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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS


DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

FICHAMENTO

Entre os dispositivos conceituais e a gramática:


o direito e a política na formação do Código Civil de 1916.

Emanuel de Santana Magliano

Santa Rita/PB
2023
O texto inicia sua abordagem com a complexa evolução do direito privado brasileiro,
destacando a influência de duas principais tradições jurídicas no mundo ocidental: a romano-
germânica e a Common Law. A Common Law, derivada da tradição inglesa e adaptada nos
Estados Unidos, mantém uma conexão com as raízes históricas da Inglaterra. Por outro lado, a
tradição do direito romano-germânico remonta ao direito romano, passando por reconstruções
conceituais na modernidade. Os juristas brasileiros têm uma forte tradição de estudos históricos
para estabelecer a legitimidade histórica do direito privado.
O desenvolvimento do direito privado brasileiro ocorreu em diferentes estágios,
começando com a recepção do direito português na sociedade colonial e sua subsequente
adaptação local. A grande transição aconteceu com a institucionalização do sistema judiciário
brasileiro, especialmente durante o período do Segundo Império. Este período viu o
estabelecimento de faculdades de direito em São Paulo e Olinda, e os juristas brasileiros, que
inicialmente foram formados em Coimbra, começaram a adotar influências norte-americanas,
refletindo um ideal "americanista" que também influenciou a Constituição de 1891.
A adaptação do desenho institucional norte-americano ao contexto brasileiro durante a
formação da primeira República, se deu inicialmente, com os juristas brasileiros inspirando-se
nas experiências da América Latina, especialmente da Argentina, para estabelecer instituições
constitucionais no Brasil após a emancipação colonial. A prioridade inicial estava na construção
do quadro constitucional, seguida pela necessidade de estabelecer instituições penais e
comerciais. Notavelmente, a criação de um código civil brasileiro foi adiada em relação a outras
áreas do direito.
Várias mudanças legislativas ao longo do século XIX distanciaram o direito privado
brasileiro das Ordenações portuguesas. Isso incluiu reformas significativas na regulamentação
da propriedade, como a reforma hipotecária de 1864 e a "Lei de Terras" de 1850, que buscaram
modernizar o conceito de propriedade. O processo de substituição das Ordenações nas relações
cíveis começou no século XIX, com a contratação de Teixeira de Freitas para desenvolver uma
consolidação das leis civis e um projeto de código civil. O Código Civil de 1916 resultou desse
processo e envolveu debates entre juristas notáveis, como Clóvis Beviláqua, Rui Barbosa e
Ernesto Carneiro Ribeiro.
Além disso, o texto destaca as questões simbólicas relacionadas à formação de um
quadro normativo nacional, com ênfase na importância do código civil nesse contexto. Também
aborda o debate parlamentar sobre o Código Civil de 1916, sublinhando a complexidade do
estudo histórico do direito devido ao anacronismo na interpretação dos debates e às omissões
propositais para defender pontos de vista enviesados, abordando ainda as questões simbólicas
relacionadas à aprovação do Código Civil na República do Brasil, dividindo-as em três
principais temas interligados:
1. Definição de um símbolo de nação: Os juristas buscaram estabelecer um código civil
que refletisse a nacionalidade brasileira e não fosse simplesmente uma extensão das leis
da antiga metrópole portuguesa. Isso gerou debates sobre a importação de modelos
estrangeiros versus a criação de uma legislação genuinamente brasileira.
2. Definição de uma legislação republicana: O processo de formulação do Código Civil
também visava marcar a transição do período imperial para a República. Os debates no
Congresso refletiram a busca por instituições republicanas distintas do Império, com
destaque para a primazia do casamento civil em detrimento do religioso.
3. Impacto da mudança do paradigma jurídico: O trecho menciona as mudanças
significativas relacionadas ao casamento civil e religioso, destacando o Decreto n. 181
de 1890, que definiu a primazia do casamento civil sobre o religioso. Essas mudanças
refletiram uma transformação nas práticas matrimoniais no Brasil, influenciada por
reformas liberais anteriores.
As questões simbólicas que permearam o processo de formulação e aprovação do
Código Civil de 1916 no Brasil, são ressaltadas, com destaque a importância de construir uma
legislação nacional e republicana em um contexto de mudanças sociais, políticas e econômicas.
Além disso, destaca também o papel fundamental de figuras proeminentes, como Rui Barbosa
e Clóvis Beviláqua, nas discussões sobre o código civil e a busca por uma legislação moderna
e lógica no país.
Os debates e eventos relacionados à aprovação legislativa do Código Civil de 1916 no Brasil
podem ser resumidos da seguinte forma:
Fase de Antecedentes (1840-1901): Esse período representou um momento de
amadurecimento intelectual e político no campo jurídico brasileiro, com o interesse crescente
na codificação civil. No entanto, várias tentativas de formulação de leis foram feitas, mas
nenhuma proposta jurídica coerente e completa foi apresentada.
Formulação do Projeto de Clóvis Beviláqua (Mandato de Campos Sales, 1898-1902):
Durante o mandato de Campos Sales, Clóvis Beviláqua foi encarregado de elaborar um novo
Código Civil. Sua apresentação desencadeou debates intensos, incluindo a polêmica
envolvendo Rui Barbosa.
Tramitação do Projeto de Clóvis Beviláqua até a Aprovação (até 1916): O projeto de Clóvis
Beviláqua passou por um processo legislativo que envolveu o Senado, sob a gestão de Campos
Sales. Rui Barbosa exerceu forte oposição ao projeto, argumentando que a pressa
comprometeria a qualidade do código. Como resultado da oposição, o projeto passou por várias
emendas e modificações.
A pesquisa destacou que as críticas de Rui Barbosa à legislação não eram apenas
motivadas por considerações pessoais ou filológicas, mas também por preocupações jurídicas
legítimas. Rui Barbosa acreditava que as leis deveriam ser claras, bem escritas e que a pressa
na aprovação era prejudicial à qualidade das leis. Portanto, sua ação política resultou em um
debate mais profundo e reflexivo, levando a emendas e melhorias no Código Civil de 1916.
A metodologia da pesquisa envolveu uma abordagem histórica dos conceitos e fez uso
dos trabalhos de Reinhard Koselleck como referência. O autor destacou a importância de
acessar fontes primárias para fundamentar a análise, coletando informações detalhadas sobre a
tramitação do projeto e o debate relacionado.
A pesquisa não se estendeu à análise de tentativas e projetos anteriores de códigos civis, devido
ao foco específico da pesquisa e às dificuldades em localizar fontes para tais análises. Além
disso, as tentativas anteriores de codificação do direito civil no Brasil, lideradas por Teixeira de
Freitas e apoiadas por Nabuco de Araújo, foram consideradas conceitualmente bem-sucedidas,
embora tenham falhado na prática devido a desafios políticos e de implementação.
Houve outras tentativas de codificação do direito civil no Brasil durante o período do
Império, tendo como exemplos o projeto de Coelho Rodrigues e Joaquim Felício dos Santos.
Destacou-se a importância dos debates no Congresso Nacional para entender as questões
políticas e institucionais relacionadas ao processo legislativo do Código Civil de 1916. A
divergência entre Clóvis Beviláqua e Rui Barbosa, tanto em termos de perspectiva jurídica
quanto de motivações pessoais, foi explorada na historiografia, com diferentes interpretações
destacando motivações políticas e a importância que Rui Barbosa atribuía à qualidade literária
e à clareza nas leis.
O debate em torno das críticas de Rui Barbosa ao projeto do novo Código Civil de 1916,
elaborado por Clóvis Beviláqua. Por ele enfatizado na relação entre as preocupações
linguísticas e jurídicas nesse debate, destacando vários pontos-chave:
1. Pressa e Qualidade: Rui Barbosa acreditava que a pressa na aprovação do projeto
comprometeria sua qualidade e durabilidade. Ele enfatizava a necessidade de um
processo cuidadoso para garantir que o novo Código Civil fosse bem elaborado e
resistisse ao teste do tempo.
2. Revisão Gramatical e Filológica: Parte do debate se concentrou na revisão gramatical
e filológica do parecer de Rui Barbosa, conduzida por Ernesto Carneiro Ribeiro. Isso
demonstra o compromisso de Rui Barbosa com a qualidade da linguagem jurídica e sua
crença na importância da clareza na redação das leis.
3. Complexa Interconexão entre Questões Linguísticas e Jurídicas: O trecho
argumenta que é difícil separar as críticas linguísticas das críticas jurídicas feitas por
Rui Barbosa. A precisão na linguagem é vista como fundamental para a interpretação e
aplicação do direito, o que liga intrinsecamente o debate jurídico à precisão linguística.
4. Contribuição do Debate: O trecho destaca que o debate entre Rui Barbosa e Clóvis
Beviláqua, embora acalorado, contribuiu para a produção do texto final do Código Civil.
A tréplica de Ernesto Carneiro Ribeiro sugeriu que as críticas de Rui Barbosa
confirmaram os pontos de vista de redação, demonstrando a importância do debate na
melhoria do projeto.
5. Anacronismo: O autor do trecho enfatiza a necessidade de evitar o anacronismo ao
interpretar eventos históricos. O debate não deve ser simplificado como uma mera
disputa política ou uma guerra de egos, mas sim como uma complexa interação entre
questões políticas, jurídicas e linguísticas.
Há uma análise detalhada do debate entre Rui Barbosa e Clóvis Beviláqua, destacando como
questões linguísticas e jurídicas estavam intrinsecamente ligadas nesse contexto, e como esse
debate contribuiu para a qualidade final do Código Civil de 1916 no Brasil.
REFERÊNCIA:

VERONESE, Alexandre. Entre os dispositivos conceituais e a gramática: o direito e a


política na formação do Código Civil de 1916. V Congresso do Instituto Brasileiro de História
do Direito. Curitiba, 2011.

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