Você está na página 1de 4
‘Antigo de Revisio RestrieGes dietaticas para pacientes neutropénicos: realmente necessarias? Dietary restrictions for neutropenic patients: really necessary? Unitermos: Dieta, Neutopenia. Neoplasias Key words: Diet. Neutropenia. Neoplasms Endereco para correspondéncia: Patricia Claudia Modesto ‘Ay Albert Einstein, 627-701 ~ Setor Nutrigdo ~ So Paulo, SP, Brasil ~ CEP: 05652000 E-mail patmodesto@gmal.com Submisséo 3 de janeiro de 2010 ‘Aceito para publicagao 28 de novembro de 2010 4. Nuticionista clinica do Hospi Isaelta Abert Einstein; Espaciasta em Nutrigdo enteral © ‘parenteral pea SBNPE. 2. Médico; Professor da Universidade Federal de Sto Paulo, professor tla da Universidade de Sento Amara e Médico, 3. Mtivo; Professor ttuiar do Departamento de Pediat da UNIFESP, Sao Paulo, SP. Bras Patricia Claudia Modesto’ Luiz Anderson Lopes? Fernando José de Nobrega? RESUMO Introdugdo: Pacientes submetidos a tratamento antineoplésico apresentam além de coutras consequéncias da terapia, cminuigdo da imunidade celular. Portanto, nesta situ- ‘ago, muitos centros de tratamento recomendam insttuir certas praticas para controle de infecgées. Estas inciuem, além de outras medidas profiléticas, a restrigdo de alimentos crus. Método: Revisdo da literatura sobre a conduta dietoterdpica para pacientes rneutropénicos, a partir de publicagSes cientficas nas bases de dados Medline e LILACS. Discusséo e Consideragdes Finals: Nao ha um protocolo definido para orientagéo assertiva da dieta que deve ser utlizada em pacientes neutropénicos, bem como, n&o ha fortes evidéncias de que dietas restritas reduzam a incidéncia de infecdo ou tenham impacto na mortalidade destes pacientes. ABSTRACT Introduction: Patients undergoing antineoplastic treatment have some consequences of therapy as decreased of cellular immunity. Therefore, inthis situation, many treatment centers recommend introduce certain practices to control infections. These include, in addition to other prophylactic measures, the restriction of raw foods. Methods: Review ofthe literature on this conduct for neutropenic patients, from scientific publications in the Medline and LILACS. Discussion and Concluding Remarks: There is no a defineg protocol fo guide assertive diet that should be offered to neutropenic patients, and there is no strong evidence that this restrictions could reduce the incidence of infection or have an impact on mortality of this patients. ev rae Nr in 2010; 26 4300 330 Restrgtes cetticas para pacientes, INTRODUGAO cancer se caracteriza pela perda do controle da divisto celular e pela capacidade de invadir outras estruturas orgénicas Os tratamentos antineoplasicos seguem protocolos diferen- ciados, de acordo com o diagnéstico, podendo ser compostos por quimioterapia, radioterapia ou cirurgia e, em alguns casos, também pode existir a indicagao de transplante de medula 6ssea, tais condutas podem ser utilizadas de forma isolada ou combinada, dependendo do tipo celular do érgao de origem e do grau de invasto do tumor", ‘A terapia antineoplisica pode causar uma série de eventos, adversos, entre eles a toxicidade medular, que resulta no comprometimento da imunidade celular®, National Institute of Cancer publicou um eritério para a classificagto da leucopenia e neutropenia grave, que considera como pontos de corte para diagnéstico de leucopenia e neutro- Penia menos que 1000 mm? ou menos que 500 mm’ de leucécitos € neutrofilos, respectivamente” ‘As doengas infecciosas sto complicagdes frequentes em pacientes com neutropenia. Os microrganismos envolvidos geralmente so provenientes da microflora intestinal, da pele e dos tratos respiratério, geniturindrio e gastrintestinal™" Nos pacientes com neutropenia secundaria ao tratamento uimioterépico, frequentemente se observa infecgdes associadas as lesdes de cavidade oral ow mesmo infecgdes sistémicas graves. Esta situagdo clinica reflete diretamente na qualidade de vida do paciente com impacto significante na morbidade e mortalidade”®"*, Portanto, nesta situagdo, muitos centros de tratamento recomendam instituir certas prticas para controle de infecgdes. Estas estratégias incluem mecanismos de barreira, profilaxia com antibioticoterapia, educagdo dos pacientes e seus familiares quanto a condutas higiénicas, além de dieta especifica'* A dictoterapia em situagdes de neutropenia geralmente restringe o consumo de frutas frescas, sucos naturais, legumes/ vverduras cruas e ovos/ cares mal cozidos"*, No encontramos na literatura estucos que embasem tal conduta OBJETIVO Realizar revisio com andlise critica da literatura das dife- rentes priticas de dietoterapia, ressaltando a necessidade de restrigdo de alimentos crus para pacientes neutropénicos. METODO. Trata-se de trabalho de revisto da literatura sobre a conduta dictorépica para pacientes neutropénicos, a partir de publica- 60es cientificas nas bases de dados Medline e LILACS. Para 4 busca bibliogrifica considerou-se o period de 1999 a 2009, empregando as seguintes palavras-chave: neutropenia, cancer, diet, raw diet, cooked diet. RESULTADOS Os resultados estdo condensados na Tabela 1. DISCUSSAO A deta destinada ao paciente com comprometimento imuno- J6gico possui inémeras nomenclaturas, podendo ser dieta para netropéricos: eslmente necessiias? neutropenia, dieta com baixa contagem de microorganismos, ietalimpa, dieta sem crus'S"”. As restrigdes alimentares a serem seguiidas também sto varidveis, como demonstra a literatura, Estudo mostra que oleaginosas e frutas secas so alimentos permitidos em 23% dos centros e proibidos em 43%, Além de relatar que 88% utilizavam proiocolo para orientago do consumo de alimentos com baixa contagem microrganismos durante a intemnagdo e na alta hospitalar'*, A qualidade microbiolégica dos alimentos é fundamental para evitar bacteremia ou sepse ocasionada por translo- cago bacteriana, especialmente em pacientes em terapia antineoplisica. Orgios como 0 Food and Drug Administration, Centre of Disease Control propdem algumas recomendagées visando seguranga alimentar. Estas estabelecem condutas para a separagio (importante para se evitar a contaminaglio eruzada), higienizacao e sanitizagao adequada, coceio (a fim de garantir a temperatura interna adequada, assim como no reaquecimento) e reftigeragao™™ Isto se faz importante porque as bactérias mais comumente encontradas em frutas frescas e vegetais sio Escherichia, Pseudomonas, Klebisiella, Enterobacter, Cittrobacter, Listeria ¢ Serratia. Podem ser encontrados na Agua e gelo a Salmonella, Shigella, Aspergilos e Canpylobacter™ E importante ressaltar que os patégenos encontrados em pacientes oncolégicos com neutropenia geralmente so endé- gen0s ou do cateter, com importincia muito menor pela via alimentar”, Assim sendo, novamente questionamos a aplicagao das restrigdes dietéticas para este grupo de pacientes. O que se observa, normalmente, é uma importante diminuigo da acei- taco alimentar durante o periodo de tratamento, 0 que muitas vvezes leva ao comprometimento do estado nutricional deste paciente. Isto é agravado quando hé necessidade de restrigio de alimentos de consumo habitual, como frutas e salada, como ‘mostraram alguns estudost £ importante relatar que alguns dos estudos aqui qnalisados apresentam limitagdes como exclusto de pacientes sulbmetidos a transplante de medula dssea, restrigo de faixa etéria ou ‘mesmo no seu delineamento como a nao definigao das bases de dados pesquisadas, assim como critérios adotados. Tais fatos, no permitem afirmar que jé ndo hé necessidade de mantermos a restrigdo alimentar para pacientes neutropénicos, mas sem davida mostram anecessidade de rever tal conduta to restritiva e largamente aplicada. CONCLUSAO ‘Nao ha um protocolo definido para orientagdo assertiva da dicta que deve ser utilizada em pacientes neutropénicos, bem como, nao hi fortes evidéncias de que dietas restrtas reduzam a incidéncia de infecgdo ou tenham impacto na mortalidade dos pacientes neutropénicos'** literatura encontrada, apesar das limitagdes metodologicas ‘observadas em alguns artigos, nao identificou relagao direta entre dicta de baixa contagem ou cozida, prevenindo infecgoes em pacientes neutropénicos devido a tratamento antineoplisico. As recomendagdes mais assertivas focam na seguranga alimentat™. Rev Bras Cn 2010; 25 4): $808 31 Modesto PC et TTabela 1- Comparagao dos estudes. ‘Caractorstica do estudo Muticntrco / 108 questonérios (uso de gu- dln p restigbes alimentares) Desfecho: Estabelecer pontos de corte para Iniciar LBD e para restrigbes amentares Resultados 88% néo usam guidelin, 79% usam para orienta alia, Dife- |rancas entre os guidelines seguidos pelos centros 34% dos centres usaram LBD naiternagSo do autiogo © 33% ara alogbnico,no inicio da OT: 23% autéiogo e 21% alogénio Referéncla Mank AP et al. Pilto prospecivo descivo cl 23 pacientes ambuletriais Desfecho: aderéncia a dita p! neutropenia, febre e cultura positva Muticntoo 156 questonos(condgdes cl nicas p restric cettica e lista de alimentos | a serem retios) _Deteinagéo de neutropenia 70% aderem LBD, 30% néo aderram LBD ‘Sem diferenca significante pl feb ou cultura positva entre | 0s grupos Definigdo neutropenia diferente enre as nstiuiges 78% destas resringem a alimentagao durante a neutopenia| | Debit Det al” | ‘Smith LH etal.* Revisao Nao hd nallteratura estudos que mostrem relago dita entre LBD preveninco infeco0.em neutropenia apés quimioterapia, As recomendag6es focam em lavagem das mos, promogdo {da alimentagao eiminando alimentos que no podem ser lavados ou cozidos Wilson BJ Prospectivo, randomizado ol 10 pacientes| guideline FDA 9 LBD ‘Todos receberam proflaxia com ATE. Desfecho: aderéncia acta, qualidade de vida, febre einfeogao Revisao Nao houve diferenca eslalisicamente sigificante entre 0s ‘grupos p!aderéncia, febree infecgso. Dierengasignficante p/ qualidade vida p<0,05 (FDNY LBD), Desoorlaminag TG ocasiora dingo da lor endgona, prsnta custo elevado endo tem eftvidacecomrovada 80% das infecgbes nos pacientes neuropérics s8o de rigom endégena | Moody K et al2® Rust DM et al? Randomizados 2 grups (n=20}- grupo 1 LBD; grupo 2¢ dita normal Todos receberam proflaxia com ATB Desfecho: Coprocultura, Infecrdo, Custos Nao howe dierenga esialsicamente Sgnificane ene os| grupos Van Tel F ot al Randomizado, 153 pacientes divididos em 3 grupos: dleta cozida recusa em participar (0°53) “Todos receberam profiaxia com AT Desfecto: febre,infeogdo, mortalidade Case report Nao houve dlferenca eslatisicamente signifeante entre os| Tupos em relagdo a infeogdo eletalidade Febre de oigem indeterminada foi comum no cozido axa acellagdo alimentar durante otratamento. Nao restinge alimentagdo a pacientes neuropénicos, apenas, garante a seguranca alimentar Gardner A@t al. | Todd J ot al. * Legenda: TB: nisi; LD: aw Batra TWO: antl do recs 6se; FOR: Food and Grp Adnan Faz-se necesséria a realizagao de mais estudos que analisem a contagem de microorganismos nos alimentos sanitizados, alimentos cozidos, alimentos que necessitam de maior mani- pulago, com posterior avaliagdo por meio de ensaios clinicos. Somente assim poderemos padronizar, com competéncia higiénico sanitéria, as rotinas operacionais, além de determinar quais alimentos podem estar dentro do grupo de alimentagdio segura para pacientes com comprometimento imunol6gico. REFERENCIAS: 1. Guimaraes GC, Oliveira, Aibara BH, Lopes A, Montagnini AL. Nitrigho e cfncer. Acta Oncol Bras. 2002:22(1):227-32, 2. Luisi FA, Petilli AS, Tanaka C, Caran EM. Contribution to the ‘treatment of nausea and emesis induced by chemotherapy in children and adolescents with osteosarcoma. S80 Paulo Med J. 2006;124(2):61-5, Maculevieius J, de Fomasari ML, Baxter YC. Levels of care in rutzition. Rev Hosp Clin Fac Med Sao Paulo. 1994;49(2):79-81 Odelli C, Burgess D, Bateman L, Hughes A, Ackland S, Gilles J.etal. Nutrition support improves patient outcomes, treatment tolerance and admission characteristics in oesophageal cancer. Clin Oneol (R Coll Radiol). 2005;17(8):639-45. Ravasco P. Aspects of taste and compliance in patients with ‘cancer. Eur J Oncol Nurs. 2005:9(Suppl 2):S84-91 National Cancer Institute. Common Toxicity Criteria Manual, Version 2.0, United States: Cancer Therapy Evaluation Program; 1999. 27p. Sawada NO, Dias AM, Zago MMF. O efeito da radioterapia sobre a qualidade de vida dos pacientes com cdncer de eabega e pescogo. Rev Bras Cancerol, 2006:52(4):323.9, Re Bras Nr in 2010, 28): 5909 332 14, 15 16, 17. 19. Resricdes dietticas para pacientes Inagaki J, Rodriguez V, Bodey GP, Proceedings: Causes of death in cancer patients. Cancer. 1974;33(2):568-73, Segel GB, Halterman JS. Neutropenia in pediatric practice. Pediatr Rev. 2008;29(1):12-23. National Cancer Institute. Common Toxicity Criteria Manual, ‘ersion2.0. United States: Cancer Therapy Evalution Program: 1999, 27p. ‘National Comprehensive Cancer Network. [periédicoeletrdnico] Acessado em 05/09/2008. Disponivel em: http:/iwww.neen.org. Kligerman, J. Cancer ¢ qualidade de vida, Rev Bras Cancerol, 1999;45(2):5-7, |. Schwartzberg LS. Neutropenia: etiology and pathogenesis. Clin Comerstone. 2006;8 Suppl 5):S5-11 Kirshbaum M. Neutropenia: more than a low neutrophil count, Eur J Oncol Nurs. 1998;2(2):115-22. National Comprehensive CancerNetwork.[periédicoeletrénico] Acessado em 30/01/2010. Disponivel em: http://www:neen.org, ‘Mank AP, Davies M. Examining low bacterial dietary practice: a survey onlowbacterial food, Eur}OncolNurs. 2008; 12(4):342-8, DeMille D, Deming P, Lupinacci P, Jacobs LA. The effect of the neutropenic diet in the outpatient setting: a pilot study. Oncol Nuts Forum. 2006;33(2):337-43. Smith LH, Besser SG. Dietary restrictions for patients with neutropenia: a survey of institutional practices. Oncol Nurs Forum. 2000;27(3):515-20. Wilson BJ. Dietary recommendations for neutropenic patients. Semin Oncol Nurs. 2002;18(1):44-9, neutropéricos: realmente necossérias? 20. Moody K, Finlay J, Mancuso C, Charlson M. Feasibility and safety of a pilot randomized trial of infection rate: neutropenic diet versus standard food safety guidelines. J Pediatr Hematol Oncol. 2006:28(3):126-33. RustDM, Simpson,K, Lister. Nutritional issuesin patients with severe neutropenia, Semin Oncol Nurs. 2000;16(2):152-62. van Tiel F, Harbers MM, Terporten PH, van Boxtel RT, Kessels AG, Voss GB, et al. Normal hospital and low-bacterial diet in patients with eytopenia after intensive chemotherapy for hematological malignancy: a study of safety. Ann Oncol, 20075:18(6):1080-4 Gardner, Mattiuz7iG, FaderlS, BorthakurG, Garcia-ManeroG, PieteeS, etal, Randomized comparison ofcookedandnoncooked diets in patients undergoing remission induction therapy for acute myeloid leukemia. J Clin Oncol. 2008;26(35):5684-8, Todd J, Schmidt M, Christain J, Williams R. The low-bacteria 4iet for immunocompromised patients. Reasonable prudence or clinical superstition? Cancer Pract. 1999;7(4):205-7. . Food and Drug Administration — FDA. [periddico eletrénico] ‘Acessado em 07/11/2009. Disponivel em: http:/www.ede.gov. Centers ff Disease Control and Prevention - CDC. Acessado em 07/11/2009. Disponivel em: http:/www-ede.gov. Figueiredo RM. Guia pritico para evitar DVAs ~Doengas veieu- ladas por alimentos, vol 2. Sto Paulo;2001. Figueiredo RM. Programa de redueao de patégenos: manual de procedimentos e desenvolvimento. Vol. 1. Sto Paulo;1999. 1 Argilés JM, Busquets S, Lépez-Soriano FI, Figueras M. Pathophy- siology of neoplasic cachexia. Nutr Hosp. 2006:21(Suppl 3):49, 21 26. 21. 28, Local de realizagao do trabalho: Hospital Israelita Albert Einstein, Sao Paulo, SP, Brasil. Rev Bas Mr in 2010; 25 (8: 5803 333

Você também pode gostar