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Referência do texto: DIAS, Maria Odila Leite da Silva.

Interiorização da metrópole e
outros estudos. 1 ed. São Paulo: Alameda, 2005, pp. 7-38.

FICHAMENTO “A interiorização da metrópole”.

A autora inicia o texto abordando algumas especificidades, apesar de existirem


paralelismos com outras nações antes colonizadas buscando uma identidade, da transição de
colônia para Império no Brasil, colocando em pauta a falta de um movimento nacionalista
específico e o fato de que a consolidação da unidade nacional brasileira só ocorreu quase
trinta anos após a declaração da independência.

Adentrando-se nos estudos específicos da independência brasileira, é possível


encontrar pesquisas sobre a mercantilização portuguesa na colônia, as consequências da falta
de uma revolução para o processo de independência e da criação de um sentimento de nação,
em uma “consciência nacional”, etc. Autores como Caio Prado Júnior, Sérgio Buarque de
Holanda e Emília Viotti da Costa são lembrados por Dias.

A Revolução Industrial e o amadurecimento do capitalismo na Inglaterra afetou todo o


ocidente, como sabemos, e isso é reforçado pela autora em seu texto. Os conflitos entre
mercantilismo e liberalismo econômico abalaram todos os países que eram diretamente ou
indiretamente dependentes dos ingleses, em decorrência do comércio. Essa mudança
impactou de maneira expressiva os brasileiros que, agora não mais dependentes dos
portugueses, viram os mesmos tornando-se interessados em nossas famílias rurais e em suas
produções.

Dias analisa que a maioria dos autores que escrevem sobre a independência do Brasil
ainda possuem certos “vícios” e se utilizam de termos e conceitos europeus quando publicam
seus estudos sobre o episódio histórico. Até os dias atuais, alguns estudiosos se utilizam do
exemplo dos Estados Unidos e tentam colocar a nação brasileira em um modelo esquemático
de revolução que desencadeou uma mudança social e estrutural em todo o Estado.

[...] nossa historiografia, [...] ainda não se descartou completamente de certos vícios
de interpretação provocados por enfoques europeizantes, que distorcem o processo
brasileiro entre os quais avulta o da imagem de Rousseau do colono quebrando os
grilhões do jugo .da metrópole; ou da identificação com o liberalismo e o
nacionalismo próprios da grande revolução burguesa na Europa. (DIAS, página 11)

Talvez os portugueses não perceberam, naquela época, que a vinda da Corte em 1808
por si só já significava uma ruptura com o antigo reino e com o pacto colonial, surgindo
contraposições entre aqueles portugueses que permaneceram em Lisboa e os que agora
habitavam na nova Corte. Ademais, antes mesmo nessas novas divergências entre os
portugueses, já haviam tensões e conflitos internos advindos da Revolução Francesa, explica a
autora.

Diante desse cenário inóspito à Portugal, também em consequência da Revolução do


Porto, os políticos e diplomatas portugueses passaram a enxergar as terras brasileiras como a
salvação do reino português. Partindo para o Brasil e decididos a saírem da miséria e dos
conflitos, os portugueses sobrecarregaram suas capitanias, especialmente as do Norte do
Brasil, encarregando-as de arrecadar uma quantidade significativa de impostos, o que ajudaria
a acentuar o sentimento de revolta e vontade de dispersão daquela região.

Os “homens da geração da independência” (p. 17), como nomeia Dias, tinham


consciência dos regionalismos e das discrepantes diferenças entre as capitanias brasileiras,
que eram suficientemente grandes para que não houvesse um aparecimento de consciência de
nação brasileira e que, por conta disso, a possível existência de uma revolução que realmente
viesse a provocar mudanças estruturais no Brasil era inteiramente utópica. É a esse
enraizamento do Estado português no Brasil, inclusive, que devemos a interiorização da
metrópole.

Dias também explica que os homens portugueses da nova Corte se preocupavam em


serem homens civilizados vivendo em meio ao ‘primitivismo’ de uma colônia e, tendo assim
desse sentimento, procuraram ter a “vontade de serem brasileiros” (p. 17), política que foi
uma das principais modeladoras do império, segundo a autora. Além disso, estabeleceram-se
políticas de relações comerciais e agrárias com casamentos de portugueses com famílias
locais, grandes e numerosas obras públicas em todo o território nacional, que tentavam se
equilibrar com o monarquismo português.

A instabilidade crônica da economia colonial gerava mecanismos sociais de


acomodação, tais como a consequente e relativa “fluidez” e “mobilidade” das classes
dominantes, servindo como força neutralizadora para abafar divergências e impedir
manifestações de descontentamento que multiplicassem inconfidências e revoltas.
(p. 23)

A autora também destaca em seu texto as pesquisas que nos levam a compreender o
elitismo presente no Brasil colônia, fundamental para entendermos as relações da metrópole
interiorizada. A interdependência dos interesses administrativos, rurais e comerciais e a
ameaça de uma fragmentação do poder tendo em vista a fraqueza das classes dominantes
foram fatores que contribuíram para o modelo de metrópole estabelecido após a
Independência. Contudo, os conflitos, cada vez mais discrepantes dado a dicotomia do
absolutismo versus a política mercantilista, foram o pontapé para o início das transformações
que finalmente viriam a acontecer nesse período.

A insatisfação gerada pelos conflitos supracitados fica claro nas publicações da


imprensa do século XIX, que clamavam pela nacionalização do comércio e por todas as outras
reivindicações dos “praieiros” e de Pernambuco, em 1848. Essas insatisfações, atribuídas
como consequência da interiorização da metrópole, precisam ser cuidadosamente estudadas e
publicadas como pesquisa, para que assim possamos entender com totalidade a formação da
nacionalidade brasileira, segundo Dias.

Ao longo do texto, a autora dialoga sobre, principalmente, dois períodos: o da


declaração da independência (1822) e o da consolidação da unidade nacional (1840-1850),
indo e voltando a esses períodos em diferentes momentos de sua fala a fim de ilustrar as
mudanças e as permanências políticas e sociais que decorreram desses quase trinta anos que
separaram os dois fatos históricos. A tese da autora durante este capítulo de seu livro é a de
que a imagem da independência não pode ser usada para definir o caráter a formação da
nacionalidade brasileira e, para isso, utiliza pesquisas contemporâneas e também fontes da
época, como cartas, notícias e informes diplomáticos.

Além disso, a crítica de Dias se dá pelo fato dos atuais pesquisadores utilizarem
conceitos europeus para estudarem a independência de um país latinoamericano, como o
liberalismo e o nacionalismo da própria Europa, com “certos vícios de interpretação
provocados por enfoques europeizantes, que distorcem o processo brasileiro” (p. 11). Por
tanto, somente quando estudarmos as especificidades brasileiras sem os vícios do
eurocentrismo poderemos, então, entender a formação da consciência nacional brasileira.

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