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ANAIS DO

VIII SIMPÓSIO NACIONAL DOS PROFESSORES


UNIVERSITARIOS DE HISTÓRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME I

LXIV
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÃO PAULO - BRASIL


1976
ANAIS 00
VIII SIMPÓSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITARIOS DE HISTÓRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME I

LXIV
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÃO PAULO - BRASIL


1976
r. - INTRODUÇÃO.
NA PLATAFORMA NORDESTINA O
VIII SIMPÓSIO DE HISTÓRIA.
(Aracaju/75) .

MARIA REGINA
do Departamento de História da Faculejade de Filoso-
fia, Letras e Ciências Humanas da U.nive"sidade de
São Paulo.

Realizou-se na cidade de Aracaju, SE, de 1 a 7 de setembro de


1975, o VIII Simpósio da Associação Nacional dos Professores Uni-
versitários de História - ANPUH, sob os auspícios da Universidade
Federal de Sergipe e a colaboração do Núcleo Regional da entidade
daquele Estado. Que irá somar, as suas prioridades marcantes no con-
texto das regiões norte e nordeste do País, o fato de haver sido o pri-
meiro a facultar uma plataforma efetiva e afetiva aos encontros bi-
anuais da ANPUH. Entidade que, como se sabe, havendo surgido em
1961, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Marília, SP,
então Instituto Superior Isolado do Estado e se deslocado para os nú-
cleos regionais: Curitiba, PR; Franca, SP; Porto Alegre, RS; Campi-
nas, SP; Goiânia, GO; Belo Horizonte, MG; fincou estacas na capital
sergipana, ponta de lança de uma nova plataforma, atlântica, dispu-
tada na Assembléia Geral de 3/IX/75 e. escalada para Florianópolis,
SC, em julho/77.
A fim de discutir problemas relacionados com o temário:
1. - Propriedade rural (tema fundamental)
2. - Metodologia da História e
3. - Fontes primárias,
reuniram-se em Aracaiu, cerca de 700 pessoas, muitas das quais pro-
cedentes
-8-

Porquanto os simposiastas, durante a Semana da Pátria/75, viveram in-


tensamente a maratona sergipana: nas sessões de estudos simultâneas,
nos cursos intensivos, nos encontros e re-encontros de colegas e, alguns,
nas noitadas nas praias de Atalaia, conjuntos folclóricos e o sabor dos
pratos típicos regionais, sejam as "fritadas de caranguejo", sejam as
"muquecas de sirí". Ainda peregrinavam até os acervos de um passado
opulento, rico em tradições, conservado, dentre outros monumentos his-
tóricos, no Museu de Arte Sacra, em São Cristovão, ex-capital provin-
cial. Semelhante à famosa Ouro Preto mineira. Uns poucos tiveram o
privilégio de reverenciar o trabalho de base, realizado pela equipe de
Irmãs de Nossa Senhora de Sion, oriundas dos colégios desta e da ca-
pital paranaense, lá no município da Divina Pastora.
Enquanto se aguarda a publicação dos ANAIS do VIII Simpósio
da ANPUH, ora passando por reformas estruturais em decorrência do
alto custo da matéria-prima, promoção cuja periodicidade invulgar,
é uma outra especificidade promissora, pode-se focar alguns dos parâ-
metros. Com o reconhecimento que se supõe unânime de haver sido
válida mais esta promoção, organizada e coordenada frontalmente, por
dois dos mais idealizadores professores da Universidade de São Paulo
(Alice Piffer Canabrava e Eurípedes Simões de Paula). Com a em-
preendedora e entusiasta colaboração, igualmente idealista, de um dos
professores da Universidade Federal de Sergipe, José Silvério Fontes, o
Professor "Silverinha" carinhosamente respeitado por toda a gente .

-9-
são recebidas, analisadas, transcritas e distribuidas nas Pastas, junto
com o material, selecionado com antecedência e acrescentando lá, mer-
cê de uma certa tolerância, com os incorrigivelmente indisciplinados.
Em suma, a montagem, tanto intrinseca, como extrínseca do cer-
tame, é toda feita no Núcleo Regional de São Paulo e deslocada em
unidades móveis até a sede do Simpósio, ao qual fica o encargo de
indicar as comissões locais; os locais para as inscrições; as reuniões.
Ainda, com a devida antecedência, a relação de hoteis, pensões, com
a tabela de preços, mais o painel das vias de acesso, tambem os pre-
ços das passagens. Pois os participantes, os simposiastas, viajam e se
hospedam por conta própria, com raras exceções. Ao que se saiba, no
encontro de Aracaíu, somente a delegação de Mato Grosso, cerca de
30 participantes, contou com o apôio do Governador do Estado, ele
próprio sergipano de nascimento. Apôio consubstanciado no transporte
em ônibus especial, hospedagem em hoteis e até mesmo um pro-labore
individual. Enouanto que a Fundação Educacional "General Sombra"
de Vassouras, RJ, facultou o transporte, tambem em ônibus especial,
sem a responsabilidade de alojamento.

Como curiosidade a ser meditada, a iniciativa de um empresário


pernambucano, relacionado com centros culturais paulistanos e ora
operando na capital cearense. Através da imprensa periódica, de
tentou conscientizar o intelectuais cearenses do sentido cultural do VIII
Simpósio, oferecendo, mediante concurso, "bolsas de participação".
Que distinguiram uma professora da Universidade Federal do Ceará
(com o título de Mestre pelo Departamento de História da Universi-
dade de São Paulo) e dois universitáiros. Aqueles, alimentando a es-
perança da criação do Núcleo Regional sediado na Universidade Fe-
deral do Ceará. Estado que até então, pode estar representado nos en-
contros bi-anuais da ANPUH, graças ao desprendimento e a acuidade
intelectual do diretor e fundador da Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras de Crato, o saudoso historiador José Augusto de Figueiredo
Filho, cujo falecimento ocorreu na ante-véspera do Encontro de Belo
Horizonte.

De início registre-se que o Estado de Sergipe cooperou efetiva-


mente, oferecendo hospedagem num dos melhores hoteis a quatro mem-
bros da Diretoria, aos professores que ministraram os cursos intensivos
e aos conferencistas igualmente convidados.

Enquanto que, das taxas de inscrição (Cr$ 100,00) professores e,


(Cr$ 50,00)
- 10-

Todas as demais despesas foram, a que se saiba, por conta pró-


pria.
Antes de regressar à base operacional, sita na capital paulista, os
dirigentes novamente reeleitos, promoveram um encontro, informal, nos
salõse do "Palace Hotel", na data de 5/IX. Oportunidade em que pre-
sidentes de núcleos regionais, assim como associados e simpatizantes,
fizeram uma avaliação crítica do certame e se posicionaram frente aos
esclarecimentos solicitados a quem de direito e, mais ainda a perspec-
tiva global do próximo Simpósio, que será o primeiro do novo calendá-
rio: 2. a quinzena de julho de 1977. - Com o temário seguinte:
1.0 - O Homem e a Técnica (tema fundamental)
2. o - Metodologia: da História
3.° - Fontes primárias.

Programa realizado.

O encontro de Aracaiu, no contexto das comemorações da Se-


mana da Pátria/75, cumpriu, salvo pequenas alterações, o programa
previsto nas circulares enviadas, pontual e insistentemente, pela Secre-
taria Geral da entidade. Dentre outras, duas especificidades sergipa-
nas poderiam ser, eventualmente, seguidas, pelo núcleoo hospedeiro
seguinte. Uma cultural, outra operacional. Aquela de uma brasilidade
'parlante' no hasteamento solene, da Bandeira Nacional, no páteo in-
terno do próprio edifício onde, dia a dia, ritmava o início das sessões
de estudos, COl1centrava tacitamente os simposiastas, uns poucos arma-
dos de máquinas fotográficas. Esta, com a instalação de uma sucursal
do Banco do Brasil junto ao local onde instalou-se a secretaria geral
com uma das mesas destinada a receber o pagamento das inscrições,
único suporte financeiro de uma entidade, sustentada até então pelo
desprendimento, pelo idealismo de uns poucos dirigentes.

En passant o programa realizado nas vertentes seguintes, salvo


omissões, enganos, críticas aceitas a priori; solenidades de abertura e
de encerramento; sessões de estudos, distribuidas em cinco salas do
mesmo edifício, a fim de facultar a apresentação e discussão das se-
tenta e duas (72) comunicações pelos próprios autores - uma outra
especificidade da ANPUH.
-11-

a). - Cursos intensivos de extensão cultural, em quatro verten-


tes operacionais e certificados de frequência, aberrtos tambem aos es-
tudantes universitários e aos professores de grau médio.
b). - Conferências pronunciadas por especialistas, que aborda-
ram grandes temas pertinentes ao Nordeste.
c). - Excursões, programadas, a duas das cidades históricas de
Sergipe, com edifícios restaurados pelo Instituto do Patrimônio Histó-
rico e Artístico Nacional do Ministério da Educação e Cultura
(IPHAM-MEC) .

Sessões Solenes.

a). - Abertura: a Sessão solene de abertura teve lugar no gran-


de auditório do Colégio Estadual de Sergipe, sito à rua Cristina s/n, a
20,00 horas do dia 1Q de setembro. Em se tratando de uma promoção
conjunta da entidade universitária e do Núcleo Regional, coube ao
Magnifíco Reitor da Universidade Federal de Sergipe presidir e convi-
dar para compor a Mesa, dentre outras autoridades presentes, o Vice-
Governador do Estado, o Vice-Reitor da Universidade de Sergipe, o
Presidente e o Secretário Geral da ANPUH, o presidente do núcleo
local, sendo este ovacionado pelas mais calorosas e merecidas salva
de palmas. Dos discursos proferidos, justifica-se acatar a idéia de, em
anexo, transcrever na íntegra, a saudação do Prof. Dr. Luís Bispo,
Magnifíco Reitor da UFS, e de agradecimento do Prof. Dr. Eurípedes
Simões de Paula, da USP e Presidente Nacional da ANPUH.
Ao encerrar a solenidade, o presidente da Mesa, convidou todos
os presentes, para um coquetel de confraternização, oferecido pela
Reitoria.

Encerramento.

Antecipada para as 11,30 horas de 7 de setembro, realizou-se, sob


a presidência de Eurípedes Simões de Paula, a solenidade de encerra-
mento do VIII Simpósio. Oportunidade em que, perante uma assis-
tência reduzida, o presidente homologou a nova Diretoria e Conselho
Consultivo para o biênio 1976-1977, eleitos na Assembléia Geral de
3/IX e, por força estatuária, automaticamente empossados. Das colo-
cações em pauta, assinale-se as que se seguem:
Que o Simpósio de Aracajú alcançou um teto inusitado de cerca
de 700
- 1~-

siastas haver viajado por conta própria. Ainda. Correndo o risco de


sofrer consequências de faltas injustificadas. Mais ainda. O grupo
medular, de veteranos, que vem sendo acrescido nos Simpósios pos-
teriores, identificado com o valor conjecturaI dos re-encontros, face
às limitações do próprio horizonte profissionalizante. Confraternizan-
do-se tambem com os simposiastas 'neófitos', o sócio fundador presi-
dente, destacou duas, três, presenças promissoras.
Maria Jessemy Leite Cavalcante, Mestre em História pela USP e
vinculada ao corpo docente da Universidade Federal do Ceará.
Maria Celia Portella Nunes, do corpo docente da Universidade
Federal do Piauí, ora matriculada num curso de especialização, na ex-
capital brasileira.
Eloina Monteiro da Silva, do corpo docente da Universidade Fe-
deral do Amazonas, comissionada na capital paulista e matriculada na
USP, ao que se sabia, primeira e única amazonense regularmente vin-
culada, pois prestou exame de qualificação a uma das áreas de pós-
graduação facultadas pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo. Ponderando que estes regis-
tros poderiam acenar com a criação e dinamização de núcleos regio-
nais no Ceará, Piauí e Amazonas, ficou a esperança de que o IX en-
contro venha a contar com professores universitários da área de Ciên-
cias Humanas, vinculados a instituições dos únicos Estados, até então
ariscos: Alagoas, Acre, Maranhão e Pará.
Em cor..siderando a inoportunidade de veicular outras informações
pertinentes ao certame, cuja radiografia iria depender de uma análise a
ser feita pela Diretoria, cujas coordenadas serão comunicadas, opor-
tunamente, não se cometeria indiscrição, antecipando três coordenadas
específicas;
1. - A coragem, a bravura, o pioneirismo do núcleo regional
de Sergipe, pelo fato de haver hospedado a VIII Simpósio, facultando
o ritmo promocional da entidade, com a primeira plataforma no norte
e nordeste brasileiro.

2. -
- 13

Ainda na última sessão solene, o Sr. Presidente focando a pre-


sença do Prof. Porfírio Rufino, a seu lado, representando o vice-pre-
sidente eleito e presidente do núcleo regional de Santa Catarina, formu-
lou votos de que o IX Simpósio, planejado para Florianópolis, em ju-
lho de 1977, chegasse a alcançar um nivel de realizações tão positivas,
quanto o da plataforma sergipana.
Em seguida, anunciou a parte artística programada pelo núcleo
com a colaboração do Coral da Universidade Federal de Sergipe. Um
belo, belíssimo espetáculo artístico cultural, em que sob a batuta do
Maestro Prol. Antônio Carlos Plech, cerca de 35 rapazes e moças, de
branco e vermelho, numa linha que parece específica de trajes regio-
nais de paises bálticos, proporcionaram uma bela mensagem musical,
aos simposiastas que encantados, maravilhados, tiveram o privilégio de
a captar. Foi a primeira vez que, conforme a palavra autorizada do
Presidente da ANPUH, aconteceu um encerramento com 'chave de
ouro'.

Sessão Administrativa. •
Em decorrência do fato, compreensivel, da malOna dos associa-
dos regressarem às bases operacionais, antes do término do conclave c,
obviamente não participarem das deliberações de base, - a diretoria
decidiu deslocar a data da assembléia administrativa, para meados da
semana. Que se realizou no dia 5/IX, a partir das 9,00 horas no Co-
légio Estadual de Sergipe. Sob a presidência de Eurípedes Simões de
Paula, secretariada por Alice Piffer Canabrava, com a seguinte ordem
dos trabalhos:
1. - Apresentação à mesa, por escrito, das eventuais emendas
ao projeto dos novos Estatutos da ANPUH, distribuidas, junto com o
material fornecido aos Simposiastas, nas Pastas, de inscrição. Suges-
tões que, discutidas e aprovadas pelo Plenário, irão instrumentar cir-
culares a serem enviadas, oportunamente pela Secretaria Geral.
2. - Propostas quanto ao organograma do IX Simpósio
-14-

na aprovada por 126 votos contra 31 dados àquela. Pode-se afirmar


que, mantida a faixa de dois anos, o IX Simpósio da ANPUH, acon-
tecerá na 2. a quinzena de julho de 1977, a fim de não colidir com os
encontros anuais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
(SBPC), realizados na l.a quinzena de julho; entidade a qual a ANPUH
está integrada e da qual alguns associados presentes, participam ativa-
mente. Quanto à precisão da data, circulares darão ciência, breve-
mente.
b). - Local: Dir-se-ia que uma das teclas da solidez de uma ins-
tituição, seria a disputa levantada por núcleos urbanos, desejosos de
hospedar as suas promoções culturais. Assim sendo, a ANPUH, pode
e deve ser considerada uma entidade consolidada, porquanto quatro
Estados, disputaram oficial e bravamente, a idéia de abrigar o IX Sim-
pósio, em área de sua jurisdição. Apresentadas, defendidas e subme-
tidas ao pronunciamento do plenário, a vitória coube à proposta apre-
sentada pelo Núcleo Regional de Florianópolis, referendada pelo Mag-
nífico Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina. Assim sendo,
delineadas e consolidadas as coordenadas requeridas pelo núcleo di-
rigente, a Capital catarinense irá hospedar o IX Simpósio, na 2. a quin-
zena de julho de 1977.
c). - Temário: Quanto à problemática do tema fundamental a
ser analisado no próximo simpósio, o plenário posicionou-se em sete
opções, que ;ustificadas pelos proponentes e submetidas à votação, con-
seguiu uma vitória suplementar de 86 votos o tema: O Homem e a
Técnica.
Núcleo que irá especificar o Temário do IX Simpósio, porquanto
as duas outras vertentes operacionais, deverão ser mantidas, num ritmo
a ser explicado oportunamente: temário: .
1). - O Homem e a Técnica (Tema fundamental).
2). - Metodologia da História.
3). - Fontes primárias, relacionadas com o tema fundamental
e apresentadas em nivel a ser explicitado oportunamente .


Moções.

Dentre as doze Moções apresentadas, aprovadas pelo plenário, fo-


car-se-ia as que se seguem:
1. - Posicionamento da entidade dirigida ao Sr. Ministro da
Educação e Cultura, face a problemática implantação dos Cursos "de
- 15-

Estudos Sociais", em detrimento da História, a mais fundamental das


Ciências Humanas.
2. - Explicitando o sentido cultural da "Coleção Afrânio Pei-
xoto", criada pela Academia Brasileira de Letras, com a obra, ora
esgotada e vinculada a uma temática fundamental do conclave -
Geórgicas Brasileiras (cantos sobre cousas rústicas do Brasil) veicula-
da em 1941 - cento e sessenta anos depois da la. edição romana (De
Sacchari Opificio Carmen e de Rusticis Brasiliae Rebus) enriquecida
de notas eruditas e exaustivo levantamento bibliográfico dos autores
Prudêncio do Amaral e José Rodrigues de Melo, pela professora Regina
Rocha Pirajá da Silva - o plenário posicionou-se por uma re-edição,
a ser tramitada por quem de direito.
3. - De agradecimentos à Universidade Federal de Sergipe, ao
Governo do Estado de Sergipe, à Prefeitura Municipal d Aracajú, ao
Núcleo Regional da ANPUH em Sergipe, pela cordialidade da recepção
que ofereceram aos seus irmãos provenientes de todo o Brasil.
4. - De congratulações ao Diretor fundador e manutendor da
REVISTA DE HISTÓRIA na oportunidade do lançamento do número
jubilar, em 4 tomos, numa periodicidade impar em publicações perió-
dicas específicas tanto no Brasil, como no mundo civilizado - 100 nú-
meros num 1/4 de século.
d. - Mesa eleitoral e resultado da eleição da Diretoria para o
biênio 1976-1977.
A fim de presidir a mesa o senhor Presidente nomeou o associado
Coreíno Medeiros dos Santos que, em recinto anexo à Assembléia Ge-
ral, instalou a Mesa eleitoral. Com a colaboração dos escrutinadores:
Cláudia Nikitiuck e Joubran EI Murr, computados os resultados da
votação, assim ficou construído o painel dirigente da ANPUH, 1976-
1977 e automaticamente empossado:

Presidente: Eurípedes Simões de Paula (SP) (re-eleito).


Vice-Presidente: Walter F Piazza (SC).
Secretária Geral: Alice Piffer Canabrava (SP) (re-eleita).
1.° Secretário: Cecília Maria Westphalen (PR).
2. 0 Secretário: David Gueiros Vieira (Br).
1.° Tesoureiro: Raul Andrada e Silva (SP).
2. o Tesoureiro: Laima Mesgravis (SP).
Imprensa e Propaganda: Maria Regina da Cunha Rodrigues Si-
mões de Paula (SP) (re-eleita).
Conselho Consultivo:
Armando Souto-Maior (PE).
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Helga Iracema Landgraff Piccolo (RS).


Jaciro Campante Patrício (Marília-SP) .
José Silverio Leite Fontes (SE).
Kátia Queiroz Mattoso (BA).
Marilda Corrêa Ciribelli (RJ).
Odilon Nogueira de Matos (Campinas-SP) .
Rufino Porfírio (SC).
Renato Costa Pacheco (ES).
Ruy Christovam Kachowicz (PR).

Registre-se que os postos chaves (Presidente e Secretária Geral)


vêm sendo mantidos pelo concenso unânime dos associados, porquanto
eles detem responsabilidade direta e eficiente continuidade da ANPUH .
Registre-se tambem que as diferentes chapas são identificadas pela
disputa do cargo de Vice-Presidente. Quanto aos demais titulares, a
faixa dissidente é mínima, face a idéia de prestigiar os colegas dos
núcleos anpuanos presentes no encontro em pauta .

Quadro Social.

Antes de encerrar a sessão administrativa o Prof. Eurípedes Si-


mões de Paula, tentou esclarecer murmurações captadas em relação à
categoria de associados: todos os professores de História de Faculda-
des e Institutos de Ensino Superior do País têm direito de se filiar ao
quadro social da entidade. Todavia, explicitou, que por motivos disci-
plinares na oportunidade de se requerer atestados para currículos ou
outras exigências burocráticas, ainda para envio de correspondência,
sugeriu que as inscrições fossem realizadas através dos Núcleos regio-
nais, devidamente articulados com a Secretaria Geral da ANPUH.
Ainda enfatizou que a categoria de professor de História, subtendia,
não apenas os pertencentes aos quadros dos Departamentos de His-
tória, mas tambem de outros Departamentos interdisciplinares, onde a
História identificasse disciplinas outras. Explicitando que no plenário
encontravam-se sociólogos, geógrafos, antropólogos, economistas, lado
a lado com os historiadores.


Anuidades e inscrições.

Ponderando que a ANPUH


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por ora, qualquer outra subvenção, impõe-se que se conscientizem tanto
do pagamento das anuidades (Cr$ 120,00 - cento e vinte cruzeiros
endereçados ao 1.0 tesoureiro, por intermédio dos núcleos regionais)
como das taxas de inscrição (Cr$ 100,00 - cem cruzeiros) e estudan-
tes, (Cr$ 50,00 - cinquenta cruzeiros) na oportunidade dos simpósios
bi-anuais. Informando não ter dados referentes ao montante da taxa
de inscrição arrecadada, e nem mesmo das despesas inerentes a mon-
tagem do certame, tentou sensibilizar no sentido de uma afetiva re-
ceptibilidade aos apelos da tesouraria da entidade .

Sessões de Estudos (72 comunicações).

No edifício da área de Humanidades da Universidade Federal de


Sergipe (rua Campos, 177) foram realizados nas manhãs dos dias 2-2-5-
6 e 7 sessões de estudos, simultâneas, agrupadas em 5 vertentes opera-
cionais, a fim de permitir a apresentação de setenta e duas (72) comu-
nicações sintonizadas com o Temário do VIII Simpósio.
De acordo com o uso costumeiro, para a presidência das sessões
foram convocados tanto os presidentes como os demais integrantes dos
núcleos regionais. Enquanto que a secretaria das mesmas, ouvida a
Comissão organizadora, foi reservada aos professores do núcleo hos-
pedeiro . Registre-se a presença eficiente e calorosa dos universitários
sergipanos, quer atuando como monitores nas referidas sessões, quer
respondendo as indagações dos simposiastas visitantes.
Face a perspectiva de um esclarecimento, pormenorizado, dos te-
mas apresentados e respectivas intervenções em processo de montagem
dos ANAIS do VIII Simpósio, justifica-se analisar duas das especifi-
cidades da ANPUH.
1.0 - As comunicações, por dispositivo regimental podem ser
apresentadas e desenvolvidas somente em plenário, pelos próprios au-
tores. Cada expositor dispõe de 10 minutos, para apresentar um re-
sumo, ficando a resposta as eventuais intervenções, levadas à mesa, por
escrito, numa faixa de tempo a critério dos respectivos presidentes.
Como é óbvio, a fecundidade das comunicações poderia ser tes-
tada pelo debate objetivo e construtivo, em algumas delas.
2.°
- 18-

sões de estudos. Apresentando trabalhos, intervindo nas discussões.


Não há e, certamente, nem poderia haver um processo seletivo, um
cerceamento à liberdade de expor as próprias idéias sintonizadas com
o temário aprovado em assembléIa deliberativa.
Sabe-se que o posicionamento acima, defendido pela Diretoria e
por muitos dos associados, não é unânime. Sugestões vem sendo feitas
no sentido de elevar "o nivel das comunicações" limitando-as a pre-
sença, a participação dos mais consagrados historiadores brasileiros,
que seriam "especial e insistentemente convidados". Face à problemá-
tica, apenas de conceituação, registre-se a idéia .
...

Cursos Extensivos.

Em decorrência do que fora decidido na Assembléia Geral de


Belo Horizonte (setembro de 1974), os dirigentes da entidade aceita-
ram o desafio de articular uma nova promoção anpuhana. Cursos ex-
tensivos de cultura histórica, ministrados por especialistas, com inscri-
ções abertas tambem aos professores do grau médio e aos universitá-
rios de História.
Realizados, no período vespertino, em dois locais apropriados e
preparados, satisfatoriamente, pela Comissão de Recepção.
a). - No Anfiteatro da Biblioteca Estadual:
1.0 - curso de História Econômica com o enfoque seguinte:
Uma perspectiva de formação econômica do Brasil, pela Profes-
sora Alice Piffer Canabrava do Instituto de Pesquisas Econômicas e
da Faculdade de Economia e Administração da USP.
2.° - Curso de Metodologia, com o enfoque seguinte:
Metodologia da Síntese, pela Professora Marilda Corrêa Ciribelli
do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do
Rio de Janeiro e da Fundação Educacional "General Sombra", de Vas-
souras, RJ.
b). - No Anfiteatro do Banco do Estado de Sergipe:
1.0 - Curso de História Contemporânea, com o enfoque se-
guinte:
A Crise na Civilização Ocidental, pela Professora Cecília Maria
Westphalen do Departamento de História da Universidade Federal do
Paraná.
- 19-

2.° - Curso de História Medieval, com o enfoque seguinte:


Contribuições intelectuais da Idade Média para a Civilização Mo-
derna, pelo Professor Niko Zuzek do Departamento de História da Fa-
culdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
Considerando que se não tem em mãos o painel das matrículas e
nem mesmo, algumas das provas e cômputo dos cartões de inscrição,
comentários captados, até o encerramento da presente avaliação, po-
de-se afirmar que a iniciativa foi das mais válidas, operacionais, posi-
tivas.
Iniciativa que, dentre outras realizações poderia servir de modelo
para outras instituições congêneres. Neste objetivo e pensando nos
colegas, historiadores ausentes por motivos supervinientes é que, em
anexo, transcrever-se-á tanto as unidades nucleares, como as biblio-
gráficas básicas dos referidos cursos .
..
Conferências .

À semelhança dos Simpósios anteriores, o de Aracajú proporcio-


nou aos participantes, um ciclo de conferências, realizadas no período
noturno. Com um acréscimo, uma especificidade marcante, todas elas,
realizadas no auditório do Colégio Estadual de Sergipe, versaram so-
bre alguns aspectos importantes da História do Nordeste. Foram pro-
feridas pelos mais categorizados especialistas na área abordada. La-
mentavelmente não se conseguiu obter, por ora, tanto os conceitos
chaves, como a bibliografia básica citada, motivos pelos quais, nesta
nota prévia, limitar-se-á, en passant, ao registro do historiador e do
respectivo tema. A primeira conferência, foi proferida no 3jIX, às
20,00 horas pelo Prof. José Silvério Leite Fontes (SE) - "Aspectos
geo-históricos do Nordeste".
dia 4 - Prof. Armando Souto Maior (UFPe), "O Nordeste de
1870 a 1880: uma economia em crise".
dia 5 - Prof. Gadiel Perrucci (UFPe), Economia açucareira do
Nordeste durante o século XIX.
dia 6 - Prof. José Calazans Brandão da Silva (UFBa), O Nor-
deste e a Revolução de 1930.
.
Considerações Finais.
Ao encerrar estas
- 20-

Com um posicionamento objetivo, seguro, de que o VIII Simpó-


sio foi positivo, havendo mesmo ultrapassado algumas previsões.
Pela própria realização temporo-especial, facultando tanto a con-
tinuidade do rítmo mantido pela entidade, abrindo corajosamente a
plataforma norte e nordestina.
Do ponto de vista sócio-econômico, podem ser aferidas - caso
já se dispuzesse de um painel com as coordenadas das unidades de ba-
se, d'onde se deslocaram, heroicamente até, os simposiastas, para a
capital sergipana um sentido de busca, de orientação, de esperança no
fornecida pela entidade promotora do encontro. Num ângulo mais cris-
pante, incisivo, medular, duas das novas plataformas estruturais da
ANPUH.
1.0 - A proposta, apresentada por Eurípedes Simões de Paula,
e aprovada pela quase totalidade de associados, presentes na Assem-
bléia Administrativ ade 3/IX/74, da mudança da data, até então tra-
dicionalmente sintonizada com a Semana da Pátria (setembro) para a
2a. quinzena de julho, mês de férias, em que todos os colegas interes-
sados, possam comparecer ao nosso Simpósio, de tal maneira que não
interfira com a Reunião Anual da SBPC, que vem se reunindo na 1. a
quinzena de julho.
2.° - A aferição de uma experiência, utH, necessária e opera-
cional, decorrente dos Cursos de Extensão Universitária, coordenados
por especialistas e abertos aos estudantes e professores de diferentes
categorias. Com um reparo. Apenas, muito de leve, no sentido de
uma análise, objetiva, então facultada por elementos computados em
eventuais provas de aproveitamento.
Com uma abertura a crítica e sugestões, aceitas a priori tanto pela
Diretoria e mais incisivamente pelo Setor de Imprensa e Propaganda,
encerra-se estas notas com o slogan vezes mil repetido lá em Aracajú:

"Até Florianópolis, em 1977"


11. - PROMOÇÃO DO SIMPÓSIO.
PROMOTORES.

PROMOÇÃO E COORDENAÇÃO.

Associação Nacional dos Professores Universitários de História.


Universidade Federal de Sergipe.
Núcleo Regional da ANPUH - Sergipe.

PATROCtNIO.

Governo do Estado de Sergipe.


Prefeitura de Aracaju.

COMISSÃO DE HONRA.

Dr. Luís Bispo Dr. José Rollemberg Leite.


Magnífico Reitor da UFS. Governador do Estado de Sergipe.
Dr . José Lopes Gama. Dr. José Ribeiro Soutelo.
Vice-Reitor da UFFS. Vice-Governador do Estado.
Profa. Cândida M . F. de
Santana
Coordenadora da Área de Dr. Everaldo Prado Aragão.
Humanidades. Secretário de Educação e Cultura de
Sergipe.
Profa. Maria de Lourdes Dr. João Alves Filho.
A. Maciel. Prefeito Municipal de Aracaju.
Diretora do Instituto de Filo-
sofia e Ciências Humanas.

COMISSÃO EXECUTIVA.

Coordenação Geral:
José Silvério Leite Fontes e Maria da Glória Santana de Almeida.
Secretaria Geral:
Luiz Rabelo Leite, Maria de Andrade Gonçalves e Mar:a The-
tis Nunes.
- 24

Sub-Comissão de Finanças:
Sônia Maria de Azevedo Soares, Alberto Carvalho e Juan José
Rivas Pascua.
Sub-Comissão de Hospedagem:
Luiza Maria Gonçalves, Eduardo Ubirajara Rodrigues Batista
e Maria da Conceição Menezes Vasconcelos.
Sub-Comissão de Recepção:
Wilma Alves de Souza,Terezinha Alves de Oliva e Marlene Mon-
talvão.
Superintendência das Atividades do Simpósio:
Adelci Figueiredo Santos, José Luiz Oliveira, José Alfeu do
Nascimento, Beatriz Góis Dantas e Maria Hosana de Souza.
Representação da Faculdade Tiradentes:
Lauro Pacheco de Oliveira e José Augusto Siqueira.
Representação dos Professores do 2Q Grau:
José Carlos de Souza.
Representação dos Estudantes Universitários:
Heribaldo Bernardino de Souza.

* *
*
ASSOCIAÇÃO DOS PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS DE
HISTÓRIA
(Biênio 1974-1975).

Diretoria.
Presidente - Eurípedes Simões de Paula (SP).
Vice-presidente - José Silvério Leite Fontes (SE).
Secretário Geral - Alice Piffer Canabrava (SP).
1.0 Secretário - Norma de Goés Monteiro (MG).
2.° Secretário - Valmir Batista Correa (MT).
1.0 Tesoureiro - Cecília Maria Westphalen (PR).
2. ° Tesoureiro - Helga Iracema Landgraf Piccolo (RS).
Imprensa e Propaganda - Maria Regina da Cunha Rodrigues Si-
mões de Paula (SP).
- 25-

Conselho Consultivo:
Aydil de Carvalho Preis (RJ).
GadieI Perruci (PE).
Gilka Vasconcelos Ferreira de Salles (GO).
Hélio Dantas (RN).
João Batista Pinheiro Cabral (DF).
José Calazans Brandão da Silva (BA).
José Denizard Macedo de Alcântara (CE).
José Roberto do Amaral Lapa (SP).
Lucinda Coutinho Coelho (GB).
Nancy Tsupal (AM).
Odilon Nogueira de Matos (SP).
Sérgio Afonso deI Caro (ES).
Vera Lúcia Calheiros (AL).
Wilma dos Santos Monteiro (PB).
Walter Piazza (SC).
REGULAMENTO DO VIII SIMPOSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITARIOS DE HISTORIA.

TITULO I.
Das Inscrições.

Artigo 1Q - Poderão inscrever-se no VIII Simpósio da ANPUH os professo-


res e estudantes universitários de Histó:ia, os professores das ma-
térias afins dos mesmos institutos, e os professores de História
dos estabelecimentos de ensino secundário.
§ Único - A inscrição ao VIII Simpósio será feita pela Secre-
ta~ia Geral até 15 de agosto do corrente ano, ou .pela Comissão
Executiva local, durante a realização do certame.
Artigo 2Q - A inscrição dos professores de História e das mltérias afins dos
institutos superiores de ensino, assim como a dos p ·ofessores de
História do ensino secundário, está subordinada ao pagamento
da taxa de participação, de Cr$ 240,00 (duzentos e quarenta
cruzeiros), cor:espondente à anuidade da Associação no biênio
1974/75.
§ primeiro - Aos estudantes. a taxa de participação é de Cr$
120,00 (cento e vinte cruzeiros).
§ segundo - A secretaria local do VIII Simpósio p~ovidenciará
distintivos diferentes para cada categoria de participante.
Artigo 3Q - A Diretoria da ANPUH conferirá aos pa~ticipantes regularmen-
te inscritos no VIII Simpósio, o certificado de comparecimento
ao certame.

TITULO 11.
Das Comunicações.
Artigo 4Q - A apresentação de comunicações ao VIIIQ Simpósio é ~eservaJa
aos professores de História dos institutos do ensino superior.
participantes do certame.
§ primeiro - As comunicações deve:ão ter por objeto, exclu-
sivamente, os assuntos indicados no temário aprovado pelo VII
Simpósio da ANPUH, realizado em Belo Ho-izonte, em setem-
bro de 1973, e dado a conhecer nas circulares distribui das pela
mesma entidade.
-28 -
§ segundo - As comunicações deve~ão ser originais, não sendo
aceitos trabalhos já publicados.
Artigo SQ - As comunicações, sob a forma de resumos, são recebidas pela
Secretaria Geral, e delas transmitirá a relação, em tempo habil, à
Comissão Executiva do VIII Simpósio, para a programação dos
trabalhos das Sessões de Estudos.
§ primeiro - Os resumos das comunicações deverão ser enca-
minhados à Secretaria Geral da ANPUH até 30 de julho do
corrente ano, em uma página datilog:afada, para serem mimeo-
grafados pela Diretoria da entidade e constarem do Elenco a ser
distribuido a cada participante.
§ segundo - O texto completo das comunicações - 30 páginas
no máximo - fora as ilustrações, datilografadas em espaço du-
plo, deverá ser encaminhado em três vias, à Diretoria da entida-
de, para publicação posterior dos ANAIS.
§ terceiro - As comunicações serão objeto de exposição oral
pelos autores, em Sessões de Estudos.
§ quarto - A Diretoria da ANPUH reserva-se o direito de con-
dicionar o rigoroso cumprimento do estatuto nos §$ primeiro e
segundo, para a publicação nos ANAIS e, bem assim, se necessá·
rio, de selecionar os trabalhos a serem imp:esos nos ANAIS.
Artigo 6Q - As comunicações inscritas na Sec~etaria Geral, cujos autores
não estiverem presentes ao VIII Simpósio, não serão programadas
para discussão nas Sessões de Estudos, nem serão impressas no~
ANAIS do mesmo certame, pe:manecendo à disposição dos au-
tores.

TITULO m.
Das Sessões de Estudos.

Artigo 7Q - As Sessões de Estudos são as reuniões dedicadas exclusivamente


à apresentação e debate das comunicações ao VIII Simpósio,
programadas pela Comissão Executiva.
§ único - a condução das Sess&es de Estudo será atribuida aos
Diretores dos Núcleos regionais da ANPUH, e, facultativamente.
aos Professores de História dos institutos superiores de ensino.
Artigo 8Q - As comunicações deverão ser apresentadas pelo Auto~, de forma
sintética, em exposição oral, na Sessão de Estudos, em dia e
hora que lhes for programada.
§ primeiro - Cada autor de comunicação disporá, na Sessão
de Estudos, de 1S (quinze) minutos, no máximo, para apresentar
uma exposição oral da mesma, a qual deverá salientar os pon-
tos fundamentais.
- 29-
I segundo - Os comentários atinentes às comunicações serão
feitos imediatamente ap6s a palavra do auto~, mediante inscri-
ção escrita encaminhada à presidência da Sessão, com o nome
do interpelante.
§ terceiro - Cada intervenção terá a duração ideal de 3 (três)
minutos.
§ quarto - Findas as intervenções, o autor da comunicação
disporá, se assim o desejar, de 15 (quinze) minutos para respon-
der, de modo geral e suscinto, às críticas formuladas, com o di-
reito de encaminhar à Secretaria do VIII Simp6sio justificativa
por escrito para constar dos ANAIS.
§ quinto - Ap6s a resposta do autor da comunicação, cada in-
terpelante poderá usar da palavra por 3 (três) minutos.
§ sexto - Finalmente, o autor das comunicações disporá de 10
(dez) minutos, se quiser usar da palvra.
§ s timo - Sempre que julgar necessário, o presidente da Ses-
são poderá suspender o debate.

TITULO IV.
Dos Cursos.

Artigi 10 - A ANPUH promoverá durante o VIII Simp6sio, a realização


de quatro cursos, ministrados por professores universitários, e
abertos a todos os participantes.
§ primeiro - Somente poderão inscrever-se nos cursos todos
os participantes inscritos regularmente no VIII Simp6sio.
§ segundo - A inscrição em cada curso está sujeita à taxa de
Cr$ 50,00 (cinquenta cruzeiros).
§ terceiro - O curso sobre a "Hist6ria do Nordeste", será
franqueada a todos os interessados.
§ quarto - Os participantes do VIII Simp6sio, inscritos nos
cursos, farão jús aos respectivos certificados de freqência aos
mesmos, conferidos pela Diretoria da ANPUH.

TITULO V.
Das Reuniões.
Artigo 11 - São consideradas reuniões do VIII Simp6sio, as Assembléias
Gerais e as Reuniões Sociais.
§ primeiro - As Assembléias Gerais têm como Objetivo a
discussão, em plenário, dos assuntos pertinentes à Associação
Nacional dos P:ofessores Universitários de Hist6ria.
§ segundo - Somente poderão fazer uso da palavra, nas As-
sembléias Gerais, os professores de Hist6ria dos institutos suo
- 30-

periores de ensino, inscritos regula~mente no certame.


§ terceiro - As Reuniões sociais são promovidas e organizadas
pela Comissão Executiva local do VIII Simpósio, e de sua es-
trita responsabilidade.

TíTULO VI.
Das Moções e Propostas.

Artigo 12 - As moções e propostas relativas aos interesses e objetivos pró


prios da ANPUH deverão ser apresentadas por escritos à Se-
cretaria local do VIII Simpósio nos dias destinados às Sessões
de Estudo, a fim de serem apenas discutidas e aprovadas du-
rante as Assembléias Gerais.
§ primeiro - Não serão recebidas novas propostas e moções
durante as Assembléias Gerais.
§ segundo - As moções e propostas serão submetidas à vota-
ção pelo Presidente da Mesa, e as delibe:ações serão tomadas
pela maioria dos votos dos sócios da ANPUH presentes à reu-
nião.

TITULO VII.
Das Eleições.

Artigo 13 - A Secretaria local do VIII Simpósio providenciará urna e re-


gist:o dos votantes, destinados a receber os votos e assinaturas
dos sócios da eleição da Diretoria da ANPUH, para o biênio
1976-1977 .
§ primeiro - O Presidente da ANPUH comunicará, na As-
sembléia Geral de instalação do VIII Simpósio, os dias destina-
dos ao recebimento de votos e respectivo horá. io, e designará
previamente a Comissão encarregada de apurar o resultado fi-
nal, antes da realização das Assembléias Gerais finais.
§ segundo - O di:eito de voto é reservado aos professores de
História dos institutos de ensino superior, regularmente inscri-
tos no VIII Simpósio.
§ terceiro - O resultado das eleições será proclamado na úl-
tima Assembl ia Geral do VIII Simpósio.

TITULO VIII.
Das Publicações.

Artigo 14 - Cabe somente à Comissão Executiva do VIII Simpósio e à


Diretoria Geral da ANPUH o direito de editar, resumir e en-
-31-

viar ao público e às autoridades competentes, as comunicaçõe~,


exposições, debates, moções e propostas relativos ao trabalho
científico desenvolvido pelo VIII Simpósio.
§ único - As moções e propostas relativas à ANPUH serão
encaminhadas e publicadas pela Diretoria da mesma.

TíTULO IX.
Das Disposições Gerais.

Artigo 15 - Caberá à Comissão Executiva do VIII Simpójo, ouvida a


Comissão Organizadora do ce~tame e a Diretoria da ANPUH,
resolver os casos omissos no presente Regulamento.
PROGRAMA EXECUTADO.

1. o de setembro.

8,00 às 17,00 horas. Inscrição e apresentação de credenciais.


20,00 horas. Sessão solene de abertura. Coquetel.
• •

2 de setembro.

7,30 às 12 horas. l.a Sessão de Estudos.


Equipe A. História Geral.
Presidente: José Silvério Leite Fontes (UF /SE).
Secretário: Alberto Carvalho (UF/SE) .
1. - Marilda Corrêa Ciribelli (FAFI/Vassouras. RJ). - A pro-
priedade rural nas Geórgicas de Virgílio.
2. - Maria Regina e Eurípedes Simões de Paula (USP/SP). - A
propriedade rural no Baixo Império (193-395).
3. - Nachman Falbel (USP/SP). - A heresia dos pseudo-após-
tolos e a dissolução da propriedade rural livre (allodium) nos
séculos XIII e XIV.
4. - Antônio Emílio Muniz Barreto (FEA/USP). - A grande pro-
priedade rural e as transformações da economia de exporta-
ção argentina (1876-1906) .

Equipe B. História do Brasil.
Presidente: Adalgisa Maria Vieira do Rosário (Brasília).
Secretária: Maria Andrade Gonçalves (UF/SE) .
1. - Luiz R.B. Mott (UNICAMP/SP). - As fazendas de gado
do Piauí (1697-1762).
2. - Corcino Medeiros dos Santos (UF/Brasília). - Distribui-
ção e uso da terra no Rio Grande do Sul no século XVIII.
3. - Maria da Glória Santana de Almeida (UF/SE). - Uma uni-
dade açucareira em Sergipe - o Engenho Pedras.
34

*
Equipe C. História do Brasil.
Presidente: Lauro Pacheco de Oliveira (UF /SE) .
Secretário: Alexandre Diniz (UF/SE) .
1. - Alice Piffer Canabrava (USP /SP). - Terras e escravos na
grande lavoura paulista.
2. - Maria Thetis Nunes (UF/SE). - A ocupação territorial da
vila de Itabaiana: a disputa entre lavradores e criadores.
3. - Altiva Pilatti Balhana e Cecília Maria Westphalen (UF /PR).
- Fazendas do Paraná Provincial.
4. - José Enio Casalecchi (FAFI/Araraquara. SP). - A Com-
panhia Industrial, Agrícola e Pastoril d Oeste de São Paulo e
os problemas de mão-de-obra (1912-1924).

*
Equipe D. Metodologia.
Presidente: Maria da Glória Alves Portal (F AFI/Marília. SP).
Secretário: Humberto Rocha (UF /SE) .
1. - Euza de Aguiar Frazão, Maria Luiza Corassin e Niko Zuzek
(USP /SP). - Uma experiência em torno dos seminários de
História Antiga.
2. - José Sebastião W~tter (USP /SP). - O "tape" de televisão
como fonte documental.
3. - José Sebastião Witter (USP /SP). - As fontes para o estudo
do esporte no Brasil no século XX.
4. - David Gueiros Vieira (UF/Brasília). - A crise de julho na
Revolução dos Cravos.

*
Equipe E. Fontes Primárias.
Presidente: Odah Guimarães Costa (UF/PR) .
Secretário: Juan José Rivas Pascua (UF /SE).

1. - Zenilde de Jesus Silva (UF /SE). - Arquivo Público do Es-


tado (Sergipe).
2. - Katia M. Queiroz Matoso (UC/BA). - Fontes para o estudo
da propriedade rural: o Recôncavo baiano, 1684-1889.
3. - Katia M. Queiroz Matoso (UC/BA). - Para uma história
social da cidade do Salvador no século XIX: os testamentos
e inventários como fontes de estudo da estrutura social e de
mentalidade.
- 35-

4. - Maria da Glória Alves Portal (FAFI/Marília/SP). - Aná-


lise de documentos concernentes à propriedade rural na pri-
meira colônia teuta em terra capixaba - 1847-1920 .

14,00 às 18 horas: Cursos - A Metodologia Científica: metodologia
da síntese. - Marilda Corrêa Cirlbelli
(FAFI/Vassouras/RJ) .
- Uma perspectiva da formação econô-
mica do Brasil. - Alice Piffer Cana-
brava (USP/USP) .
- A crise da civilização ocidental. -
Cecília Maria Westphalen (UF /PR).
- Contribuições intelectuais da Idade Mé-
dia para a Civilização Moderna. - Niko
Zuzek (USP /SP) .
• •

3 de setembro.

9,00 às 12,00 horas. - Sessão administrativa.


14 às 18,00 horas. - Cursos (Continuação).
20,00 horas. - Conferência: Aspectos geo-históricos do Nordeste -
José Silvério Leite Fontes (UF /SE) .

* *
4 de
*
setembro.

8,00 horas. - Excursão às cidades históricas de São Cristovão e La-


ranjeiras.
20,00 horas. - Conferência: O Nordeste de 1870 a 1880 - Armando
Souto Maior (UF/PE) .
* *
*
5 de setembro.

7,30 às 12,00 horas. 2a Sessão de Estudos.


Equipe A. História Geral.
Presidente: Eloina Monteiro da Silva (UF/ AM) .
Secretário: Emmanuel Franco (UF /SE).
1. - Jaciro Campante Patrício (FAFI/Marília/SP). - A cons-
telação agro-pastoril da América Espanhola Colonial (1500-
1700).
- 36-

2. - Yessai Kerouzian e Beatriz Diniz (USP /SP). - Política agrá-


ria na Armênia Ocidental sob o Império Otomano nos sé:.:ulos
XIX e XX (1850-1914).
3. - Helmi Mohamed Ibrahim Nars (USP /SP). - A reforma agrá-
ria no Egito.
4. - Rina Azaryah Barreto Nunes (UF /SE) . - A propriedade
rural na obra de George Eliot.

*
Equipe B. História do Brasil.
Presidente: Eurípedes Antônio Funes (UF/GO).
Secretária: Nilce Aparecida Lodi (FAFI/São José do Rio Preto/SP) .
1. - Angelina Nobre Rolim Garcez e Katia M. Queiroz Matoso
UF/BA e UC/BA). - Introdução ao estudo dos mecanismos
da propriedadecacaueira na Bahia: eixo Ilheus-Itabuna.
2. - Maria da Glória Santa de Almeida (UF /SE). - Nota prévia
sobre a propriedade canavieira em Sergipe (século XIX).
3. - Walter F. Piazza (UF /SC). - Introdução à história da
propriedade rural em Santa Catarina.
4. - Hilda Pivaro Stadinsky e Arlete Vieira da Silva (UE/Maringá/
PR). - Estrutura fundiária e cooperativismo. - um estudo
micro-regional.
5. - Maria A. Brandão (UF /BA). - Propriedade e uso da terra
na periferia do Recôncavo açucareiro; prob~emas de história
recente.

*
Equipe C. História do Brasil.
Presidente: João Batista Ferreira (UF /RN).
Secretário: Adelci Figueiredo Santos (UF /SE) .
1. - Diana Maria de Faro L. Diniz (UF ISE). - A propriedade
rural em Rio Claro (SP).
2. - Victor Valla (UFF /NiteroijRJ) . - Fatores relacionados com
a distribuo ção fundiária na lavoura cacaueira da Bahia.
3. - Alexandre Felizola Diniz P, DIana de Faro Diniz (UF /SE) .
- Evolução da distribuição da terra em Sergipe (1920-1960).
4. - Odah Regina Guimarães Costa (UF IPR). - Planos de colo-
nização oficial aplicados a partir da década de 1930 em zonas
pioneiras e de povoamento no Estado do Paraná.

*
Equipe D. Metodologia.
Presidente: Armando Souto Maior (UF /PE) .
Secretária: Victória Namestnikov EI Murr (USP ISP) .
- 37-

1. - José Sebastião Witter, Arlete S. Piqueira, J. C. Neves Lo-


pes, Maria Helena B. Granja, Rosa Maria G. Silveira e
Zélia Fernandes (USP /SP). - Aretê - Uma experiência
de ensino e divulgação científica pelo Rádio.
2. - José Sebastião Witter e colaboradores (USP /SP). - O "Cur-
so Programado de História do Brasil" - experiências e resul-
tados. O ano letivo de 1974.
3. - Amélia Franzolin Trevisan (FAFI/São José do Rio Pardo/
SP). - Os "Sertões", história e arte.
4. - Elza Nadai (USP /SP). - Um projeto de montagem de recur-
sos didáticos aplicados à História.
5. - Haydée de Castro Pimentel (UE/MT). - Estágio Supervi-
sionado - Prática de Estudos Sociais .

Equipe E. Fontes Primárias.
Presidente: Fernando Antônio de Morais (UF /ES) .
Secretária: Maria Hosana de Souza (UF /SE) ;
1. - Hilda Pivaro Stadinsky e Arlete Vieira da Silva (UE/Marin-
gá/PR). - Arrolamento de fontes primárias para um es-
estudo revisional de estruturas fundiárias.
2. - Otavina Mariana da Silveira (UC/MG). - A propriedade
rural e a industrialização de Patos de Minas.
3. - Dorothéa V. G. Beisegel. (UE/MT). - Notas a um manus-
crito inédito: "Parceria e Pecuária" do Dr. José Sab'no do
Patrocínio.
4. - Lúcia Amélia Antunes Sepúlveda (FAF1/Monte Claros/
MG). - Arrolamento de fontes primárias de Montes Claros
- Minas Gerais.
5. - Adalgisa Maria Vieira do Rosário (UF/Brasília). - Docu-
mentos do Arquivo Histórico da Câmara Federal sobre a pro-
priedade da terra (1823-1829).

*
Equipe F. História do Brasil.
Presidente: Hélio Dantas (UF /RN) .
Secretária: Eugênia Nery (UF/BA).
1. - J. C. Barriguelli (I. Piracicabano/SP). -A propriedade -
lucro e capital.
2. - J .C. Barriguelli (1. PiracicabanojSP). - Fazendeiros e vo-
lantes.
3. - Maria Aparecida Rocha Bauab e Nilce Aparecida Lodi (FA-
FI/São José do Rio PretojSP). - Arrolamento das Fontes
Históricas de Olímpia (SP).
- 38-

4. - Nilce Aparecida Lodi (FAFIjSão José do Rio PretojSP).


- 25 anos de Legislação Municipal sobre o ensino - São Jo-
sé do Rio Preto - 1950-1974.

14,00 às 18,00 horas. - Cursos (Continuação).
20,00 horas. - Conferência: Economia açucareira do Nordeste du-
rante o século XIX - Gadiel Perrucci (UF jPE) .
* •

6 de setembro.
7,30 às 12,00 horas. 3. a Sessão de Estudos.
Equipe A. História Geral.
Presidente: Helmi Mohamed Ibrahim Nasr (USP jSP) .
Secretária: Maria da Conceição Vasconcelos (UF jSE).
1. - Raul de Andrada e Silva (USP jSP). - A propriedade rural
durante o movimento autonomista do Rio da Prata (1810-1825).
2. - Joubran Jamil EI Murr (USP jSP). - Breve nota sobre Abu
Yusuf.
3. - Victória N. EI Murr (USP jSP) . - Propriedade rural na
Rússia do século XIX a partir de um conto de Turguéniev.

Equipe B. História do Brasil.
Presidente: Adernar Peixoto Martins (UEjMT).
Secretária: Amélia Franzolin Trevisan (FAFIjSão José do Rio Par-
dojSP).
1. - Ruy Christovam Wachowicz (UF jPR). - A transformação da
propriedade fundiária no vale do Rio 19uaçú.
2. - France Luz e Ivani Omura (UEjMaringájPR). - A pro-
priedade rural no sistema de colonização da Companhia de
Melhoramentos Norte do Paraná - Município de Maringá.

Equipe C. História do Brasil.
Presidente: Paulo M. Gomes (UF IMG) .
Secretária: Maria José Soares (UF JMG) .
1. - Beatriz Goes Dantas (UF jSE). - lndios e brancos em con-
flito pela posse da terra.
2. - Sílvio Tavares (FAFljJacarezinhojPR). - A propriedade
rural.
- 39

3. - Nadir Domingues Mendonça (FAFI/Bagé/RS). - A pro-


priedade rural no processo da urban:zação da campanha rio-
grandense.
4. - Iraci deI Nero da Costa (USP /SP). - Os registros paroqui-
ais como fonte complementar de História Econômica e So-
cial.

Equipe D. Metodologia.
Presidente: Walter F. Piazza (UF/SC).
Secretário: José Augusto de Andrade (UF /SE).
1. - Walter F. Piazza, George P. Browne e David Gueiros Vieira
(UF/SC; USA; UF /Brasília). - Documentação em História
Oral.
2. - Joana Neves (UE/MT). - Estudos de História de Mato Gros-
so - Integração, ensino e pesquisa.
3. - Plauta Carolina Irion e Maria do Nascimento Barnewitz (UF/
Santa Maria/RS). - Organização a nivel departamental de
um setor de Metodologia.
4. - Maria do Nascimento Barnewitz (UF/Santa Maria/RS). - O
sentido da biografia na História.

*
Equipe E. História do Brasil.
Presidente: Katia M. de Queiroz Matoso (UC/BA).
Secretária: Cláudia Nikitiuk (USP /SP) .
1. - Betralda Lopes, Elizabeth C. Mirra e Euza Rossi de Aguiar
Frazão (USP /SP). - O Setor de Documentação do Depar-
tamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ci-
ências Humanas da Universidade de São Paulo e a pesqu:sa
histórica
2. - Emmanuel Franco (UF /SE). - A venda de um escravo.
3. - Emmanuel Franco (UF /SE). - Emigração intelectual.
14,00 às 18 horas. - Cursos (continuação).
20,00 horas. Conferência: O Nordeste e a revolução de 1930 - José
Calazans Brandão da Silva (UF /BA) .
* *
*
7 de setembro.

7,00 horas. - Hasteamento da Bandeira Nacional.


7,30 às 1045. - Cursos (conclusão).
11,15. - Sessão solene de encerramento.
PROGRAMAS DOS CURSOS.

METODOLOGIA DA StNTESE

Profa. MAR/LDA CORREA C/R/RELLI


Instituto de Filosofia e Ciências Sociais - UFRJ e
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Vas-
souras (R. 1.)
I. - Conceituação da Problemática Proposta:
1. - Redação de trabalhos científicos, suas dificuldades;
2. - Atividade científica e trabalho científico;
3. - Metodologia científica como "Ciência Auxiliar";
4. - Metodologia da síntese.
11. - Estratégia do Estudo:
1. - Técnica de Leitura Ativa:
1 . 1. - Objetivos e Etapas;
1 . 2. - Pesquisa do Livro;
1 . 3. - Condições e práticas fundamentais de uma
leitura dinâmica;
1 . 4. - Manejo e utilização do livro.
2. Técnica de Fichamento:
2. 1. - Objetivo;
2 . 2. - Tipos de fichas:
2.2. 1. - Bibliográficas
cópia
2.2.2. - Conteudo
resumo
2.3. - Normas genéricas da elaboração de fichas:
2.4. - Fichas resumo de livro e trabalhos.
3. - Os Resumos:
3. 1. - Necessidade de resumir e esquematizar;
3.2. - Dificuldades encontradas ao resumir;
3.3. - Busca da idéia principal e das secundárias;
3.4. - Técnicas de sublinhar;
-42 -

3.5. - Técnica dos esquemas;


3. 6. - Requisitos fundamentais de um bom ficha-
mento.
III. - Metodologia da Síntese:
1. - Trabalhos científicos e de divulgação;
2. - Diferentes espéc:es de trabalhos científicos;
2. 1. - Pesquisa científica;
2.2. - Relatório e Pesquisa;
2.3. - Tratamentos à maneira científica;
"Recensão", "Abstratos" e "Sumários";
4. - Dissertações, Monografias e Teses.
IV. - Redação de um trabalho científico:
1. - Preocupações do autor:
1 . 1. - Objetivos visados;
1 . 2. - Linguagem científica;
1 . 3. - Planejamento da ação;
1 .4. - Redação provisória;
1 . 5. - Problema do plágio e das citações;
1 . 6. - O conhecimento do conteudo e da metodo-
logia da disciplina.
2. - As partes de um trabalho científico:
2 . 1. - Organização material;
2 .2. - Organização do conteudo:
- Prefácio (Preâmbulo, Proêmio ou Intro-
dução Formal);
Introdução Material;
lndice Remissivo
lndices
lndice Onomástico
Plano ou Sumário;
Os capítulos
Os títulos
- Divisão do trabalho
Os subtítulos
- Notas de pé de página;
- Abreviaturas;
Indicações b:bliográficas;
- Apêndices: Gráficos, tabelas; mapas; glos-
sários; ementas etc ...
V. - Conclusão: Qualidades e Requisitos indispensáveis a Redação
dos Trabalhos Científicos.
43


BIBLIOGRAFIA:

Andrews (T. O.), Méthodes de la Psychologie. Paris, P.U.F. 1952.


Associação Brasileira de Normas Técnicas, Normalização da Documentação
no B:asil. 2. a ed. Rio de Janeiro. I.B.B.D. 1964.
Bayd (Baisden), Mott e Memnler - Bibliotecas. (Como organizar Pesqui-
sas. Como orientar Leituras) Instituto Nacional do Livro. Lida-
dor. 1968.
Berardi (Roberto), Diddatica deUa Storia. Itália. Torino. 1966.
Best (J. W.), Como investigar em Educação. Madrid, Morata, 1967.
Chavigny (P.), Orgaflisaciofl dei Trabajo Intelectual. Barcelona. Labor, 1936.
De La Vega (J. L.), Manual de Documentación. Madrid. Labo~. 1969.
Descartes (R.), Discurso do Método. Rio de JaneLo. E. OU"o. 1965.
Ooode (W.); Hatt (P.), Métodos de Pesquisa Social. São Pauto, Herder, 1968.
Hyman (R.), Natureza da Investigação Psicológica. Rio de Janei"o, Zahar, 1967.
Kaplan (A.), A Conduta na Pesquisa. São Paulo. Herde~,1969.
Morgan (C. T.) e Deese (J.), Como estudar. Rio de Janeiro, Freitas Bastos,
1967.
Nerici (Imideo), Metodologia do Ensino Superior. Brasil. Potugal. Rio de
Janeiro. Ed. F. de Cultura, 1967.
Ne:ici (1.0.), Educação e Metodologia. Livraria Pioneira Editora. São Paulo,
1970.
Pardinas (O.), Metodologia y Técnicas de Investigaciófl en las Ciencias Sociales.
México, 1969.
Ramon y Cajal, Regras e Conselhos sobre a Investigação Científica. Lisboa.
s/d
Rego (Silva), Lições de Metodologia e Crítica Histórica. Lisboa, Portucalensis,
1969.
Ruy (Luiz), Como Redigir trabalhos científicos. São Paulo, Universidade de
São Paulo, 1972 .
Salomon (Délcio Vieira C.), Como fazer uma monografia. (Elementos de
Metodologia do trabalho científico). Instituto de Psicologia da Uni·
versidade Católica Minas Oerais. Belo Horizonte. 1971.
Selltiz (C.); Jahodam; Deutsch (M.); Cook (S.), Métodos de Pesquisa na)
Relações Sociais. São Paulo, Herder, 1967.
Vera (A. A.), Metodologia deUa Investigation. B. A. Kapeluz. 1968.
Vilas Boas (Maria Violeta), Como estudar. Senac. Rio. 1959.

• •

- 44-

CONTRIBUIÇÕES INTELECTUAIS DA IDADE M:E:DIA PARA


A CIVILIZAÇÃO MODERNA.

Prof. NIKO ZUZEK


Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
da Universidade de São Paulo.

1. - Renascença do século XII.


2. Organização e tipos de Universidades.
3. Ensino: currículos, mestres, alunos e graus.
4. Conquistas humanistas das Universidades medievais.
5. Reflexos sócio-políticos do ensino universitário medieval.

BIBLIOGRAFIA:

D'!rsay (S.), H istóire des universités françaises et étrangeres des origines à nos
jours. Paris, 1933.
Paré (O.), Brunet (A.) et Tremblay (P.), La Renaissance du Xl/e siecle.
Les ecoles et l'Enseignement. Paris, 1953.
Renucci (P.), L'aventure de l'humanisme europeen au Moyen Age. Pa~is, 1953.
Nordstrom (J.), Moyen Âge et Renaissance (trad. do sueco). Paris, 1933.
Langlois (Ch. V.), La connaissance de la nature et de monde au M oyen Âge.
Paris, 1911.
Ooff (J. Le), Les intellectuels au M oyen Âge. Paris, 1962.
Haskins (C. H.), The Renaissance of the Twelfth Century, London, 1927.
Hearnshaw (F. J. C.), Medieval Contributions to Modem Civilization. Lon-
don, 1927.
Thorndike (L.), Um'versity Records and Life in the Middle Ages, Oxford, 1944.
Simões de Paula (E.), As Universidades Medievais, in "Revista de História",
n Q 31. São Paulo, 1957.
Janotti (A.), Condicionalismo sócio-cultural das origens do movimento uni-
versitdrio europeu, in "Revista de Histó~ia", nQs. 82, 85, 87. São
Paulo. 1970-72 .
* *
UMA PERSPECTIVA
*
DA FORMAÇÃO ECONôMICA
DO BRASIL.

Profa. ALICE PIFFER CANABRAVA


Faculdade de Economia e Administração da Univer-
sidade de São Paulo.

1. - Os fundamentos conceituais da Formação Econômica do Brasil


de Celso Furtado. As características da obra.
-45 -

2. A economia da Grande Lavoura de produção açucareira.


3. A economia escravista da Mineração.
4. A economia cafeeira e o problema da mão-de-obra.
5. Os problemas de nivel de renda e de crescimento na segunda
metade do século XIX.

Bibliografia básica:

1. - Furtado (Celso), Formação Econômica do Brasil. 1<' edição, Rio de


Janeiro, 1959.
2. - Prado Júnior (Caio), Formação do Brasil Contemporâneo. Colônia. 13
edição, São Paulo, 1942.
3. - Prado Júnior (Caio), História Econômica do Brasil. 1(1 edição, São
São Paulo, 1945.
4. - Simonsen (Roberto C.), História Econômica do Brasil, 1500-1820. 1(1
edição, São Paulo, 1947, 2 vols.
5. - Andreoni (João Antônio) (André João Antonil) - Cultura e Opulência
do Brasil, Texto da edição de 1711, Introdução e Vocabulário por
A. P. Canabrava. 2(1 edição, São Paulo, 1973.
6. - Calógeras (João Pandiá), As minas do Brasil e sua legislação. Rio de
Janeiro, 1904/5, 3 vols.
7. - Taunay (Afonso de E.), Pequena História do Café no Brasil. Rio
de Janeiro, 1945.
8. - Silva (Sérgio Milliet da Costa e), Roteiro do Café e outros ensaios.
Contribuição para a história econômica e política do Brasil. 3(1 edição,
São Paulo, 1941.
9. - Manchester (Alan K), British Preeminense in Brazil. lts rise and de-
cline, Chapell Hill, 1933.
10. - História Geral da Civilização Brasileira, direção de Sérgio Buarque de
Holanda. Tomo I, voI. 2 - Administração, Economia e Sociedade;
Tomo 11, voI. 4, Declínio e Queda do Império. São Paulo, 1962, 1971.

• •

A CRISE DA CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL.

Profa. CECILIA MARIA WESTPHALEN


de Universidade Federal d Paraná

1. Situação conflitual do mundo contemporâneo.


2. Contestações e angústias.
3. Filosofias das História.
4. Sínteses explicativas.
5. Opções alternativas.
-46-

BIBLIOGRAFIA:
Althusser (Louis), Pour Marx. Paris, Maspero, si d .
Aron (Raymond), Sociologie des sociétés industrielles: esquisse d'une théorie
des regimes politiques. Paris, Centre de Documentation Universitaire
1964.
Braudel (F.) et am, Le monde actuel. Paris, E. Belin .
Braudel (Fernand), Ecrits sur I'Histoire. Paris, Flammarion, 1969.
Camus (Albert), Le mythe de Sisyphe. Paris, Gallimard.
Foucault (M.), Les mots et les choses. Paris, Seghers, 1961.
Grenet (Paul), Theilhard de Chardin, Paris, Seghers, 1961.
Grousset (R.), Bilan de I'Histoire, Paris, Plon.
Huillier (F.), et am, Histoire de notre temps: politiques et conflits internatio·
naux, 1945-1962. Paris, Sirey, 1966.
Jaspers (Karl), La situation spirituelle de notre époque. Paris, Desclés de
Brouwer, 1951.
Levy-Strauss (Claude), Le pensée sauvage. Paris, Plon.
Lipset (Seymour M.), O homem político. Rio de Janeiro, Zahar, 1967.
Marcuse (H.), Eros e civilização, Rio de Janeiro, Zahar, 1969.
Maritain (J.), HU11lanisme integral: problemes temporels et spirituels d'une
nouvelle chretienté. Paris, Iubier, 1947.
Mounier (E), Introduction au existentialisme. Paris, Gallimard.
INSCRIÇOES (*) .

Adalgisa Maria Vieira do Rosário - DF


Adalgisa Rosa da Conceição
Adernar Araujo da Costa - RN
Adernar Peixoto Martins - MT
Adhemar de Oliveira - SP
Adria de Araujo Ramos Lavres - SE
Adriana Maria Carbonell Gragnani - SP
Agamenon de Araujo Souza - SE
Agamenon Guimarães Oliveira - SE
Aglaé Ferreira de Araujo Ramos - SE
Ailda Porto Hora - SE
Aidil Carvalho de Carvalho - BA
Albene Miriam F. Menezes - BA
Albertina Lima de Vasconcelos - BA
Alberto Carvalho - SE
Alberto Lima Vasconcelos - BA
Alda Alves de Araujo - SE
Alda Maria Duarte A. Castro
Aldeci Figueiredo Santos - SE
Alice Piffer Canabrava - SP
Aline Castelo Branco - SP
Almerinda Izabel Viana - MT
Altiva Pilatti Balhana - PR
Amália Xavier Pontes - PB
Amélia Trevisan - SP
Ana Alice Barreiros da Silva - RI
Ana Alice Cones - MT
Ana de Almeida -
Ana Bertrame - SE
Ana Conceição S. Carvalho - SE
Ana Luiza D. Valadares - MG
Ana Maria Abreu de Almeida - RI
Ana Maria Correa F. Barone - SP
Ana Maria da Costa Rodrigues - RN

( *). - Esta lista, infelizmente, está incompleta em virtude de extravio


de algumas folhas de registro de presença e de falta de indicações precisas
acerca do p:oveniência dos simposiastas. (Nota da Redação).
-48 -

Ana Maria Macedo de Souza - RN


Ana Maria de S. Boer - RS
Ana Maria de Sant'Ana Barros -
Ana Maria Xavier Moreira - MO
Ana Marízia Melo e Silva - SE
Ana Ruth Teixeira Nery - SE
Andrelina de Melo - SE
Ângela Assis Moreira -
Ângela Inês Liberatti - SP
Ângela Maria Cardoso de Lima - SE
Ângela Maria Matos - SE
Ângela Maria Passos Machado - SE
Ângela Maria de Sant'Ana Almeida - BA
Ângela Maria Silveira de Aragão -
Ângela Maria de Souza Macedo - BA
Ângela de Oliveira Dieb - RN
Ângela dos Santos R. de Carvalho - BA
Angelina Nobre Rolim Garcez - BA
Ângelo Bressan Filho - SP
Ângelo Reia Neto - SP
Anieta Teixeira de Souza - SE
Anita Novinsky - SP
Antonieta Gomes de Melo - SE
Antônio Batista Neto - SE
Antônio Benedito Nogueira - MG
Antônio Eduardo Silva Ribeiro - SE
Antônio Emílio Muniz Barreto - SP
Antônio Fernando S. dos Santos - SE
Antônio José Soares -
Antônio Norberto Martins - SP
Antônio Sérgio Melo Braz - MG
Antônio Vieira de Araujo -
Ápio Costa Rosa - MG
Araci Losano Fontes -
Ariadne Nascimento de Souza - SE
Arlete Ribeiro José - RJ
Arlete Vieira da Silva - PR
Augusto Amândio A. Lino - BA
Aurora Maria dos Santos Matos -
Avani Aparecida Rogatti Omura - PR

Beatriz Diniz - SP
Beatriz Goes Santos - SE
Beatriz Migueis Serra - MT
Benedita C. Lima - RJ
- 49-

Benélia Albanete de Oliveira - RN


Benemérita de Barros Vilela - SE
Bertha Maria de Azevedo Feio - RJ
Betralda Lopes - SP
Cacilda Maria de Jesus - SP
Camilo da S. Oliveira - SP
Cândida Raquel Lopes Cardoso -
Carlos Augusto Costa Garcia -
Carlos Eduardo Guimarães - SE
Carlos Roberto de Oliveira - SP
Carmen Regina de Vargas - RJ
Carmozita Fontes Fereira - SE
Cecília Maria Westphalen - PR
Celeste Maria de Oliveira Souza - SE
Cibele de Oliveira Correia - SE
Cícero Pinheiro Maciel - SP
Clara Marta Costa da Silva - SE
Clarice Geraldo Salomão - MG
Claudia Lima - SE
Cládia Nikitiuk - SP
Cláudio Sanches de Araujo - RJ
Clea Maria Brandão Mendes - SE
Cleofas Sant'Ana -
Corsino Medeiros dos Santos - SP
Creusa Maria dos Santos - BA

Daisy Ribeiro de Carvalho - SP


Dalila Chagas Sobrinho
Dalísia E. Martins Doles - GO
Daniel Lopes de Moraes - RS
Dante Caldas Martins - RJ
Darcy Aparecida Diniz - SP
Darcy Fantini - MG
David Gueiros Vieira - DF
Denise Costa Lima da Rocha - SE
Diana Maria de Faro Leal Dinis - SE
Dídimo Buarque da Silva -
Dileindo Assis Godoy - MT
Diana Maria de Faro Leal Diniz - SE
Diores Santos Abreu - SP
Dirce Higa - RJ
Djanilton Macedo Mafra - RN
Doraleida Vieira Froes -
Edélcio Polenas Gomes - SE
50 -

Edgard Carone - SP
Edna Antônia Cordeiro - SP
Edna Inagaki - RJ
Edna Maria da Rocha Plácido - SE
Edna Fagundes dos Santos -
Edilzeni Maria de Figueiredo - PB
Edinete Bezerra da Silva - SE
Eduardo Andrade Barbosa -
Eduardo Ubirajara R. Batista -
Edvaldo Santos Rocha Teles -
Edwiges Maria da Costa Nascimento - SE
Eliana Melo Santos -
Eliane Dias Duarte - MG
Elina Maria Trindade Freitas - SE
Eloina Monteiro dos Santos - AM
Elizabete Conceição dos Santos Guimarães - RI
Elizabete Goes da Rocha - SE
Elizabete dos Santos Bernardo - SP
Elizabete Santos R. Teles - SE
Elisete Feitosa de Rezende - SE
Elizete Rocha Alves - SP
Elpídio Jacob Braun - RS
Elvira Mari Mara Kubo - PR
Elza Carneiro - SP
Elza Nadai - SP
Elza da Silveira Fontes - SE
Emanuel Franco - SE
Enau:oa Souza do Nascimento -
Enolina da Rocha Santos - SE
Erilene Correa de Matos - SE
Erivaldo Bernardino Souza - SE
Esmeralda Almerinda Campelo do Bomfim - BA
Esmeralda de Oliveira - MT
Eugênia Lúcia Viana Nery - BA
Euler Ruchhardt Freire - SE
Eunice Tavares Dantas -
Eurípedes Antônio Funes -<30
Eurípedes Simões de Paula - SP
Eusilles Pastore - SE

Fábio Manuel dos Santos - SE


Fátima Cristina da A. Rocha - SE
Fernando Antônio de Castro - BA
Fernando Antônio de Moraes Achiane - ES
Flávio Antônio da S. Nascimento - SP
-51-

France Luz - PR
Francisca Anaide Rondon Valinos - MT
Francisca Edna Galvão - RN
Francisco Cesar Álvares da Cruz - SE
Francisco Pinto Cabral - SP
Gadiel Perruci - PE
Geani Silva Tavares - RI
Geo~ge Philip Browne - USA
Geraldo Batista Ferreira da Silva - RN
Geraldo Sálvio da Silva Costa - SE
Gervásio Rodrigues Martins - SP
Gilbert Zarmati - SP
Gilce Macedo Rocha - SP
Gildete Aguiar Caldas -
Gildete Tavares de Jesus - SE
Gilnete Cardoso - SE
Gilene de Souza Sales - RN
Gilvacy Medeiros da Cunha - SE
Gipse Pereira Montenegro -.- RN
Gircea Vieira de Souza -
Gilzelda Maria Gonçalves Silva - SE
Grimaldina de Carvalho - GO
Haydée de Castro Pimentel - MT
Helmi Mohamed Ibrahim Nasr - SP
Helena Barros - RN
Helena Pignatari Werner - SP
Helena Pinheiro dos Santos - SE
Heleno Ávila dos Santos Silva - SE
Hélio Carlos de Almeida - RJ
Hélio Dantas - RN
Heloisa Barbosa da Silva - SP
Hilda Pívaro Stadniky - PR
Holien Gonçalves Bezerra - SP
Hortência Maria Sobral Magalhães
Humberto da Rocha Souza - SE
lalmar Leocádio Viana - BA
Iara Miranda - MG
Iara Moema Barreto - SE
Ibaré Aires Pinto - RS
Idê Maria Pacheco - MG
lete Rodrigues -SP
Ilza Santos Donald - SE
Inácio Aluzzi Fonseca - MG
Inah Souza Silva - SE
- 52

Irací deI Nero Costa - SP


Iraní Lucia Ferreira Pires - SP
Irene Nedavaska - SP
Ireni Silva Vasconcelos - BA
Irma Araujo Avila Quintero - MG
Isabel Cristina da Silva - MT
Izabel Maria Villela Costa - SE
Izabel Menezes - SE
Iva Margarida M. Vieira - SE
Ivan Dória Câncio Soares - BA
Ivan Silva Lima -
Ivar:ete Rocha de Oliveira - SE
Ivete Nunes Palermo - SP
Izaias de Jesus Carmo - SE
Izailde Cesar N ovaes -

J acêmia N. Dantas Teixeira Porto - SE


Jaelson Bitran Trindade - SP
Jairo de Araujo Andrade -
Jandira Batista de Azevedo - SE
Jane Henriques de Oliveira - MG
J ane de Souza Vieira - SE
Janete de Oliveira Santos - SE
J anice Stelman Leôncio - RJ
J ayro Gonçalves Melo - SE
Jerônimo Barros Ferreira Costa - MG
João Andrade Teles - SE
João Batista Ferreira da Silva - RN
João Batista Pinheiro Cabral - DF
João Francisco Tide Lima - SP
João Luis Clemente - SP
João R. Castro Filho - SP
João Tavares de Amorim - PE
Joana d'Arc Lemos Moura -
Joana Neves - MT
Jorge Luiz C. Rubini - BA
José Alberto Pereira Barreto -
José Alfeu do Nascimento - SE
José de Almeida Lima - SE
José Antônio Segatto - SE
José Arnaldo Coelho de A. Lima - MG
José Augusto de Andrade - SE
José Benedito Zavella - SP
- 53-

José Calazans Brandão da Silva - BA


J osé ~nio Casalecchi - SP
José Jorge Santos Mesquista - SE
José Luiz de Campos - SP
José Paulo de Menezes - SE
José Rivadavia Lima - SE
José Silvério Leite Fontes - SE
José Sebastião Witter - SP
Josefa de Almeida Santana - SE
Josefa Eliana Souza - SE
Josefa do Espírito Santo Menezes -
Josefa Ferreira Aquino - SE
Josefa Marlene Santos -
Josefa Suzana de Almeida - SE
Joseny Silveira Paullineli - MG
Jaciro Campante Patrício - SP
Juberto Carlos dos Santos - SE
Joubran EI Murr - SP
Juçara Maria Duarte do Amaral - SP
Juçara Rabelo de Lima - SE
Júlia Maria Andrade e Silva - SE
Júlia Maria de Paula Rocha -
Jussara Rabelo Avila - MG

Kátia de Queiroz Mattoso - BA

Ladislau Martinelli - ES
Laima Mesgravis - SP
Laudelino Graciliano Mateus - SE
Lauro Pacheco de Oliveira - SP
Lauro Rocha de Lima -
Lea Maria Sobral Bispo - SE
Leila Maria dos Santos - SE
Leilah Coelho Leite - SE
Ledinalva Simões - BA
Lenelice Ramos Carvalho - BA
Lení Ferreira Chaves - MG
Leopoldo Manoel de Souza - SE
Lidenice Damásio da Silva Soares - M T
Lídia Gomes da Silva - RN
Lígia Beatriz de Paula Germano - MG
Lígia Soares de Abreu - PR
Lili H. Matzembacher - PR
Lindinalva dos Santos - SE
Lizete Martinelli Paiva - ES
- 54-
Lucenira Souza Possos - SE
Lúcia Benevides de Lemos Tavares - SE
Lúcia Maria Maiená - SP
Lúcia Maria dos Santos Oliveira - RN
Luciano Sales de Oliveira - SE
Luciara Silveira Aragão e Frota - CE
Lucila Carvalho Junqueira Meir - SP
LucilIa da Rocha Santos - SE
Lucinara Souza Passos - SE
Luiz Cesar Lisboa Teixeira - SE
Luiz Gonzaga dos Santos -
Luis Henrique Dias Tavares - BA
Luiz Mott - SP
Luiz Palacin - GO
Luiz Ricardo Maria Rabelo - SE
Luiza Andrade da Silva - SE
Lizette MartineIli paiva - ES

Magaly Lima Franco -


Magna Maria Santana - SE
Marcia Aparecida Brasil - SP
Marcia Cristina Gonçalves Conceição
Marcia E. Campos Graff - PR
Marcia Silva Lacerda - RI
Marco Antônio Romero - MG
Marcy José de Souza - SP
Maria Adalgiza dos Santos Almeida - SE
Maria Amélia Menezes de O. Silva - SE
Maria Ana Ferreira - GO
Maria de Andrade Gonçalves -
Maria Andrelina de Melo - SE
Maria Ângela Malatesta - SP
Maria Angélia Braga - RI
Maria Aparecida Carvalho Silva - SE
Maria Aparecida Fernandes Trindade
Maria Aparecida Paladini - SP
Maria Aparecida Rocha Bauab - SP
Maria Aparecida Teixeira - SE
Maria Auxiliadora Santos Silva - SE
Maria de Azevedo Brandão - BA
Maria Bernadete Ribeiro Goes - SE
Maria Bueno Bastos - SP
Maria Cândida Araujo -
Maria Carmem A. Perdigão - MG
- 55-

Maria do Carmo Leandro Borges - RN


Maria do Carmo de Oliveira - SE
Maria do Carmo da Silva - SE
Maria do Carmo Silva Araujo -
Maria Cecília Caropreso - SP
Maria Célia de Lima - PB
Maria Célia Portella Nunes - RJ
Maria Célia Xavier dos Santos - SE
Maria Clarice da Silva - RJ
Maria Claudina Soares Santos - SE
Maria Conceição Carvalho Moura - RN
Maria Conceição de França Dutra - SE
Maria Conceição Menezes Vasconcelos SE
Maria Conceição M. de Souza - SE
Maria Conceição Santos - SE
Maria da Conceição Serra - SE
Maria da Cunha Escobar - MT
Maria Dalva Medeiros Silva - RN
Maria das Dores Martins - SP
Maria Edivalda Silva -
Maria Edna F. Fonseca - SE
Maria Eliana Basile - SP
Maria Elizabete de Santana - SE
Maria Elizabete da Silva -
Maria Eleonora Barrero de Lima - SE
Maria Basile - SP
Maria Eliane da Silveira - R"I
Maria Emília Lima Costa - SE
Maria Eugênia de Medeiros - RN
Maria Evalci Silva - SE
Maria Evilnardes Machado Dantas - RN
Maria de Fátima C. Rezende -
Maria de Fátima C. Silva - SP
Maria de Fátima Mendes - RJ
Maria de Fátima N. de Menezes
Maria de Fátima P. Paixão - SE
Maria de Fátima Silva - SE
Maria de Fátima Viana Lima - CE
Maria Feliciana Montalvão -
Maria Filomena da Cunha Gebran - RJ
Maria Fonseca Menezes - SE
Maria Francisca Lopes de Oliveira -
Maria Gilsa de Oliveira - SE
Maria Gilza Alves Santos - MG
Maria das Graças B. de Aguiar - SE
- S6 -

Maria das Graças Barreto Menezes -


Maria das Graças Firmo Ávila - SE
Maria das Graças J. Rodrigues - CE
Maria das Graças Melo - SE
Maria da Glória Alves Portal - SP
Maria da Glória Santana Almeida - SE
Maria Goretti de Castro Cortez - RN
Haria Haydée Gonçalves Dias - RJ
Maria Helena de Mendonça - SE
Maria Helena Santa Cruz - SE
Maria Helena Silva Melo -
Maria Hilda Batista - SE
Maria Hortência S. Oliveira - SE
Maria Hosana de Souza -
Maria Ignez Arregny Soares -
Maria I1aide Marques de Souza - SE
Maria Inácia dos Santos - SE
Maria Inês Alves B. Andrade - SP
Maria Inez dos Santos -
Maria Izabel Ramos Cardoso - SE
Maria Izabel dos Santos - SE
Maria Izabel dos Santos Andrade - BA
Maria Izabel dos Santos Silva - SE
Maria Ivette Martinelli - RS
Maria Jessemy Leite Cavalcante -:- CE
Maria José Andrade -
Maria José França Veiga - SE
Maria José Lemos de Menezes - SE
Maria José de Oliveira -
Maria José Santos de Jesus - SE
Maria José Santos Silva -
Maria José de Souza - SE
Maria José Tenório da Silva -
Maria Ledna Faria Fonseca - SE
Maria Júlia Pascale - SP
Maria Lení de Oliveira - PE
Maria Lígia Madureira Pina -
Maria de Lourdes Amaral Maciel - SE
Maria de Lourdes Goes - SE
Maria de Lourdes Goes Silva - SE
Maria de Lourdes Maciel - MT
Maria de Lourdes Malta Varejão - ES
Maria de Lourdes Moraes - RJ
Maria de Lourdes Nunes dos Santos - SE
Maria de Lourdes Pinto Silva - RN
- 57-

Maria de Lourdes Rodrigues Fontes - SE


Maria de Lourdes Santos - SE
Maria de Lourdes Teixeira Porto - BA
Maria de Lourdes Veiga - SE
Maria Lúcia Ramos de Carvalho - SE
Maria Lúcia de Souza Rangel Biase - SP
Maria Lúcia Cerqueira Alves - SP
Maria Luiza Ferreira Ribeiro - SE
Maria Luzia Peixoto - SE
Maria Madalena A. Lisboa - SE
Maria Mercês - SE
Maria Miriam Lima - SE
Maria Nazaré de Lima - SE
Maria Nivalda dos Santos -
Maria Odete do Nascimento -
Maria da Paz Conceição - SE
Maria da Piedade Costa - RN
Maria Pureza da Conceição -
Maria da Purificação Aragão - SE
Maria Regina Alcântara Nascimento - SE
Maria Regina da Cunha ROdrigues Simões de Paula - SP
Maria Rosana de Souza - SE
Maria do Socorro de A. Rocha - SE
Maria do Socorro Alves -
Maria Solange Soares Rocha - SE
Maria TeIma Santos -
Maria Tereza Cury - SP
Maria Tereza Salgueiro Pereira -
Maria Therezia Butzen - SC
Maria Tetis Nunes - SE
Maria Terezinha M. Porto - SE
Maria Vânia Valois Tavares - SE
Maria Vilma da Silva Siqueira - SE
Maria Virgínia Viana da Silva - SE
Marielza Ribeiro Sebastião - SP
Marília Cristina C. Conceição - BA
Marilda Corrêa Ciribelli - RI
Marileide Almeida Barreto - SE
Marilene Almeida Barreto - SE
Marilene Gomes dos Anjos -
Marilene Souza - SE
Marinalva Meirelles Coelho - BA
Maristher Moura Vasconcellos - SE
Marivone Matos Chaim - GO
Mariza Saens Leme - SP
- S8

Marlene Machado Tojal -


Marlene de Moura Carvalho Mendes - SE
Marlene de Souza Santana - RN
Marlí Sobral Magalhães - SE
Marluce Freire de Araujo - SE
Marlúcia Maria Falcão Viana -
Martha Christina A. Tavares -
Masako N akatami - PR
Miriam Akiko - SP
Miriam Cambará - MT
Miriam Poli Nicolosa - SP
Mônica Salomão - SP

Nachman Falbel
Nader Domingues Mendonça - RS
Nádia Ângela dos Santos Torno - RJ
Nadir Vieira dos Reis - MT
Neuza Batista de Assis - MT
Nadja Maria de Oliveira Bezerra - SE
Nadja Maria Teles dos Santos - SE
Neide Maria Souza Carvalho - SE
Neide Ferreira Pinto -
Neide Tenório de A. Ferreira -- SE
Nely Reis Bacelar - SP
Neuma Maria Prado Carvalho -
Neuza Maria de Andrade Menezes -
Nida Gattaz Nasr - SP
Niko Zuzek - SP
Nilce Aparecida Lodi - SP
Noemí dos Santos - SE
Norma da Cruz Poconé - MG
Norma Regina Pinotti - SP

Odah Regina Guimarães Costa - PR


Odete Toledo de Albuquerque - MG
Oraides Vieira - GO
Orlando Mancini - SP
Ozilda Freire Nunes - RN
Osanir Aldereste Fernandes - RJ

Paulo Freire Lima - SE


Paulo de Melo Filho - MG
Paulo Miranda Gomes - MG
Paulo Nogueira Fontes - SE
Philomena Gebran - RJ
59 -

Pires Ioseph - SP
Plácido Alves - SE
Raimunda Fontes Vieira - SE
Raquel Gonçalves Dias - RI
Raquel Glezer - SP
Raul de Andrada e Silva - SP
Regina Costa de Oliveira - SE
Regina Lúcia da Silva - MT
Rey Belem de Araujo - SE
Rina Azaryain Barreto Nunes - SE
Rita de Cássia Andrade de Souza - SE
Rita França de Aguiar - SE
Roberto Machado de Carvalho - SP
Roberto Sanches Rabello - BA
Rodolfo Pontel - SP
Rosa Gomes Vieira - SE
Rosa Maria de Araujo - SE
Rosa Maria Costa Leal - SE
Roseana Brito Mota - SE
Rosemarie Carneiro Cruz - RS
Rosemary da Conceição Silva - SE
Rufino Porfírio de Almeida - SC
Ruth do Valle - RS
Ruy Christovam Wachowicz

Samira Hanrouche - SP
Sandra Fernandes -
Selma Maria Fontes dos Santos -
Selma Maria da Silva - SE
Sérgio Aguiar - SP
Sérgio Barreiras - DF
Sérgio Dapieve Miranda - BA
Sérgio de Paula Amaral - MG
Silene Fátima Cunha - MG
Silvana Maria Leal Coser - MG
Silvio Rosário Lima -
Simone Tavares R. de Pinho - BA
Sônia Cristina S. da Silva - SE
Sônia Maria de Almeida - SP
Sônia Maria de Azevedo Soares - SE
Sônia de Azevedo Gonçalves - RI
Sônia Maria Bonetti Moreno - SP
Sônia Maria Carpinter Barbosa - RI
Sônia Maria Oliveira Othon - RN
Sônia Maria da Silva - SP
- 60-

Sônia Maria da Silveira Fontes -


Sueli Robles de Queiroz - SP
Suzete Pereira de Carvalho - RN
Tânia Maria Fonseca Andrade - SE
Tarsila Rosana B. Tirace - SP
Teima Remião Moura - RS
Teima Rosita Andrade -
Tereza Correia Menezes -
Tereza Cristina R. Prudente - SE
Tereza Faro Passos - SE
Tereza Santos Lemos -
Terezinha Assad Figueiredo - MT
Terezinha Cunha Fajardo - RI
Terezinha de Jesus Severo - RS
Terezinha Oliveira de Souza -
Terezinha Silva Araujo - SE
Valdete Pires de Araujo - GO
Valdice dos Santos Oliveira - SE
Valmir Batista Correa - MT
Valtênio Paes de Oliveira - SE
Vanda Santana Marcena - SE
Vânia A. de Souza Cruz
Vânia da Silva Campos - RJ
Vanilda Carvalho Lopes - RN
Veida Flogino Godoy - MT
Vera Lúcia Costa Santana - SE
Vera Lúcia dos Anjos Maciel - SE
Vera Lúcia de Azevedo - SE
Vera Lúcia Barbosa Gomes - MG
Vera Lúcia de Macedo - RN
Vera Lúcia Cordeiro dos Santos - BA
Vera Lúcia Martella - SP
Veralúcia Gomes de Melo -
Vera Maria Cordilhã Porto -
Vera Maria Fonseca Teixeira - SE
Verônica Maria Menezes Nunes - SE
Victória Namestnikov el Murr - SP
Vilma Monteiro Barreto - SE
Vilma Santana - SE
Vitor Valia - RJ
Victor Paes de Barros Leonardi - DF
Vitória Nunes de Moura - SE
Wagner de Paiva Ferreira - RN
Waldcmir D. Zamparoni - SP
- 61

Waldir Pires Argolo - SE


Walter Fernando Piazza - se
Weimar Lúcia Dorini de Oliveira - SP
Wilma Alves de Souza - SE
Wilma Roma Faro - RS
Wilson Pizzi dos Reis -
Wilson Valentim Biasotto - MT
Wladimir Dolabel1a Bicalho - MO

Yvone Leonel Alves Oarcez -

Zailde Soares Matos - SE


Zamaria Mahd Abdelhamiel - MT
Zélia de Deus Ferreira - SE
Zenilde de Jesus Silva -
Zilda Monteiro de Oliveira - MT
Zilene Marinho de Souza - SE
Zilnette Martinelli - ES
lII. - SESSÕES SOLENES.
DISCURSO DO PROFESSOR EURIPEDES SIMõES DE
PAULA, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS
PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS DE HISTÓRIA, POR OCA-
SIÃO DA ABERTURA SOLENE DO VIII SIMPÓSIO.

Permitam-me, as autoridade, a comunidade sergipana aqui pre-


sentes, trazer-lhes os agradecimentos da ANPUH que se afirma posi-
tiva e irreversivelmente no contexto das realizações culturais do Brasil
com este VIII Simpósio Nacional, cuja realidade representa a vossa
receptibilidade à proposta apresentada à Assemb:éla Geral de Belo-
Horizonte, há dois anos, pelo presidente do Núcleo Regional de Ser-
gipe em considerações agrupadas nas vertentes seguintes:
1. - plataforma pioneira de Sergipe;
2. Concretização da problemática criada com os "Estudos So-
ciais": o lugar da História e dos candidatos a historiogra-
dores;
3. - a estrutura do VIII Simpósio Nacional.
1. Plataforma pioneira de Sergipe.
Os Simposiastas poderão constatar na análise de uma perspectiva
diacrônica, a fidelidade que Sergipe vem mantendo ao papel de pla-
taforma pioneira. Sejam focados dois fatos apenas:
ontem, pois foi das margens do rio Real que partiu o 1.° grito,
o 1.° impulso de reação contra os invasores flamengos. Sergipe
foi no continente americano uma réplica, de curta duração graças
a Deus, como a resistência nas Astúr:as, durante a Reconquista
Ibérica.
hoje, um outro pioneirismo, a 1.a plataforma 'la ANPUH em
todo o Nordeste e Norte do País. Justifica-se que se repita que,
em 14 anos de atividades ininteruptas, de tentativas inauditas, é a
1.a vez que historiadores fincaram o pé numa plataforma nor-
destina, a fim de dialogar com os colegas de áreas afins, com uma
comunidade autêntica através dos seus elementos mais represen-
tativos. Plataforma que se torna o epicentro de um leque, cujas
varetas, com três exceções, por ora, cobrem todo o território da
República Federativa do Brasil.
- 66-

Considerando que nós todos estamos atarrachados ao presente,


vislumbramos uma plataforma continental. de cu;as sinclinais, a tecno-
logia vem de extrair o petróleo, esse parâmetro' do poderio incontes-
tavel nos tempos presentes. Enquanto que silenciosa e positivamente,
já se vem 2.~entando a presença do mesmo nos vossos campos de
Carmpólis.
Enquanto ao alcance do ângulo de nossa visão, cartazes e mais
cartazes comunicam que uma feira de gado terá início - precisa-
mente ao término do nosso encontro - no vizinho município de
Largato. Fato que nos sensibiliza, não apenas porque filho, neto e
b:sneto de fazendeiros, antigo criador de gado Nelore, mais e mais
ainda pela sincronia histórica ainda recente, em que os campos sergi-
panos facultavam a transumância do gado da Bahia para Pernam-
buco. Mais ainda. Retoma-se as reflexões de um dos nossos maio-
res historiadores, mestre Cap:strano de Abreu, que com seu livro cha-
ve: Caminhos Antigos trouxe uma lúcida e nova interpretação à
História Pátria. Na constelação capistraneana, outros mestres mere-
cem ser lembrados, dos quais o vosso conterrâneo João R.beiro, cuja
História do Brasil, moldada nas grandes linhas da histor:ografia ale-
mã, constitui, salvo melhor juizo, uma síntese ainda hoje insuperada.
Bem mais próximo e mais caro àqueles que praticam o artesanato da
História Regional, a presença impar do Dr. Filisberto Firmo de
Oliveira Freire, com sua História de Sergipe tbalisada de 1577 a
1855) e impressa no Rio de Janeiro, em 1891, depois de seis anos de
exaustivas pesquisas. Fato que torna o livro de uma fecund.dade es-
tupenda, com eruditas notas de rodapé e mais ainda, em apêndice,
23 páginas de documentos sobre as Sesmarias de Sergipe.
Haveria um outro ensaio de historiador sergipano ma;s completo,
mais atual, do que Fil;sberto Freire? Caso haja e espero que sim, que
os historiadores sergipanos perdoem a ignorância de um velho pro-
fessor de História Antiga; caso contrário, aí está mais uma plataforma,
mais um desafio aos historiadores. Nem seria preciso que fossem sergi-
panos, que fossem jovens, muito jovens. Nesta sala está um pesqui-
sador, um cientista social, que é jovem e por mais de 4 meses, teria
a cidadania sergipana, beneficiado com uma bolsa da Ford Founda-
tíon - licenciado de sua Universidade, creio que não cometerei in-
discrição, apontando-o - Dr. Luiz Mott - QUE AINDA ONTEM
falava-nos da riqueza dos arquivos das cidades históricas dos arredo-
res. Procurem-no no Hotel Jangadeiro, para eventuais hipóteses de
trabalho. Pois as vertentes estruturais de uma eventual história regio-
nal, conta com dois pesquisadores de alto nivel, ao mesmo tempo,
autênticos cronistas desta Cidade. Sim, refiro-me e reverencio neste
momento, o vosso, o nosso amigo EPIFANIO DA FONSECA DÚRIA,
- 67-

o primeiro sergipano com quem correspondi através da nossa RE-


VISTA DE HISTóRIA e a primeira visita social que fiz questão de
realizar quando da minha primeira aterrizagem ha 2 meses atrás.
Oportunidade em que tambem tive notícias de um valioso trabalho
ainda inédito e que merece publicação: as Efemérides Sergipanas,
que, em continuidade poderia registrar este nosso VIII Simpósio
Nacional. Assim como no plano internacional o XIV Congresso
Internacional de Ciências Históricas, encerrado ontem em São Fran-
cisco, Califórnia, conclave que se realiza de 5 em 5 anos, sendo que
no de 1965, tivemos a honra de representar o Brasil. Mais do que
um registro, queremos deixar uma sugestão. Poderia ser até uma
escalada para outras modificações estruturais na ANPUH. No sen-
tido de uma gestação a curto prazo. Esclarecendo melhor: a idéia
de que no próximo encontro, em local e data a ser decidido pela
Assembléia Geral, os sergipanos efetivos e afetivos, possam levar um
elenco de publicações de realizações elaboradas após este Simpósio
de Aracaju. Uma nova plata~orma, igualmente pioneira, para a ca-
pital pioneira que é esta hospitaleira Aracaju. Ainda ontem os pe-
regrinos que aqui estão reunidos surpreendiam-se com as ruas largas,
com o plano viário, com o embrião desta cidade que nasceu pla-
nejada. Perguntava-se o por que do próprio vocábulo. Mais dois
desafios com endereço certo. Ao professor do Departamento de
Geografia da Universidade Federal de Serg·pe, José Alexandre Fi-
lizola Diniz, especialista em Geografia Urbana, livre-docente pela
Faculdade de Filosofia, C:ências e Letras de Rio Claro, São Paulo.
E a um outro, pois por alguns dias tereis aqui o professor de Linguís-
tica da Universidade de São Paulo: Dr. Erasmo d'Almeida Maga-
lhães que prontamente, tenho certeza, procuraria estudar com os
especialistas locais a problemática dos nomes indígenas, já que é
tupinólogo ilustre.
Eis aí duas, três ou mais idé:as, conceitos, equivalentes a uma
eventual mensagem dos mais velhos aos mais jovens historiadores
aqui congregados.
Justifica-se um outro esclarecimento. Ou, melhor, posiciona-
mento. No sentido que a ANPUH não é, nem poderia ser, uma en-
tidade elitizante, muito menos alienada da realidade nacional, da
problemática mais crispante de seus associados de hoje e de amanhã.
Concientizamo-nos da tese de Lucien Febvre de que o "historiador não
tem o direito de desertar", como se pode ver no seu famoso Combats
pour lBistoire, na sua página 229.
Um outro ângulo bem mais próximo, mais crispante à nossa sen-
sibilidade de professor e estudante de História, foca a implantação dos
- 68-

chamados "estudos Sociais", de estrutura ao que saiba, ainda indefi-


nida que, salvo melhor juizo, se nos afigura de total agressividade à
História, a mais fundamental das ciências do Homem.
Informe-se que a Associação Nacional dos Professores Univer-
sitários de História deu inequívoca provas de solidariedade àqueles
que se afligem, que se consternam face às linhas dirigentes do plano
educacional, do lugar relegado à História nos currículos escolares.
Ela já demonstrou seu posicionamento em moções, em ofícios enca-
minhados às autoridades competentes, em entrevista de seus diretores,
veiculadas pela imprensa escrita e falada do País.
Quanto ao campo de trabalho, a profissionalização de nossos
estudantes de hoje, nossos colegas de amanhã, cuja presença maciça
neste conclave significa uma estupenda afirmação de que nem tudo
está perdido, permitimo-nos acenar-lhes com perspectivas que se lhe
abririam nesta era tecnológica, cuja interdiciplinalidade é um impe-
rativo, é um desafio. Cursos técnicos de microfilmagem, de manu-
seio de computadores, de modernização de arquivos se lhe ofereciam,
desde que o desejassem e se dispuzessem a adquirir, cientificamente,
a familiariedade requerida - interesse que poderia ser imediato,
pois ao provar e comprovar o interesse da ANPUH para com os jo-
vens e os não mais jovens - convocou-se e aqui está presente, o
técnico professor do Setor de Documentação Histórica do Departa-
mento de História da nossa Universidade Sr. Carlos Fabra Perru-
gotia. Já carregou unidade móveis para microfilmar parte dos ar-
quivos do Rio Grande do Norte, da vizinha Paraiba, antes ainda do
centro-oeste goiano. Um entendimento, um plane~amento, uma hi-
pótese de pesquisa para este Estado de Sergipe. Seria uma tenta-
tiva de agradecer parte do muito que devemos ao Núcleo Regional
de Sergipe, que, através de suas atuantes comissões de hospedagem,
soube sensibil:zar as autoridades máximas do Estado, aos colegas e
seus alunos, mais a sociedade sergipana, para este encontro, que
estará acionando um re-encontro.
Concient1zado da tremenda responsabllidade de falar em nome
da ANPUH, pedimos permissão para endossar, a tese de Gaston
Bachelard:
"O real demonstra-se, não se mostra".
(Gaston Bachelard, citado por Pierre Gréco, Epistomologie de la
Psychologie. Paris. Encycloped:e de la Pleiade, pp. 967;1967).
• •
*
- 69-

DISCURSO PROFERIDO PELO REITOR, DR. LUIZ BISPO,


NO ENCERRAMENTO DO VIII SIMPÓSIO DA ASSOCIAÇÃO
NACIONAL DOS PROFESSORES UNIVERSITÁROS DE HISTÓ-
RIA.

Quando recebi o professor Silvério Fontes ao retornar do último


Simpósio da Associação Nacional dos Professores Universitários de
História trazendo a notícia da aprovação de Aracaju para sede do
Simpósio seguinte, sabia, antecipadamente, que ao lado da notícia ha-
veria a solicitação do auxílio da Universidade para o evento que se
planejava.
E, de logo, confirmei a minha satisfação pela notícia receb:da.
Mais tarde, o pedido que eu aguardava veio à tona mas de forma
bastante acentuada. Não mera ajuda, mas, o co-patrocínio. Isto de
uma forma ou de outra, haveria de preocupar-me inicialmente. Es-
tado pequeno, Universidade nova ainda em consolidação na sua im-
plantação, cheia de problemas com a reforma, com os novos cursos,
com os anseios da elevação do seu nivel, qualificação dos professores,
da excelência dos seus cursos. Teria de suspender aulas de toda uma
das suas grandes áreas durante uma semana, alem de arcar com
grandes responsabilidades na infra-estrutura do encontro.
Mas esses temores não seriam e (realmente não o foram) su-
ficientes para levar-me à negativa do apôio ao Simpósio. E várias
eram as razões: jamais neguei apôio a qualquer realização de âm-
bito cultural no nosso meio; reconheço a necessidade de professores
encontrarem-se periodicamente, para o estudo dos seus problemas;
engrandeço o interesse do mestre que procura atualização profissio-
nal, técnica e científica, isoladamente ou em grupos; afinal, provocado
com a idéia do Simpósio a esperança da colaboração que a Universi-
dade haverá de receber com as suas conclusões no que se refere ao
ensino da História, no momento marcante em que estamos examinan-
do os novos currículos e o aperfeiçoamento do -ensino. Sim, era, uma
esperança. E plenamente justificavel porque o Simpósio é de uma
Associação de Professores Universitários. O mais, era a satisfação de
receber em terras de Sergipe e no ambiente físico e acadêmico da
Universidade, os mais destacados mestres da História no País, e todos
os que se preocupam com o seu ensino, Professores ou estudantes.
Era evidente que essa fosse a minha posição, consciente que a
História considerada na etimologia do grego significando pesquisa,
investigação e informação exige sempre um atento e apurado estudo,
para que não venha a se caracterizar, apenas, como uma concepção,
ou pior ainda mera tendência à Crônica ou mesmo à crítica, disso-
-70 -

ciadas da análise profunda dos fatos ocorridos e apegados a opiniões


meramente eudeusadoras dos dirigentes em cada época, e até de su-
postos líderes cu:a liderança não foi alem do domínio pelo temor ou
da obediência pelo interesse.
João Batista Vico já admitia existir na História "um constante
tecer e destecer". O pretenso historiador fazia a História apenas como
o uso de suas próprias convicções ou do seu mero interesse, e a His-
tória foi muitas vezes expressões de fatos ocorridos e até não ocorridos
com as distorções do cronista historiador, apesar da tendência históri-
co-filosófica que se manifesta em tradicionais escalas seja a pro-
videncialista de Santo Agostinho ou a escola fatalista; seja Hegel com
o seu idealismo ou Comte com o seu positivismo; Darwim com a sua
evolução; Marx e o seu materialismo ou o relativismo de Spengler.
Nos currículos dos Cursos de História, o nosso se inclui, entra na
divisão dos períodos da História, a História Contemporânea. f: o
trazer-se a História ao terceiro quartel do século XX. f: a renuncia
de De Gaule, a sucessão de Adenaur, a invasão da Tcheco-Eslováquia
pelas tropas do pacto de Varsóvia, a derrota dos Paises Árabes na
guerra dos Seis Dias, a intervenção Norte Americana no Vietnam
e até o Parlamentarismo brasileiro de 1961 e o restabelecimento do
Presidencialismo por João Goulart.
Eu sinto que ao dosar-se o ensino da História Contemporânea
com análises dos fatos que ainda vivemos, necessitamos de análises
profundas dos fatos antecedentes, dos personagens que neles influ-
enciaram, dos problemas surgidos e ainda mantidos para que não
antecipemos as conclusões e criemos as bases de uma falsa História.
São vivas as nossas tendências e basta que redijamos as crônicas e
os documentos para a futura pesquisa da História. que será a nossa
História.
Porque só a análise profunda dos elementos pesquisados quan-
do serão postos em evidências os fatos, as tendências, os resultados
encontrados na documentação catalogada, resultará naquilo que se
pode conceituar como História, História Científica ou a Ciência da
História.
Discute-se quando começa a História, mas o maior significado
das épocas é a fixação do ambIente, modos de vida, cultura, influên-
cias, etc, elementos que servirão para a interpretação dos fatos. Há
quem afirme que a História do Brasil começou com Pero Vaz de Ca-
minha. Luiz Delgado assegura que a História do Direito Brasileiro
inicia-se com as doações das Capitanias Hereditárias e as Cartas dos
Forais.
-71-
Mas isso é irrelevante. O que importa é a análise do que viu
Caminha, do que ele interpretou, do que ele documentou.
Importa saber que antes das Capitanias o Direito que aqu: have-
ria de nascer sofria a influência das Ordenações Manuelinas. A Lei
das Sesmarias foi incorporada às Ordenações Aronsinas. E as Ordena-
ções Filipinas já eram o nosso DireIto e subsistiram à quebra dos
laços com o reino português. São de grande relevo as inl.ormações
das épocas por si mesmas. Dom João lU ordenara ao Primeiro Go-
vernador Geral castigo exemplar aos índios

"que são da linhagem dos Tupinambás e se elevantaram já por


vezes contra os cristãos e lhe fizeram muitos danos e que ora
estão ainda levantados e fazem guerra".

Todavia, mais relevantes serão as deduções a que chegarem as


pesquisas na explicação do perdão que el-Rei mandava que fosse con-
cedido ao indígena, porque selvagem, desde que ace:tasse a conversão
à fé católica, e no porque configurou-se como guerra justa toda a
guerra que se fizesse e até o extermínio da linhagem dos Caetés, por-
que devoraram o primeiro Bispo, apesar do seu igual estado de selva-
geria e da sua tambem possivel conversão.
Graças a Deus, a análise dos fatos registraram, em conclusão a
tra:ção de Joaquim Silvério dos Re:s e o patriotismo de Joaquim José da
Silva Xavier. Tambem dos outros inconfidentes. E são relevantes
estes versos de Gonzaga:

Os c~imes deshonram
Se são existentes:
Os ferros que oprimem
As mãos inocentes
Infames não são.

Consoante Pontes de Miranda esses são versos de um juiz do


Tribunal, escritos durante a viagem dás Minas Gerais para o Rio
de Janeiro. E

"o major José Botelho, que os trouxe, nunca se esqueceu dos


seus prews, tão cavalheiros, e no dia da execu;;:ão de Tiradentes
disse à família que nunca lhe aborrecera tanto a vida militaI
e deseja deixar a farda".

Apesar de tudo houve a condenação e houve a execução.


-72-

Calabar ainda hoje é tra:dor, mas existem cartas trocadas entre


ele e Matias de Alburquerque que definem situações dignas de
análises. Um grande governador, um grande general, um grande li-
der não troca correspondências com traidores. Agora quando os
ânimos e as tendências já não sofrem os impulsos do momento vivi-
do.
E é tambem destas circunstâncias que o apôio, da Univers:dade,
a este Simpósio teve a sua justificação.
:e: cedo para se falar das suas conclusões. Mas, espero que de
tão importante reunião dos maiores historiadores entre os que mi-
litam no ensino Universitário, sérias recomendações tenham sido apre-
sentadas para o ensino da História:
O curso destinado ao historiador, ao pesquisador da História e o
curso próprio para o professor de História no ensino médio e até para
o professor polivalente, em Estudos Sociais, na linguagem atual do
ensino de 1.0 e 2.° graus.
Espero as recomendações que deverão ser feitas para o pesqui-
sador, para o analista dos documentos históricos.
Muitas destorções haverão de ser corrigidas na apresentação da
nossa História. E, importa mais ainda, que saibamos guardar as notas
que servirão à análise da futura História do Brasil. E relevante que
pensemos que os fatos agora vividos e explicados inconveniente e indes-
descriminadamente, apontados como histórico contemporâneo não
venham a ser mais tarde a História da nossa época ou os exemplos
vividos por nós e legados às gerações futuras.
Para isso é imperioso o cuidado e o preparo da juventude que
na Universidade procura os cursos de História. E as responsabili-
dades maiores são dos Senhores professores.
Ao apresentar os agradecimentos aos professores desta Univer-
sidade que bem se conduziram na execução do Simpósio trabalhando
para o êxito alcançado, quero consignar a minha admiração à Asso-
ciação Nacional dos Professores Universitários de História e à sua
eficiente Diretoria.
Resta-me, pois, os agradecimentos aos ilustres visitantes vindos
das mais variadas partes deste imenso Brasil para aqui oferecerem
um pouco da sua experiência, do seu saber, da sua cultura, da sua
Ciência, para o brilhantismo deste Simpósio que a Universidade Fe-
deral de Sergipe, com muita honra colaborou com o seu co-patrocí-
nio.
IV. -- CONFERÊNCIAS.
ASPECTOS GEO-HIST6RICOS DO
NORDESTE (*).

JOSÉ SILVÉRIO LEITE FONTES


da Universidade Federal de Sergipe

Convidado que fomos pela diretoria da ANPUH para pronun-


ciar uma conferência neste ciclo sobre o Nordeste, ora apresentado no
VIII Simpósio Nacional dos Professores Universitários de História,
escolhemos o tema ASPECTOS GEO-HIST6RICOS DO NORDES-
TE por tratar-se de assunto que nos permitirá discutir a possibilidade
de considerar-se o Nordeste como individualidade histórica.
O Nordeste do Brasil é assinalado como uma das regiões em
que se divide o país. O conceito de Região é originário da Geografia.
Por isso, deveremos fazer inicialmente breve excurso em tomo do es-
clarecimento dele, para, em seguida, examinar da possibilidade de
utiliza-lo para a História e, finalmente, se será válido escrever-se uma
História do NORDESTE BRASILEIRO.
Os historiadores têm usualmente utilizado tipos geográficos co-
mo fundamento de suas dissertações e frequentemente tipos geo- po-
líticos: continentes, bacias fluviais, paises, províncias, cidades, etc.
Encontramos muitas Histórias da América ou da Europa. O Nilo, o
São Francisco, o Reno, e outros rios têm sido estudados em obras si-
multaneamente de Geografia e História, algumas delas famosas. Quan-
to as figuras geo-políticas são de uso comum. Do mesmo modo, o
conceito geográfico de Região, se justificado, poderá servir de base a
acontecimentos históricos relativamente unificados.
Não sendo geógrafo, desconhecemos a pretensão de resolver o
assunto nesse plano. Entretanto, como estudioso de História, cabe-
nos analisa-lo enquanto possa trazer resultados para a nossa disci-
plina.
(*). - Conferência pronunciada no dia 3 de setembro de 1975 no Au-
dit6rio do Colégio Estadual de Sergipe
-76-

A preocupação de dividir o espaço geográfico não é recente.


Corresponde a uma salutar tendência da mente científica, porque di-
vidir um todo em classes atende a exigência do espírito analítico para
melhor conhecimento da estrutura desse todo. Corresponde, em His-
tria, ao processo de periodização. Mas. tempo e espaço são totalida-
des contínuas e as divisões operadas pela mente têm sempre algo de
artifício, pois, se cada classe possui seu núcleo característico, a transi-
ção para outras classes é gradual, havendo entrelaçamento dos carac-
teres das classes vizinhas. Só a mente recorta com nitidez e precisão.
Somente ela separa. Daí a primeira dificuldade em descrever uma
região geográfica ou um período histórico. Por isso, muitos geógrafos
separam as regiões por faixas e não por linhas limítrofes, assim como
muitos historiadores separam os períodos por faixas cronológicas e não
por datas. Mera ilusão! - observa acertadamente Fábio de Macedo
Soares Guimarães - pois as faixas supõem traçados definidos para
as mesmas, o que implica cair na mesma dificuldade (1).
A segunda dificuldade provem da variedade de aspectos de cada
área ou período. As classes da realidade concreta não são simples ou
uniformes. Exigem que se defina sua unidade na complexidade de
fatos aparentes, unidade que decorre da estrutura, isto é, do sistema
de relações entre esses fatos. Como, porem, focalizar os pontos cen-
trais desse sistema? Diegues Junior fala na homogeneidade dos carac-
teres dominantes, coexistindo com outros diversificados (2). Vidal
de la Blache refere-se ao modo como se combinam e se modificam os
muitos traços componentes da região. Camille Vaillaux sugere que se
possa defini-la pelas causas muito gerais que promovem a aglutinação
dos diferentes fatores (3). Ora, Macedo Soares Guimarães observa
que a classificação das regiões depende do ponto de vista adotado.
Entre muitas causas gerais, o geógrafo selecionaria as que lhe pare-
cessem dominantes. Conclusão dificil de obter por procedimentos ex-
clusivamente objetivos, pois implica na maior importância atribuida a
esse ou aquele aspecto, de acordo com a perspectiva do estudioso.
Apesar disso, o autor citado acredita numa única divisão após o co-
nhecimento exaustivo da realidade (4). Mas isso não passa de ideal
inatingível. Lucien Febvre insiste ser a ciência geográfica uma ciência
de relações de fenômenos de ordens diferentes: geológicos, climatoló-
gicos, biológicos, sociais, etc. Qual deles o dominante para fixar os

(1). - GUIMARÃES (Fábio de Macedo Soares),Divisão Regional do


Brasil, in Revij(a Brasileira de Geografia, ano, IH n\> 2, Rio de Janeiro, 1941,
pg. 331.
(2). - DIEGUES JÚNIOR (Manuel), Regiões Culturais do Brasil,
Rio de Janeiro, 1960, pg. 8.
(3). - GUIMARÃES (Fábio de Macedo Soares), ob. cit., 329-330.
-77-
contornos do aglomerado regional? Isso vai depender da concepção do
geógrafo sobre sua tarefa e sobre a importância de tal ou qual fator,
o que jamais poderá resultar da análise quantitativa e externa das
relações entre eles, mas do exame da essência de cada um e de suas
possibilidades causais. Daí a diversidade de pontos de vista. Um
breve esboço histórico da questão esclarecerá melhormente o que
acabamos de expor.
Buache, no século XVIII, imaginou uma divisão fundamentada
nas bacias fluviais. Divisão errônea, porque supervalorizava o fator
curso d'agua, considerado um elemento estático; alem de fantasiosa,
por supor entre as bacias necessariamente a existência de serras divi-
sórias (5). Esse último erro quanto aos fatos observáveis é psicologi-
camente explicavel pelo acento posto na depressão das bacias fluviais.
Como Buache, outros ressaltam o clima, a vegetação, o solo, a com-
posição geológica, a orografia, etc. Ricchieri admitiu a validade re-
lativa de tais classificações, chamando-as de regiões elementares, em-
bora partindo para uma concepção mais ampla de regiões geográficas
complexas e da conexão destas em regiões integrais (6).
Durante muito tempo, sobretudo sob a influência de Vidal de la
Blache, Brunhes, Vaillaux, etc., distinguia-se, com o segundo, as re-
giões naturais e as reg:ões históricas. Já se vê, somente aquelas seriam
verdadeiramente geográficas. A Terra e o Homem seriam campos
diversificados. O Homem, um ser de acréscimo na superfície da Terra,
simples produto dela, para os deterministas; algo diferente e estra-
nho, para os possibllistas. Quem sabe não resultaria isso da trágica
separação entre o Espírito e a Natureza, provinda da ascética tradicio-
nal e da filosofia alemã? Mas, no século XX, os geógrafos descobriram
novas perspectivas e um aspecto sadio do naturalismo filosófico levou-
os a integrar o Homem na Natureza, sem absorve-lo nela. O pensa-
mento de Te:lhard de Chardin é, de certo modo, o coroamento dessa
tendência, pois vê a realidade hominal como uma nova camada da
realidade terráquea, mas a envolve-la e domina-la.
Cholley, Kayser e outros passaram a chamar região aquilo que
Pedro Pinchas Geiger denominou de
"organização do espaço decorrente da atividade humana" (7).

(5). - Ibidem, pg. 332; FEBVRE (Lucien), Pour une Histoire à Part
Enteriere, Abbeville, 1962, pg. 32.
(6). - ANDRADE (Manuel Correia de), Espaço, Polarização e De-
senvolvimento, São Paulo, 1973, pg. 34-35.
(7). - GEIGER (Pedro Pinchas), Esboço Preliminar da Divisão do
Brasil, nas chamadas Regiões Homogêneas, in Revista Brasileira de Geografia,
ano 29, n9 2, '1967, pg. 60.
-78 -

A região abrange elementos físicos do espaço: clima, estrutura


geológica e pedológica, flora, fauna, relevo, hidrografia, etc. A causa
dominante, porem, de que falava Vaillaux, é a atividade humana.
Poderíamos conceber regiões puramente naturais antes da presença
humana. Hoje, se existem, definem-se pela ausência do ser humano.
Este é um elemento constitutivo da superfície terrestre e operante ne-
la, sempre em crescente profundidade, para os ceus do espaço superior
e para os infernos da intimidade do globo.
Em consequência, a idéia de região perde seu carater estático.
Transforma-se numa realidade que se constroi dia a dia, num campo de
ações concomitantes de intensidades variáveis, mais do que a inscrição
espacial precisa de equilíbrios fundamentais, no dizer de Bernard Kay-
ser (8).
Essas considerações justificam a perspectiva fundamental por
meio da qual trataremos o Nordeste. Não é uma individualidade geo-
gráfica imobilizada e definida para sempre. Por outro lado, nem
sempre existiu como hoje a visualizamos. Ele se fez na História da
pátria brasileira. Do ponto de vista da ciência geográfica, tal estudo
importa no modo temporal de explicação que ela exige e de que nos
fala Harvey (9). Do ponto de vista histórico, representa a função do
espaço diferenciado na existência do homem brasileiro e de sua cul-
tura. A História do Nordeste é a compreensão da série das ações
temporais dessa consistência geográfica que é nordestino brasileiro,
ou, se preferirem ressaltar o quadro e não o agente, o Nordeste feito
pelo brasileiro com a utilização das possibilidades dos elementos
físicos do meio e a resposta a seus desafios. Inscreve-se assim essa
concepção no programa que Fernand Braudel traçava à Geohistória
na conclusão, da Primeira Parte, de seu livro famoso, O MEDITER-
RÂNEO E O MUNDO MEDITERRÂNEO NA ÉPOCA DE FILI-
PE II (lO).

"Ap~esentar os problemas humanos tais como os vemos,


estendidos no espaço e, se possivel, cartografados numa geogra-
fia humana inteligente, ou seja, apresenta-los não só para o p~e­
sente e no presente, mas tambem no passado e em considerando
o tempo, desembaraçando a Geografia dessa preocupação pelas
realidades atuais a que se tem aplicado exclusiva ou quase ex-

(8). - KAYSER (Bernard), A Região como objeto de Estudo da Geo-


grafia, in A Geografia Ativa, São Paulo, 1968, pg. 282.
(9). - HARVEY (David), Explanatíon in Geography, London, 1969,
pg. 418.
(lO). - BRAUDEL (Fernand), El Mediterraneo y El Mundo Mediter-
raneo en La
-79 -
cIusivamente, obrigando-a a pensar de novo, com seus métodos
e seu espírito, as realidades passadas e, por isso mesmo, o
que poderíamos chamar o devir da História."

Como obra humana, toda região supõe, segundo Bernard Kai-


ser (11), em sua relatividade histórica:
1.0 - laços comuns entre seus habitantes;
2. 0 uma organização econômica e social;
3. 0 - a existência de um centro;
4. 0 - a participação em um conjunto mais amplo.
Claro que essas notas pressupõem a existência de um espaço
determinado, com seu quadro natural no qual se configuram. Mas
esse espaço não é imutavel. O homem é o agente de sua distensão ou
integração, maior diversidade ou uniformidade, extensão ou contra-
ção, maior ou menor abertura para conjunto mais amplo. Tome-
mos esse conceito de região como guia para esse estudo e vejamos
até que ponto ele se justifica na análise da formação do Nordeste.
Ao estudo histórico regional já foram consagrados muitos tra-
balhos que tratam de aspectos isolados ou episódios determinados.
Faltam, porem, obras de síntese. No entanto, enquanto isso não se
fizer, a História nacional será imperfeitamente conhecida e subrep-
ticiamente deformada. Os historiadores tendem a exagerar os aconte-
cimentos de suas próprias regiões e quando o são de áreas políticas
ou econômicas predominantes resumem os fatos da nacionalidade
aos sucessos dessas áreas. A História Política padece gravemente
desse mal. No periodo colonial, todas as atenções se voltam para
Bahia e Pernambuco. Após a Independência, são as províncias do
centro-sul, ou melhor, Rio de Janeiro e São Paulo, aparecendo Minas
e Rio Grande do Sul esporadicamente. A Casa Grande e Senzala
de Gilberto Freyre quase que só trata de Pernambuco e Bahia. O
seu Nordeste é apenas o Nordeste do açucar. E assim sucessivamen-
te. Houve, sem nenhuma dúvida, exceções. Oliveira Viana soube
distinguir, embora parcialmente, a diversidade de áreas sociais.
É verdade que em muitas Histórias Gerais do Brasil há capítu-
los dedicados às províncias. Mas a essas referências falta uma visão
compreensiva da integração delas na História nacional. São ver-
dadeiras crônicas enquistadas em obras de História. Seguem
- 80-

Brasil e que tanto contribuiu para o conhecimento de nossa nacio-


nalidade. Em Memória apresentada ao Instituto Histórico e Geo-
gráfico Brasileiro, datada de 1843 (12), sobre Como se Deve Escre-
ver a História do Brasil, observava a variedade dos costumes brasi-
leiros, assim como dos produtos agrícolas, relacionando-os com a
diversidade de solos e climas. Por cima da divisão administrativa em
províncias, propunha fossem

"tratadas conjuntamente aquelas porções do país que, po: ana-


logia de sua natureza física pertencem umas às outras".

E exemplificava, dizendo inclusive que

"à roda dos acontecimentos de Pernambuco formlm um gIUpO


natural os do Ceará, Rio G:ande do Norte e Paraiba. Enfim,
a história de Sergipe, Alagoas e Porto Segu~o, não será senão
a da Bahia".

Registre-se, apenas, de passagem, o engano da inclusão de Ala-


goas no grupo da Bahia. Segue-se uma grande série de tentativas de
divisão, desde as de base econômica, como as de Rebouças e Sílvio
Romero, as de carater étnico, como a de Nina Rodriguts 03). Divi-
sões propriamente em regiões geográficas de sentido amplo começam
com Said Ali, em 1905, até chegarmos aos dois modelos propostos
por Fábio de Macedo Soares Guimarães, em 1941, e pelo Conselho
Técnico de Economia e Finanças, em 1939 (14).
Ora, de acordo com os princípios que desposamos somente se
pode falar em Nordeste no século XX. Igualmente seus limites são
variáveis, de acordo com os fluxos e refluxos da História. Observe-
mos que, no século passado, o conceito de Nordeste é praticamente
desconhecido. Falava-se em províncias do Norte, como simples ex-
pressão cartográfica. A divisão sugetida por Martius, depois corri-
gida pelo sergipano Manuel Bonfim. em O Brasil Nação (15), cor-
respondia, como veremos, a uma realidade histórica. Foram os geó-
grafos que introduziram essas divisões formais que pressupõem um

(12). - MARTIUS (Carlos Frederico), Mem6ria sobre como se deve es-


crever a Hist6ria do Brasil, in Revista do lHGB, t. VI, 18442' ed., pgs. 407-
408.
(13). - nlEGUES JÚNIOR (Manuel), Regiões Culturais do Brasil, Rio
de Janeiro, 1960, pgs. 10-12.
(14). - GUIMARÃES (Fábio de Macedo Soares). ob. cit., pgs. 346-364.
(15). - BONFIM (Manuel), O
- 81-

centro geográfico ideal, de onde partiriam as faixas direcionais para


pontos cardeais ou colaterais. O estudo histórico, onde encontramos,
ao que nos foi possivel verificar, pela primeira vez, expressamente,
referência ao Nordeste, é um ensaio de Basílio de Magalhães, publi-
cado na Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, tomo
85, ano 1919, intitulado: A Conquista do Nordeste Brasileiro no sé-
culo XVII (16).
Braudel, logo na primeira página de sua obra sobre O Mediter-
rdneo e o Mundo Mediterrâneo na época de Filipe lI, adverte que
não propõe

"explicações geográficas válidas ina eternum, para todos os sé-


culos e todas as fases da civilização. Referem-se ao estado de
cousas existentes no século XVI ou, mais exatamente, em sua
segunda metade" (17).

Parece-nos, todo aquele que versa historicamente sobre um tema


geográfico não pode desliga-lo dos segmentos do tempo. Se o quadro
dito natural, desde o aparecimento do homem, inclui o homem como
elemento constitutivo essencial, os elementos não humanos dele devem
ser tratados na perspectiva temporal dos homens que lhes dão nova
vida e fisionomia.
Dito isso, passemos a tentar descrever a formação histórica da
realidade Nordeste, em rápidos traços, como esboço, como sugestão,
pensando em ajudar outros a estuda-la com mais profundidade e
sabedoria.
Os portugueses que abordaram inicialmente o litoral brasileiro
estavam empenhados numa grande empresa, a do comercio marítimo
das lndias. Guiava-os a perspectiva de lucros abundantes e riquezas
fáceis. Se entre os homens embarcados nas frotas da lndia havia
aqueles que visavam a outros objetivos, o propósito dominante era o
proveito material. Pero de Magalhães Gandavo, no seu Tratado da
Provincia do Brasil, escrito aí por 1570, declarava faze-lo para denun-
ciar

"a fe:tilidade e abudância da terra do Brasil para que esta fama


venha à notícia de muitas pessoas que nestes Reinos vivem com

(16). - MAGALHÃES (Basílio de), A Conquista do Nordeste no Sé·


culo XVII,
- 82-

pobreza e não dividem escolhe-la para seu remédio porque a


mesma terra é tão natural e favoravel aos estranhos que a todos
agasalha e convida como Remédio por pobres e desampa -ados
que sejam" (18).

Os primeiros visitantes de nossa terra deixaram se impressionar


pela extensão dela e pelo verde de suas matas. Em 1502, Américo
Vespucci referia-se à

"infinidade de árvores verdes, muito grandes, que nunca perdem


as folhas, têm odor suavíssimo e aromático, produzem muita e~­
va, flo:es, raizes tenras e boas. Algum1s vezes tanto me m:lravi-
lhavam o cheiro suave das ervas e flores e o sabor das f utas
e raizes, que para mim pensavam estar perto do paraiso terres-
tre" (19).

O manuscrito Coisas Notáveis do Brasil diz que é

"esta terra do Brasil muito sadia e lavada com Os ventos nor-


deste, leste e sudeste", t:ata dos ,"muitos arvoredos, montes e
vales que causam uns nevoeiros pelas manhãs do que comu-
mente vem a chuva com que a terra fica muito fresca. As ár-
vores sempre têm folhas" (20).

Por sua vez, Gandavo:

'Esta terra é muito fertil e viçosa, toda cobe:-ta de altíssi-


mos e f:ondows arvo~edos, permanece sempre a verdu~a nela
inverno e verão" (21).

Jean de Lery explica a razão dessa nota característica do país


tão logo observada e assinalada:

"pudemos admirar as florestas, árvores e ervas desse país que,


mesmo em fevereiro, mês em que o ge'o oculta ainda no seio da
ter:a todas essas cousas em quase toda a Eu-opa, são tão verdes

(18). - GANDAVO (Pêro de Magalhães), Tratado da Província do


Brasil, Rio de Janeiro, 1965, pg. 59.
(19). - VESPúCIO (Amé:ico), El Nuevo Mundo, Buenos Ayres, 1951,
pgs. 145-147.
(20). - Coisa Notáveis do Brasil, Rio de Janeiro, 1966, pgs. 79-81.
(21). - GANDAVO (Pêro
- 83-

quanto na França em maio e junho. E isso acontece éu:-ante


todo o ano nessa terra do Brasil" (22).

Outro aspecto que chamava a atenção dos novos visitantes era


a multidão de portos e baias, espalhados pela costa, a oferecer bom
abrigo para os navios da época, caravelas de 100 toneladas, no máxi-
mo, somente ampliadas no século XVII. As grandes naus, de 500 a
1 . 000 toneladas, seriam mais raras e nunca empregadas no comercio
ordinário do pau brasil (23).
A faixa litorânea merecia então verdadeiramente a denominação
que lhe ficou até hoje: a zona da Mata. A cobertura florestal do li-
toral estendia-se outrora de modo quase contínuo do Rio Grande do
Norte ao Rio de Janeiro. Apesar da variação das espécies vegetais á
medida que se aproximavam de latitudes mais meridionais, em toda
ela se estendia a mata do pau brasil, cujo primeiro conhecimento,
segundo alguns, teria sido adquirido pelo próprio Pedro Alvares Ca-
bral e com toda certeza pela expedição de Amér:co Vespucci (24), em
1503.
Ainda hoje, apesar do devastamento operado pelo homem, toda
a faixa litorânea, de Rio Grande do Norte ao Recôncavo, apresenta
elevadas taxas pluviométricas, e mantem cobertura arbórea, embora,
principalmente no Rio Grande do Norte e Paraiba, se limite às vár-
zeas dos rios interrompidas por tabuleiros. Até Alagoas, ela fica aper-
tada entre a escarpa da serra da Borborema e o mar. Em Alagoas,
o mar invade rios e várzeas. Surgem restingas e lagoas. Em Sergipe,
o mar tambem penetra muito acima nos rios, enchendo suas margens
e fazendo majestosos estuários de seus pequenos rios. Na Bahia,
ao norte do Recôncavo há grandes áreas arenosas e alguns rios cauda-
losos (25). A zona da Mata morre em algumas serras isoladas, de
pouca altltude, como a de Itabaiana, em Sergipe.
A exploração do pau brasil deu lugar a alguns estabelecimentos
costeiros precários e aos primeiros contactos com o indígena. Embora
não houvesse conexões entre eles, o objetivo econômico único e a
riqueza explorada comum criaram uma só problemática para toda

(22). - LERY (Jean de), Viagem à Terra do Brasil, tradução brasi-


leira segundo a edição de Paul Gaffarel, 2\1 ed., São Paulo, 1951, pg. 68.
(23). - MAURO (Frédé ic), Le Portugal, L'Atlantique au XVII Siecle
1570-1670, Pa~is, 1960 pg. 32.
(24). - SOUZA (Bernardino José de), O Pau Brasil na Hi~t6ria Na-
cional, São Paulo 1939, pgs. 86-90, 102-104; Cousas Notáveis do Brasil, ob,
cit., pg. 31.
(25). - ANDRADE (Manuel Co~reia de), A Terra e o Homem no
Nordeste. São Paulo,
- 84-

área, sobretudo com a superveniência do traficante francês. A necessi-


dade de defender a costa do Brasil e o ponto de escala para as arma-
das da IndIa desencadeou o processo da colonização definitiva.
Os portugueses preferiam a madeira do Brasil a da África pela
simples razão que o nosso l~toral está mais próximo de Lisboa que a
Guiné para um navio a vela. Alem disso, não era só o brasil, como o
jacarandá e outras madeiras (26).
Mas, finalmente, chegou a data em que partiu do Tejo para inici-
ar a conolização definitiva do Brasil, a frota de Martim Afonso de
Sousa, seguida da institu:ção do regime das Capitanias Hereditárias.
Para servir de base econômica ao estabelecimento colonial, a
nova terra já fora testada em suas possibllidades de cultivo da cana
de açucar, pois numa fetioria em Itamaracá já se fabricavam açúcares,
aí por 1526 (27).
O açucar, que experimentara baixa de preços nos fins do século
XV (28), estava então invadindo novos mercados. Sua procura crescia,
pois o apetite voraz e em busca de requintes que complementassem o
tradicional pescado ou a carne salgada dos tempos anteriores, dos
homens do norte europeu, era estimulado pelos astutos comerciantes
flamengos, cada vez mais influentes na praça de Lisboa. No século
XVI, tambem houve altas e baixas nos preços, mas, o saldo final foi
favoravel. A leitura da obra de Lippmann, a História do Açucar, de-
monstra bem quanto era ele apreciado na cozinha e farmácia. Alem
dos doces mais requintados, carnes e sopas eram temperadas com
açucar (29). Era como se os tenebrosos pratos dos séculos anteriores
houvessem sido substituidos pelos saborosos e estranhos maniares dos
novos tempos. .. E Lippmann quem nos cita a seguinte passagem do
Teutsche Speisskammer, de Hieronymus Bock:

"Nas farmácias e cozinhas senhoriais da Teutolândia não há


cousa mais comum e mais usada que o açucar, de que ~e fazem
eletuários, xarope~, bebidas, bebidas :efrigerantes, cândita, con-
servas, confeitos, tabletes, maçapão e muitas outras cousas; nas

(26). - MAURO (Frédéric), ob. cit., pgs, 117-120.


(27). - PORTO SEGURO (Visconde de), Hist6ria Geral do Brasil, 3'
edição revista por Capistrano de Abreu. Rio de Janeiro, 1907, pg. 155.
(28). - FURTADO (Celso), Formação Econômica do Brasil, Rio de
Janeiro, 1959, pg. 19.
(29). - LlPPMANN (Edmund O.
- 85-

cozinhas de hoje, todos Os m:mjares e bebidas devem ser pre·


parados e salgados com açucar" (30).

Por tudo isso, a partir de 1517, começaram os preços a subir por


todo o século XVI (31), compensando os gastos havidos com a ins-
talação industrial em terras distantes, a aquisação e manutenção de
escravos (mão-de-obra barata) e o transporte do produto através do
Atlântico, em navios de fretes altos, por 30 a 40 dias de viagem cheia
de riscos.
A zona da Mata do Nordeste, rica em água, é cortada de rios
de meia água, rios lângu:dos e românticos que sabem transformar-se
em rios bravios nas súbitas cheias, terra encharcada de água, de solo
rico, o negro massapê, fruto da decompos:ção de calcários, solo que
uma vez desvestido de sua cobertura arbórea, pôde ondular com os
verdes canaviais das várzeas. Essas canas grossas, durante séculos, com
sua gordura de substâncias sacarosas puderam muito tempo permitir a
ocupação de grupos humanos que nelas se estabeleceram para arran-
car as canas muito mais ricas que as das Sicília e da Madeira. Mas
essas áreas eram de largura variavel, do Rio Grande à Bahia de
Todos os Santos, muito mais ampla no Recôncavo desta última e no
sul de Pernambuco que na Paraiba e nas Alagoas dos tab~leiros e
nas areias do norte da Bahia. Ora, justamente o massapê de Per-
nambuco e do Recôncavo situavam-se nas prox:midades de dois portos
de maior importância. A Baía de Todos os Santos tem 200 kms. de
circunferência e uma abertura de 8,5 kms. É, por isso, acolhedora. Em
sua entrada, há um maciço granítico de gneiss, em que seria fundada a
cidade de Salvador. Como observa Mauro, é um pequeno Mediterrâ-
neo que interrelaciona todas as terras ribeirinhas. Salvador, sua ci-
dade, centralizaria as atividades humanas que a baía permitia se inter-
comunicarem.
Recife é menos absorvente e centralizador. Os campos em redor
se espraiam em sua liberdade. O porto é formado entre os recifes que
se aproximam do litoral e a quase-ilha de Recife (32).
Esses portos podiam abrigar várias naus e de maior tonelagem,
centralizando assim as atividades de exportação das áreas circunvi-
zinhas.
De Recife e Salvador partiram duas distintas correntes de coloni-
zação do litoral circunjacente e do interior.

(30). - Ibidem, pg. 75.


(31). - Ibidem, pgs. 369-371.
(32). - MAURO (Frédéric), ob. cit., pgs. 99-100.
- 86-

A civilização aí implantada encontraria condições físicas simila-


res e assentaria na mesma base econômica principal: a produção do
açucar. Daí a quase identidade de organização soc:al e de costumes.
Entretanto, Pernambuco sempre foi politicamente independente
da Bahia, ainda na época em que esta foi sede do Governo Geral. Capi-
tania hereditária até os meiados do século XVII, conservaria sempre
autonomia. Embora os regimentos dos Governadores Gerais lhes atri-
buíssem consideráveis poderes de intervenção, esses, de fato, raramente
eram exercidos (33). No relatório final do Vice-Rei Marquês de La-
vradio (1774), há referências apenas à Capitania do Rio de Janeiro
(34), o que indica ser esse o campo de sua efetiva atuação. No século
XVIII, sobretudo com o destaque dado a figura do Capitão General,
que tinha como subordinados os Capitães Mores das Capitanias cir-
cunvizinhas, enfraquece-se a pos:ção dos Vice-Reis. Bahia e Pernam-
buco seriam Capitanias Gerais, abrangendo aquela a Serg·pe e essa a
Alagoas, Paraiba, Rio Grande do Norte e Ceará. A partir de 1763,
o Vice-Rei não residia mais na Bahia.
As comunicações comerciais entre Bahia e Pernambuco não eram
intensas, pois ambos os portos estavam voltados para a exportação
do açucar com destino a Portugal. Estabelecia-se, porem, relaciona-
mento dos portos menores com Pernambuco e Salvador, tendo em vis-
ta a localização dos agentes das firmas portuguesas e a facilidade de
embarque em navios maiores. Essa navegação de cabotagem, embo-
ra apresentasse seus perigos, sobretudo devido aos bancos de areia nos
estuários dos rios ou aos baixios em outros pontos do litoral, podia
fazer-se com relativa facilidade.
De Pernambuco, partiu a corrente de ocupação do litoral entre
4 e 10 graus de latitude aproximadamente. Paraiba, na década de
1580. Rio Grande do Norte, 1599. Nos começos do século XVII, no
Ceará. Alagoas, nos últimos anos do século XVI e primeiras décadas
do século XVII (35). A ocupação efetiva do Rio Grande do Norte e
do Ceará seria diminuta até o término das invasões holandesas. Antes
dessas, no Rio Grande, sesmarias haviam sido distribui das, no sul,
até o rio Curumataú e, ao norte, duas a três léguas acima de Reis Ma-

(33). - FLEIUSS (Max), História A dminimaliva do Brasil, 2\\ edição,


São Paulo, 1925, pgs. 50-52-55; PRADO JÚNIOR (Caio), Formação do
Brasil Contemporâneo, 2\\ edição. São Pau'o, 1945, pgs. 310-302.
(34). - CARNAXIDE (Visconde de), O Brasil na Administração Pom-
balina, São Paulo, 1940, pgs. 277-332.
(35). - FONSECA (Pedro Paulino
- 87-

gos, até o Potengí e o Jundiaí. Jerônimo de Albuburque fundara o


engenho Cunhaú e inciara a exploração do sal (36).
Depois da ocupação flamenga, tomaria novo impulso a ocupação
da área. Mas a praça principal de comércio até o século XIX seria
Recife, para onde se dirigia a produção escoada pelos portos de Ara-
catí, Natal e Para_ba. Somente no século XIX esses portos estabele-
ceriam relacionamento direto com a Europa, sem deixar de ser depen-
dentes do Recife (37). Outro tanto ocorreria com Sergipe, Ilheus e
Porto Seguro, em relação à Bahia de Todos os Santos, sendo de notar
a pequena importância dessas últimas, até que despontasse o ciclo do
cacau. Sergipe cuja colonização começou em 1575, de que comemora-
mos o 4. 0 centenário, foi ocupado em 1590 e somente iria adquirir
sua independência política em 1820 e se libertaria da alfândega baia-
na pouco depois. Os portos sergipanos seriam por todo o século XIX
frequentados por navios europeus, mas a navegação direta com o Rio
de Janeiro apenas se estabeleceria ao início do período republicano,
por iniciativa do governador Felisbello Freire.
Do ponto de vista cultural, Recife e Salvador seriam polos de
influência sobre as respectivas áreas. Cabe notar, porem, que, no plano
educacional e cultural, desde cedo - a partir da criação da Faculda-
de de Direlto de Recife (1827) e da Faculdade de Medicina da Bahia
(1836) - os dois centros exerceriam influência generalizada em todo
o Nordeste, por força das circunstâncias, visto serem as únicas es-
colas superiores de toda a área. Esse fato proporcionou intenso in-
tercâmbio entre as duas cidades, que refletiu na formação literár:a e
filosófica das gerações do Ceará à Bahia. A República, expressão
política das tendências Iocalistas, de certo modo iria quebrar esse
intercâmb· o das elites, por uma nova concentração respectivamente
em Salvador e Recife. Esse fato foi assinalado pelo prof. José Ca-
lazans, quando distinguiu, na história sergipana, a geração dos ba-
charéis de Recife da geração dos bacharéis da Bahia. O progresso
da vida urbana, no Nordeste, durante o século XX, até a atualidade,
abriria caminho para a diversificação local dos centros de cultura e
a formação das universidades locais, sem que por isso Recife e Bahia
deixassem de projetar a sua sombra.
Do ponto de vista social, a sociedade do açucar possui estrutura
idêntica em toda extensão do litoral, já sobejamente descrita pelos

(36). - LYRA (A. Tavares de), Sinópse Histórica da Capitania do


Rio Grande do Norte, in Anais do IV Congresso de História Nacional, 2\1 volume.
Rio de Janeiro. 1950, pgs. 165-210.
(37). - GIRÃO (Raimundo), Pequena História do Ceará, Fortaleza,
1953, pg. 109.
- 88-

vários e eminentes historiadores e sociólogos que versaram sobre o


assunto. O trabalho escravo, o sistema patriarcal, a endogenia das
altas classes, e hierarquia entre os senhores de engenhos, plantadores
de cana, médios proprietários e agregados, o estilo aristocrático de
vida, podiam ser encontrados onde a cana despontasse da terra e as
moendas ou engenhos trabalhassem.
Apesar dessa uniformidade, tanto Gilberto Freyre, como Fer-
nando de Azevedo e Arthur Ramos denunciam a necessidade de es-
tudar-se a diversidade dos agrupamentos humanos do Nordeste. Gil-
berto Freyre, depois de falar do Nordeste do açucar, que se estende-
ria do Maranhão à Bahia, tendo por centro Pernambuco - de certo
que apenas espacial - , acrescenta:

"há mais de dois Nordestes e não um, muito menos o Nordeste


maciço e único de que se fala tanto no Sul com exagero de
simplificação. As especializações regionais de vida, de cultura e
de tipos físicos no Brasil estão ainda para ser traçadas debaixo
de um critério rigoroso de ecologia ou de wciologia regional, que
co.-rija tais exageros e mostre que dentro da unidade essencial
que nos une há diferenças às vezes profundas" (38).

Fernando de Azevedo tambem se refere a essa diferenciação,


embora esquematize em demasia, em tratando apenas da diferencia-
ção entre o homem do norte e o do sul (39). Arthur Ramos, na
conclusão de sua Introdução à Antropologia Brasileira, insiste que

"não se trata apenas de identificar áreas antropológicas do lndio,


do Negro, ou do Branco, já tentadas nesta obra, mas de caracte-
rizar a distribuição das populações mestiças. bem como a dos
seus perwnagens-tipos, nos vários quadros dos costumes" (40).

Já Oliveira Viana, no plano da Sociologia Política, demonstra


como a centralização legal do sistema administrativo português era
de fato quebrada e pulverizada pelo fator distância e pelo fator hu-
mano dispersão. Não somente era reduzida a autoridade dos Capi-
tães Generais sobre os Capitães Mores de capitanias dependentes,
como a desses em relação aos Capitães locais e às Câmaras das vilas

(38). - FREYRE (Gilberto), ob. cit., pg. 5.


(39). - AZEVEDO (Fernando de), A Cultura Brasileira, 2' edição,
São Paulo, 1944, pgs. 119-120.
(40). - RAMOS (Arthur), Introdução à Antropologia Brasileira, 2'
- 89-

afastadas da sede administrativa (41). Isso vale para todo o Brasil Co-
lônia e tambem para o Nordeste.
Capistrano de Abreu, seguindo as pegadas de Martius, estuda
o povoamento nordestino a partir dos dois polos de Pernambuco e
Bahia.
Nada nos mostra tão bem a identidade e a diferenciação do
Nordeste-Bahia e do Nordeste-Pernambuco que dois fatos históricos
de ritmos temporais e níveis diferentes, como as invasões holandesas
e a ocupação do Sertão pelas correntes humanas dedicadas ao pas-
toreio.
Chama de logo a atenção a maior eficácia da resistênc:a baia-
na que da pernambucana ao invasor. Isso, em parte, poderá ser
explicado pela diferença em disponibilidade de recursos pela Coroa
luso-espanhola nas décadas de 1620 e 1630. Porem, não nos esque-
çamos da derrota de Nassau diante de Salvador, em 1638. Por outro
lado, a presa baiana era mais sedutora, pelas vantagens indiscutíveis
de seu porto sobre o de Recife e pela concentração da riqueza açu-
careira, mais ou menos equivalente a de Pernambuco, numa área
reduzida. Câmara Cascudo observa que as primeiras vilas baianas
do Recôncavo, depois da cidade de Salvador, somente seriam cria-
das em 1697 e 1698 (42). O litoral do rico Recôncavo era protegido,
em sua retaguarda. por linha de costa de terras sáfaras e despovoa-
das, pouco promissoras para a manutenção de numerosa tropa. Para
resistência contra o ocupante da cidade, os senhores de engenho ti-
nham a seu favor maior concentração populacional e a proximidade
relativa das casas fortes de seus engenhos, se comparados com os de
Pernambuco. Nesta capitania, a extensão da costa, a multiplicidade
de pequenos portos e a maior dispersão do povoamento facilitavam
o ataque em diversas frentes e a ocupação de faixa litorânea mais
ampla.
A ocupação do sertão abriu uma nova área geográfica, de certo
modo ligada aos dois Nordestes anteriores e de certo modo autôno-
ma, pois, do ponto de vista cultural e social e do mútuo relaciona-
mento, não haveria diferença entre o Sertão de Pernambuco e Bahia,
embora o houvesse do ponto de vista da direção geográfica da vida
econômica.

(41). - OLIVEIRA VIANA, Evolução do Povo Brasileiro, Rio de Ja-


neiro, 4' edição. 1956, pgs. 214-220.
(42). - CASCUDO (Luiz da Câmara), Geografia do Brasil Holandês,
Rio de JaneUo.
- 90-

A linguagem popular, justificada pelos geógrafos, denomina na


área natural nordestina mais duas faixas, além da Zona da Mata. o
Agreste e o Sertão, figurando essa como intermediária entre as duas
outras. De Rio Grande do Norte a Alagoas, o Agreste é assinalado
pela serra da Borborema, que separa as terras baixas do litoral do
planalto sertanejo. A encosta leste fora encoberta de matas até os
fins do século XIX. :B a fonte de vários dos rios nordestinos, em cujas
margens há brejos e matas ciliares, que Manuel Correia de Andrade
distingue em 3 (três) tipos:

"a). - brejos de altitude e exposição, situados na crista e que


resultzm da altitude e da ação dos ventos aIíseos, vindos de
Sudeste, provocando condensações, orvalho e chuva; b). -
brejos dos vales que cortam a Bo. borema na direção Noroeste-
Sudeste, que se podem cobrir de matas; c). - os brejos ciliares,
em função dos rios e riachos que escorrem, muito deles intermi-
tentes, ressecados no estio, embora permaneçam como corren-
tes d'água subterrânea, permitindo a abertura de fu~os ou ca-
cimbas" (43).

A vegetação tambem é de trans:ção, apresentando espécimens


da mata litorânea e da caatinga.
Em Sergipe e no norte da Bahia, as serras são de pequena ex-
tensão e elevação. A área consiste numa planície que se eleva con-
tinuamente até confundir-se com o Sertão propriamente dito. As
Serras são inaproveitadas, embora haja umidade e cultura agrícola
ao pé das mesmas (44).
Em sequência ao Agreste, vem o Sertão. Estende-se das proxi-
midades do litoral do Ceará e Rio Grande do Norte à Chapada D:a-
mantina. :B superfície aplainada, com altitude média de 400 ms. A
temperatura é elevada. Há forte evaporação. Caem anualmente 400
a 800 mm. de chuva, que logo se evapora ou escoa, devido à imper-
meabilidade da rocha e a declividade do terreno, ora em direção ao
São Francisco, ora em direção ao mar. Daí rios temporários e a
vegetação xerófila das caatingas, que perde suas folhas durante a
estação seca. As chuvas caem de janeiro a junho. As cactáceas, co-
mo o mandacarú, o facheiro, o xique-xique, retem água para so-

(43). - ANDRADE, (Manuel Correia de), Paisagens e Problemas do


Brasil, São Paulo, 1973, pgs. 132-134.
(44). - ANDRADE (Manuel Correia de), A Terra e o Homem no
Nordeste. São Paulo, 1963, pg. 18; ABREU (S.
- 91-

breviver. Mas tambem o joazeiro, o umbuzeiro e a quixabeira guar-


dam água nas raizes. Os rios, que secam no estio, alargam-se por
extensas várzeas, às vezes de dezenas de quilômetros de largura,
quando vêm as chuvas. No "inverno" não chove. A estação seca
guarda esse curioso nome porque nela as árvores perdem a folha-
gem à semelhança do inverno europeu. Daí a denominação dada
pelo colonizador português.
Entretanto, em meio à planura, elevam-se as serras e chapadas
a 900 e 1000 ms. acima do nivel do mar. A altitude e os ventos
úmidos do Atlântico permitem aí a mata tropical e tambem a agri-
cultura, especialmente nas Chapadas onde espessos depósitos sedi-
mentares armazenam água. A Chapada do Araripe, as serras de
Baturité, Russas, Serra Grande, Carirís, no Ceará. A Chapada do
Apodí, no Rio Grande do Norte. As serras da Baixa Verde e Ne-
gra em Pernambuco. Ao norte, o sertão aproxima-se do litoral.
Daí a aridez da faixa que liga Ceará ao Rio Grande do Norte.
A ocupação da área sertaneja foi devida à pecuária. Nela se
criou a "civilização do couro", a que se referia Capistrano de Abreu.
Nos vastos campos, o gado podia criar-se solto. As várzeas dos rios
podiam alimenta-lo na época chuvosa. Na estação seca, a vegeta-
ção sertaneja e as cacimbas podiam sustenta-lo O grande flagelo do
sertão, porem, foi sempre a seca, renovada periodicamente, embora
sem regularidade. Algumas secas mais curtas poderiam ser supor-
tadas. Mas as grandes secas devastavam a vida. Antes da coloniza-
ção, os animais e os índios fugiam. Depois, à medida que a popu-
lação aumentava se agravavam seus efeitos, pois mais dificil se tor-
navam a mudança e o refúgio em outras partes já ocupadas por po-
pulação sedentárias e numerosas.
O gado procurou primeiramente os tabuleiros arenosos, em Iga-
raçú e Alagoas, para Pernambuco, e em Sergipe e ao norte da Bahia,
para o Recôncavo. Tambem a zona do agreste, ao sopé da Borbo-
rema. Ao tempo da guerra holandesa, Fernandes Vieira, Vidal de
Negreiros e Gomes da Silveira aí possuiam currais.
A penetração no Sertão foi facilitada pelo curso intermitente
e às vezes prolongado de certos rios. Na Bahia, os gados dos Avila
subiram o Itapicurú e o Real, assim como outros criadores subIram
o Vasa-barris até atingir o São Francisco. Na área pernambucana,
no Rio Grande do Norte e Ceará, os rios Açú, Mossoró e Jaguaribe.
O Paraiba do Norte, o Piranhas e o P~ancó, na Paraiba, outros tantos,
em Pernambuco. Os
- 92-

rio, tendo de testada uma ou meia légua junto ao rio e várias léguas
de comprimento (45).
A arrancada deu-se na segunda metade do século XVII, com o
término da guerra holandesa e o aumento da população. O ímpeto
é diverso, da corrente pernambucana e da baiana. A primeira ocu-
pou o que Capistrano de Abreu chamou de sertão exterior, e a
segunda, o sertão interior. Os baianos, depois ajudados por bandei-
rantes paulistas, passaram o médio São Francisco, transpuzeram o
alto sertão pernambucano, atingiram o rio Piauí e, depois, já no atual
Maranhão, povoaram o território de Pastos Bons, entre o alto !ta-
picurú, o Balsas, o Manuel Alves Grande e o Tocantins. Para a
leste, atravessaram as serras Ibiapaba e Grande e espalharam-se pela
bacia do Potí. Na Paraiba, chegaram ao Piancó. Nesses pontos,
encontraram com a corrente pernambucana, mais modesta, que su-
bia os rios tributários do Atlântico nesses territórios (46).
O que surpreende na civilização do Sertão é a sua relativa ho-
mogeneidade em área tão vasta e de povoamento tão disperso. Do
ponto de vista econômico, o gado sertanejo destinava-se à popula-
ção do Litoral. Para isso, na Bahia, percorria grandes distâncias até
a feira de Jacobina. No Ceará, surgiram as famosas charqueadas, que,
arruinadas pela seca de 1792-93, seriam suplantadas pelas gauchas.
Mas, fora isso, não havia no sertão, centros econômicos de onde se
irradiasse um determinado estilo de vida. Mas esse existia e ainda
existe.
Os latifúndios eram imensos, mas a posse efetiva competia aos
foreiros, que, no início do século XVIII, pagavam 10 cruzeiros por
ano. Ou aos vaqueiros, pagos com um quarto do criatório. Isolan-
do-se das correntes de civilização do litoral, distinguindo-se, pelo
arcaismo de palavras e hábitos, do homem do litoral, o sertanejo
manteria, em sua área, intercâmbio cultural eficaz. O sertão não é
propriamente uma Região, pois seus centros econômicos estão na
periferia do país, mas por outro lado, do ponto de vista social e cul-
tural, sempre foi mais diferenciado do Litoral, que as áreas de Per-
nambuco e Bahia entre si. Os roteiros, ligando o Maranhão à Bahia
como o prova o documento escrito por Manoel José de Oliveira Bas-

(45). - BRASIL SOBRINHO (Tomas Pompeu Sousa), Alguns Aspectos da


Geografia Humana Cearense, in Revista do Instituto do Ceará, T. LIV, ano
54, 1940, pgs. 153-192.
(46). - PRADO JÚNIOR (Caio), Formação do Brasil Contemporânea,
2' edição. São Paulo,
- 93-

tos, em 1819 (47), permitiram ao sertanejo percorrer, na direção


norte-sul, toda a vastidão desse imenso país interior.
As secas tiveram sempre efeitos traumáticos na vida sertaneja.
Sobretudo, as grandes secas. As grandes secas significavam migra-
ções. Quando a população ainda era escassa, apenas para as serras
e as cidades litorâneas. Isso criava transtornos tambem à economia
litorânea. Em recente artigo publicado na Revista Brasileira de Geo-
grafia (48), Galloway procura demonstrar que a despressão da eco-
nomia açucareira, na primeira metade do século XVIII, foi causada
primordialmente pela baixa dos preços internacionais do açucar,
mas precipitada e agravada por duas grandes secas na primeira e na
terceira década, de que resultou grande mortalidade entre os escra-
vos e escassez da mão-de-obra (49), na faixa litorânea.
A seca de 1771-1772 deu lugar ao término das charqueadas cea-
renses, substituidas pelas gauchas, de maior rentabilidade, como já
dissemos.
No século XIX, a seca de 1877 e as do começo do século XX
levaram ondas de nordestinos à Amazônia, fornecendo a mão-de-
obra solicitada pela expansão da indústria extrativa da borracha. As
grandes secas mais recentes das décadas de 30 a 50 favoreceram a
expansão da indústria paulista com mão-de-obra barata, assim como
a expansão da cultura cafeeira.
Surpreendente tambem é como a população sertaneja se recu-
pera desses choques profundos. Já os observadores do século XIX
chamavam a atenção para isso, especialmente no que se refere ao
Ceará. De modo que, em certas áreas, pelo menos, as secas não im-
pediram o crescimento da população e das atividades econômicas.
Durante muito tempo, como dissemos há pouco, o Agreste e as Ser-
ras serviram de abrigo e ocupação às populações em fuga, o que se
tornava ainda mais facil nas fases de expansão da produção algodo-
eira.
Outra decorrência das secas, mais dificil de precisar, é a desor-
ganização da sociedade patriarcal sertaneja com o fracionamento das
famílias que se deslocam e a transferência dos vínculos de proprie-
dade da terra. Daí certa situação de anomia observada por Maria
Iaura Pereira de Queiroz e que ela atribui apenas aos próprios con-
flitos internos da sociedade sertaneja (50).

(47). - BASTOS (Manoel José de Oliveira), Roteiro de Viagem, em


Revista do IHGB. n Q 8, 1846, pgs. 527-539.
(48). - Galloway (J. H.), Nordeste do Brasil J700-1750 - Reexame
de uma crise em "Revista Brasileira de Geografia", ano 36, n Q 2, pgs 85-102.
(49). - Ibidem, pgs 92-94.
(50). - QUEIROZ (Maria Isaura Pereira de), O Messianismo no Brasil e
no mundo. São Paulo,
- 94-

Finalmente, o cangaço e os movimentos meSSlamcos sertane-


jos encontram algumas de suas raizes nas secas, não somente pela
anomia resultante, enfraquecendo o sistema tradicional de liderança,
como tambem pelas repercussões psicológicas de protesto ou de
busca de um paraiso terreno no inferno dos campos ressequidos.
Está claro que o cangaço e o messianismo não são privilégios do Ser-
tão. Eles se encontram tambem no Centro ou no Sul do Brasil. Mas
o que caracteriza os líderes religiosos nordestinos, destacadamente
Antônio Conselheiro, Padre Cícero e Pedro Batista (embora haja
exceções) é sua ação socialmente renovadora e construtiva, mas com
estilos diferentes. Partindo do fundamento religioso trad~cional do
sertanejo, daquela religiosidade despojada e ascética, introduzida nos
tempos coloniais e alimentada pela vida morigerada do sertanejo,
eles buscavam uma Terra da Promissão não apenas celestial, mas que
se pudesse traduzir em melhoria das condições da vida. Representa-
vam um fator de renovação na vida nordestina e de luta contra as
agruras do amb:ente. Por sinal, religiosidade bem diversa daquela do
litoral açucareiro, festeira, amante dos espetáculos, sentimental, em
que aparecem várias santas mulheres, mas nenhum varão santo, como
observa Gilberto Freyre.

Uma
PERNAMBUCO E O OCASO DO IMPÉRIO (*).

ARMANDO SOUTO MAIOR


da Universidade Federal de Pe "nambuco.

Durante muitos anos, debrucei-me sobre a documentação exis-


tente nos arquivos de Pernambuco, Paraiba e Alagoas e no Arquivo
Nacional, relativa à década de 1870/1880. O que vou dizer aqui, en-
tretanto, nada tem de definitivo. A História é uma elaboração perma-
nente e o historiador reflete, de certa forma, sua essência. Talvez, por
essa mesma razão, sejam suscitados aqui mais problemas e não, pro-
priamente, escavadas intransponíveis trincheiras documentais em tor-
no de teses e posições.
A limitação exatamente de uma década não é uma pos:ção teórica
ou metodológica, pois nem século nem década podem ser considerados
critérios para uma aceitavel periodização histórica. As datas destas aná-
lise, portanto, deverão ser entendidas como marcos e não como fron-
teiras. Essa década tem globalmente uma característica que lhe dá
homogeneidade: é a fase crítica da decadência das instituições monár-
quicas. f: a década da Questão Religiosa, o maior abalo que experi-
mentou a Igreja no Brasil e se pode dizer que a inteligência nacional
nessa época foi radical. Não apenas a que chamaríamos de institucio-
nalizada como a da Faculdade de Direito de Recife, mas a de perso-
nalidades como um Joaquim Nabuco que confessa

"nesse tempo e durante alguns anos o radicalismo me arras-


ta e eu sou, por exemp'o, dos que tom:Jm parte ativa na campanha
maçônica contra os bispos e contra a Igreja. Entro nas idéias
de Feijó de uma igreja nacional, independente d:t disciplina rom:l-
na".

(*). - Conferência pronunciada no dia 4 de setembro de 1975 no Au-


- 98-

Onde estariam as raizes da ressureição do antijesuitismo dessa


época? Como justificar a violência do pensamento de um Carneiro Vi-
lela, de um Franklin Távora, de um Aprígio Guimarães, sem falar nos
artigos contundentes de Saldanha Marinho, o terrivel Ganganelli?
Provavelmente são bem velhas. Disse Adrien Balbi, referindo-se
aos jesuitas em Portugal, que .jamais um poder sem armas foi em qual-
quer país tão absoluto. No Nordeste, enquanto os jesuitas ergueram o
edifício de seu formalismo escolástico, outros padres, os oratorianos,
procuraram conciliar melhor a fé com as letras. Nas suas classes do
Recife ensinavam em compêndios próprios noções de História e Geo-
grafia. Havia, pois, elementos de comparação e julgamento.
O Seminário de Nossa Senhora das Graças, em Olinda, fruto tro-
pical da reforma pombalina, é provavelmente o tronco desse radica-
lismo nordestino - mas definidamente pernambucano - que apare-
cerá na segunda metade do século XIX. Fora no prédio mesmo do
antigo colégio dos jesuitas que Azeredo Coutinho instalara o novo se-
minário. Português, francês, história, geografia, física experimental,
história natural e química eram as inovações que dariam ao Seminário
de Olinda elementos para que Tollenare em suas Notas Dominicais o
comparasse a um liceu francês. Melhor seria dizer que foi uma rutura
com a arcaica trad:ção jesuítica do ensino colonial. O antijesuitismo,
a partir desse momento, passa tambem a significar uma abertura a no-
vos horizontes do espírito e da inteligência. Gilberto Freyre registra
agudamente que o Seminário de Olinda assumiu "um caráter quase es-
candaloso para o lemTJo". O seu ensino correspondia às novas necessida-
des do país, evolu:ndo do patriarcalismo agrário para situações sociais
mais complexas, originadas pela vida urbana e pré-industrial, exigindo
técnicos e não apenas artífices e escravos.
A geração que saiu do Seminário de Olinda foi multiplicadora de
idéias Lberais. Liberais não no sentido partidário da palavra. Um li-
beralismo brasileiro, pois aqui os princípios liberais não se forjaram,
como na Europa, na luta da burguesia contra os privilégios da aristo-
cracia e da realeza. Liberalismo de bachareis filhos de senhores de
engenho, com uma peculiaridade, que é sua conciliação com a Igreja.
Antijesuítico, é verdade, porem católico e apostólico. A presença dos
padres nos mov;mentos revolucionários é, ao mesmo tempo, causa e
efeito dessa categoria histórica. Capistrano de Abreu não hesitou em
dizer que, sem o bispo Azeredo Coutinho e seu Seminário, não teria
surgido a geração idealista de 1817 e não é sem razão que a revolução
feita por ela foi chamada também de "revolução de padres"
- 99-

ralmente de radicalismos. E um ponto singular de referência para o


estudo das idéias e da sociedade brasileira dessa época é a figura do
extraordinário e admiravel sergipano que foi Toblas Barreto, que um
dia aporta ao Recife com uma poesia no bolso - a famosa À Vista
do Recife - e 94 mil réis no outro. Não é de admirar, na política de
1867, que Tob~as fosse preterido na nomeação para professor de Filo-
sofia do Ginásio Pernambucano por outro concorrente que fora clas-
sificado em segundo lugar. Foi este o nomeado, sob o pretexto de
que era casado. Os interesses da prole confundiam-se assim com os
da Filosofia.
Araripe Júnior confessa que foi através de Tobias que, pela pri-
meira vez, soube que havia um Darwin e um Haeckel. Tobias Barreto
sentiu, como nenhum outro intelectual de sua época, que o mundo se
transformava, que as tendências românticas iam cedendo terreno ao
pensamento crítico que se baseava na ciência.
Do seio da sociedade burguesa de então surgiram teorias que in-
terpretavam sua evolução e seus anseios. Não era mais possivel tratar
os problemas sociais em estrofes condoreiras. Politicamente, tanto en-
tre os conservadores como entre os liberais, há quem compreenda as
mudanças sociais e se disponha a partir, com maior ou menor cautela,
ao seu encontro. Tanto num grupo como no outro, há nomes que en-
carnam a reação e a imobilidade. Interessam menos onde se pretende
enfocar mudanças e transformações de uma maré democrática. As
contradições da época são variadas. O problema da grande proprie-
dade, sempre tão resguardado, é discutido por um visconde, marechal
de campo, o Ministro do Supremo Tribunal Militar, Beaurepaire Ro-
han, na mesma ocasião em que um dos líderes do Partido Liberal, João
Luís Vieira Cansação Sinimbú, presidindo o I Congresso Agrícola,
proclama:

"a grande prop"iedade tem sido e continuará ainda po· muitos


anos a ser a pojerosa alavança do no:so prog-esso em suas va··iadas
manifestações" .

Disse, simplesmente, Rohan que cumpria


"não confundir a grande lavoura com a grande p··opriedade"

e que aquela nesta havia podido manter-se por meio do elemento ser-
vil. E profeticamente completou:
"não está longe a época em que não haverá m:lis
- 100-

Beaurepaire Rohan é incisivo ao condenar a escravidão e diz que


o escravo

"tão pouco inte-essado nos lucros do seu senhor, é entre-


tanto compelido ao trabalho por esses meios violentos, que estão
em uso, e que tão negro estigma imprimem em nossa moralida-
de".

Incisivamente escrevia em seu hoje raro opúsculo O Futuro da


Grande Lavoura e da Grande Propriedade no Brasil que o porvir da
agricultura e a riqueza do país estariam seguros se fosse tomada uma
med:da espantosa para a época: a conversão dos escravos em colonos
e transformação das fazendas em colônias agrícolas.
As consequências sociais da concentração fundiária não passaram
despercebidas nesse período. Um antecessor de Henrique Pereira de
Lucena no governo da província de Pernambuco, Domingos Velho Ca-
valcanti de Albuquerque, paraibano que a governou em 1871, já cons-
tatara o quanto era nefasto o domínio do latifúndio na sua jurisdição,
com palavras de permanente atualidade e rara acuidade histórica:

"Realmente há uma parte de nossa população profundamente


desmoralizada, perdida até; mas resta uma grande massa, donde
podem sair braços úteis. Que garantias, porem, acha esta para
seus direitos, que segurança [la~a os serviços que presta, que
incentivo para perseverar nas boas práticr.s?"

A constitu'ção de nossa propriedade territorial, enfeudando vas-


tíssimas fazendas nas mãos dos privilegiados da fortuna, só por exce-
ção permitiu ao pobre a posse e domínio de alguns palmos de terra.
Em regra, ele é rendeiro, agregado, camarada ou o que quer que seja
e sua sorte é quase a de um antigo servo da gleba.
Como espelho da renovação desse período seria oportuno lembrar
várias medidas do gabinete Zacarias que indicam a existência de um
outro ritmo político: liberdade de cabotagem, abertura do Amazonas,
navegação subvencionada para os Estados Unidos e estruturação do
crédito agrícola. f:
- 101 -

gão consultivo de administração, sem contudo, ter autoridade polí-


tica.
Pouco depois, os radicais do liberalismo completaram esse pro-
grama. Em 1870 funda-se o Partido Republicano entre seus quadros.
Poder-se-ia dizer, então, que a década de 1870-1880 começa com uma
evidência, a desagregação do regime monárquico no Brasil, expressa
no famoso Manifesto de 70, que mereceu do Prof. Reynaldo Carneiro
Pessoa, da Universidade de São Paulo, lúcida análise, publicada recen-
temente na Revista de História. Pode-se, provavelmente, com muita
razão, dizer-se que programas, proclamações e manifestos refletem uma
parte menor da realidade política de um país. O povo, como sua maior
dimensão, é que lhes dá importância e exequibilidade. Porem, seja-me
permitido perguntar: - o que poderíamos entender como povo nesse
período? ];; contundente a afirmativa de Hermes Lima de que o Im-
pério não tinha povo no sentido político da palavra. O povo brasileiro,
como realidade política, seriam as 300 ou 400 mil pessoas pertencen-
tes às famílias proprietárias de escravos, senhores de engenho ou fa-
zendeiros, de onde saiam os bachareis, os médicos, os padres e os che-
fes de empresa, dotados de universo crítico e cultural capaz de enten-
der o que vinha a ser monarquia, república, sistema representativo, di-
reito de voto, governo etc. Um milhão e meio de escravos, talvez um
milhão de índios (que o governo insistia em reduzir para 400.000),
agregados de fazendas, trabalhadores braçais nos engenhos, vaqueiros
e operários rurais primitivos, cujo horizonte político era seu próprio
horizonte visual, interferiram pouco na vida nacional. Daí os partidos
políticos terem sido de certa forma ficções institucionais e poder o Im-
perador chamar ao governo qualquer conservador ou liberal para rea-
lizar o programa que sua augusta conveniência determinasse.
O Nordeste de 1870 reflete em dimensões provinciais o que há e
o que se passa na Nação. Estatísticas dos fins da década revelam que
nas seis maiores províncias o desemprego é superior a 50%. A re-
lação entre os que têm e os que não têm trabalho é espantosa: na faixa
etária entre 13 e 45 anos há 1.434.170 trabalhadores livres, 650.540
escravos da lavoura e 2.822.583 desocupados. Nas estatísticas gerais
do Império representava Pernambuco uma das regiões mais desenvol-
vidas; embora seus 1.288 engenhos gemessem e moessem as vicissi-
tudes da escravidão, nessa época implantavam-se no Recife centros de
indústria manufatureira, fábricas de tecidos e bancos de capital inglês.
A cada 24 horas, dois navios estrangeiros, em média, ancoravam no
Recife, desembarcando mercadorias e imigrantes, levando grandes car-
regamentos de produtos agrícolas.
Os
- 102-

cumentos do governo. O capital inglês aplicado no Brasil até 1860


fora relativamente pequeno. Cresceu muito nesse período e embora
infelizmente não se saIba exatamente o total das remessas de dividen-
dos, apesar dos estudos de Alan Manchester e Richard Graham, e é ad-
missivel que correspondessem a uma média de 6% dos investimentos
ao ano, cifra muito alta quando se tem em conta as reinversões muito
expressivas feitas entre 1871 e 1880. É conveniente que se diga que
nesse período construiram-se 5. 199 kms. de estradas de ferro, com
capital e técnicas inglesas, o que significa quase quatro vezes mais que
os vinte anos anteriores e muito menos que os dez anos seguintes. A
Inglaterra foi o grande exportador e os Estados Unidos o grande im-
portador das relações de nosso comércio internacional nessa época.
O Brasil importava da Grã-Bretanha não somente o capital e conheci-
mento técnico, mas tambem a alimentação das classes médias e altas
das cidades costeiras

"Vieram, nessa época, engenheiros, funcionários e comer·


ciantes ingleses, não apenas para o doce Brasil - diz espirituo-
samente Gilberto Freyre - mas tambem para o Basil da febre
amarela, da comida plebeiamente cozinhada com muita banha,
muita cebola, muito alho, das viagens áspe:-as por terras paludosas,
da cachaça em vez de vinho do Porto. O Brasil de m:ttutos e
até miseráveis, para qmis todo inglês era um Rothschild de rico".

Mauá foi um dos muitos meninos pobres brasileiros que, como


caixeiros de armazens ingleses receberam influências inglesas. Muitos
outros, ricos e remediados, cursavam colégios ingleses ou eram educa-
dos por preceptores ingleses, e vale aqui o testemunho de uma per-
nambucana, filha de senhor de engenho, Flora Cavalcanti de Albu-
querque, viuva de Oliveira Lima, que confessou a Gilberto Freyre:
"só sei rezar em inglês".
- 103-

pelas chamadas classes produtoras, o regime parlamentar foi o grande


e solene cenário de divergências pacíficas e quase sempre elo quentes .
Não se diga, porem, que o Parlamento no Império foi apenas um so-
lene acordo de cavalheiros. Nele as forças sociais que representaram
o grande drama governamental das províncias, exprimiram seus inte-
resses e aspirações. Corresponde à concepção política dominante no
seu tempo entre a maioria das nações ocidentais.
Nos seus Anais pode-se acompanhar grande parte das transfor-
mações da sociedade brasileira e seria injusto repetir-se o que já foi
amargamente escrito, ou seja, que nas atas parlamentares entremeiam-
se a erudição esteril com a insigne conversa fiada. Ao historiador brasi-
leiro contemporâneo não deverá causar espanto suas incongruências com
as realidades nacionais. Em paises onde a diferença cultural entre a elite
e a massa é muito profunda, toda organização política oferece esse
aspecto de artificialismo. A estrutura política não podia se limitar
apenas a considerar o que era o nosso grande triângulo de problemas:
o regime escravocrata, a massa iletrada e a monocultura. Viveu-se
uma categoria histórica, muito comum no Ocidente, onde uma estru-
tura mais atrasada passa a se servir de métodos políticos mais adian-
tados. Resultaram disso inconveniências e contradições, mas foi, in-
dubitavelmente, uma condição de progresso, uma etapa de nossa evo-
lução social.
O que se chamou de partido conservador era evidentemente o
grupo menos entusiasmado por mudanças e reformas. O Conselho de
Estado, o Senado vitalício e as prerrogativas do Poder Moderadox: fo-
ram símbolos antepostos às mudanças estruturais. Não se pode negar
que era muito divulgada a idéa de que o país não praticava melhor
as instituições porque o povo não tinha capacidade para o governo
livre. A versão da frase cada povo tem o governo que merece, mais
ou menos repetida ainda hoje, na década de 70 era "é mau o povo,
não pode ser bom o governo". Era assim que os conservadores arqui-
vavam como utopias as idéias democráticas.
Até 1870 não se vê grande esforço do governo imperial para me-
lhorar o nhel de vida das camadas mais humildes da população. Não
seria, pois, de se estranhar, a onda de agitação que atingiu o país em
1874 e que no Nordeste assumirá formas muito curiosas. Refiro-me,
especificamente, ao movimento dos "quebra-quilos", surgido simulta-
neamente na Para:ba
- 104-

vam usando o novo sistema de pesos e medidas. Como gritassem Que-


bra os Quilos! Quebra os Quilos!, a expressão passou genericamente a
indicar todos os movimentos de contestação ao governo a respeito do
recrutamento militar, cobrança de impostos e adoção do sistema mé-
trico decimal. Nem a arquivística nacional escapou a essa generaliza-
ção. Ainda hoje, parte da documentação sobre esses acontecimentos
acha-se reunida em um só códice no Arquivo Nacional, onde quebra-
quilos paraibanos, pernambucanos, cearenses e revoltadas mulheres mi-
neiras e paulistas contra o recrutamento de seus maridos, repousam na
paz de uma única classificação.
Embora o quebra-quilos seja, de certa forma, um movimento mu-
do e hesitante, comparativamente a outros movimentos do século pas-
sado e do atual, não se poderia dizer que é cego, fruto da fúria de as-
sassinos e bandidos. A consciência política é uma aqu:sição lenta e de
algum modo sistemática. Os sediciosos que aparecem no noticiário po-
lítico da época pertencem ao mundo dos que não liam nem escreviam
livros expondo idéias. Os
- 105-

do novo sistema de pesos e medidas, pelos ressentimentos religiosos e


reação contra o excesso tributário, foi inevitavel o aparecimento de
um tipo especial de bandido, o bandido social transitório, às vezes pa-
radoxalmente conservador, como são quase sempre os líderes quebra-
quilos.
Em diversas cidades, o Quebra-Quilos não passa de uma turba,
sem atingir, ao menos, a gradação de sedição, como se depreende do
noticiário de jornais da época como o Despertador na Para~ba e a
Província em Pernambuco. Se bem que o conceito de "turba" seja
extremamente elástico e plurivalente, aplicavel, na maioria dos casos,
a movimentos pré-políticos urbanos, a circunstância especial de um
grupo de quebra-quilos, na sua maioria agricultores, viverem nas vilas
onde os acontecimentos marcantes têm lugar nas feiras, nas igrejas e
nos cartórios, enfim em centros econômicos e sociais de comunidades
urbanas pré-industriais, a subversão da ordem coloca-se, repetidas ve-
zes, precisamente nesse nivelo
A década de 1870 a 1880 é tambem a década da Questão Reli-
giosa o maior abalo que experimentou a Igreja do Brasil no Segundo
Reinado. Depois dos estudos de Nilo Pereira, creio que não há mais
nada a se dizer sobre o assunto. Valho-me de sua obra aqui, somente
para repetir que a Questão Religiosa foi um dos grandes motivos ele
debate jornalístico. A imprensa do tempo era essencialmente polêmica
- diz Nilo Pereira - com inteira razão. Bastaria lembrar os nomes
de Soriano de Souza, Carneiro Vilela, Franklin Távora e Aprígio Gui-
marães.
O Diário de Pernambuco, por exemplo, foi fiel à sua época. Foi
polêmico e tomou partido. Acusou os jesuitas como os grandes res-
ponsáveis pelo Quebra-Quilos e pela Questão Religiosa.
A falta de gazetas e o medo de falar alto fizeram surgir na co-
lônia uma singular forma de imprensa - o pasquim - pregado nos
muros, mais ou menos às escondidas, tirado em cópias e metido por
debaixo das portas. Formas ilegais de comunicação, sorrateiras, pe-
rigosas para as autoridades, constituiram, entretanto, os pasquins uma
forma de protesto contra a preponderância e a censura. Às vezes se
aparentam com cartas anônimas e calúnias. O mais antigo de que se
tem notícia é da autoria de um certo Jorge Martins, aliás redigido con-
tra a chamada Companhia de Jesus. O antijesuitismo que veremos ex-
plodir no Diário de Pernambuco por ocasião da Questão Religiosa e
da Revolta dos Quebra-Quilos é, portanto, antigo. Em 1608, a Câ-
mara de São
- 106-

Onde escrevem sem vergonha


Não só brancos, mas mestiços
Que pa~a os bons sou inferno
E para os maus paraiso.

o Diário de Pernambuco da década de 1870 a 1880 é polêmico.


Reflete os conflitos de seu tempo. Seu duelo diário com outro jornal
"A Província", é um dos mais curiosos capítulos da história da im-
prensa brasileira. Nilo Pereira esmiuçou, letra por letra, linha por li-
nha, nos seus editoriais e noticiários, as posições governamentais em
relação à Questão Religiosa . E escreveu páginas definitivas sobre o
assunto. Deixou como legado de prudência e honestidade intelectual
a indagação da participação dos jesuitas no movimento dos Quebra-
Quilos. Nenhum historiador poderia abordar este tema sem o Diário
de Pernambuco de 1874 e 1875 nas mãos.
As sedições dos quebra-quilos, tomadas aqui em sua pluralidade,
poderiam ser encaradas como reformistas de maneira apenas limitada.
Raramente os matutos que tomam parte na agitação concebem a cons-
trução de uma nova sociedade. O que pedem em seu limitado universo
mental e político é a correção do que lhes parecem anormalidade e in-
justiças da velha ordem tradicional.
O movimento não seria, segundo as notas oficiais do Partido Li-
beral - e tal fato em suas linhas gerais é seguramente verdadeiro -
um movimento de partido e premeditado, e sim uma expontânea res-
posta popular à situação vigente. Resposta violenta aos bachareis, de-
putados, câmaras, coletorias, cartórios e impostos, peças fundamentais
da engrenagem político-administrativa da época. Os enfoques locais
fazem com que apareçam como causa principal, como lei! motiv, a
política dos governadores provinciais. Se na Paraiba é Silvino Car-
neiro da Cunha que "lança impostos sobre gêneros alimentícios e sobre
o chão que se pisa", convertendo "o povo em escravos de sua feitoria"
como dizia agressivamente o jornal A Província, no Recife, o gover-
nador Henrique Pereira de Lucena seria o pai e a mãe de todas as
desgraças que se abatiam sobre Pernambuco.
O
ESTRUTURA E CONJUNTURA DA ECONOMIA
AÇUCAREIRA NO NORDESTE DO BRASIL,
1889-1930 (*) (**).

GADIEL PERRUCI
da Universidade Federal de Pernambuco.

1. - INTRODUÇÃO.

o presente trabalho refere-se a um período de tempo e a uma


região até recentemente pouco estudados.
Na verdade, a Primeira República brasileira tem permanecido,
em muitos aspectos, um período de tempo relativamente desprezado
pelos historiadores brasileiros, especialmente os universitários que, pa-
rece, não o têm considerado como um grande tema histórico. t;:. pos-
sível que essa despreocupação tenha origem no fato de que a grande
maioria dos nossos melhores historiadores tenha vivido por demais
próx:ma do período republicano inicial e, por isso mesmo, quando de
sua juventude, tenha se dirigido em seus estudos para épocas mais dis-
tantes.
t;:. inegavel, porem, que a partir de um certo tempo, têm surgido
análises sobre a Primeira República, algumas delas meros ensaios ou
tentativas de abordagens (1), outras representando trabalhos de longo

(*). - Conferência pronunciada no dia 5 de setembro de 1975 no Au-


dit6rio do Colégio Estadual de Sergipe (Nota da Redação).
(**). - Versão resumida deste trabalho está sendo publicada pela Re-
vista da Instituto Hist6rico e Geográfico Brasilei:o, sob o título "Economia
açucareira no Segundo Reinado".
(1). - Cf., por exemplo, Boris FAUSTO, Pequenos ensaios de Hist6ria
da República: 1889-1945. São Paulo,
- 108-

fôlego como os de Edgard CARONE (2). Qualquer que seja a razão,


entretanto, parece que os estudos sobre a Primeira República apresen-
tam um certo receio em penetrar na sua estrutura econômica ou mes-
mo deslindar os vai-e-vem de suas conjunturas, excetuando-se setores
isolados, na verdade bem estudados, como o café, por exemplo. Re-
firo-me à Primeira República como um todo, evidentemente, e não
apenas à Primeira República do café, ou a da industrialização, ou a
da urbanização, isoladamente.
Por outro lado, o Nordeste parece ter tido um destino similar, se
me for permitido comparar espaço e tempo, um período histórico e
uma região. Pedaços do Nordeste - espaço e tempo - têm sido bas-
tante estudados - o açucar colonial, a Guerra Holandesa, as revo-
luções da primeira metade do ~éculo XIX; o Nordeste do século XVIII,
quase nada, o Nordeste do século passado, pouquíssimo, o Nordeste
durante a Primeira República permanecendo quase que inteiramente
desconhecido.
E, no entanto, como conhecer os problemas nordestinos atuais
sem a necessária revisão do Nordeste novecentista e republicano?
A história do Nordeste brasileiro, na verdade, pelo menos aquela
que é conhecida e que é objeto de ensino, começa com a colonização
e se continua até o fim do século XVII; parece que ocorre, então, uma
interrupção e que os historiadores se interessam por outras regiões, a
da mineração em particular. De 1800 a 1848, ano da Praieira, talvez
a última grande insurreição regional, novamente voltam-se os historia-
dores para o Nordeste . A partir de 1848, contudo, recomeça para a
história nordestina um tempo vazio que se estende até os anos de
1960, quando a agitação social, real ou imaginária, reativa o interesse
pela região. Desde então, a bibliografia pertinente se enriquece bas-
tante, embora esses estudos estejam essencialmente ligados aos pro-
gramas de desenvolvimento econômico lançados pela SUDENE.
Para retomar uma frase de Josué de CASTRO,
"o Nordeste do Brasil foi descobe,to em 1500 pelos portu·
ses e em 1960 pelos americanos do norte. As duas descobertas
se devem a erros: a de 1500 foi o rewltado de um e:ro de
navegação, a de 1960, de um erro de interpretação" ... (3).

(2). - Cf., por exemplo, Edgard CARONE, A primeira República.


São Pau!o, Difel, 1969.
- A República Velha (Instituições e Classes Sociais). São Paulo, Difel,
1970.
- A República Velha (Evolução Política). São Pau'o, Difel, 1971.
(3). - 10sué de CASTRO, Une zone explosive: le Nordeste du Brésil -
Paris, Editions du Seuil,
- 109-

Os americanos do norte talvez não tenham feito realmente a "se-


gunda descoberta", mas o capitalismo moderno, sobretudo através de
investidores e de empresas já operantes do Sudeste do Brasil, aprovei-
tando-se da nova política de estímulos econômicos, lançou-se segura-
mente numa verdadeira "corrida do ouro" .
Aparentemente, há apenas duas coisas que lembram o Nordeste:
a cana de açucar e as secas, atribuindo-se a esses dois aspectos da rea-
lidade todas as causas do subdesenvolvimento regional. Essas idéias
convencionais, baseadas ainda sobre critérios antigos, talvez tivessem
alguma validade na época colonial; atualmente, é evidente que uma
região tão vasta como o Nordeste não pode ser reduzida a uma esque-
matização por demais simplista. A realidade contemporânea é muito
mais rica nos detalhes, na variedade de suas paisagens, na composição
de seu meio sócio-econômico, em sua História.
Não pretendemos aqui, no entanto, preencher o vazio historiográ-
fico acima referido, mas simplesmente contribuir para o estudo do
Nordeste durante a Primeira República, aclarando alguns de seus as-
pectos sócio-econômicos. Na verdade, o presente trabalho faz parte
de uma análise mais ampla da realidade econômica brasileira durante
a Primeira República, cujos resultados serão brevemente publicados
em forma de livro.
Sem fugir de uma perspectiva de história regional, acreditamos
que a Região somente pode ser explicada dentro do complexo histó-
rico brasileiro; sem renunciar aos assuntos da conjuntura regional, pen-
samos na aplicação de técnicas modernas de investigação que poderão
mais tarde contribuir para sínteses históricas globais em termos de
con~unto
110 -

Assim, a análise nos levou, de um lado, a situar o Brasil dentro


do conjunto do sistema mundial para melhor compreender as direções
da economia nacional, suas quebras de ritmo, suas acelerações, suas
contrad'ções. De outro lado, tentamos mostrar que a decadência da
região nordestina e o progresso do sul do país participam, na verdade,
dos mesmos fenômenos. Com efeito, as causas da decadência regional
ultrapassam largamente o Nordeste em si mesmo e não podem ser
completamente esclarecidas sem nos elevarmos ao nivel do conjunto
do desenvolvimento nacional.
Em resumo, acreditamos que a situação do Nordeste brasileiro
somente pode ser compreendida historicamente através das transforma-
ções mundiais dos fins do século passado, pelo papel desempenhado
então pelo Brasil no sistema internacional e, enfim, pela conjuntura
interna determinada predominantemente pelo Sudeste brasileiro.
NORMANO escreve que, de possessão de Portugal na época co-
lonial, o Brasil tornou-se depois da Independência uma propriedade
privada da classe dos fazendeiros (5). Essa boutade, contudo, repre-
senta antes o pensamento da intelligentzia brasileira dos anos de 1930,
sai da da pequena burguesia republicana, do que a realidade dos fins
do século passado e dos inícios do atual.
Na verdade, as grandes mudanças ocorridas naquela época repre-
sentam o enorme trabalho de novas forças econômicas para adaptar as
antigas estruturas brasileiras às realidades mundiais da época. Esse
esforço foi melhor sucedido onde justamente as condições estavam ma-
duras, isto é, no Sudeste do café. Assim, a "grande propriedade pri-
vada dos fazendeiros", no dizer de NORMANO, sofreu o assalto con-
jugado de forças nacionais e internacionais que deram nascimento ao
Brasil contemporâneo.
Essas transformações, contudo, foram lentas, entremeadas de cri-
ses de crescimento, confusas, porem espectaculares, pelo menos se <:e
considerar o que tem ocorrido nas grandes cidades do litoral e sobre-
tudo do Sudeste.
Estabelecendo pontes de ligação entre a evolução do capitalismo
ocidental e a realidade brasileira, verificamos que a Primeira Repú-
blica constitui um período de transição sócio-p6lítico-econômica, de
modernização das antigas estruturas, modernização, é bem verdade,
provocada em grande parte por fatores externos ao país.

(5). - J. F. NORMANO, Evolução Econômica do Brasil. São Paulo,


- 111-

o presente trabalho pretende identificar o carater dessas mudan-


ças e desse período de transição ao nivel regional através de um es-
tudo da economia açucareira nordestina, tomando-se o Estado de Per-
nambuco como caso limite. Para isso, entretanto, achamos necessário,
para melhor entendimento do quadro geral brasileiro, traçar previa-
mente uma balanço dos acontecimentos que preparam o advento da
República no Brasil.
*
2. - A DECADENCIA DO REGIME IMPERIAL.

A proclamação da República no Brasil é frequentemente definida


como um movimento político superficial sem grande relação com os
fatos econômicos do país. Ela teria constitui do simplesmente uma pas-
sagem formal de um regime a outro, passagem provocada por um pro-
nunciamento de tipo latino-americano, fruto do mau humor de alguns
oficiais superiores do exército - monarquistas, em sua maioria - aliás
com a cumplicidade de um punhado de políticos que agitavam as idéias
republicanas no Parlamento e na imprensa (6).
Assim, a Questão Militar (7) e a crise de autoridade do poder
imperial, sensivel sobretudo na capital, teriam chocado grandemente a
classe militar brasileira de então. Juntando-se à Questão Militar, a
Questão Religiosa (8) e a abolição do trabalho escravo, o quadro es-
taria completo para poder-se entender por que os militares decidiram
mudar o regime (9).
Aparentemente, o texto pelo qual o Governo Provisório Republi-
cano anuncia a tomada do poder, em 15 de novembro de 1889, con-
firma esta idéia; excetuando-se a palavra "república", nada indica,
com efeito, que uma importante mudança política acabava de se pro-
duzir.
Entretanto, no mesmo dia, o primeiro decreto governamental ins-
tala a República Federativa do Brasil, estabelecendo uma nova ordem
institucional que responde em muitos aspectos à realidade concreta do

(6). - Cf. José Maria BELO. História da República. (6a. ed.). São
Paulo, Companhia Editora Nacional, 1969 - p. 17.
(7). - Cf. John SCHULS - "O Exército e o Império", in História
Geral da Civilização Brasileira (O Brasil Monárquico) - Tomo 11, vol. 4 -
São Paulo, Difel, 1971 - pp. 235 esq.
(8). - Cf. Roque Spencer M. de BARROS, A Questão Religiosa" in
História Geral da Civilização Brasileira (O Brasil Monárquico). Tomo 11,
vol. 4. São Paulo, Difel, 1971 - pp. 338 e sq.
(9). - José Maria BELO,
-112 -

país (10). Na verdade, a grande descentralização federativa da Pri-


meira República exprime muito bem o sentimento de autonomia de
certas províncias, como São Paulo, por exemplo, que, apesar de um
progresso material espetacular, sofre a administração centralizadora do
Império como um freio às suas aspirações econômicas quando não, em
realidade, como uma carga inutil a sustentar ou a financiar (11).
Aparentemente, no entanto, a criação da República teria interes-
sado apenas a uma pequena camada da população brasileira - a clas-
se dominante, que disputará as novas funções políticas, e os funcioná-
rios públicos, que sofrerão as adaptações político-administrativas ha-
bituais nas mudanças de regime. .. Retomando uma frase célebre da
época, o povo assiste estupefacto o acontecimento republicano e a or-
dem reina, como de hábito, sobre todo o território nacional (12).
Na realidade, porem, o exame da evolução econômica brasileira
das últimas décadas do século XIX, por superficial que ele seja, de-
monstra sem dúvida nenhuma que a agonia política do Império re-
presenta apenas a parte visivel do problema. Com efeito, profundas
transformações sócio-econômicas se desenvolvem no conjunto do sis-
tema mundial, sem que as instituições imperiais possam acompanha-
las ou estimula-las; ao contrário. tenta-se assimila-las, freiando-as ou
bloqueianclo-as simplesmente (13).
Num plano mais amplo, a nova organização capitalista ocidental,
baseada sobre o capital industrial e financeiro, redistribui praticamen-
te as funções econômicas internacionais. A economia brasileira, na
época, é complementar e dependente dos mercados internacionais com-
pradores de matérias primas, a Inglaterra em primeiro lugar. O Bra-
sil é, pois, levado a se adaptar a esse novo equilíbrio; e, como resultado

(10). - Edgard CARONE, A Primeira República (pp. 13 esq.). O


Autor reproduz o texto da Proclamação dos Membros do Governo Provisório,
feita em 15-11-1889 e o primeiro decreto republicano.
(11). - Celso FURTADO - Formação Econômica do Brasil - (3a.
ed) - Rio, Edit. Fundo de Cultura, 1961 - p. 194.
(12). - Em 23-11-1889. o consul da França em Pernambuco i-forma
seu Ministério de que a "notícia da queda da Monarquia foi recebida com
entusiasmo pelos habitantes de Pernambuco". A Monarquia - acrescenta o
agente consular - não encontrara um só defenso-.
Archives du Ministere des Aftaires Etrangeres (Paris) - Correspondance
Commerciale et Politique - PERNAMBOUC. vol. 10. Dépêche du 23-11-1889.
Usaremos, daqui por diante, apenas a sigla AMAE-CC, em relação às citações
de documentos desse Arquivo.
(13) - Caio PRADO IR. - História Econômica do Brasil - (3a. ed.)
- São Paulo, B;asiliense, 1953 - p. 200.
- 113-

de sua especialização, ele se toma um dos maiores produtores de ma-


téria prima e de produtos tropicais do mundo (14).
Entretanto, a ordem institucional de tipo patriarcal anterior a
1889, baseada no regime de grande propriedade (plantation), ameaça
enfraquecer cada vez mais o país, confrontado a mudanças internas e
externas. O resultado dessa resistência institucional do Império será,
pois, o despreparo da nação para resistir aos imperialismos externos e
para empreender internamente a modernização de suas próprias es-
truturas.
Em consequência, de um lado, o Brasil será facil presa do ca-
pital financeiro internacional que, nessa fase de penetração, será ainda
mais ou menos controlado pelo poder central; e de outro lado, o des-
locamento dos paIos de crescimento econômico para o Sudeste, o
quase isolamento dos Estados nordestinos e a permanência de suas
antigas estruturas de dominação agrária, o rápido crescimento dos
centros urbanos, o desenvolvimento industrial que se acelera, provo-
carão, de início, sérios riscos de fragmentação política do país e, mais
tarde, a criação de áreas de subdesenvolvimento crônico, a exemplo
do Nordeste (15).
Assim, as estruturas do Império, que não serão abaladas e substi-
tuidas senão muito vagarosamente durante o primeiro período repu-
blicano, demonstram bem a fraqueza da economia brasileira baseada
quase que exclusivamente sobre um ou dois produtos de exportação;
isso significa, evidentemente, que o país continua inteiramente subme-
tido aos mercados externos e, por isso mesmo, dependente das flutua-
ções imprevisiveis da conjuntura internacional.
NORMANO escreve que toda a história econômica brasileira,
antes de 1930, teria sido apenas uma longa sequência de recordes es-

(14). - Celso FURTADO - Les Etats-Unis et le sous-dévéloppement de


l'Amérique Latine - Paris, Calmann-Lévy, 1970 - p. 124.
(15). - WIENER, Ministro plenipotenciário francês no Brasil, acredi-
ta na hipótese de um desmembramento da, federação brasileira, a curto prazo.
Ele pensa que não há laços de solidariedade nacional e que os Estados não
apoiarão o Governo Central; estima ainda que nem mesmo um ditador pode-
ria manter com sucesso pela força a coesão nacional. Na verdade, WIENER
expõe duas idéias essenciais: 1) a União não pode subsistir; 2) os Estados
federados proclamarão sua liberdade ou se agruparão em inúmeras repúblicas
independentes. A partir dessa análise, WIENER aconselha uma certa prudência
aos investigadores franceses e o desvio para outros mercados dos títulos que
se encont 'am circulando no mercado frances, mesmo com perdas. Alem disso,
sugere mudanças na política francesa de investimentos no exterior; assim, se-
gundo ele, a
- 114-

petaculares na produção de alguns produtos tropicais de exportação


que, em épocas diferentes, teria respondido a necessidades do mercado
mundial - o açucar, na época colonial, o algodão, até o fim da Guer-
ra Civil norte-americana, a borracha, até os anos de 1920 e, final-
mente, o café, desde a segunda metade do século passado (16).
Essa visão esquemática, contudo, talvez possa ser válida apenas
para a época colonial e os começos da independência política. Com
efeito, o imobilismo colonial começa realmente a desaparecer durante
o Segundo Reinado em consequência sobretudo do café que passa a
ser não mais um produto de exportação episódico, porem um produto
permanente da economia brasileira até nosos dias. Alem disso, em-
bora acentuando a tendência mono-exportadora de nossa economia, o
café possibllita uma rápida acumulação de capital no Sudeste que será
responsavel, em parte, pelo início do processo de industrialização nas
primeiras décadas deste século. Assim, a economia do café, concen-
trada sobretudo no Sudeste, a curta mais intensa subida do algodão e,
principalmente, da borracha, provocaram uma acumulação de capital
que criou, bastante lentamente, é verdade, as condições para o pro-
cesso de relativa modernização do conjunto do país.
A partir da aboEção do tráfico negreiro, nos anos de 1850, os
capitais anteriormente imobllizados naquele tipo de comércio, são li-
berados e se juntam aos excedentes da economia exportadora para a
criação de múltiplas atividades reprodutoras, a exemplo do que se
passa na indústria leve, no comércio e nos serviços.
Estudando a economia brasileira da segunda metade do século
passado, Humberto BASTOS escreve que o grande efeito benéfico da
monocultura do café foi sentido sobretudo em três dos mais importan-
tes setores do desenvolvimento nacional. No setor demográfico, com
a imigração estrangeira que provoca a melhora do nivel da mão-de-
obra do país; no estímulo à industria de máquinas leves destinadas ao
tratamento de produtos agrícolas e, finalmente, numa maior acumu-
lação capitalista, fruto do quase monopólio no mercado internacional
do café (17).
Por outro lado, o progresso material durante o Segundo Reinado
não se realiza uniformemente em todo o Brasil; pode-se até mesmo
afirmar que quase todas as iniciativas econômicas bem sucedidas fo-
ram desenvolvidas no Sudeste, a seu exclusivo proveito e, o que é mais
grave, em prejuizo de outras reg:ões, a exemplo do Norte e do Nor-
deste.
(16). - J. F. NORMANO, op. cit., p. 23.
(17). - Humberto BASTOS, Desenvolvimento ou escravidão. São Paulo,
- 115-

Escrevendo sobre a renda real do conjunto brasileiro da época,


Celso FURTADO observa que a renda da região mais dinâmica da
economia nacional, isto é, o Sudeste, quintuplicou, enquanto que a do
do Nordeste beneficiou-se apenas de um aumento da ordem de 54% .
Sabendo-se que o açucar e o algodão, acrescenta FURTADO, são os
dois únicos produtos de alguma significação na exportação nordestina
e que esses mesmos produtos perdem cada vez mais importância em
relação ao conjunto das exportações brasileiras, pode-se compreender
que o progresso econômico durante o Segundo Reinado não se esten-
deu a todo o território nacional (18).

Em resumo, pode-se traçar o balanço da vida econômica brasi-


leira, nas vésperas da República, da seguinte maneira.

A aboI:ção do trabalho escravo é recente, havendo ao que tudo


indica uma séria crise de mão-de-obra, com graus relativos de impor-
tância segundo as diversas regiões do país. Caio PRADO JR., por
exemplo, observa que a crise de mão-de-obra teria sido mais sensivel
no Nordeste, região que não fora privilegiada por correntes imigrató-
rias, enquanto que o Sudeste teria sido menos atingido em face do de-
senvolvimento anterior do trabalho livre (19). Contrariamente, no en-
tanto, alguns autores nordestinos, como CORREIA DE ANDRADE,
baseados em pesquisas empíricas, afirmam que o Nordeste não foi
atingido por nenhuma crise de mão-de-obra provocada pela Abolição,
em face sobretudo das diferenças existentes entre a estrutura econô-
mica nordestina e a do Sudeste do país (20).

Por outro lado, o papel desempenhado pela economia do café ul-


trapassa grandemente o do açucar e do algodão; em consequência, os
negócios são mais ativos no Sudeste, onde se localizam os centros de
decisão político-econômica. No Norte do Brasil, a borracha encon-
tra-se ainda em expansão, atraindo para o seu mercado de trabalho
grande parte da mão-de-obra nordestina.

O comércio exterior é controlado por estrangeiros e vive em fun-


ção da conjuntura internacional; tanto as transações quanto o trans-
porte de mercadoria~ são realizados por bancos e por navios estran-
geiros. O comércio interno depende, tambem, em grande parte, do
estrangeiro; em primeiro lugar, porque há um comércio ativo baseado

(18). - Celso FURTADO, Formação Econômica do Brasil, p. 164.


(19). - Caio PRADO Jr., op. cit., p. 207.
(20). - Cf. Manuel Correia de ANDRADE, A terra e o homem no
Nordeste São Pau!o,
- 116-

em mercadorias importadas (21), em seguida, porque a cabotagem é


realizada parcialmente através de navios de bandeira estrangeira (22).
O setor industrial do país sofre dificuldades em razão da falta de
capitais que se dirigem preferencialmente ainda para os setores de
bens e de serviços; alem disso, forçoso é reconhecer que as empresas
industriais estão espalhadas por todo o imenso território brasileiro ha-
vendo, portanto, uma descentralização demasiadamente grande dificul-
tando a criação de áreas industriais regionais polarizadoras do cresci-
mento econômico (23) .
O desenvolvimento tecnológico é muito pouco es.timulado. Na ver-
dade, ao que parece, a demanda por tecnologia não é ainda uma aspi-
ração da economia nacional desde que a agricultura extensiva não é
muito exigente enquanto que o crescimento industrial é muito limitado.
Não há uma política econômica nacional delineada a longo pra-
zo, resumindo-se as questões político-econômicas a meras preocupa-
ções fiscais tendo em vista o equilíbrio orçamentário e dentro de uma
perspectiva quase que exclusivamente monetária. Em consequência,
não existe qualquer esforço de se estruturar coerentemente uma polí-
tica alfandegária capaz de proteger a incipiente indústria nacional; o

(21). - Em seu relatório de 1-9-1883, o consul da França em Pernam-


buco assinala inúmeros produtos importados pelo mercado ~egional: carvão
de pedra, cimento, cal, madeira, móveis, ferro, aço, máquinas e aparelhos,
bacalhau, munições bélica,s, animais, carne seca, manteiga, artigos de bijute-
ria, cabelos, crinas, penas, cutelaria, cobre e suas ligas, drogas e produtos quí-
micos, frutas, relojoaria, instrumentos de música, marfim, legumes e farinha
de trigo, fósforos, palha, cordoaria, perfumaria, papelaria, peles e couros,
plantas e flores artificiais, chumbo, porcelana e cristais, chá, tecidos de al-
godão e de lã, fios de linho e de seda, carne salgada, conservas, óleos e asfalto.
AMAE-CC-Pernambouc, vol. 9, Rapport du 1-9-1883.
(22). - A lei federal de 11-11-1892 poibiu a cabotagem aos navios
estrangeiros; essa medida foi, no entanto, adiada em razão da precariedade da
marinha mercante brasileira e dos protestos enérgicos das potências estrangeiras
interessadas no comércio interno, como a Inglater:a, a França e a Alemanha.
Nessa época, a frota mercante do Brasil havia crescido consideravelmente
em razão sobretudo do aumento do comércio inter-provincial, consequência da
expansão da produção global do país. Alem disso, as correntes comerciais se
tinham modificado; o comécio interno se desenvolvia tanto ou mais do que
o externo. Em 1893, a frota mercante brasileira era estimada em: 50 vapores
ultrapassando 500 t. (dos quais 9 de 1. 000 a 3.000 t.), 126 vapores para a
pequena cabotagem, de 150 a 500 t., e 35 vapores, exclusivamente servindo
no Amazonas, totalizando 9.655 t. O total se elevava a cerca de 83.651 t. É
necessário acrescentar a tonelagem (desconhecida) rep-esentada pelos pequenos
veleiros (barcaças) que faziam, até recentemente, a pequena cabotagem entre
as p"ovíncias próximas umas das outras.
AMAE-CC-Pernambouc, vol. 10, Rapport du 20-1-1893.
(23). - Pierre DENIS, Le Brésil au XXeme. siecle. (2ê. ed). Paris
Armand Colin, 1909,
- 117-

resultado é que os produtos estrrangeiros penetram quase que sem dis-


criminação no mercado brasileiro.
Os equipamentos de infra-estrutura são pouco desenvolvidos e
mal distribui dos . Não há estradas, exceto algumas de importância se-
cundária no Sudeste; os transportes terrestres no Nordeste, por exem-
plo, são ainda realizados através dos antigos caminhos de boiadas.
A rede ferroviária é pouco desenvolvida, os portos do país não estão
preparados e equipados para a navegação a vapor e para o crescente
volume do comércio. As grandes cidades são ainda inóspitas, mal
construidas e sujeitas a frequentes epidemias (24) .


3. - NORDESTE: TRANSIÇÃO SOCIAL E ECONOMICA.

A Primeira República no Nordeste pode ser considerada global-


mente como um período de transição caracterizada pela substituição
progressiva dos engenhos pelas usinas. Em outros termos, esse período
assiste no Nordeste à decadência progressiva da antiga aristocracia da
cana de açucar e ao nascimento de novos setores ou grupos sociais ba-
seados no desenvolvimento do capital industrial e financeiro. Isso sig-
nifica tambem a retomada do crescimento de grandes cidades como
Recife, o que representa nesse caso preciso um verdadeiro renasci-
mento econômico. Com efeito, no tempo dos holandeses, Recife já se
constituia numa cidade de população cosmopolita e instavel, com ati-
vidades especificamente urbanas; ela anunciava, embora de uma ma-
neira prematura, a divisão clássica entre o engenho e a cidade, entre
o senhor rural e o mascate. Esse fenômeno urbano representa, aliás,
segundo BUARQUE DE HOLANDA, um fator completamente novo
no Brasil do século XVII (25).
Nos fins do Império e começos da República, aparecem na região
os engenhos centrais e as usinas que transtornam toda a situação da
economia açucareira; para se ter uma idéia disso, aliás, basta exami-
nar, mesmo rapidamente, o crescimento demográfico do Recife, o pro-
gresso dos seus equipamentos urbanos e o estabelecimento de novas
relações sociais, políticas e econômicas, originadas da nova conjuntu-

(24). - Humberto BASTOS, op. cit., p. 121.


(25). - Sergio Buarque de HOLANDA, Raizes do Brasil. (2a. ed.).
Rio de Janeiro Livraria José Olympio Editora. 1948, p. 71.
Cf. tambem, José Antônio Gonsalves de MELLO, Tempo dos Flamengos.
Rio de Janeiro Livraria José Olympio Editora. 1947, pp.
- 118-

ra. Em consequência, Recife torna-se o centro das novas elites urba-


nas que impulsionam quase todas as mudanças da região (26).
Entretanto, apesar dessas transformações, não se pode verdadei-
ramente falar de uma mudança das estruturas da economia regional.
Ao nosso ver, somente o controle do mecanismo da produção é modi-
ficado; isto é, que o grupo dos grandes senhores rurais é absorvido
progressivamente pelo capitalismo urbano. A monocultura do açucar
para exportação permanece sempre intacta; é sua modernização e seu
controle pela cidade que representam uma nova situação .

4. - A ECONOMIA AÇUCAREIRA.
4. 1. - Produção e exportação.

o começo da crise da economia agrária colonial brasileira no sé-


culo XVII está ligado à dominação de Portugal pela Espanha (1580-
1640) e à invasão do Nordeste brasileiro pela Holanda (27) .
Esses acontecimentos comprometem irremediavelmente a estreita
cooperação entre a produção agrícola, assegurada pelos portugueses, e
a distribuição comercial, assegurada pelos holandeses; o açucar brasi-
leiro perde, assim, o monopólio do mercado internacional, controlado
daí por diante por outras potências européias. Acres.cente-se a isso, a
descoberta das minas no Brasil que provoca o desinteresse crescente
pelas atividades agrícolas; é o ouro que durante o século XVIII con-
centra em torno de si quase todos os esforços econômicos da colônia.
A crise se agrava ainda em razão da política européia do pacto
colonial que procura preservar o mercado de cada nação aos produtos
de suas próprias colônias (28); o Brasil, cuja metrópole representa um
pequeno mercado de consumo, não é, pois, favorecido (29).
Entretanto, no fim do século XVIII, a produção agrícola brasi-
leira melhora relativamente, não somente em razão da decadência das
minas mas tambem pela reabertura dos mercados mundiais e pelo

(26). - Cf. Gadiel PERRUCI, "A cidade do Recife 0889-1930): o


crescimento urbano, o comercio e a indústria", in A cidade e a Histó'·ia. Anais
do VII Simpósio Nacional dos Professores Universitários de História. Belo
Horizonte. 1974. Volume I.
(27). - Frédéric MAURO, ['Expansion européenne (1600-1870). (2é.
édit.). Paris, PUF, 1967, pp. 142 e 169.
(28). - Cf. Fernando NOVAIS, "O Brasil nos quadros do antigo sistema
colonial" in Brasil em Perspectiva (2a. ed.). São Paulo, Difel, 1969 - pp.
51 esq.
(29). - Caio PRADO JR., op.
- 119-

abandono da estreita política do pacto colonial. Com efeito, o desen-


volvimento da população européia durante aquele século e, sobretudo,
os acontecimentos que marcam a revolução industrial provocam a va-
lorização dos chamados gêneros coloniais. A esse respeito, Portugal é
bem favorecido; de um lado, sua relativa neutralidade nos conflitos
europeus facilita o trabalho dos seus negociantes e os favorece em re-
lação aos concorrentes estrangeiros; de outro lado, esses conflitos pou-
pam o Brasil - ao contrário do que aconteceu com outras colônias
americanas, as Antilhas inglesas e francesas, por exemplo - e a agri-
cultura brasileira pode se recuperar tranquJamente.
Alem disso, no fim do século XVIII e no começo do XIX, o al-
godão traz novo fôlego à produção agrícola colonial, sendo dessa épo-
ca a intensa, embora curta, euforia econômica que reina no Nordeste,
sobretudo na Capitania do Maranhão, que surge praticamente no ce-
nário econômico colonial (30), e de Pernambuco com o desenvolvi-
mento de áreas até então pouco exploradas como o Agreste (31) .
A cultura do algodão torna-se tão importante para Pernambuco
que a sua exportação, nos inícios do século XIX, chega mesmo a su-
perar em valor as exportações de açucar, base permanente da econo-
mia regional (32).
Em 177 8, o Brasil exporta 3. 510 quilos de algodão, mas desde
o início do século XIX esta exportação oscila entre 450 e 600 tonela-
das, por ano (33). Em 1801, por exemplo, o valor em dinheiro da
exportação do açucar representa apenas um terço do valor do algodão
exportado (34).
Para um exame mais detido da produção algodoeira em Pernam-
buco, nos princípios do século XIX, aliás, são interessantes as anota-
ções e os números indicados por KüSTER e por TüLLENARE (35),

(30). - Celso FURTADO, op. cit., pp. 89 esq.


Cf. tambem, Mário M. MEIRELES, História da Independência do Mara-
nhão. Rio de Janeiro, Artenova, 1972, p. 33.
- Melo e Póvoas (Governador e Capitão General do Maranhão). São
Luiz, SIOGE, 1974, pp. 77 esq.
(31). - Manuel Correia de ANDRADE, A Pecuária no Agreste Pernam-
bucano. Recife, 1961, pp. 60 e 61.
(32). - M. de Oliveira LIMA, Pernambuco, seu desenvolvimento histó-
rico. Leipzig, F.A. Brockauss, 1895, p. 244.
(33). - J.F. NORMANO, op. cit., p. 43.
(34). - Carlos Guilherme MOTA, Nordeste, 1817. São Paulo, Perspecti-
va, 1972, p. 20.
(35). - Henry KOSTER, Viagens ao Nordeste do Brasil. (t~ad. c notas
de L. da Câmara Cascudo). São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1942,
p. 38.
L.F. TOLLENARE, Notas rominicais, tomadas durante uma viagem em
Portugal e no Brasil em 1816, 1817 e 1818. Salvador, Livraria Progresso Edi-
tora, 1956, pp.
- 120-

e repetidos em grande parte por PEREIRA DA COSTA em seus de-


sordenados e, por vezes, inconsequentes ANAIS PERNAMBUCA-
NOS (36).
Entretanto, apesar do algodão continuar sendo cultura importan-
te no Nordeste, a economia regional é ainda dominada pelo açucar até
nossos dias.
O açucar brasileiro aproveita-se tambem da conjuntura interna-
cional da época; a crise de São Domingos, em 1792, e as guerras na-
poleônicas provocam uma elevação dos preços do açucar nos mercados
mundiais (37). Em 1790, a libra do açucar brasileiro valia no mer-
cado de Amsterdam 0,33 Florim; esses preços se elevam progressiva-
mente até 0,81 Florim, em 1799, mas declinam, na década seguinte,
para quase o mesmo nivel anterior à crise. Em consequência das guer-
ras napoleônicas, entretanto, os preços do açucar retomam uma cota-
ção elevada e atingem, em 1810, o valor de 1,69 Florim por libra de
peso. :a somente depois de 1830 que os preços do açucar brasileiro
se esboroam; eles se mantêm por todo o século XIX a um nivel com-
paravel ao do século anterior (38).
As primeiras décadas do século XIX assistem, pois, a uma curta
renascença da economia açucareira. O Nordeste, entretanto, não con-
segue resolver os problemas provocados pelas crises anteriores; desse
momento em diante, aliás, ele começa a sofrer mais fortemente a con-
corrência da produção açucareira do Sudeste, em particular da zona
de Campos, que exporta grande parte de sua produção. Contudo, em
razão do desenvolvimento da cultura cafeeira, essa concorrência não é
ainda mortal e o açucar nordestino permanece concorrencial.
Em realidade, no Nordeste ou no Sudeste, o avivamento da eco-
nomia açucareira brasileira apresenta um carater passageiro; o estado
de crise crônica reaparece logo que a produção das Antilhas se n~r­
maliza ~ a cultura da beterraba dá bon~ resultados na Europa (39).
Os Estados Unidos, que se abrem, entã6, à produção brasileira, a In-
(36). - F.A. PEREIRA DA COSTA, Anais Pernambucanos, voI. VII.
Recife, Arquivo Público Estadual, 1954, p. 238.
(37). - Manuel DIÉGUES JUNIOR, O engenho de açucar no Nordeste.
Rio de Janeiro, Ministério da Agricultura, SIA, 1952, p. 4.
(38). - N . W. POSTHUMUS, Inquiry into the Izistory 01 prices in
Holland, voI. I. Leiden, E. 1. Brill, 1946, pp. 124 e 125.
(39). - Em 1870, a produção açucare ira mundial montava a 1.619.000
toneladas, das quais 1.020.000 de açucar de beterraba e 1 .599 .000 de açucar de
cana. Em 1900, o total da produção se elevava a 8.414.000 toneladas, das
quais 5.510.000 de açucar de beterraba e 2.904.000 de açucar de cana.
Cf. "A produção e o consumo mundiais de açucar no fim do século XIX",
in Brasil Açucareiro, ano VI,
- 121-

glaterra e a Argentina absorvem ainda em pequena quantidade o açu-


car que o Brasil exporta. Mas essa situação termina quando os Esta-
dos Unidos preferem se abastecer em Cuba e em Porto Rico e quando
a Argentina desenvolve sua própria produção açucareira nos fins do
século XIX (40).
As exportações de açucar do Brasil não cessam, então, mas sua
Irregularidade e pequena monta evidenciam o lugar secundário do Bra-
sil no mercado açucareiro internacional. Nosso país somente aparece
como grande e médio exportador nas épocas de crise, como o após-
guerra, por exemplo. .

EXPORTAÇÃO BRASILEIRA DE AÇUCAR (41).

Anos Toneladas Anos Toneladas


1878 170.540 1904 7.861
1879 187.547 1905 37.747
1880 246.461 1906 53.715
1881 161.258 1909 64.483
1882 246.769 1914 1.365
1883 223.865 1915 2.928
1884 329.377 1916 31.813
1885 274.311 1917 104.828
1886 112.399 1918 94.719
1887 226.010 1919 50.049
1901 187.166 1920 63.181
1902 136.758 1921 87.696
1903 21. 890 1922 106.637
1924 51.407

(40). - Sobre exportações de açucar para a Inglaterra e os Estados


Unidos pelo porto do Recife, Cf. Gadiel PERRUCI, Le Pernambouc (1889-
1930): Contribution à l'histoire quantitative du Brésil, p. 221.
(41). - FONTES:
De 1878 a 1887: Hen~i DIAMANTI, "Nota sobre a indústria açucareira
no Brasil", in Revista do Museu do Açucar, ano V, voI. I, n\> 7. Recife, 1972,
p. 34.
De 1901 a 1906: Proces verbaux. Convention InternationaTe sur Te régime
des sucres (Bruxelles, 1906-1907) Bruxelles, Imprimerie et Lithographie A.
Lesigne. 1907, p. 48.
Para o ano de 1909: AMAE-CC-Nollvelle Série, vol. 73, Rapport du
27-11-1912.
De 1914 a 1924: Gileno dé CARLI, "Aspectos da indústria açucareira do
8rasil", in Brasil Açucareiro, ano IV, voI. VIII, set. de 1936, n\>
- 122-

Depois da perda dos mercados internacionais, o Nordeste açuca-


reiro tem como única alternativa sua reconversão em direção do mer-
cado interno, o que é tentado e parcialmente realizado, nos fins do
século XIX, com a instalação dos engenhos centrais.
Entretanto, essa reconversão somente é possível em razão de con-
dições excepcionais da produção agrícola brasileira: a produção de
açucar não aumenta no Sudeste porque o café, sendo mais rentavel no
momento, lhe é preferivel. Por esta razão e porque as tarifas alfande-
gárias tornam proibitivos os preços dos açúcares estrangeiros, o açucar
nordestino, cujo custo de produção é elevado, pode conquistar os mer-
cados do sul. A partir de 1940, todavia, a situação torna-se mais fa-
voravel aos produtores do Sudeste (42).
Em seu número de 22 de janeiro de 1911, o jornal LE BRÉSIL
publica um estudo sobre o açucar brasileiro, de onde se destaca o se-
guinte trecho:

"O açucar do Norte chega (a São Paulo) sobrecarregado


pelas taxas de entreposto e de embarque, pelo frete e pelo imposto
de exportação do Estado de origem. A propósito desse imposto
convem dizer que Pernambuco víve atualmente às custas de São
Paulo e do Rio Grande do Sul, seus melhores clientes. Para o
açucar exportado para os Estados do Brasil, Pernambuco pecebe
8% ad vaiorem, enquanto que para o açucar exportado para o
estrangeiro ele exige somente 2 %, a fim de poder lutar contra
o açucar de beterraba. Esta situação é tão verdadeira que se a
exportação para São Paulo cessasse, o tesouro pe·nambu~ano
ficaria numa situação tão crítica como a dos agricultores e dos
usineiros" .

É, pois, sob um regime muito especial que o açucar do Nordeste


pode sobreviver desde que suas exportações para o sul somente po-
dem ser feitas com a ajuda de subvenções governamentais e de tarifas
privilegiadas.
Durante a Primeira República, a produção de açucar no Nordeste
praticamente estaciona, excetuando-se alguns anos de superprodução,
1918, 1928 e 1929, por exemplo; em Pernambuco, a produção não
aumenta sensivelmente em relação ao século XIX. Isto significa que,
durante as primeiras décadas da República, a revolução tecnológica,
provocada pelos engenhos centrais e pelas usinas, não trouxe de ne-

(42). - Patrick Calemard nu GENESTOUX, Le Nordeste du Sucre


I, tese de Doutorado). Texto mimeografado. Paris, 1967, p.
- 123-

nhuma forma os resultados esperados, pelo menos no que diz respeito


ao crescimento da produção (43). Assim. entre 1894 e 1917, a média
anual da produção foi somente de 126.290 toneladas, quantidade me-
nor do que a produção do ano de 1894. Em razão da Primeira Guerra
Mundial, a produção aumenta levemente e, se se considerar o período
de 1894 até 1936, esta média é de 171.532 toneladas (44).

PRODUÇÃO DE AÇUCAR DE PERNAMBUCO (45) .

Anos Toneladas

1894 194.419
1911 120.000
1917 216.625
1918 235.000
1920 141.482
1921 187.992
1922 136.997
1923 118.101
1924 180.944
1925 145.086
1926 155.859
1927 192.558
1928 232.616
1929 276.187

Ao contrário de outros Estados, os do Sudeste principalmente,


Pernambuco exporta quase toda a sua produção de açucar, o consumo
local sendo pouco importante. Isto, aliás, constitui uma das mais signi-
ficativas diferenças entre os dois Brasis açucareiros; a produção do
Sudeste é, às vezes, mais importante, porem ela é destinada priorita-

(43). - AMAE-CC-Pernambouc, vol. 9, Raport du 26-1-1885.


(44). - Gileno dé CARLI - "Geog -afia econômica e social da cana
de açucar no Brasil" in Brasil Açucareiro, ano V, vol. X, ni> 4-5 (1937/1938).
Rio de Janeiro, IAA, 1938, p. 301.
(45). - FONTES:
Para os anos de 1894, e de 1920 a 1929: Gileno dé CARLI, op. cit., p.
301.
Para o ano de 1911: AMAE-CC-Nouvelle Série, vol. 73, Rapport du
27-11-1912.
Para o ano de 1917: AMAE-CC-Nouvel/e Série, vol. 73, Rapport
5-6-1917.
Para o ano de 1918: Estado de Pernambuco - Obra de Propaganda
Geral. Rio de Janei:o. Imprensa Editora Pimenta de Melo e Companhia, s/d
- p. 51.
Para o ano de 1920:
- 124-

riamente ao consumo local enquanto que o Nordeste, face ao fraco


poder aquisitivo de sua população e da relativa extensão das planta-
ções, produz essencialmente para exportar (46).
Uma vez fechados os mercados externos para o açucar nordestino
é o Sudeste que os substitui; a dependência do Nordeste para com a
exportação permanece, portanto. Mas, a situação precária da econo-
mia nordestina perturba todo o sistema brasileiro porque o governo
central é obrigado a tomar medidas protecionistas para impedir a de-
bacle definitiva do açucar do Nordeste. Assim, por exemplo, o De-
creto n.o 6.905 de 27 de março de 1908 eleva de 200 para 400 réis
por quilo os direitos de entrada sobre os açúcares estrangeiros (47).
A tarifa precedente datava, aliás, de 1906, mas o açucar nordestino
perdia cada vez mais rapidamente seu carater concorrencial, até mes-
mo no mercado interno.
EXPORTAÇÃO DE AÇUCAR PELO PORTO DO RECIFE (48).
Anos (*) Toneladas Anos(*) Toneladas
1890 133.908 1913 135.828
1898 135.285 1914 138.478
1900 92.188 1915 146.045
1901 112.397 1916 92.940
1902 74.787 1917 181. 658
1903 12.393 1918 159.405
1904 2.326 1919 181.430
1905 20.385 1920 107.991
1906 106.182 1923 164.500
1907 9.391 1924 168.926
1909 48.295 1926 198.625
1911 123.158 1927 195.644
1912 128.536 1928 190.217
(*). - Os anos de 1900, 1901, 1902, 1903, 1904, 1905, 1907 e
1909 representam somente as exportações para °es-
trangeiro.

(46). - Em 1889, a média anual de consumo de açucar no Brasil é


de 26 Kgjhb; essa média é inferior às de Cuba, dos Estados Unidos e da
Inglaterra e representa cerca da metade da média calculada para a Austrália que
era de 50 Kgjhb.
Cf. Henry RAFFARD, Relatório da secção dos ns,t/Ícares. Primeira ex-
Dosição especial brasileira de assúcares e vinhos Rio de Janeiro. Imprensa
Nacional. 1890, p. 17.
Cf. tambem Henri DIAMANTI, op. cit., p. 33.
(47). - In Diário Oficial da União, ano XLVII, n 9 74, de 29-3-1908.
(48). - FONTES:
Para o ano de 1890: Anuário estatístico do Brasil, ano V, (1939-1940).
Rio de Janeiro, IBGE, 1940.
125
..
4 .2. - A cultura da cana de açucar.

Durante o Reinado e a Primeira República, a cana de açucar é


cultivada através de métodos arcáicos em Pernambuco, como aliás,
em todo o Nordeste, talvez mesmo em todo o Brasil. Assim, no do-
mínio estrito das técnicas agrícolas, não há absolutamente nada de
novo a assinalar, exceto a utilização mais generalizada do arado, in-
troduzido no Brasil no século XVIII e o aparecimento de algumas es-
pécies de cana, como a caiana, para citar apenas um exemplo (49).
Em 1888, o consul da França em Pernambuco escreve:

"Quanto à cultura da ca,na, ela é praticada ainda hoje como


se fazia há cem anos atrás; não há o mínimo progresso a re-
gistrar, nem no preparo do solo, nem no emprego de instrumen-
tos ag'Ícolas aperfeiçoados. Sem dúvida alguma, 1":0 dia em
que os p~oprietários da Província - homens em geral muito
inteligentes mas apáticos e rotineiros - quiserem modernizar a
agricultura poderão sem grande esforço aumentar da metade ou
talvez mesmo dobrar a p:odução atual" (50).

Dez anos mais tarde, essa esperança ainda não havia sido con-
cretizada. Ass~m, em 1898, Renri DIAMANTI escreve que

"a cultura da cana é rudimentar no Brasil; não se pratica


a adubação nem se prepara a terra na maioria das plantações,
abandonando-se o terreno esgotado para ir mais adiante" (51).

Para o ano de 1898: in Patrick Calemard DU GENESTOUX, op. cit.,


p. 177.
Para os anos de 1900 e 1907: Indústria açucareira do Brasil. Rio de Janei-
ro Typographia de Estatística, 1949.
De 1901 a 1906: Proces verbaux-Convelltion internationale sur le régime
des sucres (1906-1907), p. 48.
Para o ano de 1909: AMAE-CC-Nouvelle série, vol. 73, Rapport du
27-11-1912.
De 1911 a 1920: Recenseamento do Brasil-Synopse do Censo da Agricul-
tura (1920).
Para os anos de 1923 e 1924: APEP (Arquivo Público do Estado de Per-
nambuco). Junta Comercial, Relat6rio Hordman (1924). p. 227.
Para os anos de 1926, 1927 e 1928: in J.F. NORMANO, op. cit., p.
36.
(49). - Manuel Correia de ANDRADE, A terra e o Homem no Nordeste.
p. 84.
(50). - AMAE-CC-Pernambouc, vol. 10,
- 126-

Pior ainda, a situação parece se agravar de tal maneira que, em


1967, as técnicas agrícolas empregadas em Pernambuco são cada vez
mais arcáicas tirando-se cada vez menos bom partido dos recursos na-
turais:

"o resultdo é um rendimento da te Ta decrescente e um ren-


dimento do trabalho que estagna ab:lixo do observado na época
colonial" (52).

Geralmente, a cana é plantada num sulco cavado por um arado


primitivo ou por enxada; entretanto, seria necessário preparar a terra
pelo menos três vezes no espaço de oito meses e destruir a vegetação
estranha antes que ela floresça. Nos terrenos lateríticos, por exemplo,
ou naqueles onde subsistem tocos - o desmatamento sendo frequen-
temente mal feito - os arados de aço são rapidamente estragados,
sendo substitu!dos por arados de madeira dura, mais resistentes porem
sem a mesma eficiência (53).
Em Pernambuco, a cana é plantada de maio a dezembro; o pe-
ríodo de plantação se estende, portanto, do meio da estação das chu-
vas até o meio da estação seca. Entretanto, o período mais favoravel
para o plantio parece ser do mês de julho aos começos de setembro,
durante os três últimos meses de chuva, quando a umidade é ainda
bastante consideravel e as chuvas em quantidade suficiente (54). A
colheita deve ser feita quando a cana atinge 16 a 18 meses em pri-
meiro corte, ou 12 meses em ressaca. No mês de setembro, em geral,
começa a moagem - a botada dos velhos banguês - primeira etapa
do processo industrial açucareiro. Assim, o trabalho no engenho ou
numa usina é contínuo, as tarefas industriais se sucedendo às da agri-
cultura ou mesmo coincidindo com elas (55).
*
5. - DOS BANGUÊS AOS ENGENHOS CENTRAIS.

Alguns autores vêm na vetustez das técnicas agrícolas as princi-


pais causas da decadência do açucar em Pernambuco: o esgotamento
dos solos, a rotina do trabalho agrícola e as más variedades de cana
(56).

(52). - Patrick Calema~d DU GENESTOUX, op. cit., p. 70.


(53). - AMAE-CC-Nouvel/e Série, vol. 73, Rapport du 14-8-1913.
(54). - Patrick Calemard DU GENESTOUX, op. cit., p. 28.
(55). - Manuel Correia de ANDRADE, op. cit., p. 74.
(56). - Gileno dé CARLI, O processo histórico da usina em Pernambuco.
Rio de Janeiro, Irmãos Pongetti Editores, 1942, p. 109.
- 127-

Acreditamos, entretanto, que esta explicação, a mais aceita, aliás,


na b~bliografia consagrada ao açucar nordestino, não é totalmente satis-
fatória para a compreensão do fenômeno em toda a sua complexidade.
As técnicas arcáicas constituem certamente causas para a decadência
do açucar nordestino mas elas não são, por si mesmas, as causas prin-
cipais. Com efeito, na época anterior à República já existiam técnicas
aperfeiçoadas adaptáveis aos solos e à morfologia da zona da mata,
por exemplo, e que não eram ignoradas no Nordeste (57).
Parece, ao contrário, que a decadência açucareira se deve antes
a problemas sócio-econômicos e políticos do que meramente técnicos.
De fato, no Nordeste, o progresso tecnológico somente foi aplicado ao
nivel da indústria do açucar e não ao da cultura da cana - da qual,
evidentemente, a fabricação depende porque as estruturas senhoriais
da economia agrária da região não permitiram.
A introdução do progresso tecnológico na agricultura teria pro-
vocado, cedo ou tarde, a vinda de técnicos e de numerosos trabalha-
dores agrícolas especializados, como tambem de investimentos de ca-
pitais mais importantes. Em suma, a fortaleza em que se constituia o
engenho tradicional teria que se abrir ao capitalismo industrial e íi-
nanceiro de origem urbana, o que teria acentuado, em consequ.ência,
a penetração capitalista na zona rural e provocado a ruptura do sis-
tema senhorial ainda forte e grandemente imbricado com o poder po-
lítico da região.
Este ensaio de interpretação pode aclarar, tambem, as razões da
falência do sistema dos engenhos centrais. Originariamente, com efei-
to, eles foram criados para conciliar as relações de produção agrária
tradicional com as mais modernas técnicas de fabricação de açucar.
Separando-se as duas fases da produção açucareira e modernizando-se
apenas a organização do setor industrial, aparece no sistema uma con-
tradição dificil de ser superada. De um lado, o setor agrícola está in-
teiramente ultrapassado, não somente pelas técnicas de cultura da ca-
na, mas principalmente pelos interesses econômicos e pelo ideal social
da classe que as explora; de outro lado, o setor industrial é controlado
pelo capitalismo industrial e financeiro, estrangeiro, nacional ou local,

(57). - Em 1879, o consul da França em Pernambuco se espanta do


~traso das técnicas de produção na economia cana vieira : '11 se ~ait difficile d'
p.xpliquer cette négligeance si elle n'avait par excuse une abondance de prospérité
qui fut malheureusement d'une trop courte durée. Les provinces du Nord de
I'Empire sont en relations fréquentes avec La Havane et nos Antilles ou le~
perfectionnements d'agricultue et de fabrication ont fait des progres qui n'ont.
ju~qu'à présent, pu être surpassées".
- 128-

cuja preocupação de expansão e de modernização não se harmoniza


com a estrutura senhorial do antigo engenho de açucar (58).
O abastecimento dos engenhos centrais em matéria prima ilustra
a contradição fundamental entre os dois setores da produção açuca-
reira.
Um engenho tradicional forma um conjunto composto da plan-
tação de cana e do moinho onde se efetua a transforrmação da cana,
a um nivel frequentemente artesanal. Em realidade, o setor industrial
- o moinho - trabalha em função da cana disponivel; isto é, o
moinho tem uma cota de produção que sempre se harmoniza com a
colheita de cana, seja ela boa ou não. As dificuldades momentâneas
da plantação não provocam automaticamente a falência do moinho
porque o sistema é suficientemente elástico para funcionar em regime
fechado.
Frédéric MAURO, explicando a contrad:ção aparente entre o pe-
queno lucro do senhor de engenho e sua vida suntuosa, escreve:

"Este paradoxo se explica em parte pelo cara ter esquemá-


tico e teórico das contabilidades. Mas, ele se explica sobretudo
pelas relações entre a produção e o consumo. ° engenho vive
em grande parte em economia fechada. Aquilo que é registrado
pela contabilidade ra-amente foi objeto real de despesa monetária,
porque o senhor de engenho soube obter de seu pessoal, por nada,
utilizando apenas os tempos mortos. Ele somente compra no
exterior certos produtos manufaturados e, quando a colheita é
boa, produtos de luxo para o seu consumo pessoal. Economia
especulativa, sem dúvvida, mas muito pouco monetária, quase
sempre à beira da falência mas, no fim de contas, bastante sólida
para se:vir de suporte ao nascimento de uma civilização" (59).

Assim, esta organização da estrutura agrária da produção açuca-


reira permite ao senhor de engenho tradicional sobreviver como tal,
mesmo nos anos de depressão:
"ele pode semp"e se sustentar e sustentar o seu peswal com a
produção de gêneos de subsistência do engenho... ele po:!e, pois,
esperar um bom ano se ele atravessa uma campanha ruim, um
bom período se ele vive um mau período e, às vezes, mesmo,

(58). - José Honó-io RODRIGUES, "A revolução industrial açucareira:


os engenhos centrais", in Brasil Açucareiro, ano XIV, voI. XXVII, fevereL'o
de 1946, n Q 2. Rio de Janeiro, IAA, 1946, p. 83.
(59). - Frédéric MAURO,
- 129-

uma prosperidade de longa duração se ele conhece uma grande


depressão, ainda que esta última traga freque:ltemente mudanças
de est utura que o atingem diretamente" (60).

No momento em que aparecem os engenhos centrais, as mudan-


ças sofridas pelos antigos engenhos apenas atingem o setor industrial;
o engenho torna-se uma simples plantação de cana, isto é, um engenho
de fogo morto - o termo engenho passa a ser, então, um simples há-
bito linguístico. O fenômeno, entretanto, é importante pelas suas re-
percussões econômicas e sociais. Enquanto simples fornecedor de ca-
na, o antigo senhor de engenho é aparentemente favorecido duplamen-
te; de um lado, ele se vê aliviado da produção industrial do açucar, do
seu transporte para o mercado consumidor e, sobretudo, do mecanis-
mo financeiro bastante complexo no qual ele estava envolvido; de ou-
tro lado, ele continua sempre a possuir grandes propriedades, funda-
mento do sistema político-social da região.
Entretanto, renunciando à produção industrial, o antigo senhor
de engenho é rejeitado do setor mais dinâmico e moderno da economia
regional; com o tempo, isto representa uma queda certa na hierarquia
social e uma perda de influência política e econômica. Assim, nos
anos de 1950, os antigos senhores de engenho ou, simplesmente, os
fornecedores de cana formam apenas um setor secundário ao lado da
classe dirigente da região.
Por outro lado, o engenho central é uma fábrica moderna, aber-
ta, que funciona segundo os princípios da economia capitalista dos fins
do século XIX e que é, portanto, submetida às leis do mercado livre;
ele precisa ser competitivo para sobreviver. Alem disso, os investimen-
tos massiços de capitais necessários à instalação de um engenho cen-
tral exigem um nivel de produtividade elevado, o que somente pode
ser obtido graças a uma planificação da produção.
Ora, como a produção industrial depende do fornecimento de ca-
nas e como este fornecimento pelas plantações é sempre incerto, os
engenhos centrais são todos, antes mesmo de funcionar, condenados à
falência. Com efeito, a resistência dos antigos senhores de engenho
aparece desde a instalação dos primeiros engenhos centrais; ela atinge
o novo sistema em seu ponto fragil, ameaçando o abastecimento das
fábricas em matéria prima (61). As canas não são entregues nem em
quantidade suficiente nem a uma cadência conveniente e a experiência
dos engenhos centrais durará apenas uma quinzena de anos.

(60). - Idem, idem, p. 341.


(61). - Alice P. CANABRAVA, "A grande Lavoura" in Hist6ria Geral
da Civilização Brasileira (O Brasil Monárquico). Tomo 11, voi. 4, p. 109.
- 130

A usina substitui o sistema dos engenhos centrais; porem, desta


vez, a produção agrícola e o processo industrial são concentrados em
uma só mão. A usina representa, assim, uma síntese entre os dois se-
tores da produção configurando uma importante transformação na
economia do açucar: a passagem de uma economia controlada por ca-
pitais predominantemente agrários, para uma economia dominada por
capitais predominantemente industriais (62).
*
6. - OS ENGENHOS CENTRAIS.

Durante o século XIX, as iniciativas para modern:zar a indústria


açucareira b:-asile:ra são numerosas, embJra este:am quase sempre
atrazadas em relação aos outros paises produtores. Entre essas inicia-
tivas, podem ser assinaladas mais particularmente a introdução do mo-
inho a vapor, a adoção de cilindros horizontais aperfeiçoados (63), a
utilização do bagaço e a adaptação das caldeiras a esse novo combus-
tivel, o aparecimento de modernos processos de fabricação do açucar
branco e o abandono dos antigos métodos de purgar (64).
Entretanto, a aplicação dessas técnicas modernas é lenta e re-
fere-se apenas a alguns engenhos mais importantes situados nos prin-
cipais Estados produtores de açucar. Assim, o vapor é introduzido
como força motriz na Bahia em 1815, em Pernambuco em 1817 e em
Campos, em 1827 (65); mas, em 1854, dos 532 engenhos existentes
em Pernambuco, 101 são movidos pela água, 426 por animais e so-
mente 5 utilizam o vapor como força motriz. Em 1914, dos 2.756 en-
genhos pernambucanos - inclusive as engenhocas - , 329 são hidráu-
licos, 1.] 82 são de tração animal e apenas 785 utilizam-se do vapor,
isto é, 28% do total (66).
Alem disso, com o processo extremamente lento de renovação
tecnológica - atingindo uma por uma as unidades de produção -
essas técnicas não são suficientes para romper o sistema dos engenhos
tradicionais que, no conjunto, conservam os mesmos traços arcáicos
de outrora. Contudo, as crises que assolaram o açucar brasileiro du-
rante a segunda metade do século passado, a difusão generalizada do
progresso material sob o Segundo Reinado, o interesse cada vez maior

(62). - Miguel COSTA FILHO, "Engenhos centrais e usinas", in Re-


vista do Livro, ano V, n\! 19, setemb o de 1960. Rio de Janeiro. MEC-INL,
1960 pp. 89 e 90.
(63). - Frédéric MAURO, op. cit., p. 167.
(64). - Cf. Henri DIAMANTI, op. cit., pp. 26 e 27.
(65). - Alice P. CANABRAVA, op. cit., p. 105.
- 131

manifestado pelo capital estrangeiro pelo Brasil e a necessidade de


adaptar a produção econômica ao trabalho livre (67), levam o Go-
verno Imperial a proceder uma profunda revisão do antigo sistema.
Na verdade, desde 1857, a Câmara Provincial de Pernambuco
havia expressado o desejo de instalar engenhos centrais naquela pro-
víncia (68). Mas, o processo de instalação somente é possivel depois
da lei imperial de 1875, que regulamenta a instalação das grandes fá-
bricas.
A lei de 1875 foi criada, ao que parece, com a intenção de atrair
importantes investimentos no setor. Com efeito, a montagem de um
engenho central exige grandes quantidades de capital que precisam,
por sua vez, de garantias seguras, em razão principalmente do sucesso
aleatório da modernização da indústria açucareira no Brasil. Assim,
importantes estímulos foram concedidos às empresas, em particular
uma taxa de interesse garantido de 7 % por ano durante vinte anos so-
bre o capital efetivamente investido, o direito de expropriar terrenos e
edifícios necessários à fábrica, o direito de utilizar, para sua constru-
ção, material - madeira, por exemplo - dos municípios ou dos ter-
renos públicos em geral, a isenção dos impostos de importação de má-
quinas estrangeiras.
A partir de 1874, os engenhos centrais aparecem no Brasil, ins..,.
talados quase sempre por sociedades estrangeiras, especialmente ingle-
sas. Os engenhos centrais foram concebidos originalmente por empre-
sários franceses nos inícios do século XIX; parece que a experiência
começou em 1838 com a instalação pela empresa Derosne & Cie. de
estabelecimentos chamados de "fábricas centrais", na ilha de Bourbon,
estendendo-se em seguida a Martinica e a Guadeloupe (69).
Este tipo de fábrica de açucar tinha sido, portanto, experimentado
com sucesso nas Antilhas e o seu aparecimento no Brasil dependia
aparentemente apenas dos necessários investimentos (70).
Na verdade, o problema merece explicação mais detalhada. Em
termos de maximização de lucros, parece evidente que a aceitação de
qualquer progresso tecnológico que aumente a produtividade de um
determinado setor econômico deveria ser pacífica. Entretanto, em ter-
mos de "racionalidade político-social" ou, se se preferir, de "lógica

(67). - José Honório RODRIGUES, op .cit., p. 82.


(68). - Gi'eno dê CARLI, "Geografia econômica e social da cana de
açucar no Brasil", in Brasil Açucareiro, ano V, vaI. X, n\> 4 p. 293.
(69). - Alice P. CANABRAVA, op. cit., p. 108.
(70). - Humbe·to BASTOS, Rumos da civilização brasileira. São Paulo,
-132 -

interna do sistema", nem sempre a questão se apresenta com a mesma


clareza.
Assim, o sucesso dos engenhos centrais nas Antilhas francesas,
por exemplo, deve-se mais às estruturas locais determinadas em grande
parte ainda pelo governo colonial francês, devendo-se notar que os ca-
pitais industriais já formam, na França dos meados do século XIX, o
setor de vanguarda da economia.
No Brasil - apesar de na época tratar-se de país político-admi-
nistrativamente autônomo - as heranças coloniais de dominação agrá-
ria ainda perduram na sua estrutura econômica; por isso mesmo, o
processo de modernização, requerido pelo capitalismo industrial, tor-
na-se lento e a cada instante é questionado pelos grupos agrários do-
minantes. Alem disso, essas pressões, embora a nivel do sistema ca-
pitalista mundial, não são do tipo mais ou menos fechado existentes
entre metrópole-colônia, a exemplo das Antilhas. A capacidade de
resistência à modernização entre os grupos agrários dominantes num
país independente parece ser, pois, muito maior do que o teria sido
numa colônia clássica como as Antilhas francesas.
Apesar disso, são os próprios grupos agro-açucareiros brasileiros
que, originariamente, defendem a instalação dos engenhos centrais; mas
eles o fazem sem que o fato implique necessariamente numa po~:ção
contraditória desde que, na verdade, os engenhos centrais não deve-
riam passar de simples meios auxiliares ou instrumentos de sustenta-
ção dos grandes proprietários de terra.
Entretanto, para funcionar, o sistema de engenhos centrais exige
previamente a modernização e a cooperação dos dois setores da produ-
ção, o que já havia sido realizado em grande parte nas Antilhas, mas que
não era absolutamente o caso do Brasil. Até mesmo em Guadeloupe,
por exemplo, houve importantes resistências às "fábricas centrais"; as-
sim, de 1850 a 1860, assinala-se que a indústria açucareira local apre-
senta um quadro de estagnação e, em 1855, um relatório do Gover-
nador da colônia constata que
"dans la plus grande partie des habitations, on recontre en-
core aujourd'hui les primitives chaudieres en potin du pere La-
bat, ce sont les mêmes râteaux, les mêmes rôles ve~ticaux, le
vezou so't de la grande à l'état de sucre d'un brun noirâtre pou:
être livré au commerce de nos ports sans autre préparation qu'un
égouttement de quelques jours" (71).
(71). - Josette FALLOPE-LARA, La Guadeloupe entre 1848 et 1900:
contribution à une étude sur les conséquences de l'émancipation et les crises
de la fin du siecle (Tese de Doutorado). Texto mimeografado. Paris, 1971,
p. 130.
- 133-

No Brasil, os engenhos centrais representam uma iniciativa 10


Governo sob pressão dos grupos agro-açucareiros ainda no poder.
RAFF ARD, produtor de açucar dos fins do século XIX, justifica
a implantação dos engenhos centrais da seguinte maneira:

"Não só para separar dois gê.leros de t:abalho comp!etamente


diferentes, como porque as dispendiosas instalações dos apare-
lhos e mlquinismos aperfeiçoados não podiam ser feitas pelos
lavradores isoladamente, salvo raras exceções, nasceu a neces-
sidade de associações de agricu'tores e capitalistas para a reali-
zação das grandes fáb. icas centrais, onde o pesso:tl técnico e
habilitado labora o produto que leva o agricultor, interessado na
prosperidade da fábrica, pelo compcometimento de suas econo-
mias recebendo em troco o valor mercantil das suas canas e os
conselhos que o profissional lhe dá para realizar melho.·amentos
no solo e, portanto, aumento da riqueza sacarina d" grambea
que um cultiva e o outro labora" (72).

Assim, aparentemente, os engenhos centrais foram o meio encon-


trado para socorrer os senhores de engenho, já em crise há bastante
tempo. Na verdade, o novo sistema não representa uma solução de-
nitiva para o problema açucareiro, desde que as suas funções não ul-
trapassam o papel de mero auxiliar da produção agrária tradicional.
Algumas limitações legais impostas aos engenhos centrais ilus-
tram, aliás, esse fato: proib:ção de plantar cana, obrigação de cons-
truir vias férreas para facilitar o transporte da matéria prima da plan-
tação à fábrica, proiblção de utilizar a mão-de-obra escrava, implan-
tação da fábrica em lugares previamente designados pelo Governo,
etc. (73).
Apesar de constituir uma empresa privada, o estatuto jurídico do
engenho central é de tal maneira ambíguo, sua dependência face ao
poder político tão flagrante, que seria melhor talvez classifica-lo como
uma empresa semi-oficial, como uma concessão do Governo (74).
Apesar dessas restrições legais que ligam estreitamente o engenho
central ao sistema tradicional dos engenhos, as instalações do novo tipo
(72). - Henry RAFFARD, op. cit., p. 13.
(73). - Cf. Edgard CARONE, A República Velha (Instituição e Clas-
ses Sociais), p. 53.
Cf. tambem Manuel Correia de ANDRADE, op. cit., p. 86.
Cf. ainda: Gileno dé CARLI, O
- 134-

de estabelecimento são numerosas em todo o Brasil. Com exceções de


poucos instalados por capitalistas brasileiros, a maioria é fruto de in-
vestimentos estrangeiros (75).
Assim, foram criados no Rio com capitais nacionais, em 1875, o
engenho central de Quissaman, em 1881 o de Brachui, em 1888 os de
São Fidelis, de Airisés e de Campo Grande. Em São Paulo, o capital
brasileiro instala em 1881 os de Lorena, Piracicaba e Porto Feliz (76),
em 1883 o de Tietê e em 1884 o de Taubaté.
Os ingleses são, na época, quase os únicos estrangeiros que se
interessam pelos engenhos centrais. Eles instalam no Rio de Janeiro,
em 1880 o estabelecimento de Araruama (The Rio de Janeiro Central
Sugar Factories), em 1882 os de Muriaé, de Itaboraí e de São João
da Barra (The London and Brazilian Sugar Factories); em São Paulo,
eles financiam em 1881 o de Capivarí (The São Paulo Sugar Factory
of Brazil).
Em Pernambuco, são os capitais ingleses que fundam os primei-
ros engenhos centrais. Em 1881, são inaugurados os de Palmares, do
Cabo, de Água Preta e de Escada, todos construidos por The Sugar
Factories of Brazil; em 1884, o de Nazaré da Mata (The Nazarefh
Central Sugar Factory of Brazil); em 1888, o engenho central insta-
lado pela The North Brazilian Sugar Factories.
Assinalam-se, entretanto, algumas iniciativas locais como as de
Jovino Bandeira que, em 1881, instala o engenho central de São Lou-
renço da Mata, e a de Domingos Moutinho que, em 1882, constroi os
de Nazaré, Itambé, Ipojuca e Sirinhaem.
Os franceses participam, então, no processo inicial de instalação
sobretudo na parte técnica, na montagem das fábricas e, às vezes, na
gerência das mesmas. Em 1873, Pernambuco já havia contratado com
Fives-Lille a instalação de um engenho central através da Compagnie
Franco-Brésilienne de la Province du Pernambouc, de capitais franco-
brasileiros, empreendimento, no entanto, fracassado (77).
Em 1888, o consul da França em Pernambuco assim descreve o
engenho central de Bamburral, situado a 9 Km. de Aripibú, ao 'iul
do Recife, e montado pelo engenheiro francês Emile Billon com ma-
terial vindo da França: o transporte da cana é feito por um "chemin

(75). - José Hon6~io RODRIGUES, op. cit., ano XIV, vol. XXVII,
março de 1946, n Q 3, pp. 37 e sq.
Cf. tambem: Idem, idem, ano XIV, vol. XVIII, abril de 1946, nQ 4, p. 102.
- 135-

de fer portatif" (sic) de 4 Km; as canas alimentam um moinho cons-


truido por Mariolle-Pinguet, de Saint-Quentin e movido por um motor
do mesmo construtor. A capacidade do moinho é de 125 toneladas por
dia. A cana esmagada, ou bagaço, é então enviada aos geradores onde
ela é queimada em fomos especiais, o que é bastante, sem necessidade
de outro combustivel, para a produção do vapor exigido pela fabrica-
ção. Os geradores, que apresentam uma superfície de esquentamento
de 310m., foram construidos por Bédie Freres, estabelecidos em Man
(Somme), bem como o conjunto do material e das máquinas, salvo o
moinho. Os aparelhos que preparam o caldo são dispostos gradual-
mente, de maneira a economizar a tubulação e a facilitar o trabalho
das máquinas para o efeito tríplice e o do aparelho de cozinhar. As
turb:nas são solidamente estabelecidas e dão, graças à sua velocidade
de 1.800 voltas/minuto e graças ao vapor acondionado dos secadores,
açúcares de primero e segundo jatos conforme os tipos ped:dos pelo
mercado de Pernambuco. Os aparelhos desta "fábrica central", que
podem fabricar 140 sacos por dia, isto é, cerca da 1O. 500 Kg., fo-
ram concebidos não somente para produzir o açucar demandado pelo
consumo local como tambem todos os tipos destinados à exporta-
ção (78).
A proliferação dos engenhos centrais provoca um boom na produ-
ção açucareira; a melhoria dos meios de transporte toma mais eficaz
e mais rápido a entrada do açucar na praça do Recife. Em dezembro
de 1883, o consul da França em Pernambuco descreve assim os pri-
meiros sinais da mudança:

"Les arrivages (à Recife) en sucres ont été tres grands, du"ant


ces trois dernie-s mois; i1s ont dévancé l'époque habituelle de
leur apparition sur le marché, ils se continuent avec une activité
sans précédents et continueront ainsi, à n'en point douter, durant
toute la crmpagne. Jl est permis d'ape"cevoir déjà dans ce mou-
vement ascensionnel de la production et du transit un premier
effet des avantages offerts à l'agricultu -e par l'impu~sion donnée
à la création des usines centrales et par I'ouvertu"e de nou-
velles voies ferrées" (79).

Esses fatos fazem com que sejam esquecidas pelos observadores


da época as dificuldades e as contradições do novo sistema.
Na verdade, desde pelo menos 1885, começam a aparecer os
primeiros e grandes problemas provocados pelos engenhos centrais.

(78). - AMAE-CC-Pernambouc, vai. 9, Rappart du 12-11-1888.


(79). - AMAE-CC-P(!rnambouc, VQI. 9, Rapport du 20-12-1883.
-136 -

Basta, aliás, a má colheita de 1884 para que surja em Pernambuco uma


crise açucareira que se prolongará até os inícios da República.
Um observador contemporâneo tenta analisar as causas da crise,
privilegiando mais os aspectos secundários do problema. Assim, o re-
sultado negativo dos engenhos centrais teria sido provocado mais por
razões técnicas do que estruturais. De um lado, o percurso das linhas
férreas teria sido mal escolhido e o seu traçado mal executado. De
outro lado, os engenhos centrais teriam sido instalados em áreas mal
selecionadas. Enfim, muitas das concessões teriam sido entregues a
especuladores, cujo único interesse residia na garantia de lucros eleva-
dos que as leis permitiam. Em realidade, dos treze engenhos centrais
concedidos até 1885, somente quatro funcionavam, um dos quais não
tendo ainda podido cotar seus açúcares na praça do Recife (80).
Por outro lado, numerosos pequenos engenhos centrais foram
criados indiscriminadamente, graças às subvenções governamentais
(81). Bastava, aliás, que um senhor de engenho introduzisse algumas
modificações ou alguns aperfeiçoamentos na sua moenda para que pe-
disse e obtivesse os favores do poder público. Em realidade, as falên-
cias foram tão numerosas quanto as inaugurações de engenhos centrais.
As razões do fracasso generalizado dos engenhos centrais pare-
cem-nos bastante claras. Já assinalamos, acima, a contradição interna
que determina essencialmente o desaparecimento do sistema. A ela,
devem-se ainda acrescentar outros fatores, mais visíveis porque mais
imediatos (82). As máquinas importadas são frequentemente usadas
ou velhas demais. Em 1883, por exemplo, o consul da França em
Pernambuco descreve, assim, um acidente ocorrido no engenho central
de Cuyambuca, pertencente aos The Central Sugar Factories 0/ Brazil:

"as tu;-binas, encarregadas de cristalizar o açucar, explodi-


ram fazendo no mínimo dois mortos e inúmeros feridos. As
máquinas atingidas fo -am compradas depois que o rei do Egito
as recusara e, po tanto, elas eram pelo menos suspeitas de de-
feitos de fabricação" (83).

(80). - AMAE-CC-Pernnmbauc, vai. 9, Rappart du 26-1-1885.


(81). - A partir de 1881, o número dos pequenos engenhos centrais
que já empregam aparelhos aperfeiçoados parece aumentar rapidamente. O
consul da França em Pernambuco assinala que chegaram em Pernambuco
8.000 calis de máquinas em 1882, 15.000 em 1883 e quase a mesma quanti-
dade em 1884.
Cf. AMAE-CC-Pernambauc, vai. 9, Rappart du 26-1-1885.
(82). - Alice P. CANABRAVA, ap. cit., p. 109.
(83). - AMAE-CC-Pernambauc, vai. 9, Rappart du 20-12-1883.
- 137-

Alguns engenhos centrais não passavam de simples banguês dis-


farçados. A mão-de-obra especializada era escassa e alguns técnicos
estrangeiros não passavam de charlatões atraidos pelo importante mer-
cado de trabalho especializado brasileiro . Os transportes eram insu-
ficientes e mal concebidos. Entretanto, a causa mais evidente foi sem
dúvida a irregularidade no fornecimento da matéria prima.
Com o fracasso dos engenhos centrais - eles duraram apenas
uma quinzena de anos - não se pensa em voltar atrás, restabelecen-
do-se a produção baseada no antigo banguê. Com efeito, a importân-
cia das somas de dinheiro investidas e a impossibilidade de uma "in-
volução tecnológica" levam, ao contrário, a uma nova etapa da "re-
volução tecnológica" açucareira no Nordeste, representada pelas usi-
nas.
"
7. - AS USINAS.

As usinas trazem problemas novos à conjuntura regional da épo-


ca. Aparentemente, voltou-se a um sistema de produção semelhante
àquele do antigo engenho, isto é, os dois setores da produção açuca-
reira - o agrícola e o industrial - encontram-se novamente reunidos
em uma só empresa.
Na realidade, porem, a usina representa a consolidação do ca-
pital industrial e financeiro no campo que, a partir de agora, passa
a controlar sozinho todo o processo econômico do açucar, desde a cul-
tura da cana até a distribuição comercial, passando pela fase indus-
trial. Neste sentido, a usina é a síntese das duas etapas precedentes
da revolução açucareira. Ela se harmoniza tambem com as grandes
linhas do desenvolvimento brasileiro durante a Primeira República; a
supremacia das cidades sobre o campo, o processo industrializante, o
domínio do capital industrial e financeiro, nacional ou estrangeiro, so-
bre as atividades econômicas do país.
Em Pernambuco, no entanto, o aparecimento das usinas marca
um recuo do capital estrangeiro, de tal maneira que certos autores mo-
dernos consideram a retomada da industrialização do açucar pelo ca-
pital nacional como uma das características mais interessantes do fe-
nômeno usineiro nordestino (84). Com efeito, parece que os inícios
da República brasileira não tenham sido desprovidos de um certo ca-
rater nacionalista avant la lettre, sobretudo o curto período do Gover-
no Provisório com as medidas político-econômicas de Rui Barbosa
(84). - Gileno dé CARLI, O
- 138-

(85); alem disso, é fato sabido que o capital estrangeiro se dirige pre-
ferencialmente para os polos econômicos dominantes, no caso brasi-
leiro da época, situados no sul do país.
A usina é uma empresa privada, sem obrigações com o Estado,
com toda a liberdade de se instalar onde pretender o empresário; ela
é livre sobretudo de plantar suas próprias canas, o que será fatal ao
engenho tradicional.
Assim, a usina combina o projeto dos engenhos centrais - ins-
talação de grandes fábricas modernas - com a propriedade das plan-
tações de cana que asseguram a matéria prima necessária. Com a
posse da terra e com a cultura de suas próprias canas, o usineiro tende
a se tomar inteiramente independente dos fornecedores, eliminando, as-
sim, a contradição que existia no sistema dos engenhos centrais.
Entretanto, a usina não constitui, rigorosamente falando, um sis-
tema original, pois, em realidade, alguns proprietários de engenhos
centrais já o praticavam anteriormente. DIAMANTI, em seu relató-
rio já citado, refere-se ao fato e aconselha aos industriais plantarem
cana nos vastos terrenos em redor dos engenhos centrais, em vez de
os arrendarem, como até então fazia a maioria; segundo o mesmo
Autor, esta medida permitiria anular a ignorância desconfiada e per-
tinaz da imensa maioria dos fornecedores, ajuntando que alguns pro-
prietários estrangeiros, assim agindo, têm obtido notáveis resultados
(86) .
Na verdade, porem, o obstáculo maior ao rápido desenvolvimen-
to da "revolução tecnológica" do açucar não era representado pela
"ignorância dos fornecedores" mas pela ameaça do seu desapareci-
mento como classe, implicada no desenvolvimento e no expansionismo
usineiro.
Os poderes públicos, no entanto, encorajam a criação de usinas,
em particular através de uma legislação de incentivos; de uma maneira
geral, pode-se dizer que a maioria dos governadores de Pernambuco
ou são fortemente influenciados pelo novo setor da classe dominante,
ou são eles próprios usineiros (87).
Em Pernambuco, a ação oficial em favor das usinas começa com
o decreto de 2 de abril de 1890, no Governo do Barão de Lucena.
Os sucessores de Lucena, especialmente Barbosa Lima, aceleram o
fenômeno usineiro aumentando os empréstimos oficiais e reforçando

(85). - Gadiel PERRUCI, op. cit., pp. 110 esq.


(86). - Cf. Henri DIAMANTI, op. cit., p. 25.
(87). - Gileno dé CARLI, op. cit., p. 40.
- 139-

os privilégios fiscais das novas empresas. Em 1890 e 1891, as usinas


obtém o privilégio de zona, isto é, cada usina se reserva uma zona de
influência com um raio de 15 Km; em outros termos, ficava proib:do
construir uma usina numa zona em que já existisse outra instalada.
As consequências dessa decisão foram evidentemente desastrosas
para os antigos engenhos desde que eles ficaram obrigados, a partir de
então, a somente vender suas canas à usina de sua própria zona, esta-
belecendo-se quas.e que um regime de monopólio usineiro. Assim, a
usina pode facilmente impor os seus preços aos fornecedores e, even-
tualmente, comprar suas terras abaixo dos preços correntes (88).
Nos começos da República, os empréstimos do Governo são ain-
da modestos e destinados antes de tudo às pequenas e médias usinas.
O custo de instalação é, então, de cerca de 300 contos de réis para ~lS
pequenas e de mais de 600 contos para as maiores. O empresário re-
cebe um terço do capital necessário à construção contra a hipoteca da
fábrica; as amortizações, de 10% por ano, no início, são reduzidas em
1890 para 5% por ano.
Durante o governo de Barbosa Lima (1892-1896), instala-se em
Pernambuco a maior parte dos modernos estabelecimentos da nova
indústria do açucar. Até 1892, os empréstimos destinados à monta-
gem de dez usinas se elevam a um total de 2. 190 contos de réis; em
dezesseis meses, sob o governo de Barbosa Lima, as somas empresta-
das para a instalação de 26 usinas se elevam a 13.950 contos de réis
aproximadamente; certos empréstimos contratados atingem mesmo o
montante de 900 contos de réis, individualmente (89).
Em certos momentos, a participação do empresário não passa do
terreno, a fábrica, portanto, nada lhe custando. Assim, o sistema de
produção baseado na usina triunfa tão espetacularmente, em Pernam-
buco, que os usineiros se sentem bastante poderosos para recusar o pa-
gamento de suas dívidas contraidas ao Estado. Apesar de recusas sis-
temáticas e de dispos:ções legais bastante claras permitindo ao Estado
vender em leilão as usinas devedoras, não se conhece um só caso de
intervenção estatal por motivo de dívidas públicas das usinas e não
pagas, tão perfeita era a identificação entre o poder público e o sis-
tema usineiro.
Essa identificação marca, aliás, não somente a fase final da "re-
volução tecnológica" do açucar mas representa tambem, no plano po-
lítico, a tomada do poder pelas novas elites saidas, na maior parte, do

(88). - Para os p~eços


- 140-

capital industrial e financeiro, responsavel, em última análise, pelo fi-


nanciamento e instalação das usinas no Nordeste.
Os laços entre a indústria açucareira e o capital urbano são, aliás,
evidentes; o fenômeno começa, na verdade, bem antes do aparecimen-
to das usinas. A introdução de máquinas aperfeiçoadas nos engenhos
de açucar implica, pelo menos desde a segunda metade do século XIX,
num endividamento progressivo e, consequentemente, numa dependên-
cia dos produtores em relação aos comissários e aos financistas do Re-
cife. Em 1890, um produtor de açucar reconhece que a quase totali-
dade dos engenhos centrais - trata-se antes de tudo daqueles monta-
dos por capitalistas brasileiros - estão hipotecados aos bancos e aos
portadores de títulos, mas tambem que a maioria dos próprios forne-
cedores estão endividados de uma maneira ou de outra (90).
Na verdade, o fenômeno enquadra-se perfeitamente dentro do
processo econômico vivido pelo Brasil nos fins do Segundo Reinado e
durante todo o período republicano. Durante a Primeira República, o
país conhece uma grande extensão da rede bancária e uma forte pene-
tração de capitais estrangeiros que se dirigem principalmente para o
financiamento da modernização parcial da infra-estrutura brasileira,
como a construção de caminhos de ferro, modernização e construção
de portos, reformas urbanas etc. Entretanto, são os bancos, especial-
mente os estrangeiros, que se encarregam de financiar a produção e
que controlam todo o comércio exterior da nação; eles se tornam, as-
sim, num país exportador por excelência, os verdadeiros árbitros do
desenvolvimento nacional.
Em Pernambuco, este fenômeno parece apresentar um carater
centralizado r mais acentuado do Que no Sudeste (91). Asslm, os usi-
neiros e fornecedores fazem empréstimos aos banqueiros-exportadores
locais a taxas que podem atingir 12 % e contra garantia das fábricas
ou das colheitas. Alem disso, os banqueiros-exportadores cobram co-
missões que representam até 6% do preço da venda, impõem taxas de
transporte e de entrepostos elevadas, o que lhes permite controlar es-
tritamente toda a produção açucareira.

(90). - Henry RAFFARD, op. cit., p. 14.


(91). - Em 1885, há somente dois bancos em Recife e todos os dois
são ingleses: "London and River Plate Bank Ltd. ", com um capital de
;f, 1.500.000, e "London and Brazilian Bank Ltd"" com capital de cC. 1.5000.000
(Cf. AMAE-CC-Pernambouc, vol. 9, Rapport du 26-1-1885).
Entretanto, dez anos depois, àqueles juntam-se mais quatro bancos com
capitais brasileiros: Banco Popula.r, Banco de Crédito Real de Pernambuco,
Banco de Pernambuco e Banco Emissor de Pernambuco (Cf. AMAE-CC-Nou-
velle Série,
- 141-

o consul da França na Bahia cita um exemplo local do domínio


do capital financeiro sobre o açucar, exemplo que é válido, aliás, para
outras regiões açucare iras.

"Com um estoque local de 440 . 000 a 500.000 sacos -


escreve o consul - pa.gou-se sem nenhum protesto no Rio de
JaneilO, de 700 a 730 réis o quilo de açucar que havia custado
apenas 200 réis a fabricar, enquanto que em fevereiro último -
o consul escreve em agosto de 1913 - os preços tenl:o caido a
440 e 480 réis, com estoque de apenas 320.000 sacos, reclamou-
se de açambarcamento do me:cado. O Sindicato Açucareiro da
Bahia, que compreende doze usinas das vinte e uma existentes,
foi fundado por uma firma de banqueiros-exportadores portugue-
ses que construiram rapidamente uma fortu!1u co~ossaI. obrigando
os diretores das empresas ajudadas financeiramente por eles a
lhes pagai' uma taxa de 10%, depois a utilizar o Sindicato como
intermediário para as vendas do açucar, pagando 6% de comis-
são, para o fornecimento de material, compra de sacos de algo-
dão etc; mas, acrescenta o consul, é indubitavel que, sem a ajuda
do Sindicato, a indústria açucareira não teria atingido o desen-
volvimento que ela possui agora" (92).

Entretanto, se os privilégios exorbitantes e o apôio do capitalis-


mo urbano beneficiam largamente as usinas em relação ao antigos en-
genhos, estes mostram ainda uma grande capacidade de resistência e
de adaptação às novas conjunturas; eles somente desaparecerão defi-
nitivamente como unidades de produção de alguma importância depois
de 1930. O fato se deve, ao que parece, a dois fatores: as crises açu-
careiras durante a Primeira República e a falta de mercados para o
açucar nordestino que bloqueia o aumento da produção (93).
Em definitivo, se o fenômeno usineiro é importante para explicar
o crescimento de Recife, não somente pela concentração nessa cidade
das operações financeiras e pela criação de indústrias de bens de con-
sumo, mas tambem pelo crescimento demográfico que é o resultado
do êxodo rural, o novo grupo dos usineiros não constitui por esta ra-
zão um elemento social ativo na construção de uma sociedade mais
aberta e democrática (94).
Ao contrário, fi estrutura montada a partir do fenômeno usineiro
parece possuir um carater aristocrático e autoritário muito mais acen-
tuado do que aquele revelado pelo sistema anterior baseado nos en-
(92). - AMAE-CC-Nouvelle Série, vol. 73, Rapport du 14-8-1913.
(93). - Edgard CARONE, op. cit., p. 57.
(94). - Miguel COSTA FILHO, op. cit., p. 90.
- 142-

genhos tradicionais. O fato, na verdade, apesar de trazer importantes


consequências para a região, indica que não houve uma ruptura estru-
tural na economia agro-industrial nordestina. O carater agro-indus-
trial do fenômeno usineiro - e não apenas industrial - representa
tambem objetivamente os limites da modernização e dos compromis-
sos possíveis dos grupos agrários com o capitalismo industrial e finan-
ceiro.
Na realidade, o espírito capitalista e expansionista mais visivel do
grupo dos usineiros torna-o mais potente e mais ganancioso. Se é ver-
dade que alguns problemas técnicos, como os métodos de produção do
açucar e os transportes, foram em parte resolvidos pelas usinas, elas
não contribuiram em nada - antes agravaram - para uma solução
das antigas tendências reacionárias do sistema econômico regional, a
exemplo da exploração latifundiária, da concentração fundiária, do
nivel de renda muito baixa da população rural (95).
Enfim, se o sistema usineiro provoca mudanças importantes, ele
deixa intacta a estrutura de dominação agrária regional, acentuando
o cara ter monocultor e mono-exportador da economia e contribuindo,
assim, para o agravamento dos desequilíbrios regionais no Brasil, de
que o Nordeste parece representar um dos polos negativos.
'"
8. - CONCLUSÃO.

A Primeira República parece ter sido um período muito impor-


tante para a nossa história contemporânea principalmente porque se
assiste a uma transição entre duas épocas: a era pré-industrial e a era
industrial no Brasil.
A economia monocultora e mono-exportadora constitui o setor
dominante, mas a acumulação capitalista que resulta em parte da ex-
portação do café torna pouco a pouco possivel a criação de um par-
que industrial moderno ao redor de São Paulo.
A transição é marcante tambem nas relações entre o Brasil e o
mundo capitalista ocrcrental, em razão dos acontecimentos internacio-
nais da época. De um lado, a nova distribuição internacional do tra-
balho provocada pela expansão do capitalismo industrial e financeiro
dos fins do século XIX,
- 143-

geiro no Brasil contribui de uma maneira decisiva para modernizar


inúmeros setores da infra-estrutura nacional.
Enfim, as crises e os conflitos europeus, coincidindo com uma
prosperidade brasileira generalizada, aceleram o progresso da indús-
tria nacional através do mecanismo de "substituição de importações".
Durante o período estudado, o papel desempenhado pelas gran-
des cidades torna-se bastante importante. Embora a população brasi-
leira apresente um crescimento relativo ainda pequeno, o êxodo rural
é intenso; as cidades encontram-se "inchadas" pelo excesso de popu-
lação, tomando-se reservatórios de mão-de-obra barata para as ativi-
dades industriais no momento em que se assiste ao aparecimento de
um mercado interno para os produtos manufaturados.
Entretanto, o desenvolvimento nacional é desigual e desequili-
brado. Os polos de crescimento se deslocam para o Sudeste e as
antigas províncias do Nordeste estão quase que condenadas à estagna-
ção econômica. Exceto o efêmero surto da região Norte, provocado
pela exploração da borracha, não ocorre nada de comparavel no plano
econômico entre as duas grandes partes do país, o sul e o norte.
O carater de transição pode ser assinalado tambem no nivel po-
lític0 e social. De uma parte, a decadência do açucar nordestino en-
fraquece a influência política da antiga aristocracia regional em pro-
veito dos fazendeiros de café do Sudeste que ascendem ao poder, no
início do período republicano. De outra parte, com o progresso indus-
trial e o crescimento das cidades, aparecem no Brasil novas elites ur-
banas, baseadas no capital industrial e financeiro, que disputam o po-
der com os setores agrários tradicionais.
Do ponto de vista regional e nordestino, as mudanças são tambem
dignas de referência, embora marcadamente diferentes daquelas ocor-
ridas no sul do país.
Na realidade, o progresso econômico apenas atinge algumas gran-
des cidades onde se concentra a elite da burguesia comercial, industrial
e financeira da Região. Nesse sentido, a mudança somente existe no
próprio meio da classe dirigente; a modernização do setor industrial
da produção açucareira provoca um lento mas irreversivel processo de
eliminação dos antigos senhores de engenho em benefício dos usinei-
ros, banqueiros, comerciantes e industriais.

o fracasso dos engenhos centrais, que teriam representado uma


tentativa de "democratização" por etapas do setor dominante da eco-
nomia, acentua o carater autoritário e centralizador do sistema eco-
nômico regiom.!.
- 144-

estruturas econômicas regionais, representando tão somente uma rela-


tiva mudança no controle do mecanismo da produção, fenômeno que,
aparentemente não constitui fator de progresso social e político para a
Região.
Entretanto, em consequência de maiores investimentos na econo-
mia açucareira, a infra-estrutura de algumas cidades, como Recife, é
parcialmente modernizada, o que na verdade facilita um relativo surto
de crescimento das atividades industriais locais, embora esse fato não
contribua em quase nada para atenuar a dependência regional em face
do Sudeste brasileiro.
Assim, no Nordeste, a Primeira República, em linhas gerais, re-
presenta tambem o período em que o regime de produção açucareira
das usinas se consolida e impede as reformas estruturais e a diveorsifi-
V. - SESSÃO ADMINISTRATIVA.
(Novos Estatutos)·

(*). - As moções e p-opostas apresentadas já foram comentadas na


Introdução (Nota da Redação).
A sessão administrativas foi aberta às 9,00 horas pelo Presidente
da ANPUH, Prof. Eurípedes Simões de Paula e devidamente secre-
tariada pela Profa. Alice Piffer Canabrava, Secretária-Geral.
. O Presidente solicitou dos presentes que enviassem à Mesa emen-
das ao projeto dos novos Estatutos da Associação que tinham sido
apresentados junto com o material fornecido aos Simposiastas.
Depois de vários debates, foram apresentadas três propostas que
foram aprovadas pelo plenário e determinaram modificações no pro-
jeto apresentado.
*
PROPOSTA n9 1 (1).
Propomos que se acrescente o cargo de Vice-diretor no elenco da Diretoria da
ANPUH na reforma do seu Estatuto.
Aracaju, 3 de setembro de 1975
a). - Maria Regina da Cunha Rodrigues Simões de Paula
Claudia N ikitiuk.
*
PROPOSTA n 9 2 (2).
Propomos a criação de Sub-Núcleos da ANPUH e que um deles fique
situado na Região Sul Fluminense.
Aracaju, 3 de setembro de 1975
a). - Sônia Gonçalves
Eloina Montei o
Maria Regina da Cunha Rodrigues Simõe de P;;.ula
J

Philomena Gebran
Maria Célis Portella Nunes
Claudia Nikitiuk
*
PROPOSTA n 9 3 (3).
Propomos, como emenda à proposta dos novos Estatutos da ANPUH
que o tempo de mandato das Diretorias dos Núcleos Regior:ais devam ser de
(dois) anos, coincidindo com o da Direto.ia Nacional da ANPUH.
Aracaju, 3 de setembro de 1975.
a). - Cecília Maria Westphalen.

(1). - Emenda aprovada por unanimidade (Nota da Redação).


(2). - Aprovada pelo plená~io por unanimidade (Nota da Relação).
(3). - Emenda aprovada por unanimidade (Nota da Redação) .
- 148-

ESTATUTOS DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROFESSORES


UN/VERSIT ARIOS DE HISTÓRIA (ANPUH).

TITULO I.

Dos objetivos.
Artigo 1Q. - A Associação Nacional dos Ploje;sores UliÍrersitários de
História (ANPUH), fundada na cidade de Marília, Estado de São Paulo, em
19 de outub o de 1961, tem por objetivos:
a). - o aperfeiçolmento do ensino de História em nível
superior;
b). - o estudo, a pesquisa e a divu'gação de assuntos de
História;
c). - a defesa das fO.ltes e manifestações cu:tu,ais de in-
teresse para os estudos históricos.
Artigo 2Q. - Pa:a atingir seus objetivos, a Associação promo\ e:'á o
intercâmbio de idéias entre seus associados através de reuniões perió':icas e
outros meios; realizará e auxiliará pesquisas; manterá publicações pe iójicas e
procu,ará, por meio da fundação de Núcleos e Sub-Núcleos Regionais ou em
cooperação com organizações simila es, irradiar SU1S atividades pelo te.ritÓ-
rio do país.
Artigo 3Q - A Associação não poderá tomar parte em manifestações
políticas ou religiosas, nem tratar de qUllquer aSéunto est.anho aos seus
objetivos.

TITULO lI.

Dos associados.
Art:go 49. - A Associação comp:eenderá três categodas de aS.ociados:
a). - sócios fundadores;
b). - sócios efetivos e
c). - professo es associados.
§ único. - São considerados sócios fundadores da ANPUH aqueles que
participaram dos trabalhos do I Simpósio de Professores de Histó ia do Ensino
Superior, realizado em Marília, de 15 a 21 de outubro de 1961.
Artigo. 59 - A catego~ia de sócio efetivo é limitada aos P.ofessores
Universitários de HistÓ:'ia que hajam pub:icado trabalho o:iginal de com·
p ovado valor em qUllquer ramo da História.
§ único. - Os sócios efetivos são eleitos pelos Núcleos e Sub-Núc:eos
Regionais.
Artigo 69. - A categoria de Professor associado é destina:la aos P ofes·
sores de História do Ensino Superior ao ingressar na A. éOcLção.
Artigo 79. - Os associados não respondem nem solidária, nem sub"idia-
riamente pelos compromisws que venha assumir o Conselho Diretor
- 149

TITULO m.
Da administração.

Artigo 8". - A Associação Nacional dos Professo: es Universitários de


Histó ia será administrada pela sua Di:etoria.
Artigo 9". - A Diretoria compor-se-á de Pre"idente, Vice-Presidente, Se-
cretário Geral, 19 e 29 Secretários, 1" e 2" Tesou eiros, Diretor de Impe:!sa e
Propaganda e Conselho Consultivo.
Artigo 109 - Compete ao Presidente:
a). - Presidir às reuniões da DLetoria e Assembléi.ls Ge··
rais;
b). - tratar dos interesses gerais da Associação, repre-
sentando-a em juizo ou fora dele;
c) . elabo.ar o programa anual das atividades cie.,tíficas
da Associação.
Artigo 11". - Compete ao Vice-Presidente mbstituir o Presidente nas
suas faltas e impedimentos.
Artigo 129. - Aos Secretá~ios compete despachar o expediente e, de
acordo coIl\ o Presidente, administrar a Associação.
Artigo 13". - Aos Tesoureiros compete gerir os inte:-esses financeiros
da Associação, de acordo com o P. esidente .
Artigo 14". - Ao Diretor de Imprensa e Propaganda compete julgar
tudo que refere a relações públicas e divulgação da Aswciação.
Artigo 15". - Ao Conselho Consultivo compete, opina', qUlndo con-
sultado, sobre queétões de cara ter técnico, ou quaisquer outras, de interesse para
a Associação.
Artigo 16". - A Diretoria se:á eleita pelos sócios funda10res e efeti-
vos em Assembléia Geral ordinária e os membros eleito; se' ão cOllsider;ldos
empossados independentemente de qualquer outra fo malidade.
§ único. - A Diretoria eleita exe~cerá SU:lS funções até o té"mino do
Simpó3io Seguinte.

TITULO IV.

Das Reuniões.

Artigo 17". - A Associação Nacional dos Professores Universitá~ios de


História realizará reuniões ordinárias e extrao:'dinárias, em Assembléia Geral.
Artigo 18". - Haverá uma reunião ordiná:ia, bi-anual, e uma Assembléia
Geral, designada como Simpósio, em data e local fixados pela Assembléia Ge-
ral.
§ único. - A comunicação da data e local fixados e o progr~m:l de
reuniões serão enviados aos sócios e às Diretorias dos Núcleos e Sub-Núcleos
Regionais com a devida antecedência.
- 150-

Artigo 199. - As reuniões extraordinárias em Assembléia Geral serão


realizadas po: convocação de seu Presidente, quando requeridas pela maioria
dos sócios fundadores e efetivos para tratar de assuntos constantes do reque-
rimento.
§ único. - A Secretaria fará as comunicações necessárias com t:inta
dias de antecedência no mínimo.
Artigo 209. - Todos os associados poderão compaecer às reuniões da
Assembléia Geral e tomar pa:te nos debates.
§ 19. - A Diretoria faculta a presença às Assembléias Gerais e Sessões
de Estudo de professores secundários, e professores de maté:ias afins.
§ 29. - A Associação Nacional dos Professores Universitários de Histó-
ria faculta aos estudantes o comparecimento às Sessões de Estudo.

TITULO V.

Das publicações.
Artigo 219. - A Associação Nacional dos Professores Universitários de
História manterá publicações periójicas, os Anais da Associação Nacional dos
Professores Universitários de História.
Artigo 229. - A Associação poderá editar ainda publicaçõfs especiais,
a juizo da DL etoria .
Artigo 239. - Os assuntos administrativos e comerciais referentes às pu-
blicações da Aswciação ficarão a cargo do Presidente.

TITULO VI.

Do Patrimônio.
Artigo 249. - O patrimônio da Associação se:á formado pelas subven-
ções, anuidades e doações que lhe fo~em feitas.
§ único. - Todos os sócios pagarão anuidade fixada pela Assembléia
Geral.
Artigo 259. - Em caso de dissolução da Associação, seu patrimônio
será entregue à instituição dedicada à pesquisa e estudo da HLtória que for
designada pelo voto de t ês quartos da totalidade dos sócios efetivos e funda·
dores.
Artigo 269. - O patrimônio da Associação será distinto do dos Núcleos
e Sub-Núcleos Regionais.

TITULO VII.
Dos Núcleos e Sub-Núcleos Regionais.
Artigo 27 9 . - Os Núcleos e Sub-Núcleos Regionais serão os orgãos da
Associação nos Estados.
Artigo 28 9 . - Os Núcleos e Sub-Núcleos assim organizados terão exis-
tência autônoma em tudo o que disser respeito ao seu peculiar interesse, nos
termos dos presentes Estatutos.
- 151-

§ 19. - Cada Núcleo Regior:al poderá ab:-anger um:! ou mais unida-


des da Federação.
§ 29. - Em cada Estado poderá haver um ou mais Sub-Núcleos Regio-
nais.
Artigo 299. - Cada Núcleo ou Sub-Núcleos será di igido por uma Di-
retoria composta pelo menos, de um Diretor, um Secretário e· um Tesoureiro,
com mandato de dois anos, e eleitos na última reunião de cada ano_
1\ 19 - A Diretoria deverá participar imediatamente sua eleição ao
Presidente e à Secretaria da Associação, para que tenha existência regular.
§ 29. - A Diretoria deverá apresentar um relatório anual à Diretoria
dd Associação.
Artigo 309. - Haverá em cada Núcleo ou Sub-Núcleo regional uma
Comissão Consultiva Regional composta de três membros eleitos juntamente
com a Direto~ia.
Artigo 319. - As atribuições dos membros da Diretoria, da Comissão
Consultiva, assim como o funcionamento dos Núcleos e Sub-Núcleos Regionais
serão fixados pormenorizadamente nos respectivos regulamentos.

TITULO VIl/.

Disposições Gerais.

Artigo 329. - A Sede e o Foro da Associação Nacional dos Professores


Universitários de História serão na cidade de São Paulo, onde funcionará a
Secretária Ge~al.
Artigo 33<;1. - Os presentes Estatutos poderão ser reformados no todo
ou em parte, pelo voto da maioria absoluta dos sócio, presentes da Associação,
reunidos em Assembléia Geral.
§ único. - O projeto de reforma, de iniciativa da Diretoria ou de dez
sócios, deverá ser comunicado com antecedência a todas os sócios fundadores
e efetivos.
Artigo 34". - A Associação poderá ser dissolvida pelo voto de tês
quartos da totalidade dos seus sócios.
Artigo 359. - Os casos omissos nos presentes Estatutos serão resolvidos
pela Diretoria, ad referendum da Assembléia Geral.

TITULO IX.

Disposições Transitórias.

Artigo 36 9 . - Nas Unidades da Federação, os Núcleos e Sub-Núcleos


Regionais deverão ser criados por iniciativa dos p-ofessores universitários de
HistQria,
VI. - COMUNICAÇOES.
(A propriedade rural). (História Geral).
A PROPRIEDADE RURAL NAS GEÓRGICAS DE
VERGÍLIO (*).

MARILDA CORREA CIRIBELLl


da Faculdade de Filosofia, Ciências e LeLas de
Vassouras (R.J.) e do Instituto de Filosofia e Ciên-
cias Sociais da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.

INTRODUÇÃO.

Nossa intenção ao redigirmos esta Comunicação é, somente, apre-


sentar uma síntese dos estudos que estamos realizando sobre a contri-
buição das Geórgicas de Vergílio à Ciência Agronômica na Roma An-
tiga.
Não reivindicamos qualquer originalidade para este trabalho por-
que o consideramos apenas um Ensaio que nos permitirá maior apro-
fundamento nas Geórgicas, obra que nos despertou vivo interesse por
suas informações sobre a Agricultura Romana.
O poema de Vergílio, obra clássica e verdadeiramente romana é
de grande interesse para o estudo da propriedade rural. Embora seu
objeto seja o camponês, todo seu canto gira em torno dos campos e
da vida rústica. Suas fontes agronômicas, agrícolas, geológicas, botâ-
nicas, ao lado do seu próprio conhecimento dos campos e dos proble-
mas da terra, dão às Geórgicas um carater sério, cujo conteudo revela
técnica digna de especialista e são de importância para os historiadores
da matéria.
A grande originalidade de Vergílio está no fato do poeta ter es-
crito sobre a pequena propriedade, ao contrário do que fizeram auto-

("'). - Comunicação apresentada na 1\l Sessão


- 156-

res romanos, como Catão, Varrão, Plínio e Colume1a que estudaram


as grandes extensões territoriais, o latifúndio.
O pensamento Vergiliano nas Geórgicas (lI, 412) é claro: laudatia
ingentia rura exguum calita (exalta tanto quanto deseje a grande pro-
priedade, mas saiba cultivar seu pedaço de terra).
Procauramos tambem realçar como nas Geórgicas, Vergílio de-
plora a ruina dos "pequenos proprietários" e ensina aos camponeses
os melhores métodos de cultivo como as formas de atenuar suas difi-
culdades no trato da terra.
As Geórgicas são fonte de grande importância para os estudiosos
da ciência-agronômica em Roma, não só pela matéria contida, nos seus
quatro livros (no Primeiro trata da lavoura, da cultura dos campos, no
Segundo da arboricultura e viticultura no Terceiro da zootécnica e no
Quarto da criação das abelhas), mas por seus ensinamentos técnicos
estarem em grande parte de acordo com a Ciência Moderna.
* *
*
I. - PRELIMINARES.
1. O - DADOS BIOGRAFICOS SOBRE VERGILIO.

Públio Vergílio Marão nasceu em Andes (70 a. C . ?), perto de


Mântua, Norte da Itália. Poucos pormenores conhecemos sobre sua
vida íntima. Sabemos que seus parentes habitavam em uma aldeia,
Andes, hoje Pistóia, porque encontramos evocação de sua paisagem
nas Geórgicas. Há controvérsias quanto à profissão de seu pai. Para
alguns, seria oleiro, para outros, criador de abelhas e há ainda quem o
considerasse agricultor a trabalho de um magistrado que lhe confiou
o domínio e depois a filha Mágia (1). De qualquer forma, segundo
Suetônio e f:lio Donato, as origens de Vergílio estão ligadas à terra ita-
liana (2).
Há quem afirme sua origem gaulesa, mas o que nos importa é a
sua cultura latina. Vergílio passou os seus primeiros anos ao lado de
seus irmãos, no campo, em uma fazenda modesta que o pai explorava
inteligentemente. Segundo Pichon, sua imaginação estava repleta dos
ruidos e das cores da natureza. Estava impregnada dela e vivia em
grande parte para ela. Os traços de sua origem camponesa marcariam
toda sua vida (3).
(l). - BELLESSORT (A.), Virgi/e, son oeuvre et son temps p. 2-3.
(2). -IBIDEM, p. 3.
(3). - PICHON (R.), Histoire
- 157-

Todos os autores descrevem Vergílio como alguem de saude fragil


e profundamente influenciado pelo meio e pela educação recebida.
Sua educação fortificou suas aptidões nativas: ternura íntima, so-
nhadora melancolia, simpatia pelos animais e vegetais, sentimento con-
fuso de vida univer,sal e curiosidade inquieta de um futuro misterioso.
Longe do tumulto da cidade, sua existência interior tornou-se mais pro-
funda e o poeta voltando-se sobre si mesmo, desenvolveu a reflexão e
a meditação.
Depois da educação do campo recebeu a da Escola. Com doze
anos foi para Cremona, estudou sob a direção dos Gramatici a língua
grega, a métrica, a poesia e a história.
Recebeu, aos quinze anos, a toga viril, o que fugia aos costumes
da época, porque em geral, o jovem a recebia entre dezesseis e dezes-
sete anos. Este fato leva-nos a admitir ter sido Vergílio um jovem de
qualidades excepcionais.
Vergílio de Cremona foi para Milão, onde estudou advocacia.
Sua timidez, seu embaraço, sua palavra dificil,

"sua voz de uma suavidade divina ao recitar seus versos mas


que se fatigava ,seu físico e sua alma o afastaram dos combates
do Forum".

Nosso poeta recebeu influência da filosofia do Gramático poeta


Parthenius e de Sirão. Este, era um dos numerosos amigos de Cícero,
que o julgava um homem excelente e de vasto saber. Foi quem o ini-
ciou na doutrina epicurista que se refletiu nas suas primeiras obras.
Através de Parthenius adquiriu o gosto pela poesia e o culto dos es-
critores gregos.
Vergílio sofreu tambem influências de Lucrécio e Catulo. Após
sua estadia em Milão, foi para Roma e só então, influenciado pelos
acontecimentos da Metrópole, escreveu seus poemas.
Sua obra começa realmente com as Bucólicas (37 a. C.). Pouco
sabemos sobre os primeiros ensaios da juventude nem sempre consi-
derados de sua autoria (4). As Geórgicas foram compostas em 37 a
39 ou 29, perto de Nápoles, e seu último trabalho foi a Enêida, epo-
péia romana que não terminou por causa de sua morte prematura.
Para que possamos chegar a alguma conclusão sobre ela e as contro-
vérsias quê provocam no que se refere a uma chamada "literatura

(4). - PICHON
- 158-

engagée", é necessário, em primeiro lugar, uma rápida análise da si-


tuação de Roma quando da chegada do mantuano à cidade .

2.0 - SITUAÇÃO DE ROMA NA F;POCA DE VERGILIO.

Depois de ter se estabelecido em Roma, sabemos que o poeta


voltou várias vezes ao seu país natal, o que vem confirmar que, apesar
de frequentar com Catulo o Círculo Máximo, o Campo de Marte, o
Templo de Júpiter, de misturar-se com os advogados e com aqueles
que frequentavam o Forum, não amava a vida da cidade. Este pen-
samento aparece nas Geórgicas, quando felicita os camponeses por não
conhecer

"nem as leis de ferro dos tribunais, nem os escritórios, onde


se guardavam os arquivos do povo rom:n:o".

Não sabemos se entre 17 e 28 anos morou todo tempo em Roma,


mas de qualquer forma, grande parte deste período viveu na cidade
e apesar de amante da solidão e da tranquilidade, não podia ficar in-
diferente às transformações da Urbs.
Roma se transformava materialmente. O tijolo substituia a ma-
deira nas construções, as colinas enchiam-se de palácios, surgiam os
primeiros teatros em pedra como o que Pompeu dedicou a Venus.
No Forum, surgiam lojas, templos, basílicas etc.
As transformações morais eram mais rápidas ainda. A Repú-
blica Romana decadente oferecia um triste espetáculo. Os Senadores,
que haviam regido o destino de Roma, abandonavam-na à sua sorte,
perdidos em discussões estéreis. A corrupção política, as persegui-
ções, faziam com que a Tribuna se ensanguentasse.

"O ouro inundava a cidade e se ~efletia nos lambris das casas


e nos cabelos das mulheres. Jamais o escândalo das fortunas
excessivas e as enormes dívidas tinham paralelamente insult:ido a
miséria" (5).

A Aristocracia decaia, entregue ao abuso do gozo.


O culto dos costumes antigos não era para os patrícios senão um
divertimento. Reações isoladas se faziam sentir como a de Catão, que
apesar de pregar a moralidade e a volta ao MOS MAIOR UM,
- 159-

sava como afirmam os antigos as noites a beber e usava a mulher. A


leitura de Plutarco é significativa para um entendimento da corrupção
existentes em Roma nesta época (6).
A Religião, como vimos em páginas anteriores, acompanhava
esta decadência.
Cícero denunciava a incredulidade e o desrespeito aos deuses.
As divindades antigas eram abandonadas pelos romanos que se volta-
ram para cultos novos, que interessavam aos intelectuais e traziam o
mistério do Oriente. Segundo Belessort, a religião tomava-se um ver-
dadeiro ateismo supersticioso. Decadência da Religião e do Patriotis-
mo.
As desordens dessa Sociedade preparavam uma nova era para a
humanidade e uma nova civilização. A Grécia renasceria em Roma,
pois a influência grega tomava-se enorme entre os romanos, fazendo
com que a idéia da humanidade alargasse os horizontes das almas.
Os escravos eram mais bem tratados. A instrução diminuia as distân-
cias, surgindo um novo poder, o do espírito.
Varrão escreve as Antiguidades Romanas. Cesar, as suas memó-
rias. Uma sociedade mundana se forma onde os costumes se relaxam,
e a mulher se emancipa. Os jovens intelectuais se ligam aos grandes
retores e oradores.
A República estava arrasada. As guerras civis continuavam.
Quem se apoderaria da República. Cesar? Pompeu?
Era este o panorama de Roma, quando da chegada de Vergílio.
Ele deveria ter ouvido falar em Cesar e em suas vitórias, como tam-
bem das turbas políticas em Roma entre Clódio e Milão. A batalha
de Farsália certamente o teria conduzido a reflexão. Teria assistido
à volta de Cesar e conhecido Cleópatra? Teria convivido com Cícero?
Assistido aos Jogos Troianos e à Festa dos Lupercais, onde Marco
Antônio tentou coroar Cesar7 Teria assistido a sua recusa e os aplau-
sos do povo ao seu gesto (7).
Teria Vergílio assistido ao assassinato de Cesar?
É dificil sabe-lo. A leitura dos versos das Bucólicas levam-nos
a pensar que Vergílio se colocava ao lado de Cesar como mais tarde
se colocaria do lado de Otávio (8).
(6). - PLUTARCO. Vidas Paralelas. São Paulo, Cultrix, 1963.
(7). - BELLESSORT (A.), op. cit., p. 21.
(9). - Vide IX Bucólicas, onde Vergílio faz refe-ência "à
- 160-

o poeta era por natureza um espírito que amava a ordem e a


paz e achava que esta só poderia ser alcançada através de um poder
forte. Era um idealista que detestava os tumultos das Guerras Civis
da República e que certamente tenderia apoiar Augusto. Desejava
ser util ao seu país e na obscuridade preparava-se para sua obra que,
seria uma reação contra todo o luxo, os excessos e vícios da Urbs que
tanto amava.
O Epicurismo estava em moda e convinha com seu materialismo,
a essa Sociedade que vivia dos prazeres e do gozo e que desejava se
livrar do medo da morte. Ele repudiava as crenças ancestrais e os
deuses. Vergílio dos Epicuristas herdou apenas o amor à Ciência.
Foi influenciado por Catulo, mas a influência de Lucrécio foi maior
(9) . Este criou um verdadeiro sistema filosófico. Cantou todas as
dores humanas, ao contrário de Catulo que SÓ cantara a sua. Sua
tristeza deve ter fortificado a melancolia de Vergílio. Nos dois poetas
encontramos o sentimento de piedade pelos seres humanos. Amava a
humanidade e seu sentimento de natureza se alargava e aprofundava
em sua visão cósmica.
Assim, julgamos que os homens de letras, principalmente Sirão
e Lucrécio, bem como o elegíaco Cornélio Galo, exerceram conside-
ravel influência nesta época e, portanto, contaminaram Vergílio.
O poeta em 43, havia retornado a Andes, quando Asínio Polião
tornou-se governador da Cisalpina (lO). Sabemos que unia às suas
qualidades de administrador a de poeta, e que acolheu Vergílio em
sua Província. Este, mostrou suas primeiras Buc6licas, que devem ter
lhe agradado.
Em Roma, neste momento, os assassinos de Cesar fugiam. As
Guerras Civis retomavam. O Triunvirato estava prestes a se formar.
Até onde estes acontecimentos teriam influenciado Vergílio?
Otávio permaneceu em Roma e Antônio foi para o Oriente. O
primeiro resolve repartir os campos das dezoito cidades mais ricas da
Itália e aqui sua política começaria a influir sobre a vida do poeta,
pois Mântua estava entre estas cidades.
Alfinos Varro, que substituira Polião como governador da Pro-
víncia, consentiu na expulsão de Vergílio de suas terras, nada adian-
tando os versos a ele dedicados pelo poeta.
Vergílio voltou à Roma. Sua cólera foi grande contra Otávio.
Galo e Mecenas levaram-no ao futuro Augusto que prometeu-lhe a
(9). - Lucrécio se suicidou no dia em que Vergílio recebeu a toga
viril.
(lO).
- 161-

restituição das terras. Nada conseguiu embora tenha recebido indeni-


zação por elas, na Campânia.
Qual a reação do poeta? Aceitara e compreendera que, na con-
fusão geral, sua infelicidade era ainda pequena? Teria Otávio conquis-
tado Vergílio para sua causa na entrevista que tivera? Não tendo con-
seguido retirar de suas terras o centurião Arios que a recebera teria
aceitado e ficado satisfeito com a indenização que Otávio lhe conce-
dera? Estas e muitas outras perguntas estão sem respostas.
As informações que possuimos apresentam Vergílio em Roma,
familiar de Mecenas, ligado a Horácio, mostrando suas Bucólicas a
Galo e logo conseguindo que fossem levadas à declamação no teatro.
O poeta aparece-nos já aplaudido pela opinião pública (11).
*
3.0 - AS OBRAS.

As obras de Vergílio refletem segundo Leoni mais que nenhuma


outra os sentimentos, as idéias, as dores e as esperanças deste período
de transição de Cesar a Augusto (12). Assim Vergílio é, nesse sen-
tido, um dos escritores mais representativos do seu tempo.
Apesar de lhe serem atribuidas algumas obras da juventude, é a
partir das Eglogas ou Bucólicas que seu gênio se manifesta. Têm im-
portância histórica. Encontramos nelas, traços das trágicas consequên-
cias da Guerra. A sombra da recordação da perda injusta dos campos
paterno transborda na poesia que descreve, quse em contraste com a
tranquilidade e a frugalidade dos pastores e sua vida apegada à terra.
:B a primeira expressão dos sentimentos novos: amor e desejo de
paz, que virão com Augusto. Não só os acontecimentos políticos in-
fluenciaram o autor, mas foi tambem decisiva a ação da poesia de
Teócrito.
As Bucólicas foram escritas sob a influência de Lucrécio e do
Epicurismo. Vergílio havia abandonado Roma e nos arredores de
Nápoles, mergulhado nos estudos científicos a respeito da natureza
das coisas, compôs os dez cantos com o título de Carmina Bucolica .
. As Bucólicas são unidas seguindo um critério artístico. Compos-
tas entre 42 e 39 a. C ., são uma exaltação à vida campestre com sua

(11). - MECENAS é uma das figuras mais discutidas da época. Con-


seguiu reunir em to~no dele, vários literatos como Horácio, Vergílio etc.
Sabia a importância dos poetas, a literatura era para ele "uma energia nacional".
(12). - Vide LEONI (O),
- 162-

paz profunda e cantos agrestes . São a primeira afirmação artística do


poeta. Segundo alguns autores, a que melhor define a sua índole.
São poemas novos, de uma época que surge onde o elemento lírico so-
brepuja o trágico na poesia pastoril.
Há no seu canto quase um eco trágico de contraste entre a fé no
advento da paz universal e a fúria do veterano que expulsa o poeta do
pequeno campo paterno. A fé prevalece; logo o elemento lírico su-
pera o trágico.

"Então, todos os personagens desaparecem de cena onde


fica só o poeta, a verde extensão dos campos se alarga e um novo
canto de amor e paz tem por cena um mundo cujo centro é
Roma".

Esta obra sem dúvida atraiu sobre Vergílio a atenção e a admira-


ção de Mecenas e de Otávio, que passaram a ver nele um intérprete
de seus sentimentos e de seu programa de governo.
A segunda grande obra de Vergílio, As Geórgicas, escrita entre
27 e 29 a. C., é um poema complexo e orgânico que trata de todos
os aspectos da agricultura, do amor à terra e dos animais do campo.
Ela será o objeto de nosso estudo mais aprofundado.
Na sua terceira grande obra, A Enêida, trabalhou dez anos. Nela
irá fundir velhas tradições, memórias semi-históricas, reminiscências li-
terárias, contos populares e romances. É uma Épica Nacional, consi-
derada por muitos como sua "obra prima". Escrita após o ano de
29 a. C., após Ácio, a pedido de Mecenas, tornou-se obra clássica,
logo que publicada.
Nos seis primeros dos seus doze livros, a Enêida narra as aven-
turas de Ené:as e do seu grupo de troianos, de Tróia à Itália, nos últi-
mos seis anos.. descreve a conquista troiana do Lácio e o estabelecimento
da nova nação. É obra contemporânea à formação do Principado e
"Roma é a sua verdadeira protagonista".
A idéia da grandeza de Roma e de sua missão civilizadora criara
no espírito de Vergílio o desejo de narrar as façanhas de Ené:as.
- 163-

antiga comunidade espiritual descrita por Homero. Enéias seria, se-


gundo a tradição, o fundador da estirpe Júlia e, portanto, antepassado
de Cesar e Augusto.
Roma, era assim a verdadeira protagonista da Epopéia e embora
não tenha sido fundada por Enéas, estava ligada a ele.
Na Enêida, Vergílio fez florescer a poesia épica, a grandeza de
Roma foi exaltada e o Império de Augusto passou a significar a Civi-
lização do Mundo inteiro.
Vergílio morreu aos 50 anos sem terminar a Enêida, voltando-se
cada vez mais para a filosofia. Em sua obra abriu ao auto-conheci-
mento humano, novos caminhos. Pôs em evidência a humanidade de
seus herois, voltando-se de modo particular para a psicologia dos per-
sonagens.

"Para Vergílio a lenda e a história unem-se em todo orgâ-


nico" (13).

• •

11. - AS GEORGICAS.
1.0 - CONCEITUAÇÃO.

As Geórgicas, poema sugerido por Mecenas a Vergílio, é obra


clássica, forte e prática, verdadeiramente romana. Exalta as belezas
do trabalho e as recompensas da vida rústica.
As Guerras Civis, como vimos, haviam devastado, empobrecido
e despovoado os campos da Itália. As terras abandonadas clamavam
a volta dos camponeses, que haviam ido para Roma.
Fez, então, Vergílio as Geórgicas, onde deplora a ruina dos cam-
pos e indica remédios para remediar seus males em quatro livros (13):
1.0 - sobre o cultivo dos campos;
2.° - sobre as árvores;
3. 0 - sobre a criação de animais;
4. 0
- 164-

religiosos. Por isso levantou-se a hipótese que os quatro livros de Ver-


gílio são prelúdio das reformas religiosas de Otávio (14).
As Ge6rgicas tem na aparência o seu heroi, figurado no campo-
nês ideal, mas seu verdadeiro heroi é a Itália inteira, a que fizera a
grandeza de Roma. Elas não são só a homenagem a Otávio, mas a
força moral da Itália nos benefícios da vida rústica .

2. O - CONCEPÇÃO E OBJETIVOS.

Para alguns historiadores o movimento literário desta época foi


inspirado de cima, Mecenas, muito inteligentemente, teria dirigido a
difusão dos temas e artigos fundamentais da política de Augusto: exal-
tação patriótica de Roma e do Itália, restauração das antigas vsrtudes,
da família e da religião, como a necessidade de repovoamento (16).
Nesta linha de idéias, o objetivo de Vergílio ao escrever as Ge6r-
gicas, foi vivificar a agricultura decadente. Compreendia que a gran-
deza de Roma estava ligada a ela, e o estado social, moral e econô-
mico do Mundo necessitava, para que não se tomasse inquietante, da
base forte e rigorosa da população rústica, mas desejava antes de tudo
auxiliar a Re~orma de Augusto (17).
Os fatos teriam ocorrido da seguinte maneira:

"Vergílio começou as Geó.'gicas em 37 a.C. Trabalhou-a


durante sete anos, enquanto a Itália caminhava para a pacificação
e Otávio por uma política habil e moderada, se impunha no Oci-
dente" .

Depois da vitória de Acio, segundo Suetônio, Otávio ao voltar do


Oriente, parou na Campânia, onde escutou a leitura dos quatro livros
das Geórgicas, gostando imensamente deles (18). Os versos do poeta
lhe agradaram mais que qualquer das homenagens que lhe foram pres-
tadas. Eles atendiam aos seus desejos. Vergílio lhe aparecia como
excelente colaborador que compreendera sua obra de reconstrução.

(14). - SAINT-DENIS (E.), Georgiques. Paris, Les Belles Ietres, 1968.


(15). - LUCR~CIO. Natureza das Coisas. São Paulo, Cultura, 1941;
LEONI. op. cit., p. 79.
(16). - ROMO (L.), Le Haut Empire. T. m. Paris, Glotz, p. 162.
(17). - PICRON (R.), Literatura Latina. p. 335-361.
(18). - SUETONIO. As Vidas dos Doze Césares. R.J., Athena, 1937;
SAINT DENIS
- 165-

Poucos homens públicos tiveram a sorte de serem apoiados por um


gênio literário, como foi Augusto por Vergílio.
S. Denis afirma: Vergílio estava submetido às ordens expressas
de Mecenas e em'olvido numa campanha de propaganda para a agri-
cultura, para o retorno à terra.
O próprio Vergílio afirmava nas Ge6rgicas:

"São estas, Mecenas, as tuas ordens, não fáceis de cumprir.


Sem ti, não poderá minha mente abalançar-se em altos comedi-
mentos" (19).

Gibbon acha que a idéia do grande poema rural teria vindo da


necessidade de dar aos veteranos o gosto pela sua nova condição de
agricultores, no que é contestado por S. Beuve: o próprio Vergílio foi
espoliado em proveito de um veterano (20).
Villeneuve:

"Vergílio escreveu em função dos camponeses desavisados


(veteranos). - "Aprendei as culturas próprias de cada espé-
cie" (21).

Ele queria interessar estes novos proprietários nas terras que ha-
viam recebido.
:e. forma que a maioria dos literatos e historiadores narra a con-
cepção das Ge6rgicas. O assunto parece-nos muito complexo, pois as
controvérsias relativas ao fato de ter sido o poema encomendado por
Mecenas (que lhe sugerira inclusive a abordagem do assunto) são inú-
meras. Até onde é válida a afirmativa de uma literatura engagée para
as Ge6rgicas? Há os que não concordam com a idéia. Assim:

PICHON - A ob!"a não foi encomendada pO' Mecenas


e consequentemente por Otávio. Apenas
concordava maravilhosamente com as in-
tenções do Imperador (22).

(19). - "Sequamur intactos tua, Mecenas, haud mollia uissa" - "te


sinc sine ni! altum neus incohat... (1. 111, 40, 41, 42) .
(20). - SAINT-DENIS (E.), op. cit., p. VII-IX (e R.C. onde é ana-
lisada a poHtica agrícola e a distribuição de terras aos veteranos. J. Gagé -
Paris, 1935, p. 101-103.
(21). - VERG tUO. GeÓrgicas. 11, 3S.
(22). - PICHON,
166 -

BELLESSORT o poeta não foi domesticado pelos favores


de Mecenas, nada de semelhante teria se
passado. O que acontecia é que a mais
nobre inspiração se juntava aos mais jus-
tos cálculos de política. É claro que
Mecenas o tinha encorajado como outro
já o fizera com as Bucólicas, "mas
as Geórgicas tinham outra razão de se:,
que a fantasia e a vontade de Mecenas.
Vergílio queria tentar um campo novo
como fizera Lucrécio, pois os assuntos
mitológicos já tinham sido muito tratados
pelos Alexandrinos" (23).
PARATORE - Vergílio vagueando na pequena fazenda,
descrevendo sua vida, contemplando com
os estáticos a divina natureza, não fez ou-
tra coisa que concretizar com forma ex-
pressiva o seu p otesto contra a guerra
nefanda, contra aquilo que era o seu má-
ximo bem, o seu sonho de um retorno à
paz e à essência da vida agreste. Afirm:1
o autor que não é possível interpretar a
obra como uma tarefa encomendada por
Mecenas. "Uma grande obra de arte não
pode surgi: jamais sobre "comitione", so-
bre a falsificação de um esquema preme-
ditado por outros, onde a fantasia do
poeta deve permanecer aprisionada".

o que aconteceu foi que o poeta aderiu do fundo do coração ao


programa de renovação da terra italiana. Vergílio não se dirigia di-
retamente aos camponeses pois não podia acreditar que estes o com-
preendessem e estudassem. Dirigia-se a todos os que tinham cultura.
As Geórgicas, segundo ele, deveriam enobrecer perante a todos a ta-
refa do camponês. Iluminaram sua vida e celebrariam "a glória dos
campos divinos". O poeta desejava chamar a atenção dos homens pú-
blicos para o trabalho dos campos e para a dureza da vida do campo-
nês. O movimento de simpatia que as Geórgicas criariam em tomo
deles, levaria talvez os cidadãos das cidades congestionadas a retomar
aos campos. Encorajaria os pequenos proprietários a viver em suas
propriedades a assumir os seus deveres.

(23). - PARATORE,
- 167

"Se atingisse seus fins, Ve-gílio seria lido nas escolas e os


filhos de camponeses como ele, guardariam um amor mais refle-
tido de sua terra".

Para o autor, a obra de Vergílio tinha a intenção deliberada de


atingir a todos indistintamente. Ele não era apenas um fragil elemento
da vontade de Otávio, um executor de suas ordens. Vergílio desejava
isto ao escrever o poema. Tanto melhor se esta intenção coincidisse
com os desejos de Augusto (24).
O problema da ligação de Vergílio a Augusto ainda esta reque-
rendo novos estudos.
* *
*
3.0 - FONTES.

Vergílio preparou seriamente o conteudo de sua obra.


As fontes de sua ciência agronômica são numerosas e seguras: o
velho poema de Hesíodo (Os Trabalhos e os Dias), de Aristóteles
(História dos Animais), Eratóstenes (Tratado de Astronomia), Teo-
frasto (História das Plantas), Nicandro (As GeórgÍCas e os Melissúr-
gicos), podem ser citadas entre outras obras gregas. Magão, Catão
(De Agricultura), Varrão (Res Rusticae), Cícero (Os Econômicos) e
Rigino (Tratado de Agricultura e Apicultura), entre as fontes cartagi-
nesas e latinas.
O poeta recorreu à Geologia para definir as diversas espécies de
terrenos, à Botânica para distinguir as diferentes plantas e as condi-
ções do seu desenvolvimento, à Fisiologia para compreender os méto-
dos de criação e à Astronomia para enumerar os preságios da tempe-
ratura.
O poeta juntou a essas informações a tradição moral dos campo-
neses e l,!,S suas observações individuais. Desse conjunto de conheci-
mentos nasceu uma técnica digna de um profissional (25).
O charme especial da sua obra que não aparece no Tratado de
Catão, nem na Economia de Xenofonte, vem da perfeição da forma
(26).

(24). - PARATORE (E.), Le Georgiche. p. 15-16.


(25). - PICHON (R.). op. cit., p. 335.
(26). - Vide Ge6rgicas, especificamente a cena da tempestade, a descri-
ção dos cavalos de raça e das "1;lelhas. (Indicação bibliografia no fim do tra-
\:>alho)
- 168-

Vergflio não é apenas o estilista, é tambem o pensador influen-


ciado :pelas idéias filosóficas de Lucrécio. Sua concepção do mundo,
da vida, está presente em seu poema e esta lhe dá um auto-retrato
moral.
Mas esta concepção é determinada pelo sentido da dor, mas não
a dor que nasce da injustiça e do arbítrio. Nada se obtem sem esforço,
sem trabalho e este traz consigo suor e lágrimas. Este é o pensamento
vergiliano (27).
A influência de Lucrécio em Vergflio é relativa. O primeiro acha-
va por exemplo que a missão de instruir os homens, é a função social
do poeta. A Vergílio iria imita-lo nessa parte, mas procuraria neutra-
lizar os efeitos nocivos do seu poema. Assim, sobre vários pontos, as
Geórgicas são uma refutação indireta do Natura Rerum (28).
Vergílio se afasta dos Alexandrinos que cultivavam a poesia eru-
dita e didática, que praticavam antes de tudo uma poesia de luxo,
quando procura vulgarizar a ciência, difundi-la, influenciar sobre os
espíritos e melhorar a situação social.
A influência de Hesíodo em Vergílio é indiscutivel (29). Sua
obra não possuia a serenidade que se exigia do gênero literário, como
a de Lucrécio. Era um protesto em nome da moral lesada em sua
pessoa e uma sequência de preceitos agrícolas e religiosos destinados a
mostrar o valor de sua sagacidade e de sua superioridade. Sem dúvida
a primeira educação do nosso poeta, suas lembranças de criança, per-
mitiram-lhe a compreensão de Hesíodo pois ele tambem nascera no
campo.
A obra de Hesíodo: Os Trabalhos e os Dias, mostrou-lhe que a
simples existência do camponês e as lides do campo eram temas fecun-
dos e de inspiração poética (30).
Embora as influências do poeta, apareçam em Vergílio, muitas
são as diferenças entre suas obras.

(27). - Vide BELLESSORT, op. cit., p. 79.


(28). - LUCRÉCIO. De Natura Relum. São Paulo, Cultura, 1941.
(29). - Hesíodo, poeta grego que escreveu o primeiro modelo de poema
didático: O Trabalho e os Dias. O poeta camponês concedeu uma obra nas-
cida quase toda ela da imaginação de um queixoso desconsolado. Era uma
obra de combate. Vide BELLESSORT, op. cit., p. 17-18.
(30). - A análise da obra Hesiódica revela toda uma filosofia de vida.
Seu
- 169-

Outro autor que influenciou VergHio para a elaboração das Geór-


gicas foi Varrão (36 a.C.) (31). Sua obra Diálogos sobre Agricultura,
intitulada De Re Rustica, foi preciosa para o poeta. Varrão, como
grande proprietário que era, se ocupou principalmente do latifúndio e
se dirigiu aos proprietários como ele, que possuíam belas casas de
campo. Em sua obra descreve as grandes propriedades, suas riquezas,
seus móveis, etc.
Estava contaminado pelo luxo dos homens do seu tempo. Apesar
disso, os personagens dos seus diálogos deploram a corrupção dos cos-
tumes, o abuso da prodigalidade, dos banquetes públicos e das refei-
ções dos campos. Mas são esses mesmos proprietários que se apro-
veitam destes festins para elevarem os preços dos víveres que lhes au-
mentarão as rendas.
A grande originalidade da obra de Vergílio é a de ter escrito so-
bre a pequena propriedade e não como Varrão e Catão, sobre as gran-
des extensões territoriais que parece pouco conhecer e admirar. Tal-
vez compreendesse os seus perigos como mais tarde Plínio: Latifundia
perdidere [taliam (os grandes domínios perderam a Itália) e Columella
que se queixava da gente rica que abandonava regiões inteiras ao gado
e às feras.
O pensamento de Vergílio (11, 412) é claro quando escreve: Lau-
datio ingentia rura: exiguum coUto! (Exalta, tanto quanto queira, a
grande propriedade mas saiba cultivar o seu pedaço de terra!).
Não aparece em sua obra nem a figura dos Villicus, nem as casas
dos escravos e demais elementos comuns à grande propriedade.
A obra de Varrão nos permite avaliar a situação econômica da
Itália e a segunda crise da agricultura romana. Nela aparecem as quei-
xas para o retomo à terra, acusações sobre os ricos proprietários que
preferem viver em Roma que viver em seus domínios, contra o luxo
decadente etc (32). Lamenta a falta de trigo para nutrir as popula-
ções. Mostra que as guerras civis e os progressos da latifúndia aumen-
taram a crise geral. Explica que a Itália só contava com as províncias
para se alimentar, mostrando que a vida de Roma ficara submetida ao
mar e ao trigo que vinha da Sicília, Sardenha e Alrica, como a vinha
das Ilhas (33).

(31). - Varrão foi um dos mais notáveis polígrafos de Roma. Era


sabino. Apareceu no Forum e no campo. Possuia grande erudição e teve pa-
pel importante em Roma, embora não se afastasse dos negócios e da adminis-
tração de suas propriedades. (BELLESSORT, op. cit., p. 80).
(32). - SAINT-DENIS, op. cit., p. XII e XIII.
(33). -VARRÃO (R.R.), De Re Rustica. 11
- 170-

Parece-nos que a Varrão, Vergílio deve o essencial das suas in-


formações técnicas sobre a adaptação das culturas aos diferentes ter-
renos (R. R. I, 6; Geórgicas, 11, 109; 177), sobre as diversas qualida-
des do solo e da maneira de os tratar (R. R. I, 7; Geórgicas, 11, 226),
sobre os fundamentos e as posições que convem à vinha (R. R ., I, 25
e 26; Geórgicas, 11, 83), sobre o ciclo anual da viticultura, etc.
A outra fonte romana de Vergílio foi Catão (34). Em seu Tra-
tado de Agricultura procura apontar o remédio para a crise da econo-
mia agrícola posta em perigo pelas guerras assassinas, pela destruição
da classe média de pequenos proprietários e pela falta de mão-de-obra
nacional que substituida por prisioneiros reduzidos à escravidão, va-
lorizou os grandes domínios que começaram a se constituir; a cultura
dos cereais decadente é substituída por uma economia fechada e esta
substitui a policultura da antiga exploração nos grandes domínios, a
cultura da vinha e da oliveira assim como a criação de gado substituem
as cultura~ antigas.
Catão se esforça por mostrar que os médios proprietários podem
ainda viver e ter êxito, com a condição de substituir a policultura de
outrora por uma repartição mais produtiva das terras semeadas de tri-
go, das culturas frutíferas e arborescentes (25).
J. Ruelens calculou que por volta de 104 a. C. o número de pe-
quenos proprietários podia ser nesse período de 7.000 a 15.000 na
Itália, enquanto dos grandes proprietários ia a 2.000 segundo as in-
formações do tribuno Filipo. Nos anos seguintes, os latifúndios se
acresceram, enquanto a política agrária multiplicava os colonos. (Al-
guns romanos chegam a possuir a quase totalidade da Itália no último
século da República (tinham em média mais de 5.930 ha.) (36).
Embora Vergílio tenha estudado seriamente as obras dos seus pre-
decessores, sua ciência não parece ter sido retirada só dos livros (37).
Vergílio expõe em sua obra ao narrar o trabalho e as ocupações dos
camponeses aquilo que reteve de sua vida campestre com uma precisão
científica. Sua "ciência" confere à sua obra um carater didático e lhe
dá um "charme" todo especial. Vergílio consegue transmitir ao leitor
uma ternura íntima pela árida matéria que trata, fazendo-lhe sentir
que ela era o seu amor e fazia parte de sua vida. Por isso Columella ao
(34). - CATÃO viveu entre 234 a. C. e 149 a. C. Esc~eveu um tratado
sobre agricultura denominado: De Agricultura.
(35). - SAINT-DENIS, op. cit., p. 11. Vide tambem 1. Ruelens, La
Repartition de la Proprieté fonciere en ltalie, au dernier siecle de la Republi-
que, p. 28-29.
(36). -RUELENS (1.), op. cit., p. 31.
(37). - Vide BELLESSORT (A.), Virgile, son oeuvre et son temps, p.
83.
171 -

afirma que Vergílio foi o mais pessoal dos poetas nas Ge6rgicas, e
mais pessoal ainda onde obedece estritamente as exigências técnicas do
seu assunto (38). Vergílio soube impor a uma matéria técnica uma
distribuição e uma expressão singular.
As fontes de Vergílio foram numerosas e variadas, mas sua obra
foi original pela maneira muito pessoal que tratou seus temas.
* *

4.0 - COMPOSIÇÃO.

o "amor ao campo, a piedade para o sofrimento de seus habi-


tantes, o culto à Roma, o fervor por César e por Augusto" e todas as
aspirações que começaram a aparecer nas Bucólicas são desenvolvidas
e vivificam-se nas Geórgicas (39).
A maneira de Vergílio tratar os problemas agrícolas de Roma nas
Geórgicas, pode parecer à primeira vista ao leitor idêntica a dos agrô-
nomos latinos: Catão, Varrão, etc. Quando Vergílio compôs o poema,
como vimos nas páginas anteriores, teve sem dúvida sob seus olhos es-
tas obras, mas não pretendia exagerar a tecnicidade da matéria nem
fazê-la completa (40).
Enquanto Varrão, minucioso na arte de dividir e subdividir, tra-
ta em seu estudo sobre agricultura primitiva do terreno a explorar, das
construções e dos estábulos existentes nas propriedades, do pessoal e
do material de construção, para em seguida analisar os cuidados que
a terra exige e as épocas que convém trabalhá-la Vergílio retoma al-
guns desses assuntos no Canto I das Geórgicas, enquanto que os ou-
tros ne msequer aparecem na sua obra. Enquanto Varrão estende-se
longamente sobre a oliveira e sua colheita e sobre vários animais cam-
pestres, Vergílio dá um lugar especial à vinha e apenas alguns versos
à oliveira e seus derivados. No Canto IV, trata da apicultura (41).
A obra de Vergílio comparada por exemplo a de Columella pode
ser considerada incompleta, pois o nosso autor não trata das prada-
rias, construções horticulturas, etc. A verdade é que Vergílio não teve
a intenção de fazer uma obra exaustiva como a análise de seu próprio
plano demonstra. Por isso, alguns autores como Sêneca, opulento

(38). - Cf. BELLESSORT (A.), op. cit., p. 84.


(39). - PICHON (R.), op. cit., p. 104.
(40). - VERGILlO. Geórgieas (111,42): Non ego eoneta meis amplietl
uersibus appto (Não pretendo tudo asarcar em meus versos) .
(41). - VERGILlO,
- 172-

proprietário e viticultor, ahcam que o charme poético do assunto im-


portava mais a Vergílio que a exatidão técnica das prescrições. PHnio,
o antigo, critica-o quando afirma que: a lista de colheitas nas Geór-
gicas é incompleta (42). Isto não quer dizer que Vergílio não tenha c;e
dirigido aos agricultores, pois a arte de Vergílio nas Geórgicas é de
sugerir.
Os poemas ou tratados consultados por Vergílio para a elabora-
ção das Geórgicas não explicam sua divisão em quatro Cantos.
O a'Ssunto do poema, que aparece nos cinco primeiros versos, re-
sumem um plano pré-estabelecido que anuncia uma divisão muito ní-
tida da agricultura em quatro partes: trabalho dos Cereais (subdivi-
sões: operações rústicas e dados astronômicos); Arboricultura (viticul-
tura); criação de gado (subdivisões: bois e gado miudo); apicultura.
Segundo Saint-Denis, essas quatro sessões são repartidas em dois
grupos de dois, sendo que cada grupo é precedido de um preâmbulo
e de um elogio (43). Este plano não é de Hesíodo, nem de Catão,
nem de Varrão. Nem Columela, nem Paládio usaram essa maneira
de dividir. Terá sido baseado nos Alexandrinos Calímaco e Apolônios?
Não é um plano completo ne mracional, não saiu de uma obra técnica,
mas segundo Saint-Denis de um elogio entusiasta e lírico da vida cam-
pestre (.4).
Passemos à análise de algumas características que desejamos re-
alçar.
• •

5.0 CARACTERISTICAS.

19 ). - A primeira idéia das Ge6rgicas é a de paz inspirada na


série de comportamentos pastods. Não aquela paz egoís-
ta do indivíduo abrigado num refúgio privilegiado, pro-
tegido contra as tempestades e os outros. Mas a paz,
operosa, a paz de Augusto.
29). - A segunda característica é a de retorno à etrra, ao seu
cultivo. Mas não sem conside~ar que ela precisava ser
cultivada e santificada com duras fadigas, banhada com

(42). - SAINT-DENIS,
- 173-

suor e lágrimas que se tornavam fontes sadias energias


(45).
3Q). - O autor deixa claro tambem que o trabalho constroi não
só a g'ória dos campos mas a própria glória de Roma.
Ao contrário das Bucólicas, as Geó gicas mostram-
nos alem do trabalho do a~ado, o trabalho realizado com
as armas e com as leis, com as tradições e com a jus-
tiça, com ação do pensamento. É o rompimento do
poeta com a posição idílica de indiferença e de agons-
ticismo que demonstrara antes.
4Q ) . - A exposição de Vergílio está repleta da paixão, do senti-
mento e de inspiração lírica do autor, que t"ansparecem
nos epílogos e nas digressões. É exemplo disw o elogio
da vida agrícola (lI, 457-542), a oração aos deuses
para que salvaguardem o bem do Estado e o jovem
Otaviano (I, 463-514) etc.
A sensibilidade invade toda obra, comunicando-lhe
um sopro de poesia. Tudo nela é humJno, é espiritual,
terno e afetuoso, pela simpatia que Vergílio infunde a
todas as coisas (46).

• •

6.0 - CONTEUDO DOS VERSOS DOS QUATRO PRIMEI-
ROS LIVROS DA GEORGICAS.

LIVRO I

100-120 - Sementei~as;
condições propIcIas de clima, irrigação
1- 4 - Assunto e divisão do poema:
• Lavoura (cultivo dos campos).
• Arboricultura e Viticu~tura (cultura das árvores,
especialmente: vinha e oliveira).
• Zootecnica (criação de animais).
• Apicultura (criação de abelhas).
5- 22 - Invocação dos Deuses Campestres.
23- 42 - Invocação a Augusto.
43- 69 - Lavoura e Diferentes Espécies de Terras.

(45). - Labor omnia vicit improbus, et duris urgens in rebus legetas.


Geõrgicas, I, 145.
(46). -Vide sobre o assunto ROSTAGNI (A.), Storia deUa Literatura
Latina. p. 26-76 e The Oxford Classical Dictionary. Virgil. Oxford at Cla-
rendon Press, 1950.
- 174-

79- 99 - Métodos de Cultura: Repouso dos campos pela alter-


nação das culturas, queimada, dupla aradura_
e drenagem das terras_
121-159 - Origens da Agricultura; pássa~os e plantas nocivas; as
idades.
160-186 Os instrmentos aratórios e o clima.
187-192 Meios de prever a qualidade de uma colheita; conse-
lhos dos antigos; sinais do ceu, animais e certas
plantas.
193-256 As Épocas do Ano e os Trabalhos que lhes são apro-
priados.
276-286 Dias favoráveis e desfavoráveis de acordo com o ca-
lendário lunar. Vide seu trabalho.
287 -310 - Trabalhos a executar à noite no verão e no inverno.
311-355 Tempestades de equinócio (outono e primavera) e
meios de prever o tempo.
356-369 - Prognósticos e sinais dos ventos.
370-392 - Prognósticos das chuvas.
393-423 - Prognósticos do belo tempo.
424-437 - Presságios fornecidos pela lua.
438-465 - Sinais fornecidos pelo sol.
466-497 Presságios de Guerra Civil quando da morte de Ce-
saro
498-514 - Votos em favor de Augusto. (Prece aos deuses pá-
trios para que o protejam, que ele seja o pacificador
e que os campos voltem a florescer.

*
LIVRO li

1- 8 Invocação a Baco.
9- 37 As árvores; suas variedades e diferentes maneiras de
rep~odução (artificial ou enxerto).
38- 46 Invocação de Mecenas a favor de sua emp :esa.
47- 82 Árvores selvagens e maneira de melhor cultiva-las. O

83-108
- 175-

177-258 - Variedade de terreno segundo a altitude e a força pro-


dutiva. Maneiras de reconhecimento dos te:renos e
a escolha do mesmo.
259-314 - Cultura da vinha: plantio, preparo do terreno, época
pwpícia à plantação.
315-396 - Cuidados com as videiras novas; prejuízos produzidos
pelos animais; as festas de Baco.
397-419 - Cuidados requeridos pela videira durante o ano. Apo-
logia da pequena propriedade - 412: laudato ingentia
rura, exiguum colito ...
420-425 - Cultu:a da oliveira; cuidados a observar.
426-457 - Cu'turas de outras árvo~es.
458-542 - Elogio da vida campestre. Canta a felicidade daque-
les que conhecem a razão das coisas e chama de
afo:tunados os que conhecem os deuses campestres .


LIVRO llJ

1- 12 - O poeta quer se ilustrar tratando de um assunto novo.


13- 39 - Tempo alegórico em homenagem a Otávio.
40- 48 - Invocação a Mecenas.
449- 71 - Reprodução dos touros.
72-136 - Reprodução dos cavalos.
157-178 - O cuidado com os bezer:os.
179-208 - O cuidado com os potrinhos.
209-285 - Amor aos animais: combate dos tou' os, furor dos ca·
valos.
286-338 - As ovelhas e os cães.
339-348 - Os rebanhos na Líbia.
349-383 - Os rebanhos na Síntia.
384-393 - A lã.
394-403 - O leite.
404-413 - Os cães.
414-439 - O cuidado da limpeza dos estábulos.
440-473 - As doenças dos rebanhos.
474-566 - A peste nos animais na Líria .


LIVRO IV
1- 7 - Invocação à Mecenas.
8- 50 - Construção das Colméias.
- 176-

67-115 - Escolha do Rei.


116-148 - Digressão sobre os jardins. O veillard de Tarento.
149-227 - Costumes, trabalhos e instintos das abelhas.
228-250 - Recolha do mel.
251-314 - Doenças.
315-357 - Episódio de kisteu.
358-56 - Epílogo.

• •

7.0 - ASPESTOS AGRICOLAS DOS DOIS PRIMEIROS
LIVROS DAS GEORGICAS.

Desenvolvemos as pesquisas sobre os aspectos agrícolas das Geór-


gicas em outro trabalho, neste nos limitaremos a relacionar os aspectos
agrícolas que trata Vergílio nos dois primeiros livros das Geórgicas e a
adiantar que sua análise confirma as considerações que fizemos, nos
capítulos anteriores, sobre a importância dos conhecimentos técnicos
do poeta. Suas idéias sobre "técnicas agrícolas" concordam em grande
parte, com a ciência agronômica moderna (47).
No livro I Vergílio trata dos seguintes assuntos:

• Vinha de Enforcado (1-2);


• Lavoura de preparação (abrição); (1-43-46) e (1-64-70).
• Espécies de terra (1-50-59);
• Aptidão Cultural - qualidades intrínsecas do solo (edafolo-
gia); (1-50-55) e (11-109-103).
• Métodos de Cultura; (1-70-99).
• Alternância dos Cereais e Leguminosos; (1-71-76) e (1-79-80).
• Cultura esgotantes (linho, aveia, do mideira ou papoulas);
(1-77-78) .
• Aveias; (1-77) e (1-154).
• Adubação; (1-79-81).
• Queimadas - teorias sobre os seus efeitos; (1-84-93).
• Pulverização da te~ra, "Rastrum"; (1-94).
• Grades; (1-94-95); (1-166).
• Como semear a terra; (1-100-120).
• Aves daninhas; (1-119-120).
• Desponta; (1-111-113).

(47). - Sobre O assunto vide obra de MAYER (R.), As Ge6rgicas de


Vergflio.
177 -

• Enxugo das terras; (1-113-117) e (11-348-350).


• Rega; (1-106-110).
• Origens da Agricu:tura; (1-150-160).
• Doenças dos Cereais; (1-150-151).
• Vegetação infestante; (1-151-154).
• Instrumentos aratórios; (1-160-186).
• Joeira; (1-166).
• Charrua; (1-169-175).
• Eira; (1-178-180).
• T;ilhos; (1-164).
• Animais daninhos; (1-118-185) e (11-374-381).
• Relação entre a floração da amendoeira e a produção do trigo;
(1-187-192) .
• Clima e sua influência na terra; (1-193-256) e (1-311-437),
• Tratamento de sementes; (1-193-196).
• Seleção de sementes; (1-197-199).
• Épocas para sementeiras; (1-215-230).
• Fava de p'rimavera; (1-215).
• Feijão; (1-227).
• Trigo espelta; (1-219).
• Cevada; (1-210).
• Luzerna; (1-215).
• Vida dos Camponeses; (1-257-310).
• Época para abater árvores; (1-256).
• Atilhos para colheita; (1-265).
• Anobe; (1-295-296).
• Pez; (1-275) e (11-438).
• Sega de restolhos e ervas pastenses; (1-289-290).
• Caça e pesca; (1-307-310).
• Previsão do tempo; (1-311-355); (335-337), (351-355), (361,
460) .
• Ritos Rurais; (1-338-350) e (11-393-396) .


No 11 Livro das Geó~gicas os assuntos tratados são:

• Produção por estacas; (11-24-25).


• Enxertia; (11-32-34) e (69-82).
• Castas de oliveira e tipos de azeitonas; 111-85-86),
• Castas de videiras e tipos de uvas; (1I-89-108),
• Árvores e plantas exóticas; (11-114-135).
• Árvores reno 'escentes; (11-150).
• Caracteres das terras; (11-177-225).

- 178-

• Densidade da plantação das vinh3s; (11-274-277).


• Disposição a dar às carreiras de cepas; (11-277-287).
• Época para meter bace'o; (11-319-322).
• Exposição a dar às vinhas; (11-298).
• Cava e lavra da vinha; (II-354-357) e (397-401).
• Ânimo das videiras; (II-358-361).
• Esladroamento; (11-365).
• Poda da vinha; (11-407).
• Despana; (11-410).
• Raspa da vinha; (11-411).
• Cultura da oliveira; (11-420-425).
• Ârvo-es florestais; (11-429-457).
• Processo de formação de árvores; (11-931).

* *
*
IH. - CONCLUSÃO.

o grande perigo em que incidem muitos estudiosos da literatura


clássica ao estudarem a obra de Vergílio é o de esquecerem a crono-
logia, o meio e sua importância no estudo das obras literárias. Es-
quecem de estudar "o momento histórico" daí uma visão incompleta
do pensamento do autor. Raciocinam, julgam, analisam as obras clás-
sicas com mentalidade moderna, com idéias desta época.
Até onde podemos aceitar este processo simplista de encarar os
fatos? Até onde podemos generalizar o pensamento dos autores de
uma época esquecendo-lhes a formação e influências recebidas? Até
onde podemos afastar estas influências e a do meio em que viveram,
atribuindo às obras de um autor apenas a vontade de um homem, aos
seus interesses?
Estas e muitas outras perguntas ficariam sem resposta se fossem
feitas àqueles "especialistas" em Vergílio que enquadram as Geór-
gicas em uma chamada literatura engagée, atribuindo-a aos planos de
governo de Augusto.
O estudo superficial que empreendemos sobre Vergílio e as Geór-
gicas revelou-nos um campo imenso a explorar dentro da temática
proposta. Não sentimos em relação a obra mencionada, considerando
como fizemos o período em que foi escrita, o propalado envolvimento
de Vergílio e seu comprometimento com Augusto. Não compreende-
mos como acusa-lo sem apelo em nome da "crítica",
- 179-

e precil'o compreender o poeta em seu momento, reconhecer


seus escrúpulos, seus anseios, sua boa fé, seu ardor patriótico, seu
amor à tradição romana, enfim sua alma de camponês. Só poderemos
emitir um juizo desapaixonado sobre sua obra conhecendo com maio-
res detalhes sua vida, sua ligação com a sociedade em que viveu, com
a legislação, costumes e literatura geral do seu país (48).
Neste Ensaio introdutório à obra de Vergílio, procuramos desco-
bir estas influências. Elas vieram da tradição que tanto amou, de sua
educação campesina refletida nos louvores que faz ao campo nas Geór-
gicas; do meio conturbado pelas "Guerras Civis" em que viveu que o
levariam a desejar a Paz, cantada nas Bucólicas e que conseguida ins-
piravam ao poeta e elogio àquele que a trouxera para Roma e a pátria
glorificada através da Enêida.
Vergíliv foi um dos gênios mais completos e harmoniosos da His-
tória das Letras. Com seu coração terno e casto, seu amor pelos ani-
mais e pelo campo, por toda a natureza, espalhou ternura por tudo
que via, e o que via animava para fazer amado (49).
Enquanto para Catão a terra era instrumento de lucro, para Ver-
gílio ela era a "deusa que alimenta", a mãe de todos os seres.
O poeta vê, compreende todo o círculo da Vida Universal e no
entusiasmo de sua Ciência Poética desenvolve o grito que é o da hu-
manidade: Felix qui potuit rerum concnoscere causas (50).
As cordas do seu coração vibram pela grandeza de sua Pátria,
que chama a mais bela das coisas, (Serum pulcherrima). Seus senti-
mentos e suas lembranças, recobre-os da mais suave poesia.
Nas Geórgicas, Vergílio não é somente poeta, ao estudar os ecos
distantes do passado, ao recorrer a tantas fontes sobre seu tema, faz
também obra de ciência fazendo obra didática (51) . Tentou, através
da poesia, o que os Gracos tentaram pela lei, reviver o gosto do tra-
balho e das virtudes rústicas (amor do divino esplendor dos campos,
Divina Gloria Ruris (52) . Na Enêida procurou recordar os feitos ro-
manos (Gesta popoli romani), revitalizando entre os romanos o culto
dos deuses (Deve-se honras aos deuses - esta era a palavra de ordem
de Augusto também) e dos herois da pátria.

(48). - Vide CIRIBELLI (Marilda), Historiografia na Época de Au-


gusto, onde defende pensamento idêntico em relação à obra de Tito Iívio.
(49). - DURUY (V.), Histoire des Romains. vol. IV, p. 124.
(50). - VERGlLIO, Eneida. IX, 448.
(51). - VERGíLIO, Eglogas Y GeÓrgicas. Tradução de José Velasco
Y Garcia. Glem s/do
- 180-

As Geórgicas são o elogio do trabalho santificado pela religião e


recompensado pelos deuses, enquanto a Enêida a glorificação da mo-
narquia consagrada pela vontade e proteção divina.
Nas Geórgicas o poeta transcende seu obíeto, o autor expõe sua
concepção do mundo e da vida, ao lado do lirismo que transparece
nos quadros da vida do campo, repletos de emoção e piedade.
As Geórgicas são um poema didático. de profundo lirismo que
refletem o pensamento político do autor e que por seus ensinamentos
sobre a Agronomia romana são fonte de grande importância para o
estudo da Agricultura romana.
• •

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TOVT
A PROPRIEDADE RURAL NO BAIXO-IMPÉRIO
ROMANO (193-395) (*).
(Resumo) .

MARIA REGINA E EURIPEDES SIMÕES


DE PAULA
do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Filoso-
fia, Let:as e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo.

o domínio rural.

Uma das causas do declínio da escravidão teria sido a concentra-


ção em imensos latifúndios das grandes e pequenas propriedades rurais
no Baixo-Império, balis.ado no período de: 193-395 a. D.
O domínio rural geralmente estava dividido em duas parcelas,
uma que o senhor cultivava diretamente, ou melhor, cultivava através
das corvéias dos "seus homens", e a outra que era composta de pe-
quenas tenures, cultivadas por escravos casati, por tributarii, ou de uma
maneira mais comum pelos coloni originales. Essas pequenas explora-
ções agrícolas, partes integrantes dos grandes domínios, tornar-se-ão os
mansi da Idade Média; sua extensão parece ter sido determinada em
função de uma unidade fiscal.
Ausônio (309-392) (1) nos fornece as dimensões do que ele
chama de "propriedade média": 60 hectares de campos cultiváveis, 25
de vinhas, 12 de pastos, 175 de florestas, ao todo 260 hectares (1 hec-
tare = 10. 000 mts 2 ) . Os ricos possuíam grupos de grandes domínios
(massae fundorum). Nesses domínios existia muitas vezes uma aldeia.

(*). - Comunicação apresentada na 1\l Sessão de Estudos, Equipe A,


no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - J:'ílios, III, 21. Decimus Magnus Ausonius, poeta latino, nas-
ceu em 309 em Burdigala (Bordeaux) e morreu mais ou menos em 394. Era
filho de um senador. Estudou ret6rica na sua cidade natal, tendo sido encar-
regado da educação do jovem imperador Graciano (375-393). Foi questor,
governador da Itália, Af:ica e -das Gálias, consul em 379 e depois pro-consul
da Asia. Na velhice, retirou-se para sua região natal onde compôs suas
obras. DeixÇ)u-nos epigramas, idílios, éslosas e epístolas. .
- 184-

Paládio (2), no seu manual agrícola. redigido no fim do IV século


diz que era obrigatória a existência nos domínios de artesões de todas
as especialidades: carpinteiros, tanoeiros, ferreiros, oleiros, etc., a fim
de que os camponeses, por qualquer pretexto, não procurassem ir até
a cidade mais próxima (3). Catão (234-149 a.C.) (4) ao contrário,
aconselha aos proprietários efetuarem suas compras nos mercados pró-
ximos. No IV século havia, pois, uma tendência à economia fechada,
em que cada propriedade devia bastar-se a si própria.
O peso dos impostos obrigava os proprietários a manterem uma
exploraçã<.' agrícola mais científica e daí decorreu a necessidade de in-
corporar-se ao custo de produção uma parte crescente dos lucros. O
campo, dizia Símaco (340-402) (5), que outrora alimentava as fortunas,
devia agora ser alimentado. Dizia ser essencial que houvesse uma
justa proporção entre o número de trabalhadores e a extensão cultiva-
da, a fim de que toda propriedade pudesse ser cultivada para que não
houvesse pessoas a mais a serem alimentadas.
Conhecemos mal o progresso da técnica agrícola do IV seculo.
O declínio da escravidão deve ter tido como corolário o desenvolvi-
mento do lI'aquinismo. Paládio chega mesmo a descrever uma colhe-
deira mecânica que teria funcionado na Gália (6) .


(2). - Rutilius Taurus Aemilianus Palladius, agrônomo latino, que
se acreditava ter vivido no IV século a D. Parece ter sido filho de Exsupe-
rantius, prefeito das Gálias. Estudou Direito na Gália e em Roma. Depois
fixou-se na Campânia. Deixou 14 livros (De Re Ruslica), inse.idos na cole-
ção dos Rei ruslicae Scriplores. Esse tratado nada mais é do que uma com-
pilação de Columela, Gargílio Martial e dos Geoponiques gregos. É uma es-
pécie de almanaque, que indica os trabalhos agrícolas que devem ser feitos
mês a mês. Dos 14 livros, 12 são consagrados às instruções mensais; o 19
contem preceitos gerais e o 149 um poema sobre o enxerto, esc:ito aliás com
elegância.
(3). - I, 6; VII, 8. Apud André Piganiol, L'Empire Chrélien (325-395),
in "Histoire Romaine", Coleção Glotz. Tomo IV, 2' parte, p. 280. Obra que
nos serviu de base para estas modestas notas.
(4). - M. Porcius Cato, chamado Catão-o-antigo ou Catão-o-Cen-
soro Nasceu em Tusculum em 243 a.C. de uma família obscura. Foi exce-
lente na jurisprudência e na agricultu~a. Tornou-se célebre pelo fecho que
imprimia em todos os seus discursos: Delenda Carthago. Catão é censurado
pelo seu amor ao vinho e pela avareza, que é patente na sua obra De re ,usli-
ca.
(5). - I, 5 (376): namque hic usus in noslram venil aelatem, uI 'us,
quod solebat alere, nunc alatu,.
Q. Aurelius Anicius Symmachus, orador e estadista. Foi prefeito de
Roma em 364. Protetor
185 -

A aldeia de camponeses livres.

o discurso de L:bânio (314-393) (7) sobre o patronato deixa


transparecer a oposição entre a aldeia que pertencia a um único pro-
prietário e a aldeia que era de muitos pequenos proprietários.
O Estado procurava estabelecer uma solidariedade fiscal entre os
camponeses, pois os membros duma comunidade eram responsáveis soli-
dariamente perante o fisco. Daí a tendência do desaparecimento desse
tipo de aldeia.

Os bens das cidades.

Não há mais motivos para falar-se, nessa época, de ager publicus.


Todos os bens do Estado foram incorporados ao patriotismo imperial
e isso desde a época de Vespasiano (65-79). Mas no início do século
IV cada cidade possuia ainda um patrimônio rural, que era oriundo
provavelmente das terras que tinham permanecido indevisás quando
da sua fundação, ou provenientes de doações (8). Ignoramos em que
data essas terras públicas, disseminadas por todo o Império, foram
absorvidas por sua vez pela administração dos bens da coroa. Essa
grande reforma deve datar do reinado de Constâncio (352-361), pois
o imperador Juliano-o-apóstata (355-363) a aboliu e entregou às ci-
dades as suas rendas (9). Posteriormente, foram as cidades novamente
despojadas desse rendimento. Em seguida, receberam 1/3 das rendas
com a condição de aplica-las na manutenção das suas muralhas (10).
Os bens dos templos permaneceram vinculados ao das cidades.
Desde o Alto-Império as cúrias assumiram o controle de suas rendas
e as entregavam aos padres. Tambem no Alto-Império proib:u-se às
cidades alugarem as suas terras por um prazo longo e aos decuriões
de arrenda-las. No Baixo-Império deu-se o contrário, o aluguel per-
pétuo toma:-se o mais comum e os decuriões aparecem como seus ar-

(7). - Libanius. Retor grego, nasceu em Antioquia em 314 a.D.,


ensinou com sucesso nas escolas de Constantinopla, N icomédia e Antioquia.
Apesar de ser pagão contava entre seus discípulos com São Basílio e São João
CrisÓstomo. Juliano-o-apóstata o tinha em alta conta e talvez isso tenha con-
tribuido para a acusação de magia que pesou sobre ele.
Fato que acarretou seu banimento temporário (346). Morreu em Antio-
quia, circa 390. Temos dele os seus Discursos. O resto de sua obra pe:deu-se.
(8). - Código de Teodósio, XII, I, 6.
(9). - Ammiano Marcelino, XXV, 4, 15: vectigalia civitatibus reddi-
ta cum fundis.
(lO). - Código
- 186-

rendatários. Fato bem sintomático de concentração das propriedades


em mãos de muito poucos.

Os bens da coroa.

No Alto-Império o imperador confiava as suas terras aos seus


intendentes (procuratores); estes as alugavam a arrendatários (con-
ductores), cujos alugueis eram renovados periodicamente. Os campo-
neses tinham o direito de ocupar as terras sem lavrar abandonadas pe-
los condl-lctores. Beneficiavam-se de uma imunidade temporária, e
pelo fato de as ter valorizado, adquiriam uma posse temporária. Pelo
menos é o qlle conhecemos no caso da África, onde, desde o fim da
República essa posse foi regulamentada por uma lei: a lex Manciana.
No Baixo-Império esses casos são muito conhecidos. Os co 11-
ductores a curto prazo foram substituidos por arrendatários de longa
duração que conseguiram uma enfiteuse (emphyteuticarii) ou mesmo
o título de posseiros perpétuos (perpetuarii) que compraram seu di-
reito (jus perpetuum salvo canone) porque comportava o pagamento
de uma renda (canon). Os camponeses conseguiram manter o direito
d~ locação perpétua, hereditariamente transmissivel, que importava no
pagamento de um imposto e de uma taxa de arrendamento. Na África
foram as culturas mancianas que mantiveram esse tipo de locação,
que aliás duraram até a invasão vândala (11).
*
Os bens do imperador.

O termo res privata designava o conjunto das terras teoricamente


geridas pelo imperador. Distinguimos nessas propriedades: de um la-
do os bens propriamente ditos da coroa ou arrendados hereditariamen-
te (patrimonium) e de outro, os bens privados do imperador (res pri-
vata). Neste último caso estão as villae, geridas pelos seus actores.
Esses bens aumentavam com os confiscos mas diminuiam com as li-
beralidades do príncipe (12).
*
As terras abandonadas.

O problema das terras abandonadas e desertas começou a inquie-


tar o Império desde o fim do 11 século. A gravidade do problema é

(11). - Ibidem. V, 13, 30: sibi habeat, suis reliquant.


(12). - Ibidem. VII, 2, 11; XI, 5, 6 (349); Código
- 187-

bem visivel nas leis do IV século, pois o Estado foi obrigado a renun-
ciar à percepção de impostos dessas propriedades rurais, por não ter
de quem cobrar.
Como as forças do trabalho não eram suficientes para cultivar to-
das as terras, as consideradas de má qualidade eram simplesmente
abandonadas. O Estado reagiu contra isso porque essa prática dimi-
nuia suas rendas fiscais. Proibiu
BREVE NOTA SOBRE ABU-YUSSUF (*).

JOUBRAN JAMIL EL MURR


da Faculdade de FilC'sofia, Letras e Ciências Humanas
da Universidade de São Paulo

Tendo em vista o temário do VIII Simpósio da Associação Na-


cional de Professores Universitários de História (ANPUH), sobre pro-
priedade rural, resolvemos fazer um estudo sucinto quanto à questão
no Islão. A primeira razão que motivou essa pesquisa foi o fato de
termos ouvido dizer, quase sempre, que a propriedade nos primórdios
do Islão, e até mesmo durante muitos séculos depois, era comum. O
trabalho ora apresentado não tem a pretensão de dar uma resposta ca-
bal no atinente ao problema suscitado, limitando-se a algumas consi-
derações a respeito. Mais ainda, nossa principal preocupação será nos
atermos mais propriamente à figura de Abu-Yussuf e à sua obra pio-
neira nos anais da jurisprudência muçulmana: Kitab al-Kharadj (1);
(*). - Comunicação apresentada na 3\1 Sessão de Estudos, Equipe A,
no dia 6 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
( 1 ). - Epístola dirigida ao mais conhecido califa abássida, Harun
ar-Rashid. Não recebeu uma redação definitiva pois o Fihrist o faz figurar entre
os amáli, ditados, coletados pelo seu discípulo Bishr. Segundo Brockelmann que
não cita fonte, o redator teria sido Muhammad b. al-Hassan ash-Shaibani.
Sofre, como acontece com muitas obras que nos foram legadas, acréscimos,
mutilações, interpolações e outros tipos de erros cometidos por copistas. E.
Fagnan que faz a t~adução do texto de Bulak, para o francês, impresso em
1312. Refe:e-se à existência de outros manuscritos em Paris, Constantinopla e
Berlim que lhe permitem confirmar a opinião supra-cita. O editor do texto de
Bulak, nas poucas notas que apõe à obra faz crer ter tido acesso a mss. sem especi-
fica-los, até cita um sharh. comentário, que não deve ser senão anotações à mar-
gem ou interlineares. Fagnan refere-se ainda a uma tradução para o turco de
1094, por Rudussi-Zadeh. Menciona tambem um trabalho em italiano: Il Kitab
al-Kharai. o Libro de Imposto, de P. Tripodo, Roma, 1906. Infelizmente não
pudemos ter em mãos estas obras acima referidas, o que permitiria enriquecer
este trabalho com comparações. Traduzido por E. Fagnan como O Livro do
Imposto Territorial ou Fundiário. Trata-se de todo um corpo de regras e en-
sinamentos que se aplicam à terra conquistada pelos muçulmanos e cuja pro-
- 190-

prendendo-nos menos ao conteudo total do livro que se estende pro-


longadamente sobre vários tópicos de Shari'a (2). Isto não significa
necessariamente um menosprezo pela obra, mas traduz, pelo contrário,
nosso propósito de nos mantemos dentro do balizamento inicialmente
estabelecido de darmos apenas um ligeiro esboço da figura luminar do
seu autor, conforme explicitamos no título por nós escolhido. Não se
poderia fazer uma análise exaustiva porque isso seria uma tarefa para
um trabalho de maior amplitude e profundidade que não corresponde,
em realidade, ao momento presente.

Abu-Yussuf·

Seu nome completo é A bu-Yussuf Y a' qub ibn lbrahim l-Ansari


l-Kufi. Não se sabe ao certo a data de seu nascimento embora se dê
a do ano 113 H. como a mais provavel; a de sua morte é 182 H.
(713-798 a.D.). É de origem puramente árabe, seu ancestral Sa'id i.
Habta era jovem no período em que o Profeta permaneceu em Medina;
AI-Khatib I-Baghdadi dá-nos amplos detalhes de sua genealogia.
Abu-Yussuf foi um dos principais fundadores da escola Hanifita
de jurisprudência, em Kufa, fazendo-a se sobressair e se rivalizar com
a de Bosra. Estudou em Medina e Kufa tendo sido seus principais mes-
tres Abu Hanifa, Málik ibn Anas, al-Laith i. Sa'id e outros. Alem de
seu grande saber em direito islâmico e Hadith (3) seus escritos e as
citações a ele atribuidos pelos seus discípulos revelam-no douto em
exegese corânica e história pré- e pós-islâmica. Apesar disso, apresen-
tava-se modesto, declarando-se incapaz de responder a cinco questões
que lhe foram formuladas por Abu Hanifa, segundo nos revelam fontes
árabes.
Entre os discípulos mais eminentes, alguns dos quais preservaram
e elucidaram o pensamento de seu mestre, Muhammad ibn al-Hassan
ash-Shaibani é o mais ilustre. Em sua obra: Kitab l-Makharej f-il Hiál,
( 4), boa parte do pensamento de Abu-Yussuf é apresentada. Outros
não menos importantes para o conhecimento e apreciação da doutrina
legal de Abu-Yussuf são Ahmad ibn Hanbal e Bishr ibn al-Walid Kin-
di. Nos trabalhos que os três legaram ao saber jurídico muçulmano
(2). - É o termo que designa o direito canônico muçulmano. Baseia-
se no Alcorão, no Hadith, e nas inte.pretações dos doutos da lei islâmica.
(3). - Ao pé da letra significa, fala, diálogo, conversação embora con-
textualmente refira-se à tradição. É o corpo de tudo que o Alcorão não abrange
em termos de jurisprudência e designa tudo que foi recontado por qualquer
pessoa que tenha convivido com o Profeta ou seus familiares e que é confi mado
por terceiros. Recorre-se ao Hadith para assentar quaisquer disputas e para
firmar jurisp~udência e aplicar as leis. É um corpo extenso composto de al-
gumas dezenas de volumes.
(4). - O
- 191-

aparece visivel a marca de Abu-Yussuf. Reproduzem-se ali discussões


e polêm:cas em torno de todos os assuntos e questões que afetavam a
vida cotidiana do califado e dos súditos, não apenas no relacionamento
de um muçulmano com outro, mas tambem nas relações de ambos com
os demais elementos, de outros credos, ao abrigo dos estandartes do
Islão.
Não obstante sua humilde origem Abu-Yussuf galgou o mais alto
posto de hierarquia judiciária do Califado: Cadi dos Cadis (5). Ne-
nhum juiz podia ser nomeado, sem o crivo de sua aprovação, para qual-
quer uma das regiões do vasto império árabe. Ainda em vida vê seu
filho, Yussuf, nomeado cadi para um dos setores de Bagdá. Da sua
extensa obra a mais importante e a mais discutida é Kitab al-Kharadj
e que nos chegou às mãos editada por E. Fagnan, grande orientalista,
em 1921. Outras obras a ele atribuidas são:
a). - Kitab -l-Hiál, O Livro das Artimanhas;
b). - Kitab -l-Athár, O Livro dah tradições;
c). - Kitab Ikhtiláf Abi Hanifa ua Ibn Abi Laila, O Livro de
Discordância entre Abu Hanifa e Ibn Abu Laila;
d). - Kitab r-Radd 'ala Siár l-Auzá'i, O Livro de Respostas
às Opiniões de Al-Auzá'i.
O segundo e o terceiro livro foram editados no Cairo em 1355
a.H. e 1357, respectivamente; o primeiro tratando das tradições cúfi-
cas e o segundo discorrendo sobre as divergências de dois doutrinários
tambem da escola cúfica. No último Abu-Yussuf refuta as colocações
do estudioso sírio no tocante às leis de guerra.
Alem dos títulos acima que, segundo outro orientalista, J. Schacht,
são indubitavelmente da autoria de Abu-Yussuf, o Fihrist (6) lhe atri-
bue mais dois, de natureza comparativa e polêmica: Kitab Iktiláf
-l-Amsar (7) e Kitab -r-Radd 'ala Málik I. Anas, O Livro de Respos-

(5). - Qadi l-Qudat, juiz dos juizes, título dado a Abu-Yussuf, pela
primeira vez na história das instituições islâmicas e que passa a ter, m1is tarde,
quando da decadência do império árabe, um caráter meramente honorífico. No
caso presente designava uma série de funções cujo exercício cabia ao seu de-
tentor a principal delas sendo opinar sob:e nomeações de todo e qualquer cadi.
(6). - Trata-se de uma obra mo~umental compilada por Ibnan-Nadim
antes do surgimento da arte de impressão no Islão. Contem uma listagem sistemá-
tica de todas as obras que se conheciam na época constituindo-se num1 valiosa
fonte de referência. An-Nadim era um livreiro e vivia em Bagdá. Realizou
este trabalho de dez volumes entre 987/88 a. D. Os seis primei os referiam-se
a escritos islâmicos sobre o Alcorão, gramática, história, belas letras, poesia,
filosofia escolástica e direito. Os demais sobre filosofia, ciências, lendas, fá-
bulas, seitas, credos e alquimia. Em cada volume há um retrospecto do assun-
to ali tratado e seu desenvolvimento, tudo o que existe escrito a respeito, alem
de dados bio e bibliográficos de seus auto:es.
(7). - O
- 192-

tas a Málik ibn Anas. Em seus escritos revela interesse pela teoria do
direito embora não lhe tivesse dedicado estudos específicos, pelo menos
tais estudos não chegaram até nós. Reconhecia, como seu mestre, Abu
Hanifa sobre cujo pensamento legal assentava suas formulações. A di-
ferença mais notavel entre ambos reside no fato de Abu-Yussuf apoiar-
se na tradição. Às vezes divergia dele, nem sempre para melhor e,
em momentos vários, mudava, com demasiada frequência, de opnião,
talvez devido as suas funções de juiz. Todavia, deve-se a ele o desen-
cadeamento do processo de superação da antiga escola iraquiana pela
dos adeptos da doutrina de Abu Hanifa.
Não se sabe ao certo se sua nomeação deveu-se a al-Mahdi, al-
Hadi ou a Harum r-Rashid. Sabe-se entretanto que tomou-se amigo
deste último principalmente devido à sua capacidade de sempre encon-
trar uma saida legal para os problemas que lhe eram submetidos por
Harum. Aliás, sua principal obra, Kitab al-Kharadj é dirigida a ele:
"Queira Deus 'Alah' prolongar os dias do Príncipe dos Cren-
tes (Amir-I-Mu'minin) e fazer perdurar seu poder em completa
prosperidade e perene consideração! Possa Ele, aos seus bene-
fícios neste mundo acrescentar os da outra vida, eternos e sem
fim e lhe oferecer a companhia do Profeta, bendito seja".

Seu relacionamento com o Califa era extremamente cordial, fi-


gurando entre seus principais conselheiros.
Após dedicar sua obra ao ar-Rashid Abu-Yussuf dá-nos a justifi-
cativa de escreve-la:
"O P. íncipe dos Crentes, ... , pediu-me que lhe escrevesse um
livro contendo as regras que devem reger o recebimento do
imposto territorial, os dízimos, ... , os tributos onde eu exponho,
explico e comento os princípios segundo os quais se deve agir.
Tal é a finalidade deste livro".

Kitab aI Kharadj.

No comentário que se fará a seguir, para facilitar a eventuais con-


frontações com o texto, dar-se-á após cada citação entre aspas o nú-
mero ou números de páginas, em algarismos arábicos, da edição de E.
Fagnan. :B escusado dizer que as citações são traduzidas.

A primeira preocupação de Abu-Yussuf


- 193-

"Allah que ajusta rapidamente as contas paga a cada um a


retribuição daquilo que ele ganhou, pois Allah é Allah" (p. 3).

Para enfatizar a necessidade de uma conduta virtuosa acrescenta


logo a seguir:
"O mundo é perecivel, os homens são mortais, enquanto que
a vida futu.-a é eterna. Não deixeis pois para amanhã o serviço
de Allah, seguindo destarte o caminho dos transgressores, pois, é
devido às suas obras e não às suas posições que o Juiz Supremo,
no dia de acerto de contas, recompensará as criaturas".

Depois de discorrer durante algum tempo sobre um tratamento


condizente com as leis corânicas formula o seguinte anseio:
"Espero que se agires segundo as regras que expus, Allah
te permiti~á, sem prejudica~ nem um mu;u'mano nem um alia-
do (mu'dhed) , de aumentar o produto do imposto territorial e
de predispo: melhor teus súditos para contigo, pois, a prosperidade
deles depende da aplicação das leis escritas que lhes é feita, da
supressão da injustiça que os oprime e dos prejuizos que eles so-
frem reciprocamente quando existem dúvidas quanto às obriga-
ções que lhes são devidas" (p, 6),

Fiel ao seu apego às tradições e ao bom exemplo expõe ao Calüa


as recomendações dadas por um seu antecessor a um 'amil (8) que
nomeara para a cidade de 'Okbera:
"Cuide bem para preservar a totatilidade do khara;'j sem
fazer concessões nem deixar perceber nenhuma fraqueza". Di-
tas estas palavras em público pediu ao seu preposto que vo~tasse
a se encontrar com ele e lhe disse: "Se eu (Ali b. Abi Táleb)
te falei deste modo em presença dos teus administrados é po'que
eles são enganadores po: vis artimanhas. Tenha cuidado quando
os encontrares e não lhes venda, nem no verão, nem no inverno,
nenhuma vestimenta, nenhum dos produtos que lhes sirva de
alimento, nenhuma besta-de-carga que emp,eguem; a nenhum den-
tre eles subtraia dinheiro, nem os faça ficar sobre um pé só (pro-

(8). - Uma das várias conotações que apresenta, refere-se ao agente


ou funcionário nomeado pelo governo principalmente, isto é, cuja principal
função é a de coletar impostos. No começo eram escolhidos pelo p!"óprio Pro-
feta para recolher as sadaqát, ou zakat, dízimo dos muçulmanos e os tributos e
impostos de não muçu'manos. Poderia significar tambem governante nos pri-
mórdios do período abássida. Em certas instâncias eram apontados pelo próprio
povo. O termo ocorre no Alcorão (ix, 60)
- 194 -

cesso de intimidação para obriga-los a pagar, não lhes venda ne-


nhuma me:cadoria cujo preço seja computavel a seu favor pelo
kharadj, pois a ordem que nos foi dada é de lhes tomar apenas o
excedente (Ale. vii, 191). Se te opuseres às minhas ordens, é
Allah que na minha falta te punirá, e, se ouvi: que tu me tenhas
desobedecido serás destituído" (p. 23).

Dá conta a seguir de que a execução das normas ditadas por Ali,


o quarto Califa, segundo a tradição corânica
"em nada diminui o produto do kharadt' (p. 24).

Sabemos que nas primeiras suras do Alcorão o fiel é conc1amado


a dar do seu excedente para a divisão entre: a). - o Profeta; b). -
seus próximos; c). - os órfãos; d). - os pobres e e). - os andari-
lhos. O texto do vers. 41, Sura viii, diz:
"Sabei que, de tudo quanto despojardes do adversário, a
quinta parte pertencerá a Deus, ao Apóstolo e seus parentes, "os
orfãos, aos indigentes e ao viandante" (9).

Este cumprimento do preceito religioso, principalmente durante


os primeiros Califados, foi a norma que prevaleceu. Ouçamos o que diz
outra Sura:
"Os donativos são tão somente para os pobres, para os necessi-
tados, para os arrecado-es, para os indecisos, para a redenção dos
cativos, para os devedores, para a causa de Deus (os que estão
a serviço, seus exércitos) e para o viandante" (10).

No período Abássida, a esta altura apresentando uma estrutura de


poder marcadamente mais complexa, Abu-Yussuf nos dá conta de um
sistema extremamente elaborado de fixação de tributos segundo o qual
o imposto dependia do tamanho da propriedade, espécie de produto,
sua proximidade ou afastamento das cidades, tipo de aguada que rece-
bia: de chuvas, de rios, de canais, etc. Em linhas gerais, este sistema
de taxação obedecia igualmente aos preceitos religiosos que norteava
o kharadj nos primórdios do Islão.
À página 28, referindo-se à tradição da partilha do butim, cita
um dos companherios do Profeta que com ele esteve durante a batalha
de Badr (uma das primeiras ganhas por Maomé), dá a seguinte infor-
mação que não deixa de ter algo de pitoresca e revela a sensualidade
do árabe:

(9). - Alcorão - trad. de Samir al-Hayek, com prefácio do Xeque


Abd AlIah Abd ash-Shakkur Kámel, Ed. Tangará, São Paulo, 1975.
(10). - Op. cito
- 195-

"Em Badr, o Profeta dividiu o butim a razão de duas partes


por cavalei:o e uma por infante. Al-Ghifari me relatou: 'meu
irmão e eu estávamos em Honein em companhia do Profeta e
cada um de nós tinha seu cavalo; o Profeta nos atribuiu seis
partes: quatro para nossas duas montarias e uma parte para ca-
da um de nós. Empregamos essas seis partes para comprar duas
virgens em Honein".

Evidencia-se por este trecho a importância da cavalaria como ele-


mento de estratégia militar e isso nos recorda as aulas do nosso mestre
no curso de graduação, Prof. Eurípedes Simões de Paula. Percebe-se
tambem o valor que tinham as virgens; referimo-nos aí, obviamente,
ao conteudo do texto de Abu-Yussuf.
Outro aspecto interessante que o livro aborda diz respeito aos
metais. O produto das minas de ouro, prata, cobre, ferro e chumbo,
seja nos paises árabes ou estrangeiros era tratado como butim, isto é,
dividido em quintos que tinham a meSillla destinação prescrita no Al-
corão e nos Hadith. Tratavam-se igualmente objetos de valor e o
âmbar retirado do mar.
Extremamente importante e elucidativo no atinente à questão que
motivou este trabalho é o relato que vem a seguir e que revela a filo-
sofia que ditou a política do uso de solo. A tradição citada é atribuida
ao Califa Ornar b.-l-Khattab e aparece na p. 37. Bilal b. Rabah e
seus companheiros pediram ao Ornar que procedesse a seu favor na
divisão dos territórios do Iraque e da Síria que "Allah fizera cair em
suas mãos", dizendo-lhe para dividir estas terras da meSillla maneira
que a do butim. O Califa recusou-se a faze-lo:
"Allah vos deu por associados na divisão deste feyy (11 )
aqueles que vi. ão depois de vós; se eu o dividisse entre vós nada
sobraria para eles: e se (estas terras) ficarem tal qual, o pastor
de San'a terá sua parte neste feyy sem que tenha de enrubescer
para a reclamar".

(11). - No período pré-islâmico designava luc:o proveniente de saque


para ser dividido pelos vitoriosos em 4 ou 5 partes, ghanima, cabendo uma ao
chefe. O hábito foi adotado pelo Profeta depois da batalha de Badr. Teori-
camente, sua explicação baseia-se no significado de afa'a, "t:azer de volta",
aquilo que por direito pertence a Deus e, consequentemente, à sociedade muçul-
mana (Sura lix, 7). Já a Sura xxxiii, 49 dá idéia de outra conotação: recebi-
mento anual de lucros. Alem disto, outros teóricos acham dificil definir o
vocábulo. A persistência dos costumes beduinos teria deixado a possibilidade
de dividir os 4/5 entre as tropas conquistadoras em vez de permanecerem co-
mo terras do Estado. Outra
- 196-

Na página seguinte, este mesmo Ornar, numa epístola dirigida ao


seu comandado Sa'ad b. Abu Waqqas, após a conquista do Iraque,
instruiu-o quando à divisão:
"Daquilo que AlIah fez chegar às suas mãos deixe as terras
e as ribei 'as dos rios àqueles que as fazem produzir para que o
produto seja consag~ado ao usufruto cos mu;ulmanos".

Isto nos perm:te concluir que havia, nesse momento da história


árabe, a preocupação de não despovoar as zonas agrícolas nem per-
mitir qualquer instabilidade no fluxo de sua produtividade, embora a
finalidade expressa fosse a de preservar os direitos daqueles "que vies-
sem depois". Nesta mesma instrução Ornar sab:amente acrescenta:
"Qual será pois, no futuro, a sítU1Ção dos mu;ulmanos (la-
mentavelmente não diz árabes) que encontrarão, como conse-
quê.lcia de uma divisão anterior, o solo e seus habitantes com pro-
priedades hereditá: ias e detentores de sua posse." (O grifo é
nosso) .

Aliás, O próprio Ornar conclui assim:

"Isto não é razoavel".

É mui digna de registro a visão que o Califa Ornar antepõe em


relação ao futuro, pois não lhe faltou o assédio e a sanha dos conquis-
tadores no sentido de uma partilha permanente da terra, coisa em que
não consentiu. Ouçamos seus argumentos:
"Ce, tamente depois de mim não se farão mais cO,:quistas
de regiões tão ricas; é possivel mesmo que os acréscimos poste-
riores se transformem numa carga para os fieis. Qumdo eu
tiver repartido o solo do Iraque e seus habitantes, o solo da
Síria c os seus habitar.tes como proceder à defesa das fronteiras?
O que ~estará nesta região e fora dela para as necessidades das
criança,s e dos pobres da Síria e do Iraque?"

Patenteia-se pelo exposto a preocupação em construir um império


duradouro. Aliás, e não obstante profundas diferenças, não é
- 197-

mo Simpósio pelo Prof. Dr. Helmi M. I. Nasr). As divergências sus-


citadas diante de tal prob!emática são apresentadas por Abu-Yussuf,
num relato às pp. 40 e seguintes. Os companheiros de Maomé, quer os
Muhadjirun, os emigrados que o acompanharam de Meca; quer
Oi) 'Ansar, partidários medinenses que aderiram à sua doutrina e o
ajudarem em sua causa, não estavam de acordo. Uns defendiam, ou-
tros refutavam a partilha. Ouçamos Abu-Yussuf:
"Ele (Ornar) convocou dez respeitáveis ancmes dentre os
Ansar, cinco sendo Ausíats e cinco Khuradjitas, aos quais se diri-
giu nos seguintes termos: "Eu apenas vós incomodei para fa-
zer de vós co-participantes da lealdade com a qual gero vossos
negócios, dos quais eu suporto o peso. Eu não espe"o nada alem
de que cada um dentre vós, e hoje eu vo·lo peço, diga qUlI é
o p 'ocedimento correto; aquele que desejar que comb::ta a mi-
nha opinião, aquele que desejar que a compartilhe, eu não forço
ninguem! (louvavel espírito democrático). A situação sendo tal,
vós tendes um livro vindo de Allah e que contem a verdade;
jU"O que quando me pronuncio em qualquer situlção nada busco
além da ve:dade'. 'Fa!e Príncipe dos Crentes, nós te escutamos'.
- 'Ouvistes falar que esta gente pretende que eu os estou le-
sando nos seus direitos. Que Allah me guarde de cometer qU1I-
quer injustiça! Se eu os prejudiquei em algo que lhes pertença e
que eu tenha dado a outrem, serei verdadeirame:lte infeliz, mas
eu acreditava que nada mais nos restava conquistar !epois do país
de Kis"a (Chosl'Oes) cujas riquezas, solo e habitantes Allah nos
deu. Fiz a divisão das riquezas mobiliárias entre aqueles que as
haviam conquistado, deduzindo o quinto que estaria sob a minha
guarda e que será empregado para o uso ao qU11 é consag ado.
Ju'guei dever reservar o solo e seus habitantes e impor a estes o
kharadj com relação à terra, e a captação a título de tributo
pessoal, esta captção constituindo um feyy para o proveito dos
muçulmanos que aí combateram, dos seus filhos e daqueles que
os sucederão, ... , Pensais que estes grandes paises: Síria, Meso-
potâmia, Kufa, Bosra, Misr (e outros) não devem ser cobertos
de tropas que preciso remunerar muito bem? Donde tirar este
soldo se fizermos a partilha do solo e daqueles que o habitam?" (os
grifos são nossos).

Sawad, na região de Kufa, foi a primeira a ser mandada medir


por Ornar.
"Desde antes de sua morte, o kharadj de Sawad, de Kufa ~en­
dia anu11mente cem milhões de dirhmans (cf. al-Mas'udi, at-
Tanbih) ."
- 198-

Segundo relatos sucessivos em tomo do kharadj e de sua aplica-


ção destacamos este (p. 60) que mostra a evolução da política agrária
do Califado e revela as condições da propriedade rural e nos informa
dos produtos que se cultivavam. Vejamos:
"Omar b. al-Khattab enviou 'Uthman b. Bonaif ao Sawad
para fazer sua avaliação e, diante disso, impôs por arpente (12)
cultivado ou não, mas suscetivel de o ser, um dirham e um kafiz,
sem distinguir entre pasto, vinhedo, tamareiral ou outras culturas;
alem disso impôs uma taxa de 48 dirhams per capita e a obrigação
de oferecer, durante três dias, hospedagem a todo muçulmano
que passasse pela vizinhança. 'Uthman cobrou estes impostos com
antecedência, durantes três anos, e quando levou o produto a
Omar disse-lhe que os habitantes poderiam pagar mais".

Segundo outros informantes de Abu-Yussuf, a captação variou de


rico para pobre, sendo cobrado deste último apenas a metade, isto é,
24 dirhams, pagando ainda, o mais pobre somente doze. Quanto à
terra cultivada, o arpente de vinhedo pagava 10 dirhams, o de bálsamo
5, o de legumes 3, o de algodão 5 e o de tamareiras ficou isento.
:f: evidente que esta política tinha por finalidade fazer os proprie-
tários de terras zelarem por elas e conservarem os caminhos abertos e
seguros para o trânsito de mercadorias e do correio. Era mister pre-
servar as vias de comunicação permanentemente em paz e protegidas.
A obrigatoriedade de acolher aos árabes acrescentavam-se outras con-
dições que mandavam recusar abrigo aos inimigos, heréticos e sectários
"alem dos habitantes terem que ensinar o caminho" (p. 61).

A região acima referida foi avaliada em 36 milhões de arpentes


(em árabe o equivalente é djerib). Alem dos produtos já mencionados
citam-se trigo, cana de açucar, cevada, azeitona, sendo estes os princi-
pais.
Como já dissemos acima, os tributos cobrados pelas propriedades,
em produção, variavam segundo fatores que se alteraram ao longo do
tempo: natureza do produto, tipo de solo, irrigação natural ou artifi-
cial, distância de centros urbanos e outros fatores de importância me-
nor. A oscilação chega por vezes a ser bastante grande e, segundo o
informante de Abu-Yussuf, em quase toda extensão da obra aparecem
valores, pode-se concluir que a sociedade árabe desta época já conhe-
cia o fenômeno da inflação. Outro fator importante que determinava
(12). - Palavra de origem gaulesa, antiga medida ag~ária dividida em
100 perches, variavel segundo a localidade de 35 a 50 ares (100
- 199-

a quantia do kharadj a pagar era o fato da propriedade já ter o pro-


duto como nativo, não o sendo, a quantia estipulada era outra. Ainda
quanto ao montante tributavel em função de distância temos que as
propriedades a um dia de marcha de núcleos urbanos eram considera-
das "próximas" e as que ficavam a mais de um dia "distantes". Este
valor foi estabelecido no Califado de 'Abd I-Malik b. Marwan (p.
65) .
À página 69 Abu-Yussuf menciona um fato que merece reflexão.
Conta-nos de um convertido denominado ar-Rufail que após sua con-
versão recebeu permissão para continuar a cultivar suas terras desde
que pagasse o kharadj. Este fato permite formular várias hipóteses:
a). - A propriedade pertencia a alguem que se reconhecia como dono;
b). - O muçulmano, por razões que merecem ser levantadas, não
cultivava a terra; c). - O novo adepto da fé muçulmana deixava de
trabalhar a terra ou continuava a faze-lo, mas sem o compromisso de
pagar tributos. f: bem verdade que as suposições levantadas podem
parecer conflitantes, mas, embora não seja o objeto deste trabalho, con-
vidam para uma pesquisa para determinar isso de modo definitivo.
Outro ponto interessante focalizado por Abu-Yussuf na página 77,
refere-se ao relacionamento dos árabes com os judeus de Khaibar.
Propõe-se-Ihes, por determinação do próprio Maomé,
"o encargo de cultivar a terra meio a meio, deixando-os escolher
a metade".

Esta proposta foi aceita, pois, o autor afirma ter durado este tra-
to até o Califado de Ornar. Diante deste fato, duas coisas chamam
nossa atenção: 1). - o espírito equitativo que se revela e 2). - a
existência desse sistema entre nós, embora um tanto diferenciado, mais
de um milênio depois. Na página seguinte, Abu-Yussuf indica que
este sistema foi adotado numa região chamada Fadak e conclui:
"Os muçulmanos não empregaram nem cavalos nem came-
los para marchar sobre esta localidade".

A conclusão parece verossimil embora algo estranha.


Quanto as fiefs, termo este condenado por vários orientalistas
(13) ou mais apropriadamente, Qataí, terras concedidas ou ainda con-
cessões, estas obedeciam a seguinte fórmula:

(13). - Termo usado para designar uma concessão territorial. A exten-


são e as peculiaridades variam de tempo e de lugar acompanhando a evolução do
império árabe. ~ quase uma paailha sujeita a taxação, menos onerosa todavia
que o kIJarad;.
200 -

"Aquelas que são irrigadas pela natureza deviam pagar o


dízimo; aquelas que são irrigadas por água carregada até o local
em sacos de cou o, por água retirada de poços com auxílio de rodas
deviam pagar 1/20 devido aos gastos. O dízimo e o tributo des-
tinado à esmola, cobrado sobre os frutos e as colheitas devia
se-lo apenas por terras sujeitas a taxação. As tradições e o
costume tambem previam a cobrança sobre terras irrigadas na-
turalmente, e, 1/20 sobre as higadas artificialmente, ... , a
opinião de todos os doutores que consultei estava totalmente
de acordo com isso" (p. 79).

A esta altura revela Abu-Yussuf uma tendência não apenas para


o detalhe mas tambem para uma decisão acertada e justa, pois diz:
"Sou de parecer de que 1/10 deve incidir sobre aquilo
que permanece e se conserva nas mãos dos homens e não sobre
hortaliças que não podem ser guardadas; nem sobre forragens;
nem sobre lenha. Os p"odutos que não se conse-vam são, por
exemplo, melão, pepino, abóbora, cer:oura, beringela; verduras
de folha; plantas aromáticas e outros produtos congê :eres" (pp.
79/80).

Apresentando as variantes conhecidas de cobrança de tributo o


autor sugere que o príncipe escolha a que lhe parecer melhor para o
povo e para o Tesouro (p. 82) .

Qataí' .

No lraque as qataí' constituem tudo aquilo que pertencera a Kisra,


aos seus sátrapas e a sua família, em cuja posse ninguem entrara (p.
88).

Quanto ao solo do Hidjaz, Meca, Medina, lemen e dos paises


árabes conquistados pelo Apóstolo de Allah nada há para ser mudado,
seja a mais, seja a menos, pois houve uma decisão do Profeta a este
respeito ~ o lmam não pode muda-la. Ora, sabemos que o Profeta,
depois de ter conquistado os territórios árabes, instituiu o dízimo e
nunca o kharadj.

Toda propriedade localizada em terras conquistadas deve pagar o


kharadj a menos que o lmam a transforme em terra de dízimo; no en-
tanto, não lhe cabe, não seria aceitavel nem lícito, fazer qualquer mu-
dança ou transformar o estado de coisas estabelecido e ordenado pelo
Profeta (p. 90).
- 201-

o Profeta e as califas que o sucederam fizeram de qataí' a diver-


sos indivíduos; em assim agindo, viam vantagens tanto para o Islão
quanto para favorecer o cultivo do solo (p. 93).
"Faziam-se falsificações nos títulos de concessão, de modo
a aumentar-lhes a importância, da mesma forma que as terras
do kharadj são valorizadas, por exemplo, em consequência de uma
comp~a, ligada a uma terra do dízimo _ Para combater fraudes e
não diminuir os impostos, é preciso medir as concessões e con-
frontar os títulos apresentados com os registros do divã e de-
pois proceder à avaliação _ É preciso, tambem, esclarecer as de-
savenças dos que estão sujeitos ao kharadj que, em consequên-
cia de uma desavença culposa e remunerada· com os que estão
sujeitos ao dízimo, trazem seus cereais na á 'ea destes, etc _"
(p. 94).

Embora a ortodoxia muçulmana recuse-se a admitir a conversão


motivada pelo desejo do vencido em conservar seus bens, o título deste
capítulo é:
"Sobre pessoas de paises de guerra e de beduinos que se
converteram para conservar suas terras e seus bens"_

Suas terras são terras de dízimo e ninguem pode expulsa-los dela!


Podem transmiti-las por herança ou por contrato (p. 95).
Todo povo politeista com quem o Islão assinou a paz, com a con-
dição de que sua autoridade será reconhecida, submeter-se-á à divi-
são e ao kharadj, é um tributário, e o solo que ele ocupa é dito terra
do kharadj: cobra-se dele o que é estabelecido por tratado, mas agindo
de boa fé e sem sobrecarrega-los.
Toda terra sujeita ao imam, caso ele o julgue próprio, poderá ser
por ele dividida entre os que a conquistaram, tornando-se então terra
de dízimo, ou, se ele o achar mais proveitoso, deixa-la entre os con-
quistados como terra de kharadj: os vencidos terão então sua posse to-
tal, podendo transmiti-la como herança ou contrato e o kharadj deles
cobrado não poderá ser superior ao que eles puderam pagar (p _ 96).
Se nas terras conquistadas houver grandes espaços sem cultivo al-
gum e sem povoações, que não se constituem em fey' para as localida-
des vizinhas, nem em pastos comuns. nem de locais de inhumância,
nem matas, chamadas terras mortas, transformam-se em propriedade
daquele que as vivifica ou que vivifica parte delas. Pode cede-las em
qataí' a quem desejar, ou coloca-las em locação, fazendo delas o que
julgar mais util. Deverá existir permissão do imam. O
- 202-

"Aquele que vivifica uma terra morta, torna,se seu proprie-


tário". "Aquele que a delimitou só terá direito a ela durante 3
anos". "Aque'e que faz um muro ao redor de uma te:ra torna-se seu
proprietário" CP. 98).
As terras árabes diferem das não árabes do ponto de vista
que só combatemos os árabes para faze-los abraçar o Islão, e não
para pagar a captação. Com relação aos não árabes, combate-
mo-los tanto para que se convertam, como para que paguem a
captação CP. 100).
Quanto aos renegados árabes e não árabes eles são tratados
como os árabes idólatras: escolhem entre a conve~sação ou a mo,te,
e não são suscetíveis de captação (p. 101).

A seguir, Abu-Yussuf faz um relato para mostrar as diferenças


entre terras de dízimo e de khara'dj no qual nos dá conta de que o
Profeta, tendo conquistado terras de árabes, deixou-as tais quais e
"elas permanecerão sendo de dízimo até o dia do juízo final".

Diz ainda que todo local habitado por não árabes, conquistado
pelo Imam, é terra de kharadj a não ser que seja repartido entre os
vencedores tomando-se terra de dízimo (p. 106).
Nesse momento Abu Yussuf passa a falar da cobrança do im-
posto e informa que segundo a tradição pode-se recorrer à força para
recebe-lo; cita ainda o Alcorão xlix, 6. Menciona a seguir os castigos
que atingirão os recalcitrantes no Julgamento Final (p. 120).
Advelte ao ar-Rashid para não encarregar as meSilllas pessoas do
receb~mento de kharadj e dízimo porque:
"não convem que os produtos de ambos se misturem. Em
verdade já ouvi que os recebedores do kharadj enviam em seu
nome, para receber, ... , indivíduos que empregam p."ocessos in-
justos e abusivos, eles fazem cobranças que não são nem lícitas
nem admissíveis. Para os dízimos é preciso escolher apenas
pessoas reservadas e virtuosas" .

Pela advertência evidencia-se uma discriminação no tratamento


dado a muçulmanos e não muçulmanos e confirma o grave problema de
atribuir, ve-se que isso não ocorre, a pessoas sempre idôneas o trato
com os dinheiros do fisco pois:
"aqueles Cos impostos provenientes do kharadj) constituem
um feyy pa,ra todos os muçulmanos, e os dízimos de esmola re-
tornam para aqueles 'lue AIJah designou no seu Livro santo"
- 203-

o Islão tem direito de aumentar ou diminuir o kharadj que ele


1mpõe aos detentores do uso de solo, na medida de suas poss:bilidades;
assim como, sobre a terra toda com a condição de não sobrecarregar
o contribuinte, modificar o imposto, do ponto de vista do aumento
proporcional em natura ou em dinheiro, estabelecido segundo a medi-
ção por arpentes Cp. 129).
Abu-Yussuf torna a formular novas advertências no sentido de
coibir abusos contra os que fazem as propriedades produzir:
"Examine a te~ra e não trate o que é inculto como o que
está cultivado, nem o que está cultivado como o que está inculto.
Examine as partes incultas e, se elas podem pagar alguma coisa,
tire delas o que puderem pagar e taxe-as até que passe ao estado
cultivado (determinação extremamente sábia); não cobre adian-
tado sobre nada, sobre o que, estando plantado, não esteja produ-
zindo;" (p. 130).

Preocupado mais uma vez com a .tranquilidade dos que trabalham


a terra, recomenda ao Califa:
"Não incluas no kharadj as sete coisas mais exatamente me-
didas para ?s quais não há regras: a). - os salários dos darrab
(exatado~es); b). - a fusão do dinheiro; c). - os presentes dos
nouruz e mahradjan (parece tratar-se de espécies de festivais e
exposições de produtos agrícolas); d). - os preços dos livros
(de escrituração); e). - os salários dos carteiros; f). - os
alugueis das moradias e g) - o dinheiro do casamento" (p. 131).

Nas páginas que vem a seguir Abu-Yussuf passa a descrever, sem


nunca deixar de citar Hadith e fontes, tipos de propriedades, de solo,
extensão, pomares, etc. Deixaremos de nos deter neles para não ultra-
passarmos os limites que se impõem a este trabalho (pp. 132/160).
Para finalizar, tendo em vista nosso propósito inicial de dar des-
taque à figura e ao pensamento de Abu-Yussuf, concluiremos este mo-
desto trabalho com as palavras do nosso autor que falam por si mes-
mas:
"Queira Deus conservar o Príncipe dos Crentes, que escolhas
entre pessoas de bem, de religião e de probidade, homens que
encarregues do kharadj, que sejam jurisprudentes, instruidos, que
recorram a pessoas capazes de dar bons conselhos, reservados, de
quem nada de vergonhoso se conheça, que não tenham aos olhos
de Deus nenhuma mácula, que pela sua p~eocupação
- 204-

justiça e sua prática de probidade preparem-se para a felicidade


eterna, homens cujos atos mostrem que não merecem o castigo
divino após a morte, cujo testemunho seja admitido caso haja
necessidade de se recorrer a ele, dos quais nenhuma injustiça possa
ser levantada num julgamento caso tenham que julgar. É um
homem assim que encarregarás da co:eta dos impo;tos sobre
bens, de recolher o que é lícito, ... , de tratar nas suas audiências
e nos seus atos com igualdade de modo que todos, nobres e ple-
beus, sejam iguais no direito" (p. 161/2).
"Com os funcionários que nomeares enviarás homens do
djund (exército) inscritos nas listas do diwan e wb cujos om-
bros pesa a responsabilidade de serem para contigo amigos leais. Tua
própria lealdade exige que não faças mal aos teus súditos e orde-
narás que seus soldos lhes sejam entregues mensalmente pelo di-
wan do qual eles serão escolhidos e que, fora disso, não lhes
passe nenhum dirham proveniente do kharadj". (p. 163).
"Atenda aos queixosos na ordem de chegada. Amenizando a
aflição de um crente neste mundo, Allah amenizará uma aflição tua
na out:a vida" (p. 171).
"O cargo de governador só é bem exercido com vigor mas
sem vio'ência, com candura mas sem fraqueza (O. b. al-Khattab)
p. 182.

Tratar a propriedade, seus detentores e os que nela trabalham


deste modo só pode resultar numa política altamente benéfica e pro-
dutiva. f.
A HERESIA DOS PSEUDO-APÓSTOLOS E A
DISSOLUÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL
LIVRE (ALLODIUM) NOS SÉCULOS
XIII e XIV (*).
Resumo.

NACHMAN FALBEL
do Departamento de Hist6ria da Faculdade de Filo-
sofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade 4e
São Paulo.

f: quase oplmao unamme dos estudiosos das heresias na Baixa


Idade Média de que sua origem estava ligada ao crescimento da urbe
e das novas condições sociais surgidas na sociedade urbana medieval-
ocidental. Portanto, a atmosfera espiritual da urbe determinava uma
nova atitude perante a religião e a instituição eclesiástica ou, em ou-
tros termos, uma nova religiosidade.

Um dos traços marcantes dessa nova religiosidade é o apego ex-


tremado à pobreza evangélica, como sendo a mensagem principal de
Cristo e dos Apóstolos, constituindo mesmo o fundamento ou a co-
luna central sobre a qual se assenta o Cristianismo. Cataros, valden-
ses, pseudo-apóstolos, beguinos, e boa parte das heresias do tempo in-
terpretaram e entenderam o Cristianismo como uma religião que de-
veria pregar a pobreza como a via certa para se chegar à salvação. A
reação ortodoxa, sabemos bem, foi a de incorporar a mesma concepção
como resposta, em parte, à heresia pauperística esvaziando-a e fa-
zendo sua a religião da pobreza evangélica. Daí coincidir o surgi-
mento das Ordens Mendicantes, com este período de expansão e ao
mesmo tempo de combate da Igreja com as doutrinas heréticas. Nesse
sentido as Ordens Franciscana e Dominicana foram parte da resposta
(*). - Comunicação apresentada na 1\l
- 206-

que a Igreja, ameaçada pela heterodoxia, teve de dar à sociedade de


seu tempo, em que formulava uma religião de humildade e simplici-
dade.
Mas se boa parte dos historiadores pressupõem, e com forte ra-
zão, que os elementos humanos que aderiram às heresias eram habi-
tantes das cidades medievais e estavam ligados à sociedade urbana, ou
ao "burgo", compreendendo artesãos de toda ordem e profissão, temos
sérios indícios de que uma boa parcela de seus adeptos teria vindo
do campo e mais especificamente do campesinato livre, o allodium
arruinado e pauperizado devido a um processo interno que ocorria na
sociedade feudal.
:B isto precisamente que procuramos demonstrar em nosso traba-
lho, que se baseia no estudo direto dos textos ligados à descrição das
heresias e em especial à Chronica de Salimbene de Adam naquelas pas-
sagens onde se refere aos Psudo-Apóstolos e ao seu lider Gerardo Se-
garelli. O fato de comprovarmos nossa tese através do estudo de uma
única heresia, isto é, a dos Pseudo-Apóstolos, implica em sua limita-
ção, e impede que possamos aplica-la as demais sem pelo menos as
examinarm0s mais de perto. Mas encontramos os mesmos indícios
tambem em outras heresas ainda que não possamos nos aprofundar
em seu estudo no sentido de examinar a composição social do seu ele-
mento humano.
Salimbene critica os hereticos "qui se appellant aposto los et nun
sunt. .. "... dimittunt illud offitium, ad quod sunt apti scilicet ut sint
custodes vacarum et porco rum et ut agriculturam exerceant . .. " (p.
272 e 276). A partir
A CONSTELAÇÃO AGROPASTORIL DA AMÉRI-
CA COLONIAL ESPANHOLA (1500-1570) (*).

JACIRO CAMPANTE PATRICIO


da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
Marília (SP).

INTRODUÇÃO.

Por volta de 1754 já havia na América Espanhola, segundo a


primeira estimativa demográfica global efetuada por J. López de
Velasco, mais de 200 povoações européias. Salvo raras exceções,
ao longo do período que se propõe perquirir - 1500 a 1570 - ca-
da povoado era circundado pelo ejido, dehesa, chacaras, peonías,
caballerías, estancias, terras comunais nas quais viviam os ameríndios,
terras nas quais viviam os naturais encomendados e terras baldías ou
realengas.
A análise detalhada da referida periferia ou retaguarda agro-
pastoril revela uma gama enorme de incongruências: do vocábulo à
dimensão, do direito proveniente do usufruto comunal ao direito de
propriedade privada. Ainda predominava a política de distribuição
de terras em carater precário pela via gratuita. O conceito de proprie-
dade aplicado sobre a terra pode revelar-se inadequado, insuficiente
e artificioso como instrumento de análise. A propriedade rural, mes-
mo na condição de privada, chegava a ser desfrutada coletivamente,
ocorrendo o inverso com a comunal.
A advertência não elimina, porem, a faculdade de se adequar
dois conceitos provisórios à referida realidade agropastoril sem dis-
torce-la. Cada componente da relação acima enumerada, do ejido
às terras realengas, passa a ser denominado entidade agro pastoril .

(*). - Comunicação apresentada na 2'


- 208-

E, ao conjunto relacionado das referidas entidades, dá-se o nome


de constelação agropastoril. Este conceito não se ajusta a nenhum
caso singular com exatidão, porem tem significado global indublta-
vel, comum às entidades que se formaram, que se multiplicaram e
que se reproduziram num amplo espaço geográfico ao longo do
período perquirido. Em seu curso evolutivo houve o desaparecimento
e transformação de algumas entidades sob a ação de denominadores
históricos comuns que asseguraram a sobrevivência de outras.
Em suma, o trabalho se compõe de três partes. A primeira é
destinada a esta breve introdução metodológica. Na segunda pro-
cura-se analisar separadamente cada uma das entidades; são indi-
vidualizadas e dimensionadas quando possivel. Na terceira, colo-
cam-se em destaque alguns dos denominadores históricos comuns -
o poder monárquico, o poder municipal e o poder minerador - que
originaram, relacionaram e transformaram as entidades da conste-
lação globalizante. Nesta fase do trabalho a relação proposta é sub-
metida, inicialmente, a uma macroanálise muito mais estática que
dinâmica, provisória e parcial, refletindo sobretudo a vontade do
poder monárquico. Entretanto, aquela ordenação ou modelo, sob a
ação do poder municipal, em realidade, tomou outra configuração espa-
cial e dinamicidade histórica. Isto se comprova ao nivel da microanáli-
se local e regional; outrossim demonstra-se que a central potosina,
alem de promover a valorização das encomiendas alto-peruanas, pos-
sibllitou a aplicação de dividendos, resultantes do trato do minério,
na aquisição de chacaras e estancias cuzquenhas, platenses e cocha-
bambinas.
f: deveras oportuno afirmar com ênfase neste Simpósio que a
temática agrária, no espaço e no tempo em apreço, encontra-se ainda
inteiramente aberta à pesquisa. Todavia, o que se propõe é tão so-
mente a utilização de dois instrumentos conceituais explicativos e
oferecer subsídios ao estudo da estrutura fundiária numa fase sobre-
tudo inicial da ocupação européla, rica em ensinamentos aproveita-
dos, a partir da década de 70 do Século XVI, pelo poder metropoli-
tano para a reestruturação de sua política agrária. Trata-se de um
estudo modesto e provisório. Apenas alguns aspectos do importante
problema são abordados.
Todo trabalho histórico, em que pesem as ponderações em con-
trário, é o resultado da interação entre o sujeito da pesquisa, a temá-
tica e as provas. E, neste trabalho em específico, as provas procedem,
principalmente, das atas dos Cabildos e das escrituras públicas, im-
pressas e manuscritas, das obras atinentes à história institucional e
de outras fontes b:bliográficas.
209


AS ENTIDADES AGROPASTORIS.

o ejido (1) devia ser assinalado quando da fundação do povoa-


do. Era uma parcela de terreno do termo ou território municipal (2),
prevista para atender ao crescimento do povoado e para o recreio
do população. A cobertura vegetal, frutos silvestres e as fontes d'água
ficavam à dispos:ção coletiva dos moradores. A escolha do sítio ur-
bano pelos primeiros fundadores tinha em vista a aproximidade da
maior parte desses fatores (3). O referido espaço podia ainda abri-
gar currais e o matadouro públicos; mas nele, em teoria, não se po-
dia praticar a agricultura e nem perambular livremente o gado. Em
realidade, muitos fatores chegaram a diminui-lo, transforma-lo e até

(1). - O ejido procede, etimologicamente, do latim: erodus, saida.


Não se sabe o suficiente a seu respeito no decurso colonial, embora ainda tenha
importância na estrutura fundiária de alguns países hispano-americanos. V.
Recopilación de Leyes de los Reinos de Indias. Concejo de Hispanidad, Grá-
ficas Ultra S.A., Madrid, 1943, lei XIV, título VII, livro IV; 1. M. Ots Cap-
dequí, Espana en América. El régimen de tierras en la época colonial. Fondo
de Cultura Económica México-Buenos Aires, 1959, pp. 19 e 51; Francisco
Domínguez y Compaíiy, "Funciones Económicas dei Cabildo Colonial Hispano-
americano". In Contribuciones a la História Municipal de América. Instituto
Panamericano de Geografia e História. Estudios de História 11, México, D. F .,
1951, pp. 139-178; Constantino Bayle, Los Cabildos Seculares en la América
Espanola. Sapientia, S.A. de Ediciones, Madrid, 1952, pp. 79-100; Juan
Augustín García, La ciudad indiana. Libreria y Editorial Castellví S. A ., Santa
Fé, /1954/, pp. 63-64; F.ançois Chevalier, "O ejido e a estabilidade política no
México". In América Latina. Estruturas em crise. Coordenação de Claudio
Veliz. Instituição Brasileira de Difusão Cultural S. A., São Paulo, pp. 170-202.
(2). - Embora o poder monárquico tenha se preocupado em dimensio-
nar o território municipal americano, este oscilou de uma região para out. a,
antes e após as Ordenanzas de descubrimiento y nueva población de 1573. Na
Ilha Espanhola foi facultada a fundação de novas povoações com termo mu-
nicipal de 2 léguas en cuadro, desde que estiveoisem situadas aquem das 10
léguas da cidade de Santo Domingo; para alem deste limite o termo municipal
poderia ser de um espaço quadrado de 3 léguas de lado. Nas Orenanzas de
1573 fixava-se o limite mínimo de 4 léguas en cuadro o prolongado según la
calidad de la tierra ... V.1. Ots Capdequí, op. cit., pp. 15 e 20. Quanto à
abordagem conceitual e jurídica atinente ao município colonial, v. Rafael
Altamira y Crevea, "Plan y documentación de la História de las Municipali-
dades en las Indias Espaíiolas (Siglos XVI-XVIII)". In Contribuciones a la
História Municipal ... cit., pp. 3-107.
(3). - 1563.16. VIII. Instruciones para población: "Eligiréis sitio y
lugares para poblar teniendo respeto a que sea la tierra sana y fértil y abun-
dante de água y leíia y buenos pastos para ganados". In /uicio de Limites
entre el Perú y Bolivia. Prueba peruana (coleção de documentos) presentada
ai Gobierno de la República Argentina por Victor M. Maúrtua, Barcelona,
1906 (12 vols), vol. 11, pp. 31. Estas instruções, com as mesmas ou outras
palavras, repetiram-se em muitas cédulas reais e, posteriormente foram incor-
poradas às Ordenanz.as de 1573 e à Recopilación de 1680.
- 210-

extingui-lo; ainda podia confundir-se com a dehesa e refazer-se em


detrimento da área destinada a ela.
Na dehesa (4) - outra parcela do termo municipal - soltava-
se o gado para pastar sob a vigilância dos proprietários que estavam
autorizados a construir, dependendo do número de cabeças, um ou
mais currais privados. A presença do gado solto faz supor que a re-
ferida área deveria distanciar mais que a anterior do sítio urbano.
Houve entre as duas entidades um traço comum: franqueadas
ao aproveitamento comunal (5) de todos os moradores. Mas alem das
duas parcelas de terra, de dimensões não padronIzadas ~ 6) e desti-
nadas ao aproveitamento comunitário, ainda havia uma outra que
compunha os propios (7) da municipalidade. Ela podia ser explorada
sob a forma de arrendamento temporário, cujos dividendos eram utili-
zados para cobrir parte dos gastos públicos (8).

(4). - O vocábulo dehesa, deriva do latim, defesa, defendido; na Es-


panha distinguia-se a dehesa para pastagens (de inverno e de verão) de bois,
carneiros, pOtIOs e ainda uma outra de~tinada ao matadouro. Sobre a mesma
entidade v. a indicação bibliográfica da nota n 9 1.
(5). - A propósito dos bienes comunales, escreveu Francisco Domínguez
y Compaiíy, op. cito p. 167: "se entendía, en la legislación hispanoamericana,
aquella classe de propiedades municipales cuyo uso y aprovechamento corres-
pondía por igual a todos los habitantes de la ciudad, por el &010 hecho de ser
vecinos de la misma". Entretanto, deve-se adve. tir que as leis especificavam
que os montes, pastos e águas eram bens comuns gerais liberados a todos os
moradores, espanhois e índios. V. Recopilación ... cit., lei XIV, título XVII, livro
IV e lei XI, título XVII, livro IV.
(6). - Quanto à área destinada ao ejido, as Ordenanzas de 1573, le-
galizando o que se tornara prática comum, apenas recomendavam: "en tan
competente cantidad Ide terra/, que aunque la problación vaya en mucho Cle-
cimiento siempre quede bastante espacio a donde la gente se pueda salir a
recrear y salir los ganados que hagan daiío", v. J. M. Ots Capdequí, op. cit.,
p. 22. J uan de Garay ao traçar a planta da cidade de Buenos ALes, reservou
para o ejido uma superficie de 24 cuadas de norte a sur, por una legua de este
a oeste; ... v. Juan Augustín Garcia, op. cit., p. 64. Na Recopilación de 1680,
as referidas entidades tambem não estão mensuadas, as leis apenas especificam
que o ejido devia corresponder a competente cantidad de tierra e que a dehesa
devia possuir uma área suficiente para que pueda pastar abundantemente el
ganado, que han de tener los vecinos. V. lei XIV, título VII, livro IV da
Recopilación em apreço.
(7). - Julio Alemparte R., El Cabildo en Chile Colonial. Ediciones de
la Universidad de Chile, Santiago de Chile, 1940, adverte que nos primórdios
da colonização não se fazia distinção ent:e bienes de propios e bienes comunales.
Entretanto, F. Domínguez C., op. cit., p. 153, define os propios: "el conjunto
de propiedades, de cualquier genero que sean, pertenecientes a una ciudad, villa
o lugar, destinadas a sufragar con sus productos los gastos públicos munici-
pales" .
(8). - Se
- 211-

Ao longo do período perquirido, não obstante as diversidades


regionais, ao início da fundação de cada povoado, tambem se repetiu
com acentuada frequência a aplicação de um outro esquema-padrão,
do qual dependeu a configuração e evolução da estrutura fundiária.
As entidades agropastoris do referido esquema, embora coexistindo
com o ejido e a dehesa, foram dissemelhantes quanto ao conceito de
propriedade.
Para alem das terras comunais de cada povoado, promovia-se a
distribuição gratuita de terras privadas apropriadas à agricultura ou
ao simples pastoreio, aos vecinos (9) já contemplados com solares
(10) ou lotes urbanos. Assim se originaram as peonías, caballerí-
as, chacras ou chacaras, sitios, granjas, huertas, fincas, hatos, es-
tandas e haciendas. A referida nomenclatura vocabular se difun-
diu amplamente, porem, as entidades que elas expresavam, até
quando destinadas a um mesmo tipo de aproveitamento, variaram
quanto à forma e dimensão.
As peonías e caballerías começaram a ser distribuídas nos pri-
mórdios da colonização. Ao que tudo ind:ca, pensava-se muito mais
na capacidade produtiva do solo que no dimensionamento terdorial.

(9). - Du-ante certo tempo o habitante de um povoado qualificado co-


mo vecino desfrutava de muitas prerrogativas sobre os demais discriminados
como moradores e estantes. Os vecinos fundadores chegaram a ter prioridade
sobre os demais habitantes na distribuição gratuita de lotes urbar.os, no usu-
fruto das ter~as comunais, na distribuição graciosa de terras privadas e índios
encomendados. E:am os cidadãos com voz ativa no Cabildo. Os primeiros
encomenderos chegaram a desfrutar com enorme exclusividade do referido
qualificativo, porque estavam obrigados a avecindarse ou fixar o domicílio no
povoado em cujo termo se encontravam as aldeias e terras de seus encomen-
dados. Sob este critério, é importante observar que Potosí embora tenha
sido o mais expressivo aglomerado demográfico do Continente Americano em
seu decurso colonial, por não possuir em seu termo encomiendas, não contava
com vecinos! Felipe 11, nas Ordenanzas de 1573, mandava aplicar o qualificativo
aos filhos e parentes dos novos povoadores até ao quarto g:au; acabou se
estendendo aos habitantes que não eram encomenderos.
(lO). - 1549.29.XI. La Paz: "Sobre que se den a los vecinos mas
grandes solares". Assim deliberaram os representantes do Cabildo de La Paz,
descontentes com o fundador, capitão Alonso de Mendoza, pO.que há agraviado
a los vecinos distribuindo solares quadrados de 150 pés (28 cm. por unidade)
quando era uso y costumbre usada y guardada en todas las lndias de dar cada
docientos pies e término a cada solar ... A verdade é que não houve medida
padronizada: cidade do México 150 pés, Cuzco 200, Córdoba 220. S~bendo-se
que na comuna pacenha um lote correspondia a 150 pés, pode-se deduzir que
uma quadra ou manzana era de 600 pés, portanto pouco mais de 7.000 m2,
enquanto que em outras cidades foi de mais de 10.000 m2. V. Actas capi-
tulares de la ciudad de La Paz. Recopiladas, descifradas y anotadas po~ H.
Gabriel Feyle. Instituto de Investigaciones Históricas y Culturales de La Paz,
La Paz, 1965, tomo I, acta nQ
- 212-

As primeiras caballerías antilhanas foram distr~buidas para o cultivo


de montones de yuca (11). No Istmo do Panamá a referida entidade
chegou a significar um espaço de terra com capacidade para conter
200.000 montones ou matas de ají e a peonía 100.000 (12).
Algo se conhece sobre os montones de yuca (mandioca). Para
que o refer:do vegetal produzisse boas raizes, era plantado pelos na-
turais antilhanos, em montes de terra arredondados, de 8 a 10 pés de
circunferência e meia vara de altura; eles ficavam tão iuntos, ao nivel
de base que quase se tocavam. Um testemunho colonial, depois de de-
terminar a raiz quadrada e elaborar outros cálculos matemáticos, esti-
mou a caballería de 200.000 montones de yuca em um espaço qua-
drado de 1. 341 pés de lado (13).
Ao final do período perquir:do, peonías e caballerías já expressa-
vam uma realidade fundiária diversificada e bem ampla. Coube ao
poder monárquico legaliza-las e limitar entre 1 a 5 o número máximo
das primeiras atribui das a uma só pessoa e de 1 a 3 às últimas (14) .

(11). - Julio Le Riverend, "Los orígenes de la economía cubana". In


Jornadas. Centro de Estudios Sociales de EI Colegio de México. México,
D.F., 1945, nQ 46, p. 25: caballería para labrar conuco para dos o tres mil
montones de yuca (1559). O conuco, vocábulo de origem antilhana, corres-
pondia às pequenas pa-celas de terra onde os naturais plantavam sobretudo a
mandioca. V. ainda, Devon C. Co"bitt, "Mercedes and realengos. A survey
of the Public Land System in Cuba". In Hispamc American Historical Review,
1939, voI. 19, pp. 262-285.
( 12). - V. Constantino Bayle, op. cit., p. 91. O aii (e não aje) é uma
variedade de pimenta adaptada a um clima subtropical quente.
(13). - O testemunho em apreço foi o jurista Antonio de León Pinelo,
autor de Tratado de confirmaciones reales, no qual dedica o capitulo XXIII
da 11 parte ao estudo de las cavallerías y peonias y demás casos que reqcieren
confirmaci6n, v.1. M. Ots Capedequi, op. cito pp. 25 a 27 e 78 a 79, nas
quais reproduz trechos do precioso e raro documento.
(14). - Nas Ordenanzas de descubrimiento y nueva poblaci6n de 1573
facultava-se poderes ao adelantado ou chefe da expedição colonizadora para
dar y repartir aos parentes e demais povoadores (o povoado devia ter no
mínimo 30 vecinos, cada qual com 20 ovelhas; 10 vacas, 4 bois ou 2 bois e 2 no-
vilhos; 5 porcas; 6 galinhas, 1 galo e 1 égua) tierras de pasto y labor en tanta
cantidade de peonías y caballerías, conforme a capacidade colonizadora de
cada um, desde que não excedesse a cada uno más de cinco peonías, ni tres
caballerías ... Em seguida discriminava o que se devia entender por peonía:
um lote ou solar para residência de 50 por 100 pés; 100 hanegas de terra para
o cultivo do trigo ou cevada; 10 para o cultivo do milho; 2 huebras de te~ra
para huerta e 8 para plantas diversas; terras para 10 porcas, 20 vacas, 5 éguJs,
100 ovelhas e 20 cabras. A caballería era conceituada como um solar ou lote
para residência de 100 por 200 pés)' de todo lo demás con cinco peo· ías. V.
t~anscrição do documento em apreço em J. M. Ots Capdequí, op. cit., pp. 19
a 21. Em 1680 os mesmos dados foram reproduzidos na Recopillaci6n ... , V.
- 213-

Nas décadas de 70 e subsequentes já havia passado a era da con-


quista bélica clássica e diminu'a o número de conquistadores que pre-
miavam os acompanhantes com peonías e caballerías. Estas, porem,
sobreviveram como simples padrões para mensurar a superfície da
terra. Nestas condições variaram porque resultaram de práticas con-
suetudinárias regionais. Uma merced de terra podia corresponder a
várias peonías ou caballerías. Em Quito uma caballería chegou a cor-
responder a 16 solares (15). Na Nova Espanha a referida unidade agrá-
ria teve diferentes valores: 6 (16) e 43 (17) hectares aproximadamente.
Ainda sobrevive em Cuba correspondendo a 13 hectares (18).
As poucas cabeças de gado introduz:das na meseta mexicana, nos
llanas venezuelanos e no pampa platense, favorecidas pela exuberância
de pastagens naturais e amplos espaços disponíveis, multiplicaram-se e
dispersaram-se de modo surpreendente (19). Grande número de fatores
combinam-se para distanciar a cobertura vegetal das terras and:nas
do resto da América do Sul. Mas, não obstante a adversidade do meio,
o original quadro pastoril, representado por lhamas, alpacas, vicunhas
e guanacos (20) que se alimentavam como o ichu (21) e outras gramí-
neas típicas, foi diversificado com a introdução de animais de procedên-
cia européia. O cavalo chegou com os primeiros conquistadores (22).
I

(15). - Constantino Bayle, op. cit., p. 91. V. nossa nota 10 atinente à di-
mensão variavel de alguns solares.
(16). - Julio Le Riverend, op. cit., p. 24.
(17). - Richard Konetzke, "América Latina. 11. La época colonial". In
História Universal Siglo Veintiuno, vol. 22, Siglo XXI Editores, S.A., Mé-
xico, 1972, p. 44. Um estudioso, trabalhando com as cifras da Or':enanza de
1573 e dados de outras fontes, deduziu que a caballería de ter:a devia cor-
responder a um espaço territorial de 7.888.800 varas quadradas, convertidas
em 504 hectares ou 8.896 metros quadrados. V. Joaquín García Borrero,
Neiva en el siglo XVII. Bogotá, 1939, p. 65. Segu'amente cometeu um equí-
voco em somar todas as cifras, do solar às terras para 100 cabeças de porcos.
(18). - Julio Le Riverend, op. cit., p. 24.
(19). - O quadro evolutivo, com cifras seriadas (1536-1620), do. re-
banhos bovinos, ovinos e caprinos do planalto central mexicano pode ser
apreciado no trabalho de Lesley Byrd Simpson, "Exploitation of land in Cen-
trai México in the Sixteenth Century". In Ibero-americana, vol. 36, Berkeley
y Los Angeles, 1952.
(20). - Constatou-se que, em 1567, apenas da província de Chucuito, 7 a
8 .000 cabeças de lhamas eram negociadas anualmente e destinadas a Poto,í.
Isto significa admitir que as 40.000 cabeças de ganado de la tierra, que um
visitador estimou pertencer à comunidade, em algumas décadas seriam dizi-
madas pelo monstro potosino. Apenas no cerro Sumaj-Orko, 8.000 lhamas
subiam e desciam, diáriamente, transportando minério de prata. V. Jaciro C.
Patrício, Os mercadores no mundo andino alto-peruano (1550-1650). Facul-
dade de Filosofia, Ciências e Letras de Marília, Marília, 1973, vol. I, pp. 58-59
(tese mimeografada).
(21). - O ichu ou pala brava alem de forragem pa~a
- 214-

Em certas regiões, a pastagem natural rarefeita, associada ao frio, pu-


nha em risco a vida do animal (23). Mas, correndo igual risco, no
rastro do cavalo chegaram a mula, o jumento, o boi, a ovelha, a cabra
e os porcos. Estes animais não podiam errar expontânea e livremente
em amplos espaços, como nas outras terras; eles, como o Homem,
fugiam das terras alheias, altas, frias, áridas e desocupadas. O meio
geográfico semidirigiu a penetração dos referidos animais que tiveram
que convergir para os trechos do altiplano e para os vales onde a te-
cedura demográfica pré-existente era mais expressiva. A sobrevivên-
cia e a procriação, em certas épocas do ano, dependiam da presença
humana. Não obstante o desafio, adaptaram-se e continuam multi-
plicando até hoje.
A caça como um bem comum (24), a domesticação e a apropria-
ção livre do gado cimarrón foram atividades que precederam a forma-
ção das primeiras estancias ganaderas antilhanas, mexicanas e pla-
tenses. Na Nova Espanha, os colonos que se dedicavam à criação
transumante de ovelhas, conseguiram, a partir de 1537, a implantação
de uma instituição chamada mesta de procedência metropolitana. Por
algum tempo, em prejuizo dos naturais que praticavam a agricultura
sedentária, ficou assegurado o direito comunal de usufruto sobre as
pastagens naturais, algumas das quais situadas 300 a 400 qu'lômetros
das estancias individuais ou privadas (25). Houve na Ilha de Cuba, no

(22). - O cavalo possibilitou que os europeus desfrutassem vantagens


militares e psicológicas nas lutas contra os quíchuas e aymarás.
(23). - Um testemunho declarava em 1567 que na província de Chu-
cuito, em decorrência do frio, aqueles naturais que cuidavam dos cavalos
levavam uma vida muito dura: tinham que p 'ocurar a yerba para alimenta-los,
cobri-los com mantas e ainda dormir aos pés dos referidos animais. V. "Vi-
sita hecha a la Provincia de Chucuito por Garci Diez de San Miguel en el
ano de 1567". In Documentos Regionales para la Etnologia e Etnohistoria An-
dina. prologo a la serie por J. Maria Arquedas, Ediciones de la Casa de la
Cultura deI Perú, Lima, 1964, tomo I, pp. 219-220.
(24). - O gado montaraz ou cimarrón constituia os chamados bens
mostrencos, franqueado a quem houvesse por bem caça-lo e fazer proveito
do couro e da carne. A sombra do referido direito multiplicaram-se os abu-
sos. Na Ilha de Cuba alguns moradores chegaram a apropriar-se das te~ras de
pastos e monterías declaradas comunais. Outros que iam montear matavam o
gado privado com marcas de ferro na orelha; cortavam a orelha e vendiam o
couro. Para conto 'nar o abuso as autoridades proibiram a venda de couro que
não fosse acompanhado das orelhas. V. "Ordenanzas Municipales de la H:t-
bana y de los demás pueblos de la Isla de Cuba por el oidor D. Alonso de
Cáceres" (1574). In Apendice Documental do trabalho de Rafael Altamira y
Crevea, op. cit., pp. 95-97.
(25). - Sabe-se que a indicada corporação ou sociedade de criadores de
ovelhas, inserida num contexto histórico e geográfico diferente do ibérico,
não vingou, apesar de contar com o patrocínio do Cabildo da cidade do
México e com o poder monárquico através do vice-rei D. Antonio de Men-
doza. V. José Miranda, "Notas sobre la introdución de la mesta en la Nueva
Espaiía".
- 215-

México e no Equador um tipo de estancia de gado de forma circular,


com três, duas e meia léguas a la redonda (26); entretanto, acabou pre-
dominando a de forma quadrada (27), algumas das quais com 1.780
hectares (28). Próximo a La Paz, em pleno altiplano andino, tam-
bem esteve presente a referida entidade (29). f: lícito inferir que uma
estância para a criação de suinos não precisava ter as dimensões de
uma outra destinada à criação extensiva de gado. Isto é válido para
as outras entidades. No México, por exemplo, um sitio para ganado
menor equivalia a 18 caballerías enquanto que um outro destinado ao
ganado mayor era de 41 (30).
As primeiras chacaras, granjas e as huertas, ao longo da fase per-
quirida, foram, inicialmente, concedidas gratuita e individualmente,
transformando-se em unidades de produção de alimentos para os ha-
bitantes dos povoados europeus. Enquanto que as maiores chacaraç,
entre as primeiras distribui das em La Paz, foram de meia fanega de

(26). - Julio Le Reverend, op. cit., p. 20-21-27; François Chevalier, "La


formación de los grandes latifundios en México (Tierra y sociedad en los
siglos XVI y XVIII). In Problemas agrícolas e industriales de México, 1956,
vol. VIII, nQ 1, pp. 1-258 e "La g~an propriedad en México desde el siglo
XVI hasta comienzos dei Siglo XIX". In Desarrollo Económico, 1963, vol.
2, n Q 1-2, pp. 45-55. O curral, uma árvore ou o bramadero serviam de ponto
central de referência para dimensiona-Ia. O mensurador depois de caminhar
algumas léguas sobre uma montaria, punha alguns marcos que indicavam os
limites da p:opriedade circular.
(27). - Entre duas estancias de forma quadrada ou retangular, deixava-
se uma légua de espaço para evitar discussões sobre os limites e as incursões
de gado vizinho. Tolerava-se que terceiros corressem o risco cultivando a
faixa de terra inte:mediária. A ausência de cercas contribuia para a fusão dos
rebanhos que se multiplicavam, porem identificados pelas marcas dos respecti-
vos proprietários. Enquanto que no México, com o passar do tempo, a estanciu
converteu-se em simples padrão agrário de mensuração das haciendas, no
Prata e no Chile ela continuou designando a prop:iedade territorial.
(28). - François Chevalier, "La formación de los grandes lat. ...., op.
cit., pp. 1-258.
(29). - O fundador da cidade La Paz possuia na província de Larecaja,
nas terras que diziam pertencer ao Sol, uma estancra; ao morrer, sem deixar des-
cendentes, ela passou ao patrimônio municipal. Junto à antiga rota incaica,
próxima à ponte do Rio Desaguadero, passagem obrigatória para os caminhantes
que se dirigiam de Cuzco ou Lima à Potosí, a municipalidade pacenha tam-
bem dispunha de out'a estancia e uma venda. Em 1557 o Cabildo pacenho
recebeu uma provisão que o facultava distribuir e assinalar, com a assistência
do corregidor, estancias e chacaras aos vecinos e moradores. V. Actas capi-
tulares de la ciudad de La Paz ... op. cit., tomo I, actas n: 139 (pp. 289-291),
n Q 149 (pp. 309-310), tomo 11, acta n Q 481, pp. 812-813.
(30).
- 216-

sembradura de maíz (31), em Cuenca houve solicitação de uma huerta


de 50 fanegas de sembradio (32). Não se pode, portanto, assegurar
que as primeiras entidades foram sempre maiores que as últimas. Os
vecinos de Cuzco solicitaram e obtiveram em 1552, no vale de Yucay,
pedazos de terra onde pudessem recrear, edificar casas, formar huertas
e chacaras. Rara e excelente prova cartográfica revela a regularidade
geométrica no traçado das referidas entidades: quadriláteros subdi-
vididos em 2, 4 ou mais chacaras, cada qual correspondendo a um so-
lar de 298 pés de lado, paralelos, separados por caminhos de 12, 30 e
32 pés de largura (33). Quando da fundação da Vila de Oropesa, no
vale de Cochabamba, o fundador dispunha de poderes para mandar
assinalar e distribuir aos vecinos duas quadras (8 solares) de terra para
huerta e 20 fanegas de terra para chacaras (34). No mundo andino
alto-peruano, resultante da conquista e dominação européia, de todas
as entidades agropastoris, que marcaram a estrutura fundiária emer-
gente, destacou-se a chacara (35).
Às vezes conced:a-se a terra para labranza y sementera, com 30
varas de largura por 300 de comprimento, com a indicação do valor

(31). - 1549.29.XI. La Paz. V. Actas Capitulares ... , tomo I, acta n 9


71, pp. 167-171. Ora, sabendo-se que a fanega ag.ária equivale a 64 ares, deduz-
se que no âmbito pacenho houve unidades da referida entidade com 3.250
metros quadrados, quando uma quadra do referido povoado era de 7.000 me-
tros quadrados.
(32). - 1559.19.V. Cuenca. O dado procede do Libro dei Cabildo da
referida localidade. V. Constantino Bayle, op. Clt. p. 92.
(33). - Cerca de 41 vecinos cuzquenhos foram agraciados com chacaras.
Out:ossim, um cacique 'ocidentalizado' que entrou com recursos, por julgar-se
com direitos hist6ricos sobre as terras partilhadas, recebeu um número estimá-
vel de chacaras, cerca de 21, conforme a prova cartográfica rep;oduzida e
anexada a este trabalho. V. Horacio Villanueva Urtega, "Documentos sobre
Yucay en el Siglo XVI". In Revista dei Archivo Histórico dei Cuzco, 1970,
n 9 13, pp. 1-148.
(34). - 1571.8.VIII. Cuzco. "provisi6n y comisi6n dada por el Virrey
deI Perú Don Francisco de Toledo aI capitan Don Geronimo Osorio ... ". V.
José Macedonio Urquidi, EI origtn de la Nobre Villa de Oropesa. Editorial
Canelas S. A., Cochabamba, 1970, comprobaci6n documental n9 11, p. 116. A
escolha do sítio recaiu sobre as chacaras que 3 encomenderos já vinham des-
frutando de longa data. O fundador estava instruido para recompensa-los com
boas terras em outra parte do vale cochabambino.
(35). - Unidade de produção que procedia da fase quíchua-ayma~á e que
mais se compatibilizava com a realidade andina . Sua geografia esteve na
dependência de manchas dispersas de solo e água que possibilitavam a agri-
cultura e pastagens naturais. Não se pode omitir a presença significativa de
yanakunas transformados na principal mão-de-obra utilizada pelos chacareros.
O
- 217-

de 25 pés cada vara (36), sem nenhum qualificativo nominal. Em


Buenos Aires 26 vecinos foram contemplados com pedazos de tierra
com uma légua de fundo por 350, 500 e 3.000 varas de frente (37).
Nem sempre a área efetivamente cultivada de uma entidade cobria a
sua área total dimensionada. Houve regiões nas quais o solo ficava
em descanso por um ano. E, dependendo das condições climáticas,
plantava-se só a coca ou vários produtos como a batata, o milho, a
quínua, trigo, centeio e alfafa. Mas é necessário acrescentar ainda que
as medidas agrárias de procedência espanhola - o pé, a vara, a légua,
o passo de marca e a fanega - variaram e coexistiram com padrões
ameríndios, resultando intrincada equivalência de uma região para
outra (38) . No Perú, por exemplo, uma fanega chegou a corresponder
a duas pocchas e 10 lrupus ou topos; um topo a 10 braças; uma pa-
pacancha a um terreno quadrado de 20 por 20 varas (39). Para des-
lindar situações como estas as próprias autoúdades da época, às ve-
zes, não sabiam em que pé se achavam.
As terras comunais nas quais viviam os naturais não encomen-
dados se configuraram como entidades agropastoris representadas pe-
las reducciones tambem designadas corregimientos. Elas resultaram
do remanejamento forçado e concentração da população autoctone em
novos povoados. Nas circunvizinhanças dos novos pueblos, com ruas
que se entrecruzavam em torno de uma praça central, segundo o
mesmo planejamento das vilas e cidades para europeus, reservam-se
terras para o uso coletivo, denominadas resguardos, com uma légua de
lado ou a la redonda (40).
Nos territórios juridicamente recobertos pelas municipalidades
ainda havia terras nas quais viviam os naturais encomendados. Os
encomenderos, legalmente, estavam obrigados a residir ou avecindar-se

(36). - 1546.15.IX. Santiago de Chile. Concessão efetuada pelo Ca-


bildo da referida localidade, v. Constantino Bayle, op. cit., pp. 92-93.
(37). - Acta de la fundación de Buenos Aires, segundo Juan Augustín
García, op. cit., pp. 64-65.
(38). - Observem algumas intrincadas equivalências: 1 pé, 28 e 33 cm;
1 vara, 25 pés; 1 braça, 2 varas; 1 paso de marca, 1 2/3 vara,· 1 fanega agrária,
64 ares, portanto 6.400 m2., em algumas regiões foi equivalente a 4 solares
1 solar de 11 O por 200 pés, 2.200 varas quadradas. Medidas brasileiras antigas:
1 légua, 3.000 b:aças ou 6,60 km; 1 légua quadrada, 43,65 km2; 1 braça qua-
drada, 4,84 m2.
(39). - Rolando Mellafe, "Frontera agraria: el caso dei virreinato pe-
ruano en el siglo XVI". In Tierras Nuevas. Expansi6n territorial y ocupación
dei suelo en América (siglos XVI-XIX). EI Colegio de México, Guanajuato,
1969, pp. 19.
(40). - V.J.M. Ots
Iêm~·~
~~-

VALE DE YUCAY
In Rev. deI Archivo Hist. deI
13.
- 219-

na sede do município que abarcava em seu termo os pueblos e as ter-


ras de seus encomendados.
Em que pese as dificuldades quanto ao dimensionamento terri-
torial, a referida instituição configurou uma entidade agropastoril de
terras comunais (41). Há uma relación de 1548 que serviu para que
Pedro de La Gasca confiscasse, taxasse e redistnbuisse novas enco-
miendas. O documento em apreço permite que se tenha uma visão
global de 38 encomiendas que integravam o território de Charcas.
Nele estão arrolados os respectivos titulares, tr.butários, valor e natu-
reza do tributo. Elabora-se um quadro com as cifras atinentes ao tri-
buto taxado, expresso em pesos, em ordem crescente:
tributo anual tributários tributo anual tributários
1.500 20.000 260
2.900 300 21.300 800
3.900 600 22.600 100
5.000 22.800 80
5.400 50 25.000 1.200
5.600 40 26.600 550
6.000 200 27.500 1.200
8.600 600 29.000 1.000
11.800 900 29.600 450
13.000 600 32.500 2.200
13.000 50 37.000 1.600
14.000 100 49.000 2.000
15.800 1.200 53.315 2.000
16.000 700 120.000 2.000
16.000 500 140.000 4.000
16.000 500 7.000
17 .000 800
18.000 500
19.000 800

Pode-se perceber a ausência de regularidade e sincronia cres-


cente ou decrescente entre o valor do tributo e o número dos tributários.
Há no quadro alguns exemplos contrastantes (3.900:600 e 22.800:80)
que negam os mais simples meandros da pretendida lógica: a expressi-
vidade numérica dos tributários estaria refletindo a imensa área da

(41). - Abundam estudos que dizem respeito ao seu perfil jurídico cam-
biante no tempo e no espaço. Mas outros aspectos ainda continuam intei-
ramente abertos à pesquisa. A encomienda foi a um só tempo uma instituição
militar, política, social, religiosa, de t;abalho,
220 -

terra agricultavel ou destinada ao pastoreio. Em realidade era o


valor mercantil atribuído aos diversos gêneros agropastoris, indepen-
dente do número de tributários, que contribuia para a referida expres-
sividade. Portanto, não é facil mapear a geografia encomendera e
dimensionar a entidade em questão. A relación em apreço aponta o
valor global do tributo, 864.700 pesos (864.715 segundo nosso cál-
culo), representado por 6.100 fanegas (medida para líquidos: 55,5
litros por unidade) de milho e trigo; 1.200 fanegas de milho e mijo
(quínua), 400 arrobas (16,1 litros por unidade) de mijo e milho; 600
fanegas de milho, carne e roupa, 7. 350 cestos de coca (cada qual com
capacidade para mais de meia arroba de folhas do referido arbusto) e
6.400 costales (desconhecemos o valor unitário) de coca. Outrossim
oferece a cifra global dos tributários, 40.560 (pela soma das parcelas
indicadas encontramos 34.580), dos quais, 4.056 já prestavam ser-
viço, sobretudo nas minas, na condição de mitayos (42).

Uma outra relación de 1560, atinente à Nova Epanha, tambem


importante por arrolar 344 encomiendas abarcando 468 pueblos, com-
prova o predomínio de cerca de 93, com maior número de pueblos, ao
redor de 124, cujo valor do tributo anual estava compreendido entre
501 aI. 100 pesos. Apenas havia 3 com 3 pueblos, cujo tributo era
superior alO. 000 pesos (43). Não se pode, portanto, através do nú-
mero de povoados arrolados na documentação colon:al, pretender di-
mensionar a geografia encomendera e tipificar a referida entidade. O
quadro abaixo reflete o que se acaba de expor:

tributo anual n9 de encomiendas n9 de pueblos


mais de 10.000 3 3
10.000 a 7.000 1 1
7.000 a 5.001 1 1
5.000 a 3.501 12 19
3.500 a 2.501 14 20

(42). - 1548. l Q • VII. Potosí, "Relación hecha por el capitan Gabriel


de Rojas", v. Rafael Loredo, "Relación de repartimientos que existian el
el Perú ai finalizar la rebelíon de Gonzalo Pizarro". In Revista de la Universidad
Católica dei Peru, tomo VIII, pp. 51 e segs. "EI Reparto de Huaynarima".
In Revista de História, tomo XVIII, pp. 78 e segs. Bocetos para la nueva
historia dei Perú. Los Repartos. Lima, 1958.
(43). - 1560. "Relación de los pueblos de indios de Nueva Espana que
están encomendadas en personas particulares, descontando el diezmo que se
paga, hecha por Hortuno de lbarra". In Epistolario de la Nueva Espana,
recopilación de Francisco deI Paso )' Troncoso, México, 1940,
- 221

2.500 a 2.101 8 13
2.100 a 1.501 29 51
1.500 a 1.101 31 44
1.100 a 501 93 124
500 a 301 60 69
300 a 100 92 123

Mensurava-se o número dos naturais sobretudo aqueles em idade


de tributar, levantava-se o número de pueblos, arrolava-se os titulares
encomenderos, avaliava-se a renda de cada entidade e fixava-se uma
taxa periódica (anual) - em termos monetários - que incidia sobre
os gêneros agropastoris e o trabalho assalariado obrigatório (dos mi-
tayos). Os naturais encomendados cumpriam suas obrigações tribu-
tárias pela entrega de produtos, pela prestação de serviço ou trabalho
e ainda com o dinheiro resultante da venda do que produziam (44).
Por que não se dimensionou o território de cada encomienda? Por que
não procederam como na fundação das cidades, deixando provas car-
tográficas detalhadas sobre a referida entidade? Pode-se dar uma res-
posta que se ajusta satisfatoriamente às diferenças geográficas e a
outras influências particulares: os amerínc:-:>s eram encomendados e
não as terras por eles trabalhadas. A entidade em apreço foi uma
\lllÍ.dade de produção, porem de limites não dimensionados. E, em
decorrência desta situação e outros fatores, aquele que nela trabalhava
caiu na condição de camponês sem terra.
As demais terras, devolutas ou escassamente cultivadas, povoa-
das ou despovoadas, ausentes de concessões, integravam o patrimônio
monárquico na condição de baldías ou realengas. Tambem retoma-
vam à esta condição, temporariamente, as terras doadas a particulares
e não efetivamente aproveitada para o pastoreio ou cultivadas dentro
de certos prazos fixados. O mesmo ocorria, segundo os preceitos ju-
rídicos da época, com aquelas declaradas usurpadas ou apropriadas
sem justo título e após o comprovado abandono das terras comunais
nas quais viviam os ameríndios encomendados e não-encomendados
(45).

(44). - Pela Relación de Gabriel Rojas, a fanega do milho e do trigo,


quando eSltes produtos eram remetIdos à Potosí em lhamas dos p·óprios
encomendados, estava cotada a 8 pesos, 4 quando vendidos nas terras dos
pueblos; o cesto da coca, 10 pesos em Potosí e 5 nas yungas. A omissão da
papa ou batatinha, tradicional produto do Altiplano, deixava aos encomen-
dados duas alternativas: troca-la pelo milho e trigo dos vales interandinos
ou vende-la em Potosí e saldar o tributo em dinheiro; o mesmo podia ocorrer
com a coca que, ao contrário da batatinha, não e:a cultivada no Altiplano.
(4S). - Sobre as terras baldías ou realengas, v. J. M. Ots
222

*
ALGUNS DENOMINADORES HISTORICOS COMUNS.

1. O poder monárquico.

A salvaguarda da soberal'ia monárquica, política e econômica,


explica a contínua ingerência do aparato burocrático, jurídico e admi-
nistrativo, metropolitano e ultramarino, nos rumos da história agrária.
Caso fosse possivel materializar leis em capitais, o investimento espa-
nhol na América seria de uma expressividade sem tamanho (46). En-
tretanto, não se pode afirmar que o direito indiano nasceu à moda de
Minerva, pronto e acabado da cabeça de Júpiter. Mas, pode-se de-
sentranhar da miliardária legislação as normas jurídicas atinentes ao
direito de domínio, de conquista, de colonização, de distribuição da
terra e da mão-de-obra, de posse do solo e subsolo.
À medida que a terra emergia como problema inerente ao siste-
ma colonial e sua preservação, o aparato burocrático do poder monár-
quico, na condição de peça atuante do referido sistema, destacou-se à
serviço da ordem estabelecida advertindo que sean guardadas las leyes
y ordenanzas, para no innovar en lo que hubiese costumbre e ainda
lo hagan guardar y cumplir, sin novedad (47). Sua existência e fUJl-
ções se justificavam precisamente pela necessidade de formular, siste-
matizar, legitimar, aplicar c impor normas gerais à estrutura fundiária
emergente no patrimônio ultramarino. Ao cumprir suas funções re-
guladora e mediadora em relação à minoria adventícia dominante e
à maioria dominada, aquele aparato gerou muitas contradições. Mas
sem ele não se pode compreender a constelação em estudo e sua evo-
lução.
A América Espanhola, segundo o direito vigente, ascendeu ao
palco da história européia, não obstante as polêmicas e contestações,
como mais um reino ou uma parcela constitutiva e inalienavel da mo-
narquia espanhola. As terras americanas transformaram-se em pa-

(46). - Por volta de 1560 a rápida proliferação de leis chegava a um


volume tal que era quase impossivel aos agentes da máquina burocrática iden-
tifica-las antes de aplica-las. A obra de Diego de Encima, impressa em 1596,
embora não se tratasse de copilação exaustiva, já continha mais de 3.500 do-
cumentos reais representados por provisiones, cédulas, ordenanzas, instrucciones
e cartas régias. Mas a empresa codificado~a não se deteve, em 1680
- 223-

trimônio e propriedade da monarquia em apreço. Mas os monarcas


podiam ceder aos súditos, o jus utendi et abutendi de uma parte das
terras, sem abdicarem para tanto do direito de soberania. Esta, fun-
damentada em princípios salvacionistas, exigia dos reis responsabili-
dade e compromissos para com os naturais que, embora adquirindo
o status jurídico de súditos livres, foram qualificados como menores ou
inocentes perante a lei. Por este imperativo legal, a distr.buição de
terras aos europeus não podia ser em detrimento daquelas que os
naturais vinham habitando e cultivando. Outras instruções régias,
como aquelas destinadas à fundação de povoados, os quais deviam ser
em sítios de solo fertil e abundante em água, com frequência foram
aplicadas em detrimento das terras dos naturais. Na cond;ção de súdi-
tos livreF por adoção, os ameríndios contraiam legalmente muitas obri-
gações ~ uma delas era o pagamento do tributo e o não abandono da
terra. Houve a intenção de assegurar ao natural o direito de usufruto
de terras comunais incorporadas ao patrimônio monárquico. Mas,
o índio abandonava as referidas terras, quer fugindo pela impossibili-
dade de continuar pagando o tributo, quer recrutado para a prestação
de serviços pessoais forçados em outras paragens. A forte hemorragia
demográfica experimentada pelo contingente pré-existente tambem
conduzia ao abandono da terra antes habitada e trabalhada. O direito
de usufruto cessava quando se comprovava que as terras estavam
baldías. E, nestas condições, por lei, ficavam à disponibilidade de
solicitantes espanhois. Outrossim, em decorrência da política real,
os naturais foram obrigados a viver em novos povoados, traçados à
imagem dos europeus. É certo que ao final restavam mu:tas terras
baldías. Todas estas afirmações que comprovam alguns dos caminhos
legais segundo os quais os súditos livres foram perdendo as terras a
eles reservadas, não excluem as poucas sanções jurídicas que culmina-
ram com a devolução do solo apropriado ilegalmente. É claro que
ao natural importava a terra, independente deste ou daquele direito.
Mas nos séculos XIX e XX, em decorrência do secular, porem sim-
ples direito de usufruto, em prejuízo dos ocupantes, muitas terras co-
munais foram negociadas pelo poder público e transformadas em pro-
priedades privadas (48). Todavia, bem antes que estes fatos se consu-
massem, ao longo do período perquirido, autorizava-se que os caci-
ques vendessem terras desde que fosse em hasta pública e amparados
por tutores. Frutífera expoliação! Portanto, o poder monárquico,

(48). - Assim ocorreu na Bolívia durante o governo do General M.


Melga~ejo. O decreto de 20 de março de 1866 colocava os indígenas na
condição de usurpadores de terras. V. Arturo Urquidi, Las comunidades in-
digenas en Bolívia. Editorial Los Amigos dei Libro, Cochabamba, 1970,
- 224-

embora propiciando a estruturação da constelação agropastoril, tam-


bem promoveu o desaparecimento paulatino das intidades reserva-
das aos naturais enquanto assegurava a sobrevivência de outras.
Uma outra característica da constelação agropastoril, formalizada
e institucionalizada pelo poder monárquico, foi a coexistência no tem-
po e no espaço das propriedades comunal e privada. Muitas cidades
hispano-americanas conseguiram preservar em seus termos os chama-
dos bienes comunales, regulamentados, ampla e minuciosamente, na
fase colonial. O fato deixa perceber que o alcance social pretendido
com a terra não chegou a ser totalmente sufocado pelo direito de
propriedade plena e absoluta, embora os colonos europeus em sua
maioria e alguns juizes de Audiências, influenciados pelas doutrinas
do direito romano-justiniano, chegaram a sobrepor e defender os in-
teresses privados em detrimento dos interesses superiores da coletivi-
dade. g interessante acrescentar que dois monarcas espanhols legi-
timaram a implantação de uma instituição de origem feudal, a derrota
de mieses, através da qual a propriedade rural, mesmo na condição de
privada, chegava a ser desfrutada coletivamente (49).
Os chefes particulares das expedições colonizadoras e as autori-
dades reai:, ultramarinas foram depositários do poder monárquico para
a distribuição de terras em carater precário pela via gratuita. No iní-
cio da colonização a terra não foi objeto de renda para o erário régio.
Através dela os monarcas viabilizavam, pela recompensa e promoção
social dos colonos, reforçar o poder político e militar. Alem de re-
galía, a terra era utilizada como fundamento doutrinário do absolutis-
mo, como recurso de sedução, de favor e de subordinação incondicio-
nal dos colonos. Os primeiros títulos de propriedade rural na América
Espanhola foram representados por três documentos reais: a capitula-
ción, a provisitín e a cédula. Eles eram expedidos antes, durante ou
após a ação colonizadora que resultava na distribuição da terra. Salvo
raras exceções não passaram de títulos precários. A concessão podia
ser revogada caso fossem descobertas minas no subsolo ou por muitas
outras razões. Exigia-se do contemplado a fixação e o amanho da
terra no prazo de 4, 5 e até 8 anos. Só após cumpridas estas exigências
é que a terra configurada como privada podia St>T vend:da ou arren-
dada. Assim mesmo, os títulos de propriedade expedidos pelos vic<.,-
reis e juizes das audiências só se consolidavam após a real conflrma-
ción.

(49). - Direito facultado aos habitantes de apascentar o gado nas


propriedades particulares após a colheita. Apesar de estar reproduzido na
Recopilaci6n . .. , lei· VI, título XVII, Liv. IV, vingou apenas em algumas
regiões, sobretudo no Chile. V. Julio Alemparte R., EI Cabildo en Chile
Colonial. Ediciones de la Universidade de Chile, Santiago de Chile, 1940.
- 225-

Mas a realidade fundiária resultante da colonização em seus pri-


mórdios já oferecia duas facetas que ainda perduram. Por um lado
retratava a intenção legal imposta pelo poder monárquico. Por ou-
tro, o ilegal, representado pela grilagem das terras realengas e daque-
las destinadas ao desfrute dos indígenas. História de ontem e de hoje
numa perspectiva de longa duração! Os agentes da máquina burocrá-
tica, contudo, dispuseram de tempo para traçar um diagnóstico da rea-
lidade fundiária (50). Em troca da submissão os colonos vinham co-
metendo muitos abusos compatíveis com o crescimento econômico da
Colônia. A demanda sempre crescente de gêneros agropastoris e a
emersão de um mercado agrário (51) contribuiam para acentuar a
grilagem. Diante desta ~onjuntura adicionada ao crôn:co apuro fi-
nanceiro metropolitano, o poder monárquico começou a dar uma res-
posta ao problema reestruturando sua política agrária. Ao final do
período perquirido e, sobretudo nas décadas posteriores, sem aban-
donar antigos propósitos, acrescentou outros. Aquele poder seguiu nas
pegadas da livre iniciativa dos colonos, comunicando tambem à terra
um fim econômico ou objeto de renda para o fisco real. O primeiro
passo foi limitar a concessão gratuita das terras baldías ou realengas
remanescentes. As autoridades não as deviam conceder sem as colo-
car em leilão púb~1co. O segundo foi exigir que os proprietários de
estancias, chacaras, caballerías e haciendas apresentassem para o exa-
me, os justos títulos. O terceiro foi legitimar, pelo ato jurídico deno-
minado composición, a posse de fato cm domínio de direito, median-
te o pagamento de uma certa quantia em dinheiro. Esta política agrá-
ria de conteudo reformista está patente na cédula real de 1591 (52).

2. O poder municipal.

A relação proposta, do ejido às terras realengas, até agora foi


submetida a uma macroanálise muito mais estática que dinâmica, pro-
visória e parcial, refletindo sobretudo a vontade do poder monárquico.
Entretanto, aquela ordenação ou modelo, sob a ação de um outro
denominador histórico comum, o poder municipal, em realidade, to-
mou outra configuração espacial e dinamicidade histórica. Isto se
comprova ao nivel da microanálise local e regional. Não se pode, por

(50). - Não faltavam denúncias sobre a especulação imobiliária. Ti-


tulos de caballerías eram vendidos antes de serem outorgados; outros ocupa-
vam a terra com precárias benfeitorias para assegurar o direito privado e em
seguida vende-la; autoridades influentes expediam títulos de p-opritdade aos
seus criados que em seguida negociavam a terra. V. Richard Konehle,
op. cit., p. 44.
(51). - V. Rolando Mellafe. op. cit., p. 21 e segs.
(52). - V. LM. Ots Capdequí.. op. cit., capo
- 226-

exemplo, entender o desaparecimento ou a transformação do ejido e


da dehesa em entidades agropastoris privadas, omitindo-se a função
econômica, política e administrativa de alguns Cabildos em particular.
Embora proceda a tese atinente à debilidade política do Cabildo
em seu decurso colonial, pode-se afirmar que quanto ao problema
agrário ele não foi mero apêndice do poder monárquico. Este, aliás,
formulou normas gerais e atribuiu ao órgão em apreço personalidade
juríd:ca e livre exercício para ir solucionando a questão da terra (53).
Assim que se constituía, o Cabildo dispunha da importante faculdade
de mercedar os seus vecinos com propriedades privadas, assinalar e
administrar as comunais, ambas circunscritas no têrmo municipal.
A prioridade inicial coube aos vecinos fundadores que tambem rece-
biam índios transformando-se em encomenderos. Ao lado destes ele-
mentos representantes da estrutura oligárquica em emersão, índios,
negros forros e mulatos, na condição de simples moradores, tambem
encaminhavam suas petições requerendo solares e terras para o ama-
nho (54). Uma vez deferida a petição, o beneficiado ficava obrigado
a desmatar o terreno para que as autoridades nomeadas pelo CabJdo,
geralmente regidores e alcaides, procedessem à demarcação e men-
suração. Para não perder o direito sobre a terra mercedada, esta
tinha que ser cultivada dentro do prazo determinado, que podia ser
prorrogado. Caso contrário, retornava à jurisdição do Cabildo, em
condições de ser concedida a um outro solicitante (55). As práticas
abusivas, difíceis de serem contornadas, ocorriam sobretudo nas ter-
ras adjacentes àquelas concedidas para a criação do gado. O boi
foi um andarilho que ocupava terras alheias. O domínio estanciero
se trasladava (56).

(53). - Todo documento real remetido a uma cidade ou vila devia ser
aberto e lido apenas no Cabildo: o escribano estava encarregado de transcreve-
10 em livro especial, guarda-lo no cajón e valer-se dele quando necessário;
tambem estava sob a responsabilidade do referido funcionário os documentos
originais ou cópias dos títulos de propriedades e as peticiones sobre terras. A
posse só complementava após o reconhecimento e registro do documento, mes-
mo com a assinatura real, no órgão municipal.
(54). - 1557. 29. I. Havana. O Cabildo fez merced à índia Catalina
Marin um pedazo de tierra de monte para edificar una estancia. 1559. 9. I.
Havana, desta vez ioram agraciadas negras horras. V. Francisco Domínguez y
Compafiy, op. cit., p. 174. 1567. 4. IX. La Plata, T. de Alcaráz, vendeu a
uma índia palia chamada Francisca. a metade de um solar por 100 pesos. Ar-
chivo Nacional de Bolivia, Escritura Pública, Aguila (tabelião), f. CCLXX.
(55). - Em realidade houve Cahildos que toleraram a venda da terra
doada antes do cumprimento dos requisitos exigidos; outros reagiram, inclusive
anulando a venda.
(56). - O boi chegou a ser concebido com um recu-so superabundante
que se apresentava desvinculado do direito efetivo de propriedade. Os colonos.
na rrática, procederam de modo inverso. O
- 227-

Ao contrário do que se apregoa, nem todas as povoações nas-


ceram como tabuleiros de jogo de damas (57). Houve localidades
onde os espaços previamente destinados às ruas chegaram a ser culti-
vados (58); em outras, do meio da rua os moradores extraiam o barro
para a fabricação de tijolos de adobe (59) e os animais chegavam a
vagar nos lotes urbanos (60). Nem todos os fundadores mandaram
demarcar e reservar os espaços para o ejido e para a dehesa (61); os
moradores de certas localidades tinham que ir recolher a lenha de que
necessitavam a uma distância de 5 a 6 léguas do sítio urbano (62).
Dois fatores podiom diminuir, transformar e até extingu:r as referidas
entidades: corresponderem na origem a espaços exíguos e o crescimen-
to rápido e bem sucedido dos núcleos urbanos. Ainda podiam confun-
dir-se mutuamente ou uma refazer-se em detrimento da área destinada
a outra. Outrossim, sabe-se que muitas destas terras comunais dis-
punham de solo fertil e água, dois elementos tentadores para a apro-
priação privada e a consequente transformação em entidades agro-
pastoris individualizadas. A presença de fincas onde se praticava cul-
tivo particular na área do ejido, ocorreu com frequência, dificultando
o trânsito do gado que tambem chegava a ser morto pelos donos das
plantações. O mesmo chegou a ocorrer na área destinada à dehesa.
Embora resguardando o direito de apascentamento comunal do gado,

estancieros em grandes posseiros que, temerosos de denúncias, foram constantes


requerentes de títulos de propriedades. Longe da vigilância das autoridades ('u
contando com a sua omissão, podiam atuar através de propostos vaqueiros que
tangiam premeditadamente o gado para novos rumos e, alegando posse da terra.
pediam reconhecimento da propriedade.
(57). - Em La Paz, por contingência topográfica, apenas o núcleo
central era simétrico; em Potosí, a 4 quadras da praça cent-al, havia uma rua
muito estreita chamada de las Siete Vueltas; o Cabildo de Lima em 1549 de-
liberava que as construções não alinhadas deviam ser derrubadas.
(58). - V. Constantino Bayle, op. cit., p. 390.
(59). - 1552.9.XIII. La Paz, v. Actas capitulares ... cit.,t. I, ata n Q
250, pp. 476477. E, tambem em outras localidades, v. C. Bayle, op. cit.,
p. 389.
(60). - Assim ocorreu em alguns povoados da Guatemala, Equador e
Perú, v. C. Bayle, op. cit., pp. 389-390.
(61). - 1549.29. XI. La Paz ... , ni hay exidos ni asientos para cosa
ninguna . .. , v. A ctas Capitulares '" cit. 1. I, ata n Q 71, p. 168; Em Buenos
Ai~es, Juan de Garay não executou o modelo preconizado pelo poder monár-
quico, partilhou entre os vecinos fundadores as terras destinadas à dehesa, v.
J. Augustín García, op. cit., p. 64; em Arequipa, queixava-se em 1558 ...
por cuanto esta ciudad va en aumento de vezmos y ganados, y no tiene exido
ni dehesa ni prado ... ; em contrapartida, na cidade do México gastavam-se 2
dias para se percorrer o ejido, e em Quito havia dois muito extensos, um ao
sul e outro ao norte, este com duas léguas de comprimento. V. C. Bayle,
op. cito pp. 87-90.
(62). - 1549.29 . XI. La Paz, V. Actas capitulares ... cito 1. I, ata nQ
- 228-

houve Cabildo que tolerou a presença de plantações pedindo tão so-


mente que fossem cercadas (63). Nos povoados que não se desenvol-
viam ou decresciam, os efeitos da ruralização se transferiam para o
ejido, à dehesa, quadras, lotes e ruas abandonadas. Quando ocorria
o inverso, os problemas eram resolvidos à med:da que surgiam, com
muitas queixas e muitas dúvidas quanto ao traçado e demarcação ori-
ginais. Outrossim, a escolha de novas áreas para fins comunais, so-
bretudo distantes dos núcleos urbanos, ocorria em detrimento das ter-
ras reservadas aos naturais (64) .
As terras de solo fertil e os naturais agr:cultores encontravam-
se frequentemente juntos. O poder monárquico advertia e recomen-
dava aos representantes dos Cab:Idos. que procedessem na concessão
da terra sem prejuizo dos naturais. Ao colono, contudo, a posse da
terra, a título precário ou definitivo, sem a mão-de-obra indígena,
pouco representava. Jogava-se com argumentos, aparentemente jus-
tos, para lezar os naturais. O procurador da cidade de Cuzco em
1550 suplicou à Audiência de Lima que autor:zasse a distribu:ção de
terras para chacaras no vale de Yucay, a quatro léguas da cidade,
argumentando com números que a população nativa decrescia e que o
clima cuzquenho por ser tan desabrido apenas permitia a sobrevivência
de 4 em cada 10 filhos que nasciam de pais espanhois (65). Trans-
corridos dois anos, do:s caciques do vale de Cochabamba, muito bem
instruídos por quem pretend:a leza-Ios, encaminharam um documen-
to ao alcaIde da Vila de Potosí declarando que eram inorantes e dese-
javam contratar com os espanhois. Solicitavam um curador e licença
para vender, no vale em questão, un pedazo de tierra donde dicen
Canata, que no lo siembran ni tienen dello aprovechamiento ninguno;

(63). - 1552.15.I. e 1552. 12.XII. Havana, deliberações do Cabildo,


v. F. Dominguez y Company, op. cit., pp. 168-169.
(64). - O fato se repetiu com frequência, v. F. Domínguez y Com-
pany, op. cit., pp. 168 a 171 e C. Bayle, op. cit., pp. 87-90.
(65) . . - Até 1550 sobrevivia no vale de Yucay a estrutura agrária in-
caica representada por chacaras cuja extensão oscilava de 1 a 100 topos de
terras de sembratura. Ao tempo do manclo incaico, as autoridades construi-
ram casas pa -a a recreação e fixaram mais de 3.500 agricultores que impul-
sionaram o cultivo do milho, coca, algodão, ají, maní e camote através dos
andenes e canais de irrigação. Após a conquista espanhola, os indígenas, da-
quelas terras declaradas e reconhecidas como patrimônio privado do Sol
e Inca, foram convertidos em encomienda pessoal de Francisco Pizarro, trans-
ferida por he -ança ao filho menor chamado Gonzalo. Por força de uma
cédula real ela foi reincorporada ao patrimônio monárquico espanhol em
1551. A população pré-existente declinava de 3.500 para menos de 700
índios, a p~odução de milho de 1.200 para 670 fanegas. Os vecinos de Cuzco
alegavam que havia muita terra para poucos naturais, embora um cacique de-
clarava que era costume deixar a terra em descanso. "Documentos sobre
Yucay en el Siglo XVI". Archivo Historico dei
- 229-

com o dinheiro resultante da venda, pretendiam comprar gado e


outras coisas de que tinham necesidades (66). Os testemunhos ouvi-
dos, espanhois e índios, todos moradores no vale cochabambino, con-
cordaram que a venda em questão não seria em prejuízo dos naturais,
pois havia muchas e buenas en tan cantidad que les sobran tierras
para su labor, que son mucho mejores que las susodichas y donde'
no se mueren los indios (67). Assim, em ambos os vales, as terras de
solo fertil, sob o amanho comunitário dos naturais, transformaram-
se em propriedades privadas, através de argumentos aparentemente
justos, entre eles o fator morte.
Houve povoados nos quais o referido orgão municipal se exce-
deu em suas atribuições. O de Havana chegou a conceder a parti-
culares um trecho do mar e lagunas (68); um vice-rei do Perú chegou a
revogar, com a aprovação do poder monárquico, terras que lOram
distnbuídas graciosamente, em seu nome, por vários Cabildos (69).
Outrossim, as institu:ções em apreço chegaram a mercedar e vender
terras situadas a muitas léguas dos centros urbanos. O de Havana
assim procedeu em pontos situados a 35 e 40 léguas da cidade (70);
o de La Paz chegou a estar vigilante ao que se passava na província
de Chucuito e no tambo de Caracollo, distante, a primeira ao norte
e o outro ao Sul, dezenas de léguas da comuna pacenha t 71) .
As necessidades econômicas do erário régio e a emersão de um
mercado agrário, contribuiram para que os Cabildos tambem pro-
cedessem na venda de lotes urbanos e a terra em hasta ou leilão pú-
blico. Aquelas concessões cujos proprietários abandonavam, eram
incorporadas aos propios da municipalidade e, ao invés de red,stribui-
das graciosamente, eram vendidas à vista ou em prestações t 72).

(66). - 1552.6.X. Potosí. "Expedientes de la información testificai".


Archivo Historico Municipal de Cochabamba. V. José Macedonio Urquidi,
op. cito comprobación documental n Q 4, pp. 94-95.
(67). - Idem, pp. 97-98.
(68). - 1568.25.VIII e 1569.9.11. Havana, deliberações do Cabildo
que contrariavam as Leyes de Indias, V. F. DomÍnguez y Compaíiy, op. cit.,
p. 176.
(69). - 1589.10.11. "Carta de S.M. ai virrey dei Perú", V. Actas
Capitulares ... cit., t. I, p. 504, nota 2.
(70). - F:ancisco DomÍnguez y Compaíiy, op. cit., p. 177.
(71). - 1549.26.VIII, 1552.29.IV e 1552.12.V. La Paz, V. Actas
Capitulares .. , cit., t. I, atas n Q 52 (pp 132-133), n Q 217 (pp. 430-431) e
n Z19 (pp. 434-435).
Q

(72). - 1552 A. III e 1551.15. VI. La Paz, o Cabildo delibe:ava sobre


a venda de solares, dois dos quais por 600 pesos, V. Actas Capitulares ... cit.,
t. I, atas n<1 208 (pp. 414-415) e nQ 146 (pp. 300-301). Já em 1555 o
Cabildo de Havana tambem resolvia transformar os solares concedidos gratui-
tamente e nãQ edificados em
- 230-

Deve-se observar, portanto, esta precoce discriminação de natureza


econômica pré-capitalista, beneficiando sobretudo aqueles que já dis-
punham de certa acumulação primitiva de capital.

3. - O poder minerador.

A mineração na América Espanhola em seu decurso colonial


foi a mais importante atividade econômica. Portanto, não constitui
surpresa o seu destaque na produção historiográfica, nos colóqu~os
e congressos internacionais (73). Todavia, não obstante sua impor-
tância prolongada no tempo, esteve relacionada com a atividade
agropastoril. E pode-se comprovar este histórico imbricamento quan-
do se estuda as relações de produção e o comércio colonial em sua
esfera interiorana (74).
Mas, como não poderia deixar de ser, os princlpais centros de
extração, industrialização e comercialização do minério e metal tam-
bem foram fatores que influiram no curso evolutivo da constelação
fundiária globalizante. Isto porque eles se converteram em núcleos
receptores de expressivos contingentes demográficos, poderosos cen-
tros de consumo de gêneros agropastoris procedentes do solo ame-
ricano, geraram rotas de abastecimento que punham em contato re-
gular o mercado de consumo com os núcleos de produção, promove-
ram a intermediação de mercadores ocasionais e profissionais que
comunicaram aos produtos e preços mobilização forte e ondulante. E,
finalmente, tambem promoveram o mercado imob:Iiário da proprie-
dade rural.
A opção pela central potosina, como exemplificação concreta
de um denominador histórico, tem em vista contribuir para o conhe-
cimento da temática em uma área ainda inteiramente aberta à pes-
quisa (75). Pretende-se comprovar que aquela central promoveu

venda para el dicho e/ecto. V. F. Domínguez y Compafiy, op. cit., p. 115.


Contudo a prática tornou-se mais frequente a partir da década de 70 e subse-
quentes até ocorrer a substituição da doação gratuita pela venda em hasta
pública.
(73). - Entre os mais recentes destaca-se o VI Congresso Internacional
de Mineração, v. La Mineria Hispana e lberoamericana. Contribución a su
investigación historica. Estudios, fuentes, bibliografia. Ponencias deI I Colo-
quio Internacional sobre historia de Mineria. Cátedra de San Isidoro, León,
1970, vol. I.
(74). - Nós já tivemos a opo~tunidade de comprovar o histórico imbri-
camento, v. nota 20
231 -

a valorização das encomiendas e chacaras num raio de muitas lé-


guas, sobretudo em Cuzco, La Plata e Cochabamba.
O poder pizarrista, em que pese as ponderações em contrário
muito caras à história política clássica, não foi uma questão de honra
feudal. lndlos, riquezas do solo e subsolo foram as razões daquela
conjuntura bélica, sua ascenção, declínio e a emersão da conjuntura
subsequente de mando monárquico. Os membros da família Pizarro
puderam atuar em causa própria quanto à d:stribuição de naturais
encomendados (76). Às vezes deve-se insistir no óbvio: não havia
produção argentífera sem a mão-de-obra indígena, sobretudo quando
a última emprestava o seu conhecimento ou o know how minerador.
Pela via mercantil capitalizante os encomenderos do Perú procuraram
negociar o aspecto feudalizante da institu;ção, isto é, a perpetuidade.
A preservação do direito de sucessão perpétua era importante não
apenas porque dava continuidade ilimitada ao status social adquirido,
mas porque através dela asseguravam-se os benefícios econômicos
que vinham obtendo na livre manipulação da mão-de-obra indígena
canalizada para a atividade mineradora argentífera e tambem na li-
vre apropriação dos produtos agropastoris na forma de tributos mo-
bilizados com propósito mercantil para o mercado consumidor inter-
no que se esboçava em tomo dos centros mineiros (77).
A conjuntura político-administrativa pós-pizarrista de mando
monárquico, que teve início em 1548, caracterizou-se por ser uma

(76). - Francisco. Pizarro, alem do. título. de marquês da PrQvíncia de


AtabillQs, havia recebido. para si e seus herdeirQS 20.000 índios encomendados;
cQntudo., a esta cifra deve-se acrescentar QS 3.500 do. vale de Yucay e mais
7.050 que viviam em 8 PQvQadQs dispe~sQs nas terras que atualmente cQnfigu-
ram QS departamentQs de La Paz e PQtQsí, cuja carga tributária era superiQr a
3 .000 costales de CQca e 500 fanegas de milho., cQnfQrme a relación de 1548.
A encomienda de Chayanta, revisada em 1548, 2.000 tributáriQS, taxadQs em
3 .000 fanegas de milho., 53.315 pesQs PQr ano., em seu início. era de HermanQ
PizarrQ. A menQr, dQcumento. que se estudQu, era de CristQbal PizarrQ, o. qual
tinha SQb encomienda QS índiQs muyu-muyu, cuja tributação. em CQca fQi esti-
mada em 1.500 peSQs. TQdavia, GQnzalQ PizarrQ vinha desfrutando., na prQ-
víncia de Charcas, da encomienda de Chaque, a mais expressiva quanto. à capa-
cidade tributária: 140.000 peSQS anuais, representadQs sQbretudQ PQ~ 5.000
fanegas de milho., e trigo. 4.000 índiQs, 400 dQS quais remetidQs às minas,
seguramente de PQrCQ. É provavel que ainda PQssuisse Qutras minas e Qutms
encomendados. O mesmo. QCQrria co.m QS seus partidários e adversáriQs.
(77). - PQde-se recQnhecer na mQrte do. vice-rei duas atitudes: uma
reaciQnária, pelo. desejo. de preservação. e fQrtalecimentQ de privilégiQS sociais
alimentadQs pela sQbrevivente estrutura mental ibérica feudalizante; a Qutra,
revQluciQnária, pelo. desejo. manifesto de dar cQntinuidade à atividade mercan-
til segundo. a nQva o.rdenaçãQ sóciQ-ecQnômica capitalizante. Esta nQva Qrdem
gerava o. PQder ecQnômicQ e QS demais deco.rrentes, CQmQ
- 232-

empresa reconquistadora, mais política que militar, desencadeada


pela invasão de burocratas reais: vice-reis, ouvidores e fiscais das Au-
diências, visitadores, oficiais fazendários, etc. Mas esta reconquista
estatal não pôs fim às encomiendas, muito pelo contrário, houve no-
vas redistribuições. Diego de Centero que antes de aderir à causa
real arrecadava de seus encomendados 30.000 pesos de prata por
ano, conseguiu elevar a referida cota para 100.000, alem de trans-
formar-se em grande mineiro. Pedro de Hinojosa, após destacar-se
como general do bando real, recebeu a encomienda que fora de Gon-
zalo Pizarro, taxada em 140.000 pesos anuais. Todavia, não foram
os únicos, porque havia em La Plata, segundo um testemunho da
época, vecinos qualificados como os mais ricos do domínio espanhol
e que las estancias y heredamientos tienen en este tiempo (1548-49)
gran precio, causado por la riqueza que se ha descubZerto de las mi-
nas de Potosí; outrossim, a renda das encomiendas foi revalorizada
na proporção de 10 por 1 (78). Portanto, na província de Charcas e
sobretudo entre La Plata e Potosí, separadas apenas por 18 léguas,
houve uma valorização recíproca entre a produção argentífera em as-
censão e a entidade agropastoril encomendera.
Mas a coca tambem aproximou Cuzco da central potosina, não
obstante separadas por mais de 300 léguas. Em termos teóricos admi-
tia-se que os monarcas espanhois eram sucessores legítimos de uma
tirania incaica injusta. Os colonos foram advertidos para que res-
peitassem as terras destinadas à comunidade enquanto promoviam a
divisão daquelas sob o mando dos monarcas incaicos e seus deuses.
Os vecinos cuzquenhos julgaram-se com direito às terras das yungas
porque nelas se cultivava a coca para o Inca e o Sol. Bem arqu~tetadas
denúncias contra os caciques - acusados de explorar os vassalos -
possibilitava a transferência das chacaras de coca para as mãos d0s
espanhois. O mercado consumidor potosino valorizou o referido pro-
duto e, este, o solo. No início da conjuntura pós-pizarrista, sobretudo
nos anos de 1548, 1549 e 1551, os encomenderos que exigiam cestos
de coca como tributo tiveram suas rendas elevadas para 20.000,
40 .000, 60.000 e 80. 000 pesos; algumas chacaras cuzquenhas, por

(78). - Augustín Zárate, História dei descubrimiento y conquista dei


PerÚ. Edictón introducción y notas de Dorothy Me Mahon. Instituto de
Historia Argentina y Americana, Facultad de Filosofia y Letras de la Uniyer-
sitad de Buenos Aires, Buenos Aires, 1965, v. notas pp. 66-67; Pedro de Cieza
de León, La crónica dei PerÚ. Prólogo de Sé.·gio Elias Ortiz. Instituto Colom-
biano de Cultura Hispanica, Edición n Q XXIV de la Revista Ximenez de Que-
sada. Editora ABC; Bogotá, 1971, p. 367; Inca Garcilaso de la Vega, Hi~'foria
General dei Perú, Libreria Internacional deI Perú S. A. e Editora Peuser S. A .•
- 233-

volta de 1567, chegaram a ser negociadas por 20.000, 30.000 e até


50.000 pesos (79).
A prata potosina tambem comprava os gêneros de primeira ne-
cessidade que chegavam ao centro minerador e, em pequenos punha-
dos, à boca do indígena. O crescente aumento dos naturais metidos na
atividade mineradora exigia maior consumo de milho e batatinha,
maior demanda de roupa confeccionada pelos próprios naturais (man-
tas e ponchos) em decorrência dos rigores do frio, maior solicitação
de carne de lhama, boi, cabra, ovelha e porco. Houve interação entre
a central potosina, os núcleos de produção agropastoril e o mercado
agrário em emersão. As escrituras públicas lavradas em Potosí, La
Plata e Cochabamba, oferecem subsídios para a comprovação da tese
em apreço.
A opção econômica do vale de Cochabamba, não se excluindo
os demais adjacentes, foi agropastoril. Uma orientação rural e não
mineradora. O mercado consumidor potosino despertou o interesse
pelas terras do vale supra citado. No ano de 1552 foi lavrada, na Vila
Imperial de Potosí, uma escritura de venda de terra cochabamb~na.
A transação foi realizada em leilão público, sendo proclamadas, pelo
leiloeiro, as condições de venda en publica almoneda e os limites do
imovel já circundado por estancias de três encomenderos, fixados no
vale há mais de 10 anos. Entre várias ofertas de 30, 50, 60 e 80 pe-
sos a terra acabou sendo arrematada por 150 pesos de prata corren-
te (80). Sucederam-se, com bastante frequência, outras transações.
Mas, ao que tudo indica, os melhores preços dependiam sobretudo das
feitorias, dos animais, dos canais de irrigação, dos implementos agrí-
colas e tambem dos yanaconas, arrolados entre os bens ou adscriptus
glebae, como se dizia no Velho Mundo. O tabelião da época não pro-
cedia com o rigor de hoje quanto ao dimensionamento do imovel

:79). - Parte da coca que procedia das yungas cuzquenhas e-a permu-
tada por rapa de la tierra e lhamas na província de Chucuito. Mas o maior
volume chegava à central consumidora potosina. Nos anos ante iores a 1590,
um cesto de coca era comprado em Cuzco por 2,5 a 3 pesos e vendido em
Potosí, à vista ou de contado por 4 a 5 pesos, contudo, em momentos de es-
cassês por 10 a 15 pesos correntes o ce~to de 8 a 10 lib as. Na década de 80,
a contra:ación média da coca em Potosí alcançava, anualmente, 500.000 pesos
ensayados resultantes do trato de 90 a 95.000 cestos, sendo que, no ano de
1583, foram negociados 100.000 cestos. Ela era trocada por minério, por
metal e negociada a dinheiro. Logo, procede a observação de um per~onagem
.:la época: se faltasse o trato da coca, todos os demais declinariam, a prata não
se~i3 extraida, não seria possivel servir-se do trabalho indígena e o Perú des-
povoar-se-ia. V. Jaciro C. Patrício,op. cit., vol. I, pp. 37 a 72.
(80). - A venda foi precedida de um informe acompanhado de pro-
- 234-

escriturado. A escritura pública, na condição de título de proprie-


dade, era acrescida de uma claúsula declarando que a venda era con
todas sus entradas e salidas, liSOS e costumbres e servidumbres (81)-.
O preço variava em função dos bens: 650, 900, 1.230, 3.000 pesos
de prata corrente (82). A chacara destacava-se entre todas as de-
mais entidades agropastoris do mercado agrário em emersão. Entre
os compradores havia vecinos do vale e estantes procedentes de La
Plata, Potosí e outras localidades. Predominavam as vendas a pres-
tações e, numa delas, certo comprador deu 250 pesos de entrada, 100
pagos em Potosí após 40 dias e o restante, mais 100 pesos, no local
que o vendedor houvesse por bem indicar (83). Depara-se, às ve-
zes, com escrituras que indicam apenas a quantidade da terra prepa-
rada para o cultivo como cuatro fanegas de tierra de sembradura, que
yo tengo en la quebrada de Arocagua (84). Por volta de 1567, uma
testemunha já reconhecia a função de celeiro agropastoril do vale em
apreço: es valle que se coxe en el mucho pan, y se provee de él la
ciudad de Potosí y la Paz de mucho pan que se acarrea en cameros
de la tierra. Em 1605 um religioso escrevia es el sustento de Potosí
en trigo, maiz, tocino, manteca. .. vá en mucho aumento, cuyos ve-
cinos, alguns ricos de plata, pero de ganados nuestros casi todos. Na
segunda década do Século XVII, apenas o vale de Mizque, de ex-
pressividade geográfica inferior ao de Cochabamba, encaminhava à
Potosí, alem do trigo moido em 4 moinhos, 100.000 botijas de vinho.
A comercialização do milho e do trigo chegava a uma média anual
de 1.000. 000 de pesos de oito reais na praça cochabambina. Isto
tudo refletia na valorização das chacaras e haciendas, estas chegando
a ser estimadas em 40, 50 até 80.000 pesos, na década em questão
(85). Estes fatos ulteriores confirmam o mundo agropastoril já emer-
so que se consegue visualiza-Io em emersão nas escrituras públicas
lavradas no asiento de Canata, sob a .iurisdição da Nobre Vila de
Oropesa do vale de Cochabamba, nos primeiros anos da década de 70
do Século XVI.
Outros escrituras públicas, bem mais recuadas no tempo, dimen-
sionam um outro mercado agrário em emersão na cidade de La
Pia ta, fundada em 1538, hoje Sucre. Esta cidade, embora localizada

(81). - laciro C. Patrício, op. cit., vol. I, pp. 184-185. A referida


cláusula fica melhor esclarecida quando se examina o rol de bens de uma
chacara vendida, por exemplo, em 1573, pOr 650 pesos: 4 índios yanaconas, 2
juntas de bois, 2 juntas de novilhos por domar, 4 rejas e arados com aperezos y
aderezos, 60 pés de magueyes, 1 escop/o, 1 azue/a, e sementeras.
(82). - Idem, {lp. cit., vol. I, pp. 185-186.
(83). - Ibidem.
(84). - Ibidem.
(85). - Idem, op. cit., vol. I, pp. 206-207.
- 235-

num vale de diminuta express.ividade, quando comparado ao cochamba-


bino, desfrutou de muitas vantagens, entre elas, situar-se ao longo
da rota mercantil potosina e acolher entre os seus moradores minei-
ros abastados, encomenderos e mercadores profissionais atrai dos pela
suavidade do clima e altitude.
Os mercadores, proprietários de tiendas e minas em Potosí (86),
tambem participaram do mercado imobiliário de La Plata. Os imo-
veis urbanos negociados nesta última localidade quanto ao preço não
perdiam para a primeira onde tudo era caro, a partir das fezes huma-
nas secas ao sol e vendidas a um peso cada costal: 2.000, 1.600,
1 .500 e 1.000 pesos (87). Entretanto os mesmos agentes do comér-
cio não estiveram indiferentes às transações sobre imóveis rurais.
Em 1565, por exemplo, o mercador Juan Barón comprou uma estan-
da de gado, uma chacara de pan [levar, 700 vacas, 600 cabras, 5
éguas, 1 negro escravo, 2 juntas de bois e demais apetrechos agrí-
colas por 9.500 pesos (88). No mesmo ano um encomendero, Ro-
drigo de Orellana, vedno de La Plata, proprietário de uma chacara,
certas casas, um moinho, 1. 000 cabras, 500 vacas, 300 porcos e 50
éguas, lavrava o seu testamento, fazendo ainda constar que deixava aos
seus encomendados, por descargo de mi conciencia y por cualesqu:er
cargos en que yo les deba, 150 vacas e 1.000 ovelhas (89).

* *
*
FONTES E BIBLIOGRAFIA (*)

F. Manuscrita.
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potosí nos anos: 1549, 1552, 1564, 1565, 1566 e 1588.

(86). - 1559.3.11. Potosí, carta de obligación: um mineiro compra na


tienda do mercador Antón de León vários produtos e se compromete a pagar
100 pesos. Archivo Nacional de Bolivia (ANB). Escrituras públicas (EP),
Aguila (tabelião), f. 122; 1549.9.VII. Potosí, carta de concierto; Baltazar de
Castilla, possuia tienda e mina. ANB. EP. Soto, f. L; 1559. 20. V. Potosí,
carta de venta: Diego de Nava:rete, à Francisco de Olmedo, ambos mercadores
e moradores, 20 varas de mina por 200 pesos de prata corrente. ANB. EP.
Aguila, f. 420, etc.
(87). - 1564. 2. VIII. La Plata, carta de venta. ANB. EP. Aguila, f.
CCCXXXVIII v; 1566.6. V. La Plata, carta de venta. ANB. EP. Aguila, f.
CLXXI v; 1588.5.IV. La Plata, carta de venta. ANB. PE. Avilés, f. 70.
(88). - 1565. 14.XII. La Plata, carta de venra. ANB. EP. Aguila,
f. 526 a 528.
(89). - 1565.5.IX .. La Plata, testamento, ANB. PE. Aguila, t. 7,
f. 204.
- 236-

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* *

- 238-

INTERVENÇOES .
Do Prof. Eurípedes Simões de Paula (Universidade de São Paulo).
Pergunta:
"Algumas dessas instituições fundiárias citadas pelo autor teriam
raizes indígenas?"
*
Do Prof. Corcino Medeiros dos Santos (Faculdade de Filosofia, Ci-
ências e Letras de Marília. SP.).
Indaga:
"Qual a origem das estâncias circulares e por que esse tipo de
propriedade, já que o normal seria a forma retangular ou quadrada?"
*
Do Prof. Raul de Andrada e Silva (Universidade de São Paulo).
Disse:
"Antes de mais nada, queremos felicitar vivamente o Prof. Ja-
ciro Campante Patrício pelo alto teor de sua comunicação e pela va-
lia de suas pesquisas arquivais. E pedimos vênia para, a título de
eventual colaboração e esclarecimento, sem nenhum carater de cons-
testação, dirigir-lhe as seguintes indagações:
1). - Por que será inadequado e artificioso, como instrumento
de análise, o conceito de propriedade privada aplicado à análise da
posse e uso da terra, no período colonial? As limitações que houve, na
legislação espanhola, quanto ao exercício do direito do uso e posse
da terra, parece-nos que não eliminou todas as características da
propriedade territorial. De sorte que, as várias maneiras de aquisi-
ção da terra (a doação gratuita, as arrematações em hasta pública e
as "composições") constituem pelo menos um começo de proprieda-
de, que com o tempo se consolidou.
2). - Foi assinalada a variedade das estâncias quanto à forma
(redondas e quadrangulares). Quanto ao tipo de exploração agrária
não há tambem uma distinção: "chacra" (exploração agrícola predo-
minante) e "estância" (exploração pastoril)?
3). - Parece-nos que a ';encomienda" foi definida como pro-
priedade territorial, o que julgamos discutivel. A "encomienda" era o
título jurídico pelo qual o índio "encomendado", que devia o serviço
pessoal, recebendo em troca a proteção que a lei configurava. Na
prática se transformou num instrumento de opressão do indígena pelo
branco.
4). - Perguntamos: nas fontes citadas (atas capitulares, escritu-
ras, testamentos), aparece o termo propriedade e o respectivo con-
ceito?"
239

* *
*
RESPOSTAS DO PROFESSOR JACIRO CAMPANTE PATRíCIO

Ao Prof. Eurípedes Simões de Paula.


Agradecemos a intervenção por julga-la oportuna e pertinente.
Contudo, em face da documentação consultada, constatamos apenas
entidades agropastoris pré-colombianas e ibéricas coexistindo ao longo
do período perquirido. No Peru, por exemplo, a chacara coexistiu
com a chajra incaica; em um documento de 1552 atinente ao vale de
Yuncay estão mencionadas chacras que procediam de estrutura agrá-
ria incaica cuja dimensão unitária variava de 1 a 100 topos, isto é, de
2.700 a 270.000 metros quadrados. Na área antilhana' constatamos
a sobrevivência do conuco, pequena parcela de terra onde os naturais
plantavam sobretudo a yuca (mandioca). No México as entidades
agro pastoris comunais do tipo altepetlalli ~ calpullali que sobreviveram,
confundiram-se, frequentemente, com o ejido e a dehesa. Acrescen-
tamos que as entidades de procedência européia expandiram-se em
prejuizo das pré-colombianas. Os padrões de mensuração agrária tam-
bem coexistiram e alguns de origem pré-colombiana sobrevivem até
hoje.

Ao Prof. Raul de Andrada e Silva.
Agradecemos, inicialmente, as gentis palavras em relação à nossa
modesta comunicação. Outrossim, esclarecemos ao ilustre Professor
que o trabalho ora apresentado, alem de ser uma resposta à temática
do Simpósio, oferece subsídios ao estudo da estrutura fundiária e tam-
bem à compreensão de alguns problemas agrários do presente: deduz-
-se, por exemplo, que a grilagem de terras é um fato histórico ulterior
ao advento da sociedade capitalista latino-americana.
1. - Para o período estudado - 1500 a 1570 - predominou a
política de distribuição de terras em carater precário pela via gratuita.
No início da colonização a terra não foi objeto de renda para o erário
régio. Através dela os monarcas viabilizavam, pela recompensa e pro-
moção social dos colonos, reforçar o poder político e militar. Os
- 240-

condição de privada, chegava a ser desfrutada coletivamente, e ocorria


o inverso com a comunal. Por estas e outras razões o conceito de pro-
priedade (privada e comunal) se nos afigura inadequado e artificioso
como instrumento de análise da estrutura fundiária para o período
perquirido. O ato jurídico denominado composición, pelo qual o poder
monárquico legitimou a posse de fato em domínio de direito, mediante
o pagamento de uma certa quantia em dinheiro, ocorreu num mo-
mento posterior ao período que estudamos. Aliás, lembrar a política
agrária de conteudo reformista, patente na Cédula Real de 1591 -
resposta a uma estrutura fundiária representada sobretudo pela grila-
gem das terras realengas e daquelas destinadas ao desfrute dos indí-
genas - é importante porque não contradiz a nossa posição.
2. - E deveras pertinente a observação do caro Professor. As
referidas entidades alem de serem diferentes quanto à forma dimensão
tambem divergiram quanto ao aproveitamento. No Altiplano Andino,
contudo, centenas de chacaras não passaram de pequenas unidades
de produção agrária mergulhadas num amplo universo pastoril.
3. - Em momento algum de nosso trabalho tivemos o propó-
sito de caracterizar qualquer das entidades estudadas como proprie-
dade rural. Portanto, não iríamos proceder deste modo com a enco-
mienda. Ela é focada tão somente como uma entidade agropastoril
da constelação em estudo. Procuramos provar que não se pode di-
mensionar a geografia encomendera através do levantamento quanti-
ficado atinente aos tributários, aos povoados e ao quantum do tributo
previamente taxado. Deixamos claro que os ameríndios eram enco-
mendados e não as terras por eles trabalhadas.
4. - O passado colonial americano encontra-se inteiramente
aberto aos estudos lexicológicos. Parece-nos que o Prof. Raul sugere
o estudo do vocábulo propriedade, através da documentação da época
colonial, acreditando que o uso frequente comprovaria uma identida-
de profunda entre a realidade de fato e a de direito. Nas fontes que
consultamos despontam com mais frequência estes vocábulos: bienes
comunales, tierras baldias, merced de tierra, pedazo de tierra, granjas,
huertas, fincas, hatos, alem daqueles que arrolamos e estudamos. O
tabelião da época não procedia com o rigor de hoje quanto ao dimen-
sionamento do imovel rural escriturado. Havia explicações como estas:
até onde a vista alcança, o tempo necessário para se fumar um cigarro,
um quarto de latitude e igual de longitude, etc.
E claro que não se pode negar a realidade colonial pela compro-
vação do uso pouco frequente do vocábulo "colônia" na documenta-
ção de antanho. Outrossim, acreditamos que o estudo léxico do vo-
cábulo "propriedade"
- 241-

tribuição da terra em carater precário pela via gratuita, sobretudo


entre 1500 a 1570.
*
Ao Prof. Corcino Medeiros dos Santos.
Um
A PROPRIEDADE RURAL DURANTE O MOVI-
MENTO AUTONOMISTA NO RIO DA PRATA
(1810-1830) (*).

RA UL DE ANDRADA E SILVA
do Departamento de Históda da Faculdade de Filo-
sofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade
de São Paulo.

Introdução.

o título desta comunicação sugere temática extensa, excessi-


vamente extensa até. Mas, o que na realidade pretendemos mostrar
são dois relevantes aspectos da história da propriedade rural, durante
a crise da independência no Rio da Prata, a saber: o desencadeamen-
to de forças tendentes à reforma agrária e a existência de pelo menos
alguns projetos de redistribuição da propriedade rural; em segundo lu-
gar, apontar alguns sistemas legais sobre o uso da terra pública, que
visavam a conferir certo sentido social a esse mesmo uso.
Entretanto, convem traçar preliminarmente uma súmula da for-
mação da propriedade rural, durante o colonialismo. Conforme a le-
gislação das lndias de Sevilha, o domínio da terra, de pleno direito,
cabia à Coroa, em suas possessões americanas. Mas, o Rei podia ce-
der a terra por mercê, ou aliena-la por venda direta ou por arremata-
ção em hasta pública. Os primeiros títulos de posse originais foram
as "capitulações" - a mais antiga é a conferida a Cristovão Colombo
- passadas aos descobridores de terras e a seus primeiros povoado-
res; assim tambem os primeiros repartimientos de terras e de índios.
Estas doações, assim como as mercês, eram de carater gratuito e,
para a sua validade, cumpria que os donatários residissem na terra
concedida por quatro anos, ao cabo dos quais adquiririam a plena
propriedade. Mas, as constantes aperturas do Tesouro Régio levaram
(*). - Comunicação ap~esentada na 3\\ Sessão de Estudos, Equipe A.
no dia 6 de setembro de 1975 (Nota da RedaçãfJ).
- 244-

os "arbitristas" (1) a sugerir que, com o fim de aumentar as receitas


da Coroa, fossem as "regalias" (2) negociadas a título oneroso.
Daí, a mudança na política de terras, que a legislação das lndias
de Sevilha acusou, a partir da Carta Régia de 1591 (3), permitindo a
adjudicação de propriedades por venda em hasta pública, aos arrema-
tantes que oferecessem maiores lanços. Isto não significava que a
Coroa renunciasse nem às "regalias", nem à prática da concessão de
mercês gratuitas, mediante Cartas Régias ordinárias ou extraordiná-
rias. Outro modo de alienação das terras pela Coroa consistiu nas
composiciones, instituto jurídico pelo qual, em determinadas circuns-
tâncias, uma situação de fato, produzida à margem do direito ou con-
trariamente a ele, podia converter-se numa situação legal, mediante o
pagamento de certa importância ao fisco. Por exemplo, foram admi-
tidus a "compor-se" os que haviam ocupado mais terras que aquelas
a que tinham direito, por concessão e com título legítimo; ou os es-
trangeiros, entrados clandestinamente e que, ocupando terras, prefe-
riam compor-se, para que não fossem expulsos. E ainda havia a ar-
rematação de realengos (terrenos baldios da Coroa), sujeitos a foro
anual (4).
Por mais que a política territorial da Coroa e sua respectiva le-
gislação buscassem evitar injustiças e abusos na apropriação da terra
pelos povoadores, o resultado desse processo foi a formação de lati-
fúndios; processo facilitado tanto pela liberalidade com que a Coroa
fazia grandes concessões territoriais, quanto pt'la imensidade das su-
perfícies disponíveis, que iam sendo ilegalmente ocupadas e alargavam
as áreas concedidas aos particulares ou por eles compradas.
Todavia, por maior que fosse a extensão das terras distribuídas
ou adquiridas, a Coroa conservou enormes áreas de terrenos baldios,
os chamados realengos, que passaram a ser propriedade dos novos
Estados independentes, quando se desmembrou o império colonial es-
panhol.

(1). - Eram os avaliadores dos "arbítrios" ou tributos devidos ao


Tesouro.
(2). - Assim se chamavam os di.-eitos que a Co"oa se reservava, in·
clusive a propriedade da terra. Cf. Ots Capdequí (J. M.), Espana
- 245-

Projetos de Redistribuição da Terra.

Havia, pois, largas disponibilidades de terrenos a serem povoados


e explorados, quando rebentaram os movimentos autonômicos, nas
províncias espanholas da América.
No Rio da Prata, esses movimentos desataram forças tendentes à
reforma agrária e à redistribuição da propriedade rural. Percebe-se,
por exemplo, o carater reivindicatório no levante das populações ru-
rais, encabeça das pelos caudilhos. das províncias, em luta contra o
centralismo político e econômico de Buenos Aires. A massa campe-
sina pugnava não somente pela autonomia local, mas tambem pela
reivindicação da propriedade das terras e do gado nativo (5). Da
Pampa y las vacas para todos bradavam os peões da campanha. As-
pecto este, por sinal, ainda mal estudado pelos investigadores plati-
nos. Mas, nem o governo de Buenos Aires, nem os governos provin-
ciais nada fariam em matéria de redistribuição da propriedade terri-
torial; e quanto ao uso das terras públicas, só na administração de
Bernardino Rivadavia, a partir de 1822, definiu-se um sistema legal.
Na Banda Oriental do Uruguai, entretanto, da revolução autono-
mista de 1811 resultou o governo de José Artigas, quando este grande
caudilho nacional acrescentou, ao domínio da campanha (6), de onde
partira a rebelião por ele encabeçada, a conquista de Montevidéu, li-
bertada dos dominadores espanhois. No tumulto da luta contra es-
panhois, portenhos e adeptos uruguaios destas duas facções, foi ela-
borado por Artigas e seus assessores, no acampamento de Purifi-
cación, em 1815 o Reglamento Provisorio de la Provincia Oriental
para el Fomento de Su Campana y Seguridad de Sus Hacendados (7).
Como o próprio título indica, esse Regulamento provinha da necessi-
dade de por termo às depredações dos rebanhos de gado, praticadas
pelos comandantes das tropas estacionadas na campanha, que abatiam
8S rezes para o aprovisionamento de couros, o que ameaçava de ruina
a atividade pastoril e punha em perigo a vida dos criadores que qui-
sessem reagir. Mas, o texto foi mais longe e traçou as bases para uma
reforma agrária, que previa a redistribuição da terra entre os povoa-
dores pobres, quer os criollos (filhos de espanhois nascidos na Amé-

(5). - Alvarez (Juan), Estudio sobre las Guerras Civiles Argentinas,


p. 104, Buenos Aires, 1914.
(6). - Cf. Pivel Devoto (J uan E.), Raices Coloniales de la Revolu-
ción Oriental de 1811, p. 267-269, Montevidéu, 1957; Benvenuto (Luis C.),
Breve Historia deI Uruguay, p. 40-44, Buenos Aires, 1967; Sosa (Jesualdo),
losé Artigas, p. 52-80, Buenos Aires, 1968.
(7). - Veja-se a íntegra deste documento em Street (John) , Artigas y
la Emancipación deI Uruguay. Apêndice I, p. 278-280,
- 246-

rica), quer os zambos (mestiços de índio e negro), os mestizos, os ín-


dios e os negros livres (8), conforme o artigo 6.° deste decreto. E o
dispositivo seguinte (art. 7.°) mencionava os demais agraciados: viu-
vas pobres que tivessem filhos, os americanos casados de preferência
aos solteiros, e estes de preferência a estrangeiros de qualquer espé-
cie. Entrando na posse da terra, deviam os agraciados construir um
rancho e dois currais" dentro de dois meses, ao fim dos quais se con-
cederia o prazo suplementar de um mês. em caso de omissão; persis-
tindo a negligência, a terra seria doada a um colono mais laborioso e
benéfico à Província.
Até ulterior deliberação, depois que a situação interna se nor-
malizasse, os concessionários não podiam alienar suas estâncias, nem
contrair débitos com garantia das mesmas, sob pena de nulidade das
concessões. As terras divisíveis eram as confiscadas a emigrados "maus
europeus" e aos "piores americanos", isto é, os orientais que se tinham
bandeado para a oligarquia espanhola de Montevidéu, numa palavra
os "realistas"; tambem as terras vendidas ou doadas pelo governo da
Capital, entre 1810 e a ocupação da cidade pelos orientais, em 1815,
salvo se os proprietários fossem uruguaios, caso em que poderiam con-
servar uma estância, nos termos do Regulamento. Os estrangeiros,
sendo solteiros, perderiam toda a sua propriedade; sendo casados, e
possuindo terra em demasia, podiam conservar parte suficiente para o
sustento dos filhos.
O Regulamento estabelecia tambem os pormenores técnicos da
partilha das terras. Cada parcela mediria légua e meia de frente por
duas de fundo, podendo variar a superfície, conforme a localização
das terras, que deviam possuir sempre as necessárias aguadas. Se-
riam fixadas as demarcações, para que se evitassem litígios futuros
entre os donatários lindeiros. Cumpria impedir que o mesmo agra-
ciado recebesse mais de uma doação, de modo a que ninguem se benefi-
ciasse mais que outrem, à sombra do Regulamento. E as adjudica-
ções anteriores seriam ratificadas, a pedido dos interessados, reser-
vando-se ao poder público apenas as áreas destinadas à criação e ma-
nutenção das cavalhadas do exército.
Outros dispositivos regiam a apropriação de gado vacum e equino
das estâncias de europeus e "maus americanos", para que se preve-
nissem os saques desordenados e o desperdício do gado. E para tal
efeito, proibia-se aos estancieiros a matança das rezes, salvo as de
sua propriedade, ficando igualmente vedada a exportação de gado

(8). - Cf. Street (John), op. cit., p. 170: Alonso Eloy (Rosa et alii),
La Oligraquia Oriental en la Cisplatina, p. 18-21, Montevidéu, 1970.
- 247-

para o Brasil. Finalmente, o Regulamento dispunha sobre a fiscaliza-


ção e força policial necessária à sua plena execução e obediência.

As circunstâncias do agitado momento, em que o Regulamento


apareceu, conspiraram contra a sua efetiva aplicação. O Cabildo de
Montevidéu, em fins de setembro de 1815, deu publicidade ao Regu-
lamento, mas o Alcaide Provincial, a quem competia, pelo art. 1.0
desse diploma, a faculdade de distribuir as estâncias solicitadas, de
imediato alegou que a desordem reinante na campanha entravava a
ação da autoridade, de sorte que o ritmo da reforma foi quase nulo.
Malgrado as reiteradas ordens de Artigas, para que se acelerasse a
marcha da aplicação do Regulamento, só no início de 1816 se cons-
tituiu a força policial, destinada a impedir a dilapidação dos rebanhos
pelos camponeses sem terras, que se apropriavam das rezes soltas; e
na mesma ocasião foi publicado o convite aos que desejassem solicitar
terras. Poucos o fizeram, já que eram desanimadoras as condições de
insegurança da campanha, ainda não submetida a uma ordem poli-
ciada. Por outro lado, o Cabildo na verdade acolheu friamente essa
reforma, que no fundo não aprovava. E os funcionários subalternos
executaram atabalhoada e arbitrariamente suas funções. Nem o Re-
gulamento previa qualquer sistema de crédito que facilitasse a esses
pequenos estancieiros os meios materiais indispensáveis ao aproveita-
mento de suas terras. Assim, antes que a planejada reforma de fato
se implantasse, a invasão portuguesa de 1816 veio compromete-la de-
finitivamente .

Seria interessante cotejar os preceitos do Reglamento uruguaio


com as idéias de José Bonifácio de Andrada e Silva, no conturbado
momento da luta pela libertação do Brasil. O Patriarca da Indepen-
dência advogou a extinção do antigo sistema da doação gratuita ue
sesmarias, do qual resultara a formação de latifúndios improdutivos;
e nas Lembranças e Apontamentos, de 10 de outubro de 1821, tra-
çadas para uso dos Deputados brasileiros às Cortes de Lisboa, pre-
conizava, mediante venda e não mais a título gratuito, a redistribuição
das terras revertidas à massa dos bens nacionais, no caso das sesma-
rias doadas a indivíduos sem cabedais e que as deixavam reduzidas a
vastas glebas incultas. O produto dessas vendas seria empregado no
favorecimento da colonização por europeus pobres, índios e negros
forros, aos quais se daria de sesmaria, em carater de exceção, lotes de
terra para que os cultivassem e neles se estabelecessem. Essa reforma
da propriedade fundiária seria completada por medidas conducentes à
efetiva colonização e exploração das terras, à preservação dos matos e
arvoredos, à prática do reflorestamento, ao uso equitativo das agua-
das. Em suma, as linhas gerais de uma reforma agrária, meditada à
- 248-

luz das realidades da época e que, sob vários aspectos, ainda não per-
deu sua atualidade (9).
Contudo, esta reforma não passou do plano das formulações teó-
ricas, pois que José Bonifácio foi apeado do poder, antes que as cir-
cunstâncias lhe permitissem ataca-las, no domínio das realizações prá-
ticas de governo. Tal como a reforma definida no Reglamento de
Artigas.
Em conclusão, durante a fase dos movimentos autonômicos no
Rio da Prata persistiu e dilatou-se o patrimônio territorial do Estado,
ao lado da propriedade privada de carater latifundiário, provindo tan-
to esta, como aquele, do passado colonial .

o Uso das Terras Públicas.

Os governos autônomos, no Rio da Prata, não somente defende-


ram o patrimônio territorial do Estado, mas tambem às vezes o au-
mentaram, graças a novas adjudicações. Exemplo típico deste pro-
cesso foi a multiplicação das Estancias La Patria, de propriedade es-
tatal, sob a ditadura do Dr. Frância, no Paraguai, que tambem ~e
havia separado das Províncias Unidas do Prata. Esse patrimônio que,
ao findar a ditadura francista, abrangia pouco menos da metade do
Paraguai oriental e praticamente toda a extensão do Chaco paraguaio
( 10), formara-se com as terras realengas da época colonial, às quais
se acrescentaram as propriedades particulares, confiscadas pelo Dita-
dor, bem como as das Conventualidades que o Dr. Frância extinguiu
e foram por ele adjudicadas ao Estado (11). Eram campos de pas-
toreio, áreas de cultivo, matas de erva-mate e madeira que, quando
não administrava diretamente, o Estado arrendava a particulares, em
geral ocupantes das terras confiscadas, com a obrigação de as explo-
rarem efetivamente. Mas, o governo ditatorial sequer planejou uma
reforma agrária, com redistribu;ção da propriedade rural e, por outro
lado, respeitou a propriedade privada dos estancieiros que não lhe pa-
reciam suspeitos. O que Frância buscou foi propiciar a posse e o uso
(9). - Cf. Silva (José Bonifácio de Andrada e), Obras Científicas,
Políticas e Sociais, coligidas por Edgard de Cerqueira Falcão, p. 99-100,
Santos, 1963; Silva (Raul de Andrada e), José Bonifácio, o Pensador Reformis-
ta, p. 405, in "Revista de História", nQ 92, São Paulo, 1972.
(lO). - Cf. Pastore (Carlos), La Lucha por la Tierra en el Paraguay,
p. 46-47, Montevidéu, 1949.
(11). - Arquivo Nacional de Assunção - Seção Histó'ia - voI. 229:
lista de 72 estâncias do Estado, cuja mapeação estamos intentando fazer; cf.
Silva (Raul de Andrada e), A Ditadura no Paraguai (1814-1840) - Uma
- 249-

da terra, não a sua propriedade, a um número consideravel de pe-


quenos e médios arrendatários de modo a emprestar uma finalidade
social ao uso da mesma. E simultaneamente respeitou o direito dos
índios à propriedade territorial, nos termos da velha legislação caste-
lhana, que Prância não revogou totalmente (12). Em suma, o Ditador
não alterou o quadro da propriedade rural no Paraguai, a não ser o
aumento consideravel das áreas pertencentes ao Estado.
Em Buenos Aires, por iniciativa de Bernardino Rivadavia, então
Ministro do Governador Martin Rodriguez, o patrimônio estatal foi
preservado pelas leis de 17 de abril eLo de julho de 1822, que proi-
biam a venda das terras públicas. Salvaguardava-se, por essa forma,
a riqueza mais valiosa do Estado, que bastou para garantir o vultoso
empréstimo externo de 15 milhões de pesos, negociado com a Grã-
Bretanha.
Em 1825, quando o Brasil declarou guerra às Provlncias Unidas
da Prata, foi necessário ao governo de Buenos Aires mobilizar novos
recursos, eis que os fundos resultantes do empréstimo, conforme a lei
que o regulava ( a de 18 de agosto de 1822), se destinavam a gastos
administrativos prefixados e ao fomento de um Banco Nacional. O
expedIente financeiro de que lançou mão o governo foi o arrendamen-
to das terras públicas, uma vez que não podia vende-las, pois eram
inalienáveis, como se viu. Por lei de 18 de maio de 1826, era instituída
a enfiteuse, como sistema de arrendamento (13).
Com essa medida, ao mesmo tempo que levantava recursos es-
peciais para as despesas de guerra, Rivadavia, agora chefe do governo
portenho, conferia um carater social ao uso da terra pública. Mas,
não se tratava de um arrendamento igual à enfiteuse romana, que era
um tipo de arrendamento perpétuo, destinado a fixar o agricultor ao
solo, o qual continuava sendo patrimônio das cidades coloniais. Tal
sistema não tinha a virtude de despertar no arrendatário mais que um
interesse transitório, faltando-lhe o estímulo permanente, que só a
propriedade, dentro do regime individualista, pode suscitar. Durante
sua vida toda, o camponês podia usar a terra, mas não podia vende-la,
pois não era sua.

(12). - Pastore (Carlos), oh. cit., p. 43 e 48; Arquivo Nacional de


Assunção - Seção História, vol. 243: recomendação do Dr. Frância aos
administradores dos povoados de índios.
(13). - Cf. Lestard (Gastón H.), Historia de la Evolución Económica
Argentina, p. 50 e 51, Buenos Aires, 1937; Cárcano (Miguel Angel), Evolu-
ción Histórica dei Régimen de la Tierra Pública
- 250-

Rivadavia, sob o mesmo nome de enfiteuse, criava uma novo


tipo de arrendamento. Sua lei facultava ao governo entregar a terra
ao cultivador que a solicitasse, ficando este obrigado ao pagamento de
um foro ou renda anual, fixada cada dez anos, sobre o valor calculado
da terra que o enfiteuta ocupava. Cabia a um juri ou comissão .de
cinco arrendatários ou proprietários, vizinhos da terra, estabelecer tal
valor, que vigorava até a avaliação seguinte. O foro variava conforme
a qualidade da,> terras. A enfiteuse seria concedida pelo prazo mínimo
de vinte anos, e o primeiro foro seria de 8 % ao ano, sobre o valor
das terras de pastoreio, e 4% ao ano, sobre o das terras de cultivo (14).
Alem da obtenção de recursos para o tesouro nacional, mediante
as rendas produzidas pelo pagamento do foro enfitêutico, o governo
tinha em mira fomentar a colonização do interior, pela fixação de po-
voadores à terra e pelo estímulo à produção agrária. Parecia tambem
aos governantes que as cautelas legais eram bastantes para impedir
que alguns enfiteutas arrendassem áreas excessivas, pois pensavam que
ninguem estaria disposto a pagar renda pela posse de terras que não
pudesse aproveitar, dada a sua desmedida extensão.
Todavia, uma lacuna da lei veio a ensejar essa inesperada con-
sequência. Isto porque o texto legal não limitava a superfície de terra
que cada enfiteuta podia solicitar. Assim, os mais bem providos de
recursos entraram na posse de toda a terra que quiseram, não para a
explorar totalmente, senão para subarrendar vastas áreas, transfor-
mando em objeto de especulação o que não deveria ser mais que uma
obra de bem estar coletivo. E há historiadores que sustentam que,
ainda por cima, só uma minoria efetivamente pagou os foros devidos
ao Estado (15). Quando o governo, mediante novas providências le-
gais procurou restringir a entrega de terras em arrendamento, era
tarde. Os grandes arrendatários já tinham entrado na posse de áreas
imensas, e ainda burlaram a nova lei, de 10 de maio de 1827, solici-
tando mais terra em nome de suas mulheres, filhos ou simples testas-de-
ferro.
A partir de 1832, sob a ditadura de Juan Manuel de Rosas, co-
meçava o desmantelamento do sistema da enfiteuse. Por um decreto
de 9 de junho daquele ano, prescrevia-se a doação de terras públicas,
em campos fronteiriços da província de Buenos Aires, e subsequente-
mente essas terras foram sendo alienadas, por venda ou remate em
hasta pública, ou doadas a militares que tinham participado das cam-
panhas contra os índios ou a favor de Rosas, bem como a povoadores

(14). - Veja-se a lei de enfiteuse in Jacinto Oddone,


- 251-

de zonas de fronteira. Entre os compradores estavam os próprios en-


fiteutas, que haviam cumprido as exigências do arrendamento de suas
concessões, principalmente o pagamento regular dos foros, e que go-
zavam de amplas facilidades, contratos a longo prazo e isenção de ju-
ros (16). Assim, o patrimônio imobiliário do Estado, que Rivadavia
e seus colaboradores tinham pensado em preservar, passava às mãos
de particulares, na maior parte à propriedade de umas poucas cente-
nas de famílias, que constituiram a aristocracia agrária da Argentina,
cuja caracterização vai-se precisar na segunda metade do século XIX.
No Paraguai, sob o governo dos Cônsules Carlos Antônio Lopez
e Mariano Roque Alonso, o Decreto de 9 de dezembro de 1843 re-
servou para arrendamento as terras de propriedades do Estado, situa-
das nas fronteiras do Norte e do Sul, em territórios de domínio ainda
indeciso e reivindicado pelo Brasil e pela Argentina. Essas terras, des-
tinadas à criação de gado, eram cedidas em enfiteuse, a despeito do
malogro desse sistema, na província de Buenos Aires. O arrendamento
durava oito anos e o enfiteuta obrigava-se a pagar anualmente ao Es-
tado 5% do valor da terra, calculado por um juri, formado por três
estancieeiros e pelo Comandante comissionado do distrito em que a
terra se localizava. Vencido o prazo da enfiteuse, podia o arrendatá-
rio adquirir por compra o seu lote, correspondendo os lotes a áreas de
uma, duas, três ou quatro léguas quadradas. Mas, quer dessas vendas,
quer das enfiteuses, ficava exclui do o direito de explorar, beneficiar e
exportar a erva-mate, direito privativo do Estado. O que o governo
objetivava era fomentar a ocupação efetiva dos territórios limítrofes,
cujo domínio, como se viu, era questionado pelos governos brasileiro
e bonaerense; e não uma ampla política
- 252-

FONTES e BIBLIOGRAFIA.

1. - Fontes Manuscritas.
A~quivo Nacional de Assunção - Seção História: vols. 229 e 243 (as ci-
tações específicas encontram-se no texto, em nobs de pé de página).
2. - Bibliografia Sumária.
ALONSO ELOY (Rosa) et alii, La Oligarquia Oriental en la Cisplatina. Mon-
tevid€u, 1970.
ALVAREZ (Juan), Estudio Sobre las Guerras Civiles Argentinas, Bue .. os Aires,
1914.
BEVENUTO (Luis C.), Breve Historia dei Uruguay, Buenos Ai~es, 1967.
CÁRCANO (Miguel Angel), Evolución Historica dei Régimen de la Tierra
Pública, Buenos Aires, 1925.
LESTARD (Gastón H.), História de la Evolución Económica Argentina, Bue-
nos Aires, 1937.
ODDONE (Jacinto), La Burguesia Terrateniente Argentina, Buenos Aires,
1967.
OTS CAPDEQUI (1. M.), Espana en América, Buenos Ai,es, 1959.
PASTORE (Carlos), La Lucha por la Tierra en el Paraguay, Montevidéu, 1949.
PIVEL DEVOTO (Juan E.), Raices Cololliales de la Revolución Oriental de
1811, Montevidéu, 1957.
SILVA (José Bonifácio de Andrada e), Obras Científicas, Políticas e Sodais,
coligidas por Edgard de Ce-queira Falcão, Santos, 1963.
SILVA (Raul de Andrada e), losé Bonifácio, o Pensador Reformista, in "Re-
vista de História", nQ 92, São Paulo, 1972.
Idem, A Ditadura no Paraguai (1814-1840). Uma Interpretação (Tese de
Doutoramento, não publicada).
SOSA (Jesualdo), losé Artigas, Buenos Aires, 1968.
STREET (John), Artigas y la Emancipación dei Uruguay, Montevidéu, 1967.

* *
*
INTERVENÇÃO.

Do Prof. Niko Zuzek (Universidade de São Paulo).


Pergunta:
"Na
- 253

• •

RESPOSTA DO PROFESSOR RAUL DE ANDRADA E SILVA.

Ao Prof. Niko Zuzek.


A revisão dos títulos de propriedade. a que nos referimos, ocor-
reu ainda durante o período colonial, na segunda metade do século
XVIII, e se inclui a na reforma, definida pela Real InstrucGÍón, de 15
de outubro de 1754. Esse diploma legal, abordava os aspectos essen-
ciais do problema da terra, no momento, e por outro lado reiterava os
princípios básicos do sistema agrário, instituido na legislação castelha-
na, desde o século XVI.
Todavia, quer-nos parecer que, em termos de reforma agrária,
entendida a expressão no sentido que ho.ie correntemente se lhe empres-
ta, não se processou, à luz dessa nova lei. conforme indaga o prezado
Prof. Niko Zuzek, meu Colega na Universidade de São Paulo, uma
política revisionista, tendente a promover o acesso à propriedade ter-
ritorial a um maior número de posseiros. A Real InstrucGÍón resguar-
dou os títulos de propriedade dos que já possuiam terras anteriormen-
te a ela, chegando a admitir as justificações de posse como títulos de
justa prescrição, no caso das situações de fato, ocorridas até 1700,
porem sempre com a obrigação, para os posseiros, de manter cultiva-
dos e lavrados os terrenos. Já para as posses posteriores a 1700, a
autoridade régia exigia a apresentação de título legítimo, medida que
servia para salvaguardar os interesses fiscais da Coroa, objetivo pre-
cípuo da reforma.
Alem disso, a nova lei não facilitava a simples aquisição de terras
pelos mais pobres, que não podiam arcar com o custo e vencer as di-
ficuldades das diligências judiciais, a que tinham de sujeitar-se os que
desejavam terras ou tinham de provar a legitimidade da posse das que
já ocupavam.
Em suma, tanto a Real InstrucGÍón
POLíTICA AGRÁRIA NA ARM~NIA OCIDENTAL
SOB O IMPÉRIO OTOMANO NOS SÉCULOS
XIX-XX (DE 1850 A 1914) (*).

YESSAI OHANNES KEROUZIAN


e
BEATRIZ DINIZ
da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Huma-
nas da Universidade de São Paulo.

Sob O Império Otomano não houve, nos paises do Oriente Médio,


uma estatística organizada referente ao setor agrário, como em qual-
quer outro da vida nacional. O censo oficial, relativo ao setor agro-
pecuário, realizou-se em 1927, no regime da Nova Turquia republi-
cana e com a assistência externa (1).
Durante cinco séculos, desde a queda de Constantinopla em 1453,
por Mohamed lI, até a segunda década do século XX, este império,
de regime teocrático e altamente autocrático, chefiado por um Sultão
c assistido por dois conselheiros onipotentes, o Grão-Vizir para os as-
suntos políticos e Sheik-ul-Islã para os religiosos, governou e adminis-
trou o seu próprio território e os dos paises conquistados pelas leis do
Islão.
A Armênia Ocidental, com uma superfície aproximadamente de
200.000 km2 (2), situada entre os rios Arax (a leste) e o Eufrates (a
oeste), depois de cair em poder do Sultão do Egito e dos Turcomanos,
em seguida sofreu o jugo da Pérsia e finalmente no século XVI, em
1555 (3), passou a integrar o Império Otomano. A política agrária
(.). - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe A,
no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - AMBARIAN, p. 5.
(2). - EREMIAN, p. 118.
(3). - Tratado de Amásia. assinado entre a Turquia e a Pérsia em
1555, estabelecia as fronteiras entre o Império Otomano e a Pérsia; v. Hist6-
ria do Povo Arm2nio, p. 85.
- 256-

adotada pelo governo central, com sede em Constantinopla, longe de


incentivar o meio rural, visava o esvaziamento da terra por parte de
seus legítimos donos, que eram os armênios, para transferir sua posse
aos grupos otomanos. E para alcançar esse fim, não havia a menor
preocupação com os meios utilizados, sendo violentos os preferidos.
As razões dos sinistros efeitos desta política não devem ser procura-
das pura e simplesmente nas leis do Islão em si, mas sim na estranha
mentalidade com que eram entendidas. De todos os paises do Islão,
onde o súdito não-muçulmano era o zimmi (devedor), somente no Im-
pério Otomano se aplicou com rigidez esta teoria segregacionista; aqui
o AI-Corão não foi interpretado com a devida flexibilidade. Os povos
árabes, promotores do Islão e predecessores da expansão otomana,
contribuindo para as artes e ciências nos paises conquistados, nos dão
uma clara distinção entre as duas mentalidades.
A política dos Romanos e Arabes referente aos povos dominados,
aproveitando suas leis e cultura, não foi totalmente seguida pelos Oto-
manos na conquista dos territórios do Império Bizantino. O não apro-
veitamento deveu-se em grande parte à mentalidade do conquistador,
assim como ao desconhecimento dos idiomas grego e latino em que se
encontravam compiladas essas leis; bastante complicadas, foram aban-
donadas. à medida que decorriam os anos. Assemelham-se as leis
otomanas às bizantinas no que se refere à criação do corpo militar
dos janízaros, versão otomana dos Temas bizantinos e às referentes
à distribl.!ição de terras (4).
A seguir versaremos, resumidamente, sobre as fontes, surgimen-
to do impériv otomano, divisões territoriais, normas de distribuição
de terras, categorias do meio rural e a terminologia fiscal:
I - As FONTES que nos esclarecem a respeito da política agrá-
ria otomana, são:
a). - Os "Registros" (daftar) (5), eram tipos de atas referen-
tes aos direitos e finanças do meio rural, e os "Anuários" (Sal-namé)
(6), tipo de almanaque: forneciam dados sobre o número de habitan-
tes das regiões, a produção agrícola, a pecuária, os impostos, etc.
Ambos eram os meios oficiais de informação, dos primeiros dispõe-se
apenas de documentação referente a alguns anos por década e os se-

(4). - PEIXOTO, p. 42, 44 - nQ 36; 138, nQ 116; p. 57, nQ 50;


KEROUZIAN, p. 324.
(5). - Daftar: Termo de origem árabe-pe~sa, designando caderno,
registro; SAFRASTIAN-ZULALIAN,
- 257-

gundos careciam de publicação regular; embora de carater oficial, es-


tão, por razões políticas e financeiras, deturpados. Uns e outros cons-
tituem portanto fontes primárias turcas para a realização deste tra-
balho;
b). - Os "Relatórios" de governos estrangeiros, em particular
os da Inglaterra, Rússia e França; subordinados muitas vezes a razões
de política externa, nem sempre nos dão a realidade. A parcialidade
e a simples reprodução, em muitos casos, dos dados fornecidos pelos
orgãos do governo otomano, apoucam-lhes o crédito. O mesmo acon-
tece com os relatórios dos viajantes particulares ocidentais, em que
há a t~ndência geral de agradar o dominador otomano, não faltando
ofensas aos "súditos" armênios, sem amparo governamental. Exem-
plos desses relatórios são os: de Carlile Mac Koan (7), membro do
parlamento inglês; do viajante francês Vital Cuinet (8); dos oficiais
russos Koliubakin, Maevski, Smirnov, Averianos, etc; os relatórios
desses últimos refletem a política anti-armênia dos tzares após a guerra
russo-turca de 1877-1878. Relatórios mais objetivos são os do belga
RoUen Jekmen (9), do inglês Can Melcoln Mackol e dos russos Ve-
selovski, Kovalevski, Grin e Diev. Os Relatórios dos últimos autores
foram inspirados no livro "Azul" do governo inglês (lO).
c). - Os "Arquivos armênios": do Patriarcado Armênio de
Constantinopla, dos centros diocesanos e de mosteiros, esses últimos,
dispersos por todas as regiões da Armênia, na parte oriental e ociden-
tal. Dos relatórios do Patriarcado os mais importantes são: "Rela-
tório das arbitrariedades turcas no interior" (11) "Relatório de con-
fisco de terras" (12); "Almanaque-Anuário do Hospital de São Sal-
vador de Constantinopla", a começar do ano de 1900; e "Atas do
Conselho Central Armênio" de Constantinopla, dos anos de 1860 a
1914.
d). - Os "Relatórios" de viajantes-pesquisadores armênios, da
Imprensa armênia, publicados sob a forma de livros. A série destes é

(7). - CARLILE, v. AMBARIAN, p. 6, nota 1.


(8). - CUINET, v" AMBARIAN, p. 6, nota 2.
(9). - Na tradução russa da obra do belga ROLLEN encontram-se
reunidos os relató 'ios dos autores russos citados no texto sob o título, A
Armênia - OS ARMENIOS E OS TRATADOS, Moscou, - 1896 (em
russo) .
(10). - AMBARIAN, p. 6; KOLIUBAKIN, A.M. v. AMBARTAN.
p. 7, nota 4; MAEVSKI, v. AMBARIAN, p. 7, nota 5. Esses últimos autores
foram consultados através de referências contidas na obra de AMBARIAN.
(11). - Relatório das Arbitrariedades Turcas no Interior, Constantino-
pla, 1876, sob a forma de livro.
(12). - Relatório de Confisco de Terras - elaborado por uma Comis·
são do Patriarcado Armênio, Constantinopla, 1910,
- 258-

longa demais. Notem-se, pela sua importância primordial os de G.


Servanztianz, M. Mirakhorian, P. Nathanian, R. Begulianz, G. Ardz-
runi, A. Eritzian, Leo, A. Thokmakian, etc. (13).
Por falta de um poder civil armênio, nesta parte, a Igreja (com
sede em Etchmiadzin na Armênia Oriental), as instituições humanitá-
rias, culturais e a Imprensa Armênia é que se interessavam pela orien-
tação e pelo destino de seu povo, através de boletins, de diários de via-
jantes, que informavam sobre a realidade armênia.
Por razões óbvias eram as duas últimas categorias de fontes, as
armênias, que nos oferecem a realidade histórica.
* *

11. - O APARECIMENTO DO IMPERIO OTOMANO.

Vindas da Ásia Central, as primeiras tribos turcas invadem, no


século XI, a Á1sia Menor e no século XII formam o Sultanato de Icônio
(Cônia de hoje). Mais tarde, no século XIV, um chefe, Osman ou
Otman, agregando os diferentes grupos autônomos dessa tribo, im-
planta um império de força, denominado "Otomano". Adestrados pela
natureza para guerrear e destruir, os sucessores de Osman conquistam,
até o século XVII, todo o Oriente Médio, a Ásia Menor, todo o litoral
norte da África, a península Balcânica e a Hungria. No ano de 1555,
pelo "Tratado de Amásia", assinado entre o Império Otomano e o Irã,
todas as regiões armênias do Rio Arex para o ocidente passam para o
domíl1io otomano, ficando as da parte oriental sob a ação do Irã.
Inicialmente com a expansão árabe e depois com a otomana, a
Armênia Ocidental ,situada no caminho entre o leste e o oeste, acabou
como uma ilha num imenso mar panislâmico. Com o tempo, elemen-
tos de tribos alheias, em particular turcas e kurdas, espalharam-se por
toda a superfície da Armênia Ocidental, nas aldeias e nos centros ur-
banos, vivendo à custa dos povoados armênios. Terras e bens acaba-
ram alienados aos armênios, que começaram a ser considerados, pelo
governo central, como "minoria" (Mil-let) (14) em seu próprio país.

(13). - Dos autores mencionados me-ecem destaque os seguintes: SER-


VANZTIANZ, obra citada; MIRAKHORIAN, obra citada; NATHANIAN.
obra citada; BEGULIANZ, obra citada; ARDZRUNI, p. 14; ERITZIAN,
obra citada; LEO,
- 259-

o sultão Mohamed 11 outorgou, em 1453, um Estatuto para a


"mino:ia" armênia de seu império; ao mesmo tempo instituiu o Pa-
triarcado Armênio de Constantinopla. Visava, por esta última provi-
dência, prevenir toda interferência externa nos assuntos dos armênios
de sua dominação, em particular a do supremo patriarca de todos os
armênios, com sede na Armênia Oriental. de uma ou de outra forma
sob a influência russa. O patriarca armênio de Constantinopla go-
zava ele autoridade limitada, religiosa-jUrÍdica-administrativa, assim co-
mo era responsavel pela conduta de seu povo perante a Sublime- Por-
ta (15).
Ao lado dos armênios, todos os povos cristãos do império foram
considerados como "minorias", tendo cada um seu chefe religioso e
estatuto próprio, cuja aprovação dependia do governo central.
Deveriam os estatutos garantir as [berdades civis e religiosas das
minorias. Na prática as liberdades estavam garantidas somente no pa-
pel. Todo o interior armênio estava à mercê dos bandoleiros armados
de toda espécie: turcos, kurdos, etc., incentivados pelo governo cen-
tral. O· porte de armas era proibido à "minoria" armênia. Os bando-
leiros agiam impunes com a conivência das autoridades civis e milita-
res locais. Confisco de terras, de bens, pilhagens, raptos, com simu-
lada legalidade, atentados contra a vida, abjurações forçadas, etc.,
estavam na ordem do dia. O recrutamento de crianças cristãs, islami-
zadas e criadas pelo governo, a fim de formarem futuramente um se-
leto corpo de choque, com o nome de Janízaros, Yenitcheri, foi um
plano diabólico dos sultões.
Houve, sim, várias tentativas reformistas, visando aparentemente
à melhoria dos povos subjugados. Em 1826, o sultão Mamud 11 (1809-
1839) aboliu a temivel organização dos Yenitcheri por se ter tomado
uma força independente dentro do próprio governo. Seu sucessor, o
sultão Abdul-Medjid (1823-1861) publicou o decreto Gulhané Hatti
Sherif (Escrito Ilustre da Casa de Rosas), como primeira regulamen-
tação (Tamzimat) da inviolabilidade da vida e bens de todos os súditos
do Império, da distribuição equitativa dos impostos, da redução do
tempo de serviço militar, etc. Em 1856, após a guerra da Criméia,
outro decreto, Haddi Humayum reconhecia a todos os súditos do im-
pério, sem distinção de crença e nacionalidade, igualdade perante a
lei; concedia-se direito aos cargos públicos, estudo do idioma nacional;
prometia-se coordenar o sistema dos impostos; proibia-se o uso dos

(lS). - Porta ou Sublime Porta: Os sultões viviam enc1ausurados vo-


- 260-

apelidos ofensivos aos cristãos (guiavur, infiel) e aos judeus (djihud).


Abdul-Hamid lI, (1842-1918) o "Sultão Vermelho", ao subir ao tro-
no, em 1876, deu a nova Constituição, onde as expressões "igualda-
des de todos os súditos, garantia de vida e bens, distribuição equitativa
dos impostos, liberdade de palavra, de imprensa, de consciência", etc.,
se repetiam de forma monótona.
Com estes decretos "reformistas" preocupava-se apenas em anu-
lar os motivos de interferências das grandes potências ocidentais em
favor das "minorias" cristãs, assim como em prevenir o desmorona-
mento do império, ameaçado pelos subsequentes levantes de liberta-
ção, em várias áreas, inclusive e sobretudo na Armênia Ocidental, e
pela incontrolavel corrupção, que do palácio do próprio sultão se es-
tendia até os últimos representantes militares e civis do poder. Infe-
lizmente, essas reformas não passavam de mera ilusão, pois, após a
publicação de cada decreto, a situação se agravava na Armênia Oci-
dental. O Sultão Vermelho, logo após a promulgação da nova Cons-
tituição, declarou fora da lei o uso das palavras, como "liberdade,
igualdade, constituição, revolução, progresso, etc."; foram proib:das
as reuniões dos Conselhos Regionais dos Armênios, os agrupamentos,
o ensino da História da Armênia, a venda da figura da "Mãe-Pátria
Armênia", até o olhar para cima, ao passar pelo palácio do governo;
e começaram as execuções em massa de armênios.
O regime político adotado pelo império para com os povos ven-
cidos, originou problemas complexos, permitindo aos dominados a per-
manência em seus territórios, mas obrigando-os, em troca, a manter-
se socialmente isolados, em bairros separados. O historiador turco do
século XVI, Ibrahim Bechevi, referindo-se à invasão do Oriente pelo
sultão Solimão II (1494-1566) durante os anos de 1551-1554 e ao
trato dado aos armênios escreveu:

"As forças otomanas chegaram à região denominada Shora-


kial e alí se detiveram; este país era próspero e tinha muitas al-
deias ricas, com terras cultivadas. A região é montanhosa. O
exército destroçou e dest. uiu essas aldeias pacíficas, reduziu a
nada os edifícios arrasando-os. Daí o exército se dirigiu à cidade
de Erevan, que é o coração do país... puseram fogo, incendia-
ram e arrasaram tudo. Somente Deus sabe o núme~o de mor-
tos e feridos" (16).

Outro historiador turco, Selinik, dos fins do século XVI,


- 261-

de acordo com o tradicional costume otomano, as au-


to:idades careciam de consciência... como os lobos se lançam
sobre o rebanho de ovelhas, assim atacavam aos armênios e os
saqueavam" (17).

No entender dos governantes do império, a melhor forma de so-


lucionar a chamada Questão Armênia (18) consistia na liquidação de
todos os armênios.
* *
111. - DIVISÃO
*
ADMINISTRA TlVA DA ARMENIA
OCIDENTAL
Nos fins do século XVI, os territórios asiáticos do Império Oto-
mano se dividiam em elayetes (19). A partir desta data os nomes das
localidades armênias começaram a ser substituídos por nomes turcos.
Em 1860 a maior parte da Armênia Ocidental integrava-se no elayete
de Erzerum, antigo Karin, e a outra parte nos elayetes de Sebaste e
Tigranakert. Os armênios eram tão numerosos no de Erzerum, que
este fúi denominado ermenistan elayeti (elayete armênio). Dele de-
pendiam militar e administrativamente os territórios da Armênia sub-
metidos à autoridade do sultão.
A partir da segunda metade do século XIX, o governo otomano
modificou inúmeras vezes a divisão administrativa da Armênia Oci-
dentl1l, sempre com a mesma finalidade de demonstrar que os turcos
constituiam a maioria em todas as suas regiões.
A Lei dos Vilayetes (Teshkliat Vilayet) de 8 de novembro de
1864, do sultão Abdul Aziz, transformava a divisão de elayetes em
Vilayetes (20).
Em 1876 o elayete de Erzerum foi dividido em vilayetes de Er-
zerum, Van, Kars, Erzinka, Bayazid, Paghesh, Mush, Dersin.
Após a Guerra Russo-Turca (1877-78) a província de Kars e
adjacências foram incorporadas à Rússia e os demais vilayetes de Er-
zerum, Kharberd, Dersin, Paghesh, Van. Hekyar, Sivas (Sebaste) e
Tigranakert, passaram a constituir a Armênia Ocidental.
Os Armênios eram centralizados de preferência nos vilayetes de
Erzerum, Van, Bayazid, Kharberd, Diarbekir, Sivas e Cilícia. Este
último fora dos limites da Armênia Ocidental.
(17). - OHANIAN, p. 22.
(18). - AMBARIAN, p. 29-36; OHANIAN, p. 21, 40.
(19). - Elayete: antigo distrito provincial em que estava dividido o
Império Otomano.
(20).
- 262-

Esta distribuição em Vilayetes atendia a fins políticos, não a ra-


zões geográficas, econômicas e administrativas, como no caso do Vi-
layete de Bitlis ou Paghesh, a 20 Km da costa ocidental do lago Van,
o qual ficou completamente isolado de Sighert; que estava a 50 Km ao
sul; da mesma maneira se separou de Tigranakert uma parte e consti-
tuiu o Vilayete de Kharberd (Mamuret-ul Aziz): dos quatro pontos car-
diais somaram povoações turcas e formaram o vilayete de Sivas (Se-
baste), pensando em debilitar a superioridade numérica dos ar-
ménios. As povoações eram principalmente rurais e as aldeias e po-
voados se agrupavam ao redor de uma capital (Mairakaghak) (21).
Os vilayetes governados por um pashá (22), com o cargo de vali
(governador) (23), se subdividiam em sandjaks (províncias) (24), go-
vernadas pelos muttesariffs (25); cada sandjak em gazás (distritos),
governadas por Kaimakams (26). Os Kodjabashis (27) governavam
as aldeias.
O vali era, no vilayete, a autoridade máxima e se encarregava
de sancionar as leis. administrar iustiça e arrecadar impostos, asses-
sorado por vários funcionários: religioso (gadi); comentarista do Al-
Corão (Mufti); financeiro (defterdar); chefe de escritório (mektubedji),'
chefe da guarda militar; responsavel rural; encarregado policial da
identidade dos súditos, etc. Alem desses funcionários havia os Con-
selhos locais (Medjlis Idaresi), eleitos pelo povo, cabendo a eles os as-
suntos relativos aos impostos, multas, rendas e despesas, comércio,
agro-pecuária, educação e religião dos súditos. Conforme o assunto,
cada conselho era composto de quatro funcionários, sendo dois mao-
metanos e dois cristãos eleitos anualmente entre as personagens mais
ricas e influentes. Na prática, a designação desses funcionários como
a estrutura do aparato governamental baseava-se no suborno, sendo
os cargos e funções vendidos aos que melhor pagassem.
Entre os anos de 1860-1870, o número de armênios no Império
Otomano girava em tomo de 3.400.000 a 3.600.000 (28).
Ao passo que em 1880, após a Guerra Russo-Turca, quando o pro-
blema armênio tomou-se objeto da diplomacia internacional, o go-
(21). - Mairakaghak: (cidade-mãe), termo armênio que designa ca-
pital.
(22). - Pashá: deriva do persa pa (pé) e shah (rei) e equivale a
"sustentáculo do trono".
- 263-

vemo otomano declarava que na Armênia Ocidental havia somente


780.000 armênios. O viajante francês Vital Cuinet, não vacilou em
abaixar tal número para 666.435 armênios (29), baseado nos dados
oficiais.
* *
IV. -
*
NORMAS DE DISTRIBUIÇÃO E AQUISIÇÃO
DE TERRAS.

No Islão, o sultão, como vigário divino, gozava do senhorio sobre


as terras de seus domínios. Daí derivava-lhe a faculdade de estabele-
cer normas de distribuição de terras, impostos e taxas imobiliárias
(30), aos seus súditos, assim como, a partir dos meados do século XIX,
aos estrangeiros que habitavam o Império Otomano.
Grande parte do território, o sultão reservava para si e para a
sua família; do restante, parte era distribuida aos altos funcionários ci-
vis e militares, em recompensa de serviços prestados, assegurando-lhes
uma renda anual de 100 mil aktché (31). Essas terras eram isentas de
impostos governamentais, e caso os seus donos deixassem de servir ao
sultão, as terras eram devolvidas. Outra parte das terras era doada
aos militares (sipahi), conforme o seu posto. Havia nesse caso dois
tipos de doações, os timari e os ziamedi, diferenciadas entre si, pela
extensão e renda territorial. As de timari eram dadas aos militares
com uma renda de 3 a 20 mil aktché, e as de ziamedi, aos militares
de 20 a 100 mil aktché.
Os militares (sipahi) pagavam impostos e eram obrigados ao ser-
viço militar, a recolher impostos e multas para os cofres públicos e
fornecer para o governo central um certo número de soldados; tinham
o direito de deixar para os filhos os seus bens. Mas, caso os descenden-
tes estivessem incapacitados de prestar serviço o militar exigido, eram
privados de suas terras (32).
Os direitos e as obrigações desses dois sistemas de doações (Ti-
mari e Ziamedi) eram os mesmos do sistema de terras adotado no feu-
dalismo ocidental (33).
A começar dos séculos XVI-XVII, os sipahis adquiriram o di-
reito de possuir dois, três ou mais feudos; isso os tomou uma cate-
(29). - ARAKERIAN, tomo XVII; AMBARIAN, p. 43.
(30). - VARTANIAN, p. 30.
- 264-

goria de médios latifundiários e, para cuidar de suas terras, eles


por sua vez criaram o sistema de vassalagem. Com o tempo a posição
desses latifundiários tornou-se tão perigosa para o governo e para as
populações, que o sultão Abdul Medjid mandou executar muitos de
seus chefes (34). A medida contribuiu para aumentar, nos anos de
1830 e 1850, o número de pequenos proprietários rurais.
Uma grande parte das terras conquistadas o sultão doava às ins-
tituições religiosas do Islão. Até o século XVIII, essas instituições se
tornaram proprietárias de grandes latifúndios. Em 1834 o sultão Ma-
mud lI, tentou restringir os direitos de tais instituições, mas, devido à
grande reação destas, desistiu de seus intentos.
Abdul Medjid promulgou o decreto de 21/4/1858, dividindp em
cinco categorias as terras do Império Otomano: Arazi-Metruké, Arazi-
Mevat, Arazi-Miriyé, Wakf, Mülk.
a). - Na primeira categoria (Arazi-Metruké), entravam as ter-
ras de aproveitamento público como os bosques, estradas, pontes, pas-
tagens, terrenos destinados ao mercado, lugares sacros, e as minas.
Ninguem podia se apropriar delas.
b). - Na segunda categoria (Arazi-Mevat), entravam as mon-
tanhas, as regiões de vegetação de pequeno porte, e pantanais, distan-
tes meia hora de um povoado (em mula ou em burro). Podiam ser
aproveitadas por parte de terceiros, por dois anos, com a condição de
realizar melhoramentos, cultiva-Ias, sem pagar para isso nenhum im-
posto. Após dois anos essas terras teriam que ser devolvidas.
c). - A terceira categoria (Arazi-Miriyé) constituia-se de ter-
ras cultiváveis, sendo direito de todos aproveita-las. Se alguem dese-
java se apropriar dessas terras, deveria fazer requerimento ao chefe
municipal superior (Kaymakam) ou ao provincial (Muttesariff) , ou
ainda ao chefe regional, o vali. Funcionários enviados posteriormente
por esses chefes, mediam a extensão da terra pretendida, demarcavam
as divisas, avaliavam o preço e faziam as operações de transação.
O requerente pagava aos cofres públicos a taxa de transação e
recebia uma cópia do documento provisório chamado kotcham; outra
ficava no arquivo local e uma terceira, no arquivo central de Constan-
tinopla, onde era deferido ou indeferido o pedido. Em caso de defe-
rimento o requerente recebia o documento definitivo de posse, cha-
mado tapu, no qual constava nome e sobrenome, limites, medidas,
valor da terra, e forma de posse. Essa podia ser por herança, compra,

(34). - Masis (Perió:lico) núme-os de janeiro-fevereiro-abril-julho de


1882, abril de 1883; MIRAKHORIAN, obra citada; AMBARIAN, p. 50.
- 265-

doação, hipoteca ou ainda pela "lei dos dez anos" (35)., O tapu pas-
sava para as atas do governo.
Os compradores das terras em forma de tapu, tinham direitos de
utiliza-las até a morte, herda-las, dividi-las entre seus familiares, fazer
doações, hipoteca-las, vende-las, construir casas, transforma-las em po-
mar ou vinhedos, etc. (36). Tais compradores, mesmo sem se tor-
narem proprietários, gozavam de todos os direitos de propriedade (37).
Nos casos em que o governo julgava oportuno, como o não cul-
tivo das terras por mais de três anos, o não pagamento de impostos,
multas, etc., podia requisitar tais terras, pagando uma certa indeniza-
ção.
d). - As terras da quarta categoria (Wakf) eram de domínio
das fundações religiosas muçulmanas. Compreendia os bens de raiz ina-
lienáveis, cuias frutos pertenciam às mesquitas e em geral ao culto
islâmico, a uma fundação religiosa ou à descendência do constituinte
da fundação: não pagavam impostos, taxas e contribuições. Os cam-
poneses que as cultivavam deviam utilizar os seus próprios instrumen-
tos de trabalho e entregar ao proprietário a metade da colheita. A
condição social desses trabalhadores é equiparada à dos escravos, pois
eram doados como acessórios da terra e não podiam abandona-las. As
terras desta categoria eram adquiridas tambem por intermédio de tapu,
mas não da mesma maneira que as da categoria anterior. Com o tapu
apenas se adquiria o direito de cultivar as terras pelo sistema de mea-
ção. Eram terras que podiam ser herdadas, mas nunca vendidas ou
hipotecadas. Eram fiscalizadas por um Ministério chamado Evkaf.
e). - A quinta categoria (Mülk) eram terras de particulares.
Os donos gozavam o direito, independente do consulta, de as vender,
herdar, hipotecar, doar e mesmo deixar de cultivar. Porem a lei im-
punha certas restrições; assim, era proibido tudo que pudesse de al-
gum modo prejudicar o direito de outrem. Não era permitido o plan-
tio de arroz quando prejudicasse o vizinho; era permitida a poda dos
ramos que a arvore deitasse sobre o terreno contíguo, etc. (38). De

(35). - A Lei dos Dez Anos, ou da Antiguidade, consistia no seguinte:


quem por dez anos ininteruptamente cultivasse as terras de arazi-miriyé, teria
o direito de requerer o tapu sem efetuar nenhum pagamento, Ao passo que,
se alguem se apossasse dessas terras de forma indevida, podia obter o tapu me-
diante o pagamento estipulado; caso contrário, o governo podia se apossar das
terras.
(36). - Arquivo Hist6rico Georgiano, Fundo 521, 543, 547, 1087; AM-
BARIAN, op. cit., pp. 51, 52, notas 11 e 12.
(37). - Bizâncio (Revista), julho 1905; AMBARIAN, p. 52.
(38). - PEIXOTO, Lei das XII Tábuas, do Direito Romano, p. 57,
n'" 50.
- 266-

acordo com a lei de 1858, ditada pelo sultão Abdul Medjid, só podia
ser proprietário de terras dessa categoria quem recebesse do governo
o título de propriedade (lapu), por venda ou doação. Nos vilayetes
orientais do Império, isto é, nas regiões da Armênia Ocidental, só go-
zavam do direito de possuir título de propriedade os senhores (aghás)
(39) principalmente kurdos e um pequeno número de pashás e beys
(40) .
Em 1867 um decreto do sultão Abdul Aziz (1830-1876) obrigava
os pequenos proprietários, para garantir a posse de suas terras, a pagar
quantia equivalente a 15% de sua renda anual. Um mês depois, o
decreto de 18.6. 1867, permitia a estrangeiros a compra de terras no
Império Otomano, sujeitando-os às mesmas obrigações dos súditos oto-
manos.
Em 1873 outro decreto do sultão obrigava a revisão dos docu-
mentos de posse da terra (tapu), e, quem não os tivesse, teria que re-
gularizar a sua situação através de pagamentos. Essas leis asseguravam
quantias notáveis para os cofres do sultão.
De todos os sultões, Abdul Hamid lI, foi o maior latifundiário do
Império Otomano, com cerca de 3,1 % das terras do Império, que equi-
valiam a 37.000.000 de denüm (41), compreendendo, na Ásia Menor,
Adana, Bagdad, Bassora, Mussul, Alepo, Damasco, Beirute e Jeru-
salem (42). Seus ministros, os dignatários do governo e os grandes la-
tifundiários, embora constituissem 5% da população do Império Oto-
mano, tinham centralizados em suas mãos, segundo uma estatística,
65,5% das terras da Turquia. Enquanto isso, os pequenos proprietá-
rios rurais que compunham 87 % da população, tinham apenas 31,4%
das terras; finalmente os restantes 8% da população rural não possuiam
terras, não tinham poder algum, e, portanto, viam-se colocados numa
posição social inferior, com muitos deveres, e quase sem direitos (43).
Segundo um levantamento das propriedades rurais da categoria
do mülk, de acordo com as origens dos elementos raciais que povoavam
a Armênia Ocidental, constituiam os kurdos o maior núcleo de pro-
prietários de terras em quase todas as regiões da Armênia Ocidental;
os turcos prevaleciam em Sebaste, Erzerum (Karin); os Sírios em Van;
e os armênios, na região de Kharberd, Van e Tigranakert, contando

(39). - Aghá: chefe militar.


(40). - Bey: chefe; título honorífico turco de militar de grau supe-
rior ao de coronel e na hierarquia civil aos de graus correspondentes ou maio-
res.
(41). - Denüm: 1 denüm equivalia a 40
- 267-

em 1903, com 119 mosteiros e 1.073 igrejas (44), distribuidas nas re-
giões de Erzerum (Karin), Paghesh, Van, Khorberd, Tigranakert, Se-
baste (45). A população armênia, em sua maioria, aproximadamente
2 . 500. 000, pertencia ao campo. Com o tempo foi diminuindo o nú-
mero de pequenos lavradores armênios, sempre à mercê das pilhagens
civis e militares turcas. Os armênios começaram então a adquirir
imóveis nos grandes centros urbanos, dedicando-se de preferência à
profissões liberais, ao comércio e ao artesanato.

* *

V. - AS CATEGORIAS DO PEQUENO MEIO RURAL E SUAS
POSSESSOES NO IMPÉRIO OTOMANO.
Os trabalhadores rurais dividiam-se na Armênia Ocidental, em
quatro categorias: livres, bradak, marabás e escravos.
Os livres: os trabalhadores considerados livres, pagavam impos-
tos ao governo central ou às instituições religiosas e não estavam pre-
sos à terra.
Os bradak: eram trabalhadores rurais sem terra, viviam como
mão-de-obra, recebendo pequena remuneração em dinheiro, em rou-
pas e alimentos. Geralmente prestavam serviço extraordinário, em
épocas de colheita e de semeadura.
Os marabás: estes trabalhadores viviam em situação miseravel,
em completo isolamento durante anos, sem mesmo poder ver os fa-
miliares. Havia dois tipos desta categoria, alguns não possuiam os
meios necessários para trabalhar a terra, viam-se constrangidos a con-
trair empréstimos usurários, alem de pagar as contribuições impostas
pelo governo; no mesmo passo, outros possuiam os instrumentos de
seu trabalho e eram mais independentes. Geralmente, neste caso, aos
homens cabia o trabalho de semear, lavrar. colher, alimentar os ani-
mais, enquanto as mulheres costuravam e lavavam as roupas dos pro-
prietários e dos membros de sua fanulia, ordenhavam, preparavam a
manteiga, o queijo e outros tipos de comida em conserva, etc., enfim
todo o serviço determinado pelo proprietário.
Nos dois casos dos marabás, havia um compromisso oficial entre
os trabalhadores e os senhores das terras, que se realizava através de
empréstimos com lucros e juros.

(44). - Almanaque Anuário do Hospital Armênio São Salvador_ Cons-


tantinopla, 1903; AMBARIAN, p. 65.
(45).
- 268-

Os proprietários chegavam a intervir nos destinos dos seus la-


vradores, mesmo combinado os casamentos, e gozavam do direito de
vida e morte sobre os súditos.
Aqui era adotado o sistema de meeiros e proibidas as mudanças
de residências e de trabalho.
Os abusos, nesta categoria, praticados com o consentimento do
governo central, criavam uma verdadeira forma de escravidão extra-
oficial.
Nos vilayetes armênios haviam muitos marabás, que eram conside-
rados camponeses livres, mas, na realidade, com o tempo, passavam
com a família a trabalhar em propriedades particulares de funcioná-
rios turcos, em condição similar a dos vassalos medievais, em serviços
agrícolas e ainda domésticos; dependiam de benevolência, não tinham
relação direta com o governo central. Grande parte, para se libertar,
emigrava para as cidades. EmVan, Shadak, Mogs, Mush, Bitlis, Sasun
e Diarbekir, os aghás kurdos, entregavam os marabás com suas fa-
mílias e bens a outros senhores, em doação ou em pagamento.
Os escravos: a escravidão existiu na época da dominação oto-
mana. Em 1848 o sultão Abdul Medjid promulgou um decreto abo-
lindo-a, mas este ficou sem efeito algum.
A compra de escravos se fazia muitas vezes por preços baixíssi-
mos; por exemplo: o preço de uma moça era equivalente a mais ou
menos um dolar atual. Na Armênia Ocidental eram os cristãos, em
particular as mulheres armênias, sujeitos à escravidão, vendidos aos al-
tos funcionários do sultão pelos governadores e chefes de províncias e
de tribos kurdas (46).
Faltam-nos estatísticas dos bens da classe dos lavradores, apenas
possuimos alguns dados entre 1909 e 1910 dos seguintes vilayetes:

Van: o trabalhador rural podia possuir 3,3 hectares


Erzerum (Karin): 1,5 hectares
Paghesh: 8,3 hectares
Sebaste: 2,4 hectares
Kharberd: 1,9 hectares
Tigranakert: 4,0
- 269-

Quanto ao gado, a proporção era tambem desigual entre esses


três grupos. As razões eram as mesmas referidas acima. Cabia a cada
lavrador uma média de 2 a 3 cabeças de bovinos e de 5 a 10 caprinos.
Em quase todas as regiões ao pequeno lavrador armênio (74,1%) era
negado o direito de possuir gado.
* *
*
VI. - TERMINOLOGIA FISCAL DA ÉPOCA, REFERENTE AOS
PRINCIPAIS IMPOSTOS (47).

Os súditos do Império Otomano, alem de satisfazer aos grandes


latifundiários, às instituições religiosas, através de doações agro-pe-
cuárias, deviam pagar os seguintes impostos ao governo central:
Adeti agnam - imposto sobre os animais com chifre de pequeno
porte (tipo cervo).
Ashar - era um imposto porcentual em dinheiro sobre as co-
lheitas obtidas no cultivo de propriedades do Estado, das mesquitas,
conventos e ainda de propriedades de alguns particulares. Do ponto
de vista fiscal estas terras se chamavam ashirié. Teoricamente o im-
posto era um quinto, mas na prática se duplicava e às vezes alcançava
a metade da colheita (48).
Bedel Askerieh - resgate que pagavam as "minorias" para se
eximirem do serviço militar no exército turco. Era um imposto anual,
fixado inicialmente em 5.000 piastras para cada 180 homens e, depois
de 1884, para cada 130 homens (49) .
Djizya. Capitação - tributo que pagavam os vencidos aos ven-
cedores muçulmanos, para salvar a sua vida. Impunham-se aos varões
adultos não-muçulmanos em troca da liberdade de conservar a sua re-
ligião num estado muçulmano, conforme a posse do contribuinte. Até
a sanção do Hatti Humaiun em 1856, se impunham à razão de 60 pias-
tras aos ricos, 30 aos de meia fortuna e 15 aos pobres.
Cr.air Akchesí - imposto sobre as aves;
Cherakhor Akchesí - imposto sobre o gado;
Dekhavanar - imposto sobre os porcos;

(47). - A terminologia fiscal otomana na mlioria, tem origens árabe-


persa; foram consultadas as obras de AMBARIAN, p. 313-316; SAFRASTIAN-
- 270-

Ebenié - imposto cobrado na reforma ou construção de mora-


dias;
Erazi Mirié - imposto territorial;
Ferash - imposto cobrado na venda de terras;
Gumruk - imposto alfandegário;
Haratch ou Diezmo - era uma contribuição direta que onerava
a renda dos imóveis com uma taxa de 10% sobre os frutos da terra.
Os imóveis taxados se denominavam hartchié; não se pagava por indi-
víduo, mas segundo a população do vilayete; assim, uma vez fixada
uma quantia determinada, devia ser paga sempre, sem se terem em
conta as diminuições possíveis por calamidades ou emigrações;
Intiral - imposto cobrado sobre a herança de terras;
llisab - sobre a venda de animais (cavalo ou boi);
Kasáb Akchesí - sobre a carne;
Khainchur - sobre as pastagens;
Kilé Parasí - sobre a venda de trigo;
Maden - sobre poços e minas;
Mar,.if Hisasi - imposto escolar;
Mehkem - taxa judicial;
Nufuz Teskeresi - imposto sobre cada filho;
Orman Resmi - sobre a venda de madeira para construção;
Rabib Akehesi - sobre as confissões religiosas;
Reftiyé - sobre a exportação;
Resmi Agnam - imposto sobre a cabeça de cada ovelha e cor-
deiro;
Resmi Mucerred - sobre o celibato;
Rüsumi Arusane - sobre o casamento;
Resmi Muskirat - sobre as distilarias (bebidas - arak);
Salyané - sobre os bens imóveis dos lavradores (terra cultivavel,
pastagens, moradias, vendas) de 3 a 5% anuais;
Sesim Kismet - imposto sucessório;
Tanzi Fat Verkusi - sobre a venda de imóveis urbanos;
Tapu - imposto cobrado na venda de propriedades. Era a cer-
tidão de propriedade;
Temet - Tuhat - sobre os ganhos, lucros;
Tobrak - Basan - imposto cobrado no estacionamento de car-
roças e cavalos;
Verguiú - sobre os edifícios;
Zabié - na matança de gado de corte;
Alem dos impostos citados, ainda os havia sobre o sal, o tabaco,
os selos postais, ainda para manter os correios do sultão; para os imó-
veis de propriedade do império; para cobrir gastos de novos recruta-
mentos no exército; para construção e conservação de caminhos
- 271-

pontes, que se satisfazia etn trabalho pessoal quatro ou cinco dias por
ano e dele era possivel eximir-se mediante um pagamento em dinheiro
(gorr, pekiar).
Ainda podemos citar o "imposto de hospitalidade" que consistia
na obrigação do cristão de oferecer alojamento e comida três dias por
ano a qualquer funcionário do governo ou autoridade que visitasse a
região (50).
A função de coletar impostos no Império Otomano era dada a
pessoas conforme o tipo de arrecadação. Os coletores do ashar eram
geralmente funcionários, compravam os cargos dos arrecadadores lo-
cais e desse modo reuniam em poucas mãos não só os impostos legais,
senão tambem suas ganâncias particulares.
O Diezmo ou haratch era arrecadado por dois meios: ou o davam
aos elayetes, atribuindo-se a pessoas privilegiadas (multezim) por uma
soma fixa e um período determinado, ou era coletado diretamente por
agentes do Tesouro, civis ou militares. Ambos os sistemas criavam
dificuldades: a adjudicação, que se seguiu até aproximadamente a me-
tade do século XIX, originava corrupção e desonestidade, já que o
multezim cobrava as contribuições no elayete e entregava ao Tesouro
Público uma quantia fixa e pré-determinada, ficando com a diferen-
ça (51) .
Com o tempo o multezim aumentou a taxa dos impostos, se apro-
priou da maior parte das rendas e só recolheu ao Estado a quantidade
fixada por lei; frequentemente o adjudicatário era o vali, cujo poder
aumentava na medida da distância da capital e das influências pode-
rosas nas altas esferas; geralmente ajudava um sara! (cambista ou
prestamista), que adiantava o custo do cargo para explorar os contri-
buintes (52).
Depois de pagar, o adjudicatório tinha direitos plenos sobre os
contribuintes, .os quais não podiam reclamar ante o governo central,
em Constantinopla, pela ausência de um controlador administrativo
superior, aumentando assim, os protestos contra o vali local, que não
eram escutados. O medo às represálias do arrecadador submetia os
contribuintes (53).
Concluindo, o sistema feudal na Armênia Ocidental foi mais rí-
gido do que o adotado nas demais regiões do Império Otomano, usado
(50). - TRITTON, p. 5; VARANTIAN, vol. I, p. 30; BARON, vol.
m, p. 139.
(51). - BOGHOSIAN, vol. 111, p. 236.
(52). - HERSHLAG, p. 15; VARTANIAN, p. 33; NERSESSIAN, p.
55.
(53).
- 272-

para gara..'ltir a estabilidade do governo central. Foram mesmo cria-


dos grupos de milícia encabeçados por elementos turcos e kurdos, do-
tados de inteira liberdade de ação, com a finalidade de sufocar os des-
contentamentos do meio rural. E devido a isso inúmeros armênios
deixaram suas terras fugindo desse regime, aumentando assim a Diás-
pora Armênia.
Conclui-se do exposto que o sistema agrário adotado pelo go-
verno otomano em relação à Armênia Ocidental, longe de incentivar
o meio rural, visava o esvaziamento total da terra por parte de seus
legítimos donos, os armênios, facilitando sua posse por parte de gru-
pos turanianos. O camponês (raia) (54) estava submetido ao poder da
força, que havia organizado um regime de imoralidade administrati-
va. Isto gerava relações de conflito entre o camponês e os elementos
do dominador otomano.
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Periódico Masis, janeiro, fevereiro, abril, julho, 1882; abril 1883 (em armênio).
Relatório das Arbitrariedades Turcas no Interior (armênio), da Cúria do Pa-
triarcado Armênio de Constantinopla, Constantinopla, 1876 (em ar-
mênio) .
História do Povo Armênio - de autoria de uma equipe de professores da
Universidade de Erevan, sob o patrocínio da Academia Armênia de
Ciências, E-evan, vol. IV, 1972 (em armênio).
Relatório de Confisco de Terras, Constantinopla, 1910 (em armênio).
Revista Bizâncio, Constantinopla, julho, 1905 (em armênio).

• •

INTERVENÇÃO.

Do Prof. Eurípedes Simões de Paula (Universidade de São Paulo).


Pergunta:
"Essas instituições fundiárias otomanas, analisadas pela autora,
têm raizes bizantinas e persas?"
• •

- 275-

RESPOSTA DA PROFESSORA BEATRIZ DINIZ.

Ao Prof. Eurípedes Simões de Paula.

"Senhor do Império Bizantino, o conquistador otomano poderia


modelar as suas instituições fundiárias naquelas bizantinas. Isto acon-
teceu apenas parcialmente, pois foram raros os casos em que as insti-
tuições otomanas tiveram suas raizes nas bizantinas. O fato deveu-se
às dissonâncias entre o conquistador e o "conquistado" no tocante à
mentalidade, religião e nivel cultural, assim como ao desconhecimento,
por parte do primeiro, dos idiomas grego e latino, com que se encon-
travam compiladas as leis bizantinas. Houve maior aproveitamento
das instituições árabes, adotando, inclusive, quase que por completo,
a terminologia rural e fiscal árabe, que, por sua vez, tem origens co-
muns com a persa.

Ver na parte introdutória e na letra "e" do item IV e no item VI


BURMISTR (*) (1).

VICTORIA NAMESTNIKOV EL MURR


da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Huma·
nas da Universidade de São Pau~o

A cerca de 15 verstas de minha propriedade, vive um co·


nhecido meu, Arcádi Pávlitch Pénotchkin, jovem proprietário,
oficial da guarda reformado. Há muita caça em suas ter;'as, a
casa foi construída com a planta de um arquiteto francês, os se~vi­
çais vestem-se à inglesa, oferece ótimos banquetes, recebe afetuo-
samente as visitas, mas, apesar de tudo, não se tem muita von-
tade de visita-lo. Homem sensato e positivo, muito bem educado,
como de praxe, exerceu função pública, arrastou-se na alta socie·
dade e agora administra suas prop~iedades com grande sucesso.
Falando de si próprio Arcádi Pávlitch diz ser severo mas justo;
preocupa-se com a sorte dos seus súditos e castiga-os para o
seu próprio bem. "Em tais casos", afirma, "é preciso trata-Io~
como crianças - é a ignorância, mon cher; il faut prendre celà
en consideration". Entretanto, no caso do chamado mal neces-
sário, evita movimentos bruscos e impulsivos e não gosta de
elevar a voz, limitando-se a apontar com o braço em riste, dizen-
do calmamente: "Afinal eu te pedi, meu caro", ou: "O que
há amigo, volte a si" - nisso apenas cerra levemente os dentes
e entorta a boca. Não é de grande estatura, bem proporcionado e
apessoado, cuida muito das mãos e das unhas e a saude emana
dos seus lábios rosados e das faces coradas. Uma contração aia·

(*). - Comunicação apresentada na 311 Sessão de Estudos, no dia 6


de setembro de 1976, Equipe A (Nota da Redação).
(1). - Burmistr - Do ponto de vista etimológico trata-se de um em-
préstimo linguístico que penetrou na Rússia através da Alemanha. No reinado
de Pedro-o-Grande, em 1699 o burgomestr ou burmistr e~a representante do
poder central nas cidade. No presente conto o vocábulo designa o administr~
- 278-

vel dos olhos castanhos e límpidos acompanha seu riso sonoro


e despreocupado. Veste-se muito bem e com gosto; recebe li-
vros franceses, desenhos e jornais mas não é grande amante da
leitura: mal conseguiu chegar ao fim de O ludeu Errante. ~
mestre no jogo de cartas. Em suma, Arcádi Pávlitch é considera-
do um dos nobres mais cultos e dos pa:tidos mais invejáveis do
nosso governo; as damas perdem por ele a cabeça e elogiam
sobretudo suas boas maneiras. Seu comportamento é extraordi-
nário, cauteloso ·como um gato, nunca se envolveu em escândalo,
mas, em ocasião favoravel, gosta de impor-se sobre um tímido,
aniquilando-o e deixando-o perplexo. Tem verdadeira repulsa
pelas companhias inexpressivas, receando comprometer-se; entre-
tanto, em momentos de alegria declara-se cultor de Epicuro, em-
bora, em ge:al, não se refira bem à filosofia, chamando-a de ali-
mento nebuloso das mentes germânicas, e às vezes, de asneira re-
matada; gosta de música e, jogando baralho, cantarola entre
dentes, mas com sentimento; lembra-se tambem de trechos de
Lúcia e da Sonâmbula, mas sempre está numa ordem impecavcl:
até os cocheiros sujeitaram-se à sua influência e todos os dia'i
não só limpam as coalheiras e os cafetãs, como lavam até a pró-
pria cara. Na verdade os fâmulos de A:cádi Pávlitch olham meio
de esguelha, mas aqui na Rússia é dificil distinguir um tristonho
de um sonolento. Arcádi Pávlitch fala com voz macia e agrada-
vel, pausadamente, parecendo sentir prazer na passagem de cada
palavra através do bigode belo e perfumado; tambem emprega
muitas expressões francesas, como: "Mais e'est impayable", "Mais
eomment dane!", etc. Apesar de tudo, eu pelo menos, não o visito
de muito bom g:ado e, se não fossem os tretrazes e as perdizes,
provavelmente esqueceria que o conheço. Algo como uma estra,-
- 279-

manhã, mandei preparar meu coche, m:lS ele não quis me deixar
partir sem o desjejum à moda inglesa e levou-me ao seu escritório.
Com o chá serviram-nos bolinhos de carne, ovos quentes, man-
teiga, mel, queijo e outros. Dois camareiros de luvas brancas e
limpas, com a maior eficiência e em silêncio adivinhavam nossos
menores desejos. Estavámos sentados num divã persa. Arcádi Páv-
litch vestia largos calções de seda, jaqueta negra de veludo, um
belo fez com pingente azul escuro e chinelos chineses, ama~elos,
sem calcanhar. Tomava chá, ria, examinava as unhas, fumava,
ajeitava as almofadas debaixo de si, tudo isto num ótimo estado
de espírito. Tendo tomado seu farto desjejum com evidente satis-
fação, Arcádi Pávlitch serviu-se de um cálice de vinho tinto, apro-
ximou-o dos lábios e, súbito, franziu a testa.
- Por que o vinho não está aquecido? perguntou de modo
um tanto brusco a um dos camareiros.
Este ficou confuso, parou estático e empalideceu.
- Não estou te perguntando, meu caro? continuou calma-
mente Arcádi Pávlitch sem tirar os olhos dele.
o infeliz mexeu-se no lugar, enrolou umas vezes o guarda-
napo e não proferiu palavra. Arcádi Pávlitch abaixou a cabeça
e, pensativo, olhou-o de cenho franzido.

- Pardon, mon cher, - proferiu com agradável sorriso, to-


cando amistosamente meu joelho com a mão e, de novo, fixou o
camareiro. Depois de b:eve silêncio, acrescentou: - Bem, vai-te.
Ergeu as sobrancelhas e tocou a sineta.
Entrou um homem gordo, moreno, cabelos negros, testa baixa
e olhos totalmente inchados.
- Quanto ao Fiódor... que se tomem providências, disse
Arcádi PávlitCh a meia voz, com total auto domínio.
- Será feito - respondeu o gordo e saiu.
- Voi/à, mon cher, désagréments de la campagne, observou
alegre Arcádi Pávlitch. Onde o senhor vai? Fique mais um pouco.
- Não, respondi, tenho que ir.
- Sempre a caça! Ai, estes caçadores! Para onde o senhor
vai agora?
- A quarenta verstas daqui, a Riábovo.
- Riábovo. Oh,
- 280-

Riábovo está a cerca de cinco verstas apenas da minha Chipílovka


e, na verdade, há muito que não vou lá: nunca disponho de tem-
po. Tudo vem a calhar: hoje o senhor caçará em Riábovo, e à
noitinha virá a minha casa. C e sera charmant. Jantaremos jun-
tos, - levaremos o cozinheiro, - e passará a noite em casa. Óti-
mo! ótimo! - acrescentou sem esperar resposta. C' est arrangé . ..
Ei, quem é! Mandem preparar a caleça, e rápido. O senhor nunca
esteve em Chipílovka? Eu teria receio em lhe oferecer dormida na
isbá do meu burmistr, mas sei que não é exigente e que em Riábovo
dormiria num depósito de feno ... Vamos, vamos!
Arcádi Pávlitch entoou uma romança f:ancesa.
- O senhor talvez não saiba, prosseguiu, balançando-se so-
bre as pernas, lá os meus mujiques pagam obrÓk. (2) É a Consti-
tuição, que se vai fazer? Entretanto pagam-me obrók pontualmen-
te. Confesso que eu os colocaria há muito tempo na bárchchina,
(3) mas a terra é pouca! Até me admiro como eles conseguem
sobreviver. Afinal, c'est leur affaire. Tenho um ótimo burmistr,
une forte tête, um estadista! O senho~ verá ... Na verdade como
tudo se encaixou bem!
Não havia nada a fazer. Em vez de nove da manhã saimos
às duas. Os caçadores entenderão minha impaciência. No seu
próprio modo de dizer, Arcádi Pávlitch gostava de ap~oveitar a
ocasião para regalar-se, e levou tamanha quantidade de roupa
branca, mantimentos, trajes, pe-fumes, almofadas e toda espécie de
miudezas que para um alemão econômico e austero estes bens se-
riam suficientes para um ano. Em cada descida de morro Arcádi
Pávlitch fazia um breve mas sério seTmão ao cocheiro, do que pu-
de concluir que meu conhecido era um medroso a toda prova.
Aliás, a viagem foi levada a termo de modo bastante feliz; só que
numa ponte recem-consertada a telega que levava o cozinheiro
despencou e a roda traseira prensou-lhe o estômago.
Arcádi Pávlitch vendo a queda de Karem, criado em sua
casa, assustou-se e imediatamente mandou perguntar se seus bra-
ços estavam ilesos. Tendo recebido resposta afirmativa, logo se
tranquilizou. Com tudo isto nossa viagem foi bastante demorada;
eu estava na mesma caleça que Arcádi Pávlitch e no fim senti
angústia mortal, tanto mais que d~pois de algumas horas meu

(2). - Obrók - Tributo em dinheiro pago aos proprietários de terras


pelos servos.
(3). - Bárc.'tchina
- 281-

companhei~o perdeu todas as forças e Ja começou a tomar ares


de liberal. Chegamos afinal, só que não a Riábovo e sim direta-
mente a Chipílovka, sem que eu o pudesse explicar. Naque~e dia,
de qualquer modo, eu não poderia mais caçar e, embora a con-
tragosto, sujeitei-me ao destino.
o cozinheiro chegara alguns minutos antes de nós e, ao que
parece, já tivera tempo de dar as ordens e prevenir a quem ne-
cessário, já que, no momento de entra~mos na propriedad'e, fomos
recebidos pelo stárosta, (4) (filho do burmistr) , mujique forte,
de cabelos ruivos, com cerca de um sájem (5) de altura, a cava-
lo, de cabeça descoberta, vestindo um armiák novo (6) desabotoa-
do. "Mas onde está Sofrón?" - perguntou-lhe Arcádi Pávlitch.
Primeiro o stárosta pulou ágil do cavalo, inclinou-se diante do
pat:ão até a cintura e disse: "Salve, paizinho Arcádi Pávlitch",
depois soergueu a cabeça, sacudiu-se e informou que Sofrón fora
a Peróv, mas já haviam mandado busca-lo. "Bem, siga-nos",
disse Ar.;ádi Pá\'litch. O stárosta, por respeito, afastou o cavalo
para o lado, jogou-se sobre ele e trotou atrás da caleça, o gorro
na mão. Atravessamos a aldeia. Pelo caminho cruzamos com
alguns mujiques em telegas vazias; vinham da eira e cantavam,
dando pulos e mexendo as pc~nas no ar; mas ao ver nossa caleça
e o stárosta, calaram-se de chofre, tiraram seus gorros de inver-
no (isto foi no verão) e soe gueram-se, como que aguardando
ordens. Arcádi Pávlitch inclinou-se condescendente. Havia in-
dícios de uma inquietação propagando-se pela aldeia. Mulheres de
saia xadrês atiravam gravetos nos cachorros que de nada descon-
fiavam ou eram cônscios demais dos seus deveres; um velho man-
co, de barba, que começava logo abaixo dos olhos, expulsou de
junto do poço um cavalo que não acabara de beber, bateu-lhe
na ilharga, sem que ninguem soubesse por que, e depois fez uma
mesura. Garotos em longos camisolões corriam berrando para as
isbás, deitavam-se de bruços no alto umbral, baixavam a cabeça,
ati~avam as pernas para cima e assim, bem agilmente, rolavam
para alem da porta, para os escuros vestíbulos, de onde não mais
se mostravam. Até as galinhas lançavam-se a trote acelerado para
baixo do portão; um galo briguento de peito preto, semelhante

(4). - Stárosta - Chefe de comunidade; no caso e~a o representante


dos camponeses, eleito por eles, em assembléia. Constituia, juntamente com o
burmistr, a cúpula administrativa da propriedade rural. .
(5). - Sajem - Antiga unidade de comprimento, variando entre 1,80
e 2,20m.
- 282-

a um colete de cetim, e de rabo vermelho enrolado até a crista,


deteve-se no caminho e já se preparava para g~itar, mas de re-
pente ficou confuso e tambem fugiu correndo. A isbá do burmistr
localizava-se distante das demais, no meio de um campo de cânha-
mo espesso e verdejante. Paramos diante dos portões. O senhor
Pénotchkin levantou-se, tirou a capa com gesto pitoresco e saiu da
caleça, olhando, amigavelmente para todos os lados. A mulher do
burmistr recebeu-nos com reverências profundas e aproximou-se
da mão do senhor. Arcádi Pávlitch permitiu que ela a beijasse à
vontade e subiu para o alpendre. Um canto escuro do vestíbulo
a mulher do stárosta estava em pé, tambem se inclinou mas não
ousou aproximar-se da mão. Na assim chamad'a isbá fria, (7)
à direita do vestíbulo, já se moviam duas outras mulheres; tiravam
de lá um monte de bugigangas, bilhas vazias,tulúpi (8) ensebados,
potes de go-dura, um berço com um monte de trapos e com um
bebê em roupas coloridas, varriam o lixo com vassouras de ba-
nho . (9) Arcádi Pávlitch mandou-as embora e acomodou-se num
banco sob as imagens. Os cocheiros começaram a trazer para
dentro baús, arcas e demais petrechos, tentando, a todo custo,
abafar o ruido das suas pesadas botas.
Enquanto isso, Arcádi Pávlitch pedia info~mações ao stárosta
sobre a colheita, a semeadura e outros assuntos atinentes à admi-
nistração. O stárosta respondia satisfatoriamente, mas de modo
indolente e constrangido, abotoando o cafetã com os dedos co-
mo que enregelados. Estava em pé junto da porta e a todo mo-
mento acautelava-se e olhava para trás, dando passagem ao agil
camareiro. Por cima de seus ombos vigorosos, consegui ver que a
mulher do burmistr, no vestíbulo, às escondidas, batia numa outra
mulher.
Súbito, ouviu-se o barulho de uma telega que parou diante do
alpendre: entrou o burmistr.

(7). - IsM fria - Isbá é uma habitação rural de madeira, geralmente


de pinho, que consiste em duas cabanas contíguas a um pátio coberto. Numa
encontra-se o fogão destinado para cozinhar e aquecer, na outra, ele inexiste,
daí o nome de "fria". O
283 -

Este, um estadista segundo Arcádi Pávlitch, era de pequena


estatura, ombros largos, grisalho, corpulento, nariz vermelho, pe-
quenos olhos azuis e barba em leque. A p~opósito é bom notar,
que desde que existe a Russ, (lO) nunca houve um homem que
tendo melhorado de vida e enriquecido não tivesse uma respeitavel
barba; alguem que sempre tivera barba rala, em cunha, de repente
está emoldurado como por uma auréola - vai-se lá saber de onde
vem o cabelo! O burmistr com toda certeza deve ter se dive.tido em
Peróv: seu rosto ficou bastante inchado e o cheiro de bebida sentia-
se à distância.
- O pais nossos, - começou a falar cantado e de rosto tão
embevecido que parecia prestes a chorar, finalmente dignaram-se
a nos honrar! A mãozinha, paizinho, a mãozinha, acrescentou, es-
tendendo os lábios com antecedência.
Arcádi Pávlitch satisfez seu desejo.

- Bem, irmão Sofrón, como vão as coisas? perguntou ama-


velmente.
- O pais nossos! exclamou, como é que as coisas poderiam
ir mal! Vós que sois nossos pais, caridosos, decidistes iluminar
nossa aldeiazinha com vossa vinda, d'eixando-nos felizes pelo
resto dos nossos dias. Graças a Deus, Arcádi Pávlitch, graça, graças
a Deus! Tudo transcorre bem, g~aças a vossa bondade.
Então Sofrón calou-se, deu uma olhada para o patrão e
como que de novo arrebatado pela efusão de sentimentos em que a
embriaguez tambem tinha parte, pediu-lhe as mãos mais uma vez e
pôs-se a entoar com mais ênfase que antes:
- O pais nossos, caridosos... e... que se pode dizer!
Juro que fiquei bobo, de alegria. Por Deus, mal posso acreditar nos
meus olhos... O pais nossos! ...

Arcádi Pávlitch olhou-me, deu uma risadinha e perguntou:


"N'est-ce pas que c'est touchant?"

- Sim, paizinho, Arcádi Pávlitch, continuava o incansavel


burmistr, como foi isso? Fico completamente desolado, paizinho;

(lO). - Russ - Nome do primeiro Estado Russo, fundado no século


IX na região de Nóvgorod e cuja capital, por razões econômicas, deslocou-se
para Kiev, cidade que deu o nome ao primeiro período da História Russa
(Período Kievano). O
- 284-

não vos dignastes a me informar de vossa chegada. Onde passa-


reis a noite? Aqui não está limpo, há sujeira ...
- Não é nada, Sofrón, não é nada, respond'eu sorrindo
Arcádi Pávlitch, aqui está bem.
- Mas, pais nossos, para quem está bem? Para nós outros
mujiques, está bem; mas para vós. .. oh vós, pais meus, concesso-
res da mercê, oh vós, pais meus! ... Perdoai a um bobo, fiquei lou-
co, por Deus, perdi completamente a cabeça.
Enquanto isto, serviram o jantar; Arcádi Pávlitch começou a
comer. O venho mandou embo,a seu filho, dizendo-lhe que não
abafasse mais o ar.
- Como é, dividiram as terras, meu velho? - perguntou
o senhor Pénotchkin, que desejava, com toda evidência, imitar a
fala do mujique, e piscou para mim.
- Dividimos, paizinho, g~aças à tua bondade. Anteotem assi-
namos a escritura. Bem, primeiro os de Khlinovski se fizeram de
rogados. .. se fizeram de rogados, meus pais, realmente. Exigi-
ram. .. exigiram... e só Deus sabe o que exigiram; são uns
bobos, paizinho, gente imbecil. E nós, paizinho, com a tua graça,
declaramos nossa gratidão e satisfizemos o intermediário Mikolai
Mikoláitch; agimos em tudo segundo às tuas ordens, paizinho;
como te dignaste mandar, assim fizemos, e sempre agimos com o
conhecimento de legor Dmítritch.
- legor me comunicava tudo - notou com importância Ar-
cádi Pávlitch.
- Claro, paizinho, legor Dmítritch, claro.
- Bem, então com certeza vocês agora estão satisfeitos?
Era o que Sofrón esperava.
- O nossos pais, nossos benfeitores! cantarolou novamente ...
Tende piedade de mim... por vós, nossos pais, nós rezamos
a Deus de dia e de noite ... Na verdade, a terra é pouca
Pénotchkin interrompeu-o:
- Está bom, está bom, Sofrón, sei que és meu servidor fiel
... E como está o trigo batido?
Sofrón
- 285-

Ora, vós que sois nossos pais, o trigo batido não é lá muito
bom. Aliás, paizinho Arcádi Pávlitch, permita comunicar-vos, um
fatozinho que aconteceu (Aproximou-se, abrindo os braços, do
senhor Pénotchkin, inclinou-se e entrece:rou um olho). Apareceu
um defunto em nossas terras.
- Como assim?
- Eu mesmo não consigo entender, paizinho, nossos pais,
o demo nos confundiu, ao que tudo indica. Só que por sorte
apareceu perto da divisa alheia; mas para que ocultar um pecado?
- em terra nossa. Na mesma hora mandei que o carregassem
para ter,a alheia, enquanto era possível, coloquei guarda e falei
aos meus: Caluda. Por via das dúvidas, expliquei ao comissário:
são estas as ordens, digo; dei-lhe chazinho, e agradecimento ...
Pois é, o que o paizinho está pensando? Afinal ficou pendurado no
pescoço dos outros; afinal um cadáver é como duzentos rublos,
como um pãozinho doce (11).
O senhor Pénotchkin riu muito da espirituosidade do seu
burmistr e disse-me algumas vezes, indicand'o-o com a cabeça:
"Quel gaillard, ah?"
Neste meio tempo escureceu totalmente lá fora; A:cádi Páv-
litch deu ordens para que se tirasse a mesa e para que se trouxesse
feno. O camareiro estendeu lençóis, distribuiu os travesseiros;
deitamo-nos. Tendo recebido ordens para o dia seguinte, Sofrón
retirou-se. Ado:mecendo, Arcádi Pávlitch ainda filosofou um
pouco sobre as excelentes qualidades do mujique russo e frisou
imediatamente que desde que Sofrón passou a administrar os
camponeses de Chipílovka, eles não ficavam devendo nem um
vintém ...
O vigia bateu na tábua; em alguma isbá choramingou uma
criança que, segundo tudo indica, ainda não tivera tempo de se
impregnar de altruismo... Adormecemos.

(11). - Devido ao desgaste econômico que a Rússia teve nas sucessivas


guerras de que participou, houve certo empobrecimento da nobreza. Tentou-se
sanar o problema enviando, para as várias unidades territoriais, um nobre com
toda a sua comitiva, no intuito de estabelecer uma fiscalização. O sustento destes
elementos, durante sua pe. manência no local, que variava de um a dois
anos, recaia sobre os camponeses. Estava no seu interesse acusa·r falhas, pois
tal fato se constituia em fonte de renda. Um dos processos mais dispendiosos
era justamente aquele que se iniciava com o encOntro de um cadaver. O
- 286-

No dia seguinte levantamos bastante cedo. Eu me preparava


para ir a Riábovo, mas Arcádi Pávlitch desejou mostrar-me sua
propriedade e convenceu-me a ficar. Aliás, eu mesmo gostaria de
certificar-me, na prática, das ótimas qualidades administrativas de
Sofrón. Apareceu o burmistr. Vestia uma armiák azul, presa por
uma faixa vermelha. Falava bem menos que no dia anterior, olha-
va aguda e fixamente nos olhos do patrão, respondia com aprecia-
ção e apuro. Partimos com ele para a eira. O filho de Sofrón, stáros-
ta de três archins, (12) ao que tudo indicava pessoa bem tola, seguiu-
nos, juntou-se ainda a nós Fedosséitch do zemstvox (13), soldado
reformado, de enormes bigodes e com estranhíssima expressão no
rosto: como se desde muito tempo tivesse ficado extremamente
perplexo com algo e não tivesse voltado a si. Examinamos a eira,
o celeiro, a tulha, os galpões, o moinho de vento, o curral, a hor-
ta, os cânhamos; realmente tudo estava na mais perfeita ordem:
só os rostos tristonhos dos mujiques deixavam-se um tanto perplexos.
Alem do util, Sof:ón preocupava-se tambem com o agradavel:
plantou salgueiros junto de todas as valas, abriu caminhos entre
as medas na eira, cobrindo-os de areia, instalou um cata-vento no
moinho, com forma de urso de bocarra aberta e língua vermelha,
grudou ao curral de alvenaria algo semelhante a um frontão grego
e debaixo do f:ontão escreveu com letras brancas: "Construido
na aldeia de Chipiloka emil oito centos e carenta. Este curai".
Arcádi Pávlitch ficou totalmente comovido, passou a expor-me em
francês as vantagens do obrók, notando, entretanto, que a bárchchi-
na era mais vantajosa para o senhor de terra, - mas o que não
acontece neste mundo?!. Começou a aconselhar o burmistr como
plantar batata, como prepa~ar a ração do gado, etc. Sofrón ouvia
com atenção a fala do patrão, às vezes replicava, mas já não o
tratava nem de pai, nem de benfeitor e sempre frisava que as
terras eram poucás, não seria nada mau comprar mais. "Por que
não? Compre - disse Arcádi Pávlich, - tenho nada a opor se for
no meu nome". Sofrón não respondeu nada, só ficou alisando a bar-
ba. "Seria bom irmos à mata" - observou o senhor Pénotchkin.
Imediatamente nos trouxeram cavalos; fomos à floresta, ou como
se diz entre n6s, ao "zakáz" (14). Lá encontramos recantos im-
penetráveis e muita caça, pelo que Arcádi Pávlitch elogiou Soí ón
e deu-lhe palmadas no ombro. O senhor Pénotchkin mantinha-se
fiel aos conceitos russos de silvicultura e aproveitou a ocasião

(12). - Archin - Antiga medida de comprimento =


0,71 m.
( 13). - Zemstvo - Administração local e provincial eleita pela nobreza
e pelas classes privilegiadas da Rússia.
(14). - "Zakáz" - Termo regional. Literalmente significa "encomenda-
da".
- 287-

para contar-me um epis6dio, segundo ele divertidíssimo, sobre


um senhor de terra gozador, o qual ensinou a seu guarda flores-
tal que a mata não se torna mais espessa com a de:rubada e,
como prova, arracou-Ihe metade da barba... Aliás, no que dizia
respeito a outros assuntos, nem Sofr6n nem Arcádi Pávlitch, eram
avessos às inovações. Na volta à aldeia o burmistr levou-nos para
ver a tarara, há pouco trazida de Moscou. Ela parecia realmente
funcionar bem, mas se Sofrón soubesse que fato desagradavel aguar-
dava-o e tambem ao patrão neste passeio, provavelmente teria
permanecido conosco em casa.
Eis o que aconteceu. Saindo do galpão vimos o quadro se-
guinte. A alguns passos da porta, junto a uma poça suja, onde
três patos chafurdavam despreocupados, estavam pa:ados dois
mujiques: um velho de uns sessenta e um jovem de uns vinte,
de camisas transpassadas e com remendos, descalços, com uma
corda servindo de cinto. Fedosséitch, o chefe do zemstvo, tentava
convence-los com afinco a afastarem-se e provavelmente o teria
conseguindo se nos tivéssemos demorado no galpão, mas, tendo-nos
visto, pôs-se em posição de sentido e ficou imovel. O stárosta
achava-se tambem ali, de boca aberta e punhos indecisos. Arcádi
Pávlitch franziu o cenho, mordeu o lábio e aproximou-se dos
suplicantes. Ambos inclinaram-se em silêncio, até o chão.
- Que desejam o, que pedem? perguntou em tom severo
e um tanto fanhoso. (Os mujiques entreolharam-se sem proferir
palavra, limitaram-se a contrair os olhos, como que protegendo-se
do sol, e acelerou-se-Ihes a respiração).

- Então? continuou Arcádi Pávlitch dirigindo-se imediata-


mente a Sofr6n: - A que família eles pertencem?

- À dos Toboléiev, - respondeu letamente o burmistr.

- Então, o que é? - indagou de novo o senhor Pénotchkin,


será que perderam a língua? Diga, o que quer? - acrescentou,
indicando o velho com um movimento de cabeça. - Não tenha
medo, imbecil.

O velho esticou o pescoço enrugado e pardacento-escuro, re-


torceu os lábios azulados, entreabriu-os e disse com voz rouque-
nha: "Interceda por nós, senhor" - e novamente bateu com a
testa no chão. O jovem mujique tambem se inclinou. A:cádi Páv-
- 288-

- Qual é o problema? De quem te queixas?


- Tenha piedade, senhor! Permita que respiremos... Não
podemos suportar mais os maus tratos (O velho falava com difi-
culdafe) .
- Quem te maltratou assim?
- Ora, Sofrón lákovlitch, paizinho.
Arcádi Pávlitch calou-se por um instante.
- Como te chamas?
- Antip, paizinho.
- E ele, quem é?
- Meu filho, paizinho.
Arcádi Pávlitch fez silêncio novamente e moveu os bigodes.
- Como foi que ele maltratou? - disse, olhando para o
velho através do bigode.
- Paizinho, arruinou-nos totalmente. Recrutou dois filhos,
sem que fosse a vez deles, e agora está querendo tirar-me o
terceiro (15). Ontem, paizinho, tirou-me a última vaca e surrou
minha mulher: aí está a sua g~aça (Indicou o stárosta).
- Hum! - proferiu Arcádi Pávlitch.
- Não permita que acabem de nos destruir, benfeitor.
O senhor Pénotchkin franziu a testa.
- O que significa tudo isso? - perguntou ao burmistr, a
meia voz, demonstrando insatisfação.
- É um bêbado e preguiçoso, respondeu o burmistr emp~egan­
do pela primeira vez o de cortesia (16). Há cinco anos que não
consegue sair das dívidas.
- Sofrón lákovlitch pagou minha dívida, paizinho, - conti-
nuou o velho, - há quatro anos e pouco, assim que pagou, e
assim que pagou, transformou-me num escravo, paizinho, e ...
- E qual o motivo que te levou a fazer dívida? Perguntou o
senhor Pénotchkin, ameaçadoramente. ( O vell p inclinou a
cabeça constrangido). - Vai ver que gostas de beber, de te

(15). - O recrutamento fazia-se entre os camponeses, levando em conta


o número de indivíduos do sexo masculino existente numa família. Este
princípio, previsto por lei, segundo se pode dep~ender, era burlado. O indivíduo
recrutado chegava a passar períodos muito longos no exército, cerca de 20 a 30
anos.
(16). - Era costume na Rússia, como forma de cortesia, colocar-se um
s
- 289-

arrastares pelos botequins? (O velho chegou a abrir a boca). Eu


vos conheço - continuou Arcádi Pávlitch com veemência, -
o vosso caso é beber, ficar deitado em cima do fogão (17) e
fazer com que um bom mujique ,'esponda por vós.

- Além do mais é um prosseirão - acrescentou o bu mistr


à fala do senhor.
- O:a, isso é evidente. É sempre assim; já observei isto
mais de uma vez. Passa o ano todo na libertinagem, profere gros-
serias e agora joga-se aos meus pés.

- Paizinho, Arcádi Pávlitch, - balbuciou o velho em deses-


pero - que prosseirão sou eu? Como diante de Deus, Nosso
Senhor, digo que não podemos mais supo~tar. Sofrón lákovlitch
passou a não gostar de mim, os motivos - só Deus sabe! Está me
arruinando totalmente paizinho... o meu último filhinho. .. até
este. .. (Nos olhos amarelos e en, ugados do velho brilhou uma
lágrima pequenina). Tenha piedade, paizinho, interceda ...

- Além do mais, não é só conosco, - pôs-se a dizer o


jovem mujique ...

Arcádi Pávlitch de repente explodiu.

- Quem é que está te perguntando, hem? Já que não te


perguntam, cala-te. .. O que que é isso? Cala-te, é o que te digo!
Cala-te! .. , Oh, Deus meu! parece até uma rebelião. Não, amigo,
não te aconselho a te rebe:ar ... eu ... (Arcádi Pávlitch deu
um passo à frente, e, provavelmente lembrando-se da minha pre-
sença, vi ou-se e enfiou as mãos nos bolsos). /e vaus demande
bien pardon, mon cher. - disse com um sorriso forçado, abaixan-
do o tom de voz, significativo. - C'est le mauvais côté de la
médaille. .. Está bem, está bem, - continuou sem olhar para
os mujiques, - eu ordenarei. .. está bem, retirem-se. (Os mu-
jiques não se erguiam). Ora, eu não lhes disse? .. está bem. Reti-
rem-se, vou dar a ordem, estou lhes dizendo.
Arcádi Pávlitch deu-lhes as costas. "A eterna insatisfação",
disse ente d'entes e com passos largos dirigiu-se para casa.
Sofrón seguiu-o. O funcionário do zemstva arregalou os olhos
como se pretendesse dar um grande salto para um po.;to distante.
O stárosta espantou os patos da poça. Os
290 -

ceram mais um pouco no local, entreolharam-se e :.rra"t:uam-se


para casa sem olhar pa:a trás.
Cerca de du~ horas depois, eu já me encontrava em Riábovo
com um mujique conhecido, Anpadist, e preparava-me para a
caça. Até o momento da minha partida, Pé..otckin fazia cara
feia para Soflón. Puxei conversa com Anpadi5t sobre os c..:.mpo-
neses de Chipílovka, sobre o senhor Pénotchkin, e pe~guntei se
não conhecia o bUl miHr .
- Sof~ón lákovlitch .. , ora!
- Que tipo de homem é?
- Não é um homem, é um cachorro; um cão dectes não
existe até Kursk.
- Como assim?
- Ora, Chipílovka só consta como sendo do tal do Penkin;
mas não é ele que a possui, é Sofrón.
- Será possíve:?

- Possui como se fossem seus bens. Os camponeses sempre


lhe devem; trabalham para ele como peões: manda levar carga,
uns para um canto, outros para outro... acabou totalmente com
eles.

Pa:ece que eles têm pouca terra.


Pouca? Só dos Khlinóvsk arrenda 80 diessiatinas (18) e
dos nossos 120; as tão aí 150 c'iessiatinas. (19) Depois não é só
com terra que ele comercia: tambem o faz com cavalos, gado,
alcatrão, azeite, cânhamo e tudo o mais... É inteligente, muito
inteligente, e é rico, o danado! O que tem d'e mau, é que gosta de
briga. É um animal, não é um ser humar.o; como se diz: é um
cachorro, um cão, um cão perfeito ...
- Como é que não se queixam ce!e?
- Ora! no que é que a desgraça afeta ao patrão?! Não há
dívidas, então que lhe impo'ta o . esto E além do mais - acres·
centou depois de b-eve silêncio, - queixa-te. Não, ele vai te ...
sim, ora ... Não, ele te, bem ...
- Pois é - disse Anpadist, - agora vai acabar com ele;
acabará totalmente com o homem. O stárosta vai moê-lo de pan-

(18). - Diessiatina - Antiga medida agrária russa correspondente a


1,09 ha.
(19). - Embora a soma de 80 com 120 seja 200 no original encontra-
mos 150.
- 291-

cadas. Que homem sem sorte, veja só, coitado! E quais os mo-
tivos que o levam a sofrer... De certa feita discutiu com o
burmistr, não aguentou, aconteceu... Grande coisa! Foi aí que
ele começou a bica,.lo, ao Antip. Agora está acab:mdo com ele.
Pois é um cachorro, um cão, Deus que me perdoe meus pecados,
e sabe a quem ataca~. Aos velhos mais ricos e de família mais
nume~osa deixa em paz, o diabo careca, mas aí perdeu o controle.
Recrutou os filhos do Antip antes do tempo, trapaceiro imperdoa-
vel, cão, Deus que me perdoe os pecados!
Partimos para a caça.

Salzbrunn, Silésia,
julho de 1847.

'" ...
...

PROPRIEDADE RURAL NUM CONTO DE TURGUÉNEV.


(Burmistr - 1847).

Sem o intuito de entrar na validade de um texto literário para


uma abordagem histórica, decidimos apresentar esta análise, plenamen-
te justificada, a nosso' ver, uma vez que sem uma noção cultural da
época é totalmente impossivel compreender a narrativa. Não basta
conhecer a língua do original a tradução do conto é uma verdadeira
aventura, a correspondência terminológica simplesmente inexiste, uma
infinidade de vocábulos exige notas explicativas, fazendo com que o
texto literário perca muito da sua naturalidade e fluência.
Escrito em 1847" o conto pareceu-nos significativo por abordar
a temática predileta dos escritores da época. Mantidas as distâncias
no tempo e no espaço poderia se comparar às criações literárias do
nosso período abolicionista. O escravo e o servo constituem-se na
temática mais abordada por uma pleiade de escritores e poetas.
Não é nosso propósito fazer aqui uma abordagem crítica de um
paralelismo literário. Desejamos, apenas, através dos elementos forne-
cidos por um único conto, estudar uma propriedade rural que não tem,
absolutamente, a pretensão de servir de modelo.
O conto Burmistr (1) trata da vida de um oficial reformado no
seu poméstie, cercado pelos servos dos quais exige obediência e de
(1). - Este conto faz parte de uma série de 25 narrativas que consti-
tuem um todo - Zapíski Okhótnika, traduzido para o português como Memó-
- 292-

cuja vida dispõe integralmente. Possuindo mais de uma propriedade,


delega a outrem os poderes de sua administração.
Cumpre notar aqui que o vocábulo poméstie, traduzido por nós
como "propriedade", tem sua origem ligada a uma das duas formas
básicas de propriedade rural, existentes na Rússia, nos séculos XVI-
XVII.
Poméstie - correspondia a uma propriedade condicional, da qual
o proprietário, poméchtchik, dispunha em vida; geralmente pertencia
à classe dos dvoriani. Nas origens esta era a designação dada aos ser-
vidores da corte; com o tempo passaram a constituir-se em pessoas ti-
tuladas, pertencentes às principais camadas sociais do país. O título,
dado como recompensa de serviços prestados à coroa, tornou-se here-
ditário. A eles competia administrar seus bens imóveis assim como
os hab:tantes locais. Distinguiam-se os rodovíe dvoriáni, cujos ances-
trais pertenciam a esta classe por várias gerações; os stolbovíe dvoriáni,
de origem bastante remota e os potómstvennie dvoriáni, que foram ele-
vados a esta categoria pessoalmente, ou na época de um ancestral pró-
ximo.
V ótchina - correspondia a uma propriedade incondicional e he-
reditária, geralmente pertencente aos boiardos. Ainda no Período Kie-
vano, boiardo, era o mais alto título concedido pelo Grão-príncipe (2).
No século XIX correspondia ao bárin, ou seja, senhor; eram os gran-
des potentados.
A distinção entre Poméstie e V ótchina praticamente desaparece
em meados do século XVII mas, somente o ukáz ou a lei de 1714
transforma o Poméstie em propriedade incondicional. Ambos confun-
diram-se num conceito jurídico único de propriedade "imovel". Desta
maneira cvnsolidou-se a aliança dos dvoriani com os boiardos, unifi-
cando a classe dominante (3).
O narrador nos informa de que o proprietário, amigo seu, era
jovem oficial reformado e, alem do mais, ficamos sabendo que o re-
crutamento se fazia no meio rural, entre os camponeses. Devido a isto
achamos interessante elucidar o problema do recrutamento, (que, por

(2). - Boiardo, em russo boiárin - etimologicamente é possível que


o termo tenha se originado de bó; - luta, combate, ou de boliárin - que se
preocupava com alguem (o Príncipe) ou, ainda, de bólchak - grande maio~.
DAL, Vladimir - Dicionário Explicativo da Lingua da Grande Rússia, Moscou,
1903. Baseado nisto, julgamos que poderia tratar-se da junção de dois vocá-
bulos: bói e iárí, vigoroso, ou seja combatente vigoroso, destemido.
(3). - Vsemírnaia ]stória, História Universal, Ed. da Literatura Sócio-
Econômica, Moscou, 1958. T. V.
- 293-

mais de uma vez aparece na corruptela de recrutamento, proferido pelas


personagens campesinas).
Foi na época de Pedro-o-Grande, que se organizou o exér-
cito regular e a marinha na Rússia. Data de 1699 o primeiro recruta-
mento para serviço permanente nas tropas regulares. As famílias cam-
pesinas deviam fornecer um recruta para um determinado número de
seus componentes do sexo masculino. Com o fim de evitar que üs
componentes das classes privilegiadas servissem como simples soldados,
criaram-se os regimentos de Semiónovski e de Preobrojénski que cor-
respondiam às escolas preparatórias para oficiais. Em 1731 foi fun-
dado o Corpo de Cadetes de Shlákhetsk. A partir desta época come-
çou a difundir-se o hábito de inscrição dos filhos dos nobres, nestas
escolas de treinamento militar, quando ainda eram crianças, assim, ao
atingirem a maioridade, já eram oficiais em decorrência dos "anos de
serviço", não tendo idéia alguma das responsabilidades daí decorren-
tes. Em 1736 decretou-se que um dos filhos de uma família nobre
seria disptnsado do serviço militar para que pudesse cuidar das pro-
priedades; os demais deveriam servir por um período de 25 anos.
Levando-se em conta a inscrição das crianças do sexo masculino nas
escolas de treinamento para oficiais, com poucos anos de idade, tor-
nava-se oossivel o afastamento do exército de indivíduos extremamente
jovens. Por outro lado, sendo dificil exercer o controle com relação
ao recmtamento entre os camponeses, muitos viam-se prejudicados
não só pelos senhores como, sobretudo, pelos intermediários em cujas
mãos se encontrava o poder. Tal fato já ocorria nos séculos XIV-XV,
quando o látego não se encontrava na mão do senhor e sim na de um
grupo pretencioso e grosseiro que ocupava postos de destaque e per-
tencia aos kholópi (4), predecessores dos servos.
Uma simples leitura do conto mostra a grande dependência da
propriedade e do proprietário, da atividade do servo, ligado à terra ou
dedicado aos serviços caseiros ou ainda, ao atendimento pessoal do
senhor. Um dos problemas mais complexos que se nos apresenta, pos-
sivelmente devido à inexistência, entre nós, de bibliografia especiali-
zada, é o de início desta instituição.
Fontes bizantinas e árabes fazem menção à não existência de es-
cravos entre os eslavos. Mesmo os prisioneiros de guerra, tendo ser-
vido aos seus senhores por algum tempo, eram acolhidos entre eles, co-

(4). - O ukáz de 1714 p-évia que o iménie só poderia passar por


heranças a um único filho, sendo que a parte dos demais, ser-lhe-ia dada em
dinheiro ou outros bens móveis. Estas limitações foram suprimidas em 1730.
IAKOVLEV, A. - Kholópi no Império Moscovita do século XVII. Ed. da
Academía das Ciências da URSS, Moscou-Leningrado, 1943. pp. 2S.
- 294-

mo iguais. Até o século XI, nos tratados feitos com os gregos, o vo-
cábulo usado com maior frequência para designar o escravo, pelos es-
lavos, corresponde a tchéliad e tcheliadin que, nas obras medievais, era
usado tambem para designar uma grande família. Desta maneira
acham-se, incontestavelmente ligados à constituição familiar, designan-
do agregados de elementos estranhos ou não a ela. A partir do sé-
culo XI penetra no léxico uma série de outros termos, predominando
a parelha kholóp (5) e rabá alem do curioso vocábulo ótrok (6).
Partindo de uma abordagem crítica de um livro publicado na épo-
ca (7) V. O. Kliutchevski (8) faz um estudo muito interessante sobre
o problema, dizendo que o erro mais grave dos historiadores até então
era estabelecer um elo indissoluvel entre os servos e a terra. Isto teria
ocorrido apenas em fins do século XVI, como instituição do governo
estatal. Já o kholópstvo, sempre fora instituição particular. Referin-
do-se à legislação do Império Russo de 1836, compilada por Speranski,
cita o seguinte:

"Legalmente a situação servil constitui-se na de um camponês,


localizado em terras de um poméchchik com ob-igações he editá-
rias e recíprocas: o camponês deve oferecer em proveito do
poméchchik metade de sua força de trabalho e o poméchchik, por
sua vez, deve proporcionar ao camponês uma tal quantidade de
terra que lhe permita, empregando o restante de suas forç~s, con-
seguir o suficiente para a subsistência dele e de sua família".

Entretanto, como bem nota o autor, nesta conceituação existem


dois pontos fracos: não se leva em conta o relacionamento dos servos
com o Estado e não se faz menção aos servos que não exercem o tra-
balho rural e sim o caseiro. As leis de 1827 tentaram estabelecer a
dependência dos servos com a terra proibindo que nobres os com-
prassem sem prévia comprovação de existência de terras. Por outro
(5). - Iákovlev admite a possibilidade de relacionar a introdução deste
termo com o estabelecimento dos ex-prisioneiros da Polônia (1018-1031) nas
proximidade de Kiev que teriam introduzido o vocábulo khlóp - khláp kholóp,
dizendo que em polonês seu significado é "subalterno", "agricultor" (klóp).
A palavra encontra-se registrada até o século XVIII.
(6). - Ótrók é a forma breve de otr6dok, reflete a origem desta cate-
goria dos componentes inferiores da drujína ligada ainda à distante organização
de clã, indica uma parte consaguínea dele que se desliga, com certo rebaixa-
m.:nto
- 295-

lado, leis mais antigas possibilitavam ao proprietário, a transferência


dos servos dos trabalhos do campo para os de casa e vice-versa, trans-
feri-los individualmente ou em comunidades, para outras terras e ven-
der ou penhora-los individualmente e sem terra alguma. A política
financeira do Estado fazia com que se achasse necessário oferecer aos
camponeses terras suficientes para sua sobrevivência e para garantir a
possibilidade do pagamento de taxas ao próprio Estado.
Inegavelmente a servidão não surgiu do nada e sua ligação com
os outros kholopi é inegavel. Os documentos dos séculos XVI-XVII
mostram que havia vários tipos de dependência: entrega independente,
com registro ou sem ele, entrega pessoal como garantia de juros e ca-
pital do devedor, vendas da família, etc. Distinguiam-se os kabálnie
kholópi libertados por ocasião da morte do senhor, caso sobrevives-
sem a ele e os pólnie kholópi que passavam como herança, juntamente
com os demais bens. Sem dúvida foi o primeiro tipo que teve maior
relação com o desenvolvimento da servidão.
O texto literário em questão, coloca-nos frente a frente com uma
realidade social correspondente à véspera da libertação dos servos.
Neste moinento sabemos que eles estão ligados ao Estado, à Igreja e
aos particulares. :E: a terceira alternativa que vai nos interessar no
momento, em função do ponto que nos serviu de base.
Na época, alem dos servos que executam os trabalhos dentro da
casa do senhor, nas mais diversas funções e que podem se~ por ele
transferidos para outra ocupação a qualquer momento, existem os que
se dedicam ao cultivo da terra - os camponeses, livres ou não.
O artigo de V . A. Alexandrov (9) faz-nos pensar que na primeira
metade do século XIX os proprietários, como que tomaram consciên-
cia dos direitos que podiam exercer sobre seus campones.es e decidiram
fazer uso deles. Prova disso seriam as instruções por eles redigidas ao
seu administrador ou burmistr que variavam de indivíduo para indiví-
duo e, portanto, de propriedade para propriedade. Embora existissem
leis gerais referentes aos camponeses, na realidade cada caso consti-
tuia-se numa realidade específica de administração. Estas instruções
variavam desde as mais gerais até as que se prendiam aos mínimos de-
talhes, dependendo das convicções e dos pontos de vista de cada pro-
prietário.
Voltando ao texto de Turguénev que nos serviu de ponto de par-
tida para o breve estudo que ora apresentamos sobre um assunto que

(9). - ALEXANDROV, V. A. - "A Comunidade Rural e o Vótchina


na Rússia (séc. RVII - início do séc. XIX)" in lstorítcheskie Zapiski (Anota-
ções Históricas), 89, Ed. "Naúka",
- 296-

mereceria ser muIto mais aprofundado, encontramo-nos diante de duas


variantes no relacionamento dos camponeses com os seus senhores.
Trata-se da bárchchina e do obrók.
Ligados por um binômio de dependência, conforme já foi dito
acima, os camponeses, livres ou não, deviam fornecer ao proprietário
parte dos produtos obtidos pela força de seu trabalho.
A bárchchina consistia no trabalho dos camponeses nas terras do
próprio senhor, sendo variavel a quantidade de dias, variavel de lugar
para lugar, embora, no que nos conste, fosse limitada pela lei a três
dias por semana. Os demais podiam ser, por eles ocupados nos cuida-
dos para o seu próprio sustento, trabalhando as terras que lhes eram
destinadas.
O obrók consistia no pagamento de uma quantia, ao senhor, pre-
viamente estipulada por ele, liberando o camponês de trabalhos em ter-
ras do proprietário. A quantia variava de região para região, de pro-
priedade, para propriedade, de senhor para senhor e de época para
época. Ela podia ser obtida pelo camponês por meio de trabalho em
terras de outro proprietário ou naquelas que lhe eram destinadas. O
pagamento podia ser feito em dinheiro ou em espécie. Quando o tra-
balho se efetuava nas terras do camponês a taxa provinha dos produ-
tos da -terra que podiam ser entregues in natura ou de sua venda nos
mercados da região, com o consentimento prévio do proprietário.
Cumpre notar ainda que existia um sistema misto em que obrók
e bárchchina coexistiam num sistema misto.
Pode-se perceber que o obrók era mais comum nas propriedades
menores, como é o caso referido no conto em estudo. Já que as ter-
ras eram relativamente poucas, não exigiam para seus cuidados todo
o tempo do camponês. Fato oposto ocorria no caso da bárchchina.
Seria desnecessário dizer que o tamanho das propriedades variava
muito. Em todo caso, chamou nossa atenção um dos exemplos apre-
sentados por Alexandrov (10) referente à família dos Vorontzov, dona
nada menos que de 300 hectares de terras, localizadas em 16 gubér-
nias (11) (sendo que na época a Rússia estava dividida em 19), com
165 aldeias e 8 povoados, com aproximadamente, 120.000 almas.
Para terminar, seria necessário tecer um breve comentário sobre
a administração de uma propriedade rural. Pelo que se pode depreen-
der do exposto, ás variantes era mmuitas. No caso em estudo, podemos

(lO). - ALEXANDROV (v. A.), op. cit., pp. 273.


(11). - Gubérnia - do latim gubernium, uma das divisões territoriais da
Rússia, administrada por um governador, subdividida em uiézdi.
- 297-

perceber que o burmistr, ao que tudo indica, administrava os bens


pessoais do senhor e aproveitando-se de sua constante ausência, cons-
tituia-se no dono, de fato, da situação. Fontes históricas nos elucidam
a respeito de suas funções, que eram bastante variadas. Sendo uma
espécie de intermediário entre o proprietário e o stárosta, represen-
tante da sélskaia obchchina (comunidade dos camponeses) cabia-lhe
transmitir as ordens do bárin aos camponeses, recolher o tributo
(obrók) julgar e aplicar punições, fiscalizar as propriedades dos cam-
poneses, desempenhar o policiamento, apaziguar e evitar brigas com
os vizinhos, etc. Em caso de prejuizos sofridos pela vótchina cabia-lhe,
em caso de roubo, por exemplo, cobrar o equivalente dos camponeses.
Caso os camponeses se julgassem prejudicados pelo burmistr po-
diam recorrer ao stárosta e, em última instância, ao bárin, a quem ca-
bia a última palavra. :e. fácil imaginar que as soluções eram muito ar-
bItrárias, dependendo do bom-senso, interesse ou, simplesmente, do
estado de espírito em que este se achava no momento. Comprova-o
o episódio ocorrido no conto, quando o velho, com todo respeito se di-
rige ao senhor, pedindo clemência. Note-se que o próprio stárosta,
eleito pelos camponeses, com a finalidade de defende-los, nada mais é
díl que filllO do bU"mistr. Isto nos faz pensar na validade das eleições
dentro da comunidade cam:pesina embora um exemplo sui-gêneris nos
seja dado ainda por Alexandrov (12) para comprovar a importância
destas eleições ocorridas entre os camponeses de príncipe S. B. Kura-
kin. Por uma instrução redigida por ele para suas aldeias e povoados,
onde existia o sistema do obr6k, em 1794, onde residiam 654 almas,
e que se localizavam no uiezd de Rostov e na gubernia de Iaroslavl.
Sem se intrometer nas atividades econômicas dos camponeses, o prín-
cipe indicara o burmistr a partir de uma lista de 4 nomes escolhidos
numa reunião geral da comunidade; entregava-lhe a administração da
votchina e sujeitava-o à fiscalização de elementos de confiança indica-
dos por cada povoação. O burmistr poderia ser substituido com o COIl-
sentimento do príncipe. Em conjunto com os fiscais designados o
burmistr analisava as brigas e as petições dos camponeses, julgava,
aplicava as "somas coletadas" (dinheiro proveniente de multas, das co-
letas na igreja). Devia levar em consideração as opiniões dos represen-
tantes quanto às necessidades de uma ou outra povoação e apresentar
nas reuniões gerais da votchchina as questões mais complexas. Ao que
tudo indica os camponeses valorizavam este tipo de administração
pois, em 1806, depois da morte do príncipe e sob a ameaça de venda
da propriedade, concordaram em pagar, ao irmão do falecido, obr6k
de 30 mil rublos, em lugar de 20
- 298-

Esperamos ter, na medida do possivel, aproveitado o micro-uni-


verso do presente conto, para focalizar a veracidade histórica do relato
de um contemporâneo. Procuramos unir literatura e história num todo
coeso, em busca dos contornos vivos de um passado distante.
'" '"
'"
INTERVENÇOES.

Do Prof. Dr. Niko Zuzek (FFLCH/USP).


Perguntou:
"1. - Entre burmistr, majordomus ou stwards dos senhores feu-
dais medievais existe algum paralelo?
Resposta: Majordomus - do latim major domus era o chefe da
casa, isto é, chefe dos domésticos de uma grande casa; o mesmo ocor-
rendo com os stewards. No conto corresponderia ao comerdiner, tra-
duzido por "camareiro". Já o burmistr possuia funções diversas, como
já dissemos voltadas para a administração das propriedades.
Sabemos, por exemplo, pela instrução de V. N . Samarin (mencio-
nada por V . A. Alexandrov) que na aldeia de Spásskoie, na Gubémia
de Tula, em 1769 o burmistr devia constituir-se na instância interme-
diária entre o prikachtchik e a sélskaia obchchina. As reuniões ordi-
nárias, antes convocadas livremente e pelos camponeses, agora só po-
diam se-lo pelo burmistr. Cabia a ele ter todas as ordens enviadas pelo
bárin, informando assim os camponeses; a cobrança do tributo passava
dos administradores da vótchina, os prikaztchiki, para o burmistr. Nas
reuniões da comunidade rural julgavam-se os conflitos e os castigos
deviam ser atribuidos na presença do burmistr. Em caso de votação,
o burmistr tinha direito a 3 votos.
Desta maneira percebe-se a reação pela qual Pinotchkin denomina
seu burmistr de "verdadeiro estadista". Por outro lado, a administração
das casas senhoriais, podendo estar nas mãos do camerdiner (cama-
reiro) poderia apresentar certo paralelismo com o majordomus ou
stewards medievais do ocidente.
2. - Os servos, na Rússia, para abandonarem os territórios re-
cebiam tal permissão do burmistr ou do stárosta? (Referência a Almas
Mortas, de Gógol).
Resposta: Pelo Sudénik (Codex) de 1497 previa-se que uma vez
por ano, uma semana antes do dia de São
- 299-

os camponeses podiam deixar os territórios onde residiam (dia 26 de


novembro), com a obrigatoriedade de pagar nosnusoro isto é, o corres-
pondente devido pela residência nas terras do senhor.
Em fins do século XVI, pela introdução, em 1581, dos záno-
védnie tetá legislação que proibia a saida dos camponeses, mesmo na
semana de São Jorge. Esta determinação foi confirmada pelo ukáz
1592-93. A partir de 1767 foi proibido aos camponeses fazer queixas
contra os poméchchiki, sendo que tal atitude podia ser punida pela en-
trega do queixoso ao serviço militar, cuja duração mínima era de 25
anos. Desta forma legalmente não há possibilidade de abandono das
terras pelos servos. Entretanto, partindo do princípio de que o senhor
era absolutamente livre para fazer o que desejasse, sabia-lhe autorizar
a saida dos seus servos - camponeses mediante pagamento de taxas
ou de outra forma qualquer.
Com relação a Almas Mortas, ficamos sabendo que, muitas ve-
zes os camponeses, simplesmente, fugiam. Tal atitude, confirmada
em outras fontes literárias e mesmo históricas era passivel de castigo.
A legislação previa mesmo punições para os que acolhessem um servo
fugitivo, sem notificar as autoridades.
Existia ainda a possibilidade do servo comprar sua própria liber-
dade, como no Brasil - a alforria. Entretanto isto se tornava extre-
mamente dificil, com a instituição de pagamento da "·taxa residencial",
isto é, estipulava-se uma quantia que o servo devia pagar ao senhor
pelo usufruto anual da terra e da moradia. Dificilmente poderia arran-
jar, alem desta quantia, o suficiente para seu alforriamento. Podia
ocorrer que mesmo tendo dinheiro suficiente o senhor se recusasse em
aceitar sua libertação.
• •

Da Prof.a Rina Azaryah Barreto Nunes (Universidade Federal de Ser-
gipe) .
1. - Os dois termos mais usados para designarem o elemento
que se retira do grupo, têm correspondentes em português? Qual a ati-
tude do grupo em relação aos elementos que o abandonam?
Resposta: A maior dificuldade apresentada pela abordagem do
assunto em questão encontra-se justamente na inexistência de termi-
nologia correspondente em português. S uma realidade social diversa
e distante da que estamos acostumados a conhecer. Os
- 300-

dievais para designar uma grande família e ótrok ou otródok, na sua


forma total, indica filologicamente uma proximidade indiscutível com
o vocábulo ród, ou seja gen, a grande família tribal e ót, fora, para
fora, partícula que indica afastamento. Otrok ou otródok seria então
um indivíduo pertencente à própria família, mas que por qualquer
motivo se viu afastado dela. Não seria o caso dos prisioneiros de guer-
ra estranhos, na sua origem, à constituição do gen. Inclusive no pe-
ríodo da Rússia Kievana temos várias referências a prisioneiros de
guerra, escravos durante um período de tempo, que passam a integrar
o clã, passando a ser vistos como parte dele.
Seria interessante lembrar aqui o termo izzór que designava os
descendentes da família de Rurik cujo ancestral falecera sem ter che-
gado a ocupar o trono Kievano. Dava-se este nome também aos fi-
lhos de padres que não sabiam ler e escrever, constituindo, portanto,
uma exceção dentro do seu próprio grupo. Usava-se ainda para de-
signar a situação instavel de indivíduos que por exemplo, deixaram
uma ocupação e não se definiram em outra. Este termo izzói nos faz
pensar numa proximidade bastante marcante de gnát, tocar, fazer cor-
rer, perseguir, expulsar e iz, algo dentre um conjunto, para fora, de.
Portanto izzói, ligado a izznát, expulsar de, poderia muito bem ser al-
guem expulso da comunidade familiar - como é o caso dos príncipes
que não têm direito à sucessão e passam a ser dependentes dos seus
superiores, ou seja, dos que continuam com o direito de aspirar ao
trono Kievano.
A atitude do grupo em relação a estes elementos, pelo que nos
tem sido dado ver a respeito, não era das mais condescendentes. O fato
se deve, parece-nos, a uma dependência binária, existente entre senhor
e servo, semelhante à que existe entre pai e filho (a própria abordagem
filológica das designações, mostra sua proximidade). O senhor obriga-
se a fornecer ao servo os meios indispensáveis para sua subsistência
junto com a família, enquanto este deve empregar parte de sua capa-
cidade de produção em proveito do senhor. Uma vez que o próprio
senhor tornara-se uma espécie de servo do czar nada mais normal do
que julgar-se um dever sagrado servir bem, isto é, o servo devia ser
1lTl'l
A GRANDE PROPRIEDADE RURAL E AS TRANS-
FORMAÇÕES DA ECONOMIA EXPORTADORA
ARGENTINA (1879-1906) (*).

ANTONIO E. MUNIZ BARRETO


da F<1culdade de Economia e Administração da Uni-
versidade de São Paulo

o objetivo deste trabalho é mostrar a relação existente entre a


exportação de cereais e o estabelecimento de estradas de ferro, fluxo
de imigrantes e importação de bens de capital, neste caso considerado
o arame para cercas, destinados à agricultura, na Argentina, à base
na grande propriedade rural entre 1879 e 1906 (**).
*
Evolução Histórica.

Ao contrário do que aconteceu no caso brasileiro, a Argentina


incorporou-se de forma vigorosa no comércio internacional somente
a partir da segunda metade do século XIX.
Após a descoberta, no século XVI, as regiões que formaram pos-
teriormente o Vice-reinado do Rio da Prata, foram sempre depen-
dentes ou periféricas do grande centro minerador localizado no pla-
nalto andino peruano, ligado tambem ao comércio exterior.
Apenas 20% do atual território argentino forma a região pam-
peana oriental, de clima temperado, chuvas abundantes e bem distri-
bu:das que possibilitam as culturas e a criação de rebanho bovino e
ovino. A parte restante é formada pelos bosques da região do Chaco
e Misiones, a área montanhosa dos Andes e outras formações orográ-

(*). - Comunicação apresentada na 1" Sessão


- 302-

ficas, e o pampa árido e o planalto patagônico, onde as condições eco-


lógicas nem sempre se consideram as melhores para a atividade agrí-
cola.
A ocupação do território argentino pelo homem reflete em gran-
de parte a influência da configuração geográfica, na dependência da
localização de suas planícies, montanhas, vales e rios. O fluxo mi-
gratório seguiu duas grandes linhas decorrentes da atividade econô-
mica desenvolvida nos anos da colonização: a). - a procedente di-
retamente da Espanha que, ao penetrar pelos Rios da Prata, Paraná e
Paraguai, fundou cidades na beira desses rios, as principais Buenos
Aires e Assuncion; e b). - a colonização proveniente do Perú que
deu origem a toda uma série de centros urbanos, em dependência, de
forma direta ou indireta, deste centro minerador.
Aldo Ferrer em sua análise histórica da economia argentina,
mostrou uma primeira fase, na qual predominam as economias regio-
nais de subsistência, ou seja, deu certa importância à área colonizada
desde o Norte. Nesta, Buenos Aires não passou de uma segunda
opção do caminho à Europa procedente do Perú e um ativo centro
de contrabando, onde os portugueses tiveram papel de relevância.
O segundo período considerado estende-se desde o fim do sé-
culo XVIII até 1862. Ferrer denominou-o a "etapa de transição",
que se afirmou a cidade de Buenos Aires como centro comercial e o
país adquiriu as atuais fronteiras. Multiplicaram-se rapidamente, os
rebanhos bovino e ovino, que propiciaram a base para exportar couros
e carne-seca, ao favor das condições ecológicas da área privilegiada dos
pampas.
A terceira fase abrangeu os anos considerados neste trabalho,
denominada da "economia primário-exportadora" (1860-1930). O
complexo lavoura-pecuária revelou-se o elemento dinâmico de desen-
volvimento desse período.
Contudo o desenvolvimento não foi homogêneo em sua estru-
tura produtiva e participação nas trocas internacionais. Até a década
dos oitenta predominaram na pauta de exportação a lã, couros, car-
ne-seca e sub-produtos do rebanho bovino e ovino. A partir desta
década aconteceu o que Scoble denominou a "Revolução nos Pam-
pas",
- 303-

Justificativa do Período Considerado (1879-190.6).


Foram escolhidos 28 anos dentro dos quais ocorrem as mudan-
ças salientadas por Scobie; começam em 1879, ao se iniciar a recu-
peração da crise ocorrida anos anteriores. Di Tella e Zymelman con-
sideram os anos entre 1876 e 1913 como de precondicionamento, com
o marco de 1876, quando a Argentina começa seu desenvolvimento
agrícola. Pretendíamos utilizar 30 anos, isto é, 1876 a 1906, mas a
dificuldade em achar dados para os anos 1876, 1877 e 1878 nos levou
a restringir em três anos o período utilizado.
*
Tipo de Produção.
Durante a segunda metade do século XIX, tnlClou-se o cerca-
mento das fazendas, em geral de áreas extensas, acompanhado da
ampliação do rebanho bovino. Estes objetivos de melhoria e diver-
sificação agrícola enriqueceram-se tambem de tentativas de estabe-
lecimento de colônias agrícolas baseadas em pequenas unidades. A
primeira iniciativa correspondeu a do Dr. Brougnes em 1853 e quase
simultaneamente a de A. Castellanos; surgiram ainda outras nesses
primeiros anos de experiências de colonização. Estes esforços iniciais
foram denominados por Ricardo M. Ortiz como de "colonização em
massa" e finalizaram poucos anos. depois, em 1865, sem atingir os
objetivos propostos.
A estrutura produtora básica do setor agrícola continuou a man-
ter a grande propriedade rural. Perto de Buenos Aires, concentrou-se
o rebanho ovino, que deslocou o bovino para regiões mais afastadas
do porto.
Nesta primeira fase que se inicia, desenvolveu-se um novo tipo
de ocupação do solo denominado "etapa da colonização particular",
entre os anos de 1865 e 1872. Estas colônias, provenientes de lotea-
mentos de grandes áreas de terras, estabeleceram-se no sul da pro-
víncia de Santa Fé, deram lucros aos antigos donos das terras e co-
meçaram a diversificar a produção agrícola. Destas colônias proce-
deram os primeiros embarques de trigo para o exterior.
O êxito da colonização e a série de mudanças na década dos oi-
tenta acarretaram alta muito grande nos preços da terra, fato que
impossibilitou sua compra pelos colonos e levou ao sistema de arren-
damento da terra. Esta permaneceu nas mãos dos grandes proprie-
tários.
*
As Mudanças dos Anos 80.
- 304-

trutura produtiva do setor agrícola e, por meio dela, a Argentina pas-


sou a ser um dos principais exportadores de cereais e carne conge-
lada do mundo.
Em 1880 fixaram-se de forma definitiva pelo General J . A. Roca,
as fronteiras com os índios; a superfície possivel de exploração alar-
gou-se as incursões dos antigos donos da terra foram contidas.
Tambem nestes anos intensificou-se a implantação do sistema
ferroviário oue ligava o interior com o porto de Buenos Aires e tam-
bem ao de Rosário, facilitando assim a exportação dos produtos agrí-
colas, couros, lã e carne. Este fenômeno tambem foi um novo fator
na tendência para incorporar terras, que até então estivera limitada
pelos custos e tempo de transporte. Neste sentido, podem ser salien-
tadas as linhas férreas que ligavam o Oeste e Sul com a cidade de
Buenos Aires. Entre os anos de 1880 e 1910 construiram-se aproxi-
madamente 23.000 Km. de linhas férreas localizadas na planície dos
pampas, ou seja, nas províncias de Buenos Aires, Córdoba, Santa Fé
e Entre Rios.
Uma das consequências importantes do desenvolvimento da es-
trada de ferro foi a grande alta nos preços da terra, fato que impediu
sua aquisição por pessoas de poucos recursos. Afiançou-se, desta for-
ma, o tipo de propriedade que caracterizou esta época: a "estância".
O tipo de rebanho tambem mudou como consequência do em-
prego do arame como cerca, e possibilitou, desta forma, a introdução
de reprodutores de raça, o Shorthorn em geral, que melhoraram a
qualidade dos bovinos destinados à exportação, em pé ou congelados.
A implantação dos frigoríficos tambem acrescentou dinamismo ao se-
tor exportador.
O rebanho ovino sofreu mudanças, uma vez que se utilizava não
só a lã mas tambem a carne. Desta forma, os Lincoln substituiram
aos poucos os merinos existentes até então.
As safras agrícolas transformaram-se nestes anos: surgiu a cul-
tura do trigo, milho e linho para consumo interno e exportação, e
tambem as pastagens para engorda do gado, a substituir as variedades
naturais e rudes de capim, pelas especiais cultivadas. Merece salien-
tar a plantação de alfafa.
Tudo isto foi completado pelos fluxos migratórios, tanto de
imigração como emigração. Estes, pela estrutura existente, não ti-
nham condições para se estabelecer de forma definitiva na terra. O
que aconteceu com estes adventos foi o seguinte: a). - uma parcela
mínima conseguiu fixar-se à terra pelo sistema de pequena proprie-
dade, basicamente nas províncias de Santa
- 30S-

outra parcela trabalhava na agricultura, como arrendatária, nas pro-


priedades consideradas grandes. Nem sempre os imigrantes cultiva-
vam a mesma terra ao longo do ano: a rotação dentro da mesma
propriedade, os levava, às vezes, a deixa-la; c). - um número rela-
tivamente maior destes imigrantes deslocou-se em função das safras,
os chamados "andorinhas" que após as tarefas agrícolas voltavam ao
Velho Mundo; d). - o sucesso da urbanização fixou outro grupo
dentro das cidades, principalmente em Buenos Aires.
No quadro abaixo apresentamos a origem dos imigrantes entre
1861 e 1890.

QUADRO NQ 1
IMIGRAÇÃO NA ARGENTINA.

Período Itália Espanha França G. Bretanha Áustria Alemanha


1861-1870 113.554 22.627 8.371 3.897 815 1.298
1871-1880 152.061 44.717 32.717 9.701 4.261 3.819
1881-1890 493.885 158.764 93.843 16.212 16.518 14.184
FONTE: Direcci6n Genera,l de Imigracion, "Resume estadístico deI Movi-
miento migratorio de la R. Argentina (1857-1924)" in Caramuti O.
Stahringer de, La Política Migratoria Argentina, Depalma, 1975, pg.
71.

Pode-se observar a grande participação dos originários da Itália


e numa parcela menor, dos da Espanha, ou seja, da Europa Meridio-
nal. Os imigrantes, na sua maioria pertenciam ao sexo masculino, sol-
teiros e entre 13 e 60 anos de idade.
Todo este conjunto de mudanças marcou de forma evidente a in-
corporação da Argentina como país agrícola exportador, na qual o pro-
cesso produtivo desenvolveu-se a base de grandes propriedades, para
comercializar uma série de produtos, e nas quais a mão-de-obra dedi-
cada às tarefas agrícolas distinguia-se pela origem européia e pela
condição de assalariado.

A Propriedade Rural.
Pode-se afirmar, sem dúvida alguma, que as transformações ocor-
ridas a partir dos anos 80
- 306-

dades. As leis de 4 de novembro de 1864 e 10 de janeiro de 1867


culminaram na mais importante que fixou as normas de colonização
e favoreceu a concentração da propriedade (lei n. o 817 de 19 de
outubro de 1876).
Paralelamente à formação destas leis intensificou-se a passagem
de terras do Estado às mãos de particulares . Segundo Panettieri, en-
tre 1883 e 1889 foram outorgadas 15.569.717 Has em 234 conces-
sões, mais por motivo de especulação que por aumento da área pro-
dutiva. Estas terras, após dar bons lucros aos seus proprietários ini-
ciais, tambem passaram a produzir à base do sistema da grande pro-
priedade.
Entre 1876 e 1902 passaram às mãos de particulares mais de
5 .000.000 Has; nem sempre localizaram-se em áreas próprias para
a agricultura, mas o objetivo não era fixar o homem à terra.
A lei Geral de Terras n. O 4.167 de 1902 intentou regulamentar
novamente a confusa, e às vezes contraditória legislação argentina.
Esta lei, assim como as que se seguiram em 1903, 1905 e 1906 ti-
nham como propósito, segundo o autor acima mencionado, o fomento
da imigração, proteger e estimular as safras agrícolas e evitar os abu-
sos da concentração da propriedade. Porem fracassou, na sua execu-
ção e, aumentou a tendência especulativa e o latifúndio.
Este problema foi analisado por Scobie de forma clara e exaus-
tiva
"Un estudio de la política general respecto a la tierra, los
imigrantes y las tarifas muestra que el gobierno argentino tuvo
muy poco intéres duradero o eficiente por el desarrollo agrícola
deI país. No adoptó una política racional de tierras antes que el
dominio público pasara a manos privadas. No estimuló la imi-
gración mas aliá de la que fue producto natural de los períodos
de prosperidad económica de 1882-1889 y 1904-1912. No ofreció
atractivos ni oportunidades a los imigrantes para que se estable-
cieran en la tierra. Y con su política tarifaria favoreció a otros
p-oductos agrícolas, y aun a productos seudoindustriales, en
detrimento directo deI trigo y la harina. En este sentido las
autoridades nacionales imitaron la actitud general de los intereses
terratenientes y ganaderos. Los agricultores y los imigrantes fue-
ron aceptados como servidores que debian construi~ la grandeza de
la Argentina. Pero no constituyeron la principal preocupación
de la Nación".
- 307-

dade existente nos anos considerados, responsáveis pela estrutura agrá-


ria existente, com as seguintes características: a grande propriedade,
trabalho livre, em geral de imigrantes, na parte dedicada à agricultura,
sua produção condicionada pelo grande desenvolvimento .

o Teste Estatístico.

o período considerado, os anos 1879-1906 apresentam graus de


liberdade suficientes para o tratamento estatístico dos dados. Dentro
destes anos verificou-se grande aumento das exportações dos cereais
considerados, que passaram de 55.436 tons. em 1879 a 9.215.000
tons. em 1906. O Teste consistiu em verificar até que ponto a expan-
são da produção está ligada ao aumento na utilização dos fatores de
produção mais importantes.
Os produtos agrícolas incluidos no teste foram trigo, milho e linho;
pelo fato de não ter sido possivel obter dados objetivos sobre a produ-
ção ou área cultivada, consideramos somente dados referentes à expor-
tação, sem utilizar o consumo interno e a parcela reservada a sementes.
Entretanto, como o grande crescimento das safras foi consequência da
exportação, acreditamos ser correto utilizar destes dados que mostram
o dinamismo do setor, condicionado pelo comércio exterior.
Como indicador de utilização de bens de capital (inclusive terra)
no setor agrícola, adotou-se o estoque acumulado de arame entre os
anos de 1879 e 1906, estimado a partir das importações realizadas.
Não foi considerada depreciação alguma pelo fato de que o arame
podia ser utilizado por um número relativamente longo de anos. A
maior restrição a ser feita é que este bem de capital podia ser utilizado
não só para cercar terras de lavoura mas tambem destinadas à pecuária,
tanto no caso dos bovinos, como ovinos. Mas, por não existir dados
sobre este uso, alem dos referentes à da rotação, ou seja, terras utiliza-
das para a lavoura tambem o foram para a pecuária. Desta forma,
considerou-se a importação total do arame como se fosse destinada
apenas à lavoura.
Como mão-de-obra, foi usado o fluxo de imigrantes na sua tota-
lidade. Embora uma parcela dos mesmos ficasse nas áreas urbanas,
a maioria dedicou-se à agrÍcultura; nos anos em consideração, o nú-
mero relativamente alto de emgirantes mostra que a imigração estava
fortemente ligada ao trabalho temporário nas atividades agrícolas.
Outra variavel explicativa utilizada foi o número de quilômetros
construidos de linhas férreas, que passou de 2. 231km. em 1879 a
20.560 km. em 1906,
- 308-

nhar o observado crescimento do setor exportador agrícola. Esta


variavel serve para representar a contribuição dos investimentos pú-
blicos para o aumento da capacidade produtora da economia argentina.
Como no caso anterior, pode ser feito o reparo de que as estradas de
ferro não foram construidas unicamente. condicionadas pelas expor-
tações agrícolas, mas tambem para o transporte de lã, animais vivos,
importações e eventualmente, transporte de passageiros.

*
o MODELO.

Para quantificar o exposto acima foi utilizada uma função do


seguinte tipo:
bi
i, ..... n.
Na qual a exportação de trigo, milho e linho é função do: i) esto-
que de arame importado; ii) fluxo de imigrantes e iii) quilômetros
construidos de estradas de ferro (estoque) .
Na utilização econométrica dos dados foram utilizadas as seguin-
tes variáveis:
Y 1: quantidade de trigo exportado
Y 2: quantidade de linho exportado
Y s: quantidade de milho exportado
Y 4 : soma do trigo, linho e milho Y 4 = Y I + Y2 + Ya
Xl: estoque de arame importado
X 2: fluxo de imigrantes no ano considerado
X s: Km de estradas de ferro existentes.
A conveniência da utilização de Y 4 , ou seja, o total de trigo, linho
e milho exportados - em quantidade - explica-se pelo fato de que
nem sempre a mesma terra produzia o mesmo cereal, existindo a possi-
bilidade de produzir alternadamente. Em geral, nas "estâncias"
- 309-

No trabalho de estimação a equação adotada foi a seguinte:


+
log Y4 = cf> (log XI, log X 2 , log Xa ) Termo Aleatório
admitindo-se que cf> é uma função linear.
Utilizando o método de mínimos quadrados o resultado obtido
foi o seguinte:
Log Y 4 = - 13,6597 + 0,3818 Xl + 0,7020 X 2 + 1,2879 X a
(0,8225) (2,6141) (2,3112)
sendo
R2 múltiplo: 0,9102
F: 81,150
Durbin-Watson: 1,7075
O R 2 e o F da regressão são satisfatórios, assim como o teste de
Durbin-Watson e os sinais dos coeficientes. Os valores dos "t" de
Student, que querem, entre parenteses. mostrar que a significância
do coeficiente de Xl é duvidosa, devendo ser notado, todavia que há
forte multicolinearidade entre as variáveis explicativas. Isso se evi-
dencia, por exemplo, pelos coeficientes de correlação entre log Xl e
log X 2 , entre log Xl e log X 3 e entre log X 2 e log X 3 , que tem os va-
lores de 0,65 ;0,97 e 0,60 respectivamente.
*
CONCLUSOES.

O grande crescimento das exportações agrícolas argentinas entre


1879 e 1906 pode ser explicado pelos investimentos privados refletidos
pela delimitação de terras agrícolas graças ao arame, pela expansão da
infra-estrutura interna de transportes e pelo fluxo dos imigrantes a
fornecer mão-de-obra disponivel que proporcionaram o aumento das
safras e da exportação. Desta forma, a Argentina conseguiu acom-
panhar e participar do dinâmico mercado mundial necessitado de
forma crescente de matérias primas e alimentos, no fim do século XIX.
A produção foi obtida na sua maior parte, em grandes unidades,
alternando culturas, como consequência do alto preço da terra e a não
aplicação de leis que possibilitassem aos pequenos produtores a fixar-
-se na mesma. O
- 310-

TABELA N9 1
Ano Imigração Emigração Saldo Saldo Acumulado
1879 55.155 23.696 31.459 31.459
1880 41. 651 20.377 21.274 52.733
1881 47.484 22.374 25.110 77.843
1882 51.503 8.720 42.783 120.626
1883 63.243 9.510 53.733 174.359
1884 77.805 14.444 63.361 237.720
1885 108.722 14.585 94.137 331. 857
1886 93.116 13.907 79.209 411.066
1887 120.842 13.630 107.212 518.278
1888 155.632 16.842 138.790 657.068
1889 260.909 40.649 220.260 877.328
1890 110.594 80.219 30.375 907.703
1891 52.097 81.932 -29.835 877.868
1892 73.294 43.853 29.441 907.309
1893 84.420 48.794 35.626 942.935
1894 80.671 41.399 39.272 982.207
1895 80.989 36.820 44.169 1.026.376
1896 135.205 45.921 89.284 1.115.660
1897 105.143 57.457 51. 607 1.167.267
1898 95.190 53.536 41.654 1.208.921
1899 111.083 62.241 48.842 1.257.763
1900 105.902 55.417 50.485 1.308.248
1901 125.951 80.251 45.700 1. 353.948
1902 96.080 79.427 16.653 1.370.601
1903 112.671 74.776 37.895 1.408.496
1904 161.078 66.597 94.481 1.502.977
1905 221.622 82.772 138.850 1.641.827
1906 302.249 103.852 198.397 1.840.224
FONTE: Direción General de Imigración, Resumen Estadístico dei Movimiento
Migratório en la República Argentina (1857-1924).
Direción General de Estadística de la N ación . Anuários Estadísticos
de la República Argentina.

TABELA N92

Ano Arame para Arame de A + B Saldo Acumulado


Cercas (A) Ferro e Aço (Kilos) (A + B) (Kilos)
(Kilos) (Kilos) (E)
1879 9.688.574 9.688.574 20.350.350
1880 13.447.570 13.447.570 33.797.920
- 311

Ano Arame para Arame de A + B Saldo Acumulado


Cercas (A) Ferro e Aço (Kilos) (A + B) (Kilos)
(Kilos) (Kilos(E)
1881 21.847.157 21.847.157 55.645.077
1882 14.434.179 14.434.179 70.079.256
1883 19.727.103 1.735.336 21.462.439 91.541.695
1884 22.323.080 2.161.706 24.484.786 116.026.481
1885 22.359.663 1.904.507 24.264.170 140.290.651
1886 19.835.561 3.560.497 23.396.058 163.686.709
1887 35.145.425 3.571.880 38.717.305 202.404.014
1888 28.323.076 2.664.927 30.988.003 233.392.017
1889 39.414.060 653.095 40.067.155 273.459. 172
1890 10.205.369 625.968 10.831.337 284.290.509
1891 21.846.753 958.010 22.804.763 307.095.272
1892 41.118.837 1.331.111 42.449.948 349.545.220
1893 21.820.756 2.941.357 24.762.113 374.307.333
1894 28.991.434 388.346 29.379.780 403.687.113
1895 20.643.263 5.832.324 26.475.587 430.162.700
1896 23.758.084 120.500 23.878.594 454.041.284
1897 21. 521. 231 28.908 21.550.139 475.591.423
1898 18.323.447 95.866 18.419.313 494.010.736
1899 17.747.632 75.685 17.823.317 511.834.053
1900 14.964.989 67.017 15.032.006 526.866.059
1901 15.669.448 15.669.448 542.535.507
1902 13 .080 .965 13.080.965 555.616.472
1903 15.902.796 15.902.796 571. 519.268
1904 15.557.000 15.557.000 587.076.268
1905 17.437.293 17.437.293 604.513.561
1906 21.895.170 21.895.170 626.408.731
FONTE: LATZINA, Francisco, Estadística Retrospectiva dei Comércio Exterior
Argentino, 1875-1904, Compafiia Sud-Americana de Billetes de
Banco, Buenos Aires, 1905.

TABELA Nt? 3·
Ano Trigo (TNS) Milho (TNS) Linho (TNS) Total (TNS)
1879 25.669,3 29.521,3 246,0 55.436,6
1880 1.165,6 15.032,0 958,0 17 .155,6
1881 157,1 25.052,2 6.394,6 31.603,9
1882 1.705,3 107.327,2 23.351,8 132.094,2
1883 60.754,7 18.634,4 23.061,7 102.450,8
1884 108.499,2 113.710,1 33.991,7 256.201,0
1885 78.4"93,4
- 312-

Ano Trigo (TNS) Milho (TNS) Linho (TNS Total (TNS)


1886 37.864,4 231.660,3 37.689,9 307.214,6
1887 237.865,9 361.844,3 81.208,2 680.918,4
1888 178.928,5 162.037,5 40.222,9 381.188,9
1889 22.806,4 432.590,7 28.195,8 483.592,9
1890 327.894,2 707.282,0 30.720,6 1. 065 .896,8
1891 395.555,2 65.908,9 12.213,3 473.677,4
1892 470.109,6 445.935,0 42.987,1 959.031,7
1893 1.008.137,0 84.513,7 72.199,4 1.164.850,1
1894 1. 608 . 249,0 54.876,0 104.434,8 1.767.559,8
1895 1.010.269,0 772.318,0 276.443,0 2.059.030,0
1896 532.002,0 1.570.517,0 229.675,0 2.332.194,0
1897 101.845,0 374.942,0 162.477,0 639.264,0
1898 645.161,2 717.105,0 158.904,0 1.521.170,2
1899 1.713.429,0 1.116.276,0 217.713,0 3.047.418,0
1900 1. 929.676,0 713.248,0 223.257,0 2.866.181,0
1901 904.289,0 1 .112.290,0 338.828,0 2.355.407,0
1902 644.908,0 1.192.829,0 340.937,0 2.178.674,0
1903 1.681.327,0 2.104.384,0 593.601,0 4.379.312,0
1904 2.304.724,0 2.469.548,0 880.541,0 5.654.813.0
1905 4.103.000,0 3.574.000,0 740.000,0 8.417.000,0
1906 3.672 .000,0 4.951.000,0 592.000,0 9.215.000,0

FONTE: LATZINA, Francisco, Estadística Retrospectiva dei Comércio Exterior


Argentino, 1875-1904, Compaiíia Sud-Americana de Billetes de
Banco, Buenos Aires, 1905

TABELA N94.

Ano E. de Ferro
Kms
1879 2.231
1880 2.516
1881 2.516
1882 2.632
1883 3.164
1884 3.632
1885 4.503
1886 5.836
1887 6.689
1888 7.571
1889 8.158
1890
- 313

Ano E. de Ferro
Kms
1891 12.475
1892 13.682
1893 13.852
1894 14.030
1895 14.116
1896 14.461
1897 14.755
1898 15.451
1899 16.413
1900 16.563
1901 16.907
1902 17.377
1903 18.404
1904 19.428
1905 19.794
1906 20.560
FONTE: Direci6n General de Estadística de la Naci6n. Anuários
Estadísticos de la República Argentina.
Tornquist, Ernesto e Cia The Economic Development of
the Argentine Republic, Buenos Aires, 1919.

• •

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Tornquist (Ernesto e Cia.),. The Economic Development of the Argentine
Republic, Buenos Aires, 1919.
Latzina (Francisco), Estadística Restrospectiva dei Comercio Exterior Argen-
A PROPRIEDADE RURAL NO EGITO:
A REFORMA AGRÁRIA (*).

HELMI MOHAMMED IBRAHIM NASR.


da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Huma·
nas da Universidade de São Paulo

APRESENTAÇÃO.

Julgamos oportuna nossa contribuição neste VIII SIMPOSIO DA


ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROFESSORES UNIVERSI-
TARIOS DE HISTORIA, que ora se realiza em Aracaju, onde se
procura enfocar o problema da Propriedade rural, de capital interesse
para o mundo, em geral, e para os paises em desenvolvimento, em
particular.
Tendo apresentado, primeiramente, neste trabalho, os dados geo-
gráficos do Egito e sua distribuição populacional - fatores que, por
si só, justificam um estudo da propriedade rural neste país, a partir
do século XVI até 1952 - , passamos a analisar as consequências
advindas do gritante contraste no domínio da propriedade, e aborda-
mos, finalmente, os principais itens da lei da Reforma Agrária, san-
cionada após a Revolução de Nasser, em 1952, a evolução da proprie-
dade rural e as vantagens que a Reforma trouxe à sociedade, em ge-
ral, e aos camponeses, em particular.
* *
*
INTRODUÇÃO.

A superfície do Egito é de cerca de 250 milhões de feddans, ou


seja, um milhão de Kms 2 (1). Mas, grande parte dela é desértica. O

. (*). - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe A, no


dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Cada feddan corresponde a aproximadamente 4.200
- 316-

Nilo, que a atravessa numa extensão de 1.500 Kms, deixa uma faixa
de terra extraordinariamente fecunda, entre duas regiões áridas. En-
tretanto, a superfície do Vale do Nilo e de seu Delta é de apenas 9
milhões de feddans (2), dos quais dois milhões representam os lagos, o
leito do Nilo e outras ramificações. O Egito é uma nação, por ex-
celência agrícola e sua vida esteve sempre condicionada ao grande
rio que, com as periódicas enchentes, propiciava às terras extraordiná-
ria fertilidade.
A população do Egito é de 37 milhões de habitantes, quase toda
ela ocupando uma área relativamente pequena, isto é, 98,8% dos
egípcios vivem numa superfície de, apenas 3,8% da totalidade do
país. Esta área compreende a faixa, por onde passa o Nilo, e a zona
costeira do Mediterrâneo. Somente meio milhão habita o deserto, que
corresponde a 96,2 % do país. Do ponto de vista demográfico, o
Egito é considerado o país mais densamente povoado, pois cada habi-
tante ocupa uma área de 0,27 feddans, e a porcentagem se reduz a
0,20 feddans, quanto à terra cultivável. À guisa de curiosidade, tal
porcentagem, na Europa, é de 0,90, e, no Estados Unidos, de 3,90
feddans (V. mapa anexo).

* *
*
HISTóRICO: A PROPRIEDADE RURAL NO EGITO.

A). - Do século XVI ao XX.


I. - Na época dos mamelucos (3) e da expedição francesa no
Egito, a propriedade rural estava distribuida da seguinte maneira:
a). - A maioria das terras pertencia aos mamelucos e ao governo;
b). - Uma parte das terras era controlada por seis mil pessoas
denominadas multazim, que, na época, gozavam de grande prestígio
e autoridade na região; estes se encarregavam de pagar, antecipada-
mente, ao governo os impostos da localidade, e recolhiam, depois, os
impostos dos usuários, com um acréscimo equivalente ao juro da
quantia adiantada ao governo. As terras, controladas pelos multazim,
pertenciam ao governo e eram cultivadas pelos felah (4), que tinham

(2). - 37.800 Kms2.


(3). - Milícia turco-egípcia, originariamente formada de escravos, e
que avassalou o Egito de 1250 a 1571. O general Bonaparte os destroçou na
Batalha das Pirâmides, em 1798, e Mohamed Aly os exte:minou em
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PALM TR EE S J----,.,-;;ç
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OLD MONUM E N TS
- 317-

o direito de explora-las, mas jamais o direito de cede-las. O gover-


no doava, ainda, aos multazim, uma grande área, isenta de impostos,
denominada wissiya e que era cultivada pelos felah, para o próprio
multazim. Esta doação, inicialmente, era renovada a cada ano; de-
pois, a propriedade passou a pertencer-lhes, durante toda a vida; fi-
nalmente, ela passou a ser hereditária.
c). - Outra parte das terras era doada às mesquitas e se cha-
mava uakf.
11. - Ao dominar o Egito, Mohammed Aly (5) confiscou as
propriedades de todos os mamelucos e anulou o sistema dos multazim.
Assim, todas as terras passaram, a pertencer-lhe. Ele se tornou o maior
multazim e se entendia, diretamente, com os felah. Nessa época, a
terra foi dividida da seguinte maneira:
a). - Distribuiu a cada felah pequenos lotes de 3 ou 5 feddans.
Este usufruia a terra, pagava o imposto devido, mas não tinha o di-
reito de ceder, vender ou doar. E, se não pagasse o imposto, a área
era desapropriada.
b). - Deixou as terras de wissiya com os felah, que deveriam
cultiva-las, e, com sua morte, as mesmas seriam restitui das ao Go-
verno.
c). - Doou muitas terras não cultivadas aos militares, altos
funcionários, à elite e aos membros de sua família, com direito abso-
luto sobre a propriedade.
d). - Doou aos chefes das cidades (cheik aI balad), 4 ou 5 fed-
dans, isentos de impostos, em recompensa aos serviços prestados por
cada 100 feddans.
IH. - Na época de Saíd, filho de Mohammed Aly (6), houve
uma importante evolução na história da propriedade rural do Egito.
O governo concedeu aos usuários o direito de alugar, vender ou
hipotecar as terras. No entanto, reservava-se o direito de desapro-
pria-las, desde que os usuários não houve sem feito benfeitorias nas
respectivas terras, tais como construções, nórias ou arborização. A
propriedade rural ganhou, pela primeira vez, na história moderna,
um aspecto estavel, que serviu de estímulo aos cultivadores. Estes,

(5). - Originário da Albânia, soldado no exército que o Califa da Tur-


- 318-

A EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL NO EGITO

1916-1917

o
aspecto
da proprietários superfície possuida média da
prop:iedade propriedade
número porcenta- quantidade porcenta- individual
gem gem
nÇ> % feddan % feddan Kilat

menos de 1 feddan 1.066.866 61,9 429.532 7,9 12


de 1 a 5 feddans 473.688 29,1 1.020.928 18,7 2 4
de 5 a 10 feddans 76.641 4,7 258.560 9,7 6 22
de 10 a 20 feddans 36.982 2,3 509.991 9,4 13 19
de 20 a 30 feddans 11. 194 0,7 272.264 5,0 24 8
de 30 a 50 feddans 8.658 0,5 334.738 6,1 38 16
de 50 a 100 feddans
de 100 a 200 feddans 12.297 0,8 2.356.453 34,2 191 15
mais de 200 feddans
total 1.626.326 100 5.452.466 100 3 18

A EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL NO EGITO

1926-1927

o
aspecto
da proprietários superfície possuida média da
prop~iedade propriedade
número porcenta- quantidade porcenta- individual
gem gem
nÇ> % feddan % feddan Kilat
menos de 1 feddan 1.391.533 66,9 555.585 9,9 10
de 1 a 5 feddans 531.324 25,6 1.106.452 19,7 2 2
de 5 a 10 feddans 81.597 3,9 557.522 9,9 6 20
de 10 a 20 feddans 39.027 1,9 533.702 9,5 13 16
de 20 a 30 feddans 12.178 0,6 293.756 5,2 24 3
de 30 a 50 feddans 9.460 0,5 362.938 6,4 38 9
de 50 a 100 feddans 6.825 0,3 473.714 8,4 69 10
de 100 a 200 feddans 3.215 0,2 448.934 8,0 139 15
mais de 200 feddans 2.425 0,1 1. 294.898 23,0 533 23
total 2.077.584 100 5.627.501 100
- 319-

A EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL NO EGITO

1936-1937

o
aspecto
da proprietários superfície possuida média da
prop. iedade propriedade
número porcenta- quantidade porcenta- individual
gem gem
n/) '}'o feddan % feddan Kilat
menos de 1 feddan 1.677 .536 69,9 688.600 11,8 10
de 1 a 5 feddans 564.700 23,5 1.148.019 19,7 2
de 5 a 10 feddans 84.617 3,5 561.348 9,6 6 15
de lOa 20 feddans 39.643 1,7 528.362 9,0 13 8
de 20 a 30 feddans 12.425 0,5 296.697 5,1 23 21
de 30 a 50 feddans 9.374 0,4 360.303 6,2 38 10
de 50 a 100 feddans 6.854 0,3 474.249 8,1 69 5
de 100 a 200 feddans 3.162 0,1 430.527 7,4 136 4
mais de 200 feddans 2.404 0,1 1.348.807 23,1 561 2
total 2.400.715 100 5.836.912 100 2 10

A EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL NO EGITO

1949-1950
o
aspecto
da proprietários superfície possuida média da
prop~iedade propriedade
número porcenta- quantidade porcenta- individual
gem gem

nQ % feddan % feddan Kilat

menos de 1 feddan 1.955.773 71,6 788.604 13,2 10


de 1 a 5 feddans 618.262 22,6 2.305.302 2,2 2 3
de 5 a 10 feddans 79.647 2,9 527.136 9 6 15
de 10 a 20 feddans 43.100 1,5 589.028 10 13 16
de 20 a 30 feddans 12.747 0,46 303.160 5,1 23 19
de 30 a 50 feddans 9.488 0,34 358.615 6,02 37 19
de 50 a 100 feddans 6.680 0,24 455.557 8 68 5
de 100 a 200 feddans 3.278 0,1 454.001 7,6 138 12
mais de 200 feddans 2.145 0,078 1.166.731 20 543 22

total 2.731.120 100 5.948.134 100


- 320-

desde então, passaram a se esforçar mais para aumentar a produção


e comprar mais terras. Em decorrência, o preço da propriedade su-
biu vertiginosamente. Em 1891, antes do fim do século XIX, por-
tanto, foram estabelecidas, definitivamente, as bases da propriedade
rural como direito absoluto do proprietário.

*
B). - No século XX (1900 a 1950).
Os quadros, que apresentamos nas folhas 4 e 5, esclarecem a
distribuição da propriedade rural no Egito, a partir do século XX.
Sua análise nos revela os seguintes aspectos:
1). - O número de proprietários aumentou, consideravelmen-
te, pois a cifra de 1.626.326, em 1916, passou a 2.731.120, em
1950. Entretanto, a porcentagem de proprietários não ultrapassou em
10% a totalidade do povo. Quer dizer, 90% permaneciam à margem,
como simples colonos, mal pagos. Dessa maneira, o nivel da sociedade
continuou baixo, uma vez que este se mede pela rentabilidade das
classes. A baixa renda dos colonos levou-os à pobreza, subnutrição,
doença e analfabetismo, fatores de grande peso na força de produção
e consumo.
2). - O número de proprietários, possuidores de menos de um
feddan, aumentou, progressivamente, pois, em 1916, já representava
61 % da totalidade, e, em 1950, passou a 71,6% . Contudo, o aumento
deste grupo não correspondeu a um aumento da superfície, que possuia
cada um. Assim, um proprietário possuia, em 1916, 12 kilats (2. 100
ms 2, a metade de um feddan) (7), e, em 1950, 10 kilats. Outro fato
constrangedor, que ocorria, era que quase 95% dos proprietários pos-
suiam, cada um, menos de um ou dois feddans, compreendendo um
total de 25 % da terra cultivada. A tabela demonstra, tambem, que
0,5% dos proprietários tinha cada um mais de 200 feddans e este grupo
possuia 35 % da terra cultivada.
:E: evidente a enorme desproporção existente entre os proprie-
tários pobres e ricos e o desnivel de vida dos dois grupos. De um
lado, uma pobreza ultrajante, do outro, uma riqueza ostensiva. Se
calcularmos em quatro, a média dos componentes de uma família de
pequenos proprietários, poderemos avaliar a baixa rentabilidade per
capita que tinham.
O fato é tão mais alarmente, quando se tem, ainda, a considerar
que o nivel de vida tendia a baixar mais, cada vez que se fragmen-

(7). - O
- 321-

tava a propriedade, em virtude das partilhas, por ocaSlao das he-


ranças. Devemos considerar, outrossim, que a média baixa diferia de
um lugar a outro, conforme a capacidade produtiva da terra. Indu-
bitavelmente, as propriedades pequenas representavam unidades eco-
nômicas muito fracas, no que diz respeito à produção, devido, em
parte, à ignorância, à falta de cooperação, à impossibilidade de se
servir de sistemas modernos e métodos científicos na solução dos
problemas agrários.
3). - A estatística demonstra, tambem, que a porcentagem do
grupo de proprietários, possuidor cada um de 10 a 50 feddans, de-
cresce, significativamente, pois, em 1894, era de 9,3%; em 1916, de
3,5%; em 1950, de 2,3%. A este grupo pertencia a classe média,
considerada a coluna vertebral de uma soc:edade desenvolvida. In-
felizmente, esta camada básica, necessária ao equilíbrio e estabilidade
de um Estado, decresceu, progressivamente, ao invés de crescer e
ser estimulada.
O fato de quase 50% da propriedade rural se concentrar nas
mãos dos grandes proprietários, resultou na intransigência e no au-
mento do aluguel da terra cultivada em todo o país. Consequente-
mente, verificou-se o aumento nos preços dos produtos agrícolas e
elevou-se o custo de vida. O pequeno inquilino da terra foi o mais
atingido com a estranha situação, e as autoridades nada fizeram para
protege-lo. Pagava aluguel elevado, o custo do cultivo, e ganhava, ape-
nas, um lucro irrisório; e, se a produção fosse atingida por uma des-
graçà, era obrigado a fazer empréstimos, para pagar o aluguel; caso não
o conseguisse, o grande proprietário tinha o direito de se apoderar de
seus bens e pertences. Sua situação em nada se diferenciava da do
simples colono. Sem que os grandes proprietários considerassem es.-
tes problemas e tentassem melhorar as condições dos cultivadores, es-
tes atingiram, inevitavelmente, um nivel de miséria. Como o desen-
volvimento demográfico, no Egito, é maior que o desenvolvimento da
terra cultivada, houve grande número de colonos, que se deixou ex-
plorar pelos graMes proprietários, à custa de míseros salários. Suas
famílias viviam miseravelmente; a média de consumo de carne, para
cada indivíduo, ao mês era de 1/5Kg, a média de manteiga ultrapassa-
va pouco mais de 1/4. Quanto às frutas, eram obrigados a abster-se
delas quase que completamente. (V. quadro demonstrativo na pág.
322).

• •

- 322-

o ASPECTO DA PROPRIEDADE RURAL NO ANO DE 1952, ANTES DA


REFORMA AGRARIA.

O aspecto
da
propriedade os p oprietários % as proprie- 0/0
dades em
Fe !dans

meaos de 5 "Feddans" 2.642.000 94,30 2.122.000 35,4


de 5 a 10 79.000 2,80 526.000 8,8
de 10 a 20 47.000 1,70 638.000 10.7
de 20 a 50 22.000 0,80 654.000 10,9
de 50 a 100 6.000 0,20 430.000 7,2
de 100 a 200 3.000 0,12 437.000 7,3
mais de 200 2.000 0,08 1.177 .000 19,7
total 2.802.000 100 5.984.000 100

A REFORMA AGRÁRIA.

Vimos, através do estudo analítico da distribu:ção rural no Egi-


to, que inexistia praticamente a just:ça social, em virtude dos con-
trastes existentes entre as propriedades grandes e pequenas; por isso,
o Governo do Egito, em setembro de 1952, no início da Revolução
de Nasser, decretou uma importante lei de Reforma Agrária, que
limitava e organizava a propriedade rural. Os artigos mais importantes
desta lei são:
1). - Ninguem poderá possuir mais de 200 feddans de terra
cultivavel, salvo:
a). - as companhias que tratam as terras não cultivadas, para,
depois, vende-las;
b). - aquelas que tratam as terras desérticas e inexploradas:
c). - as companhias industriais, que precisam de uma super-
fície maior que 200 feddans.
2). - O governo se apossará das terras, que ultrapassarem os
200 feddans, após entrar em vigor esta lei, em um período de 5 anos.
Assim, cada ano, recolherá não menos de 1/5 destas terras.
3). - O governo pagará ao proprietário uma indenização equi-
valente a 10 vezes o valor do aluguel da terra, alem do valor das ins-
talações, instrumentos fixos e árvores frutíferas. O valor do aluguel
será calculado em 7 vezes o valor do imposto original.
4). - A indenização será paga com ações do governo, a :uros
de 3%, resgatáveis em 30
- 323-

5). - As terras devolutas serão distribuidas aos pequenos felah


das aldeias, de maneira que cada um tenha uma propriedade não me-
nor que 2 feddans e que não ultrapasse a 5, conforme a qualidade da
terra. O felah, para receber a terra, deve ser egípcio, adulto, idôneo,
agricultor de profissão, e não deve possuir mais de 5 feddans de terras
cultivadas. Terá prioridade na distribuição aquele que cultive efeti-
vamente a terra, seja inquilino ou colono. Depois, aquele que tiver
maior família, na aldeia. Em seguida, o mais pobre deles; finalmente,
o estranho na aldeia.
6). - Os pomares serão distribui dos aos agrônomos, formados
nos Institutos agrícolas, e divididos de maneira a não prejudicar a
produção; e não deverão ultrapassar 20 feddans de terras. Os agrô-
nomos, que receberem pomares, não deverão possuir mais de 10 fed-
dans de terra cultivavel.
7). - O valor da terra distribuida será igual ao preço da in-
denização, que o governo pagou, mais os juros anuais de 3%, e ainda
15% do valor da terra, para compensar as despesas de recolhimento
e distribuição das mesmas. O total do preço será pago em prestações
anuais iguais, durante 30 anos.
8). - Formar-se-á, em cada aldeia, conforme a lei, uma Socie-
dade Cooperativa Agrícola, constituida por aqueles que receberam
terras recolhidas e que não ultrapassam mais de 5 feddans, na mes-
ma aldeia. A Cooperativa se encarregará das seguintes atividades:
a). - obter vários empréstimos agrícolas, conforme a necessi-
dade. das terras pertencentes aos membros da cooperativa;
b). - fornecer aos cultivadores o necessário para explorar a
terra, isto é, sementes, adubo, gado, instrumentos agrícolas; proteção
à safra e transportes;
c). - organizar o cultivo da terra, da melhor maneira, inclusi-
ve a escolha das sementes, a defesa contra as pragas e o preparo de
açudes;
d). - vender os produtos básicos dos membros da Coopera-
tiva, descontando as prestações das terras distribuidas pelo governo,
os impostos e outras dívidas;
e). - realizar outros serviços agrícolas necessários, de interes-
se dos membros e, ainda, os serviços sociais.
9). - A Sociedade Cooperativa desempenhará suas atividades
sob controle de um funcionário, escolhido pelo Ministério do Bem
Estar Social, que poderá controlar mais de uma cooperativa.
10). - Se
- 324-

na escolha de um beneficiado, em nome de quem ficará a proprie-


dade. Se resultar dificil o acordo, deverão recorrer ao tribunal da
região, a fim de se processar à escolha daquele que ficará com a
propriedade e sua indenização aos demais interessados. Se não hou-
ver quem possa pagar o que corresponde às demais partes, o tribu-
nal deverá decidir a venda das terras em leilão.
11). - T údos os anos, o Ministro da Agricultura formar á uma
comissão para determinar o salário dos colonos, nas regiões agríco-
las. Esta com:ssão será chefiada por um funcionário do Ministério
da Agricultura e composta de seis elementos escolhidos pelo Minis-
tro. Três deles serão representantes dos propr:etários e inquilinos;
três outros serão representantes dos colonos. A decisão da comissão
entrará em vigor após a aprovação do Ministro da Agricultura. Os
colonos poderão formar sindicatos para defender seus :nteresses co-
muns.
*
Em vigor, a lei da Reforma Agrária apresentou resultados sur-
preendentes, no que tange à elevação do nivel de vida dos camponeses.
A situação econômica e social melhorou, porque:
1 ). - A Reforma Agrária protegeu a propriedade do lavrador
contra a divisão de terras em menos parcelas que o limite necessário;
2). - Garantiu ao inquilino agrícola uma parte justa na renda
da terra, e ao colono, um salário justo.
3). - Estimulou o trabalho no campo, transformando a terra
árida em cultivavel e aumentando a exploração da riqueza agrícola;
4). - Ajudou o crescimento da produção econômica e o de-
senvolvimento da riqueza pública, pois uma parte do capital foi trans-
ferida do campo agrícola para o campo industrial;
5). - Criou as cooperativas, que passaram a controlar a ex-
ploração agrícola, o que resultou na melhora da produção, melhora
da riqueza pecuária e da indústria agrícola local.
Parece que a lei da Reforma Agrária de 1952 deixou algo a
desejar, no que diz respeito à justiça social. Assim, o Governo egíp-
cio, em julho de 1961, introduziu-lhe algumas modificações, entre
as quais, a diminuição, ao máximo, da propriedade rural, em 100
feddans, em lugar de 200. Desta maneira, os 100 feddans restantes
foram distribui dos aos colonos, que ainda não possuiam terras.
Na primeira Reforma Agrária, o Governo recolheu 500.000
feddans, que foram distribui dos a 160.000 famílias; na segunda, re-
colheu 300. 000 feddans e distribuiu-os a 90. 000
....-- 325 -

uma vez que a solução certa para o problema do agricultor não está
na transformação da terra em propriedade pública. Ela implica na
existência da propriedade individual e na realização desta proprieda-
de, estabelecendo o direito de posse para o maior número de assala-
raiados, juntamente com o apôio a esta propriedade, por meio de
cooperação agrícola, durante todos os estágios do processo de produ-
ção. Cooperação esta que protege o agricultor, liberta-o dos latifun-
diários e intermediários, e o habilita a usar maquinarias modernas e
meios científicos mais avançados para o aumento de sua produção.
Consequentemente,a sociedade recebe uma força cêntr:ca, que a im-
pele na direção de seu ideal supremo, pois, como disse o grande his-
toriador Arnold Toynbee,

"melhorar o meio de vida não que,- dizer, meramente, elevar


o standard material de vida; quer dizer, acima de tudo, dar con-
fiança ao povo, para que possa mudar sua vida por si mesmo,
Quer dizer, despertar a iniciativa, que possa estar ado:mecida, por
gerações, mas que está sempre latente no subconsciente da natu 'eza
humana",
* *
*
BIBLIOGRAFIA SUMÁRIA.

1). - Dr, M, M. AI Sayyad, Os recursos econômicos na República Arabe


Unida, Cairo, 1967,
2). - Dr. M.M. AI Sayyad, A Geografia da Pátria Arabe. Instituto de
Pesquisas e Estudos Árabes. Cairo, 1968,
3). - Dr. M. I. Hassan, A Expansão Agrícola na República Arabe Unida.
Instituto de Estudos Árabes. Cairo, 1962,
4). - Rachid AI Barraui, A Evolução Econômica no Egito 1i0S Tempos Mo-
dernos. Caio, 1945.
5), - Ministério da Cultura, Estatísticas Anuais, 1936/37, Cai'o,
6). - Câmara do Comércio de Alexandria, A Evolução Econômica no Eg.'to,
Observações e Estatísticas. Cai o, 1951.
7). - Waddih Ayyoub, O Problema da Propriedade Rural no Egito C:íi'o,
1950.
8). - Mohamed Mustafa, A Proprie.'ade Rural no fraque. Instituto do&
Estudos Árabes, 1966.
9). - Gamal Abdel Nasser, A Filosofia da Revolução. Cairo, 1962.
10). - Luís Toledo Machado, A Revolução no Mundo Arabe. Edarli, São
Paulo, 1963.
* *
*
- 326-

INTERVENÇOES .

Da Profa. Nida Gattaz Nasr (FFLCH-USP. São Paulo).


Perguntas:
O Prof. não mencionou a população do Egito e sua distribuição
demográfica. Não acha que, em relação à superfície habitavel, é
fator de grande importância no contexto da Reforma Agrária?
O Governo tem procurado aumentar a área cultivável, para novas
distribuições, após a Revolução de Nasser?
*
Do Prof. Eurípedes Simões de Paula (FFLCH-USP. São Paulo)
Perguntas:
Como foram distribuidas as terras obtidas com a irrigação, após
Assuã?
A cidadania egípcia era, tambem, dada a filhos de estrangeiros?
A quem afetou o programa da Reforma Agrária?
*
Da Profa. Euza Rossi de Aguiar Frazão (FFLCH-USP. São Paulo).
Pergunta:
Que produtos agrícolas se destacam no atual Egito?
*
Da Profa. Maria Thetis Nunes (Universidade Federal de Sergipe).
Perguntas:
Quais as implicações da construção da barragem de Assuã na
Reforma Agrária do Egito?
g possivel saber quanto aumentou a área cultivavel do Egitc,
após a construção da barragem de Assuã?
*
Do Prof. Francisco Pinto Cabral (Universidade Federal de Sergipe)
Pergunta:
O que é feito dos canais, que ligavam o Nilo ao Mar Vermelho?
*
Do Prof. laciro C. Patrício (FFLCH-Marília. São Paulo).
Pergunta:
A Reforma Agrária foi acompanhada de medidas, que favorece-
ram a aquisição de máquinas agrícolas e fertilizantes?

327 -

Do Prof. Joubran J. EI Murr (FFLCH-USP. São Paulo).


Pergunta:
Qual o reflexo da Reforma Agrária na vida rural egípcia? Houve
uma volta ao campo dos felahs?
* *
*
RESPOSTAS DO PROFESSOR HELMI MOHAMMED IBRAHIM
NASR.

À Profa. Nida Gattaz Nasr.


Na realidade, em virtude da escassez do tempo, não mencionou o
autor este aspecto, mas lembra que, em seu trabalho, se encontram
dados estatísticos, que muito bem esclarecem sobre a população e
sua distribuição no Egito, verificáveis na página 2. Quase toda a
população do Egito, que é de 37 milhões de habitantes, ocupa uma
área relativamente pequena, ou seja, 98,8% dos egípcios vivem em
uma superfície de 3,8 % da totalidade do país. Portanto, por existir,
apenas, esta pequena superfície habitável, explica-se a necessidade
da aplicação da Lei da Reforma Agrária.
Claro. O Governo realizou inúmeros projetos, que visavam a
atingir este alvo, sendo que muitos deles foram realizados com êx:to,
e outros estão a caminho da realização. Citem-se, como exemplo
entre os primeiros projetos, o aumento da área cultivavel em milha-
res de feddans, na região de Assuã, o aterro da metade das lagoas do
Delta (Al Manzala, AI Burulus e outras), cuja parte de terra cultiva-
vel chegou a 278.500 feddans. Entre os projetos a serem realizados,
cita-se o da depressão de Kattara, graças ao qual, as águas do Mar
Mediterrâneo vão comunicar-se com a depressão, inundando-a, o que
propiciará, evidentemente, evaporação suficiente para causar chuvas.
que irão fertilizar a grande área do deserto.
*
Ao Prof. Eurípedes Simões de Paula.
Uma parte ficou com o Ministério da Agricultura, para que ser-
visse de modelo às outras áreas cultiváveis. A outra foi distribuida
ao povo, segundo a Lei da Reforma Agrária.
Desde a Revolução de Nasser, aquele que nasce no Eg:to é
egícpcio, seja qual for sua nacionalidade de origem.
O
328


À Profa. Maria Thetis Nunes.
Primeiramente, a Represa deAssuã muito corroborou para o
aumento da área cultivavel. Em segundo lugar, a água retida
pela represa, garante a contínua irrigação desta área e das demais,
onde se aplicou a Lei da Reforma Agrária. Alem disso, a represa
não só vem a garantir a região contra a seca, mas tambem contra as
ocasionais enchentes das grandes inundações.
De 6.133.700 feddans passou, depois de Assuã, para 10.104.500
feddans.

À Profa. Euza Rossi de Aguiar Frazão.
O algodão, o linho, cereais, cítricos e tâmaras.

Ao Prof. Francisco Pinto Cabral.
Estes canais existiram em tempos antigos, em sucessivos pe-
ríodos, desde os faraós até os árabes. Entretanto, depois do Canal
de Suez, perderam sua razão de ser e se encontram, hoje, totalmente
soterrados.

Ao Prof. laciro C. Patrício.
A meta principal na formação das sociedades cooperativas agrí-
colas, como está exposto no trabalho do autor, é garantir a aquisi-
ção de máquinas agrícolas, fertilizantes e empréstimos agrícolas, con-
forme a necessidade das terras.

Ao Prof. loubran l. EI Murr.
Uma
A PROPRIEDADE RURAL NA OBRA DE
GEORGE ELIOT (*).

R/NA AZARYAH BARRETO NUNES


do Instituto de Letras, Artes e Comunicação da Uni-
versidade Federal de Sergipe.

"Toda literatura", dizia Goethe, "experimenta periodicamente a ne-


cessidade de voltar-se para o estrangeiro". :e desta necessidade que
surge, por um lado, a renovação de correntes e, por outro, a possibi-
lidade de delimitar assuntos que são objeto de estudo de disciplinas
ainda não definitivamente estruturadas como a literatura comparada e
a sociologia da literatura.
Com o desenvolvimento da tecnologia em geral, é forçoso reco-
nhecermos uma tendência de imprimir a todos os assuntos e discipli-
nas um cara ter eminentemente científico, possibilitando uma com-
provação matemática das conclusões apresentadas.
Não obstante tal tendência científica, poderíamos afirmar, mes-
mo sem nos aprofundarmos nesta análise, que à própria natureza dos
fatos literários se deve a dificuldade de estabelecer a legitimidade quan-
. to às correntes que se debatem para delimitar as fronteiras precisas do
relacionamento dos fatos literários com as demais fontes científicas.
Eis por que não nos cabe equacionar os dados porventura aqui
apresentados, pois que a exposição visa tão somente a focalizar pontos
fundamentais numa mais ampla perspectiva histórica, na qual ganham
interesse todos os dados que possamos obter sobre as características
culturais da sociedade rural.
Esta!> características, seguindo-se uma análise minuciosa em todos
os detalhes, divergem muito segundo as épocas e lugares diversos
(*). - Comunicação apresentada 2\\ Sessão de Estudos, Equipe A no
dia S
- 330-

Importa-nos, porem, avaliar os pontos fundamentais a serem identifi-


cados nos diversos elementos desta sociedade.
Uma das fontes de maior interesse, ao nosso alcance, encontra-
se na leitura das obras de George Eliot, mormente aquelas de sua pri-
meira fase, na qual a romancista vivifica sua profunda e pensada ex-
periência pessoal no meio rural, tais como o Adam Rede, The Mill on
the Floss e Si/as Mamer.
Interessa-nos constatar que a produção de tais obras só aparece
na vida de Mary Ann Evans quando esta atingia a faixa dos 40, tendo
sido as mesmas publicadas a partir de 1859, distanciadas de um ano,
sob o pseudônimo de George Eliot. Tais fatos nos levam a observar
dois aspectos importantes, quais sejam, a insegurança que cercava o
trabalho intelectual feminino, na opinião da novelista, mesmo na épo-
ca vitoriana, tão ligada à nossa, bem como o entrelaçamento de dois
pontos 'de vista na narração, em todos os episódios ligados à experiên-
cia rural da escritora, .sendo um deles o ponto de vista vivencial da
personagem nos períodos da infância e da adolescência, ligados à re-
gião rural de Warwickshire, e o segundo, o ponto de vista do narra-
dor, ciente de sua maturidade e reflexão.
Em todos esses romances mencionados é o cenário rural que
surge diante de nós, evocado num estilo vigoroso, do qual contudo se
depreende o amor pelas coisas rústicas which never betrayed her, tor-
nando-se quase um símbolo.
Basta que comecemos a leitura de Sitas Mamer para que aquele
mundo rural se apresente real diante de nós, in the days when the
spinning-wheels hummed busily in the farm-houses.
O
- 331-

Citaremos a seguir mais uma passagem de seu livro Si/as Marner,


no primeiro capítulo. Descreve George Eliot:
"As pessoas eram enraizadas no lugar. Do contrário, a su-
perstição, o receio cercava o tipo de pessoa intermitente, que
aparecia ocasionalmente" ("No one knew where wandering men
had Iheir homes or Iheir origin, and how was a man to be ex-
plained unless you knew his falher and mother? To the peasants
of old times the world outside their own direct experience was a
region of vagueness and mystery").

Fica evidenciada a importância da famUia duma maneira clarivi-


dente - eis os aspectos circunstanciais do drama de Silas Mamer, o
tecelão, apresentado com equal play of humor.
E, porem, em The Mill on the Floss que vamos encontrar a fa-
mília Tulliver, a do mestre moleiro, da qual se destacam Tom e
Maggie, irmãos, personagens centrais, interessando-nos particularmen-
te a primeira parte do romance, Boy and Girl, que retrata singular-
mente a infância da própria escritora numa dimensão artística e his-
tórica que lhe dá autenticidade e beleza poética. Esta opinião é sus-
tentada por vários críticos e escritores como Dickens, quase contem-
porâneo, pois que já atingira o apogeu quando George Eliot iniciava
sua carreira, com Scenes of Clerical Life em 1858. Já em nossa épo-
ca, Virgínia Woolf afirmava que Maggie Tulliver era a personagem
na qual a escritora se revelava mais claramente. O crítico americano
W. C. Brownell considerava The Mill on the Floss como one of the
great literary epitomes of lhe pathos and tragedy of human existence.

Assim, o livro encerra três aspectos fundamentais - romance


rústico, trágico e autobiográfico. E possivel que seja precisamente a
fusão destes três aSipeCtos numa atmosfera artisticamente sustentada
que lhe confira tanto interesse.
Ao folhearmos as primeiras páginas de The Mill on the Floss, a
romancista declara: Eis Dorlcote Mill. E surge logo a figura do moi-
nho: brings a dreamy deafness. Aquele som distante do moinho per-
dido no passado nos envolve sutilmente. The sounds of si/ence são
rompidos pelo som compassado da carroça que passa. E neste am-
biente que encontramos Mr. Tulliver, o mestre moleiro, integrado na
sociedade rural, acatado pelo meio social, dentro de um clima de res-
peito mútuo.

A infância decorria serena junto ao riacho "e estar à beira do lago


parecia um pedaço do céu. And the mill with its booming".
- 332-

nário rural - what novelity is worth that sweet monotony where every-
thing is known and loved be'cause it is known?- surge a figura de
Mrs. Tulliver, educada nos rígidos padrões vitorianos, com excelentes
prendas domésticas, pertencente à tradicional família dos Dodsons, a
cujo respeito dizia a serviçal:
"É um orgulho servir a uma patroa, senhora da arte da pas-
telaria" .

Ela se sentia respeitavel, pois suas tortas eram famosas e a rou-


paria estava sempre em ordem, e era assim aceita . Tom, o filho,
limitado, objetivo, senhor de si. Maggie, temperamental, vibrante, in-
tuitiva. A vida decorre serena. A nd the mill with its booming. Ambos
tentam uma educação escolástica com preceptores, sendo Maggie quem
mais se destaca.
Em Book Third, The Downfall, dá-se a catástrofe. Mr. Tulliver
perde a propriedade do moinho.
"And Mr. Tulliver, you perceive though nothing more than
a superior miller and a malster was as proud and obstinate as if
he had been a very lofty personage. The pride and obstinacy of
millers, and other insignificant people, whom you pass unnoticingly
on the road every day".

A tragédia se abate sobre a família, evidenciando a tremenda


importância da propriedade rural na vida dos Tulliver. A reação de
Mrs. Tulliver sublinha a tragédia pois a sua mente não pode abarcar
alem da perda de seu enxoval, de sua prataria, de seus lençóis borda-
dos à mão, de seus aparelhos de louça fina.
Evidencia-se o talento de George Eliot em imprimir a este ce-
nário rural toda a tragedy and pathos of Life. Maggie se esfacela.
Tom se concentra e dá um sentido íntegro à sua reação. The faithful
representing of commonplace things toma a figura do mestre moleiro,
arraigada em seu métier próprio, indelevel, símbolo de um status
quo, impregnado de dignidade humana, posição definida na estrutura
rural, dando-nos a visão do homem em luta com o meio. :E: inegavel
que tal visão stirs yours sympathy with commonplace troubles.



INTERVENÇÃO.
Da Prof.a Eloina Monteiro da Silva (Universidade Federal do Ama-
zonas).
Pergunta:
"O
333

• •

RESPOSTA DA PROFESSORA RINA AZARYAH BARRETO
NUNES.

À Prof. a Eloina Monteiro da Silva.


Respondeu:
"A intuição, ou seja insight é, na verdade, um dos elementos
mais diretamente ligados à criação de obras literárias, pois o escritor
deve apresentar ao leitor uma visão pessoal do mundo, da realidade
que o cerca. A partir desta visão, quer ela seja verdadeira, ou não,
dá-se a possibilidade da criação artística, e podemos até ir alem e
afirmar que esta intuição pessoal pode expressar-se não só em pala-
vras, como em canções, sons, imagens ou esculturas. :s indispensavel,
porem, que à intuição se juntem vários outros fatores aos poucos, no
cadinho do subconsciente, acrescentados no decorrer da experiência
pessoal e da atividade mental do artista, que organiza tal criação em
forma artística capaz de dar-lhe sobrevivência. A fusão desses ele-
mentos corresponde a um blending que ultrapassa os limites puramen-
te racionais, razão pela qual podemos afirmar que science is
tNDICE DO I VOLUME.

I. INTRODUÇÃO 5

Na plataforma nordestina o VIII Simpósio de História


(AracajujI975) (Maria Regina) ............ 7

11. - PROMoçÃO DO SIMPóSIO ................. 21


Promotores ................................ 23
Regulamento do VIII Simpósio Nacional dos Profes-
sores Universitários de História . . . . . . . . . . . . . . 27
Programa Executado ......................... 33
Programa dos Cursos ............. . . . . . . . . . . . . 41
Inscrições .................................. 47

111. - SESSOES SOLENES ......................... 63


Discurso do Professor Eurípedes Simões de Paula, Pre-
sidente da Associação Nacional dos Professores
Universitários de História .................. 65
Discurso proferido pelo Reitor, Dr. Luiz Bispo, no
encerramento do VIII Simpósio da Associação
Nacional dos Professores Universitários de Histó-
ria .................................... 69

IV. - CONFEReNCIAS 73
Aspectos geo-históricos do Nordeste (José Silvério
Leite Fontes) ............................ 75
Pernambuco e o Ocaso do Império (Armando Souto
. Maior) ................................ 97
Estrutura e conjuntura da economia açucareira no
Nordeste do Brasil (1889-1930) (Gadiel Per-
ruci) .................................. 107
V. - SESSÃO ADMINISTRATIVA................. 145
Novos Estatutos ............................. 147
VI. - COMUNICAÇOES (A propriedade rural) (História
Geral) .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 153
A propriedade rural nas Geórgicas de Virgílio (Maril-
da Correa Ciribelli) ....................... 155
- 336-

A propriedade rural no Baixo-Império Romano (193-


-395) (Maria Regina e Eurípedes Simões de
Paula) .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 183
Breve nota sobre Abu-Yussuf (loubran Jamil El
Murr) ................................. 189
A heresia dos pseudo-apóstolos e a dissolução da pro-
priedade rural livre (allodium) nos séculos XIII
e XIV (Nachman Falbel) .................. 205
A constelação agropastoril da América Colonial Es-
panhola (1500-1570) (laciro Campante Patrí-
cio) .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 207
A propriedade rural durante o movimento autonomis-
ta no Rio da Prata (1810-1830) (Raul de An-
drada e Silva) ... :....................... 243
A política agrária na Armênia Ocidental sob o Império
Otomano nos séculos XIX-XX (de 1850 a 1914)
(Yessai Ohannes Kerouzian e Beatriz Diniz) .. 255
Burmistr (Victória Namestnikov EI Murr) ........ 277
A grande propriedade rural e as transformações da
economia exportadora argentina (1879-1906)
(Antônio E. Muniz Barreto) ............... 301
A propriedade rural no Egito: a reforma agrária
(Helmi Mohammed lbrahim Nasr) .......... 315
A propriedade rural na obra de George Eliot (Rina
Azaryah Barreto Nunes) .................. 329
Secção Gráfica
U Faculdade de Filosofia,
S Letras e
P Ciências Humanas
ANAIS DO
VIII SIMPÓSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITÁRIOS DE HISTóRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME II

LXV
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÃO PAULO - BRASIL


1976
ANAIS DO
VIII SIMPÚSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITARIOS DE HISTÚRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME II

LXV
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÃO PAULO - BRASIL


1976
VII. - COMUNICAÇOES.
(A propriedade rural). (História do Brasil).
FAZENDAS DE GADO DO PIAUÍ: 1697-1762 (*).

LUIZ R.H. MOTT


do Departamento de Ciências Sociais da Universidade
Estadual de Campinas (SP).

Que no período Colonial - e mesmo até bem perto dos nossos


dias dias - o Brasil era um país fundamentalmente rural, é assunto
amplamente estudado e que farta b:bliografia sobejamente o com-
prova (1):

"Toda a estrutura de nossa sociedade colonial teve sua base


fora dos meios urbanos. .. Os portugueses instaura' am no Brasil
uma civilização de raizes rurais. É efetivamente nas prop"iedades
rústicas que toda a vidà da Colônia se concentra durante os sé,,'u-
los iniciais da ocupação européia: as cidades são virtualmente.
se não de fato, simples dependências delas" (2).

Se tal fenômeno é verdadeiro no que tange às Capitanias que


foram sede dos principais surtos econômicos do passado, a "ditadura
do ruralismo" torna-se muito mais notória naquelas áreas interioranas
que não participaram diretamente de tais ciclos exportadores. A Ca-
pitania do Piauí oferece-nos ótimo exemplo desta tendência centrí-
fuga de povoamento.

(*). - Comunicação apresentada na 1\1 Sessão de Estudos, Equipe B,


no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Azevedo (Aroldo de), "Vilas e Cidades do Brasil Colonial: en-
saio de geografia urbana retrospectiva". São Paulo, Boletim nQ 208, Faculda-
de de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, 1956.
Reis Filho (N. Goulart), Evolução Urbana do Brasil. São
Paulo, Livraria Pioneira Editora/Editora da Universidade de São Paulo, 1968.
Anais do VII Simpósio da Associação Nacional dos Professores
Universitários de História, "As Cidades e a História", Belo Horizo .. te, 1974.
(2). - Buarque de Holanda (S.), Raizes do Brasil, Rio de JaneLo,
Livraria Jo~é Olympio Editora, 5\1
- 344

Descoberto por volta de 1674, o Piauí é povoado de maneira


diversa da das demais Capitanias: seu solo é conquistado partindo-se
do interior (do Rio São Francisco) para o litoral. Foi no vale do rio
Canindé que Domingos Afonso Sertão, considerado como o descobri-
dor destes sertões (3), funda várias fazendas de gado, sendo a mais
importante, a da Aldeia do Cabrobó, que em 1712 é elevada à con-
dição de vila, recebendo o nome de Mocha (4), sendo instalada so-
mente em 1717, ocasião em que o Governador do Maranhão envia
muitas famílias para a nova povoação, inclusive um magote de 300
degredados, com a finalidade de promover seu desenvolvimento (5).
Desde os seus primórdios foram as fazendas de gado que defini-
ram a forma de ocupação do solo e a distribuição dos colonizadores ao
longo do sertão piauiense: já em 1697, apenas um ano após a criação
de sua primeira freguesia, contavam-se em 129 o número de fazendas
de gados, situadas nas margens de 33 rios, ribeiras, lagoas e olhos
d'água limitrofes com as terras dos gentios (6).
Por volta da matade dos Setecentos, de acordo com as informa-
ções do Vigário da principal vila piauiense, a esperança que tais ser-
tões se urbanizassem era ainda muito remota:

"Acha-se situada esta freguesia de Nossa Senhora da Vitóri;l


no centro do sertão do Piauí; não tem outra povoação, vila ou
lugar mais que a vila da Mocha, que consta de 60 mo~adores,
pouco mais ou menos, e pouco ou nenhuns permanentes, por serem
os mais deles solteiros, e se hoje se acham nela, amanhã fazem
viagem e o que avulta nela são os oficiais de justiça. Tem circun-
vizinhos alguns moradores na distância de 1 légua, que tratam de
algumas pequenas roças de mandiocas, milhos a,frozes que nem a
terra admite agricultu;a abundante por mui seca no tempo do
verão e não haver com que regar, e por serem muitas as enchurra-
das no tempo do inve;no. Como a maior parte dos fregueses são
criadores de gado vacum e cavalar e não podem comodamente
morar junto da vila se acham dispersos por vários riachos, moran-

(3). - Pereira d'Alencastre (José Martins), "Memó:ia Chronológica,


Histórica e Corographica da Província do Piauhy", Revista do Instituto Histó-
rico e Geográfico Brasileiro, tomo XX, l Q Trimestre de 1857, p. 5
(4). - Pereira da Costa (F. A.), Cronologia Histórica do Estado do
Piauí, desde os seus primitivos tempos até a Proclamação da República em
1889. Pernambuco, Tipografia do Jornal do Recife, 1909, p. 6.
(5). - Pereira da Costa, op. cit., p. 28.
(6). - Ennes (Ernesto), As Guerras nos Palmares. Rio de Janeiro,
Brasiliana, vol. 127, 1938, p. 370.
- 345-

do com suas famílias para com comodidade tratarem da criação


de seus gados" (7).

Tentando corrigir esta tendência extremamente dispersa que assu-


mia o povoamento nesta área situada entre as Capitanias do Maranhão
e de Pernambuco (8), D. José I envia uma carta régia ao primeiro
Governador do Piauí, João Pereira Caldas, nos seguintes termos:
"Tendo consideração das grandes utilidades que hão de resul-
tar ao serviço de Deus, e meu, e ao bem comum de meus vas-
salos, de se reduzirem os sertões desta capitania a povoações bem
estabelecidas, para que ao mesmo tempo em que nelas se intro-
duzir a polícia, floresça a agricultura e o comércio, com as van-
tagens que prometem a exten5ão e fertilidade do país. .. mandei
restituir aos índios a liberdade de suas pessoas, bens e comércio ...
fazendo-lhes repartir as terras competentes para sua lavoura e
comércio nos distritos das vilas e lugares que de novo deveis erigir
nas aldeias que hoje têm, e no futuro tive~em os referidos índios, as
quais denominareis com os nomes dos lugares e vilas deste reino,
sem atenção aos nomes bárbaros que têm atualmente, dando a
todas as ditas aldeias e lugares alinhamentos e a forma de gover-
no civil que devem ter" (9).

Dois anos mais tarde, recebe o mesmo Governador outra carta


régia, esta mais explícita, na qual recebe a incubência de fundar oito
vilas na novel Capitania:
"Eu, el Rei... tendo consideração ao muito que convém ao
serviço de Deus e ao meu, e ao bem comum de meus vassalos desta
Capitania, que nela floresça e seja bem administrada a justiça,
sem a qual não há estado que possa subsistir e atendendo a que
a necessária observância das leis se não pode até agora conse-
guir para dela se colher aquele indispensavel fruto que pela vas-
tidão da mesma Capitania, vivendo seus habitantes em grandes
distâncias uns dos out:os, sem comunicação, como inimigos da
sociedade civil e do comércio humano, padecendo assim os des-

(7). - Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Arq. 1.1.12, Ms.


do Conselho Ultramarino, Relação da F;eguesia de Nossa Senhora da Vitória da
Vila da Mocha, do Sertão do Piauí, do Bispado do Maranhão, pelo Vigário
Antonio Luiz Coutinho, 11 de abril de 1757 (fi. 502/510).
(8). - Até o ano de 1799 tanto o Ceará, como o Rio Grande do Norte e
a Paraiba faziam parte da Capitania de Pernambuco, quando através de uma
Carta Régia de 17 de janeiro, o Ceará passa a ser a Capitania limítrofe ao
sul, com o Piauí. Cf. Studart (Guilherme), Datas e Factos para a História
do Ceará, Fortaleza, Tipografia Studart, 1896, p. 425-426.
(9). - Pereira d'Alencastre op. cit., Carta Régia de 29 de julho de 1759,
p. 150.
346 -

cômodos e as despesas de irem buscar os mlgistrados a lugares


muito remotos e longínquos, de sorte que quando chegam os des-
pachos, vem tão tarde, que não servindo para remédio das quei-
xas, lhes trazem somente a rui na dos cabe dais, seguindo-se da-
quela dispersão e separação de famílias internadas em lugares er-
mos e desertos, faltarem-lhes os estímulos e Os meios para se fa-
zerem conhecidos na corte e pa~a serem nobilitados os que o
merecerem, como sucede nas vilas e cidades onde seus habitan-
tes entram na governança delas e se graduam com os cargos de
juizes e vereadores e com os mais empregos públicos e acrescendo
a tudo que até a própria religião padece, não só pela falta da
administração dos sacramentos, mas tambem pela da propagação
do Santo Evangelho, em razão de que os índios que se acham
internados nos matos, não encont:ando outros objetos que não
sejam o de verem os cristãos quase no mesmo estado e fora
da comunicação e da sociedade, carecem dos estímulos que tira-
riam da felicidade em que vissem os habitantes das povoações
civis e decorosas, ou para fugirem para elas, ou pa:a procurarem
viver igualmente felizes em outras semelhantes, e havendo toma-
do na minha real consideração e paternal providência todos os
sobreditos motivos, tenho resoluto que em cada uma das oito
freguesias que compreende este governo, seja fundada uma vi-
la" (lO).

Assim sendo, alem da vila da Mocha que se torna Cidade e Se-


de da Capitania, seis outras freguesias ascendem ao status de Vila:
Campo Maior, Jeromenha, Marvão, Parnaiba, Paranaguá e Valença.
Apesar de diversos moradores terem-se comprometido, quando da
instituição das novas vilas, em construir casas nas sedes das mesmas
(11), o certo é que dez anos depois, tais localidades permaneciam sem
grande melhoria, isto é, despovoadas e insignificantes. Eis o que re-
latava a este respeito o Ouvidor da Capitania no ano de 1772:
"A cidade da Mocha, com 157 fogos e 692 almas, não tem
relógio, casas de Câmara, cadeia, açougue, ferreiro ou out:a
qualquer oficina pública. Se:vem de Câmara umas casas térreas
de barro e sobre o que corre litígio. A cadeia é coisa indigníssima,
sendo necessário estarem os presos em troncos e ferros, para se-
gurança. A casa do açougue é alugada, e de mais, coisa nenhuma.

(lO). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 152, Carta Régia de 19 de junho


de junho de 1761.
(11). - Eis o número das pessoas que haviam se comprometido a
instalarem residências nas novas vilas: 10 em Parnaguá, 15 em J eromenha,
23 em Marvão, 45 em Campo Maior, 59 na Parnaiba. Cf. Pereira d'Alencastre,
op. cit., p. 70,
- 347-

As casas da cidade, todas são térreas, até o próprio palácio do


Governo. Tem uma rua intei~a, outra de uma só face, e metade
de outra. Tudo o mais são nomes supostos; o de cidade, verda-
deiramente, só goza o nome" (12).

Se tal era o panorama "urbano" da principal cidade e capital da


Capitania, coisa pior era de se esperar das vilas restantes. Parnaguá,
com apenas 29 fogos e 191 almas, não possuia sequer uma oficina
pública (13); Jeromenha, situada a 30 léguas da sede da Capitania,
apesar de encontrar-se em lugar cômodo, nenhum aumento tinha tido
até então, pois apesar de ser vila há onze anos, não possuia na sua
sede senão cinco residências. Valença, por seu turno, encontrava-se
"no pior sítio de todo o seu distrito: sem águas, sem pasto o e
outra alguma comodidade necessária para qualquer povo. Tem
uma e:mida de barro, mas arruinada. Não tem câmara, cadeia,
açougue ou outra alguma oficina, e fica numa baixa terrivel
onde se bebe de cacimbas. Tem nove vizinhos" (14).

Marvão ainda ganha de Valença no que se refere à infelicidade


de seu nicho ecológico:
"Esta vila é a pior de toda a Capitania, porque se acha no
sítio mais seco e fúnebre da mesma. Tem únicas três casas ou
moradores para melhor dizer, pois ainda que aquelas são mais,
não tem inquilino algum ... Nem esperança deixa destes aumen-
tos,. por lhe faltarem todos os princípios condizentes para os
mesmos". (15).

Campo Maior é vista pelo Ouvidor Durão, o autor desta descri-


ção, com mais benevolência, localizando-se numa espaçosa e alegre
campina, com 79 fogos e semelhanças de povoação do Reino, inclusi-
ve, desafrontada de matos. Diz que em redor havia muito povo, muita
fazenda e bons sítios (16). A última vila é a de Parnaiba, situada à mar-
gem oriental de um braço do rio do mesmo nome. Segundo as pala-
vras do citado Ouvidor, possuía - uma igreja de pedra de cantaria
assaz mangífica, fazendo uma despesa de quase 200 mil cruzados,
embora estivesse sem uso posto que descoberta. Diz que o principal
negócio que se fazia nesta vila era o da matança de gado. Como

(12). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 3, "Descrição da


Capitania de São José do Piauí",
348 -

porem os abatedouros estavam arrimados à vila, grandes danos so-


fria a população com o fétido que causa o sangue derramado e mais
miudos de vários milhares de reses que se matavam no pequeno es-
paço de um até dois meses, corrompendo o ar e atraindo grande nú~
mero de moscas e savandijas (17).
Certamente que as esperanças de D. José ao determinar a
criação destas vilas não estavam se realizando a contento: ainda
por muito tempo a população do Piauí vai preferir construir suas
moradias pelas brenhas e sertões, e não no perímetro das vilas e po-
voações (18).
Qual seria a razão da preferência dos habitantes desta reglao
nordestina em fugir das vilas e cidades, e viver dispersos pelo sertão?
Não é a falta de população que explica o baixo índice de urbanização
desta capitania, mas sim, o carater predominantemente extensivo e
disperso que assumiu aí o povoamento:

"A Capitania do Piauí é falta de povoações formadas; não


há falta de povoadores, que mo:am e vivem dispersos em suas
fazendas de gados, as quais requerem para sua boa criação gran-
de extensão de terras. De sorte que se os seus moradores se unis-
sem em povos, basta~iam para formar várias cidades e vilas" (19) .

Desde o início, conforme já o dissemos, a forma de ocupação


do solo piauiense se faz através das fazendas de gado. Nos finais do
século XVII grande parte deste território era partilhado por dois
potentados: o já citado Domingos Afonso Sertão e Francisco Dias
D'Avila, da chamada Casa da Torre (20). Possuiam diversas fazen-
das espalhadas nas beiras dos principais cursos d'água, fazendas es-
tas que eram zeladas por vaqueiros ou camaradas, prepostos seus

(17). - Idem, ibidem, fI. 15.


(18). - Idem, ibidem, fI. 4.
(19). - Nunes (Odilon), Pesquisas para a História do Piauí. Teresina,
Imprensa Oficial do Estado do Piauí, 1966, voI. I, p. 155, nota 55.
(20). - Embora a vida urbana não chegasse a se desenvolver no Piauí,
o fato é que alguns observadores da época julgavam que melho. seria con-
quistar e povoar extensivamente toda a área deste país, mesmo que as ci-
dades fossem prejudicadas pela baixíssima concentração demográfica. A ex-
plicação deste douto viajante, ainda no tempo da Colônia, não deixa de ser
criteriosa: "A experiência tem mostrado, diz este autor anônimo, que os
paises aptos para a criação de gados, tais quais o Piauí, todos abertos e cheios
de campinas, são por onde em menos tempo se adiantam as povoações". Ro-
teiro do Maranhão a Goiás, Revista do Instituto Histórico e Geográfico Bra-
sileiro, tomo LXII, parte 1, 1900,
- 349-

(21). Aos habltantes da vila da Mocha pareceu que eram muito


grandes os danos causados pela concentração de tão grandes lati-
fúndios nas mãos de tão poucos, de modo que através da Câmara
desta cidade, enviam no ano de 1743 uma representação ao Con-
selho Ultramarino dando parte de tal situação calamitosa:

"São extraordinários os danos espirituais e materiais que


tem havido e atualmente experimentam nesta Capitania, origina-
dos da sem razão e injustiça com que os Governadores de Per-
nambuco nos p:incípios da povoação daqueles sertões deram por
sesmaria neles e indevidamente, grandes quantidades de terras a
três ou quatro pessoas particulares, moradores na cidade da
Bahia, que cultivando algumas delas, deixaram a maio~ parte
devolutas, sem consentirem a que pessoa alguma as povoasse,
salvo quem as suas custas e com risco de suas vidas as desco··
brissem :e desvendassem do gentio bárbaro, constrangendo-lhes
depois a lhes pagarem dez mil réis de renda por cada ~ítio em
cada um ano" (22).

Alem das enormes datas de terra obtidas em longa data, isto é,


durante o século XVII, em pleno século XVIII temos notícia que o
Ouvidor do Piauí dera posse à poderosa Casa da Torre de mais uma
fabulosa propriedade que media 180 km. de comprimento, por 120
km. de largura, situada no vale do Crateus (23).
Certamente com vistas a evitar tais excessos que a 14 de outubro
de 1744 é publicada uma provisão do Conselho Ultramarino delimi-
tando o termo de 3 léguas de terra para sesmaria que de então por
diante se tivesse de conceder na Capitania do Piauí (24).
Embora limitadas as datas de terra, o certo é que vigorou na
maioria dos casos, doações bastante generosas, o que levou ao distan-
ciamento cada vez maior de uma fazenda da outra.

(21). - Ao morrer, Domingos Afonso Sertão (tambem chamado "Ma-


frense"), possuia 30 fazendas de gado (e outro tanto de sítios e roças), o
que perfazia aproximadamente 277 léguas de sesmarias, ou seja, 1.206.612
hectares de terra. cf. Nunes (Odilon), op. cit., p. 174.
(22). - Pe'eira da Costa, op. cit., p. 47, Provisão do Conselho Ultra-
marino de 3 de dezembro de 1743.
(23). - Nunes (Odilon), op. cit., p. 147-148.
(24). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 6.
Boxer (C.R.), A Idade de Ouro do Brasil. São Paulo,
- 350-

"As te~ras do Piauí, informava um viajante do século XVIII,


são repartidas aos moradores em sesmarias ou datas de três lé-
guas, cuja cultura consiste na criação de gados, mais vacum que
cavalar. Cada uma das sesmarias forma uma fazenda, deixando-se
uma légua para a divisão de uma e outra fazenda. Na dita lé-
gua entram igualmente os vizinhos a procurar os seus gados, sem
contudo poderem nela levantar casas e currais" (25).

Esta tendência latifundiarista da posse da terra, tinha a nosso


ver, duas razões de ser: não só respondia à cob:ça dos sesmeiros, de-
sejosos de possuirem grandes glebas, mas tambem a necessidade in-
trínseca à prática da pecuária extensiva, posto que, como observou
von Spix e von Martius,

"na ocasião da seca se torna necessário movimentar as boiadas


em g;-andes espaços, alternando pastos para que elas consigam
achar capim seco e frutas (daí) os grandes proprietários das
grandes fazendas não quererem ceder porção alguma de SU:lS
terras (para moradia dos agregados), por considerarem indispen-
sáveis as grandes extensões para atender à criação do seu gado"
(26).

Infelizmente os documentos por nós pesquisados pouco informam


a respeito do tamanho das fazendas que existiam no Piauí espalhadas
ao longo dos cursos d'água. As numerosas doações de fazendas, sí-
tios e datas de terra conferidas pelo Governador do Grão-Pará e Ca-
pitão Geral do Estado, durante toda a primeira metade do século
XVIII especificam apenas a localização das doações em relação aos
rios e lagoas, omitindo porem sua superfície. Tomando como amos-
tra 33 fazendas que pertenceram a Domingos Afonso Sertão, e que
depois de sua morte passaram a ser administradas pelos regulares da
Companhia de Jesus, podemos ter uma idéia aproximada da superfí-
cie média das fazendas existentes no PIauí no século XVIII (27):

SUPERFIClE DAS FAZENDAS DO PlAUI - Século XVIll (em léguas).


comprimento X largura área total frequência.
x 2 2 1
1 x 2;5 2,5 1
1 x 3 3 2

(25). - "Roteiro do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 79.


(26). - Von Spix (J .B.), & Von Martius (C.F.P.) Viagem pelo Brasil.
Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1938, p. 419-420.
(27). - Pereira
351

x 4 4 4
1 x 4,5 4,5 1
1 x 6 6
1 x 7 7
1,5 x 2,5 3,7
1,5 x 4,5 6,7 1
2 x 2 4 4
2 x 3 6 5
2 x 4 8 3
2 x 2,5 5 1
3 x 3 9 4
3 x 4 12
4 x 4 16 2
5 x 14 70

Através deste quadro notamos que muito embora desde 1697


a Coroa Portuguesa tivesse decretado que as sesmarias não poderiam
ultrapassar a área de 3 léguas de comprimento por 1 de largura, o
certo é que dessa lista 33 fazendas, 29 possuiam superfície superior
ao limite máximo etabelecido por lei.
A razão da existência de fazendas com áreas tão dilatadas se
explica, repetimos, pela maneira como tais terrenos eram ocupados:
a rusticidade do nível técnico dominante na pecuária e a rarefação das
pastagens nos períodos estivais forçavam os proprietários a desejarem
e necessitarem grandes extensões fundiárias.
Conforme observava este arguto escritor ao passar pelo Piauí,

"Pela mudança que há no Piauí tão sensivel nas estações do


tempo, até chega a faltar em muitas partes o mesmo pasto seco,
e toda a extensão do terreno muitas vezes não basta para que ha-
jam lugares onde ele se conserve e se m:mtenham os gados, o que
faz com que os morado es vivam pela maior parte dispersos e
distantes três, quatro e cinco léguas uns dos outros" (28).

Se tomarmos como fonte a Dezcripção do Certão do Peauhy, do


Pe. Coutinho, temos para o final do século XVII o seguinte quadro
de distância entre uma fazenda e outra: (29).

(28). - "Rotei,o do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 79.


(29). - Ennes (Ernesto), op. cit., p. 370-389.
- 352-
DISTÂNCIA EM LÉGUAS DE UMA FAZENDA A OUTRA
(1697)
distância de uma fazenda às adjacentes frequência
1 - 1 1
1-2 4
1-3 1
2-2 18
2-3 14
2-4 3
2 - 5 2
3 - 3 7
3 - 4 6
3 - 5 2
3 - 6 1
3 - 10
4-4
5 - 6
5 - 10
5 - 13

Tais dados comprovam a avaliação feita pelo referido Pe. Cou-


tinho que dizia estarem as fazendas de gado situadas ordinariamente
mais de duas léguas umas das outras (30). Já em 1757, outro vigário
da mesma freguesia (Nossa Senhora da Vitória da Mocha), fazia outros
cálculos:

"Nas beiradas dos riachos assistem os paroquianos, crianrlo


gados vacuns e cavalares, distantes uns dos out··os, t es, qu .. tro,
cinco, seis, sete, oito, dez e mais léguas, por morarem jU,1to dos
possos que ficam nos tais riachos do tempo do inver,.o". (31).

Das 130 fazendas que naquela época arrolava o dito vigário, em


25 está especificada a distância, havendo na maioria dos casos de 6
a 10 léguas utna e outra (32).
Certamente que nem todas as propriedades rurais existentes no
Piauí eram latifúndios. Havia propriedades menos extensas, situadas
geralmente nos brejos e terras mais úmidas, onde uma pequena parce-

(30). - Idem, ibidem, p. 373.


(31). - "Relação da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória da Mocha",
op. cito
- 353-

la da população se dedicava à agricultura de subsistência. Muito em-


bora os moradores do Piauí

"se interessavam só na criação dos gados" (33),

uma parte da população sempre se dedicou às lides agrícolas. Já em


1697 referia o primeiro vigário destes sertões que

"nuns olhos d'água a que vulgarmente chamlm 'brejos' nos quais


está situado o Capitão Mor dos Paulistas, Francisco Dias de Si-
queira, com um arrdial de tapuias, tem algumas plantas de fa-
rinha, arroz, milhos, feijões, frutas, como são bananas, batl-
tas ... " (34).

Todos os viajantes, memorialistas e homens públicos que escre-


veram sobre o Piauí na época Colonial são unânimes em referir-se
ao descaso com que os sertanejos tratavam este tipo de trabalho. Du-
as seriam, segundo eles, as principais causas do desprezo que rele-
gavam o setor agrícola: a primeira de ordem ecológica, ou seja, as
más condições climáticas, a ausência de chuvas regulares, a constânc;a
das secas, a pobreza dos cursos d'água, a natureza arenosa e lageada
da grande parte do território. De um total de 33 cursos dágua assina-
lados pelo Pe. Coutinho em 1697, apenas 4 ribeiras eram perenes, de
modo que todos os demais riachos, nascente e mesmo lagoas, só pos-
~miam água no tempo das chuvas, tempo este que segundo informava
um reinol que descreveu a capitania, costumavam chamar euforica-
mente de "verde" (35). Como desenvolver a agricultura num lugar
como aquele onde se situava a vila de Valença, que segundo este
mesmo informante,

"era o pior sítio de todo o territó:io, sem águas, sem pastos e


sem outra alguma das comodidades necessárias para qu:!lquer
povo"? (36).

Por mais que o Governo insistisse em estimular o desenvolvi-


mento agrícola, o resultado sempre foi decepcionante. As tentativas
realizadas por volta de 1798 visando a divulgação do uso do arado,
redundaram em fracasso, pois segundo disseram os lavradores, após

(33). - "Roteiro do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 83.


(34). - Ennes (Ernesto), op. cit., p. 379.
(35). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí", de Morais Du-
- 354-

terem experimentado este instrumento, constataram que seu uso era


impratiêavel, devido à natureza do solo quase todo composto de ca-
tingas, chapadas e matos, preferindo os agricultores mudarem de ter-
reno quando este se esgotava, em vez de utilizar o arado a fim de
tentar revolver a terra e continuar a plantar no mesmo chão (37).
A segunda explicação pelo descaso com que tratavam a agricultura
está na vantagem econômica e na excelência que os piauienses atri-
buiam à pecuária. Com grande parte de seu território coberto pelo
rico capim mimoso (38), apesar das limitações advindas da seca e
da falta de aguadas, o certo é que a pecuária representava para esta
zona sertaneja não só uma saida, mas um grande negócio. Tanto a
Bahia, como o Maranhão, a primeira cultivando notadamente a cana
e o fumo, o segundo, algodão, precisavam durante séculos, da carne
bovina do Piauí. Muito embora tais regiões pudessem desenvolver
mais sua própria pecuária, era-lhes mais interessante ocuparem suas
terras e mão-de-obra com a lavoura comercial, sendo por conseguinte
mais rentavel comprar dos sertões do Piauí as boiadas necessárias para
o consumo interno (39). No Piauí não eram apenas os latifundiários
que preferiam a pecuária, atraidos pelos lucros que auferiam pela sua
prática em terras pouco propícias à outra atividade; desenvolve-se
tambem nesta área como que uma "ideologia pecuarista" que enalte-
cia a atividade criadora, depreciando o amanho da terra. Entre a
gente do povo notava-se

"uma tal inclinação para trabalhar nas fazendas de gados que


p-ocura com empenhos ser nele ocupada, constituindo a sua
maior felicidade em merecerem algum dia o nome de vaqueiro.
Vaqueiro, criador ou homem de fazenda são títulos honoríficos
entre eles e sinônimos com que se dhtingue aqueles, a cujo cargo
está a administração e economia das fazendas" ( 40) .

(37). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 67.


(38). - De acordo com Renato Castelo-Branco, O Piauí: A terra, o
Homem, o Meio, São Paulo, Livra:ia Quatro Artes, 1970, p. 41,62% das terras
do Piauí são campos, catingas ou chapadas cobertas de pastagens extensas a
se perder de vista.
(39). - Prado Ir. (Caio), Hist6ria Econômica do Brasil. São Paulo,
Editora Brasiliense, 4" edição, 1956, Cap. 8, "A Pecuária e o progresso do
Povoamento do Nordeste".
Furtado (Celso), Formação Econômica do Brasil, São Paulo,
Editora Fundo de Cu'tu~a, 6" edição, 1964, Cap. X, "P. ojeção da economia
açucareira: a pecuária".
Buescu (Mircea), Hist6ria Econômica do Brasil: pe~quisas e
análises. Rio de Janeiro, APEC, 1970, p. 185-188, "A Economia do gado
segundo Antonil".
(40). - "Roteiro do Maranhão a Goiás",
- 355-

Inconformavam-se alguns com tamanha preferência e exclusivis-


mo que conferiam os piauienses à pecuária: o Ouvidor Morais Durão
assim se manifestava em sua Descrição:

"As negociações, manufatu~as, tráficos e mais modos de


florecer qualquer estado se reduzem aqui a desprezar tudo o
que é ofício e trabalho, vivendo unicamente de gados e cavalos
que os campos criam, dos frutos que o mato produz e de um
pouco de mandioca que amestradamente plantam" (41).

Consequência dessa extrema especialização pastoril é o modus


vivendi, inclusive a cultura material desta população sertaneja. Con-
forme observou o arguto Pe. Coutinho,
"Comem estes homens só carne de vaca, com laticínios e al-
gum mel que tiram pelos paus. A carne ordinariamente se come
assada porque não há panelas em que se coza; bebem água de
poços e lagoas, sempre turva e muito salitrada. Os ares são muito
grossos e pouco sadios. Desta so~te vivem estes miseráveis hfJ-
mens, vestindo couros e parecendo tapuias" (42).

Como dissemos, nem todos os imóveis rurais existentes no Piauí


durante os séculos XVII e XVIII eram latifúndios, nem tampouco
se dedicavam exclusivamente à criação bovina. Havia propriedades
menos extensas, geralmente situadas nos brejos e terras mais úmidas,
onde plantavam-se gêneros de subsistência. Enquanto que se restringia
o uso do termo fazenda àquelas propriedades onde se criava gado
vacum e cavalar, sítios eram chamados terras onde se cultivava, sen-
do separadas das áreas de criatório. Para o Ouvidor Durão o termo
sítio abrangia igualmente as roças e engenhocas de açucar (43).
Na freguesia da Mocha, por exemplo, relatava seu vigário que
circunvizinhos à vila viviam
"alguns moradores na distância de uma légua, que tratam de
algumas pequenas roças de mandioca, milhos, ar:ozes" (44).

(41). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí", op. cit., fi. 18.
(42). - Ennes (Erensto), op. cit., p. 373.
(43). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí", op. cit., fI. 1.
É importante notar, como o faz por duas vezes o ouvidor Du··ão, que apenas
os lugares onde se cultivava separadamente das fazendas de gado é que apa-
receram descritas em sua memória como sendo sítios, posto que embora em
muitas fazendas de criatório tambem pudessem ser encontradas engenhocas e
roças de mantimentos, ele as arrolou na categoria de fazendas, pois "seria
isto multiplicar-lhes fantasticamente o número".
(44). - "Relação da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória da Mocha",
356 -

Na freguesia de Parnaguá, por sua vez, referia seu pároco que


na

"fazenda chamada Jacaré, tem uma capela de Nossa Senhora da


Conceição e capelão, com dez mo.·adores que vivem de suas la-
vouras. Mais adiante, a 10 léguas da fazenda Mimosa, tem um lu-
gar chamado Brejo, que terá quinze moradores, terra de roças
e fumos" (45).

De um total de 56 propriedades rurais arroladas em 1757 na


freguesia da Mocha, 53-eram referidas como sendo fazendas de gado,
3 como

"terras de roça" ( 46) .

De um total de 148 doações de terra feitas pelo Governador e


Capitão General do Estado, entre 1728 e 1746, observamos que 99
sesmarias (mais de 66%) aparecem referidas como "sítio", 19 como
"fazenda" e 30 com denominações variegadas, tais como "data de
terra", "lugar", "uma sorte de terras", etc. (47).
Do total de 81 propriedades rurais que possuiam os J esuitas no
Piauí, e que foram confiscadas quando de sua explusão em 1760,
32 eram denominadas como fazendas de gado, 49 como sítios (48).
Até o momento dispomos de quatro informações relativas ao
número total das propriedades rurais existentes no Piauí durante os
século XVII e XVIII: infelizmente apenas numa estão arroladas se-
paradamente os sítios de lavoura das fazendas de gado, de modo que
ficamos em dúvida se nos outros totais estão indu dos tambem os
sítios ou referem-se unicamente às fazendas de cria tório (48 a).

(45). - Instituto Histórico e Geográfico Brasilei:o, Arq. 1.1.12. Ms.


do Conselho Ultramarino, Relação da Freguesia de Nossa Senhora do Livra-
mento do Parnaguá, a última do Bispado do Maranhão, pelo vigário Francisco
da Costa Silva, 1757 (fi. 530-536).
(46). - "Relação da Freguesia de Nossa Senho~a da Vitória da Mocha",
op. cit.,
(47). - Perei:a da Costa, op. cit., p. 37 e seguintes.
(48). - Arquivo Histórico da Secretaria de Estado das Relações Exterio-
res (Itamaratí), Lata 267, maço 2, pasta 1, "Relação de todos os bens de
raiz e por tais seculares, que possuiram e administraram os Regulares da
Companhia denominada de Jesus nesta capitania de São José do Piauí", 25 de
Janeiro de 1762.
(48 a). - Tais são as fontes para este quadro:
1697: Ennes (Ernesto), op. clt., p. 3-,0.
1730: Rocha Pita, História da América Portuguesa. Salvador,
1950, 3\1
- 357-

NUMERO DE FAZENDAS DE GADO DO P/A UI

Ano Total
1697 129
1730 400
1762 536
1772 578

Sendo a Descrição da Capitania de São José do Piauí, de au~o­


ria do Ouvidor Morais Durão o documento mais completo relativo à
distr.buição das fazendas e sítios desta Capitania, vejamos então,
baseando-nos nele, o que seu autor nos revela sobre este tema. Ini-
cialmente transcrevemos o número e a localização de todos os imó-
veis rurais espalhados pelo Piauí: alem das vilas com seus subúrb:os
(isto é, a área de uma légua em circunferência da sede), arrolamen-
mos as propriedades rurais do distrito, sendo cada local referido com
o nome do principal rio ou ribeira existente no lugar.

FAZENDAS E SI TIOS DO P/AUI (1772).

localidade n9 de fazendas n'l de sítio:,

1. - Oeiras e subúrbio 64
Riachão 10 4
Guaibas 14 2
Itaim 28 1
Talhada 10 5
Canindé 54 16
Piauí 66 11
Total 182 103
2. - Parnaguá e subúrbio

Co~imatá 16 5
Gelbóes 22 4
Paraim 22 2
Total 60 11

1762: "Remmo de todas as pessoas livres e cativas, fogos, fazen-


das da Cidade, Vilas e Sertões da Capitania de São José do Piauí" - A:quivo
Histórico da Secretaria de Estado das Relações Exteriores (ltamaratí), Lata
267, maço 2, pasta 1.
1772: "Descrição da Capitania de São José do Piauí", do Ouvidor
Antônio José de Morais Durão, op. cito
- 358-

localidade n9 de faz.endas n'! de sítios


3. - leromenha e subúrbio 18
Gorguéa do Poente 19
Beira da Parnaiba 15 23
Gorguéa do Nascente 35 5
Total 69 46
4. - Valença e subúrbio 4 12
Sambito 10 3
Potí da Ponte do Sul 18 6
Serra Negra 14 18
Berlengas 12 7
Total 58 46
5. - Marváo e subúrbio 13
Cais 19 15
Carateus 20 22
Total 39 50
6. - Campo Maior e subúrbio 7
Longá 14 15
Beira da Parnaiba 18 4
Potí da Ponte do Norte 27 14
Serobí 25 16
Total 91 49
7. - Parnaiba e subúrbio 19
termo todo 79 28
Total 79 47
QUADRO GERAL.

Oeiras 182 103


Parnaguá 60 11
Jeromenha 69 46
Valença 58 46
Marvão 39 50
Campo Maior 91 49
Parr..aiba 79 47
Total 578 352

Através destes quadros notamos algumas tendências importan-


tes na caracterização das propriedades rurais do Piauí nas últimas
décadas do século XVIII, a saber:
1). - As fazendas de gado representavam 62,2% do total das
propriedades rurais, os sítios, 37,8%. Malgrado a afirmação cons-
tantemente repetida por viajantes, memorialistas e historiadores de
que só a pecuária vingava no Piauí,
- 359-

conforme vimos, como esta estatística do Ouvidor Durão, revelam


que os sítios de lavoura era bem mais numerosos do que se propala-
va. Os documentos, no entretanto, não nos permitem saber muitos
detalhes sobre tais sítios; ignoramos, por exemplo, suas superfícies,
sua estrutura e organização socio-econômicas, etc.
2). - Apenas na vila e distrito de Marvão é que vamos observar
a superioridade do número de sítios face ao das fazendas: apesar de ser
descrita como a

"pior vila de toda a capitania, porque se acha no sítio mais seco


e fúnebre da mesma..... possuindo apenas uma :ibeira mais
consideravel no seu distrito, que é a do Carateus" (49),

não obstante tal quadro aparentemente tão pouco convidativo à agri-


cultura, o mesmo narrador acusa uma superioridade de 12,4% do
número de sítios face ao de fazendas.
3). - No que se refere à localilzação dos sítios e fazendas, nota-
mos que via de regra as fazendas estão situadas fora do sub;.írbio das
vilas, isto é, ao menos distantes uma légua em circunferência das
mesmas, isto com exceção de Valença e Campo Maior, que inexpli-
cavelmente constam como tendo 4 a 7 fazendas, respectivamente,
situadas dentro do próprio subúrbio do vilarejo. Os sítios, por sua
vez, tendem a situarem-se mais perto das sedes "urbanas": 35,7 %, dos
sítios do Piauí estavam localizados dentro da circunferência de uma
légua em derredor das vilas da capitania. A única vila que não pos-
suia nem sítio, nem fazenda no seu "subúrbIo" éra a de Parnaguá,
isto talvez pelo fato de ter

"junto a si um lago com 5 léguas de circunferência" (50).

};; tambem Parnaguá a localidade que possuia o maior número


de estabelecimentos dedicados à agricultura: 103, ou seja, 30% do
total dos sítios da Capitania; em contrapartida, era a freguesia pos-
suidora do menor número de fazendas dedicadas à pecuária: apenas
11 estabelecimentos consagravam-se com exclusividade ao criatório
de gado vacum e cavalar.
Já dissemos anteriormente que um dos principais problemas que
enfrentavam os povoadores do Piauí era a falta de cursos d'água pe-
renes: foi exatamente em vista de se garantirem o abastecimento re-

(49). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí", op. cit., fI. 11.
(50).
- 360-

gular e constante deste precioso líquido que os moradores tinham


como prática solicitar doações de terra junto e à beira de tais rios
perenes. Tanto as relações nominais de todos os moradores da Ca-
pitania feitas pelos Vigários, assim como a Descrição feita pelo Ou-
vidor Durão tiveram como critério na enumeração das fazendas e
sítios, sua localização à beira ou ao longo dos principais cursos flu-
viais. A este respeito, eis o que refere Pereira d'Alencastre, o ilus-
trado autor da Memória Chronológica, Histórica e Corográphica da
Província do Piauhy:

"As fazendas de gado vacum estão situadas sobretudo nas fral-


das de vários olhos d'água que delas nascem. Para que no sertão
uma fazenda me eça o nome de boa, deve ser primdro bem pro-
vida de água, porque sendo o Piauí mjeito a secas, como tojos os
altos sertões do Brasil, as fazendas faltas de águ~ são as primei-
ras que ficam despovoadas de seus gados" (51).

Para as fazendas situadas distantes dos cursos fluviais perenes, a


solução era levar o gado a beber

"em lagoas e outras águas conservadas em tanques feitos por


indústria dos habitantes, com muito trabalho e moléstia" (52).

Escolhido O lugar para a instalação da nova fazenda, certifican-


do-se da existência de boas aguadas, construia-se em primeiro lugar
um curral onde pudessem ser abrigados os bezerros logo que nas-
cidos. As demais instalações vinham com o tempo e os progressos
da criação. Boxer diz que o primeiro cuidado ao se trazer o gado
para uma nova propriedade era habitua-lo à novel localidade evi-
tando-se desta forma que os animais se perdessem ou se extravias-
sem no meio do mato ou nas fazendas circunvizinhas (53). Não é
difícil imaginarmos as dificuldades que deviam de enfrentar os no-
vos colonos ao chegarem no Piauí, vindos do Maranhão, trazendo
consigo 200, 300 e até 600 rezes de uma só vez (54).
Embora o termo curral, segundo Durão, fosse a maneira como
vulgarmente se chamava às fazendas de gado no Piauí (55), há quem

(51). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 69.


(52). - "Relação da Freguesia de Nossa Senhora do Livramento do
Parnaguá", op. cito
(53). - Boxer (C.R.), op. cit., p. 246.
(54). - Pereira da Costa, op. cit., p. 37, Informação de 4 de fevereiro de
1727.
(55). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí",
- 361

afirme o contrário: que o curral, ou melhor, os currais eram apenas


uma parte das fazendas:

"Em cada fazenda devem haver pelo menos 3 cu:rais, que to-
m::!m diversos nomes conforme o serviço que prestam. Chamam-
curral de vaqueijada aquele em que se recebe o gado que tem
de ser vendido, onde se tira o leite e onde se faz o rol de po:-
teiras; curral de apartar o em que se recebe todo o gado indistin-
tamente para ao depois ser disLibuido pelas diferentes acomoda-
ções; curral de benefício onde se recolhem os garrotes para serem
ferrados e para se fazer as partilhas dos vaqueiros". (56).

Outro autor, o qual diz tcr com toda a miudeza indagado in loco
de um vaqueiro antigo a respeito do funcionamento das fazendas de
gado, refere-se aos retiros como sendo o estabelecimento maior que
compreendia inclusive os currais:

"Retiro é uma certa porção de terras contíguas à mesma fa-


zenda onde há currais e os necessários prepa:ativos para tratar
as crias nas ocasiões em que é preciso separá-las das mães". (57)

Antonil, por sua vez, embora use indistintamente os termos curral


e fazenda, parece, segundo a interpretação de A. Canabrava, con-
siderar o curral como uma parte da fazenda, local onde se reunia o
gado uma vez por ano, para sua partilha. Casos havia de que uma
única fazenda de gado possuia vários currais (58).
Fundar fazenda l~ão era, na maioria dos casos, tarefa facil.
Domingos Afonso Sertão, o mais importante fazendeiro que já tcve
o Piauí em toda sua história, diz em seu testamento que suas fazen-
das estavam situadas

(56). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 69.


"Antigamente, nas fazendas de criar do Nordeste, levantava-se
primei:amente tem uma cas::! rústica de paredes de taipa e cobertura de duas águas.
Para este mister preferiam-se as palmas da carnaubeira, muito abundantes na
região. Os currais onde introduziam centenas de cabeças, eram armado, com
troncos de árvores deitados sobre forquilhas, fo-mando lozangos ou quadrilá-
teros nas proximidades da casa". Goulart (José Alípio), Brasil do Boi e do
Couro, Rio de Janeiro, Edições GRD, 1965, p. 122 ..
(57). - Machado (F:ancisco Xavier), "Memória relativa às Capitanias do
Piauí e Maranhão (1810)" Revi~ta do Instituto Histórico e Geográfico Bra-
sileiro, tomo XVII, 1854, 3" série, n Q 13, 1Q trimestre, p. 58.
(58). - Antonil (João Antônio) (Andreoni), Cultura e Opulência do
Brasil, (1711), São Paulo, Companhia Editora Nacional, 211 edição, Introdução e
Vocabulário por A. P. Canabra\ a, p. 123; 307
- 362-

"em terras que descobri e povoei com grande risco de minha


pessoa e consideravel despesa, com adjutório dos sócios". (59).

Reclamando contra os senhores absenteistas que exigiam aluguel


de suas terras, os moradores da Mocha diziam que foram necessários
muitos gastos e perigos para se conseguir novas terras, sendo nume-
roso e violento o gentio que habitava naquelas áreas ainda não ex-
ploradas (60). Temos mesmo notícia que na zona chamada "Catin-
gas Gerais" - região de Valença - devido à existência do mato
continuado e inferior, e à falta d'água, várias tentativas foram feitas
no último quartel do século XVIII para se tentar ocupar tal espaço,
porem sempre redundaram em fracasso, devendo os interessados
voltar sem mais circunstâncias de seu descoberto (61).
No que se refere aos tipos de terrenos aproveitáveis para a
criação, distinguia-se no Piauí principalmente duas categorias de
pastos: os do agreste e os de capim mimoso, sendo este último o de
melhor qualidade e que por conseguinte maior rendimento dava aos
fazendeiros (62):

"Nas fazendas de pasto agreste, 300 vacas produzem 130 be-


zerros, sendo que as que parem em um ano, descansam o ano
seguinte; nas fazendas chamadas de mimoso, em que o p3sto é
bastante suculento, 300 vacas p:oduzem 250 bezerros anualmen-
te, isto é, sem interrupção. O que se diz acerca do gado vacum é
extensivo ao cavalar" (63).

Infelizmente não conseguimos encontrar nos Arquivos nenhum


inventário setecentista que nos informasse a respeito do número de
animais existentes nas fazendas piauienses. Antonil diz existirem
currais no Nordeste com 200 até 1.000 cabeças de gado vacum, de
tal modo que quando se reunia todo o gado dos vários currais de uma
mesma fazenda, estes chegavam a representar de 6.000 até 20.000
cabeças (64).

(59). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 144 "Testamento de Domingos


Afonso Sertão, Descob:idor do Piauí".
(60). - Idem, ibidem, p. 47.
(61). - "Descrição da Capitania de São José do Piauí", op. cit., f!. 9.
(62). - Segundo A.A. Miranda, Estudos Piauienses, São Paulo, Com-
panhia Editora Nacional, Brasiliana vol. 116, 1938, p. 142, "o capim mimoso,
talvez a melhor forrageira americana, é sem dúvida fator de riqueza do estado
do Piauí".
(63). - Pereira d'Alencastre op. cit., p. 68.
(64). - Antonil,op. cito p. 309.
- 363-

Na falta de dados globais sobre todas as fazendas do Piauí, to-


maremos como amostra as 31 fazendas que foram de Domingos
Afonso Sertão e que, conforme já dissemos, pertenceram em seguida,
até o ano de 1760 aos Regulares da Companhia de Jesus, sendo em
seguida assumidas pela administração governamental (65).

NUMERO DE BOIS E VACAS POR FAZENDA (século XVIll).


n9 de cabeças frequência
até 100 8
1001 a 2000 8
2001 a 3000 10
3001 a 4000 3
5000
6000

A fazenda que possuia o menor rebanho vacum possuia 100


cabeças: era a chamada fazenda Caehé, situada na Inspecção do
Piauí, com a superfície de 2,5 léguas em quadra. A propriedade
possuidora do maior número de reses era a fazenda do Castelo, com
6 .000 cabeças distribuidas em 4 léguas quadradas. Dificil é saber
qual a área média de pasto necessária e disponivel para cada ca-
beça de animal, em se tratando de área de catinga ou de mimoso.
Aparentemente não há uma correlação direta entre o número de lé-
guas das referidas fazendas e o número de cabeças efetivamente pos-
suidas. Assim, por exemplo, enquanto que na Fazenda do Julião, a
mais extensa da Inspecção do Piauí, com 70 léguas em quadra ha-
via somente 1.200 reses, na supra-citada Fazenda do Castelo, com
apenas 4 léguas em quadro, pastavam 6.000 animais, havendo ou-
tras duas fazendas com 4 léguas de extensão que possuiam uma
4.000 animais, e outra, 2.500 (66).
O fato de uma fazenda ser possuidora de muitas léguas de terra
não significava necessariamente que toda sua extensão fosse aprovei-

(65). - Pereira d'Alencastre, op. cit., p. 52 e seguintes.


(66). - Como dissemos alhures, em muitas fazendas alem da criação
de bois e vacas, havia tambem certo número de cavalos e éguas, geralmente
em número inferior ao gado bovino. Tais animais eram criados mais com a
finalidade de servirem aos vaqueiros no pastoreio e transporte das boiadas.
Em 1782, por exemplo, enquanto que Os bovinos representavam, nas ex-
tintas fazendas dos J esuitas, 50.670 cabeças, os cavalos e bestas atingiam apenas
2.870 unidades. (Pe:eira
- 364-

tavel e aproveitada de facto, quer para o pastoreio, quer para a la-


voura.
o gado bovino criado no Piauí pertencia à chamada raça "néo-
ibérica", recebendo localment:s< a denominação de araçá, caracú ou
laranja (67). Von Spix e Von Martius descreveram-no com as seguin-
tes palavras:

"O gado bovino é grande e bem formado, distinguindo-se pelos


chifres compridos e pela diversidade do co:orido" (68).

Segundo ,vários autores tanto do passado, como do presente, o


gado oriundo das fazendas situadas em região mais úmida e habituado
ao capim mimoso, era o mais corpulento e o que melhor preço conse-
guia tanto dentro como fora da Capitania, muito embora por ser mais
delicado e sensivel, era o que mais morria nos caminhos segu:dos pe-
las boiadas do Piauí que iam para a Bahia ou para o Maranhão (69).
Segundo os cálculos de um experiente conhecedor da pecuária sete-
centista,

"uma fazenda no seu estado flo~escente, não pode anualmente


produzir mais de 800 até 1.000 crias. Destas, pelo cálculo que
tem feito a longa experiência, não se pode extrair mais do que
uma boiada de 250 ou 300 bois (deduzindo os dízimos e o qmrto
que é estipêndio do vaqueiro). As vacas, que pouco excedem no
número, conservam-se sempre pa~a a multiplicação, sustento e mais
despesas que se fazem nas mesmas fazendas" (70).

(67). - Neves (Abdias), Aspectos do Piauí. Teresina, Tipografia "O


Piauí", 1926, p. 30.
(68). - Von Spix & Von Martius, op. cit., p. 418.
(69). - Nunes (Odilon), op. cit., p. 199-200.
(70). - "Roteiro do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 80.
Se tomarmos como exemplo todas as ex-fazendas de Domingos
Afonso Se7tão, que no ano de 1782 possuiam um total de 50.670 cabeças de
gado vacum, e que neste mesmo ano foram delas tiradas 7 boiadas, perfazendo
um total de 1954 animais, constatamos que ou avaliação do crescimento ve-
getativo do referido escritor (300 vacas produzindo em média, por ano, 157, 2
novas crias) não estava correta, ou então, em vez de enviar regularmente toda
a sua produção de garrotes para a Bahia, boa parte deles permanecia nas
próprias fazendas ou tinha outro fim que desconhecemos. Supondo-se que as
vacas constituiam a metade do rebanho permanente - o que não é provavel,
pois conforme vimos, a praxe era conservarem-se nas fazendas apenas as fê-
meas e alguns poucos tomos reprodutores, enviando-se os gaLotes para
- 365-

Embora contanto com boas pastagens do capim mimoso, que se-


gundo especialistas no assunto, trata-se talvez da melhor forrageira
americana (71), vários fatores limitavam o desenvolvimento ainda
mais pleno da pecuária no sertão piauiense. Morcegos, insetos, onças
e cobras, ervas venenosas, etc, causavam grandes perdas aos rebanhos
(72). Von Spix e Von Martius falam que notadamente na época em
que faltam as chuvas, grandes epidemias infestavam os bovinos, mor-
rendo rapidamente grandes quantidades de animais (73).
O gado era geralmente criado solto: como não havia cercas di-
vidindo as fazendas umas das outras, e existindo consuetudinariamcn-
te uma légua de terra de uso comum entre as mesmas (74), sucedia
certamente que os animais de um proprietário se misturassem com os
dos vizinhos. A maneira de se evitar tais perdas e descaminhos era
ou marcar com ferro quente o dorso de todos os animais, ou então fa-
zer certos talhos numa das orelhas dos mesmos, de maneira a distin-
guir as reses das diferentes fazendas. Nas fazendas dos Jesuitas, por
exemplo, duas marcas eram utilizadas distinguindo dois conjuntos de
propriedades: os animais pertencentes à chamada "Capela Grande"
eram ferrados com o sinal: Á e os da "Capela Pequena", com o sinal: y
(75).
Variavam bastante, ao longo do ano, os trabalhos exigidos pela
criação bovina. A descrição feita por Von Spix e Von Martius ilus-
tra muito bem o efeito das variações sasonais na organização do tra-
balho pastoril:

"Depende a criação do gado nessas regiões exclusivamente da


chuva. Se no fim de dezembro entrar o tempo das águ:ls, alcan-
ça até os fins de fevereiro o apogeu de sua abundância, e com::ça
então a diminuir de intensidade até fins de ab il. Enchem-~e de
água naquela estação os inumeráveis açudes e covas, a terra amo-

que os 1.954 animais que efetivamente sairam das supra-citadas fazendas re-
presentariam apenas 45,5% do total de animais que potencialmente poderiam
delas ser extraidos. Confira: Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 4,
Ofício dirigido aos Governadores Interir.os, de 27 de setembro de 1786; Caixa
7, Consulta de Martinho de Mello e Castro ao Rei a respeito do que fazer com
as boiadas das Fazendas dos Proscritos J emitas, de 7 de janeiro de 1790.
(71). - Miranda (A.A.), op. cit., p. 142.
(72). - "Roteiro do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 80.
(73). - Von Spix e Von Martius, op. cit., p. 418.
(74). - "Roteiro do Maranhão a Goiás", op. cit., p. 79.
(75). - Arquivo Histórico Ultrama:ino, Piauí, caixa 4, 'Relação das
Boiadas que foram das Fazendas pertencentes à Capela Grande e Capela Pe-
quena", de 5 de abril de 1773. Em diversas "Relações" aperecem reproduzidas
na margem, a marca de cada uma das Capelas. Supomos que estas marcas re-
presentavam as letras S.
- 366-

Ieee e o pasto cresce luxuriante. Durante este tempo as vacas que


como todo o gado, vivem no campo, são tocadas para os cerca-
dos onde passam as noites, para serem mungidas de manhã e
p~epararem-se os queijos. Do mês de maio em diante, deixam-se
de novo as vacas no pasto. Por vezes acontece passar o mês
de fevereiro sem chuva, e torna-se então impossivel a produção
de queijos, porque O leite não chega a alcançar a quantidade e
gordura necessárias, e as manadas, a não se:em algumas vacas
para o serviço doméstico, precisam ficar sempre nos pastos" (76).

Outro observador, Pereira d' Alencastre, assim descrevia o ciclo


anual dos pecuaristas do Piauí:

"Os meses de novembro e dezembro (fim de verão) são as


épocas mais abundantes de produção. Fazem-se as vaqueijadas
duas vezes no ano nas fazendas de grande criação, e isto sucede
nos meses de janeiro e junho. Porem nas pequenas fazendas, uma
só vez. Os meses de janei:o e junho são o tempo mais feliz do
fazendeiro e mais divertido para os vaqueiros que se empenham
em provar muita perícia no exercício de suas funções. Nesses
meses se fazem tambem as vaqueijadas do gado grande, que tem
de ser remetido para as feiras ou vendido nas porteiras dos currais
aos negociantes ambulantes" (77).

Antes de encerrar estas páginas, vejamos o que os documentos


nos ensinam a respeito do valor representado pelo gado bovino no
decorrer do século XVIII.
Segundo os peritos da época, um boi "gordo e capaz de matalo-
tagem" pesava entre 9 e 12 arrobas ao sair da porteira do curral (78):
no caso de ser transportado, ou melhor, comboiado para a Bahia, a lon-
ga caminhada de mais de 22 léguas, fazia-o perder muito peso. Não
só as boiadas chegavam desfalcadas (vários animais ou se extraviavam
ou morriam pelo caminho), como os animais que conseguiam chegar
à feira de Capoame, no Recôncavo baiano, tinham perdido às vezes
até 1/3 de seu peso ao iniciar a jornada de uma capitania para ou-
tra (79).

(76). - Von Spix & Von Martius, op. cit., p. 418.


(77). - Perei:a d'Alencastre, op. cit., p. 68.
(78). - Idem, ibidem, p. 80.
(79). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 4, "Relação de
todas as boiadas saidas das Fazendas confiscadas aos Regulares da Companhia
de Jesus, enviadas à feira da Capoame na Bahia", de 1770 a 1788, datado de
20
- 367-

Uma arroba de carne bovina custava no açougue da vila da


Mocha, em 1727, 80 réis (80), passando a valer, entre 1752 e 1754,
aproximadamente 200 réis (81). De acordo com as Posturas e Taxas
estabelecidas pela Câmara do Senado da vila de Campo Maior, tais
eram, em 1764, os preços máximos dos animais (82):

PREÇOS MAXIMOS DOS BOVINOS (1764).


1 vaca grande e gorda 1$500
1 vaca inferior 1$200
1 boi grande e gordo,
capaz de matalotagem 1$920
1 boiote 1$600

Na Bahia, na feira da Capoame, o principal mercado da pecuária


piauiense, o preço dos animais não parece ter aumentado gradativa-
mente ao longo de quase dois decênios: tomando como exemplo as
34 boiadas das fazendas que foram dos J esuitas, pertencentes apenas
à Inspecção de Nossa Senhora de Nazaré, temos os seguintes dados:
entre 1770 e 1788 foram enviados 9.711 bois para a Bahia. Destes,
quando os vaqueiros e tangedores vendiam alguns pelo caminho, seu
preço importou em média, 1~914. Na feira de Capo ame, no entretanto,
os animais tiveram seu valor oscilante entre 3$000 e 4$500, sendo seu
valor médio, 3$641. As vacas, por sua vez foram geralmente vendidas
entre 2$300 e 4$700, apresentando o valor médio de 3$094 (83).
Salvo erro, a última boiada enviada à Bahia partindo destas
fazendas foi a do ano de 1788, pois os Administradores das fazen-
das reais decidiram a partir de 1789 que era mais rentavel aos cofres

(80). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 1, "Informação


de Antônio Marques Cardoso a respeito da marchanteria da Vila da Mocha",
de 23 de setembro de 1727.
(81). - Arquivo Histó -ico Ultramarino, Piauí, Caixa 6, "Preço de dife-
rentes gêneros e fazendas do Piauí, 1752-1754".
(82). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 3, "Posturas e
Taxas da Vila de Campo Maior", de 24 de agosto de 1764. Esta lista de taxas
encontra-se, com pequenas modificações, reproduzida igualmente em Pereira
da Costa, op. cit., p. 79 .
(83). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 4, "Mapa de
todas as boiadas que têm saido das Fazendas de Gado do Real Fisco desta
Capitania desde o ano de 1770 até 1788 inclusive." 2 de março de 1789. Es-
tamos p:eparando para breve um trabalho relativo às fazendas de Gado dos
Jesuitas do Piauí, dando particular atenção à essa estatística que vem assinada
pelos três membros da Junta Governativa da Capitania, José B. da Silva,
João Paulo Diniz e José Pereira
- 368-

da metrópole vender as reses a quem as quizesse por conta própria


se encarregar de revende-las na Capoame, em vez de continuar a
prática herdada ainda o tempo dos Jesuitas, de os próprios vaqueiros
e tangerinos das fazendas comboiarem os animais (84). Assim sen-
do, nos meados de 1789, vendiam-se nas porteiras das fazendas da
Inspecção de Santo Inácio do Canindé, bois dos pastos mimosos, a
3$000, os dos pastos agrestes, a 2$600; na Inspecção de São João do
Piauí seu valor foi, indistintamente, de 2$800, enquanto que os ani-
mais procedentes da Inspecção de Nossa Senhora de Nazaré foram
arrematados ao valor de 2$500 cada um (85).
Não temos notícia de que no Piauí se fizesse, como na Ilha
Grande de Joannes (Marajó), as chamadas "caça ao boi", em que
vaqueiros e peões armados de espingardas, perseguiam as reses sel-
vagens criadas no mato, abatendo-as in loco, tendo, apenas o trabalho
de tirar a pele do couro, posto que a carne possuia pouco valor co-
mercial (86). Von Spix e Von Martius falam que havia muita abun-
dância e fartura de gado no Piauí quando por lá perambularam; con-
tam mesmo que era praxe levar-se à porta do viajante que passasse
por aqueles sertões, um belo boi, utilizando-se o forasteiro de sua
carne, muito ou pouco, a seu bel prazer (87).
Se compararmos os preços do gado bovino com outros gêneros
corrente no Piauí, notaremos que efetivamente a principal fonte de
rendas desta capitania - tanto dos particulares, como tambem dos
cofres públicos (88) - tinha baixa cotação no mercado interno. Entre
1752-1754, v.g., uma arroba de carne de vaca custava no Piauí,
$200 réis, ou seja, aproximadamente $013 réis cada quilo. Três ovos
de galinha custavam pouco mais do que um quilo de carne; com o
valor que se pagava a um queijo flamengo ou a um chapéu "multo
ordinário", podia-se comprar o equivalente a 73 quilos de carne bo-
vina. Um par de meias de seda ordinária valia o exorbitante preço de
4$000, ou seja, quase a mesma quantia que se pagaria por dois bois
dos mais gordos e mais corpulentos (89).

(84). - Idem,ibidem.
(85). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 7, "Consulta de
Martinho de Mello e Castro ao Rei a respeito do que fazer com as boiadas das
Fazendas dos Proscritos Jemitas," de 7 de janeiro de 1790.
(86). - Biblioteca Nacional, Seção de Manuscritos, 1-31-17-8, "Ca;ta
de Francisco da Silva Castro informando sobre as fazendas de gado dos
extintos jesuitas da Ilha de Marajó", Pará, 29 de dezembro de 1866.
(87). - Von Spix & Von Martius, op. cit., p. 447 ..
(88). - A respeito dos dízimos do gado vacum, consulte-se a lista das
arrecadações de cada uma das vilas entre os anos de 1791 e 1804, in Pereira
d'Alencastre, op. cit., p. 70-71.
(89). - Arquivo Histórico Ultrama~ino, Piauí, Caixa 6, "Preço de di-
ferentes gêneros e fazendas do Piauí".
- 369-

Por volta de 1764, vemos que pelo preço de uma vaca gorda e
grande podia-se comprar 5 galinhas, ou 5 patos, ou 2 perús, ou 3 fras-
cos de aguardente comum. Se se tratasse de aguardente de boa qua-
lidade, trocava-se 2 vacas das melhores, por 2 frascos e meio de tal
bebida. Dois freios de cavalo ou dois pares de esporas valiam mais
do que um boiote. Era preciso o equivalente ao valor de duas vacas
das melhores para se mandar fazer uma porta de uma casa, vindo esta
acompanhada de seu portal (batente). Em se tratando da confecção
de um vestido, caso o tecido fosse ordinário, o oficial alfa' ate cobrava
o equivalente a duas vacas; caso fosse um vestido de veludo, ou de se-
da, aí então seu feitio representava o tanto quanto valiam 3 vacas das
melhores. Um par de botas custava mais do que 2 vacas inferiores
(90) .
Afinal, "o que era um boi, para quem tinha 5 boiadas"? (91).

(90). - Arquivo Histórico Ultramarino, Piauí, Caixa 3, "Posturas e


Taxas da Vila de Campo Maior", de 24 de agosto de 1764.
(91). - OBSERVAÇÃO FINAL:
Este trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla que estamos
desenvolvendo, tendo como tema o estudo da composição e dinâmica da po-
pulação residente nas fazendas do Piauí ent~e os anos 1697 e 1762. Baseando-
nos principalmente na "Dezcripção do Certão do Peauhy Remetida ao IIm Q
e Rm Q Sr. F:ei Francisco de Lima, Bispo de Pernambuco", escrita pelo Pe. Mi-
guel de Coutinho (Ennes, E. 1938, op. cit.,) , datada de 1697, e na "Relação
dos Róis de Desobriga", esc~ita em 1762 pelo Pe. Dionísio José de Aguiar
(op. cit.,) estamos tentando analisar as principais características demográficas
dos estabelecimentos rurais do Piauí, tais como o número de fogos por fazen-
das, a quantidade e qualidade das pessoas residentes em cada fogo, a composi-
ção dos grupos domésticos, a importância de cada grupo étnico, a po·centagem
de esc "avos e livres por fazenda, os diferentes grupos profissionais ligados à
pecuária e à lavoura, etc. É por essa razão que neste primeiro artigo limi-
tamo-nos a descrever e analisar apenas a estrutura e orga:1ização "material"
das fazendas piauienses, deixando para proximamente o estudo da com-
DISTRIBUIÇÃO E USO DA TERRA NO
RIO GRANDE DO SUL NO SÉCULO
XVIII (*).

CORCINO MEDEIROS DOS SANTOS


da Universidade de Brasília.

OS PRIMEIROS POVOADORES.

o território do atual Estado do Rio Grande do Sul era povoado


primitivamente por indígenas da grande família Tupí-Guaraní e den-
tre os grupos dessa família, os que tiveram maior influência

"na formação do tipo humano a que se daria o nome de


gaucho, legando-nos um certo número de hábitos, objetos de uso,
e mesmo algumas características pessoais foram os minuano e
charrua" (1).

A ocupação do território fez-se inicialmente por militares e por


medidas estratégicas. De outro lado, as condições de trabalho não
exigiam o braço africano.
O elemento branco seria constituido pelos portugueses da metró-
pole e de outras partes da América portuguesa, como Laguna, São Pau-
lo, Minas, Rio de Janeiro e ainda dos Açores.
No último quartel do século XVII, quando os bandeirantes pau-
listas já haviam ultrapassado o meridiano de Tordesilhas na direção
sul, a coroa portuguesa manifesta clara intenção de fazer do Rio da
Prata uma fronteira natural. É assim que em 1676 D. Pedro fazia

(*). - Comunicação apresentada na 1\l Sessão de Estudos, Equipe B,


no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Rosa (Othelo), "A Formação do Rio Grande do Sul", in Funda-
mentos da Cultura Riograndense. Porto Alegre, Faculdade de Filosofia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
- 372-

outorga de capitanias nas terras do Sul até a boca do Rio da Prata.


Com este fato tem início a política expansionista naquela direção,
cuja concretização se faz em 1680 com a fundação da Colônia do
Santíssimo Sacramento em frente de Buenos Aires.
Ainda naquele ano Domingos de Brito Peixoto parte para o sul
com o ob~etivo de fundar Laguna, primeira sentinela avançada, antes
da Colônia do Sacramento. De fato escreve o pioneiro paulista:

"Me animei a fazer a conquista da L'lguna, terras muito


férteis e ~ bundantes de pescado e carnes e para a mais lavoura,
com a visinhança de Buenos Aires, donde m~ parece haverá
maiores haveres; pelo que reso~vi fazer dU1S embarcações, uma
que perdi have á já 4 anos, outra em que de p~esente vou à
minha custa com meus filhos, parentes e amigos com desíg'lio de
mandar fazer di'igê:Jcia por prata ... " (2).

Entre as pessoas que o acompanhavam estavam seus dois filhos


Sebasfão de Brito Guerra e Francisco de Brito Peixoto. Depois de
fundar a vila, nas muitas escaramuças que tivera com os índios, morreu
juntamente com o filho Sebastião, mas a obra desbravadora foi con-
tinuada pelo outro filho que descobriu e fez o reconhecimento de ex-
tensas campanhas. Mandou convidar gente nas diversas vilas de São
Paulo e no início do século' XVIII, Santo Antônio da Laguna era ele-
vada à categoria de vila, contando então com 42 casas e 300 pessoas
adultas. Mas a verdade é que entre o Rio de Janeiro e Colônia do
Sacramento ainda continuava um imenso vasio demográfico. Foi as-
sim que o primeiro esforço oficial se endereçou à Colônia do Sacra-
mento. Este esforço consistiu na remessa de 61 casais vindos de Por-
tugal em 1718 com fim de dedicarem ao cultivo da terra (3). De acor-
do com o esquema estabelecido, a cada casal se forneceu a quantia de
25 alqueires de sementes de trigo que cor respondem a 5 alqueires de
Portugal. Alem das sementes receberam tambem juntas de bois para
lavrar a terra. A primeira plantação foi de 71 alqueires, do que re-
sultou uma colheita de 618 alqueires.
Os portugueses conheciam a região desde o século XVI, mas so-
mente no século XVIII é que o Rio Grande do Sul se incorporou ao
território luso-brasileiro. Paranaguá, já visitado pelos paulistas no fi-
nal do século XVI desenvolveu o seu povoamento e por volta de 1656
era criada a caI"itania de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá. Mais

(2). - Perrei-a (Tito Lívio), História de São Pau/o. 1\l voI. São
Paulo, Gráfica Biblos Editora, 1973, p. 319.
(3). - Arquivo Histórico Ultramarino, Rio de Janeiro, caixa 10.
- 373-

ou menos pela mesma época iniciou-se o povoamento dos Campos de


Curitiba. De Paranaguá, pelo litoral, e dos Campos de Curitiba, pelo
Planalto, pro~,segu.u a marcha da conquista e ocupação do terri-
tório meridional (4). Realmente, por volta de 1658, Manuel Lourenço
de Andrade assentou os fundamentos de São Francisco (5). O ponto
seguinte, pelo litoral, seria Santa Catarina. Ao mesmo tempo o po-
voamento dos campos curitibanos progredia coma irradiação da cria-
ção de gado. Prosseguindo a marcha para o sul atingiram Laguna.
Mas o cresc:mento populacional desses primeiros núcleos não foi tão
grande como se poderia esperar. É o que depreendemos de informa-
ções colhidas entre 1726 e 1727 pelo mestre de Campo David Mar-
ques Pereira, por ordem do governador da Capitania de São Paulo,
Rodrigo Cesar de Menezes (6). Com os dados fornecidos pelo refe-
rido David Marques Pereira organizamos o quadro que segue, pelo
qual se terá uma imagem clara do povoamento do litoral sul do Brasil
até aquela data.

Vilas Casais Casais Homens prontos


Brancos Bastardos para a Guer a

Laguna 25 40 42
São Francisco 94 21 100
Santa Catarina 26 16 31
Paranaguá 400 44 260
Iguape 37 20 49
São Vicente 48 21 51
Cananéia 35 28 36
Itanhaem 42 30 47
Santos 450 42 300
TOTAIS 1.157 262 916

Em 1727 ainda não existia a povoação do Rio Grande de São


Padro, mas desde 1721 o seu sítio estava escolhido' como o mais apro-
priado

(4). - Diegues Júnior (Manuel), Regiões Culturais do Brasil. Rio de


Janeiro, I.N.E.P., 1960. p. 304.
(5). - Taunay (Affonso ele E.). "Em S'lnta C"tarina Colonial". Anais
do Museu Paulista. Tomo VII. São Paulo, 1936, p. 586.
(6). - Relações das Vilas da Co<ta do m'lr do Rio Grande rle São
Pedro até a Praça de S,mtos.
- 374-

"para dar aumento da Nova Colônia e prontidão para os


seus socorros" (7).

Para socorrer a Colônia do Sacramento, principalmente por ter-


ra, a corte de Lisboa ordenou ao governador do Rio de Janeiro a fun-
dação de um presídio militar, o que se deu no porto de São Padro.
Para o empreendimento foi indicado o brigadeiro José da Silva Paes.
Na região já se encontravam alguns povoadores, pois alem dos condu-
zidos por Brito Peixoto, João de Magalhães já havia estabelecido em
1724 com 30 homens junto às margens do Tramandahy com criação
de gado.
O povoamento seria feito inicialmente por moradores do Rio de
Janeiro, onde já em 1735 havia muitas pessoas interessadas em seguir
para aquela região. A expedição de Silva Paes constou de 254 homens
das tropas auxiliares do Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais. Depois
dos soldados, do Rio de Janeiro tambem vieram os recrutas, casais e
mulheres desimpedidas (8). As primeiras sesmarias foram concedidas
em 1732, onde assentariam moradas os primeiros proprietários a tí-
tulo legal, mas seus donos já as ocupavam de fato antes da chegada de
Silva Paes.
Os moradores de Laguna começaram a encaminhar-se para o
Sul e essa corrente de povoadores foi engrossada a partir de 1742 com
a chegada dos açorianos. O fato é que 10 anos depois de sua funda-
ção o presídio do Rio Grande já era um próspero povoado. Por carta
Régia de 17 de junho de 1747, foi elevado à categoria de vila (9).
A partir do Registro de Torres, o português com o elemento la-
gunista e outros que se associaram naquela aventura, avançou pelo li-
toral e formou as células primárias, Rio Grande, Viamão, Santo An-
tônio da Patrulha e Conceição do Arrôio. Numa segunda fase, Es-
treito, Mostardas e São José do Norte surgiram como pontos de Liga-
ção entre o presídio do Rio Grande e Viamão (10).
*

(7). - "Notícias Práticas da Costa e Povoações do Mar do Sul", in


Taunay (Affonso de E.), Relatos Sertanistas. São Paulo, Livraria Martins
Editora, 1953, p. 225.
(8). - Rodrigues (José Honório), O Continente do Rio Grande. Rio
de Janei:o, Edições São José, 1954, p. 33.
(9). - Rosa (Othelo), "A Formação do Rio Grande do Sul", in Fun-
damentos da Cultura Riograndense. Porto Alegre, Faculdade de Filosofia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
- 375-

FORMAS DE APROPRIAÇÃO DA TERRA.

No Brasil, a posse e a propriedade da terra resultava de simples


doação, na forma de sesmarias.
Originariamente, sesmaria era o nome que se dava às doações
de terras que estavam abandonadas. A Coroa dava então estas pro-
priedades de sesmaria ou autorizava às Câmaras que as dessem pa-
gando o beneficiário a sexta parte dos frutos. Foi o rei D. Fernando
I quem promulgou a lei das sesmarias que muito contribuiu para o
desenvolvimento da agricultura em Portugal. D. João I não só con-
firmou como tambem deu aos sesmeiros vários outros privilégios a tí-
tulo de estímulo.
Para povoar o Brasil e estabelecer a grande lavoura voltada para
os mercados europeus era preciso estímulos e o primeiro seria o ofe-
recimento de terras graciosamente àqueles que desejassem se estabelecer
nelas. Por isto a instituição das sesmarias foi transplantada para o
Brasil.
O preceito das ordenações do Reino que proibia que se desse a
uma pessoa mais terras do que as que pudesse aproveitar, assumIU
aqui no Brasil uma feição particular. Havia quantidades imensas de
terras e por isto há muitos casos de concentração de dezenas de lé-
guas nas mãos de um único colono. Embora tal fato ocorresse com
razoavel frequência, a tendência geral foi de concessão de sesmarias
de uma, duas, três ou quatro léguas de testada (11). Entre 1682 e
1796 foram expedidas uma grande variedade de Cartas Régias, Avisos,
Disposições, Ordens, Provisões, Alvarás e Decretos sobre sesmarias,
com derrogações e ampliações que tornam o problema confuso. Mas
pela Carta Régia de 7 de dezembro de 1597 já se estabelecia que a
sesmaria devia ter três léguas de testada (12). Gonçalves Chaves
aponta os seguintes inconvenientes do sistema de distribuição da terra:
1.0, o crescimento populacional em relação à quantidade de terras foi
quase nulo nos três primeiros séculos de colonização; 2. 0 , as terras fo-
ram quase todas distribuidas; 39 , os açambarcadores possuiam até
20 léguas de terreno, e raras vezes consentiam no estabelecimento de
famílias de lavradores em suas terras; 4.°, em consequência existiam
muitas famílias pobres vagando de lugar em lugar segundo o favor e

(11). - Canabrava (Alice P.), "A Grande Propriedade Rural", in


História Geral da Civilização Brasileira. Tomo I, 2Q vol. São Paulo, Difusão
Eu~opéia do Livro, 1960. p. 102.
(12). - Chaves (Antônio Gonçalves), "Memórias Ecônomo-Políticas
sobre a Administração Pública do Brasil",
- 376-

capricho dos proprietários de terra; 5.°, nossa agricultura permanecia


no maior atrazo e desânimo (13).
A doação era feita, pelo menos teoricamente, sob a cond:ção de
que o beneficiado deveria aproveita-la dentro de um certo prazo pre-
viamente estabelecido, em geral 5 anos. Quem recebia a sesmaria não
deveria pagar pela terra coisa alguma, por isso expressa o documento:

" . " a qual lha dou forra e isenta para si e todos os seus
herdeiros e descendentes" (14).

Alem disso gosavam de outros privilégios como isenções de tri-


butos, comércio com a metrópole livre de direitos e na terra deveriam
pagar o dízimo da Ordem de Cristo. Esta distribuição nem sempre se
fez dentro dos preceitos legais e morais. Há muitos exemplos em que
cartas de sesmarias eram dadas pelas autoridades coloniais a pessoas
das vilas que nunca sairam delas para pessoalmente ocupar a terra.
C. R. Boxer classifica esses proprietários em três categorias: aLa na
°
qual incluia a família Ravasco, gastava todo seu tempo nas cidades
litorâneas; a 2. a, na qual incluia os Dias D'Ávila, que dividiam seu
tempo entre suas sedes nas cidades costeiras e suas propriedades no
interior; a 3. a categoria abrangia aqueles que passavam virtualmente
a vida inteira em suas propriedades (15). Diante dos exageros e des-
virtuamento da instituição, a administração procurou corrigir as dis-
torções por meio de leis apropriadas ao caso específico do Brasil. Foi
assim que o decreto régio de 27 de dezembro de 1695 estipulou que
no futuro, uma pessoa individualmente não poderia receber terra que
medisse mais de quatro léguas de comprimento por uma de largura.
Dois anos mais tarde outro decreto reduzia mais ainda o tamanho da
sesmaria, pois estipulava que devia ser de três léguas de comprimento
por uma de largura. Determinava ainda a existência de uma légua en-
tre uma e outra sesmaria. Essas medidas foram mantidas no terceiro
decreto (20-1-1669) que ameaçava de expropriação aos proprietários
que não cultivassem suas terras (16).
* *
..
(13). - Ibidem, op. cit., p. 70.
(14). - Veja-se Documento nQ 9 "Carta de Doação da Ilha de S:mto
Antônio a Duárte de Lemos", in Tapajós (Vicente), H ist6ria Administrativa
do Brasil, vol. 11. Brasília, DASP - Serviço de Documentação, 1966, p.
2111214.
(15). - A Idade do Ouro do Brasil. São Paulo, Companhia Edito:a
Nacional, 1963, p. 202.
(16). - Boxer (C. R.), op. cit., p. 204.
- 377-

No Rio Grande do Sul, cujo processo de colonização e povoa-


mento foi diferente, a posse e propriedade da terra não foi diferente.
Não havia a grande lavoura, mas havia a criação de gado vacum, ca-
valar e muar em larga escala e extensivamente e que por isso mesmo
requei'ia grandes extensões de terras. Se é verdade que o processo de
integração do Rio Grande na economia atlântica só ocorreu na se-
gunda metade do século XVIII, tambem é verdade que desde o alvo-
recer de sua história funcionou como economia dependente.
Desde o primeiro momento da instalação das estâncias nos cam-
pos de Curitiba, de Lages e de Viamão, assistimos à fixação definitiva
do homem luso-brasileiro, amando a terra e constituindo-se na grande
propriedade rural.
A med~da que promoviam a conquista dos territórios meridionais,
fazendo-se a penetração pelo interior e pelo litoral, iam promovendo
a distribuição de sesmarias, tendo em vista a fixação dos pioneiros.
Partindo de alguns pontos de irradiação como Paranaguá, Laguna,
Santa Catarina (Florianópolis), São Francisco do Sul e posteriormente
do presídio do R~o Grande, os povoadores foram ocupando o conti-
nente. Persiste a regulamentação na distribu:ção das sesmarias, mas
lançando mão de muitos subterfúgios conseguiam apossar-se de gran-
des área~ de terras para a criação de animais. A sesmaria oficial será
de três léguas de comprido por uma de largura, mas algumas vezes
conseguiam reunir duas, três ou mais sesmarias nas mãos de uma só
pessoa. No distrito de Santa Bárbara da Encruzilhada, por exemplo,
um tal Jerônimo da Silve:ra Machado possuia 5 propriedades sendo 3
de três léguas de comprido por uma de largo e uma de duas léguas e
meia de comprido por uma de largo alem de outra de uma légua e
meia de comprido por meia de largo (17), o que equivale a 53.361
ha. Contudo, no sistema de apropriação das terras no Rio Grande do
Sul aparecem dois aspectos:

"a zona de predominância aço~iana, a pequena propriedade,


nascida das datas de terra, tornou-se comum, ao passo que a estân-
cia, sistema de grande prop"iedade caracterizou a área gaucha.
A estância teve papel importante na articulação do Rio Grande
do Sul, pois representou o regime inicial de fracionamento do
ter:itório em estabelecimentos pastoris ... " (18).

(17). - "Relação dos moradores que tem campos e animais no Distrito


da Freguesia de Santa Barbara da Encruzilhada", in Cor~espondência com o
Governador e mais Pessoas Encarregadas do Real Serviço no Continente do Rio
Grande. Arquivo Nacional, Cod. 104, vol. 7.
(18). - Diegues Júnior (Manuel), Regiões do Brasil. Rio de Janeiro,
I.N.E.P., 1960,
- 378-

Como se vê os colonizadores portugueses tinham para assegurar


sua ação construtora, o amparo de uma legislação adiantada. Por isso,
fixando nos campos de Viamão e noutras áreas do Continente, os no-
vos fronteiros procuravam normalizar a situação de proprietários pe-
rante as autoridades da vila de Laguna, durante a primeira fase da
ocupação. As propriedades assim adquiridas, permitiam ao estancieiro
agir de modo permanente e estavel e por outro lado garantiram o es-
tabelecimento do comércio dos gados bovino, cavalar e muar ao lado
de algumas iniciativas agrícolas de consideravel importância. Na se-
gunda fase de ocupação do território, segunda metade do século XVIII,
houve uma verdadeira corrida em busca de sesmarias. Eram numero-
sos os pedidos de concessão por parte de antigos aventureiros, de la-
vradores desiludidos e principalmente de militares que voluntariamente
se afastavam das funções. para se tornarem estancieiros. Para tanto bas-
tava escolher o terreno e estabelecer-se nele com a construção de um
rancho e algumas cabeças de gado e depois solicitar o título de posse.
Como soi acontecer nestas ocasiões, não havia nenhum dispositivo
acautelador nas doações, ocasionando complicadas questões de terras
no futuro. Era comum a posse da terra e a posterior venda sem título
legítimo. Na segunda fase de ocupação, a maior parte das terras es-
tava nas mãos dos militares graduados que de posse de uma simples
autorização do Comandante ou do governador as vendiam a terceiros.
É assim que das 841 propriedades existentes em 1785 apenas 41 eram
sesmarias régias legitimamente concedidas, 536 possuiam título pre-
cário (autorização do governador ou comandante militar) e estavam
com papeis encaminhados para legitimar o título de posse e em 264
delas seus ocupantes não possuiam documento algum. Nesse caso po-
deria ser despejado da terra pela autoridade régia, se precisas.se dela.
É assim que por ordem do Vice-Rei em 1789 uma relação de 20 pes-
soas tiveram que abandonar a terra que ocupavam no Distrito de Ser-
ro Pelado até o Camaquan (19). A corrida para a posse de terras,
alem do aspecto econômico, envolve tambem um aspecto social, pois
a concessão de sesmaria representava acesso na hierarquia social.
Alem disso redimia de culpas e supria a ausência de tradições familia-
res.
A falta de regularidade na distribuição das terras provocou al-
guma desordem, de modo que enquanto uns ocupavam grandes exten-
sões de terras outros andavam dispersos e sem domicílio e quase por
necessidade se entregavam ao modo de vida dos índios e mestiços que
vagavam pelas vastas campanhas, entregando-se quase por necessidade
ao roubo e ao contrabando, alem de outras prevaricações. Um outro

(19). - "Relação das pessoas ... ", in Correspondência ... , ibidem, Cod.
104,
- 379-

problema decorrente era a falta de terras devolutas para acomodação


dos casais das ilhas que tambem começaram a se dispersar. ];; por isto
que em mais de uma ocasião encontramos a autoridade régia reque-
rendo o despejo dos ocupantes ilegítimos para nelas estabelecer casais
ou organizar qualquer estabelecimento Real. Isto aconteceu quando !>e
transferiu a Feitoria Real do linho cânhamo do Rincão do Canguçú
para o Faxinal do Courita. Em 1785, por exemplo, 125 famílias de-
clararam na provedoria possuir animais e viver de favor (agregados)
nos campos de outrem.
A desordem não ficou desconhecida das autoridades, chegando
até ao conhecimento do Vice-Rei Luís de Vasconcelos que alvitrou a
seguinte solução:

"Para se prevenirem as consequências que resultam de tanta


irregularidade e se ir remediando pouco a pouco o mal que se
conhece, se faz necessário primeiro que tudo, dar outra nova
forma à distribuição das ter ,as que se acham repartidas contra
as ordens de Sua Majestade, e acautelar as desordens que tem
precedido dos notórios enganos e simulações com que mal e
indevidamente se conservam muitos moradores na posse da maior
parte daqueles terrenos. Por isso me pareceu determinar ao
provedor da Real Fazenda a diligência que devia ir fazendo
para se conhecer o verdadeiro estado daquele continente" (20).

Uma das principais causas do envolvimento de muitos em con-


tendas e pleitos entre visinhos confrontantes era o fato de não haver
um tombo exato de cada distrito pelo qual se pudesse conhecer o ver-
dadeiro título dos possuidores e as balisas certas de suas possessões.
Por isso o Vice Rei preconizou a existência no Rio Grande, de um
ministro com disposição e saude, designado especialmente para fazer
o tombamento das terras. Solução que foi expressada assim:

(20). - Ofício do Vice-Rei Luis de Vascovcelos para Martinho de Melo


e Castro - Arquivo Histórico Ultramarino, Rio de Janeiro, caixa (1784-85).
Graças a essa providência é que pudemos dispor da Relação de todos os
moradores que possuiam campos e animais, no Rio Grande do Sul em 1785.
Todos foram chamados a declarar na provedoria as terras que ocupavam sua
extellfião (em léguas), a que títulos ocupavam e o número de animais que
possuiam.
Acreditamos que as dimensões em léguas, declaradas pelos ocupantes pos-
suem uma elasticidade muito grande, contudo para efeito do nosso cálculo,
conforme tabela que apresentamos adiante utilizamos exatamente as dimensões
declaradas. Para tanto aceitamos para uma légua a equivalência de 6 .600
- 380-

" me parece seria muito conveniente que esta providên-


cia que devia estender a todas as terras do Brasil se estabelecesse
imediatamente no Rio Grande, despachando Sua Majestade um
ministro escolhido com gênio e saude própria para este traba-
lho com o ordenado e predicamento que for servido para tom-
bar todas as terras daquele continente e assinalar os limites ce:-
tos de cada um dos possuidoes confo'me os títulos que se achar
nas circunstâncias de se poderem legitimur, havendo t2mbem por
devolutas todas as mais que o abuso tivesse introduzido ou o
dolo e enganos confirmados na parte com que se acharem" (21).

Com isto pretendia o Vice-Rei acabar com a grande desigualdade


que vinha acontt:cendo na distribuição das terras, pois havia morado-
res que em seu nome ou no de outros se achavam na posse de muitos
quinhões para depois venderem. Referindo-se a este assunto escreve
o Vice-Rei:

"Neste gênero de negocIo escandalosíssimo há aí muitos que


se tem feito proprietários da maior parte daqueles terrenos, e
das suas melhores situações para os pode 'em vender por alto
preço a outras pessoas que vão continuando igualmente na pos-
se ilegítima por ter sido fantástico e ilusório o primeiro título
de sua concessão com que mais e com ela se contentam por ser
impraticavel entrar neste exame de outro modo pela grande
confusão e desordem em que se acham os mesmos ter:enos" (22).

o pior é que os principais responsáveis pela ordem pública do


Continente, os comandantes militares, estavam quase sempre envolvi-
dos não só nos negócios desonestos das terras como nos contrabandos.
Era esse o caso do coronel Rafael Pinto Bandeira que era um profundo
conhecedor da terra e utilizou seus conhecimentos para realizar toda
espécie de negócio ilícito.
A posse da terra estava provocando tamanha confusão que se tor-
nava necessário providências urgentes, sobre o que opinava o Vice-Rei:

"Alem de se verificarem as condições com que S. Majestade


concede as sesmarias e ser indispensavel que os sesmeiros tenham
escravos para cultivar as terras como esta última claúsula não
pode deixar de faltar em muitos dos pretendentes por nem terem
estes sempre trabalhadores próprios, nem naquele país haver se-

(21). - Ofício, loco


- 381-
melhante uso em todas as concessões antigas. Seria muito CO:1-
veniente que todos aqueles sesmeiros fossem obrig"dos à propor-
ção de suas sesmarias a conservar nelas aquele número de indi-
víduos que parecesse necessário a cada uma, regulado conforme
os diversos serviços da lavoura e da criação de animais" (23).

Para o cumprimento dessas providências sugeria que nenhum re-


querimento fosse aceito sem que primeiro constasse o número de in-
divíduos que deviam ficar na gleba.
O sistema proposto pelo diligente Vice-Rei alem de possibilitar
maior progresso da agricultura e dos rebanhos, possibilitava às autori-
dades um conhecimento perfeito e atualizado da verdadeira situação
econômica do Rio Grande. Se não todas, pelo menos parte das su-
gestões foram postas em prática. Uma delas foi o tombamento das ter-
ras com a respectiva conferência dos títulos de posse. Foi assim que
no período de 1784 a 1785, todos os comandantes de distritos fizeram
relações de todos os moradores que possuiam terras, bem como dos
animais que mantinham nelas (24).
As medidas saneadoras tiveram limitado efeito, pois no começo
do século XIX, um dos males do Rio Grande ainda era a grande pro-
priedade territorial. Luccock observou que as menores propriedades
possuiam quatro léguas quadradas e as maiores atingiam centenas de
léguas quadradas (25).
* *
*
ESTRUTURA FUNDIARIA.

Analizando a documentação em nosso poder (26), pudemos de-


terminar uma distribu:ção regional da propriedade conforme mostra a
tabela I. Por aí se vê que a que possuia maior número de proprieda-
des é a de Cachoeira e a que possuia o maior número de pequenas
propriedades era a de Mostardas. A grande propriedade predomina
em Cachoeira, mas de um modo geral o maior número de proprieda-
des está entre 1.000 e 5. 000 ha. Mas voltando nossa atenção para a

(23). - Ibidem.
(24). - Veja-se Relações in Correspondência com os Governadores do
Continente do Rio Grande. Arquivo Nacional, Cod. 104, vols. 6 e 7.
(25). - Aspectos Sul-Riograndenses. Rio de Janeiro, Editora Record,
1935, p. 82.
(26). - "Relação dos Moradores que tem Campos e Animais no Con-
tinente",
TABELA 1.

DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE RU RAL POR DISTRITO NO ANO DE 1785.

Grupo de área (HA.) Cacho- Rio Vacaria Viamão Triunfo Encruzi- Mostar- Taquary Estreito Totais
eira Pardo lhada das
Menos de 20 6 18 19 10 53
De 20 a 50 2 2
De 50 a 100 16 6 22
De 100 a 200 3 3
De 200 a 500 2 7 1 32 4 49 31 51 177
De 500 a 1.000 3 5 4 9 8 6 36
De 1.000 a 5.000 37 37 8 26 56 23 19 13 13 232
De 5.000 a 10.000 42 12 24 7 31 14 12 1 143
De 10.000 a 20.000 53 5 16 8 29 22 6 10 2 151
De mais de 20.000
- 383-

TABELA Il.

DISTRIBUIÇÃO DA PROPRIEDADE TERRITORIAL NO RIO GRANDE


DO SUL NO ANO DE 1785.

Grupo de área (HA.) Número de Bsta- % Ãrea dos Estabe- %


belecimentos lecimentos (HA.)
Menos de 20 53 6,30 111 0,00
De 20 a 50 2 0,24 86 0,00
De 50 a 100 22 2,61 1.531 0,03
De 100 a 200 3 0,35 397 0,01
De 200 a 500 177 21,05 46.379 0,93
De 500 a l.000 36 4,28 24.380 0,48
De l. 000 a 5.000 232 27,59 626.980 12,43
De 5.000 a 10.000 143 17,00 l.173.941 23,26
De 10.000 a 20.000 151 17,95 2.029.435 40,20
De mais de 20.000 22 2,61 l.145.628 22,69
TOTAIS 841 100,00 5.048.868 100,00

TABELA m.

DISTRIBUIÇÃO DA TERRA NO RIO GRANDE DO SUL NO ANO DE 1940.

Grupo de área (HA.) Número de Bsta- % Ãrea dos Estabe- %


belecimentos lecimentos (HA.)
Menos de 10 37.457 16,24 209.976 1,02
De 10 a 20 52.866 22,91 735.261 3,60
De 20 a 50 87.588 37,96 2.607.377 12,75
De 50 a 100 25.966 11,26 l. 734.217 8,49
De 100 a 200 1l. 119 4,82 l.543.561 7,56
De 200 a 500 8.332 3,61 2.607.681 12,75
De 500 a 1.000 3.864 1,68 2.694.143 13,18
De l.000 a 5.000 3.253 1,41 6.223.563 30,45
De 5.000 a 10.0000 226 0,10 l. 49l. 642 7,30
De mais de 10.000 41 0,02 594.394 2,90
TOTAIS 230.722 100,00 20.441.815 100,00
- 384-

tabela II podemos ter uma clara idéia da distribu:ção da propriedade


fundiária no Rio Grande do Sul em 1785. Vejamos: enquanto 22
propriedades de 50 a 100 ha. correspondem a 2,61 % do número to-
tal, somando 1.531 ha. corresponderá apenas a 0,03% da área total
ocupada. No entanto 151 propriedades de 10.000 a 20.000 ha. cor-
respondendo a 17,95% do númerro (841), representava 40,20% da
área total ocupada (5.048.868 ha.). Por aí se vê que havia predo-
mínio absoluto da grande propriedade territorial como em todo o
Brasil. Considerando que a terra era utilizada quase que exclusiva-
mente para a criação de gado extensivamente em pastagens naturais é
compreensivo a necessidade de grandes extensões de terra nas mãos
de cada posseiro.
Não dispomos de meios para avaliar a evolução da propriedade
rural no Rio Grande do Sul através dos tempos, mas o quadro que le-
vantamos do censo de 1940 (tabela III) mostra que apesar de ter ocor-
rido mudanças significativas na sua distribuição, a grande propriedade
territorial cvntinuou a dominar. Comparando com o de 1785, vê-se
que há sensivel alteração não só com relação à área ocupada como
tamhem ao número e tamanho de cada unidade. Há, portanto, maior
diversificação do que no século XVIII.
Até 1785, segundo documentação oficial que utilizamos, estavam
orupados somente 5.048. 868 ha. das terras contra 20.441 . 815 ha.
em 1940, de um total de 26.745. 500 ha. que compõem o território
do atual Estado do Rio Grande do Sul.
Em 1785 a área ocupada, segundo declaração dos seus ocupan-
tes, representava pouco menos de 1/4 de todo o território. Mas con-
vem lembrar que os limites e as distâncias apresentadas em léguas
eram vagas, pois até então não havia ainda nenhuma demarcação ju-
dicial. Prqvidências a esse respeito foram tomadas a partir desta data.
A legalização e demarcação foi um processo lento, pois em 1802 havia
apenas 529 propriedades demarcadas judicialmente (27).

*
At0DOS DE PRODUÇÃO.

o conceito de modo de produção é uma criação marxista. Marx


não chegou a expor de forma completa uma teoria sobre o referido
conceito, mas a leitura de seus escritos permite perceber seu emprego

(27). - Casal (Manuel Aires de), Corografia Brasilica. São Paulo,


- 385-

40
REPRESENrAÇÃO PERCENTUAL DO NlThIEROE
AREA DAS PROPRIEDADES RURAIS DO RIO
GRANDE DO SUL EM ~ 785
35

30

11 '15'
:,
'!
ti
~ '10
ti
p,

° 2
:Tarnanho das proprie,dades

t:1r;>imero
~area

em três sentidos diferentes: 1.0, um sentido descritivo e etimológico,


sem uma dimensão teórica; 2.°, identificação de uma série de modos
de produção que chegaram a ser dominantes em determinados períodos
da evolução histórica (exemplo: feudalismo, capitalismo) 3.°, modos
de produção que poderemos chamar de secundários, já que não che-
garam a ser dominantes (28). Então pergunta-se qual o modo de pro-
dução colonial? Há uma variedade de respostas que refletem a inse-
gurança teórica de seus autores. Para uns foi feudal, para outros ca-
pitalista, para outros foi um modo de produção escravista, para ou-
tros foi um modo de produção híbrido. Outros usam o termo neo-
feudal ou semi-feudal para identifica-lo, outros ainda afirmam que

(28). - Cardoso (Ciro F, S, ), "Sobre los Modos de Produccion Colo-


niales de América", in Estudios Sociales Centroamericanos, San
- 386-

"o regime medieval da colonização conciliava teó-ica e pra-


ticamente a propriedade feudal e o sistema comunitário" (29).

Alberto Passos Guimarães afirma que o modo de produção do


Brasil colonial era feudal e teria que se-lo pois

"quando a Metrópole decidiu 18nçar-se na empresa colonial


não lhe restava outra alte~nativa política senão transplantar pa-
ra a América Portuguesa o modo de p odução dominante no
alem-mar. E o fez cônscia de que deveria repousar no monopó-
lio dos meios de produção fundamentais, isto é, o monopólio da
terra". E continua: "Na impossibilidade de contar com o servo
da gleba, o feudalismo colonial teve de regredir ao escravismo,
compensando a resultante perda do nivel de produtividade, em
parte com a extraordinária fertilidade das terras virgens do Novo
Mundo e, em parte, com o desumano rigor aplicado no tratamen-
to da mão-de-obra" (30).

Se de um lado tiveram que dar alguns passos para traz em rela-


ção ao estádio mercantil, que correspondia ao seu modelo, restabele-
cendo alguns aspectos da economia natural, de outro lado pode desen-
volver o carater comercial de sua produção voltada para o mercado
externo. Mas o estádio da produção mercantil, segundo escreveu Engels
distingue-se do ponto de vista econômico, pela introdução: 1.0, da
moeda metálica e com ela o capital-dinheiro, o empréstimo, o juro e
a usura; 2.°, dos mercadores, como intermediários entre produtores e
consumidores; 3. 0 , da propriedade territorial e da hipoteca; 4,°, do
trabalho escravo, como forma dominante da produção (31).
O que há de comum no Rio Grande do Sul com as outras áreas
do Brasil é o monopólio da propriedade territorial como o mais im-
portante dos meios de produção. Lá como em todo o Brasil colonial,
dominar a terra, açambarca-Ia significava ter praticamente o domínio
absoluto dos meios de produção agrícola (32).
No Rio Grande as fazendas em geral eram menores que as dos
engenhos e os proprietários dirigiam diretamente a exploração. O tra-
balho livre predominava e era executado pela família do proprietário
(29). - Ibidem, op. cit., p. 51/52.
(3). - Quatro Séculos de Latifúndio. Rio de Janeiro, Editora Paz e
Terra, 1968, p. 28/29.
(31). - Engels (Friedrich), A Origem da Família, da Propriedade Pri-
- 388-

e seus agregados. O trabalho escravo era empregado somente como


acessório. As próprias características da produção pastoril, a baixa
densidade de mão-de-obra que exige, sua fraca composição econômica,
determinaram o raro emprego do trabalho escravo (33).
A propriedade pecuária subdividindo sua exploração, naturalmen-
te dá lugar ao aparecimento do arrendatário, do vaqueiro ou capataz
que ganha uma em cada 4 crias do rebanho. Com isto o modo de pro-
dução da pecuária permitia o acesso à exploração e mais tarde o aces-
so à propriedade, de homens de menores recursos (34). :B um modo
de produção mais próximo do capi,talismo e representa um passo à
frente em relação ao engenho. Há maior emprego do trabalho assa-
lariado (os peões) e nisto o índio é largamente utilizado. Os estan-
cieiros, os vaqueiros são trabalhadores socialmente mais independen-
tes e economicamente melhor retribuidos do que no engenho. Mas o
fator decisivo da superioridade desta região fora o deslocamento dos
mercados ou mais propriamente o nascimento de um pobre mercado
interno nas visinhanças da criação, dando ensejo ao aproveitamento
de subprodutos do gado, inclusive da carne (35). Convem notar que
inicialmente os rebanhos eram destinados à subsistência das populações
indígenas especialmente aldeadas pelos jesuitas, depois foram neces-
sários para o sustento da tropa e somente mais tarde é que se desti-
naram ao comércio. De um modo geral a ocupação do território pelo
gado precedeu à ocupação humana. Verificamos que na segunda me-
tade do século XVIII há ainda uma grande desproporção entre a área
territorial ocupada, o número de habitantes e o número de cabeças de
animais. Senão vejamos: em 1780 a população do Rio Grande era
de 17.923 (36) contra uma área ocupada de 5.048.868 ha. o que
equivale aproximadamente a 285 ha. para cada habitante. Em com-
pensação o rebanho era imenso, baseado em dados do ano de 1787
apresentamos a tabela IV que contem um total de 882.231 cabeças
de animais entre bovinos, equinos, muares ~ ovinos. Assim teríamos uma
distribuição de uma rês para cada 5 ha. aproximadamente. Com estes
dados concluimos que a ocupação e exploração da terra no Rio Gran-
de, no século XVIII ainda era precária. No que diz respeito à pro-
dução agrícola, temos informação apenas sobre a produção comercia-

(33). - Schilling (P. R.), "O Trigo e o Latifúndio no Rio Grande do


Sul", in Revista Brasiliense. N9 18. São Paulo, julho-agosto, 1958, p. 80.
Veja-se tambem Ohlweileir (OUo Alcides), "Sobre o P;"ocesso do Desen-
volvimento Econômico do Rio Grande do Sul", in Revista Brasiliense n9 s.
18 e 19.
(34). - Guimarães (Alberto Passos), op. cit., p. 69.
(35). - Ibidem, p. 75.
(36). - Cardoso (Fernando Henrique), Capitalismo e Escravidão no
Brasil Meridional. São Paulo,
TABELA IV.

ANIMAIS DE DIVERSAS ESPP:CIES QUE EXISTIAM NO CONTINENTE DO RIO GRANDE EM 1787.

Bois Gado Animais Animais Burros Ove- Totais


Mansos Vacum Cavalares Muares Burras lhas
-- ~-- ._~

&>l Distrito da Vila de São Pedro 946 19.170 6.531 47 8 200 26.902
Q
784 7.765
~
Distrito do Povo Novo 3.431 19 10 108 12.117
Distrito do Serro Pelado 746 59.200 14.899 475 31 3.385 78.736
<' Distrito do Estreito 1.611 21.602 5.880 89 85 462 29.729
....O
~
Distrito de Mostardas 2.014 57.866 6.551 726 74 507 67.738
Distrito do Rio Pardo 315 6.404 2.309 125 24 507 9.257
Distrito de J acuí e Piquery 582 103.049 36.655 2.372 336 2.288 145.282
O Distrito do Coito 305 7.528 3.064 30 40 1.070 fLô"37
Q Distrito da Encruzilhada 440 104.616 27.342 1.428 218 4.672 138.716
~
-<
Q.,
Distrito de Santo Amaro 426 61.226 28.564 1.693 471 7.146 99.526
Distrito de Taquary 332 4.861 2.108 100 8 1.752 9.161
O
.... 440 94.894 23.775 1.061 252 6.080 126.502
Distrito do Triunfo
~
Dist. de Nossa Senhora Mãe de Deus 465 5.621 1.599 10 109 7.804
""
~
O
Distrito de Cahy 381 23.417 7.618 517 181 3.002 35.116
~ Dist. de Nossa Senhora dos Anjos 480 7.516 5.305 262 41 1.090 14.694
....:l
...:: Distrito de Viamão 981 35.487 5.673 216 58 502 42.917
O Dist. de Santo Antônio da Serra 791 10.457 2.914 44 10 86 14.302
f-4
~ Dist. de Nossa Senho:a da
O
f;l.. Conceição da Serra 416 8.485 2.252 167 69 406 11.793
12.455 639.164 186.470 9.371 1.926 32.945 882.331
(37).

(37). - Correspondência com os Governadores - Arquivo Nacional, Cod. 104,


- 390-

vel, a dv trigo. Os gêneros de consumo estritamente local tinham uma


produção insignificante. Apresentamos a seguir a tabela V que alem
de conter dados sobre a produção tritícola no ano de 1787, contem da-
dos sobre a estrutura dos meios de transportes com os quais se promo-
viam o escoamento dessa produção. Por aí se pode ver que a produção
total de todo o Continente era apenas de 106.794 alqueires de trigo e
os agricultores contavam para elabora-la e transporta-la com 613 car-
ros de bois e 157 carretas.

TABELA v.

SITUAÇÃO DA AGRICULTURA NO TRIGO NO ANO DE 1787.

Distrito Produção
de Trigo Carros Carretas
(Alqueire)
São Pedro 9.694 49 7
Povo Novo 7.472 43 4
Serro Pelado 8.708 38 7
Estreito 15.848 56 10
Mostardas 14.126 39 58
Madre de Deus 3.316 44 2
Nossa Senhora dos Anjos 4.534 18 13
Viamão 6.127 35 6
Cahi 6.166 45 6
Lombas 8.233 44 9
Nossa Senho~a do Rosário 4.936 39
Povo do Coito 2.378 21 3
Cachoeira 2.195 19 12
Encruzilhada 2.321 19 11
Taquarí 5.884 49
Santo Amaro 2.955 14
Triunfo 1.901 41 9
TOTAIS 106.794 613 157

(38). - Ibidem. Cod. 104,


FAZENDAS DO PARANÁ PROVINCIAL (*).

ALTIVA PILATTI BALHANA


CECILIA MARIA WESTPHALEN
da Universidade Federal do Paraná.

Introdução.

A presente Comunicação está inserida na linha de pesquisa do


Departamento de História da Universidade Federal do Paraná que
objetiva o estudo das estruturas econômicas e sociais do Paraná tra-
dicional. Assim, constitui uma etapa parcial.
No início do século XVIII, os moradores de Paranaguá já haviam
introduzido as primeiras cabeças de gado nos campos de Curitiba.
Em decorrência das necessidades de abastecimento das Minas Ge-
rais, alí se formaram fazendas e sítios, com base no criatório de gado
vacum, que se estenderam e ocuparam os campos de Curitiba e os
Campos Gerais. As necessidades de suprimento dos mercados mineiro
e paulista levaram tambem os criadores de gado do Paraná a dedica-
rem-se à condução e invernagem das tropàs de muares, vindas do Rio
Grande do Sul para as feiras de Sorocaba. Essa atividade teria su-
plantado a primeira, tornando-se os paranaenses antes tropeiros do
que criadores de gado.
Mas, até que ponto foi realmente abandonado o criatório pelos
moradores da s.a Comarca?
Este trabalho procura contribuir para a clarificação deste pro-
blema, pelo estudo quantitativo das fazendas existentes no Paraná, lo-
go após a sua emancipação provincial e justamente na conjuntura em
que o comércio de tropas atingia o seu optimum na feira de Sorocaba,
bem como pelo estudo quantitativo da criação de gado miudo e graudo
nos campos do Paraná.
(*). - Comunicação apresentada na 111
- 392-

o trabalho, na realidade, é mais amplo, pois que, na sua última


etapa, objetiva o estudo da repartição da propriedade no Paraná Pro-
vincial, identificando quantitativamente as fazendas e sítios existentes,
terrenos ocupados e incultos, produtos cultivados, tropicais e alimen-
tares, criação de gado miudo e graudo, valor das propriedades e da
sua produção, trabalhadores empregados, livres e escravos.
Será completado na medida do término do levantamento das fon-
tes disponíveis, encontradas sobretudo no Departamento do Arquivo
do Estado do Paraná.

As fazendas da Província.

Daniel Pedro Müller, em seu Quadro Estatístico, aponta a exis-


tência de 88 fazendas de criar, na 5. a Comarca, e de mais 2 ainda em
formação. Estas últimas, localizadas em Guaratuba, não serão con-
sideradas neste trabalho, nem aquelas que posteriormente aparecem
em Antonina. Nestas vilas do litoral não teve expressão o criatório.
A área abrangida era, em 1836, a dos campos de Curitiba, Prín-
cipe e Castro.

Comarca de Paranaguá e Curitiba


Número de fazendas em 1836 *
Localidade
Curitiba 38
Príncipe 13
Castro 37
Total 88
* Fonte Daniel Ped.o Müller

Era esta, no entanto, a conjuntura da ocupação dos campos de


Guarapuava, seguida por aquela dos campos de Palmas, realizadas
entre 1820
- 393-

Província do Paraná
Número de fazendas em 1958 ...
Localidades N9
Curitiba 15
São José dos Pinhais 13
Lapa
Rio Negro 4
Ponta Grossa 13
Castro 14
Tibagí 10
J aguariaiva 13
Guarapuava 35
Palmas 37
Total 154
... Fonte Francisco Liberatto de Mattos
= Desconhecido.

o número de estabelecimentos havia duplicado, porem o que é


mais importante, esta duplicação se fizera pela organização de fa-
zendas de criar nos campos de Guarapuava e Palmas. Estes campos
concentravam já 46% do número de fazendas, e 49% do número to-
tal das cabeças gado em criação, que era de 288.000.
Em 1860, o Presidente José Francisco Cardoso apresenta o re-
banho do Paraná como "em cerca de 41.000 cabeças", cUra inacei-
taveI para a totalidade das fazendas do Paraná. Porem, ele já obser-
vava que o criatório havia ganho os campos de Guarapuava e Palmas.

"Em todo o município de Guarapuava e especialmente na


freguesia de Palmas, assim como parte da de Castro, é a indústria
criadora aquela que maior riqueza representa. Se houvesse mé-
todo e sistema e se procurasse o melhoramento das raças, alí tão
degeneradas, sem dúvida a criação cresceria de valor" (1).

Neste momento era voz geral o definhamento dos campos e dos


gados do Paraná.
Nas suas Mem6rias sobre o estado da agricultura na Província
do Paraná, José Mathias Ferreira de Abreu tambem dizia em 1860
que, embora "a paixão dominante e talvez característica hereditária"
da população do interior paranaense que considerava a criação de

(1). - Re/at6rio do Presidente José Francisco Cardoso, em 19 de março


de 1860,
- 394-

animais como "a mais bela e nobre", o estado de atrazo em que se


encontrava era notório pela

"falta de instrução especial e falha até dos rudimentos da


veterinária". Eram "igno-ados os méto::los e as operações espe-
ciais para conservar e propagar as raças" (2).

Pelo declínio dos campos e das raças, o Barão de Tibagí, tam-


bem em 1860, observava que a criação de gado "com muito trabalho
não dá !loje uma recompensa de 5 % "o As fazendas do Paraná que
cobriam uma área de campo "para mais de 400 léguas de superfície",
produziam em média anualmente cerca de 13. 666 cabeças de gado
vacum. B certo que nessa área pastavam tambem aproximadamente
30.000 destinadas a Sorocaba (3).
O Departamento do Arquivo do Estado do Paraná conserva cs
originais do levantamento geral ordenado pela presidência da Provín-
cia no final de 1864, sobre a situação do criatório paranaense, nos
anos de 1862 a 1864.
o levantamento foi realizado pelas Câmaras Municipais, através
dos inspetores de quarteirões e com estes originais (4) puderam ser
organizadas as tabelas que seguem acerca do número de fazendas e
sua frequência por número de cabeças criadas, considerados os gados
vacum, cavalar e muar, como gado graudo, e os gados lanígero e
suino, como gado miudo.
Por esse levantamento, o número de fazendas sofre alterações evi-
dentes pelo que se refere ao município de Ponta Grossa, onde de 13
fazendas existentes em 1858, aparecem agora nominalmente referidas
37 fazendas para Ponta Grossa, e 30 fazendas para a sua freguesia da
Palmeira, revelando grande fraccionamento da propriedade pastoril
nos Campos Gerais.
Na Lapa, ou se.ia no Príncipe, tambem é evidente o fracciona-
menta, pois para as 13 fazendas do Príncipe encontradas por Daniel
Pedro Müller, estão agora presentes 44 fazendas para a Lapa e a fre-
guesia do Rio Negro.

(2). - Mem6rias de losé Mathias Fert'eira. Of/ícios, 1860.


PROVINCIA DO PARANÁ
CRIAÇÃO DE GADO VACUM
Número de fazendas *

NQ de
cabeças Curitiba Lapa Rio Negro Ponta Grossa Castro Palmeira Palmas Guarapuava Total %
62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64

0- 99 18 18 18 32 32 32 3 3 3 28 29 29 18 19 19 2 2 2 - 102 104 104 43,7 44,6 44,6


100-199 4 4 4 3 3 3 6 5 5 9 6 5 6 6 4 28 24 24 12,0 10,3 9,0
200-299 2 2 2 2 2 2 2 4 5 5 5 5 12 14 15 5,0 6,0 6,4
300-399 5 5 4 5 4 3 1 1 11 10 9 4,7 4,3 3,8
400-499 1 1 3 3 4 6 7 8 4 4 4 4 3 18 19 17 7,7 8,0 7,3
500-999 2 2 4 4 4 15 15 17 3 3 2 24 24 24 10,2 10,2 10,2
1000-1499 - 1 2 2 3 8 8 9 19 18 18 30 28 32 12,8 12,0 13,7
1500-1999 - 4 5 6 4 6 6 1,7 2,5 2,5
2000-2999 3 3 3 4 4 5 1,7 1,7 2,1
,.
Total 18 18 18 36 36 36 8 8 8 37 37 37 40 40 40 30 30 30 31 31 31 33 33 33 233 233 233 100,0 100,0 100,0

* Não foram computadas as


PROVINCIA DO PARANA
CRIAçÃO DE GADO SUINO
Número de fazendas •

NQ de Lapa Rio Negro Ponta Grossa Castro Palmeira Palmas Guarapuava Total %
cabeças 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64
O- 9 6 14 13 32 31 31 --1 1 1 1 40 47 47 18,6 21,9 21,9
10- 19
20- 49 3 3 2 1 1
20 13 14
11 10 9
2 1
3. 5 , 3 3 1
12 10 6
25
30
17
29
15
23
11,6
14,0
7,9 6,9
13,5 10,6
50- 99 23 21 14 1 1 1 11 12 16 4 4 3 4 4 4 43 42 40 20,0 19,5 18,7
100-199 8 10 17 4 4 2 3 2 2 3 4 5 23 22 24 25 24 21 66 66 71 30,7 30,7 33,1
200-499 2 2 3 2 2 4 1 1 1 1 1 3 4 3 3 4 7 11 14 19 5,1 6,5 8,8
Total 36 36 36 8 8 8 37 37 37 40 40 40 303030 31 31 31 33 33 33 215 215 215 100,0 100,0 100,0

• Não foram computadas as fazendas de Curitiba e de São José dos Pinhais


PROVtNCIA DO PARANA
CRIAçÃO DE GA DO CAVALAR
Número de fazendas *

N9 de Lapa Rio Negro Ponta Grossa Castro Palmeira Palmas Guarapuava Total %
62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64

0- 9 36 36 36 8 8 8 28 29 29 22 22 22 1 2 2 1 1 1 1 1 1 97 99 99 45,4 46,0 46,0


10- 19 1 1 1 3 3 3 5 4 4 --- --- 9 8 10 4,1 3,7 4,8
20- 49 7 6 6 14 13 11 10 10 10 --- -~- 31 29 27 14,4 13,5 12,6
50- 99 1 1 1 1 9 8 8 1 1 1 --- II 11 11 5,1 5,1 5,1
100- 199 1 1 1 4 5 5 --- --- 5 6 6 2,3 2,8 2,8
200- 499 1 1 1 4 2 2 1-- 6 3 3 2,8 1,4 1,4
500 999 --- 16 12 11 18 16 14 34 28 25 15,8 13,2 11,6
1000-1499 --- 4 9 10 5 7 9 9 16 19 4,1 7,4 8,8
1500-1999 --- 3 4 3 2 3 3 5 7 6 2,3 3,2 2,8
2000-2999 --- 2 2 3 6 6 6 8 8 9 3,7 3,7 4,1
Total 36 36 36 8 8 8 37 37 37 40 40 40 30 30 30 31 31 31 33 33 33 215 215 215 100,0 100,0 100,0

* Não foram computadas as fazendas de Curitiba e de São José dos Pinhais


- 398-

Castro, porem, conserva relativo equilíbrio, pois que apresen-


tando 37 fazendas em 1826, 37 em 1858 quando englobava Tibagí e
J aguariaiva, possui agora em 1862 a 1864, 40 estabelecimentos de
criar. Tambem, em Curitiba parece estavel o número de fazendas de
criação. A criação do gado vacum, seguida pela do gado cavalar, foi
a grande ocupaçãó das fazendas paranaenses.
Analisando a distribuição do gado vacum, por número de cabe-
ças por fazenda, observa-se que 45 % das fazendas criavam menos de
10e animais, 55% menos de 200 animais, 73% menos de 500 ani-
mais, 83% menos de 1.000 animais, 96% menos de 1.500 animais,
e somente 4 % realizavam o criatório de 1.500 a 2. 999 animais.
Observa-se tambem que as fazendas de grande criatório estavam lo-
calizadas sobretudo em Guarapuava e Palmas e, em menor escala, na
Palmeira e Castro. A pequena criação realizava-se nos campos de
Curitiba, Lapa, Rio Negro e Ponta Grossa.
Deve ser referido que não foi ainda possivel determinar o nú-
mero de fazendas de São José dos Pinhais, onde se realizava grande
criação de gado vacum.
No caso do gado cavalar, verifica-se a mesma observação, o gran-
de criatório, superior a 200 animais, estava praticamente concentrado
nas fazendas de Palmas e Guarapuava.
Com a criação do gado muar, cujo número em geral é baixo, ou
seja 56% das fazendas criando menos de 10 cabeças, e 99% criando
menos de 100 cabeças, tambem se verifica que os estabelecimentos com
maior número de animais, concentram-se em Palmas e Guarapuava e,
em parte apenas, na Palmeira e Castro.
Por sua vez, com o gado suino, embora a grande criação esteja
tambem em Palmas e Guarapuava, há maior proporcionalidade na re-
partição das faixas do número de cabeças criadas, e na sua distribui-
ção geográfica.

o gado.

O número total de cabeças de gado miudo e graudo criado na


Província do Paraná, em 1858, era de 227.922. A média verificada
nos anos de 1862 a 1864 foi de 229.486 cabeças, revelando um certo
estágio estacionário entre os dois momentos da observação. Estágio
que, na verdade, constitui uma regressão no criatório de gado vacum,
ocorrida sobretudo nos rebanhos de Castro, Ponta Grossa e Palmeira.
Apenas o rebanho vacum de São José dos Pinhais
PROVÍNCIA DO PARANA
CRIAÇÃO DE DE GADO MUAR
Número de fazendas *

NO de Curitiba Lapa Rio Negro Ponta Grossa Castro Palmeira Palmas Guarapuava Total %
cabeças
62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64 62 63 64

0- 9 18 18 18 36 36 36 8 8 8 32 30 32 31 30 30 3 3 2 3 2 2 1 2 132 128 130 56,9 55,3 56,2


10- 19 --- 4 4 4 4 6 6 6 6 7 4 4 3 20 21 8,5 9,0 9,0
20- 29 --- I 2 3 3 3 3 4 3 10 9 10 4 4 2 21 22 19 9,0 9,4 8,1
30- 39 ---- I 1 7 6 5 7 9 8 6 6 6 21 22 20 9,0 9,4 8,5
40- 49 ---- 4 5 4 3 3 4 7 7 9 14 16 17 6,0 6.8 7.2
50- 99 ---- 7 6 9 3 3 3 11 11 9 21 20 21 9,0 8,5 9,0
100-199 ---- 2 2 3 2 2 3 0,8 0,8 1,2
200-299 ---- I 1 2 2 2 0,8 0,8 0,8

Total 18 18 18 36 36 36 8 8 8 37 37 37 40 40 40 30 30 30 31 31 31 33 33 33 233 233 233 100,00 100,00 100,00

* Não foram computadas as fazendas de São José dos Pinhais.


PROVINCIA DO PARANÁ
CRIAçÃO DE GADO
Número de cabeças

1862 1863 1864


Localidades
Vacum Muar Cavalar Lanig. Suino Vacum Muar Cavalar Lanig. Suino Vacum Muar Cavalar Lanig. Suino

Curitiba 880 300 3.000 880 340 3.200 910 370 3.350
São José 11.397 2.943 2.248 444 4.661 11.562 4.879 2.706 441 4.851 12.678 3.256 3.158 565 5.565
Lapa 2.230 2.948 3.150 3.345 3.150 3.644
Rio Negro 920 1.227 920 1.380 920 1.535
Palmeira 10.760 881 1.809 98 1.550 12.347 962 1.792 120 1.794 13.979 1.105 1.961 128 2.082
Ponta Grossa 2.826 73 250 120 506 2.508 152 240 105 427 2.594 83 134 105 498
Castro 7.498 176 561 180 390 7.645 164 491 230 620 7.855 183 589 440 710
Guarapuava 40.850 1.830 40.765 900 4.660 43.350 1.805 43.884 1.270 5.220 46.440 1.930 46.885 1.730 5.970
Palmas 25.380 1.100 30.947 900 3.630 26.975 1.265 33.695 1.415 3.585 28.586 1.405 35.283 1.700 5.135

Totais 102.741 7.003 76.880 2.642 22.572 109.337 9.227 83.148 3.581 24.422 117.112 7.962 88.380
PROVíNCIA DO PARANA
CRIAÇÃO DE GADO
% de cabeças sôbre o total

Vacum Muar Cavalar Laníngero Suino


Localidades
1862 1863 1864 1862 1863 1864 1862 1863 1864 1862 1863 1864 1862 1863 1864

Curitiba 0,8 0,8 0,7 0,3 0,4 0,4 13,1 13,0 11,6
São José 11,0 10,5 10,8 42,0 52,8 40,8 2,9 3,2 3,5 16,8 11,4 12,1 20,4 19,8 19,3
Lapa 2,1 2,8 2,6 12,9 13,6 12,6
Rio Negro 0,8 0,8 0,7 5,3 5,6 5,3
Palmeira 10,4 11,2 11,9 12,5 10,4 13,8 2,3 2,1 2,2 3,7 3,3 2,7 6,8 7,3 7,2
Ponta Grossa 2,7 2,2 2,2 1,0 1,6 1,0 0,3 0,2 0,1 4,5 2,9 2,2 2,2 1,7 1,7
Castro 7,2 6,9 6,0 2,1 1,7 2,2 0,7 0,5 0,6 6,8 6,4 9,4 1,7 2,5 2,4
Guarapuava 39,7 39,6 39,6 26,1 19,5 24,2 53,0 52,7 53,0 34,0 32,9 37,0 20,4 21,3 20,7
Palmas 24,7 24,6 24,4 15,7 13,7 17,6 40,2 40,5 39,9 34,0 39,5 37,0 15,9 14,6 18,8

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
PROVíNCIA DO PARANÁ
CRIAÇÃO D E GADO
Número de cabeças

GADO GRAUDO GADO MIUDO TOTAL


Localidades
1862 1863 1864 1862 1863 1864 1862 1863 1864

Curitiba 1.180 1.220 1.280 3.000 3.200 3.350 4.180 4.420 4.630
São José 16.588 19.147 19.092 5.105 5.292 6.130 21.693 24.439 25.222
Lapa 2.230 3.150 3.150 2.948 3.345 3.644 5.178 6.495 6.794
Rio Negro 920 920 920 1.227 1.380 1.535 2.147 2.300 2.455
Palmeira 13 .450 15.101 17.045 1.648 1.914 2.210 15.098 17.015 19.255
Ponta Grossa 3.149 2.900 2.811 626 532 603 3.775 3.432 3.414
Cast~o 8.235 8.300 8.627 570 850 1.150 8.805 9.150 9.700
Guarapuava 83.445 89.039 95.255 5.560 6.490 7.700 89.005 95.529 102.955
Palmas 57.427 61.935 65.274 4.530 5.000 7.135 61.957 66.935 72.409

Total 186.624 201.712 213 .454 25.214 28.003


- 403-

Província do Paraná
Criação de gado grau do
1858 Média 1862-64
Gado NQs abs. % NOs. abs. %
vacum 132.860 58,0 109.730 47,0
cavalar 66.762 29,0 83.136 36,0
muar 2.190 1,0 8.064 3,5

o gado muar é que relativamente apresenta maior incremento,


registrando-se grande aumento no rebanho de São José dos Pinhais.
O gado cavalar cresce tambem, mas nos campos de Guarapuava e
Palmas. Aliás, estes campos concentram praticamente toda a criação
de cavalos do Paraná, com 93% dos animais criados.
São José dos Pinhais era o grande criador de mulas, com 45%
dos animais criados, seguido por Guarapuava e Palmas com 39%, e
da Palmeira e Ponta Grossa com 13,5%.
Guarapuava e Palmas criavam 64% do gado vacum, enquanto
que 13,5% estavam nos campos da Palmeira e Ponta Grossa, 11 %
nos de São José dos Pinhais, e 6,7% naqueles de Castro.

Província do Paraná
Criação de gado graudo
1862-1864-%

Localidades Vacum Muar Cavalar


Guarapuava e Palmas 64,0 39,0 93,0
Palmeira e P. Grossa 13,5 13,5 2,5
São José dos Pinhais 11,0 45,0 3,2
Castro 6,7 2,0 0,6
Outras 4,8 0,5 0,7
Total 100,0 100,0 100,0

No gado miudo lanígero observa-se que o rebanho baixou de


2,6% para 1,5% do total de animais criados na Província.
Os campos de Guarapuava e Palmas concentravam tambem, de
1862 a 1864, 71 % dos carneiros e ovelhas, seguidos por São José dos
Pinhais com 13 %, e Castro com 7,5%.
No que respeita ao gado suino, tambem os campos de Guara-
puava e Palmas concentram o maior criatório, com a média anual de
37,2 %, seguidos por São José dos Pinhais com 20%,
- 404-

PROVÍNCIA DO PARANÁ
CRIAÇÃO DE GADO
% sôbre o total

GADOGRAUDO GADO MIUDO


Localidades
1862 1863 1864 1862 1863 1864
Curitiba 0,6 0,6 0,5 12,0 11,4 10,0
São José 8,8 9,4 8,9 20,2 18,9 18,3
Lapa- 1,1 1,5 1,4 11,5 11,9 10,9
Rio Negro 0,4 0,4 0,4 4,8 4,~ 4,6
Palmeira 7,2 7,4 7,9 6,5 6,8 6,6
Ponta G.ossa 1,6 1,4 1,3 2,4 1,9 1,8
Castro 4,4 4,1 4,0 2,2 3,0 3,4
Guarapuava 45,0 44,3 45,0 22,2 23,2 23,0
Palmas 30,9 30,9 30,6 18,2 18,0 21,4

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

No total da criação de gado miudo, carneiros, ovelhas e porcos,


Gua~apuava e Palmas aparecem com 42% do total do criatório, se-
guidas por São José dos Pinhais, Rio Negro e Curitiba, com 31 %, e
pela Lapa com 17 % _

Província do Paraná
Criação de gado miudo
1862-1864-%

Localidades Média 1862 a 1864

Gua-apuava e Palmas 42,0


São José dos Pinhais e Curitiba 31,0
Lapa e Rio Negro 17,0
Ponta Grossa e Palmeira 6,0
Castro 4,0

Total 100,0

Isto posto, observa-se tambem que os maiores criadores de gado


graudo eram Guarapuava e Palmas com 75%, São José dos Pinhais
- 405-

Província do Paraná
Criação de gado graudo
1862-1864-%

Localidade Média 1862-1864


Guarapuava e Palmas 75,0
São J o,é dos Pinhais 9,5
Palmeira 7,5
Diversos 8,0
Total 100,0

Finalmente, observa-se que os campos de Guarapuava e Palmas


CO!lcentravam a criação de 75% do gado graudo, enquanto que os
Campos Gerais contavam apenas com 15%, e aqueles de Curit.ba
com 10%. Guarapuava, Palmas, Palmeira e São José dos Pinhais,
eram os principais criadores.
Província do Paraná
Criação de Gado
% sôbre o total
1862-1864

Região Gado graujo G.ldo miu'o


Cu itiba 10,0 31,0
Campos Gerais 15,0 27,0
Guarapuava e Palmas 75,0 42,0

Total 100,0 100,0

Do gado miudo, 42% estavam em Guarapuava e Palmas, 31 %


nos campos de Curitiba, e 27% nos Campos Gerais, ou seja em Gua-
rapuava, Palmas, São José dos Pinhais, Curitiba, e Lapa .

Conclusão.

Do presente estudo pode concluir-se:

1.0 - Que as grandes propriedades criadoras de gado estavam,


em 1862 a 1864, localizadas no Município de Guarapuava e na sua
freguesia de Palmas, ou seja que a área do grande criatório, quer de
gado graudo como de gado miudo, já se havia deslocado e fixado nos
campos mais a oeste de Guarapuava e Palmas, abandonando-se até
certo pontos os Campos Gerais, área tradicional do criatório parana-
ense. O
- 406-

nova organização na economia do espaço e, pois, mudanças signifi-


cativas, a ponto de poder afirmar-se que nessa conjuntura os Campos
Gerais já haviam perdido sua função como criadores de gado. O gado
miudo ainda em 58% permanecia nas áreas tradicionais, pelo seu
papel no abastecimento imediato de suas populações mais densas.
2. o - Que se achava estacionário o crescimento do rebanho para-
naense.
Era, p.a verdade, uma regressão do rebanho vacum, motivada pela
ausência de hábitos e conhecimentos técnicos, segundo os contempo-
râneos. Entretanto, registrou-se aumento nos rebanhos de gado muar
e cavalar. Observações complementares permitem afirmar provisoria-
mente que se tratava de problemas de mercado, o qual, na conjun-
tura, demandava maior número de cavalos, éguas, e mulas, do que
gado vacum.
3. 0 - Houve aumento no número de propriedades destinadas ao
criatório, não só pela sua expansão espacial, mas pelo fraccionamento
das propriedades, sobretudo na área tradicional dos Campos Gerais,
o que está por certo relacionado, à diminuição do criatório nestes cam-
pos.
4. o - Embora a degenerescência das raças, e o fraccionamento
das propriedades, contudo a criação de gado constituia ainda um gran-
de negócio que, em certa medida, revelava a adaptabilidade dos pa-
ranaenses às exigências do mercado pelo incremento da criação de
gado cavalar.
5. 0
A OCUPAÇÃO TERRITORIAL DA VILA DE ITA-
BAIANA: A DISPUTA ENTRE LAVRADORES E
CRIADORES (*).

MARIA TRETIS NUNES


do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade Federal de Sergipe

A Vila de Itabaiana foi, indiscutivelmente, uma das mais antigas


unidades político-administrativas em que se dividiu o território sergi-
pano, então subordinado à Capitania da Bahia.
Divergem os historiadores quanto à data de sua criação, embora
cremos que a razão se encontre com Felisbelo Freire quando afirma
ser a criação de vilas em Sergipe uma decorrência da autonomia que
lhe foi conferida com a elevação, em 1696, à categoria de Comarca
desligada da Bahia. Argumenta ele com a Portaria de D. João de
Lancaster, de 20 de outubro de 1687, dirigida ao Dr. Diogo Pacheco
de Carvalho, primeiro Ouvidor de Sergipe:

"tanto que Vmce. receber esta, vá logo ao lugar denomi-


nado de Itabayana e Lagarto a formar duas villas, escolhendo
para isso os sitios mais acomodados e fazendo que os moradores
desta Capitania queiram fazer a casa da Camara e cadeia a
sua custa" (l).

Eram bens extensos os limites territoriais da Vila de Itabaiana,


abrangendo uma área consideravel do território sergipano, conforme
se evidencia pela primeira descrição dela conhecida, feita em 30 de

(*). - Comunicação apresentada na 1\1 Sessão de Estudos, Equipe C,


no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Freire (Felisbelo), História Territorial do Brasil, 19 volume,
pág. 300. Rio de Janeiro, 1909.
- 408-

janeiro de 1757 por sua Câmara Municipal, atendendo a uma exigên-


cia do Governo da Bahia a esses órgãos legislativos sob sua jurisdição:

"Esta Villa de S. Antonio e Almas de Itabayana esta edifi-


cada em hua grande planice hua legoa distante da Serra do
mesmo nome, e seo termo confina com o da Villa do Lagarto
pra o Ocidente, e divide pelo rio Vasabarris, pouco abundante
de agoas correntes, o qual tem o seo nascimento no ce:tão da
Freguezia de S. JO~.m do Girimoabo: da parte do nascente con-
fina com o districto da Villa de Santo Amaro pelo ~io de Ser-
gipe, que não tem agoas senão as que recebe das chuvas de
inverno, e só neste tempo corre: para a parte Sul confina com
otro da cidade de Sergipe de El-Rey, sua Capital, da qml dista
dez legoas, e a mesma distancia ha desta Villa a do Laga!·to c do
Santo Amaro: para o certão confina com terras disertas do
Sertão de Ge imuabo; e para esta corre hum pequeno riacho
chamado Jacoca, que termina o seu curso no Vasa barris, ha mais
otro riacho, Jacarasica, que tcm seo nascimento no termo desta
Villa, e atravessando muita parte do seo continente, fenese o seo
curso no rio de Sergipe, e não ha nesse hum rio navegavel neste
districto" (2).

Esses limites vão coincidir com a descrição feita pelo Dr. José
da Matta BacelIar, o último Ouvidor de Sergipe antes da Carta Régia
de D. João VI, de 8 de julho de 1820, que elevou essa Comarca à
categoria de Província independente da Bahia. Num trabalho intitulado
Relação 4.breviada da Cidade de Sergipe dEI Rey, Povoaçoens, Villas
e suas denominações pertencentes à mesma Cidade, e sua Comarca,
datado de 8 de maio de 1817, assim ele descreveu:

A Villa de Itabaiana está situada huma legoa ao Norte da


grande Serra do mesmo nome. Tem huma só Parochia dedicada
a Santo Antonio e Almas, essa dista da Cidade de Sergipe d'E]-
Rey doze lego as e tem o seo termo de extensão vinte le50as de
Norte a Sul, contadas do rio do Sal, qea divide do te:-mo de
S. João de Je~emoabo, Comarca da Bahia, ao Rio Ve-melho que o
divide com o termo da cidade de Sergipe d'El-Rey; e dez legoJs
contadas de Leste a Oeste do Rio Sergipe, q-a separa do Termo

(2). - Lima Júnior (Francisco Antônio de Carvalho), Monografia His-


t6rica do Município de Itabaiana. In "Revista do Instituto Histórico e Geográ-
fico de Sergipe",
- 409-

da Vil!a de Proprihá, ao rio Vazabarris, q- lhe serve de diviza


com a Villa do Lagarto" (3).

Assim, inicialmente, abrangia a Vila de Itabaiana uma área de


cerca de 200 léguas quadradas. Sua ocupação territorial começou logo
após a fixação da colonização portuguesa em Sergipe, como resultaclo
do êxito de Cristovão de Barros na investida contra os íncolas da
reg:ão nos começos de 1590. Comprovam essa afirmativa as sesma-
rias concedidas a diversos proprietários já datadas dos primeiros anos
do século XVII.
Lento, porem, foi o desenvolvimento da Villa, prejudicado pela
passagem do holandês. As fazendas de gado que, prósperas, começa-
vam a desenvolver-se, foram destruidas ora pelos portugueses, ora pe-
los holandeses, ante a disputa do território sergipano na época de
Nassau. Barleus, o historiador da aventura flamenga no nordeste bra-
sileiro, refere-se à prosperidade que ° gado apresentava nas bandas
de "Itapuana", como denomina ele a Itabaiana. Será a agricultura
que, aos poucos, vai fixando o colono à terra com as plantações de
algodão, mandioca e legumes. Tambem vinha constituindo-se um ar-
tezanato, utilizando o algodão, do qual saiam tecidos grosseiros e re-
des, yue vão garantir a subsistência das famílias aí residentes. Um
próspero comércio, decorrente dessas fabricações, se iniciou através de
negociantes que percorriam os sertões da Bahia, Pernambuco e Ceará
levando aqueles produtos. A cana se desenvolveu nos vales férteis dos
rios Sergipe e Jacaracica.
D. Marcos Antônio de Souza, na Memória sobre a Capitania de
Sergipe, datada de 1808, quando já era vigário de Nossa Senhora da
Vitória na Bahia, após ter sido, em Sergipe, na Freguezia de Pé do
Banco (hoje Sirirí), traçou um quadro pessimista de Itabaiana ao es-
crever:

"na villa quasi deserta e seo termo se contam nove centos e


noventa e nove habitantes, entretanto pessoas de todas as classes.
Estes são os mais pobres de toda a Coma:ca e apezar de haver
quatorze engenhos de assucar, que embarcam suas duzentas cai-
xas no po;to de S. Anna e um d'el1es no de Itaporapga, contudo
são muitos diminutos os seos productos. Criam pouca porção

(3). - Bacellar (José da Matta) , Relação abreviada da Cidade de


Sergipe d'EI Rey, Povoaçoens, Villas e suas denominações pertencentes à mesma
Cidade, e sua Comarca. Arquivo do Instituto Histó,ico
- 410-

de gado, que não chaga para a sustentação dos habitantes, e da


mesma forma a mandioca e legumel> que plantam" (4).

Somos levados à discórdia dessa descrição pouco animadora tra-


çada pelo futuro bispo do Maranhão, e ficar com Clodomir Silva,
quando, no Album de Sergipe - 1920, afirma que, em 1775, a po-
pulação da Vila de Santo Antônio e Almas de Itabaiana possuia 220
fogos com uma população de 1.010 habitantes (5). Já para o ano de
1808, o mesmo autor encontra 6. 364 dos 72.236 que D. Marcos de
Souza calculara ter Sergipe naquela época. Carvalho Lima Júnior de-
monstra que , nos princípios do século XIX, era Itabaiana bastante
povoada na zona compreendida entre os rios Sergipe e Vaza-Barris,
com núcleos de população até a fralda da Serra do mesmo nome,

"e em toda cordilheira desde Se:ra Comprida, até Serra


Redonda, povoadas e cultivadas as terras das Flexas, Pé do Vea-
do, Moita, Malha,da Vermelha, Quizongo, Campo do Brito, Ca-
rangao, rios Sergipe, Jacaracica, Salgado, Jacoca e Vasa-Barris,
etc., com fazendas de criação de gado até os sertões de São
Matheus, Contendas e os limites com Geremoabo Bôa Vista até
encontrar Porto da Folha, e de se:ras abaixo prosperava a la-
voura da cana de açucar" (6).

A sede da Vila (onde hoje se encontra a cidade de Itabaiana) es-


tava situada

"em Tabuleiros arenozos tão improprios de plantação que


apenas produzem a lavoura de mandioca com excessivo trabalho
dos habitantes" (7).

Eram esses terrenos conhecidos desde os primórdios da coloni-


zação como caatinga de Aires da Rocha, exigindo dos agricultores adu-
bos para a aquisição dos quais não tinham eles recursos financeiros dis-
poníveis. Mas na circunferência destes tabuleiros ficavam "mattas fres-
cas", onde as terras eram férteis e

(4). - Souza (Marco Antônio de), Mem6ria sobre a Capitania de


Serzipe, Anno 1808, pg. 30. Aracaju, 1944.
(5). - Silva (Clodomi:), A/bum de Sergipe - 1920, pgs. 42 e 43.
(6). - Lima Júnior (Francisco Antônio de Carvalho), Obra citada,
pg. 140.
(7). - Informação prestada pela Câmara da Vila de Itabaiana ao
Conselho Geral da Província em 4 de outubro de 1830.
- 411-

"se poderiam fazer as plantações sem a necessidade dos cer-


cados que tanto as encareciam".

Alem do que, produziam

"toda a qualidade de legumes, e algudões entanto, em aio r


abundância que qual quer hum lugar desta Provincia" (8).

À medida que a agricultura ia desenvolvendo-se "em aberto", fi-


xando o colono e, assim, ocupando,territorialmente, uma grande parte
da Villa na base da pequena propriedade (os sítios), que ainda hoje é
a característica marcante do município de Itabaiana, se deu o choque
entre lavradores e criadores. Estes, e até mesmo os das vilas vizinhas,
se deslocavam, principalmente, no estio quando se tornava dificil man-
ter o gado nas caatingas.
J á nos fins do século XVIII, se anunciaram os primeiros sinais
do embate, conforme evidenciam as providências tomadas pelas auto-
ridades portuguesas para contorna-lo. Assim, em agosto de 1779 o
Governador da Capitania da Bahia, o Marquês de Aguiar, recebeu or-
dens pa:a mandar o Ouvidor de Sergipe proceder a demarcação entre
as terras que se prestavam à agricultura e as que se prestavam à pe-
cuária. Procedida a verificação, reuniu-se essa Autoridade com a Câ-
mara da Vila de Itabaiana, e em comum acordo ficou deliberado que

"de serra abaixo senão poderião trazer' gados soltos; e que


quem os quizece conservar embeneficio da sua lavoura, faria
pastos cercados; podendo os lavradores plantarem em aberto: e
que no Terreno da Serra assima que hera proprio para a Cria-
ção de gados, poderião estes andar soltos; e qualquer Habitante
que quizesse fazer plantações, cercaria suas Lavouras com cer-
cas fortes e dobradas" (9).

Mas o desenvolvimento, tanto da agricultura como da criação, fez


que essas demarcações fossem ultrapassadas. Em 1814, o problema
se agravou levando a

(8). - Ofício dirigido pela Câmara da Vila de Itabaiana ao IUmo. e


Exmo. Snr. Presidente da Província Ignácio José Vicente da Fonseca em
17 de novembro de 1828. A~quivo
- 412-

"Conselho os Povos deste Termo, tanto criadores, como la-


vradores, em Audiencia Ge:al, com assistencia do Ouvidor Ge-
rai" (10),

em busca de uma solução para o caso, invocando-se o Alvará Real do


século anterior que proibia a criação até léguas do litoral. Alegavam
os agricultores que a zona "das matas" se encontrava dentro desses li-
mites.
Numa demonstração do papel desempenhado pelas Câmaras Mu-
nicipais na \!volução política de Sergipe, ficou deliberado, nessa reu-
nião, a retirada do gado, que perturbava as plantações, das "matas"
para as caatingas. Era estabelecida uma muIta de dois a seis mil réis
para cada cabeça de gado, cujo dono infringisse tais determinações.
Essa resolução foi encaminhada ao então Príncipe-Regente D. João,
que a confirmaria por Provisão de 10 de junho de 1816.
Minoritários na Câmara Municipal da Vila de Itabaiana e, incon-
formados com essa decisão, os Criadores apelam para o Rei em 1817,
liderados pelo Capitão João de Campos Telles. Procuram demonstrar
"a força e violência, e esbulho" que contra eles havia sido praticada
pelo Ouvidor da Comarca de Sergipe, Dr. José Teixeira da Matta
Bacelar, unido à Câmara Municipal, obrigando-os a

"extinguirem as suas Fazendas de Gado Vaccum e Cavalar


com o pretexto de damnificarem as lavouras dos habitantes do
mesmo Destricto".

Responsabilizaram pela decisão favoravel aos interesses dos la-


vradores, a influência na política sergipana do Pe. Alexandre Pinto
Lobão, importante agricultor da Vila de Itabaiana e membro desta-
cado de sua Câmara. Invocam, afinal, a nulidade da Provisão de 10
de jur:ho de 1816 e posta em execução em 10 de setembro do mesmo
ano, desde quando não tramitara pela Chancelaria-Mor do Reino e
não pagara os devidos direitos (11).
A Mesa do Desembargo do Paço, para onde foi remetida pelo
Rei essa apelação, reconhece sua improcedência, taxando de "falsas, e
caluminozas" as acusações contra o Pe. Alexandre Pinto Lobão e o
Ouvidor José da Matta Bacellar, embora reconheça que se devia

(lO).
- 413-

"ter expedido antes hua P.. ovizão da confirmação do dito


Provimento, que tranzitasse pela Chancelaria, e pagasse nella os
competentes Direitos, do que hua simples Ordem como alias foi a
'chamada Provizão de 10 de junho de 1816" (12).

Como a delimitação da zona da criação e da agricultura deter-


minasse controvérsias, a Câmara da Vila de Itabaiana se dirigiu a D.
João VI, em 2 de agosto de 1819, solicitando que ele ordenasse uma

"geral demarcação das mattas dignas de plar:tação, e campos


dignos de criar".

Assim se tornava necessário porque

"alguns proprietarios de gado q- pastão nos campos conti-


guos às mmas. Mattas, de alguma forma arroga0 e se querem
utilizai das Mattas das contendas na Real PrQviz~o de V. Mgg. e
e da m. ma fo~ma alguns Lavradores deixando o interior das
Mattas concedidas vem pôr as suas roças em muitas, qu. e Pro-
priam. te são campos proprios da creação dos gados, ou aliás tão
visinho a elles, q- facilm. te são dist:uidos pelos m. mos gados"
(13) .

o Conde da Palma, Capitão e Governador da Bahia, foi incum-


bido pelo Rei de determinar que o Ouvidor da Comarca de Sergipe
desse seu parecer sobre essa solicitação. Como resultado dessa me-
dida, ele informou a D. João VI

"julgar conveniente abem dos Povos, que se faça a demar-


cação",

devendo-se, assim, reservar

"tfez legoas da beira das Mattas para denLo para a Criação,


e dahi para o centro das mesmas Mattas para a plantação de La-

(12). - Anotações feitas à Representação do Capitão João de Campos


Teles e outros, acima citada, pelo Procurado: da Coroa, a quem foi encami-
nhada em 24 de novembro de 1817.
(13). - Ofício da Câmara da Vila de Itabaiana a D. João VI em 3
de agosto de 1819. Arquivo Nacional, Seção
- 414-

vouras". Desse modg, cessariam "as desavenças, eprejuizos dehu-


ma eoutra parte" (14).

Como consequência dessa informação, no ano de 1820 a Câmara


de Itabaiana recebia autorização real para proceder as necessárias de-
marcações.
Desfrutava já a região de tranquilidade

"pelo que entrou vantajosamente a floresce, a Agricultura


e o Comércio e os povos a gozarem os fmctos de seu trabalho".

Prospera a Vila com o aparecimento de Lojas e Armazens

"pela cópia de consumidores que ao mercado delIa concorrem"


(15) .

A crise de autoridade que se abateu sobre Sergipe a partir de


março de 1&21, quando foi deposto Carlos Cesar Burlamaqui, pri-
meiro presidente nomeado por D. João VI para Sergipe após conce-
der-lhe autonomia por Carta Régia de 8 de julho de 1820, influenciou,
porem, para que fosse desrespeitada a decisão da Câmara de Itabaiana
de 1811, referendada pela Provisão de D. João VI datada de 1816.
Em 1826, na presidência de Manuel Clemente Cavalcanti de Al-
buquerque, agrava-se o choque entre lavradores e criadores. Alguns
destes criadores, acobertados pela influência de pessoas importantes na
administração provincial, passaram a deslocar o gado para as "matas"
de Itabaiana, região onde a agricultura já era promissora e importante
para a economia local, pois

"pelo dizimo do gado vacum e cavalar de todo aquele Termo,


incluindo o Terreno em questão não há quem queira dar pelo
biênio, hum conto de réis: e pelo Dizimo das Lavouras exceptuado
o algodão, já se tem dado t~imestramente dous contos e quinhen-
tos mil réis, cotando com as produções do dito Terreno" (16).

(14). - Ofício do Conde da Palma ao Muito Alta e Poderosa pessoa


de Vossa Magestade D. João VI em 2 de agosto de 1820.
- 415-

Dois desses criadores, o Capitão José de Campos Teles e o Te-


nente Manuel Caetano dos Samtos, são conseguir que cesse a proibi-
ção do gado pastar livremente nas região das "matas" de Itabaiana
pelo Aviso de 3 de janeiro de 1826, de Pedro 1. O pedido havia sido
encaminhado ao Imperador com parecer favoravel do Ouvidor Dr.
Joaquim Marcelino de Brito, autoridade ainda desconhecedora dos pro-
blemas regionais, desde quando assumira o cargo em 9 de março do
ano anterior.
Ante o prejuizo que tal decisão trazia à vida da Vila, a Câmara
de Itabaiana encetou uma luta memoravel pela sua derrogação, enca-
minhando, em 6 de dezembro de 1828, uma bem documentada repre-
sentação ao Imperador, por intermédio do Conselho do Governo da
Província, a quem cabia informa-la favoravel, ou não, antes do envio
às autoridades imperiais. Encabeçava o grande número de assinaturas,
o Capitão-mor das Ordenanças de Itabaiana, José Matheus da Graça
Leite Sampaio, o mais importante senhor de terra da Vila e um dos
mais destacados da Província, como se pode evidenciar pela sua par-
ticipação nos acontecimentos que envolveram Sergipe na luta pela au-
tonomia e adesão à independência nacional. Havia sido eleito, junta-
mente com o Dr. José Nunes Barboza Madureira, para deputado à
primeira Assembléia Geral do Império iniciada em 1826. Não chegou
José Matheus a exercer o mandato por motivo de doença já sendo,
na ocasião, de avançada idade, falecendo em janeiro de 1829.
Esse requerimento implorava ao Imperador a

"Graça de ser ratificada a Determinação da Provizão de


dous de Maio de mil oito cento e dezeseis, que confirmou a
Postura da Camara do Destricto, que permittio a Plantação
em aberto nas Mattas d'aquelle termo, prohibibdo n'ellas a
creação de Gados" (17).

O Conselho, depois de examinar os documentos que acompanha-


vam o Requerimento, a esse foi favoravel, devendo, assim, a Súplica
ser

"levada à Impe:ial Presença na forma requerida pois que


a ser permitida a creação de Gados nas ditas terras para o que
não são proprias, arruinar-se-ha inteiramente a Lavoura, de
certo mui ponderoza n'aquelle Termo, e principal fonte de sua

(17). - Ata da Sessão do Conselho de Governo da Província de 30 de


janeiro de 1827. In "Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe",
- 416-

prospeidade e abastança, visto a impossibilidade de ser feita


em cercados pelas razões com verdade expedidas na menciona-
da suplica". Ainda argumentava que "em tal cazo aquella Villa,
que pela Agricultura tem ido em progressivo augmento, irá
immediatamente em deperecimento à falta de generos de per-
muta no mercado, ou feira, que semanariamente, depois da
faculdade de planta em aberto ha muitos annos se acha alli es-
tabelecida. (18).

Em 29 de outubro de 1829, Pedro I tomou conhecimento dessa


Representação. Ficou determinado, nessa ocasião, que ·cab;a às Câ-
maras Municipais estabelecerem em suas Posturas a proibição de ga-
dos soltos, em pastos nas matas de plantação em aberto, em virtude
da Lei de 1.0 de outubro de 1828, título 3, art. 66, parágrafo 5 e 10
(19).
Ao ter conhecimento dessa resposta, imediatamente, a Câmara de
Itabaiana reuniu-se aprovando a proib:ção da existência de gado solto
nas "matas", estabelecendo uma multa de 30$000 a 60$000 aos in-
fratores da mesma (20). Tal resolução foi aprovada pelo Congselho
Geral da Província em sessão de 14 de janeiro de 1830.
Ainda tentaram alguns infratores manter suas prerrogativas basea-
das na prepotência; mas são obrigados a recuar ante a res.istência dos
agricultores itabaianenses, que eram maioria na Câmara Municipal de
sua Villa, e que tinham, mais uma vez, o reforço da decisão favoravel
das autoridades superiores às suas pretensões.
E numa afirmativa da atuação decisiva que, como outras congê-
neres, desempenhou na formação de uma consciência para as reivin-
dicações políticas locais, a Câmara da Villa de Itabaiana, ao encami-
nhar à autoridade que despachara favoravel aos interesses dos criado-
res, acrescentava energicamente:
"porém, Exmo. Senhor, estando esta C:lm:lra enca·Tegada
por Lei de promover o augmento, e felicidade dos CiJaJãos des-
te Município, já mais cederá das Suas attribuições, e nem dei-
xará perder o beneficio Publico a trôco do particular interesse,
e cap:icho de dous homens inimigos asserimos de sua Patria"
(21).

(18). - Idem.
(19). - Ofício dirigido pela Câmara de Itabaiana em 4 de outubro de
1830 a destinatário não especificado no documento. Arquivo Público de Ser-
gipe.
(20).
- 417-

Garantidas as plantações em aberto nas "matas", a agricultura foi


se expandindo, ocupando principalmente as terras do oeste da Vila.
Sua fertilidade chegou a garantir duas colheitas anuais de algodão.

"Alguns p'oprietarios chegaram a colher 6 a 9.000 arro-


bas de algodão herbaceo em caroço em uma safra" (22).

o algodão toma-se o produto mais importante nessa arrancada


dos agricultores de Itabaiana, coincidindo com a grande demanda que
esse produto passa a desfrutar nos mercados internacionais. Assim, a
crise mundial de abastecimento, que o comércio algodoeiro sofre na
década de 1860 a 1870 como consequência da Guerra de Secessão dos
Estados Unidos, já encontrou a cultura do algodão em larga expansão
e prosperidade na zona agrícola de Itabaiana. A alta do preço alcan-
çada, na época, concorreria ainda mais para estimular sua produção.
Decorrente, porem, dessa expansão agrícola

"debastaram-se então as afamadas mattas seculares, que


serviram de pasto ao fôgo destruidor, que devorou as mais pre-
ciosas madei :as de lei, afluindo para lá em busca do salario re-
munerador, jornaleiros de todas as partes, sobretudo simondi-
eiros levados pela fama do novo Eldorado" (23).

o auge da expansão foi atingida a partir de 1870 quando a má-


quina, a vapor, de descaroçar algodão chegou à Itabaiana. Rapida-
mente, se propagou o invento, e, em 1874, o Município contava com
50 vapores, o que influenciou na vida urbana itabaianense, que se
toma cidade pela Resolução 1.331 de 28 de agosto de 1888. Nos
fins do século XIX, já a população do município alcançava 27.000
habitantes (24). Começa a destacar-se nessa época, a partir da insta-
lação de um descaroçador de algodão, uma povoação situada em pleno
centro das "matas" de Itabaiana, num local conhecido como Chã de
Genipapo, e que toma o nome de São Paulo (atual cidade de Frei
Paulo). Seria a primeira pórção do Município de Itabaiana a desmem-
brar-se, formando uma nova unidade política.
Ao mesmo tempo que Itabaiana era atingida pela prosperidade
econômica, iam surgindo núcleos de população que se tomavam cen-

(22). - Lima Júnior (Francisco Antônio de Carvalho), Ob~a citada,


{lg.133.
(23). - Idem, pgs. 133 e 134.
(24). - Silva Lisboa (L. C.), Chorographia do Estado de Sergipe,
pg. 11 O.
- 419-

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- 420-

tros de influência de sua região. À medida que iam crescendo, busca-


vam autonomia política. Assim, a área territorial da Vila, criada nos
idos do século XVII, foi dando origem a novas unidades político-ad-
ministrativas de Sergipe. Dela se desdobraram novos Municípios co-
mo Frei Paulo, Campo do Brito, Carirá, Macambira, Ribeirópolis, Pi-
nhão, Pedra Mole, Moita Bonita, ou complementando outros que se
foram desmembrando dos municípios vizinhos. Ficaria, assim, a an-
tiga Vila de Itabaiana reduzida a 420 Km2, um terço, aproximada-
mente, de sua área inicial avaliada, em 1817, pelo Ouvidor José da
Matta Bacella. ·.
.
íNDIOS E BRANCOS EM CONFLITO PELA
POSSE DA TERRA.
(Aldeia de Água Azeda - século XIX) (*) (**).

BEATRIZ GOlS DANTAS


da Universidade Federal de Sergipe.

INTRODUÇÃO.

o nosso estudo tem como objetivo analisar as relações entre ín-


dios e brancos, particularmente senhores de engenho, em situação de
contato interétnico, numa zona de antiga ocupação e economia agro-
açucareira. Limita-se ao século XIX e, para desenvolve-lo, baseamo-
nos em documentos, sobretudo manuscritos, que fornecem os dados
empíricos para a análise da situação de contato aqui enfocada, a partir
do esquema conceitual de "fricção interétnica" (1), adaptado a uma
reconstrução histórica e às limitações impostas pela fragmentariedade
dos dados disponíveis. Estes nos permitem analisar a situação de con-
tato ao nivel econômico, sobretudo através dos conflitos gerados pela
posse da terra que constitui a patrimônio da aldeia indígena, e ao nivel
político através do poder dos grupos antagônicos.
A documentação por nós consultada representa apenas uma par-
cela do material que sobre o assunto deve existir nos nossos Arquivos

(*). - Comunicação apresentada na 3\1 Sessão de Estudos, Equipe C,


no dia 6 de setembro de .975 (Nota da Redação).
(**). - ABREVIATURAS:
AN - Arquivo Nacional - Rio de Janeiro.
APEB - Arquivo Público do Estado da Bahia - Salvador.
BN - Biblioteca Nacional - Rio de Janeiro.
DHF - Departamento de História e Filosofia - Aracaju.
APES - Arquivo Público do Estado de Sergipe - Aracaju.
(1). - OLIVEIRA (Robe .. to Cardoso de), Problemas e Hipóteses Re-
lativas à Fricção lnterétnica: Sugestões Para Uma Metodologia in "Revista
do Instituto de Ciências Sociais", vaI. IV, no
- 422-

ainda em fase de organização. Baseamo-nos, particularmente, em


manuscritos do Arquivo Público do Estado de Sergipe e em alguns do-
cumentos da Biblioteca Nacional e do Arquivo Nacional.
Este trabalho, que se constitui no resultado parcial de uma pes-
quisa mais ampla sobre o índio em Sergipe, pretende ser uma aborda-
gem preliminar sobre o assunto, que será completada na medida em
que novas fontes forem encontradas.
Na fase de coleta de dados para elaboração desta comunicação,
contamos com a elaboração dos alunos: Ângela Maria Santana Al-
meida, Arlete de Aguiar Pereira Meneses, Carlos Augusto Costa Gar-
cia, Doraleda Vieira Fróis, Iara Moema Barreto, Norma da Cruz Po-
coné e Rui Belem de Araujo.
... ...
...
1. - A ALDEIA DE AGUA AZEDA - SUAS ORIGENS.

Efetuada a conquista de Sergipe nos fins do século XVI, as ter-


ras foram gradativamente ocupadas pelos brancos, enquanto os re-
manescentes indígenas da Capitania eram reunidos em aldeias e mis-
sões, que persistiam encravadas nas áreas de lavoura e pecuária dos
civilizados.
Cerca de quatro léguas de São Cristovão, antiga capital da pro-
víncia, na zona açucareira do Vasa-Barris, ficava a aldeia de Água
Azeda.
Segundo o historiador Felisbelo Freire, o aldeamento tinha uma
certa organizaçã administrativa, desde o governo do Conde de Atou-
guia (1654-1657), época em que a Câmara de São Cristovão se de-
clarava favoravel à sua destruição (2).
Ao que tudo indica, porem, foi preservado e talvez ampliado,
tendo o capitão-mor Jerônimo de Albuquerque, por volta de 1658, to-
mado a

p-ovidência de reunir os índios em uma aldeia, junto


aS. Cristovão de onde devia tirar a força precisa" (3),

(2). - FREIRE (Felisbelo), História de Sergipe. Rio de Janeiro.


1891 p. 165.
(3). - Ibidem, p. 154.
- 423-

para combater os levantes de aborígines e negros que atentavam con-


tra a tranquilidade da Capitania, assaltando inclusive os hab:tantes da
capital.
Assim, a aldeia parecia, pois, constituida de índios pacificadas,
talvez remanescentes dos nativos habitantes da área, que aliados aos
brancos, lutavam em defesa dos interesses destes, expediente aliás usa-
do com frequência pelos conquistadores na ocupação da terra.
Os conflitos armados, nos quais tomavam parte, e as doenças
transmitidas pelos civilizados provocavam decerto uma intensa des-
população entre os habitantes da aldeia (4), cujo contingente popula-
cional precisava ser renovado periodicamente. Desse modo, é que se
explica, talvez, a atuação de Fernão Carrilho que, por volta de 1675,
tendo acompanhado funcionários do Governo em busca das minas de
Itabaiana, diz que:

desceu nesta ocasião uma aldeia de gentio com seu


principal e muitos de arco, e as situou 3 léguas de Sergipe, a
sua custa, sustentando-os e provendo-os a sua custa digo do
necessário ten<lo-os domésticos na minha obediê. cia, p-estes
para as ocasiões que se oferecem contra outros rebeldes ... "
(5) .

Assim, ter-se-ia renovado o contingente populacional da aldeia,


com índios talvez de procedências diversas que, destribalizados, eram
postos a serviço da manutenção da ordem da sociedade colonial envol-
vente.
Ao que parece, ao contrário de outros aldeamentos de Sergipe,
Água Azeda não foi posto sob a tutela de nenhuma ordem relig;osa
específica, sendo assistido no espiritual, ora por padres seculares, ora
por algum missionário disponivel (6), tendo, porem, uma administra-
ção civil com possivel utilização das lideranças nativas manipuladas
pelos civilizados.

(4). - RIBEIRO (Darcy), Os índios e a Civilização, Editora Civili-


zação Brasileira, Rio de Janeiro, 1970, p. 272 seg.
(5). - Registro da Petição do Capitão Fernão Carrilhos in "Docu-
mentos Históricos", Biblioteca Nacional, Rio <le Janeiro, vol. XXIX p.
432-436.
(6). - ABREU (J. Capist:ano de), Capítulos de História Colonial
1500-1800. Livraria Briguiet, 1954. Mapa inserto às pp. 282-283. Pública
forma do Alvará de doação de sesmaria aos lndios de Agua Azeda. Ms. pro-
priedade do Sr. José das Virgens - Aldeia São
- 424-

Durante o século XVIII, registra o historiador Felisbelo Freire


desordens constantes nas aldeias indígenas de Sergipe, ocorrendo no
ano de 1751 um levante dos nativos que, em número de três mil, as-
saltaram a cidade de São Cristovão, fato que se repete alguns anos
mais tarde, em 1763, quando, aliados aos negros, os índios invadem
novamente a cidade (7).
Nesses conflitos, perguntamo-nos, estariam os índios de Água
Azeda entre os rebelados? ou contra estes, integrando as forças de re-
pressão dos civilizados? Não dispomos de documentos que nos per-
mitam uma resposta, mas, de qualquer sorte, essas lutas afetavam
muito diretamente a população nativa, que aí vivia ilhada em meio à
população clvilizada.
Os dados referentes às origens da aldeia, embora esparsos, nos
fornecem alguns pontos de referência, para situa-la no contexto histó-
rico do século XIX e melhor entender o seu relacionamento com o
mundo dos civilizados.

• •

2. - OS lNDIOS E OS BRANCOS NO SECULO XIX.

Adotando a posição teórica, segundo a qual a situação dos grupos


indígenas será melhor entendida se analisada em termos de seu rela-
cionamento com a sociedade envolvente, idéia subjacente à noção de
fricção interétnica (8), tentemos uma reconstituição histórica da so-
ciedade inclusiva, ou mais exatamente de alguns dos seus aspectos
que interferem mais diretamente no seu sistema de relações com o
índio ..

2 . 1. - A sociedade inclusiva - aspectos econômicos e demo-


gráficos.

No início do século XIX, a área do Vasa-Barris e do Poxim,


onde se localizava a aldeia de Água Azeda, podia ser caracterizada co-
mo de antiga ocupação, uma vez que, desde o início do século XVII,

(7). - FREIRE (Felisbello), op. cit., p. 189 e 200.


(8). - OLIVEIRA (Roberto Cardoso de), op. cit .•
- 425-

sesmarias começaram a ser distribuidas aos colonos, seguindo-se a


ocupação da área pelos civilizados (9). Aí foi fundada a cidade de
São Cristovão, centro político e administrativo da Província até mea-
dos do século XIX. Estava, assim, sujeita a forte incremento demo-
gráfico. Era, por outro lado, uma área economicamente dinâmica.
Se inicialmente foram as fazendas de gado o elemento de povoamento,
logo os engenhos se espalharam pelo vale do Vasa-Barris, sem con-
tudo fazer desaparecer o gado, complementar da atividade agro-açu-
careira.

No início do século XIX, D. Marcos Antônio de Sousa registra


na Freguesia as atividades de pecuária e lavoura de subsistência, con-
siderando, porem, que:

"A cultu-a mais consideravel é a da cana, que plantam


nas margens do Vasa-Barris e fazem a manipulação do açucar em
dez engenhos situados nas campinas por onde dirige seu rápido
curso o sobredito rio, que fertiliza os terrenos, que banha qu:mdo
sai do seu leito. ( ... ) Tambem se aplicam a essa lavoura nas
várzeas do Poxim e seus contornos, onde não experimentam a
estagnação das águas, porque este rio ainda que transborde e
alague as suas margens não demora a sua enchente. Todo o fa-
brico do açucar chega a oitocentas caixas que exportam para a
Bahia e em seu troco recebem escravos para os engenhos e mer-
cadorias de Portugal" (lO).

A estrutura economlCa regional repousava assim, basicamente,


numa agricultura comercial voltada para a exportação desenvolvida
com base no trabalho escravo.

A esse respeito é bastante significativa a composlçao demográ-


fica da Freguesia de Nossa Senhora da Vitória (São Cristovão), con-
forme se apresenta no quadro abaixo:

(9). - BEZERRA (FeIte), Etnias Sergipanas, contribuição ao seu


estudo. Livraria Regina Editora. Aracaju, 1950, p. 57.
(lO). - SOUZA
- 426-

POPULAÇÃO DA FREGUESIA DE NOSSA SENHORA DA VITÓRIA - 1802.

B~ancos 1.237
Pardos forros 1.705 População livre 3.524 58%
Pardos escravos 0.503 População escrava 2.517 42%
Pretos livres 0.582 Total 6.041 100%
Pretos escravos 2.014
TOTAL 6.041 Vadios 0.210
FONTE: Autor Anônimo. Descrição Geográfica da Capitania de Sergipe d'EI
Rei Ms B. N. (Xerox do arquivo do DHF da UFS).
OBS. Não está incluida no quad:o acima a população indígem.

Ressalte-se que os escravos representavam 42% da população


local, constituindo-se decerto na mão-de-obra preferencialmente em-
pregada na agro-indústria do açucar. Alem destes, havia muitos par-
dos e pretos livres e, decerto, muitos brancos pobres trabalhando na
lavoura e na pecuária, restando 210 indivíduos sem ocupação regular
definida, apresentados como vadios, indicando que a economia re-
gional não absorvia de modo permanente toda a mão-de-obra dispo-
nivelo Nesse contexto, a mão-de-obra dos aldeados de Água Azeda
parece-nos francamente dispensavel. Tanto assim que os proprietá-
rios de engenho pleiteiam num dado momento a transferência do gru-
po indígena para local bastante afastado, o que não seria plausivel ca-
so necessitassem da força de trabalho dos nativos (11) . Alem do mais,
os estereótipos negativos difundidos entre os regionais a respeito dos
índios, apresentados em documentos da época como: preguiçosos, va-
dios, ébrios, indolentes, errantes (12), tomavam-nos pouco aptos para
concorrer num mercado de trabalho onde a mão-de-obra parecia su-
ficiente.

Desse modo, se a sociedade inclusiva não necessitava da força de


trabalho indígena, os nativos aldeados em Água Azeda representavam
para ela e particularmente para os senhores de engenho, reitores do
sistema político e econômico regional, um estorvo, pois alem dos pre-
juizos que causavam às suas propriedades, conforme veremos opor-

( 11). - Ofício do Presidente da província ao Secretário Geral dos


Negócios do Império. 13/6/1825. Ms. do AN. Xerox do arquivo do DHF da
UFS.
(12). - SOUZA (Marcos Antônio de), op. cit., p. 18 e ANONIMO,
Descrição Geográfica da Capitania de Sergipe, 1802, Ms. da BN. Xerox do
Arquivo do DHF da UFS.
- 427-

tunamente, ocupavam terras que poderiam ser incorporadas ao seu


patrimônio e ampliar as empresas agro-açucareiras.

2 .2. - O grupo indígena.

Tentemos agora uma reconstituição do grupo indígena envolvido


nessa situação de contato interétnico.
Comecemos pelo tamanho do grupo. Os documentos a este res-
peito trazem por vezes informações contraditórias. Assim, a popula-
ção local é apresentada com grandes oscilações numéricas, mesmo em
épocas bem próximas conforme se poderá observar pelo quadro abaixo
(13) .

POPULAÇÃO DE AGUA AZEDA - SÉCULO XIX.

ANO POPULAÇÃO
1802 317 índios (1).
1808 Cerca de 40 índios (2).
1835 300 a 400 índios (3).
1845 Poucos habitantes (4).
1850 312 índios (5).
1851 180 mestiços e 2 ou 3 índios (6) .
1869 Cerca de 100 mulatos e mestiços (7) .

FONTES: 1. - De~crição Geográfica da Capitania de Sergipe d'el Rei.


1802, Anônimo, Ms. da BN. 2. - Marcos Antônio de Sousa, Memória sobre
a Capitania de Sergipe. 3. - Ofício da Câmara de São Cristovão ao Presidente
da Província 15/12/1835, Ms do APES - 36. 4. - Ofício do Diretor Geral
dos lndios ao Presidente da Província, 22/6/1845 Ms do APES - 847. 5. -
Ofício do P;esidente da Província ao Ministro e Secretário do Estado dos Negó-
cios do Império, 24/3/1851, Ms do APES - Gl - 243. 6. - idem. 7. - Ofí-
cio do Vigário de Itaporanga ao Presidente da Província, 18/10 /1869. Ms do
APES - 121.

(13). - A propósito dos dados sobre população de Água Azeda algu-


mas considerações merecem ser feitas:
1. - A informação de D. Marcos Antônio de Sousa refere-
se certamente à população indígena qUe! habitava um aglomerado de casas em
to~no da capela, deixando de computar os índios cujas habitações estavam dis-
- 428-

As informações mais frequentes indicam a existência de um grupo


em torno de duas a três centenas de indivíduos que, reconhecidos co-
mo índios pelos integrantes do mundo civilizado até meados do sé-
culo, a partir de então são apresentados quase sempre como mestiços
que:

não se distinguem como descendentes de índios nem


pelas feições ... " (14).

conforme dizia o Presidente da Província em 1851, num apelo ao cri-


tério antropofísico de identificação dos nativos, àquela época já certa-
mente com o fenótipo bastante modificado através dos cruzamentos
interraciais. Os integrantes do grupo, porem, até o final do século
continuavam identificando-se como indígenas, portanto os considera-
remos como tais, de acordo com o critério de auto-identificação étni-
ca (15). Segundo alguns documentos, os índios aí localizados eram
remanescentes dos Tupinambás (16), portanto Tupis; outros, porem,
apresentam-nos como Boimés (17), estes uma tribo Tapuia, conforme
Piso e Marcgraf (18). Não há indícios de que conservassem os índios
uma identidade tribal; é certo, porem, que mantinham identidade
étnica, afirmando-se índios por oposição a civilizados, brancos, por-
tugueses, cons~ituindo-se decerto no que Darcy Ribeiro denomina de
"índios genéricos" (19).
Como viveriam os índios de Água Azeda por essa época?
Os documentos, até então consultados, não nos dão informações
de carater etnográfico. As observações de Marcos Antônio de Sousa
indicam que a população nativa, apesar da aculturação resultante do
prolongado contato, conservava decerto elementos de sua cultura tra-
dicional. Diz ele:

2. - A queda bru~ca de população em 1845 explica-se pelo


fato dos índios terem se dispersado em consequência de um recrutamento for-
çado levado a cabo na aldeia pouco tempo antes.
3. - A partir de 1851 os documentos oficiais passaram a apresen-
tara população das aldeias como mestiça a fim de justificar sua extinção e incor-
poração das terras dos índios.
(14). - Ofício do Presidente da Província ao Ministro e Secretário do
Estado dos Negócios do Império. 24/3/1851. Ms do APES Gl 243.
(15). - MELLATI (Júlio Cesar), lndios do Brasil, Coordenada Edi·
tora. Brasília, 1970 p. 35.
(16). - SOUZA (Marcos Antônio de), op. cit., p. 18.
(17) . - ABREU (1. Capistrano de), op. cit., Mapa inserto às pp.
282-283.
(18). - HOHENTHAL JR. (W. D. ), As tribos indígenas do Médio e
Baixo São Francisco, in "Revista do Museu Paulista", vol. XII, 1960,
- 429-

não estão civilizados em quase três séculos que habi-


tam entre os portugueses, nem tem abraçado a ordem civil e social
que entre os mesmos se mandou estabelecer" (20).

Alguns registros permitem uma tentativa de reconstrução da vida


econômica dos nativos.

2 . 2 . 1. - A economia do grupo indígena.

Tomemos como ponto de partida a ocupação da população mas-


culina da aldeia no ano de 1825, expressa no quadro abaixo:

OCUPAÇÃO DA POPULAÇÃO MASCULINA DE ÁGUA


AZEDA - 1825.

OCUPAÇÃO HOMENS %
Lavoura 99 96%
Carapina 01 1%
Pescador 01 1%
Serrador 02 2%
TOTAL 103 100%
FONTE: Relação dos índios existentes em Se gipe. Ano de
1825. Ms. AN X. M - 67.

Registre-se que não estamos trabalhando com a população total,


pois o documento que nos serve de base relaciona apenas os indivíduos
do sexo masculino (21). Observe-se que 96% destes tinham como
ocupação atividades ligadas à lavoura. Da população masculina, 24%
eram crianças com menos de 11 anos, restando desse modo uma po-
pulação ativa de 78 homens aptos para os trabalhos agrícolas.
Como e onde desenvolveriam eles suas atividades? Trabalhariam
nas fazendas das vizinhanças, ou desenvolveriam trabalho autônomo
em suas terras?

(20). - SOUZA (Marcos Antônio de), op. cit., p. 18.


(21). - Relação dos índios existentes na Província de Sergipe com
declaração dos seus nomes, ocupações, estados, idades e residências. 1825.
Ms do AN. X-M 67. Devemos ao Dr. Luiz Mott, que o~a pesquisa sobre
Estrutura e Dinâmica da população de Sergipe - 1802-1854,
- 430-

Considerando que esta opção parece estar diretamente relacio-


nada com a produção agrícola das terras ocupadas pelos índios (22),
vejamos os aspectos gerais do território indígena.

2.2.1.1. - A terra dos índios.

Dispunham os nativos de uma reserva de terra cuja posse lhes


havia sido reconhecida em séculos passados, por títulos legais. Se-
gundo alguns documentos, a extensão do terreno era de uma légua em
quadra (23); outros, porem, reduzem-no à metade (24), o que denota
um esbulho parcial das terras por parte dos civilizados. Isso se torna
mais compreensivel, quando se conhece um pouco da história das ter-
ras dos índios.
De conformidade com a orientação da Coroa Portuguesa de re-
servar para as aldeias indígenas terras destinadas à sua subsistência, os
índios de Água Azeda tinham assegurado já no início de Oitocentos o
direito de posse sobre um território cuja extensão era provavelmente
da meia légua. Em face do número de aldeados, que, em 1718, era
superior a 300, pelo que necessitavam de mais terra para sua lavoura,
pediram ao Vice-Rei Conde de Vimieiro uma ampliação do território
tribal, conseguindo então mais meia légua de terra contígua às que já
possuiam, conforme está registrado no Alvará, pelo qual o Conde de
Vimieiro:

teve por bem de conceder e dar de sesmaria em nome


de Sua Majestade que Deus o Guarde, aos índios d'Aldeia de
Água Azeda da Administração Espiritual do Reverendo Vigário
da cidade de Sergipe d'EI Rei por eles e seus descendentes meia
légua de terra de largo e outro tanto de comprido, contígua a
outra so~te de terras que possuem na mesm:t Aldeia ... " (25).

Teriam assim os índios direito sobre um território de aproxima-


damente uma légua em quadra, cuja posse fora reconhecida em dois
momentos diferentes da história do grupo.

(22). - AMORIM (Paulo Marcos de), Acamponesamento e Proletari-


zação das populações indígenas do Nordeste Brasileiro, Boletim do Museu do
Indio, Antropologia, nQ 2 - 1975, p. 8.
(23). - Ofício da Câmara de São Cristóvão ao Presidente da Província
22/7/1829. Ms do APES. Pac. 33.
(24). - Ata da sessão extraordinária do Conselho do Governo da
província de Sergipe. 1/2/1830 in "Revista do Instituto Histórico e Geográ-
fico de Sergipe". Aracaju. 1926, vol. VI nQ (11), p. 102.
- 431-

Na l.a metade do século XVIII, registraram-se constantes con-


flitos dos índios com os civilizados que invadiam as terras dos nativos.
Este requerem, em 1737, medição e demarcação do território como
forma de dirimir as questões. Segundo consta, essa demarcação não
chegou a ser efetuada, persistindo os conflitos e a contestação sobre a
posse dos referidos terrenos. Nessas querelas, títulos de posse da
terra dos índios

dizem terem sido desencaminhados tendo desapare·


cido um índio que os levava com um dos processo para a Relação
da Bahia ... " (26).

Isso teria facilitado a usurpação de uma parcela do território in-


dígena por parte dos civilizados que, depois de se apropriarem das ter-
ras mais férteis, reconheciam aos índios o direito de posse sobre meia
légua apenas. Desta, ao que tudo indica, foi efetuada uma medição
em 1824 (27), constituindo-se, assim, nos terrenos de que dispunham
os índios para sua lavoura, durante o século XIX.
A meia légua em quadra, correspondente aproximadamente a
1089 hectares, era constituida de terrenos apresentados em documen-
tos da época como

"agrestes, verdadeiramente estéreis ... " (28).

sendo mais apropriados para a pecuária que para a agricultura. Aí


desenvolviam os índios a sua lavoura, considerada em 1802 por um
Autor Anônimo como:

" . .. insignificante, que apenas lhes chega para uma escassa


sustentação ... " (29).

Apesar de sua exiguidade e pequena fertilidade, a terra repre-


sentava para o grupo indígena, no nivel econômico, a base de sua so-
brevivência, pois aí desenvolviam uma pequena agricultura de subsis-

(26). - Ofício dó Presidente da província ao Minist~o e Secretário


de Estado dos Negócios do Império. 24/3/1851. Ms. do APES Gl 243.
(27). - Termo de medição de discriminação dos terrenos devolutos do
extinto aldeamento de índios de Água Azeda. 30/8/1870. Ms. do APES.
Pac. 283.
(28). - Ofício do Presidente da província ao Ministro da Agricultura
Comércio e Ob~as Públicas. 2/11/1869. Ms. do APES G 17.
(29). - ANÕNIMO, Descrição Geográfica da Capitania de Sergipe
d'EI Rei - 1802. Ms. da BN. Xerox do Arquivo do DHF da UFS.
- 432-

tência e certamente atividades de caça, coleta e pesca, enquanto, no


nivel ideológico, funcionava como reforço para manutenção da iden-
tidade étnica, pois o que lhes dava acesso à terra apesar das contesta-
ções, era o fato de "ser índio", de identificar-se com a etnia indígena
(30).

2.2. 1 .2. - Os índios em face da economia regional.

Vivendo em contato permanente e prolongado com o mundo ci-


vilizado, os índios de alguma forma dependiam deste para a aquisição
de bens incorporados às suas necessidades. Assim, deveriam por à
disposição dos integrantes da sociedade envolvente produtos ou força
de trabalho, em troca dos quais receberiam os bens produzidos pela
tecnologia do homem branco.
A exploração de suas terras, ao que tudo indica, não seria sufi-
ciente para manter o grupo e garantir um excedente comerciavel. Se
produtos agrícolas eram vendidos pelos índios nas feiras de São Cris-
tovão, Laranjeiras e Itaporanga (31), representavam, decerto, parcela
do alimento necessário à sobrevivência do grupo, desviada para a aqui-
sição de produtos como sal, querosene, álcool, vestes, instrumentos
de trabalho e outros, produzidos pela sociedade envolvente, contribu-
indo desse modo para aumentar o depauperamento dos índios.
Doutro lado, as possibilidades de inserção destes, como mão-de-
obra nas atividades econômicas dos regionais, parecem-nos extrema-
mente limitadas pela estrutura econômica e demográfica da área que,
não absorvendo regularmente toda a mão-de-obra disponivel, certa-
mente apenas na época de intensificação dos trabalhos agrícolas, tal
como o trabalho do corte de cana, oferecia mercado de trabalho para
o indígena. Quanto às fazendas de gado, que em 1854 elevam-se a 12
no município de São Cristovão (22), e, segundo opinião bastante di-
fund:da, incorporariam facilmente o índio como mão-de-obra, pare-
ce-nos significativo que o quadro de ocupações dos aborígines de Água
Azeda transcrito à página 189 não registre nenhum índio ocupado na
pecuária, indicando que o trabalho na fazenda de gado não constitui a
atividade regular para os índios de Água Azeda e, se alguns se encai-
xavam nessa ocupação, era às custas do abandono das terras da aldeia
e, talvez, com a perda da identidade étnica.

(30). - RIBEIRO (Darcy), op. cit., p. 423 e sego e AMORIN (Paulo


Marcos), oh. cito
(31). - Ofício do Vigário de Itaporanga ao Presidente da Província.
18/10/1869. Ms. do APES. Pac. 121.
(32). - SEBRÁO SOBRINHO,
- 433-

Na tentativa de suprir as necessidades criadas pela convlvencia


com os civilizados, dispunham os índios de outra possibilidade, que
era a incorporação nas tropas, com as consequências daí decorrentes
para sua economia.
Referindo-se aos habitantes de Água Azeda, diz D. Marcos An-
tônio de Sousa:

vivem sempre errantes, sempre pro .. tos para acompa-


nhar os cabos de justiça logo que lhes dão algum mstento, ou pe-
lo seu nectar delicioso, que é o agua~dente ... " (33).

Um outro documento datado de 1835 diz que na aldeia havia:

.. . .. 300 e tantos a 400 índios machos e femeas grandes e


pequenos com o número de cem p-ontos as ordens ... " (34).

Nessa época, quase um terço da população indígena local (o que


julgamos exagerado) estava destinado a integrar-se às tropas dos civi-
lizados, sendo com frequência esses índios requisitados para ajudar a
manter a ordem.
Os dados até então disponíveis não nos permitem saber como
regularmente eram recompensados os índios que participavam dessas
diligências dos brancos. Pelo menos numa dessas ocasiões, quando os
índios lutaram contra os sediciosos de Santo Amaro em 1836, foi-lhes
arbitrado um pagamento, conforme se depreende do Ofício que o Pre-
sidente da Província enviou ao Comandante da Força da Legalidade
da Comarca de Laranjeiras:

"Não posso deixar de aprovar o So'do que V.S. por bem


da Causa Púb!ica mandava abonar as Forças auxiliares de qual-
quer denominação, que se tem reunido a dos Permanentes, visto
que de outra forma impossivel torna a defesa do Estado, devendo
p:aticar o mesmo com os índios de Água Azeda que pJra aí
destacaram" (35).

Se um lado a participação do índio nas tropas lhe dava oportu-


nidade de adquirir moedas e/ou produtos dos civilizados, de outro la-

(34). - Ofício da Câmara Municipal da Capital ao Presidente da Pro-


víncia 15/12/1835. Ms. do APES. Pac. 36.
(35). - Ofício do Comandante em Chefe da Força da Legalidade da
Comarca de Laranjeiras ao Presidente da Província. 22/11/1836. Ms. do
APES OI
- 434-

do a intermitência dessa atividade preiudicava decerto a produção das


roças, agravando assim a situação de penúria dos habitantes da aldeia,
que tentavam a satisfação das suas necessidades mínimas de subsis-
tência, tambem através da apropriação dos bens dos brancos. :e. ainda
Marcos de Sousa quem informa:

"Estes descendentes dos selvagens Tupinambás, que viviam


vagabundos nesta capitmia, ainda hoje não conhecem as doçu-as
do direito de propriedade, bem como seus ascendentes ... " ! 36) .

Com frequência, queixavam-se os neobrasileiros das vizinhanças


dos furtos dos índios que, no dizer de um documento da época,

" . " ali em perfeita anarquia, sem temer Lei nem respeitar
Autoridade, e entregues ao ócio, e embriaguez só vivem da rapina
com que incomodam constantemente os pacíficos lavrado-es das
circu:wizinhanças ... " (37).

Outra fonte enumera explicitamente os prejuízos causados. pelos


habitantes da aldeia, que viviam

..... destruindo gados e lavou as e matas dos p-op-ietários


vizinhos com serrarias para vende-em taboados aos que não são
donos de tlis terre:os. Com roças que ao queimar deixam o fogo
destruir as matas dos Engenhos vizinhos ... " (38).

aumentando assim as tensões entre os dois grupos em contato.


Os dados revelam, pois, a existência de um grupo indígena que,
apegado à sua identidade étnica, habitava um pequeno território en-
volvido e disputado pelos civilizados e mantinha dependência em re-
lação à sociedade envolvente. Revelam, de outro lado, oposições e
antagonismos do grupo indígena e de segmentos da sociedade inclu-
siva, configurando uma situação de fricção interétnica.

2 . 3. - O sistema de poder dos grupos em confronto.


A oposição de interesses entre o grupo indígena e segmentos da
soc:edade envolvente, identificavel no nivel econômico, conduz à ques-
(36). - SOUZA (Marcos Antônio de), op. cit., p. 18.
(37). - Ofício do Presidente da Província ao Secretário Geral dos
Negócios do Império. 13/7/1825. Ms. do AN. Xerox do DHF da UFS.
(38). - Ofício da Câmara de Itaporanga ao Presidente da Província,
22/3/1872. Ms. do APES Pac.
- 435-

tão da capacidade de organização e mobilização dos indivíduos inte-


grantes dos grupos em contato, tendo em vista a utilização de meios
que permitem atingir os fins propostos, investigando-se, assim, os as-
pectos sócio-políticos envolvidos no contato, ou mais especificamente a

" . .. natureza do poder e autoridade de um grupo sob"e


outro, focalizados como pa~te de um sistema de dominação ... "
(39).

Não dis.pomos de documentos que nos permitam saber a organi-


zação do grupo indígena aldeado em Água Azeda e sua capacidade
de articulação para consecução dos objetivos. É fora de dúvida, po-
rem, que a sociedade envolvente e particularmente os senhores de en-
genho estavam mais aptos a atuar organizadamente e de modo contí-
nuo na sua luta pela posse da terra dos índios, que, no caso, constituia
o objetivo básico dos civilizados perante o grupo nativo.
Quanto ao exercício do poder, é obvio que a sociedade envol-
vente levava inegáveis vantagens, pois detinha o poder de decisão so-
bre os índios. O Governo Imperial impunha os aldeamentos, legislava
sobre as aldeias e sua administração, transformando quase sempre as
lideranças nativas, através da instituição do capitão, ou qualquer ou-
tro título que se lhe desse, num instrumento de manipulação da auto-
ridade nativa pelos brancos. Em Agua Azeda, isso é o que se observa
durante o século XIX, sendo o capitão-mor dos índios um chefe de
tropas a serviço dos regionais., conforme se depreende do teor do Ofí-
cio do Presidente da Província àquela autoridade, dirigido em 1836:

"Logo que esta receber sem a menor perda de tempo faça


reunir toda a Força do seu Comando, e siga com a mesma para
esta Capital, que assim o exige a bem do S. P. confio que V. S .
não hesitara um só instante no cumprimento desta Ordem por-
que conheço o seu Patriotismo, e amor a Augusta Pessoa de
Sua Majestade Imperial o Senhor D. Pedro lI" (40).

O uso da força, outrora importante no sistema de poder dos Ín-


dios, parecia reduzir-se a atos isolados, como ocorreu em 1802, con-
forme informação do capitão-mor de Sergipe ao Governo da Bahia:
". .. o capitão-mo: Valério dos Santos com os índios de
sua aldeia de Água Azeda se ausentaram, deixando deserta a

(39). - OLIVEIRA (Roberto Cardoso de), op. cito


(40). - Ofício do Presidente da Província ao Capitão-Mor dos índios
de Água Azeda. 17/12/1836. Ms. do APES
- 436-

mesma aldeia sendo o motivo da ausência de todos o temor


do castigo que mereciam dois dos ditos indivíduos que comete-
ram duas mortes der~tro desta cidade cm uma sexta-feira de
Paixão ... " (41).

A documentação de que dispomos, até então, não indica a utili-


zação da força como recurso do grupo, nem mesmo no momento cru-
c:al da sua transferêl1cia para outra localidade. Ao que tudo indica,
gradativamente se esfacelara o sistema tradicional de poder dos índios,
nas relações de prolongado contato com os civilizados. Então, era
lançando mão dos mecanismos gerados pelos brancos que os índios
tentavam fazer valer os seus direitos, sobretudo aqueles relativos à
posse da terra, ora pleiteando tombamento do seu território ora re-
presentando ao Imperador contra as invasões do mesmo (42).
Do Governo Central emanava um conjunto de princípios por ve-
zes contraditódos e ambíguos relativamente aos índios e suas terras,
princípios que deveriam ser zelados pelas autoridades locais. Estas, po-
rem, eram quase sempre representantes dos senhores de engenho, rei-
tores do sistema conômico e político regional, e como tais identificados
com os interesses destes em opos:ção aos índios. O próprio Presidente
da Província que, pela função administrativa, exercia a intermediação
direta entre o Governo Imperial, ou seja, os "interesses nacionais" e
o poder político local sustentado pelos "interesses regionais", identifi-
ca-se quase sempre com estes, sugerindo ao Imperador soluções em
consonância com os ob~etivos dos senhores de terra em choque com
os índios. A correspondência mantida entre o Governo Provincial e a
Corte revela com nitidez essa postura dos Presidentes.
Desse modo, os proprietários rurais, dispondo da capacidade de
uso da força (inclusive da utilização do aparato policial do Estado), da
manipulação das autoridades locais (delegados, juizes, etc.) e da ca-
pacidade de influir nas decisões do Imperador através do Presidente,
gozavam de um poder bastante amplo, fortalecido, na maioria das ve-
zes, pela chancela das autoridades constituidas.
>I< ..

(41). - Ofício do Capitão-Mor de Segipe ao Governo da Bahia.


11/8/1802 Ms. APEB Pac. 205.
(42). - Ofício do Secretário do Presidente da Província ao Juiz de
Paz do Distrito de São Cristovão, 9/2/1836. Ms. do APES Gl - 9 e Ofício
do Presidente da Província ao Delegado de São Cristovão 14/1/1862. Ms.
do APES.
- 437-

3. AS TENTATIVAS DE ALIENAÇÃO DAS TERRAS


DOS lNDIOS.

As relações de opos:ção entre índios e brancos, derivadas do an-


tagonismo de interesses dos dois grupos em contato, e as relações de
dominação e subordinação operantes na situação interétnica, explicam
as ocorrências em que se vêem envolvidos os nativos de Água Azeda,
durante o século XIX, e auxiliam a compreensão da história da aldeia
nesse período.

3. 1. - A transferência dos índios.

Em 1825, os proprietários rurais das vizinhanças da aldeia, como


não necessitassem da mão-de-obra dos indígenas e estivessem interes-
sados em suas terras, representam ao Imperador contra tais índios, plei-
teando sua remoção para outra localidade. Ao encaminhar o reque-
rimento dos senhores de terra ao Governo Central, o Presidente da
Província assim resume as acusações imputadas aos índios, apresen-
tando a aldeia como:

" . .. um verdadeiro valhacouto de toda sorte de criminosos,


que ali em perfeita anarquia, sem temer Lei nem re,peitar Autori-
dade, e ent "egues ao ócio e a embriaguês, éÓ vivem da rapina,
com que incomodam constantemente os pacíficos lavradores da
circunvizinhança que atormentados de tamanho flagelo, me ::pre-
sentam o requerimento incluso por eles assinado em que pedem
( ... ) providência que lhe mantenha a segur""nça individU)1 e o
Sagrado direito de Propriedade, sendo os poucos Índios alí exis-
tentes removidos para a Vila de Thomar do Ge u, ou para a povoa-
ção da Pacatuba, ambos nesta mesma Província, e desta mesm:l
Ca,sta de gente, onde, tendo melhor quem os doutri;:e - e civilize,
poderão tornar-se de prejudiciais e danosos, que ora são a Socie-
dade, em homens úteis a si p~óprios, e ao Estado" (43).

Medianeiro entre os intreesses locais e o Governo Central, o Pre-


sidente da Província manifesta-se favoravel à transferência, arbítrio
por ele julgado "acertado e mesmo necessário". Ass:m, por Aviso do
Ministério dos Negócios do Império, datado de 27 de agosto de 1824

(43). - Ofício do Presidente da Província ao Secretário Geral dos


Negócios do Império. 13/6/1825. Ms. do AN. Xerox do Arquivo do DHF -
UFS.
- 438-

(44), é autorizada a remoção dos índios de Água Azeda para Gero,


antiga missão dos carirís localizada ao sul do Estado, elevada a vila
após a expulsão dos jesuitas., seus fundadores (45) .
Vejamos como reagiram os índios às determinações para mudan-
ça de habitat.
Tendo o Comandante da aldeia, no início de dezembro de 1825,
receb:do ordens do Presidente da Província para, dentro le 15 dias, efe-
tuar a mudança de todos os índios para o Gero (46), procura alongar
a permanência na antiga aldeia, pleiteando o prazo de um ano para
transferir-se com sua gente para o novo local que lhes era indicado.
Concordou o Presidente que permanecessem em Água Azeda somente
até a chegada das chuvas (47), e assim, no fim de abril, lhes dá o prazo
de 8 dias para que efetuem a mudança. Ele próprio foi passar uma
revista no aldeamento, e no dia 11 de maio de 1826 os índios deixam
Água Azeda e partem para o Gero (48) .
Não há notícias de conflitos armados por parte dos aborígines no
sentido de impedir a transferência; no entanto, menos de um ano de-
pois, muitos deles já haviam retornado à terra onde tinham vivido os
seus ancestrais, renovando-se os atritos com os representantes da so-
ciedade envolvente, particularmente os proprietários rurais, que fazem
novas representações às autoridades, queixando-se dos danos por eles
causados e exigindo a remoção dos índios de Água Azeda, sob pre-
texto de fiel cumprimento à determinação imperial, a respeito da qual
demonstram um zelo inusitado (49).
A trama de interesses em jogo foi, aliás, muito bem expressa por
M. A. Galvão em seus Apontamentos para a História de Sergipe, es-
critos por volta de 1847-49. Diz ele:

"Os lndios de Água Azeda removidos para o Geru, não


permaneceram longe do seu lar e dos lugares conhecidos e vol-

(44). - Aviso do Ministé~io do Império ao Presidente de Sergipe,


27/8/1825. Ms. do APES. Pac. 422.
(45). - DANTAS (Beatriz Góis), Subsídios à História da antiga
missão do Geru. Comunicação apresentada no V Simpósio de História do
Nordeste, Aracaju, 1973.
(46). - GALV ÃO (M. A.), Apontamentos para a História de Sergipe.
Ms. da BN 19-4-13. Ordem de 2/12/1825.
(47). - Ibidem. Ordem de 14/1/1826.
(48). - Ibidem. É estranho que apesar de dispormos de relativa do-
cumentação sobre a aldeia de Geru por essa época, não tenhamos encontrado
até então notícias da chegada desse contingente que para lá se teria desloca-
do.
( 49). - Ofício do Presidente da Província ao Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império. 30/8/1827. Ms. do APES
- 439-

taram ave-los, :ew:utos a fica~em na SU:l antigl pos_e. O sar-


gento-mor Silvestre Juquitibá Boticudo (Botocu.!o?) era homem
resoluto e capaz de cometer qualquer empresa. O Vice Presi-
dente mandou chamar por carta de 25 de agosto de 1827 e o
incumbiu da missão de ir sondar os ânimos e trat:tr de desa!ojar
os índios, podendo emprega a força p3ra os coagi:- a sair em de
Agua Azeda. Era vontade dos Senhores de E gen.ho da vizin~an­
ça da aldeia que aqueles vizinhos deixassem este lugar não tanto
para ficarem livres de uma vizinhança que assim me mo não e"a
das melhores, _como po~ poderem apossar e utilizar sem estorvo
das terras. O major prometeu desempenhar a comi~são de que
o incumbira sem reparar quem tinha razão. Tr..tou em p.lZ com
os índios instou com eles p:tra que saissem, pondo-lhes po - dLnte
a ob:igação de cumprir a vontade do gove -no: e:es negaram-se,
mas como ele tinha ordens, e era cump- ido', dirigiu-se ao Ca-
pitão-Mor pedindo uma força que por si só fizesse fugir os Ldios,
e dirigiu-se aos vizinhos senhores de engenho interessados, orde-
nando que pusessem no ponto que lhes indicou, tu:lo o que
era necessário para o sustento da gente que peJiu, suste to que
orçava por grande quantidade de víve es, pO'-que a gente que
requisitou não foi pouca. Os interessados que nada queriam se-
não gozar e a quem pesou o encargo, correram ao Vice Prejdente
representando contra o sargento-mor que os obrigava a uma cont i-
buição aliás, muito justa, visto que lhes ia dar um dhito que
eles não tinham e que eles queriam ter sem custo. O Vice-Presi-
dente a 28 de agosto de 1827, mandou agradecer ao S lrgento-
Mor o seu serviço (o qual) abriu mão da comissão que fora en-
ca,regado, nada mais obrando" (50).

o súbito desinteresse dos senhores de engenho na solução da ques-


tão, negando-se a fornecer víveres para a tropa reunida com o obje-
tivo de desalojar os índios, está certamente relacionado com a decisão
do Governo Central em relação às terras da aldeia de Água Azeda.
Com efeito, com a mudança dos índios para outra localidade, res-
tava uma faixa de terra desocupada, situada na zona açucareira na:.
proximidades da capital, terra que, se não era suficientemente fertil
para o plantio da cana de açucar serviria para ampliar a área de pas-
tagens dos animais necessários às atividades dos engenhos, e, por con-
seguinte, cobiçada pelos proprietários rurais.

(50). - GALV ÁO (M. A.), op. cito Transcrição baseada em MOTT


(Luiz), Brancos, Pardos, Pretos e lndios em Sergipe, 1825-1830, in "Anais
- 440-

Antes mesmo de ve-Ia desocupada pelos índios, o Presidente da


Província apressa-se em pedir ao Imperador instruções quanto ao des-
tino das referidas terras, se deviam ser:

". .. arrendadas, ou aforadas por enfiteuse; ou se arremata-


tadas em hasta pública, a fim de se evitar que fic:mdo elas devo-
lutas não sirvam de covil e valhacouto de malfeitores" (51).

Arrendamento, aforamento ou arrematação eram expedientes


através dos quais os senhores rurais teriam acesso legalizado às terras
que desde muito desejavam e pelas quais lutaram, pleiteando a remo-
ção dos índios. Mas o desfecho da questão não lhes será de todo fa-
voravel, pois, tendo pedido esclarecimentos sobre o terreno e infor-
mado de que sua extensão era de meia légua, valendo 800$000, pres-
tando-se apenas

"para criar gados de ambas as espécies" (52),

o Governo Central, por Portaria de 10 de julho de 1827, manda que:

" . .. se conserve desocupado o sobredito ter:eno para nele


e noutros assim devolutos se acomoda~em Colonos Estrangeiros
que se espera" (53).

Destinadas as terras do aldeamento para os imigrantes, barravam-


se as pretensões dos proprietários rurais de acesso às mesmas, daí o
súbito desinteresse pelo desalojamento dos índios.
O Presidente da Província, porem, deveria dar cumprimento ~s
determinações Imperiais e, assim, comunica ao Governo Central a inuti-
lidade da diligência do Capitão Boticudo para que, por meio de per-
suasão, fizesse os índios abandonar o local, declarando que:

só por força se poderá conseguir expulsar dali os qua-


renta ou cinquenta lndios que servem acoitados nas matas donde
saem a perpetrar os crimes de que vivem e não julgando conveni-

(51). - Ofício do P:esidente da Província ao Ministro e Secretário do


Estado dos Negócios do Império. 5/11 /1825. Ms. do AN. Xerox do Arquivo
do DHF-UFS.
(52). - Ofício do Ouvidor Provedor Interino ao Vice-Presidente da
Província, 26/3/1827. Ms. do AN. IJJ9.
(53). - Ofício do Ministro e Secretário do Estado dos Negócios do
Império ao Presidente de Sergipe. 10/1/1827. Ms. do APES. Pac.
- 441-

ente mandar gente armada para os expulsar sem positiva Ordem


de Sua Magestade ... " (54).

aguarda determinações a respeito.


Várias tentativas são feitas para transferir definitivamente os ín-
dios para o Gem, redundando em fracasso, pois, apesar das ameaças
do uso da força, os índios estavam decididos a permanecer na terra dos
seus an~estrais. Com base nos Apontamentos para a História de Ser-
gipe, Luis Mott em seu trabalho: Brancos Pardos, Pretos e lndios em
Sergipe 1825-1830 assim resumiu a resistência indígena:

"No ano seguinte, exatamente em setcmbo de 1828, os índios


que ali persistiram, instados pela Presidência a p;trti~'em para o
Gem, pedir<.m que se lhes concedesse tempo para colherem suas
plantações, sendo-lhes ordenado que fizesóem a colheita e se
retirasse o mais pronto. Por ofício de 11 de outubro do mesmo
ano, o Governo dá como prazo último o dia 31 de dezembro para
que os mesmos se recolhessem à vila de Tomar do Gem. Nesta
ocasião, o documento ameaça-os de serem "coagido:,", caso COIl-
tinuassem relutantes. Aos 14 de janeiro do ano seguinte, 03 índios
impertinentemente permanecem imutáveis no desígnio de não arre-
dar o pé do lugar que secularmente ocupavam; em vista disto, o
Governo nomeia o índio Maxinio como secretário a fim de lide 'ar
a transumância. Novo fracasso. Uma semana após, vencido, o
Presidente envia ofício ao Gove~no Central dando conhecimento
dessa situação impossivel de se rewlver" (55).

Em dezembro de 1829, o Pres:dente volta a consultar o Governo


Central, declarando-se em dúvidas:

" . .. se os índios devem ser conservados na dita Aldeia ou


se devem voltar a vila do Tomar como já lhes foi determinado,
cuja ordem recusam cumpri-la pelos meios de brandu,'a ... " (56).

Com referência aos anos seguintes, escasseiam os documentos,


não nos permitindo saber o que se passava na aldeia. Em 1833, no

(54). - Ofício do Presidente da província ao Ministro e Sec'etário de


Estado dos Negócios do Império. 30/8/1827. Ms. do APES Gl 267.
(55). - MOTT (Luiz), Brancos, Pardos, Pretos e lndios em Sergipe -
1825-1830, in "Anais de História". Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
de Assis. 1974.
(56). - Ofício do Presidente da Província ao Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império. 9/1211829. Ms. do APES
- 442-

entanto, a situação ainda continuava indefinida, sendo levada a dis-


cussão nu Conselho Geral da Província, onde o Conselheiro Caldas
Lima propõe que se torne efetiva a lei que determinou a extinção da
aldeia e que as terras sejam postas em arrematação, constituindo-se os
descendemes dos índios em arrendatários preferenciais (57). Antônio
Fernandes da Silveira apresenta uma emenda no sentido de que as ter-
ras de Água Azeda fossem compradas pela Nação e aforadas em hasta
pública (58). Contra tais propostas insurge-se o Conselheiro Maurício
apresentando uma emenda que mereceu aprovação do Conselho Geral
da Província:

"Que se punam os maus, se expulsem se preciso for, mas


que os indígenas, ou os seus descendentes conhecidos por tais sejam
considerados como Proprietários do lugar, visto que nenhuma
Lei nem Divina, nem humana, lhes pode tirar o gozo de uma
pequena fração de um vastíssimo País que lhes pertencia, e de
que fo~am esbulhados pela prepotê:J.cia Luzitana" (59).

Diante disso, o Presidente da província recomenda que se ordene


ao Juiz de Paz de Água Azeda que exerça vigilância, de modo a im-
pedir que malfeitores se abriguem na aldeia (60), cuja população, no
ano d~ 1835, é avaliada em 300 e tantos a 400 índios, indicando as-
sim que os nativos haviam retornado em massa para o antigo aldea-
mento (61).
Para essa época, os índios requerem "tombamento" das terras
que habitam (62), sendo, contudo, este pedido indeferido pela Assem-
bléia Legislativa, não só por considerar tal pretensão,

"pouco vantajosa ao bem geral da Província, mas até mesmo


prejudicial aos interesses da Fazenda Pública ... " (63).

Tinham, porem, os nativos reconquistado pelo menos o direito


de viver nas terras que secularmente ocupavam. Reorganiza-se a al-

(57). - LIMA JÚNIOR (Francisco A. de Carvalho), M emó··ia sobre


o Poder Legislativo em Sergipe., 1824-1889, in "Revista do Instituto Histórico
e Geográfico de Sergipe", Aracaju, voI. IV nQ , p. 28.
(58). - Ibidem.
(60). - Ibidem.
(60). - Ofício do Presidente da província do Major G. da Cunha.
16/12/1833. Ms. do APES. Gl 280.
(61). - Ofício da Câmara Municipal da Capital ao Presidente da Pro-
víncia em 15/12/1835. Ms. do APES. Pac. 36.
(62). - Ofício do Secretário do Presidente da P-ovíncia ao Juiz de
Paz do Distrito de São Cristovão. 9/2/1836. Ms. do APES.
- 443-

deia, e os índios voltam a integrar as tropas que visam à manutenção


da ordem do mundo civilizado. Ora são convocados para combater
grupos armados que hostilizavam Itaporanga (64), ora para lutar con-
tra os revoltosos de Santo Amaro (65).
Reconhecia-se a chefia do capitão como intermediário entre os
Índios e os brancos (66), enquanto para lhes dar assistência religiosa
nomeava-se um capelão, o padre João José Pires (67), que deveria re-
sidir na povoação, para dizer missa e ensinar primeiras letras aos Ín-
dios e demais pessoas (68).
A violência, todavia, não demorará a irromper nas relações entre
os aborígenes e a sociedade envolvente. Assim, no ano de 1842, o Pre-
sidente da Província ordena ao Capitão do Corpo de Permanentes
que:

se dirija ao Arraial denominado Água Azeda no termo


desta cidade e faça capturar a todos os indivíduos que ali encon-
trar que estejam nas circunstâncias de prestar serviço ao exército de
mar e te~ra, fazendo-os conduzir com segurança para esta Cida-
de (São Cristovão) ... " (69) .

Esse recrutamento fez com que os índios amedrontados se disper-


sassem, passando a viver "pelas grotas em palhoças", diminuindo con-
sideravelmente a população da aldeia, que em 1847, é apresentada co-
mo insignificante (70). Nesse mesmo ano é instalada em Sergipe a Di-
retoria Geral dos lndios, criada pelo Governo Imperial em 1845, cujo
titular entre outras atribuições deveria:

(64). - Ofício do Presidente da província ao Juiz de Paz de Itaporanga


26/5/1836. Ms. do APES. Gl 97 e ofício deste aquele 27-5-1836. Ms.
do APES. Pac. 384.
(65). - Ofícios do Presidente da Província ao Comandante em Chefe
das Forças da Legalidade. 19/12/1836 e 22/11/1836. Ms. do APES. Gl 128.
(66). - Ofício do Presidente da Província ao Capitão Mor dos índios
de Água Azeda, 17/12/1836. Ms. do APES Gl 128.
( 67). - Ofício do Secretário do Presidente da Província ao 1Q Secre-
tário da Assembléia Provincial, 25/1/1837 Ms. do APES Gl - 128.
(68). - Decreto n Q 11 de 21/3/1838 in "Legislação Provincial de Ser-
gipe 1835-1842".
(69). - Ofício do Presidente da Província ao Capitão Mor do Corpo
de Permanentes. 12/7/1842. Ms. do APES. Gl - 133.
(70). - Fala com que o Exmo. Sr. Presidente da Província Dr. José
Fe~reira Souto abriu a 2a. sessão ordinária da Assemb'éia Legislativa Provincial
de Sergipe em o dia 3 de maio de 1847. In "Correio Sergiperu;e",
- 444-
,. demarcar e arrendar as terras habitadas pelos índios:
exercer vigilância sobre as relações dos índios com os civiliza-
dos ... " (71).

Desta Diretoria, que em Sergipe foi precedida de instituição con-


gênere e homônima (72), não dispomos, por enquanto, de dados que
nos permitem avaliar globalmente sua atuação, aliás, bastante curta.
O Diretor Geral dos índios, Gonçalo Pais Barbosa Madureira,
levanta a questão das terras de Água Azeda, procurando mostrar que
os índios tinham direito de posse sobre uma légua em quadra, no que
é contestado com veemência pelo Presidente da Província (73). Plei-
teia ainda a nomeação de um Diretor Parcial para a referida aldeia,
sendo então nomeado para rege-la Silvério José Gomes, em 1850
(74). Nesse mesmo ano, porem, dispositivos legais e atos imperiais
abrem novas perspectivas na luta pela alienação das terras dos índios.

3 .2. - A negação da existência de índios.

Em s~tembro de 1850, foi promulgada a Lei das Terras (Lei n.o


60l), dispondo sobre os terrenos devolutos, e logo em seguida tenta-se
incorporar a estes terras das antigas aldeias indígenas. Assim, por
Aviso n.o 172 do Ministério dos Negócios do Império, de 21 de ou-
tubro de 1850, inicialmente destinado ao Ceará, estendido tambem a
Serg~pe (75) e talvez às demais Províncias, manda o Governo Imperial:

" ... incorporar aos Próprios Nacionais as terras dos índios,


que já não vivem a,Jdeados, mas sim dispersos e confundidos na
massa de população civilizada, e dá p-ovidências sobre as que se
acham ocupadas" (76).

(71). - ARNAUD (Expedito), Aspectos da Legislação sobre os lndios


do Brasil. Museu Goeldi, nQ 22, Belém. 1973, p. 17.
(72). - Criada pela Lei Provincial nQ 127 de 1844 (Coleção das Leis de
Sergipe) a Diretoria Geral dos índios funcionou até 1847, quando foi substi-
tuida pela sua congênere criada pelo Governo Imperial.
(73). - Ofício do Presidente da Província ao Minist-o e Secretário de
Estado dos Negócios do Império. 24/3/1851. Ms. do APES Gl - 243.
(74). - Ofício do Diretor Geral dos índios ao Presidente da província
24/2/1850. Ms. do APES. Pac. 848 e Ofício deste àquele 4/3/1850. Ms. do
APES G1 - 96.
(75). - Ofício do Ministro dos Negócios do Império ao Presidente da
Província de Sergipe. 21/10/1850. Ms. do APES. Pac. 425.
(76). - Coleção de Leis e Decisões do Império - Decisões do Gover-
no. 1850.
- 445-

Este dispositivo ambíguo, interpretado do modo que convinha aos


interesses regionais, passou a ser invocado pelas autoridades da Pro-
víncia para por fim às aldeias de Sergipe, mediante a alegação da ine-
xistência de ír:.dios.
Essa postura é adotada pelo Presidente A. J . Pereira Andrade
que, em 1851, fez um extenso relatório sobre as aldeias, contestando
as informações do Diretor Geral dos índios e apresentando-as como
constituidas de mestiços e alguns poucos aborígenes que viviam entre
os civilizadores, sugerindo com insistência que as aldeias deveriam ser
extintas e seus terrenos incorporados aos próprios nacionais (77).
Especificamente em relação a Água Azeda, dizia:
" . " não há mais do que dois ou três índios muito velhos;
os mais não se distinguem como descendentes de índios, nem pe-
las feições; vivem dispersos por aqueles contornos, alguns por
costumes, e outros por estarem disputando os teLenos que enten-
dem pertencer-lhes; estes mesmos não são 312 como diz o Dire-
tor Geral, eles não passam do número de 180" (78).

Depois de historiar alguns fatos da vida da aldeia, concluia:


" . " parece não ser conveniente restabelecer-se ali uma aldeia
de homens que a muito se tem postO' fora ela condição de índios
aldeados, sendo preciso providências para que cesse de uma vez a
p_etensão de serem regidos por Diretores" (79).

As posições defendidas pelo Presidente A. J . Pereira de Andrade


em relação ao índio foram adotadas pelo ser sucessor José António de
Oliveira e Silva, que solicita ao Imperador a extinção da Diretoria Ge-
ral dos índios em Sergipe (80), o que foi decretado pelo Governo
Central, em 6 de abril de 1853 (81).
Esta medida intempes.tiva, mais tarde reconsiderada em parte por
outros governantes provinciais (82), representava uma vitória dos
rurais contra os índios uma vez que, nos diferentes aldeamen-
tos eram constantes os conflitos por causa de posse das terras, e a

(77). - Ofício do Presidente da Província ao Ministro e Sec~etário de


Estado dos Negócios do Império. 24/3/1851. Ms. do APES Gl - 243.
(78). -Ibidem.
(79). - Ibidem.
(8). - Ofício do Presidente da província ao Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império, 18/3/1853. Ms. do APES Gl - 102.
(81). - Decreto nQ 1.139 de 6/4/1853 in "Leis
- 446-

extipção da Diretoria dos lndios facilitava a utilização, sem estorvo,


dos terrenos das antigas aldeias.
Doutro lado, as terras que antes constituiam seu patrimônio ale-
gando-se que estavam abandonadas, eram apresentadas como devolu-
tas (83) e como tais, passíveis de aquisição legal por parte dos civili-
zados, que poderia.m adquiri-las em hasta pública, conforme a legis-
lação então vigente (84).
Anos mais tarde, quando em Sergipe se procede ao registro de
terras, visando discriminar as terras possui das por particulares das de-
volutas, Agua Azeda não foi regis.trada entre aquelas de posse reco-
nhecida, explicando o vigário que não o fizera, por não terem os Ín-
dios um diretor, que seria a pessoa capaz de registra-las de acordo
com a Lei (84).
A população nativa, ao que tudo indica, continuava habitando
as terras da antiga aldeia em confHtos com os proprietários rurais. Em
1862, época em que as terras destinadas outrora ao patrimônio das
aldeias indígenas encontravam-se em sua maior parte "usurpadas por
particulares" que as tinham invadido (86), os índios de Água Azeda
queixavam-se de:

perseguições e violências praticadas pelo proprietário do


Engenho Escurial contra o direito individual e de propriedade
dos representantes (1ndios)" (87).

A indefinição em torno da propriedade das terras acentuava as


tensões entre os proprietários rurais e os índios, não só em Água
Azeda mas nas outras aldeias. Doutro lado, a legalização da posse
exigiria uma prévia medição e demarcação dos terrenos em litígio, e
assim, por aviso de 21 de junho de 1865, o Governo Imperial manda
que sejam medidas as terras dos antigos aldeamentos de Sergipe (88),
tarefa que se inicia dois anos mais tarde, sob a chefia do Engenheiro

(83). - Aviso 172 de 21/1/1856. Decisões do Império. Tomo XIII p.


e XIX p. 44.
(84). - Lei nQ 601 de 18 de setembro de 1850, particularmente Artigos
14 e 15. Leis do Império. Tomo XI p. 307.
(85). - Livro de Registro de Terras da Freguesia de Itaporanga.
Anotações de 10/11/1859. Ms. do APES. s. cl.
(86). - Ofício do Ministério da Agricultura Comércio e Obras Públicas
ao Presidente da Província de Se.gipe 23/6/1862. Ms. do APES Pac.
416.
(87). - Ofício do Presidente da Província ao Delegado de São Cristovão.
14/1/1862. APES Gl 243.
(88). - Ofício do Ministério da Agricultura Comércio e Obras Públicas
ao Presidente da Província de Sergipe. 21/6/65. Ms. do APES Pac.
- 447-

Bernardino Marques da Cunha Bastos, que, à frente de uma Comissão


e Obras Públicas, inicia os trabalhos na aldeia da Chapada, desdo-
bramento da aldeia do Geru, onde as terras disputadas eram mais ex-
tensas e mais férteis e onde os ânimos estavam mais acirrados (89).
A necessidade de cortar despesas fez com que os trabalhos fossem sus-
pensos, sem que as terras de Água Azeda tivessem sido medidas. A
situação continuava, portanto, indefinida. No ano de 1869, o Barão
de Estância, figura de grande projeção na vida econômica e política
da Província (90), proprietário do Engenho Escurial, confinante com
as terras de Água Azeda, toma a iniciativa de requerer ao Imperador:

". .. a medição e demarcação dos terrenos intitulados -


Água Azeda - contíguo a uma de suas propriedades, terrenos
que outrora fizeram parte de um aldeamento extinto a mais de
quarenta anos e que hoje acham-se devo~utos - os quais o mes-
mo Barão deseja possuir depois de preenchidas as formalidades
legais ... " (91).

O Presidente da Província endossa a pretensão do senhor de en-


genho, argumentando mais uma vez com base nos roubos atribuidos
aos habitantes da extinta aldeia, e algum tempo depois é informado
que deverá nomear um juiz comissário que se encarregará, mediante
emolumentos das partes interessadas, de medir, legitimar e discriminar
aquelas terras (92), silenciando, porem, quanto à sua alienação, em
vista do que o Barão de Estância volta a insistir junto ao Imperador,
solicitando:

para ser a Presidência desta Província não só autori-


zada a mandar medir, demarcar e disc:iminar os terrenos do extin-
to aldeamento de Água Azeda, como tambem a cede-los a quem
os pretenda por meio de arrematação ou como melhor entender o
Governo Imperial ... " (93).

(89). - Relatório apresentado à Assembléia Legislativa da Provín-


cia de Sergipe no dia lQ de março de 1869 pelo Exmo. Sr. Presidente Dr.
Evaristo Ferreira da Veiga. APES.
(90). - Vide GUARANÁ (Armindo), Dicionário Bio-bib/iográfico Ser-
pipano. Gráfica Ed. Paulo Pongeti. Rio de Janeiro, 1925.
(91). - Ofício do Presidente da Província ao Ministério da Agricul-
tura Comércio e Ob~as Públicas. 21/8/1869. Ms. do APES Gl - 7.
(92). - Ofício do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Pú-
blicas ao Presidente da Província de Sergipe. 25/9/1869. Ms. do APES
Pac. 4.
(93). - Ofício do Presidente da Província ao Ministro da Agricultura,
Comércio e Obras
- 448-

Mais uma vez o Presidente da Província coloca-se ao lado dos


proprietários rurais, opinando favoravelmente à adoção da medida,
consid~rando que:

a simples medição, demarcação e discriminação não


impedirá os atentados praticados por indivíduos mll intencionados
que se dizem descendente dos índios e que vivem à custa dos
gados e plantações alheias que constantemente devastam ocor ên-
cia que por mais de uma vez tem dado origem a várias reclama-
ções ... " (94).

Conclu~ apresentando as vantagens que, no seu modo de ver, ad-


virão de tal !legócio:

"A a~rem1tação do pequeno espaço, onde outrora foi estabe-


lecida a Aldeia de Água Azeda, trará alem da vantagem à Fa-
zenda Púb~ica a tranquilidade de muitos proprietários da Ribei-
ra, do Vasa Barris, po: ato este que dio deixará t'.mbem de influir
a bem da Agricu'tu~a" (95).

o Barão de Estância não era aliás o único interessado nas terras


de Água Azeda, e assim outros proprietários de engenhos confinantes
com a aldeia, encabeçadas por Sílvio Anacleto de Souza Bastos, re-
querem ao Governo Central, em 1870, que as tais terras fossem ven-
didas em hasta pública (96). A este requerimento acompanhado de
um "ofício confidencial" do Presidente da Província responde o Mi-
nistério de Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas que
nada poderia resolver a este respeito, enquanto não fossem medidas as
ditas terras, conforme fora determinado (97).
A medição dos terrenos era, pois, o ponto de partida para a ven-
da, sendo então nomeado o Bacharel Antônio Dias dos Santos para
chefiar os trabalhos que foram des.envolvidos em agosto de 1870 com
a presença dos proprietários confinantes interessados: Antônio Dias
Coelho e Melo, Barão de Estância e dono do Engenho Escurial; Cel.
Domingos Dias Coelho e Melo, Barão de Itaporanga e proprietário do

(94). - Ibidem.
(95). - Ibidem.
(96). - Ofício do Ministério da Ag:icultura, Comércio e Obras Públi-
cas ao Presidente da Província de Sergipe. 21/5/1870. Ms. do APES Pac.
- 449-

engenho do mesmo nome; Sílvio Anacleto Souza Bastos, do engenho


Itaperoá e Cap. Joaquim Rodrigues Dantas Portela (98).
O interesse demonstrado pelos vários proprietários cujas terras
confinavam com a aldeia, mostra mais uma vez que o problema funda-
mental não era a simples vizinhança incômoda dos índios, mas o de-
sejo de ampliar os seus domínios territoriais, incorporando as terras
que eles ocupavam, adquirindo-as em hasta pública por baixo preço,
único compativel com a esterilidade aue se lhes atribui a . Com efeito,
o engenheiro encarregado da medição~ por sinal da parentela Coelho e
Melo (99), dizia, em seu relatório, que era:

..... meia légua em quadro de terreno agreste de fo~·mação


aluvial nimiamente esteril e imprestavel para a colonização e
até mesmo para a criação, por cuja razão e apesar de Sll'l exten-
são, reputo não valer um conto de reis" (100).

Neste parecer exagerava-se decerto muito propositadamente a má


qualidade dos terrenos, pois muitos outros documentos registram que
as terras se prestavam para criação de gado.
E possivel que os descendentes dos índios, diante da medição das
terras, tenham reclamado seus direitos, pois, de acordo com a lei n.o
1 . 174 de 27 de setembro de 1860, os terrenos das extintas aldeias po-
deriam ser vendidas depois que se tivesse dado aos índios que aí per-
manecessem e requeressem, a terra que se julgasse suficiente para sua
sobrevivência (101) .0 fato é que o Governo Central não autorizou a
venda, e anos mais tarde, em 1875, através da Diretoria da Agricul-
tura, o Governo Imperial ordena que as terras de Água Azeda sejam
discriminadas de conformidade com a lei 1.114 de 1860 (102). Os
trabalhos foram confiados ao Engenheiro Aristides Armindo Guaraná,
tambem nomeado Juiz Comissário para os processos de posse de re-

(98). - Termo de medição e discriminação das terras devolutas do ex-


tinto aldeamento de índios de Água Azeda. 30/8/1870. Ms. do APES, pac.
283 e SEBRÃO SOBRINHO, op. cit., p. 60.
(99). - GUARANÁ (Armindo), op. cito
(100). - Termo de medição e discriminação das terras devolutas do
extinto aldeamento de índios de Água Azeda. 30/8/1870. Ms. do APES.
Pac. 283.
(101). - Leis do Império. Tomo XXI p. 74.
(102). - Ofício da Secretária de Estado dos Negócios da Agricultura,
ao P:esidente da Província de Sergipe, 23/4/1875. Ms. do APES, Pac. 418 e
Ofício do Presidente ao Engenheiro Aristides Guaraná, 10/1/1876. Ms. do
APES
- 450-

validação das terras (103). Iniciados em janeiro de 1876, parecem


concIuidos em 1877, tendo-se gasto na discriminação a quantia de 2
contos e quinhentos (104), quantia muito alem daquela em que esta-
vam avaliados os ditos terrenos.
Não tivemos, até o momento, acesso aos resultados do trabalho
de Guaraná, mas ao que tudo indica não foram do agrado dos proprie-
tários da região que, liderados por Domingos Dias Coelho e Melo,
fazem representação ao Governo Imperial em 1878, reclamando con-
tra a:

u:u"pação de terras petencentes ao extinto aldeamento


de ÁgUl Azeda e pedem providências no sentido de se-em as
me~m1S te,ras incorporadas nos p'óprios nacionais" (05).

Estas são as últimas notícias que, até o momento, conseguimos a


respeito das terras dos índios de Água Azeda, referentes ao século
XIX. Até então, a centralização política do Império, a indefinição e
ambiguidade do Governo Central em relação ao problema tinham sus-
tado a pretensão dos proprietários rurais de legalização de posse sobre
as referidas terras; ou, pelo menos, sobre a meia légua em quadra na
qual, ao que tudo indica, continuava habituando uma população que
se identificava como de ascendência indígena, servindo-se da identi-
dade étnica na sua luta pelo acesso à terra. cuja posse havia sido dada
aos índios e seus descendentes, por títulos legais emitidos durante a
administração portuguesa.
* *
*
CONCLUSÕES.

o estudos das relações entre brancos e índios numa área de an-


tiga ocupação e economia açucareira, durante o século XIX, evidencia
aspectos particulares, porem não singulares, de um processo histórico
que, iniciado no Brasil desde o século XVI, se desenrola até o pre-
sente - a espoliação das terras dos índios pelos civilizados.

(l 03) - Relatório com o Exmo. Sr. Dr. Cipriano de Almeida Sebrão


passou a Administração da Província ao Exmo. Sr. Presidente Dr. João
Ferreira de Araujo Pinho em 24/211876. APES.
(104). - Ofício do Ministé io da Agricultu"a. Comércio e Obras Públicas
ao Presidente de Sergipe. 19/10/1877 Ms. do APES. Pac. 419.
(105). - Ofício do Ministério da Agricultura Comércio e Obras Públicas
ao Presidente de Sergipe. 30/4/1878. Ms. do APES Pac.
- 451-

No caso específico, em que a posse da terra parecia constituir-se


no interesse central dos regionais em relação aos nativos, a transferên-
cia destes para outra localidade e, mais tarde, a negação da existência
de índios, então apresentados como mestiços assimilados aos regio-
nais, constituem-se em estratégias utilizadas pelos civilizados, na tenta-
tiva de alienar as terras dos índios e pleitear a posse legalizada das
mesmas, utilizando-se então da intermediação dos Presidentes de Pro-
víncia quase sempre identificados com os interesses regionais. A cen-
tralização política do Império e a descontinuidade de ação relativa-
mente às terras devolutas de Sergipe, tudo indica que, no caso em es-
tudo, funcionaram como barreiras às pretensões dos proprietários de
engenho, que, ao iniciar-se o último quartel do século XIX, não tinham
conseguido a posse legalizada sobre as terras, em tomo das quais se
centralizavam os antagonismos e interesses em oposição dos índios e
dos brancos, configurando a situação de fricção interétnica.
Este estudo sobre a história de Água Azeda confirma que, tam-
bem em relação ao século XIX, são válidas conclusões resultantes de
pesquisas realizadas entre grupos indígenas do presente, ou seja, a
posse ej ou propriedade da terra é elemento fundamental para a com-
preensão das relações entre índios e brancos.

* •

INTERVENÇOES.

Do Prof. Paulo Miranda Gomes (Minas Gerais).


Qual foi a participação dos alunos em sua pesquisa?
N a medida em que os indígenas não participavam da mão-de-
obra local e foram marginalizados, porque é que eles não foram sim-
plesmente dizimados?

Da proLa Maria Hosana de Souza (Sergipe).
Como funcionava a Diretoria dos índios?

- 452

• *
*
RESPOSTAS DA PROFESSORA BEATRIZ GóIS DANTAS.

Respondeu:
Ao Prof. Paulo Miranda Gomes.
"Os alunos participaram na fase de coleta de dados, pesquisando,
sob nossa orientação, no Arquivo Público do Estado de Sergipe, loca-
lizando, selecionando e copiando os documentos.
Embora o uso da força por parte dos civilizados tenha sido cons-
tatado em diferentes momentos da história do grupo indígena, acre-
ditamos que a proximidade da aldeia em relação a capital da Província
e a recorrência dos índios ao Governo Central, decerto instruidos por
elementos do mundo civilizado, constituiram-se talvez, entre outros fa-
tores, em obstáculos a uma dizimação dos índios" .

À prof.a Maria Hosana de Souza.
"A Diretoria dos lndios instalada em Sergipe no ano de 1847
tinha um titular nomeado pelo Governo Central que deveria exercer
vigilância sobre as relações entre índios e civilizados, fiscalizar a apli-
cação das rendas das aldeias, arrendar as terras dos índios etc. Era
auxiliado pelos diretores parciais que atuavam especificamente em ca·
da uma das aldeias" .
*
À Prof.a Hélia Paula.
"Em Agua Azeda, atualmente, há alguns indivíduos que se con-
sideram descendentes dos índios, e como tais, com direito às terras da
antiga aldeia, que até hoje têm sua posse disputada pelos fazendeiros
das vizinhanças."
A LEI DAS TERRAS DE 1850 E A IMIGRAÇÃO (*).

GEORGE P. BROWNE.
Seton Hall University
South Orange, N ew J ersey
E. U. A.

Desde o período colonial, a política imigratória do governo bra-


sileiro visou o desenvolvimento agrícola e a ocupação do território do
Brasil (1). Esta tradição, fielmente seguida pelos governos do Brasil
imperial criou estreita ligação entre imigração e a política territorial
destes governos, a qual transparece nos antecedentes, nas disposições,
e nas tentativas de implementação da Lei de 18 de setembro de 1850,
a chamada Lei das Terras. A presente comunicação tenciona traçar
estas ligações e analisar os efeitos da política territorial sobre a imi-
gração no período imperial.
No princípio da época imperial, a política territorial herdada do
Brasil colonial impunha sérios obstáculos ao desenvolvimento de uma
política imigratória acolhedora ao agricultor europeu. O sistema de
doação de sesmarias tomara-se no Brasil veículo para a alienação de
vastas e mal definidas porções do território nacional. Tentativas de
coibir a distribuição exagerada de sesmarias levara à ocupação de ter-
ritórios tambem vastos por posseiros a quem tradições de gerações
(*). - Comunicação apresentada na 3\1 Sessão de Estudos, Equipe B,
no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Veja Manuel Diégues Júnior, "Contribuição dos casais ilhéus à
fixação do 'Uti-Possedetis,''' Revista de Imigração e Colonização, IX, 2 (1948),
8-15; Francisco Adolfo de Varnhagen, História Geral do Brasil; antes de sua
separação e independência de Portugal (4a ed.; 5 vol.; São Paulo: Companhia
Melhoramentos de São Paulo, 1926?-1936?), 11, 185; Artur César Ferreira
Reis, "Os açoreanos e a integridade territorial do Brasil," Revista de Imigração
e Colonização, VIII, 4 (1947), 5-9; C. R. Boxer, The Golden Age of Brazil,
1695-1750; growing pains of a colonial society (Berkeley: University of Cali-
fo:nia Press, 1969), pp. 246-250; Dauril Alden, Royal Government in Colonial
Brazil, with special reference to the administration of the Marquis of Lavradio,
Viceroy, 1769-1779 (Berkeley: University of Çalifornia Press,
- 454-

dariam direitos indefinidos. A ausência ou imprecisão das demarcações


de terras juntava-se a estas tradições pródigas para dar ao novo país um
sistema caótico de posses. Em 1822 Gonçalves Chaves concluiria que,
embora a população brasileira fosse diminuta relativamente ao território,
as terras iá estavam divididas e possuidas, com exeção daquelas sujeitas
a invasões indígenas, que monopolistas possuiam até vinte léguas qua-
dradas de terras onde não permitiam que ninguem se fixasse, que ha-
via muitas pessoas que vagavam pelo país sem conseguir terras pró-
prias e que como resultado a agricultura brasileira era das mais atra-
sadas das eJ\.istentes (2). Neste ambiente onde a posse de terras equi-
valia à riqueza, onde demarcação, registro, e posse de terras era fre-
quentemente irregular, o propósito de povoar o Brasil com milhões de
colonos europeus (3), exigia medidas que definiriam e libertariam ter-
ras públicas para serem concedidas aos colonos.
Bom exemplo dos problemas de aquisição de título definitivo à
terra vê-se na experiência de um dos colonos suiços vindos ao Brasil
ainda no reinado de Dom João VI. Como muitos de seus companhei-
ros fundadores de Nova Friburgo, João Lourenço Sadenberg havia
abandonado as terras que recebera naquela colônia e recebido outras
terras perto do Rio Macaé (4). Em 1846 ele teve que recorrer ao
Conselho de Estado diante da ameaça de perder boa parte das terras
que o governo brasileiro lhe dera em 1821. A Viscondessa de Ca-
choeira, após um lapso de muitos anos, mandara medir a demarcar
uma sesmaria, e ficara claro que parte das terras concedidas a Sa-
denberg estavam dentro dos limites da dita sesmaria. A despeito do

(2). - Citado em Rui Cirne Lima, Terras Devolutas (Porto Alegre,


1935), pp. 33-34. Veja tambem Hélio Vianna, História do Brasil (7a. ed.; 2
vol.; São Paulo: Edições Melhoramentos, 1970), I, 238-239; T[homas] Lynn
Smith, Brazil; People and Institutions (ed. revisada; Baton Rouge: Louisiana
State University Press, 1963), pp. 266-270, 286-287, 290, 324.
(3). - Veja José Bonifácio de Andrada e Silva, "Instruçoens particulares
para servirem de regulamento ao Sr. Jorge Antonio de Scraeffer na missão
com que pa te desta Corte para a de Vienna de Austria e outras, 21 de Agosto
de 1822," pp. 1-3; e Jorge Antônio de Scheffer a José Bonifácio de Andrada e
Silva, Le Havre, s.d. f18231, ambos em Brasil, Ministério de Relações Exte-
riores, Missões Diplomáticas Brasileiras, Hamburgo, Offícios de Schaeffer,
1822-1828, Arquivo Hist6dco do Itamarati, 271/1/1.
(4). - Veja "Decreto de 6 de maio de 1818", Brasil Colleção das leis
do Brasil de 1818 (Rio de Janei-o: Imprensa Nacional, 1889), p. 40; "Aviso de
29 de agosto de 1821," José Paulo de Figueiroa Nabuco Araújo, Legislação
Brazileira, ou Colleção Chronologica das leis, decretos, resoluções de consulta,
provisões, etc., etc., do Imperio do Brazil, desde o anno de 1808
- 455-

argumento do colono que os recepientes originais da sesmaria jamais


haviam validado seu título às terras, o Conselho de Estado concluiu
seu exame do assunto reconhecendo que a justiça provavelmente daria
ganho de causa à pretenção mais antiga da Viscondessa, e que so-
mente restaria ao governo imperial recompensar ao colono Sadenberg
pelos prejuizos sofridos (5). Estas falhas e falta de segurança nos tí-
tulos de terra, a ameaça de que após anos de trabalho e de melhora-
mento das terras o imigrante pudesse ser assim despejado, criava um
crma de absoluta desconfiança no sistema de posse das terras, justa-
mente entre aqueles que o governo imperial tentava atrair: colon\)s
europeus desejosos de tornarem-se proprietários.
Reconhecendo a necessidade de se criar um sistema racional de
discriminação e alienação de terras públicas, resolveu o governo im-
perial suspender a concessão de sesmarias pouco tempo após a pro-
clamação da Independência (6). Em teoria, esta suspensão daria tem-
po ao governo para formular a legislação necessária, mas interviria
mais de um quarto de século antes da adoção da lei. Neste intervalo
a invasão de terras continuou, e mesmo o governo imperial contribuiu
para futuras confusões na discriminação de títulos, autorizando distri-
buições especiais de terras em várias ocasiões (7).
Pontua-se o longo hiato entre a suspensão da concessão de ses-
marias e a adoção da lei das terras em 1850 por lembranças ao go-
verno da conveniência de tal legislação. Em 1829 e 1830, Dom Pe-
dro I recomendou ao parlamento a criação de "um bom regulamento
para a distribu:ção das terras incultas," como med:da para encorajar
a imigração (8). Ministros, presidentes provinciais, e governos muni-
cipais fizeram eco a esta idéia durante as décadas seguintes (9). Tí-

(5). - Brasil, Conselho de Estado, seção dos negócios do Império,


"Parecer sobre o requerimento em que João Lourenço Sadenberg, um dos
Colonos Suissos da Colonia de Nova Friburgo, se queixa de ter sido privado
de parte das terras", Arquivo Nacional, seção histó:ica, códice 276, I, 225-229.
(6). - Smith, Brazi/, pp. 268, 290.
(7). - Veja George P. Browne, Government lmmigration Policy in
Imperial Brazil, 1822-1870 (Ann Arbor, MI: University Mic~ofilmas, 1972),
pp. 222-225.
(8). - Brasil, Falias do Throno desde 1823 até o anno de 1889 acom-
panhadas dos respectivos votos de graças da camara temporaria; e de diferentes
informações e esclarecimentos sobre todas as sessões extraordinarias, adia-
mentos, dissoluções, sessões secretas e fusões com um quadro das epochas e
motivos que deram lugar a reunião das duas tamaras e competente histórico
collegidas na secretaria da camara dos deputados (Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1889), 167, 169.
(9). - Veja Joaquim Vieira da Silva e Sousa,
- 456-

pico é uma relatório do presidente de Santa Catarina citado pelo Mi-


nistro do Império, Cândido José de Araujo Viana, em 1842.

"Na ilha, e em todo o litoral do continente (diz ele) vem-se


apinhoados centenares de homens trabalhando a terço e con-
sumindo-se para tirarem a custo escaça subsistência de terras
já d'ha muito este~ilisadas, ao mesmo tempo que tem á vista,
e á mão, vastos terrenos ferteis, que não podem rotear com a
certeza de as possuir em . Tenho exigido informações ácerca do
numero de chefes de família. que, não tendo terras proprias, as
desejão como colonos; e das já recebidas de sete districtos, que
não são os mais populosos, vejo que sobe a 431 o nume:o delles,
com 1.633 pessoas de familia" (lO).

Tais lembranças não provocaram ação legislativa, especialmente du-


rante as regências, quando questões de imigração e terras cederam a
primazia a outros acontecimentos (11). Um projeto de lei introduzido
na Câmara dos Deputado sem 1830 jamais chegou a ser colocado na
pauta para debate (12).
Efetivamente, o trabalho legislativo que conduziria à lei das ter-
ras teve seu início em 1838 com a introdução na Câmara de dois pro-
jetos para incentivar a imigração (13). Em 1840, quando se iniciou o
debate desses projetos prontamente lembrou-se a conveniência duma
conjunção de terras públicas e incentivo à imigração. Foi nomeada
uma comissão da Câmara, para reconciliar os dois projetos e encon-
trar uma fórmula que permitiria a venda de terras públicas e a utiliza-
ção das receitas para auxiliar a imigração. A comissão trouxe à Câ-

á Assembléa Legislativa na sessão ordinaria de 1836 (Rio de Janei~o: Typogra-


phia Nacional, 1836), p. 22; Antônio Paulino de Abreu, Relatorio da reparti-
ção dos negocios do imperio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na
sessão ordinaria de 1837 (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1837), p.
20; Brasil, Annaes do Parlamento Brasileiro. Camara dos Srs. Deputados (Rio
de Janeiro: várias editoras, 1857-1889), 1829, IV, 103; 1832, 11, 29-32 [esta
obra será citada como Brasil, Anais da Câmara (data)l; "Decisão de 6 de
outubro de 1832", B:asil, Collecção das decisões do governo do Imperio do
Brasil de 1832 (Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1875), p. 301 [esta obra
será citada como Brasil, Decisões de (data) 1.
(10). - Cândido José de Araújo Viana, Relatorio da Repartição dos
Negocios do 1mperio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na 1'J sessão
da 5~ Legislatura (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1843), p. 22.
(11). - George P. Browe, "A política imig:atória no Brasil regência",
Blumenau em Cadernos, XVI, 1 (1975), 3-14.
(12). - Brasil, Anais da Câmara, 1830, lI, 605-607.
(13). - Brasil, Anais da Câmara,
- 457-

mara um projeto que propunha modestos impostos sobre proprieda-


des rurais e autorizaria o governo a levantar empréstimos contra esta
fonte de renda para estimular a imigração (14). Embora este projeto
tambem não chegasse a ser debatido, sua influência reflete-se nitida-
mente no projeto preparado pelo Conselho de Estado e introduzido
por Joaquim José Torres em 10 de junho de 1843 (15). Após extenso
debate, o projeto foi adotado pela Câmara dos Deputados em setem-
bro de 1842, e enviado ao Senado. Este projeto inclui a provisões que
regulariam os processos de registro de terras, definiriam terras públicas
ou devolutas, vedariam a alienação de terras devolutas a não ser por
venda, imporiam impostos às terras rurais, e dirigiriam a renda destas
duas fontes à promoção da imigração (16).
No Senado o projetou vegetou por seis anos sem ação definitiva.
Neste tempo aumentar-se-ia o interesse na imigração, e sucessivos Mi-
nistros do Império queixariam que sem legislação regulando a posse
de terras não se podia efetivamente promover a imigração (17). O
projeto que finalmente foi devolvido à Câmara para sua aprovação e
eventual promulgação como a Lei de 18 de setembro de 1850 continha
importantes emendas (18). O imposto sobre terras incluido no pro-
jeto original fora removido. Os donos de terras receberiam a primeira
oportunidade na compra de terras devolutas contíguas às suas quando
o governo as oferecesse para venda. Autorizava-se a criação de uma
Repartição Geral das Terras Públicas que seria

"encarregada de di:igir a medição, divisão, e descripção das


terras devolutas, e sua conservação, de fiscalisar a venda e distri-

(14). - Brasil, Anais da Câmara, 1840, I, 214, 217-219, 407-409, 414-


425.
(15). - Brasil, Anais da Câmara, 1843 (2\\ sessão), I, 592.
(16). - Brasil, Anais da Câmara, 1843 (2<1 sesão), 11, 118, 348-353, 379-
398, 400-416, 419-425, 439-499, 452-471, 490-505, 660-672, 682-695, 704-719,
737-751, 762-773, 782-793, 799-808, 826, 843, 851-865, 868-879, 891-901, 901-
909, 925-933; m, 27-29. 93-94, 159-163.
(17). - José Carlos Pereira de Almeida Torres, Relatorio da Repartição
dos Negocios do Imperio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na 3<1
sessão da 5i! Legislatura (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1844), pp.
25-26; Joaquim Marcelino de Brito, Relatorio da Repartição dos Negocios do
Imperio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na 3i! sessão da 6a. Legis-
latura (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1846), p. 29; Visconde de
Monte Alegre fJosé da Costa Carvalhol, rRelat6rio do Ministério do Império
de 18501 Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1850), p. 39.
(18). - Brasil, Anais da Câmara, 1850 (2<1
- 458-

buição dellas, e de promover a colonização nacional e estrangei-


ra" (19).

Nem a Lei das Terras, nem o Decreto de 30 de janeiro de 1854,


que a regulamentou, conseguiram resolver as confusões existentes na
posse de terras. Houve resistência geral às tentativas de se fazer re-
gistrar e demarcar as terras a particulares. Em 1861, com a criação
do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, a Reparti-
ção Geral das Terras Públicas foi abolida, e a responsabilidade do re-
gistro de títulos passou aos governos provinciais (20). A validação de
títulos cessou quase por completo, e a ocupação de terras públicas che-
gou a proporções nunca antes atingidas (21). Mesmo o governo im-
perial frequentemente infringiu as disposições que proibiam a aliena-
ção de terras a não ser por venda (22). Quase se pode dizer que a
Lei das Terras não passou de um plano para regularizar a política ter-
ritorial do governo imperial, e na medida em que deixou de ser posta
em execução deixou de resolver o problema da aquisição de terra com
título garantido para o colono imigrante.
Mesmo assim, a Lei das Terras permitiu o desenvolvimento de
companias de colonização e a aquisição de terras por imigrantes. O
Conde de Montraveal comprou terras para fundar Santa Maria da Sole-

(19). - "Lei de 18 de setembro de 1850", Brasil, Collecção das leis do


Imperio do Brasil de 1850 (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1851), I,
n.
307 -313 [a Collecção da leis. .. será citada como Brasil, Leis de (data
(20). - "Decreto de 28 de julho de 1860", "Dec~eto de 16 de feve-eiro
de 1861", Brasil, Ministério da Justiça e Negócios Interiores, Arquivo Nacional,
Organizações e Programas Ministeriais; Regime Parlamentar no Imperio (2\1
ed.; Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1962), p. 126n; Brasil, Anais da
Câmara, 1858, 11, 35; 1859, I, 66; Luís Manoel de Albuquerque Galvão, Rela-
taria sobre as colonias Blumenau, Itajahy, Principe D. Pedro e D. Francisca
(Pro~iflcia de Santa Catharina) apresentado ao ministerio da agricultura, com-
mercio e obras publicas . .. em 9 de março de 1871 (Rio de Janeiro: Typogra-
phia Nacional, 1871), p. 15.
(21). - H. Vianna, História do Brasil, 11, 180; Galvão, Relatório, p.
15; Godolphim Torres Ramos, "Terras e colonização no Rio G -ande do Sul",
Revista de Imigração e Colonização, I, 4 (1940),740-741; Smith, Brazil, pp.
273-276.
(22). - "Decreto de 7 de agosto de 1852, condição 22", "Decreto de 30
de agosto de 1852, condição 14", "Decreto de 20 de outubro de 1852, art. 8",
Brasil, Leis de 1852, 11, 350, 362, 385; Brasil, Conselho de Estado, seção dos
negócios do imperio, "Parecer de 26 de maio de 1854", Arquivo Nacional,
seção histórica, códice 276, lU, 289-290; "Dec~eto de 8 de julho de 1854",
Brasil, Leis de 1854, lI, 257; "Decreto de 21 de outubro de 1857, condição 25",
Brasil, Leis de 1857, lI, 358; Sérgio Teixeira de Macedo, Relató'-io apresentado
á Assembléa Geral Legislativa pelo Ministro e Secretario de Estado dos Negocioy
73; "Aviso de 27 de ma~ço de 1863", "Aviso de 28 de março de 1863",
- 459-

dade no Rio Grande do Sul; prometeu-se terras à Associação Central


de Colonização para quaisquer imigrantes que trouxesse ao Brasil;
guarantiu-se à Companhia de Colonização de Hamburgo, alem das ter-
ras que obtivera do dote da Princesa Dona Francisca; reservou-se gran-
de área do Vale do Itajaí para o desenvolvimento da Colônia Blume-
nau; e muitos outros grupos conseguiram terras para colonização ue
acordo com os termos de Lei (23).
Pela Lei, indivíduos poderiam comprar terras em lotes de 250,000
braças quadradas, ou seja 121 hectares, mas teriam que pagar à vista.
As terras seriam classificadas em quatro qualidades e vendidas a um pre-
ço mínimo de meio real a dois reais a braça quadrada. Tanto o ta-
manho dos lotes como o requisito de pagamento à vista dificultavam
sobremaneira a compra de terras para a grande maioria de imigran-
tes. Resolveu portanto o governo que nas colônias imperiais os lotes
poderiam ser subdivididos e que os colonos poderiam pagar o preço
num prazo de cinco anos (24). Em 1867, o Regulamento para as co-
lônias imperiais permitiria maior subdivisão dos lotes e pagamento em
cinco prestações anuais a partir do segundo ano de ocupação do lote
(25). Estas modificações da Lei de 1850 facilitariam o desenvolvi-
mento da imigração e o crescimento da mesma e das colônias de pe-
quenos proprietários. Surgiriam porem críticos que apontariam falhas
na legislação que, julgavam os críticos, impediam ainda maior cresci-
mento da imigração.
O ponto mais criticado foi a ausência de imposto territorial na
legislação fundamental. Os preponentes do imposto arguiam que o
mesmo forçaria os proprietários ou a fazerem uso lucrativo de suas
terras ou as venderem, de qualquer maneira abrindo possibilidades de
trabalho ou reservas de terras ao colono. O projeto adotado em 1843
pela Câmara propusera um imposto de 500 réis por quarto de légua
quadrada de terras aráveis, e 125 réis por quarto de légua de pasto
(26). Como já notamos, o Senado, sensivel aos interesses latifundiários

(23). - "Aviso de 14 de abril de 1855", "Aviso de 18 de setembro de


1855", Brasil, Decisões de 1855, pp. 512-513,533; "Decreto de 28 de março de
1857, art. 1", Brasil, Leis de 1857, 11, 124-125; "Decreto de 1 de maio de
1858, art. I", Brasil, Leis de 1858, 11, 234-235; Manoel Pinto de Sousa Dantas,
Relatorio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na primeira sessão da
decima terceira Legislatura pelo ministro e secretario de estado dos negocias
da Agricultura, commercio e obras publicas (Rio de Janeiro: Typographia
Perseverança, 1867), anexo F.
(24). - "Aviso de 27 de fevc:reiro de 1856", Brasil, Decisões 1856,
pp. 134-136; "Decisão de 11 de novembro de 1862", "Decisão de 13 de novem-
bro de 1862", B:asil, Decisões de 1862, pp. 416-417,420-421.
(25). - "Decreto de 19 de janeiro de 1867, art. 4-6", Brasil Leis de
1867, 11, 32-33.
(26). - Brasil, Anais da Câmara, 1843 (2\1. sessão), 111,162.
- 460-

removeu o imposto do projeto de lei, mas o assunto não morreu com


a passagem da lei. Em 1845, Manoel Felizardo de Sousa e Melo, se-
nador e diretor da Repartição Geral das Terras Públicas, solicitou no-
vamente a adoção de um imposto territorial.

"Um dos abusos que naturalmente farão os especuladores da


lei de 18 de setembro de 1850, será o de comprarem os melho-
res lotes de terras ... , e conservá-los incultos á espera de que o
augmento de população e de riqueza faça crescer o valor daquel-
les, e então realisar grandes lucros. Se com este procedimento
apenas soffressem os interesses do thesouro, ainda assim convinha
corta-lo; porém tendo elle tambem outro alcance, por atacar
gravemente o fim da lei - a Colonisação - ugente me pare-
ce tomar quanto antes providencias que embaracem este mal.
O que se offerece á primeira vista é o imposto territorial; del-
le se lançou mão nos Estados Unidos, e o governador da Aus-
tralia o reclamou como meio de impedir a acumulação das me-
lhores. terras em mãos que as conse.vavão inuteis, e com prejuiso
da emigração.
O remedio indicado não é novo, no projecto de lei de terras
enviado pela camara dos deputados ao senado, vinha elle; razões
porém, que não me cumpre agora avaliar, o supprimirão.
O estudo e observações posterio es talvez tenhão mojificado
a opinião dos legisladores; e quando não se julgue conveniente
estender o imposto territorial a toda,s as terras particulares, cre-
ando-se assim uma renda certa e independente das crises com-
merciaes, acredito que uma imposição moderada sob e as terras
devolutas, que se forem vendendo, não encontrará os preco:Icei-
tos que fierão modificar, na parte de que trato, o projecto primi-
tivo da lei das terras" (27).

Os argumentos de Melo, e de outros que levantariam novas razões


para a imposição de impostos territoriais não conseguiriam nenhum
resultado. O imposto territorial ameaçava os interesses daqueles cuja
opinião era decisiva no Brasil império. Mesmo com o apôio de figu-
ras com o realce de Zacarias de Góis e Vasconcelos, de Tavares Bas-
tos, e de quase todos os Ministros da Agricultura, um imposto sobre
terras rurais não podia ser adotado (28).

(27). - "Relatorio da Repartição Geral das Terras Publicas", p. 18,


apenso a Luís Pedreira do Couto Ferraz, Relatorio apresentado á Assembléa
Geral Legislativa na terceira sessão da nona legislatura pelo ministro e secre-
tario de estado dos negocios do lmperio (Rio de Janeiro: Typographia Uni-
- 461-

Outra falha apontada pelos críticos na Lei das Terras foi a inca-
pacidade de suas provisões para facilitar a abertura de terras pr6ximas
a mercados de consumo para colonos imigrantes. Desde o período das
Regências reconhecera-se as vantagens de colocar as colônias agrícolas
em lugares acessíveis a mercados onde poderiam os colonos vender
seus produtos (29). Acesso a mercados continua a ser um tema na
literatura sobre o fomento de imigração durante o segundo Império
(30). Mas o reconhecimento do assunto não facilitou sua aplicação.
As falhas, e a inexecução, da Lei das Terras impossibilitava a discri-
minação de terras públicas junto a cidades, estradas, ou rios navegá-
veis. A inexecução das provisões que requeriam o registro universal
de títulos, o fechamento das repartições de terras públicas, a rigidez
de um sistema de hipotecas territoriais imposto pelo requerimento de
alienação somente por venda de terras, a contínua aquisição fraudu-
lenta de terras, a ausência de impostos territoriais acumularam para
restringir a imigração e impossibilitar ao governo a criação de colô-
nias com acesso facil aos mercados. Embora existissem terras ociosas
e acessíveis, não podia o governo lançar mão delas. Em 1871, Luís
Manoel de Albuquerque Galvão lamentava o atraso das colônias em
Santa Catarina.

"Outras causas contribuem para o atrazo das colonias, taes


são a existencia de grandes proprietarios de terras incultas e des-
povoadas entre as colonias e o litoral, terras fertilissimas que se
achão sem cultura alguma, e pelas quaes os p:"oprietarios não pa-
gam o minimo ao Estado" (31)"

Percebendo a ineficácia da Lei das Terras para facilitar o acesso


às colônias, teve o governo que procurar outros meios. Forçado a co-
locar colônias em locais isolados onde se podia encontrar terras pú-
blicas, teve o governo que gastar somas consideráveis na construção
de estradas e vias de comunicação com as colônias. No orçamento
imperial para 1857-1858, se propôs o governo a gastar mais de uma
terça parte dos dinheiros de colonização na abertura de estradas e na

(29). - José Lino Coutinho, [Relat6rio do Ministério do Império de


1832] (Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1832), p. 9; J. V. Sousa,
Relat6rio de 1835, p. 25; Francisco de Paula de Almeida e Albuquerque, Re-
latorio apresentado á Assembléa legislativa na sessão ordinaria de 1839, pelo
ministro e secretario de estado interino dos nego cios do lmperio (Rio de Ja-
neiro: Typographia Nacional, 1839), pp. 29-30; Brasil, Anais da Câmara,
1838, I, 351-352; 1840, I, 408, 742.
(30). - Veja
- 462-

medição e demarcação de terras (32). Mesmo assim o processo de


abertura de estradas era moroso e difícil, e a colonização dependente
deste processo tambem não progredia a contento. Como concluiu o
Ministro da Agricultura, Joaquim Antão Fernandes Leão, em 1869,
"Desenganemo-nos; o interior do paiz, salvo rarissimas excep-
ções, que ainda explicão e confirmão a regra não ha de ser po-
voado emquanto não fôr cortado de estradas commodas e de facil
accesso a carros. E, como os unicos meios de que dispomos nos
não permite realizar este deside-atum, cumpre procurar outros
para a solução do problema" (33).

Mas outras soluções, como o de comprar terras para colônias


perto das estradas de ferro (34), não passaram de planos, e o cresci-
mento da corrente imigratória brasileira continuaria restrita pela di-
ficuldade de aquisição de terras para se cultivar com proveito.
Em conclusão, a política territorial do governo imperial fez pou-
co para encorajar a imigração, como demonstra o efeito da Lei das
Terras de 1850, expressão máxima desta política. Apesar de definir,
discutir e propor soluções aos entraves relativos à imigração, o gover-
no nunca se dispôs a resolver o emaranhado das posses e títulos, a
impor um imposto territorial, a proceder ordenadamente, a resolver os
problemas de comunicação. Os valores de uma sociedade que punha
alto valor na posse da terra bloqueava as tentativas daqueles que vi-
savam utilizar a política territorial para tornar o Brasil atraente ao
imigrante. O sistema de demarcação e confirmação de títulos conti-
nuou caótico após do fim do século. A imposição de impostos terri-
toriais ainda não está bem implantada no Brasil. Ainda hoje o governo
luta para abrir regiões mal habitadas com programas enormes de cons-
trução de estradas.
Encontrando terras disponíveis para colonização somente em áreas
remotas, não pôde o governo, com algumas exceções, usar as terras
para concessões a indivíduos ou companhias que patrocinariam imigra-

(32). - Manoel Felizardo de Sousa e Melo, "Relatorio da Repartição


Geral das Te:ras Publicas", quadro 8, apenso a Luís Pedreira do Couto Ferraz,
Relatorio apresentado á Assembléa Geral Legislativa na quarta sessão da nona
legislatura pelo ministro e secretario d'Estado dos negocias do lmperio (Rio
de Janeiro: Typographia Nacional, 1856).
(33). - Relatório apresentado á Assembléa geral legislativa na primeira
sessão da décima quarta legislatura pelo ministro e secretario de estado dos
negocias da agricultura, commercio e obras publicas (Rio de Janeiro: Typo-
graphia do Diario do Rio de Janeiro, 1869), p. 63.
(34). - "Lei de 27 de setembro de 1860, at. 11, par. 26", Brasil, Leis
de 1860, I, 77; Brasil, Anais da Câmara, 1861, m, 280.
(35). - Richard Graham, Britain and the Onset of Modernization in
Brazil, 1850-1914 (Cambridge University Press,
- 463-

ção. Estradas de ferro ficariam na dependência de garantias de juros,


ao contrário do exemplo norte-americano (35). Somente no Rio Gran-
de do Sul, onde colonizadores particulares fizeram um negócio lucra-
tivo da venda de terras aos imigrantes (36), as tentativas de persuadir
os latifundiários a estabelecerem colônias não tiveram sucesso. Em
1887 Luís Couty comentaria que imigrantes em São Paulo não com-
prariam terras de fazendeiros, ainda que achassem terras disponíveis,
por receio de serem ludibriados ou de não conseguirem título defini-
tivo às terras (37) . Enfim, embora adotando uma política imigratória
destinada a atrair imigrantes que se tornariam pequenos proprietários,
o governo imperial reconheceu a estreita ligação entre as políticas de
terras e de imigração mas não conseguiu fazer da primeira alavanca
de apôio à segunda. A Lei das Terras de 1850, dando definição à po-
lítica territorial ajudou e facilitou o crescimento da imigração, mas
suas falhas e inexecução mostram a força da inércia e dos elementos
latifundiários opostos à imigração, confirmando o julgamento de J.
Fernando Carneiro:
"Os fazendeiros não viam com bons olhos a política da criação
de núcleos coloniais, na base da pequena propriedade.
Fora da órbita do café, bem longe no Rio Grande do Sul
ou em Santa Catarina, vá lá que o govêrno imperial fundasse
colônias de pequenos proprietários. Mas perto da lavoura do
café", não (38).

(36). - Leo Waibel, "Princípios da colonização européia no sul do Brasil",


Revista Brasileira de Geografia, X,2 (1949), 169.
(37). - Pequena proprieda"e e immigração eu'opea, Livros de propa-
ganda da Sociedade Central de Immigração, vaI. IV (Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1887), pp. 51-52.
(38). - Imigração e colonização no Brasil (Rio de Janeiro: Universidade
do Brasil, Faculdade Nacional de Filosofia, Cadeira de Geografia do Brasil,
publicação avulsa 2), p. 11. Em seus comentários após a apresentação oral
deste trabalho no VIII Simpósio Nacional da Associação Nacional dos Pro-
fesso-es Universitários de História, os professores Ruy Wachowicz e Cecília
Westphalen sugeriram que a Lei das Terras de 1850 representaria uma vitória
da corrente anti-imigratória na vida política brasileira, que a Lei faria mais
para impedir do que para enco-ajar a imigração. Não resta dúvida de que a
lei e seus efeitos no desenvolvimento da imigração no Brasil ficou muito
aquem do que conjeturavam os proponentes da imigração e dos planos que
propuseram e fizeram adotar pela Câmara em 1843. Por outro lado, encora,.
rando a Lei das Terras como um primeiro passo para sanar as tradições caó-
ticas que regem a posse de terras durante os tres séculos da época colonial,
representa ela uma força positiva e regularizadora contra as correntes de
inércia e privilégio e um plano que pe-mitiu o desenvolvime!lto colonial na-
quelas pàrtes do império onde proprietários enraizados não resistiram. Talvez
a sociedade imperial brasileira somente permitiria uma lei tímida, falha
tando na sua concepção como na sua execução. Urgiria porem que esta legis-
lação e-a necessária mesmo para o desenvolvimento da imigração e coloniza-
ção que ocorreu após 1850.
464

... ...


INTERVENÇÃO.

Do Prof. Ruy C. Wachowicz (Universidade Federal do Paraná).


Declarou:
1. ° - "Permita-me o prezado colega fazer algumas observações,
com relação à sua comunicação:
A lei de terras de 1850 foi apresentada como sendo apenas um
estímulo para atrair imigrantes. No meu entender ela pode ser vista
por um prisma diferente. Ela foi o produto da reação dos grandes la-
tifundiários de café paulistas, haja visto os obstáculos criados para a
aquisição de terras para os imigrantes estrangeiros existentes na refe-
rida lei. Os proprietários das grandes plantations cafeeiras, desejavam
imigrantes, mas como mão-de-obra, para as suas fazendas. Até escra-
vos das províncias vizinhas eram comprados para esse fim. As crises
econômicas da década de 1850 geraram. entretanto, prementes neces-
sidades para o aumento da produção dos produtos de subsistência.
Esta é a razão pela qual a regulamentação de 1854 vai procurar faci-
litar ao imigrante a aquisição de pequenas datas de terra, organizadas
em regime colonial. Desta maneira, foi possivel o surgimento de deze-
nas de colônias de imigrantes europeus, no sul do país, onde havia
ainda terras devolutas baratas.
2.°) . - O resenhista afirma ainda que as companhias construto-
ras de estradas de ferro, ao contrário do que ocorreu nos Estados
Unidos, não promoveram a colonização estrangeira. Na realidade,
ocorreu o contrário. A Brazil Railway Co., por exemplo, iniciou a
colonização de suas terras, em território hoje paranaense e catari-
nense, com imigrantes. Porem, abandonou essa atividade, por julga-la
excessivamente cara, passando a explorar a madeira que se revelava
mais vantajosa sob o ponto de vista econômico" (*).

(*). - O Autor da comunicação deixou de enviar; por


FATORES RELACIONADOS COM A DISTRIBUI-
çÃO FUNDIÁRIA NA REGIÃO CACAUEIRA DA
BAHIA (*).

VICTOR V. V ALLA
do Instituto de Ciências Humanas e Filosofia. Uni-
versidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro.

1. - INTRODUÇÃO.

o cacau é o quarto produto agrícola em importância no contexto


da exportação brasileira. Do total do cacau produzido no Brasil, mais
de 97 % tem sua origem no Estado da Bahia. Durante a última déca-
da, mais de 85% da produção de cacau do Estado da Bahia saiu da
Micro Região Cacaueira da Bahia (Litoral Sul).
Composta de 28 municípios, essa região no sul da Bahia repre-
senta atualmente 22,28 % do valor da produção agrícola e de 30 a
35% da área cultivada do Estado da Bahia. Possui uma superfície
de 17.091 Km2, com uma população estimada em cerca de 650.000
habitantes. No início do século essa região contribuiu para que o
Brasil fosse o primeiro produtor da cacau do mundo. Atualmente, a
Região Cacaueira, mantem praticamente sozinha o Brasil como o ter-
ceiro produtor de cacau no cenário mundial (1).
Se, por um lado, os dados acima mencionados revelam com cla-
reza a posição que essa região baiana ocupa no cultivo de um dos
produtos importantes no esquema de exportação do Brasil, a distribui-
ção fundiária, por sua vez, apresenta uma situação mais complexa de
interpretar.

(*). _ Comunicação apresentada na 2(1. Sessão de Estudos, Equipe C, no


dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Embora o cacau seja cultivado em várias regiões do Brasil,
para os fins do presente estudo a Mic:o Região Cacaueira da Bahia será deno-
minada como a "Região Cacaueira".
- 466-

A História começa no presente com a localização dos problemas


que mais preocupam as pessoas de um determinado país ou região.
O presente, ou seja, nesse caso, o quadro apresentado acima, será
analisado à luz do passado a fim de entender melhor o presente e pre-
ver com uma relativa clareza a tendência do futuro. O estudo histó-
rico em questão visa a análise dos fatores que direta ouindiretamente
contribuiram, contribuem ou que deveriam contribuir para a distribui-
ção fundiária da lavoura cacaueira da Bahia.
* '"
'"
2. - A ESTAGNAÇÃO PROLONGADA DA REGIÃO CA-
CAVEIRA.

A região sul da Bahia, desde sua colonização até os meados do


século XIX, testemunhava uma estagnação econômica quase total.
Com poucas exceções, durante os séculos XVI, XVII e XVIII, apenas
o litoral dessa região foi ocupado por colônias humanas, e mesmo as-
sim, vivendo praticamente de uma economia extrativa. A incapacidade
da Região Cacaueira de se incorporar no ciclo de açucar na forma
que foi realizada na área de Salvador, implicava na sua desintegração
no sistema produtivo colonial (2).
Ameaçados constantemente pelos aimorés, as populações litorâ-
neas na reg'ão da cidade de llheus, desenvolveram uma pequeníssima
agricultura de subsistência, sobrevivendo, de grande modo, dos ma-
riscos dos mangues e do peixe dos rios e do mar. Sem nenhuma forma
de infraestrutura, em 1741, a capitania de Ilhéus chegou ao extremo
a ser a única capitania brasileira que não possuia um açougue (3).
Em 1801 Capistrano de Abreu acha a vila de Ilheus pouco dife-
rente daquela de 1601, sua indústria mais importante sendo a ex-
tração de madeira (4). A mesma vila, que, nessa época, era a povoa-
ção mais importante da capitania de São Jorge dos llheus, é visitado
por Avé-Lallemant em 1859 quando faz o seguinte comentário:

(2). - GARCEZ (Angelina Nobre Rolim) e FREITAS (Antônio Fer-


nando Guerreiro), Diagnóstico Sócio-Econômico da Região Cacal/eira. História
Econômica e Social da Região Cacaueira. Comissão Executiva do Plano da
Lavoura Cacaueira - CEPLAC; Universidade Católica do S:t.Ivador - UCS.
Bahia 1974. O autor agradece a permissão dos P:ofessores Garcez e Freitas,
de utilizar a versão preliminar desse estudo.
(3). - CAMPOS
- 467-

a vila de I1heus, velha, pequena, mesquinha, vista de


fora, é quase ainda mais mesquinha por dentro... não se pode
compreender como uma povoação, que já existe há 300 anos, te-
nha feito tão pouco p~ogresso" (5).

No presente estudo, todavia, a abordagem do aspecto "estagna-


ção" dessa região tem como finalidade demonstrar como essa caracte-
rística era um fato primordial nos acontecimentos que atingiram a Re-
gião Cacaueira na segunda metade do século XIX (6).
'" *
*
3. - ROMPIMENTO BRUSCO DA ESTAGNAÇÃO ECO-
NOMICA.

Dois fatores principais explicam a mudança espetacular que ocor-


re na Região Cacaueira na segunda metade do século XIX: o aumento
vertiginoso da procura do cacau no exterior e as crises nordestinas de
1846, 1855, 1873 e 1877-80 (7). É nessas circunstâncias que essa re-
gião estagnada fornece uma inicial resposta positiva aos migrantes nor-
destinos, mas num prazo mais longo, seria criado um quadro mais
sombrio para essas hordas de homens procurando sua sobrevivência.
Pois, durante o decorrer do século XIX, milhares de migrantes pene-
trarão a floresta para fazerem suas roças, inicialmente combinando
uma agricultura de subsistência com o plantio de cacau, e nessa ma-
neira, segundo o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio da
época, criando uma riqueza sem capital (8).

(5). - AVÉ-LALLEMANT (Robert), Viagem pelo norte do Brasil no


ano de 1859. Rio de Janeiro, Instituto Nacional do Livro, MEC. 1961. Vo-
lume I, p. 70.
(6). - O botânico franco-suisso, Frédé-ico Louis Warneaux trouxe
em 1746 as primeiras mudas aproveitáveis para o sul da Bahia. SELIGSOHN
(OUo), Cacau da Ba'Ilia, História e problemática. Salvador. Livraria Econô-
mico, Edição IPESA. s.d., p. 15.
(7). - Ibidem., p. 21-22: PRADO JÚNIOR (Caio), História Econô-
mica do Brasil. Nona edição. São Paulo, Editora Brasiliense, 1965, p. 248;
SEMENZATO (Geraldo), Um Município da Zona Cacaueira - Aspectos da
sua situação agrár:a. Salvador. Instituto de Ciências Sociais, Universidade
Federal da Bahia, s.d., p. 5.
(8). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, INDúSTRIA E COMÉR-
CIO, DIRECTORIA DO SERVIÇO DA INSPECÇÃO E FOMENTO AGRl-
COLA
- 468-

Se por um lado a região oferecia uma resposta aos migrantes do


Nordeste, tambem em pouco tempo os reflexos da livre concorrência,
iniciativa privada juntamente com virtualmente nenhuma intervenção
governamental, começaram a se revelar. Pois as pequenas roças

"iniciadas pelo esforço rude de humildes roceiros, passavam


a constituir o núcleo das grandes propriedades futuras, para cuja
organização se movimentam sobretudo os intermediários na colo-
cação do produto" (9).

Uma coisa era fixar-se na terra, outra era fazer com que a tardia
colheita (três a cinco anos de espera) rendesse lucro para os lavrado-
res que se localizavam longe dos pontos de exportação e faltavam todo
tipo de experiência em negociar os seus produtos. Sem tradição no
plantio do cacau, desconhecendo os preços internacionais correntes,
angustiados por falta de recursos financeiros, os pequenos lavradort!s
da época inicial do processo de implantação da cultura do cacau eram
vítimas fáceis do grande intermediário, uma

"mescla de comerciantes, fornecedor de me."cadorias de con-


sumo, financiador e consequente herdeiro prospectivo da roça do
pequeno lavrador" (10).

Camillo Torrend observou em 1920 que os pequenos lavradores


ainda achavam que qualquer terreno no interior da zona de Ilheus
servia para a cultura do cacau e alertava que desde 1900 as condições
naturais tinham mudado: com o desaparecimento dos matos tinha de-
saparecida a umidade necessária para o cacaueiro (1).
Torrend escreveu que plantações de apenas 14 a 16 anos já ti-
nham sinais evidentes de senilidade devido ao esgotamento da terra e
às numerosas feridas produzidas na casca por descuido e inexperiência
dos trabalhadores (12). Foi uma cultura rotineira iniciada sem nenhu-

(9). - TOSTA FILHO (Ignácio), Plano de Ação Econômica para o


Estado da Bahia. Secção B do Volume 11. Bahia. Instituto de Cacau da Bahia.
1948, p. B - 24-25; INSTITUTO DE ECONOMIA E FINANÇAS DA
BAHIA, A Zona Cacaueiro. Salvador. Livraria Progresso Editor, s. d ., p.
190-191.
(lO). - TOSTA FILHO, op. cito
(11). - TORREND, S.l. (CamilIo), A Cultura do Cacau. Separata da
Revista Brotéria (Série de Vulgarização Scientifica). Braga. (XVI, XVII):
278, 1920.
- 469-

ma possibilidade de favorecer uma seletividade genética que resultou


numa exploração que crescia desordenada e indiscriminadamente (13).
:E: lógico concluir que não foi apenas o pequeno lavrador que co-
meteu os erros acima mencionados, mas que sua absoluta falta de re-
cursos e localização precária fariam com que esses efeitos negativos
pesassem mais na sua situação econômica particular.
Torrend comenta no mesmo estudo que s6 aquele agricultor que
contribua com muito trabalho, indústria e conhecimento científico
prosperará no futuro, pois que não bastava entregar as plantações à
empregados rotineiros e ignaros dos princípios elementares da agri-
cultura (14). Como resultado, os pequenos lavradores foram obriga-
dos a resignarem-se com sua s~tuação precária, isto é, uma pequena
roça com poucas possibilidades de progresso, nem agronômica nem
economicamente.
• •

4. - OS OBSTACULOS ENFRENTADOS NUMA REGIÃO
DE CARACTERISTICAS ESPECIAIS.

Na medida que a cultura do cacau entrava em expansão, as ca-


racterísticas geográficas foram se revelando como sendo de uma im-
portância primordial para a futura distribuição fundiária da Região
Cacaueira. Devido ao fato de que a cultura do cacau é muito exigente
em termos de temperatura, pluviosidade, necessidade de sombreamen-
to, altitude e condições de solo, a faixa geográfica em que se desenvol-
via no sul do Estado da Bahia era muito restrita (15). Essa faixa en-
globa uma área de aproximadamente 175 Km, do norte ao sul, esten-
dendo-se 75 Km do litoral, a maior concentração de cacau situando-
se praticamente num raio de 50 a 60 Km da cidade de Itabuna (16).
Como resultado, entre os anos 1920/21 e 1939/40 praticamente to-
dos os melhores solos, e mesmo nas zonas marginais, já foram planta-
(13). - ELUS (Waldemar), Temperaturas como Fator-Limitante da
Podridão Parda do Fruto do Cacaueiro. Instituto de Cacau da Bahia, Depa7ta-
mento Técnico Agrícola, Boletim Técnico. 1952., p. 3-4. SEMENZATO,
op. cit., p. 7.
(14). - TORREND, op. cit., p. 278.
(15). - I.B.G.E., CONSELHO NACIONAL DE ESTATISTICA, SER-
VIÇO NACIONAL DE RECENSEAMENTO, Brasil, Censo Agrícola. Série
Nacional, Volume 11. Ano de 1949. Rio de Janeiro. 1956, p. 229; SILVA
(Luiz Ferreira da), Recursos Naturais da Zona Fisiográfica Cacaueira. Intro-
dução à Região Cacaueira da Bahia Brasil. Volume I. CEPLAC. 1970, p.
28. (Seminário de Desenvolvimento Regional Integrado).
(16). -Ibidem., p. S.
- 470-

dos, com os problemas mencionados por Torrend em 1920 se agra-


vando: decadência das plantações das primeiras e segundas décadas do
século atual; material botânico sem seletividade e em terras pouco
apropriadas; pouca resistência às pragas a ao clima (17).
Mesmo com todos esses aspectos limitantes, a produção de cacau
subiu bruscamente no século XX, passando de 24. 000 toneladas lon-
gas de 1900/01 - 1909/10 a 151.000 toneladas longas de 1950/51
a 1959/60 (18), e a Região Cacaueira se firmou como produtor prin-
cipal brasileiro, sendo que 96% da produção brasileira veio dessa re-
gião nes anos 1928 a 1948 (19). Com o aumento da procura e o do-
mínio da cultura cacaueira nessa região, as terras se valorizavam, um
hectare cie terra devoluta chegando a valer 400$000 a 500$000 em
1922 quando outras devolutas no Estado da Bahia não alcançavam
mais de 3$000 (20).
O pequeon lavrador, embora sempre chegasse a compor a maior
parte da população agrícola, sofria pressões dos dois lados: dos fato-
res limitantes naturais e dos fatores econômicos. Alem dos problemas
de clima e solo, que gradativamente limitariam as suas opções em ter-
mos de movimentação, o antigo migrante e seus descendentes sofriam
as devastações dos aspectos creditícios e comerciais.
Em termos agrícolas, o Eng.o Agrônomo Joaquim Bahiana já es-
creveu sobre uma grande moléstia que assolava a região em 1902, co-
mentando que o tempo de recompensa era demasiadamente longo para
o pequeno lavrador que lutava com dificuldade inerentes à natureza
dos trópicos e às da sociedade embrião (21). Já em 1920 achou que
sem sociedades cooperativas, os pequenos lavradores não podiam re-
solver a crise que os atacou (22). A qualidade do cacau brasileiro

(17). - Ibidem., COMISSÃO DE ESTUDOS DA POLíTICA DO CA-


CAU, Relatório, 1966. s. 1. s.d., p. 178; GUIA TURíSTICO DO CACAU
(TOURIST GUIDE OF BRAZILIAN COCOA ZONE). ltabuna. Editora Pa-
norama Ltda., 1964, p. 206-207; ERNEHOLM (Ivar), Cocoa Production of
South America, Historical Development and Geographical Distribution. Gothem-
burg, Sweden. 1948, p. 165.
(18). - COMISSÃO DE ESTUDOS DA POLíTICA DO CACAU,op.
cit., p. 1.
(19). - TOSTA FILHO, op. cit., p. B-22.
(20). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA ... FOMENTO AGRí-
COLA, op. cit., p. 475; Semenzato menciona que em 1930 um hectare de
mata alcançou um p:eço de 660$000 a 1.100$000 no sul da Bahia. SEMENZA-
TO, op. cit., p. 8.
(21). - BAHIANA (Joaquim), Relatório Apresentado pelo Engenheiro
Joaquim Bahiana Ao Ermo. Sr. Dr. Secretário da Agricultura, Viação, Indús-
tria e Obras Públicas. Bahia. Imprensa Official do Estado. 1920.,
- 471-

produzido em 1922 fora tão ruim que era cotado duas vezes abaixo do
produto de outras procedências, e até o próprio Estado de São Paulo
importava 50% das amendoas de cacau do exterior (22). Se esse qua-
dro negativo era geral para todos os agricultores da época, era justa-
mente o pequeno lavrador que sofria mais, pois dependia quase unica-
mente da cotação para sua sobrevivência.
Em termos creditícios, o próprio Ministério da Agricultura, In-
dústria e Comércio adimitiu em 1925 que o crédito agrícola tinha sido
vacilante e· não incentivava a lavoura, referindo aos "vexatórios em-
préstimos" e "juros criminosos" que colocavam o lavrador indefeso
nas mãos do prestamista sem escrúpulos (24). O Instituio de Cacau
do Brasil tambem não poupava palavras quando declarou que os gran-
des e médios conseguiam crédito porque tinham suas propriedades de-
vidamente regularizadas quanto a títulos de domínio e outros papeis
indispensáveis à efetivação imediata de uma transação hipotecária, en-
quanto os pequenos lavradores de 100 a 300 arrobas não possuiam tí-
tulos líquidos e eram apenas posseiros transitórios (25).
Na comercialização do cacau as dificuldades eram do mesmo gê-
nero, com os compradores dominando totalmente a situação, forne-
cendo crédito de 36 a 60% ao ano e impondo reduções arbitrárias aos
preços. Tosta Filho comenta que antes de 1930

"não havia coisa alguma que se aproximasse crédito rural, e


o financiamento da lavou -a nas entre-safras era de feito mediante
ruinosas vendas antecipadas do cacau em flor, por p~eços ainda
mais depreciados do que no decurso da safra".

E pergunta:

"Que é que se pode fazer de pronto para atender esses ho-


mens sacrificados? Não há que se possa fazer numa zona tradicio-
nal como esta de um momento para outro" (26).

(22). - Ibidem., p. 16-17.


(23). - BONDAR (Gregório), Variedades Cultiva "as de Cacáo e Preços
Baixos do Nosso Producto. Bahia. Imprensa Official do Estado. 1922.
(24). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, INDÚSTRIA E COMÉR-
CIO, SERVIÇO DE INFORMAÇÕES, A Lavoura e o Commercio de Cacau.
Rio de Janeiro. 1925, p. 15.
(25). - INSTITUTO DE CACAU DA BAHIA, Relatório e Annuário
de 1932. Bahia. 1933, p. 74.
(26). - TOSTA FILHO, op. cit., p. B-31; TOSTA FILHO (Ignácio),
Problemas Fundamentais do Lavrador de Cacau.
- 472-

o pequeno lavrador era obrigado a lidar com os intermediários,


pois existiam grandes dificuldades em transportar o cacau por tropas
de animais e o produto final não tinha garantia nenhuma de sua inte-
gridade no processo de transporte (27).
De um modo geral, todos esses obstáculos exerciam o papel de
manter o pequeno agricultor numa dependência financeira, o resultado
sendo que raramente era possivel acumular o capital suficiente.-como
reserva para o futuro. A sua situação precária se revelava com cla-
reza durante as muitas crises cíclicas que Tosta Filho comenta. Era
nessas horas que os pequenos lavradores desapareceram como produto-
res independentes, absorvidos por vizinhos com maiores recursos de
capital (28). Ou quando apareceram os resultados negativos de uma
agricultura rotineira e não-científica - as pragas, erosões, a decadên-
cia - de que falou Torrend e Joaquim Bahiana (29). Ainda em 1954
Urquhart menciona que a temida podridão parda frequentemente res-
ponsavel pela destruição de 18 a 25 % da produção total, enquanto al-
gumas propriedades perdiam quase a metade da sua produção (30).
Nesse ponto, é esclarecedor observar que a solução encontrada para
essa doença - o controle químico - é econômico somente em áreas
de elevada produtividade (31).
Embora o presente estudo se preocupe principalmente com a pri-
meira metade do século XX na sua tentativa de explicar a situação
atual na Região Cacaueira, é interessante notar que a literatura re-
cente continua a comentar os problemas acima mencionados. Em
cerca de 1960 o Instituto de Economia e Finanças da Bahia, no seu
trabalho A Zona Cacaueira, comenta as dificuldades de concessão de
crédito aos pequenos produtores devido aos problemas burocráticos e
ao fato de que muitas propriedades serem demasiada pequenas para per-
mitir uma formação de poupança dentro das unidades agrícolas (32).
(27). - TOSTA FILHO (Ignácio), Plano de Ação para o Estado da
Bahia" op. cit., p. B-30; DOCUMENTARY MATERIAL ON COCOA FOR
THE USE OF THE SPECIAL COMMITTEE ON COCOA OF THE INTER-
AMERICAN SOCIAL AND ECONOMIC COUNCIL. Part. I. Washington,
D.C., Pan American Union. 1947, p. 28-30; MINISTÉRIO DA AGRICUL-
TURA ... SRVIÇO DE INFORMAÇÕES, A Lavoura e o Commércio de
Cacau, op. cit., p. 16-18.
(28). - TOSTA FILHO, Plano de Ação para o Estado da Bahia, op. cit.,
p. B-38-39.
(29). - Ibidem.
(30). - URQUHART (D. H.) e WOOD (G.A.R.), Report on a
Visit to the Cocoa Zone of Bahia, Brazil. Bournville. Cadbury Brother's Ltd.
1954, p. 18.
(31). - ANDRADE (Maria Palma), Itabuna. Estudo Monográfico.
Itabuna. 1972, p. 33.
(32). - INSTITUTO DE ECONOMIA E FINANÇAS
- 473-

Odette Rosa da Silva observa em 1970 que a agiotagem economlca


provoca a ruína do pequeno lavrador (33). E, em junho do corrente
ano, o Eng. o Agrônomo Landim da CEPLAC conclui no seu estudo
sobre a Cooperativa Mista do município de Una que o projeto de Co-
lonização, criado há 22 anos, registrou até hoje quase nenhum me-
lhoramento devido à falta de crédito. Iniciado com 198 colonos, com
cada família recebendo em média 30 hectares, a maioria dos colonos
não tem títulos de propriedade e são obrigados a trabalhar para ter-
ceiros, sendo, dessa maneira, impedidos de explorar plenamente suas
próprias terras (34).
* *

5. - OBSTACULOS QUE ESCAPAM AO CONTROLE
BRASILEIRO.
De um modo geral, todos os obstáculos detalhados até agora nes-
se estudo, são teoricamente passíveis de soluções internas, embora na
prática para a maioria dos lavradores da Região Cacaueira, o ponto
em questão não tem sido relevante. Em 1935 o Instituto de Cacau do
Brasil refere-se ao fato de que o produto de cacau é um artigo de luxo
quase totalmente sujeito à política cambial e protecionista dos paises
consumidores e aos movimentos bolsistas de grandes especuladores in-
ternacionais. Trata-se de um produto cujo consumo pode crescer ou
decrescer de mês para mês, e que enfrenta problemas de tal ordem
que suas soluções escapam à própria natureza agro-técnica (35). Tosta
Filho revelou em 1939 que 98% da produção brasileira foi para o ex-
terior, pois o consumo brasileiro sempre era baixo, mesmo nos anos
mais recentes, atingindo em 1969 apenas 300 gramas per capita quan-
do a média nos paises consumidores é de quase 2.000 gramas per
capita (36).
Um outro problema bem conhecido entre os especialistas da Re-
gião Cacaueira, é mencionado porque coloca em relevo o carater da
estrutura ~onômica da região sul da Bahia. Trata-se da concorrência
dos paises produtores da África e suas estruturas históricas e sócio-eco-

(33). - SILVA (Odette Rosa de), Produtores de Cacau da Bahia: Ca-


racterização Sócio-Econômico. São Paulo. Tese de Mestrado. F. F. C. L.,
Universidade de São Paulo. 1970, p. 9.
(34). - Landim comenta que aqueles colonos que consegui.'am crédito
rural foram beneficiados pelo governo japonês, LANDIM (Alfredo Dantas),
Considerações sobre a Cooperativa Mista de Una Resp. Ltda. Itabuna. CEPLAC.
(Trabalho não publicado).
(35). - RELATóRIO DO INSTITUTO DO CACAU DA BAHIA
(1935). Bahia. Oficinas da Livraria Duas Américas. 1938, p. 8; SEMENZA-
TO, op. cit., p. 9.
(36). - BARROCO (Hélio Estrela), Comercialização de Cacau na Bahia.
- 474-

nomlcas. Representando apenas 03,5% da produção mundial em 1880,


a produção africana chegou a compor quase 70% da produção mun-
dial entre 1930 e 1937 e atualmente quatro dos primeiros cinco paises
produtores do mundo são africanos (37). O Eng.o Joaquim Bahiana
já destacou em 1920 os contrastes marcantes entre os quadros brasi-
leiros e africanos quando observou que o padrão de vida do africallo
era outro, o transporte aos paises consumidores mais rápido e mais
barato com os mercados mais próximos, os instrumentos e máquinas
de origem inglesa eram mais aperfeiçoadas e que já existiam estudos
meticulosos sobre os climas das terras, o melhoramento do sistema
de culturas, suas variedades e dos adubos mais eficientes (38).
Mas o que talvez seia mais importante nesse aspecto é a análise
comparativa do quadro humano e geográfico do Brasil e África, pois
nesse ponto não apenas se vê um dos enfoques dos múltiplos problemas
que pesam sobre o pequeno cacuicultor brasileiro, mas tambem a sobre-
vivência do pequeno lavrador africano (39). Dois fatores se distinguem
frontalmente com a situação brasileira: mão-de-obra e terra em abun-
dância, o primeiro se destacando mais ainda porque é indígena da re-
gião cacaueira africana, de um padrão de vida tradicionalmente muito
simples onde muitas dezenas de milhares de pequenas roças represen-
tam o meio de vida da maior parte dessas populações africanas. Cinco
hectares é geralmente considerado uma propriedade grande na Áfri-
ca. A própria estrutura cultural e política da economia cacaueira afri-
cana permite que o cumprimento das instruções governamentais seja
um reflexo natural do quadro existente (40).
*
* *
6. - A POSIÇÃO DAS AUTORIDADES POBLICAS.

Os problemas sociais gerados pelos fatos analisados até esse ponto


nesse estudo são mais conhecidos através das obras do Jorge Amado,
pois a literatura técnica e oficial faz poucas referências à estes reflexos
sociais. Tosta Filho, todavia, faz menção que na época da I Grande
Guerra foi efetivada uma verdadeira limpeza das hordas de "fascÍnoras
e criminosos" que tornava precária as condições de segurança do in-

(37). - TOSTA FILHO (Ignácio), The Cocoa Situation in Bahia (Bra-


zil): Paper P:esented to the 1953 Cocoa Conference. Bahia. 1953; BOLETIM
ESTATíSTICO DO CACAU. CEPLAC, Assessoria de Programação e Ava-
liação, Assessoria Estatística. Volume 6, N9 2. 1973, p. 16.
(38). - BAHlANA, op. cit., p. 15.
(39). - Sugere-se um estudo comparativo mais profundo das regiões
caoaueiras africanas e brasileiras.
(40). - SELlGSOHN, op. cit., p. 35; TOSTA FILHO, Plano de Ação
para o Estado da Bahia, op. cit., p. B-14; TOSTA
- 475-

terior (41). O Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio no seu


livro comemorativo do Centenário da Independência do Brasil obser-
vou que os

"desocupados crescem em números e a miséria aumenta sem


que as autoridades competentes tomem a mais salutar das providên-
cias, rumando-os para o campo" (42).

o Instituto de Cacau da Bahia comenta que em 1932 que poucas


fazendas preferiam o trabalhador casado permanente e de que os tra-
balhadores não participavam nas perdas e nos lucros como era o caso
na lavoara cafeeira (43). Um documento de pesquisa produzida pela
Pan A merican Union, sediada em Washington, D. C ., notou em 1947
que o aparecimento de clubes, de cunho comunista, e que o melhora-
mento dos meios de comunicação estavam contribuindo para insatis-
fação dos trabalhado~es porque permitiam que trocassem idéias e co-
mo resultado, migrassem (44).
Chega-se a conclusão que as autoridades públicas, durante a ocu-
pação dos espaços rurais da Região Cacaueira, inicialmente eram in-
diferentes aos problemas, e com o decorrer das décadas, iniciam ten-
tativas modestas que implicitamente reconheciam a situação sócio-eco-
nômica de dificil solução imediata ou mesmo no futuro distante. A vé-
Lallemant, na sua viagem à Bahia em 1859, comenta que o Presi-
dente da Província, Pais Barreto, acusava a instabilidade dos Presi-
dentes da Província, que eram mudados quase a todo momento de ma-
neira que não tinham tempo para inspesionar sua província, para não
falar em tomar medidas enérgicas (45).
Lavigne, no Regionalismo, O Sul do Estado e O Instituto de
Cacau, observa que só depois de 1930 é que as autoridades públicas co-
meçaram a ouvir o clamor da região e que o lavrador assistia até então
a expropriação substancial das suas propriedades pela ação vexativa
de particulares,

(41). - TOSTA FILHO, Plano de Ação para o Estado da Bahia, op. cit.,
B-28.
(42). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA ... FOMENTO AGRt-
COLA, Aspectos da Economia Rural Brasileira, op. cit., p. 448
(43). - INSTITUTO DE CACAU DA BAHIA, Relatório e Annuário de
1932. Bahia. 1933, p. 16. A situação na Região Cacaueira modificou-se nos
últimos anos devido à escassez da mão-de-obra e atualmente a procura é para
trabalhadores casados.
(44). - DOCUMENTARY MATERIAL ON COCOA ... ECONOMIC
COUNCIL,
- 476-

"sob a garantia do chamado Poder Público" (46).

Comparou a região à uma colônia dentro do Estado, que em 30


anos, fornecia mais de 400. 000 contos aos cofres estaduais, do qual
nem 10% tinha sido aplicado em obras públicas, mas que mesmo as-
sim a região tinha sofrido um crescimento

"contra a apatia dos governos bahianos" (47).

Palavras semelhantes às de Eunápio Peltier de Queiroz, quando


declarou que a cidade de Ilheus se consolidou apesar da indiferença
e da incompreensão dos poderes públicos (48).
A ação das autoridades públicas geralmente tendia para preocu-
pações verbais com planos de atender os pequenos lavradores um dia
no futuro, embora o Eng. o Joaquim Bahiana, em 1920, considerasse o
pequeno agricultor brasileiro movediço, inconstante e ignorante dos
processos da cultura cacaueira e sugeriu famílias de imigrantes italia-
nos e portugueses como maneira de dar exemplo para os nômades bra-
sileiros (49).
Por outro lado, provavelmente se baseando na experiência afri-
cana, Tosta Filho achava que para o maior número de pequenos produ-
tores o melhor seria a riqueza agrícola da região e comentou no relatório
do Instituto de Cacau da Bahia que precisava providenciar instalações
em conjunto, numa base cooperativista (50). Criticou o próprio Insti-
tuto de Cacau do Brasil por não se preocupar com o pequeno produtor,
lembrando que essa preocupação teria que ser gradativa, mas que uma
boa obra coletiva poderia ser desenvolvida depois de ter resolvidos os
problemas dos médios e dos grandes,

"mais facilmente abordáveis e mais seguramente servidos" (51)

o Instituto de Cacau do Brasil no seu relatório de 1936 reconhe-


ceu a necessidade do crédito agrícola em bases uniformes que permitia
condições mais favoráveis para o
(46). - LAVIGNE (Eusínio), Regionalismo. O sul do Estado e o Insti-
tuto de Cacau. s.1. 1938, p. 4.
(47). - Ibidem., p. 3-5.
(48). - QUEIROZ (Eunápio Peltier de), Problemas Econômicos de
llheus no Plano da Administração Federal. Departamento de Imprensa Nacio-
nal. 1950. p. 9.
(49). - BAHIANA, op. cit., p. 19.
(50). - TOSTA FILHO,
- 477-
"lavrador desprotegido e modesto, muito mais necessitado
de que o produtor abastado e independente" (52).

• •

7. - DEPEND"ENCIA E DESENVOLVIMENTO.

Na medida que a procura, volume e preços de cacau aumentavam,


essa cultura tomou-se predominante na agricultura da região, ocu-
pando todas as atenções dos agricultores e como resultado forçando a
importação de todos os produtos necessários para a sua subsistência,
contribuindo nessa maneira para a carestia de vida e a elevação dos
salários (53). Mesmo numa data tão recente como a de 1966, a Co-
missão de Estudos da Política de Cacau comenta que a região produ-
tora de cacau importa todos os bens de consumo, inclusive bens de pri-
meira necessidade. Considera a Região Cacaueira com ótimas condi-
ções ecológicas para outras culturas, definindo a diversificação como
medida de necessidade imperiosa (54). Mesmo em 1972 Andrade frisa
que a produção itabunense de alimentícios é de apenas 02,8% da pro-
dução agrlcola total, os outros 97,2 % sendo de cacau (55).
De uma maneira indireta, o sistema de monocultura na Região
Cacaueira tem sido no decorrer do século XX mais um obstáculo para
o pequeno lavrador, pois a compra das suas necessidades alimentícias
encarecem seus custos de vida e a agricultura paralela de subsistência
o ocupa numa atividade que indiretamente diminui seus possíveis lu-
cros na hora da colheita, de não falar dos reflexos negativos mais ge-
rais que pesam sobre uma região dependente para quase todas as suas
necessidades reais e virtuais em outras áreas do Brasil.
Numa época quando os termos "dependência" e "desenvolvimen-
to" não eram assuntos do momento, destacou-se a obra desenvolvida
pela Estação Geral de Experimentação da Agua Preta (56). Iniciada
em 1918, teve a finalidade de ser uma propriedade agrícola modelar,
onde o lavrador poderia ver soluções para todas suas necessidades.
(52). - INSTITUTO DE CACAU DA BAHIA, Relat6rio do Instituto
de Cacau da Bailia, 1936. Bahia. Oficina da Livraria "Duas Américas". 1936.
p. 16.
(53). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA ... FOMENTO AGRt-
COLA, Aspectos da Economia Rural Brasileira, op. cit., p. 448.
(54). - COMISSÃO DE ESTUDOS DA POLlTICA DO CACAU, op.
cit., p. 178.
(55). - ANDRADE, op. cit., p. 25.
(56). - O local antigamente chamado Água Preta é hoje a cidade de
Uruçuca, localizado aproximadamente a 40
- 478-

Funcionava precariamente durante a década de 1920-30, mas mesmo


assim, reconhecia que seu objetivo era fomentar o desenvolvimento de
outras culturas e indústrias que concorreriam para uma boa organiza-
ção da economia rural regional e evitar os males da monocultura. Já
nessa década sua receita principal, provinha, alem do cacau, das ven-
das dos enxertos de citrus a serem utilizados para o desenvolvimento
da policultura local (57).
Cedido ao Instituto do Cacau do Brasil pelo Ministério da Agri-
cultura, Indústria e Comércio em 1932, foram reafirmados seus pro-
pósitos no seu relatório do mesmo ano, objetivando que a policultura
era uma necessidade para a região, pois não existia dinheiro para im-
portar prodtitos alimentícios caros. A grande qualidade desse propósito
era que a Estação Geral de Experimentação chegou a ser efetivado e
um trabalho sério foi desenvolvido por vários anos. O já mencionado
relatório dest.aca em detalhes os tipos de atividades desenvolvidas: a
cultura de citrus (seis tipos de laranjas com mais de mil pés; cinco ti-
pos de grape fruit; oito tipos de limoeiro; limeira, cidreira, tangerina,
kumquat, limoeiro japonês); viveiros de outras culturas, tais como eu-
calipto, bananeira, mamoeiro, ata de lima, graviola; pequenas cultu-
ras, incluindo milho, sorgo, aracéas, mandioca, aipim, batata doce,
cana de açucar, soja, favas e jutas; culturas arbóreas e permanentes,
incluindo cafeeiro, pimenta do reino, guaraná, cravo da lndia, fruta-
pão, coqueiro da Bahia, abacaxiseiro, pinheira; horticultura (Couve-
flor, repolho, couve, alface, aipo, agrião d'água, coentro, rabanete, ce-
noura, beterraba, beringela, tomate, pimenta, pimentão, quiabo, abo-
bora, pepino, feijão, morango e alho cebola); plantas téxteis e oleagi-
nosas; plantas forrageiras, ornamentais e de cobertura do solo; criação
de animais domésticos, apicultura e sericicultura (58).
* *
*
8. - INOVAÇÕES E MUDANÇAS TECNOLóGICAS.

Embora a inovação tecnológica seja um favor bem mais recente


na História da Região Cacaueira, já havia preocupação nesse sentido
desde dos primeiros anos do presente século. Como Odette Rosa da
Silva afirma, a ciência pode ajudar pouco a cacuicultura de 1900 a

(57). - BONDAR (Gregório), História da Estação e Obras de Adapta-


ção Realizadas pelo Instituto de Cacau por Gregório Bondar, Chefe do DeptQ
Técnico Agrícola, Instituto do Cacau do B~asil SA, DeptQ Técnico Agrícola,
Boletim Técnico, Estação Geral de Experimentação de Cacau em Água Preta,
Parte
- 479-

1930, depois do qual a química, bioquímica e virologia juntamente


com outras áreas de pesquisa começaram a revelar sua utilidade para
contornar os muitos problemas do cacuicultor (59). Mesmo assim os
relatórios do Torrend e Joaquim Bahiana são exemplos de uma preo-
cupação com o conhecimento científico aplicado à agricultura. Tor-
rend advertiu que somente o fazendeiro com conhecimentos científicos
prosperaria depois de 1920 enquanto Bahiana sugeriu a passagem de
uma cultura esgotante aos recursos naturais para uma cultura com-
pensadora seguindo os melhores métodos que a ciência aconselhava
(60). Parece que uma das áreas principais de inovação tecnológica na
década de 1920-30 era a procura de uma estufa de secagem idônea
que eliminará eficientemente o tradicional "cheiro de fumaça" do ca-
cau brasileiro (61).
Se bem que as. inovações tecnológicas foram poucas antes de 1930,
é com o aparecimento do Instituto do Cacau do Brasil inicialmente, e
principalmente com a criação da Comissão Executiva do Plano de Re-
cuperação Econômico-Rural da Lavoura Cacaueira que as inovações
e mudanças tecnológicas começaram a realmente ter peso no controle
dos fatores negativos e no aumento da produtividade da cacuicultu-
ra (62). As principais áreas de investigação científica com implica-
ções significantes para a cacuicultur asão as seguintes: melhoria qua-
litativa do solo atravds de adubação; fertilização e calagem; novos mé·
todos de cultura; emprego de material botânico de alta produtividade;
combate às pragas; melhores técnicas do trato cultural das plantações;
fermentação e secagem; uso de implementos agrícolas e instalações
técnicas mais aperfeiçoados (62).
Se por um lado reconhece-se a necessidade da inovação e mu-
dança tecnológica como resultado da pesquisa científica, (pois a acir-
rada concorrência mundial exige cada vez mais uma qualidade de ca-

(59). - SILVA (Odette Ro~a da), op. cit., p. 149.


(60). - TORREND, op. cit., p. 278; BAHIANA, op. cit., p. 14.
(61). - MINISTÉRIO DA AGRICULTURA ... SERVTÇO DE IN-
FORMAÇÕES, A lavoura e o Comércio, op. cit., p. 12; BAHIANA, op. cit.,
p. 7.
(62). - "A CEPLAC é uma das maiores organizações do mundo devo-
tada à assistência técnica e financeira aos p~odutores do cacau. No Brasil, é
a primei~a organização de desenvolvimento que trabalha simultaneamente e
de forma ,inetgrada em pesquisas agronômicas, extensão rural, crédito agrícola,
abastecimento de insumos modernos, formação de mão-de-obra especializadas,
alem de contribuir para algumas obras de infraestrutura relacionadas ao
desenvolvimento 3grícola".
CACAU, HISTÓRIA E EVOLUÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO.
CEPLAC. Superintendência Regional, Assessoria Regional de Relações Públi-
cas. Km 26 da Rodovia Ilheus-Itabuna, Bahia. 1972.
(63). - SELIGSOHN,
- 480-

cau altamente refinado), tambem tem que ser reconhecido que dentro
da estrutura sócio-econômica que rege a Região Cacaueira, apenas o
cacauicultor com recursos suficientes pode adotar as inovações. Pois
como Semenzato e Silva afirmam, a inovação técnica custa caro e de-
pende quase exclusivamente das possibilidades financeiras do cacaui-
cultor (64).
Tudo indica que esse novo fator no processo histórico da cacaui-
cultura do sul da Bahia seja de grande peso na distribuição fundiária
atual e futura, pois com os planos oficiais para um contínuo aumento
da produção cacaueira juntamente com a exigência internacional de
qualidade, o fator tecnológico parece de grande relevo numa área li-
mitada climática e geograficamente. É recente a confirmação que uma
boa qualidade de cacau pode ser cultivada atualmente em terras até
recentemente consideradas inferiores, se recursos suficientes da tecno-
logia moderna sejam aplicados aos casos em questão (65). Tais afir-
mações, se por um lado, abrem perspectivas não vistas até agora para
a cacauicultura, tambem referem-se apenas ao cacauicultor com re-
cursos financeiros sificientemente amplos para enfrentar esse novo qua-
dro.
• •

9. - CONCLUSÃO.

o presente estudo tem a finalidade de examinar os vários fatores


relacionados com a distribuição fundiária da Região Cacaueira sul-ba-
hiana durante seu processo histórico. Embora essa distribuição fun-
diária seja bem conhecida pelos especialistas da região em estudo, é
valioso resumir os dados novamente. Já em 1947 a Pan American
Union observou que dos 23.094 cacauicultores, menos de 1.400, ou
seja, 06% da população produtora, era responsavel para quase 60%
da produção (66). Seligsohn, baseando-se nos dados da CEPLAC,
conclui que entre 1944 e 1965 o número de cacauicultores diminuiu
de 28.000 para 18. 000 e infere que nos 20 municípios de maior pro-
dução na Região Cacaueira, que 15% dos produtores nos 20 municí-
pios de maior produção representam quase 60% da produção desses

(64). - SEMENATO, op. cit., p. 32; SILVA (Odete Rosa da), op. cit.,
p.270.
(65). - °
autor deve essas informações aos técnicos da CEPLAC com
quem mlnteve entrevistas.
(66). - DOCUMENTARY MATERIAL ON COCOA ... ECONOMIC
COUNCIL,op.
- 481-

municípios e que a menor propriedade (67), é a menor área cultivada


em relação à área total da propriedade (68). Essa descoberta demons-
tra que há uma estreita relação entre volume de produção e quantidade
de terra, inferindo que a agricultura da região ainda é atrasada, pois
se apoia em quantidade de superfície de terra e não em intensidade de
técnica (69). Com referência ao ponto de possuir grandes quantidades
de terra, é importante salientar que na Região Cacaueira é comum um
grande produtor não possuir sua terras numa superfície contínua. A
fim de proteger-se contra pragas, doenças, secas, envelhecimentos e
empobrecimento de solos, o produtor de rcursos compra uma, duas
ou mais faixas de terra em lugares diferentes, procurando nessa ma-
neira compensar os possíveis prejuizos e manter o prestígio (70). Há,
portanto, uma diferença consideravel entre um pequeno produtor de
cacau e um pequeno proprietário de cacau, sendo que há muitos exem-
plos de grandes produtores possuindo várias propriedades pequenas.
Silva descobriu no seu estudo que 45,5% dos produtores entrevistados
possuiam mais que uma propnedade e que os 52,5% que possuiam
apenas uma propriedade eram quase exclusivamente pequenos produ-
tores ou até burareiros (71). No mesmo estudo revela que muitos téc-
nicos da Região Cacaueira não consideram o burareiro como sendo
um cacauicultor, pois mesmo que dobre seu rendimento agrícola, ainda
sua produção é considerada insignificante (72).
Seligsohn concluiu que há uma forte tendência do desaparecimen-
to do minifúndio por se tornar economicamente insustentavel, pois
mesmo dentro da faixa de pequenos produtores de uma propriedade
só, muitos são obrigados a trabalhar para terceiros ou tem outras ati-
vidades (73). Justamente como grandes e médios produtores são fre-
quentemente médicos, advogados, farmacêuticos e grandes comercian-

(67). - SELIGSOHN, op. cit., p. 23-24.


(68). - ALENCAR (Maria Helena), Aspectos da Concentração da
Produção de Cacau e da Estrutura Fundiária na Região Cacaueira do Estado da
Bahia. Centro de Pesquisas de Cacau, CEPEC/CEPLAC. Comunicação Técni-
ca NQ 37. 1970, p. 3, 17.
(69). - SILVA (Odette Rosa da), op. cit., p. 99.
(70). - Ibidem., p. 100.
(71). - Alencar define o burareiro como sendo p~odutor de até 400
arrobas; o pequeno produtor de 401 ai. 500 arrobas; o médio produtor de
1.501 a 6.000 arobas; e o grande produtor, acima de 6.001 arrobas; ALEN-
CAR, op. cit.; SILVA (Odette Rosa da), op. cit., p. 95.
(72). - Ibidem.
(73). -SELIGSOHN, op. cit., p. 26; A pequena propriedade familiar
é uma unidade supridora de força de trabalho mais do que de produtos agrí-
colas. QUEDA (Oriowaldo) e SZMRECSCINYI (Tomás), O Papel da Ed~­
cação Escolar e da Assistência Técnica. Vida Rural e Mudança Social: leI-
turas básicas de sociologia rural. (Queda e Srmrescinyi, o-ganizadores).
São Paulo.
- 482-

tes, há uma forte tendência para a pequena propriedade e mesmo a


burara a passar às mãos do pequeno comerciante e funcionário públi-
co. Embora não exista um estudo nesse sentido, conclui-se que o tra-
dicional pequeno agricultor independente, que mora na terra, está di-
minuindo rapidamente na Região Cacaueira e que cada vez menos a
propriedade cacaueira é uma única fonte de renda.
Quando se faz uma análise de todos os fatores apresentados nesse
estudo, chega-se a conclusão que o destino do pequeno lavrador inde-
pendente já estava fadado desaparecer desde o início da implantação da
cultura do cacau na região sul-baiana, mas que o processo do seu desa-
parecimento começou a acelerar-se quando os limites climáticos e geo-
gráficos foram atingidos. Talvez seja uma conclusão um pouco arriscada
afirmar que nos últimos 10 a 15 anos, esse processo já acelerado, entrou
num rÍtmo ainda mais rápido devido às inovações e mudanças tecnoló-
gicas; às mudanças na infraestrutura da região (por exemplo, a cons-
trução da Rodovia BR-I0l
NOTA PRÉVIA SOBRE l\ PROPRIEDADE
CANAVIEIRA EM SERGIPE.
(Século XIX) (1).

MARIA DA GLORIA SANTANA DE


ALMEIDA
do Departamento de História e Filosofia Federal da
Universidade Federal de Sergipe.

Vivendo seus primeiros momentos, apoiada, principalmente, na


criação de gado e lavoura de subsistência, a capitania de Sergipe deI
Rey não acompanhou a fase áurea da economia açucareira, que fez a
riqueza e o progresso do Nordeste nos séculos XVI e XVII. Nessa
época, nossas férteis planícies ribeirinhas e nossos sertões menos dis-
tantes eram ocupados, em sua maior parte, por pastagens cujas cria-
ções serviriam de alimento às zonas açucareiras vizinhas. Sobre Ser-
gipe, no início do século XVII, o Livro que dá razão do Estado do
Brasil ressalta:
"Esta capitania é muito proveitosa aos engenhos e fazendas
de Pernambuco e da Bahia para os quais todos os annos vai mui-
to gado tanto para comer como para o serviço criam-se nestes
pastos ( ... ) boas eguas e bons cavalos que dos do Brasil são
os melhores" (2).

A localização de Sergipe, entre as duas grandes forças opositoras


da Colônia, na primeira metade do século XVII, holandeses e portu-
gueses, transformou-a em zona de destruição onde nem uns, nem ou-
tros desejavam ve-Ia florescer, para não servir da base de apôio ao ini-
migo

(1). - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe


B, no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação) .
(2). - Livro que dá razão do Estado do Brasil. Instituto do Livro.
Ministério da Educação, 1960,
- 484-

- "destruídos os gados que ficavão parte para os Po~tugue­


ses parte pa~a os Holandeses e o resto pelas onças de tal sorte,
que era difícil cassar algum" (3).

Quando essas circunstâncias se alteraram, em fins do século XVIII,


se iniciava a decadência da outrora florescente indústria açucareira do
Nordeste, provocada tanto pela concorrência, cada vez maior, da pr:1-
dução das colônias européias nas Antilhas como, internamente, pela
corrida do ouro das Minas Gerais, após sua descoberta em 1725.
Sergipe participou dessa nova atividade, não apenas fazendo ex-
plorações em seu próprio solo, em Itabaiana ou nas margens do rio São
Francisco, como tambem fornecendo material humano que se evadia
para as minerações ao sul, de promissoras reservas. Daí o retarda-
mento do impulso agrícola sergipano. Somente a nova conscientização
do valor da agricultura, que acompanhou o esgotamento das explora-
ções mineradoras, trouxe-lhe os germes do seu primeiro desenvolvi-
mento, a partir dos meados do século XVIII. Em 1775, já existia
uma nítida diferenciação na ocupação da terra da capitania: os que
habitavam no interior do seu território têm como atividade única a
criação

de todo o gênero de gados"

e os que se estabeleceram nas proximidades do litoral

" . .. se empregão na cultura de mandiocas e de todo gênero


de legumes com que fornecem esta cidade (Salvador) que sem
elas não pode subsistir e tambem na fábrica de alguns (g"ifo
nosso) engenhos" (4).

Na realidade, nessa época não era tão reduzido esse número de


engenhos localizados nas zonas litorâneas. Anos antes - em 1756
representando um terço dos engenhos existentes na Bahia (5) - a Ca-
pitania de Sergipe contava com quarenta e seis unidades açucareiras
(6) distribuídas pelas bacias hidrográficas do Real, Piauí, Vasa-Barris,
(3). - Secção de Manuscritos. Biblioteca Nacional.
(4). - Inventário dos Documentos relativos ao Brasil, existentes no
Arquivo da Marinha e Ultramar. Anais da Biblioteca Nacional, vol. 22,
1910, pág. 290.
(6). - CALDAS (José Antonio), Notícia Geral de toda esta Capitania
da Bahia. .• Revista do I. G . H. Ba. - 57.
(5). - CALASANS (José), Professor da Universidade Federal da
Bahia em palestra profe;ida no I Ciclo de Estudos da Associação dos Diplo-
- 485-

Cotinguiba, Sergipe, Japaratuba e São Francisco. Era a manifestação


de um fenômeno de carater nacional que, associando condições am-
bientais à conjuntura itnernacional beneficiaria principalmente a pro-
dução agrária monocultora. Em outras regiões, como São Paulo tam-
bem data da segunda metade do século XVIII o progresso da cultura
canavieira (7). As dificuldades das Colônias Antilhanas e a abertura
dos Estados Unidos como novo mercado, dentre outros fatores, trou-
xeram melhoria para o preço do açucar e renascimento da produção.
A permissão de navegabilidade sem que fosse em frotas, apesar de não
alterar sensivelmente o quadro sergipano de exportação dos seus pro-
dutos, que continuaram a ser enviados para portos estrangeiros atra-
vés da praça da Bahia, não deixou de reduzir a incerteza no cumpri-
mento dos prazos para o seu embarque.
• •

1. - DEL/M/TAÇÃO DAS AREAS CANAV/E/RAS.

A extraordinária adequação do solo para o florescimento da cana,


nas zonas dos cursos fluviais, possibilitou uma significativa produção
de açucar em Sergipe. Ao limiar do século XIX, definia-se a ocupação
agrícola da região: Itabaiana vende cereais e algodão; Lagarto exporta
gado; Campos vende couros e sola; e os vales da Cotingulba - Vasa-
Barris e Piauí - se ocupam da lavoura açucareira. Afirma-se, deste
modo, na Capitania, como em toda a Colônia, o mesmo processo de
desenvolvimento da cultura canavieira ligada à faixa litorânea. Daí
a produção alcançava mais facilmente os mercados da Bahia e da Eu-
ropa, principais locais recebedores do produto sergipano.
Por enquanto, torna-se dificil aquilatar o número de propriedades
canavieiras existentes na Província de Sergipe, até a segunda metade
do século XIX. A falta de registro de terras, constando sua dimensão
e a especificação da cultura a que se dedicam, restringe a possibilidade
de construir uma tipologia agrícola da região, ressaltando a estrutura
fundiária. Para superar essas limitações, valemo-nos das referências
sobre o número de engenhos da Província, em determinadas épocas,
como uma forma de inferir a orientação de certas áreas para o plantio
da cana-de-açucar. Isso se justifica pelo fato de que, a cada edifica-
ção de casa de moer canas, corresponde a existência de uma base fí-
sica agrícola, capaz de satisfazer as suas exigências de matéria prima.

(7). - PETRONE (Maria Thereza Schorer), A lavoum canavieira em


São Paulo. Difusão Européia do Livro. São
- 486-

Assim, esboçamos uma primeira classificação das regiões cana-


vieiras da Província, durante o século XIX:

1 . 1. - Cinturão litorâneo e sub litorâneo meridional.

A colonização se processara a partir do sul, pelas margens do rio


Real, em terras que, pouco a pouco, iam sendo ganhas do silvícola
pela força das armas e da persuasão. O povoamento das terras adqui-
ridas cedo propiciou a criação da vila de Santa Luzia. No começo do
século XIX, se estendia por dez léguas e englobava a povoação de Es-
tância a duas léguas. Nessa área foram construídos vinte engenhos que
conseguiam produzir quinhentas arrobas de açucar (8). Marcos de
Souza considera os seus terrenos impróprios para as canas, por serem
arenosos. E em suas zonas baixas ou várzeas e nos

"pequenos altos ou outeiros e suas grotas que produzem


canas" (9).

Mas, durante o inverno, as chuvas podem causar grandes danos


pelo apodrecimento das plantas. Isto, porem, não restrigiu a área de
ocupação da cana-de-açucar. Em 1823, o mapa dos engenhos da Pro-
víncia registra o nome de vinte e oito propriedades com máquinas de
moer, pertencentes ao termo de Estância, entre as quais constam tam-
bem nomes de engenhos tidos em 1837 como localizados em Santa
Luzia. São propriedades próximas ao litoral, apenas uma distando
cinco léguas do porto de embarque. Prodigiosamente, o número de
propriedades cresceu na região. Estância e Santa Luzia possuem, con-
forme registro em 1837, quarenta e três e trinta e sete fábricas de
açucar, respectivamente (10).
Começos do
século XIX 1823 1837 1856 1875 1881
Santa Luzia 20 37 70 30
Estância 28 43 65 55
Espírito Santo 7 58
Itabaianinha 56 50 62
Arauá 40 16
Santa Luzia 20 23 80 198

(8). - SOUZA (Marcos Antônio), Memória da Capitania de Sergipe


- 1808. 2' edição. Aracaju, 1944.
(9). - Ofício da Câmara de Santa Luzia ao Presidente da Provín-
cia, 1836. Manuscrito. Pacotilha 33. Arquivo Público do Estado de Sergipe.
(lO).
- 487-

Em 1856, a região conta com cento e noventa e oito engenhos,


distribui dos entre Santa Luzia com setenta; Estância com sessenta e
cinco; Itabaianinha com cinquenta e seis e Espírito Santo com sete.
Algumas Câmaras Municipais, informando, em 1875, sobre o nú-
mero dos seus engenhos e a capacidade de sua produção, revelam o
quadro da situação canavieira em suas respectivas áreas. Santa Luzia,
naquele ano, possui trinta engenhos, distribui dos de tal forma que não
divide sua área cultivavel senão com a mandioca e outros poucos ce-
reais, sem margem para a composição de nenhuma fazenda de criação.
Em Arauá são arroladas quarenta máquinas de fazer açucar e

"geralmente dedicam-se todos a cultura da cana"

Sem diversificação da sua atividade econômica, apenas dando


margem a uma fazenda de criação, seria

"um dos municípios de maior indústria agrícola desta zona


da província" (11).

Já O Município de ltabaianinha engloba uma extensa área que


possibilita a orientação diversificada da sua economia. Apesar de pos-
suir, em 1875, cinquenta engenhos, conta tambem com quarenta e
nove fazendas de gado.
Em terras mais afastadas do litoral, ficava a vila de Lagarto.
Seria principalmente em seus solos localizados no Sul, e de onde se
formariam os municípios de Buquim e Riachão, que se encontravam
as melhores condições para o plantio da cana-de-açucar. Apesar de,
em 1808, Marcos de Souza associa-la à criação de gado, já em 1823
seu nome consta da relação de engenhos matriculados, com um total
de doze engenhos. Possui então, as unidades açucareiras mais afas-
tadas dos portos.

1823 1837
Lagarto 12 10
Buquim
Riachão
Simão Dias
Lagarto 12
- 488-

Sem dúvida, esse afastamento prejudicou a comercialização do seu


açucar e a maior expansão do cultivo da cana em suas terras. Dois
deles estavam a dez léguas do local de embarque. Entretanto, em
1846, veriiicou-se um sensivel progresso da cultura da cana, quando
Lagarto passou a ter trinta e quatro engenhos. Na segunda metade do
século o desmembramento de Lagarto é responsavel pela formação de
novos municípios produtores de cana-de-açucar nessa região da Pro-
víncia. Em 1875, Buquim possuia vinte e dois engenhos, Riachão
contava com onze e Simão Dias com três. Em 1881, houve uma evo-
lução desses números para quarenta e uma unidades açucareiras em
Lagarto, dezesseis em Riachão e seis em Simão Dias (12).

1.2. - O Vale do Vasa-Barris.

Às margens do Vasa-Barris localizava-se o único aglomerado da


região, São Cristovão, com focos de cidade e capital, nos inícios do
século XIX. Dominava uma região fertilíssima, com solos constitui-
dos de excelentes massapês. Considera-se que o melhor testemunho
de solo do Estado localiza-se aí, na zona da atual Itaporanga d'Ajuda
(13). A generosidade do terreno se revelam na produção de oitocen-
tas caixas que apenas dez engenhos conseguiam atingir (14). Aliás, o
Pe. Marcos de Souza ressalta que esses engenhos com vinte cativos
podiam chegar a uma produção que não o conseguiam

.. . .. muitos ricos lavradores do Recôncavo da Bahia com


os enfraquecidos braços de cem escravos".

Naquela ocasião, o escoamento da produção era amplamente fa-


vorecido pela navegabilidade do rio Vasa-Barris, que permitia o per-
curso de canoas até três léguas acima de Itaporanga. Em 1823, estão
matriculados vinte e três engenhos, número esse que chega a quarenta
e três em 1854.
Começos do
século XIX 1823 1854 1856 1875 1881
São Cristovão 10 23 43 4 10 13
ltaporanga 34 15
São Cristovão 10 23 43 38 28

(12). - Mapa estatístico dos engenhos pertencentes aos diversos municí-


pios da Província de Sergipe. Manuscrito - out. 1881. Pacotilha 418. Ar-
quivo Público do Estado de Sergipe.
(13). - Entrevista com o engenheiro agrônomo José Luiz de Góis
quando se tratou sobre estudos realizados pela SUDENE, sobre os solos de
Sergipe. Ago. 1975. Aracaju.
(14). - SOUZA
- 489-

A transferência da Capital e a criação dos municípios de Aracaju, en-


globando terras de Socorro, e de Itaporanga logo depois, alteraram,
em 1856, esse número para apenas quatro (15). Apesar disso, a cana
é ainda a atividade agrícola de maior importância.

"Os lav~adores deste município só dedicão-se a plantações de


cannas. .. outros dedicão-se aos cereais que fazem o comércio ex-
terno e abastecem o povo" (16).

São duzentos e cinco sítios aí arrolados que garantem essa diver-


sificação da atividade agrícola. A cultura da cana ainda se constitui
uma atividade atraente para a região em 1881, época em que possui
treze engenhos. Percebe-se, entretanto, que a criação de gado ganha
terreno, como se pode constatar pelo número dessas propriedades em
1854 (doze) e o seu aumento para vinte em 1875 (17).

1 . 3. - A Região da Cotinguiba.

Sem dúvida, era a chamada região da Cotinguiba o maior depósito


açucareiro da Capitania, a mais representativa dentre todas as que se
dedicavam ao plantio da cana-de-açucar. Desenvolvendo uma ativi-
dade agrícola que orientava sua produção exclusivamente conforme as
solicitações do mercado estrangeiro, seus interesses mercantis eram
bem acentuados. Por isso, várias vilas aí localizadas alcançaram um
maior florescimento, favorecidas tambem pelo clima de urbanização
que caracterizava a sociedade no início do século XIX. Era a produ-
ção da Cotinguiba que animava o comércio de exportação do açucar
da Província e tomava a sua barra a mais frequentada e de maior vo-
lume de vendas.
Nossa Senhora do Socorro e Laranjeiras, embora administrativa-
mente fossem povoações do distrito de São Cristovão, ao início do sé-
culo, sob o ponto de vista geo-econômico, se identificavam realmente
com as áreas que compunham o chamado vale da Cotinguiba. Eram
regiões de grande fertilidade e por todo o século se mantiveram como
importantes centros açucareiros da Província. Principalmente Laran-

(15). - Relatório com que foi entregue a adm. da província de Ser-


gipe no dia 27 de fev. de 1856 ao Ilm Q Sr. Dr. Salvador Correia de Sá Be-
nevides pelo lQ Vice-Presidente ExmQ Sr. Barão de Maruim. Relat. 835
BPES.
(16). - Ofício da Câmara de São Cristovão ao P.esidente. Manuscri-
to. 1856. Pacotilha 416. Arquivo do Estado de Sergipe.
( 17). - Ofício da Câmara de São Cristovão ao Presidente da Província.
Manuscrito. 1875. Pacotilha 419. Arquivo Público do Estado de Sergipe.
- 490-

jeiras, um dos mais florescentes, chegaria, em 1881, a englobar noventa


e sete engenhos, a maior cifra da Província, naquele ano.
A área que mais se destacou como zona produtora, da Cotingui-
ba, nos inícios do século, foi Santo Amaro das Brotas. Compreendia
uma ampla região com quase doze léguas de extensão. Segundo Mar-
cos de Souza, era a

"mais famosa e rica de toda a Capitania" e os seus habitantes "vi-


viam pela maior parte da plantação de cana e manipulação de assu-
car em toda a sua extensão" (18).

Ao termo dessa vila, pertencia o maior numero de propriedades


canavieiras da Capitania e tambem povoações de representavel popu-
lação, tais como: Rosário do Saco, distante três léguas da de Santo
Amaro; missão de Japaratuba a sete léguas; Capela a oito léguas a
freguesia de Divina Pastora e São Gonçalo, distantes quatro léguas;
Pé do Banco, atual Sirirí, distante cinco léguas; sítio dos Enforcados
(Nossa Senhora das Dores), distante dez léguas; outra no Bom Jesus,
distante cinco léguas,

alem de outros lugares tambem notaveis" (19).

Mais tarde, cada uma delas, administrativamente desmembrada,


veio a constituir vila progressiva, graças à riqueza proporcionada aos
seus agricultores pela produção e comércio do açucar.
Começos do
século XIX 1823 1856 1875 1881
Santo Amaro 40 104 10 10
Laranjeiras 144 73 52 97
Rosário 60 42 43
Riachuelo 35
Capela 130 61 82
Divina Pastora 57 66
Maroim 22 17 23
Japaratuba 35 43
Socorro 20 21 24 22
Itabaiana 13 29 16 14
Nossa Senhora das
Dores 23

(18) . - Souza (Marcos Antônio), op. cito


(19). - Ofício da Câmara de Santo
- 491-

Consideremos o quadro geral da intensidade da cultura da cana


nessa zona da Cotinguiba. De uma relação de dezenove municípios da
Província, dados em 1856, como dedicados à cultura da cana, oito se
encontravam nos vales formados pelos rios Cotinguiba, Sergipe e Ja-
paratuba. São setecentos e cinquenta engenhos na Província, dos quais
quatrocentos e dois foram aí construidos. A modificação desses va-
lores far-se-á em função, principalmente, da criação de novos municí-
pios como Japaratuba e Riachuelo, desmembrados de Capela e Laran-
jeiras, respectivamente (20). Daí, em 1881, dos vinte municípios da
Província que possuem engenhos, a metade pertence a essa região. Do
total de setecentos e vinte e cinco engenhos estão distribuidos entre
eles, 53,3% estão concentrados na zona da Cotinguiba.
Como um apêndice econômico e social da Cotinguiba, Itabaiana
compreendia uma vasta região de dez léguas de comprimento e de-
zessete de largura. Uma parte do seu solo apresentava condições fa-
voráveis ao desenvolvimento da cana-de-açucar e, em 1823 cedo, apa-
receram treze engenhos. Associava-se-lhe uma boa localização não
muito afastada dos portos de embarque. Mas a Câmara em 1861 se
expressaria sobre a pobreza do município formado de

"te,renos de catinga"

e sobre o reduzido número das suas propriedades canavieiras:

"A cana é cultivada em pequena escala pela impropriedade


dos terrenos e a prova d'um ou outro engenho edificado n'elle
bem no-lo demonstra; a excepção do districto de Santa Roza ainda
da Cotinguiba cujos terrenos ainda são de massapê, tudo mais é
desfavorável a este ramo de cultivo" (21).

Para uma época que assistira à expansão avassaladora da lavoura


da cana-de-açucar, não possuir solos propícios a essa cultura signifi-
cava estar a região submetida a grandes restrições que dificultavam sua
participação no processo de desenvolvimento da região. O número de
seus engenhos continuaria a se fazer representar nos mapas da Pro-
víncia com vinte e nove, dezesseis e quatorze unidades açucareiras em
1856, 1875 e 1881 respectivamente.

(20). - Enciclopédia dos Municípios Brasilei~os - Sergipe - Alagoas.


Obra conjunta dos Conselhos Nacional de Geografia e Nacional de Estatística.
IBGE. Rio de Janeiro, 1959, p. 335 e 428.
(21). - Ofício da Câmara de Santo
- 492-

Avançando a cultura da cana de açucar em áreas do médio curc;o


do rio Sergipe, em 1881, introduziria o município de Nossa Senhora
das Dores no cinturão açucareiro do vale da Cotinguiba. Contava nes-
sa ocasião com vinte e três unidades de cana-de-açucar.

1 .4. - A Região Sanfranciscana.

Esta foi uma das mais tardias regiões a completar esse quadro das
áreas que contribuiram para o florescimento de nossa economia aç'l-
careira, no século passado. As terras ribeirinhas do São Francisco, e
mais próximas do litoral, compunham a chamada Vila Nova. Apesar
de Marcos de Souza não considera-la associada à cultura canavieira.
Já em 1823, ela contava com doze engenhos e, a sua desmembrada
Propriá possuia nove delas (22).

1823 1856 1881


Vila Nova 12 52 25
Propriá 9 23 11
Vila Nova 21 75 36

Evidencia-se, então, que somente nas primeiras décadas do século


XIX a expansão das propriedades canavieiras alcançaria os limites da
Província ao Norte. Em 1856, esses dois municípios reuniam setenta
e cinco engenhos, a maior parte deles em Vila Nova. A grande adapta-
bilidade da cultura algodoeira nessa área foi uma das grandes respon-
sáveis pela redução do número desses estabelecimentos em 1881, quan-
do pouco mais da metade deixa de existir.
• *
*
2. - ORIGEM DAS FAZENDAS DE CANA-DE-AÇUCAR.

As fazendas canavieiras tiveram em Sergipe deI Rey uma origem


que acompanhou o seu próprio movimento de colonização. Partindo
da doação de trinta e duas léguas de costa que o Rei da Espanha fi-
zera a Cristovão de Barros Cardoso, para as vender a repartir com
colonos, a ocupação das margens do rio Real em fins do século XVI
estendeu-se às do Piauí e, em seguida, do Vasa Barris. O elemento
colonizador, arregimentado, em sua maior parte, na Bahia, foi to-

(22). - C6pia da Matrícula dos Engenhos desta Província. 1823. Ar-


- 493-

mando posse das áreas banhadas por esses rios, através de doações de
sesmarias. Já em junho de 1602, Baltazar Ferraz solicita lhe sejam da-
das em sesmaria duas léguas de terra,

" . .. medidas pelo dito rio de Sergipe hua legoa da outra


banda ficando em meo a dita ribeira para nela fazer engenho ou
engenhos de asucar que nella não há."

Mas, logo em agosto do mesmo ano, nova solicitação de

" . .. tres leguas de terra que se mendiram da cotindiba asima


da banda do norte legoa e meia da banda do sul ... "

tambem com a finalidade de fazer engenho, foi feita por Gaspar Da-
morim e Manoel Tomé (24). Passados alguns anos, os colonizadores

" . .. fabricarão quatro engenhos e efetuarão quatro cen-


tos currais de gado ... " (25).

Por quase dois séculos, as terras obtidas por essas doações oficiais
estiveram orientadas, em sua maioria, para a lavoura de subsistência
e criação de gado. A expansão das superfícies ocupadas pela proprie-
dade c:mavieira, a partir do século XVIII, se fez principalmente nes-
sas primitivas terras de sesmarias, localizadas nas margens dos rios, ou
em lugares propícios ao cultivo da cana-de-açucar e com relativa fa-
cilidade de escoamento da produção, uma vez que o açucar está con-
dicionado a alcançar os mercados estrangeiros. No século XIX, cons-
tituir fazendas de canas por obtenção de sesmaria era tanto mais di-
ficil, quanto as zonas de solo mais favoravel à cultura já estavam ocu-
padas. Entretanto, em 1880, o capitão João Barbosa de Madureira,
na lagoa do Pia, junto ao rio Salgado, recebe

"três léguas de comprido" (26).

(23). - FREIRE (Felisbelo), História de Sergipe. Rio de Janeiro, 1891.


Apêndice Sesmarias de Sergipe, p. 395.
(24). - Ibid., p. 398.
(25). - Secção de Manuscritos - Biblioteca Nacional
(26). - FREIRE (Felisbelo), História Territorial do Brasil, 19
- 494-

A Assembléia Provincial examina, em 1836, sobre a concessão


de três léguas de terras em sesmaria ao Coronel João de Aguiar Cal-
deira Boto (27).
As áreas onde primeiramente se processou a colonização, logo
cedo não dispunham de terras devolutas para serem distribuidas entre
cultivadores da região ou colonizadores a serem admitidos. Em 1829,
a Câmara de Santa Luzia e Estância declaram não dispor de

"terras devolutas donde se possão tirar sesmarias" (28).

Nesse mesmo ano, outras Câmaras respondem igualmente sobre a


inexistência de terras a serem doadas em suas respectivas vilas. La-
garto não as possui

e as que são capazes d'Agricultura, que Ja sao diminu-


tas, não podem ser bastantes para os Povos, que há neste territó-
rio" (29).

Santo Amaro, Propriá, Itabaiana se pronunciam da mesma for-


ma. São Cristovão ressalta que

" . .. no curto espaço de nosso termo há um grande número


de Povos a quem falta terreno para plantações de particulares
que todos tem a seu favor o di~eito de propriedade. .. e está a
parte fértil cultivada de cannas por houver grande número d'En-
genhos e outras plantações; e a parte estéril que hé a maior está
assim mesmo occupado com fazendas de gado e tem igualmente
differentes Proprietários" (30).

Em verdade, a grande maioria das propriedades canavieiras exis-


tentes no século XIX se formaram da subdivisão das semarias, por he-
rança, por venda ou por doação de qualquer natureza, por aforamen-
to, etc. A posse de terra, sem base legal, não deixou tambem de ~e
fazer representar, como um dos tipos de formação das propriedades de
cana-de-açucar de Sergipe. Em 1827, a Câmara de Estância informa
que muitas das suas terras

(27). - Noticiado" Sergipense. Aracaju - mar. 22, 1836


- n Q 94, p. 2.
(28). - Ofício da Câmara de Santa Luzia e Estância ao Presidente da
Província. Pacotilha 33. Arquivo Público do Estado de Sergipe.
(29). - Ofício da Câmara de Lagarto, pacotilha cito
(30). - Ofício
- 495-

se achão com seus Proprietários e po~ estes agricultadas,


e estes mesmos dependem de muitas dúvidas sobre posses e por
isso grandes demandas pendem" (31).

Proprietários havia que pagavam foro pelas terras onde planta-


vam a cana e erigiam o engenho. Em 1829, o coronel Domingos Dias
Coelho e Melo torna-se "enfiteuta" do engenho Quidongá, que perten-
cia à Associação Carmelita Calçada de São Cristovão (32). Em 1836,
Pedro Muniz Teles Barreto, proprietário dos engenhos Cruz e Alagoa,
em Itabaiana, pretende arrendar um deles. A partir da década de 40,
a documentação dispersa a respeito dos engenhos revela que a maior
parte da transferência de propriedades se faz em termos de compra e
venda ou de herança. A compra podia complementar uma parcela ga-
nha por herança: o engenho São Miguel

"havido por herança da sogra D. Rosa de Ser queira Dantas


em 1823 e parte por compra aos cunhados" (33).

o Várzea Grande, tambem em Estância, é outro desses exemplos.


A falta de capitais para a manutenção da propriedade e dos seus
senhores era, algumas vezes, o motivo da decisão a que era levado o
proprietário de vender parte de suas terras. Documentos vários reve-
lam denominações de "sitios", sendo aplicadas as terras desmembra-
das de engenhos. Sítios se formaram do desmembramento da Comen-
daroba, do Tartaruga, do Maria Teles, etc.
Se as proporções o permitissem, muitos deles davam origem a
novos engenhos, como o Boa Sorte, que se formou de terras do enge-
nho Canabrava. Geralmente recebiam os nomes seguidos das expres-
sões Novo, Velho, Baixo, de Cima, etc. Temos inúmeros deles, em ter-
ras sergipanas: Maruim de Baixo - Maruim de Cima, Catete Novo,
Catete Velho, Mato Grosso de Baixo, Mato Grosso de Cima, Periperí
Nove - Periperí Velho, etc. Se não chegassem a erigir novos enge-
nhos, passariam a plantar canas que seriam moidas por engenho vi-
zinho, geralmente da família; o sítio "Outeiros", vizinho ao Maria Te-
les, em Maruim, teria essa origem.
A imposição de partilha sucessória seria uma grande responsavel
pela extrema mobilidade da estrutura fundiária canavieira. Se uma
propriedade tinha uma dimensão que lhe permitisse a divisão entre her-

(31). - Ofício da Câmara de Estância, pac. cito 1827.


(32). - Engenhos. Pacote de documentos diversos sobre engenhos da
Província existentes no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe. Aracaju.
(33). - Aracaju. Arquivo Público
- 496-

deiros, seria essa solução preferivel à da indivisibilidade, pelos trans-


tornos que nesse caso, sem dúvida, as exigências de cada um não dei-
xariam de ocasionar, ou pela má administração dos bens por diretores
incapazes. Considerando os vários testemunhos de propriedades em
mãos de um mesmo grupo familiar, julgamos que a partilha não se pro-
cessava, em muitos casos, quando o seu tamanho já não permitia a
rentabilidade desejavel a uma cultura de natureza devoradora de ter-
ras. Daí o recurso para a preservação do conjunto agrícola em mãos
de família, cujos membros possuiam seus quinhões herdados. A par-
tir da terceira década do século XIX, certamente tambem pela exces-
siva multiplicação dos engenhos nas áreas já ocupadas, as proprieda-
.des aí constituídas adotaram a manutenção do sistema de exploração
sob um grupo parental. Foi o caminho que se lhes abriu para não
transformar antigos engenhos de força regular em simples "sítios", for-
necedores de canas a outros engenhos. Manter-se-ia a unidade dos
bens e o padrão social que a atividade imprimia, já que muito rara-
mente um grupo ligado à sociedade açucareira poderia optar por plan-
tações de cereais ou algodão. Dentre outros, são engenhos que estão
em mãos de vários herdeiros: Prazeres, Campo Grande, Calumby, Ma-
ta. Quatro irmãos possuem o Tramandahy. A testamenteira do Li-
moeiro deixa-o para os seus sobrinhos, cabendo ao testamenteiro, ir-
mão dos outros, ficar na posse dos bens com obrigação de satisfazer
com dinheiro os herdeiros na parte que lhes pertencer. Este engenho
já lhe pertencia em associação com seu irmão Felipe de Faro Mene-
zes (34). Esse sistema de "quinhões" tem-se revelado a forma mais
aplicada em terras de cana-de-açucar, nos meados do século XIX.
Alterava-se constantemente a distribuição da terra ligada à cul-
tura canavieira. Em 1848 por leilão de arrematação, o engenho Pom-
binho, de propriedade de José Pinto de Carvalho, passou para as mãos
do coronel João Gomes de Melo, e, logo depois, já se encontra, pelo
mesmo processo, em mãos do coronel José Sutério de Menezes. Por
arrematação, o engenho Pedras em 1875 escapa das mãos dos Ro-
lemberg para as do Barão de Propriá. Por qualquer dessas formas de
transferência, tanto se poderia levar a propriedade a uma extrema frag-
mentação, como a uma aglutinação de lotes. Subdividida por herança,
uma propriedade que se preservava pelo processo de indivisão de qui-
nhões em mãos de familiares, pode, pouco a pouco, por compra dos
lotes, recompor sua unidade em poder de um só proprietário. Inúme-
ras são as evidências desse processo que permite aos mais prósperos
poder dispor de capitais capazes de lhes permitir tal investimento. A
partir da década de 40
- 497-

careira, já por si pouco extensas, pelas sucessivas fragmentações que


se vinham efetuando, através dos processos anteriormente citados. Po-
demos nos aperceber do grau desse esfacelamento das propriedades até
meados do século XIX, pela análise da evolução do número de enge-
nhos da Província. Os trezentos e quarenta e sete (35) engenhos er-
guidos nas suas zonas litorâneas, em 1823, dão lugar, em 1856, a se-
tecentos e cinquenta (36) unidades açucareiras, em grande parte dis-
tribuidas naquelas mesmas áreas que ofereciam as melhores condições
para o plantio da cana-de-açucar. Significa que, em apenas trinta e
três anos, a Província ultrapassou o dobro do número de engenhos
construidos em seu solo. Nessa ocasião está bem marcada a orienta-
ção da agricultura sergipana para a cultura canavieira já que conta
com setecentos e cinquenta e três engenhos, oitenta e nove fazendas de
criação de gado, catorze fazendas de plantadores de café e cento e
trinta e oito alambiques.
Nos meados do século, ter uma propriedade grande em terras
propícias à lavoura da cana, significava a possibilidade de maiores lu-
cros, erguendo um outro engenho. Em anúncio da venda do Enge-
nho Nossa Senhora do Desterro do Rio Comprido, nas proximidades
de São Cristovão, há destaque especial para essa qualificação -

.. . .. o engenho comprehende entre grande pu 'são de terras


que dão mui bem para se levantar huma outra p'op-iedade inde-
pendente" (37).

Não temos condições de determinar a intensidade da ocorrência


de "partidistas" em Sergipe, como aquele grupo que possuindo terras
proprias e não tendo onde moer as canas nelas plantadas recorriam ao
engenho próximo. Proprietário de terras em Vila Nova, em requeri-
mento, utiliza essa expressão .

.. . .. dentro de um grande partido de cannas do suplicante de


melhor de 30 tarefas ... " (38);

para se incluir entre os simples plantadores de cana-de-açucar. Entre-


tanto, documentos como a inscrição de terras em Maruim, Laranjeiras,

(35). - Cópia de matrícula dos engenhos, op. cito


(36). - Relatório com que foi ent~egue a administração da Província
de Sergipe no dia 27 de fev. de 1856... op. cito
(37). - Correio Sergipense. Aracaju, abr. 22 - 1842 - Bi-
blioteca Pública Estadual. Nota de venda de um engenho.
(38). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe - Re-
querimento ao Presidente por senhor de engenho. Pacotilha
- 498-

Estância e diversos inventários, frequentemente se referem a "sítios",


onde se piantam canas e utilizam os engenhos dos vizinhos para moe-
las. Em 1864, Antônio Travassos oficia ao Presidente da Província
sobre o vale do Japaratuba, onde existam cento e vinte engenhos

" . .. muitos deles possuídos por mais de um proprietário e


quaze todos conservão ilimitado número de plantadores sendo a
estes que vu1gamente na Província se dá o nome de "lavradores"
(39).

A ambiguidade da expressão que tambem se aplica àqueles de pe-


quenas roças de produtos de subsistência, dificulta a obtenção de da-
dos precisos sobre a extensão dessa atividade ligada à cana, e que aos
engenhos propiciou condições para que pudessem reduzir suas dimen-
sões, sem prejuízo da utilização do maquinário que tinham implanta-
do. Em recenseamento de Santo Amaro, apresentando pelo presidente
Sá Benevides em 1856, aí existem dez engenhos, três alambiques, cin-
quenta e quatro sítios de lavoura. Sem dúvida, neste número de pro-
priedades incluem-se os mais diversos tipos de culturas. Em 1874, a
Câmara de Santa Luzia é clara quando, referindo-se ao número dos
seus engenhos, acrescenta que tem o município

" . .. cerca de duzentas herdades, ou pequenos sítios, cujos


possuidores não plantão uns mais do que alguma mandioca -
algum café, outros alguns feijão, milho, mZ.mona, ar:'oz, côcos,
etc. que constitue a producção da pequena lavoura" (40).

Em registro de terras de Estância tambem há muitas referências


a sítios de terras anexas a engenhos: o Boa Hora de Santa Ana de In-
diaroba os possui, como tambem o Vargem Grande, o Passagem etc.
Isso caracteriza as limitações de uma análise sobre terras que, com a
mesma denominação, poderiam estar plantadas com canas ou não.
• •

3. - ORGANIZAÇÃO INTERNA.

Para constituir uma propriedade canavieira, tinha-se que consi-


derar todos os elementos que possibilitassem a rentabilidade do inves-

(39). - Ofício de Antônio Travassos ao Presidente da Província. 1864.


(40). - Ofício da Câmara de Santa Luzia ao Presidente. 1874. A:qui·
vo Público do Estado. Pacotilha
- 499-

timento. A associação que se convencionou fazer, entre a fazenda de


cana com engenho e uma grande porção de terrenos, é uma decorrên-
cia dos requisitos básicos necessários para que ela atingisse uma pro-
dução satisfatória.
Orientada para tal atividade, a propriedade deveria dispor, alem
de uma boa proporção de terras próprias para o plantio da cana, de
abundantes recursos de água, de uma boa quantidade de matas e de
áreas que permitissem a pastagem dos animais. Incluir ainda um pe-
daço de terra para o cultivo de produtos de subsistência era uma ga-
rantia para a alimentação do elemento humano que a compunha.
Considerando a pequenez do território sergipano e, em particu-
lar, das áreas litorâneas, ocupadas, no início do século XIX, por con-
sideravel número de fazendas de cana-de-açucar, acreditamos ter ha-
vido, aqui, desde muito tempo, uma quebra de relação entre a pro-
priedade de extensas áreas e esse tipo de cultura. Uma análise sobre
as doações de sesmarias em terras sergipanas, nos fins dos séculos
XVI e XVII, transcrita por Felisbelo Freire (41), revela que, dessas
duzentas e onze cartas de entregas a sesmeiros, cento e oitenta não
ultrapassam a dimensão de uma légua em quadro. f: verdade que quan-
do a terra deveria ser orientada para o estabelecimento de um enge-
nho, logo suas dimensões se tornavam maiores. f: o caso de oito pe-
didos de terras para engenho que, naquela época, são atendidos com
a entrega de uma a três léguas de terras (42).
Se atentarmos ao longo do processo de fracionamento dessas pri-
mitivas propriedades, que certamente não deixou de ocorrer por força
da intensificação do movimento das zonas litorâneas, da maior de-
manda das terras aí localizadas e, principalmente, dos estímulos sobre
a produção açucareira, havemos de convir que, no início do século
XIX, al'
- 500-

A fragmentação gradual das terras de engenho até a metade do


século XIX, em parte se tomou praticavel, em vista da disposição dos
nossos proprietários visando a reduzir ao máximo as áreas de apro-
veitamento da propriedade. Com tal procedimento, provocaram resul-
tados quase sempre danosos, já que significou muitas vezes a dispensa
da associação de um engenho a seus elementos constitutivos, prinzi-
palmente, matas, causando o encarecimento da madeira, pela sua
quase inexistência em zonas próximas aos engenhos e a necessidade de
importa-la de outras regiões. Em todo caso, o desmatamento das zo-
nas litorâneas pela ação destruidora dos cultivadores, que queriam er-
guer novos engenhos, ocasionou a prodigiosa expansão das áreas de-
dicadas ao cultivo com a cana-de-açucar.
O maquinário do engenho era custoso e de pequena capacidade.
Uma terra de grande fertilidade tinha condições de atende-lo plena-
mente sem grandes extensões dos canaviais. Do número de engenhos,
erguidos em onze municípios sergipanos, e da produção de cada um
em 1875, podemos constatar que o maior número dessas máquinas de
moagem de cana eram acionadas por animais e produziam em média
de 2.000 a 5.000 arrobas (43).
A conjuntura favoravel para o açucar da Província, na primeira
metade do século XIX, e a incapacidade das condições técnicas de o
engenho absorver uma maior quantidade de canas, contribuiram para
a subdivisão das propriedades e a construção de mais engenhos, mui-
tas vezes em mãos do mesmo proprietário. Certamente para compen-
sar o baixo rendimento dos engenhos de pequena dimensão que então
se formaram, os proprietários que dispunham de algum numerário,
compravam um novo engenho. Como pudesse haver dificuldade de
conseguir terras em áreas vizinhas ao seu engenho, já em funcionamen-
to, o proprietário tinha que procurar aplicar seus capitais e faze-los
render com a aquisição de outras unidades açucareiras independentes.
Poderíamos ainda tentar explicar essa pulverização de engenhos iso-
lados em mãos de um mesmo proprietário, como uma tentativa de al-
cançar maior projeção social e polítiea pela diversificação de sua área
de influência, ou de arriscar menos a produção da propriedade em
zonas de condições climáticas diferençadas. A transmissão da pro-
priedade por herança poderia ser tambem o motivo da existência des-
ses vários engenhos em uma única mão. De Domingos Dias Coelho
dizia-se que possuia mais de oito engenhos. O cap. José Calazans Bi-
tencourt tinha três, dois deles em Santa Luzia e um em Itabaiana, em
associação com seu irmão. Joaquim José da Silveira possuia em Ita-

(43). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe - Câ·


- 501-

baiana três engenhos. O Barão de J aparatuba é proprietário de ou-


tros três na zona da Cotingu:ba, etc.
O solo extremamente fertil do litoral da província possibilitou
um equilíbrio da produção açucareira, em reduzida extensão da sua
área de cultivo. Possuindo, em 1872, mais de oitocentos engenhos, di-
ria o Presidente Álvares d'Azevedo que estão

.. . .. qU:lse acumulados uns sobre os outros" (44).

Para se adaptar às restrições de tamanho, a fazenda de cana em


Sergipe teve que adotar soluções que a tomassem uma empresa eco-
nômica com o mínimo espaço possivel. Foram os elementos que com-
partilham das terras com a cana-de-açucar - matas, pastos e roças -
que tiveram de ser sacrificados para o avanço das suas plantações.
Em 1850, o proprietário do Engenho Flor de Maroim ressalta que a
sua propriedade de engenho

... " tem mui pouco limite e estende o seu teLeno qU:lze todo
ocupado com plantações e pasto não tenho podido conceder mo-
radas aos poucos moradores que nelle rezidem" (45).

As melhores áreas de uma propriedade estavam destinadas à for-


mação do canavial. Constituiam as terras negras e fortes classificadas
como massapês e os "selões", terras vermelhas, capazes de poucos cor-
tes. Nosso solo era reconhecimento tido como

"ubérrimo" ..... cu:tivado em uma diminuta exte.:são de


sua pequena área (gripo nosso), produz mais do que p!"oduzem
outras Províncias em extensão mais dilatadas" (46). .

Essa reconhecida fertilidade agia sobre a grande fragmentação da


propriedade canavieira na primeira metade d oséculo XIX.
O plantio do canavial se verifica em julho e agosto. Com um
ano, a planta está em pleno amadurecimento e capaz de ser cortada
para ser levada à máquina de moagem. Sem que seja preciso nova
planta,

(44). - Relatório apresentado à Assembléia Provincial pelo Presiden-


te Luiz Alvares d'Azevedo - mar. 4 - 1872. Biblioteca Estadual.
(45). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe. Ofício de
p~oprietário de engenho. 1850. Pacotilha 1850.
(46). - Relatório apresentado à Assembléia provincial pelo Presidente
Luiz Alvares d'Azevedo ... op. cito
- 502-

"a raiz torna a rebentar e no segundo anno se faz outro


corte a que chamam sócca". Assim sucessivamente, "... o mes-
mo canavial produz dez e doze e mais resoccas, quando as cannas
não murcham se seccam pe!o rigoroso verão" (47).

Em 1849, em visita aos grandes centros produtores, Evaristo da


Veiga se admira com aquelas verdadeiras planícies de canaviais que,
contudo perder o terreno sua força produtora (48).
Considerando a área reduzida dos nossos engenhos, podemos aqui-
em alguns lugares, se prestarão ao corte de oito, dez e doze vezes, sem
latar o quão restritas devem ter sido as terras suficientes para o plan-
tio da C3na. Agravando mais ainda essa limitação de área disponivel,
vemos os processos e técnicas aplicados nas propriedades canavieiras
como os mais ineficientes e depredadores possivel. Métodos destruti-
vos acompanhavam o trabalho dos campos, desde a preparação do so-
lo, com desprezo pela preservação das suas qualidades, até a colheita
do caule e obtenção do açucaro

2 . 1. - A presença de água.

Ao nivel da importância com a categoria dos solos, a existência


das águas numa propriedade canavieira era fator determinante quando
da escolha da área para sua formação. As sesmarias distribuidas nos
séculos XVI e XVII posicionavam os rios como o marco mais impor-
tante da terra. Daí podermos agrupa-las de acordo com a indicação
dos rios onde se localizavam.
O papel imprescindivel das águas numa fazenda de açucar advem
dos fins a que se destinavam. Gilberto Freire considera os rios me-
nores os fixadores da colonização

"tornando possível a sedentariedade rural".

Foram os cursos de água, reduzidos, mas constantes, que

docemente se prestaram a moer as canas, a alagar as várzeas,


a enverdecer os canaviais, a transportar o açúcar".

De uma relação de quarenta e três engenhos, situados em Estân-


cia, no ano de 1873, quarenta e um estão às margens de rios. Se a

(47). - SOUZA (Marcos) ... op. cito


(48). - Relatório apresentado pelo presidente Evaristo da Veiga. 1849.
Relatórios 98. Biblioteca Pública
- 503-

quantidade de água fosse suficiente para poder ser utilizada como força
motriz, aí surgiria um engenho de água. Se não, carecia-se da sua pre-
sença camo insumo para a produção açucareira. Sua grande impor-
tância residia tambem no papel de veículo de circulação dos produ-
tos: ainda por transformar-se - a cana: o combustivel indispensavel
- a lenha; o produto acabado - o acuçar.
Uma barca ordinária, com cinco homens, podia conduzir, de uma
só vez,

20 caixas de assúcar, que se"ão necessá:"ias 120 bois e 40


pessoas para a condução por terra" (49).

Alem de permitir o transporte de um maior volume da produção


com menor dispêndio, a utilização das vias fluviais para o escoamento
da produção revelava-se quase que a única praticavel, considerando
que as estradas

"existem em hum estado tal, que muitíssim:ls vezes nellas


sucumbem os mesmos animais que os conduzem, e com isso se de-
teriorão as suas me"cadorias" (50).

Durante todo o século, vozes são unânimes em apontar a impra-


ticabilidade da utilização das nossas estradas como fator das crises
que atingem a produção açucareira. Resulta maior, então, a impor-
tância das vias fluviais como meio de comunicação e transporte.
Muitos engenhos tinham condições de possuir seus portos parti-
culares, por estarem privilegiadamente localizados às margens de rios
largos e de grande acessibilidade. Da relação de engenhos estancia-
nos, três possuem portos de embarque em suas propriedades. O caso
de Maruim de Baixo é significativo, porque, pela sua excelente loca-
lização, originou a cidade do mesmo nome. A situação dos engenhos
de Laranjeíras, sob esse aspecto, se revela singular. De quarenta e
nove engenhos existentes em 1838, este possuem porto próprio, quinze
estão a uma distância inferior a meia légua, enquanto onze distam
uma légua e catorze estão afastados duas léguas do porrto. Os doIs
mais óistantes não ultrapassam as três léguas.

(49). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe. Relató-


rio do Engenheiro João Bloem ao Presidente da Província. Pacotilha 847"
(50). - Falla com que o Presidente Bento de Mello Pe:eira abrio a
3\1 sessão ordinária da la. legislatura desta Província. IJ 1908
- 504-

Como força motriz, a água foi sempre muito pouca utilizada pe-
los engenhos da Província. Em 1889 de um total aproximado de se-
tecentos engenhos, apenas vinte e quatro eram impulsionados por força
hidráulica. Com a interiorização das áreas canavieiras e as constan-
tes variações climáticas que os tornavam bastante precários nos pe-
ríodos de seca, continuou a persistir o predomínio de máquinas mo-
vidas por animais, e, no último quartel do século XIX, foram introdu-
zidas a vapor. Os engenhos de animais, apesar de moerem menos,
evitavam a estreita exigência de água e sua oscilação anual que, como
já dizia Fernão Cardim,

" . .. às vezes lhes falta" (51).

A~ facilidades que um curso d'água podia oferecer, algumas ve-


zes, erram responsáveis pelo surgimento de novos engenhos ou soergui-
mento de outros. Daí as terras ribeirinhas serem disputadas palmo a
palmo pelos proprietários que queriam extender seus canaviais ou eri-
gir novos engenhos, tanto pela sua maior fertilidade, quanto pela dis-
ponibilidade de água. Fato característico encontramos nas margens do
Japaratuba, quando, a partir de 1858,

". .. depois que o Engenheiro Bloem o limpou ainda que


imperfeitamente, levantarão-se muitos engenhos, animarão-se ou-
tros abandonados e reparão-se os que caminhavão para a decadên-
cia" (52).

Quando a economia açucareira foi atingida pelos desníveis de


produção, ou pelas oscilações do mercado externo, provocando a re-
tração das superfícies de cultivo, seriam os vales fluviais que mante-
riam os limites físicos marcados pelas condições naturais que haviam
comandado a sua expansão.

3.2. - Matas.

A presença de matas para compor uma propriedade canavieira,


fazia-se necessária pelo grande consumo de lenhas para as fornalhas
do engenho, para a construção dos seus edifícios e para confecção da
caixaria, forma de acondicionamento do açucar mais utilizada pela
Província. Em 1835, São Cristovão dispõe de matas

(51). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe - Rela-


ção dos Engenhos de Laranjeiras - 1838. Secção de Sebrão
- 505-

na maior parte dos engenhos nos quais há diferentes


qualidades de madeiras" (53).

Em 1836, a Câmara de Socorro informa que não há matas con-


sideráveis e apenas alguns pedaços em terras de engenho (54). As an-
tigas matas de que dispunham as zonas litorâneas da Província esta-
vam sendo profundamente sacrificadas desde os inícios da colonização
tanto pela ação depredatória dos primeiros povoadores como pela· po-
lítica dos senhores de engenho do século XIX. Em 1836 o presidente
da ProvíI!cia (55) chamava a atenção para os prejuizos dessa orienta-
ção destruidora, que resultou no sacrifício das matas e se mantinha
pelos métodos dos plantadores de algodão. cuja cultura, nessa época,
recebia estímulos. Como a lenha era o combustivel necessário nas ofi-
cinas, para efetuar a evaporação do caldo, diariamente utilizava-se de
quinze a quarenta carros de lenha. Assim, as matas cada vez mais ra-
reavam.
Com os esgotamento dos solos de cultura, e sem a utilização de
técnicas ~apazes de reconstitui-Ios da extenuação de sucessivos plan-
tios, seriam as reservas de matas que poderiam fornecer as novas ter-
ras para a lavoura. Em 1840, Wenceslau de Oliveira Bello (56) oficia
que

"para a edificação dos 433 engenhos que tem hoje a Pro-


víncia, destruirão os p-imeiros povoadores as matas que haviam;
está portanto reduzida a importar taboado para as caixas em
que exportão os assúcares e a não ser o uso que fazem geralmente
do bagaço de cana, como combustível, estarião a maior parte dos
Engenhos privados de trabalhar por falta de lenha".

Justamente nessa época se verifica a maior fragmentação das pro-


priedades para dar margem à multiplicação dos engenhos. Com uma
superfície de cinco e seis léguas quadradas, às margens do Rio Real,
em seu trecho não mais navegavel, existia a mais extensa reserva de
matas da Província. Entretanto em 1851

". .. mais da metade está roteada".

(53). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Sergipe - Ofício


da Câmara de São Cristovão ao Presidente da Província. 1835. Pacotilha 33.
(54). - Idem ... da Câmara de Socorro.
(55). - Noticiador Sergipense. Aracaju. nQ 78. 1836. Biblioteca Nacional.
(56). - Ofício do presidente Wenceslau de Oliveira Belo ao Ministro da
Marinha 1840.
- 506-

Diante da devastação das matas abria-se a possibilidade de se for-


marem novas propriedades canavieiras. Porisso os donos de unidades
açucareiras, em dificuldades financeiras, sacrificavam suas matas, para
permitr a criação de mais engenhos. Como resultado, em 1851, La-
ranjeiras está quase destituida de matas,

sendo necessário importar para suas construções e até


para encaixar-se seu assúcar recebe taboado de caxões do sul da
Bahia e de Pinho trazidos da Europa em direitura" (57).

Somente alguns senhores de engenho possuem "pedaços de ma-


tas" como em São Cristovão, dentre as quais as mais famosas perten-
ciam ao coronel Domingos Dias Coelho e Mello (58). Constatamos
que alguns deles dispõem de matas bem mais para o interiorr da Pro-
víncia, afastadas das áreas internas do seu engenho. Não seria essa
uma das soluções, para o aproveitamento total da reduzlda área que
podiam dispor para a plantação da cana-de-açucar em áreas que lhe
eram propícias? Pela compressão exercida sobre essas terras, não pa-
receria mais vantajoso à política imediatista dos senhores de engenho
manter áreas de matas fora do circuito da propriedade?
Quando a produtividade descia a um nivel não compensador, tor-
nava-se menos oneroso destruir as matas e abrir novas áreas de cul-
tura em solos virgens do que melhorar os processos de cultivo. Pouco
a pouco, e em alguns casos, a presença de matas poderia estar disso-
ciada de uma fazenda de cana-de-açucar.

3 . 3. - Pastagens.

A possibilidade de dispor de terras próprias, para a pastagem do


gado destinado ao transporte da cana do terreno de plantio ao enge-
nho e, em muitos casos, ao movimento da moenda, devia tambem ser
ponderado ao se formar uma fazenda. Quando o engenho não ficava
às rr.argens de rios, era no lombo de muares ou nos carros puxados
por bois que se fazia o transporte do açucar encaixado. Dessa forma,
não poderiam deixar de existir terras de pastagem para esse gado in-
timante ligado aos trabalhos da propriedade. Com o entusiasmo pela
cultura da cana e seu beneficiamento, muitas dessas soltas foram trans-
formadas em fazendas canavieiras. Seriam elas responsáveis tambem
pela ampliação de área de cultura da cana nas regiões litorâneas. Em

(57). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado - ofício da Câma-


ra de Laranjeiras ao Presidente da Província. 1851 - Pacotilha 848.
(58). - Idem ... Câmara de São
- 507-

1863, Jacindo Mendonça ressalta justamente esse aspecto da expan-


são da cultura canavieira em detrimento das áreas de pastagem. Dizia
ele:

a indústria agrícola tende a invadir o terreno arável


ocupado atualmente com pastagem: eem futuro breve os gados
destínados à cultura das terras, ao movimento das máquinas, ao
transporte dos produtos, à viação terrest:e e à alimentação públi-
ca, não acharão pasto suficiente à reparação das forças ... " (59).

Já em 1836 não há fazendas de animais de espécie alguma em


Santa Luzia

por não ser o território vasto" (60).

As vantagens da lavoura canavieira estavam afastando a criação


de gado dessas áreas. Por isso, nessa região

"cada um proprietário possue conservação de sua fábrica o


necessário para o tráfico de seu trabalho e economia de sua
família" (61).

Em média um engenho movido por animais concentrava em suas


pastagens sessenta animais. Impulsionados por essa força motriz a
Província ainda possui a quinhentos e oitenta e cinco engenhos, em
1881, de um total de setecentos e vinte e cinco máquinas para obten-
ção do açucar.
Esses animais de engenhos, pela ausência de demarcações, às ve-
zes eram motivo de litígio entre vizinhos. Notadamente quando a vi-
zinhança era constituida de agricultores, a pressão exercida pelo gado
do engenho significava verdadeira catástrofe pelos prejuizos e contli-
tos que gerava. Representações foram feitas em 1819 ao Rei pelos
agricultores de Itabaiana que reclamavam os estragos causados pelas
gramínias dos engenhos vizinhos (62).

(59). - Relatório de João Jacinto de Mendonça - 1863. Arquivo PÚ-


blico de Sergipe.
(60). - ARACAJU - Arquivo Público do Estado de Se~gipe. ofício
da Câmara de Santa Luzia ao Presidente da Província. Pacotilha 33.
(61). - Ibid.
(62). - Ofício da Câmara da Vila de Itabaiana ao Rei D. João VI.
Ago. 3 - 1819 - Arquivo Nacional - Secção
- 508-

Para compensar a redução dos pastos que o aumento dos enge-


nhos encetava, os resíduos dos processos de purificação eram larga-
mente utilizados para o sustento dos animais. Considerando uma pro-
dução anual, em 1862, de 1.563.766 arrobas de mel (regularmente
obtinha-se uma canada por arroba de açucar) somente 1.542.942 ca-
nadas eram consumidas na Província. Essa aplicação do mel como
alimento do gado era muito favorecido pelo baixo preço do produto,
que não compensava o seu transporte até os portos de embarque feito
por alto custo.
Quando Pedro Andrade fazia promoção das suas máquinas de
fazer açucar à vapor, chamava atenção sobre as vantagens que trariam
com a dispensa de uma boa proporção dos animais mantidos nos pas-
tos da propriedade. Seria uma economia de dois terços dos terrenos
ocupados em pastos para o sustento do gado da fábrica.
• •

3 .4. - Culturas Subsidiárias.

Para a concessão de terras, exigia-se a

"obrigação de se cultivarem gêneros alimentares desde o


primeiro ano de concessão" (63).

Nem sempre se verificou o cumprimento desse preceito. Quando


os centros urbanos começam a se constituir em maior número, são to-
madas providências que levam os proprietários a plantarem mandioca
e outros alimentos que garantam a subsistência da população concen-
trada nos engenhos. Em 1875, a Câmara de Santa Luzia faz referên-
cias sobre a produção da mandioca no município,

"plantando as casas do engenho esse legume para a sustenta-


ção da escravatura" (64).

Divina Pastora sempre teve uma expressiva produção de cana-de-


açucar. Em 1861, somente repartia a exclusividade do seu cultivo
com a mandioca plantada,

(63). - PRADO Júnior (Caio), História Econômica do Brasil. Editora


Brasiliense, 13' ed. São Paulo, 1970.
(64). - ARACAJU, Arquivo Público do Estado de Se-gipe, ofício da
Câmara de Santa
- 509-

"s6 para subsistência porque os proprietários de cana possuem


quase todos os terrenos".

o aumento do número de propriedades dedicadas ao plantio da


cana-de-açucar se fez tambem em detrimento das áreas ocupadas com
o cultivo de mantimentos, principalmente da mandioca, maior produ-
tor agrícola de concorrência à cana. Esse sacrifício provocou perío-
dos de fome que, muitas vezes, sobreveio sobre a região, como em
cravos da Província atingidos pela "cólera-morbis" levaram o senhor
1857. O aumento do preço do açucar e a redução do número de es-
de engenho a orientar todas as suas reservas de trabalho para a obten-
ção do açucar.
"Ai esses engenhos onde out'ora se cultivavão também os
legumes, hoje pela falta d'escravos todo trabalho converge para
o fabrico do principal germem da exportação. Os próprios Se-
nhores d'engenhos comprão a farinha e a carne de xarque que
se~ve d'alimentação de suas escravaturas e agregados" (65).

Esse afastamento dos engenhos em manter suas próprias roças


precipitou em meados do século a crise da alta de preços dos produtos
de consumo alimentar já que esses gêneros passaram a ser apenas cul-
tivados por

"lavradores pobres privados de capitais e de braços que os


auxiliem" (66).

• •

INTERVENÇOES.

Da prof.a Kátia M. de Queirós Mattoso (Universidade Católica de


Salvador-Bahia.
Pergunta:
"1). - A multiplicação dos engenhos na primeira metade do
século XIX seria uma indicação de ampliação da área de cultivo da
cana de açucar ou uma tendência ao desenvolvimento de antigos en-

(65). - ARACAJU
- 510-

genhos, desmembramento ligado à abolição na década de 1830 da ins-


tituição do morgadio?"
Disse:
"2). - Queria assinalar a existência no Arquivo Público da
Bahia de um livro de matrícula de engenhos de 1807 em que são re-
gistrados os Engenhos de Sergipe."
*
Do Prof. Luís Mott (Universidade Estadual de Campinas. SP) .
Pergunta:
"Quais as fontes para as datas utilizadas na análise da obtenção
do número de engenhos de Sergipe entre 1808 e 1881?"
Informa:
"Confirmo a informação pela Autora de que em Santa Luzia no
começo do século XIX a principal fonte de renda era a produção ue
farinha, exportando inclusive para a Bahia, enquanto que nos meados
do século XIX a situação se inverte pela carência de farinha inclusive
em Santa Luzia."

Da Prota Angelina Nobre Rolim Garcez (Universidade Federal da
Bahia).
Indaga:
"Ficou dito que a lavoura canavieira em Sergipe conheceu o pro-
cesso de evolução da pequena ocupação da terra para a grande ocu-
pação mediante a sucessiva adição de novas áreas. Como ficou dito
tambem que não havia terras devolutas, como isso pode ocorrer?"
- 510 A -

* *
*
RESPOSTAS DA PROFESSORA MARIA DA GLORIA SANTANA
DE ALMEIDA.

À Profa. Kátia Mattoso.


1). - A evolução bem pronunciada do número de engenhos da
Província nos meados do século XIX tanto pode ter se verificado pela
expansão em novas áreas quanto pelo fracionamento dos antigos en-
genhos por influência do novo sistema de transmissão da herança. Uma
observação das áreas de desenvolvimento dos engenhos evidencia que
no início do século a ocupação se fazia principalmente em regiões mais
próximas do litoral ou/ e às margens dos rios. Nos meados do século,
a expansão verificada introduz nesse quadro da cultura cana vieira zonas
mais interiorizadas como ltabaianinha, Buquim, Capela, Nossa Senho-
ra das Dores. Como já ressaltamos, se o engenho possuia um tamanho
capaz de possibilitar o seu desmembramento, por herança ou venda
uma nova unidade agrícola poderia se formar numa área já ocupada
pela cana de açucar .

2). - Agradecemos esta informação. Nada conhecemos ainda


sobre a documentação existente nos arquivos da Bahia sobre Sergipe.
Uma relação completa dos engenhos sergipanos no começo do século
significará uma valiosa contribuição para o conhecimento de uma fase
de documentação ainda muito esparsa.

*
Ao Prof. Mou.

Antônio Marcos de Souza através da "Memória da Capitania de


Sergipe" nos indicou os dados referentes ao ano de 1808. Na "Relação
dos Engenhos pertencentes aos termos de Estância e Santa Luzia",
obtivemos as informações sobre essa zona, no ano de 1837. Do ano
de 1823 existe no Arquivo Público do Estado de Sergipe, secção
Sebrão Sobrinho, uma "Relação dos Engenhos Matriculados da Pro-
víncia". No Relatório com que foi entregue a administração da Pro-
víncia de Sergipe em 27 de fevereiro de 1856 ao Ilm9 Sr. Dr. Salvador
Correia de Sá Benevides pelo Vice-Presidente Exm9 Sr. Barão de
Maruim conseguimos uma relação dos engenhos no ano de 1856. Da
correspondência de várias Câmaras Municipais extraimos os dados re-
ferentes a 1875 (Pacotilha 419 - Arquivo Público
- 510 B -

finalmente, um "Mapa Estatístico dos Engenhos pertencentes aos di-


versos municípios da Província de Sergipe" (Pacotilha 418 A. P . E. S.)
revelou as informações que utilizamos para o ano de 1881 .


A Profa. Angelina Garcez.
Na realidade evidenciamos que houve uma ampliação da área de
ocupação da lavoura canacieira em Sergipe a partir da segunda década
do século XIX. Sem
UMA UNIDADE AÇUCAREIRA EM SERGIPE.
- O ENGENHO PEDRAS - (*) (**).

MARIA DA GLORIA SANTANA DE


ALMEIDA
do Departamento de História e Filosofia da Universi-
dade Fede~al de Sergipe.

l. - INTRODUÇÃO.

Desde os inícios do século XVII, quando o elemento colonizador


começou a reivindicar as terras centro-litorâneas do território sergi-
pano, as vantagens que os ricos vales formados pelos rios Cotinguiba,
Sergipe e Japaratuba ofereciam à agricultura, em especial à cultura da
cana-de-açucar, foram claramente percebidas. Constituido seu solo
de ricas terras dEr massapê, a lavoura canavieira aí se desenvolveria, sem
necessidade de constante renovação ou de técnicas que sacrificassem
a sua ocupação, por longos períodos. Associava-se a essas vantagens,
a localização, aí, da melhor via de comunicação de que a Província
dispunha, principal meio de escoamento da produção regional - o
largo estuário que o Sergipe forma ao lançar suas águas no Atlântico,
conhecido como Barra da Cotinguiba . Esta região pareceu-nos ideal
para fornecer um modelo de propriedade açucareira que retratasse os

(*). - Comunicação apresentada na 1<1 Sessão de Estudos, Equipe B,


no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(* *). - APES - Arquivo Público do Estado de Sergipe.
BPES - Biblioteca Pública do Estado de Sergipe.
AB - Arquivo da Sra. Baby Leite.
ACM - Arquivo Cartorial de Maroim.
BN - Biblioteca Nacional.
AN - Arquivo Nacional.
(*"'*). - A coleta de dados cartoriais contou com a colaboração da
aluna Lenalda Santos
- 512-

estímulos que atuaram sobre o desenvolvimento da economia, as dis-


crepâncias internas do sistema agrícola e comercial e as transforma-
ções a que se impôs para adaptar-se à revolução tecnológica dos tem-
pos industriais.
O antigo engenho Pedras se nos afigurou uma dessas unidades
que possibilitaria uma análise particular do processo evolutivo da cul-
tura canavieira em Sergipe. Situada nessa faixa de grande potenciali-
dade agrícola, profundamente propícia à cana-de-açucar, surgiu como
resposta aos incentivos externos e internos que, em fins do século
XVIII e inícios do século passado, atuaram sobre a produção açuca-
reira no Brasil e garantiram a formação de um novo ciclo de açucar
em nosso país. Tentamos considerar o seu ritmo de vida em amplas
unidades de tempo, por quase dois séculos de descontínua evolução.
Nesse período de larga duração, enfocamos seus ciclos de apogeu e as
etapas que limitaram seu esforço para atingir um plena realização
econômica. Sob aspectos muito reais de continuidade, a história dessa
unidade açucareira atravessa, então, distintas fases que se identificam
com as profundas mutações que atingem a cultura da cana-de-açucar
em Sergipe.
A mais significativa documentação de que dispomos para este
comunicado sobre a propriedade Pedras foi obtida em pesquisas carto-
riais, à base de testamentos e inventários (* * *). Graças ao respeito pe-
las coisas do passado, a Sra. Baby Leite, membro da família outrora de-
tentora da propriedade, nos pôs em contato com outras informações,
principalmente referentes à vida das Pedras, neste século. Contribui-
ram para precisar os contornos da sua evolução. Outros documentos,
esparsos, obtidos em Pesquisas no Arquivo Público Estadual, foram,
pouco a pouco, compondo um quadro significativo mas limitado, ape-
sar dos esforços despendidos. Através de entrevistas com os mais re-
centes proprietários da Usina, Dr. Gonçalo Rolemberg do Prado e
Dr. Augusto do Prado Leite, pudemos obter dados mais atuais sobre
o histórico da empresa.

• •

lI. - FORMAÇÃO DA PROPRIEDADE - ESBOÇO HIS-
TORICO.

A mais antiga informação sobre a existência do Engenho Pedras


data de 1807, quando um viajante que atravessava a região o cita co-
mo um ponto de passagem anterior ao Engenho Unha
- 513-

propriedade do coronel Gonçalo Paes (1). O desejo de obter dados


que permitissem buscar as origens da propriedade levou-nos à recom-
posição da genealogia da família, em função das propriedades que
possuiam. Eram todos senhores de engenho, de grande destaque na
vida política, social e econômica da Continguiba, nas primeiras déca-
das do século XIX.

Esta tarefa, que exigiu um trabalho de pesquisa apurada, e com


grande dispêndio de tempo, pelo exame de inventários diversos, não
conduziu a dados precisos sobre a formação da propriedade, mas per-
mitiu que construíssemos uma hipótese com alta probabilidade de cer-
teza.

Detendo-nos nos inícios do século XIX, na região compreendida


entre o rio Sergipe e o Japaratuba, veremos que nas várzeas do rio Si-
rirí, erguem-se engenhos. banguês pertencentes a membros de uma só
família. Observemos os limites de um deles, Pedras, objetivo do nosso
estudo: .

"ao sul com o engenho Santo Antônio e Pombinha; ao norte


com o engenho Unha do Gato; ao nascente com o da Canoa Nova
e ao poente com o Maria Teles" (2)"

Onde se encontram o norte e o poente, localizam-se os engenhos


que estavam em mãos de um mesmo grupo familiar. O Maria Teles,
ao oeste, na primeira metade do século XIX, é propriedade de Simião
Telles de Menezes, casado com Clara Maria de Lima, irmã de Manoel
Rollemberg d' Azevedo, ambos filhos de Gonçalo Paes de Azevedo, o
citado dono do engenho Uunha do Gato em 1807. Tal nome consta
de uma relação de proprietários da comarca de Sergipe Del Rey que
Antônio Caldas em 1759 enumera como pertencente ao partido da
Cotingu:ba. Atribui que seu engenho tenha produção anual de 78 ar-
robas de açucar branco e 1. 390 arrobas de mascavado. Não é uma
grande produção, uma vez que no mesmo quadro, Manoel Suzarte de
Andrade chega a conseguir 1. 603 arrobas, e 4 libras de açucar bran-
co e 1.050 arrobas de mascavado (3).

(1). - TAVARES (Luiz Henrique Dias), Roteiro de uma viagem em


1807, Cachoeira a Bahia ao Recife em Pernambuco. Trabalho apresentado ao
V Simp6sio de Hist6ria do Nordeste, A "acaju, 14-18 de agosto de 1973"
(2). - MARUIM, Inventários e Testamentos - 1866.
(3). - CALDAS (José Antônio), Notícia Geral de toda esta Capitania
da Bahia. Revista do I. G . H "B. Salvador.
- 514-

Por sua vez o engenho Maria Teles se limitava tambem com o


Unha do Gato e o engenho Mato Grosso (4). Este, em 1807 é pro-
priedade de João Paes Rolemberg que poderia ser irmão de Gonçalo
Paes d'Azevedo; em todo caso, seu parente bem próximo. O Unha do
Gato, por sua vez, limitava-se tambem com as terras do engenho Vi-
tória e, como ele pertencente à família, nos meados do século.
Das propriedades existentes no termo de Santo Amaro em 1757,
Felisbelo Freire (5) cita os sítios Berlengas, Moita, Maria Teles; entre
os engenhos que relaciona estão o Jordão, Catete, Maruim de Baixo,
Maruim de Cima etc. Não seria deste sítio, como então se denomina-
vam áreas que só plantavam a cana, que se originaram os engenhos da
família nos último decênios do século XVIII?
Julgamos que todas essas terras teriam pertencido a um ancestral
comum que as teria fracionado, pouco a pouco, com a finalidade de
proporcionar aos filhos uma razoavel subsistência e garantir-lhes a po-
sição na sociedade que a posse de engenhos assegurava. Mais que
isso, o fim do século XVIII e começos do século XIX assistiram a
um dos períodos mais florescentes para a economia açucareira como
resultado da valorização dos preços de açucar, das exigências do mer-
cado internacional, da queda da produção das Antilhas, etc.
Essas cond:ções estimuladoras tornaram a comercialização mais
lucrativa e possib;litaram a dispensa de maiores áreas para a manu-
tenção do nivel de produtividade da fazenda.
Baseando melhor esta argumentação, destacamos que em 1823 o
engenho Pedras pertence a Manoel Rolemberg d'Azevedo, e o Unha
do Gato ainda está em mãos de Gonçalo Paes d'Azevedo (6). Dois
anos mais tarde registra-se a posse deste último pelo referido proprie-
tário das Pedras, seu filho, e será através do casamento da viuva de
Manoel Rolemberg, Maria de Faro Rolemberg, que o Unha do Gato
passará para as mãos do Barão de Maruim.
Em 1834 são proprietários do Engenho Pedras Luiz Barbosa de
Madureira (cuja família era possuidora do Engenho Periperí, nas pro-
ximidades) e sua mulher Ana de Faro Rolemberg, filha de Manoel
Rolemberg d'Azevedo. Constatamos, então, que os quatro engenhos
vizinhos tinham passado, por herança, aos descendentes de Manoel
Rolemberg - Unha do Gato, ao Barão de Maru:m pelo seu casamen-
(4). - ARACAJU - APES - Livro de Registro de Terras de Maruim·
1856.
(5). - FREIRE (Felisbe10), História Territorial do Brasil, lQ voI.
Typografia do Jornal do Comércio. Rio de Janeiro. 1906.
(6). - ARACAJU - APES
- 515-

to com Maria de Faro Rolemberg (viuva); o Vitória, limítrofe deste,


ao seu filho Gonçalo de Faro Rolemberg, futuro Barão de Japaratu-
ba; o Maria Teles a Manoel Rolemberg de Menezes, casado com a
neta, filha do Barão. Julgamos válido referir, em vista da sua proxi-
midade e para dar uma visão total do patrimônio da família, o enge-
nho São Joaquim, de propriedade de outra filha de Manoel Rolemberg,
Maria de Faro Rolemberg, que teve morte trágica.
Enfim, as quatro primeiras propriedades constituiam um todo
contínuo e homogêneo, atravessadas pelo rio Sirirí, elemento indispen-
savel para a composição de uma propriedade canavieira. Quando Ja
introdução das relações capitalistas no setor açucareiro, seria princi-
palmente sobre este complexo familiar que a usina Pedras faria a ex-
pansão da sua área de cultivo.
*
Os meados do século XIX significam uma fase de grande preo-
cupação dos líderes sergipanos pelos grandes projetos considerados
como os verdadeiros caminhos para a autêntica concretização da auto-
nomia da Província e da sua realização econômica e social: a aber-
tura de canais, ligando os grandes rios entre si, significava perspecti-
vas de facil comunicação entre as regiões litorâneas de Sergipe e a
Província da Bahia, para onde continuava a ser enviada a maior parte
dos nossos produtos; a linha de navegação a vapor reduziria a irregu-
laridade do movimento de embarcações à vela, apressaria o tempo de
viagem e os perigos da barra seriam melhor superados; a construção
de estradas; a criação de estabelecimentos de crédito rural

"onde o negociante pudesse obter os valo:es precisos às suas


transações sem ver-se coagido a comprar em praças de províncias
estranhas aonde lhes garante o crédito e o dinheiro" (7).

A par dessa conscientização das necessidades da região, para"en-


cetar a arrancada para o progresso, a Província teve que atravessar
graves momentos que prejudicariam, profundamente, a concretização
da sua "ideologia do progresso" como definiu o Prof. Luiz Mott (8),
quando evidenciou essa ansiedade de transformações que acometeu os
provincianos daquela época.
A proibição do tráfico negreiro, ao mesmo tempo que possibilitou
a libertação de capitais para empreendimentos novos, desfechou gran-
(7). - ARACAJU - APES - Demonstrativo do Movimento da A.I-
fândega de A.racaju - 1873/1875. Fev. 1875.
(8). - MOIT (Luiz R. B.). O Imperial Instituto Sergipano de Agri-
cultura e a Ideologia do Progresso. Trabalho apresentado ao V Simpósio
- 516-

de golpe sobre a força de trabalho utilizado nas empresas agrícolas,


principalmente açucareiras. Como consequência, os escravos de ativi-
dades de subsistência foram atraidos para satisfazer as necessidades da
cultura açucareira, que dispunha de capitais capazes de mante-Ios em
seus serviços. Aliado esse fato à eclosão do cólera-morbus e às su-
cessivas secas que afligiram a agricultura da Província, assistiu-se em
fins da década de 50 a uma das maiores crises da século XIX, eviden-
ciada pelos horrores da alta dos preços de alimentos e, em decorrência,
da fome.
Foi nesse clima de instabilidade social e econômica, caracterizada
por grandiosos planos e por condições adversas, que o engenho Pedras
esteve em mãos de Luiz Madureira. A propriedade reflete esse estado
de coisas com momentos de expansão e aplicação de capitais em es-
cravos e artigos de luxo e com instantes que prenunciam uma grande
crise que se avizinha.
Muitas fortunas sofreram completa desarticulação com a partilha
dos bens, por morte de um dos cônjuges. Percebe-se claramente esse
processo de decomposição através do sistema de sucessão hereditária,
que se aplicou aos bens do casal, inventariados após a morte de D.
Ana em 1866.
Da avaliação total da suas posses em mais de 229: 032$800, coube
ao proprietário viuvo uma parte correspondente a 110:562$650.
O golpe s0frido, principalmente com a extrema redução da possibili-
dade de dispor de uma força de trabalho humana ou animal, necessá-
ria ao perfeito funcionamento dessa unidade açucareira, reduziu todas
as chances de a propriedade vir a recompor sua capacidade de pro-
du,..ã". Apesar de, no inventário, constar o montante das dívidas em
6:707$488, sabemos que a propriedade já atravessava um período de
crise com falta de capital circulante.
O auge do processo de desarticulação do sistema se revelou com
a morte de Luiz Madureira, em 1872, e o protesto de dívidas por An-
tônio Pereira Espinheira e Companhia, em quantia superior a cem
contos. Percebemos que, nesses seis anos, a propriedade resvalou por
um plano inclinado de desníveis de produção a ponto de constar, no
seu inventário de 5 de dezembro de 1872, apenas 40 escravos e, co-
mo semoventes, 117 bestas, uma poldra, 9 sendeiros, um burro e um
poldrinhú. Nessa época, o engenho continuava a ser avaliado em
90:000$000.
- 517-

filhos (de sua primeira mulher Alexandrina Rolemberg Madureira)


faz queixa ao oficial de Justiça sobre o comportamento do seu cu-
nhado que

"tem procurado por todos os meios, defraudar os bens do ca-


sai, já alforriando po~ sua conta as escravas Germana e Amân-
cia, já finalmente vendendo outros a diversos, aliem da fábrica de
bois e cavallos, que tudo também depôs em seu proveito particular".

Essa situação leva o Juiz de Orfãos a mandar que

"ficasse suspensa a partilha dos bens deste espólio segundo o


protesto existente nos ditos autos até que se liquidasse o mesmo
espólio que aliás se acha sobre carregado de dívidas talvez supe-
riores aos bens existentes" (9).

Arrematada em hasta pública pelo Barão de Propriá, em 1875,


logo a propriedade passaria para as mãos do seu filho adotivo, Gon-
çalo Vieira de Melo Prado (lO). De posse do engenho Pedras nas úl-
timas décadas do século, Gonçalo não o conduziria a uma posição van-
tajosa ante o progresso técnico que atingira a indústria açucareira em
todo o Brasil. Não se lhe podem negar as medidas necessárias para
preserva-lo e reconduzi-Io ao equilíbrio. Ele mesmo reconheceu em
seu testamento a situação de estabilidade que imprimiu ao engenho
quando disse:

"Por graça de Deus e devido à generosidade do meu Cla~o


Padrinho o Barão de Propriá, vivi na abastança deixanro os meus
bens senão augmentados pelo menos intactos ... " (11).

o período sob sua direção assistira à modificação radical da força


de trabalho agrícola do Brasil, com a abolição da mão-de-obra escra-
va, o que alterou profundamente a ordem interna de muitas proprie-
dades açucareiras. Os dados são imprecisos sobre o seu tempo. Esse
período foi, sem dúvida, um dos mais críticos, quando os problemas se
avolumavam e o pequeno Estado atravessava grandes vicissitudes.

"Por todos os vapores que saem do nosSO pequeno porto, emi-


gram para o norte e o sul do país levas dos nossos compatriotas

(9). - MARUIM - ACM - Inventários e Testamentos - 1874.


(lO). - ARACAJU - ABP - C6pia da Carta de Arrematação - 1875.
(11). - MARUIM - ACM - Inventários e Testamentos - 1907.
- 518-

que vão buscar na Amazonas e em São Paulo o trabalho e o bem


estar que lhes falta na ter:-a em que nasceram. .. é m:lis frisante
prova da crise agrícola e industrial em que se debate nosso Estado"
(12) .

o valor atribui do ao engenho em 1907 está reduzido à metade


do que lhe coubera em 1872. A que atribuir essa avaliação tão baixa,
se não houve desmembramento da sua área? Seria apenas uma prática
que se estava firmando de registrar as propriedades com um valor ex-
tremamente reduzido ou seria o sintoma dessa crise que se abatia sobre
o Estado, talvez iniciada com a abolição do cativeiro, e que teria pro-
vocado o aumento da oferta de propriedades e sua consequente desva-
lorização?

o montante dos bens inventariados em 1907 resumia-se a ....


5:800$000 de gado vacum e cavalar, 5:600$000 em bens de raiz, sendo
um quinhão "pro indiviso" nos terrenos do extinto engenho Maria Te-
les (herança de sua mãe) no valor de 5:400$000 e de dois sítios Ca-
bula e Labareda no valor de 200$000 (que couberam aos filhos de li-
bertas). A soma total dos bens chega a 75:000$000 donde se ex-
trairia 19:051$000 de dívidas e despesas e 13:700$000 dos legados
deixados a crias. Restavam ao jovem herdeiro 42:649$000.

Com essa pequena fortuna, Gonçalo Rolemberg do Prado lDlCla


um período de pleno florescimento da empresa agrícola, que lhe coube
por herança. Para romper essa fase de estabilização, seria necessário
grande inversão de capitais. Tornava-se primordial que a propriedade
fosse introduzida nas técnicas de produção de açucar que substitui-
ram os velhos banguês, a partir dos fins do século XIX . A instalação
de moderna usina e a separação entre a fábrica e o campo serão con-
sequências do novo tipo de relações que se estabeleceram.
Podemos atribuir ao coronel Gonçalo Rolemberg do Prado, uma
dessas figuras de ação como homem da cana e do açucar, que soube
crescer mesmo em período de crise, como aquele compreendido entre
os anos 1889-1930. Partindo de uma propriedade que mal se adapta-
va aa período industrial do açucar, o coronel Gonçalo chegou a im-
plantar um significativo complexo agro-industrial.
Em 1957, após sua morte, os bens entraram em processo de par-
tilha ficando sua esposa, D. Maria Rolemberg da Cruz Prado, como
a grande acionista da Usina. Tendo seu filho, Dr. Gonçalo Prado, à
frente da administração, grandes reformas foram implantadas, quer na

(12). - MARUIM - O
- 519-

aquisIção de maquinário novo e de maior capacidade, quer na intro-


dução de novas técnicas no cultivo do solo.
Recompondo um conjunto que o coronel Gonçalo tinha dissocia-
do, em 1969 o grupo Oiteirinhos, de membros da família, fez fusão
com Pedras e passou a ser Usina Oiteirinhos Ltda., que se preservou
apenas por 3 anos. Constituia-se, então, em um imovel rural da So-
ciedade Agrícola e Industrial Usina Oiteirinhos Ltda. compreendendo
cinco áreas não contíguas, assim discriminadas conforme o mapa 1 (13):

Fazenda Área (ha)


Pedras 3.634
Oiteirinhos 2.956
Cajueiro 216
Ladeira 667
Pé de Galinha 94
Área Total 7.567

Sob a direção do Dr. Augusto do Prado Leite, neto do coronel


Gonçalo, foram vendidas 50% das ações, em julho de 1971, à ASTEP
SI A, empresa de Recife dedicada a estudo sobre estradas. Foi uma
composição efêmera, pois em agosto de 1972 o grupo Franco e C:a.,
hoie Usina São José do Pinheiro SI A, adquiriu a maior parte das ações
daquele grupo. Como usina, ela continuou a executar seus trabalhos
de moenda até a safra de 1974. Desde então transformou-se em fa-
zenda de canas, fornecedora de matéria prima para o trabalho de moa-
gem da Usina Pinheiro SI A.
• •

IH. - ORGANIZAÇÃO DA PROPRIEDADE AGRICOLA.

Diante da Comissão encarregada de registrar as terras do muni-


cípio de Maruim, Luiz Barbosa de Madureira em 1856 diria que pos-
sui o engenho Pedras

"cuja extensão não hé conhecida".

Ajudada pela marcação do limites da propriedade nos tempos


atuais, feita pelo Dr. Gonçalo Rolemberg do Prado, e pela fixação

(13). - ASTEP S/A - USINA OITEIRINHOS


- 520-

aproximada das áreas adquiridas pelo seu pai, pudemos avaliar, de


acordo com cálculos sobre a aerofotogrometria da região fornecida
pela Petrobrás, que a propriedade Pedras, nos meados do século XIX
deveria ter uma dimensão aproximada de 280 hectares.
Continuando as informações que prestava naquela ocasião à re-
ferida comissão, o proprietário do engenho assim fixava os seus limi-
tes, detalhadamente:

"Principia com o Engenho Canoa, propriedade do Capitão


Francisco de Assumpção Menezes e com o Engenho Peripe i do
finado meu irmão Gonçalo Paes Barbosa de Madureira. No po-
ente com o Engenho Maria Telles do major Manoel Rolemberg de
Menezes. No Norte, na parte que banha o rio Siriry com o
Engenho Unha do Gato do Barão de Maroim. No sul com o
Santo Antônio do tenente coronel José de Ba:ros Pimentel e com
o da Pombinha do coronel José Sutério de Menezes" (14).

Era uma unidade agrícola de reduzida dimensão para absorver


uma estrutura agrária bastante complexa como deveria ser a proprie-
dade açucareira, fracionada em áreas ocupadas pela lavoura da cana-
de-açucar, pastagem para o gado destinado aos trabalhos da empresa
agrícola, matas que fornecessem a lenha para alimentar a fornalha da
fábrica e aquela, de utilização não agrícola, destinada às vivendas e à
fabrica. É verdade que o banguê não possuia capacidade para o apro-
veitamento de extensas terras, nem sua aparelhagem permitia a moa-
gem de grandes safras. Mas essa área muito reduzida diminuia a pos-
sibilidade de esboçar experiências com novas culturas, capazes de di-
minuir o choque das oscilações comerciais que acometeram a ativi-
dade açucareira. Far-se-ia necessário, para isso, sacrificar sua renta-
bilidade normal, reduzindo da cana o espaço que lhe era dedicado.
J á se fazia necessária uma pequena plantação de mandioca para asse-
gurar aos escravos a alimentação diária. Nem todos os engenhos a
possuiam. Apesar de as leis coloniais a terem tornado obrigatória nos
engenhos, a redução do tamanho das propriedades açucareiras condu-
ziu ao aproveitamento máximo da área com atividades ligadas exclu-
sivamente à produção do açucar. Em 1866 o Engenho Pedras tinha
suas "roças de mandioca". Sem dúvida, o alto preço dos cereais e a
falta do produto nos mercados, como ocorrera nos fins da década de
50, contribuiram muito para que os proprietários procurassem ter um
mínimo de garantia do produto em suas fazendas. Na década de 60,
motivados pelos estímulos de comercialização que o algodão vinha
(14) - ARACAJU - APES
-- 521--
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USINA OITEIRINHOS MAPA DE SITUAÇÃO

ESTUDOS BA:SICOS AST EP S/A os - 1/4


- 522-

conseguindo e preocupados com o prolongamento da crise açucareira


decorrente da baixa de preço do açucar e retração do mercado ex-
terno, muitos agricultores sergipanos se voltaram para a cultura algo-
doeira. Senhores de engenho tambem participaram do empreendim.::n-
to. O engenho Pedras possuia seus "algodões" em 1866.
Se as condições financeiras permitissem a um proprietário de
engenho a expansão dos seus negócios, a ideologia do sistema o le-
varia para a inversão de capitais na ampliação da força de trabalho
da empresa simbolizada, até o último quartel do século XIX, no nú-
mero de escravos da unidade econômica ou na compra de novas terras,
geralmente, propícias à cultura canavieira.
Em 1866 o proprietário das Pedras possuia tambem o engenho
Periperí Novo, no termo de Rosário do Catete, comprado por escri-
tura pública a seu cunhado, o Barão de Japaratuba. Esse engenho se
tinha formado do desmembramento do Periperí que pertencera à fa-
mília de Madureira. Como parte da herança materna, dispunha tam-
bem de um quinhão no que agora constituia o engenho Periperí Ve-
lho. Duas pequenas partes de terras indivisas no sítio Toucinho, no
próprio Termo de Maruim, e 17 ações na Companhia Sergipana de
Estocagem complementavam o quadro das possibilidades de reapli-
cação de capitais de que dispusera Luiz Madureira.
O ciclo de desnivel da curva de crescimento da produção, que
perdurou por mais de 10 anos, na década de 65-74, começou a ser
alterado quando da administração do coronel Gonçalo Vieira de Melo
Prado. A estrutura interna da unidade de produção analisada manter-
se-ia intacta, apesar da obrigatoriedade de aplicação da mão-de-obra
livre em seus serviços e da adoção do vapor para o movimento das
suas máquinas.
Quando, a partir de 1910, o primitivo engenho procura adaptar-
se ao processo de industrialização, o faz acompanhando a crescente ten-
dência da usina a substituir-se ao lavrador. Esse fato revolucionou
completamente a dimensão e distribu~ção
- 524-

Engajado nesse movimento geral das unidades açucareiras do


Brasll, que dispunham de meios suficientes para tentar a sua participa-
ção no processo de renascimento da decadente classe açucareira, o
engenho Pedras modificaria completamente a sua estrutura e viria a
compor um conjunto de propriedades conhecido como PEDRAS SI A.
Essa composição se processaria lenta, mas constantemente, durante as
três primeiras décadas do século atual, através do fenômeno de rea-
gregação de terras. Um movimento contrário, como vimos, teria sido,
primitivamente, responsavel pela formação de várias unidades de pe-
quena dimensão, mais adaptadas ao tipo de exploração de um enge-
nho banguê.
O mapa 2, mostra a unidade central do conjunto Pedras, abar-
cando propriedades que, no século anterior, compunham pequenas
empresas independentes. Através dessa política, chegou a reunir, em
torno do seu núcleo, cerca de 11.992,2 tarefas ou 3.634 ha (15). Em
1909 se iniciou esse processo de unificação de várias partes, com a
compra ao coronel Francisco Cardoso do engenho Canoa Nova, com
"suas máquinas, taxas, casas de mo~ar, casas pequenas para
trabalhadores e demais pertences e terras do engenho e ainda 30
bois ao preço de 40:000$000".

A preço de 100:000$000 foi adquirido em 1913 o Engenho Vi-


tória ao coronel Manoel Aguiar Melo e mulher, Joaquim Machado
de Faro Rolemberg, Zacarias Rolemberg, etc.,
"com todas as suas terras e safra".

A Adolfo Schimith e à firma comercial de Maruim, em liquida-


ção, A. Schramm, adquiriu ao preço de 70:000$000 o engenho Pom-
binha com terras anexas ao Maruim de Cima, em 1916. O Santo
Antônio, antiga usina limítrofe com as Pedras e tambem contínuo ao
Pombinha, foi adquirido, em 1917, a José Diniz de Faro Dantas.
Nesse mesmo ano o Batinga passou ao grupo. Outras aquisições
foram feitas no período compreendido entre 1910 e 1930. Conforme
quadro abaixo, podemos ter uma real visão da política de concentra-
ção de propriedades rurais a que se impôs a empresa Pedras para con-
seguir a formação, em 1917, de uma das cinco usinas completas de
que dispunha o Estado. Em 1934, assim está o lançamento de algu-
mas das propriedades de Gonçalo Rolemberg do Prado nas diversas
Exatorias municipais do Estado:

(15). - ASTEP S/A, op. cito


- 525

Pela Exatoria de Capela:


Ladei:a 150:000$DOO
Boa Vista 25:000$000
Sapucaia 15:000$000
Pela Exatoria de Japaratuba: 900:000$000
Pela Exatoria de Laranjeiras:
Santa Cruz e Gravatá 160:000$000
Pela Exatoria de Maruim:
Pedras - valor venal 900:000$000
Fazenda Bolinga 60:000$000
Fazenda João Pereira 40:000$000
Fazenda Prainha 30:0JO$000
Pela Exatoria de Rosário do Catete:
Curitiba - valor venal 40:000$000
Unha do Gato 180:000$000
Vict6:ia 180:000$000
Floresta 280:000$000
São Miguel 100:000$000
Macambira 180:000$000
Panelas 120:000$000
U ... de Cima 200:000$000
Idem de Baixo 200:000$000
Pela Exatoria de Siriri:
Fazendas Farias 40:000$000
Essa política da ampliação da sua área levou à formação de no-
vos confrontantes para a Usina Pedras:
Ao norte: - Fazenda Maniçoba
Fazenda Piranhas
Povoado Siririzinho
Fazenda Oiteirinhos *
Ao sul: - Fazenda Canoa *
Fazenda Vassoura *
Fazenda Flor do Maruim *
Sítio Praça da Estação
Sítio Rio Sirirí
Sítio Canoa *
Sítio Lebra
Fazenda Forno
Fazenda São João *
A oeste: - Fazenda Sítio
Sítio Pinheirinho
Fazenda Lagoa dos Porcos
- 526-

Povoado Oiteirinhos
Fazenda Olhos D'agua *
Fazenda Mato Grosso *
Engenho Novo *
Fazenda Maniçoba

Integrada no sistema capitalista de produção, o conjunto Pedras


procuraria diversificar a utilização agrícola das suas áreas de produ-
ção. Enquanto a Usina, envolvendo a área do citado mapa 2, em
anexo, era orientada para a cultura da cana-de-açucar, fazendas de
gado localizadas em Maruim (Sião), no sertão, na Bahia ou em Ca-
pela asseguraram a diversificação de empreendimentos capazes de ga-
rantir o equilíbrio econômico da composição. O coronel Gonçalo Ro-
lemberg do Prado tomou-se ainda o maior acionista e Diretor Presi-
dente do Banco Mercantil Sergipense e da Fábrica Santa Cruz da
Companhia Industrial de Estância. Isso lhe possibilitou um ganho de
lucros capaz de manter a empresa em crescente desenvolvimento (16).
Aí, em Pedras, a cana-de-açucar cederia terreno para uma pe-
quena quantidade de gado e para o aumento das matas suficientes ao
fornecimento da madeira necessária a construções e outros fins. O
relevo dominante da propriedade é o plano ou suavemente ondulado
(17) . Assim sendo, as condições morfológicas constituem elementos
altamente estimuladores para a cultura da cana-de-açucar na região.
Em 1972, entretanto, apesar de estar orientada para essa cultura, a
fazenda Pedras dedica à cana-de-açucar apenas 1.414 ha. ou seja
38,8 % do total da sua área. O restante das terras assim estava distri-
buido (18):

Area ha Area ha
Pasto 384 Capoeira 85
Mata esparsa 943 Culturas diversificadas 84
Mata densa 380 Bambu 33
Área em pousio 262 Área sem vegetação 48

Dissociando-se da parte industrial, a usina Pedras passou a com-


por desde agosto de 1972 um grupo muito mais complexo e poderoso
que a reduziu a fazenda canavieira, fornecedora de matéria prima à
Usina
- 527-

ção da propriedade tem se aplicado na expansão cada vez maior da


área destinada ao plantio de cana de açucar.

Safras Cana Nova Cana de Corte


1972/1973 340 ha 750 ha
1973/1974 520 ha 822 ha
1974/1975 591 ha 1.290 ha

Pela observação do quadro acima podemos perceber que da pri-


meira para a segunda safra houve uma expansão correspondente a 252
ha de cultivo de cana. Da safra de 73/74 para 74/75 garantiu-se o
aumento da área de ocupação canavieira em 539 ha.
* '"
*
IV. - TECNOLOGIA E MÃO-DE-OBRA.

A fertilidade natural do solo, dotado da umidade e dos elemen-


tos nutritivos necessários ao desenvolvimento extraordinário dos cana-
viais, revelou-se uma das condições prioritárias para que a proprie-
dade fosse orientada no sentido da produção açucareira. A terra ocu-
pada pela cana-de-açucar na unidade agrícola estudada, como acon-
tecia com os melhores solos do Cotinguiba, apresentava um tal índice
de fertilidade que não sofria do esgotamento que, geralmente, acome-
tia aos de outras Províncias ocupadas pela lavoura açucareira. Nos
inícios do século XX, a plantação de um canavial na Usina Pedras
perdurava, em média, de 6 a 7 anos. Hoje, a renovação se faz neces-
sária num tempo mais reduzido, 4 anos, no máximo. Muitas vezes fa-
zia-se apenas a retocagem de pequenas áreas onde houvesse falhas de
fertilidade. Havia regiões de tão alta fertilidade que possibilitava a
conservação de uma planta por 30 anos seguidos. Na área do antigo
engenho Vitória, uma das mais férteis do conjunto, havia um canavial
conhecido como "canavial dos 39 anos" (19). Para compensar os teo-
res baixos de alguns elementos nutrientes do solo como fósforo, po-
tássio, etc., em tempos do Dr. Gonçalo, filho, foi realizada uma ex-
periência com adubação complementar nos moldes da mais moderna
técnica de tratamento dos solos. As análises revelaram a necessidade
de adubação à base de NP e/ou NPK e, em algumas áreas, de aplica-
ção de caIcáreo (20).

(19). - LEITE (Augusto), Entrevista concedida à autora. Aracaju,


1975.
(20). - ASTEP
- 528-

Não podemos determinar as variedades de cana que nela eram


cultivadas enquanto engenho banguê . Entretanto sabemos que até os
meados do século XIX, era a crioula, conhecida no Brasil desde os pri-
meiros dias da colonização, a variedade preferentemente utilizada pe-
los nossos lavradores. Em 1810 a cana caiana, tambem chamada
Otaiti, foi introduzida na Bahia e, decorrentes dos contatos mais in-
tensos entre os agricultores sergipanos e os daquela província vizinha,
certamente foi logo divulgada entre aqueles. A caiana logo se mani-
festou superior à variedade existente, graças ao seu teor sacarígeno
superior quatro a seis vezes mas, cujo poder de degenerescência pre-
coce restringiu sua maior divulgação. Essa perda de características
que geralmente atingia as sementes depois de anos sucessivos de plan-
tio tomava imprescindivel a sua substituição por novas variedades.
Mais modernamente a propriedade passou a fazer suas plantações com
POj 2878, de alta rentabilidade mas que tambem entrou em processo
de degeneres.cência. Associou-se então a CO 290 que aguentava muita
água. Oriunda do cruzamento das duas, plantou-se o CO 231 .
Pelos dados obtidos, não se pode associar aos proprietários do
~ngenho, no século XIX, nenhum espírito inovador capaz de modifi-
car as técnicas de plantio vigentes entre plantadores de cana-de-açu-
car. À ideologia progressista que atingiu a Província, desde os inícios
da segunda metade do século passado, não foi possivel ligar o nome
do proprietário Madureira. Seu nome não participa da criação do
Imperial Instituto Agronômico, nem tampouco do Comício Agrícola
Sergipense, sediado na vizinha cidade de Maruim e do qual partici-
pavam importantes proprietários de engenhos do Vale da Cotinguiba.
Se à primeira instituição não é possivel atribuir tomada de medidas
que resultassem na aplicação de técnicas mais modernas, à segunda
devem-se reconhecer iniciativas concretas visando à melhoria das prá-
ticas de cultivo da cana-de-açucar. Implementas agrícolas foram com-
prados para serem vendidos aos lavradores sergipanos por um preço
mais reduzido. Ao Comício Agrícola Sergipense devem-se, tambem,
providências para a importação de sementes de cana "salangor". Essa
atitude de Luiz Madureira, que poderíamos chamar de alheamento, é
provocada menos pelo seu arraigado preconceito às inovações, do que
pelas dificuldades que, à essa época, vinham atravessando as finanças da
família (21).
Sem sombra de dúvidas podemos afirmar que as técnicas agríco-
las usadas no cultivo de cana-de-açucar e na fabricação do açucar
eram, no engenho Pedras, até o 3.°
- 529-

testamentos de engenhos de Maruim registraram os utensílios agríco-


las utilizados, como pás, enxadas e foices. Entretanto, o detalhado
inventário de D. Ana, talvez pela grande quantidade de objetos de
maior valor aí relacionados, sintetiza sobre o assunto, quando, à enu-
meração de carroças e formas de açucar, acrescenta "e mais outros
utensílios". O arado quase não era utilizado nos serviços da agricul-
tura sergipana, que ainda se achava em estágio bem rudimentar, quan-
to à técnica de preparação do solo.
Práticas de pousio eram quase impossibilitadas face à reduzida
área da propriedade. A devastação constante das matas para satisfa-
zer à demanda de combustivel do engenho levava à ocupação de quase
toda a área pelo cultivo da cana-de-açucar. As pastagens necessárias
para a alimentação do gado, que se destinava ao trabalho do engenho,
podem ter significado possibilidades de aplicação do sistema de ro-
tação de terras. Ter-se-ia uma adubação natural do terreno, capaz de
aumentar-lhe a produtividade. Essa associação com a criação con-
tr:buiu, em todo caso, para que os excrementos fossem utilizados co-
mo adubos, associados à cinza das queimadas, para a revitalização
dos solos. Em época mais recente uma pequena rotação foi praticada,
embora empiricamente.
Anos seguidos de secas ardentes ou de chuvas abun~antes que,
com frequência, atingiram a província, não deixaram de provocar da-
nos sobre o desenvolvimento do trabalho da propriedade Pedras. A
lavoura canavieira sofria, muito profundamente, a influência das con-
dições climáticas. Tão atuante se fazia sobre o desenvolvimento da
planta, quanto a própria natureza do terreno.
A rotina e o atraso que perduraram nos trabalhos agrícolas, du-
rante quase todo o século XIX, lambem se repetiram no fabrico do
açucar. Até 1874, o engenho Pedras era movido a cavalos (22). En-
quadrava-se na grande maioria da força motriz dos engenhos da re-
gião e da Província. Nesse ano, de uma relação dos dezessete enge-
nhos moentes e correntes do município de Maruim, somente quatro
eram movidos a vapor. Os treze restantes eram impulsionados pela
força de cavalos e bois (desses, apenas um). Essa situação evidencia a
mentalidade retrógrada dos proprietários de engenhos da zona que,
dentre outros sistemas mais evoluidos, mantem-se apegados a uma
força motriz que apresenta as menores vantagens, quer pela morosi-
dade que imprime à máquina, quer pelo dispêndio com a aquisição,
manutenção e necessidade de constante renovação do rebanho. Mas
tambem revela, principalmente, as suas dificuldades de capitais para

(22). - ARACAJU - APES - Ofício da Câmara de Maruim (manus-


- 530

empreender transformações técnicas. As máquinas a vapor eram de


dificil aquisição pelos proprietários, que apenas dispunham de parcos
recursos.
Em função desse trabalho de movimentar o engenho, o testa-
mento de 1866 relaciona a posse de 30 cavalos e uma grande capa-
cidade de renovação desse rebanho, graças às 16 éguas da fazenda.
O número de gado vacum aí registrado - 63 bois, 6 garrotes e 2 va-
cas - leva-nos a crer que, não apenas cavalos trabalhavam no movi-
mento das moendas, mas tambem bois. Aliás, bem poderia ter ha-
vido uma pequena modificação na força motriz do engenho, sem que
à Câmara de Maruim tivesse conhecimento, uma vez que naquele
mesmo ano Siqueira Maciel queixava-se contra seu cunhado inventa-
riante porque "vendeu mais a fábrica de bois" (23). O maior número
de bois se deve à sua utilização em outras atividades da fazenda, prin-
cipalmente no transporte da cana e da lenha até o engenho. Eram os
célebres carros de bois, imortalizados por poetas e pintores, que cria-
vam um amb:ente animado e sonoro durante as fainas do tempo de
moagem. Em 1866 o engenho possuia dois carros em bom uso, 3 car-
ros quebrados, duas carroças de madeira e uma de ferro (24). Como
o engenho distava 2 léguas do porto de embarque, os carros serviam
tambem para conduzir as caixas de açucar até o porto de Maruim.
Quando o prodt1to era acondicionado em sacos, poderia ser transpor-
tado por muares. Mas o seu uso era destinado, principalmente, ao
comércio de aguardente. Para isso a fazenda dispunha naquelt! ano
de 14 burros.
Em 1874, período de retração, é verdade, ao engenho é atribuida
a insignificante produção de 2.500 arrobas de açucar. No entanto,
o seu proprietário tinha aplicado vultosos capitais em terra, escravos,
casa de moagem, etc. Admira que participando da elite social e polí-
tica da província, registrado seu nome em frequentes viagens à Bahia,
Luiz Madureira não tivesse perceb:do a importância da aplicação de
métodos mais aperfeiçoados para alcançar uma maior produtividade
da sua empresa. Com a adoção de máquinas a vapor e de caldeiras
para limpar e cozinhar o caldo da cana, ele poderia ter substitui do os
animais de tração que imprimiam o movimento às moendas e que,
em 1866, l~presentavam não menos de quatro contos de réis. Alem
de constantes perdas por acidentes ou mortes, exigiam que fossem
mantidas maiores áreas de pastagem numa propriedade que já era de
reduzido tamanho. Alem do apego às tradições, características da
mentalidade de abastados senhores de engenho e da falta de capitais
que, sem dispon~bilidade
- 531-

havia a idéia corrente de que a máquina a vapor gasta muito combus-


tivel e muita água. Supunham que era um aparelho de dificil mane-
jo, e se desarranjava com facilidade, o que se agravava com a falta de
casas de fundição. Alguns fatos contribuiam para sustentar essa aver-
são às coisas novas, mesmo que elas representassem a garantia de um
bom negócio. Foram montados, no engenho Espírito Santo, os apa-
relhos de Dero3ne e Cail e um pequeno Wetzell e seu proprietário teve
prejuizos por não saber faze-los funcionar (25). O Barão de Estância
trouxe em 1867 máquinas novas e até 1874 tinha sérios problemas
para po-Ias em atividade, entregues

"à ação cor~osiva da ferrugem" (26).

Em 8 de maio de 1860, Resolução do Governo de Cunha Galvão


cria prêmio de 5 contos a quem estabelecer na Província uma fun-
dição

"que se preste a concerto de machinas de Engenho à vapor,


rodas de ferro de moer com água e que ao mesmo tempo fabri-
que todas as ferragens e instrumentos agrícolas" (27).

Mas o funcionamento, em Aracaju, de fundição a vapor só veio


a se concretizar em 1870, para satisfazer essa velha ambição dos go-
vernantes e proprietários de engenho esclarecidos que receavam im-
plantar técnicas modernas nas suas empresas sem a garantia de um
estabelecimento capaz de sanar qualquer defeito apresentado nas má-
quinas. Desde então, o número de engenhos a vapor cresceu gradati-
vamente. Contando com apenas 8 em 1863 e com 40 em 1871, al-
cançaria

"cento e muitos em 1880" (28).

A Fundição fora iniciativa de Cameron, Smith & Cia. e, por isso,


se tornou fornecedora de grande número de máquinas adotadas na
Província. A. Schramm & Cia, com sede- em Maruim, e uma das mais
importantes casas estrangeiras, era tambem grande concorrente no for-
necimento de máquinas. Algumas, de fabricação francesa, tambem
foram introàuzidas.

(25). - A Liberdade, Aracaju, janeiro de 1874 - BPES.


(26). - Ibidem.
(27). - Relatório apresentado à Assembléia Legislativa Provincial
1860, pelo Presidente da Província Cunha Galvão. BPES.
(28). - ARACAJU - Relatórios de Presidentes da Província - BPES.
- 532-

A adoção do engenho a vapor em fins do século XIX, não modi-


ficou sensivelmente a organização da fazenda. No testamento de Gon-
çalo Vieira de Melo Prado, observamos que o gado cavalar quase dei-
xou de existir, em consequência da substituição da força motriz. Esse
fato não provocou a expansão das áreas cultivadas com a cana-de-
açucar e a redução das terras de pastagens. O rebanho de 127 cabe-
ças aí mantido no ano de 1866 é reduzido, apenas, para 114 cabeças
"50 de gado a 40 mil réis cada, 60 cabeças de bois mansos
de brocha a 60 mil réis cada, 4 cavalos a 50 mil réis cada" (29).

Quando o engenho Pedras passou a utilizar máquinas a vapor pa-


ra imprimir movimento às suas moendas, nas últimas décadas do sé-
culo XIX, a indústria açucareira já dera largos passos para a aplica-
ção de técnicas mais modernas e de maior rentabilidade econômica.
Em 1885 se iniciava, no município de Riachuelo, a construção do En-
genho Central, construido em 1888.
"Com as vantagens que os novos aparelhos asseguravam aos
Srs. de Engenho na fabricação de açucar, comp-ovados pelo
Engenho Central de Riachuelo, os srs. Barões de Estâ:1cia, pro-
prietários do Escu ial e José de F. Rolemberg, do S. Joaquim,
município de Divina Pastora, adquiriram vácuos de cob e que
instalaram no seu engenhos, seguidos pelos doutores Gonçalo
Rollemberg, no engenho Topo e Thomaz Rodrigues da Cruz
no Santa Clara em Japaratuba. Em 1909 Adolfo Rolemberg, no
Escurial, instala a primeira usina comp'eta, porem pequena,
adquirida na Inglaterra" (30).

Procurando acompanhar essa linha de renovação tecnológica, o


Sr. Gonçalo Rollemberg do Prado faz contrato em junho de 1909
com a sociedade anônima inglesa H enry Roger, Son & Cia of Brazil,
Limited de Wolverhampton e Rio de Janeiro no valor de 6.950 libras
esterlinas, para a aquisição de máquinas e materiais para a "Uzina
Pedras". Constava de jogos de moendas;
"um motor a vapor horizontal de alta pressão",

uma caldeira a vapor multitubular cilindral, um aparelho


"triplex efeito"

vertical, para evaporar e tratar o caldo, filtros, etc.

(29). - MARUIM - Inventários ... op. cit., 1907.


(30). - DANTAS (Orlando), O Problema Açucareiro de Sergipe. Li-
- 533-

A maior capacidade de produção que passou a ter, como usina,


exip;ia um volume de canas que a área da propriedade não teria con-
dições de fornecer. Ela já se vinha expandindo, anteriormente, com a
compra das terras da Canoa Nova, por exemplo (32). Tornava-se ain-
da indispensavel que lavradores complementassem as suas necessida-
des. Estabelece-se um sistema de fornerimento de canas que permite
a manutenção vantajosa do maquinário adquirido.
E março de 1929 foi firmada uma carta contrato com a vende-
dora Abw Smith Co. Ltda-Glasgow, através de Ribeiro & Cia., para
a compra de novos maquinários - tacho de vácuo de ferro fundido
com capacidade de cem sacos de açucar, duas caldeiras multitubula-
rer; a vapor, bomba rotativa para mel, duas bombas centrífugas, etc.
(?3) .
Era a plena participação da empresa na moderna tecnologia de
p"odução do açucar.
*
Em 1850, claramente se evidenciava a posição do governo ante
o problema da escravidão. Mais cedo ou mais tarde o país seria la-
vado dessa mancha abominavel. Antes desse ano, já em 1831, com o
est abelecimento de que todos os escravos que entrassem no território
brasileiro, vindos de fora, ficavam livres, a Província passou a tomar
posição para o cumprimento da lei, quer aumentando a vigilância dos
barcos diante do tráfico da mereadoria humana que aí estava se pro-
cessando ilegalmente, quer mesmo aprisionando os autores desse trá-
fico, geralmente os chefes de embarcações.
Há exemplos, embora um pouco tardios, de proprietários de en-
genho que passaram a empregar exclusivamente o trabalho livre para
o serviço agrícola de sua fazenda e o fabrico de açucar: o doutor
Sílvio Anacleto de Souza Bastos no seu engenho Taperoá, o major Vi-
cente de Oliveira Ribeiro no engenho Varzinhas (34). Foram movi-
mentos isolados, de pequena repercussão, de uma classe principalmen-
te escravocrata, donos de engenho. A exploração de uma fazenda ca-
navieira pelo braço escravo se identificava melhor com as concepções
do seu proprietário, Luiz Barbosa de Madureira, e com a vigente po-
sição dos seus colegas proprietários. Em 1866 o número de escravos
ar~olados sob o seu poder revela ser o referido engenho um dos mais

(31). - ARACAJU - AB - 1909.


(32). - MARUIM - Registro de Propriedades - ACM.
(33). - ARACAJU - AB - 1929.
(34). - ARACAJU - O Descrido, Aracaju, nQ 9 - 1882
- 534

im'Portantes da Província, em força de trabalho. São 129 escravos


sobre os quais teceremos algumas considerações sobre sexo, procedê~­
cia. idade, preço, capacidade de trabalho.
Uma análise sobre a repartição dos escravos por sexo, permite
ccnstatar que a propriedade empregava:
Homens - 69 Mulheres - 60

Desperta a atenção o fato de ser utilizado no trabalho da pro-


pdedade de uma porcentagem quase idêntica de trabalhadores do sexo
feminino e masculino. Warren Dean (35) considera que os homens
eram sempre preferidos sobre as mulheres para as atividades agrícolas,
por serem mais fortes e resistentes. Dificulta uma melhor apreciação
sobre as razões dessa aproximação do número total dos sexos, a falta
de especificação das atividades exercidas por cada um.
Pela procedência podemos construir a seguinte tabela:

Proceddncia Africanos Crioulos Cabras Mulatos Pardos


Homens 25 38 3 3
Mulheres 8 50 1
TOTAL 33 88 3 4

A observação desta tabela perm,ite constatar que a quantidade de


e"cravos nascidos no Brasil é consideravelmente superior àquela dos
escravos nascidos na África. Este fato, apesar da pouca significação,
ror estar isolado, confirma que, a essa época, a abolição do tráfico
negreiro alterou profundamente a relação numérica escravos crioulos
-escravos africanos, impedindo que novos escravos da Africa fos-
sem introduzidos. nas fazendas canavieiras. Dos escravos relacionados
como nascidos na Africa, somente um está com 33 anos. Todos os
outros possuem de 40 anos para adiante. Os 6 escravos de mais de
60 anos são todos africanos. É pena que os dados fornecidos não se
ativessem sobre a origem desses escravos africanos, isto é, a nação de
sua procedência na África.
Consideremos a idade desses escravos que permite constatar a ca-
pacidade produtiva da propriedade:

(35). - DEAN (Warren), Slavery on coffee plantations: Rio Claro,


Brasil 1820-1880 (population, labor conditions, methods of control, social
cohesion). In. Kátia de Queirós Mattoso, "Os escravos na Bahia no alvorecer
do século XIX". Revista de História 97. São Paulo, 1974 p. 109-135.
535 -

Idades até 12 anos 13-25 26-40 41-60 mais de 60


Homens 15 20 6 24 4
Mulheres 16 18 15 9 2
TOTAL 31 38 21 33 6

Levando-se em conta que a capacidade de produção da criança é


quase nula, embora, em se tratando da sociedade escravocrata, a crian-
ça desde os 7 anos desempenhasse o papel de agente de produção, o
engenho Pedras possuia quase 30% de pessoal que poderia ser con-
siderado improdutivo. Esta porcentagem inclui tambem velhos com
mais de 60 anos, um deles alcançando 80 anos, e uma mulher doente
do útero. É importante ressaltar que essa porcentagem representa
quase um terço do total de escravos da fazenda. Com este número,
não deixa de ser oneroso para o proprietário cuidar desses escravos
improdutivos cujo custo de manutenção deve ter pesado, sensivelmente
na rentabilidade dessa empresa agrícola.
A alimentação distribuida aos negros de Sergipe era tida por
autores contemporâneos como melhor que a de outras regiões, como
a da Bahia. O vestuário chega a ter um certo apreço. Pelo menos é
o que se pode perceber das descrições de negros fugitivos, através de
jornais da éposa:

"Levou vestido camiza d'algodão da terra, calça de brim


branco somente, e chapeu de palha de carnauba deb uado com
fita de seda preta. Levou também huma jaqueta de riscado ver-
melho escuro, huma camiza fina, branca, huma calça de gonga
azul nova da índia, huma pequena tualha d'algodão, bo-dada com
fio de dito azul" (36).

Alimenta-los e vesti-los não deixava de ser tarefa dispendiosa,


suja compensação estaria na capacidade de produção de cada um.
Temos que levar em consideração que daquele total considerado
improdutivo seis representavam, sem dúvida, um capital investido que
jamais seria recuperado. Como, porem, a grande maioria era de cri-
anças, 5 delas com capacidade de produção muito próxima e conse-
quente preço de venda bem elevado, o proprietário teria possibJidade
de recuperar as despesas com relativa brevidade.
A força escrava do engenho era uma das mais representativas da
Província. Seu valor global estava calculado em 102:740$000 réis
significativamente superior ao da propriedade, registrada com o valor
(36). - Recopilador Sergipense - 1834 - 244 - BP.
- 536-

de 90:000$000. Em inventários, os preços dos escravos, como tam-


bem dos outros bens m6ve:s e de raiz, são preços de avaliação e, por
isso, inferiores ao seu valor real. Não podemos aquilatar a diferença
entre o preço dos escravos registrados no inventário e o seu valor 110
nivel das transações. Nota-se uma grande oscilação dos preços dos
escravos, conforme sua origem, idade e sexo. Um escravo doente
tinha um preço bem mais reduzido como é o caso da crioula de 34
anos que, por ser doente do útero, teve seu preço reduzido para a me-
tade.
o mais alto preço - 1:500$000 - foi aplicado a quatro escra-
vos: um africano de 47 anos, um crioulo de 7, outro de 25 anos e um
mulato de 25 anos. Acreditamos que a criança teve seu valor aumen-
tado por razões afetivas, para que se criassem dificuldades à sua ven-
da. Uma mulata do engenho, mulher de 20 anos, tambem tem um
alto preço - 1:400$000. Os preços dos escravos variavam entre 100
réis e 1:500$000. Um deles apenas, com 80 anos, valia 10$000.
Mais da metade, 62 escravos, tinha um valor compreendido entre 800
e 1:300$000.
Percebemos que a atribuição do valor dos escravos nascidos no
Brasil é um pouco inferior à dos escravos africanos. Não seria isso
influência da extinção do tráfico negreiro que, cada vez mais os trans-
formou em mercadorias raras? Somente um crioulo, com 25 anos, foi
avaliado em 1:500$000. De 38 deles, 23 estão avaliados entre ...
800$000 e 1: 300$000 porque, justamente, esse número está na faixa
etária de maior capacidade produtora, isto é, entre 15 e 40 anos. Ape-
nas 2 crioulos têm idade superior a 40 anos. Enquanto o de 44 anos
possui um valor de 1:400$000, certamente pela especialização do seu
trabalho, o outro, com 50 anos, vale 800$000.
Pelo total reduzido, não podemos tirar maiores conclusões, mas
percebe-se que não há distinção entre o valor do escravo-homem e do
escravo-mulher. A faixa etária de maior valorização da mulher pa-
rece estar antecipada à do homem, pois a partir de 20 anos seu preço
cai mais nitidamente. É observação superficial, sem margem para
comprovação, uma vez que a idade dos escravos crioulos raramente
ultrapassa os 40 anos.

Idades até 12 anos 12-25 25-40 40-60 mais de 60 Total


Crioulos 28 32 20 6 2 88
Africanos 4 25 4 33

O
- 537-

um valor entre 100$000 a 400$000, uma de oito meses foi avaliada


em 600$000.
A força de trabalho apoiada no braço humano escravo aumenta-
va a extrema dependência da capacidade de produção da fazenda com
relaç'ão à saude e bem-estar de um número fixadamente delimitado de
agentes da produção. As condIções físicas da escravaria eram pri-
mordiais para que a propriedade tivesse a garantia da sua produção.

"Importava a mortalidade nas senzalas em diminuição séria


no capital dos Senhores" (37).

Não raras ocasiões, a Província sofreu o alastamento e agravo


de doenças infecciosas que se transformaram em epidemias generali-
zadas e fatais. A febre amarela, o mal das bexigas, a cólera ceifaram
muitas vidas que labutavam no campo. Por todo o século XIX, re-
gistros de perigosas doenças alertam a população e a previnem sobre
os cuidados para afasta-las ou tratamentos prescritos para cura-las.
Sem sombra de dúvida, a "Cólera Morbus" que, segundo a outras Pro-
víncias do Brasil, alcançou Sergipe em 1855, se constituiu na maior
epidemia e de mais funestas consequências. Calculada sua população
em 200 mil almas, sofreu naquela ocasião uma perda de 34 mil.

"Um terço dessa cifra foram b~aços arrancados à lavoura e,


segundo estatística, a quantidade dos escravos mortos foi elevada
a mais de quatro mil" (38).

A região do Cotinguiba foi um das mais duramente atingidas. A


intensificação do flagelo se deu justamente no tempo da própria sa-
fra. Prejuizos incalculáveis criaram uma situação penosa para a maioria
dos lavradores de açucar que se viam impossibilitados de cumprir os
seus contratos e se sobrecarregaram com prêmios excessivos. Sobre o
engenho Samo Antônio, vizinho ao Pedras, tem-se notícia de que a
epidemia

"invadio com todo rigor".

(37). - FREIRE (Gilberto), Casa Grande & Senzala. Formação da


Família Brasileira sob o Regime da Economia Patrimonial, 2Q tomo, 13'
edição, Brasil. 14' em língua portuguesa. José O1ympio Editora, Rio de Janei-
ro, 1966.
(38). - FREIRE - Correio Sergipense, Aracaju, abril 3 BP.
- 538-

Justamente nessa região entre Laranjeiras, Maruim e Rosário do


Catete a epidemia se fez acompanhar do tifo e o problema se acen-
tuou profundamnte.

UA escravatura dos engenhos tem sido horrivelmente ceifada,


grande parte dos mesmos tem deixado de moer e outros ficarão de
fogo morto" (39).

Sendo o escravo um bem do proprietário, constitui um investi-


mento que participa do capital fixo da empresa. Sua libertação, sem
qualquer compensação para o proprietário veio a se tornar um dano
irreparavel a curto prazo, uma descapitalização da empresa.
Ao se iniciar o segundo quartel do século XIX, a criação dos en-
genhos centrais, denominados usinas, contribuiu poderosamente para
a solução de um grande problema envolvido na questão do fabrico do
açucar - a substituição eficaz do trabalho escravo.
A criação desses estabelecimentos alem de multiplicar e aperfei-
çoar melhor o produto, facilita o emprego de braços livres e torna os
lucros mais avultados, condicionantes do surgimento do pequeno cul-
tivador, fornecedor de canas.
O trabalhador rural passou a ser o responsavel pelas atividades
da produção canavieira. Lavrava a terra por diárias; recebia, pelos
seus serviços um salário reduzido que o tornava endividado com os
proprietários de terra.
Como usina, a partir de 1910, Pedras participou desse mesmo
movimento que visava a introduzir-se no processo revolucionário in-
dustrial, caracterizado pela melhoria técnica, pelo aumento da produ-
tividade, pela especialização e divisão do trabalho e, principalmente,
pela utilização exclusiva da mão-de-obra assalariada.
* *

V. - CARACTERlSTICAS DE PRODUÇÃO.

UÉ pela fo~ça de trabalho, expressa pelo número de escravos


que se pode avaliar a produção de um engenho" (40).

(39). - ARACAJU - APES - Ofício da Comissão Médica de Divina


Pastora (manuscrito) novembro de 1855. Pac. 849.
(40). - VARGAS (Carmem), Histó:ia do açucar no Brasil, in Brasil
Açucareiro. Rio de Janeiro, 5 vol. LXXX:
- 539-

Partindo de dados fornecidos por Mircea Buescu (41) sobre o


rendimento médio de um engenho brasileiro, tentaremos utiliza-los
para a obtenção de valores, aproximados a respeito da produção de
açucar do Engenho Pedras, em meados do século XIX. Um engenho
movid9. por animais, como esse que ora estudamos, deveria ter uma
produção diária de 30 arrobas em 24 horas. Era uma reduzida cifra,
considerando que a utilização da água como força motriz poderia ele-
va-la de 40 a 70 arrobas em 24 horas.
Se um engenho que produzisse cerca de 10.000 arrobas anuais
de açucar, deveria empregar mais de 320 pessoas, proporcionalmente,
a estar correta essa avaliação, o engenho Pedras, com uma força de
trabalho expressa pelo número de seus escravos, já referidos em 1866,
poderia alcançar uma produção aproximada de 4.000 arrobas, na-
quela época.
A um escravo é atribuida a produção média de 60 arrobas por
ano. Nesse caso, a um engenho de 360 pessoas que conseguissem
produzir 10.000 arrobas anuais, admitia-se que apenas quase 170
delas ou seja pouco menos da metade, participaram efetivamente do
processo de produção. Assim sendo, para alcançar a produção de
4.000 arrobas atribuidas à sua capacidade, o engenho em estudo ape-
nas utilizaria cerca dos 68 cativos dentre o total da sua população eS-
crava, em 1866. Como se calcula que de 100 escravos costumam em-
pregar-se no trabalho do campo 55, vemos o cálculo feito ajustar-se
perfeitamente, quando do total de 129 escravos, mais ou menos 70
estavam ocupados com o amanho da terra e atividade da fábrica. Os
demailj eram orientados para serviços outros, principalmente domés-
ticos. Em sua maioria, eram meninos, velhos, doentes, etc., que pres-
tam serviços pouco valiosos ou são inteiramente inúteis.
Se considerarmos que desses 70, 40 devessem trabalhar a terra,
e que cada enxada regularmente trata uma tarefa de rego e uma a
uma e meia de soca e o produto de cada enxada bem administrada, é
de duas a três caixas, ou seja, de 90 a 125 arrobas, raras vezes mais
de 120 (42), podemos admitir que o cálculo da produção em 4.000
arrobas tem chance de se consolidar.
A casa d'alambique que se associava ao conjunto do engenho
completava o quadro natural do complexo açucareiro. Quase todas as
propriedades canavieiras produziam, alem do açucar, a aguardente.
Era um comércio animado e de maior movimentação de capitais. Em
1848 o engenho Pedras destila 12 canadas por dia, numa produção
(41). - BUESCU (Mircea), Evolução Econômica do Brasil, APEC, Rio
de Janeiro, 1974.
(42). - CARSON
- 540-

anual de 3.600 canadas (43). Não constitui esse alambique um dos


que tivessem maior capacidade. O seu cunhado Tenente-Coronel Gon-
çalo Faro Rollemberg, no seu engenho Flor da Murta, conseguiu uma
produção de 6. 000 canadas com seus próprios meios e com os que
compra a outros engenhos.
Em 1874, a Câmara Municipal de Maruim dá ao engenho Pedras
uma produção de 500 pães ou 2. 500 arrobas ou 37,40 Kg. Esses
números não correspondem à época do pleno florescimento do enge-
nho, quando possuia um número de escravos que assegurasse uma
maior rentabilidade, conforme vimos. Pelo contrário, são referentes à
época de grande crise quando seria feita a arrematação da proprie-
dade por insolvência de dívidas. E segue-se a uma época de extravios,
quando o filho inventariante, Manuel Rolemberg Madureira, adminis-
trando mal a propriedade e desagregando o patrimônio paterno, le-
vou-o ao pleno caos. No quadro fornecido pela citada Comissão, en-
contramos engenhos próximos, tambem movidos a cavalos, com pro-
dução de 5.000 arrobas como o Toque, Mungula, Olhos d'Agua e
Flor de Maruim. Se utilizavam à máquina a vapor, a produção podia
subir para 10.000 ou 11.000 arrobas como nos engenhos Mato Gros-
so, São Joaquim e Santo Antônio.
As moendas antigas causavam prejuizo de até 50% do caldo.
Um aparelho de maior força que fosse adotado pelos engenhos maiores
de 16 a 20 arrobas, poderia fazer sua produção subir a 40 ou 50 mil.
Custava apenas de 35 a 40 contos. de réis. Não era que faltasse com-
pletamente ao senhor este capital. No caso do engenho Pedras, so-
mente em escravos ele possui a 3 vezes mais o valor dessa quantia.
Faltava-lhe, porem, o necessário espírito de renovação que lhe per-
mitisse romper com a estrutura vigente que assegurava ao proprietário
uma importância correspondente ao número de escravos que estivesse
sob o seu domínio. A produção da cana, numa propriedade de área re-
duzida, não seria suficiente para alimentar um maquinário de grande ca-
pacidade de produção. Todos esses fatores atuam para provocar uma
posição de inércia entre a classe de proprietários.
Transformando em usina, um dos seus objetivos principais, o au-
mento da produtividade - teria necessariamente que ocorrer. O lati-
fúndio, novamente implantado pela absorção dos banguês e usinas de
pouca capacidade e aperfeiçoamento da técnica, teria necessariamente
que gerar a multiplicação da sua capacidade de produção.
Em 1940-1941, a Usina Pedras e suas agregadas conseguiram
atingir uma produção de 45.749 sacos (44). Recebendo cada saco
(43). - ARACAJU, APES - Relação de alambiques da vila de Ma-
ruim (manuscrito) Pac. 725.
(44). - ARACAJU - AB - Receita e despeza da Usina Pedras S,A.
- 541-

60 Kg, significava que a produção era de 2. 744 . 940 Kg ou seja de


182.996 arrobas ou aprox;madamente 183 toneladas. De engenho
banguê para usina, a produção cresce numa porcentagem extraordiná-
ria. Ela chegou a alcançar o total máximo de 56.000 sacos durante
o tempo do Cel. Gonçalo.
Para a conservação da Usina Pedras e algumas fazendas, naque-
le ano, a empresa realizou as seguintes despesas:
Fazendas Pedras ................. . 88:053$500
Vitória 31:897$100
Pombinha 16:603$000
170:804$300

Era um total de gastos no valor de 170:804$300. Acrescente-se


a esta quantia a importância de 101:116$700 correspondente às com-
pras de cana.
As canas moidas pelo maquinário da usina vinham das diversas
propriedades da empresa agrícola e de fornecedores de cana.
Pedras 6.157.190 kg
Victoria .................... . 2.280.920 kg
Unha do Gato ............... . 3.336.590 kg
Pombinha .................... . 1.616.710 kg
Peripery 3.366.850 kg
Catete Novo 3.482.510 kg
Sítio Novo ................... . 1.665.100 kg
Agenor Rocha ............... . 3.048.440 kg
Lavradores da Usina ........... . 2.411.692 kg
Pequenos Fornecedores 3.411.692 kg

o compromisso de fornecimento de cana estabelecia-se muitas


vezes através de uma declaração formal. Em 1924 celebra-se um des-
ses compromíssos entre Crispim de Faro e o Coronel Gonçalo Rollem-
berg do Prado, sob pena de pagamento de multa para quem o trans-
gredisse. Formalizava-se um costume
"já de tantos anos estabelecido entre nós"

de fornecer a produção do engenho Periperí, durante a moagem. Re-


gulamentava o contrato que quinzenalmente seriam feitos os pagamen-
tos e um preposto do fornecedor assistiria às pesadas dos seus pro-
dutos (45).

(45). - ARACAJU - AB - Contrato de fornecimento de canas.


- 542-

o Comício Agrícola de Maruim se pro,nuncia em 1881 contra


contratos para o fornecimento de canas a preços fixos por quilogra-
ma. Na Martinica se faz obrigatório o fabricante do açucar pagar ao
fornecedor das canas 6% em açucar.
"Parece que entre n6s 5% seria um termo razoável" (46).

Essa posição visava possibilitar ao fornecedor de canas auferir


das vantagens do alto preço e torna-lo partícipe de sua baixa.
O crescimento da demanda da matéria prima por parte da usina
pode ser parcialmente atendido através desse sistema de fornecimento,
já que o aumento das áreas do conjunto ainda não eram suficientes
para garantir a plena utilização dos seus equipamentos. As reformas
introduzidas nesse setor pelo Dr. Gonçalo levaram à duplicação da
sua capacidade. Quando da reunificação da Usina Pedras e Oiteiri-
nhos, a produção alcançou a casa dos 158.789 sacos de açucar na
safra de 1969/1970. Apesar de se ter plantado muito mais canas, a
safra de 1970;1971 foi profundamente sacrificada com a seca desse
ano. Houve então uma queda de produção para 132. 000 sacos. Co-
mo a seca tem reflexos mais prolongados, a safra de 1971/72 mani-
festaria ainda um declínio de produção alcançando apenas 128.000
sacos embora o volume de canas compradas na fazenda Caraibas de-
vesse assegurar um volume de açucar bem mais elevado (47) .

Desde os fins do século XVIII que os preços do açucar vinham
melhorando sensivelmente. Em 1781, em sua "Carta muito interes-
sante", José da Silva Lisboa, futuro Visconde de Cairú, informava a
Domingos Vandelli que, desde cinco anos, o valor do açucar tinha
quase dobrado. E continuou a subir (48). Com essa motivação de
preços, os engenhos proliferaram na Província ao alvorecer do século
XIX. O aumento da produção do açucar foi seu resultado natural.
Ao tempo em que a Província intensificava sua lavoura canavieira, o
açucar começa a evidenciar-se como seu principal produto de exporta-
ção. Era através das vias fluviais que canoas transportavam as caixas
ou sacos de açucar até os portos de embarque. Aí, embarcações na-
cionais vinham apanhar o produto e o conduziam à Bahia onde era
pesado e marcado; considerado como baiano, o açucar era exportado
para portos estrangeiros . Nosso comércio até 1839 foi exclusivamente

(46). - ARACAJU - APES - Ofício do Comício Agrícola de Ma-


roim ao P;esidente da Província. Pac. 418.
(47). - LEITE, Augusto - Entrevista citada. 1975.
(48). - LISBOA (José da Silva), Carta muito interessante in Manuel
Diégues Júnior. "O Açúcar no período da Independência". Brasil Açucareiro.
L)CXJ( (2) 20p.
- 543-

colonial. Somente lá pela metade do século XIX, a Província de Ser-


gipe lutaria contra a prejudicial tutela que a Bahia vinha exercendo
sobre o nosso comércio (49).
As facilidades de escoamento do açucar, produto que visava,
principalmente, à exportação, tinham que ser consideradas quando do
estabelecimento de um engenho. Esse fator e a natureza própria do
terreno representavam o motivo primordial da concentração dos en-
genhos às margens dos rios, próximos do litoral. Tornava-se muito
dispendioso transportar caixas de 45 arrobas, aproximadamente, por
meio de carroças. Enquanto uma carroça só conseguia levar ao porto
de embarque uma caixa com tal peso, uma barca poderia conduzir 20
caixas (50).
Quando acontecia de um proprietário mais afoito erigir engenhos
a 8 ou 14 léguas do porto, as despesas eram muito acrescidas em vir-
tude dos fretes mais altos cobrados para a condução do açucar até o
local ond~ seriam embarcados. O engenho Pedras fora erguido a 2
léguas do porto de embarque. Em decorrência disso, as suas despesas
para levar o produto ao porto onde as sumacas iam apanha-lo e con-
duzi-lo aos outros portos nacionais ou estrangeiros eram maiores que
as dos engenhos que ficavam às margens ou a uma ou menos légua
de distância (51). Manoel Rollemberg paga de carreto, em 1823,
1$280 réis por caixa enquanto um engenho erguido a uma légua paga
a metade ou um à beira-mar dispende apenas 160 réis por caixa.
Empresa de poucos lucros, como era a maior parte dos nossos
engenhos, tinha que necessariamente, levar em consideração o acrés-
cimo dessas despesas como sensíveis à sua rentabilidade.
O acondicionamento do açucar a ser exportado era feito em caixas.
A obtenção da madeira para a confecção das caixas de açucar foi res-
ponsavel pela diminuição nas nossas matas, pelos primeiros donos de
engenhos. Quando do esgotamento das nossas reservas, a Província
teve que apelar para a importação. A carga de sumacas e lanchas que
demandavam os nossos portos em busca do açucar traziam em seu
bojo a madeira para feitura das caixas (52). A preferência por esse
tipo de acondicionamento, apesar de oneroso, se deve à qualidade de
preservar melhor o produto. O açucar exportado em sacos e feixes

(49). - ALMEIDA (Maria da Glória S. de), A Barra da Cotinguiba e o


Açucar 1840-1850. Trabalho apresentado ao V Simpósio de História do Nordes-
te, Aracaju 14-18 de agosto de 1973.
(50). - ARACAJU - BPES. Relatórios diversos. Ref. 818.
(51). - ARACAJU - APES - Cópia de matrícula dos Engenhos des-
ta Província (manuscr.) 823.
(52). - ALMEIDA (Maria da Glória S. de), A Barra ... , op. cito
- 544-

somente a partir de 1840 começa a ganhar terreno. Era uma decor-


rência das dificuldades de madeiras, dos transtornos do deslocamento
e da preferência de mercados estrangeiros pelo produto ensacado. Os
compradores europeus reclamavam o exagerado tamanho das caixas

"o que não só influi para que estes nos preços que oferecem
pelo gênero já levem em conta as grandes despesas do trânsito,
mas até para muitas vezes preferirem o de outras naçê('s que
acondicionando em barricas e sacos lhes proporciona mais v,mta·
gens na condução" (53).

Em 1823, cada caixa custava 2$500 réis e eXigIa mais de 400


réis de pregos para confecciona-la (54). Todos os senhores de enge-
nho tinham que por as marcas dos seus engenhos nas caixas. Na-
quele ano, o engenho Pedras exporta seu açucar em caixas contendo
as iniciais do seu proprietário MR. Para fazer sua produção de açu-
car chegar até à Bahia, o proprietário do Engenho Pedras tinha uma
despesa de 13$600 réis por caixa, pregos. carreto, encaixe, frete, le-
vantamento, etc .. , Somente de frete ele gastava a quantia de 8$000
réis. Essas despesas contribuiam para encarecer o produto, diminuin-
do o lucro.
Em 1843, o Sr. Dr. Pinto de Carvalho demonstrou como o açu-
car comercializado ficava muito prejudicado com a taxa de 5 % ado-
tada na nossa legislação.

"O lavrador paga de fato 6,5% e não 5% como quer a lei,


pois que ~egulando-se o despacho pelo preço do mercado da
Bahia, onde o assucar é regularmente mais caro um cruzado do
que na província - essa diferença importa o ônus de 1 1/2% con-
tra o lavrador, que é quem vem a pagar todos os vexames que
se fazem quer ao comé~cio quer a propria lavoura" (55).

Dos trapiches que controlavam o recebimento do açucar sergipa-


no na capital baiana, na década de 40, o Gomes, o Pilar e o Barnabé
eram os que recolhiam maior número de caixas vindas dos portos do
Cotinguiba (56). Sem dúvida, para um deles ia parte do açucar pro-
duzido pelo engenho Pedras. Em 1839 estabelecia-se em Maruim

(53). - OLIVEIRA (Clemente Álvares), Memória oferecida aos Agri-


cultores e Negociantes do Império do Brasil.
(54). - ARACAJU - APES - cópia de matrícula ... op. cit., 1823.
(55). - ARACAJU - A União Liberal. Aracaju. abril de 1853.
(56). - ARACAJU - APES
- 545-

uma exportação estrangeira, Era um grande passo para o incentivo


comercial da região,
A Schramm, conhecida na Província como casa inglesa, era na
verdade de hamburgueses que se incumbiam, principalmente, de ne-
gócios com a produção do açucar, Forneciam dinheiro, financiavam
máquinas e s{' encarregavam de fornece-las aos proprietários de en-
genhos, A produção de açucar da Cotinguiba que se orientava para a
Alemanha o fazia através dos seus representantes em Maruim, De tal
forma se intensificava a exportação do açucar da Província para aque-
le país europeu que quando da guerra franco-prussiana os armazellS
de açucar sergipanos ficaram abarrotados do produto, pelas alterações
do seu comércio, Não podemos determinar o grau das relações entre
o engenho Pedras e a casa Schramm, Pela proximidade de ambos,
certamente não deixou de haver relacionamento comercial entre eles,
Entretanto, a intervenção da casa hamburguesa em assuntos de comer-
cialização do açucar não afastou o engenho da dependência do mer-
cado baiano,
A exportação não era feita diretamente pelos produtores, O açu-
car era vendido aos mesmos comerciantes que forneciam capitais de
giro aos donos de engenhos, provocando o endividamento destes em
favor daqueles, A falta de fundos em circulação na Província fazia
com que as pessoas mais necessitadas,

"principalmente na classe dos ag icu'tores, tom:lssem dinheiro


a prêmio de 3% e mesmo 4%",

O comércio de Sergipe dependia essencialmente da Bahia, Não


era apenas a força do hábito atuando sobre uma população resistente
às inovações, Era principalmente a imposição do crédito, A maior
parte dos nossos lavradores iam procurar na Bahia, os capitais de que
tinha necess~dade, Eram os principais comerciantes de açucar que
lhes forneciam o dinheiro a juros extorsivos e agravados, muito mais
ainda, pela obrigação de ser mandada a produção para os armazens
da Capital baiana,
O fato de serem vendedores do gênero os credores da classe pro-
dutora resultava abusos que restringiam a sua autonomia comercial
retirando-lhe a liberdade de esperar melhor mercado para os seus
produtos. Alme:ando um banco agrícola que pudesse remediar essa
pr(udicial
- 546-

"o lavrador recorreu aos comprado~es do seu açucar" (57).

Uma vez consciente da necessidade do lavrador, o comércio de


eX'10rtacão, monopolizador, impôs-lhe condições onerosas: os juros,
15% mais do que o legal, sem amortização, e a imposição do preço da
mercadoria, de modo que o lavrador perdia dois terços do suor do
seu trabalho ...

"mais da metade das r.ossas p'opriedades foram hipotecadas" (58) .

A generalização desse fenômeno atingiu o engenho Pedras que,


como outras empresas da Província, se viu dependente dos comercian-
tes de açucar da Capital baiana. Disso adveio-Ihe funestas consequên-
cias. Em 1873 Antônio Pereira Espinheira e Companhia negociantes
da Bahia, entra em justiça protestando uma dívida de valor superior
a cem contos

"que esse débito está plenamente ga~antido pela escriptura de


hipoteca comp ehendida do Engenho Pedras e suas terras e benfei-
toria,s. Com 103 escravos que o mesmo comendado~ e sua mulher
D. Anna Rollemberg Madureira tambem falecida passarão aos
suplicantes na cidade da Bahia de 28 de agosto de 1863" (59).

Como integrante das complexas relações do capitalismo, o enge-


nho Pedras, nas primeiras décadas do século participa das dificuldades
de comercialização do açucar, manifestas nas constantes baixas de
preços e numa produção em massa gerando a super-produção.
O açucar produzido pela usina era enviado, em 1840/1841, para
o trapiche Cruz de onde era exportado por navios que frequentavam
o porto de Aracaju. Da produção oficial daquele ano, 45.625 sacos
foram conduzidos para esse trapiche. Mais recentemente, a exporta-
ção se fazia principalmente por rotas terrestres. O porto de Aracaju
tornou-se impraticavel ao recebimento de navios e provocou reflexos
sobre a comercialização do açucar, uma vez que o transporte por ca-
minhões é mais oneroso que por navios. O produto procurava o mer-
cado da Bahia, principalmente. Alguma parte ia para o Rio de Ja-
neiro, donde seguia tambem para os portos estrangeiros. Uma por-
centagem certa que tomava esse destino da antiga capital era a da "cota
de sacrifício" parte proporcional da produção de cada um que se des-
tinava às refinarias do I. A. A.

(57). - ARACAJU - O Estado. Aracaju, 3, agosto. 1891. BPES.


547 -
... ...

"'
VI. - CONSIDERAÇÕES FINAIS.

o engenho Pedras, sendo do tipo banguê, era uma fábrica de mé-


dia capacidade produzindo pouco mais de três mil arrobas. Adapta-
va-se, então, a um sistema fundiário que exigia áreas de cultivo de
menor dimensão, pelos gastos de instalação e movimentação do enge-
nho, pelas dificuldades de mão-de-obra e capitais para promove-las.
Por isso pode constituir-se, como várias outras unidades açucareiras
vizinhas, duma primitiva superfície muito mais extensa. A usina, mais
aperfeiçoada, dispunha de uma aparelhagem industrial bem mais com-
plexa, o que lhe permitia uma produção incalculavelmente superior,
pelo melhor aproveitamento da matéria prima e pela maior capaci-
dade de moagem. Mas, para isso, era necessário a correspondente
evolução das áreas de plantio, quer pela racionalização dos processos
de cultivo, quer tambem pela absorção de áreas muito mais vastas.
A usina conduz ao latifúndio. Dá-se, no caso da unidade de produ-
ção estudada, o reagrupamento das terras que, nos inícios do século
XIX, tinham possibilitado a composição de pequenas empresas.
Os períodos de maior expansão da propriedade, ou sejam, 1830/
1850 e 1910/1940, paradoxalmente, coincidem com períodos de crise
da economia açucareira do Brasil. Na primeira fase, em meados do
século XIX, a crise se manifesta pela estabilização e início da queda
dos preços do açucar e diminuição da procura do produto pelos mer-
cados exteriores, pela superação das técnicas de cultivo e produção
por outras regiões, que passam a fazer concorrência ao açucar brasi-
leiro. A segunda fase, nas primeiras décadas do século atual, trans-
forma um quadro que se anunciava promissor nos fins do século XIX,
numa repetição de crises sucessivas. caracterizadas tambem pela queda
dos preços e crescimento da produção sem absorção pelo mercado
consumidor. Podemos dizer que a precariedade das bases em que se
apoiou o crescimento da propriedade no século XIX, condicionou os
profundos transtornos do período de retração que se lhe seguiu, acen-
tuados pela partilha sucessória; no século XX, entretanto, a diversifi-
cação dos empreendimentos sob a ação de um dirigente de grande
capacidade administrativa, levou a empresa açucareira a um prodigioso
desenvolvimento.
Seus períodos de depressão e expansão se relacionam muito es-
treitamente com o processo de transmissão hereditária. Por
- 548-

e a aplicação dos seus rendimentos em setores que, de acordo com a


vigente ideologia do sistema, conseguissem alcançar um maior rendi-
mento do seu processo de produção açucareira. Na primeira metade
do século XIX, sob Madureira, a correlação considerada indispensa-
vel entre um engenho de grande importância e capacidade e a posse de
um elevado número de escravos resultou na ampliação dos negócios,
através da aplicação de vultosos capitais na aquisição da escravagem.
Em outra ocasião, envolvendo duas gerações consecutivas, o longo
período de equilíbrio pode assegurar o seu engajamento no processo
de capitalização da economia açucareira.
A propriedade Pedras se transformou gradativamente em usina,
ora alterando e aperfeiçoando sua aparelhagem, ora adquirindo um
vácuo, ora uma turbinas, ora um tríplice efeito. Foi o fruto de um
proprietário mais esclarecido que se convenceu das vantagens que tra-
ziam os evaporadores a vapor sobre os antigos, a fogo nu. Mas não
foi resultado de estudos preliminares que selecionassem a área mais
propícia pela garantia de fornecimento da matéria prima capaz de
corresponder à capacidade de produção do seu maquinário, às vanta-
gens de comercialização que se manifestam com a expansão dos mer-
cados externos e· à manutenção dos preços do produto num nivel com-
pensador aos capitais de investimento nela aplicados. Membro da an-
tiga família do engenho, José Nunes Barbosa Madureira, interrogava
através de O Estado.

"Em qualquer zona do nosso Estado prova-se que os prop:-ie-


tários, se procuram o bem estar próprio não o sabem. Como ex-
plicar-se máquinas de força supe"ior às necessidades das proprie-
dades? Como explicar-se que a maior parte do tempo acham-se
paralizados? Como explicar-se grande parte de terrenos em descan-
so por julgarem-se cançados?" (60).

o obtenção de capitais para a manutenção e montagem de apa-


relhagem moderna, sempre se constituiu como uma forma de restrição
aos proprietários mais dinâmicos . A falta de casas creditícias na Pro-
víncia, provocou sérios entraves à expansão dos negócios do engenho
e, muitas vezes, foi a causa da posição retrógrada desse ou daquele
proprietário. Em algumas ocasiões faltavam-lhe as condições de au-
tofinanciamento e, então, a aquisição do dinheiro necessário para in-
vestir em terras e equipamentos significou a condução da empresa a
uma situação de estrangulamento, sob o peso da usura. Pela inexis-
tência de Bancos ou pelas limitações que a política governamental po-

(60). - O ESTADO. Aracaju, outubro de 1891 - BPES.


ANALISE DE DOCUMENTOS CONCERNENTES À
PROPRIEDADE RURAL NA PRIMEIRA COLÔNIA
TEUTA EM TERRA CAPIXABA - (1847-1920).

MARIA DA GLÓRIA ALVES PORTAL


da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Marí-
lia (SP.).

Considere-se o presente trabalho como uma introdução ao estudo


da propriedade rural na primeira colônia alemã do Espírito Santo. Tra-
ta-se de um projeto particular de pesquisa. Evidente está que, trabalho
deste tipo, para apresentar todos os elementos em extensão e profundi-
dade, requereria maior disponibilidade de tempo e recursos.
Analiso algumas fontes disponíveis, destacadamente, escrituras de
compra e venda de terras, designação de lotes, mapas de loteamento, li-
vros de atas das sessões do governo municipal e de alistamento eleito-
ral, numa indagação das condições estruturais sócio-econômicas, espe-
cialmente a propriedade rural.
O estudo foi encaminhado visando aos seguintes pontos específi-
cos:
1.°). - verificar se houve ou não, e naquele caso até que ponto,
evolução na estrutura agrária;
2.°). - indagar se essa comunidade influenciou a economia re-
gional e nacional.
Advirto que a análise dos documentos nem sempre obedece a um
rígido respeito a balizas cronológicas determinadas.
Advirto ainda quanto aos limites que me foram impostos para uma
severa precisão na análise de contratos de compra e venda de terras, do-
cumentos fundamentais ao conhecimento das transformações da estru-
tura agrária. Até 1920,
- 552-

mencionam a superfície, limitando-se a expressões. tais como: "um ter-


rena", "um terreno com benfeitorias", etc. Referem-se a negócios de:
uma "colônia", um "prazo". Para efeito de cálculo as unidades "colô-
nia" e "prazo" foram consideradas com o valor de 30 hectares.
O presente estudo teve origem em 1974, quando em equipe com
os professores Vitória e Joubran EI-Murr, vimos Alguns Aspectos da
Colonização Alemã em Domingos Martins 0847-1889), trabalho que
foi apresentado no IH Colóquio de Estudos Teuto Brasileiros, realizado
em Porto Alegre.
Externo meus agradecimentos ao Sr. Octaviano Santos, pai do
ilustre ex-governador do Espírito Santo, Dr. Arthur Carlos Gerhardt
Santos e a todos os que, de uma forma ou de outra, colaboraram para
que fosse possivel es.ta comunicação .

Acreditando que as d:stinções cronológ:cas podem afetar o proces-
so em estudo não só em sua intensidade, senão que essa intensidade e
efeitos podem dar lugar, mesmo dentro de um período estipulado, a
é'1ocas de vida oolítico-administrativa ou sócio-econômica diversas, ba-
lizei a história da Colônia - depois Município - de Santa Isabel na
época em estudo, em duas fases. A primeira iria desde sua fundação
em 1847, quando instalaram-se ali 163 prussianos, até 1893 data em
que fol recriado, e definitivamente, o Município de Santa Isabel. Nesta
fase, conferem-se os primeiros lotes, Títulos de Propriedade, provisórios
ou definitivos, estabelecem-se as interligações entre alemães e brasilei-
ros. A Colônia já vende as sobras de sua produção, em Viana e Vitó-
ria. A partir de 1879, há registros de negócios de compra e venda de
terras.
A segunda fase iria de 1893 a 1920. O município fora inicialmen-
te criado com sede na povoação de Santa Isabel em 1891 (1) e supresso
no ano seguinte. A instalação definitiva ocorreu a 19 de dezembro de
1893 (2), com sede em Campinho. Em 1896 a sede municipal volta à
Vila de Santa Isabel (3), ocorrendo aqui, dentro desta fase, uma nova
época na vida político-administrativa com reflexos diversos, mas que
não chegam a abalar, de maneira sensivel, a estrutura sócio-econômica.

(1). - Primeiro livro de "Atas das Sessões do Governo Municipal de


Santa Izabel", folha 2.
(2). - Decreto estadual nQ 41.
(3). - Primeiro livro de "Atas das Sessões do Governo Municipal de
Santa Izabel", ata do dia 26 de junho de 1896, folha 49, verso, a 51; Decreto
nQ
- 553-

GERMAN
COLONIZATION
INESPIRITO SANTO
I .
Sc.J.,,1,750.ooo
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~ . :X:::'~7~G;;:tLz..E.p1rUJJ SG~. Rloiú
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- 554-

A transferência da sede municipal ocorreu devido às condições topo-


gráficas que - segundo a documentação -

"não davam margem a que se estendessem as edificações, e


tambem para atender à questão de melhor salubridade".

Levou-se em conta tambem o fato de Santa Isabel

"dispor de um patrimônio, o que não se verifica em Campi-


nho, cuja área é toda de propriedades pa:ticulares" (4).

Para a segunda fase, a documentação existente no Cartório do Pri-


meiro Ofício de Domingos Martins é bastante rica. Permite, junto com
o mapa de loteamento colonial e a lista de eleitores, realizar estudo com-
parativo, na busca da problemática proposta.
Em 1917 (5) a sede do Governo Municipal é novamente transfe-
rida a Campinho, onde permanece até hoje. Em 1921 o município per-
de o nome da velha colônia e passa a designar-se Domingos Martins.
A Prefeitura Municipal conserva documentação de suas origens.
No Cartório do Primeiro Ofício de Domingos Martins há boa documen-
tação: contratos de meação, de doações, de negócios de compra e venda
de terras; contratos de serviços, de compra e venda de escravos, de ca-
samento, etc.

Santa Isabel foi instalada na zona fisiográfica Serrana do Centro;
região de serras de composição ígnea. Na maioria dos terrenos graníti-
cos as fontes são bastante frequentes, o que permite a disseminação da
população e das propriedades. Foram elas sagazmente aproveitadas
pelos colonos no funcionamento de moinhos, conforme pude observar
pela leitura de contratos entre proprietários e pessoas que se encarrega-
vam da construção destes maquinismos (6). A terra não é má para a
plantação de cafeeiros. A região é chamada "zona fria". Seu clima
apresenta variações de temperatura que vão entre máximas de 30 e

(4). - Idem, Ibidem.


(5). - Lei Municipal de 16 de outubro, aprovada por Lei estadual n 9
1126, de 3 de dezembro.
(6). - Contrato entre Jorge Helmer, proprietário, e Manoel Pereira
das Neves, construtor do maquinismo "Constante de uma roda d'água. .. para
ralar mandioca, um moinho para moer milho, dois pilões para socar café, pelo
preço e quantia de quatrocentos mil réis". Cartório do 19 Ofício, livro n 9
- 555-

mínimas de 8 graus centígrados. Tais oscilações térmicas indicam um


clima temperado.
Entre 1847 e 1886 é a fase formativa da Colônia. O Governo Im-
perial financiou a subsistência dos colonos pelo espaço de seis meses,
forneceu medicamentos, algum gado e instrumentos próprios da lavou-
ra. Os colonos prometeram reembolso no prazo de quatro anos. Até
o momento em que a Colônia emancipou-se do governo provincial, em
1886, o governo despendeu com ela 364:000$000 (7).
O governo da Província do Espírito Santo primeiro distribuiu lotes
com 50 hectares, reduziu-os depois, aproximadamente, à metade. En-
tretanto, vários colonos, empregando diversos meios, honestos ou não,
acabaram por tomar-se donos de dois a três lotes dos quais só parte re-
duzida podiam cultivar, uma vez que a terra era explorada economica-
mente apenas pelo colono e sua família.
Trata-se de sociedade original, que nesta primeira fase permaneceu
autônoma. Caracteriza-a, a coesão familiar que se manifesta e foi man-
tida pela endogamia; assim, a educação e o patrimônio cultural, por
medíocre que fosse, permaneciam germânicos. O misoneismo rural foi
ao mesmo tempo causa e consequência dessa coesão. Um outro traço
característico foi a constituição entre os colonos, de uma democracia
rural que se foi firmando (8), alicerçada na pequena propriedade, na
qual a família praticava a livre empresa.
Os 163 colonos, cedo se multiplicaram. passando de 800 no início
da década de 1860. No fim da década de 1870 eram mais de 1800 (9) .
Em 1850, registrava o Presidente Felipe José Pereira Leal, refe-
rindo-se a Santa Isabel:

"a colônia única que possui a Província, continua a florescer,


os indivíduos que a formam mostram-se satisfeitos, e entregam-se
todos à lavoura, plantando em larga escala o café, feijão, milho e
mandioca, e desta fabricam farinha em abundância e superior.
O número de óbitos avulta um pouco, porque é devido às febres

(7). - Torres Filho (Arthur E. Magarinos), O Espírito Santo e seu


Desenvolvimento Econômico. Rio de Janeiro, Tip. Pimenta de Mello, 1913,
p. 350.
(8). - "Primeiro Livro de Atas das Sessões do Governo Municipal de
Santa Izabel", 1893-1897. A afirmação é pe~ceptivel em várias atas. Normal-
mente realizava-se o mutirão para a construção de pontes e estradas. Colonos
realizaram empréstimos à Prefeitura incipiente.
(9). - Roche (Jean), A Colonização Alemã no Espírito Santo. São
Paulo,
- 556-

inte~mitentesque se desenvolveram no começo da colônia, mas


atualmente têm elas desaparecido" (lO).

Por essa época continuavam as concessões de lotes. Veja-se o fac-


símile de uma designação, a título provisório, conferida em 1865, ao
Sr. Rodolfo Pulss. Confiram-se os lotes designados com os números
que aparecem no mapa de loteamento colonial, anexo ao trabalho.
São os lotes de números 200 e 228, de áreas correspondentes a 125.000
braças quadradas, "pouco mais ou menos", (uns 30 ha cada um).
O documento impõe três condições fundamentais: a necessidade de
residir no lote conferido, a obrigação de cultivar o lote, e o compromis-
so de marrter as estradas.
A necessidade de residência afirma-se na introdução e nas cláusu-
las: 2, 3,4 e 10. Ressalta a preocupação com o povoamento e a valo-
rização da zona rural, não com o desenvolvimento dos distritos urbanos:

"Até seis mezes depois d'esta designação deve estar construi-


da uma casa, que tenha, pelo menos, quatrocentos palmos qU'l-
drados ... " (cláusula 2).

O colono recebia o lote "medido e demarcado na frente e em parte


dos fundos" (cláusula 1). Os lotes eram mal demarcados, mas antes de
serem conferidos os "Títulos Definitivos de Propriedade", realizava-se
a "medição", processo dificil e oneroso. Lendo a descrição das medi-
das dos lotes n. o 64-A, do Sr. Samoel Welfli Filho, e n. o 54, do Sr.
Jacob Weiand, verifica-se a dureza do empreendimento. Por outro lado,
viver e produzir nesta área, corresponde a um trabalho gigantesco.
"Descida forte", "subida forte", são expressões comuns nas descrições
dos agrimensores; correspondem à topografia da região. Os primei-
ros colonos vieram das elevações do Hunsrück, região do Reno, mas
aqui, dispersos, sem meios de comunicação, era necessário espírito de
luta. Foi a coesão familiar, e, em certos momentos, o mutirão, que
tornaram possivel a sobrevivência.
A obrigatoriedade do cultivo firma-se, alem dessa introdução nas
cláusulas 2, 3, 4 e 10:
"Até seis mezes depois d'esta designação deve estar roçada e
plantada urna área de mil braças quadradas..... (cláusula 2).

(10). - Apud Diégues Júnior (Manuel), in "Colonização Estrangeira no


Espírito Santo",
t-/-

-l~~
-+-ü-
Provincia do Espirito Santo.

<!tolonia bt §anfa ~511btl.

Designação de lote de terras. jand-~nwrisltng;s-~!hein..


ÁQ Snr. a"~
&~ pelo presente designado OI 10ft; de tenDa, IUl'nci(,l· Ivirb ~itrlllit bat ill b." lololli<llortt. ·tijtricl
~&...,.
.,
Dado na planta dA C~loni., diolricto ~~ ~

COm o'No. ~~cndo au.r....JJ /.,[I;.~ mit 9lro.4.~.tt81ti.idjllt!, ~","bjtiicf, m,\lttt rillm &14·
Ji~ qua1:das, pouco mais ou men08, afim de ad- d).n.alltn ,!ÍOII IIl1o'fiíb'
quiril-o.icomo propriodRlle lua, oab a condi~ão de cultura ílllab.atbralfen ,"tgal!. aIlOClui,(III. 11111 balfclb. bll.dJ ~.fiiDuIl6
'e mo'l-ada habitual e .lTecliva, •• ujeito ás mai. obriga- bcr 2),billgIlIlO be. ba",,,,bCll IIl1b tgat(iidJlilt'" 2),,,,obll'lI~ IIl1b
ÇÕt!'s irsherente;l l.' compra do mesmo lote, que lão ~_ .~tbQlten~ ali feiu (!intntbulII 3" t~lJJrrbtu, tuobti tt an bjr
~guint.. : :"ritcrll \l.lcrpnidJtlllloen g.b"llb'" i;t, ",cid), ali b'" aaui .bm
bi.!,. Cil.illlbjtticfll g,llIiipft IIltb bi. lodJiO\g'lIb," Ollb; •
1. Recebendo o comprador O lote medido e demar- 1. 'i)rr Mllfcr ,ibrrllillllllt bo~ Q;'"lIb;tiur obo'II"II'" ili
cado na frente • em parte dOI fundol, deve tratar da brr lllo.bcrr.it. IInb tb.ilm.ij. ill brr li.i', IIl1b bat übrr bi.
coa..rvação dOI marcOl, nAo deixando que ..jAO de.lo- I!'baltllllg brr Cilrrllwidj.1I i" ",ad),", bamit O. lIid)t btrriilft
cadoo, • 8ubetituindo por outrOl 08 que tiverem eido:, ",,,b,", (o ",i. bit bllrdJ \l,"" ob" allbm, UII!oll !critõrt'lI burdJ
dostl'uidol por fOito. ou por outro accident;" No 0:110 d.· allb,,, """ iU .r(r~,", 3111 \laUr, ba~ .bm 'bi.[r (l)rr"3iricljn,
dellnpparecerem o.u serem deslocados 08 mesmo! marcos. \1trfd)ruillbtn obrr uttriltft rurrb~lI. fallrll l'Iit lt'o;trll rin", rtroa
• dcepcsa da nova medição e dcmarcac;Ao, se fôr ncee... 'lIõtbio grmorb,"rll IImtll !l3'.lIIiffllllg IIl1b IllbQtrI'lllllR 'illlig IIl1b
earia, correrá unicumente por COnta. do comprador, ou, "Utíll anf brn Jtdllftr, obrt', tuo arori obrr 1II('brrrr G5rnl1b~tücrr
.e confinarem doUs ou mnia lotes, BC dividirá proporcio- aUf"nullwjtoprll, 1111111('11 l1r l10n bel! lKtr('ffl'IlD~1I "rl'II~lhld.1barli
".Iment. entra OI ">.pcctivo. hcréoa. illl lllrrbãltllilfr g.traon, nirrb"L

2. Âté ,ei. hl~'Zl" depois d't.'8ta clesig.mçãn (leve 2. ~illn(11 i(d)~ 9Rollatru tlom 1Q11" ilkj(r 9hlludt\ulIl\
(,Itar roÇndn. c pln.utatla uma área de mÚ braças quadra.. ali 1I111~ .illr ()b,,~üd)r nOIl lIIillbr(trll' tallimb Cllat\..~tbrafftlt
das, pelo men08, c cOIHHruid. uma casa, que tenh", pelo gmilliot lII,b brpOalllt lIub rill o),'>all~ ".11 mi"b'it,"o '.icrb"ll",
~e~oe, quatroc('nlo8 palmos qUA<lmdoB, para "ua hnbi- brrt C'h,b'rat[palllln, Cilrnllb"ãdJ' ali [tüllbiO' iIlo!JIIIIIIR b~
tação permanente e de lua mmiliL A inobsrl"vancia Shluj(té: lIub frilltr tll1lnilit rrbnutf frin. ~i(' 9lid)tt·rhillulIt1
deeta obrigaçãO imp0l'tará a perda das bcmfcitorintl, que bi'irr I)Jrrv~idjtllllR brbillot bri, ll.Icrlll[t brr a".o.iúbrtm Illrb,i·
teu io mi, brr ;;Ia~IIlIlO'", bit 3.lIrr rllva grl,i(t't bat, m'b ba.
tiver feito, IUIsim como das prestaçôcs, que tiver pago,
Rngl"IVirjt:lIt IMrunbjlillf fautl nur~ 9tmr. 1101ll o:Dil'rrtot l1~rfllllft
podendo eer o lote dcsignado vendido pelo Director, sal- "
",rrb,". rilllin all~o,"ollIlI'lI \lã li. nOIl bõbrrrr (!Irtualt IIl1b
VOI 80mentç 08 casos de força maior e enfermidade pro-- lallorr IIl1b b,,,,i,(,",, $t,uIII~.it, ill IUrldJ'lI D.III !füll!rr .ill'
longada e provado, em que será concedida ao compra- ~lrrl"n;!riit nOIl !",ri biS [,d)~ !!JlolI,trn i"gr(tallblll IUrrbtll
dor uma momtoria de 2 a G mczest eendo as (lUCSh)c8, (oll IIl1b bir eitrrit[.aOlll,' bi, OdJ ba.itllrr ,tma l,uiid)", iblU
que entre eIle e o mcsmo "Director 8C suscitarem, deci- IIl1b b,m l1i",to. rrb.b.II, bllrd) edJi,b'ridJtrr !II rnt;dJtibrll
didas por arbitrol e8001hidos entre os que th·(lrf·tn, pC'lo (illb, 1U,1d), IUrlrr b.1I (,it rni"b,(t,"o brri ::Inh"" in ber Aol.,
m('no!', tt'f'8 "nn~ a(> rt'sidf'lI('i" fixn. nR ('olcmiJl., nir ftit 9lllAtfeifrnrll trmõ~rt It'ltll\tll lUuIT'"'1.
- 558-

!l, o c!(tUlprauúl' obteni. o titulo dt:fillirivo tl~ pro. 3. orlll 'lIbgilliigrn '!l,ii~littl ü6", bd~ dIlS'I"i,j'lI'
pl'h'dndc, elo lote dl'signndo depois de ter pago integral... Glrllllh[liuf ~at htr .!\õlIfrr ill ,mpfollg'II, lIad)b,m tr btll 'B,.
lIlente a sua imp0l't:mcia, ~ah1ndo tudo qU:lllto dever a trnghrrr,lb'lI boUihillNO b,\a~lt. \1IU,~ lUa. rr h,m õffrnllidlrn
Fa~~ndn. :Kncionnl, c provado por si ou po~ pl'ESOQ. de
qUí', ed)a~, [d)lIlb,t, obg,I,"O'1I IIl1h horg,lgall ~al, ba~ rr. irlbit'
sua confinnçn, t('nll3 tido no 'mes~o lote um anDO, pelo obrr rill ~~ . .rtrcl1lrll~lIIalll1 Ruj bcm gCIlRuutrn G3rtillbjtiuf'c lUin-
menoa, de rC8idcnci~ habitual e cultura effcctiva. b,jlrn, ,ill Sol)r 10llB ihillbig BtlUO~I~1 ulIb f. Ibal[.id)liclj '~f'
ball.rl I)at.

4. Somente stlo tli~pcnsndos da. obl'iga~~:lo de mo .. 4. mOIl btr !Brbh'!lllug br~ l1>ir!lid)'1I !l.1'lUobu,u~ llllb
rRda e cultura <..'ftecti\'n. os, Iotr! de 111('001" 8upcdh·je 1l0~ t't'lllllll'H~ ji11i.'1 IIU\'
birjmintn fI,iu('1'II (\3nlllbjrfufr in bCII ('Itt-
districtos urbanos, ('onccdiJos pnra qunlqucl' fim de r(~· id)l1fti-p{~1iC11 b~fl'rh·t. lurld)c 311 il'l\('lI1) t'iurr ml'rt11('11~ull!l au·
conhecida utilidade. Se n:l0 fOI'('m COII\'elli<'llt('UIl'utc UftlJlllÍl'1' 9lilpfid)fdt ilú!J{'!lr&tll lllllrt'lcn. eic urrraOen "jcbocb.
npro\'(~itndoíl por espaço de dous nnnos, pelo menos, ca- aorbrl)oltlid) br' 0prud)" nOIl ed)i,b~ridlltrll, ru,ml pc llidlt
llirão ClU commisso, sah'o o juizo :u'bitl'al. millb"ilrn, ;lOri 301)" 10119 allg,m'iirn brllll~1 rorrbrll.

5. Os caminho! ruráes terão 1\ largura d(> quatro 5. '1)ic lãllhlic!)rn !lll'g' b,folllllltll bi, !Brril, noll ui«
brnç:1s, n;ia se podendo plantar arvores 6('n<10 Ó. distancia" !Broffrn, lUobri !!l.illlll' rrit ill brr G:lIlferillmo rillrr !Bran' aon
de uma brrl~"a, pelo menos, da estrada, Para n tlbêrtúra brr elrai!' g'pflallsl rorrbrn billfen. !!lei brr G:.õffllllllg Iltlltr
.. do novas <,stradas desnpropriar-ac-ha (,8paço TIl'ce>sfl.ario, ell'Of,rn umf, N, halll lIõlbis' <ll'llllbniid), abnrtrrtrn ulIb j.n,n
sendo indcmni.md08 os 8('08 pl'oprictnriol! tanto das bi, G:inenll)iullrr [.n'ol iftr bi, boroui g,mod)trll lSrrbrffrrullg'll,
'6mnfcitorias, que n'ellc existl.10, mediante> juiso nl'bitral, lIac!) id);,Mric!)t,rlic!),m Ei\'lllc!)', ro;, iftr bi, I}lodj' irlbil '111·
como do terreno. cujo pl'CÇO set't1. o da primitiva [dj,ibigl rorrbrn, brrrll 1,~I,m lJl"iô illllrrl)alb hrr '1[lm fim!
compra" dumnte o" 'primeirA quinqu<.'nnio, contado d." 3.,!)", uom gentio'" 'itaS' ou B,,,djll'~ h"imio' h,ô ur[Vriina·
.lata d'esta. licljru .!talljG [riu ion.

6. Dc\"{'m 8("1' immediatn.- e illt('it'nmc>nlc r~mo.. 6. <Vi, !Bãllm" 11>,ldj' b,im !lllalbicljloOtll allf hi, !lB'ge
-vida!' ar"orcs, quo nns dcrrubndu8 ('ahil'em sobre 08
a8 fl\UClI, i:l~b jofort nub gãu3lid) I\ltOlurillllllttl, ~(llIIit bcr n.lcrrc~r
caminl1os, afim de contlcrvru'-sc dcscrnhnr:tc;.ado o transito, Ilid)1 g'bi"'),,1 mrrb, , in !!l'3119 oni rodCl}"1 bi, iBoridjri!tnl
nh~er,'anflo-.sp Il "(>li:te relilpcito quanto .se ncha previ:lto ~,r ID'lllni3ipal·J\aIl1lIltr.mtrorbllulIgm Rtllell.
JI~ posturas das Camarns Municil'ae!.

7. Pnm as pontes c Ol1!l'ns obras publicas S(l Jloderá 1. 3n !!lrftllm llnb' anbrrn ,ffentlicbrn Wr&rit'll iit "
tirnr' gratuitamente da. partI! inculta 003 10t(,5 madeira., gejhlttet, OllÔ l:Irlll "'lIIbr[1Clmh'l! '!t,dh' ber mnlllbjtfufc utlUt
pedra. c OU~I'OS matcriacs, h:l.\'cndo indcmnisnç<1o, oet('1'- ~l1tid)ii~i!\ll11!1 ,p~I;I't, 9trinr lIub fOIl;tillt' ro?aterialim 311 fllt.
minad:.. por arbitras, Q1lltndo d'abi resultar pl'l'juiso prF- nrl)ll1C11 j rntjtl'l)t bobnrd) blt'ibrn~l'r ed)a~ru jlir" bo~ (9rull"b.
manente. itiu!, io ioU riu< I'"n ed!i,b'rid)trrn in b'ilillllll'lIb, (!l1licl!õ·
bigltll!l Ildcijrct ltJerbcn,

8. X. d.m ..-e.~ do. fundo. do. lote. devem o. ~. ~lri 'Ilrnll'ITnng brr 'iticjm brr (\lrunbftiur, ~abta
~eo! dono. e os htréol confinant('s nl.n';l' piradas, tIS irlH 23"rfiticr lI11b bie ~tClI3Uad)bartl bic ~reI15id)l1df,el1 nllhll •
eujn con8(,l'v~ãO fica. a. seo cargo, senda por c11('s roçn- jd)logcu, bcrm í)ffCIl~C'lttllll!l i~lIell oblirgt, illbem fir fold)c nU·
das e limpas annunlmcnte f! conservados 08 competentes jõl)rlicl) t1tld)3npu~clf lIub bit 11etTeifcllbcu t»rcllalridJw. lvir obm
mnrco., como fieou declorado. 9,[agl, illl Eitaub, lU aba!!," bab(n.

,. O prcço d'c.te lote é de /ft r •. por brnç. 9. <V" Jtallfprri~ bi,[,~ mrullhililllc' i[t ./fo mri'
qun.drn<ln; será pngo peJo ('ompr:Hlol' pdn. Corrn~ dct('r- für bic ünobratbrafir, ullb in bl'r ~dic 311 rrleill'lI. l\lie jie
m;nfld~ no respt>cti,'o rc~ulan1('nto, de que se lhe ueo im bdrcftmDcn mt'OIlIIl11lClltc fl'it!lefl'~t tI\li) bem -iliilljcr btfcumt
eonhe('imento. :Em quanto Idio s"e reflli8n~ o pa;.rnmento ocmad)t I\lllrbm iit. 50 lall!\t 'hieil'r mrtrng fo roie allr
QR sua importancia, bem como de totlns ns qunntins, flllbClII ElUlllllell, rodd)c ber ,fiõufrr bem etootc fd)ulbrt, uidJt
que o comprador deva no Estndo, ficarn o mesmo lote a{lb'lal)lt llIorbrn iinb, bleibl ,bm bi,j,'· mtllllbitiur ~~potb~
hypotheea.do mio !'lG pc>]o r('ferido pagamento, como pe- rirt. l1id)t aUdn fúr bil'jf IDetrãnc. jOllbrrn QudJ für lIie etra-
1M multatl, ('ro que o propl'ictru'io "illcol'l'l'l' por infmcç":'i.o im, in I",I<!:, brr 'llcii~" ro'B'll 9lid)trr[ilUllll~ brr IDlulli3ipal.
c1u poatUJ'1\8 relAtivas' coQP·ervaç-lio dOI caminho;f. 'll,rorbllllllQrn .ilbrr bi, ;,\llitanbbaltllllQ brr $,S' 'tiro. baiiillt.
- 559-
10. O. direitos, conferidos por esta designação, 10. 1)i, bllt.!) bi'i' ~llIu,iflllln iib"".O"'''i Dl,.!)t. 9'('
aproveitA0 somente ~ ptlSoa ou familin.. em cujo bene- '11 IIl1t filr bi, 'll"foll ob,r 1l.lIIiIi,. i" bmll (11"11[1," ji, ali',
ficio é expedida, ou a08 se08 descendentes e herdeiros com q,[I,nl ijl. obrt flir igr< 'lIblõIlIlIlIiIlO' IlIIb (!,bm. IIlrldj. b..
• precisa capacidade, pnra cumprirem com os deveres õgint pllh. bit obm noro,[<i)ri'bmm m"l,fli<i)IIIIIQrll. b,[ollbtr'
acima preceitundos, e esp"ecinlmente com IL constante cul· billji<i)tridj b,1 [Ióllbiom !B,baIlCll8 IlIIb m'lIloglI<ll' .lIIlb bit
tu,·, e habitação e com 1\ conservação das cstrndos. .l!,g.1I11110 brt I$lrnpm. 3" "fiIOm. Bllr U,borl'.QIIIIQ bi.!cr
Par!, a tran8feren~ia dYel'tcs direitos por vendA. ou por Dlt<i)lt bnrdl. morlallf obor l.b. allbor, 111,1 mllp bi, BlljlimlllllllO
qua1quer outro modo, deve preceder approvação dp. b" 'llrouill,.!jlrõiib'lIll1t II.dI !BnidJI bIt 1)imtor' .innt~.li
Pre.ideneia da Pr~villcia SObl'C informação do Dil'ector. IIlrrbMI.

'olonia h .!!Ianto 39nb.I, /Ya. tt1~ d. 13&1r--

Decl'r~n,le o Direetor • .ti.rcitas as condições rer.ri.d.. na .tsu..uI. 2', a prelente deoignoç.'Io ti... oraIenda
como titulo prOTlliOrlo.
ctollnia h .ianla 3Ubtl/ /t- de a'~ d. 18/.s'->

.4·~--~
ver,..... d ~.

E.tando satisCeitas as condiçOei mencionad..- o....omprador quite MM s Fazenda Publica, pettence-lho

o di,'eito d. réceb~r o titulo deftoltlTo te pelo .preaeDte lhe 'foi d..ignado.


'olonia br ~onta 3.abrl d.la

.. Direi'"
- 560-

Não tornando produtivo o seu lote, pelo menos legalmente, o co-


lono estava sujeito à perda das benfeitorias que houvesse feito e da
quantia já paga. Entretanto o rigor da cláusula 2 é atenuado quando
reza:

"salvos somente os casos de força maior e enfe~midade pro-


longada e provada".

o compromisso de conservar as estradas, expresso nas cláusulas 5,


6, 9 e 10, revela a preocupação com a interligação colonial, tão neces-
sária quanto util.

"Os caminhos ruraes terão a la -gu"a de quatro braças. .. Para


abertura de novas estradas desapropriar-se-ha espaço necessário,
sendo indemnisados os seos proprietários". (cláusula 5).

A análise da "Designação de Lotes" em foco evidencia que os de-


veres atribuidos aos colonos, eram desproporcionais aos direitos. Estes,
muito parcos, resumiam-se no direito à luta pela sobrevivência.
Pagava o colono, 1 1/4 réis por braça quadrada, ou seja, 156$250
por 125 .000 braças (uns 60 ha. ). (Introdução e cláusula 9) .
A insistência nas três idéias - residir no lote, cultivar, conservar
as estradas - reflete, sem dúvida, o ideal da obra colonizadora: a ocu-
pação territorial, e um possivel abastecimento dos centros urbanos com
as sobras da produção da colônia.
Uma superfície de 75 hectares era cultivada mais ou menos da se-
guinte maneira: café (3.000 pés), 1,5 a 2 ha; milho, 4 a 6 ha; tubér-
culos, 1 ha; pastos, 4 ha (11). Em 1856 produziram os colonos 1.200
alqueires (um alqueire = 13,8 litros) de farinha de mandioca, e no ano
seguinte colheram 10.000 arrobas de café, independente de muitos ce-
reais (12). O café acabou por imprimir direção a toda a economia.
Consideravam- se 100 arrobas de café não descascado, por 1000 pés,
como excelente colheita.
Examinados todos os negócios de compra e venda de terras entre
1879 e 1889 sente-se intensa atividade nas transações, o que indica cer-
tamente, a formação de novas famílias através do casamento dos filhos.
O
- 561-

,
OPERACÕE 5 DE COMPRA E. Ve:N1lA De T E.RRAS
NlA1'Ile,.o de 1B79 -1889
~5~_~o~ci~o~~~o~I~,~~~~~~~~ ____________________________~

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- 562

1. - Prepoaderam as operações de compra e venda em


que ambos os cont"atantes são alemães, ou de ascendência ale-
mã. É possível que muitos dos vendedo es fossem aqueles que
no início haviam conseguido mliores extensões; posteriormente
vendiam uma parte aos descendentes de seus compJtriotas.
2. - Diminuem os proprietários luso-brasileiros de fo~ma
cada vez mais sensivel aumentando o número de alemães p"oprie-
tários. (Gráfico n9 1).

Entre 1879 e 1889 predominam as vendas de propriedades entre


25 e 50 hectares (61,9%). Vêm em seguida as propriedades de áreas
entre 10 e 75 hectares (15,4%). Áreas inferiores a 25 hectares (14%).
Em último situam-se os negócios de terras com mais de 75 hectares
(8,7%). (Quadro n. o 1 e gráfico n. O 2). A maior propriedade negocia-
da media 250 hectares. Ocorreu o negócio em 1887.
O ideal do colono era a propriedade do solo de forma livre e de-
sembaraçada em regime de pequenas extensões - o que a topografia
da região favorecia - de modo que a terra pudesse ser explorada eco-
nomicamente pela família, proporcionando-lhe sua manutenção. Esse
ideal contrapunha-se ao sistema de arrendamentos.
O primeiro arrendamento legalizado, foi a 3 de julho de 1881 (13).
Os meeiros alemães eram poucos. Entre 1879 e 1889 houve 7 arren-
datários alemães e 12 luso-brasileiros, 9 locadores alemães e 10 luso-
brasileiros. Nessa década foram, pois, 19 os arrendamentos legalizados.
No livro 5, folhas 63-64, constante no arquivo do Cartório do
Primeiro Ofício de Domingos Martins, lê-se um interessante contrato
realizado entre Jorge Helmer e sua mulher Thereza Helmer, com Ni-
cola0 Gonnohing, a 7 de março de 1885. O casal entregava a Nicolao
uma "posse" de terras, com casa, pasto e cafezal, no distrito Califórnia,
pelo tempo de 7 anos, sob várias condições: no primeiro ano "apanhar
todo o café existente no prazo, soca-lo, limpa-lo" e entregar ao referido
casal "sem tirar del1e parte alguma". Nos seis anos seguintes,

(13). - Cart6-io do Primei"o Ofício, Domingos Martins, livro n 9 3,


folha 12. Os contratantes são luso-brasilei os e provavelmente parentes: Antô-
nio Coutinho Fer.-eira Rangel arrenda a Manoel Seraphim Rangel. O documen-
to registra o local, os limites da propriedade arrendada, o prazo que foi fixado.
em 5 anos, a data, o preço: "225$000 em cada ano, que serão pagos em
pagamentos iguais e anuais, logo que se conte os doze meses, tudo em moeda
metálica livre de ciza ... " Tambem é indicado o local de pagamento que é a
casa do locado·, e as obrigações do arr'endatário: "Conservar os rumos certos
e suas competentes marcas; e, se faltar aos pagamentos nos devidos tempos ou
deixar de cultivar os rumos elle locador rehaverá a prop~iedade, ficando elle
rendeiro ainda sujeito a indenizar ... ".
- 563-
QUADRO N9 ,

VARIAÇ~O DA ~REA DAS PROPRIEDADES NEGOCIADAS

NO PERIoDO DE 1879 a 1889

Hectares FreqUência
me nos de 25 29 14,0
25 ----- 50 128 6",9
50 ---- - 75 32 15,4
75 ou mais 18 8,7

T o t a 1 ..•.•. 207 100,0

'.. . .
~R.EAllo.S LOTES DE TERRoR NE60C.IADOS
1919 ex. 1889

Mt1enos de 2skCL (]JJ 2S a. 5 O laGl


~"5h4,DW. metis. eEl50 Q. 15 h4
- 564-

"apanhará os ditos cafeis e d'elles entrega-á a meias".

Seguem-se outras condições como, limpar e tratar os cafezais, ca-


sa e

"benfeitorias como dos mais bens como seja o moinho ... ".
"Findos os sete annos e cumpridas as ob:igações fielmente, Helmer
e sua mulher, ou seus herdeiros, estavam obrigados a passar-lhe
escriptura do dito prazo, ou em caso negativo entregarão a Ni-
cola0 a quantia de um conto e quinhentos mil réis em moedas
ou em bens ... ".

A lei imperial de 28 de outubro de 1848 concedendo áreas de ter-


ras às Províncias para fins de colon:zação, proibia que nessas terras ~e
emnregasse o trabalho de negros escravos. Mas a escravidão não foi in-
troduzida nas colônias teutas, menos por força da lei, que pela falta de
meios, ou de utilidade em regime de pequena propriedade trabalhada
pela família.
A escravidão praticamente inexistiu nas colônias alemãs. Encon-
tramos apenas três negócios de escravos. O primeiro documento que
registra venda de escravo é de 27 de agosto de 1878 (14).
No final da época servil, em 1885, a Colônia de Santa Isabel pa-
deceu com os pretos fugitivos (15) .

Na segunda fase, que se inicia com a criação do Município, a vida
político-administrativa toma incremento. Há documentação de vivência
de verdadeira democracia rural. Os colonos elegem os "governadores",
seus representantes no governo municipal. Unidos, conservam pontes e

(14). - Trata-se de Guilhermino, "de cor parda", com 14 anos de idade,


vendido e comprado por luso-b~asileiros, avaliado em um conto de réis. Cartó-
rio do Primeiro Ofício de Domingos Martins, livro nQ 1, folhas 18, 19 e 20.
Outro negócio é uma "escritura de venda que faz Pinto Rangel de um escravo
de nome Joaquim, com porte de vinte e cinco anos de idade, a Antônio Pe-
reira Co -deiro". O preço foi oitocentos mil réis. Idem, Livro n'" 4, folhas 11 e
12. - "Escritura de venda que faz Antônio Victorino Pinto de um escravo de
nome Marcelino a Pedro Geraldo pelo preço e quantia de 1:200$000".
Idem, Livro nQ 3, folhas 66-67.
As duas últimas transações, correspondem ao ano de 1882.
(15). - "Na Colônia de Santa Izabel andam vagando sete p-etos fugi-
dos que ali estão praticando furtos, atacando casas, etc ... " Jornal A Província
do Espírito Santo, de 6 de julho de 1885, apud Novais (Maria Stella), in A
Escravidão e
- 565-

Estado do Espirito Santo


'""" ... ",,~!!:r. ~-~ .
"'llIIIH'lplO....~LI<._. ",,,,,,~.ci..
~ 1,
""llIa~"~_..--4<:'<-"'~."."""
.4': Disll'iCto

PLAN D.\
- 566-

caminhos. Enfrentam dificuldades. Ocorrem secas. O café baixa de


preço. Mas o município consegue vencer os problemas.
A total igualdade de possibilidades do início, evoluiu lentamente
para a formação de classes sociais diferenciadas pela natureza e pela
importância do patrimônio, e em seguida pela renda.
Em 1895 eram 25 os comerciantes instalados no já então municí-
pio de Santa Isabel (16). Havia progresso.
Quanto à propriedade rural, entretanto, persistem a cultura exaus-
tiva e a técnica rudimentar. Atendendo à característica fundamental da
economia espírito-santense, os colonos plantavam cafeeiros, que adju-
dicavam-lhes uma pequena renda suplementar com a qual adquiriam os
elementos que não produziam e dos quais tinham necessidade.
A própria riqueza da terra foi frequentemente, no Brasil, mais obs-
táculo que convite à aplicação de processos mais aperfeiçoados (17).
Faltavam tambem recursos para tanto. As derrubadas e queimadas,
métodos da agricultura indígena, foram os adotados pelos colonos. Mas
no começo da segunda década do século XX, os agricultores de Santa
Isabel já consideravam cansada a terra em alguns lugares.
Há documentos provando que luso-brasileiros foram adquirindo
propriedades bem maiores que aquelas que em média mantinham os
teutos. Examinemos o processo de compra de um lote concluido com
o "Título de Propriedade" assinado a 24 de agosto de 1897 pelo então
Vice-Presidente do Estado, Constante Gomes Sudré. Veja-se a planta
anexa ao trabalho; trata-se da
"medição de uma posse criminosa ocupada po: Francisco
Luiz Nascimento".

A propriedade possuia a área de 368. 840 metros quadrados situ-


ando-se no antigo distrito de Sapucaia (hoje Paraju). A taxa de me-
dição (245$440), é superior ao preço do lote, (147$540). Pela planta,
memorial e selos, o referido senhor pagou 75$000. Somando tudo
obtem-se 467$980. Recebe a importância da conta o "Engenheiro Pre-
posto do 4.° Distrito", Arthur Correia de Mattos Thompson (18). O

(16). - "Livro de Atas da Comissão Municipal para proceder à revi-


são dos alistamentos eleitorais", aberto a 10 de junho de 1895.
(17). - Carneiro (Fecnando), Hist6ria da Imigração no Brasil - Uma
Interpretação, in "Digesto Econômico", São Paulo, 1948, p. 1031.
(18). - Arthur S. M. Thompson, foi eleito "Presidente do Governo
Municipal de Santa Izabel" na sessão realizada para este fim a 23 de maio
de 1896. Dos quatro votos dos "governadores" presentes, o referido ci-
dadão obteve três votos. "Livro de Atas das Sessões do Governo Municipal",
- 567-

COMM1SSARIADO GERAL
-DO ......
- 568-

"Título Definitivo", s6 é conferido no ano seguinte, tendo o proprietá-


rio pago mais 20$000 de selos na Recebedoria da Capital do Estado do
Espírito Santo. O "Título de Propriedade", que leva o selo do Estado,
especifica no reverso da primeira folha, as características do terreno:

"o terreno em sua totalidade é montanhoso e quase todo ar·


giloso, e dista 38 Km da Vila Férrea Sul do EspLito Santo.
Contem esse terreno uma área aproximada de 20 hectares culti·
vada e o resto em mattas virgens.
A avaliação da propriedade é de 2: 000$000. Sendo em bens
imóveis, 1 :000$000" .

Finalmente destaque-se o essencial: a planta do terreno aponta co-


mo limitante, a leste, o mesmo Sr. Francisco Luiz Nascimento. A nova
área vinha portanto, ampliar suas propriedades. Já o mesmo não
ocorria com outros, notadamente alemães, o que se constata pela "reti-
ficação do lote n. o 64 A, ocupado pelo Sr. Samoel Welfli Filho". (Plan-
ta anexa). O terreno mantem seus limites originais com lotes de pro-
prietários diversos, e de origem alemã. Conclui-se que o Sr. Welfli,
continuava, como a maioria dos alemães no fim do século XIX, dentro
do sistema de pequena propriedade, enquanto o Sr. Nascimento pro-
vavelmente agia como outros brasileiros, que ficavam com extensões de
terra que não podiam cultivar, desfazendo-se geralmente delas em favor
de teutos como ficou demonstrado acima (Gráfico n. o 1). O mapa de
loteamento que acompanha o trabalho configura a propriedade do Sr.
Marciano, ao Sul do Rio Braço Sul. Pelos cálculos que pudemos reali-
zar tinha ele 360 ha; era, pois, uma das exceções. O

"Livro de Atas da Comissão Municipal que devia p·oceder


à revisão dos alist2mentos eleitorais seccionais, em virtude da
Lei nQ 35, de 26 de janeiro de 1892",

rubricado por Christiano Bruske, presidente da comissão, aberta a 10


de junho de 1895, consigna, por força da lei citada, a filiação do eleitor,
o estado civil, a profissão, o domicílio e a data da qualificação. Em
1895 as profissões eram: lavradores, 223 (271 casados e 52 solteiros)
negoc:antes, 25; engenheiro, 1; ferreiros, 4; artista, 1; professores par-
ticulares, 2; carpinteiros, 5; padeiros, 3; empregados da prefeitura, 2;
seleiro, 1; proprietário, 1; empregado, 1; sapateiro, 1.
Dos lavradores, 23 estavam com mais de 60
- 569-

V01"'iocão
!I
da área. média dos
loies de terra l1e!ociado5
H.éta"r.' ~B80 -1920

o
1880 1885 1890 1895 1900 1905 1910 19~5 19~O
A-nos
G.,.~ftco N° 3
- 570-

Em estudo comparativo entre o mapa de loteamento e os agricul-


tores alistados como eleitores, observa-se que os lotes configurados são
em número superior a 500, o que indica que alguns lavradores possuiam
mais de um lote; leve-se em consideração que nem todos os lavradores
devem ter-se alistado. Mas, 323 participavam da vida municipal, esta-
dual e nacional. Veja-se o mapa de loteamento que acompanha o tra-
balho e que foi desenhado no fim do século passado. A área loteada é
de uns 19.050. O cálculo foi realizado graças ao conhecimento das
áreas de lotes conferidos.
Dentro dos limites de precisão do mapa, foi possível estabelecer
que os lotes tinham uma área média de aproximadamente 30 ha. Para
manter a interligação entre as propriedades rurais e a sede do município
era necessário que se construissem e conservassem estradas e pontes.
Aliás, como já se viu, o colono comprometia-se a realizar estes traba-
lhos quando receb:a a "designação de lote". Em ata de 30 de novem-
bro de 1894 lê-se:

" petição de diversos moradores, do lugar denominado


Chapeu, de auxílio pecuniário para a reconstrução de uma ponte
que dá passagem sobre o rio do mesmo nome, confluente do
rio Jucu em terras de propriedade do cidadão Hermann Hohr,
cuja necessidade impugnada pelo cidadão Presidente e apoiada
pelos outros senhores governadores foi reconhecida e resolveu-se
mandar por em concorrência pública o serviço da mesma ... " (19).

A ata do dia 10 de março de 1896 firma a necessidade:

"de sem demora restabelecer a comunicação do Campinho


pela est~ada que conduz por cima da serra a Sapucaia cujo trânsito
foi interrompido devido as chuvas torrenciais terem desmorona-
do um pequeno trecho da referida estrada no prazo colonial de
propriedade do cidadão João Frederico Pruss... o atalho que
o referido p~oprietário fizera não serve para cargueiros que correm
iminente perigo de rolarem com suas cargas pelo enladeirado
solo abaixo" (2).

o processo de desenvolvimento municipal, dentro do segundo pe-


ríodo estipulado neste estudo, apresenta uma nova época em 1896. A

(19). - Primeiro livro de "Atas das Sessões do Governo Municipal",


iolhas
- 571-

sede municipal é transferida para o local que tem a mesma designação


do município, Santa Isabel (21).
Verifique-se no gráfico n.o 3 como não houve grandes oscilações
na área média dos lotes negociados entre 1880 e 1900. Entretanto, em
1905 a área méd:a eleva-se a 68 hectares.
O fato ocorre em correlação com a saida à procura de áreas pio-
neiras (zona do rio Doce), onde os colonos poderiam ter propriedades
(22). Pode tambem ser apontado como consequência do fracionamento
observado pelo ano de 1890. Há o constante desejo dos colonos em
tornar seus filhos proprietários (23). Considero como fator relevante,
e até agora não situado por nenhum estudioso, a oscilação no mercado
do café. Inicialmente houve a grande seca de 1898-1899 que continuou
em 1900 prejudicando as safras de 1901 e 1902. Em 1905 baixou o
preço do café, o que deve ter arrefecido o ânimo de muitos lavradores.
Chegou-se mesmo a considerar como fatalmente perdidas as plantações,
pela falta de trato (24). E possivel que este fato tenha incentivado a
saida da região proporcionando o aumento do número de negócios (106,
em 1905 e 85 dez anos depois). Os que permaneceram puderam ter
propriedades de maior área, o que se reflete no cálculo apresentado
correspondente à área média das propriedades negociadas em 1905.
No transcorrer do século XX, o Governo Municipal da antiga Co-
lônia de Santa Isabel procurou incentivar a produção dos colonos. O

(21). - A preocupação com o progresso municipal é patente na Ata da


Sessão do Governo Municipal, de 3 de agosto de 1896. "Fixam-se editais pondo
em concorrência pública o talhe de carne verde para abastecimento da popu-
lação deste município, e manutenção de iluminação pública das praças e ruas
desta vila de Santa Izabel. .. O contrato que estipula as condições sobre as quais
este governo pretende estabelecer a iluminação pública desta vila com Iam-
peões de luz e querozene acha-se igualmente à disposição dos proponentes ... "
Idem, folha 55.
(22). - A construção da estrada de ferro Vitória-Minas, 1904, foi uma
das causas da ocupação desta zona.
(24). - Desejo que realizam cedendo-lhes parte da propriedade, o que
minimiza excessivamente a área de cada um, ou comprando terras de outros
colonos, o que tambem contribui para o fracionamento. Por vezes, a família
toda emigra para novas terras onde pode permanecer unida e possuir proprie-
dade maior. A p:imeira escritura de doação de pai a filho, é do ano de 1880.
Nicolau Stein e sua mulher,doam a seu filho Mathias Stein "uma colônia com
benfeitorias" Cartório de Domingos Martins, livro nQ 1, folha 42.
(24). - Torres Filho (Arthur E. Magarinos), op. cit., p. 105. As
rendas do Estado foram, em 1896, 5.437: 545$212, e em 1905,2.614:926$462,
idem, p. 103. Em 1895 o Estado do Espírito Santo produzira 1.622.045 arro-
bas de café, em 1900, 1. 234 .195. Só em 1909 a produção voltou a equilibrar-
se àquela de 1895. Idem, p. 105.
- 572-

Decreto n. O 130, de 29 de junho de 1914 (25) procura estimular os la-


vradores, estabelecendo diversos prêmios.
A interligação com o mercado regional se fazia através dos mas-
cates e negociantes estabelecidos nas vendas próximas.

" . .. foi decidido pelo conselho aceitar a quantia de 800


mil réis pela rescisão de contrato sobre mascateação em caixa
feito com o cidadão Felipe João Daniel que alegando grandes
prejuízos havidos com o pessoal empregado neste serviço, não
pode continuar com o referido ramo de negócios visto sof:er
constante invasão de outros mascates vindos do Porto de Caxo-
eiro de Santa Leopoldina e Alfredo Chaves ... " (26).

A ligação com o mercado de Viana e Vitória, para a entrega dos


produtos que sobravam, era geralmente feita pelos vendeiros.
A produção do café, em substituição à do açucar, concorreu de
modo extraordinário para o crescimento da renda do Estado. A antiga
Colônia de Santa Isabel não esteve alheia à contribu'ção para o au-
mento da produtividade espirito-santense. Uma propriedade de 50 hec-
tares, no começo do nosso século, era ocupada, geralmente, em 1 a 1,3
com plantação de café. Sabe-se que a contribuição dos imigrantes foi
destacada, uma vez'que enquanto diminui a no Espírito Santo o número
de escravos aumentou a produção cafeeira (27) .

(25). - Livro de Decretos, rubricado por Maximiliano SaIloker, folha 2:


"Duzentos mil réis para cada lavrador que no verão fo:necesse para o consu-
mo público durante quatro meses consecutivos vinte litros de leite, diáriamente,
sendo necessário a pessoa que concorrer para este prêmio, ter dez vacas dando
leite" (Artigo I, a). Em 1913, o Município de Santa Isabel tinha 7.800 bovi-
nos, 20.500 suinos, 6.100 muares, ;3.200 equinos, 950 ovinos, num total de
38.550 cabeças, Wagemann (E.), op. cit., p. 56. O "Liv~o de Informações
Estatísticas", a 18-7-1919, registra uma população de 8355 habitantes. No que se
refere à pecuária os dados são as seguintes: 8159 suínos, 516 caprinos 3812
cavalos e 1458 muares.
(26). - Primeiro livro de Atas das Sessões do Governo Municipal. Ata
do dia 18 de setembro de 1895, folha 28.
(27). - O Espírito Santo tinha, em 1882, 20.717 esc~avos e, em 1885,
18.115. A produção do café foi em 1874,33.863 kg., e dez anos após,
18.446.703 kg. Taunay (Affonso de E.), História do Café no Bra.<il, Rio de
Janeiro, Depa tamento Nacional do Café, 1939, 1. IV, vol. 6, p. 309.
- 573-

Situação atual. Zona I ural.


- 574-

CONCLUSÃO.

Uma das metas do presente estudo era verificar se houve ou não


evolução na estrutura agrária. Esta estrutura permaneceu a mesma,
sustentada pelo trabalho familiar - quase inexistiram os sistemas de
meação e de escravismo - e praticada através de técnica rudimentar
que levava o terreno à exaustão. A área da propriedade média oscilou
em torno de 30 hectares. Dada a excelência da terra para o café, esta
cultura progrediu continuando ainda hoje o principal produto, aliás co-
mo em toda a terra capixaba. V árias causas contribuiram para a saida
de agricultores da antiga colônia em busca de zona pioneira, mas sem
dúvida, a principal, foi a própria estrutura agrária histórica que se
vinha mantendo.
Quanto à segunda questão - indagar se essa comunidade influen-
ciou a economia regional e nacional - diga-se que foi benéfica a parti-
cipação dos alemães na economia espírito-santense, porque lhe trouxe
força vivificadora, capaz de evitar o declínio em um momento em que
escasseava o braço escravo. As relações com os mercados próximos
realizavam-se através dos vendeiros, não contribuindo para a integração
do grupo na cultura nacional.
Em suma, o estudo tratou de uma comunidade imigratória direta-
mente para a região onde até hoje se conserva e que permanecem du-
rante muito t~mpo autônoma, original, cujos valores eram distintos dos
da sociedade que os recebia. Pode-se dizer que em Santa Isabel vingou
o tipo de "civilização camponesa" almejada pelos idealizadores.
* *

INTERVENÇÕES.

Do Prof. Juan José Rivas Pascua (U. F. S. ) .


Pergunta se a Prof. a descobriu a existência de alguma tentativa dos
colonos no sentido de plantar sementes ou árvores européias, ou outras
plantas, tais como a videira.
*
Do Prof. Jadro Campante Patrício (F AFI. Marília. SP) .
1.a). - A retificação dos lotes não está sugerindo mudança na
estrutura fundiária?
2. a ). - A presença de vendeiros não teria contribuido para que
a referida sociedade perdesse o seu carater "original" e "autônomo"?
*
- 575-

Da prof.a Kátia Mattoso (PUC.Salvador.Ba).


1.a). - Qual a fisionomia física?
2. a ). - O colono alemão vem acompanhado de sua família?
3. a). - Quando há operações de compra e venda de terras, tra-
ta-se de terras contíguas às já cuidadas pelo comprador, ou de terras
não limítrofes?

Da Prof. a Angelina Garcez (U. F . S . ) .
Qual o significado de "posse criminosa" que aparece na planta
n.O 2?
*
Do Prof. Fernando Achiame (Arquivo Público. ES).
Por que não foram realizadas pesquisas de fontes primárias no
Arquivo Público Estadual do Espírito Santo? Desde quando a profes-
sora vem SI! dedicando a esta pesquisa?
• •

RESPOSTAS DA PROFESSORA MARIA DA GLóRIA ALVES
PORTAL.

Ao Prof. J uan José Rivas.


Inicialmente a Professora agradece a atenção que o trabalho des-
pertou.
A seguir esclarece que se cultivavam: café, milho, feijão e
mandioca. Estas são até hoje as principais culturas. Atualmente culti-
va-se a uva e o trigo em Domingos Martins, mas o café continua a pre-
dominar.
Recentemente iniciou-se o aproveitamento dos brejos dos al-
tos vales da região. Estes banhados tinham sido desdenhados pelos co-
lonos por serem impróprios para a plantação cafeeira. Hoje, drenados
os brejos e, associando a irrigação à fumigação, à mecanização e às
lavras profundas, praticam-se aí culturas de legumes, enviados por ca-
minhões a Vitória, dando por hectare um lucro vinte vezes superior ao
das culturas tradicionais.
O Decreto n.O 130, de 29 de junho de 1914, que se insere entre ()S
documentos analisados, estabelecia prêmios para estímulo dos lavrado-
res. O artigo 1.0, alínea c, "fixa
- 576-

no valor de cinco mil réis, sendo preciso a pessoa que concorrer a esse
prêmio ter uma horta que possa dar essa produção" .

Ao Prof. laciro Campante Patrício.
1.a). - De maneira alguma. Retificar os limites dos lotes que
foram conferidos aos colonos, ou por eles comprados posteriormente,
jamais poderia indicar mudança na estrutura fundiária. Significa fir-
mar os limites. As medições às quais me refiro não eram sempre re-
tificações. Geralmente a medição era feita após vários anos de ocupa-
ção da terra. Um curso de água, sempre que possivel, era uma das di-
visas. Duas perpendIculares a essa corrente, estabelecidas com a ajuda
da bússola, constitu:am dois outros lim'tes, que eram marcados por uma
picada. A ligação dos dois pontos extremos formava a quarta linha de-
marcativa que, às vezes, não se assinalava por uma picada. O trabalho
de medição era difícil e oneroso. Precedia ao título definitivo de pro-
priedade.
A estrutura fundiária foi e é uma só nas colônias teuto-capixabas:
a pequena propriedade, trabalhada de forma quase exclusiva pela fa-
mília, 'iegundo os métodos da agricultura indígena (derrubadas e quei-
madas). Como pode ser verificado nos gráficos distribuidos, a proprie-
dade manteve-se sempre em torno de médias inferiores a 75 hectares.
2. a). - Conforme se lê na conclusão do trabalho, a sociedade
não perdeu, na época em estudo, nem o perdeu em grande parte ainda
hoje, o seu carater original. A língua, e os costumes de regiões alemãs,
são conservados. Por exemplo, realizam-se, ainda agora, interessantes
casamentos com cerimônias do tipo pomerânio.
Os vendeiros limitaram-se à função de intermediários. Aliás, eram
na maioria alemães, ou "de origem". Por outro lado, constatei, in loco,
que ainda hoje é dificil a interligação entre os diferentes distritos e, en-
tre estes e a sede municipal. As propriedades espalham-se pelos lindos
vales e serras. Os vendeiros e os mascates ambulantes não interferiram
num tipo de vida que, acima de tudo, era o desejado pelos colonos.
Ainda hoje, nas vendas isoladas que se encontram na zona rural do mu-
nicípio, vêm-se por vezes reunidos, descendentes de teutos.
As rendas dos proprietários, mesmo as dos mais ricos, acabaram
sendo inferiores às dos comerciantes, mesmo modestos. Mas os com~r­
ciantes investiam parte de suas disponibilidades em bens fundiários.
Não se manifesta o espírito de iniciativa dos negociantes do sul. Con-
sidero essa uma das causas do fechamento do mundo teuto-capixaba
sobre si mesmo.

577 -

À Prof.a Kátia Mattoso.


1. a). - A colônia foi instalada na zona fisiográfica serrana do
centro do Estado. Nas sucessivas cadeias de montanhas, compreenden-
do a parte do Estado para o sul do rio Doce, avultam morros graníticos,
cobertos de pequena camada de terra. Encontram-se tambem muitos
terrenos excelentes, profundos, cobertos por boa camada de detritos
vegetais. A terra de massapê, formada pela decomposição de rochas
ígneas foi aproveitada para os cafeeiros, base da fortuna pública e par-
ticular do Estado do Espírito Santo. As terras do Estado não oferecem,
porem, o conjunto de propriedades físicas da terra "roxa" e nem têm
como ela grande profundidade.
2. a). - O primeiro contingente era formado por 47 famílias de
emigrantes alemães da Prússia Renana e de zonas adjacentes.
3. a). - Pelo que observei ao analisar os documentos, os colonos
procuravam ter os seus filhos próximos e empregavam as economias na
aquisição de terrenos contíguos, quando era possivel. A primeira escri-
tura de doação de pai a filho data de 1880 (livro 1.0, folhas 42 - Car-
tório do Primeiro Ofício de Domingos Martins). Nicolau Stein e sua
mulher doam a seu filho Mathias Stein "uma colônia com benfeitorias
no valor de um conto e duzentos mil réis". Os mesmos pais fizeram
doações a mais dois filhos. Os documentos registram os limitantes das
propriedades doadas, estando entre eles os próprios doadores. Isto in-
dica que estes pais haviam adquirido inicialmente mais terras do que as
normalmente conferidas aos colonos, ou que as haviam adquirido poste-
riormente, de forma contígua. Entretanto essas terras próximas foram
tomando-se mais escassas. Foi um dos motivos de que os colonos, de-
sejando terras maiores, buscassem a zona do rio Doce .

À Prof. a Angelina Garcez.
Pode significar que o senhor que adquiriu o lote dele houvera ,>e
apossado ilegalmente e só posteriormente realizava a devida transação
de compra. Pode indicar que o primitivo ocupante não cumprisse os
compromissos que a "designação de lotes" exigia. Sabe-se que alguns
procuravam apossar-se de terras devolutas do governo. Mas não possuo
elementos para esclarecer o caso específico citado.
,.
Ao ProL Fernando Achiame.
O título do trabalho já responde à questão: "ANALISE DE DO-
CUMENTOS . .. ", e não, Análise DOS Documentos. Meu propósito
era estudar fontes que pudessem ser encontrados no Município.
A pesquisa foi inicÍilda há dois anos. Compulsei, principalmente,
o material arquivado no Cartório do Primeiro Ofício. Na Prefeitura há
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS MECANISMOS
DE FORMAÇÃO DA PROPRIEDADE NO EIXO
ILHEUS-ITABUNA - 1890-1930 (*).

ANGELINA NOBRE ROLIM GARCEZ


da Universidade Federal da Bahia.

KATIA M. DE QUEIRÓS MATTOSO


da Universidade Católica do Salvador.

INTRODUÇÃO.

Apesar de ser de colonização antiga, a região de Ilheus-Itabuna,


situada no sul do Estado da Bahia, atravessou o período colonial e os
três quartos do século XIX sendo uma área de escasso povoamento.
Seus núcleos populacionais enquistaram-se nas costas do litoral atlân-
tico, desenvolvendo basicamente três atividades: a pesca, o extrati-
vismo vegetal - principalmente madeiras de lei e piaçava - e a pro-
dução de gêneros de subsistência. A comercialização dos excedentes,
contribuindo para o abastecimento de Salvador e seu Recôncavo, in-
tegrava a Região, subsidiariamente, no esquema agro-industrial ex-
pllrtador, baseado na produção e comércio do açucar e tabaco, prin-
cipalment~ .

Essa primeira vocação da área vem a ser modificada por uma no-
V8 circunstância que torna a região um polo dinâmico de atração mi-
gratória: o desenvolvimento da cultura do cacau Esta última atividade
é que vai integrar diretamente a região de Ilheus/Itabuna no mercado
agro-exportador, conferindo-lhe uma posição de destaque no plano eco-
nômico do Estado.

(*). _ Comunicação apresentada na 211 Sessão


- 580-

Introduzida na segunda metade do século XVIII, a lavoura ca-


caueira progrediu lentamente. Apesar de apresentar uma tendência ni-
tidamente crescente a partir da terceira década do século XIX, até
1890 o produto não conseguiu ultrapassar os 20% do total das expor-
tações do Estado. Em torno desta data porem, a cultura do cacau to-
ma um rÍtmo acelerado, em decorrência de uma série de fatores de or-
dem externa e interna. O setor agro-mercantil fundado na produção
e comercialização do açucar e do fumo entra em crise. O primeiro
destes produtos sofre verdadeiro colapso, resistindo aos esforços dos
poderes públicos para dinamizar o setor. Este definhamento está li-
gado tanto à conjuntura geral do mercado externo consumidor quanto
a fatores conjunturais locais. Externamente destacam-se as circunstân-
cias de retração da demanda face à concorrência feita ao açucar brasi-
leiro pelo produto europeu (de melhor qualidade e mais baixo custo);
a desvalorização constante da moeda brasileira com relação às moedas
mais fortes dos paises integrantes do mercado consumidor; as cris~s
de longa duração enfrentadas pelo mundo oc:dental. Mais ainda po-
rem, que as circunstâncias externas, são as causas de ordem interna
que desferem o golpe mortal sobre a tradicional lavoura açucare ira .
Primeiramente, há que considerar todo um processo de inquieta-
ções sociais e decadência econômica secular, agravado a partir do mo-
mento da Independência. Segundo, tanto causa como consequência des-
ta situação, da-se o deslocamento de grande parte da mão-de-obra servil
para o novo espaço cafeeiro que se desenvolve no sul do Brasil, des-
locamento esse que atinge grandes proporções, principaimente, a par-
tir da extinção do tráfico em 1850. Finalmente, as crises severas de
natureza climática (as secas que marcam a cronologia baiana do sé-
culo XIX), os surtos epidêmicos de febre amarela e cholera morbús
(1850/1860) e a moléstia que ataca os canaviais na década de 70 aca-
bam por desorganizar o setor de produção. Então, apesar das tenta-
tivas de reorganização - através da instalação dos Engenhos Centrais
(1886) que ob·etivam racionalizar a produção, e as medidas de apôio
adotadas pelas instituições governamentais em favor dos produtores de
açucar - acelera-se o processo de decadência da economia açucareira
do Recôncavo. Assim, a proclamação da República encontra a eco-
nomia regional tradicional desarticulada, enquanto o cacau passa a
afirmar-se como alternativa agrícola de exportação, principalmente,
após o malogro para desenvolver na Bahia a cultura cafeeira - ma-
logro esse que se deveu a uma série de razões, algumas acreditamos,
ligadas a problemas de transporte.
A partir da última década do século, a produção de cacau co-
meça a avultar mais aceleradamente e em 1905, o produto ocupa o
primeiro lugar nas exportações do Estado, contribuindo em 28,7% do
- 581-

Esse crescimento da produção cacaueira, demonstrado pelo au-


mento do volume das exportações do produto, coincide, em amplas
linhas com a formação das grandes plantações, fato cujos mecanismos
não foram até agora estudados de maneira sistemática. Essa coinci-
dência entre o aumento da produção e a formação das grandes unida-
des produtivas legitima a aceitação do ano de 1890 como marco cro-
nológico inicial do nosso estudo, que adotou o ano de 1930 como li-
mite final. Esse período assinala o grande surto da cacauicultura e a
data final é aquela em que se acredita ter a região, no que diz res-
peito à ocupação das terras, assumido sua feição atual.
O presente estudo, que amb:ciona ser apenas uma introdução ao
estudo dos mecanismos de posse da terra em uma área ainda por des-
bravar e de fraco povoamento inicial, será dividido em três partes:
Primeira Parte - Definição Geo-econômica da Região;
Segunda Parte - Mecanismos de Formação da Propriedade Ca-
caueira e sua Expansão;
Terceira Parte - Reflexões à guisa de Conclusão.
• •

PRIMEIRA PARTE - DEFINIÇÃO GEO-ECOONOMICA DA
REGIÃO.

A região sul do Estado da Bahia, abrangendo o território das an-


tigas Capitanias de Porto Seguro e Ilheus, apresenta duas realidades
geo-econômicas distintas:
a). - a faixa litorânea, formada por terrenos de aluvião qua-
ternário, clima úmido, com largura aproximada de 100 quilômetros a
partir da costa, abrigou desde o início da colonização uma série de pe-
quenas vilas, cujos habitantes ocupavam-se da pesca, da exploração
dos recursos vegetais naturais característicos da paisagem, e de uma
lavoura de subsistência cuio excedente era comercializado entre eles e
com Salvador. Caracteriza assim, a área, um vínculo permanente com
o litoral e acentuado intercâmbio entre os núcleos e destes com a ca-
pital.
b). - a faixa dos tabuleiros, terreno terciário de arenito, clima
mais seco,
- 582-

Integrantes do primeiro eco-sistema, os atuais Municípios de


Ilheus e Itabuna reproduzem sua feição característica, que permanece
praticamente inalterada até as primeiras décadas do século XIX. Es-
cassamente povoada, e com grande parte do seu território por desbra-
var, a região só vai conhecer uma ocupação efetiva da terra com a im-
plantação da lavoura cacaueira.
Instal:lda definitivamente na área a partir da segunda década do
século passado, a cacauicultura começa a produzir regularmente para
exportação de 1834 em diante (1) funcionando como elemento modi-
ficador por excelência da realidade sócio-econômica regional. Até a
data acima mencionada conhecem-se apenas exporádicas exportações
de pequeno volume do produto. Daí em diante porem, o cacau passa
a concorrer regularmente na pauta de exportações do Estado com a
seguinte progressão:

Exp. Vol. (T)


1834 27
1840 103
1850 304
1860 579
1870 1.216
1880 1.669
1890 3.503

Com um desenvolvimento relativamente lento, a lavoura do ca-


cau va~ ganhando a região, inicialmente exercida nas margens dos rios
e, posteriormente, a partir de 1860, quando é introduzida uma varie-
dade nova, do tipo "Forasteiro" (mais rústica e mais resistente), as
plantações alcançam as encostas, ocupando terras até então considera-
das inaptas para a cacauicultura. Mesmo com esse desenvolvimento,
o plantio continua sendo realizado dentro do sistema policultor regio-
nal, a despeito da destinação do produto para exportação.
A vocação monocultora da região só vai aparecer na última dé-
cada do século, quando se inicia a formação das grandes unidades pro-

(1). - A introdução do cacau para plantio na Bahia é assinalada no


ano de 1746, quando foram trazidas do Pará as primeiras sementes e plantadas
às margens do Rio Pardo, atual Município de Canavieiras, então Comarca de
Ilheus. Durante um largo período porem, a lavou~a permaneceu como "culti-
vo de quintal", sem aproveitamento econômico, conhecendo até um retrocesso,
com erradicação das árvores. Depois do ano de 1822 um núcleo de colonos
alemães deu início ao cultivo regular do cacau, implantando roças nas mar-
- 583-

dutoras, ao molde de plantation, com progressiva atrofia do setor


agrário de subsistência.
A presente abordagem adotou as balizas cronológicas 1890-1930,
período esse considerado como o da formação da

"grande propriedade cacaueira". (2)

Nesse período tambem, a despeito de uma progressiva tendência


para o fortalecimento da cacauicultura como atividade dominante, a
região não deixou de conhecer outras atividades agrárias, nenhuma po-
rem de maior expressão ou modeladora de propriedade específica .

OUTRAS ATIVIDADES ECONOMICAS NA REGIÃO.
A Borracha - Como atividade econômica, a produção de borra-
cha na região conheceu duas modalidades:
- extrativa e de cultivo.
O surto extrativista da borracha ocorreu mais intensamente no pe-
ríodo compreend:do entre a última década do século passado e o pri-
meiro Quartel do atual, coincidindo, em linhas gerais, com a grande
expansão da cacauicultura. Nesta modalidade, extraia-se o latex das
plantas nativas denominadas Maniçoba e Mangabeira. De um modo
geral, os aglomerados nativos de maniçoba e mangabeira eram consi-
derados de domínio público e a extração do produto se fazia por gru-
pos de pessoas da região, de forma assistemática e eventual. Na
maioria dos casos, era uma atividade exercida pouco regularmente e
não empresada. As interferências de proprietário nesse tipo de ati-
vidade são raras.
Quanto à atividade de cultivo da borracha, é realizada mais efe-
tivamente com a espécie seringueira, cuja cultura, à exemplo do cacau
tambem transplantada para a região, foi tentada a partir da primeira
década do nosso século (1908/1909) e sofreu inúmeros reveses.
As primeiras propriedades seringalistas surgidas na região, a des-
peito dos bons resultados iniciais, acabaram por ser abandonadas e
desestimularam maiores cultivos, dada a queda dos preços do produto
(2). - A expressão "grande propriedade" é usada com muitas reser-
vas, dado que os critério: definidores não estão ainda suficientemente esclareci-
dos. Para sua utilização não pode ser levada em conta apenas a área, mas todo
um conjunto de outros fatores como: extensão da lavoura, volume p'oduzido,
- 584-

nos mercados consumidores e paralela diminuição da demanda do


nosso produto face à concorrência externa. Na década de 20, ante
uma reativação do mercado, o Governo do Estado tenta promover a
formação de propriedades dedicadas ao cultivo da seringueira, ofere-
cendo alguns incentivos para tal (distribuição de terras e sementes)
(mensagem 1927:270), mas a campanha não encontrou maior recepti-
vidade. Na terceira década do século, a borracha começa a desapare-
cer sistematicamente do cenário econômico do Estado, decaindo o vo-
lume das exportações do produto de 238 toneladas em 1920 para 35
toneladas em 1930.
A Pecuária - Atividade tambem presente na região, a pecuaria
não assumiu porem, maior expressão, sendo exercida de um modo ge-
ral, subsidiariamente, nas próprias propriedades cacaueiras, ocupando
terras impróprias para a cacauicultura, as chamadas "pastagens na-
turais", correspondendo a solos rasos ou esgotados. Nestas condições,
desenvolveu-se um criatório em pequena escala na maioria das pro-
priedades cacueiras chamadas de dedicação exclusiva. Em alguns ca-
sos, o criatório assume maiores dimensões, configurando então a cha-
mada "propriedade mista" cuja ocorrência é mais frequente na faixa
de transição (3) ou nas propriedades mais velhas, cujos solos enfra-
quecidos vem se transformando gradativamente em pastagens naturais.
Á Piaçava - Presença nativa na região, a piaçava vem sendo
explorada extrativamente de longa data, sem que jamais se cogitasse de
seu cultivo sistemático. Coexistindo fisicamente com o cacau, repete,
até certo ponto, a situação da propriedade mista do modelo cacau!
pecuária. No caso de piaçavaj cacau, a primeira funcionária, nas pro-
priedades de áreas maiores, como opção para a mão-de-obra ociosa
do cacau em períodos de entressafra ou crise do produto principal.
Nas terras devolutas, a exploração era de domínio público e atendia
ao sustento das camadas mais pobres da população ou ao dos traba-
lhadores flutuantes que acorrem à região na época da colheita e, finda
esta, ficam marginalizados do labor do cacau.
A despeito da existência de um mercado constante para o pro-
duto, e da sua persistente e até certo ponto, marcante presença nas ex-
portações do Estado, não se assinalam maiores preocupações ou assis-
tência oficial nos trabalhos. de exploração da piaçava.

(3). - A faixa ecologicamente p-opícia ao cacau abrange uma exten-


são aproximada de 150 quilômetros a partir do litoral, iniciando-se aí a faixa de
transição, onde os solos começam a ficar menos aptos para o cultivo do ca-
cau. Essa distribuição porem, não é rigorosamente regular e, em alguns lo-
585 -

Alem dessas atividades já mencionadas, contam-se tambem os


cultivos de gêneros de subsistência, com produção mais regular de
mandioca e menos de arroz, milho, café, etc. Essa atividade, tambem
e, mais que nenhuma,· subsidiária à cacaicultura, realiza-se concomi-
tantemente com esta e sofre maiores influências das suas oscilações.
De fato, a excessão do café que alcançou grande importância como
produto de exportação até a primeira década do século XX (foi o pri-
meiro produto na pauta de exportações do Estado nos anos entre
1892 a 1903) os demais produtos, geralmente para consumo local com
pequena margem para comércio no período em estudo, vão sofrer to-
dos os condicionamentos do produto nobre. A atividade do setor de
subsistência vai espelhar todo o comportamento econômico do cacau.
Nos anos de crise deste, reativa-se a lavoura de subsistência. Quando
o cacau está em alta, para sua lavoura voltam-se todas as atenções, e
atrofia-se o outro setor. Em termos de tendência a longo prazo, iden-
tifica-se porem uma progressiva atrofia do setor de subsistência.
* *

SEGUNDA PARTE - MECANISMOS DE FORMAÇÃO DA
PROPRIEDADE CACAUEIRA E SUA EXPANSÃO.
FORMAÇÃO DA PROPRIEDADE CACAUElRA.

A partir de 1890, quando a economia cacaueira já se confirmou


como opção econômica viavel, cujas potencialidades aumentam para-
lelamente com o crescimento do consumo mundial do produto (4), vai
se iniciar o processo de formação dos grandes estabelecimentos ca-
caueiros.
Convem notar que durante todo o período que antecede à im-
plantação da cacauicultura, as imensas áreas de terras da região, na
sua maioria, mantinham-se em estado devoluto. Mesmo as terras ses-
máricas não eram ocupadas

"porque a maioria das extensas fazendas pertenciam a Se-


nhores, muitos dos quais as não cultivam nem habitam"

segundo informa em seu Relatório datado de 1870, o Presidente da


Província, Barão de São Lourenço. Prossegue informando que

(4). - Em 1900 a produção mundial de cacau atingiu a 102.066 tone-


ladas c o consumo a 100.992.
- 586-

"nossas Comarcas do Sul offerecem à immigração recursos


immensos, todas cortadas de rios e cobertos de mattas virgens onde
a devastação não tem ainda chegado".

Dessa forma, a abundância de terras férteis oferecia amplas pos-


sibilidades para a formação ou expansão de propriedades, sem mui-
tas exigências legais. A primeira Lei de Terras do Brasil, datada de
1850 e posta em vigor a partir de 1854 que tinha por objetivo discipli-
nar e legitimar a posse das terras devolutas - Terras Nacionaes -
não obteve grande êxito. A inoperância da Lei, na Região, se dev0u
às dificuldades de medir e demarcar as grandes áreas de terras ainda
por desbravar. Mesmo com relação às terras já ocupadas, cujo re-
gistro a Lei passa a exigir para legitimar a posse (primária ou não),
não são cumpridas as determinações de fazer constar a área, limites,
etc. Um estudo recente, com base em 255 registros de terras da Fre-
guezia de São Jorge da Vila de Ilheus, demonstrou as falhas do re-
gistro como instrumento legal. Pelo menos nesse caso, os lançamen-
tos em livro são imprecisos ou omissos sobre os aspectos mais impor-
tantes, e deixam margem para os futuros litígios em torno da proprie-
dade da terra.
Atéa o advento da República, as terras devolutas eram da com-
petência do Governo Imperial. A abundância de terras sem utilização
e a dificuldade de fiscalização facilitava a ocupação arbitrária. Na
área em estudo, havia uma Comarca cujos Ouvidores tinham por en-
cargo fiscalizar o corte de madeiras e promover a fixação e/ou o de-
senvolvimento de lavouras como a do café e do próprio cacau, não cons-
tando de suas atribuições policiar a ocupação da terra. No relatório
mencionado, o então Presidente da Província da Bahia refere-se a empe-
nhos do Governo Imperial no sentido de demarcar e vender lotes nas
Comarcas do Sul, com o objetivo de atrair e fixar colonos. na região, vi-
sando principalmente o suprimento de braços para a lavoura, em vista
da situação cada vez mais instavel da mão de obra servil no País. In-
forma tambem o Presidente da Província, das dificuldades de realizar
aquele intento, bem como de fazer legalizar as posses daqueles que
ocupam terras nacionais em carater arbitrário, uma vez que
"os custos com medição, demarcação e o p~ocesso de legitima-
ção das posses resultariam três vezes mais caros que a própria
terra" .

Em seu Relatório Anual, datado de 1884, o Presidente da Pro-


víncia reafirma o interesse do Governo em
"povoar
- 587-

ou retalhando-as em lotes que serão vendidos a crédito por 3 a 5


annos ou a dinheiro",

propósito esse, que pelas mesmas dificuldades já mencionadas, não se


concretiza na ocasião.
Dessa maneira, a lavoura cacaueira, no seu processo de implanta-
ção (considerado até 1890) valeu-se largamente da modalidade de
ocupação primária da terra, prática aliás habitual a todas as ativida-
des agro-econômicas desenvolvidas na Região. A partir de 1890,
- 588-

o desatendimento ao aspecto legal da posse da terra vai gerar,


durante todo o período, em estudo, uma situação de conflito entre os
agentes àa produção, em dois níveis distintos:
1. - Oposição entre o pequeno lavrador - geralmente aquele
que por maior carência de recursos e esclarecimentos é o que menos se
preocupa em legitimar as posses das terras que ocupa - e o grande
produtor. Este, mediante o expediente de requerer ao Estado a posse
legal de grandes áreas, vai "engolir" o pequeno posseiro cujas roças
estejam situadas na área por ele requerida.
Ainda dentro desse aspecto de oposição entre o grande e o pe-
queno lavrador (ou posseiro), há o problema da invasão das grandes
propriedades semáricas, cujas terras incultas vão sendo tomadas pelas
roças de cacau (5).
2. - A segunda situação de conflito estabelece-se entre reque-
rentes de posses de grandes áreas na disputa por determinadas faixas
de terras contíguas a seus domínios, ou por questões de limites.
Dessa situação geral, e por força do cara ter ilegal de que se re-
vestia a posse de grande parte das propriedades de cacau na região,
resultou um clima extremamente propício ao surgimento de querelas
que, não raro, se resolveram pela violência. Permitiu tambem a prá-
tica do "Caxixe" (6) em larga escala e toda a sorte de arbitrariedades
e desonestidades no apossamento de terras, ou ainda a ação de aven-
tureiros que buscavam lucros fáceis com o comércio da terra .

EXPANSÃO DA PROPRIEDADE CACAUEIRA.

O presente trabalho coloca, como uma de suas questões básicas,


que a propriedade cacaueira no seu processo formativo, apresenta uma
tendência a evoluir da pequena para a grande ocupação da terra. À
medida em que o produto se firma economicamente, com o aumento
da solicitação pelos mercados consumidores determinando preços mais
altos, desenvolve-se paralelamente a tendência monocultora na Região,
fazendo expandir a área dos estabelecimentos produtores no encalço
da produção em grande escala.

(5). - Isso ocorre geralmente menos por má fé que pela impossibili-


dade de se distinguir entre terras devolutas e propriedades particulares.
(6). - Modalidade fraudulenta de apossamento e/ou comércio de pro-
priedades não registradas ou com documentação irregula~, mediante O
- 589-

Ao nivel de pequeno lavrador, o mecanismo mesmo da expansão


na propriedade, obedece a algumas formas de comportamento mais ou
menos típicos.
Em alguns casos, o próprio lavrador das "buraras" (7) expande
a 5 suas roças, incorporando áreas vizinhas à sua plantação inicial, aca-
bando por formar uma propriedade de grandes dimensões. Expande
ao mesmo tempo, o sistema de trabalho, que inicialmente era do tipo
familiar, passando a utilizar mão-de-obra alugada e contratada, con-
forme as exigências de uma propriedade de maiores dimensões. Nesse
processo de expans.ão tanto pode ocorrer a incorporação de áreas ain-
da incultas, onde são plantados novos cacauais, como tambem, a com-
pra de roças já feitas, no sistema de pagar por pé de cacau plantado,
cujo preço varia de acordo com a idade do cacaueiro. A terra não en-
tra como valor nessa transação, uma vez que geralmente inexiste sua
posse legal. A posse que se estabelece, mesmo nesses casos de compra
de cacaueiros, continua sendo do tipo primário, uma vez que se trata
da transferência de terras não tituladas. Dessa maneira, na expansão
da propriedade, o lavrador de cacau, de um modo geral, conserva a
modalidade de ocupação primária da terra e na maioria dos casos, a
legalização da posse jamais chega a ser realizada. Frequentemente a
posse chega a ser requerida sem que haja maiores empenhos por parte
dos posseiros na conclusão dos processos de legalização. Um exemplo
dessa displicência, é a quantidade de processos de requisição de posse,
que permanecem na Delegacia de terras de Ilheus, alguns datados até
dos finais do século passado, sem serem conclui dos por falta de com-
parecimento dos requerentes à referida repartição para cumprirem as
exigências legais que se fazem necessárias para sua complementação.
Um outro tipo de propriedade cacaueira de grandes dimensões é
a que se instala nas grandes áreas de terras cuja posse é requerida ao
Estado, prática que se tomou mais ou menos frequente a partir da
primeira década do nosso século. Esses requerimentos eram feitos, ge-
ralmente, por pessoas mais esclarecidas e influentes na região e que
dispunham de algum capital para arcar com as despesas de medição,
demarcação e tramitação do processo de legitimação da posse. Alem
disso, as posses eram concedidas mediante o pagamento de um deter-
minado preço por hectare, que nos anos de 1908-1910, variava entre
2$000 e 5$000 (8), de acordo com a localização das terras, não só em
diferentes municípios, como em função da qualidade do solo. Assim,

(7). - Denominação regional, atualmente de carater pejorativo, da pe-


quena roça de cacau.
(8). - Conforme "Edital nQ 2 da Diretoria de Terras e Minas -
Vendas de Terras", publicado no Jornal A Bahia, de 22 de janeiro de 1908.
- 590-

temos no ano de 1909, 22 posses concedidas no município de Ilheus


"com preço de 3$000 a 5$000" (9).
Alem dessas despesas com a aquisição da terra, o proprietário da
grande área requerida legalmente, deveria arcar ainda com o onus da
formação dos cacauais, embora o sistema de trabalho adotado para o
desbravamento e as primeiras plantações, não requeresse um grande
emprego de capital.
A modalidade mais comum na implantação de grandes cacauais,
nesse período é aquela que utiliza o trabalho da mão-de-obra contra-
tada.
o "contratista", figura muito presente na fase de desbravamento,
dedica-se, mediante contrato (10) por tempo determinado, a plantar
certo

"número de cacaueiros, cuidar deles até a primeira colheita,


geralmente, cinco a seis anos".

Segundo informa Otto Seligsohn.


Findo o prazo de formação do cacaual, o "contratista", receberia
por cada cacaueiro uma determinada soma" (Ibidem). A manutenção
do contratista e sua família, era assegurada pelo fruto das roças de
subsistência que eram cultivadas paralelamente ao cacau, e por oca-
sionais atividades extrativas, principalmente a piaçava. Como se vê,
o dispêndio de capital por parte do proprietário só se fazia quando a
roça já estava em princípio de produção, na maioria dos casos, auto-
financiando-se. Até certo ponto, o contratista funcionava dentro dos
moldes tradicionais de maior valorização do trabalho do que da terra.
Quando se inicia a "corrida do cacau", a abundância de terras devolu-
tas permite aos recem-chegados à região, a ocupação de áreas em locais
de fácil acesso e solos aptos.
Esta fase inicial (fins do século XIX e primeiros anos do XX),
foi marcada por intenso movimento migratório, multiplicando-se as
pequenas roças individuais, resultantes da ocupação indiscriminada das
terras por parte dos lavradores vindos para a região, oriundos, não só
de outras regiões do Estado, como de outros Estados, principalmente
Sergipe.

(9). - Idem ne;> 4 de 13 de fevereiro de 1909.


(lO). - No caso, a expressão não tem sentido de fo-malidade
- 591-

Com o crescimento da lavoura e a maior ocorrência de requisi-


ções de posses de grandes áreas de terras, vai ser mais constante a mo-
dalidade de trabalho sob contrato, já que os imigrantes não encontram
as mesmas facilidades para ocuparem terras livres e bem localizadas.
Da última década do século XIX até 1930, mais ou menos., atua-
ção do contratista, vai ser uma constante na região e seu trabalho vai
ser a base da formação das grandes plantações.
* *

TERCEIRA PARTE - REFLEXÕES À GUISA DE
CONCLUSÕES.

Acredita-se que a propriedade cacaueira no período que assinala o


seu processo de formação, inclinou-se naturalmente, em termos de opção
tipológica, para uma conformação que mais se adequasse ao melhor
exercício da sua lavoura. Evidentemente era buscada a forma que
oferecesse a maior margem de lucro para o proprietário. E a maior
margem de lucro derivava diretamente do maior volume produzido.
Considerando-se que durante o período em estudo esse aumento ja-
mais foi tentado através do fomento à produtividade das roças e que
paralelamente, os solos iam se desgastando e oferecendo cada vez me-
nor rendimento, a solução óbvia era a expansão da área de cultivo:
para produzir mais, planta-se mais. Em função desses critérios comu-
mente aceitos, a propriedade de grandes dimensões aparecia como a
mais indicada, permitindo a multiplicação dos cacauais e garantindo
assim safras mais volumosas. As propriedades de grandes áreas per-
mitiam ainda que fossem cultivadas com cacau apenas as faixas de ter-
ra de solos mais aptos, desprezando-se aquelas que exigissem algum
tipo de corretivo para produzir satisfatoriamente. Isto é, explorava-se
a terra assistematicamente, desperdiçando-se solos que poderiam ser
recuperados (no caso de solos "cansados")
- 592-

suas safras, lucros estes que só podiam ser aumentados com um maior
volume de produção e portanto, expansão do cultivo.
Disso tudo decorre, acredita-se, a tendência que pode ser verifi-
cada, da propriedade cacaueira evoluir da pequena para grande ocu-
pação da terra. À medida em que se intensificou a vocação cacaueira
da Região, a pequena roça ou "burara", em termos de tendência geral,
ou se ampliava, ou era incorporada a áreas maiores de cultivo. Um
dos fenômenos o mais corriqueiro que pode ser observado na região
em estudo, é a ocorrência do "Conjunto" - propriedade geralmente
de grandes dimensões, ou várias propriedades pertencendo ao mesmo
dono - formado pelo processo de agregação sucessiva de áreas à uma
propriedade nuclear.
Uma das questões que se pretende lançar para discussão, no pre-
sente trabalho é uma comparação entre as tendências apresentadas pe-
las propriedades cacaueira e açucareira, em termos de formação do
estabelecimento produtor. Acredita-se que essas tendências são opos-
tas: enquanto a propriedade cacaueira evolui da pequena para a gran-
de ocupação da terra, isto é, da ocupação de pequenas áreas para a
ocupação de grandes áreas, a propriedade açucareira, ao contrário, so-
fre um lento mais persistente processo de desgaste e desintegração das
formas macrod:mensionais iniciais.
Identificado assim o carater antieconômico da propriedade de
pequenas dimensões, entende-se o fenômeno - constatado - , do seu
progressivo desaparecimento como unidade autônoma de produção.
De fato, a despeito de não se contar ainda com um estudo sobre o as-
sunto para o período em questão, sabe-se que vem se reduzindo siste-
maticamente o número de proprietários na Região. Para um período
mais recente Otto Seligsohn informa, com base em Recenseamento
realizado pelo Instituto de Cacau da Bahia e CEPLAC, que

"o número de cacauicultores que somava 28 mil em 1944, pas-


sa a 18 mil, vinte e um anos depois".

o desgaste se dá, segundo a mesma fonte, predominantemente ao


nivel do pequeno proprietário. Esse fenômeno pode ser ainda melhor
compreendido se se considerar a própria cond;ção do pequeno produ-
tor de cacau. Não se prende exclusivamente ao fato de produzir em
pequena escala mas a toda uma problemática que se inicia aí: sua
margem de lucro é pequena e sua disponibilidade financeira é geral-
mente muito limitada, vivendo ele do imediatismo da produção (fre-
quentemente consumindo a próxima safra, através dos adiantamentos
obtidos do comprador ou da "venda do cacau na flor" isto é,
- 593-

antecipada da safra com base em estimativas geralmente mais favorá-


veis ao comprador). Via de regra pouco esclarecido e desconfiado,
não reCOi~re a créditos oficiais. Não tem condições para ampliar sua
área de cuitivo ou mesmo melhorar suas roças (renovação de cacauais
em tempo habil, recuperação de solos esgotados, etc.), obtendo delas
assim cada vez menor produtividade. Com isso, vai alimentando as
condições que fatalmente conduzirão à absorção de suas terras por
proprietários mais fortes da vizinhança, ou ao desaparecimento de suas
roças por perecibilidade dos cacauais ou depauperamento dos solos.


INTERVENÇOES.
Do ProL Walter F .Piazza (Universidade Federal de Santa Catarina).
Pergunta:
"As autoras poderiam informar o tamanho das semarias da re-
gião de Itabuna-Ilheus, para fixar o termo médio da grande proprie-
dade cacaueira?

Do Prof. Ruy C. Wachowicz (Universidade Federal do Paraná) .
Indaga:
"Como estudioso da imigração no sul do Brasil, tenho encontrado
referências a grupos europeus fixados na região cacaueira. Pergunto:
esses imigrantes eram proprietários ou formavam a classe proletária
da região?"
• •

RESPOSTAS DAS PROFESSORAS ANGELINA NOBRE ROLIM
GARCEZ e KÁTIA M. QUEIRÓS MATTOSO.
Ao Prof. Walter F. Piazza .
Resposta:
"Devo chamar a atenção inicialmente para o fato de que o con-
ceito "grande propriedade cacaueira"
594 -

Quanto ao tamanho médio das sesmarias na região, as seis últi-


mas conced~das no município de Ilhéus, nas duas primeiras. décadas
do século XIX, mediam uma légua de frente por três de fundo cada
uma" .

Ao Prof. Ruy C. Wachowicz.
"Realmente, a presença de grupos europeus na região sul do Esta-
do da Bahia é marcante durante o século XIX, quando se deram várias
tentativas de colonização com elementos irlandeses, polacos., suiços e
principalmente alemães. De um modo geral, esses grupos vinham
sub'1encionados pelo governo ou iniciativa particular, com o objetivo
de colonizar a região e radicar aí uma mão-de-obra mais qualificada.
Essas tentativas de colonização - todas elas - fracassaram a curto
ou médio prazo e os grupos se dispersaram, seguindo alguns dos seus
integrantes para o sul do País e outros permanecendo na região. Des-
ses últimos, vários serão identificados mais tarde, como proprietá-
rios de "terras Nacionaes", ocupadas primariamente e posteriormente
legitimadas as posses por us.ucapião ou presença de cultivo perma-
nente. Mu:tos acabaram por se tornar proprietários de grandes áreas
de terra.
Alem desses casos, tem-se notícia de estrangeiros grandes pro-
prietários que obtiveram sesmarias na região a exemplo de Weyll
que promoveu a vinda de cerca de 200 alemães para colonizar suas
terras"
PROPRIEDADE E USO DA TERRA NA PERIFE-
RIA NORTE DO RECÔNCAVO AÇUCAREIRO.
Aspectos de história recente (*).

MARIA DE AZEVEDO BRANDÃO


do Departamento de Sociologia da Univecsidade Fe-
deral da Bahia.

INTRODUÇÃO.

Apesar da formação de um incipiente parque industrial na Ci-


dade do Salvador, do crescimento demográfico e da integração recí-
proca de suas diferentes áreas, o Recôncavo da Bahia preservou até a
década de sessenta, em torno da cidade e dos restritos pontos direta-
mente afetados pelas operações da Petrobrás: um setor primário pra-
ticamente intocado em suas características estruturais em relação .10
quadro deixado, após os anos vinte, pela última e breve fase de re-
cuperação da produção açucareira na região.
Contudo, a partir do fim da década de sessenta, todo o Recôn-
cavo, e principalmente sua área norte vem mudando rapidamente, em
face das perspectivas de instalação do Complexo Petroquímico do
Nordeste (COPENE) e da ação polarizadora de Salvador.
O que se tentará nesta comunicação é descrever alguns aspectos
da estrutura de distribuição e uso da terra num município da área
norte do Recôncavo, exatamente antes do início das referidas modifi-
cações, isto é, no período anterior e em torno de 1960.
Trata-se do município de Camaçarí, local de implantação do Com-
plexo Petroquímico e área adjacente ao Centro Industrial de Aratú e
à Cidade do Salvador.

(*). - Comunicação apresentada na 2\1


- 596-

o caso deste município antes de sua fase atual é tomado como


ilustração de uma situação de periferia funcional e física em relação
ao núcleo açucareiro do Recôncavo, e deve deste modo contribuir pa-
ra especificar aspectos da região na fase final de sua história como
cenário de uma produção monocultora de tipo tradicional (* *) .
*
o COMPLEXO REGIONAL DO RECONCAVO.

A região que se veio a estruturar como Recôncavo da Baia de


Todos os Santos, jamais fora, ecológica ou economicamente, um es-
paço uniforme, mas antes um complexo de sub-áreas especializadas.
E necessário compreender as relações genéticas e estruturais dessas
áreas em face do âmago açucareiro para que se possa esclarecer a pró-
pria natureza da organização da produção monocultora que por mais
de três séculos dominou a região.
Grosso modo, o Recôncavo tradicional, nas condições em que o
encontrou a Petrobrás, à altura de 1950, compreende quatro sub-
áreas: a área do massapê, dominada pela produção do açucar; o alto
Recôncavo, a leste, dedicado basicamente à produção de fumo, mas
tambem de alimentos, demograficamente denso e marcado por um
processo de intensa minifundização; o baixo Recôncavo, ao sul, com
maior frequência de médias e pequenas propriedades, e que se ocu-
param sempre mais preponderantemente com a produção alimentar,
assinalado pela presença de numerosas caieiras (fornos de preparação
de cal) e olarias, exportadoras típicas de materiais de construção para
Salvador e cidades próximas até a década de cinquenta; o Recôncavo
Norte - retraido numa economia mista de agricultaura alimentar, co-
co da Bahia, gado - demograficamente ralo e marcadamente isolado
das demais áreas da região e da própria Capital, apesar de sua vizi-
nhança com esta.
A influência da Petrobrás por sua vez revelou-se tambem desi-
gual na região (1). A exploração do petróleo caminhou da área típica
do massapê para o norte, afetando profundamente o âmago da antiga
área da cana e, mais recentemente, o Recôncavo Norte, com a implan-
tação do Conjunto Petroquímico e a abertura de poços ao norte desta
área, deixando, praticamente, intocados o baixo e o alto recôncavos.

(**). - Este trabalho baseia-se em dados de crmpo colhidos em 1956


e em 1963 e em dados censitários de 1940. 1950 e 1960.
(1). - Sobre a influência da Petrobrás, v. T. de Azevêdo (1960); Ritz
(1960); Talma Sampaio
- 597-

TIpicamente, o Recôncavo dedica-se, desde o século XVI, à


produção açucareira, cuja história se constitui aí num suceder de fa-
ses de prosperidade e depressão, que se alternam já desde muito cedú,
por força de determinações de origem basicamente externa, mas que
se mesclam progressivamente com fatores destas gerados internamen-
te (2).
Entretanto, a cana-de-açucar jamais subsistiu só ai, mas inte-
grada num complexo de atividades espacialmente organizadas dentro
da região. De um modo simplificado se poderia dizer que, nos mo-
mentos de prosperidade, encontrava-se no âmago do Recôncavo a pro-
dução da cana-de-açucar e, nos diferentes setores de sua periferia geo-
gráfica, desenvolviam-se atividades complementares de produção ali-
mentar, pecuária, extração de lenha, cultivo do fumo e produção ue
materiais de construção.

Com o tempo, sedimentou-se essa espécie de divisão de trabalho


entre diferentes áreas, formando-se um complexo regional interna-
mente diferenciado e razoavelmente autônomo, em que os segmentos
periféricos desempenhavam funções essenciais à vitalidade ou mesmo
à sustentação das atividades nucleares da economia regional.
A área norte do Recôncavo, com poucos trechos de solo propí-
cio à cultura da cana e de um modo geral menos favoravel à agricul-
tura qu~ os demais, tendeu a tornar-se um desses segmentos especia-
lizados, inicialmente dedicada à produção pecuária e posteriormente
mais voltada à produção de lenha. Contudo, situada nos limites da
área de massapê e contando com algumas manchas isoladas deste tipo
de terreno e de solos de tipo barreiras, o Recôncavo Norte foi oca-
sionalmente penetrado pela produção da cana.

Em virtude dessas duas formas de participação no complexo re-


gional do Recôncavo, essa área desenvolveu-se em duas linhas. Uma
derivada da dinâmica de uma zona especializada em certo tipo de pro-
dução comlllementar à produção do açucar, e outra decorrente da do-
minância intermitente da própria produção monocultora e da condição
de marginalidade face a esta mesma atividade e ao seu centro de do-
minância, nas prolongadas fases de depressão que afetaram a econo-
mia do açucar na região.

(2). - Sobre a evolução econômica da reglao v. Pinho (1944); T.


de Azevêdo (1955); Mattoso (1968, 1970, 1971, 1972 e 1974); Azevêdo e
Lins (1969); Mattoso e Athaide (1971); Tavares (1964 e aulas no Instituto
de C. Sociais, UFBA,
- 598-

Esta alternância tornou-se notória a partir do fim do século


XVIII, quando em meio a uma fase de prosperidade da economia do
açucar, os melhores pastos da área eram dados como ocupados com
a cultura da cana (3).
Esse período de prosperidade prolonga-se até o primeiro quartel
do século XIX, cedendo à depressão que, nas décadas de 20 a 60,
atinge a economia açucareira no Recôncavo. Segue-se depois nova
fase de recuperação, do período da Guerra da Secessão à Abolição,
daí uma nova fase de retração, até a década de vinte, quando, pela
última vez, os canaviais se expandem para o norte.
No curso do processo sumariamente referido acima ocorrem
dois tinos de fenômenos: uns de carater cíclico, exemplificados na al-
ternância de atividades produtivas e de certo modo na aglutinação e
fragmentação da terra em resposta às exigências da produção comer-
cial; e outros, de carater cumulativo, como é o caso do adensamento
demográfico, da degradação do ambiente natural e da cristalização da
estrutura social.
Como o saldo dos processos cumulativos tendeu a reduzir pro-
gressivamente a margem das opções econômicas abertas a cada dife-
rente segmento territorial, desenvolveram-se com o tempo sub-espe-
cializações internas à área, resultando numa organização do espaço
que reflete a dinâmica entre oportunidades econômicas e estrutura so-
cial.
Em Camaçarí, devido à existência de manchas de solo favorá-
veis à cultura da cana, esta teve aí urna presença intermitente e espa-
cialmente descontínua. Quando e onde a cana penetrou, a terra ten-
deu a concentrar-se e, retraida a onda de prosperidade da economia
açucareira, a área ajustava-se à depressão valendo-se da extração da
lenha e
- 599-

ainda na década de sessenta liquidava as últimas reservas de vegeta-


ção mais robusta restantes.
Nas áreas menos férteis, à medida que se foi esgotando a cober-
tura florestal, desenvolveu-se uma incipiente atividade extrativa, apro-
veitando-se dos depósitos locais de argilas finas. Em pontos isolados,
as terras passaram ao controle direto de numerosos rendeiros e de
resto permaneceram estagnadas nas mãos displicentes de proprietá-
rios descapitalizados ou ausentes.
Nas zonas de solo mais fertil, onde mais facilmente se reconstitui
a vegetação em mata secundária de pequeno porte ainda aproveitavel
para o carvão, e onde o solo tem podido suportar continuada explo-
ração agrícola, as grandes propriedades mantiveram-se de um modo
geral íntegras recorrendo ao arrendamento em dinheiro e em espécie
e realizando uma produção alimentar itinerante, associada à extração
de lenha e à feitura de carvão vegetal (4). Por outro lado, nos pe-
quenos sírios do interior e da costa, impróprios a outras das culturas
praticadas na região, passou-se, em escala crescente, a cultivar o co-
queiro (5).
Presente em toda a sua história e, de certo modo, quase univer-
sal na área, a criação de gado da terra tambem tornou-se uma das
formas de ajustamento à retração econômica, desempenhando a fun-
ção de manter na posse da terra antigos proprietários descapitalizados.
Não só nos grandes estabelecimentos se recorreu à criação. Pequenos
e médios proprietários a associaram à cultura de coco ou a uma redu-
zida fruticultura, em áreas que variam de cerca de 20 a 200 ha, par-
ticularmente concentradas a nordeste do município (6).

(4). - Cf. Viana (1893); B. Bar~os (1923). Vale notar aqui que, de
acordo com o censo de 1872, ainda que fazenao reservas à sua exatidão, é
forçoso admitir que a proporção de 7.757 pessoas livres do sexo masculino
para 3.551 escravos do mesmo sexo encontrados nesta área revela a presen-
ça de explorações agrícolas de grande porte, nos moldes do resto do Recôncavo.
Frente às c:ises subsequentes, antigos proprietários foram abandonando a
região, que reagiu à crise pela expansão da agricultura de subsistência. Não é de
estranhar que os últimos proprietários residentes que restaram, empobreci-
dos e incapazes de organizar a mão-de-obra local, passassem a arrendar suas
terras a essa camada de pequenos lavradores. Aos antigos pequenos lavra-
dores veio juntar-se parte do contigente escravo liberado e a região conseguiu
certo equilíbrio ecológico graças a um regime quase de subsistência mínima.
Sem a existência de um emp. egador que lhe oferecesse opo'tunidade de tra-
balho, a população que permmeceu passou a viver dentro de um círcu·o
- 600-

Tem-se, assim, pelo menos a partir do fim do século passado,


quatro diferentes linhas de desenvolvimento de modos de utilização
da terra na área: primeiro, a agricultura de subsistência, que se cons-
titui num instrumento da absorção dos excedentes de mão-de-obra, de-
rivados da retração da economia de mercado e do próprio crescimen-
to vegetativo da população; segundo, nos pequenos sítios próximos
à costa, intensificou-se o plantio do coqueiro, já antigo na região (7);
em terceiro lugar, manteve-se uma atividade pecuária residual, cujo
volume oscila em resposta à dinâmica dos grandes estabelecimentos,
alguns possivelmente antes dedicados à cana, e de pequenas e médias
propriedades dedicadas à produção de coco; em quarto lugar, de-
senvolveu-se certa atividade extrativa, em áreas impróprias à agricul-
tura; na costa, a pesca; no interior, a extração de argila; e, por toda
parte, o carvão que, em resposta ao mercado da capital, tornou-se,
nesses anos de retração econômica, uma atividade praticamente uni-
versal na área.

A AREA ESTUDADA: PAISAGEM E POPULAÇÃO.

O Município de Camaçarí, com 926 km2 e 21 . 849 habitantes em


1960, situa-se a partir de cerca de 40 km ao norte da Cidade do Sal-
vador, numa faixa de cerca de 20 km em média de largura, da orla
marítima ao interior. Esta área corresponde ao extremo nordeste do
Recôncavo e tem por limites ao sul e a leste o rio Joanes, ao norte
um tributário do Pojuca - o Itapecirica - e a leste o mar, confi-
nando com os municípios de Salvador (8), Simões Filho, Candeias,
São Sebastião do Passé e Mata de São João.
Tais limites físicos impuseram certa unidade sócio-econômica à
área, pois que dificultaram até a década de sessenta maior contato da
população local com áreas vizinhas.
Essa unidade, por outro lado, não subentende uma homogenei-
dade interna, contrariada em primeiro lugar pelas próprias caracte-
rísticas fisiográficas da área, responsáveis por três tipos de paisagens
distintas: uma faixa litorânea, de cerca de 3 a 6 km de largura na

(7). - Cf. Bondar (1939).


(8). - Pelo
- 601-

costa; ronas de colinas, de variado teor húmico, às vezes bastante aci-


dentadas, correspondendo mais predominantemente à porção sul do
município, entre a faixa litorânea e a margem esquerda do Joanes -
área de Abrantes - e à porção nordeste dessa faixa à margem es-
querda do Pojuca - área de Monte Gordo - , e os "tabuleiros" e
planícies adjacentes, ocupando grande área do município, justamente
em torno da cidade de Camaçarí e da Vila de Dias d'Ávila.
A faixa litorânea é assinalada por uma orla de dunas por trás das
quais há extensas áreas permanente ou temporariamente alagadas du-
rante os períodos de chuva. Em trechos isolados, encontram-se man-
chas de terreno com certa ferti1:dade que permitem a prática de pe-
quenas roças. De resto, esta faixa é ocupada por coqueirais geral-
mel"lte antigos.
Mais para o interior, quando se iniciam as primeiras elevações, é
que surgem os solos argilosos das colinas que marcam predominante-
mente as paisagens sul e nordeste do município. Estes solos não são
uniformes. Em virtude do alto teor de ferro que caracteriza os solos
da série "barreiras" a que se filiam, os topos das colinas submetem-se
facilmente ao processo de laterização, resultando ein áreas quase to-
talmente impróprias à agricultura. Por outro lado, determinados va-
Ies e as encostas adjacentes apresentam solos bastante férteis, sobre-
tudo na área sul.
Finalmente, os "tabuleiros" são praticamente impróprios à agri-
cultura e as planícies de sedimentação, caracteristicamente pobres, não
se prestam senão a plantas pouco exigentes. O coqueiro, à custa de
maior produtividade, tem sido a única cultura aí praticada. :e. nestas
planícies e "tabuleiros" que se encontram frequentes depósitos de ar-
gilas finas e tabatingas ou caolins, os quais vêm sendo explorados in-
dustrialmente.
Em decorrência de tais características de solo e relevo, o mu-
nicípio apresenta uma área de produção agrícola mais intensa a su-
doeste e outra a nordeste, esta contudo mais propriamente agropecuá-
ria, e a extensa área de "tabuleiros" e planícies centrais praticamente
desertas.
Devido às dificuldades de comunicação pela costa durante os pe-
ríodos de chuva, entre as áreas sul e nordeste, de outra parte tambem
separadas no interior pelos "tabuleiros".
- 602-

Abrantes - desenvolveu-se uma produção alimentar em grande parte


destinada ao consumo local e realizada em "sítios" ou em regime de
parceria ou arrendamento de pequenas parcelas de terra.
Nesta área, o desenvolvimento da estrutura fundiária foi bastante
complexo, partindo da criação da gleba comunal da missão jesuítica
do Espírito Santo, cuja sede foi transformada, no meado do século
XVIII, em Vila de Abrantes, à ocupação da periferia, por fazendas de
jesuitas e de "fregueses portugueses" que finalmente entraram pelo
território da missão. (9)
Estabeleceu-se daí em diante uma espécie de moto contínuo de
fragmentações e reaglutinações, que resultou numa variedade de ta-
manhos de propriedades e na minifundização de certas áreas onde a
população se adensa progressivamente, vindo em vários casos a nu-
clear-se em pequenos povoados. (10)
Enquanto na área do atual distrito de Abrantes formara-se desde
séculos atrás, uma organização do espaço relativamente complexa,
graças ao pa'pel catalítico desempenhado pela presença da missão je-
suítica, a zona norte do município permaneceu indiferenciada, sob re-
gime de propriedade monopolística da terra, voltada para a pecuária
extensiva e ligada, até o século passado, à Casa da Torre.
Com o desmembramento dessas terras pelo fim do séc. XIX,
passando a pequenos e médios proprietários, foram estabelecidos na
área canaviais e pequenos engenhos - "engenhos de pau". (11) Em
dois pontos, por sucessivas fragmentação, formaram-se as atuais nu-
cleações de São Bento e Bom Jesus.
As poucas engenhocas que chegaram a este século desapareceram
pelos anos trinta. Daí para cá verificaram-se duas tendências que se
mantiveram até mais ou menos 1950. A primeira resultou na cristali-
zação da estrutura fundiária, segundo a qual antigos proprietários ou
herdeiros seus mantêm a posse da terra, porém sob muito baixa pro-
dutividade. Nestas condições, o principal produto comercial é o côco,
cultivado extensivamente e, ao lado deste, subsidiariamente, uma pe-
quena pecuária e a produção de subsistência. Predominavam aí em

(9). - Cf. Bittencourt e Sá, 1758: As sucessivas concessões de te:ras


na área de Camaçari desde o primeiro século, ~Ó poderiam ter levado a uma
ocupação relativamente densa desta área por portugueses. Cf. Freire (1906,
p. 15-27); Acciole (1937); Tavares (1964).
(10). - Vários dos nomes de localidades nesta área testemunham seu
aparecimento em locais de antigas fazendas.
(11). - Cf. Registro de Te,ras,
- 603-

sessenta a parceria e, s.ecundariamente, o "dia dado" (*) de trabalho e


o arrendamento da terra. A orientação para o mercado era muito re-
duzida e praticamente ausente qualquer esforço de capitalização.

A segunda tendência resultou, como em Abrantes, na minifundi-


zação de certas áreas, multiplicando os chamados "sítios" - peque-
nos lotes de cerca de 3 a 8 hectares ou ainda menores, às vezes de me-
nos de meio hectare. A pequena extensão dessas áreas inibe a pro-
dução de subsistência que exige, com seu carater itinerante, uma dis-
ponibilidade de terra pelo menos três vezes superior à área cultivada
por ano. Em consequência disto, os proprietários de sítios dedicam-
se à cultura do coqueiro e recorrem à parceria e ao arrendamento de
terras de terceiros quando as suas são extremamente pequenas ou im-
próprias a qualquer cultivo.

A porção oeste do município - compreendendo os atuais dis-


tritos de Camaçarí e de Dias d'Ávila - das margens do Joanes aos
extensos "tabuleiros" e planícies centrais e atingindo ao norte as mar-
gens do Jacuipe, permanece ainda hoje sob o regime da grande pro-
priedade, ainda que a terra se tenha progressivamente fragmentado.

A vinculação mais intensa desta parte do município com a área


da cana, como tambem as facilidades relativas de comunicação com
a Capital - a que a mesma se liga por via férrea desde 1860 - COIl-
correrarr. para a permanência da área sob controle de um número re-
lativamente reduzido de proprietários, antigos donos ou novos com-
pradores, incapazes de explorar suas terras produtivamente ou sim-
plesmente interessados na especulação imobiliária. Em qualquer caso,
desta situação resultou um movimento de dispersão ou ao menos de
não fixaçã0 da população, ao tempo em que se intensificou a explo-
ração predatória e contínua da cobertura florestal.

Na parte mais central do município, a partir da estrada de ferro


para a cvsta, as áreas de "tabuleiros" e as planícies sedimentares per-
maneceram totalmente abandonadas e às vezes como terras devolu-
tas, até praticamente o meado do decênio de cinquenta. Havia até
década de sessenta esporádicas explorações de tabatinga, e, nos limites
dos "tabuleiros."
- 604-

A faixa litorânea do munictpio organizou-se em função da expan-


são da cultura do coco, respondendo ao problema dos excedentes de
mão-de-obra que se formavam no interior com o desenvolvimento da
pesca, responsavel por um cordão de povoados costeiros (12) .

Assim é que, no meado deste século, as atividades econômicas da


área apresentavam-se organizadas espacialmente de modo mais ou me-
nos nítido: na costa uma estreita faixa de coqueiros, às vezes não ul-
trapassando mais de quatro filas de árvores. Em seguida, no restante
da planície litorânea, havia reduzidas "roças" de subsistência, até que
em volta dos pequenos povoados, no limite da faixa litorânea com os
terrenos de argila, realizava-se uma pequena agricultura de subsistên-
cia, aliada, tambem, em reduzida escala, ao cultivo de coqueiros.

Na porção sul do município - distrito de Abrantes - a ativi-


dade típica era a agricultura de subsistência, esporadicamente a pe-
cuária; a Nordeste - distrito de Monte Gordo - , a cultura do coco
aliava-se à produção de subsistência e à pequena pecuária. Mais para
o interior ainda da zona norte, à margem esquerda do Pojuca, e no
limite oeste do município, à margem esquerda do Joanes, onde a ocu-
pação era, e o é ainda hoje, rala, persistiam algumas reservas de mata
entre as quais se praticava a agricultura de subsistência aliada à pro-
dução de carvão vegetal.

Obviamente esta distribuição jamais se tornara rígida. A ativi-


dade pecuária, por exemplo, esteve sempre mais ou menos presente
em todo o município, menos ligada a variações do meio, que lhe é ali
geralmente propício, do que à dinâmica econômica da região. O cul~
tivo do coco tambem, apesar de sua dominância na costa e no nor-
deste, tornou-se mais ou menos disseminado no município, tendendo
a expandir-se progressivamente na zona de colinas e penetrando na
década de sesenta as planícies internas de sedimentação. E a produ-
ção do carvão, embora mais típica das áreas acima mencionadas, era
praticada tambem em vários pontos do município a depender da exis-
tência do que restasse de mata.

(12). - Segundo a tradição oral da zona de Jauá, este local fora ponto
de desembarque de escravos no século passado. No início deste século. teria
apenas 4 casas. Depois de 1910, por cerca de 10 anos, para aí vieram nume-
rosos indivíduos, cujos sobrenomes são os da população atual. As famílias
de residência mais antiga no local tendem a apresentar maior aparência de
descendência neg:a
- 605-

Em 1960, a população do município distribuia-se, em sua grande


parte, em povoados que começam a partir de 10 a 20 até 250 casas
e em dois centros urbanos maiores - a sede municipal e a sede do
distrito de Dias d' Ávila (13). Ao longo da estrada de ferro estão os
núcleos distantes e isolados entre si: Parafuso, com aproximadamente
700 habitantes, Camaçarí, com 5.342 e Dias d'Avila, com 2.519, na-
quele ano.
A outra linha de núcleos demográficos situa-se nos limites da
faixa litorânea com as primeiras colinas, incluindo como principais
núcleos, ao sul, Abrantes, Sucupió, Gagirús, Maracaiuba, Areias, Açú,
e ao norte, Coqueiro, Pau d' Arco, Monte Gordo, São Bento, Bom
Jesus, Barra de Pojuca e Pojuquinha.
o terceiro eixo de povoados é constituido pelos arraiais pesquei-
ros de Busca Vida, Jauá, Arembepe e Porto de Guarajuba. Embora
fora dos limites do município, pode-se incluir entre os últimos o arraial
de Praia do Forte, com intensas relações com a zona de Pojuca e Po-
juquinha.
Entre essas três linhas de ocupação, a população se distribuia de
um modo geral em campo aberto, sendo quase desertos os "tabulei-
ros" e planícies centrais e a parte interior da planície costeira.
Em termos sócio-econômicas essa população se estratifica em
três níveis:
a). - Proprietários rurais residentes, proprietários de áreas de
tamanho variavel, em geral entre 40 e 500 ha; donos de casas de ne-
gócio; empreiteiros de obras; grande parte dos funcionários públicos
de carteira; proprietários de pequenas indústrias e administradores das
empresas maiores.
Em termos do sistema social global, evidentemente este grupo in-
tegra um estrato de renda média, possivelmente mais próximos dos li-
mites inferiores da "classe média", vista em âmbito regional.
b). - Lavradores proprietários de sítios que oscilam entre 10
e 40 ha, variavelmente aproveitados; "donos de venda"
- 606-

civil; certa parte do funcionalismo público; operários industriais semi-


qualificados.
Para a grande maioria da população local, este grupo é o intér-
prete mais direto da ordem política e moral dominante e o interme-
diário nas relações políticas e sociais com os membros do grupo su-
perior. Seus participantes são cabos eleitorais de políticos municipais,
inspetores de quarteirão que auxiliam o trabalho de delegados e sub-
delegados; e, como empreiteiros de trabalho, são os recrutadores de
mão-de-obra para os empreendimentos particulares e públicos em
operação na área.
c). - Cultivadores sem terra - sejam arrendatários, parceiros,
assalariados e proprietários de minifúndios; operários não-qualifica-
dos da construção civil e da indústria; empregados de balcão, empre-
gados domésticos; soldados; serventes e trabalhadores braçais em ór-
gãos públicos; pescadores.
Dentro da escala local de prestígio, este grupo divide-se entre o
"lavrador", trabalhador por conta própria, proprietário ainda que de
pequeníssimo lote e possivelmente arrendatário ou parceiro em terras
alheias ou simplesmente arrendatário ou parceiro - e, do outro lado,
o trabalhador "de aluguel", "a ganho", "a dia" apenas, que na ex-
pressão local, "se aluga", "vende adia", "trabalha para os outros".
Esta última categoria, ainda reduzida nas áreas rurais, cresce rapida-
mente desde o fim da década de cinquenta.
Como duas categorias sociais tambem vinculadas à estrutura so-
cial local, vale citar o grande proprietário ausente, displicente pela
produção e indiferente quanto a assuntos de âmbito local, dono de
terras que geralmente pouco lhe rendem e apenas aguardam valoriza-
ção; e a figura em emergência do moderno produtor capitalista, agrí-
cola ou industrial, que, na maioria das vezes, tem perante a região re-
lações extremamente especializadas.

*
A EVOLUÇ..10 RECENTE DA ESTRUTURA FUNDIARIA.

De 1940 a 1960 a área total coberta por estabelecimentos ru-


rais em Camaçarí elevou-se de 29.638 ha a 75.413 ha. Esta expan-
são, que se acelerou na última das duas décadas com um acréscimo
que correspondeu a 78 % sobre a área ocupada em 1950, decorreu
basicamente de operações especulativas ins.piradas pela perspectiva de
valorização da terra, por força da crescente integração da área com
Salvador
- 607-

distrito sede do Município e do Centro Industrial da região de Salva-


dor, na área vizinha de Aratú.
Alem disso, a descoberta de depósitos de caolim branco, na área
centro-oeste do município, e de um lençol de água mineral no distrito
de Dias D' Á vila tambem concorreram para a generalizada corrida
pela terra.
Apesar disso, verificaram-se tambem certas alterações no setor
agropecuário, cuja tendência predominante foi a expansão das áreas de
lavoura. Ainda que a área total dos estabelecimentos se tenha expan-
dido em todo o município, incorporando extensas zonas estéreis de "ta-
buleiro" e das planícies sedimentares internas, a área cultivada em
1960 alcançou 13,1 % da área total ocupada, representando portanto
um consideravel avanço sobre 1950, quando aquela percentagem era
de 3,4%.
Enquanto a área total ocupada por estabelecimentos agrícolas
crescera entre 1950 e 1960 na razão de 78 %, a área de lavoura se
expandiu em 583% sobre a registrada em 1950, passando de 1.845
a 9.876 ha. Contudo essa expansão reflete muito mais a instalação
de três colônias agrícolas ao sul do município e a utilização de tre-
chos das planícies internas com cultivos extensivos do que um pro-
cesso interno de transformação do setor primário.

o crescimento demográfico, a criação das colônias agrícolas e o


estímulo por elas trazido à produção de consumo alimentar imediato,
no sul do município, foram os principais fatores de elevação da taxa
de utilização do solo, no período considerado. Contudo coube à pe-
cuária e ao cultivo do coque!ro, a contribuição mais efetiva para a ex-
pansão da área ocupada pelos estabelecimentos agropecuários e da
área de lavoura em particular, excluida a especulação imobiliária.

Embora com a desvantagem de um longo período de maturação


e com altos custos de implantação, o cultivo do coqueiro representa
um investimento de rentabilidade assegurada e de facil administração
e baixos custos de manutenção. Por estas razões constituiu uma atra-
ção perante investidores estabelecidos em outros setores de atividade,
ou mesmo em diferentes ramos agropecuários, fora da área.

Quanto à pecuária, a expansão foi reduzida em termos do vo-


lume físico do rebanho - 56% entre 1950 e 1960,
608

Sob a recessão econômica que atingiu o Recôncavo até a dé-


cada de cinquenta, a atividade pecuária no município mantivera-se
praticamente estacionária representando apenas uma espécie de recurso
de sobrevivência de certos estabelcimentos, num regime de generali-
zada descapitalização (14).
A partir de cinquenta, entretanto, essa atividade tem-se tomado
um dos veículos de penetração de produções comerciais nas áreas ru-
rais do município. Não se trata do crescimento de pequenos reba-
nhos dispersos, subsidiários a outras formas de atividades e fontes :\e
renda, mas de uma expansão da atividade pecuária em pontos isolados
do município, concentrada em estabelecimentos de área relativamente
grande.
O que em realidade ocorreu foi o desenvolvimento de uma pe-
cuária de proporções médias, para corte ou voltada para a produção
do leite, ao lado de uma pequena pecuária de consumo local, ainda
remanescente da atividade pecuária precedente, subsidiária à atividade
agrícola.
No primeiro caso, o recurso à pecuátia associou-se ao apareci-
mento de novos proprietários na região, quase sempre absentístas, e
que recorrem à mesma como um recurso tático simultâneo de aplica-
ção de poupança e de posse efetiva das áreas de que são titulares. Nes-
te caso, a criação é feita em bases tecnológicas e organizacionais bas-
tante rudimentares, sob uma baixa taxa de utilização do solo e redu-
zido emprego de mão-de-obra.

Já a criação do gado leiteiro, que envolve procedimentos mais


complexos e uma utilização mais intensiva da terra, com pasta-
gens cultivadas e arroteamento de pas.tos naturais, tomou-se uma alter-
nativa muito menos frequente.

Na caso da pequena pecuária, a tendência verificada no decênio


de cinquenta foi a de ser um instrumento de manutenção do nivel de
renda de produtores descapitalizados e sob deficiente integração no
mercado regional ou de tornar-se um veículo de acumulação primitiva
tendente a produzir uma pecuária de porte médio de estilo capita-
lista.

Num município com terras sob crescente valorização, em virtude


de sua localização face à Capital do Estado e às atividades industriais

(14). - V.
- 609-

a estabelecerem-se na área, a e~pansão da pecuária representou na


verdade um veículo de penetração capitalista, num regime de explo-
ração que se faz valer de baixas custos de operação, aliados à curta
maturação do investimento e à simplicidade de administração da em-
presa.
Durante todo esse período, a distribuição da terra condicionou e
refletiu essa evolução da produção. De 1940 a 1960, a minidifundi-
zação foi a tendência predominante, não em prejuízo da grande pro-
priedade, mas dos pequenos estabelecimentos de 1940. Com efeito,
unidades de menos de 5 hectares que constituiam 17,0% dos estabe-
lecimentos agrícolas de 1940 passam a constituir 37,8 % do número
total de parcelas em 1960, enquanto diminui a percentagem dos esta-
belecimentos de 5 a 20 ha, passando de 43,8% a 25,7% em 1960.

Ao mesmo tempo, verifica-se um aumento das unidades de 20 a


50 hectares, em parte refletindo os desmembramentos resultantes da
criação de 107 lotes coloniais com áreas médias de 15 a 40 ha. Mas
no conjunto os estabelecimentos de menos de 50 hectares conservam
a mesma participação na área total ocupada: 9,5 em 1940 e 10,0 em
19"0. Enquanto isto os médios e grandes estabelecimentos de mais de
200 hectares expandem-se ao ponto de ocuparem 81,3% da área to-
tal dos estabeledmentos, expansão que provavelmente deriva, nesse
período, tanto da aglutinação de estabelecimentos menores em unida-
des maiores, quanto da conquista de áreas devolutas.
Alem do que possam revelar os dados censitários quanto à ten-
dência à concentração da terra, a experiência de campo mostra decisi-
vamente que nos anos que precedem a 1960 foram frequentes as re-
aglutinações de áreas confinantes e a concentração da propriedade, por
compra em separado de diversas áreas não contíguas.
Na história recente da terra no município, as áreas de 20 a 50
hectares constituem tipicamente uma forma instavel entre a grande ou
média propriedade em fragmentação e o minifúndio, ou, ultimamente,
um tipo de estabelecimento sujeito à aglutinação em unidade maiores.
Quanto a estabelecimentos de menos de 50 ha, a forma típica de
reaglutinação ocorre entre herdeiros, um deles adquirindo, por compra,
a parte dos demais. O outro padrão de concentração da propriedade
é resultante da compra sucessiva de áreas contíguas ou não, por indi-
víduos de fora da região, com fins mais puramente es.peculativos Jo
que a título de investimento reprodutivo em caráter imediato.
Frequentemente, tais proprietários associam a compra à requi-
sição de áreas devolutas. Um
- 610-

colas da região, dispondo de uma área contígua de mais de 1. 000 ha,


resulta da compra de três parcelas a particulares e da requisição de
uma área de terras devolutas ao Estado. Em outro caso, seis estabele-
cimentos não-confinantes compõem um conjunto sob controle unifi-
cado, somando um total superior a 4.000 ha. Um dos maiores pro-
prietários locais, por exemplo, era titular de pelo menos oito diferentes
estabelecimentos no início de sessenta.
Em todos os casos estudados de grandes explorações caracteri-
zadas por compras sucessivas de diferentes áreas, seus proprietários
são pessoas estranhas à área, produtores agropecuários em outros pon-
tos do Estado ou comerciantes e profissionais liberais sediados na Ca-
pital.
A concentração da terra ocorre assim, não só pela reaglutinação
e pela ocupação de extensas áreas devolutas, mas ainda pelo fenômeno
invisivel através dos dados censitários, da compra sucessiva por um
mesmo indivíduo de diversos estabelecimentos não contíguos ou man-
tidos cada um sob administração independente.
Por outro lado a concentração da propriedade resulta de dois
processos principais: da expansão de empreendimentos agrícolas e/ou
pecuários de tipo capitalista e da especulação da terra decorrente das
vantagens locacionais do município face à Capital e ao futuro prin-
cipal núcleo industrial do Estado.
A evolução recente da distr:buição da terra em Camaçarí obe-
dece assim a um padrão usual no Recôncavo, segundo o qual aos mo-
mentos de prosperidade econômica corresponde uma tendência à con-
centração da propriedade, ao tempo em que as fases de retração im-
plicam na fragmentação de áreas e, de outro lado, na estagnação de
grandes propriedades, sob uma administração omissa ou displicente,
com baix3 atividade produtiva (15). O saldo final tem sido a mini-
fundização, de um lado, e a concentração da propriedade de outro,
contrariado no caso estudado apenas pela interferência direta de ori-
gem governamental, expressa, como vimos, nas experiências de colo-
nização, ou por força de loteamentos especulativos na periferia das
concentrações urbanas.

(15). - V. por exemp'o Schwartz (1973) e Schwartz


- 611

PADROES DE USO DA TERRA.

Em termos da área cultivada, o cultivo do coqueiro, ocupando


1 .660 ha em 1961 (16), e em visive1 expansão, em sessenta, constitui
cada vez mais a principal produção agrícola local.
Esta lavoura apresentava-se no início da década, no município,
sob três estágios distintos: velhos coqueiros, onde são frequentes ár-
vores de trinta e mais anos, resultantes do plantio ocasional em al-
guns casos, ou de decadentes plantações feitas pelos anos vinte, parti-
cularmente na costa, plantações sistemáticas, embora sob trato muito
rudimentar, implantadas nas décadas de quarenta e cinquenta e gran-
des novas plantações promovidas sob razoáveis padrões técnicos, por
compradores recentes de terras no município.
A baixa taxa de ocupação da mão-de-obra nesta lavoura toma-a
porem menos significativa na área do que à primeira vista poderá pa-
recer. De fato, em termos de mão-de-obra empregada, a agricultura
tradicional de subsistência é a forma dominante de atividade agrícola
ainda.
Com uma área que possivelmente supera aquela oficialmente re-
gistrada, a producão de artigos de sub"istência cobre não menos de
200 ha, contando-se apenas o plantio de mandioca. Essa produção é
tipicamente feita em "roças", termo que designa a exploração de uma
área de geralmente um hectare com uma cultura alimentar temporá-
ria dominante, de fins comerciais, associada a culturas alimentares pa-
ra consumo próprio do lavrador. A designação aplica-se a áreas sob
variadas formas de posse permanente ou temporária da terra.
Alem de principal absorvente de mão-de-obra, a importância da
lavoura de subsistência deriva de várias outras razões: primeiro, a
mesma está quase invariavelmente presente em todos os estabeleci-
mentos agrícolas locais; depois, prevalece-se de grande parte das áreas
mais férteis da região; alem disto, a sua produção constitui, invaria-
velmente, para o "lavrador" local - proprietário renderio ou par-
ceiro - um elemento obrigatório de composição de sua renda bruta;
finalmente, a "roça" de subsistência ocorre tambem associada à im-
plantação de culturas permanentes e à abertura de pastagens.
As formas mais tradicionais de "roça"
- 612-

nas de colina e às margens dos principais rios, em que tal produção


é feita basicamente por lavradores sem terra, em regime de parceria
da produção ou de arrendamento da terra. Em qualquer caso, a "ro-
ça" em si ocupa, em geral, de meia a quatro tarefas e é trabalhada por
um só homem ou por ele e sua família. Seu tamanho deriva geral-
mente dessa disponibilidade de força de trabalho.

A natureza do solo, na área de Camaçarí, exige, para uma "boa"


roça, a disponibilidade de uma área que inclua uma parte alta e ou-
tra de "baixada", de modo a garantir uma produção de inverno a ve-
rão. A falta de renda e de capital em mãos do lavrador para o sus-
tento de sua família na fase do plantio e para o eventual pagamento
de mão-de-obra extra impõe ainda que a área obtida tenha uma co-
bertura aproveitavel para o fabrico de carvão, cuja venda proporciona
os recursos necessários até a colheita.

A "roça" alia-se tambem à abertura de pastos, representando para


o proprietário uma forma de "limpa" auto-financiavel. A outra con-
dicão de recurso à agricultura alimentar trad;cionalliga-se à expansão
recente de culturas comerciais permanentes. Nestes casos, a mandioca,
oue é geralmente o cultivo preferido, é plantada logo em seguida à im-
plantação da cultura permanente, entre os espaços deixados pela úl-
tima. No caso de coqueirais, as "roças" são feitas até o quinto ou
sexto ano, se muito, desaparecendo com o desenvolvimento das novas
árvores, e p<Xlendo ser repetidas vários anos depois, aproveitando os
espaços não sombreados entre as plantas crescidas. São frequentes
"roças" plantadas entre árvores antigas nos ralos coqueirais da orla
marítima.

Ao lado da "roça" de subsistência, a outra atividade amplamente


difundida na área, em pontos onde ainda resta alguma mata, é a pro-
dução pura e simples de carvão vegetal ou a extração de madeira pa-
ra lenha. Nessas áreas, enquanto a cultura de subsistência cabe em
geral
- 613-

o primeiro tipo de criatório - a pecuária extensiva de "gado


da terra" - foi, como se sabe, atividade importante no passado (17).
Durante toda a primeira metade deste século não parece que a mesma
se tenha ex.pandido. Ainda assim, à medida em que se desorganiza-
ram as antigas fazendas locais e que se desenvolveram as vinculações
das estações de estrada de ferro com a Capital, grandes áreas passa-
ram, por compra, algumas vezes em leilões em hasta pública, às mãos
de comerciantes ou profissionais residentes na Capital, ou de produto-
res de outras áreas do Estado. Estes, de um modo geral, recorreram
à pecuária extensiva como um meio da utilização efetiva da terra e
de fixação de poupanças.
O mecanismo de expansão e retração desse tipo de atividade li-
ga-se particularmente às oscilações da função empresarial. Em pas-
sado recente. nas propriedades onde a deficiência do capital ou ausên-
cia pessoal dos proprietários dificultaram uma exploração efetiva em
termos agrícolas, a atividade pecuária tomou-se um recurso de ma-
nutenção da propriedade da terra. Tanto que em áreas de solo mais
fertil, uma vez intensificada a demanda pela terra, a produção pe-
cuária extensiva foi ocasionalmente expulsa em favor da agricultura.
Presentemente a situação é diferente. A pecuária extensiva uti-
liza-se de certas áreas de tabuleiros e de solos laterizados das colinas,
ocorrendo a depender da existência da grande propriedade e cada vez
mais ligada a novos compradores.
Tais criatórios representam uma forma de inversão bastante atra-
ente para o proprietário ausente, motivado pela expectativa de valori-
zação da terra e de manutenção de patrimônio. Com exceção da cons-
trução de um cercado, que muitas vezes é dispensado graças à fre-
quente existência de cursos de água, a fazenda de gado para corte não
requer outras instalações, utilizando uma reduzida mão-de-obra, re-
munerada em bases extremamente baixas.
Este tipo de pecuária constitui, pois, uma forma de ocupação do
solo com três vantagens principais: a relativa liquidez do investimen-
to, a extrema facilidade de manejo da produção e os baixos custos de
operação da mesma.
O segundo tipo de criação - a do gado leiteiro - tem sido mais
ou menos constante nas áreas sul e oeste do município, ao menos neste
século. Contudo, esta produção, como o cultivo de laranja e outros

(17). - A presença de gado para corte e tração na periferia da área


de produção de cana é documentada por inúmeros fontes contemporâneaa,
V.
- 614-

produtos do pomar, está tão intimamente ligada tambem a proprie-


tários provindos de fora da região e ao absenteísmo e transitoriedade
dos mesmos, que a sua história é marcada por sucessivos altos e bai-
xos (18).
Criatórios de gado leiteiro ocorrem na zona sudoeste e oeste do
município, aproveitando-se de terrenos de relevo diversificado e de
melhores solos em que são possíveis o cultivo de pastos artificiais e o
suprimento de boas aguadas. Este tipo de pecuária exige uma par-
cela relativamente grande de capital fixo e minstalações e inversões
contínuas em pastos cultivados e na compra de animais raciados.
Por outro lado, a complexidade do trato do gado leiteiro exige,
da parte do produtor, um nivel cultural mais alto e um controle mais
intenso das atividades de produção. Acresce que, não existindo até o
início da década de sessenta um sistema regional integrado de escoa-
mento da produção e não constituindo os núcleos locais um mercado
suficiente para a produção leiteira, o produtor é obrigado a prover-se
de transporte próprio para conduzir o leite fresco ao consumidor, :la
Capital (19).
Tudo isso tomou inacessivel a produção leiteira aos médios e
grandes proprietários residentes, geralmente descapitalizados e não fa-
miliarizados com processos mais complexos de produção e, com os
canais muito pessoais de comercialização do leite em Salvador na
época. Assim, as tentativas de criação de gado leiteiro têm sido feitas
sempre por produtores vindos de fora da região, proprietários tran-
sitória ou permanentemente ausentes, dispondo de certo capital e exer-
cendo supervisão ainda que indireta da exploração.
Contudo, apesar da relativa complexidade de operações envol-
vidas neste tipo de pecuária, para estes proprietários, em geral de ni-
vel educacional alto e habituados a ocupações urbanas, a produção de
leite representa uma atração em vista de sua relativa rentabilidade e
facil manejo administrativo.
Entretanto, a tênue vinculação destes proprietários com a terra,
que para si é fundamentalmente um bem patrimonial, leva facilmente
ao abandono de tais iniciativas. O
- 615-

como a perda de um administrador que vinha antes "tomando conta"


da mesma, é pretexto para o desmantelamento da produção.
Não raro o motivo é totalmente estranho à atividade e ao esta-
belecimento em particular, vinculando-se a circunstâncias ocasionais da
vida pessoal do proprietário ou de sua família residente em Salvador.
Em consequência, frequentemente encontram-se instalações totalmen-
te abandonadas, às vezes em ruinas, em meio a propriedades semi-de-
sertas, entregues a um antigo empregado ou parente idoso do proprie-
tário, sem meios nem autorização para utilizar as terras.
Compreende-se porque, embora a proximidade do mercado de
Salvador seja naturalmente um forte incentivo a tal atividade, a na-
tureza da relação produtor-terra não favorece o desenvolvimento pro-
gressivo e estavel da produção leiteira, que assume por isto um carater
intermitente.
o terceiro tipo de atividade pecuária é aquele já referido, pra-
ticado em pequena escala, partindo de duas ou três cabeças de gado,
cujo rebanho se expande, em geral, quase que tão somente ao ritmo
do seu crescimento natural. Este tipo de criação sempre esteve pre-
sente no município e é praticado por um número consideravel de pe-
quenos produtores. Sua principal peculiaridade é a de ser parte de
um sistema de economia semi-fechada em que exatamente é o ani-
mal vendido localmente - rês, porco, carneiro - que constitui a
única produção comercial, às vezes aliada à do coco .

TIPOS DE UNIDADES DE PRODUÇÃO.

As produções acima relacionadas na realidade aparecem raramen-


te isoladas, mas em complexos típicos, segundo padrões específicos de
associação entre as mesmas.
Em primeiro lugar, em importância pela área e pela mão-dc-
obra que absorvem, estão as médias e grandes fazendas sub-utilizadas
das áreas de colina e das margens do Joanes, onde se pratica a "ro-
ça" e se produz o carvão vegetal. Nestas, a área utilizada é ínfima,
em re!açã) à extensão do estabelecimento, e a economia é predatória
por excelência, seja na derrubada sistemática da mata, seja na destrui-
ção direta ou indireta do solo, com um saldo crescente de terrenos
empobrecidos.
O outro
- 616-

fazenda tradicional de coco, no litoral. São grandes extensões de co-


queirais antigos, entre os quais se pratica uma pequena agricultura de
subsistência ou, em alguns casos, a pequena pecuária para consumo
local.
Nas grandes propriedades - marcadas, em geral, pelo absen-
teismo dos proprietários - a produção de subsistência é feita em es-
cala muito reduzida pela pequena mão-de-obra permanente existente
na fazenda ou, esporadicamente, por lavradores sem terra, residentes
nos núcleos costeiros. O proprietário da terra e sua família, mesmo
quando presentes, geralmente abstem-se da pequena agricultura, pois a
produção comercial do coco é relativamente grande em volume.
Nas explorações de área média ou pequena - geralmente de pro-
prietários residentes - o baixo volume de renda propiciada pela ven-
da do coco induz ao recurso a outras atividades por parte do produ-
tor e de sua família. Nestes casos, a densidade de ocupação da terra
com culturas anuais é muito mais alta e a associação com a pequena
pecuária é frequente. A produção de subsistência é praticada muitas
vezes pelo próprio produtor em regime de família extensa, mas é tam-
bem facilitada a parceiros, rendeiros e moradores. O gado criado en-
tre o coqueiral é geralmente objeto de trato do produtor e de mem-
bros de sua família. Tais características permitem considerar este tipo
de estabelecimento como um padrão à parte, o terceiro entre os aquí
relacionados.
O quarto tipo de unidade produtiva é o "sítio" de coqueiros, pe-
quenas áreas onde praticamente o coqueiro é a única cultura. Fre-
quentemente, o "sítio" resulta da fragmentação da terra por herança.
Em certos casos, esta fragmentação é posterior ao estabelecimento do
cultivo do coco, em outros casos este é um recurso de utilização mais
rentavel da terra, nessas glebas Ínfimas onde são inviáveis culturas
anuais, devido à rápida exaustão do solo.
Nos estabelecimentos de grande extensão, a relação área culti-
vada-área total iamais põe em iminência o perigo da falta de ter-
ra. Há uma espécie de fronteira aberta. Mas nos estabelecimentos de
pequena área a terra rapidamente se esgota, daí porque seus proprie-
tários são levados a recorrer a culturas permanentes inserindo-se no
sistema de produção comercial. Tem-se então, paradoxalmente, de um
lado, às vezes, o grande e médio proprietários sob uma economia re-
duzida voltada para o mercado, e, de outro, o proprietário de mini-
fúndio, frequentemente dependente da produção comercial apenas.
Outra linha de origem do "sítio" é
- 617-

sim fixaram-se permanentemente na mesma. Os "sítios" dessa origem


têm uma tendência a desaparecer, ou a não mais se formarem, em
virtude de os proprietários atuais vetarem a rendeiros, moradores e
parceiros o plantio de plantas permanentes, justamente pelo temor de
fixação dos mesmos na terra.
Uma variante deste padrão é o quintal de fundo de casa nos nú-
cleos populacionais. Aí, mesmo sob baixa rentabilidade, pratica-se uma
limitada agricultura alimentar que se resume quase que apenas à hor-
ticultura de pauta tradicional - iiló, tempero verde, leguminosas,
tomate de rama, maxixe e ervas medicinais, com a presença de alguns
poucos pés de coqueiro.
O quinto tipo de unidade, importante em particular pela área re-
lativa que ocupa, se bem que muito menos pela mão-de-obra que en-
gaja é a fazenda de criação extensiva de gado de corte. Neste tipo de
estabelecimento é possivel encontrar-se ou frequentemente encontram-
se limitadas áreas sob cultivo de "roças", praticadas pela reduzida mão-
-de-obra permanente ou por eventuais arrendatários e parceiros resi-
dentes fora dos mesmos.
A tendência, porem, é de expulsão da lavoura de subsistência,
em virtude da pecuária e da dificil proteção das "roças" contra as in-
cursõe!'> do gado. De um modo geral, nestes estabelecimentos não há
pastagens artificiais e somente esporadicamente comparecem outras re-
duzidas criações do tipo "de quintal", para consumo do produtor e fa-
mília ou, em alguns casos, do encarregado local da fazenda.
Outro padrão é constituído pelos estabelecimentos produtores de
leite, que utilizam a terra em grande parte de modo extensivo, exceto
numa pequena percentagem da área ocupada com pastos cultivados.
A exigência de maior controle da produção nestes casos motiva visitas
mais frequentes do proprietário, que excepcionalmente reside na fa-
zenda. Por esta razão, existem, com mais frequência, nestes estabele-
cimentos, culturas de pomar ao lado de alguma criação "de quintal" .
Como nos demais estabelecimentos pecuários, a agricultura de subsis-
tência é limitada e permanentemente ameaçada.
Finalmente, o último padrão de uso da terra representa a forma
emergente de culturas permanentes, comportando crescente teor de ra-
cionalidade. Quanto às novas plantações de coco, são raros os estabele-
cimentos em que esta cultura liga-se exclusivamente à nova fase. Muitas
vezes é frequente a presença de velhos coqueiros ao lado de novas plan-
tações ou mesmo de árvores antigas isoladas em meio às novas plantas.
Esta
- 618

locais ou em alguns lotes coloniais e nos grandes estabelecimentos


comprados por produtores de fora. Nos lotes coloniais e nas pequenas
propriedades, as novas plantações de coqueiros com frequência subsis-
tem ainda ao lado de culturas de subsistência ou são implatadas em
associação com as mesmas, aí cultivadas a'té cerca do quinto ano.
O sistema de implantação de culturas permanentes associadas à
agricultura de subsistência envolve um contrato particular de trabalho
com a mão-de-obra local. O proprietário que deseja implantar deter-
minado número de pés de coqueiro ou outra planta, propõe a um
lavrador local ceder-lhe uma área na qual este deverá plantar os co-
queiros, inclusive as vezes fornecendo a própria semente, sem con-
tudo receber qualquer remuneração em dinheiro, mas apenas o direito
de utilizar-se da mesma terra com culturas anuais para seu consumo ou
comércio.
Nas grandes propriedades inexistem praticamente "roças" de sub-
sistência, exceto as permitidas à mão-de-obra permanente, pois nem
aos produtores interessa pratica-las, nem os mesmos admitem com fa-
cilidade a cessão de áreas em arrendamento ou parceria. Nestes ca-
sos, a população permanente é bastante limitada e a tendência é ex-
pulsar, por completo, outras formas de utilização da terra.
Onde o cultivo é feito com grande preocupação de racionalidade
é totalmente ausente inclusive a associação inicial entre a cultura per-
manente e a de subsistência, pois este padrão condiciona geralmente
um nivel tecnológico inferior de implantação das plantas permanentes,
que em sessenta incluiam tambem a mamona e o sisal.

*
CONCLUSÃO.

De um modo geral, poder-se-ia dizer que a dinâmica do uso da


terra em Camaçarí, pelo meado desse século - fase que precede à
atual reestruturação da economia do Recôncavo - derivou basica-
mente de dois. processos: da preservação da terra sob um padrão de
propriedade privada concentrada - ainda que a custa da circulação
de proprietários, da intermitência de diferentes atividades produtivas
e mesmo da improdutividade - e dos mecanismos de sobrevivência
da população local constituida em larga escala por pequenos e não
proprietários.
Os
- 619-

isto a área a uma alternância de empreendimentos descontínuos que


ora requisítaram mão-de-obra, mas igualmente ora a dispensaram. Por
sua vez, a dificuldade e crescente impossibilidade de acesso a terra
pela população local que se acumulou com o tempo na área, permitiu
uma variedade de arranjos na organização da produção, nos quais a
participação da mesma se fez sob a mais aguda e continuada espo-
liação. A minifundização, um entre outros testemunhos da situação,
é suficiente para demonstra-lo.
Por outro lado, é preciso observar que dois processos presentes
na área em momentos anteriores, aceleraram-se a partir do meado
deste século: de um lado o avanço de mono culturas terra-e traba-
lho-extensivas e a reativação da pecuária em competição com a pro-
dução de subsistência, e, de outro, a especulação da terra com a cres-
cente resistência dos proprietários à cessão de áreas a lavradores au-
tônomos. Em consequência, desencadeou-se um processo de desalo-
jamento e assalariamento de grande parte dessa população, expressa
nes dados censitários pelo crescimento muito maior da população eco-
nomicamente ativa dependente da agricultura (115,9%, de 1950 a
1960) do que da população rural (23,3%, no mesmo período), pro-
gressivamente concentrada em nucleações urbanas.
As características da estrutura fundiária e as oportunidades eco-
nômicas reservadas à população local constituem assim as duas faces
de um processo em que os modos de utilização da terra se apresen-
tam como soluções necessariamente instáveis das tensões entre as re-
lações de produção e a dinâmica dos recursos produtivos.
Esse processo não se restringe à área e ao período estudados. A
evolução da estrutura fundiária em Camaçarí constitui um testemunho
de processos que têm por referência o Recôncavo em sua totalidade.
Contudo há duas condições peculiares aos mesmos que tornam muito
mais evidetnes aí as tendências que caracterizam a dinâmica econô-
mica da região como um todo.
Tratando-se de uma periferia ecológica, onde as condições am-
b~entais condicionaram uma participação física ambígua da área na
produção direta da mercadoria hegemônica da região no passado e a
produção essencial porem complementar a esta - a de animais e
combustivel vegetal, nela se tornaram mais expressos os efeitos das
restrições sofridas pela produção nuclear da reg.ião.
- 620-

ções segundo padrões mais explícitos de acomodação à retração do


capital. O principal motor dessas acomodações foi nesses momentos a
necessidade de absorver a oferta de trabalho sobrante, sem contudo
alterar a estrutura de acesso à terra.
Entretanto, a esta função conjuntural somou-se a função estru-
tural dessas áreas, de manter um excelente de mão-de-obra, intolera-
vel dentro das áreas mais propícias à produção da cana, e de ao mes-
mo tempo preservar suas zonas mais ricas para as expansões cíclicas
daquela produção comercial.
• •

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• •

INTERVENÇÃO.
Do Prof. Luiz Mott (Universidade Estadual de Campinas. SP) .
Pergunta:
"A Autora, no início, criticou a teoria do dualismo. Não acha
que o conceito de "âmago-periferia" é necessariamente dualista, por-
tanto incapaz de dar conta da dialética sócio-estrutural?"
Declara:
"Não concordo que a parceria seja uma relação "pré-capitalista" .
A rigor só podemos chamar a meiação e as demais formas de traba-
lho semelhantes de pseudo-parceria, pois são formas disfarçadas de
assalariamento . "
- 622-

RESPOST A DA PROFESSORA MARIA AZEVEDO BRANDÃO.

Ao Prof. Luiz Mott.


Disse:
"A referência à questão do dualismo foi feita ao iniciar a expo-
sição oral da comunicação escrita e não aparece nesta. Contudo, cer-
tamente, vale a questão uma vez que, como afirmei, os dados do es-
tudo de que procede a comunicação constituem uma demonstração das
impropriedades das perspectivas de índole dualista.
Numa concepção dualista, as categorias centro e periferia assu-
mem um carater explicativo e as realidades a que se referem são con-
cebidas sob dinâmicas independentes, abstraindo a unidade de deter-
minação de ambas. Nas concepções centro~periferia mais ingênuas
chega-se a ver essa relação inclusive como uma oposição estrutural.
O meu uso do conceito de âmago (ou núcleo) -periferia com-
porta duas observações e diverge da percepção dos modelos dualistas.
Em primeiro lugar, a expressão foi usada em referência a uma di-
mensão espacial e a uma diferenciação setorial, com uma função des-
critiva, no primeiro caso em sentido concreto e, no segundo, analógico.
A referência é feita a uma região dominada e geneticamente es-
truturada por uma atividade produtiva - a produção do açucar -
que por seu carater primário vincula-se fortemente a um território
que, fisicamente heterogêneo, a condiciona diferencialmente no espa-
ço. Por outro lado, dentro da sua área de viabilidade ecológica, uma
ocupação inicial historicamente situada teve lugar e a partir dela or-
ganizou-se o espaço físico da produção.
Por
- 623-

do dinamismo geral da e.col1omia. Nas zonas mais distantes ou menos


propícias à cana, a ocupação tendeu por isto a ser menos densa e me-
nos homogênea em relação ao âmago geográfico da região. A perife-
ria, sempre moveI, progredindo e retraindo-se, ora mais larga, ora
mais delgada, constitui assim uma categoria descritiva cujo referente
não pode ser de modo algum tomado de modo rígido, nem visto co-
mo um princípio de organização da realidade.
No caso do Recôn.cavo açucareiro da Bahia, como em outras
áreas de ocupação primária, fisicamente isoladas de outras áreas eco-
nomicamente dinâmicas, essa imagem de uma região dotada de um
âmago em referência ao qual se estruturam vários segmentos periféri-
cos, ou seja uma periferia diversificada, tem mais uma razão objetiva
de ser na existência de uma fronteira aberta, fronteira esta que se or-
ganizou lentamente e exatamente sob a direção da atividade hegemô-
nica representa pela produção do açucar.
Quando essa fronteira incorporou novas áreas à região, o fez em
função da complexidade das atividades que se viabilizaram nessas áreas
no interesse da produção do açucar. Dadas as determinações técnicas
dessa i'rodução, a região só se constituiu quando o espaço se organi-
zou de um modo dinamicamente diferenciado. A relação centro-pe-
riferia ai constitui portanto um fenômeno derivado, e não primário.
Segundo a dimensão setorial, o conceito é usado para distinguir
uma atividade produtiva tomada por referência daquelas que lhe es-
tão a mont~nte, numa analogia de base ~spacial; essa atividade é vista
como uma função nuclear que requisita outras atividades essenciais,
porem indiretas, como, no caso da produção de açucar, a produção de
alimentos e materiais de construção e de energia.
Na concepção usada por mim, o conceito âmago - periferia não
tem cara ter analítico e por isto não pretende dar conta da dialética
sócio-econômica. Pelo contrário, pretende apenas revelar como esta
dialética expressa-se no espaço, constituindo e criando uma super-
estrutura, isto é, a organização física da região, descrita mas não ex-
plicada pelos termos acima.
Evidentemente que descrita em tais termos a região, centro e pe-
riferia foram usados como local de determinadas atividades e funções,
o que não deve ser confundido com atribuir a tais categorias um ca-
rater explicativo".
*
"A
- 624-

Antes de tudo, a questão não me parece simples do ponto dI'!


vista formal. Em primeiro lugar é preciso distinguir a natureza em si
da relação como forma de remuneração de fatores. Dado o seu ca-
rater variavel em função da produtividade esperada do solo - daí a
meia, a terça e a quarta - e da produtividade efetiva do solo - ex-
pressa pelo volume total da produção que é afinal o que determina o
volume das partes retiradas pelos contratantes, a parceria como é ge-
nericamente praticada na área, no momento estudado, pode ser con-
cebida como renda da terra.
O salário não é variavel, muito menos em função da produtivi-
dade da terra. Variando, poder-se-ia pensar num componente agre-
gado de lucro, isto é, um salário ao qual se deixasse presa uma par-
cela da mais-valia, da Qual se deduziriam perdas - menor produtivi-
dade do solo ou redução da produção por força de atos da natureza
- implicando em menor parcela de remuneração ao trabalhador.
B por outro lado possivel contra-argumentar que a desvantagem
progressiva para o trabalhador, da partilha, em função da produtivi-
dade do solo - descendo da quarta à terça e desta à meia - poderia
apenas significar um a;uste do volume da remuneração às necessida-
des de reprodução da força de trabalho, de modo que em verdade a
remuneracão do trabalhador mantem-se invariante e por isto a "par-
te" - meia, terça ou quarta - se assemelharia ao salário.
Esta alternativa pode inclusive ganhar mais força perante o caso
da participação do proprietário com parcelas de capital constante, co-
mo ferramentas, fertilizantes, corretivos, sementes e inseticidas, pois
remuneração do trabalhador mantem-se invariante e por isto a "par-
bilidade de este participar do lucro decorrente daquela parte do ca-
pital.
Contudo, isto não elimina a presença de um componente variavel
na composição da "parte", isto é, a parcela da diferença de produti-
vidade do solo - mesmo que entendido este como parte do capital
constante - ou das variações de ambiente. Em qualquer caso, res-
taria uma fração mesmo que próxima de zero - mas nem por isto
menos real - de lucro retido pelo trabalhador. Poder-se-ia chamar
a isto de salário?
A coisa porem complica-se ainda mais quando se observa o caso
em que o proprietário participa do processo pagando tambem um sa-
lario ao parceiro - sua "despesa"
- 625-

capital de produção - o salário do próprio parceiro, sem falar no


fato de que a partilha é feita em função do valor comercial esperado
da produção. Então no fim, o que realmente representaria a "parte"
do trabalhador depois de todas as deduções, inclusive do seu salário?

Como se vê a questão não é tão simples e há a segunda parte,


isto é, a do significado da natureza da relação quanto ao modo de
produção a que porventura se vincule. Aqui não é possivel raciocinar
em abstrato. Na situação estudada, a parceria dá-se basicamente se-
gundo a sua forma clássica, isto é, sem outra participação do proprie-
tário alem da terra em si, embora se generalizem as variantes que in-
cluem outras participações deste, inclusive o pagamento daquele "sa-
lário", se quizermos, "parcial" - "a despesa" do trabalhador. Na
situação usual, a parceria ocorre em partee dentro de um regime de
produção praticamente sem acumulação e onde o proprietário e sua
familia dispõem do produto da terra para seu consumo direto ou in-
direto. Em outros casos o produto da terra retirado pelo proprietá-
rio --o caso do titular ausente de grandes extensões - corresponde a
uma espécie de tributação aplicada em serviços e benfeitorias desti-
nadas a manter a propriedade patrimonial. Não se poderia dizer que
de modo imediato a renda da terra e o lucro se destinem a constituir
um capital de produção, embora se esteja dentro de uma economia
tipicamente capitalista.

Nestes casos, a parceria em si não pode ser concebida facilmente


como uma relação capitalista típica, ainda que ela decorra de um
modo de produção capitalista e exista em uma economia capitalista.
O seu carater pré-capitalista contudo não subtende de modo algum
uma procedência temporal do ponto de vista genético, nem uma asso-
ciação a outro princípio de organização da produção, como poderia
ser o caso de uma organização de tipo feudal. Alem disso, mesmo
na sua forma mais arcaica, a parceria não se opõe à direção geral da
produção capHalista. Em seu padrão clássico, ela parece antes cons-
tituir uma forma atípica de resolução de problemas estruturais - a
preservação de uma excelente mão-de-obra sem comprometer par-
celas de capital variavel - e conjunturais - as trocas não monetari-
zadas em situação de depressão e em zonas periféricas menos especia-
lizadas, quando e onde se reduz o fluxo monetário.

Porque chamar então de "pseudo-parceria" a uma relação que


em verdade se dirige e coopera com a acumulação capitalista, mas
que não atende plenamente às características ·típicas do assalariamen-
to, sobretudo considerando que a mesma não é
- 626-

A questão e o comentário acima levam-me a ver a parceria como


uma relação compativel e cooperante com um modo capitalista de
produção, embora de carater menos universal e típico que outras re-
lações, sobretudo em suas formas mais recentes e em situações onde
a produção se apresenta generalizadamente dirigida à acumulação, sem
que por isto se deixe de distingui-la do assalariamento em sua forma
pura e dominante."
INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DA PROPRIEDADE
RURAL EM SANTA CATARINA (*).

W ALTER FERNANDO PlAZZA


do Departamento de História do Centro de Estudos
Básicos da Universidade Federal de Santa Catarina.

I. - INTRODUÇÃO.

o estudo da propriedade rural em determinada área geográfica


gera reflexões as mais diversas.
Em primeiro lugar estão, evidentemente, as razões da sua forma-
ção. Por que foi adotado este ou aquele sistema de ocupação do solo?
Portanto, temos que nos reportar à história da formação fundiária de
um Estado ou de uma região.
É, pois, deveras importante a avaliação das várias facetas do pro-
blema, bem como as repercussões que tem gerado na problemática so-
cial-econômica e, algumas vezes, tambem, na política-administrativa
e, até nas programações político-partidárias.
Este trabalho pretende ser, pois, uma modesta introdução ao es-
tudo da propriedade rural em Santa Catarina, numa perspectiva his-
tórica.
Da análise de cada um dos itens, enfocando formas determinadas
pela legislação colonial portuguesa ou pela normativa do governo im-
perial brasileiro ou, ainda, pelos governos provinciais de Santa Ca-
tarina, ou, então, já no regime republicano, ora orientada a política
fundiária pelos interesses da nação, ora pela iniciativa do Governo
Estadual, vamos encaminhar algumas breves conclusões.

(*). - Comunicação apresentada na 2\'-


628 -

Esperamos ter contribuido, desta forma, para conhecimento de


mais um aspecto do desenvolvimento social e econômico do nosso Es-
tado de Santa Catarina.
* *

2. No sistema colonial português.
a. - Sesmarias.
Para início do estudo da propriedade rural em terras brasileiras
vamos aceitar, desde já, um pronunciamento de quem bordejou, em
outras eras, o assunto.
Diz João Cardoso de Menezes e Souza (1):

"Desde o tempo da divisão do Brasil em capitanias, as


quais eram concedidas aos donatários com poderes discricioná-
rios, mediante o pagamento à Coroa de um direito de suserania,
adotou-se um vicioso sistema de apropriação do solo. Sesmarias
de uma, duas e' tres léguas eram distribuidas por toda a vasta
extensão do país, o Príncipe Regente, ao chegar ao Brasil em
1808, reviveu a autorização para serem essas sesmarias concedi-
das pelos governadores e capitães-generais, e a 25 de novemb;o
do mesmo ano permitiu que, a bem da agricultura, fossem conce-
didas terras por sesmarias, com a condição, porem, de todos os
concessionários obterem do desembargo do paço a respectiva con-
firmação.
Resultou desta amplitude de liberdade que todas as terras
das cidades do litoral e de importantes povoações cairam no do-
mínio particular, de modo que hoje não é possivel achar nas ci-
dades populosas, junto dos mercados e no correr das grandes
linhas de comunicação, um palmo de terra, que pertença ao Es-
tado e possa ser convertido' em núcleo de colonização ou disto i-
buido aos emigrantes".
"Dessa concentração de propriedade na mão de poucos,
resultou o abandono da ag"icultura nos campos, a estagnação ou
falta de desenvolvimento das construções urbanas, pobresa e
dependência de grande parte da população, que não achava
campo à sua atividade, nem meios de se tornar proprietáda, e fi-
nalmente as dificuldades, que hoje cercam a administração púb~ica

(1). - SOUZA. Theses sobre colonização do Brasil. Rio de Janeiro,


Tipografia Nacional, 1875. p. 308.
- 629-

para oferecer aos imigrantes colocação comoda e apropriada e


que os prenda ao país, onde vieram procurar condições de existên-
cia mais favoráveis, do que as que na pát~ia se lhes deparavam"
(2) .

Mas, por que as sesmarias?


E a resposta coerente, objetiva e, de certa forma, bem clara é
esta:

..... a política de ocupar de forma efetiva as terras brasilei-


ras por Portugal, consistiu em adotar um plano de exploração agrí-
cola, isto é, de cultivo permanente do solo tendo em vista o
fornecimento de gêneros de interesse para o comércio. O povoa-
mento deco reu da necessidade de organizar a p~odução. Por meio
das sesmarias, a Coroa procurou estender os terrenos de cultivo e
ocupar o solo de forma permanente, prendendo a ele o lavrador.
De novo, aqui, seria um esforço de pioneirismo, pois tratava-se
da primeira experiência de criação de uma colônia agrícola em
terras da América, à base da grande lavoura. Desta forma, de
simples empresa extrativa, destinada ao abastecimento de pau-
brasil, a América portuguesa passou a constituir parte integran-
te da economia reprodutiva eu~opéia" (3).

E, adiante, a mesma autora, explícita a estrutura e a origem das


sesmarias (4).

"A posse e a popriedade da terra resultaram de simples doa-


ção, na forma de sesmarias, sem restrições de maior impo,tância
que não fossem a obrigatoriedade de ocupa-la".

E, logo, conclui:
"Mas o velho preceito das ordenações manuelinas e filipinas
que proibia que se desse a uma mesma pessoa maiores terras alem
das que razoavelmente poderiam aproveitar, assumiu na colônia,
me-cê da imensidade de seu território e dos reclamos da produção
em grande escala, feitio particular. Ainda que tenha havido, em
muitos casos, a convergência de dezenas de léguas de terras em

SOUZA. op. cit., p. 308-309.


(2). -
(3). - CANABRAVA (Alice), A grande propriedade rural. In HO-
LANDA (Sérgio Buarque de, diretor): História geral da civilização brasileira.
t. I,
- 630-

mão de uma, duas, três ou quatro pessoas. O fato de se tornar


de imediato grande proprietário constituia um chamariz para o
colonizador. Se não estavam em jogo distinções à base da hierar-
quia social do sesmeiro, a obrigatoriedade de ocupar e povoar
a terra implicava em discriminação de natureza capitalista, pois
os meios para explora-Ia, em última análise, iam condicionar a
posse efetiva do solo".

Pequenas e grandes sesmarias foram, desta forma, tambem, dis-


tribuidas na então Capitania e depois Província de Santa Catarina.
Da análise de processos da confirmação de sesmarias que estiveram e
transitaram pelo Desembargo do Paço, obteve-se dados assim discri-
minados (5).
Sobre as semarias concedidas, independentemente de qualquer
compromisso real - como o caso dos "casais de número" ou "casal
d'EI-Rey" açorianos - tem-se, tambem, que elas não foram de ex-
tensão muito dilatada, conforme os exemplos aqui alinhados:
MANUEL DE DEUS PEREIRA: Ajudante do Terço de Auxi-
liares da Ilha de Santa Catarina pede confirmação da Carta de ses-
maria, obtida do Governador do Rio de Janeiro com 370 braças de
testada e 700 de sertão na Ilha de Santa Catarina, por documento de
29 de agosto de 1748.
ANTONIO VIEIRA REBELO:

"morador da vila de Laguna"


"que eIle he Senhor e possuidor de hua data de terreno de
cultura no lugar denominado Campo Bom, districto da mesma
Villa" .
Despachado ao Ouvidor da Comarca para demarcação a
20/07/1813.
A sesmaria fora, originalmente, concedida a 05/04/1773
em favor de MANOEL DE SOUZA PINTO.

JOSÉ DA SILVEIRA GULARTE: Tenente reformado do Regi-


mento da Ilha de Santa Catarina. Qualificado, posteriormente
como Capitão.

(5). - ARQUIVO HISTóRICO DE JOINVILLE. Esta organização


pertence a Prefeitu~a Municipal de Joinville, está sob a direção do Sr. Adolfo
Berna~do Schneider. Fez xerocopiar no Arquivo Nacional, Rio de Janeiro,
todos os processos de sesmarias, referentes ao território cata~inense, ali exis-
- 631-

"q. para melho~ subsistir deseja formar hum estabelecimento


em terras do districto do Rio de São Francisco", "huma legu:l de
terras em qU:ldro na paraje denominada o Ryo da Tapacu, q.
fica entre Tapacuroya e Rio de São Francisco, fazendo frente para
o mesmo Tapacu, corendo os fundos para a parte do sul, co~fron­
tando pelas partes do Leste com Manoel Lamin, e pelos mais com
terras realengas, e como se achão as das devolutas".
A 28/06/1793 foram-lhe concedidas 1.500 (hum mil e
quinhentas) braças de terras em quadra.
A 05/08/1793 mandado passar-lhe carta de sesmaria. A
21/06/1794 a Câmara da Vila de São Francisco informa ao Go-
vernador da Capitania "se conhrce estarem devolutas as teLas"
requeridos e "se verifica não ter em estas terras Ereos". (assinam
a informação: Antonio M. de Andrade, Floriano E'oy de Me-
deiros, Antonio Xavier dos Santos, José Nunes da Silva e Anto-
nio de Bitancur Cidade).
Passada Carta de Sesma ia, assinada pelo Conde de Resende,
a 05/08/1794, de uma légua em quadra.
Registrada na Provedoria da Real Fazenda no Desterro a
09/09/1794, no L. 5", fls. 23.
o Demarcador Manoel Antônio Tavares faz esta declaração:
"porem somte. medi meia legua em coadra e não pude medir
a houtra meia legua na frente por cauza dos mtos. Pantanos,
brejos, e Lagoas de q. he composto aquele te. reno, e juntamente.
Não medi qdo. nofundo mais de meia legoa por não prejudicar a
houtras datas cuja medição de meia legoa em cO:ldra fiz de pao
de Masaranduba de doze palmos de roda q. mandei lavrar por
coatro faces q. está da pte. do sul confrontando com terras de-
volutas, de cujo marco Lancei o rumo de oeste em q. medi mil e
quinhentas braças q. finda~ão em hu pao de Canela Cebo q. está
na margem do mesmo Rio Lavrado as coatro faces confrontando
com terras devolutas e lhe lancei pa o fundo rumo do Sul com
mil e quinhentas braças, q. faz meia lego a em coadra, e foi feita
esta medissão". a 20/05/1794.
A 25/06/1794 foi requerida a concessão de 1.500 braças de
terras em quadra.
Foi-lhe passada a Carta de Sesmaria em duas vias "sendo a
segunda remetida para Lisboa foi aprehendida pelos Franceses,
por cuja razão teve o supte na precizão de recorrer a 1'!- via".
José Ferreira de Mendonça, "Furriel de Cavalaria. Auxiliar,
Piloto e Demarcador das terras sesma~ias da Real Fazenda",
- 632-

A partir de 07/07/1812 aparece como procurador do Tte.


José da Silveira Gularteo Tte. Manoel Pereira da Costa, por pro-
curação passada a 16/08/1805.
No p~ocesso de demarcação funcionou como ajudante da
corda Manoel da Cunha Bacelar e a respectiva corda "a qual tinha
vinte e sinco braças de comprida e hera de linho da Embauba",
e tendo como demlrcador Francisco Rodrigues Bacelar.
A medição e demarcação foi efetu~da a vista do despacho do
Juiz Ordinário da Vila de São Francisco do Sul, João d'Oliveira
Falcão, a 20/07/1812 e a afixação dos marcos de peda, por
sentença, onde os havia de pau a 21/11/1815.

Assim, a demarcação e colocação do primeiro marco de pedra é


a 12/11/1815, nas margens do rio Itapocú, da parte esquerda "indo
rio acima", e que no marco

"neIle tem Escripto em letra redonda o Nome do Senhorio


e Capitão José da Silveira Golarte, cujo marco olha para o No""te
e Sul".

A 13/11/1815 foi colocado e reconhecido o segundo marco nos

"fundos d'as Terras do Capitão José da Silveira Golarte",


"cujo nome olha para Leste".

A 14/11/1815 da-se a colocação do terceiro marco e a 15/11/


1815 é a vez do quarto marco.
A 21/11/1815 foi encerrada a demarcação e a colocação dos
marcos.
Foi-lhe concedida, por D. Pedro, confirmação da Carta de Ses-
maria

"a qual começou ~o Luglr Rio do Itapocú da parte esquera


rumo do Norte Sul indo plra o campo em o qual lug:r se fixou o
primeiro marco ao qual se medirão mil novecentas e sessenta e
nove braças até o segundo marco, do qual seguindo-se a rumo
de Leste-Oeste se medirão três mil braças, de frente até o terceiro
marco; do qual seguindo-se rumo do Norte, se medirão duas mil
setecentas braças até o lugar denominado Barra do Furado,
aonde se afixou o quarto marco, e findou a dita medição e de-
marcação"
634 -

Mandada passar carta de confirmação de sesmaria a 22/07/


1824. (anexo doc. carta de confirmação) (v. mapa).
ANTONIO JOSÉ MARTINS: Presbítero secular.
Padre, capelão da Armação de Nossa Senhora da Piedade da
Barra do Norte da Ilha de Santa Catarina.

"que elle suplicante tinha escravos necessanos, para a sua


existência naquele lugar, sem ter terras em que os ocupasse e
porque queria estabelecer-se e sabia que nas margens do rio In-
ferninho, Freguesia de São Miguel, Terra firme da dita Ilha, ha
hua grande quantidade de terras pantanosas e a maior parte delas
incapazes de cultura, por serem alagadas de tal mojo, que sendo
já rodeadas de datas concedidas aos Casaes da dita Ilha todos as
tem desprezado, por incapazes, as quais fazem frente ao mar da
enseada dos Ganchos, tendo por Hereos a Leste Manoel Jo"é Gar-
cia e da parte oposta entre outros, os herdeiros de Francisco Antô-
nio e Manoel Correa, Me pedia lhe concedesse hua legoa de terras
d'e frente, com duas de fundo, e faltando em frente, ou fundo,
que se possa estender, para qualquer das partes que se acha.-em as
ditas terras devolutas". Recebeu carta de Sesmaria ~ 15/04/1794.
Demarcadas as terras em 26/11/1799 (Demarcador Manoel An-
tonio Tavares, Tenente e Comandante da Nova Esquadra de
Cavalaria Auxiliar do distrito de Canasviei:as e demarcado r atual
de terras de sesmarias"). (v. mapa).

O demarcador assim descreve a propriedade demarcada:

"Teve princípio em a boca de um Ribeirão denominado Rio


dos Morretes que desemboca no Mar das Tejucas G.-andes defron-
te das terras de Francisco Manoel da Silva, em o lugar que no
desenho incluso se mostra a figura A, cujo rio devida pela parte
de Oeste as terras do dito Francisco Manoel da Silva e as terras
de Maria de Santa Anna e pela parte de Leste o te:reno pedido
pelo dito Reverendo, em margem do dito Rio lhe fiz marco em
hum pao de seu Nascimento de Canela amarela, que divide com
terras de que hé herdeiro Miguel Co!reia no lugar da figura B,
e desse Lugar lhe lancei o Rumo de Sul quarta de Suesta,
- 635-

,~,u, dD,g;,,6n1i r'da ~·;d,z,.b


- 637-

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- 638-

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- 639-

medi cento e sessenta braças em té a beira do Rio do InferninJ~o,


e lhe fiz marco em hum pao de Arasá no lugar da figu:a D, e
seguindo o Rio do Inferninho para a parte do Sul serve de divisão
pela parte de Oeste o mesmo Rio emté a extrema do Capitão
José Coelho Machado, no lugar da figura E., e lhe fiz marco em
hum pao de Canela lavrado as quatro faces, e desse lugar segue o
Rumo de Leste com mil seiscentas e cinquenta braças até a ex-
trema de Manoel José Garcia, no fundo da sua data, em o lugar
da figura F., e voltando ao Norte pela extrema do dito Manoel
José Garcia com mil e oitocentas braças amté ao canto do Infer-
ninho devedindo pela parte de Leste com o dito Manoel José, em
o lugar da figura G, e desta sorte ficou medido e demarcado, o
terreno pedido dentro da área das figuras A. B. C. D. E . F . G ., fa-
zendo a sua Lente ao Mar do Saco das Tejucas Grandes".
Medido em 01/07/1794.

MANOEL DA COSTA FRAGA: "Sargento de Granadeiros en-


carregados do expediente da Secretaria deste Governo" (de Santa Ca-
tarina) .
Foi-lhe concedida Carta de Sesmarias pelo Governador -
a quem servia - Francisco de Barros Moraes Araújo Teixeira
Ornem, "cavaleiro profeço na Ordem de Cristo, Fidalgo da Casa-
de Sua Mage. Brigadeiro de Infantaria do Exé:cito da mesma
Senhora e Governador da Ilha de Santa Catarina", na Costeira da
Caeira junto à Barra do Sul do termo desta Vila", a 03/04/1786.
(1. 1Q Sesmarias fls. 95, 95v., e 96).

Posteriormente, adquiriu, através de processo regular, outra Ses-


maria, adiante descrita. Já então Ajudante dos Auxiliares da Ilha de
Santa Catarina.

"que para seu estabelecimento, e suplemento de onze pessoas


de que se compoem a sua família, inclusos tres escravos" - "huma
legoa de terra m quad.-a, que pouco mais ou menos se acha de-
voluta na praia denominada de Tajaí".
Requereu em 12/05/1795.
Informação favorável do Governador João Alberto de Miran-
da Ribeiro: 09/06/1795.
- 640-

Sesmaria concedida pelo Vice-Rei (Conde de Rezende) a 25/08/


1795. (v . mapa) .
JOÃO RODRIGUES DA COSTA:

(Capitão). (Residente no Rio de Janeiro) "que achandose


com forças suficientes para estabelecer huma fabrica de fazer assu-
car, e estando devoluta acima da fo quilha do Rio de Bopetuba,
que devido as Capitanias da Ilha de Santa Catarina e Rio Gran-
de, huma grande extensão de terreno proprio para o sobredito
fim requereu" huma legoa de terras de frente com outra legoa
de fundo".
Requerimento de outubro de 1796.
Editais a 7 de outub'o de 1809
Despacho interlocutório (SC) em 16/outubro/ 1809.
Concedida a 07/07/1811. (v. mapa).

PAULO JOSE MIGUEL DE BRITO: Cavaleiro da Ordem de


Cristo, Tenente Coronel de Cavalaria e Ajudante de ordens do Go-
verno da Ilha de Santa Catarina.

"Nelle necessita fazer estabelecimento em lavoura e criação de


gado"
"tem noticia que na margem do Sul do Rio Cuba tão do Districto
da freg!! de N. Sra. do Rosário da Enciada de Brito no Conti-
nente de terra firme adjacente à mesma Ilha, e detras da Serra
do Pico, aq... do q. co ore na direção do Leste p!! o Oeste desde
a barra do rio denominado S. João athe ao pro. salto do mesmo
rio Cubatão, se achão ainda desocupados Legoas de costão de-
voluto" .
Requer uma legua em qUldro "fazendo frente ao fundo da
data do Capm. de Infantaria de Linha João Bitancurt Pereira
Machado e Souza, confrontando por todos os lados de Leste, Sul
e Oeste com Costão devoluto, aonde ainda não há data ou Ereo
algum".

Determinado ao Ouvidor da Comarca as diligências a 28/06/


1813.
Determinado se passasse provisão de medição e demarcação a
19/06/1815.
Processo de justificação da pretensão de Paulo José Miguel de
Brito, iniciado ~ 12/12/1814 (testemunhas José Antônio de Carva-
lho, casado, "que vive do seu negócio",
- 642-

checo. solteiro, "que vive do seu negócio". 30 anos, José Antônio Pe-
reira Franco, casado, "que vive do seu negócio", 28 anos).
Procuração passada por Paulo José Miguel de Brito a 22/09/
1814 (fls. 14).
ANTONIO JOS);: DE SOUZA e outros: ( ... José Inácio da
Silva Henriques O), Joaquim José de Castro (2), Demétrio da Silva
Maiato (3), José Correa da Silva, José de Souza Chaves, Ana Maurí-
cia Rosa de S. Felix, Manoel Cardoso, Francisco Caetano Soares (4),
Valentim Gonçalves do Saibro).
1). Capitão.
2) . Capitão.
2). Alferes.
4). Sargento-mor.

"São Senhores e possuidores de diversas datas de te ras con-


tiguas no Rio do Cubatão da Provincia de Santa Catarina prove-
niente de outras primarias concedidas aos Cazaes João de Souza
Cabral, José Teixeira Machado, Miguel Francisco Garcia, e Ma-
noel Roiz Cardoso e por que varios intruzos intentão avançar
sob-e os limites de suas propriedades requerem demarcação".
Despacho de 31/07/1823.

ANTONIO JOS);: CABRAL: lavrador, morador no RioCubatão


da Província de Santa Catarina,

"que elle he possuidor de quat-ocentas e setenta e seis bra-


ças de terras de frente e fundos competentes na forma de suas
datas, o qU1I dominio tem justamente adquirido tanto por heran-
ça de seu Pay João de Souza Cabral, Casal das Ilhas dos Açores,
como por compra de igual data de José Teixeira Pacheco, e pela
ocupação corporal e beneficio d'agricultu~a que tem feito".
Despacho de 08/04/1824 (por Monsenhor Miranda).

DOMINGOS JOS);: DA COSTA: Sargento-mor. "filho e herdei-


ro de Antonio José da Costa e de Ana Maria de Jesus".
- diz de Antônio José da Costa era Coronel.
- mandou-me passar carta de confirmação de sesmaria - 24/
09/1827.

"declaro (AJC, em codicilo) que no fundo do campo de Ara-


- 643-

estabelecimento em huma legoa de te-ras de frente, que alcancei


por sesmaria do Vice-Rey Luiz de Vasconcelos e Souza, que
por ser sujeita a estar invadida pelos gentios, lha traspassei para
confirmar a sua confirmação Regia, e d'eUa abri mão em bene-
ficio do ditto filho, que por esta razão nada tem o meu Cazal
com estas terras".

E, outro documento anexo, é mais preciso:

"Dizemos nós abaixo assinados o Capm. Antonio José da


Costa e sua mu. D. Pascoa Maria de Jezus, que sendo-nos con-
cedida no Real Nome de sua Alteza, huma legoa de terras de
frente, e outra pa o fundo, citas no lugar das cabeceiras do Rio de
Manciambu, até o Rio Imbahu, que extremão pela parte do
Norte com as terras que forão de João Roiz Cardoso como cons-
ta da mesma Sesmaria e Certidão do Demarcador, cujas terras,
e da sua Sesmaria, fazemos traspasse a nosso Filho primogenito, o
Tenente Domingos José da Costa, pa. nellas estabelecer o Enge-
nho de assucar pa. q. nos fo~ão concedidas".

19/11/1823 - Juramento do Piloto Demarcador e Ajudante de


Corda.
20/11/1823 - Exame da agulha para poder iniciar a demarca-
ção.
20/11/1823 - Exame da corda,
"a qual sendo-lhe apresentada achou ser hum Cadarço bran-
co de linho, que sendo medido achou ter dez braças craveiras, cada
uma de dez palmos".

20/11/1823 - Início da medição.


21/11/1823 - Reconhecimento do marco e princípio da me-
dição:
"huma pedra bruta, com huma face direita, com palmo e
meio de largo e dous e meio de alto, que na direção da face
apontava com lados Norte-Sul, tendo dois testemunhos ao pé".
- 644-

"às pessoas que estivessem em condições de fundar estabeleci-


mentos rurais".

Desta forma tem-se um dado importante a concessão de sesma-


rias não é abolida ao proclamar-se a nossa Independência política .

a.2 _ - Sesmarias concedidas aos açorianos.

Pela Resolução de 7 de agosto de 1746, ordenava, entre outras


coisas, D. João V, que:

"Os homens que passa;em por conta de S. Magestade ficarão


isentos de servir nas tropas pagas, no caso de se estabelecerem no
termo de dous anos, nos citios que se lhes destinarem, onde se
dará a cada casal hum quarto de legoa em quadro para principiar
a sua cultura, sem que lhes levem direitos, nem salario algum por
esta sesmaria; e quando pelo tempo adiante tenhão familia, com
que possão cultivar mais te;ras, as poderão pedir ao Governador do
Distrito, que lhes concederá na forma das Ordens, que tem nesta
materia.
"E aos casaes das Ilhas que quiserem hir deste Reyno, por se
acharem nelle, se lhes darão as mesmas conveniencias, como tam-
bem aos casaes de estrangeiros, que não forem vassalos de sobera-
nos, que tenhão dominios na America a que possão passar-se, aos
que forem a;tifices se lhes dará uma ajuda de custo, conforme os
requisitos que tiverem" (5).

A simples leitura do trecho que se grifou demonstra que aos


llheus que migraram para Santa Catarina, de 1748 a 1756, oriundos
das Ilhas dos Açores e da Madeira, se lhes deviam uma porção de
terra para cultivo.
Tal foi providenciado ao que parece lentamente. e
o que se de-
preende do contato com o 1.0 Livro de Sesmarias do Governo da Ca-
pitania de Santa Catarina, que abarca o periodo de 2 de junho de
1753 a 26 de junho de 1806, e é, pois,

"Livro q. hade servir na Ilha de Sta. Catarina pa. nelle


selançarem as dattas das terras q. Sua Magde. manda dar aos
cazaes q. passão das Ilhas dos Assores ... " (v. fotocópia).

(5). - MATOS
ANO M~S DIA N9 DE BRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁ.RIOS LUGAR

1753 junho 2 1.400 José Luiz Marinho Cubatão


maio 20 300 Pedro da Costa Cardoso Ponta do Fernando
maio 24 100 Gregorio José de Freitas Lisboa Terra Firme
maio 28 100 João Soares Saco do Itacolomí
maio 18 355 Antônio Dias da Rocha Idem
julho 3 700 Manoel Roiz d'Araujo Barreiros
setembro 18 1.500 José Bernardo Galvão Biguassú
julho 16 400 Luiz Martin$ Ponta do Cacupé
outubro 10 170 João Pereira Cardoso Sacco
1758 setemb:o 9 300 Francisco Vidal da Sa. Sta, Ana
1759 junho 22 500 Miguel Gonçalves Leão Embahu
agosto 28 400 Manoel da Rocha Enseada dos Cast.
setembro 6 108 Manoel Gonçalves dos Stos. Santo Antônio
novembro 6 140 Manoel da Ventura Ponta Grossa
1760 janeiro 2 100 Manoel Duarte (?) Rio dos Tavares
1770 agosto 8 400 João Je. de Le~o Rio do Chiqueiro
julho 3 6.000 João da Costa Orossanga
abril 7 6.000 Francisco J. Pera. Coutinho Rio Acaray
1772 julho 11 750 Manoel de Miranda Bitancourt Rio Cubatão
1773 outubro 20 750 Elias Alexandre Sa. Maruhy
setembro 27 3.000 Manoel de Moraes Pedroso Tubarão
1806 janeiro 11 170 Pedro de Sza. e Silva São Miguel
175 Antônio Dias Bello São Francisco
abril 2 200 Gonsalo da Silveira Dito
200 Salva Fernandes do Rosário Dito
30 150 Manoel de Oliveira Cereal São
ANO M2S DIA N9 DE BRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁRIOS LUGAR

maio 9 150 João José de Sá Brandão ltapocoroy


16 200 Manoel Espindola Vargem de Ratones
23 80 Maria de São José Pescaria Brava
junho 10 250 Antônio Alex. da Maia São Francisco
14 300 Ignácio J. Linha:es São Miguel
18 40 José Silveira da Rosa Santa Ana
68 Florentino Quaresma Gomes Laguna
26 101 Manoel Antônio de Sza. N. A. das Necessidades
1805 agosto 4 155 Antônio Eugenio de Ma. Tavares Araribá
16 250 Rodrigo Antônio d'Espindola Rio da Una
23 95 Cypriano José de Mattos Biraquera
250 Joaquim José Soares Santa Ana
28 150 Franco. de Miranda Couto Pão d'Açucar
setembro 15 200 José Rodrigues dos Passos São Franco.
400 João da Rocha Linhares São Miguel
20 260 José Correia de Mirda. Corrego Grde.
170 Patrício Manoel de Bitancourt Garopaba
outubro 2 34 Manoel J e. de Bitancourt Enseada
23 27 João de Sza. de Quadros Ponte das Pedras
29 60 Maria dos Anjos Lagoa
30 61 Anastácio Pereira Retiro
novembro 5 271 Joana Pereira Quebra-Cabaços
18 137 Miguel Ferreira Laguna
19 400 D. Rita Ignácia d'Almeida Tapera
dezembro 4 55 Manoel Lopes d'Oliva. Santa Ana
1806 janeiro 11 100
ANO M~S DIA NfI DE]JRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁRIOS LUGAR

30 70 Franco. Ferreira Braga São Francisco


30 100 Franco. Lopes de Sza. Dito
janeiro 31 80 Ignácio d'Oliva. Falcão Dito
1793 maio 20 750 Ignácio Custodio de Sza. Lobo São José
junho 20 400 Manoel da Cunha Biguassú
23 300 Luiz Gomes de Carvalho Laguna
1794 janeiro 17 350 José Rodrigues da Costa Rio Cubatão
março 31 350 Antônio Silva Dutra Rio Biguassú
1795 setembro 18 375 Manoel Vargas Rod:igues São José
1803 abril 20 60 Ana Maria do Sacramento Ribeirão
1804 abril 28 220 Manoel Dutra Garcia Bareiros do Ribeirão
maio 5 160 João José de Sa. Brandão Praia das Pissaras
1805 janeiro 6 750 Manoel Luiz da Rosa Estrada do Certão
fevereiro 18 toO João Francisco da Luz Biraquera
março 11 150 Ignácio Garcia dos Stos. Rio dos Pinheiros
15 100 José Felix dos Santos Xavier R. da Me. ou Imbahu
abril 3 140 Franco. de Souza Leal Santa Ana
18 41 Miguel Francisco da Costa Lagoa
maio 21 41 João dos Stos. e outros Dita
junho 20 75 Manoel Fernando Claro Me;>
22 300 João Teixeira da Cunha
julho 11 133 Francisco Fera. da Costa
11 100 José Felix dos Stos. Xe;.
24 200 Antônio Franco. da Sa.
1787 novemb-o 28 120 João dos Santos e A. Fernandes
1788 março 15 420 Alexandre José da Sa.
ANO M~S DIA N" DE BRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁRIOS LUGAR

maio 15 750 Miguel Antônio da Silva N . S . das N ecessidadcs


agosto 19 750 Manoel Garcia Pires Enseada de Brito
outubro 30 125 Manoel Machado Lucas Rio Tavares
novembro 26 240 Antônio Frano. Minsores Laguna
1789 janeiro 26 104 Frano. de Souza Xavier São Miguel
fevereiro 19 400 João de Sza. Bitancourt Cubatão
julho 22 750 Anastácio Silva. de Sza. Maruhy
1790 março 12 750 Joana do Nascimento Pantano
17 900 Miguel Frano. de Fraga. Laguna
setembro 20 2.600 Antônio Vieira. Rabello Rio Tavares
30 950 Manoel Vieira Fernandes Enseada de Brito
dezembro 18 82 Aleixo Maria Caetano Itarocoby
1791 março 22 313 Franco. da Rocha Cota Biguassú
maio 20 750 Vicente Zuzarte Pinto Idem
30 360 Manoel Soares Serrão Passa Vinte
setembro 20 594 Antônio Correa da Silva Lagoa
23 300 João Franco. de Medeiros Rio Maruhy
24 750 João da Costa da Silva Sacco
30 190 Aleixo Correa d'Andrade Passa Vinte
julho 12 495 Domingos da Ponte Cabral Na Ilha
fevereiro 10 808 D. Guiomar H. da Cunha Coivara
maio 2 920 D. Ant' M' da Cunha Frejubahé
março 15 1.500 Manoel Soares Coimbra Saco do N aruhi
1776 janeiro 21 60 Izabel de Jesus Ribeirão
fevereiro 27 750 José da Silva Pereira Biguassú
abril 2 150
ANO M~S DIA N9 DE BRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁ.RlOS LUGAR

agosto 13 160 José da Rosa Luz Ratones


dezembro 12 120 Paulo Lopes Falcão Saco dos Limões
1777 fevereiro 18 350 Francisco Je. de Castro Biguassú
12 550 Luiz Gomes de Carvalho Laguna
17 185 Manoel Borges Saco dos Limões
março 10 500 José Cardoso Caldeira Caiacanga
maio 9 294 Francisco Gomes de Mgs. Garopaba
junho 2 275 Antônio Vieira Affonso Idem
1778 janeiro 27 65 Manoel Cardoso de Souza Lagoa
fevereiro 1 248 Manoel Vieira e outros Idem
13 250 Frano. Xer. Fernandes Laguna
22 600 Antônio dos Stos. Xavier Rancho do Ouvidor
1778 março 28 Antônio José Fernandes Campos dos Pinheiros
29 152 Bernardo da Costa Rib. Grande (Laguna)
1772 fevereiro 22 3.000 Manoel G. Leite de Barros Araranguá
1774 janeiro 19 400 João d'Andrade Praia das Frexas
100 o mesmo Freg\l da Lagoa
fevereiro 28 400 Maria do Espírito Santo Caputera
400 a mesma Maruhy
abril 5 9.000 João da Costa da Silveira Araranguá
junho 22 500 Francisco da Rocha Cota Serraria
março 21 100 José Nunes Dinis Morro dos Ingleses
julho 2 200 João Pereira Valle São Miguel
2 200 Agostinho Ferns. de Carvalho Idem
junho 26 150 Silvestre Soares Maruhy
26 750
ANO MES DIA N{) DE BRAÇAS NOME DOS CONCESSIONÁRIOS LUGAR

julho 28 600 Matheus Antônio Rio dos Bobos


junho 16 1.500 D. Guiomar H. da Cunha Rio Tavares
agosto 5 750 Jacinto Jaques Nicós Tubarão
5 750 João da Costa Moreira Idem
20 750 José Luiz Marinho Aririú
setembro 4 400 Antônio José Nunes Ingleses
1775 março 15 400 Pedro da Silva Barros Massambú
17 800 João Marcos Vieira
- 651-

E, pela sua originalidade transcreve-se, aqui o índice elabora-


do (6).
Muitas destas sesmarias vão mudar de mão, por herança, ou por
compra e venda, e vão ter as suas confirmações operadas pela Mesa do
Desembargo do Paço e seus processos hoje (1975) estão em de-
pósito no Arquivo Nacional, Rio de Janeiro.
Mas, vale a pena, pelo seu conteudo transcrever algumas delas,
explicitamente concedidas a "Casal de número" ou "Casal d'EL REI"
ou a seus descendentes.
Tais são:

1. - JOSÉ LUIZ MARINHO - 1.400 braças em quadro,


na paragem do Cubatão da terra firme "com a frente ao rumo
do Norte extremando por esta parte com Antônio de Souza, cor-
rendo ao Sul, frente para o Sul findando a sua medição com
José Teixeira", sendo-lhe concedida, pelo Governador Manoel
Escudei:o Ferreira de Souza, a 2 de junho de 1753.
2. - PEDRO DA COSTA CARDOSO - 300 braças em
quadro "em huma ponta chamada a do Fernandes com a frente
ao rumo do Norte e os fundos ao de Oeste extremado pella parte
do Norte com André de Souza", foi-lhe concedida, pelo supraci-
tado Governador, a 20 de maio de 1753.
3. - GREGÓRIO JOSÉ DE FREITAS LISBOA - 100
braças de frente com 500 de fundos "principiando a sua testada no
corgo a q. demarca com o Padre Ignacio J oseph de Abreu, "foi-
lhe concedida, pelo aludido Governador", a 24 de maio de 1753.
4. - JOÃO SOARES - "que na paragem do Sacco do
Hitacolomin se achava de posse" de 100 braças de frente, extre-
mando pela parte do Norte com Manoel Alvares da Cruz e pela
do sul com Clemente Henriques, sendo-lhe concedida, pelo mes-
mo Governador, a 20 de maio de 1753.
5. - ANTôNIO DIAS DA ROCHA - 350 braças "na
paragem do Sacco do Hitacolomin", sendo-lhe concedida sesmaria
pelo mesmo Governador, a 18 de maio de 1753.
6. - MANOEL RODRIGUES DE ARAUJO - 700 braças
de testada e, 1465 (de fundos) "na paragem dos Barreiros da
terra firme", "extremado da parte do Norte com Antônio Rodri-

(6). - PIAZZA
- 652

gues Rachadel e da do sul com Joseph de Souza de Azevedo"


sendo-lhe concedida, pelo mesmo Governador, a 3 de julho de
1753.
7. - JOS~ BERNARDO GALVÃO (Capitão) - "que na
paragem do Rio de Embigoas1,l se achava de posse" de 1500 bra-
ças em quadro, "ext~emado pela parte do sul com o mesmo Rio
e pela do Norte com mattos baldios", foi-lhe concedida, pelo
mesmo Governador, a 18 de setembro de 1753 (7).
8. - LUIZ MARTINS - 400 braças de testada "na para-
gem da ponta de Cacupé indo findar a sua medição no Saco da
Capotera" "principiando a sua demarcação na extrema de Marti-
nho de Amorim, e acabando na de Antônio Dias da Rocha",
sendo-lhe concedida, pelo mesmo governador, a 16 de julho de
1753.
9. - JOÃO PEREIRA CARDOSO - 170 braças de testa-
da, "co:rendo a frente ao rumo de Norte e Sul, extremado por
esta parte com Antonio dos Santos Xavier e por aquella com o
Rocio desta Villa", "na paragem do Sacco", sendo-lhe concedida,
pelo aludido Governador, a 10 de outub"o de 1753.
10. - FRANCISCO VIDAL DA SILVA - 300 braças de tes-
tada com 450 de fundos" na freguesia de Sta. Ana na paragem
chamada a Barranceiras", "que pela parte do sul partia com
Laurinho Soares e pelas do No:te com Francisco Lopes da Sil-
veira", sendo-lhe concedida sesmaria peJo Governador D. José
de Mello Manuel, a 9 de setembro de 1754.
11. - MIGUEL GONÇALVES LEÃO - (Capitão) - "de
posse de huns pastos dezertos e. alagadiços" "no caminho que ha
da Guarda do Embahu para a Villa da Laguna", "que teriam
legoae meia athé duas de cumprido e huma de largo mais ou
menos as quais eram cercadas por naturesa, po: tres partes, hua
pela costa do Mar Grosso, outra pela Serra do Siriu e a outra
parte pelo Rio d'e Embau e do seo braço chamado o Madre",
sendo-Ihe concedida, pelo supra mencionado Governador, a 22
de junho de 1759.
12. - MANOEL DA ROCHA - (Capitão) - 400 b:aças
de frente com 600 de fundos "na paragem chamada a Enciada
dos Castelhanos dentro da dita Ilha, aonde em outro tempo se
fazia se fazia Caeiras para as obras reais", sendo-lhe concedida
pelo aludido Governador, a 28 de agosto de 1759.

(7). - A respeito dele encontra-se: Capitão de Infantaria da Praça da


Ilha de Santa Catarina, pediu provimento na guarnição do Rio de Janeiro,
em 1755. Pediu, no mesmo ano de 1755, confirmação da sua carta de sesma-
ria (datada de 18/09/1753), o que lhe foi concedida por Portaria de 19/01/1756.
653 -

13. - MANOEL GONÇALVES DOS SANTOS - "na


paragem da Praya Cumprida na freguesill de Nossa Senhora das
Necessidades" com 108 braças de f:ente "athé as agoas verten-
tes" de fundos, e que comprara de Manoel Duarte e sua mulher
Gertrudes Tavares e confrontava "pela parte do Sul com Fran-
cisco Antônio Marques", sendo-lhe concedida, pelo mesmo Go-
vernador, a 6 de setembro de 1759.
14. - MANOEL DA VENTURA (Soldado) - 140 braças
de testada "nas vizinhanças do Pontal da Fortaleza da Ponta
Grossa desta mesma Ilha e com os fundos athé ao alto do Monte,
"e que pe:tenceram a Miguel de Castilhos e as vendera a Igna-
cio de Azevedo e pelo falecimento deste à mulher do requerente,
"e partião as ditas terras pela parte do Nordeste com José Coelho
e pela do Sudoeste com o soldado Silvest:e Fernandes", sendo-
lhe concedida, pelo aludido Governador, a 26 de novembro de
1759.
15. - MANOEL DUTRA - 100 braças e 637 de fundos,
"quinhentas de fundos na frente das ditas cem braças que lhe
dera em dote de casamento seu sogro Miguel Tavares, cem em
coadro por concessão deste Governo", o que lhe foi concedido
poe sesmaria a 02 de janeiro de 1760, pelo mesmo D. José de
Mello' Manuel.

Poder-se-ia alinhar todas as outras feitas aos "casais" ou aos seus


descendentes, constantes do índice, a princípio, reproduzido .

111 - NO PROCESSO COLONIZADOR DO IMP"ERIO.
a. - Nas colônias particulares.
a. 1. - A Colônia Blumenau.

o Dr. Rermann Otto Bruno Blumenau percorrera o Brasil-me-


ridional, em 1846, em nome da "Sociedade de Proteção aos imigran-
tes Alemães no Sul do Brasil", como procurador da mesma e encar-
regado de estudar as condições de vida dos imigrantes aqui radicados
(8).
Em 1848 explorou o vale do Itajaí-Açú e seus principais afluen-
tes, acompanhado do seu sócio Fernando Hackradt. E, a 26 de março
daquele ano de 1848, inicia o Dr. Blumenau a luta administrativa,

(8). - SILVA
- 654-

junto aos orgãos governamentais da Província de Santa Catarina para


obter concessões de duas "datas" de terras, cada uma com 5 ou 6 lé-
guas em quadro (9), às margens do grande rio, para coloniza-las.
Consegue uma pequena concessão.
Volta à Alemanha, arregimenta emigrantes, embarca-os para o
Brasil, onde chegam os primeiros dezessete. Isto em 1850.
Os trabalhos de medição e demarcação dos lotes urbanos e ru-
rais dão-se no início de 1852 e os primeiros distribuidos foram:

Nome dos colonos NQ do Hectares Preço Pessoas por


Lote Família
Dr. Fritz Muller 49,5 100$000 3
Augusto Muller 2 48,5 100$000 2
Eurico Ehrhardt 10 37,75 10$500 3
Augusto Hesse 5 36,0 11$000 9
Frederico Seifferth 6 37,5 10$500 4
Gaspar Huhn 7 36,0 10$500 5
João Gebien 8 39,0 11$000 3
Christiano Josinger 9 36,0 10$500 7
Andreas Klinger 11 33,5 10$500 5
Carlos Spiess 12 33,75 10$500 4
Christian Halneman 13 33,25 10$500 7
Eurico Leuthausser 14 33,0 10$500 4
Total 12 452,0 306$000 56

De acordo rom a orientação do Dr. Hermann B. O. Blumenau


eram estas as suas especificação para a formação da propriedade na
Colônia:

"a.) - Os lotes urbanos, tem desde 300 até 10.000 e ainda


mais braças quadradas, segundo a situação e qualidade das ter-
ras e conveniência da distribuição: o seu preço deve ser de 5 a
40$000 por geira de 500 braças quadradas, ou de 10 a 80 réis por
braça quadrada pagavel à vista.
b). - Os lotes rurais, podem haver desde 10 geiras ou
5.000 braças e nunca terão mais de 200 geiras ou 100.000 bra-
ças quadradas. O seu preço deve ser de 1$000 até 4$000 por
geira, ou de 2 a 8 réis pela braça quadrada, pagavel à vista" (10).

(9). - A légua quadrada equivale a 43,56 Km 2 •


(lO). - BLUMENAU (Dr. Hermann B.O.), Os
- 655-

Deve-se dizer que a área da colônia quando, em 1860, passou


para o domínio do Governo Imperial era de 23 3/4 de léguas qua-
dradas, ou seja 1. 034 km2 • De 1860 a 1869 havia se expandido de
128 a 145 léguas quadradas, ou seja de 6.000 a 6.400 km2 • Encon-
travam-se de posse de particulares em 1859, 5.509 hectares, e, em
1869, 36.242 hectares.
Em 1882 a área da Colônia compreendia 6.481 km2 que abran-
gia 341 lotes urbanos com 2. 100 hectares e 2.904 lotes coloniais com
68.524 hectares, o que significa, nestes últimos, uma média de 23,6
hectares por lote.
No ano seguinte, 1883, a Colônia Blumenau tinha sua sede trans-
formada em sede municipal, e deixava de existir o regime especial das
colônias, passando a funcionar o regime das leis gerais do país.
Vamos, pelos dados apurados que erà, inquestionavelmente, uma
colônia de pequenas propriedades agrícolas, onde, tambem, o número
de membros da família não alterava, diante da Direção da Colônia,
as condições de tamanho do lote rural que lhes era atribuido.

b. - Nas terras dotais.

Partindo do princípio consuetudinário de que cada consórcio em


uma família real implicava no estabelecimento de um dote; a Família
Imperial Brasileira não fugia à regra.
Assim, pela Lei n.o 166, de 29 de setembro de 1840, ficava es-
tabelecido que as princesas, filhas de D. Pedro I, e, portanto, irmãs
de D. Pedro lI, em idade de casar, teriam, entre outras vantagens
econômicas, um patrimônio em terras, pertencentes à nação. Caso
optassem pela residência no exterior receberiam quantia correspon-
dente ao valor das terras, em dinheiro.
Tal lei beneficiaria, prontamente, as Princesas Dona J anuária e
Dona Francisca (1824-1898), por ordem de nascimento.
E, entretanto,
656

LEI N9 1.217. - de 7 de Julho de 1864. Estabelece a


dotação de Suas Altezas Imperiaes, quando houver de realizar-se
o seu Consórcio.
Dom Pedro, por Graça de Deus, e Unanime Aclamação dos
Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil;
Fazemos saber a todos os Nossos Subditos que a Assembléa Ge-
ral Decretou, e Nós Queremos a Lei seguinte:
Art.19 Ficão em vigor, para a dotação de Sua Imperial A Se-
nhora D. lzabel, as disposições da Lei numero cento e sessenta
e seis de vinte e nove de Setembro de mil oitocentos e quarenta,
com as seguintes alterações:
§ 19 Quando se realizar o Consorcio de Sua Alteza Impe:ial,
será a sua dotação de cento e cincoenta contos de réis, cessando
desd'e então os alimentos, que actualmente percebe, e será paga
pela forma, por que o é a de Sua Magestade o Imperador.
§ 29 Fica decretada a quantia de trezentos contos de réis
para a acquisição de predios, destinados à habitação de Sua Al-
teza Imperial e Seu Augusto Consorte.
Enquanto se não effectuar esta aquisição, será pago pelo The-
souro, na razão de seis por cento do referido capital, o aluguel de
predios, que sejão para o mesmo fim mais idoneos.
§ 39 Fica decretada a quantia de duzentos contos de réis,
para as despezas do enxoval e outros objectos do serviço dos
Augustos Consortes.
§ 49 Sahindo Sua Alteza Imperial para fora do Império,
se lhe entregará por uma só vez, na forma do artigo cento e
treze da Constituição Política, o dote de mil e duzentos contos de
réis.
Art. 29 As disposições relativas ao Consorcio de Sua Alteza
Imperial são inteiramente applicaveis ao de Sua Alteza e Senho-
ra D. Leopoldina.
Art. 39 Ficão revogadas as disposições em contrário.
Mandamos portanto a todas as autoridades, a quem o conhe-
cimento, e execução da referida Lei pertence:, que a cumprão, fa-
ção cumprir, e guardar tão inteiramente, como nella se contém.
O secretário de Estado dos Negocios do Império a faça im-
primir, publicar e correr.
Dada no Palacio de Janeiro em sete do mes de julho de mil
oitocentos sessenta e quat.o, quadragesimo terceiro da Indepen-
- 657-

IMPERADOR com Rubrica e Guarda.


José Bonifacio de Andrada e Silva.
Zacarias de Góes e Vasconcellos.
Sellada na Chancellaria do Imperio em 12 de julho de
1864 - Candido Mendes de Almeida, Director Geral interino.
Registrado.

Nesse mesmo ano de 1864, casa-se a 15 de outubro, a Princesa


Dona Izabel com o Conde d'Eu (Gastão d'Orleans), e, pela Lei n.o
1. 904, de 17 de outubro de 1870, se estabelece, na forma seguinte
de acordo com o contrato matrimonial, o patrimônio dotal desta Prin-
cesa:

LEI n'l 1904 - de 17 de outubro de 1870.


Estabelece para Sua Alteza Imperial a Senhora D. Izabel
Christina e seu Augusto Esposo, nos termos do respectivo con-
tracto matrimonial, um patrimonio em terras nas provincias de
Santa Catarina e Sergipe.
Dom Pedro Segundo, por Graça de Deos e Unanime Aclama-
ção dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do
Brasil: Fazemos saber a todos os Nossos Subditos que a Assem-
bléia Geral decretou e Nós Queremos a Lei seguinte:
Art. 1\> Fica estabelecida para Sua Alteza Imperial a Se-
nhora D. Izabel Christina e seu Augusto Esposo, nos termos do
respectivo contracto matrimonial, um patrimonio em terras, cons-
tante de duas porções, cada uma de 49 leguas quadradas, sendo uma
na Provincia de Santa Catarina e outra na de Sergipe, ou em qual-
quer outra Provincia do Imperio, se porventura nesta ultima não
houver porção de terras suficiente; podendo os lotes conter no
minimo até 6 leguas quadradas.
Este patrimonio, do qual fará parte o predio comprado para
habitação de Suas Altezas, se,·á considerado como proprio nacio-
nal, como o destino que lhe é dado, e nos termos do mesmo
contracto matrimonial.
É, porém, permitida a venda de metade das terras a colo-
nos que as venhão cultivar, sendo o producto líquido da aliena-
ção empregado em apólices da divida publica fundada do Imperio,
as quaes, inscriptas como inalienaveis no grande livro, farão parte
do patrimonio de Suas Altezas.
Art. 2\>
- 658-

Fica para esse fim concedido ao Governo um credito de


35:000.000.
Art. 39 Ficão revogadas as disposições em contrario.
Mandamos, portanto, a todas as Auto'idades, a quem o co-
nhecimento e execução da ~eferida Lei pertencer, que a cumprão e
fação cumprir e guardar tão inteiramente, como nella se con-
tém . o Secretário de Estado dos N egocios do Imperio a faça
cumprir, publicar e correr.
Palacio do RIO de Janeiro, em dezassete de Outubro de mil
oitocentos e setenta, quadragesimo nono da Independencia e do
Imperio.
IMPERADOR com Rub ica e Guarda.
João Alfredo Corréa de Oliveira.
Carta pela qual Vossa M~gestade Manda executar o
Decreto da Assembléia Geral, que Houve por bem Sancionar,
estabelecendo para Sua Alteza Impe~ial a Senhora D. Izabel
Christina e seu Augusto Esposo, nos termos do respectivo contrac-
to mltrimonial, um pat imonio em terras, como nella se decla-
ra.
Para Vossa Magestade Imperial ver.
Luiz Ferreira da Silva Cabral a fez.
Chancelaria-mó r do Imperio. - Barão das Tres Bar-
ras.
Transitou em 19 de Outubro de 1870. - José da Cunha
Ba~bosa. - Registrada.
Publicada na Secretaria de Estado dos Negocios do
Imperio, em 20 de Outubro de 1870. - Fausto Augus-
to de Aguiar.

Desta forma, tem-se a compreensão de como se formou, em


território catarinense, o patrimônio dotal das princesas brasileiras.

b. 1. - A Colônia "Dona Francisca".

A Colônia "Dona Francisca" fundada, em 1851, pela "Socie-


dade Colonizadora de Hamburgo, de 1848", em terras pertencentes
ao dote da Princesa Dona Francisca, casada com o Príncipe
- 659-

Esta Colônia recebeu seus primeiros habitantes, desembarcados


da marca "Colon", a 9 de março de 1851 e, logo foram eles distribui-
dos, conforme nos foi possivel constatar, e assim configurou-se a ocu-
pação territorial por esses primeiros imigrantes:

Friedrich Wilhelm Ebert


J oham Friedrich Rosskamp
Wilhelm Hoffmann
Christian Gilgen
J ohannes Schmidhlin
Anne Weber Ahlers
Barbara Weber Müller
Hans George Müller e inúme~os outros.

Acerca da distribuição fundiária em sua área territorial, tem-se o

"Livro de Registro das vendas de terras da Sociedade Colo-


nizadora de Hambu~go, em 1849" (12).

Naquela parte que, hoje, é a parte urbana da cidade de Joinville


a distribuição das terras foi efetuada a partir de 15 de março de 1851
- portanto, seis dias depois da chegada dos primeiros imigrantes, que
coube a Friedric.h Wilhelm Ebert, no rio Mathias, com 17.500 braças
quadradas, e as ultimas anotações do referido livro chegam a 25 de
outubro de 1898.
Uma visão do movimento anual de vendas dessas propriedades
pode ser, assim, caracterizada.
Por outro lado, fruto da análise da mesma fonte primária tem-se
que avaliar o tamanho dessas propriedades para situa-las como já,
na origem, nitidamente urbanas ou com características de proprieda-
des dedicadas às atividades rurais.
f: o que se faz no quadro seguinte:
A chamada "Rua Suiça" ou "Aguas Vermelras" é a que se apre-
senta com maior quantidade de propriedades com área superior a
15 . 000 braças quadradas.

(12). - Depositado no Museu Nacional de Imigração e Colonização,


de Joinville como Livro Avulso nQ 4, cuja c6pia e tradução foi efetuada pela
Sra. ILKA GõCKS,
- 660-
COLôNIA DONA FRANCISCA.
MOVIMENTO DE VENDAS DE TERRAS.

Anos Meses
Jan Fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Total
1851 9 1 6 5 2 1 2;
1852 4 2 2 2 11 5 12 4 43
1853 1 2 2 5 3 17
1854 1 5 1 2 11
1855 3 4 4 2 18
1856 3 3 1 3 14
1857 5 2 3 8 2 10 7 6 1 3 12 59
1858 4 2 3 3 5 2 1 23
1859 2 4 8 2 21
1860 2
1861 5 2 8
1862 1
1863 5 2 7
1864 1 1 3
1865 3 3 1 10
1866 2 4 7
1867 2 2 3 10
1868 2 2 2 7
1869 2 2 3 3 3 14
1870 2 3 2 10
1871 1 6
1872 2 1 1 2 2 9
1873 2 S
1874
1875 2
1876 3 4
1877 1 5
1878 1
1879 4 6
1880 4 2 2 1 9
1881 2
1882 1
1884 2
1883 1 3
1885 O
1886 2 2
1887 O
- 661

Anos Meses
Jan Fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Total
1889 1 1 2
1890 1 2 6
1891 1 3 3 7
1892 2 3
1893 1
1894
1895 2 2
1896 1
1897 2 1 3
1898 2 4

A efetiva conversão da "braça quadrada" em metros quadrados


(cada braça equivalendo a 4.84 m2) ver-se-á que houve, nesta distri-
buição Que corresponde, hoje, à área urbana da cidade de Joinville, era
povoada de pequenas, médias e grandes propriedades rurais, porquanto
já a gleba de 5.000 braças quadradas iguala-se a um módulo agrícola
de 24. 200 metros quadrados.
Isto é, pois, um pequeno adminículo ao estudo da formação ter-
ritorial da Colônia "Dona Francisca", a partir distribuição inicial das
propriedades!

b. 2. - A Colônia Grão Pará.

No contrato matrimonial entre o Conde d'Eu e a Princesa Isabel,


ficava estabelecido o seguinte dote: à Dona Isabel, 150 contos por
ano, 200 contos para o enxoval, 300 contos para a compra do pa-
lácio, um patrimônio em terras devolutas e, para o Conde d'Eu, 30.000
francos em jóias, 32.000 florins austríacos, 43.700 francos em va-
lores diversos, no regime de separação de bens (13).
A parte definindo o patrimônio dotal em terras devolutas, só
bem mais tarde, foi objeto de esclarecimento, ao ser votada a Lei n. o
1 .904, de 17 de outubro de 1870,
TAMANHO ORIGINAL DAS PROPRIEDADES
TAMANHO ( Braças quadradas (*) )

Local de de de de de mais
até 250 250 a 500 501 a 1. 000 1.001 a 5.000 5.001 a 10.000 10.001 a 15.000 de 15.001
Rio Mathias - Cachoeira 1 7 3 1 3 8 8 (4)
Rua Adolfo
Rua do meio 1 5 4 8 15 7 12 (1)
Rua Alemã 1 1
Cachoeira 5 5 12 4 4 8 (2)
Estrada Griger 9 2 8 (3)
Est(ada Carolina 2
Estfada Norueguesa 2 6 5
Rua Ludovico 2 2
Rua Frederico 2 2
Rua do Porto 1 2
Rua Jacó 1 2 2 6 40
Rml Suiça-Aguas Vermelhas
Rua do Norte 2
Rua Olaria 1 2
(*). - a braça quadrada convertida para o sistema métrico o decimal, equivale a 4,84m 2 •
(1) - Entre estas se anota uma propriedade com 129.792 braças quadradas.
(2). - Entre estas se anota uma propriedade com 78.480 braças quadradas.
(3). - Entre estas se anota uma propriedade com 130.800 braças quadradas.
( 4). - Entre estas se anota uma propriedade com 79 . 500 braças quadradas.
(5). - Entre estas se encontra uma prop~iedade com 76.166 braças quadradas.
(6). - Entre estas se encontra uma propriedade com 86.343 braças quadradas.
(7). - Entre estas se encontra uma propriedade com 69.610 braças quadradas.
-663-

guas. E, somente, em 21 de fevereiro de 1888 concluiram-se as me-


dições do patrimônio dotal.
É esta a súmula das medições e indicações de como se compõs
o patrimônio dotal da Princesa Dona Isabel:

"Em Tuba:ão completaram-se vinte e quat""o léguas, as qUlis


se ajuntaram em 1887 outra grande extensão de terras.
As demais para completar as 98 do Patrimônio Dotal foram
medidas no norte do Estado, nos vales do rio Negro e Itapocú.
Para a colonização e venda destas ultimas os Condes haviam con-
tratad'o a Companhia Colonizadora de Hamburgo" (15).

A 15 de novembro de 1881 é assinado entre os Condes d'Eu, re-


presentados pelo Visconde de Carapebus, e o Comendador Joaquim
Caetano Pinto Júnior um contrato de colonização no vale do Tubarão,
em parte das terras do Patrimônio dotal .

C. - Colônias Oficiais.

C. 1. - A Colônia Nacional Angelina - Na Colônia Nacional


"Angelina" (16), ao organizar-se a sua vida foram, pelo Presidente da
Província de Santa Catarina, baixadas "Instruções" reguladoras a 10
de dezembro de 1860, que, assim, se exprimem no tocante à proprie-
dade rural.
Ar!. 4Q - Os prazos coloniais se. ão de 62.500 braças qua-
dradas e demarcadas pela maneira seguinte:
1Q - A linha de frente será traçadas paralelamente ao rio,
deixando-se de permeio o espaço suficiente para abertura de
uma estrada de 10 braças de largura e com o ~esguardo suficiente
contra as inundações <to rio"
2<'- - Serão abertas as linhas laterais n'uma extensão so-
mente de 20 braças, indicando-se, porém, na planta, na qual
a sua direção e extensão total que devem ter, até encontrar a li-
nha dos fundos, que será tambem indicada, ficando reservada a
dema~cação completa destas linhas para quando se tiver concluído
os trabalhos mais urgentes, que são prescritos e assim resolver
o presi<tente da província.

(15). - DALL'ALBA, op. cit., p. 21.


(16). - PIAZZA (Walter F.), Ant:elina,
- 664-

3' - Os prazos coloniais terão cem braças de frente e os


fundos correspondentes.
Art. 59 - Os colonos serão empossados dos lotes de ter-
ras em vista de um título provisório, que será passado pela de-
legacia de terras em virtude de despacho ou ordem do presidente da
provincia. N'este título se especificarão as condições seguintes:
§ 19 - A venda das terras a preço de 1/2 real à braça
quadrada e a prazo de quatro anos
/ 29 - Pagamento em prestações iguais, a contar do fim
do segundo ano do estabelecimento do colono
§ 39 - Hipoteca das terras e benfeitoriaS! que n'ellas forem
construídos, até coletivo embolso da Fazenda Nacional.
Art. 11 9 - Se findo os primeiros seis meses, contados da data
da entrega das terras, não tiver o colono dado principio à cul-
tura, e levantado sua casa, ainda que provisória, julgar-se-há ter
abandonado o seu prazo colonial, e poderá ser entregue a outro
que o requerer.
"Cada colono ocupa um lote de terras que mede cem braças
de frente com 650 de fundo" (17).

Fundada em 1860, em 1863 possuia demarcados. 69 lotes colo-


niais e destes foram distribuidos 41 (18).
Em 1864 era esta a situação da Colônia:

"Acham-se demarcados 96 lotes de terras dos quais já foram


distribuídos 72, sendo 50 com estabelecimento definitivo e 22 em
principio" (19).

A área original de 9.000.000 de braças quadradas (42.560.000


m2) em 10 de dezembro de 1860, vai ser ampliada por ato de 27 de
janeiro de 1866 (20).
Ao findar 1866 o quadro territorial da Colônia era, assim, defi-
nido: dos 156 lotes de terra atualmente demarcados, 139 já se acham
distribuidos, sendo com estabelecimento definitivo 105 e em principio
34 (21).
Como se vê o número de lotes demarcados não era muito grande!

(17). - MOTA, Relatório. 1862 p. 26.


(18). - OLIVEIRA, Relatório. 1864, p. 23.
(19). - CHAVES, Relatório, 1865, p. 33-34.
(20). - BOITEUX, 1.
- 665-

C. 2. - A Colônia ltajaí - Brusque. A Colônia Itajaí fun-


dada a 4 de agosto de 1800 denominada, logo depois da sua fundação,
Brusque, pelo seu primeiro Diretor, Barão Maximiliano Von Schnee-
burg em homenagem ao então Presidente da Província de Santa Cata-
rina, dr. Francisco Carlos de Araujo Brusque, situou-se no Vale do
Itajaí-Mirim.
Diz um analista (22):

"se processou o povoamento do vale do Itajaí-Mirim e em


que ele se assemelha ao sistema de Waldhufen".

E, O mesmo Autor acrescenta:

"A Rufe correspond'e à área de terreno alongado e, em ter-


mos gerais, designa a propriedade de cada família camponesa. O
processo de povoamento das flo~estas alemãs era sempre prece-
dido pela atribuição de Rufe, cujo tamanho, em hectares, varia-
va conforme a região".

E completa, a seguir:

"O tamanho do lote atribuido a cada colono no Vale do Itajaí-


Mirim tambem se aproximava do tamanho de cada Rufe. De acor-
do com Niemeier a largura da Rufe, em qualquer dos quatro
sistemas em que esta predominou, variante entre algumas dezenas
de metros até cerca de 200 metros e seu compdmento ia desde
algumas centenas de metros até alguns quilômetros. Conforme o
terreno, os limites âa Rufe são lineares ou irregulares. O ponto
inicial da mesma e tambem a direção das propried'ades, é deter-
minado por um riacho, um canal ou um caminho, a partir do
qual são traçadas as linhas de demarcação".

E, enfatiza, finalmente:

'0 tamanho da propriedade de cada colonizador raramente


ultrapassava os 30 hectares.

(22). - SEYFERTR (Giralda), A Colonização alemã no Vale do ltajaí-


Mirim. Porto
- 666-

Pois bem, nesta Colônia Itajaí-Brusque em 31 de dezembro de


1862 se localizavam 181 famílias e já existiam demarcados, dentro do
sistema descrito, 221 lotes (23).
No ano seguinte 1863 a situação poderia ser resumida desta for-
ma: para 953 pessoas existiam 225 lotes demarcados e ocupados (24).
Já, no ano de 1866 foram demarcados mais 48 lotes com 40.864
braças correntes (25).
A 21 de julho de 1869 contavam com distribuidos os lotes, a se-
guir, relacionados:
Nicolau Fischer 1828 braças
Maximiliano Bittelmam 1336 braças
Francisco Hoenert 668 braças
Pedro Rieg 1168 braças
Francisco Carlos Kohler 668 braças
João Hei! 1168 b~aças (26).

No ano de 1876 a Colônia Itajaí-Principe Dom Pedro (esta última


havia sido incorporada àquela), apresentava-se com uma área de 15
léguas quadradas, dividida, até então, em 724 lotes, todos ocupados, e
com uma área, cada um, aproximadamente, de 10.000 m2 •
Já, no mesmo ano, o Relatório apontava 1736 lotes, como me-
didos e ocupados, abrangendo uma área de 25.000.000 m2, onde se
localizavam 2620 alemães, 2214 austríacos, 2098 italianos, 996 bra-
sileiros, 68 franceses, 36 ingleses, 25 espanhois, 7 belgas e 6 holan-
deses (27).
Dessa situação resultaram as seguintes projeções, como se con-
cui:
. a aquisição de terras era a principal meta do chefe da
família. Essas terras raramente ficavam contínuas ou próximas à
colônia do comprador, porque um certo número de novos imigran-
tes aos quais se atribuiam lotes - entravam todos os anos na
área de colonização".

(23). - SCHNEEBURG (Barão de),Relatório data-lo de 19 de janeiro


de 1863. (Arquivo da Sociedade Amigos de Brusque - SAB).
(24). - SCHNEEBURG, Relatório de 15 de dezembro de 1863. Arquivo
SAB.
(25). - SCHNEEBURG, Relatório de 1867. Arquivo da SAB.
(26). - Ofício da Direção da Colônia, datado de julho de 1869. Arqui-
- 667-

"Essa aquisição de terras não conduziu à formação de nú-


cleos familiares extensos por duas razões: a desconrinuidade dos
lotes e a tradição familiar dos camponeses alemães no século XIX.
Nas áreas rurais alemães dessa época, em geral, uma família com-
punha"se de t~ês gerações vivendo na mesma propriedade: os
pais, um dos filhos casados e sua prole. Os demais filhos eram
obrigados a abandonar a propriedad'e paterna" (28).

E a mesma Autora conclui:


"Portanto, a herança da terra estava, nessa época, vinculado ao
tipo de família, ao tamanho da propriedade de terras devolutas.
Os arranjos feitos nos processos de he:ança não mudaram quase
nada o sistema tradicional alemão".

E, nas demais colônias alemãs e italianas do Estado de Santa


Catarina vai se ter grande número de exemplos que confirmam ru
nossas afirmativas.

d. Nas colônias militares.
O Governo Imperial procurando dar nova dimensão à ocupação
do solo brasileiro e. ao mesmo tempo, defender os caminhos de pene-
tração, procurou uma fórmula adequada a tais finalidades.
Desta forma, fez implantar o sistema de colônias militares.
A Lei n. o 555, de 15 de junho de 1850,
"fixando a d'espesa e orçando a receita para o exercício de
1850 a 1851",

no seu artigo 11, § 5. 0 , reza:


"estabelecer, onde convier, presídios e colônias militares dan-
do-lhes a mais adequada organização".

Fruto desta nova organização é a criação, pelo Decreto n. o 1266,


de 08 de dezembro de 1843, da Colônia Militar "Santa Tereza", nesta
então Província de Santa
- 668-

lônia Militar do Chapecó, em território que se integraria, já no pe-


riado republicano, à área catarinense.

*
d.l. - Colônia Militar do Chapecó.

Na região do hoje extremo oeste catarinense dadas as suas con-


dições naturais existiam campos nativos, onde, paulatinamente foram
se instalando "fazendas-de-criação". Em 1840 havia nos chamados
"Campos de Palmas" 37 dessas fazendas.
Por portaria de 16 de agosto de 1844 a Presidência da Província
de São Paulo determinou a Francisco Ferreira da Rocha Loures a
abertura de uma picada dessa região para o Rio Grande do Sul.
A região passou a ser contestada pela República Argentina, da-
das as imprecisões das "partidas" demarcatórias dos Tratados de Ma-
drí e Santo Ildefonso.
O Governo Imperial Brasileiro no intuito de proteger os habitan-
tes, radicados naquela região, estabeleceu colônias militares. E o De-
creto n.o 2.502, de 16 de novembro de 1859, criava a Colônia Mi-
litar do Chapecó.
Por esse decreto se estabeleciam algumas condições de ocupação
do solo.

Art. 5Q - Na falta de praças de l\' linha apropriadas para


a fundação das ditas colônias, o Presidente da P;ovíncia, poderá
fazer engajar os colonos que forem necessários até o número
fixado no art. 4Q (50)".

A estes colonos era dado um equipamento de trabalho mínimo,


como está disposto no art. 7. 0 :

". .. por uma vez somente, hum machado, huma foice, huma
enchada, huma faca ou facão de mato, huma espingarda ou ela-
vina, huma libra de polvora, quatro ditas de chumbo grosso, e
huma data de terras de dez braças de frente e cincoenta de fundo
para edificação de casas no logar em que foi estabelecida a colo-
nia, e outra data de terras destinada para cultura ou criação,
nunca excede de hum quarto de legua quadrada, em terreno para
cultura, e huma legoa quadrada em campos próprios para cria-
ção".
- 669-

E, no final do art. 8. 0 do mesmo decreto se estabelecia que tais


concessões não ultrapassariam o total de "cem legoas quadradas".
Desta forma foram dados, assim, os princípios legais do povoa-
mento 'da região, entretanto, a determinação para a fundação da Co-
lônia emana do Governo Imperial a 18 de outubro de 1880, o que se
processa a 14 de março de 1882, sob as ordens do então Capitão José
Bernardino Bormam.
Os colonos que se instalam assinam um contrato. E, em 1884,
já eram 50 colonos que, alí, viviam.
Em 1885 o número dos seus habitantes era da ordem de 196, em
1886 o era de 242, em 1891 alcançava 688 almas. Formava-se, deste
modo, um núcleo avançado da soberania nacional!
*
4. - A dinâmica da colonização na República.

a). - Os núcleos coloniais.


b). - As empresas colonizadoras.
a. 1. - Núcleo Colonial "Esteves Júnior".
Dentro da política governamental republicana de localização de
emigrantes europeus, que, ainda, na primeira década do século XX
fugiam da Europa, houve por bem o Governo Brasileiro, através do
Serviço Nacional de Povoamento, de criar Núcleos Coloniais.
Foram criados, em Santa Catarina, os Núcleos Coloniais "Rio
Branco", "Anitápolis" e "Esteves Júnior".
O Núcleo Colonial "Esteves Júnior" foi estabeelcido em terras
devolutas existentes no então limite oeste do município de Nova Tren-
to, em 31 de junho de 1910, sendo sua sede provisória o lugar cha-
mado "Corridas", que passou a chamar-se "Conquista" (29).
O local era

''tanta vargem que dá para colocar meia Alemanha" (30),

abrangendo 121. 600 hectares e toi escolhido em abril de 1911, sendo


pioneiro da façanha Miguel Joaquim de Oliveira. Era diretor no-

(29). - PIAZZA (Walter F.), Nova Trento. Florianópolis, Imprensa


Oficial do Estado, 1950. 186 p. Referência à p. 26.
(30). - "A E.POCA", jornal, Florianópolis, 06-05-1911.
- 670-

meado do Núcleo o Dr. Sizenando de Matos Bourguignon, que es-


colheu para sede definitiva o nome de "Boiteuxburgo".
Na área do Núcleo Colonial "Esteves Júnior" estava compreen-
dida a localidade de Pinheral, fundada em 1880, por colonos polone-
ses, russos e galicianos.
A eles se juntaram, no período de 8, 9 a 10 de maio de 1911,
121 imigrantes alemães.
E era tão ponderavel a imigração alemã para o Núcleo que, em
maio de 1911, lá esteve o Consul alemão Dr. GRINKE.
Aqueles colonos, a 28 de outubro de 1911, se juntam mais 20
colonos alemães.
Os trabalhos de medição e demarcação dos lotes no núcleo, desde
1911, estiveram a cargo do agrimensor Luiz Demoro.
Apresentava-se em 1916 com 456 lotes demarcados e, somente
147 ocupados, onde se localizavam 147 famílias com 805 pessoas (31).
Para atender ao escoamento e comercialização da sua produção
agrícola existiam 107. 868 metros de caminhos vicinais, 66.054 me-
tros de estradas de rodagem internas e 42.683 metros de estradas de
rodagem, isto é, ligando o núcleo a povoações na sua periferia.
O Núcleo Colonial "Esteves Júnior" continuou vivendo isolado,
com comunicações precárias até os nossos dias, apesar de localização
em altiplano de excelente clima, notadamente para produtos de clima
temperado e frio, o que se coadunaria com as tradições agrícolas de
seus povoadores.

b . 2. - A colonização do médio e extremo-oeste catarinense
(32).

Terminado os trabalhos de construção da Brazil Railway Co.


(Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande). no trecho Porto União da
Vitória a Marcelino Ramos, coube à sua subsidiária, Brazil Developm-
ent & Colonization Co., na forma dos ajustes existentes com o Go-
verno da República, as seguintes concessões: 1). - Lageado Liso,

(31). - MATIOS (Jacinto Antônio de), Colonização do Estado de


Santa Catarina. Florianópolis. Tip. "O Dia", 1917 p. 197.
(32). - PIAZZA
- 671-

2) . - Lageado, 3). - Rio Preto, 4) - Rio 15 de Novembro, 5). -


Lageado do Leãosinho, 6). - Rio do Peixe, 7). - Rio Uruguai,
8). - Rancho Grande, 9). - Rio do Engano, 10). - Pepery e
11). - Chapecó.
A medição e a demarcação destas concessões foi realizada, em
1915 e 1916, por engenheiro nomeado pelo Governo Federal.
A execução do seu povoamento vai ser efetuada através de um
processo de partilha dessas glebas com pequenas companhias coloniza-
doras ou a entrega de grandes áreas que são adjudicadas para coloni-
zação, por empresas que se dedicam à tarefa colonizadora.
Tal ação da Brazil Development & Colonization se processa a
partir de 1916, mas tal só é validado pelo Governo de Santa Catarina,
através de contrato celebrado a 7 de janeiro de 1922, em que a em-
presa colonizadora se obriga a realizar a sua obrigação dentro de
quinze anos, a contar de 1.0 de janeiro de 1932, caso contrário rever-
teriam ao Estado. Tal contrato sofreu alterações em 30 de janeiro
de 1924 e 28 de março de 1924.
Com taís alterações contratuais o Governo do Estado de Santa
Catarina efetiva à Brazil Development & Colonization Co., realmen-
te, as seguintes concessões:
a). - de l. 073.582.648 m2 , em 22 de fevereiro de 1924, co-
nhecida como Engano;
b). - de 325.702.000 m2 , em 22 de fevereiro de 1924, conhe-
cida como "Rancho Grande";
c). - de 2.737.035.472 m2 , em 19 de abril de 1924, conhe-
cida como "Peperí-Guaçú";
d). - de 540.622.762 m2, em 26 de novembro de 1924, co-
nhecida como "Xapecó";
e). - de 174.889.652 m2 , em 11 de fevereiro de 1926, co-
nhec:da como "Capetinga" e,
f). - de 913. 634 . 804 m 2 , em 11 de fevereiro de 1926, conhe-
cida como "Rio Saudade".
Estas concessões foram quase que imediatamente atribuidas para
colonização, pela Brazil Development & Colonization Co.. na área
integral da concessão, às seguintes empresas: "Rio Engano" à Socie-
dade Territorial Mosele, Eberle, Ahrons & Cia., "Rancho Grande"
à Empresa Povoadora e Pastoril Theodore Capelle; à Empresa Pe-
pery - Chapecó; a área conhecida como "Xapecó"
- 672-

a qualquer colonizador; "Capetinga" a Nicolau Bley Neto e José Luiz


Maia, e "Rio Saudade" a Ernesto F. Bertaso e Manoel Passos Maia.
E contrato adicional, assinado a 6 de abril de 1929, depois trans-
ferido às empresas. colonizadoras, a Brazil Development & Coloniza-
tion Co., obrigou-se com o Estado de Santa Catarina a demarcar "lo-
tes rústicos" de 24 a 30 hectares e de 100 a 1000 hectares quando

"se tratar de terras apropriadas à industria extrativa e pas-


toril" e, ainda, "construir, por sua conta, estradas de rodagem
que sirvam a todos os lotes".

Entretanto, em 1940, havia grandes áreas da concessão da Brazil


Development & Colonization Co. que não estavam colonizadas ou em
vias de colonização e o governo da União, por se encontrarem na
"faixa de fronteira" (150 km. a leste da fronteira com a Argentina),
encampou-as pelo Decreto n.o 2.073, de 8 de março de 1940, sendo
1 .760.478.527 km 2 das concessões "Xapecó" e "Pepery" e ....
174.889.653 metros quadrados das concessões "Capetinga", in-
tegralmente .
Relacionada com a Brazil Development & Colonization Co. vai
surgir no extremo-oeste a firma Bertaso, Maia & Cia., estruturada a
18 de setembro de 1918, com um capital de Rs. 100:000$000 tendo
como sócios Agilberto Maia (prefeito da cidade gaucha de Guaporé),
seu irmão Manoel Passos Maia e Ernesto F. Bertaso. As suas ativi-
dades têm início no contrato entre Manoel Passos Maia e o Governo
Catarinense, assinado a 26 de junho de 1920, quando obtem 100.000
hectares para colonizar, na margem esquerda do rio Chapecó,
"em continuação à concessão Jerônimo Vargas" e "ai não
existindo, onde as houver entre os rios Xapecó, Uruguai e Antas",

pelo preço de Rs. 5$000 o hectare. A esta área se acrescentam a fa-


zenda "Chapecó", de 538.186.748 km 2 , concessão do Governo Es-
tadual, a 26 de junho de 1920, bem como a fazenda "Rodeio Bonito",
com 288.203.010 m2 , em pagamento da construção da estrada de
Passo do Goyen a Passo dos 1ndios e que foi entregue à firma Ir-
mãos Lunardi para colonizar.
Dissolvida a firma Bestaso, Maia & Cia., o sócio Ernesto F.
Bertaso assumiu o seu ativo e passivo e acrescentou-lhe a fazenda
"Campina do Gregório", com a área de 509.234.879 m2 , adquirida
dos herdeiros da Baronesa de Limeira (D. Francisca de Paula Souza).
Ernesto F. Bertaso acrescentou, ainda, ao patrimônio da sua em-
presa colonizadora a fazenda "Rio Saudade",
- 673-

pela Brazil Development & Colonization Co., com a área de ....


913.624.804 m 2 •
Totalizava, desta forma, uma área global de 2.249.259.441 m2,
que, a partir de 1932 vai ser colonizada com elementos de origem ita-
liana, vindos do Estado do Rio Grande do Sul.
Ernesto F. Bertaso encaminhou para a colonização do oeste ca-
tarinense, aproximadamente, 8.000 famílias, a quem vendia as terras
com uma entrada de 30% do valor total e o restante do pagamento
em duas prestações semestrais.
Outra das colonizadoras que teve terras adjudicadas pela Brazil
Development & Colonization Co. foi a Mosele, Eberle, Ahrons & Cia.,
com sede em MarcelinQ Ramos, Estado do Rio Grande do Sul, a quem
coube a gleba "Rio Engano".
Em 1926 se localizavam as primeiras famílias, e até 1928 são escri-
turados 125.682.764 m!!. No ano de 1932 a gleba "Rio Engano" (tam-
bem chamada Colônia "Concórdia") estava inteiramente medida e a
sua área territorial - 1.073.582.648 m2 - distribuida em 3.638
lotes rurais, 256 lotes urbanos e 26 chácaras, ocupados por ítalos e
teutos-brasileiros, oriundos do Estado do Rio Grande do Sul.
Outra empresa que recebeu atribuição para desenvolver trabalhos
de colonização da Brazil Development & Colonhation Co. o foi a
Empresa Povoadora e Pastoril Théodoro Capelle & Irmão, com a gleba
"Rancho Grande", tendo sede em São Paulo.
Inicia-se o seu processo colonizador em 1925 e vai se desenvol-
vendo até 1932. Neste ano a sua divisão era de 1.244 lotes rurais
de 21 hectares cada um, 75 lotes urbanos de 1.000 m2 cada, e 3 chá-
caras de 10.000 m2 cada, alem de uma gleba de cinquenta lotes (Fa-
zenda Laranieiras). Eram, tambem. ítalos e teutos-brasileiros, alem
de famílias alemãs, italianas, polonesas e suiça (uma).
Uma outra foi a Empresa Chapecó-Pepery, com sede em Ca-
rasinho, tambem no Estado do Rio Grande do Sul, segundo as dire-
trizes de Hermann Faulhaber, fundador de Nova Wurtemberg (hoje
Panambí), no Estado do Rio Grande do Sul, de onde saia a rota pio-
neira para alcançar as margens do rio Uruguai.
A sua área inicial era de 3.452.547.887 m2 , mais tarde subdi-
vidida e, posteriormente, parte encampada pelo Governo Federal,
sobrando-lhe, então, 537.622.179 m2 • O lote de 24,2 hectares era
vendido ao preço de Rs. 3.000$000.
Até 1932 foram na sua área demarcados 4. 620 lotes rurais de
25 rectares, 831 lotes urbanos de 1.000 m2 , e 169 chácaras de 10.000
- 674-

m2 • sendo 1 . 777 lotes rurais, 464 lotes urbanos e 80 chácaras em "Por-


to Feliz de Mondahy" e 2.843 lotes rurais, 367 lotes urbanos e 89
chácaras em "Porto Itapiranga".
Em "Porto Feliz do Mondahy" predominavam teuto-brasileiros
do Rio Grande do Sul, alemães natos (de Wurtemberg) e uma pe-
quena população ítalo-brasileira, localizada em Vorá.
Da área da "Empresa Chapecó-Pepery Ltda", desmembrou-se
uma parte, como se viu, que foi adquirida pela "Sociedade popular
para os católicos de língua alemã", chamada, popularmente, de Volks-
verein.
Esta sociedade, sob a diretriz dos Padres Jesuitas Theodore Ams-
tad, João Rick e Max de Lassberg, em 1925, assinou contrato com a
"Empresa Chapecó-Pepery Ltda., e adquiriu-lhe 582.057.816 m2
de terras para colonização.
Arregimentou colonos em todas as áreas do Rio Grande do Sul,
notadamer.te nos vales do Caí e do Taquarí, nas chamadas "colônias
velhas" e, excepcionalmente, em Santa Catarina, no vale do rio Braço
do Norte.
Assim, em 1926, o primeiro grupo de colonizadores gauchos de-
manda a margem catarinense do Rio Uruguai, onde fundam "Porto
Novo". Ao final da demarcação e subdivisão de sua gleba a Volksverein
apresentava 26.000 lotes coloniais com 25 hectares cada um.
Outros empreendimentos colonizadores são devidos a José Rupp,
que transfere à Colonizadora Oeste Catarinense Ltda. as terras q lle
obtivera com a construção da estrada Cruzeiro (hoje Joaçaba) a Pas-
so Bormann. E, por sua vez, a Colonizadora Oeste Catarinense trans-
fere-as à Companhia Territorial Sul Brasil, com sede em Porto Ale-
gre, num total de 2.467 .074. 800 m2 •
Nessa área formam-se, até 1930, as povoações de Cascalho, Pas-
sarinhos. Palmitos, São Carlos, Ilha Redonda e Iracema e esta região,
em 1934, con~ava com 771 famílias, das quais 398 teuto-brasileiras,
15 ítalo-brasileiras, 70 luso-brasileiras, 35 alemãs, 10 italianas, e 229
teuto-russas.
Outro!>
675


b. 3. - As três etapas da colonização do Itajaí d'Oeste.

o Governo Hercilio Luz fez, através de sucessivos contratos, uma


vantajosa política desenvolvimentista para o Estado de Santa Cata-
rina.
Da mesma forma que agiu, no extremo-oeste catarnense, pagan-
do em terras a construção de estradas, tambem o fez com relação ao
alto vale do Itajaí.
a). - O pioneirismo de Victor Gaertner (Júnior), pelo contrato
de 28 de fevereiro de 1919, para a construção de uma estrada de ro-
dagem da barra do rio Trombudo à povoação de Corisco, no Municí-
pio de Curitibanos, numa extensão aproximada de 90 quilômetros, ao
preço de Rs. 5$000 o metro linear "em terreno de natureza vulgar"
e a Rs. 10$000 o metro em terreno pedregoso ou de rocha, havendo
um aumento de 10% para qualquer eventualidade.
Na forma do aludido contrato o Governo do Estado de Santa
Catarina se comprometia a pagar-lhe até Rs. 200$000 em dívidas co-
loniais e o restante em terras devolutas, ao preço de Rs. 20$000 o
hectare, as terras próprias para plantação à margem da estrada e a
razão de Rs. 15$000 as terras de fundos e fachinais.
Tal contrato teve um aditamento a 22 de novembro de 1922, em
que se alteraram os preços, encontrando-se um preço médio para as
terras de Rs. 7$000 e para as obras de Rs. 8$000 o metro linear,
indistintamente, quanto a classe de terreno.
Entrementes, Victor Gaertner foi autorizado pelo Governo do Es-
tado a medir lotes de 50 (cinquenta) hectares de terras e o fez nos
seguintes lugares:
a). - no rio Itajaí do Oeste, com a área de 84.224.332 ml ,
com título expedido a 8 de janeiro de 1923;
b). - no ribeirão da Fronteira, com área de 45.986.731 m2 ,
com título expedido na data anterior; .
c). - no ribeirão Toca Grande, com a área de 193.886.401
m2 , com título da mesma data do anterior;
d). - no rio Itajaí do Oeste, com a área de 140.757.615 m2 ,
com título da mesma data.
e). - no rio Itajaí do Oeste,
- 676-

g). - no rio Itajaí do Oeste, com área de 932.724 m2 , com tí-


tulo da mesma data:
h). - no rio Amoado, com área de 161.986 m2, com título ex-
pedido a 24 de março de 1926;
i) . - nos fundos do rio Ita iaí do Oeste, com área de 13.986.900
m2 , com título expedido na data do anterior;
j). - tambem nos fundos do rio Itajaí do Oeste, com área de
5.647.680 m2, com título da data do anterior;
1). - tambem, nos fundos do rio Itajaí do Oeste, com área de
3.443.900 m2 , com título da data do anterior;
m). - no rio Pombinhas, com áreas de 15.906.978 m2 , com
título da data do anterior; e
n). - no rio das Pombas, com área de 322. 645 m2 , com título
expedido a 18 de fevereiro de 1921.
Tudo, excetuando o ultimo item, englobou 539.144.660 m2, no
valor contratual de Rs. 377:401$250.
Concluida a estrada que se comprometera a executar Victor
Gaertner (Júnior) tornou-se credor do Estado de Santa Catarina da
importância de Rs. 400:$000. Para ressarcir-se desta importância me-
diu, na seguinte ordem, novas glebas:
a). - na margem direita do Itajaí do Oeste com área de ....
140.757.615 m2 ;
b). - na margem esquerda do rio Itajaí do Oeste com área de
84.224.332 m2
c). - terreno entre a estrada de cargueiros Blumenau-Curitiba-
nos e os lotes do rio das Pombas, margem direita, com área de ....
2.763.962,5 m2 ;
d). - terreno situado entre os travessões da linha ribeirão da
Toca Grande e o ribeirão Grande com área de 192.886.401 m2 ;
e). - terreno situado entre a estrada Blumenau Curitibanos e os
rios das Pombas, Itajaí do Oeste, ribeirão da Fruteira, ribeirão Ca-
çador e terras de Paschoal Simone, com área de 45.986.731,5 m!!;
f). - terreno entre lotes da margem direita do rio Itajaí do
Oeste e outras terras concedidas com área de 32.464.349 m2 ;
g) . - terreno situado na margem esquerda do rio Itajaí do
Oeste, 2. a secção, com área de 932.724 m2 ;

Com a morte de Victor Gaertner (Júnior) sua viuva, face à ho-


mologação do inventário, a 4 de outubro de 1926, transferiu à Com-
panhia Salinger as terras assim descritas:

"terras de cultura, situadas na zona do rio do Oeste, neste


Município (então município de Blumenau), de ambas as ma~­
- 677-

fluentes do rio do Oeste, a saber: na margem direita, ribeirão da


Fruteira ribeirão do Angico, ribeirão São Bernardo, ~io das Pombas,
ribeirão da Herva e fundos, de ambos os lados do rio Taió, ri-
beirão Woelfer e ribeirão da Paleta; e na margem esquerda, ri-
beirão Laurentino e fundos, ribeirão do Café Alto, ribeirão Mo-
ratelli, ribeirão Pizetta, ribeirão do Amoado, ribeirão do Bugio e
ribeirão Pequeno".

b). - a ação colonizadora de Luiz Bértoli.

A 23 de novembro de 1920 assina com o Governo do Estado de


Santa Catarina contrato no qual se compromete a construir uma es-
trada de rodagem, desde a barra do Rio das Pombas, até a estrada
Geral em Pouso Redondo, numa extensão de 20 km e 200 metros,
pagando-lhe o Governo Estadual 6: 000$000 rs. por quilômetro, sen-
do 1/3 em dívidas coloniais, 1/3 em moeda corrente e 1/3 em terras
devolutas a razão de 5$000 rs. o hectare, obrigando-se Luiz Bértoli
a colonizá-las dentro de dez anos.
Recebe, inicialmente, três glebas: 1). - de 66.212.568 m2, ti-
tulada a 16 de fevereiro de 1925; 2). - de 1. 421. 092 m2 , titulada
a 30 de novembro de 1922. situada a margem direita do rio Itajaí
do Oeste, dela fez Luiz Bértoli sua invernada; e, 3). - de 1.040.614
m2, titulada a 21 de janeiro de 1924.
Da primeira gleba descrita é que tem início o trabalho coloniza-
dor de Luiz Bértoli, na região de Salto Grande (hoje município ue
Ituporanga), onde subdivide-as nas linhas "Dona Matilde", "Ribeirão
das Pedras" (lotes, desde menos de 100.000 a 310.000 m2), "Dona
Luiza" e fundos (desde 130.000 a 420.000 m2).
A 3 de janeiro de 1921 faz Luiz Bértoli um segundo contrato
com o Governo do Estado para a construção de caminhos vicinais, to-
talizando 46 km, e sucederam-se outros contratos, sendo, entre ou-
tros, o seu requerimento para erguer uma povoação, obtendo terras
em pagamento de serviços, o que lhe é concedido a 12 de dezembro
de 1922, assim nasce a povoação de Ribeirão Grande (hoje sede do
município de Salete).
E, desta forma pode colonizar a linha do Ribeirão Grande (lotes
de 130.000 a 370.000 m2), "Rbeirão Cipriano" (lotes de 110.000
a 320.000 m2 ), "Rio Itajaí do Oeste" (2. a e 3. a secções) (lotes de
90.000 a 330.000 m2 ), "Ribeirão Luiz" (lotes de 140.000 a 330.000)
"Ribeirão Engano" (lotes de 220.000 a 310.000 m2) e "Ribeirão
América" (lotes de 140.000 a 290.000
- 678-

c). - a ação colonizadora da Companhia Salinger.

Lembre-se, tão somente, que adquiriu terras da viuva de Victor


Gaertner (Júnior) e recebeu, por força contratual, terras em pagamen-
to da construção da estrada do rio Itajaí do Oeste ao rio do Campo,
numa extensão de 52 quilômetros, em 1922. .
Assim, no seu relacionamento com o Governo do Estado de
Santa Catarina, apresentava colonização de áreas no "Ribeirão Pi-
zetta" (lotes de 270.000 a mais de 400.000 m2 ), no "Ribeirão Alto
Café" (lotes de 210.000 a mais de 400.000 m2 ), no "Ribeirão Mll-
ratelli" (lotes de 200.000 a 340.000 m2), no "Ribeirão Fruteira" (lo-
tes de 70.000 a 400.000 m2), no "Ribeirão Grande" (lotes de ....
200.000 a 700.000 m2), no "Ribeirão Woelfer" (lotes de 220.000
a 320. 000 m2 ) e na "Linha Fundos do Rio Taió e Ribeirão Paleta"
((lotes de menos de 100.000 a 600.000 m2 ).
Desta forma se tem, ainda que, sucintamente, as três grandes li-
nhas de ocupação do vale do rio Itajaí do Oeste que se fez, a partir ela
década de 20 com excedentes populacionais de outras áreas do Es-
tado de Santa Catarina, notadamente com descendentes de italianos.
• •

CONCLUSÃO

O enfoque geral da propriedade rural em Santa Catarina, numa


perspectiva histórica, nos faz considerar as suas várias formas e os re-
sultados delas advindos, como sejam:
1. - O regime de sesmarias concedidas, a partir da estruturação
das Capitanias Hereditárias, quando o atual território catarinense fi-
cou incluido no termo da Capitania de Santo Amaro e Terras de Sant'
Ana e por força da morte, sem herdeiros, de Pero Lopes de Souza,
seu donatário, foram as sesmarias concedidas pelos capitães-mores,
loco-tenentes da Capitania de São Vicente, resultou numa ocupação,
sem maiores frutos sociais e econômicos.
2. - O regime de concessão de terras aos "casais"
- 679-

famílias numerosas dos luso-açorianos ocasionavam, pela explosão de-


mográfica, a necessidade de novos tratos de terra para cultivo e a con-
sequente abertura de novas "frentes pioneiras".
3. - Por outro lado, o regime de concessão de "sesmarias"
para as áreas de pastoreio, do planalto catarinense, quando este se
achava sob a govemança da Capitania de São Paulo, que o foi até
1820, gera uma situação peculiar e particular, ainda não devidamente
dimensionada e estudada.
4. - Há que considerar que a Lei n. o 601, de 18 de setembro
de 1850, tambem conhecida cofo "Lei de Terras", procurou formali-
zar no período do 2.0 Império, a posse e uso das sesmarias, até en-
tão, concedidas ao estabeleser no seu artigo 4. 0 •

"Serão revalidadas as sesmarias, ou outras concessões do


Governo Geral ou provincial, que se acharem cultivadas, ou com
princípios de cultu "a, e moradia habitual do respectivo sesmei"o,
ou concessionário, ou de quem os rep"esente, embora não tenha
sido cumprida qualquer das outras condições, com que forão
concedidas" .

E, na mesma Lei, em seu artigo 7. 0 , já estabelece condições de


regularização da posse:

"O Governo marcará os prazos dentro dos quais deverão


ser medidas as te:ras adquiridas por posses ou por sesmarias,
ou outras concessões, que estejão por medir ... " .

Como se vê a tendência do Governo Imperial era, indiscutivel-


mente, estabelecer uma norma de regularização das concessões, a qual-
quer título, já feitas.
Isto posto ver-se-á estender a problemática das "sesmarias",
- 680-

Desta forma, somente a análise particular de cada um dos esta-


belecimentos colonizadores poderá esclarecer a situação do uso da
terra, e, consequentemente, da propriedade rural, nas várias áreas de
colonização do Estado de Santa Catarina.
6. - As próprias formas oficiais de colonização variam de di-
retriz, quer no Império, quer na República, quando, de per si, novas
modalidades de ocupação do solo e refletindo-se, obviamente, no pro-
cesso social-econômico, vejam-se, as colônias militares, latu e strictu
sensu, ou então, os núcleos coloniais e ter-se-á definida a variavel dos
resultados que se alcançarão, a partir do estudo de sua implantação,
da sua direção e orientação social-econômica e política, alem das for-
mas de relacionamento com os elementos humanos, que nelas se lo-
calizam.
• •
*
INTERVENÇÃO.

Da Prof.a Kátia M. de Queirós Mattoso (da Universidade Católica de


Salvador-Bahia) .
Pergunta:
"Há a possibilidade de conhecer-se a estrutura familiar dos 6.000
açorianos vindos para Santa Catarina nos meados do século XVIII?"
• •
*
RESPOSTA DO PROF. WALTER F. PIAZZA.

À Prota Kátia M. de Queirós Mattoso.


Respondeu:
"Em atenção ao proposto pela prof.a Kátia Mattoso deve-se es-
clarecer que o estudo da estrutura familiar dos "casais" açorianos, ten-
tamos no trabalho sobre a freguesia de Nossa Senhora do Rosário de
Enseado de Brito, publicado na Revista do Instituto Histórico da Ilha
Terceira, Açores, e na nossa tese de livre-docência: Angelina - um
caso de colonização nacional, onde se apresenta o problema da explo-
são demográfica dos descendentes dos "casais" açorianos e a conse-
quente formação de nova "frente pioneira"
EMIGRAÇÃO DE INTELECTUAIS (*).

EMMANUEL FRANCO
da Universidade Federal de Seegipe.

Em 28 de setembro de 1871, foi aprovada no Brasil a "Lei do


Ventre Livre", que declarava livres os filhos de escrava. Em 13 de
maio de 1888, foi aprovada a "Lei Áurea", que declarava livre todos
os escravos.
Este período da Abolição, teve como consequências para Sergipe,
a emigração de intelectuais e de capitais, para a região cafeeira de
São Paulo.
No século XIX, a Cotinguiba, a região canavieira de Sergipe, era
a reg!ão mais rica e mais culta de Sergipe. Os férteis solos de mas-
sapê negro, produziam muita cana que os engenhos de açucar moiam
e fabricavam o açucar que era exportado.
A tecnologia da época permitia que os engenhos produzissem no
máximo, 3.000 sacos de açucar ou 1. 500 pães de açucar.
O caldo cosinhado em tachas abertas, as almanjarras movidas a
tração animal, os carros de boi com eixo de madeira sucupira, o tra-
balho braçal executado por escravos, limitavam a capacidade de moa-
gem dos engenhos de açucar. Por isto, surgiu uma rica classe média,
com engenhos variando entre 100 hectares (330 tarefas) e 300 hecta-
res (1.000 tarefas) de área. Os expoentes da classe já se tomavam,
do meio para o fim da existência, uma verdadeira aristocracia rural.
Eles iam adquirindo terras e montando engenhos para os seus filhos
e filhas. O Dote, era uma prática normal e os casamentos eram ver-
dadeiros negócios.

(.) - Comunicação apresentada na 3'" Sessão


- 682-

o pai do aspirante à noivado, ajustava com o pai da possivel noi-


va, na hora do Pedido de Casamento, qual seria o Dote. Se este con-
viesse, o casamento seria acertado, os noivos eram apresentados um
ao outro e ambos os pais dariam em partes iguais, o que os futuros
cônjuges iriam receber. Assim, estes poderiam iniciar a vida. Rece-
biam escravos, terra e às vezes um engenho de açucar, moendo, ou
de "Fogo Morto". O iovem casal que trabalhasse e puzesse a moer.
Se O Dote não conviesse, o pedido era desfeito na hora e não havia
casamento.
Uma bem orientada política casamenteira, fazia com que deter-
minadas famílias predominassem na Cotinguiba, nos diferentes quar-
téis do~ séculos XVIII e XIX.
Consanguineidade estreita, com casamentos entre tios e sobrinhas,
entre tias e sobrinhos, entre primos co-irmãos ou entre primos car-
nais, provocavam posteriormente a decadência destes familiares, com
o surgimento de outras. A riqueza daquela família passava através a
linha feminina que procedia a um refrescamento de sangue, casando-
se uma moça rica com um rapaz pobre, mas de sangue estranho. Des-
ta maneira, a riquesa era transmitida através da linha feminina, sur-
gindo então novos nomes de família. A linha masculina era desorien-
tada. Os filhos varões, perdulários e preguiçosos, educados como
príncipes, esbanjavam o que herdavam, empobreciam e desapareciam.
Daí o apogeu e o desaparecimento de muitas famílias que tiveram
fausto e grandesa e depois empobreceram.
Era frequente a fuga de moças ou o rapto, quando o casamento
não era desejado, ou para evitar o Dote. Era frequente a viuvez por
morte das esposas durante o parto. De vez em quando, assassinava-se
o marido, para casar com a mulher quinze dias depois e se assenhorear
dos bens. E assim, a riquesa passava de mão em mão.

A propriedade média canavieira, as boas terras produzindo muita


cana e muito açucar por unidade de área, o comércio do açucar atrain-
do ingleses e alemães que negociavam com a Europa, fizeram desen-
volver cidades como Santo Amaro das Brotas, Maroim e Laranjeiras,
inicialmente e depois as demais cidades da Cotinguiba.

Laranjeiras e Maroim se tomaram os centros intelectuais da épo-


ca. Os senhores de engenho educavam os seus filhos. Cada família
devia ter um filho médico, outro juiz e o terceiro Padre. O mais
burro, o menos dotado de inteligência, seria o sucessor do pai, o se-
nhor de engenho. Geralmente, o mais inteligente, aparentando ser o
mais burro, era quem ficava no engenho e quem mais herdava. Os
- 683-

formados tinham que lutar pela vida, fora, para enriquecer. Geral-
mente morriam pobres, quando casavam com moças sem Dote ou
com Dote em dinheiro.
Na segunda metade do século XIX, a família Barreto era pro-
prietária de muitos engenhos de açucar, na Cotinguiba. O Cemitério
da Igreja do Engenho Velho, no Município da Vila de Itabaiana,
atualmente pertencendo à Cidade de Santa Rosa de Lima, está cheio
de sepulturas de pessoas pertencentes a esta família. Existiam senho-
res de engenho com sobrenomes Muniz Barreto e outros com sobre-
nomes Mattos Barreto. Estes engenhos se situavam nos municípios
das Vilas de Riachuelo, Divina Pastora e Itabaiana.
No ano de 1875, Francisco Muniz Barreto, era proprietário do
Engenho Vassouras, em Divina Pastora. Dr. Antônio Freire de Mat-
tos Barreto era dono do Engenho Contadoro e de dois sítios, no Mu-
nicípio de Riachuelo.
Francisco Muniz Barreto herdara de seus pais, que faleceram
moços. O Schistosoma e o Impaludismo grassavam na região e pro-
vocavam a Hidrópisia ou Barriga d'Água, e os homens morriam cedo.
A falta de higiene durante o parto, causava a morte das mulheres. Ha-
via assim, uma sucessão rápida.
O Dr. Antônio Freire de Mattos Barreto, possuia os engenhos
das melhores terras do município de Riachuelo, daí a sua riquesa.
Ele conseguiu educar três filhos que foram: Dr. Antônio Freire
de Mattos Barreto, formado pela Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro, Dr. Augusto Freire de Mattos Barreto, laureado pela Facul-
dade de Medicina do Rio de Janeiro, Dr. Adolpho Coelho de Mattos
Barreto, formado pela Faculdade de Direito do Recife.
Naquela época não se usava acrescentar a palavra Filho ou Jú-
nior, para diferenciar o pai, do filho do mesmo nome.
A partir da "Lei do Ventre Livre", os mais clarividentes jovens,
filhos de senhor de engenho, perceberam o fim da escravidão e pro-
curaram fugir dos seus efeitos.
Havia começado o surto do café em São Paulo e a emigração de
italianos para os trabalhos de campo.

Após 1875, Francisco Muniz Barreto, muito jovem, vendeu to-


dos os escravos, o seu engenho Vassouras e partiu para Mococa, no
norte de São
- 684-

com uma moça de família muito rica e constituiu família. Muito rico,
mais tarde fundou a Casa Bancária F. Barreto, que é atualmente o
Banco F. Barreto. Ali ele se radicou.
Seu primo, Albano do Prado Pimentel, referido no nosso tra-
balho "A venda de um escravo", vendeu todos os escravos e terras e
seguiu tambem para São Paulo, onde se radicou em J aboticabal. Com-
prou terras e plantou café. Enviuvando, casou-se novamente com
uma rica paulista. Novos filhos nasceram e todos alí se radicaram.
No início da década de 1880/90, os holandeses montaram três
Usinas Centrais de Açucar. Uma na Paraiba, outra em Campos, no
Rio de Janeiro e a terceira em Sergipe. Foi a Usina Central Riachuelo.
Adquiriram 66 hectares (200 tarefas) de terra do engenho San-
tana, nas margens do Rio Jacarecica, perto da confluência com o Rio
Sergipe e aí localizaram a Usina de Açucar. Construiram uma estrada
de ferro, do Central, como passou a ser popularmente chamada, para
a cidade de Riachuelo e o Porto do Sapé, na parte navegavel por sa-
veiros, do Rio Sergipe. Começaram a moer na primavera de 1887.
O engenho Contadoro, do Dr. Antônio Freire Mattos Barreto,
fica na área de influência da Usina Central. Formando os seus fi-
lhos em Medicina e Direito, estes preferiram o sul do país.
A Abolição dos escravos agitava o país e todos previam o fim
da escravatura. A propriedade canavieira encarecera e dividira a ter-
ra. As propriedades eram pequenas. Houvera divisão e sub-divisão
no decorrer das gerações e muitos engenhos foram divididos em pe-
quenas áreas, constituindo-se em sítios.
Com a montagem da Usina Central, utilizando maquinário e tec-
nologia novas, os engenhos de açucar tinham um fim previsto. Por
isto, quem fosse jovem, ousado e culto ou apenas jovem e ousado,
procurasse outras áreas. A Luz Elétrica, símbolo do futuro que se
avisinhava, foi pela primeira vez utilisada no Brasil, pelas três Usinas
Centrais.
A terra roxa paulista, mais barata que a da Cotinguiba, em Ser-
gire e a cultura do café com braço assalariado, atraiam ventureiros e
ambiciosos. Entre eles estavam a inteligência e capitais sergipanos.
Em 1888, chega a libertação dos escravos. Morre o Dr. An-
tônio Freire Mattos Barreto, pai. Em 1890,
- 685-

As procurações são dirigidas ao irmão Luciano Freire de Mattos


Barreto que morava em Divina Pastora. São as seguintes procurações:
Dr. Antônio Freire de Mattos Barreto e sua mulher D. Joanna Me-
nezes Barreto, passada em Maroim, Sergipe; Dr. Adolpho Coelho de
Mattos e sua mulher D. Maria Isabel do Livramento Barreto, pas-
sada em Capivary, Estado de São Paulo, onde era Juiz Substituto da
Comarca de Capivary; Dr. Augusto Freire de Mattos Barreto e sua
mulher, D. Marianna Lima de Mattos Barreto, passada em Mococa,
Estado de São Paulo; D. Clotildes Eugenia de Mattos Barreto, resi-
dente em Divina Pastora.
Os bens vendidos foram os sítios Mucambo, com aproximada-
mente 22 tarefas e Mucambinho, com 8 tarefas, mais ou menos, visi-
nhos do engenho Contadoro, por dois contos e quinhentos mil réis, a
Firmino Muniz de Vasconcellos, citado no nosso artigo "A venda de
um escravo". O engenho Contadoro foi vendido à Usina Central.
Partindo de Sergipe, os Mattos Barreto foram residir em São
Paulo. O Dr. Antônio foi para Vassouras, no Estado do Rio de J a-
neiro e posteriormente para São Paulo. O Dr. Adolpho Coelho, ca-
sou-se com D. Maria Isabel Livramento, de importante família na
época, em Capivary. Dr. Augusto casou-se com uma moça da fa-
mília Lima, em Mococa. Não há notícia dos demais.
Deslocando-se para São Paulo, todos eles levaram capitais que
contribuiram para o progresso paulista.
Como Cortez, eles cortaram as amarras da sua terra natal, nunca
mais voltaram e se tornaram Paulistas, os condutores deste país.
A Usina Central construiu uma linha férrea para o engenho Con-
tadoro e prolongou para os engenhos Mata e São Felix que tambem
foram adquiridos. Contadoro e Mata foram sempre as suas melhores
propriedades de cana. Foi comprando novos engenhos, em 'um total
de vinte e dois e se tornou um feudo canavieiro. No centro de suas
terras, apenas não vendeu, Firmino Muniz de Vasconcellos, que não
partiu, porem, não empobreceu.
Usinas substituiram os engenhos de açucar. Cada nova Usina
adquiriu os engenhos visinhos e a concentração de terras iniciada du-
rante e após a Abolição dos escravos, continuou até os nossos dias.
Nos séculos XVIII e XIX, a Cotinguiba, com uma classe média
alta, com laivos de aristocracia e com boa distribuição da terra, foi
se tornando um feudo canavieiro a partir de 1874. Um
- 686-

engloba aproximadamente dois terços de suas terras, abrangendo cen-


tenas de engenhos e indo do Vale do Rio Vasabarris até o Vale do
Rio Japaratuba, descontinuamente, O preço da terra caiu,
Em 1890, 30 tarefas de terra foram vendidas por dois contos e
quinhentos mil réis', Cada tarefa custou oitenta e três mil réis, Era
um preço muito alto para a época, Se compararmos com o preço de
há dois anos atraz, valeria vinte e cinco mil cruzeiros, Descontando
a inflação, não teria aumentado o seu preço em um século, Com a
supervalorização da terra, em consequência do incremento da infla-
ção, elas valem atualmente quarenta e cinco mil cruzeiros,
A Abolição dos escravos, teve como consequência final, o desa-
parecimento de uma área de terra onde havia em Sergipe, uma equi-
tativa distribuição da riquesa, onde existiu fausto, Para isto, o pro-
gresso não deixou de contribuir, Desapareceram ao mesmo tempo, o
fausto e a miséria escrava,
* *

INTERVENÇÃO,

Da Prof.a Betralda Lopes (FAFI, Santos, SP) ,


Pergunta:
"O autor centralizou sua comunicação na família Barreto que
emigrou para São Paulo, ou realizou estudo de outras famílias? Em
caso afirmativo, seria possivel uma cópia desse trabalho? Esse e ou-
tros informes sobre emigração de famílias de Sergipe para São Paulo
poderão ser enviados ao Setor de Documentação do Departamento
de História da Universidade de São Paulo?"

* *

RESPOSTA DO PROFESSOR EMMANUEL FRANCO,

À Prota Betralda Lopes,


Mirmou:
"Inidei apenas estudos sobre a família Barreto, Outras famílias
tambem foram para São Paulo vendendo seus engenhos em Sergipe",
A VENDA DE UM ESCRAVO (*).

EMMANUEL FRANCO
da Universidade Federal de Sergipe.

Estamos no século XIX.


Era o dia 30 de agosto de 1875. Neste dia terminava a longa
Escritura de venda de um escravo.
"No ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de
mil oitocentos e setenta e quatro, aos cinco dias do mês de ja-
neiro do dito ano, no Engenho denominado Areia Branca., termo da
Villa de Divina Pastora, Comarca da cidade de Laranjeiras, Pro-
víncia de Se gipe de EI-Rei, em casa residencial da viuva Dona
Margarida Santana de Jesus, Manoel Cupertino de Oliveira, sen-
do o Tabelião interino e Thomaz Aquino Machado, Primeiro Ta-
belião de público judicial e notas, Escrivão Capitular e Residual e
da Providoria do Município da Villa de Divina Pastora, por sua
Magestade Imperial e Constitucional o Senhor Dom Pedro Se-
gundo a quem Deus Guarde na forma da lei. Certifica que por
se acharem as partes havido uniformemente contratados, tendo
como vendedor Albano do Prado Pimentel, morador no Engenho
dos Brasinhos, Município da Villa de Itabaiana e de outra, co-
mo comprador Firmino Muniz de Vasconcellos, morador no seu
Engenho Mombaça do mesmo termo da Villa de Itabaiana, am-
bos conhecidos do Tabelião e das testemunhas abaixo firmadas,
F.-ancisco Muniz do Prado e Silva e José Ignacio Muniz Barreto.
Albano do Prado Pimentel disse ao Tabelião, em presença
das testemunhas, que era legítimo Senhor e possuidor de mança e
pacifica prole de um escravo de nome Tertuliano, preto, solteiro,
com vinte anos de idade, roceiro, matriculado sob número nove

(*). - Comunicação apresentada na 3\1


- 688-

centos e oitenta e cinco da matrícula geral e da relação apresen-


tada e mat:iculado em primeiro de junho de mil oito centos e
dous na Colletoria da Villa de Itabaiana o qual houve por herança
de seu pai, e pela forma que o faz dá livre e desembaraçado
desta missão e vende de hoje para sempre à Firmino Muniz de
Vasconcellos, pela quantia que se convencionarão de um conto de
réis, cuja quantia elle vende e tinha recebido delle comprador
em moeda corrente porisso que della passaram :ecebido detalhado
de quite, para que não mais lhe seja repetido. Pelo comprador
foi dito em presença das testemunhas que aceitava a escritura pela
forma declarada.
o comprador apresentou o talão de haver pago a meia Siza
e mais direitos, na quantia de Unta e dous mil réis, sendo trinta
mil, réis da meia Siza e dous mil réis da tabela. O talão estava
com o selo adesivo de mil réis. O pagamento foi efetuado ao
Exator Manoel da Paixão Oliveira da Exatoria da Villa de
Divina Pastora. José Joaquim Rodrigues Santos, Decano, assina
a nota.
Em testemunho da verdade, Thomaz de Aquino Machado, da-
ta e assina sobre treis selos de 200 réis. Estes selos de cor
verde tem a efige do Imperador, ainda de cabelos e barbas ne-
g~os, as palavras "Império do Brasil" e "Selos" e a importância de
"200 Reis" em tinta vermelha.

o dia 5 de janeiro é véspera da Festa de Reis. Naquele dia, 5


de janeiro de mil oito centos e setenta e quatro havia uma festa no
Engenho Areia Branca. Estavam presentes os Senhores de Engenho
da redondeza e de longe.
De longe vieram os Senhores de Engenho do Vale do Rio Ser-
gipe, no Município de Itabaiana. Havia jovens e velhos casais, ra-
pazes e moças, meninos e meninas. Estas festas eram ponto de en-
contro onde surgiam os casamentos. Entre os jovens casais estavam
Firmino Muniz de Vasconcellos e sua esposa e Albano do Prado Pi-
mentel e sua esposa. Festejava-se a data com corridas de cavalos,
danças, comidas e bebidas e se aproveitava o encontro para fazer ne-
gócios. Comprar, vender e trocar. Compra e venda de gado e tam-
bem compra e venda de escravo. E assim Tertuliano foi vendido e
comprado.
Em 1874/75, a Cidade de Laranjeiras ainda estava no auge de
sua grandeza, como centro econômico de uma Região e como centro
intelectual do Estado de Sergipe
- 689-

história. O Rio Sergipe separava o Município da Vila de Divina Pas-


tora do Município da Vila de Itabaiana.
A área do Município da Vila de Itabaiana se estendia da Serra
de Itabaiana e o Rio Jacarecica, a leste, até os limites das províncias
de Sergipe e Bahia a oeste; limitando-se pelo Rio Sergipe ao norte e
pelo Rio Vaza Barris ao Sul das Vilas circunvizinhas.
Estendendo-se até o Rio Sergipe, o Município da Vila de Ita-
baiana possuia Engenhos de Açucar como os outros Municípios da
Província de Sergipe de El Rei. O Engenho Mombaça está situado
entre os Rios Sergipe e o seu afluente J acarecica. Naquela época, as
cheias desses dois Rios, pelo represamento do Jacarecica pelo Rio
Sergipe eram demoradas e o impaludismo grassava na área.
O Engenho Brasinho, era um entre os inúmeros Engenhos de
Açucar do Município da Vila de Itabaiana e foi no Vale do Rio Ser-
gipe, na área entre as Vilas de Divina Pastora e Itabaiana que se lo-
calizaram os Prado Pimentel.
Durante muitas gerações, até a geração atual, os Albano do Pra-
do Pimentel se fizeram presentes na história econômica de Sergipe de
El Rei.
Em 28 de setembro de 1871, o Visconde do Rio Branco, na pre-
sidência do Conselho de Ministros, conseguiu aprovação da "Lei do
Ventre Livre" que declarava livres os filhos de escrava. Para con-
trolar a escravatura e o número de escravos, foi encarregada cada
Coletoria de fazer uma relação geral dos escravos existentes e de ma-
tricular cada escravo. Albano do Prado Pimentel matriculou o jo-
vem escravo Tertuliano no dia primeiro de junho de 1872, sob o nú-
mero 985. Isto indica que a população escrava matriculada na Co-
letoria da Vila de Itabaiana era grande no ano de 1872, ha pouco
mais de um século.
A "Lei do Ventre Livre" não desestimulou a compra e venda de
Escravos entre os Senhores de Engenho.
Em 5 de janeiro de 1874, Firmino Muniz de Vasconcellos meu
avô materno, ao comprar o jovem escravo Tertuliano, não previa que
quatorze anos, cinco meses e oito dias depois, seria declarada extinta
a escravidão no Brasil. Ao passar a Escritura em 30 de agosto de
1875, da compra para sempre, do jovem escravo Tertuliano, não
previam Firmino Muniz de Vasconcellos, as Testemunhas e o Escrivão,
as mudanças sociais que iriam ocorrer dai a menos de treze anos.
Há justamente um século atraz, ocorria a compra e venda de um
escravo e o comprador não percebeu as consequências da "Lei
- 690-
- 695-

Ventre Livre". Que modificações sociais não irão ocorrer antes do


fim do século XX, que muitos não terão o discernimento de perce-
ber?
Firmino Muniz de Vasconcellos, vendeu anos depois ao seu ir-
mão, João Batista de Vasconcellos a sua parte no Engenho Mombaça
e comprou em 1887, o Engenho Araçá, no Município de Riachuelo,
onde foi morar.
No dia 13 de maio de 1888, a tardinha, os tambores africanos
começaram a soar de longe e chegaram a soar nos Engenhos vizinhos.
A noticia correu celere: A Princesa Isabel tinha declarado livres to-
dos os escravos.
Os escravos abandonaram tudo que faziam e passaram a pular,
a cantar e a sambar. Uma escrava, mãe de leite do único filho varão
de Firmino, deixou no mesmo momento de amamentar o filho do Se-
nhor e foi se juntar aos outros seis escravos de Firmino e passaram
a cantar, a sambar, a tocar tambores e a perambular de engenho em
engenho. A alegria tomou conta dos engenhos e de longe se ouvia o
soar dos tambores. A noite, o fogo das fogueiras iluminava o céu.
Na noite daquele dia, a senhora dona, teve que cozinhar, lavar
e cuidar da casa, uma operação esquecida há muitas gerações.
Os escravos se foram juntamente com Tertuliano e nunca mais
regressaram. Apenas uma escrava, que tinha um filho pequenino e li-
berto, de nome Candinho, voltou e ficou morando com seus antigos
senhores e com os filhos e netos dele até que a morte levasse Candi-
nho já sexagenário. Eram pigmeus africanos.
A alegria da libertação dos escravos continuou por muito tem-
po. Era perambular, pular, cantar e sambar.
Com a libertação dos escravos, o mato começou a crescer nos
canaviais. Os
- 696-

Passada a alegria, os ex-escravos procuraram serviço e não en-


contraram. Ninguém tinha dinheiro para pagar. A riqueza era cons-
tituida de terra e escravos. Liberto os escravos, somente ficava a ter-
ra e ela sozinha de nada valia. Pouco tempo depois, no verão de
1890/91, veio uma fome terrivel, denominada' "a fome do bolachão" .
O Governo da República mandou farinha de trigo para fazer bolachões
para distribuir entre os famintos. Muitos ex-escravos morreram.
Muitos senhores de Engenho, empobrecidos venderam suas ter-
ras e partiram. No município de Riachuelo, a nova Usina Central, de
propriedade de Capitais Holandeses e que tinha iniciado a produção
em 1887, adquiriu muitos engenhos. Iniciava-se a concentração de
terras na zona canavieira e que continuaria pelo século seguinte.
Muitos Senhores de Engenho venderam suas terras e emigraram
para São Paulo. Outros enlouqueceram. Entre os que partiram, es-
tava Albano do Prado Pimentel, que vendeu tudo que possuia e emi-
grou para São Paulo, onde comprou terras, educou filhos e bem velho,
octagenário, ali morreu.
Outros resistiram, se adaptaram e conseguiram morrer como pro-
prietários daquela e de outras terras, transmitindo-as aos seus suces-
sores. Firmino Muniz de Vasconcellos, o comprador do escravo Ter-
tuliano foi um destes.
* *

INTERVENÇOES.

Da prof.a Kátia Queiroz Mattoso (UC.Salvador).


Pergunta:
"1.0). - Existem no Arquivo Público de Sergipe livros de com-
pra e venda de escravos?
2.°). - Existem livros de Notas de Escrituras dos fundos dos
tabeliães?
3.°). - Em Sergipe haviam portos de desembarque de escravos
ou eles provinham da Bahia?"

Da Prof.a Maria Hosana da Silva (UFSe).
Indaga:
"Quais os preços dos escravos em Sergipe?"

- 697-

Da Prof. a Lindinalva Simões (UC. Salvador) .


Pergunta:
"O Autor acredita que somente a libertação de escravos causou
a decadência dos engenhos em Sergipe?"
• •

RESPOSTAS DO PROFESSOR EMMANUEL FRANCO.

À Prof. a Kátia Queiroz Mattoso.


Respondeu:
"1.0). - Sim, existem vários livros de compra e venda de es-
cravos e livro de notas.
2.°). - Sim, haviam portos de desembarque. Navios aportavam
nas margens do Rio Sergipe."
*
À Prof.a Maria Hosana de Souza.

"O preço de escrravos variou com a qualidade e a lei da oferta


e procura. Escravo era como gado. Valiam a qualidade, a idade, a
necessidade e a oferta."

À Prof. a Lindinalva Simões.

"A libertação de escravos empobreceu a reglao. A decadência


dos engenhos é consequência da implantação das Usinas de Açucar,
com tecnologia nova. O
A TRANSFORMAÇÃO DA PROPRIEDADE FUN-
DIÁRIA NO VALE DO RIO IGUAÇÚ (*).

RUY C. W ACHOWICZ
da Universidade Federal do Paraná.

INTRODUÇÃO.

Em 1843, emancipava-se politicamente a s.a Comarca de São


Paulo, surgindo em consequência a Província do Paraná. Esta nova
unidade política do Império brasileiro passou a ser controlada econo-
micamente e politicamente pelos chefes das grandes famílias criadoras
de gado, dos Campos Gerais paranaenses. O surgimento de uma vida
politicamente própria, na região, veio fortalecer a liderança e o con-
trole que esses fazendeiros possuiam. As oligarquias familiares insti-
tucionalizaram-se como forma de domínio (1).
Desde o início do século XIX, seus campos de criação de gado
estavam sofrendo um processo de transformação de utilidade. As tro-
pas de gado vacum e muar, procedentes do Rio Grande do Sul e Cor-
rientes, da Confederação Argentina, passaram a invernar nos· Campos
Gerais com o fito de recuperar o peso perdido durante a longa cami-
nhada, para sua posterior revenda na feira de Sorocaba. Surgia, para
os fazendeiros paranaenses, uma nova fonte de renda. Em consequên-
cia,

"o cria tório foi se reduzindo nos campos paranaenses, à me-


dida que aumentava o novo modo de uso da propriedade" (2).

(*). - Comunicação apresentada na 3" Sessão


-700 -

o rebanho foi sendo descuidado pelos latifundiários e a qualidade


do gado vacum, dos Campos Gerais, passou a declinar.
Como resultado dessa importante transformação dos campos pa-
ranaenses, observaram-se modificações no comportamento de suas po-
pulações:
1. - tendência de inúmeras famílias a fixarem residência nos
centros urbanos da região.
2. - deslocamento de capitais e mão-de-obra para a atividade
do tropeirismo.
A criação da Província do Paraná veio encontrar essas elites cam-
peiras paranaenses em fase de transformação ocupacional, alem de
um aumento do ritmo de urbanização, o qual foi ainda mais acelera-
do, com a criação da Província. Os territórios circunvizinhos aos
campos do segundo planalto paranaense, notadamente para o leste e
para o sul, eram formados de matas onde predominavam as araucá-
rias, imbúias e a erva mate. Estes solos eram mais ricos em matéria
orgânica e mais propícios para a agricultura, do que os dos Campos
Gerais, que se apresentam arenosos e excessivamente ácidos. Esses
territórios, que podem ser denominados de zona da mata, ainda não
eram ocupados do ponto de vista da fixação do homem, com exceção
das circunvizinhanças de Curitiba. Conservavam-se como terrenos de-
volutos. Os caminhos de tropas, então existentes, apenas atravessavam
esses territórios, não existindo nenhum núcleo populacional, a não
ser o pouso e registro do Rio Negro, localizado nas margens do rio do
mesmo nome, onde o governo provincial fiscalizava e controlava as
tropa~ que demandavam do Rio Grande do Sul. Com o desenvolvi-
mento da economia baseada na exploração da erva mate, a mão-de-
obra disponivel na Província foi canalizada para este fim. Ainda em
1859, o presidente Francisco Liberato de Mattos constatava que ape-
sar dos altos preços a que chegavam os gêneros de subsistência, ainda
não conseguiam

"distrahir a população do predilecto tráfico do mate. Assim,


sem braços, que a eUa se dediquem, continua a agricultura, em
geral, sem desenvolvimento" (3).

Desde o início da criação da Província, constatou-se uma canali-


zação cada vez maior de capitais e de força de trabalho para este setor

(3). - PARANÁ. Relatório do Presidente da Província Francisco Li-


berato de Mattos na abertura da Assembléia Legislativa Provincial em 7101/1859.
Curityba, Typ. Paranaense
-701 -

de sua economia, isto é, para o setor que apresentava maior rendimento


e comercialização: a economia ervateira. O Vice-presidente da Pro-
víncia, José Antônio Vaz de Carvalhaes, soube captar muito bem a
relação que existia entre o aumento da produção da congonha e a de-
cadência da produção agrícola, ao afirmar que o decréscimo da pro-
dução da lavoura na Província devia-se à utilização exclusiva de quase
toda a mão-de-obra existente na produção de erva-mate, cujo incre-
mento

"coincide sempre com a c:escente falta e carestia de gêneros


alimentícios" (4).

A falta de mão-de-obra refletia-se inclusive no setor público, obri-


gando o governo provincial a adotar, na construção da estrada da
Graciosa (ligação entre Curitiba e o litoral), o sistema de pequenas
empreitadas, pelo qual deixava de se preocupar a Província com t)S
aborrecimentos de recrutamento de mão-de-obra. Em 1856, existiam
trabalhando nesta importante via de comunicação apenas 54 empre-
gados. Concomitantemente a essa problemática regional, aguçavam-se
em âmbito nacional os debates relativos à Lei de Terras. Este debate
levantou a temática da .imigração para o país. As discussões parla-
mentares sobre estes assuntos foram acrescidas por mais um outro
problema intimamente correlato: a extinção do tráfico de escravos. O
tripé: propriedade da terra, imigração e extinção do tráfico escravo,
dominou os interesses das autoridades governamentais nos fins da dé-
cada de 1840 e no início da de 1850 . Para suprir a falta de mão de
obra agrária, a imigração para o país afigurou-se a melhor solução.
Porem esta solução estava em descrédito. Após os fracassos das pri-
meiras tentativas realizadas pelo governo de D. Pedro I, em promover
a imigração para o Brasil, a mesma havia caido em completo desinte-
resse. A lei orçamentária de 1831, simplesmente aboliu as despesas
com a colonização estrangeira nas Províncias' do Império. Embora o
Ato Adicional de 1824 autorizasse às Províncias a promoverem a imi-
gração, as colônias que surgiram no Brasil com tal permissão foram
em número exíguo e diminuta a quantidade de imigrantes entrados.
No período regencial, não se gastou oficialmente nem

"um tostão com imigração e colonização" (5),

(4). - PARANÁ. Relatório do Vice-Presidente da Província José


Antônio Vaz de Carvalhaes na abertura da Assembléia Legislativa em 7/01/1857.
Cu.ityba, Typ. Paranaense de Candido Martins Lopes. 1857, p. 96 e ss.
(5). - BROWNE (George P.), Política imigratória no Brasil regên-
-702 -

embora existissem pequenos estímulos para a iniciativa privada. Com


a estagnação da imigração e a contínua dificuldade de se importar
mão-de-obra escrava africana, divisava-se no país o advento de uma
grave crise de escassez de gêneros de subsistência. As plantations de
café em São Paulo absorviam inclusive a mão-de-obra escrava das
províncias vizinhas. A lei orçamentária de 1848 procurou atenuar a
crise que se avizinhava, estimulando novamente as Províncias a pro-
moverem imigração, pelas facilidades de concessão de terras devolu-
tas e criação respectiva de núcleos coloniais.

"Contudo, o predomínio político-econômico dos latifundiários


do café e a pressão por eles exercida no legislativo do Império,
teriam implicações na redação da Lei de Terras de 1850 ... preco-
nizaram o acesso à terra unicamente por meio de compra, fixan-
do exp:essamente no artigo primeiro da referida lei: Ficam proi-
bidas as aquisições de terras devo:utas por outro título que não
seja o de compra" (6).

Tal redação visava dificultar aos imigrantes pobres a aquisição


da terra própria,

"obrigando-os à prática do aluguel do seu trabalho, e evi-


dencia a vitória dos representantes dos grandes proprietários" (7) .


A CRISE ECONOMICA DA DÉCADA DE 1850.

A Província do Paraná não possuia latifúndios agrícolas, nem tão


pouco o sistema das plantations da Província de São Paulo. Em con-
sequência, não tinha condições de receber colonos por salários. Para
tanto, a maneira mais viavel afigurava-se a utilização do decreto n.o
1.318, de 30 de janeiro de 1854, o qual atenuava as condições de
compra de terras por colonos estrangeiros, estipuladas na Lei de Ter-
ras de 1850. Neste interim, o mercado brasileiro viu-se assolado por
uma grande inflação. A partir de 1852, chegou a subir numa pro-
porção de 200%, o preço dos produtos de subsistência (8).

(6). - BALHANA (Altiva Pilatti) , Política imigratória do Paraná.


Revista paranaense de desenvolvimento. Curitiba (12): 1-16, mai-jun. 1969.
p. 9.
(7). - Idem.
(8). - OFtCIO do fundador e diretor da colônia de Superaguí, Carlos
Perret Gentil, ao P:esidente da Câmara Municipal de Pa.ranaguá, Comendador
Manuel Antônio Guimarães, datado de 15/11 /1857. OFFtCIOS, 1858 voI. 2.
Arquivo Público do Estado do Paraná,
-703 -

Esta grande crise não foi somente regional; abrangia todo o sis-
tema econômico capitalista, no qual o Brasil estava inserido. Cecília
Maria Westphalen, estudando os fenômenos conjunturais que levaram
a economia paranense a uma série de crises - sobretudo o da erva
mate, seu principal produto de exportação - nas décadas de 1840 e
1850, afirma que nesta última, a crise foi mais violenta, atingindo, no
exercício de 1856-1857 seu ponto de crise, caindo no entanto em
contração no exercício de 1857-1858 e atingindo o fundo da depres-
são no de 1858-1859 (9).
A Presidência da Província do Paraná, preocupadíssima com as
proporções alcançadas pela crise, consultou às Câmaras Municipais,
procurando indagar das razões que teriam levado à carestia então do-
minante. As Câmaras Municipais de Guarapuava e Paranaguá, con-
sultaram então por escrito a Maurício Faivre, fundador colônia Te-
resa nas margens do rio Ivaí, e Carlos Perret Gentil, iniciador da co-
lônia Superaguí ao norte da baía de Paranaguá - aliás ambas funda-
das anteriormente à emancipação política da Província. Estes foram
unânime!l em ressaltar as pressões conjunturais: internacionais e na-
cionais no desencadeamento da crise. Maurício Faivre, numa expli-
cação surpreendentemente lúcida para a época, assim se expressou:
.. . .. este augmento extraodinário dos generos alimentícios
e de todos os se:viços em geral, não me parece ter outro mo-
tivo senão o augmento extraordinário e repentino dos valores
monetarios, tanto em ouro como em papel que tem surgido entre
nos estes tempos passados - semelhante crise e pelo mesmo
motivo tem se notado em França e na Inglaterra. Contudo essa
crise ha de passar por se só, o valor da produção ag ícola e
de fabrica, ha de se por ao par do valor monetario que neste
momento pela sua repentina abondancia, como disse, ficou de-
sacreditado - O ouro da California, da Australia, e a crea-
ção dos Bancos os seis mil contos para a colonização, as gran-
ds Emp:esas que se formão - e taes são as fontes que dera-
mando repentinamente e com abondancia nos nossos mercados
suas riquesas, produzirão o effeito que debalde esta nos assus-
tando ... " (lO).

(9). - WESTPHALEN (Cecília Maria), Navios e mercadorias no


Porto de Paranaguá, nos meados do século XIX. In: Portos, Rotas e Co-
mércio. v. I. São Paulo, 1971. Anais do V Simpósio Nacional dos Professo-
res Universitários de História. São Paulo, Coleção da "Revista de Histó:ia",
v. XXXV, 1971. p. 449-521. p. 467.
(10). - OFICIO do fundador e diretor da colônia Theresa Dr. Maurí-
cio Faivre ao Presidente da Câmara Municipal de Guarapuava, datado de
25/12/1857. OFFICIOS, 1858 voI. 2. Arquivo Público do Estado do Paraná,
-704 -

Reagindo contra a crise, os governos Imperial e Provincial pla-


nejaram em âmbito regional a criação de uma grande colônia agríco-
la, formada por colonos nacionais e estrangeiros e que deveria inclu-
sive superar a colônia Blumenau, que estava em franco desenvolvi-
mento no vale do Itajaí, na vizinha Província de Santa Catarina. As-
sim, em 1860, surgiu a colônia do Assunguí, em regime de pequena
propriedade, localizada a 109 Km ao norte de Curitiba, sem entre-
tanto uma infra estrutura preliminar necessária a qualquer projeto
de tamanho vulto. Foram alí estabelecidos em terrenos devolutos, mi-
lhares de pessoas. O projeto visava criar uma colônia mista, isto é,
localizar na mesma colonos nacionais e estrangeiros, com a predomi-
nância dos primeiros. Em 1880, a colônia contava com 2.054 habi-
tantes brasileiros e 903 estrangeiros, notadamente alemães, franceses,
ingleses, suiços e italianos, com o total geral de 2.957 habitantes (lO).
Apesar dos esforços do governo provincial e dos elevados custos
da mesma colônia, onerando os cofres provinciais, esta primeira ini-
ciativa governamental em promover a imigração de colonos europeus,
acabou se transformando num verdadeiro fracasso. Os colonos na-
cionais e estrangeiros, sobretudo estes últimos, abandonaram em gran-
de número as propriedades que lhes couberam na colônia, insatisfeitos
sobretudo com a falta de condições para colocação de seus produtos,
nos portos do litoral, como no mercado da capital.
Nos fins da década de 1860, o governo Provincial aproveitou-se
da experiência colhida pelos colonos, reimigrantes espontâneos, sobre-
tudo da colônia D.a Francisca, da vizinha província de Santa Cata-
rina, que se estabeleceram no rocio de Curitiba, em pequenas cháca-
ras. Estes reimigrantes, principalmente alemães, manifestavam-se sa-
tisfeitos ('om sua fixação nos arredores da capital. Imitando tal exem-
plo, a Província criou, nos arredores da capital e nos municípios
vizinhos, uma série de colônias menores, tendo os colonos ali estabele-
cidos mercado garantido nos centros urbanos próximos. Floresceram
assim nos arredores de Curitiba, São José dos Pinhais, Campo Largo
e Freguesia do Iguaçú, 21 colônias. Estas. em 1880 contavam com
6. 180 habitantes, sendo a maioria formada por imigrantes poloneses
e italianos. Estas 21 colônias, foram estabelecidas em terrenos parti-
culares, comprados pela Província e vendidos aos colonos em peque-
nos lotes.

(11). - PARANÁ. Relatório do P~esidente da Província Dr. João ]0-


sé Pedrosa por ocasião da instalação da 2' sessão da 14a. legislatura da Assem-
bléia Legislativa da província no dia 16/02/1881. Curytiba, Typ. Perse-
- 705-

Nos terrenos devolutos do litoral, surgirão colônias de iniciativa


particular e governamental. Foram Sabino Tripoti e a firma Pereira
Alves & Bendaszeski, os responsáveis pela introdução da maioria dos
imigrantes dirigidos para o litoral. Alem das despesas normais com
um tal tipo de atividade, a Província comprometia-se a pagar aos in-
trodutores responsáveis pelos imigrantes, 20$000 por pessoa maior de
21 anos, 10$000 por pessoas de 21 a 9 anos e 5$000 por menores de
9 anos (12). Este sistema de introdução de colonos europeus afigu-
rava-se, para a Província, lento e caro. A colônia Assunguy, para a
qual a Província carreava enormes somas do tesouro, não atingia suas
finalidades. A introdução de colonos nos arredores de Curitiba era
cara, pois eram estabelecidos em terrenos, adquiridos pela Província,
de particulares e os responsáveis por sua introdução pagos per capita.
Desde fins de 1876, surgiu a oportunidade da Província receber,
de forma mais econômica, cerca de 20.000 russos-alemães, proce-
dentes das margens do Volga.

"Ela representava um esforço das auto~idades p~ovmclals


no sentido de estender, até o segundo planalto, os benefícios
do sistema de colonização que vinha sendo posto em prática
na marinha e no primeiro planalto" (13).

A Província foi tomada por uma verdadeira onda de regozijo e


entusiasma. A presença desses 20.000 russos-alemães expontâneos,
com mínimas despesas para os cofres públicos era ao que tudo indica-
va, uma aquisição vantajosa.
A Câmara Municipal de Palmeira, entusiasmada em receber no
seu território alguns núcleos de colonos que ela denominava de "rus-
sianos", agradecia ao Presidente da Província o estabelecimento des-
tes "úteis hóspedes" em seu território (14).
As autoridades alimentavam esperança de que

"o sistema agrícola dissociado da criação, que caracte i-


zava a estrutura agrária paranaense, fosse modificado pe!os
imig~antes po~tadores de outra tradição rural" (15).

(12). - Lei Provincial n Q 369 de 7/03/1874.


(13). - MACHADO (Brasil Pinheiro) & BALHANA (Altiva Pilatti).
p. 33.
(14). - OFICIO da Câmara Municipal de Palmeira ao Presidente da
Província do Paraná, Dr. Adolfo Lamenha Lins, datado de 30/05/1877.
OFFICIOS, 1877, vol. 8. Arquivo Público do Estado do Pa:aná,
- 706-

Entretanto, por terem sido estes colonos localizados em terrenos


de campos arenosos, impróprrios para a agricultura, esta colonização
redundou em um avultado fracasso. Dos 20.000 colonos esperados,
vieram apenas 3.809, dos quais somente em 1879 sairam para fora
do país 1. 960. Para impedir sua saida, a Província realizou ingentes
esforços para agrada-los e impedir sua retirada. De qualquer forma,
cerca de 50% deles abandonaram o Paraná (16).
De qualquer forma, a imigração que deveria ser extraordinaria-
mente vantajosa e barata, revelou-se imprópria - naquelas circunstân-
cias e cara. A epopéia dos "úteis hóspedes" revelou-se no final por
demais onerosa à Província. A tentativa de colonização dos Campos
Gerais paranaenses pelos colonos russo-alemães, transformando seus
pastos em terrenos agrícolas em regime de pequena propriedade, trans-
formou-se no maior fracasso imigratório em território paranaense. A
Província, receosa de novos fracassos nesses moldes, não tomará ne-
nhuma iniciativa de vulto com relação à imigração européia durante
a década de 1880. Os núcleos surgidos neste período serão pequenos,
e de pouca expressão.

A OCUPAÇÃO DO VALE DO IGUAÇO.

Enquanto a Província colhia contínuos dissabores com sua polí-


tica oficIal de colonização (Assunguí e russos-alemães), na parte sudo-
este de seu território um novo problema tomava vulto. A Confederação
Argentina não só passou a reivindicar os territórios compreendidos na
questão que ficou conhecida por "questão de Palmas" (17), como
tambem passou a penetrar em território litigioso entre as duas nações.
Os "correntinos" chegaram a abrir uma picada, pavimentada nas par-
tes mais difíceis, ligando a fronteira correntina com o território de
Palmas.
Cargueiros transportavam regularmente sobretudo mate para a
Argentina. Comissões topográficas e de sondagens do mesmo país
percorriam frequentemente o território contestado. Boatos alarman-
tes, inclusive de presença de milicianos argentinos na região, causa-

(16). - Ibidem., p. 37 e 38.


(17). - Para o Brasil, pelo Tratado de Santo I1defonso em 1777, a
fronteira nesta parte de seu território com a Argentina, passava pelos rios
Santo Antônio e Peperí-Guaçú. Como a Comissão Demarcadora das te~ras
portuguesas e espanholas em 1788 não chegou a um acordo específico sobre
o assunto, a Argentina interpretou que sua fronteira com o Brasil seria for-
mada pelos rios que os brasileiros ch~mavam de Chapecó e Chopim. Desta
forma, os te Titórios que hoje formam o oeste de Santa Catarina e o sudoeste
do Paraná,
-707 -

vam pânico nas populações brasileiras, que estavam completamente


desguarnecidas. Um desses boatos. ocorridos no mês de fevereiro de
1881, segundo o qual mais de mil argentinos armados haviam sacri-
ficado pelo morticínio os habitantes de Campo Erê, fez a população
de Palmas abandonar suas casas com suas famílias, a pé ou a cavalo,
retirando-se no maior desespero e deixando a cidade praticamente des-
povoada (18). Muitos desses retirantes refugiaram-se em Porto União,
Campos do Erê e em Palmeira. No mês de março de 1881, alguns
desses refugiados chegaram a Palmeira, trazendo consigo parte do seu
gado e muitos outros estavam a caminho (19). O Juiz Municipal de
Palmas solicitava presença de força militar estacionada na região, não
para combater argentinos "porque não há guerra actualmente", mas
para precaver-se de possíveis ataques de bandidos e malfeitores cor-
rentinos

''que abundam na sahida da picada que deste Campo se-


gue e sahe no de Corrientes" (20).

Por sua vez, Jesuino Marcondes de Oliveira e Sá tambem corro-


borava com esta opinião, escrevendo que

"este receio tem algum fundamento po·que os hervaes de


Corrientes, desde o lugar, a margem do Uruguai, chamado For-
migueiro, até a Campina do São Pedro, junto ao Campo-Erê, é
habitado por criminosos argentinos, orientaes e b"asilei"os, e por
escravos fugidos do Rio G:ande e Paraná" (21).

Essa tensão, existente no relacionamento diplomático entre o Bra-


sil e a Argentina, fez os estrategistas imperiais brasileiros a levantarem
a questão das comunicações com a região em disputa, caso houvesse
algum conflito militar com a Confederação Argentina, haveria neces-
sidade de comunicações rápidas com a região. As únicas vias exis-
tentes que colocavam a região contestada em contacto com os grandes
centros decisórios nacionais, eram ainda os caminhos vicinais que de-

(18). - OFíCIO do 19 suplente em exercício do Juiz Municipal de Pal-


mas Arlindo Moreira Miró ao Presidente da Província Dr. João José Pe-
drosa, datada de 11/03/1881. OFFICOS, 1881 vol. 5. Arquivo Público do
Estado do Paraná, documento manuscrito.
(19). - OFíCIO de J. Marcondes de Oliveira e Sá de Palmeira ao Pre-
sidente da Província J. Pedrosa, datado de 9/03/1881. OFFICIOS, 1881
vol. 5. Arquivo Público do Estado do Paraná, documento manuscrito.
(20). - OFtCIO do 19 suplente do Juiz Municipal em exercício de
Palmas ...
(21). - OFtCIO de J. Marcondes de Olivei~a e Sá
-708 -

sembocavam no antigo caminho de tropas, o qual comunicava o Con-


tinente de São Pedro do Rio Grande do Sul com a feira de Sorocaba,
em São Paulo. Desta maneira, a comunicação era extremamente mo-
rosa e deficiente. Em pleno século das ferrovias, a comunicação com
a parte meridional do território brasileiro era feita nos moldes dos
séculos aateriores, isto é, através dos muares. Era preciso ligar o sul
do país de forma definitiva por meio de comunicação à altura da
época, obedecendo as exigências da segurança nacional. Esta comu-
nicação deveria ser feita no sentido norte-sul e leste-oeste. A solução
mais rápida encontrada foi a opção leste-oeste; a norte-sul foi dei-
xada para mais tarde, por ser mais dificil e onerosa. A comunicação
leste-oeste objetivava colocar em contacto direto o porto de Parana-
guá com os sertões ocidentais da Província. O Decreto Imperial
2.502 de 16 de novembro de 1859, já autorisava a criação das co-
lônias militares na região contestada com a Argentina. Foi então o
mesmo executado, fundando-se duas colônias: Chapecó, em 14/03/
1882 e a de Chopim, e m 27/12/1882. Como eixo principal de co-
municaçãe destas colônias militares, com o litoral, foi escolhido o rio
Iguaçú, que corre justamente de leste para oeste. Neste sentido, um
velho projeto de 1857, do engenheiro Hégreville, foi desarquivado.
O rio Iguaçú revelava-se navegavel desde a corredeira de Caiacanga,
a 2 léguas de Palmeira, até o Porto da Vitória, numa extensão de
aproximadamente 350 km. O acesso do Porto de Paranaguá até
Caiacanga seria feito por estrada de ferro; e do Porto Vitória até as
colônias militares, por comboios de muares. Embora esta comunica-
ção contasse com três meios de locomoção, encurtaria o trajeto em
4 a 5 dias. De qualquer forma, era um grande melhoramento e o
mais plausivel. Esta é a razão fundamental do grande empenho do
Governo Imperial em construir aceleradamente a histórica estrada de
ferro entre Paranaguá e Curitiba. Sua construção foi iniciada em
1880, com a presença da própria pessoa do Imperador e inaugurada
em 1885, pela princesa Izabel. No ano de 1882, iniciava-se a nave-
gação do rio Iguaçú, ao ser lançado o vapor "Cruzeiro". A empresa
de navegação fora confiada a um jovem empresário de transportes de
"carroções eslavos" da região: o "coronel" Amazonas Marcondes (22).
Esta empresa era, no início, totalmente deficitária. De Porto Amazo-
nas até União da Vitória, isto é, em todo o vale médio do rio 19uaçú
não existia nenhum centro populacional. A navegação do vale desen-
volvia-se em terrenos cobertos de matas e praticamente despovoados.

(22). - A primeira viagem fora feita em 27 de novembro de 1882, do


porto
-709 -

COLONIZAçÃO EUROPÉIA PALMAS~

MATO GROSSO
SÃO PAULO

PARAGUAI

....us I
m'Nf.JJ

OCEANO
ATLÂNTICO

®.
W
REGiÕES DE CO,LDNIZAÇAo
ESTRATEGICA
URUGUAI

ª
"'e REGIÃO CONTESTADA EN-
TRE BIl~SIL E ARGENTINA
(QUESTAO DE PA L. MAS)

. -.......- ESTRADAS DE FERRO

~ PARTE NAVEGÁVEL 00
VAL.E DO IGUAÇU
-710 -

Nos 350 km de extensão da navegação pela margem direita, só havia


alguns casebres e, na margem esquerda, nada absolutamente, pois era
território dominado pelo indígena xokléng, mais conhecido por boto-
cudo. Para que Amazonas Marcondes não desistisse de sua empresa,
o Governo Imperial autorizou uma subvenção para a companhia de
12:000$000 anualmente. Em 1883 o Presidente da Província comen-
tava a problemática e já indicava a solução para a mesma:

.. . .. a linha de navegação não só auxiliará o desenvolvi-


mento da co!onização nas margens do rio Iguaçú, como habilita-
rá o governo a atender a qualquer urgente reclamação das colô-
nias militares no Chopim e do Chapecó desde que se melhore a
estrada do porto da União a Palmas e ao Xanxerê ... " (23).

A iniciativa da comunicação norte-sul somente será encarada nos


últimos anos do Império. O Decreto n.O 10.432 de 9 de novembro
de 1889, concedia por 90 anos ao engenheiro João Teixeira Soares,
ou à Companhia que este organizasse, a construção, uso e gozo de
uma estrada de ferro, que partindo de Itararé, Província de São Pau-
lo, fosse ter a Santa Maria da Boca do Monte, no Rio Grande do Sul.
O Decreto n. o 305 de 7 de abril de 1890. do governo provisório da
República revalidou a concessão, modificando apenas alguns itens.
Em 1908, a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande,
constituida para construir a ferrovia, passou para o controle da Brazil
Railway Company, componente do denominado "Sindicato Farquahr".
Com o início da navegação do vale do rio Iguaçú, desenvolveu-se na
região a e~ploração da erva mate. Na região de São Mateus, este pro-
duto existia em grande quantidade em estado nativo. Foi justamente
em São Mateus, a partir de 1890, que se iniciou a grande imigração
para o vale. Razões estratégicas assim o exigiam. As colônias foram
colocadas de preferência na margem direita do rio Iguaçú, visto que
a margem esquerda, alem de estar povoada pelo indígena hostil, es-
tava em disputa com a vizinha província de Santa Catarina. Surgirão
então as colônias de São Mateus, Palmira, Água Amarela, Água Bran-
ca, Rio Claro, Barra Feia, Antônio Olinto, Jangada etc. Por seu
turno, nas margens da ferrovia São Paulo-Rio Grande, foram criados
os núcleos de Iratí, Rio Azul, Marechal Mallet, Rebouças, Vera Gua-
rani etc. D\:slocadas mais para o centro do território paranaense, sur-
giram Prudentópolis, Ipiranga, Ivaí, Candido Abreu, Jesuino Mar-

(23). - PARANA. Relatório do Vice-Presidente da Província do


Paraná, Comendador Antônio Alves de Araujo ao passar a administração ao
Dr. Carlos Augusto de Carvalho em 26/05/1883. Cu.ityba, Typ. Perseveran-
ça de 1. F. Pinheiro.
-711-

condes, Apucarana, Senador Corrêa etc. Todas estas colônias ficaram


ligadas ou dependentes aos dois eixos de comunicação: vale do 19uaçú
e o leito da estrada de ferro São Paulo-R:o Grande.
Leo Waibel, referindo-se à ocupação e colonização dessas terras
cobertas por matas, assim se expressa:

"Mas que espécie de gente deveria ser co'ocada nessas flores-


tas densas e inacessíveis? Nem os luso-brasileiros, nem os colo-
nos dos Aço-es e da Madeira tinham mostrado até então qualquer
interesse em ir morar na mata; preferiam, sem dúvida, o campo
abe~to, onde podiam estabelecer suas estâncias e administra-las
com o auxílio de escravos negros" (24).

Para os fins colimados, o país necessitava de colonos, pequenos


proprietários, que cultivassem as terras cobertas de matas em regime
de trabalho familiar. Um tal imigrante, que almejasse tais circunstân-
cias, foi encontrado na Europa Central, em territórios habitados por
aldeões poloneses e ucranianos, notadamente os primeiros. Seu maior
sonho era possuir terra suficiente, da qual pudessem tirar o sustento
de sua família e possuir matas, das quais tirassem a matéria prima
para construir suas casas, móveis e demais utensílios domésticos de-
rivados da madeira, bem como lenha para combustivel de sua cozinha.
Nas colônias do vale do rio Iguaçú, até a Primeira Guerra MUll-
dial, foram estabelecidos aproximadamente 65.000 imigrantes euro-
peus, em regime de pequena propriedade. Desde o início, preenche-
ram as finalidades para as quais foram trazidos: garantiu-se a nave-
gação do vale do 19uaçú e os produtos de subsistência passaram a
afluir em quantidades aos grandes centros consumidores do Estado.
A localização estratégica das colônias formadas por imigrantes
europeus levando em conta a "questão de Palmas" - não se restrin-
giu ao território paranaense. A mesma medida foi tomada no Rio
Grande do Sul. A criação de colônias federais, no noroeste do Estado
gaucho, teve o mesmo objetivo estratégico. São as colônias de Gua-
raní das Missões, Ijuhy, Santa Rosa e posteriormente Erechim, Ba-
liza, Treze de Maio etc. Vizavam estas tambem ocupar a "zona da
mata" localizada ao sul da região contestada entre os dois paises.
(Ver mapa anexo). Algumas dessas colônias surgiram após o arb:tra-
mento do presidente norte-americano Grover Cleveland favoravel ao
Brasil (1895). Com a solução arbirtral dos Estados Unidos, o perigo

(24). - WAIBEL (Leo), Princípios da colonização eu'opéia no sul do


Brasil. Revista brasileira de Geogrvrjia.
-712 -

de um conflito armado entre as duas nações havia diminuido, porem


o problema estratégico permanecia. A política brasileira de ocupar as
terras devolutas nas circunvizinhanças do território contestado com
imigrantes europeus, ao que tudo indica era a mais acertada. A rea-
ção da Argentina foi de seguir a mesma política adotada pelo governo
brasileiro. A partir de 1897, os argentinos iniciaram a criação de co-
lônias na província limítrofe de Missiones. Surgem então as colônias
de Azarra, Apostoles, San José, Posadas etc. Observe-se que a for-
mação étnica dos imigrantes ali fixados em terras "fiscales" é basica-
mente a mesma que a em território brasileiro: fundamentalmente po-
loneses e ucranianos. Em 1903 seu número era superior a 6.000 imi-
grantes (25).
A República do Paraguai - guardadas as devidas proporções de
envolvimento na oroblemática - precavendo-se contra qualquer possi-
vel problema militar na região, tambem procurou atrair imigrantes
europeus para seu território limítrofe e desabitado com a província
de Missiones. Surgiram então as colônias de: Kamby-retá, Picada
Boca, Jezus i Trindad, Urusapukey, Kay-puente etc., numa propor-
ção bem menor do número de imigrantes fixados no Brasil ou na Ar-
gentina.
Esta colonização, no Brasil, do ponto de vista da ocupação da
terra, não foi compacta. As colônias estavam isoladas e separadas
entre si pelos campos e matas, sendo as primeiras ocupadas por lati-
fundiários.

"Não havia uma co!onização compacta e em grande escala,


nem uma acumu~ação de riqueza compJravel a certas colônias
alemães e italianas nos out-os Estados" (26).

Mas o que fazia o colono eslavo exultar no Brasil, era a possi-


bilidade de adquirir praticamente tanta terra quanto fosse capaz de
adquirir. Dava sempre preferência por terrenos cobertos por arau-
cárias e erva mate, em cuja exploração logo passou a participar, ini-
cialmente como produtor e em seguida como comerciante.
Entre as inúmeras vantagens apontadas para a introdução de imi-
grantes europeus na região, destacava-se o fato de serem conheced,)-
res de processos mais acabados e hab:tuados
-713 -

- instrumento para aplainar a terra arada - , a gadanha, que é um


ferro com cabo para cortar trigo ou centeio, o picador de palha, o
mangoal - instrumento para malhar as espigas de cereais - , o mo-
inho manual, que é um instrumento semelhante à mó, o radnik -
utensílio utilizado para fazer sulcos no solo para semeadura - , o al-
fange, lâmina de ferro semi-circular, utilizada no corte dos cereais, e
a carroça que vai caracterizar esta colonização no sul do Brasil. Sua
aceitação e difusão no sul do país foi de tal monta, que a carroça ge-
rou o que se poderia chamar de "ciclo" da carroça como meio de
transporte.
O Brasil, excluindo-se os Estados meridionais, notadamente o
Paraná, foi de uma maneira abrupta lançado da era do muar, do trans-
porte em lombo de burro, isto é, das tropas, para a era dos transpor-
tes rodo-ferroviários. No Paraná, graças à carroça, a evolução dos
transportes foi de certa forma parecida com a ocorrida no continente
europeu: entre o transporte animal e o veículo auto-propulsor, de-
senvolveu-se um "ciclo" intermediário, que é o da carroça (27).
Os colonos imigrantes do vale do Iguaçú não receberam orienta-
ção alguma para dirigir e trabalhar sua propriedade. No início, fa-
ziam-no nos mesmos moldes como o faziam na Europa. Desejavam
derrubar o mato e arar o terreno. Mas, logo perceberam que tal não
podiam fazer, devido aos cepos que permaneciam. Adaptaram então
os métodos utilizados pelos nativos: derrubar a mata do trecho esco-
lhido para a cultura, tomando o cuidado de deixar as árvores mui~o
grossas de pé, como imbuias e pinheiros, por exemplo. O mato cor-
tado esperava-se secar, ao que é posteriormente ateado fogo. Assim,
no meio dos tocos carbonizados plantavam milho ou semeavam cen-
teio, trigo etc. Quando os cepos já estavam praticamente erradicadús
ou apodrecidos, o terreno já podia ser considerado "capoeira", pas-
sando então a utilizarem-se do arado para revolver a terra. Após dois
anos de colheita, deixavam o terreno para descanso por alguns anos,
em cujo período o mesmo cobre-se novamente de capoeira. A aceita-
ção, por parte destes imigrantes, do sistema de queimadas, veio pre-
judicar a terra.
Nas colônias onde havia brasileiros nas proximidades, surgiram
conflitos entre os imigrantes e os mesmos. Tal fato deveu-se à ine-
xistência de cercas nas propriedades dos brasileiros. Não costumavam
cercar seu gado, fosse bovino, suino ou qualquer outra espécie de ani-
mais de criação. Era a manifestação do milenar conflito entre agri-

(26). - WACHOWICZ, Ruy Christovam. O camponês polonês no Brasil.


Tese apresentada nO Concurso de Docência Liv~e no Departamento de His-
tória da Universidade Federal do Paraná.
-714 -

cultores e criadores. Os conflitos entre colonos e proprietários brasi-


leiros eram tão comuns, que nas delegacias do interior do Estado, os
livro!> de registro de queixas sobre o gado abatido pelos colonos, es-
tavam repletos.

CONCLUSÃO.

Na Província do Paraná, as iniciativas governamentais de grande


vulto, no sentido da criação de colônias com imigrantes europeus para
a produção de produtos de subsistência, haviam fracassado. Somente
as colônias criadas nas proximidades dos centros urbanos maiore'),
apresentaram características de sucesso. A criação dessas colônias ti-
nha a finalidade básica de produzir gêneros de subsistência, em re-
gime de pequena propriedade.
A tentativa de implantar uma extensa colonização com fins agrí-
colas nos Campos Gerais paranaenses com colonos russo-alemães do
Volga, por diversos motivos havia fracassado.
Entretanto, uma profunda modificação na estrutura agrária pa-
ranaense vai ocorrer, não em terrenos componentes dos Campos Ge-
rais e sim na chamada "zona da mata". A colonização das terras do
vale navegavel do Iguaçú, foi motivada por razões estratégicas, de-
vido à problemática gerada pela chamada "questão de Palmas", entre
o Brasil e a Confederação Argentina. Esta colonização foi concreti-
zada através da fixação ao solo de milhares de imigrantes notadamen-
te eslavos. O regime de pequena propriedade - 10 a 15 hectares no
máximo, para cada família de colono - provocou na região a pri-
meira grande transformação agrária que se registrou em território pa-
ranaense. A "zona da mata" foi transformada, por esta colonização,
no maior centro de produção agrícola do Estado, até o surgimento da
grande colonização nas terras roxas do norte, a partir da década de
1930.
O regime da pequena propriedade, a utilização de novos instru-
mentos agrícolas desconhecidos na região, a carroça como meio funda-
mental de transporte, a introdução da cerca na separação das proprie-
dades, são elementos que provocaram uma verdadeira revolução agrí-
cola no Estado.
Os proprietários pré-existentes na região, começaram - devido
às transformações ocorridas - a sentir-se "apertados". Sua mentali-
dade não conseguiu acostumar-se rapidamente ao uso das cercas. A
solução en~ontrada
-715 -

sequência, desenvolveu-se na região um processo de compra de terras


das mãos dos assim chamados luso-brasileiros. Os colonos, descenden-
tes dos imigrantes ocuparam, pelo processo de compra, praticamente
todo o vale navegavel do Iguaçú, desde os arredores de Curitiba, até
Porto Vitória, numa extensão superior a 350 km.
'" '"
'"
INTERVENÇOES.

Da Prota Maria Regina da Cunha Rodrigues Simões de Paula (Uni-


versidade de São Paulo)
Pergunta:
"Dentro da linha temporal-espacial, a que modesta e concreta-
mente procuro filiar-me, há áreas históricas de eventual delimitação
na temática abordada?
O Núcleo do Paraná, marcado por uma vertente de iniciativas e
concretizações das mais válidas, como a do plano diretivo do arrola-
mento das fontes primárias, teria realizado algo semelhante em rela-
ção às tradições culturais, à sobrevivência do folclore, tanto em pro-
cesso de aculturação, como ainda fiel às manifestações dos núcleos
urbanos de onde se originaram os imigrantes?"
'"
Da Prof!- France Luz (Universidade Estadual de Maringá).
Declarou:
"Gostaria de saber se o estabelecimento desses núcleos coloniai~.
foram de iniciativa provincial apenas, ou se faziam parte de um plano
mais amplo do Governo Imperial?"
'"
Da Prota Ivani Aparecida Rogatti Omura (Universidade Estadual de
Maringá).
Indaga:
"Entre os muruclplos atualmente existentes na Região do Vale
do Iguaçú, quais teriam sido oriundos das primitivas colônias alí. ins-
taladas?
Até que ponto a penetração cultural eslava pode ser evide:nciada
junto aos elementos humanos aí existentes atualmente?"
716 -


Do Prof. Roberto Machado Carvalho (Faculdade de Filosofia, Ciên-
cias e Letras de Moema. SP).
Informou:
"O trabalho vem apresentar um tipo de imigrante merecedor de
um estudo mais amplo, sobretudo pela sua importância em terras pa-
ranaenses. Não se compreende bem porque a imigração italiana, ale-
mã, japonesa, já foram objetos de amplos estudos, enquanto a eslava
aguarda o seu momento. Eis um excelente tema, sobretudo para us
historiadores paranaenses.
Solicito esclarecimentos para os seguintes pontos:
1.°). - O único fundamento dos receios eram as expenencias
anteriores ou haviam outros, como por exemplo, interesses locais de
distribuição das terras?
Se na "zona da mata" os terrenos na época eram mais propícias
para a agricultura, porque foram relegados a segundo plano?
2.°). - Qual a razão ou razões que explicam a preferência do
Paraná pelos eslavos? Especialmente na década de 90, houve inter-
venção do Estado naquele sentido? Era o tipo de imigrante mais indi-
cado para favorecer as ligações leste-oeste, atendendo ao problema
estrtégico?
3.°). - No processo de interiorização na mata ou procura de
centros urbanos dos chamados brasileiros, parece-me que o fator étnico
é importante. Afinal, eslavos e nacionais tinham duas mentalidades
diferentes. Qual a posição do autor em relação ao problema?"
• •

RESPOSTAS DO PROFESSOR RUY C. WACHOWICZ.

À ProU Maria Regina da Cunha Rodrigues Simões de Paula.


"O Departamento de História da Universidade Federal do Pa-
raná não possui projeto de estudos para o levantamento da problemá-
tica da aculturação dos imigrantes no Paraná, nem sobre o folclore da
região. Os nossos projetos giram em torno de levantamento de Fon-
tes Primárias,
-717 -

mas, pelo menos por enquanto, a premência do tempo impede de fa-


ze-lo" .
*
À Prof. a France Luz.
"Todos os núcleos coloniais constitui dos por imigrantes no vale
do rio Iguaçú foram, nessa fase da imigração, constitui dos pelo go-
verno da República, embora os planos iniciais tivessem sido organi-
zados ainda pelo governo imperial. O governo estadual não participou
diretamente do empreendimento."
*
À ProU Ivani Aparecida Rogatti Omura.
"Das antigas colônias, várias hoje formam municípios do Sul do
Estado, como por exemplo: São Mateus do Sul, Marechal Mallet, RIO
Azul, Cruz Machado, Cândido Abreu, Iratí, Antônio Olinto, etc. Por
outro lado, a influência cultural da população eslava na região é bas-
tante acentuada, embora ainda não esteja devidamente estudada. Po-
demos adiantar, por exemplo, a grande importância que teve para a
região o uso difundido da carroça eslava como meio de transporte,
que substituiu as tropas de muares e os carros de bois. O linguajar
da região possui características próprias, bem como o folclore, os cos-
tumes, etc.

Ao Prof. Roberto Machado Carvalho.
"1.0). - Acredito que os receios do governo da Província \10
Paraná, em promover uma imigração em grande escala no fim do pe-
ríodo colonial, estejam ligados às experiências mal sucedidas, como as
da colônia Assunguy, a colonização do litoral e a experiência nega-
tiva de grande repercussão, inclusive internacional, dos russos-alemã~s
do Volga. Esses fracassos condicionaram o governo provincial a ter
maior cautela em promover novos planos de imigração. Por outro, os
terrenos da "zona da mata" estavam relegados a segundo plano, de-
vido ao fato da atividade pecuária dominar a economia paranaense
por muito tempo, deixando os terrenos cobertos de matas em segundo
plano.
2.°). - As razões da preferência do elemento eslavo para ocu-
par o vale do rio Iguaçú, prendem-se ao fato de ser na oportunidade
este imigrante o mais propenso a emigrar das terras européias. No
início da década de 1890, as cond:ções na Polônia e na antiga Galícia
austríaca, favoreciam a emigração em massa. Essas condições
-718 -

aproveitadas, na ocaSlao, pelo governo brasileiro. Se este imigrant~


era o mais indicado para promover esta colonização já é um
outro problema. O fato é que este elemento era o mais disponivel, no
momento, na Europa, para promover a colonização em regime de pe-
quena propriedade, de acordo com plano do governo brasileiro.
3.°). - No processo de interiorização do elemento eslavo em ter-
ras brasileiras, nunca se pode esquecer o maior objetivo do mesmo,
qual seja o de adquirir a maior quantidade de terra possivel, para si e
para os filhos. É a chamada "fome de terras", da qual ele era pos-
suido. Terra era o que mais lhe faltava na Europa, porem no Brasil
ela poderia ser adquirida com grande facilidade.
O processo de compra dessa terra, dos elementos locais, ditos na-
cionais, é indiscutivelmente um dos pontos fundamentais para o estudo
da aculturação do polonês e do ucraniano no Brasil. O fator étnico
desempenhou papel de primeira monta."
A PROPRIEDADE RURAL EM RIO CLARO (1).

DIANA MARIA DE FARO LEAL DINIZ


do Departamento de Filosofia e História da Universi-
dade Federal de Sergipe.

INTRODUÇÃO.

A zona de São João Batista da Beira do Ribeirão Claro, situada


nos "Sertões do Morro Azul", era de povoamento antigo, caminho dos
que demandavam a região das Minas e ao longo do qual se tinham for-
mado pequenos núcleos,

"destinados quase unicamente a amparar os transportes e


comunicações que se faziam por aí" (2).

Pouco a pouco, foram concedidas sesmarias, que se dedicaram à


criação de gado e ao cultivo de cereais e, sobretudo, de cana-de-açu-
car, hav~ndo uma intensificação do povoamento.
Partindo das terras fluminenses do Vale do Paraiba, o café in-
gressou em São Paulo, e atingiu, em meados do século XIX, a zona
de Rio Claro, que se manteve como ponto limite dessa cultura por
largo tempo, até que a ferrovia libertasse os produtores dos excessivos
fretes de transporte por muares. A implantação da nova cultura apro-
veitou-se da organização montada pela lavoura canavieira, já deca-
dente. Pouco a pouco, as exportações de café superaram as de açu-
car, e esse produto instalou-se como cultura dominante na Província.

(1). - Comunicação apresentada na, 2\1 Sessão de Estudos, Equipe


C, no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(2). - Caio Prado Júnior, História Econômica do Brasil. 8(1 ed;
São Paulo,
-720 -

Antes do café, portanto, Rio Claro já se integrava na zona cana-


vieira paulista, com grandes unidades territoriais que, no dizer de
Alice Canabrava, apresentava um

"marcante contraste na distribuição da terra" (3).

De fato, mais de metade da terra estava em mãos de 5,58% dos


proprieLários, enquanto pouco mais de 46% possuiam apenas 2,62%
da área. Como as terras do atual Município de Rio Claro pertenciam
à Freguesia de Piracicaba, podemos ter uma idéia de que a distribui-
ção da terra na área era ainda mais concentrada do que no total da
zona açucareira. De fato, aí 88,3% das terras estavam concentradas
nas mãos de 14,47% dos proprietários, enquanto que 32,53% pos-
suiam somente 0,76 de área. Por outro lado, esta Freguesia contava
com as maiores propriedades de toda a zona canavieira, tendo as gran-
des cerca de 4.176 alqueires paulistas, em média (4).
A implantação da lavoura cafeeira fragmentou os latifúndios ca-
navieiros, criando um maior número de propriedades, fato esse tam-
bem observado em Rio Claro. De modo geral, a propriedade cafeeira
ocupava uma área menor do que a canavieira. Alfredo Ellis diz que,
segundo Machado de Oliveira,

"a fazenda de açucar, como unidade, e:a muito maior que


a de café. Esta só tinha, em média, 21 légms quadradas, enqmn-
to que o latifúndio açucareiro era de 4 vezes maior, com 92 lé-
guas quadradas, ou sejam 400%" (5).

A partir da década de noventa, vamos encontrar em Rio Claro


as propriedades de sociedade, constituidas por grupos comerciais, ou
por pessoas de uma mesma família. Tais propriedades foram forma-
das em virtude de uma maior exigência de capitais por parte da la-
voura cafeeira. É tambem a partir dessa década que começam a apa-
recer as pequenas propriedades adquiridas por imigrantes estrangeiros,
germâniros inicialmente, e mais tarde, italianos. Originadas das fa-
zendas cafeeiras, essas propriedades irão constituir os chamados bair-
ros rurais, ainda hoje existentes em Rio Claro.

(3) - Alice P. Canab~ava, "A Repartição da Terra na Capitania de


São Paulo, 1818". Estudos Econômicos, vol. 2, n\> 6, 1972. p. 92.
(4). - Ibidem.
(5). - Alfredo E1\is Júnior e Myriam Ellis, A Economia Paulista no
Século XVIII. Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Ciências
e Letras, Boletim n\> 115, São Paulo, 1950,
-721 -

o presente trabalho tem, portanto, a finalidade de analisar a


propriedade rural em Rio Claro, enfocando-a em três aspectos: as
sesmarias, as propriedades de sociedade e as de imigrantes estrangei-
ros.

*
AS SESMARIAS E O INICIO DA OCUPAÇÃO AGRICOLA.

Segundo a documentação oficial (6), temos informações de uma


concedida a Francisco Pereira de Carvalho, de

"3 légoas de terra em quadra no sítio do Rio Claro, Ribeira


do Rio Preto, que parte com os montes claros, e de outra banda
com o Riacho das Araras e de outa com o mesmo Rio Claro" (7).

A concessão desta sesmaria não tem data precisa, mas consta


das Sesmarias e Patentes concedidas entre 1739 e 1742, e que, a nos-
so ver, teria sido a primeira a ser doada. Aliás, cronistas de Araras
mencionl.lm, neste mesmo local, a existência de uma grande sesmaria,
a dos Goes Maciel, concedida em 1818. É possivel que, realmente,
tenha havido um povoamento tão antigo na área, pois aquela sesma-
ria de Francisco Pereira de Carvalho faria divisa com a do R.beirão
das Araras, concedida a Manoel de Miranda Freire, em 1727 (8). As
divisas desta sesmaria coincidem com a concedida aos Goes Maciel,
podendo-se levantar a hipótese de não ter sido ocupada.
Temos, ainda, conhecimento de uma outra sesmaria, datada de
1817, concedida ao Tenente Joaquim Galvão de França, juntamente
com os sesmeiros José Galvão de França e Manoel de Barros Fer-
raz (9).
Entre 1817 e 1821, observa-se uma grande concentração na con-
cessão de sesmarias, demonstrando que esta é a frase mais representa-
tiva do povoamento efetivo dos "Sertões do Morro Azul". Podemos
destacar como sesmeiros, nesta época, Manoel Ferraz de Campos,
(6). - Estas info"mações encontram-se no trabalho de Jeanne Ber-
rance de Castro e José Alexandre F. Diniz, sobre as sesmarias em Rio
Claro (em fase de conclusão).
(7). - APESP-TC (Arquivo Público do Estado de São Paulo), Ses-
marias e Patentes, 1739-1742, L. 10, fI. 90 V. (MS).
(8). - José Alexandre F. Diniz, Organização Agrária do Município
de Araras. Tese de Doutoramento; Faculdade de Filosofia, Ciências e Le-
tras de Rio Claro, 1968. Mimeografada. p. 33.
(9) - APESP-TC, Sesmarias e Patentes, 1815-1817, L. 39, fI. 124.
(MS)
-722 -

Joaquim Galvão de França, Alexandre de Goes Maciel, os irmãos Pe-


reira, M&noel Paes de Arruda e outros (10). Analisando-se a proce-
dência de alguns sesmeiros deste período, observa-se o predomínio da-
queles provenientes de Piracicaba, enquanto outros vieram de Itú, Mo-
gí-Mirim e Santos. Essas sesmarias foram concedidas ou a um só in-
divíduo, ou a mais de uma pessoa, membros ou não da mesma famí-
lia.
Algumas sesmarias, localizadas a curta distância da cidade de
Rio Claro atual, tiveram importância para o estabelecimento das gran-
des propriedades, como é o caso da sesmaria do Morro Azul, de onde
procederam quatro importantes fazendas: lbicaba, Morro Azul, Santa
Gertrudes e Paraguaçú. De sesmarias mais ao norte o futuro Senador
Vergueiro adquiriu, logo no ano de 1818. as terras que deram origem
à colossal Fazenda Angélica, com cerca de 12 léguas de circunferên-
cia (11).

*
A EXPANSÃO DA CAFEICULTURA E AS PROPRIEDADES
DE SOCIEDADE.

Em meio século, isto é, de 1850 a 1900, as fazendas de Rio Claro


passaram por transformações profundas, originadas pela substituição
dos produtos cultivados. De fazendas essencialmente açucareiras pas-
saram a basicamente cafeeiras. É evidente que uma mudança de tal
envergadura repercutisse profundamente nos tipos de gestão da pro-
priedade, nas relações de trabalho agrícola e na própria dimensão da
fazenda.
QUADRO 1.
SESMARIAS DO CORUMBATAl E MORRO AZUL.
1739/1742-1821.

Sesmeiro(s) Datade Concessão

Francisco Eugenio de Andrada, Pe.


Patrício Manoel de Andrada e S\l D .
Maria Flora de Andrada. 16/6/1817
2 Cap. m Francisco Galvão de França,
Agostinho de Camargo Penteado, Pe.

(lO). - Ibidem, 1819-1821, L. 41, fls. 155/155V; 147/147V; 143V /144.


(MSS) .
(11). - Djalma Forjaz, O Sena"or Vergueiro, Sua Vida e Sua 1!:poca,
1778-1859. São Paulo, Officina do "Diario Official",
- 723

José Galvão de França, Alferes Fran-


cisco Xavier de Bar:os França, D.
Maria Dias Leite e Antônio Galvão
de França 29/9/1816
3 José Golçalves Meira 28/4/1820
4 Joaquim Cardoso Pimentel 16/2/1821

5 Alferes Manoel Paes d'Arruda 30/3/1821

6 Rafael Antônio Pereira, Antônio Pe-


reira, Ignacio Antônio Pereira, Chris-
tovão Perei;a, Bento Pereira, João Pe-
reira Ribeiro, Manoel da Cruz Pereira
Joaquim Antônio Pereira, Bento José
da Cunha e Rafael dos S:lotos Pe-
reira 17/4/1821

7 Alexandre de Goes Maciel, Antônio de


Goes Maciel, José Alves Futado,
Pedro Alves, José Alves e Pau!o Pi-
res. 17/5/1821

8 - Francisco Pereira de Carvalho 1739-1742 (?)

9 Tenente Joaquim Galvão de França,


José Galvão de França e Manoel de
Barros Ferraz 13/1/1817

10 Capitão Agostinho Rodrigues de Al-


meida 19/5/1820

11 Antônio José da Cruz, Joaquim Fran-


cisco da Cruz, Bernardo José Alva:es
e Joaquim da Costa Garcia 6/10/1795

12 Manoel Ferraz de Campos 1/10/1817

Embora os grandes fazendeiros e proprietários individuais tives-


sem sempre constituído maioria entre os agricultores, a partir de 1890
começam a aparecer as fazendas geridas por sociedades. Tal fato me-
rece destaque porque, até 1861, Vergueiro & Cia. formava a única
sociedade para exploração da cultura do café em Rio Claro, com a
Fazenda Angélica. O
724 -

QUADRO 2.

MUNICIPIO DE RIO CLARO.


VALOR DA FAZENDA ANGELICA.
1865

Terras ................................... . 1.285:000$000


350.000 pés de café ............... . ...... . 135:000$000
Edifícios e máquinas ..................... . 112:250$;)00
Açude de 112 braças .................... .. 30:000$000
Escravos (139) ........................... . 206:700$000
Gado .................................... . 8:400$000
TOTAL ................................. . 1.777:350$000
FONTE: Djalma Fo-jaz, O Senador Vergueiro, Sua Vida e Sua
Epoca (1778-1859), p. 74.

Pela relação de fazendeiros do Município, em 1892, notam-se já


16 sociedades, sendo 9 de grupos familiares. As restantes pertenciam
a grupos comerciais, propriamente ditos, como Aranha & Corrêa, Ca-
margo & Abreu, Corrêa & Corrêa, Franco & Cia., Godoy & Joly,
QueiroL. & Barros, Gomes Pinto & Sá (12). As sociedades, mesmo
as familiares, parecem apresentar uma maior necessidade de capitais pa-
ra o desenvolvimento da cultura do café
De fato, por volta de 1897, a lavoura exigia um grande capital
de exploração que, segundo Franco Lacerda, chegava a 90:000$000
para uma farenda com produção de 10.000 arrobas. Computando-se
o capital fundiário, as despesas eram muito maiores, fazendo com que
o lucro do fazendeiro nunca fosse muito elevado. O Quadro 3, mostra
o capital necessário para uma fazenda assim, destacando-se que o ca-
pital fundiário (13) atingia a cifra de 1. 000:000$000. Note-se tam-
bem que o maior emprego deste capital era no cafezal, mais caro uo
que a terra e as benfeitorias. No capital de exploração, as maiores
des?esas eram de administração e transporte.
A. d'Escragnolle Taunay informa que todas as despesas com ca-
fé, tanto em Santos como nos mercados consumidores, elevavam-se
em média, a 23% sobre o valor da mercadoria. Assim, as despesas

(12). - AHRC (Arquivo Histórico de Rio Cla~o), "Relações dos Agri-


cultores de Caffé Classificados para Pagamento de Imposto em 1892". (MS).
(13). - Capital Fundiário e de Exploração de acordo com a classifi-
cação de natureza jurídica de Pierre Fromont, Economie Rurale. Paris, Ed.
Génin, 1958. p. 200.
-725 -

"desde a compra até a venda para o consumo eram as se-


guintes: preço da sacca, imposto de 11% sobre o valor do
café, despesas de embarque, comissão de exportação, correta-
gem, frete do vapor e seguro marítimo. Na Europa occorriam
er.tas outras: desemba: que, armazenagem, seguro, commissão
bancaria, commissão de venda, corretagens, descontos, taxas,
etc" (14).

No cômputo geral, o lucro final do fazendeiro era de 7% do ca-


pital empregado, demonstrando uma insuficiente rentabilidade. O ca-
pital aplicado na economia cafeeira produzia um lucro percentualmen-
te mais baixo do que se fosse aplicado em outro ramo de negócio.

QUADRO 3.

ESTADO DE SÃO PAULO.


CAPITAL EMPREGADO NUMA FAZENDA CAFEEIRA COM
PRODUÇÃO DE 10.000 ARROBAS.
1897

CAPITAL Valor em 1$:>00


150.000 pés de café 600:000$
400 alqueires de terra 200:000$
Benfeitorias 200:000$
Sub-total 1.000:000$
Despesas com colheita, beneficiamento e
remessa para Santos, comissão de vendas,
etc. 15:000$
Colheita 15:000$
Carretos, seca e beneficiamento 10:000$
Administração e out~as despesas 20:000$
Frete 20:000$
Comissão de 3 % e carreto em Santos 10:000$
Sub-total 90:000$
TOTAL 1.090:000$
FONTE de dados brutos: A. d'Escragnol!e Taunay, Hist6ria do
Café no Brasil. VoI. IX; T. I.; p. 209.

(14). - A. d'Escragnolle Taunay, Hist6ria do Café no Brasil. 15 vols.;


Vol. IX, T. I. Rio de Janeiro, Edito:a do Departamento Nacional do Café,
1939. p. 209.
-726 -

"Uma industria que no Brasil de 1897 apenas dava 7% do capital era


simolesmente precária. E para is.to ainda exigia uma média de pro-
dução consideravel de lavouras novas a chegar" (15).
Comparando essa estimativa com a de 1860, verifica-se uma tri-
plicação no capital necessário para uma produção superior à daquela
época, em apenas 1.000 arrobas. O capital necessário para a forma-
ção de uma fazenda com produção de 9.000 arrobas, com 300 mil pés,
era de 300 contos de réis. Agora, com apenas a metade de pés e uma
produção de 10.000 arrobas, eram necessários 1.000 contos de réis.
O lucro, que era de 4 a 5 %, no máximo, aumentou para 7 %
apenas.
Comprovando a relação entre a necessidade de capital e a cons-
tituição das propriedades de sociedade para a produção de grande
quantidade de café, observamos que das 18 fazendas com produção
superior a 8.000 arrobas de café, 5 eram de sociedades. Nas pro-
priedades de mais de 8.000 arrobas, as sociedades perfazem 27,7% do
total. Já nas propriedades de menor produção, as sociedades consti-
tuem apenas 5,9%. Comparando-se as propriedades de grupo fami-
liar com as de sociedades comerciais, pode-se comprovar que es.tas,
embora em menor número eram as mais importantes. A análise das
médias de produção nas propriedades de sociedade (Tabela 1), mos-
tra que, enquanto as primeiras produziam 3.100 arrobas como média
dos anos de 1892 e 1895, as sociedades comerciais alcançavam uma
média de 8. c)83 arrobas. É importante salientar, ainda, que as pro-
priedades de sociedade eram mais importantes do que as individuais,
exatamente pela existência de maiores capitais. Enquanto a produção
média do total das propriedades era de 3.640 arrobas, nas de socie-
dade essa média alcançava 5.591, 5 arrobas (16).
Provavelmente as mesmas condições que explicam a presença
das sociedades explicam tambem a existência de Bancos como pro-
prietários de fazendas cafeeiras em Rio Claro. O primeiro caso de
penetração de bancos na economia agrícola rioclarense ocorreu em
1871, quando o London and Brazilian Bank adquiriu da firma Ver-
gueiro & Cia., em falência, a Fazenda Angélica. Posteriormente, em
1880 o Banco, que se achava em liquidação, vendeu a fazenda após
dividi-la em várias partes (17).

(15). - Ibidem.
(16). - AHRC, "Relações dos Fazendeiros de Café em 1892 e 1895".
(MSS) .
(17). - APESP-TI, Officios Diversos de Rio Claro, 1866-1891, ex.
398. "Recurso do London and Brazilian Bank, firma em liquidação e pro-
prietária da Fazenda Angélica, ao Presidente da Província, em 1 de julhO de
1888". (MS).
727

*
TABELA 1.

MUNICIPIO DE RIO CLARO.

MÉDIA DE PRODUÇÃO DE CAFÉ NAS PROPRIEDADES DE


SOCIEDADES (ARROBAS).
1892-1895.

Classificação 1892 1895 Média dos 2 anos


Grupo Familiar 2.928 3.272 3.100,0
Soe. Comercial 6.166 10.000 8.083,0
Médias geral das
sociedade 4.547 6.636 5.591,5
Média do total
das propriedades 3.326 3.954 3.640,0

FONTE de dados brutos: AHRC - "Relações de fazendeios de


café classificados para pagamer.to de imposto", 1892-
1895. (MSS).

Em 1892, aparecem dois outros grupos, possuidores de proprie-


dades cafeeiras em Rio Claro. São o Banco Agrícola Industrial e o
Banco de Crédito Real de São Paulo. Todavia, essas duas proprieda-
des não são importantes., pois produzem menos de 4. 000 arrobas cada
uma, e não há referência a seu respeito numa outra classificação de
proprietários em 1895, possivelmente porque os bancos não se interes-
saram em operar diretamente no setor agrícola.
Não parece ter havido, no Município de Rio Claro, uma pene-
tração de Casas Comerciais de café diretamente na atividade agrícola
através da aquisição de propriedades. O mesmo caso que ocorreu com
o London and Brazilian Bank se deu com a Casa Exportadora Prado
Chaves, que recebeu a Fazenda Paraguaçú nos fins do século: não se
interessando pela atividade agrícola, imediatamente a revendeu a mem-
bros da família Baeta Neves.
*
AS PEQUENAS PROPRIEDADES DE IMIGRANTES.
Foi justamente no Ooeste paulista, sobretudo ap6s a extinção
oficial do tráfico negreiro, e a consequente diminuição da oferta do
braço escravo, que os fazendeiros optaram pela vinda do imigrante
europeu para as fazendas de café. Através desse esquema o Oeste
-728 -

paulista procurou superar os problemas de mão-de-obra e, ao mesmo


tempo, liberar o grande capital investido na aquisição e manutenção
de escravos, a fim de aplica-lo em outros setores econômicos, ligados
a atividades urbanas e técnicas.
Rio Claro, municínio onde o café comecara a se implantar, tam-
bem se viu uma situação crítica com o estabelecimento da Lei de
1850, dando-se a primeira crise na sua nascente lavoura cafeeira
"quando da alta do preço do escravo e consequentemente
falta de braços" (18).

Com a criação da firma Vergueiro & Cia., por volta de 1846, o


município foi beneficiado com a chegada de braços para a lavoura,
pois, alem de Vergueiro possuir uma fazenda em Rio Claro - Fa-
zenda Angélica - pôs a sua organização a serviço dos outros fazen-
deiros.
Com a Revolta de Ibicaba, em 1856, Rio Claro atravessou um
novo período de crise de mão-de-obra, até a década de setenta, quan-
do passou a receber imigrantes italianos.
A partir dos fins do século XIX, como resultado das crises do ca-
fé, e do fato de Rio Claro já se constituir uma zona velha, muitos fa-
zendeiros faliram, e suas propriedades foram divididas e as partes ad-
quiridas por imigrantes, ou seus descendentes, muitos já radicados nas
próprias fazendas loteadas. Em 1892 existiam já 16 proprietários es-
trangeiros, quase todos de origem germânica, como se pode verificar
nor nomes como Fritz, Heiderich, Helsdorf, Kappel, Schmidt, Drys-
bach, etc. O total de sua produção se situava sempre entre os meno-
res, coro as seguintes médias: 1.680 arrobas em 1892, 1.784 arrobas
em 1895 e 3.680 arrobas em 1898 (19).
Embora pequenas, essas lavouras revelam uma ascensão social
dos imigrantes que se dedicaram ao café: não eram mais colonos e
sim, proprietários. Tentando, por todos os meios, sair daquela precá-
ria situação, os estrangeiros não poupavam esforços para adquirir bens
e mudar de condição de vida.

(18). - APESP-TI, Officios Diversos de Rio Claro, 1845-1857, ex.


396. "Officio da Camara Municipal de Rio Claro ao lImo. Sr. Presidente da
P;ovíncia, em 12 de novembro de 1854". (MS) .
(19). - Os dados brutos para cálculo da produção média foram ex-
traidos das "Relações dos Agricultores de Café Classificados para Pagamento
-729 -

"Aliás, perguntados sobre a razão do seu sucesso, os homens


que enriqueceram dizem dever isso a seu esforço, a um trabalho
duro, ao espírito de economia e à união de todos os membros da
família num trabalho de colabo-ação visando o mesmo fim. A
'sorte' teve seu papel, mas, foi secundá~ia" (20).

Os dados de proprietários, em 1907, servem para demonstrar a


crescente importância dos estrangeiros, 50 onde antes havia 16. Por
outro lado, agora já predominam os proprietários italianos, perfa-
zendo um número de 30 (21).
~ interessante observar que na mesma década em que se organi-
zaram as propriedades de sociedade, apareceram tambem as proprie-
dades de estrangeiros. Naturalmente aqueles fazendeiros que se orga-
nizaram em sociedades puderam sobreviver aos prenúncios do declí-
nio que já ameaçava Rio Claro nos fins do século, evitando a fragmen-
tação das suas fazendas.
O aparecimento desses novos tipos de propriedade é marco deci-
sivo nas transformações profundas que ocorreriam no século XX, quan-
do da intensificação da problemática do café e da fragmentação, às
vezes total, das fazendas, abalando o tradicional esquema da pro-
priedad" rural da área.

(20). - Julia Maria Leonor Scarano, "Comentários Sobre Imigrantes


que Demandaram Uma Zona Cafeeira". 1 Seminário de Estudos Brasileiros.
São Paulo, 1971. pp. 1/7 (mimeografado).
(21). - Almanach d'Oeste do Estado de São Paulo para 1907. Guilher-
me Votta Ed., São Paulo, Typographia Americana, 1907.
A COMPANHIA INDUSTRIAL, AGRÍCOLA E
PASTORIL D'OESTE DE SÃO PAULO E OS
PROBLEMAS DE MÃO-DE-OBRA
(1912-1924) (*).

JOSÉ ENIO CASALECCHI


da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ara-
raquara (SP).

Este trabalho estuda os problemas de mão-de-obra de uma das


maiores propriedades agrícolas do Estado de São Paulo, entre os anos
de 1912 a 1924. Trata-se do Cambuí, pertencente à Companhia In-
dustrial Agrícola e Pastoril D'Oeste de São Paulo, perfazendo um to-
tal de 25 mil alqueires e localizada na região de Araraquara.
Os p!:"oblemas tratados nesta análise são de duas ordens: os que
se referem ao suprimento da mão-de-obra e os relativos à sua explo-
ração. Nem sempre, por facilidade de exposição, estas ordens estarão
separadas.
1). - O Cambuí não fugia ao destino das grandes propriedades
agrícolas da época, tendo como problema constante o suficiente abas-
tecimento de mão-de-obra para as suas atividades. Para tanto, se
beneficiava da presença de 3 núcleos coloniais, localizados ao sul da
propriedade, a saber: Nova Europa, Nova Paulicéia e Gavião Peixoto.
Resta saber em que medida este abastecimento seria suficiente.
Como não se desconhece, desde fins do século passado, muitos
proprietários puseram em execução um plano de colonização parti-
cular, no sentido de solucionar-lhes a carência de mão-de-obra. Con-
sistia o plano em dividir as áreas de sua propriedade em pequenos lo-
tes, formando um potencial obreiro favoravel nas épocas de maior
necessidade . Eram os "viveiros de trabalhadores", como foram de-

(*). - Comunicação apresentada na 1\l Sessão


-732 -

signados na época. Este recurso deve ter dado resultados positivos


tanto que desde os fins do século passado, os governos federal e es-
tadual d,spuzeram-se a fundar núcleos coloniais oficiais. No presente
século, tivemos a criação dos núcleos coloniais de Nova Europa e Ga-
vião Peixoto em 1907. Pouco antes, em 1905, haviam sido criados o
de Jorge Tibiriçá e Nova Odessa .Até 1911, existiam Nova Veneza,
Martinho Prado, Indaiatuba e Parnaiba.
Quanto aos núcleos de Nova Europa e Gavião Peixoto, de nosso
interesse, temos os seguintes dados (1):

População (habit.) Area Cultivada (alq.)


ANO 1910 1911 1912 1910 1911 1912
Gavião Peixoto 726 917 1248 217 372 700
Nova Europa 1358 1431 1751 765 700 815

o panel desses núcleos, no que se relaciona às eventuais exigên-


cias de mão-de-obra pela grande propriedade, evidencia-se na época
da colheira. Sab:damente, esta era uma das atividades que pedia
maiores recursos em mão-de-obra. O uso de máquinas na substitui-
ção de trabalhadores era inviavel na colheita. Assim, os habitantes
dos núcleos coloniais poderiam ter uma atividade paralela durante os
meses da colheita do café, sem paralisar as suas costumeiras tarefas,
pois nesta atividade, seria aproveitado o trabalho das mulheres e cri-
anças, ~m prejuizo para os trabalhos normalmente desenvolvidos nos
núcleos. Este dado tem maior significado se considerarmos a insta-
bilidad.e do imigrante em São Paulo, no decênio que cobre 1903-
1912. Para 461 mil entradas, houve perto de 324 mil saidas, per-
manecendo 25% das entradas.
Neste particular, não fica nisto a posição privilegiada do Cam-
buí, pois em 1915, criou o núcleo colonial de Meia-Légua, com uma
área de 700 alqueires, apoiado em legislação que facultava aos pro-
prietários a criação de núcleos coloniais em áreas de sua propriedade
(2).

(1). - COLONIZAÇÃO E IMIGRAÇÃO. Exposição Elucidativa de


uma proposta apresentada ao Congresso Mineiro, 1911, p. 11, São Paulo.
Weisflog & Irmãos, 1913.
(2). - Confome decreto nQ 1.458, de 10 de abril de 1907, que dispõe
sobre a Imigração e colonização em São Paulo. Secção 11, Título I, artigo
188 e seguintes. in Boletim da Seco do Comércio e Obras Públicas, São
Paulo,
-733 -

Na verdade, a criação do referido núcleo se deu em etapa em


que a Companhia não tinha problema de falta de mão-de-obra, em
boa parte liberada pela crise de 1914. Isto pode significar que have-
ria pouca procura de lotes em Meia-Légua, compostos de 10 alquei-
res, vendidos a 2:000$000, sendo 600$000 de entrada e o restante
em dez anos. Note-se que a época era de retração de créditos e de
desemprego. Por isso, a venda foi morosa, sendo que, iniciada em
1915, em 1917 haviam sido vendidos 56 dos 72 lotes. No esquema da
Companhia, a venda dos lotes explica-se por vários motivos.
Os preços são remuneradores, com juros incluidos nas presta-
ções, devendo fornecer

"quantia de alguma importância que muito auxiliarão a Com-


panhia" (3).

Os virtuais compradores de lotes poderiam ser os proprietários


dos núcleos do governo, o que era facilitado pela localização de Meia-
Légua próxima de Nova Europa, Nova Paulicéia e Gavião Peixoto.
Ainda mais, o sucesso obtido nesses núcleos possibilitava maior inte-
resse em Meia-Légua. Alem do que, para o Cambuí, não haveria
quebra na unidade de suas terras, uma vez que o referido núcleo en-
cravava-se entre os do Estado.
Some-se a isto a hipótese de se ter aumentado a reserva de mão-
de-obra, sendo os lotes vendidos especialmente a imigrantes (4).
O Cambuí, ao lado da presença dos núcleos coloniais periféricos,
podia contar com um segundo fator que lhe favorecia a coleta de
mão-de-obra para a expansão sempre constante de suas atividades.
Este lhe foi propiciado pela crise do ano de 1914, geradora de de-
semprego. Apesar da situação parecer contraditória, uma vez que o
Cambuí não poderia estar insensivel à crise, o fato é que, dada a sua
condição de grande propriedade, em que mais de uma atividade pro-
dutiva era desenvolvida, com imensa disponibilidade de recursos na-
turais, alem dos recursos econômicos que uma Companhia poderia ter
para enfrentar a crise, aproveitou-se desta, para com mão-de-obra
disponivel e barata, melhor ocupar a propriedade. Não haveria dis-
pêndio de recursos por parte dos proprietários. Para tanto acenava-
se ao empreiteiro com os frutos da produção cafeeira do 3.° ao 7.0

(3). - Relatório da Companhia - 1914. Entre 1914-1915, a Compa-


.nhia acusou prejuizo em seu balanço.
(4). - A legislação pertinente aos núcleos coloniais estabelecia que
a venda dos lotes a p.oprietários brasileiros não se fazer em proporção maior
que 10%.
-734 -

ano, tendo o mesmo a seu cargo as roças, casas de moradia e demais


despesas de instalação. Bastava ao trabalhador ter um pequeno pe-
cúlio para que pudesse subsistir, até que passasse a produzir o cereal
para a sua manutenção. Era um comportamento muito vantajoso ao
Cambuí, pois, sem que despendesse recursos, teria as suas terras ocu-
padas e valorizadas.
Um terceiro ponto favoravel ao Cambuí na busca de mão-de-
obra, liga-se a constante atividade de seu proprietário, Carlos Leôncio
Magalhães, contactando-se com os órgãos encarregados do abasteci-
mento de mão-de-obra, alem de uma efetiva propaganda das terras,
visando atrair imigrantes.
Concretamente, a Itália foi o maior fornecedor de mão-de-obra
para as nossas fazendas, sendo uma constante preocupação não só de
Magalhães, mas dos proprietários maiores, conseguir atrair esses ele-
mentos que haviam reagido favoravelmente na grande lavoura ca-
feeira. Mas não só a Itália era o centro de preocupação, com a im-
portância que passa a ter no segundo decênio de nosso século a imi-
gração japonesa. Desde 1912, há uma preocupação em se introduzir
o elemento japonês na propriedade, oferecendo-se oportunidade para
500 famílias que o Cambuí estava disposto a receber. Este imigrante
receberia terras para o cultivo de cereais, forragem e algodão, alem
de casas para moradia. A situação do imigrante seria a de meeiro.
Acaso o colono quisesse dedicar-se integralmente à lavoura de algo-
dão, teria terra gratuita para isso, ficando com a produção ou ven-
dendo-a, se preferisse. A situação de meeiro explica-se mais por se
tratar de uma cultura nova, que a Companhia teria interesse em de-
senvolver, sem absorver muito as suas atividades nesta nova cultura.
A meação interessa ao trabalhador, cujo ganho é maior e as condi-
ções de vida são melhores.
O desenvolvimento da meação na cultura algodoeira, feito em
1912 pela Companhia, será um comportamento comum em São Pau-
lo depois de 1930, onde se introduziu em larga escala a cultura do al-
godão em substituição ao café (5).
O interesse do Cambuí na produção algodoeira ligava-se ao fato
de se buscar matéria-prima para uma fábrica de tecidos grossos que
a Companhia tenta criar, cuja manufatura seria vendida nos municí-
pios vizinhos. Na verdade, embora o meeiro pudesse "vender a quem
quisesse" (como constava nas condições), teria pouca possibilidade de
(5). - PRADO (CAIO), Revista Brasiliense nQ 28, março-abril de
1960,
-735 -

colocar o seu produto fora da Companhia. Outros problemas absor-


vem as atenções de Magalhães e o projeto da fábrica não se realiza,
em parte por não conseguir mobilizar os japoneses.
Ainda neste mesmo ano de 1912, e sempre acompanhando a po-
lítica imigratória, Magalhães se propõe a receber 400 famílias de por-
tugueses, exilados na Espanha por terem participado de uma frustrada
revolta para o retomo da monarquia ao seu país. Apesar destas ten-
tativas de se conseguir mão-de-obra imigrante, poucos foram os re-
sultados concretos. O que vale é a constante preocupação de Maga-
lhães na aquisição de mão-de-obra, pois pretendia povoar o Cambuí
de gente "ambiciosa e trabalhadeira, jamais de caboclos e negros",
segundo afirmava.
O prr.conceito contra a mão-de-obra nacional já se generalizava
entre os proprietários paulistas, sendo comuns as afirmações: "os ita-
lianos são gente trabalhadeira", "os brasileiros são preguiçosos". É
preciso, no entanto, explicar o comportamento dos proprietários, as-
sim como dos trabalhadores italianos e nacionais. A produtividade
maior dos trabalhadores italianos ligava-se menos a um aparato técni-
co e mais

"por um conjunto de fatores que se prendem a característi-


cas de trabalho livre numa economia de mercado" (6).

O trabalhador nacional, era, em boa parte, absorvido pelo setor


de subsistência, com impossivel acesso ao mercado. Mesmo o negro,
após a abolição, procura produzir apenas o suficiente para a própria
subsistência, sem utilizar-se da sua força de trabalho, único instru-
mento que dispõe para a ascensão numa economia de mercado.
Atrofiam-se as técnicas produtivas e a organização do trabalho.
Havia por parte do trabalhador brasileiro um sistema de atitudes que
não valotizavam a intensidade da atividade produtiva. Daí o ócio ser
uma atitude plenamente aceita (7). Já os imigrantes italianos pos-
suiam padrões muito mais elevados, no que se refere à intensidade e
organização das atividades produtivas. Foi por isso que se adaptaram
melhor à atividade cafeeira, que proporcionava condições econômicas
para a fixação do italiano, como trabalhador livre. Houve por parte

(6). - DURHAN (EUNICE RIBEIRO), Assimilação e Mobilidade -


I.E.B. U.S.P. - 1966, p. 27. Ver a respeito a Integração do Negro na
Sociedade de Classes - F. Fernandes Domingos - U. S. P. - SP - 1965 -
vol. I - Capo I.
(7). - Consultar a respeito ANTôNIO CÂNDIDO DE MELLO E
SOUZA, Os
-736 -

do trabalhador imigrante uma atitude favoravel a uma regularidade e


à intensidade de trabalho. Daí a aceitação da mão-de-obra imigrante,
a par das opiniões negativas concernentes ao trabalhador nacional, e
de que participava Magalhães (8).
A busca do imigrante foi prejudicada, pelo menos nos primeiros
anos da primeira guerra, desorganizando a sua entrada regular. In-
ternamente, no entanto, havia a crise, iniciada pouco antes de 1914,
agravada pela situação de beligerância que gerou uma disponibilidade
de mão-de-obra. O Cambuí utilizou a crise em favor do aumento de
suas atividades.
Mas não só este aspecto, o Cambuí utilizou-se da crise, senão
através de um comportamento que tipifica o latifúndio em épocas de
retração. Na grande propriedade, sempre que havia prosperidade, em
que o café estava a bons preços, não havia pagamento senão mone-
tário aos trabalhadores, assegurando para o proprietário, a posse do
produto mais lucrativo. Nas crises, ocorre a meação, alem de se au-
mentar o número de empreiteiros.
No caso específico do Cambuí, vale a pena analisar os aspectos
acima levantados. Assim, diante do desemprego em que houve a con-
Sequente queda dos salários, verificou-se ao lado dessa diminuição
salarial a dispensa da mão-de-obra.

"O que é preciso é que você continue a dispensa~ o pessoal


de uma vez a baixar de uma vez o preço daque!es que não pu-
der dispensar",

afirmava Magalhães ao seu administrador geral, em janeiro de 1914.


E ainda,

"não tenha acanhamento de oferecer e nem pJgue mais que a


metade que se costumava pagar" (9).

O 'que se nota no Cambuí é que em 1914, houve uma queda no


número de camaradas. Isto pode parecer contraditório, pois esta mão-
de-obra era a de mais baixo custo. No entanto, ela era a que menos
vínculos tinha com a propriedade, sendo a mais facilmente dispen-
sada. Para fazer frente à crise, Magalhães ofereceu a meação aos co-
lonos, uma vez
-737 -

"era impossivel sustentar o cont -ato com o colono, pois haverá


uma queda de 50$000 por mil pés, e $300 o alqueire, sendo o
pagamento só feito depois da venda do café"_

Juntamente com a meação, o Cambuí ofereceu "terras para plan-


tarem muita roça". Isto ganha mais sentido se soubermos que havia
uma necessidade de alimentos, cujos custos se elevavam. Para a gran-
de propriedade era um modo de resolver favoravelmente a problemá-
tica da mão-de-obra.
Mas não só neste aspecto o Cambuí aproveitou-se da crise, uma
vez que tinha disponibilidade de recursos naturais poderia contar com
créditos que o fazendeiro comum talvez não conseguisse. Como de-
senvolvia atividade paralela à cafeeira, basicamente a pecuária, teria
mais recursos para atravessar a crise, com menos sacrifício que os de-
mais proprietários. Aqui se nota proceder comum à grande propriedade;
que em época de crises conjunturais que afetam as suas atividades co-
merciais, agem com um acentuado carater especulativo (lO). No caso
em análise, a especulação se faz em torno da mão-de-obra, aprovei-
tando-se da ocasião para produzir a baixos custos, um produto em crise,
mas de grande importância na economia brasileira. Assim, num pri-
meiro momento, a atitude da Companhia foi dispensar mão-de-obra,
contando para isso com a falta de estabilidade do trabalhador, favo-
recendo a sua dispensa imediata para a sobrevivência da propriedade.
Num segundo momento, ainda durante a etapa do desemprego,
o Cambuí muniu-se desses trabalhadores sem condições de exigên-
cias. É possivel que em ocasiões como esta, mesmo nas fazendas em
que as relações nas formas de produção tenham sido tipicamente ca-
pitalistas, caminhem para relações pré ou subcapitalistas. Na área
em estudo isto não ocorre (11).
Em nenhum momento, desde 1912, notamos muitas dificuldades
para com a mão-de-obra na propriedade. Isto se devia, em boa parte
à constante preocupação de Magalhães em cuidar desse aspecto, fun-
damental para o bom andamento das atividades. Certamente, até
1917 colhia os resultados do desemprego iniciado a partir de 14,

"pois em razão das condições favoráveis que o Cambuí oferece,


não podemos temer falta de baços" (12).

(lO). - PRADO JR. (CAIO), Revista Brasileira, n Q 28, março-abril,


1960, p. 205.
(11). - Ver
-738 -

Melhor seria dizer que estas condições seriam menos ofertadas


pelo Cambuí, mas inerentes à sua situação de latifúndio nas mãos de
uma Companhia Agrícola.
Com as consequências da geada de 1918, em nosso café e a in-
tensa atividade que se desenvolveu na Companhia daí em diante, hou-
ve necessidade de se ampliar a mão-de-obra. O café, que vinha se
expandindo desde 1917, sustado pela geada de 1918, já em 1921,
acusava falta de mão-de-obra. Não é por acaso que desde 1918,
Magalhães tentou, sem muito sucesso, incentivar a entrada de japo-
neses na sua propriedade em escala maior que a que vinha se proces-
sando, apesar de sua opinião negativa a respeito deste integrante em
1915: "esta canalha tem um defeito, não para".
A necessidade de mão-de-obra é demonstrada através dos pe-
didos feitos pela Companhia Industrial, Agrícola e Pastoril D'Oeste
de São Paulo ao Departamento Estadual de Trabalho, a partir de
1919, come se poderá perceber no quadro seguinte:
trimestre N9 de
Ano famílias Condições de T:abalho
80$ - 100$ pelo trato do café
1919 19 100 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 1$000 pela colheita
----
1919 29 109 IDEM
1919 39 121 IDEM
80$ - 100$ pelo trato do café
1919 49 123 15$ - 30$ pela carpa do café
500$ - 1$000 pela colheita
1920 19 153 IDEM
80$ - 150$ pelo trato do café
1920 29 145 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 700$ pela colheita
1920 39 146 IDEM
1920 4Q 121 IDEM
8J$ - 150$ pelo trato do café
1921 19 124 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 1$::>00 pela colheita
80$ - 200$ pelo t "ato do café
1921 39 146 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 700$ pela colheita
1921 49 157 IDEM
1922 19 152 IDEM
1922 29
- 739

trimestre NQ de Condições de T:abalho


Ano famílias
80$ - 120$ pelo trato do café
1922 39 141 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 1$300 pela colheita
80$ - 200$ pelo trato do café
1922 4Q 131 15$ - 40$ pela carpa do café
500$ - 1$40:> pela colheita
120$ - 200$ pelo trato do café
1923 1Q 63 15$ - 40$ pela carpa do café
600$ - 1$4:>0 pela colheita
130$ - 250$ pelo trato do café
1923 29 69 40$ - 50$ pela carpa do café
600$ - 700$ pela colheita

Desde o início das atividades da Companhia aumentou o número


de famílias de ano a ano. Porem, existe exceções: em 1917 há uma pe-
quena diminuição, certamente em função da superprodução do café
naquele ano, o que leva a uma paralisação das atividades. O ano de
1920 acusou sensivel queda da quantidade de mão-de-obra em re-
lação ao ano anterior com um decréscimo de 10% aproximadamen-
te. O que explica esta situação foi a oferta restrita de mão-de-obra
imigrante, levando alguns fazendeiros, dos mais importantes da região,
a solicitar mão-de-obra de outros Estados. É o caso de Magalhães,
do Conselheiro Antônio Prado e outros, que se propunham a receber
familías de nordestinos, provenientes de regiões assoladas pela seca
daquele ano. Monbeig acusa essa migração interna, depois de 1920
e principalmente depois de 1930, especialmente de elementos do Nor-
te do país (13).
A necessidade de mão-de-obra devia ser grande, a acreditarmos
nas informações do encarregado do envio dos trabalhadores cearenses
os mesmos estavam
"fracos, depauperados e abatidos moralmente" (14).

O que melhor demonstra esta necessidade é o fato dos emissários


do Conselheiro Antônio Prado terem se apossado de toda a mão-de-
obra nordestina, ignorando o pedido dos demais proprietários. Este
malogro levou Magalhães a requisitar, em fins de 1920, mais famílias
de nordestinos para a sua propriedade, e que só fazia por força da

(13). - MONBEIG (PIERRE), op. cit., p. 133.


(14). - Co:respondência entre a Polícia do Ceará e C.L.M. - 1920.
-740-

necessidade, uma vez que a sua preferência era pelas famílias de imi-
grantes (15). Em nada havia mudado a situação dos proprietários,
porque no início do ano de 1921, houve uma declaração de Antônio
Prado na Sociedade Paulista de Agricultura, em que mostrava que a
terceira parte da cultura cafeeira, estava sem mão-de-obra regular,
isto devido à falta de imigrante,

"único recurso pa~a atenuar os efeitos de semelhante crise


de trabalho" (16).

Certamente esta situação levou Antônio Prado a organizar jun-


tamente com outros proprietários, a Sociedade Auxiliadora de Forne-
cimento de Braços à Lavoura de São Paulo, visto que o governo ita-
liano estava disposto a tratar particularmente com os fazendeiros, já
que tiveram uma proposta recusada pelo governo federal. A refe-
rida Soceidade teria o apôio do serviço de imigração do Estado (17).
Em agosto de 1921, realizava-se a Convenção de Ouchy, na
Suiça, em que Antônio Prado, em nome da Sociedade Auxiliadora e
de Michellis, comissário geral da emigração decidem as bases desta
emigração para o Brasil. O que se poderá notar no documento é que
as exigências do governo peninsular eram muitas, em razão das me-
lhores condições que a Itália poderia oferecer aos seus camponeses,
segundo afirmava De Michellis. É possivel que as exigências italia-
nas coincidissem com a necessidade de mão-de-obra que a nossa la-
voura demonstrava ter, apesar das afirmações de um membro da emi-
gração italiana para o Brasil, para o qual havia

"um contínuo prog"esso dos camponeses, vivendo hoje em nossa


pátria em condições diferentes das de poucos anos atrás, não se
permitindo oferecer mais aquelas condições de trabalho existentes
alí (refere-se ao Brasil), e que devem ser consideradas de outra~
épocas" (18).

Daí as exigências da Convenção de Ouchy: transporte gratuito


para o trabalhador e à sua família até a fazenda, contrato com a du-
(15). - Correspondência particular de C . L . M . , Julho de 1920.
(16). - Desde antes da abolição. Antônio Prado já havia se ligado aos
prob'emas do abastecimento de braços imigrantes para a nossa lavoura. Com
a República, aceita a missão de superintender na Europa o Serviço de Imigra-
ção.
(17). - Conforme declarações de Antônio Prado, Correio Paulistano de
16 de outubro de 1921.
(18). - Declarações do Comenda dor Clemente Tandoni
-741 -

ração de três anos, com revisão anual dos preços, pagos com base no
salário da região. Livre acesso dos cônsules italianos para inspecionar
a propriedade; existência de escola na fazenda, assistência médica, for-
necimento de remédios (a preço de mercado) nas áreas situadas a
mais de 10 quilômetros da cidade. Condições higiênicas favoráveis,
inviolabilidade do domicílio, condições de mu1tas limitadas somente
por faltas ao trabalho, e liberdade de compra de gêneros em outra
parte, nas fazendas em que houvesse armazem fornecedor.
Na verdade, essas exigências não animaram muito aos fazendei-
ras, pois ainda em 1922, segundo Delfim Netto, um dos problemas
enfrentados pela lavoura cafeeira era a falta de mão-de-obra. Só mes-
mo os grandes fazendeiros poderiam cumprir as exigências do gover-
no italiano. No que se refere ao Cambuí, os problemas encontrados
na busca de mão-de-obra italiana terão implicações curiosas, em ra-
zão das negociações que Magalhães vinha entabulando com o governo
daquele país para a venda da propriedade. O objetivo da compra do
Cambuí pelo governo italiano era para utiliza-lo em um plano de ex-
pansão de emigração italiana para o Brasil, comportamento já reali-
zado no Paraná, sem muito resultado, desde 1914. As boas relações
de Magalhães com o comissário da emigração de Roma anuviam-se
desde a não concretização dos negócios, com consequentes desenten-
dimentcs.
O que poderia ser um plano já em andamento da emigração ita-
liana, procurando dar melhores condições aos seus emigrantes nos pai-
ses em que se fixassem, foi recebido por Magalhães como uma perse-
guição ao Cambuí.
Eram as seguintes as exigências feitas, concretamente ao Cambuí:
a). - Construir no Cambuí uma enfermaria com leitos suficien-
tes, uma farmácia bem "sortida", assistência médica, sala de pronto
socorro, sala de maternidade, etc ... , para uso dos colonos e a custo
da fazenda;
b). - Construir escolas-recreio para os filhos dos colonos, para
recolhe-los diariamente, provendo, à custa da fazenda, uma refeição
suficiente e ainda vigilância e instrução.
c). - Construir em cada fazenda da Companhia uma pequena
igreja;
d). - Providenciar para que as casas dos colonos sejam mais
amplas e arejadas, tendo na frente laranjeiras e bananeiras;
e). - Diminuir o número de cafeeiros que comumente é en-
tregue ao colono, elevando a retr:buição de 200$
-742 -

pés, para 250$, assim como aumentar de 1$200 por saca de 100 litros
e 1$500. Quanto à diária, por tudo que fizer no interesse da fazenda
ou a pedido do fazendeiro, deveria passar de 4$000 a seco, para 5$000.
Houve ainda outras restrições a respeito de possíveis multas aos
colono!>. O que se depara desta exigência do Comissário da emigra-
ção, é que as mesmas estavam alem das possibmdades do fazendeiro.
Havia pela mesma época em que a mão-de-obra era escassa, uma difi-
culdade de crédito (19), tendo, portanto, o fazendeiro poucas condi-
ções de satisfa~er às propostas. Mesmo porque, alem dos custos ele-
vados para a manutenção do trabalhador dentro das condições impos-
tas, havia a barreira já criada pela sempre subalterna situação social
do colono tendo, a partir daí, condições altamente privilegiadas nas
propriedades.
O que se pode depreender é que, embora tenha melhorado a COIl-
dição do imigrante italiano em comparação com os primeiros tempo",
o que já se notou através da Conveção de Ouchy, as propostas de
Randoni só poderiam ter sido feitas ao Cambuí, por dois motivos: ou
o Comissário da Emigração sabia da importância da propriedade e
queria tirar proveito da carência da mão-de-obra da Companhia, ven-
do-a com possibilidades de responder favoravelmente às exigências;
ou procurava estabelecer medidas descabidas, no firme propósito de
não atender ao pedido do Cambuí, com o qual havia tido sérias di-
vergências por ocasião das citadas negociações da propriedade.
Estas dificuldades impostas pela Emigração Italiana foram sen-
tidas por Magalhães, podendo-se perceber a sua reação através de de-
clarações no ano de 192 3 .

"Conhecido como é o Cambuí do póprio governo italiano


não vejo razão para criar dificuldades na vinda de gente para o
Cambuí".

E, em outra ocasião:

"Eu não posso compreender e nem sei mesmo as razões que


levam o governo italiano a dificultar a vinda de colonos para
a minha fazenda" (20).

(19). - DELFIM NETIO (ANTÔNIO), op. cit., p. 110.


(20). - CorreSllJondência
-743 -

Isto porque, para o seu proprietário, no Cambuí

"o colono é fartamente remunerado no seu trabalho, e onde


ao cabo de três ou quatro anos fica positiv::mente rico",

lamentava-se da oportunidade que o governo da Itália tirava-lhe de


fazer

"a fo:tuna dessa gente só com a plantação de algodão" (21).

Há exagero nestas últimas declarações, segundo a minha opinião.


Curiosamente, ao lado das ressalvas que o proprietário do Cam-
buí fez às exigências italianas, propunha-se a criar condições favorá-
veis 'na área, para receber a mão-de-obra peninsular, pois,

"por um dever de humanidade procU"o sempre melhorar a


sorte dos colonos que trabalham comigo",

apesar de conhecer

"sobejamente a índole do colono, pode dar o que quiser a ele,


nunca está contente. Ele não compreende que a sua sorte está em
permanecer, pois o colono inconstante é, e será sempre um infeliz"
(22).

:E:. bem provavel que mais a necessidade de mão-de-obra fosse


responsavel por estas afirmações.
O problema que sempre foi angustiante para o fazendeiro era o
de pequena fixação do colono, apesar da Convenção de Ouchy ter
estabelecido o contrato para o prazo de 3 anos. Na busca de fixar
o colono ao Cambuí, Magalhães ofereceu alguns benefícios novos,
através de um seguro de vida. Talvez fosse um meio de conseguir
abastecer a sua propriedade de mão-de-obra, escapando às exigências
italianas. Por ser um comportamento impar, ao que parece, no que
se re~ere à assistência à mão-de-obra, merece análise pormenorizada.
O
-744 -

fazendo com que o aumento da sua produtividade mInlmlZaSse os


custos do seguro. Era um comportamento que fazia jús ao espírito de
Magalhães, plenamente dentro dos moldes capitalistas, procurando as
melhores saidas para resolver a contento os seus problemas, pois
afirmava:

"ninguem compreende melho: a arte de ganhar dinheiro que


eu" (23).

Certamente, valia conseguir através do seguro do colono, uma


plena ocupação da propriedade, que teria a sua rentabilidade aumen-
tada, sendo que esta proposta se afigurava como um bom negócio
tanto para a Companhia como para o segurado. Daí a propaganda,
que em técnica de elaboração pouco fica a dever aos mais modernos
meios de divulgação.
Buscando uma área de penetração ampla, esta propaganda se
fez em três idiomas: português, italiano e espanhol. Dirigia-se basica-
mente ao imigrante, numa linguagem em que a "segurança da familia"
e "a economia da família" e "o amor pela família" eram os pontos
básicos de toque. Isso vinha ao encontro das espectativas dos imigran-
tes. Nada melhor para retratar esta situação que a própria reprodu-
ção de documento do seguro.
Depois de condicionante introdução, passava-se ao contrato de
seguro:

"Cada famma de colono, terá na pessoa de seu chefe, um


seguro de vida de l. OOG$OOO (um conto de réis) por mil pés de
café que tratar, sendo que o seguro mínimo será de 3.000$300
(três contos de réis) e o máximo de 5.0JO$000 (cinco mil contos
de réis) para qualquer famma que venha a tratar de mais de 5 mil
pés de café. Alem desse seguro, a Companhia dará mais um p êmio
de 50$JOO a todos os colonos indistintamente por ano e por mil
pés de café que tratar. Este prêmio será denominado Prêmio de
Estágio e será entregue ao colono no fim de cada ano. Os colo-
nos que permanecerem na fazenda três anos consecutivos receberão
ainda um prêmio de 20% em dinheiro sob e o valo' do seu seguro.
Esse prêmio se denominará Prêmio do Trabalho. Assim sendo.
têm os colonos as seguintes garantias:
Se morrer, a família terá sempre de 3 a 5 contos de réis em
dinheiro, no fim do ano conforme o valor do seguro, e mais
-745 -

Pr2mio de Estágio, no fim do ano, que é 50$000 po:· mil pés de


café que tratar.
Se não morrer receberá sempre o Prêmio do Estágio. Se
permanecer na fazenda três anos consecutivos, receberá mais de
20% sobre o valor do seguro - prêmio de Trabalho".

Note-se que havia uma marcante preocupação em interessar à


família a cuidar da maior quantidade de pés de café possivel, através
do prémio de estágio, além de propiciar um trato mínimo de 5 mil
pés, embora fosse o máximo dentro do seguro. Por outro lado, atra-
vés do prêmio do trabalho, procurava reter pelo menos durante 3 anos
o colone na propriedade, que era, sem dúvida, muito vantajoso para
o bom desenvolvimento das atividades. Depois de exemplificar o se-
guro no caso específico de uma família que se incumbisse do trata-
mento de 10. 000 pés de café, continuava a argumentação:
"UM CHEFE DE FAMíLIA NÃO PODE SER INDIFEREN-
TE A ESSES BENEFICIOS. O Chefe de família deve ter, para
fazer jús ao seguro, o máximo de 50 anos. Caso o chefe da famí-
lia exceda desta idade, o seguro será feito na pessoa de seu filho
mais velho, em proveito da família, isto é, das que sobreviverem
ao segurado: pai, mãe, irmãos e viuva. A importância do seguro
pela ocasião do falecimento do segurado se~á ent:egue a viuva, se
houver, ou filho1a), em proveito da família. O valor do seguro e
intangivel, mesmo que o colono deva na fazenda, devendo ser
pago à vista. Caso o colono entre na fazenda sofrendo moléstia
grave incuravel, o seguro se fará como se ele tivesse mais de 50
anos. Se o colono adquirir moléstia grave ou incuravel na fazenda,
o seguro é válido para sempre".

Note-se que todas as famílias podiam ser incluidas no seguro,


mesmo que o chefe tivesse alem da idade limite. Era uma maneira
de atrair mão-de-obra e de não provocar situações diferentes dentro
da propriedade. Finalmente, o documento encerrava-se:
"NÃO PODE SER SEGURADO - Aquele que faz uso ha-
bitual do alcool. A Companhia não pagará o seguro, se o segurado
for assassinado por pessoa da família interessada em SUl morte.
O seguro vigorará sempre e caducará com a saida do colono. A
Companhia reservará sempre, para ga;-antia da vida dos chefes
de famílias, seus colonos, a quantia de 200.000$0:>0 (duzentos
contos de réis) em seus balanços".

Pelo que se verificou não estava sem razão o proprietário do


Cambuí ao afirmar ser esta uma "iniciativa
-746 -

no Brasil". Não obstante, devendo vigorar a partir de novembro de


1923, foi um comportamento de curta duração, uma vez que um ano
depois a Companhia é vendida aos ingleses, não havendo a partir daí,
a continuidade ào seguro. Ainda mais, no caso do Cambuí, o seguro
poderia ser visto como um modo de atrair mão-de-obra de outras
propriedades, pois havia atritos entre Magalhães e o serviço de emi-
gração italiana. Em relação a esse problema da entrada do imigrante
italiano, a posição de Magalhães tornou-se mais radical, como se de-
para de suas declarações em reunião da Sociedade Rural Brasileira,
da Sociedade Paulista de Agricultura e da Liga Agrícola no ano de
1924.
Não só neste aspecto o Cambuí primou pelo pioneirismo, mas
pela constante preocupação em recorrer a meios mais importantes de
divulgação para conseguir os seus objetivos.
O uso da propaganda foi uma atitude costumeira à Companhia
D'Oeste desde as vendas dos lotes do núcleo de Meia-Légua, passando
pela propaganda de 1915, de 1918, para finalizar no seguro de vida.
Ao lado disso, os boletins e cartazes que a fazenda fazia distribuir na
região, quase sempre em 3 idiomas. Conforme os pontos buscados
pelo Companhia, mudavam os pontos de toque.
Em 1915, o objetivo era a venda de lotes de Meia-Légua, daí
temos a enfatização dos pontos favoráveis "da pequena propriedade e
a tranquilidade do trabalhador", a "ausência de patrão como sendo o
ideal para um homem honesto e trabalhador", alem de ter "a neces-
sidade de semear economia para recolher riqueza", "fortuna de sau-
de, porque quem trabalha por conta própria trabalha contente e ale-
gre; fortuna de dinheiro porque produz sem gastar". Esta situação
assemelhava-se ao sentimento de felicidade propiciado pela pequena
propriedade, de que nos fala Sismondi (24).
Estes aspectos favoráveis à fixação do trabalhador à pequena
propriedade são aparentemente contraditórios, partindo do latifundiá-
rio. A contradição inexiste, se nos lembrarmos que a referida propa-
ganda tinha como objetivo a venda de lotes, lucrativa para a Compa-
nhia, como já pudemos demonstrar. Mais que isso, a presença do nú-
cleo colonial era vantajosa, pois eram verdadeiros abastecedores de
mão-de-obra para a grande propriedade em épocas de necessidades.
No mesmo ano de 1915, vemos nova propaganda em dois dos
principais periódicos consultados pelos imigrantes: O F anfulla e o

(24). - SISMONDI (J .C.L. SISMONDE DE), Etudes sur L'Economie


Politique - citado por KAUSTKY
-747 -

Diário Espanhol. Agora ó único modo de fazer fortuna era tomar a


plantação de café por contrato, o que coincidia com as perspectivas
dos imigrantes, enfatizava-se a segurança da família, a possibilidade
de sucesso, etc. Os resultados das propagandas do Cambuí, poderão
ser constatadas através do quadro abaixo, onde se especificam os pe-
didos de informação sobre a propriedade, como as visitas feitas à
mesma por aqueles que pretendiam se engajar como trabalhadores.

NQ de pessoas em NQ de pedidos
Ano busca de trabalho de informação

1915 345 242


1916 127 175
1917 329 228
1918 283 198
1919 183 371
1920 57

Observe-se que logo após a propaganda realizada, são imediatos


seus efeitos no Cambuí, aumentando não só a procura de empregos
como os pedidos de informação. Para complementação dos dados a
esse respeito, serve de ilustração o quadro da página seguinte que
enumera as cidades em que a propaganda do Cambuí surtia algum
efeito. Para isso foram compulsadõs os pedidos de informação tão
somente, uma vez que faltam elementos para avaliação da área de que
provinham os que buscavam emprego através de visitas à proprieda-
de. Na verdade, é possivel concluir que esta deveria ser a mesma da-
quelas especificadas no quadro, com o acréscimo dos trabalhadores
das fazendas próximas às do Cambuí. Possivelmente muitos pedidos
de informação eram motivos para posterior visita à propriedade.
Estes pedidos de informação encerram-se em 1921, o que é la-
mentavel pois não podemos avaliar a penetração do seguro, proposto
pela propriedade.

Para encerrarmos o estudo deste aspecto, vale mencionar o A r-


rivo A I
-748 -

Magalhães no trato com o colono. Percebe-se que os Consigli ai Co-


loni eram uma espécie de brinde.

CIDADES QUE TOMARAM CONHECIMENTO DA PROPAGANDA DO


CAMBUI

Cidade Estrada de Feno Cidade Estrada de Ferro

Araraquara Paulista Sorocaba Sorocabana


Nova Europa Paulista Jaú Sorocabana
São Carlos Paulista Pindorama Paulista
Descalvado Paulista Cascavel Araraquarense
Botucatú Sorocabana Franca Mojiana
Cachoeira Central do Brasil Itú Mojiana
Lorena Central do Brasil J abuticabal Paulista
Barretos Paulista Brodosqui Mojiana
Araras Paulista São Simão Mojiana
Dourado Paulista Judiaí Santos-Jundiaí
Matão Araraquarense Bebedou'o Paulista
Cravinhos Mojiana Ourinhos Sorocabana
Corredeira Noroeste São João da Boa
J acarezinho Mojiana Vista Mojiana
Rio Preto Araraquarense São José do Rio
Ibitinga Paulista Pardo Mojiana
Dois C6r:egos Paulista Vargem Gde. Sul Mojiana

Constatamos que o proprietário da Companhia D'Oeste, através


de suas declarações e das propagandas, na busca de mão-de-obra, en-
fatizava a possibilidade do trabalhador ficar rico no Cambuí. O exa-
me dos salár!os, propõe, no entanto, os seguintes resultados: entre
1912-1919, 25% dos colonos, recebia salário bimestral, inferior a
61$000, sendo 39,5% entre 61$000 e 120$000. Se acrescentarmos
que uma família rural composta de 7 pessoas, tinha como custo mí-
nimo mensal 50$000, em 1911; 56$000, em 1917; 68$000, em 1919;
e, 74$000, em 1921 (25), as possibilidades de acumulação por parte
de 64,5% (2!\% que recebe entre 30 e 61$000, e 39,5%, entre 61-
(25). - Para o cálculo do custo de vida nos anos mencionados, toma-
mos por referência os dados da publicação de Evaristo Leitão, Romualdo Cavina
e J .S. Palmeira, O trabalhador Rural Brasileiro, do Departamento de Esta-
tística e Publicidade, em 1917. O referido trabalho nos forneceu os dados
de 1911 e 1921. Os demais foram calculados com base nos Boletins do Depar-
tamento Estadual do Trabalho, publicação trimestral da Secretaria da Agri-
cultura, Comércio e Obras
-749-

120$000) dos colonos não faziam jus às declarações de proprietário


da Companhia O'Oeste, mesmo considerando-se que boa parte da
subsistência do colono estava assegurada pelo cultivo do feijão, milho,
arroz, criação de porcos, galinhas, etc.
Este cultivo de cereais era feito nas terras dada por fora ao co-
lona. Essas terras eram proporcionais ao número de pés de café tra-
tados (no máximo 3.000 metros quadrados por mil pés no Cambuí).
O colono poderia ter tambem o resultado das plantações efetuadas
entre os pés de café. Este era menos relevante daquele obtido, nas
terras por fora, pois era permitido plantar duas carreiras de feijão das
águas em 1/4 do cafezal tratado. Os 64,5% dos colonos que ganha-
vam até 120$000 por bimestre, cuidavam entre 2500 a 4000 pés de
café (veja-se o quadro de salário da região mais abaixo) .
Os 35 %, tinham salários superiores a 120$000 por bimestre.
Certamente, eram famílias mais numerosas, pois cuidavam de maior
quantidade de pés de café. Tinham pois, salários e gastos mais ele-
vados. Entre 35,5%, 16,5%, teriam condições mais favoráveis, pois os
salários estavam alem dos 200$000 por bimestre (26) .
Na realidade, esta não era uma situação típica da área em es-
tudo, pois os salários regionais não diferiam daqueles da Companhia,
conforme constatamos. O quadro abaixo, mostra os salários no muni-
cípio de Araraquara (27).

Ano Município Po: mil pés Pela Carpa Pela Colheita


por ano de 50 litros
1912 Araraquara 60$-120$ 12$-20$ $500- $600
1915 Araraquara 90$-120$ 15$ $500- $600
1916 Araraquara 90$-110$ 15$ $5CO
1917 Araraquara 90$-110$ 15$-30$ $500-1$000
1918 Araraquara 80$-110$ 12$-40$ $500-1$300
1919 Ara~aquara 80$-120$ 15$-30$ $500-1$000
1920 Araraquara 80$-150$ 15$-40$ $500-1$000
1921 Araraquara 80$-180$ 15$-40$ $500- $800
1922 Araraquara 80$-190$ 15$-40$ $500-1$000
1923 Araraquara 120$-250$ 20$-50$ $500-1$000

(26). - 15,7% em 1912; 21,9% em 1913; 3,27% em 1914; 8,7% em


1915; 24,4% em 1916; 16,6% em 1917; 20,5% em 1918; 17,0% em 1919.
(27). - Para a elaboração do quadro ao lado, consultamos os Boletins do
Departamento Estadual do Trabalho. Não foi possivel localizarmos todos os
exemplares, o que explica as falhas do quadro. Como pretendíamos dados
anuais, fizemos quando possivel, as médias, uma vez que os boletins são tri-
-750 -

Ainda do exame dos salários, no que diz respeito aos colonos,


temos entre os anos de 1914 a 1915, uma brusca queda de salários.
Houve 50,2 % dos trabalhadores com salários inferiores a 60$000 por
bimestre. O motivo disto foi o não cumprimento do contrato por
parte do proprietário do Cambuí, em razão da crise daquele ano, co-
mo já indicamos anteriormente. A solução encontrada pelo Cambuí,
foi o de aumentar a oferta das terras de cultura, alem de oferecer a
meação da safra do café. Observe-se que o café era, na época, um
produto em crise, o que explica o procedimento da Companhia. Não
obstantl!, o aumento do cultivo de cereais era vantajoso ao colono.
Alem de poder garantir a sua subsistência, teria lucro comercializando
os cereais, pois a área era de carestia de gêneros.

Nota-se que os colonos deixam de existir depois de 1919. A


partir desta data, as folhas não mais especificam os salários bimes-
trais, mas somente as remunerações por mil pés e por ano. Assim te-
mos:

Ano Salário

1919 120$000 por mil pés


1920 140$000 po~ mil pés
1921 160$000 por mil pés
1922 200$000 por mil pés
1923 220$000 por mil pés
1924 400$000 por mil pés

A alta de 1924, explica-se pela

"assustadora falta de mão-de-obra"

daquele ano, como anunciava a Revista da Sociedade Rural Brasi-


leira (28).
Quanto à posição de camaradas e diversos faremos o estudo,
agrupando-os, pois representam a mesma modalidade de trabalho.
Tinham funções mais definidas nas fazendas, gozando de maior
estabilidade do que os camaradas. Os salários seriam semelhantes
entre o~ dois tipos. O que aumenta a sua renda era a sua maior es-
tabilidade na propriedade. Entre 1912 a 1915, 30% recebia até
60$000 por bimestre entre 1919 a 1924, 12,3%. Enquanto para o

(28). - R.S.R.B. - nQ
- 751-

camarada nos mesmos períodos, temos 46,7% e 25,7% respectiva-


mente (19). Quando comparamos estes dados, àqueles obtidos pelos
colonos, temos uma situação mais favoravel destes últimos.
Para a propriedade, o camarada ou volante, apresentava pontos
favoráveis, tendo maior ou menor presença conforme as necessidades
da fazenda: época de colheira, épocas em que a Companhia toca café
por conta própria, eac. Desde que não houvesse necessidade da sua
presença, seria dispensado, pois não guardava vínculos com a pro-
priedade, ganhando por dia de serviço.
Quando sabemos que 59,5% dos camaradas e diversos recebia
salários b:mestrais até 90$000, entre 1912 a 1924 e que os salários
médios mensais na reg:ão de Araraquara, para os camaradas, eram
os seguintes (30):
Ano Salário
1912 70$000 a 80$000
1915 60$000 a 80$000
1916 70$000 a 80$000
1917 70$000 a 80$000
1918 70$000 a 80$000
1919 80$000 a 90$000
1920 70$000 a 110$000

e que pelo censo de 1920, tínhamos os seguintes salários, por dia, em


Araraquara:
Adulto Masculino Adulto Feminino Menor
4$000 3$000 2$000

somos levados a concluir que a situação dos camaradas e diversos,


era de grande instabilidade e por isso tinham baixos salários na pro-
priedade. Quanto à situação dos colonos, camaradas e diversos as
condições de acumulação eram desfavoráveis.
Tudo isto mostra que o Cambuí não fazia jus à fama de acenar
com a riqueza aos seus trabalhadores, pois na realidade as condições
concretas de existência destes eram bastante precárias.

(29). - Os dados anu'lis para diversos eram os seguintes:


1912 - 15,9%; 1913 - 17,0%; 1914 - 28,0% 1915 - 60,0%
1919 - 14,4%; 1920 - 21,7%; 1921 - 7,8%; 1922 - 18,0%; 1923 -
8,7%; 1924 - 3,4%. Os dados anuais para os camaradas, eram os seguintes:
1912 - 30,90/0; 1913 - 30,0%; 1914 - 54,3%; 1915 -75,0%;
1919 - 40,5%; 1920 - 28,1%; 1921 - 31,0%; 1922 - 22,1%; 1923
15,2%; 1924 - 17,17%.
(30).
ESTRUTURA FUNDIARIA E COOPERATIVISMO
- UM ESTUDO MICRO-REGIONAL (*).

(Resumo).

HILDA P/VARO STADNIKY


ARLETE VIEIRA DA SILVA
do Departamento de História da Universidade Estadual
de Maringá (PR).

A ocupação e exploração de terras, os meios de produção e a


circulação dos gêneros agrícolas sobressaem como grandes problemas
sócio-econômicos que se revestem de maior importância quando se
trata da concentração da renda.
Uma série infindavel de estudos tem sido elaborada, abordando
o homem e seu labor agrícola, procurando atingir a essência dos por-
blemas sociais que surgem à medida que novas áreas vão sendo ocu-
padas. Contraditoriamente, tais problemas criam novas faces e eclo-
dem com maior vigor quando essa ocupação é alterada por contin-
gências histórico-culturais ou sócio-econômicas.
Paralelamente, tem se intensificado a ação governamental para
proteger os interesses do próprio Estado e de particulat"es, visando ga-
rantir uma efetiva, satisfatória e compensadora ocupação de áreas até
então inexploradas, por razões diversas. Entretanto, resta saber qual
o comportamento do homem colonizadOt" e povoador diante das me-
didas govern3illlentais. f: necessário saber em que proporção o homem
reage e corresponde à estrutura de ocupação de terras organizada pa-
ra acomodar interesses diversos envolvidos na ação das frentes pio-
neiras e colonizadoras.
Do ponto de vista estrutural, seria interesante delinear a permea-
bilidade de tais esforços no agricultor e estabelecer os limites de sua
correspondência à ação governamental. Partindo de tal preocupação
(*). - Comunicação apresentada na 2' Sessão
-754 -

seriapossivel a ordem direta ou indireta do binômio "ação governa-


mental" e "reação e correspondência do agricultor". Seria possivel
ainda, saber quais os fatores que condicionam as ações e reações do
lavrador em se tratando da produção e comercialização de gêneros
agrícolas.
Tais idéias serão aplicadas na ocupação do Norte paranaense,
dando ênfase à disseminação do cooperativismo no setor de produção
agrícola. Nosso objetivo será estabelecer a estrutura fundiária e de-
termmar os índices de cooperativismo nas pequenas, médias e grandes
propriedades. Será, portanto, um estudo micro-regional, adotado co-
mo modelo para aplicação de estudo semelhante em outras áreas do
Estado.
A área de concentração da pesquisa será a micro-região n.o 14,
cuja sede base é Maringá e compreende 15 municípios, especifica-
mente uma área de ocupação recente, resultante da ação da 'Compa-
nhia de Terras Norte do Paifaná', embora particular, responsavel pela
colonização de vasto espaço Norte paranaense.
Desse modo, a primeira etapa do trabalho compreende um estudo
concreto e atualizado da estrutura fundiária desta micro-reg:ão, com
um levantamento total dos dados disponíveis. A segunda fase, aliás a
preocupação maior do trabalho proposto, será estabelecer o grau de
incidência do cooperativismo na área delimitada e determinar seus
índices na estrutura fundiária estabelecida na etapa anterior. Ao lado
disso, far-se-á um estudo do revezamento das culturas com o objetivo
de se conhecer a intensidade dos agentes sócio-econômicos dinarmza-
dores da ação cooperativista.
Finalmente, esperamos contribuir para o desenvolvimento das
pesquisas regionais paranaenses que se nos apresentam como um cam-
po fértil, de explorações ilimitadas, cujos recursos em fontes primári:1s
são inesgotáveis, desafiando a avidez do pesquisador e aberto às mais
variadas especulações do pensamento humano. Constitui nosso obje-
tivo, ainda, apresentar uma abordagem inédita, como modelo de en-
foque para novas pesquisas neste setor, ressaltando as implicações só-
cio-econômicas do cooperativismo a partir de uma determinada es-
trutura fundiária.
• •

INTERVENÇÃO.

Da Prota Betralda Lopes (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras


de Santos. SP).
- 755-

"Gostaria de saber se a organização de cooperativas em Marin-


gá está vinculada à organização de outras cooperativas nas demais
regiões cafeeiras, como tambem o preço de torrefação detenninado pe-
lo mercado norte-americano, a penetração do açucar na região de
Bandeirantes e o início do cultivo de café na região da Bahia."


* *
RESPOSTA DAS PROFESSORAS HILDA PtvARO STADNIKY
e ARLETE VIEIRA DA SILVA.

Á Prof.a Betralda Lopes.


A medida em que a lavoura cafeeira se expande e avança em
direçãc ao "norte novíssimo" e oeste do Estado do Paraná, inúmeras
cooperativas são fundadas, porem são grupos sem vinculação entre
si. Sabemos que as pressões do mercado norte-americano tem sido for-
tes, contudo seria necessário um estudo paralelo para se apurar até
que ponto o preço da torrefação do café nos Estados Unidos teria, em
caso afi-mativo, resultado no agrupamento cooperativista.
Quanto à expansão da lavoura de cana de açucar na região de
Bandeirantes e de café na Bahia, acreditamos nada haver de comum
com a criação das cooperativas de café, pois o mecanismo de ativida-
des econômicas da micro-região de Maringá, tem forças próprias e o
estabelecimento da lavoura cafeeira é continuação do processo de
expansão natural e incontrolavel do café."
lNDICE DO I VOLUME.

I. - INTRODUÇÃO ............................ 5

Na plataforma nordestina o VIII Simpósio de História


(Aracajuj1975) (Maria Regina) ............ 7

lI. - PROMoçÃO DO SIMPÚSIO ................. 21


Promotores 23
Regulamento do VIII Simpósio Nacional dos Profes-
sores Universitários de História ........... ooo 27
Programa Executado . oo.. oo.. oo.... oo... ooo. o 33
Programa dos Cursos ooo.. oo. oooo. oo. o. oooo. oo 41
Inscrições . ooo. . . ooo. oo. . . o • • • o o o • o o oo. . ooo. 47

III o - SESSOES SOLENES oooo. oo. o.. oooo.. o oo. o. o o 63


Discurso do Professor Eurípedes Simões de Paula, Pre-
sidente da Associação Nacional dos Professores
Universitários de História ...... oo.... o. . . o o 65
Discurso proferido pelo Reitor, Dr Luiz Bispo, no o

encerramento do VIII Simpósio da Associação


Nacional dos Professores Universitários de Histó-
ria o. ooo. o. o o o. oo. oo.. o
o • 0,0 •• o. . o o o •••• 69

IVo - CONFEIU:NCIAS 73
Aspectos geo-históricos do Nordeste (José Silvério
Leite Fontes) o..... oo. o. o. o o..
o o oo o o o ••• o 75
Pernambuco e o Ocaso do Império (Armando Souto
Maior) oo. ooooo o. oooo. o o.. o
o o o ••••• o o o o 97
Estrutura e conjuntura da economia açucareira no
Nordeste do Brasil (1889-1930) (Gadiel Per-
ruei) o.. oooo... o.. o... o.... o
o o o o ••••• o • 107
-758 -

V. - SESSÃO ADMINISTRATIVA 145


Novos Estatutos ............................. 147

VI. - COMUNICAÇõES (A propriedade rural) (História


Geral) . . . . . . . . . . . . . . . .. .. .... . . . . . . . . . 153
A propriedade rural nas Geórgicas de Virgílio (Maril-
da Correa Ciribelli) ....................... 155
A propriedade rural no Baixo-Império Romano (193-
-395) (Maria Regina e Eurípedes Simões de
Paula) . . . .. . . .. . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . 183
Breve nota sobre Abu-Yussuf (Joubran Jamil EI
Murr) ................................. 189
A heresia dos pseudo-apóstolos e a dissolução da pro-
priedade rural livre (allodium) nos séculos XIII
e XIV (Nachman Falbel) .................. 205
A constelação agropastoril da América Colonial Es-
panhola (1500-1570) (la ciro Campante Patrí-
cio) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 207
A propriedade rural durante o movimento autonomis-
ta no Rio da Prata (1810-1830) (Raul de An-
drada e Silva) ........................... 243
A política agrária na Armênia Ocidental sob o Império
Otomano nos séculos XIX-XX (de 1850 a 1914)
(Yessai Ohannes Kerouzian e Beatriz Diniz) .. 255
Burmistr (Victória Namestnikov EI Murr) ........ 277
A grande propriedade rural e as transformações da
economia exportadora argentina (1879-1906)
(Antônio E. Muniz Barreto) ............... 301
A propriedade rural no Egito: a reforma agrária
(Helmi Mohammed lbrahim Nasr) .......... 315
A propriedade rural na obra de George Eliot (Rina
Azaryah Barreto Nunes) .................. 329

* *

-759 -

íNDICE DO 11 VOLUME.

VII. - COMUNICAÇOES (A propriedade rural) (Histó-


ria do Brasil) ........................... 341
Fazendas de gado do Piauí (1697-1762) (Luiz R. B.
Mott) ................................. 343
Distribuição e uso da terra no Rio Grande do Sul no
século XVIII (Corcino Medeiros dos Santos) .. 371
Fazendas do Paraná Provincial (Altiva Pilatti Balha-
na e Cecília Maria Westphalen) ............. 391
A ocupação territorial da vila de Itabaiana: a disputa
entre lavradores e criadores (Maria Thetis Nunes) 407
índios e brancos em conflito pela posse da terra (Al-
deia de Água Azeda - século XIX) (Beatriz
Góis Dantas) ........................... 421
A Lei das Terras de 1850 e a imigração (George P.
Browne) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 453
Fatores relacionados com a distribuição fundiária na
região cacaueira da Bahia (Victor Valla) ..... 465
Nota prévia sobre a propriedade canavieira em Ser-
gipe (século XIX) (Maria da Glória Santana de
Almeida) .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 483
Uma unidade açucareira em Sergipe. - O Engenho
Pedras - (Maria da Glória Santana de Almeida) 511
Análise de documentos concernentes à propriedade ru-
ral na primeira colônia teuta em terra capixaba -
(1847-1920) (Maria da Glória Alves Portal) .. 551
Introdução ao estudo dos mecanismos de formação
da propriedade no eixo llheus-Itabina - 1890-
-1930) (Angelina Nobre Rolim Garcez e Kátia
M. de Queiroz Mattoso) .................. 579
Propriedade e uso da terra na periferia norte do Re-
côncavo açucareiro (Aspectos de história recen-
te) (Maria de Azevedo Brandão) ............ 595
Introdução à história da propriedade rural em Santa
Catarina (W aller F. Piazza) ............... 627
Emigração de intelectuais (Emmanuel Franco) .... 681
-760 -

A venda de um escravo (Emmanuel Franco) 687


A transformação da propriedade fundiária do Vale do
Iguaçu (Ruy C. Wachowicz) .............. 699
A propriedade rural em Rio Claro (Diana Maria de
Faro Leal Diniz) ........................ 719
A Companhia Industrial, Agrícola e Pastoril d'Oeste
de São Paulo e os problemas de mão-de-obra
(1912-1924) (José Enio Casalecchi) ......... 731
Estrutura fundiária e cooperativismo - um estudo
micro-regional (HUda Pívaro Stadniky e Arlete
Vieira da Silva) .....................•... 753
Secção Gráfica
U Faculdade de Filosofia,
S Letras e
P Ciências Humanas
ANAIS DO
VIII SIMPóSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITARIOS DE HISTóRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME III

LXVI
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÃO PAULO - BRASIL


1976
ANAIS DO
VIII SIMPóSIO NACIONAL DOS PROFESSORES
UNIVERSITÁRIOS DE HISTÓRIA

Organizado pelo Prof. Eurípedes Simões de Paula

A PROPRIEDADE RURAL
VOLUME 111

LXVI
Coleção da Revista de História
Sob a direção do Professor
Eurípedes Simões de Paula

SÁO PAULO - BRASIL


1976
VII. - COMUNICAÇÕES (A propriedade rural).
(História do Brasil) (Continuação).
EVOLUÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DA TERRA EM
SERGIPE (1920-1960) - UMA ANÁLISE
QUANTITATIVA (1).

JOSE; ALEXANDRE FELlZOLA DINIZ


DIANA MARIA DO FARO LEAL DINIZ
da Universidade Federal de Sergipe.

INTRODUÇÃO.
o presente trabalho, essencialmente descritivo, é parte inicial de
um estudo bem mais profundo, que procurará analisar todo o processo
de mudança da terra agrícola em Sergipe, principalmente investigando
as causas das transformações fundiárias. Neste estudo, entretanto.
observamvs apenas as mudanças, procurando precisar os graus de con-
centração ou de distribuição do espaço rural em relação ao número
de agricultores. Como os dados utilizados - número de estabeleci-
mento e área ocupada, por categorias dimensionais - foram extrai-
dos dos Censos Agrícolas de 1920, 1940, 1950 e 1960, tratamos, de
fato, de distribuição da exploração rural, e não de propriedades. En-
tretanto, pelo fato de a maior parte dos estabelecimentos possuirem
valorização direta, dessa análise pode-se bem inferir condições fun-
diárias.
Para análise da distribuição da terra empregamos a curva de
Lorenz, modelo já bastante utilizado em estudos agrários, e que mede
a diferença entre a distribuição real e a que deveria ocorrer em caso
de distribuição equitativa (2). No eixo do x coloca-se a porcentagem

(1). - Comunicação apresentada na 2~ Sessão de Estudos, Equipe


C, no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(2). - Sobre a aplicação da Curva de Lorenz à análise da distribui·
ção da terra, veja: Ceron, A. O. e Diniz, J. A. F ., "Tipologia da Agricul-
tura" - Questões Metodológicas e Problemas de Aplicação ao Estado de
São Paulo", Revista Brasileira de Geografia, ano 32, nQ3, pp. 41/71.
Diniz, Diana M. F. L., "Modelos Cuantitativos en la Elabo-
ración de una Tipologia Agrícola: Una Experiencia en Historia", Primeiro
- 768-

acumulada do número de estabelecimentos e no de y a porcentagem acu-


mulada da área. No caso hipotético de cada classe ocupar a mesma
percentagem nos dois eixos, seria traçada uma reta, que dividiria o
gráfico em duas partes iguais. A curva real é comparada, então, com
essa reta hipotética de equidi'stribuição, e quanto maior seu afastamen-
to, maior a concentração.
Há dois tipos principais de medida desse afastamento: o primeiro,
o índice de Gini, que dá duas vezes a área limitada pela curva, já em-
pregado em es,tudo da distribuição da terra em São Paulo (3); o se-
gundo, usado no presente trabalho, é a DISTANelA MAXIMA DE
AFASTAM4NTO (DM), medida em milímetros, e que pode ser en-
contrada, num processo numérico, pela fórmula
x' = x. sen e - y. cos e
onde e é o ângulo da reta equitativa, ou seja, 45 0 •
A tabela 1 mostra os dados de distribuição da terra para o con-
junto do Estado de Sergipe, com as percentagens simples e as acu-
muladas . Plotando~ as percentagens acumuladas do número na
abscissa e as percentagens acumuladas da área na ordenada, obtemos
uma curva com afastamento máximo igual a 42 milímetros.

TABELA 1.
ESTADO DE SERGIPE.
DISTRIBUIÇÃO DA TERRA, 1920.

Classes de área Número de estabelecimentos Area de estabelecimentos


ha. total % % ac. total (ha.) % %ac.

- 41 5.170 63,45 63,45 69.797 9,30 9,30


41 a 100 1.393 17,09 80,54 90.898 12,11 21,41
101 a 200 640 7,85 88,39 93.894 12,51 33,92
201 a 400 545 6,69 95,08 156.057 20,78 54,70
401 a 1000 310 3,80 98,88 181.823 24,22 78,92
1001 a 2000 70 0,86 99,74 95.306 12,69 91,61
2001 a 5000 17 0,21 99,95 41.034 5,47 97,08
5001 a 10000 3 0,04 99,99 22.022 2,92 100,00

Fonte de Dados: Censo Agrícola, 1920.

(3). - Canabrava, Alice P., "A Repartição da Terra na Capitania


de São Paulo, 1818", Estudos
- 769-

Alem de efetuarmos uma análise da evolução da distribuição da


terra no Estado, nos quatro períodos mencionados, procuramos estu-
dar as variações locais, a fim de melhor explicar as relações entre esse
fato e a produção agrícola, as produtividades, a distribuição da p0-
pulação, etc. Como não era possivel trabalhar com os próprios muni-
cípios, em virtude das inúmeras alterações de área, elaboramos uma
classificação de UNIDADES MINIMAS DE COMPARAÇÃO 1920-
1960, que se encontra no Anexo 1.
________________________________
IOO%~ ~

-1000

c
.....
Gl:SO
"C

50 100%
NOMERO
*
A DISTRIBUIÇÃO DA TERRA.
A Situação em 1920. - Como mencionamos acima, a distribui-
ção da terra no conjunto do Estado era representada por um valor
42, gerado, sobretudo, pela grande participação dos estabelecimentos
de menos de 100 hectares, que totalizavam 80% do número e ocu-
pavam 21 % da área.
-770 -

A maior parte das unidades mínimas de comparação possuia va-


lores de distribuição bem mais baixo, e, se computarmos as curvas
abaixo de 43, vemos que 'Íotalizavam 82% das unidades. Só isso é
suficiente para caracterizar o Estado como uma área de terras não
muito concentradas pois, não havia, sequer, uma unidade com acen-
tuada concentração, superior a 52.
Duas áreas se destacavam pelas terras mais bem distribuidas. A
primeira, indo de Aracaju para o norte até Japaratuba, e para o oeste
até Frei Paulo. Aí, se destacavam duas unidades pela excepcional dis-
tribuição, próxima à reta equitativa: Dores e Campo do Brito. A se-
gunda área, mais ao sul, era formada por Estância, Santa Luzia e, so-
bretudo, por Arauá e Riachão. A maior concentração da terra se en-
contrava em Porto da Folha, Neópolis, Pacatuba, Socorro e Buquim.
As áreas médias dos estabelecimentos agrícolas eram altas, pre-
dominando as unidades com valores superiores a 100 ha. De fato,
apenas Socorro, Dores, e Lagarto apresentavam áreas médias infe-
riores a 50 hectares, o que vem confirmar a tendência geral à equi-
distribuição, sem grandes extremos de tamanhos de imóveis. Das três
mencionadas unidades, apenas Lagarto prenunciava uma tendência à
fragmentação excessiva da terra, pois a área média dos seus estabele-
cimentos já estava abaixo de 20 ha.
Exatamente em Lagarto, e ainda em Dores, destacava-se a pe-
quena exploração de menos de 41 ha., que ocupava mais de 40% da
área de cada uma dessas unidades. Secundariamente, outras unidades
apresentavam maior destaque dos pequenos estabelecimentos: Estân-
cia, Socorro, Itabaiana e Simão Dias.
Os grandes estabelecimentos de mais de 1.000 ha. predomina-
vam nas unidades litorâneas (de modo geral ocupando mais de 20%
da área), sobretudo em Santo Amaro, Buquim, Pacatuba e Neópolis.
:E: interessante notar, em toda a área sertaneja do Estado, sobretudo,
nas unidades limítrofes com a Bahia, a grande importância dos esta-
belecimentos maiores, notadamente em Porto da Folha, onde ocupa-
vam mais de 80% da área.
A situação em 1940. - Há uma sensivel mudança em relação
a 1920. A distribuição da terra, para o conjunto do Estado, afasta-se
da equidistribuição, apresentando uma DISTANCIA MÁXIMA de
47. Alem disso, predominavam as unidades com distância máxima
acima de 43. De modo geral, enquanto no litoral estavam as unidades
com terra mais concentrada, no interior ficavam as unidades com ter-
ras mais equidistribuidas, com exceção de Porto da Folha.
A terra mais bem distribuida, com valores de DM entre 26 e 34,
- 771-

Itabaianinha. A maior concentração era encontrada em Neópolis, São


Cristovão, Campo do Brito, Itaporanga e Estância, todas com distância
máxima superior a 52.
As áreas médias dos estabelecimentos iam até quase 200 hecta-
res, mas os valores superiores a 100 ha. só eram encontrados em
Dores e Porto da Folha. Na realidade, predominavam áreas médias
bem inferiores, e as unidades de Itabaiana, Lagarto, Simão Dias e Ria-
chão já se destacavam por apresenta-las inferiores a 20 ha.
Os estabelecimentos de menos de 50 hectares predominavam no
centro-sul do Estado, sobretudo em Simão Dias. Na porção centro-
norte e ao longo do São Francisco, tambem eram importantes, ocu-
pando de 20 a 40% da área das unidades mínimas de comparação.
Porto da Folha continuou sendo a exceção em termos da importância
do estabelecimento de mais de 1 .000 ha., no interior. De fato, a ten-
dência a esses terem maior destaque na faixa litorânea se tomou mais
nítida em 1940, sobretudo no litoral norte e nas proximidades de
Aracaju, marcadamente em São Cristovão e Itaporanga.
A situação em 1950. - A distribuição da terra para o total do
Estado sofreu ligeira tendência à equidistribuição, alcançando uma
DM de 46. As áreas de diferentes valores de distância máxima se
tornam mais nítidas. O litoral, com curvas de mais de 43, e o sertão,
com predomínio acentuado de unidades com distribuição entre 35 e
43. Apenas uma delas (Tobias Barreto), apresentava DM entre 26 e
35. Nota-se que predominava a maior concentração da terra nas vi-
zinhanças de Aracaju e no litoral do São Francisco.
As áreas médias dos estabelecimentos estavam abaixo de 100
hectares, e os valores mais elevados, entre 50 e 100 ha., só eram en-
contrados em seis unidades mínimas de comparação. Em oposição,
quatro unidades apresentavam médias abaixo de 20 ha.
Os estabelecimentos de menos de 50 hectares tinham maior im-
portância no interior, praticamente a oeste de uma linha de Propriá a
Itabaianinha, pois as unidades litorâneas, em sua quase totalidade,
apresentavam menos de 20% da área ocupada com estabelecimentos
nessa categoria dimensional.
Os grandes estabelecimentos predominavam no litoral, sobretudo
em Itaporanga, que apresentava mais de 40% de sua área ocupada
com imóveis de mais de 1.000 hectares. Nota-se, entretanto, que o
estabelecimento de grande porte não era destacado em todo o Estado,
pois 16 unidades apresentavam menos de 20% de sua área com eles.
A situação em 1960.
- 772-

monstrando o alto grau de concentração da terra, apenas sete unida-


des, predominantemente localizadas no interior, apresentavam distân-
cia máxima inferior a 43. Nota-se, tambem, que no litoral, principal
área de concentração, apareceram 11 unidades com distância máxima
superior a 52.
As áreas médias tenderam a diminuir consideravelmente e já 27
unidades apresentavam médias inferiores a 50 ba., e apenas Maruim
e Porto da Folha possuiam-nas entre 50 e 100 hectares. Note-se que
as áreas médias abaixo de 20 hectares aparecem em unidades do inte-
rior, Itabaiana, Campo do Bdto, Lagarto, Simão Dias, Buquim, Ria-
chão e ltabai'aninba, mas, tambem, em Neópolis, Aracaju, Socorro e
Santo Amaro.
Persistiu a divisão entre litoral/interior, graças ao maior desta-
que dos estabelecimentos de menos de 50 ha. na segunda zona, s0-
bretudo em Itabaiana e ltabaianinha, onde ocupavam mais de 60% da
área. O litoral permaneceu com destacada ocupação de área por es-
tabelecimentos de mais de 1.000 ha., e uma nítida tendência a pos-
suirem, apenas, menos de 20% da área ocupada com imóveis de me-
nos de 50 hectares.

AS MUDANÇAS GLOBAIS.

A nivel estadual, houve profundas mudanças na distribuição da


terra no período em análise. Comparando-se as distâncias máximas
de 1920 e 1960, obtem~se \lIlla variação de 6. Entretanto, a variação
20-40 foi a maior no período, enquanto observa-se uma redução de 1
entre 40/50, demonstrando ligeira tendência à equidistribuição, que
ocorreu nessa fase.
O processo dominante foi, portanto, a concentração da terra, que
teve seu apogeu nas décadas de vinte e de trinta, mas, que reapareceu
na década de cinquenta após sofrer interrupção nos quarenta. Essa
concentração da terra, essencialmente estatística, poderia ocorrer, ou
pela redução da importância dos pequenos estabelecimentos e reforça-
mento dos grandes domínios, ou pela expansão acelerada dos menores
imóveis, superior ao crescimento dos grandes. As tabelas 2 e 3 per-
mitem uma análise mais aprofundada do fenômeno.
A área média dos estabelecimentos agrícolas em Sergipe passou
de 91,9 ha., em 1920, para 25,2 ha., em 1940; 26,0 ha., em 1950 e
22,6 ha., em 1960.
-773 -

concentração. De fato, enquanto o número de estabelecimentos pas-


sou de 8.202 (1920) para 65. 014 (1960), uma variação de 692,7%,
a área total variou apenas numa percentagem de 94,9%.
A fragmentação da terra, entretanto, não agiu igualmente sobre
as diferentes categorias dimensionais. Deve-se observar que, no pri-
meiro período em estudo, os estabelecimentos de menos de 50 ha.
aumt".ntaram 512,6% em número e 236,2% em área. Os imóveis en-
tre 100 e menos de 1.000 ha. cresceram apenas 1,1 % em número e
sofreram uma redução de 12,7% na área ocupada. :e importante no-
tar que os maiores es,tabelecimentos (mais de 1.000 ha.), sofreram
reduções em número e em área ocupada de, respectivamente, 26,7%
e 0,6%. Entre 1940 e 1950, exatamente a década de tendência à
equidistribuição, o número de estabelecimentos teve um crescimento
percentual inferior ao crescimento da área ocupada. Por outro lado,
enquanto baixavam sensivelmente as percentagens de crescimento dos
menores estabelecimentos, os imóveis de mais de 1.000 ha. perdiam
pouco mais de 10% de sua área total. Nota-se nessa fase a expansão
dos estabelecimentos de tamanho intermediário (100 a menos de
1.000 ha.), Que aumentaram 37,4% no número e 40,3% na área.
Entre 1950 e 1960, novamente o crescimento do número de estabele-
cimento foi superior ao da área e os de menos de 50 ha. tiveram pri-
mazia, aumentando 55,9% em número. Em área, entretanto, os
maiores imóveis tiveram, pela primeira vez no período estudado, uma
variação em área, superior à do número, demonstrando que a tendên-
cia da terceira década foi o reforçamento dos estabelecimentos de mais
de 1.000 ha.
Uma análise conjunta das mudanças mostra, nitidamente, que a
razão fundamental da concentração estatística da terra está na frag-
mentação dos menores estabelecimentos. De fato, entre 1920 e 1960,
estes aumentaram 1.069,1% em número, e pouco menos de 500%
em área. Em oposição a eles, os imóveis de tamanho médio (100 a
menos de 1.000 ha.) e grande, aumentaram em proporções sensivel-
mente mais baixas, que não chegaram a 70%. A oscilação da área
média dos estabelecimentos acima de 1.000 ha. mostra que, há uma
tendência à permanência de tamanhos semelhantes em diversas épo-
cas. Por outro lado, os estabelecimentos nas classes média e baixa
mostram uma tendência à redução da área média.
Todos esses fenômenos, vistos em conjunto, indicam um acele-
rado processo de fragmentação da terra em Sergipe, que explicaria os
elevad~
774 -


UMA ANALISE REGIONAL DAS MUDANÇAS

Entre 1920 e 1940, apenas seis unidades mínimas de compara-


ção (Pacatnba, Gararú, Porto da Folha, Simão Dias, Tobias Barreto
e ltabaianinha) apresentaram estabilidade ou tendência à equidistri-
buição da terra. Todo o restante tendeu à concentração. Na década
seguinte, de todas essas unidades, apenas ltabaian~nha e Simão Dias
tenderam à concentração, enquanto as cinco restantes se mantiveram
no mesmo estado. Por outro lado, a grande massa de unidade que
antes tendia à concentração, passou à estabilidade, ou mesmo à equi-
distribuição. A década de cinquenta produziu uma alteração diversa
pois a equidistribuição foi encontrada apenas em três unidades. Basi-
camente, o litoral tendeu maciçamente à concentração, enquanto o
interior evoluia para uma manutenção das curvas apresentadas na dé-
cada anterior.
Em termos de uma análise por unidade, vê-se confirmada a ten-
dência geral de concentração da terra, pois é crescente o número de
unidades com DM maior (Tabela 4).

TABELA 4.
ESTADO DE SERGIPE.

NOMERO DE UNIDADES M/N/MAS DE COMPARAÇÃO, POR VALORES


DE DM.

DM
anos 1920 1940 1950 1960
-26 4
26 a - 35 9 5 1 1
35 a - 43 11 4 10 6
43 a-52 5 13 10 11
52 e mais 7 8 11
FONTE de Dados Brutos: Censos Agrícolas de 1920, 1940, 1950 e 1960.

As áreas médias foram sensivelmente reduzidas e a tendência ge-


ral foi, ano a ano, o aumento do número de unidades que possuiam
médias abaixo de 50 ha., que passaram de três em 1920, para 27, em
1960 (Tabela 5). O
TABELA 2.
ESTADO DE SERGIPE.
DISTRIBUIÇÃO DA TERRA.
1920-1960
Total Estab. de - 50 ha. Estab. de IOOa 1000 - ha. Estab. de 1000 ha.a mais
Ano D.M. NQ Área NQ Área NQ Área NQ Área
1920 42 8.202 754.086 5.170* 69.797* 1.483 434.629 90 164.242
1940 47 34.579 870.654 31.674 234.673 1.499 379.368 66 163.262
1950 46 42.769 1.111.645 38.780 303.046 2.059 532.236 78 146.377
1960 48 65.014 1.469.446 60.442 414.021 2.447 627.947 107 250.844
Fonte de Dados Brutos: Censos Agrícolas de 1920, 1940, 1950 e 1960. * menos de 41 ha.

TABELA 3.
ESTADO DE SERGIPE.
VARIAÇÃO NA DISTRIBUIÇÃO DA TERRA.
1920-1960.
Percentagens de Variação
Período D.M. Total Estab. - 50 ha. + Estab. de 100 a - Estab. de 1000 ha. e
1000 ha. mais
NQ Área NQ Área NQ Área NQ Área
1920-1940 5 321,6 15,5 512,6 236,2 1,1 -12,7 -26,7 -0,6
1940-1950 -1 23,7 27,7 22,4 29,1 37,4 40,3 18,2 10,3
1950-1960 2 52,0 32,2 55,9 36,6 18,8 18,0 37,2
1920-1960 6 692,7 94,9 1.069,1 493,2 65,0 44,5 18,9
FONTE de Dados Brutos: Tabela 1. + Menos de 41 ha, em 1920.
776


QUADRO 1.

ESTADO DESERGIPE.

UNIDADES M/NIMAS DE COMPARAÇÃO COM AREA MEDIA INFERIOR


A 20 HECTARES·

1920 1940 1950 1960


Lagarto Lagarto Lagarto Lagarto
Simão Dias Simão Dias Simão Dias
Riachão Riachão Riachão
Itabaiana Itabaiana Itabaiana
Itabaianinha Itabaianinha
Campo do Brito Campo do Brito
Socorro Socorro
Aracaju Aracaju
Pacatuba
Neópolis
Santo Amaro

PONTE de Dados Brutos: Censos Agrícolas de 1920, 1940, 1950 e 1960.

Classificando-se as percentagens da área ocupada em grupos de


20%, vê-se que algumas unidades (Porto da Folha, Gararu, Frei Pau-
lo, Pacatuba, Maruim, Santo Amaro, Socorro e Itabaianinha) não so-
freram mudança de classe, entre 1920 e 1960. Por outro lado, obser-
va-se o aparecimento, em 1950 ou 1960, dos maiores estabelecimen-
tos em unidades de mais extrema minifundização, como Itabaiana,
Simão Dias, Lagarto, Riachão, Buquim, Aracaju e Ne6polis. Tal fato
n06 sugere, para o futuro, o estabelecimento de uma distribuição es-
tatística ainda mais afastada da equidistribuição. };: interessante notar
que, em termos dos estabelecimentos de menos de 40 hectares, Dores,
Socorro, Santa Luzia e Lagarto, são as unidades em que ocorreu au-
mento de árca ocupada.
Os dois processos opostos, de ocupação percentual da área por
estabelecimentos abaixo de 50 ha. e acima de 1.000 ha., podem ser
vistos nas tabelas 6 e 7 .

UMA TIPOLOGIA DAS MUDANÇAS.
-777 -

1920 e 1960. O atributo Qásico para essa classificação foi a concen-


tração ou equidistribuição da terra em cada período analisado, usan-
do-se a ocorrência de estabilidade como característica acessória.
*
TABELA 6.

ESTADO DE SERGIPE.

UNIDADES MINIMAS DE COMPARAÇÃO, POR AREA OCUPADA POR


ESTABELECIMENTOS DE MENOS DE 50 HECTARES.

%
ano 1920 1940 1950 1960
- 10 19 7 3 2
19 a - 20 4 6 12 12
20 a - 40 4 10 7 11
40 a - 60 2 5 7 2
60 a - 80 1 2
FONTE de Dados Brutos: Censos Agrícolas, 1920, 1940, 1950 e 1960.

*
TABELA 7.

ESTADO DE SERGIPE.

UNIDADES MINIMAS DE COMPARAÇÃO, POR AREA OCUPADA POR


ESTABELECIMENTOS DE MAIS DE 1.000 HECTARES.

%
ano 1920 1940 1950 1960
- 10 1 3 10 6
10 a - 20 6 4 5 7
20a-40 7 6 6 7
40a-60 4 4 1
60 a - 80 1
80 e mais
sem a classe 10 11 7 7
FONTE de Dados Brutos: Censos Agrícolas, 1920, 1940, 1950 e 1960.
-778 -

~A1

~A2
[JJ A3

Do
De
Fig. 2. - P.ocessos de mudança na distribuição da terra, por unidades mí-
nimas de composição, 1920-1960.
Três grandes tipos de processo podem ser identificados:
Tipo A. - pode ser subdividido em três:
AI - ocor: ência de concentração da terra entre 1920-1940, 1940-
1950 e entre 1950 e 1960.
-779 -

dos pequenos estabelecimentos, nota-se um aumento da


importância relativa dos grandes imóveis, sob etudo após
1950.
A 2 - existe em 8 unidade e se caracteriza por concentração da
terra, com algum período de estabilidade, que pode ter
ocorrido entre 1920 e 1940 (Pacatuba e Simão Dias), en-
tre 1940 e 1950 (Santa Luzia e Neópolis) na última década
analisada (Itabaiana e Dores) e mesmo nas últimas duas
décadas (Gararu e Santo Amaro). É importante notar que,
nesse tipo, não há uma constância da explicação da concen-
tração. Em algumas unidades isso ocorreu fundamental-
mente pela fragmentação dos menores estabelecimentos,
em outras por esse motivo, mas, tambem por um cres-
cimento dos maiores imóveis ou até pelo aparecimento
de estabelecimentos grandes, como ocorreu em Dores.
As - o tercei:o sub-processo de concentração é essencialmente
atual, pois foi antecedido por equidistribuição no período
1940-1950 e de concentração entre 1920 e 1940. É a ca-
racterização, a micro nivel, do processo global do Es-
tado e aparece em Maruim, Divina Pastora, Propriá,
Lagarto, Itaporanga, Itabaianinha, Estância e Frei Paulo.
Há g~ande variedade de explicações para o processo de
equidistribuição, desde a diminuição de importância dos
pequenos e grandes estabelecimentos, até o desapareci-
mento desses últimos, como ocorreu em Itabaianinha.

Tipo B. - em que ocorre uma equidistribuição atual, precedida


de concentração nos períodos anteriores, aparecendo apenas em São
Cristóvão, Socorro, Sirirí e Campo do Brito. A fragmentação dos me-
nores estabelecimentos foi a principal responsavel pela concentração
que ai ocorreu, e hoje a tendência à equidistribuição se dá mais por
um reforçamento dos imóveis de tamanho médio e talvez por uma
tendência à aglutinação de estabelecimentos muito pequenos.

Tipo C. - característico de apenas duas unidades, situadas nos


extremos noroeste e sul do Estado (Porto da Folha e Tobias Barreto),
o presente tipo indica a tendência permanente à equidistribuição da
terra. Em Porto da Folha este processo decorre da redução dos esta-
belecimentos muito pequenos (abaixo de 5 ha.) e muito grandes. Em
Tobias Barreto, ao contrário, houve desaparecimento de estabeleci-
mentos muito grandes nas décadas de vinte e quarenta, e os grandes
vêm sendo constantemente reduzidos até 1960.
-780 -

CONSIDERAÇOES FINAIS.
o presente trabalho deverá prosseguir, com o levantamento de
novos dados e testes de várias hipóteses que já podem ser formuladas,
em termos de associações entre a evolução da distribuição da terra e
condições demográficas, culturais e econômicas. Em diversos mo-
mentos da análise ficou patente uma nítida diferenciação entre uma
faixa litorânea, tradicionalmente canavieira e uma zona interiorana,
pecuarista e com lavoura de cultivos anuais. f: possivel que uma re-
lação entre orientação da agricultura e mudanças na distribuição da
terra, possa ser estabelecida de forma segura. Não devemos esquecer,
todavia, que Sergipe está sofrendo um violento processo de mudança
em termos de ocupação de espaço, com a redução de· área em culti-
vos tradicionais, a expansão de novos, como é o caso da laranja e o
acelerado desenvolvimento de pastagens. Entretanto, a própria pecuá-
ria sofre uma crise de graves proporções, com a modernização dos
meios de circulação e as mudanças de consumo.
Talvez uma relação tambem possa ser expressa entre a distribui-
ção da terra e a pressão demográfica, bem como entre aquela e os pro-
cessos de herança que, ligados a uma tendência à manutenção dos gran-
des estabelecimentos, forçaria a fragmentação dos pequenos imóveis,
gerando o aparecimento de uma classe de agricultores sem capital e
quase sem terra, incapaz de promover um desenvolvimento agrícola
marcante.
f: importante notar que o processo de minifundização tende a se
espalhar de maneira difusa, começando no interior e penetrando, pou-
co a pouco, no litoral. Observando--se a evolução das áreas médias,
nota-se que o ponto original desse processo se encontra realmente,
na zona cerealicultora e horti-granjeira do Estado. O aumento da con-
centração da terra nessas áreas vem mostrar, nitidamente, que o con-
tínuo processo de formação de pequenos estabelecimentos familiares,
tradicionalmente considerados bem explorados, se faz dentro deles
mesmos. f: bem possivel que o estabelecimento dos módulos pelo
INCRA, na década de sessenta, venha impedir, ou, ao menos, reduzir
a intensidade do mencionado processo. A concentração da terra por
expansão latifundiária, não parece ter importância em Sergipe, ao me-
nos até 1960, pois os maiores estabelecimentos tendem a manter a
mesma área e chegam, até, a reduzir sua importância relativa em vá-
rias unidades mínimas de comparação. f: significativo o fato de não
haver em 1972, "latifúndios por dimensão" em Sergipe, mas uma ele-
vada percentagem de minifúndios, de acordo com o Estatuto
- 781-

Fig. 3. - Mapa Base das Unidades Mínimas de Comparação.


RELAÇÃO DAS UNIDADES MINIMAS DE COMPARAÇÃO
E RESPECTIVOS MUNICIPIOS, EM 1960

1. - Aracaju (Aracaju, Barra dos Coqueiros).


2. - São Cristovão (São Cristovão).
3. - Socorro (Nossa Senhora do Soco;ro).
4. - Santo Amaro (Santo Amaro das B"otas).
5. - Laranjeiras (Laranjeiras, Riachuelo, Malhador).
6. - Maruim (Maruim).
7. - Divina Pastora (Divina Pastora, Santa Rosa de Lima).
8. - Sirirí
- 782

9. - Capela (Capela).
10. - Japaratuba (Japaratuba, Rosário do Catete, Carmópolis).
11. - Propriá( Propriá, Malhada dos Bois, Muribeca, Ampa-
ro do São Francisco, Cedro de São João, Aquidabã, Ca-
nhoba, Graco Cardoso).
12. - Pacatuba (Pacatuba, Japoatã).
13. - Neópolis (Neópolis, Ilha das Flores, B~ejo Grande).
14. - Gararu (Gararu, Itabi, Nossa Senhora da Gló.ia, Mon-
te Alegre de Sergipe) .
15. - Porto da Folha (Porto da Folha, Canindé do São Fran-
cisco, Poço Redondo).
16. - Frei Paulo (Frei Paulo, Carirá).
17. - Itabaiana (Itabaiana, Ribeirópolis).
18. - Dores (Nossa Senho~a das Dores, Cumbe).
19. - Campo do Brito (Campo do Brito, Macambira, Pinhão).
20. - Simão Dias (Simão Dias).
21. - Lagarto (Lagarto).
22. - Itaporanga (Itaporanga d'Ajuda).
23. - Buquim (Buquim, Salgado).
24. - Tobias Barreto (Tobias Barreto, Poço Verde).
25. - Riachão (Riachão do Dantas).
26. - Itabaianinha (Itabaianinha, Tomar do Geru).
27. - Arauá (Arauá, Pedrinhas).
28. - Estância (Estância).
29. - Santa Luzia (Santa Luzia do Itanhi, C:istinápolis, Um·
A PROPRIEDADE RURAL :t\O SISTEMA DE
COLONIZAÇAO DA COMPANHIA MELHO-
RAMENTOS NORTE DO PARANÁ - MUNI-
CÍPIO DE MARINGÁ (*).

FRANCE LUZ
IVANI APARECIDA ROGATTI OMURA
da Universidade Estadual de Maringá (PR).

INTRODUÇÃO.

A estrutura agrária do Município de Maringá, assim como de


boa parte do norte do Paraná, foi implantada pela Companhia de
Terras Norte do Paraná, hoje Companhia Melhoramentos Norte do
Paraná.
Para se conhecer e se fazer a história deste município, portanto,
é necessária a pesquisa de seu povoamento inicial, o qual está direta-
mente vinculado à ação daquela companhia. Seu sistema de colonização
demonstrou ser racional e eficiente, integrando a região no processo de
expansão agrícola, principalmente cafeeira que, vindo de São Paulo,
atingiu as terras norte-paranaenses.
A Companhia de Terras Norte do Paraná teve, assim um papel
destacado no desbravamento inicial, no povoamento, na organização
da vida rural e valorização sócio-econômica da região. Estudar a
propriedade rural no norte do Paraná é, em última instância, estudar
a estrutura agrária que aquela empresa privada de colonização ali im-
plantou. Daí a importância de que se reveste a pesquisa dos dados
que ela nos pode oferecer.

(*) - Comunicação apresentada na 3\1


-784 -

o objetivo do presente trabalho é despertar o interesse pela pes-


quisa das fontes referentes à propriedade rural no Município de Ma-
ringá, para o que apresenta uma contribuição inicial.
Para sua realização foram levantados os dados existentes nos ar-
quivos da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná em Maringá,
referentes às vendas de lotes rurais realizadas por aquela empresa na
área atual do Município.
Tais elementos foram coletados nos livros de registro de vendas
e nos fichários individuais da Secão de Contabilidade da Companhia,
por gleba em que se situam os lotes.
Procedeu-se à tabulação dos mesmos, seguida da elaboração de
tabelas e gráficos sobre a área, o ano de venda, a nacionalidade e pro-
c~dência dos primitivos compradores, e preço por alqueire dos lotes
vendidos.
A apresentação do trabalho obedeceu a seguinte ordem: primeiro
aborda-se o povoamento da região Norte do Paraná em suas etapas
distintas; a seguir destaca-se o sistema de colonização implantado pela
Companhia de Terras Norte do Paraná, abrangendo um breve histó-
rico da mesma, o método de vendas e a divisão de terras adotados, o
estabelecimento de vias de comunicação e a criação de núcleos urba-
nos; por fim, passa-se a relatar os resultados obtidos com a pesquisa
realizada nos arquivos da Companhia Melhoramentos Norte do Para-
ná em Maringá, referentes à propriedade rural do município. Na con-
clusão procura-se sintetizar a obra colonizadora efetuada na região,
ressaltando o saldo positivo deixado pela mesma.
* •

1.0. - CONSIDERAÇOES SOBRE A EXPANSÃO DA LA-
VOURA NA REGIÃO NORTE DO PARANA.

Houve, na expansão cafeeira no Norte do Paraná, três etapas su-


cessivas, as duas últimas de maior relevância em decorrência da con-
juntura econômica nacional:
1). - Norte Velho - área compreendida desde a divisa nor-
deste com São Paulo até Comélio Procópio, colonizada entre 1860 e
1925 (1), por elementos paulistas e mineiros seus núcleos principais

(1). - Balhana (A.P.), Machado (B.P.) e Westphalen (C.M.),


H ist6ria do Paraná.
- 785-

foram: J acarezinho, Santo Antônio da Platina, Ribeirão Claro, Cam-


bará, Andirá, Bandeirantes e Comélio Procópio (2).
2). - Norte Novo - área delimitada pelos rios Tibagí e Ivaí
até às margens do Paranapanema, colonizada entre 1920 e 1950 (3);
entre as cidades mais importantes destacam-se: Londrina, Maringá,
Apucarana, Arapongas, Nova Esperança, Paranavaí, Porecatú e Ja-
guapitã (4).
3). - Norte Novíssimo - área que se estende do rio Ivaí ao
Paraná e aoPiQuirí, colonizada desde 1940 até 1960 (5); como cida-
des principais põdemos citar: Cianorte, Umuarama, Cruzeiro do Oeste,
Xambrê, Terra Boa e outras (6).
Para que se tenha idéia de como se processou o avanço do po-
voamento e da colonização no Norte do Paraná, impulsionado pela
expansão cafeeira nas etapas referidas, procuraremos acompanhar a
obra ali realizada, de início 'por indivíduos isolados e, depois, por em-
presas privadas e pelo próprio Estado, destacando-se a ação desen-
volvida pela Companhia de Terras Norte do Paraná.
,
EXPANSÃO DO POVOAMENTO NO NOR TE DO PA RA NÁ /IH. 1H O.

o at é 1850

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- direção d o po'lOa me ntC'

escala

As primeiras tentativas de expansão rumo ao Norte do Paraná,


em meados do século XIX, foram mais de ordem militar que coloni-
zadora . Desta época são os estabelecimentos da Colônia Militar de
Jataí e dos aldeamentos indígenas de São Pedro de Alcântara e de São

(2). - "Certeza de luc ~ o e garantia do direito de propriedade colo-


nizarem o Norte do Paraná". O Estado de São Paulo, 15 jan . 1965, supl.
publ.: 3 .
(3), - Cf. Balhana (A.P . ), colab. (et alli), loco cito
(4) . - O Estado de São Paulo, 15 jan. 1965, supl. publ.: 3.
(5). - Cf. Balhana (A . P . ), colab. (et a/li), loco cito
(6). - O
-786 -

Jerônimo da Serra, os quais não resultaram na ocupação efetiva da


terra (7). A Colônia Militar de Jataí, fundada em 1885 por ordem
do Governo Imperial, permaneceu isolada e não progrediu (8).
Desta forma, apesar daquela primeira fundação, o Norte do Pa-
raná permaneceu, até o último quartel do século XIX, como sertão
desconhecido e desabitado; não houve, por parte do governo, interes-
se no seu devassamento e, alem disso, a mata tornava dificil a pene-
tração de caboclos isolados e a formação de roças (9).
A iniciativa particular só seria atraida no final do século passa-
do, quando o avanço da onda cafeeira, tendo penetrado o oeste pau-
lista, já atingia os rios Itararé e Paranapanema. Progrediu, então, a
frente pioneira, com a instalação de fazendas de café nas terras roxas
dos espigões à margem esquerda do último rio, já em território para-
naense (10).
As notícias cada vez mais difundidas sobre a fertilidade daquelas
terras levaram fazendeiros a requerer concessões das mesmas ao Go-
verno Imperial, pagando-as a baixo preço. Nesta primeira frente pio-
neira, que chegaria apenas ao rio das Cinzas, surgem os núcleos da
Colônia Mineira (1862), Tomazina (1865), Santo Antônio da Pla-
tina (1866), Venceslau Braz e São José da Boa Vista (1867) (11).
Esta frente pioneira era constituida por grandes proprietários iso-
lados, que realizaram o empreendimento somente com suas famílias e
alguns empregados, procurando espontaneamente as terras do Norte
do Paraná para plantar café e para criação de gado (12).
As fazendas eram, então, constituidas por grandes propriedades.
Os colonos, na maioria brasileiros, procediam de São Paulo e Minas
Gerais. A produção se escoava por São Paulo, sendo as técnicas agrí-
colas e o regime de trabalho um prolongamento dos praticados na-
quele Estado vizinho (13).
A penetração, no entanto, em território paranaense como verda-
deira onda colonizadora, somente adquiriria expressão no início do
século XX. Isto porque a conjuntura nacional tornou procuradas e

(7). - Cf. Balhana (A.P.), colab. (et aUi), op. cit., p. 213.
(8). - Cf. Bernardes (L.M. Cavalcanti), O Problema das "Fren-
tes Pioneiras" no Estado do Paraná. Rev. Bras. de Geog., XV
-787 -

preferidas, para o café, as terras do Paraná. Este Estado, que não


ultrapassara ainda suas cotas de produção, não era atingido pelas leis
restritivas ao plantio do café que vigoravam em outros Estados pro-
dutores, em decorrência da superprodução (14).
Durante as primeiras décadas do século, realizou-se a coloniza-
ção da área entre os rios Itararé e Tibagi, ainda na forma de ocupa-
ção espontânea dos fazendeiros que, como empresa privada e indivi-
dual, estabeleciam as suas fazendas em terras adquiridas ao Estado do
Paraná, a antigos posseiros ou a concessionários na região (15).
Em 1904 a penetração atingia Cambará, fundada por fazendei-
ros de café vindos de Ourinhos e primeira etapa do avanço para oeste.
Prosseguindo, as derrubadas alcançaram Bandeirantes em 1921 e. Cor-
nélio Procópio em 1924. Esta penetração verificou-se num período

COLONIZAÇÃO DO NORTE DO PARANÁ

"t ..... _ ......

escala
mcolonização recente não dirigida na área de Cinz. § Colonização recente dirigida de iniciativa paniculr
r:;::;"/7Ãcolonização recente não dirigida no planalto,. mmTi1I Colonização recente didgida de iniciativa oficial
~L .. te do Tibogi Ul!lllllI

de grande expansão da cultura cafeeira que, iniciada no Estado de


São Paulo, originou um povoamento diverso daquele observado em
outras regiões do Paraná: não houve criação de núcleos isolados e in-
dependentes entre si, mas uma expansão contínua do povoamento (16).
Esta ocupação estendeu-se até às margens do rio Tibagí e com-
pletou-se ao final da década de 1920 (17). Apesar da grande procura
de terras, foram deixadas, à espera de valorização, vastas áreas em
mata, que foi sendo derrubada para dar lugar a outras culturas ou à

(14). - Id., ibid., pp. 213-214.


(15). - Id., ibid., p. 214.
(16). - Cf. Bernardes (L.M. Cavalêanti), op. cit., pp. 26-27.
(17). - Balhana, A.P.),
-788 -

criação de gado (18). Em 1929, a faixa pioneira já atingia o vale do


Tibagí e, apesar da crise daquele ano e suas consequências nos anos
seguintes, prosseguiu a oeste deste rio, com maior vitalidade (19) ..
Numa das áreas que permaneceram desocupadas na retaguarda
da frente pioneira, foi fundada em 1931 a Colônia Assaí, pertencente
à Sociedade Colonizadora do Brasil Ltda., de capitais e direção ja-
poneses. A vinda de imigrantes foi cuidadosamente preparada, sendo
os colonos assistidos por um agrônomo e um médico. O êxito da co-
lônia foi rápido devido às terras ricas, ao clima saudavel e à pequena
distância de Jataí. Em 1926 um terço da área total da colônia já es-
tava dividido em lotes de extensão média de 10 alqueires (20). A co-
lônia japonesa de Assaí dedicou-se à policultura, seguindo a praxe
adotada na colonização por elementos dessa origem (21).
A colonização dirigida, realizada por empresas privadas ou por
iniciativa oficial, desenvolveu-se sobretudo entre a margem esquerda
do rio Tibagí e as barrancas do rio Paraná (22).
A expansão da lavoura cafeeira provocou um grande interesse
dos capitaIs particulares pela colonização das terras férteis próprias
para o plantio do café e ainda cobertas por matas de lei.
Por outro lado, alguns povoadores atingiram o Norte do Paraná
atravessando o rio Paranapanema, dirigidos por companhias coloni-
zadoras. Foram obtidas do Estado numerosas concessões para fins de
colonização, no planalto a oeste do Tibagí. Desde 1919 duas glebas
de 50.000 hectares tinham sido concedidas, respectivamente, a Corain
e Cia. (Primeiro de Maio) e a Leopoldo de Paula Vieira (Sertanó-
palis), que foram em seguida loteadas. Sua çolonização foi projetada
visando aproveitar as terras roxas para o plantio do café. Em 1923
chegavam de São Paulo os primeiros povoadores da Colônia Primeiro
de Maio.
A obra colonizadora nestas glebas representou a abertura de uma
frente pioneira independente daquela que, partindo de Ourinhos, de-
senvolveu-se de leste para oeste. Seu êxito reveste-se de importância
por terem sido as primeiras tentativas de colonização a oeste do rio
Tibagí (23).

(18). - Cf. Muller (N .L.), Contribuição ao Estudo do Norte do


Paraná. Boletim Paulista de Geografia, 22, mar. 1956, p. 73.
(19). - Cf. Bernardes (L.M. Cavalcanti), op. cit., p. 27.
(20). - Id., ibid., pp. 27-29.
(21). - Muller (N. L. ), loco cito
(22). -Balhana (A.P.),
-789 -

A mais consequente das concessões foi a realizada pelo Governo


do Estado, através da venda de terras devolutas à Paraná Plantation
Ltd. Esta empresa inglesa, fundada em 1925, após uma viagem feita
no ano anterior por Lord Lovat ao Norte do Paraná, contratou em
1927, com o governo deste Estado, a aquisição de 500.000 alquei-
res (24) das melhores terras roxas, situadas entre os rios Paranapane-
ma, Tibagí e Ivaí. Através de suas subsidiárias no Brasil - a Com-
panhia de Terras Norte do Paraná e a Companhia Ferroviária São
Paulo-Paraná - , executou o plano de colonização das referidas ter-
ras, dividindo-as em zonas que, após os trabalhos de medição e de-
marcação, abertura de picadas e estradas, eram sucessivamente colo-
cadas à venda (25).
Até o ano de 1943, a Companhia de Terras Norte do Paraná
vendera cerca de 17. 000 alqueires de suas terras e dez anos depois,
aproximadamente 400. 000 alqueires, num total de 26 mil lotes agrí-
colas (26).
Em 1951, já sob direção inteiramente de brasileiros, não poden-
do adquirir novas terras devolutas do governo do Estado, a Companhia
lançou-se a novos empreendimenitos, passando a denominar-se Com-
panhia Melhoramentos Norte do Paraná (27).
O êxito da colonização levada a efeito pela Companhia de Ter-
ras Norte do Paraná renovou o interesse pelas terras inaproveitadas.
O governo estadual, possuidor de grandes extensões de terras devolu-
tas entre os rios Ivaí e Paranapanema e de outras que retornaram ao
seu domínio em 1934, pela anulação de algumas concessões feitas,
empreendeu a sua colonização a partir de 1939 (28).
Alem de Jataizinho, situada entre Ibiporã e o rio Tibagí, foram
criadas pelo Departamento de Terras e Colonização as colônias Içara
(1941), Jaguapitã (1943), Centenário (1944), Interventor (1950) e
Pagú (1950), em terras da ex-concessão A. Alves de Almeida, e Pa-
ranavaí, a maior de todas. Estas colônias de iniciativa oficial destina-
vam-se à localização de elementos nacionais, situando-se as primeiras
a norte e a última a oeste dos domínios da Companhia de Terras Norte
do Paraná (29).
As colônias Içara e Jaguapitã, situadas no vale do rio Bandei-
rantes do Norte, apesar do seu solo não se constituir de terra roxa
(24). - Referímo-nos ao alqueire paulista: 24 m 2 ou 2,42 hectares.
(25). - a. Balhana (A.P.),
-790 -

legítima. puderam desenvolver a lavoura cafeeira nos níveis superio-


res a 500 metros. O plano inicial visava à fundação de uma só colô-
nia; porem, devido às dificuldades de comunicação, foram criadas
aquelas duas colônias distintas que se comunicavam, respectivamente,
com Arapongas e Rolândia (30). Em 1941, a Colônia Içara já estava
com suas glebas ocupadas com o plantio de 400.000 pés de café. Nas
duas glebas que formaram a Colônia Jaguapitã a ocupação espon-
tânea por nacionais precedeu a demarcação e a medição dos lotes,
iniciada em 1943 (31).
A 40 km de Jaguapitã criou-se a Colônia Centenário, localizada
entre os rios Bandeirantes do Norte e Pirapó, cuja demarcação foi
iniciada em 1944 e terminada em 1946. Originoú-se ali nova frente
pioneira que avançou em direção às margens do Paranapanema, onde
desde 1942 se haviam estabelecido elementos vindos de São Paulo,
com grandes fazendas de café e de cana de açucar (32).
Em gleba pertencente ao Estado, indo desde os limites ociden-
tais das terras da Companhia de Terras Norte do Paraná, foi fundada
a Colônia Paranavaí, cuja sede dista 78 km de Maringá (22). Por
ocasião de sua demarcação, em 1942, achavam-se ali radicados ape-
nas dois habitantes, remanescentes da antiga Fazenda Brasileira, que
não tivera êxito duas décadas antes. As terras desta colônia, por se-
rem de constituição arenosa, não se prestam à lavoura cafeeira, des-
vantagem esta acrescida pela maior distância dos centros de comer-
cialização. Apesar disso, verificou-se um afluxo consideravel de co-
lonos para aquela região muitos dos quais, já radicados no norte do
Estado, procuravam adquirir propriedades, atraidos pelo preço redu-
zido fixado pelo governo do Estado e as facilidades de pagamento
em prestações anuais (34).
O sistema de colonização praticado pelo Governo do Paraná foi
semelhante ao da Companhia de Terras Norte do Parana: predomina-
. ram os pequenos lotes agrícolas, salvo nas colônias Centenário, lo-
teada em fazendas, e Paranavaí, onde as propriedades rurais variavam
de extensão conforme estivessem próximas ou distantes da sede da
colônia (35).

(30). - Cf. Muller (N.L.), op. cit., pp. 79-80.


(31). - Cf. Bernardes (L.M. Cavalcanti), op. cit., p. 38.
(32). - Id., ibid., p. 39.
(33). - Cf. Muller (N.L.), op. cit., p. 80.
(34). - Cf. Bernardes (L.M. Cavalcanti), op. cit., p. 39.
(35). - Balhana (A.P.),
- 791-

Em consequência da colonização promovida por particulares e


pelo governo, o Norte do Paraná tomou-se uma das zonas mais prós-
peras do Estado.
* •

2.0. - O SISTEMA IMPLANTADO NAS TERRAS DA
COMPANHIA DE TERRAS NORTE DO PARANA.
2.1. - Breve Histórico da Companhia de Terras Norte do Pa-
raná.

A colonização intensiva do planalto arenito- basáltico do Para-


ná, em. moldes modernos, teve início em 1929 e foi obra da Compa-
nhia de Terras Norte do Paraná. Esta empresa foi constituida com
capitais ingleses 1. 460 . 000 i:.- em ações e 375. 000 i:.- em obriga-
ções) (36), em 1925, e realizou, entre este ano e 1927, transações com
o governo do Estado do Paraná para a compra de uma área de 515
mil alqueires, ou 12.643 km 2 de terras devolutas cobertas de mata
virgem, no norte do Estado, situadas entre os rios Paranapanema, Ti-
bagí e Ivaí. Como fossem as mesmas disputadas na época por pos-
seiros e concessionários, o primeiro problema da empresa seria diri-
mir as dúvidas que pudessem surgir no futuro quanto à legitimidade
dos títulos de propriedade; nesse sentido adquiriu os títulos de con-
cessões inseguros, pagando em alguns casos duas ou três vezes por
uma mesma área (37).

Area colonizada pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná

(36). - Muller (N.L.), op. cit., p. 75.


(37). - Cf. "Certeza de lucro e garantia do direito de propriedade
colonizaram o Norte do Paraná". O
-792 -

A pretensão dos colonizadores ingleses era comprar essas terras


para nelas empreender a cultura do algodão, produto que estava em
crise no Sudão. Assim, as lavouras do Paraná iriam substituir as da-
quela região da África. As primeiras viagens de reconhecimento de-
monstraram que talvez melhores resultados fossem obtidos com o lo-
teamento da gleba em pequenas propriedades: os colonos plantariam
algodão e, atingindo assim o seu objetivo primário, a Companhia po-
deria ainda recuperar, com lucros, o capital empatado (38).
Formou-se a Paraná Plantation Ltd., que foi desdobrada em duas
subsidiárias: a Companhia de Terras Norte do Paraná, que trataria da
colonização, e a Companhia Ferroviária São Paulo-Paraná que, par-
tindo da compra do ramal Ourinhos-Cambará já instalado, procuraria
levar os trilhos até as zonas do loteamento. Desta forma, as duas se
completavam: uma loteando e vendendo as terras a serem colonizadas,
a outra possibilitando o escoamento da produção, a ligação com os
demais centros e a penetração propriamente dita (39).
A Companhia tomou posse de sua propriedade em julho de 1929,
logo fundando a cidade de Londrina, onde instalou sua sede.
A ação desenvolvida pela Companhia de Terras Norte do Pa-
raná concentrou-se em três atividades principais: 1). - Colonização,
incluindo o planejamento, o loteamento e a venda de terras; 2). -
Construção de estradas, essenciais ao escoamento da produção, a li-
gação dos vários núcleos de povoamento entre si e com os principais
centros do país; 3). - Implantação de núcleos urbanos (cidades e pa-
trimônios), destinados a concentrar as atividades econômico-sociais e
servir como polos irradiadores de toda a obra colonizadora. Alem
dessas atividades, a companhia desenvolveu outras que lhe foram com-
plementares,servindo para difundir o progresso na região, tais como a
produção de energia elétrica e a montagem de fábricas de cimento e
de açucar (40).
A Companhia de Terras Norte do Paraná, talvez em consequên-
cia dos pesados impostos sobre capitais estrangeiros durante a confla-
gração mundial, foi colocada à venda em São Paulo e no Rio de Ja-
neiro (41), tendo sido adquirida por um grupo de empresários paulis-
tas liderados por Gastão Vidigal e Gastão Mesquita Filho (42).

(38). - Muller (N.L.), op. cit., p. 77.


(39). - Cambiaghi (S.M.), O povoamento do Norte do Paraná".
Anais da Associação dos Geógrafos Brasileiros, vol. VI, tomo I, 1951-52, p.
86.
(40). - O Estado de São Paulo, 15 jan. 1965, supl. publ.: 8.
(41). - Muller (N.L.), op. cit., p. 79.
(42). - O
-793 -

Como condição imposta para que o governo concedesse a cober-


tura cambial necessária à transação, figurou a transferência da estrada
de ferro São Paulo-Paraná, já com os trilhos em Apucarana, para o
acervo da União. Na posse dos colonizadores paulistas ficou a gleba
de 515.000 alqueires, que incluia cidades em pleno surto de progres-
so como Londrina, Apucarana, Cambé, Rolândia e outras (43).
Em 1951, sob a direção de brasileiros apenas e com as suas ati-
vidades ampliadas visando ao desenvolvimento das áreas já coloniza-
das e por colonizar, a empresa passou a denominar-se Companhia Me-
lhoramebtos Norte do Paraná.
Em sua nova fase, a empresa não mudou de orientação: o lotea-
mento das t\!rras, a construção de estradas e a fundação de núcleos
ll':-banos foram sendo exe-futados conforme tinham sido planejados.
Nesse período fundou-se Maringá (1947), cidade destinada a se tornar
capital da porção mais ocidental das terras da companhia. Entre ou-
tras cidades que então se desenvolveram destacam-se Apucarana, Man-
daguarí, Jandaia do Sul. Na zona do Ivaí fundou-se, na década de
1950, a cidade de Cianorte, nova capital regional (44).
Posteriormente foi feita a aquisição de mais 30.000 alqueires de
terras a oeste da gleba principal, que passaram a constituir parte do
"Norte Novíssimo", tendo como centro a cidade de Umuarama (45) .

2.2. - Método de vendas.

A Companhia Melhoramentos Norte do Paraná promoveu a ven-


da das propriedades rurais que loteara, intensificando a propaganda
sobre a fertilidade das terras oferecidas, as vantagens para o pequeno
agricultor, as perspectivas de êxito na exploração da terra através do
cultivo de vários produtos, tais como café, algodão, cereais etc.
Na propaganda tambem se aludia aos benefícios que poderiam
ser auferidos com a compra de lotes de uma empresa colonizadora or-
ganizada, que oferecia garantia de posse indiscutivel das terras, alem
de facilidades na forma de aquisição.
A companhia teve por praxe a distribuição de folhetos, nos quais
especificava todas as condições em que se poderia comprar uma pro-
priedade destinada à exploração agrícola, e os resultados já obtidos;
jornais tambem se encarregavam da divulgação dos métodos da com-
(43). - Idem.
(44). - Muller (N.L.), loco cito
(45). - O Estado de São
-794 -

panhia, não só no Estado do Paraná como tambem no de São Paulo


(46) .
Agentes de vendas eram encarregados de aliciar futuros compra-
dores nas principais localidades do Norte Velho do Paraná e em toda
a região cafeeira paulista, notadamente no oeste. Alem disso, a em-
presa se encarregava de facilitar o transporte e prestar assistência para
a instalação inicial dos colonos (47).
O seu programa era favorecer o pequeno proprietário, sem, po-
rem, afastar os de maiores recursos.
A companhia vendeu: a). - datas, nas cidades fundadas por
ela, com extensão média de 500-600 m2 cada uma; b). - chácaras,
em redor das cidades e vilas, até a área de 5 alqueires paulistas; c) . -
lotes rurais, de 5 alqueires paulistas para cima, para sítios e fazendas
(48) .
As cond;ções de aquisição eram diferentes conforme se tratasse
de: a) . -lotes agrícolas: 30% de entrada e 4 anos de prazo para pa-
gamento: b). - chácaras: 40% de entradas e 2 anos para pagamento;
c). - datas urbanas: 50% à vista e 50% no prazo de um ano. Os
juros cobrados eram de 8 % ao ano.
Os funcionários da companhia gozavam de um desconto especial
de 20%. No ato da aqu:sição, era assinado um compromisso de com-
pra e venda em que o comprador se obrigava a conservar 10% da
propriedade adquirida como área florestal; esta cláusula não foi cum-
prida, salvo nas áreas reservadas pela companhia para sua própria
exploração.

2 . 3. - A divisão de terras adotada.

A área de propriedade da companhia foi dividida em zonas e es-


tas em glebas. As zonas eram seis: Tlbagí, Pirapó e Primitiva, que fi-
cavam ao norte do espigão mestre (de leste para oeste); Rio Bom e
Paranhos, situadas ao sul daquele espigão (seguindo a mesma ordem);
Ivaí, a sudoeste da zona Paranhos, na direção do rio do mesmo no-
me. A colonização se processou na seguinte ordem: de início as zonas
Tibagí e Pirapó, e seguir Rio Bom, depois ParanhOS e Primitiva, e

(46). - Cf. Balhana (A.P.), colab. (et alli), op. cit., p. 215.
(47). - Id., ibid., p. 216.
(48). - "Comp. de Te-ras Norte do Paraná - a maior empresa co-
lonizadora da América do Sul"
-795 -

finalmente Ivaí (49). O Município de Maringá fica localizado na zona


Paranhos.
O loteamento foi iniciado em 1930 e desenvolveu-se obedecendo
a planos predeterminados. Os lotes foram constituidos por faixas de

Tipos de loteamentos
-796 -

largura variável, desde o topo das elevações até o fundo dos vales, ao
longo de toda a encosta. Assim, no sistema implantado pela com-
panhia, cada propriedade possui uma parte alta propícia ao plantio
de café, e uma parte baixa, destinada a pastos, hortas e pomares, de-
limitando-se acima por uma via de acesso e abaixo por um curso
d'água (50), não havendo, portanto, servidões nem propriedades en-
cravadas (51).
O tamanho médio das propriedades rurais é de 10-15 alqueires
paulistas. O maior número é constituído de pequenas propriedades de
5, 10, 15 e 20 alqueires. São poucas as propriedades maiores de 50
alqueires, a extensão média dos lotes varia de acordo com a localiza-
ção: 1 a 5 alqueires ao redor dos núcleos urbanos, 5 a 10 alqueires
em seguida e, nas áreas mais afastadas, acima de 10 alqueires.
No Norte do Paraná, as propriedades subdividiram-se ou soma-
ram-se conforme as, tendências da produção agro-pecuária local e o
preço da terra, tendo em vista tambem as posses e preferências dos
compradores.
A divisão de terras realizada pela companhia, através do lotea-
mento inicial de toda a região sob sua adminis.tração, não correspon-
de rigorosamente à estrutura agrária que na verdade se implantou.
devido aos desdobramentos e anexações realizados posteriormente.
No entanto, o regime de pequenas e médias propriedades não chegou
a ser alterado basicamente.
Atualmente não há mais terras a vender na área da Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná. Esta se reservou algumas proprie-
dades, que explora de forma racional e modelar.
As gl>!bas de extensão variada em que foi dividida a área do
Município de Maringá, de acordo com a topografia e os cursos d'água,
foram. as seguintes: Atlantic, Caxias, Centenário, Chapecó, Colombo,
Maringá, Morangueiro, Paissandú, Patrimônio, Iguatemí, Patrimônio
Maringá, Pinguim e Sarandy (52) .

2 .4. - O estabelecimento de uma infra-estrutura de transpor··
teso
O eixo de toda a colonização e espinha dorsal da penetração foi
o espigão divisor das águas entre as bacias dos rios Ivaí e Paranapa-
(50). - O Estado de São Paulo, 15 jan. 1965, supl. publ.: 5.
(51). - Cf. Balhana (A. P.), colab. (et al/i), op. cit., p. 215.
(52). - As glebas Caxias, Chapecó Pinguim e Sarandy p,osseguem
-797 -

nema. Este esplgao, com seu topo largo e plano, possibilitou que
nele fossem traçados os leitos da ferrovia e da estrada principal, e re-
servadas áreas para os núcleos urbanos da região (53).
Dele sairam as estradas secundárias que, acompanhando os con-
trafortes, iriam depois se desdobrar nos caminhos vicinais e receber
os núcleos menores. Por uma hierarquia de estradas e centros urba-
nos, toda a área colonizada ficava engrenada no sistema de circula-
ção, não distando nenhuma propriedade mais de 14 km de uma vila
ou cidade. A companhia construiu, de 1929 a 1935, 3.615 km de
estradas (54).
Ao mesmo tempo que se efetuava o loteamento, a estrada de
ferro progredia, tendo atingido Jataizinho em 1931, Londrina em
1935, Apucarana em 1937 e Maringá em 1954 (55). Desde 1939 a
via férrea não mais pertencia à Paraná Plantation Ltd., pois fora en-
campada pelo Governo Federal, passando a constituir um ramal da
Rede Viação Paraná-Santa Catarina .


2. 5. - Planejamento e implantação de núcleos urbanos e sua
relação com o meio rural.

As cidades fundadas pela atual Companhia Melhoram~ntos Norte


do Paraná obedeceram a um plano urbanístico previamente estabele-
cido. As praças e ruas foram abertas com o aproveitamento das ca-
racterísticas do relevo (56).
Os centros urbanos foram divididos em datas destinadas à cons-
trução de prédios comerciais e residenciais. Ao redor dos mesmos
planejaram-se os "cinturões verdes", constituidos por chácaras desti-
nadas ao abastecimento da população.
Os núcleos básicos da colonização empreendida pela Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná foram estabelecidos progressivamen-
te: Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama. Estas cidades foram
planejadas para se transformarem em centros regionais de relevância,
a cerca de 100 km uns dos outros.

(53). - Muller (N .L.), op. cit., p. 77.


(54). - Muller (N .L.), loco cito
(55). - Id., Ibid., p. 79.
(56). - O
- 798-

Entre os núcleos urbanos principais foram criados patrimônios e


cidades menores, de 15 em 15 km. Sua finalidade era servir como
centros de abastecimento para a numerosa população rural. Previa-se,
assim, a integração entre o meio rural e o urbano (57).
No que se refere à maioria dos núcleos urbanos, a ação da Com-
panhia se limitou ao planejamento, o qual incluia a instalação de seu
escritório de vendas, a construção de uma estação de "jardineiras" e
de uma escola; exigia somente, em contrato, que os compradores de
lotes urbanos construissem no prazo mínimo de um ano (58).
Deve-se ressaltar tambem que a Companhia fez diversas doações
a orgãos públicos, entidades assistenciais, religiosas etc. No que diz
respeito às entidades públicas, foram doados terrenos para a constru-
ção de edifícios destinados à administração municipal, estadual e fe-
deral, estradas, pátios ferroviários, aeroportos, praças e escolas, nos
principais núcleos urbanos criados. Quanto aos terrenos doados a
entidades assistenciais e religiosas, foram utilizados para a construção
de sedes próprias das mesmas, templos religiosos, casas paroquiais,
colégios etc.

As cidades e patrimônios ligaram-se por uma rede de estradas


de rodagem e pela ferrovia, que atualmente está com os seus trilhos
estendidos até Cianorte, devendo atingir, no rumo sudoeste, a cidade
de Guaira, na fronteira com o Paraguai.
• •

3.0. - LEVANTAMENTO DE DADOS REALIZADO NOS
ARQUIVOS DA COMPANHIA MELHORAMEN-
TOS NORTE DO PARANÁ EM MARINGÁ.

Após o levantamento dos dados existentes nos arquivos referidos,


constatamos o seguinte:

3 . 1. - Quanto à área dos lotes vendidos:

Há uma maior concentração nos lotes de até três alqueires (700);


a seguir vêm os lotes de 5 a 10 alqueires (444) e os de 3 a 5 alqueires
(318). Verifica-se, assim, que 1.462 dos 1.909 lotes têm uma área de

(57). - Cf. Balhana (A.P.), colab. (et alli), op. cit., p. 215.
(58). - O Estado de São
-799 -

até 10 alqueires, representando 76,6% dos mesmos; os lotes de mais


de 50 alqueires são apenas 37, isto é, 1,9% do total; os lotes cuja
área se situa entre 10 e 50 alqueires representam 21,5% (410 lotes).
A incidência maior de lotes de até 3 alqueires nas glebas Patrimônio
Maringá se deve ao fato de tais glebas circundarem respectivamente o
distrito de Iguatemí e a área urbana de Maringá, sendo seus lotes, no
planejamento geral da companhia, destinados a chácaras que formam
o "cinturão verde", a fim de suprir a população urbana de produtos hor-
tigrangeiros. Nas demais glebas há uma acentuada predominância dos
lotes cuja área varia de 5 a 10 alqueires, sendo esta, aliás, a média
que se observa em toda a zona tipicamente rural do município. Há
poucos lotes com mais de 100 alqueires (6), cuja tendência é para o
desdobramento (ver tabelas I e 11).

QUADRO I.

MARINGA - Area dos primitivos Lotes Rurais.


1938-1973
ALQUEIRES NQ DE LOTES %
0- 3 700 36,7
3- 5 318 16,7
5 - 10 444 23,2
10 - 15 166 8,7
15 - 20 99 5,2
20 - 30 91 4,8
30 - 50 54 2,8
50 - 100 31 1,6
100 - 300 6 0,3
Total 1.909 100,0

Fonte - Livro de Registro de Vendas de Lotes Rurais da Compa-


nhia Melhoramentos Norte do Paraná .


3 .2. - Quanto ao ano de venda dos lotes.

Observa-se que a venda foi realizada entre os anos de 1938 e


1973, principalmente na década de 1940. Até o final desta foram
vendidos 1. 662 lotes, ou seja, 87%; na década de 1950 foram reali-
zadas 204 transações (10.6%), seguindo-se a década de 1960 com 42
vendas (2,8%) e a de 1970 com apenas 1. Os
- 800-

nização da região de Maringá e seus arredores recebeu por parte da


companhia nesse período, dentro do plano geral de avanço para
oeste; a ação dos agentes de venda tambem se intensificou no Norte
Velho e no Estado de São Paulo, tendo em vista a rápida expansão
agrícola nas terras daquela empresa colonizadora e o sucesso obtido
nas zonas e glebas já desbravadas e povoadas. Na década de 1950 as
atenções da companhia já se concentravam na região alem do Ivaí,
onde se destacava a recem fundada cidade de Cianorte.
Em quase todas as glebas, as vendas se concentraram entre <,s
anos de 1938 a 1947. As glebas Patrimônio Iguatemí e Patrimônio
Maringá, por serem praticamente suburbanas, tiveram as duas vendas
realizadas mais tarde: nos anos de 1947 a 1949, estendendo-se pela
década de 1950 e, no caso da segunda, atingindo a década de 1960.
O estabelecimento de núcleos urbanos valorizou os pequenos lotes ao
seu redor (ver Tabela III).
No que se refere ao relacionamento entre a exploração agrícola
e o estabelecimento do núcleo urbano, verifica-se que a venda dos lo-
tes, segdda da abertura de frentes pioneiras, instalação de proprieda-
des agrícolas e sua valorização econômica foi, em boa parte, anterior
à instalação da sede do distrito e futuro município de Maringá, ocor-
rida a 10 de maio de 1947. Até o ano de 1946 já tinham sido vendi-
dos 1.104 lotes rurais, ou 57,8%. Não se levando em conta as gle-
bas Patrimônio Iguatemí e Patrimônio Maringá, a porcentagem ele-
va-se para 98% (59).

QUADRO 11.

MARINGA - Venda de Lotes Ru ·ais por período.


1938-1973.

PERIODOS N'" DE LOTES %


1938 - 1943 480 25,1
19 / 3 - 1948 876 45,9
1948 - 1953 358 18,8
1953 - 1958 46 2,4
1958 - 1963 128 6,7
1968 - 1973 4 0.2
Total 1.909 100.0

Fonte - Livro de Registro de Vendas Lotes Rurais da C.M.N.P.

(59). - Excluindo-se as duas glebas. o total de lotes vendidos é de


1 .056. dos quais 1.043
801


3 . 3. - Quanto à nacionalidade dos primitivos compradores dos
lotes rurais.

Constatou-se a grande predominância dos brasileiros (1.453),


seguindo-se, entre os estrangeiros mais numerosos, os espanhois (102),
os japoneses (74), os italianos (67), os portugueses (56), os alemães
(30) e os russos (24), além de outras nacionalidades que aparecem
com menor freqüência. Foram constatadas 27 nacionalidades e 3 ca-
sos em que a pessoa se declarou sem nacionalidade (ver Tabela IV).
Os brasileiros representam, portanto, 76,1 % dos compradores, sendo
os restantes 22,9% repartidos entre os estrangeiros de diversas nacio-
naliJades. Entre os europeus predomina o grupo latino (portugueses,
espanhois, italianos e franceses), totalizando 227 ou 11,8 %; destacam-
se tambem os europeus orientais., do bloco socialista, num total de 78
compradores, representando 4 % do total. Há ainda os europeus oci-
dentais, do grupo não latino, que somam 57 e representam 2,9%. Os
asiáticos somam 85, ou 4,5% do total, com predom~nância dos ja-
poneses. Os sul-americanos são apenas 4 e os americanos do norte
apenas 2.

QUADRO 111.

MARINGA - Nacionalidade dos primitivos compradores, de


lotes rurais (1938-1973).

GRUPOS DE
NACIONALIDADES COMPRADORES %
Brasileiros 1453 76,1
Europeus 362 19,0
Asiáticos 85 4,5
Sul Americanos 4 0,2
Norte Americanos 2 0,1
Apátridas 3 0,1
Total 1.909 100,0

Fonte - Fichas individuais do Arquivo de Contabilidade da


C.M.N.P.
Deve-se ressaltar que boa parte dos brasileiros são descendentes
de imigrantes, principalmente italianos e japoneses, cujos pais haviam
trabalhado nas lavouras do Estado de São Paulo; isto se pode compro-
var facilmente pelos seus sobrenomes .

- 802-

3 .4. - Quanto à procedência dos primitivos compradores.

Observou-se que 779 dos indivíduos que adquiriram terras no


Município de Maringá procediam de outras localidades do Norte do
Paraná (40,8 % do total), vindo a seguir os procedentes dos Estados
de São Paulo (604), Rio de Janeiro (20), Santa Catarina (17), Rio
Grande do Sul (15) e Minas Gerais (11). Mato Grosso, Bahia e Es-
pírito Santo contribuiram com apenas 1 comprador cada. Da Europa
vieram 5 proprietários (ver Tabela V).
Nas glebas em que os lotes foram vendidos nos primeiros anos de
atuação da companhia na região de Maringá, há um certo equilíbrio
entre os procedentes de localidades do Norte do Estado (Cambará,
Comélio Procópio, Londrina e Cambé), num total de 458, e do Es-
tado de São Paulo (502).
Tomando-se todo o Estado do Paraná, obtem-se uma incidência
de 1.234 compradores (64,6%), contra 675 (35,4%) vindos de outros
Estados, com predominância de São Paulo (31,6%), e de outros pai-
ses. Interessante é a pouca frequência com que aparecem compra-
dores de outras regiões paranaenses: apenas 23.

QUADRO IV.

MARINGA - Polo Migrat6rio dos primitivos compradores de


lotes rurais.

PROCEDENCIA COMPRAODRES %
Paraná 1.234 64,6
São Paulo 604 31,6
Estado do Rio 20 1,0
Santa Catarina 17 0,9
Rio Grande do Sul 15 0,8
Minas Gerais 11 0,6
Outros Estados 3 0,2
Europa S 0,3
Total 1.909 100,0

Fonte - Fichas Individuais do Arquivo de Contabilidade da


C.M.N.P.
- 803-

"Velho", cujo desbravamento e povoamento o precedera em duas dé-


cadas pelo menos. À medida que se desenvolvia a ação da Compa-
hia Melhoramentos Norte do Paraná nas terras mais a oeste, os lavra-
dores da região de Cambará, Comélio Procópio, Londrina, Apucara-
na etc., foram atraidos pelas novas terras. Aparecem como provin-
dos do Norte do Paraná, mas na realidade são naturais, na sua maioria,
do Estado de São Paulo uma vez estabelecidos nas zonas mais "an-
tigas" do norte paranaense, acompanharam a "frente pioneira" em
seu avanço.

3. 5. - Quanto ao preço do alqueire de terras.

Constatou-se que houve grande variação de preço, levando-se


em conta' a). - as glebas tipicamente rurais e as próximas aos nú-
cleos urbanos; b). - a valorização havida em decorrência da venda
anterior de lotes contíguos ou próximos; c). - a compra de lotes de
maior ou menor área.
Nas glebas Patrimônio 19uatemí e Patrimônio Maringá, o preço
do alqueire de terras foi superior ao das demais, em virtude de serem
constituidas por lotes bem valorizados por sua proximidade com a zona
urbana. Atualmente grande parte dos mesmos perdeu sua caracterís-
tica rural, sendo tributados pela Prefeitura Municipal (60).
A valorização dos lotes pode ser observada de ano para ano,
ocorrendo variações apreciáveis no mesmo ano; isto em virtude da
melhor localização da gleba ou do lote, de sua topografia, da procura
verificada etc. A aquisição de uma área superior à média, ou de vá-
rios lotes, podia significar uma redução do preço por alqueire.
À medida que os anos transcorreram, com uma infra-estrutura já
implantada, as lavouras produzindo e a cidade em pleno desenvolvi-
mento, a valorização se acentuou cada vez mais.

(60). - A maioria dos lotes da gleba Patrimônio Maringá e alguns


de outras não são mais cadastrados pelo Incra, por serem utilizados por
empresas industriais, comerciais, entidades recreativas e assi!ltenciais. De
acordo com o art. 6Q da Lei nQ 5.868, de 12 de dezembro de 1972, consi-
dera-se imovel rural, para fim de incidência do Imposto sobre Propriedade
Territorial Rural, "aquele que se destinar à exploração agrícola, pecuária,
extrativa vegetal ou agro-industrial e que, independentemente de sua locali-
zação, tiver área superior a 1 (um) hectare". No parágrafo único se de-
termina que "os imóveis que não se enquadram no disposto neste artigo, in-
dependentemente de sua localização, estão sujeitos aos Imposto sobre a Pro-
priedade Predial e Territorial Urbana ... "
- 804-

Observa-se que no quinquênio de 1938 a 1942 o preço do al-


queire variou de Cr$ 200,00 a Cr$ 1.500,00. Dos 475 lotes vendidos
nesse período 370 variaram de Cr$ 650,00 a Cr$ 800,00, represen-
tando 89,3% dos mesmos (Tabela VI).
No quinquênio de 1943 a 1947 foram vendidos 570 lotes, cujo
preço variou de Cr$ 225,00 a Cr$ 4.000,00. A concentração maior se
verificou entre Cr$ 750,00 e Cr$ 1.100,00; 499 dos lotes vendidos
oscilaram entre estes dois valores, representando 87,5% do total ven-
dido no período (Tabela VII).
Nos quinze anos que vão de 1948 a 1962 foram vendidos 11 lo-
tes cujos preços estiveram entre Cr$ 1.200,00, no ano de 1949, e
Cr$ 150.000,00 em 1962 (Tabela VIII).
O levantamento a que os dados acima se referem são dos lotes
rurais das glebas mais afastadas do núcleo urbano. Separamos de pro-
pósito as glebas Patrimônio Iguatemi e Patrimônio Maringá por apre-
sentarem características diferentes das demais, com lotes menores e de
preços mais elevados. Nelas as vendas se efetuaram, na sua maioria,
mais tarde em relação às outras.
Na gleba Patrimônio Iguatemí o preço do alqueire variou, no
ano de 1947, entre Cr$ 3.000,00 e Cr$ 15.000,00 chegando em
1963 a Cr$ 100.000,00 o alqueire. As vendas se concentraram entre
os anos de 1947 e 1953, quando foram vendidos 179 dos 184 lotes
(Tabela IX).
Na gleba Patrimônio Maringá, as vendas foram realizadas de
1938 a 1973, concentrando-se entre os anos de 1947 e 1950: num
total de 669 lotes, 430 foram vendidos nestes anos, representando
64,3%. O preço do alqueire na referida gleba oscilou desde Cr$ ..
1.000,00 no ano de 1938 até Cr$ 20.000.000,00 no ano de 1973.
De 1947 a 1952 o preço se concentrou entre Cr$ 3.000,00 e Cr$
30.000.00; de 1953 a 1958 variou de Cr$ 30.000,00 a Cr$ ....
300.000,00; de 1959 a 1962 se concentrou entre Cr$ 100.000,00 e
Cr$ 2.000.000,00; de 1963 a 1973 oscilou entre Cr$ 2.000.000,00
e Cr$ 20.000.000,00. É interessante destacar que dos 669 dos lotes
desta gleba apenas 24 foram vendidos de 1962 a 1973 (Tabela X) .

* * ..
CONCLUSÃO.

Os fatores responsáveis pelo êxito do empreendimento da Com-


panhia de Terras Norte do Paraná
- 805-

ras, a pússibilidade de se tornar proprietário que era estendida aos in-


divíduos de p0UCOS recursos, bem como a divisão das terras em pe-
quenos lotes e a tranquilidade quanto à legitimidade da posse das ter-
ras adquiridas.
As terras colonizadas pela Companhia de Terras Norte do Pa-
raná estão localizadas na melhor porção do Norte do Estado. De re-
levo suave e cortada por diversos rios e seus afluentes, esta área é re-
coberta em sua maior extensão pela "terra roxa" legítima; estas con-
dições, alem da altitude e do clima próprio para a lavoura do café,
favoreceram a ação daquela empresa.
O tipo de povoamento promovido pela Companhia de Terras
Norte do Paraná diferiu daquele que se verificou nas zonas cafeicul-
toras de São Paulo e da zona paranaense situada entre os rios Itararé
e Tibagi. Em vez da criação de grandes fazendas monocultoras, optou-
se pelo regime de pequenas e médias propriedades, menos suscetíveis
de se abalar com o advento de urna crise do café e mais capazes de
originar uma vida regional intensa, pois as partes não apropriadas pa-
ra o café são aproveitadas para outras culturas e a criação de gado.
Alem disso, uma maior distribuição de riquezas favoreceu o co-
mércio locat e o desenvolvimento das cidades, que se tornaram cen-
tros de beneficiamento dos produtos agrícolas.

O aproveitamento dos lotes rurais, baseado no café, foi comple-


tado com o algodão, o arroz, o milho, a batata etc. A pequena pro-
priedade possibilitou que se difundisse, assim, a policultura, estimu-
lada tambem pelas tradições trazidas pelos imigrantes e seus descen-
dentes. Fazendas de criação de gado, de extensão maior, se forma-
ram ao lado das propriedades cafeeiras.
O sistema de colonização desenvolvido no Norte do Paraná, a
partir de 1920, estimulou a concentração da produção, a explosão
demográfica e o aparecimento de classes médias rurais (61).

Como saldo positivo deixado na região pela Companhia Melho-


ramentos Norte do Paraná podemos destacar ainda os 64 núcleos ur-
banos por ela implantados, alem de outros que, embora não sendo
de seu planejamento dire-to, foram fundados por particulares em suas
terras. Destes "patrimônios"
TABELA I
MARINGA - LeTES VENDIDOS POR GLEBA E AREA (1938-1973)

Área lem alqueires)


GLEBA TOTAL 0----<3 3--15 5---<10 10-<16 15-{20 20-<30 30 -<50 50-<100 + 100
Atlantic
Caxias
99
16
1
3
5 38
5
19
1
13
1 -
8 14
-
-
- -
1
6
Centenário 131 - 28 58 22 11 6 4 2 -
Chapecó 8 - - ·2 2 - 3 1 -3 -
Colorrbo 102 5 15 44 19 4 10 2 -
Maringá 257 4 68 105 32 14 16 8 9 1
Morangueiro 84 - 11 27 16 9 10 2 7 2
Paissandu 68 1 10 22 7 10 6 8 4 -
Patr. Iguatemi 184 116 54 13 1 - -1 - -- -
Patr. Maringá
Pinguim
66·9
228
563
7
71
36
28
77 34
3 2
31 26
1
11 4
-2
Sarandi 63 - 14 25 10 4 5 3 2 -.
Total 1909 700 318 444 166 99 91 54 31 6

TABELA II
MARINGA - LOTES VENDIDOS. POR ÃREA E ANO DE VENDA (1938-1973)

TOTAL Área (em alqueires)


ANO
0 - 3 3--<5 5----<10 10~15 15-12 20 .... 30 30-50 50 ....'00 +100
1938 8 2
2
2
2
5
-
1
-
4
-
2
-1 1
.3 -
1
1939 19 1
1940 20 1 1 5 3 - 4 1 5 -
1941 314 1 55 115 59 34 32 10 7 1
1942 119 1 24. 47 17 14 7 8 1 -
1943 302 13 92 107 30 17 24 11 7 1
1944 222 9 23 87 44 21 16 16 4 2
1945 77 .4 ·9 37 6 7 6 7 1 -
1946 23 3 6 8 2 2 - - 2 -
1947 252 205 34 12 1 - "- - - -
1948 192 150 38 4 - - - - - -
1949 81 59 l4 6 1 - - - - 1
1950 33 24 4 4 1 - - - - -
1951 4 4 - - - - - - - -
1952 48 40 8 - - -- - - - -
1953 15 11 3 1 - - - - --
1954 3 1 -- 2 - -
-
- -
-
- -
1955 5 4 1 - - -
1956 10 9 :1 - - - - - - -
1957 13 12 .: 1 - - - - - --
1958 11 11 - - - - - - -
1959 52 52 - - - - - - - -
1960 43 43 - - - - - - -- --
1961 16 15 - 1 -- - -- -
1962 6 4 2 - - - - -
1963
1964
2
14 13
2 -
1
-
-
-
-
-
-
-- -
-
-
-
--
1965
1968
1
2
1
:2
-
-
-
-
-
--
-
-
-
-
-
-
-
- .--
1969 1 1 - - - - - - -
1973 1 1 - - - - - - - -
Total 1909 700 318 444
TABELA v
MARINGA - PROCEO~NCIA DOS PRIMITIVOS COMPRADORES OE LOTES RURAIS
,PRDCEDIONCIA
GLEBA totl' ma, norte
ringé ml.l"lic. palInd PR SP se RGS MT MG ES BA Rio EurOp

At1antic 99 1 5 29 - 49 1 4 - 6 1 - 3. --
Caxias 16 ~
- 9 - 7 - - -1 - - -1 - ,

Centenário
Chapecó
131
8
4
-
-
-
71
5
-
-
53
2
-
--
-
- - -
1 -
-- 1 31
-- --
Colombo 102 - 2 43 - 53 - - -3 -
-- -- 1
--
Maringá 257 - 4 102 2 141 3 1 -
Morangueiro 84 - 6 33 - 45
- -7
- - - -
Paissandu 68 - 5 21 - 35 - -1 - -- -3 -
Pt. Iguatemi 184 26 73 67 1 9 3 1 - -- - 7 -
Pt. Maringá
Pinguim
669 293
228 2
-
4
254
117
20 93
- 97
1
1
1
1
-
-
-- - - 1
-
5
Sarandy 63 2 5 28 - 20 8 - - ~
- - - -
TOTAL 1909 328 104 779 23 604 17 15 1 11 1 1 20 5

f .. wn: L.".... Df. .. ~t., .. ~~o PR '-.""'.N. P. llfrE Rt.Nrf " l.o'~s.
..v."" .

TABELA VI
MARINGA - LOTES VENDIDOS, POR GLEBA E PREÇO 00 ALQUEIRE (1938 - 1942)

GLEBA
Preço Im cruzeiros total atlante caxias dEpecó tente- moran- paissan
nária Cdorrbo rTB'"irtJá pinguim sarandy
ueiro du
200,00 3 - - - - 2 - - 1 - -
225.00 - - - - -- -- - - - - -
400,00 1 - -- -- - - 1 - -
500,00 1 - - - - - - 1 -
550,00 1 -
-
-- - -
-
-
-
- -2 -- 1 -'

600,00 6 - - 4 -
630,00 1 - - - - - - - - 1 -
650,00
700,00
109
99
-3 -
-
-
-
-
7
-:
-
29
34
31
16
1
17
21
22
27
-
725,00 1 - - - - - 1 - - - -
750,00 83 - - - 13 1 3 4 12 50 -
775,00 1 - - - - - - - - 1 -
800,00 84 - - - 11 36 15 - 1 21 -
825.00 6 - - - - - -- - - 6 --
850.oà' 35 - - - - 4 1 - 30
900,00' 34 - - - 11 5 17 - - 1 -
930,00 1 -- - -- - - -1 1 - -
- - -
-
1.000,00' 7 ~
- 1 5
1.100,00 1 -- - -
-
- -
-
1 - - - -
-
1. 500 ,00 1 - - 1 - - -
TOTAL 475 3 - - 42 49 102 55 33 159· 32

fONTE: Livro de registro da C.M.N.? referente a lotes rurais.


TABELA UI
MARINGA - LOTES VENDIDOS. POR GLEBA E ANO (1938-1973)
GLEBA
ANO total Patr. Patr,
Ali. C... Cent. Cha. Col. Mgá. Mor. Pais. Igual Mgá. Pi'll. Sar.

1938
1939
6
19
- - - -
- - - -
-
3
2
1
-
5
1
2
- 3
- - 6
2 -2
1940 20 - - - - - 3 5 - - - 2 10
1941 314 .- - 19 - 34 71 40 12 - 2 116 18
1942 119 3 - 23 - 12 25 5 18 - - 31 2
1943 302 1 16 31 - 32 90 15 31 - 33 44 9
1944 222 72 - 43 7 13 44 3 3 - 17 13 7
1945 77 12 - 13 1 5 15 6 1 - 3 4 15
1946 23 4 - - - 1 5 2 - - 3 8 -
1947
1946
252
192
- -
- -
1 -
- - -
-
-
1 -
-
- 27 223
- 56 134
-
-
--
1949 61 3 - - - - - - - 31 47 - -
1950 33 -- -- - - -
- -
-
- -
1 - 6 26
- - 4
- --
1951 4 - -
1952 46 1 - - - - - - - 45 2 - -
1953 15 - - - - 2 - - - 12 1 - -
1954 3 - - - - - - ~
- 2 1 - -
1955 5 - - - - '" - - - 1 4 - -
1956 10 - - - - - - - - - 10 - -
1957 13 1 - - - - - - - - 12 -- -
1956 11 - - - - - - - -- -- 5211 -
1959 52 - - - - - - - -- -
1960 43 - - - - - - - - 1 42 -
1961 16 - - 1 - - - - - - 15 -- -
1962 6 2 - - - - - - - - 4 -
i963 2 - - - - - - - - 1 1 - -
1964 14 - - - - - - - - - 14 - -
1965 1 - - - - - - - - - 1 - -
1966
1969
2
1
- -
- -
- - -
- - - -- -
-
- - 2
- : 1
- -
-- --
1973 1 - - - - - - - - - 1
Total 1909 99 16 131 6 102 257 64 66 184 669 226 63

TABELA IV
MARINGA - NACIONALIDADE DOS PRIMITIVOS COMPRADORES DE LOTES RURAIS
NACIONALIDADE
GLEBA
~
ai ~ ~
d.
oll
d.
"I
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;;: § ~ :Jti li..: ~~~
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Õ
.
«~
.:
:!
u.
h
« -i! 11c
.,; .
" a:
Atlantic 74 6 3 1 - 3 2 - 1 - 3 - -
Caxias 15 1
Centenário 101 3 10 6 2 3 3 -
Chapecó 6 2 -
Co101rbo
Maringá
64 4 5 3
202 10 6 21 6 1 3
1
2 -
- 2
- 2 2 - - -
2 - -----
---
-
Moranguei ro 46 6 9 5 4 - 3 3 4 1 .- -- .:
Paissandu 54 3 2 5 1 - 3
Pt. Iguatemi 156 6 5 6 1 - 4 2 - .: -
Pt. Maringá 496 12 13 21 49 13 1 2 - 10 - 3 11 4 15 1 1 1 2 3 2 3 2 3
Pinguim 166 12 7 20 3 9 1 - - 1 - 2 1 1 3 1 1 -- ----
Serandy 49 1 7 6 -------
Tote1 1453 56 67 lD2 74 30 l2l25 12 2 7 5 14 lO 24 4 2 2 2 3 2 4 2 3
24
FD,.,ff. : ~t&."'.~
Co, ......... , ••
06 AIIQ.\,h'ia .DI\- s.J:~,Á.
• D' ... N'fft&'L.IIPItDl liA-
- 809-

TABELA VII
MARINGA - LOTES VENDIDOS. POR GLEBA E PREÇO DD ALQUEIRE (1943 - 1947)

GLEBA
ch.,..:ó olomb mairgj moran- paidu
P'IÇO Im auzeiro. tot,l atlantic caxias ctnte- •• n
nário Ultra
plnguim sarandy

225.00 1 - - - - - - - 1 -
600.00
650.00
2
8
-
-
-
-
-- -- -- --3 24 -- -- ,--"-·1
- - - -
700.00
725.00
-750.00
27
2
142
-
1
--
16
-
27
1
-
-
5 4 5
-
-
4 8
2
2B
-
3
-
24
-
37
-
6
.
BOO.OO 147 6B 12 - 8 39 4 2 13 1
B50.00 23 3 - 13 - - 2 3 - 1 1
900,00 51 1 - 20 6 17 4 - 1 2 -
950.00 2 1 - - - - 1 - - - -
LOOO,OO B1 4 - 2 ~ 19 49 2 - 2 ,1
L 100;00 53 11 - 10 - 1 12 5 1 - 13
L200.00 13 - - 2 - 6 1 - - 4 -
1.250.00 4 - - - - - 3 - - 1 -
1.300.00
L500.00
3
5
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
3
2
-
-
-1 -2 -
-
---
LBOO.OO 1 - - 1 - - - - - -
2.000.00 1 - - - - - - 1 - -
3.000.00 2 - - - - - 1 - - 1
4.000.00 2 - - - - - - - - 2- -
TOTAL 570 B9 16 SB 8 51 155 28 35 69 31

TABELA VIII
MARINGA - LOTES RURAIS VENDIOOS. POR GLEBA E PREÇO DO ALQUEIRE
194B -. 1962
GLEBA
p'eço em cruzeiros total cente· moran- paissal'l
atl.mie caxias nkio ~ caombo mrirg6 gueira du pinguirr ser.ndy

1. 200.00 4 2 2
L 800 .00 1
2.700.00 -I
10.000.00 1
15.000,00 1
60.000.00 1
150.000.00 2 2
TOTAL 11 7 2
(DHU: LlllaO Dl a'"u.,..o til ,,( ... I\~ Dl. LO'1t.S "'UIl"'I~ DOI c.. Mo. AI. P.
- 810-
TABELA IX
MARINGA - PREÇO DOS LOTES 'VENDIDOS NA GLEBA PATRIMONIO IGUATEMI. POR ANO
1947 !!I 1963
VALOR EM CRUZEIROS (milho,.,)
ANO totel 1,36 1.5 2,7 3 4 6 6 7 8 10 12 16 20 25 30 36 40 60 60· 100
1947 27 5 4 9 4 1 2 1 - 1-
1948 58 - - 1 13 9 11 7 6 11 - - ~ - - -
1949 ·31 1 1 9 13 6 1 - - - - - - -
1950 6 - 3 1 - 2-
1952
1953
45 -
12
- - - - 1 3 1 20 15
2 -
4
4 6
1 - -

1954 2 2 -
1955 1 - 1 -
1960 1 - - - - 1
1963 1 1
TOTAL 184 1 1 18 13 32 24 13 15 223 22 15 10 7 1 2

TABELA X
MARI~GA - PREÇO DOS LOTES VENDIDOS NA GLEBA PATRIMONIO MARINGA.
POR ANO - 1938 a 1973

.. VALOR EM CRUZEIROS

1938
ANO total

'3,
88 88
~M

3
riu;
-
~! ~h~
-
88 88 88 88 gg
~iii iiilõ! !~
N~
§~ ;~~
n n
~~ I~~ ~~ ~~ I~~ ·1
1941 2 2 -
1943 33 33 - -~

1944 17 16 -
1945 3 3 - - - - -
1946 3 1 - 1
1947 223 - 20 10l 52 42 4 4 -
1948 134 2 19 41 22 20 30 -
1949 47 5 8 13 8 11 2
1950 26 3 1 411 4 3 -
1951 4 1 2 - 1 -
1952 2 2 -
1953 1 1 -
1954 1 - - - - 1 -
1955 4 4 -
1956 10 - - - - 6 3 -
1957 12 - - - - - - 7 5 -
1958 11 :z 9 -
1959 52 39 10 3 -
1960
1961
42
15
- -
-
-- -- - 1 -
2 3 6 13 18 -
2 4 2 6 -
1962 4 1 - 2 1 -
1963 1 1 -
1964 14 - - - - 1 - 2 5 3 3
1965 1 1 -
1966 2 1 -.
1969 1 1 -
1973 1 1 -
TOTAL 669 59 48 152 94 82 50
GRÁFICO 1
MARINGÁ - LOTES VENDIDOS, POR GLEBA 11938-1973)

669

257

Pinguim 222

Patr. Iguatem I 184

Centen'rio

Colombo

Atlantic 99

Morangueiro 84

Pai"lndu 68

Saraneli 63

CaxilS 16

Chapacó 8

100 200 300 400 500 600 700


UNIDADES
Fonte: Livro de Registro de Lotes Rurais da C.M.N.P.

GRÁFICO 2
MARINGÁ - ÁREA DOS PRIMITIVOS LOTES RURAIS 11938-1973)
Lote. 700
660
600
550
500
450
400
350

250
200
150

100

50
O
0-3 3-5 510 1015 1520 2Q.3l 3J.OO 50100 lOO3Jl
Alqueires

Fonte: Liwo de Registro da Lotes Rurais da C.M.N.P.


UnidadeS GrMico3
900 Maríng6· Venda de Lotei Rurai, por período
1938-1973

800

700

800

500

400

300

200

100

o
1938-1943 1943-1948 1948-1953 1953-1958 1958-1965 1965-1968 1968-1973
PEr (odos

Fonte: Livro de Registro de Lotes Rurais da C.M.N.P.

Unidades
320
310
300 Gráfico 4
290 Maringá - Lotes Rurais Vendido.
280
270 1938-1973
280
250
240
230
220
210
200
190
180
170
160
150
140
130
120
110
100
90
80
70
60
50
40
30
20
lO
O

m~O~NM.~~~~~O_NM~~~~~mO~NM.~~~m00~NM

ffiffi~~~~~~~~~~~~~~~~~ê~~~~~~~~~~~~~~~5
ANOS
Fonte: Livro de Registro de Lotes Rurais d. C.M.N.P:
- 813-

A Companhia vendeu ao todo cerca de 38.000 lotes rurais, cuja


área média é de 14 alqueires.
O impulso dado à região por ela foi relevante; deve-se, porem,
levar em conta que o resultado positivo conseguido decorreu, em maior
parte, da ação dos pioneiros, indivíduos que para ali se dirigiam em
busca de melhores oportunidades.
O pr0gresso verificado na área colonizada pela Companhia Me-
lhoramentos Norte do Paraná não resultou apenas da fertilidade do
solo, mas principalmente da iniciativa privada de indivíduos que, pro-
curando concretizar suas esperanças, desbravaram a mata, cultivaram
o café e outros produtos, plaJlltaram cidades, encontraram, sobretudo,
a oportunidade de possuir terra. Realizou-se ali, desta maneira, uma
pacífica distribuição e ocupação da terra, enquanto em outras regiões
do Estado se desenrolavam as disputas entre posseiros e supostos do-
nos, em glebas pertencentes aos poderes públicos.
* *
*
INTERVENÇOES.

Da Prof. a Maria Regina da Cunha Rodrigues Simões de Paula CUSPI


São Paulo).
Formula as seguintes perguntas:
1. a) . - Porque o espaço geográfico, estabelecido e adquirido
pela então Companhia de Terras Norte do Paraná, poderia ser consi-
derado na linha de especialistas de geografia política, aberta por Ca-
mille Valloux, uma vertente potencialmente ativa?
2. a). - Qual a assistência humana oferecida pela Companhia
aos adquirentes de lotes? .
3. a). - O espantoso e vertiginoso crescimento do Município de
Maringá quantos anos tem de vida? Qual o posicionamento de Ma-
ringá no painel urbano do Estado do Paraná?

*
Do Prof. Ruy C. Wachowicz (Universidade Federal do Paraná).
Solicita esclarecimentos das razões do insucesso da política dos
ingleses que tentaram localizar 100. 000 assírios, provenientes do atual
Iraque no Nortç gO r~ran~ com o fim específico de plantar al~odãQ,
814 -

*
Da Prof. a Sônia Maria da Silveira Fontes (Universidade Federal de
Sergipe) .
A propósito da informação, de que para garantir a propriedade
das terras, a Companhia Norte do Paraná procurou adquirir os títulos
das terras pagando duas ou mais vezes pelos mesmos, pergunta:
1.0). - Por que houve tal procedimento?
2.°). - Não teria sido mais viavel procurar mais cuidadosamen-
te o legítimo proprietário?
3.°). - Não teria a Companhia adquirido levianamente os tí-
tulos de propriedade?
* •
*
RESPOSTAS DA PROF.a FRANCE LUZ

Respondeu:
À Prof.a Maria Regina da Cunha Rodrigues Simões de Paula.
1.0). -- As terras onde se localizou a área de colonização da
Companhia de Terras Norte do Paraná são constituidas por "terra
roxa" leg{tima, propícia à lavoura cafeeira e a outras culturas; seu
relevo é suave, sendo cortada por vários rios e seus afluentes; o clima
é sub-tropical. A região, coberta anteriormente por extensas matas, é
propícia a uma ocupação rápida, à exploração agrícola intensiva e à
concentração demográfica. Seu povoamento se fez de leste para oeste,
em três décadas principalmente. O 'seu dinamismo se deve ao fato de
ser região de povoamento dirigido e recente, à fertilidade das terras e
à iniciativa particular.
2. o. - A Companhias preocupou-se em realizar uma propaganda
intensiva, conclamando pequenos lavradores a se estabelecerem na
região. Loteou as glebas, construiu estradas e implantou núcleos ur-
banos, mas não se preocupou efetivamente com o estabelecimento de
assistência sanitária, educacional, hospitalar, etc. Com o processo de
povoamento e o crescimento dos núcleos urbanos, a iniciativa parti-
cular e os orgãos oficiai,s passaram a suprir as necessidades nesses
- 815-

3.°). - Maringá foi fundada em 10 de maio de 1947, toman-


do-se município em 1951. Atualmente está aproximadamente com
200.000 habitantes, sendo 73% na zona urbana. É a terceira cidade
do Estado e a segunda da região Norte. Sua densidade demográfica é
de 238 habitantes por km 2, que, em comparação com o total do Es-
tado do Paraná (40 habitantes por km2) é elevada e bastante signifi-
cativo. No aspecto urbano, o seu traçado é moderno, dividindo-se o
perímetro urbano em zonas residenciais, comerciais e industriais. Pos-
sui uma Universidade; é sede de diocese conta com um canal de te-
levisão, três jornais e quatro emissoras de rádio. É o município cen-
tral da micro-região 15 do Estado do Paraná .
...

Ao Prof. Ruy C. Wachowicz.


Disse que no arquivo da Companhia de Terras Norte do Paraná
não há nada a respeito do que foi perguntado. Talvez nos arquivos
da Companhia em São Paulo haja alguma documentação a respeito,
mas o assunto não foi pesquisado .
...
À Prota Sônia Maria da Silveira Fontes.
1.°). - O procedimento teve o objetivo de evitar dúvidas quan-
to à legitimidade das terras adquiridas pelos compradores.
2.°). - Havia, muitas vezes, dúvidas quanto ao legítimo dono;
várias concessões tinham sido feitas anteriormente e algumas áreas
tinham mais de um proprietário, título duvidosos eram frequentes e
mesmo a delimitação das terras acarretava problemas.
3 0). - A Companhia logo de início se preocupou em examinar
a documentação a respeito da área a
PLANOS DE COLONIZAÇÃO OFICIAL APLICA-
DOS, A PARTIR DA DÉCADA DE 1930, EM ZONAS
PIONEIRAS E DE POVOAMENTO, NO ESTADO
DO PARANÁ (*).

ODAH REGINA GUIMARÃES COSTA


do Departamento de História da Unive-sidade Federal
do Paraná.

PROBLEMA:

Em que medida se desenvolveu a colonização oficial, a partir da


década de 1930, em zonas pioneiras e de povoamento, no Estado do
Paraná?

1. - INTRODUÇÃO.

No Paraná, os problemas de terras eram decorrentes do próprio


modo como se conduziam os serviços de colonização, realizados quase
que exclusivamente por particulares, visando fins lucrativos, desinte-
ressando-se, o próprio Estado, da organização de planejamento oficial
e racional de incentivo de povoamento de suas terras. O Estado via-se
impossibilitado de exercer a sua ação em extensas áreas, que consti-
tuiam verdadeiros entraves ao seu desenvolvimento. A revolução de
1930, pela simplicações que teve na conjuntura nacional, haveria de
assinalar, no Paraná, uma fase de transição com novas diretrizes polí-
ticas, no sentido da regulamentação e melhor aproveitamento de suas
terras. A reorganização dos serviços de colonização, através da apli-
cação de planos de colonização oficial, seria uma forma de solucionar
problemas de ordem judicial e administrativa, inclusive aqueles ligados
à alienação das terras devolutas, constituindo-se propriedades, desen-

(*) - Comunicação apresentada na 2<1 Sessão de Estudos, Equipe C. no


dia 5
- 818-

volvendo-se as zonsa rurais e aumentando as rendas públicas, através da


tributação competente.
Montam-se novos esquemas de ação, através da aplicação de le-
gislação saneadora, da anUlação de concessões, que resultaram im-
produtivas, e da aplicação dos referidos planos de colonização oficial,
pelo antigo Departamento de Terras e Colonização, depois Departa-
mento de Geografia, Terras e Colonização, estimulando-se a coloni-
zação, principalmente com elementos nacionais, em zonas pioneiras e
de povoamento do Paraná. À medida que se realiza a colonização,
constituem-se novas comunidades, que, pouco a pouco, vão se entro-
sando no seu contexto sócio-econômico.
* *
*
2.. - A LEGISLAÇÃO E A POLlTICA DE TERRAS NO
PARANA.

A revolução de 1930, Ja na época da l.a Interventoria Federal


do Paraná, tendo à frente o General Mário Tourinho, empenha-se em
regulamentar o setor de terras, reconquistando concessões que se tor-
naram improdutivas, e procurando normalizar a venda de terras de-
volutas,assim como efetuar revalidações e legitimações de posses.
O decreto n.o 300, de 3 de novembro de 1930 (1), é verdadeiro
marco da nova política aplicada pelo Governo do Estado, rescindindo
o contrato firmado com a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-
Rio Grande, a 8 de setembro de 1917, e por esta cedido à Companhia
Brasileira de Viação e Comércio, revertendo ao Estado a área de
1.700.000 hectares. O decreto n.o 1495, de 15 de junho de 1934,
tornou caduca a concessão de 300.000 hectares, de A. Alves de Al-
meida, no Norte do Estado, na região onde seria constituida a colônia
Içara, a primeira experiência de colonização oficial em novos moldes
a ser realizada pelo Governo do Estado, seguindo-se outras anulações
de concessões de terras.
Atendendo aos problemas e sem ferir direitos legitimamente ad-
quiridos é que foi baixado o decreto n. O 800, de 8 de abril de 1931
(2). Estabeleceu, entre outras medidas, que as terras devolutas só
(1). - PARANÁ (Estado). Leis, decretos etc. Decreto nQ 300. Dia-
rio Ofticial do Estado do Paraná. Curitiba, 04-11-1930, nQ 17, anno I, p.
5-7.
(2). - PARANÁ (Estado). Leis, decretos etc. Decreto nQ 800 de 8
de abril de 1931. Leis e decretos-leis do Estado do Paraná de 1930 a 1937. Curi-
tiba, Impr. Of. do Estado, 1954. p. 30-4.
- 819-

po,deriam ser adquiridas, a título, de co,mpra, pelas pesso,as que reve-


lassem a intenção, de nelas se localizar, cumprindo, as condições de
manter cu1tura efetiva e mo,rada habitual. Do,is outros aspectos deste
decreto confirmavam o carater eminentemente social da co,lonização"
ou sejam, o, limite máximo da área de 200 hectares de terras, a serem
vendidos à cada pessoa o,u família interessada na colonização, e o
sentido, po,lítico, do, preço, mínimo, de 18$000 o, hectare, para as
terras devolutas, e de 2 a 50 réis o metro quadrado" para o,s lo,tes co-
loniais, urbanos o,u rurais, podendo variar, de acordo, co,m a qualidade
e a lo,calização, a critério, do, Go,verno,.
o Departamento de Terras e Colo,nização, tambem pôs em prá-
tica medidas administrativas, baixando, instruções (3), so,bre terras de
do,mínio, particular, terras revalidáveis, terras legitimáveis e terras de-
vo,lutas, sendo, mantidas as determinações, do, Go,verno" de venda, até
o limite máximo, de 200 hectares, pelo mesmo, preço, mínimo de 18$000
o hectare, podendo, ser majorado" a critério, go,vernamental.
Para melhor o,rdenamento, dos serviço,s de medição" demarcação
e fiscalização, das terras devo,lutas, na fo,rma da lei e confo,rme os re-
gulamentos em vigo,r, fo,i o Estado, dividido" primeiramente, em treze
distritos (4), depois dez (5), com a deno,minação, de Co,missariado,s de
Terras.
O Estado, não, instituira, ainda em 1936, a co,lo,nização, o,ficial mas
celebrava no,vos contrato,s e concedia facilidades a empresas co,loniza-
doras e a particulares, interessado,s em promo,ver a co,lonização" ce-
dendo,-Ihes terras a baixo, preço, e em condições vantajo,sas de paga-
mento,.
A lei n. O 46, de 10 de dezembro, de 1939 (6), veio, confirmar essa
política, auto,rizando, o, poder executivo" representado pelo, Intervento,r
Manoel Ribas, que imprimiu no,vo, dinamismo, no, setor de terras, a
pro,mover a co,lonização, das terras devo,lutas do, Estado" po,r meio, de
concessão de glebas, a empresas o,u particulares, e mediante contrato,
com cláusulas que garantissem o,S interesses públicos e o fiel cumpri-

(3). - Instruções do Departamento de Terras, mandadas observar pela


portaria n 9 132, de 8 de maio de 1931. Legislação de Terras vig. at.é
31-12-1934 coord. e consolido p/Eng9 Civil Francisco Gutierrez Beltrão. [Cun-
ba], Serv. de Div. do Dep. de Terras e Coloniz. p. 190-200. publ. n9 2.
(4). - Decreto n9 321, de 29 de janeiro de 1931.
(5). - O decreto anterior foi derrogado pelo decreto n9 1291, de 19
de maio de 1933.
(6). - PARANÁ (Estado). Leis, decretos etc. Lei n 9 46, de 10 de
dezembro de 1935. Legislação de Terras. De jan. de 1935 a 31 de
dez. de 1940, coord. p/Dep. de Terras e Colonização. rCuritiba], Servo de
Div. do Dep. de Terras e Coloniz. p. 18-9, publ. n 9
- 820-

me~to das condições contratuais. A área máxima a ser cedida não po-
dena exceder 50.000 hectares e o prazo para a colonização das gle-
bas seria, no máximo, de seis anos, podendo haver prorrogação por
mais dois anos, se já estivesse colonizada mais da metade da área obti-
da por concessão, ao preço mínimo de 10$000 o hectare, não devendo
exceder cada lote a 200 hectares. O poder executivo ficava ainda au-
torizado a conceder, por venda ou aforamento, a agricultores ou cria-
dores, terras devolutas, na área máxima de 2. 000 hectares.
Cresce a procura de terras no Paraná ampliando-se o movimento
de vendas e ativando-se a colonização individual e espontânea. A
maior procura de terras era no Norte do Paraná, que pouco a pouco
vai se tomando um polo de atração de capitais e de mão-de-obra, de-
vido à fertilidade dos seus solos e a expansão da cultura cafeeira. Au-
mentam os pedidos de venda de terras do Estado localizadas na mar-
gem esquerda do rio Tibagí, nas proximidades de Jataí, reduzindo-se
as áreas a serem vendidas e elevando-se o preço do hectare até o
máximo de 100$000. Na região de Bandeirantes do Norte, na ex-
concessão A. Alves de Almeida e nos municípios de Tibagí e Gua-
rapuava tornam-se mais numerosos os pedidos de compra, o mesmo
sucedendo nas outras circunscrições de terras.
O título provisório de terras, expedido conforme as leis vigentes,
era motivo de errôneas interpretações sobre o seu justo valor, sendo
considerado, mui,tas vezes, como prova legítima de propriedade, oca-
sionando a falta de cumprimento, Por parte do interessado na compra,
dos outros compromissos assumidos para com a administração, não
se preocupando com o processo de medição e assim criando sérios
empecilhos ao processamento dos negócios públicos. O Departamen-
to de Terras e Colonização solicitou ao Governo a solução do proble-
ma, sendo-lhe dada autorização, pela portaria n.o 218, de 7 de junho
de 1935, instituindo-se título de opção com os mesmos efeitos legais
atr"buidos aos títulos provisórios. Os requerimentos para medição,
instruídos com os títulos de opção, seriam despachados pelo Diretor
do Departumento, tornando-se mais rápida a fase de medição. A
portaria n.O 538, de 30 de dezembro do mesmo ano, fundamentada
no ofício n.O 562/35 do referido Departamento, que salientou o con-
tínuo encaminhamento de petições, solicitando, com base em procu-
rações de cessionários de direitos, a expedição, em nome de terceiros,
dos títulos de propriedade, o que implicava na transferência velada
de imóveis, regulamentou o pagamento do imposto de transmissão
causa mortis, do imposto de transmissão inter-vivos e a legitimação
de posse.
O decreto n.O 8.716, de 14 de junho de 1939, veio trazer trans-
formações de ordem administrativa, criando-~ as Inspetorias de
- 821-

ras, em número de 6, sendo extintos os 10 Comissariados de Terras.


Esta nova organização do Departamento de Terras e Colonização,
aliada a outras medidas do Governo do Estado, haveria de contribuir
para a defesa do patrimônio territorial e a salvaguarda dos interesses
dos adquirentes de terras.
Entretanto, ainda havia diversos problemas a serem resolvidos,
inclusive ligados à legislação. Se a legislação contribuia para solucio-
nar, em parte, os problemas de terras no Paraná, ela própria trazia
novas implicações, que demandavam solução imediata, principalmente
no que se refere à venda das terras pertencentes ao Estado. Entre as
determinações legais destacavam-se, como condição essencial, a cul-
tura efetiva e a morada habitual, antes do interessado conseguir o tí-
tulo de propriedade das terras. Isto vinha incentivar a invasão das
terras públicas, motivando a devastação das matas,

"atividade criminosa que é acobertada e incentivada pelo


preceito legal que regula as adjudicações de terras", referenda-
da nos favores concedidos "sob o simples pretexto de intento
da compra sempre e invariavelmente protelada" (7).

A localização espontânea dos ocupantes de trras públicas, me-


diante o estabelecimento de atividade agrícola incipiente e de morada
rústica, implicava na ocupação desordenada e crescente ampliação da
área ocupada, numa consequente devastação sistemática, seleção das
melhores terras, utilização das águas e de outras servidões, ocorrendo,
inclusive, problemas no que se refere ao traçado perimétrico. Este
sistema era totalmente contrário aos interesses do Estado, pois facili-
tava a devastação das melhores terras e o abandono das outras, de-
preciadas e desvalorizadas.
Alem disso, a portaria n. o 537. de 30 de dezembro de 1935, es-
tabeleceu que a comprovação da cultura efetiva e morada habitual,
realizada por meio de inspeções locais, deveria ser complementada
com o pagamento do respectivo imposto territorial. A falta de paga-
mento implicava na desarticulação do sistema fiscal e na penhora de
terras do Estado, que eram vendidas, em hasta pública, a terceiros,
aumentando a complexidade do mecanismo da compra e venda de
terras.

(7). - PARANÁ (Estado). Relatorio dos serviços executados p/Dep.


de Terras e Colonizo durante o ano de 1940 apreso ao Dr. Angelo F. Lopes,
Secr. de Estado dos Neg. de Obras Publ. Viação e Agric. pelo Dir. Eng"
Civil Antonio Baptista Ribas. Curitiba, 30-06-1941, f. 190.
- 822-

Para resolver estes problemas, o Departamento de Terras e C0-


lonização vai adotar uma política em novos moldes, baseada na me-
dição e demarcação de extensas áreas de terras, dividindo-as em lotes
para depois proceder a sua venda, objetivando elimilIlar os aspectos
negativos do sistema anterior, de concessões a companhias e a parti-
culares, sendo previstas servidões de águas, as possibilidades de aces-
so às estradas e o traçado regular do perímetro. Estruturam-se os ele-
mentos básicos do novo plano de colonização oficial, aplicado a partir
de 1939.
o Estado continuava a enfrentar o problema da formação dos
"grilos" de terras, alguns com extensão equivalente a municípios, de-
vido à dissimulação do direito de propriedade, originando da inexis-
tência de divisões judiciais e de falsas sentenças de homologação, pre-
judicando o povoamento em face da dúvida do adquirente de terras
quanto ao seu domínio, não tendo conhecimento se pertenciam ao
Estado ou aos "grileiros". O Departamento de Terras e Colonização,
no biênio de 1938-39, solicitou providências junto ao Governo, para
a solução do problema,sendo restabelecidos os aIíts. 2.° e 4.°, da lei
n.O 2518, de 26 de março de 1928, pelo decreto n.O 8750, de 19 de
iunho de 1939. que determinavam a apresentação, por ocasião dos
atos da transmissão de propriedade, do registro de posse, conforme o
art. 19, da lei n.o 68, de 20 de dezembro de 1. 892, ou do título de
propriedade, ou provisório, expedido pelo Governo do Estado, crian-
do-tse, assim, uma barreira à formação dos "grilos".
Outros problemas demandavam solução imediata no que se re-
fere a terras no Paraná e, principalmente, à colonização particular.
O Departamento de Terras e Colonização fez ao Governo, por diver-
sas vezes, insistentes pedidos de medida judicial competente para sub-
meter as empresas particulares de colonização à fiscalização e con-
trole do referido Departamento, à aprovação prévia do plano de lo-
teamento e divisão das glebas, apresentação de dados estatísticos e
históricos das colônias, venda dos lotes e outras informações.
O Governo enfrentava ainda o problema da impossibilidade de
exe,rcer a sua jurisdição sobre terras, que poderiam ficar sob o seu
domínio, como aquelas destinadas para a localização de indígenas. A
Diretoria do Departamento de Terras e Colonização, representada
pelo Eng.o Antonio Baptista Ribas. no Relatório de 1937, e em outros,
fez referência à extensão da área reservada, equivalente a cerca de
200 .000 hectares, salientando a necessidade de um entendimento en-
tre o Governo do Estado e da União, de modo a ser demarcada uma
área determinada para a localização dos indígenas, revertendo o res-
tante ao patrimônio do Estado. Porem, o problema mantinha-se inso-
luvel, no início da década de 1940,
- 823-

econômico do Estado e prejudicando o povoamento de terras férteis


e estrategicamente localizadas, tornando-as glebas improdutivas e objeto
de intrusão intensa,

"sem que, a administração estadual póssa tomar qualquer


medida coercitiva de tão pernicioso abuso" (8).

A falta de um cadastro territorial, que possibilitasse o conhecimen-


to da situação das terras devolutas, dificultava a solução dos proble-
mas de terras no Paraná. O Departamento de Geografia, Terras e
Colonização. assim denominado pelo decreto-lei n. o 15, de 25 de fe-
vereiro de 1942, enfrentava dificuldades devido à exiguidade da do-
tação orçamentária, que lhe era destinada, e à falta de técnicos.
Continuava o problema da intrusão, que contrariava as disposições
do art. 34 de Regulamento de Terras, aprovado pelo decreto IA,
de 8 de abril de 1893, que proibiu a invasão de terras públicas. O
Governo procurava incrementar o povoamento das zonas rurais e
combater

"a fraude e o vício, no que diz respeito a falsos documen-


tos com que supostos proprietarios se arrogam o dominio so-
bre extensa área, constituindo cerca de 1/3 da superficie terri-
torial do Estado" (9).

Porem, as medidas coercitivas, postas em prática, não surtiam o


efeito necessário. Em 1948, registravam-se,

"aproximadamente duas mil famílias localizadas em ter-


ras do Estado, das quais muitas já transferidas por títulos de
domínio a terceiros e outras oneradas por compromissos que a
administração assumiu" (10).

(8). - PARANÁ (Estado). Relat6rio dos serviços executados p/Dep.


de Terras e Colonizo durante os anos de 1938 e 1939 apreso ao Dr. Angelo
F. Lopes, Secr. de Estado dos Neg. de Obras Publ., Viação e Agric. pelo
Diretor Eng'? Civil Antonio Baptista Ribas. Curitiba, 25-01-1940, datilogr.
(9). - Grilos de terras no Estado do Paraná, Sintese org. por este
Dep. ao Interventor Federal, em exposição que dirigiu ao Chefe do Governo
da República. Relat6rio dos serviços executados d/Dep. de Geografia, Terras e
Colonizo durante o ano de 1942 apreso ao Dr. Angelo F. Lopes, Secr. de
Estado dos Neg. de obras Publ., Viação e Agric. p/ Dr. Antonio Baptista
Ribas, Eng'? Diretor. Curitiba, 30-06-1943. datilogr.
(10). - Relat6rio rdel 1947 apreso ao Cél Antenor de Alencar Lima,
Secr. de .Viação e Obras públ., pelo Eng'?
- 824-

A maioria das intrusões se registraram na reglao das terras da


ex-concessão A. Alves de Almeida, havendo sido expedidos títulos
e em tempo revalidados conforme o que foi dispos.to pelo art.
3. 0 do decreto n. o 1.495, de 15 de junho de 1934, que tor-
nou caduca aquela concessão. O Estado teve que assumir o compro-
miss.o de respeitar uma área equivalente a 40.000 hectares, ficando
sujeito ao onus da evicção, se não desse cumprimento ao que fora
acertado, com enormes prejuizos para o erário público. A solução
para o problema seria localizar os intrusos em outras terras. Para a
conciliação dos interesses dos posseiros e do Estado faziam-se neces-
sárias algumas medidas: 1). - Redução, a ser feita por decreto, da
área reservada como floresta protetora, na zona noroeste do Estado,
visando a consütuição de gleba de 50.000 hectares para a localiza-
ção de cerca de 2.000 famílias de intrusos, cabendo 25 hectares para
cada família. 2). - Determinação de crédito especial de Cr$ ....
1 .500.000,00 para os serviços relativos à colonização. 3). - Deter-
minação, por lei, do pagamento dos lotes, em prestações anuais, no
prazo máximo de 10 anos, dando-se, em garantia, o lote e as benfei-
torias ao Estado (11).
Não convinha ao Estado adotar uma política de deslocamento
daqueles que estavam radicados em suas terras, na dependência da
extração do título de propriedade, e, de outro lado, incentivar a com-
pra de terras, por baixo preço e a longo prazo. Uma política conci-
liatória, e, sobretudo, a ativação do plano de colonização oficial de
assistência social, econômica e cultural, que vinha sendo aplicado, des-
de 1939, em Içara e outras colônias seriam as medidas mais aconse-
lhadas.
Porem, a política governamental sofreria distorções, registrando-se
um

"completo desvirtuamento do verdadeiro objetivo da colo-


nização racional" (12).

Fatores diversos descontrolaram os serviços de terras, sendo


"que o Estado vendeu o que não mais possuia, alcançando
área superior a 130.000 alqueires de terra a área comp"omissa-
da pelo Govêrno com os requerentes, com prestações pagas e

(11). - Ibidem, p. 28.


(12). - PARANA (Estado). Mensagem apreso à Assembléia Legislativa
do Estado, por ocasião da abertura da 1\1 sessão ord. da 2~ legislo por Bento
Munhor.
- 825-

cuja localização se pode dar em qualquer out-a parte do País,


menos território Paranaense" (13).

A poHtica de colonização oficial já havia produzido bons resul-


tados nas colonizações efetuadas no sul do Estado, no município de
Clevelândia, e na zona norte, nas colônias Jaguapitã, Içara, Centená-
rio, Faxinal de São Sebastião e nas primeiras glebas das colônias Mou-
rão e Paranavaí, com a aplicação do sistema de pequenos lotes colo-
niais. Entretanto, a política governamental sofreu alterações, passando
a adotar o sistema de grandes lotes de terras, com aproximadamente
500 hectares, em quase todas as glebas das colônias Paranavaí, Goio-
Erê. Tape;ara e outras. Novamente formaram-se grandes latifúndios
no Paraná, preterindo-se direitos dos verdadeiros interessados, com
graves implicações na vida do Estado.
Para regulamentar os trabalhos de colonização foi baixado o de-
creto n. O 3060, de 26 de outubro de 1951 (14), que, entre outras deter-
minações. estabeleceu, no art. 1.0, que o Departamento de Geografia,
Terras e Colonização ficava autorizado a promover os meios necessá-
rios para o término dos trabalhos de medição, loteamento e demarca-
ção das terras devolutas do Estado, dando solução rápida aos pro-
cessos de compra, que se achavam em andamento. O art. 2.° pres-
creveu a redução a 250 hectares da área máxima a ser demarcada, em
favor de cada requerente, em caso de requerimentos já deferidos e não
incursos em caducidade. No que se refere às terras devolutas foi pre-
visto, no art. 8.°, a proib:ção de ocupação, sem a respectiva ordem
da autoridade competente, incorrendo, em caso contrário, na condição
de invasor e nas penalidades previstas em lei.
O Departamento de Geografia, Terras e Colonização, em ação
com a Fundação Paranaense de Colonização e Imigração [F P C I],
com o Grupo Executivo das Terras do Sudoeste do Estado do Paraná
[G E T S O P], o I B R A e o I N D A, o Conselho de Desapropria-
ção e Colonização rCDC] e do respectivo Fundo - F D C, já em 1972,
como instituição autônoma e sob a denominação de Fundação Ins-
tituto de Terras e Cartografia [F I T C] (15), conseguiu aplicar ex-
tenso programa de colonização, contribuindo, decisivamente, para o
desenvolvimento do Estado do Paraná.

'" '"
'"
(13). - Ibidem, p. 63.
(14). - PARANÁ (Estado). Leis, decTetos etc. DecTeto n'" 3"60. de
26 de outubro de 1951. Diário Oficial [do1 Estado do Paraná. Curitiba.
Impr. Of. do Estado, 29 out. 1951. nO 194, ano 39, p. 1, colo 1-4.
(15). - A lei nO 6. 316, de 20 de setemb °
- 826-

3. - A APLICAÇÃO DOS NOVOS PLANOS DE COLONIZA-


çÃO OFICIAL NO PARANA.

Um dos principais objetivos do Departamento de Terras e Colo-


nização era promover o serviço de colonização, principalmente pelas
suas implicações na vida política, econômica e social do Estado, vi-
sando o povoamento das zonas rurais e terras devolutas, donde provem
a produção e, consequentemente, o intercâmb:o comercial, alem da
transmissão da propriedade, trazendo lucros para o Estado através da
tributação competente.
Estes e outros fatores levaram o referido Departamento a incen-
tivar a cc1onização do Faxinal de São Sebastião, das colônias de na-
cionais localizadas nos municípios de Palmas e Clevelândia e das ou-
tras que seriam fundadas.
Atendendo às necessidades conjunturais e visando atingir os ob-
jetivos governamentais, foi baixado o decreto n. O 8564, de 17 de maio
de 1939 (16), que autorizou a Secretaria de Obras Públicas, Viação
e Agricultura a por em prática serviços racionais de colonização nas
terras devolutas existentes nos municípios de Londrina, Guarapuava e
Paranaguá, incluindo grandes áreas de terras no norte, noroeste e
oeste paranaense, alem de algumas no litoral.
Foi mon!ado esquema de trabalho, incluindo a escolha das re-
giões mais favoráveis, e elaborado um plano com a determinação dos
núcleos coloniais futuros e das áreas das glebas a serem divididas em
lotes, observando-se, nos trabalhos de campo, o critério básico do le-
vantamento dos perímetros externos, espigões e águas internas, de
modo a facilitar o loteamento e a construção das estradas de acesso,
gerais e vicinais. Levou-se em consideração o problema do urbanis-
mo, no que se refere à localização das sedes coloniais, de modo a fa-
cilitar a divisão em lotes urbanos. Estudaram-se as possib:Iidades de
instalação futura dos serviços de água e luz, bem como foi previsto o
estabelecimento de uma população rural e o seu desenvolvimento eco-
nômico, senào projetadas chácaras, localizadas ao redor do perímetro
urbano. Os lotes rústicos teriam no máximo 100 hectares, conforme
a legislação vigente. Deveria ser dado atendimento à assistência so-
cial, representada pela previsão de médicos nas sedes dos núcleos co-
loniais, hospitais, escolas, casas para administração, postos rádio-tele-
gráficos, hoteis e outros.

(16). - PARANÁ (Estado). Leis, decretos etc. Decreto n Q 8.564, de


17 de maio de 1939. Diario Oficial do Estado do Paraná. Cu-itiba, 32-5-39.
a. 90, n Q 2.071,
- 827-

A aplicação do plano oficial redundaria inicialmente no desen-


volvimento do norte e do noroeste do Estado, a começar por Içara, a
primeira colônia fundada nos novos moldes de colonização. Locali-
zada na margem esquerda do rio Bandeirantes do Norte, no antigo
município de Londrina e distrito de Rolândia, em terras da ex-con-
cessão. A. Alves de Almeida, destinada a ser colonizada por colonos
nacionais, logo seria tambem polo de atração de capitais e de mão-
-de-obra. Incluiu, ao todo, três glebas, sendo demarcadas inicialmente
duas, cabendo os trabalhos de campo ao Eng.o Ulysses Medeiros.
O Governo do Estado alienou as terras da colônia Içara por
preço bastante reduzido, com inclusão das despezas relativas à aber-
tura de estradas, de medição e demarcação dos lotes, sendo o preço
inicial de 70$000 o hectare e devendo-se efetuar o pagamento de
modo parcelado, incluindo a primeira prestação no prazo de três me-
ses, a partir do despacho favoravel, seguindo-se a segunda, no prazo
de nove meses, após a primeira, e, as demais, em prestações anuais,
perfazendo, ao todo, seis prestações. O preço do metro quadrado dos
lotes urbanos, todos com 675 m2 , era equivalente a 150 réis, sendo de
200 réis, quando localizados nas esquinas das quadras. Consagravam-
se, assim, os objetivos políticos e sociais do Estado, procurando, atra-
vés de uma política racional e de preços acessíveis, promover efetiva-
mente a colonização de suas terras, em contraposição ao antigo sistema
de concessões, que visava quase unicamente o lucro dos concessioná-
rios, que conseguiam as terras
"ao preço infimo e lrrIsorio de 5$000 por hectare, alie-
nando-as por valores elevados e dificultando, dest'arte o povo-
amento das mesmas, de vez que são alienadas a pessôas abas-
tadas c não a colônos". .. ( 17) ,

podendo ser prorrogado o prazo, por disposições contratuais, possibi-


litando a aquisição de lucros advindos da transação comercial de
compra e venda de terras, ainda desabitadas e sem exploração eco-
nômica. Dentre as colônias constitui das sob novos moldes destaca-
ram-se, alem de Içara, Jaguapitã, Centenário, Paranavaí, Campo Mou-
rão, Goio-Erê, Goio-Bang, Muquilão, Cancã, Cantu e Piquirí.
No biênio de 1938-1939, foram incentivados os trabalhos de co-
lonização nas colônias estaduais, com a venda dos lotes ainda exis-
tentes,

(17). - Relatono dos serviç<M executados p/Dep. de Terras e Colonizo


durante os anos de 1938 e
- 828-
"cujo número vai se tornando reduzidíssimo dete~minando a
necessidade de organização de novas colônias nos moldes de
Içara". .. (18).

Porem, mesmo sendo reconhecida a influência da colonização


na vida política, econômica e administrativa do Estado, o Departa-
mento de Terras e Colonização não pode contar com
"uma dotação que lhe assegurasse a possibilidade de poder
desenvolver o plar.o traçado, de uma colonização oficial inte:I"
sa e produtiva, calcada nos moldes ditados pela técnica e expe"
riência do assunto" (19).

Entretanto, os resultados obtidos no Faxinal de São Sebastião,


na colônia Pato Branco e em outros núcleos de colonização estavam
a confirmar os resultados esperados e a servir de motivo para o in-
centivo do plano de coloniZação oficial iniciado em Içara.
No sentido de que a organização dos novos núcleos atendesse
aos preceitos técnicos mais modemos, foram estabelecidas determina-
ções quanto ao prazo e baixadas instruções, pelo Departamento de
Terras e Colonização, conforme os seguintes princípios: 1). - Le-
vantamento topográfico da linha de perímetro. 2). - Levantamento
das águas internas. 3). - Levantamento topográfico das sedes e ben-
feitorias. 4). - Levantamento topográfico dos divisores de águas.
5). - Determinação do local para a fundação da sede. 6). - Ela-
boração do projeto do loteamento de toda a área. 7). - Delimitação
dos lotes, após a aprovação do projeto. 8). - Projeto das estradas
gerais e vicinais. 9). - Projeto da sede e sua demarcação. 10). .-
Organização de memorial descritivo e justificativo dos serviços reali-
zados (20). Deveriam ser observados ainda os preceitos legais e re-
gulamentares em vigência, sobre os serviços de colonização.
Foi bastante intenso o movimento de venda de lotes em Içara a
colonos e interessados nacionais, nos termos da alínea C, do art. 35
do decreto-lei n. o 1.202, de 8 de abril de 1939. O novo plano de co-
lonização oficial seria posto em prática na colônia Mourão, inicial-
mente no núcleo n. O 5, já estando, em 1941, autorizados os serviços
nos municípios de Guarapuava, Londrina, Foz do Iguaçu e Parana-
guá. Em janeiro de 1942 encontravam-se em andamento a medição e
demarcação das terras denominadas Pedra Branca do Araraquara, no
(18). - Ibidem.
(19). - PARANÁ (Estado). Relatório dos serviços executados p/Dep.
de Terras e Coloniz. durante o ano de 1940. " f. 71.
(20).
- 829-

município de São José dos Pinhais, e da colônia Pereira, no município


de Paranaguá, anteriormente de carater particular, cuja arrematação
fora efetuada pelo Estado, em hasta pública, devido a penhora, com
ação movida pela Fazenda Estadual para a cobrança do imposto ter-
ritorial, tornando-se núcleo de colonização oficial para a legalização
dos colonos nacionais ali localizados. No município de Londrina fo-
ram concluidos alguns trabalhos na colônia Içara, como construção da
casa escolar, arruamento de 4,5 alqueires e ponte sobre a ribeirão
Driades. bem como ativaram-se os. serviços de medição e demarcação
no patrimônio São José e na gleba Pirapó. O plano oficial teve larga
aplicação no município de Guarapuava, estando em andamento a me-
dição e demarcação da gleba 8, Marquinho, da gleba 1, Santa Maria,
da gleba 4, São José, da gleba 7, Guampará, da gleba 11, Rio do
Campo, encontrando-se concluidos os serviços na gleba 5, Rio Claro,
e na gleba 9, Lagoa, bem como foram ativados os serviços na gleba
Beniamim Constant, no município de Foz do Iguaçú. Encontrava-se
conclu~da a colonização da colônia Pato Branco, no município de
Clevelândia, e das terras Fartura, no município de Palmas, e, em an-
damento, a organização da colônia de nacionais de Chopim, no mes-
mo município.
A Diretoria do Departamento de Terras e Colonização formulou
sugestões ao Governo no sentido de ser adotado, nos núcleos coloniais
em formação, o sistema de trabalho dos interessados na compra dos
lotes na construção de estradas para outros núcleos e de estradas ge-
rais de comunicação com os centros consumidores. Esta medida visava
atender aqueles colonos que não dispunham de outros bens ou valores
e que dependiam da produção agrícola para saldar os seus compro-
missos relativos à compra das terras e para a sua subsistência, a exem-
plo do que se processava no núcleo de Pato Branco, onde até o final
de janeiro de 1942,
"possivelmente estarão conc1uidos cerca de 62 quilômetros
de estradas sem onus algum para o Estado" (21).

A par da colonização oficial desenvolvia-se no Paraná uma co-


lonização de carater semi-oficial, processada indiretamente por meio
de intermediários, através de concessões efetuadas pelo Estado e fir-
madas por contratos, como aquela outorgada ao Eng.o Francisco Gu-
tierrez Beltrão, em pagamento dos serviços relativos à construção das

(21). - PARANÁ (Estado). Relatório dos serviços executados p/ Dep.


de Geogr., Terras e Colonizo durante o ano de 1941 apreso ao Dr. Angelo
F. Lopes, Secr. de Estado dos Neg. de Obras públ., Viação e Agric. pelQ
I>ir, Enlf' Civil Antonio Baptista Ribas Curitiba, 12-01-42, datilogr,
- 830-

estradas de rodagem de Cleve1ândia a Santo Antonio e Porto Vitória


a Mangueirinha (22), localizada na gleba Jacutinga, no município de
Londrina, sendo ali fundada a colônia Ibiporã.
Outro tipo importante de colonização na época era a das compa-
nhias particulares, destacando-se, não só pelo montante dos capitais
investidos como pela extensão e importância dos serviços de coloni-
zação, a Companhia de Terras Norte do Paraná. O Estado procurava,
a exemplo dos resultados que estavam sendo obtidos pela colonização
particular, principalmente daquela Companhia, corrigir e ativar o seu
próprio sistema de colonização, de modo a atender à crescente pro-
cura de terras. O resultado dessa ação conjugada manifesta-se na co-
lonização de extensas glebas de terras, contribuindo para o desenvol-
vimento sócio-econômico do Estado. Entretanto, ainda havia diversos
problemas a serem superados. O Departamento de Geografia, Terras
e Colonização continuava a enfrentar diversas dificuldades, principal-
mente de ordem de pessoal e de verbas, mesmo sendo considerado,
em meiados de 1943, o plano oficial por ele aplicado como
''um sistema ideal e pe:feito para a concretização dos obje-
tivos visados". .. (23).

A constituição dos núcleos coloniais estava ligada às dota-


ções a serem consignadas nas leis orçamentárias, condição essencial
para a execução do plano de colonização, de modo a se opor ao antigo
sistema de venda de terras públicas,
"que não se coaduna mais com a evolução dos respectivos
serviços e o desenvolvimento economico do Estado" (24).

Da aplicação do plano oficial adviriam resultados práticos, que


complementariam aqueles ligados diretamente à colonização, ou se-
jam, o aproveitamento integral e racional das terras e a colet~ de da-
dos topográficos para a organização do cadastro territorial do Paraná,
bem como contribuiria para regulamentar aquele tipo de colonização
espontânea, em tratos isolados, corrigindo a ocupação desordenada
das terras públicas e impedindo a devastação impiedosa das matas.
(22). - O contrato entre o Estado e o referido concessionário foi fir-
mado a 11 de maio de 1933, sendo a concessão titulada ao mesmo a 8 de
agosto de 1935.
(23). - PARANÁ (Estado). Relatório dos serviços executados p/Dep.
de Geogr., Terras e Colonizo durante o ano de 1942 apreso ao Dr. Angelo F.
Lopes, Secr. de Estado dos Neg. de Obras Publ., Viação e Agric. pelo Dr.
Antônio Baptista Ribas, Eng" DIT. Curitiba, 30-06-43. p. 126. datilogr.
(24). - Relatorio dos serviços executados p/Dep. de Geogr., Terras
e
831 -

Braços e capitais afluiam, em grande parte, para o Norte do


Estado, como decorrência do plano oficial de colonização, principal-
mente devido à superação dos primeiros levantamentos, efetuados em
1939 e 1940. em Campo Mourão, Paranavaí, Içara e Centenário, em
plena zona do sertão, despovoada e de dificil acesso. Já se tornava
necessária a extensão do plano às regiões dos baixos Ivaí e Piquirí e
do vale do rio Paraná.
Com o decorrer do tempo, o plano organizado em 1939 deveria
sofrer transformações, sendo, porem, conveniente a manutenção de al-
guns princípios básicos. conforme determinações da Diretoria do De-
partamento de Geografia, Terras e Colonização: 1). - Aplicação do
princípio de autoridade, sendo punida a apropriação ilegal da terra e
a devastação das florestas; 2). - Projeto prévio do custo unitário de
uma gleba, com previsão dos serviços de levantamento, demarcação,
construção de vias de comunicação, assistência sanitária, escolar, técni-
ca e administrativa; 3), - Determinação dos preços de terras, da
medição e forma de pagamento; 4), - Ocupação da terra depois da
demarcaçãa da gleba, referendada pelo deferimento da petição; 5).
- Conscientização e atendimento dos colonos para o regulamento da
administração; 6). - Recolhimento das importâncias relativas à ven-
da de terra5 e das medições sob rubrica especial, para serem aplicadas
em serviços de colonização 7), - Seleção do quadro de funcioná-
rios; 8), - Utilização das terras para futura titulação definitiva; 9).
- Proib'ção da cessão de direitos ou venda de benfeitorias; 10), -
P!'ojeto e construção de estradas e atendimento aos serviços de
água e luz das sedes das colônias; 11), - Distribuição da quota de
70% a agricultores profissionais e de 30% a outras pessoas interessa-
das, de modo a garantir o aproveitamento total das terras; 12), -
Distr;buição de 10% dos lotes a colonos estrangeiros; 13), - Doa-
ção de sementes selecionadas e estabelecimento de campos experimen-
tais; 14), - Serviço médico e escolar, permanente e obrigatório; 15).
- Serviço e;;tatístico relativo à população agrícola e à produção em
geral (25). Estas são as diretrizes gerais do plano oficial de coloniza-
ção, permanecendo, na essência, o mesmo plano inicial, porem, enri-
quecido com as novas experiências e procurando atender melhor as
objetivos gerais da colonização,
Em fins da década de 1940, o Governo ainda destinava extensas
áreas à colonização, visando atender sobretudo aos interesses e ne-
- 832-

Ivaí e Paraná, numa área de cerca de 300.000 hectares. Ativavam-se


os serviços demarcatórios na zona ao sul e a oeste do município de
Campo Mourão. Haveriam de ser iniciados os estudos para a coloni-
zação das terras do oeste, incluindo os sertões dos baixos rios Ivaí e
Piquirí e do vale do rio Paraná. Continuavam a afluir levas de famí-
lias principalmente para o sudoeste e o noroeste, e o Governo devia
resolver e antecipar-se mesmo aos inúmeros problemas que surgiam,
procurando soluções adequadas para os mesmos. O Estado beneficia-
va-se tambem com o movimento imigratório europeu, contando, na
época, com a colaboração do Comando da 5. a Região Militar, através
do 13.0 R. I., da cidade de Ponta Grossa, para a fase de adaptação
inicial no Paraná, antes da localização definitiva. Crescia o movimento
de migração de nacionais, atraidos principalmente pela crescente va-
lorização das terras.
No que se refere ao plano geral de colonização, o Estado incluia,
na época, dois setores: 1). - O que abrangia as terras do norte e do
noroeste, na região compreendida pelas bacias hidrográficas dos rios
Paranapanema e Ivaí, à margem esquerda do primeiro e direita do
segundo; 2). - A região localizada à margem esquerda do rio Ivaí,
incluindo as terras de Campo Mourão e seguindo até o rio Piquirí.
É possivel constatar em algumas colônias alguns resultados da
aplicação do plano de colonização oficial do Estado. A gleba n.O 3,
da colônia Mourão, apresentava, em 1949, uma população de 610
brasileiros e 9 estrangeiros. A produção pecuária atingia 3.000 ca-
beças. A área cultivada alcançava 1.010 hectares, sendo a área total
de 12.544 hectares. A gleba n. O 1, denominada Santa Maria, da co-
lônia Piquirí, apresentava uma população de 985 brasileiros. A pro-
dução pecuária atingia 6. 300 cabeças. A área cultivada era de 3. 100
hectares, num total de 15.560 hectares. A gleba n.O 3, Cancã, da co-
lônia Cantu, possuia a população de 721 nacionais e 16 estrangeiros.
A produção pecuária atingia 5.010 cabeças. A área cultivada equi-
valia a 1. 077 hectares, num total de 16.823 hectares (26). Devido à
grande procura de terras, estava ocorrendo uma disparidade com os
serviços de demarcação, havendo sempre, nas sedes das colônias de-
marcadas, diversas famílias que esperavam a distribuição dos lotes,
para posterior ocupação e exploração econômica.
Nos últimos meses do exercício de 1950 e no começo de 1951, a
situação r~ferente a terras agrava-se no Paraná. No que se refere mais
diretamente à colonização, verificou-se um completo desvirtuamento

(26). - Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa do Estado por


ocasião da abertura da sessão legislo ord. de 1949 por Moyses Lupion, Go-
vernador
- 833-

dos planos que vinham sendo aplicados pelo Departamento de Geo-


grafia, Terras e Colonização, dentro de uma linha de verdadeira as-
sistência sócio-econômica, haja visto os resultados já obtidos no mu-
nicípio de Clevelândia e nas colônias Jaguapitã, Içara, Centenário,
Faxinal de São Sebastião e nas primeiras glebas das colônias Mourão
e Paranavaí, que contaram com pequenos lotes coloniais. Adotou-se a
divisão de lotes de 500 hectares aproximadamente, sem qualquer pla-
nejamento ou sentido de colonização e sem atender à determinação
das áreas das futuras sedes coloniais, preterindo-se, na aquisIção das
terras, os verdadeiros interessados, que eram os colonos, atendendo-se
aos interesses políticos e à possibilidade de lucro faci! e imediato. A
área de terras devolutas no Norte do Estado era ins.uficiente para
atender aos compromissos assumidos pelo Governo.
O setor dos trabalhos de colonização e, consequentemente, o pla-
no oficial de colonização havia
"sido relegado a plano secundário, absorvido pelos trabalhos
de maior urgência de medição e demarcação de glebas destinadas a
atender à corrida de vendas de terras que se processou nos últi-
mos anos" (27).

Os problemas, que haviam se acumulado, eXIgIam uma solução


imediata e acertada, tornando-se necessária a realização, em diversos
núcleos coloniais, dos trabalhos de arruamento, demarcação de datas
e chácaras, expedição de títulos definitivos de propriedade, constru-
ção de casas para a administração e de escolas, instalação dos serviços
de água e luz e outros. Alem desses serviços administrativos, o Go-
verno teria que enfrentar e solucionar problemas relativos à intrusa-
gem, a movimentos armados, que vão por em perigo a paz social.
O decreto n.O 3.060, de 26 de outubro de 1951, veio regulamen-
tar os trabalhos de colonização a serem desenvolvidos pelo Departa-
mento de Geografia, Terras e Colonização, sendo expedldas outras
instruções em editais, ordens de serviço e circulares. Regularizado o
expediente, procedeu-se à movimentação de requerimentos pendentes
de solução, à expedição de ordens de ocupação, à revisão dos preços,
deparando-se o Governo com o grave problema da localização da
área concedida, procedidos os trabalhos de medição e demarcação,
garantindo-se o direito de propriedade.
Como resultado da ação governamental e da reestruturação do
referido Departamento, foram ativados os serviços de medição e de-
(27). - Mensagem apres. à Assembléia Legislativa do Estado por oca-
sião da abertura da 2'" sessão ord. da 2'" legisl. por Bento Munhor. ia Rocha,
Governador do Paraná. Curitiba, 1952. p. 101.
- 834-

marcação de sedes e sub-sedes de colônias, estando em pleno desen-


volvimento os. de paranavaí, Peabiru, Centenário e Jaguapitã, trans-
formadas em sedes municipais.
Em 1954, o grande problema de concessão de terras devolutas
pertencentes ao Estado foi equacionado, procurando-se soluções jus-
tas e atendendo-se os ob;etivos sociais. Efetuaram-se vistorias para a
verificação das posses, organizou-se o cadastro de ocupantes, fez-se
a constatação de benfeitorias, objetivando a verificação das áreas ocu-
padas e das disponíveis. Estava sendo desenvolvido o levantamento
aerofotogramétrico do Estado, de modo a possibilitar um conheci-
mento mais concreto da realidade.
No que se refere à colonização propriamente dita, foram senten-
ciadas cerca de 33 glebas referentes às colônias Paranavaí, Cantú,
Goio-Erê, Tapejara, Muquilão, Cruzeiro, cidade de Cascavel, núcleo
Rio do Veado e Rio da Areia. Desenvolveram-se os patrimônios de
Içara, Itaguajé, Nossa Senhora das Graças, Interventor, Jurema, Ara-
raruna, Tuneiras, Mamburê, Campina da Lagoa, Pa,to Branco, Co-
ronel Vivida, Vargem Bonita, Santo Antônio, Cascavel e outros. Pa-
ralelamente a estes melhoramentos, procurou-se resolver o problema
dos posseiros, que ainda não haviam requerido as terras, de modo a
legalizar a sua situação.

Continuavam a vir para o Paraná centenas de famílias de colonos


nacionais, principalmente do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e
de São Paulo, passando a fazer parte da comunidade paranaense e
pouco a pouco entrando num processo de integração. Traziam con-
sigo alguns conhecimentos instrumentais e técnicos relativos à vida
agrícola, contribuindo, em parte, para a solução de problemas refe-
rentes à mão-de-obra e à produção em geral. As correntes migrató-
rias dirigiram-se principalmente para o oeste paranaense. Com este
elemento humano estavam sendo lançadas as bases para o desenvolvi-
mento daquela região, com uma economia fundamentada na policul-
tura e em outras fontes de riqueza.

A Fundação Paranaense de Colonização e Imigração já vinha


desempenhando papel importante no sentido da colonização, princi-
palmente contribuindo para o fluxo de capitais, de mão-de-obra espe-
cializada e para a introdução de novas culturas, como a oliveira e o
tungue, aliado à construção de estradas para a circulação da produção.
O
- 835-

A 4 de outubro de 1956, foi aprovado novo plano de colonização


oficial do Estado. O objetivo a ser atingido foi o de possibilitar ao
agricultor a aquisição da pequena propriedade, facilitando os meios
e a obtenção de lucros. Dentro deste planejamento deveria ser dada
prioridade à expedição de títulos referentes a pequenas áreas. Insti-
tucioaalizava-se, assim, o sistema da pequena propriedade agrícola no
Paraná.
No sentido de facilitar a compra e a entrega de pequenas áreas,
o Departamento de Geografia, Terras e Colonização fez publicar as
portarias n. O 55/57 e 56/57, resolvendo, na primeira, recomendar
aos Chefes de Divisões, Seções e Serviços e outros funcionários no
sentido de atenderem com prioridade, a
"todos os pedidos e requerimentos de compras relativos a
lotes coloniais, isto é, com áreas infj!riores a 50 hectares" (28)
o

e, na segunda, determinando ao Assistente Técnico, Eng. Ulysses


Medeiros, ao Chefe da Divisão de Serviços Técnicos, Eng. Ney Pom-
peo Machado, aos Chefes das Seções e outros funcionários, bem como
aos Inspetores de Terras do interior do Estado, para colaborarem em
todos os sentidos com a Divisão de Terras e Colonização do referido
Departamento, objetivando fixar o homem ao solo, prevenir-se contra
o êxodo de populações e possibilitar a distribuição de terras devolutas
agricultáveis, em lotes coloniais, para os verdadeiros interessados em
coloniza-las (29).
Devido ao fenômeno da intrusão e ao tipo de intruso, que estava
se apossando das terras devolutas do Estado, representado, na maioria,
por colonos, o Governo determinou as seguintes providências: 1). _
Autorizar o Departamento de Geografia, Terras e Colonização a en-
caminhar os requerimentos de compra de áreas relativas à formação
da pequena propriedade agrícola, de modo a facilitar o seu imediato
processamento. 2). - Estabelecer que as Inspetorias de Terras rela-
cionassem as posses de boa fé, para fins de registro e cadastramento,
evitando-se novas intrusões e regulamentando as posses, conforme a
legislação vigente. 3). - Determinar que os Inspetores de Terras
efetuassem, com brevidade, as vistorias e o encaminhamento para a
regularização das posses 4). - Ordenar. aos empreiteiros das me-
o

dições das terras devolutas a rápida execução dos trabalhos, conforme


a legislação em vigor. 5). - Determinar que os requerimentos con-

(28). - Portaria nQ 55/57. In: PARANÁ (Estado). Mensagem à Ás--


sembléia Legislativa do Estado por ocasião da abertura da sessão legislo ord o

de 1957 por Moysés Lupion, Governador do Paraná. Curitiba, 1957. p. 119.


(29) o - Portaria
-- 836 -

siderados caducos e já arquivados no Departamento de Terras pudes-


sem ser restabelecidos, conforme o plano de colonização em vigor
(30). O plano previa a organização colonial baseada em lotes míni-
mos de 10 alqueires, devendo ser dado o inteiro apôio do Estado aos
colonos que se estabelecessem com cultura efetiva e morada habitual,
na terra a ser explorada preferentemente pela própria família, sem
contratação de trabalho assalariado.
O desenvolvimento da política de terras e colonização posto em
prática pelo Governo do Estado
"atir.giu no decurso de 1963 as suas principais metas de tra-
balho, fruto da justa e firme orientação imprimida ao Departa-
mento de Geografia, Terras e Colonização - DGTC - que tudo
tem feito dent"o dos limites de sua competência, em defesa e pro-
teção do homem rural" (31).

Restabeleceu-se, no Paraná, desde 1961, um clima de confiança


e tranquilidade na zona rural, indispensavel para o progresso da vida
agrária. O referido Departamento soube superar muitas das dificul-
dades e problemas existentes, dinamizando os serviços de regulariza-
ção da propriedade rural, e sobretudo,
"impôs a certeza de que, o Estado destina suas terras, somen-
te, àqueles que a elas têm direito" (32).

Naquele mesmo ano tiveram prosseguimento as atividades do De-


partamento, que concedeu autorização para serviços técnicos de me-
dições, demarcações e divisões de lotes, vistorias, possibilitando a
instrução de processos de pedidos de compra de terras e de acordos,
em casos de litígio, alem da expedição de títulos de domínio. Alem
do serviço aerofotogramétrico de cerca de metade do Estado do Pa-
raná, abrangendo aproximadamente 100.000 quilômetros quadrados,
desenvolveram-se os serviços de mapeamento de municípios e do Es-
tado o projeto da nova divisão regional do Estado, prosseguindo a ela-
boração do Atlas Geográfico do Estado e da carta de navegação aérea
do Paraná. Ativaram-se projetos e obras referentes a hidrelétricas de

(30). - PARANÁ (Estado). MefTSagem apresentada à Assembléia Le-


gislativa do Estado, por ocasião da abertura da sessão legislo ord. de 1958,
por Moysés Lupion, Governador do Paraná. Curitiba, 1958. p. 111.
(31). - Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa do Estado por
ocasião da abertura da 2~ sessão da 5~ legisl. por Ney Aminthas de Barros
Braga, Governador do Estado. Curitiba, Dep. de Impr. Of.
- 837-

Marmeleiro, Chopinzinho, Clevelândia a Toledo, fizeram-se estudos e


projetos da rede de água e reservatórios de Cascavel, Toledo e Guaira e
efetuou-se a construção de estradas de Santa Teresa a Marmelândia e
Catanduvas a Ouro Verde.
Desenvolveram-se os trabalhos de valorização do sudoeste do Es-
tado, principalmente através do Grupo Executivo das Terras do Su-
doeste do Paraná - GETSOP. Os problemas relativos a terras fo-
ram atendidos pelo Conselho de Desapropriação e Colonização -
CDC, e o respectivo Fundo, tambem encarregado da realização da
política de terras e colonização do Governo do Estado. Devido à efi-
ciência dos trabalhos realizados pelo Departamento de Geografia, T er-
ras' e Colonização,
"a atividade governamental no setor de terras e colonização,
caminha já no rumo de soluções finais para as áreas do Esbdo ... "
(33),

aolicando-se política regulamentadora para dirimir as questões surgi-


das e evitar os conflitos sociais. A Fundação Paranaense de Coloni-
zação e Imigração [F P C I], continuou a regularizar a situação jurídica
dos ocupantes dos lotes coloniais, contribuindo para a solução de di-
versos problemas relativos às terras.
No final do quinquênio de 1961/1965, o referido Departamento,
através da política acertada, que vinha aplicando, conseguiu ver reali-
zados os objetivos programados, trazendo a tranquilidade nas regiões
do oeste e sudoeste do Estado. Atuando como mediador,
"pôde ajustar acôrdos entre proprietá -ios e posseiros de ter-
ras, ... (34)

conseguindo harmonizar interesses e resolver problemas pendentes de


solução. Estes acordos foram realizados. sempre que possíveis, e, nos
casos de dificil solução, o Estado aplicou a desapropriação, efetuada
através do Conselho de Desapropriação e Colonização. Firmaram-se,
por exemplo, diversos acordos na colônia Adelaide, restando a gleba
7, com parte para reserva indígena, e solucionando-se, em grande par-
te, problemas referentes às glebas Boa Ventura, Areia Branca do Tu-
cum e Barro Preto. Não tiveram solução completa as questões de
terras relativas à Faixa de Fronteiras, procurando, entretanto, o Es-

(33). - Ibidem, p. 84.


(34). - PARANÁ (Estado). Mensagem à Assembléia Legislativa do
Estado por ocasião da abertura da 4~ sessão ord. da 5~ legislo por Paulo
Cruz
- 838-

tado entrar em acerto com a União. Restavam ainda, dependendo de


solução final do Supremo Tribunal Federal, algumas questões de ter-
ras pertencentes às ex-concessão da Companhia Estrada de Ferro São
Paulo-Rio Grande e Companhia Brasileira de Viação e Comércio e o
"grilo" Santa Cruz. A Fundação Paranaense de Colonização e Imi-
gração tambem incentivou os trabalhos, juntamente com o IBRA e o
INDA, dinamizando a recolonização de área de cerca de 140.000
alqueires na região da Faixa de Fronteira, incentivando o refloresta-
mento em áreas de sua jurisdição.
Em 1968, resolvidas as questões mais graves, já se encontrava
"pràticamente erradicada a disputa pela terra no Paraná" (35).

o Departamento de Geografia, Terras e Colonização encontrava-


se em condições de complementar a titulação de terras devolutas aos
posseiros, regularizando a posse em larga escala, efetuando o serviço
com toda a segurança e com base no serviço geral de cadastramento.
O Estado, através da sua política de terras, e o Departamento de
Geografia, Terras e Colonização, atualmente Fundação Instituto de
Terras e Cartografia, contribuiram decididamente para a execução de
importantes planos de colonização oficial, favorecendo o desenvolvi-
mento sócio-econômico do Estado do Paraná e criando condições pa-
ra a verdadeira integração das suas regiões e das suas comunidades.

* *
*
4. - CONCLUSÃO.
No presente trabalho foram enfatizados os problemas referentes
a terras no Paraná e os planos de colonização oficial aplicados, pelo
Governo do Estado, a partir da década de 1930. Esta década assinala
a anulação de diversos contratos firmados pelo Governo com Compa-
nhias e particulares, que não cumpriram o que fora estipulado, como
a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, cedido à Com-
panhia Brasileira de Viação e Comércio, revertendo, ao Estado, ex-
tensas áreas de terras, que precisavam ser colonizadas. A crescente
procura de terras, principalmente no Norte do Paraná, a necessidade
de regulamentação judicial da situação dos que haviam obtido legal-

(35). - Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa do Estado por


ocasião da abertura da 2~ sessão ord. da 6~ legislo por Paulo Cruz Pimentel,
Governador do Estado. Curitiba, Dep. de Impr. Of.
- 839-

mente títulos de terras e a ativação da "intrusagem" motivaram a apli-


cação da nova política de terras, mediante a criação de núcleos colo-
niais dentro de novos moldes, com características acentuadamente na-
cionalistas e democráticas, ditadas, inclusive, pelas próprias contin-
gência!> criadas pela 2. a Guerra Mundial, já que as terras destinavam-
se a ser colonizadas por nacionais, estabelecendo-se preços acessíveis e
condições vantajosas de pagamento, possibilitando que um maior nú-
mero de pessoas se tomassem proprietárias.
A questão de terras e a colonização constituiram ponto nevrálgico
das diversas administrações que se sucederam no Paraná, principal-
mente pelas implicações políticas, sociais e econômicas, com reflexos
na conjuntura nacional.
O Departamento de Terras e Colonização, depois Departamento
de Geografia, Terras e Colonização, teve atuação decisiva na implan-
tação e desenvolvimento dos planos de colonização oficial, dirimindo
problemas e criando condições para o Estado exercer o papel de me-
diador e conciliador de interesses.
A nova política de terras contribuiu mais ainda para a migração
de nacionais, vindos de outros Estados, principalmente Minas Gerais,
São Paulo e Rio Grande do Sul, concorrendo para a constituição de
variadas comunidades paranaenses. Atualmente, o problema é co-
nhecer em que medida estas comunidades estão realizando a sua in-
tegração.
Não resta dúvida que, nos planejamentos de colonização ofi-
cial, procurou-se realizar uma reforma agrária, fundamentada na pe-
quena propriedade, sem contar com as distorções havidas, em alguns
governos, e com relação a certas colônias, onde se constituiram lotes
de cerca de 500 hectares, perdendo-se, inclusive, o sentido da ver-
dadeira colonização.
Mesmo havendo estes problemas, foram encontradas soluções ade-
quadas, sendo possivel, através de uma legislação saneadora e da ação
vigorosa do Governo, criar um clima de paz e de justiça social.
Atualmente, a Fundação Instituto de Terras e Cartografia, en-
carregada de resolver os problemas de terras no Paraná, continua a
exercer uma política bastante dinâmica e acertada, contribuindo para
o exercício do justo direito à propriedade.

'" '"
'"
- 840-

INTERVENÇOES.

Da prof.a Diana Maria de Faro Leal Diniz (Universidade Federal de


Sergipe) .
Pergunta:
"Qual o critério adotado pelo Governo no que diz respeito à com-
pra de terras pertencentes aos grandes proprietários?"

Do Prof. Geraldo Batista de Araujo (Universidade Federal do Rio
Grande do Norte).
Indaga:
"A Fundação Instituto de Terras e Cartografia exerce uma efe-
tiva fiscalização a fim de que a terra distribuida seja realmente pro-
dutiva?"

Do Prof. Humberto da Rocha Souza (Universidade Federal de Ser-
gipe) .
Pergunta:
"Qual a dimensão dos módulos quando da colonização no Norte
do Paraná e na área de Paranaguá?
Houve desdobramento (divisões) dos lotes com tendência a for-
mar minifúndios?"

* *
*
RESPOSTAS DA PROFESSORA ODAR REGINA GUIMARÃES
COSTA.

Respondeu:
À prof.a Diana Maria de Faro Leal Diniz.
"O Governo do Paraná aplicou, a partir da década de 1930,
- 841-

particulares, pelo inadimplemento das cláusulas contratais, revertendo


ao patrimônio do Estado, grandes extensões de terras que se manti-
nham improdutivas. A aplicação de novos planos de colonização ofi-
cial, aliada à colonização efetiva, como aquela realizada pela Compa-
nhia de Terras Norte do Paraná, contribuiu para a implantação de
uma verdadeira reforma agrária no Paraná, fundamentada no sistema
de pequena propriedade. A reforma agrária surtiu efeito tambem, co-
mo elemento dinamizador, sobre aquelas propriedades pertencentes aos
grandes proprietários, muitos dos quais procuraram, na medida do
possivel, torna-las mais produtivas". .

Ao Prof. Geraldo Batista de Araujo.
"Atualmente, a Fundação Instituto de Terras e Cartografia, encar-
regada de resolver os problemas de terras do Paraná, continua a exer-
cer uma política bastante dinâmica e acertada, zelando, principaLmen-
te, pelo exercício do direito à propriedade. Porem, a maior parte das
terras já distribui das está sob o controle e a jurisdição das Prefeitu-
ras Municipais, cabendo aos próprios municípios o incentivo à sua
produção. "

*
Ao Prof. Humberto da Rocha Souza.
o decreto n.O 8.564, de 17 de maio de 1939, estabeleceu, no
seu art. 1.0, que a Secretaria de Obras Públicas, Viação e Agricul-
tura ficaria autorizada a organizar e efetuar trabalhos de colonização
em terras do domínio do Estado nos municípios de Londrina, Guara-
puava e Paranaguá. O art. 4.° do referido decreto determinou que a
área dos lotes deveria variar entre 10 e 200 hectares. Pouco a pouco,
este plano foi sendo aplicado em outras regiões do Paraná, firmando-
se o sistema da pequena propriedade, havendo, assim, a tendência a
se formarem alguns minifúndios"
A PROPRIEDADE RURAL NO PROCESSO DE
URBANIZAÇÃO NA ZONA DA CAMPANHA
RIOGRANDENSE (*).

NADIR DOMINGUES MENDONÇA


das Faculdades Unidas de Bagé (Fundação Attila
Taborda). Bagé. (RS.).

INTRODUÇÃO.
o presente trabalho tem como objetivo comunicar o resultado
de uma pesquisa.
O problema partiu da preocupação em saber, porque tendo a re-
gião da Campanha riograndense uma alta participação na economia
estadual, seus centros urbanos tiveram um desenvolvimento menor do
que outros do resto do Estado, não servindo de polos de atração, em
contraste com outras regiões riograndenses.
Por ser a maior renda, desta região, oriunda do setor agrope-
cuário, a propriedade rural foi o enfoque de nosso estudo, sem no
entanto, desconhecer, a existência de outros fatores.
A metodologia utilizada foi o estudo comparativo entre a zona
da Campanha e as demais regiões do Estado, estabelecendo médias,
para estas. Usou-se como termos de comparação a renda interna, a
densidade populacional e alguns indicadores de urbanização.
A primeira parte deste trabalho, aborda pois, os aspectos acima
explicitados, enquanto a segunda tenta indicar as causas da implica-
ção da propriedade rural neste fenômeno.
A última parte trata das conclusões.
(.). - Comunicação apresentada na 3" Sessão de Estudos, Equipe C,
DO dia 6 de setembro de 1975
- 844-

..


... o

." •
...
'"
EST.tDO 110
IUO GRANIll DO SUL
. .•
... ""jo IIUNICtNl
MIe_' -Il10 ... ,0,. MOIIO""UI :

~-..... ...-. o

Entende-se por zona da Campanha, a 14.a micro-região do Rio


Grande do Sul, dela fazendo parte os seguintes municípios: Alegrete,
Bagé, Cacequí, Dom Pedrito, Itaquí, Quaraí, Rosário do Sul, Santana
do Livramento, Santo Antônio das Missões, São Borja, São Gabriel e
Uruguaiana.
O período tem como limite, desde os primórdios da colonização
até o ano de 1970, fazendo-se coincidir com o último censo, por ter o
estudo se baseado em dados estatísticos.
* *

I.
*
ESTUDO COMPARATIVO DO DESENVOLVIMENTO
DA CAMPANHA COM AS DEMAIS REGIÕES DO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.
- 845-

ploração da terra com base na pecuária de corte e na criação de ovi-


nos. A orizicultura e a triticultura completam o quadro de utilização
do solo, nesta zona.
Observada a situação dessa região, dentro do quadro riogranden-
se, verifica-se que a renda oriunda do setor agropecuário assume um
papel de destaque dentro da economia do Estado.
Segundo o Censo Agropecuário de 1970, o valor da produção de
arroz, nesta região, foi de Cr$ 118.959. 134,00, representando 27,5 %
do total do Estado. O valor da produção do trigo, neste mesmo ano,
foi de Cr$ 94.604.310,00, significando 13,4% do Rio Grarnde do
Sul.
O coteio do valor da produção orizícola e tritícola da Campanha
com o do Estado, com destaque dos percentuais de participação, per-
mite estabelecer um confronto com outras regiões do mesmo.
Observando-se os quadros abaixo, transcritos de Informações so-
bre o Estado do Rio Grande do Sul, publicação da Secretaria de Co-
ordenação e Planejamento, podemos demonstrar a afirmação acima e
nos permite verificar a variação percentual do ano 1969/1970 com os
dados expressos inicialmente.

Qaudro I.

Produção de a:roz.
Micro Cidades que mais produ-
Região Toneladas % US $ % zem.
Itaquí, Uruguaiana, São
14 322.989 26,13 19.272.288 26,7 Borja, São Gabriel, Ale-
grete.
12 164.969 13,35 9.190.916 12,7 Santa Vitória do Palmar,
Arrôio Grande, J aguarão.
10 153.460 12,42 8.904.401 12,4 Camaquã, Tapes, São Lou-
renço.
8 152.839 12,77 9.163.573 12,7 Cachoeira do Sul, Rio
Pardo, Butiá.
87.356 7,07 4.943.942 6,9 Viamão, Guaiba, Barra do
Ribeiro.
Sub-
total 881.613 71,74 51.475.120 71,4
Esta-
do 1235.896 100;00 72 .124 .990 100,0
- 846-

Quadro 11.

Produção do trigo.
Micro Cidades que mais produ-
Região Toneladas % US S % zem.
15 142.140 13,05 14.480.459 13,3 Cruz Alta, Santiago, Santa
Bárbara do Sul.
16 133.000 12,28 12.482.758 11,5 Giruá, Santo Ângelo, Ca-
tuipe.
21 126.153 11,58 13.050.310 12,0 Palmeira das Missões, Pas-
so Fundo, Carazinho.
14 124.136 11,39 12.784.643 11,7 São Borja, Santo Antônio
das Missões, Bagé.
19 111.007 10,19 11.426.823 10,5 Erechim, Campinas do
Sul, Getúlio Va.·gas.
Sub-
total 637.236 58,49 64.224.993 59,0
Es-
tado 1.089.412 100,00 108.950.690 100,0
Fonte DEE - 1969.

A importância das lavouras de arroz e de trigo, dentro do con-


texto econômico riograndense, pode ser observada através do quadro
abaixo, transcrito igualmente de Informações sobre o Estado do Rio
Grande do Sul publicação da Secretaria de Coordenação e Planeja-
mento.

Quadro III.
Principais produtos agrícolas do Rio Grande do Sul.
Produto Toneladas % Valor US S %
Trigo (grão) 1.464.830 19,9 141. 892.840 23,6
Arroz (c/casca) 1.459.596 10,9 87.286.379 14,5
Milho 2.384.198 17,7 76.405.012 12,7
Soja 968.148 7,2 54.735.038 9,1
Mandioca 3.682.016 27,4 46.169.323 7,7
Feijão (grão) 236.932 1,8 30.303.888 5,0
Fumo (folha) 98.114 0,7 22.637.206 3,8
Uva 403.188 3,0 16.690.363 2,8
Cana de açucar 1.227.020 9,1 3.738.479 0,6
Sub total: 11.924.042 88,7 479.858.440 79,8
Fonte: DEE - 1970
- 847-

No que se refere à pecuária, procuramos enfocar a bovinocul-


tura e a ovinocultura, estabelecendo confronto entre o valor de produ-
ção da região em relação ao Estado.
Segundo o Censo Agropecuário de 1970, o valor da produção
bovina, na zona da Campanha foi na ordem de Cr$ 994.733.080,00,
significando 34,2% do total do Estado, ao mesmo tempo que o de
ovinos foi de Cr$ 152.213.830,00, representando 50,2% do Rio
Grande do Sul.
Confrontando o valor da produção de bovinos e ovinos do Es-
tado, podemos perceber a importância destes produtos, em relação ao
quadro geral da pecuária.

Quadro IV.

Pecuária.
Número de cabeças e valor por espécie no Rio Grande do Sul - 1970.
Espécie Efetivo em 31.12.70 % /total Valor Cr$ % /total
Asininos 18.440 0,07 1.520.420 0,04
Bovinos 12.416.230 45,0 2.906.209.140 84,2
Caprinos 256.300 0,9 5.291.490 1,51
Equinos 1.314.910 4,8 172.843.000 5,0
Mua:es 147.340 0,53 18.767.990 0,55
Ovinos 13 .392 .900 48,7 303.064.340 8,7
Total 27.546.120 100,00 3.4:>7.696.380 100,00

Fonte: Anuário Estatístico do R. G.S. - 1971.

Verificada a posição de destaque da região da Campanha na eco-


nomia gaucha e sabendo-se que o Estado do Rio Grande do Sul tem
se destacado no cenário nacional pela sua excelente produção agro-
pecuária, detendo seu rebanho bovino o 2. 0 lugar no Brasil, enquanto
o ovino ocupa o 1.0 lugar, muito distanciado dos demais Estados e
tendo o 41rroz gaucho oma boa demanda no mercado externo, era de
se esperar que a 14. a micro-região, tivesse um desenvolvimento urbano
proporcional a significativa participação na Renda Interna do Estado.
Tal não acontece, conforme tentaremos demonstrar através de
levantamentos de alguns indicadores de melhoramentos urbanos e a
utilização da mão-de-obra, em que se correlacionou os percentuais
obtidos na região da campanha com uma média estabelecida, para o
estado,
- 848-

Quadro V.

Melhoramentos Campanha Demais Regiões Total Estado


urbanos. nQ absolutos % /pop. n Q absolutos % Ipop.
Leitos em hos-
pitais. 1 .788 0,33 27.614 0;40 29.402
Automóveis 12.487 2,3 148.208 2,1 160.689
ônibus p. 22/
28 passageiros
e mais de 28
passageiros 213 0,03 4.839 0,06 5.052

Fontes: Censo Demográfico - 1970.


Anuário Estatístico - RGS - 1971.

Quadro VI.

Melhoramentos Campanha Demais Regiões Total Estado


urbanos. n Q absolutos % /pop. nQ absolutos % Ipop.
Abastecimen-
to d'água,
prédios liga-
dos rede geral 72.606 65,7 988.228 82,3 1.060.834
Iluminação elé-
trica nQ de li-
gações 51.561 48,0 624.606 52,0 676.167
Instalações sa-
nitádas-esgo-
to-Fossa séptica 27.610 25,7 327.719 27,3 355.329
Televisão nQ de
aparelhos 11. 732 10,9 292.591 24,3 304.323
Geladeira 32.521 30,2 393.643 32,7 426.164

Fontes: Censo Demográfico - 1970.


Anuário Estatístico - RGS - 1971.

Da análise dos quadros V e VI inferimos que o grau de urbaniza-


ção
..-=. 849 -

população sobre a do Estado e que se distancia significativamente das


demais regiões. Deveremos considerar muito expressivas as diferen-
ças de percentuais entre os melhoramentos urbanos da Campanha e
das demais regiões do Estado.

Quadro VII.

População.

Micro Porcentagem S/a do


Regiões Citadina Rural Total Estado
1 1.494.440 294.780 1.789.220 24,46
2 64.900 184.350 249.250 3,41
3 28.130 140.640 168.770 2,31
4 142.980 179.580 322.560 4,41
5 24.980 153.160 178.140 2,44
6 38.150 161.530 199.680 2,73
7 47.060 232.220 279.280 3,82
8 102.960 180.700 283.660 3,88
9 123.460 137.170 260.630 3,56
10 203.010 256.640 459.650 6,28
11 101.460 48.440 149.900 2,05
12 31.230 37.670 68.900 0,94
13 29.210 135.220 164.430 2,25
14 319.790 219.040 538.830 7,37
15 88.970 132.820 221.790 3,03
16 55.870 121.130 177.000 2,42
17 55.700 362.370 418.070 5,72
18 35.300 259.070 294.370 4,02
19 83.790 339.920 423.710 5,79
20 33.050 84.900 117.950 1,51
21 94.850 110.920 205.770 2,81
22 10.000 34.470 44.470 0,61
23 12.230 91.230 103.460 1,41
24 44.380 150.620 195.000 2,67
Estado 3.265.900 4.048.590 7.314.490 100,00
Fonte: Anuário Estatístico do R·G.S.
- 850-

Quadro VIII.
Mão-de-obra. População economicamente ativa.
População econo- Campanha Demais Regiões Total Estado
micamente ativa nQ abso- % pop. n Q abso- % pop.
lutos ativa lutos ativa
População eco-
nomicamente
ativa na pecuá-
ria, agricul-
tura, pesca 166.362 35,8 2.102.573 46,1 1.044.760
População eco-
nomicamente
ativa na indústria 23.454 14,0 354.673 16,8 378.127
Fonte: Censo Demográfico - 1970.

Aanálise do quadro VIII nos indica que a mão-de-obra utilizada


na agropecuária e no setor industrial, é em níveis inferiores à média
das demais regiões do Estado.
Observando o gráfico das regiões polarizadas concluimos que os
municípios da Campanha têm um fraco interrelacionamento, estabele-
cendo suas relações diretamente com Porto Alegre, sem haver uma
hierarquia entre os mesmos. Encontraríamos explicação, para este
fenômer.o, em terem os municípios desta região, demandas semelhan-
tes eonde a mão-de-obra apresenta índices muito baixos.
*
Sintetizando, tentamos na primeira parte deste trabalho, demons-
trar que a região da Campanha riograndense tem uma alta participa-
ção na renda interna do estado, em contraste com o grau de urbani-
zação, que é inferior à média das demais regiões.
• •
*
11. - IMPLICAÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL NO
PROCESSO DA URBANIZAÇÃO NA ZONA DA
CAMPANHA.

Por ser, nesta região, a renda oriunda do setor agropecuário su-


perior à rendIA
- 851-

REGIÕES POLARIZADAS E2 !!2 ~ ~ ~.


- 852-

processo histórico da ocupação das terras;


posição geográfica e acessibilidade;
utilização dos recursos humanos.
A conquista das terras do sul deu-se pela ação das armas, en-
quanto a consolidação desta conquh.ta, efetiva-se através das conces-
sões de sesmarias.
Estas, multiplicam-se no segundo quartel do século XVIII. O
limite de três léguas previsto pela legislação, era contornado pelas ali-
anças de família ou por burla dos semeiros, conforme Alcides Lima:

"As sesmarias concedidas multiplicaram-se ~ssombrosa e


desordenadamente. Em breve todos os habitantes quiseram ser
estancieiros. A capitania foi retalhada em propriedades extensas.
A lei das sesmarias que mandava conceder apenas 3 léguas de
campo, foi iludida, violada e desprezada pelos sesmeiros e pel03
govemado~es que faziam conces:)ões largas e arbitrárias. A
grande abundância de gados, requerendo grandes extensões de
campo para cria-los, incitava à violação da lei das sesmarias e
como que justificava as grandes concessões. Os indivíduos não
escrupulizavam mais. Requeriam sesmarias não só em seus r,omes
como ainda no nome das mulheres, dos filhos e filhas, de crian-
ças que estavam no berço e das que ainda estavam por nascer"
(1) .

Surgiram sesmeiros de vanas procedências, comandantes milita-


res, pessoas que haviam prestado serviços à Coroa, oficiais e soldados,
e por serem concedidas sem maiores formalidades, a distribuição pro-
cessou-se desordenadamente.
Não podemos fugir de, em considerando à luz da época e do
meio, reconhecer a necessidade desta estratégia, para assegurar atra-
vés do povoamento, o domínio efetivo das
- 853-

As charqueadas produzindo movimento de exportação e circula-


ção monetária têm sua parcela de responsabilidade no crescimento ur-
bano do século XIX.
Em 2 de dezembro de 1884 é inaugurada pelo governo imperial,
após 17 anos de projetos e obras, a ferrovia Rio Grande-Bagé.
A ligação ferroviária entre a fronteira oeste e o porto de Rio
Grande efetivou-se pela estrada para o sul. De Bagé a São Gabriel
foi inaugurada 0m 8 de outubro de 1900 uma ferrovia.
A ferrovia Porto Alegre-Uruguaiana começou a ser construida
em 21 de dezembro de 1877, mas somente em 22 de novembro de
1907 a viagem podia ser feita até Alegrete e no mês seguinte até Uru-
guaiana, iniciando a viagem em Cachoeira, daí até Porto Alegre o
percurso era feito por via fluvial. O eixo Porto Alegre-Uruguaiana
ficou pronto somente em 28 de janeiro de 1911.
Livramento ligou-se a este eixo em 30 de outubro de 1910.
A linha entre Alegrete e Quaraí foi concluida em 1939.
O desenvolvimento lento das vias férreas que permitissem a li-
gação da região da fronteira com Porto Alegre e Rio Grande fez com
que quase todo século XIX, o quadro urbano da faixa fronteiriça so-
fresse a influência do Prata. Itaquí, Uruguaiana e Livramento mais
diretamente.
No final do Império, a região da Campanha perde para a região
colonial a hegemonia econômica que vinha detendo no Estado.
O regime de pequena propriedade e a facilidade de comunicação
pelo tráfego ferroviário com São Paulo e Porto Alegre, o surto indus-
trial da região colonial, provoca um crescimento urbano e demográ-
fico com aumento consideravel de produtividade e renda nesta zona,
em contraste com a zona da Campanha, que passa a ter um rítmo lento
de crescimento. Não há na Campanha aumento de centros urbanos,
a densidade demográfica tem índice de elevação inferior à média do
Estado.
A indústria frigorífica estrangeira com produção bastante variada,
produzindo carnes frigorificadas, enlatados e sub-produtos como ex-
trato de carne, salsicharia e outros destina-se, em sua maior parte ao
mercado externo. Sofre como a maioria dos produtos exportáveis do
Brasil, séria concorrência dos similares estrangeiros.
O comércio e a indústria de carnes
- 854-

A cnaçao de ovinos tambem vem crescendo em quantidade e


qualidade, permitindo uma lotação maior da pastagem do que a de
bovinos.
Como a carne, o comércio de lãs movimenta mão-de-obra no pe-
ríodo da safra, para tosquia, frete, beneficiamento, enfardamento e
exportação e um declínio na demanda de mão-de-obra na entre-safra.
O orizicultura e a triticultura estão mudando o quadro pastoril da
Campanha, não sem vencer a luta dos altos arrendamentos e a resis-
tência de mudar as pastagens em lavoura.
Questão em aberto, se essa mudança trará maiores vantagens eco-
nômicas para o Estado. Trata-se de área pastoril .tradicional, com boa
demanda de seu produto no mercado externo.
Tanto o trigo como o arroz encontraram na Campanha condições
naturais propícias para seu desenvolvimento e exigem mão-de-obra
mais numerosa que a pecuária, apesar da mecanização da lavoura.
Mas é sobretudo na época do plantio e da colheita que há necessidade
de recursos humanos, encontrado com bastante disponibilidade.
De pequena expressão, a população rural em relação a total, as-
aim tem permanecido, apesar da alteração que o quadro rural vem
IIOfrendo. O trabalhador rural não tem opção profissionalí ou se toma
assalariado, muitos temporariamente, ou tem que migrar para os cen-
tros urbanos.
Os fatores que levantamos como responsáveis pela baixa influên-
cia polarizadora e o pequeno número de centros urbanos na Campa-
nha, então, vinculados à sua estrutura agropecuária.
Não desconhecemos que estamos analisando apenas com um apec-
to da realidade, outras variáveis estão envolvidas, mas nosso objetivo,
neste trabalho, limita-se a apreciar as implicações da propriedade rural
no processo da urbanização na zona da Campanha.
Apontamos assim, os latifúndios e o regime de exploração das
terras, criação extensiva, embora atualmente utilizando a moderna
tecnologia responsáveis pela baixa densidade demográfica em relação
à média do Estado, rarefação da população rural, baixo custo de mão-
de-obra em consequência de sua sub utilização.

* *
*
855 -

IH. - CONCLUSÃO.

As atividades pastoris da Campanha tiveram um papel decisivo


na ocupação das terras e o povoamento definitivo da região, mas a
pecuária extensiva não resultou positiva para o fenômeno da urbani-
zação e em consequência, não favoreceu ao centro comportar-se como
polo de atração.
A sub utilização dos recursos naturais e humanos estão a eviden-
ciar que as atividades agropecuárias, não serviram, nesta região como
fatores de progresso social, apenas representaram a prosperidade eco-
nômica.
Em consequência, poder-se-ia questionar a necessidade da execu-
ção de estratégias de desenvolvimento que:
- resultem no aproveitamento intensivo das possibilidades da
terra objetivando o aumento da produtividade;
- corrijam a defasagem entre a oferta e a demanda da mão de
obra nos municípios da Campanha.
* *
IV. -
*
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS.

ANDRADE (Manuel Cor:eia), Cidade e Campo do Brasil. Editora Brasilien-


se, 1974.
ANUÁRIO ESTATfSTICO DO RIO GRANDE DO SUL, 1970.
ANUÁRIO ESTATfSTICO DO RIO GRANDE DO SUL, 1971.
BALÉN (Jorge), Centro e Periferia no Desenvolvimento Brasileiro. Ed. Di-
fusão Européia do Livro, São Paulo.
CENSO DEMOGRAFICO DO RIO GRANDE DO SUL, 1970.
CÉZAR (Guilhermino), História do Rio Grande do Sul, Período Colonial.
Ed. Globo, 1970.
FERREIRA Filho (Arthur), História Geral do Rio Grande do Sul. Ed. Globo,
1974.
FORTES (Amyr Borges), Geografia Física do Rio Grande do Sul.
GRANDE REGIÃO SUL. Vol. IV, Tomo 11, Fundação IBGE.
INFORMAÇÕES SOBRE O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, Secre-
taria de Coordenação e Planejamento do Rio Grande do Sul.
LIMA (Alcides), História Popular do Rio Grande do Sul.
PRADO et alli, Rio Grande do Sul, Terra e Povo. Ed. Globo.
RAMOS (Tibério Vargas), Rede Ferroviária cumpriu em marcha lenta seu
longo caminho na história. Artigo no "Correio do Povo"
CONFLITO E PARTICIPAÇÃO NO MEIO RURAL.
(A greve da Usina Nova América - 1962) (*) (1).

JOSÉ CLAUDIO BARRIGUELLI


do Instituto Educacional Pi:acicabano. Piracicaba.
(S.P.) .

A crIse da indústria açucare ira no início da década de 60 provocou


alterações. profundas no processo de produção do açucar em quase
todo o mundo. O Brasil, como o segundo exportador mundial do pro-
duto, teve sua economia afetada na medida em que não conseguiu
acompanhar a defasagem preço-produção que se estabelece a partir de
1961 (vide Quadro I).
Até 1962/1963 o açucar atravessava período de extremada es-
cassez, fazendo elevar os preços do produto a índices recordes (vide
Quadro lI). A diminuição da produção em quase todos os paises do
mundo se agrava ainda mais com a quebra da safra cubana, maior ex-
portador mundial, em quase 50%. No Brasil a safra referente ao mes-
mo b:ênio cai em quase 12%, baixando de 56,7 milhões de sacas (do
biênio 61/62) para 51,1 milhões de sacas (no bIênio 62/63). Apesar
dos mercados internacionais serem extremamente atrativos, preços al-
tos, o Brasil não consegue se recompor e é somente a partir da safra
65/66 que a economia açucareira nacional consegue manter um certo
equilíbrio com relação à procura internacional do produto. A dimi-
nuição da defasagem preço/produção é conseguida graças à política
assUmida pelo hemisfério de bloquear economicamente Cuba, resul-

(*). - Comunicação apresentada na 2!l Sessão de Estudos, Equipe F, no


dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - O presente artigo é resultado de pesquisas realizadas em regiões
agrícolas da Alta Sorocabana, tendo como objetivo final avaliar a participação
dos diversos setores sociais agrários no estabelecimento de uma consciência
política de classe. A greve da Usina Nova América, como outros conflitos
existentes na área são por nós entendido como uma demonstração desta ma-
- 858-

tando em vantagens para o Brasil que desta forma capta o mercado


consumidor americano (o maior consumidor mundial).
QUADRO I - Setor Açucareiro no Brasil - milhões de sacas.
S~fras Estoque Inicial Produção Exportação Es. Final
1960/61 9,6 54,2 14,6 6,2
1961/62 6,2 56,7 7,4 10,1
1962/63 10,1 51,1 10,0 5,2
1963/64 5,2 51,4 5,8 7,0
1964/65 7,0 59,6 7,0 12,7
1965/66 12,7 76,0 15,3 27,0
1966/67 27,0 68,6 19,2 26,0
1967/68 26,0 70,3 17,2 25,9
Fonte: Mundo Econômico - Março/Abril 1970.

São Paulo, na qualidade de segundo produtor nacional, sofre as


consequências desta retração do mercado. Internamente a crise se dá
em função de dois fatores básicos: as más colheitas devido a proble-
mas tais como, inadaptação da indústria açucareira aos novos moldes
de produção e desestímulo internacional pela baixa de preços verifi-
cada nos anos anteriores (década de 50). O problema paulista é agra-
vado ainda mais pela política de quotas estabelecida pelo governo cen-
tral na defesa da safra e da indústria açucareira nordestina. O açucar
do centro-sul é produzido em melhores condições que o do Norte!
Nordeste. Com um solo mais fertil e investimentos de capitais na me-
lhoria dos meios de produção, o açucar paulista é produzido com cus-
tos de produção sensivelmente mais baixos que seu correspondente
QUADRO 11 - Preços Internacionais - Cotação Disponível - Bolsa Nova
York - Cents Libra Peso.
Anos Mercado Livre Mercado Preferencial
Mundial (FOB) Americano (CIF)
1960 3,14 5,80
1961 2,91 5,74
1962 2,98 5,82
1963 8,50 7,56
1964 5,87 6,27
1965 2,11 6,12
1966 1,86 6,37
1967 1,95 6,65
1968 1,98 6,90
Fonte Mundo Econômico - 1970.
- 859-

nordestino. Desta forma, no estabelecimento médio dos preços do


produto os usineiros centro-sulistas tinham condições de auferir maiores
ganhos já que o valor da produção era menor no referente aos seus
custos. Assim com uma mesma quantidade de açucar produzido os
usineir~ paulistas conseguiam, em relação com a produção, maiores
ganhos (sem se considerar aqui a qualidade do açucar produzido) .
QUADRO lU - Exportações Brasilei;as de Açucar Demerara, segundo Proce-
dência/Destino - 1960/68 (1.000 sacasj60k).
PROCED~NCIA
DESTINO 1960 1961 1962 1963 1964 1965 1966 1967 1968
PROCED~NCIA
Pe;nambuco 7503 4675 5005 4970 3032 8100 6744 6316 7121
Alagoas 1931 1434 1755 1932 1430 3768 4425 2888 4165
Guanabara 912 922 8
São Paulo 3884 5366 1207 1284 2911 5790 7644 6971
DESTINO
Chile 1378 372 142 1491 1503 1357 2236
EEUU 1724 4887 6026 7032 2727 5437 8275 9946 10443
França 1481 130 71 88 531 1053 728 919
Japão 4084 4311 351 390 220
G. Bretanha 225 255 350 924 2916 311 207
Fonte: Instituto do Açuear e do Aleool.

Paralelamente a isto o açucar sulista estava em franca retração


diminuindo-se as plantações e as áreas cultivadas, como pode-se ver
no quadro IH.
A crise da indústria açucareira não se resumia exclusivamente
numa questão de preços internacionais - já que ofereciam atrativos
dado a alta de preços. A questão fundamental que se coloca é que as
formas em que se repousavam a cultura açucareira não permitiam aos
usineiros e plantadores estabelecerem a partir da exploração da mais-
valia dos trabalhadores rurais processos mais racionais de acumulação
de capital que lhes permitissem reinvestimentos concretos na dinami-
zação dos meios de produção no sentido de sua modernização. Desta
forma o cerne da crise se localizava nas relações de produção, tendo
como o ponto crítico as formas de submissão do trabalho ao capital.
A inadequação do sistema de retenção do sobretrabalho do tra-
balhador rural, em relação aos demais ramos da indústria em expan-
são, levou a Usina Nova América e o complexo "monopolístico" sobre
a qual se apoiava a reter determinados capitais "devidos" aos traba-
- 860-

tempo uma estabilidade relativa do capital variavel aplicado em sa-


lários. O capital retido, que se não movimentado poderia desvalori-
zar-se rapidamente dado o índice crescente da inflação, é aplicado na
ampliação dos meios naturais e materiais de produção (terras, planta-
ções, maquinários, etc.), como uma tentativa de investimento a curto
e médio prazo rendoso dado o fator inflacionário dos preços dos im-
plementos agrícolas e industriais (crescimento do capital fixo através
da desvalorização da moeda a ser paga pelos implementas).
A persoectiva de valorização do caoital fixo a partir do jogo no
processo inflacionário só poderia ser realizado no momento em que o
capital variavel em salários diminuisse em proporção às necess:dades
de reinvestimento. :E: assim que a Usina Nova América passa a reter
os salários devidos e os benefícios sociais de direito dos trabalhadores
(rurals e operários).
Antes, porem, de ,se adentrar às causas imediatas da greve que
eclode na Usina e fazenda Nova América dever-se-á estabelecer a evo-
lucão histórica do complexo monopolístico açucareiro que nela se com-
põe (evolução da propriedade) e as relações que mantem com o "tra-
balho" assalariado da qual se utiliza.
A Usina e fazenda localizam-se atualmente em diversos municí-
pios da Comarca de Assis (SP) e foi adquirida a partir do inventário
realizado pela família Pires, proprietária das quatro fazendas que vi-
riam compor o núcleo inicial do grupo monopolístico Nova América.
Em 1944 estas quatro fazendas pertencentes à família Pires são
adquiridas por Ferdinando Matarazzo e Renato Rezende Barbosa, es-
tabelecendo-se assim uma sociedade que visava explorar a cultura açu-
careira na região. A sociedade Matarazzo/Resende adquire 3.332,34
ha do antigo imóvel Dourado, tradicional latifúndio existente na área.
Da fusão das fazendas, com outras desmembradas do imovel
Dourado, nasce a Fazenda Nova América, núcleo monopolístico dos
Rezende, que mais tarde lhe é incorporada a fazenda Nova Aliança
com 90,78 ha.
Em 1946 Ferdinando Matarazzo vende aos Rezende a parte de
direito de sua sociedade, constituindo-se assim os Rezende nos únicos
proprietários dos meios de produção, controlando a partir de então
os 4.474, 69 ha do complexo agro-açucareiro Nova América. No
ano da crise, 1962, o complexo Nova América estava da seguinte for-
ma consütuido (juridicamente): Fazenda Nova América - 3.332,34
ha; F2.Zenda Nova Aliança - 90,75 ha; Fazenda Nova Walburga -
242,00
- 861 -

Inicialmente a fazenda buscava uma relativa autosuficiência na


produção agro-pecuária, produzindo cereais diversos, mantendo uma
pecuária necessária à satisfação das necessidades locais e tendo como
fonte principal de exploração a cana-de-açucar. Com a formação e
implantação da Usina as áreas disponíveis vão gradativamente ce-
dendo lugar à cana na medida em que a ampliação da capacidade in-
dustrial da Usina se efetiva num consumo crescente de matéria-prima.
É neste mesmo sentido que os Rezende vão adquirir a materia prima
de plantadores regionais que se sentem atraidos pelo mercado consu-
midor próspero e seguro.
Pelo fato da Usina Nova América, e a outra que é construida pelo
grupo no município vizinho, constituir-se na única usina de transfor-
mação num raio de aproximadamente cem quilômetros, os Rezende
têm condições de monopolizar toda a produção açucareira regional,
passando, como consumidores/produtores, a deter a "política dos pre-
ços". Esta monopolização vai implicar diretamente no sentido objeti-
vado do ganho e da acumulação de capital realizado pelo grupo Nova
América.
Em primeiro lugar, dado o fato de que a usina é única na região,
toda a produção que não está inserida no complexo Nova América
(produção do monopólio em si) sofre consequentemente o problema da
determinação dos preços da cana bruta. Os pequenos e médios plan-
tadores ficam sempre à mercê da política estabelecida pela Usina, já
que esta é a única compradora (maior oferta de cana para menor con-
sumo).

O llrtifício usado pelo complexo monopolístico foi a separação ju-


rídica da fazenda (ou das fazendas produtoras) em relação à Usina,
transformando as primeiras em simples "vendedoras" ou fornecedoras
de mate ria-prima tal qual os demais proprietários.

Com os capitais acumulados no setor industrial (retenção de mais-


valia operária) o complexo tem condições de constantemente ampliar os
meios de produção nas fazendas próprias produtoras, rebaixando con-
tinuamente os custos de produção da matéria-prima. Assim os custos
de produção da matéria prima produzida no complexo vão concorrer
com os cu~tos de produção (mais altos) da mesma matéria produzida
pelos pequenos e médios proprietários. A cana produzida pelas fazen-
das do complexo concorrem no mercado de oferta com aquela produ-
zida pelos proprietários livres. É evidente que a Usina sempre alegará
excesso de produção em relação à demanda de cana para a indústria.
A redução do preço é inevitavel, mas como o custo de produção da
cana produzIda pelo complexo é
- 862-

lucratividade possivel (sobretrabalho retido) dos demais proprietários


são canalizadas para o complexo através do referencial preços médios.
Apesar de somente ficarem com uma parcela do sobretrabalho retido,
os pequenos e médios proprietários ainda continuam a plantar cana na
medida em que esta é ainda uma forma de produção segura dada a
contínua procura de matéria-prima efetuada através do complexo.
Por outro lado a Usina não pode rebaixar excessivamente o preço do
produto na medida em que diminuirá exageradamente os ganhos dos
dema~s proprietários impossibilitando-os de reinvestirem nas planta-
ções, que terá como consequência a perda de sobretrabalho indireto
canalizado através dos preços médios do produto na compra da pro-
dução livre.
Em segundo lugar, pelo fato de a região, no período estudado,
voltar-se progressivamente para a pecuária, grandes contingentes de
trabalhadores rurais eram expulsos das velhas fazendas, afluindo para
o complexo açucareiro na busca de empregos, aumentando gradativa-
mente o exército de trabalhadores (e consequentemente a concorrência
entre eles) na proporção em que diminuia os salários (redução grada-
tiva do preço da força de trabalho).
A contínua redução do preço da força de trabalho (ou o equilíbrio
em tomo de um mínimo de salário necessário à sobrevivência) possi-
bilita ao complexo o emprego de mão-de-obra barata e consequente-
mente maior retenção de sobretrabalho . Os maiores índices de reten-
ção de sobretrabalho incidem sempre no trabalho direto agrícola, já
que a legislação em vigor protegia exclusivamente o operário (da Usi-
na) obrigando os patrões ao pagamento de um salario mínimo esta-
belecido. Porem, dado o fato da existência de um grande exército de
mão-de-obra de reserva, não ,só sem quaisquer vinculações empregatí-
cias como aquelas já empregadas na fazenda em trabalhos nos campos,
forçavam sempre a fixação dos preços da força de trabalho operária
naqueles mínimos estabelecidos por lei.

O
- 863-

do de São Paulo tiveram que d!minuir o capital variavel em salários


para poder investir mais nos meios de produção, a fim de aproveita-
rem a alta dos preços do açucar no mercado internacional. Neste
processo não ocorre só o rebaixamento dos salários (dado o aumento
do desemprego na região - aumento da massa proletária desempre-
gada decorrente do decréscimo na taxa de oferta de empregos) como
a Usina uassa a reter salários devidos e benefícios sociais não tribu-
tados. Esta solução "extraordinária" de capital, auxiliada pela cons-
cientização das formas diretas de exploração do trabalho por parte dos
trabalhadores rurais, faz emergir de forma nítida as contradições entre
capital f' trabalho, manifestando-se no movimento grevista.
Os sistemas diretos de retenção do sobretrabalho são questiona-
dos e conscientizados por parte do trabalhador a partir do momento
em que recrudescem as pressões exercidas pelos proprietários dos meios
de produção na utilização do esquema do "barracão". O barracão
como forma de retenção do capital variavel em salários por parte dos
proprietários não permitiu que os trabalhadores recebessem seu salário
em moeda circulante, mas sim o recebimento deste em "espécie": troca
direta.
Com tal artifício os fazendeiros não pagavam, em moeda, o tra-
balho concretizado, mas sim através da prestação de serviços e de gê-
neros alimentícios. O barracão prestava-se: 1). - os operários e
trabalhadores rurais residiam em casas construidas pela fazenda e por
elas pagavam aluguel descontado em fonte; só que se houvesse mais
de uma pessoa sob cada domicílio trabalhando nos próprios da fazen-
da, este indivíduo tinha tambem sua taxa de aluguel descontada em
fonte; 2). - a farmácia existente vendia remédios necessários aos
trabalhadores, apesar de ter os mesmos preços que qualquer farmácia
dos centros urbanos próximos, tinha a utilidade de reter o salário dos
trabalhadores que ali compravam "fiado para descontar no salário",
ao mesmo tempo a Usina auferia pequeno lucro já que as indústrias
farmacêuticas ofereciam os remédios a preço de produção e estes eram
ali vendidos a preço de "praça" 3). - a venda de mantimentos e
roupas era tambem equivalente aos preços da "cidade", ou mesmo
menores, cumprindo a mesma função anteriormente estipulada: reter
os salários (moeda não paga) e consumir os produtos da própria fa-
zenda (cereais, açucar, carne, leite, verduras, etc.) dando ao proprie-
tário um mercado consumidor constante; 4). - clube esportivo cons-
truido pela fazenda para a recreação dos trabalhadores descontando
mensalmente uma taxa de conservação e utilização. Após todas estas
deduções o trabalhador recebia em média de 10/15%
- 864-

lar qualquer capital oriundo de salários na medida em que este con-


tinuamente se desvalorizava dada a alta inflacionária.
Para superar a crise instaurada o rebaixamento (ou não aumento)
dos salários e a contínua retenção deste - por não pagamento - faz
emergir a crise política entre fazendeiros (donos dos meios de produ-
ção) e trabalhadores assalariados (força de trabalho). O cerne da
crise está nas próprias formas de exploração da força de trabalho,
conscientizadas no processo pelos trabalhadores, manifestando-se nas
suas formas usuais: luta por aumentos salariais e pelo cumprimento
da legislação trabalhista em vigor.

A organização do proletariado se dá em função da reivindicação


pelos direitos assegurados em lei e não cumpridos por parte do de-
tentor dos meios de produção (fazendeiro/usineiro), constituindo-se na
justiça dois processos trabalhistas que envolvem aproximadamente 150
trabalhadores contra a Fazenda e Usina Nova América e seu proprie-
tário Renato Rezende Barbosa. A essência do processo trabalhista se
resumia nos seguintes quesitos:
I. - não recebimento de férias, horas extras, domingos, feria-
dos pagos em dobro, abono de Natal, salário mínimo, décimo terceiro,
aumentos resultantes de acordos intersindicais;
lI. - deslocamento de empregados qualificados para atividades e
trabalhos agrícola no corte de cana;
IH. - que os reclamantes foram despedidos sem justa causa;
IV. - contra a jornada de trabalho de 12 horas.
Como as denúncias trabalhistas já vinham sendo efetuadas na jus-
tiça a certo tempo e dado a morosidade dos processos, o Sindicato dos
Trabalhadores na Indústria de Alimentos é procurado pelos reclaman-
tes para que este exercesse pressões junto aos setores governamentais
na solução do impasse. A inoperância das gestões realizadas pelo
Sindicato da classe leva-o a organizar os operários a reivindicarem os
direitos através da greve. A primeira manifestação grevista ocorre em
maio de 1962 tendo sido protelada as suas decisões na medida em que
vislumbrava-se um acordo intersindical para todos os setores açuca-
reiros.

Em julho de 1962, dado o não cumprimento dos acordos inter-


sindicais, o proletariado no complexo monopolístico apoiado pelo Sin-
dicato de classe e demais setores urbanos sindicais promove uma se-
gunda greve envolvendo não mais exclusivamente os operários da Usi-
- 865-

na como tambem os trabalhadores rurais - principal setor de explo-


ração. A greve de julho ultrapassa, quer no nível do operariado como
no dos proprietários, os limites da fazenda transformando-se numa
deflagrada luta de classes entre possuidores e não-possuidores. Esta
luta não só envolverá toda a máquina política de pressão do proleta-
riado, como por parte dos setores burgueses se dinamizará toda má-
quina estatal (local, estadual e federal) como forma de reação à orga-
nização do proletariado (principalmente a partir da adesão de outros
setores da burguesia "teoricamente" não envolvidos na disputa ime-
diata) .
A umao do proletariado fica expresso na Assembléia por eles
realizadas, com o auxílio do sindicato da classe, que convoca não só
os trabalhadores da Nova América como outros setores sindicais lo-
cais - onde recebem apóio da Associação dos Ferroviários de São
Paulo. Como veremos adiante esta assembléia tambem denotará a or-
ganização dos quadros burgueses na reação contra à organização pro-
letária (infiltração de informantes).

Numa cidade pequena como Assis, de aproximadamente 45.000


habitantes, uma assemb~éia político-reivindicatória com a presença de
mais de 300 operários e trabalhadores rurais (segundo relatório poli-
cial feito a pedido do Delegado Regional de Polícia, juntamente com
os proprietários da Nova América, anexado no processo-crime movido
contra os grevistas) cria verdadeira situação de batalha, envolvendo
não só a localidade como estrapola as barreiras locais transformando-
se em verdadeira questão crucial para os grupos (classes) em luta.
Esta extrapolação está nitidamente representada nas adesões às clas-
ses em luta: adesões sindicais para os operários e trabalhadores, e
adesões políticas de setores administrativos conservadores (pessepistas
e udenistas) ao proprietário do complexo monopolístico.
O temário da assembléia, onde é decidida a greve, nos dá uma
idéia significativa dos anseios, da perspectiva e da consciência polí-
tica dos setores trabalhistas:

1. luta contra o Sindicato Rural:


2. lutas específicas:
a). - contra taxa de habitação;
b). - por aumento salarial.
c). - contra violência policial.
3. --
- 866-

Na discussão política que se segue com finalidade precípua de


estabelecer uma diretriz política ao movimento os oradores tendem
a fixarem a emergência de uma organização operária mais dinâmica e
a luta incessante contra o capital, eis o resumo:
que a união do proletariado é temida pelos patrões porque
solapa as bases do capital, que é automaticamente taxado de
"comunista" como artifício para desunir a classe ...
defesa dos movimentos negros como movimento proletário
(o orador era um negro) ...
solicitação de apâio aos ferroviários para auxiliar na pres-
são contra os patrões no cumprimento dos acordos intersin-
dicais (greve geral da classe proletária) ...
convocação para a participação nas passeatas de apôio e os
diversos movimentos grevistas eclodidos no Estado de São
Paulo a ser realizada na capital (apelo à unidade operária)
(2).

Paradoxalmente o movimento grevista de 1962 não pega de sur-


presa o proprietário do complexo monopolístico Nova América, uma
vez que muito bem informado, através da infiltração policial e de
operários que para ele trabalhavam, articula-se de antemão na de-
fesa de seus interesses que, ao pressentir a greve como único cami-
nho possivel, organiza-se estimulando os setores administrativos lo-
cais e membros da classe conservadora a criarem uma frente de "rea-
ção política". Desfraldando a velha bandeira "anti-comunista" junta-
mente com o prestígio que desfruta junto aos setores políticos conser-
vadores (pessepistas e udenistas) mobiliza todos os recursos particu-
lares e estatais que lhe são colocados a dispos.ição para o "enfrenta-
mento" .
A m~bilização de ambos os setores, claramente expresso no pro-
cesso-crime, reflete uma luta de classes conscientemente levada a efei-
to a partir de posições nítidas, manifestando-se neste processo - por
parte das classes expostas. - a necessidade imperiosa de superação do
"estado de coisas vigente".
Esta superação se resume na concretização de dois processos: a).
- a busca de uma unidade proletária na articulação dos apôios sin-
dicais manifestos e na passeata de congraçamento (mobilização popu-
lar para a formação de uma possivel Confederação Geral dos Traba-

(2). - No p~ocesso-crime movido pelos patrões contra os trabalhadores,


esta passeata de unidade proJetaria será usada como argumento para a idéia
de "infiltração comunista", recurso utilizada para caracterizar a "ilegalidade"
- 867-

lhadores) e b). - a burguesia regional (com a imprensa que lhe é


favoravel) articulando-se com os partidos conservadores (UDN, PSP e
PRP) e governo do Estado buscam através da greve defragada estimu-
lar uma crítica mais sistemática à política do governo petebista (o cha-
mado "permissivismo").

Alem de utilizar-se da greve como meio de articulação crítica


contra o governo os elementos da classe dominante local utilizam-se
dos seguintes recursos para a pressão contra o movimento grevista:

- utilização do aparelho repressivo do Estado para reprimir os


insurretos infiltrando elementos da polícia civil e operário a
soldo nas reuniões públicas do operariado ...

- utilização do aparelho repressivo (corpo policial) para im-


pedir os elementos que participavam das reuniões operárias
de entrarem nos próprios da fazenda. A polícia cerca a pe-
dido do proprietário, minutos após a declaração da greve (o
local das reuniões ficava a mais de 20 kilômetros de distan-
cia da fazenda), a fazenda para que esta impedisse a entrada
dos grevistas (estes acampam na entrada da fazenda por mais
de 20 dias) ...

estes elementos que não puderam entrar na fazenda foram


despedidos por terem se ausentado do serviço (principalmen-
te operários já que a greve seria teoricamente dos trabalha-
dores rurais) ...

- outros elementos de liderança operana que ainda estavam


na fazenda, mas que tinham participado de outras reuniões
do Sindicato, não encontraram na "chapeira"
- 868-

justificam a ilegabilidade da greve demonstrando já terem


realizado acordo com o sindicato Rural (3) que não era re-
conhecido pelos trabalhadores rurais e operários ...
ao eclodir a greve abre processo-crime contra os grevistas
destacando os seguintes aspectos:
a). - que eram agitadores políticos fato que poderia ser com-
provado pelas reclamações na justiça (recusa da liderança em fazer
acordo na junta de conciliação);
b). - infiltração comunista já· que o presidente da Federação
dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação, Luiz Tenório de Li-
ma, havia sido apoiado, nas eleições, por Luis Carlos Prestes.;
c). - que os grevistas haviam coagido funcionários, trabalhado-
res rurais e operários a aderirem à greve;
d). - sabotagem na produção e na usina;
e). - ilegalidade da greve por não haver sido comunicada pre-
viamente;
f). - piquetes ilegais.
Na caracterização da ilegalidade da greve e na sua "essência co-
munist:t" utilizam do acordo em separado realizado com o Sindicato
dos trabalhadores Rurais (de tendência fascista), usando mesmo os di-
rigentes desta agremiação como testemunhas de acusação contra os
operários no processo-crime; as passeatas realizadas em São Paulo e
em Assis são consideradas como "mostra do avanço" comunista na
conquista dG poder (clara referência ao "permissivismo" do governo
central) e por último que os operários da usina não podiam fazer
greve e nem apoiar greve já que indústria nada tem a ver com a agri-
cultura (no processo alegam que a fazenda e a usina são entidades

(3). - A luta contra o Sindicato dos Trabalhadores Rurais revela o


n!vel de consciência política da classe. Este Sindicato, auto izado pelo mi-
nIstro do Trabalho - Franco Montoro (PDC), foi organizado pelo ex-depu-
tado José Rotta, ex-presidente da organização conservadora católica Congrega-
ção Mariana e membro ativo do integralismo regional (organizara anteriormente
auxiliado por setores nisseis direitistas o grupo jovem "Aguia Branca" que
tinha como patrono e conferencista Plínio Salgado). Aliando-se ao Círculo
Operário Católico e Sindicato dos Trabalhadores Cristãos organiza na Alta
Sorocabana o Sindicato Rural. Em Assis é acessorado por Ivo Picolo (do Círculo
Católico Operário) e Benedito Castilho com auxílios provenientes da Con-
greção Ma:iana
- 869 -,.

jurídicas separadas - apesar de remanejarem funcionários de uma


para outra sem requalificação em carteira trabalhista).
A crise política instaurada não se localiza exclusivamente em
função dos interesses imediatos do usineiro, mas afeta toda uma par-
cela dos quadros dominantes locais na luta ideológica contra as pers-
pectivas adotadas pelo governo central, como forma de apóio tácito
às correntes conservadoras que visavam uma rápida mudança do "re-
gime". A greve como "bandeirada comunista" é o argumento mais
fartamente utilizado para não só envolver a opinião pública na crí-
tica ao "caos reinante" como uma forma de sensibilizar certos setores
políticos dominantes ainda não definidos com os rumos de desenvol-
vimento político e social a ser tomado ou impressos.
Se por um lado o proletariado buscou a organização de uma Con-
federação Geral dos Trabalhadores como meio imediato de estrutu-
ração da classe na defesa dos interesses políticos e econômicos, a con-
tra resposta dos quadros conservadores foi a organização e mobiliza-
ção de uma frente de combate político ao "permissivismo" político do
governo central (unidade conservadora contra o petebismo no gover-
no).
Dada que a solução da crise na sua continuidade satisfazia plena-
mente aos interesses da elite dom~nante local (fazendeiros e pequenos
industriais), esta sentiu-se forte em alterar os processos de aquisição
da força de trabalho, numa tentativa de ao mesmo tempo superar a
crise política eliminando o foco de sua propagação (o conjunto resi-
dencial da usina) e por outro dar condições futuras para novas formas
de acumulação de capital a partir da retenção de maiores índices de
sobretrabalho .
A superação da crise se dá quando a fazenda expulsa todos os
trabalhadores da vila operária que ela mantinha internamente, já que
obrigada pelos acordos intersindicais a não cobrar taxa de aluguel,
prefere deixar as residências fechadas eliminando assim o foco de ten-
são e de intercâmbio de idéias que ali inevitavelmente se processaria.
Assim os conflitos e as contradições não seriam ali discutidos, jo-
gando para fora dos limites da fazenda, como se isto fosse a solução
concreta, a problemática dos trabalhadores. Esta expulsão no entanto
terá sua razão lógica de ser na medida em que a categoria trabalho
se especifica.
O fato de os operários da indústria açucareira terem uma legis-
lação trabalhista que os protege de certas investidas do capital lhes dá
sempre um grau relativo de consciência sobre seus direitos de traba-
lhador. O
- 870-

tica (tempo-livre onde as relações sociais se processam com maior in-


tensidade) propicia uma conscientização das condições de trabalho,
principalmente no contacto entre trabalhador da usina (operário com
certos direitos) e trabalhador rural que pouca legislação trabalhista
possui para assegurar seus direitos.
A racionalização na aquisição da força de trabalho vem não co-
mo consequência da greve, mas a partir dela é que afIora à consciên-
cia dos proprietários. Se a maioria dos trabalhadores rurais no corte
da cana e no amanho da terra para o plantio eram "camaradas" que
residiam na fazenda sem direito a plantio em benefício próprio (assa-
lariados semanalistas ou mensalistas), a partir da greve, os fazendei-
ros tomam consciência de que é necessário uma nova forma de ad-
quirir a força de trabalho abundante na região. Com o desemprego
provocado pela pecuarização das fazendas o proletariado rural tendia
a aumentar em proporção sempre maior em relação aos empregos dis-
poníveis, transformando-se em mão-de-obra barata, vivendo gradati-
vamente em tomo de um mínimo vital cada vez menor.
A partir de então os fazendeiros passam a contratar não mais
de forma fixa (evitar os direitos trabalhistas) mas sim em períodos
específicos necessários à produção (colheita, amanho, etc.). Toma-se
o processo mais lucrativo já que em termos de racionalização do tra-
balho é justamente neste momento que a categoria se especifica. A
transformação do camarada em volante é um processo de proletari-
zação crescente da massa trabalhadora que corresponde a uma indi-
vidualização da força de trabalho na diminuição dos mínimos vitais
de sobrevivência. Um indivíduo só não consegue mais ganhar para
seu sustento e o de sua família, isto é, não consegue formar e am-
pliar no âmbito familiar a própria classe trabalhadora. Esta indivi-
dualização faz com que cada indivíduo produza o suficiente para si,
obrigando à família volante a mobilizar-se com um todo na produção
a fim de alcançarem um mínimo vital. A liberalização correspondente
à passagem da categoria camarada para a de volante representa uma
racionalização na especificação da própria categoria trabalho.
Na medida em que a família volante trabalha como uma "uni-
dade de produção" na busca do mínimo vital, ela recebe o equivalen-
te de salário que a categoria anterior recebia, só que a quantidade
que ela produz triplicou. Ou seja, o camarada recebia um determi-
nado salário, hoje este mesmo camarada transformado em volante re-
cebe o mesmo só que a força de trabalho aumentou com a inserção
no trabalho de toda a célula familiar. Neste sentido o .fazendeiro
aplica cada vez menos em capital variavel e lucra (retendo o sobre-
trabalho da falIDlia volante) muito mais. O
- 871-

envolve-se mais com o trabalho. Para não responsabilizar-se juridica-


mente com o processo de aquisição contrata a seu serviço um "tur-
meiro" que em nome do fazendeiro, ou de uma quantidade de traba-
lho, contrata nos aglomerados ou bairros rurais próximos o trabalho
volante.
A contratação de trabalho pelo "gato" (ou turmeiro) se realiza
de forma original. Os trabalhadores reunem-se em volta do caminhão
de propriedade do gato e este propõe um preço pela jornada de tra-
balho, se os volantes não aceitarem não terão trabalho na medida em
que fazendeiro algum contrata pessoalmente trabalhadores. Assim os
trabalhadores ficam na dependência dos turmeiros que representam no
ato da compra o fazendeiro. Os fazendeiros não contratam pessoal-
mente trabalho já que o turmeiro é um assalariado indireto. É a par-
tir da exploração do trabalho do volante que o turmeiro consegue re-
tirar seus lucros, assim se vai conseguir para o fazendeiro mão-de-
obra este não pode concorrer com o gato contratando paralelamente
trabalho. Neste sentido o fazendeiro estipula um preço pela produ-
ção determinada (número de homens necessários) e o turmeiro terá
que conseguir a mão-de-obra necessária. Deste preço bruto pelo tra-
balho é que o turmeiro vai retirar seu lucro (do trabalho direto do
trabalhador), assim quanto mais rápido for entregue o serviço, mais
mão-d~-obra terá liberado para novos contratos. O trabalhador não
consegue furtar-se ao trabalho já que a sua diária refere-se quase
sempre à uma quantidade estipulada em um máximo. Para alcançar
o mínimo vital deve produzir o máximo por dia, favorecendo conse-
quentemente ao turmeiro.
Na UNA os turmeiros conseguiram seus meios de produção (os
caminhões e a mão-de-obra) a partir de transformações internas ge-
radas pela própria usina no sentido de racionalização dos custos de .
produção. Os caminhões obsoletos foram vendidos gradativamente
aos seus motoristas. Assim o fazendeiro eliminou uma parte de sua
frota que durante parte do ano (a colheita é realizada normalmente
uma vez por ano) ficava totalmente paralizada, empatando desta for-
ma capitais necessários à ampliação de outros setores da empresa.
Ao adquirirem os caminhões os motoristas passaram a trabalhar
por "conta" facilitando ainda mais à empresa na medida em que pas-
sou a acumular capital retendo parcelas de sobretrabalho destes. Os
contratos com os motoristas são feitos a determinados preços e estes
ao mesmo tempo que carregam volantes, quando nos campos trans-
portam a cana produzida pelos trabalhadores. Assim os turmeiros
recebem um salário ramavelmente
872-

A contratação de trabalho por parte dos turmeiros é facilitada


pela origem comum que mantinham no trabalho na usina. Geralmen-
te os turmeiros eram operários como os demais e gradativamente fo-
ram passando de função sem contudo perderem os contatos com a
massa trabalhadora.
o trabalho volante constitui-se desta forma numa racionalização
do trabalho tendo em vista uma maior retenção de mais-valia rela-
tiva. O fazendeiro ao contratar o turmeiro deixa de ter responsabili-
dade sociais e jurídicas com o trabalho, é o turmeiro quem toma-se
responsavel por isto. Assim o fazendeiro deixa de pagar os benefícios
sociais devidos aos trabalhadores volantes (baias-fria) conseguindo des-
ta forma reduzir significativamente o capital variavel em salários, di-
minuindo consequentemente os custos de produção.
Por fim, para que o exemplo de greve (para que se não faça mais
novas greves) seja lembrado sempre, a Usina Nova América nunca
mais contratou aqueles elementos que dela participaram, estendendo
a sua "maldição" para todas as gerações que se seguiram à dos gre-
vistas ... ("E a maldição cairá sobre ti e juntamente sobre os seus" .) .

* *
*
Bibliografia.

Marx (Karl), lntroduccion a la critica de la eonomia politica Se-ie Comunica-


cion B, ed. esp. 1968.
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nQ 40, Cordoba. 1974.

* *
*
INTERVENÇÕES.

Do Prof. Adernar Martins (Universidade Estadual de Mato Grosso).


Pergunta:
"Quais as perspectivas do Brasil ainda nesta década com a sus-
pensão do bloqueio cubano (açucar)?"
- 873-

Do Prof. Wilson Valentin Biasotto (Universidade Estadual de Mato


Grosso).
Declarou:
"Entendo a farmácia não como uma forma de retenção de capi-
tal dos trabalhadores, mas no máximo uma retenção do lucro. De-
ve-se considerar, segundo penso, uma aplicação de capital por parte
do fazendeiro para a formação de uma farmácia."
... ...

RESPOSTAS DO PROFESSOR JOS:E: CLÁUDIO BARRIGUELLI.

Ao Prof. Adernar Martins.


Resposta: ":E: difícil fazer-se um prognóstico sobre as relações do
Brasil com os EEUU, no referente ao comércio açucareiro, após o
levantamento do bloqueio cubano. :E: provavel a ocorrência de uma
queda dos preços na Bolsa de Nova York que poderia ou não afetar
a economia açucareira nacional. A queda no consumo do produto
por parte do mercado americano talvez não seja demasiadamente acen-
tuado dado os laços político-econômicos que o Brasil tem com os
Estados Unidos. Por outro lado deve-se ver se Cuba es-tá interessada
no mercado americano, já que nesta última década viveu sem ele."

Ao Prof. Wilson Valentin Biasotto.
Resposta: "Realmente. A farmácia não é uma forma de reten-
ção de capital dos trabalhadores, mas sim uma forma que o fazen-
deiro faz para não circular o capital monetário. O pagamento em
espécie e o sistema de "barracão"
FAZENDEIROS E VOLANTES.
(duas categorias sociais em mudança) (*) (1).

JOSÉ CLAUDIO BARRIGUELLl


do Instituto Educacional Piracicabano. Piracicaba
(S.P.) .

Nas sociedades interioranas, principalmente aquelas nas frentes


de expansão (antigas áreas pioneiras do café), onde hoje predominam
a produção pecuarista, são as classes rurais mais significativas (fa-
zendeiros) que procuram capitalizar, enquanto classe, as diretrizes do
desenvolvimento social e econômico, tendo como porta-vozes as clas-
ses médias profissionalizantes e a pequena burguesia comercial.
Este desenvolvimento se faz de modo implícito na perspectiva de
ampliação dos mercados - a cidade se amplia como mercado -
buscando satisfazer de modo direto às necessidades dos centros ur-
banos (industrializados) que polarizam os interesses e a produção de
ambito local.
Ideologicamente as populações interioranas creem que o desen-
volvimento expresso na expansão das forças produtivas seja fruto de
"atitudes objetivas" da classe dominante local (classe esta que se com-
põe, confusamente ainda, de diversos sub-grupos de classe: fazendei-
ros, industriais, pequena-burguesia comercial, profissionais liberais e
burocratas), em nome da sociedade global. Haverá sempre aqui uma
nítida iiubstituição de valores. É a comunidade local que imprime
uma "idéia de desenvolvimento", e não que este seja fruto de um

(*). - Comunicação apresentada na 2\1 Sessão de Estudos, Equipe F, no


dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - As mudanças processadas nas categoriais fazendeiro e volante
fo~am
- 876-

processo mais amplo que engloba significativamente a própria cidade


interiorana como elemento periférico da centralidade do sistema.
Ao lutarem por uma ampliação do mercado e a melhoria de
suas condições (a ampliação dos mercados é tida como a única forma
possivel para a real acumulação de capital - formulação de um ex-
cedente), telldo em vista os interesses da classe dominante local que
busca identifica-los com os interesses da sociedade global (com a ci-
dade interiorana), a ação objetiva dos fazendeiros e dos sub-grupos de
classe que com eles compõem criam as condições básicas para a pene-
tração e ampliação das novas forças produtivas no campo.
Esta penetração é realizada enquanto o fazendeiro constitui-se
numa categoria rural, submetendo-se, enquanto classe, aos interesses
do mercado - do centro de decisão. O conceito de fazendeiro está
aqui ainda preso à própria estrutura do espaço interiorano enquanto
área periférica dos grandes centros de decisão.
Para elucidar a própria categoria fazendeiro é necessário antes
de mais nada analisar sua formação histórica.
Nas áreas de expansão do café, rumo ao oeste paulista, as co-
munidades interioranas se organizaram sobre um tripé econômico ca-
racterístico, todos tendo como fundamento a propriedade rural e a
organização do mercado local. A composição inicial fundou-se em:
a). - grupos sociais envolvidos com a especulação imobiliária que
tenderam à fixação nos núcleos nascentes b). - fazendeiros que
adquiriram grandes extensões de terras boas para o cultivo do café
e cereais; c). - pequenas propriedades normalmente adquiridas por
imigrantes ou seus descentes ("as colônias")
- 877-

custos de produção as áreas abandonadas, inférteis ou "velhas" já per-


corridas pela frente de expansão e ainda produzindo. Assim, no esta-
belecimento de um preço médio do produto, tendo como base a re-
tenção do sobretrabalho dos colonos em relação à produtividade do
solo, os fazendeiros e pequenos proprietários "idealizavam" a formu-
lação de um excedente agrícola na determinação de um ganho signifi-
cativo.
Paralelamente a isto a cidade (o núcleo urbano) desenvolve-se
como mercado local de circulação das mercadorias. Sua estruturação
se baseia fundamentalmente na criação de uma pequena-burguesia
comercial, na prestação de serviços, na organização de uma economia
semi-industrial de âmbito estritamente local e na organização dos qua-
dros burocrático-administrativos. O sentido da dominação política
prende-se ainda às velhas concepções já importadas de outras áreas.
f: no setor de especulação imobiliária que se concentrará a maior par-
te dos coroneis que dominarão a política local. Dada as relações so-
cio-oolíticas que estes coroneis mantêm com o poder central a distri-
buição de cargos públicos e a pers.pectiva de evolução da infra-estru-
tura urbana da comunidade se efetuará segundo padrões nítidos de
uma organização semi-oligárquica.
Os fazendeiros relacionam-se com o setor especulativo-imobiliá-
rio através do parentesco, compadrio ou apadrinhamento político, a
maioria uos especuladores conseguiam a concessão das terras pelo go-
verno do Estado através das ligações efetivas (familiares, principal-
mente) que com ele mantinham. A distribuição e venda das terras
obedecia a um critério tambem pessoal favorecendo consequentemen-
te àqueles mais chegados aos especuladores. Assim quando a elite ur-
bana procurava defender os interesses da comunidade como um todo
(ampliação da infra-estrutura urbana) visava antes de mais nada de-
fender os interesses dos fazendeiros, e não de todo o setor agrícola.
Neste momento histórico o fazendeiro é ainda o proprietário que
reside na prooriedade dirigindo-a pessoalmente, cabendo aos coroneis
na cidade a defesa de seus interesses. Os fazendeiros outorgavam, por
assim dizer, aos "coroneis"
- 878-

dos cafeicultores e no ambito político - na política municipalista -


como sustentáculo da oligarquia do café).
Com o enfraquecimento das terras e consequentemente o aumen-
to dos custos de produção agrícola em relação às novas frentes pio-
neiras (principalmente Norte do Paraná), as regiões mais antigas sen-
tem uma diminuição na sua capacidade de reter capitais e ampliar os
ganhos. Fixam-se estes ganhos exclusivamente na retenção do sobre-
trabalho dos colonos, revestido como sobreproduto agrícola. Conse-
quentemente a perspectiva de acumulação de capital torna-se negati-
vista em relação ao processo acumulativo anterior. A rotatividade
agrícola recem inserida e a mudança constante dos produtos efetiva-
dos não altera o processo na medida em que a colheita de um pro-
duto muito requisitado pelo mercado pode dar altos ganhos em uma
determinada safra, em outras poderá haver diminuição sensivel nos
preços dada a grande concorrência entre os produtores. Em termos
médios, de ano para ano, o fazendeiro (e mais dramaticamente ainda
os pequenos proprietários) não consegue ampliar seus ganhos, man-
tendo sempre sua lucratividade em torno da retenção do sobretrabalho
dos colonos.

Dois fatores básicos impedem a ampliação dos ganhos e conse-


quentemente a dinamização dos meios de produção: em primeiro lu-
gar a contínua política de ampliação dos meios naturais de produção
(aumento da propriedade rural na busca de terras férteis que possibi-
litasse uma maior produção com uma quantidade mais ou menos cons-
tante de trabalho) cria o impasse para o fazendeiro que deverá inver-
ter excessivos capitais na propriedade para o aumento de sua produ-
tividade; em segundo lugar, o trabalho do colono que até então lhe
possibilitava altos ganhos torna-se agora pouco lucrativo, na medida
em que tem que manter um capital variavel em salário não compativel
com o montante da produção. A aparente estagnação da fazenda é
provocada basicamente pela não alteração nas relações sociais de pro-
dução.
A partir do momento em que o fazendeiro consegue superar cer-
tas contradições internas realiza um duplo movimento na busca da
ampliação de seus meios de produção: por um lado passa à policul-
tura, dividindo a propriedade agrícola em diversas culturas e por ou-
tro diminui o capital aplicavel em salários ao se modificarem as con-
dições de aquisição da força de trabalho. Situa-se neste momento a
passagem do trabalho do colono (regime do colonato) para o de ca-
marada. A liberalização da mão-de-obra rural dos laços que o pren-
diam à fazenda (economia de subsistência familiar) cria condições
para Q
- 879-

aplicação de capital em salários e por outro estabelecendo uma faixa


de consumIdores locais já que o camarada não desenvolve uma eco-
nomia de subsistência paralelamente ao trabalho assalariado.

A única relação que se estabelece entre fazendeiro e camarada


é o da venda da força de trabalho por parte deste e o recebimento do
preço correspondente: o salário. Se numa primeira fase o fazendeiro
retinha o sobretrabalho do colono ao não lhe pagar as horas (e à pro-
dução) de trabalho dispendidas em sua plantação pelo fato de que o
colono podia usar parte de seu tempo em benefício próprio (domin-
gos e feriados), nesta segunda fase o fazendeiro simplesmente paga-
lhe um salário pelas horas estipuladas de trabalho concreto realizado.
A retenção do sobretrabalho se dá de forma mais racional na me-
dida em que o camarada não está preso à fazenda. Os camaradas
concorrendo entre si provocam continuamente um rebaixamento dos
salários, o que propicia ao fazendeiro a diminuição dos custos de pro-
dução.

A passagem do trabalho assalariado do colono para o trabalho


assalariado camarada é reflexo de uma racionalização do sistema ten-
do em vista a ampliação dos ganhos dos fazendeiros. O camarada
contudo revela antes de mais nada não uma generalização definitiva
do proceso de trabalho, mas sim é justamente a passagem para um
estágio superior: o trabalho assalariado volante. A generalização do
trabalho camarada só é possivel na medida em que o campo, princi-
palmente a grande propriedade, especializa-se num ramo de produção
onde o trabalho é pouco requisitado: a pecuária.
O surgimento da fazenda de gado, destruindo as casas e expul-
sando os colonos das terras agrícolas, faz emergir um contingente de
mão-de-obra flutuante que se dirige ora para as fazendas menores e
médias propriedades que ainda se dedicam a produzir gêneros básicos
(cereais), ors para os bairros rurais produzindo neles um crescimento
urbano progressivo. Apesar de uma intens.ificação do êxodo rural
este não chega a constituir-se num processo de escasseamento de mão-
de-obra que pudesse reduzir a tal ponto os recursos humanos de tra-
balho que fizesse inverter o mercado de trabalho determinando um
aume3to nos índices salariais (oferta de trabalho ser menor que a
nrocura). que obrigaria o fazendeiro a dispender mais capital em sa-
lários. Pelo contrário, como o processo de "pecuarização"
- 880-

pital. Desta forma a média propriedade dedica-se a investir, ou re-


investir, na propriedade no sentido de ampliação dos instrumentos
de trabalho e dinamização dos meios de produção com a inserção de
tecnologia avançada - máquinas, implementos, adubos, etc. Este
reinvestimento só é possivel na medida em que o médio proprietário
deixa de aplicar capital variavel na aquisição de força de trabalho e
na medida em que o trabalho camarada oferece maiores oportuni-
dades para a retenção de uma taxa maior de sobretrabalho. A espe-
cialização da atividade agrícola significa a produção racional com
sentido de não concorrência entre produtores em determinadas faixas
ou classes sociais rurais. Se o fazendeiro agora é investido da função
de "boiadeiro" e busca ampliar continuamente seus meios de produ-
ção (terras) como forma de especializar-se num ramo de produção
nual, o médio proprietário passa a produzir os gêneros básicos agrí-
colas transformando sua propriedade numa empresa rural . A amplia-
cão do primeiro só pode ocorrer na medida em que o segundo ofe-
rece concorrência desvantajosa para os pequenos proprietários, arren-
datários e meeiros que não dispõem dos excedentes necessários para
a dinamização e ampliação dos meios de produção. O não reinvesti-
mento de capitais (fixos) na aquisição de novas terras por parte dos
médios proprietários com o sentido precípuo de dinamizar interna-
mente a propriedade, visa um aumento significativo da produtividade.
A empresa média rural aumenta por um lado a concorrência com os
pequenos proprietários cujos excedentes agrícolas se estabelecem a
partir de altos custos de produção (quantidade maior de trabalho ne-
cessário para produzi-los) e por outro faz desvalorizar as terras desses
pequenos proprietários na medida em que estes não reaplicam capi-
tais no sentido de aprimorarem os meios de produção tendo em vista
o problema da fertilidade do solo para a produção. A média proprie-
dade transformada em empresa gera as condições para que o "fazen-
deiro-boadeiro" amplie os seus meios de produção adquirindo a bai-
xo custo a pequena propriedade dispondo na compra de menos ca-
pital anteriormente acumulado. A pequena propriedade não tende a
desaparecer mas restringe-se a satisfação de determinadas necessida-
des da empresa agrícola (grandes e médias) tais como a determinação
de preços dos produtos agrícolas estipulados no valor da produção
agrícola global. Ou
- 881-

o fazendeiro tradicional ao transformar-se em "fazendeiro-boia-


deiro" abandona a propriedade rural e passa a viver nos centros ur-
banos que se organizam ora como mercados regionais da pecuária,
ora como centros industriais de transformação da carne e seus deri-
vados. Esse êxodo, se assim poderia ser chamado, dos "fazendeiros-
boiadeiros" s6 é possivel na medida em que a pecuária não exige tra-
balho especializado e que o controle da produção pode ser realizado
por poucos homens sem a intervenção pessoal do proprietário na fa-
zenda. Por outro lado, a ampliação dos meios naturais de produção,
as terras, nem sempre ocorrem num plano vertical de vizinhança à
antiga fazenda. Na maioria dos casos os fazendeiros compram pro-
priedades distantes umas das outras criando um verdadeiro monop6-
lio das terras sem que estas liguem-se fisicamente entre si. Este fato
se dá necessariamente em função da perspectiva de não investimento
exagerado em capitais fixos para não diminuir o capital acumulado
que servirá para a aquisição e ampliação da própria matéria prima
que visa produzir e ampliar: o gado. O desdobramento da ampliação
de capital se dá então no sentido de aplicar o menos possivel no má-
ximo das terras, para que com o restante de capital acumulado possa
adquirir e ampliar a matéria~prima da produção: o boi.
Este tipo de investimento de ca.pitais (fixos) cria para o "fazen-
deiro-boiadeiro" o impasse de fixação pessoal de sua residência já
que controla grande parte de meios naturais de produção, s6 que em
locais os mais diversos possíveis. Assim sendo o "fazendeiro-boiadei-
ro" passa a residir preferencialmente nos centros urbanos que exer-
cem fator de polaridade no mercado da carne e sua industrialização.
f: assim que certas regiões interioranas paulistas constituem~e em
centros de decisão sobre a carne e seus derivados.
Ao mudar para as cidades/centros-regionai~e-decisão os "fa-
zendeiros-boadeiros" visam não exclusivamente a busca de um status
pessoal definido como muitos procuram apregoar, mas a centralização
de suas atividades junto ao mercado da carne que procurará dominar.
Para isto é necessário a racionalização da produção pecuária e o es-
tabelecimento de uma empresa comercial (escrit6rios/sedes das fazen-
das) que realizará a comercialização, planejamento e decisão sobre o
carater e destino da produção. O "fazendeiro-boiadeiro"
- 882-

lhoria dos pastos, cercas, água represada, gado estabulado, investi-


mentos em reprodutores, inseminação, fazendas/modelos de criação,
etc.) como sugere tambem a intelectualização do papel do "fazendei-
ro-boiadeiro" no sentido da valorização do planejamento diretivo em
detrimento ao trabalho material exercido junto à produção direta. O
capataz que substitui nas fazendas o "fazendeiro-boiadeiro" é o tra-
balhador assalariado que desfruta teoricamente de uma situação pri-
vilegiada de trabalho em relação aos demais assalariados na fazenda
(camaradas e peões.). A função diretiva do capataz, como trabalhador
direto, representa não uma liberdade de ação por parte deste em fun-
ção daquilo que crê sobre o significado e destino da produção pecuá-
ria. Segue simplesmente os postulados traçados no planejamento ela-
borado pelo "fazendeiro-boiadeiro" a partir de sua empresa localiza-
da no centro urbano. Este fato se eXiplica na medida em que a fa-
zenda considerada isoladamente possui uma característica prÓlpria den-
tro do processo global da produção pecuária. As fazendas mais dis-
tantes tendem a se constituir em áreas livres de reprodução animal,
onde o gado é mantido momentaneamente até estar apto a ser trans-
formado em mercadoria. As fazendas mais próximas tendem a cons-
tituir-se em locais de engorda para a venda no mercado próximo,
já que os custos de transportes são mais baratos (rebaixamento do
custo de produção) alem de poupar o gado mantendo-o dentro de
certos padrões de peso e qualidade.
Alem disso, os "fazendeiros-boadeiros" prestam através de seus
escritórios serviços a outras fazendas menores, vendendo não só mer-
cadorias que visam valorizar os meios de produção (gado seleciona-
do, semen, etc.), como tambem o próprio know-how adquirido. Este
know-how só pode ser vendido na medida em que a empresa rural
investe não só em novas técnicas por eles não produzidas, como tam-
bem, através da contratação de técnicos especializados (zootécnicos e
agrônomos), passam a elaborar e pesquisar novos recursos. Desta for-
ma o "fazendeiro-boiadeiro" começa a investir tambem em setores
não diretamente ligados à produção pecuária imediata (a ampliação
dos rebanhos com fins de mercantilização).
Por outro lado os "fazendeiros-boiadeiros" tendem a se associar
ou criar cooperativas "de capital" para investirem no setor industrial:
nos frigorificos. O
- 883-

prios ou na compra de ações dos frigoríficos estrangeiros) é uma ten-


tativa de controlar tambem os meios de distribuição buscando a mo-
nopolização da economia voltada para a pecuária.
A dominação parcial dos meios de distribuição faz gerar um cír-
culo vicioso que tende a favorecer a acumulação do capital e amplia-
ção dos ganhos por parte dos pecuaristas. Com a penetração dos ca-
pitais (acumulados na produção direta) na indústria da carne o mer-
cado passa a ser controlado de modo a realizar os fins almejados for-
çando por um lado o contínuo rebaixamento dos custos de produção
na fonte produtora (consequentemente reinvestimento em tecnologia
nas fazendas) e a ampliação da produção nos setores industriais com
bases na racionalização da eXJploração do trabalho assalariado (reten-
ção do sobretrabalho no processo urbano de produção).
A perspectiva de acumulação por parte do "fazendeiro-boiadeiro"
se dá em função de três fatores fundamentais distintos.: a) . - na pro-
dução direta na fonte, b). - na comercialização do know-how ad-
quirido. e c). - na reprodução do capital no setor industrial e de
distribuição.

f: no processo de migração para as cidades que o "fazendeiro-


boiadeiro" vai gradativamente se transformando na elite dominante
urbana, deixando de ser uma categoria rural para constituir-se numa
categoria rural e urbana. Ao assumir este papel passa a representar a
fonte de inovação e expansão das forças produtivas no campo, age di-
retamente como fator de urbanização e é em nome deste processo
que reinvestirá na cidade e no campo.

A "pecuarização" das grandes propriedades faz surgir grandes


contingentes populacionais que as abandonarem as grandes fazendas
passam ou a dirigirem-se para as grandes cidades ou então a buscar
empregos nas fazendas ainda voltadas para a produção agrícola. Este
processo de liberação da mão-<le-obra colona ou camarada força uma
alteração global na base de todas as relações de produção agrárias: o
trabalho rural. Neste sentido a média propriedade pode desenvolver-
se na busca do empresariamento na medida em que encontrou novas
formas de acumulação e ganho: a exploração
- 884-

A liberação do colono e do camarada em relação a um tipo es-


pecífico de contrato de trabalho se dá não só em função de que ele
pode a qualquer momento trabalhar com este ou aquele fazendeiro
(ou turmeiro), mas sim que o seu trabalho só será requisitavel dentro
das disponibilidades impostas pela própria produção (isto é, pelo ci-
clo de produção agrícola), Assim o volante não depende mais dire-
tamente do fazendeiro, depende da produção que o fazendeiro ou mé-
dio proprietário realiza em sua propriedade, Seu trabalho flutua de
acordo com a necessidade da produção,
Se o camarada ainda se ligava de alguma forma à fazenda ou
propriedade rural pelo menos era contratado pelo proprietário da
fazenda, hoje transformado em volante é contratado por um inter-
mediário que se coloca entre ele e o fazendeiro: o turmeiro, :s este
tipo de capataz que adquire sua força de trabalho e é através dela
que acumula seu capital dividindo o sobretrabalho com o fazendeiro,
O turmeiro não significa na prática um trabalhador autônomo que ex-
plora o trabalho de terceiros, constitui-se na prática um assalariado
dos fazendeiros que lhe pagam dividindo o sobretrabalho dos assala-
riados voiantes,

Na medida em que as relações entre trabalhadores e fazendeiros


foram tornando-se cada vez mais impessoais o volante, como os gran-
des fazendeiros, foram deixando a vida rural da qual pouca relação
mantem para a vida na periferia das cidades, Esta e~pulsão dos cam-
pos representa duplo papel que satisfaz ao sistema como um todo:
por um lado o homem rural desliga-se da terra não mais produzindo
de forma alguma para seu sustento (não há economia de subsistência)
o que lhe dá a condição de produtor-consumidor (mas nem sempre
consumidor dos próprios elementos produzidos), por outro na peri-
feria das cidades mantem constantemente um exército de mão-de-obra
de reserva que serve como padrão para o estabelecimento do valor e
preço da força de trabalho requisitavel no centro urbano,
O desligamento do trabalhador rural da terra (colono e parcial-
mente o camarada) cumpre a função de desagregar a unidade familiar
de produção e consequentemente individualizar a força-de-trabalho,
Esta individualização se dá em função das novas exigências produti-
vas que mede a produtividade a partir de quantidades especificadas,
Assim, o volante só pode organizar-se familiarmente para a produ-
ção na busca dos mínimos vitais de sobrevivência, Ou
- 885-

víduo não dá cond:ções para seu sustento e nem para a formação da


classe trabalhadora). Dessa feita, o trabalhador rural deve requisitar
a sua família para o estabelecimento dos mínimos vitais de sobrevi-
vência e de formação.
A reorganização da unidade familiar tem o sentido precípuo de
sobrevivência no nivel imediato. A busca da periferia das cidades
(com os encargos que dela advem, luz, água, alugueis, etc.) não obe-
dece a um critério exclusivista de melhoria das condições sanitárias
individuais como vários organismos públicos procuram afirmar. Esta
busca relaciona-se fundamentalmente à perspectiva de serem absorvi-
dos pela produção urbana, que oferece melhores salários. Assim, ao
migrarem rumo as cidades buscam valorizar um status que contradiz
a situação anterior: procuram alcançar o conceito do operário. Ape-
sar de almejarem a inserção no sistema, transformação de trabalhado-
res ocasionais no setor terciário em trabalhadores diretos - operários,
organizam-se dentro de uma forma camponesa na periferia - rees-
truturando-se a partir de valores rurais tradicionais.
Os volantes podem organizar-se de modo tradicional na periferia
das cidades na medida em que são livres e não estão mais presos a
formas específicas rurais de produção que já se urbanizaram (em-
presa rural) ou estão em processo acelerado de urbanização. Esta re-
organização tem como pressuposto uma ruralidade manifesta em con-
trapos:ção a uma urbanidade ainda não adquirida.
Ao se fixarem na periferia, constituindo-se ou não num exército
de mão-de-obra de reserva, os volantes deixam tambem de ser uma
categoria exclusivamente rural para constituírem-se numa categoria
rural e urbana.
A evolução do "fazendeiro-boiadeiro" de elite dominante do cam-
po, para uma elite dominante do campo/cidade (aqui identificados
dada a urbanização do primeiro) corresponde à proletarização cres-
cente do trabalhador assalariado que tambem deixa de ser categoria
de trabalho exclusivamente rural para constituir-se no processo de
urbanização em dupla categoria: rural e urbana.
Em síntese o que se pode concluir é que o processo de urbaniza-
ção do campo faz adequar as relações de produção às novas forças
produtivas
- 886-

centra para a produção industrial - reproduzindo o capital, como


tambem no processo de divisão do trabalho é o centro de decisão (tra-
balho intelectual) de onde emanam as novas perspectivas de evolução
do sistema. A cidade nem sempre se organiza diretamente neste sen-
tido. As cidades interioranas não industrializadas representam sem
dúvid~ alguma o processo de submissão do campo às novas condições
de desenvolvimento, porem deve-se ressaltar que elas não são orga-
nizadas de forma a nuclearizarem em torno de si as decisões.
A cidade interiorana organiza-se antes de tudo em função do
mercado regional agro-pecuário. A primeira relação de dominação
que se estabelece é a da imposição dos preços mínimos aos produtos
do setor agrário. Sua organização se funda na circulação das mer-
cadorias: do setor agrário para o setor industrial avançado. Neste pro-
cesso a contradição gerada entre cidade interiorana e campo se situa
na luta pela determinação de preços cuja diretividade de controle não
se localiza no núcleo interiorano e sim a partir dos centros consumi-
dores onde são produzidas as demais mercadorias. Assim a cidade
interiorana age mais como elemento intermediário do centro de deci-
são sobre o campo, do que como um centro com decisões próprias.
Apesar disto a cidade interiorana desenvolve--se não simplesmen-
te pelo fato de constituir-se em mercado regional (desenvolvimento a
partir de uma autonomia do setor terciário), mas sim na relação di-
reta da expansão das forças produtivas no campo. O aumento da
produtividade agrícola e consequentemente o aumento da produção
com custos mais baixos é que tornará possivel a acumulação de ca-
pital por parte de uma elite dominante. Esta acumulação inicial é
que permitirá uma industrialização possivel. Em primeiro lugar a apli-
cação dos excedentes na nova forma de produzir tendo como ponto
de partida a própria
- 887-

acentuam. Para a ocorrência deste processo não é necessano que a


cidade interiorana possua de antemão uma infra-estrutura industrial
que se sobreponha à atividade agrícola submetendo-a de forma direta
aos seus interesses (rebaixamento dos custos da produção agrícola).
O que se ve é que a dominação não precisa ser exercida em termos
diretos regionais. Ela pode - e geralmente ocorre - de modo in-
direto partindo-se dos centros de decisão (centralidade do sistema)
para a periferia deste centro (a cidade interiorana). A cidade interio-
rana constitui-se assim em um momento na evolução histórica da do-
minação da cidade sobre o campo. É evidente que a centralidade do
sistema (centro de decisão) promove na periferia (cidades interiora-
nas) a luta pela industrialização. Esta luta terá sempre como porta-
vozes setores urbanos comprometidos com a política local ou seja,
classes ou grupo de classes que buscam a ampliação de seus interes-
ses socio-econômicos: estas classes preferencialmente são as médias
profissionalizantes e a pequena burguesia comercial.
O desenvolvimento das forças produtivas globais imprime as for-
mas de organização do espaço urbano e rural interiorano, e é a partir
deste que a cidade interiorana deixa de constituir-se em centro perifé-
rico para adentrar através da industrialização no próprio centro de
decisão. Os fazendeiros e os volantes na evolução de sua própria ca-
tegoria são a expressão deste desenvolvimento das forças produtivas.
* * *
Bibliografia.

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FUKUI (Lia), Alternatives concernant les rôles de la femme chez les petits
paysans traditionnels au Brésil. Ed. mimeo. Dubrovnik. juin. 1975.
CAMARGO (J. Francisco), Sobre a estrutura agrária de São Paulo. São
Paulo. 1971.
* *

INTERVENÇOES.
Da Prof. a Joana Neves (Universidade Estadual de Mato Grosso).
Pergunta:
"Qual a situação atual dos volantes?"

- 888-

Da Prof. a Ledenice Damásio (Universidade Estadual de Mato Gros-


so).
Pergunta:
"A atuação dos turmeiros teria provocado uma evasão do traba-
lhador agrícola?"
Se isto aconteceu, qual foi a medida tomada pelo governo em
prol desses trabalhadores?"
'" '"
'"
RESPOSTAS DO PROFESSOR JOS:B CLÁUDIO BARRIGUELLI.
À Pruf. a Joana Neves.
Resposta:
"A pergunta é bastante ampla o que dificulta uma resposta con-
cisa. A voltantização do trabalho agrícola faz com que o trabalhador
deixe de ser um trabalhador específico (lavrador) para tomar-se um
trabalhador em geral (assalariado de modo geral). Assim sua função
de trabalho nem sempre é produtiva já que foi separado das condições
de seu próprio trabalho. A migração para a periferia urbana caracte-
riza exatamente esta situação. Ali comportar-se-á ora como traba-
lhador produtivo (na agricultura) e como improdutivo (na cidade)
ao prestar serviços no setor terciário. Esta duplicidade na sua ativi-
dade faz com que perca sua especificidade rural e transforme-se num
trabalhador ruro-urbano, constituindo-se na prática no exército de
mão-de-obra de reserva com dupla função: para a cidade como contin-
gente industrial possivel, no rural como força de trabalho agrícola."

À Prof. a Ledenice Damásio. '"


Resposta:
"O turmeiro é uma função que surge concomitantemente com a
do próprio volante. Nem todas as regiões esta figura social surge co-
mo recrutador de mão-de-obra. Nas áreas em que aparece tem a fun-
ção de fixar uma mão-de-obra como seus sub-empregados. A evasão
dos campos é função da própria condição de dominação que a cidade
impõe ao campo e nada tem a ver com a função do turmeiro. Ele
cumpre um pa,pel eficaz na medida em que ao contratar jornaleiros
para a atividade agrícola automaticamente está desresponsabilizando o
fazendeiro de faze-lo, assim, como não se constitui num proprietário,
não tem obrigações legais (trabalhistas) com seus contratados. O fazen-
deiro ao contratar individualmente a mão-de-obra teria que pagar corre-
tamente os direitos trabalhistas. No que se refere a ação governamen-
tal. no Estatuto da Terra, nada se encontra que possa defender o tra-
balhador volante."
TERRAS E ESCRAVOS NA GRANDE LAVOURA
PAULISTA.

ALICE PIFFER CANABRAVA


da Faculdade de Economia e Administração da Uni-
versidade de São Paulo.

Em 1798 o governador da capitania de São Paulo colocava o


problema da área de terra essencial ao desempenho da propriedade
agrícola destinada à produção açucareira: meia légua em quadra (450
alqs.) não seria suficiente para
"a formação de um engenho de alguma consideração".

Ao fim do século podia-se considerar o fator terra como de oferta


ilimitada no conjunto da Capitania, quando sobravam terras para a
gente que há,
"com muita terra devoluta e, em sua maior parte, com muito
pouco valor" (1).

A expansão dos engenhos no interior paulista, às vesperas da


Independência, estava a inorementar a demanda de terras, como se
pode deduzir da observação de Saint-Hilaire, feita em 1818, com
respeito às terras da vila de Itú, já todas ocupadas (2). Entre as duas
dat'as, os anos intermédios parecem representar uma fase muito impor-
tante para o equacionamento do fator terra, na grande lavoura, nos vá-
rios centros antigos do povoamento paulista.
Neste trabalho abordamos o problema da área da propriedade
rural na capitania paulista, dedicada às culturas de exportação, essen-
ci&lmente o açucar e o café. Tendo em conta a estabilidade das técni-

(1). - Ofício do governador Antônio Manoel de Melo Castro e


Mendonça ao Conselho Ultramarino. São Paulo, 15-10-1798, Documentos para
a Ilistória e Costumes de São Paulo, vol. 29, p. 76.
(2). - Saint-Hilai~e (Auguste de), Viagem à província de São Paulo
e Resumo das viagens ao Brasil. 2\1
- 890-

cas de produção do açucar, como da agricultura de modo geral, nos-


sa análise preocupou-se em verificar a importância relativa de dois fa-
tores: a terra, observada quanto à superfície da propriedade, e a
força de trabalho. Partimos da hipótese de que as tendências indica-
das pela relação terrajesoravo, poderiam instruir a noção quant1tativa,
no momento histórico, com referencia às propriedades rurais dedicadas
às culturas de exportação, ou seja, a grande lavoura.
Os dados empíricos procedem do cadastro de propriedades ru-
rais efetu.<tdo em 1818 na capitania de São Paulo, que abrangeu 8.363
propriedades com área declarada, ou seja, 88,65% do numero total
de acervo e 26.222 escravos (91,88 %) do mesmo (3).
* *
*
Ao longo do passado colonial, a propriedade rural foi configu-
rada de modo geral, em grandes e~tensões, quando legalmente cons-
tituida por meio do estatuto da sesmaria. As exigências impostas ao
colono, para obter sesmari1a, que se lêm no regimento do primeiro
governador geral (1548), transcritas nas Ordenações, consideraram
primeiramente as de natureza funcional, ao firmar a obrigatoriedade
de oCllpar a terra e fraze-Ia produzir. Correspondia ao propósito da
Coroa de povoar a Colônia, torna-la rentavel, o que foi inalteravel-
mente reiterado durante todo o período colonial. As restrições quanti-
tativas implícitas constam indefinidas na advertência de que
"não se dessem maio-es terras a uma pessoa que as que ra-
zoave'mente parecer ... , que poderão aproveitar" (4),

e inspiram-se naqueles objetivos. No contexto da combinação dos


fatores, os preceitos limitativos significavam que a importância do
fator terra seria definida pelas outras variáveis.
Um conjunto de circunstâncias do processo de colonização al-
terou o sentido dessas recomendações e condicionou a predominân-
cia das grandes áreas como unidade de sesmaria (5), independente-
mente do desempenho dos outros fatores. As recomendações de
1695 com referência ao Norte da Colônia, e de 1697, relativamente

(3). - Departamento do Arquivo do Estado de São Paulo - MSS. -


Inventário dos Bens Rústicos. Capitania de São Paulo, 1818. Desta fonte pro-
cedem todos os dados quantitativos sobre a área e escravos da propriedade rural
aqui utilizados.
(4). - Lima (Rui Cirne) , Pequena História Territorial do Brasil.
Sesmarias e Terras Devolutas. 2(1 ed., Sulina Editora, Porto Alegre, 1954, p.
36/43.
(5). - Prado Júnior (Caio), Formação do Brasil Contemporâneo. Co-
lônia. 1(I edição, Editora Martins, São Paulo, 1942, cap. "Economia".
- 891-

às partes subordinadas ao governador do Rio de Janeiro (6), mos-


tram a preocupações de explicitar, em termos quantitativos, os limi-
tes máximos das sesmarias. Dois modelos foram fixados pelo pre-
ceito legal: o de três léguas de comprido por uma de largo (5.400
alqs .) e o de légua em meia quadra (4.050 alqs.). Um século de-
pois, o alvará de 1795 (5 de outubro), ao consolidar normas disper-
sas em muitos textos legais, reafimnou a obrigatoriedade ao colono de
explorar e ocupar as terras dadas em sesmaria, como tambem as li-
mitações com respeito à área. Agora, três modelos definiram clara-
mente, no texto legal, as dimensões das sesmarias: três léguas por
uma (5.400 alqs.), uma légua em quadra (900 alqs.) e meia légua
em quadra (450 alqs.) .
Na capitania paulista, a provisão de 7 de j-aneiro de 1797 sus-
pendeu o cumprimento daquele alvará; possivelmlente em resposta aos
reclamos dos povoadores, empenhados na expansão da grande lavoura.
Em parecer sobre o disposütivo legal (7), o governador defendeu as
vantagens e a necessidade de determinar os limites das sesmarias, nos
termos daquele preceito. A vitalidade do processo em marcha para a
apropriação do solo é denunciado na situação confusa criada pela ati-
vidade dos posseiros, combinada com a negligência dos sesmeiros em
demarcar suas terras e pelos numerosos pleitos judiciais pendentes e
em perspectiva que tumultuavam a Capitania. Contudo, medir sesma-
ria significava onus financeiro, a contar com pouca receptividade da
parte dos sesmeiros.
Sob outros aspectos o parecer do governador consubstanciou os
interesses dos grandes senhores rurais, em três proposições principais:
defendeu a prorrogação do prazo legal para delImitar as terras de ses-
maria (dois anos em vez de um, justificada em cada caso); questionou
as dimensões das sesmarias fixadas no alvará, especialmente as de meia
légua em quadra (450 alqs.), área que não considerava suficiente para
formar um engenho de alguma consideração; sugeriu ainda que se re-
vigorasse o alvará de 1703, que permitiu ao colono requerer tnlais de
uma sesmaria, desde que a ocupação da primeira fosse comprovada,
dispositivo este que viria estimular o povoamento e levar ao grangelO
as terras incultas. Tais seriam, ao fim do século, as mais caras exigên-
cias da classe senhorial agrária da capitania paulista. Com uma visão
muito realista do problema da exploração da terra, o governador
equacionou de fomna explícita o problema da área a ser concedida,
com o da força de trabalho, ao propor, como condição para obter
sesmaria, ao interessado, o mínimo da propriedade de quatro escra-

(6). - "Memória sob~e as sesmarias da Bahia", p. 397, apud Prado


Júnior (Caio), Op. Cit., p. 187.
(7). - Ofício do governador '" Op.
- 892-

vos. Como área indispensavel, a lavoura canavieira como a de subsis-


tência, requeda uma légua em quadm (900 alqs.); para a criação
do gado vacum e cavalar, uma légua por três (5.400 alqs.) eram ne-
cessárias. Como faJtor restritivo a discipLinar a ambição dos coloni-
zadores, a sugestão quanto à for~ de trabalho seria inoperante; viria
de alguma forma reforçar a tendência reconhecida de que as sesma-
rias tendiam a engrossar os oabedais dos ricos, aqueles que podiam
suportar o dispêndio financeiro com as formalidades legais para soli-
citar, confirmar e medir as terras em; sesmaria, como tambem ex-
pIora-las. A nova dinâmica das forças econômicas que voltava a
estimular a ocupação e o amanho da .terra, após a longa decadência
da Capitania (1704-89), alicerçava as justificações do governador em
seu empenho para garantir as mais amplas perspectivas à expansão
da grande propriedade rural instituida pela sesmaria.
O conceito firmado sobre a grande lavoura, elaborou-se a partir
da realidade de base - a grande propriedade. Esta se entende num
sistema, típico da grande lavoura, no qual estão intimamente associa-
dos a exploração em grande escala destinada a exportar, a monocultura
e o trabalho escravo, este na sua organização coletiva. Orientada para
o mercado interno, a lavoura de subsistência tendia a ocupar, de modo
geral, áreas de pequena extensão, e não possuia escravos ou assalaria-
dos, as tarefas seriam realizadas pelos próprios ocupantes ou proprie-
tários com a família. Neste esquema conceitual, nosso ponto de partida,
a força de trabalho, é o fator essencial que distingue a função produtora
de cada uma das economias consideradas. A mesma mercadoria po-
dia ser objeto de exploração tanto ao nivel de subsistência como ao do
mercado externo. A grande lavoura tambem podia comportar gran-
dezas variáveis de superfície, desde que garantida a área em nivel ope-
racional, sem omitir a tendência para a grande extensão (8). Quando
autônoma, a lavoura de subsistência podia associar-se excepcionalmente
à grande superfície. A partir destes conceitos, procuramos conhecer a
relação terra/escravo, na Capitania paulista, como base à noção quan-
titativa com referência às propriedades dedicadas à grande lavoura.
• •

A grande lavoura desenvolvia-se em duas áreas da Capitania pau-
lista: no interior do planalto, com os engenhos de açucar, e na parte
centro-oeste do Vale do Paraiba, com engenhos de açucar e culturas
cafeeiras. A primeira, no espaço inter-fluvial formado pelo Tieté e
Mogí Guaçú, afirmava-se como a mais importante às vésperas da In-
dependência, quando a produção açucareira estava em pleno desenvol-

(8). - Prado Júnior (Caio), Op.


- 893-

vimento nas vilas de Itú, Porto Feliz, Campinas e Mogí Mirim. Crescia
há um quarto de século (9). Quando da restauração da autonomia
administrativa da Capitania de São Paulo (1765), vendia-se na capi-
tal o açucar ituano, fruto de lavouras de subsistência. Mais tarde, des-
de 1789, os engenhos expandiram-se rapidamente, estimulados pelas
condições favoráveis do mercado internacional e as medidas governa-
mentais que tenderam a valorizar o porto de Santos. A grande lavoura
açucareira dominava completamente a economia da área, ao tempo do
inventário das propriedades rurais em 1818, como o motor propulsor
da economia paulista. A estrada de Itú, tornou-se, então, a estrada do
açucar, a estrada da riqueza, pela qual transitava a maior parte da
exportação da Capitania.
Em 1818 o açucar exportado a Santos por aquelas três primeiras
vilas, compreendia cerca de 99,00% de suas exportações, 71.635 sa-
cas. Incluindo-se o produto estimado da vila de Mogí-Mirim, cerca de
2.000 sacas, a área deveria participar em 65,00% da safra açucareira
paulista (lO). A vila de Itú, o mais velho centro comercial do açucar,
mantinha-se como o mais importante da área, com o produto anual re-
presentado por 25.986 sacas, superior ao de Campinas apenas 6,15 %
(24.480 sacas) e 22,75% maior que o de Porto Feliz (21.169 sacas).
São pequenas empresas, como se verifica em Campinas, onde a maior
safra média por engenho orçava em 400 sacas e nos mais importantes
o produto médio anual alcançava cerca de 734 sacas (11).
Esta área açucareira concentrava o maior contingente de força
de trabalho da caoitania paulista: 9.069 escravos em 595 oroprieda-
des rurais (12). Deixamos de lado, por ora. a freguesia de Piracicaba,
para examinar o con.iunto das localidades restantes. Nestas encontra-
vam-se estabelecidas 536 propriedades escravistas (47.86% do nú-
mero e 80.03% da área), com 8.024 escravos. A distribuição da for-
ça de trabalho pelas propriedades escravistas, segundo as classes de
extensão da superfície em alqueires. mostra-nos que mais de dois ter-
ços (70.48%) do seu número localiza-se nas propriedades entre 70 e
menos de 630 alqueires de superfície. Nas propriedades maiores, a

(9). - Vide Petrone (Maria Thereza Schorer). A grande lavoura ca-


navieira em São Paulo - Expansão e Declínio (1765-1851). Difusão Eu:-opéia
do Livro, São Paulo, 1968.
(10). - Departamento do A"quivo do Estado de São Paulo - MSS. -
Maços da População. Procedem desta fonte todos os dados sobre a produção
e a exportação da Capitania de São Paulo, suas vilas e freguesias.
(11). - D'Alincourt (Luis), Mem6ria sobre a viagem do porto de San-
tos à cidade de Cuiabá. Editora Martins, São Paulo, 1953, p. 53.
(12). - O termo "propriedade" não assume conotação jurídica; refere-
se indistintamente às superfícies ocupadas, sem distinguir formas legais ou
outras, de ocupação. A unidade de superfície adotada, o alqueire paulista,
mede 24.200 metros quadrados; a légua de sesmaria, 6.600
- 894-

partir de 630 alqs., o contingente de escravos declinava para 12,26%


com o mais baixo porcentual em Pirapora (6,34%) e o mais alto em
Campinas (18,55%). Nas propriedades com menos de 70 alqs. a
porcentagem de escravos oscilava entre 7.66% (Campinas) e 22,28%
(Itú), com a média de 17,26%. Cerca de 35,89% das propriedades
(402 em número) e 7,32 % da área não possuia escravos. Nesta cate-
goria, ou seja, a propriedade sem escravos. a maior parcela se encontra
nas classes com menos de 70 alqs.: 91,04% do número e 50,92%
da área.
A outra área da grande lavoura ocupava o centro-oeste do Vale
do Paraiba. Este, visto em coniunto, apresentava estágios diferentes de
desenvolvimento econômico, a revelar estruturas de produção em mu-
dança. No passado. no século XVIII, uma economia de subsistência
havia s.e desenvolvido em função da demanda dos centros minerado-
res das Gerais, com base nos gêneros alimentícios, fumo, tecidos de
algodão. Com a decadência das minas (cerca de 1770), a economia
retrocedeu ao nivel das trocas locais, em volume ínfimo, o necessário
para aquisicão do vestuário e do sal (13). Ao fim do século (1797-
-1801), as localidades vale-paraibanas conseguiram desvincular-se da
imposicão legal de exportar pelo porto de Santos, beneficiaram-se da
demanda criada com o estabelecimento da Corte no Rio de Janeiro e
retomaram o processo de desenvolvimento. Engenhos de açucar iá
estavam imnlantados em várias vilas; na década dos 90. pela freguesia
de Areias introduziu-se o café que lentamente, expandiu-se ao longo
do vale. Com base ness.as culturas, nova estrutura de produção come-
çou a se articular, a da grande lavoura; ao tempo do nosso estudo
(1818) é a mais característica da parte centro-oeste do Vale.
O setor mais dinâmico encontrava-se nas vilas e freguesias limí-
trofes da capitania do Rio de Janeiro. pioneiras da lavoura do café.
No maior centro produtor, a vila de Areias, 62.00% do valor de suas
exoortacões estava representado pelo café e 23,33% pelo açucar, este
iá em fase de ránido declínio. Lorena ocupava o segundo lugar na sa-
fra cafeeira do Vale (26.11 % do valor de suas exportações); peque-
nas quantidades do produto colhiam-se em Pindamonhangaba e Gua-
ratinguetá. Nesta vila desenvolveu-se o maior centro açucareiro de
toda a Capitania: sua safra anual, 30.200 sacas para 42 engenhos
(719 sacas em média por unidade), significava cerca de 90,00% da
producão do vale. As pequenas safras de Areias, Pindamonhangaba
e Taubaté cabia a porcentagem restante. Todo o produto açucareiro

(13). - Abreu - (Manoel Ca"doso de), "Divertimento admiravel para os


historiadores observarem as maquinas do mundo reconhecidas nos sertões da
navegação das minas de Cuiabá e Mato Grosso", Revista do Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro, voI. 77, .2\1
- 895-

do Vale, 33.848 sacas, orçava em 29,00% da safra de açucar da Ca-


pitania. No coniunto das localidades mencionadas o açucar e o café
alcançavam 56,88% do valor total de suas exportações.
O setor da grande lavoura do vale paraibano paulista apresenta
características semelhantes à da região açucareira quando exminamos
sua força de trabalho. Nas seis vilas mencionadas mais a freguesia
de Bananal encontrava-se um contingente de 6.639 escravos em 765
propriedades rurais (42,24% do número e 78,29% da área). Exce-
tuadas a vila de Taubaté e freguesia do Bananal, por razões a serem
esclarescidas mais adiante, vamos considerar o conjunto das outras
vilas iá mencionadas. Nestas, 559 propriedades rurais escravistas
(46.05% do número e 76,51 % da área) estavam estabelecidas com
4. 831 escravos. A estrutura da distribuição dessa força de trabalho,
segundo as faixas de grandeza das propriedades, aproxima-se da que
encontramos na área açucareira. Mas da metade dos escravos distri-
buia-se pelas propriedades com mais de 70 e menos de 630 alqs.,
(51,35%), com a maior concentração em Areias (60,40%), e a me-
nor em Guaratinguetá (45,05%). As propriedades com área a partir
de 630 alqs., ocupavam menos de um quarto do contingente total de
escravos (21,84%), com a mais alta porcentagem em São Luís do
Paraitinga (28.63%) e a mais baixa em Guaratinguetá (15,30%).
Nas propriedades com menos de 70 alqs. distribuia-se uma parcela de
pouco mais de 25,00% dos escravos (26.83%) a mais elevada em
Guaratinguetá (39,65%) e a mais baixa em São Luís do Paraitinga
(17,35%). Sem escravos, existiam 647 propriedades rurais (53,29%
do número e 20,51 % da área); nestas, as propriedades com menos de
70 alqs. alcançavam 87,17% do número e 23,49% da área da cate-
goria.
* *

O exame dos dados apontados nos permite distinguir, na relação
área/escravo, dois modelos essenciais. Com respeito à grande lavou-
ra, nos velhos centros de povoamento, pode ser definido, em termos
quantitativos, do seguinte modo. A tendência à baixa porcentagem de
escravos nas propriedades inferiores a 70 alqs., é verificada tambem
naquelas a partir de 630 alqs., e combina-se com a importância por-
centual do segmento de escravos localizados nas faixas intermediárias
que se apresenta sempre superior a 50,00%, exceto em Guaratinguetá.
A significação dessa proporcionalidade é posta em evidência pelo fato
de que as propriedades escravistas. com área a partir de 630 alqs.,
ocupam 46,24% do espaço cadastrado das localidades açucareiras in-
dicadas e 51,17% no Vale, no espaço cadastrado das localidades con-
sideradas; pouco menos de 5,00% pertenciam às propriedades com
menos de 70 alqs. (4,89 % e 4,80% respectivamente). :a
896 -

que os mais velhos centros de povoamento tendem a porcentagens


mais elevadas quanto à força de trabalho. nas propriedades com menos
de 70 alqs., comparados com as localidades de fundação mais recente.
Assim, nas duas áreas indicadas da grande lavoura, encontramos, em
números absolutos, quase sete (6,87) e quase 5 (4,98) escravos em
média por propriedade, na faixa de grandeza indicada, situando-se em
Itú, com quase dez (9,72) escravos, e Guaratinguetá com cinco e meio
escravos (5,54) as médias mais elevadas de toda a Capitania, ou seja,
nos dois centros açucareiros mais importantes. Se acrescentarmos que,
nas localidades açucareiras típicas as propriedades sem escravos ocu-
pam apenas 7,32% do total de suas áreas, o porcentual mais baixo en-
contrado (e 20,51 % nas povoações do vale consideradas, dedicadas
à grande lavoura no Vale paraibano), podemos concluir que, o modelo
proposto está melhor realizado na área açucareira, onde a economia
paulista encontrava-se mais desenvolvida.
Taubaté e Bananal distinguem-se do modelo indicado pelas caracte-
rísticas do estágio de desenvolvimento. A primeira reunia um conjunto
de atividades que a caracteriza de modo especial. A transferência
da Corte estimulou a demanda de generos alimentícios e de gado, va-
cum e suino, para abastecimento do Rio de Janeiro; as terras do termo
passaram a ser utilizadas pelo gado vacum em trânsito para a Corte,
como estação de invernada, destinada ao descanso e engorda do gado.
Ao mesmo tempo decaia o produto dos engenhos e lentamente sur-
giram pequenas lavouras de café. Em 1818 o termo de Taubaté pos-
suia apenas doze pequenos engenhos de açucar, cuja safra anual mé-
dia orçava em 151 sacas e a colheita de café se resumia em 32 sacas.
A evidência dos dados revela uma estrutura de produção que resultava
de uma economia diversificada, não especializada como seria a da
grande lavoura, mas sim, voltada para os gêneros alimentícios, as cul-
turas de exportação ainda incipientes e a pecuária.
Bananal pertencia à zona de pioneirismo o mais recente quanto
à cafeicultura do Vale; as terras da freguesia vieram a ser procuradas
a partir de 1810, quando as primeiras derrubadas abriram claros nas
reservas florestais. Saint-Hilaire observou esses trabalhos, que marca-
vam a implantação da grande unidade rural, pelos grandes donos de
terras (14). Aí, as propriedades a partir de 630 alqs. ocupavam
82,53% de suas terras, e concentravam 68,53% do estoque da força
de trabalho escravo; restavam para as propriedades com menos de 70
alqs. apenas 0,63 % das terras do povoado, e 2,02 % do total de seus

(14). - Saint-Hilaire (Auguste de), Op. Cit., p. 214, 223 e 226/68:


Beyer (G.), "Ligeiras notas de viagem do Rio de Janeiro à capitania de São
Paulo no ve:ão
- 897-

escravos, cabendo às faixas intermediárias. 16,84% da área e 29,45%


dos escravos. Suas características como área pioneira, aproximam Ba-
nanal da freguesia de Piracicaba, no termo de Porto Feliz, na região
açucareira. Ambas as freguesias se distinguem pela elevada proporção
de escravos nas propriedades a partir de 630 alqs., (43,47% em Pi-
racicaba e 68,63% em Bananal), e pelas baixas porcentagens nas pro-
priedades rurais com menos de 70 alqs.(7,63% em Piracicaba e
2,02 % em Bananal), enquanto que, nas faixas. intermediárias distri-
buia-se um contingente menos significativo do que o encontrado nos
centros especializados na grande lavoura (48,90% em Piracicaba e
29,30% em Bananal). As características de ambas, como áreas de
exploração recente, configuram outro modelo, o das áreas pioneiras da
grande lavoura, distinto do anterior, pela expressão que alcançavam,
quanto à força de trabalho, as propriedades acima de 630 alqs.
* *

As observações feitas não significam que os modelos apontados
estejam a instruir, com carater de generalidade, a noção quantitativa
quanto à área da propriedade dedicada à grande lavoura, nas zonas
de colonização mais antiga e nas de penetração recente. Firmado o
conceito da grande lavoura, em termos qualitativos, o problema da
ordem de grandeza essencial ao desempenho lucrativo da empresa agrí-
cola deve ser formulado no contexto das condições do momento his-
tórico. A noção que se infere dos modelos indicados reflete as condi-
ções da fase de desenvolvimento da Capitania de São Paulo, às véspe-
ras da Independência, no seu estágio da técnica de produção, de acumu-
lação de capital e de apropriação do solo. As tendências observadas
na relação área/escravo mostram que a grande lavoura, nos velhos
centros, estava representada, sobretudo, nas propriedades situadas nas
faixas intermediárias que concentravam mais de dois terços da popula-
ção escrava. Nos povoados de exploração recente, como Bananal, a
elevada proporção de escravos e o desenvolvimento da propriedade nas
faixas de grandeza a partir de 630 alqs., configura o modelo que tende
a definir-se nas áreas pioneiras da grande lavoura, nos quais, a oferta
ilimitada de terras podia alimentar a ambição sem limites dos ses-
meiras e compradores.
Nos antigos centros povoados, a ação de múltiplas circunstâncias
como as partilhas, doações, posses, atos de compra e venda, o declínio
de interesse pelas sesmarias durante o período da decadência da Capi-
tania, com o predomínio dos negocios do gado e o atrativo das minas,
não teria favorecido a abertura de novas áreas para a grande lavoura,
durante cerca de três.
- 898-

níveis dos velhos centros. O avanço sobre as terras incultas foi co-
mandado pela lavoura do açucar e do café. A hipótese de que a rela-
ção área/escravo significaria a opção dos lavradores, na preferência a
investir em escravos nas áreas da lavoura, vem ao encontro da conhe-
cida afirmação de Saint-Hilaire de que
"não se pode colher senão com negros, é, pois, comprando
negros que gastam todas as rendas" (15).

A hipótese fundamenta-se na alocação dos fatores: a terra, como


fator de produção vale pouco, sua oferta, ilimitada; a técnica, estagna-
da; os investimentos tendiam a concentrar-se na força de trabalho.
Somente esta podia gerar a riqueza.
O advento da cafeicultura foi marcado pela vitalidade de todas
as formas de apropriação do solo. A grande propriedade, identificada
com a grande lavoura, em ordens de grandeza que alcançariam e ul-
trapassariam os 600 alqs., teria afirmado o seu predomínio. Este já
despontava, no momento do nosso estudo, na estrutura de produção
observada na relação área/escravo das áreas pioneiras.

(15). - Saint-Hilaire (Auguste de), Op. Cit.,


A EVOLUÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL EM
CERES-GO. (*).

(Resumo).

ELIANE GARCINDO DYRELL


da Faculdade de Educação da Universidade Federal
de Goiás.

o município de Ceres, criado em 1953, originou-se da Colônia


Agrícola Nacional de Goiás, instituida em 1941, por decreto do Go-
verno Federal. Esta Colônia CANG, fazia parte do amplo programa
da "Marcha para o Oeste", efetuado durante o Estado Novo. Seus
objetivos visavam à correção do êxodo rural, à implantação da pe-
quena propriedade, à educação rural de sua população, seu crescimento
sócio-econômico, alem da ocupação demográfica e econômica da re-
gião, por motivos geo-políticos. A colônia deveria constituir um polo
de desenvolvimento, atraindo e impulsionando a área periférica, a
partir do modelo apresentado. O Estado Nacional procurava melho-
rar e aUfilentar a produção e superar as questões agrárias através da
implantação da pequena propriedade, em áreas desocupadas.
O município localiza-se na zona do "mato-grosso-goiano", à
margem do rio das Almas. Constituiu uma ponta de lança na penetra-
ção para o Norte, especialmente na construção da rodovia Belem-
Brasília.
Sua produção é eminentemente agrícola, representada na sua
maior parte pelo arroz, seguido do feijão e do milho, exportados pa-
ra o Norte e Sul do país. A indústria se res.tringe ao beneficaimento e
transformação da produção agrícola.
Quando o município foi instituído, em 1953 existiam aí 3543
propriedades que alcançavam em média 20ha.
- 900-

município possuia: 2490 minifúndios, ocupando uma área de 58.410


ha, 132 latifúndios - 17.751 ha; 17 empresas rurais - 187 ha. Em
1972 a distribuição da propriedade era a seguinte: 1774 minifúndios
- 33.356 ha, 4.831 latifúndios - 34.793 ha, 129 empresas ru-
rais - 10.073 ha.
Observa-se, pois, uma tendência à concentração da propriedade.
Esta tendência é acompanhada de uma modernização dos meios de
produção, através de emprego de técnicas e maquinário competentes.
Paralelamente, esfacela-se o minifúndio, continuadamente subdividido
por heranças e casamentos ou vendido e até mesmo abandonado. A
impossibilidade de receber assistência, incentivos ou empréstimos, a
preservação de técnicas e mentalidade incompatíveis com as exigên-
cias atuais do desenvolv,imento
VIII. - COMUNICAÇÕES (Metodologia).
UMA EXPERIÊNCIA EM TORNO DOS SEMINÁ-
RIOS DE HISTóRIA ANTIGA (*).

EUZA ROSSI DE AGUIAR FRAZÁO


MARIA LUIZA CORASSIN
NIKO ZUZEK
do Departamento de História da Faculdade de Filo-
sofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo.

Para fins de coordenação de ensino, o currículo do Departamento


de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo, conta, no rol das disciplinas obrigató-
rias, com a de História Antiga, dividida em História do Oriente, His-
tória da Grécia e História de Roma, ensinadas mediante a ministra-
ção de cursos teóricos e seminários. Com respeito à duração dos
seminários, a carga horária prevê duas horas/aula semanais: as horas
aula são computadas à base de 50 minutos no curso diurno e de 40
minutos no curso noturno.
Nossa atividade docente relaciona-se com a orientação dos se-
minários de História da Grécia e História de Roma, que se desen-
volvem, cada qual, no decorrer de um semestre.
Considerando-se o grande número de alunos matriculados no
curso teórico - cerca de 120 - as classes são divididas, para efeito
de seminários, em turmas de aproximadamente trinta alunos. As ati-
vidades são efetuadas por equipe de três (ou mais) docentes, cada um
dos quais torna-se responsavel por uma turma. A originalidade da
solução encontrada prende-se ao fato de que o trabalho realiza-se
dentro do sistema de rodízio. Selecionados 12 temas, cada um dos
três professores encarrega-se de quatro deles, organizando-se um ca-
lendário de maneira que o mesmo professor assista nas diferentes
(*) . Comunicação apresentada na 1(1.
- 904-

turmas, à apresentação dos quatro seminários, dos quais está encar-


regado. Isto apresenta a vantagem de ser realizado um trabalho mais
eficiente e proveitoso, já que ao invés de 12 temas, ele preparará ape-
nas 4.
o objetivo dos seminários prende-se à complementação de as-
pectos não abordados ou ao aprofundamento de aspectos tratados
superficialmente no decorrer das aulas teórico-expositivas.
O planejamento dos seminários é efetuado pelos professores que,
em reunião prévia, selecionam os temas a serem abordados de forma
a se obter entrosamento com o curso teórico. :É imprescindivel que
o conjunto dos assuntos escolhidos apresente, entre si, unidade coe-
rente. Outrossim, será selecionada bibliografia básica, recomendada
para o conjunto dos temas. São ainda estipuladas as atividades dis-
centes a serem desenvolvidas: leitura e fichamento de obra de cunho
geral, resenha bibliográfica e apresentação, em cada aula, de ficha in-
dividual de leitura pertinente ao assunto em pauta.
No primeiro dia de contacto com a classe é dada a relação dos
temas, a bibliografia geral e são formadas as equipes, compostas até
de 4 integrantes. A cada tema proposto corresponde texto extraido
de autor antigo, a ser devidamente analisado.
A etapa seguinte é reservada para uma aula teórico-expositiva,
durante a qual se oferece à classe uma visão de conjunto sobre o pe-
ríodo a ser analisado através dos seminários.
Cabe a cada equipe a preparação do seminário, iniciada através
do levantamento bibliográfico específico, constante de manuais, enci-
clopédias e periódicos especializados, obras gerais, etc.
Dentro do horário afixado para atendimento, os alunos deverão
discutir previamente com o professor encarregado do seminário, a bi-
bliografia consultada, o esquema da exposição e as questões propos-
tas, cuja finalidade é evitar um sem número de falhas na estrutura da
exposição.
Na data afixada a equipe encarregada inicia os trabalhos distri-
buindo à classe folha mimeografada com os seguintes ítens:
a). - texto selecionado
b). - esquema;
c). - bibliografia específica.
O tempo disponivel é
- 905-

a). - rápida localização do autor no contexto da época;


b). - exposição do assunto:
c). - apresentação de questões para discussão.
A se!!unda fase. abrangendo metade do tempo, será empregada
na discussão, com participação da classe, sendo levantadas questões,
dúvidas, dadas contribuições pessoais, etc. Para a obtenção de me-
lhor resultado, é necessário que toda a classe tenha efetuado leituras
que possibilitem efetivo acompanhamento do debate. Desta forma, são
eliminados os defeitos mais sérios e mais criticados que costumam
ocorrer neste tipo de atividade, qual seja a falta de participação da
maioria, prejudicando a dinâmica da discussão.
Ocasionalmente podem ser designados dois alunos incumbidos da
crítica formal e de conteudo a ser expressa depois da explanação.
O papel do professor, durante o seminário, consiste em orientar
a discuso;;ã"_ estimulando o debate e. ao seu final. efetuar críticas ao
plano, à bIbliografia,
- 906

d). - resenha bibliográfica.


Em última reunião semestral, com o objetivo de efetuar a ava-
liação, cada professor, responsavel por uma classe, recebe dos cole-
gas, a relação das notas atribuidas aos alunos pertencentes à sua tur-
ma.

INTERVENÇÃO.

Da Prota Maria A,narecida Rncha Bauab (Faculdade de Filosofia,


Ciências e Letras de São José do Rio Preto, SP).
Questiona a expositora a respeito dos problemas que poderiam
advir para o crédito de avaliação, em consequência do "Intercâmbio"
dos professores. Solicita esclarecimento ssobre a metodologia utili-
zada.
R. - Para homogeneizar a avaliação é necessário grande en-
trosamento entre os professores. Exige-se, antes de nada mais, dis-
cutir os valores ou pesos a serem atribuidos a vários aspectos do se-
minário, tais como limitação do assunto ou enfoque pedido, logicida-
de do desenvolvimento, dosagem entre as partes, bibliografia apre-
sentada, exatidão histórica, precisão da linguagem, comunicação etc.
Contudo, para que a variação seja mínima, a troca de experiência, (lU
melhor, a convivência dos professores que trabalham na mesma disci-
plina é fundamental.
Salientamos, outrossim, que o mesmo problema existiria se uma
turma de aula expositiva fosse dividida em três de seminários, cada
professor orientando seminários somente da sua turma. Neste caso
uma turma inteira estaria arriscada a ser avaliada com maior severi-
dade do que a outra, sem controle nenhum. O
MARANON E O SENTIDO DA BIOGRAFIA NA
HISTÓRIA. SEU VALOR E IMPORTÂNCIA PARA
A EDUCAÇAo (*)

MARIA NASCIMENTO BARNEWITZ


da Unive~sidade Federal de Santa Maria (RS.).

Seria discutivel o valor educativo do ensino da História através


da Biografia:
A). - Se encarado sob o tradicional enfoque, segundo o qual
considerava-se "perigoso" ao educando apresentar-lhe toda a realidade
face ao risco de lhe "sugerir" exemplos negativos. Mais tarde, acen-
tuou-se tambem a preocupação de evitar a mistificação dos persona-
gens pela exaltação exagerada de suas qualidades "heróicas". Ora, o
vício, a fraqueza e a miséria moral não deixam de existir porque os
ocultamos; assim tambem, a falsa virtude mais cedo ou mais tarde,
acaba por se desmascarar.
Ao conhecer os defeitos e a grandeza das figuras representativas
dos fatos históricos não mais se fazem ídolos, mas faz-se conhecer o
homem.
B). - Se não houver plena consciência dos dois principais ris-
cos a contornar: 1.°). - o da distorção histórica pelo estudo psico-
lógico retrospectivo como o de um diagnóstico clínico à distância;
2.°). - o da vulgarização e aplicação indevida de técnicas psicoló-
gicas,ao avaliar as mudanças de conduta com vistas a verificar o ajus-
tamento ou o grau de amadurecimento pretendidos indiretamente com
a utilização da Biografia como técnica didática.
A testagem psicológica só deve ser utilizada por profissionais com-
petentes e para fins idôneos.

(*). - Comunicação apresentada na 3(1 Sessão


- 908-

Não cabe ao professor de História ou de Didática, a obrigação


de aprofundar seus conhecimentos de Psicologia porque não deverá
atuar como autoridade no assunto. Compete-lhe porem conhecer Psi-
cologia para valoriza-la devidamente e para capacitar-se a integrar
uma equipe de especialifitas em História, Didática e Psicologia de mo-
do a ter condições de fornecer os dados necessários à avaliação dos
objetivos e resultados obtidos.
Portanto, como técnica, em educação e estudo da História, atra-
vés da Biografia é válido porque pode servir como grande recurso pa-
ra "sensibilizar" o estudante podendo até ser decisivo no sentido de
ajudá-lo a conseguir a sua própria realidade através da realidade de
outrem, sobretudo quando se trata de personalidades que se destaca-
ram na liderança de grupos ou de povos.
O estudo de personalidades notáveis com base na ciência psico-
lógica pode tornar-se fascinante para o aluno que de um momento
para outro, sentir que está encontrando a verdade e o sentido dos
acontecimentos a partir de si próprio.
Dentro da metodologia científica e através da técnica biográfica
poderá o estudante não só reconstruir o passado da humanidade, mas
dar-lhe vida pela interpretação psicológica do desempenho dos perso-
nagens, ao mesmo tempo em que seleciona e memoriza, necessaria-
mente, de maneira mais natural e expontânea, os acontecimentos ou
fenômenos importantes como causa e/ou efe1to da atuação de suas
figuras representativas.

Ezequiel Cesar Orte~a (1), numa exposição clara e documentada,


dá uma visão compreensiva de épocas e valores obtida através de uma
erudição exaustiva e elaborada.
Alem do panorama detalhado da Biografia, apresenta os pers0-
nagens biográficos em seu meio e em seu momento o que explica cer-
tas peculiaridades e influências inevitáveis, sejam filosóficas, religio-
sas, políticas ou econômicas.
A produção biográfica torna-se, um índice e um símbolo de ca-
da tempo.

"Conhecer os homens que fizeram a História através de sua


biografia é COllTIpenetra~-se da essência humana de hoje e de

(1). - Ezequiel Cesar Ortega, História de la Biografia. Editorial EJ


Ateneo, Buenos Aires, 1945, página 304,
- 909-

ontem aquilatando conceitos e matizes, ap~eciando figuras e


atos de especial significado" (2).

Por este meio, faz-se luz sobre o homem a partir do instante de


sua aparição, concretizada pela sua atitude eterna frente à complexi-
dade dos processos e fenômenos sociais.

Pelo estudo da Biografia, enriquecem-se temas, métodos e con-


teudos: do déspota oriental, como figura protagônica ao estadista e
filósofo grego; do santo e heroi medieval ao artista do renascimento; do
rei absoluto ao homem complexo atual a quem se aprecia em todos
os seus desníveis.
Aprofundando o estudo de algumas figuras máximas como meio
para evocar as qualidades humanas, abarca-se a História em todos os
tempos; mais ainda: projeta-se luz sobre os conceitos e valores do
próprio momento e da prospectiva ...
As tentativas de perpetuar a experiência do homem em sua eter-
na limitação datam de épocas remotas.
O relato de vidas antecede ao histórico - tal como hoje se com-
preende. Xenofonte apresenta Sócrates, numa forma comovedoramen-
te humana, em suas Memórias, que seguem ao Agesilao, primeira bio-
grafia.
Mais tarde, passou-se ao triunfo do espírito científico e filosófico,
predominando como reação saudavel o grande princípio: O homem
deve conhecer-se a si mesmo.
Depois do exame, surge uma consciência clara de possibilidade e
capacidade para que o homem possa enfrentar o estudo de quanto o
rodeia e das leis que regem o universo.
"O homem é a medida das coisas" (Protágoras). Isso ainda não
é biografia mas está intimamente relacionado com seu objeto e con-
teudo: a atenção se concentra no individuo - daí a importância fun-
damental.
O biógrafo não isola os fatos: ao contrário, no decorrer de uma
vida vai colhendo opiniões, dados, sugestões coletivas, mudanças na
moral e nos costumes, na literatura, na filosofia, na religião.
O homem "utilitarista" da república romana, depois do império
decadente, representa as taras e degenerações hereditárias que lhe são

(2). - Ibid. - Prefácio.


- 910-

próprias e tambem o seu seu meio. Disso constituem exemplos típi-


cos: Nero, Tibério, Calígula. . . .
Tácito, Suetônio e Cúrcio dão-nos uma visão nova do homem:
surgiu o detalhe revelador e significativo, a observação fisionômica e
psicológica desentranhando sentimentos.
Na China, Confúncio e Lao Tsé além de poetas são pedagogos.
Sobrevoando épocas, um Dostoyewsjy e um MareeI Proust fo-
ram os intérpretes de interessantes estados de espírito.
Nos grandes homens como no homem comum a par de suas gran-
dezas, os defeitos não deixam de existir porque estão disfarçados. As-
sim surgiram imagens admiráveis de Isabel-a-Católica, de Catarina-a-
-Grande, de Napoleão, Disraeli, Voltaire, Tibério, Churchil, etc., atra-
vés de obras de Zweig, Lacroix, Maurois, Maraiíon.
b biógrafo busca a verdade, a idéia de mobilidade psíquica, o
estudo realista da personalidade e suas reações com as demais perso-
nalidades.
A vida do homem e da sociedade são algo mais que documentos.
Enquanto não se compreender tal coisa. haverá sempre entre a evi-
dência e o homem uma distância incomensuravel.
De tudo se conclui que há um elemento que permanece cons-
tante; a individualidade marcada. Por isso o homem quis, quer e que-
rerá conhecer a imagem do homem .

GREGÓRIO MARA~ON (3).
(1887 - 1960)
Médico e ensaista espanhol, autor da extensa obra sobre proble-
mas de Endocrinologia e Sexologia da qual passou ao estudo psicoló-
gico de vultos do passado como Henrique IV de Castilla y Su Tiempo,'
Amiel - Un Estudio sobre la Timidez, Tibério - História de un
Resentimiento; EI Conde Duque de Olivares - La Pasion de Man-
dar,' Don Juan - Ensaio sobre EI Origem de su Leyenda.
Por ocasião de sua morte, em número especial o seminário
A . B . C. (4) de Madrid, publicou em primeira página:

(3). - Enciclopédia Barsa, edição de 1966, voI. 9, Melhoramentos,


São Paulo, 1966.
(4). - A .B.C. - Seminá~io de Madrid, junho de 1960 - Edição
especial, exemplar enviado pelo consul Nicolau R. Domingues ao escritor
gaúcho Manoelito de Omellas.
911 -

"Depõem sobre o homem que, vencido pela morte, venceu


a própria vida, as glórias maiores de Espanha: D. R:lmon Peres
de Ayala, Azorin, Menendez y Pidal e José Maria Peman.

A ele se referiu ainda o escritor Manoelito de Omenas (5) como


o grande mestre, autor de Elogio y Nostalgia de Toledo e cita em ou-
tro artigo comemorativo do sétimo aniversário de sua morte (6) al-
guns conceitos importantes, extraidos de Obras Completas de Mara-
iion:

- "Inventa-se uma técnica nova e com ela tornam-se a di-


zer coisas eternas, como se fossem recém-nascidas .....
- "Diante de uma tese ninguem pode se arrogar o direito
à última palavra porque os temls, sobretudo os de carater so-
ciológico nunca se esgotam e são, a cada passo, revisados sob
uma nova consciência do problema".
- No capítulo "EI B:asil, en fin": "Tudo que é moderno
tem nesse grande povo uma representação genuina. A gigantes-
ca e trepidante atualidade, com os blocos de suas edificações,
com suas máquinas, com sua fúria de chegar antes, parece que
nasceu ali, para ser dali mesmo".

Ele é, segundo afirma o articulista citado, a rara conjugação de um


estilo de límpida beleza às idéias palpitantes do mundo moderno .

MARAtVON, MEDICO HUMANISTA
MODELO EM EDUCAÇÃO

Sabia o grande mestre, profundamente dedicado ao estudo cien-


tífico dos enfermos que a doença não é só um processo natural, bio-
lógico, no sentido estrito, mas um fato humano. Essa condição hu-
mana é que norteava sua sensib:lidade e esforço em compreende-la.
Pôs em prática esse modo de pensar e de agir, diariamente, na clínica
e usou-o como critério metodológico em suas "biografias biológicas".
A tomada dos antecedentes que cientificamente se denomina
anamnese é a captação da personalidade do enfermo que permite o
aproximar-se da causa patológica alem dos sintomas manifestos que
possibilitam identificar o doença. As técnicas importam para facilitar
o diagnóstico.·

(5). - Artigo publicado no Correio do Povo, junho/1960 - RS.


(6). - lbid., edição de 27-06-1967.
- 912-

o método clínico, aplicado por Maranon à Biografia é o das ope-


rações que integram a anamnese:
1). - Recolher sintomas e reconhecer sua significação;
2). - Os sintomas são experiências de momentos de vida;
3). - Formar-se uma idéia da personalidade do enfermo e por-
tanto, de sua atitude ante a enfermidade. Descobrir a
atmosfera social, familiar e hereditário-biológica que
a integram;
4). - Criar a relação enfermo e médico, que resulta mais com-
plexa do que a primeira vista parece;
5). - Iniciar a terapêutica em forma de catarse. O enfermo
começa a descarregar-se do peso de sua enfermidade.
Gregório Maranon soube ver a enfermidade não como um pro-
cesso de causalidade linear mas como uma pluridade na unidade que
é o que caracteriza a dinâmica humana. Sua vocação historiográfica
provem da preocupação por compreender a vida humana.
A saude é o silêncio do corpo, a ordem no organismo. Há uma
síntese ótima do Eu como há um metabolismo social ótico. Daí evo-
luiu o biólogo-historiador para a integração "psico-histórica" que leva
o pesquisador a mover-se em planos mais profundos da realidade, di-
ferentes dos que habitualmente se maneja (7).
Voltando à História de la Biografia (8), para Ortega, Maranon
representa na plêiade de historiadores famosos, não a biografia ps.ico-
lógica psicoanalítica, intuitiva e estética, mas a biografia de tipo mé-
dico (dai a atualidade de seu enfoque), baseada em investigações re-
centes sobre a endocrinologia e estudos biopatológicos que estabele-
cem as diferenças na constituição dos indivíduos e que forçosamente,
se traduzirão em atos e caracteres.
Para Maranon esta é a única maneira válida. Chegou a isso co-
mo reação frente a tendência tradicionais imperantes na biografia,
mas tambem critica as produções recentes, por seu excesso de psico-
logia, pois deve basear-se sobre uma realidade no presente, mas pas-
sada. O primeiro lhe parece algo artificial; o segundo um tanto arris-
cado.
Escreve Marafion (9):

(7). - Juan José Lopez Ibor, Op. Cit., páginas 9-15.


(8). - lbid., página 312.
(9). - Gregório Maraíion: Tibério, História
- 913-

"Não somente nos esboços históricos como nos grandes


tratados da época moderna, o leitor tem a grande impressão de
que assiste a um grande espetáculo teatral em que, mercê de
pacientes es~udos reconstruiram-se e!SCTupulosamente a paisa-
gem, a indumentária, os gestos, as palavras, da antiga vida ofi-
cial. .. Mas se compara~mos a antiga vida assim ressucitada com
a que está cada um de nós vivendo, percebemos logo a simpli-
cidade daquele artifício. Os personagens que rep~esentam aos
nossos olhos os grandes papeis de protagonistas são, na realida-
de, entes simbólicos. O certo é que cada ser humano encarna
nessa existência papéis distintos: os que lhes impõem as forças
ocultas, brotadas da alma em combinação inexoravelmente va-
riada com as reações do ambiente, dos outros homens e as cós-
micas cujo verdadeiro significado só Deus conhece".

o esforço dos escritores modernos fez-se no sentido de transfor-


mar essa solene representação histórica na simples existência.
Vida e Hist6ria são uma mesma coisa: a História aparatosa do
passado é a nossa mesma vida humilde e cotidiana. A vida de hoje
será amanhã História, tal como é hoje, sem passar pelas retortas mis-
tificadoras dos professores.
Os técnicos da História clássica empenhavam-se sobretudo em
separar no legado da Antiguidade, o que era realidade do que cons-
tituia lenda. O naturalista de hoje sabe que a lenda faz parte da vida
passada e se torna importante e necessária para o conhecimento desta
como a própria História oficial. Com o fato preciso, recolhido pela
História, nasce no mesmo manancial a lenda. Representa esta a rea-
ção do ambiente ante a personalidade do grande protagonista e o
suceso transcendente e ensina-nos, portanto, muito do que foi aquele
amb;ente e a oersonalidade do heroi, isto é, parte da verdade estrita
do acontecimento. -

"Com dados exatos e com lendas devemos pois tratar de reconsti-


tuir a História, interpretando-os com um critério de natu-alis-
tas. Insisto nesta palavra, de nobre amplitude, para afastar a
suspeita de que se trata de defender aqui as interpretações ex-
clusivamente psicológicas dos personagens remotos e suas fa-
çanhas" (lO).

(10). - Ezequiel Cesar Ortega, História a la Biografia Editorial EI Ate-


neo, Buenos Aires, 1945, página 310.
- 914-

Em consequência, a todo momento, em qualquer época, os ho-


mens e a vida social tem sido em essência semelhantes; é necessário
ter em conta essa conclusão essencial e não desnaturalizar o passado
fazendo-o simples com representações artificialmente convencionais.
Mas isso já era do domínio da biografia atual quando Maranon es-
crevia; já se havia reagido contra a teoria dos caracteres, proclaman-
do-se o indivíduo com rica e variada vida interior, pleno de con-
traditórias manifestações que às vezes obedeciam a ritmos estranhos
do micro e do macro cosmos (11).
Que traz Maranon, de novo, então?

"Sua posição é contrária ao excesso de análises psico' ógicas,


sobretudo, por não esta.r presente o sujeito da experiência pas-
sada, opõe-se, pois, a que tudo gi~e em torno das interpretações
de maneira exclusiva pois a vido é algo mais que pontos de
vista parciais de uma disciplina" (12).

Ocorre a necessidade de conhecer não só a realidade mental do


biografado, mas a orgânica que condiciona inexoravelmente e lhe de-
termina os rumos ou velocidade. Isso é inegavel, mas apenas em par-
te original e próprio do célebre endocrinólogo, pois Freud afirma re-
ferindo-se a Leonardo da Vinci que se urna biografia pretende pene-
trar até ao âmago da vida psíquica do heroi, não pode calar sobre as
características sexuais do sujeito corno ocorre quase sempre por dis-
ereção ou hipocrisia.
Maranon faz o estudo completo não somente sob esse aspecto
ainda que o considere decisivo nos casos de Amiel e Henrique IV de
Castilha y su Tiempo (ensaios b:ográficos) .
Henri Frederic Amiel (13) (1821-1881). Pensador e ensaista sui-
ço, nascido e falecido em Genebra. Estudou Filosofia em Berlim
( 1841-48) retornando depois a Genebra onde assumiu as cátedras de
Estética (1849) e Filosofia Moral (1853). Seus apontamentos desper-
taram notavel interesse na Europa, sobretudo na Inglaterra onde re-
ceberam elogios do crítico Matthew Arnold. A filosofia de Amiel ex-
pressa o pensamento de um espírito amargo, inquieto e penetrante,
conquanto assistemático e de uma timidez doentia. Obras princi-
pais: Grãos de Milho, O Pensador, O Quinhão dos Sonhos, As Es-

(11). - Op. cit., página 310.


(12). - Op. cit., página 361.
(13). - Enciclopédia Barsa, volume I, edição de 1966, Melhoramentos,
São Paulo,
- 915-

trangeiros, J. J. Rousseau visto pelos suíços de Hoje, e, sobretudo,


Fragmentos de um Diário íntimo.
Henrique IV, rei de Castella (14) (1454-1474), destronou em
1454 seu pai João 11 (1425-1474). As revoltas da nobreza enreda-
ram-se numa trama política por razões dinásticas, rejeitando como
ilegítima a herdeira do monarca, D. Joana a quem apelidaram "la
Beltraneja" dada a suspeita de que seu verdadeiro pai era o favorito
D. Beltran de la Cueva. Henrique IV, enfastiado e inseguro, acre-
ditou solucionar a questão sucessória transferindo a seu irmão Afonso
os direitos ao trono, satisfazendo aos nobres que o destituiram no ato
aclamando o novo rei. Mas Castella acorreu em defesa do monarca
deposto a quem, depois de morto Afonso, aconselharam proclamar
herdeira do trono sua Irmã Isabel dotada de grandes qualidades e noi-
va de Fernando de Aragon. Assim, Henrique IV foi o imediato pre-
decessor dos Reis Católicos.
Voltando ao tema "biografia" - segundo Ezequiel Cesar Or-
tega, toda abordagem que contenha elementos de verdade é valiosa;
deve-se ter em conta isso para obter o quadro geral tão difícil na re-
construção dos matizes de uma existência. Alem disso, deve-se en-
saiar compreensões. E indispensavel ainda o estudo "patológico" dos
homens, mas ao mesmo tempo se necessita considerar a fragilidade
dos pontos de partida. Henrique IV é uma figura que se enquadra no
caso: estatura exagerada, sem harmonia de linhas; sua torpeza e ti-
midez manifestaram-se antes mesmo de cohabitar com sua primeira
esposa, virgem ao fim de treze anos de matrimônio; seu semblante
trágico, impenetravel denunciava o desequilíbrio evidente de seu or-
ganismo que se traduzia na conduta, manifestando-se em todos os mo-
mentos tanto se tratasse de sentimentos afetivos como de relação. Atu-
almente o diagnóstico clínico, claro e sugestivo seria: tipo displásico,
eunucóide, com reação acromegálica consequente de insuficiência de
secreção interna. Tal é a interpretação histórico-endocrinológica do
"infeliz rei" .
Amiel é um estudo sobre outra modalidade de timidez. Enquanto
Henrique IV de Castella se retraia e evitava a mulher para não se
humilhar, o outro, mais capaz no terreno orgânico manifestava sua
timidez na seleção levada a cabo até ao inverossimil. Não se decidia
a amar por medo de desengano. Essa personalidade interessa ao en-
docrinólogo e ao biólogo não por suas qualidades e valores humanos,
senão por pertencer ao tipo médio que se pode estudar e conhecer

(14). - B. Sarthou e 1. B. Lafond, História Moderna, volume 11, Bue-


nos Aires, 1940,
- 916-

graças ao volumoso Diário íntimo de sua Vida. Tudo nele era perfei-
tamente vulgar, considera Maraiíon: sossegado, respeitoso, pedagogo
clássico e fastidioso - foi tomado às vezes por cretino, mas suas de-
zesseis mil páginas são fascinantes e um convite permanente a novas
investigações.
Por isso, Maraiíon põe maior interesse no corriqueiro, nas pe-
quenas invejas, no "eterno querer analisar-se".
Tudo era anotado com escrupulosidade fria e igual, pela com-
plexa personalidade do biografado. Sabe-se que esteve próximo ao
casamento e à pneumonia; que se afastou do passo sentimental por
conveniência e por cálculo e que se curou da enfermidade por certos
medicamentos dosados de modo a produzir determinados efeitos.
Não obstante, o Diário publicado depois de sua morte chegou a
encantar; cada página revelava um anelo, um desejo de perfeição, o
trabalho e o sacrifício. Que havia? Por que algumas de suas amigas
deram à publicidade somente algumas páginas, ocultando as restan-
tes? Quando tudo se desvendou, o concreto mudou e ao santo se cha-
mou lúbrico, extravagante, não por seus feitos senão por seus pensa-
mentos. Maraiíon o qualifica de tímido diferenciado, comparando-o
a Leonardo da Vinci. Mas Amiel é um ente singular que revoIta mui-
tas vezes. Várias mulheres o amaram: ele se dedicou a analisa-las, le-
vando as coisas comodamente platônicas, tomando-se o pulso para
não acelerar o ritmo... Não aprecia sacrifícios, nem afetos, nem
intenções; deixa de interessa-lo a dor que causa; quando muito, ana-
lisará o efeito produzido pela mulher que chora. Só uma vez desejou
a posse de quem o ofendera plenamente, mas não foi por vertigem ou
paixão: desejava apenas comprovar o fato, para verificar se coincidia
com o que imaginara e ao mesmo tempo já suspe~tava que não. Logo
o relata com absoluta imparcialidade, desenganado.
Com isso, comenta Maraiíon, esse tímido diferenciado acreditou
possuir os segredos do amor e se engana por completo. Em sua ma-
nia, esse cerebral não compreendeu como uma paixão vive, medra,
cresce e mal se pode aprecia-la no tempo.
Tibério, sob a pena de Maraiíon, é um ente demasiado simples.
Um ressentido típico, isto é, um homem que dentro de sua timidez
excessiva, talvez -hereditária, tudo suportou: desde as injustiças come-
tidas para com seu pai até seu divórcio e os adultérios escandalosos
de sua mulher. Tudo ficou no "subconsciente" e como em Roma não
havia psiquiatras, ali tudo permaneceu gravitando durante sua vida.
O
- 917-

isso odiará e, no poder, descarregará sua vingança em qualquer pes-


soa.
No caso de Tibério, o ressentimento foi aguçando a.té com seu
aspecto repulsivo, na maturidade ainda que forte, deformado pela le-
pra. De acordo com a biografia moderna, conclui que

"um homem varia segundo os momentos e as etapas da


vida através da qual não é possível enunciar um juízo nem ne-
cessariamente linhas gerais".

Tal a imagem formada por Maranon do seu ponto de vista, inte-


ressante e verdadeiro complemento necessário dos outros já clássicos.
Outra obra completa sua abordagem do assunto biográfico: O
Conde Duque de Olivares - a paixão de mandar.
Gaspar de Gusman, Duque de Olivares, estadista espanhol, nas-
cido em Roma, cé'ebre ministro de Filipe IV de Espanha, que lhe
cedeu a efetividade do poder. Foi adversário político de Richeleu e
declarou guerra à França. Poucos antes de morrer, perdera o seu va-
limento (1587-1645) (15).
Resultado de perspicácia, de "olho clínico" e profundo labor, é
o enfoque original efetuado por Maranon sobre o grande favorito es-
panhol que em certa época foi tudo.
Interessa ao biógrafo atual a face humana, explicavel somente
com a prolixa e desapaixonada conjunção de aspectos a a.tingir-se de
diferentes maneiras sobre toda uma polifurcação que marcada, sempre
subsiste à linha comum, geratriz: em Amiel, a timidez; em Henrique
IV, sua impotência; em Tibério, o ressentimento; em Olivares a sede
de mando que conhece uma só saciedade e não se extingue nunca, nem
ainda quando a ambição está a par da violência.
Existe em todo indivíduo um instinto de superação, fonte de
eterna e constante desigualdade, manifestado em diversos aspectos:
em alguns, força principalmente quantitativa que os torna fortes em
outros, seu tom é mais qualitativo. Levará à superação, a atividades
antisociais, à glória, ao crime e à paixão do mando. Maranon, se-
gundo Ortega, apesar de cair aos poucos como que em moldes fixos,
típicos e pré-concebidos, apresenta muito de real em suas observações
de endocrinólogo. Analisando a personalidade de Olivares, estuda sua

(15). - Dicionário Prático Ilustrado, Lello & Irmãos, Editores, Porto


- 918-

trajetória para enquadra-lo no tipo comum cuja atuação se divide em


três etapas: na primeira, o ditador que, necessitando do apôio popular
exerce sugestão inegavel na massa por certas qualidades que satisfazem
ao povo, desafiando-o e justificando-se com o número de adeptos; na
segunda fase, tendo realizado seu poderio, sente-se forte, eufórico, ca-
paz de cumprir seus ideais - é, então violento e vence a opinião ge-
ral: no terceiro momento, já cansado, suspira pela paz: o tirano tenta
converter-se em patriarca, mas seus esforços são estéreis porque se
lhe deparam novas forças que representam uma real idade diferente
que o desorienta. E o caso típico de Olivares:
Maranon classifica seu heroi de acordo com a moderna tendên-
cia derivada de fatores comprovadamente constitucionais apresentando
os caracteres biotipológicos, e, a seguir, sob tal luz estuda o indivíduo
mesmo. Evidentemente, em toda a sua obra, a tônica está em certas
características, certas reações e modalidades, mas não de modo abso-
luto, pois, como sempre, leva ele em conta o relativo e o contraditó-
rio, imperando no homem em oposição a teorias deterministas ...
Em se tratando de motivação, muitas explicações embora cientí-
ficas ainda não atingiram o "contraditório" e o "imprevisivel" de que
nos fala Maranon. Há motivações relacionadas a necessidades bioló-
gicas. Mas há também motivos mais elaborados decorrentes do pro-
prium os quais vão alem de necessidades comuns às espécies animal
e humana. Nesse tipo de atuação de alto nivel, originada do pro-
prium poder-se-iam categorizar as idéias-forças que alem de dar uni-
dade à personalidade trazem consigo aquele sentido prospectivo de
que nos fala Cesar Ortega, já citado anteriormente.

"Essas idéias que certos psicológos modernos denominam


idéias-força é que realmente governam o mundo (16) e que se
convertem em leis que regem a História".
"Mentes unilaterais nunca levarão a compreender que a ver-
dade pode ter muitos caminhos" (17).

Em San Martin el Bueno y San Martin el Maio encontram-se


uma original análise e conclusão conceptual histórica sobre o ocaso
de duas vidas a decorrer simultaneamente no tempo (século XIX) e
no espaço (Espanha-França) dentro de um paralelismo humano mas
caracteristicamente contrastante e incompativel.

(16). - Ir. Faustino João, Discurso de Paraninfo, PUCRGS, Porto Ale-


gre, 14 de dezemb:o de 1949.
(17). - Op.
- 919-

Trata-se do General José de San Martin, notavel personagem his-


tórica da emancipação hispano-americana e de José San Martin, aven-
tureiro de origem cigana - nivelados pela ignorância intransigente da
polícia francesa e do paternalismo espanhol da época, o que deu mar-
gem a interpretações equívocas sobre os últimos dias do grande general
emancipacionista, sendo as dúvidas esclarecidas graças a pesquisas rea-
lizadas por Don Gregório Maranon nos arquivos policiais de Havre e
Paris (primeiro documento investigado: F 1 12032 entre outros, datado
de 26 de abril de 1824).
Na conclusão comenta o autor:

"Pode achar o leitor rigorosamente conceptualista um tanto


incongruente que se tenha re'acionado a histó ia de um grande
militar e político com a de um trapaceiro cigano. Mas a reali-
dade é assim mesmo: os dois San Martin, viveram as mesmas
horas do mundo inquieto e romântico dos princípios do século
XIX. Nessas horas, cada qual tinha seu papel a cumprir, tanto o
herói nacionalista como o disparatado aventureiro".

E opina Maranon:

"Tenho ac:editado sempre que sem as vidas turvas que


correm como regatos depois das chuvas, não teriam sua digni-
dade nem sua razão de ser, as vidas solenes que vemos desfilar
sob os arcos triunfais.
Os que cantam romances tradicionais nas pracinhas (recan-
tos espanhóis típicos), costumam por em contraste a vida do
homem bom, e a vida do homem mau. E isso não é arbitrário,
cap:icho, mas algo que dá aos fatos o "tom" humano e seu
grande sentido histórico" (18).

Como se pode mais uma vez constatar, o método histórico de


Gregório Maranon consiste em apresentar os personagens históricos
no cenário da vida cotidiana onde se destacam bons e maus a exercer
estranho fascínio principalmente sobre a juventude atraída pelo espí-
rito de aventura.
Como técnica de ensino da História a nivel médio esse recurso
poderia parecer artificial pela sua aparência novelesca. Mas é justa-
mente esse "tom" humano da busca histórica enquanto se realiza a

(18). - Gregório Maranon, Obras Completas, Volume VII, Editora


Espasa-Calpe. Madrid, 1970.
- 920-

seleção em tomo de valores que conduz à investigação da verdade e


faz sentir a necessidade do método científico.
o adolescente é de início motivado por uma displicente curiosi-
dade e, sem sentir, na bifurcação dos caminhos vê-se envolvido pela
motivação especulativa da verdade e espontaneamente impelido a ten-
tar a investigação histórica.
Los Tres Velez é a última obra de MaraÍÍon que, apesar de te-la
revisado somente até a página dezoito, é a sua derradeira mensagem
através do método bIográfico que para ele é o mais perfeito veículo
de comunicação. Neste livro como em toda a sua vasta e extraordiná-
ria obra médica, literária e histórica - o principal protagonista é o
homem. Nesta biografia nos demonstra MaraÍÍon que os homens real-
mente representativos, em cada época, não costumam ser os herois
de estátua e pedestal nos quais a grande celebridade impõe um con-
junto de traços semelhantes, às vezes, surpreendentemente idênticos,
quaisquer que sejam o século ou o ambiente em que viveram.
Diz o autor:

"Estou convencido de que um dos males da História - a


que se escreve e a que se vive - é ser ela criada sob o padrão,
sempre um tanto arbitrário dos grandes personagens. Por isso,
tenho procurado, em meus modestos estudos biográficos ocupar-
me preferencialmente dos homens como dos demais e cercar aos
próprios protagonistas famosos de um ambiente, o mais copioso
possível de outras pe~sonalidade, secundárias ou menos que se-
cundárias.
Com isso quero dizer tambem que, para mim, o mais eficaz
da História é a Biografia, não obstante a tendência de explicar
a História pelo puro acontecimento. Muitas dessas tentativas são
verdadeiramente lúcidas e válidas como lições mesmo que apre-
sentem algum ponto de escolaridade arbitrária. Mas os acon-
tecimentos são criados pelos homens enquanto que o conhe-
cimento dos homens, contendo seu conteudo pessoal até onde se
pode conhece-lo, é indispensavel para interpretar a realidade de
cada época.

Enquanto que ao homem se perde de vista, como ser vivo, con-


traditório, sujeito·a sua própria evolução e a evolução de quanto o ro-
deia e se converte, como ocorre nos compêndios, um herói que repre-
senta o bem e o mal, a generosidade ou o egoísmo, a inteligência ou a
torpeza, a fortuna ou a má sorte, a História se converte por sua vez
- 921-

Claro é que uma biografia não consiste no mero relato de uma


vida isolada de seu ambiente. Ao contrário, o essencial dela é o am-
biente compreendido como a herança e o espírito da época, que são as
duas forças que modelam com mais fundo vigor a personalidade hu-
mana; a herança porque supõe o passado que inexoravelmente nos go-
verna em sua forma específica, peculiar para cada indivíduo; o espí-
rito da época porque representa a influência, tambem poderosa que o
meio exerce sobre cada um dos homens do tempo em que viveram.
Dessas duas forças dependem os seres humanos; a maioria porque as
obedecem passivamente e os gênios porque as superam ou tentam su-
perá-las o que não deixa de ser uma forma de reagir à própria escra-
vidão.
Los Tr~s Velez estiveram no seu tempo e estão ante a História,
ligados como os demais homens a seu passado e a seu presente, a sua
herança e a seu ambiente, de tal modo que representam protótipos de
três épocas culminantes da vida espanhola as quais ainda que remotas
continuam influenciando a atualidade. Essas três épocas são: o reinado
auroral dos Reis Católicos, em que se forjaram a unidade e a grandeza
de Espanha; o de Carlos V, que viveu e deu carater universal à matu-
ridade dessa grandeza; e o de Filipe II que representa a limitação e,
portanto, o começo rápido do seu ocaso. Nas três épocas se vê bem
a influência, a evolução humana que Deus rege, ratificada por uma mu-
lher absolutamente genial, por seu neto, de genialidade já terminal e
por seu bisneto, grande todavia, mas irremediavelmente decadente.
A vida dos três Velez coincide com a evolução de um ciclo exem-
plar da Espanha. São três homens representativos, importantes, ainda
que não de primeira linha, com as mesmas virtudes e os mesmos de-
feitos característicos de cada etapa e dos grandes protagonistas que as
regeram; e com muito mais direta e palpitante humanidade que a
maior parte destes.
Poder-se-ia eleger outros com o mesmo sentido experiencial, mas
evidenciaram-se esses três pela claridade do sentido histórico de suas vi-
das e porque os ligava como a dos três reis citados, a mesma força da he-
rança e do espírito do seu tempo, que pode resultar boa ou má. Alem
disso foram eles importantes protagonistas em três grandes aconteci-
mentos que se constituem como símbolos desses três reinados: a guerra
civil das Comunidades, a sublevação dos mouros de Granada e o as-
sassinato de Jean de Escobedo que representa nada menos que o ocaso
de grande rei Filipe II e o ostracismo de um heroi legendário: Don
Juan de Áustria.
Os personagens apesar de suas qualidades, apresentam-se deca-
- 922-

Cada cn.tico tem suas preferências antes o espetáculo dos seres


humanos. Mas todos podem ser e~plicados ajudando-nos a compre-
ender os acontecimentos muitas vezes fatos-chaves da vida atual.

*
MARAAON E AS CI~NCIAS HUMANAS.

A corrente psicológica estruturalista iniciada por Wundt (1832-


1920) ao criar o primeiro laboratório experimental para o estudo dos
dados imediatos da consciência, centrado nos estados mentais ou con-
teúdos da mente - deu à Psicologia cara ter científico.
O funcionalismo, tendo em Dewey seu expoente máximo, atenta
mais para as funções ou processos mentais, sobrepondo estes à morfo-
logia e estrutura da mente.
Watson, ao criticar o Estruturalismo e o Funcionalismo pela sua
falta de cbietividade. dá ênfase ao comportamento (behavior). Assim
enquanto o behaviorismo se insurge contra a base intelectual das dou-
trinas anteriores, o Gestaltismo, surgido na Alemanha, afirma que os
fenômenos psiquícos não podem ser explicados pela soma das partes,
mas pela forma (gestalt) do todo.
Atualmente é possivel provar que existem nesta pluralidade de
correntes, muitos pontos comuns, como por exemplo, a objetividade
dos processos psíquicos bem como a necessidade de ter sempre em
vista a totalidade do fenômeno psíquico.
No estudo da Personalidade que, segundo Allport (19) é a orga-
nização dinâmica no indivíduo dos sistemas psicofísicos que determi-
nam seus ajustamentos ao meio - a idéia de unicidade e de totalidade
correlaciona os princípios básicos de estrutura, forma e duração num
só esquema, pelo menos em tendência que se afirma caracteristica-
mente através da conduta. Entretanto, neste estudo, duas teorias pa-
recem opor-se:
- A Caracterologia que considera a personalidade como estru-
tura funcional estavel formando tipos em número limitado; e
- A Personologia que dentro de um esquema evolutivo, estuda
os fatores dinâmicos da conduta, as motivações e complexos centrais,
visando à função integrativa da personalidade.

(19). - Gordon W. AlIport, Desenvolvimento da Personalidade, Edi-


tora Herder, São Paulo,
- 923-

Os aspectos principais a focalizar no estudo da personalidade são:


- Os dados psicofísicos;
- As transformações da conduta e a fixação de certos tipos de
comportamento;
- As condições de unidade do Ego e de Identidade Pessoal;
- A cultura, determinante de conceitos de comportamento.
A partir desses fatores é que a Antropologia e a Psicologia che-
garam ao conceito de Personalidade-Base que seria a resultante de
correlações entre as instituições da cultura e da personalidade levando
ao conceito de personalidade sob o prisma e ação aceitos por determi-
nado grupo e inspiradores das instituições sociais.
O estudo da personalidade-base induz a considerar seus três com-
ponentes:
- Estrutura básica que pode ser comum a toda espécie humana;
- tendências individuais sobre as quais a cultura mais influi,
chegando a ocasionar tendências centrais chamadas "personalidade mo-
dai", denominador comum dos membros de um grupo.
Esta correlação consütui a fonte de maior contribuição da Psico-
logia às ciências sociais, levando ao próprio conceito de "carater na-
cional" porque parte da unidade psíquica da humanidade chegando
às diferenciações culturais através de escolhas e rejeições; estas, ope-
radas sobre os dados culturais, comuns, acabam por configurar os ti-
pos culturais característicos das diferentes áreas geográficas (origem do
conceito de povo e de nação). Tal conjunto de traços configura o
carater nacional que, em última análise, se identifica com o de persona-
lidade-base, isto é, a base da personalidade para os membros de um
mesmo grupo sociaI.
O confronto da obra de MaraÍÍon (biólogo, historiador, médico,
ensaista e psicólogo) com uma visão geral retrospectiva da Psicologia
Científica, dá ao autor de Tibério, uma posição privilegiada, quanto
à base científica dos temas que aborda. Sua abertura para explorações
futuras dos mesmos temas, ao admitir o imponderavel e o contradi-
tório no homem como um todo psicofísico, condicionado à influência
de fatores internos e externos, da-lhe tambem não só autoridade, mas
atualidade, face à ciência. Isso vem valorizar a contribuição do autor
em estudo, bastando saber enquadrar suas abordagens numa sistemá-
tica adequada.
• •

- 924-

BIBLIOGRAFIA:

ALLPORT (Gordon W.), Personalidade. Editora Pedagógica, Rio de Ja·


neiro, GB, 1973.
ALLPORT (Gordon W), Desenvolvimento da Personalidade, Edito:'a Herder,
São P ~ulo, 1962.
ANGELINI (Arrigo Leonardo), Motivação Humana. Editora José Olímpio,
Rio de JaneÍlo, GB, 1973.
JUSTO (Henrique), Carl Rogers: Teoria da Pel sonali..'ade. Livraria Sar,to
Antônio, Porto Alegre, RS, 1972.
LERSCH (Phillip), A Estrutura da Personalidade. Editorial Sciencia, Bar-
celona, 1971.
MOULOUD (Noel), Psicologia y Estruturas. Editorial Columba, Buenos Aires,
1970.
MARAN"ON (Gregó io Posadilla), Obras Completas, Vol. VII, Edito.a Espasa-
Calpe, Madrid, 1960.
MARAN"ON (Gregó'io Pasadilla), Tibério - Historia de un Resentimiento.
Editorial Espasa-Calpe, Madrid, 1940.
MARAN"ON (Gregó io Posadilla), Espana Y la Historia ,.'e América, Discurso
Inaugural dei XXVI Congresso Internacional de Ame icanistas, 12-10-
1957.
MARAN"ON (Gregó··io Posadilla), Vocação e Etica. Publicação Universidade
da Bahia, 1957.
MARAN"ON (Gregório Posadilla), Los Tres Velez. Editorial Espasa--Calpe,
Madrid, 1962 (Ed. Póstuma).
ENTRALGO (Pedro Lain et alli), Cuadernos Hispano-Americanos, Instituto
de Cultura Hispanica, Madrid, 1970.
SARTHOU (B) e LAFOND (1. B.), Htstó.··ia Moderna, Ed. Imp enta Lo-
pez, B. Aires, 1940. Vol. lI.
A.B.C. Semanário de Madrid. Edição Especial, junho/1960.
ORNELLAS (Manoelito de), Artigos publicados no Correio do Povo, Edições
de junho/1960 e junho/1967, Porto Alegre, RS.
BARSA, Enciclopédia. Vol. 9. Editora Melhoramentos, São Paulo, Edição/
1966.
• •

INTERVENÇOES.

Do Prof. David Gueiros Vieira (Universidade de Brasília).


Disse:
"A
- 925-

grafia para inculcar sentimentos "patrióticos" e a formação de "bons ci-


dadãos". De que maneira a Prota vê a biografia do ponto de vista de
Erik Erickson, que tenta fazer uma interpretação psicoanalística das
personagens históricas?"

Do Prof. Roberto Machado Carvalho (Faculdade de Filosofia, Ciên-
cias e Letras de Moema. SP) .
Pergunta:
"1. - Qual o critério para a escolha do personagem?
2. - Qual o número ideal de personagens? Não haveria influên-
cia na escolha de personalidades heterogêneas?
3. - Não existe o perigo do heroi sobrepor-se aos fatos de uma
época no contexto de interrelacionamento?"
* •

RESPOSTAS DA PROFESSORA MARIA NASCIMENTO BAR-
NEWITZ.

Respondeu:
Ao Prof. David Gueiros Veira.
- A utilização da biografia, com o objetivo que remonta a ve-
lha Roma para despertar sentimentos "patrióticos" visando à forma-
ção de "bons cidadãos", ainda nos parece válida para a atualidade.
O risco a se evitar estaria na mistificação dos personagens pela exal-
tação exagerada de suas qualidades "heróicas".
- Quanto ao ponto de vista de Erik Erickson, que submete o
personagem ao crivo da psicanálise, estamos com Gregório Maraiíon
quando faz restrições ao tratamento psicoanalítico que ele só aceita
para casos extremos, porque considera o inconsciente do homem co-
mo um âmago sagrado pela natureza para que nele ficassem sepulta-
dos experiências que ao próprio homem repugna aceitar. Maraiíon re-
corre à análise do inconsciente "como quem entra num templo" e so-
mente quando os recursos da anamnese foram exgotados e uma solu-
ção se impõe a qualquer preço.

Ao Prof. Roberto Machado Carvalho.
- Por enquanto, o critério para a escolha dos personagens tem
se restringido, em
- 926-

Em segundo lugar, à preferência dos alunos, desde que não interfira


demais no planejamento, que embora flexivel, deve estar condicionado
ao currículo.
- Sendo a técnica proposta destinada a orientar a motivação do
estudante no sentido de estudar a História de modo mais significativo,
não interessa propriamente o número dos personagens, mas sua influ-
ência na época em que viveu e a explicação psicológica de sua con-
duta para as 6pocas posteriores. A heterogeneidade só viria aumentar
o interesse atenuando-se sua possivel influência sobre o estudante pela
contribuição que o "diagnóstico" da personalidade trará para o seu
auto-conhecimento.
- Atualmente, ao conhecer os defeitos e/ou a grandeza das fi-
guras representativas dos fatos históricos não mais se fazem ídolos,
mas faz-se tudo para se conhecer o homem. O
DOCUMENTAÇÃO EM HISTÓRIA ORAL (*).

GEORGE P. BROWNE
da Seton Hlll University lUSA)
W ALTER F. PIAZZA
da U.Jversidade Federal de S.mta Catarina.

I. - INTRODUÇÃO. GENERALIDADES.

História oral é a designação dada ao conjunto de técnicas utili-


zadas na coleção, preparo, e uttlização de memórias gravadas para ser-
virem de fonte primária de pesquisa a historiadores e cientistas sociais.
Desenvolvidas na Europa e nos Estados Unidos durante os últimos
vinte e cinco anos, estas técnicas estão sendo ho:e aplicadas em todo
o mundo, inclusive no Brasil. O propósito desta comunicação é Je
servir de rápida introdução à História Oral, demonstrar como vem
sendo utilizada na Universidade Federal de Santa Catarina, e sugerir
possíveis utilizações desta técnica em apôio ao ensino da História em
nível universitário.
O trabalho inicial da História Oral consiste na gravação em fita
magnética de entrevistas conduzidas por um historiador, devidamente
preparado, com uma pessoa ou pessoas capacitadas para informarem
em primeira mão sobre acontecimentos que tenham interesse para his-
toriadores e cientistas sociais. A entrevista geralmente segue uma for-
ma aberta, cabendo ao entrevistador dirigi-la partindo de um plano
pré-estabelecido, mas atento para as possibilidades de aproveitamento
e exploração de assuntos correlatos, dos quais o entrevistado demons-
tre conhecimento pessoal. A entrevista busca, não somente a versão
do entrevistado sobre os acontecimentos que presenciou ou participou,
mas, tambem. sua motivação, sua visão de colaboradores e oponentes,
e suas reflexões sobre o desfecho e efeitos desses acontecimentos. A

(*). - Comunicação apresentada na 3\\


- 928-

utilidade desta informação se estende a muitos ramos da disciplina,


desde a biografia e a História Política. História Social. Econômica, a
Intelectual, e aos desdobramentos destes, como a História Rural, étnica,
regional, religiosa, ou de relações internacionais. :E: óbvio a utilidade
destas técnicas para coleta de informações junto a grupos mal instrui-
dos ou analfabetos. Limitações técnicas cercam seu alcance da His-
tória Contemporânea, ao mundo dos ainda vivos, pelo menos quanto
à fase da coleta de informações. Do ponto de vista do pesquisador, já
existem acervos de documentação assim recolhida que refletem acon-
tecimentos ainda do século passado, e na medida que se alastrar a sua
utilização deverá crescer o alcance e valor da História Oral para o his-
toriador. Para os cientistas sociais, o material e as técnicas de história
oral tambem abrem novas perspectivas. Como todos eles, do cientista
político e sociólogo ao linguista e psicólogo, trabalham com dados de
natureza histórica, a História Oral oferece-lhes outra fonte de infor-
mações e. pelo seu carater individualista e reflexivo, dá nova dimen-
são a assuntos de seu interesse. :E: justamente este carater individua-
lista que tem proporcionado aos trabalhos baseados, em parte, em fon-
tes de História Oral um toque de calor humano, uma vida ou vivacidade,
ausente em muitos estudos acadêmicos.
Uma vez gravada uma entrevista de História Oral, deverá ser a
mesma transcrita fielmente em forma datilografada. Uma vez verifi-
cada a correção de quaisquer erros de fato ou equívocos pelo entre-
vistado, a transcrição se toma documento-base para o pesquisador,
que poderá, no entanto, recorrer à gravação para verificar a interpre-
tação de informações que se poderia modificar pela entonação ou com-
passo da voz. Por meio de contrato firmado entre o entrevistado e a
agência depositária da entrevista, ajustam-se as condições de utiliza-
ção da fita e sua transcrição. Neste processo de controle pelo entre-
vistado da utilização do material doado em sua entrevista reside va-
liosa contribuição das técnicas de História Oral. Este controle pode
chegar ao sigilo aplicado a toda ou parte da entrevista por tempo de-
terminado. Ciente da possibilidade de manter selada informações que
poderiam ser injuriosas ou embaraçantes a outrem, o entrevistado po-
derá dar informações de natureza pessoal ou confidencial na certeza
de que não serão reveladas ou utilizadas até que a passagem do tem-
po lhes tire a capacidade de causar danos. Sendo a História Oral um
método de coleta de informações históricas em que intervem direta-
- 929-

memorialista; pode o entrevistador lançar mão de artifícios para arran-


car informações do entrevistado? Finalmente há perigo de que o abuso
das técnicas acarrete na destruição de sua credibilidade a indivíduos
ou grupos que teriam memórias de valor a legar resultando em danos
não só ao trabalho do historiador individualmente, mas do colega de
profissão. Limitamo-nos a indicar os tipos de problemas mais comuns
e a sugerir que a ciência de sua existência, geralmente permite solu-
ções antes que se tornem insolúveis.
Tanto para o historiador que recolhe a entrevista de História Oral,
para as suas pesquisas, como para aquele que aproveita de material
colhido por outros, estas memórias têm que ser analisadas com o mes-
mo cuidado que qualquer outra fonte histórica. Embora seja raríssimo
um memorialista deliberadamente mentir ao entrevistador bem prepa-
rado, a memória humana é falha, faz-se o engano por maior que seja
a sua boa vontade. Tem-se, então que confrontar as informações da
entrevista da História Oral com aquelas de outras fontes; tem-se que
julga-las com um cuidado natural de quem procura aproximar-se as
máximo da realidade dos acontecimentos. Pode a História Oral esc1a-
recer os fatos, dados que nos faltavam. mas seus maior valor não se
resume a isto. Pode o memoralista esclarecer sua motivação - mui-
tas vezes personagens teriam agido por razões diversas daquelas que
lhes atribuiríamos, que talvez não lhe se figurasse importante esta de-
cisão, embora nós agora a percebêssemos como crucial.
Pode o memorialista nos fornecer perspectivas novas dos seus
contemporâneos, uma visão expressiva do gênio de pessoa com quem
conviveu e trabalhou, uma avaliação, menos torcida pelo tempo, da
apreciação do oponente político, uma piada irreverente que ilumina
uma faceta básica de um carater. Finalmente, pode a memória de
História Oral produzir reflexões e definições acerca do passado que
de outra maneira talvez nem chegassem a ser formuladas pelo memo-
rialista - segundo James Wilkie da Universidade de Califórnia, em
Los Ange!es, o memorialista político vê a entrevista de História Oral
como meio de se justificar expressando completamente sua motivação,
de modo que ninguem possa deixar de se convencer. Tem, então, de
se organizar, de se expressar logicamente com um rigor dificilmente
alcançavel por outro meio. Embora a História Oral seja um método
lento e dispendioso de criação de fonte histórica oferece então múl-
tiplas aplicações, visões diferentes do passado, reflexões mais profun-
das do que as fontes tradicionais. Voltemos então a atenção para os
resultados da História Oral na Universidade Federal de Santa Cata-
rina.

- 930-

lI. - A UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATA-


RINA, A HISTORIA ORAL E O MEIO BRASILEIRO.

Partindo da experiência desenvolvida durante o 1.° Curso de Es-


pecialização em História, em nivel de pós-graduação, quando se mis-
nistrava dentro da disciplina "Metodologia da pesquisa histórica",
"Técnicas de História Oral", a cargo do Prof. Dr. George P. Browne,
o Departamento de História da Universidade Federal de Santa Cata-
rina, em reunião de 21 de novembro de 1974, aprovou a implantação
de Programa de Documentação em História Oral, dentro do Programa
Departamental de Pesquisa Histórica.
Durante o referido Curso de Especialização foram efetuadas 35
(trinta e ciaco) entrevistas, perfazendo cerca de 1.000 (hum mil) pá-
ginas de transcrições de contribuições da mais variada espécie ao co-
nhecimento da História Regional. Posteriormente, outras entrevistas
foram realizadas e estão sendo transcritas.
A implantação do aludido programa de Documentação em His-
tória Oral está sendo objeto de estudos pelos orgãos superiores da Uni-
versidade (processo n.o 022052/74).
Por outro lado entrou a Universidade Federal de Santa Catarina
em contato com a Columbia University, de New York [USA.], para
um convênio de cooperação técnica e científica recíprocas.
Visando dinamizar mais este programa, que está sendo sustenta-
do por vários professores do Departamento de História da Universi-
dade Federal de Santa Catarina, foi selecionado e participou do Curso
Intensivo, recem realizado em julho de 1975, no Rio de Janeiro, sob
os auspícios da Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino
Superior (CAPES) e da Fundação Getúlio Vargas, o Prof. Carlos Hum-
berto Pederneiras Corrêa.

IH. - O USO DA HISTORIA ORAL COMO INSTRUMEN-
TO DIDATICO.

O fim básico de História Oral


- 931-

seu passado, e 1)Or conseguinte em fatores mais remotos que influiram


em suas situações atuais. No nivel secundário, os trabalhos realizados
pelos alunos para a produção da revista Fox/ire, em Tennessee, não
só tem preservado importante informação de interesse folclórico e his-
tórico, como tem despertado interesse semelhante em muitos e diver-
sos pontos do país. Tendo estes sucessos como base, visa esta parte
do trabalho indicar possíveis utilizações da História Oral alem da-
quela já apresentada com base na experiência do programa de pós-
graduação da Universidade Federal de Santa Catarina.
Um dos problemas do ensino tradicional de história é seu amplo
alcance cronológico e espacial e sua consequente falta de relevância
imediata à experiência do aluno. Embora os programas de história
nas Universidades brasileiras esteiam tão circunscritos a uma progra-
mação oficial como os dos Estados Unidos, existe sempre a possibili-
dade de trabalho extra ou paralelo que permitiria ao professor e alu-
nos examinar, por meio de pesquisa, elementos locais ou regionais que
ilustram e vivificam a História geral que se estuda. Ao mesmo tempo,
tais trabalhos têm a capacidade de servir de introdução à pesquisa his-
tórica da parte dos alunos. Exemplifiquemos o trabalho de História
Oral que poderia servir de complemento a um curso, de nivel univer-
sitário de História do Brasil. No vale do Itajaí, Santa Catarina, po-
der-se-ia entrevistar um ou mais colonos, filhos de imigrantes alemães
e italianos que ainda conservam tradições acerca da migração paterna
e viva memória dos problemas de integração ao meio brasileiro pro-
porcionado pelo isolamento das colônias estrangeiras no século XIX
e pela crise de nacionalização precipitada pela ascendência nazista na
Europa e pela participação brasileira na segunda Guerra Mundial.
Tais assuntos serviriam não somente para ilustrar ao aluno as variá-
veis do desenvolvimento brasileiro nos séculos XIX e XX, como a
interdependência existente entre a História brasileira e a européia -
tudo de um modo direto, íntimo por serem as pessoas entrevistadas do
seu próprio círculo de conhecidos.
Permitam-me (Browne), como filho e neto de brasileiros, o exem-
plo de como experiência pessoal levou-me à condição de brasilianista
especializado em história da migração. Como criança fui frequente-
mente entretido pelas estórias da minha avó, criada em Americana,
São Paulo, neta de americanos que se recusaram a ser "reconstruidos"
- 932-

contínuos estudos sobre a história da imigração brasileira, já num âm-


bito francamente maior que aquele da migração confederada. Não te-
riam nossos conterrâneos semelhantes histórias para espicaçar o inte-
resse e a compreensão de novas gerações brasileiras?
A História Oral oferece-nos novas oportunidades para explorar
essas possibilidades. Em Marechal Rondon, Estado do Paraná, temos
amplo campo para estudo do desenvolvimento da "fronteira" brasileira
nos anos recem passados. Em Brasília existe todo o processo de de-
senvolvimento duma nova cidade em pleno século XX, com repercus-
sões que se estendem centenas de quilômetros ao redor. Outras pos-
sibilidades restam ao poder de imaginação do professor e de seus alu-
nos em situações locais. Como tem mudado nosso município, Estado,
região, nos últimos cinquenta anos, e quais as implicações desta mu-
dança no cenário nacional e mundial.
Dependendo das circunstâncias pode-se dar maior ou menor de-
senvolvimento a projetos de História Oral dentro de cursos de História.
Nos parece, porem, essencial a participação dos alunos nos projetos.
Tal participação iria desde a escolha da pessoa (pessoas) a ser entre-
vistada, ao preparo das perguntas a serem feitas - implicando isto em
pesquisa prévia à condução da entrevista, ao preparo e correção de
transcrição, e à análise final dos resultados. Embora tal participação
dos alunos implique em maiores trabalhos de preparo e direção da
parte do professor, os resultados serão de muito mais interesse e valor
para os alunos do que um trabalho feito e simplesmente apresentado
nelo professor.
De semelhante feita, um trabalho de História Oral, como centro
de uma introdução à metodologia da pesquisa histórica, oferece gran-
des possibilidades de entusiasmar o aluno. Nesta circunstância se lhe
oferece um assunto semi-<:onhecido e a oportunidade/necessidade de
uma pesquisa preliminar para bem aproveitar a entrevista, e esta ofe-
rece-lhe grande variedade de problemas de interpretação e análise his-
toriográfica de que pode aproveitar o professor-orientador para efeitos
didáticos. Numa turma grande poder-se-ia propor um tema comum,
por exemplo: uma História da Universidade, que levaria os alunos a
trabalharem em vários aspectos de interesse individual, alguns com
História Oral, outros com fontes estatísticas, fiscais, etc.

Finalmente apontaríamos a História Oral como um instrumento


valioso na direção de alunos fazendo pesquisa em nivel de pás-gra-
duação. Toda a História Contemporânea tem aspectos suscetíveis à
utilização de material de História Oral,
- 933-

pesquisa é a base essencial do trabalho de pós-graduação, urge a utili-


zação destas técnicas neste quadro. Naturalmente, não queremos com
isto sugerir que a História Oral seja uma panacéia a resolver os pro-
blemas do historiador, aprendiz ou mestre. f: ela uma técnica de co-
leta e utilização de dados primários que toma seu lugar junto à quan-
tificação, à análise psicológica de fontes, e outras técnicas como arma
de versatilidade ainda não completamente analisada do historiador mo-
derno.

* *
*
Sugestões Bibliograficas.

MOSS (William M.), Oral History Program Manual. New York, 1974.
BAUM (Willa K.), Oral History for the local Historical Society. Nashville,
1971.
WILKIE (James W.), Elitelore. Los Angeles, 1973.
WILKIE (J ames W.) & WILKIE (Edna Monzon de), M exico visto en el siglo
XX; Entrevistas de Historia Oral. Mexico, 1969.
MASON (Elizabeth B.) & STARR (Louis M. S. ), Oral History Collection,
Columbia University. New York, 1972.

* *
*

INTERVENÇÃO.

Do Prof. Jaelson B. Trindade (IPHANjSP).


Disse:
"O Prof. Walter F. Piazza coloca a História Social como sendo
a História Anônima, a do povo. Bem, mas a História do Homem que
escreve, que administra, que governa, não é também História Social,
não é a do povo? Ou é a do intelectual?
Bem, então se todos eles são sociais, o que diferenciaria a Histó-
ria seria a das teorias explicativas, as categorias econômicas e o mé-
todo usado pelo historiador, que segue uma visão do mundo de tal
ou qual modo de ver a realidade por classes, grupos, frações. Então,
qual a relação entre a objetividade e subjetividade do historiador e do
entrevistado? Entre os métodos correspondentes e a técnica? Ou
- 934

• •

RESPOSTA DO PROFESSOR WALTER F.PIAZZA.

Ao Prof. JO'elson B. Trindade.


Respondeu:
"A experiência da Universidade Federal de Santa Catarina foi ini-
ciada com alunos do Curso de Especialização em História, em nivel
de Pós-graduação, inicialmente atingindo 35 entrevistados, hoje, acres-
centadas mais 21 entrevistas. O que interessa é o material recolhido
das "memórias vivas" e evitar-se, -
"OS SERTÕES" - HISTÓRIA E ARTE (*).

AMÉLIA FRANZOLIN TREVISAN


da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de
São José do Rio Pardo.

A presente comunicação tem como objetivo - seguindo a orien-


tação do Ciclo de Estudos Euclidianos - uma tentativa de penetra-
ção vertical no universo discursivo do pensamento euclidiano.
Considerando que para apreciar devidamente uma obra, é pre-
ciso antes de tudo entende-la e ao seu Autor, colocamos, de início,
uma proposição:
- Euclides da Cunha pretendeu criar uma obra de arte literária,
ou seu elan criador projetou-se no sentido de fazer do relato da Cam-
panha de Canudos, história pragmática, visando à conscientização dos
problemas nacionais?
Abstraindo-se, por ora, a defasagem existente entre intenção e
realização, tomemos como ponto de partida a "Nota Preliminar" de
Os Sertões (2) na qual o Autor afirma:

., . .. este livro, que a princípio se resumia à história da


Campanha de Canudos"
". .. tentamos esboçar, palidamente embora, ante o olhar
de futuros historiadores"
aliada as vicissitudes históricas"
" ... força mortiz da História"
.. . .. deles de todo nos separa uma coordenada histórica -
o tempo"
.. . .. façamos jus ao admiravel conceito de Taine sobre O
narrador sincero que encara a história como ela merece"

("'). - Comunicação apresentada na 2\\


- 936-

" Tucídides, ao escrever a Hist6ria da guerra do Pelo-


poneso"

Como vemos, em apenas pagma e meia, Euclides da Cunha re-


feriu-se sete vezes de maneira enfática, ao verbete "história". As pa-
lavras, quando usadas como significação, mais do que descrição, re-
cebem um valor arbitrário e sua incidência revela a preocupação do
escritor em determinado assunto. Daí a importância de se estudar tais
verbetes em sentido relacional, pois os mesmos, em dado momento do
texto, assumem conotações específicas. E: o caso da palavra "história",
altamente significativa neste texto de apresentação do livro.
Lembrando que nem só os grandes temas, cuidadosamente elabo-
rados pelos autores, nos dão a chave de seu pensamento - como não
só é a crítica especializada que pode levar-nos à compreensão de uma
obra, vemos que Max Weber, o introdutor da sociologia na História,
ao analisar o comportamento do protestante, não estudou apenas as
obras dos grandes reformadores Lutero e Calvino. Ele foi procurar
as pastorais que eram conselhos dos Pastores, face a problemas práti-
cos da vida. Assim pode ele captar algo de vivo e real que não se
encontrava nas doutrinas representativas de um ideal inalcançavel por
nossa condição humana. Os atos triviais e as apreciações indiretas po-
dem muito bem ser a fonte que nos conduz ao rio.
Esta razão por que não apresentamos textos de Olímpio Sousa
Andrade, Venâncio Filho, Gilberto Freyre ou Nelson Werneck Sodré.
Escolhemos um documento indireto: o parecer de Afonso Celso sobre
a admissão de Euclides da Cunha como sócio do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro. E: um parecer quase jurídico, de ordem prática
e não foi escrito para ser publicado. E Afonso Celso, alem de mo-
narquista e aristocrata - política e socialmente o reverso de Euclides,
- não era seu amigo pessoal. Sua opinião foi inteiramente isenta e
interessa à linha desta comunicação. Afonso Celso assim relatou:

Os Sertões possuem alto valor científico, alto valor histó "ico


e alto valor moral, sem falar no inestimavel valor literário.
Provem o valor científico dos amplos dados geológicos, geográ-
ficos, psicológicos que reune acerca de vasta zona de nosso País.
O valor histórico está em que constitui minuciosa e interessan-
tíssima crônica das t~ágicas
- 937-

Nesta análise tão viva Afonso Celso relevou quatro valores: o ci-
entífico, o histórico, o moral e o literário. Para facilidade de análise
separamos estes valores em dois grupos: o histórico - abrangendo o
científico e o moral e o literário.
Englobamos o valor moral à história, porque imparcialidade, in-
dependência, elevação, juizos de valor são traços inerentes ao carater
do historiador; e por ser a inclusão de dados geológicos e psicológicos
em Os Sertões, decorrente da clara intenção do Autor de ultrapassar
o sentido de crônica restrita à uma campanha militar; seu intuito foi
expressar uma tomada de consciência dos problemas nacionais, atra-
vés de uma história não eventual, num estudo do social - passado e
presente com vistas ao futuro.
Um dos mais profundos problemas da teoria da história, e que
foi objeto de polêmicas desde o final do século XIX - juizos de va-
lor - colocou a indagação:
"Até que ponto o historiador pode e deve ser objetivo?"
A idéia de ciência que dominou o século passado, tentou atribuir
à história categoria e carater científicos; daí o sentido de objetividade
enunciado por Leopoldo Ranke de "apenas mostrar como realmente
aconteceu", excluindo a participação do historiador no processo. To-
davia o sentido de objetividade importou em dois fatores principais:
1.°). - um rígido carater científico baseado em leis.
Sendo a lei a relação constante entre um fenômeno e a sua causa,
como estabelecer leis históricas? Através de fatos repetitivos? Porem é
certo que a história se repete? De modo absoluto, não. O que cai no
tunel do tempo não volta mais; existem fatos semelhantes, mas nunca
idênticos em todos os matizes; essa identidade só poderia ocorrer atra-
vés da convergência de três elementos; tempo, lugar e autoria absoluta-
mente ineptíveis em conjunto.
O
- 938-

Euclides, expressando-se a respeito de Guilherme Ferrero, historiador


e conferencista italiano de grande fama, a quem chamou de medíocre
por ter afirmado "haver descoberto uma lei histórica" (3). A esse res-
peito Euclides completa:

" ... muito ao arrepio das idéias correntes (o .• ) tenho que


é impossivel conjugar-se a simplicidade das leis físicas com o
intricadíssimo dos fatos morais, submetendo-se à mesma norma de
pesquisas o menor e mais simples dos ino~ganismos, e o maior
e mais complexo dos organismos" (4).

Torna-se impossivel ao historiador atribuir à sua obra, um rígido


carater científico baseado em leis universais. Mesmo as ciências cha-
madas exatas, tomaram-se, em seu acelerado progresso, mais flexíveis;
substituiu-se

"o certo pelo infinitamente provavel; o rigorosamente men-


suravel pela noção da eterna relatividade da medida"; "Não sen-
timos já a obrigação de procurar impor a todos os objetos do
saber um modelo intelectual uniforme, haurido nas ciências da
natureza física", "as ciências do homem pa~a continuarem a exis-
tir não terão que renunciar à sua originalidade". (9).

2. 0 ). - completa isenção do historiador quanto ao fato estu-


dado.
Pretendia-se a imparcialidade do historiador. Ora, o historiador
faz uma revivência da história, baseado em documentos e testemunhos,
tendo em vista determinado assunto de sua escolha; a partir deste pon-
to, ele já está mais que projetado no tema. Euclides viveu a história
por ele interpretada, baseado no seu testemunho e em documentos por
ele coligidos, alem do estudo de autores, verdadeira enciclopédia, cujo
índice é o Dicionário Euclidiano (5).
Subjetivismo não se confunde com parcialidade. A tendência da
historiografia atual é aceitar na interpretação dos fatos históricos a
visão pessoal do historiador. A questão de subjetividade implicando
em parcialidade, não é mais sequer considerada; quem é parcial não
pode ser historiador. Para merecer este título, ele deve ser como Eu-
clides da Cunha foi - honesto consigo mesmo; extrair dos fatos os
elementos formadores da história, embora estes elementos e a explica-
ção en.::ontrada venham contrariar violentamente suas convicções. Esta
atitude metodológica é uma conquista do século XX, posterior, por-
tanto a Os
- 939-

Euclides da Cunha, o historiador confirma:

"escrevi sem dar crédito às primeiras testemunhas que en-


contrei, nem às minhas próprias imp~essões, mas narrando apenas
os acontecimentos de que fui espectador ou sobre os quais tive
informações seguras" (2),

mas paradoxalmente ao rebater críticas a juizos de valor. .. Contradi-


tório? Não. Apenas antecipou-se às conclusões da escola francesa do
grupo da Revue de Synthese Historique, que após 1900 bateu-se por
uma história não eventual e que na década de 30 teve seguidores em
Lucien Febvre e Marc Bloch. A partir de então, a história, num longo
caminho chegou à historiografia contemporânea atenuando as diferen-
ças entre o eventual e o não eventual, entre as realidades inconscien-
tes e as conscientes; e o historiador tornou-se sociólogo, antropólogo,
demógrafo, geógrafo, economista, linguista; em suma quase todos os
atributos de Euclides da Cunha.
Assim a história intrometeu-se em todas as ciências do homem,
as quais, por sua vez, vêm pedir a ela as informações de que necessi-
tam. Movimento revolucionário que partiu dos fundadores dos An-
na!es, trinta anos depois da colocação histórica euclidiana.
Não pensamos com isto dizer que todas as assertivas do Autor de
Os Sertões são inatacáveis atualmente; é preciso pensa-las em termos
de sua época e destacar as que se distinguiram pela inovação de idéias;
nosso trabalho espera esclarecer alguns aspectos, revelando até que
ponto Euclides quis ser e foi historiador.
Do ponto de vista da metodologia da história encontramos alguns
aspectos paralelos entre os tipos sociais criados por Euclides da Cunha
e o tipo de protestante criado por Max Weber (lO). Ambos os tipos
são ideais; não representam um determinado sertanejo, nem um deter-
minado protestante; nem mesmo todos os sertanejos ou todos os pro-
testantes. Euclides e Weber para estudar a conduta social dos homens
como um todo, captaram suas qualidades e defeitos encarnando-os em
tipos individuais que não existiram exatamente daquela maneira; eles
foram modelos "fabricados",
- 940-

"É essencial certo contacto com as pessoas e até mesmo com


os lugares sob "e os quais o historiador escreve, se este quiser en-
tender os problemas. Qualquer leitor desse estudo clássico so-
b -e rebelião social primitiva, Os Sertões, de Euclides da Cunha,
se dará cOnta de qu:mto essa obra deve ao conhecimento direto
e à "percepção" do autor a respeito do caboclo brasileiro e do
seu mundo" (7).

Euclides da Cunha não só escreveu capítulos de história do Bra-


sil - em 1964, José Honório Rodrigues ainda podia dizer:

"Desde então (da obra de Varnhagem) este pensamento


conservador na interpretação da História do Brasil predomina,
apesar das tentativas de uns poucos de ~efaze-lo, como Capistrano
de Abreu, João Ribeiro e Euclides da Cunha, entre 1900 e 1907
( ... ). Os três iniciaram o que Francisco de Assis Barbosa chama
"uma revolução modernista da História", seja na temática, seja
na interpretação (9) - quanto participou dela como um Hercula-
no, um Guizot, pela ativa atuação nesse período intensivo de
transformações em nossa vida política (1888-1909)".

A história é dinâmica e deve ser reinterpretada continuamente, à


luz de novos documentos, de novas teorias, de novas técnicas e por no-
vos historiadores. O historiador é filho de seu tempo e não pode dei-
xar, por mais imparcial, de contribuir em seu trabalho, com toda a
carga do meio em que vive. Por isso a obra histórica é per si o do-
cumento de uma época. E como fato histórico não pode ser ultrapas-
sado, pois se a história se constitui de processos acumulativos, estes
não são algebricamente somatórios; assim fora, e teríamos apenas dois
períodos históricos: o pré e o pós, este corrigindo aquele.
Alem d:sso, uma obra do porte de Os Sertões provoca críticas,
ensaios e traduções: a Bibliografia de Euclides da Cunha, publicada
pelo Ministério de Educação e Cultura, contem 417 páginas só de tí-
tulos de obras de e sobre o Autor.
EucEdes quis ser e foi historiador; um cientista do social, preo-
cupado com os problemas nacionais, dando-lhes um sentido profunda-
mente humano; reconhecia ser sua solução a longo prazo, por isso afir-
mou:

"Escrevi este livro para o fulu o. Levado, por um cO:Jjunto


de circu:lstâncias a que não pude forrar-me, a assistir a um
dolo"oso drama da nossa história e escrevendo-o depois <.:om
- 941-

mesma serenidade e~tóica de Tucídides ao traçar a Hist6ria da


Guerra do Peloponeso (6).

Escrevendo para o futuro, acalentava Euclides dois propósitos,


duas esperanças: 1.0). - que o livro fosse aceito pela crítica; 2.°). -
sua permanência. Como conseguir esses objetivos? - Transforman-
do sua mensagem em obra de arte literária. Mas arte é inspiração,
não procede da consciência; não basta querer produzi-la - é preciso
ter talento e Euclides o tinha.
Cada historiador tem seu estilo; no caso especial de Euclides da
Cunha, o estilista tornou-se historiador: a palavra foi o elemento es-
tético transmissor de sua mensagem. E ele a escreveu para o leitor
de 1902, de 1930, de 1937, de 1945, de 1964 ... A obra de arte as-
segurando a permanência da mensagem evocativa de graves problemas
sociais a resolver.
Portanto é preciso ver alem de sua arte literária, estilizada como
expressão de conhecimentos; considerar o pensamento social em cone-
xão com a forma a que está vinculado, sem fixar-se apenas na beleza
e sonoridade dos períodos.
Euclides da Cunha entreviu que somente através da forma sua
mensagem seria ouvida. A nacionalidade, aplaudindo a obra literária,
tacitamente aceitou a mensagem. Ela germinaria de vagar, como as
sementes das árvores de grande porte, para agasalhar e nutrir nosso
futuro .
Os Sertões - história e arte não serão superados; permanecem
um marco à nossa frente, e para alcança-lo traçamos e traçaremos inú-
meras veredas. De certo modo, à maneira de um caleidoscópio, cada
observador vê segundo sua maneira de situa-lo e de sentir. Assim ca-
da geração pode estudar Os Sertões encontrando sempre novas suges-
tões, novos quadros, novas idéias.
A obra euclidiana, situada na evolução do pensamento histórico
brasileiro, reclama um estudo profundo quanto ao pioneirismo do Au-
tor no campo da historiografia nacional.

'"
'"
.
BIBLIOGRAFIA.
(1). - Celso (Afonso), in Sílvio Rabelo - EUCLIDES DA CUNHA. 2a.
ed., Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1966, p. 212.
(2). - Cunha (Euclides da), OBRA COMPLETA. Aguila', Rio de Janei-
- 942-

(3). - Idem, IBIDEM, p. 685, vol. 1.


(4). - Idem, IBIDEM, p. 420, vol. 1.
(5). - Idem, IBIDEM, p. 715, vol. 11.
(6). - Idem, IBIDEM, p. 587, vol. 11.
(7). - Hobsbawn (E. 1.), REBELDES PRIMITIVOS. Zahar. Rio de
Janeiro, 1970, p. 8.
(8). - Plekanov, REFLExõES SOBRE A HISTÓRIA, Ed. Presença, Lis-
boa, 1970, p. 154.
(9). - Rodrigues (José Honório), ASPIRAÇõES NACIONAIS, 2a. ed.
Fulgor. São Paulo, 1965, p. 7.
(lO). - Weber (Max), A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPIRITO DO CA-
PITALISMO. Pioneira, São Paulo, 1967.

• •
...

INTERVENÇÕES.

Do Prof. Roberto Machado Carvalho (Faculdade de Filosofia, Ciên-


cias e Letras de Moema. SP).
Perguntou:
"Qual a posição da autora diante de uma revisão histórica da
obra Euclidiana, especialmente com a publicação dos manuscritos de
Antônio Conselheiro pelo Prof. Ataliba Nogueira?"
...
Do Prof. Eduardo Ubirajara (Universidade Federal de Sergipe).
Perguntou:
"Para fins metodológicos, desejaria saber se Euclides, antes de
partir para Canudos, já tinha algum compromisso para publicação de
Os Sertões ou se foi influenciado decididamente depois de coletar vas-
to material de trabalho em Canudos?"
... ...
...
RESPOSTA DA PROFESSORA AME:LIA FRANZOLIN TREVI-
SAN.

Respondeu:
Ao Prof. Roberto Machado Carvalho.
"Não
- 943-

cias quanto à figura do Conselheiro. Mas pelo que já estudamos não


nos parece que fira frontalmente o retrato traçado por Euclides da
Cunha, que afirmou ser o Conselheiro pessoa de bons conhecimentos,
tendo em vista suas ocupações da juventude: guarda-livros do negócio
do seu pai e escrivão de cartório; construiu inúmeras obras públicas
como igrejas, cemitérios, etc. e foi um lider carismático.
Quanto ao fato de Euclides da Cunha não ter feito menção !lO
manuscrito citado, prende-se ao fato de ter recebido o mesmo nos dias
que antecederam sua morte; ocupado com o seu concurso de Lógica
no Colégio Pedro 11, possivelmente não teve ocasião de estudá-lo. Mas
temos a certeza de que Euclides, o pesquisador, o amigo da verdade,
não teria dúvida em retificar seus pontos de vista caso o manuscrito o
sugerisse.

Ao Prof. Eduardo Ubirajara.
Euclides da Cunha ao partir para Canudos levava o propósito de
escrever um livro sobre a Campanha, que seria publicado no O Estado
de São Paulo, do qual era colaborador e correspondente de guerra.
Porem levava a convicção de que a rebelião de Canudos era de
reação monárquica. Retido em Salvador, pelo atrazo da partida do
Ministro da Guerra, ao qual estava adido, pesquisou arquivos, visitou
jornais, igrejas, entrevistou feridos e soldados que voltavam da luta.
Aos poucos reformulou sua hipótese, chegando à verdade em Ca-
nudos: a revolta tinha raizes sociais.
Pronto o livro em maio de 1900, tendo já passado o interesse jor-
nalístico sobre o assunto, o jornal O Estado de São
ESTUDO DE HISTÓRIA DE MATO GROSSO.
(Integração - Ensino - Pesquisa) (*).

JOANA NEVES
MARIO BALDO
do Centro Pedagógico de Aquidauana. Universidade
Estadual de Mato Grosso (* *) .

I. - INTRODUÇÃO.

Ao afirmarmos nossa concepção de que o Ensino de História é


uma extensão da Pesquisa, estamos cientes de não estarmos anuncian-
do qualquer novidade. Já se tem afirmado à exaustão que a atividade
pedagógica, notadamente ao nivel do ensino superior, é a organização
de um trabalho de pesquisa que possibilite ao estudante, a um só tem-
po, adquirir conhecimento de determinados conteudos formais e me-
todologia de estudo e elaboração científica.
Em Aquidauana uma atividade sistemática de pesquisas historio-
gráficas iniciou-se em 1971, com a instalação do Centro Pedagógico
de Aquidauana (CPA), unidade integrante da Universidade Estadual
de Mato Grosso (UEMT). Destinado à formação de professores para
a escola secundária, é óbvio que o CPA não centraliza suas atividades
no desenvolvimento de trabalhos de pesquisa; predominam as ativida-
des docentes e, vale dizer, que a pesquisa na área das ciências huma-
nas não encontra os melhores apôios de parte das autoridades e da ad-
ministração estadual.
O CPA porem, levado por uma filosofia de ensino emanada do
trabalho realizado por uma instituição de ensino experimental de São

(*). - Comunicação apresentada na 3' Sessão de Estudos, Equipe, D, no


dia 6 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
("''''). - A pesquisa foi realizada com a cooperação dos seguintes estu-
dantes: Nadir Viegas dos Reis, Neuza Batista de Assis, Veida Flausino Godoy,
Zakaria Moad Hamid e Zilda Monteiro de Oliveira.
- 946-

Paulo (Serviço de Ensino Vocacional) na qual sua primeira diretora


(Prota Dóris Mendes Trindade) e alguns de seus professores - nós
inclusive - tinham trabalhado, promoveu, desde logo, a pesquisa li-
gada ao ensino, entendendo este como decorrência daquela.
No curso de Estudos Sociais nosso trabalho nas disciplinas de In-
trodução aos Estudos Históricos e História do Brasil ensejou a criação
da Secção de Obras Raras, em agosto de 1972 (1). Com a organiza-
ção desta instituição reuniu-se no CPA um acervo significativo de li-
vros e documentos que nos permite fazer da pesquisa uma atividade
docente, visto a facilidade de manuseio das fontes. Desta forma, todos
os cursos de Introdução aos Estudos Históricos e História do Brasil
incluem na sua programação uma pesquisa utilizando as fontes primá-
rias do nosso acervo; dependendo das disposições e dos interesses dos
estudantes, esse trabalho é substituido por um trabalho de organização
da Secção como: catalogação dos livros e documentos, restauração dos
mesmos, etc., porem, de uma forma ou de outra, sempre se lida com
as fontes primárias.
.. ..

lI. O CURSO DE HISTORIA DO MATO GROSSO PARA
UM CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES.

O curso de Estudos Sociais desdobra-se, após seu término, nos


cursos de História e Geografia, igualmente destinados, especificamente,
à formação de professores, agora em Licenciatura Plena.
No curso de História tem prosseguimento as disciplinas de In-
trodução aos Estudos Históricos e História do Brasil (dois cursos, isto
é, dois semestres), ainda sob nossa responsabilidade; e, nestas duas dis-
ciplinas nossa preocupação foi de aprofundamento da pesquisa, o que
para nós equivale dizer aprofundamento do nivel de ensino.
Ao ser estruturado o curso de História decidimos que a disciplina
História do Brasil III, (o primeiro curso da Licenciatura Plena) pro-
poria um curso de História do Mato Grosso. Esta nossa decisão
deveu-se a duas considerações: adequação profissional e possibilidade
de pesquisa.

( 1). - O acervo da Secção de Obras Raras, bem como sua organização


já no ensejou a opo~tunidade de dois trabalhos: As Fontes Primárias em Aqui-
dauana, apresentado no I Simpósio Estadual de Pesquisa Histórica de Cuiabá,
em 1973 - publicado no vol. 1 dos Anais do Simpósio, p. 89 e Documentos
sobre a Fundação de Aquidauana, apresentado no VII Simpósio da ANPUH,
- 947


2,1, - Adequação Profissional.

f:. já por demais sabido que a lei n,o 5692 de agosto de 1971 que
pretende reformar o ensino nos níveis de 1.0 e 2.° graus, enfatiza em
todas as atividades de ensino e em todas as disciplinas, a preocupação,
que al;ás nã'J é recente. de se posslbilitar ao educando um melhor co-
nhecimento e, sobretudo, melhor compreensão da sua realidade local
e atual - a compreensão da cultura aqui e agora, para otimizar suas
condições de atuação,
Os pareceres do Conselho Federal de Educação (CFE), bem co-
mo de autoridades educacionais tem reiterado aquela preocupação,
Essa exigência nos impôs, praticamente, a programação de um
curso que possibilitasse ao futuro profissional matogrossense da área
de Estudos Sociais (qualquer que seja a disciplina em que ele venha a
atuar), condições de elaborar estudos sobre o Mato Grosso, Este curso
é sobremaneira importante considerando que, praticamente, nada exis-
te sistematicamente e cientificamente organizado sobre o Mato Gros-
so; a precariedade de b'bliografia é notória; a literatura didática é de
péssima qualidade, O Mato Grosso é, tambem, praticamente ignorado
pela bibliografia brasileira geral, sobretudo a de carater didático, que
alem de não focalizar o Estado, usa terminologia de tal forma inade-
quada que leva o estudante matogrossense a incorreção como definir
as "bandeiras" como grupo de homens que iam para o sertão, e afir-
mar que ocorrem frequentemente inundações lá no Pantanal matogros-
sense, para ficarmos em exemplos elementares .

2.2. - A Possibilidade de Pesquisa.

O que mais nos levou a programar um curso de História do Mato


Grosso foi extraordinária possibilidade de realizar um trabalho de pes-
quisa capaz de envolver diretamente os alunos que seriam, portanto,
os próprios elaboradores do curso e não seus assistentes.
Esta possibilidade estava aberta pela razoavel quantidade de do-
cumentos e de bibliografia a nosso inteiro dispor na Secção de Obras
Raras do CP A e outras instituições locais.
O
- 948-

postos, o número pequeno de alunos permitia, por outro lado, um


atendimento individual que evitou desajustes e insuficiências de ren-
dimentos.
Terminado o curso, os alunos optaram por continuar, no curso
seguinte (História do Brasil IV), os estudos sobre o Mato Grosso e
isso se nos apresentou como atestado de eficiência do curso realizado.
O trabalho realizado e os resultados obtidos, que a seguir são
apresentados decorrem portanto de dois cursos: História do Brasil IH
e IV realizados, respectivamente, no 2.0 semestre de 1974 e 1.0 se-
mestre de 1975. A apresentação não obedece a uma ordem cronológica
de desenvolvimento, mas se organiza de forma a apresentar clareza e ló-
gica, sendo separados pela sua natureza; na maior parte das vezes os
diferentes trabalhos foram feitos simultaneamente .

2 . 3. - Trabalhos Realizados.
2 . 3 . 1. - Bibliografia.

Os livros de autores matogrossenses e sobre o Mato Grosso (qual-


quer que fosse o seu conteudo) já haviam sido selecionados pelos alu-
nos nos cursos anteriores. Eles foram então lidos e discutidos.
Esse trabalho de leitura nos revelou uma b:bliografia pobre do
ponto de vista historiográfico; os livros de História são, como soi acon-
tecer num lugar onde não há tradição de pesquisa (2), muito mais crô-
nicas do que História.
Contudo o material é razoavelmente rico do ponto de vista do-
cumental. O material lido apresenta obras cujos dados forneceriam
muitos e bons elementos para trabalhos científicos. Aguardamos pes-
quisadores e/ou estímulos (entenda-se verbas) para que nós mesm0S
possamos empreender pesquisas .
Destacamos do acervo lido 4 obras absolutamente importantes:
a). - Viagem ao Redor do Brasil, do Dr. João Severino da
Fonseca (irmão do fundador da República). Possuimos, infelizmente,
apenas o 2. 0 volume que tem por título: Villa Bella, Cidade do Mato
Grosso. O livro cobre o período de 1875-1878 (com um retrospecto
histórico que recua até o início da povoação do Mato Grosso, com a
Fundação de Cuiabá). Foi editado no Rio de Janeiro pela Tipografia

(2). - O curso de História do Centro Pedagógico de Corumbá que for-


mou sua primeira turma em 1971, foi o primeiro curso de Histó~ia
- 949-

de Pinheiro e Cia., em 1881. O autor do livro participou de uma ex-


pedição militar que teve como objetivos demarcar as confluências dos
rios Madeira-Mamoré. Para atingir esse ponto a expedição realizou
uma excursão que compreendeu em trajeto que, partindo do Rio de
Janeiro (a Corte) percorreu grande parte do território matogrossense.
O autor, de observação aguda, e finamente irônico, deixou um
relato que é a um tempo descritivo, documental e documentado (ele
transcreve documentos da Câmara de Cuiabá que já desapareceram) .
Menciona agrupamentos indígenas apontando suas características fí-
sicas, modo de vida e linguagem - agrupamentos estes tambem já
desaparecidos. O trabalho em questão permite ainda refletir sobre o
papel do Exército na província longínqua e isolada do centro que foi
o Mato Grosso.
A leitura dos capítulos sobre o Mato Grosso em obras gerais de
História do Brasil nos permite pensar que o livro do dr. Severino da
Fonseca há de ter sido utilizado, contudo nunca o vimos citado.
b). - A Invasão de Mato Grosso, de Jorge Maia de Oliveira
Guimarães. Trata-se de uma edição comemorativa do 1.0 Centená-
rio da Guerra do Paraguai, organizada pelo tenente-coronel Elber de
Mello Henriques, com apreciação do general Raul Silveira de Mello.
O autor participou da guerra no período de 1865 a 1870. Terminada
a guerra voltou ao Mato Grosso, percorrendo os locais onde se deram
os acontecimentos relativos à invasão do Mato Grosso, para colher da-
dos para o livro. Empreendeu a viagem no período de 1871 a 1874,
aoós o qual voltou ao Rio de Janeiro onde escreveu o livro que não
chegou a ser publicado, devido a sua morte.
A obra é um interessante documento sobre a guerra, no qual res-
saltam as cdticas que o autor faz contra a política civiliSlta do Im-
pério. Jorge Maia chama a atenção ao fato da Corte não se dedicar à
organização da defesa das fronteiras deixando desguarnecidas e sem
recurso as Províncias centrais.

c). - Reminiscências da Campanha do Paraguai (1865-1870),


do general Dionísio Cerqueira. Editado no Rio de Janeiro pela Edi-
tora Gráfica Laemert, Ltda. O autor fora soldado quando da Guerra
do Paraguai e participou praticamente de toda a campanha. Suas re-
miniscências (escritas 40 anos depois) são um relato vivo e humano
das agruras, dificuldades e alegrias (!) da campanha. Fornece infor-
mações bem interessantes sobre o recrutamento e a organização do
Exército Brasileiro para a Guerra do Paraguai. Fornece tambem re-
tratos mais coloridos e humanos dos célebres herois da guerra, parti-
- 950-

c). - Album Graphico do Estado de Mato Grosso (E.E.U.U.


do Brasil), editado em Hamburgo em 1914. Ilustrado, contem o histó-
rico das principais cidades matogrossenses e documentos de real im-
portância para quem se ocupa do Mato Grosso, sobretudo o relatório
do Diretor Geral dos Indios da Província do Mato Grosso, Joaquim
Alves Ferreira, de 1848, ocasião em que ocupava o cargo citado. O
relatório fornece dados sobre as tribos indígenas da época, tais como
ele as encontrou.
Entre as obras lidas estão incluidos os principais trabalhos do
historiador matogrossense Rubens de Mendonça (vide relação anexa),
das quais destacamos História das Revoluções do Mato Grosso, pelo
seu carater vibrante, apesar de ser (como os demais) bastante descri-
tivo. De Virgílio Correa Filho, outro historiador matogrossense de
importância, infelizmente, temos poucas obras, embora tenhamos a mais
completa: História do Mato Grosso
Um
- 951-

Foram lidas, portanto, um total de 88 obras .



2.3.2. - Documentos.

B necessário, inicialmente, esclarecermos que neste setor vamos


nos referir ao trabalho feito com os documentos inéditos do acervo da
Secção de Obras Raras. Esses documentos são relativos à história de
Aquidauana, por isso sua utilização não foi tão ampla. O estudo de
História de Mato Grosso, realizado nos dois cursos, não chegou ao
ponto de cuidarmos particularmente da história local (por absoluta fal-
ta de tempo).
Para podermos de alguma forma promover trabalho com o do-
cumentário própriamente dito. a solução adotada foi a de solicitar-
mos esse trabalho no curso de Introdução aos Estudos Históricos 11,
feito pelos mesmos alunos do curso de História do Brasil e mais uma
aluna.
Foram então estudados 5 documentos (dois alunos utilizaram um
mesmo documento):
a). - Relatório do dr. Delphino Correa (3) respondendo a uma
circular do Chefe de Polícia FilIinto Muller. de 1939;
b). - Resposta do dr. Delphino Alves Correa a críticas feitas
à sua administração pela Radio Difusora (emissora local);
c). - Lei Estadual de 1918, que elevou à cidade algumas vilas
matogrossenses, entre as quais Aquidauana;
d). - Estatuto da Escola Agrícola Bom Gosto, criada em 1949
e que não chegou a ser instalada;
c). - Conferência de Custódio de Viveiros sobre a "Quarta
Humanidade" (texto integralista - 1935).
Os
- 952-

2 excursões: a primeira ao "Morro do Desenho" e a segunda a


Cuiabá (4).
A - O Morro do Desenho.
No dia 25 de agosto de 1794 o grupo constituido pelo alunos e
professores do curso de História do Brasil IIl, o professor Mario Baldo
(do CPA), guiado pelo funcionário da Prefeitura Municipal Valéria
(um índio), com condução cedida por esta instituição, visitou o Morro
do Desenho (5).
Trata-se de um abrigo sob rochas, onde há inscrições rupestres.
São desoohos e escavações na rocha, ainda não estudados por qualquer
especialista e que correm o risco de desaparecerem vítimas do tempo
e de depredadores em busca de "enterros" (6), como aliás já aconte-
ceu com uma parte do sítio. Havia um enorme pote de cerâmica en-
cravado na rocha, que foi dinamitado quando o caçador de tesouros
verificou que não conseguia retira-lo. No local das inscrições o grupo
entrevistou Valério que informou conhecer o local desde criança, onde
foi levado pela primeira vez por seu avô, segundo o qual os desenhos
eram "recordações", "lembranças" dos índios que sabiam que seus fi-
lhos seriam civilizados, e, precisariam de algo para recordar o seu po-
vo. Quanto às figuras escavadas na rocha não sabia de nada.
O sítio das inscrições está numa localidade, a bem dizer, escon-
dida nos morros e sugere procura de defesa.
As dificuldades para as pesquisas mencionadas na introdução não
permitiram até agora que se promovesse o trabalho necessário.
B - Cuiabá.
A excursão para Cuiabá foi o núcleo do primeiro curso sobre o
Mato Grosso-História do Brasil IIl. Cuiabá nos interessava por 3 as-
pectos. Primeiramente é uma cidade barroca - pela origem e pelos
resquícios culturais, materiais e não materiais (7). Em segundo
lugar, Cuiabá, pela sua condição de capital desde a Independência,
reune a maior quantidade de documentos matogrossenses, sendo as-
sim um indispensavel campo de pesquisa historiográfica.
Finalmente, é o local por onde a ocupação do território matogros-
sense se iniciou. Cuiabá foi o centro de atração dos povoadores gra-
ças ao ouro e foi o núcleo irradiador do povoamento inicial.
( 4 ). - Estas duas excursões estão documentadas com fotos e slides.
(5). - O local é assim denominado pela população indígena local.
(6). - Tesou-os enterrados, segundo o linguajar local.
(7). - O
- 953-

Orientados por esses interesses visitamos a capital matogrossen-


se no período de 01/09 e 08/09 de 1974, sob os auspícios da Secre-
taria de Educação e Cultura do Estado (8). Como a excursão a Cuiabá
constituiu-se no núcleo do curso, as considerações sobre a mesma fa-
zem parte do próximo tópico.
*
2 . 2 .4. - Resultados obtidos - Cuiabá e o Mato Grosso Bar-
roco. Roteiro da Excursão.

Secretaria de Educação e Cultura (SEC) , visita aos vários se-


tores; UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), entrevistas com
os chefes de departamentos - salientando a que fizemos com D. Ma-
ria Cecília Guerreiro de Souza, chefe da Divisão de Documentação
Histórica da UFMT, que mantem, entre outros, um acervo de mi-
crofilmes sobre a História do Mato Grosso, efetuados em Lisboa (Por-
tugal). Mais dados a respeito, vide: I Simpósio Estadual de Pesquisa
Histórica - Comunicação Sobre o Projeto de Documentação Histó-
rica da UFMT.

Arquivo Estadual, estudos e entrevistas;


Museu de Pedra, visita;
Fundação Nacional do Indio (Funai), visita;
Centro de treinamento do Magistério (CTM), entrevista;
Escola Santos Dumont - Premen;
Academia Matogrossense de Letras e Instituto Histórico Mato-
grossense, visita;
Seminário, visita e entrevista com o Arcebispo D. Orlando;
Entrevista com o historiador Rubens de Mendonça;
Igreja de Santana, na Chapada dos Guimarães e visita aos diver-
sos pontos urbanos da cidade.

Cuiabá, pela sua própria estrutura física propícia, foi uma cidade
essencialmente barroca, conservando ainda hoje traços marcantes co-
mo a localização das inúmeras igrejas, sempre no alto, em derredor da
cidade. As ruas estreitas e com pavimentação em paralelepípedos. As
construções, com diversas sacadas, trabalhadas em ferro e madeira, o
coreto da praça, altares das igrejas, o estilo das portas e janelas, os
- 954-

ruas: rua de Cima, Rua de Baixo, Rua do Meio. O povo cuiabano até
hoje reclama a todo momento a perda da "igreja velha", que atrravés
de documentos e fotografias, sabe-se que foi uma construção muito
rica e com todas as características barrocas. Fala-se com orgulho que
foi o maior crime que se cometeu em Cuiabá e olha-se com certo des-
prezo a nova matriz, que por sinal é muito bonita (9), mas não substi-
tui a beleza da antiga.
Ao visitarmos a igreja de Santana, na Chapada dos Guimarães,
conhecemos mesmo a arte barroca, com esta obra feita em 1754. Foi
tombada pelo Patrimônio Artístico e Histórico Nacional devido ao seu
autêntico valor. Os altares são todos trabalhados em madeira e ouro
(talha dourada) assim como o púlpito e o portal de entrada. Ainda
se percebem vestígios do cinzelamento a ouro. Mas tambem foi pos-
sivel perceber que o Serviço do Patrimônio Artístico e Histórico ape-
nas tombou e nada mais fez. Pois os cuidados que se deviam tomar
para a conservação não foram efetuados. Foi através de uma entre-
vista com o vigário local que pudemos constatar que já solicitara vá-
rias vezes ao Patrimônio Artístico e Histórico a restauração da igreja
e nem resposta recebera. E no estado em que se encontra a igreja é
um verdadeiro crime, pois a qualquer momento podemos perder uma
obra de valor histórico incalculavel.
Ao visitarmos o Seminário de Cuiabá, o Arcebispo D. Orlando
contou-nos toda a história da instituição, mas não permitiu a visita ao
quarto de D. Aquino, que, segundo informações, é onde se guarda o
arquivo da Arqu:diocese, organizado por D. Aquino, arquivo este de
grande importância.
O próprio historiador matogrossense, Rubens de Mendonça, em
entrevista gentilmente cedida, disse que se encontra grande dificuldade
em escrever a história de Mato Grosso, pois o Arcebispo não permite
a util:zação de arquivo da Arquidiocese. E este arquivo poderá ser
um dos mais ricos em documentos, pois nos primeiros tempos da Pro-
víncia de Mato Grosso a Igreja possuia grande poder, tudo passava
pelas mãos do vigário ...
OArcebispo D. Orlando, com essa mentalidade, está dificultan-
do o trabalho do historiador.
E, por falar em dificuldades, o próprio Arquivo Estadual contri-
bui em parte, porque já mudou várias vezes. Nem dá para imaginar
a quantidade de documentos que se perderam (10). Mas, graças ao bom

(9). - No grupo essa opinião não é unânime.


(lO). - Para o historiador Rubens de Mendonça, cada mudança de Ar·
- 955-

senso das atuais autoridades matogrossenses, o Arquivo já se encontra


em fase de organização, sob a direção de D. Vera Radazzo. Mas pelo
pouco tempo que lá estivemos e as poucas leituras feitas, estamos cer-
tos de que poucos dos historiadores matogrossenses consultaram o
Arquivo, e estamos certos tambem de que se fôssemos fazer um li-
vro sobre Mato Grosso com base nos documentos do Arquivo Esta-
dual, talvez surgisse uma nova História do Mato Grosso.
Falta ainda despertar a consciência histórica nas autoridades ma-
togrossenses para que isso aconteça, pois ao visitarmos o Instituto His-
tórico Matogrossense e a Academia Matogrossense de Letras, verifica-
mos que é lamentavel o estado em que se encontram. Fotografias de
personagens históricas jogadas, livros empoeirados, estantes quebradas,
enfim, não temos nem palavras para expressarmos o estado desespe-
rador do Instituto Histórico Matogrossense (11).
A desvalorização é tal que a própria funcionária não sabe nada
a respeito e permitiu nossa entrada sem perguntar quem éramos e o
que pretendíamos fazer. Se quizéssemos teríamos levado documentos,
livros e até ob'etos de incalculavel valor, Aliás, a mesma funcionária
nos informou que o Instituto é sempre visitado por um americano que
de lá leva, às vezes, livros e outros objetos e papeis,

Para dizer a verdade, parece mais um castelo abandonado a mi-


lhares de anos, onde as baratas, ratos, cobras e aranhas tomaram-se
proprietários, pois a funcioná,ria nem as janela abre, nem o piso é lim-
po e nem a poeira dos moveis tira, B
- 956-

Com essa excursão verificamos que, nós, professores de História,


temos que lutar muito para conseguir o apôio das autoridades a fim
rle organizarmos esses documentos históricos, pois quem sabe se a
História do Mato Grosso não poderá mudar a própria História do
Brasil?

*
Mato Grosso e a República.

Este conteudo foi desenvolvido no 2.° curso (1.0 semestre de


1975) .
Foram realizadas pesquisas individuais sobre as décadas republi-
canas:
1889 1900
1901 1910
1911 1920
1921 1930
1931 1940
Neste trabalho tentou-se localizar as realizações de grande vulto
em cada período presidencial (por força da bibliografia existente, que
assim o faz), ao mesmo tempo que, situar os acontecimentos matogros-
senses relacionados aos federais e ainda os personagens do cenário ma-
togrossense que se destacaram na política nacional. Encerrado por
um painel pelos alunos e conclusões pela professora, foi possivel veri-
ficar-se como o Mato Grosso pouco participou da política brasileira;
apenas se. fez representar, pela atuação de indivíduos, como Joaquim
Murtinho e Filinto Muller.
Em outro tópico, "Revolução e Mudanças no Brasil Republica-
no", destacou-se o papel das oligarquias como entrave a estas mudan-
ças; para esse estudo enfrentamos düiculdades, no que se diz respeito
à bibliografia, pois ela é quase inexistente. Como recurso para supri-
la, tivemos uma entrevista com o Dr. José Manuel Fontanillas Fra-
gelli, ex-governador do Estado, residente em Aquidauana e participan-
te, através de parentescos, de famílias tradicionais, vinculados à polí-
tica matogrossense. Pudemos, com este contacto, colher materiais de
estudo, tanto oral como através de livros e publicações de governo
(1975).
Foram estudadas ainda durante a programação "As
- 957-

No decorrer dos estudos, ficou-nos bem claro, que, Mato Grosso


sempre recebeu os acontecimentos nacionais apenas como "Notícias";
foi o caso da Proclamação da República, da Revolução de 1930, do
Estado Novo.
Mesmo ao estudar-se as "Dissidências", quase nada há registra-
do. A mais destacada foi quando em 1891/2, Corumbá tenta procla-
mar a "República Transatlântica" ou "Estado Livre" de Mato Grosso,
por ocasião da deposição de Manuel Murtinho, por Floriano Peixoto.
Alem de acontecimentos como esses, Mato Grosso poucas vezes se
manifestou contrário à política nacional e mesmo quando isso ocorreu
estava ligado às resoluções de São Paulo.
Este nosso estudo foi encerrado com um esquema geral focali-
zando a sociedade mundial, brasileira e matogrossense; destacava a bi-
polarização e a satelização macro e micro. existente no mundo atual.
Colocou-se a região Centro-Oeste e o papel que Brasília exerce como
foco de desenvolvimento.
Com os cursos de História do Brasil III e IV tentaram-se pesquisar,
descobrir documentos e livros, selecionar todo o material encontrado,
a fim de que se pudesse organizar o maior número possivel de assuntos
específicos e outros tipos de referências sobre nosso Estado. Esses
dois cursos sempre tiveram como objetivo melhor conhecer a His-
tória matogrossense, ainda muito obscura, devido a dispersão de do-
cumentos, livros e pequeno número de elementos com condições para
este trabalho de pesquisa.
* *
*
III. - OS PROJETOS ESPECIAIS.

Além dos trabalhos até agora relatados, dentro das atividades es-
colares regulares (aulas) ou nas excursões, estas tambem incluidas na
programação regular, apesar de desenvolvidas em períodos especiais,
a nossa programação de estudos de História do Mato Grosso incluiram
dois projetos especiais: o primeiro, a elaboração de um livro didático
para uso de estudantes do 1.0 grau e segundo a elaboração do presente
trabalho para apresentação ao VIII Simpósio da ANPUH.
*
a). - O Livro Didático.

Um
- 958-

razoavel sobre a História de nosso Estado, adequada principalmente


aos estudantes de 1.0 e 2.0 graus.
Por outro lado, temos uma grande quantidade de "matéria-pri-
ma" - documentos - para se propor um estudo sobre o Mato Gros-
so.

o livro projetado pretende ser uma contribuição para minorar


aquela escassez possibilitando um material que não só facilite o estudo
do Mato Grosso como o estimule (tanto entre alunos como professo-
res) através da perspectiva de um estudo científico.
A organização constará de uma série de lições, com textos expres-
sivos colocando as diferentes fases de Mato Grosso (Capitania, Pro-
víncia e Estado). Todos os textos serão acompanhados de propostas
de trabalho para serem realizados em classes ou extra-classe, indivi-
dual ou em grupo, indicando leituras suplementares quando se fizer ne-
cessário.
Os recursos humanos existentes são: professores do Curso de His-
tória do Brasil do Centro Pedagógico de Aquidauana, alunos da tur-
ma de 1971 e elementos da Comunidade, que serão solicitados para
entrevistas.
Os recursos materiais. existentes são os que possuimos na Biblio-
teca, na Secção de Obras Raras, bibliografia e documentos sobre o Ma-
to Grosso, que poderão oferecer subsídios necessários para a elabora-
ção de livro projetado.
Os recursos materiais necessários são: verbas para as despesas de
pesquisa e para a realização material do livro .


b). - Um Trabalho para o' VIII Simpósio da A NPUH .

A idéia surgiu no início do curso de História do Brasil IV. A in-


tenção era concretizar nossa concepção de que o ensino superior há
de ser um trabalho de equipe, no qual alunos e professores coloquem-
se como pesquisadores, enfrentando o mesmo conjunto de desafios
que vai desde o salário baixo até a comunicação de uma experiência
de trabalho intelectual válida para um grande
959
... ...
...
IV - ANEXOS.

o relato completo de tudo que foi proposto e executado nos cur-


sos extrapolaria de muito os limites de comunicação, de modo que pa-
ra o completarmos lançamos mão de anexos.
Anexo n.o 1 Programas dos cursos de História do Brasil IH e His-
tória do Brasil IV;
Anexo n.o 2 Bibliografia sobre o Mato Grosso, utilizada nos cur-
sos
Anexo n.O 3 Relação de documentos inéditos estudados;
Anexo n. o 4 Uma das propostas de estudo - do livro de História
do Mato Grosso para o 1.° grau.
... ...
...

ANEXO I.

UEMT - CPA Catalogação das Disciplinas


Disciplina: História do Brasil IV. Catalogação: CPA 0339.
Departamento: Estudos Sociais. Créditos: 4.
EMENTA: A República em Mato Grosso - O sistema
I. -
oligárquico.
lI. - Estudos de História do Mato Grosso.
PROGRAMA: I. - A República em Mato Grosso - O sistema
oligárquico.
1. - As fases republicanas no Brasil.
2. - As décadas republicanas de 1889-1940.
3. - A República em Mato Gosso.
a). - Mato Grosso e a política dos governadores.
b). - As dissidências matogrossenses.
c). - As revoluções em Mato Grosso.
4. - A organização econômica do Estado - sua repercussão
na vida política.
11. - Estudos sobre histó"ia do Mato Grosso.
1. - A Capitania - a). - exploração - bandeirismo;
b). - colonização: monções e mine-
- 960-

2. Panorama da P .ovíncia.
3. - O Estado de Mato Grosso.
4. - O Mato Grosso no contexto brasileiro.
5. - Fontes para os estudos de história do Mato Grosso.

SEMESTRE: lQ PROFESSOR: (A)


ANO: 1975 Joana Neves

... ...


BIBLIOGRAFIA.

1. - Todos os livros da Secção de Obras Raras, sob~e o Mato Grosso.


2. - José Maria BelIo, História da República.
3. Caronne (Edgard), A Primeira República.
A República Velha: Instituições e classes sociais.
A República Velha: Evolução Política.
A Segunda República.
4. - Brasil em Perspectiva.
5. - Silva (Hélio), Todos os livros do Ciclo Vargas.
6. -
.
Mendonça (Rubens), História das revoluções em Mato Grosso.
...


CUEMT - CENTRO PEDAGÓGICO DE AQUIDAUANA.
Catalogação: CPA 0339 Créditos: 4
Disciplina: História do Brasil IV.

OBJETIVOS.

1. - Aprofundar os estudos sobre a História do Mato Grosso.


2. - Possibilitar. a análise da atualidade matog'ossense atra-
vés do estudo do período republicano.
3. - Possibilitar o preparo de um mlterial didático para uso
do p~ofessor matogrossense.
4. - Aprofundar a pesquisa historiográfica.
5. - Possibilitar ao grupo condições de participar no VIII Sim-
pósio da ANPUH,
- 961

AQUIDAUANA - MT. Formulário N9 02.


Departamento: Estudos Sociais Ano: 1975.
Professo:a: Joana Neves. 1ÇSemestre .

TRABALHOS ESCOLARES PREVISTOS.

1. - Elaboração de um painel sobre as Décadas Republicanas


(cada aluno preparará uma) de 1889 a 1940 (16/05/75).
2. - Preparo de lições sobre história do Mato Grosso (cada
aluno uma) - (final do curso).
3. - Preparo de um tema de História do Mato Grosso (cada
aluno um) tendo em vista a participação do grupo no
VIII Simpósio da ANPUH. (final do curso).

UEMT -CPA .
* Catalogação das Disciplinas
Disciplina: História do Brasil IH Catalogação: CPA 0338.
Departamento: Estudos Sociais. C. éditos: 04
EMENTA: I. - Tópicos da história do Mato Grosso
11. - Principais acontecimentos da história brasilei-
ra, sua repercussão em Mato Grosso.
lU. - Viagens de estudo.

PROGRAMA:
I. - Tópicos da História de Mato Grosso.
1. - O indígena matogrossense (noções da pré-história brasilei-
ra) .
2. - A colonização de Mato Grosso.
a). - apresamento;
b). - mineração.
3. - A Guerra do Paraguai.
4. - A economia matogrossense após a República.
a). - a comunicação com outros Estados;
b). - as estradas de ferro e de rodagem.
s. - A ocupação do Pantanal.
H. - Principais acontecimentos de histó .·ia brasileira - sua
repercussão em Mato Grosso.
1. - O Bandeirismo.
2. - A Independência do Brasil.
3. - O pa,rlamentarismo.
4. - A Proclamação da República.
s. - A consolidação da República - coronelismo e oligarquia
em Mato Grosso.
6. - As transformações políticas e sócio-econômicas da década
de 30.
- 962-

IH. - Viagens de Estudo.


1. - Para o "Morro do Desenho" - Aquidamma.
2. - Para Cuiabá - Chapada dos Guima:ães e Santo Antônio
de Leverger.

BIBLIOGRAFIA.

1. - Livros - Relacionadas no catálogo da Secção de Obras Raras;


2. - Documentos - Todos os existentes na Secção de Obras Raras.

SEMESTRE: 2\1 PROFESSOR(A) :


ANO: 1974 Joana Neves

UEMT - CENTRO PEDAGÓGICO DE AQUIDAUANA.


Catalogação: CPA 0338 Créditos: 04
Disciplina: História do B:asil III
OBJETIVOS
1. - Elaborar uma visão geral da história matog ·ossense.
2. - Enfatiza,r a pesquisa histórica, através de trabalhos reali-
zados com fontes p:imárias.
3. - Salientar a necessidade de organização da documentação
existente e da sua elaboração históriográfíca.
4. - Fazer o levantamento de todos os recursos para os estudos
históricos existentes no Mato Grosso.
5. - Despertar para a necessidade de se elaborar uma perspecti-
tiva matogrossense para os estudos de história do Brasil e
Mato Grosso, como parte de um processo de interioriza-
ção da cultura.
6. - Valorizar o patrimônio histórico matogrossense tanto o do-
cumental como o artístico.
7. - Elaborar, através de uma nova visão da história local, no-
vos métodos de ensino de história.

AQUIDAUANA - MT 2Q Semestre Fo:-mulário NQ 02.


Departamento: Estudos Sociais Ano: 1974,
Professora: Joana Neves
TRABALHOS ESCOLARES PREVISTOS
1. - Pesquisa sobre um tema de história de Mato Grosso com
base em documentos da Secção dt" Obras Raras. (indivi-
- 963-

1\l etapa - plano de estudo, levantamento de material (21/08).


2\1 etapa - Relatório de pesquisa (02/10).
3\1 etapa - Redação (2 9 bimestre).
2. - Relatórios das excursões {g. upo) .
Joana Neves
* *
ANEXO 2 -
*
BIBLIOGRAFIA SOBRE MATO GROSSO.

01. AUTOR: MENDONÇA (ESTEVÃO DE).


OBRA: QUADRO CHOROGRAPHICO DE MArrO GROSSO.
EDITORA: Escolas Profissionais Salesianas, Cuiabá - 1906.
02. AUTOR: AYALA (S. CARDOSO) e (F. SIMON).
Obra: A/bum Graphico do Estado de Mato Grosso. (E.E.U.U. do
Brasil). Corumbá, Mt. 1914.
03. AUTOR: MENDONÇA (RUBENS).
Obra: Dicionário-biográfico - Mato Grosso. São Paulo, Gráfica
Mercúrio. S/A/Ed. Rio Bonito - 1953-1971.
04. AUTOR: MENDONÇA (bSTbVÃO).
Obra: Datas Matogrossenses - 11 vol. Campinas - GO, Ed. Rio
Bonito, 1973.
05. AUTOR: CORR:t!A FILHO (VIRGlLIO).
Obra: Hist6ria de Mato Grosso.
Rio, listituto Nacional do Livro-MEC, 1969.
OS. AUTOR: . CORRM FILHO (V.).
Obra: As Raias de Matto Grosso. VoI. I.
Editora: São Paulo, Ed. FFroFnteira Septentrional, 1925.
06. AUTOR: MENDONÇA (RUBENS).
Obra: Hist6ria de Mato Grosso.
Ed. CUiabá-Mt.
07. AUTOR: MENDONÇA (RUBENS DE).
Obra: Hist6ria das Revoluções em Mato Grosso.
Ed. Goiás, Ed. Rio Bonito. 1970.
08. AUTOR: MENDONÇA (RUBENS DE).
Obra: Hist6ria do lornalismo de Mato Grosso.
Cuiabá-Mt., Imprensa OficiaI de Mt. s/do
09. AUTOR: MARClLIO (HUMBERTO).
Obra: Hist6ria do Ensino de Mato Grosso (2).
CUiab~-Mt., S. E. C. /Saude, 1973.
10. AUTOR COSTA (ANTÕNIO CORR:t!A DA).
Obra: Os predecessores dos Pires de Campos e Anhangueras.
Comemoração do bi-centenário da Fundação da cidade de Cuiabá.
Necheroy - Escola Selesiana, 1918.
11. AUTOR: SOUZA (LUIZ DE CASTRO).
Ob~a:
964 -

12. LEITE (LUIS PHILIPPE PEREIRA).


Obra: Forquilha, (fundador e a padroeira).
Conjunto e Impresso na Casa da Moeda do Brasil.
13. AUTOR: GUIMIRÃES (JORGE MARIA DE OLIVEIRA).
Obra: A Invasão de Mato Grosso.
Rio de Janeiro, Biblioteca do Exército-Editora, 1964.
Edição comemorativa do líl Centenário da Guerra do Paraguai.
14. AUTOR: Fonseca (JOÃO SEVERINO DA).
Obra: Viagem ao redor do Brasil - 1875-1878 2';> vol.
Rio de Janeiro, Tipografia de Pinheiro & C., 1881.
15. AUTOR: CERQUEIRA (GENERAL DEONfSIO).
Obra: Remeniscêêcia da Campanha do Pa.'·aguai 1865-1870
Rio de Janeiro, Gráfica L'lemmert, Ltda., s. d.
16. AUTOR: BARRETO (DANTAS).
Obra: Expedição a Malta Grosso.
A Revolução de 1906.
Rio de Janeiro/São Paulo, Laemmert & C. Editores, s. d .
17. AUTOR: MAGALHÃES (AMILCAR A. BOTELHO DE).
Obra: Impressões da Commissão Rondon.
Porto Alegre, Livraria Globo, 1929.
18. AUTOR: VIVEIROS (ESTHER DE).
Obra: Rondon Conta sua vida.
Cooperativa Cultural dos Esperantistas, s. d .
19. AUTOR: VISCONDE DE TAUNAY.
Obra: Viagens de outrora: s/cenas e quadras mattogrossenses.
1865-1871) s.d.
20. AUTOR: MAGALHÃES (Cel. AMILCAR A. BOTELHO DE).
Obra: Pelos sertões do Brasil.
Porto Alegre, Livraria do Globo, s.d.
21. AUTOR: ACHILLES (PAULA).
Obra: Brasil de Oeste.
Rio de Janeiro, José Olympio, s.d.
22. AUTOR: ARRUDA (GABRIEL PINTO DE).
Obra: Um trecho do Oeste Brasileiro.
Rio de Janeiro, s.ed. 1938.
23. AUTOR: MELO E SILVA.
Obra: Canaã do Oeste (Sul de Mato Grosso).
s.ed.
24. AUTOR: VASCONCELOS (FERREIRA DE).
Obra: O
965 -

25. CORRl!A FILHO (V.).


Obra: Alexandre Rodrigues Ferreira: vida e obra do grande natu-
ralista.
São Paulo, Brasiliana-Biblioteca Pedagógica Brasileira. s. á.
26. AUTOR: CORRAA (DOM AQUlNO F.).
Obra: Uma flor do clero Cuiabano.
Rio de Janeiro, s.ed., 1933.
27. AUTOR: CORRÊA (DOM FRANCISCO DE AQUINO) (Arcebis-
po de Cuiabá).
Ob:a: Cartas Pastorais: 1922-1934.
s.ed.,
28. AUTOR: CORRl!A (DOM FRANCISCO DE AQUINO) (Arcebis-
po de Cuiabá) .
Obra: Cartas Pastoriais: 1935-1944.
29. AUTOR: CHAVES (DOM ORLANDO).
Obra: Carta Pastoral: Centenário do Seminário da Conceição de
Cuiabá. Mt. (1858-1958).
30. AUTOR: VASCONCELLOS (1. M. PEREIRA DE).
Obra: As Assembléas Provinciaes.
Rio de Janeiro, Eduardo & Henrique Laemmert, 1869.
31. AUTOR: AZEREDO (A.).
Obra: A situação de Mato Grosso.
Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1916.
32. AUTOR: HORTA (MIRANDA).
Obra: Discursos.
Aquidauana, Mt., s.ed. 1958.
33.
Obra: Mensagem dirigida pelo Exmo. Sr. Dr. Joaquim A. da Costa
Marques, Presidente do Estado de Mato Grosso à Assembléia Legis-
lativa.
Cuiabá-Mt., Typog:afia Oficial, 1914.
34. AUTOR:
Obra: Actos do Poder Legislativo: Leis nÇ!s 160 a 182.
Cuiabá, Mt., Imprensa Oficial, 1897.
35. AUTOR:
Obra: Collecção das leis e dos decretos do Poder Executivo do Esta-
do de Mato Grosso do ano de 1910.
Cuyabá, Mt., Typographia Official, 1911.
36. AUTOR:
Obra: Collecção 'de Leis e Decretos do Poder
- 966-

37. AUTOR:
Obra: Collecção das Leis e Decretos do Estado de Mato Grosso do
ano de 1923.
São Paulo, Cia. G~aphico - Ed. Monteiro Lobato, 1925.
38. AUTOR:
Obra: Constituição do Estado de Mato Grosso.
Cuiabá, Mt, Imprensa Oficial, 1947.
39. AUTOR:
Obra: Ementário da Legislação Estadual: 1936-1950 - Estado de
Mato Grosso, 1952.
40. AUTOR: MARTINS (DEMOSTHENES).
Obra: Campo Grande - Mt.
Campo Grande, Mt., Academia de Letras e História, 1972.
41. AUTOR:
Obra: Estado de Mato Grosso, município de Aquidauana.
42. AUTOR:
Obra: Estado de Mato Grosso: Catalogo dos produtos enviados pelo
Estado de Mato Grosso-Expedição Nacional, 1908.
Cuiabá, Mt., Estab. Avelino de Siqueira, 1908.
43. AUTOR:
Obra: Estado de Mato Grosso: Relatório apresentado ao Exmo.
Revmo. Sr. D. Francisco de Aquino Corrêa-DD. Presidente do
Estado. Pelo Deputado Rosário Congro. Intendente do município de
Campo Grande no período de 09.09.1918 a 07.09.1919.
44. AUTOR:
Obra: Estado de Mato Grosso: Relatório apresentado à Camara Mu-
nicipal de Porto Murtinho em sessão ordinária de 15/12/1919 -
pelo Intendente Geral Celso Teixeira Cordoniz.
45. AUTOR:
Obra: Política de Matto Grosso: Município de Campo Grande.
Rio de Janeiro, Emprensa G~aphica, 1929.
46. AUTOR:
Obra: Estado de Mato Grosso: Município de Corumbá: Relatório
Apresentado ao Conselho Executivo-Municipal pelo Prefeito Maior
João Baptista de Oliveira Motta - Orçamento da Receita e Despesa
para o exercício de 1937.
47. AUTOR: BARROS (JOÃO MOREIRA DE).
Obra: Ministério Público e Justiça de Contas - Ministério do Tri-
bunal Contas de Mato Grosso.
Cuiabá, Mt.
48. AUTOR: LIMA ANDRADE (JOÃO BELTRÃO DE).
Obra: Consolidação do Direito Judiciário-Mt.
Rio de Janeiro, Papelaria e Typografia "O Social",
- 967-

49. AUTOR: COUTINHO (1. 1. DE FREITAS).


Obra: Projeto de um Código de Processo Penal do Estado de Mato
Grosso Organizado no governo do Exmo. Sr. Dr. loaquim A. da
Costa
Cuiabá, Mt., 1914.
50. AUTOR: COSTA FILHO (FRANCISCO CORR~A DA).
Obra: Imposto de Consumo.
Cuiabá-Mt., Escolas Prof. Salesianos, 1928.
51. AUTOR:
Obra: Revista Militar Brasileira: ano XVIII, nQ 04 - outubro a
dezemb~o de 1928 - voI. XXVII.
52. AUTOR: BRASIL, MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, INDÚS-
TRIA E COMÉRCIO.
Obra: Recenseamento do Brasil.
Rio de Janeiro, Tipografia da Estatística, 1926.
53. AUTOR: BRASIL, SÃO PAULO E MATO GROSSO.
Obra: Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura da 6t:1 Região
- Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio.
54. AUTOR: MARTINS (OCLÉCIO BARBOSA).
Obra: Pela Defesa Nacional.
Rio de Janei:o, Grafica Barbero, 1944.
55. AUTOR: MARQUES (JOAQUIM R.).
Obra: A exploração da borracha em Mato Grosso.
Rio de Janeiro, Imprensa Di Paul e Ltda., s.d.
56. AUTOR: CUNHA (JORGE).
Obra: Cobre do laurú e Lagoas Alcalinas do Pantanal.
Rio de Janeiro, Papelaria Mendes, 1943.
56. AUTOR: TAUNAY (AFONSO D'E.).
Obra: A cidade de ouro e das Ruinas.
São Paulo, Cia. Melhoramentos. s.d.
58. AUTOR: SETUBAL (PAULO).
Obra: Os irmãos Lemes.
São Paulo, Cia. Editora Nacional, 1933.
59. AUTOR: SETUBAL (PAULO).
Ob~a: O ouro de Cuiabá.
São Paulo, Cia. Editora Nacional s.d.
60. AUTOR: GALDINO (FELICIANO).
Obra: Lendas Matogrossenses.
Cuiabá-Mt. Typographia Calháo e Filho, 1919.
61. AUTOR: MENDONÇA RUBENS DE) .
Obra: Sagas
- 968-

62. AUTOR: AMARILIA (TERTULIANO).


Obra: Flores do prado Matogrossense.
Cuiabá, Mt.
63. AUTOR: TOLEDO (JOSÉ CARVALHO DE).
Obra: Naquele dia.
Campo Grande-Mt. Tipografia da Livraria Ruy Barbosa. s. d.
64. AUTOR: RANDAZZO (VERA).
Obra: Pagmejera, Pagmejerá.
Baurú-SP ., Gráfica Ed. Bandeirantes Ltda.
65. AUTOR: MENDONÇA (RUBENS DE).
Obra: Dom Pôr do Sol.
Cuiabá-Mt., Sarã, 1954.
66. AUTOR: CONGRO (ROSÁRIO).
Obra: Colunas partidas.
Campo Grande-Mt., Tipografia da Livraria Ruy Barbosa, 1955.
67. AUTOR: MESQUITA (JOSÉ DE).
Obra: Piedade.
Cuiabá-Mt., Escolas ProL Salesianas, 1937.
68. AUTOR: PONTES (JOSÉ COUTO).
Obra: Deste lado do horizonte.
São Paulo, Ed. Esc~itores, s.d.
69. AUTOR: GOMES (OTÁVIO GONÇALVES).
Obra: Lampejo.
Campo Grande, Mt., Academia de Letras e História, 1962.
70. AUTOR: LINS (ANTÔNIO LOPES).
Obra: Caminhos de Lama.
São Paulo. s.d.
71. AUTOR: BARBOSA (LUIZ BUENO HORTA).
Obra: Pelo índio e pela sua proteção oficial.
Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1947.
72. AUTOR: MAGALHÃES (BASILIO DE).
Obra: Em defesa dos brasilíndios.
Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1946.
73. AUTOR: METRAUX (A.).
Obra: A religião dos Tupinambás.
São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 1950.
74. AUTOR:
Obra: Revista de História: Origem e Fundação do Serviço de Pro-
teção aos lndios - por David Hall Stauffer: voI. 37-44-46.
75. AUTOR: MOREIRA NETO (ARAUJO).
Obra:
- 969-

76. AUTOR: MOREIRA NETO (CARLOS ARAUJO).


Obra: A política Indigenista Brasileira durante o século XIX.
Rio Claro-SP. Cadeira de Antropologia da F. F . C . E. de Rio Claro-
S.P., 1971.
77. AUTOR: ALTENFENDER SILVA (FERNANDO).
Obra: Mudança Cultural dos Terena.
Xerox de uma separata da Revista Museu Paulista-nova série, vol.
li.
São Paulo, 1949.
78. AUTOR:
Obra: Boletim Informativo FUNAI - Ano lI, n 9 07 - lI-Trimestre.
79. AUTOR:
Obra: Rastreamento da Paróquia de Santana de Chapada das Gui-
marã.es.
* *
ANEXO N9 03 -
*
DOCUMENTOS DO ACERVO DA
SECÇÃO DE OBRAS
RARAS DA BIBLIOTECA DO CENTRO PEDAGÓGICO DE AQUIDAUANA.

01. FICHA N9 02.


AUTOR: DELPHINO LAVES CORRM.
ASSUNTO: RESPOSTA A UMA CRITICA FEITA AO SEU GOVERNO
PELA RÁDIO DIFUSORA: FAZ UM RELATO DAS BENFEITO-
RIAS DE SUA GESTÃO; Críticas à administração do p-efeito FER-
NANDO ALVES RIBEIRO.
Indicações: Manuscrito - 3 folhas e meia de almaço. Cópia pela esposa do
autor. Não contem título e data (seguramente posterior a 1951).
Estado do Documento: Bom.
02. FICHA N9 03.
AUTOR:PROFESSOR BRAZ A. MENDONÇA (DIRETOR).
ASSUNTO: ESTATUTO DA ESCOLA AGRICOLA D. BOSCO.
Indicações: Datilografada - 1 pág. papel almaço pautado; assinado pelo
autor. S/data.
Estado do Documento: Bom.
03. FICHA N9 17.
AUTOR: DOM FRANCISCO DE AQUINO CORRM, BISPO DE PRU-
SIADE-PRESIDENTE DO ESTADO DE MATO GROSSO.
ASSUNTO: Lei n9 772 de 1918. Elevação das Vilas de ROSÁRIO OESTE,
DIAMANTINO, CAMPO GRANDE, AQUIDAUANA, MIRAN-
DA E BELA VISTA à categoria de cidades.
Indicações: Cópia datilografada - uma página.
Data: da PRESIDENCIA DO ESTADO DE CUABÁ, 16 de julho de
1918, 309
- 970-
04. FICHA NQ 27.
AUTOR: F1LINTO MULLER (Chefe de Polícia).
ASSUNTO: l Q CIRCULAR DE 1117/1939 - do autor a DELPHINO
ALVES CORRf:A, solicitando um relatório sobre a cidade. Há 3
ítens declarados de interesse:
1. - Como foi recebido o regime de 10/11/37 (Estado Novo).
2. - Qual o aspecto do Estado Novo recebido com mais entusiasmo
pela população.
3. - Quais as diferenças entre o Estado Novo e o Regime anterio;
que a população estabelece.
Indicações: CIRCULAR IMPRENSA - 4 págs., papel timbrado. Data:
Rio de Janeiro, 11 de julho de 1939. SEGUE-SE 8 ITENS NUMERA-
DOS EM ROMANO, QUE EXPLICAM O QUE PRETENRE O
SEVIÇO DE INQUERITOS POLlTICOS E SOCIAIS (S.!. P . S. );
44 itens de aspectos que devem ser observados nos RELATÓRIOS;
na 4\1 pág. o endereço para correspondência.
Relatório datado de: 12/10/1939. DIRIGIDO A FILINTO
MULLER; 12 pág. datilog:afadas.
Estado do Documento: Bom.
* ..
*
ANEXO IV.
LIÇÕES DE HlST6RIA DO MATO GROSSO.
Vamos estudar, nesta lição, o início da ocupação do teritó io do Mato
Grosso que ocorreu em virtude da ação das bandeiras paulistas.
É preciso, então, para se estudar o assunto desta lição, que recoloquemos
alguns aspectos do bandeirismo.
Nos séculos XVI e XVII, os paulistas organizavam, sistematicamente,
expedições que, saindo de São Pau'o de Piratimnga (São Pau'o), percorriam
os territórios do sul e dos oeste brasileiros, à procura de índios. Os índios
capturados deveriam servir como escravos na própria vila de São Paulo ou
serem vendiéos para trabalharem nas lavouras de cana da Bahia e de
Pe:nambuco, principalmente.
O índio era o "remédio" para a pobreza do paulista e as bandeiras eram
o instrumento da sua caça.
No final do século XVII os bandeirantes começaram a desistir da caça
ao índio. Sua ambição voltou-se, então, para o ouro; foram descobertas as
minas de ouro na região que passou a se chamar Minas Gerais.
Alguns se tanistas, po!"em, continuaram, mesmo no início do século XVIII,
a dar caça ao índio. Pascoal Mo"eira Cabral, por exemplo, considerava que
o índio era o ouro de verdade e continuou organIZando expedições p:lfa
971 -

ve~am que mudar o rumo da sua penetração, e desta forma digiram-se em


direção ao centro-oeste, percorrendo o territó~io dos atuais estados de Goiás
e Mato Grosso.
As expedições que se dirigiam ao Mato Grosso, no século XVIII, utiliza-
vam-se dos rios como vias de penetração.
Antes de prosseguirmos convem que organizemos o que foi estudado.
Pa~a isso: utilizando o Atlas Histórico preencha o mapa abaixo com os ro-
teiros das bandeiras.
Faça, a seguir, no seu cade~no um resumo do que foi estudado sobre o
bandeirismo.
Para estudarmos a ocupação do território do Mato Grosso, vamos nos
utilizar de textos extraidos de um liv:'o já bastante antigo. Trata-se do livro
Viagem ao Redor do Brasil (segundo volume), escrito pelo Dr. João Seve-
riano da Fonseca em 1881. O livéo é bastante interessante, principalmente,
porque seu autor pôde utilizar documentos da época das expedições, que
ainda existiam quando ele escreveu o livro e que, mais tarde, desaparecer. m .

TEXTO N9 1.

"A gue:ra aos índios, para haver escravos, e à qual mais tarde se aliou
a sede do ouro, foi a causa do descobrimento desses sertões, de modo indêntico
ao por que já o tinham sido os do Cuiabá. Aqui foram Manoel de Cam-
pos, e seus filhos o capitão Antônio Pires, Pedro Vaz e Felipe BicuJo, e o
velho Anhanguera Br.rtolomeu da Silva e seu filho do mesmo nome e alcunha,
os primei:-os que ("orrendo os sertões desde São Paulo, em busca de índios
ou de ouro, vieram até o rio Cuiabá, antigo 1bitiraty".
"Já em 1682 o Anhangue:a, atravessando Goiás, encontrara, junto às
margens do Araguaia, Campos que voltava desses descobrime:1tos. Barbosa
de Sá, na sua Relação das povoações de Cuiabá e Mato-Grosso omitinc~o
o nome de Manoel De Campos, diz que Antônio Pires foi o primeiro aventu·
reiro que subiu u rio Cuiabá, em busca dos coxiponés; e conquanto não haja
certeza da época do descobrimento das minas dos Martírios (1), que o padre
José Manoel de Siqueira faz entre os anos de 1648 e 1706, não pa ece prova-
vel que fosse Manoel Campos quem o Anhanguera er.cont·ou e sim seu
filho Antônio, que acompanhou à Anhanguera naqueles descobrimentos, le-
vando em sua companhia seu filho de igUll nome, o mesmo que mais tarde
foi coronel e o destruidor dos caia pós" .
"Detiveram-se os aventureiros no lugar da confluência do Coxipó-merim,
onde tinham assentado suas tabas os bOlOrós, nação a mais guer eira e de
mais coragem que os paulistas haviam encontrado nas suas conquistas".

ESTUDO.
- 972-

3 O professor deverá esclarecer a classe sobre a lenda da Serra dos Martí-


rios.
4 Reesc:'eva o texto com suas palavras .


TEXTO N9 2.

"Se são, portanto, aqueles aventureiros os descobridores de Cuiabá é a


Pascoal Moreira Cabral de Leme, que aí penetrou em 1718, com uma ban-
deira, que se deve a fundação da cidade de Cuiabá, do mesmo modo que a
Miguel Sutil a glória do invento das suas minas de extraordinária riqueza".
"Pascoal, chegado ao lugar dos coxiponés, o mesmo onde se tinham detido
aqueles se tanistas, já achou destruida a aldeia; subiu pelo Coxipó-merim, e no
sítio da bifurcação, cerca de duas légms acima da foz, estabeleceu seus ranchos
depois conhecidos pelos nomes de sítio da Casa de Telha ou Arraial Velho. Já por
aí iam-se achando granetes e palhetas de ouro encravados na barranca; mas
pareciam de somenos vantagem relativamente às que esperavam da caçada de
índios: na Forquilha aprisionou vários, que traziam batoques e out os enfei-
tes, pedaços de OU"O, e desceu a refazer o povoado nas tabas dos Cuiabús, de-
pois São Gonçalo Velho".
"Aí apareceu-lhe o ou~o à flor da terra e em tamanha cópia que, como
diz Barbosa de Sá, si os que acompanharam Pascoal muito aproveitaram,
lucrando este uma e meia libra de ou '0, os que se demoraram ainda acharam
para colher, uns cincoenta, outros sessenta oitavas e alguns meia libra".
"Melhor avisados que os seus predecessores e que os vindouros, já não
quizeram voltar como pretendiam, nem mais pensaram em meter-se a correr
índios: não ca~eciam de muito esforço nem havia perigo algum em colher
diariamente boa máquia da ouro. Trataram logo (1722) de erguer uma ca-
peh que dedicaram à Nossa Senhora da Penha de França, pois nessa época
de fanatismo acreditavam piamente que crimes os mais iníquos podiam ser
resgata~os com práticas religiosas e aparências do culto. Trocaram as toldas
e tendas po~ palhoças mais sólidas e resistentes, de paredes da taipa ou espi-
ques de palmeiras, e trataram de roçar os terrenos próximos, e lançar-lhes se-
mentes para proverem sua manutenção. Dias depois chegavam do Itú, donde
eram naturais, os irmãos Macieis e Francisco Velho Moreira e out ·os que an-
davam tambem em bandeira, e para ali foram atraidos pela fama do descobri-
mento, a eles levadas pelos próprios bororÓs".
"Ricas e"am as minas, si tal nome se dá a terrenos que ostentavam em
sua supe ficie tão prodigiosa quantidade do precioso metal; e os aventureiros,
sabendo apertadas as ordens do Estado, na sua legislação das minas, e reco-
nhecendo em Pascoal direito do chefe, lavraram termo do descobrimento, esta-
beleceram compromissos recíprocos e delegaram um dos Macieis, Antônio,
com amostras do minério ao governador da capitania de São Paulo Minas-
Gerais, o conde de Assumar".
- 973-

ESTUDOS.

1. - Leia com bastante atenção o texto.


2. - Assinale as palavras cujo sentido voce não entenda.
3. - Assinale as palavras que designam tribos indígenas.
4. - Descreva como se deu a descoberta do ouro. Como era feita a mine-
ração, considerando que o ouro estava à superficie da terra?
5. - O que aconteceu à região focalizada, após a descoberta do ouro?
6. - Quais foram as providências administrativas tomadas pelos descobrido-
res? Por que?

TEXTO COMPLEMENTAR.

(Para ser lido e comentado junto com o professor) .


"Aos vinte e quatro do mês de junho botou o gua~da-mor Pascoal Moreira
Cabral uma bandeira à descobrimento de oi o, onde foi por guarda menor Ma-
noel Garcia Velho, junto com o escrivão das datas, onde descobriu um ribeiro
por nome São João com pinta de oitava e meia pataca e doze vintens, e outro
ribeiro de Santo Antônio com a mesma pinta, ribeiros de porte para se repar-
ti:em; e por assim ser verdade mandou o guarda-mor passar este termo por
mim escrivão das datas que o escrevi bem e fie' mente à fé do meu ofício, hoje
quinze do mês de agosto de mil e setecentos e dezenove anos. - Manoel
dos Santos Coimbra. - Pascoal Moreira Cabral. - Manoel Garcia Ve-
lho" .
Obs. O professor deverá comentar com a classe o significa:'o do te-mo
lavrado, chamando a atenção para o papel de Pascoal Moreira Cabral.

CONCLUSÃO.

Uma vez terminados os estudos os alunos se-ão divididos em grupo para


debaterem suas respostas. O p~ofessor, acompanhando as discussões as irá cor-
rigindo. Após o trabalho dos grupos, cada aluno deverá fazer uma redação
sobre o seguinte tema: PASCOAL MOREIRA CABRAL E A FUNDAÇÃO
DE CUIABA.
• •

INTERVENÇOES .

Do Prof. José Sebastião Witter (Universidade de São Paulo).


Disse:
"1.
- 974-

mente, mais existirão, quero pedir à mesma e a seus colaboradores


que não esmoreçam.
2. - Achei muito interessante que a Prof. a , a partir de pro-
posta de alunos, tenha criado um novo curso: República em Mato Gors-
so.
3. - Quero que esclareça um pouco mais a dinâmica do curso.
Como a autora faz coincidir o recurso visual apresentado com as aulas
ministradas? Ou a fixação das cenas simplesmente registram uma ex-
cursão, que faz parte do planejamento do curso?"

Do ProL Walter F. Piazza (Universidade Federal de Santa Catarina).
Pergunta:
"1. - Qual o tipo de documento manipulado pelo aluno? Ori-
ginal ou cópia?
2. - Há uma estruturação de curso de técnicas paleográficas
para o aprendizado do aluno?
3. - Qual o tipo de crítica que os professores e alunos fazem
com a bibliografia levantada?
4. - Foi efetivado um levantamento bibliográfico da coleção da
Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Mato Grosso?
4. - Qual o uso dos jornais para o estudo de períodos históri-
cos?
6. - No Mato Grosso não há professor de Antropologia, espe-
cializado em Pré-História, para supervisionar o levantamento arqueo-
lógico do Hstado?"
• •

RESPOSTAS DA PROFESSORA JOANA NEVES.

Respondeu:
Ao ProL José Sebastião Witter.
"Agradeço as colocações feitas.
Com relação às três questões gostaria de esclarecer que a excursão
constituiu-se no próprio núcleo do curso. Dela surgiram os problemas
e os recursos bibliográficos e os visuais.
A partir dos problemas colocados os livros eram lidos e discuti-
dos e os slides utilizados.

- 975-

Ao Prof. Walter F. Piazza


1. - Quando se trata de organização o aluno manuseia o ori-
ginal, quando se trata de estudo, são fornecidas cópias xerox.
2. - Não, infelizmente não dispomos de especialistas para tal.
3. - Procurou-se criticar sobretudo as concepções historiográ-
ficas dos autores procurando verificar sua fundamentação em termos
de documentos utilizados e seu envolvimento com os grupos políticos
locais.
4. - Não, isto é impossivel devido à desorganização da Bi.blio-
teca do Instituto. Solicitamos ao Instiuto, porem não obtivemos res-
posta.
5. - Não, não temos. Há um projeto de convênio com a Fa-
culdade de Filosofia, Ciências e Letras de Rio Claro para a utilização
dos serviços do Prof.
NOTAS A UM MANUSCRITO INÉDITO: "PAR-
CERIA E PECUÁRIA", DO DR. JOSÉ SABINO DO
PATROCÍNIO (*).

DOROTHBA V. G. BEISIGEL
Universidade Estadual de Mato Grosso.

INTRODUÇÃO.

O manuscrito, pertencente ao acervo de "Obras Raras" da Biblio-


teca do Centro Pedagógico de Aquidauana, unidade da Universidade
Estadual de Mato Grosso, é inédito e de carater jurídico. O autor vi-
veu numerosos anos em Miranda (MT) e Aquidauana, conhecendo a
fundo a realidade sócio-econômica da região. Em seu trabalho, a par
do exame da jurisdição, encontramos a análise das adaptações regio-
nais às referidas leis, os usos e costumes à margem da lei e um estudo
da parceria pecuária, justificando-a no contexto geográfico e econômico
do Mato Grosso.
O trabalho, terminado em 1942, tem a seguinte divisão:

1. - Bibliografia.
2. - Noção histórica da parceria.
2 . 1. Exposição geral da matéria.
3. - Da parceria pecuária.
3 . 1. - Estudo sobre a parceria pecuária na legislação francesa, ita·
liana, portuguesa e mexicana.
3 .2. - Modalidades da parceria pecuária em Mato Grosso.
4. - Comentários sobre os Artigos 1416 e 1423 do Código Civil (parceria
pecuária) .
5. - A extinção da parceria.
S • 1. - Possibilidades jurídicas.

(.). - Comunicação apresentada na 21' Sessão de Estudos, Equipe E,


no dia S
- 978

6. - Das ações que podem surgir dos Contratos de p3rceria.


7. - Jurisprudência.
8. - Legislação.
8. 1. - Da parceria agricola.
8.2. - Da parceria pecuá:ia.
8.3. - Do Penhor rural - agrícola e pecuário.
9. - Regulamento da Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco
do Brasil (1937-1938).
10. - Formulários.
10. 1. - Fórmulas dos contratos de pa~ceria agrícola e pecuária.
10.2. - Fórmulas dos contratos como eles realmente são feitos na
franca.
10.3. - Copias de contrato particulares de parceria agrícola.
10.4. - Escrituras públicas de parceria pecuária: com hipoteca ou
franca.
10.5. - ConLato particular de parceria pecuária.
10.6. - Contrato de arrendamento de gado - FICA".

o trabalho examina as bases jurídicas e históricas da parceria,


tanto agrícola quanto pastoril, baseando-se principalmente nas inter-
pretações de Clovis Bevilácqua.
O autor apresenta a preocupação em garantir a parceria docu-
mentada, devido a serem os "trabalhadores em geral, homens de pouca
instrução", podendo ser facilmente logrados quanto à partilha dos bens
auferidos. Lembremo-nos entretanto, que a valorização progressiva do
gado vacum exigiu uma documentação legal dos contratos de parceria
pois era muito mais compensatório pagar o preço do gado segundo a
tabela de cinco anos anteriores do que entregá-lo vivo, de acordo com
o contrato.
Os direitos e deveres dos parceiros contratantes são definidos,
assim como as condições para funcionamento do contrato, as possibi-
lidades de ruptura e a sua legislação. Os
- 979-

capitalista durante o Brasil Colonial motivou o desenvolvimento de


um sistema de parcerias e meações baseados nos usos e costumes, sem
documentação escrita. Esses usos e costumes persistem nas áreas pe-
cuárias - Minas Gerais, Goiás, Rio Grande do Sul e Mato Grosso.
Em geral os fazendeiros entregavam gado e terras para plantação
a meia aos filhos e agregados, constituindo-se como uma espécie de
proteção econômica.
Para o Código Civil Brasileiro, Parceria Pecuária seria o contrato
pelo qual uma pessoa entrega a outra animais para pastorear, tratar e
criar, mediante uma cota nos lucros produzidos. O Código Civil com-
pleta a lei de 24 de outubro de 1832 que estabeleceu, no Brasil, a li-
berdade de estipulação de juros acabando com as restrições advindas
da legislação das Ordenações que condenava a usura.
As Parcerias Pecuárias de gado vacum mais comuns são as se-
guintes:
1. - Criação de fêmeas para reprodução - partilha anual
das crias (animais machos). A renda corresponde de 20 a 25%
sobre o rebanho. Contrato geralmente de 5 anos, com restituição
de igual número de vacas, com a mesma idade. O restante das
crias é de propriedade do parceiro tratador.
2. - Gado a dobrar: um certo número de vacas é entregue
por um prazo certo, ge:almente 6 anos. O parceiro tratador deve
devolver o dobro do número de vacas; não há partilhas anuais e
as despesas e lucros ficam por conta do tratador.
3. - Renda anual: do gado entregue, por determinado pe-
ríodo; o proprietário recebe anualmente sua renda da seguinte
forma: metade em machos e metade em fêmeas, sendo que estas
continuam em poder do tratador. No final do contrato o parcei:o
proprietário recebe o número de vacas entregues, mais as crias
nascidas du:ante o contrato.
4. - Fica - documento regional, não previsto pela lei "O
parceiro tratador declara, por escrito particular, que ficam em seu
poder tantas vacas; o dobro do que realmente recebeu no ato e
se obriga a entrega-las ao parcei:o proprietário dentro de deter-
minado prazo". "É usado tambem na compra e venda de gado,
toda vez que o comprador deixa o gado comprado em poder do
vendedor para o receber em época determinada". O
- 980-

pagamento por parte do parcei~o tratador e sua mulher. No final


do contrato se há falta do gado e das cotas há a hipoteca da fa-
zenda. O autor alega que tal modalidade de contrato é regional,
sendo o mesmo seu introdutor em Miranda (MT); no caso de
não haver bens imóveis a hipotecar, o parceiro tratador pode apre-
sentar um fiador, sendo realizados contratos particulares ou pú-
blicos.
6. - Sub-Contrato de parceria pecuária - o parceiro tra-
tador cria o gado do prop~ietário e mais a cota anual que deveria
entregar. Quando se dá a formação da boiada e é vendida, o trata-
dor recebe uma porcentagem sobre o preço da venda. O gado é
marcado pelo proprietário para evitar extravio.

Nos contratos de parceria pecuária em Mato Grosso é costume a


estimação do gado para base de pagamento ao proprietário para ga-
rantir o extravio de gado ou falta de pagamento das cotas anuais se
houver valorização do gado o proveito cabe ao proprietário.
A valorização do gado deu lugar a inúmeras questões judi-
ciais, nas quais os parceiros tratadores procuravam entregar a quantia
da estimação e ficar com o gado mas, isto, perante a justiça é ilegal,
pois o gado é propriedade do parceiro proprietário; a única possibili-
dade do tratador permanecer com o gado é a de haver no Contrato a
variante: gado ou valor previamente estipulado.
Em Mato Grosso, onde as fazendas são enormes e os rebanhos
se contam aos milhares, a experiência mostrou que o estabelecimento
de uma renda fixa anual para o proprietário era a forma mais conve-
niente de garantir o capital empregado já que a fiscalização do gado
era impossivel.
Na criação de gado vacum em Mato Grosso o interesse primor-
dial, na época consistia no gado para corte, não interessando a explo-
ração do leite, o que aliás era em geral, impraticavel, dada a criação
extensiva. Assim o que tinha valor comerciavel era a cria, o "touri-
nho". Contratos de parceria referentes a outros animais não são co-
nhecidos, embora existam cavalhadas, cabras e ovelhas na região. Se
existiram contratos, eram de criação a meia.
A criação de gado em larga escala, a existência de imensas fazen-
das, de terras devolutas e de população escassa, alem das dificuldades
de comunicação, foram fatores que determinaram as relações entre o
proprietário do gado e o parceiro tratador, quer seja ele peão agregado
- 981-

fazendeiros velhos... muitos nos tem afirmado que


seus avós e pais começaram a vida criando a meia".

Segundo o autor na década de 40 ainda predominavam os con-


tratos verbais, chamados contratos de arrendamento de gado. O pro-
prietário recebia um recibo do "Fica" e as condições estipuladas eram
verbais, segundo os usos e costumes.
O autor estuda, em minúcias, as parcerias realizadas em Mato
Grosso segundo as leis e Decretos vigentes na época. Julgamos im-
portante destacar que, na lei há a proibição da "sociedade leonina",
isto é, onde o parceiro tratador arcaria com onus exagerado. Sendo
o parceiro proprietário dono dos animais, arca com as despesas advin-
das de perda dos mesmos, sendo nulo o contrato onde o parceiro tra-
tador arcasse com mais onus nas perdas do que nos lucros. No tra-
balho é justificada a parceria e o cálculo da porcentagem do pagamen-
to anual (20 a 25%), considerando-se que o gado, bem tratado tem
uma produção anual de 50 a 70%. A multiplicidade dos contratos de
parceria parecem ao autor índice de que os mesmos não eram prejudi-
ciais ao tratador.
Ao examinar as responsabilidades e beneficios de ambas as par-
tes observamos que a lei define o gado como capital e portanto per-
tencente ao parceiro proprietário, o parceiro tratador tem "uso e fru-
tos" do capital, que deve ser restitui do intacto salvo "caso fortuito ou
força maior (terremotos, pestes, guerras).
O sistema de parceria parece ter tido êxito na região pela facili-
dade de aumento vegetativo do gado, não se colocando restrições quan-
to à qualidade do mesmo; pelo menos nos contratos que consultamos
não encontramos tal exigência. Num regime de criação extensiva as
despesas que o parceiro tratador era obrigado a ter para criar o gado
eram mínimas: sal, alguns medicamentos, peões, tropa de montaria,
sobrando em geral no fim do contrato um número razoavel de animais,
que justificava os contratos.
Ainda ao examinar a legislação referente ao assunto o autor faz
críticas, mostrando a impossibilidade de algumas leis serem cumpridas
na região, como por exemplo:
"se um dos parceiros não cumprir as obrigações do contrato,
este não pode ser dissolvido antes do prazo fixo".
- 982-

Para o autor, os proprietários de gado são sobrecarregados de im-


postos

"inclusive o rodoviário, apesar de não haver estradas".

No trabalho ainda destacamos toda uma parte de jurisprudência


onde são analisados litígios entre fazendeiros acerca de contratos de
parceria, assim como o Regulamento da Carteira de Crédito Agrícola
e Industrial.
Na época (1939) os empréstimos para pecuária e agricultura fa-
cilitaram o crédito para os parceiros julgamos importante destacar ain-
da que, pelo Decreto-lei 4899 de 30 de outubro de 1942 tornou-se
obrigatória a pesagem do animal comprado para ser abatido como a
fiscalização oficial nos estabelecimentos compradores. No parecer do
autor isto constituiu-se numa ajuda aos produtores, sendo o "gado em
pé" (peso vivo bruto) mais interessante economicamente que o gado to-
mado como unidade.
Na época, segundo o Código Civil a mulher era considerada re-
lativamente incapaz e o autor trata dos direitos e deveres da mulher
à parceria quando Ó

"marido estiver em lugar não conhecido".

Parece nos que a parceria pecuaria constituiu-se uma das formas


de desenvolvimento econômico da região assim como de ocupação do
solo e ascensão social. O antigo peão tornou-se, com o passar dos
anos pequeno ou médio proprietário e, eventualmente, grande pro-
prietário. Um
- 983-

pagamento em "tourinhos" (crias). O valor econômico do gado au-


mentou de tal forma que, tornou impossivel a continuação do esquema
da parceria pecuaria nos moldes em que era realizada, pois traria pre-
juizos ao parceiro proprietário. Atualmente a tendência nas pequenas
e medias fazendas é o de utilizar o sistema de parceria com os filhos,
permanecendo na família os lucros auferidos com o aumento da cria-
ção. A lenta introdução de modernas técnicas e a presença de frigorí-
ficos, vão aos poucos mudando o panorama dessa região pecuarista
inserindo-a num contexto econômico onde não há praticamente lugar
para o sistema de parceria.
• •

Copias de documentos.
FICA

Declaro, para os devidos fins, que ficam em meu po::ler oito-


centas vacas mestiças de cria, de três a seis anos de idade, perten-
centes ao Sr. Antônio Gomes de Oliveira, criador residente neste
município, na fazenda "Soledad", declaro mais, que me obrigo a
lhe restituir, dent~o do prazo de cinco anos, oitocentas vacas mes-
tiças de cria de três a seis anos de idade, nas mesmas condições em
que as recebi. Tem este o valor de oitenta contos de réis (data
e assinatura sobre selo proporcional da União Federal) .


FICA

Ficam em meu pode~, para invernar em minha fazenda "Esti-


va" sita neste município, quatrocentos bois pertencentes ao Sr.
Salim Duailibi, mediante o pagamento de cincoenta mil réis por
cabeça. Obrigo-me a lhe fazer entrega dos referidos bois, à hora
que por ele me forem exigidos. Tem este o valor de oitenta con-
tos de réis. (data e assinatura sobre selo propo:cional da União
Federal) .

• •

A CRISE DE JULHO NA REVOLUÇÃO
DOS CRAVOS.
(Uma história oral da Revolução Portuguesa) (*).

DAVID GUEIROS VIEIRA


Universidade de Brasília.

o Programa de História Oral da Universidade de Brasília assu-


miu o ambicioso encargo de elaborar uma documentação da Revolu-
ção Portuguesa. Esta decisão foi tomada em vista do fato de que, es-
tando aquela Universidade em vias de montar um curso de pós-gra-
duação em História, cobrindo as áreas de história política e diplomá-
tica, desejávamos comprovar a eficiência da metodologia e técnica da
história oral como instrumento na elaboração de estudos de eventos
políticos e diplomáticos hodiernos.
"Eventos hodiernos" é o termo que utilizamos para definir o que
os anglosaxões chamam de current events. Este termo colocamos em
justaposição à expressão "história contemporânea" que, por ser cha-
mada história, compreende-se ser algo que já aconteceu, ainda que em
um passado não longíquo, e para a qual existem provas documentais.
Documentos, em nosso entender, são não apenas aqueles deposi-
tados em cartórios e arquivos públicos, como tambem, entre outros, e
não limitados a estes, cartas, jornais e mesmo memórias faladas e es-
critas dos que participaram de certos eventos em estudo. Os eventos
hodiernos, no entanto, quando produzem documentos públicos, seme-
lhantemente às notícias publicadas nos periódicos, estão sujeitos às
paixões e, consequentemente, podem, no final de contas, ser mentiras
absolutas, fabricadas para influenciar a opinião pública. Os documen-
tos mais sérios e mais achegados à verdade, em geral, só aparecem
depois que as paixões do momento esfriam ou morrem de todo.

(.). - Comunicação apresentada na I'


- 986-

Em vista do acima exposto, o estudante dos eventos hodiernos, se


de fato deseja chegar perto da verdade, deve busca-la ativamente, e não
sujeitar-se a aceitar passivamente tudo aquilo de que toma conheci-
mento nos periódicos e na imprensa falada. Nessa busca da verdade,
o estudante sério encontrará na história oral um dos seus melhores ins-
trumentos, se tiver suficiente imaginação e bastante ceticismo para se-
parar o trigo do jôio.
A história oral, com sua metodologia e técnica, produz documen-
tos orais por meio de entrevistas calmas e de antemão bem prepara-
das. No entanto, esta metodologia e técnica sofrem forte modificação
quando são aplicadas a eventos hodiernos de natureza apaixonante.
A razão é que a história oral, no seu sentido "clássico" é mais ade-
quada a programas que envolvem indivíduos já afastados da vida pú-
blica e que, por isso, presume-se não mais estejam sujeitos às paixões
dos eventos dos quais participaram. Tais seriam os casos das entrevis-
tas dos Presidentes Truman, Eisenhower e Johnson, bem como de es-
tadistas como Gandhi, Churchill e de GauHe, gravados por vários estu-
dantes da história contemporânea.
Ora, ao estudar uma revolução em andamento, raramente o pes-
quisador terá a oportunidade de conduzir uma entrevista "calma e de
antemão bem preparada", como requer a técnica da História Oral.
Portanto, o entrevistador é obrigado a lançar mão de uma dezena de
expedientes e improvisações. Essas improvisações, como constatamos
no caso de Portugal, são necessárias porque, em face de uma crise re-
volucionária, os melhores planos do entrevistador são quase sempre fa-
lhos.
Chegamos a Portugal no dia 6 de julho, dois dias depois da ale-
gada tentativa de golpe de estado - o "4 de julho", na terminologia
revolucionária portuguesa. Trazíamos cartas de apresentação para pes-
soas de influência que, a seu turno, nos poderiam apresentar a pessoas-
chaves na Revolução.
De fato, com apresentação do Prof. Henry H. Keith, da Univer-
sidade de Brasília ao Dr. José Blanco, Diretor Internacional da Fun-
daçã'1 Calouste Gulbenkian, obtivemos cartas para os Generais Car-
los Fab:ão e Othelo Saraiva de Carvalho, seus velhos companheiros
de armas em África. Do his.toriador Joel Serrão obtivemos apresen-
tação a vários r~volucionários, entre os quais o Deputado José Manuel
Marques do Ca~mo Mendes Tengarrinha, Chefe do MDP /CDE.
Do jovem historiador brasileiro, Rafael de Faria Domingues Mo-
reira, que vive em Lisboa, obtivemos apresentação ao Dr. Mário Soa-
res, Chefe do Partido
- 987-

MRPP, e a Isabel do Carmo, Chefe do não menos militante PRP IBR


e pressuposta mentora política do Gen. Othelo Saraiva.
Através da jovem brasileira, Regina Chulam, estudante de pós-
graduação em História em Lisboa, conseguimos apresentação, entre
outras, a Maria João Seixas Lopes, secretária particular do Major Vic-
tor Alves, por meio de quem esperávamos apresentação aos Majores
Melo Antunes e Victor Crespo.
De todas essas apresentações apenas as de Mário Soares e Isabel
do Carmo resultaram em entrevistas. Em face da agudização da crise
política de julho, as personagens acima mencionadas encontravam-se
em constantes reuniões de cúpula (de "cimeira", como é dito em Por-
tugal) que frequentemente duravam até às 5:55 e 6:00 horas da ma-
nhã, e portanto, não estavam disponíveis.
Diante disto, passamos a utilizar uma série de improvizações, tais
como entrar de súbito nas sedes dos partidos, tanto da direita quanto
da esquerda, solicitando entrevistas como quem lá estivesse. Desta ma-
neira obtivemos entrevistas com Lino de Carvalho, membro da Co-
missão Palítica Nacional do MDP ICDE; com o arquiteto Nuno Teotô-
nio Pereira, Diretor de Relações Internacionais do MES; com D. Ma-
ria José da Gama, Presidente da Comissão Socialista de Apôio aos
Retornados de Angola; e com o Dr. Vasco da Gama Fernandes (P.
S.), Presidente da Comissão dos Direitos do Homem e 1.0 Vice-Pre-
sidente da Assembléia Constituinte. Chegamos até a obter promessa
de entrevista com Mário CunhaI, Chefe do PCP, se lá ficássemos mais
uma semana.
Outras entrevistas foram obtidas através dos acima citados ami-
gos no Brasil e em Portugal. Entrevistamos, assim, o historiador Joel
Serrão tMDP), Vice-Presidente do Instituto de Alta Cultural e Diretor
da Fundação Gulbenkian, o historiador Jorge Borges Macedo (que se
diz apolítico); o engenheiro Fernando de Albuquerque (PPD), Chefe
de Gabinete do Ministro de Assuntos Sociais; o engenheiro Alexandre
Bettencourt, membro da Comissão Política Nacional do PPD o Dr.
Ribeiro Teles, Secretário do Meio-Ambi.ente e seu chefe de Gabinete,
Antônio Coimbra.
Em todas as entrevistas, o grande problema que encontramos foi
o de diferenciar a "verdade revolucionária" da verdade histórica. Ex-
plicamos: como homens públicos e revolucionários, os entrevistados, em
sua maioria, estavam presos à linha política de seus partidos e, por is-
so, não podiam enunciar conceitos diferentes da linha partidária. Cu-
riosamente, a mais honesta das entrevistas políticas que tivemos foi a
de Isabel do Carmo. Esta entrevista foi um verdadeiro bouffée d' ai"
- 988-

como diriam os franceses. Outrossim, poucos dos entrevistados iam


compreender o que queria dizer história oral, exceto os dois historia-
dores. Na sua maioria, criam estar com um reporte r e que suas pala-
vras seriam depois publicadas em jornais ou revistas, de modo que, em
geral, usaram de grande precaução. Ainda que houvesse tempo para
convence-los de que, suas possíveis confidências seriam cuidadosa-
mente arquivadas e nunca reveladas sem sua permissão, dificilmente
aquiesceriam fazer tais revelações confidenciais a um perfeito estra-
nho, no meio de tão violenta luta política.
De certo modo, algumas atitudes íntimas, em alguns casos, nos
foram reveladas através de "alfinetadas psicológicas" que conseguimos
ministrar aos entrevistados. Em outros casos, o método utilizado foi
mais aberto, menos sutil e talvez inadequado, embora tenha produzido
resultados.
Alguns entrevistados desejavam enviar mensagens ao Brasil, co-
mo o historiador J oel Serrão, que solicitou dos brasileiros maior "com-
preensão" para o processo revolucionário português. Igualmente, Lino
de Carvalho desejava que todos soubessem que sua organização está
bem informada dos endereços em São Paulo, no Rio de Janeiro e em
outras cidades, onde refugiados portugueses presumivelmente se reu-
nem para elaborar "planos contra-revolucionários".
Em algumas ocasiões, ao desligarmos o gravador, o entrevistado,
em amigavel conversa, expressava pensamentos quase que opostos aos
anteriormente veiculados.
Houve o caso de alguem que depois de haver mencionado que
25 .000 profissionais já haviam fugido de Portugal, e que necessária
se impunha uma lei proibindo tal imigração, ao ser desligado o gra-
vador, passou a inquirir-nos acerca do mercado de trabalho no Brasil
na sua especialidade o que nos pareceu forte indício de que tambem
planejava um dia fugir ...

A mais dramática dessas revelações entretanto, ocorreu na nossa


curta entrevista com Mário Soares. Falava o lide r socialista de sua
luta em prol de um socialismo com liberdade, dentro de uma demo-
cracia de estilo ocidental. O entrevistador era o Autor, tendo como
testemunha o historiador Rafael Moreira.

- Entrevistador: Dr. Soares, uma última pergunta: - Temos


falado com muitos socialistas, alguns até ligados à chefia do Par-
- 989-

Europa. Se os socialistas abandonam assim o país, quem fica:oá


aqui para lutar pela democracia?
- Soares: De fato, do ano passado até hoje, perdemos
25.000 técnicos que emigraram para o Brasil e Europa, por razões
políticas. Esse é um tipo de gente que não podemos e não deve-
mos perder, mas são os que tendem a fugir. Infelizmente, algu-
mas pessoas têm a tendência de resolver seus p oblem1s em
bases pessoais e não em bases comunitárias ...

Depois que o gravador foi desligado, o entrevistado perguntou de


que Universidade eram os entrevistadores. Ao saber que um deles era
da Universidade de Brasília, com expressão bem cansada e séria, e
olhando para o chão, o Dr. Soares disse: "a, um desses dias talvez
lhe bata à porta ... " .
No dia seguinte chegava o Gen. Othelo Saraiva de Carvalho ua
sua visita a Cuba, e revelava, em entrevista televisionada, que durante
toda aquela semana o MF A e o Conselho da Revolução tinham deba-
tido a poss~bilidade de novo exílio para Mário Soares.
Todas as entrevistas acima mencionadas foram liberadas para
publicação, o que faremos com comentários sobre as circunstâncias das
mesmas, bem como dos eventos do dia ou da semana que poderiam
ter influenciado as respostas. Esta futura publicação, a sair dentro
de 3 ou 4 meses, terá o título do presente trabalho.

. '"

INTERVENÇOES .

Da prof.a Ruth do Valle (Universidade Federal do Rio Grande do


Sul).
Indaga:
"Em face dessa "instabilidade" política em que os entrevistados
se contradizem entre a palavra oficial e a "oficiosa", há possibilidade
de se fazer História?"

Do Prof. José Sebastião WiUer (Universidade de São Paulo).
Pergunta:
1. - "O autor não acha impossivel fazer "História Oral" indi-
vidualmente? Acuo
- 990-

2. - Sem entrar na discussão da "Teoria da História Oral",


não acha o autor temerário usar a máquina para analisar o homem?"

Da Prof. a Sônia de Azevedo Gonçalves (Fundação Educacional Seve-
rino Sombra - Vassouras. RJ).
Indaga:
"Poderia o autor esclarecer a respeito da afirmativa "aplicabili-
dade da História Oral como metodologia auxiliar de ensino histórico
em nivel universitário". Parece-me que há erros nesta frase.
Não existe nenhuma História Oral e sim o que se tratou aqui foi
o valor de documentos gravados. A introdução do gravador na tecno-
logia moderna tanto por historiadores como por outras pessoas.
Como os próprios norte-americanos reconhecem que a expressão
em inglês não é feliz, nós não deveríamos usar essa tradução porque
ela é mais infeliz ainda. A tradução não está correta" .

Da prof.a Queila Ferraz Monteiro.
Pergunta:
"A História Oral seria uma interferência na História na medida
em que a usa como montagem da fonte?"
* •

RESPOSTAS DO PROFESSOR DAVID GUEIROS VIEIRA.
À Prof.a Ruth do Valle.
O historiador depara-se com este problema não apenas quando
estuda eventos hodiernos. Ao ler qualquer documento, quer seja mo-
derno ou antigo, o pesquisador deve sempre estar cônscio de que o mes-
mo é apenas algo que os "vencedores"
991


Ao Prof. José Sebastião Witter.
Em primeiro lugar deve-se dizer que a técnica chamada "História
Oral" é melhor aplicada por uma equipe. No entanto, torna-se tre-
mendamente dispendiosa quando se trata de um estudo no exterior.
Infelizmente, só havia verbas para uma pessoa viajar a Portugal. No
entanto, cumpre ressalvar que este pesquisador foi grandemente auxi-
liado pelo historiador brasileiro Rafael Faria Domingues Moreira, que
reside em Lisboa.
Em segundo lugar diríamos que, sem dúvida alguma, este tipo de
equipamento eletrônico faz lembrar "1984", de George Orwell. No
entanto, não podemos negar que esta técnica da eletrônica moderna
será de grande valia para o historiador, que poderá julgar, com certa
exatidão, se o entrevistado estava, ou não, sendo sincero nas suas de-
clarações.

À prof.a Sônia de Azevedo Gonçalves
Esta frase, se não me engano, foi utilizada no trabalho do Pro!.
George P. Browne. Creio que se refere ao programa de pás-gradua-
ção da Universidade Federal de Santa Catarina, que oferece treino em
metodologia e técnica de história oral, como parte do curso de meto-
dologia e técnica da história.
Quanto à sua segunda observação, estou de pleno acordo. A
tradução não é boa. No entanto, até agora ninguem encontrou ter-
mos mais apropriados. Se a professora tiver alguma sugestão, peço
que a apresente. Teremos grande prazer em adotar, se for o caso,
sua proposta ou tradução.

À prof.a Queila Ferraz Monteiro.
Muitos historiadores, por bem ou por mal, tem pessoalmente in-
terferido no processo histórico. Por exemplo, o Professor Arthur M.
Schlessinger Jr., membro do governo Kennedy, impressionado com
sua própria intervenção nos eventos daquele período, já escreveu algo
sobre o assunto. O
UM PROJETO DE MONTAGEM DE RECURSOS
DIDÁTICOS APLICADOS A HIST6RIA (*).

ELZA NADAI
da Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo.

Cada geração, na afirmativa de Bruner

"dá nova forma às aspirações que modelam a educação


em seu tempo. O que talvez esteja surgindo, como marca da
nossa, é um amplo renovar da preocupação com a qualidade e
os objetivos intelectuais da educação" (1).

Realmente, o grande impasse que o sistema educacional está vi-


vendo em virtude de um crescimento quantitativo de oportunidades, a
chamada "democratização do ensino" trás consigo a necessidade de
uma reavaliação do próprio sistema, no que tange de mais concreto
que ele possui - seus objetivos, a interação professor e aluno e os
processos didáticos empregados - , visando-se uma readaptação do
mesmo à realidade que pretende servir.
No Estado de São Paulo esse processo não é novo e segundo um
estudioso do assunto pode ser decomposto em dois períodos distintos:
na primeira etapa apresentou-se

"como uma contingência do processo de competição pelas


posições de poder"

e a segunda correspondeu a
(*). - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe D, no
dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - Bruner (Jerome S.), O proce96o da Educação. São
- 994-

"uma opção consciente por uma concepção democratizadora


da escola de nivel médio, t~aduzida em uma política educacional
e uma prática administrativa coerente com os objetivos propos-
tos para a ação do poder público no campo do ensino" (2).

o autor situa o primeiro período entre o fim do Estado Novo até


mais ou menos mil novecentos e sessenta e dois e o segundo, a partir
de mil novecentos e sessenta e sete (3). De todo modo, a década de
setenta trouxe consigo uma ampliação quantitativa do ensino médio,
principalmente das escolas de primeiro grau, buscando-se atender a
todos os jovens em idade escolar obrigatória fixada nos termos da lei
federal 5.692/71 que reformulou a educação nacional.
A esse crescimento não correspondeu uma reavaliação geral dos
objetivos, finalidades, estratégias, recursos humanos e a própria clien-
tela da escola tal qual estava implantada o que acarretou o desequilí-
brio entre a quantidade e a qualidade do próprio sistema escolar.
À escola, como bem sabemos, se atribui basicamente o papel de
transmissora sistemática da cultura que procura conservar. Mas, hoje
se debate na bU3ca das formas mais adequadas de realizar o processo
de comunicação dessa herança, pois à medida em que ela incorporou
jovens provenien~es dos mais diversos níveis sócio-econômicos, regiões
e faixas etárias, ela necessita diversificar sua forma de comunicação
objetivando encontrar uma linguagem mais adequada a uma clientela
heterogênea, com as mais diversas vivências que deverá atender.
A experiência que iremos relatar procura situar outras formas de
linguagem que não a tradicional, a serem empregadas na sala de aula.
:g nosso interesse chamar a atenção para o problema contribuindo para
a abertura de um debate sobre o assunto. Essa experiência partiu de
necessidades bem objetivas:
1.0). - A constatação da inexistência de recursos adequados
à ação docente que viesse realmente colaborar com o professor no de-
senvolvimento da atividade escolar, relativa ao ensino de História;
2.°). - A precariedade, a inadaptabilidade e a dificuldade de
acesso aos recursos existentes em Consulados e instituições congêneres;

(2). - Beisigel (Celso de Rui), A educação de adultos no Estado de


São Paulo. Tese de doutoramento apresentada à Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Sociologia (exem-
plar mimeog~afado), p. 21.
(3). - Idem., loc. cito
-995 -

3.0). - A nossa preocupação em encontrar outras formas de lin-


guagem, como exemplos - a imagem e o som que fossem usados em
sua especificidade e não como recursos meramente ilustrativos às pala-
vras do professor;
4.°). - Nosso interesse último estaria voltado para a constru-
ção de uma espécie de "Banco de Empréstimo" visando a circulação
desse material entre os professores da Capital e posteriormente do pró-
prio Estado de São Paulo.
O projeto tem por objetivo possibilitar, primeiramente a cons-
trução de recursos didáticos que cubram significativamente partes do
conteudo histórico, formando uma unidade, principalmente do Brasil.
Deve ser buscado o enfoque unitário, a fim de que o todo seja anali-
sado através de imagens, música ou texto. Posteriormente, elaborar
diferentes recursos sobre o mesmo tema, quando então seriam utiliza-
das diversas formas de co.municação.
Em síntese, o nosso projeto visaria a análise da realidade como
um todo, através de diferentes situações de estudo, onde o ponto de
partida seria o presente propondo-se uma abordagem retrospectiva do
acontecido e possibilitando, quando isso fosse possivel, uma conclusão
em aberto para que os jovens tivessem oportunidade de participarem
ativamente do processo de aprendizagem. Desta forma, acreditamos
que se consiga formar realmente o espírito crítico, cumprindo-se um
dos maiores ob;etivos da existência da História no ensino.
Esse projeto está sendo desenvolvido juntamente com os nossos
alunos de Prática de Ensino de História, desde mil novecentos e setenta
e três. Cada grupo de seis a oito alunos escolhe um tema e realiza o
planejamento de trabalho: selecionam o.s objetivos, a abordagem, o
material e os recursos disponíveis. O recurso. é então aplicado em al-
guma escola, quando são avaliados os diferentes níveis de significância,
adequação à série e abordagem. A sua construção é um entre os nú-
meros trabalhos utilizados na análise do tema, e normalmente tem sido
empregado no lançamento. do seu próprio estudo, como elemento. mo-
tivador, ou com a função de síntese e consequentemente lançamento
de outro tema. Para a análise do assunto proposto os alunos selecio-
nam e realizam a adequação de textos que devem acompanhar o tra-
balho e serem objetos de estudo em profundidade.
Até agora já temos pronto, entre outros: a sociedade açucareira;
a sociedade colonial; as migrações; a sociedade brasileira na década de
vinte; a economia colonial e o negro na sociedade colonial.
Vamos apresentar ao VIII Simpósio da ANPUH, à guisa de exem-
- 996-

setenta e quatro que, embora na aparência propõem a utilização do


som e da imagem, isto é, texto, música, pinturas e mapas, são intrin-
sicamente diferentes.
o primeiro focaliza o BRASIL HOLAND:es (4) a partir da rea-
lidade européia do século XVII compreendendo projeção de slides
sobre reproduções da época; mapas e textos especialmente compostos
juntamente com as músicas previamente selecionadas que analisam a
conquista holandesa e reconquista portuguesa; a situação econômica-
social da época a partir de gravuras do engenho, do escravo, da vida
na casa grande, etc. .. Esse trabalho propõe uma síntese sobre o te-
ma ao mesmo tempo em que deixa uma questão aberta em seu final.
O segundo trabalho enfoca o POPULISMO, utilizando um texto
sincronizado de projeção de charges da época, principalmente as que
foram publicadas na revista Caretas com músicas de cunho satírico.
Não há texto interpretativo de apôio. Tem por objetivo, alem do lan-
çamento de problemas sobre o assunto em pauta, fazer os jovens pen-
sarem em fontes historiográficas como o jornal, as revistas e a pró-
pria música satírica. Enfoca diferentes aspectos do mesmo assunto:
demagogia popular, adesismo, monopólio do poder, incapacidade ad-
ministrativa, campanha eleitoral, opinião pública e o papel da im-
prensa. Para realizar esse trabalho os alunos (5) realizaram uma pes-
quisa sem trégua na redação de diferentes jornais como: o Estado de
São Paulo, o Correio Paulistano, a Gazeta, Oltima Hora, Folha de
São Paulo, alem das revistas Cruzeiro e Manchete.
Esse segundo trabalho utiliza um tipo de documento até hoje mui-
to pouco estudado pelos historiadores, estudantes e professores de His-
tória: a charge, a sátira, a caricatura que é, sem dúvida alguma, uma
manifestação acima de tudo crítica e que, se bem empregada poderá
ser utilizada para colaborar na reconstrução do período focalizado.
Ambos os trabalhos enfatizam uma situação problema na sua con-
clusão visando a condução de u1l).a pesquisa por parte do aluno sob a
orientação do professor, objetivando estabelecer uma continuidade da

(4). - Esse recurso foi planejado, executado e avaliado às pr6prias


expensas das alunas Est6ia Omori Utiyama, Hilda Marina Siaudzionis, Márcia
O'Angelo Rezende Barros, Maria Francisca do Rosário Bueno Marcelo, Maria
Helena Navajas e Sônia de Jesus Garcia. O texto e a relação de slides encon-
tram-se no final deste trabalho, em anexo.
(5). - Os alunos que planejaram, executaram e avaliaram esse traba-
lho foram: Maurício Luiz de Souza Ar-uda, Luiz Roberto Correia Couto Pe-
reira, Marlene Borges Ribeiro, Maria Oolo-es Sanchez Vallejo y Lopez, Vara
Ralter e Sônia Regina Bagdzius. Pela
- 997-

aprendizagem enquanto processo dinâmico. :e através do questiona-


mento que o adolescente redescobre o mundo em suas complexas re-
lações e a História deve ser ensinada dessa forma.
Por fim é importante salientar que não queremos com esse pro-
jeto compor com aqueles que clamam por inovações enquanto renova-
ção entendida como remodelação de aparências, mas tão somente in-
teressa-nos uma redefinição de abordagem da própria História enquan-
to instrumento por excelência de análise de uma realidade social inse-
rida em um contexto histórico e como tal entendida nas suas relações
com a educação.
• •

Anexo.
TEXTO.

Felipe 11, rei de Espanha e agora de Portugal.


Deu-se a união Ibérica.
Há a ruptura da linha de Tordesilhas e este fato terá con-
sequências tanto para Portugal, como para a Espanha e o
Brasil.
Uma dessas consequências, para o Brasil, foram as invasões
holandesas no Nordeste brasileiro.
Flandres é um grande centro financeiro e comercial.
Os holandeses, associados aos portugueses, participam da
montagem da agricultura açucareira no Nordeste b:asileiro, que
constitui parte ponderavel da economia holandesa.
Felipe 11 está em guerra com os holandeses, pois estes recen-
temente tinham conquistado sua independência do Império dos
Habsburgos .
Isso leva Filipe 11 a embargar o comércio açucareiro holan-
dês nos portos po tugueses e brasileiros. Mas os territórios sob
os domínios de Portugal e Espanha, agora sof~erão agressão ho-
landesa.
É a ação das Companhias Privilegiadas que, de início, agem
no Oriente sob o nome de Companhia das lndias Orientais, e,
poste dormente, no Ocidente, de dominação ibérica, sob o nome
de Companhia das índias Ocidentais.
O
- 998-

E foi com esta intenção que se conquistou a Bahia.


Embora muitos senhores de engenho tenham se aliado aos
invasores, há uma resistência contínua por parte da população.
O boicote da entrada de alimentos na cidade, a reação nas cor-
tes portuguesas e espanholas e os reforços enviados, provocam a
expulsão dos holandeses.
Entretanto, esta derrota não transformou os planos da Com-
panhia que tenta uma segunda invasão, agora em Pernambuco, o
maior centro açucareiro da região. Apesar da resistência de
pernambucanos, concentrados no Arraial do Bom Jesus, os ho-
landeses continuam avançando, auxiliados pelo considerado trai-
dor DOMINGOS CALABAR, arrasando o arraial e estendendo
seus domínios de Alagoas até a Paraiba.
Após 7 anos de lutas, destruição de lavou:as, paralização da
produção, proprietários desgastados, os holandeses percebem que
é chegada a hora de estabelecer uma coexistência com os produ-
tores, e esta tarefa é entregue ao conde João Maurício de Nassau
Siegen.
Há uma conciliação entre os habitantes do local conquistado
e os holandeses, recuperação das lavouras e o estabelecimento
das bases políticas da presença holandesa na região dominada.
Há o reinício da produção do açucar, sob a direção da nova
metrópole, após a promessa de regalias e os empréstimos efe-
tuados aos senhores de engenho. A tolerância religiosa tambem
foi o suficiente para que a Igreja se unisse aos invasores.
A fisionomia das cidades é transfocmada: há prog esso eco-
nômico, aperfeiçoamento de vias de transporte, criação de mer-
cados. Isto tudo denota o domínio econômico que a Companhia
exercia.
As realizações culturais e arquitetônicas da administração de
Nassau mostram antes a necessidade de conforto a que estavam
acostumados os holandeses, o vulto das operações comerciais que
realizavam e o desejo de compa~tilhar essas realizações com o
resto da população.
Em 1640, Portugal arrasado separa-se da Espanha, mas não
está em condições de forçar as posições holandesas no território
colonial americano, sendo levado à formalização de um "Tratado
de Paz" com a Holanda. Por esta mesma época, a Holanda so-
fre as consequências da Gue:ra dos 30 anos e muda radicalmen-
te a sua política econômico-financeira. A partir deste momento,
a Companhia das índias Ocidentais eudurece o tratamento dado
aos produtores açucareiros do Nordeste, elevando a taxa de ju-
ros, os preços das mercadorias impo!tadas,
- 999

dai, os senhores de engenho, endividados com a Companhia, que


antes apoiavam a dominação holandesa, passam a apoiar o
movimento de insurreição contra os invasores.
Em 1649 o governo português manda reforços (parcos).
Em 1654, os holandeses rendem-se e se retiram definitiva-
mente do Brasil.
O fim do domínio holandês no Brasil coincide com o prin-
cípio da influência maior da Inglaterra em Portugal e, por conse-
quência, nos seus domínios coloniais atlânticos. Em 1661, a
"Paz de Háia" liquida os últimos compromissos luso-holandeses.
Portugal substitui a associação flamenga pela nova associação in-
glesa.
Ao lado disso, os holandeses criam uma área produtora de
açucar nas Antilhas, que passa a concorre~ com o comércio bra-
sileiro.

* *
*
Problemática

1. - Após esta experiência com uma administração holandesa no


Brasil, fica uma pergunta no ar: haveria possibilidades con-
cretas de um Brasil holandês?
2. - A situação intrínseca dos senhores de engenho endividados
com as Companhias de Comércio holandesas, levou-os a
uma apatia ante o domínio holandês. Por outro lado, Portu-
gal, sob o domínio espanhol, não mandou qualquer reforço
para que a expulsão dos invasores fosse consumada. Ante
estas atitudes o auxílio de Calabar à administração holan-
desa pode ser considerada traição?

• •
- 1000 -

7. - Mapa: Império dos Habsburgos


8. - Mapa: Embargo do comércio açucareiro.
9. - Mapa: Territórios sob domínio de Portugal e Espanha.
10. - Conquista da Bahia.
11. - Mapa: Invasão e Conquista de Salvador.
12. - Conquista da Bahia: gravura.
13. - Gravura.
14. - Mapa antigo: restituição da Bahia.
lS. - Invasão em Pernambuco.
16. - Mapa: Invasão e conquista de Pernambuco.
17. - Mapa: Domínios holandeses.
18. - Gravura: luta.
19. - Maurício de Nassau.
20. - Gravura de Pernambuco.
21. - Olinda na época da dominação holandesa.
22. - Aspecto de Recife.
23. - Cidade Maurícia.
24. - Mauricéia.
2S. - Aldeia Pernambucana.
26. - Mapa: Invasões Holandesas.
27. - Gravura.
28. - André Vidal de Negreiros.
29. - Batalha dos Guararapes.
30. - Mapa: reti,ada dos holandeses.
31. - Linha do Tempo.
32. - Mapa: Antilhas.
33. - Maurício de Nassau.
34. - BRASIL HOLAND~?
3S. - Calabar.
36. - CALABAR TRAIDOR?

* *

INTERVENÇOES .

Do Prof. José Sebastião Witter (USP/SP).


Disse:
"1. - A autora conhece o setor de Recursos Audio-Visuais da
"Sala Ambiente"
-1001-

3. - A técnica empregada é boa quanto à concepção, mas


acho que faltou aparelhagem apropriada. Som da música mais alto
que a voz da moça que expunha".

Da Prof~ Marlene de Mauá Carvalho Mendes (Universidade Federal
de Sergipe) .
Declara:
"Achei sempre válido o recurso utilizado no primeiro trabalho.
Apenas como sugestão: a música deveria vir somente em fundo,
bem baixa, talvez somente nos intervalos da fala, e jamais cantada" .

Do Prof. Roberto Machado Carvalho (Faculdade de Filosofia, Ciên-
cias e Letras de Moema/SP) .
Pergunta:
"1. - Qual a experiência direta, isto é, com a clientela escolar
de ensino médio? O Departamento de História está acompanhando os
resultados da aprendizagem?
2. - Qual a posição do ,presente na experiência? Já tentaram o
Plano do presente para o passado?
3. - Como encarar o problema do humorismo das charges para
os alunos - não levaria a um sentido de denegrir figuras importan-
tes da História?"

Da Prof~ Philomena Gebran (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras
de Vassouras/RJ) .
Indaga:
"Se há uma proposição didática da apresentação, até que ponto
seria compreensivel para os alunos do 2Q grau as charges, sem haver
uma explicação prévia, do momento político de cada uma?"

Do Prof. José Calazans Brandão da Silva (Universidade Federal da
Bahia) .
"Declara que lhe parece interessante fazer um levantamento sobre
música brasileira no século passado e seu aproveitamento no ensino da
História" .
• •

RESPOSTAS DA PROFESSORA ELZA NADAI.
Ao Prof. José Sebastião Witter.
Respondeu:
"Agradeçemos as intervenções do Prof.
- 1002-

Esse pro;eto nasceu, como afirmamos na nossa exposição, de


uma necessidade constatada: a ausência de recursos didáticos construi-
dos especialmente para o ensino da História, visto esta como um todo.
O grupo de alunos que integraram o curso de Prática de Ensino de
História em 1972 realizou um levantamento completo das diversas
instituições que, em São Paulo, emprestam materiais para o profes-
sor, desde os Consulados até os diferentes Departamentos que integram
a Universidade de São Paulo, portanto a "Sala Ambiente" do Depar-
tamento de Geografia.
Quanto à segunda questão proposta, queremos deixar bem claro
que não somos, absolutamente, contrários à utilização do livro didá-
tico nas escolas de 19 e 21? graus; muito menos, pela sua "pura e sim-
ples abolição" nas escolas. O que gostaríamos de salientar é que atual-
mente não se deve trabalhar somente com esse instrumento didático.
Em um mundo onde o som e a imagem adquirem um papel cada vez
mais significativo, deve-se procurar formas de interligação entre os di-
ferentes tipos de comunicação: a visual, a sonora e a gráfica.
Consideramos fundamental a existência de bons manuais que, de
certa forma, facilitam o trabalho do professor e, cremos mesmo, que
deveria haver preocupação por parte dos professores universitários em
escreve-los. Desta forma, a defasagem entre o "atual desenvolvimento
da pesquisa histórica" e a "história que ainda se ensina nas nossas esco-
las de 1<:> e 2<:> graus" diminuiria de intensidade e, quem sabe, até, che-
garia a desaparecer. Lembramos ainda, que nos Estados Unidos, é
muito comum a prática de se reunir especialistas de um mesmo cam-
po, de diferentes Universidades, para a montagem de diversos e diferen-
tes projetos que serão aplicados nas escolas secundárias.
Quanto aos prob'emas técnicos de montagem do projeto apontados
pelo Prof. Witter, necessariamente ocorreriam. Os dois exemplos que
aqui trouxemos, como todos os demais montados, foram feitos por ama-
dores em som e imagem: os próprios alunos, utilizando inclusive di-
nheiro pessoal.
Na verdade, o nosso objetivo foi testar o projeto quanto à sua va-
lidade, tomando, como ponto de referência, os colegas professores das
diferentes regiões brasileiras presentes a este Simpósio. Constitui-se
ainda em experiências isoladas que, se comprovadas pela sua adequa-
ção e validade adquirirão verdadeiramente um cunho de projeto onde
todos os detalhes técnicos serão pensados e programados.
A nossa grande preocupação é pela renovação do ensino da His-
tória, visto esta, não em sua aparência, não na utilização simples de re-
cursos sofisticados, mas naquilo que lhe é peculiar e fundamental: o
sel'
- 1003 -

seu estudo os jovens de hoje compreendam melhor a realidade em que


vivem, dando assim significação ao seu mundo. Para nós, a História
confunde-se com a própria vida" .

À Prof\! Marlene de Mauá Carvalho Mendes.
Disse:
"Cremos ter respondido à questão levantada, quando da nossa
resposta ao Prof. J. S. Witter".

Ao Prof. Roberto Machado Carvalho.
Respondeu:
"O primeiro projeto apresentado: "O Brasil Holandês" foi testado
em várias classes de 6\! séries de Colégios oficiais de São Paulo; após
terem realizados estudos sobre "Economia e sociedade açucareira do
século XVII". O recurso foi colocado ao final desta etapa de trabalho,
portanto, como um momento de síntese.
Quanto ao método de se ensinar história, partindo-se do presente
para o passado, já há alguma bibliografia a respeito, enfocando propo-
sições e formas de o realizar, citada por nós, em nosso trabalho publi-
cado nos Anais do VII Simpósio da ANPUH.
Há diversas correntes contemporâneas da Psicologia (aprendiza-
gem e adolescência) que fundamentam a necessidade do ensino partir
de um problema - base para qualquer investigação - , e que este seja
tão atual quanto possivel, de preferência vivenciados pelos próprios alu-
nos. Particularmente já tivemos oportunidade de trabalhar em expe-
riências desse tipo com adolescentes de diferentes faixas e a aprendiza-
gem em História realmente foi significativa.
Quanto ao problema cias charges realmente sua crítica procede,
tanto que, após a elaboração do referido recurso e a sua consequente
crítica por parte da classe de alunos de Prática de Ensino do ano
(1974), resolvemos pela sua não execução em nenhuma classe de 19
ou 29 graus. Em decorrência disso, neste ano, já houve uma mudança
na linha geral do projeto. Anteriormente à seleção "do que fazer", os
alunos deverão selecionar "onde aplicar" " .

À Prof\! Philomend Gebran.
Disse:
"Torna-se
- 1004 -

o projeto não seria uma mera coleção de recursos audio-visuais.


Falamos, propositadamente, em recursos didáticos, pois em sua essên-
cia estarão os documentos escritos: fontes primárias e/ou secundárias
que fariam parte integrante do mesmo. A imagem, traduzida, em
slide ou gravuras poderiam ou não aparecer. A sua utilização depen-
derá da unidade estudada".

Ao Prof. José Calazans.
Declarou:
"Agradecemos a belíssima intervenção do Prof. José Calazans
Brandão da Silva e realmente estamos de pleno acordo quanto à neces-
sidade do aproveitamento da música no ensino de História; não só do
século passado, mas de todo o nosso tempo histórico: desde a Colônia
aos dias atuais. A música e mesmo a paródia retratam um estilo de
vida da nossa gente: uma maneira de sentir, de ver a realidllrde e se
constituir em uma das grandes manifestações ainda pouco estudadas
principalmente como fonte documental.
Mas, este trabalho não poderia ser feito por um só especialista,
daí a necessidade da formação de um grupo inter-disciplinar, prática
essa adotada - cada vez mais - nas Universidades européias e nor-
te-americanas"
UM CURSO PROGRAMADO DE HISTÓRIA DA
REPÚBLICA BRASILEIRA:
- Inovaç,ões no ano letivo de 1974 - (*).

J.S.WITTER
do Departamento de História da Faculdade de Filoso-
fia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo.
ROSA MARIA GODOY SILVEIRA
da Universidade Federal da Paraiba (**).

Dando prosseguimento às experiências de Curso Programado no


Ensino de História, já revelados anteriormente (1), no 29 semestre de
1974, 39 semestre de aplicação da referida tecnologia de ensino, intro-
duziram-se algumas inovações tendentes a aperfeiçoa-la. Os resulta-
dos obtidos são objeto da presente comunicação.
Em primeiro lugar, condensou-se o programa anterior, disposto
em dez unidades, para um programa de cinco unidades, referentes à

(*). - Comunicação apresentada na 2.' Sessão de Estudos, Equipe D,


no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(* *). - Colaboraram ainda na execução do ('u~so. alem dos autores,
Arlete Scotto Piqueira, José Carlos Neves Lopes e Sofia Helena Procópio Fer-
raz Nunes - alunos do Curso de Pós-Graduação em História Social do Depar-
tamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo.
(1). - Cf. WITIER (José Sebastião et alii), "Realização e Atitudes de
estudantes universitários ante um curso programado de História do Brasil
(1889-1930)". XXV Reunião Anual da SBPC, Resumos, 25 (6): 541-542 e
"A República Brasileira (1889-1937): uma experiência de ensino", Anais do
VII Simpósio Nacional de Professores Universitários de História, Belo Hori-
zonte. 1974, voI. 11, p. 1043-1066;
WITIER (José Sebastião) e SILVEIRA (Rosa Maria Godoy), "Eficiência
de um curso programado de História da República Brasileira", XXVI Reunião
Anual da SBPC Resumos. 26: 261-662;
WIlTER (José Sebastião) e SILVEIRA (Rosa Maria Godoy) e WITIER
(Geraldina Porto), "Evolução de um Curso Programado de História do Bra-
sil", Revista de História da USP, XLIX, n.\> 99, Ano XXV, p. 263-279. São
Paulo,
- 1006 -

mesma faixa cronológica da História da República (1889-1945) e


assim distribuidas:
1\1 UNIDADE: A Organização da República Brasileira.
11<1 UNIDADE: A Economia Nacional e as Crises Financeiras.
111\1 UNIDADE: Os Militares e a Política.
IV\I UNIDADE: A República Nova.
V\I UNIDADE: O Processo de Industrialização na República.
Esta alteração se prendeu à necessidade de en_saiar de acordo com
resultados obtidos nas experiências anteriores e com as sugestões dos
alunos que a ela se submeteram, temas mais abrangentes a fim de evi-
tar-se o parcelamento demasiado dos mesmos, o que incorreria no
risco de perder-se a visão mais global dos assuntos. Ainda nesta fase
de elaboração do programa, processou-se uma renovação dos textos
de cada uma das unidades, de modo a incluir obras mais atuais sobre
os temas estudados e suprimir textos considerados de rendimento insa-
tisfatório em experiências anteriores.
Paralelamente com este programa, planejou-se uma parte de pes-
quisa em jornais e revistas especializadas numa faixa cronológica corres-
pondente ao período estudado nas universidades, cujo resultado final foi
a elaboração de monografias. Da longa série de temas monográficos re-
sultantes da pesquisa, enumeraremos alguns bastante expressivos:
- "A Participação de Minas Gerais na Vida Brasileira"
- "As relações Brasil-Argentina no século XX"
- "As crises comerciais do Brasil no início do século XX.
- "Fatores econômicos nas crises político-partidárias no Brasil de-
pois da Revolução de 1930".
- "O comportamento do eleitorado paulistano no pleito de 1959".
- "O Brasil e a Primeira Guerra Mundial".

Quanto à avaliação do curso, abandonou-se avaliações individua-


lizadas, fixando-se um mínimo de duas e um máximo de quatro opções
diferentes apenas para cada unidade. conforme Anexo I. Esta variavel
introduzida na tecnologia de ensino programado teve apenas duas for-
mas, ambas escritas: temas e interpretações de textos.
Funcionamento do Curso: O Curso Programado funcionou em
duas etapas:
- 3\1s feiras: 14/16 horas: discussão das unidades com o profes-
sor
15/18 horas: avaliação
- 4<1s
- 1007 -

ciplina ou aos monitores-alunos de Pós-Graduação. Neste sentido ain-


da introduziu-se uma outra variavel na tecnologia de Ensino Progra-
mado mediante a realização das discussões de um tema cada quinze
dias e a consequente e respectiva avaliação, forçar o ritmo do aluno de
acordo com a estrutura funcional do Curso. Mesmo assim, houve ca-
sos de alunos que mostraram um ritmo mais lento e que procurou sa-
tisfazer-se em dia para isso designado, que tambem atendeu às reava-
liações de alunos considerados insatisfatórios na primeira avaliação, de
acordo com as normas da tecnologia empregada.
Da orientação de pesquisa propriamente dita, constou inicialmen-
te a delimitação da mesma aos Editoriais, no caso de jornais, ou de
determinados tipos de artigo, no caso de revistas, dadas as naturais
dificuldades de tempo e de consulta da documentação. Reservou-se
um determinado jornal ou revistas para grupo, que era o mesmo grupo
das discussões dos temas, dividindo-se entre seus membros as tarefas,
segundo um critério cronológico dentro do qual eles selecionaram seus
temas respectivos. A título de exemplo: o exame do jornal O Estado de
São Paulo ficou a encargo de um grupo circunscrito ao período 1889-
1898 (da implantação da República ao início do Governo Campos
Sanes), ficando cada estudante do grupo com seis meses de Editoriais
para pesquisar, após o que extraiu um tema em que analisou a posição
do referido periódico a respeito, tarefa essa para a qual se valeu das
discussões dos termos de classe e de uma Bibliografia básica, sob ori-
entação do professor.
No registro das avaliações, procedeu-se como de praxe, anotan-
do-se o dia da avaliação de cada aluno e, no caso de sua reavaliação,
o que permitiu posterior análise e interpretação do ritmo alcançado,
embora este tenha sido controlado, conforme já se observou, bem co-
mo, do grau de dificuldade em cada unidade do programa.
Ao concluir cada aluno o programa, distribuiu-se-Ihe um questio-
nário de avaliação do curso em si, que ele preencheu anonimamente, e
que permitiu comparação com as observações feitas através do livro de
registros.

A. - CURSO.

Resultados: Matricularam-se no curso 112 alunos, sendo do


sexo masculino 24 e do feminino 88. Deste total, frequentaram efeti-
vamente o curso 101
- 1008-

Uma primeira constatação pois, quanto aos resultados obtidos, se


refere ao grau de desistência dos alunos em relação ao curso:

QUADRO I

Grau de Desistência dos Alunos


UNIDADES N9DEALUNOS % SOBRE TOTAL
INSCRITOS (112)
Nenhuma unidade
conclui da 11 9,8%
I' Unidade 3 2,5%
11' Unidade 3 2,5%
III' Unidade 1 0,8%
Total desistência 18 16,07%

Analisando-se depois o grupo de alunos que concluiram o curso,


ou seja, completaram as cinco unidades previstas, pode-se ter uma
idéia do ritmo das avaliações e comprovar-se o fato de que tal ritmo
constituiu-se numa variavel dentro da tecnologia na medida em que
nesta experiência foi dirigido, podemos di~r cronologicamente, ao in-
vés de ser orientado pela disponibilidade própria do aluno. Observe-se
no Quadro 11 a concentração quase maciça dos alunos em determina-
das semanas de avaliação.

QUADRO 11

RITMO DE EXECUCÃO DAS UNIDADES POR N9 DE ALUNOS E


SEMANA DE EXECUCÃO.
l.a 2.a 3.a 4.a 5.a 6.a 7.a 8.a 9.a 10.a l1.a
Unidades sem. sem. sem. sem. sem. sem. sem. sem. sem. sem. sem.
1.a 90 6 3
2.a 53 34 3 2 4 2
3.a 37 38 7 5 5 3
4.a 31 19 28 6 10
5.a 10 29 49 6

Este quadro pode ser simplificado num outro (Quadro lI-A), que
coloca os resultados em termos de tempo mínimo, médio e máximo
para execução de cada unidade. Para tanto, agrupou-se os dias de
execução em semanas ordenando-se as mesmas tendo como ponto de
partida (1. ~
- 1009 -

QUADRO li-A
RITMO DE EXECUÇÃO DAS UNIDADES SEGUNDO TEMPO
MíNIMO, MÉDIO E MÁXIMO. BASE = SEMANA
UNIDADES TEMPO MíNIMO TEMPO MÉDIO TEMPO MÁXIMO
I.a 1.a sem. 1.a sem. 6.a sem.
Il.a 2.a sem. 2.a sem. 8.a sem.
III.a 4.a sem. 4.a/5.a sem. 10.a sem.
N.a 6.a sem. 6.a sem. 10.a sem.
V.a 8.a sem. 10.a sem. H.a sem.

Desta maneira, podemos depreender que a unidade mais rápida


dessa execução foi a 5.ª", enquanto as mais lentas foram as 2.ª" e 3. a .
Dois outros tipos de dados podem ou não confirmar esta observação:
depois um se refere às reavaliações de unidades e o outro, em nivel
mais qualitativo à frequência dos conceitos atribuidos a cada unidade.
QUADROIlI
tNDICES DE UNIDADES REFEITAS SEGUNDO
NQ DE ALUNOS.
UNIDADES NQ DE ALUNOS % SOBRE TOTAL
CONCLUINTES ( =94)
I.a 4 4,2%
lI.a 14 14,8%
III.a 8 8,4%
IV.a 1 1,6%
V.a
Total 27 28,7%
OBS.: Dos alunos que refizeram unidades, 3 refizeram duas uni-
dades e 21 refizeram apenas uma unidade, o que dá o total
de 2 computado acima. Ainda quanto à reavaliação, 25
refizeram uma mesma unidade apenas uma vez e 2 refize-
ram uma mesma unidade duas vezes.
QUADRO N
íNDICE DOS CONCEITOS ATRIBUIDOS
AS UNIDADES SEGUNDO NQ DE ALUNOS
C O N C E I T O S
UNIDADES A B C D
I.a 17 50
- 1010_

A depreender-se do critério qualitativo emitido nos conceitos, po-


de-se perceber talvez um maior grau de dificuldade na 1I:;t e V:;t Uni-
dades, com ênfase especial na lI. a, onde o rendimento dos alunos caiu,
enquanto nas outras predominou um rendimento bom para regular.
Estes fatos podem ser somados àqueles extraidos do Quadro 111 que
aponta justamente a II:;t e III\l unidades como aquelas que mais foram
refeitas.

Atitudes dos Alunos: A partir do exame dos questionários res-


pondidos pelos alunos, foi possivel fixar algumas observações sobre o
comportamento dos mesmos em relação ao curso. Do total de 112
alunos inscritos no curso dos quais 94 concluiram-no, preencheram os
questionários 71 estudantes, o que dá um índice de 62,5% em relação
ao total de inscritos e 75,5% em relação ao total de concluintes.

Um primeiro quesito respondido foi quanto à experiência em


Curso Programado:

QUADRO V

NQ de % sobre % total % sobre


Alunos total conc1uintes total
inscritos (= 94) quest.
(= 112) resp.
(= 71)
I - Experiência ante-
rior em Curso
Programado 7 6,2% 7,4% 9,8%
11 - Nenhuma experi-
ência 64 57,1% 68,08% 90,1%

Dos estudantes com experiência anterior nesta tecnologia, dois


responderam que esta experiência fora apreendida em quase todos os
cursos que fizeram, sem especifica-los; duas pessoas responderam que
haviam frequentado apenas um curso nestes moldes enquanto duas
outras haviam cursado dois cada uma, que especificaram (Introdução
à Geografia e Introdução à Economia - Filosofia e Metodologia, em
nivel colegial estes últimos). Uma
- .1011 -

QUADRO VI

COMPARAÇÃO DO CURSO PROGRAMADO COM OUTRAS


TECNOLOGIAS

MAIS
n Q alunos '10 sobre total % sobre con- % sobre
inscritos cluintes quest
(112) = (94) = (71)
Qualidade 59 52,6 62,7 83,09
Autonomia 56 50 59,5 78,8
Responsabilidade 41 36,6 41,1 57,7
Melhores
Resultados 43 38,3 43,6 60,5

IGUAL
n Q alunos % sobre total % sobre con- % sobre
inscritos cluintes quest
= (112) (94) = (71)
Qualidade 4 3,5 4,2 .5,6
Autonomia 3 2,6 3,1 4,2
Responsabilidade 21 18,8 22,3 29,5
Melhores
Resultados 9 8,03 9,5 12,6
PIOR OU MENOS
n Q alunos % sobre total % sobre con- % sobre
inscritos cluintes quest
(112) (94) = (71)
Qualidade O 0,70 O O
Autonomia 0,8 1,06 1,4
Responsabilidade O O O O
Melho~es
Resultados 0,8 1,06 1,4
BRANCO
n Q alunos % sobre total % sobre con- % sobre
inscritos cluintes quest
= (112) = (94) = (71)
Qualidade 8 7,1 8,5 11,2
Autonomia 11 9,8 11,7 15,4
Responsabilidade 9 8,03 9,5 12,6
Melhores
Resultados 18 16,07
- 1012-

Ainda a respeito das unidades, os alunos, nos quesitos 4 e 5 do


questionário manifestaram sua opinião a respeito da supressão de al-
gumas unidades estudadas ou a inclusão de novas unidades no pro-
grama. O Quadro VII permite-nos verificar que a maioria se declarou
pela permanência das unidades na sequência em que foram estudadas
mas com o acréscimo de novas unidades. Entre os temas seguidos, ca-
talogou-se: coronelismo e revoltas civis, instituições surgidas com a
República; análise das correntes de pensamento, mentalidade dos mo-
vimentos levantados pela historiografia; influência da religião nas va-
rias fases estudadas; federalismo; populismo; movimento operário; for-
mação do proletariado e da burguesia; camadas médias e campesinato;
processo social e contribuição do imigrante ao nível político; socieda-
de brasileira no período estudado; aspe_ctos
- 1013 -

grande maioria dos alunos, isto é, uma opinião favoravel à manuten-


ção das formas de avaliação utilizadas no corrente programa com a in-
clusão de outras formas ainda, tais como: avaliação oral, avaliação pela
participação na discussão em classe, avaliação por prova de modo opta-
tivo entre oral e escrito, análise de texto, crítica bibliográfica, avalia-
ção de livros em inglês, relatório com consulta de bibliografia mais
aprofundada, análise de documentos expressivos de cada tema, auto-
avaliação e avaliação do grupo a cada etapa. Do número de alunos
que opinou pela exclusão de algumas formas de avaliação em uso, a
maioria sugeriu a supressão de questões escritas. na medida em que
elas "não dão muita liberdade ao aluno, restringem o assunto e as lei-
turas realizadas"; arguição oral porque é "obsoleta e não explora o
exercício fundamental da redação"; o estudo de textos "porque não é
uma forma objetiva de avaliação".
Ainda sobre avaliacões, os alunos descriminaram, atribuindo-lhes
notas numéricas (1,2 e -3) quais as avaliações mais difíceis, de maior
interesse e de maior proveito (QUADRO IX). A nota 1 representa-
va o grau mais dificil, de maior interesse e de maior proveito, avalia-
dos separadamente.
Pela interpretação dos números, percebe-se que os alunos consi-
deram como forma de avaliação mais dificil a análise de textos e a
mais facil a de questões escritas. Quanto ao interesse, oscilaram entre
os temas e as análises de textos, considerando ainda estas últimas co-
mo as de maior proveito.
B. - Pesquisas: Quanto à pesquisa, 50 alunos (44,6% do nQ
total de inscritos no curso, 53,1 % do total de concluintes e 70,4% do
total de questionários respondidos) se manifestaram favoráveis à sua
permanência sob as seguintes justificativas: pela complementaridade
que ela fornece ao curso; pela criatividade que permite ao aluno, pelo
COl'ltato aluno-documentação e a percepção de problemas não abran-
gidos pelos autores consultados no curso; pela interação teórico-prá-
tica que ela enseja. Os 21 alunos contrários à mesma (18,7% do nQ
total de inscritos no curso, 22,3% do total de concluintes e 29,5% do
total de questionários respondidos) justificaram sua resposta da seguin-
te maneira: falta de condições, falta de tempo para maior amadureci-
mento dos temas, sobrecarga de trabalho.
Finalmente, ao final dos questionários. os alunos incluiram suges-
tões para a reformulação do curso, das quais convem assinalar:
- quanto às unidades: ampliação da bibliografia; subdivisão das
unidades;substituição de determinados textos; inclusão de um
maior número de documentos; textos sobre ideologia
QUADRO VII

CONSIDERAÇõES SOBRE SEQU~NCIA DO PROGRAMA

Sim % sobre % so- % so- Não % so- % so- % so- Em % 50- % 80- % so-
total bre to- bre bre to- bre to- quest. Branco bre to- bre to- quest.
inscritos tal con- quest. tal ins- tal con- = (71) tal ins- taI con- = (71)
= (112) c1uintes =(71) critos c1uintes critos cluintes
= (94) = (112) = (94) = (112) = (94)

Supressão
de unidades 3 2,6 3,1 4,2 60
- 1015 -

QUADRO VIII

CONSIDERAÇÕES SOBRE FORMAS DE AVALIAÇÃO

SIM
nQ alunos % sobre total % &obre con- % sobre
inscritos cluintes quest
= (112) = (94) = (71)
Supressão de
avaliações 18 16,07 19,1 25,3
Ac.éscimo de
avaliações 18 16,07 19,1 25,3

NÃO
n alunos
Q
'}'o sobre total % sobre con- % sobre
inscritos cluintes quest
= (112) = (94) = (71)
Supressão de
avaliaçõer 41 36,6 41,4 57,7
Acré&Cimo de
avaliações 41 36,6 41,4 57,7

BRANCO

nQ alunos % sobre total % sobre con- % sobre


inscritos cluintes quest
= (112) = (94) = (71)
Supressão de
avaliações 12 10,7 12,7 16,9
Acréscimo de
avaliações 11 9,8 11,7 15,6

TALVEZ

n Q alunos % sobre total % sobre con- % sobre


inscritos cluintes quest
(112) = (94) (71)
Supressão de
avaliações
Acréscimo de
avaliações 0,8 1,06
QUADRO IX

CONSIDERAÇOES SOBRE O GRAU DE DIFICULDADE DE INTERESSE


E PROVEITO DAS FORMAS DE AVALIAÇÃO SEGUNDO NQ DE ALUNOS

Formas de avaliação
A. TEma
B. Questões Escritas
C. Análise de texto
- 1017 -

tura; temas de enfoque mais social; noções de Economia, câm-


bio, funcionamento da Bolsa de Valores, etc.
- quanto ao funcionamento do curso: deixar a escolha dos gru-
pos de discussão a cargo dos próprios alunos; reduzir n Q de
turnos para discussão e correção das avaliações; maior dura-
ção do curso; maior tempo para as discussões em grupo; ava-
liação do curso após cada prova para saber das falhas; mais
aulas teóricas.

Com essa ampla riqueza de dados sobre os resultados do Curso


Programado em sua atual experiência, pode-se julgar que, a despeito
de variáveis introduzidas, a tecnologia funcionou de modo positivo, a
exemplo de experiências anteriores. As lacunas porventura apontadas
pelos índices de avaliação e nos questionários servirão de fundamento
para a reelaburação do Curso em uma nova etapa, de modo consistente
como tem sido feita desde o início da experiência.
• •

INTERVENçõES .
Da Prof\l Teresinha Lemos (Fundação A. Taborda. Bagé/RS).
Disse:
"O Curso Programado se destina, a meu ver, ou melhor, é mais
adequado para a Universidade Aberta. Foi solucionado o problema da
frequência dos alunos?"

Da Prof\l Maria Nascimento Barnewitz (Universidade Federal de Santa
Maria/RS) .
"Solicita mais detalhes sobre a avaliação das etapas do "Curso
Programado de História do Brasil".
Tipos de avaliação.
Critérios de avaliação (como são harmonizados entre os pro-
fessores componentes da equipe de avaliação".

Da Prof\l Zilda Monteiro de Oliveira (Universidade Estadual de Mato
Grosso. Aquidauana).
Pergunta:
"Para que nivel é dado o curso?"

Do Prof. Geraldo Batista (Universidade Federal do Rio Grande do
Norte) .
"Disse: desejar saber como o autor resolve o problema de "di-
reitos autorais", criado em relação à confecção e distribuição de textos".
• • •
- 1018 -

RESPOSTAS DO PROFESSOR JOSf: SEBASTIÃO WITTER.

À Profl:l T eresinha Lemos.

O Curso Programado se destina a qualquer tipo de Universidade.


A experiência tem comprovado a sua eficiência. A questão da fre-
quência é resolvida pelo fato de a sala de aula ser a sala de estudos e
discussões dos temas propostos. O que desaparece é a aula expositiva
formal.
*
À Profa. Maria Nascimento Barnewitz.

Tipos de avaliação: Questões Orais, temas para dissertação,


questões escrita, análises de textos, etc ..
É dificil uma homogeinização dos critérios de avaliação mas
as reuniões semanais solucionam discrepâncias.

*
À Profa. Zilda Monteiro de Oliveira.

- Nivel Superior. Alunos de 3. Os e 4. Os anos.

*
Ao Prof. Geraldo Batista.

Os
OS REGISTROS PAROQUIAIS COMO FONTE
COMPLEMENTAR DA HISTÓRIA ECONÔMI-
CA E SOCIAL (*).

IRACI DEL NERO DA COSTA


da Faculdade de Economia e Administração
da Universidade de São Paulo.

Os estudos de demografia histórica revelaram o rico manancial


de informações dos registros paroquiais de batizados, óbitos e casa-
mentos. É desnecessário, portanto, encomiar sua importância no que
diz respeito ao conhecimento das variáveis demográficas, estado, es-
trutura e movimento populacionais. Levam-nos a falar destas fontes
primárias as informações, nelas contidas, que transcendem ao estudo
demográfico entendido em termos estritos.
No momento em que os registros paroquiais passam a ser anali-
sados de forma ampla e sistemática no Brasil, cremos ser urgente a
tarefa de indicar suas potencialidades como fonte de informações quan-
titativas e qualitativas; referimo-nos aos dados que possibilitam o co-
nhecimento de outros aspectos sócio-econômicos das comunidades es-
tudadas.
Evidentemente os assentos referidos aparecerão, sempre, com ele-
mentos complementares a outras fontes primárias disponíveis. No en-
tanto, como demonstraremos, os registros aludidos auxiliam a elucida-
ção de problemas colocados em vários campos da atividade humana
tanto no que se refere à interação sócio-econômica entre grupos ou ca-
madas sociais, quanto às· questões derivadas do relacionamento entre
a comunidade e o meio físico envolvente. Destarte, os assentos paro-
quiais não devem interessar exclusivamente ao demógrafo histórico,
mas a todos estudiosos debruçados sobre a história brasileira.

(*). - Comunicação apresentada na 3\1


- 1020-

Jj possivel, através da pesquisa dos registros referidos, delinear


a formaçã'J e o desel1volvime11to dos n{>c1eos populacionais. A ocupa-
ção do espaço geográfico pelas propriedades rurais e pelos centros ur-
banos pode ser acompanhada pelos assentos de óbitos - dos quais
consta o local de moradia dos falecidos. Uma série de tempo bastante
ampla nos permite observar a mobilidade das cidades no meio físico,
ao longo da história. Pode tambem, subsidiariamente, auxiliar-nos a
revelar as condições econômicas defrontadas em diferentes momentos
pelas comunidades estudadas.
Os reg:stros de casamentos - nos quais vem indiéada a proce-
dência dos cônjuges - permitem a identificação dos centros polariza-
dores da atividade econômica, administrativa, religiosa, quiçá vários
outros ângulos do social; ao mesmo tempo possib:Iitam avaliar a im-
portância da penetração no espaço, de cada centro aglutinador de ati-
vidades.
Por outro lado, o conhecimento do local de origem dos cativos -
a composição, alternância e distribuição da massa escrava - é funda-
mental para a compreensão dos problemas relativos. à mão-de-obra, aos
investimentos e ao desenvolvimento da propriedade rural escravista no
Brasil.
Da máxima importância é conhecer os senhores de escravos e pro-
prietários rurais em relação à origem, laços de família, de parentesco,
de apadrinhamento.

Elemento valioso para a compreensão da ordem patrimonialista


da sociedade brasileira no período colonial pode ser a determinação
dos sistemas de apadrinhamento, bem como a análise quantitativa e
qualitativa dos "agregados". Destes aspectos tambem é possivel nos
aproximar com base nos registros paroquiais.

Outra. possibilidade aberta ao pesquisador refere-se ao estabele-


cimento da situação patrimonial relativa dos vários segmentos popula-
cionais em que se podem dividir as comunidades estudadas. Dois ek-
mentos - presentes nos assentos de óbitos - expressam distinção so-
cial: ser membro de irmandade e/ou deixar testamento. A condição
de pobreza ou mendicância vem tambem, via de regra, explicitada nos
registros em epígrafe. Tais elementos são indicadores, ao mesmo tem-
po, das condições sócio-económicas por que passa dada comunidade
em determinado momento.

Quase todas organizações profissionais da Idade Média tiveram,


de acordo co~
- 1021 -

os oficiais que formavam uma corporação, organizavam-se, indepen-


dentemente desta, numa confraria religiosa, para em comum pratica-
rem os atos de piedade. Cada confraria adotava, como a corporação
respectiva, um santo padroeiro.
Associação de fieis, constitui da organicamente, para o incremento
do culto público, as irmandades ou confrarias regulam-se pelo Código
de Direito Canônico e não podem existir sem decreto formal de erec-
ção. Foram especialmente instituidas para os que desejassem vantagens
de ação prática encontradas nas organizações religiosas, mas não do-
tados de vocação para entrar nas verdadeiras ordens religiosas.
No Brasil encontramos com frequência corporações religiosas au-
torizadas pela Coroa. No período colonial as Irmandades do Carmo ou
de São Francisco apareciam em grande número de freguesias. Rivali-
zavam na construção de capelas e igrejas; faziam caridade e seus me-
sários e festeiros organizavam grandes festas.
Tomemos como exemplo a Paróquia de Nossa Senhora da Con-
ceicão de Antônio Dias, uma de duas existentes em Vila Rica no pe-
ríodo colonial.
Apenas 0,7% dos cativos mortos entre abril de 1799 e iunho de
1801 registrou-se como membro de irmandade. Dos forros, 12,7% fo-
ram "irmãos"; dentre os. demais livres (exceto os brancos) 25,9% e,
dos brancos, a grande parte: 70,9%. Neste último grupo ocorre o
único caso de estar um pobre vinculado à irmandade.
Do conjunto dos homens livres (excluindo forros) 22% deixaram
testamento e pei"tenciam a irmandades, dentre os forros apenas 3,2 %
satisfizeram à mesma condição enquanto 54,2% dos brancos a cum-
priu.
Deixaram testamento 8% dos alforriados, 9% dos "demais li-
vres" e 54,2 % dos brancos. Excluindo os escravos, para os quais não
há indicação de pobreza ou testamento, encontra-se entre os forros o
maior contingente de pobres - 25,4% deles são assim nomeados; a
cifra cai, para os livres, a 7,3%. Esta discrepância torna-se mais no-
tória se apenas forem computados indivíduos do sexo masculino, 46,7%
- 1022-

Por outro lado estes porcentuais comprovam que, ser vinculado a


irmandades, significava marco de distinção social perseguido por todas
camadas sociais; embora o acesso às mesmas não estivesse condicio-
nado pela posse de riqueza, a correlação positiva entre os dois eventos
é iniludivel.
Outro aspecto a ser explorado é o da maior ou menor permeabili-
dade social. A frequência relativa de casamentos entre distintos seg-
mentos populacionais fornece-nos bom indicador. Tomemos ainda uma
vez o exemplo da freguesia de Antônio Dias: para o período 1727-
1826, dos casamentos que envolveram escravos 25% deram-se entre
escravos e livres - 19 % referentes a uniões de homens escravos e
mulheres livres e 6% entre cativas e homens livres. Tais porcentagens
indicam a inexistência de fosso intransponivel entre escravos e livres,
ao mesmo tempv expressam, parece-nos, a posição subalterna ocupada
pelas mulheres.
O nivel de alfabetização e a distribuição do ensino entre as várias
camadas sociais podem ser aferidos pelo estudo da frequência relativa
e qualidade das assinaturas constantes dos registros de casamento.
• •
,.

Os exemplos aduzidos parecem bastante elucidativos e corrobo-


ram, ao nosso ver, a opinião expendida no início desta comunicação.
Conforme se infere do exposto advogamos postura não ortodoxa em
relação ao acervo de fontes primárias representado pelos assentos pa-
roquiais.
As linhas de pesquisa aqui apontadas apenas deixam entrever a
imensa riqueza dos referidos
PARA UMA HISTÓRIA SOCIAL SERIADA DA CI-
DADE DO SALVADOR NO SÉCULO XIX: OS TES-
TAMENTOS E INVENTÁRIOS COMO FONTE DE
ESTUDO DA ESTRUTURA SOCIAL E DE
MENTALIDADES (*).

(Resumo) .

KATIA M. DE QUEIROS MATTOSO


da Universidade Católica do Salvador, Bahia

Introdução.
A história social é principalmente fundada sobre a observação da
vida e do comportamento dos grupos sociais que compõem uma socie-
dade. Desde sua fundação (1549), Salvador sofreu profundas modi-
ficações que contribuiram para o paulatino desaparecimento dos pa-
drões tradicionais que se evidenciavam na estrutura socio-econômica e
em certos hábitos de pensar e de agir. Captar, dominar a trajetória
dessa mudança, é o nosso propósito.
Os estudos que empreendemos e que atualmente estamos desen-
volvendo são uma tentativa de conhecer em profundidade a economia
e a sociedade dessa metrópole brasileira no século XIX. Com efeito,
partiu-se da hipótese de que a Bahia conheceu no século passado pro-
fundas mutações, quer no plano econômico, quer no plano social.
Essas mutações determinaram o rumo de uma região que perdeu seu
papel de liderança para alcançar uma situação das mais precárias den-
tre os demais Estados da federação brasileira.
O contexto historiográfico.
Se as grandes linhas da evolução econômica da Bahia nos são hoje
conhecidas, a mesma afirmação não pode ser feita, no que diz respeito
a sua estrutura social. De maneira geral, o esquema de análise que
( .). - Comunicação apresentada na 1\I Sessão de Estudos, Equipe E, no
dia 2 de sctcmbro de 1975
- 1024-

nos é proposto não satisfaz, mesmo se admitirmos que a estrutura so-


cial urbana é "quase decalcada sobre o modelo rural" no qual a socie-
dade é grosseiramente dividida entre senhores-produtores e escravos-
-trabalhadores. A própria existência da cidade como centro de deci-
são e irradiação regionais, como elemento centrípeto para o qual con-
vergem os indivíduos, pressupõe uma diversificação social apreciavel,
em que cada grupo exerce função específica do trabalho social. Esta
diversificação encontra-se sob forma rudimentar na estrutura social
agrária que se desenvolveu em torno da grande propriedade rural.
A pesquisa em curso visa fornecer novos elementos para um estu-
do que deseja diferir dos estudos até agora elaborados sobre sociedade
urbana no sentido de que procura dar maior ênfase aos critérios de
referência utilizados para a elaboração de uma escala de estratificação
social. Estes critérios são: a estratificação legal, o estatuto social, a
hierarquia econômica, o poder e a estratificação ideológica. Ademais,
o estudo é principalmente voltado para o conhecimento das categorias
intermediárias da sociedade, buscando apreender a realidade do homem
comum do "homem médio" com todas as suas misérias e problemas
cotidianos, seu regime de trabalho, seus modos de pensar e de agir.
Fontes e Método.
Fontes: inicialmente, e como primeira aproximacão, utilizamos
uma única fonte: a série de testamentos e inventários. Esta fonte per-
mite que experimentemos uma primeira classificação de hierarquia so-
cial em Salvador a partir de três critérios: estratificação legal, estatuto
social e hierarquia econômica.
Método:
Hivótese de trabalho: elaboramos nossa hipótese de trabalho to-
mando como ponto de referência, de um lado, o modelo inferido da
obra de Luiz dos Santos Vilhena, A Bahia no século XVIII, em que
encontramos a mais completa e sugestiva descrição da estratificacão
social de Salvador no final do século XVIII. De outro lado, partindo
do pressuposto de que uma estratificação social espe1ha determinado
tipo de estrutura econômica, a permanência dessa estrutura. predomi-
nantemente agro-mercantil, no período considerado (século XIX), su-
geriria tambem a permanência de sua tradicional estrutura social. Afir-
mação que seria válida se a sociedade fosse concebida como estática e
imutavel, o que não vem a ser o caso. Porque e de que maneira se ope-
ram mutações ao nivel da estrutura social, eis nossa indagação.
Universo temporal e espacial da pesquisa: o período cronológico
abrangido por nossa investigação situa-se entre duas balisas: 1~00
- 1025-

Coleta de dados: emprega-se o método quantitativo para a consti-


tuição de séries cronológicas, dividido em duas etapas. Na primeira
etapa, ora em execução, examinam-se oito testamentos e inventários
por ano. Os dados coletados são consignados em fichas que irão cons-
tituir uma primeira série cronológica. Esta série, e seu estudo, serve
de linha mestra para o conhecimento do gau de diversificação que
apresenta a estrutura social de Salvador no século XIX. Prevê-se uma
segunda etapa em que serão examinados os testamentos e inventários
na sua totalidade.
O
o "TAPE" DE TELEVISÃO COMO FONTE
DOCUMENTAL (*).

(Resumo).

JOSE; SEBASTIÃO WITTER


do Departamento de História da Faculdade de Filoso-
fia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo.

A televisão vem se constituindo no veículo de comunicação de


massa mais eficaz e mais atuante no após guerra (11 Guerra Mundial).
B ele quem leva a notícia, a informação, a diversão aos lares no mun-
do inteiro e vem, num crescendo, ocupando quase o dia todo com
suas programações. Do inicial horário das 17 às 24 horas chega,
agora, aos das 7 às 2 ou 3 hs. do dia seguinte. Se quisermos pensar
no registro eventual, sem objetivos pré-estabelecidos e sem orienta-
ção, por si sós, os "tapes" estocados aos arquivos das Emissoras já
são, a exemplo dos jornais e depois do cinema (1) importantes fontes
documentais, que registram dia a dia quase todos os fatos, em quase
todos os quadrantes do Universo. Bastaria, a guisa de exemplos, lem-
brar os registros feitos pela Televisão, neste ano, quanto aos fenôme-
nos climáticos ocorridos em todo o Brasil e que servirão, num fu-
turo não muito longínquo, para análises e estudos não só do fenôme-
no em si, mas suas consequências e soluções encontradas; os relatos
de acontecimentos tais como a onda de terrorismo e as greves na Ar-
gentina, os golpes militares da África, a mudança política de Portugal,
etc., etc.
(*). - Comunicação apresentada na 1\1 Sesão de Estudos, Equipe D,
no dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(1). - José Honório Rodrigues em sua excelente obra A Pesquisa His-
t6rica no Brasil. (Companhia Editora Nacional, São Paulo, 1969, 2(1 edição, pg.
174 e segs) chama a atenção para a "fonte nova" que era o filme dizendo:" O
filme documentário, o noticiário semanal, o histórico, constituem uma fonte
nova e diferente de todas as fontes históricas até então existentes. (pág. 174).
A partir de 1950, no Brasil, a televisão é, para nós, mais uma "fonte nova"
- 1028 -

Mas, se deixarmos de lado o aspecto jornalístico e eventual do


registro ocasional e passarmos às sucessivas experiências realizadas
em TVs comerciais e educativas (principalmente nestas), poderemos,
certamente, afirmar que o "tape" já é e será um dos mais importan-
tes documentos para os futuros historiadores.
Nesta comunicação nos deteremos tão somente na experiência
realizada pela TV 2 Cultura, da Fundação Padre Anchieta de São
Paulo (capital), que, desde sua Fundação vem se preocupando com
o Ensino e buscando nos quadros da Universidade de São Paulo os
colaboradores que possam orientar programas que pretendem: pre-
servar nossos valores culturais.
A primeira experiência realizada no campo da História foi a
organização de "tapes" que servissem como aulas dos Cursos de Ma-
dureza Ginasial (atuais supletivos) e que, até hoje, ainda são utiliza-
dos como um dos meios para o enriquecimento da aprendizagem em
nível médio (2).
Esses 't'apes", em número de quarenta, voltados para o ensino
da História do Brasil serviram como material básico de pesquisa rea-
lizada no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e que
resultou em tese de Mestrado(3).
Além de ssa primeira experiência outras foram e estão sendo rea-
lizadas na TV Cultura, em São Paulo. Com a longa duração a TV 2
realizou com a orientação e supervisão da Prof.a Dr. a Maria de Lour-
des Monaco Janotti o programa "História em Debate", que buscou,
através de mesas-redondas, anaUsar com a participação de professores
especializados, temas empolgantes da historiografia nacional e mun-
dial. O resultado foi altamente satisfatório. f:, hoie, um documento
novo e importante, pois serve como fonte para o estudo de nossa his-
toriografia, de vez que, em sucessivos programas, pode-se entender a
posição atual não só dos temas analisados, mas tambem o ponto de
vista de nossos historiadores, num determinado momento histórico.
Atualmente a "História em Debate" está tendo a sua série re-
prisada ao mesmo tempo que se desenvolve o projeto do Colégio 2.
O Colégio 2 tem a orientação e a supervisão da Prota Dr. a Suely
R. R. Queiroz, no setor de História Geral e do Brasil em nivel de 2.0
Grau.

(2). - Vide: Suely Robles Reis de Queiroz e José Sebastião Witter,


Ensino de História pela Televisão: Uma Experiência, in "Anais do VI SIMPÓSIO
NACIONAL DOS PROFESSORES DE HISTÓRIA, organizado por Eurípedes
Simões de Paula, São Paulo, 1973, p. 103 e seguintes.
(3). - Efeitos da Aplicação do Sistema de Vales na Aprendizagem de
História do Brasil: um estudo com adolescentes marginalizados. (mimeografa-
da) - tese de Mestrado de Silvia Ignez Duarte Megda, defendida em agosto
de 1975 e orientada por G. P.
- 1029-

Por outro lado, nós propusemos e surgiu uma série cujo fim
último é o de captar as imagens de locais onde se desenvolveram
acontecimentos históricos marcantes e que se encontram ameaçados
de desaparecer. Surgiu da idéia de gravar imagens que pudessem num
futuro não longínquo desaparecer o "ACONTECEU AQUI" que já
realizou progrllJIllas focalizando a cidade de Itú (SP), tomando como
tema a "C!:mvenção Republicana", as cidades históricas de Redenção
e Natividade da Serra, no Vale do Paraiba (SP) e que depois de filma-
das desapareceram sob as águas represadas neste ano de 1975, a Fa-
zenda Ipallema de Sorocaba (SP), já colocados no ar, e agora estão
sendo montados um versando sobre o tropeirismo no Estado de São
Paulo e outro sobre o Arquivo Público Estadual. A partir deste e
com a experiência adquirida pretendemos ampliar o campo de ação
e partir pa~a a filmagem de todo o Brasil, sempre
ARETÊ - UMA EXPERI:ÊNCIA DE ENSINO E
DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA PELA RADIO (*).

(Resumo).

J.S. WITTER
J. C. NEVES LOPES
ARLETE S. PIQUEIRA
M. HELENA B. GRANJO
ROSA MARIA G. SILVEIRA
ZELIA FERNANDES.
do Departamento de História da Faculdade de Filoso·
fia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo.

ARET~ (1) nasceu de uma discussão entre nós e o Prof. Dr.


Samuel P. Netto, dr. em Psicologia pela Universidade de São Pau-
lo e atual diretor da Divisão de Ensino da Rádio e Televisão Cultura
da Fundação Padre Anchieta de São Paulo. Pretendia o prof. Pfrom
realizar uma série de programas na Rádio que pudesse ao mesmo tem-
po ilustrar seus ouvintes e ensinar aqueles que ainda não tivessem
ouvido falar de personagens históricos, que marcaram com sua atua-
ção, o decorrer da História Universal. Das discussões iniciais em
1974 surgiram as primeiras pesquisas e, em seguida, os primeiros pro-
gramas. Não se trata de puras biografias, embora estejam centradas
em personagens que marcaram o período em que viveram e mais do
que isso deixaram, através de sua atuação ou de seus escritos, toda
uma orientação para o um caminho a seguir.
ARETB envolve situação histórica vivida por seus personagens
e é ambientada com músicas da época.
(*). - Comunicação apresentada na 2'" Sessão de Estudos, Equipe E, no
dia 5 de setembro (Nota da Redação).
(1). - Aretê - do g~ego - significa "modelo de virtude"
- 1032-

ARETB significa trabalho de pesquisa, uma vez que o texto apre-


sentado para o produtor (2) é enriquecido com trechos de produção
dos personagens enfocados (quando políticos, escritores, pensadores,
etc.) ej ou trechos do que a crítica ou as gerações posteriores pensa-
ram sobre as figuras biografadas.
As figuras abordadas são muito variadas: políticos, escritores, fi-
lósofos, inventores.
A série é muito longa, mas como exemplo dos já gravados e di-
vulgados citamos: Dante, Abelardo, Gandhi, Lincoln, Bolivar, Freud.
Este trabalho representa mais um esforço no sentido de utilizarr
as modernas técnicas e transforma-las em documento, pois tambem
as fitas magnéticas gravadas com essas biografias ilustradas represen-
tam e representarão uma fonte de informação para os futuros estu-
diosos, que poderão analisar, através delas, o :pensamento da equipe
que elaborou o programa e a própria preservação de dados que fatal-
mente desaparecerão Se não forem sempre reelaborados.
• •

INTERVENÇOES .

Da Prof. a Joana Nf:fves (Universidade Estadual de Mato Grosso).


Perguntou:
"Qual o nivel para o qual o programa se dirige?
Qual o horário de transmissão do programa?"

Da Prof.a Maria Regina Nascimento (Universidade Federal de Ser-
gipe) .
Perguntou:
"Aconteceu aqui" é apresentado regularmente?
Através de que emissora?
Em que horário?
De que modo, ou através de que órgão os professores poderiam
adquirir cópias dos programas? (*).
(2). - O produtor da série é o profissional de alto nível DORIVAL
CARPER.
("'). - O Autor deixou de remeter à Mesa as respostas dadas em ple-
IX. - COMUNICAÇÕES (Fontes primárias).
ARROLAMENTO DE DOCUMENTOS SOBRE
REGISTRO DE PROPRIEDADE
TERRITORIAL (*).

MARISTHER MOURA VASCONCELLOS


Diretora do Arquivo Público de Sergipe.
ZENILDE DE JESUS SILVA
Responsável pela Seção de Pesquisa do Arquivo Pú-
blico de Sergipe.
MARIA ANDRELINA DE MELO
Responsável pela Seção de Arquivo Geral do Arquivo
Público de Sergipe

INTRODUÇÃO.

Este trabalho de arrolamento das fontes existente no Arquivo Pú-


blico do Estado de Sergipe (APES) sobre Registro de Propriedades, é
o primeiro de uma série de arrolamentos que a Seção de Pesquisas pre-
tende realizar dentro das suas atribuições, com a finalidade de divulgar
as fontes histódcas existentes no referido Arquivo, auxiliando aqueles
que queiram pesquisar a História de Sergipe.
Com o presente arrolamento que se limita às fontes sobre registro
de propriedades, informamos que no Acervo do Arquivo Público do
Estado de Sergipe há vasta documentação sobre terras de um modo
geral.
Neste trabalho foram arrolados:
1. - Dezoito Livros de Registro das Terras possuidas nas di-
versas Freguesias da Província de Sergipe D'EI Rey. Cada Livro con-
tem um número consideravel de minuciosas declarações das proprieda-

(*). - Comunicação apresentada na 1\1. Sessão


- 1036-

des, feitas pelos respectivos proprietários, em conformidade com a Lei


n. O 601 de 18 de setembro de 1850 e Decreto n. o 1.318 de janeiro de
1854 do Governo Imperial que dispõe sobre terras devolutas, sesmarias,
posses e colonização.
Os registros têm como datas limites os anos 1854 e 1859.
2. - Títulos de Propriedades de diversas Freguesias para fins
de registro das terras.
Um volume dos anos de 1855 e 1857.
3. - Quinze volumes contendo inúmeros Requerimentos solici-
tando ao Secretário do Estado - Presidente da Comissão de Registro
Territorial, - o registro de propriedades, feitos pelos diversos proprie-
tários do Estado, conforme o Art. 3. 0 do Decreto Estadual n. O 760 de
23 de janeiro de 1923, que expede o Regulamento para registro de
Propriedade Territorial. Os requerimentos vêm acompanhados das res-
pectivas Declarações e outros documentos. Cada Declaração compõe-
se dos segu~ntes elementos: - Nome do proprietário - Nome de
propriedade - Município em que está situada - Nome dos confron-
tantes - Limites naturais e artificiais - Extensão territorial - Dis-
tância do perto de embarque, da cidade e da Estação - Culturas -
Número de trabalhadores - Sistema adotado - Valor de proprieda-
de - Valor d~ estabelecimento - Produção - Quantidade, quali-
dade e espécie do gado existente - Data e a circunstância da medi-
ção, divisão ou demarcação.
Os requerimentos têm como datas limites os anos de 1923 e
1926.
De um modo geral, os documentos estão muito danificados, prin-
cipalmente os Livros de Registro das terras que na maioria das vezes
é impossivel se proceder o seu manuseio.
• •

1. - LIVRO DE REGISTRO DAS TERRAS.

1 . 1. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Capela.

- Novecentos e dez anotações das terras possuidas na Fre-


guesia Capela. A primeira anotação, impossivel precisar a data,
sendo a última em 28 de setemb~o de 1856. Consta de termo de
abertura, impossível precisar a data, sendo o de encerramento em
28 de novembro de 1859. Possui
- 1031-

numeradas e rubricadas com a rubrica "Porto" pelo vigário Fran-


cisco José da Silva Porto, das quais, noventa e duas foram utili-
zadas. Péssimo estado de Conservação. Sem classificação.
1.2. - Livro de Registro das Terras da Freguesia dos Campos do
Rio Real.
- T~ezentas e sessenta e quatro anotações das terras pos-
suidas na Freguesia dos Campos do Rio Real. A primeira anotação
foi em 08 de janeiro de 1855 sendo a última em 26 de dezembro
de 1857. Consta de te"mo de abertura em 03 de novembro de
1854 - sendo o de encerramento em 09 de novemb"o de 1859.
Possui duzentas folhas numeradas e rubricadas com a rubrica
"Amaral" pelo vigário Francisco Xavier de Gois Amaral, das
quais, oitenta e quatro foram utilizadas. Regular estado de
conservação. Sem classificação.
1 .3. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Jesus Maria
José do Pé do Banco.
- Quinhentas e cinquenta e três ar:otações das terras possui-
das na Freguesia de Jesus Maria José do Pé do Banco. A pri-
meira anotação foi em 11 de agosto de 1856 sendo a última em
30 de janeiro de 1858. Consta de termo de abertura em 05 de
agosto de 1856 sendo o de enceramento em 01 de novembro de
1859. Possui trezentas e três folhas numeradas e rub "icadas com
a rubrica "Santos" pelo vigário Francisco José dos S:mtos, das
quais noventa e nove foram utilizadas. Péssimo estado de con-
servação . Sem classificação.
1.4. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de No~a
Senhora d' Ajuda d'[taporanga.
- Trezentas e cinquenta e oito anotações das te:ras possui-
das na Freguesia de Nossa Senhora d'Ajuda d'Itapora,nga. A pri-
meira e última anotações estão sem datas sendo a segunda em
15 de julho de 1856 e a penúltima em 30 de setembro de 1856.
Consta de termo de abertura em 16 de outubro de 1854 sendo o
de encerramento em 10 de novembro de 1859. Possui cento e
noventa e oito folhas numeradas e rubricadas com a rubica
"Campos" pelo vigário José Evangelista de Campos, das quais,
setenta e sete foram utilizadas. Regular estado de conservação.
Sem classificação.
1.5. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa Se-
nhora da Boa Hora do Campo do Brito.
- Oitocentas e quatorze anotações das terras possuidas na
Freguesia de Nossa Senhora da Boa Hora do Campo do Brito.
A primeira anotação foi em 01 de setembro de 1856, sendo a
última em 30
- 1038-
tura em 16 de setembro de 1856, sendo o de encerramento em
01 de março de 1859. Possui cento e noventa e qua,tro folhas
nume:ad'as e rubricadas com a rubrica "Lopes da Costa" pelo
vigário Eugênio Lopes da Costa, das quais, cento e dezoito foram
utilizadas. Péssimo estado de conservação. Sem classificação.
1.6. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa
Senhora da Boo Hora do Campo do Brito.
- Trezentas e cinquentas e uma anotações das terras possui-
das na Freguesia de Nossa Senhora da Boa Hora do Campo do
Brito. A p,imeira anotação foi em 16 de setemb'o de 1856
sendo a última em 28 de setembro de 1856. Consta de termo
de abertura e de enceramento em 16 de setembro de 1856.
Possui cem folhas numeradas e rubricadas com a rubrica "Lopes
da Costa", pelo vigário Eugênio Lopes da Costa, todas utilizadas.
Péssimo estado de conservação. Sem classificação.
1.7. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa Se-
nhora da Conceição de Itabaianinha.
- Quinhentas e trinta e três anotações das terras possuidas
na Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Itabaianinha.
A primeira anotação foi em 11 de outubro de 1854, sendo a
última em 28 de janeiro de 1856. Consta de termo de abertura
em 30 de setemb.o de 1854, sendo o de encerramento em 05
de janeiro de 1860. Possui duzentas e quarenta e seis folhas nu-
meradas e rubricadas com a rubrica "T. Andrade" pelo vigário
Bernardino de Sena Travassos Andrade, das quais, cento e ses-
senta e cinco foram utilizadas. Péssimo estado de conservação.
Sem classificação.
1.8. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa Se-
nhora da Conceição de Porto da Folha.
- Trezentas e cinquenta anotações das terras possuidas na
Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Porto da Folha. A
primeira anotação foi em 05 de setembro de 1856, sendo a última
em 12 de setembro de 1856. Consta de termo de abertura em
15 de maio de 1856, sendo o de ence~ramento em 05 de dezemb"o
de 1859. Possui cento e sessenta e seis páginas numeradas e ru-
bricadas cqm a rubrica "Dorotheo" pelo vigário Fr. Dorotheo
de Loreto, das quais, cento e quinze foram utilizadas. Regular
estado de conservação. Sem Classificação.
1.9. - Livro de Registro das Terras de Nossa Senhora da Divina
Pastora.
- Cento e oitenta e cinco anotações das terras possui das na
Freguesia de Nossa Senhora da Divina Pastora. A primeira ano-
tação foi em 21 de agosto de 1856, sendo a última em 05 de ou-
tubro de 1856. Consta de termo de abertu"a em 20
- 1039 -
1856, sendo o de enceramento em 12 de dezembro de 1856.
Possui cento e treze folhas numeradas e rubricadas com a rubri-
oa "Travassos" pelo vigário Francisco José Travassos, das quais,
sessenta e uma foram utilizadas. Péssimo estado de conservação.
Sem classificação.
1.10. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa
Senhora de Guadalupe da cidade de Estância.
Quatrocentas e quarenta e cinco anotações das terras
possuidas na Freguesia de Nossa Senhora da Guadalupe da ci-
dade de Estância. A primeira anotação foi em 29 de setembro
de 1855 (a partir da folha número quatro, pois as anteriores estão
totalmente danificadas), sendo a última em 02 de janeiro de
1858. Consta de termo de abertura em 01 de outubro de 1854,
sendo o de encerramento em 05 de dezembro de 1858. Possui
duzentas e noventa e três folhas numeradas e rubricadas com a
rubrica "Alvares" pelo vigário Manoel José Alvares, das quais,
cento e noventa e três foram utilizadas. Péssimo estado de con-
servação. Sem classificação.
1.11. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa
Senhora do Rosário do Catete.
- Trezentas e vinte e duas anotações das terras possui das
na Freguesia de Nossa Senhora do Rosário do Catete. A pri-
meira anotação foi em 20 de abril de 1855 sendo a última em
30 de setembro de 1858. Consta de termo de abertura em 01
de agosto de 1854 sendo o de encerramento em 03 de junho de
1859. Possui duzentas e quarenta e seis folhas numeradas e
rubricadas com a rubrica "Cardoso" pelo vigário Manoel Dias
Cardoso, das quais, quarenta e uma foram utilizadas. Regular
estado de conservação. Sem classificação.
1. 12. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Nossa
Senhora Santa Ana da Vila de Simão Dias.
- Dezoito anotações das terras possuidas na Freguesia de
Nossa Senhora Santa Ana da Vila de Simão Dias. A primeira
anotação foi em 24 de julho de 1856 sendo a última em 30 de
setembro de 1856. Consta de termo de abertura em 01 de outu-
bro de 1854 sendo o de encerramento em 01 de outubro de 1856.
Possui noventa e quatro folhas numeradas e rubricadas com a rubri-
ca "Andrade" pelo vigário Antônio da Costa Andrade, das quais,
oito foram utilizadas. Péssimo estado de conservação. Sem
classificação.
1.13. - Livro de Registro das Terras de Nossa Senhora da
Vitória da cidade de São Cristovão.
- Seiscentas e vinte e oito anotações das terras possuidas
na F:eguesia de Nossa da Vitória da cidade de São
- 1040-
A primeira anotação foi em 10 de agosto de 1856 sendo a última em
24 de fevereiro de 1859. Consta de termo de abertura em 10 de
outubro de 1854 sendo o de encerramento em 01 de março de
1859. Possui cento e noventa e três folhas numeradas e rubrica-
das com a rubrica "Bar:oso" pelo vigário José Gonçalves Barro-
so, das quais, cento e nove foram utilizadas. Regular estado de
conservação. Sem classificação.
1.14. - Livro de Regi$tro das Terras da Freguesia de São Felir
da Pacatuba.
- Cento e setenta e sete anotações das terras possuidas na
Freguesia de São Felix da Pacatuba. A primeira anotação foi
em 05 de agosto de 1856, sendo a última em 30 de setembro de
1856. Consta de termo de abe:tura em 01 de janeiro de 1855 sendo
o de encerramento em 23 de janeiro de 1860. Possui cento e
noventa e oito folhas numeradas e rubricadas com rubrica "Moura"
pelo vigário Manoel A. de Moura até a folha número trinta e um
e com a rubrica "Santana" pelo Vigário Lucindo Aprígio de San-
tana, da folha núme~o trinta e dois em diante, sendo utilizadas,
apenas, as trintas e uma primeiras. Péssimo estado de conser-
vação. Sem classificação.
1.15. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Santo
Ant6nio das Almas de Itabaiana.
- Duas mil duzentas e trinta e uma anotações das terras pos-
suidas na Freguesia de Santo Antônio das Almas de Itabaiana.
A primei:a anotação foi em 16 de agosto de 1856 sendo a última
em 30 de abril de 1859. Consta de termo de abertura em 01 de
setembro de 1856 sendo o de encerramento em 02 de março de
1859. Possui cento e oitenta e sete folhas numeradas e rubricadas
com a rubrica "Resende" pelo vigário Domingos de Melo Re-
sende, todas utilizadas. Péssimo estado de conservação. Sem
classificação.
1.16. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Santo
Ant6nio de Vila Nova.
- Noventa e oito anotações das terras possuidas na Fre-
guesia de Santo Antônio de Vila Nova. A primeira anotação foi
em 16 de agosto de 1856 sendo a última em 30 de abril de
1858. Consta de termo de abertura em 06 de novembro de 1854
sendo o de encerramento em 16 de dezembro de 1859. Possui
duzentas e noventa e cinco folhas numeradas e rubricadas com
a rub·ica "Fraga" pelo vigário José Cardoso da Fraga, das quais,
quarenta e sete foram utilizadas. Péssimo estado de conserva-
ção. Sem classificação.
1.17. - Livro de Registro das Terras da Freguesia do Santíssi-
-1041-

- Quinhentas e onze anotações das terras possuidas na Fre-


guesia do Santíssimo Coração de Jesus da cidade de Laranjeiras.
A primeira anotação foi em 05 de agosto de 1856, sendo a última
em 28 de fevereiro de 1859. Consta de termo de abertura em
01 de setembro de 1854, sendo o de encerramento em 21 de no-
vembro de 1859. Possui duzentas e noventa e sete folhas nume-
radas e rubricadas com a rubrica "Campos" pelo vigário José
Joaquim de Campos, das quais, Oitenta e cinco foram utilizadas.
Péssimo estado de coservação. Sem classificação.
1.18. - Livro de Registro das Terras da Freguesia do Senhor do
Bom Jesus dos Passos da cidade do Maroim.
- Duzentas e trinta e uma anotações das terras possui das
na Freguesia do Senhor Bom Jesus dos Passos da cidade do
Maroim. A primeira anotação foi em 04 de julho de 1856, sen-
do a última em 14 de abril de 1858. Consta de termo de abe.tura
em 1856. Não consta de termo de encerramento. Possui setenta e
sete folhas numeradas e rubricadas com a rubrica "Vasconcellos"
pelo vigário José Joaquim de Vasconcellos, das quais, quarenta e
sete foram utilizadas. Péssimo estado de conservação. Sem classi-
ficação.
1.19. - Livro de Registro das Terras da Freguesia de Propriá.
- Mil duzentas e vinte e cinco anotações das terras possuidas
na Freguesia de Propriá. A primeira anotação foi em 10 de mar-
ço de 1855, sendo a última em 30 de dezembro de 1857. Consta
de termo de abertura em 05 de outubro de 1854, sendo o de
encerramento em 31 de dezembro de 1857. Possui duzentas e
noventa e seis folhas numeradas e rubricadas com a rubrica
"Nunes" pelo vigário Manoel Joaquim Nunes, das quais, duzen-
tas e trinta e seis foram utilizadas. Regular estado de CO,1serva-
ção. Sem classificação.


2. - TITULOS DE PROPRIEDADES. (Em Pacotilhas).
2.1. - Títulos de Propriedades de diversas Freguesias.
Quinhentos e quarenta e três documentos para fins de
registro das terras das Freguesias do Espírito Santo, de Nossa
Senhora da Guadalupe da cidade de Estância, e Vila de Santa
Luzia. Duzentos e trinta são referentes às propriedades do Espí-
rito Santo; trezentos e doze, relativos às propriedades de Estân-
cia e um documento referente à Santa Luzia. Regular estado de
conservação. Pessimo
..- 1042 ..-
3. - REQUERIMENTOS, E OUTROS DOCUMENTOS PARA
REGISTROS DE PROPRIEDADES.
3 . 1. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Regis-
tro Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme
o Art. 3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam
de out:os documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
procurações, certidão.
- Anápolis (Simão Dias) - doze requerimentos; onze De-
clarações; duas públicas formas de escrituras; uma certidão.
- Aquidaban - dois requerimentos; duas Declarações.
- Aracaju - trinta e nove requerimentos; trinta e nove
Declarações; t:ês públicas formas de escrituras; uma procuração.
- Boquim - seis requerimentos; cinco Declarações; três
públicas formas de escrituras; uma procuração.
- Campo do Brito - um requerimento; uma Declaração.
- Campos (Tobias Barreto) - um requerimento; uma Decla-
ração.
- Capela - trinta e um requerimento; vinte e nove Decla-
rações; nove públicas formas de escrituras; uma procuração.
- Carmo (Carmópolis) - quatro requerimentos; seis De-
clarações.
- Divina Pastora - quatro requerimentos; quatro Declara-
- EspUto Santo (Indiaroba) - três requerimentos; três
Declarações. Uma procuração.
- Gararú - dois requerimentos; duas Declarações.
- Itabaiana - um requerimento; uma Declaração; três pú-
blicas formas de escrituras; uma procuração.
- Itabaianinha - um requerimento; uma Declaração.
- Itaporanga d'Ajuda - dezoito requerimentos; vinte De-
clarações; cinco públicas formas de escrituras.
- Japaratuba - sete requerimentos; sete Declarações.
- Lagarto - um requerimento; uma Declaração; uma pú-
blica fo:ma de escritura.
- Laranjeiras - quatorze requerimentos; onze Declarações;
seis públicas formas de escritu,as; uma procuração.
- Maroim - dois requerimentos; duas Declarações; duas
públicas formas de escrituras.
- Nossa Senhora
- 1043-
- Riachuelo - doze requerimentos; doze Declarações.
- Riachão - 05 requerimentos; 05 Declarações .
- Rosário - quinze requerimentos; quinze Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- Santo Amaro - dois requerimentos; duas Declarações;
uma pública forma de escritura.
- São Cristovão - sessenta e um requerimentos; setenta e
oito Declarações; doze públicas formas de escrituras.
- São Paulo (Frei Paulo) - sete requerimentos; cinco De-
clarações; duas procurações.
Siriri - sete reque:imentos; seis Declarações; uma pública
forma de escritura.
- Vila Cristina (Cristinápolis) - um requerimento; uma
Declaração.
- Regular estado de conservação.
Janeiro a julho de 1923.
07 maços.
Volume 699.
3.2. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Re-
gistro Territo:ial, solicitando o registro das propriedades, confor-
me o Art. 39 do Decreto n9 760, de 23 de janeiro de 1923. Cons-
tam de outros documentos, Declarações, públicas formas de escri-
turas, procurações.
- Anápolis (Simão Dias) - dois requerimentos; duas De-
clarações.
- Aquidaban - sete requerimentos; sete Declarações; uma
pública fo:ma de escritura.
- Aracaju - treze requerimentos; treze Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Arauá - vinte e t,ês requerimentos; quarenta Declara-
ções; onze públicas formas de escrituras.
- Boquim - seis requerimentos; seis Declarações; uma
pública forma de escritura; uma procuração.
- Campo do Brito - um requerimento; uma Declaração.
- Campos (Tobias Barreto) - um requerimento; uma De-
claração.
- Capela - trinta e três requerimentos; qua:enta e três De-
clarações; cinco públicas formas de escrituras.
- Carmo (Carmópolis) - um requerimento; uma Declara-
ção.
Divina Pastora - dez requerimentos; onze Declarações.
- Espírito Santo (Indiaroba) - um requerimento; uma De-
.,-- 1044 .,--
- Estância - quinze requerimentos; quinze Declarações.
- Gararu - três requerimentos; três Declarações; uma pú-
blica forma de escritura_
Itabaiana - um requerimento; uma Declaração.
- Itabaianinha - um requerimento; três Declarações.
- Itaporanga d'Ajuda - seis requerimentos; seis Declara-
ções; uma pública forma de escritura.
- Japaratuba - oito requerimentos; onze Declarações; duas
procurações.
- Laranjeiras' - dois requeriment()s; duas, Declo:rações.
- Maroim - onze requerimentos; dez Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Nossa Senhora das Dores --onze requerimentos; onze
Declarações.
- Nossa Senhora do Socorro - dois reque-imentos; uma
Declaração.
- Porto da Folha - nove requerimentos; nove Declara-
ções; oito públicas formas de escrituras; uma procuração.
- Propriá - três requerimentos; três Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Riachão - dois requerimentos; quatro Declarações.
- Riachuelo -seis requerimentos; cinco Declarações; qua-
tro procurações.
- Rosário - doze requerimentos; quinze Declarações; uma
procuração.
- São Cdstovão - vinte e dois requerimentos; vinte e
uma Declarações; oito públicas formas de escrituras.
- Santa Luzia - vinte e três requerimentos; vinte e nove
Declarações; oito públicas formas de escrituras.
- Santo Amaro - dez requerimentos; sete Declarações; qua·
tro públicas formas de esc~ituras.
- São Paulo (Frei Paulo) - três requerimentos; duas De-
clarações.
- Sirirí - trinta e cinco requerimentos; trinta e oito De-
clarações; quatro públicas formas de escritu~as; duas procura-
ções.
Vila Cristina (Cristinápolis) - dois requerimentos; duas
Declarações; cinco públicas formas de escrituras.
Regular estado de conservação (alguns documentos).
Péssimo estado de conservação (outros).
Agosto de 1923. 4 maços. Volume 700.
3 .3. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme O
- 1045 -

Art. 3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janei:o de 1923. Constam


de outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
procurações, certidões.
- Anápolis (Simão Dias) - um requerimento; uma Decla-
ração.
- Aquidaban - um requerimento; uma Declaração; uma pú-
blica forma de escritura.
- Aracaju - sete reque:imentos; sete Declarações.
- Arauá - sete requerimentos; sete Declarações.
- Boquim - quinze requerimentos; dezoito Declarações;
sete públicas formas de escrituras.
- Campo do Brito - cinco requerimentos; cinco Declara-
ções; uma pública forma de escdtura.
- Capela - vinte e três requerimentos; vinte e três Decla-
rações; sete públicas formas de escrituras; uma procuração.
Carmo (Carmópolis) - um requerimento; duas Decla-
rações; três públicas fo.mas de escrituras.
- Divina Pastora - quatorze requerimentos; quato:-ze De-
clarações; sete públicas formas de escrituras.
- Espírito Santo (Indiaroba) - cinco requerimentos; cin-
co Declarações.
- Estância - dezoito reque:imentos; vinte e duas Decla-
rações; uma pública forma de escritura.
- Gararu - sete requerimentos; sete Declarações; três pú-
blicas formas de escrituras.
- Itabaianinha - três requerimentos; duas Declarações.
- Itaporanga d'Ajuda - um requerimento; duas Declara-
ções.
- Japa:atuba - cinco requerimentos; sete Declarações; duas
públicas formas de escrituras.
- Lagarto - três requerimentos; quatro Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Laranjeiras - dois requerimentos; dezesseis Declarações;
uma pública fo:ma de escritura.
- Maroim - doze requerimentos; nove Declarações; duas
certidões.
- Nossa Senhora das Dores - sete requerimentos; sete
Declarações; duas públicas formas de escrituras.
- Pacatuba - um requerimento; uma Declaração.
- Porto da Folha - cinco requerimentos; cinco Declara-
ções; uma pública forma de escritura.
- Propriá
- 1046-
- Riachuelo - um requerimento; uma Declaração.
- Rosário - cinco requerimentos; cinco Declarações.
- Santa Luzia - onze requerimentos; dezessete Declara-
ções; duas públicas formas de escrituras.
- Santo Amaro - dezessete requerimentos; vinte e sete
Declarações; doze públicas formas de escrituras.
- São Cristovão - três requerimentos; três Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- São Paulo (Frei Paulo) - dois requerimentos; duas De-
clarações.
- Sirirí - treze requerimentos; treze Declarações.
- Vila Nova (Ne6polis) - quatro requerimentos; doze
Declarações; três públicas formas de escrituras.
Regular estado de conservação.
Outubro de 1923.
02 maços.
Volume 701.
3 .4. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de Ser-
gipe, ao Secretário Ge:al, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedade6, conforme
o Art. 3Q do Decreto n Q 760, de 23 de 1923. Constam de outros
documentos, Declarações públicas, formas de escrituras.
- Anápolis (Simão Dias) - dois requerimentos; duas De-
clarações.
- Aquidaban - dois requerimentos; duas Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Aracaju - seis requerimentos; seis Declarações.
- Arauá - um requerimento; uma Declaração.
- Capela - vinte e nove requerimentos; trinta e cinco De-
clarações; quinze públicas formas de escrituras.
- Ca:mo (Carmopolis) - um requerimento; uma Declara-
ção.
- Divina Pastora - oito requerimentos; oito Declarações;
uma pública forma de escritura.
- Estância - oito requerimentos; dez Declarações; duas
públicas formas de escrituras.
- Gararú - três requerimentos; t:ês Declarações.
- Itabaianinha - nove requerimentos; dez Declarações.
- Itaporanga d'Ajuda - três requerimentos; três Declara-
ções.
- Japaratuba - dois requerimentOlS; duns Declarações;
uma pública fo"ma de escritura.
- Lagarto - vinte e cinco requerimentos; trinta e uma De-
1047 -

- Laranjeiras - dois requerimentos; uma Declaração.


- Maroim - doze requerimentos; treze Declarações; cinco
públicas fo:mas de escrituras.
- Nossa Senhora das Dores - seis requerimentos; oito De-
clarações.
Pacatuba - três requerimentos; cinco Declarações; três pú-
blicas formas de escrituras.
- Porto da Folha - quatro requerimentos; quatro Declara-
ções; duas públicas formas de escdturas.
- Riachão - sete requerImentos; sete Declarações; quatro
públicas formas de rescrituras.
- Riachuelo - um requerimento; uma Declaração.
- Rosário - sete requerimentos; sete Declarações.
- Santa Luzia - um requerimento; duas Declarações.
- Santo Amaro - doze requerimentos; doze Declarações;
sete públicas formas de escrituras.
- São Cristovão - três requerimentos; três Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- São Paulo (F:ei Paulo) - um requerimento; duas Decla-
rações.
- Sirirí - vinte requerimentos; vinte e duas Declarações;
uma pública forma de escritura.
- Vila Cristina (Cristinápolis) - uma Declaração.
- Vila Nova (Neópolis) - um requerimento; uma Declara-
ção.
Regular estado de conservação.
Novembro de 1923.
02 maços.
Volume 702.
3 . S. - Requerimento de diversos municípios do Estado de Ser-
gipe ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro Ter-
ritorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o Art.
39 do Decreto n 9 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam .de ou-
tros documentos; Declarações públicas formas de escrituras, p:o-
curações, certidão.
Anápolis (Simão Dias) - dois requerimentos; duas Decla-
1048 -

- Boquim - onze requerimentos; quatorze Declarações;


duas públicas formas de escrituras.
- Campo do Brito - dois requerimentos; duas Declarações.
- Campos (Tobias Barreto) - um requerimento; uma De-
claração.
- Capela - sessenta e quatro requerimentos; setenta e três
Declarações; vinte e cinco públicas formas de escrituras.
- Divina Pastora - t~eze requerimentos; dezessete Decla-
rações; uma pública forma de escritura.
Regular estado de conservação.
Dezemb!o de 1923.
02 maços.
Volume 703.
3 .6. - Requerimentos de diversos mUlIicqpios do Estado de Ser-
gipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro Ter-
rito~ial, solicitando o registro das propriedades, conforme o Art.
3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de ou-
tros documentos, Declarações; extratos de escrituras.
- Anápolis (Simão Dias) - três requerimentos; duas Decla-
rações; dois extratos de escrituras.
- Aquidaban - dezessete requerimentos; dezessete Declara-
ções; onze extratos de esc:ituras.
- Aracaju - dois requerimentos; duas Declarações.
- Arauá - um requerimento; uma Declaração.
- Boquim - dez requerimentos; dez Declarações; um extra-
to de escritura.
- Campo do Brito - dois requerimentos; duas Declarações.
Capela - trinta e cinco requerimentos; trinta e cinco De-
clarações; onze extratos de escrituras.
- Carmo (Carmópolis) - um requerimento; uma Declara-
ção.
- Divina Pastora - um reque:imento; uma Declaração.
- Gararu - dois requerimentos; duas Declarações; dois ex-
tratos de escrituras.
- Itabaiana - um requerimento; uma Declaração.
- Itabaianinha - dezesseis requerimentos: dezesseis Decla-
rações; dezesseis extratos de escritu:as.
- Itaporanga d'Ajuda - um requerimento; uma Declaração.
- Japaratuba - dois requerimentos; duas Declarações; um
extrato de escritura.
- Lagarto - três requerimentos; t:ês
-1049-
- Nossa Senhora das Dores - cinquenta e oito requerimen-
tos; cinquenta e oito Declarações; vinte extratos de escrituras.
- Nossa Senhora do Socorro - um requerimento; uma Decla-
ração.
- Pacatuba - três requerimentos; Lês Declarações; dois
extratos de escrituras.
- Riachão - dez requedmentos; dez Declarações; cinco
extratos de escrituras.
Rosário - seis requerimentos; cinco Declarações; um
extrato de escritu:"a.
- Santa Luzia - um requerimento; uma Declaração.
- Santo Amaro - quatro requerimentos; quat!Q Declara-
ções; um extrato de escritura.
- São Cristovão - sete requerimentos; sete Declarações;
um ext~ato de escritura.
- São Paulo (Frei Paulo) - um requerimento; uma De-
claração.
- Sirirí - onze requerimentos; onze Declarações; onze ex-
tratos de escrituras.
- Vila Cristina - Cristinápolis) - três requerimentos; três
Declarações.
- Vila Nova (Neópolis) - vinte e três requerimentos; vinte
e três Declarações; um extrato de escritura.
Regular estado de conservação.
Janeiro de 1924.
02 maços.
Volume 704.
3.7. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de Ser-
gipe, ao Secretário Geal, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o
Art. 39 do Decreto n9 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações, procu:ações, extratos de escrituras.
- Anápolis (Simão Dias) - dois requerime:Jtos; duas De-
clarações; um extrato de escritura.
- Aquidaban - cinquenta e um requerimentos; cinquenta e
uma Declarações; vinte e sete extratos de escrituras.
- 1050-
- Carmo (Carmópolis) - seis requerimentos; seis Decla-
rações.
- Divina Pastora - cinco requerimentos; cinco Declarações.
- Espírito Santo (Indiaroba) - um requerimento; uma
Declaração.
- Estância - sete ~equerimentos; quatro Declarações; três
extratos de escrituras.
- Gararú - sete requerimentos; sete Declarações; três ex-
tratos de escrituras.
Itaporanga d'Ajuda - um requt'rimento; uma Declara-
ção.
Itabaiana - dois requerimentos; duas Declarações; um
extrato de escrituras.
- Itabaianinha - seis requerimentos; seis Declarações; um
estrato de escritura.
- Japaratuba nove requerimentos; nove Declarações; um
extrato de escjtura.
- Lagarto - vinte requerimentos; vinte Declarações; seis
extratos de escrituras.
- Laranjeiras - seis reque:imentos; seis Declarações.
- Maroim .,-- seis requerimentos; seis Declarações; dois ex-
tratos de escrituras.
- Nossa Senhora das Dores - oitenta e oito requerimentos;
oitenta e oito Declarações; trinta e quatro extratos de escrituras.
- Nossa Senhora do Socorro - quatro requerimentos; quatro
Declarações.
- Pacatuba - oito requerimentos; oito Declarações.
- Porto da Folha - dois requerimentos; duas Decla:-ações;
dois extratos de escrituras.
Propriá - um requerimento; uma Declaração.
Riachão - dois requerimentos; duas Declarações.
Riachuelo - três requerimentos; três Decla:ações.
Rosário - seis requerimentos; seis Declarações .
- Santa Luzia - dois requerimentos; duas Declarações.
- Santo Amaro - onze reque~imentos; onze Declarações;
cinco extratos de escrituras.
- São C.Ístovão - seis requerimentos; seis Declarações; dois
extratos de escrituras.
- São Paulo (Frei Paulo) - onze requerimentos; treze De-
clarações; dois extratos de escrituras; três procurações:
Sirirí - dezesseis requerimentos; dezesseis Declarações; t:ês
extratos de escrituras.
Vila Nova (Neópolis) - oito requerimentos; oito Declara-
çães.
- 1051 -
Regular estado de conservação.
Fevereiro de 1924.
02 maços.
Volume 70S.
3.8. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de Ser-
gipe, ao Secretá:io Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o Art.
3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações públicas formas de escrituras, ex-
tratos de escrituras, constam dos documentos em anexo.
- Anápolis (Simão Dias). - um requerimento; uma Decla-
ração.
- Aquidaban - noventa e um requerimentos; oitenta e
nove declarações; onze públicas formas de escrituras; treze extra-
to de escrituras.
- Aracaju - vinte e dois requerimentos; dezoito Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- Boquim - cinco requerimentos; cinco Declarações; dois
extratos de escrituras.
- Campo do B:ito - um requerimento; uma Declaração.
- Capela - dezessete requerimentos; dezessete Declarações;
cinco extratos de escrituras.
- Carmo (Carmópolis) - dois requerimentos; duas Decla-
rações.
- Divina Pastora - nove requerimentos; nove Declarações;
quatro extratos de escritu:as.
- Espírito S.lOto (Indiaroba) - nove requerimentos; nove
Declarações.
- Estância - treze requerimentos; treze Declarações.
- Gararú - quatro requerimentos; quat o Declarações; dois
extratos de escrituras.
- ltabaianinha - oito requerimentos; oito Declarações.
- Itaporanga d'Ajuda - sete reque"imentos; oito Declara-
ções.
- 1052-
Pacatuba - três requerimentos; três Declarações.
Pacatuba - três requerimentos; t:ês Declarações.
pública forma de escritura.
Propriá - dezesseis requerimentos; dezesseis Declarações;
dois extratos de escrituras.
- Riachão - um requerimento; uma Declaração.
- Riachuelo - oito requerimentos; oito Declarações.
- Rosádo - um requerimento; uma Declaração.
- Santa Luzia - sete requerimentos; sete Declarações; um
extrato de escritura.
- Santo Amaro - três requerimentos; três Declarações.
- São Cristovão - oito . equerimentos; sete Declarações; um
extrato de escritura.
- São Paulo (Frei Paulo) - dois reque~imentos; duas De-
clarações; um extrato de escritura.
- Sirirí - um requerimento; uma Declaração.
- Vila Cristina (Cristinápolis) qU.lrenta e dois requerimentos;
quarenta e duas Declarações; um extrato de escritura.
- Vila Nova (Neópolis) - três reque,imentos; três Decla-
rações.
Regular estado de conservação.
Abril a junho de 1924.
03 maços.
Volume 706.
3.9. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de Ser-
gipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro Ter-
ritorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o Art.
3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
ce.tidão.
- Anápolis (Simão Dias) - dois requerimentos; duas Decla-
1053 -

- Espírito Santo (Indiaroba) - trinta e cinco requerimen-


tos; oitenta e uma Declarações; onze púb1icas forma de escrituras.
- Estância - três requerimentos; cinco Declarações; quatro
públicas fo~mas de escrituras; uma certidão.
- Gararú - uma Declaração.
- Itabaianinha - uma Declaração.
- J aparatuba - um requerimento; três Declarações.
- Laranjeiras - um requerimento; uma Declaração.
- Maroim - três requerimentos; duas Decla:ações; uma
pública forma de escritura.
- Nossa Senhora das Dores - trinta e seis requerimentos;
quarenta e duas Declarações; dezessete públicas formas de escrituras.
- Nossa Senhora do Soco:ro - um requerimento; uma De-
claração.
- Porto da Folha - três requerimentos; dU:ls Declarações.
- Propriá - cinquenta e seis requerimentos; setenta Decla-
rações; vinte e quatro públicas formas de escrituras.
- Riachão - três reque imentos; três Declara:;ões; uma pú-
blica fo-ma de escritura.
Riachuelo - três requerimentos; qU:ltro Declarações.
- Rosário - quatro requerimentos; quat o Declarações; uma
pública forma de escritu:a.
Santa Luzia - dois requerimentos; três Declarações.
- Santo Amaro - dois requerimentos; duas Declarações.
- São Cristovão - três requerimentos; duas Declarações.
- Sirirí - dois reque imentos; duas Declarações.
- Vila Cristina (Cirstinápolis) - um requdmento; uma
Declaração.
- Vila Nova (Neópolis) - oito requerimentos; dez Decla-
rações.
Regular estado de conservação.
Julho a outubro de 1924.
04 maços.
Volume 707.
3. 10. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro de prop'iedades, conforme o
Art. 3\1 do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações,. públicas forma de escrituras,
certidão.
- Anápolis (Simão Dias) - oito requerimentos; doze De-
- 1054-

- Divina Pastora - dois requerimentos; duas Declarações.


- Estância - quatro requerimentos; quatro Declarações.
- Espírito Santo (Indiaroba) - quatro requerimentos; seis
Declarações.
- Gararu - nove requerimentos; três Declarações; quatro
públicas formas de escrituras.
- Itabaiana - um requerimento; três Declarações.
- Itabaianinha - dois reque~imentos; duas Declarações.
- Itaporanga d'Ajuda - um requerimento; uma Declaração.
- Japaratuba - um requerimento; uma Declaração.
- Laranjeiras - dois requerimentos; duas Declarações.
- Maroim - um requerimento; uma Declaração.
- Nossa Senhora das Dores - cinquenta requerimentos;
sessenta Declarações vinte e duas públicas de escrituras.
- Nossa Senhora do Socorro - um requerimento; uma De-
claração.
- Pacatuba - um requerimento; duas Declarações.
- Porto da Folha - seis reque~imentos; seis Declarações;
duas públicas formas de esc~ituras.
- Propriá - cinquenta e dois requerimentos; oitenta e duas
Declarações; trinta e quatro públicas formas de escrituras.
- Rosário - dois requerimentos; duas Declarações.
- Santa Luzia - três requerimentos; t ês Declarações.
- Santo Amaro - cinco requerimentos; cinco Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- São Cristóvão - um requerimento; duas Declarações.
- São Paulo (Frei Paulo) - treze requerimentos; quato~ze
Declarações.
- Sirirí - quatro requerimentos; três Declarações.
- Vila Nova (Neópolis) - quarenta e seis requerimentos;
sessenta e uma Declarações; uma pública forma de escritu:a.
- Regular estado de conservação.
Novembro a dezembro de 1924
- 02 maços.
Volume 708.
3 . 11. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o
3Q do Decreto nQ 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
certidão.
- Anápolis (Simão Dias) - um requerimento; uma Declara-
- 1055 -

- Aracaju - um requerimento; uma Declaração.


- Boquim - um requerimento; uma Declaração.
- Campo do Brito - vinte e quatro requerimentos; vinte e
quatro Declarações; oito públicas formas de escrituras.
- Capela - um requerimento; uma Declaração.
- Espírito Santo (Indiaroba) - um requerimento; uma
Declaração.
- Gararu - trinta e um requerimentos; quarenta e três
Declarações. Dezessete públicas formas de escrituras.
- Itaporanga d'Ajuda - um requerimento; uma Declaração.
- J aparatuba - dois requerimentos; duas Declarações.
- Laranjeiras - três requerimentos; três Declarações.
- Maroim - dois requerimentos; duas Declarações; duas
públicas formas de esc:ituras.
- Nossa Senhora das Dores - vinte requerimentos; viüte
e três Declarações; quatro públicas formas de escrituras.
- Pacatuba - um requerimento; uma Declaração; uma pú-
blica forma de escritura.
Porto da Folha - quat o requerimentos; qu:tt"O Declara-
ções.
Propriá - quatorze requerimentos; dezenove Declarações;
quatro públicas formas de escrituras; uma certidão.
- Riachuelo - um requerimento; uma Declaração.
- Rosário - um requerimento; uma Decla~ação.
- São Cristovão - dois requerimentos; uma Declaração.
- São Paulo (Frei Paulo) - oito requerimentos; oito Decla-
rações; duas públicas formas de escrituras.
- Sirirí - seis requerimentos; cinco Declarações; uma públi-
ca forma de escritura.
- Vila Nova (Ne6polis) - treze requerimentos; vinte e oito
Declarações; cinco públicas formas de escrituras.
Regular estado de conservação.
Janeiro a feverei:o de 1925.
03 maços.
Volume 709.
3.12. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o
39 do Decreto n 9 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam de
outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
certidão, extrato de escritura.
- Anápolis (Simão Dias) - um requerimento; uma Decla-
ração.
- 1056-
- Aquidaban - vinte e um requerimentos; vinte e t~ês Decla-
rações; uma pública forma de escritura.
- Aracaju - cinco requerimentos; cinco Declarações.
- Boquim - um requerimento uma Declaração.
- Campo do Brito - seis requerimentos; sete Declarações
três públicas formas de escrituras.
- Campos (Tobias Barreto) dois requerimentos; três De-
clarações; uma pública forma de escritura.
- Capela - oito requerimentos; oito Declarações; quatro
públicas formas de escrituras.
- Espírito Santo (Indiaroba) - três requerimentos; seis De-
clarações.
- Estância - um requerimento; uma Declaração.
- Gararu - setenta e dois requerimentos; noventa e duas De-
clarações; quarenta e nove púb~icas formas de escrituras.
- Itabaiana - um requerimento.
- Japaratuba - sessenta e seis requerimentos; setenta e seis
Declarações; quinze públicas formas de escritura, um extrato de
escritura.
- Laranjeiras - oito requerimentos; oito Declarações; três
públicas formas de escrituras; uma certidão.
- Maroim - um requerimento; uma Declaração.
- Nossa Senhora das Dores - dezoito requerimento; deze-
nove Declarações; seis públicas formas de escrituras.
- Pacatuba - vinte e quatro reque~imentos; vinte e seis
Declarações quatro públicas formas de escrituras.
- Porto da Folha - cinquenta e seis requerimentos; sessenta
e oito Declarações; vinte e oito públicas formas de escrituras.
- Propriá - onze requerimentos; treze Declarações; quatro
públicas formas de escrituras.
- Riachão - um requerimento; uma Declaração.
- Riachuelo - um requerimento; uma Declaração.
- Rosário - um requerimento; uma Declaração.
- Santa Luzia - um reque-imento; uma Declaração.
- Santo Amaro - dois requerimentos; duas Declarações.
- São Paulo (Frei Paulo) - dois requerimentos; três De-
clarações.
- Sirirí - cinco requerimentos; cinco Declarações.
- Vila Nova (Ne6polis) - quatro requerimentos; quatro
Declarações; uma pública forma de escritura.
Regular estado de conservação.
Março a abril de 1925.
04 maços.
Volume 710.
- 1057
3 .13. - Requerimentos de diversos municípios do Estado de
Sergipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de RegisLo
Territorial, solicitando o registro das propriedades, conforme o
Art. 3Q do Decreto, nQ 760, de 23 de janeLo de 1923. Constam
de outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
procurações, certidões.
- Anápolis - (Simão Dias) - um requerimento; uma De-
claração.
- Aquidaban - quarenta e oito requerimentos; quarenta e
sete Declarações; duas públicas formas de escrituras.
- Aracaju - dezesseis requerimentos; dezessete Declara-
ções; três públicas formas de esc:ituras; uma procuração.
- Arauá - oito requerimentos; nove Declarações.
- Boquim - oito requerimentos; oito Declarações.
- Campo do Brito - dois requerimentos; duas Declarações.
- Capela - nove requerimentos; oito Declarações; quatro
públicas formas de esc:ituras.
- Carmo (Carmópolis) - duas Declarações; uma pública
froma de escritura.
- Divina Pasto:a - cinco requerimentos; cinco Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- Espírito Santo (Indiaroba) - nove requerimentos; dez
Declarações.
- Estância - um requerimento; cinco Declarações.
- Gararu - vinte e cinco requerimentos: vinte e seis Decla-
rações; treze públicas formas de escrituras; uma procuração.
- Itabaiana - três requerimentos; duas Declarações; uma
certidão.
- larabatuba - dez requerimentos; doze Declarações; duas
públicas, forma de escrituras.
- Lagarto - dois requerimentos; duas Declarações; uma
pública fo:ma de escritura.
- Laranjeiras - um requerimento.
- Maroim - dois requerimentos; duas Declarações.
- Nossa Senho:a das Dores - três requerimentos; seis De-
clarações; uma pública forma de escritura.
- Nossa Senhora do Socorro - três requerimentos; seis De-
clarações; duas públicas formas de escrituras; duas procurações;
uma certidão.
- Pacatuba - dezesseis reque:imentos; vinte e três Declara-
- 1058 -
- Propriá - trinta requerimentos; qua~enta e uma Decla-
rações; dezessete públicas formas de escrituras.
- Riachão - um requerimento; uma Declaração.
- Riachuelo - quatro requerimentos; três Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Rosário - seis requerimentos; seis Declarações; uma
pública forma de escritura.
- Santa Luzia - um requerimento; uma Declaração.
- Santo Amaro - dez requerimentos; doze Declarações; duas
públicas formas de escrituras; uma p~ocuração.
- São Cristovão - treze requerimentos; oito Declarações;
duas públicas formas de escrituras.
- São Paulo (Frei Paulo) - trinta e quatro requerimentos;
trinta e três Declarações; onze públicas formas de escrituras.
- Sirirí - i dez reque~imentos; dez Declarações; três públicas
formas de escrituras.
- Vila Cristina (Cistinápolis) - um requerimento; uma
Declaração.
- Vila Nova (Neópolis) - sete requerimentos; sete Declara-
ções; uma pública forma de escritura.
Regular estado de conservação.
Maio a outubro de 1925.
08 maços.
Volume 711.
3.14. - Requerimentos de diversos municípios de Estado de Ser-
gipe, ao Secretário Geral, Presidente da Comissão de Registro
Territo~ial, solicitando o registro das propriedades, conforme o
Art. 3" do Decreto, no 760, de 23 de janeiro de 1923. Constam
de outros documentos, Declarações, públicas formas de escrituras,
procurações, certidão.
- Aquidaban - quatro requerimentos; três Declarações.
- Aracaju - seis requerimentos; quatro Declarações:
- Campo do Brito - dezessete requerimentos; dezessete
Declarações; duas públicas formas de escrituras
- Campos (Tobias Barreto) - um requerimento; uma De-
claração.
- Capela - um requerimento; uma Declaração.
- Divina Pastora
- 1059-

- Lagarto - tr& requerimentos; três Declarações; uma pú-


blica forma de escritura.
- Maroim - um requerimento;; uma Declaração; uma
pública forma de escritura.
- Nossa Senhora das Dores - quatro requerimentos; cinco
Declarações; cinco públicas formas de escrituras.
Nossa Senhora do Socorro - dois requerimentos; uma Decla-
ração.
- Porto da Folha - oito requerimentos; sete Declarações;
uma pública forma de escritura.
- Riachuelo - um requerimento; uma Declaração; uma
pública forma de escritura.
- Santa Luzia - um requerimento; uma Declaração.
- Santo Amaro - quatro requerimentos; quatro Declara-
ções; t~ês públicas formas de escrituras.
- São Paulo - (Frei Paulo) - dezenove requerimentos; de-
zoito Declarações; duas públicas formas de escrituras.
- Sirirí - dois requerimentos; uma Declaração.
- Vila Nova (Neópolis) - dois requerimentos; duas De-
clarações.
Regular estado de conservação.
1926 (diversos meses).
Volume 712.
• •

INTERVENÇOES.

Da Prof. a Kátia M. de Queir6s Mattoso (Universidade Católica da


Bahia).
Indaga: "Foram utilizadas fichas das fontes? Essas fichas com-
preenderiam comentários sobre o conteudo dos documentos?"

Do Prof. laciro Campante Patrício (FAFI. Marília. SP) .
Afirma que a equipe, procedendo como fez, colaborou para a pre-
servação das fontes e tambem auxiliou os futuros pesquisadores. Con-
tudo, como o referido levantamento será publicado, sugere que o mes-
mo seja acompanhado da observação:
- Estado regular de conservação.
- Péssimo estado de conservação.
Aconselha ainda que se proceda à microfilmagem dos documentos
"em péssimo estado" de conservação.

- 1060-

Da Prota Angelina N . R . Garcez (Universidade Federal da Bahia).


Faz uma indagação sobre a possivel existência de determinado tipo
de documentação referente à saida de sergipanos para o sul da Bahia.
• •
*
RESPOSTAS DAS PROFESSORAS MARISTHER MOURA VAS-
CONCELLOS, ZENILDE DE JESUS SILVA e MARIA ANDRELI-
NA DE MELO.

À Prof. a Kátia M. de Queirós Mattoso.


Dizem que na realidade não utilizaram no Arquivo Público de
Sergipe fichas para arrolamento das fontes. Os alunos de História da
Universidade, em suas aulas práticas de Metodologia da Pesquisa, no
Arquivo Público (convênio Universidade-Arquivo), utilizam um tipo de
ficha para arrolamento das fontes que lhes foi apresentado durante um
curso ministrado pela prof.a Odah Regina, patrocinado pela Universi-
dade Federal de Sergipe, comprometendo-se, esta, a enviar cópias das
referidas fichas para o Arquivo Público' assim que for concluido o le-
vantamento .
*
Ao Prof. laciro Campante Patrício.
Declaram aceitar a sugestão de que seja acrescentado uma prévia
convenção sobre:
- Regular estado de conservação (Livros e documentos que con-
servam suas características e podem ser consultados).
- Péssimo estado de conservação (Livros bastante danificados,
sendo que alguns não podem ser manuseados).
Quanto a0 processo de microfilmagem, dizem não há no Arquivo
Público de Sergipe este recurso de preservação de documentos, apesar
do grande número de documentos danificados, do seu acervo, prestes
a desaparecerem.
*
À Prof. a Angelina N. R . Garcez .
Declaram que existe no acervo do Arquivo Público de Sergipe
vasta docume~tação
DOCUMENTOS DO ARQUIVO HISTÓRICO DA
CÂMARA FEDERAL SOBRE A PROPRIEDADE
DE TERRAS (1823-1829) (*).

ADALGISA MARIA VIEIRA DO ROSARIO


da Unive;sidade de Brasília.

Nos havíamos proposto fazer um levantamento sobre a proprie-


dade de terras no Brasil durante o I Reinado, porem, englobando a
documentação anterior, isto é, desde a chegada da Família Real até
1831. A primeira parte foi feita e a documentação pode ser encon-
trada nos Amarrados de 1826 ou 1827. Quanto à documentação que
se refere aos anos de 1828-1830 e 1831, o seu levantamento ainda
não foi conc~uido.
Apresentamos aqui o resultado de uma parte do trabalho consi-
derado na sua utilidade para futuras pesquisas.
Nota-se que a documentação de 1823 e 1829 não contem refe-
rências, encontrando-se em fase de catalogação, 1824 e 1825 está en-
globado em 1826.
Para esta pesquisa contamos com colaboração da aluna Celisa
A. Medeiros Teles, aluna do curso de História da Universidade de
Brasília.
• •

1823.
Ofíicio do Procurador da Câamara de São Cristovão sobre a
separação da Província de Sergipe D'EI Rei, da Província da

(*). - Comunicação apresentada na 2\1 Sessão


- 1062-

Bahia e tambem solicita informações sobre a eleição e núme:o


de Deputados para a Assembléia.
Petição de Custódio Couto como procurador de Antônio Borges
de Almeida, que solicita dispensa do lapso de tempo para confir-
mação de sesmaria.
Petição do Tenente Francisco Antônio Malheiros, sobre posse
de terras na Freguesia de J acarepaguá .
Petição de Alberto Silva e Antônio Alves de A~aujo, que solici-
tam proteção e posse de suas terras.
Certidão de um decreto, asinado por Manoel Rodrigues Bandeira,
sobre a compra de um terreno com casas, no Largo das Laran-
jeiras (RJ) de propriedade do Sr. Venâncio José Lisboa.
Parecer nl' 8 da Comissão de Petições à petição de Isabel Maria
da Vila de São Jorge dos Ilheus, referente a distribuição de ter-
ras a colonos alemães.
Parecer nl' 8 da Comissão de Petições à petição de Israel Maria
e Luiza Joaquina, que solicitam a anulação da venda de seus
bens feita por Francisco Raposo de Vasconcelos e que lhes
cabe por herança.
Parecer sem o número da Comissão de Legislação à petição de
Alexandre de Góis Maciel e outros de São Paulo, que pedem
dispensa do lapso de tempo (prazo) para lhes ser confirmada a
carta de sesmaria a eles concedida.
Parecer nl' 43 da Comissão de Legislação sobre as ,petições de:
Antônio Tavares Correa, J oaquina Marques de Lima, Ana Mar-
ques de Lima, Joana Marques de Lima, Manoel Ma ques de
Louza, Filipe Antônio de Amaral e Manoel Afonso Vela, que
pedem dispensa do lapso de tempo para medição e demarcação
de sesmarias.
Parecer nl' 42 da Comissão de Legislação à petição dos morado-
res do Distrito de Tanque, da Comerca do Sabará, que se quei-
xam da violência da herdeira do Marechal João Carlos Xavier da
Silva Ferrão, referente à posse de terrenos.
Parecer nQ 8 da Comissão de Legislação à petição de Luiz Telles
Baneto de Menezes, que se queixa de ser perturbado na posse an-
tiga e pacífica da ilha do Bom Jesus, pelos administradores do
Hospital dos Lázaros que pretendem estabelece-lo na Ilha.
Parecer nl' 41 da Comissão de Legislação à petição de Luiza Te-
reza do Nascimento e outros que se queixam da injustiça numa
causa contra os herdeiros do B:igadeiro Felicíssimo José Vito-
rino de Souza
- 1063 -

1826.
Lata: 13.
MAÇO: 1.
Pasta: 3.

Sete petições sobre imóveis (Sesmarias).


Peticionários:
Sebastião José Barata e João Francisco Barata.
João Luiz Torres e Bento Manoel Roiz.
Francisco da Costa Alvares.
Joaquim José de Siqueira.
Luiz José do Gouveia Freire.
Manoel Ribeiro da Silva.
José Lopes Pereira.
Data: 1826.
LATA: 14.
MAÇO: 1.
Pasta: 4.

Consulta sobre Petição de José Antônio de Oliveira Guimarães so-


bre imóveis (Sesmarias).
Data: 1825.

MAÇO N'1 1.
Pasta n Q 3.
Sete petições sobre imóveis (sesmarias).
Peticionários:
Sebastião José Barata e João Francisco Barata.
João Luís Torres e Bento Manoel Roiz (Rio de Janeiro).
Francisco da Costa Alvares (São Pau!o).
Joaquim José de Sequeira (Rio de Janeiro).
Ten. C.el Luís José de Gouveia Freire (Rio de Janeiro).
Manoel Ribeiro da Silva (V. de Itapemirim).
José Lopes Pereira (Província do Rio de Janeiro).
Data: 1826.
60 fls. 132 pág. peças.

LATA: 15.
MAÇO: 1.
Pasta: S.
Ofício (faltando as últimas folhal) - signatário desconhecido) e
Petição anexa dos moradores de Jacarepaguá, sob~e questão ju-
dicial com Frades Beneditinos, com referência a imóveis (Ses-
- 1064-

LATA: 17.
MAÇO: 1.
Pasta: 1.
Ofício do Ministro do Império sobre Sesmarias.
Data: 1826.
Projeto de Lei de autoria do Dep. Batista Pereira sobre proi-
bição de queimadas de terras.
Data: 1826.
LATA: 18.
MAÇO: 2.
Pasta: 16.
Projeto de Lei do Dep. Vergueiro sobre Direito de propriedade
de Sesmarias.
Data: 1826.
LATA: 18.
MAÇO: 3.
Pasta: 1.
Três pareceres da Comissão de Legislação sobre Sesmarias.
Data: 1826.
Pasta nl,> 4. -
Petição. Imposto sobre "seges" de Aluguel (Rio de Janeiro).
Várias assinaturas.
Data: 1826.
Consulta sob~e Petição de José Antônio de Oliveira Guimarães
sobre imóveis (Sesmarias).
Data: 1825.
20 fls. 33 pág. 2 peças.
Pasta nQ 5. -
Etiqueta 374.
Ofício (faltando as últimas folhas - signatário desconhecido) e
Petição anexa dos moradores de Jacarepaguá, sobre questão
judicial com Frades Beneditinos, com referência a imóveis (Ses-
marias). Rio de Janeiro.
Data: 1824.
Etiqueta 291.
Petição do Ouvidor da Câmara do Rio de Janeiro sobre o assun-
to da Etiqueta 374 supra.
Data: 1823.
24 fls. 24 pág. 1 peça.
Pasta nQ 3. -
Etiqueta 378.
Três autóg~afos. Decretos assinados por D. Pedro I; Presidente
da Câmara; 1Q Secretário do Senado
- 1065 -

1. - Sobre Cerimônia do Reconhecimento do Herdeiro do Trono.


2. - Sobre Direito de Propriedade.
3. - Sobre Pena de Morte.
Data: 1826. 22 fls. 31 pág. 3 peças.
Sem etiqueta.
Autóg~afo sobre Taquígrafos.
1 Ofício recebido do Ministro do Impédo sobre Sesmarias.
Data: 1826.
Pasta nQ 8 . -
Justiça (sem documentos anexos) e Ofícios, sendo 2, do Minis-
tro do Império e um, do Senado, sobre o Projeto do Direito de
Propriedade.
Data: 1826.
Pasta n Q 8 . -
Projetos de Lei - Justiça.
Ofícios de Justiça - proibição para conferir título de p"oprie-
dade.
Autor: Maia.
Pasta nQ 16. -
Projetos de Lei - Terras, Imóveis em geral Proibição de quei.
madas em terras. Autor: Batista Pereira.
Direito de propriedade de Sesmarias. Autor: Vergueiro.
Data: 1826. 14 pág. 5 fls. 2 peças.
Terras, Imóveis em geral - Sesmarias.
3 pareceres da Comissão de Legislação.
6 pág. 3 fls. 1 peça.
Fala de Deputação - Deputado Clemente Pereira, ap~esentando
o Projeto sobre Direito de Propriedade.
Data: 1826.

1827.
MAÇO N 9 l.
Pasta 1/4.
Etiqueta 3.
Parecer da Comissão de Comércio Agricultura e Artes, sobre
doação de sesmaria, cancelando até que se faça o regimento das
províncias que deve abranger tambem as sesmarias.
Data: 3/7/1826.

Pasta 1/4.
Parecer da Comissão da Agricultura, indeferindo pedido de ses-
- 1066-

Pasta 1/4.
Requenmento de José Passos, sobre criação de juizes de sesma-
rias.
Data 217/1826.

MAÇO N'J 2.

Pasta 1.
Carta de sesmaria assinada por D. Jo.é Fernando de Po tugal.
Data: 26/6/1805.

Pasta 1.
Requerimento pedindo terras devo!utas em Sergipe.

Data: 1717/1827.

Ofício encaminhando a consulta de 19 de fevereiro de 1824, so-


bre a resolução tomada acerca de pertences do Padre 10ão Antônio
Alves Vieira, sobre sesmarias em te.renos concedidos ao Desem-
bargador do Paço Cláudio Pereira da Costa. Contrmérsia e~tre
os Monges Beneditinos e o S~. Desembargador do Paço.
Data: 31-5-1824.
Requerimento do Padre João Antônio Alves Vieira e out,·os que
pretendem po: sesmarias os terrer:os que se acham em poder
dos padres beneditinos (como colonos).
Requerimento de Palácio dos Santos, pedindo uma porção de
terra devoluta.
Data: 12-11-1827.

AMAR. C.
MAÇO N'l 2.
Pasta 4.
Petição de Alexandre José dos Passos Herculano (juiz de ses-
marias) reclamando da falta de leis agrárias e pedindo legislação
a respeito.
Data: 20-6-1826.

AMAR. D.
MAÇO N'l 1.
Pasta 4.
Consulta do Conselho Real da Fazenda sobre o requerimento
dos oficiais da Câmara de Vila Rica, em que pretendem que os
terrenos foreiros à mesma Câmara sej m relevados da Décim:J.
- 1067-

AMAR. B.
MAÇO N9 7.
Pasta 3.
Parecer das Comissões de Comé~cio e Fazenda ao requerimento
de Lourenço Cavalcante de Albuquerque e José Cevilho Dantas,
pedindo uma légua quadrada de terra para sesmaria.
Data: 19-6-1827.
Outros das mesmas Comissões ao requerimento de Ped. o Ribeiro
que as terras de que está de posse, por serem devolutas, bens que
a Casa do Saldanha, pretende ter domínio.
Outro da Comissão de Comércio ao requerimento de João Luis
Torres e Bento Manuel Rodrigues, que pedem terras de sesma.ias.
Outro da Comissão do Comércio e Fazenda ao requerimento
de José Lopes Pereira pedindo terras de sesmaria,
Sessão de 4-8-27.
Declaração de voto dos Srs. Cunha Matos e Queiroz Car:eira
sobre sesmarias.
Ofício da Mesa da Consciência e Ordem sobre o requerimer.to
dos moradores da Freguesia de Nossa Senhora da Escada do
Bispado de São Paulo, que pedem a demarcação do territó io
em duas léguas em círculo pa.~a servir de limites a esta fregue-
sia, Representação da Câmara da Vila de J acareí, opondo-se à
pretenção.

Sessão de 27-6-1827.
Quarta discussão do Projeto de Lei sobre Sesmarias.

Sessão de 28-6-1827
Quinta discussão ao Projeto.
Parecer da Comissão de Comércio ao requerimento de M.moel
José de A~aujo Lima, que pede dispensa do lapso de tempo para
medir e demarcar uma sesmaria, Sessão 5-7-1827,

1829.
Projeto de Lei do Deputado Bispo do Ma;anhão, determinando que
as Juntas das províncias do Império possam aforar os terrenos in-
cultos que não tenham proprietários,
Parecer da Comissão de Justiça Civil ao requerimento da Ordem
Terceira de São Francisco da Vila de Santos, que explicam a
inutilidade da rua novamente projetada, e que vai atravessar e
devassar um terreno murado de sua propriedade,
Representação da Câmara de Vila de Slfltos pedindo que se lhe
concedão para rocio da mesma vila as te'"ras de que estão de
posse as ordens religiosDs de São Bento e do C~rmo,
- 1068 -

Parecer da Comissão de Justiça Civil à rep ~esentação de vários


moradores da cidade do Rio de Janeiro e seu terno, a respeito
de posse de terras.
Parecer da Comissão de Justiça Civil ao requerimento de Ber-
nardino José de Bittencourt, Francisco Silvei~a de Matos e Antô-
nio José de Matos, sobre problemas de terras.
Requerimento do Deputado Cunha Matos:
"Requeiro que além dos autos da questão dos foros das terras
entre os habitantes da cidade do Rio de Janei o e o ilustre Senado
da Câmara, se peçam ao governo todas as consultas do Desem-
bargo do Paço, referente ao assunto".
Parecer da Comissão de Comércio, Agricultura, Indústria e
Artes, à representação da Câmara da Vila de Nova Friburgo,
em que pede providências tendentes a mandar-se concluir as ses-
o SETOR DE DOCUMENTAÇÃO DO DEPARTA-
MENTO DE HISTÓRIA DA FACULDADE DE FI-
LOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DA
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO E A PESQUISA
HISTÓRICA (*).

BETRALDA LOPES
ELISA BETH CONCETA MIRRA
EUZA ROSSI DE AGUIAR FRAZÃO
do Setor de Documentação do Departamento de
História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo.

o SETOR DE DOCUMENTAÇÃO iniciou suas atividades em


1966 com o nome de CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO HISTÓRI-
CA. Mantido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (FAPESP) até 1970, passou em 1971 para o Departamento de
História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo, com a denominação de SETOR DE DO-
CUMENTAÇÃO.
1. - FINALIDADES.
As metas primordiais constituem-se no seguinte:
1 . 1 - formação de núcleo informativo de documentação nacio-
nal e estrangeir8. sobre História do Brasil, através de intercâmbio cul-
tural entre os diversos centros de pesquisa e preservação, pela micro-
filmagem, da documentação pátria;
1 .2 - reunir e catalogar documentos e bibliografias especializa-
das de interesse geral para os estudos históricos e para o planejamen-
to de pesquisas historiográficas;

(*). - Comunicação apresentada na 311


- 1070-

1 . 3 - oferecer a todos os interessados, instrumentos de traba-


lho necessário para a reprodução de documentos encontrados em São
Paulo ou demais unidades da Federação.
Atendendo a estas finalidades o SETOR DE DOCUMENTAÇÃO
mantém 4 categorias de atividades: documentação, bibliografia, assis-
tência ao pesquisador e divulgação, procurando desenvolve-las sob a
direção e a orientação do Prof. Dr. Eurípedes Simões de Paula.
Uma das tarefas do SETOR DE DOCUMENTAÇÃO é a de for-
mar e treinar pesquisadores nas novas técnicas de trabalho científico,
para melhor enfronha-Ios nas fontes documentárias sobre História do
Brasil.
Assim setldo, a partir do ano de 1974, o SETOR DE DOCU-
MENTAÇAO vem ministrando cursos de Introdução às Técnicas e
Sistemas de Microfilmagem.
Trabalhamos com o microfilme, pois este possibilita uma infor-
mação integral do documento, alem de permitir uma consulta mais rá-
pida e segura. Nosso interesse pela microfilmagem é devido à grande
quantidade de documentos dispersos e fadados ao desaparecimento
constante dos arquivos públicos e particulares; inexistência de legisla-
ção que preserve a documentação histórica; falta de um Instituto Na-
cional de Pesquisa Histórica que fomente e incentive tal atividade e
coordene os Centros Regionais de Documenetação (1) .

2. - T~CNICA DE TRABALHO DO SETOR DE DOCU-
MENT AÇÃO (2):

Consiste na preservação, pela microfilmagem, de todos os dados


históricos. Interessa-nos as informações visuais registradas de forma
escrita, desenhlidas, pintadas, impressas, enfim, em qualquer forma em
que se empregue como receptor da informação papéis ou similares, em
formato de livros, mapas geográficos, plantas de engenharia, jornais,
manuscritos, impressos em geral, fotografias, etc.

( 1). - Boletim Informativo do Setor de Documentação do Departa-


mento de História da F.F.L.C.H. - U.S.f. São Paulo, Ano, I, n9 1,
maio-1974.
(2). - Perugorría (Carlos A. Fabra) e Teixeira (Cláudio Daniel
Lima), Curso de Introdução às Técnicas e Sistemas de Microfilmagem (apos-
tila). São
- 1071 -

2. 1 - Preparação do Documento.
Antes de realizarmos uma microfilmagem, faz-se necessário ado-
tar certas precauções, tais como:
2. 1 . 1 - análise bioquímica do papel;
2 . 1 .2 - eliminação de dobras, costuras, etc. . . que possam im-
pedir o resgast~ integral da informação através da microfilmagem.
2 .2 - Catalogação.
Juntamente com o arranjo da documentação fazemos a cataloga-
ção. Como não há uma norma pré-estabelecida, seguimos a seguinte:
2 . 2 . 1 - ordem de assunto - estabelecendo-se ao mesmo tem-
po uma identificação e categoria do assunto;
2.2.2 - ordem cronológica;
2. 2 . 3 - ordem alfabética.
2. 3 - Indexação e Codificação.
Indexação corresponde a indicar e isolar um grupo de documen-
tos em um volume maior, desde um sistema manual ao automático.
Para codificar utilizamos símbolos que resumem uma determina-
da informação.
2.4 - O Microfilme.
Utilizamos filmes com emulsão a base de halogenetos de prata
como elemento fotossensivel para a formação de micro-imagens; estes
encontram-se em suspensão sobre a base em uma camada de gelatina..
São bastante semelhantes ao filme comum, mas tem algumas diferen-
ças, como sejam: sensibilidade e poder de resolução.
Os microfilmes em geral tem baixa sensibilidade, aproximadamen-
te 12 ASA.
O poder de resolução dos microfilmes é muito alto pela sua ne-
cessidade de registrar detalhes extremamente finos; o seu poder de re-
solução chega a 500 linhas por milímetro linear.
2 .5 - Equipamentos de microfilmagem.
2 . 5 . 1 - Microfilmadoras
Há dois sistemas de aparelhos: planetário e rotativo. O primeiro
é aquele em que o filme e o original mantem-se estáticos e no mes-
mo plano no momento da sensibilização do filme; enquanto que no
segundo o filme
- 1072-

2.5.2 - Leitores.
O leitor é ú aparelho que nos permite a leitura do documento mi-
crofilmado; o mesmo amplia o fotograma através de um jogo de lentes,
projetando a imagem num jogo de espelhos até o Ecram (visor) do
leitor.
2 . 5 . 3 - Processadoras.
O processamento dos microfilmes (revelação) pode realizar-se de
três formas: manual, semi-automática e automática.
2 . 5 .4 - Copiadoras.
O microfilme pode oferecer cópias fotográficas, ampliados ou não,
ou ser reproduzido em todo o sistema em que outro filme possa ser
copiado.
2.6 - Arquivamento.
A duração de um microfilme pode ser calculada em 300 anos
aproximadamente. Para que isto aconteça, devemos ter em conta cer-
tas precauções no arquivamento dos mesmos:
2. 6 . 1 - temperatura - de 19 a 21 graus C. e a umidade re-
lativa do ar 50%. Para se conseguir um ambiente ideal é aconselhavcl
um equipamento de ar condicionado e desunificador.
2. 6 . 2 - acondicionados em arquivos de aço.
2 . 6 . 3 - os microfilmes devem estar fora da caixa metálica, na
qual vêm originalmente embalados.
2 . 6 . 4 - os carreteis devem ser de plástico e perfurados, a fim
de permitir a ventilação dos filmes arquivados.
2. 6. 5 - no caso de rolos, devem estar em caixas de papelão
de baixo teor de enxofre, pois a presença excessiva deste elemento
prejudica a emulsão, como acontece no papelão comum.
2 . 6 . 6 - uma vez por ano, pelo menos, deve ser feita a limpeza
dos filmes para prevenir, ao máximo, o surgimento de fungos .

3. - PROGRAMAÇÃO DE ATIVIDADES DO SETOR DE
DOCUMENTAÇÃO - biênio 1974/76.

3. 1 - Museu das Bandeiras (Goiás) - período imperial -


em continuidade (3), sendo realizado pela Universidade Federal de
Goiás, com orientação e treinamento de pessoal pelo SETOR DE DO-
CUMENTAÇÃO que assim cumpre uma de suas metas: formação de
núcleos regionais de pesquisa histórica;
(3). - Ramos (Dulce H. A. Pessoa) e Glezer (Raquel), Notícia sobre
a Documentação do Museu das Bandeiras (Goiás), in "Revista de História",
n 9 76, pp. 461-476, São
- 1073-

3.2. - Jornal Fanfulla - 1893/1964 - (única coleção com-


pleta existente);
3.3 - Jornais, leis e decretos da Paraiba - 1926/30 - con-
cluido);
3.4 - Arquivo Histórico Municipal de São Paulo - total apro-
ximado de oito milhões de documentos, a partir do século XVI (em
fase de Convênio);
3.5 - Vale do Paraiba - arquivos de Câmaras e Cartórios das
cidades: Areias, Bananal, Cachoeira Paulista, Cruzeiro, Cunha, Guara-
tinguetá, Lorena, Queluz, São José do Barreiro e Silveiras - como
complemento do levantamento gráfico da arquitetura rural e urbana
realizado pelo Instituto do Patrimonio Histórico e Artístico Nacional
- setor São Paulo.
3.6 - O SETOR DE DOCUMENTAÇÃO inclui, sempre que
possivel, dentro de suas atividades a microfilmagem de documentos pa-
ra trabalhos científicos de pesquisadores e professores universitários,
desde que os mesmos venham a ampliar e complementar o acervo desta
instituição.
3.7 - Santos - levantamento das fontes históricas (em conti-
nuidade.)

4. - ARROLAMENTOS.
4. 1 - Santos (SP) - Delegacia da Receita Federal (4).
O Decreto 63.659 de 20. 11 . 1968 transformou a Direção Geral
da Fazenda Nacional em Secretaria da Receita Federal, extinguindo as
alfândegas, cuja ordem remonta aos tempos coloniais, tendo por função
arrecadar os direitos régios.
À Alfândega de Santos compete:
- fiscalização da entrada e saida das mercadorias nos armazens
internos e exte;:nos da alfândega, entrepostos e quaisquer depósitos de
mercadorias sujeitas a direitos;
- o processo dos despachos de reexportação, baldeação e trân-
sito;
- o despaoho marítimo;
- o balanço dos armazens internos e externos, entrepostos e a
liquidação da responsabilidade dos seus encarregados;
- superintendência de todo o serviço denominado das capata-
zias. Enfim, a alfândega é uma estação de arrecadação dos impostos
de importação, de navegação e quaisquer outros que de futuro se esta-
beleçam e dependam de lançamento.
(4. ). - Trabalho elaborado pela Profa Betralda Lopes, constante do
Projeto "Levantamento das Fontes Históricas da Baixada Santista".
- 1074-

o arquivo da Delegacia da Receita Federal (Praça da República,


s/n), não é organizado e sua documentação encontra-se em péssimo
estado de con~rvação; é falha por perdas e "queimadas" sucessivas,
alem do mais, com a criação do Museu do Ministério da Fazenda (Rio
de Janeiro), alguns documentos foram enviados para o mesmo.
Nosso trabalho juntp a Delegacia da Receita Federal, só foi pos-
sivel graças ao assessoramento técnico do SETOR DE DOCUMEN-
T AÇÃO e a colaboração das pós-graduandas Maria Tereza Carvalho
Ferreira e Suely Malho de Abreu Campos; dos funcionários da Divisão
de Biblioteca da Delegacia da Receita Federal e o empenho de seu di-
retor administrativo Dr. Guilmar Sampaio.

Relação de Documentos:
I. - Guard.amoria - manuscritos e encardenados, tendo por
média de 100 a 120 páginas cada volume.

A. - Posto Fiscal.
a). - Posto Fiscal n 9 1 - 1.944, 1945 (dois volumes), 1946
(dois volumes), 1950, 1953, 1954, 1959 (qu:ttro volumes),
1960 (dois volumes), 1962 e 1963.
b). - Posto Fiscal n9 2 - 1945, 1949, 1951, 1953 (dois volumes),
1955 (dois volumes), 1957, 1958,1959,1961,1962 e 1964.
c). - Posto Fiscal nO 3 - 1948, 1953, 1954, 1955, 1956, 1957 e
1960.
d). - Posto Fiscal n 9 4 - 1943, 1945, 1950, 1953, 1956, 1958,
1959, 1960 e 1962.
e). - Posto Fiscal nO 5 - 1944, 1945, 1949, 1951, 1953, 1958,
1959, 1960, 1961, 1962 e 1964.
f). - Posto Fiscal nO 6 - 1944, 1951, 1955, 1958, 1959, 1962 e
1963.
g). - Posto Fiscal n9 7 - 1948, 1951, 1953, 1955, 1957, 1958,
1959, 1962 e 1966.
h). - Posto Fiscal nO 8 - 1944, 1945, 1948, 1951, 1954, 1955,
1957, 1958, 1959, e 1962.
i). - Posto Fiscal nO 9 - 1944, 1945, 1946, 1948, 1951, 1953,
1955, 1957, 1959, 1962 e 1963.
j). - Posto Fiscal n 9 10 - 1958. 1960, 1961, 1963 e 1964.
k). - Posto Fiscal de Itapema - 1958 e 1961.
B. - Protocolo.
a). - Geral - 1926, 1932, 1938, 1940,
- 1075 -

1948 (quatro volumes), 1949 (cinco vo'umes), 1950 (dois


volumes), 1952, 1953 (t ês vo'umes) e 1958.
b). - Oficios - 1943, 1944, 1949, 1951 (dois volumes.
c). - Processos - 1938, 1940, 1941, 1948, 1957 e 1960.
d). - Papeis Diversos - 1930, 1935 (dois volumes), 1942
(dois volumes), 1946, 1951, 1952, 1953 (três volumes),
1954 (dois volumes), 1955 (quatro volumes), 1956, 1957,
1958 (dois volumes), 1959 e 1960.

c .. - Funcionários.

a). - Lancha de Ronda - 1942, 1943, 1944, 1945, 1946, 1947,


(dois volumes), 1948 (dois volumes), 1949 dois volu-
mes), 1950, 1952, 1955 (três vo'umes), 1956 e 1964.
b.) - Livro de Endereço - sem data.
c). - Livro de Ocorrencias dos Funcionários Militares - 1949.
d). - Livro de Ponto - 1928, 1931, 1939 (dois volumes),
1943, 1944, 1945, 1948, 1949 (tres volumes), 1951 (dois
volumes), 1962 e 1963.
e). - Livro de Serviços - 1937/1942 e 1943.
f). - Oco-rências - 1940, 1943 (dois volumes), 1944, 1945,
1946, 1948 (dois volumes), 1953 (dois volumes), 1954
(dois volumes), 1956 (três volumes), 1957, 1958, 1959,
1960 e 1961.
g). - - Rancho dos Marinheiros - 1943 (quatro volumes),
1944, 1945 (dois volumes), 1948 e 1949.
D. - Diversos.
a). - Assinatura dos despachantes aduaneiros - sem data.
b). - Cabotagem - 1938, 1945, 1949, 1951 e 1958.
c). - Certificado de taxa de vapores - sem data.
d). - Cópia de processos e oficios dirigido à Campanha Docas
de 1923 a 1937 - total de 14 volumes.
e). - Despachos de importação - 1954.
f). - Entra de vapores - 1937, 1942, 1944, 1945, 1948, 1949,
1951 e 1956.
g). - Folha de desca:-ga - 1941, 1945 e 1949.
h). - Livro do Guarda-mor - 1921 a 1930
- 1076-

1). -Remessa de licença ao Banco do Brasil - de 1946 a


1952 - total de 11 volumes.
m). - Remessa de 3as. vias de exportação à Companhia Docas
- 1944, 1952 e 1958.
n). - Remessa para vapores - 1941, 1945 (dois volumes), 1947
(dois volumes), 1949 e 1957.
o). - Termos de visita - 1957, 1963 e 1964 .


11. - OFICIOS - manuscritos e datilografados - arquiva-
dos em pastas contendo de 80 a 100 folhas, cada uma.

N9 de ordem: Ano:

3 1901
4 1902
10 1904
s/n\>, 5, 12 1905 (três volumes)
16 1906
2, 22 1907 (dois volumes)
394 1912
59, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67 1913 (onze volumes)
68, 70, 79,
78, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93 1914 (vinte volumes)
95, 96, 97, 98, 99, 101, 102, 103,
10, 113 e 114
116, 117, 118, 119, 120, 121, 122 1915 (quinze vo~umes)
123, 125, 126, 121, 128, 131, 132
139, 140, 141, 142, 43, 144, 145
146, 147, 148, 149, 150, 151, 152 1916 (dezenove volumes)
153, 154, 155, 156 e 196
130, 163, 166, 167, 168, 169, 170 1917 (quinze volumes)
171, 172, 174, 175, 176, 177, 178
e 179
69, 197, 198, 199, 200, 101, 202 1918 (dezesseis volumes)
203,204" 205, 206, 207, 208, 210
e 326
223, 224,225,226, 227, 228, 229 1919 (vinte e dois volumes)
230,231,232,233,234,235,237,
238, 239, 241, 244, 246, 248,
249, 250,
247, 261, 262, 263, 264, 265, 267 1920
268, 270, 271, 272, 273, 275, 276,
277,279,280,281 e 282,
- 1077-

NIJ de ordem: Ano:


297, 301, 302, 303, 304, 305, 306 1921 (vinte volumes)
307,308,310, 311, 31~ 31~ 320,
329, 330, 331, 332, 333 e 352.
322, 334, 335, 336, 337, 338, 339 1922 (vinte e quat~o volumes)
340, 341, 342, 343, 344,345,347,
349, 350, 351, 353, 354, 355, 357,
358, 384 e 386.
337, 37~ 373, 37~ 37~ 37~ 378 1923 (vinte e um volumes)
380, 381, 382, 383, 391, 393, 395,
399, 400, 401, 412, 413, 414 e
415.
371 e 411 1924 (dois volumes)
443 e 444 1925 (dois vo:umes)
269 e 459 1926 (dois volumes)
630 1933

1Il. - FROCURAÇÃO - manuscritos e datilografados - arquiva-


dos em pasta com 50 a 80 folhas, cada uma.

N" de ordem: Ano:


15 1905
41 e 42 1909 (dois volumes)
49 e 50 1910 (dois volumes)
56 e 57 1912 (dois volumes)
83 e 84 1913 (dois volumes)
115 1914
138 1915
23, 233, 186, 187, 188, 189, 190
e 192 1917 (oito volumes)
191, 220, 221 222 1918 (quatro volumes)
251, 252, 253, 254, e 256 1919 (seis volumes)
287, 288, 289 e 290 1920 (quatro volumes)
328 1921
364, 365, 366 e 367 1922 (quatro volumes)
379,390,406,407,408,409 e 410 1923 (sete volumes)
428, 430, 460 e 461 1924 (quatro volumes)
480 e 481 1927 (dois volumes)
498, 499 e 521 1928 (três volumes)
522, 523, 524, 525 e 526 1929 (cinco volumes)
542 e 543 1930
- 1078-

IV. - PORTARIA - manuscritos e datilografados - arquiva-


dos em pastas com 80 a 100 folhas. cada uma.
N'l de ordem: Ano:

5 e 6 1903 (dois volumes)


13 e 14 1905 (dois volumes)
19 1907
35 1909
47 e 48 1910 (dois volumes)
71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 80, 81 e
82 1913 (dez volumes)
106, 107,108,109, 111 e 112 1914 (seis volumes)
134 e 137 1915 (dois vo:umes)
157, 158, 159 e 160 1916 (quatro volumes)
128, 180, 181, 183 e 184 1917 (cinco volumes)
212,213, 214, 215, 216, 217,218
e 231 1918 (nove volumes)
185, 2442, 243, 247 e 283 1919 (cinco volumes)
284, 285 e 286 1920 (três volumes)
312,313,317,318,321 e 323 1921 (seis volumes)
359, 360, 361, 362 e 363 1922 (cinco volumes )
388, 402, 403, 404 e 405 1923 (cinco volumes)

V. - TELEGRAMAS - recebidos e expedidos - arquivados em


pastas com 100 a 150 cópias, cada uma.

NQ de ordem: Ano:

9 1903
24 1905
44 1909
51 1910
55 1911
58 1912
124 1915
162 1917
258 1918
257 1920
369 1922
432 1924
482, 483 e 484 1927 (três volumes)
503 e 504 1928 (dois volumes)
518 1929
539 e 566 1930
- 1079 -

VI. - PROCESSOS - acondicionados em pacotes - a partir


de 1930 até 1974. Em cada armário há uma média de 150 pro-
cessos.
N<! de ordem: Armário:

1734 a 1913 37
1914 a 2096 27
2097 a 2260 18
2261 a 2411 19
2412 a 2540 44
2541 a 2799 39 e 40
2800 a 2917 35
291R a 34

Obs.: processos estritamente confidenciais - armário 20 em


um total de 168 volumes .

VII. - NOTAS - acondicionadas em pacotes contendo em
média 60 notas, cada um.
1. - Notas de Importação.

Ano: armário: quantidade:


1964 11 15 prateleiras com 9
pacotes cada uma
1965 26
1966 23
1967 32
1968 29
1969 31
2. - 2as. vias de Notas Fiscais.
Ano: armário: quantidade:
1963 a 1965 27 15 p:ateleiras com 9
pacotes cada uma
1966 a 1967 28
1968 15
1969 13
1970 8
1971 12
3. - Nonas Vias.
Ano: armário: quantidade:
1970 7 60

- 1080-

VIII. - BALANCETES DE COLETORIAS - acondicionados


em pacotes - a partir de 1965 a 1974.

Coletoria: Armário: quantidade:


Guarujá 30 72 volumes
Cubatão 7 20 volumes
Eldorado Paulista 7 8 volumes
Caraguatatuba 7 12 volumes
Iguape 7 12 volumes
Itanhaém 7 19 volumes
Itarirí 7 2 volumes
Juquiá 7 7 volumes
J acupiranga 7 4 volumes
Pedro de Toledo 7 4 volumes
Registro 7 4 volumes
São Vicente 7 16 volumes

IX. - DIVERSOS.
A. - Encadernados.
a). - Autógrafos de Autoridades - ano de 1913.
b). - Autógrafos de Consulares - anos de 1914 e 1919 (dois
volumes) .
c). - Livro da Polícia Fiscal - ano de 1929 - vencimentos.
d). - Livro de Pensionistas - 32 volumes - a partir de 1930
vencimentos.
e). - Livro de Ponto - a partir de 1906 - total de 50 livros
- armário 24.
f). - Livro de Revelia - ano de 1962.
g). - Livro de Vencimentos dos Aposentados - a partir de
1930 - total de 23 volumes.
h). - Livro dos Fiscais Aduaneiros - sem data - vencimentos.
B. - Avulsos.
a). ....:... Documentos da Receita -a partir de 1967 - armá:io 25
- total de 118 pacotes.
b). - Folhas de Pagamento - de 1921 a 1949 - total de 78
pacotes. As folhas do pessoal administrativo encontram-se
de Pessoal - 1Q andar (a partir de 1950) .


X. - DOCUMENTOS ENCAMINHADOS AO MUSEU DO MI-
NISTÉRIO DA FAZENDA.
a). - Livro de engajamento de guardas - ano 1900.
b). - Relação de pessoal marítimo - ano 1910/11.
- 1081 -

c). - Assentamento oficiais aduaneiros - ano 1900.


d). - Folha de pagamento do pessoal marítimo de 1908 a 1913.
e). - Contribuições para o Montepio dos Empregados da Fa-
zenda - período de 1893 a 1899.
f). - Assentamentos de Militares - anos: 1911, 1920, 1921,
1923, 1924, 1926, 1927, 1928, 1932 e 1934.
g). - Pastas contendo Decisões Ta:ifárias sobre a Indústria Tex-
til - período de 1911 a 1928.
h). - Processos dos anos de 1918 a 1932.
i). - Portarias dos anos: 1907, 1908, 1909, 1910 e 1911.
j). - Telegramas dos anos de 1899 e 1900.
k). - Folha de Pagamento da Guardamoria - ano de 1901 a
1907.
I). - Folha de Pagamento de Pensionistas - ano de 1928.
m). - Ofícios - anos: 1906, 1938 e 1939 .


XI. - BIBLIOTECA - composta de 1628 ob:as; especializa-
das em legislação.
Apreciação - documentação valiosa para um estudo das
decisões tarifárias, contidas em suas coleções de
Portarias e Ofícios. Alem do mais, através da Co-
leção de Procurações tem-se uma idéia da praça
come.-cial santista . O acervo da Guardamoria é
de suma importância, visto ser um cargo já extin-
to e ao qual competia o serviço externo, ou seja,
de dirigir, ativar e fiscalizar o desembarque ou
descarga, carga ou embarque de mercadorias, co-
mo tambem de fazer guarda das costas, praias, en-
seadas e mares territoriais. Deve-se ressaltar a do-
cumentação referente as legislações alfandegárias,
sobretudo as taxações sobre o algodão e café.
4.2. - São Luis do Paraitinga (SP) - Arquivo Histórico do
Museu Oswaldo Cruz. (5).
A catalog:J.ção da documentação administrativa da Câmara de
São Luis do Paraitinga dá início ao projeto de levantamento do-
cumental do Vale do Paraiba (SP), estabelecido entre o Instituto do

(5). - Convênio IPHAN-MEC - 4(> Distrito de São Paulo e Setor


de Documentação do Departamento de História da F. F . L . C . H . - U. S . P .
(Trabalho em realização pelos funcioná:-ios do IPHAN: Jaelson Bitran Trin-
dade e Maria Aparecida Paiva de Paula e pelos funcionários do S. D .: Miriam
L. M. Leite e Carlos G. F. Cerqueira; e microfilmagem pelo funcionário
Carlos A. F. Perugorría).
- 1082 -

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (4 9 DisLito - SP)


e o Setor de Documentação do Departamento de História da
Faculdade de Filo,ofia, Letras e Ciências Humanas da Universi-
dade de São Paulo. Este projeto tem como objetivos: inventariar,
classificar e catalogar as fontes primárias municipais das cida-
des da região, acompanhando os levantamentos mét~ico-arquite­
tônicos e fotog áficos da arquitetura urbana e lUral, re:llizados
pe!o Conselho de Defesa do Patrimô.lio Histórico, Artístico, Ar-
queológico e Turístico do Estado de São Paulo.
O convênio estabelecido visa preservar e facilitar a con-
sulta da documentação desses arqUIvos de suma impo tância para
a reconstituição da história nacional, e especialmente contribuir
para o eotudo da economia e da sociedade cafeeira.
A catalogação da documentação administrativa de São Luis
do Paraitbga do Museu Oswaldo Cruz está sendo re ..llizada no
SETOR DE DOCUMENTAÇÃO e, até o momento presente,
acha-se cO.lcluída a organização dos livros de câmara (total de
193) correspondendo a 12 u ..idades de assuntos, como segue:
I. - CARGOS PUBLICOS.
1.1 - Uzanças 1809-1828.
I. 2 - Termos de Posse 1828-1880.
11. - ENTERRAMENTOS (Óbitos e sepu1tu~as).
10 livros 1877-1918.
III. - FAZENDA.
A. - Contabilidade.
A. 1. - Correição geral das contas da Câmara.
1 livro 18)0-1827.
A. 2 - Receita e Despesa da Câmara
14 livros 180J-1911.
A. 3 - Contas do Procurado~ (Rascunho).
9 livros 1810-1916.
B. - Tributação.
B. 1 - Indústria e Comércio (Licenças, Aferições, Açougue,
Indústrias e Profissões, Engenhos de Cana).
8 livros 18C6-1917.
B. 2 - Averbamento
1. livro 1815-1816.
B. 3 - Predial (Décima Urbana, Portas e janelas, Predial,
Taxa d'água).
7 livros 1840-1914.
B. 4 - Municipais (licenças, patentes, subsídios, ter-as, pe-
- 1083 -
IV. - INSTRUÇÃO PÚBLICA.
A. - Livros de Frequência escolar (lI> Grau).
12 livros 1888-1910.
B. - Exames
1. livro 1887-1896.
C. - Matrículas (lI> Grau, Escola Intermédia).
5 livros 1888-1898.
D. - Recenseamentos
3. livros 1896-s/d.
V. - IMPRENSA (Emp~esas Tipográficas) .
1 liv,-o 1874-1918.
VI. - JUSTIÇA .
. - Processo Criminal (Livros de Sumário de Querelas e
Denúncias) .
2 livros 1780-1821.
B. - Penali!ades
1 livro 1790-1844.
VII. - LEGISLAÇÃO.
A. - Ordenações (Filipinas).
2 livros 1643.
B. - Provimentos Gerais.
1 livro 1816.
C. - Posturas Municipais.
5 livros 1831-1868 sendo 2 livros si d) .
VIII. - MILITARES.
A. -.Alistamentos.
6 livros 1875-1938.
B. - Revisão.
1 livro 1875-1882.
IX. - NATURALIZAÇÃO.
1. livro 1882-1888.
X. - POLíTICA.
A. - Eleições.
A. 1 - Atas I (locais, ge-ais, provinciais e eleições de elei-
to:'es) .
8 livros 1842-1881.
A. 2 - Atas II (secções eleitorais).
13 livros 1881-1930.
A. 3 - Assinaturas.
7 livros 1881-1930.
B. - Eleitores.
B. 1 - Qualificação.
10 livros 1876-1904.
B. 2 - Lançamentos.
- 1084

B. 2.1. - Gerais.
6 livros 1876-1904.
B. 2.2. - Seccionais.
12 livros 1892-1904.
B. 3 - Recursos
1 livro 1847-1875.
B. 4 - Títulos.
1 livro 1890-1891.
XI. - TERRAS (Meações, Carta de Data, Arrendamento).
3 livros 1812-1910.
XII. - VEREANÇAS.
A. - Atas.
A. 1 - livro do Tombo.
1 livro 1769-1852.
A. 2 - Termos de Vereança.
3 livros 1776-1829.
A. 3 - Atas.
19 livros 1829-1922.
B. - Deliberações e Mandados.
2. livros 1777-1885.
C. - Correição (Almotaceria).
1 livro 1777-1833.
D. - Arrematações de Contratos.
5 livros 1794-1913.
E. - Registros Gerais (Ofícios, leis, dec etos, alvarás, p;o-
visões).
6 livros 18J6-1917.
Obs: Essa parte da documentação catalogada (livros) está
sendo microfilmada e será posta li disposição dos pesquisadores
interessados.
Quanto à catalogação da documentação avulsa (cerca de
3.0)0 documentos), está em sua fase final de organização e pces-
tes a ser microfilmada.
Afora a documentação administrativa (livros e avu'sos), con-
tem ainda o documentário histó ico de São Luís do Paraitinga
(sendo organizado): fotos, coleções de jornais, partituras musicais,
associações assistenciais, folclore t anotações) e instituições cul-
turais.
4.3 - Documentação Notarial de São Luís do Paraitinga
(SP) microfilmada, tendo um total de 14 rolos de mi-
crofilmes (cerca de 8.900 foto gramas ) (6).

(6). - Idem (Trabalho executado pe!o representante do IPHAN: Jael-


son Britan
- 1085 -

CARTÓRIO DO 2" OFICIO (Processos):


Rolo n" 1: Pacote n" 5 (documentos 70 a 90); anos de 1809
a 1819.
Rolo nQ 2: Continuação do Pacote n Q 5 (documentos 79, foI.
17); Pacote n Q 6 (documentos 91 a 113); anos de 1818
a 1820.
Rolo n" 3: Continuação do Pacote n" 6 (docum:nto 94).
Rolo n" 4: Continuação do Pacote nQ 6 (documentos 112);
Pacote n Q 7 ( documentos 114 a 13 7); anos de 1821 a
1825.
Rolo nQ 5: Continuação do Pacote nl' 7 (doc. nl' 137, foI.
53); Pacote nl' 8 (documentos 138 a 152); anos de
1825 a 1827.
Rolo nQ 6: Continuação do Pacote n\l 8 (doc. 148, foI. 27);
Pacote n\l 9 documentos 153 a 165); anos de 1828 a 1829.
Rolo nQ 7: Continuação do Pacote nl' 9 (doc. n Q 157); Pa-
cote n Q 10 (documentos 166 a 179); anos de 1829 a
1831.
Rolo nQ 8: Continuação do Pacote n Q 10 (doc. n Q 170, foI.
24); Livro Indice dos Processos; anos de 1790 a 1974.
CARTÓRIO DO lQ OFICIO (Inventá ios, Arrolamentos
e outros):
Rolo nQ 8: Continuação; anos de 1791 a 1795.
Rolo n Q 9: Anos de 1791 a 1795 (continuação).
Rolo n" 10: Anos de 1796; ano de 1797; ano de 1798; ano
de 1799.
Rolo nQ 11: Ano de 1800; ano de 18Jl; ano de 1802.
Rolo nQ 12: Ano de 1802 (continuação); ano de 1803; ano
de 1804.
Rolo nQ 13: Ano de 1805; ano de 1806.
Rolo n Q 14: Ano de 1827; ano de 1829; ano de 1830; ano de

. .. ..
1846 (só o lQ Processo).

INTERVENÇOES .

Do Prof. Emmanuel Franco (UFSe).

Afirma:

"Há
- 1086-

sapareceram. :s um crime contra a Nação. Destroem os planos e as


realizações, repetindo-se os mesmos erros que anteriormente.
:s necessário acabar com isso."

Do Prof. Rufino Porfírio de Almeida (UFSC).
Pergunta:
"1.°). - Existe relação por área, Estado ou assunto, dos micro-
filmes e qual é a técnica usada para o arquivo, guarda e conservação
dos mesmos?
2.°). - Possui esse Setor de Documentação alguma publicação
ou comunicação?
3.°). - O "leitor" da micro-ficha, caso apresentado de um livro
de 208 folhas, imprime cópia ou é só "leitor"?"

Da Prota Kátia de Queirós Mattoso (UC. Salvador) .
Indaga:
"1.0). - Se o Setor de Documentação possui um serviço de
empréstimos de microfilmes?
2.°). - Qual o critério de seleção dos documentos para micro-
filmagem?"
• •

RESPOSTAS DA PROFESSORA BETRALDA LOPES.

Ao Prof. Emmanuel Franco.


"Exatamente devido à sistemática de "queima" de arquivos é que
o Setor de Documentação vem desenvolvendo um trabalho intenso e
exaustivo na preservação da documentação histórica existente em ar-
quivos públicos e particulares.
Nosso objetivo nos Encontros e Simpósios é exatamente falar so-
bre a existência do Setor de Documentação, convidando os colegas a
se interessarem pela preservação dos documentos regionais e responder
a qualquer dúvida sobre montagem, equipamento e organização de nú-
cleos regionais de microfilmagem. Para isso nos colocamos à inteira
disposição para prestação de informes, como tambem solicitamos troca
de informações para a montagem de um Banco de Dados junto ao Se-
tor de Documentação."

- 1087-

Ao Prof. Rufino Porfírio de Almeida.


1.0). - Quanto à primeira pergunta não existe uma relação por
área, Estado ou assunto. O Setor de Documentação é aberto a todas
as áreas, Estados e assuntos.
A técnica utilizada para arquivo é a seguinte: - há primeira-
mente uma cat:llogação segundo a ordem de assunto (identificação e
categoria do documento), ordem cronológica e alfabética.
A guarda e conservação se faz em sala com aparelhagem apro-
priada com temperatura de 19 a 22°C, arquivos de aço, caixas espe-
ciais de papelão com um mínimo de enxofre e espaço para ventilação
necessária para preservação, alem de limpesas anuais com camurça e
eter, alem de sab sem cera para evitar os efeitos químicos da meSllla.
2.°). - Respondendo à segunda pergunta, esclarecemos que o
Setor de Documentação possui Boletins anuais de divulgação de nos-
sos trabalhos e que prometemos enviar-lhe cópias.
3.°). - À terceira indagação, esclarecemos que apenas divulga-
mos como se faz um processo de microfilmagem. Esclarecemos que
alem da micro-ficha apresentada, lidamos com rolos de 16 mm, 35
mm, 70 mm, r. 105 mm, com "cartão janela".
Quanto ao "leitor", ele permite a leitura do documento, amplia
o fotograma através de lentes, projetando a imagem num jogo de es-
pelhos. Podemos tambem tirar cópia dos documentos microfilmados,
pois há copiadoras de microfilmes em que um filme poderá ser co-
piado como outro qualquer, oferecendo cópias fotográficas ampliadas
ou não."

À Profa. Kátia de Queirós Mattoso.
"O Setor de Documentação tem, como uma das sua finalidades,
o intercâmbio das experiências e técnicas adquiridas entre pesquisado-
res das várias áreas de Ciências Humanas, assim o critério de seleção
de documentos inexiste, pois tudo é uma fonte documental para a His-
tória.
Ao mesmo tempo, o Setor de Documentação tem como meta o
fim do amadorismo e do individualismo na Pesquisa histórica. Por is-
so emprestamos não só microfilmes, como tambem maquinário neces-
sário para a utilização dos mesmos e técnica. Aos trabalhos de pes-
quisa a serem realizados em qualquer ponto do país. - Esse é o
nosso objetivo, por esta razão aqui estamos e nos colocamos à dispo-
sição dos interessados. Basta um contacto direto com o Setor de
Documentação, ou solicitação por escrito ao Diretor do Setor - Pro-
fessor Eurípedes Simões de Paula."
AS FONTES PARA O ESTUDO DO ESPORTE NO
BRASIL, NO SÉCULO XX (*)

J.S.WITTER
do Departamento de História da Universidade de
São Paulo

"Portanto, pouco nos surpreendemos que fosse Aldous Hux-


ley, o intelectual mais resolutamente retirado do mundo, que ti-
vesse celebrado no esporte 'uma das descobertas maiores dos tem-
pos modernos'. Ainda menos que Paul Valery tivesse declarado:
'Lastimo pertencer a uma geração que substimou o esporte' e gra-
vemente tivesse empreendido demonstrar que 'as regras impostas
aos jogos de espírito são parentes próximos daquelas impostas
aos jogos de estádio'. Para ele como para todos aqueles que ten-
tam manter-se nas margens da vida, êsse 'carnaval estranho', o
esporte, visto de longe, aparecia como um meio de simulação de
suprema eficácia: a atividade sem a ação, o último refúgio em
suma, da não participação."
(George Magnane, Sociologia do Esporte).

O centro de nossas atenções atuais é o estudo do Esporte no


Brasil no decorrer do século XX. Parece-nos que estudar o esporte
brasileiro, em especial o FUTEBOL, é estudar, de fato, o povo brasi-
leiro.
Embora pretendendo ser objetivo e manter a objetividade não
creio que poderemos, sempre, dixar de nos envolver quando da aná-
lise daquilo que nos apaixona. ~ dificil não se interpenetrar pois se
"em toda experiência da física, o experimentador faz parte
do sistema experimental, o observador de um fato social é simul-
taneamente sujeito e objeto do processo de observação" (1).

(*). - Comunicação apresentada na 1\1 Sessão de Estudos, Equipe D, no


dia 2 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
1. - Cf. Georges Magnane, Sociologia do Esp ?rte. Editora Perspectiva.
São
- 1090-

Quando se pretende estudar o século XX não se pode ignorar o


fato de <;ue o esporte em geral e o futebol em particular ocupam po-
sição de realce no mundo contemporâneo. Mais ainda se levarmos em
consideração que o Esporte,

"enquanto fenômeno social deve contar entre o que se tem


qualificado com a abominável expressão de tempo livre, que in-
dica tanto a dependência dessa esfera com respeito ao mundo do
trabalho quanto sua importância" (2).

Mas, se hoje, o esporte e o futebol como fenômeno de integração


de massa é uma realidade inconteste, sua difusão, principalmente como
preenchimento das horas de lazer, se prende a uma determinada etapa
do desenvolvimento das forças produtivas (3). Correspondendo a uma
fase em que, pelo aprimoramento da máquina o tempo livre do homem
aumentou, e esse aumento correspondeu uma diminuição o da jornada
de trabalho, e com esta o prolongamento dos fins de semana, a con-
sequente possibilidade e porque não dizer necessidade de preenchimento
do espaço vazio, o que iria criar condições para o aparecimento do
Esporte (4).
Deixando o âmbito mais amplo e restringindo a nossa análise ao
Futebol vemos que o país de origem do futebol moderno enquanto es-
porte de massas é a Inglaterra (5).

"Em meados do seculo XIX se inicia lá a transição da ex-


ploração extensiva para uma exploração intensiva do trabalho".

Já em 1863 criam-se em Londres. com a fundação da Football


Association, as premissas organizatórias que permitiriam o caminhar
rumo à "democratização" do jogo, que fora privilégio dos elementos da
juventude do estado feudal e burguês, livres do trabalho físico e que
estudavam nas escolas públicas e nas Universidades. Esses jovens ha-
viam desenvolvido o futebol, a partir de um jogo popular difundido na
Idade Média, que salvo nos torneios carnavalescos, havia cai do no es-
quecimento e se tomara mesmo relíquia do passado (6). As Cambridge
Rules criadas na Universidade do mesmo nome, foram adotadas quase

2. - Cf. Theodoro W. Adorno, Zum VerhiUtnis von Individuum und


Gesel sclzaft heute, Bad Hamburg-Berlin, Zurich, 1957, p. 17. Apud Gerhard
Vinnai, EI futbol como Ideologia, Siglo Veinteuno, Argentina, 1970.
- 1091 -

sem modificações como regras do Football Association, brindando des-


sa maneira à estrutura formal desse esporte, que se difundiu como uma
verdadeira epidemia.
A evolução do processo epidêmico, que saiu das fronteiras de um
país ou de um cont1nente e ganhou o mundo é a preocupação de todos
os governos e de todas as nações, desde as potências mundiais até os
paises do 3.° mundo. Bastariam lembrar as altas transações envol-
vendo jogadores famosos por cifras astronômicas, quer na Europa quer
na América, para dar a dimensão do problema, mas agora esta-nos
interessando antes de narrar ou discutir alguns pontos específicos ou
episódios marcantes dos últimos decênios é inquirir o papel do Futebol
no contexto histórico brasileiro e o início da pesquisa nos coloca pon-
tos interessantes a serem abordados. Desde a introdução do futebol no
final do século XIX até hoje a sua trajetória deixou o meio aristocrá-
tico para chegar a ser menosprezado não só pela elite aristocrática,
mas tambem pela classe ascendente, que procurou e procura desco-
nhecer o futebol e suas tramas para conquistar posição especial dentro
do meio em que vive. Enquanto esse grupo tenta, pelo pretenso des-
conhecimento do esporte "vulgar" galgar posição destacada dentro do
seu próprio grupo, é comum sentir-se o "intelectual"
VINTE E CINCO ANOS DE LEGISLAÇÃO
MUNICIPAL SOBRE O ENSINO.
(São José do Rio Preto (SP). 1950-1974) (*).

NILCE APPARECIDA LODI


da Faculdade de Filosofia. Ciências e Letras de São
José do Rio Preto, SP.

INTRODUÇÃO.

Há muitos anos venho colecionando as leis sancionadas pela Pre-


feitura Municipal de São José do Rio Preto, relativas a educação e
ensino. O que me induziu à procura desses documentos foi a intenção
de publicar um tNDICE (1) das mesmas, intenção que nasceu da difi-
culdade que tive, ao pretender estudar a História das Instituições de
Ensino Riopretenses. Não encontrei guias, repertórios que me condu-
zissem de modo certo e seguro aos fundamentos legais daquelas insti-
tuições. EncOl"!trei apenas, e deles me vali, dos livros de Leis e De-
cretos, originais, pertencentes aos Arquivos da citada Prefeitura e gen-
tilmente colocados à minha disposição, para estudo.
Reuni no presente trabalho, leis e decretos em ordem cronológica,
em complementação ao anteriormente publicado nos Anais do VI Sim-
pósio Nacional dos Professores Universitários de História.

LEGISLAÇÃO MUNICIPAL (1950-1974).


1950 - Lei nQ 120, de 15 de março.
Autoriza a aquisição de terreno para a construção do
7Q Grupo Escolar de São José do Rio Preto. 1

(*) - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe F,


no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação) .
(1) - Indice Básico da legislação Municipal referente à Educação em São
José do Rio Preto (SP), publicado nos ANAIS do Simposio Nacional dos Pro-
fessores Universitários de História. Volume 111. São Paulo, 1973. Pags.
- 1094-
- Lei n\> 121, de 17 de abril.
Abre crédito especial para exposição de pintura e de-
senho.
- Lei n\> 136, de 10 de julho.
Ab~e crédito especial para aquisição de livros infentis. 3
1950 - Lei n\> 153, de 18 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1951. Fixa a Re-
ceita e a Despesa Geral em Cr$ 12.200.000,00. Desti-
na Cr$ 450.810,00 à despesas com Educação e Cultura.
4
1951 - Lei n\> 168, de 3 de junho.
Concede auxílio para a construção da Escola da Fa-
zenda de São Pedro . 5
- Lei n\> 157 de 4 de abril.
Autoriza auxílios à entidades diversas, entre as quais,
grupos escolares, colégios e cu:sos. 6
- Lei n'" 192, de 6 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1952. Receita e
Despesa: Cr$ 14.000.000,00. Fixa em Cr$ 1. 106 .900,00
as despesas com Educação e Cultura. 7
1952 - Lei n\> 210, de 21 de março.
Concede auxílio à entidades. 8
- Lei n\> 216, de 8 de abril.
Dispõe sobre auxílio às Caixas Escolares dos Grupos da
cidade. 9
- Lei n'" 225, de 21 de maio
Institui p:êmio para conferência estudantil 10
- Lei n\> 235, de 10 de junho.
Concede auxílio à Biblioteca do Centro Estudantil Rui
Barbosa" (CERB). 11
- Lei n\> 248, de 25 de agosto.
Abre crédito especial para edição de livro sobre São
José do Rio Preto. 12
- Lei n'" 251, de 6 de setembro.
- Cria bolsa de estudos universitários. 13
- Lei n\> 253, de 7 de outubro.
Abre crédito especial para aquisição de livros. 14
- Lei n'" 257, de 10 de outubro.
Institui 33 p:-êmios anuais, em dinheiro, para serem
distribui dos aos "Melhores Estudantes" classificados pela
Comissão de Apuração Final. 15
- Lei n'" 259, de 10 de outubro.
Considera de utilidade pública o Conservatório Munici-
- 1095 -
- Lei n 9 265, de 9 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1953
Orça a Receita e fixa a Despesa em Cr$ 22.000.000,00.
Fixa em Cr$ 2.977.800,00 as despesas com Educação e
CUltura. 17

1953 - Lei n 9 275, de 18 de feve:-eiro.


Concede auxílio a entidades educacionais 18
- Lei n9 284, de 20 de abril.
Autoriza construção de galpão para o 79 G: upo Escolar
- Lei n 9 285, de 5 de maio. 19
Autoriza pagamento do contrato de aluguel da sala ane-
xa ao 39 Grupo Escolar. 20
- Lei n9 297, de 19 de setembro.
Abre crédito especial para aquisição de livres. 21
- Lei n 9 316, de 15 de dezembro.
Lei orçamentária para 1954. Orça a Receita e fixa a
Despesa em Crg 29.000.000,00. Destina Cr$ 1.490.200,00
à Educação e Cultura. 22

1954 - Lei n'" 323, de 13 de março.


Concede 24 bolsas de estudos: 6 para o curso primário,
4 para o 19 cicIo do curso secundário ou equivalente,
5 para o 29 ciclo e 9 para cursos superiores. 23
- Lei n9 331, de 2 de abril
Concede auxílio à entidades educacionais. 24
- Lei n'" 344, de 12 de abril
Contrata serviços de escOlas artísticas. 25
- Lei n'" 364, de 26 de outubro.
Modifica a redação da Lei 257/72, sobre Prêmios aos
"Melhores Estudantes".
- Lei n'" 374, de 7 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1955. Receita e
Despesa fixada em Cr$ 34.000.000,00. Destina à
Educação e Cultura, Cr$ 2.397.800,00. 27

1955 - Lei n9 394, de 26 de maio.


C:ia a Universidade Municipal de São José do Rio Pre-
to.
- Decreto nQ 241, de 8 de junho. 28
Nomeia o Conselho Geral da Universidade Municipal.
- Lei n9 405, de 9 de agosto. 29
Concede auxílios à entidades educacionais. 30
- Decreto n9
- 1096 -

- Lei n Q 483, de 16 de dezembro.


Lei Orçamentária para o exercício de 1956. Fixa Re-
ceita e Despesa em Cr$ 40. OOJ . 000,00. Destina à
Educação e Cultura a importância de Cr$ 3.594.433,40 32
1956 - Lei n\> 449, de 17 de agosto.
Institui exposição de desenho e pintura. 33
- Lei n\> 453, de 30 de agosto.
Cria cargos para a Faculdade Municipal de Filosofia,
Ciências e Letras. 34
- Lei n Q 454, de 30 de agosto
Abre crédito especial para instalação da Escola Arte-
zanal e o Instituto Adolfo Lutz. 35
- Lei n\> 487, de 15 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1957
Receita e Despesa: Cr$ 77.500.000,00.
Despesas com Educação e Cultura: Cr$ 6.091.980,00.
36
- Lei n\> 488, de 29 de dezembro
Concede auxílio e subvenção à entidades. 37
1957 - Lei n\> 515, de 20 de setembro.
Cria o Museu Municipal. 38
- Lei n\> 516, de 24 de setemb.o.
Autoriza doação de terreno ao SENAC. 39
- Lei n\> 520, de 2 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1958. Fixa a Re-
ceita e a Despesa em Cr$ 97.630.000,00. Destina à Educa-
ção e Cultura: Cr$ 7.037.400,00. 40
1958 - Lei n\> 537, de 13 de maio.
Doa terreno para construção de Ginásio. 41
- Lei n\> 542, de 25 de junho.
Autoriza doação, ao Estado, do Patrimônio da Faculda-
de de Filosofia da Universidade Municipal. 42
- Lei n\> 546, de 2 de julho.
Auto;iza obras de reforma do Grupo Escolar Ezequiel
Ramos. 43
- Lei n\> 566, de 10 de novembro.
Autoriza contrato para reforma do Grupo Escolar de
Borboleta. 44
- Lei n\> 567, de 10 de novembro. 44
Autoriza contrato para reforma do G~upo Escolar "Dr.
Cenobelino de Barros Serra". 45
Lei n\> 571, de 11 de novembro.
"Cria o Recanto Infantil "Chapeuzinho Vermelho".
-1097-
- Lei nQ 576, de 6 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1959.
Receita e Despesa: Cr$ 117.000 .000,00 .
Despesas com Educação e Cu'tura: Cr$ 8.186.020,00 47
- Decreto n Q 398, de 8 de dezembro.
Discrimina despesas o~çamentárias. 48
1959 - Q
Lei n 582, de 11 de fevereiro.
Concede subvenção à F. F . C. L. 49
- Lei n Q 596, de 29 de julho
Autoriza despesas de Exposição histórico-religiosa. 50
- Lei n Q 598, de 26 de agosto.
Doa terreno para construção do 5Q Grupo Escolar. 51
- Lei nQ 599, de 26 de agosto.
Doa terreno para construção do 59 Grupo Escolar. 52
- Lei n9 603, de 29 de outubro.
Doa terreno para construção de um Grupo Escolar em
Engenheiro Schmidt. 53
- Lei nQ 625, de 20 de novembro.
Doa terreno ao SENAI para construção de escola. 54
- Lei n9 627, de 11 de dezemb:o.
Lei orçamentária para o exercício de 1960. Fixa a Re-
ceita e a Despesa em Cr$ 162.000.000,00. Destina à
Educação e Cultura: Cr$ 10.396.990,00 55
- Decreto n9 430, de 11 de dezembro.
Discrimina as despesas orçamentárias. 56
1960 - Lei nQ 650, de 10 de março.
Doa terreno para construção do 79 Grupo Escolar. 57
- Lei n9 655, de 18 de março. Adquire prédios, terrenos,
móveis e utensílios da Associação Espírita Alan Kardek,
destinando-os à F.F .C.L. 58
- Lei n Q 671, de 2 de junho. Declara de utilidade pública
o Centro Acadêmico da F.F.C.L. 58 a.
- Lei n9 673, de 3 de junho.
Doa terreno para construção do 89 G:upo Escolar. 59
- Lei 686, de 22 de junho.
Autoriza construção de sala, para funcionamento de uma
escola, no loteamento Hipódromo. 60
- Lei n9 706, de 19 de outubro.
Autoriza alienação do terreno para construção do Grupo
Escolar "Cardeal Leme". 60 a.
- Lei n9 708, de 21 de outubro
Ob:iga a reserva de 100.000
- 1098 -

Discrimina as despesas orçamenárias. 64


Autoriza a concessão de bolsas de estudo. 62
- Lei n Q 723, de 13 de dezembro. Lei orçamentária para
o exercício de 1961. Receita: Cr$ 2GO. 598.000,00 e
Despesa: Cr$ 266.414.030,00. Destina à Educação e
Cultura: Cr$ 12.688.726,00. 63
- Decreto n 9 481, de 13 de dezembro.
Discrimina as despe"as orçamentárias. 64

1961 - Lei nQ 748, de 5 de maio. Cria Semana do Livro e da


Biblioteca Municipal. 65
- Lei n Q 755, de 24 de junho.

Cria o Conselho Municipal de Difusão Cultural. 66


- Lei n Q 775, de 21 de setembro.
Doa terreno para construção do 79 Grupo Escolar. 67
- Lei n Q 781, de 3 de outubro.
Cria o Conselho Municipal de Ensino. 68
- Lei n Q 797, de 11 de dezembro.
Lei orçamentária para 1962. Fixa a Receita e a Despesa,
respectivamente, em Cr$ 365.000.000,00. Destina à
Educação e Cultura, C:$ 21.649.159,00. 69
- Decreto nQ 523, de 11 de dezembro.
Discrimir:a as despesas orçamentárias. 70

1962 - Lei n Q 811, de 21 de março.


Autoriza conceder, no corrente exercício, bolsas de es-
tudo. 71
- Lei n 9 824, de 25 de abril
Institui o prêmio "9 de julho" destinado aos melhores es-
colares. 72
- Lei nQ 871, de 23 de outubro.
Doa ter:eno para construção do 11 Q G:upo Escolar. 73
- Lei n 9 878, de 13 de novembro.
Mantem o art. 89 da Lei nQ 876/62. 74
- Lei n Q 880, de 16 de novembro.
Autoriza aquisição de móveis e livros para a Biblioteca
Pública Municipal. 75
- Lei nQ 888, de 10 de dezembro.
Lei orçamentá -ia para a exercício de 1963. Orça a Re-
ceita em Cr$ 593.200.000,00 e a Despesa é fixada em
Cr$ 640.873.200,00. Destina à Educação e Cultura a
importância de Cr$ 33.040.600,00. 76
- Dec:eto n Q 576, de 10
- 1099-

1963 - Lei n9 897, de 8 de fevereiro.


Prorroga o prazo para entrada de requerimentos de bol-
sas escolares. 78
- Lei n 9 906, de 12 de março.
Concede auxílio ao Curso Científico do Colégio "Santo
André". 79
- Lei n9 932, de 24 de maio.
Autoriza a aquisição de um apa~elho projetor de "slides"
para o Instituto de Educação Estadual. 80
- Lei n9 950, de 19 de setembro.
Autoriza a construção de um Parque Infantil em En-
genheiro Schmidt. 81
- Lei n 9 958, de 21 de outubro.
Contribui com 40 milhões de cruzeiros para a constru-
ção da Faculdade de Medicina local. 82

- Lei n9 970, de 18 de novembro.


Doa terreno ao Ministério da Educação e Cultura. 83
- Lei n 9 974, de 21 de novembro.
Doa Cr$ 300,00 à Cadeira de Mineralogia e Petrologia
da Faculdade de Filosofia local. 84
- Lei n9 979, de 10 de dezemb~o.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1964
Orça a Receita em Cr$ 989.063.000,00.
Fixa a Despesa Geral em Cr$ 1.287.250.600,00.
Destina à Educação e Cultura: Cr$ 95.585.080,00. 85
- Decreto n9 627, de 10 de dezembro.
Discdmina as despesas orçamentárias. 86

1964 - Lei n9 994, de 20 de maio.


Altera a Lei 970/63, que doa terreno ao MEC. 87
- Lei n 9 1.038, de 14 de setembro.
Cria o Ginásio do Parque Industrial. 88
- Lei n 9 1.040, de 19 de setembro.
Doa terreno para construção da Escola Industrial. 89
- Lei n 9 1.044, de 23 de setembro.
Doa terreno para construção da Faculdade de Fi:osofia,
Cincias e Letras.
- Lei n Q 1.049, de 22 de outubro. 90
Doa terreno para construção do Instituto de Educação 91
- Lei nQ 1.052, de 16 de novembro.
Revoga a Lei nQ 871/62, que doa terreno.
- Lei n Q 1.055,
- 1100-
- Lei n9 1.066, de 9 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1965. Orça a
Receita em Cr$ 1. 734. 478.000,00 e fixa a despesa em
Cr$ 2.913.091.701,00. Destina Cr$ 114.684.210,00 à
Educação e Cultura. 94
1965 - Lei n9 1.108, de 16 de agosto.
Cria sete Recantos Infantís. 95
- Lei n9 1.125, de 5 de outubro.
Autoriza convênio para construção do Teatro Municipal. 96
- Lei n9 1.130, de 18 de novembro.
Institui prêmio-incentivo aos Melhores Alunos do Curso
primário, ginasial e come.cial. 97
- Lei n 9 1.132, de 19 de outubro.
Oficializa as Feiras de Ciências. 98
- Lei n9 1.148, de 13 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1966. Orça a Re-
ceita em Cr$ 3.275.000,00 e fixa em Cr$ 4.483.000,00
a despesa geral. Destina Cr$ 193.474,143 à Educação e
Cultura. 99
1966 - Lei n9 1.165, de 19 de março.
Auto:iza receber aparelhos para o Recanto Infantil. 100
- Lei n9 1.168, de 10 de março.
Abre crédito especial para início das obras do Teatro
Muncipal. 101
- Lei n9 1.196, de 25 de maio.
Doa terreno para construção do 129 Grupo Escolar. 102
- Lei n9 1.197, de 25 de maio.
Doa terreno para construção do 139 Grupo Escolar. 103
- Lei n9 1.1929, de 25 de maio.
Doa te~reno para construção do Ginásio da Vila Reden-
tora. 104
- Lei n9 1.200, de 26 de maio.
Cria a Faculdade de Engenharia. 105
- Lei n 9 1.204, de 14 de junho.
Denomina: "Conselho Municipal de Educação" o Con-
selho Municipal de EnSInO. 106
- Lei n 9 1.214, de 5 de julho.
Amplia o prazo para construção do Instituto de Educação.
107
- Lei n9 1.248, de 7 de dezembro.
Lei Orçamentária para o exercício de 1967. Orça a
Receita em C:$ 6.409.173,00 e fixa em Cr$ 7.344.720,411
a despesa geral. Destina Cr$ 396.922,096 às despesas
de Educação e Cultura. 108
- 1101 -

- Lei nQ 1.256, de 19 de novembro.


Institui a Semana Municipal de Cultura. 109
-1967 - Lei n Q 1. 265, de 13 de fevereiro.
Cria Concurso Literário-histórico. 110
- Lei n Q 1.266, de 13 de fevereiro.
Cria Concurso Literário-histó. ico. 111
- Lei nQ 1.267, de 14 de fevereiro.
Cria a Biblioteca Pública da Boa Vista. 112
- Lei nQ 1. 272, de 15 de abril.
Institui a F .R.E.S.A. 113
- Lei nQ 1.277, de 17 de maio.
Cria a Escola de Artes Plásticas. 114
- Lei Q 1.278, de 22 de maio.
Cria o Museu de Arte Contemporânea. 115.
1967 - Lei n 1.294, de 24 de junho.
Q

Autoriza o convênio para construção do Grupo Escolar


do Parque Estorial. 116
- Lei nQ 1.295, de 24 de junho.
Autoriza convênio para construção do Ginásio da Vila
Ercília . 117
- Lei n Q 1.295, de 24 de junho.
Autoriza convênio para construção do Grupo Escolar do
Jardim Urano. 118
- Lei n Q 1.297, de 24 de junho.
Auto iza convênio para construção do Grupo Escolar
da Vila São Jorge. 119
- Lei n 9 1.300, de 11 de junho
Autoriza convênio para construção do Pluricurricular do
Colégio Estadual "Alberto Andaló". 120
- Lei ne;> 1.317, de 7 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1968
Orça a Receita e a Despesa em Cr$ 7.500.000,00. Des-
tina Cr$ 673.370,32 às despesas da Educação e Cul-
tura. 121
1968 - Lei ne;> 1.328, de 11 de março.
Instituti "Salão de Arte Contemporânea" 122
- Lei ne;> 1.329, de 12 de março.
Institui a Feira Agro-científica. 123
- Lei ne;>' 1.345, de 27 de junho.
Doa terreno para construção do Ginásio Vocacional. 124
- Lei nQ 1.350, de 20 de agosto.
Doa terreno para construção do Ginásio Estadual da
Vila
- 1102-

- Lei nQ 1.360, de 8 de outubro.


Autoriza convênio para conse:vação de prédios esco-
lares. 126
- Lei n Q 1.375, de 6 de dezembro.
Cria tres Recantos Infantís. 127
- Lei n Q 1.376, de 6 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1969
Orça a Receita em Cr$ 9.700.000,00 e em
Cr$I1.979.992,80 a Despesa geral. Destina Cr$ 960.075,04
às despesas com Educação e Cultura. 128
- Decreto nQ 887, de 6 de dezembro.
Descrimina das despesas orçamentárias 129

1969 - Lei n Q 1.393, de 1Q de março.


Estabelece contribuição ao Setor Regional da Merenda
Escolar. 130

- Lei nQ 1. 395, de 28 de março.


Cria o Setor Municipal da Alimentação Escolar. 131
- Lei nQ 1.396, de 2 de abril.
Abre crédito especial para consLução do Grupo Escolar
da Vila São Jorge. 132
- Lei n Q 1.398, de 10 de abril.
Abre crédito especial para reforma do Grupo Escolar
"Cardeal Leme". 133
- Lei n Q 1.406, de 23 de maio.
Abre crédito especial para melhoramentos em Grupos
Escola~es. 134
- Lei n Q 1.407, de 23 de maio.
Abre crédito especial para construção do G~upo Esco-
lar da Vila Redentora. 135
- Lei nQ 1.419, de 9 de sentembro.
Autoriza convênio para construção de duas quadras
de esporte. 136
- Lei nQ 1421, de 10 de setembro.
Estabelece convênio com o SESI, para funcionamento
de um Centro Educacional. 137
- Decreto nQ 958, de 29 de setembro.
Ap:ova quadro de recursos e de ampliação de Capital,
no montante de NC$ 30.597.645,14, correspondente às
despesas de Capital, discriminadas no Plano Plurianual
de Investimentos, para o período de 1970
- 1103 -

Atribui à Secretaria Municipal de Educação, Saúde e


P.omoção Social: 1970 - C$ 1.360.0CO,00
1871 - 1.361.000,00
1972. - 1.910.000,00
TOTAL - C$ 4.630.000,00 138

- Lei ne;> 1.442, de 9 de dezembro.


Lei orçamentária para o exercício de 1970.
Receita geral: NC$ 15.218.400,00
Despesa geral: NC$ 17.439.913,09
Destina às despesas com Educação e Cultura:
NC$2.232.913,65 139
- Decreto ne;> 969, de 9 de dezembro.
Discrimina as despesas orçamentárias. 140
1970 - Lei ne;> 1.458, de 5 de março.
Auto~iza convênio com o Se. viço Social de Industria,
SESI, visando à manutenção e funcionamento de um Cen-
tro Educacional. 141
- Lei ne;> 1.459, de 5 de março.
Doa terreno ao FECE, para construção do Grupo do
Jardim Soraya. 142
- Lei nQ 1.460, de 5 de março.
Concede auxílio de Cr$ 17.531,00 à Associação Literária
"Santo André". 143
- Lei ne;> 1.473, de 6 de julho.
Doa terreno ao Centro do P.ofesso~ado Paulista para
construção da sede regional. 144
- Lei ne;> 1.510, de 2 de dezembro.
Homologa convênio entre Prefeitura Municipal e MO-
BRAL. 145
- Lei ne;> 1.517, de 10 de dezembro.
Celebra convênio com a Fundação Regional do Ensino
Superior - FRESA. 146
- Lei n'" 1.518, de 11 de dezemb"o.
Celeb~a convênio visando intensificação com o Centro
Comunidade - Escola. 147
- Lei ne;> 1.522, de 15 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1971.
Estima a Receita em C$ 19.804.120,00 e fixa a Despesa
em C$ 22.150.742,28. Destina C$3.330.827,OO às despe-
sas com Educação e Cultura. 148
- Lei ne;> 1.523, de 15 de dezembro
Dispõe sobre o Orçamento Plurianual
- 1104

23 da Lei 4.320, de 17/3/1964 e do Ato Complementar


nQ 43, de 29-1-1969.

ano: Programas com Educação Total de Aplicação


e Cultura de Capital

1971 - Cr$ 1. 620.000,00 Cr$ 11.646.936,46


1972 1.900.000,00 13.370.175,48
1973 - 1.950.000,00 12.572 .175,66
TOTAL - Cr$ 5.470.000,00 Cr$ 37.589.287,60

- Lei n Q 1.524, de 15 de dezembro. 149


Abre crédito de Cr$ 110.000,00, para aquisição de
veículo para o Setor do Ensino de 1Q grau. 150
- Decreto nQ 1.035, de 23 de dezembro.
Dispõe sobre a execução da despesa orçamentária para
o exercício de 1971, de que trata a Lei nQ 1. 522, de
15-12-1970. Anexo nQ 7, Secretária Municipal Educação,
Saúde e Promoção Social. 151
1971 - Lei n Q 1.535, de 4 de março.
Denomina de "Dr. Yvan Fleury Meirelles", o Município
Escola de São José do Rio Preto. 152
- Lei n Q 1.536, de 10 de março.
Celebra convênio para prosseguimento das atividades
do Município Escola. 153
- Lei nQ 1.543, de 2 de abril.
Autoriza a Prefeitura Municipal a proceder reformas e
ampliações em prédios destinados ao Ensino Primário.
154
1971 - Lei nQ 1.547, de 15 de abril.
Firma convênio com a Fundação N acionai de Material
Escolar, FENAME. 155
- Lei nQ 1. 548, de 20 de abril.
Homologa convênio entre a Prefeitura Municipal e o
MOBRAL. 156
- Lei nQ 1.549, de 26 de abril.
Autoriza convênio entre a Prefeitura Municipal e o
Instituto Nacional do Livro. 157
- Lei nQ 1.560, de 22 de junho.
Celebra convênio com o Serviço Federal de Urbanismo:
SERFHAU. 158
- Lei nQ 1.567 - Lei de 5 de julho.
Doa terreno ao Centro do Professorado Paulista
- 1105 -

1971 - Lei n Q 1.568, de 9 de julho.


Doa ao Colégio "São José" a quadro "2" do Jardim San-
ta Catarina para construção de um Centro Social Esporti-
vo. 160
- Lei n Q 1.574, de 13 de agosto.
Concede crédito de Cr$ 50.000,00 à FRESA. 161
- Lei n Q 1.582, de 3 de setembro.
Cede prédio sito à rua São João nQ 1.765, ao Instituto
Riopretense de Ensino e Cultura. 162
- Lei n Q 1.586, de 16 de setembro.
Doa terreno na rua Fé, para o Estado construir prédio
escolar. 163
- Lei nQ 1.587, de 20 de setembro.
Modifica o item 11, da Lei 1.135: aumenta o limite de
idade para concurso de ingresso ao cargo de professor.
164
- Lei n Q 1. 597, de 11 de novembro.
Autoriza auxílio de Cr$ 1.500,00 ao Diretório Acadê-
mico Filosofia da F . F . C . L. local. 165
- Lei nQ 1.598, de 16 de novembro .
Autoriza o Sr. Prefeito a ceder, em comodato, pelo pra-
zozo de cinco anos ao Instituto Riopretense de Ensino
e Cultura, um prédio pertencente ao Patrimônio munici-
pal. 166
- Lei nQ 1.606, de 15 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1972.
Estima a Receita em Cr$ 23.820.135,00 e fixa a Des-
pesa em Cr$ 25.756.216,68. Destina Cr$ 4.175.694,21
às despesas com Educação e Cultura. 167
1971 - Lei n Q 1.607, de 15 de dezembro.
Dispõe sobre o Orçamento Plurianual de Investimentos,
relativo ao Triênio de 1972 a 1974, nos termos do art.
23, da Lei 4.320 de 17-3-1964 e do Ato Complementar
n Q 43, de 29-1-1969.
Ano Programas com Educação Total da Aplicação
e Cultura de Capital
1972 - Cr$ 1.180.000,00 Cr$ 12.147.237,75
1973 - Cr$ 1.150.000,00 Cr$ 9.277.237,75
1974 - Cr$ 1.150.000,00 Cr$ 9.277 .237,75
TOTAL - Cr$ 3.480.000,00 Cr$ 30.701. 713,25
- Lei nQ 1.612, de 29 de dezembro. 168
Autoriza a Prefeitura Municipal a doar até 50.000 m2 ao
SESC,
Decreto nO 1. 121, de 15 de dezembro.
Dispõe sobre a execução da despesa orçamentá~ia para
o exercício de 1972. 170
1972 - Lei nO 1.632, de 3 de abril.
Autoriza a Prefeitura Municipal a firmar convênio com
a Secretaria de Educação do Governo de São Paulo,
para instalação de salas de aula. 171
- Lei nO 1.637, de 12 de abril.
Autoriza' o Prefeito Municipal a firmar convênio com
a Secretaria de Educação do Governo do Estado de
São Paulo, visando instalação de novas classes de 10
série do 20 grau, em estabelecimentos escolares do
ensino oficial, localizados no Município, pelo período
de três anos. 172
- Lei nO 1. 664, de 15 de novembro.
Autoriza a Prefeitura Municipal a ceder, po~ empréstimo,
à Sociedade Assistencial de Educação e Cultura (SAEC)
- 700 002 paralepípedos. 173
- Lei nO 1.669, de 9 de outubro.
Autoriza a doação de terreno para construção de um
conjunto assistencial e educacional. 174
- Lei nO 1.675, de 31 de outubro.
Doa terreno a<> Instituto Social "Santo Antonio" . 175
- Lei n Q 1. 667, de 31 de outubro.
Doa terreno ao Estado para construção do Colégio Es-
tadual "Prof. Francisco purita". 176
- Lei nO 1. 686, de 13 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1973.
Estima a Receita em Cr$ 28.527.881,81 e igual a im-
portância é fixada para a Despesa Geral. Atribui às
despesas com Educação e Cultura, Cr$ 4.356.542,61. 177
1972 - Lei nO 1.691, de 20 de dezembro.
Prorroga prazo para cessão de imóveis ao SESI, para
funcionamento de Centros Educacionais. 178
- Lei nO 1.698, de 21 de dezembro.
Doa terreno às seguintes entidades: Associação Regional
Odontológica, Associação dos Servidores da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras, Diretório Acadêmico
"24 de agosto". 179
- Lei nO 1.700, dezembro.
Concede auxílio de Cr$ 30.000,00 à FRESA. 180
- Decreto nO
- 1107-
1973 - Lei n 9 1. 740, de 2 de julho.
Autoriza a Prefeitu~a Municipal a alienar, por doação,
terreno à Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
(APAE). 182
- Lei n 9 1. 743, de 16 de agosto.
Revoga em todos os termos a Lei municipal n9 1.447,
de 15-12-1969, que autoriza a Prefeitura Municipal a
ceder, mensalmente, à Delegacia Regional de Ensino
de São José do Rio Preto, 400 litros de gasolina. 183
- Lei n9 1. 745, de 16 de agosto.
Declara de utilidade pública, para os devidos fins, a
Associação de Servidores da Faculdade de Filosofia, Ci-
ências e Letras de São José do Rio Preto. 184
- Lei n 9 1. 758, de 4 de outubro.
Auto:iza a Prefeitura Municipal a doar à Fundação Lí-
bero Badaró, imóveis destinados à construção de prédio
para uma instituição de ensino. 185
- Lei n9 1.759, de 17 de outubro.
Declara de utilidade pública, o Centro Comunidade Es-
cola de Rio Preto. 186
- Lei n 9 1.777, de 18 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício de 1974. Receita e
Despesa, respectivamente: Cr$ 45.279.149,10. Destina à
Educação e Cultura: C:$ 6.886.556,60. 187
- Dec"eto n 9 1.443, de 18 de dezembro.
Dispõe so~re a execução da Despesa Orçamentária para
o exercício de 1974, de que trata a Lei 1.777, de 18 de
dezembro de 1973. 188
- Lei n9 1.778, de 18 de dezembro.
Dispõe sobre o orçamento Plurianual de Investimentos,
relativos ao triênio de 1974 a 1976, nos termos do art.
23, da Lei 4.320, de 17-3-64 e Ato Complementar n9
43, de 29-1-69.
ano Programa com Educação Total de Aplicação
e Cultura de Capital
1974 Cr$ 2.155.000,00 Cr$ 17.791. 000,00
1975 Cr$ 4.265.000,00 Cr$ 23.674.946,00
1976 Cr$ 5.248.000,00 Cr$ 27.723.762,07
Total Cr$ 11 .668.000,00 Cr$ 69. 189 .708,07
1974 - Lei n9 1.784, de 6 de fevereiro. 189
.Autoriza a Prefeitura Municipal a celebrar convnio com o
Governo do Estado de São Paulo através da Secretaria de
Cultura, Esporte e Turismo visando a complementação das
obras do Teatro Municipal de São José do Rio P.eto. 190.
- 1108 -'-"

- Lei nQ 1.788, de 11 de março.


Firma convênio com a Companhia Nacional de Alimenta-
ção Escolar, para execução do Programa de Educação e
Assistência Alimentar. 191
- Lei nQ 1. 795, de 28 de março.
Cria o Conselho Municipal de Ensino Superior de São
José do Rio Preto. 192
- Lei nQ 1.796, de 2 de abril.
Firma convênio com a FRESA, mantenedora da Fa-
culdade Regional de Medicina de São José do Rio
Preto. 193
- Lei nQ 1.797, de 3 de abril.
Firma convênio com a Secretaria da Educação para ins-
talação de novas classes de 1Q série do Segundo Grau,
no município. 194
- Lei nQ 1.803, de 25 de abril.
Permuta terreno com outro do Serviço Social da
Idustrial - SESI - visando a construção de um con-
junto Assistencial e Educacional. 195
- Lei nQ 1.804, de 2 de maio .
Doa terreno ao Estado para construção do Colégio Téc-
nico Industrial e do Ginásio Industrial "Dr. Philadelpho
Gouveia Neto" de S. J. do Rio Preto. 196
- Lei nQ 1.813, de 31 de maio.
Doa terreno ao Estado no Jardim Alto Rio Preto, para
construção de prédio escolar. 197
- Lei nQ 1.818, de 24 de junho.
Cria o Conselho Municipal de Ensino de São José do
Rio Preto. 198
- Lei nQ 1.824, de 2 de julho.
Declara de utilidade pública o DATI, Diretó-io Acadê-
mico Tiradentes, da Faculdade Riopretense de Filoso-
fia. 199
1974 - Lei nQ 1.837, de 20 de setembro.
Abre crédito adicional de Cr$ 20.000,00, contribuição ao
MOBRAL. 200
- Lei nQ 1.839, de 20 de setembro.
Abre crédito adicional de Cr$ 80.000,00 afim de ocor-
rer às despesas com a instalação e manutenção do Ensino
Supletivo Municipal de primeiro grau. 201
- Lei nQ 1.856, de 16 de dezembro.
Lei orçamentária para o exercício financeiro de 1975
Fixa a Receita e orça a Despesa em Cr$ 63.104.846,92.
- 1109 -

Destina Cr$ 7.951.300,00 às despesas com Educação e


Cultura.
- Lei nQ 1.857, de 16 de dezembro. 202
Dispõe sobre o Orçamento Plurianual de Investimentos,
relativo ao Triênio 1975 a 1977, nos termos do art. 23,
da Lei nQ 4.320, de 17-3-1964 e Ato Complementar nQ
43 ,de 29-1-1969.
ano Programas com Educação Total de Aplicação
e Cultura. de Capital
1975 Cr$ 1.974.500,00 Cr$ 24.803.446,00
1976 Cr$ 2.940.000,00 Cr$ 28.525.131,58
1977 Cr$ 4.000.000,00 Cr$ 35.591. 000,00
TOTAL Cr$ 8.914.500,00 Cr$ 85.656.577,58
- Lei nQ 1.864, de dezembro. 203
Autoriza a Prefeitura a firmar convemo com a Secreta-
ria do Estado dos Negócios da Educação de São Paulo,
visando a intensificação do programa de assistência den-
tária aos escolares da zona rural do município de São
José do Rio Preto. 204
ARROLAMENTO DAS FONTES HISTÓRICAS DE
OLÍMPIA (SP) (*).
- Complementação -

MARIA APARECIDA ROCHA BAUAB


NILCE APPARECIDA LODI
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São
José do Rio Preto.

INTRODUÇÃO.

Dando prosseguimento ao trabalho de Arrolamento de Fontes,


por nós apresentado na 5. a sessão de estudos do VI Simpósio Nacio-
nal dos Professores de História e posteriormente publicado nos
ANAIS (* *) elaboramos sua complementação referente ao período
1971-1975.

I. - ARQUIVO PAROQUIAL - Próquia de São Joáo


Batista.
1. - LIVROS DE BATISMO: 49 volumes, 48 arquivados,
1 em andamento
1.48. - 07/02/1971 a 29/12/1974, 100 fls., todas preen-
chidas, impressas.
1971 - 317 batisados 1973 - 210 batisados
1972 - 261 batisados 1974 - 205 batisados
1.49. - 29/12/1974 a 18/05/1975 (em andamento), 100
fls. numeradas.
1974 - 3 batisados
1975 - 82 batisados (até 04/06/1975)

(*). - Comunicação apresentada na 2" Sessão de Estudos, Equipe F,


no dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
(**). - Arrolamento das fontes históricas de Olímpia (SP), ANAIS do
VII Simpósio Nacional dos Professores Universitários de História. Volume IH,
São Paulo, 1973, Pág. 709-762.
- 1112-

2. - LIVROS DE CASAMENTOS:
2.18 - 13/06/1970 a 31/05/1975 (em andamento), 100
fls. numeradas, 97 preenchidas.
1970: 78 casamentos 1973: 113 casamentos
1971: 126 casamentos 1974: 118 casamentos
1972: 95 casamentos 1975: 48 casamentos(04/06175).
3. - LIVROS DE ÓBITOS:
Apenas os livros arrolados anteriormente, nas mesmas con-
dições.
4. - LIVROS DE CRISMA:
O Arquivo contem trinta fascículos (já arrolados), 1 volume
encadernado, pertencente ao Arquivo Diocesano de Jaboticabal,
para o Registro de Crismas das Paróquias de Olímpia e Severínia,
com 165 páginas. Crismados com idade variável entre 2 meses e
84 anos.
Série de fascículos, datados de 17-6-1956, quando foram cris-
madas 907 pessoas, com idode variável de 15 dias a 44 anos, pelo
Revmo. Bispo Dom José Varanni.
5. - LIVRO DO TOMBO: 2 volumes. Nada foi registrado
no período de 1971 a 1975.
6. - VIGARIOS da Paróquia de São João Batista:
De 26/04/1964 até a presente data, Pe. Antonio Santcliments.
11. - ARQUIVO DA PARÓQUIA DE NOSSA SENHORA
APARECIDA.
1. -LIVRO DE ÓBITOS.
Nada à acrescentar. Livros deste tipo não serão mais utili-
zados.
2. - LIVROS DE BATISADOS: 8 volumes, 7 arquivados,
1 em andamento.
2.6. - 07/0211971 a 03/03/1973, páginas não numeradas,
manuscrito.
1971: 378 batisados
1972: 542 batisados
1973: 80 batisados.
2.7. - 03/03/1973 a 28/08/1974: 100 fls. numeradas, ma-
nuscritas.
1972: 476 batisados
1973: 373 batisados
Há duplicata deste Livro.
2.8. - 25/08/1974 a 01106/1975, 100 fls. numeradas, em
andamento:
1974: 203 batisados
1975: 212 batisados até 04/06/1975)
- 1113 -

3. - LIVRO DE CRISMA. Este livro não será mais usa-


do. Não há anotações no período.
4. - LIVRO DO TOMBO. Livro citado no Arrolamento
anterior, com 135 páginas preenchidas ate 27/17/1974.
5. - LIVRO DE CASAMENTOS: 3 volumes, 2 arquiva-
dos, 1 em andamento.
5.2. - 12/09/1964 a 31/10/1970, páginas não numeradas.
1964: 27 casamentos 1968 60 casamentos
1965: 145 casamentos 1969: 50 casamentos
1966: 112 casamentos 1970: 89 casamentos
1967: 115 casamentos
5.3. - 17/10/1970 a 24/05/1975 (em andamento), 100
fls.
6. - VIGÁRIO DA PARÓQUIA DE NOSSA SENHORA
APARECIDA: Frei Justino Di Giorgio a 27/02/1970.
III. - ARQUIVO DA CÂMARA MUNICIPAL.
1. - Presidentes.
1.19. - 1971-1972: Oswaldo da Silva Melo.
1.20. - 1973-1974: Orlando Lapa.
1.21. - 1975- : Alcindo Fossalussa.
2. - LIVRO DE ATAS DAS SESSõES PREPARATó-
RIAS.
Não tem sido usado e permanece nas mesmas condições já
citadas no arrolamento anterior.
3. - LIVRO DE ATAS DAS SESSõES DA CÂMARA
MUNICIPAL. 9 volumes, 8 arquivados e 1 em andamento.
3.8. - 30/09/1969 a 31/01/1973, 367 páginas datilografa-
das.
3.9. - 31/01/1973 a 15/05/1975, 158 páginas datilogra-
fadas até a presente data, livro em andamento.
4. - LIVRO DE REGISTRO DE POSSE E TERMOS DE
COMPROMISSO DOS SENHORES VEREADORES E PREFEI-
TOS.
4.3. - 31/12/1969 a 31/01/1973 - em andamento. Fo-
ram empregadas, apenas quatro folhas com o registro da posse do
Prefeito Dr. Alfonso Lopes Ferraz, referente à Legislatura 1973/
1976.
5. - LIVRO DE VISITAS. Sem novidades.
6. - LIVRO DE REGISTRO DE ORADORES DURANTE
AS SESSõES DA CÂMARA MUNICIPAL NO PERíODO DO
EXPEDIENTE. Sem novidades.
7. - LIVRO DE REGISTRO DE ORADORES, ORDEM
DO DIA. Até 30/05/1975 foram utilizadas 35 folhas, manuscri-
- 1114-

8. - LIVRO DE REGISTRO DE LEIS: 5 volumes, 4 ar-


quivadas, 1 em andamento.
8.4. - 11/0211968 a 31/08/1971, 191 páginas datilogra-
fadas.
8.5. - 31/08/1971 a 03/04/1975 (em andamento), 228
páginas datilografadas até 30/05/1975.
9. - LIVRO DE REGISTRO DE PORTARIAS. Perma-
nece sem novas anotações.
10. - LIVRO DE REGISTRO INTERNO DA CÁMARA
MUNICIPAL. Sem novas anotações.
11. - LIVRO DE DECRETOS LEGISLATIVOS. O vo-
lume citado anteriormente, está em andamento, com 22 páginas
datilografadas até 17104/1974.
12. - LIVRO DE RESOLUÇOES. Em andamento, com
131 páginas datilografadas até 17/10/1973.
13. - LIVRO DE REQUERIMENTOS E INDlCAÇOES.
13.3. - 28/0211968 a 31/03/1975. Em andamento, com
322 páginas datilografada! até o momento.
14. - LIVRO DE MOÇOES.
Em andamento, com 9 páginas datilografadas, até 23/121974,
data em que a Moção n 9 1/74 requer que "conste dos Anais" uma
"Moção de Aplauso à dupla Tonico e Tinoco pela gravação da
música OLIMPIA, MENINA MOÇA", assim como aos autores
da mesma.
15. - LIVRO DE PRESENÇA DOS SENHORES VEREA-
DORES À CÁMARA MUNICIPAL.
15.3. - 15/08/1967 a 30/05/1975, em andamento, com
119 páginas escritas.
16. - LIVRO DE REGISTRO DE CARGA E PROPOSI-
ÇOES DIVERSAS.
Livro em andamento, com 39 páginas escritas. (26/05/1975)
17. - LIVRO PARA LAVRATURA DAS ATAS DAS
REUNIOES DS COMISSOES DE JUSTIÇA E REDAÇÁO; OR-
ÇAMENTOS E FINANÇAS E ASSUNTOS GERAIS. Livro em
andamento, com 9 páginas escritas até 27/0211973.
18. - LIVRO DE CADASTRAMENTO DOS LIVROS EM
GERAL QUE COMPOEM A BIBLIOTECA DA CÁMARA MU-
NICIPAL. Livro já arrolado, registra 314 volumse
19. - LIVRO DE DECLARAÇÁO DE BENS DOS SE-
NHORES PREFEITOS, VICE-PREFEITOS E VEREADORES
DO MUNICIPIO. Livro já arrolado. Foram utilizadas 29 pá-
ginas até a presente data.
20. - LIVRO DE CORRESPOND~NCIA DA CIDADE.
20.3. - 31/12/1968 a 2/09/1969
- 1115 -

20.4. - 2/1/1969 a 2/5/1975. Em andamento, 53 páginas


anotadas.
21. - LIVRO DE CORRESPONDSN"CIA DO CORREIO.
Esse tipo de livro foi abolido, por determinação do Departamento
de Correios e Telégrafos.
22. - LIVRO DE REGISTRO DE PROJETOS, LEIS E
RESOLUÇõES .
Cinco volumes, 4 arquivadas e 1 em andamento. Por razões
desconhecidas, estes Livros não estavam no Arquivo da Câmara
por ocasião do arrolamento anterior.
22.1. - 31/01/1937 a 3/09/1951.
O têrmo de abertura está assinado pelo Presidente em exer-
cício: Josapha Marcondes. O primeiro projeto é o Regimento In-
terno da Câmara Municipal. O último projeto registrado neste li-
vro, sob n Q 149, dispõe sobre a instalação de luz elétrica no Jar-
dim da Vila Ribeiro dos Santos. Livro com 400 páginas manus-
critas.
22.2. - 30/3/1955 a 13/10/1965. O têrmo de abertura es-
tá assinado pelo Presidente Astério Moreira. 403 páginas datilo-
grafadas e 23 mimeografadas.
22.3. - 13/10/1965 a 1/06/1970.Têrmo de abertura as-
sinado pelo Presidente João José da Cunha. 250 páginas datilo-
grafadas e 68 mimeografadas.
22.4. - 01/06/1970 a 31/08/1971. Têrmo de abertura as-
sinado pelo Presidente Aldo Casarini. 128 páginas datilografadas
e 54 xerocopiadas.
22 . 5. - 31/08/1971 (em andamento). Têrmo de abertura
assinado pelo Presidente Oswaldo da Silva Mello. 270 páginas da-
tilografadas (até maio de 1975).
IV. - ARQUIVO DO REGISTRO CIVIL DE PESSOAS
NATURAIS.
Nota: Após o falecimento do Sr. Luis Teixeira Leite, aos
19 de março de 1975, Serventuário do Cartório, passou a respon-
der pelo mesmo a Senhorita Railda Bertolino, Oficial Maior.
1. - LIVROS DE REGISTRO DE NASCIMENTO. 88
volumes, 87 arquivados e 1 em andamento.
1.84. - 8/9/1968 a 13/03/1970
1.85. 13/03/1970 a 14/09/1971
1.85. - 14/09/1971 a 27/02/1973
1.86. - 14/09/1971 a 27/02/1973
1.87. - 27/02/1973 a 03/09/1974
1.88. - 03/09/1974 até a presente data, com 153 páginas
preenchidas.
1.84. - 08/09/1968 a 13/03/1970
-1116-

2. - LIVROS DE ÓBITOS. 30 volumes, 29 arquivados, 1


em andamento.
2.29. - 08/01/ a 30/02/1972
2.30. - 01/03/1972 até a presente data. Em andamento,
253 páginas preenchidas.
3. - LIVROS DE CASAMENTO: 51 volumes, 50 arqui-
vados e 1 em andamento.
3.47. - 01/04/1969 a 25/07/1970
3.48. - 25/07/1970 a 23/10/1971
3.49 - 23/10/1971 a 27/01/1973
3.50. - 27/01/1973 a 20/04/1974
3.51. - 27/04/1974 Em andamento, 289 páginas preenchi-
das.
4. - LIVROS DE EMANCIPAÇõES.
4.2. - 19/8/1970. Em andamento, com 71 páginas pre-
enchidas.
5. - LIVRO DE AUSeNCIAS. Sem nenhuma novidade.
6. - LIVRO DE INTERDIÇõES. Nada anotado.
7. - LIVROS DE EDITAIS DE PROCLAMAS. 25 livros,
24 arquivados, 1 em andamento, com 17 páginas usadas.
8. - CADERNETAS DE ATAS (Livro de Feitos): 11 vo-
lumes, 10 arquivados e 1 em andamento.
8.11. - 29/11/1974 - em andamento - 21 páginas pre-
enchidas.
9. - LIVRO TALÃO ÓBITOS: 71 volumes, 70 arquivados,
I em andamento.
9.71. - 23/9/1974, em andamento, com 186 páginas pre-
enchidas.
10. - LIVRO TALÃO DE CASAMENTO: 45 volumes,
44 arquivados e 1 em andamento.
10.45. - 28/9/1974, em andamento, com 170 páginas já
preenchidas.
11. - LIVRO TALÃO DE NASCIMENTO: 195 volumes,
194 arquivados e 1 em andamento.
11.195. - 7/4/1975, em andamento, com 135 páginas pre-
enchidas.
12. - LIVRO DE VISITAS: 1 volume em andamento.
12.1. - 27/7/1931 a 20/3/1975, com 24 páginas já pre-
enchidas.
V. - ARQUIVO DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE
IMÓVEIS.
4. - CAIXAS DE PROCESSOS.
163 caixas. Os processos são agora ordenados por ordem de
entrada, i. e ., pela data de arquivamento.
5. - LIVROS "ROL DOS CULPADOS".
- 1117-
5.2. - 11/4/1932 a 3/4/1975. Encerrado á pág. 1117.
5.2. - 11/4/1932 a 3/4/1975. Livro encerrado à pág.
117 para a adoção de um novo modelo, oficial.
5.3. - 26/5/1975. 50 páginas numeradas. Consta apenas
o têrmo de abertura.
LIVRO DE OFICIds DE REGISTRO DE IMÓVEIS.
Ofícios datilografados e arquivados em pastas. Até o mo·
mento (junho, 1975), há apenas uma pasta com 741 folhas dati·
lografadas, sem classificação numérica.
7. - LIVROS DE ATAS DO JURI.
7.9. - 28/8/1953 a 5/11/1962. Encerrado à página 110
porque as Atas passaram a ser datilografadas.
7.10. - 6/11/1962 a 20/9/1974. Atas arquivadas em pas·
ta, 46 páginas datilografadas até junho, 1975.
8. - LIVROS DE PROTOCOLO DAS AUDItNCIAS.
8.6. - 30/3/1939 e 20/2/1975. Em andamento. Livro
com 31 páginas já preenchidas.
9. - LIVRO DE OFICIOS DO GABINETE DE INVES·
TIGAÇÃO.
9.1. - 28/2/1940 a 9/12/1957
9.2. - 10/12/1957 a 6/12/1971. Em andamento, com 33
páginas preenchidas.
10. - LIVROS DE OFICIOS, EDITAIS, etc.
10.9. - 30/7/1963. Este livro não será mais usado. Os
ofícios e editais são arquivados em pastas, separadamente.
11. - LIVROS DE REGISTRO DE FEITOS.
11.2. - 1/3/1958 a 7/4/1975. Livro com 84 páginas pre·
enchidas, foi substituido por outro modelo oficial.
11.3. - 7/4/1975 a 7/5/1975. Em andamento, 100 fls,
das quais só uma preenchida.
12. - LIVRO DE CARGAS E DESCARGAS DO CARTó·
RIO DO JURI.
Adotaram uma nova forma de anotação.
12.1. - 23/4/1964 a 3/6/1975, em andamento. 167 pá.
ginas usadas. Destina-se aos advogados, delegados, etc.
12.2. - 26/5/1975, em andamento, anotada apenas uma
sindicância. Destina-se aos Juízes.
13. - LIVRO DE CARGA. Livro desmembrado em
13 .10. - 23/4/1964 a 23/5/1975, em andamento, 166 pá-
ginas preenchidas. destina-se aos advogados, delegacia, etc.
13.11. - 26/5/1975, em andamento. Uma só página pre-
enchida. Destinado aos Juízes.
14. - LIVRO DE REVISÃO DE RECENSEAMENTO.
Não há anotação referente ao período em estudo.
15. - LIVRO DE REVISÃO E SORTEIO DE JURADOS.
- 1118 -

15.4. - 29/111956 a 815/1975, em andamento, 119 pág.


preenchidas.
16. - LIVRO DE TeRMOS DE FIANÇA.
16.3. - 13/12/1935 a 10/12/1974. Em andamento, 21
págs. preenchidas.
17. - LIVRO DE T~RMO DE VISITA.

• •

INTERVENÇÃO.

Do ProL Hélio Dantas (Universidade Federal do Rio Grande do Nor-


te).
Perguntou:
"Em face da dedicação no arrolamento das fontes históricas de
Olímpia (SP), que acham as autoras de organizarem o índice da Re-
vista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo?"
• •

RESPOSTA DAS PROFESSORAS MARIA ROCHA BAUAB E
NILCE APARECIDA LODI.

Ao ProL Hélio Dantas.


"Nosso interesse pelo arrolamento das fontes históricas de Olím-
pia é decorrente, inclusive, da preocupação de que não se perca esse
material que se encontra disperso e, salvo raras exceções, sem condi-
ções para a d\!vida conservação, o que não acontece com a Revista do
Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Alem disso, esta Re-
vista já possui lndice e o trabalho nos desviaria de pesquisas já inicia-
das há mais tempo .
Por outro lado, a distância que nos separa da capital do Estado
constitui obstáculo a esse tipo de investigação.
No entanto, agradecemos o interesse do Professor Hélio Dantas
pelo nosso arrolamento e solicitamos novas sugestões."
ARROLAMENTO DE FONTES PRIMÁRIAS PARA
UM ESTUDO REVISIONAL DE ESTRUTURA
FUNDIÁRIA (*).

(Resumo) .

HILDA PlVARO STADNIKY


e
ARLETE VIEIRA DA SILVA
da Universidade Estadual de Maringá (PR).

A área compreendida entre os Rios Tibagí, Paranapanema e Ivaí


é marcada pela colonização dirigida, de iniciativa particular e oficial.
As companhias colonizadoras se sucedem atuando na região no sentido
de desvendar a qualidade dos solos e do clima para a prática das ati-
vidades agrícolas e de provocar, através de tais atrativos, fluxos mi-
gratórios.
Concessões de amplas áreas foram feitas a companhias particula-
res, entretanto, o empreendimento de maior vulto, inegavelmente, foi
o da Paraná Plantations Limited, de Londres, que passou a operar no
Brasil em consórcio com a "Companhia de Terras Norte do Paraná"
e com a "Companhia Ferroviária São Paulo-Paraná". Dessa fusão
resultou um esquema de vendas de terras e colonização de uma área
de 515 mil alqueires.
A estrutura fundiária estabelecida a partir da década de 30 foi
uniforme nas áreas onde chegaram os fluxos colonizadores da "Com-
panhia de Terras Norte do Paraná". A área global foi dividida em
zonas e estas em glebas, onde se reservavam áreas para a futura con-
centração de núcleos urbanos. O restante das terras, destinado à con-
centração das atividades rurais, foi dividido em lotes mais ou menos
padronizados, cujo tamanho médio era de cerca de 15 alqueires, es-
tendidos verticalmente para serem servidos de estradas pelo espigão
e de aguadas pelos fundos.
(*). - Comunicação apresentada na 2' Sessão de Estudos, Equipe E, no
dia 5 de setembro de 1975 (Nota da Redação).
- 1120-

A partir de tal processo, paulatinamente o norte paranaense foi


ocupado e ali se estabeleceu uma sociedade democrática, dado o
sistema de loteamento e vendas, possibilitando a todos a compra de
terras em prestações, a médio prazo, com juros inferiores a 1% ao
mês.
Constituem os arquivos da "Companhia de Terras Norte do Pa-
raná" - hoie "Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná", ma-
terial de relevante importância ao estudo não só da ocupação, mas
tambem da estrutura fundiária do norte paranaense embasada a partir
dos anos 30. Nesse campo, ressaltamos a Comunicação das professo-
ras France Luz e Ivani Rogatti Omura. ambas do Departamento de
História da Universidade Estadual de Maringá, que vem desenvol-
vendo um trabalho de levantamento do referido material, cujos resul-
tados serão levados ao VIII Simpósio da ANPUH.
Entretanto, a preocupação da presente comunicação se ocupa em
rever a e~trutura fundiária desta mesma região após decorridos quase
50 anos da transacão que envolveu o governo paranaense na venda de
mais de 1. 200 . 000 hectares de terras a Lord Lovat.
A dermbqda das matas. a abertura de sítios e a rápida expansão
cafeeira transformaram a paisagem norte paranense e novos contin-
gentes nOPulcionais eram atraidos para frentes mais avançadas onde
a "Companhia de Terras Norte do Paraná" continuou, em décadas
posteriores, o loteamento de novas áreas pelo mesmo processo anterior.
O retalhamento com a sub-divisão ou com a incorporação de novos
lotes ~e faz presente Pela sucessão em inventários ou mesmo pela ven-
da. Novas culturas são adotadas ou incorporadas paralelas à lavoura
cafeeira. A sucessão do homem e o revezamento das culturas teriam
contriburdo para a modificação do embasamento fundiário aqui esta-
belecido? Em caso afirmativo, até que ponto?
Assim sendo, nosso objetivo é rever a estrutura fundiária resul-
tante do processo de ocupação da região norte paranaense. Para tal
trabalho tomamos como modelo a micro região nQ
FONTES PARA O ESTUDO DA PROPRIEDADE
RURAL: O RECONCA VO BAIANO, 1864-1889 (*).

(Resumo) .

KATIA M. DE QUEIRÓS MATTOSO


e
ANGELINA NOBRE ROLlM GARCEZ
da Universidade Federal da Bahia.

Imperfeitamente conhecida, a formação e evolução das proprieda-


des rurais num tempo longo, secular. coloca um dos problemas mais
fundamentais da economia rural que caracteriza a vida econômica de
Salvador e de seu hinterland imediato, o Recôncavo.
Partindo da evidência de que nem todas as áreas do Recôncavo
conheceram o mesmo tipo de exploração agro-econômica e, para faci-
litar o estudo da propriedade rural nos seus aspectos estruturais e me-
canismos formadores. dividiu-se o Recôncavo em quatro áreas: área
do massapê, dominada pela produção do açucar; alto Recôncavo, de-
dicado principalmente a produção de fumo; Recôncavo sul, área de
produção de gêneros de subsistência, principalmente de farinha de
mandioca; Recôncavo norte, em que coexistem, lado a lado, a produ-
ção de gêneros de subsistência, em quantidades insignificantes, e a ati-
vidade criatória de gado vacum.
Das quatro áreas definidas pelo tipo específico de atividade agro-
-pecuária que nelas se encontra, somente uma, a área do massapê, é
atualmente objeto de indagação.
O trabalho apresenta e discute as fontes (documentos seriados)
que podem ser utilizados para o estudo da propriedade rural, unidade
de produção e industrialização de um produto monocultor que de-
manda os mercados externos - o açucar - no período situado entre
o final do século XVII e 1889.
(*). - Comunicação apresentada: na I' Sessão de Estudos, Equipe E, no
dia.
lNDICE DO I VOLUME.

I. - INTRODUÇÃO 5

Na plataforma nordestina o VIII Simpósio de História


(Aracaju/1975) (Maria Regina) ............ 7

11. PROMOÇÃO DO SIMPÚSIO ................ . 21


Promotores 23
Regulamento do VIII Simpósio Nacional dos Profes-
sores Universitários de História ............. . 27
Programa Executado 33
Programa dos Cursos 41
Inscrições ................................. . 47

m. SESSOES SOLENES ........................ . 63


Discurso do Professor Eurípedes Simões de Paula, Pre-
sidente da Associação Nacional dos Professores
Universitários de História .................. 65
Discurso proferido pelo Reitor, Dr. Luiz Bispo, no
encerramento do VIII Simpósio da Associação
Nacional dos Professores Universitários de Histó-
ria .................................... 69

IV. - CONFER:e.NCIAS 73
Aspectos geo-históricos do Nordeste (José Silvério
Leite Fontes) ............................ 75
Pernambuco e o Ocaso do Império (Armando Souto
Maior) ................................ 97
Estrutura e conjuntura da economia açucareira no
Nordeste do Brasil (1889-1930) (Gadiel Per-
ruci) .................................. 107
- 1124-

V. - SESSÃO ADMINISTRATIVA 145


Novos Estatutos ............................ . 147

VI. - COMUNICAÇOES (A propriedade rural) (História


Geral) ............................... . 153
A propriedade rural nas Ge6rgicas de Virgílio (Maril-
da Correa Ciribelli) ...................... . 155
A propriedade rural no Baixo-Império Romano (193-
-395) (Maria Regina e Eurípedes Simões de
Paula) ............................... . 183
Breve nota sobre Abu-Yussuf (loubran Jamil EI
Murr) ................................ . 189
A heresia dos pseudo-apóstolos e a dissolução da pro-
priedade rural livre (allQdium) nos séculos XIII
e XIV (Nachman Falbel) ................. . 205
A constelação agropastoril da América Colonial Es-
panhola (1500-1570) (ladro Campante Patrí-
cio) ............. ~ .................... . 207
A propriedade rural durante o movimento autonomis-
ta no Rio da Prata (1810-1830) (Raul de An-
drada e Silva) .......................... . 243
A política agrária na Armênia Ocidental sob o Império
Otomano nos séculos XIX-XX (de 1850 a 1914)
(Yessai Ohannes Kerouzian e Beatriz Diniz) .. 255
Burmistr (Vict6ria Namestnikov EI Murr) ....... . 277
A grande propriedade rural e as transformações da
economia exportadora argentina ( 1879-1906)
(Antônio E. Muniz Barreto) .............. . 301
A propriedade rural no Egito: a reforma agrária
(Helmi Mohammed lbrahim Nasr) ......... . 315
A propriedade rural na obra de George Eliot (Rina
Azaryah Barreto Nunes) ................. . 329

* *

- 1125 -

tNDICE DO II VOLUME.

VII. - COMUNICAÇOES (A propriedade rural) (Histó-


ria do Brasil) ........................... 341
Fazendas de gado do Piauí (1697-1762) (Luiz R. B.
Mott) ................................. 343
Distribuição e uso da terra no Rio Grande do Sul no
século XVIII (Corcino Medeiros dos Santos) .. 371
Fazendas do Paraná Provincial (Altiva Pilatti Balha-
na e Cecília Maria Westphalen) ............. 391
A ocupação territorial da vila de Itabaiana: a disputa
entre lavradores e criadores (Maria Thetis Nunes) 407
lndios e brancos em conflito pela posse da terra (Al-
deia de Agua Azeda - século XIX) (Beatriz
Góis Dantas) ........................... 421
A Lei das Terras de 1850 e a imigração (George P.
Browne) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 453
Fatores relacionados com a distribuição fundiária na
região cacaueira da Bahia (Victor Valia) ..... 465
Nota prévia sobre a propriedade canavieira em Ser-
gipe (século XIX) (Maria da Glória Santana de
Almeida) .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 483
Uma unidade açucareira em Sergipe. - O Engenho
Pedras - (Maria da Glória Santana de Almeida) 511
Análise de documentos concernentes à propriedade ru-
ral na primeira colônia teuta em terra capixaba -
(1847-1920) (Maria da Glória Alves Portal) .. 551
Introdução ao estudo dos mecanismos de formação
da propriedade no eixo llheus-Itabina - 1890-
-1930) (Angelina Nobre Rolim Garcez e Kátia
M. de Queiroz Mattoso) .................. 579
Propriedade e uso da terra na periferia norte do Re-
côncavo açucareiro (Aspectos de história recen-
te) (Maria de Azevedo Brandão) ............ 595
Introdução à história da propriedade rural em Santa
Catarina (Walter F. Piazza) ............... 627
Emigração de intelectuais (Emmanuel Franco) .... 681
- 1126-

A venda de um escravo (Emmanuel Franco) 687


A transformação da propriedade fundiária do Vale do
Iguaçu (Ruy C. Wachowicz) .............. 699
A propriedade rural em Rio Claro (Diana Maria de
Faro Leal Diniz) ........................ 719
A Companhia Industrial, Agrícola e Pastoril d'Oeste
de São Paulo e os problemas de mão-de-obra
(1912-1924) (José Enio Casalecchi) ......... 731
Estrutura fundiária e cooperativismo - um estudo
micro-regional (Bilda Pívaro Stadniky e Arlete
Vieira da Silva) ......................... 753

* *
*
íNDICE DO 111 VOLUME.

VII. - COMUNICAÇCES (A propriedade rural) (História


do Brasil) (Continuação) ..................... 765
Evolução da distribuição da terra em Sergipe (1920-
-1960) - Uma análise quantitativa (José Ale-
xandre Felizola Diniz e Diana Maria do Faro
Leal Diniz) ............................. 767
A propriedade rural no sistema de colonização da
Companhia Melhoramentos Norte do Paraná -
Município de Maringá (France Luz e Ivani Apa-
recida Rogatti Omura) .................... 783
Planos de colonização oficial aplicados, a partir da
década de 1930, em zonas pioneiras e de povoa-
mento, no Estado do Paraná (Odah Regina Gui-
marães Costa) .......................... 817
A propriedade rural no processo de urbanização na
zona da campanha riograndense (Nadir Domin-
gues Mendonça) ......................... 843
Conflito e participação no meio rural. (A greve da
Usina Nova América - 1962) (José Cláudio
Barriguelli) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 857
Fazendeiros e volantes (Duas categorias sociais em
mudança) (José Cláudio Barriguelli) ........ 875
- 1127-

Terras e escravos na grande lavoura paulista (Alice


Pifier Canabrava) ........................ 889
A evolução da propriedade rural em Ceres-GO (Elia-
ne Garcindo Dyrell) ...................... 899

VIII. - COMUNICAÇOES (Metodologia) .............. 901


Uma experiência em torno dos seminários de História
Antiga (Euza Rossi de Aguiar Frazão, Maria Lui-
za Corassin e Niko Zuzek) ................ 903
Maraiíon e o sentido da biografia na História. Seu
valor e importância para a Educação (Maria Nas-
cimento Barnewitz) ...................... 907
Documentação em História Oral (George P. Browne
e Walter F. Piazza) ...................... 927
"Os Sertões" - História e Arte (Amélia Franzolin
Trevisan) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 935
Estudo de História de Mato Grosso (Integração -
Ensino - Pesquisa) (Joana Neves e Mário Bal-
do) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . .. 945
Notas de um manuscrito inédito: "Parceria e Pecuá-
ria", do Dr. José Sabino do Patrocínio (Doro-
théa V. G. Beisigel) ..................... 977
A Crise de Julho na Revolução dos Cravos (Uma his-
tória oral da Revolução Portuguesa (David Guei-
ros Vieira) ............................. 985
Um projeto de montagem de recursos didáticos apli-
cados à História (Elza Nadai) .............. 993
Um curso programado de história da República Bra-
sileira - Inovações no ano letivo de 1974 (J.
s. Witter) ............................. 1005
Os registros paroquiais como fonte complementar da
História Econômica e Social (lraci dei Nero Cos-
ta) ................................... 1019
Para uma his.tória social seriada da cidade do Salva-
vador no século XIX: os testamentos e inventá-
rios como fonte de estudo da estrutura social e
da mentalidade (Kátia M. de Queirós Mattoso). 1023
- 1128 -

o "tape" de televisão como fonte documental (l. S.


Witter) ................................ 1027
Aretê - uma experiência de ensino e divulgação cien-
tífica pela rádio (J. S. Witter, J. C. Neves Lo-
pes, Arlete S. Piqueira, M. Helena B. Granja,
Rosa Maria G. Silveira e Zélia Fernandes) 1031

IX. COMUNICAÇõES (Fontes primárias) .......... 1033

Arrolamento de documentos sobre registro de pro-


priedade territorial (Maristher Moura Vasconcel-
los, Zenilde de Jesus Silva e Maria Andrelina de
Melo) ................................ 1035
Documentos do Arquivo Histórico da Câmara Fede-
ral sobre a propriedade de terras (1823-1829)
(Adalgisa Maria Vieira do Rosário) ; ........ 1061
O Setor de Documentação do Departamento de His-
tória da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciên-
cias Humanas da Universidade de São Paulo e a
pesquisa histórica (Betralda Lopes, Elisabeth
Conceta Mirra e Euza Rossi de Aguiar Frazão). 1069
As fontes para o estudo do esporte no Brasil (l. S.
Witter) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 1089
Vinte e cinco anos de legislação municipal sobre o en-
sino (São José do Rio Preto (SP) (1950-1974)
(NUce Apparecida Lodi) .................. 1093
Arrolamento das fontes históricas de Olímpia (SP)
(Complementação) (Maria Aparecida Rocha
Bauab e Nilce Apparecida Lodi) .......... 1111
Arrolamento de fontes primárias para um estudo re-
visional de estrutura fundiária (Hilda Pívaro
Stadnikye Arlete Vieira da Silva) ........... 1119
Fontes para o estudo da propriedade rural: o Recôn-
cavo Baiano, 1864-1889 (Kátia M. Queirós
Mattoso e Angelina Nobre Rolim Garcez) .... 1121
Secção Grãflca
U Faculdade de Filosofia,
S Letras.
P Ciências Humana.

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