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HORNY Antonius H. J. Gunneweg Teologia Biblica do _Antigo Testamento Uma historia da religiéo de Israel na perspectiva biblico-teolégica Bete es) yf H Fy © Teoldgica, 2005 © Kohthammer, Stuttgart, 1993 Traducao a partir do original alemao: Biblische Theologie des Alten Testaments, Eine Religionsgeschichte Israels in biblisch-theologischer Sicht — Stuttgart; Berlim; Colénia: Verlag W. Kohihammer, 1993. Diregio editorial: Silvestre M. de Lima Coordenacio editorial: Luis M. Sander Diagramagdo: CompSystem - Digitagdo e Diagramacao Ltda-Me Capa: James Cabral Valdana Dados Internacionais de Catalogagio na Publicagio (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Gunneweg, Antonius H. J., 1922-1990, ‘Teologia biblica do Antigo Testamento : uma historia da religiio de Israel na perspectiva biblico-teolégica / Antonius H. J. Guaneweg ; tradugdo Werner Fuchs ; revisio Haroldo Reimer. ~ Sao Paulo : Editora Teoldgica : Edligoes Loyola, 2005. ~ (Série biblioteca de estudos do Antigo Testamento) Titulo original: Biblische Theologie des Alten Testaments ; eine Religionsgeschichte Israels in biblisch-theologischer Sicht. 16x23 em,; 368 péginas. ISBN 85-89067-23-8 Bibliografia. 1. Biblia. A.T. - Teologia 2, Israel — Religido 3. Judaismo — Historia ~ Até 70 4, Palestina - Religiio I. Reimer, Haroldo. II. Titulo. IIL. Série. 05-5806 CDD-221.6 indices para catélogo sistematico: 1. Antigo Testamento : Teologia biblica 221.6 Proibida a reproducao total ou parcial desta obra, por qualquer forma ou meio eletronico & mecanico, inclusive através de processos xerogréficos, sem permissdo expressa da editora (Lei n® 9.610 de 19.2.1998). Todos os direitos reservados 4 ‘Teolbgica Edigoes Loyola Rua Japuri, 259 - Bela Vista Rua 1822 n° 347 - Ipiranga Cep 01319-030 04216-000 — Sao Paulo ~ SP Sio Paulo, SP - Brasil Caixa Postal 42.335 Tel./Fax.: (11) 3104-9837 0429-970 — Sao Paulo ~ SP teologica@ editorateologica.com.br Fone (11) 6914-1922 ~ Fax (11) 6163-4275 wwweditorateologica.com.br Home page e vendas: www.loyola.com.br E-mail: loyola@loyola.com.br SUMARIO Preambulo a edicao brasileira . Prefacio .... Cartruto I - CONSIDERACOES PRELIMINARES SOBRE A HISTORIA DA PESQUISA E A HERMENEUTICA 1, Esquematizagao introdutéria do problema..... 2. Da “teologia biblica” a “histéria da religiao de Israel 3. Propostas mais recentes de “teologia do Antigo Testamento” ... 4. Conclusao: teologia do Antigo Testamento como disciplina historica ou historia da religido de Israel na perspectiva biblico-teolégica Cariruto Il - A RELIGIAO DO ANTIGO ORIENTE COM ATENCAO ESPECIAL A RELIGIAO CANANEIA Capituto Il - A EPOCA PRE-ISRAELITA (APROX. 1400-1200 a. C.) — A RELIGIAO DOS PATRIARCAS ...... Carituto IV - O SURGIMENTO DOS PRINCIPAIS TEMAS RELIGIOSOS NO PERIODO PROTO-ISRAELITA..... 3. A tradigao do Sinai: teofania, alianca, lei e nome de Javé Carituto V — A RELIGIAO DE ISRAEL NA EPOCA DA FEDERACAO TRIBAL 1, Israel e El . 2. Israel e Javé .. 3. Arca e taberndculo de Javé 4, Sintese..... if ee Se Carituto VI - INOVACOES RELIGIOSAS NA EPOCA DA EXISTENCIA ESTATAL.... 1. O problema religioso do Estado . A realeza de Deus... . Jerusalém, a cidade de Deus . O templo . Sacerdotes, culto sacrifical e festas . A realeza de Jav . Criagdo e caos CP eENaUAwWN . Historiografia teolégica e sabedoria Carituto VII - O GRANDE PROFETISMO DA EPOCA DO REINADO 1. Historia prévia e inicial do profetismo .. 2. O fenédmeno do profetismo especificamente israelita 3. Os grandes profetas do perfodo pré-exilico ... CariruLo VII - O EX{LIO BABILONICO. O CAMBIO RELIGIOSO NA EPOCA DO EXiLIO 1. Crise, unificagao e recomeco. 2. O livro de Ezequiel ... 3. O profetismo de Déutero-Isaias Capiruo IX — A RESTAURAGAO DE JERUSALEM E SEUS PROFETAS 1. Ageu e Zacarias 2. O deuteronomismo Caritu.o X - O PERIODO POS-EXILICO TARDIO 1. As reformas de Esdras e Neemias.... 2. O Escrito Sacerdotal 3. A teologia cronista 4. A sabedoria tardia e sua crise . 5. Escatologia e apocalipsismo...... INDICE DE AUTORES.. REFERENCIAS TEMATICAS . REFERENCIAS BIBLICAS... PREAMBULO A EDICAO BRASILEIRA Teologia biblica é um desiderato no campo do fazer teolégico, de uma forma geral, mas em especial também no contexto brasileiro. Afinal, no mundo académico, mas também no universo eclesial, ha marcas de fragmentagao, de especializagaéo e de énfase em um dos testamentos biblicos. Desde uma perspectiva crista, ha a necessidade intrinseca de se fazer uma constante inter-relacao entre Antigo e Novo Testamento no processo interpretativo destes textos sagrados. Afinal, ambos os testamentos compéem a Biblia crista. A busca por essa cons- tante inter-relacao é uma das marcas do trabalho do professor ANTO- tus H. J. GUNNEWEG, € o presente livro Teologia Biblica do Antigo Tes- tamento certamente contribuira para preencher esta lacuna no campo da literatura teolégica no Brasil. O livro também podera fornecer im- portantes e interessantes insights sobre este modo de fazer teologia. A presente apresentagao busca ressaltar algumas dessas contribuigoes, mas também procura fazer alguns apontamentos criticos 4 obra e a metodologia do autor. ANTONIUS H. J. GUNNEWEG jd tem presenga em lingua portuguesa através da publicacéo de sua obra Hermenéutica do Antigo Testamen- to,' na qual o autor se apresenta sobretudo como um hermeneuta, isto é, como alguém que busca fazer o esforco pratico e teérico de traduzir para dentro do mundo contemporaneo as vicissitudes de tex- tos da antiguidade.” Paralelamente & publicagio da presente obra, ‘Obra publicada por Editora Sinodal e Escola Superior de Teologia, em 2003. *Nas producées literdrias do autor percebe-se essa preocupagdo com a atuali- zagao dos textos antigos para dentro do mundo contemporaneo no sentido de ajudar as pessoas no seu préprio processo de reconhecimento existencial. A Ultima obra péstuma do autor recebeu justamente o sugestivo titulo Die Schrift kommt zu Wort. Predigten [= A Escritura tem direito de expressao. Prédicas|, Stuttgart, 2002 12 PREAMLLO ARDICAO BRASLEIRA outros pensamentos, reflexées e resultados de pesquisas deste autor também estarao disponiveis em portugués através da tradugao de sua Histéria de Israel.* Assim, junto com esta Teologia Biblica, estara dispo- nivel aos leitores e as leitoras da “Altima flor do lacio’ uma trilogia das obras mais importantes deste autor. AANTONIUS HERMANN JOSEPHUS GUNNEWEG nasceu em 17 de maio de 1922 em Rotterda, Holanda, como filho de um livreiro. Entre 1940 e 1944 estudou direito na Universidade de Utrecht, Holanda, estan- do prestes a terminar sua tese de doutorado em direito quando foi levado pelos nazistas para a Alemanha para execucao de servicos forgados. Apés o final da guerra, retornou para a Holanda e traba- hou como consultor em assuntos de direito financeiro e comércio ex- terior. Em 1951, retornando para a Alemanha, iniciou seus estudos de Teologia na Universidade de Marburg, tendo como professores im- portantes mestres como Rupotr BuLTMANN, Ernst Fucus e ERNsT WORTHWEIN. Em 1957, doutorou-se em Antigo Testamento com 0 tra- balho Tradigoes orais e escritas dos livros proféticos pré-exilicos como tema da pesquisa contemporanea sobre os profetas. Apés 0 doutorado, traba- Ihou como pastor em varias comunidades protestantes nas imedia- c6es de Marburg. Em 1963 recebeu a venia legendi, isto 6, o direito de ensinar na universidade com base no trabalho de habilitacao Levitas e profetas. Apés isso, ao lado das atividades como pastor de comunida- de, passou a atuar também como docente na universidade. Em 1968 recebeu 0 chamado para assumir a cdtedra de Antigo Testamento na Universidade de Bonn, na época capital federal da Alemanha, em substituicéio ao notavel pesquisador do Antigo Testamento e Histéria de Israel, Martin Norn. Nesta universidade, GUNNEWEG lecionou por 19 anos, até a sua aposentadoria em 1989. Para sua ultima prelecéo na universidade serviu como base o material reunido no livro que aqui esta sendo apresentado. O professor Antonius GUNNEWEG veio a falecer em 17 de junho de 1990, com a idade de 68 anos. Os materiais do presente livro foram reunidos, levemente sistematizadose acrescidos de * Obra escrita originalmente em 1972, em alemao, com sucessivas reedigoes ¢ atualizacées, sendo traduzida ao portugués por Monika Ottermann a partir da 6. edigéo. No Brasil, o livro esti sendo editado em 2005 pelas editoras Teoldgica e Loyola, de Sao Paulo. PREAMBULO A EDIGAOBRASLEIRA 13 indicagées bibliogrficas por sua esposa e seu assistente e publicados postumamente em 1993, servindo de base para a tradug&o ao portu- gués. Como ressalta a apresentagao de MANFRED OEMING, 0 livro man- tém marcas de um estilo mais coloquial da prelegao oral, o que nao deixa de ser interessante na leitura. A producao bibliografica de ANTONIUs GUNNEWEG € bastante ex- tensa.‘ Evidencia uma preocupacéo panoraémica com os mais dife- rentes temas na pesquisa do Antigo Testamento. Muitas destas pro- duc6es estado na forma de artigos e capitulos de livros. Deve-se registrar também que o autor dedicou muitas paginas a andlise de textos bibli- cos, sobretudo de textos inseridos nas séries de pericopes para prega- cdo na Igreja Evangélica da Alemanha, evidenciando-se, assim, uma constante conexdo de sua obra académica com vida de fé na comuni- dade eclesial. Uma das énfases que perpassa a obra do autor é a preocupagéo com o tema proprio deste livro, a saber: teologia biblica. Essa sua énfa- se também vem marcada com alguns tragos prdprios. Para o autor, é de importancia fundamental que os textos sagrados, como expres- sdes de fé dos antepassados biblicos, devem ter 0 seu canal de expres- sao na vida e no tempo contemporaneos, devendo ser normativos para o fazer teolégico e para a propria vida de fé. Nisso se evidencia um trago marcadamente protestante ou evang¢élico do autor: a teolo- gia deve estar ancorada e sustentada pela Palavra de Deus contida na Sagrada Escritura. E essa teologia biblica deve levar em conta a Biblia como um conjunto de textos canénicos. Embora tenha sido um pesquisador dedicado ao Antigo Testamento, GUNNEWEG parece ter tomado sempre uma perspectiva crista em viés neotestamentario em suas andlises de temas biblicos e histéricos. Com isso, tem-se a im- pressao de que, para 0 autor, apesar dos textos do Antigo Testamento terem sua vida, dignidade e mensagem prépria, cles chegam ao seu pleno sentido quando lidos a luz do evento Jesus Cristo. Assim, 0 Novo Testamento adquire o papel de critério para a leitura (adequa- da) do Antigo Testamento, havendo também sempre certa seletivida- de no processo de leitura. *Para uma visualizagio de sua producao bibliografica, ver www.bautz.de/ bbkl/g/gunneweg. 14 PREAMBULO A EDGAOBRASTLERRA Essa posicao valeu ao autor varios momentos de critica por parte de exegetas e tedlogos alemaes mais estreitamente sintonizados com o didlogo cristéo-judaico e preocupados em garantir ao judafsmo a validade plena de suas escrituras sem a mediagao pelo Novo Testa- mento e sem a adesao a fé em Jesus Cristo. Trata-se ai de um debate teoldgico e hermenéutico em solo alemao como conseqiiéncia do holocausto de milhées de judeus no periodo do nacional-socialismo (1933-1945). O que os criticos, por um lado, tentam evitar é uma nova e constante expropriacao do judaismo de suas escrituras sagradas (Tord, Profetas e Escritos), reconhecendo que as mesmas tém um sen- tido prdprio sem o crivo do Novo Testamento. Busca-se, assim, asse- gurar a dignidade do outrojustamente pela valorizagao de sua alteri- dade. Por outro lado, GuNNEwec busca fazer a leitura dos textos em perspectiva claramente crista, destacando que, por maior simpatia com ojudaismo, a perspectiva crista serd sempre outra, pois tomaré a messianidade de Jesus de Nazaré como critério de leitura e avaliagio. O embate é claramente hermenéutico, mas tem também suas conse- qliéncias para a praxis da fé e para 0 prdprio arcabouco teérico-teol6- gico. Embora o debate seja tipicamente alemao, 0 mesmo pode ter algumas repercussées sobre o fazer teologia (biblica) em solo brasilei- ro e latino-americano. Também em nossa teologia deve-se primar por um respeito a cultura e ao desenvolvimento cultural do outro. Nosso problema nao é o holocausto de judeus, mas a constante expropria- Gao e subjugacao dos povos amerindios e afro-brasileiros. Em nossa hermenéutica e fazer teolégico, o outro, amerindio ou afro-latino, etc., deve ter presenca assegurada com a sua dignidade prépria, também de suas tradigSes culturais e cultuais, nio devendo ser medido pelo critério neotestamentério. Deve haver, isso sim, um didlogo, em que a messianidade de Jesus é um elemento fundamental e enriquecedor do didlogo e nao o critério nivelador ou até anulador. Fazer uma teologia biblica significa estar atento especialmente para o dado primario de todo fazer teolgico: a existéncia, a revela- Gao e a percepcao do Sagrado. Se Deus é entendido e crido como o principio criador e estruturador de todo 0 cosmo, entao suas possibi- lidades de revelacao extrapolam qualquer fronteira nacional, geogra- fica ou étnica. Deve haver uma busca constante pela universalidade de Deus, de suas marcas e de sua mensagem na multifacetariedade e PREAMBULO A EDICAOBRASILEIRA 15 no multicor da histéria humana. Neste sentido, teologia biblica deve estar atenta a pluralidade das culturas e das expressdes de fé dos diferentes grupamentos humanos, em tempos ¢ lugares distintos. Nos textos de GuNNEWEG, especialmente também na presente Teologia Bi- blica, verifica-se uma atencao a dialética entre particularismo da re- velagao e universalidade da mensagem biblica. O professor GUNNEWEG nao nega a particularidade da revelacao de Javé a Israel, mas mantém sempre uma preocupacio pela continui- dade da mensagem dessa revelacdéo nos momentos histéricos seguin- tes. Isso reforga a énfase na teologia biblica: h4 uma continuidade e uma relacdo dialética entre Antigo e Novo Testamento. Nisso ha de se concordar com o autor, isto é, a agregacao dos escritos do Novo Testamento a versdo grega do Antigo Testamento produziu uma nova obra, que, como tal, deve ser lida e interpretada como um todo.’ Essa perspectiva inaugurou no espaco académico europeu-alemao uma série de estudos e publicacées que tem recebido acolhida nas publica- des do Jahrbuch fiir Biblische Theologie [= Anuario para Teologia Bibli- ca], mas também em outras publicagdes como Biblical Theological Bul- letin, publicado nos Estados Unidos. O trabalho teolégico de Gunnewec certamente também contribuiu para isso. A presente obra traz interessantes e importantes reflexées e re- sultados da pesquisa sobre a teologia dos textos do Antigo Testamen- to. O livro esta estruturado em 10 capitulos. Entre estes capitulos ha alguns que recebem maior peso no tratamento dos materiais e do objeto. Claramente, os capitulos 6 e 7 recebem maior destaque. Ocapitulo 6 trata das inovagoes religiosas no antigo Israel coma introducdo da monarquia. A énfase esta claramente colocada nas novidades teolégicas e religiosas herdadas e criadas em ea partir da conquista e integracao de Jerusalém no circuito dos espacos israelitas. Ha observagées muito interessantes feitas sobre esse proceso. Vale destacar que a prépria concepgdo de Deus como rei provavelmente tem sua origem a partir da teologia produzida em Jerusalém, com provaveis empréstimos culticos da cultura cananéia. Isso, aliés, é um > Para uma discussao e exercicios interessantes sobre a leitura da Biblia como obra, ver Jack Mites, Deus: uma biografia, Rio de Janeiro, Cia das Letras, 1996. 16 PREAMBULO A EDIGAO BRASILEIRA traco salutar na obra de GUNNEwEG: ele reconhece, corretamente, que 0 tesouro simbélico-cultural de Israel foi construido em constante re- lag&o dialética de dar e receber com os povos e culturas do entorno.‘ No capitulo 6, além do tratamento das quest6es mais relacionadas com Jerusalém, 0 autor dedica muitas paginas ao tema da historio- grafia teoldgica. Aise revela um traco marcante na metodologiae nos pontos norteadores da sua pesquisa. GUNNEWEG pensa a teologia do Antigo Testamento (ainda quase) totalmente dentro dos marcos da chamada ‘teoria das fontes’. Assim, no que tange a historiografia teo- l6gica, o autor busca descortinar sobretudo a teologia da fonte J, ou do Javista, como um autor literdrio e teolégico nos primérdios da monarquia unida, no tempo do que GrrHarD von Rap chamou de “jluminismo saloménico”. Essa inclinag&o do autor a esse arcabougo tedrico na explicagao do surgimento dos textos do Antigo Testamen- to revela um trago conservador de Gunneweg. As novas tendéncias e modelos explicativos da formagao do Antigo Testamento nao sao de- vidamente contemplados na obra de Gunneweg. Embora, no capitu- lo 1, cite a obra de BREVEARD CHILDS e também os impulsos de ROLF RENDTORFF,’ que buscam valorizar a formal final do canon (canonical approach), GUNNEWEG nao frutifica esses insights para dentro de seu fazer teologia biblica. Isso, de certa forma, marca uma contradicao. Porque fazer teologia biblica deveria necessariamente levar em consi- deracdo a forma final do canon eas varias releituras promovidas den- tro do préprio canon através de acréscimos e de (re)arranjos de todo * Vale destacar importantes contribuigdes de Othmar Keel e da chamada “es- cola de Friburgo”, que busca situar as produgdes do Antigo Testamento em constante inter-relagio com o entorno cultural e social. Para uma amostra vale a pena ler OrnMar Keri, Do meio das nagdes. A Biblia como porta de entrada de culturas antigas do Oriente Préximo, Concilium n. 257, Petrépolis 1995, p.10-21. 7 Entre suas obras mais recentes, deve-se destacar a volumosa Theologie des Al- ten Testaments: ein kanonischer Entwourf [= Teologia do Antigo Testamento: um esbogo canGnico}. Neukirchen-Vluyn, v. I 1999 e v. II de 2001, mas também o livro Der Text in seiner Endgestalt. Schritte auf dem Weg zu einer Theologie des Al- ten Testaments [= O texto na sua forma final. Passos no caminho para uma te- ologia do Antigo Testamento]. Neukirchen-Vluyn, 2001. Anteriormente, o autor jA havia esbogado suas idéias fundamentais na sua Introdugdo ao Antigo Testa- inal de 1983), que em breve ser publicada pela Editora Teoldgica. PREAMBULO A EDIGAOBRASILERA 7 o material. Dentro desse conjunto can6nico final certamente ha mui- tas tradicdes particulares que devem e podem ser detectadas como tais. Fazer teologia biblica do Antigo Testamento, contudo, necessaria- mente implica ler as tradicées isoladas ou menores dentro do conjun- to da obra, sempre mantendo a pergunta até que ponto a moldura modifica a pintura original do quadro em si. Neste sentido, GUNNEWEG, ao procurar descortinar a teologia dojavista, mas também do escrito sacerdotal (P), fica preso a um esquema da teoria das fontes, que, entrementes, ji esta superado. Ooutro capitulo que recebe bastante atengao da parte do autor é © capitulo 7, que trata da teologia das grandes profecias durante 0 periodo do reinado. Ao modo de GerHaRD VON Rab, GUNNEWEG des- taca os principais tracos teoldgicos de cada um das profetas. Todo o esquema vai antecedido por uma discussao sobre a nomenclatura para designar estes personagens biblicos, os quais novamente sao vistos como um fenémeno religioso comum dentro do entorno cultural do antigo Israel. Uma questao critica a ser anotada a respeito das expla- nagoes do autor é a sua compreensao dos profetas enquanto intérpre- tes da lei. Essa é uma tese tradicional da pesquisa, que, porém, ja foi repetidas vezes revidada na pesquisa.* A compreensao tradicional, e também defendida por GUNNEWEG, era de que os profetas, em suas criticas sociais, estariam tomando por base leis anficti6nicas, medin- do, assim, as praticas sociais segundo as exigéncias dessas leis. Hoje, com os avancos no campo da pesquisa das leis do Pentateuco, estima- se que dificilmente tais leis poderiam ter existido na forma escrita antes dos profetas radicais do século VII a.C.; no maximo poderiam ter existido algumas leis consuetudinarias isoladas. Um cédigo de leis com vigéncia efetiva para Israel provavelmente s6 pode ser pressu- posto para o final do século VIII a.C., e os profetas provavelmente foram os preparadores para elevado conceito ético tanto em suas cri- ticas quanto nas leis subseqiientes a atuagao profética.” Com relagéo ‘Eu mesmo procurei evidenciar isso no meu trabalho de doutorado sobre Amés. Cf. Haxorpo Reimer, Richtet auf das Recht! Studien zur Botschaft des Propheten Amos [= Restabelecei o direito! Estudos sobre a mensagem do profeta Amés], Stuttgart 1992 ° Ver Hakouvo Retmek, Sobre a ética nos profetas biblicos. Estudos Biblicos, n. 77, Petrépolis, 2003, p.29-38. 18 PREAMBULO A EOIGAO BRASLERA, aseu postulado de que os profetas séo pregadores das leis anfictiéni- cas de Israel, o préprio GUNNEWEG ndo sabe indicar quais leis em par- ticular poderiam ser enquadradas nesta categoria. Os outros capitulos sao todos mais breves, havendo certo equili- brio na andlise dos materiais. Certo destaque ainda recebe 0 capitulo 10, que trata do periodo pés-exilico. Um capitulo importante é o capi- tulo 1,no qual 0 autor procura descortinar a questéo propria de uma teologia do Antigo Testamento e de uma teologia biblica dentro do panorama da pesquisa biblica do ultimo século. Esse capitulo ajuda o leitor e a leitora a situarem melhor a proposta do autor dentro do conjunto dos esbogos das teologias do Antigo Testamento. Vale des- tacar que o autor se propGe a superar 0 mero tratamento ‘sistematico’ na elaboragao de sua teologia. Nisso se evidencia um seguimento a GERHARD VON Rap na Teologia do Antigo Testamento, buscando o autor trabalhar as teologias das tradigées do antigo Israel, claramente apon- tando para uma pluralidade e diversidade de esbocos teoldgicos den- tro do préprio canon do Antigo Testamento. O autor consegue, em boa medida, manter-se na proposta de VON Rap e até avancar para além dela, embora em algumas partes da obra transparegam por de- mais certos pressupostos hermenéuticos obtidos antes do campo da teologia sistematico-dogmatica do que exauridos do trabalho exegéti- co dos préprios textos. Os capitulos desta Teologia Biblica do Antigo Testamento conse- guem fazer apresentacGes gerais sobre os mais diversos materiais des- te conjunto canGnico. Mas ha um conjunto que explicitamente falta no esbogo. Trata-se das leis, dos cddigos legais e de suas expressdes teolégicas. Neste sentido deve-se destacar a obra A Tord. Teologia das leis do Antigo Testamento de FRANK CRUsEMANN." Nesta obra, CrUsE- MANN toma justamente as leis e os cédigos legais como pilares na cons- trucdo do conjunto candnico da Tord e usa sobretudo o Cédigo Deu- terondmico (Dt 12-26) como ancora para a datacao das outras leis, bem como critério estilistico e teol6gico para a datacéo dos outros conjuntos narrativos dentro do Pentateuco. Neste sentido, Criisemann destaca trés grandes conjuntos de leis, surgidos em varios momentos © O original alemao 6 de 1992; em portugués, a obra foi publicada pela Editora Vozes, em 2002, alcangando logo uma segunda edicio: PREAMPLLO A FOCAO BRASILEIRA 19 da histéria do antigo Israel, mas alocados literariamente dentro do grande conjunto da ‘pericope do Sinai /Horebe’: o Cédigo da Alianga (Ex 20,22-23,19), cuja redagao decisiva é datada para o final do sécu- lo VIII aC, em Juda; o Cédigo Deuterondmico (Dt 12-26), entendido como revisao e ampliacao do anterior na segunda metade do século Vil aC durante a reforma josianica; o Cédigo da Santidade (Lv 17-26), surgido comoa transformacao necessaria dos fundamentos legais de Israel durante 0 periodo do exilio babilénico. Cada um destes trés cddigos é e pode ser tomado como pedra de suporte para a derivacao do desenvolvimento teolégico do Antigo Testamento. Claramente, cada um dos cédigos evidencia um passo rumo a concepcao teoldgica marcante de Israel, isto 6, 0 monoteismo exclusivo, que se firma so- bretudo na 6poca do pés-exilio. A auséncia do tratamento teolégico destes importantes materiais legais constitui uma lacuna lamentavel dentro da Teologia Biblica de Gunneweg. O autor dilui a legislagao propria ou apropriada de Israel ou no periodo da pressuposta anfic- tionia ou no exilio/p6s-exilio, tirando, assim, a potencial reforma so- cial proposta e pretendida nessas leis. Até aqui procuramos destacar elementos importantes do pensa- mento de ANTONIUs GUNNEWEG, especialmente na obra que aqui estd sendo apresentada. Igualmente alguns comentarios e questionamen- tos criticos j4 foram sendo anotados. Cabem ainda algumas conside- racées sobre 0 titulo eo subtitulo da presente obra. O titulo geral Teo- logia Biblica do Antigo Testamento busca, em termos teéricos e metodolégicos, fazer frutificar para dentro da apreciagao do material literario e teolégico do Primeiro Testamento a perspectiva de uma consideracio panbiblica, isto é, um fazer teolégico que sempre consi- dera a necesséria inter-relacao entre Antigo e Novo Testamento des- de uma perspectiva claramente crista. Foi anotado que isso constitui um dos tracos do pensamento e da obra do autor. Neste sentido, nao haveria nada a comentar e a acrescentar se nao fosse o subtitulo “Uma historia da religiéo de Israel em perspectiva biblico-teolégica”. Esse subtitulo cria algumas dificuldades e apresenta certa tensao em rela- ao ao titulo geral. Isso porque a afirmagao de pretender fazer uma “historia da religiao de Israel” cria expectativas que nao sao total- mente contempladas na obra e nem perfazem 0 seu eixo teérico e metodoldgico. 20 PREAMBULO A EDICAOBRASTLEIRA Everdade que o autor busca, na maioria das vezes, alocar histo- ricamente o material literério, para a partir dai esbogar suas reflexdes teolégicas. Isso vale tanto para os profetas quanto para o autor Javis- ta, seja ele individuo ou comunidade. Mas 0 presente livro Teologia Biblicajustamente nao é uma historia da religiao de Israel. E um livro que apresenta facetas dessa hist6ria da religiao judaica. O seu ponto alto sao as reflexdes teolégicas que sao obtidas através de um classico processo de exegese e dedugio dos contetidos querigmaticos dos refe- tidos textos com pressupostos claramente dogmiatico-sistematicos. Também a preocupacao do autor em reiteradamente destacar a ne- cessidade e a validade de uma fé pessoal e comunitaria no encontro direto com Deus é importante. Para ser uma “histéria da religiao de Israel”, porém, falta ao livro e 4 metodologia do autor um tratamento exatamente mais his- t6rico. Em muitas passagens, o autor toma os textos biblicos pura e simplesmente como testemunhos histéricos fiéis na comunicagao de eventos histéricos. Isso nao é errado, mas tanto em Homero, quanto em Flavio Josefo ou em Herddoto ha que avaliar de caso para caso 0 grau de intencionalidade pessoal ou social na projecdo dos conteti- dos. Os textos necessitam passar por uma criteriosa avaliagéo para aferir o quilate de suas afirmacGes ‘histéricas’. Se o proprio autor assinala repetidas vezes que muitos textos tiveram sua origem em periodos muito posteriores ao dos eventos relatados, deve-se traba- lhar com muito mais cautela na derivacdo do fundo histérico ali referido. Para uma histéria da religiao do antigo Israel, com trata- mento claramente mais histérico, com ampla inclusao do desenvol- vimento das leis e dos cédigos legais no antigo Israel, pode-se, sem qualquer hesitagao, remeter para a obra de Rainer Atpertz Religi- onsgeschichte Israels in alttestamentlicher Zeit [= Histéria da religiéo de Israel no periodo veterotestamentario].'' Nesta obra, busca-se tra- balhar de forma mais acurada e histérica os conflitos sociais e as influéncias politicas que afetaram diretamente o surgimento eo de- senvolvimento das idéias religiosas no antigo Israel. Também os confli- tos religiosos sao mais claramente trabalhados, sem uma demasiada " Publicado em dois volumes (1992 e 1996) em Géttingen, Alemanha, pela Editora Vandenhoeck e Ruprecht. PREAMHULO A EDICAO BRASIL ETKA 21 preocupacao na reprodugao dos contetidos querigmaticos pelo fato de se tratar de textos canénicos. Ha sempre a necessidade de se per- guntar pelas intencionalidades histéricas, sociais, teolégicas, de gé- nero na produgao dos textos. Também o tema do sincretismo é tra- tado como um processo cultural e social tipico e proprio no desenvolvimento de qualquer religiao. Uma ultima questao a ser apontada, desde minha perspectiva, é que para 0 livro ser uma “historia da religiao de Israel” falta uma aplicagdo conseqiiente de uma perspectiva fenomenoldgica. Quando o autor descreve fendmenos religiosos no antigo Israel, repetidas ve- zes ha indicacGes para fendmenos similares nas culturas do entor- no. Isso é um dado positivo, pois assim o leitor e a leitora podem ter mais claramente a percepcao de que determinados fenémenos reli- giosos nao sao exclusivos de Israel ou da fé biblica; sao antes expe- riéncias comuns do homo religiosus em tempos e lugares diversos. Em algumas partes do livro, o autor consegue descrever melhores concepgées e rituais religiosos de forma fenomenolégica, por exem- plo, na descricao dos cultos religiosos fora de Jerusalém, isto 6, no reino do Norte. Muito bem o autor destaca que as narrativas vetero- testamentarias relativas ao Israel do norte muitas vezes sao produ- Ges literdrias surgidas ou adaptadas tardiamente no reino do Sul, Juda, sob forte influxo da teologia deuterondmico-deuteronomista com seu postulado da adoracao exclusiva a Javé e a centralizacaéo do culto em Jerusalém. Frente a isso, o autor destaca acertadamente que as imagens projetadas nestes textos nao necessariamente cor- respondem a realidade, podendo inclusive haver deturpagées e ca- ricaturas. Assim, no caso da religiao do Israel do Norte, apesar de haver menor nimero de testemunhos literdrios, ha que se perguntar sempre pela forma e validade prépria das praticas e idéias religiosas ali presentes. A perspectiva fenomenolégica ¢ importante na andlise do ma- terial literario do Antigo Testamento em particular, mas também de textos sagrados em geral, justamente para nao haver um recuo para a descricao de algo como a ‘ontologia’ de Deus ou do Sagra- do. Se por exemplo se afirma que “Javé nao tolera imagens e deu- sas”, deve ficar claro que isso é representacao de autores, que, como tais, projetam nos textos normativos a imagem de um Deus uno e 22 PREAMBULO A EDIGAO BRASILEIRA s6.” A existéncia de Deus deve ser metodologicamente pressupos- ta e teologicamente aceita em fé. Mas a perspectiva de Deus ou a vontade de Deus nao pode ser exaurida ou deduzida com plena certeza dos textos analisados. Pois os textos sao expressao do homo religiosus, isto é, quem se expressa através dos textos é uma plura- lidade de sujeitos da fé, que, em conformidade com a pluralidade cultural, expressam também suas multicores percepgées do divi- no. E toda percepgéo humana do Sagrado é sempre uma redugao. O Deus que se revela é, na verdade, a poderosa forga transcenden- tal do fascinans et tremendum [= elementos fascinante e terrorifico], mas ele se torna comunicavel na rede simbdlica das palavras, nos feixos da comunicagéo humana. A percepcio de Deus ou do Sa- grado é um fenémeno religioso singular e verdadeiro, em toda a sua pluralidade, mas os contetidos desse encontro somente podem ser expressos em termos dos cédigos da linguagem humana." Por mais extdtica e esotérica que seja a experiéncia, a sua comunica- cdo sempre tender ao uso das possibilidades proprias da lingua- gem humana. Todo falar sobre Deus é sempre um falar humano; isso vale para uma teologia do Antigo Testamento, para uma teo- logia biblica ou qualquer teologia. Aos coordenadores da série Biblioteca de Estudos do Antigo Tes- tamento e aos editores resta expressar os cumprimentos pela iniciativa da publicagao da Teologia Biblica do Antigo Testamento de Antonius Gunneweg. Também o tradutor se esmerou em sua tarefa. A leitura da obra certamente contribuird para o enriquecimento da cultura teolégi- caem solo brasileiro e para um debate cada vez mais diferenciado so- bre as importantes e inolvidaveis contribuigSes da cultura hebraica para a autocompreensao humana nos mais diferentes periodos da historia. Prof. Dr. Haroldo Reimer Pastor da Igreja Evangélica de Confissao Luterana no Brasil Professor na Universidade Catolica de Goids 2Sobre o desenvolvimento da fé monotefsta no antigo Israel, cf. meu artigo de resenha de pesquisa Sobre os inicios do monoteismo no antigo Israel, Fragmentos de Cultura, v.13, n. 5, Goiania, 2003, p.967-987. 8 Sobre isso, ver J. SeveRINo CRoAtro, Linguagens da experiéncia religiosa ~ Uma introdugao @ fenomenologia da religido, Sao Paulo, Paulinas, 2001 PREFACIO Em 17 de junho de 1990 faleceu o Prof. Dr. ANtontus H. J. GuN- NEWEG. Estava intensivamente debrucado sobre a elaboragdo de sua “Teologia Biblica do Antigo Testamento”, que significava um grande desejo pessoal dele e deveria sintetizar os resultados de sua vida de tedlogo. Representa, a seu modo, uma proposta original, marcante, instigadora e necessaria de uma teologia do Antigo Testamento. Era necessdria em vista da discussdo cientifica, em que método e execu- cao de uma teologia do Antigo Testamento — particularmente no con- texto de toda a Biblia — continuam sendo bastante controvertidos; era necessdria, porém, igualmente em vista da igreja. Faz parte de seus problemas mais prementes conjugar a reflexao sobre tradicao biblica e situacao atual, justamente também em vista do Antigo Testamento e do judaismo. A definigao correta da relacio entre histéria da reli- gido e falar valido atual sobre Deus constitui 0 intento principal da presente obra. A teologia do professor GUNNEWEG resulta basicamen- te da exegese com vistas a pregagao e espelha uma proclamagao viva ao longo de décadas. A obra tem por base a tiltima prelec&o que o professor GUNNEWEG apresentou no semestre de verdo de 1987 na Universidade de Bonn. O preparo para a publicacao foi subitamente interrompido por enfer- midade e falecimento. Por isso, seguindo numerosas solicitacGes, a Sra. Irene GUNNEWEG e eu tomamos a decisao de tornar a obra acessi- vel ao publico. Em arduo e minucioso trabalho, a Sra. GUNNEWEG “de- cifrou” e digitou o manuscrito escrito 4 mao pelo autor. Na redacao final do texto procedeu-se com muito cuidado, a fim de nao introdu- zir eventuais idéias que o préprio professor GUNNEWEG nao teria rati- ficado integralmente. Em tltima andlise, portanto, nosso esfor¢o foi o de harmonizar peculiaridades do estilo de prelegdo. Nessa questao, porém, igualmente se tornou evidente para nés que a linguagem oral de uma palestra, que ainda transparece nitidamente no livro, possui 24 PREFACIO seus atrativos, seu frescor e seu charme. Ademais, a soberana brevi- dade constitui uma propriedade que ressalta 0 presente esbogo como manual didatico e de referéncia. Visando aumentar a utilidade de manual didatico, acrescentei — como o préprio professor GUNNEWEG projetara — apds cada segdo uma selecao de bibliografia atualizada. Agradecemos ao professor Walter Schmithals, o primeiro leitor da obra, por varias sugestbes, bem como 4 Sra. Christiane Thiem e especialmente ao Sr. Alexander Ernst pela ajuda na revisdo e na con- feccao dos indices remissivos. Bonn, 20 de Setembro de 1992 Manfred Oeming Carituto I CONSIDERACOES PRELIMINARES SOBRE A HISTORIA DA PESQUISA EA HERMENEUTICA 1. Esquematizagao introdutéria do problema Nao é necessario explicar o titulo “Histéria da Religiao de Israel”. Mas até os dias de hoje carecemos de clareza sobre o que significa teologia biblica e particularmente “Teologia do Antigo Testamento”, seja quanto a seu contetido, seja quanto ao método. Algumas citagées de prefacios a teologias do Antigo Testamento poderao ilustrar e con- cretizar isso. Na célebre “Teologia do Antigo Testamento” de GERHARD VON Rab, de 1957, consta logo de inicio: “A ‘teologia do Antigo Testa- mento’ ainda é uma ciéncia jovem, sim, ela é uma das mais novas entre as ciéncias biblicas. Os aspectos basicos da histéria - desde o final do séc. XVIII e inicio do séc. XIX — poderiam ser narrados rapi- damente. Digno de nota é que até hoje ainda nao se conseguiu esta- belecer uma concordancia sobre o que, afinal, seria o objeto real dessa teologia do Antigo Testament (!). Do contrario, como seria possivel apresentar sob o mesmo titulo obras tao diversas como a Teologia do Antigo Testamento de E. Jacos ou de T. C. Vriezen por um lado e a apresentada nesta obra por outro!” E verdade! De acordo com 0 pr6- prio von Rap, a teologia do Antigo Testamento nao tem a ver com a “religido de Israel” ou o mundo intelectual e religioso de Israel, mas com os testemunhos de fé de Israel, relacionados com a histéria divi- namente dirigida e, portanto, em ultima andlise com a revelagao de Deus. De maneira bem diferente procede EpmMonp Jacos (Estrasbur- go), citado por Von Rap e que utiliza um método meramente descriti- vo e visa descrever apenas 0 mundo de concepgées e pensamentos

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