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WEEE WE NEE MEMORIA SOBRE A Revolugio do (ean em 1821 POR Braw ca Costa Rubin EB que alma tem a historia, Que a faz, nas azas da gloria, De idade passar em idade? A verdade. Bern. Nov. Fro. It 166. Sem duvida o Brasil ter-se-hia desmembrado seguin- do o pernicioso exemplo do Estado outr’ora denominado America Hespanhola, se nfo fosse a presenga da familia real, que teve a feliz concepgao de transportar-se a este continente, e aqui estabelecer a metropole. Este exito, que vei realgar uma epocha da nossa historia, foi o prenun- cio de outros muitos, que apressaram o facto da indepen- dencia. Entfo sahindo o Brasil da infancia da civilisagao, ¢ soltando-se dos bragos ferreos do systema colonial, que o 316 REVISTA TRIMENSAL trazia asido, desenvolveu-se rapidamente pelo aperfeigoa- mento das leis policia dos povos; passou a gozar de novo predicamento, e presenciow corm festas e alegrias a acclamagéo de Sr. D. Jodo Vi como rei do reino unido. Os observadores politicos previram logo, que a creagdo de um vasto imperio independente n'esta parte do novo mundo ia ter uma realizacdo mais prompta do que a que se poderia esperar da ordem regular a vagarosa da vida das nagées. Se jamais houve periodo em que se devesse invocar a attencau dos historiadores, seria aquelle em que se tt vesse de tratar da origem, das circumstancias e conse- quencias da revolugéo de Hespanha, a qual tanta influen- cia exerceu em Portugal, que ahi promoveu uma outra revolugdo, e esta mais rapidamente se communicov ao Brasil. Mas nao é do nosso propositc entrar pela ardern dos successos, que no ésto das inquietagdes populares se deram de 1808 a 1821, ja consignados na historia yerai do imperio; e ousadia grande féra da nossa parte tentar por outro modo narral-os, Demorar-nos-hemas comtudo um pouco sobre os que acompanharam a aurora do ulti mo anno, pois elles dispoem, esclarecem, edao a medida justa para estimar o que toca aos pontos até hoje escuros oa duvidosos, por falta de averiguagées, da revolugac do Ceara, de que em particular nos vamos occupar, e que esperamos pér a claro, desenvolvendo miudamente os factos @ as suas causas, discutindo os duvidosos, determi- nando e verificando as datas, e descendo a particularida- des. E’, pois, esta memoria uma fonte historica, e tira todo oO ‘seu merecimento da consciencia com que é orde- nada, pois podemos dizer, sem receio de sermos refuta- dos, que uma sé proposicao nao deixa de estar apoiada € sustentada por documentos € provas. Reinava em fins do anno de 1820 por todo o Brasil uma fermentagdo surda e um espirito dé sedigdo, que se DO INSTITUTO DO CEARA 317 manifestava debaixo de diversas formas; espalhavam-se boatos sem tundamento algum, e que sémente serviam para sorprender 9s imprudentes, intimidar os tracos, ¢ assim abrir as portas a desconfianga e 4 discordia. A chegada ao Rio de Janeiro de um navio procedente de Lisboa com os despachos que annunciavam os inopinados acontecimen- tos do Porto; aresolucdo que em seguida tomouo gabi- nete pata acalmar os espiritos em Portugal, e dar 4 opi- nigo publica uma direcgdo que desviasse quaesquer hos- tilidades ao governo monarchico; a esperanga que se fez entrever aos portuguezes da Europa do regresso da fami- lia real, o que tendia a privar o Brasil da presenga do seu soberano, geralmente respeitado, e voltar 4 condigaa de colonia, tudo concorreu para exaltar as paixdes ¢ precipi- tat os acontecimentos, No 1.2 de Janeiro de 1$21 tinha rebentado uma revo- lugdo no Para, substituindo ao antigo governo uma junta provisoria, que assignalou a sua installagéo por proclama- gdes terminando pelas formulas até entdo usadas em taes papeis; foi por ahi que comecou a serie de revolagées, que mudou a ordem das cousas no Brasil. A Bahia, segun- da cidade em titulo, ea primeira n'esse tempo por sua importancia commercial, seguiu esse exemplo, se é que carecia d'elle para tal pronunciamento. A forga militar obrigou o governador a assignar a resolugdo tomada pelos agitadores de adherir a0 movimento, estabelecer tambem unia junta provisoria, a qua! devia dar immediatamente as ordens para a eleigdo de deputados por aquella provincia 4s cortes, com promessa de aceitar ¢ jurar a constituigao, que seria feita em Portugal debaixo do nome do Sr, D. Joao VI, ao qual se prestaria, bem como a sua dynastia, juramento de obediencia e fidelidade, 0 que foi executado com acclamagdo da tropa e do povo. A junta provisoria, composta, como a do Para, dos chefes da insurreigéo mili- tar, magistradas ¢ negociantes, propostos, por formalida- de, 4 aceitacio do povo, foi immediatamente installada em lugar do capitdo-general, a quem foi offerecida a pre- sidencia, o que elle recusou. O Rio de Janeiro, se no teve a prioridade d'estas 318 REVISTA TRIMENSAL emprezas, ao mesmo tempo temerarias ¢ taceis—temera- rias pelo isolameato e difficit communicagao de amas com ontras, provincias, faceis por que eram apoiadas pela tro- pa—, conseguiu pela sua importancia efeitos mais deci- sivos, e, néo obstante estar sob as vistas da cérte & do go- verno, deu ao complexo de tedos os pronunciamentos um certo grao de elevagdo, e foi-the a fortuna duradoura. O decreto de 18 de Fevereiro convocando uma assem- bléa dos procuradores de todas as cidades do Brasil para deliberar as mudangas a fazer_na antiga ordem de cousas, e applicar ao Brasil a constituigdo; ‘das cértes com as mo- dificagdes que deviam julgar-se necessarias, por isso. que as leis e instituigses de Portugal podiam nao convir ao novo reino, pareceu aos agitadores uma medida. dilatoria, ou, ao menos, que ago correspondia 4s suas vistas, nem aos seus votos. Na madrugada de 26 de Fevereiro os corpos milita- res formaram em parada no Rocio,e ahi levantaram gri- tos e vivasa el-reie d constituicgo. Reuniu se depois um conselho popular no saléo do theatro de S. Jodo, e, sabe- dora soberano d'estes acoatecimentos e das’ exigencias do povo apoiadas pelas baionetas, expediu vm decreto em que aceitava a constituicao tal como seria feita em Por- tugal pelas céftes, com que todos ficaram contentissimos, @ prestou-se depois juramento a uma lei. que ainda nao existia! A nova d'estes graves acontecimentos,. transmittida com rapidez 4s provincias do litoral, produziu iguaes e successives rompimentos, acbmparihados de cireumstancias peculiares, de pedidos e imposigdes, desacatos 4s auctori- dades, como costuma sempre acontecer quando a plebe quer ser povo, e este a aceita como auxilio para conseguir seus intentos. Concentremos, porém, a nossa atteng’o sobre a ma- teria d’esta memoria, e para melhor desempenho permitta- 8¢-Mos UM pequeno exame. retrospectivo. Corria o anno de 1820, quando em Julho tomou posse. Francisco ‘Alberto Rubim, ultimo governadar do DO INSTITUTO DO GEARA 319 Ceara (1), Esta provincia‘comprehendia entéo em uma su- perficie de 4,600 leguas quadradas (2}, pouco mais ou menos, apenas uma populagao de 150,000 habitantes (3), _ divididos pelas villas de Fortaleza, Aquiraz, Aracaty, Cra- to, Jardim, Vigosa, Monte-mér Novo da America, Icé, Quei- xeramobim, Sobral, Villa-Nova d’ELRei, Granja, Lavras da Mangabeira, S. Jodo do Principe e outras povoagdes de menor categoria. : O estado do paiz nfo era satisfactorio, ¢ differentes causas concorriam para o atrazo de sua civilisagdo. Pouce tempo havia decorrido depois darigorosa secca, que, 4 semelhanga da de 1792, affligiu toda a provincia nos anuos de 1815 e 1816 uh € 08 povos ainda sentiam as suas fu- nestas consequencias, A este mal accresciam outros, ndo devidos 4s perturbagées atmosphericas, mas ds desordens politicas, aos homens que administravam o paiz e repar- tiam a justiga. Por occasifo do infeliz successo que no mez de Mar- 90 de 1817 teve lugar em Pernambuco, Parahyba e Rio Grande do Norte, entendeu-se que ramificagdes existiam (1) Francisco Alberto Rubim, tendo. governado a capitania do Espirito-Santo de 1812 £819, foi mudado para ado Ceara, e tomou posse dé governo d’esta'em 13 de Julho de 1820. Era capitia de mar ¢ guerta, commendador e cavalleiro professo na ordem de Christo, e ganhou todos os seus postos por distinccao no servico das esquadras no Mediterraneo de iA% a 1790, e de- pois na costa d'Alrica e Brasil, (2) Mr. J.C. R. Muliet de Saint Adolphe rio Dice. Geog. Hist. e Desc. ¢o Imp. do Br. dé 4,600 feguas quadradas pouco mais ou menos; hoje tem segimdo a carta de Conrado Niemeyer (2.* edie, corr.) 3,625 leguas quadradas {3} De um mappa organisado pelas relacdes que davam os parochos, era a populagao no anno de 1813 de 131,140 homens. Por outro mappa organisado pelos Capitdes«méres, para 0 mesma anno, subiu a populacdo a 149,285. Em um officio do governador Rubim esté calculada a populagdo no anno de 1821 em 150,000 homens, calculo baseado em rigorosas investigagdes estatisticas. Arch. Pub * (4) Officid da real junta da fazenda de 20 de Fevereiro de 1817.—Arch, Publ. . 320 REVISTA TRIMENSAL no Ceara {5}, e€ que, para atalhar o seu progresso, era necessario distribuir destacamentos de tropa de linha e milicianos, afim de tornar inateis queesquer tentativas ; e, postos assim em armas muitos individuos que se entrega- vam as industrias, tirados das classes uteis ¢ indispensa- veis d sociadade, e distrahidos dos seus misteres, é con- sequencia immediata que a producgdo escacéasse, e que os arbitrios e abusos folgassem em um paiz sujeito a um regimen militar. Os habitantes do iaterior estavam ainda de ‘peior condicdo, soffriam os abusos praticados por malicia ou ignorancia dos escrivaes do civel e crime, males que mui- tas vezes nem todos os esforgos da administraggo, nem_ os magistrados podiam reparar, e todos os dias appareciam novas provas d’esta verdade. Ordinariamente impunes, abusando das circumstancias particulares do sertao, e do catacter em extremo timorato dos povos, ainda pouco civi- lisados, excediam-se em arbitrios, extorquindo o que \hes nao era devido, e nada os podia conter nog limites de suas jurisdicgoes. O culto da religido catholica, que tanto podia con- tribuir para adocar os costumes, estava, sendo de todo desprezado, quasi indifferente, mdrmente nas povoagies dos indios, gente ainda inculta, e por consequencia sem #é, sem consciencia, sem temorde Veus. As igrejas, pela maior parte arruinadas, n’ellas ndo se celebravam mais os mysterios da religido ; as imagens e ornamentos de umas achavam-se recolhidos em casas velhas com censu- ravel indecencia, e onde assim mesmo se dizia missa; os de outras tinham sido roubados ou entregues aos estra- gus do tempo, porque os vigarios, menos conscienciosos, como nfo tinham redditos, abandonavam suas igrejas, e alguns mesmo antes de tomar esse partido ousavam e¢s- tancar com suas extorsdes a seus freguezes (6). (8) Oificio da real junta da fazenda de 16 de Julho de 1817.—Arch. Publ. {6) Representagao do visitador Antonio Games Coelho de 4 de Novembro de 1819.—Arch. Publ. DO INSTITUTO DO CEARA 321 A instruccdo publica nao espalhava ainda os seus be- neficios por todas as classes da sociedade; ealgumas ca- deiras que existiam de instrucgdo secundaria eram rara mente frequentadas, Nenhuma obra de utilidade publica tinha sido em- prehendida. As estradas eram as primitivamente abertas, poucas e mas,e parece que ainda se nado tinha reconhe cido a utilidade das communicagées. O novo governador, seguindo sempre o principio sa- futar'de que a adininistracdo deve ser o sustento da pros- peridade dos povos e de sua riqueza, que nao deveria fa zer jamais sentir asua influencia sendo para aplanar o caminho por onde os homens vdo buscar a sua felicida- de, entregou-se devéras a0 conhecimento das necessida- des d'estes povos, pela maior parte ainda sem educagao, e onde com grande proveito da moral, da civilisacao e dos interesses materiaes havia muito a explorar. Néo the passou desapercebido o que havia de costumes deprava- dos ede vicios moraes n@ populagdo entéio denominada branca ¢ gentes de cér, mas o remedio a applicarihes teria effeito mais lento e carecia de tempo Othando para as rendas da provincia, esmerando-se como verdadeiro servidor em as melhorar, conseguiu um augmento de 98:0008 para ¢ triennio em que foram arrematadas, como entdo estava em praxe (7). (7) Oificte de 21 de Agosto de 1820; € por portaria de 17 de Novembro do mesmo anna ‘mandou el-rei Jouvar este bom servico, verificado peta intedligencia e 2elo com que desempenha as obrigagdes do sea cargo” .--Cart. do Thes. Nac. —Vid. Annexe I. Aqui pomos, por curiosidade, uma tabella da receita e des- peza da provincia do Ceard de 1815 a 1821, extrahida dos batan+ cos da real junta da fazenda, nao os havendo anteriores a 1815: Anno Receita Despeza 1815... 73528040... 680558533 1816... -86:47785838 . . . 61:570$224 i817... 822979052... 774338597 1818... WO704B567 © |. 70:28282336 1819, . . 130:1978149 . . 7B ALQ3B 147 1820... 162:7603872 . . . 89:806$049 1821... 188:724$737 . . . UGSEL ESS 422 REVISTA TRIMENSAL Para dar desenvolvimento 4 agricultura, e evitar a reproducgdo da falta de generos alimenticios nas occasifes do mal da secca, deu severas providencias para v plantio da mandioca e do arroz branco (8), ¢ aproveitande alguns * gecursos da natureza, tendo em vista a riqueza publica, fez por suas instancias que se promovesse a larga expor- tagdo do sal das minas de Mundahu, Mossoré e Cocé, eo conimercio directo (9); n’esta parte, porém, soffreu diver- sas contrariedades em razdo dos corsarios de Artigas te- rem aprezado alguns navios; «0 que, sda palavras de go- vernador, me tem causado 9 maior desgosto, por estar esta praga no principio de navegar suas embarcagdes para os diferentes portos da Europa, ndo fazendo como antes sémente suas exportagées para Pernambuce e Maranhio, © porque estas perdas em quem principia vao transtornar muito os meys planos de augmento de navegagdo e com- mercio». Utilisando os recursos da provincia em alguns melhoramentos materiaes, langou os fundamentos de um trapiche que tao necessario era ao commercio, ¢ de que até ahi se nao cuiddra Achando-se a provincia apartada de communicagoes faceis com o Rio de Janeire, estabeleceu o governadar do melhor modo possivel uma derrota de correios da Forta- leza 4 cidade da Pahia com 289 leguas de distancia, gas- tando na ida e volta 40 dias, pedindo ao governe da Ba- hia que ordenasse uma agencia em Hhéos e Caravelas, de onde se encaminhariam as cartas para a Victoria, na qual havia jadurante o seu governo disposto correios para Campos. Outro itinerario marcou para a cidade de Oei- ras, com 199 leguas de caminho (10). (8) Officio_do governador do 1.9 de Agosto de 1820.—Arch. Pubi.—Annexo I @) Officio do governador de 30 de Dezembro de 1820, o qual termina por estas palayras: “porque, sendo o Brasil reine unido peda lei, tdmbem 0 deve ser por correlagées mercantis”. —Arch, Publ, (10) A derrota ou itmerario dos correios para a Bahia e ‘Ociras esté publicada nla Rev. Trim. do Inst. Hist. de 1843, pag. 451. DO_INSTITUTO DO GBARA 323 Existia 0 costume inveterado de repartirem-se os in- dios por alguns fazendeiros, sob pretexto de assim os afas- tarem da ociosidade a que naturalmente eram inclinados, edos vicios que s40 a necessaria consequencia. D'este modo disfargavase a escraviddo, ¢ péde-se bem calcular a desigualdade e as extorsdes a que daria lugar esta dis- tribuigdo. governador poz immediatamente cobro a este ver- gonhose abuso, prohibindo severamente a sua continua- ¢do, e mandando restituir 4 plenatiberdade todos aquel- les que se achavam por este modo sujeitos aos servigos das lavouras, e, por maior celaxagdo de consciencia, no servigo domestico. Escusado é accrescentar que esta providencia des- agradou muito aos que tiravam proveite dos bracos dos indios, sem os retribuir, eo aggravo que d'alli julgaram receber ndo ficou esquecido, pois que algum tempo de- pois fizeram d’ella fundamento para accusagdo (11). Havia pouco mais de seis mezes que se entregava aos desvelos pelo bem estat dos povos confiados 4 sua administragao, quando se comecaram a divulgar noticias adulteradas dos acantecimentos da Bahia e sobretudo dos do Rio de Janeiro, dizendo-se ousadamente que o Sr. D. Jogo V1 tinha sido desenthronisade proclamando-se a constituigéo; e com tal arte eram tecidos estes embustes, que o governador chegou a pensar haver n’elles algum fundo de verdade, o que bem se revela no sentimento manifestado nas ordens expedidas 4s auctoridades do in- terior. Pouco a pouco chegando noticias mais positivas, cartas e gazetas, foi esclarecendo-se o herizonte politico, e conhecidas os factos. Dirigiu uma proclamacao aos povos (Annexo V), e na communicagdo ao coronel com- mandante das forcas da comarca do Crato (Annexa VII) diz: «A’ vista do expendido se vé que Sua Magestade el-rei nosso senhor ha de decidir sobre o presente objec- no emtanto é do nosso primeiro dever, visto que Ihe (1) Vid, a Fepresentagio da ge camara de 17 de Novembro de eA. Daa, Py Annexo XII 324 REVISTA TRIMENSAL temos todos jurado fidelidade, obedecer as suas lels, con- formando em tudo suas acgdes a elas, emquanto pelo mesmo augusto senhor no fér determinado o contrario Se no districto do seu commando existe algum homem amante de novidades ou constituigio, que se demore em paz, ndo perturbe 0 socego publico, porque breve ha de vir a saber da real vontade de mosso augusto soberana, que nunca deixou de prestar-se a solicitagées justas que se dirigem ao bem e prosperidatle dos seus vassallos, e o que ‘tir deliberado para uma provincia © ha de ser para todo o teinas. Em principios de Abril recebeu 0 governador um officio do capitao general de Pernambuco Luiz do Rego Barreto, communicando-Ihe que no dia 26 de Margo, loga de manha, apparecéra na altura d’aquelle porto a fragata D. Maria da Gloria com destino a Lisboa, e appro ximando-se a terra, 0 commandante Diogo Jusé de Brito lhe envidra cépia de decreto pelo qual Sua Magestade se tinha dignado jurar espontaneamente a constiuiggo que xe fizesse em Portugal, e concedél-a a tados os povos do rein unido, pelo que lhe dava os parabens (Annexo VIII. Em consequencia d’esta noticia téo transcendente, officiou circularmente a todas as camaras, auctoridades civis ¢ militares, ¢ aguardou as ordens, que bem pensada mente julgou lhe seriam transmittidas sem delonga. De- correndo, porém, algum tempy, e@ nado tendo o governador feito demonstragao alguma que parecesse dar assentimen- to 4 nova ordem de cousas, ignorando-se o seu intento pela reserva que guardava, enxergou-se n'essa demora, que ja patecia excessiva aos enthusiastas, que alguma novidade se queria occultar, e achavam ou pretendiam achar tundamento neste seu proposito, porque algumas cartas se haviam recebido das outras provincias ji pro- nunciadas, e nada transpirava do que ellas annunciavam Os mal intencionados iam além, ©, como sabiam que o povo cré avidamente todas os boatos tendentes a descon- ceituar as auctoridades, divulgaram que o governador se oppuoha abertamente ao juramento da constituigéo, inci- tando-os d’este modo a insurreigdo. DO INSTITUTO DO CEARA 325 Na madrugada de 14 de Abril em frente da casa da tesidencia du governador reuniu-se o batathdo de linha da guarnigdéo com o.parque de artilheria, ¢ povo amotinado. Q governador immediatamente soube do facto, e unica- mente acompanhado do ajudante de ordens sahiu a inda- gar a causa do famulee, e@ pelo ajudante do batalhdo foi the respondido (12): «Que, visto Sua Magestade ter jura- do a constituigao, € “approvado pelo seu real decreto de 24 de Fevercire, como era publico pelas gazetas da Ba hia e Pernambuco, queriam que se fizessem publicas de- monstragées de alegria, jurando a constitui¢do que se désse em Portugal, e se elegessem os membros para 0 governo provisorio ; e outrosim queriam augmento de sol do dobrade, como na Bahia ¢ outros jugares percebia a tropa de linha, @ que este mesmo augmento de soldo fosse dado ao major qué interinamente os commandava, em gratificagao da nomeagdo interina do commando ; ainda mais que se ahonassem aos miajores € aaindantes ‘de primejta Jinha cavalgaduras ¢ soldos para elles, ¢ esta era a 1az40 do seu “iusto rompimento». A que oge- vernador respondeu: «Que sobre requisicéo de tao alto assumpto havia muito a ponderar,; que passava a conyo- car uma sesso extraordinaria da camara, a que presidi- tiae. E encaminhando-se a casa da camara chamou 4 ve- reagdo os seus membros, e reuniuas auctoridades, clero, hobrezae povo, para resolver sobre a materia. Ahi toi recebido um officio do sargento mér Jeronymo Delgado Esteves, commandante interino do batalhdo de linha, con- cebido n’estes termos: «films. Srs. presidente e mais officiaes da camara desta villa.—Tendo a honra de ser elegide para que na frente do honreso corpo militar, e valorosos cearenses, mar- chasse para o largo do Palacio, em cujo Jarge postados hos achamos, ¢ pela parte que me toca em tazay do car- go que occupo, em nome do mesmo honrose corpo par- ticipo a VV. SS. para que desde ja bajam de publicar a 12) Vid. v auto fayrado na camara, que tem a data de 14 de Abril de 182Z1.—Arch. Publ.

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