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JUVENTUDE, OCUPAGAO E SAUDE! Jorge Castella Sarriera? Cynthia Schwarez Sheila Goncalves Camara PUCRS O estudo sobre as relagSes entre bem-estar psicolégico e situagio ocupacional, em jovens porto-alegrenses, faz parte de uma pesquisa maior que visa conhecer varios aspectos referentes a transi¢éo do jovem da escola ao trabalho. Esse periodo pode ser avaliado como um dos momentos mais decisivos na vida do jovem pelas implicagdes comuns desta ctapa do desenvolvimento adolescente, onde a saida da escola ¢ a entrada no mundo do trabalho podem significar a aquisi¢ao de um novo status, o de adulto. O jovem pode percorrer varios itinerérios de transigao escola- trabalho, considerando suas necessidades pessoais, suas habilidades, sua formagao pessoal, a situagao escolar, o apoio familiar ¢ as oportunidades do meio. Neste percurso, a procuta de um emprego efetivo, a experiéncia em empregos precérios, assim como o desemprego, constituem-se nos principais entraves para o desenvolvimento dos projetos pessoais ¢ | Trabatho desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Psicologia Comunitaria - PUCRS ¢ Financiamento do CNPq ¢ FAPERGS. 2 Endereco para correspondéncia: Instituto de Psicologia - PUCRS, Cx. Postat 1429 - CEP 90619-9900 Porta Alegre RS. 61 profissionais, 4 medida em que reduzem o campo de ago do individuo, como seu compromisso para com a atividade, limitando, também, o ambito das relagSes interpessoais ¢ produzindo sentimentos de desvalorizagdo de si mesmoe da propria posi¢ao social, (Warr, 1995 ; Blanch, 1990; Sarriera, 1993). Levando em consideragao este mal-estar produzido pela situagao de desemprego, partimos para uma andlise das implicagdes das situagdes ocupacionais estudadas (trabalhador fixo, estudante, trabalhador temporario ¢ desempregado), na satide ¢ no bem-estar psicoldgico dos jovens. Enfoque biopsicossocial da saide Entendemos a satide como estado de bem-estar ligado diretamente a vida de cada individuo e da sociedade, em um dado contexto e época especifica. Entretanto, fora entendida através do modelo clinico como a auséncia de doenga, cujas caracteristicas particulares tomaram-se, com o passar do tempo, ineficazes. Criou-se, desta forma, a necessidade de redefinir tanto o significado quanto o aleance do conceito de saide. Surge, assim, 0 conceito de satide comunitaria, que origina um novo paradigma, a partir do qual gerou-se um modelo especifico, denominado _ bio- psicgssocial. Segundo o modelo bio-psicossocial, a satide caracteriza-se por nio ser um "estado" estatico ¢ absoluto, expressando uma realidade complexa e ite dinamica, sustentada por todo um conjunto de fatores. Nao existe um li preciso entre satide e enfermidade e sim graus e expressdes diversos por pertencer a um “continuum bipolar" (doenga-satde), entendido como um processo de reagdcs diante de estimulos externos ¢ internos. Para Alvaro (1992), este modelo de saiide tem os seguintes pressupostos: * reconhecimento de que os fatores psicolégicos, sociais e culturais, em conjungdo com os organicos, influenciam na saide; 62 * a constatapo de que outras ciéncias da satde estio implicadas no processo, além da medicina: © a verificagdo de que as leis, modelos ou teorias que descrevem, explicam ou predizem o comportamento so as mesmas tanto para comportamentos saudaveis quanto para enfermos; « a aceitagéo que o modelo clinico, considerado como uma visio individualista e organica, é insuficiente; © o entendimento de que cada ecossistema (meio) produz/induz sistemas de “adequagdes" especificas - o individuo tera maior ou menor adequag4o ao seu meio dependendo de seus recursos bioldgicos e psicologicos ¢ das exigéncias do proprio ecossistema; por exemplo, quanto maior forem os recursos fornecidos ao individuo, maior sera sua facilidade em adequar-se ¢ menor serao seus desajustes pessoais. No diagrama a seguir é possivel explicar a génese dos comportamentos saudaveis ou doentios no processo de interagio individuo-meio no modelo biopsicossocial: Ambiente Ecossistema Grupo Social Vt conopegree <> | Sate Biolégico Psicalsgica Organisme {individuo) Figura 1: Modelo biopsicossocial (Santacreu, Zaccagnini, & Marquez, 1992, p.96). Como € possivel observar, na Figura 1, individuo e meio interagem de forma a produzir um comportamento que vai refletir na sua saiide assim como nas formas de ag4o, permitindo-nos conhecer as condigdes do ecossistema que facilitam em determinados sujeitos as condutas mérbidas, como, por exemplo, no caso do desemprego em determinade contexto. Perspectiva ecolégica das relagdes saude-trabalho A partir do modelo biopsicossocial, dentro da mesma perspectiva ecolégica, desenvolveu-se oa modelo explicativo de Peter Warr (1982), que estuda os efeitos da satide-e bem-estar psicolégico nas situagdes ocupacionais de emprego ¢ désemprego. O autor propde nove categorias como fatores determinantes da saude mental que explicam os efeitos do desemprego em diferentes contextos sociais: oportunidade de controle do ambiente, ocasides para 0 exercicio de habilidades, existéncia de fins ou objetivos gerados pelo meio externo, variedade de alternativas, clareza ambiental, disponibitidade financeira, seguranga fisica, contextos favoraveis para o desenvolvimento de relagdes interpessoais e¢ posig¢ao socialmente valorizada. Desta forma, o individuo pode causar influéncia sobre o ambiente qué, por sua vez, o afeta de dois modos distintos e complementares: cognitivamente, assinalando significado e valor subjetivo as propriedades de cada categoria ambiental e condutualmente, elegendo e modificando os ambientes dos quais depende o comportamento. As relagdes frente a perda do emprego variarao, também, dependendo de caracteristicas pessoais como: tipo de personalidade, expectativas de trabalho, experiéncia prévia de emprego ¢ tempo de desemprego. O tempo de desemprego podera afetar, de forma relevante, no deterioro da satide do desempregado. Foram realizados estudos sobre os diferentes estagios psicolégicos pelos quais o desempregado passa desde a 64 perda do emprego até a aceitapao de seu status de desempregado. Alguns autores, como Harrison (1976), apontam cinco fases: © A reagdo de choque frente ao inicio do desemprego, que esta interligada a alguma das seguintes condigdes: que o trabalho seja um elemento importante na definigao de si mesmo; que as esperangas de encontrar um emprego sejam escassas ou que seja a primeira experiéncia de desemprego. © Logo apés a reagdo de choque, daria-se uma busca ativa de emprego, a qual cumpriria diversas fungdes, além da de encontrar trabalho, como a construgéo de uma rotina na estruturagao do tempo e, como conduta legitimada, receber © apoio familiar. . * A terceira fase tem como caracteristicas o estado depressivo e o sentimento de ameaca 4 propria identidade causados pela maior consiéncia da perda do status associado ao trabalho. * © sentimento de desesperanga e abandono por parte da sociedade provocariam, juntamente com a inatividade na busca de um emprego, um periodo de desorganizacdo e crise. * Por Ultimo, com a assungio de uma nova identidade, baseada na adaptacZo ao novo status, de desemprego e no estabelecimento de novas metas vitais, a situagdo de desemprego se estabilizaria sem deteriorar seu estado de satide. Com base em estudos ja reatizados em outros contextos (Warr e Jackson, 1985; Sarriera, 1993) sabemos que os efeitos do desemprego e do tempo de desemprego na saiide, sAo preocupantes. Nosso interesse é conhecer e avaliar © nivel de saade dos jovens segundo suas diferentes situagdes ocupacionais e segundo o tempo de desemprego. Método Amostra Constitui o universo amostral deste estudo, 563 jovens porto- alegrenses de ambos os sexos com idades entre 16 ¢ 24 anos. 65 Os pontos de amostragem foram as zonas eleitorais do municipio. A fixagao da amostra foi proporcional as secdes eleitorais de cada zona. A selegdo das unidades primarias de amostragem (sepdes) foi feita de forma aleatéria simples e as unidades tltimas (jovens) pelo sistema de rotas aleatérias. / \ Otipo de amostragem, referentes as diferentes zonas do municipio / q a . { de Forto Alegre, utilizadas neste estudo, proporcionou-nos uma amplitude \ \_ gue fez com que se verificassemos diferentes e antagénicas realidades sdcio-econémico culturais onde se inserem os nossos jovens. Caracteristicas da amostra Destacamos trés varidveis para descrever methor a composigiio da nossa amostra: a idade, o nivel de estudos e a situagio ocupacional. A variavel sexo, pela distribuigio parelha nas trés variaveis antes citadas, nao é apresentada Verifica-se na tabela 1, que a frequéncia da amostra diminui a medida em que aumenta a idade, observando que a porcentagem é maior entre os jovens de16 e 19 anos que é de 61,1% e menor entre os jovens de 2Q € 24 anos com 38,9%. Pretende-se que esta distribuigao reflita, nas devidas proporgdes, 4 populacao jovem da cidade. Tabela 1 - Distribuigdo por idade (Jregtigncias ¢ porcentagem) Fr. Fra ” YA. Idade {anos) 96 96 71 Wl 16 93 189 16,5 33,6 17 6 265 13,5 art 18 nv 344 14,0 61d 19 53 397 94 70.5 20 44 441 78 78,3 21 49 490 87 87.0 22 Aa 330 71 94,1 23 33 563 5,9 100,0 24 66 Através dos dados amostrais referentes ao nivel de estudos (tabela 2), percebemos que alguns jovens encontram-se com escolaridade superior a segundo grau (23,6%), com estudos de segundo grau completo ou incompleto (54,7%) © com primeiro grau completo ou incompleto (21,5%). Tabela 2 - Nivel de estudos (freqiéncia e porcentagem) FA Fra % KA Nivel de Estudos 1 1 02 02 analfabeto 32 33 $7 59 1? 5° série 88 121 15,6 21,5 6 a8 rie 181 302 32,1 53,6 2° erau incompleto 127 429 226 63 2° grau completo 121 550 215 91,7 3° grau incompleto 12 362 2! 190.0 3° grau completo Dentro da prépria amostra observamos a variedade de situacdes ocupacionais destes jovens. Ha trabalhadores fixos que estudam, ou seja, dedicam-se aos estudos a noite e trabalhadores temporarios que dividem © seu dia entre o trabalho ¢ o estudo, priorizando o estudo. Na categoria estudantes foram incluidos também jovens inscritos no servigo militar, devido ao fato que muitos interrompem os estudos ou estao estudando para seguir uma carreira militar. Na situagao ocupacional de desemprego, consideramos donas-de- casa, por estas nfio exercerem atividade formal ou remunerada. Tabela 3 - Situagio ocupacional (freqléncias e porcentagens por categoria). Fr. Fr. A Yo mA Categoria 44 44 18 78 Desempregado 85 9 15,1 29 Trabalhador Temporario 189 38 33,6 56,5 ‘Trabalhador Fixo. 243 561 43.2 99,7 Estudante 67 Por ser complexo trabalhar com diferentes tipos de situacdo ocupacional, bem definidas ou mistas (estudantes e trabalhadores), que tenham certa representatividade nesta amostra, baseamo-nos no estudo de Blanch (1990), que classifica “tipos ideais de status ocupacional entre os jovens": desempregados, trabalhadores e estudantes, Neste estudo dividiu- se o grupo de trabalhadores, em tempordrios ¢ fixos. Instrumento O questiondrio foi elaborado a partir da revisio da literatura cientifica com objetivo de conhecer o bem-estar psicolégico, os aspectos sécio-cognitivos dos jovens porto-alegrenses, ¢ seus itinerarios de transi¢Zo escola-trabalho. Este instrumento foi construido e adaptado a partir do estudo de Sarriera (1993), que fez parte de sua tese de Doutorado, "Aspectos Psicossociais do Desemprego Juvenil: uma andlise a partir do fracasso escolar para a intervencao preventiva". Apesar de basearmo-nos no estudo referido anteriormente, tealizamos um estudo prévio através de entrevistas com 18 jovens da populagao em que iria realizar-se 0 estudo (Sarriera e Verdin.,1996a). O instrumento de pesquisa compde-se de 58 questdes, divididas em cinco dreas: experiéncia escolar; experiéncia de trabalho e desemprego; aspectos psicossociais e sdcio-cognitivos relacionados ao trabalho: atribuigdes, valores e significado do trabalho; Saide e bem-estar psicolégico (escala de Goldberg) ¢ dados bio-demograficos. Propriedades psicométricas da Escala GHQ-12 Utitizamos para avaliar satide e bem-estar psicoldgico, a Escala GHQ-12 de Goldberg (1972,1985) chamada Questionario de Satde Geral (General Health Questionnaire). Em investigagées de carater comunitario 68 esta escala tem demonstrado um alto nivel de validade e confiabilidade (Garcia Rodriguez; Banks; Goldberg em Sarriera, 1993). A verso origi- nal desta escala contém sessenta itens que, posteriormente, foram reduzi- dos em versdes de trinta, vinte e doze itens, sendo a margem de erro aceitavel sem descaracterizar a validade da escala. Os doze itens do GHQ-12, abarcam, em diferentes pesquisas ¢ amostras, subescalas ou fatores como felicidade, satisfagao atual, afeto positivo e negativo, expe- riéncia de tensio, auto-estima negativa, ansiedade e estado de animo de- primido. Na andlise do comportamento da escala na nossa amostra, fo- ram identificados trés fatores, utilizando rotacdo Varimax: |. Auto-estima (variancia de 32,8% e alpha de 0,66); Depressio (variancia de 11,5% alpha de 0.68) e 3. Auto-eficacia percebida (varidncia de 8,25 e alpha de 0,54 ) (Sarriera e cols, 1996b). SituacZo ocupacional e bem-estar psicolégico A fim de avaliar a relacio entre a situacZio ocupacional e o bem- estar psicolégico, recodificamos os valores da escala GHQ-12 em quatro niveis: Saude Muito Boa (12a 18 pontos); Saude Boa (19 a 24 pontos); Saiide Regular ( 25 a 30 pontos) e Satide Ruim (mais de 30 pontos). Tabela 4 - Niveis de Bem-estar psicoldgico (sreqiléncias ¢ porcentagens) Niveis de Saude Fr. Fra. % TA. Muito Boa. 230 230 44 4l4 Boa 216 446 RB 802 Regular 82 528 14,7 95,0 Ma Saide 28 556 5,0 100,0 69 Em geral, os jovens de nossa amostra se localizam entre os niveis “muito bom” e “bom” (80,2%) de bem-estar psicolégico, enquanto apenas 19,7% apresentam um maior deterioro de satide, estando nos niveis “regular” ¢ “ruim” (Tabela 4). O grupo ocupacional que apresenta o melhor nivel de bem-estar psicolégico (muito bom) ¢ o dos trabalhadores fixos, com 46,0% de jovens, frente a 41,4% dos estudantes, 38,8% dos trabalhadores tempordrios e 27,9% dos desempregados. Em contrapartida, os desempregados constituem o grupo que apresenta 0 pior nivel de satide (ruim), com 16,3% dos jovens, sobrepondo-se a 5,4% dos estudantes, 3,2% dos trabalhadores fixos e 2,4% dos trabalhadores temporarios, Esses diferentes resultados stio confirmados como muito significativos (F=4,425, p<0,05), pelo teste estatistico de Andlise de Varidncia (ANOVA), existindo uma forte associagdo entre os niveis de ocupacdo e os niveis de saitde, sendo os jovens desempregados os que apresentam um quadro de menor bem-estar psicolégico (Tabeta 5). Tabela 5 - Situagio ocupacional x niveis de bem-estar psicoldgico SituagZo Niveis de bem-cstar psicolégico Ocupaeional Muito Bom Bom Regular Mau Fr % Fr % Froo% Fr % DESEMPREGADO 12 27,9 16 372 8 = 186 7 163 T.TEMPORARIO 33 388 28 329 22 259 2 24 7. FIXO 86 46,0 72 385 23 123 6 32 ESTUDANTI: 9 41a 98 4t0 29 12,1 13 5.4 ‘TOTAL 230415 214-386 82_—*148 BS. ,425 df 3 p < 0,005) 70 Tempo de desemprego e bem-estar psicolégico Buscamos verificar, a relacdo entre o tempo de desemprego e¢ o bem-estar psicolégico. Em nossa amostra, 44 jovens eram desempregados, sem nehuma atividade, mesmo académica. Porém, 47 jovens clasificados na categoria de estudantes responderam, no questiondrio, as questées referentes a estar desempregados o que caracteriza uma situagdo de espera de emprego embora mantendo-se ligados ao sistema educacional de forma proviséria. Em consonancia com outros autores (Blanch, 1990) optamos por incluir estes jovens no estudo de tempo de desemprego ¢ bem-estar psicolégico. A variavel continua tempo de desemprego foi recodificada em cinco periodos de tempo, seguindo os parametros de estudos semelhantes (Blanch, 1990 e Sarriera, 1993). Verificamos que 62,6% dos jovens estio desempregados hé menos de seis meses, o que indica uma situagdo menos critica de desemprego que aquela dos 11,0% que estiic ha mais de dois anos sem emprego. ‘Tabela 6 - Tempo de desemprego (freqiléncias ¢ porcentagens) Tempo de desemprego Fr. Fra % A menos de | més 13 3 143 143 de 1 a3 meses 2 35 24,2 38,5 de 4a 6 meses 2 37 24,2 62,6 de 6 meses a2 anos 4 3! 264 29.0 mais de 2 anos to I 10 100,0 O grupo de jovens desempregados pelo periodo de 4 a 6 meses, neste estudo, ¢ © que apresenta o melhor nivel de bem-estar psicolégico com 1,91 de média seguido pelos jovens com tempo de desemprego de ] a 3 meses e de 7 meses a 2 anos com média de 2,00 pontos e com maior 7 comprometimento no seu bem-estar psicolégico aparecem os jovens no periodo de 1 a 3 meses de desemprego (x=2,14) e aqueles que ja poderiamos considerar com desemprego de longa duracdo, mais de 2 anos (x=2,30). Podemos considerar que os efeitos de desemprego sobre o bem- estar psicolégico nao se apresenta de forma linear € estado explicados pelas diferentes fases de impacto ¢ adaptacao pelas quais transita o jovem desempregado, Tabeta 7 - ‘Tempo de desemprego x niveis de bem-estar psicolégico Tempo de . Niveis de bem - estar psicolégico Desemprego Muito bam Bom Regular Mau Médias rro% «= Fr % Or OU Menos de 1 més 4 308 7 538 2 154 2,00 De 1 a3 meses 7 38 7 BR 6 273 2 91 24 De 4.6 meses 7 318 10 455 3 22,7 491 De6mesesa2Anos 8 333 10 41,7 4 167 2 83 2,00 Mais de 2 anos 3 300 2 20 4 400 1 100 2,30 Total 29 319 36 39,6 19 209 772,04 (F=0.61 df4 p > 0,08) ~ Em nossa amostra, nao foi ¢encontrada uma associagao linear significativa entre o tempo de desemprego ¢ os niveis de bem-estar psicolégico, o que pode refletir as caracteristicas préprias de processo de adaptaciio ao desemprego ou da presenca de outras variaveis moderadoras que amortecem os éfeitos do tempo de desemprego sobre a satide. Discussao dos Resultados O bem-estar psicolégico esta fortemente relacionado com o nivel de ocupagao dos jovens porto-alegrenses. Os trabalhadores fixos, cm nossa 72 amostra, apresentam os melhores niveis de bem-estar psicolégico: “muito bom” ¢ “bom” (84,5%). Acreditamos que isto se deva ao tempo que é investido na prépria atividade do trabalho e as preocupagdes derivadas deste. Os estudantes também obtiveram um alto nivel de bem-estar psicolégico (82,4%). Neste caso, acreditamos que os resultados referentes a este grupo estejam relacionados, especificamente, a situagao diferencial relacionada ao tipo de ocupa¢do que desempenha. E possivel que, devido ao fato deste grupo, muitas vezes, nunca ter trabalhado, elimine ou, ao menos, diminua as preocupagées relacionadas 4 sobrevivéncia, pois, de maneira geral, os jovens que, nesta faixa etaria, ainda estao estudando, possuem uma tede de apoio familiar efetiva e, as preocupagdes de ordem psicossocial relativas ao trabalho, sfo adiadas para um futuro profissional. De certa forma, as exigéncias sociais para com este grupo ficam, por hora, restritas ag estudo. Os trabalhadores temporarios se apresentaram em terceiro lugar de representatividade, com 71,7% dos jovens nos niveis “muito bom” e “bom” de bem-estar psicolégico. Pensamos que isto se deva ao fato de o trabalhador tempordrio ndo ter, ainda, o comprometimento para com.o trabalho que tem o trabalhador fixo, mas difere do estudante, por ja ter vivenciado preocupacées relativas ao trabalho, sejam estas financeiras ou Psicossociais. Este grupo, muitas vezes, encontra-se sem trabalho efetivo e considera-se desempregado. Neste caso, sofre as privagdes derivadas da perda do emprego. Verificou-se que os desempregados apresentaram-se em menor niimero nos niveis “muito bom”e “bom”(65,1%) de bem-estar psicoldgico. Isto pode ser entendido em fungdo destes ja terem experienciado alguma atividade laboral que, ao deixar de ser realizada, acarreta uma perda financeira, no estabelecimento da identidade e em toda estruturacdo temporal da vida cotidiana do jovem, provocando um sentimento de 73 “vazio”, que acaba por desmotiva-lo no sentido de tomar atitudes assertivas em busca de um emprego. No estudo desenvolvido com jovens de Leganés (Espanha) pelo coordenador deste estudo, no foi encontrada esta relacdo. Estes resultados contraditérios, especialmente na populagao de jovens desempregados, sao também comuns em outros autores: Moret ¢ cols (1990) e Cullen (1987) no encontraram diferengas entre situagdo de -emprego e desemprego e bem-estar psicoldgico entre a populag4o juvenil. Outros autores como Warr (1984) e Banks (1984) observaram uma sensivel relacio e Blanch (1990) verificou uma alta correlacdo entre depressiio e desemprego nos jovens. As possiveis razGes para sustentar esta disparidade nos dados entre os jovens, especialmente quando se verifica a unanimidade dos pesquisadores com relacgio a populagao adulta, onde é comprovada a forte relago entre desemprego e mal-estar psicolégico, pode ser explicada por algumas caracteristicas proprias dos jovens ja apontadas pela. OCDE (1986): , - O desemprego dos jovens e dos adultos ¢ de natureza diferente. Qs jovens tém muito mais probabilidade de ficarem sem trabalho que os adultos, mas possuem maior facilidade de encontrar novos empregos. - Os jovens desempregados nfo costumam ter compromissos familiares ou dependentes. - Os jovens desempregados nao formam um grupo homogéneo, especialmente, quanto aos recursos e formagdo individuais e apoios familiares, sociais ¢ econémicos. As diferencas especificas quanto 4 rela¢do desemprego/satide nos resultados da populagdo juvenil s&o entendidas por alguns autores pela presenca de variaveis moduladoras ou intermedidrias de forte predominio entre os jovens: - © compromisso ou atitude frente ao trabalho (Moret © cols. 1990); 74 - A dificuldade econémica percebida (Buendia, 1987, Alvaro, 1992); - Acclasse sécio-econémica a que pertence o jovem ( Cullen e cols. 1987); - O fracasso escolar prévio, a caréncia de projetos profissionais e significados vitais (Sarriera, 1993). + Fatores sécio-econémicos, qualidade do apoio familiar e pouca experiéncia laboral (Kraufman, Rowley e Feather apud Alvaro, 1992). Os resultados remetem-nos 4 importéncia que a ocupasao tem sobre a satide dos jovens, considerando-se as atribuigdes psicossociais €~ econémicas do trabalho. Este constitui-se em uma preocupacao constante na vida dos jovens e cumpre as funcdes de consolidar sua identidade, suprir suas necessidades econémicas, desenvolver suas relagdes sociais, fornecer a prestacZo de servigos 4 comunidade e assegurar uma fonte de renda. Investigag3es realizadas por Frélisch (1983), assinalam que jovens, frente a outros grupos de desempregados, podem estar numa melhor posi¢ao, pois nado tém tanta pressdo econémica, sua identificagaio com o trabalho pode ser menor e, néo parece que, como conseqiiéncia de niio estarem trabalhando, reduzam suas relagSes ou mudem as atividades que realizam em seu tempo livre, como ocorre em outros grupos de idade. E, ainda, muitos dos trabathos que os jovens realizam, sio tfo mal remunerados, e as condi¢des de trabathe tao desumanas, que o desemprego ido como uma altemativa valida a um trabalho percebido como pode ser vi alienante. Na anilise do nivel de bem-estar psicolégico no grupo dos jovens desempregados com base no periodo de desemprego, nao foi encontrada uma associacao significativa. Segundo Alvaro (1992), as razdes que explicam os diferentes resultados quanto a significagdo da rela¢do entre bem-estar psicolégico ¢ tempo de desemprego podem estar relacionadas a periodos muito desiguais 75 de tempo de desemprego entre aulores e 4 dificuldade de uma interpretagao causa! devido a realizagao de trabalhos de investigacao de carater universal. Os resultados de outras investigagdes oferecem apoio ao resultado que anteriormente referimos. Alguns autores também nio encontraram associa¢ao significativa entre duragao de desemprego e deterioragao no bem-estar psicolégico ou na auto-estima (Warr e Jackson, 1985; Feather ¢ Barber, em Alvaro, 1992). A associacdo entre bem-estar psicoldgico € situagéo ocupacional foi significativa em nosso estudo (F = 4.425 df 3 p < 0,05), o que confirmou ial de que os melhores niveis de bem-estar esto nossa hipétese i associados aos maiores niveis de atividade ocupacional, respectivamente, trabalhadores’ fixos, estudantes, trabalhadores — tempordrios desempregados. Acreditamos que esta diferenga perpasse questdes sécio- econdmico culturais entre as diferentes populagdes de jovens. Entendemos que, em sua dimensao econémica, o trabalho é o meio principal pelo qual una pessoa se relaciona com a sociedade e contribui, mediante a provisio de bens e servicos, 4 manutencdo de si mesmo. Este vinculo reforca um sentimento de participago e utilidade. Desta forma, o emprego serve para projetar uma imagem do prdprio individuo, a0 passo que este provém de uma posi¢ao ¢ status reconhecidos socialmente. ~ Consideragées Finais Este estudo teve como objetivo conhecer a relagio existente entre bem-estar psicolégico ¢ situag4éo ocupacional dos jovens. A confirmacio desta relacdo, leva-nos a pensar no quanto estes jovens trazem, em sua histéria pessoal ¢ social, a valorizagdo do trabalho, independente de propiciar realizagdo pessoal ou nao. Vimos que mesmo os jovens estando estudando, ja demonstram preccupagéo quanto a ter uma ocupagao profissional e esta interfere, diretamente, no nivel de bem-estar psicoldgico destes. Os jovens também 76 mostram 0 quanto se sentem inseguros quanto ao tipo de trabalho que procuram ou irdo exercer. Isto nos faz pensar na necessidade de desenvolver programas de inser¢4o sécio-laboral, com o intuito de auxilid- los a realizar uma escolha profissional e instrumentd-los quanto aos recursos que podem utilizar na busca de um emprego que possibilite maior satisfagao e melhor nivel de bem-estar psicoldgico. E importante poder realizar estudos que fagam com que nos aproximemos da realidade dos jovens, a fim de auxilid-los a ter melhores niveis de bem-estar psicolégico, nas atividades profissionais que realizam, em seu dia-a-dia ou em situagdo de desemprego. A partir destes conhecimentos € que se podera desenvolver maneiras eficazes de auxilid- los, bem como, desenvolvendo pesquisas longitudinais de acompanhamento de jovens desde a saida da escola até a insergo no mercado de trabalho. Referéncias Bibliograficas Alvaro-Estramiana, J. L. (1992). Desempleo y Bienestar Psicoldgico. Madrid: Siglo Ventiuno Editores. Banks, M. ¢ cols. (1980). 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