Você está na página 1de 9

Universidade Federal da Bahia

Programa de Pós-graduação em Biodiversidade e Evolução


Disciplina: Processos Evolutivos
Grupo: Carolina Pinho, Cibele Santos, Jéssica Leão, Ricardo Magnago, Rogério

Atividade Processos Evolutivos - Inovações-chave

Problema 1: Identifique inovações-chave ou combinações de caracteres relevantes no


clado estudado.
Contextualizando Bambusoideae:
- Tribos: Olyreae (bambus herbáceos), Bambuseae e Arundinarieae (bambus
lenhosos) (Tabela 1, em anexo).
- Sinapomorfias: perda secundária da lâmina na primeira folha da plântula e
ganho secundário do peseudopecíolo (GPWG 2012) e células braciformes com
invaginações fortemente assimétricas (células invaginantes) no
clorênquima/mesófilo foliar (GPWG 2012; Kelchner & BPG 2013; Leandro et
al. 2016).
- Outras características: folhas dos ramos amplas, lâminas foliares
pseudopecioladas e ocorrência de células fusóides flanqueando os feixes
vasculares (Judziewicz et al. 1999; GPWG 2012).
Inovações-chaves:
- Caules lignificados do tipo “colmo” geralmente ocos (Bambuseae e
Arundinariea) ou pouco lignificados (Olyreae) e raízes do tipo rizomas
(Bambuseae e Arundinariea), além de floração geralmente monocárpica (exceto
pela tribo Olyreae). Os caules lignificados possivelmente conferem maior
resistência à herbivoria. Os rizomas potencializam a dispersão e colonização de
novos territórios, originando novos brotos e aumentando sua superfície de
alimentação e o tamanho da planta. Já a floração monocárpica diminui o gasto
energético, otimizando a mobilização de recursos para o crescimento custoso de
bambus lenhosos, que florescem apenas uma única vez. No caso dos bambus
herbáceos, a floração não é monocárpica.

Problema 2: Posicione o(os) caracter(es) selecionado(s) em uma filogenia, de


preferência datada.
- Olyreae: Colmos fracamente lignificados, ausência de folhas do colmo,
ramificação vegetativa limitada, ausência de lígula externa nas folhas, flores
unissexuais e dimórficas, floração anual e raramente monocárpica (Clark &
Oliveira 2018). Todas as Olyreae, exceto Buergersiochloa aparentemente tem
células de sílica epidérmica contendo forma de cruz ou crenato (oliroid) e corpos
de sílica (exclusivo para a tribo) (Soderstrom & Ellis 1987; Clark et al. 2015).
- Bambuseae e Arundinarieae: “Síndrome do bambu lenhoso”: Colmos
lignificados, ocos e segmentados; folhas do colmo diferenciadas das folhas dos
ramos; ramificação vegetativa complexa; presença de lígula e flores bissexuais;
longos períodos vegetativos; floração gregária e monocárpica (Clark et al. 2015;
Chalopin et al. 2021; Ruiz-Sanchez et al. 2021) (Figura 1 e Tabela 1, em anexo).

Problema 3: Relacione o(os) caracter(es) selecionado(s) à diversificação do clado.


- Acredita-se que bambus herbáceos não são irmãos dos bambus lenhosos. Em vez
disso, são irmãos de uma ou mais das linhagens progenitoras que hibridizam e
produziram os bambus lenhosos, sendo estes últimos produtos de pelo menos
dois eventos independentes de hibridização + poliploidia que uniram linhagens
provavelmente diplóides. Assim, os bambus herbáceos parecem exibir uma
representação moderna de uma condição genética ancestral dos bambus lenhosos
(diploidia) e de sua forma morfológica ancestral (Triplett et al. 2014).
- Bambusoideae é a única grande linhagem dentro das gramíneas que se
diversificou principalmente em associação às florestas tropicais e temperadas
(Triplett et al. 2014; Clark et al. 2015; Kellogg 2015). Podem chegar a formar
extensas florestas compostas por bambus (Triplett et al. 2014) e inclusive se
tornaram espécies invasoras em habitats perturbados (Soderstrom & Calderon
1979), o que pode estar diretamente relacionado ao sistema rizomatoso das
raízes e brotamento e à floração monocárpica (bambus lenhosos), que permitem
rápida colonização e um longo ciclo de vida.
- Possuem uma ampla variação nas características morfológicas e ecofisiológicas,
que se reflete na plasticidade de adaptação em diferentes ambientes, o que
reforça seu potencial ecológico, especialmente para a estrutura, composição e
funções florestais (Ely et al. 2019; Canavan et al. 2019). Exercem importante
função na sucessão ecológica dessas florestas (Soderstrom & Calderon 1979),
representando 25% da biomassa total de áreas tropicais (Bansal & Zoolagud
2002), principalmente os bambus de colmos lenhosos.
- Essas adaptações aos hábitats florestais influenciam no fenótipo das folhas de
bambus, com lâminas foliares pseudopecioladas e cavidades intercelulares
muitas vezes referidas como células fusóides flanqueando os feixes vasculares
(March & Clark 2011; Leandro et al. 2018). O formato foliar obedece a um
gradiente ambiental, porém, de maneira geral, as folhas assumem um formato
linear-oval característico do sub-bosque florestal ou de ambientes de transição
floresta-campos abertos (Gallaher et al. 2019).

Problema 4: Se possível, identifique os eventos moleculares ou processos ecológicos


que originaram o(os) caracter(es) selecionado(s).
- Processos de hibridização e alopoliploidia podem estar envolvidos na história
evolutiva complexa dos bambus (Goh et al. 2013; Fisher et al. 2014; Oliveira et
al. 2014; Triplett et al. 2014; Wysocki et al. 2015; Wysocki et al. 2016; Zhang et
al. 2016; Zhou et al. 2017; Saarela et ai. 2018) - principalmente dos bambus
lenhosos (Bambuseae e Arundinarieae). Esses eventos podem ter resultado na
“síndrome do bambu lenhoso”: colmos fortemente lignificados, folhas de
colmos especializadas, ramificação vegetativa elaborada, floração gregária e
geralmente monocárpica, etc (Triplett et al. 2014). Ademais, acredita-se que os
bambus herbáceos (Olyreae) possam ter sofrido neotenia (Carvalho com pess.),
o que precisa ser melhor investigado.

Referências bibliográficas

Bamboo Phylogeny Group. 2012. An updated tribal and subtribal classification for the
Bambusoideae (Poaceae). In Gielis, J.; Potters, G., eds., Proceedings of the 9th
World Bamboo Congress, 10-15 April 2012. World Bamboo Organization,
Massachusetts, U.S.A. pp. 3-27.
Bansal, Arun K.; Zoolagud, S. S. 2002. Bamboo composites: Material of the future.
Journal of Bamboo and Rattan, v. 1, n. 2, p. 119-130.
Canavan, Susan et al. 2019. Does origin determine environmental impacts? Not for
bamboos. Plants, people, planet, v. 1, n. 2, p. 119-128.
Chalopin, Domitille et al. 2021. Integrated Genomic Analyses From Low-Depth
Sequencing Help Resolve Phylogenetic Incongruence in the Bamboos (Poaceae:
Bambusoideae). Frontiers in plant science, p. 1916.
Clark, L. G.; Londño, X.; 2015. Ruiz-Sanchez, E. Bamboo taxonomy and habitat. In:
Bamboo. Springer, Cham, p. 1-30.
Clark, Lynn G. & Oliveira, R. P. 2018. Diversity and evolution of the new world
bamboos. In: Proceedings World Bamboo Congress, Mexico.
Ely, Francisca et al. 2019. Ecophysiology and genetic diversity in species of the bamboo
Chusquea in the high Andes, Venezuela. Plant Ecology & Diversity, v. 12, n. 6, p.
555-572.
Fisher, Amanda E.; Clark, Lynn G.; Kelchner, Scot A. 2014. Molecular phylogeny
estimation of the bamboo genus Chusquea (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae)
and description of two new subgenera. Systematic Botany, v. 39, n. 3, p. 829-844.
Gallagher, Timothy J. et al. 2-19. Leaf shape and size track habitat transitions across
forest–grassland boundaries in the grass family (Poaceae). Evolution, v. 73, n. 5, p.
927-946.
Goh, W. L. et al. 2013. Multi-gene region phylogenetic analyses suggest reticulate
evolution and a clade of Australian origin among paleotropical woody bamboos
(Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae). Plant systematics and evolution, v. 299, n.
1, p. 239-257.
Grass Phylogeny Working Group II. 2012. New grass phylogeny resolves deep
evolutionary relationships and discovers C4 origins. New Phytologist, v. 193, n. 2, p.
304-312.
Judziewicz, Emmet J. et al. 1999. American bamboos. Smithsonian Institution Press.
Kelchner, S. A. BPG (Bamboo Phylogeny Group). 2013. Higher level phylogenetic
relationships within the bamboos (Poaceae: Bambusoideae) based on five plastid
markers. Mol Phylogenet Evol, v. 67, n. 2, p. 404-413.
Kellogg, Elizabeth A. 2015. Flowering Plants. Monocots. Cham: Springer
International Publishing, v. 10, p. 978-3.
Leandro, T. D. et al. 2016. The utility of Bambusoideae (Poaceae, Poales) leaf blade
anatomy for identification and systematics. Brazilian Journal of Biology, v. 76, p.
708-717.
Leandro, Thales D. et al. 2018. Fusoid cells in the grass family Poaceae (Poales): a
developmental study reveals homologies and suggests new insights into their
functional role in young leaves. Annals of botany, v. 122, n. 5, p. 833-848.
March, Robert H. et al. 2011. Sun-shade variation in bamboo (Poaceae: Bambusoideae)
leaves. Telopea, v. 13, n. 1-2, p. 93-104.
Oliveira, Reyjane P. et al. 2014. A molecular phylogeny of Raddia and its allies within
the tribe Olyreae (Poaceae, Bambusoideae) based on noncoding plastid and nuclear
spacers. Molecular Phylogenetics and Evolution, v. 78, p. 105-117.
Ruiz-Sanchez, Eduardo. et al. 2021. Molecular and morphological data support the
recognition of a new species of Otatea (Poaceae: Bambusoideae: Guaduinae) from
Durango, Mexico. Taxon, v. 70, n. 4, p. 747-760.
Saarela, Jeffery M. et al. 2018. A 250 plastome phylogeny of the grass family
(Poaceae): topological support under different data partitions. PeerJ, v. 6, p. e4299.
Soderstrom, Thomas R.; Calderon, Cleofe E. 1979. A commentary on the bamboos
(Poaceae: Bambusoideae). Biotropica, p. 161-172.
Soderstrom, T. R.; Ellis, R. P. 1986. The position of bamboo genera and allies in a
system of grass classification. In: International Symposium on Grass Systematics and
Evolution, Washington, DC (USA), Smithsonian Institution Press.
Soreng, Robert J. et al. 2017. A worldwide phylogenetic classification of the Poaceae
(Gramineae) II: An update and a comparison of two 2015 classifications. Journal of
Systematics and evolution, v. 55, n. 4, p. 259-290.
Triplett, Jimmy K. et al. 2014. Independent allopolyploidization events preceded
speciation in the temperate and tropical woody bamboos. New Phytologist, v. 204, n.
1, p. 66-73.
Wysocki, William P. et al. 2015. Evolution of the bamboos (Bambusoideae; Poaceae): a
full plastome phylogenomic analysis. BMC evolutionary biology, v. 15, n. 1, p. 1-
12.
Wysocki, William P. et al. 2016. The floral transcriptomes of four bamboo species
(Bambusoideae; Poaceae): support for common ancestry among woody bamboos.
BMC genomics, v. 17, n. 1, p. 1-14.
Zhang, Xian-Zhi et al. 2016. Multi-locus plastid phylogenetic biogeography supports
the Asian hypothesis of the temperate woody bamboos (Poaceae: Bambusoideae).
Molecular phylogenetics and evolution, v. 96, p. 118-129.
Zhou, Meng-Yuan et al. 2017. Towards a complete generic ‐level plastid phylogeny of
the paleotropical woody bamboos (Poaceae: Bambusoideae). Taxon, v. 66, n. 3, p.
539-553.
ANEXOS

Figura 1. Filogenia datada com os principais caracteres morfológicos da Tribo


Bambusoideae.

Legenda:
Tabela 1. Evidências morfológicas e moleculares sustentam o monofiletismo da
subfamília (GPWG 2012; Kelchner et al. 2013) e indicam que a diversificação tenha
ocorrido em três grandes linhagens, classificadas tradicionalmente em tribos: bambus
lenhosos tropicais (Bambuseae, 966 espécies), lenhosos temperados (Arundinarieae,
581 espécies) e bambus herbáceos (Olyreae, 123 espécies) (Kelchner et al. 2013; Clark
et al. 2015; Soreng et al. 2017).

Arundinarieae Bambuseae Olyreae

Rizomas leptomorfo ou paquimorfo geralmente paquimorfo, paquimorfo ou


alguns anfimorfo paquimorfo com
rizomas leptomorfos/
estolões

Grau de lignificação do fortemente lignificado fortemente lignificado fracamente lignificado


colmo

Folhas do colmo geralmente bem geralmente bem geralmente ausentes


diferenciadas diferenciadas

Ramificação aérea presente Geralmente presente Limitado ou ausente

Padrão de basipetal acropetal ou bidirecional não aplicável


desenvolvimento do
ramo

Lígula externa das folhas Presente Presente ausente


da folhagem

Comportamento da geralmente gregário, geralmente gregário, sazonal, geralmente


floração monocárpico monocárpico não monocárpico

Flores bissexual bissexual unissexual

Textura de lema fértil de papel a esponjoso de papel a esponjoso de couro a endurecido


feminina
Leia o artigo de Rabosky (2017). Para a sua apresentação em grupo, reflita sobre as
questões:

- Qual é o conceito de inovação-chave que o seu grupo está utilizando?

De acordo com Rabosky (2017), inovação chave é a evolução de uma característica


(ou conjunto de características funcionalmente ligadas) que fornece acesso a novos
recursos e que, como resultado, facilita um aumento na diversificação total
(riqueza de espécies) do clado pai. Deste modo, o grupo segue o conceito do autor
para responder suas questões, pois em Bambusoideae os caules lignificados
possivelmente conferem maior resistência à herbivoria. Os rizomas potencializam
a dispersão e colonização de novos territórios, originando novos brotos e
aumentando sua superfície de alimentação e o tamanho da planta. Já a floração
monocárpica diminui o gasto energético, otimizando a mobilização de recursos
para o crescimento custoso de bambus lenhosos, que florescem apenas uma única
vez.

- Inovações evolutivas geram padrões determinados de ramificação em árvores


filogenéticas?

Não, o padrão de “explosão precoce” (early burst) seria o mais consistente com o
que se esperaria de uma inovação-chave, porém, muitas ressalvas teriam de ser
analisadas. O autor indica que em trabalhos recentes muitos padrões parecidos
foram obtidos de uma gama de processos que não são inovações-chave. Além disso,
mesmo que esse padrão de “pulso de diversificação” siga a aquisição de uma
inovação-chave, o sinal acabará por ser perdido devido ao turnouver de linhagens
dependentes de diversidade. Mas de acordo com o autor as inovações podem
explicar a diversificação de espécies e por consequência as ramificações nas
árvores filogenéticas. Onde ele sugere testar alguns critérios para avaliar a relação
entre inovação e diversificação.

Vários critérios podem ajudar a determinar se uma inovação chave moldou os


padrões macroevolutivos em um determinado clado. Existem dois aspectos
para este teste: primeiro, os padrões de diversificação ecológica e de linhagem
sugerem que ocorreu uma mudança na zona adaptativa? E segundo, uma
característica ou conjunto de características em particular está por trás dessa
transição?
Primeiro, um subclado deve ser caracterizado por uma grande mudança na
posição ecológica ou um aumento na dispersão ecológica em relação à
condição ecológica ancestral;
Em segundo lugar, deve haver alguma evidência de que uma característica
particular, ou um complexo de características, fundamenta a mudança em
questão e que a(s) característica(s) facilita(m) um aumento no espectro total de
recursos usados pelo clado pai.

Como um terceiro critério, a evidência deve apoiar uma mudança na dinâmica


de diversificação do clado com a suposta inovação chave relativa ao grau/clado
pai.

Você também pode gostar