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TCC - Leonan Braga Lopes - 11-08-2022
TCC - Leonan Braga Lopes - 11-08-2022
Belém – Pará
2022
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS
FACULDADE DE ESTATÍSTICA
Belém – Pará
2022
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS
FACULDADE DE ESTATÍSTICA
Banca Examinadora
____________________________________ ____________________________________
Prof. Dr. Edson Marcos Leal Soares Ramos Profa. M.Sc. Adrilayne dos Reis Araújo
Universidade Federal do Pará Universidade Federal do Pará
Orientador Avaliadora
____________________________________ ____________________________________
Esp. Luís Carlos Jurema dos Santos Júnior Prof. Dr. José Gracildo de Carvalho Júnior
Universidade Federal do Pará Universidade Federal do Pará
Avaliador Avaliador
____________________________________
Profa. Dra. Silvia dos Santos de Almeida
Universidade Federal do Pará
Avaliadora
Belém-Pará
2022
3
AGRADECIMENTOS
4
LOPES, Leonan Braga. Caracterização de Estupro de Mulheres ocorridos na Região
Metropolitana De Belém – Pará – Brasil. 2022. 36f. TCC (Graduação em Estatística).
Faculdade de Estatística. Instituto de Ciências Exatas e Naturais. Universidade Federal do
Pará, Belém, Pará, Brasil, 2022.
RESUMO
Importância: Os crimes de estupro estão presentes no convívio social ao longo das gerações,
sendo marcado por ser uma prática forçada e de domínio sobre o corpo da vítima para a
ocorrência do ato sexual contra a própria vontade. Mesmo sofrendo com a gravidade e as
consequências causadas pelo estupro, muitas vezes a vítima convive com os julgamentos de
uma sociedade que responsabiliza mais a vítima e isenta o agressor da culpa. Objetivo:
Caracterizar o crime de estupro contra mulheres na Região Metropolitana de Belém-Pará, no
período de 2010 a 2019. Métodos: A natureza da pesquisa é aplicada, quantitativa,
exploratória e descritiva. Faz referência aos municípios que formam a Região Metropolitana
de Belém. Os dados utilizados na pesquisa foram extraídos por meio do Sistema Integrado de
Segurança Pública, e disponibilizadas a partir da Secretaria Adjunta de Inteligência e Análise
Criminal, órgão da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do
Pará. Resultados: Foi verificado que a ocorrência dos casos de estupro apresentou um
aumento a partir de 2016. Foram registrados com maior intensidade em residências
particulares (77,41%), motivado pela devassidão (33,50%) e outras causas (45,44%), e o grau
de relação com o acusado sendo o padrasto (22,63%). Além disso, essas práticas estavam
mais presentes no período da noite (28,68%), em uma quarta-feira (18,28%), com o meio
empregado por outros meios (362). A maioria das mulheres vítimas de estupro são solteiras
(81,54%), na faixa etária de 12 a 17 anos (40,87%), ocupando a função de estudante (44,84%)
e com nível de escolaridade identificado com ensino médio completo (28,44%). Conclusão: É
importante ressaltar a presença de uma política preventiva promovida pelas autoridades
públicas que ajuda trazer visibilidade ao tema e também busca conscientizar as pessoas na
importância de combater essa violência, tomando medidas cabíveis para punir os agressores e
oferecendo auxílio em programas sociais que ajudam as vítimas em recuperar a integridade
física e emocional.
Palavras-chave: Violência Sexual, Crime, Dignidade, Vulnerável.
5
LOPES, Leonan Braga. Characterization of Rape of Women in the Metropolitan Region
of Belém – Pará – Brazil. 2022. 36f. TCC (Graduate in Statistics). Faculty of Statistics.
Institute of Exact and Natural Sciences. Federal University of Pará, Belém, Pará, Brazil, 2022.
ABSTRACT
Importance: Rape crimes are present in social life throughout the generations, being marked
by being a forced practice and dominance over the victim's body for the occurrence of the
sexual act against his own will. Even suffering from the severity and consequences caused by
rape, often the victim lives with the trials of a society that holds the victim more accountable
and exempts the aggressor from guilt. Objective: To characterize the crime of rape against
women in the Metropolitan Region of Belém-Pará, from 2010 to 2019. Methods: The nature
of the research is applied, quantitative, exploratory and descriptive. It refers to the
municipalities that make up the Metropolitan Region of Belém. The data used in the research
were extracted through the Integrated System of Public Security, and made available from the
Deputy Secretariat of Intelligence and Criminal Analysis, an agency of the State Secretariat of
Public Security and Social Defense of the State of Pará. Results: It was verified that the
occurrence of rape cases increased from 2016. They were recorded with greater intensity in
private residences (77.41%), motivated by debaualness (33.50%) and other causes (45.44%),
and the degree of relationship with the accused being the stepfather (22.63%). In addition,
these practices were more present in the night (28.68%), on a Wednesday (18.28%), with the
medium used by other means (362). Most women victims of rape are single (81.54%), aged
12 to 17 years (40.87%), occupying the role of student (44.84%) and with level of education
identified with complete high school education (28.44%). Conclusion: It is important to
highlight the presence of a preventive policy promoted by public authorities that helps bring
visibility to the theme and also seeks to make people aware of the importance of combating
this violence, taking appropriate measures to punish aggressors and offering assistance in
social programs that help victims in regaining physical and emotional integrity.
Keywords: Sexual Violence, Crime, Dignity, Vulnerable.
6
LISTA DE FIGURAS
7
LISTA DE SIGLAS
8
SUMÁRIO
9
10
CAPÍTULO 1 - CONSIDERAÇÕES GERAIS
1.1. INTRODUÇÃO
A violência é mostrada como um fenômeno do cotidiano, perfazendo-se como objeto
de estudo em várias áreas do conhecimento, sendo caracterizada como um fenômeno social
responsável por diversos agravos no que diz respeito à saúde (MINAYO; SOUZA, 1993).
Para Minayo e Souza (1993), vários tipos de violência constituem redes intricadas e
complexas, onde todas as pessoas podem ser consideradas autores e vítimas. A violência é
considerada por Santos (2009) como um fenômeno multicausal ou multifatorial que atinge
todas as classes sociais, instituições e grupos etários. Os indivíduos mais indefesos são os que
recebem maior hostilidade (SANTOS, 2009).
Entre as principais violências se destaca o estupro, cuja palavra é oriunda do latim
stuprum, definida por Ferreira (1999) como uma prática de forçar outrem a ter relações
sexuais contra a vontade da vítima, fazendo o uso de violência ou ameaças físicas e
psicológicas. A violência sexual foi se constituindo num diálogo entre aspectos sociais
relacionados numa dominação entre gêneros manifestados pela cultura machista, reforçando a
virilidade masculina (SOMMACAL; TAGLIARI, 2017).
O estupro é conceituado como um ato de violência, humilhação e domínio sobre o
corpo da mulher por meio dos sexuais, sendo que a experiência vivida pelas vítimas causam
sequelas e traumas físicos e mentais na vida das mulheres (SUDÁRIO; ALMEIDA; JORGE,
2005). A vítima de estupro sofre consequências físicas com lesões nos órgão genitais,
contusões e fraturas, além conviver com gravidez indesejada e transmissão de doenças
sexualmente transmissíveis (CERQUEIRA; COELHO; FERREIRA, 2014). No aspecto
psicológico, a vítima encara diversos traumas que levam à depressão, crise de ansiedade, uso
de drogas ilícitas e tentativas de suicídio (CERQUEIRA; COELHO; FERREIRA, 2014).
Segundo o Código Penal por meio da Lei N° 2.848/1940 (BRASIL, 1940), o crime de
estupro poder ser caracterizado à ausência de consentimento por parte da vítima no momento
em que o ato libidinoso é praticado contra a própria vontade. Anteriormente, o estupro era
caracterizado a partir da existência de conjunção carnal com violência e grave ameaça
(CUNHA, 2019). Embora tenha lei que visa combater o crime de estupro, continua na
insistência da sociedade em colocar a culpa na vítima, reforçando a refletir como a
desigualdade de gênero ajuda normalizar esse tipo de violência e duvidando o lugar da mulher
na sociedade atual (SANTOS; CURVÊLLO; NERY, 2019).
O comportamento da sociedade acaba refletindo nas estatísticas, apontando que a cada
11 minutos uma mulher é estuprada (FBSP, 2015). O quadro se agravou em 2019 ao constatar
pelo menos um estupro a cada 8 minutos, com o registro de 66.123 boletins de ocorrência de
estupro e estupro de vulnerável registrado nas delegacias (FBSP, 2020). São números que dão
conta apenas dos casos que foram denunciados, pois é evidente a presença de subnotificação
dos casos diante da sensação de medo, sentimento de culpa e vergonha por parte da vítima;
além conviver com o pavor do agressor e do desestímulo por parte das autoridades
(SCARPATI; GUERRA; DUARTE, 2014).
No Pará, foram registrados, por meio de boletim de ocorrência, 3.648 casos de estupro
e estupro de vulnerável em 2019, levando consideração que meninas e mulheres
11
correspondem em 89% dos casos (FBSP, 2020). Segundo dados da Secretaria Adjunta de
Inteligência e Análise Criminal - SIAC, foram registrados na Região Metropolitana de Belém
10.304 casos de estupros entre o período de 2010 a 2020, com 5.981 casos registrados apenas
na capital paraense (PARÁ, 2022).
Neste contexto, a presente pesquisa terá como objeto o estupro geral, previsto no Art.
213 do CP, assim como o estupro de vulnerável, previsto no Art. 217-A do CP. O estudo da
pesquisa divide-se em três capítulos. No primeiro capítulo, intitulado de Considerações
Gerais, o estudo é composto por Introdução, Justificativa, Problema, Revisão da Literatura,
Objetivos, Hipótese e Metodologia. No segundo capítulo, é composto pelo Artigo Científico
com o título de “Perfil das Vítimas e dos Delitos de Estupro Praticados na Região
Metropolitana de Belém – Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019” com o objetivo de
caracterizar o crime de estupro contra mulheres na RMB. No terceiro capítulo, faz as
Considerações Finais e Recomendações Para Trabalhos Futuros.
1.2. JUSTIFICATIVA
A violência sexual é associada à figura machista perante o conjunto de condutas
desenvolvidas e reforçadas culturalmente sobre a figura masculina, glorificando os atributos
ligados ao homem e perpetuando a desigualdade de gêneros, fundamentadas numa ideologia
que normaliza o homem a controlar o governo, o mercado e as atividades públicas. Já as
mulheres, eram subordinadas à figura masculina (SOUZA; BALDWIN; ROSA, 2000).
A sociedade tem evoluído ao longo dos anos, com tendência de maior aceitação e
afastamento aos preconceitos, porém as mulheres continuam sofrendo por viver em uma
sociedade predominantemente patriarcal, que mantém uma mentalidade preconceituosa contra
a figura feminina (PEIXOTO; NOBRE, 2015). Isso se faz presente nos crimes de estupro,
onde a mulher ainda é caracterizada na figura do sexo sem consentimento, sendo o maior alvo
desejado, somando também ao fato de uma parcela da sociedade atribuir a responsabilidade
pela violência sexual em cima da vítima por questões de comportamentos, vestimenta e entre
outros, atrelado a uma suposta facilidade demonstrada pela própria mulher (PEIXOTO;
NOBRE, 2015).
Portanto, é essencial ressaltar que a violência sexual contra a mulher tem a
necessidade de ser retratado como um problema social que, para ser combatido, exige a
presença de ações públicas no âmbito da segurança, do direito e da saúde (VILLELA; LAGO,
2007).
1.3. PROBLEMA
A violência sexual representa uma violação contra os direitos humanos, pois não há
justificativa para cometer esse ato, sendo fundamental entender que a culpa nunca será da
vítima (IPG, 2019). Durante anos, os casos de estupros eram subnotificados devido ao medo,
à vergonha e ao sentimento de culpa por parte da vítima (FBSP, 2019).
Para Blumer (1971), o problema social é fruto de uma definição coletiva como objeto
operacional de interesses, intenções e objetivos divergentes e conflitantes; levando a análise
12
não ficar restrita aos aspectos objetivos de uma determinada condição social. No caso do
estupro, ele é tratado como problema social a partir do momento que há um processo de
construção coletiva, envolvendo ações de grupos ativistas, movimentos sociais e participação
política (ANGHINETTI, 2016).
Sendo assim, o problema da pesquisa foca em: (i) Qual a caracterização do crime de
estupro? (ii) Qual a relação entre a vítima e o autor?
Para Nascimento (2016), a figura da mulher como perversa e sedutora, além de ser
responsável por esse tipo de violência, está implícita num contexto reforçado por um discurso
bíblico que coloca o homem no patamar de ser descontrolado e dominado pela sedução,
justificado pelo excesso de testosterona. Partindo desse contexto, fica evidente que o estupro é
uma realidade cuja violência acompanha toda a história da humanidade, sendo exercida desde
o período pré-histórico como a “lei do mais forte” que reforçou esse ato ser uma prática
corriqueira (CAMPOS, 2016).
No Brasil, o estupro foi compreendido como violência a partir do século XX com a
realidade ilustrada no Código Penal Brasileiro, ao ser caracterizado como uma prática sexual
forçada contra mulheres “honestas” mediante a fraude, violência ou ameaças (BRASIL,
1940). A alteração desse decreto renova a ideia de que o estupro possui um caráter particular,
exclusivamente das instâncias individuais dos envolvidos, isentando assim a responsabilidade
do Estado perante a violência sexual (SILVA et al., 2021).
Segundo Buchwald, Fletcher e Roth (1993), o mito dos estupros trata a violência
sexual como um conjunto de crenças que encorajam os agressores sexuais masculinos e
oferece suporte a violência contra a mulher, caracterizada como sensual e merecedora pelas
agressões sofridas. Portanto, entender o estupro como um problema singular só ajuda desviar
o foco das questões sociais que colaboram na percepção do estupro, exemplificada na
ausência de educação sexual nas escolas e na falta de políticas públicas adequadas na
prevenção ao estupro (SILVA et al., 2021).
1.5. OBJETIVOS
14
Identificar os períodos e o local de maior ocorrência do crime de estupro na Região
Metropolitana de Belém.
Traçar o perfil de relação entre a vítima e o acusado.
1.6. HIPÓTESE
A hipótese deste trabalho é identificar se o principal agressor da vítima de estupro na
RMB é o pai ou o padrasto.
1.7. METODOLOGIA
1.7.2. Lócus
O ambiente da pesquisa faz referência aos registros característicos das mulheres que
foram vítimas de estupro na Região Metropolitana de Belém (RMB). A RMB foi instituída
em 1995 por intermédio da Lei Complementar N° 27, de 19 de outubro de 1995 (PARÁ,
1995), que no início foi integrado pelos municípios de Belém, Ananindeua, Marituba, Santa
Bárbara e Benevides. Atualmente ela é formada por sete municípios com a introdução de
15
Santa Isabel do Pará em 2010 pela Lei Complementar N° 72 (PARÁ, 2010) e de Castanhal
em 2011 pela Lei Complementar N° 76 (PARÁ, 2011).
17
CAPÍTULO 2 – ARTIGO CIENTÍFICO
RESUMO
Importância do Estudo: Os casos de estupros contra mulheres são decorrentes de um
comportamento da sociedade que normalizavam essas práticas e condenavam as vítimas,
justificando que elas causavam atração aos homens por meio dos atributos físicos. As
constantes lutas por justiça são essenciais para mudar a visão social com relação ao estupro
para entender que é necessário oferecer todo o apoio à vítima e cobrar do poder público por
punições rígidas aos agressores, que são os verdadeiros culpados. Objetivo: Perfil das
Vítimas e dos Delitos de Estupro Praticados na Região Metropolitana de Belém – Pará –
Brasil, no período de 2010 a 2019. Metodologia: A pesquisa possui caráter quantitativo e
descritivo que, com base em dados oficiais de estupro de mulheres ocorridos no recorte
temporal de 2010 a 2019, por meio da análise exploratória de dados, foram sintetizadas em
gráficos e medidas de síntese. Resultados: Foi verificado que a maioria dos casos de estupros
presentes nas residências particulares, teve o padrasto como principal agressor. Verificou-se
também que Belém é a cidade da Região Metropolitana com maior percentual de violência
sexual, com os casos ocorrendo no período da noite. Conclusões: Faz-se necessário maior
aprofundamento de estudo acerca dos fatores causais deste tipo de violência, como também,
reavaliar as medidas públicas de enfrentamento pelos órgãos da segurança pública.
Palavras-chave: Violência Sexual, Crime, Caracterização, Dignidade.
18
Profile of Victims and Rape Crimes committed in the Metropolitan Region of Belém -
Pará - Brazil, from 2010 to 2019
SUMMARY
Importance of the Study: The cases of rapes against women are due to a behavior of society
that normalized these practices and condemned the victims, justifying that they caused
attraction to men through physical attributes. The constant struggles for justice are essential to
change the social view with respect to rape to understand that it is necessary to offer all the
support to the victim and charge the public for strict punishments to the aggressors, who are
the real culprits. Objective: Profile of Victims and Rape Crimes committed in the
Metropolitan Region of Belém - Pará - Brazil, from 2010 to 2019. Methodology: The
research has a quantitative and descriptive character that, based on official data on rape of
women occurred in the time frame from 2010 to 2019, through exploratory data analysis,
were synthesized in graphs and synthesis measures. Results: It was verified that the majority
of rape cases present in private homes had as the stepfather being the main aggressor. It was
also found that Belém is the city of the Metropolitan Region with the highest percentage of
sexual violence, with cases occurring in the evening. Conclusions: Further study on the
causators of this type of violence is necessary, as well as reassessing public measures to
confront public security agencies.
Keywords: Sexual Violence, Crime, Description, Dignity.
2.1. INTRODUÇÃO
A violência sexual representa um sério problema de saúde pública, levando a ser
constituído como um dos principais indicadores da discriminação de gênero contra a mulher
(NUNES; MORAIS, 2016). Dutra e Thibau (2020) notaram que a violência sexual é vista
como um fenômeno multifatorial por meio dos aspectos culturais que determinou a
constituição masculina e feminina, categorizando historicamente as diferenças sociais, uma
vez que as relações de gênero não são um aspecto permanente de condição humana.
No caso do estupro, ele já é definido quando houver uma ausência de consentimento
da vítima, exemplificado quando embebedam uma pessoa e faz relações sexuais, pois a pessoa
não estava consciente para aprovar o ato (TERASOLO et al., 2015). Segato (2003) afirma que
o estupro é notado pelos agressores como “castigo ou vingança genérica contra a mulher que
não saiu do lugar”, dando a entender que função feminina na sociedade era ficar em casa
cuidando do lar. A limitação imposta à mulher também é reforçada nas instituições judiciais,
pois apesar da existência de leis, que visam preservar a integridade feminina, na prática o
mundo jurídico apresenta uma predominância de valores masculinos que ajudam a cumprir
um papel significativo de manutenção da ordem de status entre homens e mulheres (DUTRA;
THIBAU, 2020). As tomadas decisivas das concepções discriminatórias em relação à mulher
prova que ainda existe um quadro latente da falta de harmonia entre os propósitos da lei e a
moralidade patriarcal presentes na mentalidade dos operadores da lei (DUTRA; THIBAU,
2020).
O estudo característico da pesquisa é divido em quatro itens: localização, período de
tempo, perfil da vítima e perfil do agressor. A localização agrupa o local de ocorrência e os
municípios. O período de tempo agrupa mês, ano, dia da semana e turno. Já o perfil da vítima,
caracteriza faixa etária, ocupação/profissão, nível de escolaridade e situação civil. E o perfil
do agressor agrupa a relação dele com a vítima, a faixa etária, o meio usado durante o crime e
a motivação pelo ato.
20
Num cenário de imposição social de uma masculinidade agressiva, o estupro constitui
uma busca de poder e dominação na relação entre o homem e a mulher, levando a entender
que essas causas não levam aos momentos prazerosos em não resistir aos desejos sexuais, e
sim por meio da necessidade socialmente imposta de exercer o poder, conforme exposto
(DUTRA; THIBAU, 2020).
Dutra e Thibau (2020) afirmam que na prática cotidiana de violência sexual nas
sociedades patriarcais, em contextos de guerras e ditaduras, triunfar as mulheres pelo estupro
tornou-se a maneira de medir a vitória nos combates como parte da prova de masculinidade e
de sucesso por parte dos soldados. Além disso, as filhas virgens eram negociadas pelos
próprios pais como mercadoria para aumentar o patrimônio familiar (DUTRA; THIBAU,
2020). Somente a partir dos séculos XVI e XVII que o estupro passa a ser percebido como ato
de violência, mas sem a proteção à dignidade da mulher, visto que a ameaça maior e digna de
preservação era a honra da família, que poderia se desmoronar com o “roubo da castidade e da
virtude” por parte da vítima (ROSSI, 2016).
21
Figura 1 – Quantidade de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém
– Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por mês e ano.
16 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
15
14
12
10
Quantidade
8
6
4
2
0
Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul Jan Jul
Mês
Quantidade Média
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
A 14ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2020), lançada sob o
contexto da pandemia da Covid-19, mostra mais uma vez que a violência de gênero não tem
freio, se na edição de 2015 do anuário os pesquisadores mostraram que havia um estupro a
cada 11 minutos no país (FBSP, 2015), a edição de 2020 mostra que esse tipo de crime foi
registrado a cada 8 minutos em 2019. Foram lavrados 66.123 boletins de ocorrência de
estupro e estupro de vulnerável, registrados em delegacias de polícia apenas em 2019 (FBSP,
2020).
Quarta-feira foi o dia da semana identificado com maior percentual de estupro de
mulheres (18,28%), ocorridos na Região Metropolitana de Belém (Figura 2).
10.00
8.00
6.00
4.00
2.00
0.00
Domingo Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado
Dia da Semana
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
22
De acordo com os resultados do teste Qui-Quadrado, como o valor calculado do teste (
2 2
χ = 13,16) é maior que o valor tabelado ( χ TAB = 12,592) ao nível de significância de 5%, foi
CAL
identificado que a probabilidade de ocorrência de estupro não é a mesma ao longo dos dias da
semana. Dados apresentados como esse busca relatar dificuldades conceituais e ambiguidade
das vítimas de serem reconhecidas como a mais afetada, e mesmo assim ser a mais
responsabilizada.
O maior percentual de estupro de mulheres (28,68%) ocorridos na Região
Metropolitana de Belém foi identificado no período da noite (Figura 3).
28.68
30.00
25.38 25.38
25.00
20.56
20.00
Percentual
15.00
10.00
5.00
0.00
Madrugada Manhã Tarde Noite
Turno
23
Figura 4 – Percentual de estupros de mulheres ocorridos na Região Metropolitana de Belém –
Pará – Brasil, no período de 2010 a 2019, por município de ocorrência.
Belém 65.74
Ananindeua 19.80
Castanhal 5.58
Município
Benevides 3.81
Marituba 2.54
Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
Belém ter o maior percentual entre as vítimas está ligado ao fato da capital paraense
ter uma população maior, o que possibilita maiores chances de casos registrados, além do
fácil acesso que as mulheres estupradas têm para denunciar os agressores. No ano de 2021,
foram registrados em Belém 593 casos de estupro com o percentual de 57,63%, levando em
consideração aos municípios que integram a Região Metropolitana (PARÁ, 2022).
O local onde acorreu a maioria dos estupros de mulheres da Região Metropolitana de
Belém – Pará – Brasil, foi em residência particular (77,41%) (Figura 5).
Residência
particular
77.41
24
O fato de haver constantes casos de estupros dentro das residências está justificado por
ser o lugar que impossibilita haver interferências de terceiros. Isso indica que quando o
agressor dorme ao lado, fica evidente a gravidade do problema de violência doméstica no país
ser refletido ao viés selecionado do universo que está sendo analisado (CERQUEIRA;
COELHO; FERREIRA, 2017). Dentro dos transportes coletivos, têm ocorrido práticas de
crime contra a dignidade feminina. São os crimes de importunação sexual, definido como
“praticar contra alguém e sem a sua anuência ato libidinoso com o objetivo de satisfazer a
própria lascívia ou a de terceiro”, de acordo com o Código Penal (BRASIL, 1940). Tal
tipificação foi inserida no Código Penal por meio da Lei N° 13.718 de 2018, a qual foi criada
após ser relatado diversos casos de assédio dentro dos transportes coletivos em São Paulo,
onde os autores do crime tinham comportamentos importunos ofensivos ao pudor, embora
essa prática não seja configurada ao estupro (FBSP, 2019). Dessa forma, houve uma iniciativa
para tentar criminalizar condutas não configuradas como estupro, porém são mais graves que
a importunação ofensiva ao pudor caracterizada de contravenção penal, como afirmam Lins
(2019) e Chakian (2019). Em 2019, foram registrados 8.068 casos de importunação sexual no
Brasil com taxa média em aproximadamente 6.600 vítimas por 100 mil habitantes (FBSP,
2019).
O meio empregado durante a ocorrência da maioria dos estupros de mulheres na
Região Metropolitana de Belém – Pará – Brasil (Figura 6) foi classificado como outros meios
n = 362), seguida por uso de arma cortante ou perfurante (n = 14). Esses outros meios são
exemplificados a partir do uso de força física por parte do agressor, a prática do estupro
coletivo, e além de dopar e embriagar a vítima.
Arma de fogo
11
Arma cortante ou
Outros meios perfurante
362 14
Objeto con-
tundente
7
25
Na Figura 7, pode-se ver que devassidão, isto é, ato imoral, libertino e obsceno, foi a
motivação mais observada nas ocorrências dos estupros de mulheres da Região Metropolitana
de Belém – Pará – Brasil. As outras motivações, que também é destacada na pesquisa, é
exemplificada por meio da roupa que vítima está usando, além da influência de terceiros.
Devassidão 33.50
Entorpecentes 0.76
Outras 45.44
Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
26
45.00 40.87
40.00
35.00
30.00 24.68
Percentual
25.00
20.00
14.40
15.00 10.80
8.74
10.00
5.00 0.51
0.00
12 a 17 18 a 24 25 a 29 30 a 34 35 a 64 > 64
27
30.00 28.44
24.92
25.00
20.00 18.21
Percentual
15.00 13.10
10.22
10.00
4.15
5.00
0.96
0.00
N.A. E.F.I. E.F.C. E.M.I. E.M.C. E.S.I. E.S.C.
Escolaridade
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
Legenda: N.A: não alfabetizada, EFI – ensino fundamental incompleto, EFC – ensino
fundamental completo, EMI – ensino médio incompleto, EMC – ensino médio completo, ESI
– ensino superior incompleto, ESC – ensino superior completo.
Divorciada
0.92
Viúva
0.92
Solteira
81.54
28
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
Outras
profissões
32.74
Doméstica
11,03
Dona de casa
11.39
Estudante
44.84
29
Padrasto 22.63
14.13
Ex-companheiro 13.43
12.37
Tio 10.95
Relação com o Acusado
7.77
Primo 4.59
3.89
Esposo 2.83
2.12
Avô 1.77
1.41
Ex-namorado 1.06
0.35
Genro 0.35
0.35
0.00 5.00 10.00 15.00 20.00 25.00
Percentual
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
40.00
Percentual
30.00
20.00 15.29
12.94 12.94
10.00 4.71
2.35
0.00
12 a 17 18 a 24 25 a 29 30 a 34 35 a 64 > 64
Faixa Etária (anos)
Fonte: Construção dos autores a partir de informações da SIAC (2021).
30
Uma pesquisa feita em agosto de 2016 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública,
informou que 91% (FBSP, 2016) dos entrevistados concordaram com a afirmação “Temos
que ensinar meninos a não estuprar”. Essa informação tem a necessidade de ser abordada pela
influência que as crianças recebem dos adultos, principalmente em função do ambiente
escolar e familiar que esteja vivendo como o espaço acessível às disputas ideológicas num
sistema patriarcal e cercado pelo machismo. Por isso, a importância de educar desde cedo os
meninos para o desenvolvimento social e alterando a cultura do machismo para futuras
gerações.
31
BRASIL, Presidência da República. Decreto-Lei N° 11.106, de 28 de março de 2005. Altera
os Arts. 148, 215, 216, 226, 227, 231 e acrescenta o Art. 231-A ao Decreto Lei N° 2.848,
de 7 de setembro de 1940 – Código Penal e dá outras providências. Brasília, 2005.
BUSSAB, W.; MORETIN, P. Estatística Básica. 9.ed., São Paulo: Editora Saraiva. 2017.
CÂMARA, F.; LIMA, M. L.; CRUZ, C. Mulheres na rua: do “fiu-fiu” ao estupro. Rev Polis e
Psique, v. 9, n. 3, p. 114-132, Belém, 2019.
CUNHA, C. Cultura do estupro – Você sabe do que se trata? UOL, 2019. Disponível em:
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32
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atendimento a mulheres vítimas nas instituições policiais. São Paulo: FBSP, 2016.
FONSECA, K. R. Despertar o olhar: Até que ponto as políticas sociais definem o padrão da
mulher? Dignidade Re-Vista, v. 1, n. 1, p. 95-105, 2016.
33
CAPÍTULO 3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES PARA
TRABALHOS FUTUROS
ANGHINETTI, H. A construção do estupro como problema social. Rev Med Minas Gerais,
v. 26, n. 8, p. 112-117, Belo Horizonte, 2016.
BROWNMILLER, S. Against Our Will: Men, Women and Rape. Estados Unidos:
Ballantine Books, 1993.
BUSSAB, W. O.; MORETTIN, P. A. Estatística Básica. 9. ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
CUNHA, C. Cultura do estupro – Você sabe do que se trata? UOL, 2019. Disponível em:
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FONSECA, K. R. Despertar o olhar: Até que ponto as políticas sociais definem o padrão da
mulher? Dignidade Re-Vista, v. 1, n. 1, p. 95-105, 2016.
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social, 6.ed. São Paulo: Atlas, 2008.
IPG – INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO. Dossiê Violência Sexual: Estupro. São Paulo:
IPG, 2019. Disponível em:
<https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia-sexual/tipos-de-violencia/estupro/>.
Acesso em: nov 13, 2019.
LOUREIRO, V. R.; A pesquisa nas ciências sociais e no direito. Belém: Cultural Brasil,
2019.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M.; Técnicas de Pesquisa. 9.ed., São Paulo: Atlas, 2021.
MINAYO, M. C. S.; SOUZA, E. R. Violência para todos. Caderno de Saúde Pública, Rio
de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 65-78 jan./mar. 1993.
36
SANTOS, M. E. A. Trabalho e violência em adolescentes estudantes: uma contribuição do
enfermeiro. 2009. 154f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Faculdade de
Enfermagem, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2009.
SOUZA, E.; BALDWIN, J. R.; DA ROSA, F. H. A Construção Social dos Papéis Sexuais
Femininos. Psicologia: Reflexão e Crítica. p.485-496, Porto Alegre, 2000.
TERASOLO, C.; FRANCO, K.B.; SILVA, K.S.; ZANIN, V.A. Invertendo Ditados:
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Sistema Penal, p. 67-92, 2015.
VIGARELLO, G. A História do estupro: Violência sexual nos séculos XVI e XX. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor; 1998.
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violência sexual. Cad. Saúde Pública, v. 23, n. 2, p. 471-475, Rio de Janeiro, 2007.
37