Marx, ao analisar o modo de produção capitalista, previu uma exploração
crescente do trabalhador (proletariado) e a criação de um sistema para sua
própria supressão. Vamos discutir sobre as tendências evolutivas da arte na era da reprodutibilidade e do capitalismo. Benjamin inicia partindo do ponto de que a reprodução da arte não é exatamente uma novidade que o processo de industrialização do capitalismo introduziu, mas que tal característica sempre esteve presente, por propósitos tanto pedagógicos quanto econômicos. O autor afirma que a reprodução técnica foge da ideia de mera imitação, pois busca adicionar e ampliar a tese da obra original. A partir do desenvolvimento da fotografia, os olhos passaram a ser o meio mais importante de reprodução artística, possibilitando ao artista que sua arte estivesse disponível a todos com apenas um olho e uma câmera. O mesmo acontece com o som que passa a transmitir as mensagens uma vez escritas e lidas, com apenas a fala e o uso da audição. AUTENTICIDADE Na prática da reprodutibilidade, perde-se o “aqui e agora” da obra, sua existência única, sua autenticidade como ser que existe em apenas um determinado lugar e momento. Apenas o original é autêntico, pois apenas o original possui em si a marca do progresso dos dias e o testemunho não só de seu próprio desgaste, mas também de sua própria relevância ao atravessar as eras. Porém, a reprodução técnica se diferencia da imitação ao possibilitar, primeiramente, uma maior autonomia do que a reprodução manual, como, por exemplo, com as técnicas avançadas presentes numa câmera, o fotógrafo pode, a depender de sua intenção, enfatizar aspectos específicos de uma obra que seriam impossíveis a olho nu. Uma comparação interessante feita por Benjamin é entre o teatro e o cinema. Enquanto o primeiro mantém a sua “aura”, a sua singularidade, ou seja, o aqui e agora da obra de arte – que é captado pela plateia presente no espetáculo -, já o segundo perde sua “aura” na medida em que o expectador não está presente e a câmera (um equipamento técnico) é quem reproduz a imagem dos atores. Um pintor pode, por exemplo, ao observar uma dança, pintar um dos movimentos que lhe chamam a atenção. Já o fotógrafo ou o cinegrafista pode não apenas capturar um momento, mas toda a dança, e indo além, utilizar técnicas como o zoom ou a câmera lenta para dar efeitos desejados ou enfatizar trechos que o olho humano simplesmente não enxerga naturalmente. A reprodutibilidade técnica permite, também, a alteração do local da obra, de forma que o coro da igreja possa ser escutado pelo rádio, no próprio quarto do ouvinte. Tal avanço técnico reduz sua autenticidade à medida que aumenta sua capacidade de consumo em diferentes formas e locais. Portanto, o que se atrofia na era da reprodutibilidade da arte é a sua aura. Mas o que é essa aura, afinal? “É uma figura singular, composta de elementos espaciais e atemporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que esteja. Observar, em repouso, numa tarde de verão, uma cadeia de montanhas no horizonte [...] significa respirar a aura dessas montanhas” (Pg. 170), diz o autor. Para Benjamin, o processo de destruição da aura na arte está presente na tentativa cada vez mais incisiva e intensa de transformar os objetos, mesmo os mais distantes, em algo próximo, até mesmo pessoal. É a necessidade crescente, proporcionada pela fetichização capitalista, de não mais apenas contemplar o belo, mas de tê-lo como posse, não importando o quão único seja tal objeto. Sua aura então perde-se quando entra a massificação. É Picasso não mais exposto nos museus, mas numa estampa de camiseta, numa caneca, numa cópia impressa e pendurada na parede de uma sala ou de um escritório. “A obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução de uma obra de arte criada para ser reproduzida[...]; a questão da autenticidade das cópias não tem nenhum sentido” (Pg. 171). Além disso, essa lacuna deixada pela remoção do valor de culto religioso da arte abre alas para uma outra função social, pois “Em vez de fundar-se no ritual, ela passa a fundar-se em outra práxis: a política” (Pg. 172) Dessa forma, a arte que se torna política confere ao político a exposição, seja de si mesmo, seja de seus ideais ou de ambos. O cinema, dessa forma, cria também uma relação de submissão entre o proletariado e a massa. O ator sabe que representa não somente diante de uma câmera, mas de toda uma massa; “Ele sabe, quando está diante da câmera, que sua relação é em última instância, com a massa. É ela que vai controlá-lo.” O surgimento do cinema falado, segundo Benjamin, é um retrocesso pois significa dar voz a anseios nacionalistas que favoreceram o florescer do nazi- fascismo, como é possível ler aqui: “(...)seu público restringiu-se ao delimitado pelas fronteiras linguísticas, e esse fenômeno foi concomitante com a ênfase dada aos interesses nacionais” (Pg. 172) algo que fica evidente pela própria importância que Hitler deu ao cinema como propaganda de seu programa O cinema permite uma influência sobre o espectador nunca vista em outras áreas da arte, tornando, assim, a fala política um espetáculo equivalente à um astro de cinema. E no fascismo isso é essencial: o ditador precisa capitalizar politicamente para si as emoções de seu público e para tal, não mede esforços para conduzir a massa para si. São os interesses do capital conduzindo a política ao bel prazer das classes detentoras dos meios de produção que estão em jogo. O CINEMA COMO A CATARSE DO PROLETARIO O espectador sabe que o ator cinematográfico é alguém que se provou diante da máquina e mostrou sua aptidão, enquanto o trabalhador é alguém que precisa constantemente se provar diante da máquina para ser considerado minimamente humano. Assim, o trabalhador assiste ao ator de cinema com a esperança de que assim como o ator provou sua humanidade diante de um aparelho o trabalhador um dia irá também provar de maneira final a sua humanidade em seu trabalho. Tal relação só existe pois o trabalhador necessita alienar-se para o trabalho: ele vive pelo lucro e pela satisfação de outrem, o seu patrão. Ele vê, portanto, no ator, alguém que coloniza a máquina, que a obriga a provar sua excelência para toda a massa e faz com que, através disso, se veja diante da possibilidade de também ele triunfar sobre o trabalho que lhe rouba diariamente a humanidade resgatada pelo intérprete.