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Castonla Roosewd Ins. (coord Ries Gwe. — , npinus , 4971 PREFACIO Rubem A, Alves Lembrate, antes que cheguem os maus diss, se rompao fio de pats, se despedace 9 cope de ouro, se quebre o entaro junto & fone, © 3e desfaca roa junto pogo. Eclesiates 12,18 A la esté chia de rituais para exorcizar a Morte. Agora, {quando essrevo, dix 3 de janeto de 1991, acabantos de pastas por dois dels, B claro ie nio ies damos este nome, pois 0 seu sucesso depen de que 0 Nome Terivel nao seja ouvio, Para it se faz uma Barina enorme de sinos, foros de artifiio, densa, rsos, muita comida, & alegria engarrafada.. E tudo isso sO parm que a vor Dela alo sje ‘ava... Natal no sto? Nao existe uma tristeza sola no ar? O estonge ssespevado de repetir um passado, fazer com qu ele aconteva de nove? Encontesi, certs vez, numa loja nos Estados Unides, um pacotinho de {rv95 temperos mim saquinho’ de plistico com o some: perfrnes de Natal”. Tem de ser aquelescheios antigo, de infincla, Ay misieas ‘ovas nto servem, ¢ preciso que as mesmas dos out7os tempos jam santadas de novo. E que hala.o mesmo rebulgo, os mesos Boloe ee ‘mesmas frutas. Prepara-se a repetiio do passado, para se tera isde de que o tempo nao passou. Melhor oiacbmod da covers eda resaea do que a dor de ouvir © que Fla esd slenciostentediendo: "E, mae wail tempo pasion, Nio pode ser recuperao. Voo8 est passand Pensa ol mato. O Natal i muito. Esalmios da depesao da peda yor mdo de um culro ital, Te imaginar qu ¢ tempo paeou, Que aia, £ um novo fmpo que wm. Ha mito tempo 4 espera. "Fe ‘Ano Novo!" Ey no ena, & tudo mena, Cero est o poet Masoque es niofui, ogee cunto fiz, oa nem seqeroahel que so agora veo que deveia ef, © ue so agora caramente vjo que deveia ter sido Iso ¢ que e moro para ale de sods os Deus. Pode sez que para out mundo eu psa levar oe snbel Mas poder! eu levar pert outro mndo'© que fe exquse de sonar? Ese, t,o sonhos por have, 6 que to 0 cadve. Enteio-o ao meu corso para sempre, prs todo 9 mp0, para todo o une. (Alvaro de Campos, Poesia, "Na toe ere") io, mio, a Morte ndo € algo que nos espera no fi. # companheia senoxa que fal com Yor branda, sem quer 208 Sterorzar, diando tempee « verdade © nos convidando a sabedora deve. © que ta diz? Cosas assim “Bonito 0 crepsculo, no? Veja as cores, come sto lindas © sfémeras. NSO Seropetdo jams. Endo ba formas de segurls. Int rar uma foto. A foto sera sempre a memria de algo que deixou deer Bena tseza que a Delera da? Tver porgue Oe sea como © ereisculo.. E press vivero instante, Nao € posse colocar a vida tua cademia de poxpanca.” “soc sabe que horas lo? Est lando fio. as cores do coutono? Patee ue @ vernal chepando.” "0 que & que woot et siperanda? Como sa vids ainda nto tives comeyao. Como se Yt envene caper de algum evento fi rai mararo nko rela oa id formar, cary ena ce fl Separar da mulher ou do mardo, dscobrir 0 verdaceio amor, feat rico, aposeatar.. Como to sens nsanes presents fssem proves, prepaatris. Naseer sto ncn ses gue xe. “Eta mince que voce eta dangando? de sua autora? ‘01 éum Outro que tos, ¢voee dane? Quem &exte Osc? Lembrese so que dite 0 pow “Sou 9 nena eve o me develo © aqua qe ‘08 dejo dos outros faeram de mim’ Ma, te Y0c8 t,o ineralo, ‘vost jé mora. Acorde! Resse” Aranda fala da Morte nlo nos ateroriza or nos falar da 0s aterorza por nos falar da Vida, Ne verdad, Morte Morte. 2 ‘muna fla sobre si mesma, Fla sempre nos Fala sobre aquilo que estamos fazendo com a propria Vida, a8 prdas, os soahos que ndo soahamos, ‘of riseos que nie tomames (por mo), or mids lentos que perpetamon, cop tambetsats qu rope 0 fo de rat se dnsdae Uma das cansdes mais belas do Chico ev munca auvi tocada tno ri, Tenho perguntado, © poses gente @ conhece: Descoatie, Dorgue cia és mansasabederia da Morte, que ninguéar quer ouvits Diz assim: '“O velho sem conslhos, de joehon, de para, earega com ‘arteza todo o peso de sua vida. Ento eu ne perguno sobre 0 amr, AA vida itera, diz que se guardou do carnaval, da brincadeira que ce ‘fo brincou... E agora, velho, o que # que eu digo a0 povo? O que € ‘que tem de novo pra dezar? Nada, 80 a eaminhade, longa, pra nea, lugar...O vetho, de partida, dena a vida sem saudades, sem divide, sem. saldo, sem rival ou amizade, Entdo eu Ihe pergunto pelo amor. Ele ine diz que sempre se escondeu, nfo se comprometet nem munca se entregou... E agora, vlho, que € que eu digo ao povo? O que é que tem de novo pra devear? Nada. Eu vejo a triste estrada aonde um dia eo vou parar. O velho vaise agora, valve embora sem bagagern. No sabe bra que io, fo passeio, fot passagem. Entdo eu Ihe pergunto pelo famor... Ele me ¢ franco, Mostra ut verso mano dumm calerno em branco ave ise fecou. B ago, velho, 0 que é que eu digo ao pove? O ue é que tem de novo pra deixar? Nao. Foi sudo escito em Wao. eeu the pogo perddo mas ndo vou lasina.." Pate at que 0 CUO © 0 Jonge Luis Borges entra de acordo, pols este ecreven cost ‘muito pareida: “instants: Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na proxima tratara de cometer mais erros_Nio tentaria set (20 perfit. Relaxaria mais. Seria mais tolo ainda do que tenho sido. Na verdade, bem poucas coisas levara a sdio. Seria até mos higetico. Correia mais isos, vajaria mals, coatemplaria mals entardecetcs, Subiria mals montanhias, nadaia mais ios. leita lugares onde nunca fu, tomaria mais sorvete e menos sopa. Tria mais problemas reais menos problemas imasindrios. Eu fu una deste pessoas que vived smmsata © proctivamente cada minuto de sus vids, Eu era uina estas Dessous que munca la'a parte alguma som um termOmeto, uma balsa ste gua quent um guarda-chuva e um para-queda. Se vltateaviver, Viajaria mais leve. Se eu pudesse volar a vier, comecaria a andar descalpo no comezo da primavera © continearia asim ate 0 fim do ‘ntono, Dara mai volias na minha rua, contemplria mal amanheceres « brinearia com mais riangas, se ivesseeutra vez wma vida pela fente ‘Mas, Ja vcam, tenho 85 anos e sei que estou morrendo." Et Embora a gente nfo saiba, a Morte fala coma voe do poeta Porque ele que as dua, a Vida ea More, encontean se reconsiladan, b 7 ‘onversam tima com a outra ¢ desta conversa surge a Beleza. Agora, fo gue a Beleza ago suporta¢ 0 falatrio, a corer... Bla nos convida templar a nossa propria verdade, Eo quecla nor di €simplesmente Sto: "Veja a vida. Nio ht tempo para perder. E preciso vier agora! [Nao se pode detsar 0 amor para depots. CARPE DIEM Foi eta 4 primeira lig do profesor de litratura no filme sociedade dos poets morios. CARPE DIEM. agate 0 da! E 0 efeto de {al revelasio poetca,nascida da teconelacao da Vida com a Morte, € lima incontrolavelexplsto de Hberdade. x6 to que nos dt coragem para amebentat a mortalha com que os desejos dos outros nos ensolam 2 rnumiica. ‘Five um amigo, Hans Hockendijk, um holandés que estve prisioneito num campo’ de conventraeso alemdo. Contoume de sua ‘experincia com a mort. A guerra ja chegava 20 fim, ¢ os pisioneis compantavam num radio clandetino 9 avaneo das tropas abadas © 5 Tac o ellulo dos dia que os separavam da Uberdade. At que o omandant da prsio reoniy a tedos no patio « informou que, antes fa libertagto, todos seriam enforcados. "Fol um grto de lamenayto ‘horror. seguda da mais extraordinariaexperincia de liberdade que Jamais tive em miiba vida" de dite. "'Se von morrer dentro de dois dis, eatio nada mat imperta. Nao hé sentido em me guardar, nfo Id cenico em ser pradente. Nao preciso pretender ser outa coisa do ‘ue sou, Poss vier 4 minha verdad, pois nada pode me acontecr. ‘to preceo de mascaras. Tenho # permissdo para a honestdade total. Posso ir ao guard nacists, que tampre me aterorizou, dizer a cle tudo o que sinto petso.~. Que € que ce pode me fazer? Posso i até ‘agucamilher que sempre ame mas Ge quem nuica me aprox! (afnal, la estava com o marido, e naqueles tempos isto era levado em “onsideragio,.) epeirlicenca ao mari para confessar os entmentos. Pomeo der tudo. 0 que snto mas que nunca me atvevi a dizer, por redo" E me contou dest experiencia fantasica de Iberdade e verdade fue se tem quando se eth pendurado sobre o abismo. A Morte tem 0 poder de colocar todas ax coisas nos sens dvidos lugares. Longe do sea Slhar, somos prisoners do othar dot outros, e calmos na armaditha fas seas desejos. Deixamos de ser 0 que somos, para ser 0 qu cles fssejam que sjames, Diante da Morte, tado se torna repentinamente Duro. Nio hi lugar para mentras. E agente se deftonta entdo com a ‘erdade, aqilo que realmente importa, Para ter acesso 4 nostaVerdade, para ouvir de novo a voz do Deseo mis profunde, ¢ preciso tornar-s& lim dseipulo da Marte. Pos ela s nos dies de Vid se aacolhermos ‘como amiga “A morte ¢ nossa eterna companheira””-— data D. Juan, © bruno. “Fa se encontra sempre nossa esquerda, ao aleance do braco la nos otha sempre, até o dia em que nos Toes. Como & possivel a alguém sentirse important, sabendo que a more o contempla? 0 que ‘ose deve fazer, ao se sear impacente coe alguma coisa, € volta se para a sua esquerdae peat que sta morte 0 aconsthe. Estamos chee Gelixo! E a morte ¢ a Gai conseheira que temos, Sempre que vose 5 sentir, como acontece sempre, que tudo est indo de mal a plot © ‘que voce Se encontra 2 ponto de ser sniguilado, volese para 2 503 ‘ortee Ihe pergunte sesso € verdade. Sua morte the dir que voc ex ferrado, que nada realmente importa, fora do seu toque, Fla The irk? “hinds nfo o toqus'. Alguém tom de mudar, e depress. Alguém tem de aprender que a morte € uma eagadora e que ela se encontra sempre ‘anosa esquerda, Alguem tem de pedi oconslno da morte abandonar ‘4 maldita mesquinharia que prtence aos homens que vivem suas vias omo sea morte nunca fost baer no seu oath.” Houve um tempo em que nosso poder perante a Morte era ‘muito pequeno. E, por isso, os homens ¢ as mulheres dedicavam-se ‘ir a'ua vor e podiam forna-sesibios na arte deviver. Hoe, nosso poder aumetou, & Mote fo! Uefinida como a inimiga a ser derrotad, omos posiuidos pela fantasia onpotente de ns livrarmos de et oa, Com iso, nds nos tornamos sucos ds figher que ela pode nos ensina Ernos encontrames diane do perigo de que, quanto mis poderosos forms peaatc cla Gauilaente, porque v6 podemos aia.) mals los ros tornamos na arte de viver”F, quando iso acontece, 2 Morte que poderia ser conseleira sib transforma-se em inimies gue ros devora por detras. Acho que, para reeuperar tm pou da sabsdoria de vive, Seria precio que nos tornssemor dissipulos eno inimigos da Morte. ‘Mas, para isso, seria preciso abrir espago em nossas vides para ouvir a sua vor. Seria preciso que votésemos le os poeta...

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