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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO
DIREITO PÚBLICO

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E AS
ATUAIS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL

Giovana Nascimento

Salvador
2014
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E AS
ATUAIS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Universidade Federal da
Bahia, como exigência parcial para obtenção
do título de MESTRE em Direito, na área de
concentração Direito Público, subárea
Constituição, Estado e Direitos Fundamentais,
sob a orientação do Professor Doutor Paulo
Roberto Lyrio Pimenta.

Salvador
2014
Giovana Maria do Nascimento
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E AS
ATUAIS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO EMPRESARIAL

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Universidade Federal da
Bahia, como exigência parcial para obtenção
do título de MESTRE em Direito Público –
Universidade Federal da Bahia.

Área de concentração: Direito Público


Data da defesa: __________________
Resultado: ______________________

Banca examinadora

Nome:_______________________________________________
Titulação e instituição___________________________________

Nome:_______________________________________________
Titulação e instituição___________________________________

Nome:_______________________________________________
Titulação e instituição___________________________________
“Os pensamentos dos justos são juízo, a diretriz dos
iníquos é engano.” (Prov. 12:5)

“Uma vida sem pensamento é totalmente possível,


mas ela fracassa em fazer desabrochar sua
própria essência – ela não é apenas sem
sentido: ela não é totalmente viva. Homens que
não pensam são como sonâmbulos.”
(Hannah Arendt)
DEDICATÓRIA

A Deus, Senhor Todo Poderoso, pelo dom da fé e da vida.


A meu filho Adrian Matheus, benção sem medida em minha vida.
Pensando em você, meu filho, é que meu olhar é sempre em frente.
AGRADECIMENTOS

À minha querida família, pelo amor que nos une, incentivo, alegria e
confiança de sempre.

Aos meus amigos que nesta jornada, ainda que às vezes de longe,
estiveram sempre unidos a mim. Em especial à Milucha Perez e Andressa Amorim,
pela amizade singular de cada uma, estímulo e presença em momentos tão
importantes dessa jornada.

A Paulo Roberto Lyrio Pimenta, exemplo de comprometimento com o


mundo acadêmico e com a construção do conhecimento jurídico.

Ao Prof. Edvaldo Brito, excelente jurista e propagador do conhecimento


tributário e que pelo seu rigor, nos torna melhor e ao Prof. Saulo Casali pela
capacidade de estimular diálogos e o senso crítico sempre pautados no bom senso.

A meu amigo e parceiro de trabalho, Ricardo Fontes de Lima, pela


disposição e várias horas de discussão sobre quem é o verdadeiro responsável pelo
tributo devido diante de determinadas situações fáticas vivenciadas na praxe fiscal.

A meu amigo e Prof. José Antônio Garrido, pelas longas e diversas trocas
de ideias, sempre com incentivo a uma visão ampla e crítica do direito positivo.

A todos os professores, que sempre de alguma forma, colaboraram para


minha formação intelectual, profissional e pessoal e aos vários colegas acadêmicos
que nesta jornada contribuíram para o meu crescimento como estudiosa do Direito.

A todos aqueles que fazem parte do universo jurídico e percebem o Direito


como instrumento de realização da Justiça.
RESUMO

A sujeição passiva e a responsabilidade são fenômenos que disparam tertúlias


doutrinárias e jurisprudenciais. Partindo da premissa de que o Direito é um objeto
cultural que se manifesta através de realidades jurídicas distintas e com linguagem
próprias criam suas realidades: a Ciência do Direito com linguagem descritiva e o
Direito Positivo com a linguagem prescritiva, partimos para análise das normas que
versam sobre os ditos institutos jurídicos, em sua perspectiva estática e dinâmica,
com ênfase na responsabilidade solidária e subsidiária, fixando o conteúdo, suas
características e alcance numa apreensão sistematizada do ordenamento jurídico. O
texto constitucional é nosso feixe de luz para seguirmos nas análises acerca da
inserção no polo passivo da relação jurídica tributária do sujeito, ainda que não
tenha praticado o fato signo presuntivo de riqueza que desencadeou a obrigação
tributária. Em específico na análise das citadas normas procuramos o alcance de
uma hermenêutica que traduza a realização da solidariedade social e da justiça
fiscal quando o corte é estreitado para as formas de organizações empresariais
ilícitas.

Palavras-chave: Sujeição passiva tributária. Responsabilidade tributária.


Pessoalidade. Solidariedade. Subsidiariedade. Organização empresarial.
ABSTRACT

The passive subjection and responsibility are phenomena that trigger doctrinal and
jurisprudential gatherings . Assuming that the law is a cultural object that is
manifested through different legal realities and create their own language realities :
the science of law with descriptive language and positive law with the prescriptive
language, we set out to analyze the rules that deal with said legal institutions in its
static and dynamic perspective , with emphasis on solidarity and joint liability , setting
the content , characteristics and scope in a systematic apprehension of law . The
Constitution is our light beam to follow the analyzes concerning the insertion
defendant in the tax legal relationship of the subject , although it has not committed a
presumptive sign of wealth that actually triggered the tax obligation . In particular the
analysis of the mentioned standards seek to reach a hermeneutic that reflects the
achievement of social solidarity and justice when the tax cut is narrowed to illicit
forms of business organizations

Keywords: Passive Entry tax . Tax liability . Individuality. Solidarity . Subsidiarity .


Business organization
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Art. Artigo
CC - Código Civil Brasileiro de 2002
CTN - Código Tributário Nacional
CF/88 - Constituição Federal de 1988
EC - Emenda Constitucional
LSA - Lei das Sociedades por Ações
ICMS – Imposto sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações
e prestações se iniciem no exterior.

IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados

IPTU – Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana

IR – Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer natureza

Min – Ministro
PAF – Decreto n° 70.235, de 06.03.72
Resp - Recurso Especial
RE - Recurso Extraordinário
Rel - Relator
Superior Tribunal de Justiça - STJ
Supremo Tribunal Federal - STF
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 12

Primeira Parte
PREMISSAS EPISTEMOLÓGICAS FUNDAMENTAIS: DIREITO
POSITIVO, CIÊNCIA DO DIREITO E O SISTEMA JURÍDICO TRIBUTÁRIO

CAPÍTULO 1. NOÇÕES E CONCEITOS FUNDAMENTAIS ….......................... 20

1.1. O Saber Científico: aspectos, objeto e metodologia ..................................... 20


1.2 Sistemas Jurídicos de Linguagem: Direito Positivo e Ciência do Direito .... … 24

CAPÍTULO 2. O SISTEMA JURÍDICO TRIBUTÁRIO …......................................... 28

2.1 Notas iniciais ….................................................................................................. 28


2.2 Princípios constitucionais: normas jurídicas objeto da interpretação ................ 30
2.2.1 Princípios cardeais da tributação na Constituição …................................ 34
2.2.1.1 Princípio da estrita legalidade, da tipicidade e da reserva de lei
complementar …...................................................................................................... 39
2.2.1.2 Princípio da vedação à tributação com efeito de confisco .................... 42
2.2.1. 3 Princípio da capacidade contributiva ….............….... …................... 45
2.3 Norma jurídica tributária : conceito, estrutura e classificação ............................ 53
2.4 O Fenômeno da Incidência tributária …......................................................... . 56
2.5 A Relação jurídica tributária …..... …....................................................... …..... 58
2.5.1 A sujeição passiva tributária: o contribuinte e o responsável tributário ….... 60

Segunda Parte
A RESPONSABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO

CAPÍTULO3. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA: ALCANCE E


CARACTERÍSTICAS …..........................................................................................

3.1 Responsabilidade tributária: conceito e natureza jurídica ............................ 66


3.1.1 A responsabilidade como sanção …............................................................. 71
3.1.2 A responsabilidade papel institucional ................................................... 77
3.2.Notas sobre substituição tributária: repercussão jurídica por reembolso ou por
retenção na fonte ….................................................................................................. 81
3.3 Notas sobre responsabilidade tributária por transferência: os sucessores e os
terceiros ….............................................................................. …............................ 87
3.4 Notas sobre responsabilidade por infrações …................................................. 94

CAPÍTULO 4 A MOLDURA DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA NO CTN:


SOLIDARIEDADE, SUBSIDIARIEDADE E PESSOAL

4.1 Responsabilidade Tributária: solidária, subsidiária e/ou pessoal …............... 98


4.1.2 Art.124 do CTN : fundamento de validade da responsabilidade solidária .. 103
4.2 A solidariedade passiva: interesse comum e previsão em lei …..................... .105
4.3. Grupo econômico: responsabilização tributária ….......................................... 116
4.4 A responsabilidade tributária do sócio ou administrador: interpretação e alcance
do art.135, III .......................................................................................................... 122
4.5 Contextualização da responsabilidade dos administradores: necessidade de
integração do art.135, III por outros enunciados prescritivos …........................... 128

Terceira Parte

A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E AS ATUAÇÕES EMPRESARIAIS


ILÍCITAS

CAPÍTULO 5 RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E A CONDUTA ILÍCITA........131

5.1 A Sociedade empresária: tipo societário e a responsabilidade ….................. 131


5.2 Organização societária e a patologia fiscal de não arrecadar tributos ….........133
5.3 A responsabilidade tributária no grupo econômico irregular organizado por
interpostas pessoas: solidária, subsidiária ou pessoal do sócio ou administrador
….............................................................................................................................134
5.4 A desconsideração da personalidade jurídica e o ônus da prova que implica a
responsabilidade tributária …...................................................................................137

CONCLUSÃO .........................................................................................................140
REFERÊNCIAS.......................................................................................................160
INTRODUÇÃO

Uma premissa fundamental há que ser lançada: a atual concepção da


Constituição1 - um relicário de valores sociais, ideológicos, políticos, e econômicos
fundamentais, expressos por normas jurídicas vinculantes que informam o Estado e
a sociedade e os conformam como uma ordenação sistematizada juridicamente – é
fruto de uma evolução ocorrida nas trilhas históricas, sociais e políticas do que
resultou no modelo chamado constitucionalismo moderno, ou neoconstitucionalismo,
ou ainda na terminologia utilizada na Carta Magna, Estado Democrático de Direito
Tal concepção da Constituição é numa visão alargada como o resultado
do jogo dialético entre a concepção socialista de Ferdinand Lassale que defendia
ser a Constituição a soma dos fatores reais de poder que regem uma sociedade e
que tais forças poderiam estar transcritos ou não em uma “folha de papel” 2, da visão
eminentemente jurídica Kelseniana3 – a Constituição como norma fundamental que
orienta e conforma todas as demais normas do ordenamento jurídico, e ainda da
construção de Konrad Hesse – a Constituição com força normativa, não apenas uma
expressão do ser, mas também de um dever ser, para além do simples reflexo das
condições fáticas de sua vigência4, e que portanto a sua pretensão de eficácia se
firma quando imprime ordem e conformação à realidade fática.
Foram apenas uns respingos de notas para anunciarmos que a pesquisa
se desenvolve a partir da noção de que o “direito é um instrumento”5, que tem

1 A Constituição conceituada por José Adércio Leite Sampaio: “a Constituição é, em primeiro lugar,
uma ato de fé. Fé nas possibilidades de as formas jurídicas, assentadas em um padrão de valores e
crenças positivadas, mediarem os conflitos sociais” ( SAMPAIO. José Adércio Leite Teoria e prática
do poder constituinte. Como legitimar ou desconstruir 1988 – 15 anos depois. In SAMPAIO.
José Adércio Leite ( coord.). Quinze anos de Constituição. Belo Horizonte:Del Rey, 2004.p.59.
2 LASSALE, Ferdinand. A essência da constituição. 3. ed. Rio de Janeiro: Liber Juris, 1995.p.32
3 Para kelsen, a Constituição é entendida como um sistema de normas vigentes em determinado
Estado, alijadas de qualquer conteúdo ou qualquer consideração valorativa que possa ser feito, assim
como pouco importando se tais normas correspondem ou expressem o ideal de justiça. Esta
concepção, chamada de positivismo jurídico, teve sua grande expressão no citado autor, ao formular
a sua teoria pura, na qual buscou depurar o Direito, que era o seu objeto de pesquisa, de quaisquer
outros elementos informadas por outras ciência, bem como de quaisquer fatores, como o político, o
filosófico. A ciência do jusfilósofo alemão era a do dever-ser, e não a do ser. (KELSEN, Hans. Teoria
Pura do Direito. Tradução de João Baptista Machado. 8.ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.)
4 A construção de Konrad Hesse se coloca como uma ponderação entre aquelas, o fio tênue que
minimiza a tensão entre a norma e o real. Pois se opõe à definição lassaliana de Constituição, bem
como à rigidez exacerbada do positivismo jurídico, afirmando que a Constituição que portanto a sua
pretensão de eficácia se firma quando imprime ordem e conformação à realidade fática . (HESSE,
Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1991, p.15.)
5 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 2002.p.63
morada na força normativa da Constituição, através do qual o Estado age para
regular as condutas intersubjetivas, dirimir conflitos e instalar a segurança na
realidade social, pois projetando-se sobre esta atua não como um fim em si mesmo,
mas como revelador dos valores por ela irradiados num determinado tempo
considerando-se o contexto histórico, social, cultural e político.
O fenômeno da sujeição passiva tributária e por consequência o da
responsabilidade tributária nasce na Constituição, ou melhor, na estrutura
constitucional6 que delineia a escolha do critério pessoal da regra matriz de
incidência, em letras mais específicas, do sujeito passivo da relação jurídica
tributária.
No entanto esta é apenas uma nuance a ser estudada no instituto jurídico
da sujeição passiva tributária e da responsabilidade tributária, a que se refere aos
limites constitucionais e legais de sua definição, cabendo ressaltar que estamos
tratando de um tema envolvido em névoas densas legais, doutrinárias e
jurisprudenciais.
Por esta trilha é que corremos no sentido uma hermenêutica integrativa e
contextual desses institutos jurídicos e da sua relação com outras normas do
ordenamento tributário, que lhes fundamenta a validade e norteia os seus efeitos na
relação jurídica tributária quando da aplicação do direito nas situações fáticas da
vida real, campo fértil de várias imprecisões, dúvidas e decisões não unânimes.
Assim é que o estudo ora proposto tem como feixe de luz a perspectiva
dinâmica da responsabilidade tributária não atrelada à simples análise das normas
jurídicas, em seus nexos de subordinação e derivação, mas partindo do desenho
constitucional da previsão do sujeito passivo, percorrendo as normas dispostas pelo
legislador infraconstitucional no exercício de competência tributária se conexas ou
não aos traçados constitucionais, não só no que se refere aos limites materiais e
formais da hipótese de incidência tributária quando da instituição dos tributos, mas
principalmente no que toca à máxima do constitucionalismo moderno7 centrada na

6 Há uma acentuada controvérsia doutrinária acerca da dimensão constitucional do sujeito passivo da


relação tributária, se ao descrever nas competências das pessoas políticas a hipótese de incidência
da exação estaria incluído ou não, e ainda até que ponto há liberdade do legislador infraconstitucional
para defini-lo. Pensamos com aqueles que veem na norma constitucional traçados os critérios que
formam o conteúdo da regra matriz de incidência, inclusive o sujeito passivo. Mas o tema será tratado
com mais acuidade em momento oportuno desse trabalho dissertativo.
7 Segundo Luís Roberto Barroso” Democracia, direitos fundamentais, desenvolvimento econômico,

justiça social e doa administração são algumas das principais promessas da modernização. Estes os
proteção e garantia dos direitos fundamentais8, e numa nova concepção para o
direito tributário, o contribuinte (lato sensu) como seu ponto nuclear 9 para enfim
alcançarmos o propósito mais específico que mora no estudo da responsabilização
nas suas características solidária e subsidiária, em função do contexto em que
sociedades empresárias são organizadas de forma irregular, inclusive na abordagem
quanto aos atos de administração de seus sócios e administradores e a repercussão
quanto à inclusão pela norma individual e concreta veiculada pelo lançamento
tributário na constituição do crédito tributário, do sujeito passivo responsável pelo
pagamento do tributo devido, o caráter imprescindível ou não do ato para tal
inclusão, e ainda acerca da possibilidade de inclusão em momento posterior pelo
redirecionamento da execução fiscal.
O percurso é sinuoso e não menos instigante, e para fazê-lo a abordagem
abarca a tríade legislação-doutrina-jurisprudência como fontes de pesquisa que
refletem o universo jurídico – sua criação, aplicação e a proteção e garantia da
supremacia e efetividade das normas constitucionais9, a força propulsora é o de
alinhar a teoria desenvolvida à pratica obtida diante dos fatos da vida profissional.
Esmiuçando os passos a serem dados para a realização do estudo é que
partimos para a segunda premissa a ser destacada, qual seja, a ideia de que o
Direito como um fenômeno cultural, uno e indivisível, se expressa em duas
realidades inconfundíveis, com linguagem e formas próprias, assim como objetos
distintos. Trata-se da Ciência do Direito e do Direito Positivo.
Pois bem. A partir das noções fundamentais que diferenciam a Ciência do
Direito do Direito Positivo, seus conceitos, sistematização e objetos é que serão
estabelecidas as premissas fundamentais desse tratado discursivo, abrindo

fins maiores maiores do constitucionalismo democrático, inspirado pela dignidade da pessoa humana,
pela oferta de iguais oportunidades às pessoas, pelo respeito à diversidade e ao pluralismo e pelo
projeto civilizatório de fazer de cada um o melhor que possa ser.”BARROSO, Luís Roberto. Curso de
Direito Constitucional Contemporâneo: os Conceitos Fundamentais e a Construção do Novo
Modelo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2011.p.114).
8 Gilmar Mendes ao se pronunciar sobre tal concepção de núcleo essencial ser determinada pelo

fato de o Constituinte considerar tão relevante o conteúdo dos direitos fundamentais que “neles se
encontram ancorados os elementos e princípios essenciais da ordem constitucional” ( MENDES,
Gilmar Ferreira. Limites da Revisão : Cláusulas Pétreas ou garantias de Eternidade.
Possibilidade Jurídica de sua Superação”, in:Revista da Associação dos Juízes do Rio Grande do
Sul (AJURIS), n.60,1994, p.250.) Portanto, a jurisdição constitucional é aqui percebida como um
sistema de ações estatais que garanta a supremacia constitucional e a proteção dos direitos
fundamentais, sendo suas maiores expressões, o controle de constitucionalidade das leis e atos
normativos e a interpretação sistemática e integrativa conforme a constituição, para atribuição de
sentido que realize os ditos valores constitucionais do Estado de Direito.
9 BECHO, Renato Lopes. Filosofia do Direito Tributário. São Paulo:Saraiva, 2009.p.343.
caminhos de forma lógica e coerente para o seu percurso, no sentido de que as
conclusões traçadas possam ser melhor fundamentadas e compreendidas.
Para este feito preliminar, faz-se necessário um realce na linguagem pela
qual as duas realidades jurídicas se manifestam , ou seja: a Ciência do Direito, que
tem por objeto o estudo em linguagem descritiva, do complexo das normas jurídicas
válidas em busca da uniformização, unidade e complementariedade do sistema
jurídico – o Direito Positivo - enquanto este, aqui considerado como o complexo de
tais normas jurídicas válidas10 em determinado tempo histórico, se manifesta através
de uma linguagem prescritiva, incidindo sobre fatos considerados relevantes pelo
legislador para o fim a que se propõe, juridicizando-os e atribuindo-lhes efeitos.
Ou seja, o direito positivo com a missão de disciplinar a conduta humana
no meio social, compreende um plexo de normas jurídicas válidas que são
organizadas mediante a lógica deôntica ( lógica do dever-ser, lógica das normas)11
de forma hierarquiza , numa relação de coordenação e de subordinação formando
assim um grande sistema que é o ordenamento jurídico, do qual faz parte como
microssistema, o sistema tributário.
Nesta trilha é que será demarcada metodologicamente a temática central
desse trabalho, ou seja, a partir da leitura dos enunciados prescritivos das normas
jurídicas que atinam à responsabilidade tributária no plano do Direito Positivo –
como sistema de referência, no fito de demonstrar uma possível exegese do instituto
jurídico da responsabilidade tributária possa contribuir com o desenvolvimento do
tema, para além de sua feição teórica, como também em sua aplicação prática.
A partir das premissas fincadas de que o Direito Positivo é um fenômeno
cultural manifestado em linguagem própria e sob este prisma constitui o farol para
alcançarmos o objetivo pretendido acima destacado, é que utilizamos o método
analitico-hermenêutico proposto pelo construtivismo lógico-semântico.
O próximo passo será um debruçar sobre o sistema jurídico constitucional
brasileiro, passando pela seara da norma jurídica - da norma geral e abstrata à sua
individualização e concretização – conceito, estrutura lógica, dando realce ao
conceito de tributo, ao fenômeno da incidência tributária e da regra-matriz de
incidência tributária, do fato jurídico e da norma de competência tributária que
delineia a sujeição passiva, passando pelos princípios constitucionais tributários,

10 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21.ed. São Paulo:Saraiva, 2009.p.2
11 Idem, Ibidem. p.3
ainda que todos relevantes, a ênfase será dada aos que se alinham de forma mais
estreita ao nosso objeto de estudo, para enfim tratarmos da relação jurídica
tributária, notadamente da sujeição passiva com relação à classificação de tributos
em vinculados e não vinculados, a moldura constitucional do sujeito passivo da
exação, bem como a classificação adotada no Código Tributário Nacional, em
contribuinte e responsável.
A segunda parte do trabalho envolve o estudo da responsabilidade
tributária prevista no ordenamento jurídico tributário no que se refere aos aspectos
principais que a caracterizam de forma geral, hipóteses previstas no Código
Tributário Nacional, ressaltando aspectos relevantes, sem cair nas minúcias quanto
à classificação e aos vários aspectos que envolvem a responsabilidade de terceiros,
por infrações e ainda a substituição tributária. Assuntos que por sua relevância e
extensão, nos tiraria de imediato do corte metodológico a que nos propusemos,
portanto as notas serão breves, no entanto essenciais para a compreensão da
sistematização posta pelo legislador no ordenamento jurídico tributário.
No recorte estrutural do trabalho, compondo ainda a sua segunda parte,
nos aproximamos sem perder o fôlego ao tema da solidariedade tributária e da
responsabilidade dos sócios e administradores, analisando seus conceitos, natureza
jurídica e condutas que desencadeiam a circunstância de figurarem no polo passivo
da relação jurídica tributária, nas hipótese de obrigações solidárias e subsidiárias.
Os olhos serão postos com mais apuro no sentido de buscarmos argumentos e o
sentido jurídico para a utilização do instituto da solidariedade quando da constituição
do crédito tributário, ou seja, o ingresso de pessoa jurídica diversa da que praticou o
fato jurídico tributário ou ainda se é cabível a inclusão da pessoa do sócio ou
administrador no polo passivo solidário ou subsidiário e em que circunstâncias.
Aspectos que serão tratados no primeiro momento considerando organizações
empresariais lícitas e atos de gestão com infração de lei ou em desacordo ao
estatuto ou contrato social em detrimento dos interesses do contribuinte.
Enfim, lançamos a última premissa que serve de arrimo para o traçar da
terceira e ultima parte desse trabalho: é preciso separar o joio do trigo12. Isso

12 A parábola bíblica ( Mt.13, 24-30) indica o joio como uma semente ruim, em meio à plantação da
boa semente. Como toda linguagem, há várias possibilidades de interpretação e a que trazemos para
o nosso trabalho, para o mundo da humanidade e do Direito é a questão que todos dentro do seu
livre-arbítrio escolhem as condutas dentro das múltiplas oportunidades, inclusive as ilícitas, em
proveito próprio e em detrimento de toda sociedade. A referência é sobre os que organizam a
mesmo, inclusive no universo de possibilidade da prática de fatos eleitos para
irradiarem seus efeitos tributários e assim instalar a relação jurídica tributária.
Cuidaremos neste último momento do fenômeno da solidariedade e da
subsidiariedade tributária quando da organização de sociedades empresárias de
forma ilícita, irregular, onde ao seguir os trilhos da situação fática caiba a
formalização do grupo econômico pela autoridade administrativa, ou ainda quando
esta se depara com a organização de sociedades por interpostas pessoas. As
curvas aqui se acentuam muito, no entanto passo a passo vamos tratar da distinção
entre pessoa jurídica, a personalidade e o patrimônio, considerando o conceito e a
função que uma sociedade empresária exerce, para no momento seguinte
alinharmos o tipo societário à possível atribuição de responsabilidade, considerando
as duas situações fáticas ora analisadas
A indagação é se na constituição do crédito tributário é possível tributário
a inclusão de variadas pessoas pessoas jurídicas, assim como também os sócios e
administradores como responsáveis tributários pelo tributo devido, e mais, até que
ponto os sócios com poder de gestão ou não podem ser realmente envolvidos, e
qual tipo de responsabilidade, se solidária ou subsidiária, para então anotarmos
pontos relevantes com relação à teoria da desconsideração da personalidade , da
sua necessidade ou não para o alcance da responsabilização da pessoa dos sócios
ou administradores, para enfim nas últimas anotações, fazer uma alusão ao ônus da
prova do fato que enseja a responsabilidade tributária.
Por oportuno, importa destacar que ainda que tomado o Direito Positivo
como arrimo para o desenvolvimento do trabalho, não traduz a sua redução à
normatividade, posto que não se pretende descurar da dinamicidade valorativa
imposta pela realidade social, a evolução por ela trazida e a sua irradiação no
mundo jurídico, compondo o jogo dialético entre a realidade social e a realidade
jurídica.
Afinal de contas, para fazer uma metáfora do que diz Stephen Hawking
sobre o universo, o direito também pode assim ser visto, como um espaço que

sociedade empresária como um meio, dentre outros, de não arrecadar tributos e de auferir cada vez
mais lucros. Nesse sentido é que na hermenêutica dos enunciados prescritivos que versam sobre a
“responsabilidade tributária” torna-se imprescindível a análise miúda de cada situação fática. Como
bem diz Huberto Rohden “ o livro arbítrio põe o homem numa bifurcação positiva negativa; o livre
arbítrio é o maior privilégio do homem – e também o seu maior perigo” (ROHDEN, Huberto.
Sabedoria das Parábolas. Martin Claret, 2005, p.44).
continua e continua e continua13 sempre, mas ainda que envolvido numa casca de
noz, tomada aqui como os enunciados prescritivos da norma fundamental14
Kelseniana que norteia todas as demais normas do sistema jurídico, não pode ter
sua validez lógica à margem de toda evolução.15
Estamos tratando de “responsabilidade tributária” no dizer de Eurico
Marcos Diniz de Santi, “uma das expressões que melhor espelham as perplexidades
do mundo jurídico”16, assim é que no desenrolar desse estudo não há pretensão de
pontuar com linhas de zinco as conclusões que possamos sacar, nem tampouco
direcioná-las em favorecimento de qualquer das partes da relação jurídica tributária.
A única pretensão é a de colaborar no desenvolvimento do conhecimento do tema,
onde se busca demonstrar de forma fundamentada que a interpretação do fenômeno
estudado pode ser dada com olhos postos na realização de uma das finalidades
precípuas da tributação: a solidariedade social e a justiça fiscal.

13 HAWKING, Stephen. O Universo numa Casca de Noz. 10.ed. Tradução de Ivo Korytowski. São
Paulo:Arx,2002.p. 69.
14 Para kelsen, a “Constituição é o ponto de partida de um processo: o processo da criação do Direito

Positivo e se se pergunta pelo fundamento de validade de uma norma pertencente a uma


determinada ordem jurídica, a resposta apenas pode consistir na recondução à norma fundamental
desta ordem jurídica”. A nota principal era assim para o jurista austríaco, a da normatividade da
Constituição situada no ápice da pirâmide normativa, como fundamento de todo o ordenamento
jurídico, como um ponto nuclear que funciona como um princípio supremo que ao mesmo tempo
determina a ordem estatal e a essência da comunidade constituída por essa ordem. (KELSEN, Hans.
Teoria Pura ….......op.cit.p.222.)
15 VILANOVA, Lourival. Sobre o Conceito de Direito. Recife: Imprensa Oficial, 1947.p.82
16 SANTI, Eurico Marcos Diniz. Prefácio de Responsabilidade Tributária e os atos de formação,

administração, reorganização e dissolução de sociedades. PEIXOTO, Daniel Monteiro. São


Paulo:Saraiva,2012.p.23)
PRIMEIRA PARTE

PREMISSAS EPISTEMOLÓGICAS FUNDAMENTAIS: DIREITO


POSITIVO, CIÊNCIA DO DIREITO E SISTEMA JURÍDICO
TRIBUTÁRIO
CAPÍTULO I

NOÇÕES E CONCEITOS FUNDAMENTAIS

1.1 O saber científico: aspectos, objeto e metodologia da


Pesquisa. 1.2 Sistemas jurídicos de linguagem: Direito
Positivo e Ciência do Direito

1.1 O saber científico: aspectos, objeto e metodologia

A teia do conhecimento científico é traçada a partir de premissas


estabelecidas para que sejam alcançadas proposições que se enunciem não como
verdades incontestes, absolutas, ou de pura racionalidade apartada do conteúdo
valorativo17 filosófico ou ideológico, que carrega aquele que se propõe a obter o

17 Como Karl Popper, “acima de tudo, que nenhuma teoria está isenta do ataque da crítica; e, mais
ainda, que o instrumento principal da crítica lógica a contradição lógica - é objetivo”, e mais adiante
alinhava que “o cientista "objetivo" ou "isento de valores" é, dificilmente, o cientista ideal ( Cf.
POPPER, KARL. Lógica das Ciências Sociais. 3.ed. Tradução de Estevão de Rezende Martins. Rio
de janeiro: Tempo Brasileiro, 2004. p. 16 – 21.
18 VILANOVA, Lourival. As Estruturas Lógicas e o Sistema de Direito Positivo. 4.ed. São Paulo:

Noeses, 2010.p.1.
conhecimento, mas no sentido de que após as verificações e reflexões feitas possa
contribuir na construção de determinada teoria.
O conhecimento é fato complexo18, mas no revés, age como um meio apto
a reduzir a própria complexidade da pesquisa científica, quando revela suas
peculiaridades que determinam que seja feita a delimitação do objeto de estudo, e a
escolha do método19 a ser aplicado na aproximação do objeto em análise, no intuito
que os fenômenos verificados sejam ordenados e possibilitem que as conclusões
alcançadas sejam rastreadas num fio condutor lógico, que possam garantir certa
margem de segurança nos resultados, a coerência unitária de seus juízos e a sua
adequação ao real.20
Pois bem, nessa órbita é que gravita o conhecimento jurídico científico, e
a partir de tais premissas iniciais é que se revela que o objeto da pesquisa abarca o
direito positivo em seu universo de nomas jurídicas válidas, numa perspectiva
semântica ampla, para no passo seguinte, por cortes metodológicos, alcançarmos
as normas que efetivamente serão objeto de análise, ou seja, as gerais e abstratas
do Sistema Constitucional Tributário, do Código Tributário Nacional e ainda do
Código Civil, que influam direta ou indiretamente no regramento do fenômeno da
responsabilidade tributária.
Mais precisamente a pesquisa deita nas normas de responsabilidade
tributária que atinam à solidariedade e à subsidiariedade, quanto ao seu conteúdo,
alcance e interpretação sistemática, considerando ainda o caráter estático e
dinâmico que as caraterizam, do que se faz necessário para que o processo
metodológico seja melhor acurado, que tragamos à tona aspectos práticos alinhados
ao relicário teórico dissertativo, no intuito de que se estabeleça um diálogo na
verdade intrínseco, da teoria com a experiência prática, o que no discurso metafórico
podemos dizer, verso e reverso de uma mesma medalha, que realiza o Direito.
Lourival Vilanova resume bem a conexão intrínseca entre a experiência e
a ciência para a realização do Direito:

19 Fabiana Del Padre Tomé ressalta a importância da escolha do método para a aproximação do
objeto a ser conhecido, pois o método errado acarretaria no não conhecimento, ou o conhecimento
obtido a partir de um sistema de referência errado, ou ainda sem sistema de referência impedindo o
alcance de sua veracidade.( TOMÉ, Fabiana Del Padre Tomé. A prova no Direito Tributário. São
Paulo:Noeses, 2005.p.8-19)
20 REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.55
21 VILANOVA, Lourival. As Estruturas Lógic............op.cit, p.290.
Ante a concreção existencial do Direito dado na experiência
profissional e na experiência científico dogmática (…) a análise
formal lógica do Direito nos dá muito pouco. (…) não nos dá o
universal concreto, seja axiológico, seja factual histórico,
porque estes se revelam no processo mesmo da cultura, que é
a forma concreta global em que se desenvolve o Direito, como
os demais subsistemas normativos reguladores da conduta
humana. 21

Por oportuno cabe ressaltar que na fenomenologia da responsabilidade


tributária estão envolvidas questões políticas, sociais e econômicas, e ainda que não
se descure da importância que cada uma carrega, será o viés jurídico, o feixe de luz
a ser seguido no desenvolver deste trabalho.
Mas, de imediato, importa ainda aclarar que no esforço analítico de
compreensão e interpretação das citadas normas, a atividade da jurisdição
constitucional em matéria tributária sempre que oportuna será realçada para que as
duas realidades possam ser objeto de um sincretismo hermenêutico.
Nesse compasso é que, neste trabalho, a busca é por realizar um estudo
utilizando o método hermenêutico analítico, em que o conhecimento das normas
sobre a responsabilidade tributária, e em especial das que serão delimitadas, não
seja resultado de sua pura apreensão, de forma literal ou autônoma, mas obtido a
partir de compreensão da linguagem em que seus enunciados são emitidos.
Assim é que no desenrolar da pesquisa é de grande importância a
premissa da autorreferência da linguagem com arrimo no chamado Construtivismo
Semiótico, por considerar os planos analíticos que constituem a essência da
linguagem humana e propiciam três relações, quais sejam:”primeira, aquela que
ocorre entre o signo e o objeto que ele designa ( semântica); segunda, a relação dos
signos entre si ( sintaxe); terceira é aquela, entre o signo e o sujeito que o emprega (
pragmática)”21
A linguagem, após o movimento filosófico denominado “giro linguístico”,
deixou de ser apenas um instrumento que representava a realidade como era vista
pelo sujeito, um evento ou objeto, ou ainda como um simples meio de comunicação
que representava o conhecimento que existia da relação entre o sujeito e o objeto,
ou simplesmente um meio de comunicação entre dois sujeitos. A linguagem passou

2 1 BRITO,
Edvaldo. Limites da revisão constitucional. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1993.p.17.
22CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o construtivismo lógico-
semântico. São Paulo: Noeses, 2009.p.13.
assim a ser o pressuposto por excelência para o conhecimento 22 e nesta senda é
que este será por aquela vertido no discurso científico, inclusive o jurídico.
Com o novo paradigma a linguagem passa a se bastar por si mesma, não
um meio, mas uma referência por si própria, independendo de experiências do
mundo exterior, passando a ser a criadora do sujeito, do objeto, do conhecimento e
da comunicação que se instala através dela, pois são pelas palavras, das relações
no contexto em que estão inseridas e conforme o sistema de referência que se
tenha, que a linguagem passa a construir ainda que de forma não absoluta a
realidade, e dentro dela, a realidade social, como anuncia Paulo de Barros de
Carvalho23, ou seja, a linguagem é o universo em que os dados, os
acontecimentos24, o mundo se expressa em enunciados passíveis de compreensão,
inclusive o direito.
Isso mesmo. O direito como realidade social no universo dos bens
culturais se expressa através da linguagem, a linguagem jurídica, ou mais
precisamente, em discursos jurídicos linguísticos, um que cabe à Ciência do Direito,
e o outro ao seu objeto, em sentido estrito, o direito positivo.
Nesta trilha, Eurico Marcos Diniz de Santi anuncia que:

Também como linguagem se apresenta a Ciência do Direito, que


descreve o direito positivo e o sobrepõe na posição de
metalinguagem. O cientista não faz o direito; fala sobre ele, separa
conceptualmente as normas jurídicas.25

E Paulo de Barros Carvalho alinhava:

Tal discurso, eminentemente descritivo, fala de seu objeto – o direito


positivo – que, por sua vez, também se apresenta como um estrato
de linguagem, porém de cunho prescritivo. Reside exatamente aqui
uma diferença substancial: o direito posto é uma linguagem
prescritiva ( prescreve comportamentos), enquanto a Ciência do
Direito é um discurso descritivo ( descreve normas jurídicas).26

23 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos da Incidência. 9.ed.


São Paulo:Saraiva,2012. p. 35.
24Nessa trilha segue o pensamento de Fabiana Del Padre Tomé quando escreve: “Os acontecimentos

não falam. É a linguagem que os constitui e também é ela que os destrói. Não são os eventos que se
rebelam contra uma teoria, demonstrando sua inadequação a eles. Somente uma teoria refuta outra
teoria”. ( A prova no Direito Tributário. São Paulo:Noeses, 2005.p.19)
25
SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento Tributário. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.p.28.
26 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 21.ed.São Paulo:Saraiva,2009.p.3
Nesta trilha é que a linguística considerada em sua autorreferência, ou
melhor, a utilização do construtivismo semiótico torna-se imprescindível para que
seja alcançado os verdadeiros sentidos da significação, do alcance e conteúdo de
expressões que são utilizadas no universo da responsabilidade tributária, dentro do
próprio domínio do Direito, manifestado na linguagem prescritiva enunciada pelas
normas constitucionais, pelo Código Tributário, Código Civil e demais instrumentos
normativos verificados, sem desconsiderar os parâmetros ou critérios fincados pela
linguagem de sobre nível no sentido de alcance com mais precisão da realidade
imanente ao fenômeno jurídico objeto de nosso estudo.
Nessa perspectiva que será estudada a responsabilidade tributária, como
um fenômeno jurídico a ser interpretado em suas inter-relações por meio da
linguagem.
É claro que para os efeitos acima pretendidos há uma ferramenta que se
alinha, ou se melhor caiba, uma metodologia irrecusável27 que é ao mesmo tempo
intrínseca à linguagem prescritiva do Direito, que é a lógica deôntica que permeia as
estruturas ou fórmulas linguísticas lógicas contidas nas normas jurídicas a serem
interpretadas nos valores de válidas ou inválidas, e não nos valores de certo ou
errado, estas por sua vez, informam a linguagem descritiva da Ciência do Direito.

1.2 Sistemas jurídicos de linguagem: Direito Positivo e Ciência do Direito

Seguindo as trilhas do fio condutor do raciocínio exposto nas linhas


iniciais desse estudo, o de que com as premissas fundamentais estabelecidas é que
será possível o alcance da temática central proposta, damos o próximo passo no
sentido de aclarar, a partir da ideia de Direito como um fenômeno que se manifesta
através da linguagem28 intrínseca às suas realidades jurídicas - o Direito Positivo e a
Ciência do Direito - que estas não se confundem e que os seus diferentes objetos

27 VILANOVA, Lourival. As Estruturas..., op.cit, p.29.


28 Para o mestre pernambucano “o caminho para encontrar-se com as estruturas lógicas é a
linguagem. O direito é um fato cultutral, um de cujos componentes é a linguagem. A linguagem
jurídica é o suporte material das formas. Mas a expressão linguagem jurídica é ambígua. Refere-se a
dois níveis de linguagem: a do direito positivo e a da Ciência do Direito que tem o direito ´positivo
como objeto de conhecimento ( dogmático)” ( Ibidem.,p.290).
estão devidamente definidos e suas peculiaridades bem traçadas no universo
jurídico.
Um sistema pode ser definido como um conjunto de elementos
interdependentes que se relacionam entre si de forma racional, organizada e
harmônica orientados por um elemento maior que os integram, unificando-os
logicamente. Nesta senda é que a realidade social é tomada como um
macrossistema comunicacional dentro do qual estão inseridos vários outros e dentre
estes, o direito positivo e a Ciência do Direito.
Direito positivo, nas lições de Paulo de Barros Carvalho 29 “é um conjunto
de normas jurídicas válidas, num determinado intervalo de tempo e sobre específico
espaço territorial, inter-relacionadas sintática e semanticamente segundo um
princípio unificador”. Tais normas - elementos do direito positivo , objeto cultural e
criatura do homem - manifestam-se em uma linguagem em que seus enunciados
prescritivos têm a finalidade de regular condutas intersubjetivas, intervindo no
sentido de criar, alterar ou extinguir as relações jurídicas mediante os valores
éticos, sociais, políticos e ideológicos que a sociedade anseia e que por abstração
lógica são pintados com a nota jurídica de relevância e assim convertidos em
normas jurídicas.
As normas jurídicas são pois, elementos do sistema direito positivo,
tratando-se assim de um sistema autopoiético, autônomo, em que a autorreprodução
de seus elementos, ou seja as novas normas jurídicas acontece segundo códigos e
programas próprios, havendo assim uma clausura operativa organizacional e uma
abertura cognitiva, ou seja, semântica e pragmática que garanta a sua evolução,
como bem clareia Fabiana Del Padre Tomé:

Ao adotar o código lícito/ilícito, o sistema jurídico distingue-se


das demais comunicações sociais, pois mediante esse código
o direito passa a construir seus próprios componentes,
estabelecendo as normas reguladoras das suas operações,
estruturas, processos.30

2 9 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário – Fundamentos Jurídicos ….., op.cit, p.76.
30 TOMÉ, Fabiana Del Padre . A prova ........... ,op.cit,. p. 45.
31
VILANOVA, Lourival. As Estruturas..., op.cit, 126.
Para o Direito as condutas são lícitas ou ilícitas e o sistema jurídico
passando a regular a própria criação e sua transformação, compõe o seu domínio, o
que quer dizer – como destacado nas notas iniciais desse trabalho dissertativo - que
a validade e a inclusão de uma proposição normativa no sistema só ocorre se
podemos reconduzi-la à proposição fundamental do sistema.31
Assim sendo é que as normas jurídicas são criaturas do sistema de
Direito positivo, o direito posto, cercada pelos atributos da coatividade, no viés da
sanção pelo seu descumprimento, e que tem a sua homogeneidade conferida pela
normatividade através do ponto de partida - a norma hipotética fundamental –
garantindo a unicidade do sistema, para além de sua unidade.
De outra banda o sistema da Ciência do Direito, cujo objeto é o estudo do
Direito positivo, através de uma linguagem descritiva, que emite juízos de valor
sobre o contexto normativo, interpretando-as sistematicamente em suas conexões,
no sentido de alcançar uma integração e uniformidade de conceitos e racionalidade
dos argumentos produzidos no que toca aos efeitos de tais normas, enfim da própria
atuação desse enredo normativo.32
A linguagem descritiva da Ciência do Direito, a ciência que é
caracterizada pelo ser, é a da lógica alética e os seus enunciados – que não
vinculam33 - são marcados pelos valores de verdade ou falsidade ao descrever sobre
a linguagem do seu objeto, ou melhor, sobre as significações trazidas pelo legislador
nos enunciados prescritivos das normas jurídicas, sempre com a mira de que na
construção dos sentidos possa sempre o cientista do direito eliminar as antinomias,
contradições que venham a existir no sistema do Direito positivo, através muitas
vezes da aplicação de princípios consagrados no sistema normativo.
Nesta órbita escreve poeticamente Alfredo Augusto Becker:

32 Para Paulo de Barros Carvalho “ À Ciência do Direito cabe descrever esse enredo normativo,
ordenando-o, declarando sua hierarquia, exibindo as formas lógicas que governam o entrelaçamento
das várias unidades do sistema e oferecendo seus conteúdos de significação”.(CARVALHO, Paulo de
Barros. Curso de .., op.cit, p.2).
33
A dogmática jurídica para Tércio Sampaio Ferraz Jr é uma sistematização do ordenamento e sua
interpretação, suas teorias que compõem a doutrina , e assim é que afirma “ quando o jurista discute
temas como a nulidade das sentenças, a “natureza jurídica das convenções coletivas de trabalho”, os
“efeitos jurídicos da aparência do direito” , suas teorias (doutrina) constituem, na verdade, um corpo
de fórmulas persuasivas que influem no comportamento dos destinatários, mas sem vinculá-los” .Para
o autor as proposições doutrinárias tomam ou a forma de orientações ou de recomendações. (
FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão,
dominação. 6.ed. São paulo: Atlas, 2011.p.59)
34
BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral ….... op.cit, p.66.
A atividade jurídica que estuda a consistência e a atuação
deste instrumento é atividade científica; noutras palavras, o
estudo da estrutura lógica e da atuação dinâmica da regra
jurídica é Ciência. Porém, o construir este instrumento é
atividade artística. Em síntese, a criação da regra jurídica é
Arte, sua interpretação Ciência.34

É claro que os sistemas linguísticos se correlacionam em virtude de que o


Direito é uno e se põe como condição de sua própria evolução e da garantia de sua
funcionalidade com êxito.
Fincadas então as ditas noções sobre os sistemas jurídicos de linguagem,
indene de dúvidas que ainda que marcados por suas peculiaridades, objetos
distintos e forma própria de se manifestarem, apenas sob perspectivas diferentes
gravitam em torno de uma mesma esfera, as normas jurídicas.
.

CAPÍTULO II

SISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO


BRASILEIRO

2,1 Notas iniciais 2.2 Princípios constitucionais: normas


jurídicas objeto de interpretação 2.2.1 Princípios cardeais da
tributação na Constituição 2.2.1.1 Princípio da estrita
legalidade, da tipicidade e da reserva de lei complementar
2.2.1.2 Princípio da vedação de tributo com efeito de confisco
2.2.1.3 Princípio da capacidade contributiva 2.3 Norma jurídica
tributária: conceito, estrutura e classificação 2.4 O Fenômeno
da incidência tributária 2.5 A relação jurídica tributária 2.5.1 A
sujeição passiva tributária: o contribuinte e o responsável
tributário

2.1 Notas iniciais

Apontamos nas notas anteriores as características que possui o direito


posto como um grande sistema e dentre eles, notadamente, o sistema constitucional
brasileiro que é composto de vários subsistemas, dentre eles, o sistema
constitucional tributário. Seguindo os passos da evolução que apontamos nas
premissas do nosso trabalho, da noção de Constituição até alcançar a concepção
moderna balizada pelos princípios fundamentais da República Federativa 35 e do
Estado Democrático de Direito, também caminhou a regulação constitucional sobre
a matéria tributária.
Na esfera desse modelo de Estado estão atados o próprio dever e o
direito fundamental de contribuir nos moldes estabelecidos em lei desde que
obedecida a capacidade contributiva de cada indivíduo e que sejam resguardados o
direito ao mínimo vital geralmente através de regras imunizatórias.
Nesse passo é que a Constituição, no capítulo Do Sistema Tributário
Nacional traz princípios carreados de valores que o informam – expressos e
implícitos – assim como regras que disciplinam o poder de tributar 36 do Estado, uno
por vontade do povo37, através da repartição de competências entre a União,
Estados-Membros, o Distrito Federal e os Municípios, inclusive estipulando
limitações ao exercício de tal poder, com a característica ainda de tecer em
minúcias38 o fenômeno da tributação que tem como vetor a proteção da propriedade,
da igualdade, da liberdade, enfim, dos direitos fundamentais que por serem pintados
com o matiz da intocabilidade, não há permissão de qualquer ação estatal, quando
da tributação, que suprima ou fira as balizas constitucionais dotadas de rigidez, o

35 Na república todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido, baseando-se na
igualdade política dos homens, não podendo assim haver privilégios ou vantagens em favor de
pessoas ou categorias de pessoas, enquanto na democracia a sua maior característica é a proteção
dos direitos fundamentais da pessoa humana, tais princípios alinhados à forma federativa em que a
competência pública é rateada entre as pessoas políticas e balizadas pela norma Constitucional,
inclusive ao instituir tributos se irradiam e informam toda a tributação. Geraldo Ataliba considera
“tanto o princípio republicano quanto o federal são postos como regras supra constitucionais,
princípios super-rígidos, pedras basilares de todo o sistema. Tratados constitucionalmente da mesma
forma, assim como protegidos pela mesma super rigidez (art.60, § 4°), obrigando todos os
intérpretes” ( ATALIBA, Geraldo. República e Constituição. 3.ed. São Paulo:Malheiros .2011 p.45).
36 “ No Estado constitucional moderno, o poder tributário deixa de ser um poder de fato, mera relação

tributária de força para converter-se num poder jurídico que se exerce através das normas. Esgota-se
a relação de poder a partir do momento em que o Estado exerce, no âmbito da Constituição, o seu
poder tributário e o faz por meio do instrumento de lei formal e material, ato do poder legislativo. (
BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 2.ed. São Paulo: Malheiros,
2011,p.25).
37 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de janeiro:

Forense, 2009.p.65.
38
Nas palavras de Sacha Calmon “Somos, indubitavelmente, o país cuja Constituição é a mais
extensa e minuciosa em tema de tributação. Este cariz, tão nosso, nos conduz a três importantes
conclusões: Primus- os fundamentos do Direito Tributário brasileiro estão enraizados na Constituição,
de onde se projetam sobre as ordens jurídicas parciais da União, dos estados e dos municípios;
Secundus – o Direito Tributário posto na Constituição deve, antes de tudo, merecer as primícias dos
juristas e operadores do Direito, porquanto é o texto fundante da ordem jurídico- trinbutária; Tertius –
as doutrinas forâneas devem ser recebidas com cautela, tendo em vista as diversidades
constitucionais” Ibidem..., 2009.p.45-46. ( COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito
Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de janeiro: Forense, 2009.)
39 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário brasileiro. Revista dos Tribunais. p.8
que acaba por garantir uma determinada segurança jurídica, uma vez que o
legislador não poderá fazer alterações no sistema tributário por legislação
infraconstitucional, a não ser que seja alterado o próprio texto constitucional por
emendas e desde que não tendentes a abolir garantias e direitos fundamentais,
inclusive os de natureza tributária.
Geraldo Ataliba define, em síntese, o sistema constitucional tributário
como um conjunto de princípios constitucionais informadores do direito tributário e
aduz à característica de unidade e ordenação das normas que tratam da matéria
tomada como princípio de relação que as unifica.39
Então. Das notas trazidas até este ponto do nosso trabalho é que se pode
alinhavar que o sistema constitucional tributário através dos seus princípios e regras
disciplinam todo o fenômeno jurídico da tributação que ganha eco não no poder que
tem o Estado de tributar, ou do seu instrumento veloz unificador, o tributo, mas
principal e notadamente nos direitos fundamentais do cidadão contribuinte40, que
passa ao mesmo tempo em que se torna seu ponto nuclear, a atuar como uma
própria fonte legitimada e legitimadora do ordenamento jurídico tributário, balizadora
da hermenêutica das normas jurídicas que o integram, notadamente quando da
atuação dos seus intérpretes.

2.2 Princípios constitucionais: normas jurídicas objeto de interpretação

Nesta teia é oportuno fazer o destaque que na ordem tributária entre os


limites impostos ao exercício da competência dos entes políticos pela Constituição
Federal estão os princípios constitucionais que acampam em solo fértil, uma vez que
no agir como se fossem um pilar do todo, espancam a possibilidade de
arbitrariedade nas ações estatais quando da própria criação da norma jurídica
tributária, bem como da exigência de tributos em desacordo com tais normas de alta
carga valorativa que norteiam o Estado Democrático de Direito.
Princípio nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello significa:

40BECHO, Renato Lopes. Filosofia do Direito Tributário. São Paulo:Saraiva, 2009.p.306


41MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. Malheiros Editores,
2008.p.106.
mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,
disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a sua
exata compreensão e inteligência exatamente por definir a
lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe
confere a tônica e lhe dá sentido harmônico.41

Como enunciado pelo autor Celso de Mello os princípios se situam no


ápice da estrutura normativa, como vértices de onde emanam todas as demais
proposições normativas – as de conduta e as normas de estrutura – e de onde são
extraídos o seu próprio alcance, validade, finalidade e conteúdo (compatibilidade
vertical), estando assim dispostos de forma explícita no texto constitucional ou
implícita, quando extraídos da exegese sistemática de todo o ordenamento jurídico.
Nota primaz é a de que os princípios jurídicos constitucionais, expressos
ou implícitos, irradiam sua força normativa que fundamenta e vincula a elaboração,
interpretação e aplicação das demais normas jurídicas, ou seja, o processo de
atuação estatal na concretização de tais normas, notadamente no que diz respeito
ao fato de que concretizar42 o ordenamento jurídico é alinhá-lo às aspirações ideais
de toda sociedade estampadas no texto constitucional de um Estado de Direito e
informadoras de todo o sistema normativo.43
As normas jurídicas, sejam princípios ou regras, em maior ou menor grau,
guardam um teor de valor e nesta trilha é que os princípios são condutores de alta
carga axiológica e cercados de grande subjetividade, exibindo sua relevância ao
estipular os fins a serem seguidos para a solução de conflitos e pela posição em que

42 Concretizar a constituição é sob outro espeque interpretá-la com vistas a realizar os valores nela
contidos no ideário de justiça , e pelas palavras de Friedrich Muller , concretizar é “produzir, diante da
provocação pelo caso de conflito social, que exige uma solução jurídica, a norma defensável para
esse caso no quadro de uma democracia e de um Estado de Direito”. MULLER, Friedrich.
Metodologia do Direito Constitucional. 4.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p.
129.
43 BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação constitucional. 3 ed. São Paulo: Celso

Bastos Ed., 2002.p.240.


44
Humberto Ávila chama atenção para o fato da doutrina que defende serem os princípios normas
carecedoras de ponderação e com isso resultar numa excessiva relativização dos valores que os
informam, bem como do seu afastamento diante de qualquer razão contrária, quando escreve que “se
quer chamar a atenção para o fato de que a definição de princípios como normas carecedoras de
ponderação pode conduzir – como de tem conduzido, e o Brasil é testemunha disso – a um certo
“relativismo axiológico”; todos princípios podem ser afastados, inclusive aqueles princípios reputados
fundamentais, quer pela doutrina, quer pelo ordenamento, justamente por veicularem valores que não
poderiam ser descartados. Tal noção esteriliza o caráter jurídico-normativo que define princípios
como normas jurídicas, como bem aponta Grau”. ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios, da
definição à aplicação dos princípios jurídicos. 13.ed. São Paulo: Malheiros, 2012.p.137
se situam na estrutura constitucional, características que os faz de observância
obrigatória e de veículos orientadores para a compreensão de todo o sistema
jurídico.
A característica dos princípios como normas fundamentais, de súbito
aparta qualquer possibilidade de que sejam mitigados ou mesmo afastados, ainda
que se lance mão do critério interpretativo mediante a técnica da ponderação em
face de possível conflito quando da aplicação de determinado princípio ou da
prevalência de um diante de outro, posto que, o que é fundamental para a
concepção de Direito e de Estado, é por decorrência inafastável.44
Nesse aspecto é que a noção aqui traçada de “princípio” abarca o seu
sentido de “valor” bem como de “limite objetivo”, em que no primeiro sentido temos a
introdução de valores relevantes para o sistema jurídico como um todo, tais como os
valores45 justiça, dignidade da pessoa humana, segurança jurídica e certeza do
Direito, que no plano prático é extremamente complexa por abarcar conceitos
variáveis e subjetivos atrelados ainda à postura ideológica e filosófica do intérprete.
Ao passo que no segundo, como limites objetivos, dentre os quais são
exemplos dos que informam diretamente o sistema tributário, como o princípio da
estrita legalidade e da reserva de lei, o da capacidade contributiva, e o da
anterioridade, serão de aplicação imediata, não cabendo, portanto, a ingerência do
intérprete da norma, ao menos em alto grau, uma vez que pensamos que qualquer

45 A Teoria dos Valores ou Axiologia é defendida por Miguel Reale como de importância básica para a
Ciência Jurídica onde o “valor representa o mundo do dever ser, das normas ideais segundo as quais
se realiza a existência humana , refletindo-se em atos e obras, em formas de comportamento”, sendo
possível uma ordenação , ainda que não absoluta, do valioso. E acrescenta que toda sociedade
obedece a uma tábua de valores que têm como caraterísticas: a bipolaridade, implicação,
referibilidade, preferibilidade, incomensurabilidade e graduação hierárquica, além da objetividade,
historicidade e inexauribilidade. O pensamento do jusfilósofo é linear à sua Teoria Tridimensional do
Direito, segundo a qual “fatos e valores se integram dialeticamente em um processo
normativo”.REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.p.191-194
46 Não se trata de alijar o método subsuntivo de aplicação das normas ou ainda dos tradicionais,

como o sistemático ou teleológico, mas da decorrência lógica e necessária de que para que realize a
vontade da Constituição é indispensável que se lance mão de novos métodos de hermenêutica, uma
nova interpretação constitucional com base em princípios específicos para tal, como relata Luis
Roberto Barroso: “ Portanto, ao se falar em nova interpretação constitucional, normatividade de
princípios , ponderação de valores, teoria da argumentação, não se está renegando o conhecimento
convencional, a importância das regras ou a valia das soluções subsuntivas.(...) o relato da norma,
muitas vezes demarca apenas uma moldura dentro da qual se desenham diferentes possibilidades
interpretativas à vista dos elementos do caso concreto, dos princípios a serem preservados e dos fins
a serem realizados é que será determinado o sentido da norma, com vistas à produção da solução
constitucionalmente adequada para o problema a ser resolvido”.( BARROSO, Luís Roberto. O Novo
Direito Constitucional Brasileiro: contribuições para a construção teórica e prática da
jurisdição constitucional no Brasil. 2.reimpressão. Belo Horizonte: Fórum, 2013. )
que seja a aplicabilidade de uma norma jurídica a um fato previamente tipificado
será sempre objeto de uma atitude interpretativa46 ainda que se trate de aplicação do
método subsuntivo.
A interpretação da norma jurídica constitucional com vistas a que se
realizem os valores, fins ou interesses por ela carreados é uma decorrência lógica
de uma nova visão hermenêutica do Direito contemporâneo que passou a ser
compreendido como um sistema aberto de regras e princípios, permeável a valores
supra positivos, no qual as ideias de justiça e de realização dos direitos
fundamentais desempenham um papel principal, notadamente os que atinam ao
universo dos contribuintes em sentido lato.
O que nos leva a entender que nenhum sentido, na verdade, pode ser
captado fora do mundo circunstancial, e sim no contexto da concreta situação fática
em que se encontra, pois não há interpretação da norma jurídica constitucional
desconectada dos problemas concretos ou do seu tempo ou ainda da compreensão
do próprio intérprete. Nesta esfera cabe afirmar que a concepção moderna da
interpretação constitucional recusa uma radical objetividade, uma neutralidade
teorética, assim como uma pura racionalidade, superando-se assim uma visão
meramente positivista da Constituição diante dos novos paradigmas.
São novas perspectivas trazidas à tona e uma nova cultura filosófica
marcada pelo ideal de concretização da Constituição por sua força normativa, pela
expansão do judiciário e por uma nova hermenêutica da norma constitucional - de
forma estreita com base na nossa temática, a norma constitucional tributária - que
também não aceita tão somente um modelo de regras e de subsunção, nem a
tentativa de ocultar o papel criativo de juízes e tribunais ao exercerem a jurisdição
constitucional, como ensina Karl Larenz, no escrever sobre a interpretação das
normas no domínio da atividade jurisprudencial e a sua missão de chegar a decisões
“justas”47 com base em uma “Jurisprudência de valoração” :

(…) que a norma a qual a situação de facto deva ser


subsumida seja previamente interpretada, isto é que seja
estabelecido o seu sentido preciso e determinante. Igualmente,
a interpretação das leis, como toda a compreensão de
expressão alheias, tem lugar num processo que não se pode

47 LARENZ,Karl. Metodologia da Ciência do Direito. Lisboa:Fundação Kalouste


Gulbenkian,1997.p.167.
48 Idem, p.165-167.
adequar às estritas exigências do conceito positivista de
ciência. Exige, em rigor, a constatação dos fatos e, assim, a
constatação do texto e de toda e qualquer circunstância que
possa vir a relevar para a interpretação.(...) não é de todo
possível ao juiz, na maioria dos casos, chegar à decisão
“estritamente com base na lei”, e, porque esta carece de
interpretação e a interpretação é mais ou menos discricionária
ou requer dele a emissão de um juízo de valor.48

A orientação trazida por Karl Larenz representa um comando operativo


intrínseco à normatividade dos princípios constitucionais a ser seguido não só pelo
Judiciário, mas também pelos demais poderes públicos, Executivo e Legislativo, no
processo de interpretação e aplicação das normas jurídicas e em suas atuações,
assim como pelos contribuintes que passam a ser os vetores que norteiam a dita
valoração no ato de interpretar a Constituição, podendo ser chamados de intérpretes
naturais, indiretos ou mesmo a longo prazo, pois como argumenta Peter Haberle,
quem vive a norma, também a interpreta.4949
Em especial se reconhece mais uma vez a importância da nota de que a
interpretação constitucional tem como ponto de partida e fio condutor os princípios
fundamentais que permeiam o ordenamento jurídico, ainda que revestidos da
natureza de “limite objetivo” que tem aplicação imediata a determinada relação
jurídica ou de “valor”, em sua ação mediata como critério de interpretação e de
integração do Texto Constitucional, uma vez que dão coerência geral ao sistema
jurídico,50 onde qualquer conflito que surja em sua aplicação há que ser resolvido
mediante a técnica hermenêutica com o uso da ponderação e não pela exclusão de
um ou de outro.
Tendo em vista o corte metodológico realizado na delimitação do presente
estudo é que faremos a abordagem em volta de enunciados dos princípios
constitucionais ligados de forma estreita à eleição do sujeito passivo tributário, a que
denominamos princípios cardeais da tributação.

2.2.1 Princípios cardeais da tributação na Constituição

Os princípios constitucionais tributários são portanto, os balizadores tanto


para a Administração Pública ao editar leis cujo alvo é a esfera do patrimônio do

49 HÄBERLE, Peter. Hermanêutica constitucional. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1997. p.21-23 .
50 MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 3.ed. Coimbra: Coimbra Ed., 1999.2.t.p.226
administrado, quando das imposições tributárias, como para o aplicador e intérprete
do direito, pois através da harmonia dos textos legais a tais princípios é que se extrai
a validade, a unidade e unicidade de todo o sistema jurídico tributário, e sem menos,
a constitucionalidade dos enunciados das normas que tratam do sujeito passivo
tributário e da responsabilidade tributária.
Nesta órbita jurídica - a dos princípios constitucionais que irradiam
imediatamente o sistema tributário - é que gravita um dos maiores fundamentos do
Estado Democrático de Direito - a proteção e garantia dos direitos fundamentais,
como direitos positivados constitucionalmente, com espeque na carga discursiva de
caráter valorativo que trazem em si e que por isso devem ser protegidos, garantidos
pelo ordenamento jurídico.
Na esfera das teorias dos direitos fundamentais e aqui inseridos os
direitos fundamentais do contribuinte, os ensinos de Robert Alexy são preciosos pois
para o autor alemão os direitos fundamentais são extraídos a partir de normas
obtidas por meio de enunciados normativos existentes na Constituição, que podem
ser princípios ou regras – o que resulta em uma aplicação dos mesmos adstrita a
essa configuração – posições jurídicas definitivas ou a priori, que podem ser
analisadas como deveres do Estado, direitos frente ao Estado e ainda relações
jurídicas entre sujeitos de direito privado.51
O rol de direitos fundamentais previstos no texto Constitucional é sem
dúvida digno de aplausos, uma medalha alcançada em um ideário humano, político
e social, mas que salta aos olhos que como contrapartida, ao revés, sem desejo de
querela alguma, há um hiato em progressão acelerada entre o que há de positivado
e a concretização daqueles, do que se faz induzir que os vícios que possivelmente
se instalem como óbices à efetividade de tais direitos subjetivos devam ser

51 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo:
Malheiros Editores, 2011.p.26.
52
Para além do reconhecimento, importa mais a efetiva concretização dos direitos públicos subjetivos
fundamentais do contribuinte em face das arbitrariedades que possam surgir pelo poder do Estado.
No âmbito da tributação, tais direitos, aliados aos deveres e obrigações do sujeito passivo previstos
constitucionalmente, formam o chamado “estatuto do contribuinte”, que espanca qualquer
possibilidade de exercício de competência tributária que invada esfera jurídica do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à propriedade, à segurança jurídica e os seus reflexos no devido processo
legal, na ampla defesa e contraditório...”, ou que tão somente esteja desalinhada às balizas
constitucionais. No dizer de Roque Antonio Carraza, o “estatuto do contribuinte” exige que a
tributação, livre de qualquer arbitrariedade, realize a ideia de Estado de Direito. Às várias
possibilidades de atuação da Fazenda Pública há de corresponder a garantia dos direitos de cada
contribuinte. (...)” (CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Consti.... op.cit., p.422.)
sanados, sempre que possível, no momento da interpretação e aplicação da norma
tributária – para fechar no âmbito em que gravita o fenômeno tributário e os seus
reflexos.
As considerações até aqui alinhavadas servem de ponte para o anúncio
de que os direitos fundamentais do cidadão contribuinte, é direito inarredável e que é
diante deles que o Estado no exercício do poder de tributar esbarra e encontra
limitações, não podendo inclusive o fisco cair em arbitrariedades, uma vez que os
direitos fundamentais52 são diretrizes para a interpretação, aplicação e efetivação
das normas constitucionais lançando raios em todo o ordenamento jurídico, sistema
que no seu todo se posiciona como parte elementar o sistema tributário nacional, e
nesta esteira é que os princípios cardeais da tributação tem a missão precípua de
garantir sua proteção.
Não carece descartar a ideia de que alguns princípios constitucionais
tributários são alçados pela doutrina a verdadeiros direitos fundamentais, mas o fato
é que nem todos são direitos fundamentais, assim como há direitos fundamentais
que não são princípios e que a colisão entre princípios pode afetar o sentido das
normas jurídicas. Eis o terreno fértil para aplicação do princípio da
proporcionalidade, tão suscitado no campo das imposições tributárias quando da
necessidade de que haja para uma coletividade de pessoas que vivem em uma
determinada sociedade uma igualdade de distribuição da carga impositiva global.
A tal igualdade na distribuição da carga tributária é um dos notáveis meios
para que ocorra a Justiça, pois pensamos que numa visão ampla, o matiz dos
princípios constitucionais tributários é a realização da Justiça tributária e esta para
ser alcançada pressupõe que, antes de tudo, um princípio fundamental - e não só os
expressamente previstos na Constituição - seja objetivamente justo e para esse fim,
há que ser adequado à realidade 53 e ter como imagem retora, a Ética. Falamos aqui
de uma ética que anteceda e se oponha a qualque/*r preceito que fundamente o
Estado e a sua atuação, desde o legislador ao criar, modificar ou revogar leis, às
autoridades fazendárias quando da aplicação das normas à situação fática.
Klaus Tipke constrói com clareza a ideia de princípio fundamental justo
adequado à realidade e informado pela ética:

53 TIPKE, Klaus. Moral Tributária do Estado e dos Contribuintes . Tradução de Luiz Dória Furquim.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Ed., 2012.p.16
54 Idem, Ibidem.p.17
(…) Como todo sistema jurídico justo também o sistema
jurídico tributário é uma construção mental fundada em
princípios coerentemente refletidos levados às ultimas
consequências. Essa construção não pode ser erigida no vazio;
ela tem uma base empírica referida à realidade e depende – da
mesma deduzido – a um princípio fundamental ético,
eventualmente também de vários princípios.54

À luz da ética que deve influenciar o Direito em volta de um senso comum


que revele os valores do sistema jurídico adaptados à realidade estampada na
Constituição atual, é que justifica a busca incessante por um sistema tributário em
que as garantias e os direitos fundamentais do homem e o seu conteúdo
intrinsecamente ético e indisponível, sejam protegidos por princípios jurídicos que
objetiva e eficazmente garantam a justiça, a igualdade e a solidariedade tributária.
A ética que permeia a construção do aspirado sistema tributário justo, há
que ser ao mesmo tempo o elemento propulsor das atuações dos contribuintes,
ainda que notadamente não seja apartada a ideia de que na relação jurídico-
tributária está fincada uma vulnerabilidade55 dos destinatários da norma tributária em
face do Estado e o exercício de sua tríplice função, por ser a um só tempo o criador
da lei tributária, o aplicador e o que exerce a função jurisdicional, administrativa e
judicial dos conflitos que surjam em virtude da lei aplicada.
O status efetivo do contribuinte vulnerável ou suscetível, ou a repisada
justificativa de alta carga tributária do país, ou ainda a sua má distribuição ou não
aplicação dos recursos arrecadados pelo Estado por meio da tributação, não deve,

55 Sob o ponto de vista de James Marins a vulnerabilidade do contribuinte na relação fiscal pode ser
estudada a partir de três perspectivas que espelham as funções do Estado, compreendendo o
“Estado criador da norma jurídico fiscal e a vulnerabilidade material do contribuinte; o Estado
aplicador da norma jurídico fiscal e a vulnerabilidade formal do contribuinte; e o Estado julgador da
lide fiscal e a vulnerabilidade processual do contribuinte”.(MARINS, James. Defesa e
Vulnerabilidade do Contribuinte. São Paulo: Dialética, 2009.p. 25).
56 Pode-se dizer que o planejamento fiscal figura na órbita das estratégias fiscais dos contribuintes

com o intuito principal de não pagar ou de pagar menos tributo em que não estão incluídas as
condutas ilícitas, o que quer dizer que o planejamento fiscal, enquanto conduta protegida e permitida
pelo ordenamento jurídico configura um direito subjetivo do contribuinte no universo da
fenomenologia tributária e o dever do Fisco de aceitá-lo, desde que a este oponível em termo de
eficácia. Aos olhos de Marco Aurélio Greco planejamento tributário é o “ conjunto de condutas que o
contribuinte pode realizar visando buscar a menor carga tributária legalmente possível. Ao dizer
“legalmente” estou falando de atos lícitos. Mas não estou me referindo apenas à licitude no sentido de
não haver agressão a nenhuma norma específica; “conduta legal” neste contexto tem um sentido
mais amplo por dizer respeito às condutas que estejam de acordo com a lei ( preceitos específicos) e
com o Direito (que abrange, além das leis, os princípios jurídicos e os valores prestigiados pelo
ordenamento).(GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Tributário. São Paulo: Dialética, 2008. p.117)
no entanto, justificar o uso cada vez mais corrente pelos contribuintes de meios
artificiosos sob a falsa estratégia de planejamento fiscal56.
Assim como não justifica a opção pelo uso de meios ilícitos ou
fraudulentos no intuito de sonegar tributos e de auferir mais lucros, instalando uma
desigualdade socioeconômica latente e produzindo efeitos nocivos à sociedade, sem
perder de vista também, que não raro, o instituto jurídico da “empresa” está sendo
utilizado como instrumento para a prática predatória de não arrecadar tributos,
ferindo de forma insidiosa a princípios basilares do Estado de Direito e alijando de
suas condutas a clamada ética fiscal que é elemento intrínseco às atuações dos
sujeitos da relação jurídico-tributária.
Como fecho dessas considerações, que de pronto, não se trata de pura
ideologia, importa aclarar que o que buscamos neste tópico do trabalho foi tão
somente traçar uma visão panorâmica da importância, da finalidade e dos aspectos
que norteiam os princípios constitucionais tributários em sua função precípua de
alicerce de todo o ordenamento jurídico, para no passo seguinte tratarmos de forma
mais amiudada daqueles que julgamos ser diretamente atrelados ao tema da
sujeição passiva e da responsabilidade tributária.
Longe de ser um fim em si mesmo, o estudo dos princípios cardeais da
tributação, como o da capacidade contributiva, da igualdade tributária, da legalidade,
da solidariedade fiscal, da vedação do tributo como confisco e os seus reflexos
jurídicos torna-se o ponto de partida para a abordagem e análise sistêmica do
objetivo pretendido neste estudo dissertativo.
Podemos assim, com base no horizonte estabelecido da pesquisa e o
seu desenvolvimento a partir do estudo dos ditos princípios constitucionais
tributários, dar o passo seguinte, deixando claro que como uma imposição natural
estarão sempre presentes como retores fundamentais, os princípios supra positivos
da segurança jurídica , da certeza do direito e da justiça fiscal por dizerem de perto
com o fenômeno da tributação, ou escrevendo de forma mais clara, por serem
princípios estruturantes do Estado Democrático de Direito, de onde aqueles derivam
e encontram as razões de validade e de eficácia e de onde se desencadeia todo o
processo hermenêutico de aplicação da norma tributária no sentido do que melhor
conduza à realização de um sistema jurídico-tributário garantido pela coerência,
unidade e conformidade.
O princípio da segurança jurídica57 é acolhido na seara tributária, dentre
outras nuanças, exigindo que o Estado no seu exercício de tributar descreva na
norma legal atada às balizas constitucionais de forma amiudada, a hipótese de
incidência do tributo levando ao contribuinte a certeza das possíveis consequências
que surgirão dos fatos praticados e da atuação da Administração Fazendária, o que
acarreta a confiança no Poder Público,.
Também, é com base na segurança jurídica que, no momento de
aplicação pela autoridade fiscal da norma tributária à situação fática, se exige um
ato fundamentado e vinculado aos termos da lei e dos valores expressos por ela, e
ainda determina ao julgador uma interpretação em matéria tributária sem
alargamentos ou analogias para que daquela resulte a realização do Direito e a
garantia e proteção de igualdade e dos demais direitos fundamentais do contribuinte
A certeza do direito age concretizando o princípio da segurança jurídica
no sentido de assegurar ao contribuinte que a norma a ser aplicada ao fato jurídico
tributário por ele realizado é regida pelos princípios constitucionais que irradiam seus
efeitos no fenômeno da tributação, como o da legalidade, da irretroatividade, da
anterioridade clássica ou nonagesimal. Vale dizer, que a norma que institui ou
majora o tributo e dispõe sobre todos os seus elementos essenciais encontra arrimo
na autoridade constitucional assegurada por seus valores protetivos ou
modificadores.
A justiça fiscal58 é neste primeiro momento trazida dentro da perspectiva
não de alcançar um sentido absoluto mas, como um objetivo a ser realizado através
da relação entre o cidadão contribuinte e o Estado, que para além de uma

57 Roque Antonio Carraza ao lançar críticas por seu magistério à hipótese de tributação antecipada
veiculada pelo § 7° do art.150 da CF (após EC 3/1993) afirma: “ É sempre bom reafirmarmos que o
princípio da segurança jurídica diz de perto com os direitos individuais e suas garantias. É, assim,
“cláusula pétrea” e, nessa medida, não poderia ter sido amesquinhado por emenda constitucional ( cf.
art. 60, § 4°, da CF). (CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Const....op.cit., p.456).
58 Na interessante visão de Paulo Caliendo pode-se compreender a justiça fiscal como um ponto de

equilíbrio entre a paz e a prosperidade que são aspirações consagrados pela sociedade e assim
argumenta o autor: “(...) A justiça fiscal irá tratar da correta relação do cidadão (parte) com a esfera
pública (todo), permitindo identificar a correta forma de contribuição que o indivíduo deve realizar à
manutenção de uma esfera pública de liberdade e igualdade. O princípio da justiça fiscal volta-se aqui
à promoção do sentido público da tributação e de seus valores essenciais” ( CALIENDO, Paulo.
Tratado de direito constitucional tributário: homenagem a Paulo de Barros Carvalho/
coordenador Heleno Taveira Tôrres. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 391)
59 Miguel Reale ao tratar da lei como fonte do direito preleciona que: “ Lei, no sentido técnico desta

palavra, só existe quando a norma escrita é constitutiva de direito, ou esclarecendo melhor, quando
ela introduz algo de novo com caráter obrigatório no sistema jurídico em vigor, disciplinando
comportamentos individuais ou atividades públicas”. ( REALE, Miguel. Lições Preliminares de
Direito. São Paulo:Saraiva, 2002. p.163)
distribuição de carga fiscal igualitária e o retorno dos recursos à sociedade, sejam
preservados de súbito a liberdade e o direito de propriedade.

2.2.1.1 Princípio da estrita legalidade, da tipicidade e da reserva de lei


complementar

Se o Estado de Democrático de Direito fosse um espelho, a imagem nítida


a ser refletida seria a da lei59, por ser esta a maior expressão da legitimidade
daquele, um ato de vontade estatal que emana de um processo legislativo previsto
no Texto Constitucional, enquanto resultado da expressão de manifestação da
vontade de um povo, bem como por ser o instrumento que ao introduzir a norma,
inova o sistema jurídico conferindo direitos e impondo deveres a que todos devem
atentar, notadamente o Estado no exercício da competência do poder de tributar e o
contribuinte (sentido lato) no seu dever e direito fundamental de pagar tributos.
Esta é tão somente a exegese a ser feita do art.5, II, CF ao anunciar o
princípio da legalidade como um dos maiores pilares do ordenamento jurídico em
que a obrigação de fazer ou não é decorrente de lei.
Em matéria tributária é assim que também acontece, no entanto, para
além da norma jurídica citada, o que por si só já seria suficiente para laçar todo o
ordenamento jurídico, o constituinte originário optou por reafirmar, provavelmente
pelos valores a serem protegidos nessa esfera, o princípio da legalidade ao
determinar que a criação e majoração do tributo só será feita por meio de lei (
art.150, I, CF).
No Direito Tributário a relevância do princípio da legalidade atrai luzes
pela missão que tem de ser a fonte de revelação e garantia da justiça fiscal, além, é
claro, de estar profundamente relacionado à segurança jurídica dos cidadãos
contribuintes, tendo em vista que para além da criação e aumento da base de
cálculo ou alíquota a ser aplicada ao tributo, a sua própria modificação e extinção só
ocorrerá mediante lei editada por autoridade competente.
Estamos neste ponto a tratar da reserva absoluta da lei formal ou da
chamada estrita legalidade que informa todo o sistema tributário constitucional,
desde o momento da criação do tributo, por obrigar a pessoa política que detém a
competência tributária a descrever em minúcias todos os elementos essenciais ou
indispensáveis da regra matriz de incidência do tributo, como o aspecto material da
incidência, base de cálculo, alíquota, sujeito ativo e o sujeito passivo, assim como os
aspectos temporal e espacial da exação. Leandro Paulsen ao discorrer sobre a
determinabilidade da norma tributária impositiva e o critério da suficiência anota que

(…) Importa que se tenha a possibilidade de determinar, com


suporte direto na lei, quais as situações que implicam o
surgimento da obrigação tributária, quando e em que momento
se dá (...) A análise do atendimento ou não, por uma lei, à
reserva absoluta faz-se pela verificação da determinabilidade
mediante o critério da suficiência. A lei deve, necessariamente,
conter referências suficientes, em quantidade e densidade,
para garantir a certeza do direito.60

Desse modo é que o princípio da legalidade leva ao princípio da tipicidade


tributária61, é dizer, à exigência de que o tipo tributário há de ser exato, cerrado,
levando ao contribuinte segurança, certeza e a confiança de que somente diante da
prática de determinado fato ou da situação prevista em lei é que haverá a incidência
da norma jurídica e necessariamente há de vir o efeito tributário esperado.
A tipicidade tributária acaba assim por limitar o âmbito do poder de tributar
do Estado ao mesmo tempo em que impede no agir do Fisco a possibilidade do uso
de analogia ou discricionariedade, vinculando ao próprio Poder Judiciário que diante
de uma atecnia da lei tributária, ou de insuficiência de um dos elementos essenciais
do tipo tributário.
Em suma, o princípio da estrita legalidade atado ao da tipicidade
fechada62 determina que a instituição, a fiscalização, a arrecadação e a extinção do
tributo deve ser feita através de lei, lei ordinária que é a lei tributária por excelência,

60 PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e


da Jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p.161.
61 Para Alberto Xavier o princípio da tipicidade tributária envolve o princípio da seleção pela escolha

de situações que revelam capacidade econômica; o princípio de numerus clausus pela descrição
minuciosa dos elementos essenciais; o princípio do exclusivismo através do qual a cada tipo tributário
corresponderá certos fatos ou situações jurídicas escolhidas e por fim abarca também o princípio da
determinação pelo qual o fundamento da decisão também deve vir descrito na lei. ( XAVIER, Alberto.
Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978.
p.84-88)
62 A tipicidade fechada na seara tributária não impede que numa visão alargada da dinamicidade que

toma de conta dos fatos sociais a norma tributária a acompanhe, como desfia nesse sentido Marco
Aurélio Greco: “ a maneira de acompanhar é prever standards, padrões de conduta ou padrões de
fatos, em vez de prever condutas condutas individuais ou fatos específicos” pois entende que os
modelos possam ter uma duração maior, e assim um modelo com tessitura aberta, abstrata. (
GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Fiscal e Interpretação da Lei Tributária. São Paulo:
Dialética, 1998, p. 59-61)
alinhada em todos os sentidos à lei complementar prevista na Carta de 1988, art.
146, com a competência, dentre outras, para regular as limitações constitucionais
ao poder de tributar (art.146,II) e de estabelecer normas gerais em matéria de
tributação ( art.146, III), para citar tão somente os que dizem de forma mais casada
ao objeto específico deste trabalho: a sujeição passiva e a responsabilidade
tributária.
Tal função atribuída à lei complementar em matéria tributária é, na maior
parte, cumprida pelo Código Tributário Nacional – CTN ( lei n.5.172/66), ao estipular
normas complementares ao Texto Constitucional, traçando balizas gerais a serem
seguidas pelo legislador ordinário no momento da criação do tributo, bem como à
Fazenda Pública no momento de sua cobrança e aos julgadores, administrativos e
judiciais, enfim, a todos os seus intérpretes, representando uma das maiores
garantias fundamentais concedidas aos contribuintes.
Esmiuçando a ideia, a lei complementar dispõe acerca dos preceitos
gerais sobre o tributo, sua definição e espécies, os fatos geradores, base de cálculos
e contribuintes, do que se faz concluir que tais preceitos fincam a dita garantia ao
contribuinte de que qualquer tributo a ser pago terá sido criado, fiscalizado, lançado
e exigido com base em lei estritamente atrelada à Constituição.
Fica aqui, portanto, lançada a ideia a ser seguida ao longo do nosso
estudo, de que a arquitetura da sujeição passiva tributária é constitucional 63( art.146,
III, a), cabendo ao Código Tributário Nacional estabelecer regras matrizes de
responsabilidade tributária e ao legislador da pessoa política tecer as regras
específicas.

2.2.1.2 Princípio da vedação de tributo com efeito de confisco

Há um limite para a imposição da carga tributária. Esta, numa visão


ampla, é o anúncio constitucional dado ao legislador, destacado no art.150, IV, da
Constituição, quando expressamente proíbe a utilização de tributos com efeitos
confiscatórios.

63 Nesse rumo Renato Lopes Becho afirma: “Em outras palavras, de pouco adiantaria se o constituinte
elaborasse detalhado sistema constitucional tributário se o legislador ordinário pudesse exigir o
tributo de qualquer pessoa, sem a menor atenção ao amplo conjunto normativo previsto na Carta
Magna. ( BECHO, Renato Lopes. A Sujeição Passiva Tributária na Jurisprudência do STF. Revista
Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n. 201, junho/2012, p.137).
A vedação ao Poder Público no ato de criação ou majoração de tributos
com efeitos confiscatórios tem a ver com o direito a uma existência digna, ao livre
exercício de uma atividade lícita, à proteção das condições essenciais mínimas que
envolvem o direito de propriedade, à saúde, educação, à habitação, enfim, à leitura
indispensável de que através da tributação não pode haver uma carga tributária
insuportável ou que torne inviável os direitos subjetivos protegidos pela própria Carta
Política. Nesta trilha escreve José Eduardo Soares de Melo:

O Poder Público há de se comportar pelo critério da


razoabilidade, a fim de possibilitar a subsistência ou
sobrevivência das pessoas físicas, e evitar as quebras das
pessoas jurídicas, posto que a tributação não pode cercear o
pleno desempenho das atividades privadas e a dignidade
humana.64

O princípio que veda à tributação, o confisco, está laçado pelo princípio


da capacidade contributiva, da isonomia tributária e da propriedade, o que leva à
certeza de que o patrimônio, a renda, e a propriedade do contribuinte não poderão
ser apropriados injustamente pelo Estado com a instituição de tributos
excessivamente onerosos, o que faz com que o princípio em tela seja uma
verdadeira limitação ao exercício do poder de tributar, direta ou indiretamente, não
podendo assim, existir no ordenamento jurídico pátrio lei que regule o tributo de
modo que ele gere os mesmos efeitos econômicos que o confisco geraria. 65
De difícil mensuração é alcançar a dimensão exata do que vem a ser
confisco em matéria tributária, o que implica dizer que a agrura consiste em alcançar
a razoável fixação de limites para que as prestações pecuniárias delimitadas em lei
sejam compatíveis à capacidade econômico contributiva do contribuinte, o que nos
leva a crer que a noção deve partir do fato de que “desde a tributação se faça nos
limites autorizados pela Constituição, a transferência de riqueza do contribuinte para
o Estado é legítima e não confiscatória”66, para no segundo momento, seguir a ideia

64 MELO, José Eduardo Soares de. Curso de Direito Tributário. São Paulo:Dialética, 2010, p. 34.
65 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atualizada por Misabel
Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.910.
66 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.168.
67 José Souto Maior Borges anota que o direito de propriedade está assegurado no art.5°, XXII da CF

e que, de outra banda, a desapropriação só é possível na forma da lei e por necessidade ou utilidade
pública ou interesse social ( art.5°, XXII), estando assim eliminada a supressão por via de tributos ou
de que a manifestação de riqueza do signo presuntivo tributário do contribuinte não
poderá ser esgotado pela hipótese de exação confiscatória.
Ainda que a literalidade do dispositivo constitucional se refira tão somente
ao tributo, nos filiamos aos que entendem que a proibição se estende também às
multas tributárias67, ainda que mensuradas de forma diferente, uma vez que as
penalidades pecuniárias guardam em si peculiaridades: a uma, de não ter a
finalidade arrecadatória; a duas, por representar o caráter educativo e preventivo do
Direito Tributário, qual seja, uma forma de coibir e de que não se perpetuem as
práticas abusivas dos contribuintes no sentido de sonegar, fraudar ou tão somente
de pagar a menor o tributo realmente devido, desde a sua aplicação que nunca leve
à perda substancial do patrimônio do contribuinte.
O princípio que veda utilizar tributo com efeito de confisco é amplo,
absoluto, no entanto, como deve ser aplicado em conjunto às demais normais
constitucionais, abriga certa relativização no convívio com aquelas que atuam como
sua exceção, como na hipótese de objetivos extrafiscais do legislador, na
progressividade como elemento informador da proteção da função social da
propriedade ou para desestimular o consumo de certos bens e serviços, ou ainda
nos níveis mais elevados da imposição tributária que alcança aqueles que auferem
mais ganhos ou rendas, enfim, o fato é que, mesmo diante das hipóteses de
políticas extrafiscais, o tributo não poderá ser ainda que de forma indireta, o
instrumento para que o Estado se aproprie de forma desmedida do patrimônio ou da
renda do contribuinte.
O que há, portanto, é apenas uma flexibilização quando de sua aplicação
para alcançar os objetivos desejados pelo constituinte em determinadas situações,
garantindo-se sempre no mínimo, para fazer uso de um trocadilho, o mínimo legal
disponível para a existência digna do contribuinte e de sua família, onde se exige
mais uma vez, uma interpretação sistemática de todo o ordenamento jurídico

multa. Afirma ainda que é possível entender que cabe ao Poder Judiciário fixar de ofício uma multa
menor, quando observados os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, o que por suas
palavras escreve:“ É da essência da função jurisdicional atribuir o seu a cada um (suum cuique
tribuere): ao Fisco o que é do Fisco, ao contribuinte o que é do contribuinte. O que é vedado ao
judiciário será fixar de ofício a multa, i.e, com independência ou referibilidade à sua prefixação pelo
órgão administrativo e avaliada numa situação contenciosa.” ( BORGES, José Souto Maior. Relações
entre Tributos e Direitos Fundamentais In: FISCHER, Octavio Campos (coord.). Tributos e Direitos
Fundamentais. São Paulo: Dialética, p.220-221)
tributário, de forma que o Direito Tributário e os direitos e garantias fundamentais
dos contribuintes, se inter-relacionem em sínteses dialéticas constantes.68
Nesse compasso é que Sacha Calmon N. Coêlho69 afirma que “o princípio
do não-confisco se nos parece mais com um princípio de razoabilidade na
tributação”, e acrescenta “tributação razoável”, o que guarda perfeita sintonia com a
exigência de aplicação “deste princípio como um limite à edição de leis que afetam
direitos fundamentais dos contribuintes”70 como dito por Paulo Roberto Lyrio
Pimenta, que acerca do assunto ainda aduz que a jurisprudência da Corte Maior
trilha com firmeza no reconhecimento da razoabilidade das leis, quando escreve
que

Em diversos julgados o Supremo Tribunal Federal aplicou o


princípio da razoabilidade para invalidar normas jurídico-
tributárias. Desse modo, reconheceu a necessidade de
razoabilidade entre a base de cálculo das taxas de serviço e o
custo da atuação estatal, razoabilidade das normas que
prescrevem sanções tributárias e das normas que instituem ou
majoram tributos.71

Também na mesma trilha seguimos, quando ao alinharmos mais de perto


o princípio do não-confisco ao instituto da responsabilidade tributária, defendemos
que o tributo razoável, ético, o instrumento que atina à capacidade contributiva, à
isonomia tributária e possibilita a justiça fiscal, em nenhuma situação, cedendo o

68 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atualizada por Misabel


Abreu Machado Derzi. Rio de Janeiro: Forense, 2010 , p.909.
69 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro:

Forense, p. 247-248.
70 PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. A razoabilidade das leis tributárias: direito fundamental do

contribuinte. In: FISCHER, Octavio Campos (coord.). Tributos e Direitos Fundamentais. São Paulo:
Dialética, p.303.
71 Idem,Ibidem......p. 303.
72 A ideia de constituição viva na leitura de Ingo W. Sarlet guarda relação com a noção de identidade

constitucional, que ainda que em reconstrução constante não pode ter o seu fio condutor formado por
seus elementos essenciais afastados ou mitigados e por isso alcançam proteção, dentre outros
mecanismos, pelas cláusulas pétreas, que dentre outros objetivos, tem a missão de preservar a dita
identidade. ( SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de
Direito Constitucional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p.91.) Nesta trilha, o
fenômeno tributário se posiciona como revelador da identidade constitucional, por ser instrumento
realizador dos objetivos fundamentais da República e da garantia e proteção dos direitos
fundamentais do contribuinte, daí invocarmos em conjunto: a capacidade contributiva, a igualdade
tributária, a solidariedade social e a vedação do confisco como princípios que efetivam a existência
de uma tributação justa, justiça no aspecto substancial e não apenas formal, portanto, normas
fundamentais inarredáveis por meio de emenda constitucional.
passo apenas para as exceções elencadas pelo constituinte e dentro das balizas
fincadas no ordenamento jurídico tributário, poderá ser exigido de maneira que
acarrete a perda ou que reduza de forma substancial o patrimônio, a propriedade ou
a renda daquele que praticou de forma direta o fato jurídico tributário, nem tampouco
daquele que não o realizou, a que está apenas a ele vinculado ou para ser mais
específico, aquele que deverá pagar o tributo porque assim a lei determinou.

2.2.1.3 Princípio da capacidade contributiva

Repisamos a ideia já trabalhada neste estudo de que os princípios


tributários constitucionais atuam como limitações ao poder de tributar, bem como
representam valores, os valores supremos que se põem como antecedentes, como
precursores do ordenamento jurídico, do Estado Democrático de Direito formado
com a função precípua, dentre outras, de concretizar aqueles valores substanciais
que exprimam os ideais aspirados pela sociedade e que possui como instrumento
para este exercício a Constituição - a figura de uma constituição viva72 – aqui
retratada como a que atua concretizando seus objetivos fundamentais previstos no
seu artigo 3° através da eficácia e efetividade de suas normas e que, por outro
lado, mantem o seu texto acasalado à realidade social.
Então. Neste compasso é que a capacidade contributiva, moldura
principiológica do Direito Tributário desenhada na arquitetura constitucional - art.
145, § 1°- anuncia a concreção e a efetividade de valores fundamentais que
informam o ordenamento jurídico tributário ao dispor que a contribuição para o
custeio das atividades do Estado através de impostos 73 será feita na medida em que

73 Ainda que na previsão constitucional haja referência tão somente a impostos, pela análise
sistemática dos princípios e objetivos do ordenamento tributário, pensamos que a capacidade
contributiva deve ser princípio nuclear informador do regime jurídico de todas as espécies tributárias,
matizando os tributos vinculados e os não vinculados, os ditos pessoais e os reais, apenas a sua
aplicação na inteireza se realiza de forma mais ampla com relação aos impostos, pela sua
independência ou não vinculação a qualquer atuação estatal, ou escrevendo melhor, pela hipótese de
incidência dizer diretamente com o fato ou situação reveladora de capacidade econômico contributiva
do sujeito passivo, o que podemos perceber também com clareza meridiana a necessidade de sua
efetiva aplicação com relação às contribuições para a seguridade social, como no julgado: “ (…)
art.145, §1°, da Constituição Federal, que alude à capacidade contributiva, fazer referência apenas
aos impostos, não há negar que ele consubstancia uma limitação ao poder de imposição fiscal que
informa todo o sistema tributário. É certo, contudo, que o princípio da capacidade contributiva não é
aplicável, em sua inteireza, a todos os tributos. (…) Na hipótese das contribuições, todavia, o
princípio em tela, como regra, encontra guarida, como ocorre no caso das contribuições sociais
praticados os fatos de relevância econômica a que a lei tributária irradiou suas luzes
e os fez geradores de efeitos tributários e na igual medida em que forem reveladores
de força econômica de quem os praticou.
Há no enunciado da norma constitucional um parâmetro positivo da
imposição do Estado, ao passo que atua como limite negativo do exercício do poder
de tributar.
A eleição pelo legislador de fatos da vida social que demonstrem
manifestação de riqueza e aptidão para concorrer às despesas públicas, configura a
capacidade contributiva absoluta ou objetiva, o que trocando em miúdos quer dizer
que a hipótese de incidência tributária em seu aspecto material há que ser um ato ou
fato que revele ou represente manifestações de riqueza 74, e por outro lado, um limite
à graduação máxima no exercício da competência tributária, ambos fundamentam
juridicamente o tributo.
De outra banda, a capacidade relativa ou subjetiva refere-se à parcela da
riqueza que será objeto da tributação em face de condições individuais 75, ou seja, a
aptidão específica de dado contribuinte para suportar a imposição tributária na
medida de sua real possibilidade econômica de gerar os recursos destinados ao
Estado, agindo assim como critério de graduação e limite da tributação de modo
que o ônus tributário seja suportado sem afetações quanto ao direito a uma

previstas no art.195, I, b, c devidas pelo empregador. ( Excerto do voto condutor do Min. Ricardo
Lewandowski, quando do julgamento, pelo STF do RE 573675, mar/09).
74 COSTA, Regina Helena. Princípio da Capacidade Contributiva. 4.ed. São Paulo: Malheiros,

2012, p.28-29.
75 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário – Capacidade Contributiva –

Conteúdo e Eficácia do Princípio. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar,1998, p. 57.


76 Dando ênfase ao caráter de concreção e de efetividade da Constituição, Mizabel Derzi traz à sirga

o aspecto de que no texto constitucional há a referência à capacidade econômica e não à capacidade


contributiva com o objetivo de “ afastar criações jurisprudenciais, administrativas ou legais que,
baseadas em presunções, ficções e falseamentos, buscassem atingir fatos que não estivessem
assentados em realidades econômicas”, o que faz com que a a capacidade econômica contributiva só
possa ser medida por verdadeiras forças econômicas do contribuinte. ( Nota de atualização. In:
BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. op. cit, p.1092)
77 Sob esta mesma perspectiva a doutrina italiana demonstra que a capacidade contributiva prevista

no art.53 da Constituição italiana de 1947, em vigor, “tutti sono tenuti a concorrere alle spese
pubbliche in ragione della loro capacitá contributiva”, fixa critérios que vinculam a todos os seus
destinatários: “ (…)l'art. 53 fissa altresì criteri vincolanti per ogni interprete, sia esso il contribuente, il
giudice o l'amministrazione finanziaria“, ao passo que orienta a interpretação das normas na
realização do princípio ao afirmar: “ Nei limiti della legge, tra due diverse interpretazioni dovrá essere
dunque preferita quella che assicuri il rispeto dei principi constitucionali.( MOSCHETTI, Francesco.
LORENZON, Gianfranco. SCHIAVOLIN, Roberto, LORIS, Tosi. La Capacitá Contributiva . Padova:
Cedam, 1993. p.13.
existência digna, o que no revés, vem a garantir tanto o padrão de vida de quem o
suporta como a legitimidade do tributo devido.
Sob tal prisma de interpretação é que nos leva a crer que de fato, ainda
que a capacidade econômica76 seja pressuposto da capacidade contributiva77, não
abarca de forma global o seu conteúdo, devendo sempre ser preservado o mínimo
vital, eis dizer, a parcela economicamente existente, no entanto não tributável.
A busca da máxima eficácia do princípio deve ser uma constante aos
seus destinatários, desde aqueles que têm competência para a criação dos tributos
aos seus intérpretes e aplicadores da norma77, uma vez que toda a atuação estatal
deve ser no sentido de preservar as máximas fundamentais que informam o
universo da fenomenologia tributária, notadamente a capacidade contributiva por ser
o eco em que ressoa as vozes normativas da igualdade, da justiça tributária, da
proibição do confisco, do direito de propriedade e da solidariedade fiscal, que direta
ou indiretamente gravitam na órbita das normas constitucionais que possuem
eficácia plena e aplicação imediata, nos termos do § 1° do art.5° do Texto
Constitucional.
A noção de capacidade contributiva carrega em si a de igualdade
tributária, pois que impõe à lei tributária que trate de forma igual àqueles de idêntica
força econômica, com os mesmos deveres e direitos tributários, e de forma desigual
aos que destoam, vedando a concessão de privilégios e de benefícios fiscais de
forma restrita a determinadas categorias ou grupos de contribuintes.
Neste mesmo passo é que a igualdade no ordenamento jurídico italiano,
em primeiro momento teve uma motivação política para coibir privilégios de classes
ou categorias antes admitidas, para em seguida abarcar o sentido de igualdade
jurídica de todos diante da Lei, de acordo com a capacidade contributiva, como
anota Victor Uckmar:

L' eguagianza di fronte agli onere fiscali può essere intesa in


due sensi: a) in senso giuridico, come parità di posizione, com
esclusione di ogni privilegio di classe, di religione e di razza, di
modo che i contribuinti, i quali si trovano in identifiche
situazioni, siano sottoposti all' identico regime fiscale; b) in
senso economico, come obbligo di contribuire agli onere
pubblici in eguale misura, intesa in termini di sacrificio, e
cioè(...), in relazione alla capacitá contributiva dei singoli.78

Do liame da capacidade contributiva – personalização do tributo - à


isonomia tributária, é que se pode extrair que a previsão no ordenamento da
progressividade da exação tributária para alguns impostos, como o imposto de renda
e do imposto predial e territorial urbano em determinadas situações, assim como da
seletividade na fixação de alíquotas em face da essencialidade 79 ou não do bem ou
serviço, da não-cumulatividade que informa o IPI e o ICMS são técnicas, ou na visão
de Edvaldo Brito são possíveis de assumir natureza de princípios 80 que possibilitam
a eficácia, a efetividade da cobrança de tributos de forma isonômica, consideradas
as condições, as circunstâncias que cercam os contribuintes individualmente
considerados de forma abstrata pelo legislador atá a sua aplicação concreta à
situação fática, na medida então da aptidão econômica do contribuinte para
colaborar com as despesas públicas de acordo com a riqueza manifestada no fato
jurídico tributário por ele praticado.
A concretização do princípio é viabilizada assim de forma direta e
pessoal, sempre que possível, nos termos do Texto Constitucional, como também
pelas técnicas ou medidas previstas no ordenamento, obrigando desde o legislador
até os seus intérpretes, inclusive contribuintes e a administração fazendária, como
bem observa Edvaldo Brito:

(…) Logo tanto o legislador, quanto o aplicador da norma terão


de adotar, fórmulas do “justo e razoável” para viabilizar o
princípio, mediante adaptação dos seus elementos à técnica de
imposição de cada tributo da espécie aquinhoada pela norma
constitucional. Consequentemente, a personalização dos
impostos e a sua progressividade em razão da capacidade de
pagar de cada pessoa são critérios preferenciais na técnica de

78 O princípio da igualdade jurídica para o autor traz em sua própria essência o princípio da
generalidade da imposição fiscal. UCKMAR, Victor. Principi Comuni di Diritto Constituzionale
Tributario. 2.ed. Padova: Cedam, 1999, p.64-65.
79 Para Ricardo Lobo Torres a seletividade é um subprincípio da capacidade contributiva onde o

tributo incidirá de forma progressiva na razão inversa da essencialidade dos produtos ( TORRES,
Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 16.ed. Renovar, 2009, p.377)
80 Edvaldo Brito em sua perspicácia jurídica ensina que tudo o que se refira à proteção do patrimônio

do particular contra assédio abusivo e soberano estatal integra um núcleo legal, e este abarca
critérios como o da progressividade, não-cumulatividade, seletividade e proporcionalidade destinados
a disciplinar cada espécie de imposição. ( BRITO, Edvaldo. Princípios Constitucionais Tributários. In
Caderno de Pesquisas Tributárias n.18. Centro de Extensão Tributária e Editora Resenha
Tributária. São Paulo: 1993, p. 556-558.
imposição que o legislador há de adotar cada vez que instituir
essa espécie tributária.(...)81

Há assim um propósito para as nuanças admitidas pelo ordenamento


tributário de meios que possibilitem a efetividade do princípio da capacidade
contributiva e dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil ( art.3°
da CF) , ou em poucas palavras, há um fundamento para ambos: a justiça social, e
mais de perto, a justiça fiscal.
“A justiça fiscal é valor supremo do Estado de Direito dependente de
impostos e, ao mesmo tempo, o valor supremo da comunidade de contribuintes”, 82
esta é a lição de Klaus Tipke ao defender que não há um critério de justiça uniforme
para todo o Direito, deve-se, portanto, existir a adequação à matéria, que para o
Direito Tributário a orientação deve ser seguida pelo que dialoga o princípio da
capacidade contributiva e os demais princípios e regras que norteiam o sistema
jurídico tributário.
Ainda que carregada de alto grau de abstração e de grandes tertúlias
doutrinárias quanto ao seu real conceito - das quais nos apartamos por escapar do
eixo temático deste trabalho - a justiça tributária age como fundamento de
concretização da distribuição isonômica83 da carga tributária segundo a capacidade
contributiva ou econômica de cada qual e como o mais importante objetivo da
arrecadação tributária. Neste mesmo cenário atua o pensar de Francesco Moschetti
ao discorrer sobre a concretização da justiça tributária pelo princípio da capacidade
contributiva. Suas palavras:

81 BRITO, Edvaldo. Capacidade Contributiva. In Caderno de Pesquisas Tributárias n.14. Centro de


Estudos de Extensão Tributária e Editora Resenha Tributária. São Paulo: 1989, p. 326).
82 Para o autor os princípios são pressupostos básicos para a justiça formal enquanto orientam a

justiça material, e assim a violação a princípios justos só é justificada pela aplicação de princípios de
um mesmo valor, hipótese que supomos não caber quando da aplicação da capacidade contributiva,
pois ainda que não aplicadas no entendimento do autor, às normas extrafiscais, entendemos como já
demonstrado neste estudo que há um limite à extrafiscalidade - ainda que informada por outros
objetivos relevantes - estabelecido pela vedação do confisco, que nada mais é que uma
manifestação, ou como trata a maioria da doutrina, uma decorrência do princípio da capacidade
contributiva. ( TIPKE, Klaus. YASHAMITA, Douglas. Justiça Fiscal e Princípio da Capacidade
Contributiva. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p.18.)
83 “O conceito indeterminado da justiça é concretizado num primeiro nível: como segue: justiça por

meio de tratamento isonômico; tratamento isonômico segundo um critério adequado à matéria; justiça
social – tributação socialmente justa com base num princípio adequado à matéria, que somente pode
ser sacrificado por princípios de mesmo valor” ( Idem. p. 22)
84 MOSCHETTI, Francesco. La Capacità Contributiva. In: AMATUCCI, Andrea. Trattato de Dirito

Tributario. Tomo I. Padova: Cedam, 1994. p.227.


“Strettamente collegata à la scelta del principio de capacitá
contributiva come primario criterio de giustizia nella creazione e
ripartizione dei tributi. Solidarietá e capacità sono due aspetti
della stessa realtá. Nell' ambito de rapporti solidali, il
fondamentale criterio di giustizia si sintetizza appunto nella
formula “ da ciascuno secondo la capacitá, a ciascuno secundo
i bisogni.”84

Ora, se num giro, a justiça distributiva fiscal consiste em que aqueles que
possuam mais aptidão para contribuir no custeio das despesas públicas o façam em
medida maior, e noutro giro, o Estado tem o poder-dever de arrecadar tributos para
realização de suas atividades fins e que atendam à necessidade de todos, em
especial daqueles que por possuir menor aptidão para contribuir necessitam e
utilizam em medida maior os bens e serviços estatais, é que se esbarra em mais um
inarredável princípio informador do sistema tributário e também manifestação da
capacidade contributiva: a solidariedade social tributária.
Seja como mais um fundamento da tributação ou como um objetivo
constitucional, a solidariedade social emerge efetivamente pelo estreito laço que
vincula o cidadão contribuinte - ao retirar parcela de sua riqueza e na sua medida
para a cooperação recíproca entre os membros da sociedade e nesta senda exercer
o direito de exigir prestações positivas do Poder Público - ao Estado Democrático de
Direito - para a realização dos seus objetivos balizados numa coordenada
sistemática do conjunto de valores que o norteiam para a garantia e efetivação de
direitos fundamentais e construção do bem-estar social comum.
Há nesta perspectiva uma dimensão social do homem que deve também
informar todo o fenômeno da tributação proposta pela Constituição da Sociedade 85 e
sob este prisma é que a tributação escapa à função instrumental estatal de
arrecadação de recursos, pois na “ponderação de valores constitucionais, o peso do
valor “arrecadação ( por estar circunscrito ao âmbito tributário) é menor do que o
peso do valor “solidariedade social” ( por ser um objetivo fundamental)”.86
Em suma, podemos afirmar que há um liame efetivo que amarra o dever
fundamental de pagar tributos na dimensão econômica do pressuposto do fato
considerado, que tem como contrapartida o dever do Estado de realizar os objetivos

85 GRECO, Marco Aurélio. Solidariedade Social e Tributação. In: GRECO, Marco Aurélio. GODOI,
Marciano Seabra (coords.). Solidariedade Social e Tributação. São Paulo: Dialética, p.178.
86 Idem, Ibidem. p.179.
constitucionalmente consagrados pela sociedade na máxima eficácia possível dos
valores por aqueles revelados, em busca de um ordenamento jurídico que seja um
instrumento de superação às expectativas basilares suscitadas nos enunciados
normativos tributários no alcance do ponto que garanta o equilíbrio para uma
tributação efetivamente justa.
A tributação justa a que já nos referimos neste trabalho envolve a
atividade do legislador infraconstitucional no sentido dos caminhos possíveis pela
Constituição, em conjunto com a capacidade do contribuinte de pagar tributos em
que seja resguardado o limite do mínimo vital, expressão de igualdade tributária que
possibilita que contribuintes sejam diferenciados mediante ponderações econômicas
e meio para que se viabilize a dimensão social do homem pelo exercício da
solidariedade social.
Para além do citado liame, a clamada tributação justa suscita um
ordenamento constitucional em que seja garantida a livre concorrência, pressuposto
da livre iniciativa, ou melhor, que por meio dos princípios e mecanismos de
tributação seja possível o livre exercício de atividades dentro das normas e limites
legais estabelecidos, para que em tal ambiente haja a construção de uma sociedade
em que a cada pessoa humana seja viável uma existência digna.
Neste mesmo rumo - de um ordenamento tributário justo - é que a
atuação dos empresários deve prosperar no sentido de permitir tal construção, o que
envolve suas relações com a sociedade, inclusive o Fisco, de forma no mínimo,
ética, pautada pelas balizas do constituinte pátrio de que devemos todos construir
uma sociedade justa, livre e solidária.
Esta questão se aproxima do objetivo pretendido neste trabalho e nos
guia de forma segura, dentre os possíveis enfoques da interação da norma tributária
e da relação jurídica instalada, para o alcance dos fundamentos que indicam que à
norma tributária deva ser dada uma interpretação na magnitude exigida pelas várias
formas de atuação das sociedades empresárias87, dos seus sócios e o pagamento de

87A expressão “sociedade empresária” assim como “empresário” é empregada, neste estudo, na
acepção apresentada por Fábio Ulhoa Coelho, designando a pessoa jurídica que explora atividade
econômica de produção ou circulação de bens ou serviços, notadamente nas formas de sociedade
por quotas de responsabilidade limitada (Ltda) ou a de uma sociedade anônima (S/A), por dizerem
mais de perto com nosso estudo da responsabilidade tributária.(COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de
Direito Comercial. 15.ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.79.)
88 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da Norma Tributária. 2.ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais,1981, p.45. Para além do Direito Tributário entendemos que o fenômeno da tributação, suas
tributos.
Ou seja, a busca é pelo sentido que abarque a responsabilidade tributária
daqueles que exercem suas atividades respaldados em interesses individuais e
sociais e dessa forma agem em prol da sociedade, assim como, de forma apartada,
mas sem desgarrar a unidade que permeia o Direito, notadamente a
interdependência entre os diferentes componentes do sistema jurídico 88 , daqueles
que no intuito de proveito para si e para poucos, atuam por meio insidiosos e
simulados que intentam não sejam revelados os verdadeiros contribuintes dos
tributos devidos pelos fatos jurídicos tributários realizados, direta ou ainda que,
indiretamente.
Nesse enlace é que partimos de relance à norma jurídica tributária e sua
incidência pela completude dos elementos que a caracterizam, o que constitui um
passo a mais no intuito de encontrarmos respostas dentro do próprio ordenamento
jurídico, para a questão que atina a quem cabe de forma real diante da relação
jurídica tributária estabelecida, o dever fundamental de pagar o tributo devido e em
que viés se caracteriza tal responsabilidade, se exclusiva ou pessoal, solidária ou
subsidiária.

2.3 Norma Jurídica Tributária: conceito, estrutura e classificação

A ideia de norma jurídica como a significação obtida a partir da leitura de


textos escritos89 como as leis, as sentenças, os atos administrativos guarda perfeita
sintonia com o fato de elas serem os elementos por excelência do Direito positivo e
expressas num sistema de linguagem prescritiva que as revestem.
A norma por ser uma prescrição contem uma ordem a ser cumprida, uma
proibição que deve ser obedecida ou pode ainda estabelecer uma faculdade, e
assim a sua ilação pelo intérprete e pelo aplicador do direito dependerá sempre da
contextualização lógica das normas em todo o sistema para colher a sua real

consequências e efeitos estão diretamente atrelados à ordem econômica, social, além do direito civil
e comercial, considerando-se a unidade do Direito, sempre na busca da coerência do sistema.
89 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito .... op.cit, p.2.
90 KELSEN, HANS. Teoria Pura.....op.cit. p.6.
91 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário...op.citp.56.
92 Eurico de Santi explica que “uma se justifica pelo fato de que as normas apresentam idêntica

estrutura lógica; a outra decorre da diversidade de conteúdos dirigidos à região material da conduta
social nas suas imanentes relações de intersubjetividade” (SANTI, Eurico Marcos Diniz de.
Lançamento …..., op.cit, 2010.p.)
significação. A norma jurídica é, portanto, veiculada pelo seu suporte físico que é o
texto do Direito positivo, utilizado como meio de alcançar a sua finalidade, em
síntese, a regulação das condutas humanas.
Não há identidade entre texto jurídico e a norma jurídica, pois aquele
através dos seus enunciados prescritivos introduz no ordenamento a norma jurídica,
enquanto esta é sob este prisma o sentido que o legislador ou o intérprete lhe
atribui, ou seja, o resultado de operações mentais, uma unidade de sentido deôntico
para que seja compreendida e cumprida pelos seus destinatários. Por isso se faz
necessário o seu estudo para que as ilações acerca do tema proposto sejam mais
acuradas.
Sobre a norma, Hans Kelsen assim se pronunciou:

Norma é o sentido de um ato através do qual uma conduta é


prescrita, permitida ou especialmente, facultada, no sentido de
adjudicada à competência de alguém.90
As normas jurídicas, por sua vez, para que atinjam as suas finalidades -
entendidas aqui como um “ato de vontade intencional dirigido à conduta de outrem”
91devem se revestir de uma estrutura lógica específica 92, uma arquitetura formal que
se mostra homogênea sintaticamente, mas heterogênea nos planos semântico e
pragmático.
Todas as normas jurídicas apresentam a mesma estrutura composta de
um antecedente que é hipótese e um consequente, a tese, onde a primeira implica a
segunda, unidas pelo dever-ser em que há a associação de um fato ou situação
abstratamente eleitos pelo legislador a desencadear a irradiação da incidência
tributária e a produzir uma relação jurídica.
Tal relação jurídica é exatamente prescrita no consequente, na tese, o
que implica dizer que a norma jurídica é articulada na forma hipotético-condicional
em decorrência da imputação jurídico-normativa, cuja missão é prescrever como
obrigatórias, permitidas ou proibidas condutas humanas em interferência
intersubjetiva. Em apertada síntese, dada a hipótese, então o consequente.
Neste prisma importa ainda destacar a norma jurídica em sentido
completo, sendo aquela que em sua estrutura contenha uma norma primária – a
norma em sentido estrito e uma norma a secundária – a que prevê um fato e um
dever correlato, dos quais resulta a relação jurídica, enquanto a segunda prevê a
sanção pelo descumprimento e a sua aplicação coativa pelo Estado.
Então na sua completude as normas jurídicas têm feição dúplice 93 e cada
uma delas, tanto a primária como a secundária, possuem um antecedente e um
consequente, assim como adverte Eurico de Santi: “Na norma jurídica completa,
suprimir a norma secundária sancionadora, norma de direito adjetivo, significa retirar
a juridicidade da norma primária, norma de direito substantivo”.94
Considerando o fato descrito no antecedente das normas é que é possível
a classificação95 em abstratas ou concretas, o que significa que será abstrata
quando seu antecedente normativo descrever uma miríade de fatos passíveis de
acontecer no mundo real, ao passo que será dita concreta quando descrever o fato
realizado nos termos do que foi previsto na norma abstrata.
A norma, no que toca ao fato descrito no seu consequente, ou mais
específico, quanto aos seus destinatários legais, pode ser dita como geral ou
individual. Na primeira há a regulação da conduta de pessoas indeterminadas,
enquanto na segunda, no seu consequente há a regulação da conduta de
destinatários individualizados.
Na órbita das normas gerais ou individuais é que nasce a relação jurídica
correspondente. Situando o objeto principal da pesquisa, as normas de
responsabilidade tributária como categorias de normas gerais e abstratas, em que
somente através da norma individual e concreta, ou seja, do lançamento tributário é
que aqueles comandos interferem nas condutas intersubjetivas.
O fato é que a norma individual e concreta é o meio pelo qual a geral e
abstrata se concretiza.
As normas jurídicas podem ainda ser classificadas em dois grupos
segundo o seu conteúdo imediato ou quanto ao objeto a ser regulado: normas de
conduta, as que regulam diretamente o comportamento, as condutas nas relações
intersubjetivas, e as normas de estrutura, também chamada de organização que
instituem uma competência para o procedimento da produção normativa.
Há posições divergentes no que toca esta classificação e a sua própria
utilidade prática, pois sendo o objeto a conduta humana, tais normas, ainda que

93 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário...op.cit, p.56.


94 SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Lançamento ….... op.cit, p.40.
95 Nas palavras de Geraldo Ataliba: “ É noção cediça que toda classificação só tem valor realmente

científico na proporção em que conduz a consequências de natureza prática”. (Hipótese de


Incidência Tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.p.45).
descritas em grupos apartados acabam por regular de forma direta ou indiretamente
a conduta humana . José Souto Maior Borges ensina que:

Como as normas de competência – que alguns denominam


normas de estrutura, outras normas de organização – são
apenas normas de conduta indiretamente formuladas, a
distinção se mostra tão tênue que perde quase toda a
funcionalidade.(...) Assim sendo, a norma de conduta lato
sensu é um gênero que inclui as normas de conduta stricto
sensu (as que regulam diretamente a conduta humana) e
normas de estrutura ( as que regulam indiretamente a conduta
humana).96

Nesta visão é que a norma posta de responsabilidade tributária pelo ato


jurídico do lançamento tributário é uma norma de conduta stricto sensu, enquanto as
isenções, imunidades e as normas de competência e imposição de limites ao
exercício destas pelas pessoas jurídicas de direito público previstas na Constituição
Federal, por exemplo, são de estrutura.
Faz sentido a compreensão da norma jurídica quando os olhos estão
postos na exegese das normas que integram o Direito positivo bem como a leitura
dada pela Ciência do Direito, para que possibilite uma visão sistemática do
fenômeno da responsabilidade tributária.

2.4 O Fenômeno da Incidência Tributária

Como estampado em tópico anterior a norma jurídica em sentido estrito é


entendida como um juízo hipotético em que havendo um antecedente há um
consequente, unidos pelo liame da imputação, o dever-ser.
Noutro giro, a partir da sistematização dos enunciados prescritivos dos
textos do Direito positivo é que a norma nasce pelas operações mentais dos
intérpretes e aplicadores do direito, não raro em dissonância com o pensar do
próprio legislador. Assim também acontece com a norma jurídica tributária, inclusive
a norma tributária em sentido estrito, que tem como núcleo o dito instrumento veloz,
o tributo, norma que a doutrina denominou de “regra matriz de incidência tributária”.

96 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da …....., op.cit, p. 376-380.


O antecedente da citada norma traz um estado ou fato da realidade que
contenha um conteúdo econômico que, se ocorrido acarretará necessariamente o
consequente, ou seja, a relação jurídica entre o Estado (sujeito ativo) e o
contribuinte (sujeito passivo).
Assim é que o Estado tem o direito subjetivo de exigir o cumprimento do
dever jurídico do contribuinte de pagamento do tributo - a obrigação principal - e
nessa mesma trilha ocorre com os chamados deveres instrumentais – obrigação
acessória - em prol da arrecadação e fiscalização dos tributos.
O antecedente da regra matriz de incidência tributária é composto dos
critérios material, espacial e temporal.
Apenas para fins de destaque, em síntese bem estreita, o critério
material97, núcleo do antecedente, trata da designação abstrata de uma situação ou
estado de fato que se ocorrida ou praticada por uma pessoa física ou jurídica
acarretará a incidência da norma e a produção dos seus efeitos.
O critério espacial delimita o local em que deve ser considerado que o
fato eleito pelo legislador como irradiador de efeitos tributários possa ser realizado.
E ainda o critério temporal em que fica estabelecido o momento da
ocorrência do fato descrito no antecedente da norma, identificado como o seu
critério material.
No consequente normativo temos o critério pessoal que permite identificar
o sujeito ativo e o sujeito passivo da relação jurídica tributária, assim como também
está no consequente normativo o aspecto da quantificação do montante do tributo a
ser pago pelo sujeito passivo.
A base de cálculo e alíquota são aspectos de aferição quantitativa dos
tributos variáveis, mas cabe ressaltar que existem no ordenamento jurídico os
tributos fixos cujo montante a ser pago já vem estipulado na lei que os instituiu.
Com clareza é a lição de José Souto Maior Borges sobre o tema :

A base de cálculo (unidade de medida, preço, valor, montante


da renda etc.) não se integra, como também a alíquota, na

97 Geraldo Ataliba vê o critério material como o mais complexo da hipótese de incidência: Este
aspecto dá, por assim dizer, a verdadeira consistência da hipótese de incidência. Contém a indicação
de sua substância essencial, que é o de mais importante e decisivo há na sua configuração. É o mais
importante aspecto, do ponto de vista funcional e operativo do conceito porque, precisamente, releva
sua essência, permitindo sua caracterização e individualização, em função de todas as demais
hipóteses de incidência. ( ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incid...., op. cit, p.106-107)
previsão hipotética da norma. Em face da hipótese normativa,
sua autonomia é verificável pela análise jurídica. A hipótese –
para utilizar a linguagem de lógica jurídica moderna – é um
descritor, não um prescritor. Descreve, não prescreve. (…) Por
isso mesmo, nela não cabe a determinação (= prescrição) do
quantum do tributo a ser pago – e, pois, dos seus requisitos de
aferição. À hipótese incumbe apenas descrever os
pressupostos fáticos necessários e suficientes para a
incidência da norma tributária. Não os seus requisitos legais de
quantificação (base tributável e alíquota). (…) Os critérios de
quantificação ( base tributável e alíquota).98

A medida da quantificação do montante do tributo é obtida não


considerando a integralidade do fato jurídico tributário, mas mediante a utilização de
uma grandeza aferida em proporção como resultado de uma base de cálculo e
aplicação de alíquota que devem estar previstas em lei ordinária instituidora do
triburo destacando-se que tal grandeza não pode ser estabelecida em descompasso
aos princípios basilares do sistema tributário, notadamente o da capacidade
contributiva. Assim deve ser a regra-matriz de incidência de um tributo.
Enfim, o laureado fenômeno da incidência ou aplicação do Direito 99, nada
mais é senão o fenômeno especificamente jurídico de subsunção de um fato a uma
hipótese legal, o que significa que o fato ocorreu na moldura desenhada pelo
enunciado descrito pela linguagem da prescrição normativa tributária projetando os
efeitos previstos na formação do vínculo jurídico entre os dois sujeitos de direito.

2.5 A Relação Jurídica Tributária

Como exposto acima a incidência é uma projeção que acontece mediante


a subsunção - constitui o fato jurídico tributário – e a implicação – por força da
imputação constitui a relação jurídica, que por sua vez, se situa no consequente da
norma individual e concreta.
Para Eurico Marcos Diniz de Santi:

A relação jurídica tributária efectual equivale, na terminologia


do Código Tributário Nacional, à obrigação tributária em

98 BORGES, José Souto Maior . Lançamento.......ob.cit.p., 149.


99 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência......, op.cit,p. 43.
100 SANTI, Eurico Marcos Diniz de Santi. Lançamento...,op.cit, p.130.
sentido estrito. Esta relação jurídica decorre exclusivamente do
fato jurídico tributário (fato gerador concreto). É eficácia jurídica
do fato jurídico tributário.100

O vínculo que se estabelece entre os sujeitos de direito envolvidos na


relação jurídica tributária é constituído então a partir dos efeitos irradiados pela
concretização do fato jurídico tributário. Eis a lição de José Souto Maior Borges:

Os fatos ou situações somente estão subsumidos à norma


enquanto relacionados com a conduta humana. De feito, nem é
o Fisco, nem o sujeito passivo, que forma o conteúdo da norma
jurídica tributária. São as ações ou omissões, a conduta
humana que se esconde atrás da ficção da “Fazenda Pública”
ou “Fisco”, que formam o conteúdo das normas tributárias. O
Fisco e o sujeito passivo são apenas o âmbito pessoal de
validade da norma, não o seu conteúdo. A relação jurídico-
tributária, nesse sentido, não será, pois, uma relação
interpessoal, relação entre o Fisco, sujeito do direito de crédito
tributário, e o contribuinte ou responsável, como sujeitos do
dever (obrigação) tributário, mas, sim, uma relação entre o
dever jurídico (obrigação tributária) e o direito reflexo (direito de
crédito tributário) que lhe corresponde.101

Assim, para o autor a relação jurídica tributária consiste numa relação que
somente é estruturada por normas jurídicas e o tributo na acepção de uma relação
jurídica, nada mais é do que um complexo de deveres (obrigações) e direitos
subjetivos, o que vale dizer, um complexo de normas jurídicas. 102
Ex lege, situada está no consequente da norma jurídica individual e
concreta, a relação jurídica tem dois elementos: o subjetivo e o prestacional. Esta
apenas para aclarar, se refere ao cumprimento de determinado objeto por parte do
sujeito passivo, como uma quantia a ser paga ou o cumprimento de deveres
instrumentais formais. Nesse sentido é que a relação jurídica tributária pode ser dita
“obrigacional ou prestacional” ou ainda “ secundária de caráter instrumental”.
No elemento subjetivo é que nos debruçamos por ser o foco de nosso
estudo, em que, de um lado está o sujeito ativo, pessoa política de direito público

101 BORGES, José Souto Maior . Lançamento.......ob.cit.p. 52-53.


102 Idem,Ibidem p.54.
103 “Competência tributária é uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes de que são
portadoras as pessoas políticas, consubstanciada na possibilidade de legislar para a produção de
normas jurídicas sobre tributos.” CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito .... op.cit, p.235.
titular da competência tributária ou pessoa jurídica privada, a quem foi delegada tal
competência.103 O sujeito ativo, nos exatos termos do art.119 do CTN tem a aptidão
nos traçados constitucionais para instituir tributos, bem como a capacidade que
caracteriza a qualidade de aplicar, cobrar tributos legalmente instituídos.
Assim é que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm o poder
indelegável e irrenunciável de inovar o ordenamento jurídico tributário, na moldura
constitucional traçada pelos limites formais e materiais, no exercício de suas
competências tributárias.
Noutro lado está situado o sujeito passivo, sendo aquele que tem o dever
da prestação de dar, fazer, ou não fazer algo em favor do sujeito ativo. O laço que é
desenhado entre sujeito ativo e o passivo é o da obrigação tributária, espécie do
gênero do “dever tributário”, compreendendo a obrigação tributária principal - no que
se afigura como prestação pecuniária - e ainda as obrigações acessórias, deveres
instrumentais de cunho não patrimonial.104
Segundo José Souto Maior Borges, o direito de crédito tributário do ente
político é portanto, um “reflexo” da obrigação tributária, 105 e nessa condição não tem
existência autônoma mas estritamente vinculada àquela . Nesses termos, pode-se
dizer que, assim como sucede com a obrigação do devedor, o direito reflexo do
credor – o Fisco – somente existe em relação com uma pessoa determinada: o
obrigado, o sujeito passivo da obrigação tributária.

2.5.1 A sujeição passiva tributária: o contribuinte e o responsável tributário

O sujeito passivo da obrigação principal pode ser nos termos do Código


Tributário Nacional, art.121, aquele que tenha relação pessoal e direta com a
situação que constitua o respectivo fato gerador, ou ainda aquele que sem revestir a
condição de contribuinte, seja designado por lei.

104 José Souto Maior Borges argumenta que a obrigação tributária principal – dever individual e
concreto, nessa qualidade oposto ao dever geral e abstrato – especifica-se pela determinação do
sujeito passivo, contribuintes e responsáveis e pela prestação patrimonial estimável – dinheiro ou cujo
valor nele possa expressar-se. ( BORGES, José Souto Maior. Lançamento .......op.cit.p. 45)
105 Idem Ibidem p. 54.
106 BARRETO, Aires F. Curso de Direito tributário Municipal. São Paulo: saraiva, 2009. p.132
A Doutrina diverge com relação á estatura constitucional, ou não, da
sujeição passiva tributária. Estamos com os que pensam que o constituinte ao
desenhar em minúcias o sistema tributário constitucional, e mais específico ainda, os
critérios da regra matriz tributária, identificou dentre eles o sujeito passivo, ainda que
de forma implícita, estreitando as margens para que o legislador infraconstitucional
possa alterar o aspecto pessoal da hipótese de incidência e desse modo interferir
nos titulares da capacidade contributiva já indicada pela Constituição. 106
No sentido de que o sujeito passivo está na Constituição, expressa
Geraldo Ataliba:

O sujeito passivo é, no direito constitucional brasileiro, aquele


que a Constituição designou, não havendo discrição do
legislador na sua designação. Só pode ser posto nessa posição
o "destinatário constitucional tributário” (para usarmos a
excelente categorização de Hector Villegas).(...) O legislador
aqui é orientado por critérios pré- jurídicos da ciência das
finanças. Os princípios constitucionais implícitos servem de
limite à sua faculdade, Efetivamente, a sistemática
constitucional exige que o legislador ponha, como sujeito
passivo dos tributos vinculados, só as pessoas que se
relacionem, de algum modo, com a atuação estatal que figura
no núcleo da respectiva h.i. 107

No revés, entende Paulo de Barros Carvalho que a escolha do sujeito


passivo cabe ao legislador infraconstitucional nos limites das balizas constitucionais,
como discorre:

A Constituição não aponta quem deva ser o sujeito passivo das


exações cuja competência legislativa faculta às pessoas
políticas. Invariavelmente, o constituinte alude a um evento,
deixando a cargo do legislador ordinário não só estabelecer o
desenho estrutural da hipótese normativa, que deverá girar em
torno daquela referência constitucional, mas além disso,

107 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência......, op.cit,p. 43.


108 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, Linguagem e Método. São Paulo: Noeses,
2008, p.552. Nesta mesma trilha está o pensar de Maria Rita Ferragut ao defender que
“desconhecemos a existência de qualquer norma constitucional que indique quem deva ser o sujeito
passivo de uma relação jurídica tributária, Por isso, entendemos que a escolha é
infraconstitucional”.(FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária: Conceitos Fundamentais.
In FERRAGUT, Maria Rita. NEDER, Marcos Vinicius.( coords.) Responsabilidade Tributária. São
Paulo: Dialética, 2007, p.10).
109 “Muitas vezes o contribuinte poderá ser encontrado de modo implícito, de regra na busca do sujeito

que dá origem ao fato tributário. (...) Assim, pois, identificado o aspecto ou critério material da
hipótese tributária, poder-se-á buscar o contribuinte. (SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário.
São Paulo: Saraiva, 2011, p.445).
escolher o sujeito que arcará com o peso da incidência fiscal,
fazendo as vezes de devedor da prestação tributária. 108

Ainda que tal pensamento seja expresso na voz do eminente tributarista,


ousamos discordar e reiterar nosso entendimento de que a Constituição Federal
não deixou a largo os passos do legislador infraconstitucional para escolher quem
tem o dever legal de efetuar o pagamento da exação tributária, uma vez que ao
estipular os eventos, fatos e bens eleitos a irradiarem os efeitos tributários,
certamente, ainda que de forma implícita,109 formatou as diretrizes de quem os
realizariam de forma direta e pessoal, ou ainda que indiretamente, mas sempre
vinculado ao fato ou à pessoa que o praticou, estando portanto, a atuação das
pessoas políticas devidamente atadas aos princípios e regras constitucionais, bem
como às diretrizes das normas gerais em matéria de tributação.
O sujeito passivo da obrigação principal é gênero, do qual são espécies, o
contribuinte e o responsável, pertinência lógica do enunciado prescritivo da norma
legal (CTN, art.121).
Contribuinte, na dicção do citado dispositivo, é aquele que possui
“relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador”,
portanto aquele que realizou o fato jurídico tributário e dessa forma está obrigado ao
pagamento do tributo ou penalidade pecuniária, ou como escreve Luciano Amaro
que “dado o fato, ele é atribuído a alguém que o tenha realizado. Essa pessoa via
de regra é o contribuinte. Portanto, há pertinência lógica entre o fato imponível e o
contribuinte ( uma situação e uma pessoa, um fato e seu autor, uma ação e seu
agente)”.110
Tal relação de pertinência citada pelo autor - a do fato imponível com o
contribuinte - que aduz à expressão legal de relação pessoal e direta com a situação

110AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.168. Nesse
mesmo sentido doutrina Roque Antonio Carraza, Renato Lopes Becho, Aires Barreto, Cleber
Giardino, dentre outros.
111 Daniel Peixoto observa que o “critério material da hipótese de incidência dos tributos vinculados

descreve uma conduta de um sujeito em relação a outro, vale dizer, do Estado em relação ao
beneficiário da atuação estatal, podendo esta mesma relação ser descrita de modo direto ou
converso, variando a formulação literal”, sendo na primeira formulação o contribuinte, como aquele
que tem relação pessoal e direta com o fato gerador o objeto indireto da atuação estatal que é o
sujeito do verbo da hipótese de incidência e na segunda, como o próprio sujeito que usufrui de tal
atuação do Estado. ( PEIXOTO, Daniel Monteiro. Responsabilidade Tributária e os atos de
formação, administração, reorganização e dissolução de sociedades. São Paulo: Saraiva, 2012,
pp. 141-143).
que constitua o fato gerador é mais bem explicitada para a identificação do
contribuinte quando a alinhamos de acordo com a categoria do tributo, se vinculado
a uma atuação estatal ou não vinculado.
Tributos vinculados são neste compasso aqueles em que a hipótese de
incidência tributária pode conter em seu núcleo, ou seja, no aspecto material,
determinado critério que identifique uma atividade do Estado dirigida ao beneficiário,
de forma mediata ou imediata. Nesta órbita estão incluídas as taxas e a contribuição
de melhoria. As primeiras pela prestação de serviço público, específico ou divisível,
ou pelo exercício de poder de polícia, enquanto a segunda pela realização de obra
pública que acarrete valorização do imóvel do particular.
Seja na formulação conversa 111 , como quer Daniel Peixoto , em que há a
fruição pelo particular da atuação do Estado, seja de forma reta da atuação do
Estado diretamente ao beneficiário, na hipótese de tributos vinculados há sempre
uma relação pessoal e direta com o fato gerador. De uma ou de outra forma, o fato
é que as notas do aspecto material da hipótese de incidência nos leva a delimitação
do sujeito passivo na figura de contribuinte da exação tributária vinculada.
No que se refere aos tributos não vinculados, temos assim aqueles que
no núcleo da hipótese de incidência tributária da regra matriz não mora uma atuação
estatal, o que quer dizer, que a prática do fato que desencadeia a obrigação
tributária é do próprio particular, sendo aquele fato signo presuntivo da riqueza a que
nos debruçamos no item 2.2.1.3 desse estudo, revelador da aclamada capacidade
contributiva.
Nesse caso aquele que tem relação pessoal e direta com o fato gerador é
a pessoa física ou jurídica que o realiza, o que figura então como sujeito passivo da
obrigação principal de acordo o desenho estrutural da hipótese normativa pelo
legislador ordinário, eis dizer, o que figura como contribuinte.
Se, de outra banda, no desenho estrutural da regra matriz de incidência
tributária como consequente não figurar como sujeito passivo da exação aquele que
realizou o fato jurídico tributário, estaremos diante não da figura do contribuinte, mas
do responsável tributário.
Há, no entanto, ampla tertúlia doutrinária e jurisprudencial quanto à
definição dos conceitos de contribuinte e responsável. Há quem defenda ser
contribuinte aquele que realmente pratica o fato jurídico tributário, o que para outros
não é suficiente, como para Maria Rita Ferragut:

Contribuinte é a pessoa que realizou o fato jurídico tributário, e


que cumulativamente encontra-se no polo passivo da relação
obrigacional. Se uma das duas condições estiver ausente, ou o
sujeito será responsável, ou será o realizador do fato jurídico,
mas não o contribuinte. Praticar o evento, portanto, é condição
necessária para essa qualificação, mas insuficiente. (...)
responsável poderá ser “qualquer terceiro, desde que
pertencente ao conjunto de indivíduos que estejam
indiretamente vinculados ao fato jurídico tributário, ou
indiretamente vinculados ao sujeito que o praticou.112

Neste átimo é relevante para o propósito a que nos firmamos de estudo


da responsabilidade tributária, destacar critérios relevantes que identificam a
categoria dos contribuintes prevista no citado dispositivo legal, como o fizemos de
início pelo aspecto material a fim de por exclusão, chegarmos aos responsáveis
tributários, conjunto de pessoas que entendemos ser mais alargado que a definição
posta como a classe universal daqueles que sejam sujeitos passivos da obrigação
tributária principal.
Pois bem. Responsável tributário é aquele que não tem uma relação
direta e pessoal com o fato irradiador de efeitos tributários e da relação jurídica
tributária, mas que por disposição expressa de lei, será aquele a arcar com o ônus
do pagamento do tributo. Mas como dito acima, o legislador ordinário não tem uma
ampla e irrestrita liberdade para a escolha do responsável tributário, tem que haver
pelo menos um vínculo entre o sujeito passivo indireto 113 e o fato jurídico tributário,
ou a quem o realizou.

112 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária e o Código Civil de 2002.2.ed. São Paulo:
Noeses, 2009.p.29-30.
113 Paulo de Barros Carvalho critica a divisão do sujeito passivo em direto ou indireto, em termos

propriamente jurídicos quando são consideradas as vantagens que os participantes retiram da


realização dos fatos, importando apenas quem integra o vínculo obrigacional, onde acrescenta: “ o
índice de relacionamento econômico da pessoas escolhida pelo legislador, com a ocorrência que faz
brotar o liame tributário, é alguma coisa que escapa da cogitação do Direito, alojando-se no campo da
indagação da Economia ou da Ciência das Finanças” ( CARVALHO, Paulo de Barros. Fundamentos
Jurídicos..... op.cit, p.224). A par do tridimensionalismo de Miguel Reale, entendemos ser importante
a análise não só da norma, mas também do fato e do valor, o que requer necessariamente uma
análise mais ampla, e não só na perspectiva puramente jurídica.
SEGUNDA PARTE

A RESPONSABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO


CAPÍTULO III

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA: ASPECTOS


NORMATIVOS E CARACTERÍSTICAS

3.1 Responsabilidade tributária: conceito e natureza jurídica


3.1.1 Responsabilidade como sanção 3.1.2 Responsabilidade
como papel institucional 3.2 Notas sobre substituição tributária:
repercussão jurídica por reembolso ou por retenção na fonte
3.3 Notas sobre responsabilidade tributária por transferência:
os sucessores e os terceiros 3.4 Notas sobre responsabilidade
por infrações

3.1 Responsabilidade tributária: conceito e natureza jurídica

O signo linguístico “responsabilidade” se origina do latim respondere e


numa acepção ampla implica o dever jurídico imputado a uma determinada pessoa
por obrigações oriundas por atos ou omissões, próprios ou de terceiros.
A responsabilidade assume matizes diferentes no campo jurídico de
acordo com o contexto em que o conjunto de regras jurídicas é considerado, ou
escrevendo melhor, conforme o ramo jurídico didaticamente autônomo, se o direito
civil, o penal, administrativo, o tributário. O fato é que a responsabilidade permeia
toda a seara jurídica a partir de uma concepção de indenização, de ressarcimento
ou interesse, por fatos lícitos, ou por sanção legal por atos ou omissões ilícitos, por
culpa ou dolo.
No contexto do direito tributário o termo “responsabilidade” assume
também nuanças diferentes e peculiares, a que vamos dar ênfase notadamente às
que sejam mais relevantes para propósito da presente investigação.
A par da dicção legal do art.121 do CTN e sua distinção do sujeito passivo
da obrigação tributária pela definição encampada para o contribuinte mediante a
expressão “relação pessoal e direta com a situação que constitua o fato gerador” é
que identificamos o responsável tributário como a pessoa eleita pela lei, diante de
objetivos específicos, para o pagamento da obrigação tributária e que possui
necessariamente uma relação com o fato jurídico tributário, que não seja pessoal ou
direta, mas de outra natureza.
Então, tem o legislador ordinário, para além dos limites formais e
materiais do texto constitucional, a lei complementar que versa normas gerais e
determina que a eleição da sujeição passiva indireta não poderá ser feita de forma
aleatória, mas terá necessariamente que ao descrever os pressupostos de fato e
possibilitar a exigência do tributo por pessoa diversa do contribuinte, que com aquele
manter um vínculo.
O vínculo entre o sujeito passivo indireto e o fato jurídico tributário é
estabelecido a partir de um fato qualquer não tributário, podendo ser econômico,
político, jurídico, dentre outros que desencadeie assim a dita relação obrigacional
tributária entre o Estado e responsável.
Nesse sentido é que a lei ao atribuir a responsabilidade pelo crédito
tributário a terceira pessoa, fez a exigência de que tal eleição tenha como
pressuposto o vínculo ao “fato gerador”114, exatamente para assegurar que o ônus

114Como fato gerador foi a expressão utilizada pelo legislador, em nosso trabalho também o faremos,
mas aclarando apenas que há a coincidência, como retratado no tópico 2.4, entre tal fato e o fato que
anotamos ter ocorrido na moldura desenhada pelo enunciado descrito pela linguagem da prescrição
normativa tributária projetando os efeitos previstos na formação do vínculo jurídico entre os dois
sujeitos de direito, ou ainda, como escreveu Geraldo Ataliba o fato concreto, a que denominou “fato
decorrente do tributo possa recair sobre a pessoa que o realizou ou que ainda venha
a realizar - sujeição passiva tributária antecipada ou substituição “para frente” - nos
termos da redação dada pela EC n° 3 de 1993 ao parágrafo 7° do art.150 da
Constituição Federal.115
Em suma, se a relação obrigacional for constituída em face da regra
geral de responsabilidade tributária116 estampada no artigo 128, do CTN, o vínculo
do responsável será indireto com o pressuposto de fato objetivo da exação tributária.
Noutro giro, se a relação jurídica tributária indireta for estabelecida com
fundamento nas demais regras do estatuto tributário - artigos 130 a 138 do CTN -
admitindo-se ainda as exceções cabíveis pela atuação do legislador complementar
linear ao disposto na locução “sem prejuízo do disposto neste capítulo” que permite
a exegese de que novos responsáveis tributários de acordo com as regras
estipuladas nos citados artigos poderão ser eleitos e não atender à exigência de “
vinculação ao fato gerador” - de forma que não seja pessoal ou direta, ou melhor,
indiretamente - então, tal vínculo poderá ser, para além do pressuposto objetivo do
fato de forma indireta, como também de forma direta ou indireta com o próprio
sujeito que o realiza.
Pretendemos com essas considerações demonstrar em poucas letras que
há, na verdade, dois sujeitos com o dever de pagar o tributo coercitivamente ao
Estado: o contribuinte com relação pessoal e direta com o fato gerador tributário
(sujeito passivo direto) e titular da dívida e da responsabilidade ; e o responsável (
sujeito passivo indireto), que por não ter relação direta e pessoal com os fatos
irradiadores dos efeitos tributários, não possui uma relação tributária, possuindo a
responsabilidade patrimonial de pagamento do tributo devido por terceiro, e não por
dívida própria, como regra geral, admitas algumas exceções diante das hipóteses de

imponível” , que ocorrido no universo fenomênico por corresponder à descrição prévia na hipótese de
incidência legal, faz nascer a obrigação tributária. ( Hipótese de Incid....., op.cit, p.68)
115 A hipótese de sujeição passiva por um fato gerador antecipado prevista na EC n° 3 de 1993, não

será analisada a fundo tendo em vista o objetivo específico desse trabalho, no entanto, ao tratarmos
do realizador do fato tributário, incluído está o que possivelmente vier a realizá-lo nos termos do que
dispõe o texto constitucional.
116 Para Maria Rita Ferragut o enunciado “responsabilidade tributária” detém mais de uma definição,

posto tratar-se de proposição prescritiva, relação e fato. “As acepções caminham juntas, já que, em
toda aparição do termo, faz-se possível identificar essas três perspectivas.” E acrescenta a autora em
síntese que como proposição prescritiva, é uma norma jurídica incompleta no teor deôntico, que
implica a inclusão do sujeito que realizou o fato não tributário no polo passivo da relação; como
relação a partir do vínculo entre o sujeito obrigado ao cumprimento da obrigação e o Fisco; e como
fato é o consequente da proposição prescritiva que indica os termos da relação (sujeito ativo, passivo
e objeto prestacional). ( FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Trib......op.cit, p.33-34)
substituição tributária e de responsabilidade por infrações, que cuidaremos em
momento seguinte do nosso trabalho.
No julgamento do Recurso Extraordinário n° 562.276/PR a pronúncia
feita pela Ministra Ellen Gracie foi nesse mesmo sentido de que na exegese do art.
121 do CTN ao estipular o contribuinte e o responsável como sujeitos passivos da
obrigação tributária principal “deve-se compreender que são sujeitos passivos de
relações jurídicas distintas, com suporte em previsões legais e pressupostos de fato
específicos, ainda que seu objeto possa coincidir – pagar tributo próprio (
contribuinte) ou alheio ( responsável).”117
Escandindo a ideia é que anotamos que a diferença entre contribuinte e o
responsável tributário é que este é a pessoa que não realizou o fato descrito na
regra matriz de incidência tributária e ainda assim está posicionado no polo passivo
da obrigação tributária e por sua vez tem a possibilidade de reaver ou ressarcir-se
do tributo pago brotado do fato jurídico praticado por outro, se não for o caso de
hipóteses de responsabilidade tributária por ilícitos praticados e tipificados em lei.
Ainda na busca de parâmetros para a demarcação do responsável pelo
crédito tributário é que damos ênfase, além dos pressupostos acima arrimados na
conexão normativa dos arts. 121 e 128 do CTN, ao fato de que a aplicação da
norma de responsabilidade só será possível diante da realização simultânea do fato
jurídico tributário e de um outro fato não tributário, lícito ou ilícito, pois ambos os
eventos configuram os pressupostos fáticos que em conjunto dão origem à relação
jurídica entre o Estado e o responsável tributário.
Neste ponto do nosso estudo é preciso reconhecer que o elemento de
justificação das regras que excepcionam o direito ao patrimônio constitucionalmente
assegurado, pela eleição de um responsável em que será retirada parcela de sua
riqueza para a entrega do valor do tributo à Fazenda Pública mora no aspecto de
que a responsabilidade tributária é instituto jurídico plantado com finalidades
específicas de punir o responsável (sanção), ou de viabilizar, simplificar e dar mais

117 STF, Recurso Extraordinário n° 562.276/ PR, j.03.11.2010, Min.Relatora Ellen Gracie. Em sentido
contrário é a doutrina de Alfredo Augusto Becker que entende ser o responsável tributário devedor de
débito próprio, pois para o tributarista quando o Estado pode exigir o tributo somente de uma pessoa,
não há responsabilidade tributária, trata-se de dever jurídico não de natureza tributária, mas
fiduciária. O responsável legal não é contribuinte de jure. ( Teoria Geral do Direito Tributário. São
Paulo: Lejus, 1998.pp. 558-561).
praticidade e efetividade à arrecadação de tributos, situações em que está instalada
a necessidade e o interesse do Estado credor.
Cabe acrescentar que tendo em vista o interesse público que deve ser o
arrimo de toda a atividade estatal, apesar de que a arrecadação do tributo daquele
que realiza o fato tributário ser mais diretamente atada aos limites constitucionais da
capacidade contributiva, da vedação do tributo com efeito de confisco dentre outras
normas por nós trabalhadas neste estudo, e nesta esteira se tornar mais segura e
prática tanto para o contribuinte como para o Estado, reconhece-se que em
determinadas circunstâncias pode tornar-se extremamente difícil e quase impossível
a arrecadação do tributo, o que faz com que o legislador mediante razões e técnicas
diferentes utilize a opção de por no polo passivo da obrigação tributária uma terceira
pessoa como responsável tributário, conforme as notas de valores pretendidas e que
informam o fato eleito como causa para a atribuição da responsabilidade.
Nesse diapasão é que se torna imprescindível a análise ainda que de
forma meteórica dos fatos passíveis de serem apreendidos como hipóteses da
norma de responsabilidade tributária que obriga a uma terceira pessoa ao
cumprimento do dever de adimplir a obrigação tributária a que não deu causa, no
geral, pois, de acordo com a natureza do fato escolhido e o valor da norma a ser
alcançado é que se determina o regime jurídico a ser aplicado. Andréa Medrado
Darzé de forma precisa discorre sobre o tema:

(…) Isto porque é justamente o valor a ser alcançado por meio


da norma de responsabilidade que demarcará as
possibilidades de fatos apreensíveis pelo legislador como
hipóteses desencadeantes da obrigação de um terceiro levar
dinheiro aos cofres públicos. A natureza deste fato, por sua
vez, determinará o regime jurídico ao qual se submeterá a
responsabilidade, existindo, desta forma, uma relação de
implicação necessária entre as razões da responsabilidade, a
hipótese de sua incidência e o regime jurídico ao qual está
sujeita. 118

Demarcamos assim para a análise seguinte da aplicação das principais


acepções de responsabilidade contidas no contexto do Código Tributário Nacional

118DARZÉ, Andréa Medrado. Os Limites da Responsabilidade Tributária dos Adquirentes de Bens


Imóveis. In FERRAGUT, Maria Rita. NEDER, Marcos Vinicius.( coords.) Responsabilidade
Tributária. São Paulo: Dialética, 2007.pp. 50-51
atadas à Constituição Federal que resultam a partir da natureza do fato, no regime
jurídico aplicado às normas que tratam da responsabilidade, quais sejam:
responsabilidade tributária sancionatória e a responsabilidade tributária por interesse
ou necessidade.

3.1.1 Responsabilidade tributária como sanção

O ato ilícito é o pressuposto imediato que fundamenta as hipóteses de


responsabilidade tributária estipuladas pelo Código Tributário Nacional de caráter
sancionatório, punitivas, notadamente os enunciados prescritivos dos artigos 134 a
138, quando dispõe sobre a “responsabilidade de terceiros” e sobre a
“responsabilidade por infrações”.
A norma de responsabilidade tributária surge como um meio de sanção
que possui na hipótese de incidência como antecedente uma conduta praticada por
terceiro em desacordo ao ordenamento jurídico tributário, e mais, que tal conduta
cause de alguma forma obstáculo, impedimento à arrecadação do tributo.
Necessário portanto que em decorrência da prática do ato ilícito ocorra
uma consequência em que haja o desvalor jurídico, ou seja, o dano pelo ausência
de recolhimento do tributo pelo contribuinte ou da própria positivação da regra matriz
de incidência nos termos inicialmente fixados, na forma e no tempo previsto em lei.
Para que a responsabilidade do terceiro nasça nessas circunstâncias
necessariamente há que ter o liame, o nexo causal entre a conduta ilícita praticada e
o resultado negativo, o dano.
Ainda que por breves palavras e apartadas as grandes tertúlias e
formulações doutrinárias civilistas acerca do ato ilícito 119 e da responsabilidade
jurídica por ele desencadeada cabe trazer à sirga aspectos relevantes tendo em

119 Conforme o Código Civil ( art.186) e a doutrina civilista são elementos que configuram o ato ilícito:
ação ou omissão voluntária e contrária ao direito, por negligência ou imprudência, intencional e que
cause dano a outro, havendo necessariamente entre o comportamento comissivo, ou omissivo e o
fato, o nexo de causalidade. Para Orlando Gomes para que o o ato seja qualificado como ilícito é
preciso que a infração seja cometida tendo o infrator conhecimento da natureza ilícita do ato, e mais o
dito nexo de causalidade é adotado na doutrina moderna dentro do “conceito de causalidade
adequada, isto é, consideram-se as consequências presumíveis da ação, segundo a experiência
comum.”( GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada de
acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro:
Forense, 2010. pp 377-379)
vista nosso objetivo específico de tratarmos de perto a responsabilidade tributária
diante das organizações empresariais ilícitas.
Nas lições de Orlando Gomes o ato ilícito é uma espécie do gênero fato
antijurídico, este entendido em visão alargada como aquele que destoa da
conformidade da norma. No entanto, quando o ato volitivo além de infringir a norma
jurídica, tem como efeito o dano, a lesão a um direito subjetivo e provoca como
consequência o dever de repará-lo, caracterizado está o ato ilícito. São suas
palavras:

O ato antijurídico é ilícito quando pessoa capaz de entender e


querer, violando norma jurídica, por ação ou omissão culposa,
lesa direito subjetivo de outrem, causando-lhe dano suscetível
de avaliação pecuniária. Ato ilícito, portanto, é,
necessariamente, ação humana. A norma violada pelo agente
há de ser das que conferem direitos absolutos e unilaterais. Ao
infringi-la, o agente terá de lesar, do mesmo passo, direito
subjetivo de outrem. Quem a viola deve ter discernimento. Há
violação há de ser intencional, ou resultar de imprudência ou
negligência. Necessário, por fim, que, da violação, resulte
prejuízo indenizável (…).120

O ato volitivo, segundo o princípio da autonomia da vontade 121 é condição


inarredável para a configuração da ilicitude, posto que a par de uma consciência e
das consequências possíveis resultantes da conduta praticada dentro do livre
arbítrio de decidir, ocorra a opção pela prática do ato ou omissão lesiva e que assim
sendo constitua o fato a que deu causa ao dano.
O dano é indispensável à configuração do ato ilícito e determinação da
responsabilidade civil, podendo ser patrimonial, o que representa a perda patrimonial
efetivamente suportada como consequência do fato ou a que vier ocorrer como
decorrência do concurso de circunstâncias supervenientes, assim como o dano pode
não produzir efeito patrimonial, mas tão somente de ordem moral.

120 GOMES, Orlando. Obrigações. Rio de Janeiro: Forense, 2002.p.254


121O princípio da autonomia da vontade que rege as atuações e relações privadas, é neste momento
acentuado, em “linhas gerais, como a faculdade que têm as pessoas de atuar, decidir livremente em
determinadas situações segundo seus interesses e conveniências”, no entanto, tal princípio não tem
caráter absoluto, posto que deverá ser exercido, notadamente pelos administrados dentro da esfera
que é determinada pela ordem jurídica, pelas normas de ordem pública, e assim qualquer atuação em
desconformidade às prescrições legais “penetra as raias do ilícito” ( PEREIRA, Caio Mário da Silva.
Instituições de Direito Civil. Contratos – Declaração Unilateral de Vontade – Responsabilidade
Civil . Rio de Janeiro: Forense, 2002.p.11). Diante das caraterísticas que permeiam a ilicitude, tal
conduta necessariamente resultará em dano e na responsabilidade, no dever jurídico de repará-lo.
O aspecto subjetivo que atina o ato ilícito é de grande relevância para a
sua caracterização pois a presença ou não do ato volitivo e a forma como se
manifesta na conduta do agente vem ser configurada a culpa como elemento que
existe ou não ao ser examinada a materialidade do fato - aspecto objetivo – ou
simplesmente o agente – aspecto subjetivo.
“Toda violação imputável de um dever jurídico, intencional ou não, é
comportamento culposo.”122 Esta é a acepção ampla em que o signo “culpa”
compreende o dolo - a conduta intencionada a provocar o resultado – e a culpa
“stricto sensu” - caracterizada pela imperícia, imprudência ou negligência, sem
qualquer deliberação de violar um dever, “porém imputável por qualquer razão ao
causador do dano.”123
Nesta órbita é que as infrações são classificadas em objetivas e
subjetivas. Aquelas caracterizam as que por violarem as normas jurídicas,
independem de qualquer ato de vontade ou intencional do agente para que a partir
do resultado danoso estejam configuradas. Noutras palavras, houve a conduta
contrária às regras do Direito e causadora do resultado danoso, presente está a
ilicitude e portanto, a infração.
Como exemplo da responsabilidade civil objetiva é a hipótese em que a
lei imputa a um terceiro, que de alguma forma está vinculado ao agente causador do
dano, o dever de ressarcimento ou reparação por ato do agente que causa dano a
outro pela prática de ato ilícito doloso ou culposo, ou da simples ocorrência da
criação do risco, sendo, no entanto, indispensável a identificação de um dano a um
bem particular124 para a incidência da hipótese normativa.
As infrações subjetivas, de outro modo, são configuradas a partir do
elemento volitivo, o dolo ou a culpa do agente, constituindo elemento inarredável

122 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito...op.cit., p.379


123 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v.II. 20.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002.p.455.
124 Cada vez mais em decorrência natural da dinamicidade, pluralidade e complexidade das relações

sociais observa-se maior amplitude no âmbito civil da proteção do valor consagrado pelo direito,
indo além da proteção de bens individualmente considerados para girar em torno de determinados
bens coletivos como os relativos à propriedade, à “função social” dos contratos, etc. Neste espectro,
i.e., com relação ao bem juridicamente protegido pela norma de responsabilidade é que há uma
significativa diferença entre a norma civilista e a tributária, posto que esta, a proteção é de ordem, de
interesse público. Ademais, ainda que num instante de paralelo acerca dos dois regramentos cumpre
observar que a regra civil da responsabilidade objetiva de terceiro é a nosso ver, a que mais se
aproxima da responsabilidade tributária, na sua feição de “responsabilidade como sanção”, pela
confluência necessária para a incidência de ambas, da prática de dois atos, um lícito e outro, ilícito.
do consequente resultado danoso decorrente da conduta ilícita intencional ou pela
ausência dos deveres de negligência, prudência e perícia.
Em poucas palavras:imprescindível para a imputação da responsabilidade d
dever de reparar125 pelo resultado que causou dano é a presença do dolo ou da
culpa do agente infrator.
As noções aqui trazidas acerca da ilicitude dos atos, efeitos e o dever
jurídico deles resultantes que fundamentam a responsabilidade civil, não foram feitas
de forma aleatória, pois a nosso ver, a leitura dos seus fundamentos tornam-se
imprescindíveis para a compreensão do contexto das normas que versam sobre a
responsabilidade tributária diante da prática de atos ilícitos que configuram infrações
à ordem tributária.
Ainda que submetidas a regimes jurídicos diferentes,126 as normas
matrizes que as regem guardam semelhança pela própria unidade do direito e como

125 Existe no ordenamento jurídico eventos danosos lícitos que não acarretam o dever de reparar,
como a legítima defesa, o exercício regular de um direito reconhecido. Assim como, de outra banda,
há por disposição expressa de lei, hipóteses que ensejem a reparação de dano, independente do
elemento volitivo ou em função do exercício de situações de riscos, como disposto no art.927 do
Código Civil. No nosso ordenamento jurídico a regra geral é da infração subjetiva, embora admitidas,
por
126Cabe apontar, quando se fala em responsabilidade, que ainda que presente nas variadas

formulações específicas de acordo com as ramificações didáticas do direito ( responsabilidade nas


relações de consumo, da administração pública), há segundo a tradição jurídica, dois grandes
paradigmas que serviram de parâmetro para a atual moldura jurídica da responsabilidade: o
paradigma civil e o paradigma penal, que ainda que possuam como ponto de partida para as suas
manifestações uma identificação no aspecto estrutural como regra geral - i. a presença ou não do ato
ilícito, ii. elemento volitivo – culpa ou dolo, iii. fato próprio ou associado ao de um terceiro, iv. nexo
causal, v. resultado consistente em dano – apresentam elementos de identificação e guardam suas
especificidades e distintos regramentos jurídicos. No primeiro a noção de responsabilização está
ligada à ideia de restituição da pessoa pelo dano experimentado e de compensação na medida em
que pune o agente infrator com o dever de reparar pelo dano causado; enquanto que no paradigma
penal a responsabilização está ligada à ideia de punição, de sanção ao infrator. No que toca ao
aspecto subjetivo já referimos nesse estudo que para a responsabilização civil a exigência da culpa
em sentido amplo, é feita como regra geral, no entanto admitidas as exceções legais , será suficiente
o resultado danoso pela conduta do agente sem considerações acerca da culpabilidade; no revés,
para a caracterização da infração penal é necessária a conduta humana como contrária ao
ordenamento jurídico e que não esteja amparada por nenhuma causa de justificação e que “por ser
exigível do autor que atuasse de outra maneira nessa circunstância, lhe é reprovável (culpável)”,
assim entendido, como a representação mental relativa à intenção do resultado. ( ZAFFARONI,
Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito Penal Brasileiro. Parte geral. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais. p.324). Com o intuito ainda de demonstrar de forma meteórica
as especificidades mais relevantes quanto à responsabilidade nos dois quadrantes destacados, é que
por fim torna-se relevante também a consideração quanto ao valor que a hipótese normativa carrega
em si no aspecto funcional, que para a esfera civilista tem a ver com a proteção individualizada de um
patrimônio particular e assim age como instrumento de compensação e de restituição de uma relação
equilibrada e justa entre indivíduos, ao passo que a proteção visada pela norma penal é a do direito a
vida em sociedade em sentido amplo e nesta trilha a ofensa é à ordem pública, o interesse é de
proteção em maior intensidade a toda sociedade. Nessa linha de considerações, o intuito é deixar
constatado que vemos traços que identificam e tornam afins a responsabilidade tributária tanto ao
regra geral, o que faz com que as normas de responsabilidade tributária sejam
estabelecidas como um instrumento de sanção é exatamente que no dever jurídico
descumprido esteja configurado o ato ilícito tributário em que, do ato ou da omissão
praticado pelo agente, o tributo não seja pago, ou de alguma forma seja reduzido,
postergado ou mesmo turbe a arrecadação, bem como pelo uso de meios que
impeçam a própria positivação da regra matriz de incidência como de início fixada ou
que de certa forma, direta ou indiretamente, acabe por mascarar o verdadeiro
responsável pelo tributo devido.
Diante de qualquer dessas circunstâncias emerge a imputação da
obrigação tributária pelo dever jurídico tributário descumprido e desencadeia a
relação jurídica de responsabilidade tributária. Anote-se mais uma vez que é
imprescindível o nexo causal entre a conduta e o resultado obtido - o evento danoso
na seara tributária127 – para que haja a imputação do dever de pagar o tributo ao
responsável.
A natureza da regra de responsabilidade tributária é sancionatória,
punitiva, quando tem como pressuposto um acontecimento que é valorado de forma
negativa pelo ordenamento jurídico, ou seja, de forma específica – o não
recolhimento do tributo pelo contribuinte no tempo e da forma prevista em lei em
decorrência da prática de um ato ou de omissão ilícita por terceiro.
Na esfera dos enunciados da responsabilidade tributária de natureza
sancionatória está o art.135 - “responsabilidade de terceiros” e os arts. 136 a 138 - “
responsabilidade por infração” do Código Tributário Nacional, que prescrevem o

paradigma civil como ao penal de responsabilização, quando se está diante da norma de


responsabilidade tributária imposta pelo interesse e necessidade de proteção e garantia da
arrecadação no primeiro caso, ou nas hipóteses em que a responsabilidade decorra da ilicitude do
ato e dê origem à punição pela valoração negativa da conduta praticada e o efeito danoso à ordem
tributária em sentido amplo.
127 A comprovação do dano causado na seara tributária, ou seja, de forma direta o não pagamento do

tributo e o prejuízo causado não constitui nota essencial para a caracterização da responsabilidade
tributária , uma vez que não compõe elemento normativo da hipótese de incidência e dessa forma
não cabe ao Fisco fazer prova do descumprimento da obrigação tributária. Em algumas situações,
como na hipótese das chamadas “responsabilidade por infração” tipificadas, por exemplo, nos
conceitos legais da Lei 8.137/90, “ Dos Crimes Contra a Ordem Tributária” não se exige nem o
resultado efetivo da falta de recolhimento do tributo devido, como no caso do art.1° da lei, sendo
suficiente apenas o ato ou omissão intencional e desonesta de evasão parcial ou total do tributo
devido. O fato é que o prejuízo a ser aferido em matéria tributária, por ser objeto de interesse público
a ser protegido pelo Estado, não acontece no momento de aplicação da lei, sendo feito pelo próprio
legislador no momento da sua feitura, como medida preventiva para situações que se instaladas
teriam como decorrência o não pagamento do tributo, seja pela prática de ato lícitos ou ainda pela
prática do próprio ato ou omissão fraudulentos para turbar a fiscalização e arrecadação do tributo,
como na hipótese de sucessão empresarial ou dos ilícitos tributários que em outro ângulo configuram
também ilícitos penais, respectivamente.
dever de sujeição a uma penalidade, pois trazem balizas gerais a orientar as normas
a serem veiculadas nas leis ordinárias que venham a tratar de infrações que
envolvem crimes e que estabelecem sanções penais em sentido estrito ou não raro,
sanções administrativas.
Por estarem diretamente alinhadas ao paradigma penal - cláusula geral
do citado art.136 - “ responsabilidade por infrações“128 em que há uma reprovação
social pela conduta em virtude do bem jurídico protegido é que nessas infrações o
aspecto subjetivo, no mínimo a culpa em sentido estrito, há que ser devidamente
comprovada pela Administração Pública, uma vez que na dicção legal do enunciado
geral da responsabilidade por infrações, o dolo, a intenção de causar o resultado, só
será exigido, em situações excepcionadas por lei, como próprio prevê o estatuto
tributário, na hipótese do art.137, II e II, quando exige a figura do dolo específico.
Em sentido oposto vemos o art.135 quando prevê a responsabilidade
pessoal quando os atos forem praticados com excesso de poderes ou infração de
lei, contrato social ou estatuto, da formulação textual do legislador complementar,
claro está que prescinde a presença de dolo, sendo suficiente apenas a realização
do ato ilícito para a imputação da responsabilidade tributária ao agente infrator e a
culpa. Nesta perspectiva é que afirmamos estar configurada nesta hipótese a
responsabilidade subjetiva do responsável tributário, cabendo ao Fisco comprovar
pelos meios admitidos no ordenamento jurídico o ato ilícito que desencadeou a
responsabilidade sancionatória, bem como a culpa do agente infrator.
No entanto, cabe ainda fazer o destaque de que a par de não esgotarem
todas as situações de responsabilidade sancionatória, em definição genérica , tais
enunciados prescritivos tem o caráter de pena, de reparador de dano porque a

128 No contexto da cláusula geral do art.136, entendemos abranger infrações e respectivas sanções
de caráter penal assim como administrativas, sendo com relação às últimas, não há qualquer juízo
quanto ao grau de culpabilidade ou intenção do infrator ou ainda da natureza ou extensão dos
resultados, salvo diante de exceção como previsto no texto legal . No que toca à sanção pelas
infrações de caráter penal, há sempre a aferição do juízo de culpabilidade, por imperativo do próprio
ordenamento jurídico quanto à pessoalidade da pena e o presença do elemento subjetivo pelo menos
em seu grau mínimo, posto que o dolo é exigido nas hipóteses expressas em lei. Em sentido contrário
quanto a este último posicionamento está a doutrina de Paulo de Barros Carvalho ao defender que a
posição do terceiro no polo passivo da relação jurídica tributária é sempre de cunho obrigacional, no
entanto, de índole sancionatória – sanção administrativa, como escreve;( Nosso entendimento é no
sentido de que as relações jurídicas integradas por sujeitos passivos alheios ao fato tributado
apresentam a natureza de sanções administrativas) ( Curso de Direito Trib....op. cit, p.356).
ofensa é em sentido amplo ao interesse público, ao sistema jurídico como um todo.
Ao tratar do tema, leciona Daniel Peixoto :

(….) sob o ponto de vista do bem jurídico protegido, a


responsabilização não visa assegurar aquela relação de crédito
débito isoladamente considerada, mas a ordem tributária de um
modo mais amplo (…); sob o aspecto do juízo de culpabilidade,
este sempre será necessário nas imputações de caráter
criminal, sendo contingente nas de caráter administrativo; sob o
prisma da resposta do direito ao tipo de dano, está se
apresentará como uma punição (…); e finalmente, sob o
aspecto funcional, ressalta-se o caráter de reprovação social
ao comportamento contrário ao Fisco, sem representar a multa
uma forma de compensação ao Fisco ( ainda que represente
ingresso aos cofres públicos).129

Das notas trazidas acerca das normas de responsabilidade tributária


estatuídas pelo legislador complementar, em regras gerais, com o intuito de
sancionar pela prática da conduta ilícita que obsta de qualquer das formas a que nos
referimos a arrecadação dos tributos é que concluímos tratar-se de infrações
subjetivas, quer pela valoração negativa do dever descumprido e optado pelo
agente, quer pelo efeito danoso ser irradiado para toda a sociedade .
O fato é que entendemos, que em tais situações não pode haver o
amparo do regime jurídico e dos limites estabelecidos quando da observância dos
princípios constitucionais informadores da tributação, pois a pretensão é a de coibir
práticas com vistas ao não pagamento de tributos, lesivas e extremamente abusivas
ao interesse público a ser protegido pelo Estado, e dessa forma, que os agentes
tenham um tratamento jurídico linear à consequência dos seus atos. Isto é tão
somente uma das feições da feitura prática do princípio constitucional da isonomia
tributária, inarredável em todas as suas acepções do ordenamento tributário.

3.1.2 A responsabilidade tributária como papel institucional

Por outro lado, importa deixar explícito que o legislador complementar ao


desbancar a responsabilidade do contribuinte, aquele que realiza o fato acolhido na

129 PEIXOTO,Daniel Monteiro. Responsabilidade Tributária e os atos de formação,


administração... op.cit., p.182.
hipótese de incidência tributária ou a ele está diretamente vinculado, fazendo com
que o mesmo perca sua função de personagem passiva principal, o faz também por
interesse do Fisco, do Estado, de atender à necessidade de simplificação, de dar
maior praticidade na arrecadação e fiscalização do tributo, bem como até de torná-la

possível em determinadas situações, e de estabelecer condições de eficácia e


funcionalidade em busca da garantia do crédito tributário até sua última instância.
Trata-se aqui então, da responsabilidade tributária instituída com base no
interesse, na necessidade do Estado credor, como política fiscal para viabilizar o
adimplemento da obrigação tributária, e nesses casos, o fato lícito é o pressuposto
da hipótese de incidência da atuação do legislador que tem que ser na moldura
estatuída pelo texto constitucional, isto é, dentro dos limites formais e materiais
estabelecidos, notadamente com base nas normas gerais estabelecidas pelo
legislador, e dos princípios que esmiuçamos como o da capacidade contributiva, da
vedação do tributo confiscatório, da igualdade, da proteção da propriedade e
garantia da preservação do mínimo vital.
Como já por nós dito, a escolha do terceiro responsável não é ampla e
irrestrita, é de caráter excepcional, como ensinava Geraldo Ataliba:

(….) a “deslocação” do sujeito passivo é absolutamente


excepcional no sistema brasileiro, exigindo rigoroso e extremo
cuidado do legislador exatamente para que não se vulnerem,
sejam os desígnios constitucionais referidos, sejam os diversos
preceitos que harmonicamente – compondo o sistema
constitucional tributário – têm em vista assegurar a eficácia
daqueles mesmos princípios ( entre eles, o da capacidade
contributiva e o da igualdade). 130

Com o propósito acima referido é que a responsabilidade instituída nos


termos do enunciado prescritivo do art.128 do CTN, não tem caráter de sanção ou
de punição,131 mas no interesse de arrecadação dos tributos devidos, e dessa forma

130ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência ..op.cit., p.94.


131Art.128 Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a
responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva
permite que seja posto no tópico da sujeição passiva da relação tributária, alguém
que não tenha a relação direta com o fato jurídico tributário da obrigação principal,
mas a tem de forma indireta por relação de outra natureza com aquele que o
praticou e assim torna possível a arrecadação do tributo, ou ainda simplesmente por
possuir um dever instrumental para dar mais celeridade e praticidade a que o tributo
devido chegue aos cofres públicos.
Nesta órbita está inserida como exemplo a hipótese do sucessor tributário
por uma das formas de sucessão empresarial, ou pela morte de uma pessoa física,
situações de impossibilidade de pagamento do tributo devido por ausência de quem
praticou o próprio fato jurídico tributário.
A hipótese de retenção do Imposto sobre Serviços - ISS ou da
contribuição previdenciária que deverá ser feita daquele que remunera a pessoa
física pela prestação de serviço, ou o dever de retenção do Imposto de Renda
Retido na Fonte - IRRF em que há o dever de quem efetua o pagamento de
rendimento, reter e recolher o imposto incidente. Vemos assim que há vínculo direto
entre quem recebe o rendimento e assim realiza o fato signo presuntivo da riqueza e
revelador da capacidade contributiva, sendo o contribuinte, como há também com
este o vínculo direto de quem o paga, este sim, configurado como o responsável
pelo dever administrativo132 de recolhimento do tributo devido nos termos fixados na
norma geral e por reflexo na lei ordinária instituidora do tributo.
Nesta ultima hipótese dada como exemplo, trata-se de verdadeira
“substituição legal tributária” que representa tão somente um mecanismo no sentido
de viabilizar a racionalidade arrecadação por um dever atribuído a uma terceira
pessoa, que não praticou o fato imponível, nem tampouco ato ilícito, mas que é
responsável legal pelo recolhimento do tributo.
Em suma, tais casos de responsabilidade tributária abrangem aqueles
que embora não tenham praticado o fato gerador, o dever de pagar surge ex lege

obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do


cumprimento total ou parcial da referida obrigação.
132 Nessas situações a disponibilidade jurídica do rendimento é do contribuinte o regime jurídico

aplicável à tributação é o o do contribuinte onde o interesse tutelado é a própria tributação, e assim


sendo o legislador utiliza de mecanismos e técnicas que tornem a fiscalização e arrecadação mais
prática e menos onerosa para o Estado. O dever de levar a o tributo aos cofres públicos é meramente
instrumental, o dever de fazer, de agente arrecadador, de colaborar com o Fisco como reza o estatuto
tributário quando estipula as obrigações acessórias nesse sentido, como anuncia Luís Cesar Souza
de Queiroz “(...) que o determinado substituto ( agente arrecadador do Estado) retire ( retenha
definitivamente - “p” ) o dinheiro que já está em sua posse ( do substituto), já é da disponibilidade
jurídica do contribuinte(...). ( Sujeição Passiva Tributária. Rio de janeiro: Forense, 1999, p.201)
em virtude de um fato posterior como é o caso da responsabilidade dos sucessores,
dos terceiros, e abarca ainda aquele que não pratica o fato gerador e por força de
lei é o responsável tributário chamado substituto tributário.
É fato então, que o fundamento das regras de responsabilização
tributária, notadamente as que envolvem a figura do substituto tributário previstas no
ordenamento jurídico tributário, estão assentadas no interesse e necessidade do
Estado na tutela da tributação e no dever de imprimir racionalidade ao sistema de
fiscalização e arrecadação de tributos par que o torne mais eficaz.
Sob outra perspectiva, é que o fundamento e a justificação axiológica das
normas trazidas nos enunciados prescritivos que estabelecem o dever do
responsável legal tributário, não pode, notadamente nas situações de substituição
tributária, deixar de assegurar que o ônus econômico do tributo seja suportado por
quem efetivamente realizou o fato revelador da capacidade contributiva escolhido
pelo legislador como desencadeador relacional da obrigação tributária e que, no
revés, atue como limite imposto ao Estado de tributar apenas fatos e situações
pintados com o matiz jurídico de fato signo presuntivo de riqueza imponível.
Para este feito econômico é que temos no nosso direito positivo o
fenômeno da repercussão jurídica dos tributos possível através das modalidades de
reembolso e da da retenção na fonte, através das quais o sujeito passivo previsto na
norma como quem tem o dever legal de pagar o tributo e assim deve recompor o
seu patrimônio, possa transferir o impacto econômico do tributo ao sujeito que
realmente realiza o fato jurídico tributário. Atuam então no fenômeno da repercussão
jurídica duas figuras diante da obrigação tributária: o substituto, no primeiro caso, e o
substituído, no segundo, ambos, na verdade, permanecem com deveres distintos
estipulados por regras jurídicas autônomas.
Nesta trilha corre o pensamento a doutrina de Alfredo Augusto Becker :

Frequentemente, o legislador ao criar o tributo, embora se


utilize do substituto legal tributário, não afasta do plano jurídico
-tributário aquela determinada pessoa de cuja renda ou capital
a hipótese de incidência é fato signo presuntivo. O legislador
põe aquela determinada pessoa no polo negativo de uma
relação jurídica tributária referente àquele mesmo tributo que já
foi pago pelo substituto.133

Importa-nos enfatizar que a criação da repercussão jurídica do ônus do


tributo é de natureza obrigatória aos ditames do constituinte pátrio que erigiu a
capacidade contributiva como princípio retor da tributação e desde que aquela
recaia sobre o seu destinatário específico,134 uma vez que, dentre as hipóteses
legais em que há a imputação do dever de pagar o tributo pela eleição do
responsável tributário, este em nenhuma delas realiza o fato gerador do tributo e
dessa forma não caberia assim arcar com o ônus daquele, com exceção apenas no
ordenamento quando da prática de atos ilícitos por se situarem fora da esfera do
regime jurídico que atina às normas de responsabilidade e à conexão obrigatória aos
limites constitucionais e legais ao poder de tributar.
Por ser a substituição tributária a modalidade por excelência de
responsabilidade tributária135 prevista no direito positivo na função a que ora
tratamos, ou seja, no interesse de arrecadar tributos com mais celeridade,
efetividade e racionalidade é que passamos ao tópico seguinte, traçando as notas
gerais do instituto por entendermos ser importante para numa visão larga
alcançarmos a compreensão e interpretação dos limites normativos que
fundamentam a eleição daquele que é acolhido pela lei como responsável pelo
pagamento do tributo por fato jurídico praticado, de forma geral, por pessoa
diferente.

133 BECKER, A lfredo Augusto. Teoria Geral do Direito …...op.cit., p.555. O autor cita como exemplo
a hipótese de retenção do Imposto de Renda – IR e ensina que nesses casos há uma única hipótese
de incidência e duas regras, uma referente ao responsável legal e a outra ao substituído.
134 Luciano Amaro ensina que a escolha do responsável tributário, ainda que vinculado ao fato

gerador, não pode ser feita de forma arbitrária pela lei, sendo indispensável que haja a possibilidade
jurídica de reaver o valor do tributo destacado do seu patrimônio à conta daquele que praticou o fato
jurídico tributário, i.e, o contribuinte. ( Direito Tributário ...op.cit., p.338)
135 A dissensão doutrinária cerca a substituição tributária no direito pátrio desde a noção de que seja

uma hipótese abrangida ou não pelo fenômeno da responsabilidade tributária, pelo fato de além de
não estar expressamente prevista no CTN, não guardar total semelhança às demais hipóteses
previstas. Pois bem, de nossa parte, ainda que alvo de notas que o caracterizam de forma
diferenciada, entendemos que justificativa do acolhimento da figura do substituto tributário como
responsável deita nos seguintes pressupostos: há necessariamente a realização de dois eventos que
emergem o liame jurídico, ou seja a realização do fato jurídico tributário previsto na regra matriz de
incidência atrelado à outra norma que o coloca no tópico de sujeito passivo responsável pelo
recolhimento do tributo devido em decorrência daquele fato e desde que com este mantenha uma
relação indireta, ou ainda uma outra, direta ou indireta com o próprio sujeito que o realizou. Presentes
assim no substituto tributário as notas legais que caracterizam o responsável tributário, não há como
atribuir-lhe natureza ou regime jurídico diverso.
3.2. Notas sobre substituição tributária: repercussão jurídica por reembolso ou
por retenção na fonte

As figuras jurídicas desenhadas pela doutrina tradicional que


possibilitam a substituição legal tributária através da repercussão do ônus do tributo
ao sujeito que realizou o fato tributado, em função do modo como determina a lei,
são agrupadas em duas categorias ou modalidades: o reembolso e a retenção na
fonte, em que pela primeira há um direito do substituto de acrescentar no preço do
negócio jurídico realizado com o substituído o valor referente ao tributo já pago,
transferindo assim o encargo financeiro; enquanto na segunda modalidade, -
retenção, há um direito subjetivo do responsável de abater, da quantia devida ao
sujeito com quem mantém relação jurídica de natureza comercial, civil, trabalhista,
dentre outras, o valor devido ou já pago a título de tributo em razão da prática, por
este último, da situação fática descrita na hipótese normativa tributária.
Alfredo Augusto Becker, em seu magistério já aclarava que na hipótese
de reembolso - em que há o acréscimo no valor a ser pago ao responsável
correspondente ao montante do tributo por ele pago ( modificação da prestação não
tributária) - “o fenômeno da substituição opera-se no momento político em que o
legislador cria a regra jurídica”136 e neste feito não trata-se de um fenômeno de
apreensão jurídica, fato que nos leva a crer que a figura chamada de substituto
poder-se-ia confundir com a própria do contribuinte nos termos da literalidade do
art.121, parágrafo único do CTN.
Na repercussão jurídica por retenção na fonte - em que há a permissão
legal ao substituto de dedução do valor devido do tributo do montante de sua dívida
com outra pessoa, no caso o chamado substituído - sob um olhar melhor acurado,
pode-se perceber a existência de dois sujeitos que persistem com suas respectivas
obrigações e comandados por regras jurídicas jurídicas distintas, aquele com o
dever instrumental de arrecadar o tributo devido aos cofres públicos e este o
realizador do pressuposto fático da norma de incidência tributária, não havendo uma
“substituição” no sentido estrito da palavra. É uma perspectiva.

136 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito...op.cit., p. 554.


Nota-se porém que seja a hipótese de repercussão jurídica por reembolso
ou por retenção na fonte, não importa o efetivo exercício do direito previsto em lei137
ou ainda que implícito e decorrente da interpretação sistemática do sistema
tributário, uma vez que, para que a norma posta de responsabilidade tributária seja
válida há que ter como característica a possibilidade jurídica de que o ônus do
tributo seja arcado por quem lhe deu causa, exceto nos casos de ilicitude, como
anteriormente citado.
No entanto, o exercício de direito quanto à repercussão, inclusive quanto
à ação de regresso, não é requisito para a aferição da constitucionalidade ou não
da norma de competência tributária relativa à sujeição passiva, prescindindo de
qualquer prova que ateste a efetividade da transferência do encargo econômico do
tributo, pois para a “constitucionalidade da regra tributária basta a existência da
repercussão jurídica”,138 como ainda acrescenta o mestre gaúcho Alfredo Becker “
esta repercussão econômica pode ocorrer apenas parcialmente ou até não se
realizar, embora no plano jurídico tenha se efetivado”.139
São exemplos clássicos de substituição tributária, a previsão
constitucional da sujeição passiva tributária antecipada ou substituição “para frente” -
nos termos da redação dada pela EC n° 3 de 1993 ao parágrafo 7° do art.150 da

137 Há posição oposta ao entendimento quanto à necessidade de norma legal específica que
prescreva quanto ao direito de reembolso ou de retenção na fonte como anuncia Marçal Justen
Filho;” A transferência jurídica de riqueza da titularidade de um sujeito para a titularidade alheia
produz para o transferente uma situação de poder sobre o beneficiário da transferência. (…) A
relação jurídica que existe é exterior ao direito tributário. Por decorrência dessa relação jurídica extra
tributária é que surge uma situação de poder para alguém. Por atenção a essa situação de poder é
que a lei tributária pode instituir a substituição. Mas, exatamente porque há uma situação de poder,
não há necessidade de a lei tributária instituir um direito de regresso. Não se cria, entre destinatário
tributário e substituto, outra relação jurídica além daquela que já pudesse existir. ( Sujeição Passiva
...op.cit., p.281-283). O autor usa como arrimo de seus argumentos a título de exemplo a substituição
tributária prevista quando da retenção na fonte de imposto sobre rendimentos – IR, dos
empregadores em face dos rendimentos pagos ou devidos a seus funcionários, posição que
ousamos discordar, tendo em vista, necessariamente nessa situação em que há o desconto de um
valor referente ( como também no caso de contribuição previdenciária devida em geral pelos
trabalhadores empregados e e contribuintes individuais) a um direito subjetivo de retribuição pelo
serviço prestado é que entendemos ser imprescindível uma norma específica que disponha sobre a
hipótese de regra específica sobre a repercussão do ônus tributário.
138 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito...op.cit., p.567
139 Idem, Ibidem. p.534. O mestre gaúcho foi notável estudioso da concepção teorética da

substituição tributária, quando a apartou de influências extra jurídicas que a cercava, apresentando
assim notável contribuição para a formação da Teoria Geral do Direito Tributário, no entanto, a
própria classificação feita pelo autor para a sujeição passiva considerando o contribuinte ou na sua
dicção, o contribuinte de jure como gênero que abarca a espécie daquele que pratica o fato signo
presuntivo da riqueza e a do próprio substituto tributário não encontra amparo na disposição legal do
art.121 do CTN, por nós aqui já ressaltado, ao contemplar as espécies de sujeito passivo da
obrigação tributária principal, mais precisamente quando define o contribuinte como aquele que
possua relação pessoal e direta com o fato gerador do tributo.
Constituição Federa, para além da hipótese que citamos de retenção do Imposto de
Renda da Pessoa Física dos empregadores em face da remuneração feita ao
trabalhador - art.45, parágrafo único do CTN - existem ainda, dentre outras na
legislação esparsa, como a prevista com relação ao Imposto Sobre Serviços de
Qualquer Natureza - ISS – em algumas hipóteses, nas substituições “para frente” e
para trás” no Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias -
ICMS – e ainda na hipótese de retenção de 11% da contribuição previdenciária
sobre o valor da nota fiscal. 140
A responsabilidade tributária por substituição alcançou assim, com a
citada emenda constitucional, status constitucional, fundamentando as previsões
legais que dispunham sobre a sujeição passiva tributária antecipada ou substituição
tributária “para frente” e aqui, por escapar ao escopo do nosso trabalho, não vamos
nos insurgir acerca das posições díspares a respeito de sua constitucionalidade ou
não, mas por oportuno, deixamos claro que a nosso ver, o instituto da substituição é
indispensável para dar efetividade ao princípio da praticabilidade e da racionalidade
da tributação, além do que, o direito tributário não poder tornar-se alienígena à
dinamicidade da evolução social, o que insta à utilização de mecanismos, de
técnicas e procedimentos que garantam o ingresso da receita advinda dos tributos
aos cofres públicos, tudo atado às constitucionais, assim como são os vértices para
a figura geométrica do polígono.
Nota essencial da peculiaridade da substituição tributária que a destoa
das demais hipóteses jurídicas de responsável tributário está no fato de que não há
possibilidade de constituição do crédito tributário em face de quem o realizou,
espancando as notas caraterísticas de solidariedade ou subsidiariedade que possam
existir quando da escolha pelo legislador do sujeito passivo da obrigação tributária.

140 No Recurso Extraordinário n° 603.191/MT, relatado pela eminente Ministra Ellen Gracie, o Pleno
decidiu pela constitucionalidade da contribuição previdenciária de 11% sobre o valor da nota fiscal
prevista no art.31 da Lei 8.212/ 91 com a redação da Lei n° 9.711/98, com os seguintes
fundamentos:1. Na substituição tributária, sempre teremos duas normas: a) a norma tributária
impositiva, que estabelece a relação contributiva entre o contribuinte e o fisco; b) a norma de
substituição tributária, que estabelece a relação de colaboração entre outra pessoa e o fisco,
atribuindo-lhe o dever de recolher o tributo em lugar do contribuinte.2. A validade do regime de
substituição tributária depende da atenção a certos limites no que diz respeito a cada uma dessas
relações jurídicas. Não se pode admitir que a substituição tributária resulte em transgressão às
normas de competência tributária e ao princípio da capacidade contributiva, ofendendo os direitos do
contribuinte, porquanto o contribuinte não é substituído no seu dever fundamental de pagar
tributos(...). No Recurso Extraordinário n° 603.191/MT, Rel.Min.Ellen Gracie. Pleno. Por maioria.
Julgado em 1°.8.2011. DJ de 5.9.2011
Em matéria de substituição tributária ensinava Rubens Gomes de Sousa:

a substituição ocorre quando, em virtude de uma disposição


expressa de lei, a obrigação tributária surge desde logo contra
uma pessoa diferente daquela que esteja em relação
econômica com o ato, ou negócio tributado: nesse caso é a
própria lei que substitui o sujeito passivo por outro indireto”.141

A posição doutrinária e influenciadora de Rubens Gomes de Sousa


142nos enunciados prescritivos do CTN acerca da sujeição passiva foi largamente
discutida e reinterpretada pela doutrina, resultando em diferentes posições ,como a
de Sacha Calmon Navarro Coelho, para quem o substituto a quem chama de
“destinatário legal tributário) é sujeito passivo direto ao lado do contribuinte e a
sujeição passiva indireta ocorre apenas nos casos de responsabilidade por
transferência, como argumenta: “está claro que o sujeito passivo direto por fato
gerador alheio ostenta um status jurídico diverso dos demais responsáveis que são
sujeitos passivos indiretos, por isso que são responsáveis pelo pagamento de tributo
alheio.”143
A nosso ver e respeitada as posições dos mestres, pela simples
inteligência da racionalidade sistêmica, que sendo o fato gerador praticado por uma
pessoa e o dever de pagar o tributo imputado à pessoa diferente por disposição
expressa de lei, vinculado direta ou indiretamente ao sujeito que o praticou ou
diretamente ao próprio fato, submetido ao regime jurídico de quem o praticou e
obedecidos os limites constitucionais impostos para o execício da norma de
competência tributária na eleição da sujeição passiva e em seu regramento,
inclusive por normas específicas, entendemos ser a figura do substituto, a de um
responsável tributário.
Por isso mesmo, damos ênfase ao aspecto de que o regime jurídico
aplicado ao substituto é o do substituído, onde ele assume não só a obrigação de
caráter patrimonial como as de caráter instrumental, as acessórias, assim como se

141 SOUZA, Rubens Gomes. Compêndio de Legislação Tributária. Coordenação: IBET, Instituto
Brasileiro de Estudos Tributários. Obra póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p.93.
142 Em momento posterior o autor reformulou sua proposição doutrinária classificatória e considerou

a sujeição passiva indireta e a responsabilidade como institutos únicos, abrangendo todas as demais
hipóteses, com exceção do sujeito passivo direto, o contribuinte.
143 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito...op.cit., p.641. Renato Lopes Becho também

se posiciona no sentido de que a classificação do sujeito passivo não pode abarcar tão somente o
contribuinte e o responsável, pois existe a figura do substituto, que não se encaixa nas duas
modalidades. ( BECHO, Renato Lopes. Sujeição Passiva..op.cit., p.342)
reveste de direitos, administrativos e judiciais perante à Fazenda Pública e sob este
prisma é que não damos a ele uma conotação pré-jurídica, mas sim como o
resultado da implicação da norma substitutiva que macula o consequente da norma
matriz de incidência tributária por retirar aquele que realizou o fato tributado, ao
mesmo tempo em que traz no seu enunciado um novo sujeito para arcar com
obrigação de quem foi substituído.
Nesse instante cabe frisar que o dever é de pagamento por dívida
própria, e não alheia, em decorrência de fato de terceiro, e assim o substituto
tributário, na verdade, atua como se duas figuras fosse, a que tem a obrigação de
efetuar o pagamento do tributo devido pelo contribuinte e para além disso, a que vai
arcar no caso de inadimplemento daquele.
Tanto é assim que caso a norma que dispõe sobre a hipótese de
substituição tributária144 for revogada, o realizador do fato tributário, ou seja, o
contribuinte, em regra, será o sujeito passivo obrigado ao pagamento do tributo
respeitados os princípios constitucionais que atuam como limites à exigência dos
tributos, em específico, ao da anterioridade clássica ou nonagesimal que proteja o
tributo da exigência no mesmo exercício financeiro ou após 90 dias da lei que o
instituiu ou aumentou, respectivamente.
Em suma, o enfoque aqui é na regra geral da hipótese de substituição
tributária prevista em lei em que o parâmetro é a licitude dos atos que implica o
nascimento da obrigação do responsável, e assim sendo, é abraçada pelo regime
jurídico que cobre todo o panorama da responsabilidade tributária traçado no Texto
Constitucional e nas normas gerais estabelecidas no CTN.
Portanto, tendo em vista o eixo temático principal do nosso trabalho, que
tem em uma de suas razões o estudo mais amiudado da hipótese de

144 Por isso mesmo é que pensamos que o instituto excepcional da substituição tributária se amolda
bem na textura legal do art.128 do CTN “ Seção I – disposição gera “, pois encontramos nesse
dispositivo causa de justificação que o fundamente em sua inteireza, pois como argumenta Paulo de
Barros Por Por isso mesmo é que pensamos que o instituto excepcional da substituição tributária se
amolda na textura legal do art.128 do CTN “ Seção I – disposição geral “ pois encontramos nesse
dispositivo causa de justificação que o fundamente em sua inteireza, pois como argumenta Paulo de
Barros Carvalho, a espécie deve representar o gênero em todos os seus atributos e mais aqueles que
a especifica, e dessa forma é que, principalmente na hipótese em que há a figura do retentor, vemos
o alinhamento ao enunciado prescritivo uma vez que a regra dispõe sobre a possibilidade de excluir
a responsabilidade do contribuinte ou atribuí-la em caráter supletivo do pagamento total ou parcial do
tributo, o que a nosso ver só ocorre por inexistência da lei que dispunha sobre a substituição, e além
do que o vínculo indireto ao fato gerador exigido no dispositivo é possível, no entanto não é
inarredável.
responsabilidade por substituição prevista no art.135, III, fundamentada na prática
de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos em
específico dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito
privado que dão origem à obrigação tributária, é que a apartamos para um tópico
próprio mais adiante.
Mas, antes de alcançá-lo, faz-se ainda necessário trazer, dentre outras,
notas gerais a respeito da responsabilidade tributária intitulada pela doutrina clássica
como “responsabilidade por transferência”, que ao contrário da sujeição passiva
indireta por substituição, é aquela em que a obrigação tributária nasce com a prática
do fato previsto na regra matriz de incidência tributária pelo contribuinte e em virtude
de ocorrência posterior de um fato não tributário, lícito ou ilícito, passa a ser de
acordo com a previsão estatuída nas normas gerais de direito tributário, obrigação
do responsável.

3.3 Notas sobre responsabilidade tributária por transferência: os sucessores e


os terceiros
Os preceitos que versam sobre a responsabilidade por transferência, 145
de forma mais específica sobre a “responsabilidade dos sucessores”, para utilizar a
terminologia do legislador, estão dispostos nos arts. 129 a 133 do CTN, que
dispõem, de forma sucinta, sobre a atribuição da responsabilidade tributária àquele
que adquire a titularidade de bens, pelos tributos relativos a esses até a data do ato
da transmissão, nas seguintes situações, dentre outras: i. por aquisição tradicional
de bens imóveis (art.130) ; ii. por aquisição de herança em virtude de morte
(art.131)iii. pela incorporação ou fusão da pessoa jurídica ( art.132)146; ou ainda pela

145 A classificação trazida para a Ciência do Direito Tributário que toma a sujeição passiva indireta
por gênero, do qual são espécies a substituição e a transferência, não guarda no seu todo de
precisão técnica, mas sabemos que no mundo da linguagem comunicacional, interpretações podem
ser feitas de diversas formas, no entanto, há a necessidade de sempre buscar eliminar ou pelo
menos reduzir ou ruídos que poluem a linguagem do legislador e do intérprete, cabendo assim à
própria Ciência do Direito minimizar os efeitos ruins das imprecisões terminológicas e das
classificações decorrentes. Nesse sentido é que utilizaremos o termo “transferência” para caracterizar
a sujeição passiva indireta nascida em virtude de fato posterior ao evento tributário, mas deixamos
claro que em grande maioria dos dispositivos do CTN que tratam da responsabilidade sob esse
manto, a figura do contribuinte permanece presente ao lado do responsável, de forma subsidiária ou
até mesmo preferencial.
146 Ainda que o dispositivo traga a hipótese de responsabilidade tributária, dentre as movimentações

societárias citadas, diante da transformação do tipo societário, como por exemplo a de uma
sociedade Ltda em uma S/A, não há alteração na sua personalidade jurídica, nem de regra na
composição do patrimônio, não havendo uma sucessão propriamente dita. Não obstante, no que toca
à extensão e limites da responsabilidade dos sócios poderá haver profundas alterações, talvez por
aquisição por pessoa física ou jurídica de estabelecimento empresarial sem a
continuação das atividades pelo alienante.

Da análise sucinta dos enunciados podemos perceber que a


responsabilização nasce com a ocorrência de um fato lícito de aquisição que implica
a titularidade de bens móveis ou imóveis, pelos tributos devidos relativamente aos
bens adquiridos até a data da sucessão, em virtude da prática pelo contribuinte do
fato descrito na hipótese da norma de incidência básica que fez nascer o tributo e
não foi pago. Ou seja, da comunhão dos dois fatos jurídicos independentes, há a
alteração no polo passivo da relação tributária, e o responsável passa a compor o
lugar do contribuinte ou junto com ele147, seja de forma preferencial ou subsidiária.
Isso mesmo. Em tais hipótese não vislumbramos o vínculo com o fato
jurídico tributário acontecido anteriormente à aquisição dos bens, ou com a
manifestação de sua riqueza que carateriza a aclamada capacidade contributiva
que, seguindo o norte constitucional, deve ser intrínseca àquele que tem o dever de
pagar de pagar tributos ao Estado.
Mas a exegese não se esgota nessa ideia, pois o vínculo que existe nas
hipóteses de sucessão, na verdade, é entre o contribuinte sucedido e o responsável
sucessor de forma subsidiária ou integral, em razão de fatos negociais ou não, o que
não desnatura a figura do responsável tributário desenhada no art.128 do CTN, pois
deixamos claro quando das anotações iniciais sobre o tema, que diante da
interpretação sistêmica do contexto das normas que versam sobre a
responsabilidade tributária, tal vínculo não ocorre somente ao pressuposto de fato

isso, numa atitude de objetividade o legislador tenha optado por juntá-la à hipótese dos sucessores.
O oposto ocorreu com relação à cisão societária, seja parcial ou total - cisão é operação de
transferência integral ou de parte do patrimônio de uma sociedade para uma ou mais sociedades -
que não foi alvo do legislador no elenco da responsabilidade tributária por movimentações
societárias. A Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) traz regramento no art.233 quanto à
responsabilidade da empresa cindida e da sucessora no tocante às relações privadas, que como
sabemos não podem ser opostas à Fazenda Pública, salvo disposição expressa em lei, e ainda o
disposto no Decreto-Lei n.1.598/77( trata do Imposto sobre a Renda), daí decorrem amplas
divergências doutrinárias e jurisprudenciais acerca da sua plicação no que toca à responsabilidade
tributária.
147 Como a sucessão nem sempre implica a extinção do sucedido, por desaparecimento ou morte a

depender da hipótese, a responsabilidade na maioria dos casos é exclusiva do sucessor, exceção


feita ao art.133,II do CTN, que é subsidiária se o alienante continuar o exercício da atividade no prazo
de seis meses. Nesse diapasão é que entendemos que a constituição do crédito pelo atuação da
norma individual e concreta ou por autolançamento, se não feito à época da realização do fato
gerador pelo contribuinte, há que ser feita diretamente em face do responsável sucessor , após o fato
sucessório obviamente. E, de outra banda, se já tiver sido efetuado o lançamento em face do
contribuinte e posteriormente ou em concomitância ocorre o fato que deu origem à sucessão, tal
lançamento há que ser anulado por vício formal na identificação do sujeito passivo.
da norma matriz tributária, assim como, ambientados que estamos numa visão não
radical e ortodoxa do direito, ao próprio realizador do fato jurídico tributário.
Importa ainda observar na seara da responsabilidade por sucessão que
de acordo com a ratio do art.129148 do CTN estão abrangidos todos fatos geradores
ocorridos antes da sucessão, sejam lançados, em curso de lançamento ou ainda
que lançados posteriormente, em suma, todos os débitos tributários preexistentes à
data da sucessão referentes ao objeto da relação negocial.
Não nos alinhamos portanto aos que defendem a interpretação do
dispositivo afastando os débitos existentes e somente constituídos posteriormente à
data de sucessão, sob o argumento de que ao adquirente não cabia o conhecimento
dos débitos existentes em sua integralidade, e dessa forma não poderia repercutir o
tributo à pessoa que o realizou, afrontando assim o princípio da capacidade
contributiva, da propriedade, dentre outros. Isso assim ocorreria se a única hipótese
de repercussão do tributo fosse pelo abatimento ou outro tipo de transação
envolvendo o valor do tributo devido no momento da negociação, mas não se pode
perder de vista as ações disponíveis como meio de reparação de dano ou de reaver
valores de direito, como por exemplo, a ação de regresso.
Em dias atuais, são várias as possibilidades que o sucessor tem para
conhecer a situação tributária do objeto referente ao negócio jurídico realizado, tais
como a análise de dados, informações e demonstrações contábeis exigidas como
instrumentos indispensáveis tanto pelo Fisco como pelas novas regras contábeis,
bem como dos normativos emitidos pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis -
CPC , assim como os livros e registros fiscais, a certidão negativa de débitos e das
próprias declarações exigidas pela Fazenda Pública, como forma de manter
atualizadas as informações gerais dos contribuintes, ainda que potenciais, enfim, a
integração e a universalidade de informações fiscais caminha rumo a uma
sistematização cada vez mais eficaz, o vem a favor do Fisco, reduzindo os riscos de
inadimplência e de evasão fiscal, assim como em favor daquele de boa-fé que quer
efetuar o negócio e tem sua clara regularidade fiscal, e enfim, ao próprio sucessor

148 Art.129. O disposto nesta Seção aplica-se por igual aos créditos tributários definitivamente
constituídos ou em curso de constituição à data dos atos nela referidos. E aos constituídos
posteriormente aos mesmos atos. Desde que relativos a obrigações tributárias surgidas até a referida
data.
que vem a ter maior proteção e segurança para a realização do negócio jurídico
pretendido.
Também não abraçamos a ideia de alguns autores que consideram de
natureza sancionatória o preceito geral sobre responsabilidade na sucessão - art. 29
– nem em específico o art.130, por dois motivos: primeiro, que o caráter
sancionatório pela omissão do adquirente em verificar a regularidade fiscal retiraria
a nota característica da repercussão jurídica do tributo obrigatória para as hipóteses
de responsabilização tributária decorrente de fatos lícitos; segundo, que a sanção
estaria ocorrendo, pelo não pagamento do tributo, e no seu conceito expresso no
art.3° do CTN , excluído está da sua natureza a hipótese de sanção por ato ilícito.
E por falar mais uma vez em tributo, ainda que os dispositivos que tratem
da sucessão refiram-se literalmente a “tributos” com exceção do art.130, o fato é que
a responsabilidade na sucessão alcança em algumas hipóteses as multas também,
de acordo com o caminho seguido por diversas decisões judiciais, com a ressalva de
que só estão abrangidas as que à época da sucessão já estavam constituídas.
Imaginamos ao mesmo tempo em que há uma preocupação no sentido de que por
meio do ato sucessório existam meios ardilosos com a intenção de não pagamento
de penalidades e ainda mais, desconhecidas do sucessor, há, noutro giro, a questão
relevante da punição não transcender à figura do infrator.
Continuando na missão constitucional – art.146, III da CF/88 - de dispor
sobre “normas gerais de Direito Tributário” o CTN prevê, ainda na seara da
responsabilidade por transferência – a responsabilidade de terceiros , nos arts.134
e 135, ou de forma estreita, a responsabilidade em sentido estrito. Como já
anunciamos, o art.135, III diz direto com o nosso tema principal, então cuidaremos
em capítulo próprio, enquanto nesse primeiro momento traçaremos as notas
essenciais que caracterizam os enunciados prescritivos do art.134.
A responsabilidade de terceiros prevista no art.134 do CTN149 pressupõe duas
condições para a imputação de responsabilidade às pessoas nele referidas: i.
impossibilidade de cumprimento da obrigação pelo contribuinte e ii. que a obrigação
tributária tenha nascido em virtude de sua interferência por ação ou omissão de um

149 Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo


contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de
que forem responsáveis: I - os pais, pelos tributos devidos por seus filhos menores; (…) VII – os
sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.
dever próprio legalmente estabelecido.
A implicação da responsabilidade de pagar tributos atribuída ao pai, tutor,
curador, administrador de bens de terceiros, inventariante, síndico, comissário,
serventuário de ofício ou sócio não decorre da simples relação de representação ou
de poder que esses sujeitos possuam em relação ao contribuinte, mas da comunhão
entre a atuação ou omissão na administração de bens destes e a inadimplência da
obrigação tributária, quer pelo impedimento de sua constituição, quer pelo não
pagamento. Há dessa forma uma relação de causa e efeito imprescindível para a
imputação da responsabilidade às pessoas referidas no art .134, do CTN.
Renato Lopes Becho e Marçal Justen Filho fazem uma leitura diferente do
dispositivo legal: o primeiro, considera que o enunciado tem caráter processual 150,
em que é exigida, por exemplo, a responsabilidade do pai pelo tributo devido pelo
filho, quando este não puder por algum motivo, apresentar-se perante a
Administração Tributária; enquanto o segundo, parte da ideia de que a simples falta
de recursos do contribuinte poderia ensejar a responsabilidade do terceiro, não
dependendo da ação ou omissão deste, caso que justifica com base na ideia de que
a lei tributária transformou os representantes em “garantidores legais das dívidas
dos representados”.151
Pensamos que as justificativas dos renomados estudiosos não se
sustentam , uma vez que da própria ratio do dispositivo legal torna-se imperativo a
atuação – comissiva ou omissiva – do terceiro para a ocorrência do fato imponível e
o inadimplemento da obrigação tributária, como já anunciamos. Nesta senda não
podemos limitar a finalidade da norma à natureza processual, nem tampouco atribuir
a responsabilidade ao terceiro pelo tributo devido em decorrência do mero vínculo
que possa existir entre o responsável e o realizador do pressuposto de fato da
tributação, ou como quer o segundo autor, pelo mero fato da “representação”.
Na prescrição normativa do art.134 do CTN, a nosso ver, há uma
valoração escolhida pelo legislador que pode ser entendida sob duas perspectivas: a
uma, a defesa da proteção aos que de determinada forma dependem de terceiros e
possam vir a ser por esses prejudicados pelo ato ou omissão do que deveria ser

150 BECHO, Renato Lopes. Comentários dos artigos 121 a 137. In PEIXOTO, Marcelo Magalhães;
LACOMBE, Rodrigo Santos Masset ( coords.) Comentários ao Código Tributário Nacional. São
Paulo: MP Ed., 2008, p.1043.
151 JUSTEN FILHO, Marçal. Sujeição Passiva...op.cit., p.309/310.
feito e não foi, desencadeando uma situação jurídica tributária não desejada; a duas,
e por decorrência, resta revelada a intenção clara do legislador de punição - o
animus puniendi – e natureza sancionatória da norma, por ato ilícito culposo,152
daquele a quem a ordem jurídica exige que atue em prol e com zelo, e não contra
seus representados e em específico, se dessa forma, concorre para o não
cumprimento da obrigação tributária.
Trata-se assim, pela inteligência do caput do artigo 134 do CTN, de
responsabilidade subjetiva, em que para a sua configuração é importante perceber
que exige-se pelo menos a culpa do agente que a desencadeia e que não se
confunde com o fato tributário, mas com ele é conexo, cabendo à autoridade
administrativa lançadora demonstrar no processo administrativo por meio da
linguagem das provas cabíveis e de fortes indícios, “que existe a relação entre a
obrigação tributária e o comportamento daquele a quem a lei atribuiu a
responsabilidade,”153 sob pena de estarmos diante de uma responsabilidade
arbitrária.
Questão importante ainda com relação à responsabilidade de terceiros
prevista no art.134 do CTN é no que toca à caracterização da responsabilidade
imputada, pois na expressa literalidade do enunciado está o termo “solidariamente”
em contradição ao pressuposto a que nos referimos no inicio da análise deste artigo
que foi claro ao dispor: “nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento
da obrigação principal pelo contribuinte”, que por sua vez, caracteriza a
subsidiariedade.
Escandindo a ideia: a solidariedade é nota que caracteriza a
responsabilidade tributária prevista expressamente no art.124 do CTN, em que não
há uma definição de ordem de preferência na execução dos bens quando coexistam
mais de um devedor, seja na categoria de contribuinte, responsável, ou os dois, o
que implica que a dívida tributária poderá ser cobrada de qualquer um deles.

152 O pensamento de Regina Helena Costa segue nesta mesma trilha: “o dispositivo considera a
culpa dos terceiros apontados para atribuir-lhes a responsabilidade tributária, em razão do
descumprimento de deveres de fiscalização e de administração”. ( Curso de Direito Tributário.
Saraiva, 2009, p.203). Assim como o de Misabel Derzi quando doutrina: “... a responsabilidade dos
terceiros, arrolados no art.134, depende da ocorrência de fato ilícito, posto em norma secundária; ter
havido, em ação ou omissão, descumprimento do dever, legalmente previsto ou contratualmente
nascido, de providenciar o recolhimento do tributo devido pelo contribuinte ou de fiscalizar o seu
pagamento.” ( Nota de atualização à obra de Aliomar Baleeiro. Direito Tributário ....op.cit., p.754).
153 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito...op.cit., p.158
No revés, a subsidiariedade assegura que o responsável só poderá ser
exigido após o contribuinte, ou seja, a execução fiscal terá que ser proposta
inicialmente contra o contribuinte, e, após esgotados os meios cabíveis for
constatado não haver patrimônio disponível para arcar com a dívida tributária.
Há dissenso doutrinário e jurisprudencial quanto à característica da
responsabilidade de terceiros, mas a maior parte, nos dois casos, se posiciona
quanto à subsidiariedade, inclusive é a posição que adotamos, pela interpretação do
contexto normativo dos enunciados sobre a responsabilidade tributária e diante dos
pressupostos de ordem formal e material que a justifica, é que entendemos que na
hipótese do art.134 do CTN, só deverão ser responsabilizados os sujeitos ali
arrolados, desde que o Fisco já tenha demandado o contribuinte e para este, seja
impossível o cumprimento do dever de pagar o tributo, devido à ausência de
patrimônio disponível para a satisfação do crédito tributário ou à impossibilidade de
ser encontrado, também acontece.
Em suma: a responsabilidade contemplada no dispositivo em análise é
subsidiária, e não solidária, nem tampouco pessoal.154
Nesse sentido é que defendemos ter sido a utilização da expressão
“solidariamente” pelo legislador, uma atecnia, um equívoco da linguagem prescritiva
do enunciado, como várias outras existentes no estatuto que trata das normas gerais
de Direito Tributário, mas o fato é que não foi suficiente ou impossível de resolução
tendo em vista a hermenêutica utilizada no sentido de dar à norma o conteúdo
simétrico ao contexto em que está inserida e que lhe melhor acentue a justificativa
valorativa.
Zelmo Denari está entre aqueles que pensam diferente ao defender que a
responsabilidade de terceiros é solidária, no entanto pode ser exigido primeiro os
bens do devedor principal,155 e em sentido oposto e igual ao que pensamos, Maria
Rita Ferragut doutrina que “a responsabilidade é subsidiária na medida em que a lei
não permite que o terceiro responsabilize-se pela dívida sem que o credor certifique-

154 A análise jurídica das notas que caracterizam a responsabilidade tributária, se pessoal ou
excludente, solidária, ou subsidiária, será por nós um pouco mais aprofundada no capítulo seguinte,
com vistas a fundamentar nesse aspecto, as conclusões a serem sacadas na conclusão do trabalho.
Assim como em específico, o inciso VII, do art.134 que dispõe sobre a responsabilidade dos sócios,
no caso de liquidação de sociedade de pessoas, quando faremos um paralelo com a hipótese do
art.135, III, referente à responsabilidade dos administradores de pessoa jurídica quando atuam com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, casos que configuram a
substituição tributária decorrente de ato praticado com ilicitude.
155 DENARI, Zelmo. Solidariedade e Sucessão Tributária. São Paulo: Saraiva, 1977, p.54.
se de que o cumprimento da obrigação, pelo contribuinte é impossível.”156
Em suma: a responsabilidade dos terceiros - art.134 do CTN – tem
caráter sancionatório, é subsidiária e só se aplica aos tributos e às penalidades de
caráter moratório, não respondendo assim, o responsável por infração praticada pelo
contribuinte, salvo na hipótese de dolo específico do terceiro responsável na
caracterização da infração tributária.
E responsabilidade por infração tributária é o tema sobre o qual nos
debruçaremos no item seguinte desse trabalho, seguindo a mesmo traçado que
fizemos quando tratamos da responsabilidade dos sucessores e de terceiros:
aspectos normativos que a fundamenta e análise jurídica das notas essenciais que a
caracteriza no intuito de demonstrar o contexto geral das normas que versam sobre
responsabilidade tributária.

3.4 Notas sobre responsabilidade por infrações

Na esfera da prática de atos ilícitos que acarretam a responsabilidade


tributária, estão as normas que estabelecem sanções pelo não-cumprimento de
obrigação tributária - arts.136 e 137 do CTN – às quais o legislador denominou
“responsabilidade por infrações”.157

O art.136 do CTN158 traz em seu enunciado hipótese de responsabilidade,


que para a sua configuração, há que ser aferido o elemento subjetivo do autor da
infração, no mínimo a culpa em conexão ao resultado, dispensando tão somente a
intenção do infrator em causar o dano, ou seja, a presença do dolo ou da fraude,
salvo as exceções previstas em lei, de acordo com a literalidade do dispositivo.

156 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária e ….op.cit, p.111. A jurisprudência também
se posiciona nesse sentido: “ (...)10. Flagrante ausência de tecnicidade legislativa se verifica no artigo
134, do CTN, em que se indica hipótese de responsabilidade solidária “ nos casos de impossibilidade
de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte”, uma vez cediço que o instituto
da solidariedade não se coaduna com o benefício de ordem ou de excussão. Em verdade, o aludido
preceito normativo cuida de responsabilidade subsidiária”. ( EResp 446.955/SC, Rel. Ministro Luiz
Fux, Primeira Seção, DJ 19.05.08)
157 Não vemos justificativa para o legislador ter separado em uma seção – Seção IV, a

responsabilidade por infrações , se a responsabilidade de terceiros – arts. 134 e 135, decorre também
da prática de atos ilícitos. Talvez, pelo fato de nessa seção ,ter sido dada uma configuração da
responsabilidade diferente das outras hipóteses – objetiva – e de ter como pressuposto, de uma
forma geral, a culpa. Vamos falar melhor sobre isso no desenvolver deste item.
158Art.136. Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações independe da

intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.


Há quem perceba nesse dispositivo uma regra de imputação de
responsabilidade objetiva, como Edmar Oliveira de Andrade Filho, quando ao
discorrer sobre o enunciado do caput do art.136, argumenta:

em face da existência de leis editadas com base naquela


norma de competência, sanções tributárias são aplicadas na
base do “tudo ou nada”, isto é, sem que a administração esteja
obrigada a perquirir sobre as razões pelas quais se deu a
ofensa tributária. A aplicação das normas sancionatórias é feita
com base em simples subsunção(...) 159

Em nosso entender, não há espaço para a responsabilização objetiva em


matéria tributária, uma vez que, há nessa órbita, direitos fundamentais protegidos
constitucionalmente, como o da liberdade e o do patrimônio, os quais por si sós,
irradiam seus valores e sua imperatividade sobre outros, ainda que se trata de
resposta do ordenamento jurídico por violação de normas que estabelecem um
dever-ser, como a sanção, e esta na visão do autor, é um conceito fundamental,160
que representa a consequência de uma ação ou omissão considerada ilícita ou
antijurídica.
Neste ponto, concordamos com o autor, a regra veiculada no art.136 do
CTN, tem como carga valorativa a punição pela infração à lei fiscal que levou o
legislador a tipificá-la como um delito. No entanto, com uma divergência de
percepção, a infração fiscal é objetiva, não a responsabilidade.161
Sem dúvida que a infração fiscal configura-se pelo simples
descumprimento dos deveres tributários de dar, fazer e não-fazer previstos na
legislação, sendo o dolo e a culpa, elementos não aferidos, evitando-se com isso a

159 ANDRADE Filho, Edmar Oliveira. Limites Constitucionais da Responsabilidade Objetiva por
Infrações Tributárias. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n° 77, 2002.p.14
Renovar, 1999, p.228.
160 Idem, ibidem.p.18. Neste mesmo sentido pensa Ricardo Lobo Torres: “ aderiu o CTN, em

princípio, à teoria da objetividade da infração fiscal. Não importa, para a punição do agente, o
elemento subjetivo do ilícito, isto é, se houve dalo ou culpa na prática do ato. Desimportante também
que se constate o prejuízo da Fazenda Pública” ( Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de
Janeiro:Renovar1999, p.228)
161 Sob esta prisma Maria Rita Ferragut escreve com maestria: “(...) é inerente à responsabilidade

tributária a noção de culpa ou dolo, pois ainda que o indivíduo não atue com consciência e vontade
de um específico resultado, a infração decorre pelo menos de culpa, incluindo-se nessa regra as
espécies in vigilando e in elegendo. ( Responsabilidade Tributária e o Código...op.cit., p147.
alegação de não conhecimento da lei, ou de simples impossibilidade financeira de
adimplir a obrigação.
No entanto, parece-nos que a inteligência do dispositivo é no sentido de
que para a configuração da responsabilidade por infrações, como regra geral o que
se dispensa é a intenção, a vontade de lesar o Fisco,162 como já anunciamos,
exigindo-se no mínimo, a culpa em um de seus graus: imperícia, imprudência ou
negligencia e independendo da efetividade, natureza ou efeitos do ato ilícito.
Quanto à culpa, trata-se de culpa relativa do sujeito passivo, e nunca é
demais lembrar, que cabe à Administração Pública demonstrar o ilícito e a conexão
do evento ao sujeito infrator, por culpa no mínimo, ou dolo, dependendo da situação
e, assim como é possível ao agente acusado, por meio de provas, demonstrar que
não teve culpa na prática da infração, e assim eximir-se da sanção tributária. Nesta
questão mora a diferença substancial entre a natureza objetiva e subjetiva da
responsabilização em matéria tributária. A culpa, no mínimo ou o dolo, em uma de
suas configurações, tem que ser demonstrado e comprovado pela autoridade fiscal
quando da constituição do crédito e da representação fiscal para fins penais.
Exceção à caracterização da culpa para a responsabilização pela infração
praticada, e por outro lado, só por disposição expressa de lei, inclusive as que o
próprio CTN faz ao exigir dolo, até mesmo dolo especifico, nas hipóteses do
art.137,163 como elemento indispensável para a tipificação da responsabilidade
pessoal, ( e eventuais coautores),assim como também para agravar a penalidade, já
que nessas situações, o artificio, o ardil, o conluio não raro estão presentes com a
intenção de não pagar tributos.
Nesse caso a responsabilidade é pessoal do agente, pois são hipóteses
de ilícitos tributários, que configuram também ilícitos penais, isto é, os crimes fiscais
tipificados na legislação penal, tais como a sonegação fiscal, a apropriação indébita.
Nesses casos tendo em vista a gravidade da ilicitude e da lesividade, notadamente
pelo bem tutelado juridicamente pela tributação - o interesse publico - o legislador

162 Como bem escreve Luciano Amaro: ”Ora, intenção aqui, significa vontade: Eu quero lesar o Fisco.
Eu quero ludibriar a arrecadação do tributo. Isto é vontade. Isto é intenção.(…) O Código não está
aqui dizendo que todos podem ser punidos independentemente de culpa. ( Curso de Direito...op.cit.,
p. 471)
163 A responsabilidade é pessoal do agente: I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes

ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função,


cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito; II – quanto às
infrações em cuja definição o dolo específico seja elementar; III – quanto às infrações que decorram
direta e exclusivamente de dolo específico(...).
exigiu para a tipificação o dolo genérico, e em alguns casos, o dolo específico, como
no caso dos ilícitos praticados pelos sócios na liquidação irregular da pessoa
jurídica, ou dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito
privado quando agirem com infração à lei, no geral.
Ou seja, a intenção dolosa, a fraude, as condutas artificiosas para lesar o
Fisco são elementos levados em conta pelo legislador e para que o Estado use sua
força coercitiva em prol da ordem jurídica, ao tipificar os ilícitos tributários como
crimes penais e não só infrações administrativas, e como consequência opta por
agravar as penalidades impostas.
No entanto, não se pode perder de vista, que a inexistência de qualquer
um desses elementos, ou do evidente erro escusável, da inexigibilidade de conduta
diversa,164 ou da própria culpa, na dúvida prestigia-se a inocência ou da própria
culpa, na dúvida prestigia-se a inocência (art.112).165
E para além disso, ainda que os ilícitos tributários configurem ilícitos
penais – crimes ou contravenção – importa ressaltar que há previsão de acordo com
norma veiculada pelo art.138 do CTN do instituto jurídico tributário da “denúncia
espontânea” com o efeito de elidir a responsabilidade por infração, desde que o
infrator a comunique antes de qualquer meio fiscalizatório e acompanhada do
pagamento do tributo e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada
pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração.
São requisitos cumulativos portanto para a incidência da norma, com os
efeitos da exclusão da responsabilidade por infração e caracterização da denúncia
espontânea: a comunicação ao Fisco, acompanhado se for o caso, do pagamento
do tributo ou do depósito arbitrado, dos juros moratórios, 166 e não ter sido ainda

164 A jurisprudência dominante reconhece a inexigibilidade de conduta diversa como forma de afastar
a punibilidade nos crimes de apropriação indébita previdenciária, quando caracterizado, nos autos, o
estado de insolvência incontestável da empresa. Para isso, é necessário que os bens da empresa e
dos sócios-gerentes, diretores ou administradores encontrem-se onerados”.(KERTZMAN, Ivan. Curso
Prático de Direito Previdenciário. Editora: Jus Podium. 2010, p.316).
165 AMARO, Luciano. Curso de Direito...op.cit, p.472. Além do mais, o próprio CTN , quando trata do

julgamento da infração, determina a observância do art.108, § 2° ( equidade).


166 Quanto às multas, o entendimento que predomina é no sentido de não atentar quanto à natureza

da multa para fins de aplicação do art.138, uma vez que este não as distingue, conforme posição do
Superior Tribunal de Justiça. “ DENÚNCIA ESPONTÂNEA.MULTA MORATÓRIA. EXCLUSÃO..1. É
desnecessário fazer distinção entre multa moratória e multa punitiva, visto que ambas são excluídas
em caso de configuração da denúncia espontânea” ( STJ.1 T.,Resp 774.058/ PR. MinTeori Albino
Zavascki, out/2009). Paulo de Barros Carvalho explica de modo diferente: “A iniciativa do sujeito
passivo, promovida com a observância desses requisitos, tem a virtude de evitar a aplicação de
iniciado pela Fazenda Pública qualquer meio tendente a verificar a ocorrência da
infração, leia-se: procedimento administrativo ou ação fiscalizatória.
A exclusão, enfatiza-se, é da multa punitiva e não do pagamento do
tributo e dos juros de mora. Quanto à possibilidade de parcelamento fazer surgir os
efeitos da denúncia espontânea, após divergências jurisprudenciais e doutrinárias,
com a introdução do art. 155-A no CTN pela Lei Complementar 104/01 , não exclui a
exigência de juros ou de multa, de qualquer natureza.

multas de natureza punitiva, porém não afasta os juros de mora e a chamada multa de mora, de
índole indenizatória e destituída de caráter de punição.” ( Curso de Direito...op.cit., p.597)
CAPÍTULO IV

A MOLDURA DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA


NO CTN: SOLIDARIEDADE, SUBSIDIARIEDADE E
PESSOALIDADE

4.1Sujeição passiva e responsabilidade tributária: solidária,


subsidiária e/ou pessoal 4.2 Art. 124 do CTN: fundamento de
validade da responsabilidade solidária 4.2.1 Solidariedade
passiva: interesse comum e previsão em lei 4.3 Grupo
econômico: responsabilização tributária 4.4 A responsabilidade
tributária do sócio ou administrador: interpretação e alcance do
art.135, III - CTN 4.4.1. Contextualização da responsabilidade
dos administradores: exegese do art.135, III e 137, VI:
condutas tipificadas

4.1 Sujeição Passiva e Responsabilidade tributária: solidária, subsidiária e/ou


pessoal

Seguindo o desenho que traçamos para este trabalho, após tratarmos do


aspectos normativos e peculiaridades em notas essenciais para a análise jurídica e
compreensão das proposições prescritivas inseridas no sistema jurídico tributário
brasileiro que versam sobre a sujeição passiva e a responsabilidade tributária,
partimos para a interpretação das notas que a caracteriza, 167 ou as suas

167 Neste ponto, ousamos discordar de Maria Rita Ferragut para quem a solidariedade é espécie de
responsabilidade tributária, aliás nos opomos à proposta de classificação para a responsabilidade
tributária feita pela autora, in verbis: “ Consideramos que a classificação mais acertada para as
normas de responsabilidade tributária é a que as divide em (i) substituição; (ii) solidariedade; (iii)
sucessão; (iv) responsabilidade de terceiros; e (v) responsabilidade por infrações.
modalidades como querem alguns autores – a solidariedade, subsidiariedade e/ou
se pessoal ou excludente, pois a partir da análise jurídica diante dessa moldura é
que podemos
A atuação do sujeito passivo diante da obrigação de pagar o tributo
devido ou até de suportar a respectiva execução, como contribuinte ou responsável,
pode ser diante das hipóteses previstas em lei, de forma pessoal ou plural, o que
significa dizer, que na primeira hipótese, o tributo só poderá ser cobrado de uma
única pessoa, enquanto que na segunda, a exigência do tributo poderá ser feita a
mais de um sujeito passivo, contribuinte ou responsável, ou ambos, de forma
paritária ou com ordem de preferência desde que integrem o polo passivo da relação
jurídica tributária.
A sujeição passiva pessoal ou exclusiva pode ser daquele a quem a
autoridade legislativa acolhe como contribuinte, por ter relação pessoal e direta com
o fato tributado e assim desde a prática desse fato é o único que deve pagar o
tributo, assim como pode ser daquele que a lei elegeu, por ter uma proximidade
indireta com o fato tributado, ou direta ou indireta com quem o realiza, como no caso
da substituição tributária, que tem como exemplo típico, a responsabilidade da fonte
pagadora.
De outro modo, quando há mais de um sujeito passivo, 168 contribuinte ou
responsável de quem poderá ser cobrado o tributo, dar-se-á a sujeição passiva

( Responsabilidade Tributária e o Código...op.cit., p.56). A nossa divergência é por dois motivos


principalmente: primeiro, que o fato de existir mais de uma pessoa como sujeito passivo da obrigação
tributária, como no caso da solidariedade, não implica espécie de responsabilidade tributária, que
decorre da comunhão de um fato tributário a um evento não tributário, lícito ou ilícito, e que por
decorrência o legislador, pela diversas razões a que já nos referimos neste trabalho, optou por alterar
o polo passivo da relação tributária, incluindo de forma pessoal ou excludente, subsidiária ou solidária
a figura do responsável em conjunto ou não à do contribuinte. Estamos tratando do que caracteriza a
sujeição passiva em matéria de exclusividade ou pluralidade de pessoas como contribuintes, ou
responsáveis, de forma igualitária ou em ordem preferencial, portanto não se trata aqui de espécie;
segundo, porque carece de fundamento apartar a hipótese de sucessão da responsabilidade de
terceiros, notadamente, dentre outros aspectos, pelo fato de que o surgimento da obrigação tributária
ocorre com o realizador do pressuposto de fato e após um evento posterior desencadeia a atuação
do responsável, ainda que a natureza destes difira, pois na sucessão o fato não tributário é licito,
enquanto na de terceiros, no geral é ilícito, e eventualmente, há possibilidade de ser licito.
168 Aspecto importante e que merece destaque é o fato de que a sujeição passiva, direta ou indireta,

em decorrência até do caráter ex lege da obrigação tributária, também é de estrita reserva legal,
como bem anunciamos quando tratamos dos princípios mais afinados à responsabilidade tributária, e
assim sendo é que as convenções particulares entre os contratantes são juridicamente válidas,
exceto quando tiverem a pretensão de alterar o obrigado ao pagamento da obrigação tributária (
art.123 do CTN) Não são assim oponíveis à Fazenda Pública, ou como escreve Hugo de Machado:
(…) Terá esta, não obstante o estipulado em convenções particulares, o direito de exigir o
cumprimento da obrigação tributária daquelas pessoas às quais a lei atribuiu a condição de sujeito
passivo”. ( Curso de Direito Tributário....op.cit, p.144)
plural, também chamada de “concorrente”, hipótese em que se a obrigação de pagar
o débito tributário existir, somente na impossibilidade de exigência do cumprimento d
obrigação do devedor principal ou direto, ou seja, do contribuinte, ela será
subsidiária; enquanto, noutro giro, havendo mais de um sujeito passivo obrigado ao
cumprimento da exação tributária, seja contribuinte, ou responsável, ao ainda em
conjunto, em que qualquer um deles possa vir a ser ser compelido a pagar pela
integralidade do valor do débito tributário, a nota que matiza essa sujeição passiva é
a da solidariedade.
A solidariedade169, prevista no art. 264 do Código Civil , existe quando há
mais de um credor ou de um devedor, no polo ativo ou passivo da obrigação
tributária, em que cada um deles, tem o direito ou a obrigação com relação à
integralidade do crédito ou do débito, respectivamente.
Do instituto jurídico percebe-se quatro características principais: i.
pluralidade de sujeitos ativos, passivos, ou de ambos; ii. multiplicidade de vínculos,
sendo distinto ou independente o que une o credor a cada um dos codevedores
solidários e vice-versa; iii. unidade de prestação, visto que cada devedor responde
pelo débito todo e cada credor pode exigi-lo por inteiro; e iv. corresponsabilidade dos
interessados, já que o pagamento da prestação efetuado por um dos devedores
extingue a obrigação ou o direito dos demais.170
Girando na órbita do nosso trabalho, está a solidariedade passiva, em que
a concorrência de dois ou mais devedores, cada um com o dever de prestar a dívida
toda, e por outro lado, possibilitando ao credor a seu critério exigir parte do débito de
cada um dos devedores separadamente, ou por inteiro de apenas um, ou de parte
deles.
Washington de Barros Monteiro explica:

tal modalidade é predicado externo que cinge a obrigação e por


via do qual, de qualquer dos devedores que nela concorrem,
pode o credor exigir a totalidade da dívida. Representa assim
preciosa cautela para a garantia dos direitos obrigacionais.171

169 Art. 264 do Código Civil : Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de credor,
ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida toda.
170 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. v.2, 16.ed. São Paulo: Saraiva, 2002,

p.152
171 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 29.ed., atualizada por Carlos Alberto

Maluf, 2003,v.4, p.176.


Pensamos que talvez seja assim, a solidariedade passiva, em apertada
síntese: i. sua tônica: a autonomia e o vínculo da obrigação, que embora existam
vários devedores, cada um responde pelo total do débito, como se único devedor
fosse, ao mesmo tempo em que entre eles, apesar de cada um possuir uma parte
individual do débito, estão vinculados uns aos outros;172 ii. sua função primordial: a
garantia, a segurança que o instituto oferece para o credor, que no seu livre arbítrio,
pode escolher aquele credor de maior solvência financeira ou de mais fácil acesso,
viabilizando assim o recebimento do crédito de forma mais segura, prática e menos
onerosa; e por fim, iii. seu efeito: ainda que aparentemente exista uma única
obrigação e uma única relação , em verdade, há uma pluralidade de obrigações e de
relações de acordo com tantos devedores existam, e todos vinculados pelo
pagamento integral da dívida, enfim, há unidade de objeto e pluralidade de
obrigações.
Cabe frisar que o regime jurídico aplicado é o mesmo para todos os
codevedores e que na hipótese de um devedor fazer o pagamento integral da dívida
e assim liberar a todos os outros em face do credor, resta-lhe o direito de exigir dos
outros a quota-parte de cada um deles. A solidariedade pode surgir junto com a
obrigação para os codevedores, como também em momento ´posterior em
decorrência de um fato novo.
São várias as classificações adotadas pela doutrina quando o tema é
solidariedade e dentre elas, a que mais nos interessa, é a que leva em conta os
sujeitos que estão envolvidos na prática do pressuposto de fato da obrigação, que a
identifica conforme a situação, em solidariedade paritária ou dependente. A primeira,
quando há uma comunhão de interesses ou de fins das pessoas que praticam o fato
que origina a obrigação, e a segunda, quando ainda que praticado o fato por uma só
pessoa, a lei acresceu ao devedor originário, um terceiro coobrigado.
E por último, ainda que no Código Civil não haja disposição expressa
acerca da solidariedade passiva e o benefício de ordem, ou seja, de uma ordem de
preferência entre os devedores, a partir da análise do plexo de normas a respeito
das obrigações é que subtende-se que a opção do legislador foi de excluí-lo quando
a natureza da obrigação for solidária.

172Esta também é a perspectiva em que a solidariedade é percebida: no ângulo externo e interno,


respectivamente, onde a primeira se estabelece entre os vários devedores e o credor, e a segunda
estabelecida entre os próprios devedores.
Estabelecidos em síntese, os aspectos relevantes acerca das obrigações
de natureza solidária indispensáveis para a compreensão do instituto na seara
civilista, e em especial no contexto normativo tributário, tendo em vista que mesmo
marcadas pelas especificidades, as premissas fundamentais não se desigualam,
notadamente porque o feixe luz que referencia é a unidade do direito e assim,
importa agora trazer à sirga a nota essencial que a diferencia das obrigações
marcadas pela subsidiariedade.
A subsidiariedade não está disciplinada, ou escrevendo melhor, não está
conceituada na legislação como acontece com a solidariedade, o que obriga ao
intérprete pelo enunciado dos dispositivos existentes extrair o seu conceito e
peculiaridade.
Expliquemos. A subsidiariedade é instituto jurídico em que a ideia
principal é de que diante da existência de vários obrigados com relação a uma
dívida, o credor não pode estabelecer uma ordem de preferência para a cobrança da
dívida e execução do coobrigado. O matiz da subsidiariedade, que a destoa em
específico da solidariedade, é exatamente a presença do benefício de excussão e
mais, entendemos que só por disposição expressa de lei.
Desse modo a responsabilidade subsidiária, ou na etimologia da palavra,
secundária, obriga ao credor cobrar e executar em primeiro lugar, o devedor original,
para em seguida, em virtude da insuficiência patrimonial deste, reverter a cobrança
para os bens do devedor subsidiário. São assim dois pressupostos para a
configuração da responsabilidade subsidiária: a cobrança em primeiro lugar do
débito do devedor original ou principal e a constatação da impossibilidade de
adimplemento da obrigação por este. Só a partir de então, o sujeito ativo poderá
excutir o patrimônio do responsável em caráter subsidiário.173
A partir então das premissas feitas sobre a pessoalidade, solidariedade e
a subsidiariedade que caracterizam as obrigações e a responsabilidade por estas, é
que passamos a analisar as especificidades e suas consequências jurídicas em
matéria tributária com o fim de examinar e identificar qual a natureza do vínculo

173Para Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona a responsabilidade subsidiária “nada mais é que uma
forma especial de solidariedade, com benefício ou preferência de excussão de bens de um dos
obrigados” (…) Na responsabilidade subsidiária, por sua vez, temos que uma das pessoas tem o
débito originário e a outra tem apenas a responsabilidade por esse débito(...) não tendo sido
encontrados bens do devedor ou não sendo eles suficientes, inicia-se a excussão de bens do
responsável em caráter subsidiário, por toda a dívida” ( GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo
Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. v.II. Obrigações.11.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p.116)
relacional estabelecido entre aqueles que participam direta ou indiretamente do
pressuposto de fato da obrigação tributária, assim como entre estes e o sujeito ativo
da exação tributária.

4.2 O Art.124 do CTN como fundamento da responsabilidade tributária


solidária

As noções relevantes da figura jurídica da solidariedade na esfera


civilista, foram traçadas no intuito de demonstrar que, em linhas gerais, elas foram
incorporadas para o Direito Tributário, guardadas as diferenças em virtude de que o
fenômeno tributário e as relações jurídicas instaladas ao seu redor são regidos por
normas de direito público, o que significa dentre outros aspectos, que o Estado na
sua posição de sujeito ativo deve exercer a sua função nas balizas da supremacia
do interesse público e da sua indisponibilidade.174
Os enunciados prescritivos que compõem o art.124 do CTN 175 dispõem
sobre a pluralidade passiva simultânea pelo pagamento do tributo, quando prevê
hipóteses de solidariedades, adotando os seguintes critérios: interesse comum na
situação que constitua o fato gerador e a designação expressa de lei.
As hipóteses previstas permitem então que o sujeito ativo acione aquele
devedor que tenha maior ou suficiente solvência financeira para o cumprimento da
obrigação, uma parte deles ou todos simultaneamente ou de forma sucessiva, cada
um respondendo como contribuinte por sua parte individualizada, e como
responsável referente aos demais.

174 Sabemos que a atuação do Estado, enquanto pessoa, está adstrita ao principio da legalidade e ao
da supremacia do interesse público, e que este representa tanto a garantia de poderes jurídicos
recebidos e sua indisponibilidade, como uma barreira para que todo o exercício da atividade estatal
seja em prol da sua efetivação, o que necessariamente impõe que ainda que goze de uma posição
jurídica privilegiada sobre o sujeito passivo, ao disciplinar a relação jurídica tributária, quando da
feitura da prescrição normativa pelo legislador, que prevê a inclusão de obrigados solidários ao
pagamento de tributo além do seu devedor principal, bem como na interpretação da norma no
momento de sua aplicação pela autoridade competente, não seja extrapolado tal espectro com o
desvio da finalidade pública da tributação, dentre outras, a de dividir o ônus das despesas de forma
igualitária e justa. Marçal Justen Filho preocupou-se com essa temática e escreveu: “ Porém, o
sujeito ativo é destinatário de deveres e sujeições, porquanto sua tarefa é realizar interesse alheio (
no caso, interesse público). Não há como dissociar a supremacia do interesse público ( e, portanto, o
aspecto dos poderes jurídicos recebidos) da sua natureza indisponível ( ou seja, a utilização dos
poderes jurídicos necessariamente para a realização do interesse público.” ( Sujeição Passiva
...op.cit, p.87)
175 Art.124 São solidariamente obrigadas: I- as pessoas que tenham interesse comum na situação

que constitua o fato gerador da obrigação principal; II – as pessoas expressamente designadas por
lei. Parágrafo único:. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.
Trata-se de direito subjetivo do Estado, alertando-se para o fato de que o
instituto jurídico da solidariedade atende principalmente ao interesse da
administração tributária de viabilizar de forma mais segura e eficaz a arrecadação
tributária, tendo em vista, que a necessidade constante de realização da sua
atividade-fim, o serviço público em prol de toda a sociedade, não para, não sofre
solução de continuidade. É a tutela direta do crédito tributário em favor do interesse
público.
Na solidariedade passiva tributária, há assim, uma pluralidade de sujeitos
passivos, pessoas físicas ou jurídicas, em que a obrigação tributária una decorre da
prática do fato previsto no antecedente da regra matriz de incidência, de forma
pessoal e direta pelo contribuinte, e junto com este, pela norma de responsabilidade
tributária com base no interesse comum ou por disposição expressa de lei, há
inclusão de uma terceira pessoa no polo da sujeição passiva como responsável pelo
pagamento do tributo, vinculada ao fato tributado ou àquele que o praticou, o que
por dedução lógica, não poderia ser diferente, por estarmos tratando de
responsabilidade tributária, onde tais pressupostos são inarredáveis para a
configuração da fisionomia do instituto jurídico conforme o traço desenhado pelo
legislador complementar.
Bem, nesse compasso, cada um dos devedores é obrigado a cumprir com
o total da dívida tributária, não podendo nenhum deles se eximir do pagamento da
sua fração de dívida nem tampouco da fração a que cabe aos demais, no entanto é
assegurado ao que pagou reaver a fração referente aos demais coobrigados pela
ação regressiva.
Na solidariedade tributária não cabe benefício de ordem, podendo existir
em sua configuração, uma pluralidade de sujeitos passivos, na categoria de
contribuintes, ou de contribuintes e responsáveis. 176

176 Não é demais reiterar que a solidariedade não é forma de inclusão de terceiro, ou espécie de
responsabilidade tributária, mas tão somente uma nuança da responsabilidade tributária quando mais
de uma pessoa figura como obrigada ao pagamento do tributo nas mesmas condições, seja
contribuinte, ou este e o responsável tributário. Sob este mesmo prisma Misabel Derzi doutrina: “4.(...)
A solidariedade não é espécie de sujeição passiva por responsabilidade indireta como querem
alguns. (…) é apenas forma de graduar a responsabilidade daqueles sujeitos que já compõem o polo
passivo.“ ( Nota de atualização da obra de Aliomar Baleeiro. Direito Tributário..op.cit., p.729). Entre
aqueles que consideram a solidariedade como espécie de responsabilidade tributária, está além de
Maria Rita Ferragut que já citamos, Marcos Vínicius Neder, quando defende que “a norma de
solidariedade albergada pelo art.124 do CTN é uma espécie de responsabilidade tributária, apesar de
o dispositivo legal estar localizado topograficamente entre as normas gerais previstas no capítulo de
Sujeição Passiva e, por conseguinte, fora do capítulo específico que regula a responsabilidade
A doutrina, no geral, classifica a solidariedade tributária de acordo com os
critérios estabelecidos em lei, denominando-a de fato, aquela que decorre de uma
situação fática, em que o interesse comum é a tônica da relação jurídica instalada; e
de direito, quando prevista expressamente por lei.
Neste ponto cabe trazer à sirga um aspecto sutil, mas relevante: no direito
tributário a solidariedade resulta de lei, sempre. Na primeira hipótese o legislador
determina um critério - o interesse comum na situação que constitua o fato gerador –
por si só suficiente para entrelaçar as pessoas envolvida nesse liame como
solidárias, e portanto prescindindo de ser reiterado expressamente na lei instituidora
do tributo.
O que significa que a norma geral e abstrata basta como fundamento de
validade para a autoridade competente, diante da situação fática e verificado o
pressuposto, atar como solidárias aqueles que estejam ligados pelo interesse no
suporte factual da hipótese de incidência. É o caso de duas ou mais pessoas que
são coproprietárias de uma terra, e assim, naturalmente, codevedoras solidárias do
ITR, como também pode ser o caso de grupos econômicos não constituídos
formalmente, como veremos em tópico próprio do nosso trabalho.
Enquanto na segunda hipótese, o legislador abre possibilidades para o
ente político, no exercício de sua competência cravada na Carta Magna para a
instituição de tributos, estipular outras situações fáticas que configurem
solidariedade, que não seja o interesse comum na situação que configura o fato
gerador, por uma exclusão óbvia.

tributária” ( NEDER, Marcos Vinicius. Solidariedade de Direito e de Fato – Reflexões acerca de seu
conceito. In: FERRAGUT, Maria Rita. NEDER, Marcos Vinicius.( coords.) Responsabilidade
Tributária...op.cit., p.32). Não nos filiamos a esta ideia, pelos motivos que já expomos e por
entendermos que considerar a solidariedade uma espécie de responsabilidade nos levaria a tomar a
responsabilidade subsidiária, a pessoal, como espécie, o que significa a subversão dos preceitos
normativos da sujeição passiva, e mais de perto, a indireta. Como exemplo, podemos citar a hipótese
de solidariedade quando várias pessoas são proprietárias de um imóvel urbano, e naturalmente a
partir de uma relação negocial são coobrigados pelo pagamento da obrigação, o que nos faz crer que
ainda que não existisse a hipótese de solidariedade, a responsabilidade de cada um por sua fração
ideal persistiria entre os devedores e a unidade do objeto da obrigação perante o credor – o tributo
devido - o que implica dizer que ausente o pressuposto da solidariedade, não desconfigura a hipótese
de responsabilidade ( em sentido lato), o que não acontece com as demais hipóteses de
responsabilidade, como por exemplo, no caso de responsabilidade por um ato ilícito como o do
administrador no ato de gestão de uma sociedade, se não praticado, jamais emergirá sua
responsabilidade pelo tributo devido como decorrência do ato praticado. A norma de solidariedade
vem apenas dar o laço de união àqueles obrigados como pessoas vinculadas perante o credor
público e entre eles, portanto, uma questão de racionalidade e praticidade da administração tributária.
Assim também é a lição de Luciano Amaro que argumenta que é preciso
fazer a distinção diante de situações em que a responsabilidade do terceiro é por
algum outro interesse, outro vínculo e dessa forma dependerá de a lei
expressamente a estabelecer. 177
Feito este prelúdio, o que importa deixar aclarado, é que o fundamento de
validade para que seja instalada a solidariedade tributária, deita nas duas hipóteses
estabelecidas na lei de normas gerais - por interesse comum e por disposição de lei
- sobre as quais faremos um exame mais acurado no sentido de demonstrar a que
pensamos ser a fundamentação exigida pela Constituição e que melhor atende ao
sentido teleológico e sistemático da norma que tem trânsito no art.124 do CTN
quando de sua aplicação à situação fática.178

4.2.1 A solidariedade passiva: interesse comum e previsão em lei

Interesse comum na situação que configura o fato gerador - art.124, I do


CTN - é o critério eleito pelo legislador complementar para colocar no tópico da
sujeição passiva, pessoas físicas ou jurídicas, como solidárias pelo adimplemento da
obrigação tributária principal.
Como já noticiado, a lei que institui a hipótese de incidência tributária não
precisa trazer a previsão expressa do interesse comum no fato tributado, uma vez
que já expressamente modulada no CTN, basta ser constatada a sua configuração
na situação fática para que todos os vinculados à tal interesse sejam vinculados
como devedores solidários pelo pagamento do crédito tributário.

177 AMARO, Luciano. Curso de Direito..op.cit., p.341


178 Lenio Streck esmiúça a ideia de forma clara ao dar ênfase à necessidade de que a resposta que
se dê na aplicação do direito ao caso concreto seja a do ponto de vista hermenêutico correto e dessa
forma há que ser devidamente justificada no plano argumentativo. Nas suas palavras: “Essa resposta
propiciada pela hermenêutica deverá, a toda evidência, estar justificada ( a fundamentação exigida
pela Constituição implica a obrigação de justificar) no plano da argumentação racional, o que
demonstra que, se a hermenêutica não pode ser confundida com teoria da argumentação, não
prescinde, entretanto, de uma argumentação adequada(...) Afinal, se interpretar é explicitar o
compreendido ( Gadamer), a tarefa de explicitar o que foi compreendido é reservado às teorias
discursivas e, em especial, à teoria da argumentação jurídica. Mas esta não pode substituir ou se
sobrepor àquela, pela simples razão de que é metódico- epistemológica” (STRECK, Lenio Luiz.
Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração da construção do Direito. 2009, p.365.) O
Texto Constitucional não silencia sobre o tema, quando expressamente prevê que os juízes e os
tribunais no Brasil não precisarão explicar as suas decisões, mas justificá-las conforme determina o
art.93, IX da CF/88: “ Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (…).”
No entanto, não é tão simples como parece ser, pois trata-se, o interesse
comum, de expressão não definida pela norma que a trouxe para o universo jurídico,
cabendo à Ciência do Direito dar-lhe o significado que mais afine ao contexto
normativo e racional dos enunciados prescritivos que fundamentam a imputação da
sujeição passiva em matéria tributária.
Mas o ponto de partida da análise do enunciado prescritivo é que o
interesse comum, não é um qualquer, mas tão somente o atrelado a uma situação
jurídica, a uma relação jurídica inerente ao fato praticado ou ao próprio fato tipificado
em lei, dos quais decorra a obrigação tributária, como no caso da propriedade, da
prestação de serviços, do lucro auferido pelas empresas.
Na verdade, o pressuposto da solidariedade prevista no art.1241, I pode
ser percebido sob duas perspectivas: o fato escolhido pelo legislador como
irradiador do efeito tributário é praticado pela atuação comum de várias pessoas em
prol dos seus interesses em virtude de uma relação de direitos e deveres que são
convergentes em busca de determinados resultados, ou seja, se não houvesse a
expectativa voltada para um fim, não haveria o interesse ou necessidade da prática
do fato tributado.
Noutro giro, a segunda perspectiva: a nota que caracteriza o interesse
comum exigido pela lei para aplicação do dispositivo analisado, ou seja, que implica
a solidariedade, é jurídica, ilação que é obtida, ainda que se trate de um conceito
indeterminável, é possivelmente determinável a partir da interpretação sistemática
das normas tributárias.
A ratio essendi do dispositivo legal é que o interesse no pressuposto
fáctico do tributo é jurídico, o que requer necessariamente que as pessoas
solidariamente obrigadas pelo tributo sejam sujeitos da relação que fez surgir a
obrigação tributária, de forma direta ou ainda que pela participação indireta,
integrando o polo passivo da relação jurídica.
O interesse jurídico é comum,179 não apenas coincidente como o que há
de serviço tem para com o tomador( que enseja a cobrança do ISS) em que há a

179Paulo de Barros Carvalho atenta para o fato de que a diretriz do interesse comum dos
participantes na realização do evento é vaga, não sendo um roteiro seguro para a indicação do nexo
que se estabelece entre os devedores da prestação tributária, demonstrando a precariedade do
caminho optado pelo legislador. ( Fundamentos Jurídicos ...op.cit., p.227) Também vemos dessa
forma, como um critério há ser aferido no âmbito das balizas constitucionais para que não fique um
campo muito aberto e permita interpretações desmedidas pelo aplicador da norma.
coincidência de interesse pelo objeto da prestação, o serviço, mas não há uma
unidade quanto ao resultado, uma vez que a um cabe receber o preço, e ao outro, o
serviço. È o que ocorre naturalmente nos negócios jurídicos bilaterais.
Não é assim que vemos que se configura o interesse jurídico180 comum
indispensável para a solidariedade tributária. Aqui, unimos as duas perspectivas a
que nos referimos atrás: em que o elo é estabelecido a partir da atuação em
conjunto de pessoas que assumem direitos e deveres reciprocamente, com
interesses que convergem para o atendimento da necessidade, em que há uma
expectativa quanto ao uno resultado pretendido. Como por exemplo, no caso da
atuação em conjunto de pessoas jurídicas para o benefício de uma só atividade em
que há pelos sócios a unidade de interesse jurídico nos atos negociais ( de
propriedade e de circulação)181
Há uma interdependência e uma unidade no plexo de interesses que
envolve o interesse jurídico solidário, o que nos faz crer que ainda que o resultado
econômico ou proveito da situação que constitui o fato gerador da obrigação
principal, não configure o interesse jurídico, ele tem que ser considerado pela
autoridade competente para o lançamento fiscal, pois trata-se tão somente de uma
relação de causa e efeito, efeito cascata, por sinal: atitude positiva ou negativa,
impulsionada pelo interesse jurídico, em busca do atendimento da necessidade ,
para viabilizar o resultado pretendido.
Com relação à atuação das pessoas envolvidas na prática do fato jurídico
tributário, ressaltamos que a nosso ver ela é comum, em conjunto, pela participação
direta, como contribuinte, e indireta como responsável pelo tributo excedente à sua
parte. A regra de solidariedade tem como efeito tornar o objeto da obrigação
tributária, uno, como já vimos, posto que se tal regra não existisse, cada devedor
seria obrigado pelo tributo referente à sua parte da riqueza revelada no pressuposto
do fato tributado. Tanto é assim, que há previsão expressa no art.125 do CTN,
quanto à isenção ou remissão pessoal, o que desobriga aos demais responsáveis,
exatamente em virtude de existir uma pluralidade de relações. Nesse sentido é que
entendemos ser possível a aplicação da norma de solidariedade entre os

180 Para Alf Ross interesses são atitudes baseadas em necessidades, que impulsionam para a sua
realização , o que não acontece com as atitudes morais, destituídas de necessidade e portanto, de
interesses. ( ROSS, Alf. Direito e Justiça. São Paulo: Edipro:, 2003, p.409)
181CAMELO, Bradson Tibério Luna. Grupo Econômico de Fato. Revista Dialética de Direito

Tributário. São Paulo, n.170,p.16, nov.2009.


responsáveis tributários quando da prática de atos que configuram a hipótese de
responsabilidade como por exemplo, no caso de vários administradores
comuns de bens de terceiro que agem em conluio ( art.134,III).182
Talvez, por essas e outras situações, é que o legislador não tenha
cuidado de especificar as circunstâncias que envolvem o interesse comum das
pessoas envolvidas no fato jurídico tributário, posto que deverá ser visto caso a
caso,183 assim como tantas outras situações fáticas a serem examinadas para o
enquadramento em sua norma regente, pois, impossível esgotar a dinamicidade das
relações jurídicas.
Assim como também pensamos ser possível a aplicação da solidariedade
por interesse comum como previsto no art.124, I do CTN, entre a pessoa jurídica e
um dos sujeitos arrolados no art.135, III do CTN, mas tal ilação, importa realçar, a
partir da visão ampla do interesse jurídico como nos referimos acima, em que, nesse
caso o interesse comum e jurídico é configurado num plexo de relações envolvidas,
inclusive quanto à perspectiva de resultados únicos que beneficia a empresa
jurídica, assim como aos sócios. Esta ilação nada mais é que uma decorrência da
interpretação sistemática dos enunciados prescritivos do art.121, 124, 128 e 135, do
CTN, que não podem, sob pena de macular o verdadeiro sentido das normas, ser
interpretados cada um de per si.
Tal interpretação pode ser vista na doutrina de Paulo de Barros Carvalho,
ainda que sob uma justificativa diferente, pois o ilustre mestre considera as
hipóteses de responsabilidade previstas no CTN, como por nós aqui já realçado, tem
natureza de sanções administrativas,

(…) ele pode legislar criando outras relações, de caráter


administrativo, instituindo deveres e prescrevendo sanções. É
justamente aqui que surgem os sujeitos solidários, estranhos a
acontecimento do fato jurídico tributário. Integram outro vínculo
jurídico, que nasceu por força de uma ocorrência tida como

182 Assim também o posicionamento de Hugo Barreto Sodré Leal: “ (…) nos termos do art.124, I, do
CTN, entendemos que há solidariedade entre os responsáveis tributários que realizam conjuntamente
o suposto do fato que deu origem à sua responsabilidade(...).” ( Responsabilidade Tributária na
Aquisição de Estabelecimento Empresarial. São Paulo: Quartier Latin, 2008, p.88.)
183 Como ensina Hugo de Brito Machado: “ A existência de interesse comum é situação que somente

em cada caso pode ser examinada. A solidariedade, em tais casos, independe de previsão legal.
Nem pode a lei dizer dizer que há interesse comum nesta ou naquela situação, criando presunções.
Se o faz, o preceito vale por força do inciso Ii do art.124, que admite sejam consideradas
solidariamente obrigadas pessoas sem interesse comum. Mas haverá defeito de técnica legislativa,
que deve ser evitado. ( Curso de Direito Tributário..op.cit., p.146)
ilícita. A lei, estruturada para garantir a eficácia de suas
disposições, entrelaça os dois nexos obrigacionais, sugerindo,
à primeira vista, a existência de uma única relação, com dois
sujeitos que se aproximam pelas ligações de solidariedade
jurídica 184

Há no entanto, uma hipótese em que a solidariedade entre sujeitos


passivos é prevista, excluindo o interesse comum, quando expressamente
designada por lei, conforme previsto no art.124, II. É a chamada solidariedade de
direito.
Atendidos os limites estabelecidos na Carta Magna e nas normas gerais
do Código Tributário, quando o assunto é eleição de sujeitos passivos, inclusive o
solidário, o legislador não tem ampla discricionariedade, como anunciamos em
tópico anterior, e o pressuposto fundamental, é de que o terceiro eleito há que ter
relação indireta com o fato jurídico, ou direta ou indireta com aquele que praticou de
forma pessoal ou direta, e desde que não seja coincidente com as hipóteses
estabelecidas no CTN.
Sabemos que este pressuposto, só afastado em hipótese de
responsabilidade por tributo devido em decorrência da prática de ilícitos, é o que
assegura a repercussão do ônus tributário àquele que efetivamente praticou o fato
imponível.
Nesse diapasão é que o inciso II, do art.124, tem como destinatário o ente
político, atribuindo-lhe a competência ordinária de estabelecer vínculos de
solidariedade entre sujeitos passivos atendidos as balizas constitucionais e legais,
com a finalidade, dentre outras, de assegurar, viabilizar o recebimento do crédito
tributário.
Mesmo assim, importa observar que na hipótese de eleição de
responsáveis solidários185 com base nas hipóteses disciplinadas pelo CTN, não
poderá ser desgarrado os elementos subjetivos previstos, como o dolo, no art.137, e
a culpa, no mínimo, prevista para a responsabilidade dos sócios ou administradores
por infração à lei, na hipótese do art.135, III.

184CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário...op.cit., p.351.


185O art.723 do RIR/99 determina que “são solidariamente responsáveis com o sujeito passivo os
acionistas controladores , os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito
privado, pelos créditos decorrentes do não recolhimento do imposto descontado na fonte. Parágrafo
único. A responsabilidade das pessoas referidas neste artigo restringe-se ao período da respectiva
gestão, administração ou representação. “
Então podemos encartar duas diferenças básicas entre os dois
enunciados acerca da solidariedade. i. o traço distintivo do interesse comum, que
dispensa previsão em lei específica do tributo, e por outro lado, é por óbvio, excluído
quando a solidariedade for expressamente prevista em lei; ii. quando há o liame pelo
interesse jurídico na situação que constitua o fato gerador da obrigação tributária, a
atuação em conjunto faz nascer a solidariedade passiva plural, em regra, o que não
impede de se constatar um responsável solidário em momento posterior quando da
constituição do crédito tributário; enquanto na solidariedade prevista em lei, o evento
que coloca um terceiro como corresponsável solidário, pode por exemplo, ser um
fato totalmente estranho ao fato gerador, como na hipótese da prática de um ilícito
que obste a norma impositiva ou o seu conhecimento pelo Fisco acarretando a
obrigatoriedade para o contribuinte e o terceiro responsável, solidariamente e sem
benefício de ordem.
A partir das considerações feitas sobre a norma de solidariedade passiva
tributária, é que queremos trazer à tona mais uma questão: a aplicação dos
enunciados normativos, a nosso ver, são autônomos e suficientes, ou seja, para que
se configure a solidariedade entre os devedores do tributo, poderá ser diante do
interesse comum no fato jurídico tributado, como explicitado, ou introduzida por lei
ordinária, sem benefício de ordem, em qualquer caso.
A construção da regra sobre a obrigação solidária não acontece mediante
a obediência dos dois requisitos de modo cumulativo,186 pois, dessa forma não
haveria utilidade e esvaziaria de conteúdo um ou outro, nem tampouco significa que
considerando-se cada um individualmente, a previsão em lei ordinária seria de total
liberdade para estabelecer hipótese de sujeição passiva solidária, pois, conforme
destacamos, os pressupostos e limites para colocar no tópico da sujeição passiva,
um terceiro, não perde a sua fisionomia por se tratar de solidariedade, são
constitucionais e legais.
Como exemplo da exigência pelo ordenamento jurídico tributário do
inarredável atendimento aos preceitos constitucionais e legais no momento da
escolha do sujeito passivo e da situação fática que o coloca em conjunto com outras

186 De forma contrária pensa Daniel Monteiro Peixoto, para quem a obrigação solidária é moldada a
partir da aplicação cumulativa dos dois requisitos, um de ordem formal, a lei ordinária introdutória, e o
requisito material, pelo interesse comum no arquétipo da hipótese de incidência atada com os
critérios de relação jurídica solidária entre as pessoas autoras da conduta prevista na hipótese
(Responsabilidade Tributária e os Atos de Gestão...op.cit. p.250-251)
pessoas para responder pelo adimplemento do tributo, é que trazemos à baila o tão
controvertido e objeto de acirradas discussões art.13 da Lei n.8.620/93, 187 que
previa a responsabilidade solidária dos sócios nas sociedades por cotas de
responsabilidade limitada e dos que praticam atos de gestão para com outros tipos
societários por débitos junto a Seguridade Social.
O citado dispositivo além de ter sido revogado pelo art. 79, VII da Lei
n.11.941/2009 (conversão da Medida Provisória n.449, de 3 de dezembro de 2008),
foi objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal188 e declarada a sua
inconstitucionalidade por vício formal e material, o que se fez importante tendo em
vista que só a revogação, subsistiria a regra para o período anterior de sua vigência.
Ainda que retirado do ordenamento jurídico, importa tecer duas
considerações por serem relevantes em termo de solidariedade. A primeira diz
respeito ao fundamento da declaração de inconstitucionalidade: o vício formal - o
fato da norma de responsabilidade não ter sido veiculada por Lei Complementar nos
termos do art.146, III da CF/88 - e o vício material - por atribuir hipótese de
responsabilidade tributária objetiva dos sócios ao mesmo tempo e da mesma forma
que implica a desconsideração da personalidade jurídica societária.
A segunda questão é o entrelace entre a hipótese de solidariedade que
previa o art.13 da Lei 8.620/93 e o CTN, pois numa visão estreita, a sua
fundamentação seria exatamente no art.124, II, pela disposição expressa em lei, o
que, no entanto, seria um ledo engano, porque este dispositivo prevê a pluralidade
de pessoas no polo passivo da obrigação tributária expresso em lei, mas requer
obrigatoriamente, que tais regras, estejam afinadas às normas gerais que desenham
a arquitetura da responsabilidade de sócios e administradores, quais sejam, o
dispositivo geral do art.128, os arts.134, VII, 135, III e ainda em conjunto aos casos
de responsabilidade por infrações quando a ilicitude configurar crime ou
contravenção, hipóteses que preveem o elemento subjetivo para a configuração da
responsabilidade dos sócios, no mínimo a culpa, nos dois primeiros, e o dolo
específico ou elementar, na segunda.

187Art.13.
O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade limitada
respondem solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade Social.
Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes e os diretores
respondem solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento
das obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.
188 Nos autos do RE n.562.276 Rel. Min.Ellen Gracie, julgado em 3.11.2010 sob o rito de

Repercussão Geral pelo Tribunal Pleno e publicado no DJe. em 9.2.2011.


O fato é que lei ordinária ao instituir norma de responsabilidade com
relação aos débitos perante à Seguridade Social não poderia subverter o regime
jurídico estabelecido pelos enunciados prescritivos referidos, o que restou claro
diante da disposição sobre hipótese de responsabilidade solidária dos sócios com a
pessoa jurídica no caput, sem nenhuma prática de ilícito que a justificasse, no caso
de sociedades limitadas, enquanto que no parágrafo único responderiam de forma
solidária entre os que praticam atos de gestão ilícitos, por dolo ou culpa, mas de
forma subsidiária com relação à sociedade, no caso de S/A, por exemplo
E por fim, nesse ponto, acrescemos mais um aspecto de relevância: o
art.146, III da CF ao dispor sobre a competência de lei complementar, delegou a
atribuição de normas gerais em matéria tributária, notadamente na definição de
tributos e todos os aspectos atinentes à regra matriz de sua incidência, o que quer
dizer, que tal competência refere-se a conteúdo abrangente, condicionantes e
estruturantes, não específicos, apesar do CTN trazer o arquétipo da sujeição
passiva e da responsabilidade em minúcias, no entanto o ente político, ao dispor
sobre a espécie tributária na órbita de sua competência, pode esmiuçar os contornos
trazidos pelas normas gerais.
De forma bem simples: entendemos que a competência da lei
complementar vinculante a todas as pessoas políticas em matéria tributária, não
exclui a da lei ordinária, no revés, carece não raramente de sua integração, o que
nos faz crer que normas de responsabilidade tributária, seja pessoal ou excludente,
solidária ou subsidiária pode sim ser veiculada por lei ordinária do ente tributante,
desde que não desvirtuadas, não transgredidas as regras matrizes que o Código
Tributário Nacional189 no exercício de sua função precípua de harmonizar o sistema
tributário cravou como determinantes, tanto com relação ao conteúdo normativo,
como com relação aos parâmetros por ele definidos. O que não foi o caso do art.13
da Lei n.8.620/93.

189 Com relação, em específico, ao financiamento da Seguridade Social não exorbita demonstrar que
da interpretação conjunta do art.195, § 4° e do art.154,I, ambos da CF/88, observa-se que a
exigência de lei complementar é expressa, para o exercício da competência residual da União para
criação de novas fontes de custeio, ou seja, para além das previstas nos incisos I a IV do art.195 da
CF, e dentre estas, inclusa está a contribuição previdenciária, tributo objeto da obrigação solidária
prevista na Lei 8.620/93 e retirada do ordenamento jurídico.
Quanto aos efeitos da solidariedade na relação jurídica tributária, o CTN
as prevê expressamente ( art.125), excetuando disposição em contrário, se prevista
em lei.
A primeira consequência é a de que o pagamento integral da obrigação
feito por um obrigado aproveita aos demais, o que consiste numa decorrência
natural da natureza civil solidária, não podendo dessa forma o Fisco demandar
nenhum outro componente do polo passivo da obrigação tributária.
A isenção ou remissão objetiva do tributo aproveita a todos os devedores,
exceto se concedidas em caráter subjetivo, quando não faz parte dos elementos que
envolvem o próprio fato jurídico tributário, e assim terão caráter pessoal, onde o
sujeito é isento ou remido de sua fração, pois para esses a obrigação tributária
inexiste, ao mesmo tempo em que não pode ser cobrado pela fração cabível aos
demais, que por reflexo faz subsistir a coobrigação para e entre os demais sujeitos
passivos na proporção em que a situação material for imputável a essas pessoas. 190.
Importa aqui destacar que este efeito tem aplicação diferente se a
solidariedade é por interesse comum, ou por disposição de lei. Na primeira hipótese,
estamos tratando de solidariedade paritária, onde a comunhão de pessoas, por
interesse jurídico, praticam direta ou indiretamente, o fato gerador do tributo e nesta
trilha a regra de efeito cabe, sem problemas. No entanto, se a hipótese for de
responsabilidade dependente, em que a lei atribui um terceiro responsável como
solidário, se a regra de isenção ou remissão for pessoal do responsável, subsistirá a
obrigação do devedor principal, mas no revés, se for concedida ao devedor principal,
a obrigação dependente do responsável, por reflexo também não mais existirá. 191

Por fim, como último efeito previsto pelo legislador complementar, é o da


interrupção da prescrição nas obrigações solidárias, em que no caso, ainda que
ocorrido com relação a apenas um dos devedores implica a interrupção da
prescrição com relação aos demais. Da mesma forma, quando a interrupção da
prescrição for em favor de um dos obrigados, beneficia a todos os solidários.

190. AMARO, Luciano. Curso de Direito...op.cit., p.343


191Idem, Ibidem.p. 345. Luciano Amaro exemplifica: (…) “ Se “A” pratica certo fato ( em regra previsto
como gerador de obrigação) e a lei indica terceiro como responsável solidário, em razão de certo
vínculo com a situação material em que traduza o fato gerador, o terceiro só é devedor da obrigação
na medida em que “A” também seja, efetivamente, devedor. Uma norma isencional que venha a
desqualificar o fato como gerador de obrigação ( ainda que levando em conta condições pessoais de
“A”) não deixa espaço para a responsabilidade do terceiro. (...)
Diante das considerações até aqui expostas sobre a solidariedade nas
obrigações tributárias é que partimos para análise da responsabilidade tributária de
sociedades que integram grupo econômico, de fato e de direito, organizados sob a
égide das normas do direito positivo, para no capítulo seguinte, enfim, tratarmos da
situação em que há o agrupamento de sociedades em organizações empresariais,
atuando à margem da lei, de forma ilícita, em que são configurados o abuso de
poder e o desvio de finalidade.
A intenção é demonstrar de que modo é imputada a responsabilidade
pelo tributos devidos decorrentes dessa atuação ilícita, a quem, e de que forma se
posicionam os devedores com relação ao tributo devido.

4.3 Grupo econômico: responsabilização tributária

A análise do art.170 da CF deixa claro que os fundamentos da atividade


econômica estão, dentre outros, na valorização do trabalho humano, na livre
iniciativa e na liberdade de concorrência, que demonstram, por sua vez, a exigência
de que as empresas192 devam cumprir a sua responsabilidade social.
São princípios consagrados pelo direito positivo como proteção àqueles
que queiram realizar atividades econômicas193 lícitas através de empresas para
atuarem individualmente, ou por meio de várias que agrupam-se em prol dos seus

192 A empresa por ser um fenômeno amplo e de estrutura complexa, atua como agente de produção e
de circulação de bens e serviços para o mercado, ganhando cada vez mais relevância como
fenômeno jurídico, o que acarretou a inserção no Código Civil de 2002 de regras quanto à estrutura,
funcionamento, natureza, sócios e suas responsabilidades, através do Livro Direito de Empresa. A
concepção de empresa e a sua função ressalta como seus elementos principais, o empresário, o
estabelecimento e a atividade organizada. São precisas as palavras de Waldírio Bulgarelli sobre a
concepção de empresalidade sob a perspectiva jurídica: “ o empresário, como agente responsável e
titular do exercício profissional da atividade econômica organizada; o estabelecimento, como objeto,
para o fim de reconhecer o complexo de bens organizados pelo empresário na sua unidade e ditar
um regime de circulação e de negócios jurídicos; e , a empresa, concebida como atividade econômica
organizada, ou exercício profissional de atividade econômica organizada, e qualificada como fato
jurídico servindo como elemento qualificador do sujeito e do objeto.”(Tratado de Direito Empresarial.
São Paulo: Atlas, 1997.p.108-109)
193 Nos termos do art.966 do CC, “empresário é quem exerce profissionalmente atividade econômica

organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços, excluindo-se quem exerce


profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares
ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento da empresa.” Para o nosso
trabalho, trataremos do conceito de empresário ligando-o somente às pessoas jurídicas, e por isso
excluídos a pessoa física e as atividades não empresariais. Adotamos assim a importância da Teoria
da Empresa, “ voltada para a organização dos fatores de produção que proporcionam a circulação de
bens e serviços, com vistas ao lucro”. ( PORTUGAL, Heloísa Helena de Almeida e RIBEIRO, Maria
de Fátima. A Atuação do Fisco e o Atual Conceito de Empresa. In Direito Tributário e o Novo
Código Civil. Grupenmacher ,Betina Treiger (coord.) Quartier Latin. 2004, p.420.
objetivos através das movimentações societárias permitidas, como fusão,
incorporação ou grupos de sociedades.
Por sociedade, consideramos no nosso trabalho, a pessoa jurídica
organizada para o exercício de uma atividade em que há a convergência de
esforços, bens ou serviços, com vistas a obtenção de um resultado, constituídas sob
as regras do ordenamento, bem como aquelas, que ainda que não cabíveis na
moldura do ordenamento, por atuarem ilicitamente, estão configuradas como
atividade economicamente organizada para a produção ou a circulação de bens ou
serviços, uma ilação que decorre, além das situações fáticas observadas pelas
organizações empresariais atuais, do próprio alargamento do conceito de empresa e
empresário com o advento do Direito de Empresa no Código Civil.
Especificamente quando o tema é grupo de sociedades, duas nuanças o
reveste de imediato: a independência jurídica de seus integrantes e a unidade de
direção,193 que decorre da autonomia da vontade e da liberdade de contratar, dentre
outros fatores.
O ordenamento jurídico brasileiro admite duas possibilidades para que as
sociedades constituam grupos: com base nas relações societárias que possuem (
art.1.097 CC c/c arts. 243 a 264 da Lei n. 6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas
LSA), ou formalmente pela convenção entre as sociedades ( arts. 266 e 271 - LSA).
São denominados pela doutrina: grupo de fato e de direito, respectivamente.
No primeiro, o grupo de fato, quando há a união entre sociedades
coligadas com o percentual mínimo de 10% (dez por cento) do capital social da
outra, havendo também possibilidade de uma sociedade controladora possuir
unidade de direção, ( 1.098 CC) que lhe garanta a atribuições decisórias e
preponderância nas deliberações da sociedade.
No grupo de direito, cabe às sociedades que o constitui deliberarem na
convenção do grupo sobre a quem compete a unidade de decisões, as atribuições
dos órgãos de administração e as relações entre a administração do grupo e as
demais sociedades. ( art.269 LSA).
Nesse contexto, importa observar que a direção unitária é sob a
perspectiva jurídica, a outorga de competência a um órgão ou sociedade, típico dos

193
ANTUNES, José Augusto Q.L. Engracía. Os Grupos de Sociedades: Estrutura e Organização
Jurídica da Empresa Plurissocietária. Coimbra: Almedina, 1993, p 25-26.
grupos de coordenação,194 onde as várias sociedades se unem em torno de uma
direção econômica, mas a independência entre as sociedades é mantida, a
autonomia jurídica e econômica, pois cada uma mantém sua personalidade jurídica
e seu patrimônio, individuais.
Enquanto nos grupos em que há subordinação, a direção na mesma
perspectiva, cabe a uma das sociedades que em geral é a controladora e se situa
numa posição hierárquica superior sobre as demais sociedades do grupo195, no
entanto há também a independência e a autonomia jurídica, personalidade e
patrimônio individualizados e inclusive respondendo cada uma por suas obrigações,
sem presunção de solidariedade ( art.278, §1° LSA), exceto se do contrário, houver
disposição em lei.
Cabe um hiato para aclarar um aspecto importante: a competência na
tomada de decisões nos grupos de sociedades é elemento de relevância no intuito
de analisarmos se tal atuação dependo do poder de ingerência dessa tomada de
decisões sobre as demais sociedades, pode ou não ser vinculada à
responsabilidade por obrigações tributárias.
Ainda que estejamos na esfera dos grupos econômicos regularmente
constituídos, em exercício lícitos de atividades econômicas, cabe tecer uma
importante diferença com relação à tomada de decisões estratégicas e a conexão
com a responsabilidade por obrigações tributárias de um órgão diretivo ou sociedade
coligada, no grupo de fato, ou pela controladora, no grupo de direito.
Eis a questão: em alguns grupos de sociedades o órgão diretivo ou
sociedade controladora terá competência para tomar decisões estratégicas fixando
diretrizes empresariais dirigidas a um fim econômico comum ao grupo, cabendo a
cada uma das sociedades o poder de decisão sobre a realização ou não de
operações e negócios jurídicos, ou seja, a vinculação está restrita às estratégias
gerais, ou seja, há o centro de decisões mas não há o controle direto das atividades
exercidas pelas sociedades integrantes do grupo. Nesse caso não há uma
vinculação ou uma comunhão na prática dos fatos jurídicos e nem à obrigação
surgida, e de forma específica com relação à obrigação tributária, não há é possível
a imputação de responsabilidade à todas as empresas envolvidas por faltar
pressuposto exigido expressamente no art.124 e no art.128 do CTN.

194 Idem, Ibidem. p.53


195 Idem, Ibidem. p.54
Noutras espécies de grupos, o órgão de tomada de decisões ou a
sociedade controladora que detém o poder de tomar decisões estratégicas, mantem
o controle sobre as outras empresas, interferindo na decisão da prática das
operações e dos negócios jurídicos, administrando inclusive, as obrigações deles
decorrentes, como o pagamento de tributos e o cumprimento ou não de obrigações
acessórias. As empresas desse tipo de grupo têm uma autonomia diferida ou
disfarçada, pois o exercício de sua atividade é atado por quem controla. Nesse caso
, há uma vinculação ao fato gerador da obrigação por quem controla a prática de
atividades da empresa, e portanto, há a possibilidade de imputação de
responsabilidade tributária entre as empresas componentes do grupo e à que
compete o centro de decisões.

Importante o raciocínio Frederico Menezes Breyner sobre o assunto


quando escreve:

Em conclusão, cabendo ao centro decisório a decisão pela


realização de atos ou negócios jurídicos e pelo cumprimento
das obrigações tributárias dele decorrentes, é possível a
eleição das sociedades que intervêm na direção unitária nos
termos da convenção do grupo ou da sociedade controladora
como responsáveis tributários, desde que haja disposição
expressa de lei nesse sentido.196

196 BREYNER, Frederico Menezes. Responsabilidade Tributária das Sociedades Integrantes de


Grupo Econômico. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 187.abril.2011,
p.75. Nos alinhamos com o pensamento do autor quanto aos pressupostos fáticos para a
configuração do grupo econômico e dos efeitos relativos à responsabilidade tributária. No entanto,
defendemos que, data venia, quanto aos efeitos reflexos dessa responsabilização, só poderá assim
ser considerado, se, e somente se, a atuação econômica da organização for lícita. Vale a citação:
“(...) temos que a vinculação se dá apenas em relação aos fatos geradores que consistem em atos ou
negócios jurídicos cuja realização for efetivamente decorrente de decisão da direção unitária, e não a
fatos geradores que possam se configurar, economicamente, como consequências destes, como é o
caso do lucro e do faturamento,” e acrescentamos, desde que a disposição de lei refira-se tão
somente a uma especie tributária.” (Idem, Ibidem.p.76). No revés, se a organização estiver atuando
de forma contrária das regras tributárias e societárias, não guarda coerência com o que fundamenta a
responsabilização nesse sentido, ou melhor, atuando de forma abusiva e fraudulenta, pensamos ser
diferente, o que quer dizer que, em decorrência do controle de tomada de decisão de um órgão
diretivo ou de uma controladora, várias empresas do grupo praticam, por exemplo, a produção e
comercialização de um bem conjuntamente e alinhado a todos os elementos fáticos que citamos
necessários para a configuração do grupo econômico, não vemos justificativa bastante para ser
diferenciada a imputação de responsabilidade solidária a todas as empresas, pelo tributo devido com
relação à comercialização do produto – ICMS e no momento do lucro auferido pelas empresas, efeito
tão somente à atividade econômica, a responsabilidade ser somente da empresa submetida ao
controle, não guarda lógica positiva, nem tampouco tal ilação realiza a igualdade e a justiça fiscal.
Mas , sobre isso, cuidaremos melhor, no próximo capítulo.
Por esta razão é que a disposição expressa de lei é requisito
indispensável para imputar responsabilidade tributária diante das organizações
lícitas de atividade econômica, não por pertencer a um grupo econômico, posto que
a partir das considerações feitas acima, isto por si só, não é suficiente, sendo
necessário a atuação das empresas sob a coordenação, o controle de tomada de
decisões negociais destinadas a um objetivo comum e das consequências surgidas,
e dentre essas, o não pagamento do tributo decorrente de tais práticas, para que
esteja atada a responsabilização das sociedades pelos tributos devidos a partir dos
fatos jurídicos praticados.
Nesse diapasão, é que pensamos que deve ser a interpretação do art.30,
IX, da Lei n.8.212/1991 - Lei de Custeio da Seguridade Social, quando prevê a
solidariedade197 para empresas que integram um grupo econômico referentes às
contribuições discriminadas na lei e para a eficácia da norma e no mesmo grau, para
subsista a sua validade, insta que receba a interpretação sistemática que o
compatibilize com o ordenamento jurídico.198
Não basta a previsão expressa e tampouco pertencer a grupo econômico,
requer a convergência de indícios e de elementos fáticos e a fundamentação da
imputação deverá estar descrita de forma pormenorizada nos relatórios dos autos
devidamente atreladas à produção de provas,199 cujo ônus, nesse caso é da
Fazenda Pública ( arts.142 e 149 do CTN). A previsão expressa em lei de
solidariedade tributária, repisamos, tem que estar nos desenhos do art.128 do CTN,
ou seja, a vinculação entre pessoas que realizam o fato gerador é o maior traço.
Cabe o realce do que ensina Wladimir Novaes Martinez, quando o
assunto é configuração de grupo econômico:

197Art.30 A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à


Seguridade Social obedecem às seguintes normas.( redação dada pela Lei n.8620/1993) (…) IX – as
empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem entre si, solidariamente,
pelas obrigações decorrentes desta Lei.”
198 Renato Lopes Becho ensina que a interpretação do citado dispositivo que venha a garantir sua

constitucionalidade é no sentido de ser imprescindível que as empresas envolvidas do mesmo grupo


econômico tenha atuado conjuntamente, de alguma forma, para permitir que o fato gerador em
concreto tenha ocorrido.( A Responsabilização Tributária de Grupo Econômico .Revista Dialética de
Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 221.fev. 2014., p.75)
199Tanto é verdade que a Administração Tributária demonstra cada vez mais preocupação com a

produção de provas nos lançamentos fiscais em que há pluralidade de sujeitos passivos, que no
âmbito federal está disciplinado na Portaria n° 2.284, de 29 de novembro de de 2011, expedida pela
Secretaria da Receita Federal do Brasil.” Art.2°”Os Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, na
formalização da exigência, deverão, sempre que, no procedimento de constituição do crédito
tributário, identificarem hipóteses de pluralidade de sujeitos passivos, reunir as provas necessárias
para a caracterização dos responsáveis pela satisfação do crédito tributário lançado.”
Grupo econômico pressupõe a existência de duas ou mais
pessoas jurídicas de direito privado, pertencentes às mesmas
pessoas, não necessariamente em partes iguais ou coincidindo
os proprietários, compondo um conjunto de interesses
econômicos subordinados ao controle do capital. (…) O
importante, na caracterização da reunião dessas empresas, é o
comando único, a posse de ações ou quotas capazes de
controlar a administração, a convergência de políticas
mercantis, a padronização de procedimentos e, se for o caso,
mas sem ser exigência, o objetivo comum.200

A jurisprudência, ainda que às vezes destoante, tem caminhado nesse


rumo, e a título de exemplo, demonstramos a decisão em que a imputação de
solidariedade tributária pelo mero status de pertencer a grupo econômico, não
guarda a proteção do ordenamento jurídico.

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.


ISS. EXECUÇÃO FISCAL. LEGITIMIDADE PASSIVA.
EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO.
SOLIDARIEDADE. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 535
DO CPC. INOCORRÊNCIA. 1. A solidariedade passiva ocorre
quando, numa relação jurídico-tributária composta de duas ou
mais pessoas caracterizadas como contribuintes, cada uma
delas está obrigada pelo pagamento integral da dívida. Ad
exemplum, no caso de duas ou mais pessoas serem
proprietárias de um mesmo imóvel urbano, haveria uma
pluralidade de contribuintes solidários quanto ao adimplemento
do IPTU, uma vez que a situação de fato – a co-propriedade –
é-lhes comum. [...] 7. Conquanto a expressão “interesse
comum” – encarte um conceito indeterminado, é mister
proceder-se a uma interpretação sistemática das normas
tributárias, de modo a alcançar a ratio essendi do referido
dispositivo legal. Nesse diapasão, tem-se que o interesse
comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação
principal implica que as pessoas solidariamente obrigadas
sejam sujeitos da relação jurídica que deu azo à ocorrência do
fato imponível. Isto porque feriria a lógica jurídico-tributária a
integração, no polo passivo da relação jurídica, de alguém que
não tenha tido qualquer participação na ocorrência do fato
gerador da obrigação. [...] 9. Destarte, a situação que evidencia
a solidariedade, quanto ao ISS, é a existência de duas ou mais
pessoas na condição de prestadoras de apenas um único
serviço para o mesmo tomador, integrando, desse modo, o
polo passivo da relação. Forçoso concluir, portanto, que o
interesse qualificado pela lei não há de ser o interesse
econômico no resultado ou no proveito da situação que
constitui o fato gerador da obrigação principal, mas o interesse
jurídico, vinculado à atuação comum ou conjunta da situação

200
MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentários à lei básica da previdência social, tomo I. São
Paulo: LTR, 2010.p. 446.
que constitui o fato imponível. [...] 11. In casu, verifica-se que o
Banco Safra S/A não integra o polo passivo da execução, tão
somente pela presunção de solidariedade decorrente do fato
de pertencer ao mesmo grupo econômico da empresa Safra
Leasing S/A Arrendamento Mercantil. Há que se considerar,
necessariamente, que são pessoas jurídicas distintas e que
referido banco não ostenta a condição de contribuinte, uma vez
que a prestação de serviço decorrente de operações de leasing
deu-se entre o tomador e a empresa arrendadora. 13. Recurso
especial parcialmente provido, para excluir do polo passivo da
execução o Banco Safra S/A. (STJ, Resp 884.885/SC, 1ª
Turma, Rel. Min. Luiz Fux, Data do julgamento 05.02.09)201

Em suma: para que haja a responsabilização por tributos devidos entre


empresas que integram grupos econômicos, de fato e de direito, é imprescindível a
fundamentação legal( art.124, II do CTN) em conjunto com o pressuposto de
vinculação ao pressuposto de fato da regra matriz de incidência ( art.128 do CTN)
juntos aos elementos fáticos que comprovam a dependência administrativa e
econômica, na tomada de decisões, sobre a prática do fato gerador do tributo, e o
cumprimento ou não da obrigação tributária, principal e acessória.
Afastada esta hipótese, na sera tributária, só é cabível a imputação de
responsabilidade tributária e solidária entre pessoas jurídicas por fatos jurídicos
praticados por outras pertencentes ao mesmo grupo econômico, se comprovado o
interesse comum das pessoas jurídicas no fato jurídico tributário ( art.124, I do CTN)
ou pela prática de ato fraudulento ou simulado, abuso da personalidade jurídica,
esvaziamento do patrimônio da pessoa jurídica ou ainda pelo desvio de finalidade
previstos nos atos constitutivos da sociedade. Sobre esse tema é o nosso debruçar
no último capítulo desse trabalho.
No entanto, importa agora tratarmos da análise sistêmica do conteúdo
normativo das regras prescritivas que versam sobre a responsabilidade do sócio ou
administrador das sociedades empresariais, a partir das notas introdutórias trazidas
sobre a natureza jurídica e características que envolvem as hipóteses de imputação
de responsabilidade tributária a tais sujeitos.

201 STJ, Resp 884.885/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, Data do julgamento 05.02.09
4.4 A responsabilidade tributária do sócio ou administrador: interpretação e
alcance do art.135, III – CTN

Do ponto de vista jurídico a personalidade das sociedades 202 não se


confunde com a dos seus sócios, e este fato é ponto pacífico na doutrina e na
jurisprudência, assim como são separados o patrimônio da sociedade e o patrimônio
pessoal dos sócios.
É a regra geral em matéria tributária também. No entanto, em caráter
excepcional, o CTN, nos arts.134, VII e 135, III, dispõe sobre a responsabilidade dos
sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas e dos sócios ou
administradores diante da prática de atos com excesso de poderes, infração de lei,
contrato social ou estatuto, respectivamente.
O enunciado do art.135, III203 é o nosso objeto de estudo principal, pois a
partir dessa análise interpretativa é que alcançaremos as conclusões finais sobre a
responsabilidade da pessoa jurídica204 e dos seus sócios e administradores diante
de práticas ilícitas empresariais.
A hipótese de responsabilidade tributária como vimos, pode ser em
decorrência de atos lícitos ou ilícitos, e com base nesses últimos é que o legislador
complementar previu a hipótese de ser imputada responsabilidade tributária ao sócio
ou administrador pelos tributos devidos pela pessoa jurídica em decorrência da
prática de tais atos, que cabe afirmar, não se confundem com a prática de fatos
jurídicos tributários.
Cabe destacar que como regra geral, na sociedade limitada, por exemplo,
a responsabilidade dos sócios é limitada ao valor de sua participação subscrita no

202 Sobre a pessoa jurídica, o patrimônio e a limitação da responsabilidade falaremos no próximo


capítulo, com ênfase nas notas gerais da responsabilidade no caso das sociedades limitadas e nas
sociedades anônimas, por serem mais usuais nas organizações empresariais econômicas.
203 Art.135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes às obrigações tributárias

resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos.
I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos ou empregados
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
204 A importância que a dogmática jurídica atribui à diferença entre a noção de pessoa física ou

jurídica é no sentido de que a primeira como pessoa natural e a segunda como uma ficção jurídica,
as duas assumem sua personalidade jurídica no sentido pelo qual ao direito importa que cada uma
represente um centro de atribuições, ações ou omissões, direitos e deveres.
capital social, ainda que não integralizado,205 o que se amolda de forma perfeita à
proteção que o ordenamento jurídico dá à livre iniciativa e à atividade econômica,
pois de outra forma, ninguém se submeteria ao risco inerente à atividade
empresarial, em que o empresário costuma ser remunerado em virtude e
linearmente ao retorno do investimento feito.
É de clareza meridiana o caráter sancionatório da norma, demonstrando
a preocupação do legislador em imputar responsabilidade ao sócio ou administrador
( aqui considerados os gerentes, diretores ou representantes) e desconsiderar a
separação patrimonial, apenas quando estiverem presentes atos ilícitos praticados
com no mínimo culpa ou o dolo.
O dispositivo é alvo de divergências doutrinárias e jurisprudenciais,
notadamente quanto a três aspectos essenciais: i. a interpretação literal da norma
que traz a regra de responsabilidade pessoal; ii. o alcance ou não somente do sócio
ou administrador que possua atos de gestão;iii. A possibilidade de extensão em
determinadas situações da responsabilidade para a pessoa jurídica.
Na tentativa de desenvolver cada item supracitado, importa primeiro
deixar claro, que estamos diante de uma fato complexo, em que há a comunhão de
um ato com excesso de poderes ou ato ilícito (norma secundária que imputa a
responsabilidade) com o fato jurídico tributário praticado ( norma básica que institui a
obrigação tributária) em virtude do nexo causal entre a prática do ilícito e o fato
tributado.
Essa é a maneira mais recorrente na doutrina de interpretação do
dispositivo206, ou seja, a prática de atos ilícitos pelo gestor da sociedade e contrário
aos interesses dessa, dando causa à obrigação tributária.
Nesse sentido usual do enunciado da norma e em qualquer outro, na
verdade, torna-se de extrema relevância que sejam identificados os atos de gestão
que foram praticados de forma ilícita e contrária aos interesses da sociedade. Por

205 A diferença entre capital subscrito ou integralizado, é que o primeiro se refere à promessa e o
comprometimento do sócio com relação à sua participação na sociedade conforme contrato social, e
o segundo representa a quantia que efetivamente foi disponibilizada, entregue para a sociedade.
206 Nesta linha de interpretação Mizabel Derzi explica os pressupostos para aplicação do art.135:(i)a

prática dolosa de um ato ilícito; (ii) o ato ilícito violador de normas que regem a relação entre o
contribuinte e o terceiro responsável, praticado contrariamente aos interesses daquele que seja
externo à norma tributária em sentido estrito; e (iii) a atuação conjunta da norma básica, que institui a
obrigação tributária em sentido estrito, e da norma secundária ( constante no dispositivo em questão,
determinadora da responsabilidade tributária.) ( Nota de atualização, in BALEEIRO, Aliomar. Direito
Tributário ...op.cit., p.757)
outro lado, é notável que o destinatário legal do enunciado da norma é aquele que
tem poder de administração, comando e prática de atos negociais da empresa, seja
como sócio, ou como administrador, que pode estar incluído o diretor, o gerente ou a
pessoa que tenha poderes de representação da sociedade, tudo nos contornos de
suas atribuições previstas no contrato social das sociedades de responsabilidade
limitada ou no estatuto social das sociedade anônimas.
Dessa forma, a conduta que desencadeia a responsabilização do sócio ou
administrador com poderes de gestão, não é tão somente uma conduta que externa
às suas atribuições, mas que seja caracterizada como abusiva e contrária à lei ou
aos atos constitutivos da sociedades, como também à própria lei tributária, o fato é
que em qualquer das hipóteses, deve ser praticada com o elemento volitivo, o dolo,
a má-fé, ou a fraude, que vem a dar causa à obrigação tributária ou mesmo de
impedir a positivação da norma de incidência tributária.
Pois é pacifico hoje na jurisprudência que o simples inadimplemento da
obrigação tributária pelo contribuinte, que é a pessoa jurídica, não caracteriza
infração à lei e não acarreta a responsabilidade pessoal do sócio ou administrador,
que por sua vez, não pode ter o redirecionamento da execução fiscal para si, se não
deu causa, nem ter seu nome inserido no polo passivo da Certidão de Dívida
Ativa207 sem o devido processo legal, em que seja garantido o contraditório e a
ampla defesa.
Ainda com referência às decisões dos tribunais, em específico o Superior
Tribunal de Justiça, tem aplicado a hipótese de responsabilização pessoal dos
sócios prevista no art.135 do CTN no caso de dissolução irregular da pessoa
jurídica208, ainda que o feito não guarde conexão com o fatos jurídico tributário,
cabendo o ônus da prova de que não incorreu nas hipóteses legais aos que estão
sendo responsabilizados, configurando mais uma forma o animus puniendi do
legislador e sendo a temática já pacificada pelo enunciado da súmula n°435, do
Tribunal Superior.209

207 Nesse sentido: STJ, Resp 656860/RS, 2ª Turma, j.16.08.2007, Rel. Min. Eliana Calmon
208 Chamada de dissolução de fato, quando não são feitas as formalidades exigidas em lei para
implicar o encerramento das atividades empresariais.
209 STJ, Agravo Regimental no Agravo n° 1.345.913/RJ, 1ª Turma, Rel.Min.Arnaldo Esteves Lima,

julgado em 4.10.2011, DJe de 13.10.2011; O teor da súmula n° 435: “Presume-se dissolvida


irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicilio fiscal, sem comunicação aos
órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal par o sócio-gerente”.
De todo o exposto na interpretação do artigo legal, podemos concluir que
somente responderão de forma pessoal ou exclusiva se praticarem atos com
excesso de poderes, infração ao contrato social ou estatuto, ou ainda infração à lei,
os sócios ou administradores que possuem ordem diretiva nos atos negociais da
pessoa jurídica, e dessa forma devem responder pessoalmente e de forma direta,
uma vez que agiram contra os interesses do contribuinte, transgredindo a relação de
confiança com aquele e com a Administração Tributária, e esta por outro lado, se
não verificadas as infrações cometidas e a conduta dolosa daqueles, estará agindo
de forma arbitrária´podendo até ensejar a responsabilidade civil do Estado, e de
suportar o direito de regresso.
Nessas situações a responsabilidade é pessoal ou excludente do sócio ou
administrador que agiu de forma dolosa ou fraudulenta, com infração à lei, o que não
raro, acontece em grandes organizações empresarias, notadamente na forma de
sociedades anônimas, que possuem um grande número de acionistas, que na
realidade são todos sócios, mas o poder diretivo, de comando e de gestão
patrimonial, administrativa e financeira está restrito àqueles são detentores ou de
maior numero de ações ou que representam o maior valor patrimonial, e agem com
base em seus interesses, lesando a pessoa jurídica e os demais sócios.
Ora, de um fato jurídico podem advir diversas relações, e da mesma
forma acontece com um ato ilícito, como por exemplo, a hipótese de um ou mais
sócios de uma pessoa jurídica resolverem extrapolar suas atribuições no contrato ou
estatuto social ( infração à lei societária e civil) , desviar a finalidade do objeto social
da empresa( violação ao contrato social ou estatuto) e passar a comercializar
produtos contrabandeados ( ilícito penal) e dessa forma obtém o resultado
econômico positivo acrescendo o seu patrimônio( fato jurídico tributário).
Ou seja , a responsabilidade será imputada ao membro da sociedade
quando o fato jurídico tributário também constituir um ilícito 210 excesso de poderes
ou violação ao contrato ou estatuto social e nesse caso a interpretação que melhor
atende aos valores que justificam as normas que tratam de responsabilizar um
terceiro pelo tributo devido em decorrência de um ato praticado e pelo seu desvalor
ou valor negativo juridicamente, nada mais coerente, do que a responsabilidade

210MARQUES, Leonardo Nunes. A Responsabilidade dos Membros da Sociedade Limitada pelas


Obrigações Tributárias e o Novo Código Civil. Revista Dialética de Direito Tributário. São paulo:
Dialética, n° 111. dez.2004. p.70
pessoal e exclusiva desses sujeitos e por esses motivos, não achamos que a
sociedade tenha a obrigação de arcar com o pagamento do tributo devido junto com
aqueles, nem de forma solidária, nem subsidiária.211
Parece-nos que, de início, a intenção do legislador foi essa e a sua
melhor leitura é a de que a norma é sancionadora ao atribuir a responsabilidade
integral e exclusivamente àqueles que com poderes de gestão, optaram pela prática
ilícita de atos e como decorrência, não há fundamento para a exigência da obrigação
tributária da pessoa jurídica. Nesse caso o infrator paga por débito próprio e sem
direito de ação de regresso porque agiu contra os interesses da pessoa jurídica e
para além disso, causando dano pela conduta ilícita.
No entanto, esta é uma possibilidade interpretativa de construção da
norma atenta estritamente apegada à literalidade do teor verbal do art.135, caput, do
CTN, cabível somente quando há a comunhão dos pressupostos que citamos e sem
perder de vista o resultado que comina no surgimento da obrigação tributária em
virtude da atuação do sócio ou administrador pelo descumprimento de dever jurídico,
ou seja, o fator causal.
Mas, a nosso ver, a hipótese de responsabilidade sobre a qual, ora nos
debruçamos, cabe outra interpretação, a partir da sua integração e conjunção a
outros enunciados para a melhor construção da norma no sentido de abarcar as
condutas ilícitas das empresas unidas em grupos econômicos irregulares e criadas
por interpostas pessoas, situações cada vez mais usuais na atuação empresarial.

211Há também controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a caracterização da responsabilidade


prevista no art.135, III. Pensamos, que para esta circunstância é a melhor interpretação para o
dispositivo, como defende Aliomar Baleeiro e Ives Gandra da Silva Martins, que citamos as lições,
nessa ordem.” O caso, diferentemente do anterior, não é apenas de solidariedade, mas de
responsabilidade por substituição. As pessoas indicadas no art.135 passam a ser os responsáveis ao
invés do contribuinte” ( Direito Tributário..op,cit., p.435) e “ O elemento, todavia, fundamental, a
nosso ver, reside no fato de cuidar o artigo de atos praticados de forma dolosa contra os interesses
dos contribuintes representados, com o que houve por bem o legislador considerar responsável não
os representados, mas exclusivamente os representantes.(...)Sob este aspecto, parece-nos sadia a
orientação legislativa em tornar para estes casos: a) pessoal; b) total e c) exclusiva a
responsabilidade de pessoas físicas, enunciadas no referido artigo, sempre que o dolo, a fraude e a
má-fé forem os agentes deflagradores das obrigações tributárias.” (MARTINS, Ives Gandra da Silva.
Responsabilidade tributária – Conselho de Administração que não praticou atos de gestão –
Inaplicabilidade do artigo 135 do CTN à hipótese – Outras questões processuais. Revista Dialética
de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, n.27.1997.p.144.) Em sentido oposto é a convicção de
Hugo de Brito Machado ao defender que a pessoa jurídica não foi excluída do polo passivo pelo
legislador, uma vez que não o previu expressamente, assumindo junto com os diretores, gerentes ou
representantes a obrigação pelo tributo devido. (Curso de Direito ...op.cit., p.170)
4.5 Contextualização da responsabilidade dos administradores: necessidade
de integração do art.135, III por outros enunciados prescritivos

Lembra-se, no entanto, que o foco da análise interpretativa do dispositivo


legal pode tomar outo norte, dentre outros, como por exemplo: i. o não recebimento
do crédito tributário pela Fazenda Pública em virtude do ilícito praticado pelos sócios
ou administradores em benefício da empresa e pela utilização desta, em conjunto à
impossibilidade de recebimento do valor pelo esvaziamento do patrimônio da
sociedade, ou como comum na praxe fiscal, “pelo trânsito do lucro auferido na
atividade empresarial através da pessoa jurídica, por atuação dos seus sócios ou
administradores e escoado em prol dos reais beneficiários da atividade ilícita”.
Indaga-se: quem é o responsável tributário.
Aqui, é que a atuação do intérprete na construção da norma jurídica
veste-se no manto da perspicácia, da integração das normas com vistas a moldar a
diversidade da situação fática à regra, ao sentido daquela extraído
sistematicamente, sem no entanto mudar sua fisionomia jurídica e para isso, muitas
vezes é preciso o trânsito por diversos segmentos de enunciados prescritivos do
direito positivo.211
Nesse diapasão é que a interpretação do art.135, III, precisa de
temperamentos, para ser atrelada a outros dispositivos, para termos o alcance maior
da norma, nas situações em que aquele que tem poderes de gestão, de decisão dos
atos negociais que podem gerar a obrigação tributária ou criar obstáculos à
positivação da regra matriz de incidência, ou ainda causar o inadimplemento
daquela, aliado à insolvência da empresa estão atuando ainda que com infração à
lei, mas com base em interesses comuns e em benefício também da sociedade.
Com relação aos atos com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato ou estatuto social previstas na redação do dispositivo, o leque é amplo,
principalmente com relação à expressão “excesso de poderes” sendo necessário
uma análise minuciosa da autoridade fiscal no momento de sua avaliação que pode
ser carregada de subjetividade, mas pode ser feito um paralelo entre as atribuições
previstas nos atos constitutivos da sociedade e a as leis que a disciplina. 212

211 CARVALHO, Paulo de Barros. Fundamentos Jurídicos ...op.cit., p. 79-80.


212Como por exemplo os arts. 154, § 2°, 155, I, II e II da LSA 6.404/76 que estipulam de forma clara
sobre a vedação de determinadas condutas do sócio ou administrador por configurarem atos
A infração à lei, entendemos ser das hipóteses previstas na lei, a que
mais afeta à seara tributária e nesse sentido a construção da norma de
responsabilidade não cabe na literalidade do que dispõe o caput do art.135, pois
carece de integração para a partir do alcance da tipicidade da infração, se penal,
civil, societária, tributária , ou seja dos enunciados que qualifiquem a dita atitude
ilícita, retornar aos enunciados de responsabilidade tributária e assim completar o
sentido da norma.213
São várias as condutas tipificadas e que podem ser adequadas à
proposta acima descrita, e que foge do escopo do nosso trabalho, mas apenas a
título de exemplo, podemos citar os crimes falimentares ( Lei n.11.101/2005), a
fraude ( Lei n.4.502/64), a apropriação indébita previdenciária ( art. 168-A do Código
Penal, depende da circunstância em que for praticado), a fraude à Fazenda Pública (
CTN, art.185) que pode configurar o ilícito civil também, o art.1.107 do CC, enfim,
são diversos os tipos normativos encontrados, às vezes de cunho dispositivo,
noutras já sancionadora. Em qualquer um dos casos, vislumbramos a possibilidade
de aplicação integrativa ao art.135, III, verificadas as peculiaridades em cada área
de regulação.
Em realidade, há que haver a comunhão com outros enunciados
prescritivos no direito positivo em outras áreas como citamos, assim como às
normas do próprio CTN, é claro, como já bastante frisado em nosso trabalho, há
necessidade da referência sistêmica para a capitulação legal certa diante dos fatos.
É nesse sentido que a extração da norma de responsabilidade tributária que alcance
as atuações empresarias referidas como nossa temática central, não pode ser pela
inteligencia de um só dispositivo previsto na norma geral de matéria tributária, mas
pela comunhão de vários, para além dos acima citados, com os arts. 121, 128,
art.124, I e II, e ainda dos 135, III e 137, I e III.

irregulares de gestão, combinado ao art.158, que por outro lado, traz a previsão de hipóteses de
exclusão da responsabilidade do administrador quando seus atos de gestão forem regulares,
prevendo, por outro lado situações que possam vir a configurar sua responsabilidade, no caso de
dano, por práticas ilícitas, excesso de poderes com culpa ou dolo, etc. O fato é que longe de esgotar
as possibilidades, mas o que se defende aqui à a casuística a ser verificada uma a uma, mas são
parâmetros a serem observados
213 Na esteira segue o entendimento de Daniel Peixoto ao discorrer sobre a necessidade da dupla

motivação que deve ser formulada pelo aplicador da norma de responsabilidade, como explica: “
Essa conclusão singela já demonstra o traço de nulidade presente em muitos autos de infração, ou
mesmo em atos de redirecionamento da execução fiscal , que se limitam a capitular, para efeitos de
motivação, os dispositivos do Código Tributário, quando há necessidade, também, de capitular os
dispositivos da lei que tipificam a infração.” ( Responsabilidade Tributária....op.cit., p.336)
As atuações empresarias referidas são aquelas em que há a configuração
do abuso da personalidade jurídica, a fraude, o conluio, o desvio da função social da
empresa e da sua finalidade, que estão cada vez mais presentes no universo atual
das organizações empresariais que se unem em grupos econômicos, não
formalizados juridicamente, mas que pela atuação dos seus gestores ou do órgão ou
da sociedade que controla, praticam atos ilícitos, infrações às leis, crimes tributários
e enriquecem ilicitamente, em detrimento da ordem social, econômica e tributária.
TERCEIRA PARTE

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E AS ATUAÇÕES


EMPRESARIAIS ILÍCITAS
CAPÍTULO V

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E A CONDUTA


ILÍCITA

5.1 A sociedade empresária: tipo societário e a


responsabilidade 5.2 Organização societária e a patologia fiscal
de não arrecadar tributos 5.3. A responsabilidade tributária no
grupo econômico irregular organizado por interpostas pessoas:
solidária, subsidiária ou pessoal do sócio ou administrador 5.4
A desconsideração da personalidade jurídica, o ônus da prova
que implica a responsabilidade tributária

5.1 A sociedade empresária: tipo societário e a responsabilidade

Na esteira das premissas feitas neste estudo é que passamos à descrição


das vertentes mais relevantes no que toca à pessoa jurídica, os atos ilícitos
praticados no exercício da atividade econômica, com o fim de alcançarmos em que
extensão pode ser atribuída a responsabilidade pelas dívidas tributárias aos sócios,
acionistas ou administradores pelos seus atos de gestão em conjunto ou não à
responsabilidade da sociedade.
Partimos da ideia já fincada de que a sociedade como pessoa jurídica é
ficção jurídica, criação da linguagem normativa, com personalidade própria adquirida
a partir dos registros de seus atos constitutivos (art.985 CC), como um centro de
deveres e de direitos, e que ´possui patrimônio próprio que não se confunde com o
dos seus sócios. Cabe frisar que ainda que a pessoa jurídica possua personalidade
própria, empiricamente, é atribuída a conduta omissiva ou comissiva àquele que tem
competência para atuar em seu nome, de acordo com os seus atos constitutivos.
Tendo em vista a delimitação da temática desse trabalho, já foi ressaltado
que as sociedades consideradas são as empresariais, as sociedades limitadas (
art.1052 a 1.087 do CC) e as sociedades anônimas ( LSA 6.404/76), por atuarem
mais significativamente com a criação ou circulação de riquezas, através da
produção ou circulação de bens e serviços, com objetivo de auferir lucros.
O regime de responsabilização nesses dois tipos societários difere, pois
na sociedade limitada, a responsabilidade dos sócios é restrita ao valor do capital
subscrito, ainda que não integralizado, respondendo os sócios entre si
solidariamente pela subscrição, enquanto na sociedade anônima, a responsabilidade
de cada sócio ou acionista está limitada ao preço das ações subscritas ou
adquiridas, e não há responsabilidade pelos débitos sociais perante terceiros.
Mas há um traço em comum quanto à responsabilidade societária: os
sócios, nos dois tipos societários possuem responsabilização limitada à participação
societária, e havendo impossibilidade de adimplemento da obrigação tributária pela
sociedade, a Fazenda Pública não poderá demandar os sócios, exceto no caso da
limitada em função da solidariedade prevista entre os sócios ( art.1.052 CC) e
limitada ao capital social,
Inserida então na esfera da excepcionalidade é que em matéria tributária ,
como já frisamos, a responsabilidade por dívida tributária poderá alcançar o
patrimônio dos sócios dentro dos contornos definidos em lei, e ainda assim abarca
somente aos que exercem possuem poder de gestão, controle e tomada de
decisões dos atos negociais, exercendo a gerência ou administração, podendo no
primeiro caso coincidir com a pessoa do sócio, e no segundo não.
Importa agora demonstrar algumas atuações dos gestores empresariais
na condução das atividades que as configuram como práticas ilícitas e acarretam
efeitos na responsabilização pelo crédito tributário.

5.2 Organização societária e a patologia fiscal de não arrecadar tributos

As liberdades estão protegidas e consagradas na CF/88: a livre iniciativa,


a liberdade individual e de contratar, a livre concorrência e o exercício da atividade
empresarial. Esta, por sua vez, tem como maior característica o risco assumido em
face do retorno a ser obtido pelo investimento feito. A dinâmica da atividade
empresarial é linear à que envolve os atos negociais, ao progresso científico e
tecnológico, ao atendimento das necessidades do mercado e às próprias
expectativas quanto ao financiamento e obtenção de recursos para a exploração
econômica da atividade.
Na busca deste propósito é natural que os empresários reúnam esforços
e recursos para viabilizar suas atividades, reorganizem-se mediante as
movimentações societárias admitidas pelo ordenamento jurídico, façam
planejamentos fiscais e exerçam suas atividades empresariais com vista à obtenção
de lucro e de que a empresa cumpra sua função social e econômica perante a
sociedade. Um dos desafios talvez seja conciliar os interesses envolvidos com a
essência e a forma jurídica como são praticados diante da combinação de negócios.
Neste ponto é importante destacar que apartamos do escopo deste item
as atividades de reorganizações societárias lícitas - fusão, cisão, incorporação,
formação de grupo econômicos - protegidas pelas leis, princípios e valores
consagrados pelo ordenamento jurídico, e ainda o planejamento fiscal como
resultado de condutas em busca de menor carga tributária.214
A questão da licitude das operações realizadas pelos contribuintes nas
organizações societárias deveria ser tão somente uma preliminar, uma pedra de
toque assentada a partir da qual surgiriam os seus efeitos, tendo em vista ser a
214 Marco Aurélio Greco ao mencionar o planejamento tributário ensina que trata-se de “ conjunto de
condutas que o contribuinte pode realizar visando buscar a menor carga tributária legalmente
possível. Ao dizer “legalmente” estou falando de atos lícitos. Mas não estou me referindo apenas à
licitude no sentido de não haver agressão a nenhuma norma específica; “conduta legal” neste
contexto tem um sentido mais amplo por dizer respeito às condutas que estejam de acordo com a lei
(preceitos específicos” e com o Direito ( que abrange, além das leis, os princípios e os valores
prestigiados pelo ordenamento.” ( Planejamento Tributário. São Paulo: Dialética, 2008. p.117)
empresa um dos maiores instrumentos jurídicos para que se realizem os objetivos
fundamentais da ordem econômica cravada no Texto Constitucional.
Este modelo, no entanto, não é seguido por todos e é possível perceber a
presença de organizações societárias e celebrações de negócios desenhados com
os traços das figuras não legais, como o abuso de direito, a simulação, o propósito
negocial, fraude à lei, dentre outras. O que mais nos interessa, nesse desenho, é
identificar com base na interpretação das normas de responsabilidade tributária, com
quem está firmada, a relação jurídica tributária diante dos efeitos tributários dos atos
praticados dentro desse contexto.
Seguindo os traços do desenho das figuras não legais, podemos numa
visão larga, reuni-las numa só: abuso da personalidade jurídica, que pode ser
configurado dentre outros aspectos, quando: i. há o desvio da finalidade prevista nos
atos constitutivos, ou a própria constituição da sociedades para fins outros que não
os previstos juridicamente; ii. formação de grupos societários não formalizados,
unidos pelo interesse comum em praticar atos e realizar negócios jurídicos
montados na intenção de não pagar tributos; iii. utilização do tratamento diferenciado
oferecido pelo ordenamento jurídico, como na hipótese da redução do ônus tributário
para empresas de pequeno porte e microempresas, mascarando aquele que
realmente tem o maior interesse jurídico na realização do fato tributário; iv desvio do
patrimônio da sociedade, causando o esvaziamento e a aparente insolvência pela
transferência de bens ou distribuição de lucros indevidas.
Ora, neste contexto, aparece uma figura maior: a patologia de não
arrecadar tributos e desse mal jurídico padece aquelas sociedades que estão
reunidas em grupos econômicos irregulares e naquelas constituídas por interpostas
pessoas, de forma concomitante ou não.

5.3. A responsabilidade tributária no grupo econômico irregular organizado por


interpostas pessoas: solidária, subsidiária ou pessoal do sócio ou administrador

A natureza de grupo econômico, por si só, não desfigura a independência,


a autonomia e a identidade das sociedades que o forma, nem em matéria tributária,
como regra geral, cada uma é responsável por suas obrigações tributárias
individualmente, exceto se por previsão expressa em lei nos limites estabelecidos
pelo legislador complementar, se houver interesse jurídico comum daquelas na
realização do fato jurídico tributado ou ainda pelo abuso da personalidade jurídica,
como descrito acima.

O tema a ser enfrentado é no que diz respeito à responsabilidade


tributária dos envolvidos em grupos econômicos, por interesse comum na prática do
fato gerador de tributos e que exercem suas atividades com abuso da personalidade
jurídica das sociedades agrupadas.215 De súbito, indene de dúvidas que a opção de

215 Na tentativa de demonstrar uma das possibilidades desta situação, façamos uma simulação:A
grande empresa multinacional “VIP” instalada no estado RS, tributada com base no lucro real, é
produtora em larga escala de um determinado bem e o comercializa para vendas em lojas próprias
como franquias no mercado interno, e para o mercado externo, de onde provem sua maior fonte de
receita. Situa-se no perfil de grandes contribuintes, utiliza pela matriz e filiais, de forma direta em sua
produção fabril em torno de 8.000 pessoas, e mantem relações negociais diversas, dentro e fora do
pais. É constituída sob a forma de sociedade anônima, possui um quadro societário enxuto, com
participação de pessoas jurídicas inclusive estrangeiras, tem como representante legal um de seu
sócios acionistas majoritário, que além dessa, é responsável, em conjunto ou não com os demais
sócios, por mais cerca de 20 empresas espalhadas pelo país. Sem dúvida, a atividade empresarial
até aqui é exercida na moldura do ordenamento jurídico, dentro dos limites legais, exercendo a
grande função social e econômica da empresa, de circular bens e riquezas, gerar empregos e
contribuir com a distribuição de rendas pelos tributos pagos. No entanto, a grande empresa muda de
estratégia e resolve abrir uma grande filial em outro estado, ainda sob o mesmo regime jurídico, e
com base no seu perfil propulsor econômico, consegue junto ao governo benefícios fiscais,
concessões de uso de bens públicos para a instalação do parque fabril e de todos os outros setores
que compõe a estrutura da empresa. Num pequeno lapso temporal, a grande filial instalada na nova
cidade, transforma-se em múltiplas pequenas empresas, agora sob a tutela do regime diferenciado de
pagamento de tributos, como por exemplo o Simples Nacional, e constituídas por outras pessoas
instaladas em várias cidades pequenas, exercendo a atividade de produção de bens, agrupadas em
cada local em um mesmo estabelecimento, com quadros societários variados e com grande alteração
e alternatividade dos sócios entre as pequenas empresas, ou seja, foram criadas no sentido de
reduzir riscos, pulverizar receitas, obter o benefício tributário, descentralizar em pessoas jurídicas o
processo de industrialização, distribuir despesas entre as mesmas, e viabilizar o processo cíclico de
obtenção de lucros e distribuições constantes, havendo de fato a subordinação patrimonial,
econômico e financeira, além da coordenação da empresa “VIP”. Observa-se ainda, só para aclarar
que as pequenas empresas foram criadas por ex-empregados da grande empresa “VIP”, que antes
uma potencial contribuinte, transformou-se numa empresa com cerca de menos de 500 empregados,
um faturamento ínfimo, e no entanto, continua realizando grandes negócios, agora através das
múltiplas sociedades pequenas. Essas, por sua vez, ( as empresas, A,B,C,D,E,F, G, H,I ) realizam
toda a fabricação para um único cliente, a empresa “VIP”, que com aquelas celebrou contratos iguais
de compra e venda, com reserva de domínio e de bens industriais, inclusive coma transferência de
todo o quadro de empregados mediante uma falsa rescisão de contrato. Configura-se inclusive, a
nosso ver nessa situação, a confusão patrimonial, gerencial e financeira entre as empresas
integrantes do grupo econômico, caracterizada por transferências financeiras para cobertura de
despesas, concessão de empréstimos, inclusive pagamentos desses, despesas básicas com o
processo de fabricação ora rateadas, ora assumidas quase na sua totalidade por uma única das
empresas, adiantamento de valores constantes pelo processo de industrialização com serviço
exclusivo para um só cliente. Importante também é o trânsito do lucro auferido agora pelas empresas
, que pagando valores irrisórios de tributos, ou os não pagando, o resultado econômico é distribuído
mensalmente entre os sócios das empresas, sem declarações no imposto de renda, claro. O fato é
que diante de tal situação fática, ainda que por exemplo, o que para nós, o que mais interessa é a
medida do interesse comum a tais sociedades, qualificado pela lei, que não está somente na esfera
econômica do resultado ou proveito obtida por uma ou mais de uma das empresas que pertencem ao
grupo econômico, mas da situação que constitui o fato gerador da obrigação principal, o interesse
jurídico, vinculado à atuação comum ou conjunta da situação que constitui o fato imponível , ou seja,
atuar na órbita da ilicitude tem o efeito reflexo da não proteção do ordenamento
jurídico, em especial, no que diz respeito aos limites constitucionais e legais para
imputação de responsabilidade de adimplir a obrigação tributária nascida de tais
atos, e assim escapam, dentre outros, os princípios da capacidade contributiva, da
vedação do tributo com efeito de confisco, da proteção patrimonial e da propriedade,
pois, como bem aclarado, o bem tutelado pela tributação é de ordem pública.
O fato é que nas trilhas da situação fática, em que presentes estão as
figuras do abuso da personalidade jurídica, a simulação, o abuso do direito, a
confusão patrimonial, há a permissão para que a autoridade fiscal desconsidere os
atos dissimulados praticados, nos termos da lei216 e colher como responsáveis pelos
tributos devidos em decorrência da realização em conjunto do fato jurídico tributário,
sem prejuízos das demais penalidade cabíveis, sancionadoras administrativas e
penais, se for o caso.
Há assim a extensão em caráter excepcional da responsabilidade para
alcançar o patrimônio de todas as pessoas atadas juridicamente pelo interesse na
realização do pressuposto do fato da tributação, destacando a individualização das
sociedades participantes do grupo econômico, apenas aparente, e para além disso,
alcançar também o patrimônio daqueles que tem poderes de gestão, de decisão dos
atos negociais das empresas, em especifico, daqueles irradiadores de efeitos
tributários.
Em suma, de todas as linhas traçadas até aqui, o nosso intuito foi a
demonstração de que a aplicação dos enunciados prescritivos da responsabilidade
tem que ser feita através da comunhão com outros enunciados prescritivos no direito
positivo, pela referência sistêmica para a capitulação legal certa diante dos fatos e

na ideia de que juntas realizam a situação configuradora do fato gerador da exação tributária, que por
outro lado decorre da necessidade em conjunto da prática dos atos jurídicos, para viabilizar o
resultado pretendido. Nesta linha, foi que nas notas acima defendemos que o interesse jurídico que
dá a nuance em certos atos negociais em conjunto, tem que ser visto sob uma perspectiva ampla,
diante da situação fática. Nesta por exemplo, clara está o abuso da personalidade jurídica, com a
constituição de empresas para fins, que não os previstos exatamente nos atos constitutivos, por
pessoas que não são os seus verdadeiros sócios, configurando a fraude a lei, a simulação e o abuso
do direito. E assim, tal situação, representa uma atual forma de organização empresarial matizada
com a patologia fiscal de não arrecadar tributos no viés do enriquecimento ilícito.
216 Art.116 do CTN. (…) Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou

negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou
a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem
estabelecidos em lei ordinária.
pela comunhão de vários, para além dos acima citados, com os arts. 121, 128,
art.124, I e II, e ainda dos 135, III e 137, I e III.
Diante desses casos é que propomos nas notas introdutórias desse
trabalho, o uso da metáfora bíblica do “ joio e do trigo”, pois somente diante do fato
é que é possível ao interprete moldá-las à norma que melhor atenda aos valores
consagrados pelo direito.
Diante dessa sorte de considerações, há fundamentação bastante para
que na hipótese de grupos econômicos irregulares, cujas pessoas jurídicas foram
constituídas por interpostas pessoas, identificados e formalizados pela autoridade
administrativa, para a aplicação da responsabilidade entre as pessoas jurídicas
envolvidas atados pelo interesse comum no fato jurídico(art.121, I e II, art.128 e
art.124,I do CTN) e se existir para corroborar a disposição em lei (art.124,II), junto
com a responsabilidade dos sócios, por infração à lei ( art.135, III), e se cabível
ainda a aplicação do art.137, I e III, quando configurado crime ou contravenção
penal, aliado aos dispositivos de referência nas lei civil e societária. A
responsabilidade a que nos referimos, é a solidária e sem benefício de ordem, entre
as pessoas jurídicas e os sócios, administradores, acionistas com poderes de
gestão, em virtude de que pela prática do ilícito e do fato jurídico tributário, o
benefício também foi comum a todos, com base em provas fundamentadas.
Por fim, damos ênfase de que a interpretação feita do relicário da
solidariedade passiva na seara tributária açula como resultado da sistematização
das normas para que seja alcançado a ratio essendi dos dispositivos legais de modo
que tal exegese descanse na acústica dos princípios constitucionais da legalidade,
isonomia tributária, capacidade contributiva e ainda da segurança jurídica –
norteadores da relação jurídico tributária.

5.4 A desconsideração da personalidade jurídica, o ônus da prova que implica


a responsabilidade tributária

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica217 aplicável em matéria


tributária consiste em estreita síntese, em afastar a personalidade da sociedade para

217CC - Art.50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade,
ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério público
alcançar o patrimônio do sócio ou administrador, com intuito de garantir o
pagamento do crédito tributário.
No entanto, nem todos os casos de responsabilização se enquadram em
hipótese de desconsideração, assim como há o inverso, a aplicação da teoria em
que o efeito não é a responsabilização.
O fato é que a teoria só pode ser aplicada nas situações em que haja
fundamentos, como no caso de abuso de direito, fraude à lei, simulação, ou seja,
fatos jurídicos que fundamentem de forma suficiente à sua aplicação, o que no
revés, impede que seja baseada em arbitrariedades pela autoridade aplicadora, pois
o seu caráter é excepcional .
O que se pretende esclarecer é que há uma exigência jurídico positiva
para a sua aplicação e que diante disso, as hipóteses previstas de responsabilidade
tributária solidária, ou subsidiária, ou pessoal dos sócios ou administradores pela
obrigação da pessoa jurídica, não requer por uma interpretação axiológica, de
desconsiderar a personalidade da empresa para atribuir a responsabilidade, posto
que estão seus pressupostos devidamente desenhados pelo legislador
complementar nas hipóteses de incidência da norma, se por motivos de praticidade
e eficácia da fiscalização e arrecadação ou de caráter sancionador.
No que toca ao ônus da prova em matéria de responsabilidade tributária,
cabe ressaltar que o art.9° do Decreto 70.235,218 que disciplina o processo
administrativo fiscal dispõe sobre a necessidade de instrução por meio da linguagem
de provas de toda a situação fática e as circunstâncias pormenorizadas que deu
origem ao crédito tributário lançado e ao fato da imputação da responsabilidade, em
sua total extensão, revertendo o ônus da prova para a Fazenda Pública, caso o
sujeito passivo apresente impugnação ao lançamento fiscal.
Por outro lado, quando se trata de execução fiscal há entendimento
jurisprudencial, no sentido de que se há a mera indicação do nome do responsável
no título da CDA, há a inversão do ônus da prova, dentre outros motivos, com base
na justificativa de que a Certidão de Dívida Ativa, goza de presunção de liquidez e

quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de
obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
218 Art. 9o A exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados

em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade, os


quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de
prova indispensáveis à comprovação do ilícito.
certeza, relativa mas suficiente para fazer prova. Caso contrário, se a CDA não
contiver o nome do responsável, cabe ao Fisco a prova dos pressupostos, por
exemplo, do art.135, para redirecionar à pessoa do sócio ou administrador, a
execução.
O fato é que como bem coloca Paulo Roberto Lyrio Pimenta, não faz
sentido o deslocamento “para o âmbito do processo jurisdicional a discussão e a
certificação acerca da existência da responsabilidade tributária”, pois como
argumenta, “o processo de execução não se destina à declaração de direito.” 219

219PIMENTA, Paulo Roberto Lyrio. Da Necessidade de Apuração da Responsabilidade Tributária no


âmbito do Processo Administrativo Fiscal. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo:
Dialética, n° 211. abril.2013.p153.
CONCLUSÃO

1. O direito como realidade social no universo dos bens culturais se expressa


através da linguagem, a linguagem jurídica, ou mais precisamente, em discursos
jurídicos linguísticos, um que cabe à Ciência do Direito, e o outro ao seu objeto, em
sentido estrito, o direito positivo. Nessa perspectiva é que é estudada a
responsabilidade tributária, como um fenômeno jurídico a ser interpretado em suas
inter-relações por meio da linguagem.
2. As normas jurídicas são pois, elementos do sistema Direito positivo, tratando-
se assim de um sistema autopoiético, autônomo, em que a autorreprodução de seus
elementos, ou seja as novas normas jurídicas acontece segundo códigos e
programas próprios, havendo assim uma clausura operativa organizacional e uma
abertura cognitiva, ou seja, semântica e pragmática que garanta a sua evolução.
3. O sistema da Ciência do Direito, cujo objeto é o estudo do Direito positivo,
através de uma linguagem descritiva, que emite juízos de valor sobre o contexto
normativo, interpretando-as sistematicamente em suas conexões, no sentido de
alcançar uma integração e uniformidade de conceitos e racionalidade dos
argumentos produzidos no que toca aos efeitos de tais normas, enfim da própria
atuação desse enredo normativo.
4. A característica dos princípios como normas fundamentais, de súbito aparta
qualquer possibilidade de que sejam mitigados ou mesmo afastados, ainda que se
lance mão do critério interpretativo mediante a técnica da ponderação em face de
possível conflito quando da aplicação de determinado princípio ou da prevalência de
um diante de outro, posto que, o que é fundamental para a concepção de Direito e
de Estado, é por decorrência inafastável.
5. A interpretação da norma jurídica constitucional com vistas a que se realizem
os valores, fins ou interesses por ela carreados é uma decorrência lógica de uma
nova visão hermenêutica do Direito contemporâneo que passou a ser compreendido
como um sistema aberto de regras e princípios, permeável a valores supra positivos,
no qual as ideias de justiça e de realização dos direitos fundamentais desempenham
um papel principal, notadamente os que atinam ao universo dos contribuintes em
sentido lato.
6. A igualdade na distribuição da carga tributária é um dos notáveis meios para
que ocorra a Justiça, pois pensamos que numa visão ampla, o matiz dos princípios
constitucionais tributários é a realização da Justiça tributária e esta para ser
alcançada pressupõe que, antes de tudo, um princípio fundamental - e não só os
expressamente previstos na Constituição - seja objetivamente justo e para esse fim,
há que ser adequado à realidade e ter como imagem retora, a Ética.
7. A ética que permeia a construção do aspirado sistema tributário justo, há que
ser ao mesmo tempo o elemento propulsor das atuações dos contribuintes, ainda
que notadamente não seja apartada a ideia de que na relação jurídico-tributária está
fincada uma vulnerabilidade dos destinatários da norma tributária em face do Estado
e o exercício de sua tríplice função, por ser a um só tempo o criador da lei tributária,
o aplicador e o que exerce a função jurisdicional, administrativa e judicial dos
conflitos que surjam em virtude da lei aplicada.
8. No Direito Tributário a relevância do princípio da legalidade atrai luzes pela
missão que tem de ser a fonte de revelação e garantia da justiça fiscal, além, é
claro, de estar profundamente relacionado à segurança jurídica dos cidadãos
contribuintes, tendo em vista que para além da criação e aumento da base de
cálculo ou alíquota a ser aplicada ao tributo, a sua própria modificação e extinção só
ocorrerá mediante lei editada por autoridade competente.
9. A função atribuída à lei complementar em matéria tributária é, na maior parte,
cumprida pelo Código Tributário Nacional – CTN ( lei n.5.172/66), ao estipular
normas complementares ao Texto Constitucional, traçando balizas gerais a serem
seguidas pelo legislador ordinário no momento da criação do tributo, bem como à
Fazenda Pública no momento de sua cobrança e aos julgadores, administrativos e
judiciais, enfim, a todos os seus intérpretes, representando uma das maiores
garantias fundamentais concedidas aos contribuintes.
10. O princípio que veda à tributação, o confisco, está laçado pelo princípio da
capacidade contributiva, da isonomia tributária e da propriedade, o que leva à
certeza de que o patrimônio, a renda, e a propriedade do contribuinte não poderão
ser apropriados injustamente pelo Estado com a instituição de tributos
excessivamente onerosos, o que faz com que o princípio em tela seja uma
verdadeira limitação ao exercício do poder de tributar, direta ou indiretamente, não
podendo assim, existir no ordenamento jurídico pátrio lei que regule o tributo de
modo que ele gere os mesmos efeitos econômicos que o confisco geraria.
11. A eleição pelo legislador de fatos da vida social que demonstrem
manifestação de riqueza e aptidão para concorrer às despesas públicas, configura a
capacidade contributiva absoluta ou objetiva, o que trocando em miúdos quer dizer
que a hipótese de incidência tributária em seu aspecto material há que ser um ato ou
fato que revele ou represente manifestações de riqueza e por outro lado, um limite à
graduação máxima no exercício da competência tributária, ambos fundamentam
juridicamente o tributo.
12. A justiça distributiva fiscal consiste em que aqueles que possuam mais
aptidão para contribuir no custeio das despesas públicas o façam em medida maior,
e noutro giro, o Estado tem o poder-dever de arrecadar tributos para realização de
suas atividades fins e que atendam à necessidade de todos, em especial daqueles
que por possuir menor aptidão para contribuir necessitam e utilizam em medida
maior os bens e serviços estatais, é que se esbarra em mais um inarredável
princípio informador do sistema tributário e também manifestação da capacidade
contributiva: a solidariedade social tributária.
13. A norma jurídica por ser uma prescrição contem uma ordem a ser cumprida,
uma proibição que deve ser obedecida ou pode ainda estabelecer uma faculdade, e
assim a sua ilação pelo intérprete e pelo aplicador do direito dependerá sempre da
contextualização lógica das normas em todo o sistema para colher a sua real
significação. A norma jurídica é, portanto, veiculada pelo seu suporte físico que é o
texto do Direito positivo, utilizado como meio de alcançar a sua finalidade, em
síntese, a regulação das condutas humanas.
14. A norma posta de responsabilidade tributária pelo ato jurídico do lançamento
tributário é uma norma de conduta stricto sensu, enquanto as isenções, imunidades
e as normas de competência e imposição de limites ao exercício destas pelas
pessoas jurídicas de direito público previstas na Constituição Federal, por exemplo,
são de estrutura.
15. A incidência ou aplicação do Direito nada mais é senão o fenômeno
especificamente jurídico de subsunção de um fato a uma hipótese legal, o que
significa que o fato ocorreu na moldura desenhada pelo enunciado descrito pela
linguagem da prescrição normativa tributária projetando os efeitos previstos na
formação do vínculo jurídico entre os dois sujeitos de direito.
16. O sujeito passivo da obrigação principal pode ser nos termos do Código
Tributário Nacional, art.121, aquele que tenha relação pessoal e direta com a
situação que constitua o respectivo fato gerador, ou ainda aquele que sem revestir a
condição de contribuinte, seja designado por lei.
17. Contribuinte, na dicção do citado dispositivo, é aquele que possui “relação
pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador”, portanto
aquele que realizou o fato jurídico tributário e dessa forma está obrigado ao
pagamento do tributo ou penalidade pecuniária, ou como escreve Luciano Amaro
que “dado o fato, ele é atribuído a alguém que o tenha realizado. Essa pessoa via
de regra é o contribuinte. Portanto, há pertinência lógica entre o fato imponível e o
contribuinte ( uma situação e uma pessoa, um fato e seu autor, uma ação e seu
agente).
18. Responsável tributário é aquele que não tem uma relação direta e pessoal
com o fato irradiador de efeitos tributários e da relação jurídica tributária, mas que
por disposição expressa de lei, será aquele a arcar com o ônus do pagamento do
tributo. Mas como dito acima, o legislador ordinário não tem uma ampla e irrestrita
liberdade para a escolha do responsável tributário, tem que haver pelo menos um
vínculo entre o sujeito passivo indireto e o fato jurídico tributário, ou a quem o
realizou.
19. O legislador ordinário tem, para além dos limites formais e materiais do texto
constitucional, a lei complementar que versa normas gerais e determina que a
eleição da sujeição passiva indireta não poderá ser feita de forma aleatória, mas terá
necessariamente que ao descrever os pressupostos de fato e possibilitar a exigência
do tributo por pessoa diversa do contribuinte, que com aquele manter um vínculo.
20. Existem dois sujeitos com o dever de pagar o tributo coercitivamente ao
Estado: o contribuinte com relação pessoal e direta com o fato gerador tributário
(sujeito passivo direto) e titular da dívida e da responsabilidade ; e o responsável (
sujeito passivo indireto), que por não ter relação direta e pessoal com os fatos
irradiadores dos efeitos tributários, não possui uma relação tributária, possuindo a
responsabilidade patrimonial de pagamento do tributo devido por terceiro, e não por
dívida própria, como regra geral, admitas algumas exceções diante das hipóteses de
substituição tributária e de responsabilidade por infrações.
21. È preciso reconhecer que o elemento de justificação das regras que
excepcionam o direito ao patrimônio constitucionalmente assegurado, pela eleição
de um responsável em que será retirada parcela de sua riqueza para a entrega do
valor do tributo à Fazenda Pública mora no aspecto de que a responsabilidade
tributária é instituto jurídico plantado com finalidades específicas de punir o
responsável (sanção), ou de viabilizar, simplificar e dar mais praticidade e
efetividade à arrecadação de tributos, situações em que está instalada a
necessidade e o interesse do Estado credor.
22. O ato ilícito é o pressuposto imediato que fundamenta as hipóteses de
responsabilidade tributária estipuladas pelo Código Tributário Nacional de caráter
sancionatório, punitivas, notadamente os enunciados prescritivos dos artigos 134 a
138, quando dispõe sobre a “responsabilidade de terceiros” e sobre a
“responsabilidade por infrações”.
23. O ato volitivo, segundo o princípio da autonomia da vontade é condição
inarredável para a configuração da ilicitude, posto que a par de uma consciência e
das consequências possíveis resultantes da conduta praticada dentro do livre arbítrio
de decidir, ocorra a opção pela prática do ato ou omissão lesiva e que assim sendo
constitua o fato a que deu causa ao dano.
24. O dano é indispensável à configuração do ato ilícito e determinação da
responsabilidade civil, podendo ser patrimonial, o que representa a perda patrimonial
efetivamente suportada como consequência do fato ou a que vier ocorrer como
decorrência do concurso de circunstâncias supervenientes, assim como o dano pode
não produzir efeito patrimonial, mas tão somente de ordem moral.
25. As normas matrizes que as regem guardam semelhança pela própria unidade
do direito e como regra geral, o que faz com que as normas de responsabilidade
tributária sejam estabelecidas como um instrumento de sanção é exatamente que no
dever jurídico descumprido esteja configurado o ato ilícito tributário em que, do ato
ou da omissão praticado pelo agente, o tributo não seja pago, ou de alguma forma
seja reduzido, postergado ou mesmo turbe a arrecadação, bem como pelo uso de
meios que impeçam a própria positivação da regra matriz de incidência como de
início fixada ou que de certa forma, direta ou indiretamente, acabe por mascarar o
verdadeiro responsável pelo tributo devido.
26. Por estarem diretamente alinhadas ao paradigma penal - cláusula geral do
citado art.136 - “ responsabilidade por infrações em que há uma reprovação social
pela conduta em virtude do bem jurídico protegido é que nessas infrações o aspecto
subjetivo, no mínimo a culpa em sentido estrito, há que ser devidamente
comprovada pela Administração Pública, uma vez que na dicção legal do enunciado
geral da responsabilidade por infrações, o dolo, a intenção de causar o resultado, só
será exigido, em situações excepcionadas por lei, como próprio prevê o estatuto
tributário, na hipótese do art.137, II e II, quando exige a figura do dolo específico.
27. Em sentido oposto vemos o art.135 quando prevê a responsabilidade pessoal
quando os atos forem praticados com excesso de poderes ou infração de lei,
contrato social ou estatuto, da formulação textual do legislador complementar, claro
está que prescinde a presença de dolo, sendo suficiente apenas a realização do ato
ilícito para a imputação da responsabilidade tributária ao agente infrator e a culpa.
Nesta perspectiva é que afirmamos estar configurada nesta hipótese a
responsabilidade subjetiva do responsável tributário, cabendo ao Fisco comprovar
pelos meios admitidos no ordenamento jurídico o ato ilícito que desencadeou a
responsabilidade sancionatória, bem como a culpa do agente infrator.
28. Entendemos, que em tais situações não pode haver o amparo do regime
jurídico e dos limites estabelecidos quando da observância dos princípios
constitucionais informadores da tributação, pois a pretensão é a de coibir práticas
com vistas ao não pagamento de tributos, lesivas e extremamente abusivas ao
interesse público a ser protegido pelo Estado, e dessa forma, que os agentes
tenham um tratamento jurídico linear à consequência dos seus atos. Isto é tão
somente uma das feições da feitura prática do princípio constitucional da isonomia
tributária, inarredável em todas as suas acepções do ordenamento tributário.
29. O legislador complementar pode ainda desbancar a responsabilidade do
contribuinte, aquele que realiza o fato acolhido na hipótese de incidência tributária
ou a ele está diretamente vinculado, fazendo com que o mesmo perca sua função de
personagem passiva principal, o faz também por interesse do Fisco, do Estado, de
atender à necessidade de simplificação, de dar maior praticidade na arrecadação e
fiscalização do tributo, bem como até de torná-la possível em determinadas
situações, e de estabelecer condições de eficácia e funcionalidade em busca da
garantia do crédito tributário até sua última instância.
30. A responsabilidade tributária instituída com base no interesse, na necessidade
do Estado credor, como política fiscal para viabilizar o adimplemento da obrigação
tributária, e nesses casos, o fato lícito é o pressuposto da hipótese de incidência da
atuação do legislador que tem que ser na moldura estatuída pelo texto
constitucional, isto é, dentro dos limites formais e materiais estabelecidos,
notadamente com base nas normas gerais estabelecidas pelo legislador, e dos
princípios que esmiuçamos como o da capacidade contributiva, da vedação do
tributo confiscatório, da igualdade, da proteção da propriedade e garantia da
preservação do mínimo vital.
31. O fundamento e a justificação axiológica das normas trazidas nos
enunciados prescritivos que estabelecem o dever do responsável legal tributário,
não pode, notadamente nas situações de substituição tributária, deixar de assegurar
que o ônus econômico do tributo seja suportado por quem efetivamente realizou o
fato revelador da capacidade contributiva escolhido pelo legislador como
desencadeador relacional da obrigação tributária e que, no revés, atue como limite
imposto ao Estado de tributar apenas fatos e situações pintados com o matiz jurídico
de fato signo presuntivo de riqueza imponível.
32. As figuras jurídicas desenhadas pela doutrina tradicional que possibilitam a
substituição legal tributária através da repercussão do ônus do tributo ao sujeito que
realizou o fato tributado, em função do modo como determina a lei, são agrupadas
em duas categorias ou modalidades: o reembolso e a retenção na fonte, em que
pela primeira há um direito do substituto de acrescentar no preço do negócio jurídico
realizado com o substituído o valor referente ao tributo já pago, transferindo assim o
encargo financeiro; enquanto na segunda modalidade, - retenção, há um direito
subjetivo do responsável de abater, da quantia devida ao sujeito com quem mantém
relação jurídica de natureza comercial, civil, trabalhista, dentre outras, o valor devido
ou já pago a título de tributo em razão da prática, por este último, da situação fática
descrita na hipótese normativa tributária.
33. A responsabilidade tributária por substituição alcançou assim, com a citada
emenda constitucional, status constitucional, fundamentando as previsões legais
que dispunham sobre a sujeição passiva tributária antecipada ou substituição
tributária “para frente” e aqui, por escapar ao escopo do nosso trabalho, não vamos
nos insurgir acerca das posições díspares a respeito de sua constitucionalidade ou
não, mas por oportuno, deixamos claro que a nosso ver, o instituto da substituição é
indispensável para dar efetividade ao princípio da praticabilidade e da racionalidade
da tributação, além do que, o direito tributário não poder tornar-se alienígena à
dinamicidade da evolução social, o que insta à utilização de mecanismos, de
técnicas e procedimentos que garantam o ingresso da receita advinda dos tributos
aos cofres públicos, tudo atado às constitucionais, assim como são os vértices para
a figura geométrica do polígono.
34. Nota essencial da peculiaridade da substituição tributária que a destoa das
demais hipóteses jurídicas de responsável tributário está no fato de que não há
possibilidade de constituição do crédito tributário em face de quem o realizou,
espancando as notas caraterísticas de solidariedade ou subsidiariedade que possam
existir quando da escolha pelo legislador do sujeito passivo da obrigação tributária.
35. Cabe frisar que o dever é de pagamento por dívida própria, e não alheia, em decorrência de fato de terceiro, e assim

o substituto tributário, na verdade, atua como se duas figuras fosse, a que tem a obrigação de efetuar o pagamento do tributo

devido pelo contribuinte e para além disso, a que vai arcar no caso de inadimplemento daquele.

36. O

regime jurídico aplicado ao substituto é o do substituído, onde ele assume não só a obrigação de caráter patrimonial como as

de caráter instrumental, as acessórias, assim como se reveste de direitos, administrativos e judiciais perante à Fazenda Pública

e sob este prisma é que não damos a ele uma conotação pré-jurídica, mas sim como o resultado da implicação da norma

substitutiva que macula o consequente da norma matriz de incidência tributária por retirar aquele que realizou o fato tributado,

ao mesmo tempo em que traz no seu enunciado um novo sujeito para arcar com obrigação de quem foi substituído.

37. Os preceitos que versam sobre a responsabilidade por transferência de forma mais específica sobre a

“responsabilidade dos sucessores”, para utilizar a terminologia do legislador, estão dispostos nos arts. 129 a 133 do CTN, que

dispõem, de forma sucinta, sobre a atribuição da responsabilidade tributária àquele que adquire a titularidade de bens, pelos

tributos relativos a esses até a data do ato da transmissão, nas seguintes situações, dentre outras: i. por aquisição tradicional

de bens imóveis (art.130) ; ii. por aquisição de herança em virtude de morte de morte (art.131)iii. pela incorporação ou fusão da

pessoa jurídica ( art.132) ou ainda pela aquisição por pessoa física ou jurídica de estabelecimento empresarial sem a

continuação das atividades pelo alienante.

38. O vínculo que existe nas hipóteses de sucessão, na verdade, é entre o contribuinte sucedido e o responsável

sucessor de forma subsidiária ou integral, em razão de fatos negociais ou não, o que não desnatura a figura do responsável

tributário desenhada no art.128 do CTN, pois deixamos claro quando das anotações iniciais sobre o tema, que diante da

interpretação sistêmica do contexto das normas que versam sobre a responsabilidade tributária, tal vínculo não ocorre somente

ao pressuposto de fato da norma matriz tributária, assim como, ambientados que estamos numa visão não radical e ortodoxa

do direito, ao próprio realizador do fato jurídico tributário.


39. A responsabilidade de terceiros prevista no art.134 do CTN pressupõe duas
condições para a imputação de responsabilidade às pessoas nele referidas: i.
impossibilidade de cumprimento da obrigação pelo contribuinte e ii. que a obrigação
tributária tenha nascido em virtude de sua interferência por ação ou omissão de um
dever próprio legalmente estabelecido.
40. A implicação da responsabilidade de pagar tributos atribuída ao pai, tutor,
curador, administrador de bens de terceiros, inventariante, síndico, comissário,
serventuário de ofício ou sócio não decorre da simples relação de representação ou
de poder que esses sujeitos possuam em relação ao contribuinte, mas da comunhão
entre a atuação ou omissão na administração de bens destes e a inadimplência da
obrigação tributária, quer pelo impedimento de sua constituição, quer pelo não
pagamento. Há dessa forma uma relação de causa e efeito imprescindível para a
imputação da responsabilidade às pessoas referidas no art .134, do CTN.
41. A subsidiariedade assegura que o responsável só poderá ser exigido após o
contribuinte, ou seja, a execução fiscal terá que ser proposta inicialmente contra o
contribuinte, e, após esgotados os meios cabíveis for constatado não haver
patrimônio disponível para arcar com a dívida tributária.
42. Nesse sentido é que defendemos ter sido a utilização da expressão
“solidariamente” pelo legislador, uma atecnia, um equívoco da linguagem prescritiva
do enunciado, como várias outras existentes no estatuto que trata das normas gerais
de Direito Tributário, mas o fato é que não foi suficiente ou impossível de resolução
tendo em vista a hermenêutica utilizada no sentido de dar à norma o conteúdo
simétrico ao contexto em que está inserida e que lhe melhor acentue a justificativa
valorativa.
43. O art.136 do CTN traz em seu enunciado hipótese de responsabilidade, que
para a sua configuração, há que ser aferido o elemento subjetivo do autor da
infração, no mínimo a culpa em conexão ao resultado, dispensando tão somente a
intenção do infrator em causar o dano, ou seja, a presença do dolo ou da fraude,
salvo as exceções previstas em lei, de acordo com a literalidade do dispositivo.
44. Em nosso entender, não há espaço para a responsabilização objetiva em
matéria tributária, uma vez que, há nessa órbita, direitos fundamentais protegidos
constitucionalmente, como o da liberdade e o do patrimônio, os quais por si sós,
irradiam seus valores e sua imperatividade sobre outros, ainda que se trata de
resposta do ordenamento jurídico por violação de normas que estabelecem um
dever-ser, como a sanção, e esta é um conceito fundamental que representa a
consequência de uma ação ou omissão considerada ilícita ou antijurídica.
45. No entanto, parece-nos que a inteligência do dispositivo é no sentido de que
para a configuração da responsabilidade por infrações, como regra geral o que se
dispensa é a intenção, a vontade de lesar o Fisco, exigindo-se no mínimo, a culpa
em um de seus graus: imperícia, imprudência ou negligencia e independendo da
efetividade, natureza ou efeitos do ato ilícito.
46. A intenção dolosa, a fraude, as condutas artificiosas para lesar o Fisco são
elementos levados em conta pelo legislador e para que o Estado use sua força
coercitiva em prol da ordem jurídica, ao tipificar os ilícitos tributários como crimes
penais e não só infrações administrativas, e como consequência opta por agravar
as penalidades impostas.
47. Há previsão de acordo com norma veiculada pelo art.138 do CTN do instituto
jurídico tributário da “denúncia espontânea” com o efeito de elidir a responsabilidade
por infração, desde que o infrator a comunique antes de qualquer meio fiscalizatório
e acompanhada do pagamento do tributo e dos juros de mora, ou do depósito da
importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo
dependa de apuração.
48. A atuação do sujeito passivo diante da obrigação de pagar o tributo devido ou
até de suportar a respectiva execução, como contribuinte ou responsável, pode ser
diante das hipóteses previstas em lei, de forma pessoal ou plural, o que significa
dizer, que na primeira hipótese, o tributo só poderá ser cobrado de uma única
pessoa, enquanto que na segunda, a exigência do tributo poderá ser feita a mais de
um sujeito passivo, contribuinte ou responsável, ou ambos, de forma paritária ou
com ordem de preferência desde que integrem o polo passivo da relação jurídica
tributária.
49. contribuinte ou responsável de quem poderá ser cobrado o tributo, dar-se-á a
sujeição passiva plural, também chamada de “concorrente”, hipótese em que se a
obrigação de pagar o débito tributário existir, somente na impossibilidade de
exigência do cumprimento d
50. Quando há mais de um sujeito passivo obrigação do devedor principal ou
direto, ou seja, do contribuinte, ela será subsidiária; enquanto, noutro giro, havendo
mais de um sujeito passivo obrigado ao cumprimento da exação tributária, seja
contribuinte, ou responsável, ao ainda em conjunto, em que qualquer um deles
possa vir a ser ser compelido a pagar pela integralidade do valor do débito tributário,
a nota que matiza essa sujeição passiva é a da solidariedade.
51. A subsidiariedade não está disciplinada, ou escrevendo melhor, não está
conceituada na legislação como acontece com a solidariedade, o que obriga ao
intérprete pelo enunciado dos dispositivos existentes extrair o seu conceito e
peculiaridade.
52. A subsidiariedade é instituto jurídico em que a ideia principal é de que diante
da existência de vários obrigados com relação a uma dívida, o credor não pode
estabelecer uma ordem de preferência para a cobrança da dívida e execução do
coobrigado. O matiz da subsidiariedade, que a destoa em específico da
solidariedade, é exatamente a presença do benefício de excussão e mais,
entendemos que só por disposição expressa de lei.
53. Os enunciados prescritivos que compõem o art.124 do CTN dispõem sobre a
pluralidade passiva simultânea pelo pagamento do tributo, quando prevê hipóteses
de solidariedades, adotando os seguintes critérios: interesse comum na situação que
constitua o fato gerador e a designação expressa de lei.
54. Na solidariedade passiva tributária, há assim, uma pluralidade de sujeitos
passivos, pessoas físicas ou jurídicas, em que a obrigação tributária una decorre da
prática do fato previsto no antecedente da regra matriz de incidência, de forma
pessoal e direta pelo contribuinte, e junto com este, pela norma de responsabilidade
tributária com base no interesse comum ou por disposição expressa de lei, há
inclusão de uma terceira pessoa no polo da sujeição passiva como responsável pelo
pagamento do tributo, vinculada ao fato tributado ou àquele que o praticou, o que por
dedução lógica, não poderia ser diferente, por estarmos tratando de
responsabilidade tributária, onde tais pressupostos são inarredáveis para a
configuração da fisionomia do instituto jurídico conforme o traço desenhado pelo
legislador complementar.
55. No direito tributário a solidariedade resulta de lei, sempre. Na primeira
hipótese o legislador determina um critério - o interesse comum na situação que
constitua o fato gerador – por si só suficiente para entrelaçar as pessoas envolvida
nesse liame como solidárias, e portanto prescindindo de ser reiterado
expressamente na lei instituidora do tributo.
56. Na verdade, o pressuposto da solidariedade prevista no art.1241, I pode ser
percebido sob duas perspectivas: o fato escolhido pelo legislador como irradiador do
efeito tributário é praticado pela atuação comum de várias pessoas em prol dos seus
interesses em virtude de uma relação de direitos e deveres que são convergentes
em busca de determinados resultados, ou seja, se não houvesse a expectativa
voltada para um fim, não haveria o interesse ou necessidade da prática do fato
tributado.
57. A segunda perspectiva: a nota que caracteriza o interesse comum exigido
pela lei para aplicação do dispositivo analisado, ou seja, que implica a solidariedade,
é jurídica, ilação que é obtida, ainda que se trate de um conceito indeterminável, é
possivelmente determinável a partir da interpretação sistemática das normas
tributárias.
58. A ratio essendi do dispositivo legal é que o interesse no pressuposto fáctico
do tributo é jurídico, o que requer necessariamente que as pessoas solidariamente
obrigadas pelo tributo sejam sujeitos da relação que fez surgir a obrigação tributária,
de forma direta ou ainda que pela participação indireta, integrando o polo passivo da
relação jurídica.
59. Há uma interdependência e uma unidade no plexo de interesses que envolve
o interesse jurídico solidário, o que nos faz crer que ainda que o resultado
econômico ou proveito da situação que constitui o fato gerador da obrigação
principal, não configure o interesse jurídico, ele tem que ser considerado pela
autoridade competente para o lançamento fiscal, pois trata-se tão somente de uma
relação de causa e efeito, efeito cascata, por sinal: atitude positiva ou negativa,
impulsionada pelo interesse jurídico, em busca do atendimento da necessidade ,
para viabilizar o resultado pretendido.
60. Há no entanto, uma hipótese em que a solidariedade entre sujeitos passivos é
prevista, excluindo o interesse comum, quando expressamente designada por lei,
conforme previsto no art.124, II. É a chamada solidariedade de direito.
61. O dispositivo legal tem como destinatário o ente político, atribuindo-lhe a
competência ordinária de estabelecer vínculos de solidariedade entre sujeitos
passivos atendidos as balizas constitucionais e legais, com a finalidade, dentre
outras, de assegurar, viabilizar o recebimento do crédito tributário.
62. A construção da regra sobre a obrigação solidária não acontece mediante a
obediência dos dois requisitos de modo cumulativo pois, dessa forma não haveria
utilidade e esvaziaria de conteúdo um ou outro, nem tampouco significa que
considerando-se cada um individualmente, a previsão em lei ordinária seria de total
liberdade para estabelecer hipótese de sujeição passiva solidária, pois, conforme
destacamos, os pressupostos e limites para colocar no tópico da sujeição passiva,
um terceiro, não perde a sua fisionomia por se tratar de solidariedade, são
constitucionais e legais.
63. A lei ordinária ao instituir norma de responsabilidade com relação aos débitos
perante à Seguridade Social não poderia subverter o regime jurídico estabelecido
pelos enunciados prescritivos referidos, o que restou claro diante da disposição
sobre hipótese de responsabilidade solidária dos sócios com a pessoa jurídica no
caput, sem nenhuma prática de ilícito que a justificasse, no caso de sociedades
limitadas, enquanto que no parágrafo único responderiam de forma solidária entre os
que praticam atos de gestão ilícitos, por dolo ou culpa, mas de forma subsidiária
com relação à sociedade, no caso de S/A, por exemplo.
64. O art.146, III da CF ao dispor sobre a competência de lei complementar,
delegou a atribuição de normas gerais em matéria tributária, notadamente na
definição de tributos e todos os aspectos atinentes à regra matriz de sua incidência,
o que quer dizer, que tal competência refere-se a conteúdo abrangente,
condicionantes e estruturantes, não específicos, apesar do CTN trazer o arquétipo
da sujeição passiva e da responsabilidade em minúcias, no entanto o ente político,
ao dispor sobre a espécie tributária na órbita de sua competência, pode esmiuçar os
contornos trazidos pelas normas gerais.
65. A análise do art.170 da CF deixa claro que os fundamentos da atividade
econômica estão, dentre outros, na valorização do trabalho humano, na livre
iniciativa e na liberdade de concorrência, que demonstram, por sua vez, a exigência
de que as empresa devam cumprir a sua responsabilidade social.
66. O ordenamento jurídico brasileiro admite duas possibilidades para que as
sociedades constituam grupos: com base nas relações societárias que possuem (
art.1.097 CC c/c arts. 243 a 264 da Lei n. 6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas
LSA), ou formalmente pela convenção entre as sociedades ( arts. 266 e 271 – LSA),
São denominados pela doutrina: grupo de fato e de direito, respectivamente.
67. Nesse contexto, importa observar que a direção unitária é sob a perspectiva
jurídica, a outorga de competência a um órgão ou sociedade, típico dos grupos de
coordenação onde as várias sociedades se unem em torno de uma direção
econômica, mas a independência entre as sociedades é mantida, a autonomia
jurídica e econômica, pois cada uma mantém sua personalidade jurídica e seu
patrimônio, individuais.
68. Enquanto nos grupos em que há subordinação, a direção na mesma
perspectiva, cabe a uma das sociedades que em geral é a controladora e se situa
numa posição hierárquica superior sobre as demais sociedades do grupo no entanto
há também a independência e a autonomia jurídica, personalidade e patrimônio
individualizados e inclusive respondendo cada uma por suas obrigações, sem
presunção de solidariedade ( art.278, §1° LSA), exceto se do contrário, houver
disposição em lei.
69. O órgão de tomada de decisões ou a sociedade controladora que detém o
poder de tomar decisões estratégicas, mantem o controle sobre as outras
empresas, interferindo na decisão da prática das operações e dos negócios
jurídicos, administrando inclusive, as obrigações deles decorrentes, como o
pagamento de tributos e o cumprimento ou não de obrigações acessórias. As
empresas desse tipo de grupo têm uma autonomia diferida ou disfarçada, pois o
exercício de sua atividade é atado por quem controla. Nesse caso , há uma
vinculação ao fato gerador da obrigação por quem controla a prática de atividades
da empresa, e portanto, há a possibilidade de imputação de responsabilidade
tributária entre as empresas componentes do grupo e à que compete o centro de
decisões.
70. Não basta a previsão expressa e tampouco pertencer a grupo econômico,
requer a convergência de indícios e de elementos fáticos e a fundamentação da
imputação deverá estar descrita de forma pormenorizada nos relatórios dos autos
devidamente atreladas à produção de provas cujo ônus, nesse caso é da Fazenda
Pública ( arts.142 e 149 do CTN). A previsão expressa em lei de solidariedade
tributária, repisamos, tem que estar nos desenhos do art.128 do CTN, ou seja, a
vinculação entre pessoas que realizam o fato gerador é o maior traço.
71. Do ponto de vista jurídico a personalidade das sociedades não se confunde
com a dos seus sócios, e este fato é ponto pacífico na doutrina e na jurisprudência,
assim como são separados o patrimônio da sociedade e o patrimônio pessoal dos
sócios.
72. É a regra geral em matéria tributária também. No entanto, em caráter
excepcional, o CTN, nos arts.134, VII e 135, III, dispõe sobre a responsabilidade dos
sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas e dos sócios ou
administradores diante da prática de atos com excesso de poderes, infração de lei,
contrato social ou estatuto, respectivamente.
73. A hipótese de responsabilidade tributária como vimos, pode ser em
decorrência de atos lícitos ou ilícitos, e com base nesses últimos é que o legislador
complementar previu a hipótese de ser imputada responsabilidade tributária ao sócio
ou administrador pelos tributos devidos pela pessoa jurídica em decorrência da
prática de tais atos, que cabe afirmar, não se confundem com a prática de fatos
jurídicos tributários.
74. Nesse sentido usual do enunciado da norma e em qualquer outro, na
verdade, torna-se de extrema relevância que sejam identificados os atos de gestão
que foram praticados de forma ilícita e contrária aos interesses da sociedade. Por
outro lado, é notável que o destinatário legal do enunciado da norma é aquele que
tem poder de administração, comando e prática de atos negociais da empresa, seja
como sócio, ou como administrador, que pode estar incluído o diretor, o gerente ou a
pessoa que tenha poderes de representação da sociedade, tudo nos contornos de
suas atribuições previstas no contrato social das sociedades de responsabilidade
limitada ou no estatuto social das sociedade anônimas.
75. É pacifico hoje na jurisprudência que o simples inadimplemento da obrigação
tributária pelo contribuinte, que é a pessoa jurídica, não caracteriza infração à lei e
não acarreta a responsabilidade pessoal do sócio ou administrador, que por sua vez,
não pode ter o redirecionamento da execução fiscal para si, se não deu causa, nem
ter seu nome inserido no polo passivo da Certidão de Dívida Ativa sem o devido
processo legal, em que seja garantido o contraditório e a ampla defesa.
76. Com referência às decisões dos tribunais, em específico o Superior Tribunal
de Justiça, tem aplicado a hipótese de responsabilização pessoal dos sócios prevista
no art.135 do CTN no caso de dissolução irregular da pessoa inda que o feito não
guarde conexão com o fatos jurídico tributário, cabendo o ônus da prova de que não
incorreu nas hipóteses legais aos que estão sendo responsabilizados, configurando
mais uma forma o animus puniendi do legislador e sendo a temática já pacificada
pelo enunciado da súmula n°435, do Tribunal Superior.
77. Nessas situações a responsabilidade é pessoal ou excludente do sócio ou
administrador que agiu de forma dolosa ou fraudulenta, com infração à lei, o que não
raro, acontece em grandes organizações empresarias, notadamente na forma de
sociedades anônimas, que possuem um grande número de acionistas, que na
realidade são todos sócios, mas o poder diretivo, de comando e de gestão
patrimonial, administrativa e financeira está restrito àqueles são detentores ou de
maior numero de ações ou que representam o maior valor patrimonial, e agem com
base em seus interesses, lesando a pessoa jurídica e os demais sócios.
78. O sócio ou administrador paga por débito próprio e sem direito de ação de
regresso porque agiu contra os interesses da pessoa jurídica e para além disso,
causando dano pela conduta ilícita.
79. Da análise interpretativa do dispositivo legal pode tomar outo norte, dentre
outros, como por exemplo: i. o não recebimento do crédito tributário pela Fazenda
Pública em virtude do ilícito praticado pelos sócios ou administradores em benefício
da empresa e pela utilização desta, em conjunto à impossibilidade de recebimento
do valor pelo esvaziamento do patrimônio da sociedade, ou como comum na praxe
fiscal, “pelo trânsito do lucro auferido na atividade empresarial através da pessoa
jurídica, por atuação dos seus sócios ou administradores e escoado em prol dos
reais beneficiários da atividade ilícita”.
80. A interpretação do art.135, III, precisa de temperamentos, para ser atrelada a
outros dispositivos, para termos o alcance maior da norma, nas situações em que
aquele que tem poderes de gestão, de decisão dos atos negociais que podem gerar
a obrigação tributária ou criar obstáculos à positivação da regra matriz de incidência,
ou ainda causar o inadimplemento daquela, aliado à insolvência da empresa estão
atuando ainda que com infração à lei, mas com base em interesses comuns e em
benefício também da sociedade.
81. A infração à lei, entendemos ser das hipóteses previstas na lei, a que mais
afeta à seara tributária e nesse sentido a construção da norma de responsabilidade
não cabe na literalidade do que dispõe o caput do art.135, pois carece de integração
para a partir do alcance da tipicidade da infração, se penal, civil, societária, tributária
, ou seja dos enunciados que qualifiquem a dita atitude ilícita, retornar aos
enunciados de responsabilidade tributária e assim completar o sentido da norma.
82. Em realidade, há que haver a comunhão com outros enunciados prescritivos
no direito positivo em outras áreas como citamos, assim como às normas do próprio
CTN, é claro, como já bastante frisado em nosso trabalho, há necessidade da
referência sistêmica para a capitulação legal certa diante dos fatos. É nesse sentido
que a extração da norma de responsabilidade tributária que alcance as atuações
empresarias referidas como nossa temática central, não pode ser pela inteligencia
de um só dispositivo previsto na norma geral de matéria tributária, mas pela
comunhão de vários, para além dos acima citados, com os arts. 121, 128, art.124, I e
II, e ainda dos 135, III e 137, I e III.
83. A sociedade como pessoa jurídica é ficção jurídica, criação da linguagem
normativa, com personalidade própria adquirida a partir dos registros de seus atos
constitutivos (art.985 CC), como um centro de deveres e de direitos, e que ´possui
patrimônio próprio que não se confunde com o dos seus sócios. Cabe frisar que
ainda que a pessoa jurídica possua personalidade própria, empiricamente, é
atribuída a conduta omissiva ou comissiva àquele que tem competência para atuar
em seu nome, de acordo com os seus atos constitutivos.
84. O regime de responsabilização nas sociedades limitadas ( art.1052 a 1.087 do
CC) e as sociedades anônimas ( LSA 6.404/76), difere, pois na sociedade limitada, a
responsabilidade dos sócios é restrita ao valor do capital subscrito, ainda que não
integralizado, respondendo os sócios entre si solidariamente pela subscrição,
enquanto na sociedade anônima, a responsabilidade de cada sócio ou acionista está
limitada ao preço das ações subscritas ou adquiridas, e não há responsabilidade
pelos débitos sociais perante terceiros.
85. Inserida então na esfera da excepcionalidade é que em matéria tributária a
responsabilidade por dívida tributária poderá alcançar o patrimônio dos sócios dentro
dos contornos definidos em lei, e ainda assim abarca somente aos que exercem
possuem poder de gestão, controle e tomada de decisões dos atos negociais,
exercendo a gerência ou administração, podendo no primeiro caso coincidir com a
pessoa do sócio, e no segundo não.
86. As liberdades estão protegidas e consagradas na CF/88: a livre iniciativa, a
liberdade individual e de contratar, a livre concorrência e o exercício da atividade
empresarial. Esta, por sua vez, tem como maior característica o risco assumido em
face do retorno a ser obtido pelo investimento feito.
87. A questão da licitude das operações realizadas pelos contribuintes nas
organizações societárias deveria ser tão somente uma preliminar, uma pedra de
toque assentada a partir da qual surgiriam os seus efeitos, tendo em vista ser a
empresa um dos maiores instrumentos jurídicos para que se realizem os objetivos
fundamentais da ordem econômica cravada no Texto Constitucional.
88. As atuações empresarias ilícitas são aquelas em que há a configuração do
abuso da personalidade jurídica, a fraude, o conluio, o desvio da função social da
empresa e da sua finalidade, que estão cada vez mais presentes no universo atual
das organizações empresariais que se unem em grupos econômicos, não
formalizados juridicamente, mas que pela atuação dos seus gestores ou do órgão ou
da sociedade que controla, praticam atos ilícitos, infrações às leis, crimes tributários
e enriquecem ilicitamente, em detrimento da ordem social, econômica e tributária.
89. Há uma figura maior no contexto da ilicitude empresarial: a patologia de não
arrecadar tributos e desse mal jurídico padece aquelas sociedades que estão
reunidas em grupos econômicos irregulares e naquelas constituídas por interpostas
pessoas, de forma concomitante ou não.
90. A natureza de grupo econômico, por si só, não desfigura a independência, a
autonomia e a identidade das sociedades que o forma, nem em matéria tributária,
como regra geral, cada uma é responsável por suas obrigações tributárias
individualmente, exceto se por previsão expressa em lei nos limites estabelecidos
pelo legislador complementar, se houver interesse jurídico comum daquelas na
realização do fato jurídico tributado ou ainda pelo abuso da personalidade jurídica.
91. Nas trilhas da situação fática, em que presentes estão as figuras do abuso da
personalidade jurídica, a simulação, o abuso do direito, a confusão patrimonial, há a
permissão para que a autoridade fiscal desconsidere os atos dissimulados
praticados, nos termos de colher como responsáveis pelos tributos devidos em
decorrência da realização em conjunto do fato jurídico tributário, sem prejuízos das
demais penalidade cabíveis, sancionadoras administrativas e penais, se for o caso.
92. Há assim a extensão em caráter excepcional da responsabilidade para
alcançar o patrimônio de todas as pessoas atadas juridicamente pelo interesse na
realização do pressuposto do fato da tributação, destacando a individualização das
sociedades participantes do grupo econômico, apenas aparente, e para além disso,
alcançar também o patrimônio daqueles que tem poderes de gestão, de decisão dos
atos negociais das empresas, em especifico, daqueles irradiadores de efeitos
tributários.
93. A aplicação dos enunciados prescritivos da responsabilidade tem que ser
feita através da comunhão com outros enunciados prescritivos no direito positivo,
pela referência sistêmica para a capitulação legal certa diante dos fatos e pela
comunhão de vários, para além dos acima citados, com os arts. 121, 128, art.124, I e
II, e ainda dos 135, III e 137, I e III.
94. A responsabilidade a que nos referimos, é a solidária e sem benefício de
ordem, entre as pessoas jurídicas e os sócios, administradores, acionistas com
poderes de gestão, em virtude de que pela prática do ilícito e do fato jurídico
tributário, o benefício também foi comum a todos, com base em provas
fundamentadas.
95. Quanto à teoria da desconsideração da personalidade jurídica há uma
exigência jurídico positiva para a sua aplicação e que diante disso, as hipóteses
previstas de responsabilidade tributária solidária, ou subsidiária, ou pessoal dos
sócios ou administradores pela obrigação da pessoa jurídica, não requer por uma
interpretação axiológica, de desconsiderar a personalidade da empresa para atribuir
a responsabilidade, posto que estão seus pressupostos devidamente desenhados
pelo legislador complementar nas hipóteses de incidência da norma, se por motivos
de praticidade e eficácia da fiscalização e arrecadação ou de caráter sancionador.
96. O ônus da prova em matéria de responsabilidade tributária deve ser feito por
meio da linguagem de provas em sua total extensão, revertendo o ônus da prova
para a Fazenda Pública, caso o sujeito passivo apresente impugnação ao
lançamento fiscal.
97. Carece de fundamento o ônus da prova ser deslocado ou não para o sujeito
passivo em função de constar a inclusão ou não do nome do responsável desde o
início na Certidão de Dívida Ativa, conforme atual entendimento jurisprudencial.
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