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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ASPECTOS DA CULTURA CIENTÍFICA EM ATIVIDADES


DE EXPERIMENTAÇÃO NAS AULAS DE FÍSICA

MARIA CANDIDA VARONE DE MORAIS CAPECCHI

Tese de Doutorado

SÃO PAULO

2004
1

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ASPECTOS DA CULTURA CIENTÍFICA EM ATIVIDADES


DE EXPERIMENTAÇÃO NAS AULAS DE FÍSICA

MARIA CANDIDA VARONE DE MORAIS CAPECCHI

Tese de Doutorado apresentada à Comissão de


Pós - Graduação como exigência parcial para a
obtenção do título de Doutora em Educação

Orientadora: Profª. Dr.ª Anna Maria Pessoa de Carvalho

SÃO PAULO

2004
2

Dedico este trabalho a meus pais,


Antonio Alexandre e Yone, que
ensinaram-me o amor pelos livros, e a
meu marido, Mario, um companheiro
maravilhoso
3

Agradecimentos

Agradeço a todos que contribuíram direta ou indiretamente para a realização


deste estudo e, em especial:

No Brasil,

À Universidade de São Paulo e, particularmente, à Faculdade de Educação,


pela grande oportunidade oferecida.

A FAPESP e ao CNPq, pelo indispensável apoio financeiro.

À Profa. Dra. Anna Maria Pessoa de Carvalho, pela valiosa orientação, grande
incentivo, compreensão, amizade e notável exemplo de mulher vencedora
em todos os sentidos.

Aos Professores: Dra. Myriam Krasilchik e Dra. Marli André, Dr. Eduardo
Mortimer e Dra. Sílvia Trivelato pelas sugestões nos exames de qualificação
do mestrado e do doutorado.

Às queridas amigas Graciella, Ines, Maria Lúcia e Conceição, por todo


carinho, incentivo, e intercâmbio de idéias.

À querida amiga Amélia, pelo companheirismo e dedicação.

Aos companheiros do LaPEF e, em especial, a Aurea, Nelson, Carla, Thais,


Luciana, Viviane, Lucia, Ivã, que proporcionaram momentos ricos e
prazerosos, de troca intelectual e descontração.

Aos amigos Alex , Diana e Francisco, pelo apoio nas transcrições e Rogério,
pelas ilustrações.

A Daniela Scarpa, pelas ricas discussões.

À amiga Márcia, pelas aulas de inglês e preciosas orientações.

A Luciana, pelas prolongadas discussões em madrugadas de trabalho.


4

À Profa. Cristina e seus alunos, por permitirem minha presença durante


algumas de suas aulas, no intuito de colaborarem com este trabalho.

Em Leeds,

Ao diretor da School of Education, da University of Leeds, Prof. Dr. John


Leach, pela cordialidade e atenção.

Ao Professor Dr. Phil Scott pela co-orientação, amizade e grande apoio.

Aos amigos Edenia / Savio / Cla e Diego (minha família brasileira em Leeds)
/ Jutta, Terê y José / Jessie / Ali / Abbas e Shekou / Toyosi/ Fatih / Yvonne
(minha família multicultural em Leeds), por todo o carinho, amizade e pelos
valiosos momentos de união e intercâmbio.

À família,

Ao querido Mario, por todo carinho e compreensão.

Aos meus queridos pais, pelo apoio incondicional e constante exemplo de


perseverança.

Á minha avó Izaura Dias Carvalho por toda dedicação e exemplo de


determinação.

Ao querido Babbo Armando, por todo carinho, dedicação e jantares


deliciosos, e à querida Dona Bianca, por toda amizade e alegria.

Aos queridos irmãos Xandre e Tomoko, Mila e Edu, Záza e Wilson, e aos
queridos sobrinhos Bela, Tóta Lu, Fefa e Tuseco (carinhosamente), pela
torcida organizada.
5

Resumo

Este trabalho consiste em um estudo de caso, referente a uma seqüência de


aulas de Física em uma turma de primeiro ano do Ensino Médio de uma
escola da rede pública da cidade de São Paulo. Nove aulas com duração de
uma hora e quarenta minutos cada foram registradas em vídeo, incluindo
notas de campo. A seqüência trabalhada nas aulas é parte de um programa
de ensino desenvolvido por um grupo de professores do Ensino Médio,
incluindo a professora da turma acompanhada. O objetivo desta pesquisa é
analisar como a cultura científica é disponibilizada no plano social da sala de
aula através de atividades de experimentação e interações entre professora
e alunos numa seqüência de aulas de Física. As interações em sala de aula
foram abordadas a partir de uma análise multimodal, baseada na
identificação de funções comunicativas realizadas pelos diferentes modos
semióticos empregados por alunos e professora na construção de
explicações. Este referencial de análise é proveniente da gramática funcional
de Halliday, possibilitando a identificação de funções ideacionais,
relacionadas ao tratamento de conteúdos; funções interpessoais,
envolvendo atitudes dos alunos e da professora; e função textual,
relacionada à construção da narrativa científica. Os principais aspectos da
cultura científica identificados nas aulas foram inscrições literárias e
discussões envolvendo habilidades de argumentação. O desenvolvimento
destes temas foi resultado tanto das características de cada tipo de
atividade, quanto das intervenções e diferentes recursos semióticos
empregados pela professora.
6

Abstract

This work consists in a case study, related to a physics classes sequence on


a São Paulo public middle school first year class. Nine lessons of one hour
and forty minutes each were video recorded, including observation notes.
The sequence performed on the classes is part of a physics teaching
program developed by a middle school teachers team, including the teacher
who taught the lessons. This research aim is to analyze how the scientific
culture is made available in the class social plane through experimentation
and interaction between teacher and students activities on a sequence of
physics lessons. The interactions in classroom were approached from a
multimodal analysis based on identification of communicating functions
performed by different semiotics employed by students and teacher on
explanations making. This analysis referential is provenient from Halliday
functional grammar, making possible the ideational functions identification,
related to content; interpersonal functions, evolving students and teacher
attitudes; and textual function, related to the scientific narrative. The main
scientific culture aspects identified on the lessons were literary inscriptions
and discussions involving argumentation skills. The open lab activity
performed through four double classes of the sequence has made possible a
differentiated work with scientific culture tools – the inscriptions. On the other
hand the investigative demonstration activity has provided an argumentation
skill work The main contribution of the study was to show the breaking
possibilities of the experimentation activities traditional approach.
7

Sumário

RESUMO 5

ABSTRACT 6

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO 1 – INSERÇÃO DA PESQUISA NUMA ABORDAGEM


SOCIOCULTURAL 15

1.1. DESENVOLVIMENTO E APRENDIZAGEM 16


1.2. MEDIAÇÃO 18
1.2.1. FERRAMENTAS CULTURAIS 19
1.2.2. PENSAMENTO E LINGUAGEM 20
1.3. APRENDIZAGEM COMO PROCESSO DE ENCULTURAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O
ENSINO DE CIÊNCIAS 21
1.3.1. O PAPEL DO OUTRO NO ENSINO FORMAL DE CIÊNCIAS 21
1.3.2. FERRAMENTAS CULTURAIS E ENSINO E APRENDIZAGEM DE CIÊNCIAS 22
1.3.3. APRENDIZAGEM DE CIÊNCIAS COMO ENCULTURAÇÃO E MULTICULTURALISMO 27
1.4. FOCO DA PESQUISA 30

CAPÍTULO 2 – MODOS DE CONSTRUÇÃO DE SIGNIFICADOS NAS AULAS DE


CIÊNCIAS 33

2.1. LINGUAGEM VERBAL NAS AULAS DE CIÊNCIAS 34


2.2. DIFERENTES LINGUAGENS NAS AULAS DE CIÊNCIAS 44

CAPÍTULO 3 – ENSINO DE CIÊNCIAS E A CULTURA DO LABORATÓRIO


CIENTÍFICO 53

3.1. ATIVIDADES DE EXPERIMENTAÇÃO 54


3.1.1. LABORATÓRIO DE DEMONSTRAÇÕES 57
3.1.2. LABORATÓRIO ABERTO 58
3.2. CULTURA DO LABORATÓRIO CIENTÍFICO E CIÊNCIAS NA CULTURA ESCOLAR 60
3.2.1. INSCRIÇÃO LITERÁRIA: FERRAMENTAS CULTURAIS 61
3.2.2. ARGUMENTAÇÃO 70
8

CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA DA PESQUISA 90

4.1. QUESTÃO E METAS DA PESQUISA 90


4.2. PROJETO GERAL E ESTRUTURAÇÃO DO ESTUDO 91
4.3. CASO INVESTIGADO 92
4.4. COLETA DE DADOS 96
4.5. ESTRUTURAÇÃO DA ANÁLISE 97

CAPÍTULO 5 – ANÁLISE DO BLOCO TEMÁTICO I: DEMONSTRAÇÃO


INVESTIGATIVA 104

5.1. DEMONSTRAÇÃO INVESTIGATIVA 105


5.1.1. DESCRIÇÃO GERAL DA DEMONSTRAÇÃO SOBRE DILATAÇÃO DO AR 105
5.1.2. MICRO ANÁLISE DO EPISÓDIO 1 107

CAPÍTULO 6 – ANÁLISE DO BLOCO TEMÁTICO II: ATIVIDADE DE


LABORATÓRIO ABERTO 133

6.1. LA / FASE 1: PLANEJANDO A INVESTIGAÇÃO 136


6.1.1. DESCRIÇÃO E ANÁLISE GERAL DO DESENVOLVIMENTO DA FASE 1 137
6.2. LA FASE 2A – PRIMEIRA INSCRIÇÃO 158
6.2.1. DESCRIÇÃO E ANÁLISE GERAL DO DESENVOLVIMENTO DA FASE 2A 158
6.3. LA FASE 2B – INTERPRETAÇÃO DA PRIMEIRA INSCRIÇÃO 173
6.3.1. DESCRIÇÃO E ANÁLISE GERAL DO DESENVOLVIMENTO DA FASE 2B 173

CAPÍTULO 7 – CONSIDERAÇÕES FINAIS 195

BIBLIOGRAFIA 200

ANEXOS 207
9

Introdução

... não entendia nada do que o professor de Física falava lá


na frente ... era como se ele falasse outra língua ... por mais
que eu me esforçasse ... não conseguia entender onde ele
queria chegar com tudo aquilo...1

Inicio este trabalho recordando algumas das motivações que levaram a meu
ingresso na pesquisa sobre ensino de Ciências. Minha primeira experiência
como professora de Física ocorreu em uma escola da rede estadual de São
Paulo, quando era estudante do curso de bacharelado. Naquela época, sem
qualquer contato anterior com teorias sobre ensino e aprendizagem,
considerava que os ingredientes suficientes para a realização de uma boa
aula eram o domínio do conteúdo e a apresentação clara do mesmo para os
alunos. Não é de se admirar que aquela primeira experiência tenha sido
extremamente frustrante e que, naquele momento, eu tenha desistido de
lecionar.

Voltei a dar aulas no Ensino Médio somente três anos depois, quando
estava cursando a licenciatura. Foi um período de muito aprendizado, pois
tinha a oportunidade de questionar minhas próprias aulas e também podia
tentar aperfeiçoá-las a partir dos conhecimentos que adquiria no curso.
Minha visão sobre os processos de ensino e aprendizagem ampliou-se muito
e passei a compreender que “entender o conteúdo” significava muito mais do
que dominar conceitos e que não bastava fazer uma “apresentação clara” do

1
Depoimento de um profissional com escolaridade de nível superior sobre as aulas de Física que
freqüentou no Ensino Médio
10

mesmo para que meus alunos aprendessem, visto que o conhecimento não
podia ser transmitido, este devia ser construído ativamente.

Dentre as diversas leituras e discussões realizadas durante o curso de


licenciatura que colaboraram para minha formação como professora e
motivaram meu ingresso no campo da pesquisa sobre educação, uma
atividade deve ser destacada. Trata – se de uma entrevista que foi realizada
com profissionais que haviam completado cursos de nível superior não
relacionados à disciplina Física. Esta atividade, realizada como parte da
disciplina Prática de Ensino de Física, ministrada pela Profª. Anna Maria
Pessoa de Carvalho, visava sensibilizar os alunos do curso de licenciatura,
entre os quais eu me encontrava, para a necessidade de questionamento do
ensino tradicional e busca de soluções para seus problemas. Embora já
estivesse bastante motivada para discutir questões sobre educação e
procurar aprimorar minhas aulas, a realização das entrevistas possibilitou a
ampliação de meu entendimento sobre a disciplina que estava lecionando.
Esperava que os entrevistados não iriam lembrar-se muito de conceitos de
Física, relacionariam a disciplina com Matemática, diriam que se tratava de
uma matéria difícil, entre outros, mas o que me surpreendeu foi o
depoimento apresentado na epígrafe deste capítulo. Aquela declaração
representou um marco em minhas preocupações em relação ao ensino. O
abismo entre a ação do professor e o entendimento dos alunos revelou-se
muito maior do que eu imaginava. Ensinar Física envolvia mais do que
desafiar idéias prévias dos alunos e substituí-las por teorias mais
consistentes do ponto de vista científico, era necessário que os estudantes
vissem algum sentido naquele conjunto de teorizações, que estes
compreendessem a Física como uma forma diferente de pensar e falar sobre
o mundo. Mas como atingir este objetivo sem partir para a exposição de uma
definição da natureza do conhecimento físico? Em primeiro lugar, já não
acreditava na simples exposição como meio de ensino e, em segundo, não
havia uma definição única para expor, dada a existência de diferentes
correntes de pensamento dentro da Epistemologia das Ciências.
11

Foi com esse tipo de questionamento que ingressei no LaPEF (Laboratório


de Pesquisa e Ensino de Física) como aluna de iniciação científica. Na
época, sentia uma grande inquietação e vontade de encontrar meios para
tornar a Física, como visão de mundo, mais acessível aos alunos. Na busca
de informações para solucionar meu problema, pensei em trabalhar com
temas mais próximos do cotidiano, mas esta ainda não era a solução. É
claro que a falta de proximidade entre os fenômenos estudados na escola e
a vivência dos alunos era, e ainda é, um importante fator envolvido nos
fracassos escolares, porém o problema que me afligia ia além da escolha e
ampliação do conteúdo, relacionava-se mais precisamente ao processo de
ensino e aprendizagem. Além disso, considerava a Ciência uma visão de
mundo que não poderia simplesmente ser reduzida às experiências do
cotidiano. Era preciso que os estudantes tomassem consciência do papel
que a linguagem e os modos de produção específicos daquela área de
conhecimento representavam, em função da visão de mundo inerente à
mesma.

A leitura do artigo Establishing the norms of scientific argumentation in


classrooms, de Driver e Newton (1997), possibilitou meu primeiro contato
com a metáfora de aprendizagem de Ciências como um processo de
enculturação – a entrada do aprendiz em uma nova cultura, compreendendo
e ensaiando o uso de suas práticas, valores e linguagem. A concepção de
Ciência, e mais especificamente de Física, como uma forma de cultura
possibilitava abranger diferentes facetas daquela área de conhecimento.

A metáfora da enculturação permitiu associar as dificuldades citadas pelo


profissional entrevistado, autor da epígrafe, a seu papel de estrangeiro,
quando estudante do ensino médio, entrando em contato com uma nova
cultura. O aluno não conseguia ver sentido nas palavras de seu professor de
Física porque o último falava do ponto de vista de um grupo cultural ao qual
12

o primeiro não pertencia. O professor de Física como representante de outra


cultura não só apresentava novos signos e conceitos, mas também
considerava e interpretava o mundo que o cercava de forma diferente. O que
para o aluno eram acontecimentos corriqueiros do cotidiano, para o
professor poderiam representar fenômenos a serem estudados. É
importante observar que nem sempre o contato dos estudantes com a
cultura científica representada pelo professor é traumático. Cobern e
Aikenhead (1998) identificaram cinco diferentes formas de interação entre os
estudantes e a cultura científica escolar, considerando desde transposições
de bordas culturais suaves até aquelas praticamente impossíveis. Este
último caso costuma acontecer quando a cultura da qual o aluno é
proveniente é muito diferente da cultura científica escolar.

A metáfora de aprendizagem como enculturação levou-me a questões, tais


como, que aspectos da cultura científica deveriam estar presentes no ensino
para que os estudantes compreendessem a mesma? e como proporcionar
aos estudantes um ambiente adequado para que a enculturação ocorresse?.

Uma revisão da literatura sobre ensino e aprendizagem de Ciências


possibilitou meu posicionamento dentro de uma perspectiva sócio – cultural
e a reelaboração de minhas questões à luz da mesma. O presente trabalho
foi inspirado nestes questionamentos e envolve aspectos de diferentes áreas
de conhecimento, que precisam ser introduzidos e discutidos. Em primeiro
lugar é importante definir meu posicionamento em relação às teorias de
ensino e aprendizagem e o que entendo por enculturação, o que é descrito
no capítulo 1. Os demais capítulos que compõem a tese são descritos a
seguir.
13

Estrutura da tese

Capítulo 1: Perspectiva Teórica: Abordagem sociocultural: aprendizagem


como enculturação – o objetivo deste capítulo é situar a pesquisa dentro de
uma abordagem sociocultural de ensino e aprendizagem e esclarecer o que
entendemos por enculturação em Ciências. Esta medida é importante devido
aos diferentes usos encontrados na literatura para a metáfora da
aprendizagem como enculturação. É importante deixar claro que o foco
desta pesquisa não está nas culturas alternativas à científica e nas
dificuldades / resistências que estudantes provenientes destes grupos
podem enfrentar ao longo da escolarização, mas sim nos aspectos
essenciais da cultura científica que precisam ser trabalhados e a diversidade
de meios envolvidos na construção dos significados no plano social da sala
de aula.

Capítulo 2: Modos de Construção de Significados nas Aulas de Ciências –


através da metáfora de aprendizagem como enculturação, a linguagem
verbal, assim como outros modos de construção de significados, ganham
destaque no processo de ensino e aprendizagem de Ciências. Este capítulo
visa levantar as principais tendências dentro das áreas de pesquisa sobre
modos de construção de significados empregados em sala de aula, com o
objetivo de delimitar um instrumental teórico para a análise dos dados.

Capítulo 3: Ensino de Ciências e a Cultura do Laboratório Científico – o


objetivo deste capítulo é apresentar alguns estudos realizados sobre a
Ciência como forma de cultura. A seleção dos mesmos foi realizada em
função de aspectos daquela cultura que costumam, ou precisam ser,
abordados em disciplinas relacionadas à área de Ciências Naturais na
cultura escolar. O objetivo é identificar fatores, especialmente dentro dos
conhecimentos de física, que precisam receber maior atenção para que os
estudantes possam compreender as ferramentas culturais utilizadas pela
14

comunidade científica, assim como seus valores e produtos. Considerando o


papel de atividades de experimentação em aproximar os estudantes das
práticas da cultura científica, adotamos o laboratório científico como
referência para este estudo.

Capítulo 4: Metodologia da Pesquisa – este capítulo descreve o caso


investigado, compreendendo informações sobre a escola, professora, alunos
e programas das aulas registradas. Além disso, são abordados aspectos
metodológicos envolvidos na realização da pesquisa, que referem-se à
descrição dos processos de estruturação tanto do estudo (plano de trabalho)
quanto da análise. Com respeito ao primeiro tópico, são relatadas fases
envolvidas na delimitação do problema de pesquisa, assim como decisões
sobre a coleta de dados. Com respeito à análise, são consideradas as
etapas de transformação dos dados brutos em dados da pesquisa, assim
como a construção da estrutura de organização da análise.

Capítulo 5 – Análise do Bloco Temático I: atividade de demonstração

Capítulo 6 – Análise do Bloco Temático II: atividade de laboratório aberto

Capítulo 7 – Considerações Finais

Os capítulos 5 e 6 apresentam o desenvolvimento do estudo de caso,


contando com uma descrição geral das aulas envolvidas em cada bloco da
seqüência de ensino, assim como uma análise detalhada (micro análise) de
episódios representativos em relação à questão da pesquisa.

Finalmente, o capítulo 7 consiste nas reflexões sobre os resultados obtidos


na análise de dados e sua relação com a questão de pesquisa. São
abordados também possíveis desdobramentos do trabalho.

Anexos – apresentam a transcrição completa dos eventos selecionados para


análise.
15

Capítulo 1 – Inserção da Pesquisa numa


Abordagem Sociocultural

Nos últimos vinte anos as pesquisas sobre ensino e aprendizagem de


Ciências caminharam de uma abordagem mais voltada para os aspectos
individuais da construção do conhecimento, a uma abordagem em que
aquela construção é considerada dentro de contextos sociais (Duit e
Treagust, 1998).

A partir de uma perspectiva social, a forma com que explicações são


construídas e compartilhadas entre estudantes em sala de aula ganharam
maior atenção. Os modelos visando mudança conceitual, por exemplo, que
no final dos anos setenta e início dos anos oitenta estavam voltados para a
extinção e substituição das concepções pré-instrucionais por aquelas
corretas do ponto de vista científico, têm caminhado para a criação de meios
que proporcionem a construção de explicações contextualizadas por parte
dos alunos. Esta mudança de enfoque, de uma tentativa de substituição de
concepções para a busca de uma convivência entre as mesmas, em que o
sujeito tem a consciência da adequação de cada uma a situações
específicas, não despreza a contribuição dos estudos realizados sob um
enfoque individual, pelo contrário, acrescenta novos fatores aos estudos
sobre aprendizagem, dentre eles a linguagem utilizada em sala de aula.

Leach e Scott (2003) abordam o papel que as visões individual e social de


aprendizagem exercem nas pesquisas sobre ensino e aprendizagem de
16

Ciências em contextos formais. Embora considerem de grande importância


as contribuições das pesquisas realizadas sob um enfoque individual, tais
como aquelas sobre concepções prévias dos estudantes e estudos visando
mudança conceitual, os autores afirmam que “não é possível explicar como
o ensino habilita os estudantes a alcançarem novos conhecimentos se o
foco for a ‘estrutura mental’ dos mesmos, isolada das situações em que
aquela ‘estrutura mental’ é usada.” (página 94, tradução nossa). É neste
ponto que a abordagem sociocultural proveniente da expansão dos estudos
de Vygotsky vem auxiliar as pesquisas sobre ensino e aprendizagem em
sala de aula.

A presente pesquisa está inserida numa abordagem sociocultural de ensino


e aprendizagem e para esclarecer este posicionamento será apresentada
uma breve revisão de alguns aspectos da teoria de Vygotsky, assim como
de teorizações resultantes da expansão de seus estudos, que fundamentam
esta área de conhecimento.

1.1. Desenvolvimento e aprendizagem

Em seus estudos sobre processos psicológicos e desenvolvimento humano,


Vygotsky fez uma distinção entre funções psicológicas elementares e
funções psicológicas superiores. Esta distinção tem um papel importante na
diferenciação entre fenômenos psicológicos comuns nos animais e seres
humanos e aqueles característicos somente nos humanos. As funções
psicológicas superiores são aquelas que envolvem consciência,
planejamento e intenção e estão relacionadas a processos de aprendizagem
que dependem de relações interpessoais.

“(...) Para Vygotsky, a aprendizagem está relacionada ao


desenvolvimento desde o início da vida humana, sendo ‘um
aspecto necessário e universal do processo de
17

desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente


organizadas e especificamente humanas’ (Vygostsky, 1984,
p. 101).” (Oliveira, op. cit., p. 55)

O desenvolvimento de funções psicológicas superiores, portanto, não


depende exclusivamente de processos naturais de maturação, mas também
das relações estabelecidas entre o sujeito e o meio. Wertsch (1991) destaca
que, para Vygotsky, na ontogênese2 múltiplas forças de desenvolvimento
estão em operação simultaneamente:

“O crescimento da criança normal em direção à civilização


geralmente envolve a fusão com os processos orgânicos de
maturação. Ambos planos de desenvolvimento – o natural e
o cultural – coincidem e misturam-se um com o outro. As
duas linhas de mudança interpenetram-se e,
essencialmente, formam uma linha única de formação
sociobiológica da personalidade da criança.” (Vygotsky,
1960 apud Wertsch, 1991 p. 22, tradução nossa)

Considerando que o plano de desenvolvimento cultural está diretamente


relacionado às relações do sujeito com o mundo que o cerca, é importante
lembrar que este mundo está impregnado de elementos e significações
criados dentro da cultura do grupo social ao qual o sujeito pertence e,
portanto, suas ações neste meio, e a correspondente construção de
significados, são sempre mediadas por outros sujeitos e/ou por um legado
cultural.

Oliveira chama atenção para o significado do termo empregado por Vygotsky


na língua russa para referir-se ao processo de aprendizagem:

2
A abordagem genética de Vygotsky desdobra-se “nos níveis filogenético (desenvolvimento da
espécie humana), sociogenético (história dos grupos sociais), ontogenético (desenvolvimento do
indivíduo) e microgenético desenvolvimento de aspectos específicos do repertório psicológico dos
sujeitos), os quais interagem na construção dos processos psicológicos” (Oliveira, 1995, p. 55).
18

“obuchenie, que significa algo como processo de ‘ensino-


aprendizagem’ e inclui sempre aquele que aprende, aquele
que ensina e a relação entre essas pessoas” (p. 56).

Desta forma, um importante aspecto da perspectiva de Vygostsky a ser


considerado nas pesquisas sobre ensino e aprendizagem é a presença do
outro na construção de conhecimento. Oliveira (op. cit.) destaca, porém, que
nem sempre um educador está presente fisicamente nos processos de
aprendizagem, mas

“a presença do outro social pode se manifestar por meio de


objetos, da organização do ambiente, dos significados que
impregnam os elementos do mundo cultural que rodeia o
indivíduo” (p. 57).

Uma conseqüência disso é que a aprendizagem pode ocorrer de duas


formas distintas, uma informal, em que o indivíduo aprende por imersão num
ambiente cultural, que nem sempre conta com a presença física de outros
sujeitos, e outra formal, em que a aprendizagem é o resultado de um
processo deliberado de ensino, como ocorre na escola. Este é um tema
importante dentro da presente pesquisa e será retomado ainda neste
capítulo. Antes disso, porém, outro aspecto envolvido na perspectiva
sociocultural deve ser aprofundado. Trata-se do tema mediação, abordado a
seguir.

1.2. Mediação

Como apresentado até aqui o funcionamento mental superior é sempre


mediado por ferramentas e sistemas de sinais, tais como a linguagem
natural. Werstch lembra que:
19

“Vygotsky viu o uso de ferramentas em símios como


condição necessária, mas não suficiente para a emergência
do funcionamento mental superior.” (Werstch, 1991, p. 21,
tradução nossa)

Da afirmação acima, dois pontos devem ser destacados. Em primeiro lugar,


todas ações dos sujeitos sobre o mundo são mediadas por ferramentas
culturais. Em segundo lugar, uma importante contribuição dos estudos de
Vygotsky é a distinção entre ferramentas técnicas e psicológicas.

1.2.1. Ferramentas Culturais

O termo ferramentas culturais é empregado por Wertsch (1998) para referir-


se aos elementos mediadores de um modo geral, ou seja, todos os recursos
disponíveis para a ação dos indivíduos numa determinada cultura,
abrangendo tanto ferramentas técnicas (ou instrumentos) quanto
ferramentas psicológicas (sistemas de sinais).

Como produções culturais, todas as ferramentas apresentam potenciais e


limitações para moldar as ações por elas mediadas. Porém, tais
propriedades só podem ser observadas nos contextos reais de utilização, ou
seja, a mediação deve ser entendida como um processo envolvendo o
potencial das ferramentas culturais para modelar a ação, por um lado, e o
uso único das mesmas, por outro (Wertsch, op. cit.). Uma conseqüência
importante disso é que uma dada ferramenta cultural pode ser bastante
eficaz para mediar ações em determinados contextos e tornar-se um
obstáculo em outros. Uma imagem gráfica por exemplo, apresenta um
poderoso potencial de síntese para a construção de significados dentro da
cultura científica, porém, dependendo da forma com que é empregada em
sala de aula, pode tornar-se um obstáculo para a construção de significados
20

pelos alunos ou levar à construção de idéias distorcidas sobre o


conhecimento científico.

1.2.2. Pensamento e Linguagem

Em suas investigações sobre a espécie humana, Vygotsky encontrou o que


denominou fase pré-verbal do desenvolvimento do pensamento e fase pré-
intelectual do desenvolvimento da linguagem. Segundo Oliveira (1999) o
primeiro caso refere-se ao emprego de instrumentos materiais na mediação
entre sujeito e ambiente, numa espécie de “inteligência prática”, que habilita
o primeiro a resolver problemas e modificar o segundo. Este tipo de função
pode ser observado tanto ao longo da evolução da espécie humana
(filogênese), aparecendo também no comportamento de animais, quanto no
desenvolvimento do ser humano (ontogênese), aparecendo na utilização de
materiais pelas crianças como meio de alcançar objetos distantes, por
exemplo.

A linguagem, por outro lado, passa por uma fase pré-intelectual, em que é
utilizada somente como meio de intercâmbio. Este comportamento também
é observado tanto na análise da filogênese, quanto da ontogênese. Num
determinado momento da evolução da espécie humana3, pensamento e
linguagem passam a se relacionar, sendo que esta última, com seu caráter
generalizante, passa a funcionar como instrumento de pensamento.

Esta relação entre pensamento e linguagem tem implicações importantes


para as pesquisas sobre ensino e aprendizagem de Ciências, visto que além
de seu papel mediador da comunicação em sala de aula, a linguagem

3
Oliveira (1999) destaca: “A associação entre pensamento e linguagem [para Vygosky] é atribuída à
necessidade de intercâmbio dos indivíduos durante o trabalho, atividade especificamente humana. O
trabalho é uma atividade que exige, por um lado, a utilização de instrumentos para a transformação da
natureza e, por outro lado, o planejamento, a ação coletiva e, portanto, a comunicação social.” (p. 45)
21

muitas vezes consiste no próprio objeto de estudo dos alunos. Além disso,
como será abordado mais adiante, nas aulas de Ciências diferentes
linguagens podem ser reconhecidas, empregadas tanto como recursos
semióticos, quanto como parte do conteúdo a ser trabalhado.

1.3. Aprendizagem como Processo de Enculturação e Implicações para


o Ensino de Ciências

Partindo das considerações apresentadas até aqui, a adoção de uma


perspectiva sociocultural tem implicações importantes para o ensino formal.
Em primeiro lugar, nesta abordagem a aprendizagem pode ser considerada
como um processo de enculturação, ou seja, o processo pelo qual um
indivíduo entra em contato com os elementos que constituem determinada
cultura. Esta perspectiva de aprendizagem vem sendo adotada nas
pesquisas sobre educação em Ciências (Driver et. al., 1994; Driver e
Newton, 1997; Newton et. al., 1999; Roth, 1999; Reigosa Castro e Jiménez
Aleixandre, 2000; Lemke, 2003, entre outros), trazendo novas contribuições
para a área. Entre elas, a valorização do papel do professor na mediação
entre conhecimentos cotidiano e científico, e a necessidade de pesquisas
sobre as linguagens empregadas em sala de aula.

1.3.1. O Papel do Outro no Ensino Formal de Ciências

Como comentado anteriormente, sob uma perspectiva sociocultural a


aprendizagem pode ocorrer de dois modos, informal ou formal. Em ambos
os casos, o caráter social da construção do conhecimento está presente nas
interações entre indivíduos e ferramentas culturais. No primeiro caso, pode
ou não haver presença física do outro no processo, enquanto no segundo
caso a presença de um indivíduo mais experiente da cultura é essencial para
que avanços que não ocorreriam espontaneamente sejam alcançados.
22

Bruner (1985, p. 32 apud Driver et. al, 1994) descreve a preocupação de


Vygotsky com este processo:

“... o projeto de Vygotsky [era] encontrar a maneira pela qual


os membros aspirantes de uma cultura aprendem de seus
tutores, aqueles que já vivenciaram a cultura, como
entender o mundo. Aquele mundo é um mundo simbólico no
sentido de que consiste de sistemas de crenças,
conceitualmente organizados e delimitados por regras,
sobre o que existe, sobre como alcançar metas e o que
deve ser valorizado. Não há nenhum meio através do qual o
ser humano possa se especializar sobre o mundo sem a
ajuda e assistência de outros, em fato, o mundo são os
outros.” (destaque do autor, tradução nossa).

No ensino formal, o papel das intervenções do professor, que é o


representante experiente da cultura em que o estudante está sendo inserido,
é colocado em evidência. Desta forma, a análise das interações entre
professor e alunos e, também, entre alunos no plano social da sala de aula
representam um tema importante para a compreensão da aprendizagem em
situações formais de ensino.

1.3.2. Ferramentas Culturais e Ensino e Aprendizagem de Ciências

Além de colocar em foco o papel do professor, a metáfora de aprendizagem


como enculturação traz um novo olhar sobre os conteúdos e atividades
trabalhadas nas aulas de Ciências. Como uma forma de cultura, a Ciência é
construída socialmente, a partir do emprego de ferramentas culturais e
práticas específicas, que são sustentadas pelo compartilhamento de
crenças. A abordagem de aprendizagem como enculturação permite
abranger aspectos diversos da construção dos conhecimentos científicos,
desde seu caráter de produção humana até sua natureza simbólica. Os
elementos simbólicos, aliás, representam um papel essencial no ensino
23

formal de Ciências, tanto como recursos semióticos para a construção de


significados em sala de aula, quanto como parte do conteúdo a ser
trabalhado com os alunos.

“Nenhum conceito científico re-presenta uma realidade


preexistente absoluta; cada conceito científico oferece um
meio de interpretação de nossa experiência no mundo (...).
Cada conceito científico é um elemento em um sistema de
sinais, e também é uma fusão ou integração de elementos
simultâneos e conjuntos em vários diferentes sistemas de
sinais.” (Lemke, 2003)

Tradicionalmente, os cursos de Ciências são voltados para o acúmulo de


informações, muitas vezes consideradas como uma realidade preexistente
absoluta descoberta pelos cientistas. O principal foco de atenção está sobre
os produtos da Ciência e o desenvolvimento de habilidades estritamente
operacionais, em que, muitas vezes, o formalismo matemático e outros
modos simbólicos (tais como, gráficos, diagramas e tabelas) carecem de
contextualização. Esta prática dificulta a compreensão por parte dos alunos
sobre o papel que diferentes linguagens representam na construção dos
conceitos científicos. Mesmo quando ferramentas culturais como as
mencionadas acima são empregadas em aulas de laboratório, o uso de
roteiros de trabalho preestabelecidos - que também privilegiam ações de
caráter operacional - costuma mascarar a importância das mesmas dentro
da cultura científica.

As implicações negativas deste tipo de abordagem são muitas. O excesso


de formalismo e a falta de contextualização dos temas trabalhados nas aulas
tornam a disciplina muito distante da realidade dos alunos e dificultam seu
entendimento. A forma com que as atividades de laboratório são realizadas
contribui para a construção de uma visão distorcida do trabalho científico,
relacionado-o à aplicação de um método científico único, que possibilita
descobrir leis absolutas sobre a natureza.
24

Discussões sobre estes problemas e a busca de soluções para os mesmos


têm alimentado as pesquisas sobre ensino e aprendizagem de Ciências, e
algumas mudanças vêm sendo implementadas na educação já há algum
tempo. Os Parâmetros Curriculares Nacionais de 1997, por exemplo,
apresentam uma forte ênfase na necessidade de relação dos temas
escolares com o cotidiano dos alunos e do tratamento de aspectos sociais
envolvidos na construção do conhecimento científico. É importante, porém,
dar atenção a possíveis distorções envolvidas na busca de relações entre o
conteúdo de Ciências e a vivência dos alunos.

Gil Pérez et. al. (2001) abordam dois tipos de deformações importantes que
podem ser observadas no ensino de Ciências. Em muitos casos, no ensino
mais tradicional, a Ciência é apresentada de forma elitista e através de
conteúdos fechados. Como citado anteriormente, no caso da Física, é muito
comum que esta seja reduzida a um conjunto de formulações matemáticas
completamente distantes da realidade dos estudantes. Por outro lado, se
uma visão menos elitista (nas palavras de Gil et. el.) for levada ao extremo,
esta também pode causar problemas. Os autores chama atenção para o fato
de que uma idéia distorcida de que a atividade científica é algo simples e
que os estudantes podem ser motivados à realização de “descobertas”
também dificulta o entendimento dos conteúdos científicos. Neste último
caso, a insistência na criação de espaços para que os próprios alunos
‘descubram’ os conceitos almejados acaba levando à frustração tanto destes
quanto de seus professores. Além disso, é importante levar em consideração
que o formalismo matemático, assim como outras ferramentas culturais, é
parte do conteúdo científico e não pode ser deixado em segundo plano. Ou
seja, buscar relações entre Ciência e cotidiano é muito importante, mas há
também a necessidade de uma abordagem aprofundada da natureza
simbólica do conhecimento científico.
25

Portanto, ainda há muitas questões sobre a forma com que conteúdos são
trabalhados em sala de aula que precisam ser investigadas. Dentre elas,
como disponibilizar as ferramentas culturais da Ciência para os alunos, de
modo que eles possam compreender os potenciais que as mesmas podem
oferecer para a construção de conhecimentos, assim como familiarizar-se
com seu emprego.

Driver e Newton (1997) abordam este tema:

“Uma vez que a Ciência envolve um processo de construção


social de conhecimento, isto significa que os termos, os
modelos e modos de ver o mundo aprovados pelos
cientistas são produtos humanos – eles não são percebidos
diretamente da natureza. Dar aos aprendizes acesso a estes
‘modos de ver’, portanto, requer mais do que dar-lhes
acesso a fenômenos. Significa induzir aprendizes no modo
particular de representar o mundo usado pelos cientistas e
socializá-los para adotarem as ferramentas culturais daquela
cultura.” (Driver e Newton, 1997, p. 13)

Os autores sugerem que maior atenção seja dada ao trabalho com a


linguagem em sala de aula, considerando seu papel estruturante na
construção do conhecimento científico. Para compreender o mundo
simbólico da Ciência é necessário que o aprendiz entre em contato não
somente com produtos acabados da mesma, mas também com processos
de construção de significados, baseados no emprego de ferramentas
provenientes da cultura científica, dentre elas a linguagem social da Ciência.

Para que o estudo de teorias científicas faça sentido para os alunos, é


preciso que estes compreendam a que fim tais teorias são propostas. Um
conjunto de conceitos, que na maioria das vezes opõem-se ao senso
comum, aparentemente não apresenta nenhuma utilidade para um aluno
que não tem acesso à forma como é elaborado e aos princípios que regem
26

tal elaboração. A afirmação de Lemke (2003) traduzida a seguir expressa


bem esta questão:

“A Ciência não pode ser igualada a seus produtos: o que a


Ciência diz sobre o mundo não é a Ciência em si. A Ciência
em si é uma atividade humana que produz estas
declarações e teorias, e aprender Ciências não é aprender o
que a última geração de cientistas pensou sobre o mundo: é
aprender como cada nova geração de cientistas re-faz
nossa visão do mundo.” (Lemke, 2003)

A falta de atenção a este aspecto no conteúdo de Ciências torna o estudo


tedioso e sua compreensão, muitas vezes, inacessível para os alunos. É
necessário, portanto, que estes possam apreciar o papel das ferramentas
culturais da Ciência dentro de contextos adequados, ao invés de apenas
exercitarem o uso das mesmas sem qualquer compreensão de seus
significados.

Para que este processo ocorra, os estudantes precisam ter oportunidades de


expor suas idéias em sala de aula, num ambiente encorajador, adquirindo
segurança e envolvimento com as práticas científicas. É fundamental a
criação de espaços para a fala dos alunos. Através da fala, além de tomar
consciência de suas próprias idéias, estes também têm a oportunidade de
ensaiar o uso de uma linguagem adequada ao tratamento científico da
natureza.

É preciso considerar, porém, que outras linguagens estão envolvidas na


construção do conhecimento científico:

“A Ciência não fala do mundo somente na linguagem de


palavras, e, em muitos caso, ela simplesmente não pode
fazê-lo. A linguagem natural da Ciência é uma integração
sinérgica de palavras, figuras, gráficos, mapas, equações,
27

tabelas, esquemas e outras formas de expressão visual e


matemática.” (Lemke, 2003)

Esta afirmação reforça mais uma vez a necessidade de um contato mais


próximo dos estudantes com as ferramentas da Ciência, de forma que
possam apreciar o papel de cooperação entre as mesmas na construção de
explicações.

Uma tendência nas pesquisas sobre ensino e aprendizagem nos últimos


quinze anos tem sido a crescente atenção dada ao papel da linguagem
empregada em sala de aula, considerando sua dupla função no ensino,
como ferramenta semiótica, mediadora entre professor e alunos, e
ferramenta científica, objeto de aprendizagem. Porém ainda há muito o que
investigar sobre a linguagem verbal e também sobre outras formas de
linguagem, que costumam ser empregadas como ferramentas culturais
dentro da Ciência, tais como, formalismo matemático, gráficos e diagramas,
entre outros. É necessário compreender como estas diferentes linguagens
podem ser disponibilizadas para os alunos em sala de aula, sem a perda de
informações sobre suas funções dentro da cultura científica.

1.3.3. Aprendizagem de Ciências como Enculturação e


Multiculturalismo

A metáfora de aprendizagem como enculturação, além de contribuir para


uma visão ampla das diferentes facetas do conhecimento científico e,
portanto, dos diferentes aspectos envolvidos na aprendizagem do mesmo,
também chama a atenção para as dificuldades encontradas pelos alunos,
em função da bagagem cultural que estes trazem para a sala de aula.
Cobern e Aikenhead (1998) observam que a entrada dos estudantes numa
nova cultura não deve ser considerada apenas como uma mera aquisição
das características da mesma em detrimento da cultura pré - existente,
28

formada no cotidiano. Neste caso, estaria sendo incentivada uma alienação


dos estudantes ao invés da ampliação de suas visões de mundo. Os autores
chamam atenção para o fato de que para alguns grupos culturais a
transposição entre a cultura do cotidiano e a cultura científica escolar pode
ser muito traumática. Isto costuma acontecer principalmente quando as
diferenças culturais entre a vivência dos estudantes e a escola são muito
grandes, o que é freqüente no caso de grupos étnicos indígenas, por
exemplo.

Lemke (2001) observa que:

“[a] visão de educação em Ciências (e educação em geral)


como uma segunda socialização ou enculturação
especializada em uma subcomunidade foi desenvolvida a
partir da teoria antropológica (p. e. Spindler, 1987; Lave,
1988) e de perspectivas neo-Vygotskyanas em psicologia do
desenvolvimento (p. e. Cole, 1996; Wertsch, 1998; Rogoff,
1990)” (p. 298, tradução nossa).

Uma decorrência deste fato é que a aprendizagem como enculturação é


empregada em diferentes linhas de pesquisa sobre educação em Ciências,
compreendendo diferentes questões. Numa linha mais voltada para
questões antropológicas, o foco das pesquisas está nas dificuldades que os
estudantes apresentam na escola devido a diferenças muito grandes entre
suas culturas preexistentes e a cultura científica escolar. Muitas destas
pesquisas são realizadas com grupos étnicos marginalizados pela sociedade
ocidental, tais como, indígenas, afro-americanos e orientais, e envolvem
questões sobre o currículo de Ciências e sua relação com as culturas
preexistentes (ver Science Education volume 85 (1), 2001).

Para Aikenhead (1996), a metáfora de aprendizagem como aprendizagem


antropológica é mais abrangente do que a metáfora de enculturação. A
29

aprendizagem antropológica, segundo o autor, envolve considerar


aprendizes como antropólogos que apreciam e são capazes de construir
significados a partir da cultura estrangeira da Ciência. Para o mesmo, este
processo difere-se da metáfora de enculturação proveniente do
construtivismo social proposto por Driver et al (1994), na medida que, além
de assimilar aspectos gerais da nova cultura, sem perder sua cultura
original, o estudante é conscientizado sobre o papel da cultura prévia e pode
optar por adotar novos conceitos ou não.

Embora consideremos de grande importância as pesquisas voltadas para


questões étnicas no ensino e aprendizagem de Ciências, o enfoque do
presente trabalho não está na identificação de aspectos das culturas
preexistentes, mas na forma com que a cultura científica é apresentada na
sala de aula. Consideramos que além das dificuldades de aprendizagem,
ainda há muitos aspectos do ensino que precisam ser aprofundados, tais
como os modos de construção de significados inerentes à cultura científica e
a forma como são empregados em sala de aula.

É importante destacar, ainda, que, quando nos referimos à enculturação,


não estamos tratando de um processo de mera aquisição por parte dos
alunos de diferentes comportamentos ou formas de falar simplesmente
porque o professor de uma nova disciplina entrou na classe. Ao contrário, a
concepção da aprendizagem como enculturação prevê o desenvolvimento
de novas visões de mundo sem a perda do entrelaçamento entre as mesmas
e as visões anteriores - no caso da aprendizagem de Ciências, a aquisição
de uma nova linguagem e novas práticas, sem deixar de relacioná-las com
as linguagens e práticas do cotidiano. No contexto da presente pesquisa,
portanto, a diferenciação entre enculturação e aprendizagem antropológica
não se faz necessária.
30

1.4. Foco da Pesquisa

Os temas considerados até aqui exercem forte influência sobre a abordagem


sociocultural adotada nas pesquisas sobre ensino e aprendizagem de
Ciências. Principalmente no que concerne ao peso dado às interações
sociais na construção de conhecimentos em ambientes formais e aos meios
mediacionais envolvidos na relação do indivíduo com o mundo que o cerca
(ver Wertsch et. al., 1998 e Lemke, 2001). Nas palavras de Lemke (2001),
adotar uma perspectiva sociocultural nas pesquisas sobre ensino e
aprendizagem de Ciências significa basicamente:

“... ver Ciência, educação em Ciências e pesquisa sobre


educação em Ciências como atividades sociais humanas
conduzidas dentro de estruturas institucionais e culturais.”
(p.296, tradução nossa).

Das considerações anteriores, fica evidente que um importante contexto


para a investigação dos processos de ensino e aprendizagem é o plano
social da sala de aula. É neste plano que as interações entre estudantes e
professor, assim como relações entre estudantes e objetos culturais, tomam
lugar e podem ser observadas. A presente pesquisa tem como foco o estudo
deste plano, visando a compreensão de:

Como aspectos da cultura científica são disponibilizados no plano


social da sala de aula através de atividades de experimentação e
interações entre professor e alunos numa seqüência de aulas de
Física?

A questão acima envolve dois importantes aspectos das ferramentas


culturais, assim como das ações por elas mediadas, presentes na seqüência
de ensino sob investigação, que remetem a novas questões. O primeiro
31

deles diz respeito ao papel das mesmas na construção de significados em


sala de aula: quais ferramentas (ações) costumam ser empregadas
(realizadas) em aulas de Física? Como as mesmas contribuem para a
construção de significados?.

O segundo aspecto a ser considerado refere-se à relação entre cultura


científica e cultura escolar: das ferramentas culturais (ações) presentes nas
aulas de Física, quais delas representam a cultura científica e como podem
contribuir para a construção de uma visão adequada da mesma?. Neste
ponto, é importante lembrar que a cultura escolar sofre influências de
diversas áreas de conhecimento e conta com ferramentas (modos de lidar
com as mesmas) particulares. Desta forma, embora todas as ferramentas
culturais (ações) empregadas (realizadas) nas aulas de Física estejam
envolvidas na construção de significados, algumas delas estão (ou podem
estar) estreitamente relacionadas à cultura científica, enquanto outras não.
Para investigar a presença dessa cultura em sala de aula, portanto, é
necessário identificar as ferramentas que estão relacionadas à mesma, que
compõem o próprio conteúdo da disciplina, e as ações realizadas com elas.
Considerando que as atividades experimentais, tradicionalmente, envolvem
o contato com uma série de ferramentas da cultura científica, desde
instrumentos concretos para a realização de medidas, até linguagens
simbólicas, como gráficos e formalismo matemático, optamos por investigar
atividades deste tipo.

Para destacar os dois aspectos citados acima, optamos por abordá-los em


capítulos separados. No capítulo a seguir, apresentamos uma revisão
teórica sobre pesquisas voltadas para a análise de modos de construção de
significados nas aulas de Ciências. Os estudos citados foram selecionados
em função do embasamento teórico que proporcionam ao presente trabalho.
32

No capítulo 3, são abordadas algumas ferramentas semióticas que


constituem parte do conteúdo escolar de Ciências e sua relação com a
cultura científica. As ações e ferramentas abordadas foram selecionadas em
função de sua relação com aquelas encontradas na seqüência de ensino
sob investigação, que, no caso estudado, envolveu atividades de
experimentação.
33

Capítulo 2 – Modos de Construção de


Significados nas Aulas de Ciências

No plano social da sala de aula encontram-se diferentes ferramentas


culturais, tais como as linguagens verbal, gestual e visual e os diversos
materiais empregados por professor e alunos. Estas ferramentas e as ações
por elas mediadas estão intimamente relacionadas aos processos de
aprendizagem e, portanto, o estudo das mesmas consiste num importante
tema de investigação.

Tradicionalmente, a linguagem verbal costuma receber grande atenção nos


estudos sobre construção de conhecimentos em sala de aula. Em pesquisas
realizadas sob um enfoque sociocultural, aquela vem sendo um dos
principais instrumentos de investigação, assim como objeto de estudo nos
últimos vinte anos. Recentemente, porém, crescente atenção vem sendo
dispensada a outras formas de linguagem, considerando tanto seus papéis
como instrumentos didáticos, quanto como parte dos conteúdos abordados
no ensino de Ciências:

“Todos nós que estamos interessados no papel da


linguagem como uma ferramenta para construir significados
sabemos que os significados que a linguagem ajuda-nos a
construir também são feitos através de sua combinação com
uma variedade de outros recursos semióticos.” (Lemke,
2000, p. 245, tradução nossa)
34

2.1. Linguagem verbal nas aulas de Ciências

Nos últimos vinte anos, abordagens socioculturais para análise do ensino e


aprendizagem em sala de aula têm focalizado predominantemente
interações discursivas. Em muitas dessas pesquisas, especial atenção é
dispensada ao papel do professor e, particularmente, ao modo com que este
disponibiliza os conhecimentos no plano social da sala de aula, através da
linguagem verbal. Neste capítulo, são revisados alguns desses estudos, em
função de sua relação com a presente pesquisa.

Primeiros Estudos

Partindo da idéia de que a educação visa a construção de conhecimentos


compartilhados, Edwards e Mercer (1987) descrevem os modos com que o
professor estrutura e guia o discurso em sala de aula para introduzir
conteúdos temáticos e promover a troca de experiências com os alunos. Nos
processos de ensino e aprendizagem investigados, os autores identificam
formas de intervenção pedagógica, que variam em função do grau de
direcionamento adotado pelo professor. Num nível decrescente de controle,
as intervenções identificadas incluem as ações a seguir: extração/obtenção
de contribuições dos alunos; reforço de conhecimento como compartilhado e
significativo; extração/obtenção de contribuições por meio de pistas;
paráfrase de contribuições dos alunos; revisão; e exposição direta.

Considerando o conhecimento científico como produção humana sustentada


por processos de construção de significados, Lemke (1997) aborda a relação
entre aprendizagem de Ciências e linguagem em sala de aula. Para o autor:

“Aprender Ciências significa aprender a falar no idioma da


Ciência (...) ‘Falar cientificamente’ significa observar,
descrever, compartilhar, classificar, analisar, discutir,
35

hipotetizar, teorizar, questionar, desafiar, argüir, projetar


experimentos, seguir procedimentos, julgar, avaliar, decidir,
concluir, generalizar, relatar, escrever, expor, e ensinar
dentro e através da linguagem da Ciência”. (Lemke, 1997, p.
17, tradução nossa)

Embora, na afirmação acima, seja reconhecido o caráter multimodal do


ensino e aprendizagem de Ciências – que envolve ações mediadas por
diferentes formas de linguagem –, no referido trabalho Lemke (op. cit.)
dedicou especial atenção à linguagem verbal. O autor identificou padrões de
discurso, classificados como estratégias de diálogo e estratégias de
monólogo. Alguns dos quais se sobrepõem àqueles obtidos por Edwards e
Mercer (op. cit.). Por exemplo, dentro das estratégias de diálogo, Lemke
identificou o que denominou série de questões do professor, que, da mesma
forma que a intervenção extração/obtenção de contribuições dos alunos por
meio de pistas (definida por Edwards e Mercer), refere-se a um discurso
diretivo baseado no padrão IRF.

Outras Vozes

O padrão IRF, em que o professor Inicia o diálogo, o aluno Responde e o


primeiro dá um Feedback, é um velho conhecido das pesquisas sobre
interações em sala de aula (ver Sinclair e Coulthard, 1975 e Mehan, 1979
apud Lemke op. cit.). Durante muito tempo, o emprego deste padrão triádico
esteve associado a um ensino baseado na transmissão de informações,
contando com perguntas fortemente dirigidas por parte do professor e um
feedback com função de avaliar a resposta oferecida pelo(s) aluno(s).

Mortimer e Machado (1997) apresentaram um estudo sobre interações


discursivas no plano social da sala de aula, em que o caráter estritamente
avaliativo do padrão IRF foi questionado. Para tanto, os autores basearam-
36

se no conceito de dialogismo4 de Bakhtin e na teoria sobre dualismo


funcional de um texto5 de Lotman (1988 apud Mortimer e Machado, op. cit.).

Analisando as interações discursivas em um episódio de Química, Mortimer


e Machado (op. cit.) observaram que, embora o padrão IRF tenha
caracterizado a maior parte das interações, seu emprego nem sempre podia
ser associado a um processo de transmissão de conhecimentos prontos por
parte da professora. Em alguns casos, dependendo do tipo de feedback
oferecido, este padrão foi associado a um processo de construção conjunta
de novos significados, em que, ao invés de avaliar as contribuições dos
alunos, o feedback da professora incentivava-os a expressar suas idéias.

Além deste novo olhar sobre o padrão triádico, os autores observaram que a
alternância entre uma postura avaliativa e elicitativa por parte da professora
pode determinar o sucesso ou fracasso de um processo de mudança
conceitual.

Em nossos estudos realizados no mestrado (Capecchi e Carvalho, 2000 a e


b) observamos uma predominância do padrão IRF elicitativo nos episódios
de ensino relacionados à implementação de atividades de conhecimento
físico (Carvalho et al, 1998). Atribuímos esta postura das professoras ao fato
de estarem trabalhando com crianças pequenas, que ainda não haviam
entrado em contado com nenhum conhecimento sistematizado sobre os

4
O conceito de dialogismo construído por Bakhtin (ver Bakhtin, 1981 e Voloshinov, 1997) está
relacionado à presença de diferentes vozes numa enunciação. Para o autor este processo ocorre o
tempo todo na língua viva; todo locutor, ao buscar uma forma de expressar-se sobre determinado
tema, encontra-o já defendido e desacreditado por outrem, ou seja, todo tema carrega consigo uma
multiplicidade de vozes e significações (plurilingüismos) já atribuídas a ele em diversos contextos
sociais e históricos. Esta multiplicidade de vozes, porém, pode ser explícita/perceptível ou não, em
função das intenções do locutor e também do grau de compreensão que apresenta sobre o tema.
Uma enunciação é caracterizada como dialógica quando é possível identificar a presença de outras
vozes na mesma.
37

fenômenos estudados naquelas aulas, de modo que o objetivo das


atividades era a construção de uma primeira explicação para alguns
fenômenos, compartilhando os significados que cada aluno trazia para a
discussão. Em outro estudo (Capecchi et. al., 2000), realizado com alunos
do Ensino Médio, observamos que a alternância entre uma tendência de
padrão elicitativo e avaliativo na fala do professor, ajudou os alunos a,
respectivamente, apresentarem suas idéias e recordarem conhecimentos
básicos relacionados ao assunto, de modo a construir uma explicação para o
fenômeno em discussão fundamentada nas teorias já estudadas
anteriormente.

Outra importante pesquisa baseada nos estudos de Bakhtin foi desenvolvida


por Scott (1997). A partir de dois estudos de caso, o autor construiu um
modelo para a descrição da narrativa de ensino, em que explorou quatro
aspectos relacionados entre si: formas de intervenção do professor; natureza
dialógica e de autoridade do discurso; conteúdo do discurso e intervenções
pedagógicas de suporte. Dentre esses aspectos, destacamos o primeiro e o
segundo como importantes para a presente pesquisa.

Em relação às formas de intervenção do professor, o autor identificou cinco


categorias, que foram distribuídas em três grupos de acordo com os
propósitos de ensino envolvidos no emprego das mesmas. Estas categorias
são apresentadas a seguir:

5
Lotman (op. cit.) identifica uma dualidade funcional em textos falados e escritos. Para o autor, todo
texto apresenta duas funções básicas: transmitir significados adequadamente e gerar novos
significados. É importante notar, porém, que uma dessas funções pode ser predominante.
38

Narrativa de Ensino

Desenvolver conhecimento científico Dar suporte à construção de Manter a narrativa


significados por parte dos
alunos

Desenvolver a linha Desenvolver a Promover Verificar Manter a narrativa


conceitual: linha conhecimento entendimento
epistemológica compartilhado dos alunos
Moldar idéias

Selecionar idéias

Marcar idéias

Figura 2.1. – Intervenções pedagógicas na narrativa de ensino (Scott, 1997)

O segundo aspecto da narrativa de ensino considerado por Scott (op. cit.) é


a diferenciação entre discurso de autoridade e discurso dialógico. Esta
classificação é baseada na idéia de dialogismo de Bakhtin, também
empregada por Mortimer e Machado (op. cit.). Enquanto no discurso de
autoridade as contribuições do professor estão relacionados à transmissão
de informações, oferecendo poucas oportunidades para um diálogo genuíno,
no discurso dialógico os alunos são encorajados a pensar e debater.

Uma estrutura analítica para investigar o discurso em sala de aula

Em um trabalho conjunto, Mortimer e Scott (2000, 2002 e no prelo)


desenvolveram um modelo bastante abrangente para a descrição das
dinâmicas discursivas envolvidas na construção de significados em sala de
aula, considerando o importante papel tanto das intervenções do professor,
quanto das contribuições dos estudantes para o andamento da aula.

Numa abordagem proveniente da expansão dos estudos de Vygotsky, os


autores desenvolveram uma estrutura analítica que conta com cinco
39

aspectos relacionados entre si, subdivididos em três grupos: foco do ensino;


abordagem e ações. O primeiro deles compreende tanto o conteúdo em foco
nas interações, quanto as intenções do professor de um ponto de vista
pedagógico.

O segundo tema, abordagem, compreende a forma com que o professor


conduz sua interação com os alunos e está relacionado à diferença entre
discurso de autoridade e discurso dialógico, abordada em estudos anteriores
(Mortimer e Machado, 1997; Scott, 1997 e Mortimer, 1998).

O terceiro grupo de categorias refere-se à implementação da ‘estória


científica’ em sala de aula, compreendendo as ações propriamente ditas. O
que envolve tanto os tipos de intervenção do professor (provenientes do
estudo de Scott, op. cit.), quanto os padrões de discurso empregados por ele
(o mais comum deles é o IRF).

Aspectos da Análise

Foco do ensino 1. Intenções do professor 2. Conteúdo

Abordagem 3. Abordagem comunicativa

Ações 4. Padrões de interação 5. Intervenções do professor

Figura 2.2 – Estrutura analítica para análise e planejamento de interações de


ensino proposta por Mortimer e Scott (capítulo 3, no prelo)

Considerando a estreita relação entre os aspectos abordados nesta


estrutura analítica e o foco da presente pesquisa, três das cinco categorias
que compõem a mesma são descritas brevemente a seguir.
40

1. Intenções do professor – criar um problema; explorar e trabalhar com a


visão dos estudantes; introduzir e desenvolver a estória científica; guiar
trabalho dos estudantes com idéias científicas e dar suporte à internalização;
guiar estudantes na aplicação, e expansão do uso, de idéias científicas e
transferir aos mesmos a responsabilidade por seu uso; manter a narrativa.

Os seis tipos de intenções do professor identificados pelos autores refletem


os propósitos pedagógicos envolvidos numa abordagem sociocultural de
ensino e aprendizagem, que baseia-se na construção de significados a partir
das idéias dos alunos, mas também da introdução dos mesmos em uma
nova cultura. Processo que, por sua vez, depende do suporte oferecido pelo
membro mais experiente da mesma, o professor.

Um ponto que merece esclarecimento é a intenção denominada pelos


autores como manter a narrativa. Esta refere-se aos diversos recursos que o
professor utiliza para manter a continuidade (Mercer, 1995 apud Mortimer e
Scott, 2000) do discurso e ajudar os estudantes a seguir o desenvolvimento
da estória científica – tais como, revisar o progresso da narrativa,
redirecionar a discussão, antecipar resultados futuros, colocar as metas e
propósitos para a próxima narrativa, fazer comentários sobre história da
ciência para ilustrar o tema.

2. Conteúdo – Nesta estrutura de análise, Mortimer e Scott (op. cit.) abordam


o conteúdo que caracteriza a linguagem social6 da ciência escolar,
colocando em foco aspectos relacionados ao desenvolvimento da ‘estória
científica’ sendo ensinada. Em primeiro lugar, procuram identificar a
linguagem social predominante nas interações: cotidiana e científica.

6
O conceito de linguagem social, desenvolvido por Bakhtin (ver Bakhtin, 1981 e Voloshinov, 1997),
corresponde a estratificações da língua baseadas na divisão de grupos sociais, que incluem dialetos
empregados em áreas geográficas particulares ou formas de jargão profissional. Mortimer e Scott (op.
cit.) fazem um paralelo entre este conceito e o discurso em sala de aula, destacando que na aula de
Ciências ao menos duas linguagens sociais se apresentam enquanto professor e alunos falam a
respeito de fenômenos, a linguagem ‘científica’ e a linguagem do cotidiano.
41

Considerando que o objetivo do ensino é lidar com a linguagem científica, os


autores identificam três abordagens características da mesma – descrição,
explicação e generalização –, assim como as formas de embasamento para
a construção das mesmas: empírico e teórico.

3. Abordagem Comunicativa – Para caracterizar a interação discursiva entre


estudantes e professor, Mortimer e Scott (op. cit.) relacionam duas
dimensões do discurso. A primeira refere-se à distinção entre um monólogo
e um diálogo, considerando a presença de apenas um ou de mais de um
locutor na interação. O que caracteriza a fala como não – interativa ou
interativa, respectivamente. Enquanto a segunda dimensão refere-se ao
conceito de dialogismo de Bakhtin, considerando a predominância de
apenas uma ou mais de uma vozes na interação. O que possibilita
caracterizar a fala como de autoridade ou dialógica.

Da relação dessas duas dimensões são obtidos quatro tipos de abordagem


comunicativa:

• interativa / de autoridade (pode ser relacionada à estratégia de obtenção


de contribuições dos alunos por meio de pistas de Edwards e Mercer,
1987, ou à série de questões do professor de Lemke, 1997);

• interativa / dialógica (pode ser relacionada às estratégias obtenção de


contribuições do professor e construção conjunta, de Edwards e Mercer e
Lemke, respectivamente);

• não – interativa / de autoridade (corresponde à aula expositiva


tradicional);

• não – interativa / dialógica (esta última pode ser associada à estratégia


de parafrasear as contribuições dos alunos identificada por Edwards e
Mercer, 1987 e, também, a estratégias de revisão).
42

A Busca de Outras Dimensões

Ogborn et. al. (1996) apresentam um estudo diferenciado cujo foco está na
retórica empregada pelo professor para a construção de explicações em
sala de aula. De forma semelhante a Lemke (1997), os autores reconhecem
o papel de diferentes recursos semióticos na construção de explicações em
sala de aula, mas concentram seu estudo na linguagem verbal:

“... Nós tentamos ir além [da negociação de significados


compartilhados (Edwards e Mercer, op. cit.)], e olhar para
toda a atividade da sala de aula – fala, gesto, figuras,
gráficos e tabelas, experimentação, realização de
demonstrações – como meios para construção de
significados.” (Ogborn et. al., op. cit., p. 8)

No referido trabalho, os autores fazem uma analogia entre explicações e


‘estórias’, considerando que nas explicações científicas as entidades e
construções matemáticas envolvidas em algum fenômeno correspondem a
protagonistas, enquanto o fenômeno em si é o evento em que estes atuam.
Um importante aspecto atribuído a essas entidades é que, como
protagonistas, elas apresentam algumas capacidades, ou seja, um natureza
própria, que vai determinar a forma com que podem atuar nos eventos.
Assim, os eventos relatados não acontecem arbitrariamente, mas são
resultados da relação entre a natureza dos protagonistas envolvidos e a
situação de atuação dos mesmos. O que torna as explicações palpáveis
para os alunos.

Outra importante contribuição de Ogborn et. al. (op. cit.) é a identificação de


quatro aspectos envolvidos nas explicações: criar ‘diferenças’, construir
‘entidades’, transformar conhecimento e atribuir significação ao que é
material. O primeiro deles é baseado na idéia de que o que motiva uma
comunicação é a existência de algo conhecido por um dos participantes e
43

desconhecido7 por outro. Ou seja, para criar a motivação para a construção


de uma explicação, é preciso que o professor crie diferenças entre o que os
alunos sabem e aquilo que este deseja explicar.

O segundo aspecto das explicações é a necessidade de identificação da


natureza dos protagonistas envolvidos, ou seja, a criação de entidades. As
explicações em sala de aula costumam envolver protagonistas
desconhecidos dos estudantes ou lidar com propriedades diferentes das
atribuídas aos mesmos no cotidiano. Por este motivo, os autores chamam
atenção para o fato de que:

“... muito do trabalho de explicar nas aulas de Ciências


parece com descrever, rotular, ou definir. É preciso oferecer
o material para explicações. As entidades que serão usadas
nas explicações devem ser introduzidas para os
estudantes.” (Ogborn et. al., op. cit., p. 14)

Os dois últimos aspectos, transformar conhecimentos e atribuir significação


ao que é material estão relacionados à própria idéia de aprendizagem numa
abordagem sociocultural, que envolve professor e alunos num processo
dinâmico de transformação e construção de significados. Como já
comentado anteriormente, neste processo está envolvido o emprego de
diversos recursos semióticos, que não restringem-se apenas ao âmbito da
linguagem verbal. O papel de outras linguagens na construção de
significados nas aulas de Ciências é abordado a seguir.

7
“... ou freqüentemente assumido como desconhecido” (Ogborn et. al., op. cit., p. 11)
44

2.2. Diferentes Linguagens nas Aulas de Ciências

É crescente o número de pesquisas sobre o papel que diferentes linguagens


representam nas aulas de Ciências (Kress et. al., 1998, 2001; Lemke, 2000,
2003; Jewitt et. al., 2001; Franks e Jewitt, 2001; Jewitt e Scott, 2002; Roth,
2002; Piccinini, 2003). A partir de uma abordagem semiótica das interações
estabelecidas no plano social da sala de aula, estes trabalhos questionam a
supremacia normalmente atribuída à linguagem verbal nas pesquisas sobre
ensino e aprendizagem. Do ponto de vista da semiótica social, a
aprendizagem é vista como um processo dinâmico de construção de novos
significados, assim como transformação daqueles já existentes. Esses
processos são mediados por meios de representação específicos,
socialmente organizados e autênticos, denominados modos (Kress et. al.,
2001). Desta forma, além da linguagem verbal, outros modos mediam a
construção de conhecimentos em sala de aula, e merecem ser investigados.

Especialização dos Modos

Em um estudo sobre textos científicos, Lemke (1998) chama atenção para a


origem comum de diferentes modos semióticos empregados na
comunicação humana. O autor lembra, por exemplo, que a linguagem verbal
em suas formas oral e escrita é sempre acompanhada por recursos
semióticos visuais: gestos e/ou expressões faciais, no primeiro caso, e sinais
gráficos, no segundo. Além disso, modos visuais, lingüísticos e motores
(ações) dividem uma origem comum, que pode ser observada na
ontogênese. As crianças pequenas, por exemplo, não fazem distinção entre
escrita e desenhos, considerando-os como extensões da fala e dos gestos e
ações motoras.
45

Lemke (op. cit.) observa que a separação de escrita e desenho como modos
semióticos distintos, assim como a diferenciação entre modos comunicativos
(fala e gestos) e seus traços mais duradouros (escrita e desenho), é
resultado do aprendizado. Essa perda de unidade entre os diversos modos
de comunicação, segundo o autor, possibilita o refinamento dos mesmos, à
medida que são usados em situações sociais, proporcionando sua evolução
em diferentes especializações.

Kress et. al. (2001) também chamam atenção para a especialização


funcional sofrida pelos diferentes modos de comunicação em função de seus
usos ao longo da história. Ou seja, cada modo desenvolve-se melhor que
outros em determinadas direções e, portanto, apresenta potenciais e
limitações particulares para a construção de significados. Outro aspecto
destacado pelos autores, é a materialidade dos meios empregados em cada
modo. A característica temporal/seqüencial do som, que é o meio
empregado na linguagem verbal oral, por exemplo, proporciona à mesma
potenciais e limitações diferentes daqueles de uma imagem, cuja
materialidade envolve características espaciais e simultâneas.

Especialização dos Modos e Processo de Ensino e Aprendizagem

As diferentes especializações apresentadas pelos modos de comunicação


têm papel importante para a construção de significados, o que pode ser
estendido para a sala de aula. Kress et. al. (2001) caracterizam a seleção de
modos de comunicação pelo professor como um processo retórico para
promover o entendimento do conteúdo por parte dos alunos. Diversos
estudos (Kress et. al., 1998, 2001; Lemke, 2003; Jewiit et. al., 2001) têm
observado que diferentes modos representam papéis específicos na
construção de conceitos em sala de aula, contribuindo, entre outros, para a
ampliação das possibilidades de comunicação.
46

Além desse aspecto retórico, os estudos destacam o caráter multimodal dos


conteúdos de Ciências e do conhecimento científico. Neste último caso, a
especialidade de um dado modo pode torná-lo mais, ou menos, adequado
para a comunicação e representação de características do mundo material.

Nós podemos indicar modulações de velocidade ou tamanho, ou


relações complexas de forma ou posição relativa, de forma muito
melhor com um gesto do que com palavras, e nós podemos deixar
que o gesto deixe um traço e torne-se uma representação gráfica
visual que vai ficar e deixar-nos reexaminá-la quando tivermos
tempo. O aspecto dinâmico perdido no gráfico estático é
recuperado na simulação visual ou animação, que pode repeti-lo à
vontade, rapidamente ou devagar e congelá-lo no tempo (Lemke,
1998, p. 3, tradução nossa).

As especializações adquiridas por diferentes modos semióticos, portanto,


possibilitam a construção de significados através da associação dos
mesmos, e este aspecto pode ser especialmente observado na construção
do conhecimento científico, como descrito na citação acima. Lemke (op. cit.)
indica a matemática como uma modalidade semiótica que reúne aspectos
tipológicos (relativos à comunicação/representação de diferenças:
classificação), predominantes na linguagem verbal, a aspectos topológicos
(relativos à comunicação/representação de interações: relação),
representados em processos visuais e motores. As representações gráficas,
por exemplo, apresentam um caráter de continuidade, proveniente de modos
visuais e motores, e uma gramática implícita na leitura das mesmas,
proveniente da linguagem verbal. Desta forma, o autor destaca que os
conhecimentos científicos correspondem a híbridos semióticos,
simultaneamente e essencialmente verbais (tipológicos) e matemáticos –
gráficos – operacionais (topológicos).
47

Modos de Comunicação e a Sala de Aula

As pesquisas sobre diferentes modos de comunicação empregados em sala


de aula, citadas anteriormente, têm contribuído para a compreensão dos
papéis representados pelos mesmos na construção de significados. À seguir
passamos a abordar alguns modos de comunicação relacionados às
interações estabelecidas entre professor e alunos em aulas de Ciências,
especialmente aqueles envolvidos na seqüência de ensino investigada na
presente pesquisa.

Gestos e Ações sobre objetos concretos

Roth (2002a) argumenta que gestos representam um papel importante na


fala do laboratório científico. Neste artigo o autor sugere que a Ciência é
uma cultura com formas de narrativa particulares, práticas materiais,
crenças, etc. Visto desta forma, aprender Ciências é equivalente a outras
formas de enculturação incluindo a participação (de modos mais periféricos
para modos mais centrais) nas práticas desta cultura. O que vai ao encontro
da proposta do presente trabalho. Roth destaca que um dos aspectos
centrais da cultura é a linguagem. Mais especificamente, o autor mostra o
papel mediacional que os gestos representam entre linguagem e mundo. O
autor destaca ainda, que os movimentos das mãos representam um papel
crucial na emergência da linguagem. Inicialmente relacionados com a
manipulação e toque de objetos no mundo, esses movimentos evoluem para
gestos simbólicos e, por último, para uma linguagem descritiva e teórica
viável.

Crowder (1996) também refere-se aos gestos como instrumentos


empregados pelos estudantes na construção de significados. Segundo a
autora, nos momentos em que estão construindo explicações, os gestos
48

empregados pelos estudantes ajudam-lhes a fazer previsões, revisar e


coordenar elementos de um modelo explicativo. Por outro lado, ao
descreverem um modelo que já foi memorizado, estes estudantes
empregam gestos com uma função mais enfática do que construtiva,
aparecendo de forma redundante à linguagem verbal. A autora categoriza
gestos em dois grupos: o primeiro relacionado a conteúdos e o segundo
relacionado ao processo de comunicação. Os gestos identificados para o
primeiro caso são denominados: icônicos (representando atributos concretos
entre objetos); metafóricos (representando conteúdos abstratos) e dêiticos
(com função indicativa). As funções desses gestos observadas pela autora
em trabalhos de alunos em sala de aula são três: representar idéias
veiculadas por outros modos, numa função redundante; realçar ou estender
significados apresentados na linguagem oral, e, por último veicular conteúdo.

Em relação às ações sobre objetos concretos em sala de aula, Franks e


Jewitt (2001) identificam como significativas aquelas que são estruturadas,
transformadoras, comunicativas e geradoras. Os autores diferem a ação do
comportamento, destacando que esta última envolve interesses e
motivações, estando relacionada a processos psicológicos superiores. Para
tanto, recorrem ao conceito de atividade de Leontiev, que envolve um sujeito
humano, um instrumento mediador (ou ferramenta) e uma meta (objeto).
Desta forma, durante a realização de uma atividade de laboratório, por
exemplo, a meta de fazer medidas, envolve uma tarefa que pode ser
mediada pela linguagem verbal em suas formas oral e escrita e pelo uso de
instrumentos.

Considerando que “as pequenas ações só fazem sentido se os estudantes


entenderem-nas como parte necessária do contexto maior de padrões de
ação que são possíveis dentro da aula de Física”, os autores concluem que
a identificação destes padrões na ação dos alunos pode ser considerada
como evidência de aprendizagem. Desta forma, assumem a ação física
49

como mais um modo de significação ao lado da linguagem verbal e dos


gestos.

Modos Híbridos Matemáticos

Lemke (1998) destaca que a comunicação científica procura construir


significados que ultrapassam os princípios preponderantemente tipológicos
da semântica lingüística e demandam sua integração com modalidades mais
topológicas da semiótica visual. Esta característica dessa área de
conhecimento, segundo o autor, está relacionada à materialidade dos
processos físicos, que ultrapassa os limites de comunicação e
representação da linguagem verbal, que é mais orientada para a
classificação do que a descrição de relações de interação. É neste ponto
que a matemática vem auxiliar a construção de explicações científicas.
Lemke destaca que:

Matemática tem suas origens na linguagem natural, mas em todo


lugar que aquela linguagem natural era fraca semanticamente
para propósitos de representação de características de processos
materiais de interesse prático para nossos ancestrais, matemática
estendeu suas categorias (números racionais e razões, relações
quantitativas, variáveis, funções, infinitésimos, topologias, etc.) e
tornou possíveis os tipos de significados que poderiam ter um pé
em cada campo. Eles poderiam variar continuamente como
processos visuais e motores e representações gráficas, mas
poderiam também ser integrados em texto e discurso verbais em
modos que aqueles não poderiam. (Lemke, 1998, p. 3, tradução
nossa)

Desta forma, o autor coloca em evidência o caráter híbrido do conhecimento


científico:

... Para fazer ciência, para falar ciência, para ler e escrever
ciência, é necessário lidar com e combinar em formas regradas
discurso verbal, expressões matemáticas, representações gráfico
– visuais e operações motoras no mundo ‘natural’ (incluindo
humano como natural). (Lemke, 1998, p. 3, tradução nossa)
50

Modos e suas funções na construção de significados

Considerando que cada modo semiótico adquire suas especializações ao


longo de seu uso, um importante aspecto a ser considerado numa análise
multimodal é a impossibilidade de emprego de um sistema interpretativo
único para todos os modos. A solução adotada por diferentes pesquisadores
da área para poder comparar diferentes modos de comunicação (Kress et.
al., 2001, Franks e Jewitt, 2001, Lemke, 1998, 2000) é procurar olhar para
aspectos mais gerais da construção de significados, buscando identificar que
funções estes modos podem representar dentro daquele processo, sem
perder de vista suas características específicas.

Embora o instrumento que inspira esses autores tenha sua origem na


lingüística, este tem-se mostrado bastante adequado para a descrição do
papel de outros modos de comunicação (Kress e van Leeuwen, 1996;
Martinec, 1997; O’Toole, 1994 apud Lemke, 2000). Trata-se de uma
adaptação das funções lingüísticas desenvolvidas por Halliday (1976). Para
o teórico, toda comunicação envolve três funções lingüísticas: uma
ideacional; uma interpessoal e uma textual.

1. A linguagem serve para a manifestação de ‘conteúdo’: isto é,


da experiência que o falante tem do mundo real, inclusive do
mundo interior de sua própria consciência. Podemos
denominar este aspecto de função ideacional (...)
2. A linguagem serve para estabelecer e manter relações sociais:
para expressar papéis sociais, que incluem os papéis
comunicativos criados pela própria linguagem (...) Através
desta função, que podemos chamar interpessoal, os grupos
sociais são delimitados (...)
3. Por fim, cumpre à linguagem possibilitar o estabelecimento de
vínculos com ela própria e com as características da situação
em que é usada. Podemos chamar a este aspecto função
textual. (Halliday, 1976, p.136 e 137)
51

A função ideacional está relacionada ao tema da comunicação e representa


a idéia que o locutor deseja transmitir. Já a função interpessoal, está
relacionada ao posicionamento deste locutor em relação à platéia e em
relação ao próprio tema da comunicação. Por último, a função textual,
através da articulação das duas primeiras funções é aquela que dá
coerência à apresentação, caracterizando-a como um texto. Neste ponto, é
importante notar que um conjunto de idéias soltas, sem nenhum elo de
ligação que lhes dê coerência, tanto interna, quanto em relação ao contexto
externo, não pode ser considerado um texto. É neste ponto que a função
textual tem seu papel.

Antes de partirmos para uma extensão do uso dessas funções para a


análise de outros modos de comunicação, é essencial esclarecer que esta
divisão proposta por Halliday (op. cit.) tem um caráter estritamente analítico,
qualquer comunicação sempre apresenta os três tipos de função
simultaneamente. O que pode ser observado, porém, é uma variação de
graus de proeminência de uma função ou outra na formação do texto
comunicativo, porém todas estão sempre presentes.

Lemke (op. cit.) estende esta idéia de Halliday para o processo de


construção de significados. Para o autor, todo processo de significação
envolve simultaneamente três tipos de significados: um significado de
apresentação, que no caso das interações em sala de aula interpretamos
como relacionado ao conteúdo; um significado de orientação, representando
o posicionamento do locutor em relação ao tema e a seus interlocutores, que
na sala de aula associamos às expectativas do professor em relação ao
papel dos alunos, e, por último, um significado de organização,
possibilitando a articulação dos dois primeiros na formação de um texto
coerente. Este último significado é interpretado dentro da presente pesquisa
como os aspectos que estão envolvidos na construção da narrativa da aula
52

de Ciências, que deve apresentar tanto coerência interna, quanto coerência


externa dentro do planejamento curricular.

Para analisar as interações estabelecidas entre professor e alunos no plano


social da sala, portanto, nos propomos a interpretar os papéis exercidos por
diferentes modos de comunicação na construção de textos que possibilitem
ao professor construir junto com os alunos significados sobre aspectos da
cultura científica.
53

Capítulo 3 – Ensino de Ciências e a Cultura


do Laboratório Científico

Considerando o foco desta pesquisa sobre aspectos da cultura científica


disponibilizados em sala de aula, é necessário buscar relações entre
processos e instrumentos que costumam ser empregados dentro da cultura
escolar e seu papel na Ciência. É evidente que o conhecimento científico
não pode ser transmitido na escola tal como é produzido. O contexto escolar
conta com agentes, objetos e objetivos diferentes daqueles existentes nos
laboratórios científicos. Como abordado por Lopes (1999):

“... Segundo os autores [Chervel, 1990 e Forquin, 1992], o


conhecimento escolar é essencialmente uma cultura de
segunda mão em relação à cultura de criação: é
subordinada à função de mediação didática e determinada
pelos imperativos decorrentes dessa função.” (Lopes, 1999,
p. 19)

Antes de chegar à sala de aula, o conhecimento científico passa por


processos de transformação em função dos objetivos da escolarização.
Estes processos são complexos e envolvem desde a seleção dos temas
relevantes para o ensino formal até a transformação dos mesmos com o
intuito de torná-los acessíveis aos estudantes. O próprio fato da escola lidar
com conhecimentos produzidos em outros contextos já implica num
tratamento diferenciado dos mesmos. O que leva os estudantes a
construírem um conjunto de práticas, que podem ser, e freqüentemente são,
inconsistentes com a cultura científica (Roth, 1999).
54

O objetivo de destacar este fato não é de rotular de forma negativa a cultura


escolar, mas sim de evidenciar a importância de um questionamento sobre o
peso que estas diferenças podem ter na concepção de Ciência dos
estudantes. Como comentado anteriormente, a forma com que as
ferramentas culturais da Ciência costumam ser trabalhadas em sala de aula
pode levar a algumas distorções sobre o verdadeiro papel das mesmas em
seu contexto original. É necessário, portanto, encontrar meios de fazer com
que o trabalho dos estudantes se aproxime daquele realizado nas culturas
autênticas8, respeitando os limites do contexto escolar. Brown, Collins e
Duguid (1989 apud Jiménez Aleixandre et. al., 1998b) argumentam que
muitas das dificuldades encontradas pelos estudantes estão relacionadas ao
fato de ser exigido dos mesmos o uso de ferramentas, sem um
entendimento das metas para as quais são empregadas nos contextos
originais.

A partir das considerações anteriores, neste capítulo são apresentados os


tipos de atividades de experimentação realizadas na seqüência de ensino
sob investigação e algumas relações entre as ferramentas científicas
presentes nas mesmas e o modo com que são utilizadas em seu contexto de
origem, ou seja, no laboratório científico.

3.1. Atividades de Experimentação

Desde há muito tempo, as atividades de experimentação fazem parte das


disciplinas relacionadas às Ciências Naturais. Lunetta (1998) afirma que
relatos sobre o papel de atividades de laboratório em assistir estudantes na
aprendizagem de Ciências datam do início do século dezenove.

8
Brown et. al. (1989) fazem uma distinção entre cultura autêntica, aquela praticada no domínio
original (p. e. cultura científica), e a cultura escolar.
55

Até o final dos anos cinqüenta, atividades de laboratório eram empregadas,


predominantemente, como forma de ilustração e confirmação de
informações apresentadas pelo professor, e os estudantes tinham pouca
liberdade na realização das mesmas, limitando-se a assistir demonstrações
ou seguir roteiros rígidos para a verificação de teorias. Já nos anos
sessenta, o laboratório passou a ser um lugar de investigação, para o
desenvolvimento e teste de hipóteses, ganhando destaque dentro de
grandes projetos didáticos9, que marcaram a história do ensino de Ciências10.
A partir destes projetos, voltados para promover o engajamento dos
estudantes em relação ao conhecimento científico, o papel do laboratório
passou a receber maior atenção das pesquisas sobre ensino.

Desta forma, este tipo de atividade começou a ser associado à obtenção de


diferentes objetivos dentro do ensino formal de Ciências, dentre os quais,
aumentar a motivação dos estudantes, ensinar técnicas de laboratório,
desenvolver uma visão aceitável da natureza da atividade científica,
melhorar a aprendizagem dos conhecimentos científicos e promover
‘atitudes científicas’ (Hodson, 1994 apud Reigosa Castro e Jiménez
Aleixandre, 2000). A possibilidade de alcance destes objetivos, porém, é
questionável em função das formas de implementação das atividades em
contextos escolares (Hodson op. cit.).

Uma das principais críticas às atividades de laboratório, além do fato de


continuarem a ser empregadas predominantemente apenas como mera
ilustração de conhecimentos teóricos previamente introduzidos, é seu

9
Estes projetos, com forte ênfase nas atividades de experimentação, surgiram quando governos de
países como EUA e Inglaterra (Projetos PSSC e Nuffield, respectivamente) passaram a considerar a
necessidade de investimentos de grande porte na educação em Ciências, em função de suas
dimensões política e econômica (Carvalho, 1972).
10
No Brasil, o Projeto de Ensino de Física (PEF) foi desenvolvido dentro desta linha de trabalho, com
forte ênfase nas atividades de laboratório. Além disso, diferentes abordagens para laboratório didático
surgiram na década de setenta, acompanhando a tendência de valorização deste tipo de atividade
dentro das pesquisas sobre educação em Ciências (Pinho Alves, 2000).
56

tratamento como ‘receitas’, que transmitem uma visão deformada e pobre da


atividade científica, como, por exemplo, a crença num método científico
único que pode levar à re - descoberta de leis na natureza (Gil Pérez et. al.,
1999).

Outra questão importante a ser observada na implementação do laboratório


didático é que a ênfase em procedimentos fechados pode levar os alunos à
realização destas atividades de forma estritamente burocrática, sem
necessariamente construir conhecimentos sobre conceitos ou teorias
relacionadas ao fenômeno em questão (Reigosa Castro e Jiménez
Aleixandre, 2000). Este é um aspecto essencial quando o laboratório
didático é empregado como forma de promover a enculturação dos
estudantes em Ciências. Como qualquer outro tipo de atividade de ensino, o
simples contato dos alunos com a prática de laboratório não garante uma
compreensão adequada das práticas da Ciência. É preciso investigar de que
forma que as interações estabelecidas durante a realização daquela
atividade possibilitam torná-la significativa para os alunos e manter sua
relação com aspectos da cultura científica.

Para evitar distorções como as citadas anteriormente e aproximar as


práticas escolares de investigações mais próximas daquelas realizadas em
laboratórios científicos, Gil Pérez e Martínez Torregrosa (1983) sugeriram
converter atividades de resolução de problemas (habitualmente trabalhadas
na forma de exercícios dentro da cultura escolar) em problemas abertos, que
envolvam a análise qualitativa de uma dada situação. Esta proposta, que
aplica-se tanto a problemas de lápis e papel quanto a atividades de
experimentação, tem como principal característica o maior envolvimento dos
alunos em um trabalho de investigação e tem sido foco de pesquisas
voltadas para a investigação da enculturação em Ciências (Reigosa Castro e
Jiménez Aleixandre, 2000; Jiménez Aleixandre, Álvarez e Reigosa Castro,
1998; Jiménez Aleixandre, Díaz de Bustamante e Duschl, 1998).
57

As atividades de experimentação envolvidas na seqüência de ensino11


analisada na presente pesquisa, foram elaboradas por um grupo de
professores de Ensino Médio sob inspiração da proposta investigativa de Gil
Pérez e Martínez Torregrosa (op. cit.) e são descritas a seguir.

3.1.1. Laboratório de Demonstrações

O laboratório de demonstrações é considerado um tipo clássico de


laboratório didático, segundo Pinho Alves (2000 apud Villani, 2002). Neste
tipo de atividade, a ação está concentrada em um sujeito, em geral o
professor12, que pode contar ou não com a ajuda de algum aluno. Na
demonstração tradicional, o professor manipula materiais e apresenta um
fenômeno associado a algum tema discutido previamente, com o intuito de
ilustrar a teoria estudada.

Devido a seu formato centralizado no professor, este tipo de atividade


apresenta vantagens tanto em situações em que a quantidade de materiais
e/ou o tempo disponível são restritos, quanto quando o grau de dificuldade
de operação dos equipamentos envolvidos é elevado. Porém, uma
importante deficiência do mesmo é a redução dos alunos a meros
espectadores.

A necessidade de incentivo à participação ativa dos estudantes nas


atividades de ensino é ponto pacífico nas teorias sobre ensino e
aprendizagem dentro de uma abordagem construtivista, seja esta individual

11
Detalhes sobre esta seqüência e sua elaboração são apresentados no capítulo 4 sobre Metodologia
da Pesquisa
12
A realização de demonstrações também pode ser de responsabilidade dos alunos, quando estes
são convidados a apresentar para a turma a demonstração de algum fenômeno, mas a ação continua
concentrada em apenas poucos sujeitos, restando aos demais a observação.
58

ou social. Além disso, se uma atividade de ensino visa abordar não somente
os produtos da Ciência, mas também um pouco de suas características
culturais, é preciso que a mesma seja apresentada na forma de um
problema. Além de constituir-se num aspecto fundamental da construção de
um novo conhecimento (Bachelard, 1996), um problema a ser estudado é o
ponto inicial de uma investigação. É importante lembrar que a resolução de
um problema, neste caso, não refere-se a uma atividade estritamente
operacional, mas a uma atividade investigativa, com uma orientação próxima
do que constitui o trabalho científico, nos moldes propostos por Gil Pérez et.
al. (op. cit.).

Visando promover a participação dos alunos em discussões para a busca de


explicações para fenômenos físicos, numa prática investigativa, Carvalho et.
al. (1999) propõem a transformação das atividades de demonstração
tradicionais em atividades de demonstração investigativas. Este tipo de
atividade mantém a ação de manipulação de materiais e apresentação de
um fenômeno sob a responsabilidade do professor, porém, ao invés de uma
ilustração de alguma teoria já conhecida, a atividade é apresentada na
forma de um problema. Ou seja, o fenômeno que o professor demonstra
para os alunos é apresentado antes de sua explicação científica, sendo
estimulada uma discussão para que os alunos, com a ajuda do professor,
procurem uma explicação para o mesmo.

3.1.2. Laboratório Aberto

No laboratório didático tradicional, diferentemente do que acontece nas


atividades de demonstração, os alunos assumem um papel mais ativo,
responsabilizando-se pelas ações de manipulação de materiais e realização
de medidas.
59

O deslocamento da ação motora do professor para os alunos, embora


possibilite aos últimos entrar em contato com diferentes materiais e
instrumentos de medida relacionados às práticas do laboratório científico,
nem sempre implica numa atitude investigativa. Normalmente, as atividades
em laboratórios didáticos são direcionadas por roteiros de trabalho
desenvolvidos pelo professor. Desta forma, como citado anteriormente, a
experimentação em sala de aula pode transformar-se numa atividade
meramente operacional, distanciando o laboratório escolar ainda mais das
práticas da cultura científica.

Uma forma de orientar o laboratório didático na direção de uma atividade


científica é transformá-lo num processo de busca de solução para um
problema, que nos moldes propostos por Gil Pérez et. al. (op. cit.) deve
envolver as práticas a seguir:

• Estudo qualitativo de uma situação dada, envolvendo a elaboração de


hipóteses;

• Elaboração de estratégias para solução do problema, em função das


hipóteses elaboradas;

• Solução do problema em si, envolvendo alto grau de verbalização;

• Análise dos resultados obtidos.

Portanto, ao invés de um roteiro preestabelecido, o professor apresenta uma


questão inicial, cuja solução deve ser elaborada em conjunto com os alunos,
através de uma experimentação. Este tipo de atividade de experimentação é
conhecido na literatura sobre ensino e aprendizagem de Ciências como
atividade de laboratório aberto.
60

A atividade de laboratório aberto proposta por Carvalho et. al. (op. cit.) e
implementada na seqüência de ensino analisada na presente pesquisa conta
com seis etapas de trabalho: proposta do problema, levantamento de
hipóteses, elaboração de plano de trabalho, montagem de arranjo
experimental e coleta de dados, análise dos dados e conclusão.

O programa completo trabalhado na seqüência de ensino investigada é


descrito detalhadamente no capítulo quatro. A seguir são apresentados
aspectos da cultura científica que podem ser relacionados às atividades de
experimentação analisadas nesta pesquisa.

3.2. Cultura do Laboratório Científico e Ciências na Cultura Escolar

No começo da década de setenta, emergiu na Inglaterra uma nova


abordagem de pensamento sobre Ciência, denominada Sociologia do
Conhecimento Científico (Pickering, 1992). Diferentemente das abordagens
de pesquisa predominantes até então – voltadas para o estudo dos produtos
da Ciência e relações entre fatos e teorias – nesta nova abordagem, maior
ênfase é dada aos processos envolvidos na realidade de trabalho dos
cientistas, considerando a construção social do conhecimento científico.
Desta forma, começaram a ser desenvolvidos estudos voltados para a
compreensão das práticas científicas e do campo de recursos que as
sustentam – e também resultam das mesmas –, isto é, sua cultura. Pickering
(op. cit.) emprega o termo cultura para referir-se a todos os recursos, muitos
deles modestos, que os cientistas empregam e também transformam em
suas práticas. Esta abordagem, portanto, vai ao encontro da perspectiva
sociocultural adotada no presente trabalho, o que possibilita seu emprego
para a identificação de aspectos da cultura científica – ferramentas culturais
(correspondendo ao conjunto denominado por Pickering como cultura) e
ações mediadas por elas (as práticas científicas) – presentes na sala de
aula.
61

A seguir discorremos sobre alguns aspectos da cultura científica,


identificados em pesquisas dentro de uma abordagem sociológica do
conhecimento, e sua relação com as práticas observadas na seqüência de
ensino investigada.

Dentre os estudos realizados na área da sociologia do conhecimento


científico, consideramos como principal referência para o presente trabalho o
livro de Latour e Woolgar (1986) sobre A vida no laboratório. Este livro
representa um marco nos estudos sobre cultura científica e tem sido
empregado amplamente nas pesquisas sobre educação em Ciências (Roth,
1999, Vianna, 1998, Reigosa Castro e Jiménez Aleixandre, 2000, Villani,
2002).

O livro é resultado de dois anos de pesquisa etnográfica realizada por Bruno


Latour num laboratório de pesquisa coordenado pelo renomado cientista
Roger Guillemin13. Woolgar e Latour descrevem os diferentes fatores
envolvidos na construção de fatos científicos, incluindo questões sociais,
históricas e econômicas. A partir de um olhar distanciado sobre o mundo
exótico do laboratório, os autores identificaram, entre outros aspectos, uma
prática característica da comunidade científica, que denominaram processo
de inscrição literária, descrito a seguir.

3.2.1. Inscrição Literária: ferramentas culturais

Processos de inscrição literária estão envolvidos em grande parte das


práticas desenvolvidas num laboratório de pesquisa e seus produtos
representam um papel essencial na construção de fatos científicos. As

13
prêmio Nobel de medicina em 1978.
62

características destes processos, bem como a forma com que foram


identificados por Latour, são expostos no extrato do livro apresentado a
seguir:

“... nosso observador antropólogo vê-se confrontado com


uma estranha tribo que passa a maior parte do tempo
codificando, marcando, lendo e escrevendo. Qual é, pois, o
significado das atividades aparentemente relacionadas com
a marcação, a escrita, a codificação, a revisão? (...) A
mulher da esquerda injeta um líquido com uma seringa; ela
aspira um outro líquido em uma outra seringa, que passa à
sua colega; esta, por sua vez, esvazia o conteúdo da
seringa dentro do tubo. Somente aí começa o estágio da
escrita: as duas anotam escrupulosamente o tempo
decorrido e o número do tubo. Nesse intervalo, animais
foram mortos e diversos materiais (...) foram utilizados. (...)

A rotina de manipulação de tubos é periodicamente


interrompida. As amostras extraídas de ratos são
introduzidas em aparelhos e sofrem uma transformação
radical: longe de modificar ou etiquetar as amostras, a
máquina cospe uma folha cheia de números (...) Em outros
termos, os tubos, que são manejados com grande cuidado
durante uma semana – atividade que se pode avaliar, tanto
em termos de tempo de trabalho como de material, em
vários milhares de dólares –, agora perderam qualquer
valor. Só há interesse por essa folha cheia de números.

(...) A série de transformações, contudo, ainda não terminou.


A foto 12 mostra uma técnica que estuda diferentes
listagens produzidas pelo computador. Alguns instantes
depois de tirada a foto, a técnica foi chamada a um dos
escritórios, onde lhe mostraram o produto de todos os seus
esforços: uma simples curva traçada com elegância em
papel milimetrado. (...) Alguns dias mais tarde, o observador
tem diante de seus olhos uma nova versão passada a limpo
da mesma curva, pronta para ser publicada.” (Latour e
Woolgar, 1997, p. 42 e 43)

O extrato acima mostra claramente o papel do antropólogo investigando uma


estranha tribo e suas observações compreendem tanto aspectos das
práticas daquele grupo, quanto de questões sócio - econômicas, o
investimento de milhares de dólares para a realização de uma pesquisa, por
exemplo. Nas aulas de Ciências, consideramos que questões como estas
63

devem ser abordadas com os alunos, porém como o foco desta pesquisa
está nas ferramentas culturais envolvidas nas investigações de laboratório,
vamos nos concentrar no processo de inscrição literária.

Para caracterizar o processo observado, Latour e Woolgar utilizam-se da


noção de inscrição, tomada de empréstimo de Derrida (1967 apud Latour e
Woolgar, op. cit.) para designar operações de representação anteriores à
escrita. O termo inscritor é adotado pelos autores para fazer referência a
todas as montagens e/ou combinações de aparelhos empregados na
transformação de substâncias materiais em formas de registro que servirão
como instrumentos de análise para os cientistas, tais como, traços,
histogramas, números de registro, espectros, gráficos, etc.

A noção de inscritores adotada por Latour e Woolgar é um tema importante


para a investigação da presença da cultura científica em sala de aula, visto
que, como ferramentas culturais da Ciência, alguns deles costumam ser
trabalhados nas aulas de Ciências, como parte do conteúdo específico da
disciplina. Além disso, esta noção envolve uma prática essencial da cultura
científica, a discussão sobre propriedades do objeto de estudo através de
esquemas ou gráficos que estabelecem uma relação direta com o fenômeno
original. Os autores (op. cit.) observaram que, no laboratório científico, as
atividades e os processos que separam os fenômenos de sua inscrição
final, na forma de uma curva, por exemplo, são ocultados no momento de
discussão dos dados obtidos. Nas palavras dos autores:

"O diagrama final torna-se ponto de partida do processo


sempre renovado de escrita dos artigos sobre a substância
em questão. Nos escritórios são produzidos os artigos que
comparam e opõem esses diagramas a outros que com eles
se parecem, e aos que se encontram nos artigos já
publicados.” (Latour e Woolgar, 1997, p. 45)
64

Esta prática, que é coerente com o foco da cultura científica sobre as


propriedades extraídas dos materiais ou fenômenos em estudo, pode ser
problemática quando levada para as aulas de Ciências. Uma das principais
dificuldades dos alunos em lidar com a linguagem científica é justamente a
falta de compreensão de seu papel dentro dos contextos de pesquisa.
Enquanto para cientistas, um gráfico é praticamente o próprio fenômeno em
discussão, para os estudantes trata-se de mais uma linguagem a ser
decodificada, que se não for explicitamente relacionada com um fenômeno,
torna-se apenas mais um formalismo a ser decorado, desprovido de sentido.

“A forma pela qual os inscritores são utilizados no


laboratório distingue-se por um traço essencial: uma vez que
se dispõe do produto final – a inscrição –, rapidamente é
esquecido o conjunto das etapas intermediárias que
tornaram possível sua produção. A atenção concentra-se
sobre os esquemas ou figuras, enquanto são esquecidos os
processos materiais que lhes deram nascimento, ou melhor,
há um acordo para relegá-los ao domínio da pura técnica.”
(Latour e Woolgar, 1997, p. 60)

É importante observar que a prática de esquecimento ou desvalorização dos


processos envolvidos na construção de inscrições, comum na cultura
científica, não é trivial para os alunos. No ensino formal de Ciências, o
conteúdo das disciplinas muitas vezes é reduzido apenas ao tratamento
operacional de inscrições, sem considerar suas origens e processos de
construção, o que acaba dificultando a compreensão dos alunos sobre as
vantagens e limitações das mesmas para a construção de significados
dentro da cultura científica.

Roth (2002b) fez um estudo para mostrar como cientistas passam a usar
gráficos de tal modo que não mais os distinguem do objeto ao qual estão
relacionados. O autor refere-se a este processo como o desaparecimento da
ferramenta, no caso o gráfico, que possibilita a mediação entre o mundo
material e a investigação do cientista. Ou seja, na medida que os cientistas
65

participam de processos de transformação do mundo material em dados e


representações visuais, estas vão tornando-se transparentes ao olhar do
mesmo. Da mesma forma que um óculos auxilia um míope a enxergar o
mundo de forma diferente, levando-o até mesmo a esquecer-se de que está
usando este artefato, os gráficos e outras ferramentas científicas possibilitam
uma relação direta entre o investigador e seu objeto de estudo.

“... O ambiente material tem, portanto, uma dupla


característica: ele é o que torna possível o fenômeno e é
dele que se deve facilmente esquecer.” (Latour e Woolgar,
1997, p. 67)

Em um estudo realizado sobre cientistas trabalhando num laboratório com


foto receptores, Roth (op. cit.) observou que, em seu discurso, estes não
fizeram distinção entre os objetos sobre a lâmina do microscópio, a imagem
visual (através da ocular ou sobre o monitor), e os gráficos que
corresponderam a ambos. Isto mostra que a função mediadora do espectro
de absorção empregado pelos cientistas em seus experimentos
desapareceu, aparentemente proporcionando aos mesmos acesso direto
aos foto - receptores.

É importante notar, porém, que esta transparência só torna-se possível a


partir de um longo processo de familiarizam entre o sujeito e as ferramentas
mediadoras que utiliza para transformar seu objeto de pesquisa.

"Assumindo que construir gráficos é uma prática de


sinalização, de natureza inerentemente social, eu argumento
que o uso competente de gráficos requer familiarização com
a forma de sinalização em uso real (Roth & McGinn, 1998).
Mais do que assumir que há algo inerente ao gráfico que
permite às pessoas inferir sobre sua gramática e o conteúdo
de sua forma, eu assumo que falar sobre gráficos e seus
referentes é uma função da experiência histórica e cultural
do indivíduo." (Roth, op. cit., p. 3, tradução nossa)
66

Esta afirmação vai ao encontro do tratamento dispensado às ferramentas


culturais dentro da abordagem sociocultural, em que as potencialidades e
limitações de uma ferramenta só podem ser observadas em contextos reais
de emprego das mesmas. O que está relacionado ao uso que se deseja
fazer das mesmas e à experiência de quem pretende empregá-las.

Roth destaca que o emprego transparente de uma ferramenta cultural para a


observação de determinado fenômeno também depende da familiarização
com o próprio fenômeno. Em estágios avançados de trabalho, um técnico ou
pesquisador pode identificar algum problema na transformação de
determinado fenômeno em imagem gráfica, devido a sua extensa
experiência com o mesmo. Neste momento, a ferramenta cultural deixa de
ser transparente e o fenômeno ajuda a regulá-la em função dos
conhecimentos já estabelecidos. Esta relação de auto-regulação entre
fenômeno e sua representação, em que ora um é referente e outro sinal, e
vice-versa, característica de estágios avançados de investigação, também
precisa ser considerada quando busca-se o trabalho com ferramentas
científicas em sala de aula.

"... Às vezes, devido a sua experiência com o processo


inteiro de preparação e coleta de dados, os cientistas
puderam atribuir formas gráficas a alguns aspectos da
preparação, em outros momentos, estas foram atribuídas a
um artefato criado por sua instrumentação." (Roth, op. cit., p.
22, tradução nossa)

Os alunos muitas vezes são bastante habilidosos em enxergar essa relação,


quando solicitados a fazer relatórios sobre atividades de laboratório, estão
sempre dispostos a alterar os resultados de seus gráficos em função daquilo
que já é apresentado pela teoria. Esta, porém, é uma forma distorcida de
regulação entre referente e sinal, pois não está em questão a investigação
67

de um fenômeno, mas somente chegar a uma forma de representação do


mesmo preestabelecida pelo professor. Nestas situações a dimensão
transformadora, como lente que permite visualizar diferentes aspectos de um
fenômeno, da ferramenta cultural é perdida, e esta passa a ser vista apenas
como uma forma burocrática de representação da teoria.

"Um pequeno número de estudos analisou interpretação


gráfica ocorrendo como parte do trabalho em andamento de
cientistas e técnicos. Estes estudos sugerem que gráficos
proporcionam percepção, modos de ver os 'objetos naturais'
em que os cientistas estão interessados, enquanto ao
mesmo tempo moldam o que está lá para ser visto
(Garfinkel, Lynch & Livingston, 1981; Goodwuin, 1995;
Woolgar, 1990)." (Roth, op. cit., p. 4, tradução nossa)

Ou seja, o gráfico pode ser uma forma de sinalizar aspectos da natureza,


mas, também, através de outros dados, como a experiência anterior do
pesquisador com aquele determinado fenômeno e as teorias existentes a
respeito, a natureza serve para regularizar a forma do gráfico.

"Conhecimento científico é codificado na forma de sinais


abstratos (palavras, fórmulas, gráficos). Sinais são
diferentes dos referentes a que se referem; há, em outras
palavras, uma diferença ontológica entre sinal e referente
(Latour, 1993). (...) a coordenação de fenômenos naturais
(referentes) e representações científicas (sinais) é
alcançada através das práticas envolvidas no trabalho dos
cientistas, que possibilitam a coordenação de entidades
qualitativamente diferentes." (Roth, op. cit., p. 9, tradução
nossa)

Uma outra pesquisa sobre o emprego de representações gráficas por


cientistas foi realizada por Ochs et. al. (1996). Os pesquisadores
apresentam um estudo sobre o discurso dos físicos durante suas discussões
para a interpretação de gráficos obtidos da coleta de dados num laboratório
de pesquisa. Este estudo foi baseado em teorias provenientes das áreas de
68

lingüística, psicologia cognitiva e sociologia do conhecimento científico, e


envolveu tanto a análise da linguagem verbal, quanto informações sobre
olhares, postura e gestos dos cientistas.

Foi observado que, em alguns momentos das discussões, os cientistas


tomam a perspectiva de objetos que estão sendo analisados, envolvendo-se
nas representações gráficas (no sentido teatral do termo) dos eventos
físicos14. Ochs et. al., defendem que este tipo de ação possibilita aos
cientistas, de certa forma, re-viver os fenômenos em estudo por meio da
linguagem verbal e da gesticulação sobre as representações visuais. O que
mostra que, a gramática trabalha junto com a representação gráfica e os
gestos para construir uma identidade referencial, ao mesmo tempo, animada
e inanimada, sujeito e objeto.

Um exemplo disso é um trecho extraído da enunciação de um físico durante


a discussão de uma representação gráfica, que é apresentado a seguir:

"Ron: [quando [eu venho para baixo [eu estou [no estado de domínio
[((indica parte direita do diagrama))

[((move o dedo para a esquerda))

[((move dedo p/ direita))

[((move dedo p/ esquerda))"

(Ochs et. al., 1996, p. 331, tradução nossa)

Neste exemplo, pode ser observado o que os autores (op. cit.)


denominaram, um tipo de enunciação indeterminada, que combina um

14
Além deste tipo de prática referencial, típica do discurso informal privado, os autores observaram
outro tipo de prática, que também é reconhecida nas pesquisas sobre a vida no laboratório. Trata-se
daquela empregada em discursos formais de domínio público, em que os cientistas constróem um
relato de fenômenos científicos destacando as construções físicas de interesse para a pesquisa e
mascarando o envolvimento humano na manipulação da natureza.
69

sujeito pronominal pessoal animado ('eu', representando o pesquisador) com


um predicado que é um evento físico inanimado ('estou no estado domínio',
entidade científica inanimada). Ou seja, nesta afirmação não há distinção
entre o pesquisador e entidades físicas, os dois estão participando do evento
que está sendo estudado. Os autores concluem que

"Gráficos, então, provêm físicos com um domínio cognitivo e


espacial para habitar e percorrer. Eles também transportam
fenômenos físicos para a presença perceptiva dos físicos e
servem como um espaço em que físico e fenômeno físico
podem entrar em contato físico e simbólico um com o outro
(Ochs et. al., 1994)." (Ochs et. al., 1996, p. 350, tradução
nossa)

Uma importante constatação proveniente deste estudo é que as


enunciações com referenciais indeterminados, obtidas através da relação
entre gestos, apresentações gráficas e fala, representam um valioso recurso
discursivo e psicológico à disposição dos cientistas, enquanto estes
trabalham em suas interpretações e na busca de um consenso sobre os
achados da pesquisa.

Estas análises sobre o emprego de gráficos como ferramentas culturais


dentro da Ciências, colocam em foco a complexidade de relações envolvidas
no emprego das mesmas, o que é preciso ser considerado no momento de
sua utilização no contexto da sala de aula. É essencial, considerar que esta
habilidade discursiva dos cientistas de relacionarem-se com o fenômeno
físico através de sua representação, só é adquirida a partir de um trabalho
extenso de convivência com processos de inscrição. Os cientistas têm
consciência do papel das diferentes representações e desta forma podem ir
e vir entre elas de acordo com suas necessidades. Os alunos, por outro
lado, precisam aprender a transitar entre estes diferentes domínios para que
possam interpretar os significados envolvidos nos mesmos.
70

Uma importante implicação disso para a sala de aula, é a necessidade de


criação de espaços para que os estudantes possam familiarizar-se com as
diversas ferramentas empregadas na Ciência, tais como tabelas, gráficos,
diagramas e formulações matemáticas. Para tanto, é essencial a
participação em atividades que possibilitem acompanhar estes processos de
tornar as próprias ferramentas de trabalho transparentes ao olhar do
investigador.

3.2.2. Argumentação

Como comentado anteriormente, um importante aspecto da atividade


científica é a atenção dispensada aos produtos das inscrições literárias.
Estes produtos, além de mediarem a construção de significados no ambiente
de laboratório, representam um papel essencial em outra prática adotada
pelos cientistas, a argumentação.

“... Essa tribo dá a impressão de ter desenvolvido


habilidades consideráveis, tanto na arte de construir
dispositivos capazes de definir figuras, traços ou inscrições
fugidias – no que se refere ao aspecto material -, quanto na
arte da persuasão. (...) A capacidade de persuasão é tal que
eles conseguem convencer os outros, não porque estejam
eles próprios convencidos, mas porque estão seguindo uma
orientação coerente de interpretação dos dados.” (Latour e
Woolgar, p. 68)

Uma finalidade das inscrições literárias, segundo Latour e Woolgar, é a


transformação de enunciados em fatos científicos. Parte desta
transformação15 está relacionada à escrita e leitura de artigos, em que
produtos de inscrições literárias são empregados para a sustentação de

15
É importante citar que esta transformação de enunciados em fatos consiste num processo complexo
e longo, em que afirmações são defendidas e desacreditadas por diferentes autores, até o ponto em
que não seja necessário sequer a citação da fonte da qual o fato foi retirado (ver Latour e Woolgar,
1997, p. 68-90, e Latour, 1997).
71

argumentos. É através da argumentação, realizada por meios formais


(artigos e palestras) e informais (conversas no ambiente de laboratório) que
os cientistas convencem os outros sobre a importância de seus trabalhos, a
verdade do que dizem e a necessidade de investimentos no financiamento
de seus projetos (Latour e Woolgar, op. cit.)16. A argumentação, portanto, é
uma forma discursiva diretamente relacionada aos processos de produção
da Ciência.

Tradicionalmente, o ensino de Ciências é fortemente apoiado em fatos


científicos, sendo que estes já perderam todas as informações sobre os
processos argumentativos envolvidos em sua construção. Esta prática
contribui para uma visão distorcida do conhecimento científico, como produto
de uma descoberta, que pode envolver os esforços de uma única pessoa e
também como verdade absoluta. Além de promover idéias equivocadas
sobre a natureza do conhecimento científico, considerar os fatos da Ciência
como ‘verdades’, torna o trabalho com certas ferramentas científicas, como
os inscritores, sem sentido. Se não há necessidade de argumentação a favor
de uma idéia, por que buscar inscrições que justifiquem tais argumentos?

Desta forma, além de representar um papel essencial dentro da cultura


científica – o que já justificaria sua inclusão nos conteúdos escolares – a
argumentação também apresenta um caráter motivador para a construção
de explicações nas aulas de Ciências. Kuhn (1993) sugere que esta pode
ser empregada como uma forma de aproximação entre os pensamentos
científico e cotidiano. Visto que ao mesmo tempo em que envolve algumas
habilidades inerentes ao primeiro - reconhecimento entre afirmações
contraditórias, identificação de evidências e integração dos méritos de

16
Quando concordamos com o papel da argumentação na construção do fato científico, citada por
Latour e Woolgar, não deixamos de considerar a relação entre essa construção e a realidade.
Embora, segundo os autores, aspectos políticos e sociais exerçam forte papel nessa construção, é
importante lembrar que tanto a construção quanto o questionamento de argumentos num laboratório
passam pelo emprego de inscrições que representam atributos da realidade.
72

diferentes afirmações através da ponderação de tais evidências, por


exemplo – a argumentação também está presente no segundo.

Duschl e Ellenbogen (1999) também reconhecem a importância do emprego


de estratégias de argumentação tanto como meio para fazer e falar sobre
Ciência, quanto como forma de desenvolver o pensamento racional em
geral. Neste ponto é importante lembrar que, embora uma condição inicial
para a argumentação seja o dissenso, no caso em que se trabalha com esta
estratégia para construir explicações nas aulas de Ciências, uma síntese ou
consenso da turma são almejados. Para que este objetivo seja alcançado, é
necessário ponderar sobre o poder explicativo de cada afirmação, o que
também contribui para a formação de um espírito crítico por parte dos
estudantes (Siegel, 1995).

Considerar o papel da argumentação como ferramenta científica reforça a


necessidade de dedicar especial atenção às linguagens empregadas em
sala de aula. No caso da linguagem verbal oral, por exemplo, Sutton (1998)
destaca a importância da conscientização dos alunos sobre o papel da
linguagem em suas próprias aprendizagens.

A necessidade de criação de oportunidades para que os estudantes possam


experimentar o uso da linguagem verbal e outros modos de comunicação na
elaboração de explicações em sala de aula já foi discutida no primeiro
capítulo deste trabalho. A argumentação, como um gênero discursivo
amplamente empregado dentro da cultura científica e que merece ser
trabalhado nas aulas de Ciências, vem recebendo atenção dos
pesquisadores da área já há algum tempo (Candela, 1997, 1999; Duschl et.
al. 1999; Driver e Newton, 1997; Jiménez – Aleixandre et. al., 1998a; Driver
et. al., 1999; Capecchi e Carvalho, 2000a, 2000b; Capecchi et. al., 2000;
Villani, 2002; Villani e Nascimento, 2003). Estes estudos podem ser
separados em dois grupos, em função do enfoque adotado sobre o tema
73

argumentação. Enquanto os estudos de Candela abrangem características


gerais do discurso argumentativo em aulas de Ciências, os demais trabalhos
citados têm como enfoque aspectos estruturais que aproximam os
argumentos construídos em sala de aula daqueles empregados dentro da
cultura científica.

Candela (1997, 1999) observou que à medida que práticas discursivas são
incentivadas nas aulas de ciências, os alunos vão se apropriando de novas
formas de se expressar, adquirindo mais independência e confiança em
suas idéias. O principal foco de sua pesquisa foi investigar a capacidade dos
alunos de expressar suas opiniões e participar de uma forma ativa nos
processos de negociação de conhecimentos, contrariando a idéia de que
somente o professor determina os rumos das interações em sala de aula. A
criação de situações de conflito foi indicada pela autora como uma forma de
envolver estudantes na busca de recursos discursivos para a validação de
suas versões sobre conteúdos de Ciências.

Segundo Duschl et. al. 1999, a argumentação geralmente pode ser


reconhecida sob três formas: analítica, dialética e retórica, sendo que as
duas primeiras são baseadas na apresentação de evidências, enquanto a
última sustenta-se na utilização de técnicas discursivas para a persuasão de
uma platéia a partir dos conhecimentos apresentados por esta. No contexto
da aula de Ciências, podemos destacar a necessidade de uma
argumentação baseada na apresentação de evidências, já que estas são
tipicamente valiosas para a comunidade científica. É claro que o emprego da
argumentação retórica por parte do professor também faz parte do processo
de ensino e não pode ser desprezada.

Para investigar aspectos estruturais de argumentos que possibilitam


aproximá-los da argumentação científica, os autores dos demais estudos
74

citados anteriormente adotam como referência um padrão desenvolvido por


Toulmin (1958), que é detalhado a seguir.

Padrão de Argumento de Toulmin

O padrão de argumento de Toulmin sintetiza importantes aspectos


envolvidos na construção de conhecimentos científicos.

D Então, Q, C Dado

I I Justificativa

desde que J a menos que R Conclusão

I Conhecimento Básico

considerando que B Qualificador

Refutação

Padrão de Argumento de Toulmin

Os elementos fundamentais de um argumento segundo o padrão de Toulmin


são o dado, a justificativa e a conclusão. É possível a apresentação de um
argumento cuja estrutura básica é: “a partir de um dado D, já que J, então
C”. Porém, para que um argumento seja completo pode-se especificar em
que condições a justificativa apresentada é válida ou não. Assim, podem ser
acrescentados ao argumento qualificadores modais (Q), ou seja,
especificações necessárias para que uma dada justificativa seja válida.

Da mesma forma, é possível especificar em que condições a justificativa não


é válida ou suficiente para dar suporte à conclusão. Neste caso é
apresentada uma refutação (R) da justificativa. Os qualificadores e as
refutações dão limites de atuação de uma determinada justificativa,
complementando a ponte entre dado e conclusão. Além disso, a justificativa,
75

que a princípio apresenta um caráter hipotético, pode ser apoiada em uma


alegação categórica baseada em alguma lei, por exemplo. Trata-se de uma
alegação que dá suporte à justificativa, denominada por Toulmin como
backing (B) ou conhecimento básico. O backing é uma garantia baseada em
alguma autoridade, uma lei jurídica ou científica, por exemplo, que
fundamenta a justificativa.

O padrão de argumento de Toulmin é uma ferramenta poderosa para a


compreensão do papel da argumentação no pensamento científico. Além de
mostrar o papel das evidências na elaboração de explicações causais,
relacionando dados e conclusões através de justificativas de caráter
hipotético, também realça as limitações de uma dada teoria, bem como sua
sustentação em outras. O emprego de qualificadores ou refutações em
discussões na sala de aula carrega características da cultura científica,
como o emprego de modelos explicativos e a necessidade de ponderar
diante de diferentes teorias a partir das evidências apresentadas em favor de
cada uma delas.

Dentro da perspectiva de aprendizagem de Ciências como enculturação,


Driver e Newton (1997) destacam o papel que o desenvolvimento de
habilidades de argumentação entre os alunos pode representar na
aprendizagem, tanto do ponto de vista conceitual, a partir do domínio da
linguagem científica, quanto do ponto de vista epistemológico,
compreendendo sua construção social. Para tanto, além de sugerirem a
criação de atividades adequadas para que os alunos argumentem em sala
de aula, os autores apresentam categorias para a análise de tais
argumentos, a partir do padrão de argumento desenvolvido por Toulmin (op.
cit.). As categorias elaboradas valorizam a presença de teorias conflitantes e
as sínteses nas discussões em sala de aula. Assim, a cada categoria é
atribuído um nível de qualidade com base tanto na complexidade dos
argumentos utilizados, quanto na existência ou não de interação entre
76

diferentes idéias. O uso de qualificadores ou refutações (nível 3) só é


necessário quando há afirmações competindo (nível 2); um argumento que
não sofre nenhum questionamento pode ser incompleto, contando ou não
com uma justificativa (níveis 1 e 0, respectivamente). Fazer julgamento
integrando diferentes argumentos (nível 4) indica uma compreensão elevada
da natureza do conhecimento científico. Quando os alunos buscam uma
síntese numa discussão sobre determinado fenômeno ou tema relacionado à
ciência, estão buscando modelos explicativos mais abrangentes, o que
passa necessariamente pela elaboração de argumentos mais completos.

Num trabalho posterior, Driver et. al. (1999) indicam algumas formas de
argumentos tipicamente importantes para a comunidade científica –
desenvolvimento de simplificações; postulação de teorias explicativas
causais que gerem previsões; e apresentação de evidências a partir de
observações ou experimentações.

Jiménez Aleixandre et al. (1998) apresentam um modelo para a análise da


argumentação dos alunos em situações de resolução de problemas
experimentais. Neste modelo os autores criam algumas subcategorias para
componentes do padrão de Toulmin (op. cit.). A categoria dados é
subdividida em dois tipos, dados oferecidos (pelo professor, livro texto,
roteiro de trabalho) e dados obtidos. Os dados obtidos, por sua vez, são
classificados como empíricos ou hipotéticos. Além disso, os autores fazem
uma distinção de tipos de enunciado, que compreende hipóteses,
conclusões e oposições.

Argumentação dos Alunos e Intervenções do Professor

Apresentamos a seguir uma síntese de dois dos quatro estudos piloto


realizados no início da presente pesquisa, visando identificar e relacionar
77

argumentos empregados por alunos, intervenções do professor e


características de atividades desenvolvidas em diferentes contextos de
ensino. Três dos estudos foram realizados a partir de transcrições de
discussões em sala de aula extraídas de trabalhos relativos a outras
pesquisas (Silva, 1995; Barros, 1996; Gonçalves, 1997), enquanto o quarto
foi realizado com dados transcritos pela autora do presente trabalho. Desta
forma, os dados dos primeiros estudos já encontravam-se recortados em
episódios de acordo o objetivo das pesquisas originais.

A seleção desses dados foi realizada com base na diversidade de situações


a que se referiam, tanto do ponto de vista das atividades e do conteúdo de
Física envolvidos nas discussões, quanto do ponto de vista da faixa etária
dos alunos. Nos dois primeiros estudos, foram analisados alguns episódios
de longas seqüências de ensino com alunos do Ensino Médio, enquanto nos
últimos foram analisadas discussões correspondentes à realização de
Atividades de Conhecimento Físico com crianças na faixa de nove a onze
anos.

Estudo 1 – Investigando o Funcionamento de um Microondas (Capecchi


et. al., 2000)

Os episódios de ensino analisados neste estudo foram extraídos da tese de


doutorado de Silva (1995), cujo tema é o acompanhamento da construção
das idéias dos alunos dentro de um processo de ensino, que neste caso
está relacionado ao estudo dos conceitos de calor e temperatura. A escolha
destes episódios foi feita com base na riqueza de transcrições de discussões
em sala de aula sobre problemas envolvendo fenômenos físicos presentes
na referida tese, não tendo nenhum vínculo com o tema desenvolvido na
mesma. Tais episódios correspondem, respectivamente, à segunda e à
quarta aulas de uma seqüência de ensino sobre o funcionamento do
microondas, realizadas com uma turma de alunos do primeiro ano do Ensino
Médio da Escola de Aplicação da FEUSP.
78

Episódio 1A – Tentando explicar o funcionamento do forno de microondas

Este episódio corresponde a parte de uma discussão de um grupo de alunos


para buscar um consenso entre respostas dadas individualmente pelos
membros do grupo a questões apresentadas na aula anterior. As questões
em discussão são:

i. Relacione abaixo os aparelhos e/ou dispositivos que podem


ser usados em uma casa, destinados a provocar aquecimento.
ii. Agrupe-os e explique como eles funcionam. (Silva op.cit.p.
203)

A seguir são apresentados alguns trechos do episódio analisado que


representam as principais formas de argumentos empregados pelos alunos
nas discussões, assim como algumas intervenções do professor.

A: Deve ser algum tipo de filamento ... que esquenta ...


E: Eu acho a luz ... a onda produz calor ... que produz a luz ...
J: Sabe porque eu não acho que é filamento, senão seria resistível
e não radiação ...
F: É ...
E: Então é algum tipo de luz ...
J: A luz é emitida mas ... acho que não é a luz que aquece ...
quando se põe algo no sol ... tipo tudo aquece ... o prato também.
23. A: Eu também acho que não ... o que deve ter dentro do ...
forno para soltar as ... (Silva op. cit., p.219)

Nesta seqüência, os alunos estão levantando hipóteses sobre o princípio de


funcionamento do forno de microondas. Duas hipóteses são levantadas
pelos alunos A e E, respectivamente, o funcionamento relacionado a algum
tipo de filamento ou alguma relação com a luz. O aluno J se opõe às
hipóteses justificando sua posição, o que pode ser classificado como
refutação. A refutação ao filamento é baseada num questionamento da
nomenclatura para classificar os aparelhos e não em algum dado empírico
ou teoria. Já a refutação à hipótese da luz como princípio de funcionamento
79

é mais elaborada, contando com a apresentação de uma situação em que


esta não é válida.

Pr: Deixa eu ver ... ajudar na discussão ... Eu quero cozinhar uma
carne, por exemplo, pra isso eu posso dispor do fogão ... a
combustível ... a gás e de um forno de microondas ... a primeira
coisa ... é o tempo de cozimento eles são iguais?
J: Não ... o microondas a gente pode controlar a intensidade e o
tempo ...
Pr: Ótimo ... o microondas doura as coisas?
[todos falam juntos]
Pr: Pera aí ... um por vez...
F: Não ... porque ele cozinha por dentro ...
Pr: Ótimo vocês já tão começando a levantar hipóteses de que um
processo diferente tá ocorrendo ...
E: Aqui a gente tinha feito ... que ele aquece substâncias que
tinham 50% de água ... (Silva, op. cit., p. 219)

Neste trecho, pela primeira vez, o professor entra na discussão e sua atitude
é de promover novas questões, tentando ajudar os alunos a reorganizarem
suas idéias. Apesar de não chegarem a nenhuma conclusão, os alunos
foram evoluindo ao longo da discussão elaborando diferentes hipóteses e
apresentando dados a favor e contra as mesmas. A presença de refutações
mostrou uma preocupação com o rigor no uso do vocabulário, assim como a
capacidade de associar evidências com as hipóteses desenvolvidas. O
discurso avaliativo do professor ajudou os alunos a acrescentarem novos
dados ao problema.

Episódio 1B – Comparando o funcionamento dos fornos convencional e de


microndas

Este episódio ocorreu duas aulas depois do 1A. Nesta aula, antes da
seqüência analisada, o professor havia feito algumas experiências com os
alunos em laboratório, comparando o forno de microondas com o forno
elétrico convencional. A seguir apresentamos a transcrição da fase da aula
em que o professor pediu aos alunos que lessem em voz alta o que haviam
80

escrito sobre cada classe de aquecedores a partir das discussões das aulas
anteriores.

Aluno 8: Professor ... eu coloquei parecido com o J ... eu coloquei


que as ondas interagem diretamente com o alimento ... não
interagem com o recipiente ou com o ar ... que tá lá dentro ...
então essa energia de agitação das moléculas do alimento vai ser
maior ... que a energia ... das moléculas do ar que tá no forno
normal [a gás] ... então tem mais diferença de temperatura ... vai
ter e mais propagação de calor ... então vai evaporar mais água
também e vai ficar mais seco.
Pr: Pera aí ... O aluno 8 colocou uma nova situação: ele falou de
moléculas de alimentos ... quem são as moléculas que
basicamente constituem um alimento?
Aluno 9: Água ...
Pr: Água e que mais? Alimento é constituído de que?
Aluno 10: Amido ... carboidratos ... e outras coisas.
Pr: Será que as microondas interagem como um todo? ... em
todas as moléculas? Será que elas interagem com todas?
Aluno 5: Acho que são com as da água, né?
J: É aí as moléculas de água passam para as outras moléculas do
alimento.
Pr: Ótimo! Conta pra mim João, a que temperatura a água começa
a evaporar? A que temperatura ela vai entrar em ebulição?
J: 100 graus ...
Pr: 100 graus Celsius ... agora eu pergunto o seguinte: será que
essa microonda vai interagir com uma molécula de proteína?
J: As moléculas de água ...
Pr: O aluno 8 falou outra coisa importante: que a temperatura que
o alimento foi submetido no microondas é maior que a do que foi
submetido no forno a gás. Vocês concordam?
Aluno 11: Eu discordo ...
Pr: Diga ...
Aluno 11: Se a molécula de água evapora a 100 graus, o máximo
que ela vai ficar é até 100 graus Celsius ... no microondas. Depois
ela vai evaporar ... e no forno tem uma temperatura maior porque
ele aquece todas as moléculas ... não só as de água ... A gente
quando abre um microondas vê um monte de vapor ... e no forno
sente um bafo ... um ar quente ... (Silva, op. cit., p. 231 e 232)

Nesta seqüência, são apresentadas afirmações com justificativa, hipótese,


refutação e também uma síntese. O papel do professor é muito importante.
A partir da afirmação do aluno 8, aquele inicia um questionamento que
chama a atenção dos alunos para novos aspectos do problema. Se por um
81

lado eles apresentam suas idéias livremente, a partir de questões elicitativas


do professor, por outro lado, conhecimentos básicos já compartilhados pela
classe são enfatizados através de questionamentos mais diretivos.

O professor também procura chamar a atenção dos alunos para o que os


colegas falam. O aluno 11 apresenta um argumento completo sobre a
diferença entre os fornos elétrico e microondas, baseado no conhecimento
básico requisitado pelo professor num turno anterior. Este aluno, ao refutar a
fala de um colega, acaba apresentando uma síntese de tudo que foi
discutido até o momento. De acordo com o que já havia sido colocado pelos
alunos A5 e J e considerando o conhecimento básico sobre a temperatura
de ebulição da água, A11 diferencia os dois tipos de fornos, fazendo uma
síntese das contribuições da turma.

Comentários sobre o estudo 1

Os dois episódios podem ser divididos em duas fases de acordo com a


participação do professor nas discussões. Na ausência do professor, o nível
de argumentação dos alunos foi bastante elevado, contando com duas
refutações. Nesta fase os alunos apresentaram grande preocupação em
associar dados do cotidiano ou conhecimentos básicos às suas afirmações.

Quando o professor começou a participar com uma alternância de padrões


discursivos, a atenção dos alunos foi direcionada para aspectos
fundamentais já discutidos anteriormente, impulsionando a formulação de
uma síntese. A solicitação de conhecimentos básicos foi fundamental para a
conclusão final, da mesma forma que o aproveitamento da fala espontânea
do aluno 8 enriqueceu substancialmente a discussão.

É importante observar ainda que, além do papel do discurso do professor em


estimular um nível de argumentação elevado (nível 4) entre os alunos,
82

mesmo na sua ausência argumentos elaborados foram apresentados (nível


3 - presença de refutações). O envolvimento dos alunos com o problema
proposto, suas experiências cotidianas sobre o assunto e os conhecimentos
básicos que possuíam podem ser apontados como fatores importantes para
este fato.

Estudo 3 – O problema do submarino (Capecchi e Carvalho, 2000b)

O episódio analisado neste estudo foi extraído da pesquisa apresentada na


tese de doutorado de Gonçalves (1997), correspondendo à fase de
discussão em uma aula de conhecimento físico. A aula analisada foi
realizada numa escola estadual da cidade de São Paulo com alunos do
segundo ciclo do ensino fundamental, antiga quarta série, tendo sido
ministrada pela própria professora da turma.

O problema proposto foi que os alunos fizessem um frasco transparente


afundar e emergir numa bacia com água, descobrindo por si mesmos os
meios para que isto acontecesse17.

A seguir são apresentados alguns trechos da discussão:

Valério: O submarino estava flutuando porque o ar estava dentro


dele. Daí eu chupei assim, o caninho que estava debaixo começou
a entrar água, começou a descer assim ... na água. Para subir é
só chupar ... não, soprar ... o ar para dentro do submarino, que a
água saía pelo outro caninho. Aí ele começava a subir.
Iara [P]: Quando você soprava...
Valério: A água tava saindo e ele começava a subir.
Gisela: Professora, eu tenho uma pergunta para falar. Olha,
quando a gente chupava, por que, ao invés de esvaziar, ele
enchia? Por que a gente chupava a água que estava dentro? Por
que, não era a água que fazia ele afundar? Aí quando assoprava
ele subia? Quando assoprava, não deveria abaixar? Por que,
professora?
Iara [P]: Quem vai explicar?
Antonio: Professora, o submarino tava com ar. Conforme a gente
foi chupando, foi chupando o ar ...

17
Mais informações sobre esta atividade, O Problema do Submarino, podem ser encontradas em
Carvalho et. al. (1998), p. 68 a 77.
83

Iara [P]: Tá ouvindo? Ele está explicando pra você.


Antonio: Conforme a gente foi chupando, foi saindo o ar ... o ar
deixava a água entrar. Quando eu fui chupando o ar, a água podia
entrar, tava liberado. Quando eu soprava, entrava o ar e
empurrava.
Iara: Primeiro, o que estava dentro do submarino?
Coro: O ar!
Iara [P]: Você perguntou por que quando ia sugando ia ficando
cheio de água e ia afundando. Por que será isso?
Gisela: Ah! Porque ficava mais pesado, né?
Iara [P]: Então a água pesa mais que o ar? (Gonçalves, op. cit., p.
200 a 201)
Desde o início da discussão até o primeiro turno do extrato acima, os alunos
vinham apresentando afirmações semelhantes à do aluno Valério,
justificando claramente a flutuação do “submarino” pela presença de ar em
seu interior, contribuindo para uma maior elaboração da justificativa
apresentada até agora pela classe. Porém, algo ainda não está esclarecido:
“... quando a gente chupava, por que, ao invés de esvaziar, ele ( o
‘submarino’) não enchia?”, pergunta a aluna Gisela. Neste momento uma
explicação mais elaborada é solicitada por uma aluna, evidenciando, como
cita Candela (1997), a necessidade que os alunos têm de argumentos que
os convençam e como um discurso mais aberto da professora permite que
os mesmos participem levantando questões. Dentro da proposta elicitativa
da professora, a pergunta é jogada para a turma e o aluno Antonio dá mais
uma razão para a idéia em vigor sobre flutuação e afundamento: “... o ar
deixava a água entrar ... tava liberado.”. Além disso, a partir do
questionamento da professora: ” Por que será isso?”, a aluna Gisela
aprimora ainda mais a justificativa para o afundamento, citando o aumento
de peso. Verificamos aqui o importante papel da pergunta “por que?”
(Candela, 1997).

Rafael: O Marcelo tava perguntando por que o submarino de


verdade afunda.
Iara [P]: E daí, como será que ele afunda?Esse de vocês não tinha
tripulante nenhum, né! Será que ele entra água também, para ele
afundar?
Coro: Não!
Aluno 2: Não, senão mata as pessoas!
84

Iara [P]: Como será, então, que faz para afundar?


Valério: Ah! Professora, tem assim, um motor. Eu entendo que o
submarino tem uma máquina que faz ele descer e subir.
Antonio: Eu já vi num filme. Quando subia, saía um monte d’água,
assim, dele ... assim do lado, saía um montão d’água.
Alexandre: Professora, entrava água assim embaixo, aí quando
ele sobe a água vai saindo
Iara [P]: Você acha que ele funciona assim, do mesmo jeito?
Alexandre: Sim.
Iara [P]: Alguém acha diferente?
Adriana: Eu acho que é o peso das pessoas que desce.
Aluno 4: E para subir? Todo mundo sai nadando?
Adriana: Não, arrumava alguma coisa para subir.
Aluno 5: Acho que tem um motor atrás. Deve virar e o submarino
descer.
Anita: Deve ter um tipo de uma hélice, conforme ela roda, o
submarino
...
Alexandre: Lá embaixo, deve ter um espaço para entrar a água.
Quando a água entra, fica pesado, vai para baixo. Quando está lá
embaixo, solta a água e ele sobe para cima.
Iara [P]: Nós vamos pesquisar como funciona o submarino de
verdade. (Gonçalves, op. cit., p.201 a 202)

Ao longo do episódio, os alunos apresentaram uma explicação para o


funcionamento do “submarino”, justificando-a de forma cada vez mais
elaborada, explicando seu movimento na horizontal, a entrada e a saída de
água através da sucção e da entrada de ar, respectivamente, e atribuindo o
aumento da grandeza peso para o afundamento. No primeiro turno do
extrato acima, uma nova questão é proposta, mais uma vez por um aluno de
acordo com as expectativas de Candela (1997). A partir da questão de como
funciona um submarino de verdade, essencialmente aparecem dois tipos de
respostas, uma baseada na entrada de água e outra na ação de um motor.
Ambas as idéias são acompanhadas de justificativas de diferentes alunos,
caminhando paralelamente sem nenhum confronto.
85

Somente dez turnos depois, a aluna Adriana apresenta uma terceira idéia,
não contando nem com a entrada de água e nem com a presença de um
motor, que imediatamente é refutada por um colega. A presença de uma
refutação indica um alto nível de participação dos alunos na discussão,
estando atentos o suficiente para reagir prontamente a algum argumento
inadequado.

Apesar de sua fala ter sido refutada, a aluna Adriana apresentou uma
importante extensão da discussão anterior à nova situação, retomando a
grandeza peso como fator importante. Na fala 64, o aluno Alexandre faz uma
síntese em defesa da entrada de água para imersão, acrescentando a
grandeza peso resgatada pela aluna Adriana na fala 59.

Comentários sobre o estudo 3

No episódio analisado foram identificadas duas etapas de discussão, que


apareceram naturalmente. A primeira foi iniciada pela professora, sendo
referente à discussão do problema solucionado pelos alunos. Já a segunda
etapa foi iniciada por um aluno (fala 47), depois que as idéias da primeira já
haviam sido bastante discutidas, referindo-se ao funcionamento de um
submarino de verdade.

Durante a primeira discussão as argumentações dos alunos atingiram o nível


1, caracterizado pela presença de uma única afirmação com justificativa
sobre cada fenômeno – imersão, emersão e movimento na horizontal. Nesta
etapa os alunos descreveram suas observações sobre os fenômenos
estudados, apresentando um certo consenso de acordo com o que todos
viram. De um modo geral, todos apresentaram as mesmas idéias sobre a
emersão do “submarino” e sua imersão, porém, a cada fala, mais um detalhe
era acrescentado às justificativas que sustentavam tais afirmações.
86

Na segunda discussão os alunos tiveram a oportunidade de apresentar suas


idéias sobre um submarino de verdade, distante daquele com que
trabalharam e cujo funcionamento pôde ser experimentado por todos. É
interessante notar que esta etapa foi iniciada por um aluno depois que o
tema da aula já havia sido amplamente discutido, motivando uma extensão
dos fenômenos observados para uma situação mais complexa.

Ao falar sobre um submarino de verdade, o nível das argumentações dos


alunos subiu de um, da etapa anterior, para três. Nesta discussão as idéias
apresentadas foram sustentadas tanto pelas conclusões da discussão
anterior, quanto pela vivência dos mesmos fora da escola, apresentando
evidências baseadas, por exemplo, em suas observações em filmes. Assim,
começaram a aparecer afirmações competitivas, chegando-se inclusive a
uma refutação, evidenciando o alto nível de participação da turma na
discussão.

O discurso essencialmente elicitativo da professora proporcionou a criação


de um ambiente acolhedor em que os alunos puderam apresentar suas
idéias, inclusive iniciando novos assuntos ou exigindo argumentos mais
convincentes. A atitude da professora de não dar respostas prontas e
enriquecer a discussão com novas questões possibilitou a evolução das
explicações dos alunos, chegando inclusive à atribuição de conceitos.

Comentários Gerais

De uma forma geral as categorias empregadas na análise dos episódios de


ensino mostraram-se bastante adequadas, tendo sido identificados
diferentes componentes nos argumentos, tais como, justificativas,
conhecimentos básicos e refutações. Porém, é importante observar as
diferenças entre os tipos de atividades envolvidas em cada caso e o nível de
escolarização em que foram trabalhadas. Embora os dois estudos tenham
87

apresentado uma classificação elevada dentro das categorias desenvolvidas


por Driver e Newton (1997), o estudo 3 apresentou algumas peculiaridades.
Enquanto no estudo 1 os alunos apresentaram refutações e afirmações
competitivas logo no início da discussão, além de referirem-se também a
conhecimentos básicos, no terceiro uma única refutação, baseada somente
num raciocínio lógico, foi apresentada na fase final da discussão. Este fato
pode ser explicado tanto pelas características do tipo de atividade envolvida
neste caso, quanto pelo nível de escolarização das crianças.

As atividades de conhecimento físico envolvidas neste estudo apresentam


como principal característica um direcionamento da atenção dos alunos para
as variáveis relevantes do fenômeno estudado. Tendo sido desenvolvidas
com o objetivo inicial de atender ao ensino de crianças pequenas, estas
atividades não visam a geração de conflitos cognitivos. Uma oportunidade
rica para a elaboração de hipóteses e a experimentação das mesmas é
oferecida aos alunos, porém a solução do problema é única e as variáveis
envolvidas são visíveis de modo que os alunos possam observá-las sem a
possibilidade de dúvidas. Desta forma, no caso em que a discussão final fica
presa apenas ao problema realizado é difícil ou praticamente impossível que
opiniões contrárias surjam entre os alunos. O máximo que pode acontecer é
uma evolução das explicações através da contribuição de diferentes falas,
porém um argumento completo, com refutações ou qualificadores é muito
raro. Assim, no estudo 3, opiniões divergentes, incluindo um refutação
apareceram somente quando o assunto foi estendido para a realidade e a
discussão ficou mais aberta, de modo que cada aluno pudesse associar
suas observações do experimento realizado em classe com sua vivência
diária.

Foram identificados também dois padrões discursivos na fala dos


professores, elicitativo e avaliativo (Mortimer e Machado, 1997). Porém, no
estudo 3, foi observada uma predominância do padrão IRF elicitativo.
88

Atribuímos esta postura da professora ao fato de estar trabalhando com


crianças pequenas, que ainda não haviam entrado em contado com nenhum
conhecimento sistematizado sobre o fenômeno estudado nesta aula, de
modo que o objetivo da atividade era a construção de uma primeira
explicação para o mesmo, compartilhando os significados que cada aluno
trazia para a discussão. Por outro lado, com os alunos do Ensino Médio no
estudo 1, observamos que a alternância entre uma tendência de padrão
elicitativo e avaliativo na fala do professor, ajudou-os a apresentarem suas
idéias e recordarem conhecimentos básicos relacionados ao assunto,
respectivamente, de modo a construir uma explicação para o fenômeno em
discussão fundamentada nas teorias já estudadas anteriormente. Assim,
enquanto o padrão elicitativo estimulou as discussões, a presença do
avaliativo em alguns momentos, contribuiu para manter a atenção dos
alunos nos conhecimentos básicos já estudados ou em aspectos mais
relevantes dentro dos objetivos das discussões.

Argumentação e Ações dos Alunos em Atividades de Laboratório

Richmond e Striley (1996) realizaram um estudo sobre ações envolvidas no


desenvolvimento do que denominaram habilidades de argumentação nas
aulas de Ciências. Os autores concentraram-se mais em ações envolvidas
na criação de argumentos, do que em características discursivas da
argumentação. Algumas ações inerentes ao desenvolvimento da
argumentação no estudo de Ciências – identificação de um problema,
elaboração de hipóteses testáveis, coleta e síntese de dados e discussão do
significado dos mesmos – foram investigadas. A partir da realização de uma
seqüência de atividades de experimentação sobre temas da área de
Biologia, foi observado que a evolução dessas habilidades de argumentação
dependia do estilo de liderança dentro dos grupos de alunos. O maior
rendimento foi observado nos grupos cujos alunos adotaram uma postura
cooperativa na realização do trabalho.
89

Villani e Nascimento (2003) também abordam a argumentação em aulas de


laboratório didático, porém em situações de ensino que não foram
especialmente elaboradas para o trabalho com argumentos. Para tanto, os
autores propõem uma ampliação da categoria dado hipotético apresentada
por Jiménez Aleixandre et al. (op. cit.), transformando-a em dado resgatado.
Esta categoria visa abranger todo tipo de dados que sejam provenientes das
impressões dos alunos sobre o mundo, que costumam ser validadas pelo
senso comum. Os autores observaram em seus estudos a existência de um
gênero discursivo específico no laboratório didático, que consiste no
emprego de argumentos sustentados por dados empíricos para contrapor
argumentos baseados em dados resgatados do cotidiano dos alunos. Uma
importante contribuição deste estudo é colocar em evidência, ao lado de
dados empíricos e/ou resgatados, o papel que as tarefas realizadas pelos
alunos durante a atividade experimental representam na construção de
conhecimentos científicos. Os autores propõem uma adaptação do modelo
de Toulmin para investigar três fatores envolvidos nessa construção: dados
(fornecido, empírico, resgatado), conhecimento (escolar ou cotidiano) e
tarefas realizadas pelos alunos.

Para ampliar nosso foco de análise da argumentação, no presente trabalho


pretendemos analisar, além dos aspectos estruturais dos argumentos dos
alunos representados no padrão de Toulmin, a influência de outros modos
de comunicação na construção dos mesmos.
90

Capítulo 4 – Metodologia da Pesquisa

4.1. Questão e Metas da Pesquisa

Como apresentado no capítulo um, o objetivo deste estudo é investigar


quais, e de que forma, aspectos da cultura científica são disponibilizados no
plano social da sala de aula através das interações professor/alunos e
alunos/alunos, particularmente em situações envolvendo atividades de
experimentação. Assim, duas metas estão envolvidas neste trabalho.

A primeira delas diz respeito ao conteúdo trabalhado em sala de aula e


envolve estabelecer relações entre o mesmo e aspectos da cultura científica.
No capítulo três são apresentados os referenciais que sustentam este
aspecto da investigação.

A segunda meta refere-se à investigação do modo com que a professora


guia o processo de comunicação para proporcionar aos estudantes uma
compreensão sobre o papel das ferramentas culturais identificadas na
construção do conhecimento científico. Dentro das pesquisas sobre ensino e
aprendizagem de Ciências, apresentadas no segundo capítulo, duas
abordagens sobre a comunicação em sala de aula são identificadas, uma
discursiva, centralizada no papel da linguagem verbal e outra multimodal,
que enfatiza o papel de diferentes linguagens na construção de significados.
Jewitt e Scott (2002) sugerem a conciliação entre aspectos abordados em
cada uma destas duas linhas de trabalho como um importante desafio para
as pesquisas sobre a sala de aula, que pode contribuir para a construção de
91

modelos descritivos mais abrangentes. Desta forma, no presente trabalho


procuramos associar estas duas abordagens para análise do processo de
construção de significados em sala de aula.

4.2. Projeto Geral e Estruturação do Estudo

A presente pesquisa consiste em um estudo de caso envolvendo uma


seqüência de ensino de Física. A delimitação desse estudo envolveu vários
aspectos. Em primeiro lugar, foi necessário definir qual o conteúdo de
interesse, assim como o nível de escolarização dos alunos. Considerando o
foco da pesquisa sobre ferramentas da cultura científica, envolvendo
formalismo matemático e representações gráficas, optamos por investigar
uma turma do Ensino Médio. Em relação ao conteúdo trabalhado nas aulas,
duas condições foram estabelecidas para a realização da investigação. A
primeira delas, diretamente relacionada à questão de pesquisa, foi que a
seqüência de ensino contasse com atividades de experimentação. A
segunda relaciona-se ao espaço oferecido aos estudantes para discussão
ao longo das atividades, dado o papel de habilidades de argumentação
dentro da cultura científica.

Dadas as condições iniciais, o próximo passo para a delimitação do caso a


ser investigado foi a busca de professores dispostos a colaborar com a
pesquisa. Um aspecto essencial que norteou esta busca foi que os docentes
interessados já estivessem trabalhando com atividades de experimentação
dentro de seus programas de ensino. Esta medida visava evitar que os
mesmos se sentissem inseguros em relação àquilo que se esperava deles
ou constrangidos a seguir um roteiro de aulas imposto pelas condições da
pesquisa.
92

Oportunamente, havia no LaPEF um grupo de educadores atuando no


desenvolvimento de um projeto voltado para a melhoria do ensino, com as
características desejadas.

Grupo de Pesquisa para a Melhoria do Ensino de Termodinâmica

Este grupo era formado por cinco professores da rede pública de ensino,
que, preocupados em melhorar os resultados de aprendizagem de seus
alunos, reuniam-se uma vez por semana na Universidade de São Paulo, sob
orientação da Profa. Anna Maria Pessoa de Carvalho no Laboratório de
Pesquisa e Ensino de Física (LaPEF) da Faculdade de Educação.
Recebendo apoio da FAPESP, eles buscavam, por meio de análises e
reflexões, desenvolver um projeto de pesquisa que conduzisse os alunos a
adquirirem resultados mais satisfatórios. Dentre os objetivos almejados pelo
grupo estava o incentivo à participação dos mesmos na construção de
explicações em sala de aula e a consideração de diferentes facetas do
conhecimento científico.

Considerando estas características do grupo, entramos em contato com uma


das professoras, com a proposta de coleta de dados para a presente
pesquisa.

4.3. Caso Investigado

A Professora e os Alunos

Na ocasião da coleta de dados, a professora (referida nas transcrições pela


letra P) contava com uma experiência de cerca de vinte e três anos de
magistério e participava havia dois anos do grupo de pesquisa, que já tinha
desenvolvido um programa, publicado na forma de um livro para
93

professores18. A docente utilizava o referido programa em suas aulas para


alunos da primeira série do ensino fundamental.

Após a apresentação de nossa proposta de registro e acompanhamento de


uma seqüência de suas aulas, P sugeriu uma turma para a coleta de dados.
A escolha foi feita com base no horário das aulas. Das quatro turmas de
primeiro ano do Ensino Médio em que a professora estava implementando o
Programa de Ensino de Termodinâmica, a turma escolhida era a única que
contava com aulas duplas, um aspecto que, segundo a professora,
colaborava para o desenvolvimento das discussões em sala de aula.

A turma escolhida era formada por quarenta e dois alunos matriculados,


sendo que a média de presença no período registrado variou entre vinte e
oito e trinta e dois alunos. Este alto índice de ausências de alunos nas aulas
era comum em todas as disciplinas.

A Escola

Os dados foram coletados numa escola estadual de Ensino Médio localizada


num bairro de classe média da zona sul da cidade de São Paulo. Na
ocasião, a instituição contava com cerca de 2000 alunos distribuídos em 45
turmas – 20 no período matutino, 5 no período vespertino e 20 no período
noturno. Dentre os alunos matriculados no período matutino, em que foi
realizada a coleta de dados, cerca de 30% moravam ou trabalhavam na
região, enquanto os 70% restantes vinham de bairros distantes.

Com relação à infra-estrutura, a escola apresentava um grande número de


salas de aula, contando com laboratórios e salas de vídeo. O sistema de
trabalho era baseado na utilização de salas ambiente, sendo que as aulas

18
Termodinâmica: um ensino por investigação. Carvalho, A M. P. (coordenadora), USP, Faculdade de Educação,
São Paulo, 1999.
94

tinham a duração de 50 minutos, havendo um intervalo de 5 minutos entre


cada uma para que os estudantes pudessem trocar de salas. Dessa forma,
as aulas duplas registradas para a pesquisa duravam entre cem e cento e
cinco minutos, já que muitas vezes os alunos continuavam trabalhando
durante o intervalo.

As aulas de Física eram realizadas num amplo laboratório, contando com


quatro bancadas de alvenaria, que eram utilizadas somente quando
experimentos eram realizados pelos alunos. Nas demais atividades –
aquelas envolvendo trabalhos em grupos, demonstrações ou exposições da
professora, entre outros – os alunos utilizavam carteiras universitárias que
eram distribuídas livremente no espaço entre as bancadas e a lousa (figura
4.1). Em virtude do formato deste espaço, com uma largura maior do que a
profundidade em relação à lousa, a turma acabava rompendo a disposição
tradicional de um aluno atrás do outro.

Embora com espaço físico privilegiado, as instalações do laboratório


necessitavam de muitos reparos, a maior parte das tomadas estavam sem
espelhos, os armários de alvenaria estavam com as portas quebradas e
havia poucos materiais para a realização de experiências. Num canto da
sala havia uma estante de ferro com algumas coleções de livros didáticos de
Física que os alunos podiam consultar em seus trabalhos em classe e um
armário de aço onde a professora guardava alguns materiais. Todos os
materiais utilizados nas aulas – tanto aqueles relacionados a atividades de
laboratório, quanto fotocópias de textos – eram fornecidos pelo patrocínio da
FAPESP em função do programa de pesquisa do qual a professora da turma
fazia parte.
95

1
2
mesa P

B1 B2 B3 B4

Armários de alvenaria

1 – estante com livros didáticos lousa


2 – armário de aço com materiais
carteiras universitárias ocupadas

Figura 4.1 – Representação da sala de aula

A seqüência de ensino

Como mencionado anteriormente, uma condição essencial para a


delimitação da seqüência de ensino a ser investigada foi a realização de
atividades envolvendo experimentação. O planejamento da professora para
o período em que foi feita a coleta de dados contava com duas atividades de
demonstração e uma atividade de laboratório aberto, envolvidas no
desenvolvimento de dois temas da Calorimetria. Desta forma, a seqüência
de ensino investigada contou com dois blocos temáticos: o primeiro
dedicado ao tema dilatação dos corpos e, o segundo, dedicado à dedução
da equação geral da calorimetria. A descrição geral das atividades
realizadas ao longo dessa seqüência é apresentada a seguir.
96

Programa de Ensino Aulas: Atividades


Aula 1: Demonstração Investigativa
Bloco Temático I – Dilatação
Aula 2: Demonstração tradicional / Pesquisa bibliográfica
dos Corpos
Aula 3: Resolução de questões abertas
Bloco Temático II – Equação Aulas 4 a 8: Atividade de Laboratório Aberto
Geral da Calorimetria19
Aulas 9 e 10: Dedução da Equação Geral da Calorimetria

4.4. Coleta de Dados

Considerando que o objeto de estudo da pesquisa é o plano social da sala


de aula e as interações entre alunos e professora, o principal instrumento de
registro de informações foi a gravação da seqüência de ensino em vídeo,
acompanhado de notas de campo.

Registro em Vídeo

O registro em vídeo foi imprescindível para que os diferentes modos de


comunicação empregados pela professora e pelos alunos fossem
acompanhados detalhadamente. Para que a construção de significados e os
modos de comunicação empregados por alunos e professora pudessem ser
associados, julgamos fundamental registrar todas as etapas da seqüência de
aulas, já que era impossível prever em que momentos ocorreriam eventos
relevantes para nossa pesquisa.

Em algumas aulas tivemos a oportunidade de utilizar duas câmeras de vídeo


para o registro das informações. Nestas situações, uma das câmeras era
mantida fixa num canto da sala, enquanto a outra era operada pela
pesquisadora. Desta forma, foi possível registrar gestos e feições da

19
Uma avaliação sobre temas trabalhados em aulas anteriores à filmagem foi realizada na primeira
parte da aula 5 da seqüência registrada.
97

professora e dos alunos, o que em algumas fases da transcrição ajudou na


identificação de quem estava falando e também do que estava sendo dito.
Nas situações de trabalhos em grupo, uma câmera era mantida fixa sempre
no mesmo grupo.

Observação

As notas de campo foram empregadas como instrumento complementar ao


registro em vídeo, possibilitando obter informações sobre o andamento geral
da aula, envolvimento dos alunos, anotações realizadas no quadro de giz e
informações sobre pausas na filmagem20.

4.5. Estruturação da Análise

O processo de estruturação da análise de dados foi baseado nas metas


estabelecidas pela questão de pesquisa. Desta forma, a seleção de eventos
de interesse foi norteada pela identificação de aspectos da cultura científica
trabalhados ao longo da seqüência de ensino, enquanto o tratamento dos
mesmos foi realizado em função do objetivo de análise multimodal.

A Transformação dos Registros em Dados da Pesquisa

O processo de transformação de registros em dados de uma pesquisa é


abordado por Erickson (1998). Para o autor os registros realizados em
campo “ainda não são dados enquanto aparecem na forma bruta; são mais
apropriadamente considerados como fontes para dados potenciais” (p. 1162,
tradução nossa). Antes do processo de seleção das informações registradas,
estas podem servir a diferentes propósitos de pesquisa. Os registros só se

20
Como a professora da turma era a coordenadora da classe, em algumas das aulas registradas,
houve momentos de discussão de assuntos não relacionados à disciplina de Física. Nestes períodos
a gravação em vídeo era interrompida e a descrição e período de duração das conversas era
registrada nas notas de campo.
98

transformaram em dados para a presente pesquisa a partir do olhar da


pesquisadora em busca de respostas para suas questões. Sob este olhar,
aspectos da sala de aula relevantes para a pesquisa foram realçados,
proporcionando a construção de uma inscrição, no sentido empregado por
Latour e Woolgar (1986), do fenômeno em estudo.

A construção de uma inscrição da seqüência de ensino sob investigação


ocorreu em etapas, que envolveram processos repetidos de observação do
conteúdo das fitas de vídeo e transcrição de informações dos dados brutos.
A partir das observações efetuadas ao longo da própria coleta de dados,
verificamos que nem todas as partes das aulas registradas estavam
diretamente relacionadas à questão de pesquisa. Considerando como foco
da investigação os momentos da aula dedicados a aspectos da cultura
científica, o primeiro passo para a transformação do conjunto de informações
obtidas em dados foi a identificação de eventos dentro de cada aula da
seqüência. Essa demarcação de eventos foi baseada em mudanças no foco
das interações estabelecidas em sala de aula, tanto em relação aos temas
abordados quanto à forma de tratamento dos mesmos. Durante o
planejamento de um experimento, por exemplo, no momento em que a
turma deixa de discutir a identificação de variáveis do problema e passa para
a divisão dos grupos de trabalho consideramos que inicia-se um novo
evento. A seguir apresentamos um exemplo da demarcação de eventos
realizadas para a aula 5 da seqüência, detalhes sobre as demais aulas
podem ser observados nos anexos.

Descrição de Eventos da Aula 5 (17/05/00) ∆t


Evento 1/5 – Avaliação envolvendo temas de aulas anteriores à coleta de dados 65’

Evento 2/5 – Lab. Aberto: Revisão de hipóteses e Planejamento de teste empírico 20’20”

Evento 3/5 – Separação de grupos de trabalho 8’40”

Evento 4/5 – Discussão sobre realização de medidas 6’35”

Evento 5/5 – Discussão sobre representação de classe 4’25”


99

Em função dos diferentes temas abordados nas aulas e, mais


especificamente, das características das atividades de ensino empregadas,
uma segunda etapa na transformação dos dados brutos foi a divisão da
seqüência em dois blocos temáticos, que foram analisados separadamente.
A principal diferença entre estes blocos (apresentados na seção 4.3. deste
capítulo) diz respeito às atividades de ensino realizadas ao longo dos
mesmos. O bloco temático I contou com atividades de curta duração, que
não ultrapassaram o período de uma aula dupla. Já no bloco temático II foi
realizada uma atividade de laboratório aberto, que estendeu-se ao longo de
cinco aulas. Desta forma, agrupamos os eventos identificados anteriormente
dentro de unidades maiores que representavam atividades de ensino
realizadas nos blocos temáticos. Estas atividades de ensino foram, portanto,
identificadas como unidades macro da investigação, compostas por micro
unidades denominadas eventos.

Após a demarcação dos eventos dentro das atividades de ensino, a próxima


etapa foi a seleção daqueles que representavam aspectos relacionados ao
foco da pesquisa. Estes eventos foram selecionados para realização da
primeira transcrição. Considerando que, dentre os aspectos da cultura
científica trabalhados em sala de aula, estávamos interessados em localizar
momentos envolvendo habilidades de argumentação, a primeira transcrição
teve como foco as interações discursivas. Para a preservação de
informações sobre entonação, pausas, humor, grau de certeza nas
afirmações, entre outros, foi empregado um instrumento padrão proposto em
Preti (1997), que é descrito no anexo 1.

Em posse das primeiras transcrições, voltamos a assistir às fitas de vídeo


para a descrição dos outros modos de comunicação empregados: gestos,
desenhos, gráficos, materiais concretos e uso do quadro de giz. Nesta etapa
foi necessário definir que aspectos eram relevantes para o foco da pesquisa;
informações sobre olhares, posicionamento do corpo e gestos foram
100

registradas somente quando relacionadas à construção de significados


dentro do conteúdo de Física.

Para representar a simultaneidade de modos, alteramos a formatação do


fonte empregado, indicando a ocorrência de ações simultâneas através de
letras em negrito, itálico ou sublinhado, como demonstrado a seguir:

T Linguagem verbal oral Gestos / ações

303 P: Agitadas ... Será que é possível ... tem duas moléculas Gesto
soltas andando agitadas ... conseguir que elas fiquem
com mais velocidade ... mais ()...

304 A4: Não...

É importante observar que a transformação dos registros em dados da


pesquisa não significa a perda de contato com as informações em estado
bruto, as fitas de vídeo e anotações de campo foram revistas de forma
exaustiva na procura de aperfeiçoamento das transcrições realizadas.

Análise Multimodal de Eventos da Seqüência de Ensino

A primeira etapa da análise, como mencionado anteriormente, foi a


transformação dos dados brutos em dados da pesquisa, através da seleção
e transcrição de eventos. É importante lembrar que esta seleção de eventos
foi feita em função dos focos de discussão observados nas aulas, o que
envolveu uma primeira identificação de aspectos da cultura científica
abordados ao longo das mesmas, assim como de características específicas
das atividades realizadas.

A partir dos eventos transcritos, a segunda etapa da análise envolveu a


identificação dos modos de comunicação empregados pela professora e
101

pelos alunos ao longo dos mesmos. De forma geral, todos os eventos


receberam o mesmo tipo de tratamento, passando por um primeiro
levantamento dos modos e suas funções dentro do processo de
comunicação em que estavam envolvidos. Esta identificação de funções foi
inspirada nas pesquisas de Kress et. al. (2001) e Lemke (1998, 2000),
considerando as três funções de comunicação provenientes da teoria
lingüística de Halliday (1976). Desta forma, foi possível observar a relação
entre os diferentes modos e os principais papéis atribuídos aos mesmos ao
longo das atividades de ensino.

Numa tentativa de integração das análises sociocultural e multimodal,


procuramos relacionar dentro de nossa estrutura de análise as funções
comunicativas de Halliday (op. cit.) e as categorias desenvolvidas por
Mortimer e Scott (2000) para a análise da linguagem verbal oral.

Apresentação da Análise de Dados

A divisão da seqüência de ensino em dois blocos temáticos e a


especificidade de cada bloco levaram a algumas variações na seleção dos
eventos de interesse e também na apresentação da análise realizada sobre
os dados em cada caso. Por esse motivo, as análises dos blocos I e II são
apresentadas em capítulos diferentes no presente trabalho (5 e 6,
respectivamente).

Bloco Temático I

Este bloco temático contou com a realização de quatro atividades de ensino,


duas delas envolvendo experimentação. A primeira foi uma demonstração
investigativa e a segunda uma demonstração tradicional. Considerando a
riqueza de aspectos relacionados à cultura científica identificados no
102

primeiro caso, a demonstração investigativa foi selecionada para a


realização da análise multimodal neste bloco.

A estrutura adotada para a apresentação desta análise compreende a


contextualização do evento selecionado dentro do bloco temático; uma
descrição geral do mesmo e, por fim, a análise detalhada de toda seqüência
de interações estabelecidas ao longo da demonstração.

Uma característica da atividade selecionada que determinou o tipo de


formatação adotado para a apresentação de sua análise foi sua curta
duração. O evento em que a demonstração estava inserida compreendeu
aproximadamente quatorze minutos, sendo que dez minutos foram
empregados na construção de uma explicação coletiva para o fenômeno e
os quatro restantes envolveram uma revisão.

Bloco Temático II

Uma caraterística diferenciada deste bloco foi a realização de uma atividade


de ensino de longa duração. A Atividade de Laboratório Aberto
compreendeu um período de cinco semanas, contando com diferentes
etapas em sua realização e, consequentemente diferentes eventos. Desta
forma, a análise desta atividade envolveu etapas diferenciadas daquelas
empregadas para a demonstração investigativa e, portanto, a estrutura
adotada para sua apresentação também foi diferente.

Como parte da análise foram identificadas duas fases de trabalho dentro da


atividade de ensino: fase de motivação e planejamento e fase de execução
da investigação, respectivamente. A apresentação contínua de todas as
interações estabelecidas no plano social da sala de aula nos eventos
103

analisados foi impossibilitada pela longa duração dos mesmos. Desta forma,
optamos por fazer uma descrição analítica de cada evento, apresentado
exemplos representativos ao longo da mesma. A transcrição completa dos
eventos analisados é apresentada nos anexos 3 a 5.

Além de selecionar apenas extratos representativos das transcrições dos


eventos analisados, diferentes formatações foram empregadas na
apresentação dos mesmos, dependendo de suas características
multimodais. Em eventos em que a linguagem verbal oral predominou, as
transcrições foram apresentadas de forma simplificada:

(1a) P: este trabalho vai ser um pouquinho mais difícil ... então eu vou
propor uma questão ... e nós vamos BUSCAR a resposta [gesticula
indicando a turma toda] em grupo na classe ... então quem tiver idéia pode
falar ... nós vamos respeitar os colegas ... se não for a mesma idéia ... a
gente pode ter várias idéias ... não tem problema ... o importante é a gente
TROCAR [repete gesto anterior] essas idéias ... todo mundo tem direito de
falar e todo mundo tem direito de ser ouvido ...

(117) P: Ninguém falou nisso até agora ... né ((67’)) se eu tiver mais água
... quê que vai acontecer... [escreve no quadro: “Hipóteses: - Quantidade
de água; + água → demora mais”]
Como explicado anteriormente, a mudança na formatação do fonte, no caso
negrito, representa situações em que diferentes modos foram empregados
simultaneamente.

Nas situações envolvendo o emprego de gestos metafóricos ou vários


modos de comunicação, foi empregada uma formatação mais completa (a
mesma utilizada nos anexos) :

T Linguagem Verbal Oral Gestos / Ações

58 P: será que é essa diferencinha – a gente manteve o Gesto 1 Gesto 2


Termômetro no lugar... pelo menos deveria ter mantido...
né – será que essa diferencinha... pode ser causada pela
água da convecção (vai e volta)?

59 A2: eu acho que pode... ()


104

Capítulo 5 – Análise do Bloco Temático I:


Demonstração Investigativa

Como apresentado no capítulo anterior, durante a organização dos dados


coletados, a seqüência de ensino sob investigação foi dividida em dois
blocos temáticos em função dos temas abordados nas aulas. O bloco
temático I, foco de análise do presente capítulo, foi dedicado ao tema
dilatação dos corpos, envolvendo diferentes tipos de atividades, como
descrito a seguir.

Tabela 1 – Bloco Temático I: Dilatação do Corpos

Atividades Realizadas (aula da seqüência) Propósitos Gerais de Ensino

1. Demonstração Investigativa sobre dilatação do ar – Introdução do tema dilatação


professora apresenta um fenômeno e guia estudantes volumétrica
na construção de explicações para o mesmo
ª
(2 metade da aula 1)

2. Demonstração sobre dilatação de um sólido (aula 2) Extensão do tema iniciado na


aula anterior para o caso de
um sólido

3. Pesquisa bibliográfica em livros didáticos – alunos Identificação de explicações


pesquisam como o tema dilatação é abordado em formais sobre o tema.
diferentes livros didáticos (aula 2)

4. Resolução de questões abertas – grupos de quatro Emprego de conhecimentos


alunos resolvem três questões abertas sobre dilatação adquiridos nas aulas
(aula 3) anteriores para explicar
fenômenos relacionados ao
tema.
105

Das atividades desenvolvidas neste bloco, em função da questão da


presente pesquisa, foi considerada para a análise a atividade de
demonstração da dilatação do ar, pois mostrou-se mais rica nos aspectos
que desejamos mostrar.

5.1. Demonstração Investigativa

Esta demonstração foi realizada na segunda parte da primeira aula dupla da


seqüência de ensino, no evento 3/1. A descrição geral dos eventos
identificados nesta aula é apresentada no mapa a seguir.

Mapa da Aula 1

Evento Descrição Início ∆t

Atividade sobre tema iniciado em aulas anteriores (alunos


Evento 1/1 – 0‘ 73’50”
continuam trabalhando durante intervalo de 5’ entre aulas)

Evento 2/1 – Revisão da aula anterior 73’50” 4’10”

Evento 3/1 – Demonstração Investigativa sobre dilatação dos gases 78’ 24’

Evento 4/1 – Assuntos para próxima aula 102’ 3’

5.1.1. Descrição Geral da Demonstração sobre Dilatação do Ar

No quadro a seguir é apresentada uma visão geral do evento em que a


atividade de demonstração investigativa sobre dilatação do ar foi realizada.
Para uma análise mais aprofundada, denominada micro análise, foi
selecionado um episódio representativo dos aspectos da cultura científica
identificados neste evento, em função da questão de pesquisa.
106

Quadro de Análise Geral 1

Início do evento: minuto 78 da Aula 1

Duração total do evento: 24 minutos21

A demonstração sobre dilatação do ar consistiu no aquecimento de um


conjunto experimental, formado por uma bexiga comum acoplada à
extremidade de um erlenmeyer. A proposta da professora foi investigativa:

P: eu vou mostrar outro fenômeno... nós vamos tentar


explicar OUTRO fenômeno...
Antes de iniciar o aquecimento, P montou o conjunto experimental, apresentando todos os
materiais para os alunos. No período de montagem do aparato (duração aproximada de
4’30”), a maior parte das intervenções de P consistiu em questões e pistas sobre o nome
dos materiais utilizados, que também foram registrados no quadro. Além disso, a professora
deu informações sobre a montagem e o foco de atenção:

P: eu vou colocar a bexiga na boca do Erlenmeyer ... reparem que a


bexiga ... a bexiga está vazia na boca do Erlenmeyer... agora eu vou
pegar uma lamparina ... ((80’19”))

Assim, que o aparato ficou pronto e pouco antes de P iniciar o aquecimento, um aluno
elaborou uma hipótese sobre o que seria observado (T29):

A3: ô professora...com o aquecimento ele vai inchar?


P: então ó ... está esperando que encha...
Na seqüência, outros alunos começaram a construir explicações para o fenômeno. A
postura de P foi predominantemente elicitativa, incentivando a participação dos alunos,
reforçando o dissenso e estimulando o desenvolvimento de argumentos.

Alunos sugeriram teste experimental para verificação de hipóteses concorrentes (T92/93).

Uma explicação para fenômeno foi construída através de argumentos e emprego de teste
empírico.

No turno 132, P deixou cair por acidente o aparato experimental, o que provocou grande
agitação entre os alunos (~10’).

Após o incidente, P retomou a discussão sobre o experimento e a turma construiu


coletivamente uma explicação para o processo de resfriamento do aparato experimental.
Esta última foi motivada por uma questão de aluno.

21
Do tempo total duração do evento, aproximadamente dez minutos correspondem a um período de
grande agitação dos alunos, devido à queda do aparato experimental e quebra do erlenmeyer.
107

5.1.2. Micro Análise do Episódio 1

O evento 3/1 pode ser dividido em dois episódios de acordo com o foco das
discussões realizadas ao longo do mesmo. No episódio 1, os alunos
constróem explicações para o fenômeno demonstrado por P. Neste período,
há um grande envolvimento da classe num processo de argumentação, em
que estudantes procuram defender suas idéias e P procura organizá-las. No
episódio 2, P retoma aspectos da teoria cinética molecular estudada em
aulas anteriores para construir uma explicação sobre o processo de
resfriamento do aparato experimental.

Considerando o importante papel dos processos de argumentação na cultura


científica, o episódio 1 foi selecionado para a realização da micro análise da
construção de significados.

Episódio 1 – Demonstração Investigativa sobre Dilatação

A micro análise do processo de argumentação desencadeado pela


demonstração investigativa revelou três fases de discussão. A primeira fase
(Hipóteses Iniciais) corresponde ao início da atividade, compreendendo
desde a apresentação dos materiais e do fenômeno por parte da professora
até o levantamento das primeiras hipóteses sobre o que será observado. A
segunda fase (Primeiras Explicações) corresponde a um período em que os
alunos começam a apresentar algumas explicações para o fenômeno. Na
terceira fase (Identificando Explicações Distintas), os alunos aprimoram seus
argumentos, chegando a uma explicação coletiva para o fenômeno
observado.
108

Episódio 1A – Hipóteses Iniciais

Enquanto pega os materiais no armário para montar o arranjo que será utilizado
na demonstração, a professora vai comentando com os alunos o que está fazendo.

T Verbal Oral [Escrito] Ação / gestos Visual

1(b) P: eu vou mostrar outro fenômeno... nós vamos


tentar explicar OUTRO fenômeno...
2 A1: legal...

3 P: material [Material] ...vamos usar também P escreve no quadro


um vidrinho ... num vai ser béquer ... vamos enquanto fala
pegar um maior ... como chama isso aqui?
P mostra um
Vocês viram isso aqui em química? Erlenmeyer
Erlenmeyer
4 A1: ai ...eu vi ...

5 P: ai ... eu vi ... P balança o Erlenmeyer


erlenmeyer em frente
à turma
6 A3: chama potinho de vidro ...

7 P: vocês fizeram trabalho de Química ...

8 A2: béquer ...

9 P: béquer é um que parece um copinho P desenha a forma Erlenmeyer


((79’)) de um béquer no ar, continua na
enquanto continua mão de P
segurando o
erlenmeyer
10 A1: ai professora ... eu sei ...deixa eu ver ... Aluna procura
anotações no caderno
11 P: é Er-len-me-yer ...
109

12 A8: é o quê?

13 P: Erlenmeyer [Erlenmeyer] ...((comentários P escreve no quadro


dos alunos)) [Bexiga / Lamparina] enquanto fala

Este episódio marca o início de uma nova atividade e um novo tema. Neste
momento é necessário estabelecer as principais características do processo
de construção de significados intencionado pela professora. Em relação à
função comunicativa ideacional, o tema desta atividade é a construção de
uma explicação para um novo fenômeno. Este é apresentado no turno 1b,
quando P define o objetivo central do trabalho.

Como ocorre na realização de qualquer atividade, pode-se prever que ao


longo da mesma diferentes metas intermediárias sejam estabelecidas,
porém o objetivo final almejado será sempre a construção de uma
explicação para o fenômeno. Este objetivo, neste momento, pertence à
professora e faz parte de seu plano de ensino, e para que seja alcançado é
preciso estabelecer outros aspectos envolvidos no trabalho.

Ainda no turno 1b, a professora esboça o posicionamento que espera dos


estudantes – “nós vamos buscar ...” (função interpessoal do processo de
construção da explicação). Além de indicar a intenção de P em desenvolver
um conhecimento compartilhado com toda a turma, esta fala, aliada ao
restante do mesmo turno, também exerce uma função na organização do
trabalho que está começando – “eu vou mostrar (...) nós vamos buscar
uma explicação para OUTRO fenômeno” (função textual).

Esta apresentação das intenções de P para este novo momento da aula tem
um importante papel na construção do contexto para que a atividade
aconteça. Nos turnos seguintes, observamos que as funções comunicativas
110

ideacional, interpessoal e textual são abordadas de diferentes formas,


dependendo das necessidades imediatas de cada fase do trabalho.

Nos turnos 2 a 13, dentro do processo de organização da atividade, que


envolve a apresentação dos materiais empregados, surge a necessidade de
nomeação de um objeto, o erlenmeyer. Diferentes modos de comunicação
estão envolvidos neste processo. O modo verbal oral estabelece a questão,
assim como, veicula as intervenções dos alunos. O modo visual apresenta a
motivação para estas intervenções, um objeto aparentemente novo para a
turma, ou que vem de um contexto diferente da aula de Física. A ação de P,
balançando o objeto em frente à classe enquanto aguarda contribuições e
seu gesto icônico (turno 9) estabelecem a questão em foco e contribuem
para as intervenções, respectivamente. E, por último, o modo verbal escrito
é empregado para registrar o nome correto no quadro (turno 13).

À primeira vista, uma série de intervenções da professora e dos alunos


apenas para nomear um objeto, numa espécie de jogo de adivinhação, pode
parecer sem importância numa aula de Física do Ensino Médio. Se
considerarmos a função interpessoal deste questionamento na construção
do cenário para o trabalho, porém, este trecho inicial do episódio torna-se
relevante. A seqüência de questões desencadeada em torno do tema, numa
abordagem comunicativa interativa, ainda que de autoridade (Scott e
Mortimer, no prelo), ajuda P a ganhar a atenção dos alunos. Nota-se neste
período que um clima de envolvimento está em construção. Embora ainda
haja muita agitação e conversa na sala, diferentes alunos respondem a
questão de P, enquanto outros acompanham seus movimentos.

É importante observar, ainda, que a identificação do nome de objetos


envolvidos numa atividade de experimentação constitui parte do conteúdo
das aulas de Ciências Naturais em geral e, portanto, a ação de nomear o
111

erlenmeyer, assim como outros objetos utilizados, envolve também uma


função ideacional dentro do processo de ensino e aprendizagem.

T Linguagem Verbal Oral [Escrita] Ações / Gestos Visual

14 P: nós vamos usar pouca coisa ... P mostra bexiga enquanto Bexiga
nós vamos usar um Erlenmeyer ... fala
uma bexiga comum ...

15 A2: esse é o material? P coloca bexiga na


extremidade do
erlenmeyer

16 P: que eu vou colocar a bexiga P posiciona uma carteira Conjunto


((80’)) ... eu vou colocar a bexiga em frente à turma bexiga–
na boca do Erlenmeyer ... erlenmeyer
reparem que a bexiga ... a Muita conversa na sala
bexiga tá vazia na boca do
Erlenmeyer... agora eu vou pegar P mostra que a bexiga
uma lamparina ... ((80’19”)) está vazia

Bexiga vazia

17 ((dos turnos 17 a 22 há bastante P coloca álcool na


agitação na sala, os alunos fazem lamparina, pede um isqueiro
a
comentários sobre um isqueiro para aluna, acende a
22 que A5 empresta para que a lamparina e coloca a
professora acenda a lamparina)) mesma sobre a carteira em
frente à turma

23 P: ((81’55”)) eu vou pegar uma P pega pinça no armário Pinça mecânica


pinça porque a gente vai
precisar ((82’)) ... vamos usar
uma pinça pra segurar ...

24 A11: isso aí é o quê professora?

25 P: é uma pinça mecânica...

26 A11: não... tô falando do frasco...

27 A14: é o Erlenmeyer...

28 P: é o Erlenmeyer ... daí a gente P começa a aquecer o Arranjo


aquece ... ((82’41”)) conjunto bexiga- experimental /
erlenmeyer bexiga vazia

29 A3: ô professora...com o P continua aquecendo o


aquecimento ele vai inchar? arranjo
112

30 P: então ó ... tá esperando que


encha...

31 A17: o balão vai encher...

32 A13: vai nada...

33 A14: ó lá...tá enchendo...já... Volume da


bexiga

34 A5: ((83’)) oh:::... ((tom jocoso)

35 A14: tá enchendo...tá enchendo...

Nesta seqüência a professora continua montando e comentando o arranjo


experimental com os alunos. Até o turno 27, o tema das intervenções
relaciona-se a materiais empregados no experimento e alguns
procedimentos de montagem. A linguagem verbal oral, neste extrato,
também é empregada com diferentes funções. Na organização do evento
(função textual), como forma de estabelecer uma abordagem comunicativa
interativa (função interpessoal) e como forma de apresentar conteúdo
(função ideacional).

Ainda que intervenções mais diretamente relacionadas ao fenômeno em


discussão comecem a aparecer efetivamente somente no turno 29, uma
informação importante é apresentada no turno 16. Enquanto fala sobre
procedimentos de montagem do aparato experimental, a professora indica a
bexiga como protagonista do fenômeno que será demonstrado – “reparem
que a bexiga ... a bexiga tá vazia”. É importante notar que, embora esta
informação tenha sido apresentada dentro de uma enunciação envolvendo
outros aspectos dos materiais, o gesto dêitico de P sobre a bexiga vazia
ajuda a compensar uma possível falta de ênfase sobre a mesma.

Apesar de haver muita agitação na sala, os alunos estão acompanhando os


passos de P. Assim que começa a demonstração propriamente dita, um
113

deles levanta uma questão prevendo o que vai acontecer (turno 29). É
importante lembrar que no turno 16 a professora já tinha sinalizado que algo
aconteceria com a bexiga. A fala espontânea de A3, além de mostrar que
está acompanhando o processo, é um indicador da existência de um espaço
acolhedor para a participação. Da mesma forma, a reação da professora,
transformando tal pergunta em uma afirmação hipotética, dirigida a toda
classe, estimula o posicionamento de outros alunos a respeito (turnos 31, 32
e 33). Neste momento, com respeito à função ideacional, o papel das
hipóteses na construção de explicações para o fenômeno está sendo
enfatizado. Já com respeito à função interpessoal, a valorização de
intervenções dos alunos expressa a intenção de construção coletiva. Assim
como na seqüência anterior, há uma ampla participação da turma, mesmo
que em meio a grande agitação.

Outro aspecto a ser destacado ao longo de todo este período é o papel


representado por diferentes modos na função interpessoal. Da mesma forma
que P aceita e incentiva a participação dos alunos através da linguagem
oral, suas ações também exercem esta função. No turno 16, o gesto de
colocar uma carteira no centro do semicírculo formado pelos alunos, além de
uma função organizacional, ajuda a formar o clima para a participação.
Ainda nesta direção, pode-se observar na linguagem oral, a atitude de P em
solicitar o isqueiro de um aluno para acender a lamparina (T17 a 22).
Intervenções como esta ajudam a manter um elo de ligação com os alunos,
possibilitando que, mesmo sem tocar no arranjo experimental, estes tomem
parte da montagem.

Ao longo do período compreendido pelos turnos 14 a 23, é importante notar


também que a atitude da professora de narrar suas próprias ações exerceu
uma função textual, contribuindo para a articulação dos diferentes modos
empregados na construção de um texto coerente sobre procedimentos,
materiais e papel dos alunos dentro da atividade de demonstração.
114

Tabela 2 – Resumo do Episódio 1A

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral [Escrito] Gestos / Ações Visual

Ideacional Objetivo da atividade:


construção de explicação /
nome de materiais [escritos no Indica bexiga como Erlenmeyer
quadro] / bexiga é protagonista protagonista do fenômeno
do fenômeno Bexiga é protagonista
do fenômeno, foco
Hipótese sobre fenômeno para construção de
(apresenta da A3) explicações

Caráter hipotético de Volume da bexiga é


afirmações sobre fenômeno evidência para
(processo de investigação) confirmação de
Demonstração
proporciona teste de hipótese (visibilidade)
Identificação do fenômeno hipótese

Interpessoal P propõe construção coletiva Apresentação de um


material diferente
Abordagem Interativa (de (erlenmeyer) motiva
Autoridade) convida primeiras intervenções
participação dos alunos (T1 a Posicionamento central da de alunos
T11) professora favorece
construção coletiva
Participação de A3 no turno 29
representa a tendência Montagem do aparato
Dialógica na Interação (T12 a motiva participação dos
T35) alunos

P transforma contribuição de
A3 em hipótese do grupo /
aceita comentários de alunos
(T31 a T35)

Textual Narração de intenções de P e Mostra materiais, Mantém foco sobre


do processo de montagem do enquanto relata os materiais e
aparato experimental dá mesmos. procedimentos.
coesão ao texto em construção.

Ao longo deste episódio foram abordados três aspectos relacionados ao


objetivo geral da atividade. O primeiro deles, proposição do trabalho, foi
realizado através do modo verbal oral. No turno 1, observa-se que este
modo serviu às três funções comunicativas descritas por Halliday (1978
apud Lemke, 1998). Este tema foi abordado rapidamente pela professora,
como uma prática já conhecida por parte dos alunos. De fato, em aulas
anteriores desse programa, os alunos já haviam participado de outras
atividades de demonstração investigativa.
115

O segundo aspecto refere-se à construção do espaço para a realização da


atividade, que envolveu tanto aspectos materiais quanto interpessoais. Após
anunciar a apresentação de um novo fenômeno, P começou a citar e reunir
os materiais que seriam utilizados. Neste processo, outros modos de
comunicação, além do verbal oral, começaram a ser empregados para
efetuar as diferentes funções do processo de comunicação. Com respeito à
função ideacional, que neste momento estava relacionada ao relato de
materiais e procedimentos envolvidos numa atividade de experimentação,
foram empregados os modos verbal oral, verbal escrito, visual e gestual /
ações. Neste ponto, pode-se considerar que estes modos correram em
paralelo para veicular as informações (ver Kress et al, 1998). Cada material
citado pela professora, foi também apresentado para os alunos e teve seu
nome listado no quadro. Desta forma, a relação de materiais foi veiculada
através de todos os modos presentes na interação. Somente o nome do
erlenmeyer, que era desconhecido dos alunos, foi apresentado por meio do
modo verbal em suas formas oral e escrita.

Com respeito à função interpessoal envolvida na construção do espaço para


a demonstração, o modo verbal oral foi empregado para estabelecer uma
abordagem comunicativa interativa. Entre os turnos 3 e 13, a própria
natureza da questão de P, com resposta única, determinou o caráter de
autoridade predominante nesta interação, caracterizada por uma questão
seguida de tentativas dos alunos e pistas22 da professora. Este tipo de
interação é bastante citada na literatura (Edwards e Mercer, 1987; Lemke,
1990; Scott, 1997; Mortimer e Scott, no prelo).

A partir do turno 14, a abordagem começa a apresentar uma tendência


dialógica (Scott; Mortimer e Machado; Mortimer e Scott, op. cit.). Neste

22
Os modos visual e gestual foram empregados para informar tentativas dos alunos e ilustrar pista da
professora, respectivamente, porém isto não foi relevante para a função interpessoal.
116

período não há um questionamento diretivo por parte de P e observam-se


intervenções espontâneas dos alunos. A apresentação de uma hipótese por
A3, antes mesmo do questionamento de P, é um exemplo do espaço que
começa a ser criado para a exposição de diferentes idéias. A repetição da
idéia do aluno para a turma toda, transformando esta numa hipótese que
pode ser verificada por toda a classe, assim como as intervenções seguintes
de outros estudantes, confirmam esta tendência.

O terceiro aspecto observado nesta seqüência foi o início da demonstração


propriamente dita e as primeiras reações dos alunos. Neste momento os
modos de comunicação começaram a representar papéis
diversificados na construção de significados. Com respeito à hipótese de
A3 (função ideacional), o modo visual (volume da bexiga) trouxe a evidência
para a confirmação da mesma, enquanto o verbal oral comunicou as
observações dos alunos.
117

Episódio 1B – Primeiras Explicações

Durante todo o episódio, a


professora permanece aquecendo
o conjunto bexiga - erlenmeyer e o
volume da bexiga vai aumentando.

T Linguagem Verbal Oral Ações / Gestos

36 P: bom...então o material tá lá... pro/ P indica lousa

37 A5: o que acontece é que o ar quente


sobe

38 P: ah... peraí... ó... a A5 tá tentando


explicar as coisas... aí eu ia falar ... o
procedimento é colocar a bexiga no
Erlenmeyer e aquecer o Erlenmeyer...
né? agora... tá enchendo a bexiga... já é Aponta para A5
observação... por quê que tá enchendo?
Agora a A5 estava falando ...

39 A17: por causa do ar quente

40 A5: porque o ar quente é mais leve e A5


sobe

41 A17: porque ele se expande A17

42 A5: é
118

43 P: peraí ... o ar quente é mais leve e


sobe

44 A12: olha ... eles tão querendo dizer ...


professora ... que o ar quente expande ...
mas aí dentro ... ((inaudível))

45 A5: como ele não tem espaço ... ele A5 gesto 1 A5 gesto 2
enche a bexiga ... porque a bexiga tá ...
((inaudível))

46 A17: então

Nos turnos 36 a 38, enquanto a professora está comentando a diferença


entre materiais e procedimentos, A5 inicia uma nova fase da atividade,
fornecendo espontaneamente uma explicação para o fenômeno. Esta
atitude da aluna acompanha a tendência dialógica da abordagem
comunicativa interativa iniciada no episódio anterior (função interpessoal).
Além disso, embora no modo verbal P ainda esteja abordando aspectos
metodológicos do experimento, sua ação sobre os materiais e o modo visual
colocam em destaque o fenômeno (função ideacional).

Nas primeiras explicações é possível identificar a presença de duas idéias,


“o ar quente sobe” e o “ar quente se expande”, que são consideradas
diferentes do ponto de vista da professora e iguais ou complementares do
ponto de vista dos alunos. A professora começa a sinalizar que algo precisa
ser melhor explicado quando repete a fala de A5 no turno 43 – “peraí ... o ar
quente é mais leve e sobe”. Imediatamente A14 procura explicar – “olha ...
eles tão querendo dizer ... professora ... que o ar quente expande ... mas aí
dentro ...” e A5 complementa “como ele não tem espaço ... ele enche a
bexiga”. Os gestos empregados pelos alunos neste momento podem ser
classificados como metafóricos na nomenclatura de Crowder (1996), visto
que representam um conteúdo abstrato da explicação. Neste caso, essas
119

informações também são veiculadas pelo discurso oral. Desta forma, dentro
da função ideacional, estes gestos possibilitam enfatizar e ilustrar as idéias,
mais do que complementá-las. Esta ênfase na apresentação das
explicações pode ser interpretada como um esforço dos estudantes em se
fazer entender em defesa de suas hipóteses. Neste momento da aula
começa a configurar-se um processo de argumentação, que envolve, além
da apresentação de idéias sobre o fenômeno para a construção de uma
explicação (função ideacional), uma atitude de engajamento dos estudantes
em relação à mesma (função interpessoal).

Acompanhando a tendência dialógica da interação, as intervenções da


professora nos turnos 38 e 43 vão sempre na direção de valorizar e
estimular as contribuições dos alunos, o que contribui para o engajamento
citado no parágrafo anterior.

Para realizar a função textual, são empregados os modos verbal oral,


gestual e visual. Enquanto o primeiro ajuda a organizar os diferentes
momentos da atividade e a participação dos alunos (turnos 36 e 38), os dois
últimos possibilitam manter o foco da discussão sobre o fenômeno e o
processo de produção do mesmo.

T Linguagem Verbal Oral Ação / Gestos

47 P: mas peraí... tem duas coisas aí na história ((84’)) ...


o ar quente se expande ou o ar quente sobe?

48 A5: sobe A5 levanta os dois braços

49 A9: sobe

50 A17: sobe
120

51 A3: ô professora

52 P: porque se ele sobe ... ele tá saindo daqui... pra cá ... Indica Erlenmeyer
e _____________________aqui tá ficando vazio Indica bexiga

53 A3:ô professora ... só que ele tá no limite da bexiga

54 A15: não ___ ele se expande

55 A5: ____ não

56 A17: se expande

57 Alunos: se expande

58 A3: ô professora ele sobe... mas aí ele não tem a


tendência

59 P: peraí... um de cada vez Vários alunos falam ao


mesmo tempo

60 A3: ele não tem a tendência de sair pra se espalhar... A3 gesticula


então ele tá tipo:: se acumulando na bexiga não é ...
mais ou menos assim?

Dentro da função ideacional, nesta fase, a professora procura chamar a


atenção dos alunos para a existência de idéias diferentes (turno 47), porém
estes continuam transitando entre as mesmas sem considerar nenhum
conflito. Um exemplo disso pode ser observado no turno 48, em que, embora
verbalmente defenda que o ar sobe, A5 gesticula de forma ambígua. A
ambigüidade de seu gesto também pode ser relacionada ao fato de que a
mesma aluna já havia concordado com uma explicação baseada na idéia de
expansão no episódio anterior (turno 42).

Na tentativa de sensibilizar os alunos para o reconhecimento da diferença


entre as idéias, a professora apresenta uma interpretação mais rigorosa da
afirmação que deseja refutar (turno 52), utilizando gestos dêiticos sobre o
aparato experimental para enfatizar sua posição. Esta atitude leva a uma
121

imediata mudança de opinião por parte de alguns alunos (turnos 54, 55, 56 e
57). O que não garante que estes tenham reconhecido a diferença entre as
duas idéias (ver A3 nos turnos 58 e 60).

É importante notar também, que embora de um ponto de vista conceitual as


idéias dos alunos ainda estejam confusas, há um movimento de
aperfeiçoamento nos argumentos. Enquanto seus colegas interrompem sua
intervenção iniciada no turno 53 com afirmações sem justificativa, A3 elabora
um argumento mais sofisticado para retomar a fala nos turnos 58 e 60.
Nestes turnos apresenta uma afirmação “ele sobe”, seguida de justificativa
“ele não tem a tendência de sair pra se espalhar” e conclusão “então ele tá
tipo se acumulando na bexiga...”.

Os gestos empregados pelos alunos (T48 e T60), assim como a referência


feita por P ao modo visual (T52), também são empregados dentro da função
ideacional de construção e questionamento de argumentos.

Dentro da função interpessoal, a abordagem comunicativa continua sendo


interativa dialógica e, apenas no turno 59, identifica-se uma intervenção oral
de P visando organização.
122

Tabela 3 – Resumo do Episódio 1B

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Gestos / Ações Visual

Ideacional Etapas da demonstração:


materiais, procedimentos e
observações Gestos metafóricos Aumento de
(GM) de alunos ilustram volume da bexiga
Explicações para fenômeno explicações é objeto das
explicações
Interpretação de idéias Gestos dêiticos (GD) de
apresentadas P completam sua Bexiga/erlenmeyer
interpretação oral p/ completam fala de
idéias dos alunos (T52) P no T52

Interpessoal Abordagem comunicativa


Interativa Dialógica reflete
espaço para diferentes idéias

Textual P localiza e diferencia idéias Mantém foco da Mantém foco da


distintas / organiza idéias discussão discussão
apresentadas pelos alunos,
sem direcionar (T59).

Neste episódio uma ênfase maior é dada à função ideacional da construção


de significados. Isto se justifica, pelo fato de que o contexto para a
realização da atividade, tanto do ponto de vista das relações interpessoais,
quanto da forma de organização da mesma, já foi construído no episódio
anterior. Com respeito à função interpessoal, as intervenções de P visam a
manutenção da abordagem interativa / dialógica, contribuindo para o
engajamento dos estudantes. Já com respeito à função textual, o modo
visual e a ação de demonstração mantém o foco das discussões.

Dentro da função ideacional, nos momentos em que mais de um modo de


comunicação foram empregados, identificamos dois tipos de relação entre
os mesmos. No turno 52, os gestos dêiticos e materiais concretos indicados
por eles completaram os significados apresentados no discurso oral,
estendendo significados. Já os gestos metafóricos (Crowder, 1996)
empregados pelos alunos serviram para ilustrar e/ou enfatizar suas
afirmações, correndo em paralelo ao discurso oral.
123

Episódio 1C – Identificando Explicações Distintas

Enquanto P continua aquecendo o conjunto


bexiga – erlenmeyer, alguns alunos começam a
distinguir os dois tipos de explicação.

T Linguagem Verbal Oral Ações / Gestos Visual

61 P: o ar estava aqui embaixo... e a bexiga


estava (vazia)... o ar estava aqui... espera P gesticula Erlenmeyer
um pouquinho... vamos recapitular... ó... o indicando
ar estava embaixo... a bexiga estava erlenmeyer e bexiga Bexiga
vazia... e aí? o que aconteceu?

62 A17: o ar ficou ________ menos denso e Bexiga continua


se expandiu enchendo

63 A5:________mais leve _______________


porque ele esquentou

64 A17: menos denso e expandiu ...

65 P: peraí... ficou o quê?

66 A7: menos denso

67 A14: menos denso

68 A17: é ... menos denso

69 P: ele ficou menos denso ((85’)) e subiu


Erlenmeyer
_____ então... o Erlenmeyer tá sem ar...
ou tem muito pouco ar... e o ar que estava Indica movimento
bexiga
aqui subiu do ar

70 A14: __________________________
subiu
124

70(a) ((discussão entre os alunos sobre a Há grande


demonstração inaudível)) envolvimento na
classe

No turno 61 a professora retoma o problema iniciando uma recapitulação do


que foi observado desde o início da demonstração – “o ar estava embaixo ...
a bexiga estava vazia .. e aí? O que aconteceu?”. Esta retomada do
processo dá uma oportunidade para que os alunos reorganizem suas idéias,
levando-os a aperfeiçoá-las. Ou seja, além de representar uma função
organizacional do andamento da aula, esta intervenção de P também visa
organizar as idéias dos alunos, numa função ideacional. Neste momento, os
alunos começam a empregar argumentos mais completos, fazendo
referências a um conhecimento básico – o conceito de densidade (turnos 62
e 64) e, também, apresentando justificativas (turno 63).

Embora o emprego do conceito de densidade indique uma evolução na


argumentação, isto não garante que os estudantes tenham chegado à
explicação esperada para o fenômeno em questão. No turno 69, a
professora volta a insistir na explicação inadequada – “ele ficou menos
denso e subiu ...” – o que faz com que aqueles revelem, em suas
afirmações, que ainda estão misturando as idéias identificadas no episódio
anterior - “o ar quente sobe” ou “o ar quente se expande”. Isto pode ser
notado nos turnos 62 e 70, em que A14 refere-se às duas idéias em
momentos diferentes.

Desde a seqüência anterior as intervenções da professora envolvem


questionamentos empregados como instrumentos para estimular o
pensamento e não como um meio de fazer uma transmissão de
conhecimentos “dialogada”. É importante observar que, mesmo quando os
alunos oferecem a resposta desejada, P continua insistindo no
125

questionamento, estimulando a argumentação. Desta forma, a abordagem


comunicativa continua sendo interativa dialógica.

T Linguagem Verbal Oral Ações / Gestos

71 A7: o ar estava querendo se espalhar ... A7 levantando os braços


professora... abertos

72 A15: não... o ar sobe

73 P: ou o ar tá mais espalhado ( )? ((dá


continuidade à fala iniciada no turno 69))

74 A7: _________ô professora... menos denso


não é uma molécula tá mais longe da outra? o
ar tá ocupando mais espaço...

75 ((discussão sobre a atividade inaudível))

76 A5: ele sobe

77 A7: ô professora... o ar num tá ocupando mais P não responde


espaço? ... ó... saca só... vocês concordam
comigo que as moléculas tão mais A7 volta-se para os colegas
afastadas? então... tá ocupando mais
espaço... A7 gesticula

78 ((discussão inaudível))

79 A5: viu... professora... o ar não subiu...

80 A7: ô Bruno... o ar não tá ocupando mais P continua aquecendo o conjunto


espaço? bexiga- erlenmeyer
126

Nesta seqüência observa-se um grande envolvimento dos alunos em torno


de uma polêmica que foi sendo criada aos poucos pela professora “ele ((o
ar)) se expandiu ou ele subiu?”. Desde a fase anterior os alunos vinham
utilizando os dois tipos de explicação sem entrar em confronto. Alguns
defendiam mais um tipo, outros defendiam o outro e terceiros defendiam os
dois. Agora começa a surgir um posicionamento mais efetivo em relação a
um deles – “o ar expande” –, embora ainda não haja um confronto direto
entre os mesmos.

Mais alunos participam da discussão, havendo vários momentos em que o


grande envolvimento da turma chega a prejudicar os registros das
informações, pois vários falam ao mesmo tempo.

No turno 71, A7, que entra pela primeira vez na discussão, defende a idéia
de que “o ar se expande”, enquanto A15 se opõe. É interessante notar que
neste turno, A7 emprega um gesto semelhante ao de A5 no turno 48 do
episódio anterior. Desta vez, porém este gesto é usado para defender a idéia
de “expandir” ao invés de “subir. Este emprego de gestos semelhantes não
ocorre por acaso, como será visto mais a frente, estas duas idéias ainda são
complementares para os alunos, da mesma forma que se apresentavam
para A5 no episódio 1B.

A professora se mantém numa posição de questionamento sem colocar-se a


favor de uma ou de outra afirmação (turno 73). Esta postura de P leva A7 a
procurar outros recursos para a defesa de sua idéia. No turno 74, fazendo
uso de um conhecimento básico, o aluno tenta legitimar sua afirmação
buscando uma aprovação da professora. Percebendo que este não é o
melhor caminho, volta-se para os colegas tentando convencê-los nos turnos
77 e 80. Nesta tentativa de se fazer ouvir A7 vai elaborando argumentos
mais completos a cada intervenção: “o ar estava querendo se espalhar”;
“menos denso não é uma molécula tá mais longe da outra? O ar tá
127

ocupando mais espaço”; “vocês concordam comigo que as moléculas tão


mais afastadas? então ... tá ocupando mais espaço”. Neste último caso, o
estudante utiliza também o modo gestual para reforçar sua afirmação.

T Linguagem Verbal Oral Visual

81 P: ele se expandiu ou ele subiu?

82 A3: tá subindo...

83 A15: ele se expande

84 Alunos: expande

85 A7: ele se expande pra todos os lados...

86 ((discussão inaudível))

87 A14: ele se expande ... ele tá querendo sair Bexiga continua enchendo

88 A7:_____________ pra cima é mais fácil

89 P: quer dizer que aqui ((gesto dêitico)) não tem


Erlenmeyer
ar?

90 Turma: TEM AR

91 A21: só que ele tá subindo

92 A3: coloca de lado

93 A7: professora... coloca de lado ((o arranjo)) pra


ver o que acontece

94 ((comentários))

Apesar de todos o apelos de A7, a professora continua mantendo a postura


de questionamento – “ele se expandiu ou ele subiu?”. No turno 82, A3 se
posiciona a favor da idéia de que o ar está subindo, tendo mantido esta
posição desde o início da demonstração. Já A15 muda de idéia mais uma
vez no turno 83, enquanto A7 volta a argumentar no turno 85 – “ele se
expande pra todos os lados”.
128

Nesta seqüência o envolvimento da turma continua intenso e os alunos


começam a tentar justificar para a professora o uso das duas idéias “subir” e
“expandir”, que para eles são complementares – “ele se expande ... ele tá
querendo sair” (turno 87); “pra cima é mais fácil” (turno 88).

Enquanto isso a professora continua dando espaço para discussão,


limitando-se a repetir sempre a mesma questão (turno 81) ou insistir numa
interpretação rigorosa daquilo que estão falando – “quer dizer que aqui
((Erlenmeyer)) não tem ar?” (turno 89). Esta postura de P tem como
resultado um envolvimento cada vez maior dos alunos, que buscam
argumentos para convencê-la, chegando a ponto de sugerirem a realização
de um teste experimental para solucionar a questão (turnos 92 e 93).
Verifica-se aí um salto na argumentação dos alunos. Já que a professora
não aceita suas justificativas, estes procuram buscar na experimentação
(modo visual e ação sobre objetos concretos) evidências para sustentar suas
afirmações.

T Linguagem Verbal Oral Ações / Gestos Visual

95 P: ((6’)) se o ar... tá subindo __________ Conjunto


P vira o conjunto
se eu colocar assim bexiga –
bexiga – erlenmeyer
erlenmeyer
de cabeça para baixo
de cabeça
e continua aquecendo
para baixo

96 A7:__________________ ((inaudível))

97 A4: a bexiga vai estourar

98 P: eu vou pôr bem longe pra ela não


estourar... mas com a bexiga ia acontecer
o que?

99 A4: nada

100 ((discussão inaudível))

101 A15: ela ia esvaziar... se o ar tivesse Bexiga


subindo _____ela ia esvaziar... continua
cheia
129

102 P: ______________se o ar tivesse


subindo ela deveria estar esvaziando...

103 A15: mas o ar não tá subindo... ele tá se


expandindo... então ela não vai esvaziar...

104 Alunos: ah::::::

105 P: certo... se o ar tivesse só subindo... ele P continua aquecendo Bexiga


iria esvaziar... como ele ainda está o conjunto bexiga- continua
quente... ele deveria inverter...né? ((87’)) erlenmeyer cheia

106 A2: professora...

107 P: ahn.

108 A2: não é o caso das moléculas


((inaudível))... é esse o caso?

109 P: é:: o que estava em dúvida aqui... vem


a ser o seguinte... se o ar saiu daqui e
veio pra cá ... como se fosse na Erlenmeyer
Convecção – o ar quente fica menos Gestos dêiticos
denso ... sobe – OU se o ar se espalhou -- Bexiga
se o ar que estava aqui agora tá aqui E
aqui e tá ocupando mais espaço--

110 A5: é isso que tá acontecendo

111 ((inaudível, muita agitação, alunos falam


ao mesmo tempo))

Ao longo dos extratos anteriores, enquanto a professora insistia em mostrar


que duas interpretações diferentes podiam ser derivadas das explicações
dos alunos, estes procuravam convencê-la de que suas idéias eram
complementares. Havia um confronto entre o rigor no emprego de
determinados termos, que é inerente ao pensamento científico, e a
displicência característica do pensamento cotidiano. É importante notar que
essa diferença entre as idéias dos alunos aparecia mais claramente no
modo verbal do que no modo gestual. Este último revelou-se ambíguo em
alguns momentos da discussão (ver uso de gestos semelhantes por A5 e A7
para defender idéias diferentes nos turnos 48 e 71). Isto pode ser associado
às diferentes especializações dos modos semióticos (Kress et. al., 2001), o
modo gestual não é tão preciso quanto o verbal para a diferenciação de
130

idéias. Lemke (1998) chama atenção para as diferentes especializações dos


modos verbal e gestual, que, respectivamente, são mais adequados para
expressar características tipológicas do que topológicas e vice-versa.

A diferença entre o discurso da professora e aquele dos alunos, porém, foi


sendo minimizada à medida que o tempo foi passando e a discussão foi se
tornando cada vez mais envolvente. A postura instigadora da professora foi
levando cada vez mais alunos a participar e argumentos mais completos
começaram a ser construídos, incluindo o emprego de conhecimento básico
e a proposição de um teste experimental.

Este último aspecto foi muito marcante na evolução dos argumentos dos
alunos. É importante observar que somente nos turnos 101 e 103, após uma
ampla discussão, e em posse de uma evidência experimental, um dos
alunos apresentou uma refutação para as explicações sustentadas pela
afirmação “o ar quente sobe”, diferenciando claramente o que se entende
por “subir” e “expandir”. E, somente após esta refutação ter sido construída,
com um grande envolvimento de toda a classe, é que a professora deu um
feedback avaliativo para os alunos – “certo ... se o ar tivesse subindo .. ele
agora esvazia ... como ele ainda tá quente ... ele deveria inverter, né?” - e
explicou claramente porque a explicação refutada era inadequada – “é:: o
que estava em dúvida aqui... vem a ser o seguinte... se o ar saiu daqui
((Erlenmeyer)) e veio pra cá ((bexiga)) ... como se fosse na Convecção -- o
ar quente fica menos denso ... sobe -- ou se o ar se espalhou -- se o ar que
estava aqui agora tá aqui E aqui e tá ocupando mais espaço”.

Neste episódio, portanto, a mediação entre os pensamentos científico e


cotidiano foi feita através de uma postura instigadora da professora,
fornecendo um amplo espaço para a participação dos alunos com
argumentos e, ao mesmo tempo, acrescentando sua interpretação para os
mesmos e estimulando sua reformulação (funções interpessoal e ideacional,
131

respectivamente). Com exceção do início da demonstração em que


empregou um questionamento baseado no fornecimento de pistas, na maior
parte do episódio P manteve uma abordagem comunicativa interativa
dialógica.

Tabela 4 – Resumo do Episódio 1C

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral [Escrito] Gestos / Ações Visual

Ideacional Explicações em construção / Gestos dêiticos (GD) de


argumentos com conhecimento P indicam interpretação
básico (T61/62/64/66/67/68) de explicação dos Aumento de
alunos (T61) volume da bexiga
Alunos argumentam em defesa motiva explicações
de duas idéias Gestos metafóricos
(GM) ilustram Bexiga/erlenmeyer
Refutação (T101 e T103) argumentos ilustram fala de P
no T61
Diferença entre idéias (T109) Gestos de A5 e A7
indicam que para alunos
idéias apresentadas são
complementares (T48 e
T71)
Bexiga cheia é
Realização de teste evidência
oferece proporciona experimental para
evidência para refutação refutação

Interpessoal Abordagem comunicativa


predominantemente Interativa
Dialógica. Somente no turno
111 que P dá um feedback
avaliativo Postura dos alunos
expressa grande
Alunos julgam idéias distintas envolvimento
como complementares

P incentiva o dissenso e a
construção de argumentos,
sem explicar diferença entre
idéias.

Alunos falam ao mesmo tempo


– envolvimento

Aluno constrói refutação

Textual Intervenções de P ajudam a Demonstração mantém Mantém foco da


manter foco da discussão: foco da discussão discussão
revisão (T61) / pede para aluno
repetir idéia (T65) / refaz
questão (T98)
132

Neste episódio foi observado o ápice do processo de argumentação. Além


de buscarem conhecimentos básicos para legitimar suas asserções, os
alunos sugeriram a realização de um teste experimental das mesmas. Até o
turno 94, o aperfeiçoamento dos argumentos foi realizado
predominantemente através do modo verbal. Os gestos metafóricos
empregados correram paralelamente ao discurso (turnos 71 e 77).

Até o turno 89, as intervenções da professora tiveram papel de organização


(61), questionamento elicitativo (65, 69, 73 e 81) e interpretação (61, 69 e
89) das idéias dos alunos, mantendo a tendência dialógica da abordagem
comunicativa. Os gestos dêiticos empregados por P, ligaram os modos
verbal e visual, estendendo significados e enfatizando o papel do aparato
experimental na interpretação das explicações. Das sete intervenções de P
neste período, duas foram acompanhadas daqueles gestos indicando o
deslocamento do ar contido no erlenmeyer em direção à bexiga. A
insistência de P nesta interpretação sobre as asserções dos alunos,
acompanhada deste movimento gestual parece ter contribuído para a
sugestão de inverter o aparato apresentada nos turnos 93 e 94. Os gestos
repetidos da professora sobre o arranjo ajudaram a manter o foco da
argumentação sobre o mesmo, enfatizando o papel do teste experimental na
comprovação ou negação das hipóteses.
133

Capítulo 6 – Análise do Bloco Temático II:


Atividade de Laboratório Aberto

O bloco temático II teve início na segunda metade da quarta aula da


seqüência de ensino e terminou na décima aula. O tema em foco neste
bloco foi aquecimento e a equação fundamental da calorimetria. Este tema
foi abordado de duas formas ao longo do bloco, envolvendo a realização de
uma atividade de laboratório aberto, foco deste estudo, e introdução de
conceitos por meio de exposição. A atividade de laboratório foi empregada
no início do bloco, como forma de introdução e desenvolvimento do tema
aquecimento. Como será detalhado mais à frente, foi proposto um problema
a ser resolvido por meio de experimentação, cujo foco de estudo era o
aquecimento da água. Após todo o desenvolvimento da atividade, que
envolveu uma série de aspectos da cultura científica, a professora introduziu
o conceito de calor específico e, a partir do caso da água, estudado
experimentalmente, chegou à definição da equação fundamental da
calorimetria.

A partir da questão de pesquisa, somente as aulas envolvidas diretamente


na realização da atividade de laboratório foram selecionadas para análise.
Os aspectos da cultura científica presentes identificados ao longo dessas
aulas são apresentados na tabela 2.
134

Tabela 2 – Bloco Temático II: Equação Fundamental da Calorimetria

Atividade de Laboratório Aberto (aulas 4 a 8)


Etapas da Atividade (aula da seqüência) Aspectos da Cultura Científica Identificados
Motivação e planejamento da Investigação:
1. Apresentação do problema e
hipóteses iniciais Problema Aspectos conceituais
ª
(2 metade da A4) Hipóteses e metodológicos
Teste experimental (técnicos)
2. Planejamento de teste experimental
ª
(2 metade da A5)
Execução da Investigação:
a
3. Coleta de dados 1 inscrição: Medidas
a
(1 metade da A6) materiais → tabela
a
Interpretação da 1 Similaridades e
inscrição diferenças
a
4. Análise dos dados 2 inscrição: Incertezas
a
(2 metade da A6 a A8) tabela → gráfico Aproximações
5. Conclusões a
Interpretação da 2 Regularidades
(final da A8)
inscrição
a
3 inscrição: Reta média
gráfico → função

Definição da Equação Geral da Calorimetria (aulas 9 e 10)


Introdução do conceito de calor específico
Dedução da equação geral a partir da generalização da função obtida para o caso da água

A realização da atividade de laboratório aberto ocupou o período de cinco


semanas (4 aulas e meia) 23, contando com diferentes etapas de trabalho.
Estas etapas estavam previstas dentro do planejamento da professora,
correspondendo às características gerais de qualquer atividade deste tipo
(ver capítulo 3 deste trabalho): proposta do problema; levantamento de
hipóteses; elaboração de plano de trabalho; montagem dos arranjos
experimentais e coleta de dados; análise dos dados e conclusão.

23
É importante lembrar que as aulas filmadas eram duplas e, portanto, uma aula dentro da seqüência,
compreende 105 minutos, dos quais 5 correspondem ao intervalo entre aulas.
135

A partir das características das etapas que compõem a atividade de


laboratório aberto e os aspectos da cultura científica identificados, optamos
por dividir a mesma em duas fases de trabalho. A primeira fase está
relacionada à motivação para realização de uma investigação científica e ao
planejamento da mesma. De um ponto de vista epistemológico, as etapas 1
e 2 da atividade possibilitaram caracterizar o conhecimento científico como
resposta a um problema (Bachelard, 1996) e, além disso, apresentaram o
teste empírico como uma forma de contrastar hipóteses dentro dos
processos de construção e validação daquele conhecimento. O
planejamento do teste empírico envolveu discussões tanto de caráter técnico
quanto conceitual. A definição de uma metodologia de trabalho para
investigação das hipóteses foi baseada na identificação das variáveis
envolvidas (mensuráveis ou não), em função dos recursos materiais e
teóricos disponíveis.

A segunda fase corresponde à execução da experimentação e envolve a


construção de inscrições, o que lembra o processo de inscrição literária
descrito por Latour e Woolgar (1986). Na sala de aula, assim como no
laboratório, este processo tem início durante a coleta de dados, quando os
estudantes obtém informações sobre algumas características dos materiais
em estudo através de medições. Estas informações, agrupadas em uma
tabela, representam a primeira inscrição das propriedades daquele material
que estão relacionadas ao fenômeno em discussão. O conjunto de
transformações que caracteriza a análise dos dados só está começando, e
novas inscrições são realizadas. De um conjunto de números dispostos
numa tabela, as informações sobre o fenômeno são transformadas em um
gráfico, segunda inscrição, e, posteriormente, numa função matemática,
terceira inscrição. Ao longo deste processo de transformação, é preciso
aprender as propriedades das inscrições, como e porquê empregá-las.
136

Neste ponto, mais aspectos da cultura científica estão envolvidos, tanto


metodológicos – emprego e limitações dos instrumentos de medida, desvios
experimentais, realização de aproximações etc. –, quanto epistemológicos,
que justificam e regulam o uso que é feito dos anteriores.

6.1. LA / Fase 1: Planejando a Investigação

Como apresentado anteriormente, a fase de planejamento da investigação


ocorreu nas aulas 4 e 5 da seqüência. Assim como foi realizado com os
dados analisados no capítulo 5, cada aula foi dividida em eventos em função
de mudanças no enfoque ou tema das interações. A primeira metade da
quinta aula, por exemplo, foi dedicada a uma atividade sem relação com o
tema da pesquisa, uma avaliação relativa a conteúdos abordados no
bimestre anterior. A descrição dos eventos relacionados à atividade de
laboratório, que foram identificados ao longo das aulas da fase 1 é
apresentada no quadro a seguir.

Evento / aula Tema Duração


Apresentação do problema, levantamento de hipóteses e início
Evento 2/ 4 33’50”
de planejamento de teste para as mesmas
Alunos e professora copiam da lousa a síntese da discussão
Evento 3/ 4 16’10”
realizada
Revisão de hipóteses e definição de procedimentos /
Evento 2/ 5 20’ 20”
Separação de diferentes condições para experimentação
Evento 3/ 5 Separação dos grupos de alunos 8’ 42”
Evento 4/ 5 Discussão sobre como fazer as medidas 6’ 32”
137

6.1.1. Descrição e Análise Geral do Desenvolvimento da Fase 1

Fase 1 – Planejando a Investigação

Aula 4 – Evento 2/4

A fase 1 tem início com uma apresentação da professora sobre a realização


de um novo tipo de trabalho. No turno 1(a), na fala de P prevalece a função
de comunicação interpessoal:

(1a) P: este trabalho vai ser um pouquinho mais difícil ... então eu vou
propor uma questão ... e nós vamos BUSCAR a resposta [gesticula
indicando a turma toda] em grupo na classe ... então quem tiver idéia pode
falar ... nós vamos respeitar os colegas ... se não for a mesma idéia ... a
gente pode ter várias idéias ... não tem problema ... o importante é a gente
TROCAR [repete gesto anterior] essas idéias ... todo mundo tem direito de
falar e todo mundo tem direito de ser ouvido ...

Este é o primeiro contato dos estudantes com uma atividade de laboratório


aberto e as novidades são muitas. Desde o início das aulas de Física da
primeira série do Ensino Médio, os alunos já vêm participando de
demonstrações investigativas e tradicionais, em que suas ações envolvem a
busca de explicações qualitativas para fenômenos apresentados por P.
138

Nesta nova proposta, a construção de explicações para o fenômeno passa


pela discussão de várias questões além de sua observação, desde o
levantamento de hipóteses e identificação de aspectos envolvidos na
produção de condições adequadas ao teste das mesmas, até a realização
de uma análise quantitativa dos resultados obtidos, que será mencionada
pela professora somente nas próximas aulas. Além de considerar o grau de
dificuldade envolvido nestas ações, P espera uma atitude de engajamento
dos estudantes e dá espaço para a apresentação de idéias, o que justifica a
predominância da função interpessoal neste turno.

Episódio 6.1 – Criando Diferenças (T1b a T46)

Na seqüência, dos turnos 1b até 46, a professora apresenta o problema a


ser discutido e procura incentivar os alunos a levantarem hipóteses sobre o
mesmo. Neste período, as intervenções de P visam estabelecer diferenças
(Ogborn et. al., 1996), ou seja, criar um problema (Mortimer e Scott, 2000).

(1b) P: (...) o que acontece com a temperatura da água enquanto a gente


AQUECE essa água?
(2) A15: aumenta
(3) P: aumenta ... COMO que ela aumenta?

A princípio, o problema apresentado por P no turno 1b parece não ser


reconhecido como tal pelos alunos. A resposta para esta questão é muito
simples do ponto de vista dos mesmos – aumenta ((a temperatura)). É
necessário transformar o que é um fato aceito no senso comum em algo que
mereça ser investigado. Assim, nos demais turnos dessa seqüência a
professora procura criar essa necessidade e, para tanto, faz uso de
questionamentos, algumas vezes seguidos de pistas, e/ou reformulações do
problema inicial.

Acompanhando a proposta inicial de construção coletiva de significados, os


questionamentos de P são seguidos por respostas dos alunos, que por sua
139

vez recebem retornos, muitas vezes na forma de paráfrases das mesmas,


por parte da primeira. Este movimento caracteriza a abordagem
comunicativa como interativa. As questões e paráfrases empregadas por P
apresentam, portanto, uma função interpessoal de valorizar as idéias dos
alunos na construção. As idéias apresentadas, porém, são direcionadas em
função da intenção da professora de levar os alunos a reconhecerem o
problema proposto como tal. Dessa forma, o emprego de questões diretivas
e o fornecimento de pistas por parte de P caracterizam a abordagem como
predominantemente de autoridade (Mortimer e Scott, op. cit.).

Além de sua função interpessoal, o modo verbal oral ao longo da seqüência


exerce a função ideacional. As questões e pistas oferecidas por P
estabelecem o foco da discussão – temperatura da água –, enquanto as
respostas dos alunos trazem suas primeiras impressões sobre o tema.

As repetições e reformulações da questão inicial também estão envolvidas


numa função textual. Estas intervenções ajudam a manter o foco da
narrativa e a dar forma ao texto em composição neste momento da aula.
Outro aspecto que dá coerência interna a esse texto, possibilitando a
articulação das funções ideacional e interpessoal para a formação do
mesmo, é a realização de revisões do progresso da narrativa:

(31) A4: ela ((água quando vira vapor)) só se mistura com o ar?
(32) P: Quando ela vira vapor ela se mistura com o ar ... tá ... mas eu estou
pensando no vapor ... se a gente [indica turma toda] coloca a água pra
aquecer ... vocês estão dizendo que a temperatura aumenta ... nós temos
um primeiro problema aí ... será que ela aumenta ... sempre por igual? você
acha que não [indica A14] ... você acha que no começo ela aumenta ...

O turno 32 marca a primeira revisão do progresso da narrativa e reúne


outras das principais intervenções empregadas pela professora até então:
paráfrase e questionamento. Dentro da tendência interativa / de autoridade,
após parafrasear A4 – quando ela vira vapor ela se mistura com o ar –, P
redireciona a discussão para o tema temperatura – mas eu estou pensando
140

no vapor ... se a gente coloca a água pra aquecer (...). Em seguida, a


professora faz uma breve revisão da discussão – se a gente coloca água (...)
vocês estão dizendo que (...) – que possibilita dar coerência à narrativa e
reforçar o foco da mesma (função textual) – nós temos um primeiro
problema aí. Esta revisão leva a um novo questionamento – será que ela
aumenta ... sempre por igual? –, que especifica mais o foco da discussão:
taxa de variação da temperatura (função ideacional).

Além do modo verbal oral, que já vinha exercendo as três funções dentro do
processo de construção de significados, no turno 32 são empregados
também gestos dêiticos. Estes últimos correm em paralelo ao primeiro,
enfatizando a proposta de atividade coletiva e a aceitação das idéias dos
alunos.

Nos turnos seguintes (33 a 42), as interações continuam seguindo o mesmo


ritmo e a linguagem verbal oral volta a ser o modo predominante na
comunicação. A linguagem verbal escrita é empregada somente no turno 43,
para organizar e compartilhar as primeiras hipóteses no quadro:

(43) P: bom ... então eu vou escrever isso pra gente num perder essas
idéias ... né ... senão a gente se perde ... então primeiro o que acontece
com a temperatura da água enquanto a aquecemos ... então ela
aumenta [escreve no quadro] ... primeiro ela aumenta ... aí você [indica A6]
disse que nesse aumento ... ela aumenta ... no começo ... mais devagar
[escreve] ... ((59’))
(44) A6: ( ) eu acho que ela no começo vai mais devagar e depois mais
rápido
(45) P: e depois mais rápido [escreve] ... então vamos pensar em números
... só pra chutar ... a gente não tem a menor idéia ... mas ... vamos supor
assim ... se aumentava no começo dez graus por minuto ... depois ela
passa a aumentar quinze ... vinte ... por aí
(46) quinze ... vinte

No extrato acima, o modo verbal escrito exerce uma função ideacional. A


questão sob investigação e uma contribuição dos alunos, escritas no quadro,
representam o foco da discussão. Embora no quadro não haja menção aos
termos problema e hipótese, o registro das primeiras idéias mostra que a
141

discussão começa a seguir o caminho desejado e marca o início de uma


nova etapa: o levantamento de hipóteses. O caráter hipotético das
afirmações é reforçado pela fala da professora – eu vou escrever isso só pra
gente não perder essas idéias.

Outro aspecto a ser observado em relação à função ideacional neste extrato


é o emprego de estimativas numéricas na interpretação da hipótese de A6.
Esta prática, que foi introduzida por P no turno 37 (ver anexo 3) como uma
de suas pistas para estabelecer o problema em discussão, reflete um
movimento de transição entre o mundo do senso comum e aquele das
investigações em Ciências. A realização de estimativas numéricas coloca
em foco a taxa de variação da temperatura, uma abordagem científica da
questão apresentada.

Tabela 5 – Resumo do Processo de Construção do Problema (Ep 6.1.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Verbal Escrito Gestos / Ações

Ideacional T da água em foco / idéias: aumenta,


devagar no começo (1 a 31)

Taxa de variação de T em foco (32)


Representa foco e
Idéias de alunos (33 a 46) primeira hipótese

Estimativas numéricas (37, 45, 46)

Interpessoal Interativo (questionamento / GD: construção


paráfrase) / de autoridade (pistas / compartilhada (32) /
deixa passar idéia) contribuição de aluno
(32, 39, 43)

Textual Mantém foco: repete, reformula e


complementa questão (1 a 43) /
revisa progresso (32)

O quadro resumo mostra que o modo de comunicação predominante ao


longo desta etapa foi a linguagem verbal oral, que exerceu as funções
142

textual, interpessoal e ideacional. Outros modos, quando empregados,


apresentaram sempre informações semelhantes àquelas veiculadas pelo
modo verbal oral. Os gestos dêiticos, que tiveram espaço na apresentação
da atividade e em momentos de revisão e compartilhamento de idéias,
duplicaram a função interpessoal da linguagem verbal oral. Já o modo verbal
escrito duplicou a função ideacional, também apresentada na linguagem
verbal oral.

Episódio 6.2. – Construção de Hipóteses (T47 a T185)

Desde o início da narrativa a professora já vinha apresentando a intenção de


trabalhar com as idéias dos alunos, incentivando-os a participar. A partir do
turno 47, estabelecido o problema sob investigação, os alunos começam a
compreender a proposta e, até o turno 183, seguem apresentando diferentes
hipóteses sobre aspectos relacionados ao aquecimento da água:

(48) A21: (...) depende da temperatura que colocar água


(52) A15: ô professora ... se ela tá (...) a nível do mar ...
(65) A6: eu acho que o:: ... a temperatura do ambiente ...
(83) A23: depende também do objeto que cê vai esquentar a água
(86) A4: É ... se é alumínio ou vidro ou outra coisa ...
(90)A23: ... e também ... ou no forno microondas ou no fogão ...
(106) A23: a água ... num recipiente ... alguma coisa ... se ele é fechado ou
aberto ... também

Ao longo deste período, a maior parte das intervenções de P são elicitativas,


procurando explorar as idéias dos alunos, o que caracteriza a abordagem
comunicativa interativa como predominantemente dialógica (Mortimer e
Scott, op. cit.). Somente entre os turnos 110 e 139, a professora faz uso de
pistas para que alunos falem de um aspecto do fenômeno ainda não
mencionado – a quantidade de água. Neste momento a postura de P é de
autoridade:

(109) P(b): que mais que tá faltando? vocês não pensaram numa coisa...
(110) A4: Em relação à química...
143

(111) P: A própria água ... a gente tá falando na água ... mas não falou no
que da água...
(112) A14: ()
(113) P: ... a gente falou da quantidade de energia ... se eu estiver
aquecendo pouca água ... ou muita água ...
(114) A4: a quantidade de água?
(115) P: ahn? a quantidade de água modifica o aquecimento?
(116) A4: Claro...
(117) P: Ninguém falou nisso até agora ... né ((67’)) se eu tiver mais água
... quê que vai acontecer... [escreve no quadro: “Hipóteses: - Quantidade
de água; + água → demora mais”]

O extrato acima exemplifica o uso feito do modo verbal escrito, que segue a
tendência iniciada em turnos anteriores. Este modo é empregado como
forma de organizar e compartilhar hipóteses na lousa, a medida que estas
são apresentadas e esclarecidas pelos alunos (ver anexo 3, turnos 51a, 58,
64, 88, 107, 117, 152 e 163). A função ideacional dos registros no quadro é
explicitada na fala e nos gestos da professora no turno 119b:

(119b) P: bom ... então a gente tá vendo aqui [gesto dêitico indica lousa] ...
uma série de coisas que a gente acha que vão influneciar - - vamos parar a
conversa ... se a gente se perder agora ... a gente vai se perder pr/os
próximos ... pr/o próximo trabalho ... que é a seqüência desse aqui ... - -
então a gente tá vendo aqui VÁRIAS coisas [gesto dêitico indica hipóteses
no quadro e, em seguida, alunos] que influenciam no aquecimento ... por
exemplo ... da água ... estou falando da água porque a água é um material
fácil de conseguir ... fácil de achar ... e tudo isso ... então ... várias coisas
estão influenciando nesse assunto ... né ... se nesse aquecimento ...

Ainda dentro desta seqüência, entre os turnos 140 e 183, três alunos
começam a discutir sobre a estabilidade da temperatura da água durante a
ebulição, dois acreditam que a temperatura aumenta, enquanto uma acredita
que se mantém. Este é um aspecto importante para a motivação de um teste
experimental e, neste momento, P emprega uma abordagem comunicativa
dialógica, dando espaço para as hipóteses concorrentes:

(146) P: [a água] vai continuar aumentando?...


(147) A21: é
(148) A14: ela vai chegar num nível em que ((inaudível)) [gesto metafórico
indica aumento de temperatura] ...
(149) P: Cada vez vai aumentando mais?... ((70’))
144

(150) A14: sim


(151) A4: não
(152) P: a temperatura ... aumenta ... sempre [P escreve na lousa,
enquanto alunos continuam discutindo] ...
(153) P: mais alto ... mais alto [para alunos que estão discutindo]...
(154) A14: mais alto?
(155) P: é eu quero ouvir o papo aí que está particular e quero socializar a
idéia
(156) A4: não ... eu tô falando aqui que eu acho que se ficar a água
fervendo ... fervendo ... se colocar o termômetro lá ... vai se manter ... eles
acham que não...
(157) A21: mas eu acho que ela tem que ferver até evaporar ... então ... ela
aumenta...
(158) A14: é por isso que vai aumentar ... professora...
(159) A21: pra evaporar...
(160) A4: eu acho que não...
(161) P: eu acho ... quem mais acha? - - tem dois achados aqui - - certo?
(162) A14: eu acharei ...
(163) P: a temperatura aumenta sempre ((71’)) ... ou a temperatura
aumenta até a ebulição e depois pára de aumentar ... se mantém
[escreve no quadro]...né

O extrato acima representa o tipo de interação dialógica característico da


maior parte deste período, a professora explora a fala dos alunos
empregando paráfrases (turno 149) e questionamentos (turno 146).
Paralelamente à identificação das hipóteses levantadas através do modo
oral, o modo verbal escrito continua sendo empregado como forma de
organização da discussão e apresentação do conteúdo da mesma, numa
função ideacional (turnos 152 e 163).

No turno 148, pela primeira vez, é empregado um gesto metafórico, que


complementa a informação apresentada por A14. Até este momento,
somente gestos dêiticos haviam sido empregados.

O posicionamento dos estudantes em relação à mudança de estado da água


envolve a construção de argumentos com e sem justificativa entre os turnos
145

156 e160. A postura de P vai ao encontro dos objetivos da atividade de


laboratório aberto, enfatizando a existência de idéias divergentes sem,
porém, incentivar a construção de argumentos mais complexos. Neste
momento da atividade, marcar o dissenso e motivar o teste empírico parece
ser mais importante do que aprofundar a argumentação e chegar a uma
explicação que responda as dúvidas dos alunos.

Tabela 6 – Resumo do Período de Construção de Hipóteses (Ep 6.2.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Verbal Escrito Gestos / Ações

Ideacional Hipóteses Marca idéias no GM complementa


quadro idéia de aluno (T148)
Idéias divergentes

Interpessoal Interativo: questionamentos e paráfrases / GD convida e


dialógico: P explora idéias dos alunos (T47 enfatiza participação
a T109) e incentiva dissenso(T140 a T183) dos alunos

Interativo / de autoridade: pistas(T110 a


T182)

Textual Revisa progresso da narrativa (turno 119) Representa GD relaciona modos


texto verbais oral e escrito
construído

O modo verbal oral continua predominando ao logo desta etapa, porém


sendo complementado por outros modos. A articulação das funções
ideacional e interpessoal – apresentação/destaque de idéias sobre o tema e
valorização e incentivo ao posicionamento dos estudantes em relação às
mesmas, respectivamente – possibilitou compor um texto coerente que
reflete a proposta de construção coletiva do processo de investigação. A
clara discriminação entre problema e hipóteses através do registro no
quadro possibilitam transformar este texto em referência para as etapas
posteriores:
146

Transcrição dos registros no quadro de giz (turno 185)

O que acontece com a Conforme altitude a


temperatura da água quando a água aquece mais
aquecemos? rápido (< altitude)
(não dá p/ testar)
Hipóteses:
Quantidade de água -
Aumenta – no começo +
+ água → demora mais
devagar e depois + rápido
Recipiente aberto ou fechado Temperatura aumenta
Depende do material do sempre
recipiente : alumínio ou vidro
A temperatura aumenta
Depende da quantidade de até a ebulição e depois se
energia fornecida: + energia + mantém
rapidamente

Episódio 6.3.A – Relacionando Hipóteses e Teste Experimental (T186 a


T208)

Até aqui a professora ainda não havia mencionado a proposta de teste


experimental. A partir do turno 184 inicia-se um momento de transição
dentro da fase1, dadas as hipóteses dos alunos sobre o problema, o próximo
passo é planejar o teste das mesmas. Esta proposta, porém, não é
apresentada diretamente por P. Uma revisão dos progressos alcançados
dentro da atividade possibilita que a sugestão de teste seja oferecida pelos
próprios alunos:

(186) P: eu pus uma idéia ... um problema pra gente resolver ... a gente fez
uma série de hipóteses aqui ... a gente tem certeza de alguma coisa
dessas?
(187) Alunos: não...
(188) A21: a gente podia fazer uma experiência...
(189) P: bom [indica A21] ... a gente podia fazer uma experiência... ((73’))
(190) A14: agora...
(191) P: só que pra gente fazer uma experiência ... a gente tem que planejar
... tá ... nós estamos agindo agora como se age em ciência ... eu joguei o
problema ... eu propus uma idéia aqui ... vocês levantaram um monte de
hipóteses ... tem coisas que a gente está de acordo ... tem coisas que a
gente tem dúvidas ... né ... que todo mundo acha que no começo aumenta
mais devagar e depois mais rápido - - pelo menos ninguém disse nada em
147

contrário - - depois ... pára de aumentar [indica A4] - - já num é bem assim
- - né ... aumenta e depois pára de aumentar ...
(192) A4: só que num desce ... ela se mantém...
(193) P: ela não diminui ... ela se mantém ... né ... ele acha que no começo
aumenta mais devagar depois aumenta mais rápido ... ahn ... que o tipo de
recipiente que a gente vai usar ... o material influencia ... ((74’)) se o
recipiente está aberto ou fechado ... também ... da quantidade de calor que
fornece ... conforme a altitude ... a quantidade de água ... então ... a gente
tem uma série de coisas ... que acha que influencia ... a gente num dá bem
como ainda definir ... né ... a gente ACHA que é assim ... só hipótese

O trecho selecionado caracteriza este momento de transição. A revisão dos


progressos alcançados apresenta uma função textual dentro da narrativa,
que finaliza uma etapa e abre espaço para a proposta do teste experimental.
Ao longo dessa revisão, a professora continua enfatizando a participação
dos alunos através de gestos dêiticos (turnos 189 e 191) e citações de suas
contribuições.

O caráter hipotético das idéias apresentadas pelos estudantes é reforçado


por P várias vezes neste período: a gente tem certeza de alguma coisa
dessas? (T186) / ... tem coisas que a gente está de acordo ... tem coisas que
a gente tem dúvidas (T191) / a gente tem uma série de coisas ... que acha
que influencia ... a gente num dá bem como ainda definir ... né ... a gente
ACHA que é assim ... só hipótese (T193).

Além disso, a professora declara sua concepção do “fazer Ciência” – nós


estamos agindo agora como se age em ciência ... eu joguei o problema ... eu
propus uma idéia aqui ... vocês levantaram um monte de hipóteses ... tem
coisas que a gente está de acordo ... tem coisas que a gente tem dúvidas.
Neste ponto, o problema, as hipóteses e a realização de teste empírico
como forma de contrastá-las com a realidade são apresentados como
importantes ferramentas na construção de uma explicação científica.
148

Episódio 6.3.B – Planejando teste de hipóteses (T209 a T344)

O principal tema do plano de trabalho discutido neste período é a relação de


materiais necessários. Mais uma vez o papel das hipóteses como referência
e motivação do teste experimental é enfatizado. A abordagem comunicativa
ao longo dos turnos 209 a 258 é interativa de autoridade. É importante notar
que as hipóteses que nortearam o planejamento da experimentação já foram
discutidas, não havendo motivos para a existência de diferentes vozes neste
momento da interação.

(215) P: (...) que mais a gente precisa...


(216) A21: Lamparina...
(217) P: Lamparina ... que mais... [P escreve: “lamparina 1 ou 2”]
(218) A21: A água... ((77’))
(219) P: A água... [P escreve: “água”]
(220) A14: O fogo...
(221) P: Ela acabou de me dizer a lamparina...

A partir do turno 259, uma tendência dialógica passa a predominar na


abordagem comunicativa e outros temas começam a ser abordados. Entre
os turnos 259 a 268 as hipóteses divergentes sobre a ebulição da água,
levantadas anteriormente (turnos 140 a 183), voltam a ser mencionadas. A
professora pede para que as alunas repitam para a turma o que estão
discutindo:

(259) P: como é que é? ((80’10”)) ((para as alunas A21 e A4 que estão


discutindo sobre a temperatura da água))
(260) A4: eu estou explicando pra ela ((A21)) que um jeito de você fazer a
água se manter é com gelo ...
(261) A14: persistente ... ela
(262) P: quê que tem o gelo?
(263) A4: com gelo ... você põe a água no negócio de gelo ... põe no freezer
... fica gelado ... só que não desce mais ... vai descendo ... vai descendo ...
no caso ... se mantém ali ... que nem a água quando ferve
(264) A21: porque ela disse que a água chega num determinado tempo ...
não fica mais quente ... ((fazendo um gesto indicando uma linha horizontal))
chega num limite ...
(265) A4: aí ... evapora ... como é que fui?
149

(266) P: bom...nós vamos testar como é que...


(267) A4: ah::...professora ... dá logo a resposta
(268) P: não ... não ... calma ... tenha paciência ... bom ... a gente viu o que
a gente vai precisar de material...vamos ver se a gente consegue ...
(269) A25:()((incompreensível ... pois somente para a professora))
(270) P: Olha a pergunta do A25 ((81’)) ... ó ... existe um vapor mais quente
e um vapor mais frio...

A postura da professora em relação às idéias divergentes neste extrato é a


mesma adotada anteriormente. P marca e compartilha com a turma a
existência de hipóteses diferentes, mas não explora muito a argumentação.
A solução para o impasse é deixada em aberto como forma de motivar a
realização do teste empírico das hipóteses (turnos 266 a 268).

O diálogo transcrito acima representa o espaço oferecido às contribuições


dos alunos ao longo da fase 1 da atividade. A ênfase oferecida pela
professora aos argumentos de A4, que no turno 263 emprega um exemplo
do cotidiano para justificar sua posição, não contribui somente para a
motivação do teste de hipóteses, mas possibilita também o surgimento de
outros temas de discussão. Nos turnos seguintes (ver transcrição completa
no anexo 3), outro aluno, A25, levanta uma questão sobre a possibilidade de
aquecimento de vapor, que a professora, mais uma vez, compartilha com a
turma toda. É importante notar que este clima de envolvimento é criado tanto
através de uma postura elicitativa de P, quanto através de momentos de
maior direcionamento. Enquanto a primeira abre espaço para participação e
desenvolvimento das idéias dos alunos, o direcionamento possibilita manter
o foco da discussão, como ocorre no trecho a seguir:

(313) A14: E o gelo seco? O gelo seco é quente


(314) A25: mas assim ... ó ...
(315 ) ((alunos falam ao mesmo tempo))
(316) P: O gelo seco é outra coisa diferente de água...
150

Um ponto novo para o desenvolvimento da narrativa, apresentado entre os


turnos 320b a 344, foi a proposta de divisão do trabalho:

(320b) P: bom ... então ... ó ... nós já vimos ... quais hipóteses que a gente
quer verificar ... que vocês acham que vão influenciar ((85’)) ... nós já vimos
o material que vai utilizar ... agora como é que a gente vai fazer o trabalho?
Como é que a gente vai medir pra verificar? Porque é muita coisa pra ver...
((pausa 7”)) ... quê que a gente vai ter que fazer agora pra poder verificar
cada uma dessas hipóteses..
(324) A4: A gente... A gente se mistura ... e cada um faz um...
(...)
(330) A27: Vai um trampo ... professora...
(331) P: Vai um trampo ... então ... como é que a gente resolve o trampo?
(332) A21: Organizando...
(333) P: Vamos tentar organizar isso ... só que aí a gente vai ter que ter ...
grupos que trabalhem à sério ... porque a gente tem que confiar no
resultado do outro ... será que a gente tem - - sh:: ((para um grupo que está
conversando)) - - será que a gente pode fazer o trabalho na classe como
um todo ... onde ... um vai fazer ... com mais água ... outro faz com menos
... outro faz com mais lamparina ... outro faz com tampa ... e depois a gente
faz aí ... um grande painel pra olharmos TUDO?...
(...)
(342) P: Se a gente fizer vários ... lógico ... se a gente fizer ... sei lá ... seis
grupos ... cada um trabalhando de um jeito ... a gente vai ter uma confiança
muito grande no trabalho do colega [gesticula indicando trabalho coletivo
com toda a classe] ... então ... precisa haver um compromisso da classe de
trabalhar legal ... senão ... não pode ... se um não faz o negócio bem feito ...
não vai funcionar ... nós vamos ter que detalhar isso daí ... olha ... sh:: ...
nós vamos ter que detalhar o como fazer ... PRA TODOS AGIREM
IGUALMENTE [indica todos os alunos] ... pra gente poder comparar ... tá ...
então é pra todo mundo fazer direitinho ... pra gente não ter que retomar e
refazer nenhuma parte .. .então ... primeira coisa ... ((88’)) vamos anotar o
que está na lousa ... e vamos ... olha gente ... é importante agora ... nós
vamos ter uma seqüência de trabalho ... vocês tão vendo isso ... nós vamos
ter de fazer como medir todo mundo ... igual ... nós vamos ter que ... depois
... medir ... depois comparar essas medidas ... então ... vai ser uma coisa
seqüencial...

Neste momento a professora dá forte ênfase à necessidade de engajamento


dos alunos para a realização da atividade. Uma característica de toda fase 1
é o constante cuidado de P em marcar a proposta de trabalho coletivo e sua
expectativa de uma ampla participação dos mesmos. Propor a realização de
uma atividade de experimentação atribuindo diferentes condições de
trabalho para cada grupo de alunos é uma proposta bastante ousada, que
exige muita organização.
151

Tabela 7 – Resumo do Período de Planejamento de Teste de Hipóteses


(Ep 6.3.)

Funções de Verbal Gestos /


Significado Ações
Oral Escrita

Ideacional Caráter hipotético de afirmações (T186, T191 e


T193)

Visão de ciência (193)

Aspectos envolvidos no teste empírico: materiais,


variáveis, condições de comparação

Hipóteses concorrentes GM completa


fala de A21
Como testar hipóteses? / o que medir / fixar / (264)
variar? / divisão de trabalho

Interpessoal Interativo / dialógico: fala da professora reflete GD valorizam


diferentes contribuições dos alunos (T186 a contribuições
T193) dos alunos

Interativo / de Autoridade (T209 a T258)

I/D (T259 a T294) – I/A (T295 a T344)

Textual Revisa progresso da narrativa Relação de


materiais

Ao longo do evento 2/4 observamos a construção de dois textos


compreendendo aspectos da cultura científica. No primeiro deles o
levantamento de hipóteses sobre um dado problema é apresentado como
parte de um processo de investigação, enquanto, no segundo, o papel do
teste empírico no contraste dessas hipóteses com a realidade é destacado,
enfatizando a necessidade de planejamento e trabalho cooperativo para a
realização do mesmo. A construção desses textos envolveu a combinação
de aspectos relacionados às funções ideacional e interpessoal. Isto foi
possível por meio de intervenções da professora, tais como revisão do
progresso da narrativa, paráfrase de idéias de alunos e
repetição/reformulação de questões.
152

Aula 5 – Evento 2/5

No evento 2/5 a professora começa a revisar a discussão realizada na aula


anterior. No turno 1, com duração aproximada de três minutos, P fala do
progresso da atividade e começa a apresentar idéias para a divisão de
trabalho. Esta revisão é norteada pelas informações relacionadas no quadro,
que correspondem às idéias discutidas na aula anterior.

Transcrição dos registros no quadro de giz no início do evento 2/5

“Problema: O que acontece com a temperatura da água enquanto a aquecemos?


Hipóteses:
1) Aumenta sempre
2) Aumenta até a ebulição e depois se mantém
3) Depende do recipiente estar aberto ou fechado
4) Depende do material do recipiente: vidro ou alumínio
5) Depende da quantidade de energia fornecida: mais energia a temperatura
aumenta mais rápido
6) Aumenta mais devagar no começo, depois mais rápido
7) Dependendo da altitude a água aquece mais rápido
8) Dependendo da Quantidade de água: mais água, demora mais
Plano de trabalho:
Material: água, béquer, copo de alumínio, lamparinas, tripé, tampa, termômetro.”

Enquanto P fala das idéias construídas coletivamente na aula anterior


(anexo 4, turno 1a) a abordagem comunicativa adotada é não – interativa,
dialógica. Esta tendência começa a mudar no turno 1b, em que a professora
sugere a divisão do trabalho entre grupos:

(1b) P: vamos ver como é que a gente faz essa experiência ... não adianta a
gente sair que nem doido ... pegando material e medir ... sem saber o que
vai medir ... então a gente precisa planejar o trabalho ... pra gente depois
poder verificar ... se tudo que a gente falou estava certo ... se não estava ...
onde que a gente tem certeza ... onde que não tem...pra partir pr/os nossos
resultados ... ((70’)) então por isso precisa ... organizar o trabalho ... se cada
um ... cada grupo ... for testar tudo isso ... ele vai ter que fazer ... uma
medida com uma certa quantidade de água ... outra com outra ... outra com
ela aberta ... outra fechada ... outra com ... com vidro ... outra com alumínio
... outra com uma lamparina ... outra com duas lamparinas ... então ...
demora muito tempo pra pegar TODOS esses dados ... tá ... a gente vai
153

ficar o ano inteiro aí ... medindo ... medindo ... medindo ... pra ver ... ahn
...tirar esses valores todos ... então ... a sugestão é ... a gente dividir o
trabalho .. .nos grupos da classe ... cada um vai fazer uma parte ... e no fim
a gente faz ... uma comparação de todos ... pra gente poder ver se as
nossas hipóteses estão corretas ou não ... tá ...

Até este ponto a intenção da professora pode ser classificada como manter
a narrativa, de acordo com a abordagem de Mortimer e Scott (op. cit.). Este
momento tem o papel de retomar e sustentar o desenvolvimento da estória
científica iniciada na aula anterior.

Episódio 6.4.A – Identificando variáveis envolvidas em teste de


hipóteses (T1c a T15a)

O desenvolvimento dessa estória recomeça no turno 1c, quando P inicia


uma abordagem interativa para obtenção de idéias dos alunos sobre como
realizar os testes:

(1c) P: mesmo que a gente vá fazer assim ... cada grupo faz alguma coisa
... o quê que a gente teria que fazer? ((71’)) bem ... como que a gente ...
cada grupo iria trabalhar com esse material ... como? quê que a gente vai
medir?

Este turno marca o início de uma abordagem de autoridade, que estende-se


até o final do evento. Através de uma série de questões, às vezes seguidas
de pistas, a professora vai identificando, com os estudantes, aspectos
relacionados ao teste experimental. Dentro da função ideacional, os
principais aspectos abordados entre os turno 1c e 15a são relacionados à
identificação de grandezas envolvidas – temperatura e tempo – e a
procedimentos de medida para o teste.

(7) P: a gente vai ter que fazer o quê?


(8) A29: Ir anotando
(9) P: ir anotando ... agora ... pra eu anotar ... eu vou precisar de quanto
TEMPO aqueceu ((72’)) ... nós vamos olhar assim ... cada tanto tempo ...
como é que eu vou medir ... vou ficar olhando ... e vou dizer o que?
(10) A2: Que a água ferveu...
(11) P: Mas não é só o ferver - - se a nossa hipótese só fosse só essa
[indica hipóteses na lousa] ... ver se ela aumenta ... pára de aumentar ...
154

ou aumenta depois da ebulição ... dava pra eu fazer isso ... espera ela
ferver ... fica olhando ... se aumentou ou se não aumentou depois - - mas a
gente tem que ver ... se o material tá influenciando no aquecimento ... se a
quantidade de lamparina ... também ... etc. ... então não é só do rela/ deixa
ferver ... e pronto ...

Neste período, P reforça o papel central das hipóteses na construção do


plano de trabalho. O modo verbal escrito, que representa as hipóteses
compartilhadas pela turma, ancora esta construção, numa função textual.

Episódio 6.4.B – Obtendo informações sobre variáveis indiretamente

Um importante tema dentro da discussão sobre grandezas e medidas é a


possibilidade de medição direta ou indireta de certas variáveis envolvidas
nas hipóteses. Entre os turnos 15b e 59a, a professora começa a guiar os
estudantes no trabalho com idéias científicas (Mortimer e Scott, 2000), numa
discussão sobre medida indireta de energia fornecida e estabelecimento de
padrões para a realização do experimento.

(15b ) P: então ... a gente vai ter que medir conforme o tempo vai passando
((73’)) ... esse tempo que vai passando ... vai dar também uma outra
medida pra gente ... que é uma medida de ... quanto de energia está
chegando pra água ... como é que eu vou medir o calor que a água está
recebendo?
(16) A: Termômetro...
(17) A22: Termômetro...
(18) A: Colocando o dedo...
(19) A22: Nossa...que idéia...
(20) P: Será que se eu for e colocar o termômetro ... eu meço o calor que a
lamparina está dando?
(21) A22: Não...( )
(22) P: Espera aí ... fala aí A4 ... ela fornece o quê?
(23) A4: Calor ... pr/o negócio ferver ... né ... fogo...
(24) P: Vai chegar a energia ... quê que vai acontecer com as partículas da
água?
(25) A22: Vai...se agitando...
(26) A4: Se movimentar...
155

(27 a) P: vão ficar mais agitadas ... vão se movimentar mais .. .e é por isso
que a temperatura ((74’)) aumenta ... então pra gente ver também ... quanto
de energia a gente está fornecendo ... a gente vai medir pelo tempo

No turno 15b, a professora introduz a relação entre medida de tempo e calor


fornecido (função ideacional) e inicia um questionamento de verificação do
entendimento dos alunos sobre o que acabou de expor – como é que eu vou
medir o calor que a água está recebendo?. As respostas oferecidas pelos
mesmos nos turnos 28 a 31 são inadequadas e refletem que estão fazendo
uma confusão entre energia e temperatura. O retorno de P vem na forma de
uma questão diretiva, seguida por intervenções que selecionam (T22) e
transformam as idéias dos alunos (T24). Através dessa abordagem
comunicativa de autoridade, a professora guia os estudantes para a
diferenciação entre as grandezas mencionadas (turno 27 a). A paráfrase das
contribuições de A22 e A4 neste turno, vai ao encontro da intenção de
construção de textos coletivos, apresentada por P desde a aula anterior,
função interpessoal.

Nos turnos seguintes, ainda numa abordagem interativa de autoridade


(função interpessoal), estudantes e professora estabelecem condições de
experimentação em função das hipóteses, variando possibilidades de teste,
considerando aspectos técnicos envolvidos e mantendo padrões de
comparação entre trabalho de diferentes grupos (função ideacional). Neste
período, o modo verbal escrito começa a ser empregado com a finalidade de
marcar e compartilhar os procedimentos construídos através do oral. À
medida em que são escritas no quadro, as condições de experimentação
são nomeadas pela professora, numa divisão de grupos de trabalho: grupo I,
grupo II, grupo III etc, e o texto final do plano de trabalho é concluído.
156

Aula 5 – Evento 3/5 (duração aproximada de 8’40”)

Este evento corresponde ao período em que a professora faz a separação


dos grupos de trabalho para cada uma das condições de experimentação
definidas. Esta divisão é feita com base nos grupos formados para a
realização de atividades em aulas anteriores. A professora numera as
condições de experimentação aleatoriamente e anota o nome dos membros
do grupo correspondente. Neste período, P continua enfatizando a
necessidade de compromisso para a realização de um trabalho cooperativo.

Aula 5 – Evento 4/5

Episódio 6.4.C – Discussão sobre procedimentos de medida

Após a divisão dos grupos de trabalho, a professora retoma a discussão


sobre planejamento, agora para determinar padrões para a realização das
medidas:

(83) P: ((94’56”)) vai chegar ... nós vamos medir a água ... alguém vai ver se
as lamparinas estão certas ... vai deixar tudo igualzinho ... vamos medir a
água ... pegar a água ... cada grupo vai pegar o tripezinho ... vai colocar lá
nas mesas ... cada grupo vai trabalhar ... vai fazer o quê? Pegar o
termômetro e faz o que?24

A questão apresentada no turno 83 inicia mais uma seqüência interativa


predominantemente de autoridade (função interpessoal). Além de procurar
verificar a compreensão sobre os procedimentos construídos, P ainda
precisa estabelecer alguns aspectos importantes, como o intervalo de tempo
entre uma medida e outra, e o tempo de duração do experimento. O modo
verbal escrito, mais uma vez, é empregado (turno 93, anexo 4) para marcar
um procedimento no quadro – marcar a temperatura da água antes de iniciar
o aquecimento.

24
A contagem de turnos havia sido interrompida durante o evento 3/5.
157

Tabela 8 – Resumo do Período de Construção de Hipóteses (Eps 6.4.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Verbal Escrito Gestos / Ações

Ideacional Hipóteses / Teste de diferentes Problema e


condições / Identificação de grandezas / hipóteses
Procedimentos / Registro em tabela (T8
e T9) / Trabalho indireto com variáveis
do problema: tempo e energia /
Conhecimentos anteriores sobre
temperatura (T20 a T27) / Padrões de
experimentação

Interpessoal NI / D: Idéias construídas coletivamente


(T1a)

I / A: questões diretivas / seleção de


idéias (T1b a T82)

Textual Revisa texto da aula anterior e Anotações ancoram GD relaciona oral e


estabelece foco da presente aula discussão escrito (T1 a)

O texto construído na aula 5 é voltado para aspectos práticos envolvidos na


realização do teste empírico. Nesta etapa, as intervenções da professora
privilegiam os aspectos relacionados à função ideacional. Estimular o
engajamento dos alunos é um dos objetivos principais no início de uma nova
atividade, o que pode explicar a maior ênfase dada à função interpessoal na
aula anterior. É importante notar, porém, que mesmo na ausência de
verbalizações da professora voltadas explicitamente para o papel dos alunos
dentro da construção do plano de trabalho, seus questionamentos seguidos
de espaço para participação e o constante emprego de paráfrases
continuaram sinalizando a proposta de produção coletiva.
158

6.2. LA Fase 2A – Primeira Inscrição

A fase de coleta de dados ocorreu na primeira parte da aula 6. No início


desta aula, as diferentes condições de experimentação, definidas na fase
anterior, estavam escritas no quadro. Cada condição estava acompanhada
do número de um grupo de trabalho e a relação de seus componentes. Os
materiais a serem empregados estavam dispostos na mesa da professora e
numa carteira em frente à turma.

Após orientação da professora os grupos reúnem-se nas bancadas,


identificam suas condições de trabalho escritas na lousa e pegam materiais.
A análise a seguir focaliza um desses grupos.

6.2.1. Descrição e Análise Geral do Desenvolvimento da Fase 2A

Fase 2A – Coleta de Dados:


Obtendo Primeira Inscrição
159

Evento 2/6 – Coleta de Dados: Primeira Inscrição

O evento 2/6, descrito e analisado a seguir, tem início aos vinte e dois
minutos da aula 6. Neste momento, três dos quatro estudantes do grupo III
estão reunidos na bancada preparando os materiais para começar a
experiência. A condição de teste desse grupo25, que foi atribuída pela
professora na aula anterior, é a seguinte: 100 ml de água; recipiente de
vidro; sem tampa e 2 lamparinas.

Cena 26
Ação Verbal Oral
∆t)
(∆
Gu: observa colegas
1 Tom: acompanha Bel
(22’24”) Bel: mede temperatura inicial da água Bel: dezoito graus [p/ Vic]
Vic: anota
Gu: olha no relógio de pulso e fala Gu: ó ... já são dez e
vinte
Tom: pega as duas lamparinas, colocando-as na
2 altura dos olhos. Compara os pavios, enquanto fala Tom: essa aqui num
(22’44”)
p/ Bel. tem mais álcool?
Bel: olha p/ Gu
Vic: deixa o grupo
Gu: Fala p/ Bel (mantendo uma mão sobre o relógio Gu: já são dez e vinte
de pulso)
3
Tom: Coloca lamparinas embaixo do tripé
Bel: segura o Termômetro fora do béquer /
Gu: olha para grupo ao lado
4
Tom: curva-se para verificar lamparinas sob o tripé
(22’59’)
Bel: acompanha os movimentos de Tom
Tom: pega caixa de fósforos com grupo ao lado e
prepara – se para acender lamparinas
5
Bel: ninguém acendeu
Bel: olha outros grupos e fala p/ Tom ainda
Gu: fala p/ Tom Gu: não acende ainda

25
Para facilitar a análise desta etapa da aula, atribuímos pseudônimos aos participantes do grupo III, a
saber: Gu (A25); Tom (A14); Bel (A1) e Vic (A29). Mais detalhes sobre a escolha desse grupo de
alunos são apresentados no capítulo 4
26
Para descrever as ações simultâneas dos alunos ao longo da seqüência, optamos por uma
transcrição dividida em cenas. Em algumas dessas cenas apresentamos a marcação do tempo da
aula.
160

Tom: olha na direção da professora, segurando o


6
palito de fósforo, pronto para acender as lamparinas.
(23’49”)
Vic: retorna para o grupo
Gu: olha p/ outro grupo
7 Bel: mede a temperatura da água e anota
(24’17”) Tom: pega lamparinas para acender
Vic: observa Tom

Neste extrato observamos três diferentes posicionamentos dos estudantes


em relação ao experimento. Tom está preocupado em certificar-se das
condições iniciais padronizadas, verificando o tamanho dos pavios das
lamparinas (tema que havia sido discutido na fase anterior). Gu, que cuida
do tempo, está preocupado em começar o experimento. Bel faz a medida da
temperatura inicial da água. A autoridade da professora está presente no
discurso e ações dos alunos. Ao sinal de dúvida de Tom, Bel procura
chamar P. Os alunos também aguardam algum sinal para iniciar o teste.

Em relação à função ideacional, observamos que as ações dos estudantes


estão voltadas para o controle das condições iniciais: Tom compara
cuidadosamente as lamparinas e através do discurso oral expressa sua
preocupação em relação à quantidade de álcool. Gu mantém uma mão
sempre sobre o relógio e controla a passagem do tempo mesmo antes do
início da experimentação. Bel mede a temperatura da água.

Em relação à função interpessoal, nota-se uma postura cooperativa neste


início de atividade, em que embora exercendo diferentes funções dentro do
grupo, os alunos mantém um elo de ligação, compartilhando expectativas e
dividindo responsabilidades – Tom faz comentários sobre a lamparina com
Bel; esta acompanha seus movimentos; os alunos estão compromissados
com o restante da classe, aguardando o momento de iniciar o experimento.
Outro aspecto a ser notado em relação à função interpessoal é o papel de
autoridade da professora, mesmo em sua ausência.
161

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
Tom e Vic ajeitam lamparinas embaixo do tripé

8 Bel: observa as ações dos colegas atentamente e


procura ajudá-los, sem soltar o termômetro.
(24’38”)
Tom, Bel e Vic: mostram um sorriso de excitamento
enquanto colocam as lamparinas sob o tripé.
Bel: pega uma caneta e prepara-se para escrever, Gu: vai começar
enquanto segura o termômetro fora da água.
9 Vic: ( ) muda ... não é
Vic: fala p/ Tom melhor? Um lá e outro
aqui?
Tom: move as lamparinas cuidadosamente sob o tripé.
10 Vic: ajuda Tom
(24’51”)
Bel: observa Tom e Vic, segurando o termômetro fora
da água.
Vic: curva-se para frente para verificar a posição Gu: ah ... tá ótimo
11
das chamas embaixo do tripé
(24’58”) Gu: eu já comecei
Tom: observa os movimentos de Vic.
Vic: fala p/ Bel Vic: você quer que eu
12 anote?
Bel e Vic: trocam de posição na bancada

Neste extrato observamos um grande envolvimento dos alunos com a


montagem. Apesar da discussão realizada nas aulas anteriores e da
determinação das condições de experimentação, a ação de realizar o
experimento envolve a tomada de decisões: qual a melhor maneira de dispor
as lamparinas sob o tripé?. Vic, Tom e Bel dedicam-se a este aspecto,
enquanto Gu, que tem a tarefa de controlar o tempo de aquecimento,
preocupa-se em iniciar logo o experimento.

Em relação à função interpessoal, nota-se que há uma certa ansiedade e


bastante entusiasmo por parte dos estudantes para a realização da
atividade. Observa-se que há um grande engajamento dos alunos, que
continuam compartilhando responsabilidades, havendo espaço para a
atuação de todos dentro do grupo.
162

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
Vic: lê a folha de papel em que estão registrando os
13 dados e fala para Bel
Vic: o que você fez aqui?
(25’) Tom: aproxima-se de Vic e verifica as anotações de
Bel
Gu: vira-se para Bel e fala Gu: vê a temperatura
Bel: Segura o Termômetro fora do béquer
14
Tom: pega o Termômetro e coloca na água Vic: dez ... trinta e nove ...
dez ... vinte e um?
Vic: Lê registro de Bel
Tom: observa o termômetro dentro da água Gu: vê a temperatura
15
(25’15”) Vic: já passaram dois
minutos?
Gu: olha para Vic e fala, vira-se para o grupo ao lado, Gu: não ... quando
16
ficando de costas para seu grupo. passar eu falo
Tom: está no centro do grupo, olha para Gu e Vic, Tom: “( ) [p/ Gu] ... fica
controlando a medida de tempo e anotação dos pronto aí [p/ Vic]”
17 dados.
Bel: posiciona-se atrás de Tom e Vic, esforçando-se
para observar o termômetro à distância.
Tom: ajusta a posição do termômetro dentro da água,
de modo que não precise tocá-lo para fazer as
medidas.
18 Vic: o quê que é dez ...
Vic: verifica o que está escrito no papel e toma notas.
(25’28”)
vinte e um ? [lendo
Tom: vira-se para Bel, que está olhando distraída anotações de Bel]
para outro grupo
Tom: dez ... vinte e um
[repete questão de Vic]

Nesta seqüência os alunos demonstram uma preocupação com o rigor na


realização de suas funções. Vic e Tom pedem esclarecimentos sobre as
anotações de Bel. Outro aspecto importante é a preocupação dos alunos
com o sincronismo na realização das medidas (cena 17). Ainda nesta cena,
Tom ajusta a posição do termômetro com delicadeza, revelando uma
possível concepção sobre o papel distanciado de um observador na
obtenção de informações sobre um fenômeno.

O posicionamento dos estudantes na bancada favorece a divisão de poder.


Tom, que está no centro do grupo e mais próximo do aparato experimental,
assume a posição de líder do grupo. Esta tendência pode ser observada
163

também na cena 17, em que o aluno assume esse papel delegando funções
aos colegas.

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
Gu: olha relógio e fala Gu: faltam cinco
segundos
Tom: pronto para ler a temperatura
19
(26’40”) Bel: observa o termômetro à distância
Vic: pronta para escrever

Gu: fala Gu: vai já deu ...


20
Tom: olha termômetro Tom: trinta e oito
Bel: estica o braço para tocar o termômetro e fala Bel: trinta e oito [em voz
21 baixa]
Tom: bloqueia ação de Bel
(26’48”)
Gu: olha a escala do termômetro à distância, tentando
verificar a temperatura Tom: trinta oito
Vic: fala p/ Tom e anota valores Vic: trinta e oito?
22 Tom: movimenta a cabeça afirmativamente
Gu: parece surpreso Gu: trinta e oito?
Vic: fica em pé e verifica temperatura
23
(26’50”) Bel: toca o termômetro delicadamente, tentando ler a Bel: quarenta e um [fala
temperatura de sua posição distante e fala. em voz baixa]
Vic: observa as anotações e fala Vic: em dois minutos ...
aumentou vinte graus!
24
Tom: _____vinte graus
Bel: olha o termômetro
[fala junto com Vic]

Nesta passagem, numa função interpessoal, as ações dos alunos revelam


que estes continuam apresentando uma atitude de engajamento em relação
à realização da atividade. Todos estão empenhados na obtenção de dados:
na cena 19, os alunos estão de prontidão à espera do sinal para fazer a
medida; na cena 20, Tom efetua a medição; que é prontamente conferida
por Bel e Gu (cena 21). Observa-se que os alunos não limitam-se apenas a
suas funções específicas dentro da atividade, mas também participam e
colaboram nas funções dos colegas, constituindo efetivamente um grupo de
trabalho. A cena 22 também exemplifica esta constatação, quando Gu, que é
responsável pelo controle do tempo, demonstra estar atento também aos
164

valores medidos de temperatura. Ainda dentro desta tendência, na cena 23,


Vic, responsável pela anotação dos dados, também participa da verificação
da temperatura. Mesmo ocupando uma posição desprivilegiada em relação
ao aparato experimental, distante do mesmo, Bel também esforça-se para
participar.

Em relação à função ideacional, na cena 24, o registro dos dados na forma


de uma tabela possibilitam uma primeira constatação de Vic sobre a taxa de
variação de temperatura ao longo do tempo.

Ao longo desse episódio a linguagem verbal foi utilizada predominantemente


para a transmissão de informações.

Em relação à função textual, ao longo desta seqüência os alunos continuam


cumprindo suas funções dentro do processo de coleta de dados

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
25 Gu: fala Gu: vai ... agora
(28’57”)
Tom: observa termômetro e fala Tom: cinqüenta e oito
Bel: olha rapidamente para outro grupo
Vic: verifica anotações e fala Vic: tá de vinte em vinte
graus
Tom: se pode ver ... o
próximo vai ser ...
Gu: olha para outro grupo, enquanto aguarda
Vic: setenta e oito
passagem do tempo
Tom: o próximo vai ser?
Vic: setenta e oito

Nesta seqüência, os alunos continuam realizando as medições e um


importante aspecto da cultura científica é observado: além de identificarem
uma tendência na taxa de variação da temperatura, os estudantes começam
a fazer projeções para as próximas leituras.
165

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
26 Tom: fala para Vic Tom: vamos ver se seus
(29’09”) cálculos tão certos

27 Gu: olha o relógio


Tom: olha grupo ao lado. Fica de costas para seu
grupo. Volta para o grupo. Curva-se para observar as
Tom: o álcool não
lamparinas sob o tripé e fala
acabou
Bel e Vic: comentam algo inaudível
Gu: observa colegas ser intervir
Vic: ô professora ... ô
professora ... a quantidade
de álcool num tem que ser
a mesma aqui?
28 Estudantes: olham para a direção em que P está (fora Vic: não
do campo de visão da Câmera)
Estudantes: prestam atenção no outro grupo, embora
mantenham atenção sobre o experimento.

Os alunos continuam envolvidos com a expectativa de confirmação de suas


projeções. As ações de Tom são marcantes neste sentido. Após comentar
suas expectativas com Vic, o aluno volta-se para outros grupos, numa
aparente vontade de trocar experiências e, ao voltar-se para sua equipe,
imediatamente verifica a quantidade de álcool nas lamparinas,
demonstrando grande envolvimento com a atividade. A atitude das colegas
não é muito diferente, estas estão atentas aos movimentos de Tom, e
prontas para tomar decisões. Ao primeiro sinal de irregularidade nas
lamparinas, Vic solicita ajuda da professora.

Em relação à função textual, os estudantes continuam mantendo suas ações


padronizadas dentro da estória científica em andamento.
166

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
29 Gu: olha o relógio Vic: ô [p/ Gu] ... num é o
(30’15”) tempo ainda?
Tom e Bel: observam termômetro
Tom: setenta e cinco ...
ainda tão faltando três
graus
Gu: tá faltando cinco
segundos
30 Gu: fala p/ Tom Gu: vai ... vê aí
Tom: verifica temperatura Tom: setenta e um e meio
31 Gu, Bel e Vic: estão surpresos Vic: setenta e um?
(30’44”)
Tom: claro
Bel: toca levemente o termômetro, tentando lê-lo à Bel: setenta e um?
distância (questão sem muita
ênfase)
Gu: tá louco!
32 Tom: verifica a temperatura e surpreende-se Tom: setenta e sete
Bel: setenta e sete
33 Gu: verifica a temperatura no termômetro Gu: setenta e oito
Tom: não ... setenta e sete
e meio
Bel: setenta e sete
Tom: e meio
Vic: reclama devido à indecisão dos colegas
Vic: e meio?
Bel: não ... setenta e sete

Na cena 29, os alunos continuam cumprindo seus papéis (função textual) e


demonstrando envolvimento (função interpessoal). Mesmo que ainda não
seja momento de verificar a temperatura, Bel e Tom acompanham
atentamente a escala do termômetro. Vic também demonstra estar atenta
quando questiona Gu sobre o controle do tempo. Ainda nesta cena, Tom
continua fazendo projeções.

Após a realização da leitura por Tom (cena 30), seus colegas surpreendem-
se ao verificar que, diferentemente das previsões anunciadas pelo mesmo
167

(função ideacional), o resultado observado é inferior ao valor mencionado na


cena anterior. A reação imediata do grupo é fazer a verificação da leitura.

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
34 GU: enquanto controla o tempo, observa grupo ao
(33’05”) lado
TOM: observa o conjunto experimental e fala
TOM: tá evaporando
BEL: observa o conjunto experimental
35 Tom: fala com grupo ao lado Tom: tá evaporando
Bel: observa o conjunto experimental
Gu: olha para o conjunto experimental e fala para Vic Gu: tá indo
gradualmente?
Vic: observa suas anotações e indica tabela
Vic: daqui pra cá ... tá
indo de vinte em vinte
36 Gu: olha conjunto experimental Gu: sempre de vinte em
vinte?
Vic: verifica dados
Vic: não ... nos três
Tom: olha conjunto experimental
primeiros
Bel: olha conjunto experimental
Bel: vamos ver se ele vai
até cem graus
37 Gu: olha conjunto experimental Gu: já vai chegar em cem
(35’)
Tom: olha conjunto experimental
Bel: olha conjunto experimental
38 Gu: olha relógio Gu: agora
Tom: verifica temperatura Tom: noventa e sete ...
ainda
Bel: olha conjunto experimental
Bel: noventa e sete
Vic: toma notas
Vic: noventa e sete

Nesta passagem os alunos começam a trazer seus conhecimentos


anteriores para interpretar o fenômeno. Ao constatar que a água está
começando a evaporar, Tom procura dividir suas idéias com colegas de
outro grupo. Bel faz uma hipótese sobre a temperatura de ebulição e o clima
de envolvimento é ainda maior, todos ficam atentos ao conjunto
experimental.
168

É importante notar que, neste momento de resgate de conhecimentos, a


linguagem verbal começa a exercer um papel mais relevante, associando
hipóteses dos alunos a evidências empíricas obtidas por meio das ações dos
alunos. Em relação à função ideacional, portanto, estes dois modos
apresentam-se de forma complementar neste momento da discussão.

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
39 Tom: olha conjunto experimental Tom: noventa e sete e
(36’04”) meio ... eu acho que a
água pode ir só até cem
Bel: ( )
Vic: fala com colegas, fazendo gestos com as mãos,
Vic: ( )
indicando que a temperatura da água está constante
40 Estudantes: prestam atenção ao conjunto Tom: até ela vai evaporar
experimental ... vai chegar até cem

41 Gu: olha relógio Gu: vê ... vê agora


Tom: a mesma
Todos Estudantes: lêem a temperatura Gu: noventa e sete?
Bel: noventa e sete e meio
Tom: será que o limite da
água não é noventa e sete
e meio?
Gu e Tom: professora
42 P: aproxima-se do grupo
Estudantes: olham para professora e Tom fala Tom: o limite da água é
noventa e sete e meio ...
P: sorri e move a cabeça afirmativamente
professora?
43 P: verifica dados dos estudantes Estudantes: ( )
44 P: oh ... espera mais um
(37’20”) pouquinho
Tom: não passa de cem
Alunos prestam atenção em P
P: é uma das nossas
hipóteses
Gu: continua controlando tempo
Tom: olha [p/ Gu]
45 P: deixa o grupo

Nesta seqüência, os alunos estão bastante empenhados em verificar a


confirmação de sua hipótese. A demora em obter alguma variação na
temperatura, leva Tom a uma nova possibilidade: será que o limite da água
169

não é noventa e sete e meio?. A aproximação da professora permite uma


tentativa de confirmação dessa nova idéia. Embora esboce um sorriso de
confirmação, a professora procura manter uma atitude científica,
incentivando os estudantes a coletarem mais dados para que possam
confirmar ou não a hipótese.

É importante ressaltar que, mais uma vez, o aparato experimental tem um


papel de destaque em relação à função ideacional. As evidências empíricas
levam os alunos a questionarem uma hipótese provavelmente construída ao
longo da escolarização.

Nas cenas seguintes (46 a 52) esta tendência de grande participação dos
alunos se repete até que, na cena 53 Bel observa um dado novo:

∆t)
C (∆ Ação Verbal Oral
53 Bel: observa termômetro e surpreende-se Bel: espera ... tá
(44’10”) diminuindo ... olha
Vic: olha para BEL
Vic: mesmo?
Bel: foi para noventa e
sete
54 Tom: lê temperatura e faz uma expressão afirmativa Vic: que isso?
Gu: olha o relógio Bel: que isso ... ô
professora
55 Gu: vai ... agora
Bel: lê temperatura Bel: noventa e sete
Vic: anota a temperatura Vic: noventa e sete
56 P: aproxima-se do grupo P: está diminuindo?
(46’33”)
Estudantes: observam a professora
P: aponta béquer com água P: olha o que está
acontecendo ... está
metade fora da água
170

57 Gu: olha o relógio Gu: vai ... vê a


temperatura
Vic: olha para BEL
Vic: noventa e sete?
Bel: lê a temperatura
Bel: é
P: observa o experimento
P: vai ter que parar porque
não tem mais água
Tom: a água tá diminuindo
... a gente tá anotando
aqui
58 P: é ... e o termômetro
(46’55”) está fora da água ... vocês
já fizeram bastante ...
Tom, Bel e Vic: apagam as lamparinas e observam o pode parar
termômetro fora da água

A percepção de um novo fato: a queda gradativa da temperatura da água,


desperta o interesse da equipe, que busca coletivamente identificar a causa
de tal fenômeno. A professora se aproxima e direciona os olhares dos
estudantes para o béquer com água, promovendo a compreensão da causa
do problema: o termômetro está fora Finalmente solicita o término da
atividade.
171

Tabela 9 – Resumo do Período de Construção de Hipóteses (Eps 6.4.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Gestos / Ações Verbal Oral

Ideacional Indica objetos de interesse (C1 a C4) /


Controle de condições iniciais / Controle de condições (álcool) /
Tomada de decisões (montagem) / Tomada de decisões (montagem) /
Esclarecimentos sobre anotações (rigor) /
Preocupação com sincronismo / Preocupação com sincronismo /
Ajustes para evitar interferências nas
medidas (visão de Ciência)
Medidas (dados) / Comunicação de medidas /
Identificação de irregularidade na leitura /
Repetição de medida (rigor) /

Taxa de variação da temperatura /


Evidências empíricas / Projeções /
Hipótese sobre temperatura de ebulição /
Modificação de hipótese /

Dado novo Explicação para dado inusitado

Interpessoal Funções dentro do grupo / P é autoridade para solução de dúvidas e


cooperação / envolvimento / entusiasmo início do experimento
/ compromisso com outros grupos /
engajamento / compartilhamento de Divisão de responsabilidades / trabalho
responsabilidades / relações de poder cooperativo / envolvimento
(posição na bancada) / prontidão /
controle (alunos conferem medidas) /
cooperação

Textual Ações padronizadas repetem-se na


construção do texto: controle de tempo,
medições e registro.

Ao longo deste evento as ações dos alunos sobre a aparato experimental e


a linguagem verbal exerceram funções importantes, relacionando-se de
forma diferenciada. Em alguns momentos estes modos representaram
informações redundantes (correndo em paralelo), enquanto em outros
foram complementares (estendendo significados).

Vários aspectos da cultura científica foram identificados e realizados tanto


por meio das ações sobre objetos concretos e contato direto com o
fenômeno sob investigação, quanto por meio da linguagem verbal oral. O
processo de coleta de dados possibilitou aos alunos realizarem relações
172

com seus conhecimentos anteriores (expectativas em relação à temperatura


de ebulição da água); identificar regularidades e trabalhar com projeções;
relacionar hipóteses e evidências empíricas; buscar explicação para fato
inusitado (decréscimo da temperatura da água durante aquecimento). As
ações proporcionaram temas, que foram comentados e desenvolvidos pelos
alunos por meio da linguagem verbal. Desta forma, a realização da
experimentação revelou-se um momento rico para a construção de
significados por parte dos alunos.

As atitudes de cooperação e divisão de responsabilidades revelaram grande


envolvimento do grupo com o tema da aula. O engajamento dos estudantes
foi observado do início ao fim da atividade, demonstrando que a atenção dos
mesmos não estava relacionada apenas a uma curiosidade sobre os
materiais empregados, mas a um interesse em obter informações para
contrastar suas expectativas com a realidade. O que caracteriza o conjunto
de ações dos mesmos como a realização efetiva da atividade.

As repetidas ações dos alunos, controlando o tempo, observando o


fenômeno, fazendo medições e registrando dados obtidos, colaboraram para
a construção de um texto dentro da estória científica em desenvolvimento –
a obtenção de uma primeira inscrição do fenômeno sob investigação.
173

6.3. LA Fase 2B – Interpretação da Primeira Inscrição

Aos quarenta e sete minutos da aula, a professora solicita aos alunos que
encerrem a realização de medidas, apaguem as lamparinas e copiem os
dados coletados em uma grande tabela desenhada na lousa (evento 3/6).

Durante o intervalo entre aulas (5’), muitos dos alunos permanecem na sala
fazendo anotações ou guardando os materiais empregados na atividade. No
início da segunda aula P faz a chamada, enquanto alunos retomam seus
lugares habituais na sala e escrevem dados na lousa (evento 4/6). Em
seguida , a professora faz uma revisão do trabalho que está sendo realizado,
falando sobre as próximas etapas do mesmo (evento 5/6), dando início ao
evento 6/6, apresentado a seguir:

6.3.1. Descrição e Análise Geral do Desenvolvimento da Fase 2B

Fase 2B – Interpretando a
Primeira Inscrição
174

A estória científica que está sendo desenvolvida ao longo da atividade de


laboratório aberto envolve a construção de uma descrição matemática para
o processo de aquecimento da água. Na primeira parte da aula 6, os alunos
fizeram a coleta de dados que deu origem à primeira inscrição do fenômeno,
uma tabela relacionando valores de tempo e temperatura. A partir dos
resultados obtidos por cada grupo de trabalho, que estão dispostos na
lousa27, a professora inicia com os alunos um processo de interpretação dos
mesmos.

Episódio 6.6. – Procurando semelhanças e diferenças (T1 a T13)

Desde o início da atividade de laboratório aberto, a professora vinha


incentivando a participação dos alunos para a construção de uma explicação
coletiva para o fenômeno de aquecimento da água. Ao longo dessa
trajetória, além de procurar trabalhar com as idéias dos estudantes, P, como
representante da cultura científica, também introduzia informações e
procurava estabelecer um novo olhar sobre o fenômeno em discussão. Na
presente etapa, a construção de um olhar científico para os dados tem início
com a proposta de procurar semelhanças e diferenças entre os números
obtidos pelos grupos de trabalho:

(1) P: ((67’17”)) primeira coisa ... vamos olhar os valores ... ver o quê que a
gente pode achar de SEMELHANÇAS e de diferenças ((muita conversa na
sala)) shhh ... quê que tem de IGUAL ... primeiro ... quê que tem () ...
(2) A: temperatura ...
(3) A2: praticamente só ()
(4) P: a temperatu/ -- vamos parar a conversa ... agora é sério ((pausa – 8”))
– primeira coisa ... tem igual a temperatura? ((68’)) Inicial ... todo mundo
começou mais ou menos com a mesma temperatura ... por que? ((pausa
4”))
(5) A: ( ) a água ...
(6) Alunos: ((inaudível))

27
Ver anexo 5
175

(7) P: usamos a água da torneira ... ((comentários de alunos – 7” )) ...


então... primeiro... todo mundo começou com a temperatura mais ou menos
igual ... SEGUNDA coisa que dá pra gente tirar aí ... quê que dá pra
perceber mais?
(8) A14: que todos... mais ou menos... pararam ao mesmo tempo... a água...
(9) P: TODOS pararam ao mesmo tempo ... o que você quer dizer com
isso?
(10) A14: porque a água foi quase noventa e sete... mais ou menos...
(11) P: ah:: ((aluno fala algo)) a temperatura ... a temperatura de TODOS ...
(12) A2: quase todos... ((48’))
(13) P: QUASE todos ... mas ... ah:: noventa e sete ... noventa e sete e meio
... noventa e sete ... noventa e oito ... noventa e seis e m/ ... noventa e s/... –
continuação da quinta - ... noventa e seis e meio... noventa e seis e nove...
noventa e sete... então -- da comparação com os resultados em todos
os grupos ... ((pausa de 30’)) ... em todos ... a temperatura estabilizou
próximo:: de noventa e sete graus... ((49’)) [P escreve na lousa: “Da
comparação com os resultados de todos os grupos, temos: a) Todos
começaram com a mesma temperatura (do ambiente); b) Em todos a
o
temperatura estabilizou próximo de 97 C”]

A abordagem comunicativa nesta seqüência é interativa, com uma tendência


de autoridade. Até o turno 11, as respostas dos estudantes à questão
apresentada por P indicam que ambos observam semelhanças nos dados
escritos na lousa de um mesmo ponto de vista. No caso das temperaturas
iniciais de cada grupo, não há muito o que discutir, pois os valores medidos
foram idênticos, tornando o reconhecimento desta semelhança bastante
óbvio. No turno 8, A14 apresenta uma nova idéia de forma confusa – todos
(...) pararam ao mesmo tempo – e P procura entender seu ponto de vista
(turno 9). Neste momento também parece haver um consenso, já que as
pequenas diferenças entre os números apresentados na tabela são
desprezadas tanto por A14, quanto pela professora, que representa a cultura
científica. É importante notar também que mesmo dentro da tendência
discursiva de autoridade, P dá espaço para esclarecimentos das idéias dos
alunos, incentivando a interação, complementando e transformando as
mesmas na direção do discurso científico (turno 11).

A postura adotada por P de valorização da participação dos alunos, porém


com direcionamento, se mantém quando idéias divergentes começam a
176

aparecer. No turno 13, a professora aceita a contribuição de A2 e verifica os


dados da tabela – QUASE todos ... mas ... ah:: noventa e sete ... noventa e
sete e meio ... noventa e sete ... noventa e oito ... noventa e seis e m/ ... (...)
–, valorizando sua participação. Do ponto de vista de A2, as diferenças
encontradas nos valores de temperatura obtidos são importantes, enquanto
para a professora, que representa o discurso científico, estas podem ser
desprezadas. Seguindo uma tendência de autoridade, P unifica o discurso
na seqüência – então -- da comparação com os resultados em todos os
grupos ... ((pausa de 30’)) ... em todos ... a temperatura estabilizou próximo::
de noventa e sete graus.

Tabela 10 – Procurando Semelhanças e Diferenças (Eps 6.6.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Verbal Escrito Modos Híbridos

Ideacional Semelhanças e diferenças: Complementa Tabela informa discussão


temperaturas inicial e final observações
construídas
Pequenas variações podem ser através do
desprezadas discurso oral:
informa unidade
o
de medida: C
(T13)

Interpessoal Interativo (questionamento / Observações são Tabela representa


paráfrase) / de autoridade atribuídas a trabalho coletivo /
construção contribuição de diferentes
coletiva alunos

Textual Repetição de idéias Relaciona idéias Tabela mantém o foco


construídas
coletivamente

Dois modos de construção de significados são empregados no início da


discussão e ambos são complementares em relação à função ideacional. A
linguagem verbal oral é o meio para o desenvolvimento da discussão, porém
as informações sobre os dados estão contidas na tabela. A cultura científica
está presente na transformação de um conjunto de dados numéricos em
observações qualitativas de semelhanças e diferenças. É importante notar
177

que esta primeira interpretação dos dados, que privilegia aspectos


tipológicos dos mesmos, diferenças e semelhanças, vai ao encontro da
especialização do modo de comunicação empregado na primeira inscrição
do fenômeno, a tabela. Lemke (1998), destaca que as tabelas, modos
híbridos, têm sua origem mais direta em textos verbais escritos, ou seja na
linguagem verbal, que por sua vez é mais adequada para expressar
diferenças e relações do que interações e variações contínuas. A vantagem
do uso da tabela como inscrição, neste momento da interpretação do
fenômeno, está em seu potencial para o fornecimento de informações
tipológicas através de uma organização visual, que possibilita uma
comparação simultânea entre dados de diferentes experimentos.

No turno 13, o modo verbal escrito é empregado pela primeira vez. Embora
não tenha participado da construção de uma resposta para a questão em
discussão (turno 1), este modo ajuda a trazer para o plano social da sala de
aula mais um aspecto da cultura científica, o emprego de conceitos e
unidades de medida nas explicações. A contribuição de A14 apresentada no
turno 10 – “porque a água foi quase noventa e sete... mais ou menos” - é
transformada para “em todos a temperatura estabilizou próximo de noventa
e sete graus Celsius”, quando apresentada no modo escrito. Portanto, o
emprego da linguagem escrita, além de organizar as informações
construídas até o momento, numa função textual, possibilita à professora
realçar as informações mais importantes e introduzir termos mais
apropriados ao discurso científico.

A função interpessoal nesta seqüência foi exercida por todos os modos


empregados, porém referindo-se a momentos diferentes do processo de
construção de significados. Enquanto o modo híbrido (tabela) representou a
construção coletiva realizada pelos alunos na etapa anterior, o discurso oral,
numa abordagem interativa, estimulou a continuidade desse trabalho na
178

presente discussão. Já as conclusões escritas no quadro, no final da


mesma, representaram a concretização daquela proposta.

Episódio 6.7. – Comparando Observações com Hipóteses (T14 a T51)

Após um primeiro olhar sobre os dados, a professora começa a recordar as


hipóteses levantadas pela turma ao longo da fase 1 da atividade. Neste
momento encontram-se anotados na lousa a tabela e as primeiras
observações obtidas na seqüência anterior.

(14a) P: COMO a gente viu que estabilizou próximo do noventa e sete


[indica observações escritas no quadro] ... naquel/... naquela hipótese que
tinha... a temperatura ia continuar subindo...ou ela iria ESTABILIZAR ... já
temos uma comparação... p/ que ó... mesmo mudando o recipiente...
mesmo tampando... sem TAMPAR... não houve... alteração... só vai faltar
uma comparação... que o Bruno vai fazer... na praia... e depois ele traz...
pra gente ver se dá também se dá noventa e sete graus... né...

No turno 14 a professora inicia a construção de um novo texto, que relaciona


dados coletados e hipóteses iniciais. Além de uma função textual, de
estabelecer um organizar as idéias para o início de um novo texto, a breve
revisão das hipóteses realizada por P apresenta também uma função
interpessoal. Embora a abordagem comunicativa neste pequeno extrato seja
não – interativa, a presença das vozes dos estudantes nas idéias revisadas
caracteriza uma tendência dialógica.

Ainda neste turno, é importante notar que a função ideacional é exercida


pelos modos verbal oral e escrito. O gesto dêitico da professora, indicando o
texto escrito na lousa, vem consolidar a relação de complementaridade dos
mesmos. Embora esteja presente e seu conteúdo, relacionando dados de
diferentes arranjos experimentais, seja mencionado, a tabela encontra-se em
segundo plano. Neste momento, mais importantes que os dados brutos da
tabela, são as conclusões retiradas dos mesmos e, por isso, estas estão em
evidência. A cultura científica aparece aqui através da relação entre
hipóteses, estabelecimento de condições para teste experimental e análise
179

de resultados. Além disso, a realização de aproximações nos dados também


está presente, embora implícita.

Na seqüência a professora retoma a análise dos dados da tabela, agora


pautada pelas revisão de hipóteses:

(14b) P: QUE mais... agora que falou... que com mais lamparina aquece
mais rápido... que com mais água aquece mais devagar... será que dá pra
gente perceber isso nos resultados? ((50’))
(15) A14: dá...
(16) ((comentários de alunos))
(17) P: dá?
(18) A14: pode... por exemplo...()
(19) P: os dois primeiros... ó [indica dados na tabela]... fizeram::: com as
mesmas condições... né... era a lamparina... era o béquer... era aberto... os
resultados são:: próximos [aproxima-se da tabela para ler] ((diminui a
entonação, como se mudasse de idéia sobre sua afirmação)) ...
(20) A4: não...
(21) A14: não ...
(22) P: não? ((Quase uma afirmação))
(23) A4: sim...
(24) A14: alguns não...()
(25) A4: ___________no começo não ... no começo... (ficou diferente) ()...
dezoito... trinta e dois... cinqüenta e três...
(26a) P: dezoito ... trinta e dois ... cinqüenta e três ... dezenove ... trinta e
cinco ... cinqüenta e quatro ((A4: é)) ... setenta... setenta e cinco... ((A:
setenta e quatro)) oitenta e cinco ... oitenta e nove ... as diferenças são
de::... mais ou menos... o que ... quatro graus... ((4’ pause)) ((51’))

A pergunta de P no turno 14b é tendenciosa – “será que dá (...)?” – gerando


uma resposta imediata de A14 – “dá”. A questão da professora no turno 17,
leva o aluno a iniciar uma justificativa para sua afirmação. No turno 19,
porém, P desconsidera a contribuição iniciada por A14 e reinicia a
discussão, direcionando ainda mais o olhar dos alunos – “os dois primeiros...
ó... fizeram::: com as mesmas condições... (...) os resultados são::
próximos...”.
180

É importante notar que a professora inicia este turno num tom afirmativo,
mas ao final, olhando para os dados da tabela, parece constatar que sua
afirmação não corresponde aos resultados obtidos. A finalização deste turno
transforma-o, então, de uma afirmação para uma quase interrogação, que é
prontamente refutada pelos alunos (turnos 20 e 21). Mais uma vez, o retorno
elicitativo da professora cria um espaço para justificativas. Observa-se nesta
etapa a presença de duas idéias distintas, a expectativa teórica de P de que
nas mesmas condições experimentais os dados sejam semelhantes e a
observação sobre os dados empíricos, que negam a mesma. A interação é
dialógica, visto que há espaço para as intervenções dos alunos e seus
pontos de vista são considerados.

O modo verbal matemático volta a realizar a função ideacional, ao lado do


verbal oral. Os dois modos se complementam e o importante papel da tabela
pode ser observado no turno 19, quando provoca uma transformação no
discurso da professora. Da mesma forma, a presença dos dados empíricos
na tabela possibilita aos alunos uma participação ativa na construção de
significados, numa função interpessoal.

Nos turnos seguintes (26b a 54) discurso é mais diretivo, mantendo-se


praticamente o tempo todo no padrão IRA. A professora retoma as
condições experimentais de cada grupo de dados coletados e numa
exposição dialogada, em que aos alunos cabe apenas completar questões
com poucas palavras, vai relacionando as principais diferenças e
semelhanças que podem ser observadas. Um exemplo deste movimento é
apresentado a seguir.

(26b) P: DÁ uma outra... do primeiro pr/o segundo [indica a tabela] ... qual
era a diferença?
(27) A: tinha mais água...
(28) P: tinha MAIS água... aumentou mais devagar Quando tinha mais
água?
(29) A4: aumentou...
181

(30) A: aumentou ... pouca coisa...


(31a) P: olha... aqui... a temperatura estabilizou::: entre doze e catorze
minutos... a deles::... perto dos vinte minutos... então... DEU diferença... deu
diferença... demorou mais::: pra atingir a fervura...

Do turno 39 ao 54, a professora começa a pedir alunos dos grupos de


trabalho identifiquem-se, como no extrato a seguir:

(39) P: quem mais fez com tampa aqui? ((pausa – 6”)) qual era o de vocês?
(40) A19: o nosso?
(41) P: é
(42) A19: aquele ali que tem um monte de noventa e setezinho ..
(43) P: ah ah ... só o seu?
(44) A19: não ... ali ó ... tem dezoito ... quarenta e um ... cinqüenta e quatro
... sessenta e dois ...

Aparentemente, nesta seqüência as intervenções de P estão voltadas


especialmente para a realização das funções textual e interpessoal, de
manter a narrativa e envolver os alunos na discussão, respectivamente. É
importante observar, porém, que apesar de não contribuírem diretamente
para a construção de significados sobre a relação entre dados e hipóteses,
aquelas intervenções possibilitam que outro aspecto da cultura científica seja
destacado: o papel do trabalho colaborativo na construção de significados.
Os grupos realizaram o experimento em condições diferenciadas, em função
das hipóteses iniciais, e, quando P identifica os grupos responsáveis por
cada conjunto de dados, a necessidade de compromisso com este trabalho
para que conclusões possam ser retiradas por toda a turma fica em
evidência.

A discussão continua sendo a respeito dos dados relacionados na tabela,


fazendo com que esta apresente uma função ideacional ao lado da
linguagem verbal oral na construção de significados. Embora as primeiras
conclusões ainda estejam escritas na lousa, não há nenhuma menção ao
182

conteúdo das mesmas ao longo deste fragmento e, portanto, não


consideramos que este modo esteja envolvido nesta.

Tabela 11 – Comparando Observações com Hipóteses (Eps 6.7.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Verbal Escrito Ações / Gestos Modos Híbridos

Ideacional Relação entre Informa Tabela informa discussão


hipóteses e primeiras (14b a T54)
primeiras conclusões
conclusões (14a)

Relação entre
hipóteses e dados

Interpessoal NI / D (14 a):


apresenta
hipóteses
construídas pelo
grupo

I / D (14b a 26 a) P confere dados


em resposta a
I / A (26b a 54) idéia de alunos

Textual Revisão Relaciona modos


proporciona início oral e escrito
de novo texto Tabela mantém foco
Mantém foco
Mantém narrativa

Ao longo desta seqüência observamos o emprego de diferentes modos


mesmos em relação às funções de comunicação. Os modos verbal oral e
híbrido verbal/visual (tabela), como já citado, estiveram em primeiro plano
durante a maior parte do tempo. Estes estiveram presentes no desenrolar da
discussão proposta, compreendendo aspectos da cultura científica
relacionados à comparação dos dados de diferentes condições de
experimentação, numa função ideacional. O que envolveu a análise de
variáveis e, implicitamente, a idéia de planejamento e realização de teste
experimental para verificação de hipóteses. Estas últimas, aliás, foram
explicitamente revisadas pela professora, trazendo a existência de diferentes
pontos de vista sobre o fenômeno sob investigação para a discussão,
183

através de uma abordagem dialógica, ainda que não interativa (função


interpessoal).

O emprego do modo linguagem escrita foi realizado tanto para o registro das
primeiras conclusões, quanto para a comparação das mesmas com as
hipóteses iniciais, reforçando mais uma vez o papel da experimentação
como teste das mesmas.

Episódio 6.8. – O que pode ter afetado a coleta de dados? (T55 a 98)

No turno 55, a professora muda o foco da discussão e passa a discutir


aspectos que podem ter afetado a realização de medidas:

(55) P: por que será:: por que será... – vamos parar um pouquinho na...
estabilidade - ... por que será que ... pra certas pessoas... deu uns números
bonitinhos ... redondinhos ... sempre iguais.... e pra outras ... deu flutuações
... porque aqui [indica tabela] tem ... ninguém pode dizer que é uma
GRANDE diferença... né... tá dentro de um grau -- noventa e seis ... noventa
e sete ... nove/ -- não saiu de um espacinho de um grau... ((54’))

A questão apresentada acima inicia uma seqüência em que a professora


procura guiar os alunos na construção de uma explicação para a pequena
oscilação observada nos valores de temperatura medidos durante a ebulição
da água. Para tanto, P recorre a dois temas. O primeiro refere-se a uma
explicação baseada no fenômeno de convecção (turnos 55 a 86). Enquanto
o segundo, refere-se a decisões durante a realização das medidas (turnos
87 a 96).

Diferenças nas medidas de temperatura e o fenômeno da convecção

Entre os episódios 55 e 86, P adota uma abordagem comunicativa interativa,


que apresenta uma tendência inicial de autoridade (turnos 55 a 75) e passa
para um discurso dialógico (turnos 76 a 86). Esta mudança de tendência no
184

discurso está associada a uma mudança no foco da discussão, como


apresentado nos extratos a seguir.

T Verbal Oral Ações / Gestos


63b P: COMO é que a água aquece?
64 A4: como é o quê?
65 A14: ______gradualmente...
66 P: como que ela aquece? Gradualmente... como? Gesticula

67 A2: as moléculas se ... _____ começam a se movimentar... entre A2 gesticula


aspas... começam ir uma (contra) a outra ... e começam... formando
círculos no ar
68 A14: ____________ as moléculas se agitam...
69 P: como é que forma (essa etapa)... ((76’))

Enquanto a professora está recordando o conceito de convecção, já


estudado em aulas anteriores, o discurso é de autoridade. Apenas uma voz
está presente na discussão, já que os alunos conhecem os modelos da
Ciência para a explicação de trocas de calor.

A partir do momento em que a professora propõe uma nova idéia –


interpretar as oscilações de temperatura observadas na coleta de dados
empregando o modelo da convecção – um espaço para diferentes vozes é
criado e o discurso adquire uma tendência dialógica.

T Verbal Oral Ações / Gestos Visual


71 P: será que é essa diferencinha – a gente Gesto 1 Gesto 2
manteve o Termômetro no lugar... pelo
menos deveria ter mantido... né – será que
essa diferencinha... pode ser causada pela
água da convecção (vai e volta)?

72 A2: eu acho que pode... ()


73 A4: pode::...
185

74 P: porque se é corrente de convecção... ela


não está:... inteira -- a água – ao mesmo
tempo na mesma temperatura...
75 A4: é::
76 P: será ... que ... no lugar onde ficou o Mantém
Termômetro a gente tem variações uma mão e
porque::... sai água mais quente ... entra move a
água mais fria e etc.? outra em
círculos
77 A24: não::... porque ela tipo assim... ela está
quente...
78 A4: ___não porque a água já tá quente...
79 A24: () ela sobe... () desce... vai descendo... A24 move as mãos de
cima para baixo
80 P: então você tem o movimento de água mais P desenha na lousa
quente SUBINDO e de água mais
fria::...________ ... descendo

81 A24:__descendo... aí equilibra...
82 P: ... mas o TEU termômetro está no MEIO P aponta o Termômetro
dessa água que está em movimento desenhado na lousa
83 A14: mas (porque) o nível da água também
abaixa ...
84 P: tem outro problema... o NÍVEL da água vai
baixando::... porque ela vai... evaporando::...
teve um dos grupos:... – quem foi que o
Termômetro começou ficar fora da água?
85 A24: o nosso...
86 P: foi o de vocês ... quando a gente Gesticula Termômetro
PERCEBEU... começou a abaixar a
temperatura ... por quê? Porque... a
PARTEZINHA do termômetro... que tem o
MERCÚRIO ... a água começou a ficar por
aqui ... então já tinha mercúrio que estava
FORA da água... então aí já está medindo
de um jeito DIFERENTE... né... você não
está com ele mergulhado na água... então
isso pode ALTERAR ... ((78’))

Na primeira parte deste fragmento a abordagem é interativa unívoca, a


professora faz uma pergunta com resposta definida no turno 71. Os alunos
A2 e A4 limitam-se a concordar com o argumento que está sendo construído
pela professora. No turno 77, porém, A24 apresenta um argumento contrário
à afirmação de P e é seguido por A4, que em turnos anteriores havia
186

concordado com a mesma. Ao longo dos turnos seguintes, A24 justifica seu
ponto de vista com base numa idéia de equilíbrio da temperatura da água. A
postura da professora é elicitativa, ela deixa que o aluno desenvolva seu
argumento para poder apresentar novamente sua posição no turno 82.

Neste período, portanto, a abordagem comunicativa é interativa / dialógica,


já que dois pontos de vista distintos são identificados na discussão e há
espaço para a defesa de ambos. Dentro desta tendência elicitativa, há lugar
para a voz dos alunos e, no turno 83, A14 traz um novo dado para a
discussão, que é valorizado pela professora. No turno 86, mesmo sem a
conclusão de seu argumento, P aceita e complementa a contribuição de
A14.

A intervenção de A14, trazendo um novo dado para a discussão, interrompe


a narrativa iniciada por P sobre convecção, antes da solução do dissenso
criado entre os turnos 78 e 82. Este desvio do tema da discussão abre
espaço para o tratamento de outro aspecto relacionado aos valores de
temperatura obtidos na experimentação: o arredondamento nas medidas.

Este novo tema é apresentado através de uma abordagem comunicativa de


autoridade, em que a professora leva os alunos a recordarem o momento de
realização de medidas.

T Verbal Oral Ações / Visual Verbal Escrito


Gestos
94 A14: ele pode ter arredondado()
95 A2: sim...
187

96 P: o ar-re-don-dar pode dar exatamente Desenho


essa diferença ... três ou quatro
décimos pra cima ou pra baixo ... você
pode até arredondar... ((comentários))
... tem uma dificuldade na LEI-TU-RA
... isso a gente vai perceber que tem
uma dificuldade ... quer dizer quem
estava lendo sabe que é difícil você ...
exatamente ... saber onde que ele está Apaga o
aqui ... né ... se isso é noventa e seis desenho
vírgula oito ... noventa e seis vírgula
cinco ... então existe uma dificuldade
na leitura ... ((79’))
97 A: tem que copiar isso daí – em
amarelo – que a senhora tá
escrevendo?
98 P: é bom anotar porque são conclusões P escreve na
que nós estamos tirando do que a lousa:
gente viu ((pausa)) ((80’))
“c) o termômetro
pode ter ficado em
uma posição em
que parece mais a
convecção;
d) houve
arredondament
o nas medidas.”

No turno 98 a professora faz uma síntese das idéias levantadas ao longo de


toda seqüência. O emprego da linguagem escrita, aliado à afirmação “... são
conclusões que nós estamos tirando do que a gente viu” marcam o final de
uma etapa de discussão. Neste momento a discussão sobre a possível
influência do fenômeno de convecção sobre os dados, que havia ficado em
aberto entre os turnos 78 e 82, é encerrada prevalecendo o ponto de vista
da professora.
188

Tabela 12 – O que pode ter afetado a coleta de dados? (Eps 6.8.)

Modos de Construção de Significados Envolvidos


Funções de
Significado Verbal Oral Ações / Gestos Visual Híbrido Verbal
Escrito

Ideacional Durante ebulição da Tabela


água há pequenas informa
flutuações nos valores discussão:
medidos de temperatura (55 a 60
(55 a 60 a) GM – corrente de a)
convecção (63)
Aquecimento da água e Desenho
correntes de convecção GM – movimento representa
(60b a 70) das moléculas (64 / influência
68) de
Correntes de convecção correntes
explicam as flutuações GM – Ilustra de
nas medidas de relação entre convecção
temperatura? variações de nas
temperatura e medidas de
Sim (idéia de P) convecção (71 / temperatura
Não (idéia de As) 76)

Observação proveniente GM – representa


da experimentação: informação de A24 Desenho
nível da diminuição do (79) ilustra
nível de água causou explicação
variação na medida de T Ação sobre sobre
termômetro ilustra arredondam Informa
Arredondamento nas fala de P (86) ento conclusões
medidas

Interpessoal I/A: revisão de conceito P mostra intenção


(55 a 70) de ajudar aluna,
mas dá espaço p/
I/D: idéias divergentes que a mesma
(71 a 86) construa sua idéia Prevalece
(67) ponto de
I/A: P estabelece vista da
conclusões (87 a 98) professora

Textual Repetição de idéias Gestos repetitivos


mantém foco sobre
convecção

Ao longo dessa seqüência, observamos uma mudança no emprego de


modos de comunicação. Esta mudança acompanha o enfoque dado pela
professora à análise dos dados. Na seqüência anterior (episódio 6.7.), a
tabela (modo híbrido) exercia uma função ideacional ao lado da linguagem
verbal oral. Estes dois modos complementavam-se na interpretação dos
dados empíricos. Professora e alunos estavam concentrados na busca de
189

semelhanças e diferenças nos dados, precisando fazer uso dos dois modos
para a construção de significados.

Logo após o início do episódio 6.8., a professora muda o foco da discussão


para a busca de explicações para as diferenças encontradas nos valores de
temperatura e esta mudança tira a tabela do primeiro plano. A discussão
agora é baseada em conhecimentos adquiridos em aulas anteriores e os
dados empíricos já não são tão importantes. Neste momento novos modos
de significação passam a ser empregados tanto pela professora, quanto
pelos alunos.

Em alguns momentos estes novos modos estão em primeiro plano, ao lado


da linguagem oral, enquanto em outros não. No turno 63, por exemplo,
embora o gesto da professora não seja essencial para a compreensão de
sua pergunta, este exerce um forte papel na interpretação que os alunos
podem ter da mesma. P pergunta como ocorre o aquecimento da água e,
num gesto visivelmente involuntário, dá indicações da resposta desejada.
Diferentemente, no turno 64, o gesto de A2 é essencial para a compreensão
de sua explicação. Embora a aluna descreva o movimento sofrido pelas
moléculas de água – “as moléculas (...) começam a se movimentar... entre
aspas... começam ir uma (contra) a outra” – e exista uma coerência interna
em sua afirmação, para que a idéia seja compreendida corretamente é
necessário considerar seus gestos. O movimento que A2 descreve através
da linguagem oral é diferente daquele que ela mostra através de gestos com
as mãos. Sua fala no turno 68, porém, confirma uma intenção de descrever
um movimento circular ainda que em sua primeira afirmação isto não tenha
ficado claro. O emprego de gestos metafóricos por alunos durante o
processo de construção de uma explicação já foi observado em outras
pesquisas (Crowder, 1996; Roth, 1999).
190

O emprego de gestos metafóricos com função ideacional é bastante


freqüente ao longo de todo episódio, porém com pesos diferentes em
relação à idéia representada. No turno 71, por exemplo, quando a entidade
física convecção é citada explicitamente na fala da professora, seus gestos
são redundantes em relação à linguagem verbal oral. Este conceito, que já
era do conhecimento dos estudantes, já carrega consigo informações sobre
o tipo de movimento realizado durante o aquecimento e, neste momento, os
gestos têm apenas um papel ilustrativo e não essencial. Nos turnos
seguintes, até o 86, professora emprega modos gestuais e visuais para
reforçar suas afirmações, numa tentativa de tornar seus argumentos mais
palpáveis. Estes modos porém, correm sempre em paralelo à linguagem
verbal oral.

Ainda no turno 86, é importante observar que P resgata um fenômeno


observado somente em um dos grupos durante a experimentação e, para
torná-lo mais visível para o restante da turma, a professora emprega um
modo visual, utilizando um termômetro para completar o significado de sua
afirmação. Neste momento, o modo visual vem para o primeiro plano
novamente ao lado da linguagem oral.

A finalização do episódio com o emprego da linguagem escrita, da mesma


forma que no episódio anterior, tem a função de marcar algumas
conclusões, encerrando alguns dos tópicos em discussão. A questão sobre
as diferenças dos dados poderem ser relacionadas ao fenômeno de
convecção, que havia ficado em aberto numa abordagem dialógica em
turnos anteriores, é encerrada de forma autoritária quando P escreve seu
ponto de vista na lousa.

Em relação à função interpessoal, neste período a abordagem comunicativa


passa a ser dialógica, os alunos apresentam idéias diferentes da defendida
pela professora e há espaço para a defesa das mesmas. P, por sua vez,
191

introduz mais um modo de construção de significados, o desenho, para


construir um argumento que explique as diferenças nos valores de
temperatura em função do fenômeno de convecção. Este modo, da mesma
forma que os gestos que vinham sendo empregados, também apresenta-se
em segundo plano em relação à linguagem oral.

Até o presente momento, professora e alunos construíram um texto que


envolve vários aspectos da cultura científica – relação entre dados e
hipóteses; considerações sobre dificuldades na leitura; explicação de fatos
inusitados na coleta de dados; potencial oferecido por uma inscrição para a
interpretação de fenômeno científico.

Episódio 6.9. – Buscando regularidades nos dados

Após a construção de uma conclusão compreendendo as primeiras


observações sobre os dados, a professora sugere um novo olhar sobre os
mesmos.

T Verbal Oral Lousa


99 P: outra pergunta ... será que dá pra gente tirar alguma::: alguma::
expressão que envolva o AUMENTO da temperatura? E essas
variáveis que a gente está mexendo... quer dizer ... por exemplo ... se
eu dob/ dobramos a quantidade de água ... será que dobrando a
quantidade de água a temperatura aumentou duas vezes menos?
100 A4: um pouco ... não muito ...
101 A24: tá noventa e seis ... (vai ficar assim)() aí vai ficar demorando...()
102 P: ela vai demorar mais ... agora eu quero ver o seguinte ... no Tabela
caminho ... aqui ... por exemplo... aumentou quantos graus?
103 A: onde?
104 P: dezoito ... trinta e dois ...
105 A14: catorze... ((82’))
106 P: catorze...e aqui?
107 ((Professora mantém esse diálogo com os alunos, enquanto marca no
a quadro as diferenças entre valores consecutivos de temperatura))
112a
112 P(b): será que existe uma re-gu-la-ri-da-de não aumento? Será que
ela aumenta SEMPRE:: valores iguais?
192

Nesta etapa, P começa a motivar os alunos para a observação de um outro


aspecto da cultura científica, a busca de regularidades nos dados. É
importante lembrar que a taxa de variação da temperatura foi o primeiro
aspecto do fenômeno de aquecimento da água explorado pela professora na
fase de motivação e planejamento da investigação (aula 4 da seqüência). No
episódio 6.1. (Criando Diferenças) P fez uso de uma abordagem
comunicativa interativa de autoridade, empregando questões diretivas,
muitas vezes acompanhadas de pistas, para conduzir os alunos a uma
hipótese sobre este tema: temperatura aumenta, no começo mais devagar e
depois mais rápido.

Apesar de todo tempo dedicado ao tema naquela ocasião, cerca de vinte e


cinco por cento de toda a discussão, este parece não ter sido muito
marcante para os alunos. E, mais uma vez, é preciso fazer uso de um
discurso diretivo para que a necessidade de investigação da taxa de
variação da temperatura seja criada dentro da investigação. Este
investimento de P é observado tanto entre os turnos 99 e 112, quanto no
extrato apresentado a seguir, em que aquela continua incentivando a
participação dos alunos através de uma abordagem comunicativa interativa,
com caráter de autoridade.

(113) P: quem tinha feito uma observação? foi você ( )


(114) A14: sobre o quê?
(115) P: sobre (a água como que) a temperatura aumenta?
(116) A14: ( ) ou não...
(117) P: não ... alguém fez um comentário aqui ... dizendo que no começo::
e depois aqueceu mais rápido...
(118) A4: ah: ... fui eu... fui eu...
(119) P: foi você ... que no começo ... você achou que foi mais rápido ...
depois achou que foi mais devagar... ((83’))
(120) A14: (lógico) que ela esquenta...

É oportuno observar que, ainda neste episódio, enquanto o tema taxa de


variação de temperatura exigiu um grande investimento retórico da
193

professora para sua discussão, o tema estabilidade dos valores de T durante


a ebulição da água ressurgiu espontaneamente por meio de uma questão de
uma aluna (turnos 126 a 162). Vale a pena lembrar que, desde a fase de
levantamento de hipóteses na aula 4, a divergência entre idéias relacionadas
a este tema foi um ponto de intenso debate. Isto demonstra como a criação
de conflitos entre idéias pode motivar a participação dos alunos nas
discussões.

Após guiar os alunos na construção de uma explicação para a estabilidade


da temperatura da água durante a ebulição, tema que não será explorado na
presente análise28, a professora retoma a discussão sobre regularidades nos
dados:

(163) P: pessoal ... pra gente fazer ... pra gente poder:::... shhh::... observar
e poder fazer uma:: relação de QUAN-TI-DA-DE -- não só como a gente fez
aqui [tabela]-- aqui a gente só falou qualitativamente... aumenta ... diminui
... aumenta mais ... aumenta menos ... agora ... a gente em física trabalha ...
trabalha muito na qualidade também pra ver se afasta ... dilata ... ( ) sem ...
sem medir ... né... essa eu vou querer medir um pouco mais... ((88’)) então
vou querer es-ta-be-le-cer uma relação de quan-ti-da-de ... SERÁ que cada
vez que eu DOBRO a quantidade de lamparinas... a temperatura aumenta
duas vezes mais rápido? ou ... um vez mais rápido? ou ... será que quando
eu DOBRO a quantidade de ÁGUA ... a temperatura DEMORA metade pra
aumentar ... ela vai aumentando de menos em menos na metade... na
mesma proporção? será que É a mesma proporção? será que NÃO é? Pra
gente poder ver essa parte de quan-ti-da-de – QUANTO aumenta -- a gente
não vai poder comparar só numérico ... fazendo AQUI [tabela] o quanto
aumentou em cada minuto. .. pra cada um ... pra ver o que acontece ... pra
gente ver isso ... a gente vai usar um OUTRO recurso científico ... que é o
GRÁFICO ... ((89’)) o que a gente está vendo aqui -- olhando pra UM
MONTE de números -- no GRÁFICO a gente vai ver muito claramente...
porque você vai dar uma ... uma:: impressão VISUAL ... você vai bater o
olho no gráfico e vai dizer se está aumentando rápido ... se está
aumentando devagar ... se está aumentando no mesmo ritmo ... ou não...
(164) A14: (esse gráfico a gente pode fazer) ... pode fazer?
(165) P: PODE fazer ... VAMOS fazer ((89’35”))

A disposição dos dados numa tabela possibilitou obter informações de


caráter qualitativo, representando semelhanças e diferenças entre as

28
Embora a construção de uma explicação conceitual seja um aspecto essencial dentro da prática
científica, optamos por concentrar nosso olhar sobre as inscrições científicas empregadas nas práticas
de laboratório.
194

variadas condições de experimentação. A partir do momento em que a


professora propõe a investigação de regularidades, porém, este instrumento
começa a apresentar limitações, marcando um momento de transição em
que uma nova inscrição deve ser empregada. A necessidade dessa nova
inscrição e seu papel dentro da cultura científica é apresentada claramente
pela professora no turno 163.

As aulas seguintes da atividade de laboratório compreenderam a obtenção e


interpretação da segunda e terceira inscrições do fenômeno, gráfico e
função matemática, respectivamente. Este trabalho foi exaustivo
compreendendo o período de mais duas aulas duplas. Considerando que as
aulas analisadas até aqui já são representativas para o problema desta
pesquisa, optamos por deixar a análise das aulas seguintes para trabalhos
posteriores.
195

Capítulo 7 – Considerações Finais

Como apresentado nos capítulos 1 e 4, duas metas foram estabelecidas


para a investigação de aspectos da cultura científica disponibilizados no
plano social da sala de aula. A primeira delas diz respeito ao conteúdo
trabalhado nas aulas e sua relação com aquela cultura. Enquanto a segunda
refere-se às estratégias pedagógicas adotadas pela professora, que
proporcionaram o trabalho com os temas identificados.

De um modo geral, os dois tipos de atividades de experimentação realizados


ao longo da seqüência proporcionaram aos alunos entrar em contato com
práticas empregadas em laboratórios científicos, envolvendo o levantamento
de hipóteses e teste empírico para contraste das mesmas com a realidade.
Estes aspectos, porém, foram abordados de forma diferenciada em cada
atividade, envolvendo outras facetas do trabalho em laboratório. A atividade
de demonstração investigativa privilegiou o desenvolvimento de habilidades
de argumentação, enquanto o laboratório aberto proporcionou aos alunos a
obtenção e interpretação de inscrições literárias.

Argumentação

No primeiro caso, foi observada uma crescente evolução dos argumentos


dos alunos para a explicação de um fenômeno demonstrado pela
professora. A apresentação de argumentos pode ser associada tanto às
características da atividade quanto à forma de condução da mesma adotada
pela professora. Esta última, porém, foi o que determinou o processo de
evolução dos mesmos. A atividade ofereceu um primeiro passo para a
196

participação dos alunos, a apresentação de um problema a ser respondido


pela turma. Porém, este aspecto não seria suficiente para a construção de
argumentos de qualidade se não fossem as ações da professora, voltadas
tanto para o desenvolvimento do conteúdo, função ideacional, quanto para a
participação dos alunos, função interpessoal.

Ao longo da realização da atividade, as argumentações dos alunos foram se


transformando, passando de argumentos incompletos ao emprego de
conhecimentos básicos e construção de uma refutação. Atribuímos esta
evolução tanto à postura instigadora da professora, repetindo o
questionamento e ajudando a interpretar as idéias dos alunos, quanto ao
emprego do próprio aparato experimental, que foi o instrumento utilizado
pelos alunos para a obtenção de uma evidência para a refutação. Neste
ponto, os esforços da professora dedicados à função interpessoal também
mostraram-se importantes. Desde o início do experimento, esta procurou
incentivar a participação dos alunos, sem um forte direcionamento,
conquistando a atenção dos mesmos pouco a pouco. Neste clima de
crescente envolvimento os alunos tinham liberdade para a apresentação de
suas idéias e chegaram a propor uma alteração nas condições da
experimentação.

Obtenção e Interpretação de Inscrições

A atividade de laboratório aberto também contou com a apresentação de um


problema inicial, a forma de exploração do mesmo, porém, foi bastante
diferente. Enquanto na demonstração investigativa a visualização do
fenômeno proporcionou, desde o início da atividade, elementos para a
participação dos alunos. No laboratório aberto, foi necessário um período de
sensibilização dos estudantes para a necessidade de planejamento da
investigação. O problema precisou ser construído juntamente com os alunos,
envolvendo a criação de diferenças (Ogborn et. al., 1996). Para tanto foi
197

necessário o emprego de um discurso de autoridade por parte da


professora, fornecendo pistas para a participação dos alunos. Após
estabelecido o problema, porém, os alunos começaram a apresentar uma
série de contribuições, que proporcionaram a construção conjunta de
hipóteses para o tema.

Dado o problema sob investigação e as hipóteses dos alunos, diversos


aspectos da cultura científica foram abordados, como a identificação de
variáveis relevantes para o teste experimental, aspectos técnicos envolvidos
na realização de medidas, estabelecimento de condições padronizadas para
comparação de resultados e trabalho cooperativo. O trabalho com todos
estes aspectos da cultura científica na primeira fase da realização da
atividade foi realizado predominantemente através do modo verbal. Os
gestos, porém, tiveram importante papel na ênfase dada à função
interpessoal. Assim como no início da atividade de demonstração, a
professora dedicou grande atenção ao desenvolvimento de um clima de
participação dos alunos nesta fase.

A construção compartilhada de hipóteses, assim como o planejamento do


teste experimental das mesmas, revelaram-se aspectos importantes para o
envolvimento dos alunos na atividade de coleta de dados. No grupo
analisado, os alunos demonstraram grande engajamento com o trabalho e
domínio das condições necessárias para a realização de suas funções.
Partindo da premissa de que o envolvimento dos alunos na realização de
uma atividade está relacionado à compreensão que apresentam sobre os
objetivos envolvidos na mesma (Franks e Jewitt 2001), estes alunos
parecem ter construído importantes significados relacionados à prática de
laboratório, tais como, rigor na realização de medidas, cuidados para evitar
interferências externas, contraste entre hipóteses e evidências empíricas.
198

A analise da primeira inscrição também envolveu importantes aspectos da


cultura científica, entre eles o potencial e as limitações de uma tabela na
busca de relações entre variáveis. Este trabalho envolveu a construção de
olhar diferenciado sobre o conjunto de números obtidos na coleta de dados.
A professora guiou os estudantes na busca de semelhanças e diferenças,
explorando a primeira inscrição até chegar em suas limitações e na proposta
de realização de um gráfico. Embora o trabalho com esta última inscrição
não tenha sido considerado para análise na presente pesquisa, constatamos
que o trabalho realizado com a primeira inscrição proporcionou aos
estudantes um contato mais próximo com a construção e motivações para o
emprego dessa inscrição.

Análise Multimodal das Interações

A análise multimodal das aulas revelou-se um importante instrumento, visto


que diferentes modos de comunicação foram empregados pela professora e
pelos alunos, realizando funções diversas dentro do processo de construção
de significados.

Como observado por outros pesquisadores (Roth, 1999; Crowder, 1996), os


gestos metafórico foram empregados predominantemente em momentos de
construção de explicações, complementando ou enfatizando idéias
apresentadas pelo modo verbal. Já os gestos dêiticos tiveram especial
participação nas funções interpessoal e textual.

As ações dos alunos durante a coleta de dados no laboratório aberto


representou importante papel na construção de significados, proporcionando
aos mesmos o emprego de conhecimentos básicos na construção de
hipóteses e previsões, oferecendo oportunidades de verificação das
mesmas.
199

Os instrumentos de análise empregados possibilitaram conciliar aspectos de


pesquisas voltadas para análise dos discurso e daquelas voltadas para
análise multimodal. A concentração da análise de cada modo em suas
funções na construção de significados possibilitou relacioná-los, sem a
perder de vista a contribuição de instrumentos desenvolvidos para análise do
discurso. As categorias desenvolvidas por Mortimer e Scott (2000)
mostraram-se compatíveis com a identificação de funções de comunicação,
adotadas por Lemke (1998,2000), Kress et. al. (2001) e Franks e Jewitt
(2001), consistindo num ponto de partida para trabalhos posteriores de
integração das pesquisas voltadas para a linguagem verbal e aquelas sobre
outras linguagens.

Este trabalho proporcionou a realização de um diagnóstico da


implementação de um plano de ensino sustentado por pressupostos teóricos
voltados para a construção de conhecimentos compartilhados nas aulas de
Física. Contribuindo para ressaltar aspectos da realidade da sala de aula
que precisam ser considerados na construção de atividades de ensino,
assim como na formação de professores.
200

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título: Sociocultural Studies of Mind, em 1995)
207

ANEXOS
Anexo 1 – Normas empregadas na transcrição (Preti, 1997, p. 15 e 16)

Para marcar qualquer tipo de pausa foram empregadas reticências no lugar


dos sinais típicos da língua escrita, como ponto final, vírgulas, ponto de
exclamação, dois pontos e ponto - e vírgula. O único sinal de pontuação
mantido foi o ponto de interrogação.

Outros sinais utilizados nas transcrições foram:

( ) para hipóteses do que se ouviu;

(( )) para a inserção de comentários;

:: para indicar prolongamento de vogal ou consoante, por exemplo:


“éh:::”;

/ para indicar truncamento de palavras, por exemplo: “o pro/ ... o


procedimento...”

- para silabação, por exemplo: “di-la-ta-ção”;

Letras maiúsculas para entonação enfática;

-- para quebras na seqüência temática com inserção de


comentários, por exemplo: “as partículas do arame -- que é um
sólido -- se afastam...”.

Para turnos superpostos (falas sobrepostas) utilizamos


deslocamentos (___) e colchetes ( [ ) no caso de falas simultâneas:

A14: o ar ficou ________ menos denso e se expandiu

A5: _______mais leve_______________________ porque ele


esquentou
208

Anexo 2: Aula 1 (19/04/00) – Fita 1 – Demonstração sobre Dilatação dos


Gases

Mapa de Eventos

Evento Descrição Início (∆t)

Atividade sobre tema iniciado em aulas anteriores (alunos


Evento 1/1 – 0‘ (73’50”)
continuam trabalhando durante intervalo de 5’ entre aulas)

73’50”
Evento 2/1 – Revisão da aula anterior
(4’10”)

78’
Evento 3/1 – Demonstração Investigativa sobre dilatação dos gases
(24’)

102’
Evento 4/1 – Assuntos para próxima aula
(3’)

Evento 3/1 – Demonstração Investigativa: Dilatação dos Gases.

Episódio 1 – Demonstração Investigativa sobre Dilatação

Enquanto pega os materiais no armário para montar o arranjo que será utilizado na
demonstração, a professora vai comentando com os alunos o que está fazendo.

T Verbal Ação / gestos

1(a) P: ((0’))Teoria Cinética Molecular... a idéia de P faz gestos rítmicos


que as partículas se movem ...que esse
movimento está relacionado com a
temperatura ... elas se movem quando
ganham energia ... isso tudo é Teoria Cinética
Molecular ...

1(b) P: eu vou mostrar outro fenômeno... nós


vamos tentar explicar OUTRO fenômeno...

2 A1: legal...

3 P: material [Material] ...vamos usar também P escreve no quadro enquanto


um vidrinho ... não vai ser béquer ... vamos fala
pegar um maior ... como chama isso aqui?
vocês viram isso aqui em química? P Mostra um Erlenmeyer
4 A1: ai ...eu vi ...
5 P: ai ... eu vi ...
6 A3: chama potinho de vidro ...
7 P: vocês fizeram trabalho de Química ...
8 A2: béquer ...
209

9 P: béquer é um que parece um copinho ... P gesticula desenhando a forma de


((1’)) um béquer
10 A1: ai professora ... eu sei ...deixa eu ver ... Aluna procura anotações no
caderno
11 P: é Er-len-me-yer ...
12 A8: é o quê?
13 P: Erlenmeyer [Erlenmeyer] ...((comentários P escreve no quadro enquanto
dos alunos)) [Bexiga / Lamparina] fala
14 P: nós vamos usar pouca coisa ... nós vamos P mostra bexiga enquanto fala
usar um Erlenmeyer ... uma bexiga comum
...
15 A2: esse é o material? P coloca bexiga na extremidade
do erlenmeyer
16 P: que eu vou colocar a bexiga ((2’)) ... eu P posiciona uma carteira em
vou colocar a bexiga na boca do frente à turma
Erlenmeyer ... ((bastante conversa na sala)) P mostra que a bexiga está vazia
reparem que a bexiga ... a bexiga está Conjunto Bexiga –
vazia na boca do Erlenmeyer... agora eu vou
pegar uma lamparina ... ((2’19”))

Erlenmeyer
17 ((dos turnos 17 a 22 há bastante agitação Neste período, P coloca álcool na
a na sala e as intervenções da professora e lamparina, pede um fósforo para
22 dos alunos não estão relacionadas ao aluna, acende a lamparina e
desenvolvimento da atividade)) coloca a mesma sobre a carteira
em frente à turma
23 P: ((3’55”)) eu vou pegar uma pinça porque a P pega pinça no armário
gente vai precisar ((4’)) ... vamos usar uma
pinça pra segurar ...

24 A11: isso aí é o quê fessora?


25 P: é uma pinça mecânica...
26 A11: não... tô falando do frasco...
27 A14: é o Erlenmeyer...
28 P: é o Erlenmeyer ... daí a gente aquece ... P começa a aquecer o conjunto
((4’41”)) bexiga- erlenmeyer
29 A3: ô professora...com o aquecimento ele vai P continua aquecendo o conjunto
inchar? bexiga- erlenmeyer

30 P: então ó ... está esperando que encha...


31 A17: o balão vai encher...
32 A13: vai nada...
33 A14: ó lá...está enchendo...já... Bexiga está enchendo
34 A5: ((5’)) oh:::...
35 A14: está enchendo...está enchendo...

36 P: bom...então o material está lá... pro/ P indica lousa


37 A5: o que acontece é que o ar quente sobe
38 P: ah... peraí... ó... a A5 está tentando P continua aquecendo o conjunto
explicar as coisas... aí eu ia falar ... o bexiga- erlenmeyer
procedimento é colocar a bexiga no Aponta para A5
Erlenmeyer e aquecer o Erlenmeyer... né?
agora... está enchendo a bexiga... já é
observação... por quê que está enchendo?
agora a A5 estava falando ...
210

39 A17: por causa do ar quente Bexiga continua enchendo


40 A5: porque o ar quente é mais leve e sobe A5 abre os braços no ar

41 A17: porque ele se expande A17 gesticula

42 A5: é
43 P: peraí ... o ar quente é mais leve e sobe P continua aquecendo o conjunto
bexiga- erlenmeyer
44 A12: olha ... eles tão querendo dizer ...
professora ... que o ar quente expande ... mas
aí dentro ... ((inaudível))
45 A5: como ele não tem espaço ... ele enche
A5 gesto 1 A5 gesto 2
a bexiga ... porque a bexiga está ...
((inaudível))

46 A17: então P continua a fazer a demonstração


Bexiga continua enchendo
47 P: mas peraí... tem duas coisas aí na história
((6’)) ... o ar quente se expande ou o ar
quente sobe?
48 A5: sobe A5 gesticula

49 A9: sobe
50 A17: sobe
51 A3: ô professora
52 P: porque se ele sobe ... ele está saindo Indica Erlenmeyer
daqui... pra cá ... e Indica bexiga
_____________________aqui está ficando
vazio Bexiga continua enchendo

53 A3:ô professora ... só que ele está no limite


da bexiga
54 A15: não ___ ele se expande
55 A5: ____ não P continua aquecendo o conjunto
bexiga- erlenmeyer
56 A17: se expande
57 Alunos: se expande
58 A3: ô professora ele sobe... mas aí ele não
tem a tendência
59 P: peraí... um de cada vez Vários alunos falam ao mesmo
tempo
211

60 A3: ele não tem a tendência de sair pra se A3 gesticula


espalhar... então ele está tipo:: se
acumulando na bexiga não é ... mais ou
menos assim?

61 P: o ar estava aqui embaixo... e a bexiga


estava (vazia)... o ar estava aqui... espera um P gesticula indicando erlenmeyer e
pouquinho... vamos recapitular... ó... o ar bexiga Erlenmeyer
estava embaixo... a bexiga estava vazia... e Bexiga
aí? o que aconteceu?
62 A17: o ar ficou ________ menos denso e se
Bexiga continua enchendo
expandiu
63 A5:_____________mais leve
______________________ porque ele
esquentou
64 A17: menos denso e expandiu ...
65 P: peraí... ficou o quê?
66 A7: menos denso P continua aquecendo o conjunto
bexiga- erlenmeyer
67 A14: menos denso

68 A17: é ... menos denso


69 P: ele ficou menos denso ((7’)) e subiu _____
então... o Erlenmeyer está sem ar... ou tem Erlenmeyer
muito pouco ar... e o ar que estava aqui subiu
70 A14: __________________________ subiu
70(a) ((discussão entre os alunos sobre a
Há grande envolvimento na classe
demonstração inaudível))
71 A7: o ar estava querendo se espalhar ... A7 levantando os braços abertos
professora...

72 A15: não... o ar sobe


73 P: ou o ar está mais espalhado ( )? ((dá P continua aquecendo o conjunto
continuidade à fala iniciada no turno 69)) bexiga- erlenmeyer

Bexiga continua enchendo


74 A7: _________ô professora... menos denso
não é uma molécula está mais longe da
outra? o ar está ocupando mais espaço...
75 ((discussão sobre a atividade inaudível))
76 A5: ele sobe
212

77 A7: ô professora... o ar não está ocupando P não responde


mais espaço? ... ó... saca só... vocês
concordam comigo que as moléculas tão A7 volta-se para os colegas
mais afastadas? então... está ocupando
mais espaço... A7 gesticula

78 ((discussão inaudível))
79 A5: viu... professora... o ar não subiu...
80 A7: ô Bruno... o ar não está ocupando mais P continua aquecendo o conjunto
espaço? bexiga- erlenmeyer
Bexiga continua enchendo
81 P: ele se expandiu ou ele subiu?
82 A3: está subindo...
83 A15: ele se expande
84 Alunos: expande
85 A7: ele se expande pra todos os lados...
86 ((discussão inaudível))
87 A14: ele se expande ... ele está querendo sair P continua aquecendo o conjunto
bexiga- erlenmeyer
Bexiga continua enchendo
88 A7:_______________________________ pra
cima é mais fácil
89 P: quer dizer que aqui não tem ar? Erlenmeyer
90 Turma: TEM AR
91 A21: só que ele está subindo
92 A3: coloca de lado
93 A7: professora... coloca de lado ((o arranjo))
pra ver o que acontece
94 ((comentários))
95 P: ((8’)) se o ar... está subindo __________ P vira o conjunto bexiga –
se eu colocar assim erlenmeyer de cabeça para baixo
96 A7:______________ ((inaudível))
97 A4: a bexiga vai estourar
98 P: eu vou pôr bem longe pra ela não
estourar... mas com a bexiga ia acontecer o
que?
99 A4: nada
100 ((discussão inaudível))
101 A15: ela ia esvaziar... se o ar tivesse subindo
_____ela ia esvaziar...
102 P: ______________se o ar tivesse subindo
ela deveria estar esvaziando...
103 A15: mas o ar não está subindo... ele está se
expandindo... então ela não vai esvaziar...
104 Alunos: ah::::::
105 P: certo... se o ar tivesse só subindo... ele iria
esvaziar... como ele ainda está quente... ele
deveria inverter...né? ((9’))
213

106 A2: professora... P continua aquecendo o conjunto


bexiga- erlenmeyer
Bexiga continua enchendo
107 P: ahn.
108 A2: não é o caso das moléculas
((inaudível))... é esse o caso?
109 P: é:: o que estava em dúvida aqui... vem a
ser o seguinte... se o ar saiu daqui e veio pra
cá ... como se fosse na Convecção -- o ar
Erlenmeyer
quente fica menos denso ... sobe – OU se o
Bexiga
ar se espalhou -- se o ar que estava aqui
agora está aqui E aqui e está ocupando mais
espaço--
110 A5: é isso que está acontecendo
111 ((inaudível, muita agitação, alunos falam ao
mesmo tempo))

Evento 3/1 – Episódio 2

T Verbal Ação / Gestos


112 P: o quê que acontece quando esfria?
((10’23”))
113 A5: o ar se junta de novo... A5 gesticula indicando contração
114 A15: fica menos denso...
115 A4: fica MAIS denso...
116 Classe: mais denso...
117 A3: é...mais denso...
118 P: elas vão perder o quê?
119 A4: vão perder o lugar no espaço... vão
ficar menor...
120 P: por que elas vão perder? Há grande agitação, vários alunos
falam ao mesmo tempo
121 A16: porque elas vão se juntar...
122 A17: porque elas vão se juntar...
123 P: elas vão esfriar... elas vão se juntar mais...
por que elas vão se juntar mais?
124 A17: porque elas tão mais frias ... mais
densas ...
125 P: elas perdem o quê?
126 Classe: calor... Há grande agitação, vários alunos
falam ao mesmo tempo
127 A4: energia... ((11’))
128 P: perdem energia... e quem ganha a
energia dela?
129 A5: o béquer... o Erlenmeyer...
130 A4: a bexiga...
131 P: está esfriando o ar que está aqui dentro e
a bexiga ... ((11’12”))
132 ((A discussão é interrompida
quando a professora derruba o
arranjo experimental no chão,
quebrando o Erlenmeyer. Há muita
agitação na classe. Retomamos a
transcrição após um período de
cerca de dez minutos))
214

133 P: espera aí ... então vamos voltar para a


explicação ... enquanto está esfriando o que
acontece com o ar? ((21’))
134 A7: A7 gesticula indicando contração,
sem falar
135 A5: está se juntando
136 P: está se juntando... por que ele está se
juntando? ((alunos falam junto com a
professora))
137 A4: porque esfria...
138 A5: está perdendo... energia...
139 P: se a energia está... diminuindo... pra onde
vai essa energia?
140 A?: (pr/o espaço)...
141 A15: pr/o... pr/o vidro lá...
142 A4: erlenmeyer?
143 A15: é...
144 P: mas o Erlenmeyer também está quente ...
presta atenção gente ... a gente sempre fala
no aquecimento ... as partículas estão ficando
menos agitadas ... perdendo energia ((22’)) ...
ficando mais juntas ... e quem está ganhando
essa energia? Porque essa energia não pode
desaparecer...
145 A: o ar
146 P: o ar ... o ar de fora está ganhando
energia ... ela vai perdendo ... o quê que ia
P gesticula indicando ar que está
acontecer se tivesse chegado no final? As
em volta de um erlenmeyer
partículas iam ocupar menos espaço ... iam
imaginário
voltar pr/o Erlenmeyer e a bexiga ia voltar no
lugar como era antes...
147 A3: falei... falei...
148 P: co-mo cha-ma is-so? não é... con-vec-
ção... porque não foi o ar que subiu e
desceu... foi... DI-LA-TA-ÇÃO...
149 Classe: Oh...
150 P: nós vimos dilatação... DO ar... tá... na
próxima aula nós vamos ver a dilatação num
SÓLIDO... a dilatação do líquido é o
mercúrio... a gente não vai fazer porque a
gente já viu... se olha pr/o tubinho... nós
vamos fazer um difícil de ver que é a
dilatação do sólido... tá?
151 A18: No sólido?
152 P: no sólido... não percam a próxima aula...
então... e aí a gente vai fazer o relatório das
DUAS dilatações...
215

Anexo 3: Aula 4 (10/05/00) – Fitas 3 e 3A – Laboratório Aberto:


apresentação do problema e levantamento de hipóteses

Mapa de Eventos

Evento Descrição ∆t)


Início (∆

Entrega e comentário de atividades corrigidas / dúvidas sobre


Evento 1/4 0‘ (50’)
correção / recuperação contínua

Intervalo 50’ (5’)

Evento 2/4 Início da discussão sobre laboratório aberto 55’ (33’50”)

Alunos copiam da lousa a síntese da discussão realizada /


88’50”
Evento 3/4 alguns entregam trabalhos para P / P copia lousa em seu
(16’10”)
caderno

Evento 2/4 – Início da discussão sobre laboratório aberto: levantamento de hipóteses

T Verbal / Oral Ação / gestos

1(a) P: este trabalho vai ser um pouquinho mais difícil ... então
eu vou propor uma questão ... e nós vamos BUSCAR a
P gesticula
resposta em grupo na classe ... então quem tiver idéia pode
indicando uma
falar ... nós vamos respeitar os colegas ... se não for a
proposta de
mesma idéia ... a gente pode ter várias idéias ... não tem
trabalho coletivo
problema ... o importante é a gente TROCAR essas idéias
... todo mundo tem direito de falar e todo mundo tem direito
de ser ouvido ...
1(b) P: então ... o quê que eu vou perguntar ... a minha pergunta
é essa ... o quê que acontece - - vamos imaginar com a
água ... porque a água é uma coisa fácil - - o que acontece
com a temperatura da água enquanto a gente AQUECE
essa água?
2 A15: aumenta
3 P: aumenta ... COMO que ela aumenta? ((56’))
4 A21: são as moléculas
5 A4: as moléculas ... é isso?
6 P: uhn ... como que essa temperatura aumenta? ... será que
ela aumenta sempre no mesmo ritmo?
7 A14: não
8 A4: não ... né
9 P: será que ela aumenta ... sei lá ... mais rápido no começo
e devagar depois ...
10 A14: não ... devagar no começo
216

11 P: ela começa aumentando devagar ...


12 A14: () até chegar na ebulição ...
13 P: até ela chegar na ebulição
14 A14: (até ficar bem quente)
15 P: se eu vou aquecendo a água ... o quê que vai
acontecer?
16 A14: virar vapor
17 A4: vai evaporar
18 P: ela vai evaporar ... e a temperatura
dela?
19 A21: ()
20 A14: vai aumentar
21 P: sempre?
22 A14: Quando ela virar vapor fica gelado...
23 P: Quando?
24 A14: Quando ela virar vapor fica gelado...
25 P: Quando ela virar vapor fica gelado ...
26 A23: ()
27 P: Mais alto...eu não ouvi... ((57’))
28 A23: Nada professora...
29 A4: Ela só se mistura com o ar?
30 P: Como é que é?
31 A4: Ela só se mistura com o ar?
32 P: quando ela vira vapor ela se mistura com o ar ... tá ... P gesticula
mas eu estou pensando no vapor ... se a gente coloca a indicando uma
água pra aquecer ... vocês estão dizendo que a temperatura proposta de
aumenta ... nós temos um primeiro problema aí ... será que trabalho coletivo
ela aumenta ... sempre por igual? Você ((A14)) acha que
Indica aluno
não ... você acha que no começo ela aumenta ...
33 A14: ela vai aumentando
34 P: devagar?
35 A4: gradualmente
36 A15: gradualmente
37 P: gradualmente ... mas ... por exemplo ... esse
gradualmente seria assim ... ahn ... uma quantidade fixa ...
por exemplo ... dez graus por minuto ... sei lá ...
38 A14: ah ... pode ser
39 P: ou será que no começo ela aumenta mais ... depois Indica aluno
aumenta menos ... ou ao contrário ... fala ((para A6)) ((58’))
40 A6: eu acho que ela aumenta mais rápido quando ela está
mais quente
217

41 P: quando ela está mais quente ela aumenta mais rápido?...


42 A6: isso

Verbal
T Ação / gestos
Oral Escrito
[quadro]
43 P: bom ... então eu vou escrever isso pra “O que
gente não perder essas idéias ... né ... acontece com
P indica aluno
senão a gente se perde ... então primeiro a temperatura
o que acontece com a temperatura da da água
água enquanto a aquecemos ... então enquanto a
ela aumenta ... primeiro ela aumenta ... aí aquecemos?
você ((A6)) disse que nesse aumento ...
- aumenta – no
ela aumenta ... no começo ... mais
começo +
devagar ... ((59’))
devagar e
depois +
rápido”
44 A6: () eu acho que ela no começo vai mais
devagar e depois mais rápido
45 P: e depois mais rápido ...então vamos
pensar em números ... só pra chutar ... a
gente não tem a menor idéia ... mas
...vamos supor assim...se aumentava no
começo dez graus por minuto ... depois ela
passa a aumentar Quinze...vinte...por aí...
46 A: ____quinze...vinte...
47 P: alguém acha diferente? ((pausa de 4”)) P gesticula
pode achar...nós não sabemos ... a gente convidando
tem direito de errar tudo agora ... a gente participação dos
não sabe mesmo ... não sei ... não sabe o alunos
que está acontecendo...
48 A21: eu acho que depende da temperatura
que colocar água...
49 P: depende da temperatura que eu colocar
a água...
50 A21: se eu colocar muito alto ()
51 P(a): então aí você já está vendo uma
outra coisa ... que depende ... no caso ...
“- depende da
do ... quanto de calor você está
quantidade de
fornecendo pra água ... né ... quanto de
energia
energia você está fornecendo ... ((60’)) se
fornecida, +
eu fornecer bastante energia ela vai
energia +
aquecer mais rápido ... então é ...
rapidamente”
quantidade de energia fornecida ...
então quanto mais energia ... mais ... mais
... rápido ...
218

51 P(b): que mais? ... que mais que a gente P gesticula


pode pensar sobre o aquecimento da água convidando
... será que tem ... tem alguém que pensa participação
primeiro que alguém faz de um jeito
diferente?
52 A15: Ô...professora...se ela está--por
exemplo--a nível do mar ela ferve mais
rápido do que estando aqui em São Paulo-
-que é mais alto--então depende do local
que ela está...ela vai ter diferentes
aquecimentos...
53 P: você acha que...mas aí ela vai
AQUECER de um jeito diferente...
54 A15: Ela vai ebulir... ela vai ... ((61’))
evaporar mais rápido...
55 P: Ela vai FERVER mais rápido ou mais
devagar?
56 P: Dependendo - - ele está falando - - a
altitude...
57 A4: Eu acho que não ... dependendo da
energia que você fornecer pra ela ... eu
acho que esquenta em qualquer lugar
pode ser mais rápido ou mais devagar...
58 P: Será que a altitude no caso influencia? “- conforme
... vamos colocar aqui ... hipóteses são altitude”
hipóteses ... a gente não sabe ... então
conforme a altitude ... agora o que eu
quero saber é o seguinte ... conforme a
altitude ela vai AQUECER mais rápido ou
ela vai FERVER numa temperatura
diferente ... o que você está dizendo? ...
59 A15: Não ... ela vai aquecer mais rápido...
60 P: Ela vai aquecer mais rápido? Quer dizer
que se aqui em São Paulo ela ... por
exemplo ... aquece dez graus por minuto
((62’)) ... se eu fizer a mesma coisa lá em
Santos ... você acha que vai acontecer o
quê?
61 A15: Eu acho que ela vai aquecer mais
rápido...
62 P: então lá que é maior aumentaria quinze
graus por minuto...
63 A15: Pode ser...
64 P(a): Sei lá ... ele está chutando um “aquece mais
número ... só pra gente pensar o quê que rápido (<
é ir mais rápido ou mais devagar ... então altitude)”
conforme a altitude ... a água ... aquece
... mais ... rápido ... né ... menor a
altitude ... que mais?
219

T Verbal / Oral Ação / gestos

64 P(b): Que mais será que influencia nesse aquecimento da


água? ... fala ((para A6))...
65 A6: Eu acho que o:: ... a temperatura do ambiente ... eu
acho que é bem mais fácil aquecer uma água na Flórida do
que na Antártida ...
66 P: Ah:: ... você está dizendo no ambiente...
67 A6: Isso...
68 P: depende da temperatura do ambiente ((63’)) ... será que
isso influencia esse aquecimento dela? ... quer dizer ... ela
vai aquecer mais rápido...
69 A6: influencia porque a senhora falou que a água estava à
temperatura do ambiente...
70 P: certo...
71 A6: se na Antártida ela vai está bem mais gelada ... vai
demorar muito mais tempo...
72 P: ah::: ... certo ... aí você está falando da temperatura
inicial da água...
73 A6: ou seja ... ela vai demorar mais...
74 P: se você começar...
75 A6: ela vai demorar mais pra chegar a cem graus ... por
exemplo...
76 P: Ah:: ...está certo ... tá ... mais isso aí a gente pode
resolver...
77 A4: Ô...professora...
78 P: Por exemplo ... se a gente resolver fazer aqui a vinte
graus ... quem for fazer na Antártida ... dá uma aquecidinha
nela pra ela ficar a vinte e começa a contar só dali..
79 A4: É::... ((levantado o braço))
80 P: isso aí ... não vai depender da temperatura ambiente
porque o ambiente influencia ... é ... é a temperatura inicial
... né ... a temperatura inicial precisa ser levada em conta ...
na hora que a gente colocar os materiais com a mesma
temperatura inicial ... aí vai ser mais fáceis de comparar...
81 A23: Ô professora...
82 P: Ahn... ((64’))
83 A23: Depende também ... do objeto que você vai esquentar
a água ... também...
84 P: Depende do objeto onde que a gente vai por a água
85 A23: Também()
86 A4: É ... se é alumínio ou vidro ou outra coisa...
87 A23: É...
220

Verbal
T Ação / gestos
Oral Escrito
[quadro]
88 P: Tá ... depende do recipiente... “- depende do
material do
recipiente:
alumínio ou
vidro
89 A4: É::...
90 A23: E também ... e também ... ou no
forno microondas ou no fogão também ...
(riso)()
91 P: Se puser no fogão ou...
92 A: Ou no microondas...
93 A22: Ou numa fogueira ... então ((risos)) ...
94 P: Daí se colocar no fogão ... numa
fogueira ... na nossa lamparina ... vai fazer
diferença...
95 A22: Lógico...
96 A4: É claro...
97 P: POR quê? P gesticula
representando
ênfase neste ponto
98 A22: Por causa da temperatura()
99 P: Aí...a gente está falando do quê?
100 A14: Da energia...
101 P: Da energia fornecida ... né ... então
lógico ... se agente for aquecer a água
com um maçarico ... e aquece a água com
a nossa lamparina...
102 A4: Ah:: ... vai ser mais devagar...
103 P(a): DEVE ir muito mais devagar com a
nossa lamparina ... né ((65’))
103 P(b): que mais? Que pode influenciar?
104 A4: ()
105 P: Você está falando uma coisa
importante...
106 A23: Eu acho que é importante ... vamos
supor ... a água ... num recipiente ...
alguma coisa ... se ele é fechado ou aberto
... também
221

107 P: Se ele é fechado ou aberto ... isso pode “- depende se


influenciar ... isso a gente vai ter que é fechado ou
escolher ((escreve))... Agora você falou da aberto”
água A14 ... quê que falta da água?...
108 A22: ()
109 P(a): Não ... mas isso aí é o que ele falou
... você tem que acertar a temperatura de
começo - - Bruno ... não é hora ... agora
têm que estar ligado aqui - - depende da -
- era o que ele tinha falado - - da
temperatura inicial ((66’))... mas isso a
gente pode até começar com temperatura
inicial ... sempre a mesma ... só você
aquecer todas para Ter a temperatura que
quiserem ...
109 P(b): que mais que está faltando? vocês
não pensaram numa coisa...
110 A4: Em relação à química...
111 P: A própria água ... a gente está falando
na água ... mas não falou no que da
água...
112 A14: ()
113 P: ... a gente falou da quantidade de
energia ... está ligado () ... se eu estiver
aquecendo pouca água ... ou muita água
...
114 A4: a quantidade de água?
115 P: ahn? a quantidade de água modifica o
aquecimento?
116 A4: Claro...
117 P: Ninguém falou nisso até agora ... né “Hipóteses:
((67’)) se eu tiver mais água ... quê que - Quantidade
vai acontecer... de água -
+ água →
demora mais”
118 A14: Vai demorar mais pra aquecer...
119 P(a): Demora mais pra aquecer ...
222

T Verbal / Oral Ação / gestos

119 P(b): bom ... então a gente está vendo aqui ... uma série de
coisas que a gente acha que não fornecia/ - - vamos parar a
conversa ... se a gente se perder agora ... a gente vai se
perder pr/os próximos ... pr/o próximo trabalho ... que é a P gesticula
seqüência desse aqui ... - - então a gente está vendo aqui indicando as
VÁRIAS coisas que influenciam no aquecimento ... por hipóteses escritas
exemplo ... da água ... estou falando da água porque a água no quadro e, em
é um material fácil de conseguir ... fácil de achar ... e tudo seguida, os alunos
isso ... então ... várias coisas estão influenciando nesse
assunto ... né ... se nesse aquecimento ...
119 P(c): se a gente ... por exemplo ... escolher uma
determinada quantidade de água e uma determinada fonte
de energia e aquecer essa água ... quê que vai acontecer
com a temperatura...
120 A14: Da água? ((68’))
121 P: Ela vai subindo ... subindo ... subindo ... subindo ...
subindo...
122 A14: Ela vai até atingir o limite...
123 P: Que limite?...
124 A14: ()
125 P: ela vai para as nuvens depois quando ela virar vapor...
126 A4: ()
127 A14: Ela tem um limite...
128 P: Ela tem um limite...da temperatura...
129 A4: ()
130 A14: ()
131 A4: Não tem como subir mais()
132 P: A gente aquece ... e a temperatura vai subindo ... subindo
... subindo ... subindo ... chega uma hora que a temperatura
não aumenta mais...
133 A14: Aí vira vapor...
134 P: Aí ela vira vapor...
135 A4: É...
136 A: A A2 colocou uma pergunta...
137 A4: Porque não tem mais a ()
138 A14: Não tem mais...
139 P: Não ... mais até a água der/ evaporar todinha - -PÁRA A
CONVERSA ((pausa de 4”)) - - ((69’)) até a água ... vai
aumentar a temperatura e vai começar a virar vapor ... e vai
ferver ... agora enquanto ela estiver fervendo ... a
temperatura vai ficar a mesma ... vai aumentar ... vai
diminuir...
223

140 A4: Aumenta...


141 A22: Vai aumentar ... se a temperatura do fogo não
aumentar ...
142 P: Não ... o fogo a gente vai usar um fogo só ... aquela
história da lamparina ... pronto ... você vai colocar a água no
fogo ... na ... pra aquecer na lamparina ... a temperatura vai
subindo ... subindo ... subindo ... subindo ... subindo ... ela
começa a ferver ... ela começa a evaporar ... só que ela não
evapora num instante...
143 A22: Não...
144 P: ela vai ficar fervendo ... e enquanto ela está fervendo ...
vai com o termômetro lá dentro ... o quê que vai acontecer
com o termômetro?
145 A21 e A14: vai aumentando
146 P: vai continuar aumentando?...
147 A21: é
148 A14: ela vai chegar num nível em que ((inaudível, fazendo
gestos que indicam que a temperatura vai aumentar)) ...
149 P: Cada vez vai aumentando mais?... ((vira-se em direção à
((70’)) lousa))
150 A14: sim
151 A4: não

Verbal
T Ação / gestos
Oral Escrito
[quadro]
152 P: a temperatura ... aumenta ... sempre “- temperatura ((alunos continuam
... aumenta discutindo o tema em
sempre” voz baixa))
153 ((volta-se para a
classe novamente e
P: mais alto ... mais alto ...
fala com um grupo
que está discutindo o
problema))
154 A14: mais alto?
155 P: é eu quero ouvir o papo aí que está
particular e quero socializar a idéia
156 A4: não ... eu estou falando aqui que eu
acho que se ficar a água fervendo ...
fervendo ... se colocar o termômetro lá ...
vai se manter ... eles acham que não...
157 A21: mas eu acho que ela tem que ferver
até evaporar ... então ... ela aumenta...
158 A14: é por isso que vai aumentar ...
professora...
224

159 A21: pra evaporar...


160 A4: eu acho que não...
161 P: eu acho ... quem mais acha? - - tem
dois achados aqui - - certo?
162 A14: eu acharei...
163 P: a temperatura aumenta sempre ((71’)) “- temperatura
... ou a temperatura aumenta até a aumenta até
ebulição e depois pára de aumentar ... ebulição e
se mantém ... né depois se
mantém”
164 A4: é...
165 P: quem acha que a temperatura P indica que alunos
aumenta sempre? que concordam
levantem as mãos
Alguns alunos
levantam as mãos
166 P: quem acha que a temperatura quando Outros alunos
chega a ferver pára? levantam as mãos
167 P: e o resto tá tudo em cima do muro?
((risos)) não sabem do que está se falando
aqui ... aonde estou?
168 A6: eu acho que aumenta sempre ...
169 A25: Concordo com ele...
170 A6: E dá pra provar isso...
171 ((vários alunos falam ao mesmo tempo))
172 P: Como é que é?
173 A6: Dá pra provar isso...
174 P: Como é que a gente faz pra provar
isso?
175 Vários alunos falam ao mesmo tempo
176 P: Sh:::...se todo mundo quiser me ouvir
falar é melhor... ((72’))
177 A14: Eu acho que esquenta e depois fica
parado...
178 A: É louco...
179 A: Está doente...
180 Vários alunos falando
181 P: Bom...
225

T Verbal/Oral Ação / gestos


182 A14: Eu acho que a temperatura fica ( )... mas se evaporar A14 faz um gesto
... aí não dá pra descobrir... com as mãos na
horizontal ... como
se quisesse dizer
constante
183 P: Aí não vai mais evaporar...
184 A14: Daí o vapor ()...
185 P: A briga ali vai ser boa ... né? a briga ali vai ser boa ... Apontando para os
bom ... alunos A4 ... A21 ...
A14
186 P: eu pus uma idéia ... um problema pra gente resolver ... a
gente fez uma série de hipóteses aqui ... a gente tem
certeza de alguma coisa dessas?
187 Alunos: nã::o...
188 A21: a gente podia fazer uma
experiência...
189 P: bom ... a gente podia fazer uma experiência... ((73’)) P gesticula
enfatizando
contribuição de
aluna
190 A14: agora...
191 P: só que pra gente fazer uma experiência ... a gente tem
que planejar ... tá ... nós estamos agindo agora como se age
em ciência ... eu joguei o problema ... eu propus uma idéia
aqui ... vocês levantaram um monte de hipóteses ... tem P indica aluna que
coisas que a gente está de acordo ... tem coisas que a havia defendido esta
gente tem dúvidas ... né ... que todo mundo acha que no hipótese
começo aumenta mais devagar e depois mais rápido - - pelo
menos ninguém disse nada em contrário - - depois ... pára
de aumentar - - já não é bem assim - - né ... aumenta e
depois pára de aumentar ...
192 A4: só que não desce ... ela se mantém...
193 P: ela não diminui ... ela se mantém ... né ... ele acha que no
começo aumenta mais devagar depois aumenta mais rápido
... ahn ... que o tipo de recipiente que a gente vai usar ... o
material influencia ... ((74’)) se o recipiente está aberto ou
fechado ... também ... da quantidade de calor que fornece ...
conforme a altitude ... a quantidade de água ... então ... a
gente tem uma série de coisas ... que acha que influencia ...
a gente não dá bem como ainda definir ... né ... a gente
ACHA que é assim ... só hipótese
194 P: Tudo bem? ... bom ... proposta da A21 ... vamos fazer
uma experiência pra ver isso daqui...
195 A14: Vamos...
196 P: Vamos ... ((75’)) então vamos organizar essa
experiência...
226

197 A: Vamos...
198 P: Primeiro...
199 A27: A gente não vai precisar fazer relatório não ... né
professora...
200 A: Vai...
201 A: Só pensa em relatório...
202 P: Olha ... esse relatório você vai ver como vai ficar P apaga o quadro
comprido ... aí ... ó ... primeira coisa que a gente precisa
pra fazer a experiência...
203 A4: ... Esse aqui ... ó::..
204 P: Agora não ... vamos fazer semana que vem...
205 A4: Esse aqui ... ó::... P gesticula para dar
espaço para a fala
de A21
106 A21: Nós precisamos fazer lista com materiais da
experiência...
207 P: Então ... pera aí ... primeiro vamos planejar a experiência
... ((vários alunos falando)) pera aí...
208 A: Pega uma panela de pressão...

Verbal
T Ação / gestos
Oral Escrito
[quadro]
209 P: Plano de trabalho... “Plano de
trabalho”
210 A: Professora ... precisamos fazer um
projeto...
211 P: Vamos ver o material que a gente vai
precisar... ou a gente vai vendo/ bom ...
vamos tentar fazer as duas coisas juntas
... né ... ela falou assim que a gente
poderia testar com dois recipientes
diferentes... ((76’))
212 A21: Pra ver se a temperatura depende do
recipiente...
213 P: Pra ver se a temperatura depende do
recipiente ... então pra checar isso daqui...
214 A21: Precisa ver se um é mais pesado do
que o outro...
227

215 P: então ... pra gente testar se o material


do recipiente não influencia ... a gente
“Material:
pode utilizar recipientes de materiais
béquer
diferentes ... eu tenho no laboratório
exatamente o que vocês falaram ... eu
alumínio”
tenho o copinho de alumínio ... eu tenho o
béquer ... que é de vidro ... então nós
vamos colocar o béquer ... e o copo de
alumínio ... que mais que a gente vai
precisar ... isto pra verificar o ... o alumínio
e o vidro ... que mais a gente precisa...
216 A21: Lamparina...
217 P: Lamparina ... que mais... “lamparina 1
ou 2”
218 A21: A água... ((77’))
219 P: A água... “água”
220 A14: O fogo...
221 P: Ela acabou de me dizer a lamparina...
222 A21: ()
223 P: Que é o que a gente tem que usar...
224 A21: Precisa um termômetro ...
professora...
225 A: Tripé ... professora...
226 P: Precisamos de um tripé pra apoiar os “tripé “
copinhos ...
227 A4: Termômetro ... uma tampa...
228 P: Termômetro ... pra medir... “termômetro”
229 A27: Papel ... professora...
230 A4: Uma tela também ... pra ver se...
231 P: Olha ... não vou usar a tela ... tá ... se a
gente usar a tela ... demora muito pra
esquentar ... então a gente vai ficar muito
tempo tendo que medir ... se a gente puser
o copinho direto com a água ... assim ela
vai atingir a temperatura melhor...
232 A25: (Vamos usar aquecimento elétrico?)
233 P: Ahn...
234 A25: (Aquecimento elétrico)
235 P: Não ... não ... não ... não vamos usar
elétrico ... não ...
236 A: Material()...
237 P: Se não a gente perde a condição de ...
de ... de ... naquele elétrico o aquecimento
... a distribuição não é igual ... que mais?
228

238 A14: Uma tampa ... professora... ((78’))


239 A4: Tampa...
240 P: A tampa... “tampa”
241 A14: É pra gente ver se...
242 A4: Se o líquido ()
243 P: Tá ... que mais? ... como é que a gente
pode verificar o problema da quantidade
Indica lousa
de energia fornecida? ... como é que a
gente pode fornecer energia diferente ...
pra gente poder comparar ... por que aqui
se faz ... um no vidro ... um no alumínio
... um aberto ... um fechado ... um:: ...
agora como é que eu posso fornecer
quantidades diferentes de energia...
244 A15: Um a gente pode fazer no::..
245 A27: Colocando uma ou duas “lamparina 1
lamparinas... ou 2 “
246 P: Colocando ... por exemplo ... uma ou
duas lamparinas...
247 A27: Põe dentro de um fogão ... tem como
ajustar...
248 P: É ... a lamparina não tem...
249 P: ((79’)) Béquer ... copo de alumínio ...
lamparina ... água ... tripé ...termômetro ...
que mais?
250 A: (O forno)
251 P: Não vamos usar o forno porque não
tem...
252 A15: Ô::. .. professora ... como que a
gente vai testar a ... a altitude ... pra ver?
253 P: Essa hipótese nós não vamos poder
testar...
254 A27: A gente vai lá no porto de Santos P escreve na
... vamos lá pra praia ... professora... lousa: “não dá
p/ testar)”
255 P: A hipótese da água em altitude nós não
vamos testar...
256 A27: Aí depois a gente vai lá... aí depois a
gente vai lá pr/o Evereste...
257 P: Isso ... aí ... nós vamos fazer uma
excursão ... só pra beber água lá na
fonte...
229

T Verbal / Oral Ação / gestos

258 A7: ( )((fazendo comentários fora do conteudo da aula))


259 P: como é que é? ((80’10”)) ((para as alunas A21 e A4 que
estão discutindo sobre a temperatura da água))
260 A4: eu estou explicando pra ela ((A21)) que um jeito de você
fazer a água se manter é com gelo ...
261 A14: persistente ... ela
262 P: quê que tem o gelo?
263 A4: com gelo ... você põe a água no negócio de gelo ... põe
no freezer ... fica gelado ... só que não desce mais ... vai
descendo ... vai descendo ... no caso ... se mantém ali ...
que nem a água quando ferve
264 A21: porque ela disse que a água chega num determinado
tempo ... não fica mais quente ... ((fazendo um gesto
indicando uma linha horizontal)) chega num limite ...
265 A4: aí ... evapora ... como é que fui?
266 P: bom...nós vamos testar como é que...
267 A4: ah::...professora ... dá logo a resposta
268 P: não ... não ... calma ... tenha paciência ... bom ... a gente
viu que a gente vai precisar de material...vamos ver se a
gente consegue ...
269 A25:()((incompreensível ... pois somente para a professora))
270 P: Olha a pergunta do A25 ((81’)) ... ó ... existe um vapor
mais quente e um vapor mais frio...
271 A4: Não...
272 P: Será que é considerável eu aquecer o vapor...
273 A4: Não...
274 A: Não...
275 A25: Mas ele vai começar a dilatar...
276 P: Você tem um problema térmico ... presta atenção ...
quando você for aquecer o vapor ... primeiro precisa ...
guardar esse vapor num lugar...
277 A25: Se você colocar o vapor num ambiente fechado ...
esse vapor pode ser aquecido?
278 P: Ó:: ... presta atenção ... ele fez uma pergunta P indica aluno
interessante ... será que esse vapor vai ser aquecido?
Então ... a primeira ... o primeiro problema seria ... recolher
o vapor ... porque se você deixar o vapor saindo ... ele vai
misturar com o ar...
279 A: Deixa num lugar fechado...
280 P: Agora ... se você colocar esse vapor num lugar mais
fechado ... será que você consegue aquecer esse vapor ...
230

281 A4: não ((82’))


282 A14: Não ... senão ele vira água...
283 A21: Não...
284 A14: Devido ele estar num lugar fechado...
285 P: Você aquece o vapor e ele vira água?
286 A: Quê isso?
287 P: Sh:::...((para os alunos que começam a falar em voz
alta))
288 A14: não ... professora ... ( )
289 A21: eu acho que ele se mistura com o
ar...
290 P: Não ... mas se eu puser ele num lugar fechado?
291 A4: Não vai acontecer nada...
292 A3: ele vai se expandir
293 P: vai se expandir ... e: ... estoura o recipiente...
294 A21: Não dá pra colocar ele num recipiente...
295 P: Gente o quê que é aquecer?
296 ((alunos falam ao mesmo tempo))
297 P: olha a teoria cinética molecular ...
298 A27: Agitar as moléculas...
299 P: Agitar as moléculas... P gesticula
enfatizando fala de
A27
300 A27: Deixando elas (louquinhas)...
301 P: Como estão as moléculas de vapor?
302 A: Agitadas...
303 P: Agitadas ... Será que é possível ... tem duas moléculas Gesto
soltas andando agitadas ... conseguir que elas fiquem
com mais velocidade ... mais ()...

304 A4: Não...


305 A27: É difícil ... professora...
306 P: o problema técnico de você segurar ((83’)) ... e de o
material agüentar porque elas vão expandir vai ter ... mas
que é possível ... é ... por quê não? ... ((alunos falam juntos
3’)) ficar mais agitado ela consegue ... depois o vapor não
tem nada::::...
307 A25: Mas então ele ... ele vai ser um vapor mais quente...
231

308 P: Vai ser um vapor mais quente ... vai ter vapor a cem
graus ... a cento e vinte graus ... cento e quarenta graus...
309 A25: e o gelo? Tem um gelo mais gelado
...
310 P: Se existe gelo mais gelado? Existe ... sim ... o gelo do
frigorífico ... é mais gelado que da geladeira da sua casa ...
com certeza...
311 A14: Não sei ... o gelo ()
312 P: que existe uma diferença ... vou te dizer ... sim ... vamos
levar ... ahn ... ah ... ((84’)) cuidado com o que é quente e
frio ... que a gente volta pra sensação ... porque que eu
sinto que o gelo é mais gelado ... menos gelado ... é mais
sensação ... () ... existe gelo e temperatura ... sei lá ...
menos dez graus ... e existe gelo e temperatura ... menos
cinqüenta graus...
313 A14: E o gelo seco? O gelo seco é quente
314 A25: mas assim ... ó ...
315 ((alunos falam ao mesmo tempo))
316 P: O gelo seco é outra coisa diferente de água...
317 A25: mas assim ... professora ... o gelo é mais é
temperaturas mais frias ... então ... o ... o ... o vapor ... ele
se expande ... o gelo vai está reduzindo ... e se ele se
contrair demais?
318 P: Começa a encolher ... ocupa menos espaço...
319 A25: ()((fala somente para a professora))
320 P(a): Como é a água muda um pouca de caso ...
320 P(b): bom ... então ... ó ... nós já vimos ... quais hipóteses
que a gente quer verificar ... do que vocês acham que vão
influenciar ((85’)) ... nós já vimos o material que vai utilizar
... agora como é que a gente vai fazer o trabalho? Como é
que a gente vai medir pra verificar? Porque é muita coisa
pra ver... ((pausa 7”)) ... quê que a gente vai ter que fazer
agora pra poder verificar cada uma dessas hipóteses...
321 A21: Só se colocar...
322 A27:fazendo uma por vez...
323 P: Péra ((para os que estão conversando)) ... fazendo uma
por vez? ... por exemplo...
324 A4: A gente... A gente se mistura ... e cada um faz um...
325 A14: Aí depois...
326 A21: Só no caso com tampa e sem tampa ... a gente faz
duas vezes...
232

327 P: Olha ... presta atenção ... nós deveríamos verificar ...
quantidade diferente de água ... isso é uma coisa ... porque
se eu mexo com uma quantidade de água ... o resto tem
que estar igual ((86’)) ... depois ... as lamparinas ... você
falou que pode usar uma ... pode usar duas ...também ... se
eu faço uma ou duas ... eu tenho que medir a água ... para o
volume de água ... saber...
328 A21: Tem que fazer muitas vezes...
329 P: Contando/ muitas vezes...
330 A27: Vai um trampo ... professora...
331 P: Vai um trampo ... então ... como é que a gente resolve o
trampo?
332 A21: Organizando...
333 P: Vamos tentar organizar isso ... só que aí a gente vai ter
que ter ... grupos que trabalhem à sério ... porque a gente
tem que confiar no resultado do outro ... será que a gente
tem - - sh:: ((para um grupo conversando)) - - será que a P aponta para
gente pode fazer o trabalho na classe como um todo ... turma
onde ... um vai fazer ... com mais água ... outro faz com
menos ... outro faz com mais lamparina ... outro faz com
tampa ... e depois a gente faz aí ... um grande painel pra
olharmos TUDO?...
334 A21: dá
335 A14: E discutir...
336 P: E discutir ... e comparar...
337 A4: E ver qual está certo...
338 P: ((87’)) E ver qual que estava certo ... e qual que não
estava ...
339 A25: Se a gente fizer vários()...
340 P: Ahn...
341 A25: Se a gente fizer vários ... (o resultado vai sair melhor...)
342 P: Se a gente fizer vários ... lógico ... se a gente fizer ... sei P gesticula
lá ... seis grupos ... cada um trabalhando de um jeito ... a indicando trabalho
gente vai ter uma confiança muito grande no trabalho do coletivo com toda a
colega ... então ... precisa haver um compromisso da classe classe
de trabalhar legal ... senão ... não pode ... se um não faz o
negócio bem feito ... não vai funcionar ... nós vamos ter que
detalhar isso daí ... olha ... sh:: ... nós vamos ter que P indica todos
detalhar o como fazer ... PRA TODOS AGIREM alunos
IGUALMENTE ... pra gente poder comparar ... tá ... então é
pra todo mundo fazer direitinho ... pra gente não ter que
retomar e refazer nenhuma parte .. .então ... primeira coisa
... ((88’)) vamos anotar o que está na lousa ... e vamos ...
olha gente ... é importante agora ... nós vamos ter uma
seqüência de trabalho ... vocês tão vendo isso ... nós vamos
ter de fazer como medir todo mundo ... igual ... nós vamos
ter que ... depois ... medir ... depois comparar essas
medidas ... então ... vai ser uma coisa seqüencial...
233

343 A: Vou comparar ... professora...


344 P: Tem que haver um compromisso de anotar ... e de que P indica toda turma
esse trabalho de todo mundo ... tá ... nós vamos anotar o
que está na lousa ... todo mundo ... porque vamos estar aí
na outra aula começando o trabalho ... na próxima aula a
gente detalha o plano de trabalho ... o procedimento
direitinho ... pra todo mundo fazer igual ... aí a gente vai
medir o seu ... depois a gente vai comparar todo mundo ...
certo? Não deixa de anotar senão vai ficar perdido aula que
vem ((88’50”))
((alguns alunos vão até mesa da professora para entregar
trabalhos, enquanto outros copiam a lousa))

Lousa no final da aula:


O que acontece com a conforme altitude a Plano de trabalho
temperatura da água quando a água aquece mais Material: béquer
aquecemos? rápido (< altitude) copo de alumínio
Hipóteses: (não dá p/ testar) lamparina 1 ou 2
Aumenta – no começo + devagar quantidade de água - água
e depois + rápido + água → demora mais tripé
Recipiente aberto ou fechado temperatura aumenta termômetro
Depende do material do sempre tampa
recipiente : alumínio ou vidro a temperatura aumenta
Depende da quantidade de até a ebulição e depois se
energia fornecida: + energia + mantém
rapidamente
234

Anexo 4: Aula 5 (17/05/00) – Fitas 3A e 4 – Laboratório Aberto:


planejamento de teste experimental

Mapa de Eventos

Evento Descrição ∆t)


Início (∆
Avaliação - compreendeu a primeira aula, o período do
Evento 1/5 – 0‘(65’)
intervalo entre aulas e treze minutos da segunda aula.
Revisão de hipóteses e definição de procedimentos – a partir
de 65’, P começou a escrever na lousa o que havia sido
65’
Evento 2/5 – discutido na aula anterior (3’). Em 68’, P inicia a revisão da
(20’20”)
discussão iniciada na aula anterior / Separação de diferentes
condições para experimentação
85’20”
Evento 3/5 – Separação dos grupos de alunos
(8’42”)
94’02”
Evento 4/5 – Discussão sobre como fazer as medidas
(6’32”)
P pede aos alunos para copiarem roteiros da lousa e começa
Evento 5/5 – 100’34”
a discutir assuntos relacionados à representação da classe.

Evento 2/5 - Revisão e continuação da discussão sobre variáveis envolvidas na solução do


problema de laboratório aberto iniciada na aula anterior

Assim que alunos terminam a prova (65’) P começa a escrever na lousa um resumo
das idéias discutidas na aula anterior. Há grande agitação na classe enquanto P está
escrevendo e, por este motivo no episódio a seguir, a professora precisa chamar atenção de
alguns alunos.

Linguagem escrita (lousa)


“Problema: O que acontece com a temperatura da água enquanto a aquecemos?
Hipóteses:
1) Aumenta sempre
2) Aumenta até a ebulição e depois se mantém
3) Depende do recipiente estar aberto ou fechado
4) Depende do material do recipiente: vidro ou alumínio
5) Depende da quantidade de energia fornecida: mais energia a temperatura
aumenta mais rápido
6) Aumenta mais devagar no começo, depois mais rápido
7) Dependendo da altitude a água aquece mais rápido
8) Dependendo da Quantidade de água: mais água, demora mais
Plano de trabalho:
Material: água, béquer, copo de alumínio, lamparinas, tripé, tampa, termômetro.”
235

Verbal/ Oral Ação / gestos


T

1 a P: ... ((68’13”)) eu procurei - - dentro do que a gente tinha P vai falando e


falado na aula passada - - a gente estava meio apontando resumo
desorganizado - - hoje eu procurei organizar um pouco mais escrito na lousa
na lousa ... então ... primeira coisa vocês falaram que a
temperatura vai aumentar sempre ... então vai aquecendo ...
aquecendo ... aquecendo e a temperatura vai aumentando ...
aumentando ... depois ... disseram que a temperatura
aumenta ATÉ a hora de ferver ... depois que quando nela
entra em ebulição ela pára de aumentar ... teve outra
hipótese que dizia que começo ela ... ela aumenta mais
devagar ... e depois ela começa a aumentar rápido ...
disseram que depende do recipiente ... se o recipiente estiver
aberto ... ou se estiver fechado ... vai dar diferença no
aquecimento – agora chega ((para aluno que estava
conversando)) -- depois disseram que depende do material
((69’)) ... se usar recipiente de vidro ou de alumínio vai fazer
diferença ... depois disseram que depende da Quantidade de
energia ... até deram a idéia de usar uma lamparina ou de
usar duas lamparinas ... e com mais fornecimento de energia
... a água vai aquecer mais rápido ... depois disseram que
depende da ALTITUDE ... que conforme a altitude a água
aquece mais rápido também ... e que depende da quantidade
de água ... se a gente puser mais água demora mais ... aí a
proposta foi ... como conferir isso daí fazendo uma
experiência ... né ...
1b P: vamos ver como é que a gente faz essa experiência ...
não adianta a gente sair que nem doido ... pegando material
e medir ... sem saber o que vai medir ... então a gente
precisa planejar o trabalho ... pra gente depois poder verificar
... se tudo que a gente falou estava certo ... se não estava ...
onde que a gente tem certeza ... onde que não tem...pra
partir pr/os nossos resultados ... ((70’)) então por isso precisa
... organizar o trabalho ... se cada um ... cada grupo ... for
testar tudo isso ... ele vai ter que fazer ... uma medida com
uma certa quantidade de água ... outra com outra ... outra
com ela aberta ... outra fechada ... outra com ... com vidro ...
outra com alumínio ... outra com uma lamparina ... outra com
duas lamparinas ... então ... demora muito tempo pra pegar
TODOS esses dados ... tá ... a gente vai ficar o ano inteiro aí
... medindo ... medindo ... medindo ... pra ver ... ahn ...tirar
esses valores todos ... então ... a sugestão é ... a gente
dividir o trabalho .. .nos os grupos da classe ... cada um vai
fazer uma parte ... e no fim a gente faz ... uma comparação
de todos ... pra gente poder ver se as nossas hipóteses
estão corretas ou não ... tá ...
1c P: mesmo que a gente vá fazer assim ... cada grupo faz
alguma coisa ... o quê que a gente teria que fazer? ((71’))
bem ... como que a gente ... cada grupo iria trabalhar com
esse material ... como? quê que a gente vai medir?
2 A28: a temperatura da água...
236

3 P: a temperatura da água ... nós vamos medir a temperatura


da água ... se a gente quer um trabalho ENQUANTO a gente
aquece ... como que a gente vai ... ahn ... verificar esse
quanto?
4 A29: põe o termômetro dentro da água...
5 P: põe o termômetro dentro da água ... mas vai ficar olhando
o termômetro como?((ninguém responde)) a gente vai só
olhar?
6 A14: verificar...
7 P: a gente vai ter que fazer o que?
8 A29: ir anotando...
9 P: ir anotando ... agora ... pra eu anotar ... eu vou precisar de
quanto TEMPO aqueceu ((72’)) ... nós vamos olhar assim ...
cada tanto tempo ... como é que eu vou medir ... vou ficar
olhando ... e vou dizer o que?
10 A2: Que a água ferveu...
11 P: Mas não é só o ferver ... se a nossa hipótese só fosse Indica hipóteses na
só essa ... ver se ela aumenta ... para de aumentar ... ou lousa
aumenta depois da ebulição ... dava pra eu fazer isso ...
espera ela ferver ... fica olhando ... se aumentou ou se não
aumentou depois ... mas a gente tem que ver ... se o material
está influenciando no aquecimento ... se a quantidade de
lamparina ... também ... etc. ... então não é só do rela/ deixa
ferver ... e pronto ...

12 A29: Tipo assim ... se colocar na água quente ... o


termômetro não estoura ... não?
13 P: Não ... não estoura ... nosso termômetro é feito já pra isso
...
14 A29: Não ... não esse ... aquele que a gente usa em casa?
15a P: Ah:... o termômetro clínico estoura ... o termômetro clínico Indica lousa
estoura porque ele tem graduação de até 42 graus ... bom ...
o nosso vai até 110 ... 150 ... não tem perigo ...
15b então ... a gente vai ter que medir conforme o tempo vai
passando ((73’)) ... esse tempo que vai passando ... vai dar
também uma outra medida pra gente ... que é uma medida
de ... quanto de energia está chegando pra água ... como
é que eu vou medir o calor que a água está recebendo?
16 A: Termômetro...
17 A22: Termômetro...
18 A: Colocando o dedo...
19 A22: Nossa...que idéia...
20 P: Será que se eu for e colocar o termômetro ... eu meço o
calor que a lamparina está dando?
21 A22: Não...()
237

22 P: Pera aí ... fala aí A4 ... ela fornece o que?


23 A4: Calor ... pr/o negócio ferver ... né ... fogo...
24 P: Vai chegar a energia ... quê que vai acontecer com as
partículas da água?
25 A22: Vai...se agitando...
26 A4: Se movimentar...
27a P: vão ficar mais agitadas ... vão se movimentar mais .. .e é
por isso que a temperatura ((74’)) aumenta ... então pra
gente vêr também ... quanto de energia a gente está
fornecendo ... a gente vai medir pelo tempo
27b ... quem vai fornecer essa energia pra gente?
28 A22: A lamparina...
29 P: A lamparina fornece energia ... se a gente quiser que todo
mundo tenha ... a mesma energia nos grupos ... ou mesmo
se você vai fazer dez vezes a mesma experiência ... como é
que você vai garantir que a lamparina está fornecendo a
mesma energia?
30 A22: Termômetro...
31 A4: Aí não tem como...
32 P: Nós não temos termômetro que agüenta a temperatura Pegando lamparina
da lamparina ... como é que a gente vai garantir - - esse é sobre sua mesa
um problema técnico importante - - como é que eu vou
garantir que se eu fizer ... se eu usar duas lamparinas ...
33 A14: pela altura do fogo ((outros alunos falam ao mesmo
tempo/inaudível))
34 P: como é que eu garanto que elas vão medir...vão Mostrando lamparina
fornecer o mesmo calor? ((75’))
35 A: Pela quantidade de ... do álcool...
36 A14: Pela quantidade de álcool...
37 P: Pela quantidade de álcool que tem aqui dentro? Aponta p/ lamparina
38 A23: Pelo tamanho da lamparina...
39 P: Pelo tamanho DA lamparina?
40 A7: Êh:... já começo ... oh:...
41 A29: Do pavio...
42 P: Pelo tamanho DO pavio...
43 A4: pela quantidade de álcool não é? (( outros alunos falam
ao mesmo tempo / inaudível))
44 A7: Tamanho não é documento ... professora...
45 A29: Ah::... verificar se os pavios são do mesmo tamanho...
238

46 P: Verificar se os pavios estão do mesmo tamanho... Gesticula indicando


tamanho do pavio da
lamparina

47 A22: Sim ... e a quantidade de álcool que tem nela...


48 A4: Isso tudo junto ... quantidade álcool
49 P: Mas a quantidade de álcool que tem aqui dentro é
importante/
50 ((alunos falam ao mesmo tempo))
51 A21: olha pelo tamanho da chama...
52 A14: Aí a senhora coloca menos de álcool em um ... aí
espera acabar...
53 P: Pera aí um pouquinho ... se eu colocar menos numa...
54 A14: E a outra cheia ... quando acabar dessa ... a outra vai
estar ...
55 P: Ah:... tá ... então a gente tem que garantir que tenha
álcool pra durar a experiência inteira...
56 A14: o tempo que for necessário...
57 P: O tempo que for necessário ... tá ... então a gente garante Indica pavio
... e o tamanho? ((76’))
58 A22: do pavio
239

Verbal
Ação / gestos
T
Oral Escrito [quadro]

59a P: do pavio ... como as lamparinas são Gesticula sobre


aproximadamente iguais ... a distancia lamparina
até o béquer também vai ser mais ou
menos igual ... os tripés são iguais ... né
... e também se eu colocar um béquer
encostando aqui ... e outro béquer mais
longe ... provavelmente vai chegar menos
... energia no béquer ... né ...

59b então ... uma providência ... “procedimento Escreve na lousa:


primeiro...igualar...os pavios...das s:
º
lamparinas ... e ... estar com todas ... 1 ) Igualar os
para ((77’)) ... considerar que todas ... pavios das
fornecem ... a mesma energia ... em cada lamparinas e
minuto acesas ((P fala baixo enquanto estar com
alunos conversam)) então essa é uma todas cheias
tarefa ... essa é uma tarefa inicial ... pra para poder
gente garantir que todo mundo vai trabalhar considerar que
com a mesma quantidade de energia ... e todas fornecem
também pra garantir que o que foi proposto a mesma
na aula passada ... que pra gente aumentar energia em
a energia ... a gente vai usar uma cada minuto
lamparina ou duas lamparinas ... então ... acesas”
vamos supor quem está usando duas
lamparinas ((78’))vai estar fornecendo duas
vezes mais energia do que quem está
usando uma ... então a gente vai ter
possibilidade de comparação ...
60a P: quantidade de água ... nós vamos Vai até armário pegar
precisar trabalhar com duas quantidades de um béquer / derruba
água e vai ser medida a quantidade de um béquer no chão /
água ... vou pegar o béquer que a gente alunos comentam
vai usar ... ((79’)) nós vamos usar um
Mostra béquer
béquer desse tipo ... esse béquer está
º
marcado aqui cem e duzentos ml ... a gente “2 ) Béquer
pode usar essas duas marcas mesmo ... aí com 100 ml de
Escreve na lousa:
a gente tem uma quantidade de água e o água e 200
dobro da quantidade de água pra poder ml”))
comparar ... então a gente vai usar o
béquer... com ... 100 ml de água ... e ...
200ml ... que mais? Quantidade de água ...
ah copinho de alumínio ... eu tenho um
copinho de alumínio ... ((80’)) nós vamos
ter que um grupo fazer no vidro e o outro
no alumínio pra gente poder comparar os
dois ... só que o copo de alumínio não tem
marcação ... então a gente vai ter que
medir no béquer e botar no copo de
alumínio ... e a tampa ... com tampa e sem
tampa ... em vez de usar uma tampa ((
alunos comentam)) - - béquer não tem
“100 ml de água
240

tampa - - agora a gente pode usar o com vidro


seguinte em vez de tampar usar papel sem tampa
alumínio ... o papel vai ficar no lugar da
1 lamparina”
tampa e a gente pode furar pra pôr o
termômetro ((81’)) ... se não teria que ter
uma tampa furada pra poder colocar o Escreve na lousa:
termômetro ... né ... então com papel
alumínio está bom? Pode ser? ((alunos
concordam)) ... então vamos ver como é
que os grupos vão trabalhar? A gente vai
ter que dividir agora ((apaga parte da
lousa)) ... se a gente mudar - - presta
atenção pra gente saber como vai fazer - -
se a gente mudar muitas coisas ... a gente
perde a comparação ... então nós vamos
ter que ir mudando uma coisa de cada vez
... então vamos começar com cem ml de
água ... ((82’)) cem ml de água ... um vidro
... sem tampa ... uma lamparina ... certo?
60b Então aqui eu tenho uma quantidade de
água padrão ... um material como
recipiente ... uma situação sem tampa e
uma quantidade de energia fornecida - -
pára a conversa - - se eu vou pr/o grupo e
fizer esse ...pra eu poder comparar a
quantidade de água como é que ela
influencia ... como é que eu vou fazer?
61 A14: mudando a temperatura ... abaixa o
()
62 P: mudar o que?
63 A14: a água
64 P: mudar a quantidade?
65 A14: isso
66 P: e o resto?
67 A14: a senhora quer fazer o que mesmo?
((83’))
68 P: pra gente poder comparar como que a
quantidade de água influencia
69 A: aumenta lá
70 Als: inaudível
71 P: muda só quantidade de água? ... esses “grupo II- Escreve na lousa:
dois - - vou chamar de um e dois - - pra 200ml
gente comparar se a quantidade de água vidro
influencia ... ((84’)) agora pra gente s/ tampa
comparar a influência da energia 1 lamparina”
72 A12: aumentando as lamparinas
241

73 P: duas lamparinas e o resto ... fica : “grupo III- Escreve na lousa


igual ... agora precisa comparar o que mais 100ml
vidro
s/ tampa
2 lamp.”
74 A: a altitude
75 A: com tampa e sem tampa
76 P: a altitude não vai dar ... a não ser que
alguém se disponha ... que vai viajar
mesmo no fim da semana ... que vai levar o
béquer ... o termômetro pra levantar os
dados ((vários alunos falam ao mesmo
tempo))
77 A15: professora ... eu vou pra praia não
essa semana ... a outra
78 P> então podemos combinar
79 A: e o recipiente
80 P: e o recipiente? Como é que fica pra “grupo VI- Escreve na lousa:
mudar o recipiente? 100ml
Alumínio
S/ tampa
1 lamp.”
81 A: alumínio
82 P: ((85’)) falta o que? Já vimos este ... Indica condições
este ... este ... se ele está aberto ou experimentais
fechado ... escritas na lousa
P escreve outras
“grupo V- 100ml condições na lousa:
vidro
((85’20”))
c/ tampa
1 lamp.
Grupo VI- 100ml
alumínio
c/ tampa
1 lamp”

Evento 3/5 - Separação dos grupos / a divisão é baseada nos grupos já formados em
atividades anteriores / P anota na lousa as condições experimentais para cada grupo / P
fala da necessidade de compromisso entre os grupos ((começa em 85’20” e vai até 94’02”))
94’02” há grande agitação na sala / P começa a questionar alunos sobre como fazer as
medidas, mas ainda há muita conversa ...
242

Evento 4/5 - Discussão sobre procedimentos de medida

Verbal
T Ação / gestos
Oral Escrito
[quadro]
1 P: ((94’56”)) vai chegar ... nós vamos medir
a água ... alguém vai ver se as lamparinas
estão certas ... vai deixar tudo igualzinho ...
vamos medir a água ... pegar a água ...
cada grupo vai pegar o tripezinho ... vai
colocar lá nas mesas ... cada grupo vai
trabalhar ... vai fazer o quê? Pegar o
Termômetro e faz o que?
2 A?: pega o material pra discussão ...
professora
3 P: Material todo está aqui... quê que a
gente vai fazer?
4 Alunos: Medir a temperatura da água...
5 P: Mede a temperatura da água...
6 A22: Exatamente...
7 P: ANTES de começar a esquentar?
((quase afirmação))
8 A22: Isso...
9 A4: antes e depois
10 A29: e durante...
11 P: Antes e durante ... então ... como a “- marcar a Escreve na lousa:
gente vai medir o durante ... porque o antes temperatura da
é pegar o copinho de água ... botar lá o água antes de
termômetro e marcar ... então ... medir ... iniciar o
marcar ... a temperatura da água ... antes aquecimento”
... de iniciar ... o aquecimento ... como é
que a gente vai medir o durante? ((96’))
12 A29: A gente pode medir de dez em dez
minutos...
13 P: Dez em dez minutos é muito tempo...
14 A29: Cinco em cinco...
15 A15: Dois em dois minutos...
16 P: De um em um minuto...
17 Alunos: Não...
18 A: É muito pouco tempo...
19 A21: De cinco em cinco...
20 A: De dois em dois...professora...
21 P: Dois em dois minutos? ((afirmação))
243

22 Alunos: Cinco... “medir de 2 em


2 minutos a
((Alunos conversam enquanto P escreve
temperatura”
na lousa))
23 P: ó ... sh::... aqui outro cuidado ... então ... cronômetro” Acrescenta o item
falta no nosso material aqui ... um “cronômetro” à
relógio com cronômetro ... esse eu não relação de materiais
tenho ... então ... por favor ... cada um dos que está na lousa
grupos ... cada grupo...providencie um
relógio que tenha cronômetro ((97’)) ... que
aí a gente vai...
24 A: O seu tem né ()...
25 A: O meu também...
26 P: Acionar o cronômetro - - Marcelo ((P faz
pausa de 12”em meio a muita conversa)) --
a gente vai acionar o cronômetro na hora
que começar a aquecer... ((Alunos
conversam))
27 P: Não vão prestar atenção...né? ... não vai
dá pra fazer a aula que vem desse jeito
((pausa de 10”/continuam falando)) aciona
o cronômetro na hora que colocar a
lamparina lá e aí a cada dois minutos ... vai
marcando ... pra marcar ((vai até a lousa))
((98’)) nós vamos marcar numa tabela
temperatura ... tempo ... pra não ter erro
nós vamos ter que fazer o seguinte ... o tempo temperatura
cronômetro não pode parar - - se a gente
parar o cronômetro pr/o outro falar a
temperatura ... até ligar o cronômetro ...
zerar ... ligar de novo e marcar mais dois
minutos ... passou muito mais do que dois
minutos - - então ... aciona o cronômetro ...
passou dois minutos ... quem está cuidando
do cronômetro tem que falar já ... o outro
tem que ler a temperatura e os outros vão
anotar - - se não houver esse trabalho
conjunto ... não dá pra fazer ... o mesmo
cara Ter que olhar o termômetro ... olhar a
temperatura não dá ... por isso precisa pelo
menos três presentes mesmo - - um diz o
“já “ na hora do tempo ... o outro diz o
número da temperatura
28 A: até a água ferver
29 P: até a água ferver só?
30 A: até a água ferver e ( )
31 unos falam ao mesmo tempo))
244

32 P: tem que esperar um pouco depois que a


água ferver porque a gente tem uma
hipótese que diz que depois a temperatura
não aumenta mais ... e a outra diz que
depois continua aumentando... não pode
começar ferver ... parou ... começou a
ferver tem que continuar marcando mais
um tempo...pra ver se a temperatura
continua a aumentar ou não ...
33 A: e aí vai levar quanto tempo?
34 P: Ahn...
35 A: e aí vai levar quanto tempo?
36 P: Não sei ... nós vamos ver...
37 A4: Depende da quantidade da água?
38 P: Depende da quantidade de água ...
depende das lamparinas ... nós vamos
ver...está claro o quê que vocês vão fazer?
((100’))
39 Alunos: Tá...
40 P: Anotem isso aqui direitinho ... como vai
marcar ... anota direitinho
41 A21: Oh...professora...
42 P: na próxima aula .. então ... nós já vamos
começar pegando o material ... medindo ...
separando ... fazendo ... tá
43 ((Representante de classe vai dar recado /
final da aula 100’34”))
245

Anexo 5: Aula 6 (24/05/00) – Fitas 5 e 6 – Laboratório Aberto: coleta de


dados e análise qualitativa

Mapa de Eventos

Evento Descrição Início (∆t)

Evento 1/6 Início da aula / distribuição de materiais – 0’ (22’)


Lousa: relação das condições de experimentação que cada
um dos seis grupos de alunos deve seguir.
Materiais: Os materiais a serem utilizados pelos alunos são
dispostos em uma carteira localizada no centro do espaço
entre os lugares dos alunos e a lousa.
Ações:
- P convida alunos a iniciarem seus experimentos com
base nas condições estabelecidas para grupo, que estão
relacionadas na lousa, e utilizando os materiais dispostos
na frente da classe.
- Als começam a se reunir em grupos, identificar as
condições de experimentação relacionadas na lousa e
respectivos materiais. Alguns vão ocupando seus lugares
nas bancadas, enquanto outros vão buscar materiais.
Durante este período, P faz algumas recomendações
sobre as medidas, mencionando a necessidade de medir
T inicial.
Evento 2/6 Coleta de dados – Alunos reunidos em seis grupos 22’ (25’42”)
distribuídos nas bancadas (início quando alunos estão
reunidos no grupo aguardando momento de acender as
lamparinas)
Evento 3/6 P pede para Als apagarem lamparinas. Grupos começam a 47’42” (2’18”)
se desfazer. Alunos finalizam experimentos e voltam a seus
lugares.
Enquanto alunos terminam experiência, P desenha uma
tabela na lousa para relacionar dados de temperatura e
tempo de cada um dos seis grupos
Intervalo Durante o intervalo de 5 minutos, os alunos têm a liberdade 50’ (5’)
de sair da sala para ir ao banheiro ou tomar água. Muitos
permanecem na sala dando continuidade às atividades
iniciadas na aula anterior.
ª
Evento 4/6 Início da 2 aula / Chamada – 55’ (5’)
A medida que alunos vão retomando seus lugares na classe,
a professora vai fazendo a chamada.
Evento 5/6 Retomando atividade – P retoma o problema que os alunos 60’ (7’17”)
estão investigando, explicando qual será a próxima etapa.
Para dar início à análise dos dados coletados, P pede aos
alunos que escrevam na lousa os resultados obtidos por seus
grupos.
246

E6 – 67’17”
Análise (22’18”)
qualitativa
dos dados
(fase 4)
E7 – Início P apresenta o papel milimetrado, mencionando suas 89’35”
da vantagens em relação ao quadriculado; fala de como os (15’25”)
confecção gráficos serão construídos, que cada aluno fará o seu;
de um começa a entregar folhas para os alunos) alunos sentados
gráfico para em seus grupos (carteiras) há alunos conversando e alunos
os dados prestando atenção
Sinal Fim da aula 105’

Evento 2/6 – Coleta de dados

Cena Ação Linguagem oral

(1) A1: olha no relógio de pulso e fala A1: oh ... já são dez e
vinte
A2: pega as duas lamparinas, colocando-as na
altura dos olhos. Compara os pavios, enquanto fala A2: essa aqui tem mais
com A3. álcool?
A3: olha para A1
(2) A1: Fala com A3 A1: já são dez e vinte
A2: Coloca lamparinas embaixo do tripé e fala A2: essa aqui ( ) maior
A3: segura o termômetro fora do béquer e fala A3: ( ) ô professora
(3) A2: pega caixa de fósforos com grupo ao lado e
prepara –se para acender lamparinas
A3: ninguém acendeu
A3: olha outros grupos e fala com A2 ainda
A1: fala com A2 A1: não acende ainda
(4) A2: olha na direção da professora, segurando o
palito de fósforo, pronto para acender as
lamparinas.
(5) A2 e A3 ajeitam lamparinas embaixo do tripé
A4: observa as ações dos colegas atentamente e
procura ajudá-los.
A2, A3 e A4: mostram um sorriso de excitamento
enquanto colocam as lamparinas sob o tripé.
(6) A3: pega uma caneta e prepara-se para escrever, A1: vai começar
enquanto segura o Termômetro fora da água.
A4: ( ) muda ... não é
A4: fala para A2 melhor? Um lá e outro
aqui?
247

(7) A2: move as lamparinas cuidadosamente sob o


tripé.
A4: ajuda A2
A3: observa A2 e A4, segurando o termômetro fora
da água.
(8) A4: curva-se para frente para verificar a posição A1: ah ... tá ótimo
das chamas embaixo do tripé
A1: eu já comecei
A2: observa os movimentos de A4.
(9) A4: fala para A3 A4: você quer que eu
anote?
A3 e A4: trocam de posição na bancada
(10) A4: lê a folha de papel em que estão registrando os
dados e fala para A3
A4: o que você fez aqui?
A2: aproxima-se de A4 e verifica as anotações de
A3
(11) A1: vira-se para A3 e fala A1: vê a temperatura
A3: segura o termômetro fora do béquer
A2: move seu braço em direção a A3 e pega o A4: dez ... trinta e nove ...
termômetro dez ... vinte e um? [lendo o
papel onde A3 havia
A3: entrega termômetro para A2
começado a anotar os
dados]
(12) A2: coloca o termômetro dentro da água A1: vê a temperatura
A4: já passaram dois
minutos?
(13) A1: olha para A4 e fala, vira-se para o grupo ao A1: não ... quando
lado, ficando de costas para seu grupo. passar eu falo
(14) A2: está no centro do grupo, olha para A1 e A4, A2: “( ) [p/ A1] ... fica
controlando a medida de tempo e anotação dos pronto aí [p/ A4]”
dados.
A3: posiciona-se atrás de A2 e A4, esforçando-se
para observar o termômetro à distância.
(15) A2: ajusta a posição do termômetro dentro da água,
de modo que não precise tocá-lo para fazer as
medidas.
A4: o quê que é dez ...
A4: verifica o que está escrito no papel e toma
vinte e um ? [lendo
notas.
anotações de A3]
A2: vira para A3, que está olhando distraída para
A2: dez ... vinte e um
outro grupo
[repete questão de A4]
(16) A1: olha relógio e fala A1: faltam cinco
segundos
A2: pronto para ler a temperatura
A3: observa o termômetro à distância
A4: pronta para escrever
248

(17) A1: fala A1: vai ...


A2: olha termômetro A2:trinta e oito
(18) A3: estica o braço para tocar o termômetro e fala A3: trinta e oito [em voz
baixa]
A2: bloqueia com o braço a ação de A3
A1: olha a escala do termômetro à distância,
tentando verificar a temperatura A2: trinta oito
(19) A4: fala com A2 e anota valores A4: trinta e oito?
A2: movimenta a cabeça afirmativamente
A1: parece surpreso A1: trinta e oito?
(20) A4: fica em pé e verifica temperatura
A3: toca o termômetro delicadamente, tentando ler a A3: quarenta e um [fala
temperatura de sua posição distante e fala. em voz baixa]
(21) A4: observa as anotações e fala A4: em dois minutos ...
aumentou vinte graus!
A2: _____vinte graus
A3: olha o termômetro
[fala junto com A4]
(22) A1: fala A1: vai ... agora
A2: observa termômetro e fala A2: cinqüenta e oito
A3: olha rapidamente para outro grupo
A4: verifica anotações e fala A4: tá de vinte em vinte
graus
A2: se pode ver ... o
próximo vai ser ...
A1: olha para outro grupo, enquanto aguarda
A4: setenta e oito
passagem do tempo
A2: o próximo vai ser?
A4: setenta e oito
(23) A2: fala para A4 A2: vamos ver se seus
cálculos tão certos

(24) A1: olha o relógio


A2: olha grupo ao lado. Fica de costas para seu
grupo. Volta para o grupo. Curva-se para observar
A2: o álcool não acabou
as lamparinas sob o tripé e fala
A3 e A4: comentam algo inaudível
A4: ô professora ... ô
A1: observa colegas ser intervir
professora ... a quantidade
de álcool num tem que ser
a mesma aqui?
(25) Estudantes: olham para a direção em que P está A4: não
Estudantes: prestam atenção no outro grupo,
embora mantenham atenção sobre o experimento.
249

(26) A1: olha o relógio A4: ô [p/ A1] ... num é o


tempo ainda?
A2 e A3: observam termômetro
A2: setenta e cinco ...
ainda tão faltando três
graus
A1: tá faltando cinco
segundos
(27) A1: fala p/ A2 A1: vai ... vê aí
A2: verifica temperatura A2: setenta e um e meio
(28) A1, A3 e A4: estão surpresos A4: setenta e um?
A2: claro
A3: toca levemente o termômetro, tentando lê-lo à A3: setenta e um?
distância (questão sem muita
ênfase)
A1: tá louco!
(29) A2: verifica a temperatura e surpreende-se A2: setenta e sete
A3: setenta e sete
(30) A1: verifica a temperatura no termômetro A1: setenta e oito
A2: não ... setenta e sete e
meio
A3: setenta e sete
A2: e meio
A4: reclama devido à indecisão dos colegas
A4: e meio?
A3: não ... setenta e sete
(31) A1: enquanto controla o tempo, observa grupo ao
lado
A2: observa o conjunto experimental e fala
A2: tá evaporando
A3: observa o conjunto experimental
(32) A2: fala com grupo ao lado A2: tá evaporando
A3: observa o conjunto experimental
A1: olha para o conjunto experimental e fala para A1: tá indo
A4 gradualmente?
A4: observa dados em suas anotações A2: ( )
A4: daqui pra cá
[apontando dados na
tabela] ... tá indo de vinte
em vinte
(33) A1: olha conjunto experimental A1: sempre de vinte em
vinte?
A4: verifica dados
A4: não ... nos três
A2: olha conjunto experimental
primeiros
A3: olha conjunto experimental
A3: vamos ver se ele vai
até cem graus
250

(34) A1: olha conjunto experimental A1: já vai chegar em cem


A2: olha conjunto experimental
A3: olha conjunto experimental
(35) A1: olha relógio A1: agora
A2: verifica temperatura A2: noventa e sete ...
ainda
A3: olha conjunto experimental
A3: noventa e sete
A4: toma notas
A4: noventa e sete
(36) A2: olha conjunto experimental A2: noventa e sete e meio
... eu acho que a água
pode ir só até cem
A3: ( )
A4: fala com colegas, fazendo gestos com as mãos,
A4: ( )
indicando que a temperatura da água está
constante
(37) Estudantes: prestam atenção ao conjunto A2: até ela vai evaporar ...
experimenta vai chegar até cem

(38) A1: olha relógio A1: vê ... vê agora


A2: a mesma
Todos Estudantes: lêem a temperatura A1: noventa e sete?
A3: noventa e sete e meio
A2: será que o limite da
água não é noventa e sete
e meio?
A1 e A2: professora
(39) P: aproxima-se do grupo
Estudantes: olham para professora e A2 fala A2: o limite da água é
noventa e sete e meio ...
P: sorri e move a cabeça afirmativamente,
professora?
expressando ‘sim
(40) P: verifica dados dos estudantes Estudantes: ( )
(41) P: oh ... espera mais um
pouquinho
A2: não passa de cem
Alunos prestam atenção em P
P: é uma das nossas
hipóteses
A1: continua controlando tempo
A2: olha [p/ A1]
(42) P: deixa o grupo
(43) A1: olha relógio
A2: divide atenção entre experimento e observação
do grupo ao lado
A3: tá subindo ... tá
A3: observa Termômetro alcançando noventa e oito
251

(44) A1: vai ... agora ... vê aí


A2: está distraído
A3: lê temperatura e fala com pouca segurança A3: noventa e oito ... não
é?
A4: aguarda momento de anotar novo dado
A4: noventa e oito
(45) A3: confirma o que tinha dito movendo a cabeça
A2: olha o Termômetro A2: eu acho que não é ...
é noventa sete ...
A3: deixa o grupo e vai falar com a professora
sessenta e sete
A4: fica em pé e verifica termômetro
(46) A3: fala com a professora fora do grupo
A1: fala com a professora e A3
(47) A3: volta para seu lugar na bancada A3: noventa e sete e oito
P: aproxima-se do grupo P: é ... se está perto de
noventa e oito ... então ...
A3: observa termômetro
noventa e sete e meio ... a
P: deixa o grupo gente avalia o intervalo ...
não alcançou noventa e
oito
(48) A2: brinca com A4
A3: observa termômetro A3: agora ... alcançou
noventa e oito
A2: olha termômetro
A2: não alcançou noventa
e oito ... o limite da água tá
caindo
(49) Estudantes: observam conjunto experimental A3: alcançou ... sim
A2: o nível da água tá
caindo
A1: olha relógio
A3: caindo
A4: vou marcar aqui ...
menos água
(50) A4: toma notas A1: agora ... vai
A3: lê a temperatura A3: a mesma
A2: aproxima-se de A4 e faz brincadeiras
(51) A3: observa termômetro e surpreende-se A3: espera ... tá
diminuindo ... olha
A4: olha para A3
A4: mesmo?
A3: foi para noventa e sete
(52) A2: lê temperatura e faz uma expressão afirmativa A4: que isso?
A1: olha o relógio A3: que isso ... ô
professora
252

(53) A1: vai ... agora


A3: lê temperatura A3: noventa e sete
A4: anota a temperatura A4: noventa e sete
(54) P: aproxima-se do grupo P: está diminuindo?
Estudantes: observam a professora
P: aponta béquer com água P: olha o que está
acontecendo ... está
metade fora da água
(55) A1: olha o relógio A1: vai ... vê a temperatura
A4: olha para A3 A4: noventa e sete?
A3: lê a temperatura A3: é
P: observa o experimento P: vai ter que parar porque
não tem mais água
A2: a água tá diminuindo
... a gente tá anotando
aqui
(56 P: é ... e o termômetro
está fora da água ... vocês
já fizeram bastante ...
A2, A3 e A4: apagam as lamparinas e observam o pode parar
termômetro fora da água

Evento 6/6 – Análise Qualitativa

T Linguagem Oral Híbrido

1 P: ((67’17”)) primeira coisa ... vamos olhar os valores ... ver Lousa – Tabela
o quê que a gente pode achar de SEMELHANÇAS e de relaciona dados de
diferenças ((muita conversa na sala)) shhh ... quê que tem tempo e temperatura.
de IGUAL ... primeiro ... quê que tem () ...

2 A: temperatura ...

3 A2: praticamente só ()

4 P: a temperatu/ -- vamos parar a conversa ... agora é sério


((pausa – 8”)) – primeira coisa ... tem igual a temperatura?
((68’)) Inicial ... todo mundo começou mais ou menos com a
mesma temperatura ... porque? ((pausa 4”))

5 A: ( ) a água ...

6 As: ((inaudível))

7 P: usamos a água da torneira ... ((comentários de alunos –


7” )) ... então... primeiro... todo mundo começou com a
temperatura mais ou menos igual ... SEGUNDA coisa que
253

dá pra gente tirar aí ... quê que dá pra perceber mais?

8 A14: que todos... mais ou menos... pararam ao mesmo


tempo... a água...

9 P: TODOS pararam ao mesmo tempo ... o que você quer


dizer com isso?

10 A14: porque a água foi quase noventa e sete... mais ou


menos...

11 P: ah:: ((aluno fala algo)) a temperatura ... a temperatura de


TODOS ...

T Linguagem Oral Híbrido Linguagem Escrita

12 A2: quase todos... ((69’)) Tabela

13 P: QUASE todos ... mas ... ah:: noventa e P escreve na lousa:


sete ... noventa e sete e meio ... noventa e
“Da comparação com os
sete ... noventa e oito ... noventa e seis e m/
resultados de todos os
... noventa e s/... – continuação da quinta -
grupos, temos:
... noventa e seis e meio... noventa e seis e
nove... noventa e sete... então -- da a) Todos começaram com
comparação com os resultados em todos a mesma temperatura
os grupos ... ((pausa de 30’)) ... em todos (do ambiente)
... a temperatura estabilizou próximo:: de
b) Em todos a
noventa e sete graus... ((70’))
temperatura estabilizou
o
próximo de 97 C”

T Linguagem Oral Híbrido Ações /


gestos

14a P: COMO a gente viu que estabilizou próximo do Tabela Indica lousa
noventa e sete ... naquel/... naquela hipótese que
tinha... a temperatura ia continuar subindo...ou ela iria
ESTABILIZAR ... já temos uma comparação... p/ que ó...
mesmo mudando o recipiente... mesmo tampando... sem
TAMPAR... não houve... alteração... só vai faltar uma
comparação... que o Bruno vai fazer... na praia... e
depois ele traz... pra gente vê se dá também se dá
noventa e sete graus... né...

14b P: QUE mais... agora que falou... que com mais


lamparina aquece mais rápido... que com mais água
aquece mais devagar... será que dá pra gente perceber
isso nos resultados? ((71’))

15 A14: dá...

16 ((comentários de alunos))

17 P: dá?
254

18 A14: pode... por exemplo...()

19 P: os dois primeiros... ó... fizeram::: com as mesmas Indica na


condições... né... era a lamparina... era o béquer... era tabela dados
aberto... os resultados são:: próximos ((diminui a do primeiro e
entonação, como se mudasse de idéia sobre sua do Segundo
afirmação)) ... grupos.
Aproxima-se
da tabela e
confere os
resultados
20 A4: não...

21 A14: não ...

22 P: não? ((Quase uma afirmação))

23 A4: sim...

24 A14: alguns não...()

25 A4: ___________no começo não ... no começo... (ficou


diferente) ()... dezoito... trinta e dois... cinqüenta e três...
26a P: dezoito ... trinta e dois ... cinqüenta e três ... dezenove
... trinta e cinco ... cinqüenta e quatro ((A4: é)) ...
setenta... setenta e cinco... ((A: setenta e quatro)) oitenta
e cinco ... oitenta e nove ... as diferenças são de::... mais
ou menos... o que ... quatro graus... ((4’ pause)) ((72’))
26b P: DÁ uma outra... do primeiro pr/o segundo... qual era Apontando na
a diferença? tabela o
conjunto de
dados do
Segundo e do
terceiro
grupos.

27 A: tinha mais água...

28 P: tinha MAIS água... aumentou mais devagar Quando


tinha mais água?
29 A4: aumentou...

30 A: aumentou ... pouca coisa...

31a P: olha... aqui... a temperatura estabilizou::: entre doze e


catorze minutos... a deles::... perto dos vinte minutos...
então... DEU diferença... deu diferença... demorou
mais::: pra atingir a fervura ...
31b P: na OUTRA – do um:: pr/o três – Qual é a diferença?

32 A14: a lamparina?
255

33 P: duas lamparinas...

34 A14: estabilizou

35 P(a): a água estabilizou:: ((73’)) bem antes do tempo...


né... então... realmente ela atingiu a temperatura de
ebulição... mais rápido...
36 P(b): agora AQUI começa a mudar o copinho? Ou ainda
não?
37 A: com tampa

38 P: o de vocês era::: alumínio?... ah:: não com tampa...


COM TAMPA ...dez ... doze minutos:: é::: não teve
grande: diferença ... tampado ou não ... né?
39 P: quem mais fez com tampa aqui? ((pausa – 6”)) qual
era o de vocês?
40 A19: o nosso?

41 P: é

42 A19: aquele ali que tem um monte de noventa e


setezinho ..,
43 P: ah ah ... só o seu?

44 A19: não ... ali ó ... tem dezoito ... quarenta e um ...
cinqüenta e quatro ... sessenta e dois ...
45 P: é esse aqui

46 A19: isso

47 P: de vocês estava com tampa também ... ((74’))

48 As: tava

49 P: com o copinho de alumínio aqueceu mais rápido? Ou


não?
50 A19: num sei ...

51 A: aqueceu ...

52 A?: não...

53 A?: não ...

54 ((vários alunos falam ao mesmo tempo))

T Linguagem Oral Híbrido

55 P: por que será:: por que será... – vamos parar um pouquinho na...
estabilidade - ... por que será que ... pra certas pessoas... deu uns
256

números bonitinhos ... redondinhos ... sempre iguais.... e pra outras ...
deu flutuações ... porque aqui tem ... ninguém pode dizer que é uma
GRANDE diferença... né... está dentro de um grau -- noventa e seis ...
noventa e sete ... nove/ -- não saiu de um espacinho de um grau... ((75’))
56 A4: o último...
57 P: o último...
58 A21: ________noventa e seis... noventa...
59 A: não
60a P: não saiu de dentro de um grau – de noventa e sete... noventa seis e
dois... até noventa e seis e nove -- não saiu de dentro de um espacinho
de um grau ... por quê que pra alguns teve mais isso ... pra outros teve
menos? aqui também teve ... ó... noventa e seis... noventa e sete...
noventa e seis e meio... noventa e sete... noventa e sete e meio...
noventa e sete e oito... noventa e sete...

T Verbal Oral Ações / Gestos

60b P: COMO é que a água aquece?

61 A4: como é o quê?

62 A14: ______gradualmente...

63 P: como que ela aquece? Gradualmente... como? Gesticula

64 A2: as moléculas se ... _____ começam a se movimentar... entre


aspas... começam ir uma (contra) a outra ... e começam... A2 gesticula
formando
círculos no ar
65 A14: ____________ as moléculas se agitam...

66 P: como é que forma (essa etapa)... ((76’))

67 A4: bolinha... P mostra intenção


de ajudar, mas se
contém

68 A2: um círculo... A2 move suas


mãos formando um
círculo no ar

69 A24: de cima pra baixo...

70 A2: circulando...
257

T Linguagem Oral Visual Ações / Gestos

71 P: será que é essa diferencinha – a Gesto 1 Gesto 2


gente manteve o Termômetro no lugar...
pelo menos deveria ter mantido... né –
será que essa diferencinha... pode ser
causada pela água da convecção (vai e
volta)?

72 A2: eu acho que pode... ()

73 A4: pode::...

74 P: porque se é corrente de convecção...


ela não está:... inteira -- a água – ao
mesmo tempo na mesma temperatura...

75 A4: é::

76 P: será ... que ... no lugar onde ficou o Mantém uma mão e move
Termômetro a gente tem variações a outra em círculos
porque::... sai água mais quente ...
entra água mais fria e etc.?

77 A24: não::... porque ela tipo assim... ela


está quente...

78 A4: ___não porque a água já tá quente...

79 A24: () ela sobe... () desce... vai A24 move as mãos de cima


descendo... para baixo

80 P: então você tem o movimento de água Desenho na P desenha na lousa


mais quente SUBINDO e de água mais lousa
fria::...________ ... descendo

81 A24:__descendo... aí equilibra...

82 P: ... mas o TEU termômetro está no P aponta o termômetro


MEIO dessa água que está em desenhado na lousa
movimento

83 A14: mas (porque) o nível da água


também abaixa ...

84 P: tem outro problema... o NÍVEL da


água vai baixando::... porque ela vai...
evaporando::... teve um dos grupos:... –
quem foi que o Termômetro começou
258

ficar fora da água?

85 A24: o nosso...

86 P: foi o de vocês ... quando a gente Termômetro Mostra um termômetro


PERCEBEU... começou a abaixar a enquanto explica
temperatura ... por quê? Porque... a
PARTEZINHA do termômetro... que
tem o MERCÚRIO ... a água começou
a ficar por aqui ... então já tinha
mercúrio que estava FORA da água...
então aí já está medindo de um jeito
DIFERENTE... né... você não está com
ele mergulhado na água... então isso
pode ALTERAR ... ((78’))

T Verbal Oral Visual Ações / Gestos

87 P: que mais poderia alterar esse


resultado pra não ficar::... todo:: fixo...
será que o CUIDADO de ver o
Termômetro... também...

88 As: tem... ((alunos falam juntos))

89 P: será que::... teve gente que ... olhou Desenho na P desenha na lousa
ali... os dois tracinhos... e o mercúrio lousa
estava por aqui:::... ele falou:: ah:::... isso
é noventa e sete mesmo ... tudo bem... P aponta para o desenho

90 A: o Augusto...

91 A14: ele arredondou somente...

92 A: noventa e oito... noventa e oito...

93 P: arredondou?

94 A14: ele pode ter arredondado()

95 A2: sim...
259

96 P: o ar-re-don-dar pode dar exatamente Desenho Apaga o desenho


essa diferença ... três ou quatro décimos
pra cima ou pra baixo ... você pode até
arredondar... ((comentários)) ... tem uma
dificuldade na LEI-TU-RA ... isso a gente
vai perceber que tem uma dificuldade ...
quer dizer quem estava lendo sabe que é
difícil você ... exatamente ... saber onde
que ele está aqui ... né ... se isso é
noventa e seis vírgula oito ... noventa e
seis vírgula cinco ... então existe uma
dificuldade na leitura ... ((79’))

T Verbal Oral Escrito

97 A: tem que copiar isso daí –


em amarelo – que a senhora
tá escrevendo?

98 P: é bom anotar porque são P escreve na lousa:


conclusões que nós estamos
“c) o termômetro pode ter ficado em uma
tirando do que a gente viu
posição em que parece mais a convecção;
((pausa)) ((80’))
d) houve arredondamento nas medidas.”

T Verbal Oral Quadro

99 P: outra pergunta ... será que dá pra gente tirar alguma::: alguma::
expressão que envolva o AUMENTO da temperatura? E essas
variáveis que a gente está mexendo... quer dizer ... por exemplo ... se
eu dob/ dobramos a quantidade de água ... será que dobrando a
quantidade de água a temperatura aumentou duas vezes menos?

100 A4: um pouco ... não muito ...

101 A24: tá noventa e seis ... (vai ficar assim)() aí vai ficar demorando...()

102 P: ela vai demorar mais ... agora eu quero ver o seguinte ... no caminho Tabela
... aqui ... por exemplo... aumentou quantos graus?

103 A: onde?
260

104 P: dezoito ... trinta e dois ... P marca


diferença
105 A14: catorze... ((82’)) entre valores
de
106 P: catorze...e aqui? temperatura
consecutivos
107 A2: vinte e um ... na tabela

108 P: vinte e um ... e:... aqui?

109 A14: aí:: tem::

110 A2: (dezessete)

111 P(a): (dezessete)

112 P(b): será que existe uma re-gu-la-ri-da-de não aumento? Será que ela
aumenta SEMPRE:: valores iguais?

113 P: quem tinha feito uma observação? foi você ()

114 A14: sobre o quê?

115 P: sobre (a água como que) a temperatura aumenta?

116 A14: ()ou não...

117 P: não ... alguém fez um comentário aqui ... dizendo que no começo:: e
depois aqueceu mais rápido...

118 A4: ah:... fui eu... fui eu...

119 P: foi você ... que no começo ... você achou que foi mais rápido ...
depois achou que foi mais devagar... ((83’))

120 A14: (lógico) que ela esquenta...

121 A21: é:: ()esquenta...

122 A14: ()(aumenta rápido)...

123 A4: (disparado)...

124 P: não ... quando ela vai estabilizar ... vai chegar uma hora q/ ela nu/...
não:: pass/

125 A14: ______________________ então.. ela vai parando ... ela não
pode ir rápido ela () vai parando ... gradualmente

T Verbal Oral Gestos

126 A21: quando é que estabiliza ... professora?


261

Como vai esquentando::: esquentando:::...

127 A4: claro que não::: menina...

128 A21: eu tô perguntando::

129 P: essa pergunta (vou responder) mais pra Indica concentração de matéria
frente ... mas está relacionada com o
processo de ferver ... o quê que acontece
quando ferve?

130 A21: (eu achava que o experimento era só


pra ferver cada vez mais... até:: sei lá...)

131 P: as partículas liv/ Gesto2

132 A21: até acabar toda a água...

133 P: as partículas livres (não estão soltas) Gesto3

134 A21: ( )

135 P: muito soltas? Gesto4

136 A21: não

137 P: não ... quê que tem que acontecer para Gesto 5 Gesto 6 Gesto 7
ela virar vapor?

138 A14: ( )

139 P: () o que?

140 A4: ferver ... ferver... ((84’))

141 A27: ficaria menos denso...

142 A: menos denso...


262

143 P: menos denso... SÓ?

144 A14: ela tem que evaporar...


263

145 P: ela tem que evaporar de vez ... quer Gesto 5 / Gestos 6 e 7
dizer ... as partículas do líquido estão lá e
vão ter que ir se soltando de vez... e se Repete 5 a 7 quatro vezes
misturando com ar ... sair com grande
velocidade ... se elas são ATRAÍDAS ...
primeiro elas vão se afastando ... chega Gesto 9 Gesto 10 Gesto 11
uma HORA que pra ela ... ela não consegue
se afastar mais ... ela só vai conseguir ... se
ela consegui soltar de tudo ... sair e ir
embora ... então a partir DAÍ... toda energia
que está (chegando) ... ela vai (voltar pra) ...
não.. ela só vai evaporar ... só vai -- toda a
energia que for (chegando) -- vai ser usada
pra soltar as partículas ... fazer elas irem
voando no ar ... virando vapor... é pra
quebrar as ligações entre elas... ()essa
energia não está sendo só pra agitar... vai
se soltar ... ((85’))

146 A21: _____________ ()

147 P: olha ... nos fizemos com duas lamparinas


... com duas lamparinas elas aqueceram
mais rápido – vinte ... vinte ... dezenove --
ela aumentou MAIS rápido ... mas chegou
nos noventa e sete... noventa e oito ...
noventa e sete ... noventa e oito...

148 A14: é p/quê é o limite... da água...

149 P: é o limite de AGITAÇÃO ... você pode


AUMENTAR a agitação ... a temperatura
está relacionada com a agitação...

150 A14: e se aumentar mais um pouco ...


(como é que ia ser isso)?

151 A4: nada...

152 P: ela ia ... você ia conseguir ... produzir


mais vapor mais rápido...

153 A14: ah::...tá::

154 A21: mas a temperatura não (seria a


mesma)?

155 P: ______________() mais rápido...

156 A4: _____________ela ia esquentar mais


rápido ... não ia?
264

157 P: ela ia esquentar mais rápido ATÉ chegar


lá ...

158 A4: ahn::...

159 A14: ___ Chega no noventa e sete ...


parava...

160 P: aí ela só ia virar vapor mais rápido...


((86’))

161 A21: aí não ia aumentar a temperatura?

162 P: seria ... a continuação seria você


conseguir pegar ESSE VAPOR e aquecer
ES-TE vapor...

T Verbal Oral Lousa

163 P: pessoal ... pra gente fazer ... pra gente poder:::... shhh::... observar e Tabela com
poder fazer uma:: relação de QUAN-TI-DA-DE -- não só como a gente dados e
fez aqui -- aqui a gente só falou qualitativamente... aumenta ... diminui registros
... aumenta mais ... aumenta menos ... agora ... a gente em física feitos pela
trabalha ... trabalha muito na qualidade também pra ver se afasta ... profa. sobre
dilata ... ( ) sem ... sem medir ... né... essa eu vou querer medir um a diferenças
pouco mais... ((88’)) então vou querer es-ta-be-le-cer uma relação de entre
quan-ti-da-de ... SERÁ que cada vez que eu DOBRO a quantidade de valores
lamparinas... a temperatura aumenta duas vezes mais rápido? ou ... consecutivo
um vez mais rápido? ou ... será que quando eu DOBRO a Quantidade s de
de ÁGUA ... a temperatura DEMORA metade pra aumentar ... ela vai temperatura
aumentando de menos em menos na metade... na mesma proporção?
será que É a mesma proporção? será que NÃO é? Pra gente poder ver
essa parte de quan-ti-da-de – QUANTO aumenta -- a gente não vai
poder comparar só numérico ... fazendo AQUI o quanto aumentou em
cada minuto. .. pra cada um ... pra ver o que acontece ... pra gente ver
isso ... a gente vai usar um OUTRO recurso científico ... que é o
GRÁFICO ... ((89’)) o que a gente está vendo aqui -- olhando pra UM
MONTE de números -- no GRÁFICO a gente vai ver muito
claramente... porque você vai dar uma ... uma:: impressão VISUAL ...
você vai bater o olho no gráfico e vai dizer se está aumentando rápido
... se está aumentando devagar ... se está aumentando no mesmo
ritmo ... ou não...
164 A14: (esse gráfico a gente pode fazer) ... pode fazer?
165 P: PODE fazer ... VAMOS fazer ((89’35”))

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