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Ensaio D Processual Administrativo Karina Simões Lopes Pinheiro Fajardo
Ensaio D Processual Administrativo Karina Simões Lopes Pinheiro Fajardo
ESCOLA DE DIREITO
CURSO DE MESTRADO EM DIREITO
ADMINISTRATIVO
BRAGA
Abril de 2021
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2. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte – Processo
00474/20.3BECBR, de 27/11/2020
2.1.2 Que a ação fosse julgada procedente, por provada, e, consequentemente, que
fosse reconhecido que o ora Recorrente tinha direito a inscrever-se no quarto ano do
Mestrado Integrado de Medicina, garantindo que não decorresse qualquer prejuízo ou
consequência na sua avaliação em face dessa inscrição só ocorrer naquele momento.
2.1.3 Alegou, para tanto, em síntese, que com a intimação pretendia assegurar, em
tempo útil, o exercício do direito fundamental à educação, nos termos dos artigos 73.º e
74.º da CRP, porquanto a lesão do seu direito, concretizada na não permissão da sua
inscrição no 4.º ano de medicina, era naquele momento já efetiva, uma vez que se
encontrava impedido de proceder a essa inscrição e, desse modo, de poder frequentar o ano
letivo já em curso, havendo, ainda, sérios riscos de se agravar, de um modo definitivo e
irreversível, esse seu direito, como também os danos que decorriam dessa lesão, quer em
termos de privação do acesso efetivo às aulas e materiais disponibilizados, quer, ainda, e
de modo significativo, em termos anímicos e psicológicos, pelo sofrimento e angústia que
a situação lhe tinha causado.
2.1.5 Conclui, por isso, que o único meio processual adequado a prevenir a
possibilidade de manutenção da lesão do seu direito fundamental é a intimação para
proteção de direitos, liberdades e garantias.
“Em face de todo o exposto, nos termos das disposições conjugadas dos art.os
110.º-A, n.os 1, 2 e 3, e 131.º, n.º 1, do CPTA:
Custas do incidente pelo A., fixando-se a taxa de justiça em 1 (uma) UC, nos
termos do art.º 527.º, n.º 1, 2.ª parte, do CPC (aplicável ex vi art.º 1.º do CPTA), e do art.º
7.º, n.º 4, do RCP e tabela II-A anexa.
Alega se trata de questão que se tem de resolver de modo célere e que, por isso, a
sua resolução não pode ser alcançada satisfatoriamente através de uma medida cautelar
antecipatória, isto porque se houver convolação desta intimação numa providência cautelar
poderá suceder o seguinte: - se a medida cautelar for deferida e, a final, o direito reclamado
não for reconhecido o requerente irá frequentar o curso de medicina por vários anos e, no
limite, licenciar-se mas sem qualquer proveito pois que, com a declaração de que o acesso
ao 4.º ano do curso foi irregular, vê perdidos esse e os anos seguintes e terá de refazer a
sua vida académica universitária; - se a medida cautelar for indeferida mas, a final, o seu
direito for reconhecido concluir-se-á que o mesmo também perdeu o tempo em que esteve
impedido de frequentar o curso.
Arrazoa ter presentes os próprios fins visados com a Lei n.º 38/2020, de 16 de
agosto, cuja aplicação se reclama, que pretende consagrar como resulta do seu artigo 1.º,
um conjunto de medidas excecionais e temporárias para salvaguarda dos direitos dos
trabalhadores e estudantes do ensino superior e no Sistema Científico e Tecnológico
Nacional. Estabelecendo o legislador nessa lei medidas concretas e específicas diretamente
dirigidas à sua concretização no período temporal concreto a que se destinam, assim como
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resposta às consequências derivadas da denominada “pandemia covid” para os estudantes
do ensino superior (fundamento aliás que sequer o Tribunal a quo teve em conta, pois que
sobre o mesmo não se debruçou na decisão recorrida), o simples decretamento provisório
do direito do recorrente, que se julgou suficiente na decisão recorrida, estando em causa a
aplicação dessa lei, especial como se disse e com vigência também limitada no tempo
(assim enquanto se mantiverem as medidas de resposta à denominada “pandemia covid”),
não cria na prática as condições que o legislador com essa lei especial teve em vista
alcançar.
Alega que deve no caso ter presente o regime estabelecido, de modo especial e
extraordinário, no seu artigo 6.º, ao estabelecer-se, citando, o seguinte: “1 - As candidaturas
em ciclo de estudo para a obtenção de mestrado ou doutoramentos podem,
excecionalmente, ser realizadas sem a conclusão do ciclo de estudos anteriores e durante o
período de tempo necessário para a conclusão do mesmo. 2 - A admissão no ciclo de
estudos a que o estudante se candidata é condicional, passando a definitiva no momento da
conclusão do ciclo de estudos anterior. (...)”
Por último, recorre de ter sido condenado em custas pelo Tribunal a quo, e clama
a isenção de acordo com o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 4.º do RCP.
O Tribunal ad quem considera que a situação constitui um caso que reclama uma
decisão urgente e definitiva que se pronunciando sobre o mérito da causa julgue os
fundamentos em que o requerente funda a sua pretensão de tutela, decidindo se lhe assiste
ou não o direito à inscrição e frequência do 4.º ano do mestrado integrado de medicina na
FMUC.
A situação do apelante não se compadece, a nosso ver, com uma inscrição a título
provisório no 4.º ano do mestrado integrado de medicina na FMUC, uma vez que,
considerando o tempo em que normalmente são decididas as ações administrativas
principais, o apelante não veria a sua situação estabilizada dentro de um prazo razoável à
tutela dos seus legítimos interesses, de tal modo que, não é ficcional perspetivar-se que, só
após concluído os 6 anos do curso de medicina, quiçá o próprio ano comum, ou até o
ingresso no internato médico para efeitos de formação especializada, aquele poderia vir a
ser notificado da decisão final.
Sem custas por isenção objetiva, em ambas as instâncias – artigo 4.º, n.º 2, alínea
b) do Regulamento de Custas Processuais.
1
GOMES, Carla Amado. Pretexto, contexto e texto da intimação para proteção de direitos, liberdades
e garantias, Instituto de Ciências Jurídico-políticas, Lisboa, 2003, p. 9.
2
NOVAIS, Jorge Reis. Direito, liberdade ou garantia": uma noção constitucional imprestável na
justiça administrativa? – Anotação ao acórdão do TCAS de 6.6.2007, P. 2539/07», CJA, n.º 73,
Fevereiro, 2009, pp. 44-59.
3
CANOTILHO, José Joaquim Gomes / Vital MOREIRA, Constituição da República Portuguesa
Anotada, 3.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2014. 9
vejamos:
(…) Viabilizando o recurso a esta intimação para defesa do direito
fundamental de acesso ao ensino superior, ainda que não o qualificando
expressamente como direito, liberdade e garantia análogo, mas como um
direito fundamental inserido constitucionalmente nos direitos sociais
suficientemente preponderante e, na sua vertente negativa,
constitucionalmente densificado, para merecer a tutela contenciosa
principal urgente de forma a que os interessados que reclamam o acesso
à universidade de acordo com a lei e a CRP poderem ter certezas
jurídicas sobre o seu futuro académico.4 (…)
4
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12 de janeiro de 2018, processo nº
00774/17.0BEAVR.
5
GOMES, Carla Amado. Pretexto … cit, p. 20. 10
em análise. Uma decisão provisória que permita a inscrição no mestrado integrado, e a longa
espera por uma decisão definitiva no processo principal, acarretaria danos irreversíveis ao
Recorrente.
Ou seja, parece que a ideia central para a viabilidade da IPDLG está na necessidade
amplamente comprovada de interferência em caráter definitivo, com decisão de mérito da
ação. Pela via cautelar haverá sempre o caráter provisório da decisão, o que pode implicar
em danos irreparáveis, sem contar na sobrecarga que gera ao sistema judiciário nacional.
Como nos ensina Isabel Celeste Fonseca a intimação será necessária quando para
proteger direitos fundamentais, a necessidade de proteção seja tão intensa ao ponto de não
ser possível em tempo útil o recurso a outro meio processual, que seria o meio adequado ou
o meio próprio para resolver definitivamente a questão existente6.
A subsidiariedade diz respeito a incapacidade da cautelar definir definitivamente
uma situação e não a urgência em si. Uma tutela urgente para proteção de direitos,
liberdades e garantias que necessite de decisão definitiva, não pode ser sanada por processos
comuns, pela lentidão característica desses processos e tampouco por uma medida cautelar,
pela sua característica central de ser provisória. A existência da necessidade de tutela
urgente a direitos, liberdades e garantias está relacionada a necessidade de decisão definitiva
em um determinado espaço de tempo, e requerendo a emissão de decisão de mérito, torna
uma medida cautelar impossível ou insuficiente.
É por essa razão que se torna imperioso que o requerente apresente inicialmente
prova robusta que sustente o cumprimento dos pressupostos necessários para a
admissibilidade do pedido de intimação, bem como a sua procedência em tempo útil e
definitivamente, com resolução de mérito. Nesse sentido, nos ensinamentos de Carla
Amado Gomes cabe ao juiz da intimação avaliar da impossibilidade ou insuficiência
hipotéticas do decretamento provisório, alegadas pelo requerente, antes de admitir o
pedido7.
6
FONSECA, ISABEL CELESTE M. Dos novos processos urgentes no contencioso administrativo:
(função e estrutura), Lisboa, LEX, 2004, pp. 76 ss.
7
GOMES, Carla Amado. Pretexto… cit. pp. 20. 11
4. Conclusões
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5. Bibliografia
▪ GOMES, Carla Amado. Pretexto, contexto e texto da intimação para proteção de direitos,
liberdades e garantias, Instituto de Ciências Jurídico-políticas, Lisboa, 2003.
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