Você está na página 1de 88
COLECAO GRANDES JULGAMENTOS, DA HISTORIA As Dimensées Conceituais da Justica Tradicionalmente, a decisao do caso Marbury v. Madison & invocada como 0 principal pre- cedente que assentou nos Estados Unidos o Poder de juizes e cortes de fazer a revisao ju- dicial das leis que afrontassem a constituicao. A presente obra tem Por objetivo justamente apresentar e discutir criticamente esse que é considerado © jeading case do controle ju- dicial de constitucionalidade das leis. Como bem asseverou o Prof. Roberto Gargarella Na Apresentacéo deste opusculo, o caso Marbury v. Madison "nos abre as portas de muitas das perguntas, temas e preocu- PagGes importantes que afrontam o direito moderno” E a partir desse horizonte de possibilidades que buscamos (re)compreender o que o caso Varbury pode nos ensinar ainda hoje. [UME © HATO D6 OR cooe pO SEV e asl CONNEEA NOSSOS ouTHUS rues. 'magem de cope: MEAUILE,FORIUNE.LOUI. THE PANAMA TRIAL. 1907 igual Gualno de Gudey Vere Karam de Chet MARBURY versus MADISON ug Se ee yy CURE AEY PEE UTIs Eduardo Gunther - Marcelo Bueno Mendes tm a d t VERSUS MADISON Uma Leitura Critica Miguel Gualano de Godoy Vera Karam de Chueiri COLECAO GRANDES JULGAMENTOS DA HISTORIA COORDENADORES: LUIZ EDUARDO GUNTHER E MARCELO BUENO MENDES MARBURY versus MADISON Uma Leitura Critica Visite nossos sires na Internet urua.com.br & www. editorialjurua.com e-mail: editora@jurua.com.br ISBN: 978-85-362-6845-3 yg Brasil Av. Munhor da Rocha, 143 — Juvevé ~ Fone UUBUA Cai) "0003000." Fax (it) 3382311 ~ CED Stlds0.475 Curtibe Pavan Bra Europa — Rist General Towres, 1.220. Lajas 15 «16 ~ Fone G51) 995 710 600 ~ Centro Comercial "Ouro. $100.096 "Vila Mave de GotePorto Portal José Emani de Carvalho Pacheco Godoy, Miguel Gualano de. G589 Marbury versus Madison: uma leitura critica / Migucl Gualano de Godoy, Vera Karam de Chueiri— Curitiba: Jurud, 2017. 174 p. (Colegao Grandes Julgamentos da Historia) 1. Direito — Hist6ria. 2. Julgamentos — Historia. 3. Controle judicial. 4. Controle de constituciona- lidade. I. Chueiri, Vera Karam de. II. Titulo. CDD 347.077(22.ed.) CDU 347.991 Miguel Gualano de Godoy Vera Karam de Chueiri MARBURY versus MADISON Uma Leitura Critica Curitiba Jurua Editora 2017 SOBRE OS AUTORES ———— Miguel Gualano de Godoy, Doutor em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Parana (UFPR) com periodo como Pesquisador Visitante (Visiting Researcher) na Faculdade de Direito da Universidade de Harvard (Harvard Law School, Estados Uni- dos). Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Parana (UFPR) com Pperiodo como Pesquisador Visitante CUnvesti- gador Visitante) na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires (UBA, Argen- tina). Pesquisador do Nucleo Constituciona- lismo e Democracia do PPGD/UFPR. Asses- sor de Ministro do Supremo Tribunal Federal. Advogado licenciado. E-mail: miguelggodoy@hotmail.com 6 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Vera Karam de Chueiri, Professora Associada de Direito Constitucional dos programas de Graduac&io e Pés-Graduagio em Direito da Universidade Federal do Pa- rana (UFPR). Doutora e Mestre pela New School for Social Research CNSSR); Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Cantarina (UFSC). Pesquisadora Vi- sitante na Yale Law School. Coordenadora do Niicleo Constitucionalismo e Democra- cia do PPGD/UFPR. Bolsista de Produtivi- dade em Pesquisa do CNPq — Nivel 2. Dire- tora da Faculdade de Direito da Universida- de Federal do Parand (UFPR). E-mail: vkchueiri@gmail.com APRESENTAGAO DA COLEGAO etna llc A proposta desta colegao é de ofere- cer ao piblico leitor uma nova metodologia de apreensdo dos contetidos juridicos. Tra- ta-se de um projeto transdisciplinar que visa 0 colaboracionismo metodologico que ordene criticamente o pensamento Juridico. Pensamento que ultrapasse os limites de cada seara do saber isoladamente. Partici- pam desta colegdo: juristas, historiadores, Silésofos, socidlogos, politélogos, antropé- logos, psicdlogos, linguistas, dentre outros. Da implicagao dialégica de miiltiplas dis- ciplinas seus autores procuram obter novos dados que, articulados entre si, permitem o intercambio de ideias que viabilize a cons- trugGo de meta pontos-de-vistas. Para a concretizacdo deste projeto seus autores resgatam julgamentos e personagens céle- \cl Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri bres que se convertem em exemplos privile- giados (tipos-ideais) e que permitem, por meio de categorias conceituais, pensar e re-significar as particularidades e generali- zagées historico-juridicas. E um convite a reflextio por intermédio de cdnones inter- pretativos que fogem ao convencional. Ao mesmo tempo cientifico e diddtico, cada tomo fornecerd ao leitor um panorama cri- tico-conceitual que se distancia do lugar comum. Esse é 0 propésito. Buscar no ca- leidoscépio dos mitltiplos conhecimentos o compartilhamento do saber transformador. Néo &é uma colegdo somente para juristas. Poderdao debrugar-se sobre cada opisculo todos aqueles que desejam pensar a justiga por suas varidveis dimensées conceituais. Coordenadores: Luiz Eduardo Gunther Marcelo Bueno Mendes APRESENTAGAO DA OBRA _POR ROBERTO GARGARELLA! Naquele que talvez seja seu conto mais conhecido — o extraordindrio relato sobre El Aleph — Jorge Luis Borges nos conta sobre um pequeno ponto ou olho md- gico, localizado em um sétéo qualquer, de onde se pode ver todo 0 mundo, em todos os seus aspectos, desde os mais dramdticos até os mais inverossimeis. Tenho para mim que, no mundo do Direito, tal ponto tam- bém existe e é 0 caso Marbury v. Madison. E verdade, evidentemente, que, bem olhada, qualquer parte do Direito nos fala de todo o Direito (toda a moscadeira esté na noz). Todavia, também é verdade que Marbury vy. Madison resume tudo, chegan- ‘Professor Titular de Direito Constitucional da Uni- versidade de Buenos Aires. 10 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri Marbury versus Madison aa do a constituir-se, de alguma maneira, co- um monopélio dos juizes e, de outro lado, a mo o fundamento iltimo do Direito tal co- que defende que a missGo de interpretar a mo hoje 0 conhecemos e o disputamos. O . Constituigdéo &é uma tarefa mais difusa, caso Marbury pode ser entendido como a compartilhada por todos os poderes em pé origem e o centro de onde tudo emana; de igualdade. Essa ultima visdo é é a que também o lugar aonde tudo chega; em que se concentram e desde onde partem todos os caminhos juridicos que conhecemos. Permitam-me dar alguns exemplos do que disse acima. Primeiramente, em Mar- bury v. Madison vemos expressado, como em poucos lugares, 0 encontro entre direito e politica: um presidente perspicaz — John Adams — avultando o uso de suas faculda- des com o objetivo de permanecer no poder logo apos ter de deixd-lo. Tratou-se de uma ;conhecemos hoje como tese “departamen- talista”, defendida naquele momento pelo Presidente entrante Thomas Jefjerson, e reavivada contemporaneamente por alguns autores vinculados ao chamado “constitu- cionalismo popular”, como Larry Kramer. Ademais, também em Marbury v. Madison nos encontramos com o enfrenta- mento entre ao menos duas leituras opostas sobre o controle judicial, seus alcances e limites. Uma dessas leituras defende certas tentativa, em principio exitosa, de condicio- formas particulares e limitadas da judicial nar o mandato do presidente entrante atra- review, assumindo, ao mesmo tempo, que vés da nomeagdo urgente, apressada, desa- os juizes néio podem e nem devem ter a “ul- fiando as leis vigentes, de um amplo mime- tima palavra” institucional. A visdo alter- ro de juizes (os “juizes da meia noite”, co-. nativa sobre o tema, ao contrario, defende mo ficaram conhecidos diante das designa- ndo apenas a revisdo judicial das leis, mas ges promovidas por Adams até a sua ilti- também a supremacia judicial (judicial ma noite no poder). supremacy): nenhum grupo, nenhum dos No mesmo caso Marbury vemos tam- Poderes, deve animar-se a desafiar 0 que a bém a disputa entre ao menos duas concep- Justiga, com sua “voz final” anuncia. ¢6es sobre a interpretagdo constitucional: a E mais ainda. Ao apresentar o caso que sustenta que a tarefa interpretativa é em questdio, nos encontramos com aqueles a2 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri que destacam, sobretudo, 0 processo de ativa mobilizagado popular que se produziu — uma mobilizagao retomada e processada politicamente, de um modo que se poderia desejar sempre nos casos de vibrante atua- lidade e importancia. Por outro lado, nos encontramos também com aqueles que mi- nimizam ou desconsideram o valor da mo- bilizagGo social que se tornou palpdvel a época. E que, além disso, ainda consideram que ao sistema representativo ndo compete retomar, mas substituir (ou desestimular) os processos de mobilizagdo popular que sejam capazes de desafid-lo. O sistema re- presentativo, que para os primeiros — repu- blicanos, jeffersonianos, democratas — é simplesmente um “mal necessdrio”, resul- ta, para estes ultimos, um bem primdrio e insubstituivel que, como definiu James Ma- dison em O Federalista n° 10, nos permite conhecer quais sdo as preocupagées e inte- resses do povo de uma maneira mais fide- digna ainda que “se tenha expressado o povo mesmo, convocado para tal fim”. Em resumo, um caso como Marbury v. Madison nos abre as portas de muitas das perguntas, temas e preocupagées mais importantes que afrontam o direito moder- Marbury versus Madison 13 no — aqui somente fiz referéncia a algumas poucas — desde seus anos fundacionais e até hoje. i Notavelmente, ainda que o caso Mar- bury v. Madison tenha servido, inicialmen- te, para abrir o direito a discussdo de al- guns de seus temas mais cruciais, é certo que, com o passar do tempo, o caso termi- nou convertendo-se nGo em abertura, mas em fechamento de caminhos. Marbury v. Madison passou a ser entendido em intima relagdo com uma leitura estreita da histé- ria, como um caso que dava respostas tmi- cas — que fechava as vias alternativas e Jixava para sempre um modo particular de pensar e organizar o sistema institucional. O direito comegou a pensar a si como um produto de elites politicas e judiciais, sujei- to a revis6es exclusivas por parte do corpo Judicial, 0 qual, por sua vez, se arrogou desde ent&éo e por décadas, o monopolio indiscutido da interpretagdo constitucional ea “ultima palavra” institucional. Dada a riqueza e pluralidade de ideias que Marbury v. Madison soube representar €, principalmente, dado aquilo no que o caso terminou por converter-se — uma des- culpa perfeita para enclausurar o direito 14 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri entre paredes estreitissimas — celebramos | de modo entusiasmado a publicagdo de “Marbury v. Madison: uma leitura criti-‘ ca” dos excelentes Professores Miguel Go- | doy e Vera Karam. O livro retoma o profundo mar de ideias que enriquece o caso, a lucidez da argumentagao do juiz Marshall, os confli- tos que a decisGo expressou, e tudo isso com o objetivo de repensar a questdo de modo completamente critico. Trata-se de uma recuperagdo reflexiva, ao invés de complacente, do caso e, finalmente, focada no que ele mesmo tem para nos ensinar. Miguel e Vera estdo interessados em nos ajudar a entender o que 0 caso Marbury vy. Madison é capaz de ensinar hoje, ainda, a todos nés, mesmo os que vivem tdo longe de onde a decisio nasceu — na Argentina ou no Brasil — em outro tempo e com tantas preocupagées renovadas. PREFACIO Uma sedutora viagem, prometida pe- la leitura dos Grandes Julgamentos da Histéria: As dimensées conceituais da Justica, oferece ao leitor uma passagem de ida e volta ao passado em seus variados tempos. Com refinado acerto, os coorde- nadores LuIzZ EDUARDO GUNTHER e MARCE- LO BUENO MENDES adotaram um comple- _mento para distinguir a obra de muitas outras que tratam de casos criminais céle- bres, fixando-se, porém, muito mais nos aspectos objetivos dos fatos (regras de pro- cesso, tempo, local, protagonistas etc.). Ao propor o subtema das dimensées conceitu- ais de Justi¢a, a coletinea atende a uma orientagdo assemelhada a pesquisa mais profunda assim como ocorre com a espe- leologia, ou seja, o estudo sobre a forma- ¢do e a constituigdo das cavernas e grutas | naturais. 16 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chuciri Na ligdo do historiador, filésofo e en-° saista britanico COLLINGWOOD (1889-1943), para a pesquisa de qualquer acontecimento do passado é preciso fazer uma distingéo entre o exterior e o interior de um aconte- cimento, SGo suas essas palavras: “Por ex- terior do acontecimento, entendo tudo o ue, pertencendo-lhe, pode ser descrito em lermos de corpos e dos seus movimentos: a assagem de César, acompanhado por cer- tos homens, de um rio chamado Rubicao em certa data, ou o derramamento do seu sangue no chao do Senado, noutra data. Por_interior do acontecimento, entendo aquilo que nele sé pode ser descrito_em termos de pensamento: o desprezo de César elas leis da Repiiblica ou a divergéncia da jolitica constitucional entre eles e os seus assassinos”*. Acolhendo essa divisGo, pode- -se concluir que os aspectos exterior e interior significam o corpo ea alma dos eventos. * COLLINGWOOD, Robin George. The idea of History. 5. ed. New York: Galaxy Book, 1962. p. 213. A traduggio em portugués consta em GOMES DA SILVA, Nuno J. Espinosa. Histéria do Di- reito Portugués. Lisboa: Fundagio Calouste. Gulbenkian, 1985. v. 1, p. 6. Marbury versus Madison 7 Outro aspecto original da presente edigdo consiste na distribuigdo racional de capitulos temdticos: (a) Antiguidade, (Socrates, Cristo); (b) Conflitos ideoldgi- cos entre Direito (ciéncia) e Igreja (dog- mas), envolvendo perseguigées e castigos (Joana D’Arc, Giordano Bruno, Galileu Galilei); (c) A Revolugdo Francesa e 0 Comité de Salvacéo Piblica (Luis XVI, Ma- ria Antonieta, Danton, Camile Desmoulins); (d) Direito e Intolerancia (Alfred Dreyfus, Oscar Wilde, Julius e Ethel Rosemberg); (e) Crimes de Guerra e Crimes contra a Humanidade: Tribunal de Nuremberg (processo contra nazistas) e Tribunal Mili- tar Internacional para o Extremo Oriente, chamado Tribunal de Tt ‘bquio (crimes prati- cados por lideres do Império Japonés); (f) Crimes de Guerra e recrutamento ilegal: Tribunal Penal Internacional e a condena- gGo de Thomas Lubanca; (g) Genocidio: bris@o, processo e condenagio de Adolph Eichmann; (h) Erros judicidrios no Brasil: as condenagées de Mota Coqueiro e os irmaos Naves: (i) A devassa da Inconfi- : déncia mineira: condenagées de Claudio Manuel da Costa, Tomas Antonio Gonzaga e outros. A execugdo de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, 18 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri A indicagdo acima nao é exaustiva. Na concepgao dos professores EDUARDO GUNTHER e BUENO MENDES, o projeto de uma ampla revisao histérica ndo tem limi- tacdo quanto aos fatos e personagens que compéem um cendrio dindmico e perma- nente para demonstrar que, parafraseando a teoria de ANTOINE LAURENT DE LAVOISIER (1743-1794), a respeito da conservagdo da matéria e de seus elementos*, pode-se afir- mar que mudam os tempos, os motivos, as circunstdncias, os meios e os modos de exe- cugdo dos crimes, porém o sujeito ativo é sempre 0 mesmo: o ser humano. O filésofo e membro da Resisténcia Francesa, JOSEPH HouRS (1896-1963), em valiosa monografia, formula a seguinte indagacdo: “A Historia é um armazém de precedentes?” Ele mesmo responde dizen- do que “o melhor servico que poderiamos esperar hoje do estudo da Histéria é, sem divida, aprender com ela a methor conhe- cer o homem. Receber dela um método que, nos permita abordar com um olhar mais penetrante cada semethante e de reconhe- igure a Marbury versus Madison 19 cer nele, até nas minimas singularidades, passando antes por essas disposigées hu- manas essenciais e permanentes, que sdo de todos os tempos e de todos os paises, delas distinguindo em seguida o depésito dos principios e tradigées que a educagaéo repés como uma heranga ao nosso interlo- cutor e que faz dele o cidadao de tal século etal regido, o homem de tal classe e de tal Profissaéo’’*. Em outras palavras, mas no mesmo sentido, ORTEGA Y GASSET (1883-1955) afir- ma que a Histéria “é a realidade do ho- mem” (A rebelido das massas). Tendo como pilares de cada uma das contribuigées para os Grandes Jjulgamentos da Histéria as perspectivas do, tempo histé- rico (crenga, cultura, costumes de cada po- vo) refletido nos valores do Direito e da Justiga, cada autor traz em sua narrativa de € acontecimentos os indicadores e a pp 3 “Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. * HOURS, Joseph. Valeur de P G0 de Rosa Henriques, 1979. p. 113-114, histoire. Tradu- Coimbra: Almedina, 20___ Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri linguagem da area na qual trabalham: juris- tas, filésofos, educadores, historiadores, socidlogos, economistas, psicélogos, jorna- listas, antropdlogos, administradores e ou- tros tipos de operadores intelectuais. Certamente, os rituais e os martirios da pena de morte compéem um dos quadros essenciais na histéria dos processos e jul- gamentos, conforme os sistemas juridicos antigos e modernos. As liturgias determi- nadas pela lei ou pelos costumes na execu- gdo da pena capital e o séquito de sofri- mentos impostos ao condenado constitui- ram, no panorama de milénios, um reperté- rio de expressées simbélicas com o propé- sito de esconjurar o crime e infamar o seu agente. Como observa FOUCAULT, 0 supli- cio assume, entio, uma fungdo juridico- -politica. E um cerimonial para reconstituir a soberania lesada por um instante. Ele a restaura, manifestando-a em todo o seu brilho. “A execugdo publica, por rdpida e cotidiana que seja, se insere em toda a série dos grandes rituais do poder eclipsa- do e restaurado (coroagao, entrada do rei numa cidade conquistada, submisséo dos stditos revoltados): por cima do crime que desprezou o soberano, ela exibe aos olhos. de todos uma forga invencivel. Sua finali- Marbury versus Madison 24 dade é menos de estabelecer um equilibrio que de fazer funcionar, até um extremo, a dissimetria entre o siidito que ousou violar a lei e o soberano todo-poderoso que faz valer sua forca”’’. Nasceu, em tempos recentes, um dos mais poderosos instrumentos de comunicacGo in- dividual e coletiva: a rede social. Trata-se de uma estrutura integrada por pessoas e organiza¢ées conectadas por um ou varios tipos de relagdes que compartilham infor- magées, opinides, imagens e tudo o quanto possa ser abarcado pela palavra e pela es- tampa de pessoas e coisas, As redes sociais online operam em diversos niveis: Sacebook, twitter, insta- gram, google, youtube e whatsapp no campo de relacionamento; no campo dos negocios funciona o linkedin. Esses novissimos mecanismos tém desempenhado uma performance absolu- * FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Tradugéio de Raquel Ramalhete. Petrépolis: Vozes, 1998. p. 42. 22 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri tamente incomum na sociedade moderna e, em especial, exercem uma fun¢Go and- loga as mdaquinas de guerra que, na Idade Média, se destinavam a langar, sobre o inimigo, pedras, dardos ou outros projé- teis de grande tamanho: a catapulta. Os movimentos sociais em varias capitais brasileiras no més de margo de 2013; a convocagao e estimulagdo de grupos sociais para enfrentar — e derrotar — antigas dita- duras como ocorreu no Egito e na Libia configuram extraordindrias formas da li- berdade de pensamento, de informagdo e de expressdo. Mas existe o lado perverso, Os abu- sos praticados nas comunicagées por tais instrumentos esttio gerando inquietagdo social e fundando receio quanto & sistemd-' tica destruigGo dos valores espirituais, reli- giosos e dos direitos da personalidade (in-, timidade, vida privada, honra e imagem) de. maneira irrecuperdvel. Além das hipodteses- de crimes de caltinia, difamagéo e a injiria, existem formas de criminalidade atuais de: maior gravidade, com notdvel expansdo e acentuados prejuizos materiais e morais representadas pelos crimes cibernéticos. Marbury versus Madison 23 Entre as margens extremas do abuso nas relagées individuais e da criminalidade no _universo social, existe outra espécie de minusvalia da internet, com sérias conse- quéncias para a Cultura em geral e, parti- cularmente para a Literatura em sua forma classica. Em A civilizagdo do espetéculo: uma radiografia de nosso tempo e da nossa cultura, MARIO VARGAS LLOSA explica o titu- Jo desse best seller: “O que quer dizer civi- lizacdo do espetéculo? Ea civilizacao de um mundo onde 0 primeiro lugar na tabe- la de valores vigente é ocupado pelo entre- tenimento, onde divertir-se, escapar_do tédio, € a paixéo universal. Esse ideal de vida é perfeitamente legitimo, sem ditvida. Sé um puritano fandtico poderia reprovar os membros de uma sociedade que quises- sem dar descontragGo, relaxamento, humor e diversGo de vidas geralmente enquadra- das em rotinas deprimentes e as vezes im- becilizantes. Mas transformar em valor supremo essa propensio natural e diver- frivolidade e, no campo da informacao, a woliferacso do jornalismo irresponsével Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiti 24 da _bisbilhotice e do escandalo. (...) outro Jfator, no menos importante, para que essa realidade fosse forjada foi a democratiza- eGo da cultura. Trata-se de um fendmeno nascido de intengées altruistas: a cultura nao podia continuar sendo patriménio de uma elite; uma sociedade liberal e demo- cratica tinha a obrigagdo moral de pér a cultura ao alcance de todos, por meio da educagdo, mas também da promogéo e da subvengdo das artes, das letras e das de- mais manifestacgées culturais. Essa louva- vel filosofia_teve o indesejado efeito de trivializar e mediocrizar a vida cultural, em que certa facilitacao formal e superfi- cialidade de conteudo dos produtos_cul-; turais se justificavam em razao do pro-. época seja a literatura light, leve, ligeira, pésito_civico_de_chegar 4 _maioria. A. uantidade em detrimento da qualidade. OS, e a massiticacao cultura. Esta passou a ter exclusivamente hhermetismo de suas chaves e seus cédi- da propria ideia de: : ( : k miza ao extremo, de tal modo que uma Opera de Verdi, a filosofia de Kant, um show dos Rolling Stones e uma apresen- facao do Cirque du Soleil se equivalem’”’. Essas licidas observagées envolvem os mais diversos veiculos de transmissGo da palavra, do som e da imagem no rddio, televisGo, cinema, teatro etc. Quanto espe- cificamente as Letras, o Prémio Nobel de Literatura de 2010 afirma: “Por isso, ndo é de estranhar que a literatura _mais_representativa_de_nossa facil, uma literatura que sem o menor ru- bor se propée, acima de tudo e sobretudo divertir. Aten- VARGAS LLOSA, Mario. A ci espetéculo: uma radiografia do nosso tempo e da nossa cultura, Tradugéio de Ivone Benedetti. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. p. 20-30, 31. (Os des- taques séio meus). 26 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri ha verdadciro talentos. Se em nossa época raramente sao empreendidas aventuras literdrias t@0 ousadas como as de Joyce, Virginia Woolf, Rilke ou Borges, isso nGo se deve apenas aos escritores; deve-se tam- bém ao fato de que a cultura em que vive- mos imersos ndo propicia, ao contrdario de- sencoraja, esses esforgos denodados que culminam em obras que exigem do leitor uma concentragao intelectual quase tdo in- tensa quanto a que as possibilitou. Os leito- res_de_ hoje _querem livros _faceis distraiam, e essa demanda_exerce_uma oderoso incentivo para os criadores. A literatura light, assim como o ci- nema light e a arte light, da ao leitor e ao; espectador a cémoda impressGo de que dade propaga o conformismo através de} suas piores manifestagdes: a complacéncia 4 a autossatisfagao””’. destaques na palavra “light” so do original; nas demais, sfio meus). é| -se_e de pensar; renunciando devagar as culto, revolucionario, moderno, de que esta, fungées que esse sistema desempenha por na vanguarda, com um minimo esforgo) intelectual. Desse modo, essa cultura que, se pretende avangada, de ruptura, na ver-; 7 VARGAS LLOSA, Mario. Op. cit., p. 31-32. ol Marbury versus Madison 27 Em um capitulo destacado na parte final desse manual que eu‘chamaria de Uma reflexéo sobre os novos tempos, VAR- GAS LLOSA refere-se ao deploravel bindmio da atualidade, “mais informagado”, (e) “menos conhecimento”, provocado pela dispersao alucinante das matérias dos vei- culos de comunicagGo social. E desfecha contra os males da internet uma sentenga condenatéria, fundada e justa: “No é ver- dade que a internet é apenas uma ferra- menta, E_um utensilio que passa a ser um rolongamento de nosso préprio corpo, de nosso ic di ue, também de réprio_cérebro, maneira discreta, vai se adaptando pouco a pouco a esse novo sistema de informar- ele e, as vezes, melhor que ele. Nao é uma metdfora poética dizer que a “inteligéncia artificial” que esté a seu servigo suborna e sensualiza nossos érgdos pensantes, que, de maneira paulatina, vado se tornando t dependentes dessas ferramentas e, por fim, | Seus escravos. Para que manter fresca e ativa; a meméria se toda ela esté armaze- nada em ato que um programador de sis- ptemas chamou de ‘a melhor e maior bi- L 28 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri blioteca do mundo?’ E para que agugar a atengdo se, apertando as teclas adequadas, as, lembrangas de que necessito vém até mim, ressuscitadas por essas diligentes mdquinas? Nao é estranho, por isso, que alguns fandticos da web, como o professor Joe O'Shea, filésofo da Universidade da Flérida, afirmem: “Sentar-se_e ler_um livro de cabo a rabo nao tem sentido. Nao gum bom uso de meu tempo, jd que posso wiser com maior rapidez_através_da_web. Quando alguém se torna_cacador_experiente_na internet, os livros s@o supérfluos”. O que ha de atroz nessa frase nao é a afirmagao final, mas o fato de o fildsofo em questao acreditar que as pessoas leem livros sé, 4rmazenard com facilidade Proust, para “informar-se”. Esse € um dos estra-| '0, Popper e Platéo, os que o vicio frenético na telinha pode} obras teréo muitos leitores. Para que ter o } Marbury versus Madison 29 | centracdao, foram perdendo o habito e até a | faculdade de se concentrar e se condicio- , Haram a contentar-se com esse borboleteio cognitivo a que a rede os acostuma, com suas infinitas conexdes e saltos para acréscimos e complementos, de modo que | ficaram de certa forma vacinados contra o | tipo de atencao, reflexdo, paciéncia e pro- i longada dedicag@o aquilo que se lé, que € | @ unica maneira de ler, com prazer, a | grande literatura. Mas nao acredito que | seja sé a literatura que a internet tornou | supérflua: toda obra de criagao gratuita, ndo subordinada & utilizagéo pragmiatica, i fica fora do tipo de conhecimento e cultu- i ra que a web propicia. Sem divida esta Home- mas dificilmente suas causar. Dat a patética confisséo da douto-| trabalho de lé-las se no google posso en- tura da Universidade de Duke: “Jd _ndo consigo fazer_meus alunos _lerem_livros inteiros”. Esses alunos nao tém culpa de serem agora incapazes de ler Guerra e Paz ou Dom Quixote. Acostumados a pescar informagées nos computadores, sem preci- sarem fazer esforgos prolongados de con-' ra Katherine Hayles, professora de = contrar sinteses simplificadas, claras e amenas daquilo que foi inventado naque- les livrinhos arrevesados que os leitores pré-historicos liam? A revolugdo da in- Sormacao esté longe de terminar. Ao con- trdrio, nesse campo surgem a cada dia novas possibilidades e novos sucessos, e o impossivel vai retrocedendo velozmente. a 30 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chu Devemos ficar alegres? Se o tipo de cultu- ra que esta substituindo a antiga nos pare- cer um progresso, sem divida sim. Mas devemos nos preocupar se esse progresso significar aquilo que um erudito estudioso dos efeitos da internet em nosso cérebro e em nossos costumes, Van Nimwegen, dedu- ziu depois de um de seus experimentos: que deixar por conta dos computadores a solu- | ¢do de todos os problemas cognitivos reduz + ‘a ca acidade do cérebro de construir_es-| Tenho a convicgao que esses Grange Julgamentos da Histéria, em fungao da: sensibilidade e cosmovisdo de seus coorde- nadores, somadas a qualificagao intelectual dos diversos autores, serd um marco rele- vante na literatura paranaense e nacional. Realmente, sem necessidade da muleta do: 8 VARGAS LLOSA, Mario. Op. cit, p. 191-192, | 193. (Os destaques sao meus). Marbury versus Madison 31 computador e os 6eulos da internet?, o lei- tor terd a oportunidade de viajar no tempo com toda a liberdade para compor figuras humanas, cendrios e lugares com a auto- nomia de sua imaginagdo, que é a reserva indevassdvel da alma. E assim pode fazé-lo, estimulado pelo conselho de MONTAIGNE (1533-1592): “Viajar parece-me um exercicio proveitoso. Nele a alma exercita-se incessantemente em observar coisas desconhecidas e novas”’. (Ensaios) René Ariel Dotti (Da Academia Paranaense de Letras) A propésito, CARR, Nicholas. A geragiio super- ficial: 0 que a internet esta fazendo com os nos- sos cérebros. Tradugdio de Monica G. F. Friaga. Rio de Janeiro: Agir, 2011. | |4 INTRODUCAO i SUMARIO a 35 {2 AS ORIGENS DO CONTROLE | | | : i I | i JUDICIAL DE CONSTITUCIONA- LIDADE DAS LEIS E A DESMI- TIFICACAO DO CASO MARBURY V. MADISON 2.1 O Caso Marbury v. Madison 2.2. Critica ao (Precedente Criado Pelo) Marbury v. Madison....ssssseessssssesensenes 55 2.3 2.4 O QUE O CASO MARBURY V. MADISON TEM A NOS ENSINAR?..107 3.1 O Controle Judicial nao Decorre Logicamente da Supremacia da Constituigao seseeeeee LOT el Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri | | 3.2 A Supremacia da Constituigao, o Controle Judicial e o Brasil veld | 3.3 Da Supremacia da Corte 4 Supremacia | da Constituigao 129) 4 CONSIDERACOES FINAIS.. +155} REFERENCIAS.. ++ 163 | 1 INTRODUGAO O povo, por meio do seu poder, cons- itui algo. Esse algo que combina o consti- tuinte e constituido é a Constituigao e, acre- ditamos, nao é pouca coisa, ao contrario, a Constituigao tem autoridade sobre as de- mais normas no sistema juridico e sua supe- rioridade nfo é uma questéo de forma, mas, sobretudo, de contetdo. Por isso, leis e atos normativos que ofendam a Constitui¢&o sio desprovidos de validade, nao podendo gerar direitos e obrigagSes e, muito menos, pautar as instituigdes e estabelecer politicas publi- cas. A tarefa de garantir a supremacia da Constituigao é dever de todos os poderes rr ee rnc eterna 36 Miguel Gualano de Godey / Vera Karam de Chueiri constituidos (Executivo, Legislativo e Judi- cidrio), bem como de todos os cidadaos. O controle de constitucionalidade das leis e atos dos normativos é, portanto, um: tarefa compartilhada por todos os Poderes, no obstante o protagonismo de um ou de outro poder dependa do modelo de controle adotado. Neste sentido, o controle de cons. titucionalidade realizado pelo Poder Execu- tivo e pelo Poder Legislativo é politico en- quanto o controle realizado pelo Poder Ju- diciario é jurisdicional. Os estados constitucionais e democra- ticos derivam a sua Constituigao do poder popular. Talvez aqui seja oportuna a ideia de Bruce Ackerman, segundo a qual, ha duas diferentes decisSes que podem ser tomadas em uma democracia: a do povo ea do governo. A primeira ocorre sob condi- gdes especiais em que a maioria dos cida-; dos se engajam em um movimento politico para fazer a Constituig&o e se submetem a um foro de deliberac&o diferente do que} ocorre no cotidiano da politica. O momento; excepcional a que se refere Ackerman pode ser relacionado, guardado o seu contexto} historico-narrativo, ao poder constituinte ou ao evento fundacional da comunidade poli-;; tica. A segunda diz respeito ao que 0 go- } b. Marbury versus Madison. 37 verno, cotidianamente, faz ao legislar atra- vés dos seus dirigentes e representantes, periodicamente eleitos!”. Neste sentido, é na atividade politico- -democratica ordinaria que 0 povo e seus representantes vio dar densidade e concre- tude as previsdes constitucionais mediante a criagao de leis, atos normativos e politicas publicas. Se o povo pode atuar diretamente ou por meio de seus representantes na cria- gao de leis e politicas publicas, a legitimi- dade do controle politico de constituciona- lidade é facilmente compreendida, pois a concretizagaéo da Constituigao pela edi¢gao de leis ou politicas publicas é realizada jus- tamente pelos representantes eleitos pelo povo. E 0 povo nao elegeria representantes : que quisessem desrespeitar justamente aqui- © ACKERMAN, Bruce. We the people. Cambridge: The Belknap Press of Harvard University, 1991. p. 06-33. “They are not to assert that a normal electoral victory has given them a mandate to enact an ordinary statute that overturns the considered judgments previously reached by the People. If they wish to claim this higher form of democratic legitimacy, they must take to the specially onerous obstacle course proVided by a dualist Constitution for purposes of higher lawmaking”. 38 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chuei Marbury versus Madison 39 lo que eles querem ver concretizado — aj politicas pttblicas dos demais.Poderes, n&o Constituigéo. E para garantir que isso, de| se estaria abrindo a possibilidade de que a fato, no acontega, h4 as formas e os meios| vontade do povo seja substituida pela vonta- estabelecidos para o controle politico de} de de alguns juristas que em geral sao pouco constitucionalidade. conhecidos € a quem n&o se pode contro- A legitimidade do Poder Executivo ¢| lar?!! Por outro lado, tal objegaio acerca do Legislativo na concretizagaio da Constitui- déficit democratico do poder judiciario é go reside justamente no fato de que seus igualmente problematica quando sugere a membros so representantes eleitos pelo tirania da maioria. povo. E como tal, est&éo democraticamente Tais quest6es tém pautado o direito legitimados a definir 0 contetido e¢ a aplica-| constitucional moderno desde o final do go da Constituigéo por meio de leis, atos século dezoito ¢ as respostas que Ihes sfo normativos e politicas piblicas. Mas, se a legitimidade do Poder Executivo e Legisla-| debate politico-constitucional em suas nar- tivo se fundamenta em sua representagéo} tativas histéricas. Entretanto, de maneira democratico-popular, no que se fundamenta mais ou menos arbitraria podemos marcar ent&o a legitimidade do Poder Judicidrio,} no tempo e¢ no espago um momento e nele uma vez que os juizes nfio so eleitos pelo} uma decis&o (e isso serd enfrentado como povo, para rever e invalidar judicialmente um problema neste trabalho) que se tornou os atos dos demais Poderes? Como aceitar! referéncia deste debate acerca da revisao que a Ultima palavra sobre a constituciona das leis, qual seja, o caso Marbury v. Madi- lidade de uma lei, um ato normativo ou uma son de 1803. Tal caso e a decisio proferida politica publica fique nas miios dos juizes ou})a partir dele se tornou paradigmatica para ainda nas maos de pouquissimos julgadores, compreender o controle judicial da consti- como ocorre na jurisdi¢fo constitucional tucionalidade das leis, mas nao sé. Uma brasileira, os ministros do Supremo Tribun: Federal? Se 0 povo nao possui qualquer con. trole sobre o Poder Judiciario, ao the conferit a possibilidade de revisar as leis, os atos e as GARGARELLA, Roberto. Critica de Ia Consti- tucién: sus zonas oscuras. Buenos Aires: Capital Intelectual, 2004. p. 68. re eee eee ere 40 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri série de outras questées referem-se, de ma-} neira direta ou indireta, ao caso Marbury v. Madison e nossa tarefa neste texto é apre- sentar 0 caso, explorar suas razdes ¢ expor| as criticas a que estas sio submetidas. Wil-} liam H. Rehnquist, juiz da suprema corte | dos Estados Unidos desde 1972 ¢ seu presi-/ dente em 1986 até sua morte em 2005, afirma logo no inicio do seu livro sobre a Suprema Corte, que se precisa entender ape- nas alguns dos seus casos para entender o papel da Suprema Corte na histéria da nagiio estadunidense. Mas se deve, seguramente, entender 0 caso Marbury v. Madison’. Na sequencia deste texto, apresenta- mos 0 caso Marbury v. Madison, seus des. dobramentos teéricos e praticos, isto é, as rea¢gdes que ele provocou e o quanto impac- tou no constitucionalismo moderno. Dess: forma, segue a discussfo (2) sobre as ori gens do controle judicial de constitucionali- dade das leis a qual, tradicionalmente, é atribuida 4 deciséo de Marshall no referido caso, porém, de forma ndo reflexiva e criti- ca. A leitura que propomos desmitifica caso, nao obstante, enfatize a sua absolut: 2 REHNQUIST, William H. The Supreme Court New York: Vintage Books, 2009. p. 21. Marbury versus Madison 4a relevancia para o constitucionalismo mo- derno e, em especial, para a defesa da Cons- tituigao. Neste sentido, perguntamos (3): o que o caso Marbury v. Madison tem a nos ensinar? Em nossa resposta sustentamos que o controle de constitucionalidade nao é uma consequéncia logica da supremacia da Constituigao e tampouco significa que aos juizes e As cortes cabe a ultima palavra so- bre o significado da Constituig&o. Ainda, discutimos 0 impacto da instituigéio do con- trole judicial de constitucionalidade sobre um certo tipo de desenho institucional do Estado, em particular, 0 poder judiciario. Por fim, (4) trazemos algumas considera- ges a titulo de conclusio. Uma ultima observagao: parte das re- flexes apresentadas neste trabalho foi pre- viamente desenvolvida e apresentada pelo coautor em outra obra, a saber,:“Devolver a Constitui¢4o ao Povo: critica a suprema- cia judicial e didlogos institucionais” (Ed. Forum, 2017). : AS ORIGENS DO * CONTROLE JUDICIAL DE CONSTITUCIONALIDADE DAS . LEIS E A DESMITIFICAGAO DO CASO MARBURY V. MADISON aan Ren een eee iia eetarnanetaa 2.1. OQCASO MARBURY V. MADISON A associacao entre a supremacia da Constitui¢géo e o controle judicial de consti- tucionalidade foi feita de forma precursora } nos Estados Unidos no comego do século . XIX e foi Alexander Hamilton quem tentou responder a essas questdes em um artigo » que ficou conhecido como O Federalista n. 44____ Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiti 78'°. Hamilton sustentou que o fato de o Poder Judiciario ter a capacidade de negar validade a uma lei do Poder Legislativo nao implica de forma alguma que os juizes sejam superiores aos legisladores. Para Hamilto: nao ha que se falar em supremacia judicial, mas sim em supremacia da Constitui¢ao, entendida como a vontade constituinte do povo. Segundo Hamilton, tampouco signifi- ca que tal atuagao por parte do Poder Judici4 rio desconsidere ou ponha abaixo a vontade do povo. Ao contrario, o poder de anular leis por parte do Poder Judicidrio serve justa- mente para se garantir e reafirmar a vontade soberana do povo — representada em ultima andlise pela Constituigao. Assim, ao anular uma lei o Poder Judiciario protege e ratifica Repeater Cees '° HAMILTON, Alexander. The Federalist. Cam bridge: Harvard University Press, 2009. p. 508 517. HAMILTON, Alexander. Os federalistas Tradugio de Le6nidas Gontijo de Carvalho; A. Della Nina; J. A. G. Albuquerque; Francisco Cp Weffort. 2. ed. Sie Paulo: Abril Cultural, 1979. Pp. 161-166. Vide: GARGARELLA, Roberto Critica de la Constitucién: sus zonas oscuras, Buenos Aires: Capital Intelectual, 2004. p. 68. 72. Vide também: GODOY, Miguel Gualano de Devolver a Constituic¢ao ao Povo: critica A premacia judicial e didlogos institucionais. Belo Horizonte: Férum, 2017. Hamilton foi pelo entao presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos, John Marshall'*, no famo- Se Marbury versus Madison 45 que mente reflete a vontade popular'*. Alexander logo retomada e reforcada Essa _argumentagiio de HAMILTON, Alexander. The Federalist. Cam- bridge: Harvard University Press, 2009. Pp. 508- 517. HAMILTON, Alexander. Os federalistas. Tradugtio de Leénidas Gontijo de Carvalho; A. Della Nina; J. A. G. Albuquerque; Francisco C. Weffort. 2. ed. So Paulo: Abril Cultural, 1979. Pp. 161-166. Vide: GARC ARELLA, Roberto. Critica de la Constitucién: sus zonas oscuras. Buenos Aires: Capital Intelectual, 2004. p. 70. Vide também: GODOY, Miguel Gualano de. De- volver a Constituigio ao Povo: critica 4 supre- macia judicial e didlogos institucionais. Belo flo. rizonte: Férum, 2017. Interessante a biografia e trajetéria de John Marshall. Ele nasceu em 1755, em Fauquier County, na Virginia, e comandou uma tropa na Revolugao americana tendo lutado em varias ba. talhas ainda muito jovem, com menos de vinte ¢ cinco anos. Ble serviu sob 0 comando de George Washington de quem ele adquiriu o forte senso nacionalista, como também o respeito a discipli- nae a autoridade. Depois da independéncia, Marshall serviu na legislatura da Virginia ¢ no Congresso. Ele foi um dos famosos X¥Z commis- sioners designado para negociar com Talleyand ¢ 46 so caso Marbury v. Madison'®, julgado em 1803. dos Estados Unidos, teve seu candidato, Aaron Burr, derrotado nas eleigdes presi: denciais pelo republicano Thomas Jeferson. Entretanto, algumas semanas antes da posse 16 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Ch Marbury versus Madison 47 de Jefferson, o Congresso, de maioria fede- ralista, aprovou o Judiciary Act de 1801. Esse ato criou dezesseis Cortes federais com a justificativa de que, assim, os juizes da Suprema Corte nao mais precisariam se deslocar — 0 que lhes causava bastante can- sago — , pois a eles cabia atuar nas apela- gdes em casos federais ocorridas nos esta- dos-membros. A nomeag&o dos juizes para essas novas Cortes federais caberia a John Adams fazer, o que de fato ocorreu, entre- tanto, o fez no apagar das luzes do seu go- verno. Nao por acaso, tais juizes passaram a ser referidos como midnight judges. Além destes cargos para juizes vitali- iOS Se aprovou a criagado de quarenta e dois cargos de juizes de paz para o Distrito de Columbia. John Adams agiu, também, no sentido de reforgar o poder do judicidrio diante dos demais poderes, bem como, para garantir pessoas da sua confiancga para o provimento destes cargos. Tanto é que seu x-secretario de Estado, John Marshall, foi nomeado para presidente da Suprema Cor- te'’. Obviamente que o partido republicano John Adams (federalista), presidente o Diretério Francés em 1789 e, apés o seu retor- no, foi nomeado secretario de Estado de John Adams nos ultimos dias de governo deste. Ele assume a presidéncia da Suprema Corte em raziio da vacancia do cargo ocorrida em face da rentn: cia de Oliver Ellsworth, em dezembro de 1800. de se sublinhar o cardater politico da nomeagiio de Marshall por Adams, tendo em vista que havia dois juizes da Suprema Corte (associate just que, em tese, estavam na linha sucesséria para presidéncia e que, no entanto, no foram consi derados para tanto. Vide: REHNQUIST, William H. The Supreme Court, p. 24-25. Outro fato cu rioso é que Marshall, além de ser o politico mai popular do partido federalista nos Estados Uni dos a época, era primo de Jefferson, lider dos re publicanos que veio a ser 0 sucessor de Adams e, segundo Ackerman, talvez também por isso tio: detestado por aquele. Vide: ACKERMAN, Bruce. The failure of hte founding fathers. Jef- ferson, Marsahall, and the rise of presidential democracy. Cambridge: The Belknap Press of Harvard University Press, 2005. p. 03. 5 U.S. 137 (1803). ” Uma curiosidade digna de nota é que na época do caso Marbury v. Madison, a Suprema Corte dos Estados Unidos ocupava uma sala no primei- 4g Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri que ganhara as eleicdes nao ficou contente com as medidas tomadas por John Adams no apagar das luzes do seu governo. Do ponto de vista dos republicanos ndo seria politicamente aceitavel e republicanamente legitimo um presidente que esta deixando a chefia de Estado e de governo fazer tais indicagdes da forma como haviam sido fei. tas e as respectivas nomeagées. A nomeagio dos juizes federais e dos juizes de paz respeitava um rito, ou seja, apés a indicag&o e a confirmagio pelo Se- nado haveria a diplomacao (commissions) € a consequente nomeacio dos mesmos Ocorre que alguns dos juizes de paz, entre estes Willian Marbury, nao receberam se diploma dado o exiguo espago de tempo entre a indicagio e os demais atos necessa- rios. Assim, restou ao novo governo, ao sei secretério de Estado James Madison, exe tar tal medida. No entanto, o novo presiden te, Thomas Jeffferson, determinou a Madi son, seu secretario de Estado, que nao envias: se o diploma requerido por Marbury. Diante do nao recebimento, Marbury solicitou a Madison (secretario de Estado) informagio ro andar no prédio do Capitélio, a qual foi a ela cedida pelo Congresso em 1801 até 1808. Marbury versus Madison 49 acerca do seu diploma, entretanto, nao re- cebeu qualquer resposta: nem dele ou de qualquer servidor do departamento de Esta- do. Ainda, Marbury solicitou ao secretério do Senado um cerificado da sua indicagao e da confirmagao dada pelo Senado, mas tal certificado Ihe foi negado. Assim, incon- formado com as recusas e nao respostas, Marbury impetrou um writ of mandamus junto 4 Suprema Corte, desejando a conces- sio de uma ordem para que Madison lhe enviasse 0 diploma. Pois bem, s&o estes os fatos que constituem o caso que coloca diante da Suprema Corte dos Estados Unidos Marbury v. Madison. Diante de tal caso, a Suprema Corte se posicionou exarando uma decisao inédita ou musitada, da lavra do voto do seu presidente (Chief Jutice), John Marshall, o qual inicia seu argumento sublinhando que a peculiar delicadeza do caso, a novidade de algumas das suas circunstancias e a dificuldade em relagdo aos seus principais pontos requer que se explicitem os principios sobre os quais 0 voto esta fundado. Marshall comecga por quest6es formais e pergunta: Tem o impe- trante um direito ao diploma requerido? Se ele tem o direito e esse direito foi violado, oferece o direito americano a ele um remé- Marbury versus Madison 54 50 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiti ‘os. Em. face de tal circunsténcia, Marshall infere que a Corte nfo deve se intrometer em uestGes que sao prerrogativas do Executivo e que “(he province of the court is, solely, to lecide on the rights of individuals, not to nquire how the executive officers, perform ties in which they have discretion”'*, Por putro lado, argumenta ele, se um dos chefes io departamento de Estado for direcionado pelo direito a fazer algo que afete os direitos kbsolutos dos individuos, se ele, nesta cir- cunstancia, nfo estiver sob a orientagao do presidente e, cuja acio o presidente nao pode -galmente proibir, ent&o caberé o mandamus, fanto para que o diploma seja entregue ou mesmo até mesmo uma cépia deste. Entretan- , Testa agora verificar se caberdé a Suprema (Corte julgar e dar a resposta ao mandamus. A lei que estabeleceu os tribunais dos ados Unidos autoriza a Suprema Corte a dio? Se o direito lhe oferece um remédio serA esse um mandamus dessa Corte? Em relagao a primeira questo, Marshal constata que Marbury foi indicado, confirma- do e teve seu diploma assinado pelo entio presidente John Adams e, também, selado pelo secretario de Estado, mas niio o recebet constata, ainda, que reter o diploma é um ato que viola um direito. Quanto a segunda ques- tao, responde que quando os servidores do departamento de Estado executam a vontade do presidente ou quando agem em casos nos quais 0 executivo possuiu uma_ discrigao constitucional, nada é mais claro do que o fato de que seus atos so politicamente exa- minaveis. Mas, quando o dever especifico é estabelecido pelo direito ¢ direitos individuai dependem da performance desse dever, igualmente claro que esse individuo que se considera prejudicado tem um direito a recor rer ao direito ¢ nele buscar um remédio. A terceira questao diz respeito ao fato de se 0 impetrante tem direito ao remédio que ele reivindica e isso depende da natureza do writ e do poder da Corte. Para conceder ao man: damus 0 remédio adequado, a autoridade a quem aquele tem que ser direcionado deve ser aquela determinada pelos principios juri- ncipios e usos do direito, a qualquer tri- al ou pessoas com cargos sob a autori- ade dos Estados Unidos. O secretario de stado se encaixa nesta previsio legal. Mas FRANK, John P. Cases and materials on con- stitutional law. Chicago: Callaghan & Compa- ny, 1952. p. 43. 52 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri se essa corte nao esta autorizada a conceder o writ a uma autoridade como o secretario de Estado, deve ser porque o direito é in constitucional e, assim, absolutamente in capaz de conferir a autoridade e determinar os respectivos deveres 14 expressos. A auto. ridade dada 4 Suprema Corte pela lei que estabeleceu os tribunais para conceder o writ of mandamus aos funcionarios publicos nao parece estar garantida pela Constituigaio e € 0 caso de indagar se a jurisdigdo, assim conferida, pode ser exercitada. A Constituig&o, afirma o presidente da Suprema Corte John Marshall, é tanto superior quanto norma maxima, nio modificavel por meio de lei ordinaria e¢ qualquer lei que Ihe seja contraria nao deve ser considerada como tal. Trata-se, pois, de uma teoria ligada a ideia e a realidade da Constitui¢ao escrita e, consequentemente, deve ser considerada pela Suprema Corte como um dos principios fundamentais da sociedade americana. “Thus, the particular phraseology of the constitution of the United States confirms and strengthens the principle, supposed to be essential to all written constitution, that a law to the constitution is void; and that courts as well Marbury versus Madison 53 as other departments, are bound by that instrument. The rule must be discharged”'°. Por fim, nado obstante o reconhecimen- to de Marshall de que o diploma deveria ter sido enviado a Marbury, ele, igualmente, asseverou que a acfo estava fundada numa lei inferior 4 Constituig&éo que com ela coli- dia ¢, assim, ndo poderia ser aplicada. Destaque-se que tal debate inicial- mente ocorreu e adquiriu tamanha impor- tancia, porque a Constituig¢fo norte- -americana nao previu em seu texto 0 con- trole judicial de constitucionalidade das leis udicial review). Dai a intensa discussao sobre a legitimidade do Poder Judicidrio para negar validade as leis e aos atos dos demais Poderes. Marshall desenvolveu um raciocinio t&o légico quanto bem funda- mentado. Para ele, a nulidade da lei incons- titucional é uma decorréncia Iégica da su- premacia da Constituicio sobre as demais leis. Dessa forma, sendo a Constituig&o a norma maior em um dado ordenamento juridico, compete a todo juiz ou tribunal realizar a interpretagdo da Constituigdo e da ” FRANK, John P. Cases and materials on con- stitutional Jaw. Chivago: Callaghan & Compa- ny, 1952. p. 48. 54 Miguel Gualano de Godoy / Vera Karam de Chueiri lei e, assim, negar aplicagao a qualquer lei que afronte a Constituicdo. Além disso, 0 Poder Judiciaério contaria com uma maior capacidade para a intepretagao da Consti- tuigao dado o seu benéfico e relativo afas- tamento da politica ordinaria e das presses majoritarias de turno, podendo, assim, ga- rantir também a seguranga e protegio das minorias”°. Foi com base nesses argumentos que o caso Marbury v. Madison assentou nos Estados Unidos o controle judicial de cons titucionalidade das leis (judicial review), conferindo aos juizes e as cortes o poder de invalidar leis e atos normativos dos demais Poderes. Foi a partir dai que também se concluiu que a Suprema Corte dos Estados Unidos cabe a Ultima palavra sobre a inter- pretagio constitucional. No entanto, tal 20 5 U.S. 137 (1803). Vide também: HAMILTON, Alexander. The Federalist. Cambridge: Har vard University Press, 2009. p. 516-517. HAM ILTON, Alexander. Os federalistas. Tradugo de Leénidas Gontijo de Carvalho; A. Della na; J. A. G. Albuquerque; Francisco C. Weffor. 2. ed. So Paulo: Abril Cultural, 1979. p. 165. 166. GARGARELLA, Roberto. Critica de la Constitucién: sus zonas oscuras. Buenos Aires: |! Capital Intelectual, 2004. p. 69-71. Marbury versus Madison 55 conclusao nao pode ser légica e consequén- cia automatica do poder de revisdo judicial das leis por parte do Poder Judiciario. 2.2 CRITICA AO (PRECEDENTE CRIADO PELO) MARBURY V. MADISON Para mostrar a falacia da conclusao de supremacia do Poder Judiciario na interpre- tagao da Constituigaéo, Larry Kramer faz uma critica histérica contundente 4 constru- ¢ao do controle judicial de constitucionali- dade nos Estados Unidos, bem como a ex- clusao do povo no processo de interpretagdo ¢ definig&o dos significados e contetdos da Constituigao?! Kramer inicia sua critica apontando trés importantes casos anteriores A decisio de KRAMER, Larry. The People Themselves: popular constitutionalism and Judicial Review. New York: Oxford University Press, 2004. Vide também: KRAMER, Larry. Constitucionalismo popular y control de constitucionalidad. Tra- duc&o de Paola Bergallo. Madrid: Marcial Pons, 2011. Vide ainda: GODOY, Miguel Gualano de. Devolver a Constituigio a0 Povo: critica A su- premacia judicial e didlogos institucionais. Belo Horizonte: Férum, 2017. p. 64.

Você também pode gostar