Você está na página 1de 17

Distintas abordagens de ensino

1 - Pedagogia tradicional: Principais idéias que constituem o modelo tradicional de ensino-

aprendizagem:

MIZUKAMI, M. G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1986. p.7-18.

(Temas básicos de educação e ensino).

[...]

Considera-se aqui uma abordagem do processo ensino-aprendizagem que não se

fundamenta implícita ou explicitamente em teorias empiricamente validadas, mas numa prática

educativa e na sua transmissão através dos anos. Este tipo de abordagem inclui tendências e

manifestações diversas [p.7].

[...]

O ensino tradicional, para Snyders, é ensino verdadeiro. Tem a pretensão de conduzir o

aluno até o contacto com as grandes realizações da humanidade: obras primas da literatura e da

arte, raciocínios e demonstrações plenamente elaborados, aquisições científicas atingidas pelos

métodos mais seguros. Dá-se ênfase aos modelos, em todos os campos do saber. Privilegiam-se o

especialista, os modelos e o professor, elemento imprescindível na transmissão dos conteúdos.

[...] na concepção tradicional, [...] o aluno [é considerado como] um "adulto em miniatura",

que precisa ser atualizado.

O ensino, em todas as suas formas, nessa abordagem, será centrado no professor. Esse tipo

de ensino volta-se para o que é externo ao aluno: o programa, as disciplinas, o professor. O aluno

apenas executa prescrições que lhe são fixadas por autoridades exteriores [p.8].

[...]

O homem é considerado como inserido num mundo que irá conhecer através de

informações que lhe serão fornecidas e que se decidiu serem as mais importantes e úteis para ele. É

um receptor passivo até que, repleto de informações necessárias, pode repeti-las a outros que ainda

não as possuam, assim como pode ser eficiente em sua profissão [...]. O homem, no início de sua
vida, é considerado uma espécie de tábula rasa, na qual são impressas, progressivamente, imagens e

informações fornecidas pelo ambiente [p.8-9].

[...]

Os programas exprimem os níveis culturais a serem atingidos na trajetória da educação

formal. A reprovação do aluno passa a ser necessária quando o mínimo cultural para aquela faixa

não foi atingido, e as provas e exames são necessários para a constatação de que esse mínimo

exigido para cada série foi adquirido pelo aluno [p.9].

O diploma pode ser tomado, então, como um instrumento de hierarquização dos indivíduos

num contexto social. Essa hierarquia cultural resultante pode ser considerada como fundada no

saber, no conhecimento da verdade [...].

Socialmente falando, essa posição implica supor que as experiências e aquisições das

gerações adultas são condição de sobrevivência das gerações mais novas, como também da

sociedade [p.10].

[...]

Parte-se do pressuposto de que a inteligência, ou qualquer outro nome dado à atividade

mental, seja uma faculdade capaz de acumular/armazenar informações. A atividade do ser humano

é a de incorporar informações sobre o mundo (físico, social etc.) [...]. Usualmente há uma

decomposição da realidade no sentido de simplificá-la. [...] Aos alunos são apresentados somente os

resultados [do processo de produção de conhecimentos] [...], para que sejam armazenados. [p.10]

[...]

Uma das decorrências do ensino tradicional, já que a aprendizagem consiste em aquisição

de informações e demonstrações transmitidas, é a que propicia a formação de reações

estereotipadas, de automatismos, denominados hábitos, geralmente isolados uns dos outros e

aplicáveis, quase sempre, somente às situações idênticas em que foram adquiridos. O aluno que

adquiriu o hábito ou que "aprendeu" apresenta, com freqüência, compreensão apenas parcial.

Essas reações estereotipadas estão sempre ligadas a uma expressão simbólica, quer seja verbal,

algébrica ou numérica, que as desencadeiam.

O isolamento das escolas e o artificialismo dos programas não facilitam a transferência da

aprendizagem. Ignoram-se as diferenças individuais, pois os métodos não variam ao longo das

classes nem dentro da mesma classe.


Em termos gerais, é um ensino caracterizado por se preocupar mais com a variedade e

quantidade de noções/conceitos/informações do que com a formação do pensamento reflexivo. [...].

[p.13-14]

[...]

[...] [Já que o ensino é caracterizado] pela transmissão do patrimônio cultural, pela

confrontação com modelos e raciocínios elaborados, a correspondente metodologia se baseia mais

freqüentemente na aula expositiva e nas demonstrações do professor à classe, tomada quase como

um auditório.

O professor já traz o conteúdo pronto e o aluno se limita, passivamente, a escutá-lo. O

ponto fundamental desse processo será o produto da aprendizagem. A reprodução dos conteúdos

feita pelo aluno, de forma a automática e sem variações, na maioria das vezes, é considerada como

um poderoso e suficiente indicador de que houve aprendizagem e de que, portanto, o conteúdo está

assegurado. A didática tradicional quase que poderia ser resumida, pois, em "dar a lição" e tomar

"a lição". [...].

A utilização freqüente do método expositivo, pelo professor, como forma de transmissão de

conteúdo, faz com que muitos concebam o magistério como uma arte centrada no professor. [p.15]

No método expositivo [...] o professor é o agente, o aluno é o ouvinte. O trabalho intelectual

do aluno será iniciado, propriamente, após a exposição do professor, quando então realizará os

exercícios propostos. [...] Tal tipo de método tem por pressuposto basear a aprendizagem no

exercício do aluno [no caso, exercício de natureza repetitiva]. A motivação para a realização do

trabalho escolar é, portanto, extrínseca e dependerá das características pessoais do professor para

manter o aluno interessado e atento.

Usualmente, o assunto tratado é terminado quando o professor conclui a exposição,

prolongando-se, apenas, através de exercícios de repetição, aplicação e recapitulação. O trabalho

continua mesmo sem a compreensão do aluno e somente uma verificação a posteriori é que

permitirá ao professor tomar consciência desse fato.

Surgem dificuldades no que se refere ao atendimento individual, pois o resto da classe fica

isolado quando se atende a um dos alunos particularmente. É igualmente difícil para o professor

saber se o aluno está necessitando de auxílio, uma vez que usualmente quem fala é o professor.

Dessa forma, há a tendência a se tratar a todos igualmente: todos deverão seguir o mesmo ritmo de
trabalho, estudar pelos mesmos livros-texto, utilizar o mesmo material didático, repetir as mesmas

coisas, adquirir, pois, os mesmos conhecimentos. [p.16]

[...]

A avaliação é realizada predominantemente visando a exatidão da reprodução do conteúdo

comunicado em sala de aula. Mede-se, portanto, a quantidade e exatidão de informações que se

consegue reproduzir. Daí a consideração de provas, exames, chamadas orais, exercícios etc., que

evidenciam a exatidão da reprodução da informação. [p.17]

Historicamente [séculos XIX e XX], movimentos denominados de "educação nova"

começaram a se desenvolver tomando como ponto de partida as decepções e lacunas que se

atribuíam aos resultados da educação tradicional ou clássica. Nota-se, nos últimos anos,

preocupação acentuada com a educação e a escola, e com a elaboração de teorias e/ou propostas em

decorrência das quais pedagogias alternativas tendem a se desenvolver, mesmo que em direções

distintas e conflitantes entre si. [p.18]

CACHAPUZ, A. F. (Org.). Perspectivas de ensino. 1.ed. Porto: Centro de Estudos de

Educação em Ciência, 2000. p.7-10. (Formação de professores - Ciências, 1).

ENSINO POR TRANSMISSÃO

Na perspectiva do Ensino Por Transmissão (EPT) pressupõe-se que o professor pode

transmitir idéias pensadas por si próprio ou por outros (conteúdos) ao aluno que as armazena

seqüencialmente no seu cérebro (receptáculo). Ou seja, o professor "dá a lição" [...] e pede, em

troca, que os alunos usem a sua actividade mental para acumular, armazenar e reproduzir

informações [...]. O EPT radica, pois, no pressuposto epistemológico de que os conhecimentos

existem fora de nós, e de que, para os aprender, é suficiente escutar - ouvir com atenção [...]. [p.7]

[...] O papel do aluno é de grande passividade cognitiva, considerado mesmo "tábua rasa".

O trabalho é essencialmente individual e não existe a preocupação de obtenção intencional de um

feed-back, ainda que muitas vezes ele surja [...], mas sem que tenha um verdadeiro significado de

detecção de dificuldades e sua posterior superação. Ignoram-se as diferenças individuais, quer


sociais, quer pessoais dos alunos. A comunicação é unilateral, vertical e quase sempre de sentido

único e do professor para o aluno. O discurso didático é marcado por exposições orais do professor

e as questões por ele colocadas são essencialmente, de baixo valor cognitivo predominando questões

dirigidas à memória e reconhecimento do tipo "que", "quem", "quando", "qual". Questões

envolvendo "como" e sobretudo "porque" são bem mais raras. A avaliação está separada de facto

do processo de ensino-aprendizagem e é essencialmente de índole classificatória [...]. [p.8]

[...] o professo esquece a necessária e quão difícil transposição didática, esquece as

exigências de atendimento às necessidades específicas dos alunos e de os ajudar a pensar e a

construir o conhecimento, dado parecer estar mais centrado em si e na sua própria actualização,

sobretudo em redor do conteúdo científico. O instrucional sobrepõe-se ao educacional, havendo

pouco lugar para uma educação centrada intencionalmente na vivência de valores democráticos, de

respeito pelo outro e pela sua pessoalidade. A educação é retórica e não tem qualquer incidência em

atitudes de cooperação, de entreajuda, mas, quantas vezes de choque e competição entre os alunos.

[...] Aparentemente não existem grandes dificuldades de aprendizagem, já que a clareza, o

ritmo de apresentação, as pausas e as repetidas explicações (muitas vezes de forma idêntica),

parecem mesmo confirmar a convicção do professor de que não há dificuldades nos alunos. Estas

seriam só momentâneas, de passagem. O conhecimento científico que se apresenta definitivo e que

apenas muda porque mais factos, mais dados o fazem aumentar, crescer quantitativamente, parece

deslizar sem dificuldades do senso comum. Tal como o saber do aluno que pressupõe percorrer

patamares não tanto de complexidade crescente, mas de mero aumento quantitativo de elementos,

factos e dados a reter. [...] [p.9]

[...]

[...] esta perspectiva de ensino é ainda que com várias cambiantes muito freqüente, sem

dúvida ainda dominante, nomeadamente quando nos aproximamos dos níveis mais elevados do

sistema de ensino. [p.10]

Os trabalhos experimentais na perspectiva do ensino POR TRANSMISSÃO


Os trabalhos experimentais (TE) são frequentemente de circunstância, de ocasião, não se

sequenciam intencionalmente, nem se articulam com o currículo, numa sequência lógica e capaz de

facilitar e tornar compreensíveis as suas ligações.

Trata-se de um TE de tipo ilustrativo demonstrativo e de sentido verificatório ou quando

muito confirmatório, preparado para os alunos observarem com atenção e fazerem registros que

lhes são solicitados para fazerem. O seu grau de abertura é reduzido, ou mesmo nulo, e o protocolo

experimental ao conter as instruções todas muito detalhadas não dá espaço ao aluno para, ao

menos, perguntar para que está a fazer o que lhe foi dito para fazer.

A observação atenta do que acontece é a pedra de toque, já que o que se pretende são

registros neutros, mas rigorosos, do que vê. A explicação, bem como os resultados são óbvios,

nomeadamente, para o professor que conhece de antemão todo o processo. Trata-se de algo que

funciona, para o professor, como suporte de confirmação, ou melhor de verificação, de alguma

teoria aprendida previamente , mas que em muitos casos só o professor conhece com detalhes e com

a coerência interna, decorrente da sua unidade conceptual.

Também se acredita que a repetição sistemática, exaustiva mesmo, ao dar sempre os

mesmos resultados é um elemento indiciador que tudo vai bem; assim, pode-se, desta forma,

generalizar o conhecimento que se vai constituindo em lei infalível.

Os objectivos do TE, na maior parte dos casos, não são conhecidos dos alunos que apenas

fazem, executam, quando isso chega a acontecer .... O professor quase sempre limita-se a

administrar e a gerir os aspectos estritamente pedagógicos, decorrentes ou da falta de disciplina, ou

da pouca atenção. Por isso mesmo as suas orientações valorizam as chamadas de atenção

disciplinar.

O TE na perspectiva transmissiva parece querer evidenciar o concreto, a descoberta do

que é, do real objectivo e acessível aos nossos olhos. Ver e observar confundem-se. Existem

preocupações, muitas vezes, com o manuseamento do material, quase só para que se possa seguir o

protocolo experimental e, desse mesmo manusear, não saírem goradas as expectativas quanto aos

resultados esperados e óbvios.

As experiências mais parecem ser feitas para funcionarem como espaços lúdicos, onde se

esquece a rigidez da aula e da disciplina imposta pelas "matérias" a aprender, a memorizar.

Nalguns casos o TE aparece como uma panaceia, porventura como um prémio para os alunos.
Porém, para o professor é, muitas vezes, uma obrigação curricular e, sobretudo tal parece claro

quando o TE não está ligado à sua formação académica de base.

Resta por fim, referir que esta perspectiva de ensino é ainda que com várias cambiantes

muito frequente, sem dúvida ainda dominante, nomeadamente quando nos aproximamos dos níveis

mais elevados do sistema de ensino.

2 - ENSINO POR DESCOBERTA (EPD):

CACHAPUZ, A. F. (Org.). Perspectivas de ensino. 1.ed. Porto: Centro de Estudos de

Educação em Ciência, 2000. (Formação de professores - Ciências, 1).

O EPD que se impõe , por volta dos anos 70, como a perspectiva nuclear do que é ensino

das Ciências, acabou por fazer convergir nela dificuldades, ainda que gerando no seu seio um clima

de aceitação, por parte dos educadores. Trata se, em todo o caso, de uma ruptura positiva, que

representava significativos avanços em relação à perspectiva anterior, nomeadamente no que diz

respeito à vertente da aprendizagem que trazia em si um ar renovado ao velho EPT.

O EPD parte da convicção de que os alunos aprendem, por conta própria, qualquer

conteúdo científico a partir da observação; de que são os trabalhos experimentais radicados no

fenomenológico e no imediato que levam à descoberta de fatos "novos" e que a interpretação, mais

ou menos contingente, de tais fatos que conduz, de forma natural e espontânea, à descoberta de

idéias, das mais simples às mais elaboradas.

Valoriza a atividade do sujeito embora, como referimos, ela seja, sobretudo, mobilizada

pela via do sensor construindo idéias a partir dos fatos dados ou obtidos. Não tem, pois, em conta a

construção ativa do conhecimento, que não deve ignorar um diálogo de idéias com e contra idéias.

Também nesta perspectiva de ensino não há preocupação com o que os aluno sabem;

quando chegam à escola é como se, quase sempre, o professor ignorasse toda a vida acumulada de

um saber quotidiano que se vai progressivamente construindo. A atividade do aluno limita-se,


muitas vezes, à constatação de fatos, no sentido de serem descobertos e daí a imagem recorrente em

manuais escolares de um aluno tipo detetive, cujos fatos apenas necessitariam de esforço e

concentração para serem encontrados. É a corrente metáfora do aluno cientista. Na lógica do EPD ,

tais fatos estão ali, falam por si e basta olhá-los com atenção. No fundo confunde-se fato com fato

científico e de que o primeiro só se pode transformar no segundo desde que inserido numa rede de

razões. Há como uma colagem de velhas idéias de raízes impirista e indutivista a novas idéias de

natureza construtivista na esteira de contribuições píagetianas que haviam deslocado o olhar para

aluno como sujeito de aprendizagem. A nosso ver é uma colagem muito questionável que envolve

projetos inconciliáveis. E o que foi designado noutro local por casamento por conveniência (Santos

& Praia, 1992).

Faz-se notar que, em Portugal, os finais da década de 70 e, sobretudo os anos 80, foram

anos ricos em experiências pedagógicas, em que se encarou com um novo olhar e atitude as novas

propostas para o ensino das Ciências. Tal fica a dever-se, em boa parte, ao EPD , pela sua

visibilidade em muitas das práticas dos professores. Os projetos de renovação, nomeadamente na

formação de professores e na própria dinâmica desenvolvida por muitos grupos de trabalho, foram

acolhidos com satisfação. Os Projetos Como por exemplo o PSSC, BSCS etc, foram, em particular

os mais divulgados entre nós e ainda hoje se fazem sentir os seus efeitos.

Na perspectiva de Ensino Por Descoberta (EPD) o que se apresenta ao aluno já não são

fatos dispersos, ou mesmo idéias soltas, mas sim fatos observáveis e mesmo hierarquicamente

organizados, na presunção de que é a partir deles que sistematicamente o aluno, agora entendido

como sujeito do processo de aprendizagem, ainda que guiado, gera conceitos. De fato, "a convicção

de que todos os conceitos nascem natural e espontaneamente a partir de um processo único,

radicado na experiência simplista, imediata, concreta e direta, cria ilusões de universalidade e

espontaneidade. É uma convicção que parte do pressuposto de que há um processo de pensamento

resultante de uma maturação natural e espontânea, que leva o aluno a descobrir, por si próprio,

todo e qualquer conteúdo" (Santos & Praia, 1991). Tal situação contribui para que o professor

imprima, invariavelmente, às suas estratégias um caminho linear e seqüencial que consagra "o

método universal para construir todo e qualquer conceito - "o" método científico (MC). O

professor / método funciona, neste caso, como o pivô da descoberta, ou melhor, da sua ilusão.
Na perspectiva do EPD há pois uma deslocação do foco do processo de ensino-

aprendizagem - do professor para o aluno e dos conteúdos conceituais para os processos científicos.

O professor tem aqui o papel de programador e de o fazer de forma exaustiva, detalhada, clara,

seqüencial e rigorosa - "o" método. Tal encontra-se marcado por uma lógica de objetividade e

rigor, bem caracterizados pelo positivismo. Dá-se muita ênfase à análise da estrutura do assunto a

aprender e muito pouca ao contexto de aprendizagem. O erro deve ser evitado por todo custo e as

experiências de índole mecanicista devem ser positivas e estimuladas.

Ao refletir no entendimento que as propostas do EPD fazem do MC, referiremos à três

idéias chave (Santos & Praia, 1991):

(1) ) Dá uma imagem impirista / indutivista do trabalho dos cientistas, conduzindo ao

do "MC", já que segundo esta idéia os cientistas para chegarem à verdade caminham de forma

mecânica, invariável e linear dos fatos para as idéias;

(2) ) Abriu a porta ao "discurso do método" (por via de lacunas na formação de

professores crentes na convicção de que se pode atingir o cerme da metodologia científica por meio

de descrições bem intencionadas, quer sejam do professor, dos manuais escolares).

(3) ) Fomenta imitações ingênuas da investigação científica, já que cria nos alunos a

ilusão de que seguindo o "método científico" obterão resultados análogos aos dos cientistas,

Pretensão que, confundindo a categoria de método de ensino com a categoria método universal da

descoberta científica, não tem em conta diferenças enormes entre a construção científica e o ensino

das Ciências.

Esta confusão gera uma ilusão por parte dos alunos, que se vêm elevados à categoria de

investigadores. Reforçam as concepções de Ciência centradas numa linearidade processual, E neste

contexto o aluno é entendido como reprodutor de um processo que começa na observação, se

prolonga pela hipótese ( quantas vezes facilmente esquecida ) e pela experiência, que vai fornecer

os dados e os resultados adequados para as previsíveis interpretações e conclusões, exprime bem

este mito, que introduzido no quadro epistemológico por Bacon, se transfere como se uma simples

mágica se tratasse para o ensino, transformando-o num quadro negativo pelo próprio processo de

ensino e, naturalmente, para a aprendizagem.

As perspectivas impiristas que dão suporte ao chamado "método científico" (Observação,

Hipótese, Experimentação, Resultado, Interpretação e conclusão), mas sobretudo indutivistas,


marcam este processo, que não contempla o aluno enquanto possuidor de dificuldades conceituais.

Estas são resolvidas pelo método todo poderoso, ou seja, o MC, e ao aluno basta seguir

atentamente as instruções do professor e os resultados surgirão sem questionamento. Para o EPD

os conteúdos são meros elementos que compõe a estratégia bem delineada e depois desenvolvida

pelo professor.

Podemos dizer que a perspectiva do EPD, numa lógica de rompimento positivo com o EPT

( ainda que se centre agora no aluno e procure um dinamismo Reduzido porque se centra e

desenvolve quase só à base dos processos científicos) está apenas preocupada com a metodologia

científica, a um ponto tal que se chega a querer confundir aquela com o método de ensino, situação

epistemologicamente inaceitável.

O professor enquanto mediador de um ensino dirigido ( com vista à descoberta guiada )

com maior ou menor intervenção, tenta convencer o aluno de que é fácil reproduzir tal processo, ou

seja, a aprendizagem tende a centrar-se na descoberta, estando no cerne de tal descoberta a

observação cuidada e sistemática, a espontaneidade, o seu sentido intuitivo, como ponto de partida

que faz descobrir sem pensar a partir de quadros de referenciais teóricos, mas sobretudo por ver e

acreditar no que vê. O significado, a elaboração e a construção pessoal do conhecimento fica, aqui,

muito fragilidade, pois coloca todas as suas energias no observável ( com rigor e perseverança). A

natureza é a fonte de dados, eles estão aí, basta empenhar-se em descobri-los. Pede-se ao aluno que

ponha nessa descoberta o seu empenhamento e ver-se à q chegará (às idéias e ao entendimento

delas).

Confunde-se facilmente "descobrir o que", relativo ao âmbito descritivo/fenomenológico (e

por isso mesmo acessível ao aluno) com "descobrir porque", relativo a quadros teóricos (e por isso

mesmo inacessível ao aluno sem informação prévia).

Na perspectiva do EPD que vimos apresentando, os alunos poderão estar organizados em

pequenos grupos com vista a procurar chegar às respostas desejadas pelo professor, q as sabe de

antemão - elas são já esperadas. Porém, a conflitualidade cognitiva bem como o erro são

desvalorizados ou até mesmo excluídos no processo de ensino-aprendizagem e os alunos devem

chegar pacificamente (com o professor) aos mesmos resultados.


Em suma, podemos apontar cinco fatores associados entre si que, nos permitem explicar

porque é que a perspectiva do EPD ainda permanece nos nossos dias de hoje, e em particular no

ensino básico.

(1) a perspectiva do EPD parece aparentemente mais simples porque é a mais próxima que

toca à natureza da Ciência ao entendimento do que é e representa a atividade científica, na sua

multifacetada representação;

(2) A aceitabilidade de que gozam perspectivas pedagógicas centradas no aluno, e que

compartilham com o EPD em relação à características centradas em uma aparente linguagem

comum (indo da investigação, descoberta, observação , ...) operam a favor de um modelo científico

indutivista e ainda fortemente empirista;

(3) as representações e as concepções que os professores têm acerca da natureza da ciência

são fortemente marcadas pelo empirismo/indutivismo, concepções estas adquiridas pelas suas

experiências de aprendizagem (nomeadamente nas aulas que tiveram na Universidade) e pelas

experiências de formação contínua e que são, agora, reforçadas pelos livros texto e/ou escolares e/ou

por software educativo.

(4) a crença na existência de um método científico como um algoritmo capaz de dirigir as

investigações dos alunos na escola (como se a investigação científica se resumisse no fato de que o

trabalho experimental seria o instrumento por excelência.

(5) A Crença na objetividade e neutralidade dos fatos, isto é, livres de juízos feitos, c cria

uma simplificação, cuja idéia passada para os alunos cria a ilusão de que aprender é fácil ( não é

necessário um grande esforço).

Há, pois, uma necessidade de reagir contra uma exagerada tendência para os EPD,

entendido muitas vezes como descoberta de idéias por conta própria, A partir de fatos evidenciados

por resultados experimentais que se articulam. O que está em jogo é abandonar o síndroma da

resposta certa, bem como a tendência para considerar o erro como evidente. Temos que abandonar

e lutar contra uma didática que faz quase só reter os fatos e esquecer as razões. O erro não é

evidente e importa levá-lo em conta, Ou seja, é necessário que não ignoremos e/ou subestimemos as

idéias dos aluno já que muitas das idéias brotam do diálogo com outras idéias. Isto está longe de ser

considerado como um desvio, o erro é consubstancial ao conhecimento.


Em relação ao TE (trabalhos experimentais) pode considerar-se, no âmbito desta

perspectiva de ensino como um instrumento privilegiado, já que é, sobretudo, fundamentado em

tormo do exercitar as capacidades processuais do aluno relativas à aplicação do MC (na convicção

e crença de que ele é capaz de chegar às idéias a partir, com e através dos fatos que se lhe oferecem

gratuitamente e que lhes ajudam a melhorar as suas capacidades de pensar e de aprender. Assim, a

experiência pela experiência é, por excelência, a atividade que os alunos devem fazer

sistematicamente. Muitas vezes faz-se mais trabalho em grupo do que trabalho de grupo, o que

distorce o sentido cooperativo que este deve ter (aliás uma das finalidades subscritas para o

exercício do próprio TE), em particular na resolução conjunta de dificuldades cognitivas

individuais dos alunos que, inevitavelmente surgem. O método aparece, sobretudo, como um

exercício mecânico e independente do conteúdo e do contexto a que o TE se refere. O professor ao

requerer que o aluno desenvolva diversas capacidades inerentes ao processo científico vivenciado

pelos cientistas, Requer que o discente faça o mesmo para qualquer conteúdo, na convicção de que

o aluno ficaria preparado cognitivamente para aprender por si próprio.

A problematização nesta perspectiva de ensino é inexistente, pois o protocolo seguindo

sistematicamente os passos dá a segurança ao aluno do que está a realizar. O sentido e, sobretudo, o

significado com que o faz e para que o faz é que não está claro. O problema limita-se a ser

formulado, mas a resposta a ele é como esquecida, para valorizarem sobretudo os resultados

esperados.

Entretanto, é justo salientar que, pese embora estas críticas o EPD constituiu-se em um

salto qualitativo no ensino, em particular devido ao trazer o trabalho experimental para o cerne do

ensino das Ciências. Representou uma nova orientação marcada pelo ensino que procurava

mostrar ainda que de forma ingênua, algumas das dificuldades próprias da construção do

conhecimento científico. O papel do aluno passou a ser mais valorizado, mas, tratou-se de o

Colocar no centro do processo de aprendizagem, E não de o chamar a participar ativamente mesmo

através das suas dificuldades.

Por fim, importa referir que no final dos anos 70, embora os quadros Epistemológicos

empiristas / indutivistas que marcam o EPD estivessem já em regressão, Tal regressão só

tangenciou a Didática das Ciências. As teorias como algo que os cientistas Constróem, ainda que

provisoriamente, não pareciam estar nas preocupações e fazerem parte da reflexão didática dos
professores. Por outro lado, as idéias que os alunos traziam para a Escola, fruto do seu quotidiano

não Eram devidamente valorizadas e, em conseqüência, as estratégias de ensino no que se refere ao

EPD, eram incapazes de às superar.

3 - Novas abordagens para o ensino de ciências e matemática

Retirado de: Camargo E, P. Ensino de Física para alunos com deficiência visual: Um estudo de
caso: Trabalho realizado para o exame de qualificação, maio 2003

3.1. Conhecimentos prévios: um novo paradigma educacional


No contexto dos conhecimentos prévios, erros conceituais ou concepções alternativas, um grande
número de estudos em várias áreas do conhecimento foi realizado nas últimas três décadas (Eckstein e
Shemesh, 1993). Dentre essas áreas do conhecimento, o número de estudos sobre concepções em
mecânica ganha significativo destaque pela quantidade realizada (McDermott, 1984; Sebastiá, 1984).
Contudo, também estudos sobre conceitos ou áreas do conhecimento como: calor (Macedo e Soussan,
1985) eletricidade (Varela, 1989), Óptica (De La Rosa et al, 1984; Viennot e Kaminsky, 1991), Biologia
(Jiménez, 1987), Geologia (Granda, 1988) Química (Furió, 1986), podem ser encontrados.
Não obstante, como decorrência de tais estudos, houve uma variação na nomenclatura, bem
como, uma melhor compreensão e interpretação dos referidos conhecimentos prévios. Termos como:
“teorias ingênuas” (Caramazza et. al. 1981), “ciência das crianças” (Gilbert et. Al. 1982; Osborne e
Wittrock 1983), “concepções alternativas” (Driver e Easley 1978), "representações" (Giordan 1985),
entre outros, podem ser encontrados na literatura.
Resultante desses trabalhos, apresenta-se a constatação da não convergência entre as visões dos
estudantes e o pensamento científico atual. Pode-se interpretar como uma melhor compreensão do
significado desses “conceitos pré escolares”, o fato de que tais não constituem-se em simples equívocos
momentâneos, mas revelam-se como idéias muito sérias e persistentes, afetando de forma similar a alunos
de distintos países e níveis, incluindo uma porcentagem significativa de professores (Twigger, et. Al.
1994).
Neste contexto, A abundância e a persistência das concepções alternativas nos mais variados
campos científicos de acordo com o construtivismo, podem ser analisadas considerando-se basicamente
dois pontos quase sempre, relacionados entre si:
a) A necessidade por parte dos estudantes de compreender o mundo ao seu redor, necessidade
que produz análises e interações sensoriais e sociais, e que resultam no surgimento das concepções
alternativas, isto é, tais concepções constituem idéias que os alunos já possuem previamente ao
aprendizado escolar (Lochhead e Dufresne, 1989). Todas as pessoas adquirem representações sobre o
mundo, que lhes permitem conhecer suas regularidades, tornando-o desta forma, mais previsível e
compreensível. Desse modo, os alunos possuem um conhecimento implícito que lhes proporciona
compreender e interpretar fenômenos observados, de maneira similar ao modo indutivo de fazê-lo
(Dunbar, 1995).
Uma postura oposta a esta, é a que sustenta Preece (1984), que para explicar a existência das
concepções alternativas, defende a hipótese de que estas, não são frutos de experiências, mas sim, idéias
inatas. Tal hipótese por sua vez, não leva em conta que as concepções alternativas não são facilmente
adquiridas, pelo contrário, são o resultado de um longo processo baseado em experiências cotidianas em
um certo meio cultural.
b) As características do ensino tradicional, que põe em dúvida o fato de que a transmissão de
conhecimento torne possível uma recepção significativa dos mesmos. Os alunos que estudaram ciências
de acordo com um modelo de transmissão-recepção não só terminavam seus estudos sem saber resolver
problemas e sem uma imagem correta do trabalho científico, como também a imensa maioria deles nem
sequer atingiam a compreensão dos significados dos conceitos científicos mais básicos. Nesse sentido,
Wheatley, (1991), aponta que não se pode, como pretendia o ensino tradicional, “pôr idéias” nas cabeças
dos estudantes tanto quanto se gostaria.
Um outro enfoque dado pelo estudo das concepções alternativas, é o da relação das concepções
em mecânica com elementos da Física Aristotélica (Stinner, 1994). Idéias como: os corpos mais pesados
caem mais rapidamente, ou de que sem ação de forças os corpos não se movem, mantém semelhanças
com o referido paradigma. Como mostra Piaget (1970) as semelhanças entre as concepções alternativas
sobre movimento e o paradigma aristotélico não podem ser acidentais, mas sim, fruto de uma mesma
metodologia, consistente em concluir a partir de observações qualitativas não controladas, em extrapolar
as evidências, aceitando-as acriticamente.
Entretanto, o paradigma aristotélico é, sem dúvida, mais elaborado e coerente que as concepções
dos alunos, apesar de ambos se fundamentarem em “evidências de sentido comum” (Hashweh 1986).
Como observa Peduzzi, (1996) apesar de salutar o estabelecimento de relações entre as concepções
alternativas e alguns conceitos aristotélicos, é necessário não reduzir a criteriosa Física aristotélica, à
visão de senso comum, muito menos elaborada devido ao seu não interesse investigativo, “pois ainda que
não o seja matematicamente, a Física Aristotélica é uma teoria altamente elaborada, que transcende os
fatos do senso comum que servem de base à sua elaboração (...) não é nem um prolongamento grosseiro e
verbal do senso comum nem uma fantasia infantil mas sim uma teoria, isto é, uma doutrina que, partido,
bem entendido, dos dados do senso comum, os submete a uma elaboração sistemática extremamente
coerente e severa” (Koyré, 1986).
Aristóteles foi o primeiro a desenvolver sistematicamente formulações explícitas para
concepções de senso comum sobre fenômenos físicos e organizá-las em um sistema conceitual coerente.
“Ele, desse modo, preparou um caminho para uma crítica das concepções de senso comum, crítica esta
que contribuiu para o desenvolvimento da Física enquanto Ciência” (Halloun e Hestenes, 1985).
Dessa forma, a existência e permanência de concepções alternativas em alunos não pode
isoladamente justificar possíveis resultados negativos obtidos por um processo de ensino. Como aponta
Bachelard (1938), “é uma surpresa que os professores de Ciências, em sua grande parte, não
compreendam que não se compreenda”. Se a superação das visões de mundo, desde Aristóteles até
Galileu representou significativo obstáculo na história da Ciência, não deveriam haver grandes surpresas
em reconhecer que tal superação significa imensa barreira para os estudantes ainda hoje (Lemeignan e
Weil-Barrais, 1994).
Não obstante, observa-se que para o caso do ensino tradicional, a crítica central que se estabelece
não se refere exclusivamente à ineficácia que o referido modelo de ensino apresenta em modificar as
concepções dos alunos, e sim, que este modelo de ensino as ignora.
Portanto, as concepções alternativas devem receber um tratamento de maior importância por
parte dos professores, ou seja, devem ser consideradas como hipóteses alternativas sérias de um
determinado fenômeno, e a partir disto, valorizadas em um processo de ensino-aprendizagem.
Na seqüência, apresentar-se-a uma análise acerca de uma metodologia de ensino/aprendizagem
que procurou atentar para a importância das concepções dos alunos, mas que contudo, direcionou sua
meta de aprendizagem para um referencial um tanto quanto que radical, ou seja, na substituição das ditas
concepções por outras mais convergentes às científicas. Como será discutido, tal meta constituiu-se no
principal foco de críticas da referida metodologia, e por conseqüência, representou a base para sua
superação.

3.2. O modelo de mudança conceitual: definições e análises


Uma significativa influência nos replanejamentos das atividades de ensino exerceram as
propostas que consideraram o aprendizado de Ciências como uma "mudança conceitual" (Posner et. al.
1982). Fundamentada no "paralelismo" entre o desenvolvimento conceitual de um sujeito e a evolução
histórica dos conhecimentos científicos, tal modelo de ensino, a partir de meados de 1980, ganhou força
entre educadores construtivistas.
Segundo tal proposta, uma aprendizagem de ciências com qualidade constitui-se em uma
atividade racional semelhante à pesquisa científica e a mudança conceitual, objetivo final deste modelo de
aprendizagem, pode ser interpretada equivalentemente como uma "mudança de paradigma" (Kuhn, 1971).
De acordo com esse modelo de ensino/aprendizagem, há a necessidade por parte dos estudantes
de uma análise de seus próprios conceitos, a fim de que possam ser questionados e substituídos por novos
mediante sua ineficácia. Robin e Ohlson (1989) afirmam que as mudanças conceituais em ciências não
podem ser compreendidas sem o conhecimento dos conteúdos e das estruturas das concepções
alternativas, já que as mesmas são fundamentais para a construção de atividades de ensino.
Como já foi observado, a base epistemológica do referido modelo de ensino/aprendizagem
fundamenta-se na Filosofia da Ciência contemporânea, visto que uma das principais questões da referida
filosofia é compreender como as concepções científicas mudam sob o impacto das novas idéias e
informações.
Existem, de acordo com abordagem recente da Filosofia da Ciência, duas fases distintas na
mudança conceitual: o trabalho científico executado junto à concepção central que, por sua vez, organiza
e orienta a pesquisa, e a modificação das concepções centrais
De acordo com a primeira fase da mudança conceitual, as concepções centrais definem
problemas, indicam estratégias para resolvê-los e especificam critérios de escolhas de soluções. Kuhn,
(op. cit.) denomina de "paradigmas" as concepções centrais e de "ciência normal", a pesquisa em um
determinado paradigma. Lakatos (1979) considera as concepções centrais dos cientistas como seu "núcleo
firme teórico" e sugere que tais concepções gerem "programas de pesquisas", destinados a aplicações e
defesas do referido núcleo. Segundo esta abordagem, na hipótese da pesquisa tomar novas direções, o
cientista adquirirá novas concepções e formas de interpretar o mundo, fato que, para Kuhn, (op. cit)
caracteriza uma "revolução científica" e, para Lakatos (op. cit.), uma "mudança de programas de
pesquisa".
Os aspectos descritos acima caracterizam, por assim dizer, um "paralelismo" entre o modelo de
ensino/aprendizagem aqui discutido e a mudança conceitual em Ciências. De acordo com Posner et. al.
(op. cit.), "existem exemplos análogos de mudança conceitual na aprendizagem de Ciências, já que em
algumas ocasiões os estudantes se utilizam de conceitos próprios e correntes para o tratamento de um
novo fenômeno". Esta primeira fase da mudança conceitual na aprendizagem de Ciências é chamada por
Posner et. al. (op. cit.) de "assimilação".
Não obstante, com muita freqüência, as concepções dos estudantes são inadequadas para, de
maneira satisfatória, permitir a compreensão de novos fenômenos, o que obriga o aprendiz a substituir ou
reorganizar seus conceitos centrais. Esta fase da mudança conceitual na aprendizagem de Ciências é
denominada por Posner et. al. (op. cit.) como "acomodação".
Neste contexto, Posner et. al, (op. cit.) identificam quatro condições para que ocorra a mudança
conceitual:
1) Produção de insatisfação com os pré conceitos existentes: de acordo com esta
abordagem, é fundamental que um indivíduo tenha coletado um estoque de questões não resolvidas e
tenha observado a incapacidade de suas concepções em resolvê-las.
2) A nova concepção deve ser inteligível: o indivíduo deve ser capaz de compreender como a
experiência pode estar estruturada pela nova concepção, suficientemente para explorar as possibilidades
inerentes a ela.
3) A nova concepção deve parecer inicialmente plausível, isto é, qualquer nova concepção
adotada deve ao menos parecer ter capacidade para resolver os problemas gerados por suas predecessoras.
4) A nova concepção deve sugerir a possibilidade de um frutífero programa de pesquisa,
que deve ter potencial para ser estendido, para explorar novas áreas de pesquisa.
Desta forma, como aponta Driver (1986), a seqüência de estratégias de uma atividade de ensino
de Ciência que busque atingir mudanças conceituais nos alunos deveria incluir: identificação e
conscientização das idéias que os alunos já possuem; questionamentos, por meio de contra exemplos, de
tais idéias; introdução de novos conceitos pelo professor por apresentação ou por meio dos materiais
didáticos; geração de oportunidades aos estudantes para o uso das novas idéias afim de que adquiram
confiança nas mesmas.
Portanto, O modelo de mudança conceitual, apesar de radical quanto a sua definição e objetivo,
procurou centrar-se numa abordagem construtivista de ensino e, por conseqüência, nos seguintes
referenciais: o que "existe na cabeça do aprendiz" tem importância; encontrar sentido supõe o
estabelecimento de relações ; quem aprende constrói, de maneira ativa, significados. Como será
apresentado, a crítica efetuada à referida metodologia de ensino, refere-se principalmente ao seu objetivo,
ou seja, o de provocar alterações radicais de pensamentos. Na seqüência, apresenta-se a referida crítica.

3.3. Da perspectiva de mudança conceitual para a de reestruturação ou crescimento


conceitual.
Estudos recentes sobre o modelo de mudança conceitual questionam os aspectos de sua eficácia,
estabelecendo críticas à sua metodologia, bem como, aos resultados finais a que se propõem atingir o
referido modelo de ensino. O processo: "identificar os conhecimentos prévios, propor questionamentos
que os confrontem, e através de sua ineficácia introduzir os modelos científicos", pode de acordo com
Mortimer (1995) produzir modificações conceituais, mas raramente alterações radicais de pensamento em
seu uso mais amplo.
Para Hewson (1989) "as estratégias de ensino baseadas no modelo de mudança conceitual podem
produzir a aquisição de conhecimentos científicos com mais eficácia que as estratégias de
transmissão/recepção, contudo, em algumas ocasiões a mudança conceitual obtida é mais aparente que
real, pois após um certo tempo voltam a reaparecer algumas concepções que se julgavam superadas".
Neste sentido, um aspecto fundamental a ser analisado sobre as críticas estabelecidas ao modelo
de mudança conceitual, refere-se ao princípio sugerido por Monk (1995). Tal princípio consiste em
assumir que as diversas concepções de um mesmo sujeito não são "entidades dispersas", pelo contrário,
elas se organizam e se estruturam em sistemas de alto nível de complexidade.
Os graus de estruturação das referidas concepções podem de acordo com Oliva, (2001) serem
interpretados ao longo de um continuo entre duas tendências. Seguindo esta abordagem, em um extremo
dessas tendências, se encontrariam os defensores da hipótese de que o pensamento é algo heterogêneo, ou
seja, que mantêm um comportamento fortemente dependente do conteúdo e do contexto. Em outro, se
encontrariam os que opinam que a mente humana seria homogênea e consistente, sendo desta forma,
possível a identificação de estruturas de conhecimento universais.
Todavia, uma postura menos radical é aquela defendida por Oliva (op. cit.), isto é, a de
considerar um ponto médio entre esses dois extremos. Esta tendência conduziria a uma interpretação de
que os alunos ao abordarem como exemplo, um problema relacionado ao movimento, o fariam utilizando
argumentos causais mais ou menos articulados com argumentos intuitivos. Segundo o mesmo autor, as
mudanças conceituais observadas junto à respostas pontuais, estariam relacionadas a uma reestruturação
das "teorias implícitas" em que se fundamentam estas respostas.
Neste contexto, a partir das críticas apresentadas e da consideração do "paralelismo" estabelecido
por Posner et. al. (op. cit.) entre a mudança conceitual em ensino e a mudança conceitual em Ciências,
alguns autores como (Gunstone et al., 1988; McDermott, 1991; Scott, 1993) chamam a atenção para a
impossibilidade de mudanças conceituais radicais desassociadas de mudanças metodológicas. Como
aponta Whitaker (1983) "as concepções alternativas em mecânica estão associadas à Física pré
newtoniana por uma metodologia caracterizada por ausência de dúvidas, e a não consideração de outras
soluções para os fenômenos estudados". Tal metodologia, objetiva a busca de respostas rápidas e seguras,
baseadas apenas nas evidências dos sentidos e por tratamentos pontuais sem critérios de análises
(Champagne et. Al. 1985).
Não obstante, intende-se que centrar o objetivo de ensino em mudanças conceituais radicais dos
aprendizes, ao mesmo tempo que é inviável, condena o referido ensino ao fracasso, pois, tal objetivo cria
metas de aprendizagem fundamentadas na substituição de uma concepção, em geral considerada menos
elaborada (concepções dos alunos), por outra, em geral conciderada melhor elaborada (concepção
científica), e tal substituição raramente ocorre.
Em uma nova abordagem, a idéia de mudança conceitual deveria ser compreendida como
reestruturação ou crescimento conceitual (Silva e Latouff,1996), visto que esta, comporta uma
transformação de vários níveis, sendo estes relacionados aos esquemas causais dos indivíduos, bem como,
aos esquemas gerais em que se fundamentam suas estruturas de pensamento. Como construção de
conhecimento, o ensino deveria ser dirigido à evolução das idéias, e não a sua substituição (Oliva, op.
cit.).
Assim, atividades de ensino de Ciências que pretendam manter coerência com os aspectos
construtivistas discutidos deveriam como sugestão, exibir as seguintes características: situações
problemas suscetíveis de implicar aos alunos uma: investigação dirigida; o trabalho em pequenos grupos;
o intercâmbio entre esses pequenos grupos e a comunidade científica, que pode ser representada pelo
professor, por textos, entre outros (Wheatley, 1991; Gil, 1992; Driver e Oldham 1986), alem de não
definir a meta de aprendizagem dos alunos em mudanças radicais de pensamentos, e sim, em
crescimentos conceituais.
Em síntese, as críticas relacionadas às estratégias de ensino fundamentadas em mudanças
conceituais, possuem dois eixos a saber: o de centrar seus objetivos em modificações radicais das idéias
dos aprendizes e o da seqüência descrita para atingir tais objetivos. Contudo, adotando por referencial
alguns elementos do modelo de mudança conceitual como: a valorização das idéias dos alunos, o
questionamento de tais idéias e a reflexão acerca das mesmas, considera-se possível Orientar a
aprendizagem de Ciências como construção de conhecimento. Neste contexto, o tratamento dirigido de
situações problemas abertas, Pode resultar na elaboração de estratégias de ensino que superem os
extremismos metodológicos verificados entre as práticas tradicionais e as práticas de aprendizagem por
descobertas (Gil 1983; Millar e Driver 1987), bem como, apresentar resultados que mantenham coerência
com aspectos de respeito aos conhecimentos prévios dos alunos, valorização de formulações de hipóteses,
análises críticas dos fenômenos estudados, e de rompimento com concepções ingênuas de ciências como a
de que a mesma é imutável e "refletora da verdade".

3.4. Extremos resultantes da superação do modelo de mudança conceitual.


As impossibilidades de substituição das concepções alternativas dos estudantes por modelos
científicos, conduzem a dois perigosos extremos como aponta Pozo, 1999:
1) A recuperação dos discursos relacionados às continuidades entre o conhecimento cotidiano e o
científico.
De acordo com este ponto de vista, Pozo, (op. cit. ) afirma que a Ciência seria uma continuação
sofisticada da forma em que os indivíduos "resolvem" diariamente seus problemas. Nesta perspectiva, não
existiriam muitas diferenças entre as formas de pensar de um aluno e de um cientista, já que a Ciência não
seria nada mais que uma continuação natural à maneira em que os seres humanos exploram e controlam
seu contexto. Aprender Ciência desta forma, consistiria-se em uma tarefa apenas acumulativa que
requereria por sua vez, alguns ajustes.
2- O surgimento do risco de uma excessiva contextualização ou de um certo relativismo do
conhecimento científico.
Nesse extremo a impossibilidade de substituição das concepções alternativas pelas científicas
deveria-se ao fato de que estas, as concepções alternativas, seriam formas diferentes de conhecer, que
coexistem de modo independente junto a idéias científicas, servindo por sua vez, para contextos distintos
dos científicos (Oliva, 1999). O problema desta abordagem é a idéia de que se os modelos científicos
somente são eficazes nas condições de trabalhos intelectuais, para que ensinar Ciência a alunos que em
sua imensa maioria não serão cientistas?
Como aponta Pozo, (op. cit. ), "deve-se procurar conciliar a necessária coexistência
representacional entre as diversas formas científicas e intuitivas de conhecimento, com uma integração
conceitual e hierárquica das mesmas, frente a uma diferenciação contextual entre os diversos níveis
dessas formas de conhecimento".
Ainda de acordo com o mesmo autor "é possível contrapor uma diferenciação representacional
ou cognitiva entre modos de pensamento, baseada na integração hierárquica entre formas de
conhecimento, de modo que as mais potentes sejam capazes de explicar as mais simples sem contudo as
anular, visto que estas (as mais simples) continuam eficazes para assimilar, predizer, controlar, muitas
situações cotidianas de modo implícito, nas quais um modelo científico de forma explícita se mostraria
mais ineficaz ".
Para Pozo (op. cit.), um dos grandes problemas do modelo de mudança conceitual refere-se a
uma certa generalização e por conseqüência, uma certa ma interpretação estabelecida entre três níveis
distintos de mudança conceitual. Evolutiva: seriam as mudanças conceituais que surgem como
conseqüência de desenvolvimentos cognitivos; Epistemológica: as mudanças conceituais próprias da
história da ciência; Instrucional : as mudanças conceituais que são produto do ensino. Segundo esta
abordagem, as mudanças conceituais são distintas para os três casos descritos.
Como indica Pozo, (op. cit.) "Durante muito tempo, por influência da obra piagetiana, tentou-se
equivocadamente, comparar a mudança instrucional à mudança evolutiva" Como se processos de
explicitação de idéias, evolutivos e instrucionais, tivessem o mesmo papel ou função nos níveis citados.
Por outro lado, como já foi abordado, tem ocorrido nas últimas décadas, um estabelecimento de
certo "paralelismo" entre a mudança conceitual instrucional e a mudança conceitual epistemológica.
Neste sentido posições radicais que assumem que os processos de produção de conhecimento científico
devem ser usados como critérios para o desenvolvimento de atividades de ensino/aprendizagem de
Ciências, conduzem a um conjunto de críticas que podem por sua vez, indicar novas perspectivas ao
campo educativo.
De um certo modo, a aprendizagem de Ciências não pode se apoiar essencialmente em atividades
de pesquisa como fazem os cientistas, já que as atividades de aprendizagem de ciências de um aluno são
praticadas e são processadas em um contexto diferente do contexto científico, e as funções do professor
são muito diferentes das funções de um diretor de um projeto de pesquisa (Pozo e Gómez Crespo, 1998).
Como indica Coll, (1990) "Os cenários escolares possuem uma estrutura social e cognitiva própria, não
redutível aos cenários científicos ou às dificuldades geradas por uma pesquisa".
De outro modo, se as atividades de ensino abordarem a Ciência como uma determinada forma
de construir modelos que representam partes do mundo que se conhece, aprender e ensinar Ciências
consistirá em boa parte em desenvolver, contrastar, e argumentar diferentes modelos para diferentes
tarefas e problemas (Pozo e Gómez Crespo, op. cit. ).
Portanto, assume-se neste trabalho que um ensino de Física baseado em discussões de modelos,
pode ser compatível aos novos referenciais educacionais de construção de conhecimento, já que a prática
discente não se resumiria de acordo com esta abordagem, em repetir as explicações do professor, mas sim
em argumentar, rescrever fenômenos em função de suas próprias teorias que aos poucos deverão ser
explicitadas, reestruturadas, sem a intenção de substituí-las, mas com o intuito de buscar diferentes
enfoques aos fenômenos estudados. No capítulo(3) explicitar-se-a com detalhes o modelo educacional
utilizado para fundamentar a elaboração das atividades de ensino de Física à alunos com deficiência
visual, entretanto, adianta-se que o referido modelo contempla os novos referenciais educacionais de
construção de conhecimento discutidos.
Em síntese, discutiu-se no presente texto os seguintes temas: a necessidade da superação dos
modelos de ensino/aprendizagem fundamentados na transmição e/ou na descoberta autônoma de
conhecimentos, a importância do erro do aprendiz no processo educativo, o modelo de mudança
conceitual, e a superação do referido modelo. Objetivou-se por meio da discussão dos referidos temas,
apresentar uma evolução histórica do ensino de ciência enquanto campo de conhecimento.

Você também pode gostar