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SEMINÁRIO PRESBITERIANO DA AMAZÔNIA - SPA

CURSO DE TEOLOGIA

EXEGÉTICA: DEUTERONÔMIO 6:1 - 9

POR

JEAN CARLOS DE PAULA SILVA

Manaus - Am
2023
SEMINÁRIO PRESBITERIANO DA AMAZÔNIA - SPA

CURSO DE TEOLOGIA

EXEGÉTICA: DEUTRONÔMIO 6:1 - 9


CONFIANÇA EM DEUS EM MEIO AO SOFRIMENTO

Exegética apresentada em cumprimento parcial às


exigências da disciplina de exegética – Pesquisa Exegética
do Antigo Testamento, ministrada pelo Prof. Milton França,
para obtenção do grau de Bacharel em Teologia.

POR

JEAN CARLOS DE PAULA SILVA

Manaus - Am
2023
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................................4
1. ESTUDO CONTEXTUAL................................................................................................5
1.1 Contexto Histórico Da Passagem..............................................................................5
1.2 Contexto Literário Da Passagem...............................................................................6
1.2.1 Contexto do Livro Todo..................................................................................8
1.2.2 Contexto Remoto...........................................................................................10
1.2.3 Contexto Próximo.........................................................................................11
1.2.4 Estrutura do Contexto Próximo....................................................................13
1.3 Contexto Canônico..................................................................................................13
1.3.1 Antigo Testamento........................................................................................13
1.3.2 Novo Testamento..........................................................................................15
2.ESTUDO TEXTUAL........................................................................................................16
2.1 Texto Hebraico........................................................................................................16
2.2 Tradução Literal.....................................................................................................17
2.3 Tradução Dinâmica................................................................................................17
2.4 Defesa da Perícope e Divisão..................................................................................18
2.5 Esbôço Mecânico....................................................................................................19
2.6 Definição de Gênero e Sub-Gênero.........................................................................20
2.7 Comentário..............................................................................................................22
2.8 Mensagem Para Época da Escrita............................................................................23
3. ESTUDO TEOLÓGICO..................................................................................................25
3.1 Menasgem Para Hoje................................................................................................25
3.2 Teologia do Texto.....................................................................................................26
3.1.1 Implicação Para a Teologia Bíblica............................................................26
3.1.2 Implicação Para a Teologia Sistemática.....................................................27
3.1.3 Implicação Para a Teologia Prática............................................................29
CONCLUSÃO..............................................................................................................30
REFERÊNCIAS............................................................................................................32
INTRODUÇÃO
1. ESTUDO CONTEXTUAL

1.1 Contexto Histórico

O livro de Deuteronômio tem grande semelhança com os tratados de vassalagem do


Antigo Oriente Médio; segundo Hill e Waltom¹, um tratado padrão consistia de:
 prefácio apresentando um locutor, geralmente um suserano, autor do tratado;
 prólogo histórico ressaltando a benevolência e autoridade do suserano;
 estipulações detalhando o que era esperado do vassalo;
 afirmação relativa à exibição, armazenamento ou termos de leitura periódica;
 lista de testemunhas, geralmente divindades;
 maldições ou bênçãos dos deuses de acordo com a execução das condições.

No capítulo 6 temos a ênfase na autoridade divina (Dt 6 – 11), não temos aqui leis
individuais, mas exemplos de como obedecer ao primeiro mandamento. Temos como
principal instrução o incentivo ao amor e obediência a Deus e sobre colocá-lo à prova.

Por Deus ter eleito Israel como seu povo, e amá-lo, o livro da prova de que ele é digno
do respeito e prestígio exigidos. Ele cumpriu suas promessas e não deixará de fazê-lo.
Vemos também no capítulo 6 uma importante afirmação sobre a autoridade de Deus (6:4).

Bem como várias advertências contra a adoração a outros deuses. Como mensagem
geral dos capítulos 6 a 11 temos que Deus deve ser prioridade máxima e autoridade final
dos israelitas, este é o cerne do primeiro mandamento.

O livro de Deuteronômio também preparava o povo de Israel para duas questões


principais que a nação viria a enfrentar muito em breve. Uma era a vida sem Moisés, outra
era as guerras que o povo enfrentaria para conquistar a terra.

1
Panorama do Antigo Testamento / Andrew E. Hill, John H. Walton; tradução Lailah de Noronha. — São Paulo: Editora Vida, 2007
1.2 Contexto Literário

Deuteronômio é um livro cujas características literárias têm sido exploradas por


muitos, e diferentes, pontos de vista, apesar de que nem todos sejam igualmente
importantes ou úteis. Abaixo cito e explico algumas formas:
Podemos olhar para o livro como um tratado; historiadores mostram que o livro possui
o mesmo plano e estrutura dos tratados internacionais, também conhecidos como cultura
hetéia, do segundo milênio a.C.

Os tratados e Deusteronômio

I. Preâmbulo (Dt 1.1-5)

II. Prólogo histórico (1.6 – 3.29)

III. Cláusulas (c. 4 – 26)


A. Básicas (4.1 – 11.32)
B. Detalhadas (12.1 – 26.19)

IV. Maldições e bênçãos, ratificação (c. 27 – 30)

V. Acordos de sucessão (c. 31 – 34)


A. Invocação de testemunhas
B. Preceitos de leitura pública

Podemos olhar o livro como sistema de governo; Deuteronômio se tornou uma


“constituição” do antigo Israel. O livro definiu a ordem social, seus princípios legais e
procedimentos jurídicos, e o seu auto conhecimento sob a lei de Deus.
Como documento, o livro serviu de administrador da vida pactual do povo de Deus.
Macbride (1987) afirmou que o livro deveria ser entendido como o arquétipo e precursor
da constitucionalismo ocidental moderno.
Podemos olhar o livro como um discurso; Deuteronômio foi por muito tempo
entendido como uma série de três discursos de Moisés. As declarações começam com o
local onde foi proferida. Além do Jordão (Dt 1.5).
A primeira fala de Moisés (caps. 1 – 4) remonta ao passado de Israel até a entrada na
terra. A segunda (caps. 5 – 28) direciona ao futuro, indicando a vida de Israel, sob a lei, na
terra. A terceira (caps. 29 – 32) é a orientação para a renovação do pacto.
Podemos olhar o livro como uma exposição do Decálogo; Walton (1987) procura
validar esse tipo de estrutura literária em Deuteronômio. Ele agrupou os dez mandamentos
em quatro questões principais, cada uma das quais expostas e esclarecidas legalmente.
Um exemplo está na explicação do terceiro mandamento contra o mau uso do nome de
Deus, é explicado de diversas maneiras onde se reflete a necessidade de aceitar a Deus com
seriedade (Dt 13.1 – 14.21), não tolerando falsos profetas (13. 1 – 5), etc.
Esse estilo de abordagem é ótimo para a reflexão em questões éticas, mostra como
todas as partes da lei estão, ainda que em diferentes graus, implícitas e interpretadas em
cada um dos mandamentos.
Como uma análise mais geral de sua estrutura literária, temos que Deuteronômio se
preocupa mais com a exortação – mais aconselhamento que legislação – de modo que suas
prescrições tendem a ser menos técnicas. O livro está mais interessado no “espírito’ que na
“letra” da lei.

1.2.1 Contexto Do Livro Todo

A importância de Deuteronômio como livro está relacionada com o início do


processo canônico (Dt 31.24 – 26) que resultou mais tarde na bíblia hebraica. O livro está,
no cânon bíblico, entre os cinco livros da Torah (lei de Moisés ou pentateuco).
O livro também é conhecido como a “história deuteronomista”, pois livros
posteriores como: Josué, Juízes, 1 – 2 Samuel e 1 – 2 Reis, recebem influência direta de
Deuteronômio. Também é visto como o primeiro livro a tentar sistematizar a fé em Israel.
Dentre os três livros que mais aparecem nos arquivos do Mar Morto está
Deuteronômio (29 vezes), os outros são Salmos (36 vezes) e Isaías (21 vezes). Nos
ensinamentos de Jesus, o livro de Deuteronômio está entre os mais citados.
O livro está entre os primeiros veterotestamentários citados por Cristo, logo após o
batismo, quando está sendo tentado no deserto (Mt 4.4 cita Dt 8.3; Mt 4.7 cita Dt 6.16; Mt
4.10 cita Dt 6.13).
Na Bíblia hebraica, o livro recebe seu título apropriado de ’ēlleh hadde ḇārîm (“estas
são as palavras”).1 Deuteronômio, como obra acabada, portanto, é um registro literário de
uma fala proferida (ou série de discursos) que recebeu a forma de um documento pactual.

1
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 17.
1.2.2 Contexto Remoto

O contexto remoto começa com o primeiro discurso de Moisés. Em seu primeiro


discurso (1:5–4:40) Moisés relembra a história do povo, iniciando com seu tempo no
Monte Sinai. Em obediência a ordem de Deus, eles deixam o Monte Sinai, e onze dias
depois, eles chegam em Cades Barnea2
A partir de Dt 4:40 temos o início do segundo discurso de Moisés, este que é o mais
longo de todo o livro, a declaração da lei. Esta é a lei que Moisés colocou diante dos
israelitas (v. 44) refere-se à totalidade da lei que vai ser apresentada nos c. 5–263
Deuteronômio não é uma nova aliança, mas a renovação da antiga. O lugar e o tempo
são, então, especificados (v. 46–49) em uma seção sumária que reúne brevemente muitos
dos temas já tratados de maneira extensiva nos caps. 1–3.4
A partir do capítulo 5 temos uma conclamação de obediência a Deus. Todo o Israel é
chamado para ouvir a proclamação da lei (5.1 – 5), e a esta lei, todos os israelitas estavam
obrigados como membros da comunidade da aliança.
Dos versos 5.6 – 21 temos a declaração do decálogo, que é o coração da mensagem de
Deuteronômio. É o fundamento dado por Deus para a relação pactual, o padrão
estabelecido pelo Deus suserano como base para o relacionamento contínuo com seu povo
vassalo5.
O decálogo representava o amor de Deus no sentido de que todas as suas ordenanças,
negativas e positivas, visavam não a restrição, mas a plenitude de vida. Os mandamentos
tem seu valor em todas as eras, mas seus princípios são aplicados de acordo com ambiente
da pessoa em relação pactual.
Dos versos 22 – 33 no capítulo 5 temos a conclusão dos dez mandamentos e o início
de outra seção. Onde Moisés revela seu papel de mediador da aliança (v. 22). Dos 23 a 27
o povo pede a Moisés que continue na presença de Deus e aja em seu favor.
Dos versos 28 – 31 Deus responde a Moisés e ao povo, onde ele ouve e aprova o
pedido deles (v, 28). Dos versos 32 a 33 Moisés muda o assunto do passado e passar a falar
do presente, agora na planícies de Moabe. O povo é incumbido e instado a cuidar em fazer
exatamente o que o SENHOR, seu Deus, lhes ordenou6

2
Robert G. Bratcher e Howard A. Hatton, A handbook on Deuteronomy, UBS Handbook Series (New
York: United Bible Societies, 2000), 1.
3
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 143.
4
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 143.
5
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 147.
6
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
1.2.3 Contexto Próximo

No capítulo 7 vemos o comando de Deus para com as nações que vivam na terra
prometida, a ordem era para destruí-las. A ideia é reconhecer que os deuses dessas nações
jamais seriam dignos de adoração, por isso o povo de Israel deveria se abster de qualquer
relação com elas.
Sete nações são citadas (7.1 – 5); “..e tiver lançado muitas nações de diante de ti, os
heteus, e os girgaseus, e os amorreus, e os cananeus, e os ferezeus, e os heveus, e os
jebuseus, sete nações mais numerosas e mais poderosas do que tu;”7
Israel também não deveria fazer aliança com esses povos, eles já tinha uma aliança
direta com Deus (o termo em hebraico é berît (tratado, aliança)). Fazer qualquer tipo de
tratado com outras nações indicaria falta de fé da parte dos israelitas em relação ao seu
suserano Deus.8
Apesar de não estar implícito, o casamento misto também ficava proibido, seria
indicação de comprometimento e poderia acarretar ruptura da fidelidade pactual para com
o único Deus: pois isso afastaria seus filhos de seguir o SENHOR e eles serviriam a outros
deuses9.
A razão para a política de não se misturar com as nações pagãs está no fato da escolha
e exigência de Deus por um povo santo, a palavra no original da a ideia de um povo
“cortado” (aparentemente, o sentido original da raiz qdš, “santo”) de outros povos e
práticas.
Nos versos 7 e 8 do capítulo 7 vemos qual deveria ser a posição de Israel com relação
a sua eleição por Deus. O que deveria gerar em seus corações humildade e um sentido de
comprometimento.
De forma negativa, Israel não era uma nação de força numérica, eram um povo
pequeno se comparado com os povo no Antigo Oriente Médio. Positivamente, eles foram
escolhido pelo amor de Deus, cujas razões são um mistério.
Se fossem obedientes (vs. 12 – 16), eles teriam prosperidade, saúde e sucesso. Isso não
significava que a obediência mereceria a bênção divina, mas, antes, que a obediência
manteria o adequado relacionamento com Deus.10

7
Almeida Revista e Atualizada (Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993), Dt 7.1.
8
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 175.
9
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 175.
10
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 177.
Se confiasse na força de seu Deus, o povo veria novamente os maravilhosos feitos que
haviam sido feitos no Egito (v. 18). o capítulo fecha afirmando que até mesmo o ouro e prata
dessas nações deveriam ser queimados no fogo, por sua associação a adoração de ídolos (vs.
25, 26).

1.2.4 Estrutura do Contexto Próximo

Como estrutura do capítulo 7, sendo o contexto próximo do capítulo 6, temos as


advertências quanto ao não unir-se, sob qualquer aspecto, com as nações pagãs. Pelo
contrário a ordem era exterminá-las.
Nos versos 1 a 5 vemos que os israelitas deveriam exterminar o cananitas, recusando-
se a entrar com eles em qualquer tratado, político ou marital. Qualquer relação com essas
nações seria comprometedora e levaria a um desastre.
Nos versos 6 a 11 vemos a razão para essa política de não associação com as nações da
região. O povo de Israel, por conta de seu relacionamento com Deus, era um povo santo, e
sua estrita obediência aos comandos divinos não permitia a mistura com outros deuses.
Se fossem obedientes, a prosperidade pairaria sobre o povo. Somente assim, sendo
bons ouvintes e cuidadosos em guardar a Palavra, é que eles conseguiriam dar
continuidade em experimentar a fidelidade e bondade de Deus, versos 12 a 16.
Dos versos 17 a 26 vemos Deus lembrando que, em face a guerra, eles deveriam
lembrar do poder de seu Senhor. Se confiassem em Deus, mesmo rodeados de nações mais
poderosas, eles veriam o feitos do Egito se repetindo naquela geração.
Com isso, toda a terra de Canaã e sua religião pagã seriam apagados pelos israelitas, o
poder e autoridade dos reis pagãos seriam esquecidos pela história humana.

1.3 Contexto Canônico

1.3.1 Antigo Testamento

O texto que estamos estudando em Deuteronômio 6:1, 9 tem ligação direta com os
quatro primeiros mandamentos em Êxodo 20:3, 11. O verso 5 do capítulo 6 é basicamente
um resumo dos quatro primeiros mandamentos do decálogo.
E esse verso vai ser um dos temas principais de Deuteronômio como um todo, nele se
baseia toda a aplicação da lei dada por Moisés no monte Horeb. Vale salientar também que
essa afirmação no capítulo 6 vai mais além.
Podemos tomar como exemplo os princípios estabelecidos ainda no Éden. Deus
desejava que seus representantes na terra o amassem de todo o coração, que confiassem em
sua vontade e amassem a seu próximo como a si mesmos. Vemos isso estabelecido no amor
familiar e, consequentemente, social.
O livro, pela sua nomenclatura, é apresentado como uma segunda apresentação da lei
de Deus, feita por intermédio de Moisés, ao povo após os 40 anos de peregrinação no
deserto.
A ênfase do capítulo 6 de Deuteronômio está em reconhecer Deus como único senhor,
sua história com o Senhor revelava o poder e grandeza desse Deus, portanto, era totalmente
justo que Ele cobrasse exclusividade na adoração de Israel.
Vemos isso na canção em Êxodo 15:11, onde diz: “Ó senhor, quem é tu entre os
deuses?”, Peter Craigie, em seu comentário a Deuteronômio, afirma:
“Essa é uma pergunta retórica, requerendo uma resposta negativa: Não há deuses como
o Senhor! No êxodo, os israelitas descobriram a singularidade de seu Deus e o fato de
que os “deuses” egípcios nada podiam fazer para impedir que o povo do Senhor
deixasse o Egito. Precisamente porque haviam experimentado a presença viva de seu
Deus na História é que eles podiam chamar o Senhor de nosso Deus. Dessa maneira, a
realidade e a singularidade do Senhor eram conhecimento prático para o povo.” 11

No capitulo 6 de Deuteronômio observamos que os mandamentos deveriam estar no


coração dos israelitas, eles tinham de pensar sobre esses mandamentos e meditar de tal
forma que isso não fosse algo mecânico, mas em entendimento (6:5).

1.3.2 Novo Testamento

Deuteronômio é um dos livros do Antigo Testamento mais citados no Novo. Neste


livro vemos a profecia de que Deus levantaria um profeta como Moisés, ainda que o texto
indique uma sucessão vemos que ele aponta principalmente para o Messias, Jesus.
Jesus alimentou o povo com pão e carne, assim como Moisés (Dt 34:11). Jesus
anuncia que dele proviria um fluxo inesgotável de água viva, o traz a memória do povo o
nome de Moisés e seus milagres no deserto.
Pedro e Estevão deixaram declarações claras de que Jesus era semelhante a Moisés (At
3:22; 7:37). Quando lemos Jo 10:30 e 17:21, 23 onde Jesus declara que ele e o Pai eram
um, temos como pano de fundo o shema de Dt 6:4 que é a grande confissão central da fé de
Israel.
11
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1a
edição., Comentários do Antigo Testamento (São Paulo, SP: Editora Cultura Cristã, 2013), 166.
Temos também uma citação direta de Jesus sobre o livro de Deuteronômio quando ele é tentado
no deserto (Dt 6:13, 16; 8:3; Mt 4:1, 10). A grande preocupação de Deuteronômio com as classes
sociais vulneráveis ao abuso e à exploração está refletida no ministério de Jesus as viúvas e aos
pobres ( Dt 6:5; Mt 22:37, 40).
Do mesmo modo que o povo de Israel, no Antigo Testamento, era tido com uma
unidade, hoje a igreja é exortada a ser um todo, pois, em Jesus, ela é um só corpo, um só
Espírito, uma esperança, um Senhor, uma fé, um batismo, um Deus e Pai de todos.
Jesus pregou que o seu povo deveria ser um! (Jo 17:11).

2. ESTUDO TEXTUAL

2.1 Texto Hebraico

Transcrição do texto hebraico da perícope delimitada de Deuteronômio 6:1, 9,


de acordo com o texto da Bíblia Hebraica Stuttgartensia - BHS.

‫ ְוַהִּמְׁשָּפִ֔ט ים ֲא ֶׁ֥ש ר ִצָּ֛וה ְיהָ֥וה ֱא ֹלֵהיֶ֖כם ְלַלֵּ֣מ ד ֶאְת ֶ֑כ ם ַלֲעֹׂ֣ש ות ָּבָ֔א ֶר ץ‬a ‫ ְו ֹ֣ז את ַהִּמ ְצָ֗ו ה ַֽהֻחִּק י֙ם‬1 6
‫ֲא ֶׁ֥ש ר ַא ֶּ֛תם ֹעְבִ֥ר ים ָׁ֖ש ָּמה ְלִר ְׁשָּֽתּה׃‬
‫ ִּת יָ֜ר א ֶא ת־ְיהָ֣וה ֱא ֹלֶ֗ה יָך ִ֠ל ְׁש ֹמר ֶא ת־ָּכל־ֻח ֹּקָ֣ת יו ּוִמ ְצֹוָת י֮ו ֲא ֶׁ֣ש ר ָאֹנִ֣כי ְמ ַצֶּוָ֒ך ַאָּת ֙ה‬a‫ ְלַ֨מ ַען‬2
c b

‫ ֹּ֖כ ל ְיֵ֣מ י ַחֶּ֑ייָך ּוְלַ֖מ ַען ַיֲא ִר ֻ֥כן ָיֶֽמיָך׃‬d ‫ּוִב ְנָ֣ך ּוֶבן־ִּב ְנָ֔ך‬d
‫ ַּכֲא ֶׁש֩ר ִּד ֶּ֨ב ר ְיהָ֜ו ה‬c‫ ְמֹ֑א ד‬b‫ ִייַ֣ט ב ְלָ֔ך ַוֲא ֶׁ֥ש ר ִּת ְר ּ֖ב ּון‬a ‫ ְוָׁש ַמְעָּ֤ת ִיְׂשָר ֵא ֙ל ְוָׁש ַמְר ָּ֣ת ַלֲעֹׂ֔ש ות ֲא ֶׁש֙ר‬3
‫ ֶ֛אֶר ץ ָזַ֥בת ָחָ֖לב ּוְד ָֽבׁש׃ פ‬d‫ֱא ֹלֵ֤ה י ֲא ֹבֶ֨ת יָ֙ך ָ֔ל ְך‬
‫ ִיְׂש ָר ֵ֑א ל ְיהָ֥וה ֱא ֹלֵ֖ה ינּו ְיהָ֥וה׀ ֶאָֽחד׃‬a‫ ְׁשַ֖מ ע‬4
‫ ְוָ֣א ַהְבָּ֔ת ֵ֖א ת ְיהָ֣וה ֱא ֹלֶ֑ה יָך ְּבָכל־ְלָבְבָ֥ך ּוְבָכל־ַנְפְׁשָ֖ך ּוְבָכל־ְמ ֹאֶֽדָך׃‬5
‫ ְוָה֞י ּו ַהְּד ָבִ֣ר ים ָהֵ֗א ֶּלה ֲא ֶׁ֨ש ר ָאֹנִ֧כי ְמ ַצְּוָ֛ך ַה ֹּ֖י ום ַעל־ְלָבֶֽבָך׃‬6
‫ ּוְבקּוֶֽמָך׃‬c ‫ ַבֶּ֔ד ֶר ְך ּֽוְבָׁשְכְּבָ֖ך‬b ‫ ּוְבֶלְכְּת ָ֣ך‬a ‫ ְוִׁש ַּנְנָּ֣ת ם ְלָבֶ֔נ יָך ְוִד ַּבְר ָּ֖ת ָּ֑ב ם ְּבִׁשְבְּת ָ֤ך ְּבֵב יֶ֨ת ָ֙ך‬7
‫ ְוָה֥יּו ְל ֹטָטֹ֖פ ת ֵּ֥בין ֵעיֶֽניָך׃‬a‫ ּוְק ַׁשְר ָּ֥תם ְלֹ֖א ות ַעל־ָיֶ֑ד ָך‬8
12
‫׃ ס‬c‫ ּוִבְׁשָעֶֽר יָך‬b‫ּוְכַת ְבָּ֛תם ַעל־ְמזּוֹ֥זת ֵּביֶ֖ת ָך‬a 9

2.2 Tradução Literal


v.1 E esta, a ordenança os estatutos e os decretos que ordenou Deus, o vosso Deus,
para ensinar; a vós para cumprir, na terra para que vós os que atravessam, para ali; para
apossar dela.

v.2 Para que temas, a Deus, o teu Deus para guardar todos os estatutos dele, e as
ordenanças dele que eu o que te ordena, tu, e o teu filho, e o filho do teu filho todos os dias
12
Biblia Hebraica Stuttgartensia, electronic ed. (Stuttgart: German Bible Society, 2003), Dt 6.
de as tuas vidas; e para que prolonguem os teus dias.
v.3 E escutarás Israel e guardarás para cumprir que vá bem a ti. E que aumenteis
muito; conforme falou Deus, o Deus de os teus pais a ti, terra a que emana leite e mel.
v.4 Escuta Israel; Deus, o nosso Deus, Deus um.
v.5 E amarás Deus, o teu Deus; com todo o teu coração, e com toda a tua pessoa, e com toda
a tua força.
v.6 E estarão as palavras as estas, que eu o que te ordena hoje, sobre o teu coração;
v.7 e as inculcarás aos teus filhos, e falarás sobre elas; no teu habitar na tua casa, e no teu andar
no caminho, e no teu deitar e no teu se levantar.
v.8 E a atarás como sinal sobre a tua mão; e serão como faixas entre os teus olhos.

v.9 E as escreverás sobre os umbrais de a tua casa e nos teus portões.

2.3 Tradução Dinâmica

v1. Estes, pois, são os mandamentos, os estatutos e juízos que mandou o Senhor, teu
Deus, te ensinassem, para que os cumprisses na terra a que passas para a possuir;
v2. para que temas ao Senhor, teu Deus, e guardes todos os seus estatutos e
mandamentos que eu te ordeno tu, teu filho, e o filho do teu filho, todos os dias da tua vida;
e que seus dias sejam prolongados.
v3. Ouve, pois, ó Israel, e atenta em os cumprires, para que bem te suceda, e muito te
multipliques na terra que manda leite e mel, como te disse o Senhor, Deus te teus pais.
v4. Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é único Senhor.
v5. Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de
toda a tua força.
v6. Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão no teu coração;
v7. tu as inculcarás aos teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando
pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.
v8. Também as atarás como sinal na tua mão, e te serão por frontal entre os olhos.
v9. E as escreverás nos umbrais da tua casa e nas tuas portas.

2.4 Defesa Da Perícope E Divisões

A perícope defendida encontra-se no capitulo 6 e vai dos versículos 1 a 9.


Anteriormente dos capítulos 1 a 4 temos uma introdução a esse tratado de vassalagem, que,
como já foi discutido, era algo muito comum no Antigo Oriente Médio.
A partir do capítulo 5 vemos Moisés começar o seu discurso sobre a prática do
decálogo e suas aplicações ao contexto diário do povo, no verso 6 Moisés afirma sobre a
natureza de quem declara os mandamentos.

Passando então, de forma prática, a mostrar como os mandamentos de Êx 20 deveriam


ser interpretados para o povo que estava prestes a entrar na terra prometida. Mas, o que
temos ainda no cap. 5 é uma lembrança de tudo o que o povo passara até ali.

Temos uma descrição dos dez mandamentos e uma afirmação de Moisés como o
mediador de Deus. Logo depois disso há uma recordação de tudo o que foi feito pelo
Senhor, com o intuito de afirmar que Ele continua no controle de todas as ações.

Os versos finais do capítulo 5 se voltam para o presente (vs. 31, 32). Aqui Moisés
enfatiza a importância do passado para o presente e futuro. O povo é chamado a cuidar em
fazer exatamente o que o Senhor, seu Deus, lhes ordenou.

A ênfase de Moisés, até então, está em mostrar que suas palavras eram as palavras de
Deus e que, como tal, deveriam ser obedecidas.

A partir do capítulo 6, a nossa perícope, temos o início da explicação prática de


decálogo dentro do contexto atual de Israel. Nossa perícope trata especificamente dos 4
primeiros mandamentos e pode ser resumido em “a autoridade divina”.

Nossa perícope é o início de uma apresentação dos exemplos sobre como obedecer ao
primeiro mandamento. “Não terás outros deuses além de mim”, Deus cumpriu suas
promessas antes, e continuará a fazê-lo, por isso é o único Deus, digno de ser adorado.

Dos versos 1 a 9, no capítulo 6, temos:

 Devemos amar a Deus (1, 3);

 A verdade fundamental da religião de Israel, seu shema, que a ver com a natureza única
de Deus (4, 9).
Sobre nossa perícope, especialmente os versos 6 a 9, Peter Craigie declara:
Os mandamentos, que fornecem a estrutura na qual os israelitas podiam expressar seu
amor a Deus, deviam estar em seu coração – isto é, as pessoas deviam pensar sobre eles
e meditar neles de maneira que a obediência não fosse uma questão de legalismo formal,
mas uma resposta baseada em entendimento. Refletindo sobre os mandamentos, elas
estariam refletindo sobre as palavras de Deus (6.1) e, entendendo o caminho de vida
colocado pelos mandamentos, elas, ao mesmo tempo, descobririam a maneira como o
amor de Deus era expresso.13
Nos versos 10 em diante, Moisés passa a falar sobre a terra prometida e como o povo
deveria atuar para contar com as bênçãos do Senhor, caso contrário, seriam penalizados

13
Peter C. Craigie, Deuteronômio, ed. Cláudio Antônio Batista Marra, trans. Wadislau Martins Gomes, 1 a
pelos povos ao redor.
Isso limita de forma clara nossa perícope nos versos 1 a 9 do capítulo 6, apesar de, já
em outro contexto, continuar a tratar da obediência dos dez mandamentos dentro da nova
realidade, a terra prometida.
2.5 Esboço Mecânico

L1 Estes, pois, são os mandamentos,


os estatutos e os juízos que mandou o Senhor, teu Deus, se te ensinassem, para
que cumprisses na terra a que passas para a possuir;
L2 para que temas ao Senhor,
teu Deus e guardes todos os seus estatutos e mandamentos que te ordeno, tu, e teu
filho, e o filho do teu filho, todos os dias da tua vida; e que teus dias sejam
prolongados.

L3 Ouve, pois, ó Israel, e atenta em os cumprires, para que bem te suceda, e muito te
multipliques na terra que mana leite e mel, como te disse o Senhor, Deus de teus
pais.
L4 Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor.
L5 Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração. De toda a tua alma e de
toda a tua força.
L6 Estas palavras que, hoje, te ordeno
estarão no teu coração;
L7 tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo
caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.
L8 Também as atarás como sinal na tua mão, e te serão por frontal entre os olhos.
L9 E as escreverás nos umbrais de tua casa e nas tuas portas.

2.6 Definição de Gênero e sub-Gênero Literário

A maior parte de Deuteronômio trata-se de uma compilação dos três discursos de


Moisés para o povo de Israel, sempre que esses discursos são interrompidos (no fim de
uma seção ou capítulo) acontece uma declaração de transição como “E disse Moisés”.

Dentro desses discursos, Moisés sempre cita instruções dadas por Deus (3:2) ou faz
citações sobre o que ele disse ao Senhor (3:24, 25) e ao povo (3:18, 22), até mesmo
comentários do próprio povo (1:41).
Bratcher e Hatton deixam uma informação importante sobre o livro: “O frequente uso
de “vocês” viram as pragas do Êxodo of the exodus e outros eventos maravilhosos indica
que ainda haviam alguma pessoas antigas vivas que se lembravam dessas maravilhas.14

14
Robert G. Bratcher e Howard A. Hatton, A handbook on Deuteronomy, UBS Handbook Series (New
York: United Bible Societies, 2000), 7.
O livro é bastante complexo e tem em seu âmago um estilo exortativo, isso contribui
para uma melhor absorção do leitor. Além da exortação percebe-se um chamado a lembrar
do passado do povo, chamá-lo a recordação.
A intenção direta é mostrar como Deus, continuamente, vem cumprindo seu pacto
como o povo, e continuará a fazê-lo, agora entrando na terra prometida. Essas exortações e
recordações mostram quem é Deus, como Ele age, o que é o povo para Ele e como este
deve se comportar.

2.7 Comentário

Quero destacar algumas palavras e expressões que mostram a importância da lei do


SENHOR na vida do povo de Israel.

A lei deve ser cumprida – v.1 Moisés aqui, após uma recapitulação do decálogo no capítulo
anterior, passa a explicar que essas leis deveriam ser cumpridas a risca, elas provinham de Deus e
deveriam ser ensinadas.

A lei deve ser guardada por todas as gerações – v.2 se todos os estatutos e mandamentos
fossem guardados, os dias do povo seriam prolongados. Aqui vemos uma bênção adquirida,
caso fosse cumprida a ordem.

A lei deveria ser benção – v.3 se o povo guardasse a lei outras bênçãos viriam como
consequência de sua fidelidade. Eles se multiplicariam em uma terra que mana leite e mel.

A lei e seu mandamento principal – v. 4 aqui Moisés enfatiza, em uma frase, os 4


primeiros mandamentos, Jesus vai usar essa mesma passagem em Mc 12:29 justamente
quando é questionado sobre qual é o mandamento principal.

Guardar a lei deveria ser uma demonstração de amor – v.5 esse verso é central para
todo o livro de Deuteronomio, pois o mandamento de amar se refere a renovação da aliança
com Deus, embora exigisse obediência, o mesmo deveria ser feito em uma atitude de amor.

A lei deve estar no coração – v.6 o povo deveria pensar sobre os mandamentos e
meditar neles, até que eles deixassem de ser algo legalista, mas uma resposta baseada em
entendimento.

A lei deveria ser ensinada em toda ocasião – v.7 a palavra “inculcar” tem a ideia de
deixar o estudante (no caso os filhos) “amolados” como uma espada, prontos para serem
usados em uma ação. Isso se daria em todo o lugar, repetindo o estudo até se torna algo que
geração um coração devoto, pronto para agir em amor ao mandamento.

A lei deveria ser guardada por métodos – vs. 8 e 9 independente destes versículo
serem literais ou não, o povo deveria tanto individualmente, como sua casa e comunidade,
ser diferente em seu caráter pela obediência aos mandamentos como resposta ao amor de
Deus.

2.8 Mensagem Para a Época

O livro de Deuteronomio tinha como mensagem, primeiramente, falar dos


acontecimentos passados (caps. 1- 4) para enfatizar ao povo a importância do momento
presente. A história passada foi orientada dentro do plano e promessa do Senhor para um
alvo futuro.

Mas, para que esse alvo futuro se tornar realidade, era necessário a obediência e
compromisso dos israelitas ao seu Deus. No Êxodo, obtêm-se a libertação do povo após um
longo período como escravos do Egito.

Com a aliança no Sinai, se mantêm a promessa de Deus para o futuro. Futuro esse que
era tornar a nação de Israel especial para Deus. Para isso se fazia necessário que, no
presente, o povo fosse obediente a Deus, que o libertou do Egito.

O livro traz também a mensagem da lei e da aliança. No capítulo 6:4, 9 temos a famosa
designação da Shemá (“ouça”, a primeira palavra hebraica do texto), que é resumida
novamente em 10:12, 13:

“E agora, ó Israel, que é que o Senhor, o seu Deus, lhe pede, senão que tema o Senhor, o
seu Deus, que ande em todos os seus caminhos, que o ame e que sirva ao Senhor, o seu
Deus, de todo o seu coração e de toda a sua alma, e que obedeça aos mandamentos e aos
decretos do Senhor, que hoje lhe dou para o seu próprio bem?”

O livro traz consigo, também, uma mensagem messiânica, pois fala de um profeta que
vira e seria maior que Moisés. Outro ponto digno de observância é, como está descrito no
capítulo 18, um chamado para o povo retornar a prática dos padrões divinos designados no
livro.
3 ESTUDO TEOLÓGICO

3.1 Mensagem Para Hoje

Vemos a necessidade em nossos dias de um retorno a prática do amor ao nosso


Senhor, nos moldes de Deuteronômio. É notório que, cada vez mais, a igreja (de modo
geral) tem se afastado do verdadeiro ensino da Palavra;
Como consequência, mais e mais, temos visto o esfriamento do amor a Deus, e as
consequências já se mostram perenes. Cada vez mais a igreja tem perdido espaço para as
ideologias, que tem como objetivo acabar com os alinhamentos bíblicos morais e objetivos
judaico-cristãos.

Cada vez mais cedo temos perdido nossos adolescentes e jovens para o aliciamento,
bombardeados pelas redes sociais, televisão e outras mídias, que usam de sua influência
para arregimentar muitos jovens as suas linhas.

Em parte isso é culpa da omissão das igrejas, por meio de suas lideranças, em não criar
nas crianças, jovens e adultos uma identidade forjada na Palavra. O capítulo 6 de
Deuteronomio é crucial em mostrar como Deus agiu com o povo de Israel e,
consequentemente, quer agir hoje.

1 Mostrando que devemos guardar e perseverar na observância dos mandamentos e estatutos


de Deus.

O que nos foi deixado não é um mero alistamento de regras aleatórias, visando
simplesmente a prática da obediência, mas é essencial para entendermos o que é realmente
amar a Deus. Para que assim nosso temor a Deus se torne uma atitude de amor.
Os versos 1 e 2 demonstram isso ao declarar: “..temas ao Senhor, teu Deus, e guarde
todos os seus estatutos e mandamentos que eu te ordeno” (v.2). O cristão deve ter esse
mandato, como iremos ver, sendo praticado em todo o momento, lugar e hora.
Infelizmente não é isto que observamos em nossas igrejas. Já em casa o ensino a prática
diária dos mandamentos divinos é negligenciada por pais a seus filhos, e nos púlpitos temos
trocado a exposição bíblica por palestras de auto-ajuda.

2. Nosso sucesso como cristãos depende diretamente do cumprimento das ordenanças


divinas.
Outra garantia que o texto nos dá, se procurarmos guardar e cumprir com os
mandamentos divinos, é de que seremos bem sucedidos em nossas empreitadas. O povo de
Israel tinha a conquista da terra prometida.

Hoje temos que procurar como principal conquista nossa resiliência em resistir aos
ataques deste mundo, a certeza de quem somos em Cristo. Guardar e cumprir os estatutos
divinos gera um temor em amor a Deus, e também um povo forte e que não é levado por
qualquer vento de doutrina.

Somos chamados a atenção: “Ouve!!”, para sermos bem sucedidos e que


multipliquemos. Também para afirmar que somente “nosso Deus, é único Senhor”, este é o
Shemá para o povo de Deus (vs. 3, 4).

3. Amar a Deus acima de todas as coisas

Todo a intenção do livro de Deuteronomio pode se resumir a essa afirmação do


verso 6, do capítulo 6. Moisés chama o povo a amar a Deus com todo o seu ser, todas as
instituições do homem.

Coração, alma e força. Os mandamentos e estatutos de Deus, principalmente no


capítulo de nossa passagem, ensinavam a como o povo deveria se relacionar com o seu
Senhor.

Amar está diretamente ligado ao que Deus havia feito pelo povo, livrando-o do Egito,
de forma mais ampla, elegendo-os em Abraão. Assim também, fomos escolhidos, eleitos
em Cristo.

Nosso amor a Deus deveria ser uma expressão de uma obediência disposta e alegre aos
mandamentos do Senhor. Como deveria ser feito? Os versos de 6 a 9 nos deixam com
estratégias de abordagem nessa questão.

3.2 Teologia do Texto

3.2.1 Implicação para a Teologia Bíblica

Os salmos eram instrumentos para promover a fé bíblica para um povo que não
possuía cópias das Escrituras em casa e não podia lê-las. Representam um
compêndio de fé
veterotestamentária. Resumos de histórias (e.g. Sl 78; 105-106;136), instruções sobre
piedade (e.g. 1;119), celebrações da criação (8; 19;104), reconhecimento do julgamento
divino (37; 49; 73), garantias de seu cuidado constante (103) e consciência de sua
soberania sobre todas as nações (2;110) foram instalados no centro da fé israelita com o
apoio do Saltério.

Acima de tudo, os salmos eram declarações de relacionamento entre o povo e seu


Senhor. Pressuponham a aliança entre ambos e as implicações dessa aliança. Seus cânticos
de adoração, confissões de pecado, protesto de inocência, queixas de sofrimento, pedido de
livramento, garantias de ser ouvido, petições antes das batalhas e ações de graças depois
delas são, todas, expressões do relacionamento ímpar que tinham com o único Deus
verdadeiro”24. (Lasor. p. 483.)

3.2.2 Implicação para a Teologia Sistemática

O livro dos Salmos em sua abrangência encerra os grandes temas da teologia


sistemática, e não seria exagero afirmar sua totalidade. O Dr. Oswal Carlos Pinto, citando o
Dr. Van Gemeren que foi extremamente feliz ao comentar:

Estudar a pessoa e os atos de Deus em Salmos é um exercício devocional e


teológico precioso para qualquer pessoa, não importa quão madura ou jovem
seja na fé cristã. “O livro de Salmos é a prescrição divina para uma Igreja
complacente, porque, por meio dele, Deus revela quão grande, maravilhoso,
magnífico, sábio, e totalmente tremendo Ele é!”. 25

24
LASOR, Wiliam- Introdução ao Antigo Testamento. 1999 p. 483.
25
Pinto, C. O. C. (2014). Foco & Desenvolvimento no Antigo Testamento. (J. C. Martinez, Org.) (2a Edição
Revisada e Atualizada, p. 501–503). São Paulo: Hagnos.
O Salmo 3 nos dão contribuições significativas para a formulação e abordagem das
doutrinas centrais da fé cristã, dentre as quais citaremos, por exemplo: Teologia Própria,
Pneumatologia, antropologia, hamartiologia e a cristologia.

Certamente a intenção pessoal de Davi não era apresentar uma contribuição direta ou
apologia destas doutrinas como em muitos casos foi o objetivo do apóstolo Paulo. Porém há
uma presente possibilidade de analisar teologicamente este salmo a respeito das doutrinas
acima citadas.
Através deste salmo é possível identificar claramente alguns atributos pelos quais
Deus se utiliza para se manifestar ao salmista. Seis vezes aparece a palavra SENHOR (i.e. ֶ‫וה‬
‫ ְּה ַי‬n.pr.dei Yahweh, o nome próprio do Deus de Israel 26). (v. 1), cujo significado aponta
para a soberania de Deus, o Senhor pactual a quem o salmista dirige sua oração, seu cântico
expressando confiança (v.3) Deus é Benigno - Deus mesmo frente à indignidade e pecado
de Davi preserva o Seu caráter, revelando-se fiel ao Seu filho infiel ao rei que fracassou.
Mas para a preservação do seu pacto e por seus propósitos soberanos, o preservou.
Revelando-se como “Escudo”, sua “Glória” e o que “Exalta” a cabeça.
Na antropologia revelada nas aflições e angústia próprias da humanidade com a
presença dos “Adversários”, da angústia que o remete a presença do Senhor quando
“Clamo” expressa um grito quando suas forças se esvai, ele se entrega completamente nas
mão daquele, único, que o pode livrar.

O Salmo 3, pouco apresenta e contribui para a formulação da doutrina do Espírito


Santo. Porém baseando-se no versículo 1 e 8, pode-se apresentar algumas característica
concernente à atuação do Espírito Santo no Antigo Testamento, como por exemplo: Com as
palavras “com a minha voz clamo...e Ele me responde”. (Rm 8)

Do Senhor é a salvação (ָ‫ עה יּשו‬n.f. salvation —1. welfare, prosperity. 2. deliverance. 3.


salvation by God27) (v.2, 8) – Que está muito ligado à salvação que Ele oferece ao homem,

26
Whitaker, R., Brown, F., Driver, S. R. (Samuel R., & Briggs, C. A. (Charles A. (1906). The Abridged
Brown-Driver-Briggs Hebrew-English Lexicon of the Old Testament: from A Hebrew and English Lexicon of
the Old Testament by Francis Brown, S.R. Driver and Charles Briggs, based on the lexicon of Wilhelm
Gesenius. Boston; New York: Houghton, Mifflin and Company.
27
Whitaker, R., Brown, F., Driver, S. R. (Samuel R., & Briggs, C. A. (Charles A. (1906). The Abridged
Brown-Driver-Briggs Hebrew-English Lexicon of the Old Testament: from A Hebrew and English Lexicon of
onde Deus, em toda Sua grandeza e majestade, se dispõe a estar tomando o homem pelas
mãos a fim de estar purificando e restaurando-o dos seus pecados. O que Davi deixa
transparecer nesta passagem é que o Senhor já havia lhe oferecido esta salvação, porém,
devido o seu pecado e suas consequências o salmista já não se alegrava e contemplava nesta
posição de salvo (2Sam 15), talvez por se achar indigno de estar perante a santidade e pureza
de Deus.

E finalmente, a doutrina de Cristo e a doutrina das ultimas coisas, visto não apenas nos
versos já mencionados, mas no próprio contexto vivencial (sitz in leben) do salmista.

O Senhor é o personagem central no livro dos Salmos. Seja como alvo da petição seja
como motivo do louvor e exultação dos salmistas, o Deus de Israel é o ponto de
convergência de todos os poemas do saltério.
Um sem-número de categorias pode ser levantado para analisar a pessoa e a atividade de
Deus nesse livro. Porém a abordagem do salmista aqui é concentrada nos principais atributos
exaltados e em algumas áreas de atividade relacionadas à posição do Senhor como Soberano
da aliança sob a qual os salmistas viviam e no contexto da qual formulavam suas
expectativas quanto à presença e atuação de seu Deus em suas vidas.
Vemos neste salmo de uma forma marcante a ação soberana de Deus preservando e
administrando o seu pacto através da vida de Davi sobre quem é evidenciada a graça de
Deus

3.2.3 Implicação para a Teologia Prática

A importância para a teologia na vida diária do povo implicava em promover temor e


intimidade que combinavam-se no entendimento que os israelitas tinham do
relacionamento com Deus através da leitura e cântico dos salmos.

Eles temiam o poder e a glória de Deus, sua majestade e soberania. Ao mesmo tempo,
protestavam diante dele, discutindo suas decisões e pedindo sua intervenção. Eles o
reverenciavam como Senhor e o reconheciam como pai.

Esse senso de relacionamento especial é o que melhor explica os salmos que


amaldiçoam os inimigos de Israel. A aliança era tão estreita que qualquer inimigo de Israel

the Old Testament by Francis Brown, S.R. Driver and Charles Briggs, based on the lexicon of Wilhelm
Gesenius. Boston; New York: Houghton, Mifflin and Company.
era inimigo de Deus e vice-versa. E mais, o relacionamento de Israel com Deus era
expresso num ódio feroz conta o mal, exigindo um julgamento tão severo quanto o crime
(Sl.109; 137. 7-9). Mesmo essa exigência de julgamento que era um produto da aliança,
uma convicção de que o Senhor Justo protegeria seu povo e puniria os que desdenhassem
seu culto ou sua lei. Ao que parece, o julgamento ocorreria durante a vida do perverso. O
ensino de Jesus sobre o amor para com os inimigos (Mt 5:43-48) pode fazer com que os
cristãos tenham dificuldade em usá-lo como oração, mas os cristãos não devem perder o
ódio pelo pecado nem o zelo pela santidade de Deus que os originaram.

Por mais que estejamos preparados, os problemas sempre sobrevirão à vida humana. A
nossa vida de fé e comunhão com o SENHOR Deus, não nos isenta dos problemas (João
16:33), embora alguns insistem em pensar de modo contrário. São nesses momentos de
crise e provação que somos testados com relação à nossa fé.

Quanto mais o crente ativo é abatido por Deus, seja pelas apreensões da providência,
seja pela reprovação de seus inimigos, tomará uma postura mais firme e unir-se-á mais
estritamente a Ele. Os que são filhos de Deus sobressaem diante da simples possibilidade
de perder a esperança no auxílio divino. Vejamos o que Deus é para o seu povo, o que será
no futuro, o que n’Éle encontramos, e o que Davi encontrou em Deus: Segurança (Sl. 3.3),
um escudo para mim; Honra (v.3), aqueles que Deus reconhece tem verdadeira honra sobre
si; Gozo e Libertação (v. 5), quando o povo de Deus levanta a sua cabeça com gozo no pior
dos momentos, ciente de que tudo contribui para o bem, reconhecerá àquele que lhe dá
motivo e coração para regozijar-se.

CONCLUSÃO

O salmo 3 apresenta o salmista passando por grande aflição e crise, devido a


perseguição que sofreu dos seus adversários. O salmo trata de um cântico em forma de
oração que retrata uma pessoa em fuga, que através deste cântico demonstra toda sua
confiança em Deus Iaweh.

Este salmo é uma oração de confiança, de alguém que sabe por experiência que pode
confiar plenamente em seu Deus. Não se trata de uma oração pedindo auxílio por algo
desnecessário, mas de uma oração direcionada ao Deus real com quem tivera várias
experiências, e agora por uma situação que está sendo vivenciada pelo salmista que se
encontra aparentemente sozinho na batalha, cercado pelos inimigos que gritam “não há em
Deus salvação para ele”. Sua fé é a única aliada neste momento de profunda crise.

Todavia, apesar da adversidade, o salmista não desanima. Embora esteja cada vez mais
abandonado pelos amigos e perseguido pelos seus muitos inimigos, ele levanta a cabeça e
se volta para Deus, sua justiça em quem deposita toda a sua confiança. Na certeza de que o
seu Deus lhe ouvirá a oração, e nele encontrará conforto e segurança. Tornando se assim
persistente em seu clamor, certo de que seu Deus não o abandonou, nem o abandonará.
Pois ele na sua angustia e aflição sabe que pode confiar em Deus, seu escudo e proteção,
pois este permanece com os ouvidos aberto, mão estendida para atender suas petições.

O salmista demonstra que sua confiança no Senhor não surgiu de uma situação
adversa, mas ela é decorrente de uma vida na presença de Deus. Sua confiança está
alicerçada na própria experiência de oração que possui, que o leva ao passado, trazendo à
memória episódios nos quais Deus estava com ele e o livrou. Por este motivo ele pode
deitar e dormir seguro, pois é o próprio SENHOR quem o guarda (v. 3).

Há uma certeza no coração do salmista, Deus é o seu aliado. E por mais que os
adversários cresçam, chegando até ao número de milhares, ele está convicto de que o poder
de Deus o anulará todo poder dos exércitos inimigos. Para o salmista Deus é o seu escudo,
a sua proteção, aquele que levanta a sua cabeça e lhe dá força para a batalha.

A expressão “mas tu Senhor”, revela o desabafo do salmista, perante uma situação de


desespero e aflição. Esta expressão nos mostra que, apesar das adversidades, ele se
apresenta como uma pessoa que tem fé, alguém confiante e seguro no seu Deus.

Esta demonstração de confiança vivenciada pelo salmista não exclui a possibilidade de


que as adversidades sobrevenham. E, é exatamente por ser uma pessoa confiante, que ele
pode erguer a sua voz e clamar ao seu Deus por socorro, ciente de que Ele pode efetuar
salvação e a libertação. Para ele o SENHOR é o Deus que pode e que fere violentamente
(v.7) os seus adversários, e por este motivo deve ser louvado em todo tempo.

Portanto o salmista afirma que somente Deus pode salvá-lo, pois Ele é a própria
salvação, isto nos faz reportar ao episódio que gerou este cântico (2Sm 15:14), quando o
salmista em um gesto de insegurança, medo e desespero diz: “Levantai-vos, e fujamos,
porque não podemos salvar-nos de Absalão”, com esta atitude ele reconhece a limitação
sua
e de seus homens de se livrarem de uma situação adversa. Mas agora, reconhece a
soberania de Deus, ele pode de forma segura concluir o seu cântico, pois sabe que sairá
vencedor dela, e triunfará sobre a opressão e a perseguição. Pois agora sabe que não existe
outro ser em quer se possa encontrar proteção e salvação, porque nada nem ninguém existe
fora, ou além do SENHOR, passível de uma confiança tão incondicionalmente e de uma
ação tão abrangente.

Ele encerra o cântico cheio de confiança e esperança, suplicando a benção do


SENHOR para o povo, no qual também está incluído. Mostrando que a benção divina é
indispensável para o bem estar da comunidade, pois é somente do SENHOR que vem a
salvação (v.8).

REFERÊNCIAS

BIBLIA SAGRADA. A Tradução João Ferreira de Almeida. Edição Revista e


Atualizada no Brasil. Barueri – SP. SBB. 2009.

ARCHER, Gleason L. Merece Confiança o Antigo Testamento? Trad. Gordon Chawn.


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KIDNER, Derek. Salmos 1-72 – Introdução e Comentário. Trad. Gordon Chawn. São
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