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OPINIÃO

A vitória do derrotado: o IDEB em Pernambuco


Numa breve investigação feita por um trio de pesquisadores foram observados
problemas na divulgação dos dados.

Dalson Figueiredo*, Erinaldo Carmo** e Romero Maia*** COMPARTILHE


Recife (PE), 07 de Outubro de 2016 às 16:23

O resultado do IDEB coloca Pernambuco e São Paulo empatados no Ensino Médio. Mas a divulgação
da informação não veio acompanhada de uma análise acurada dos dados. / Alyne Pinheiro/SEE

No último dia 8 de setembro, o resultado do exame do Índice de Desenvolvimento da


Educação Básica (Ideb) 2015 foi divulgado e os estados de Pernambuco e São Paulo
apareceram empatados na primeira colocação do Ensino Médio. A notícia repercutiu
bastante na grande mídia. Mas a ênfase dada na divulgação da informação não veio
acompanhada de uma análise mais acurada dos dados. Numa breve investigação feita
por um trio de pesquisadores, coordenados pelo prof. dr. Dalson Figueiredo, da UFPE,
foram observados problemas na divulgação dos dados que comprometem a validade
do ranking. Problemas que vão desde os mais simples como uso inadequado de
arredondamentos, até a variação incomum dos resultados em PE ao longo dos anos,
passando pela incoerência de resultados entre Ideb e Exame Nacional do Ensino
Médio (Enem).

Na questão do arredondamento, viu-se que o que a taxa de aprovação (쁼ᛍuxo) escolar


foi o mesmo: 0,89, apesar da nota desempenho ter sido diferente. Enquanto SP teve
4,41, PE obteve 4,35. Essa diferença que foi omitida pelo arredondamento faz, na
verdade, que os 3,87 pontos alcançados por PE 䄁ฺquem mais próximos do 3º lugar
(Goiás, com 3,83) do que de SP (3,92). O grá䄁ฺco abaixo ilustra a variação do Ideb
2015 por unidade da federação sem o efeito do arredondamento.

Também foi veri䄁ฺcado qual o nível de correlação entre esse resultado do Ideb e a
nota do Enem, que é uma avaliação diferente da Avaliação Nacional da Educação
Básica principalmente porque os estados não têm a possibilidade de preparar apenas
algumas poucas escolas e afetar positivamente a amostra. Observou-se que no Enem
de 2015, PE 䄁ฺcou na 9ª posição, distante de sua posição vitoriosa no Ideb do Ensino
Médio. Já SP foi coerente e ocupou o 1º lugar, com média igual a 506, dezenove
pontos acima de PE. Ou seja, estranhamente PE tem um desempenho simplesmente
bem próximo à média nacional no Enem, mas muito acima da média nacional no
Ideb. Vale frisar que o Ideb usa a taxa de aprovação como fator de cálculo, e PE mais
uma vez aprova 89% de seus alunos, enquanto a média nacional é de apenas 80%.

Mesmo a evolução das notas dos estados de SP e PE ao longo dos anos revela uma
trajetória incomum do estado nordestino. Da série histórica com seus escores 䄁ฺnais
no Ideb, salta aos olhos o movimento ascendente excêntrico sem par no Brasil. Se
comparado com SP, que passou de 3,3 em 2005 para 3,9 em 2015; PE obteve um
crescimento meteórico, passando de 2,7 para 3,9 no mesmo período. Ou seja, um
incremento abrupto de 44,44% enquanto SP fez 19% em 10 anos, e a média nacional
foi de 16,33%. Como se não bastasse, ainda existe uma forte incoerência entre o
desempenho de PE no Ideb entre níveis de ensino. Em relação aos anos iniciais do
Ensino Fundamental, PE aparece na 18ª posição, enquanto SP se mantém em primeiro
lugar. Para os anos 䄁ฺnais, os dados mostram PE na 11ª posição, porém rati䄁ฺcam a
coerência da análise sobre SP e o apontam como líder mais uma vez.

O que se conclui dessas informações disponíveis no site do INEP é que o estado de PE


é muito diferente de todos os outros do Brasil quando o assunto é aumentar a nota
do Ideb. Mas é tão diferente que precisa ser profundamente investigado, inclusive
para que seus métodos de gestão possam ser copiados Brasil afora. Por outro lado, o
peso das evidências exige também que os leitores sejam mais prudentes ao se
depararem com notas e outras avaliações que possuam grande impacto de marketing.
Di䄁ฺcilmente acontecem milagres em educação.

As notas do Ideb não parecem re쁼ᛍetir claramente a qualidade da educação no País, e


muito menos no estado de PE. Defender o contrário pode ser tentador mas
negligencia as evidências. O maior desa䄁ฺo dos gestores hoje é aperfeiçoar a
metodologia das avaliações. Pode-se começar evitando que escolas da amostra sejam
prévia e especialmente capacitadas, alcançando resultados irreais para a realidade
local. Deve-se também garantir total transparência sobre dados de evasão escolar,
bem como da análise de dados que orienta a divulgação de rankings. Todos desejamos
que a educação melhore nos estados, mas avaliamos que poucos reúnem as condições
necessárias para alcançar essa vitória de maneira consistente.

Dalson Figueiredo é Professor Dr. do dpt. de Ciência Política da UFPE.

Erinaldo Carmo é Professor do Colégio de Aplicação da UFPE e Dr. em Ciência


Política.
Romero Maia é Analista de Planejamento e Estatística do IBGE.

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