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Capítulo 20

CHOQUE - ABORDAGEM NA
EMERGÊNCIA

EDUARDA MIRANDA PEIXOTO1


NICOLE MIRANDA LEMES1
BRANCA LOPES DA SILVA GUEDES2
MARCUS ALEXANDRE SÁ PEIXOTO3

1. Discente do curso de medicina da faculdade Centro Universitário Governador Ozanam Coelhos/


UNIFAGOC, Ubá, Minas Gerais, Brasil.
2. Discente do curso de medicina da faculdade Centro Universitário Presidente Antônio
Carlos/UNIPAC-JF, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil.
3. Discente do curso de medicina da Universidade Federal de Ouro Preto/ UFOP, Ouro Preto,
Minas Gerais, Brasil.

Palavras Chave: Emergência pediátrica; Baixo débito; Suporte hemodinâmico.

10.29327/569733.3-20 147 | P á g i n a
INTRODUÇÃO fazendo vasoconstrição aumenta a pré-carga, di-
recionando o sangue para o coração, aumen-
Quando ocorre alteração na função celular tando contratilidade cardíaca (MANÇANEIRA,
de metabolismo aeróbico para anaeróbico, tere- 2018).
mos o estado de choque. Esta é uma situação clí- Vale lembrar, que o aumento da resistência
nica potencialmente crítica, caracterizada por vascular sistêmica (RVS), mantem a pressão ar-
uma oferta inadequada de oxigênio a nível celu- terial limítrofe em alguns casos, mesmo com
lar, para satisfazer as demandas metabólicas do uma diminuição do débito cardíaco (DC), pois a
organismo (MANÇANEIRA, 2018). pressão arterial é determinada pelo DC e pela
O desequilíbrio entre oferta de oxigênio e RVS. Com isso, choque não necessariamente re-
demanda, leva ao estado anaeróbico, resultando quer a presença de hipotensão. O choque pode
em acúmulo de ácido lático, um indicador de estar presente com pressão arterial normal, au-
ineficiência do sistema circulatório (MANÇA- mentada ou diminuída (POMERANTZ, 2022).
NEIRA, 2018). Porém, essas anormalidades rapidamente
O choque se desenvolve, como resultado de tornam-se irreversíveis e resultam sequencial-
condições que causam diminuição e distribuição mente em morte celular, lesão de órgão alvo, fa-
anormal do volume intracelular ou função car- lência de múltiplos órgãos e parada cardiorres-
diovascular prejudicada. Situações como febre, piratória, sendo necessário identificação e ma-
infecção, lesão, desconforto respiratório e dor, nejo precoce. (POMERANTZ, 2022).
também pode levar ao quadro de choque, por
elevarem a demanda dos tecidos por O2 e nutri- Identificação do choque, metas
entes (PALS, 2017). clínicas e estabilização inicial
Nas etapas iniciais do choque, com o au-
mento da frequência cardíaca e da elevação da Um dos estágios do choque é em relação ao
contratilidade cardíaca, o organismo consegue seu efeito sobre a pressão arterial, podendo ser
compensar o quadro, mantendo perfusão para os um choque compensado, hipotensivo ou irrever-
órgãos nobre. Além disso, o sistema nervoso sível. E outra forma de classificação do choque
simpático realiza vasoconstrição periférica e é em relação a sua etiologia, incluindo, hipovo-
meios adicionais para obtenção de energia, lêmico, obstrutivo, cardiogênico e distributivo,
como a glicólise hepática e a lipólise, tornando- que será discutido posteriormente (POME-
se fonte de energia para as células (WALTZ- RANTZ, 2022).
MAN, 2021). Choque compensado e hipotensivo
Como mencionado, uma das variáveis que o
nosso corpo consegue remanejar para manter a Choque compensado se trata da existência
perfusão é o débito cardíaco, este é o produto do completa e funcional da pressão arterial, com a
volume sistólico pela frequência cardíaca. Com presença de sinais de perfusão tecidual inade-
isso, a taquicardia é um sinal precoce de choque quada como tempo de reperfusão aumentado,
(POMERANTZ, 2022). pele fria, em crianças com choque compensado,
Outra variável é o volume sistólico e este é vale ressaltar, que esse achado também pode ser
compreendido pela pré-carga, contratilidade influenciado pela temperatura ambiente (PALS,
cardíaca e pós-carga. O sistema simpático atua 2017).
diretamente na melhora desse parâmetro, pois
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A frequência cardíaca é inicialmente au- Durante esta fase, os mecanismos compen-
mentada. Sinais de vasoconstrição periférica satórios são sobrecarregados. Sinais e sintomas
(como pele fria, pulsos periféricos diminuídos e de disfunção orgânica (como estado mental al-
oligúria) podem ser observados à medida que a terado, sendo resultado de má perfusão cerebral)
perfusão fica ainda mais comprometida (PO- aparecem. A pressão arterial sistólica cai, em-
MERANTZ, 2022). bora as crianças que perderam até 30 a 35 por
Por outro lado, no choque descompen- cento do volume de sangue circulante normal-
sado/hipotensivo os sinais de choque se asso- mente podem manter a pressão arterial sistólica
ciam à hipotensão arterial sistólica (PALS, normal (MANÇANEIRA, 2018).
2017). Abaixo na Tabela 20.1 seguem os É importante salientar que, em crianças, a
valores de referência pediátricos da frequência hipotensão é um sinal tardio e súbito de descom-
cardíaca normal, já na Tabela 20.2 seguem os pensação cardiovascular. Portanto, a pressão ar-
valores de referência pediátricos da pressão terial não é um bom indicador da homeostase
arterial para delimitar a hipotensão. cardiovascular nesses pacientes (CARLOTTI,
2012).
Tabela 20.1 Valores de frequencia cardíaca normal em
batimentos por minuto (bpm) de acordo com a idade Identificação geral do choque
(média +- 2 desvios-padrão).
Na maioria das crianças os choques se ca-
Idade Fc (bpm) / +- 2 desvios-padrao racterizam por debito cardíaco (DC) baixo,
Recém-nascido 140 +- 50 mesmo que algumas formas possam ter DC ele-
vado (sepse, anemia grave). Todas as formas de
1-6 meses 130 +- 50
choque podem comprometer as seguintes funci-
6-12 meses 115 +- 40
onabilidades vitais: cerebrais, com alteração do
1-2 anos 110 +- 40
estado de consciência (irritabilidade, agitação,
2-6 anos 105 +- 35 letargia e coma), hipotonia, crises convulsivas e
6-10 95 +- 30 alterações pupilares e renais (baixo débito uri-
>10 anos 85 +- 30 nário, filtração ineficaz) (CARLOTTI, 2012).
Condições como febre, infecção, lesão e an-
Fonte: Adaptado de Pediatric Advanced Life Support
Provider Manual, 2017. gústia respiratória podem contribuir para o cho-
que, através do aumento da demanda tecidual de
Tabela 20.2 Definição de hipotensão pelos limites de oxigênio e nutrientes (PALS, 2017).
pressão arterial sistólica (mmHg) de acordo com a idade. A avaliação clínica cuidadosa é essencial
Pressão arterial para a identificação genuína do choque, de-
Idade
Sistólica (mmHg) vendo-se estar atento às alterações da frequência
Recém-nascidos a cardíaca e da pressão arterial, e aos sinais de hi-
< 60
termo (0-28 dias)
Lactentes (1-12 meses) < 70
poperfusão tecidual. Ressalta-se que a taquicar-
Crianças 1-10 anos < 70 + (2x idade em anos) dia sinusal é um sinal inespecífico de compro-
>10 anos < 90 metimento circulatório, pois pode ocorrer em
várias situações de estresse (dor, ansiedade e fe-
Fonte: Adaptado de Pediatric Advanced Life Support
Provider Manual, 2017.
bre) (CARLOTTI, 2012).

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As crianças doentes e sob estresse apresen- Figura 20.1: Via de saída da aorta; →: válvula mitral;
tam frequentemente aumento da pressão arte- VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo; AE:
átrio esquerdo.
rial. Portanto, a pressão arterial no limite infe-
rior da normalidade pode ser inapropriada para
uma criança gravemente doente (SOUZA &
FORONDA, 2020).
A diminuição da perfusão sistêmica se inicia
nas extremidades, com diminuição e desapare-
cimento dos pulsos periféricos, e progride em
direção ao tronco, com enfraquecimento dos
pulsos centrais. A pressão de pulso é a diferença
entre a pressão arterial sistólica e a diastólica
(WALTZMAN, 2022).
O desaparecimento dos pulsos centrais é um
sinal pré-mórbido que indica a necessidade de
Fonte: Arquivo de imagens da autora.
intervenção muito rápida para evitar parada car-
díaca. A diminuição da perfusão cutânea é um
Nos pacientes em choque, é possível obser-
sinal precoce de choque. Normalmente, as mãos
var, no ecocardiograma, um padrão hiperdinâ-
e os pés encontram-se aquecidos e corados
mico, que consiste em taquicardia com variação
(WALTZMAN, 2022).
no tamanho do VE visualmente normal
Ultrassonografia Point-Of-Care no (SOUZA & FORONDA, 2020).
Para a detecção de derrame pericárdico, a
Choque
janela mais utilizada é a chamada de subxifoide
As modalidades de Pocus no choque envol- ou subcostal. O derrame aparece como uma
vem o ecocardiograma focado para emergência estrutura anecoica, portanto de cor preta, ao
e a avaliação do diâmetro da veia cava inferior redor do coração. No contexto do paciente hipo-
(VCI). O ecocardiograma, realizado pelo mé- tenso, a presença de derrame pericárdico levanta
dico que conduz o paciente crítico, objetiva ava- a possibilidade de tamponamento cardíaco
liar qualitativamente a função do ventrículo es- como causa do choque (ZAMPERLINI, 2022).
querdo (VE) e identificar o derrame pericárdico, O tamponamento ocorre quando o derrame
caso o tamponamento cardíaco seja a causa do pericárdico reduz a complacência das câmaras
choque (SOUZA & FORONDA, 2020). cardíacas, levando à diminuição do retorno ve-
Ambas as informações podem ser determi- noso, do débito cardíaco DC e da pressão arte-
nantes para guiar o tratamento do paciente. Uma rial. Nessa situação clínica, o ventrículo direito
das formas mais usadas para estimar a função do VD câmara que funciona em regime de menor
VE é a obtenção de uma janela cardíaca, cha- pressão, sofre mais precocemente os efeitos da
mada de para-esternal eixo longo, como de- compressão externa pelo líquido (ZAMPER-
monstrado na Figura 20.1 (ZAMPERLINI, LINI, 2022).
2022).

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A ausência de derrame pericárdico a USG posta basicamente por: oximetria de pulso; me-
exclui a possibilidade de tamponamento cardí- didas de PA, acompanhamento do monitor car-
aco como causa do choque (SOUZA & FO- díaco, verificação de glicemia capilar, calcemia,
RONDA, 2020). controle da temperatura e da diurese (MANÇA-
NEIRA, 2018).
Estabilização inicial
Choque hipovolêmico
Para o manejo inicial de crianças com cho-
que, além do choque obstrutivo, que são cuida- O choque hipovolêmico pode ser definido
das em um ambiente com capacidade de cui- por um volume intravascular sanguíneo insufi-
dado crítico, sugere-se a terapia-alvo usando ob- ciente que como consequência tem a redução da
jetivos fisiológicos e clínicos, incluindo pulsos pré-carga e diminuição do volume sistólico.
centrais e periféricos, tempo de enchimento ca- Esse mecanismo gera uma baixa oxigenação dos
pilar, estado mental, pressão arterial e débito tecidos prejudicando a função primária do sis-
urinário (WALTZMAN, 2022). tema cardiovascular que é fornecer oxigênio e
A avaliação rápida deve determinar preco- outros substrato para as células. A resposta com-
cemente a presença e o tipo de choque possível. pensatória a esse sistema é observada pelos sin-
Manejo inicial deve focar na ressuscitação de tomas de baixo débito que o paciente poderá
fluídos com solução cristaloide isotônica ade- apresentar diante do quadro: a taquicardia, o au-
quada ao tipo de choque e terapias farmacológi- mento da resistência vascular periférica e o au-
cas específicas, conforme indicado, uma vez mento da contratilidade cardíaca (MCKIER-
identificada a etiologia do choque (WALTZ- NAN & LIEBERMAN, 2005).
MAN, 2022). A causa mais comum de choque em crianças
As intervenções devem ser administradas é o hipovolêmico. Esse choque pode estar asso-
em rápida sequência, com avaliação de indica- ciado a muitas causas: diarreia, vômitos, hemor-
dores fisiológicos antes e depois de cada inter- ragias, ingesta insuficiente de fluídos, diurese
venção (WALTZMAN, 2022). osmótica (cetoacidose diabética), perdas para o
O cronograma ideal para o manejo inicial do terceiro espaço, queimaduras (POMERANTZ,
choque em crianças é incerto e pode ser inalcan- 2022).
çável na prática clínica, dependendo dos fatores Dessa maneira, o seu diagnóstico pode ser
e configuração. realizado de acordo com o sinal clínico do paci-
Os objetivos da primeira hora de tratamento ente e uma anamnese detalhada. Dentre os sinais
do choque são: garantir a ventilação e a oxige- e sintomas podemos encontrar sinais de desidra-
nação, manter circulação eficaz, com normali- tação, como fontanela deprimida, olhos fundos,
zação da FC e da perfusão periférica, reestabe- perda do turgor da pele; mecanismos compensa-
lecer a diurese e o nível de consciência ade- tórios a hipovolemia como taquicardia e au-
quado (MANÇANEIRA, 2018). mento da pressão arterial; entre outros sinais de
Todo paciente com quadro de choque deve hipovolemia como diminuição da pressão de
ser colocado em leito de emergência, monito- pulso, tempo de enchimento capilar prolongado,
rado e puncionado (pelo menos, um acesso ve- pele fria, alteração do estado mental e oligúria.
noso periférico). A monitoração deve ser com- A hipotensão pode estar presente em quadros de
choque descompensado, ela ocorre geralmente

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com perdas de mais de 30% do volume sanguí- A angiografia pulmonar, fornece imagem de
neo circulante (PALS, 2017). diagnóstico definitiva para embolia pulmonar
A abordagem do choque hipovolêmico pode (PE), mas só deve ser realizada em pacientes
ser realizada com ressuscitação fluída vigorosa, que respondem ao tratamento inicial de choque
restaurando a perfusão e prevenindo danos em (oxigenação, ressuscitação de fluido intrave-
órgãos-alvo. Dessa maneira é necessário para o noso e suporte vasopressor) (WALTZMAN,
sucesso do manejo em crianças com possível 2022).
choque hemorrágico traumático, realizar a imo- Em pacientes que permanecem instáveis
bilização da coluna cervical, até que uma fratura apesar da ressuscitação adequada e em que a
de coluna seja descartada; o manejo da via aérea suspeita de EP é alta, o teste definitivo é típica-
com oxigênio suplementar e o acesso vascular mente considerado inseguro. A ultrassonografia
adequado deve ser obtido para infusão rápida de transtorácica ou transesofágica de cabeceira
fluido. A ressuscitação volêmica inclui a admi- pode ser usada nesses pacientes para estabelecer
nistração de cristaloides isotônicos em bólus de um diagnóstico presuntivo de EP e usada para
20 mL/kg, seguida de avaliação dos indicadores justificar a administração da terapia trombolí-
fisiológicos de perfusão periférica (pressão arte- tica (WALTZMAN, 2022).
rial, qualidade dos pulsos centrais e periféricos, O tratamento específico deriva de determi-
perfusão cutânea, estado mental e débito uriná- nadas condições, (tamponamento cardíaco, ten-
rio). As crianças que não melhoraram após re- são do tórax por pneumotórax, lesões cardíacas
ceber um total de 60 mL/kg de fluido isotônico congênitas dependentes do canal arterial, embo-
devem ser avaliadas quanto à perda contínua de lismo pulmonar maciço), como:
sangue ou outras causas de choque (POME- • Dependente do Canal Arterial (obstru-
RANTZ, 2022). ção da via de saída do VL): - Prostaglan-
dina E¹, - Consultar um especialista.
Choque obstrutivo
• Tensão do tórax por pneumotórax: -
Trata-se do aumento da resistência vascular Descompressão por agulha, - Toraco-
causada por condições como doença cardíaca centese com tubo.
congênita com lesões ductais dependentes (por • Tamponamento cardíaco: - Pericardio-
exemplo, coração esquerdo hipoplásico) ou con- centese, - Bolus de 20 mL/kg SSN/LR.
dições obstrutivas adquiridas (por exemplo, • Embolia Pulmonar: - Bolus de 20 mL/kg
pneumotórax, tamponamento cardíaco ou em- NS/LR, repetir conforme a necessidade,
bolia pulmonar maciça) (WALTZMAN, 2022). -Considere trombolíticos, anticoagulan-
Embora a radiografia ou tomografia compu- tes, - Consultar um especialista (PALS,
tadorizada do tórax possam ser ferramentas para 2017).
auxiliar em diagnóstico, sempre que possível, Tratamento Específico do Tamponamento
pneumotórax hipertensivo e hemotórax devem Cardíaco: crianças com tamponamento cardíaco
ser identificados clinicamente ou por ultrasso- podem melhorar temporariamente com a admi-
nografia de emergência e rapidamente tratados nistração de fluidos para aumentar o débito car-
pela descompressão por agulha, seguida de to- díaco e a perfusão dos tecidos até ser possível
racocentese para inserção de tubo torácico realizar uma drenagem pericárdica. A drenagem
(WALTZMAN,2022).

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pericárdica eletiva (pericardiocentese), frequen- pelo músculo cardíaco, causando um menor dé-
temente orientada por ECO ou fluoroscopia, bito cardíaco, que consequentemente o corpo
deve ser realizada por especialistas treinados e tentando voltar para sua homeostase aumenta a
com habilidade para respectivo procedimento. frequência cardíaca assim como na pós carga do
A pericardiocentese de urgência também poderá ventrículo esquerdo e aumenta a resistência dos
ser realizada em caso de parada cardiorrespira- vasos para priorizar a perfusão de órgãos vitais.
tória sem pulso iminente ou real, quando houver Mesmo não estando com hipovolemia a princí-
forte suspeita de tamponamento (PALS, 2017). pio (somente se tiver outra causa associada), o
Tratamento Específico de Pneumotórax hi- rim reduz a filtração em uma tentativa de au-
pertensivo: deve especificamente ser identifi- mentar o débito cardíaco, porém acaba gerando
cado pelo exame clínico, e o tratamento não edema pulmonar. Ou seja. Em uma tentativa de
deve ser retardado até a confirmação por uma manter a perfusão de órgãos nobres como cora-
radiografia de tórax. A imediata descompressão ção e cérebro, acaba prejudicando outros ór-
por agulha, seguida de toracocentese para inser- gãos, como o pulmão e uma sobrecarga no ven-
ção de tubo torácico assim que possível conti- trículo esquerdo. Além disso, é muito comum
nua sendo o Gold Standard. A descompressão que o coração também sofra com uma oxigena-
por agulha de urgência, realiza-se inserindo um ção irregular, além de aumentar o uso energé-
cateter sobre a agulha (técnica de Seldinger) de tico, ele é distribuído de forma irregular, ou seja,
calibre 18 a 20 por sobre a 3ª costela (2º espaço as crianças em um choque grave, ou até mesmo
intercostal) da criança, na linha média clavicu- em um choque sustentado pode gerar sequelas
lar. Um jato de ar é sinal de que a descompres- miocárdicas (WALTZMAN, 2022).
são por agulha foi, de fato, bem-sucedida. Isso Os sinais desse choque passam pelo apare-
indica alívio da pressão que havia se formado no cimento de esforço respiratório que em geral é
espaço pleural (PALS, 2017). decorrente do pulmão edemaciado, assim como
uma insuficiência cardíaca congestiva e cianose
Choque cardiogênico – uma vez que a saturação pode ser reduzida de-
O choque cardiogênico ocorre quando há vido a injúria no pulmão. Outros sintomas apa-
uma baixa perfusão nos tecidos corporais, como recem, porém, são comuns a todos os choques
não há sangue suficiente nestes tecidos, acaba como o aumento da frequência cardíaca, da fre-
causando também uma disfunção do músculo quência respiratória, pulsos periféricos reduzi-
cardíaco, o miocárdio. Além disso, há várias dos ou até mesmo ausentes, oligúria, rebaixa-
causas desse choque relacionadas a parte cardí- mento do nível de consciência entre outros
aca e a sua contratilidade, como uma cardiopatia (PALS, 2017).
congênita, miocardite, miocardiopatia, arrit- O tratamento deve ser criterioso em relação
mias, ou até mesmo um trauma que cause lesão a hidratação, pois se rápida e precipitada pode
ao miocárdio. Há também causas por fatores ex- acabar trazendo malefícios, aumentando o
trínsecos como a sepse e a intoxicação edema no pulmão, piorando a função cardíaca,
(PALS,2017). e dessa forma, agravando os sintomas pela pato-
A história natural desse choque provém do logia descrita. Logo a hidratação deve ser lenta,
mal funcionamento do bombeamento de sangue de 5 a 10 ml/kg de líquido isotônico feito em

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bolus, deixando correr de forma mais lenta e nervoso quando é atingido acima da sexta vérte-
sempre monitorizando o paciente para que não bra torácica, causando uma falha no sistema ner-
haja situações em que o metabolismo seja au- voso simpático, que é responsável pela vaso-
mentado, como esforço respiratório, febre, agi- constrição, aumento da frequência e débito car-
tação. As crianças e lactentes podem necessitar díaco, logo, há uma vasodilatação intensa cau-
de medicações que aumentem o débito cardíaco, sando hipotensão, mas a pressão de pulso se
melhorando a contratilidade miocárdica e dessa mantém estável, porém a frequência cardíaca se
forma reduzindo a resistência dos vasos, e dessa mantém normal ou reduzida, e sem mecanismos
forma o indivíduo possa se recuperar do choque compensatórios da hipotensão, diferenciando
cardiogênico (WALTZMAN, 2022). assim do choque hipovolêmico. Outros sinto-
mas que podem ser observados é a respiração
Choque distributivo diafragmática causada também pelo trauma
Esse choque mantém um volume sanguíneo (POMERANTZ & WEISS, 2022).
normal, porém como o nome mesmo diz a sua
Choque séptico
distribuição aos tecidos corporais é feito de
forma inadequada, causando uma má perfusão Aqui vamos abordar principalmente o cho-
visualizada principalmente no baço, um órgão que séptico, que é causado por uma resposta er-
bastante vascularizado. Algumas das formas rônea ao agente infeccioso, com alta mortali-
mais recorrentes de apresentarem esse choque é dade em crianças. É utilizado um protocolo para
através do choque séptico, anafilático e até o tratamento, que constitui em colher a hemo-
mesmo o neurogênico – cada um à sua maneira, cultura, e caso não cause atraso, em seguida ini-
causando uma vasodilatação. (POMERANTZ ciar a antibioticoterapia de acordo com a sus-
& WEISS, 2022) peita do sítio infeccioso (eles devem ser inicia-
Choque anafilático é a reação do corpo a al- dos na primeira hora). Em relação ao volume, o
gum alérgeno, como um medicamento, ali- indicado é usar cristaloides para ressuscitação
mento, entre outros, essa reação gera uma res- inicial, fazer monitorização, tendo como obje-
posta corporal em minutos ou segundos após a tivo manter a pressão arterial média entre o per-
exposição, causando sinais de ansiedade, urticá- centil 5-50 para a idade, monitorar o débito car-
rias, angioedema, que é preocupante principal- díaco/índice cardíaco, o índice da resistência
mente quando atinge a glote, podendo causar dos vasos, a saturação central venosa do oxigê-
parada respiratória. A histamina é fundamental nio e acompanhar o tratamento com os níveis de
no processo, causando uma vasodilatação sistê- lactado sérico (SBP, 2022; MARTIN & FIO-
mica, o que acaba gerando uma permeabilidade RETTO, 2021)
capilar maior com perda de líquido para o ter- Em relação as drogas vasoativas diluídas em
ceiro espaço. Outro efeito que ocorre é uma va- veia periférica no início, é recomentado inicia-
soconstrição pulmonar, o que causa um au- las somente após ressuscitação volêmica de 40
mento da pressão no lado direito do coração, e a 60 ml/kg sem retorno da perfusão adequada,
também redução da pressão arterial sistêmica. É ou tiver limite para o uso de fluidos, logo, usar
uma das causas rápidas de óbito (PALS,2017). epinefrina quando há baixo débito cardíaco, no-
Já o choque neurogênico na maioria das ve- repinefrina em choque hipotensivo. Lembrar de
zes acontece devido a algum trauma no sistema associar a vasopressina ou até mesmo titular as

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catecolaminas para os indivíduos que necessi- Além disso, é importante manter a glicemia
tem de altas doses de catecolamina, se as drogas abaixo de 180 mg/dL, monitorar e manter nível
vasoativas não reduzirem a disfunção cardíaca e normal de cálcio.
a hipoperfusão, são indicados os inodilatadores É recomendado também iniciar nas primei-
(POMERANTZ & WEISS, 2022). ras 48h, quando possível, a nutrição enteral atra-
Já em relação ao suporte ventilatório na se- vés do tubo gástrico, e suspendê-la em até 7 dias
quência rápida de intubação usar cetamina e da entrada do paciente (SBP, 2022; MARTIN &
benzodiazepínico em baixa dose. FIORETTO, 2021).
Vale ressaltar que o uso de corticoide só é
recomendado se a causa do choque for devido a
exposição ao corticoide.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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