer foro ou instancia”. Aconselhar é atividade livre. Tivemos durante certa época, principalmente apés 0 término da Se- gunda Guerra, contingente de juristas estrarigeiros que se localizarain em Séo Paulo, e que, como consultotes de empresas estrangeiras aqui sediadas, ou mesmo como jurisconsultos, davam pareceres, orientavam dientes etc. Foi luta ardua, essa de pleitearmos a ampliagio do campo de nossas atividades, inclusive e principalmente a de orientar, a de aconselhar. GARSSONNET, APPLETON, PEREIRA E SOUZA, MORAIS E SILVA e tantos outros autores, quer nacionais ou estrangeiros, dio como 278 Scanned with CamScanner atos do advogado nao sé alegar no Foro, auxiliando as partes em juizo, como aconselhar e responder de direito. ‘Advogado, na linguagem juridica, como salierita AFONSO FRAGA, traduz “chamar alguém para si, alguém que o assista com o conselho ¢ preste patrocinio em jufzo”. Portanto, aconselhar, dar consultas, € ato privativo do advogado. Para outros, no entanto, nao ¢ ato inerente ao exercicio da advocacia. Para estes, s6 no postular em juizo se restringe a prerrogativa nossa. Para aqueles, entre os quais nos arrolamos, 0 conselho, a consulta tam- bém é, tanto assim que o art. 27, n.° XV, do velho Regulamento ji considerava falta “assinar parecer... que no tenha feito ou em que nio haja colaborado”; 0 mesmo ocorreu, com mais preciso e rigor no Estatuto, que inscreve como infragio disciplinar “assinar qualquer es- ctito destinado a processo judicial ou para efeito extrajudicial, que nao tenha feito, ou em que rido tenka colaborado” — n° VI, art. 108. O Cédigo de Etica, por seu turno, profbe aconselhar contra disposi¢ao literal de lei — letra a n.° VIII — sec. III, como que esté indicando que ‘esse ato de aconselhar deve ser privativo do advogado. ‘J& um nosso magistrado, ao apreciar um caso de contravengio pelo exercicio ilegal da profissio, sentenciou, com muito acerto: “Praticou o réu 0 exercicio da advocacia sem preencher os re- quisitos exigidos pela lei. Pouco importa que nao haja o réu assinado qualquer petigio na qualidade de advogado. O exercicio da advocacia compreende também os atos diretamente relaciona- dos com 0 cliente. Pertencem a esta classe as consultas, os contra- tos de honordrios, os recebimentos por conta de honordrios € custas. E demonstrado se encontra que o réu dew consultas a vi tima, contratou com a mesma sua defesa na referida acéo, recebeu importancia por conta dos seus honordrios e das custas”. Seria diminuir 0 relevo ¢ a significagio da missio do advogado — disse-o DARIO DE ALMEIDA MAGALHAES “reduzi-la aos estreitos Ambitos da atividade estritamente pro- fissional, abstraindose dos seus deveres civicos, pois 0 advogado 6, por natureza, 0 defensor da ordem juridica, 0 propugnador da legalidade e no pode furtar-se A obrigacéo de empenhar todos .os esforgos para o aperfeicoamento dessa ordem juridica, para o res- peito e o prestigio da lei e da justiga”. Para a segunda corrente, aquele que aconselha, que orienta, que dé parecer enfim, se nfo estvinscrito na Ordem é passivel de um processo por contravengio penal na conformidade, alias, da sentenga condena- tria do M. Juiz Dr, LINCOLN DE ASSIS MOURA, acima referida. Para a primeira, nao. Mas para esta, se aquele que aconselha esté inscrito nos quadros da Ordem, o ato torna-se prolissional, e, assim, sujeito a jurisdicao disciplinar desta se for ofensivo de qualquer norma 274 Scanned with CamScanner ética. E 0 caso, apreciado pelo Conselho, de consultas respondidas por jornais e pelo radio, em seccdes dirigidas por advogados, em que se tem entendido ferirem alguns preceitos éticos. Nesses casos € preciso nio esquecer que 0 advogado nao pode anunciar imoderadamente, admitida apenas a indicacio de titulos, especialidade, sede de escritério e corres- pondentes. Por ultimo, deve o advogado inteirar-se de todas as circuns- tancias do caso antes de emitir juizo sobre ele (letra b, n.° 1 — seccéo 11), 0 que nao se verifica no caso das consultas. (© que nio resta diivida, porém, é que o conceito da profissio tem de evoluir, nio podendo mais pautarse pelos retrégrados princ{pios inscritos nos tratados dos nossos velhos praxistas. E preciso ampliar, tanto quanto possivel, a natureza da advocacia, melhor conceituando os atos inerentes ao seu exercicio, enquadrando os atos privativos do advogado dentro de érbita mais extensa, ao mesmo tempo que sé se deverd permitir a pratica de tais atos aos advogados militantes, ou seja, aqueles que estiverem efetivamente exercendo a adyocacia, Interpretando restritivamente nossas leis profissionais, tem predomi- nado até hoje a corrente que sustenta ser ato privativo do advogado apenas o postular em juizo, Embora no nos possamos amparar em texto expresso, sempre lutamos denodadamente contra esse modo de entender. : E isso porque, na verdade, o advogado nfo atua nessa qualidade so- mente em juizo, dentro de autos forenses. Sua acéo faz-se sentir, na feliz expressio de CARVALHO PINTO, “na multiplicidade de reali- zages juridicas que se formam, se conservam ou se desfazem no torve- linho da vida coletiva”. ‘A grande soma de servigos dos maiores escritérios de advocacia no & constituida por petices ou arrazoados em autos forenses, mas pela complexa atividade profissional, que caracteriza a advocacia, preventiva. Os trabalhos extrajudiciais, de assisténcia ao cliente, orientando-o nos negécios, examinando documentos, minutando contratos ¢ escrituras, redigindo cldusulas testamentérias, aconselhando, orientando e opinan- do sio, inquestionavelmente, atos inerentes ao exercicio de nossa profissao. Fora do ambito estritamente forense h4, portanto, uma série de atos preparatérios, pré-judicidrios que devem ser considerados, com toda a justica, como sendo privativos do advogado. Sao fungbes advocaticias € que constituem, em suma, a advocacia preventiva. : A solucio, a nosso ver, seria discriminar as fungdes do procuratério, como sendo as pré-judiciais e preventivas, atribuindo-as com exclusivi dade ao advogado. O Estatuto da.Ordem dos Advogados do Brasil agasalhou tal pre- tenso sem, porém, dar-lhe forca coercitiva, No seu art, 71 ficou assegu- rado que “A advyocacia compreende, além da representagdo em qual- quer juizo ou tribunal, mesmo administrativo, 0 procuratério extraju- 275 Scanned with CamScanner dicial, assim como os trabalhos de consultoria e assessoria, € as fungées de diretoria juridica”. (Os trabalhos de assessoria jurfdica, com o espantoso desenvolvimento econdmico da nossa época, caracterizado pelo tecnicismo € pela velo- cidade das transformagées sociais, esta criando novas dimensdes para a advocacia. ‘A complexidade da vida moderna esté reclamando do advogado maior soma de conhecimentos especializados e novos métodos de tra- balho, para integrarse no ordenamento juridico. do desenvolvimento nacional. Tais atividades extravasam de muito o velho conceito de ad- vocacia, expresso, desde as Ordenagées, no nosso Estatuto, no § 8.° do art. 71, como o de postular em juizo. Hoje, ja se est estruturando uma nova modalidade da advocacia, qual seja “a advocacia empresarial”, que examinaremos em outro capitulo. Continua, ainda, a definigio cujos termos examinamos: “defender na justica, oralmente ou por escrito, a honra, a liberdade, a vida e 0s interesses de seus clientes”, Pela nossa sistematica, tanto a defesa oral como a escrita so priva- tivas do advogado (§ 8.%, art. 71). Dai a razo pela qual, nas audiéncias de instrugio e julgamento, nfo podem atuar os estagidrios, na fase de julgamento, A defesa oral nas audiéncias s6 & permitida ao advogado inscrito na OAB. Por ultimo, esclarece a defini¢io de APPLETON “que ele assiste ou representa”, © advogado, quando age em juizo, em nome do cliente, no o faz como seu mandatério, Ele 0 assiste, o representa em juizo. A diferenca,” segundo acentuam os autores, importante. Como mandatério ele com- prometeria o mandante, Tudo que dissesse seria como dito pelo man- dante, Ele assiste a0 cliente, ele o representa em juizo. Ele se faz de juiz perante o seu cliente. Ele 0 ouve, analisa os fatos, pesquisa as provas, e, enti, oferece ao juiz o resultado desse seu julga- mento. O que diz em juizo é seu pensamento pessoal. Tivemos a oportunidade de manifestar-nos, em proceso disciplinar, na Ordem dos Advogados, sobre o asstinto, em acérdao, em que se decidira: “Q.querelante, em suas alegagdes na inicial, invoca e procura sus- tentar a tese de que os advogados e procuradores das partes se tornam, pelo simples fato de desempenho do mandato, co-autores ou cimplices elas, pelos atos, porventura criminosos, que hajam as mesmas prati- cado. O Conselho, todavia, pelo voto uninime de seus membros, deixa aqui consignada a sua integral repulsa a semelhante tese, a qual, se aditada, viria a constituir completa subversio de um dos principios bé- sicos, invariavelmente aceitos, do exercicio normal da’ advocacia”. © advogado entre nds assume as duas fungGes: a de procurador € a de defensbr, 20 contrério do que ocorre em outros paises. ‘Apreciando @ atividade do advogado sob um prisma amplo, dentro 276 Scanned with CamScanner da conceituagao fixada no art. 68 do Estatuto, propomos defini-lo como sendo um “servidor do piiblico e do Estado; aquele, como intérprete da lei, € a.este, como elemento indispensivel administragio da jus- tiga”. Sobre a identidade do primeiro advogado no Brasil, conhecido como bacharel de Cananéia, ainda paira divida. Assis Cintra, ilustre historiador, esclarece que o primeiro bacharel que morou no Brasil foi um degredado que a expedigéo de Gaspar de Lemos dexou em Cananéia, no ano de 1501, cujo nome era DUARTE Hi, porém, quem apresente a hipdtese de ser o bacharel de Cananéia, GOSME FERNANDES PESSOA, conhecido como mettre Cosme Ba- are). © historiador da nossa profissio — Joio Gualberto de Oliveira, em artigo intitulado “O primeiro bacharel no Brasil” e publicado na Re- vista da OAB, S.P., n.° 161, vol. 24, pag. 109 — arrola grande numero de autofes, sustentando ser Duarte Peres 0 primeiro bacharel chegado 20 Brasil. Conclui Jodo Gualberto, admitindo, “A mingua de outra versio mais fidedigna, que o primeiro bacharel que habitou o Brasil, degre~ dado em Cananéia no ano'de 1501, tenha sido mesmo Duarte Peres”. Por outro lado, prossegue: “Cumpre ter presente que esta questio do primeiro bacharel no Brasil: tem sido exaustivamente discutida por homens de reconhecida idoneidade. O j4 citado Emesto Guilherme Young, a quem devemos luminosos trabalhos, inculca “Mestre Cosme’” ou Cosme Fernandes Pessoa. Rui Dias de Guzmén parece nao ter di vidas sobre Duarte Peres; Adolfo Varnhagem, a principio partidario de “Mestre Gosme”, depois passou a apresentar Gongalo da Costa, como bacharel de Cananéia; Candido Mendes de Almeida quebrou lancas por Joio Ramalho que, por sinal, a famosa comissio do Instituto Histérico © Geogrifico de Sio Paulo, em 1962, julgou analfabeto. E mais alguns nomes poderiamos citar de acordo com outros pesquisadores do nosso remoto passado. Mas preferimos ficar com Duarte Peres, por nos parecer melhor a documentagio em que seus propugnadores se alicercam € por ios sentirmos, nesse ponto de vista, em assaz respeitvel companhfa de gente categorizada, quer pela sua autoridade, quer pelos servicos que, incansavelmente, presta & histéria desta parte do nosso mundo”. ‘A nossa profissdo se sempre foi também vilipendiada e quase sempre caluniada, por seu turno € glorificada. Para reagirmos contra essa onda de calinias, 0 remédio se encontra, embora a longo prazo, no preparo do jovem causidico. o No tocante aos principios éticos que informam a nossa profissio, Jorge O: Benchetrit Medina — “Ztica de la Abogacia”, Enciclopedia, ‘Omeba, cap. 11, pdg. 127 € segs. — adverte: “A profissio de advogado é freqiientemente caluniada, desclassificada e, para defendé-la da mali- cia vulgar, é preciso que o advogado conheca bem a fundo a natureza de sua missio e as regras que norteiam sua conduta, defendendose a si mesmo também dos riscos e“das tentagdes que podem fazé-lo ¢rair, 217 Scanned with CamScanner sem disso dar-se conta, os printipios que enobrecem e dio beleza ao duro e sacrificado offcio de advogar”. “Daria margem para um longo capitulo historiar as acusagdes contra ela e 05 louvores a seu favor. Combatendo o mau uso de se atribuir ao advogado epitetos jocosos, taxando-os, nfo raro, de sofistas profissionais, de mercadores de pala- vyras, de exemplares mais nocivos da fauna social, dizia Eurico Sodré, aque estes nossos detratores “ignoram que no panorama universal, entre todos os que trabalham e assim realizam a riqueza, 0 progresso ¢ se aproximam da felicidade social, 0 advogado aparece como colaborador dos mais eficazes. Cada pleito judicidrio é uma bigorna sobre a qual, pelo menos, dois malhos — autor e réu — martelam as leis, a doutrina @ a jurisprudéncia, mostrando-Ihes, num esparrame de cinzas’e fagulhas, 08 érros e as exceléncias, quando no os conformando as exigéncias dos fatos concretos, Exercem, assim, mais que um trabalho de critica, imen- samente util 20s legisladores e aplicadores da lei, uma acéo fecunda ao progresso juridico que ultrapassa o interesse de obter justica em cada caso isolado”. “Defendendo, na mesma causa, interesses em choques e pontos de vista diferentes, seno antagOnicos, os advogados das partes submetem 0 direito positivo a experiéncias especificas e, pela indicagio de suas fa- Ihas, abrem novos horizontes 20 direito.constituendo’ “Uma demanda nao é apenas um entrevero de litigantes. £, quase sempre, um reajuste de principios, uma devassa de meandros, uma com- paréncia de situacées peculiares em busca de harmonia juridica, que Gao como resultado os movimentos da jurisprudéncia € 0 conselho das reformas”. “Desse embate de interesses legitimos ou mesmo ilegitimos ¢ que surge, para o bem comum, a compreensio da atualidade juridica” ('). Ha uma frase de Dickens, que, numa feliz sintese do problema, dé a um dos aspectos mais evidentes da advocacia o seu verdadeiro sentido: “Se nao existissem pessoas mis nao haveria bons advogados”. “Assisti- mos e acompanhamos — como se estivesse comentando tal frase, escreve um culto colega — “numa intimidade imperdodvel, tanta miséria, tanta desgraca, tanta torpeza... a todos dando a acomodagio que a lei !per- mite, a solugdo que a convivéncia social impée, que... nem a gratidio temos direitos, pois que nao é humanamente razodvel que o constituinte e, na hipétese melhor, o constituinte inocente ndo queira esquecer tudo, tudo 0 que liga a tanto infortimio. Nessa libertacao pela amnésia li vamos nés de cambulhada entre sorridentes ¢ ironicamente compreen- sivos’ (Carlos de Araijo Lima, Rev. da OAB do Cons. Fed., n.° 3, 1970, pag. 171). Além desses detratores da nossa profissio, ha os que, por nfo verem deferidas as suas pretenses em juizo, levam & conta do advogado pos- (1) RUY SODRE — “Eurico Sodré — Jurista Notivel — v we gs rico Jurista Notdvel — Advogado Completo’ 278 Scanned with CamScanner siveis erros, negligéncias ou mesmo dolo. A esse tipo de clientes ouca- mos a resposta do nosso: patrono, Ruy Barbosa: “A profissio do advogado tem, aos nossos olhos, uma dignidade quase sacerdotal. Toda vez que a exercemos com a nossa consciéncia, consi- deramos desempenhada a nossa responsabilidade, Empreitada é a dos que contratam vitérias forenses. Nés nunca nos comprometemos ao vencimento de causas, nunca endossamos saque sobre a consciéncia dos tribunais, nuna abrimos banca de vender peles de urso antes de mortos. Damos aos nossos clientes 0 nosso juizo com o nosso conselho, a nossa conviccio com nosso zelo; e, depois, quanto ao prognéstico e & respon- sabilidade, temos a nossa condigéo por igual & do médico honesto, que nao conta vitérias antecipadas como os curandeiros, nem se hé por «le- sonrado, quando nao debela casos fatais”. ‘Nés outros advogados n&o dispomos sequer, nas relagées com a clientela, do poder que exercem 0s médicos sobre os seus doentes: na Medicina, entre a ciéncia e a cura apenas intervém os decretos da Pro- vidéncia; ao passo que, no foro, entre o direito e a sentenca se metem os erros da justiga humana, a cuja discricao esta o destino das causas". “No nos venham, pois, quando uma delas sogobra, concluir pela culpa do conselho temerério, ou do patrocinio desastrado, porque no no bem ou no mau éxito dos pleitos que est4 o critério da honesti- dade dos litigios ou 0, merecimento dos patronos”. “No quase meio século que j4 mede a nossa carreira forense, temos tido, muitas vezes, a honra de perder abracado com as causas mais justas, mais santas, mais gloriosas, para, anos depois, recebermos 0 con- solo dos nossos reveses, vendo laurear os principios com que tempos antes haviamos sido esmagados”. “Nao poderfamos, pois, aceitar essa medida igndbil, pela qual se estima as cegas a legitimidade das reivindicagbes juridicas segundo o desenlace dos pleitos’, (Ruy Barbosa, apud Rubem Nogueira — “O Advogado”, Ruy Barbosa, ed. 1949, pags. 427/428. Ninguém melhor e com maior soma de autoridade poderia fazer a “apologia do advogado” do que SS. o papa Paulo VI em célebre alocugdo ao receber 0s membros do Conselho da Unio Internacional dos Advogados, na qual enumerou “as razdes da estima e da conside- ago de que goza aos olhos da Igreja” a nossa profissio. Consagradoras — e por que nao dizer, também, consoladoras — as palavras de S. Santidade o papa Paulo VI, de cuja alocugao transcre- vemos 0 trecho referente a “Um homem em busca da verdade”: “© advogado assiste, aconselha, defende, Mas, para fazé-lo, deve estar bem informado. E aqui.se manifesta outro aspecto de sua personalidade: 6 um homem em busca da verdade. Verdade dos fatos, para apoiar, num 279 Scanned with CamScanner terreno sdlido, sua defesa; verdade das leis, cuja posse plena Ihe é ini- posta como um dever da sua consciéncia profissional; mais que tudo, verdade das almas, cujos mais intimos segredos recolhe com tanta fre- qiiéncia, Ninguém, talvez, a nfo ser 0 sacerdote, conheca melhor do que ele a vida humana sob seus aspectos mais variados, mais dramaticos, mais dolorosos, por vezes os mais defeituosos, mas nao raro também os melhores. Nao é, portanto, de admirar, tenha sido 0 advogado, desde a antiguidade, o candidato naturalmente indicado para as fungées politi- cas ou encargos puiblicos, por ser o mais capaz de exercé-los: homenagem prestada espontaneamente a seu valor humano, a sua capacidade, & sua experiéncia.” 280 Scanned with CamScanner

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