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O RACISMO

Apontamentos sobre:

NO FUTEBOL
BRASILEIRO
SUMÁRIO
1 Prefácio
2 História
3 Estatísticas
4 O primeiro clube
brasileiro punido
por racismo

5 Ocorrências
6 Vinícius Junior
7 Legislação
8 Considerações
finais

9 Fonte
•O Brasil, segunda nação com o maior números de negros,
apresentou ao mundo inúmeros jogadores de futebol, dentre
eles aquele considerado como Rei: Edson Arantes do
nascimento, o Pelé, jogador negro.

•Em razão da conjuntura supra, essa mesma nação deveria ter

PREFÁCIO
como obrigação tratar as questões do racismo com maior
severidade. O que não acontece, principalmente na seara
futebolística.

•O Brasil foi considerado durante muitos anos como o país da


“Democracia Racial”, termo usado para descrever as relações
raciais, considerando que a maioria dos brasileiros não se via
como promotores da discriminação. Entretanto o título que
muito demonstrava a harmonia entre a diversidade cultural de
raças que nosso país tem, foi desmitificado pela ONU
(Organização das Nações Unidas), em setembro de 2014, através
do seu relatório de desenvolvimento humano, que reuniu uma
série de indicadores sociais e econômicos.

•O estudo da ONU (Organização das Nações Unidas), levantou


dados em relação à renda, saúde e educação, e em todos eles, os
negros brasileiros estão em situação desfavorável em relação
aos brancos, definindo que no Brasil o “racismo é
institucionalizado”.
•A ONU também observou que o esporte, mesmo que tenha
como princípio o desenvolvimento físico e da saúde, serve
também para a aquisição de valores necessários para coesão
social e mundial. Esporte vai muito além das disputas dentro dos

PREFÁCIO
estádios e ginásios. Cada vez mais cresce a sua importância
como ferramenta de inclusão social

•Nesse interim, o presente trabalho tem como escopo promover


uma reflexão sobre o racismo no futebol brasileiro através de
pesquisa com abordagem quanti/qualitativa, sendo certo que a
importância maior estará nos fenômenos e nos processos que
serão analisados e não só quantificados.

•Serão abordados os números dos casos de discriminação no


futebol brasileiro de 2014 a 2021 disponibilizados pelo
Observatório da Discriminação Racial no Futebol, ocorrências
especificas e seus desfechos, além de caso de grande
repercussão, o do jogador Vini Jr., cujo histórico racismo remonta
da época que defendia o Clube de Regatas do Flamengo. Por fim,
serão analisados dispositivos legais sobre a temática.
HISTÓRIA
•Antes de adentrar os casos de discriminação no futebol no
Brasil, oportuno trazer a baila um breve bosquejo sobre a
participação negra na história do futebol em solo brasileiro.

•Como se sabe, no Brasil, o futebol é o esporte mais popular e

HISTÓRIA
começou a se difundir a partir de 1894 quando Charles Miller
trouxe um jogo de uniformes e uma bola. Dizem que antes dele
em 1874 marinheiros ingleses se apresentaram, na praia da
Glória, para a princesa Isabel.

•Esse futebol que nasceu amador e elitista foi se transformando


ao logo do tempo.

•A profissionalização começa em 1916, quando foi criada a


Confederação Brasileira de Desportos (CBD), com apoio de Bahia,
Minas Gerais, Pará, Paraná e Rio Grande do Sul. No mesmo ano,
a entidade se filiou à Confederação Sulamericana de Futebol
(Comembol) e à Fifa (Federação Internacional de Futebol).
•O esporte era ainda elitista, já que somente jogadores da alta
sociedade, apenas sócios, jogavam nos clubes.
•O futebol foi ficando cada vez mais popular nos anos 1920,
quando alguns clubes aceitaram que jogadores de classe média
ou baixa, inclusive negros, atuassem por seus times. Vem daí o

HISTÓRIA
termo “pó-de-arroz”, produto aplicado na pele dos jogadores
negros, para disfarçar sua cor.

•Um passo importante para a “profissionalização” do esporte


bretão nasceu do preconceito racial entre os frequentadores dos
clubes. Os sócios, geralmente conservadores, não aceitavam os
negros do time de futebol circulando pelos clubes e começaram
a pedir que eles se tornassem funcionários, com tratamento
diferenciado ao dado aos associados, inclusive usando outras
portas de acesso.

•Surgiu, então, a ideia de pagar salários aos astros das equipes e


torná-los empregados.
•O Vasco foi o primeiro time a aceitar negros sistematicamente, o
que levou Fluminense, Flamengo, Botafogo e América a
fundarem uma liga separada, a AMEA (Associação Metropolitana
de Esportes Atléticos), deixando o Vasco, que havia sido o
campeão carioca em 1923, na LMDT (Liga Metropolitana de

HISTÓRIA
Desportos Terrestres).

•Mas o verdadeiro pioneirismo em aceitar um jogador negro é


disputado entre o Bangu, no Rio, e a Ponte Preta, de São Paulo.
•O Bangu, time da fábrica de tecidos Bangu, dirigido por ingleses,
escalou o negro Francisco Carregal num amistoso contra o
Fluminense, em 1904, e ganhou por 5 a 3.

•A Ponte Preta, nascida no bairro operário do mesmo nome (o


que facilitava a presença de negros), em Campinas, se gaba
porém de ter escalado um “centre-half” – isto é, centro-médio –
negro, de nome Miguel do Carmo, logo após a fundação da
equipe, em 1900.
ESTATÍSTICAS
•Os estádios de futebol e a Internet são mais um palco, no qual é
possível ver ódio e violência sendo disparados contra atletas,
dirigentes, torcedores e outras tantas pessoas envolvidas no
mundo esportivo.

ESTATÍSTICAS
•Salientamos que os constantes casos de racismo nos estádios,
na Internet e demais espaços “derrubaram” o antigo mito da
democracia racial existente no Brasil e que teve no futebol um
falso exemplo de como as diversas raças conviveriam em
harmonia no nosso país.

•Um olhar descompromissado pela “fotografia” da seleção


brasileira é capaz de nos fazer acreditar que atletas negros e não
negros, assim como torcedores, estabelecem uma relação sem
conflitos nos estádios brasileiros. Contudo, os inúmeros casos já
denunciados nos anos anteriores comprovam que essa união
não é plena e no momento de derrota esportiva o culpado tem
uma cor, seja na seleção, seja nos clubes.
•De 2016 a 2019 os números dos casos de discriminação no
esporte brasileiro aumentaram ano após ano. Em 2020, os casos
tiveram uma queda de 50,65% (cinquenta vírgula sessenta e
cinco por cento) em sua totalidade, entre todos os tipos de
incidentes de preconceito trabalhados neste relatório.

ESTATÍSTICAS
•Entretanto, não podemos esquecer que foi um ano atípico, com
a ocorrência da pandemia e sem a frequência de torcedores nos
estádios. Assim, destacamos a existência de um número elevado
de atos discriminatórios, sendo que a presença de público nas
competições não chegou a completar exatos três meses no
Brasil.

•Contudo, o ano de 2021, mesmo tendo ocorrido sem a presença


do público em boa parte dele, bastou o retorno dos torcedores
aos eventos esportivos para evidenciarmos como um ano que
igualou o número recorde de discriminação e preconceito no
esporte brasileiro, que foi 2019, com 158 registros. Em relação ao
ano anterior, 2020 foi um aumento de 97,5%.
A intolerância demonstrada de diversas formas não está mais
restrita aos estádios e à Internet. As denúncias envolvem
ocorrências em programas esportivos, telejornais de rádio e
televisão, sedes administrativas de entidades, veículos de
transporte público, locais sociais e de lazer, entre outros.

"O racismo não desapareceu


nem vai desaparecer. Mas a
lei pegou, sim. Há hoje na
sociedade uma consciência
de que racismo é um crime.
A sociedade passou a ser
menos tolerante, a exigir
igualdade e a não aceitar a
discriminação. O que faz a
lei pegar é a punição."

(Carlos Alberto Caó de Oliveira)


MONITORAMENTO
DE CASOS
•De acordo com o último Relatório de
Discriminação Racial 2021, realizado pelo
Observatório da Discriminação Racial no
Futebol Museu da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul/PROREXT, estão descritos 158
(cento e cinquenta e oito) casos dos quais 137
(cento e trinta e sete) efetuaram-se no Brasil e
21 (vinte e um) sucederam-se com atletas
brasileiros no exterior.
MONITORAMENTO
DE CASOS
•Dentre esses 158 casos, selecionamos alguns
com maior repercussão sobre discriminação
racial que envolveram jogadores brasileiros e
que serão abordados neste trabalho.
O PRIMEIRO CLUBE
BRASILEIRO A SER PUNIDO
22/10/2005: Juventude x Internacional
•O Juventude foi o primeiro clube brasileiro
punido por racismo. O Superior Tribunal de
Justiça Desportiva (STJD), em decisão unânime,
aplicou multa de R$ 200 mil e tirou o mando de
campo de duas partidas da equipe de Caxias do
Sul.

•Denunciado pelo árbitro mineiro Alicio Pena


Júnior, que apitou a partida contra o
Internacional no dia 22 de outubro de 2005, no
Alfredo Jaconi, o Juventude foi penalizado pelos
atos de sua torcida. Conforme relatou o árbitro
em sua súmula, a torcida local ‘imitava um
macaco todas as vezes” que Tinga, volante do
Inter, tocava na bola.

A procuradoria do STJD denunciou o Juventude


no artigo 213 do Código Brasileiro de Justiça
Desportiva (CBJD), o que poderia acarretar em
pena de até três jogos. A defesa do clube
gaúcho tentou amenizar a punição com dois
argumentos principais.
OCORRÊNCIAS
Atleta Aranha
•28/08/2014:
•Santos X Grêmio: Copa do Brasil
Rio Grande do Sul (RS)

Fato: Durante a partida entre Grêmio e Santos,


alguns torcedores da equipe Gremista xingaram
o goleiro santista, Aranha, de macaco.

Como terminou: Grêmio foi julgado pelo STJD e


foi excluído da Copa do Brasil. Recorreu e foi
penalizado com a perda de 3 pontos, sendo
desclassificado da competição.
Atletas do Clube de Regatas do Flamengo
Data: 11/08/2021 Jogo: Olimpia x Flamengo
Campeonato: Copa Libertadores da América
Onde: Estádio Manuel Ferreira
Cidade: Assunción/PARAGUAI

Fato: Atletas do Flamengo relataram que


sofreram injúrias raciais por parte de torcedores
do Olimpia, do Paraguai. Os insultos ocorreram
ainda no primeiro tempo. O atacante Gabigol e o
goleiro Gabriel Batista foram alguns dos alvos.
Os jogadores como Matheuzinho e Rodinei
rebateram os paraguaios. Foi registrado vídeo
em que se ouve gritos de “macaco” vindos da
arquibancada.
Desdobramento: Jogadores e comissão técnica
do Flamengo se manifestaram repudiando os
atos de racismo. O clube carioca cobrou a
Conmebol por atitudes. A entidade sul-
americana abriu um procedimento disciplinar
para apurar racismo no duelo entre Olimpia e
Flamengo.
Como terminou: Após mais de um mês a
Conmebol multou o Olimpia em R$ 157 mil
devido às ofensas racistas.
.
Atleta do Clube do Rem
Jefferson Victor Machado Ambrósio
Data: 28/10/2021
Jogo: Cruzeiro x Remo
Campeonato: Brasileiro Série B
Onde: Estádio Raimundo Sampaio (Independência)
Cidade: Belo Horizonte/MG

Fato: A torcida organizada do Remo, “Barra do Remo”


denunciou um caso de injúria racial no Independência, em
jogo contra o Cruzeiro. Na denúncia feita no Twitter, é possível
ver e ouvir um torcedor gritando “macaco” enquanto o
atacante Jefferson, do Remo, comemora com seus
companheiros o gol. A gravação não permite a identificação do
autor da injúria racial.
Desdobramento: O Remo formalizou a denúncia de injúria
racial à Confederação Brasileira de Futebol. O Cruzeiro, em
nota, lamentou o caso e pediu desculpas. A administração do
Estádio do Independência afirmou que analisaria as imagens.
Em manifestação, os jogadores do Remo protestaram contra o
racismo no futebol. O caso foi encaminhado para o Superior
Tribunal de Justiça Desportiva.
Como terminou: O Cruzeiro foi julgado no STJD por injúria
racial cometida por torcedor na partida contra o Remo. Em
primeira instância, o clube mineiro foi punido com perda do
mando de campo e multa de R$ 50 mil reais. Após recorrer da
decisão, o STJD retirou a punição do Cruzeiro.
Torcedores brasileiros e Neymar da Silva Santos Júnior
atleta da Seleção Brasileira
Data: 10/07/2021
Onde: Redes Sociais

Fato: Desde o início da Copa América foi


possível identificar dezenas de perfis de
usuários argentinos chamando Neymar Jr. e
os brasileiros de macacos. Os comentários,
todos com conteúdo racista, foram
verificados com mais intensidade durante a
partida Brasil e Argentina.

Desdobramento:
Diversos perfis de brasileiros denunciaram e
repudiaram os comentários racistas
proferidos por torcedores argentinos.

Como terminou:
O caso não teve sequência.
Atletas do Red Bull Bragantino
Data: 17/09/2021
Onde: Redes Sociais – Instagram

Fato: Um perfil falso no Instagram iniciou ataques


racistas às jogadoras do Red Bull Bragantino. A
primeira vítima foi a atleta Isabela, que recebeu uma
mensagem privada escrito: “macaca feia nojenta” A
atleta denunciou o ato racista sofrido. Após expor o
caso, os ataques foram dirigidos a diversas jogadoras
do clube, com comentários como: “Quando essas
negritas eram escravas, não acontecia isto”, “As
horríveis do Bragantino feminino ganharam uma p… e
acha que tem moral pra falar. Volta pra cozinha
minha escrava”. E em post do time masculino foi
possível ler: “o verdadeiro futebol! Sem LGBTQI+ e
macaco”.

Desdobramento: As atletas denunciaram os atos


racistas. O departamento jurídico do clube foi
acionado. As mensagens foram apagadas e o
Instagram removeu o usuário da plataforma.

Como terminou: Não houve evolução jurídica.


VINÍCIUS JR.
“NÃO FOI A 1ª, 2ª ou 3ª”
VEZ EM “VINÍCIUS JUNIOR”
"Não foi a primeira vez, nem a segunda e nem a terceira. O racismo é o
normal na La Liga.“
Esta foi a manifestação do atacante Vinícius Junior no domingo
(21/05/2023) após ser novamente alvo de ataques racistas em um jogo da
La Liga, o campeonato espanhol, desta vez em um jogo entre seu clube, o

FOI VÍTIMA DE RACISMO


Real Madrid, e o Valencia.

Antes e durante a partida, a torcida do Valencia cantou músicas em que


chama Vinícius Junior de "macaco". Durante a partida, Vinícius Junior se
dirigiu a torcedores do Valencia que o estavam xingando.

A partida foi interrompida por alguns minutos pelo árbitro e o sistema de


som do estádio transmitiu um pedido para que os torcedores evitassem
xingamentos racistas.

Na Europa, o episódio mais antigo de racismo contra Vinícius Junior foi


noticiado em 24 de outubro de 2021, um ano depois de ele chegar ao
clube madrilenho.
“NÃO FOI A 1ª, 2ª ou 3ª”
•24/10/2021 - Barcelona 1 x 2 Real Madrid
Fato: o incidente aconteceu no estádio Camp Nou, durante um clássico
contra o Barcelona vencido pela equipe de Vinícius. Um torcedor fez ataques
considerados racistas ao brasileiro e o incidente chegou a ser denunciado às
autoridades espanholas.

VEZ EM “VINÍCIUS JUNIOR”


Como terminou: o caso foi arquivado porque as autoridades disseram que
não conseguiram identificar o agressor.

14/03/2022 - Mallorca 0 x 3 Real Madrid


Fato: Vinícius marcou um dos gols na vitória do Real Madrid e voltou a ouvir

FOI VÍTIMA DE RACISMO


xingamentos racistas da arquibancada. Novamente o caso foi denunciado às
autoridades, que arquivaram as acusações, afirmando que não constataram
crime de ódio.
Meses depois, o capitão do Mallorca, AntonioRaíllo, acusou Vinícius Junior de
provocar seus adversários com danças.

•26/01/2023 - Real Madrid 3 x 1 Atlético Madrid


Na véspera do jogo, torcedores do Atlético Madrid penduraram em uma
ponte da cidade um boneco vestido com a camiseta de Vinícius Junior,
simulando enforcamento do jogador.
O boneco estava com mensagens de ódio contra o atacante e o clube.
A atitude despertou mensagens de repúdio da Confederação Brasileira de
Futebol e dos dois clubes. Na internet, a hashtag #BailaViniJrviralizou.

•21 /05/2023 - Valencia 1 x 0 Real Madrid


Antes da partida, vídeos mostram torcedores do Valencia cantando músicas
em que chamam Vinícius Junior de macaco.
Durante a partida, o jogador brasileiro confrontou torcedores que o
xingavam na arquibancada. O árbitro chegou a interromper a partida por
alguns minutos e foi feito um aviso contra racismo no alto-falante.
Após o jogo, Vinícius criticou a La Liga e foi rebatido pelo presidente da
entidade.
PROVIDÊNCIAS O Itamaraty entrou em contato com a embaixadora
da Espanha no Brasil, Mar Fernández-Palacios,
pedindo esclarecimentos do governo espanhol sobre
o mais recente caso de racismo contra o atacante
Vinícius Júnior, do Real Madrid.

A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco,


afirmou em coletiva de imprensa, que o governo
brasileiro acionou o Ministério Público da Espanha
contra a Primeira Divisão da Liga de Futebol
Profissional.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse,


durante pronunciamento sobre a viagem ao Japão,
que atitudes devem ser tomadas pela Fifa e pela Liga
Espanhola para cessar os casos de racismo no
futebol.

O Real Madrid apresentou uma denúncia na


Procuradoria-Geral da Espanha por delitos de ódio e
discriminação contra o brasileiro Vinícius Jr.

A polícia espanhola prendeu sete pessoas suspeitas


de ataques racistas contra o jogador Vinicius Jr.
NO BRASIL •16/08/2017 Botafogo x Flamengo – Copa do Brasil
Fato: Torcedor do Botafogo é detido por injúrias raciais a
familiares do atacante Vinicius Jr. O acusado fazia sinais
apontando para o braço e gritava “tudo macaco”.
Como terminou: O Superior Tribunal de Justiça
Desportiva (STJD) informou que não puniria o Botafogo
por conta da injúria racial do torcedor alvinegro, por se
tratar de um torcedor isolado que teria realizado o
suposto gesto de “injuria racial”, não infringindo assim o
artigo 243-G do CBJD, na forma como prevê também o
Engana-se quem pensa que os ataques Código Disciplinar da FIFA em seu artigo 58, item 2.
racistas ao atleta Vinícius Júnior iniciaram-
se em território europeu. O racismo sofrido
pelo jogador remonta da época em que •03/03/2018- Flamengo X Botafogo - Campeonato
defendia a camisa do Clube de Regata do
Carioca
Flamengo:
Fato: No momento em que Vinicius Jr. deixava o
gramado do Nilton Santos, vários alvinegros xingaram,
cuspiram e fizeram gestos obscenos para o camisa 10.
Uma senhora cometeu racismo contra o atleta,
chamando-o de “viado, neguinho safado”.
Como terminou: O Tribunal de Justiça Desportiva do Rio
de Janeiro (TJD-RJ) absolveu o Botafogo por maioria de
votos em processo sobre supostas injúrias raciais
proferidas por torcedores alvinegros contra Vinicius
Júnior, atacante do Flamengo. O Tribunal se baseou no
primeiro depoimento do atacante, que disse não ter
conseguido identificar.
LEGISLAÇÃO
•1951: o racismo surge como contravenção penal na Lei 1.390/51
que ficou conhecida como lei Afonso Arinos, devido ao nome de
seu proponente.

•1985: a Lei 1.390/51 teve seu texto modificado pela Lei 7.437/85.
Porém, ainda como contravenção o racismo não era encarado
como uma conduta nefasta, nem perigosa o suficiente para
alarmar ninguém com a sanção.

LEGISLAÇÃO
•1988: a Constituição Federal, além de declarar no caput de seu
artigo 5º, que todos são iguais, no inciso XLII, classificou a prática
do racismo como crime inafiançável e imprescritível, sujeitando o
delinquente a pena de reclusão.

•1989: a Lei 7.716/89 é um marco no Brasil na busca da


igualdade, estabelecendo os crimes resultantes de preconceito
de raça ou de cor. Essa legislação legal confirmou as posições
assinadas pelo Brasil em 1968 na “Convenção internacional sobre
a eliminação de todas as formas de discriminação racial”, com
texto de 1965. Por essa lei o artigo 20 teve a redação do crime de
prática de racismo alterada e foi incluída no Código Penal de
1940 uma qualificadora do crime de injúria.

•2023: a Lei 14.532/2023, tipificou como crime de racismo a


injúria racial, com a pena aumentada de um a três anos para de
dois a cinco anos de reclusão. Enquanto o racismo é entendido
como um crime contra a coletividade, a injúria é direcionada ao
indivíduo.
•A legislação esportiva dá margem para punições rígidas, mas o
texto é dúbio em uma questão central: até onde penalizar os
clubes aos quais estão ligados os agentes das manifestações
racistas?

•Geralmente, as penas englobam multas e perdas de mando de


campo. O extremo da lei, com perda de pontos e exclusão,

LEGISLAÇÃO
costumava ficar longe da pauta.

•Existe um ambiente que dificulta a exposição desses gestos


racistas: o temor de represálias em casos de denúncias, a timidez
dos clubes no combate ao preconceito e a permissividade do
meio esportivo a gestos que em outras esferas são mais
condenados.

•A discussão sobre como punir um clube em situações assim


divide opiniões – e o tamanho da pena, mais ainda. Afinal, a
Legislação esportiva: entidade tem culpa de ter um torcedor racista? O procurador-
quem punir e como punir? geral do STJD, Paulo Schmitt, entende que as agremiações
sempre devem ser julgadas em casos da racismo, seja quem for
o agente da manifestação – torcedor, dirigente, jogador.

•Clubes já respondem por violência dentro dos estádios, seja por


meio de tumultos, desordens, arremesso de objetos, invasões
etc, e devem ser também responsabilizados por essa forma de
atraso social.
•Artigo 3º do Estatuto da FIFA: A discriminação de qualquer tipo
contra um país, uma pessoa ou grupos de pessoas por causa da
raça, cor da pele, etnia, origem social, gênero, língua, religião,
opinião política ou qualquer outra opinião, saúde, local de
nascimento ou qualquer estatuto, orientação sexual ou qualquer

LEGISLAÇÃO
outra razão é estritamente proibida e passível de punição por
suspensão ou expulsão”.

•Artigo 23 do Código de Ética da FIFA:Pessoas vinculadas por este


Código não podem ofender a dignidade ou a integridade de um
país, pessoa privada ou grupo de pessoas por meio desprezo,
palavras ou ações discriminatórias […] em virtude da raça, cor da
pele, origem étnica, nacional ou social, sexo, língua, religião,
opinião política ou qualquer outra condição, orientação sexual ou
qualquer outro motivo.
O que diz a FIFA?
•Artigo 58 do Código de Ética da FIFA: proíbe “dirigentes, jogadores
e agentes de agir de forma discriminatória em relação a etnia,
raça, cultura, política, religião, gênero ou idioma”, código esse
atualizado em 2020, apontando multas e interrupção de práticas
esportivas quando da violação de algum direito referido no
documento.
•O que diz o Código Brasileiro de Justiça Desportiva?
Artigo 243-G: “praticar ato discriminatório, desdenhoso ou
ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica,
raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de
deficiência”. A pena para esta infração é de suspensão de cinco a
dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente,
treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão

LEGISLAÇÃO
pelo prazo de 120 a 360 dias, se praticada por qualquer outra
pessoa natural submetida a este Código, além de multa, de R$ 100
a R$ 100 mil. (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

•O que diz a Lei 9.615/98 (Lei Pelé)?


Artigo 2º: estipula o desporto, como direito individual, tem como
base os princípios democratização, garantido em condições de
acesso às atividades desportivas sem quaisquer distinções ou
formas de discriminação.

•O que diz o Regulamento Geral das Competições da CBF?


Artigo 1º: as competições nacionais oficiais do futebol brasileiro
exigem de todos os intervenientes colaborar de forma a prevenir
comportamentos antidesportivos, designadamente violência,
dopagem, corrupção, racismo, xenofobia ou qualquer outra forma
de discriminação
Art.13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no
recinto esportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em
lei (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010):

LEGISLAÇÃO
IV – não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou
outros sinais com mensagens ofensivas, inclusive de caráter
racista ou xenófobo; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).
V – não entoar cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos
(Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).

Parágrafo único. O não cumprimento das condições estabelecidas


neste artigo implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor
ao recinto esportivo, ou, se for o caso, o seu afastamento imediato
O que dizia o Estatuto de Defesa do do recinto, sem prejuízo de outras sanções administrativas, civis
ou penais eventualmente cabíveis. (Incluído pela Lei nº 12.299, de
Torcedor (Lei 10.671/2003), revogado
2010).
pela Lei Geral do Esporte (Lei nº
14.597/2023)?
•Artigo 17: Qualquer jogador ou oficial que insulte ou atente contra
a dignidade humana de outra pessoa ou grupo de pessoas, por
qualquer meio, por motivos de cor de pele, raça, sexo ou
orientação sexual, etnia, idioma, credo ou origem, será suspenso
por um mínimo de cinco jogos ou por um período de tempo

LEGISLAÇÃO
mínimo de dois meses.

•Qualquer Associação Membro ou clube cujos torcedores insultem


ou atentem contra a dignidade humana de outra pessoa ou grupo
de pessoas, por qualquer meio, por motivos de cor de pele, raça,
sexo ou orientação sexual, etnia, idioma, credo ou origem, será
sancionada com uma multa mínima de cem mil dólares
americanos (USD 100.000). Da mesma forma, o Órgão Judicial
competente poderá impor a sanção de jogar um ou vários jogos à
porta fechada ou o fechamento parcial do estádio.

O que diz a Conmebol no •Se as circunstâncias particulares do caso requerem, o Órgão


seu regulamento da Judicial competente poderá impor sanções adicionais à Associação
Libertadores da América? Membro ou ao clube, jogador ou oficial responsável.
•Se proíbe qualquer forma de propaganda de ideologia antes,
durante e depois da partida. Aos infratores dessa disposição, serão
de aplicação as sanções previstas nos pontos 1 ao 3 desse mesmo
artigo
•A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj)
aprovou em 06/06/2023 medidas contra o racismo nos estádios de
futebol e a concessão da Medalha Tiradentes, maior honraria do
Parlamento Fluminense, para o jogador Vini Jr.

LEGISLAÇÃO
•Essas ações fazem parte de uma mobilização de diversos
deputados da Casa, de diferentes matizes ideológicas, após a onda
sucessiva de ataques racistas contra o atacante da seleção
brasileira em partidas na Europa. Com isso, a Alerj tornou-se a
primeira casa legislativa do país a aprovar projetos de combate ao
racismo nos estádios.

•Entre as medidas aprovadas, está a Política Estadual Vini Jr de


Combate ao Racismo nos Estádios e Arenas Esportivas, proposta
no Projeto de Lei 1.112/23, e aprovada em regime de urgência. A
proposta prevê que as partidas poderão ser interrompidas quando
ALERJ APROVA MEDALHA houver qualquer denúncia ou manifestação racista. A interrupção
TIRADENTES PARA VINI JR E durará o tempo que o organizador do evento ou o delegado da
PROJETOS CONTRA RACISMO NOS partida julgar necessário e enquanto não cessarem as atitudes
ESTÁDIOS reconhecidamente racistas. Em caso de atos praticados por grupos
ou de forma reincidente, o jogo poderá ser encerrado.
•A publicação dessa Lei unifica todas as normas do esporte
brasileiro em um único dispositivo. Com isso, ficam revogadas
outras normas, como o Estatuto do Torcedor. Essa norma
estabelece os parâmetros gerais do esporte, o que não afasta leis
específicas, salvo se tivesse revogado expressamente.

•Artigo 11, XVII: O planejamento, a formulação, a implementação e

LEGISLAÇÃO
a avaliação de políticas públicas, de programas e de ações para o
esporte, nas diferentes esferas governamentais, realizam-se por
meio do Sistema Nacional do Esporte (Sinesp), sistema
descentralizado, democrático e participativo, que tem por
objetivos adotar as medidas necessárias para erradicar ou reduzir
as manifestações antiesportivas, como a violência, a corrupção, o
racismo, a xenofobia, a homofobia, o sexismo e qualquer outra
forma de discriminação, o uso de substâncias ilegais e os métodos
tipificáveis como dopagem.

•Artigo 201: Promover tumulto, praticar ou incitar a violência ou


Lei Geral do Esporte: Lei nº 14.597, de invadir local restrito aos competidores ou aos árbitros e seus
14 de junho de 2023. auxiliares em eventos esportivos: Pena - reclusão, de 1 (um) a 2
(dois) anos, e multa. § 7º As penalidades previstas neste artigo
serão aplicadas em dobro quando se tratar de casos de racismo no
esporte brasileiro ou de infrações cometidas contra as mulheres.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
CONSIDERAÇÕES
Reconhecer o problema é o primeiro passo para combatê-lo, e este
reconhecimento passa por quebrar a invisibilidade dos atos
discriminatórios.

Há racismo e discriminação no futebol porque infelizmente ainda


vivemos numa sociedade racista, sexista, homofóbica e violenta, como

FINAIS
demonstram situações cotidianas frequentemente noticiadas:
discriminação racial em prédios residenciais; abordagens
discriminatórias, humilhações e abusos; crimes de feminicídio e
correlatos; práticas excludentes e assédios no acesso ao emprego ou
no exercício profissional; maus tratos e acusações injustificáveis
devido ao preconceito; intolerância à diversidade de costumes e de
manifestações culturais, etc.

O futebol tem a responsabilidade de ser instrumento para mudar isso,


e não simplesmente um agente passivo dos processos históricos e
socioculturais que conduzem aos mecanismos de opressão, violação
Por um futebol e uma sociedade de direitos e violência. O futebol é também, e sobretudo, um
modelador da sociedade, que precisa evoluir.
antirracista
CONSIDERAÇÕES
É por isso que a CBF, as Federações e os Clubes, sensibilizados pelos
recentes episódios de discriminação e violência no futebol, assinaram
no dia 07 de março de 2022 o “Manifesto pelo Futebol e pela Vida”,
reafirmando o compromisso de trabalharem em conjunto e harmonia
para que o futebol se transforme, definitivamente, em uma referência
de boas práticas para a sociedade.

Na legislação brasileira, o racismo é crime inafiançável. No futebol não

FINAIS
deve ser diferente. Por isto entendemos que os episódios de
discriminação devem ser denunciados, investigados e, quando
confirmados, punidos com rigor, como atos racistas legítimos.
Defendemos a inclusão de punições esportivas severas aos envolvidos
em episódios de violência, racismo e discriminação no futebol.
Sanções pecuniárias não bastam!

A sociedade brasileira de hoje é menos racista que no passado


porque, por meio do futebol os jogadores e equipes brasileiras
subverteram, ao menos parcialmente, a lógica do racismo imposta
pelo colonialismo séculos atrás. Isso mostra que, se assim o
Por um futebol e uma sociedade quisermos, podemos fazer do futebol uma importante ferramenta
antirracista antirracista. A luta deve ser de todos, e a CBF não se eximirá de seu
papel.
FONTE
O conteúdo que subsidiou o presente trabalho foi embasado em
dados e estatísticas do Observatório da Discriminação Racial no
Futebol, projeto parceiro da CBF e que acredita no futebol como um
importante instrumento de inclusão social e de luta contra a violência

FONTE
e a discriminação racial.

Idealizado com o objetivo de monitorar, acompanhar e noticiar os


casos de racismo no futebol brasileiro, assim como divulgar e
desenvolver ações informativas e educacionais que visem erradicar
essa praga que tanto macula a sociedade nacional, o Observatório
tem se tornado uma ferramenta de consulta para pesquisas
acadêmicas, imprensa e público no geral, interessados no debate e
construção do conhecimento.

Com o monitoramento dos casos, foi possível lançar anualmente o


Observatório da Discriminação Racial Relatório da Discriminação Racial, que hoje já não fala apenas de
no Futebol casos com ocorrência no futebol, mas também relata casos em outros
esportes que envolvam atletas brasileiros, assim como outras formas
de preconceito e discriminação como machismo, lgbtfobia e
xenofobia.

Disponível em: https://observatorioracialfutebol.com.br/


Dossiê apresentado à disciplina: A Democracia e Cidadania e o Racismo Estrutural
como Questões Estruturante das Políticas Públicas no Brasil : Proteção dos Direitos
Difusos, Combate à Desigualdade e Acesso à Justiça

Professor: Nelson Saule Junior

Alunas:
Letícia R. Anézio RA 00330528
Melissa Pimentel RA 00330495

Mestrado em Direito - Puc / São Paulo


2023

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