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PSICOLOGIA ESCOLAR E A EDUCAÇÃO: PERSPECTIVAS DECOLONIAIS

Marina Coimbra Casadei Barbosa da Silva1


Antonio Carlos Barbosa da Silva2

RESUMO

Este ensaio aborda a prevalência da educação colonizadora na sociedade, destacando sua estreita relação
com a psicologia escolar tradicional, que tem servido como um instrumento para a manutenção do status
quo social. A educação ocidental, em muitos casos, perpetua valores conservadores e opressivos,
reproduzindo as dinâmicas da colonialidade. Essas dinâmicas, enraizadas nas relações de poder,
perpetuam a dominação e submissão, atribuindo valor à classe dominante e desvalorizando a classe
explorada, sob a influência de princípios morais colonizadores. Historicamente, a psicologia desempenhou
um papel significativo na promoção de valores colonizadores e capitalistas na sociedade. No entanto,
reconhecendo o potencial transformador da psicologia escolar crítica, podemos repensar seu papel e
abraçar uma abordagem decolonial na educação. Essa abordagem visa promover práticas psicossociais
inovadoras e, assim, avançar em direção a uma sociedade mais equitativa e inclusiva.

Palavras-chave: Psicologia escolar, educação, decolonialidade.

A EDUCAÇÃO COLONIZADORA – O MUNDO DO CAPITAL

O colonialismo representa uma estrutura de poder que perdurou nos países colonizados, como na
América Latina, continuando até os dias atuais sob a forma de colonialidade. Esta última se manifesta
como um padrão de poder que naturaliza hierarquias territoriais, raciais, culturais e epistemológicas,
perpetuando relações de dominação que deixam profundas marcas nos colonizados.
A colonialidade replica relações de poder, perpetuando a dominação e submissão, valorizando a
classe dominante e desvalorizando a classe explorada, guiada por princípios morais colonizadores (muitas
vezes perpetuados em valores considerados cristãos) e relações de mercado. Isso resulta na naturalização
de um estilo de vida marcado pelo mercantilismo, individualismo e, mais recentemente, consumismo.
Dentro do pensamento decolonial entendemos que a América não foi "descoberta", mas sim
colonizada, afetando profundamente os povos originários, escravizados e suas culturas. Ao usar o termo
“descoberta” parte-se do pressuposto que não havia ninguém habitando nas terras, o que não procede. Os
colonizadores impuseram aos povos originários sua cultura e espiritualidade, exploraram os recursos

1
Psicóloga e Doutora em Educação (Unesp-Marília), Docente de Psicologia na Universidade de Marília (Unimar).
2
Doutor de Psicologia - PUCCamp. Professor Departamento de Psicologia Social, UNESP-Assis.
naturais, causando impactos destrutivos que ainda hoje exigem esforços para serem compreendidos e
superados.
A teoria decolonial é uma abordagem crítica que busca desafiar e desmantelar as estruturas de
poder, epistemologias e hierarquias culturais que foram estabelecidas durante o período colonial e que
continuam a influenciar as sociedades contemporâneas. Essa perspectiva emergiu principalmente no
campo das ciências sociais e humanidades e oferece uma crítica profunda à colonialidade do poder, que
não se limita apenas à dominação política, mas também se estende às esferas culturais, econômicas e
epistêmicas.
Os principais pontos da teoria decolonial repercutem na discussão sobre as relações de poder
estabelecidas durante a era colonial que persistem, mesmo após a independência política, influenciando
estruturas sociais, econômicas e culturais. A teoria decolonial questiona as formas tradicionais de
conhecimento e epistemologias dominantes, muitas vezes consideradas eurocêntricas, defendendo a
validade e a importância de outras formas de saber, especialmente aquelas historicamente marginalizadas.
Nesse ponto se insere este trabalho que tem como objetivo refletir a educação numa perspectiva
decolonial. Compreendemos que as identidades foram construídas durante o período colonial e essas
construções impactam as relações sociais contemporâneas, por isso a teoria decolonial destaca a
importância de reconhecer e desafiar as estruturas de poder que moldam as sociedades contemporâneas,
promovendo uma visão mais inclusiva, equitativa e diversificada do conhecimento e da experiência.
Na América Latina e em outros territórios historicamente colonizados, surgiu uma nova
perspectiva epistemológica baseada na consciência de que nossa forma de pensar, produzir conhecimento
e entender a existência perpetua a colonialidade, ou seja, é uma lógica colonizadora, que aderimos por
meio dos processos de subjetivação que foi moldado historicamente a partir da colonização.
Neste trabalho, enfocamos a educação como o ponto central para o debate da colonialidade que
persiste e se intensifica, muitas vezes de maneira sutil no meio escolar. Essa educação perpetua um
conhecimento ocidentalizado sobre o poder e a identidade. Concentramo-nos particularmente na
colonização do ser, abrangendo as esferas do ser, sentir e pensar.
A educação colonizadora muito se assemelha a uma educação que contribui para o sistema de
classes a qual é estruturada a partir da divisão em classes sociais antagônicas, que impõem diferentes
perspectivas de apreensão da realidade. Dependendo da classe social, os indivíduos são direcionados para
caminhos específicos, alguns buscando especialização intelectual e internalizando valores burgueses como
competitividade e individualismo, enquanto outros são preparados para trabalhos manuais e restringidos a
papéis limitados na sociedade, contribuindo para a dinâmica da valorização do capital.
Conforme Bock (2003), a educação é vista como um processo ideológico e cultural que desenvolve
as capacidades valorizadas em um sistema capitalista. No entanto, os aspectos sociais e econômicos,
muitos deles prejudiciais à população explorada, que compõem a educação, permanecem encobertos. A
educação é um processo social através do qual a sociedade cria um conjunto de ideais e valores que são
transmitidos às crianças e jovens, promovendo as necessidades e cultura dos grupos dominantes.
A educação desempenhou um papel fundamental na consolidação do capitalismo, impulsionando
avanços na ciência e na indústria. Mas, mais do que a consolidação do sistema capitalista, a educação
perpetua a lógica de exploração. A sociedade passou a se organizar de acordo com os princípios europeus,
adotando métodos quantitativos e exatos em busca de verdades universais. A educação refletiu esse
conceito colonizador e europeizado, enfatizando a precisão e a obediência.
A educação modelou os cidadãos para servirem ao sistema econômico vigente, disciplinando seus
corpos e tornando-os dóceis, em linha com a perspectiva de Foucault (1982) sobre a disciplina das
instituições modernas para atender às demandas do capitalismo.
No entanto, é importante reconhecer que a instituição escolar, apesar de suas falhas, continua
desempenhando um papel fundamental ao proporcionar acesso ao conhecimento racional e ao fomentar
questionamentos sobre a ordem social vigente na maioria da população. Podemos dizer que a educação, de
um modo ou de outro, é uma instituição ainda capaz de instrumentalizar os sujeitos com os saberes e
conhecimentos basilares acumulados pela humanidade.
Porém, na sociedade capitalista, a educação não é um espaço neutro. Ela está profundamente ligada
às ideologias predominantes, moldando as subjetividades e reforçando as relações humanas. A história da
escola está intrinsecamente ligada à história da sociedade, especialmente em um sistema capitalista com
economia burguesa, que muitas vezes oprime as classes menos privilegiadas e promove um ensino
tendencioso.
Ivan Illich (1975) argumenta que a educação institucionalizada e a escola se adaptaram ao
capitalismo, produzindo mercadorias como ensino, livros e material escolar, com valor determinado de
troca. Isso beneficia aqueles que já possuem capital cultural e financeiro.
O sistema escolar, de certa forma, espelha o capitalismo e consequentemente caracteriza-se como
colonizadora ao perpetuar as relações de poder. A avaliação dos alunos se traduz em notas, que lembram
dinheiro, e o ensino muitas vezes é condensado em apostilas, refletindo uma abordagem efêmera e de
rápida aprendizagem. A disciplina e a obediência exigidas se assemelham a ambientes fabris e militares.
A educação no mundo capitalista estimula a busca incessante de qualificações, diplomas e
certificados, pois eles abrem portas para melhores empregos. No entanto, esse sistema cria uma
mentalidade competitiva e de consumo que não promove a socialização do conhecimento ou a celebração
da democracia.
Em vez disso, os estudantes são incentivados a vincular seus desejos aos produtos educacionais
disponíveis, perdendo uma visão crítica da dependência desses produtos. As escolas buscam equipar-se
com tecnologia, condensam conhecimento em apostilas e promovem a comunicação e pesquisa eletrônica
via internet para preparar os alunos para o mundo capitalista com suas comunicações eletrônicas,
mobilidade, flexibilidade e hiperconsumismo.

EDUCAÇÃO, PSICOLOGIA ESCOLAR E A ADAPTAÇÃO DAS SUBJETIVIDADES

A psicologia desempenhou historicamente um papel crucial na promoção de valores colonizadores


e capitalistas na sociedade. Conforme Bock (2003) aponta, ferramentas psicológicas, como testes e teorias
de desenvolvimento, eram utilizadas na escola para criar classes mais uniformes, avaliar o
desenvolvimento psicológico das crianças e, em alguns casos, segregar indivíduos. A psicologia clínica
também se entrelaçava com a psicologia escolar, ajudando crianças com dificuldades de aprendizagem e
problemas de desenvolvimento na escola. Paralelamente, a psicologia educacional contribuía com
conhecimentos teóricos e do desenvolvimento para aprimorar a educação de acordo com as demandas do
capital.
Essa atuação da psicologia escolar ganhou destaque no Brasil com o surgimento da pedagogia da
Escola Nova no início do século XX. Essa pedagogia surgiu para atender às necessidades do capitalismo
monopolista, que demandava a formação de indivíduos capazes de lidar com uma sociedade em constante
evolução.
Para a Escola Nova, nada era intocável, e tudo poderia ser transformado e comercializado. A
estagnação era inaceitável, pois apenas a dinâmica constante da sociedade poderia garantir o progresso e a
reprodução do capital. Isso exigia indivíduos inquietos, ativos e criativos, empreendedores por natureza. A
escola, com sua abordagem científica e a ajuda da psicologia escolar, passou a fomentar essas qualidades,
enquanto marginalizava aqueles que não se encaixavam nesse modelo.
A escola, como qualquer instituição no sistema capitalista, não é neutra ou desinteressada. Ela
molda os indivíduos em uma direção específica, favorecendo os interesses de grupos dominantes,
religiosos, empresariais, políticos e outros. A política educacional é o resultado das negociações e disputas
que ocorrem na sociedade entre esses diferentes grupos.
Bock (2003) argumenta que a Psicologia, historicamente, aliou-se à pedagogia escolanovista,
desempenhando um papel conservador e adaptando-se às necessidades escolares. Em seu auge
conservador, a psicologia escolar tendeu a naturalizar os aspectos sociais do desenvolvimento dos alunos.
Nessa perspectiva, o psicólogo escolar muitas vezes negligenciava a avaliação de currículos,
discussões sobre políticas públicas educacionais, observações das práticas pedagógicas e relações dos
professores, bem como a compreensão dos contextos culturais e históricos dos alunos e da escola. Em vez
disso, o foco era predominantemente na atenção individual e clínica dos alunos, buscando analisar
possíveis conflitos e desenvolvimentos cognitivos e emocionais subjacentes às dificuldades de
aprendizagem.
Essa abordagem permitia que a escola se isentasse de responsabilidades, enquanto o psicólogo
escolar reforçava sua identidade clínica, individualizando a culpa dos problemas educacionais no aluno.
Isso, por sua vez, mantinha uma conexão ideológica com os interesses do capital.
Ao concordar com esse enfoque, o psicólogo escolar contribuía para perpetuar a posição
tradicional dos indivíduos na sociedade, seja como dominantes ou dominados. Mesmo quando
aparentemente atuava contra o sistema, suas intervenções geralmente se limitavam a soluções temporárias,
em vez de provocar mudanças estruturais no ambiente educacional que levariam a uma reflexão crítica
sobre a educação.
As ações da psicologia escolar tendiam a consolidar os valores de uma sociedade dividida em
classes (competição, moralidade, virtude, esforço, cooperação etc.), reforçando o individualismo, os
valores burgueses e religiosos. Além disso, contribuíam para a formação de uma imagem de sujeitos
considerados "normais", marginalizando aqueles que não se enquadravam nesses padrões, rotulando-os
como "problemas", "anormais" ou "antissociais".
Castoriadis (1987) ressalta que é impossível ignorar o impacto da sociedade na formação do
indivíduo, que não se desenvolve como uma planta, mas é moldado pela sociedade através de uma ruptura
com seu estado psicológico inicial. Sempre, uma instituição social está envolvida nesse processo. Quando
um aluno não se alinha ao modelo educacional estabelecido, é frequentemente estigmatizado como
"patológico", excluído e considerado um fracasso, alguém que não incorporou os valores da sociedade.
Essa abordagem alienante não contribui para uma educação consciente e transformadora,
individualiza os processos de aprendizagem e perpetua ideologias neoliberais, mantendo a influência da
cultura europeia como padrão.
No entanto, acreditamos na necessidade de redefinir o papel do psicólogo escolar na educação.
Devemos abordar questões que mantêm atitudes conservadoras e alienantes na psicologia escolar. Ao
fazê-lo, podemos direcionar nossas intervenções para promover uma educação que desenvolva a
autonomia e a capacidade crítica dos envolvidos no processo educativo, incluindo alunos, pais,
professores e comunidade.
Para avançar em direção a uma atuação do psicólogo escolar comprometida com a transformação
da sociedade, a autonomia dos sujeitos envolvidos no processo educativo e a busca por novas formas de
conhecimento crítico, devemos nos perguntar: Como o psicólogo escolar pode implementar ações críticas
que abordem essas questões?

O PAPEL DO PSICÓLOGO ESCOLAR: UMA PERSPECTIVA DECOLONIAL

A atuação crítica da psicologia escolar nas últimas décadas gerou conhecimentos que apontam para
novas abordagens. Segundo Sawaia (2001), essa abordagem crítica visa criar "espaços de diálogo" entre
alunos e professores, revelando contradições nas práticas educacionais e propondo alternativas.
Portanto, a atuação do psicólogo na escola não deve se limitar a culpar o aluno pelos problemas
escolares. É fundamental mudar o foco de atuação da psicologia, passando de uma visão centrada no aluno
para uma abordagem que considere todos os aspectos dos processos educacionais. A primeira abordagem
não reconhece a influência da sociedade e das contradições institucionais na escola, enquanto a segunda
encara as dificuldades de aprendizagem como resultado de políticas educacionais ineficazes, que excluem
aqueles que não se encaixam em padrões culturais burgueses e patologizam quem não se adapta à cultura
capitalista.
Apesar do progresso social e educacional no Brasil, ainda persistem práticas educacionais
condenatórias e excludentes que refletem valores conservadores. Nesse cenário, a psicologia escolar, ao se
aliar à pedagogia escolanovista, desempenha um papel significativo.
Este texto propõe uma reflexão sobre a psicologia escolar a partir de uma perspectiva decolonial,
ou seja, uma abordagem crítica que considera os contextos históricos e sociais, questionando os processos
colonizadores na educação brasileira.
A educação crítica deve buscar a emancipação, a sensibilidade e a humanização do ser humano. No
entanto, nas sociedades neoliberais, a educação muitas vezes é influenciada pelo poder político,
econômico e pelos valores ocidentais, promovendo a cultura e a ideologia dominante.
A colonialidade do saber promove a supremacia do conhecimento acadêmico ocidental e a
marginalização dos saberes de povos indígenas, escravizados e populares. Essa dominação epistemológica
seleciona e valida alguns conhecimentos enquanto exclui outros, perpetuando padrões de poder opressivos
no sistema capitalista.
Uma perspectiva decolonial na psicologia escolar requer uma reavaliação da educação vigente e a
defesa de uma abordagem educativa decolonial. Conforme Walsh (2013), a dimensão pedagógica da
decolonização envolve a rejeição de conceitos e práticas impostos e herdados, bem como a condução dos
processos de desvinculação e descolonização.
A menosprezo dos saberes subalternizados resulta na desvalorização dos indivíduos que os detêm,
fazendo parte da estratégia colonial para impor a cultura e os valores europeus e ocidentais.
Além de seu impacto econômico, a colonização teve um aspecto subjetivo, contribuindo para a
formação da consciência burguesa ao mesmo tempo em que subjugou a imagem do Outro. A colonização
moldou a subjetividade moderna, um ponto central na teoria decolonial e na psicologia escolar.
A atuação da psicologia escolar dentro de instituições que perpetuam valores coloniais limita sua
capacidade de ação crítica e emancipatória. Portanto, é essencial explorar brechas no sistema educacional
e promover reflexões decoloniais em colaboração com conhecimentos educacionais e psicológicos.
Percebemos que a educação acrítica, oriunda de projetos modernos e colonizadores, perdura na
atualidade. No entanto, não podemos mais acreditar nos ideais emancipatórios da modernidade, pois a
concessão de liberdade e universalidade ao sujeito envolveu a repressão, particularização e discriminação
daqueles que não se encaixam nesse modelo abstrato. Quando a psicologia escolar não questiona esse
modelo opressivo, contribui para a naturalização dos problemas educacionais, ao individualizar e
patologizar os desafios, segregando e excluindo os alunos que não se adequam ao processo colonizador.
Santos (2020) destaca a importância das "desaprendizagens" e aprendizagens necessárias nas
epistemologias do Sul, que buscam construir ações libertadoras de forma artesanal. Isso requer
desaprender muitos preconceitos da ciência moderna do Norte Global sobre o que é ciência, seu objeto e
os saberes apropriados no processo educativo, para ouvir e aprender com os subalternizados.
Embora não seja possível descartar completamente o legado da educação moderna, dado nosso
contexto ocidentalizado e a influência contínua do colonialismo, é essencial questionar os paradigmas
conservadores. Uma alternativa é adotar uma postura decolonial, afastando-se dos imperativos e normas
que alienam os indivíduos de sua subjetividade. Essa discussão é crucial no campo da psicologia.
Fanon (2020) e Kilomba (2019) destacam as "atitudes mentais" adotadas pelos negros diante da
civilização colonial branca, resultando em sofrimentos psíquicos, como alienação, negação de suas
origens, violência sexual, segregação, culpa e ódio. O giro decolonial representa uma resistência
epistemológica, ontológica e ética, oferecendo uma perspectiva valiosa para repensar uma educação
comprometida com a descolonização. Fanon (2020) propõe uma ruptura com a atitude moderno/colonial
predominante nas ciências eurocêntricas, das quais a escola e a universidade derivam. Ele instiga uma
atitude decolonial, que vai além do método e envolve a reorientação do sujeito em relação ao
conhecimento, poder e identidade.
Por meio do giro decolonial, aqueles previamente considerados "condenados" emergiriam como
pensadores, criadores e ativistas, formando comunidades engajadas na luta pela descolonização como um
projeto contínuo. Esse ativismo decolonial transcenderia o pensamento e a criação, abrangendo a
expressão da religiosidade e a elaboração de estratégias para transformar as instituições da sociedade.
Seria um projeto coletivo com o objetivo de "construir junto".
A teoria decolonial desafia a pensar e agir de maneira inovadora a partir do que temos hoje. Não se
trata de esquecer o passado ou aceitar cegamente o presente, mas sim de reinventar e ressignificar com
base em nossa herança, tornando-se insurgente nas propostas psicológicas e educacionais.
A psicologia escolar decolonial deve ter um impacto abrangente, afetando a formação dos sujeitos
em áreas como moral, ética, trabalho prático, criação intelectual, sensibilidade emocional e muito mais.
Ela visa o desenvolvimento de indivíduos que se afirmam historicamente, reconhecendo sua liberdade e
comprometendo-se com o controle coletivo das relações sociais. Além disso, busca superar a divisão entre
trabalho intelectual e manual, individualismo, consumismo desenfreado e preconceitos da sociedade
burguesa.
Nessa perspectiva, a psicologia decolonial tem como objetivo formar sujeitos que se definem por
sua vontade de conhecer, compreender e dominar a realidade, em vez de simplesmente buscar a satisfação
pessoal. O sujeito se enriquece pela busca constante do conhecimento e reconhece a importância da
realidade externa, natural e social, moldada pela história em harmonia com a natureza.
A psicologia decolonial desempenha um papel crucial na construção de novas formas de interação
social, mais democráticas, justas, afetivas e solidárias. Ela fortalece o compromisso social, a autonomia e
a conexão histórica com saberes populares e nativos, apontando para um novo horizonte de vida social.
Além disso, favorece a transição de uma mentalidade de massa para a de povo, de indivíduos adaptados à
sua realidade cotidiana para sujeitos críticos e conscientes de sua história. A educação popular
desempenha um papel fundamental nesse processo, capacitando indivíduos para se tornarem agentes
ativos de transformações libertadoras.
Em resumo, a psicologia escolar decolonial se concentra na modulação das subjetividades
sensíveis às causas das minorias, povos nativos e à história de violência decorrente do colonialismo. Ela é
sensível às culturas e costumes dos povos marginalizados e continua a ser aliada às comunidades que
resistem aos impactos da "civilização" de forma resiliente.

REFERÊNCIAS

BOCK, A. M. B. Psicologia e Educação: cumplicidade ideológica. In Meira, M. E. M. e Antunes, M. A.


M. Psicologia escolar: teorias críticas São Paulo, Casa do Psicólogo, 2003.
CASTORIADIS, C. A Instituição Imaginária da Sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Tradução: Sebastião Nascimento. São Paulo: Ubu Editora,
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ILLICH, I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975b.
KILOMBA, G. Memórias de plantação: episódios de racismo cotidiano. Tradução: J. Oliveira. 1 ed. Rio
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Tomo I. Quito, Ecuador: Ediciones Abya-Yala, 2013.

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