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Escola de Ciências

Departamento de Biologia

Manual das aulas teórico-práticas de


Farmacologia Ocular

Licenciatura em Optometria e Ciências da Visão


3º ano

Autora: Sofia Duarte


Ano: 2022
Índice e conteúdos

Pág.
TP1. Cálculos Farmacêuticos. Formas farmacêuticas. Diferentes tipos de formas 3
farmacêuticas (sólida, semi-sólida e líquida). Fármacos de aplicação tópica ocular. Diferentes
tipos de colírios. Definição de substância ativa e excipiente. Caracterização das formulações
farmacêuticas: determinação da quantidade relativa dos seus componentes. Diferentes formas
e unidades de expressar os componentes de uma formulação farmacêutica.

TP2. Farmacodinâmica. Conceitos de eficácia, afinidade, potência, ED50. Agonistas e 7


Antagonistas. Tipos de Antagonismo. Interpretação de Curvas Dose-resposta.
Farmacodinâmica Ocular – alguns exemplos.

TP3. Introdução à Farmacocinética: Absorção de fármacos. Introdução à 12


Farmacocinética. Absorção de fármacos. Fatores que influenciam a absorção de fármacos, no
geral e no olho. Equação de Henderson-Hasselbalch. Uso da equação de Henderson-
Hasselbalch para determinar as frações de fármaco ionizadas e não ionizadas que serão
encontradas entre compartimentos corporais ou formulações que diferem no pH.

TP4. Biodisponibilidade de fármacos. Fração biodisponível e biodisponibilidade. 18


Biodisponibilidade de fármacos oculares. Barreiras oculares e fatores que afetam a
biodisponibilidade de fármacos oculares. Estratégias para aumentar a biodisponibilidade de
fármacos oculares. Definições de “area under the curve”, concentração máxima e tempo
máximo. Modelos animais para o estudo da biodisponibilidade de fármacos oculares.
Resolução de problemas de biodisponibilidade para fármacos de uso oftálmico.

TP5. Cálculo de parâmetros farmacocinéticos. Importância do cálculo de parâmetros 24


farmacocinéticos. Definições de constante de eliminação, tempo de meia-vida, volume de
distribuição e clearance total. Cálculo de parâmetros farmacocinéticos mediante diferentes
regimes de dosagem: doses únicas, dosagem múltipla discreta, infusão intravenosa contínua.
Estudo da farmacocinética de fármacos oculares.

TP6. Exploração de bases de dados de fármacos. A importância das bases de dados 34


de fármacos. Uso da base de dados DrugBank (https://go.drugbank.com/) para pesquisar
informação, tal como as indicações terapêuticas, os nomes de formulações comerciais, as
classes dos fármacos, os recetores e alvos terapêuticos, os mecanismos de ação, a
biodisponibilidade e outros parâmetros farmacocinéticos, de fármacos usados no tratamento
de afeções oculares.

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TP1. Cálculos farmacêuticos
Na farmacologia, é essencial saber manipular, preparar e administrar formas farmacêuticas.
Estas são o estado final que as substâncias ativas ou excipientes apresentam após terem sido
submetidas às operações farmacêuticas necessárias, a fim de facilitar a sua administração e obter
o maior efeito terapêutico desejado. A forma sólida, é a preferida pelas indústrias por ser mais
estável e nesta categoria incluem-se os pós, as cápsulas, os granulados, os comprimidos e as
drageias. A forma semissólida é normalmente a escolhida para produtos de uso tópico como os
cremes, as pomadas e os géis. A forma líquida facilita a deglutição em pessoas mais sensíveis
como as crianças e os idosos e permite o ajuste das doses, e incluem-se nesta categoria os xaropes,
os elixires, as gotas/colírios e as suspensões.
Os medicamentos para aplicação oftálmica, podem ser usados como meio de diagnóstico ou
para fins terapêuticos, nas formas de pomada, colírio e discos ou compressas impregnadas com o
fármaco. Os colírios, são os mais comumente usados e são soluções ou suspensões estéreis,
aquosas ou oleosas, contendo uma ou várias substâncias ativas e destinadas a serem aplicadas no
globo ocular ou nas conjuntivas ou a serem inseridas no saco conjuntival. Existem várias
categorias de colírios, destacando-se os seguintes:
Vasoconstritores: utilizam-se para o tratamento de irritações, ardores e pequenas moléstias
que fazem com que os olhos fiquem vermelhos e sensíveis. Agem contraindo os vasos sanguíneos,
que diminuem a passagem de sangue na região e deixam o olho com um aspeto mais branco.
Lágrimas artificiais: estes colírios são lubrificantes oculares que servem para humedecer os
olhos que estão secos devido a causas naturais, como o avançar da idade, ou causas artificiais,
como a exposição prolongada a um computador.
Antialérgicos: utilizados especificamente para casos de conjuntivite alérgica, que são
diferentes dos casos de conjuntivite infeciosa. Neste tipo de conjuntivite é mesmo necessário
recorrer a um médico que, depois de analisar, indicará o melhor colírio.
Anti-inflamatório: utilizado em pós-operatórios, em conjuntivites de origem viral e
inflamação na córnea. Dentro deste tipo de colírios, estão os hormonais (que contêm corticoides)
e os não-hormonais.
Antibiótico: são, geralmente, usados para combater processos infeciosos provocados por
bactérias.
Anestésico: embora alivie as dores nos olhos, deve ter o uso restrito ao médico para exames e
cirurgias, pois o uso abusivo ou inadequado deste colírio pode provocar lesões graves na córnea.
Antiglaucomatoso: específico para quem tem glaucomas e necessita de usar colírios
regularmente para reduzir a pressão intraocular, pela diminuição da produção de líquido no olho
ou indução de uma drenagem adequada.

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A maioria dos colírios são soluções. As soluções são definidas como misturas homogéneas de
duas ou mais substâncias, cujas propriedades dependem da composição e da natureza dos seus
componentes e que existem sobretudo no estado líquido.
Numa solução o soluto é o componente da solução que se encontra presente em menor
quantidade enquanto que o solvente é o componente da solução que se encontra presente em maior
quantidade. A água é um solvente extraordinariamente adequado para solutos iónicos e polares e
as soluções resultantes são chamadas soluções aquosas. Para caracterizar a composição de uma
solução é essencial determinar a quantidade relativa dos seus componentes à qual se dá o nome
de concentração. Na farmacologia, a percentagem (%) é um meio frequentemente usado para
expressar a concentração das substâncias ativas e dos excipientes. As substâncias ativas são
aquelas que vão provocar o efeito terapêutico desejado, enquanto que o excipiente é qualquer
componente do medicamento, que não a substância ativa e o material da embalagem, e que têm
como função o ajuste do volume e massa da formulação, coerência física de partículas, controlo
da desintegração e da libertação dos princípios ativos, além de proporcionar uma camada
protetora, e poder alterar o gosto e a aparência.

Fórmulas comummente usadas para determinar a concentração de substâncias ativas ou


excipientes das formas farmacêuticas:
• Molaridade (M): nº de moles de soluto n a dividir pelo volume da solução em L V
• Percentagem (% p/v): gramas de soluto por 100 mL de solução
• Percentagem (% v/v): volume de soluto por 100 mL de solução
• Percentagem (% p/p): gramas de soluto por 100 gramas de solução

Outras fórmulas que poderão ser úteis na preparação de soluções:


• Nº de moles = massa de soluto (g) / massa molecular do soluto (g/mol)
• Concentração inicial (Ci) x Volume inicial (Vi) = Concentração final (Cf) x Volume final
(Vf)

Conversões de unidades úteis na preparação de soluções:


g a mg x103 L a mL x103 Fator Prefixo Fator Prefixo
mg a g /103 mL a L /103 109 giga (G) 10-3 mili (m)
g a µg x106 L a µL x106 106 mega (M) 10-6 micro (µ)
µg a g /106 µL a L /106 103 kilo (K) 10-9 nano (n)
mg a µg x103 mL a µL x103 10-1 deci (d) 10-12 pico (p)
µg a mg /103 µL a mL /103 10-2 centi (c)

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Exercícios TP1
1.1. Na Cruz Vermelha, é necessário lavar os olhos a um paciente com 300 mL de soro fisiológico
(solução 0,9% p/v), mas lá só têm disponíveis frascos de 200 mL contendo solução de cloreto de
sódio a 2% (p/v). Como se pode contornar o problema?

1.2. Observe a seguinte prescrição farmacêutica de uma solução oftálmica anestésica:


Citrato de fentanil 20 µg/mL
Hidrocloreto de bupivacaína 0,125% (p/v)
Cloreto de sódio 0,9% (p/v) 100 mL
Qual a % de citrato de fentanil na prescrição farmacêutica e a concentração de hidrocloreto de
bupivacaína em mg/mL?

1.3. Observe a seguinte prescrição farmacêutica de uma solução oftálmica antibacteriana:


Antipirina 54 mg/mL
Lactobionato de eritromicina 14 mg/mL
Glicerina 2,5 mL
Água esterilizada 97,5 mL
Qual a % (p/v) de antipirina e lactobionato de eritromicina na prescrição farmacêutica?

1.4. Observe a composição de substâncias ativas presentes no seguinte colírio usado no tratamento
do glaucoma de ângulo aberto:
Travoprost: 40 µg/mL
Timolol: 5 mg/mL
Qual a % (p/v) de cada um dos componentes?

1.5. Observe a seguinte prescrição farmacêutica de uma pomada oftálmica usada no tratamento
de conjuntivite bacteriana:
Acetato de prednisolona: 5 mg/g
Sulfato de neomicina: 5 mg/g
Sulfacetamida sódica: 100 mg/g
Excipiente apropriado: q.b.p.
Qual a % (p/p) de cada um dos componentes na formulação?

1.6. Um colírio usado em profilaxia e terapêutica de cataratas contém 0,5 mg/mL de pirenoxina.
Calcular a % (p/v) de pirenoxina na solução.

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1.7. Um colírio usado no tratamento de glaucoma contém 2% de dorzolamida e 0,5% de timolol.
Calcule as quantidades de cada uma das substâncias ativas em mg, sabendo que o frasco contém
5 mL.

1.8. Um colírio usado no tratamento de glaucoma contém 0,1 mg de travoprost. Sabendo que o
frasco contém 2,5 mL de volume de solução, calcule a concentração de travoprost em mg/mL de
solução e depois em %.

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TP2. Farmacodinâmica
A farmacodinâmica estuda as ações farmacológicas e os seus mecanismos, resumindo, o que
o fármaco faz ao organismo. As respostas farmacológicas são iniciadas pelas interações
moleculares dos fármacos com os recetores que se encontram nas células. Um recetor de um
fármaco é uma macromolécula alvo especializada, presente na superfície celular ou
intracelularmente, que se liga ao fármaco e medeia a sua ação farmacológica. Os fármacos podem
interagir com enzimas, ácidos nucleicos ou recetores de membrana. Em qualquer um dos casos,
a formação de um complexo fármaco-recetor conduz à resposta biológica e a magnitude da
resposta é proporcional ao número de complexos fármaco-recetor:

A magnitude do efeito de um fármaco depende da sua concentração no local do recetor, que


por sua vez é determinada pela dose de fármaco administrada e por fatores característicos do
fármaco, como a taxa de absorção, a sua distribuição e o seu metabolismo. O efeito de um fármaco
é mais facilmente analisado traçando o gráfico da resposta (o efeito biológico) versus a dose de
fármaco – curvas dose-resposta (Fig. 2.1).

Figura 2.1. Curvas típicas do efeito de um fármaco (resposta) versus a sua concentração para
fármacos com diferenças na potência e na eficácia. ED 50=dose de fármaco que origina 50% da
resposta máxima. Fonte: https://www.pharmacologyeducation.org/clinical-
pharmacology/clinical-pharmacodynamics

A eficácia corresponde à resposta máxima produzida por um fármaco. Depende do número de


complexos fármaco-recetor formados e da eficiência com a qual o recetor cativado produz uma
ação celular. A afinidade traduz-se como a capacidade de ligação e expressa-se pelo coeficiente
de dissociação Kd, que é a concentração de fármaco para a qual se obtém 50% da ligação máxima
ao recetor. A potência também denominada por concentração de dose efetiva é uma medida da
quantidade de fármaco requerida para desencadear uma determinada resposta. Quanto menor a
dose requerida para desencadear uma determinada resposta, mais potente será esse fármaco. A
potência é expressa frequentemente como a dose de fármaco que origina 50% na resposta
máxima, ED50. Um fármaco com um ED50 baixo é mais potente que um fármaco com um ED 50

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mais elevado. Afinidade e potência são na prática sinónimos pois nos casos em que o agonista
total necessite de ocupar todos os recetores para provocar a resposta máxima teremos Kd = ED50.
Os agonistas e os antagonistas permitem caracterizar melhor a ligação do fármaco ao seu
recetor, permitindo conhecer melhor as características da ligação. Um agonista total é um
fármaco que é capaz de produzir num órgão a resposta máxima que esse órgão pode dar como
consequência da ativação de um determinado sistema de recetores por um ligando endógeno. Ou
seja, esse fármaco tem uma eficácia de 100%. Quando um fármaco produz apenas um efeito
submáximo no órgão (ou seja, a sua eficácia é superior a zero, mas inferior a 100%) esse fármaco
é um agonista parcial, pois a resposta é inferior à resposta provocada pelo agonista total. Um
antagonista é um fármaco que apenas ocupa os recetores (apenas possui afinidade), não
produzindo qualquer efeito no órgão, isto é, não o ativando e não originando qualquer resposta.
A sua eficácia é, portanto, zero. Estes fármacos, ao ocuparem os recetores, impedem a ligação do
agonista ou impedem a ativação do recetor por este. Os antagonistas competitivos, são fármacos
que nos recetores se ligam no mesmo local do agonista, competindo pela mesma ligação que este.
Um antagonista competitivo desloca a curva de dose-resposta do agonista para a direita, fazendo
com que o fármaco se comporte como se fosse menos potente. Já um antagonista não
competitivo liga-se em outro local do recetor alterando a sua conformação e desta forma
impedindo a ligação do endógeno ou do agonista ao recetor, diminuindo a sua eficácia.
Na farmacologia ocular, a miose (contração da pupila), a midríase (dilatação da pupila) e a
pressão intraocular, têm sido respostas biológicas comummente usadas para investigar a
eficiência de fármacos oculares. Por exemplo, a resposta miótica do olho tem sido usada para
demonstrar o efeito de fármacos colinérgicos que mimetizam a ação do neurotransmissor
acetilcolina. A pilocarpina é um fármaco miótico e é usada no tratamento do glaucoma. No
tratamento do glaucoma, a pilocarpina atua diretamente nos recetores colinérgicos (de
acetilcolina) resultando na contração dos músculos ciliares (miose), o que aumenta o fluxo de
saída do humor aquoso, provocando uma diminuição da pressão intraocular. A resposta midriática
tem sido usada para demonstrar a resposta de fármacos que dilatam a pupila, como a atropina
(anticolinérgico). Este fármaco compete pelos mesmos locais de ligação nos recetores
muscarínicos da acetilcolina (antagonista competitivo). É usado durante exames oculares, uma
vez que ao dilatarem a pupila permitem ao oftalmologista observar o fundo do olho e também no
tratamento da paralisia dos músculos ciliares do olho.

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Exercícios TP2
2.1. Indique, justificando, se as seguintes afirmações são verdadeiras ou falsas:
a. Se 10 mg do fármaco A produz a mesma resposta de 100 mg do fármaco B, então o fármaco A
é mais eficaz que o fármaco B
b. Quanto maior a eficácia, maior a potência de um fármaco.
c. Na seleção de um fármaco, a potência é mais importante que a eficácia.
d. Um antagonista competitivo aumenta a ED50.

2.2. Observe a seguinte figura:

Fonte: Lippincott Illustrated Reviews: Pharmacology


a. Coloque por ordem crescente de eficácia os fármacos A, B e C.
b. Coloque por ordem crescente de potência os fármacos A, B e C.
c. Se A e C representarem curvas do mesmo agonista da curva mais à esquerda (fármaco só) na
presença de um antagonista, de que tipo de antagonismo se trata? Justifique a resposta.

2.3. As curvas abaixo representam as respostas para uma série de fármacos (A, B, C e D) que se
ligam ao mesmo recetor.

Fonte: Human Pharmacology: Molecular to Clinical


Com base na figura, indique justificando:
a. O fármaco que tem maior afinidade.

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b. O fármaco menos eficaz.
c. O fármaco mais potente.

2.4. Uma paciente com 73 anos, com insuficiência cardíaca congestiva e edemas vai iniciar um
tratamento com um diurético (fármaco que promove a excreção renal de sódio e água). Os
fármacos X e Y têm o mesmo mecanismo de ação diurética. O fármaco X na concentração de 1
nM produz a mesma magnitude de efeito diurético que 10 nM do fármaco Y. Selecione,
justificando, as opções corretas:
a. O fármaco X é mais eficaz que o fármaco Y.
b. O fármaco X tem uma afinidade 10 vezes superior à do fármaco Y.
c. O fármaco X é mais potente que o fármaco Y.

2.5. Considere dois fármacos, em que o fármaco A eleva a pressão intraocular e o fármaco B
baixa-a. Se for adicionado um antagonista não competitivo de A, o que acontecerá à pressão
intraocular como resultado final da interação A + antagonista de A + B?

2.6. Observe a seguinte figura e indique justificando o fármaco mais potente e o fármaco mais
eficaz (A a C).

Fonte: Lippincott Illustrated Reviews: Pharmacology

2.7. As curvas abaixo representam as respostas de uma série de fármacos – A, B, C e D – que se


ligam ao mesmo recetor.

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Fonte: Human Pharmacology: Molecular to Clinical
Com base na figura indique justificando:
a. o fármaco que tem maior afinidade.
b. O fármaco mais eficaz.
c. O fármaco menos potente.
d. Se as curvas C e D representarem as curvas dos mesmos agonistas das curvas A e B,
respetivamente, mas na presença de um antagonista, de que tipo de antagonismo de trata.

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TP3. Introdução à Farmacocinética: Absorção de fármacos
A farmacocinética é o “caminho” que o medicamento percorre num sistema biológico, de um
compartimento para outro, desde a sua administração até à sua excreção envolvendo 4 etapas
principais: a absorção, a distribuição, o metabolismo, e a eliminação, o que em conjunto se
designa por ADME. Antes de um fármaco poder ser absorvido por um determinado sistema
biológico, tem que ser libertado da sua forma de dosagem (por exemplo, um comprimido), e
dissolvido nos fluídos biológicos. Na maior parte dos casos, os fármacos têm que atravessar as
membranas celulares para acederem aos seus locais de ação. O primeiro dos processos a entrar
em jogo é a absorção, considerada não como o desaparecimento do fármaco, mas sim como a
sua entrada na circulação sanguínea. Algumas áreas do corpo são caracterizadas por possuírem
compartimentos múltiplos, como é o caso do olho, cérebro ou da placenta. A facilidade com que
um fármaco atravessa as membranas celulares é a chave para aceder à velocidade e extensão da
absorção e distribuição do fármaco através de compartimentos múltiplos do corpo. Existem vários
fatores que afetam a facilidade com que um fármaco atravessa as membranas e que influenciam
a absorção: a carga, a polaridade, o peso molecular e a lipossolubilidade. Dado que as
membranas são compostas por uma bicamada lipídica e, portanto, são fortemente hidrofóbicas,
são favorecidas as moléculas sem carga, apolares, de baixo peso molecular e solúveis em
lípidos, a atravessarem as membranas.
A maioria dos fármacos são ácidos ou bases fracas. Um ácido é um composto que se pode
dissociar e libertar um protão (ião hidrogénio H +). Logo, os fármacos acídicos (normalmente
representados por HA) podem dissociar-se e libertar H+, formando um anião com carga (A-). Por
outro lado, as bases são compostos que podem aceitar um H +. Logo, os fármacos básicos
(normalmente representados por B) ao aceitar um H+ formam BH+. Em solução, os ácidos e as
bases fracos ionizam-se parcialmente e existem em equilíbrio com o H+ e A-, no caso dos ácidos
fracos; ou H+ e B, no caso das bases fracas, podendo este equilíbrio ser representado pela equação
de dissociação. Por convenção, o ácido deve aparecer no lado esquerdo da equação de dissociação
(HA e BH+) e as bases do lado direito (A- e B):

Tal como referido acima, o fármaco desloca-se mais facilmente através das membranas
celulares se se encontrar na forma não ionizada sem carga, HA para os ácidos fracos e B para
as bases fracas. Sendo assim as formas A- e BH+ não permeiam as membranas. Deste modo, a
concentração efetiva da forma permeável (HA ou B) de cada fármaco no seu local de absorção, é
determinada pelas concentrações relativas das formas ionizadas e não ionizadas. A razão entre as
duas formas A-/HA ou B/BH+, por sua vez, é determinada pelo pH no local de absorção e pela
força do ácido ou base fracos que é representada pelo pKa, em que o Ka representa a constante

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de dissociação ácida ou constante de ionização. Por norma, os ácidos tornam-se mais ionizados
em ambiente básico, enquanto que as bases se tornam mais ionizadas em ambiente acídico.
A relação entre o pKa e a razão das concentrações ácido-base e o pH do local de absorção
pode ser obtida usando a equação de Henderson-Hasselbalch:

pH = pKa + log ([forma não protonada]/[forma protonada]), logo:

pH = pKa + log([A-]/[HA]), para ácidos fracos


pH = pKa + log([B]/[BH+]), para bases fracas

A razão entre as formas não protonada (A -, para os ácidos e B, para as bases) e protonada (HA,
para os ácidos e BH+, para as bases), pode ser obtida fazendo o inverso do logaritmo de base 10
ou antilogaritmo:

10pH-pKa = [A-]/[HA], para ácidos fracos


10pH-pKa = [B]/[BH+], para bases fracas

Nos ácidos a forma protonada é a forma sem carga (HA), enquanto que nas bases a forma
protonada é a forma com carga (BH+).
Esta equação é muito útil para prever a quantidade de fármaco que será encontrada, nas formas
ionizada e não ionizada, em cada lado de uma membrana que separe dois compartimentos
corporais que diferem no pH, como por exemplo, o estômago (pH 1,0 a 1,5) e o sangue (pH 7,4).
Deste modo permite determinar o compartimento corporal onde uma maior quantidade de
fármaco irá ser absorvida. No entanto, para se poder usar esta equação é necessário saber o pH do
ambiente (compartimento corporal, formulação, entre outros), e o pKa do fármaco.
A gama de pH dos fluidos corporais varia entre 1 e 8 (Fig. 3.1A). Para uma base, quanto maior
o pKa, maior será a sua força, enquanto que para os ácidos, ocorre o oposto e a sua força será
maior, quanto menor o pKa (Fig. 3.1B). O valor de pKa será igual ao valor de pH quando o
fármaco se encontra 50% dissociado.

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A B

Figura 3.1. Variação do pH nos diferentes fluídos corporais (A) e valores de pKa para alguns
fármacos comuns (B). Fonte:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/804016/mod_resource/content/1/Propriedades%20f%C3%ADsic
o-qu%C3%ADmicas.pdf (A) e http://www.ppgfarma.uneb.br/wp-content/uploads/2019/10/Assunto-1-
literatura-tema-geral-1-Rang-Dale_-Farmacologia-caps-8-e-9-1.pdf (B)

No caso do olho, o sucesso do tratamento de patologias oculares usando formulações de


aplicação tópica, como é o caso do glaucoma, requer que haja absorção suficiente do fármaco
através da córnea, de forma a provocar o efeito terapêutico desejado. A córnea é constituída por
3 camadas principais: 1) o epitélio (adjacente à conjuntiva), que é formado por 5 a 7 camadas
celulares e é rico em lípidos; 2) o estroma, que constitui aproximadamente 90% de toda a
espessura da córnea, e é uma matriz aquosa composta por colagénio e queratócitos, e é pobre em
lípidos, e 3) o endotélio que constitui a camada mais interna da córnea, sendo constituído por
uma única camada de células, rica em lípidos, e encontra-se em contacto com o humor aquoso,
que preenche o espaço (câmara anterior), que se situa entre a córnea, e a íris e a pupila (Fig. 3.2).
Logo, de forma a serem efetivamente absorvidos, os fármacos devem possuir solubilidade
intermédia nestas fases lipídicas e aquosas e devem possuir um baixo peso molecular. O fluido
lacrimal é secretado por glândulas na superfície ocular. Possui um pH de 7,4 e possui uma boa
capacidade tampão (devido à presença de ácido carbónico, ácidos orgânicos fracos e proteínas),
sendo capaz de neutralizar formulações oculares com pH entre 3,5 a 10.

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Figura 3.2. Constituição da córnea. Fonte: https://www.allaboutvision.com/resources/cornea.htm

Tal como observado em outros compartimentos corporais, também o pH influencia a absorção


de fármacos através da córnea e o pKa do agente terapêutico ocular vai determinar a sua ionização
a valores de pH definidos. Logo, uma vez que a camada mais externa da córnea, o epitélio, é rico
em lípidos, será necessária uma concentração efetiva da forma não ionizada de fármaco para que
haja a sua difusão para o interior da córnea. A camada mais interna, o estroma é
predominantemente aquoso e como tal irá ocorrer ionização do fármaco, onde vão coexistir ambas
as formas ionizada e não ionizada. A nível do endotélio, também rico em lípidos, a forma não
ionizada é que se irá difundir para o humor aquoso. No humor aquoso, o fármaco vai novamente
ionizar-se e irá ocorrer a sua dissolução, a nível do qual irá produzir o efeito terapêutico.

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Exercícios TP3
3.1. Considere a aspirina, um fármaco com comportamento de ácido fraco e cujo pKa é igual a
3,5. Determine a razão entre as formas ionizada e não ionizada no estômago (pH=1,4) e no
duodeno (pH=6,4). Com base nos resultados obtidos onde se dará a maior absorção da aspirina
para o sangue, a nível do estômago ou do duodeno?

3.2. Considere a penicilina, um fármaco que se comporta como um ácido fraco (pKa=2,74). No
momento em que a razão entre as formas ionizada e não ionizada é igual a 0,5, qual é o pH do
fluído em questão?

3.3. A brimonidina é um fármaco básico usado no tratamento do glaucoma e cujo pKa = 7,78. A
razão entre as formas não ionizada e ionizada entre uma formulação com pH 5,4 e outra
formulação com pH 7,3 irá:
a. Diminuir para metade
b. Aumentar cerca de 80 vezes
c. Diminuir cerca de 80 vezes
d. Aumentar para metade

3.4. Observe o seguinte gráfico da % da forma não ionizada de três fármacos – o ácido
acetilsalicílico, o fenobarbital e a anfetamina - em função da variação do pH.

Sabendo que o valor de pKa será igual ao valor de pH quando o fármaco se encontra 50%
dissociado (%forma ionizada=%forma não ionizada), indique, justificando, se as seguintes
afirmações são verdadeiras ou falsas:
a. o pKa do ácido acetilsalicílico encontra-se entre 3 e 4.
b. o pKa do fenobarbital é superior ao da anfetamina.

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c. o ácido acetilsalicílico comporta-se como um ácido fraco.
d. a anfetamina comporta-se como base fraca.

3.5. Considere o ibuprofeno, um fármaco ácido com um pKa = 5,3. Sabendo que o pH do
estômago é igual a 2,1 e que o pH do duodeno é igual a 6,2, a percentagem de fármaco absorvido,
após administração de um comprimido:
a. Será superior no estômago
b. Será superior no duodeno
c. É idêntica no estômago e no duodeno
d. Nestas condições, o fármaco não será absorvido

3.6. Um grupo de investigadores está a testar o efeito do pH na formulação ocular de uma amina
básica, a AGN 191103, cujo pKa é igual 9,53. Testaram 3 pH diferentes: 8,2; 7,2 e 6,2. O que
pode concluir acerca do efeito do pH na razão entre as formas não ionizada e ionizada na
formulação?

3.7. A pilocarpina é um fármaco básico, cujo pKa=6,78 e é estável a pH igual a 5. No entanto a


este pH a maior parte do fármaco encontra-se na forma ionizada e como tal a absorção será baixa.
Tendo em conta que o pH do fluido lacrimal é de aproximadamente 7,4, qual será a sua influência
na absorção da pilocarpina a nível da córnea?

3.8. A atropina é um fármaco básico cujo pKa=9,43. O que irá acontecer à forma ionizada na
formulação se se aumentar o pH da formulação de 5 para 6,8?

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TP4. Biodisponibilidade de fármacos
A biodisponibilidade refere-se à fração da dose de fármaco administrada que entra na
circulação sistémica ou que chega aos compartimentos e tecidos oculares, no caso do olho, numa
forma não alterada. Quando os estudos de absorção de um determinado fármaco demonstram
consistentemente que apenas uma fração de fármaco numa determinada forma de dosagem se
encontra disponível para absorção biológica, o fator biodisponibilidade do fármaco F pode ser
usado para determinar a fração de fármaco biodisponível. Por exemplo, se 100 mg de um fármaco
forem administradas a um paciente e apenas 70 mg atingem a circulação sistémica então F é 0,7
ou a biodisponibilidade desse fármaco é 0,7 x 100%, ou seja, 70%.
Após administração de um fármaco podem ser recolhidas amostras do sangue em intervalos
de tempo específicos, e o seu conteúdo em fármaco analisado. Os dados resultantes podem ser
apresentados graficamente de modo a obter um gráfico da concentração de fármaco no sangue
em função do tempo (Fig. 4.1). Quando o fármaco é administrado, a concentração no sangue é
zero, exceto quando administrado por via intravenosa. No caso de um fármaco ter sido
administrado oralmente, assim que passa pelo estômago e/ou intestino é libertado da sua forma
de dosagem, dissolve-se totalmente ou parcialmente, e é absorvido. Com a continuação, as
amostras revelam concentrações aumentadas de fármaco até atingirem um pico máximo de
concentração (Cmáx). Depois os níveis de fármaco decrescem progressivamente e se não for
administrado mais fármaco a concentração poderá baixar até zero. Para as formas de dosagem
mais convencionais, a Cmáx ocorre num único ponto de tempo referido como Tmáx. A quantidade
de fármaco administrada e a sua biodisponibilidade, e a absorção, influenciam a sua concentração
no sangue. A taxa ou velocidade a que o fármaco é absorvido determina o Tmáx, o tempo no qual
é atingida a concentração máxima após administração, logo quanto mais rápida a taxa de
absorção, mais cedo será atingido o Tmáx.
Num gráfico da concentração versus o tempo, a “area under the curve” ou em português a
área sob a curva ou AUC é considerada representativa da quantidade de fármaco total absorvido
(na circulação sistémica ou nos compartimentos e tecidos/fluidos oculares) (Fig. 4.1). A
biodisponibilidade (F) de um fármaco também pode ser determinada pela razão entre a AUC para
a forma de dosagem (que não a tópica) e a AUC para a forma intravenosa, uma vez que por
definição a extensão de absorção de um fármaco administrado intravenosamente é de 100%, uma
vez que todo o fármaco entra em circulação.

F = AUC outra forma de dosagem / AUC forma intravenosa

A biodisponibilidade de um fármaco pode variar quando este se encontra em formas de


dosagem diferentes ou na mesma forma de dosagem, mas produzidos por diferentes laboratórios.
Logo, pode ser necessário calcular doses equivalentes de dois produtos não equivalentes, que

18
possuam diferentes biodisponibilidades. Dois fármacos dizem-se equivalentes se possuem
biodisponibilidades comparáveis e AUCs, e tempos similares para atingirem as concentrações
máximas no sangue, e se produzirem os mesmos efeitos.

Figura 4.1. Gráfico da concentração de um fármaco medida no sangue ao longo do tempo. Neste
caso a Cmáx, é 4 µg/mL e o Tmáx 2 horas.

Biodisponibilidade de fármacos oculares de aplicação tópica


A aplicação de colírios contendo fármacos oculares no saco conjuntival, é a forma mais usada
para a administração de fármacos no tratamento de patologias associadas ao segmento anterior do
olho (por exemplo, olho seco, conjuntivite e glaucoma). Apesar desta forma de aplicação possuir
numerosas vantagens, a obtenção de concentrações efetivas no local de ação é desafiante. A
biodisponibilidade de um fármaco aplicado topicamente no olho depende de vários fatores,
relacionados com o olho, com o fármaco, com a própria gota (o volume pode variar entre
diferentes marcas), e com o paciente. Apenas cerca de 5% da dose inicial de uma gota aplicada
no olho entra nas estruturas oculares. Os fatores mais importantes e que influenciam a forma como
as substâncias ativas penetram nas estruturas oculares, são as propriedades físico-químicas do
fármaco e a colaboração do paciente. A córnea é a via primária para a absorção de fármacos
aplicados topicamente no olho e oferece barreiras anatómicas significativas. O contacto de uma
gota com a superfície ocular é também muito curto, normalmente inferior a 5 min, o que também
contribui para que apenas cerca de 5% da forma original atinja o alvo pretendido.
Algumas estratégias têm sido desenvolvidas de forma a minimizar a perda de fármaco pré-
corneal e a maximizar a absorção de fármaco pela córnea tais como: i) o aumento da dose efetiva,
tanto pelo aumento da dose e/ou da frequência de aplicação; ii) o melhoramento da composição
molecular da formulação de forma a aumentar a lipofilicidade e/ou solubilidade e iii) a alteração

19
da formulação de forma a aumentar a viscosidade, a penetração através da córnea e o tempo de
contacto. No entanto, devido ao elevado grau de envolvimento do paciente na aplicação do
fármaco ocular, estas estratégias que melhoram a absorção dos fármacos podem não resultar numa
maior biodisponibilidade do fármaco, se este não for bem aplicado pelo paciente. Por exemplo,
uma baixa biodisponibilidade pode requerer uma maior frequência de administração, uma razão
comum para a fraca adesão do paciente. Algumas características moleculares, como a
lipofilicidade, afetam a formulação e requerem a agitação antes da aplicação, o que pode resultar
na variação das concentrações de fármaco administradas, como no caso das suspensões. Quando
o paciente não agita o fármaco tal como indicado, parte do fármaco pode depositar-se no fundo
do frasco e só ser maioritariamente administrado no final do tratamento, quando é menos
necessário.
Para fármacos administrados pela via ocular e cujo efeito terapêutico que se pretende é local,
as concentrações de fármaco medidas no plasma sanguíneo dizem-nos muito pouco sobre a sua
farmacocinética. Por este motivo, têm que ser usados modelos animais para estudar a distribuição
de fármacos nos compartimentos e tecidos oculares. O coelho tem sido a espécie mais
comummente usada em estudos pré-clínicos de farmacocinética ocular, uma vez que é de fácil
manipulação e tem-se mostrado mais previsível, na extrapolação dos resultados obtidos para o ser
humano.

20
Exercícios TP4
4.1. Se a biodisponibilidade de cloranfenicol numa pomada oftálmica contendo 10 mg é 10%
comparada com a biodisponibilidade de um colírio de cloranfenicol a 8 mg/mL que é 5%, calcular
o volume de colírio que terá que ser administrado para que a dose de cloranfenicol seja equivalente
à da pomada.

4.2. 100 mg de um antibiótico foram administradas oralmente sob a forma de um comprimido a


um paciente de 6 em 6 horas, para tratar uma infeção ocular. A biodisponibilidade do fármaco
sob a forma de comprimido é de 50%. Qual a quantidade biodisponível em gramas tomada pelo
paciente após 3 dias?

4.3. A concentração do antibiótico ofloxacina a 0,3% (p/v) num colírio ocular que atinge a câmara
anterior do olho é de cerca de 5% da concentração inicial. Calcular a concentração biodisponível
em mg/mL de ofloxacina na câmara anterior do olho.

4.4. Sabendo que a biodisponibilidade de uma solução de pilocarpina, usada no tratamento do


glaucoma, é de apenas 1%, quantas miligramas de pilocarpina teria que conter a solução inicial
para se atingir uma concentração de 0,1 mg nos tecidos do corpo ciliar?

4.5. Após uma intervenção cirúrgica a uma catarata, o médico prescreveu um comprimido de 1 g
de paracetamol a administrar de 8 em 8 horas, a um paciente, para anestesiar as dores devidas à
intervenção cirúrgica. Para evitar uma infeção o médico prescreveu um comprimido de 500 mg
de ampicilina, um antibiótico, para ser administrado de 12 em 12 horas. Sabendo que as
biodisponibilidades para o paracetamol e para a ampicilina são 70 e 80%, respetivamente, calcule
as quantidades biodisponíveis em gramas, de cada um dos fármacos, tomadas pelo paciente após
5 dias.

4.6. Observe a seguinte tabela com os resultados de uma experiência realizada para estudar o
efeito da formulação (nomeadamente os conservantes usados – purite e cloreto de benzalcónio
(BAK)) na farmacocinética da brimonidina no humor aquoso, após a aplicação de uma gota em
olhos de coelhos.

21
AUC0-5h
Formulação Cmáx (µg/mL) Tmáx (h)
(µg*h/mL)
1) Alphagan (0,2% tartarato de
brimonidina/0,005% BAK, pH 1,74 2,77 0,55
6,4)
2) 0,2% tartarato de brimonidina
2,69 3,78 0,33
/0,005% Purite, pH 7,2
3) 0,2% tartarato de brimonidina,
1,24 2,49 1
sem qualquer conservante, pH 6,4
Fonte dos dados: Acheampong et al. 2003
a. Determine as razões entre as Cmáx obtidas entre cada formulação.
b. Para qual das formulações a absorção de brimonidina no humor aquoso foi superior? Justifique
com base nos resultados experimentais obtidos.
c. Para qual das formulações a taxa de absorção foi mais rápida? Justifique com base nos
resultados experimentais obtidos.
d. O que pode concluir acerca do efeito da formulação na biodisponibilidade da brimonidina no
humor aquoso?

4.7. Observe a seguinte tabela com os resultados de uma experiência realizada para estudar o
efeito do uso de um polímero, o polycarbophil#, na farmacocinética de uma nova formulação
oftálmica de azitromicina 1% (p/v), usada no tratamento de tracoma, em diferentes
compartimentos de olhos de coelhos.
Controlo Polycarbophil
Cmáx AUC0-144h Tmáx (h) Cmáx AUC0-144h Tmáx (h)
Compartimento
(µg/g) (µg*h/g) (µg/g) (µg*h/g)
Conjuntiva 9,55 79,2 0,083 108 737 0,083
Córnea 8,78 196 0,083 40,4 837 0,083
Filme lacrimal$ 893 155 0,083 10539 3016 0,083
Humor aquoso$ 0,003 0,250 24 0,076 0,689 0,083
Fonte dos dados: Akpek et al. 2009
#
O polycarbophil é um polímero que permite aumentar o tempo de contacto de fármacos com a superfície
ocular.
$
As unidades da Cmáx e da AUC no filme lacrimal e no humor aquoso são μg/mL e μg*h/mL,
respetivamente.
a. Para cada um dos tratamentos, em qual dos compartimentos a absorção da azitromicina e a
biodisponibilidade foram superiores? Justifique com base nos resultados experimentais obtidos.

22
b. Para cada um dos compartimentos oculares, determine a razão entre as concentrações máximas
obtidas entre o tratamento com polycarbophil e o tratamento controlo.
c. Em qual dos compartimentos oculares a biodisponibilidade da azitromicina parece beneficiar
mais com a adição de polycarbophil à formulação? Justifique com base nos resultados
experimentais obtidos.
d. O que pode concluir acerca do efeito de polycarbophil na biodisponibilidade da azitromicina?

4.8. Observe a seguinte tabela com os resultados de uma experiência realizada para estudar o
efeito de uma partícula – o MPP#, na farmacocinética de uma nova formulação oftálmica de
loteprednol (LE-MPP 0,4%), um corticosteróide usado no tratamento de inflamações oculares,
em diferentes compartimentos de olhos de coelhos.
Formulação comercial Lotemax LE-MPP 0,4%
0,5%
Cmáx AUC0-12h Tmáx (h) Cmáx AUC0-12h Tmáx (h)
Compartimento
(ng/g) (ng*h/g) (ng/g) (ng*h/g)
Humor aquoso$ 6 14 0,5 20 31 0,5
Córnea 621 1130 0,083 2260 1670 0,083
Conjuntiva 1130 1610 0,083 2930 1610 0,083
Íris/corpo ciliar 49 91 0,5 137 206 0,25
Retina 2,1 6,9 0,5 6,8 14,7 0,5
Plasma$ 0,33 0,76 0,25 1,19 2,12 0,25
Fonte dos dados: Schopf et al. 2014
#
A córnea e a conjuntiva encontram-se revestidas por uma camada externa de 3 a 40 µm de muco. A MPP,
“mucus penetrating particle”, melhora a penetração de fármacos na conjuntiva, uma vez que consegue
penetrar mais rapidamente esta camada de muco.
$
As unidades da Cmáx e da AUC no humor aquoso e no plasma são ng/mL e ng*h/mL, respetivamente.
a. Para cada uma das formulações, em qual dos compartimentos a absorção do loteprednol e a
biodisponibilidade foram superiores? Justifique com base nos resultados experimentais obtidos.
b. Para cada um dos compartimentos oculares, determine a razão entre as concentrações máximas
obtidas entre a formulação com MPP e o tratamento com a formulação comercial.
c. O que pode concluir acerca do efeito do MPP na biodisponibilidade do loteprednol?
d. Em qual/quais compartimentos oculares a taxa de absorção do loteprednol foi mais rápida?
Justifique com base nos resultados experimentais obtidos.
e. De acordo com os resultados obtidos nesta experiência, acha que as concentrações medidas no
plasma sanguíneo podem ser um bom indicador das concentrações medidas nos tecidos/fluídos
oculares?

23
TP5. Cálculo de parâmetros farmacocinéticos
O cálculo de parâmetros farmacocinéticos desempenha um papel fulcral no estabelecimento
de um regime de dosagem ou no ajustamento de um regime de dosagem já estabelecido, de forma
a aumentar a eficiência de um fármaco ou a reduzir os sintomas de toxicidade. No processo de
desenvolvimento de novos fármacos, a farmacocinética desses mesmos fármacos é acedida.
Idealmente, a concentração de fármaco deveria ser medida no seu local de ação, ou seja, no seu
recetor. No entanto devido à inacessibilidade de medição das concentrações de fármaco nos seus
recetores, as concentrações de fármacos são normalmente medidas no sangue, nomeadamente no
sérum ou no plasma. É assumido que as concentrações de fármaco no sangue se encontram em
equilíbrio com as concentrações de fármaco nos seus recetores.
Para uma dose administrada uma única vez, e intravenosamente, a concentração será
máxima poucos minutos após a injeção e vai diminuindo ao longo do tempo, à medida que o
fármaco se vai distribuindo pelos diferentes compartimentos do corpo e vai sendo metabolizado
e excretado (Fig. 5.1A). O fármaco deixa a circulação sanguínea através de vários processos: 1)
distribuição através das membranas para as células que constituem os tecidos ou para outros
fluidos corporais; 2) excreção do fármaco não alterado por vias renais ou biliares e 3) metabolismo
do fármaco em outros compostos ativos ou inativos.

Figura 5.1. Gráfico da concentração de um fármaco administrado por via intravenosa (A) e por
via oral (B) versus o tempo. Fonte: Clinical Pharmacokinetics.

No caso de um fármaco que é administrado oralmente o gráfico da concentração versus o


tempo é diferente do gráfico para um fármaco administrado intravenosamente apenas durante a
fase de absorção (Fig. 5.1B). Inicialmente não existe fármaco no plasma pois a formulação tem
que ser primeiro desintegrada e absorvida do estômago ou do intestino, para a circulação
sistémica. No entanto, os gráficos tornam-se similares para a fase pós-absorção (após ter atingido
a Cmáx) ou fase de eliminação.

24
Geralmente, os fármacos são eliminados do organismo seguindo uma cinética de primeira
ordem na qual uma fração constante de fármaco é eliminada por unidade de tempo e esta é
proporcional à concentração de fármaco. Para este tipo de cinéticas, o gráfico da concentração
versus o tempo segue uma exponencial negativa e o gráfico resultante do logaritmo da
concentração versus o tempo é uma linha reta (Fig. 5.2).

Figura 5.2. Gráfico do log da concentração no plasma (logCp) versus o tempo. Fonte: Clinical
Pharmacokinetics.

A partir do gráfico linearizado da fase de eliminação é possível obter parâmetros


farmacocinéticos importantes – a constante de eliminação, o tempo de meia-vida, o volume de
distribuição e a clearance ou depuração, que podem ser muito úteis para determinar os regimes
de dosagem:
• Constante de eliminação, kel: corresponde à fração de fármaco eliminada por unidade
de tempo e equivale ao declive da reta do gráfico do logaritmo da concentração do
fármaco versus o tempo.
• Tempo de meia-vida, t1/2: tempo necessário para reduzir a concentração de fármaco para
metade do seu valor inicial. Este parâmetro é muito importante para estimar quanto tempo
é necessário para estimar, por exemplo, o tempo entre dosagens e é igual a:
t1/2 = ln2/kel  t1/2 = 0,693/kel
• Volume aparente de distribuição, Vd: o volume de distribuição não possui qualquer
significado biológico; não é um volume real, e por esse motivo é referido como
“aparente”. É o volume de plasma requerido para dissolver a quantidade total de fármaco
no corpo, de forma a refletir a concentração atingida no plasma. O volume de distribuição
pode ser expresso como um simples volume ou como percentagem do peso corporal. É
obtido através da razão entre a concentração de fármaco administrada intravenosamente
(dose administrada - D) e a concentração de fármaco no sangue (CP):
Vd = D / CP

25
• Clearance, CL: é o volume de plasma do compartimento vascular depurado por unidade
de tempo devido a metabolismo do fármaco ou à sua excreção. A clearance é constante,
se o fármaco for eliminado por uma cinética de primeira ordem. O fármaco pode ser
eliminado por excreção renal ou por metabolismo ou por ambos. Conhecendo o tempo de
meia vida e o volume aparente de distribuição, é possível determinar a clearance através
da seguinte forma:
CLtotal = 0,693 x Vd / t1/2  CLtotal = kel x Vd
CLtotal = CLrenal + CLnãorenal
Por exemplo, se um fármaco possui uma CL de 2L/h, isto diz-nos que 2L de Vd (no qual o fármaco
está dissolvido) são depurados por hora.

Regimes de dosagem múltipla


Embora alguns fármacos possam ser administrados uma única vez (dose única), a maioria dos
fármacos são administrados durante um longo período de tempo para obter o efeito terapêutico
desejado. Os dois principais modos de administração usados para obter um efeito prolongado são:
1) doses múltiplas discretas, segundo um determinado regime de dosagem e 2) infusão
intravenosa contínua. O objetivo de cada um destes modos de administração de fármacos é
aumentar a concentração plasmática de fármaco até atingir uma concentração no equilíbrio (Ce),
que irá produzir o efeito terapêutico desejado sem provocar toxicidade. Esta concentração no
equilíbrio poderá ser mantida durante minutos, horas, dias ou mesmo durante mais tempo,
consoante o requerido pela situação clínica.

Dosagem múltipla discreta


Na dosagem múltipla discreta, a dose e o tempo entre doses ou intervalo de tempo (T) são
fixos. Os intervalos de dosagem de 6, 8, 12 ou 24 horas são os mais usados. Adicionalmente, para
a dosagem oral, os miligramas por dose devem ser compatíveis com as existentes sob a forma de
comprimidos ou de outras preparações farmacêuticas. O T pode ser selecionado de duas formas:
1) de modo a que todo o fármaco da dose anterior desapareça antes da administração da dose
seguinte (Fig. 5.3A) ou 2) de modo a que o fármaco da dose anterior se encontre ainda presente
quando a dose seguinte é administrada (Fig. 5.3B). No primeiro caso, não há acumulação de
fármaco e não será atingido nenhum “plateau” ou estado de equilíbrio (Fig. 5.3A). No segundo
caso, a concentração plasmática aumenta gradualmente até que o fármaco perdido por eliminação
durante T seja igual à dose de fármaco adicionado no início de T. Quando esta equitabilidade é
alcançada, a concentração média para T é Ce, a concentração no equilíbrio (Fig. 5.3B). A taxa
média (sobre o intervalo da dose) de entrada de fármaco é constante para D/T. A taxa de
desaparecimento do fármaco é muito pequena durante o primeiro T, mas aumenta com a
concentração de fármaco durante os intervalos seguintes até que a taxa média de desaparecimento

26
seja igual à taxa média de entrada de fármaco. Para uma acumulação significativa de fármaco, o
T deverá ser pelo menos tão pequeno como a meia vida ou ainda inferior. Deste modo:
Ce = (D/T) / CL, sendo D/T a taxa de entrada de fármaco e CL a clearance.
Através desta equação é evidente que a dose e a duração do T podem ser alteradas de modo
a modificar a concentração no equilíbrio, Ce. Para uma dose oral:
Ce = (F x D/T) / CL, em que F é a fração biodisponível.

Figura 5.3. Perfis típicos da variação da concentração plasmática para fármacos administrados
em regimes de dosagem múltipla. Em (A) o intervalo de tempo (T) entre a administração das
doses é longo o suficiente de tal modo que cada dose administrada desaparece completamente
antes da administração da dose seguinte. Em (B) o T é muito mais pequeno de tal modo que a
dose da última administração ainda se encontra presente aquando da administração da dose
seguinte. Isto resulta numa acumulação do fármaco com a Ce a representar a concentração média
do fármaco no “plateau”, no qual a taxa média de entrada do fármaco iguala a taxa média de
desaparecimento do fármaco para cada T. Fonte: Human Pharmacology: Molecular to Clinical.

Infusão intravenosa contínua


Numa infusão intravenosa contínua, o fármaco é administrado a uma taxa fixa - dose de
manutenção ou taxa de infusão (R0). A concentração plasmática do fármaco aumenta
gradualmente e depois atinge um “plateau”, a concentração no equilíbrio (Ce), para a qual a taxa
de infusão iguala a taxa de eliminação (Fig. 5.4). Logo, no equilíbrio:
Ce = R0 / CL, em que R0 é a taxa de infusão (ex. mg/min) e CL é a clearance.

27
Figura 5.4. Perfil típico da variação da concentração plasmática (C p) de um fármaco ao longo do
tempo para uma injeção intravenosa contínua a uma taxa de infusão constante. A C p(ss) é a
concentração no “plateau” ou no equilíbrio (C e), onde a taxa de infusão iguala à taxa de
desaparecimento do fármaco. Fonte: https://www.boomer.org/c/p4/c06/c06.pdf

Farmacocinética ocular
A farmacocinética ocular mede a absorção do fármaco em relação ao tempo e em função da
dose administrada. As concentrações alteram-se nos tecidos ou nos fluidos do olho, quando
administradas em diferentes formas de dosagem e através de diferentes vias. A determinação de
parâmetros farmacocinéticos nos tecidos oculares é desafiante devido à anatomia do olho, que
é bastante complexa, e às barreiras fisiológicas e dinâmicas que este possui. As vias mais
convencionais de administração de fármacos oculares incluem a tópica, a local ocular (por
exemplo, subconjuntival, intra-vítrea, retrobulbar e intracameral) e a sistémica (Fig. 5.5).

Figura 5.5. Principais vias de administração de fármacos oculares. Fonte:


https://www.mdpi.com/1999-4923/10/1/10/htm

28
Todas elas enfrentam vários desafios que limitam o sucesso em alcançar as concentrações
desejáveis nos tecidos alvo. O método mais apropriado de administração depende da área do olho
a ser tratada. A conjuntiva, a córnea, a câmara anterior e a íris normalmente respondem bem à
terapia tópica. O segmento posterior requere sempre terapia local ou sistémica, uma vez que a
maior parte da medicação tópica não penetra no segmento posterior, ou as concentrações
alcançadas são muito baixas para provocar o efeito terapêutico desejado. Os fármacos
administrados sistemicamente (e oralmente) atingem o olho através da artéria oftálmica e do plexo
coróide e circulam pela íris, corpo ciliar, coróide e retina. No entanto as paredes dos vasos
sanguíneos na íris e na retina possuem junções muito estreitas entre as células endoteliais
(barreiras sangue-olho e olho-sangue), o que torna a permeação através das paredes dos vasos
sanguíneos muito lenta, e que pode limitar a absorção de fármacos menos lipofílicos e de maior
tamanho.
A farmacocinética ocular tem sido frequentemente estudada assumindo que o olho possui
múltiplos compartimentos, nos quais o fármaco pode ser absorvido, distribuído homogeneamente
em cada tecido/compartimento e eliminado por diferentes vias. A desvantagem é ainda o elevado
grau de desconhecimento sobre a distribuição local nas várias estruturas oculares. Têm sido
considerados os seguintes compartimentos para o estudo da farmacocinética ocular:
1) filme lacrimal e saco conjuntival: após administração tópica, o fármaco entra em contacto
com a córnea. O fármaco é absorvido por permeação do filme lacrimal pré-corneal, através da
córnea, ou através da circulação sistémica a partir dos capilares sanguíneos presentes no saco
lacrimal. Após a instilação, grande parte da dose é drenada para fora devido à baixa capacidade
do saco conjuntival, e, como resultado, menos de 5% do fármaco atinge os tecidos intraoculares.
Os fármacos de aplicação tópica e os seus metabolitos podem ser eliminados através de vários
mecanismos: da ação de pestanejar das pálpebras e da via naso-lacrimal. O fármaco que entra na
câmara anterior pode ser eliminado através do fluxo do humor aquoso para fora do olho.
2) câmara anterior do olho: após absorção através da córnea, os fármacos são transferidos
para o interior da câmara anterior. O fármaco pode ser distribuído para a íris e o corpo ciliar. A
eliminação é efetuada através do fluxo do humor aquoso, para fora do olho que pode ocorrer por
dois mecanismos: através do canal de Schlemm e através do fluxo sanguíneo pela úvea anterior
(a maioria dos fármacos).
3) cavidade vítrea: os fármacos administrados aqui têm acesso direto à cavidade vítrea e à
retina, mas pode levar várias horas até o fármaco atravessar todo o humor vítreo. A permeação de
fármacos da cavidade vítrea para o coróide é lenta devido à barreira imposta pelo epitélio
pigmentar retinal, enquanto que a difusão de fármacos do corpo vítreo para a retina é restringido
pela membrana interna limitante. São vários os fatores que controlam a concentração de fármaco
na cavidade vítrea: a dose inicial, o volume de distribuição e a taxa de eliminação. Na cavidade
vítrea o fármaco pode ser eliminado por vias anteriores e/ou posteriores. A eliminação de fármaco

29
pode ser influenciada primariamente por dois fatores: volume de distribuição e tempo de meia
vida.
4) espaço retro/periocular: o espaço periocular refere-se à periferia ou à região que circunda
o globo ocular. Esta via é considerada efetiva para a administração de fármacos ao segmento
posterior. Os fármacos administrados por esta via podem atingir o segmento posterior através da
via transcleral, da circulação sistémica e através de fluxo sanguíneo coroidal.

30
Exercícios TP5
5.1. Após administração de 1,25 mg de bevacizumab no corpo vítreo (tratamento da retinopatia
diabética), em olhos de coelhos, o tempo de meia vida deste fármaco no plasma sanguíneo foi de
6,86 dias. Determine a concentração plasmática atingida (em µg/mL), a constante de eliminação
e a clearance, assumindo que o volume aparente de distribuição do bevacizumab no plasma
sanguíneo é de 237 mL.

5.2. Observe a seguinte tabela com os resultados dos tempos de meia vida (h), obtidos numa
experiência realizada para estudar a farmacocinética de uma formulação de dorzolamida e de uma
formulação de brinzolamida (tratamento do glaucoma), em vários tecidos e fluidos oculares, após
a administração de 1 gota de cada formulação em olhos de coelhos. Em qual tecido ou fluido
ocular ocorreu uma maior eliminação da Dorzolamida e da Brinzolamida?
t1/2 (h)
Tecido
Dorzolamida Brinzolamida
Córnea 1,08 1,71
Conjuntiva 0,72 1,01
Humor aquoso 7,06 6,16
Retina 0,87 3,94
Corpo vítreo 1,99 8,07
Fonte dos dados: Kadam et al.2011

5.3. Numa experiência para descrever a farmacocinética do fármaco bevacizumab (Avastin),


usado no tratamento da retinopatia diabética, foi injetada uma dose de 1,25 mg de fármaco no
corpo vítreo em olhos de coelhos. A tabela abaixo contém os valores de alguns parâmetros
farmacocinéticos, obtidos em cada um dos compartimentos oculares e no plasma sanguíneo. A
partir de qual dos compartimentos oculares ocorreu uma maior clearance de fármaco?
Compartimento t1/2 (d) Vd (mL)
Corpo vítreo 4,32 2,67
Humor aquoso 4,88 0,13
Plasma 6,86 237
Fonte dos dados: Bakri et al. 2007

5.4. Observe a seguinte tabela em que se encontram alguns parâmetros farmacocinéticos obtidos
na córnea e na conjuntiva, determinados após aplicação de duas formulações diferentes em olhos
de coelhos - o Lotemax 0,5% e o LE-MPP#, 0,4%. Determine as constantes de eliminação para

31
cada formulação, em cada um dos compartimentos oculares. O que pode concluir acerca dos
resultados obtidos?
Cmáx AUC0-12h
Tecido Formulação t1/2 (h)
(ng/g) (ng*h/g)
Lotemax 0,5% 621 1130 3,75
Córnea
LE-MPP 0,4% 2260 1670 1,89
Lotemax 0,5% 1130 1610 4,26
Conjuntiva
LE-MPP 0,4% 2930 1610 1,92
Fonte dos dados: Schopf et al. 2014
#A córnea e a conjuntiva encontram-se revestidas por uma camada externa de 3 a 40 µm de muco. A MPP, “mucus
penetrating particle”, melhora a penetração de fármacos na conjuntiva, uma vez que consegue penetrar mais
rapidamente esta camada de muco.

5.5. A tabela abaixo contém os tempos de meia vida no corpo vítreo de fármacos pertencentes a
diferentes grupos farmacológicos e com diferentes características farmacocinéticas.
Tempo de
Grupo
Fármaco Características meia vida
farmacológico
(h)
Baixo peso molecular
Corticosteroides Dexametasona 3,48
Insolúvel em água
Baixo peso molecular
Antibióticos Ceftizoxima 5,70
Solúvel em água
Análogos da Elevado peso molecular
Octreotide acetate 16,00
somatostatina Solúvel em água
Elevado peso molecular
Antiviral ISIS 2922 62,00
Solúvel em água
Dexametasona: tratamento de inflamações
Ceftizoxima: tratamento de infeções bacterianas
Octreotide acetate: tratamento da retinopatia diabética (antiangiogénico)
ISIS 2922: tratamento de retinite provocada por citomegalovírus
a. Para cada um dos fármacos, determine as constantes de eliminação.
b. O que pode concluir acerca do efeito das características dos fármacos na sua eliminação a partir
do corpo vítreo?

5.6. A seguinte tabela contém os resultados de uma experiência em que um microfilme


biodegradável de prednisolona foi implantado subconjuntivamente em olhos de ratos, com uma

32
taxa de libertação de fármaco contínua de 0,002 mg/dia. Determine a clearance do fármaco a
partir do humor aquoso após 2, 4 e 12 semanas em mL/h.
Tempo Concentração no humor
(semanas) aquoso (ng/mL)
2 76,7
4 70,3
12 42,7
Fonte dos dados: Liu et al. 2013

33
TP6. Exploração de bases de dados de fármacos
A quantidade e complexidade elevadas de informação que existe acerca de fármacos tem
crescido rapidamente. Esse crescimento da disponibilidade de informação acerca de fármacos,
acompanhado pelo aumento do uso de medicação, tem potenciado o papel dos farmacêuticos nas
equipas multidisciplinares de saúde, sobretudo em hospitais, como sendo os grandes especialistas
em medicamentos. O uso de ferramentas que suportem decisões clínicas, tais como as bases de
dados eletrónicas contendo informação sobre os fármacos, podem ajudar os farmacêuticos na sua
prestação de cuidados farmacêuticos, assim como melhorar a segurança da medicação. Como tal,
o acesso dos farmacêuticos a recursos eletrónicos de fácil utilização e que providenciem de uma
forma rápida informação detalhada, precisa, e atual, tem-se tornado cada vez mais importante,
nomeadamente na prática da farmacêutica hospitalar, onde os farmacêuticos clínicos são fulcrais
no processo de tomada de decisões terapêuticas.
Uma das bases de dados mais conhecidas é a DrugBank (https://go.drugbank.com/). Esta base
de dados permite fazer a pesquisa pelo nome comercial do fármaco ou da substância ativa, e
providencia informação detalhada e atual sobre as propriedades físico-químicas dos fármacos, as
indicações e os alvos terapêuticos, os seus mecanismos de ação e a farmacodinâmica, e ainda
informação sobre o seu metabolismo, segurança e toxicidade, parâmetros farmacocinéticos
(quando conhecidos), entre outros.
Usando a base de dados de fármacos DrugBank (https://go.drugbank.com/) pesquise para os
fármacos da Lista 1, e que são usados para tratar afeções do olho, a seguinte informação:
• Indicações terapêuticas
• Nome de uma formulação comercial
• Classe do fármaco (por exemplo: anestésico, antibiótico, antiviral, anti-angiogénico, anti-
glaucomatoso/hipertensor, anti-histamínico, anti-inflamatório, vasoconstritor)
• Recetor/alvo terapêutico
• Mecanismo de ação
• Biodisponibilidade
• Volume de distribuição
• Tempo de meia vida
• Clearance

Lista 1. Fármacos usados para o tratamento de afeções oculares. Entre parenteses encontra-se a
designação em inglês, necessária para efetuar a pesquisa na base de dados DrugBank.
1. Timolol
2. Brimonidina (Brimonidine)
3. Cloranfenicol (Chloramphenicol)

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4. Oxibuprocaína (Oxybuprocaine)
5. Ranibizumab
6. Antazolina (Antazoline)
7. Bromfenac
8. Tetrizolina (Tetryzoline)

35
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