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Artigo Natalia Rego - Revisado Bruna
Artigo Natalia Rego - Revisado Bruna
RESUMO
O presente trabalho se propôs abordar o tema da classificação do reeducando no Centro de
Ressocialização Vale do Guaporé, no município de Porto Velho, capital de Rondônia, como
garantia à individualização da pena e à dignidade da pessoa humana do preso, frente à Lei de
Execuções Penais. O problema levantado foi se o Centro de Ressocialização do Vale do
Guaporé promove a garantia da dignidade da pessoa humana, no que tange a individualização da
pena frente a Lei de Execuções Penais. Diante disso, o objetivo principal foi demonstrar que a
classificação realizada pelo Centro de Ressocialização Vale do Guaporé garante o princípio
da dignidade da pessoa humana no que se refere a individualização da pena perante à LEP; já
os específicos foram demonstrar a natureza jurídica do instituto da individualização da pena,
esclarecer o sistema de classificação utilizado pelo Centro de Ressocialização Vale do
Guaporé e verificar se o sistema garante realmente a supracitada individualização e a
dignidade da pessoa humana do apenado. A metodologia constou de estudo documental,e
revisão bibliográfica, por meio doa qual os aspectos jurídicos e históricos do tema foram
abordados. Este artigo dispõe, em seu primeiro capítulo, sobre a Pena, tratando tanto da sua
finalidade, do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Sistema Penal Brasileiro, quanto
do Princípio da Individualização da Pena; no segundo capítulo aborda a Lei de Execução
Penal Brasileira, seu histórico e a ressocialização do apenado; em seguida, traz à baila
informações acerca do Centro de Ressocialização do Vale do Guaporé, a estrutura deste e a
Comissão Técnica de Classificação no Programa de Individualização de Pena; para, então,
chegar às considerações finais do artigo. Após análise da realidade da unidade prisional,
observou-se claramente a garantia da individualização da pena bem como o respeito ao
princípio da dignidade da pessoa humana do reeducando.
ABSTRACT
The present work proposed to address the issue of the classification of the re-educated in the
Vale do Guaporé Resocialization Center, in the municipality of Porto Velho, capital of
Rondônia, as a guarantee for the individualization of the sentence and the dignity of the
prisoner's human person, in view of the Law of Executions Criminals. The problem raised
was whether the Vale do Guaporé Resocialization Center promotes the guarantee of the
dignity of the human person, with regard to the individualization of the penalty under the
Penal Execution Law. Therefore, the main objective was to demonstrate that the classification
carried out by the Vale do Guaporé Resocialization Center guarantees the principle of human
dignity with regard to the individualization of the penalty before the LEP; the specific ones
were to demonstrate the legal nature of the institute of individualization of the sentence,
clarify the classification system used by the Vale do Guaporé Resocialization Center and
verify if the system really guarantees the aforementioned individualization and dignity of the
human person of the inmate. The methodology consisted basically of a literature review,
through which the legal and historical aspects of the subject were addressed. This article
provides, in its chapter 01, on the Penalty, dealing with both its purpose, the Principle of
Dignity of the Human Person and the Brazilian Penal System, and the Principle of
Individualization of the Penalty; in chapter 02 it deals with the Brazilian Penal Execution
Law, its history and the re-socialization of the convict; then, it brings up information about the
Vale do Guaporé Resocialization Center, its structure and the Technical Committee for
Classification in the Pena Individualization Program; to then reach the conclusion of the
article. After analyzing the reality of the prison unit, the guarantee of individualization of the
sentence was clearly observed, as well as respect for the principle of human dignity of the re-
educated person.
1 INTRODUÇÃO
Por muito tempo, o poder punitivo do Estado atuou de modo desenfreado e, muitas
vezes, injusto. A pena era aplicada de forma mecânica, padronizada, não considerando caso a
caso, nem as particularidades do indivíduo. Em 1988, com a Constituição Brasileira, o
princípio da individualização da pena foi consagrado.
Entretanto, observa-se que o referido princípio ainda não vem sendo aplicado de forma
eficaz e ampla, em um ordenamento jurídico que o manipula e o utiliza com finalidade de
manutenção da ordem de exclusão. É por essa razão que a análise da temática em pauta torna-
se tão importante e atual.
Com isso, o presente artigo tem como meta realizar um breve estudo sobre a
classificação do reeducando no Centro de Ressocialização Vale do Guaporé como garantia à
individualização da pena e à dignidade da pessoa humana do preso, frente à Lei de Execuções
Penais, no município de Porto Velho, capital do Estado de Rondônia. A citada classificação
do reeducando realizada pelo Vale do Guaporé garante a individualização da pena e a
dignidade da pessoa humana do apenado? A hipótese seguida foi a de que o sistema de
classificação do apenado no centro prisional em pauta, diferente da realidade normalmente
vista no sistema prisional brasileiro, assegura os princípios supracitados.
Optou-se, como metodologia, basicamente por estudo documentalrevisão
bibliográfica, através doa qual abordou-se o tema a partir de aspectos jurídicos e históricos.
Houve coletas de textos como legislação atualizada, publicações científicas e históricas e
doutrinas. Por fim, realizou-se leitura dos escritos elencados, fichamento e análise destes, a
fim de se realizar os estudos pretendidos.
O trabalho se divide essencialmente em três objetivos específicos: i) demonstrar a
natureza jurídica do instituto da individualização da pena) inicialmente trata sobre a pena,
expondo um breve histórico, a finalidade da pena, o Princípio da Dignidade da Pessoa
Humana relacionado ao Sistema Penal Brasileiro, e o Princípio da Individualização da Pena;
ii) esclarecer o sistema de classificação utilizado pelo Centro de Ressocialização Vale do
Guaporé logo após, é abordada a Lei de Execução Penal, expondo-se o histórico desta e a sua
relação com o processo de ressocialização do apenado; iii) por fim, verificar se o sistema
garante realmente a supracitada individualização e a dignidade da pessoa humana do
apenado.será apresentado o Centro de Ressocialização Vale do Guaporé, através da descrição
de histórico e estrutura, bem como será retratada sua Comissão Técnica de Classificação no
Programa de Individualização de Pena e feita uma análise da eficácia de suas ações.
Sempre que se toma uma decisão visando a punição de alguém que infringiu alguma norma,
aplica-se uma pena. Então, pode-se depreender disso que pena é consequência de uma
desobediência. Com isto, pena seria a consequência da citada desobediência.
Para Damásio de Jesus3, pena é a sanção aflitiva que o Estado impõe, por meio de uma ação
penal, que atua como uma retribuição por um ato que foi considerado ilícito e consiste em se
diminuir um bem jurídico objetivando que novos ilícitos ocorram.
3 JESUS, Damásio. Direito Penal: Parte Geral. 36. ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 563.
Já Edgard Magalhães Noronha4 compreende que a pena é a privação de bens jurídicos ao
criminoso, em razão de atos praticados. É como se fosse uma expiação de ações ilícitas,
enraizada na ideia de que todo aquele que pratica um mal também deve sofrer um mal. O
autor acredita, ainda, que tal prática não é simples afirmação de vindita, mas o símbolo de
que, frente a um direito ofendido, a lei protesta e reage, não apenas para defender um
indivíduo, porém para a proteção de toda a sociedade.
Cezar Roberto Bitencourt5 vai mais além e afirma que a Pena e o Estado são
estritamente ligados, a tal ponto que para que um se desenvolva o outro também precisará
desse desenvolvimento.
Enquanto isso, para Eugenio Raúl Zaffaroni 6, pena seria qualquer privação ou
sofrimento de um direito ou um bem relativo a uma ação considerada inadequada, e que não
seja o resultado julgado adequado apropriado a uma solução de conflito dos outros ramos
existentes do direito.
Em suma, a pena seria uma retribuição, uma espécie de vingança frente ao mal praticado pelo
indivíduo, por meio da quebra da regra estabelecida. Vale citar que esta expiação não é
praticada simplesmente em função da pessoa lesada; mas, antes disso, de toda a sociedade que
poderia ser vítima de semelhante ato.
Os teóricos que defendem a teoria absoluta, afirmam que a pena tem por finalidade retribuir
uma prática de algum mal praticado. Logo, haveria a retribuição de um mal considerado
injusto (contravenção ou crime) por um mal que seria justo - a pena (punitur quia peccatum
est). Seria trocar um mal por outro mal, muito próximo ao observado em inúmeros antigos
códigos, como o de Hamurabi.
4 NORONHA, Edgar Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 226.
5 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal brasileiro: parte geral. Vol. 1. São Paulo: Saraiva,
2017.
6 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em busca das penas perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal. 5.
ed. Rio de Janeiro: Revan, 2001. p. 204.
Haroldo Caetano e Silva7 afirma que, para a teoria absoluta - também chamada de retributiva
-, a pena é caracterizada por ser a retribuição a um mal feito, tendo o propósito principal de
recompensar um mal com outro mal, muito próximo ao observado em inúmeros antigos
códigos, como o de Hamurabi..
Ao que parece, aplicar a pena com a referida finalidade é o que mais parede suprir o ímpeto
da sociedade por uma punição que considerem adequada. Vale citar que, para aplacar a ânsia
social, é necessário a existência da privação de liberdade do infrator; isso porque, é comum o
relato de que penas alternativas, como multas ou prestação de serviços, geram uma sensação
de impunidade nas pessoas.
Por outro lado, para os teóricos da teoria relativa, a função da pena não é retribuir, antes disso,
ela tem a finalidade de agir como prevenção. Ou seja, a pena é aplicada para que não haja
nova quebra de normas (punitur ne peccetur); atuando, assim, para proteger a sociedade de
futuros males.
Esta teoria divide-se em dois grupos, especial e prevenção geral. Segundo Barros 8, enquanto a
prevenção geral supõe que a pena realizada não surte efeito apenas ao caso concreto, mas a
todos os membros de uma sociedade, através do temor imposto por esta; a prevenção especial
se propõe a atuar na consciência daquele que praticou o delito, a fim de que este repense o
mal praticado, por meio do sofrimento pelo qual está passando.
Assim, a aplicação da pena tanto preveniria que o apenado cometesse novos delitos
(prevenção específica), como serviria para que a sociedade tivesse medo de praticar infrações
e crimes a sociedade (prevenção geral).
Por outro lado, para os teóricos da teoria mista (também chamada de eclética, unificadora e de
dupla finalidade) a pena serviria tanto para castigar um condenado, devido à norma quebrada;
quanto para prevenir a ocorrência de novos crimes, tanto pelo apenado quanto pela sociedade
7 SILVA, Haroldo Caetano da., Manual de Execução Penal., 2º edição, Ed. Bookseller, Campinas, 2002: P. 35.
8 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. 3ª ed. Revisada, atual. e ampliada. São
Paulo: Saraiva, 2003, p. 62.
de maneira geral. Para Souza 9, foi desenvolvida por Adolf Merkel, e é a que predomina na
atualidade.
Para Bitencourt10, as teorias mistas, também denominadas unificadoras, visam agrupar em um
único conceito os fins das penas, por meio da escolha e unificação dos aspectos mais
marcantes das teorias absolutas e relativas. Consoante o autor, foi Merkel que, no início do
século XX, idealiza, na Alemanha, a teoria eclética. Desde então, é a mais dominante nos
meios jurídicos.
De acordo com Inácio Carvalho Neto 11, as teorias mistas surgiram por conta das inúmeras
críticas tanto às teorias absolutas e quanto às relativas. Com isso, houve uma unificação de
ambas, ou seja, a tentativa de fusão e mescla de conceitos preventivos e retributivos.
A Constituição Federal do Brasil, de 1988, em seu artigo 1°, III, versa que a República
Federativa do Brasil tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.
A dignidade da pessoa humana é, de acordo com Bonavides, o princípio de maior valia a fim
de compendiar a unidade material da Carta Magna. Já que é um fundamento, não é valor
máximo a ser defendido apenas pela Constituição, mas também pelo Direito, pela Democracia
e por todo o Estado Federativo.
Por ter um conceito deveras abrangente, há uma significativa dificuldade na formulação de
um conceito jurídico a respeito. Tanto a definição quanto a delimitação são amplas, por
mesclar inúmeros sentidos.
Para Plácido e Silva12, a palavra dignidade é latina e deriva de dignitas, que significa honra,
virtude e consideração. Em regra, é uma qualidade moral que um ser possui e que baseia o
respeito relegado a este. Seria, ainda, a ação por meio da qual um indivíduo passa a ser
conceituado publicamente.
Baseando-se no princípio da dignidade da pessoa humana, desde 1984, ano de sua
implementação, a Lei de Execução Penal enfatiza que toda e qualquer autoridade precisa
respeitar a integridade, tanto moral quanto física, de todos os detentos (tanto apenados quanto
os presos provisoriamente).
9 SOUZA, Paulo S. Xavier., Individualização da Penal: no estado democrático de direito., porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 2006, p. 85.
10 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal brasileiro: parte geral. Vol. 1. São Paulo:
Saraiva, 2017, p. 88.
11 CARVALHO NETO, Inacio., Aplicação da Pena., Rio de Janeiro: Editora Forense, 1999, p. 16.
12 SILVA, Plácido e. Vocabulário Jurídico. Vol. II; São Paulo: Forense, 1967, p. 526.
Todavia, a situação das penitenciárias no Brasil não é das melhores. Constantemente,
são vistas notícias de rebeliões, fugas, além de um aumento da violência, tanto do apenado
quanto contra este. Em parte, isso ocorre devido às precárias condições que o sistema
penitenciário do país submete o preso, dentro das celas.
Segundo Foucault13, a delinquência de uma pessoa é atribuída a esta por meio de um ou mais
delitos praticados. Então, a identidade delinquente inicia sua formação no instante em que o
indivíduo é inserido no sistema carcerário, independendo da idade do infrator. Para o autor, a
instituição na qual o indivíduo permanece isolado - e que teoricamente teria a função social de
recuperar o detento - é aquela que, de forma antagônica, acaba por rotular ou marcar o ente,
dificultando uma futura reinserção deste na sociedade.
Nota-se que, infelizmente, a pena de prisão no Brasil não soube aproveitar os
benefícios trazidos pelo desenvolvimento dos estudos penais, tendo sido direcionada para a
um processo de desumanização do preso. No sistema penitenciário brasileiro, o apenado é
condicionado a acostumar-se à vida na prisão, não sendo auxiliado e preparado para a vida em
liberdade.
E esta realidade parece refletir o desejo da sociedade no Brasil. Para Rogério Greco 14, a
população brasileira, em geral, tem uma gana por um profundo sofrimento dos presos., aAlém
da condenação a estes impostas que os priva de liberdade., sSeria necessário, para muitos, que
a situação do preso fosse a pior possível, havendo um sofrimento intra muros tal qual o
sofrimento das vítimas extra muros. Segundo Greco, governantes comumente não se
preocupam com a causa dos encarcerados, fazendo com que o sistema de reintegração à
sociedade seja falho, já que é normal não levar em consideração os ambientes por vezes
promíscuos, miseráveis em extremos, sem direitos básicos nos quais muitos praticantes de
infrações penais cresceram e viveram. Os direitos básicos de cidadão não tinham como ser
exercidos, já que não eram garantidos acessos à saúde, lazer, moradia, cultura, alimentação,
ou seja, acesso aos direitos básicos de todos os seres humanos.
Com isto, o princípio da dignidade da pessoa humana, no âmbito geral, não parece ser
respeitado no Sistema Penitenciário Brasileiro; já que se nota a necessidade de se saciar a
ânsia de vingança da sociedade, ânsia esta que, para ser aplacada, precisa não apenas que um
condenado seja preso, mas que o local de pena seja cruel e desumano, como as antigas
masmorras medievais.
13 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: historia da violência nas prisões. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 2003. P.
225.
14GRECO, Rogério. Sistema Prisional – Colapso atual e soluções alternativas. 2ª ed. Niterói, Rio de Janeiro:
Editora Impetus, 2015.
2.3 Princípio da Individualização da Pena como Solução para Injustiças
15 LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: SAFE, 1991. p.123.
16 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. V. 1. Niterói, Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2012. p. 69.
17 PALAZZO, Francesco. Valores constitucionais e direito penal: um estudo comparado. Tradução de Gérson
Pereira dos Santos. Porto Alegre: SAFE, 1989. p. 120.
fundamental é ligada a outro direito também fundamental, o da liberdade, que possui valor
universal.
Consoante Machado18, o princípio da individualização da pena é realizada através de
três fases do processo de criminalização: a primária, a secundária e a terciária. Na primária, há
a figura do legislador, que observa a proporcionalidade guardada por uma ação tipificada, no
que diz respeito ao modo e à gradação da pena relacionada ao delito, com o intuito de que a
pena aplicada sirva para reprovar ou prevenir determinado comportamento social. Na
secundária, é levada em consideração a margem legal prevista, o contexto do delito praticado
e, observando o indivíduo, a humanidade expressa no mesmo, no âmbito do que se denomina
individualização judicial da pena. Já a criminalização terciária é aquela que leva em
consideração o exame constante do indivíduo já condenado, observando-se sua evolução
dentro do programa de reintegração, a fim de que haja abrandamento ou endurecimento do
regime de pena que o detendo esteja cumprindo.
A fase judicial é o momento em que a pessoa está mais vulnerável ao poder do Estado,
e às decisões arbitrárias deste. Com isso, é o momento real em que se invoca o princípio da
individualização da pena, para que se penalize na justa medida da ação realizada e do autor
desta. É quando se analisará o condenado, mesclando sua condição humana a regras e
equações, com o intuito de inseri-lo na condição de criminoso.
As normas constantes na Lei de Execução Penal têm como base o direito do apenado
de ser ressocializado, garantido a este os subsídios necessá7rios a esta ressocialização, que
respeitem tanto a integridade do preso quanto a integridade moral e a física deste.
Em 1981, através da Portaria 429, foi fundada uma comissão coordenada pelo
professor Francisco de Assis Toledo e composta por inúmeros juristas, entre eles Renê Ariel
Dotti, Benjamim Moraes Filho, Miguel Reale Júnior, Rogério Lauria Tucci, Ricardo Antunes
Andreucci, Sergio Marcos de Moraes Pitombo e Negi Calixto. A meta era se elaborar um
anteprojeto para a Lei de Execução Penal. Já em 1982, após revisão por segunda comissão, tal
anteprojeto foi apresentado e encaminhado ao Congresso Nacional pelo então presidente João
Figueiredo, transformado no PL 1.657.
A Câmara dos Deputados propôs algumas emendas e, após estas, o anteprojeto
transformou-se na Lei 7.210, de 11 de junho de 1984. Com ela, houve fim uma longa luta
tanto da academia quanto de parlamentares que buscavam ter o Brasil um sistema de
execução penal diverso do preconizado pela antiga Lei 3.274/1957, um que se constituísse
uma execução penal mais preocupada com a dignidade humana, em alinhamento com o
Estado de Direito, mais adequado ao novo paradigma a ser preconizado pela Constituição
Federal de 1988.
Consoante Beneti20, na Lei de Execução Penal (LEP) há o detalhamento dos direitos
dos presos, atrelados à ideia de que o apenado, mesmo condenado, continua sendo titular de
direitos que não são atingidos pela sentença que o privou de liberdade. Para o autor, os citados
direitos são expostos de forma precisa e clara, com o intuito de evitar imissões ou vagueza de
19 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: Causas e alternativas. 4ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2011, p. 159.
2020 BENETI, Sidney Agostinho. Execução penal. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 35.
determinados textos; além de solidificar a inviolabilidade, imprescindibilidade e
irrenunciabilidade dos direitos invocados.
Em suma, as finalidades básicas da LEP não é somente que a sentença condenatória
seja efetivamente cumprida, mas também que o sentenciado seja recuperado e retorne ao
convívio em sociedade.
Além desses, são utilizados, ainda, os critérios subjetivos, que abrangem a observação
de características comportamentais. Dependendo do comportamento do reeducando - que
abrange nível de comportamento em programas e projetos, e a interação com os pares e
servidores-, a comissão pode realocar em nível maior ou menor, por mais que o
comportamento notado não esteja documentado em livro de elogios e ocorrências. Além da
vida atual do apenado, será analisada a vida pregressa deste, a fim de decidir o nível
adequado; como também serão elencadas necessidades e aptidões, vulnerabilidade sexual (ou
comportamento agressivo) e renúncia de programas ou falso testemunho de capacidade
técnica para certa função ou trabalho37.
Vale citar que a realocação do reeducando está atrelada, ainda, ao número de vagas
ofertadas em cada nível. É a Unidade Prisional que estabelece a referida quantidade por
pavilhão e nível de privilégios, quantidade esta apresentada a cada semana pelo Chefe Geral
de Segurança. É importante que não ocorra realocação de mais de dois níveis de privilégio,
raras exceções; e não poderá haver realocação de mais de três níveis em uma mesma reunião
da Comissão. Para isso, será necessária outra reunião. A realocação em nível diferente do
avaliado somente poderá ocorrer por meio da intervenção do Diretor Geral, mesmo que seja
contrária à decisão da Comissão. Somente poderá permanecer no CRVG o apenado que tiver,
no máximo, 25 pontos no instrumento de classificação da Comissão Interna. Afora esta
pontuação, o reeducando apenas permanecerá na unidade por intervenção do Diretor Geral.
Por fim, vale citar o Pavilhão de Exceção ACUDA, do CRVG. Esse pavilhão serve
apenas para alocar apenados participantes do Projeto Iluminar, realizado pela Associação
Cultural e de Desenvolvimento do Apenado e Egresso (Acuda). Este projeto oferece oficinas
de artesanato em geral, entre os quais marcenaria, tear, artes plásticas, cerâmica, reciclagem e
hortifrutigranjeiros. Há, também, cursos de terapias holísticas, banhos de argila, meditação e
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por fim, vale citar que tanto o objetivo geral quanto os três objetivos específicos -
demonstrar a natureza jurídica do instituto da individualização da pena; esclarecer o sistema
de classificação utilizado pelo Centro de Ressocialização Vale do Guaporé; e verificar se o
sistema garante realmente a supracitada individualização e a dignidade da pessoa humana do
apenado foram plenamente alcançados. Todavia, importa esclarecer que este artigo é apenas
um início para uma grande jornada em busca de um conhecimento mais profundo sobre como
instituições prisionais que tratem cada interno como um ser humano único podem trazer
benefícios para a sociedade brasileira.
<http://esic.cge.ro.gov.br/Resposta/Visualizar/a4cb1a00-77e9-4197-9852-9991df671f5e>
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