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DESENVOLVIMENTO COGNITIVO MUSICA E

NEUROLOGIA
1 NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em


atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com
isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em
nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no
desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de
promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem
patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras
normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável


e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética.
Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de
cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do
serviço oferecido.

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SUMÁRIO

Disciplina: Desenvolvimento Cognitivo Musical............................................................. 4

1 - A MÚSICA E O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA ........................................ 4

1.1 - A música e o desenvolvimento cognitivo da criança ............................................... 6

1.2 - A música e o desenvolvimento afetivo .................................................................... 7

1.3 - A música e o desenvolvimento social da criança ..................................................... 9

Nota ................................................................................................................................ 12 2

- Cognição e Música (ADAPTADO) .......................................................................... 13

2.2. Conceito da Música e a Inteligência Humana ......................................................... 15

2.3. A Música como uma Linguagem............................................................................ 17

2.4. O Aprendizado Musical e a Leitura ......................................................................... 18

REFERENCIAL ............................................................................................................. 21

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Desenvolvimento Cognitivo Musical

Caro aluno nessa disciplina se fará necessário o acesso dos textos e vídeos
sugeridos para o aprofundamento e esclarecimento de diversas nuances desse
assunto.

Bons estudos Disponível em:


http://www.cienciasecognicao.org/pdf/v09/m346117.pdf -

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INTRODUÇÃO

O ambiente sonoro, assim como a presença da música em diferentes e variadas


situações do cotidiano fazem com que os bebês e crianças iniciem seu processo de
musicalização de forma intuitiva. Adultos cantam melodias curtas, cantigas de ninar,
fazem brincadeiras cantadas, com rimas, parlendas etc., reconhecendo o fascínio
que tais jogos exercem. Encantados com o que ouvem, os bebês tentam imitar e
responder, criando momentos significativos no desenvolvimento afetivo e cognitivo,
responsáveis pela criação de vínculos tanto com os adultos quanto com a música.
Nas interações que se estabelecem, constroem um repertório que lhes permite iniciar
uma forma de comunicação por meio de sons. (BRASIL, vol. 3 p. 71).

O interesse pelo desenvolvimento cognitivo musical tem crescido muito nas últimas
décadas devido a recentes descobertas no campo da neurociência. A diferença entre
alturas, timbres e intensidades já acontece desde o nascimento até o décimo mês
de vida, tornando-se cada vez mais refinadas. As preferências e memórias musicais
também se dariam a partir dessa época, por meio de processos imitativos e de
impregnação, estando também associado a inúmeras funções psicossociais, como
a comunicação e o desenvolvimento da linguagem compreensiva e expressiva, por
exemplo, ou entretenimento (ILARI, 2005 apud PINTO, 2009).

A música é uma ciência básica com um grande número de variações de códigos, o


que possibilita o desenvolvimento intelectual da pessoa. Quanto mais cedo crianças
entrarem em contato com o mundo da música, maiores serão as chances de que
elas assimilem novos códigos sonoros que a música pode oferecer. Além disso,
maior será o conhecimento armazenado na memória sonora, quanto mais tipos de
sons a criança ouvir, o que pode ser também ampliado se a criança praticar um
instrumento musical. Neste processo, a criança torna-se o agente criador de
diferentes códigos sonoros, por meio de criações realizadas com seu instrumento. o
estímulo ao aprendizado da música é necessário, uma vez que a música, segundo
(STRALIOTTO, 2001, PEDERIVA e TRISTÃO 2006 apud PINTO 2009), para a

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criança funcionaria como uma nova forma de exteriorização dos sentimentos, como
um novo idioma que servirá de veículo para as emoções.

As pesquisas investigativas da neurociência, se desenvolvem rapidamente e por


isso tem se ampliado, consideravelmente, e interessando autores de diversas
áreas. Por muito tempo, a área ficou mais restrita ao aspecto biológico, ou seja,
aos comandos dados pelo cérebro, transportados e executados por outras partes
do organismo, isso porque a sociedade não relacionava diretamente o cérebro à
consciência humana, que exerce grande influência na postura, pensamentos,
desejos e até necessidades.

Porém, uma vez que o cérebro se tornou protagonista em eventos e experimentos,


ficou clara sua ligação e correlação com a consciência, provocando uma série de
questionamentos a respeito do seu papel nas decisões humanas. Foi assim que a
neurociência ganhou ainda mais relevância, já que tem potencial para explicar, além
de reações do corpo, os fenômenos da mente. O cérebro é o mais requintado dos
instrumentos capaz de refletir as complexidades e os emaranhamentos do mundo
ao nosso redor. Centro da inteligência, memória, consciência e linguagem, o
cérebro controla, em colaboração com outras partes do encéfalo, as sensações e
os órgãos efetores, ele é o ponto mais alto da evolução, o único órgão consciente
da sua existência. A associação da música a tratamentos convencionais e não
convencionais de doenças físicas e mentais, pois proporciona prazer aumentando
a qualidade de vida, uma vez que há estímulos cerebrais..

A NEUROCIÊNCIA

Os estudos da neurociência estão divididos em campos específicos que exploram


as áreas do sistema nervoso, como

1. Neurofisiologia: investiga as tarefas que cabem as diversas áreas do


sistema nervoso.

2. Neuroanatomia: dedica-se a compreender a estrutura do sistema


nervoso, dividindo cérebro, a coluna vertebral e os nervos periféricos externos em
partes para nomeá-las e compreender as suas funções.

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3. Neuropsicologia: foca na interação entre os trabalhos dos nervos e as
funções psíquicas.

4. Neurociência comportamental: ligada à psicologia comportamental, é a


área que estuda o contato do organismo e os seus fatores internos, como
pensamentos e emoções, ao meio e aos comportamentos visíveis, como fala, gestos
e outros.

5. Neurociência cognitiva: estudo voltado à capacidade cognitiva, em que


estão inclusos comportamentos ainda mais complexos, como memória e
aprendizado.

Nessa perspectiva, existem diversas neurociências, dependendo da condução e


objetivo que motivaram o estudo do sistema nervoso. Mas em todas essas áreas, o
cérebro é considerado em uma perspectiva unitária, já que todos os processos
mentais têm influências físicas e as questões físicas alteram o indivíduo a nível
emocional. Além disso, as pesquisas realizadas no ramo exploram mais de uma área
do conhecimento.

Por esse motivo, essa ciência é considerada multidisciplinar, reunindo diversas


especialidades, como bioquímica, biomedicina, fisiologia, farmacologia, estatística,
física, engenharia, economia, linguística, entre outras que objetivam investigar o
comportamento, os mecanismos de aprendizado e a aquisição de conhecimento
humanos. São várias as finalidades das pesquisas na área da neurociência. Entre
elas, vale dar destaque para o entendimento de como nossas vivências são capazes
de alterar o cérebro e como interferem no seu desenvolvimento. Dessa forma, essa
disciplina abrange a inteligência, o raciocínio, a capacidade de sentir, de sonhar,
comandar o corpo, tomar decisões, fazer movimentos, entre outros.

Alguns setores específicos também se utilizam da neurociência, como é o caso dos


profissionais em engenharia médica, no desenvolvimento de equipamentos e
soluções a portadores de necessidades especiais. Da mesma forma, podemos citar
profissionais da informática que desenvolvem softwares, para viabilizar as atividades
de pessoas com algum tipo de limitação intelectual ou física. Para compreender esse

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complexo mecanismo, os cientistas consideram a forma como funcionam os
processos a nível cognitivo, principalmente no que se refere à decodificação e
transmissão de informação realizadas pelos neurônios, bem como suas respectivas
funções e comportamentos.

Com o advento da tecnologia, descobriu-se métodos para estudar as várias áreas


e funções cerebrais que comandam o corpo. Aspecto importantíssimos onde são
identificadas as áreas motoras, sensitivas, cognitivas e áreas relacionadas com a
memória, bem como, programações para as cirúrgicas no cérebro.

Vale relembrar quais são essas áreas:

Encéfalo: localizado no córtex cerebral as superfícies corticais não são uniformes,


possuem saliências (giros) e depressões (sulcos). Compreende:

 Telencéfalo, que é constituído pelos 02 hemisférios cerebrais;


 Diencéfalo, que situa-se na linha mediana, entre os dois hemisférios, se
divide em: Epitálamo, tálamo e hipotálamo;
 Epitálamo: forma a glândula pineal e a habênula;
 Tálamo, que é a estação retransmissora de informações no cérebro,
com exceção das informações olfatórias;
 Hipotálamo, que controla o sistema endócrino e intefere nas funções
viscerais;
 Cerebelo, onde se localiza-se por trás do tronco cerebral, e é responsável
pelo equilíbrio e a coordenação motora; Tronco cerebral, é a substância
nervosa que vai do cérebro à medula. No centro há uma formação reticular
no controle da consciência, sono e vigília. É dividido em três partes:
 Mesencéfalo, por porção superior do tronco cerebral, de onde se
originam os pares de nervos cranianos III e IV;
 Ponte, porção média do tronco cerebral, de onde se originam os pares
de nervos cranianos V, VI, VII e VIII;.
 Bulbo, porção inferior do tronco cerebral, de onde se originam os pares
de nervos cranianos IX, X, XI XII. (Martin 1998);
Cada um dos dois hemisférios é dividido em quatro lobos anatomicamente distintos:
o frontal, o parietal, o occipital e o temporal.
Cada lobo tem circunvoluções características e dobras (um antigo artifício biológico
para aumentar a área de superfície). As cristas das circunvoluções são

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denominadas giros. As ranhuras são chamadas sulcos ou fissuras. Os giros e
sulcos mais proeminetes são semelhantes entre um indivíduo e outro e tem nomes
específicos (giro pré-central, sulco central e giro pós-central). As circunvoluções
representam uma adaptação que serve para ajustar uma grande área superficial
dentro de um espaço restrito da cavidade craniana.

O córtex cerebral e suas camadas


Um corte em profundidade no cérebro mostra que a superfície cinzenta tem uma
espessura que varia de 1 a 4 mm. A maior parte é composta por células nervosas
(neurônios) que recebem impulsos dos pontos mais distantes do corpo e os
retransmitem ao destino certo. Mas o cérebro desempenha funções altamente
diversificadas e, por isso mesmo, as células que os constituem, também são
especializadas. Tipos diferentes de neurônios são distribuídos através de diferentes
camadas no córtex dispostos de tal forma a caracterizar as várias áreas dos
hemisférios, cada qual com sua função.
Existem dos tipos de córtex: isocórtex e alocórtex. O primeiro é formado por seis
camadas (conforme acima) bem definidas durante o desenvolvimento embrionário
e o segundo não apresenta este número de camadas e elas não são nítidas. Apesar
de cada camada não ser constituída exclusivamente por um tipo de neurônio,
considera-se a camada IV como sendo receptora da sensibilidade e a V como sendo
motora. As demais camadas são consideradas de associação. Do ponto de vista
filogenético, pode-se dividir o córtex cerebral em arquicórtex, paleocórtex e
neocórtex. No homem, o arquiocórtex está localizado no hipocampo, o paleocórtex
ocupa o uncus e a parte do giro para-hipocampal.
Todo o resto do córtex é classificado como neocórtex. Arquicótex e paleocórtex
estão ligados à olfação e ao comportamento emocional. O neocórtex é o
responsável pelas mais importantes funções cerebrais do homem (Singi 1996).

O neurônio
O tecido nervoso compreende basicamente dois tipos celulares: os neurônios e as
células gliais ou neuróglia. O neurônio é a unidade fundamental, com a função

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básica de receber, processar e enviar informações. A neuroglia compreende células
que ocupam os espaços entre os neurônios, com funções de sustentação,
revestimento, modulação da atividade neuronal e defesa (Machado 1998). Durante
o desenvolvimento intra-uterino, o cérebro humano produzirá todas as células
nervosas que o acompanharão durante a vida. Os neurônios, por sua vez, são
células nobres, extremamente exigentes quanto aos seus níveis de glicose e de
oxigênio. Isso acontece porque, ao contrário das outras células, os neurônios não
possuem reservas para estes componentes. Em caso de morte dos neurônios,
estes não se regeneram mais, uma eventual cicatrização resultaria em tecido
fibroso constituído por astrócitos e células de Schwann. O impulso nervoso (de
natureza eletroquímica) tem sua velocidade ou intensidade aumentada por
substâncias neurotransmissoras, como a acetilcolina e a adrenalina, de singular
importância para a o estudo das doenças do sistema nervoso. No neurônio, unidade
funcional básica do sistema nervoso, a transmissão dos impulsos se dá sinapse,
dendritos e axônios. Através dos nervos, o cérebro e a medula espinhal enviam
comandos aos sistemas e aparelhos orgânicos.
Existem diversos tipos de neurônios, com diferentes funções dependendo da sua
localização e estrutura morfológica, mas em geral constituem-se dos mesmo
componentes básicos:
 o corpo do neurônio (soma) constituído de núcleo e pericário, que dá suporte
metabólico à toda célula;
 o axônio (fibra nervosa) prolongamento único e grande que aparece no
soma. É responsável pela condução do impulso nervoso para o próximo
neurônio, podendo ser revestido ou não por mielina (bainha axonial);
 o envoltório do axônio é a Bainha de Mielina (lipídeos e proteínas), serve
para aumentar a velocidade da condução do potencial de ação, possui
aparência esbranquiçada porque é rica em uma substância gordurosa;
 os dendritos que são prolongamentos menores em forma de ramificações
(arborizações terminais) que emergem do pericário e do final do axônio, são eles
que levam o impulso nervoso até o corpo celular; sendo, na maioria das vezes,
responsáveis pela comunicação entre os neurônios através das sinapses.
Basicamente, cada neurônio, possui uma região receptiva e outra efetora em
relação à condução da sinalização.

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A sinapse
É a estrutura dos neurônios através da qual ocorrem os processos de comunicação
entre os mesmos, ou seja, onde ocorre a passagem do sinal neural que é a
transmissão sináptica; através de processos eletroquímicos específicos, isso
graças a certas características particulares da sua constituição. O axônio leva os
impulsos para fora do corpo celular, as extremidades de cada axônio chegam até
bem próximo dos dendritos do próximo neurônio, mas não chega a tocá-lo, existe
entre eles intervalos chamados sinapse, a sinapse impede que os neurônios tenham
uma ligação física, mas permite que mediadores químicos passes de um neurônio
a outro. As sinapses são muito diversas em suas formas e outras propriedades:
algumas são inibidoras e algumas, excitadoras; em algumas o transmissor é a
acetilcolina (DeGroot 1994).
Em uma sinapse os neurônios não se tocam, permanecendo um espaço entre eles
denominado fenda sináptica, onde um neurônio pré-sináptico liga-se a um outro
denominado neurônio pós-sináptico. O sinal nervoso (impulso), que vem através do
axônio da célula pré-sináptica chega em sua extremidade e provoca na fenda a
liberação de neurotransmissores depositados em bolsas chamadas de vesículas
sinápticas. Este elemento químico se liga quimicamente a receptores específicos
no neurônio pós-sináptico, dando continuidade à propagação do sinal. Um neurônio
pode receber ou enviar entre 1.000 a 100.000 conexões sinápticas em relação a
outros neurônios, dependendo de seu tipo e localização no sistema nervoso. O
número e a qualidade das sinapses em um neurônio pode variar, entre outros
fatores, pela experiência e aprendizagem, demonstrando a capacidade plástica do
SN.
A neurociência tenta explicar como o cérebro reage aos estímulos sensoriais e
como o indivíduo interage com o meio em que vive, onde manifestam as suas
emoções (BEAR, 2002, p.4). Atividades 13 cognitivas como organizar a sensação
em forma de conhecimento e agir com base em um plano exigem a capacidade de
integrar os diversos aportes sensoriais e de conservar um traço de experiências
sucessivas. Tal capacidade se deve à atividade da rede de neurônios que
constituem o córtex cerebral. O funcionamento e as conexões das estruturas do

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córtex possibilitam prever, imaginar e representar um objeto não percebido naquele
momento e ainda tornam possível o desenvolvimento da linguagem, meio de
expressão e de comunicação, sendo o suporte privilegiado do pensamento.
(CAMBIER, 1988, p. 121).

Neurociência e os estudos sobre o cérebro

A cada ano, muitos estudiosos de diferentes áreas do conhecimento pesquisam e


estudam o funcionamento do cérebro, sua constituição, capacidade e influência
sobre os processos comportamentais e cognitivos do ser humano. Essa área do
conhecimento é compreendida pela Neurociência, ciência que estuda o
funcionamento do cérebro humano e animal (BEAR, 2002, p. 3). A neurociência pode
ser definida como a disciplina que busca explicar o mecanismo usado pelo encéfalo
para controlar as funções mentais superiores e produzir ações (BHATNAGAR, 2002,
p. 1), sendo que a base biológica dessas funções interage com as atividades
celulares e com a mente. O campo de ação da neurociência inclui o estudo das
estruturas anatômicas, das funções celulares e dos processos fisiológicos do
sistema nervoso central e periférico. A neurociência estuda o arcabouço da anatomia
e da fisiologia normais do encéfalo, tornando possível identificar os locais de
anormalidades estruturais e funcionais. Assim a neurociência é indispensável para
que sejam compreendidos os correlatos fisiológicos da fala, linguagem, memória,
atenção, cognição e música.

O estudo do encéfalo, entretanto, é tão antigo como a própria ciência em geral.


Historicamente, das ciências que se devotaram ao estudo do sistema nervoso
resultaram em diferentes disciplinas como a biologia, medicina, psicologia,
fonoaudiologia, física, matemática, química e a música. O desenvolvimento da
neurociência ocorreu quando os cientistas perceberam que a melhor abordagem
para o entendimento da função do encéfalo vinha da interdisciplinariedade na
pesquisa nas diferentes áreas do conhecimento (BEAR, 2002, p. 3). Sabemos que o
encéfalo, a medula espinhal e os nervos do corpo são fundamentais para a vida e
permitem ao homem sentir, mover-se e pensar.

O cérebro é dividido em dois hemisférios, sendo que o hemisfério esquerdo é


responsável pela linguagem, o cálculo, alguns tipos de análise de fatos e conceitos
mais abstratos. Geralmente o hemisfério direito é o dominante nos seres humanos.

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O hemisfério direito tem como função a parte motora, conexões com áreas
responsáveis pelo controle emocional, sensitivo e imaginativo (CARNEIRO, 2001
apud ILARI, 2003). Com relação à percepção auditiva, o hemisfério esquerdo é
responsável pela linguagem verbal, e no hemisfério direito são percebidas a música
e as onomatopeias (CARNEIRO, 2001 apud ILARI, 2003).

A relação entre música e cérebro apresenta uma forte identificação com o binômio
linguagem e cérebro, inclusive nas suas patologias, Afasia e Amusia. A amusia pode
ser definida como a incapacidade de reconhecer músicas ou melodias. As amusias
podem ser classificadas em amusias receptivas, nas quais ocorrem manifestações
como a dificuldade de discriminação dos elementos musicais e a rejeição a estímulos
sonoros. Na amusia expressiva ocorre a dificuldade nas várias modalidades
musicais como cantar, tocar qualquer instrumento musical, além da amnésia musical,
com ocorrência de não reconhecimento de trechos musicais.

A Memória

Memória é a aquisição, formação, conservação e evocação de informações


(IZQUIERDO, 2002, p. 9). A aquisição é também chamada de aprendizagem, pois
só o que foi aprendido pode ser lembrado. A evocação é também chamada de
recordação, lembrança ou recuperação. Só é lembrado o que foi gravado ou
aprendido. Em suma, pode-se dizer que “somos o que recordamos”, e o acervo da
memória faz com que cada um seja único com características bem definidas (ibid.).
A memória está envolvida em todos os aspectos do psiquismo, desde a lembrança
de experiências passadas até o aprendizado de novas informações (MORAES &
LANNA, 2008, p. 86). Através dela, o ser humano registra as ocorrências positivas e
negativas de sua vida, gerando uma resposta comportamental, reorganizando o
psiquismo e modificando os valores pessoais. Na doença de Alzheimer, a memória
é a primeira função cognitiva a ser prejudicada, e no paciente com demência, a
percepção de que a memória está se desvanecendo é algo assustador. Ele se
depara com a própria incapacidade de relembrar fatos ou uma música (MORAES &
LANNA, 2008, p. 86).

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A memória compreende a memória de curto e de longo prazo. Na memória de curto
prazo são incluídas:

1. a memória sensorial, com participação dos órgãos sensoriais como visão, tato
e audição; e
2. a memória de trabalho, com localização anatômica no lobo frontal, que tem a
capacidade de reter por alguns segundos um número limitado de informações.

Na memória de longo prazo, as informações são armazenadas por horas, dias e, às


vezes, anos, possuindo uma capacidade ilimitada de gravar informações. A memória
de longo prazo é subdividida em:

1. memória visual, com características de abstração de teor visual; e


2. a memória verbal, onde ocorrem lembranças de eventos já ocorridos.

Este gradiente temporal é confirmado nos pacientes com doença de Alzheimer, nos
quais a perda ocorre predominantemente nas informações mais recentes e em fases
mais avançadas da doença, quando a memória remota também é comprometida
(MORAES & LANNA, 2008, p. 87).

A Linguagem

A linguagem é a função cognitiva e executiva que permite a comunicação entre as


pessoas. No seu contexto amplo, pode ser considerada uma faculdade humana
(GOLDFELD, 1998, p. 18).

A capacidade de reproduzir por imitação a mensagem percebida constitui uma etapa


decisiva do desenvolvimento da linguagem. Na criança recém-nascida o choro é a
primeira forma de comunicação entre mãe e filho. O controle e execução da
linguagem são exercidos pela região têmporo-parietal esquerda. Os distúrbios de
linguagem recebem o nome de afasia e é grande a ocorrência de sintomas afásicos
na doença de Alzheimer.

A fala pode ser avaliada de forma espontânea ou através da compreensão desta. A


dificuldade de fala espontânea é denominada ‘’afasia de Broca” e o da compreensão
da fala de “afasia de Wernicke”. As principais alterações de linguagem nas
demências são a anomia, na qual ocorre a dificuldade de nomeação; as parafasias,
onde ocorre a substituição de palavras; a disfluência da fala; a anosognosia, falta de

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consciência do problema cognitivo; dislexia, na qual ocorre o distúrbio da leitura e
escrita; repetição de palavras ou frases, ecolalia, caracterizada pela repetição de
sons ou palavras sem motivo aparente; mutismo, ou ausência de linguagem oral
(MORAES, 2008).

A Função executiva

A função executiva compreende a habilidade necessária para a execução de um


determinado objetivo levando o indivíduo à capacidade de abstração, seleção de
estratégias e desempenho de atividades mais complexas (MORAES & LANNA,
2008, p. 88). Relaciona-se também ao pensamento, atenção, memória e ao resgate
de informações armazenadas. O córtex pré-frontal é o responsável pelo controle da
função executiva. O comprometimento desta região pode levar a uma disfluência da
fala e à redução da atenção. A lesão de lobo frontal pode levar a um
comprometimento e alteração de comportamentos, levando à agressividade, alegria
em excesso, impulsividade, hipersexualidade, falha no julgamento, labilidade
emocional, redução da motivação, depressão, apatia e diminuição da
espontaneidade. O 20 grau de lesão pode levar a casos mais avançados como o
mutismo e a apatia profunda (MORAES & LANNA, 2008, p. 88).

A Praxia

Praxia é a capacidade de formular, coordenar ou mesmo sequenciar atos motores


com um objetivo determinado. O lobo parietal do hemisfério dominante é o
responsável direto por esta função. A apraxia é o distúrbio mais comum no déficit da
praxia. Existem dois tipos de apraxia, a ideomotora, na qual ocorre a dificuldade de
transformar uma dada ideia em ação, e a ideatória, na qual há uma dificuldade de
realização de ações que dependem de um objeto, como por exemplo, vestir-se,
acender um cigarro, cozinhar, entre outras.

As apraxias podem ser avaliadas através de ordens, imitações e uso fictício ou real
de objetos (MORAES & LANNA, 2008, p. 89). No exame clínico, a avaliação da
apraxia pode ser realizada através de manobras relacionadas à:

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1. utilização e manejo de objetos (beber em um copo, usar um pente ou
usar uma chave);
2. gestos simbólicos (bater continência, jogar um beijo ou implorar com
as mãos);
3. gestos sem sentido e repetição (palma da mão direita sobre o olho
direito e mão direita na orelha esquerda);
4. escrita espontânea e depois ditada; e 5) desenho espontâneo e depois
copiado (CAMBIER, 1988, p. 139).

Ainda com relação às apraxias, existe a relação com a organização do gesto


propositado, onde são utilizados mecanismos complexos do controle dos
movimentos. O gesto ou a atividade gestual têm grande relevância no processo
cognitivo, permitindo a manipulação ou exploração de coisas ou objetos. Em um grau
superior de abstração, as atividades gráficas e a representação simbólica do espaço
sustentam uma representação conceitual das relações espaciais; são as atividades
espaciais construtivas.

Manipulação, atividade gestual simbólica e atividade espacial construtiva são as


etapas que podem ser acompanhadas no desenvolvimento da praxia do ser humano.
Cada um dos momentos evolutivos, conhecimento dos objetos, conhecimento do
corpo e conhecimento do espaço, encontram-se ligados à maturação do gesto. Em
todas as funções, o gesto elementar tem seu lugar em uma cadeia ordenada de uma
ação. O desenrolar satisfatório de uma ação faz intervir em todo o encéfalo. Os
dispositivos corticais do lobo parietal sustentam, 21 a cada momento, a integração
dos dados perceptivos sensoriais e visuais, conservam os esquemas perceptivo-
motores provenientes de experiências motoras anteriores. O lobo frontal impede as
estereotipias, mantendo a intenção de realizar o movimento motor.

A Gnosia

A gnosia é a capacidade de reconhecer estímulos externos. A dificuldade de


reconhecimento é denominada de Agnosia, caracterizando-se por dificuldades de
perceber estímulos de ordem visual, auditiva ou tátil sem comprometimento dos
órgãos sensoriais. A agnosia visual é a mais comum, onde o paciente não reconhece
mais cores, letras e objetos. Esta tem íntima ligação com a associação semântica e
traz efeitos sobre a linguagem (CAMBIER, 1988, p. 140). Por ser mais incidente,

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merece menção a descrição do exame das funções cognitivas visuais. O exame
pode avaliar as formas através de imagens e objetos simples, desenhos sobrepostos
figuras geométricas e classificação de objetos por categoria. Acrescenta-se ainda a
avaliação de símbolos gráficos, como letras, palavras e algarismos e de álbum de
fotografias de familiares, fotografia de celebridades e personalidades e avaliação de
percepção espacial e avaliação de cores, nomeação e emparelhamento de cores
idênticas.

O conhecimento do corpo como um espaço definido é denominado somatognosia. O


conhecimento orientado do espaço extracorporal e o conhecimento dos objetos
como entidades diferenciadas são aquisições psicológicas submetidas ao
desenvolvimento em função da experiência e da educação de cada um (CAMBIER,
1988, p. 142). Conhecer é poder reconhecer e poder confrontar toda experiência
perceptiva ao conjunto de experiências anteriores. A psicologia e a genética
valorizaram a natureza sensório-motora dos esquemas sobre os quais repousa essa
confrontação. É neles que se baseiam as convergências multisensoriais visuo-
somestésicas, auditivas e até olfativas que sustentam o suporte cognitivo necessário
para o desenvolvimento humano (CAMBIER, 1988, p 142).

Função visuoespacial

A função visuoespacial está relacionada à localização espacial. A área


anatomicamente relacionada a esta é a região parieto-occipital do cérebro, que tem
relação com todas as funções cognitivas Seu comprometimento pode levar à
desorientação espacial, levando à perda dentro de trajetos já conhecidos, como
dentro da própria residência, dificuldade com direções ou sentidos como direita e
esquerda, perda do esquema corporal e dificuldades geográficas como localização
em mapas.

A perda da função visuo-espacial pode ser diagnosticada quando se apresenta um


objeto qualquer ao paciente, um objeto de valor sentimental, por exemplo, mas ele
não é reconhecido imediatamente, mas após a sua manipulação há a possibilidade
do reconhecimento pelo idoso. Na maioria das vezes o paciente está em um
determinado local, mas acredita estar em uma casa ou cidade onde morou há muitos

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anos, perde-se com frequência, levando-o, muitas vezes, à irritação, impaciência e
agressividade.

A MÚSICA E O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA

A presença da música na vida dos seres humanos é incontestável. Ela tem


acompanhado a história da humanidade, ao longo dos tempos, exercendo as
mais diferentes funções. Está presente em todas as regiões do globo, em todas
as culturas, em todas as épocas: ou seja, a música é uma linguagem universal,
que ultrapassa as barreiras do tempo e do espaço.

Entretanto, a forma pela qual a música, como linguagem, acontece no seio dos
diferentes grupos sociais é bastante diversificada. A música que é vivenciada em
uma cerimônia do Quarup, no Parque do Xingu, por exemplo, tem um caráter
bastante diverso da música que colocamos para tocarno nosso carro; o mantra
entoado em um templo budista, por sua vez, não apresenta a mesma função de
um canto de lavadeiras do Rio São Francisco. Apesar dessas diferentes funções,
em todas essas situações e em muitas outras, a música acompanha os seres
humanos em praticamente todos os momentos de sua trajetória neste planeta. E,
particularmente nos tempos atuais, deve ser vista como uma das mais
importantes formas de comunicação: segundo o pedagogo Snyders (1992),
nunca uma geração viveu tão intensamente a música como as atuais.

É exatamente para falarmos de uma das facetas dessa intensa relação que trata
o texto. Será abordada, particularmente, a relação que se dá entre a música,
entendida como prática e vivência, e o desenvolvimento da criança.
Inicialmente é preciso esclarecer nosso conceito de desenvolvimento.
Desenvolvimento, segundo o dicionário Houaiss, é um termo que apresenta
muitas acepções. Escolhemos algumas delas: “aumento de qualidades morais,
psicológicas, intelectuais etc”, “crescimento, progresso, adiantamento”
(HOUAISS, 2002, p. 989). No entanto, há uma tendência, em nossa civilização,
de se concentrar a ideia de desenvolvimento da criança nos aspectos cognitivos,
isto é, no que diz respeito ao aprendizado intelectual. É uma tendência natural
em uma civilização tão competitiva e tecnicista. Em função disso, muito se tem
falado a respeito do papel da música na melhoria do rendimento acadêmico de
estudantes.

18
Nossa opção, contudo, vai pela contramão desta tendência. Entendemos que o
processo de crescimento de uma criança está muito além apenas de seus
aspectos físicos ou intelectuais; esse processo envolve outras questões,
certamente tão complexas quanto às da maturação biológica. Dessa forma,
optamos por trabalhar a ideia de desenvolvimento infantil a partir de uma
abordagem mais ampla, abarcando também seus aspectos de amadurecimento
afetivo e social, sem deixar de lado, obviamente, o aspecto cognitivo.

É importante fazer uma ressalva que toda criança está imersa em um caldo
cultural, que é formado não só pela sua família, mas também por todo o grupo
social no qual ela cresce. Nesse sentido, a forma como a música influencia o
desenvolvimento de uma criança carajá, por exemplo, é muito diferente da forma
como isso se dá com uma criança branca; da mesma forma, uma criança de
classe média alta, que frequenta ambientes nos quais a música é praticada de
forma intensa, apresenta características bem diversas de uma criança que se vê
vítima da exploração do trabalho infantil.

Obviamente nosso foco não será o de uma criança especial, de algum grupo
social específico. Nossas observações levarão em consideração as pesquisas
feitas na área que, na sua grande maioria tiverem como sujeitos crianças
ocidentais, escolarizadas, de inteligência dita normal. Ainda que não
concordemos com a ideia de um modelo de criança universal, entendemos que
estas pesquisas, guardadas as devidas proporções, podem nos elucidar em
muitos aspectos.
Nesse sentido, entendemos que as reflexões a serem apresentadas neste artigo,
a partir de um referencial específico, podem nos auxiliar a compreendermos
melhor a relação criança-música-desenvolvimento, ressaltando que as
particularidades de cada grupo social merecem ser investigadas com afinco, em
outros momentos, por outros autores.

19
1.1 - A música e o desenvolvimento cognitivo da criança

Inúmeras pesquisas, desenvolvidas em diferentes países e em diferentes


épocas, particularmente nas décadas finais do século XX, confirmam que a
influência da música no desenvolvimento da criança é incontestável. Algumas
delas demonstraram que o bebê, ainda no útero materno, desenvolve reações a
estímulos sonoros.

Schlaug, da Escola de Medicina de Harvard (EUA), e Gaser, da Universidade de


Jena (Alemanha), revelaram que, ao comparar cérebros de músicos e não
músicos, os do primeiro grupo apresentavam maior quantidade de massa
cinzenta, particularmente nas regiões responsáveis pela audição, visão e controle
motor (apud SHARON, 2000). Segundo esses autores, tocar um instrumento
exige muito da audição e da motricidade fina das pessoas. O que estes autores
perceberam, e vem ao encontro de muitos outros estudos e experimentos, é que
a prática musical faz com que o cérebro funcione “em rede”: o indivíduo, ao ler
determinado sinal na partitura, necessita passar essa informação (visual) ao
cérebro; este, por sua vez, transmitirá à mão o movimento necessário (tato); ao
final disso, o ouvido acusará se o movimento feito foi o correto (audição). Além
disso, os instrumentistas apresentam muito mais coordenação na mão não
dominante do que pessoas comuns. Segundo Gaser, o efeito do treinamento
musical no cérebro é semelhante ao da prática de um esporte nos músculos. Será
por isso que Platão já afirmava, há tantos séculos, que a música é a ginástica da
alma?

Outros estudos apontam também que, mesmo se o contato com a música for
feito por apreciação, isto é, não tocando um instrumento, mas simplesmente
ouvindo com atenção e propriedade (percebendo as nuances, entendendo a
forma da composição), os estímulos cerebrais também são bastante intensos.
Ao mesmo tempo que a música possibilita essa diversidade de estímulos, ela,
por seu caráter relaxante, pode estimular a absorção de informações, isto é, a
aprendizagem. Losavov, cientista búlgaro, desenvolveu uma pesquisa na qual
observou grupos de crianças em situação de aprendizagem, e a um deles foi
oferecida música clássica, em andamento lento, enquanto estavam tendo aulas.
O resultado foi uma grande diferença, favorável ao grupo que ouviu música. A

20
explicação do pesquisador é que ouvindo música clássica, lenta, a pessoa passa
do nível alfa (alerta) para o nível beta (relaxados, mas atentos); baixando a
ciclagem cerebral, aumentam as atividades dos neurônios e as sinapses tornam-
se mais rápidas, facilitando a concentração e a aprendizagem (apud
OSTRANDER e SCHOEDER, 1978).

Outra linha de estudos aponta a proximidade entre a música e o raciocínio


lógicomatemático. Segundo Schaw, Irvine e Rauscher (apud CAVALCANTE,
2004) pesquisadores da Universidade de Wisconsin, alunos que receberam aulas
de música apresentavam resultados de 15 a 41% superiores em testes de
proporções e frações do que os de outras crianças. Em outra investigação, Schaw
verificou que alunos de 2a. série que faziam aulas de piano duas vezes por
semana, apresentaram desempenho superior em matemática aos alunos de 4 ª
série que não estudavam música.

Enfim, o que se pode concluir a esse respeito é que efetivamente a prática de


música, seja pelo aprendizado de um instrumento, seja pela apreciação ativa,
potencializa a aprendizagem cognitiva, particularmente no campo do raciocínio
lógico, da memória, do espaço e do raciocínio abstrato.

1.2 - A música e o desenvolvimento afetivo

Um outro campo de desenvolvimento é o que lida com a afetividade humana.


Muitas vezes menosprezado por nossa sociedade tecnicista, é nele que os efeitos
da prática musical se mostram mais claros, independendo de pesquisas e
experimentos. Todos nós que lidamos com crianças percebemos isso. O que tem
mudado é que agora estes efeitos têm sido estudados cientificamente também.
Em pesquisa realizada na Universidade de Toronto, Sandra Trehub (apud
CAVALCANTE, 2004) comprovou algo que muitos pais e educadores já
imaginavam: os bebês tendem a permanecer mais calmos quando expostos a
uma melodia serena e, dependendo da aceleração do andamento da música,
ficam mais alertas.

21
Nossas avós também já sabiam que colocar um bebê do lado esquerdo, junto ao
peito, o deixa mais calmo. A explicação científica é que nessa posição ele sente
as batidas do coração de quem o está segurando, o que remete ao que ele ouvia
ainda no útero, isto é, o coração da mãe. Além disso, a eficácia das canções de
ninar é prova de que música e afeto se unem em uma mágica alquimia para a
criança. Muitas vezes, mesmo já adultos, nossas melhores lembranças de
situação de acolhimento e carinho dizem respeito às nossas memórias musicais.
Já presenciamos vivências em grupos de professores que, a princípio, não
apresentavam memórias de sua primeira infância. Ao ouvirem certos acalantos,
contudo, emocionaram-se e passaram a relatar situações acontecidas há muito
tempo, depois confirmadas por suas mães.

Por todas essas razões, a linguagem musical tem sido apontada como uma das
áreas de conhecimentos mais importantes a serem trabalhadas na Educação
Infantil, ao lado da linguagem oral e escrita, do movimento, das artes visuais, da
matemática e das ciências humanas e naturais. Em países com mais tradição
que o Brasil no campo da educação da criança pequena, a música recebe
destaque nos currículos, como é o caso do Japão e dos países nórdicos. Nesses
países, o educador tem, na sua graduação profissional, um espaço considerável
dedicado à sua formação musical, inclusive com a prática de um instrumento,
além do aprendizado de um grande número de canções. Este é, por sinal, um
grande entrave para nós: o espaço destinado à música em grande parte dos
currículos de formação de professores é ainda incipiente, quando existe. É
preciso investir significativamente na formação estética (e musical,
particularmente) de nossos professores, se realmente quisermos obter melhores
resultados na educação básica.

Ainda abordando os efeitos da música no campo afetivo, estudos recentes


ampliam ainda mais nosso conhecimento a respeito. Zatorre, da Universidade de
McGill (Canadá) e Blood, do Massachusetts General Hospital (EUA),
desenvolveram uma pesquisa que buscou analisar os efeitos no cérebro de
pessoas que ouviam músicas, as quais segundo as mesmas lhes causavam
profunda emoção. Verificou-se que ao ouvir estas músicas, as pessoas
acionaram exatamente as mesmas partes do cérebro que têm relação com

22
estados de euforia. Segundo esses autores, isso confere à música uma grande
relevância biológica, relacionando-a aos circuitos cerebrais ligados ao prazer
(2001).

Há também inúmeras experiências na área de saúde, trabalhos em hospitais que


utilizam a música como elemento fundamental para o controle da ansiedade dos
pacientes. A origem deste trabalho remonta à 2a. Guerra Mundial, quando
músicos foram contratados para auxiliar na recuperação de veteranos de guerra
por hospitais norteamericanos. Pode-se afirmar que esse foi um grande impulso
para a área de musicoterapia, hoje com reconhecimento acadêmico consolidado.
É cada vez mais comum a presença da música nestes locais, seja para diminuir
a sensação de dor em pacientes depois de uma cirurgia, junto a mulheres em
trabalho de parto (para estimular as contrações) ou na estimulação de pacientes
com dano cerebral. Nesse sentido, não é exagero afirmar que os efeitos da
música sobre os sentimentos humanos estão, cada vez mais, migrando da
sabedoria popular para o reconhecimento científico.

1.3 - A música e o desenvolvimento social da criança

A música também traz efeitos muito significativos no campo da maturação social


da criança. É por meio do repertório musical que nos iniciamos como membros
de determinado grupo social. Por exemplo: os acalantos ouvidos por um bebê no
Brasil não são os mesmos ouvidos por um bebê nascido na Islândia; da mesma
forma, as brincadeiras, as adivinhas, as canções, as parlendas que dizem
respeito à nossa realidade nos inserem na nossa cultura.

Além disso, a música também é importante do ponto de vista da maturação


individual, isto é, do aprendizado das regras sociais por parte da criança. Quando
uma criança brinca de roda, por exemplo, ela tem a oportunidade de vivenciar, de
forma lúdica, situações de perda, de escolha, de decepção, de dúvida, de
afirmação. Fanny Abramovich, em memorável artigo, afirma:
Ò ciranda – cirandinha, vamos todos cirandar, uma volta, meia volta, volta e meia
vamos dar, quem não se lembra de quando era pequenino, de ter dados as mãos

23
pra muitas outras crianças, ter formado uma imensa roda e ter brincado, cantado
e dançado por horas? Quem pode esquecer a hora do recreio na escola, do
chamado da turma da rua ou do prédio, pra cantarolar a Teresinha de Jesus,
aquela que de uma queda foi ao chão e que acudiram três cavalheiros, todos eles
com chapéu na mão? E a briga pra saber quem seria o pai, o irmão e o terceiro,
aquele pra quem a disputada e amada Teresinha daria, afinal, a sua mão? E
aquela emoção gostosa, aquele arrepio que dava em todos, quando no centro da
roda, a menina cantava: “sozinha eu não fico, nem hei de ficar, porque quero o
...(Sérgio? Paulo? Fernando? Alfredo?) para ser meu par”. E aí, apontando o
eleito, ele vinha ao meio pra dançar junto com aquela que o havia escolhido...
Quanta declaração de amor, quanto ciuminho, quanta inveja, passava na cabeça
de todos. (1985, p. 59).

Essas cantigas e muitas outras que nos foram transmitidas oralmente, através
de inúmeras gerações, são formas inteligentes que a sabedoria humana inventou
para nos prepararmos para a vida adulta. Tratam de temas tão complexos e
belos, falam de amor, de disputa, de trabalho, de tristezas e de tudo que a criança
enfrentará no futuro, queiram seus pais ou não. São experiências de vida que
nem o mais sofisticado brinquedo eletrônico pode proporcionar.

Mais tarde, já às voltas com as dores e as delícias do adolescer, ainda uma vez
a música tem papel de destaque. Sem sombra de dúvida, a música é uma das
formas de comunicação mais presente na vida dos jovens. Inúmeras vezes, é por
meio da canção que temáticas importantes na inserção social desse jovem, não
mais como criança, mas agora como preparação para a vida adulta, lhe são
apresentadas. Como exemplo, temos os videoclipes que apresentam a jovens de
classe média a dura realidade do racismo, da vida nas periferias urbanas e que
podem ser utilizados por pais e educadores como forma de estabelecer um
diálogo, uma porta para a construção da consciência cívica.

Os pais e adultos podem se incumbir da educação de crianças, no tange à sua


formação musical, iniciando do útero. Como já foi dito, fetos reagem a estímulos
sonoros externos e, portanto, deve ser benéfico que a mãe possa, ela mesma,
desenvolver atividades musicais. Se você teve a oportunidade de aprender um
instrumento musical, pratique-o muito durante a gravidez. Caso não seja esse o

24
seu caso, cante bastante, pois esse instrumento, a voz, está bem aí ao seu
alcance, por isso utilize-o, entre para um coral, aprenda cantigas de ninar, cante
no banheiro!

Além de cantar, ouça também boa música. Aproveite esse período para
ficar a par de boas produções musicais para criança. Muitos pais reclamam, com
razão, do lixo musical que infesta os grandes meios de comunicação. Contudo,
há um razoável número de CDs de boa qualidade, voltado para o público infantil,
como por exemplo, toda a obra de Bia Bedran, a Coleção Palavra Cantada, entre
outros. Vale a pena buscar aqueles discos de vinil que fizeram sua alegria quando
pequena (Saltimbancos, Arca de Noé, Coleção Disquinho). Se você se dispuser
a formar um pequeno acervo, não se preocupe com o lixo que seu filho ouvirá lá
fora, oferecendo outras alternativas, dentro de casa, certamente ele terá meios
para uma escolha mais crítica.

Mais tarde, depois do nascimento, faça dos momentos junto ao bebê


momentos de puro prazer: cante enquanto lhe dá banho, faça brincadeiras
ritmadas na troca de fralda, toque seu corpo ao ritmo da canção. E,
principalmente, não abra mão das cantigas de ninar. Esqueça a conversa de que
isso “põe a criança mimada”: atualmente, pediatras são unânimes em estimular
esse contato. Lembre-se: criança quieta, que dorme sozinha, que não reclama
companhia, nem sempre é sinônimo de criança feliz. Muitas vezes, o bebê super
independente de agora, poderá vir a ser o adulto carente de amanhã.

Caso você sinta necessidade, procure serviços especializados na


musicalização de bebês. Busque informações sobre os profissionais envolvidos,
assista a algumas aulas, certifique-se do tipo de trabalho desenvolvido. Mas
lembre-se: não busque por aceleração de aprendizagem, pela formação precoce
de virtuoses. Tenha em foco apenas a possibilidade de momentos prazerosos e
estimulantes para seu bebê. Todo o resto, que poderá vir a acontecer ou não,
será lucro.
Mais tarde, por volta dos quatro, cinco anos, é comum os pais se
perguntarem se não estará na hora de aprender um instrumento. É importante

25
saber que o processo de musicalização deve anteceder o aprendizado de um
instrumento específico. Em geral, as boas escolas de música desenvolvem um
trabalho anterior, de vivência e sensibilização musical, para depois, quando a
criança já se encontra alfabetizada, iniciar as aulas de instrumento e de leitura
musical. Se esse for o seu interesse, vá em frente; caso não o seja, insista para
que na escola de seu filho a música tenha espaço no currículo. Esse espaço não
significa necessariamente uma aula específica de música: no caso da educação
infantil, essa fragmentação do trabalho pedagógico nem é a mais indicada pelas
tendências educativas mais sólidas. Esse espaço pode ser concretizado mesmo
nas atividades de rotina, no repertório utilizado, nas brincadeiras musicais, na
frequência a eventos promovidos pela escola. Por outro lado, a presença de um
professor especialista, um licenciado em música, pode potencializar um trabalho
de qualidade, na parceria com os demais educadores: o importante é que esse
trabalho não seja artificial, isolado do projeto pedagógico como um todo.

Por fim, dois lembretes:


1) todas essas atividades e preocupações, desde os embalos para ninar
até a verificação do trabalho musical da escola são da responsabilidade de mães
e pais, sem exceção;

2) não descuide do repertório. Isso pode parecer difícil, mas tente utilizar
a mesma tática da boa alimentação: um fast food, de vez em quando, não faz mal
a ninguém, desde que a nutrição básica seja feita por meio de uma dieta
balanceada, rica em verduras, frutas, cereais e proteínas. Da mesma forma, os
malefícios de se ouvir música descartável na TV podem ser minimizados se, em
casa, você “nutrir” os ouvidos e cérebros de seus filhos com música rica,
estimulante e de boa qualidade.

Nota
1Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo – USP. Profª.
Adjunta da Faculdade de Educação da UFG.

26
2 - Cognição e Música (ADAPTADO)

A educação musical adequada e planejada auxilia na compreensão dos aspectos


da nossa língua, de nossos costumes, de nossa história e de nossa realidade
nacional, facilitando assim a formação do sentimento de cidadania, o
enriquecimento de nossa cultura popular e, principalmente a importância de seu
papel na sociedade. O enfoque é nas crianças que estão no ensino infantil, pré-
escola e ensino fundamental. Esta área já vem sendo estudada há alguns anos
e suas evidências correspondem ao período em que ocorrem mudanças muito
importantes nas funções psicológicas da criança. Esta reflexão nos mostra que
a educação musical pode contribuir para promover esse desenvolvimento por
meio do ensino pedagógico musical. Introdução

A linguagem musical tem extrema importância pelo fato de promover o


desenvolvimento do ser humano. É um modo de interdependência entre o corpo
e a mente, entre a razão e a sensibilidade, entre a ciência e a estética, para
promover a liberdade na criação e realização de sua própria ação. Portanto,
educar por meio das linguagens artísticas, teatro, dança e entre elas a música,
não é só um desafio, mas a aspiração de conscientização política e social.

A educação musical já esteve ausente mais ou menos trinta anos dos


currículos escolares. O que não exige a formação de profissionais na área de
música, licenciatura. Sendo assim, a música se torna um campo fechado. As
escolas que por ventura venham a trabalhar com o ensino pedagógico musical
são obrigadas a elaborar seu próprio plano de ensino. O maior desafio, contudo
está na formação de futuros profissionais e programas adequados para não
fragilizar o papel essencial e humanizador que a música propicia, em meio a
“nomes, números e datas”, favorecendo o conhecimento, a criatividade e a
expressão musical (KAETER, 2008, p.2).

Neste sentido, um dos aspectos fundamentais no aprendizado da música


é entender que é uma forma de representação das visões de mundo, das
maneiras de interpretar a realidade por meio de sons e silêncios.

27
Segundo Vigotski (1991), o desenvolvimento de funções psíquicas
acionadas pela educação musical, está em estreita relação com as condições
histórico- culturais nas quais o sujeito está inserido. Nessa reflexão pretende-se
estabelecer relações entre os processos de aprendizagem e desenvolvimento tal
como definem alguns autores, a linguagem musical como uma prática
pedagógica capaz de contribuir para o desenvolvimento de funções psíquicas em
crianças, aprimorando as qualidades humanas historicamente produzidas.

2.1 Conceito da Música e a Inteligência Humana

A educação musical exige um trabalho complexo quando envolve


formação de grupos e isto é muito comum em quase todas as atividades musicais:
corais, banda, teatro, rodas e brinquedos cantados.

Deve-se sempre preservar a expressividade de cada elemento envolvido


no trabalho e muitas vezes se torna difícil conciliar posturas diferentes. O
educador deve estar atento a todas as formas de expressão escolhidas pelas
crianças valorizando-as.

Fontes superiores, conforme explica Vigotski (1991) são assim


denominadas, porque se referem a mecanismos intencionais, ações conscientes
controladas, processos voluntários que nos dão à possibilidade de independência
em relação a circunstâncias do momento e espaço presente, tem sua origem nas
relações sociais que o indivíduo estabelece com o mundo.

O processo de humanização está ligado às relações de trabalho e ao


próprio trabalho (ação com instrumentos para modificar a natureza). As ações de
transformação da natureza, e consequentemente do próprio homem, promovem
a constituição de novas funções psíquicas. Assim, por meio do trabalho, as
funções psicológicas humanas, de elementares transformaram-se em funções
capazes de diferenciar o homem dos outros animais. Leontiev (1978) “o trabalho
é, portanto, desde a origem, um processo mediatizado simultaneamente pelo
instrumento (em sentido pleno) e pela sociedade” (LEONTIEV, 1978, p. 74).

Dessa forma não há apenas uma relação do homem com a natureza, mas
também, para a efetivação desse trabalho, uma interação com outros homens.
As atividades musicais contribuem para que o educando aprenda a viver na

28
sociedade, abrangendo aspectos comportamentais como: disciplina, respeito,
gentilezas e polidez.

Esclarecendo, é pelo processo de desenvolvimento profundamente


enraizado nas relações entre a história sócio-cultural e a história individual que
ocorre a formação humana. Portanto, a memória, a percepção e o pensamento
infantil, dentre outras funções, compõem o psiquismo humano, e diferenciam o
homem dos demais animais, pela intencionalidade de suas ações. Essa
perspectiva teórica leva em consideração que essas capacidades mentais
tipicamente humanas são constituídas no decorrer de interações mediadas por
signos (neste caso linguagem musical), e instrumentos físicos entre o indivíduo e
o meio social. O ser humano encontra-se em uma ambiência que pode favorecer
ou não seu desenvolvimento.

O cérebro humano possui uma base fisiológica neuronal, um bebê ao


nascer dispõe de todas as células nervosas, mas necessita de sinapse, isto é,
conexões entre os neurônios para que ocorra o seu desenvolvimento psíquico,
físico e vital. Para que isto ocorra, o seu cérebro precisa de um ambiente
estimulante, uma vez ao inserir-se num mundo de linguagem cultural, a crianças
necessita da presença do adulto para sua sobrevivência, aprendizagem e
desenvolvimento.

Esses autores percebem que a criança não nasce com seu


desenvolvimento predeterminado, ao contrário, a exposição à cultura e à língua
específica determina a sua forma de perceber o mundo e a si mesmo. Nesse
contexto como a música parte da cultura sócio histórica do homem, pode
contribuir para o desenvolvimento da criança.

A música se faz presente na história da humanidade. Ao nascer a criança


entra em contato com o universo sonoro que a cerca. Sua relação com a música
pode ocorrer, por exemplo, por intermédio do acalanto da mãe ou aparelhos
sonoros, sons da natureza e outros sons produzidos em seu cotidiano. Sendo
assim a música dialoga com a constituição interna do ser humano. A criança

29
estabelece suas primeiras relações com o mundo sociocultural por meio dos
sentidos e dos laços afetivos.

Alguns estudos afirmam que o contato da criança com a música ocorrer


até antes de seu nascimento, este contato pode ser sentido até mesmo dentro do
útero da mãe, ao ouvir os batimentos cardíacos, este contato estimula a
percepção do ritmo. Deste modo iniciamos nosso contato musical desde quando
nos encontramos no útero materno e o estendemos por toda a vida, na medida
em que nos apropriamos de práticas sociais e tradições culturais historicamente
produzidas pela humanidade.

Justificando a linguagem musical como recurso para o desenvolvimento


psíquico de crianças da educação infantil, visto que a mesma garante que
desenvolvam-se determinadas funções psíquicas ao se apropriarem do
conhecimento veiculado em produções culturais da humanidade, em um
processo educativo do qual participam de forma integral.

2.2 A Música como uma Linguagem

Alguns estudos investigaram as relações causais entre o aprendizado da


música e o aprendizado da linguagem. Cutietta (1996) revisou a literatura e
encontrou uma relação estreita entre o aprendizado das duas formas de
comunicação humana por sons. Nos estudos revisados, os alunos musicalizados
mostraram um desempenho superior ao de seus colegas não-musicalizados em
tarefas de percepção e de articulação da fala. Outro estudo (THOMPSON,
SSCHELLENBERG e HUSAIN, 2003) sugeriu que os músicos possuem uma
habilidade superior aos não-músicos na percepção da prosódia na fala tanto em
frases faladas como em frases musicais análogas. Segundo os pesquisadores,
tal habilidade se estende à interpretação do conteúdo emocional, que é
transmitido através da prosódia contida tanto na fala quanto na música. Além
disso, Cutietta (1996a) sugere que há uma possível relação entre a aprendizagem
musical e o aprendizado de línguas estrangeiras. No entanto, apesar de a música
e a linguagem aparentarem ter relações muito próximas, todo cuidado é pouco
no estabelecimento de relações causais entre elas já que não há garantias de
que haverá, necessariamente, transferência cognitiva de uma área para a outra.

30
A musicalização favorece sobremodo a oralidade, uma vez que a música
é primordialmente oralidade. Convivendo com as crianças é notável que no início
das atividades elas só observavam as canções e aos poucos acompanhavam o
ritmo e cantavam os finais das frases, isto na pré-escola. Elas fazem registros
musicais na sua memória, a princípio apenas vocaliza, canta e aos poucos vão
aumentando seu repertório de palavras, desenvolvendo sua capacidade de
expressão, ao imitar gestos e ações. A linguagem faz com que pensamentos e
emoções de uma pessoa possam habitar a outra.

Como professora na área de musicalização infantil eu suponho que a


música reorganiza todos os processos mentais da criança. A palavra passa a ser
assumida como um fator excepcional que dá forma à atividade mental aperfeiçoa
o reflexo da realidade e cria novas formas de memória, de imaginação, de
pensamento e de ação. Desse modo, o ser humano constitui-se não só um
produto do seu meio, mas agente ativo nessa ambiente. Assim o desenvolvimento
da linguagem é fator essencial para seu desenvolvimento psicointelectual.

A linguagem musical guarda em si, e, portanto, permite comunicar aos


outros, o conhecimento, os valores, os sentimentos e o modo de pensar dos
homens de diferentes épocas distintas. Por essa razão, ela faz mediação entre o
individual e o social, em um processo em que ambos se modificam.

É possível afirmar depois de ler livros e pesquisas que a música ajuda a


desenvolver a capacidade de concentração imediata, de persistência e de dar
resposta à constante variedade de estímulos, e assim, facilita a aprendizagem ao
manter em atividade os neurônios cerebrais.

2.3 O Aprendizado Musical e a Leitura

O interesse pelos efeitos da música no desenvolvimento cognitivo nos


últimos anos, trouxe à tona a questão dos efeitos da educação musical em uma
área fundamental: a alfabetização. Embora existam poucos estudos, os
resultados apresentados até o momento são bastante sólidos. Um estudo recente
conduzido por Anvari e colegas (2002) sugeriu que a percepção musical tem uma

31
relação estreita com o desenvolvimento da leitura e com a consciência fonológica
(isto é, a habilidade que o ouvinte tem de segmentar a fala em unidades menores
e ainda assim reconhecê-las independentemente de variações em altura, tempo,
timbre e contexto). Outros estudos revisados anteriormente por Cutietta (1995)
sugerem uma forte correlação entre a educação musical e o rendimento de leitura
em alunos com idade variável entre 5 e 19 anos. Em conjunto, estes estudos
sugerem que o aprendizado musical pode ser útil para o desenvolvimento da
leitura. Porém, é importante frisar novamente que, até o presente, não foram
encontradas relações causais entre os dois aprendizados. Os estudos
resenhados sugerem que as crianças musicalizadas podem aprender a ler mais
depressa, mas novos estudos ainda são necessários para determinarmos se há,
de fato, uma transferência cognitiva generalizada, de uma área de conhecimento
para a outra.

A linguagem musical estimula a memória verbal e escrita, visto que uma


canção pode ser o relatório de uma leitura, e as notas ensejam o mesmo
significado das palavras. Amplia seu repertório de palavras e a sua visão de
mundo, não com repetições monótonas, mas com conhecimento que fazem parte
de sua vida e por meio da apropriação de bens culturais produzidos socialmente.
Leontiev (1978) deixa bem claro que memorizamos melhor o que tem significado
importante para a nossa vida, e também aquilo que está associado aos nossos
interesses e necessidades.

Este mesmo autor sugere que a atenção e a percepção são funções


fundamentais, que se encontram na base do desenvolvimento das demais
capacidades de modo que o raciocínio, a memória e a imaginação, não se
estabelecem e não operam sem essa participação efetiva.

Há também outro fator de grande importância na educação infantil, a


escuta. Escutar é perceber e entender os sons por meio do sentido da audição,
ou seja, detalhar e tomar consciência do ato sonoro.

Enfim, nesse pequeno estudo, compreendemos que as crianças ao se


apropriar da linguagem, fica apta a organizar sua percepção e memória, e é capaz
de tirar conclusões a partir das suas próprias observações e fazer deduções e,
assim, conquistar todas as potencialidades do pensamento. Ao nomear algo, ela

32
estará analisando e passando a usar palavras para designar e resolver problemas
relacionados ao seu mundo, por intermédio de experiências de todo o gênero
humano.

Com base na concepção de que o desenvolvimento da linguagem oral e


escrita bem como da musical é resultado do processo de educação, e, por
acreditar que a música é um dos meios mais adequados para essa mediação de
ensino. Neste estudo me baseei na minha experiência como professora de
musicalização infantil com crianças de 0 há 10 anos submetidas ao ensino de
musicalização em aulas semanais de uma hora por dia. Um dos motivos que me
levaram a fazer psicologia foi a curiosidade em saber o quanto a musica contribui
para o desenvolvimento psíquico não só das crianças mas também de
adolescentes, jovens, adultos e idosos.

A musicalização deve ser vista como uma educação em si, e não, uma pré-
educação. Devem ser valorizados seus objetivos, conteúdos e métodos próprios,
de forma que as crianças possam se apropriar da herança cultural deixada pela
humanidade, desenvolvendo suas funções psíquicas. Segundo Leontiev (1978)
é neste período de novos aprendizados que se reorganizam e reforçam as
conexões entre as células do cérebro humano. Novas conexões e sinapses são
formadas à medida que novos conhecimentos são adquiridos.

Os dados obtidos nas pesquisas e na vivencia com as crianças são


indicativos de que a linguagem musical é um instrumento psicológico excelente
para o desenvolvimento de funções psíquicas de crianças nesse nível de ensino.
É notável que além da aprendizagem de conceitos musicais, houve a ampliação
do vocabulário das crianças, maior participação nas aulas trazendo as suas
próprias experiências sonoras como contribuição e também a alegria com a
participação de jogos e brincadeiras infantis do nosso folclore esquecidos por
educadores. Apesar dos avanços científicos recentes, as investigações acerca
dos efeitos da música no desenvolvimento intelectual ainda estão em fase
preliminar.

33
A música no contexto da Educação Infantil, quando é trabalhada de forma
lúdica e dinâmica, com professores comprometidos, traz experiências
gratificantes para as crianças e constitui um elemento inestimável para a sua
formação e desenvolvimento, permitindo-lhes a sua apropriação sem reservas,
porque a música não deve ser um privilégio de alguns, mas de todo ser humano.

Se por um lado os estudos sobre os prováveis benefícios extra-musicais


da música parecem fomentar argumentos promissores para a educação musical,
sobretudo em um país como o nosso que luta pela inserção da música como
disciplina obrigatória na educação básica, os mesmos estudos transformam a
música em um meio e não em um fim em si. A música tem valor próprio e há
muitas razões que justificam sua inserção na escola. Em primeiro lugar, a música
constitui uma importante forma de comunicação e expressão humana e
praticamente todos os povos do mundo possuem algum tipo de música. Em
segundo lugar, a música carrega traços de história, cultura, e identidade social,
que são transmitidos e desenvolvidos através da educação musical. Em terceiro
lugar, o fazer musical da aula de música envolve diversas formas de
aprendizagem contidas em atividades como audição, canto, representação,
reprodução, criação, composição, improvisação, movimento, dança e execução
instrumental entre outras. Todas estas atividades auxiliam no desenvolvimento
da inteligência musical. Além disso, no exercício dessas formas de aprendizagem
os alunos podem ter uma sensação de realização pessoal, de bem estar e de
prazer.

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