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Cervejas de Guarda
Cervejas de Guarda
Minha história com cervejas de guarda é bem recente e começou em 2014. Na época eu
havia participado de um concurso e ganhei várias garrafas e já com uma breve noção de
que alguns estilos poderiam ficar melhores com o tempo e resolvi fazer o teste. Comecei
colocando garrafas dentro do guarda-roupa, dentro de botas (não tinha muito espaço em
casa na época), basicamente onde havia um espacinho disponível! O mais emblemático
de todos foi dentro da cama! Um belo dia meu telefone caiu atrás da cama e tive que
desmonta-la para resgatar o bendito. Nesse dia descobri um certo espaço vago entre as
gavetas e as garrafas foram todas para esse cantinho. Depois de montada, esse espaço na
cama acabou virando uma espécie de cofre onde 27 parafusos (e uma chave Philips
capenga) garantiram que eu não ia tirar as 10 garrafas que foram colocadas ali tão cedo!
E assim se passaram 2 anos até eu ter coragem de desparafusar a cama e começar a
degustar as cervejas! Sendo assim o primeiro aprendizado de todos foi: garrafas não
acessíveis envelhecem mais!
A princípio parece estranho ouvir que cervejas possa ser envelhecidas ou até mesmo
consumidas vencidas e quem dirá que ficarão melhores com o tempo! Observe que
grande maioria das cervejas são feitas para se consumir frescas e ficarão com sabores
indesejáveis após algum período na garrafa. O famoso trans-2-nonenal ou aroma
associado a papelão é uma das principais características indesejada relacionadas com
oxidação/envelhecimento da cerveja. Apenas uma minoria irá se transformar em um
verdadeiro elixir!
O conceito de cervejas de guarda é basicamente uma cerveja cujas características
sensoriais evoluem (quando armazenadas corretamente) com o passar do tempo, se
tornando mais complexas. Durante o envelhecimento as características relacionadas
com frescor diminuem devido inúmeras reações químicas. Na grande maioria das
cervejas essas características são negativas.
É importante saber que os fenômenos que ocorrem durante o envelhecimento da cerveja
são extremamente complexos e dependem de uma série de fatores que estão associados
a formação e degradação de moléculas. O objetivo aqui é compartilhar algumas das
informações que tenho encontrado durante esse breve período em que estudo e adego
cervejas de uma forma relativamente simples.
Se você também quer começar uma adega cervejeira talvez a coisa mais importante é ter
paciência mas, as informações abaixo vão te dar um norte sobre algumas coisas
importantes:
Qual cerveja pode ser “de guarda”?
Via de regra estilos de teor alcóolico acima de 8%, escuras e com características
maltadas, re-fermentadas em garrafa, não pasteurizadas e com bom residual de açúcar
são boas candidatas para guarda.
Estilos como Barley Wine, Old Ales, Imperial Stouts, Belgian Strong Ales, Belgian
Sours (Flandres Red e Brown, Gueuze e Lambics), Doppelbocks e Robust Porters são,
em geral, bons candidatos para sua adega! Porém como toda boa regra há sempre
algumas exceções.
Observe que:
Tempo de guarda
É importante considerar a estrutura de cada cerveja ao estipular o prazo “máximo” para
guardá-la. Uma cerveja mais delicada jamais aguentará ficar na adega por tanto tempo
quanto uma cerveja mais robusta. Quanto mais características positivas de
envelhecimento tiver uma cerveja maior poderá ser o seu tempo na adega. No livro
Tasting Beer, Randy Mosher cita alguns exemplos:
Belgian Dubbel: 1 a 3 anos;
Belgian Trippel/ Strong Gold Ales: 1 a 4 anos;
Strong Ale/ Old Ale: 1 a 5 anos;
Belgian Dark Strong Ale: 2 a 12 anos;
Barley wine, Imperial Stout: 3 a 20 anos;
Cervejas com ABV superior a 15%: indefinidamente
Lembre-se de comprar mais de uma garrafa do mesmo rótulo, assim você pode degustar
a cerveja jovem e comparar as notas sensoriais da mesma cerveja depois de alguns anos
de envelhecimento.
Controle da Adega
A organização e controle da adega é algo pessoal, o importante aqui é ter uma ideia do
tempo de envelhecimento das suas garrafas e saber o que você tem guardado sem
precisar ir fisicamente na adega.
Quando comecei não fazia muito controle e parte do objetivo deste texto era terminar
com toda minha adega organizada. Criei uma simples planilha de excel com as
informações que eu considero relevantes, principamente para que eu possa ter uma ideia
de quantidade de garrafas e vintage, o resto é mais curiosidade. As informações que
coloco na minha planilha são:
Cervejaria - Cerveja - País - Estilo - ABV - Volume da garrafa - Lote - Quantidade de
garrafas - Data de Envase - Data Vencimento - Entrada na Adega - Notas/Observações
Alguns amigos me deram a ideia de criar uma pasta no Untappd com as cervejas que
possuo na adega e apesar de não ter feito (ainda) acho super legal.
E ... Fim!
Era isso! Texto escrito, adega atualizada e organizada! Comecei com mais ou menos
dez garrafas e hoje depois de catalogar todas elas descobri uma verdadeira paixão por
adicionar o meu toque de tempo e paciência a cada uma das mais de 100 garrafas! Vejo
como uma interferência pessoal na receita já que a forma como eu adego cada garrafa e
o tempo que eu espero para degustar cada uma delas influência no sabor da cerveja!
Assim como uma boa cerveja tudo fica melhor se compartilhado e resolvi disponibilizar
a minha adega online para inspirar outras "Adeguianes" a se aventurar no apaixonante
universo das cervejas de guarda.
Lembre-se… aqueles que tiverem paciência - às vezes - são recompensados! Se você
conhecer o que tenho na minha adega clique aqui.
Bibliografia
Para quem quiser se aprofundar mais sobre o assunto segue abaixo algumas das
bibliografias consultadas:
No basement, no problem: A guide to aging beer in hostile environments.
Zach Fowle. Draft Magazine, 2016
You should be aging bad beer. Zach Fowle. Draft Magazine, 2016
The case against wax seals. Kate Bernot. Draft Magazine, 2015
Cellaring Dos and Don’ts. Emily Hutto. Craft Beer and Brewing
Magazine, 2015
Trabalho feito durante o curso de Mestre em Estilos do Instituto da
Cerveja, 2014
To age or not to age? Michael Agnew. Revista The Growler nº15, 2014
Vintage Beer. Patrick Dawson. Storey Publishing, 2014
Cellaring Beer: To Age or Not to Age? Andy Sparhawk. Craft Beer.com,
2014
Lessons in beer aging: Saisons. Draft Magazine, 2013
A mesa do mestre cervejeiro. Garret Oliver. SENAC São Paulo, 2012
The Oxford Companion to beer. Garret Oliver. Oxford University Press,
2012
Wood Aging of Beer. Part I: Influence on beer flavor monophenol
concentrations. Femke L. Sterckx, Daan Saison, and Freddy R. Delvaux,
2012
Improved Flavor Stability by aging beer in the presence of yeast, Daan
Saison, David P. De Schutter, Filip Delvaux, and Freddy R. Delvaux,
2011
Tasting Beer. Randy Mosher. Storey Publishing, 2009
Aging characteristics of different beer types / Bart Vanderhaegen, Filip
Delvaux, Luk Daenen, Hubert Verachtert, Freddy R. Delvaux, 2006
The chemistry of beer aging - a critical review. Bart Vanderhaegen *,
Hedwig Neven, Hubert Verachtert, Guy Derdelinckx, 2005
Main flavor changes in aged specialty beers, Daan Saison
Required reading: The chemistry of beer aging. Draft Magazine