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Os acordos de Bretton Woods foram propostas definidas entre os participantes da

Conferência Monetária e Financeira Internacional das Nações Unidas e Associadas,


realizada entre 1 e 22 de julho de 1944, que elaborou regras para o sistema monetário
internacional. O sistema concebido nas negociações recebeu o mesmo nome da
localidade em que o evento foi realizado, em Bretton Woods, no estado norte-americano
de New Hampshire. A conferência criou o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco
Mundial.
No encontro, os participantes aprovaram dois estatutos, um para a operação do FMI e
outro do Banco Mundial, denominados de Artigos de Entendimento — em inglês, Articles
of Agreement. Os acordos foram ratificados ao longo de 1945 e entraram em vigor ao final
daquele ano, após somarem o apoio de 30 países.[1]O resultado é um marco bem-sucedido
na história da diplomacia, pois à época os acordos multilaterais eram improváveis. O
amadurecimento das propostas nos anos anteriores à conferência pelos economistas John
Maynard Keynes, do Reino Unido, e Harry Dexter White, dos Estados Unidos, ajudou a
obter o consenso necessário no encontro. Eles publicaram seus rascunhos em separado
em 1942, que foram discutidos principalmente entre colegas economistas, banqueiros e
empresários.[2]
Com delegados de 44 países, a conferência foi organizada em três comissões. A comissão
I, encarregada de discutir o FMI, foi presidida por White. A II, sobre o Banco Mundial, ficou
a cargo de Keynes, e a III, que cuidava de outras formas de cooperação financeira
internacional, foi supervisionada pelo mexicano Eduardo Suárez, ministro da Economia e
chefe da delegação de seu país. Cada comissão, por sua vez, trabalhava em diferentes
comitês específicos. O Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, anfitrião do evento,
preparou as transcrições dos debates. As minutas do evento foram publicadas em 1948,
mas a íntegra das transcrições não tinha sido tratada para publicação até 2013, quando o
material foi editado por dois pesquisadores do Centro para Estabilidade Financeira.[3]

As experiências da Grande Depressão


Um alto nível de concordância entre os países sobre as metas e meios do
gerenciamento econômico internacional facilitou em muito as decisões tomadas pela
conferência de Bretton Woods. A fundação daquele acordo foi uma crença comum no
intervencionismo. Apesar de os países desenvolvidos diferirem quanto ao tipo de
intervenções que preferiam para suas economias nacionais (a França, por exemplo,
preferia um maior planejamento e intervenção estatal, enquanto os Estados Unidos
eram favoráveis a uma intervenção estatal mais limitada), todos, no entanto,
baseavam-se predominantemente em mecanismos de mercado e na noção de
propriedade privada.
Assim, foram as semelhanças, mais do que as diferenças, que foram postas em
evidência. Todos os governos participantes de Bretton Woods concordavam que o
caos monetário do período entreguerras forneceu valiosas lições.
A experiência da Grande Depressão, quando a proliferação de controles e barreiras de
comércio levaram ao desastre econômico, estava fresca na memória dos
participantes. Os conferencistas esperavam evitar a repetição da debandada dos anos
30, quando os controles das trocas minaram o sistema internacional de pagamentos,
base do comércio mundial. A política de "beggar-thy-neighbor" ("empobrece teu
vizinho") dos governos dos anos 30—usando tarifas alfandegárias a fim de aumentar a
competitividade de seus produtos de exportação e, assim, reduzir os déficits da
balança de pagamentos—ocasionaram espirais deflacionárias que resultaram na
diminuição da produção, desemprego em massa e declínio generalizado do comércio
mundial. O comércio nos anos 30 ficou restrito a blocos monetários (grupos de nações
que empregavam uma moeda equivalente, como o bloco da "Libra esterlina"
do Império Britânico). Esses blocos retardaram o fluxo internacional de capitais e as
oportunidades de investimentos estrangeiros. Apesar de esta estratégia tender a
aumentar o dinheiro arrecadado pelo governo a curto prazo, ela piorou drasticamente
a situação a médio e longo prazo.
Assim, para a economia internacional, todos os planificadores de Bretton Woods
favoreceram um sistema relativamente liberal, o qual se baseava primeiramente no
mercado, com um mínimo de barreiras ao fluxo de comércio e capital privados. Apesar
de não estarem inteiramente de acordo sobre a maneira de pôr em prática esse
sistema liberal, todos concordaram com um sistema aberto.
Segurança econômica
Também com base nas experiências do período entreguerras, os planificadores
estadunidenses desenvolveram um conceito de segurança econômica—entendendo
que um sistema econômico liberal internacional aumentaria as possibilidades de paz
no pós-guerra. Um dos que viram tal segurança foi Cordell Hull, o secretário de Estado
dos Estados Unidos de 1933 a 1944.[8] Hull acreditava que as causas fundamentais
das duas guerras mundiais estavam na discriminação econômica e nas guerras
comerciais. Especificamente, tinha em mente acordos bilaterais de controle de
comércio e trocas da Alemanha Nazi e o sistema de preferência imperial praticado
pelo Reino Unido (pelo qual membros ou antigos membros do Império britânico
beneficiavam de um status comercial especial). Hull argumentava que:
Comércio sem obstáculos associado com paz; altas tarifas, barreiras comerciais e
competição econômica injusta, com guerra... se conseguíssemos tornar o comércio
mais livre... mais livre no sentido de menos discriminações e obstruções... de tal modo
que um país não ficaria mortalmente invejoso de outro e os padrões de vida de todos
os países pudessem crescer, eliminando com isso a insatisfação econômica que
alimenta a guerra, teríamos uma chance razoável de paz durável.[9]
O surgimento do intervencionismo governamental

Harry Dexter White, do Tesouro americano, e John Maynard Keynes, na conferência


inaugural dos governadores do Fundo Monetário Internacional, em 1946.
Os países desenvolvidos também decidiram que o sistema econômico liberal
internacional requeria intervencionismo do governo. Após a Grande Depressão, a
administração pública da economia emergiu como uma atividade primeira dos
governos de Estados desenvolvidos: emprego, estabilidade e crescimento eram então
assuntos importantes da política pública. Com isso, o papel do governo na economia
nacional ficou associado com a apropriação, pelo Estado, da responsabilidade de
garantir a seus cidadãos um certo grau de bem-estar econômico. O welfare
state (estado de bem-estar social) nasceu a partir do impacto da Grande Depressão,
que criou um ambiente para o intervencionismo estatal na economia, e das
contribuições teóricas da escola econômica Keynesiana, que defendia a necessidade
de intervenção estatal a fim de manter níveis adequados de emprego.
Em âmbito internacional, essas ideias também surgiram da experiência dos anos 30. A
prioridade dos objetivos nacionais, a ação independente nacional no período
entreguerras e uma nova dinâmica para a macroeconomia mundial, como alta
tarifação e desvalorizações competitivas, que contribuíram para o desenvolvimento da
economia durante os próximos anos, possibilitando ser chamado de Os Anos
Dourados do Capitalismo (Golgen Ages), em que, o mundo experimentou suas
maiores taxas de crescimento durante os trinta próximos anos. Contudo, a lição foi,
como explica Harry Dexter White, adepto do New Deal e principal arquiteto do sistema
Bretton Woods:
a falta de um alto grau de colaboração econômica entre as nações industrializadas...
resultará, inevitavelmente, em guerra econômica que será o prelúdio e instigador de
guerra militar em uma escala ainda maior.[10]
Para garantir a estabilidade econômica e a paz política, os Estados concordaram em
cooperar para regular o sistema econômico internacional. O pilar da visão americana
do mundo pós-guerra era o comércio livre. Liberdade de comércio implicava tarifas
baixas e, entre outras coisas, uma balança comercial favorável ao sistema capitalista.
Assim, as economias de mercado mais desenvolvidas aceitaram a visão dos Estados
Unidos de gerenciamento econômico internacional do pós-guerra, que foi concebido
para criar e manter um sistema monetário internacional efetivo e encorajar a redução
de barreiras ao comércio e ao fluxo de capital.
O surgimento da hegemonia dos Estados Unidos da América
O gerenciamento econômico internacional baseava-se na potência dominante para
dirigir o sistema. A concentração de poder facilitou o gerenciamento na medida em
que reduziu o número de atores cujo acordo era necessário para o estabelecimento de
regras, instituições e procedimentos e para levar a cabo o gerenciamento dentro dos
sistemas em acordo. Esse líder foi os Estados Unidos da América. Como a potência
com a economia e política mais avançadas do mundo, os EUA estavam claramente
em uma posição ideal para assumir essa liderança.
Os EUA emergiram da Segunda Guerra Mundial como a mais forte economia do
mundo, vivendo um rápido crescimento industrial e uma forte acumulação de capital.
Os EUA não haviam sofrido as destruições da Segunda Guerra Mundial, tinham
construído uma indústria manufatureira poderosa e enriqueceram vendendo armas e
emprestando dinheiro aos outros combatentes; na verdade, a produção industrial dos
EUA em 1945 foi mais do que o dobro da produção anual dos anos entre 1935 e 1939.
Em comparação, a Europa e o Japão estavam dizimados militar e economicamente.
Quando a Conferência de Bretton Woods aconteceu, as vantagens econômicas dos
Estados Unidos eram indiscutíveis e esmagadoras. Os EUA tinham a maioria dos
investimentos mundiais, da produção manufaturada e das exportações. Em 1945, os
EUA produziam a metade de todo o carvão mundial, dois-terços do petróleo e mais do
que a metade da eletricidade. Os EUA eram capazes de produzir imensas quantidades
de navios, aviões, automóveis, armamentos, máquinas, produtos químicos, etc.
Reforçando a vantagem inicial—e assegurando a liderança dos EUA no mundo
capitalista—os EUA detinham 80% das reservas mundiais de ouro e tinham não
somente poderosas Forças Armadas, mas também a bomba atômica.
Na condição de maior potência mundial e uma das poucas nações não afetadas pela
guerra, os EUA estavam em posição de ganhar mais do que qualquer outro país com
a liberação do comércio mundial. Os EUA teriam com isso um mercado mundial para
suas exportações, e teriam acesso irrestrito a matérias-primas vitais.
Os EUA não eram somente capazes de, mas também queriam, assumir essa
liderança. Apesar de os EUA terem mais ouro, mais capacidade produtora e mais
poder militar do que todo o resto do mundo junto, o capitalismo dos EUA não poderia
sobreviver sem mercados e aliados. William Clayton, o Secretário de Estado
assistente para Assuntos Econômicos, foi uma das várias personalidades influentes na
política estado-unidense que colocaram em evidência esse ponto: "Precisamos de
mercados - grandes mercados - por todo o mundo, onde poderemos comprar e
vender".
Houve várias previsões de que a paz traria de volta a depressão e o desemprego
devido ao término da produção bélica e ao retorno dos soldados ao mercado de
trabalho. Entre as dificuldades econômicas estava um aumento abrupto da inquietude
trabalhista. Determinado a evitar uma catástrofe econômica equivalente à da década
de 1930, o presidente Franklin D. Roosevelt viu a criação de uma ordem pós-guerra
como uma maneira de garantir a prosperidade dos EUA.
A carta do Atlântico
Roosevelt e Churchill durante a conferência secreta de 9 a 12 de agosto de 1941
no Atlântico Norte, que resultou na Carta do Atlântico, anunciada dois dias depois
pelos Estados Unidos e pela Grã-Bretanha.
Durante a guerra, os Estados Unidos imaginaram uma ordem econômica mundial pós-
guerra na qual pudessem penetrar em mercados que estivessem anteriormente
fechados a outros blocos, bem como abrir novas oportunidades a investimentos
estrangeiros para as privilegiadas empresas estado-unidenses,[11] removendo
restrições de fluxo de capital internacional.
A Carta do Atlântico, esboçada em agosto de 1941 durante o encontro do presidente
Roosevelt com o primeiro-ministro britânico Winston Churchill em um navio
no Atlântico Norte, foi o mais notável precursor à Conferência de Bretton Woods.
Assim como Woodrow Wilson antes dele, cujos "Quatorze pontos" (Fourteen Points)
delinearam os objetivos dos Estados Unidos para o pós-guerra da Primeira Guerra
Mundial, Roosevelt lançou uma série de objetivos ambiciosos para o mundo pós-
guerra antes mesmo de os EUA entrarem na Segunda Guerra Mundial. A carta do
Atlântico afirmou o direito de todas as nações a igual acesso ao comércio e à matéria-
prima. Além disso, a carta apelou pela liberdade dos mares (um objetivo principal da
política estrangeira americana desde que a França e o Reino Unido ameaçaram
navios americanos nos anos 1790), o desarmamento dos agressores e o
"estabelecimento de um amplo e permanente sistema de segurança geral.".
Quando a guerra aproximava-se do fim, a Conferência de Bretton Woods foi o ápice
de dois anos e meio de planejamento da reconstrução pós-guerra pelos Tesouros dos
EUA e Reino Unido. Representantes estado-unidenses estudaram com os colegas
britânicos a reconstituição do que faltara entre as duas guerras mundiais: um sistema
internacional de pagamentos que permitisse que o comércio fosse efetuado sem o
medo de desvalorizações monetárias repentinas ou flutuações selvagens das taxas de
câmbio — problemas que praticamente paralisaram o capitalismo mundial durante a
Grande Depressão.
Na ausência de um mercado europeu forte para os bens e serviços estado-unidenses,
pensava a maior parte dos políticos, a economia dos EUA seria incapaz de sustentar a
prosperidade que ela alcançara durante a guerra. Além disso, os sindicatos de
trabalhadores tinham aceitado a contragosto as restrições impostas pelo governo aos
seus pedidos durante a guerra, e eles não queriam esperar mais tempo por mudanças,
principalmente depois que a inflação afetara as escalas de salários de maneira
violenta (no final de 1945, já havia acontecido greves importantes nas indústrias
de automóvel, eletricidade e aço).
Financiador e conselheiro autoindicado de presidentes e congressistas, Bernard
Baruch resumiu o espírito de Bretton Wood no início de 1945: se pudermos "eliminar o
subsídio ao trabalho e à competição acirrada nos mercados exportadores," bem como
prevenir a reconstrução de máquinas de guerra, "oh boy, oh boy, que prosperidade a
longo termo nós teremos.".[12] Assim, os Estados Unidos vão usar sua posição
predominante para restaurar uma economia mundial aberta, unificada sob controle dos
EUA, que deu aos EUA acesso ilimitado a mercados e matéria-prima.

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