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03/02/2021 A ‘morte cruzada’ do Executivo e do Legislativo | JOTA Info

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DEFENSOR LEGIS

A ‘morte cruzada’ do Executivo e do Legislativo


Seria o curioso instituto do Equador uma alternativa melhor do que o impeachment?

ROBERTA SIMÕES NASCIMENTO

03/02/2021 07:58

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Quando se volta a falar de impeachment no Brasil, vale a pena conhecer a gura jurídica
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da “morte cruzada”, alcançada como consequência da aplicação dos artigos 130 e 148
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da Constituição do Equador de 2008.

Em síntese, tais dispositivos estabelecem a possibilidade recíproca de destituição:


tanto o Poder Legislativo pode destituir o presidente da República, quanto o presidente
da República pode dissolver a Asamblea Nacional (como é chamado o equivalente ao
Congresso Nacional do Equador).

Ocorre que, nos dois casos, é como se (para usar uma metáfora do boxe) quem dá um
nocaute levasse outro igual. Se a Asamblea Nacional remove o presidente da República,
ca automaticamente dissolvida: são convocadas novas eleições gerais tanto para o
Poder Executivo, quanto para o Poder Legislativo. Da mesma forma, se o presidente da
República dissolve a Asamblea Nacional, ca automaticamente destituído.
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De acordo com o artigo 130 da Constituição do Equador, a Asamblea Nacional pode
destituir o presidente em dois casos: 1) por avocar funções que não lhe correspondem
ESTOU CIENTE
constitucionalmente (como, por exemplo, tirar os magistrados da cúpula judicial),
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conforme prévio parecer favorável do Tribunal Constitucional; ou 2) por grave crise


política e comoção interna.

Concluído o procedimento previsto na lei, em 72 horas, a Asamblea Nacional resolverá


em decisão fundamentada, com base em meios de defesa apresentados pelo
presidente da República. Para a destituição, é necessário o voto favorável de 2/3 de
seus membros. Esse poder só pode ser exercido uma única vez durante os 3 primeiros
anos da legislatura.

No caso de destituição, o vice-presidente assumirá a presidência da República. Então,


no prazo máximo de 7 dias após a publicação da resolução de destituição, devem ser
convocadas eleições legislativas e presidenciais antecipadas (para uma mesma data)
para o resto do período respectivo.

Por seu turno, o presidente da República pode dissolver a Asamblea Nacional em três
situações: 1) quando, a seu juízo, esta tiver assumido funções que não lhe
correspondem constitucionalmente, também após parecer favorável do Tribunal
Constitucional; 2) se esta se obstruir repetidamente e injusti cadamente à execução do
Plano Nacional de Desenvolvimento (que equivaleria à aprovação das leis do programa
de governo); ou 3) por grave crise política e comoção interna. Esse poder também só
pode ser exercido pelo presidente uma única vez nos primeiros 3 anos do mandato,
que é de 4 anos.

Da mesma forma, no prazo máximo de 7 dias após a publicação do decreto de


dissolução, serão convocadas eleições legislativas e presidenciais (para a mesma data)
para o resto do período respectivo.

Até a instalação da nova Asamblea Nacional, o presidente da República pode, com


prévio parecer favorável do Tribunal Constitucional, expedir decretos-leis de urgência
econômica, que podem ser aprovados ou revogados pelo órgão legislativo
(posteriormente).

Dentro do sistema de freios e contrapesos, trata-se da incorporação de uma ferramenta


típica do parlamentarismo ao sistema presidencialista. No entanto, diferentemente da
moção de censura, que dispensa a apresentação de razões para a perda de con ança,
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de exigência de um impeachment, o qual ainda dependeria da prática de condutas
especí cas.
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Está claro que a “morte cruzada” e o impeachment não são guras equivalentes, o que
prejudicaria qualquer comparação. Inclusive, a Constituição do Equador também traz
sua própria modalidade de julgamento político do presidente da República pela prática
de crimes, conforme o art. 129.

A grande diferença em relação ao impeachment é, ao


mesmo tempo, o principal atrativo da “morte
cruzada”: se o Poder Legislativo entender que o
presidente da República incorre nas situações da
“morte cruzada”, tanto o presidente quanto os
membros da Asamblea Nacional devem deixar seus
cargos.

O instituto foi inserido como novidade na Constituição do Equador de 2008. Tal


hibridismo resultou das necessidades políticas equatorianas após sucessivas rupturas
institucionais – desde 1830, o Equador já teve 20 Constituições, e chegou à média de
uma nova Constituição a cada 8 anos –, em uma tentativa de neutralizar a hegemonia
política de um dos poderes sobre os demais.

À pergunta: a morte cruzada é compatível com um sistema presidencialista? A


resposta parece ser sim, pois há tantas variações concretas, que o correto seria falar
em presidencialismos, já que o modelo admite certas anomalias em seus mecanismos
de freios e contrapesos, desde que mantida a separação de poderes.

Como ainda não foi usada desde a sua instituição, a gura desperta dúvidas sobre se é
simplesmente ine caz ou se está realmente conseguindo alcançar seu objetivo de
conferir alguma estabilidade na política do Equador.

Fica a re exão: será que os mecanismos de checks and balances só funcionam se


forem aplicados na prática? Seriam necessariamente ruins as ferramentas de uso
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Talvez, o grande valor da “morte cruzada” residiria justamente em servir de advertência


aos poderes. Por isso, mesmo nunca implementada, a solução desperta curiosidade,
nem que seja só no plano teórico.

É bem verdade que só a história poderá responder se o instituto acabou favorecendo


maus políticos que passaram impunes. Mas o interessante está em fazer com que a
decisão de remover um presidente também seja sentida na “própria carne” do
Legislativo, fazendo “doer” também nos parlamentares.

É a ideia da “pele em risco” (skin in the game) explorada pelo trader de opções
nanceiras e lósofo Nassim Taleb, que usa justamente os políticos como exemplo de
assimetria na sociedade: por vezes, sem arriscar a própria pele, os políticos mantêm os
ganhos e vantagens de governar, transferindo os prejuízos e desvantagens de suas
ações aos governados[1].

A “morte cruzada” corrigiria essa assimetria, permitindo que, além do presidente, os


parlamentares passem a arcar também com as consequências de suas ações.

Aqui, não se defende que a inovação jurídica equatoriana seja usada como modelo
para Brasil. A possibilidade de o presidente da República dissolver o Parlamento e
convocar novas eleições até chegou a existir na Constituição de 1937, art. 167,
parágrafo único, mas sem que o presidente caísse junto (ou seja, a medida era tão
autocrática quanto a própria a Carta de 1937). Hoje, à luz da atual Constituição de
1988, a providência seria inconstitucional e crime de responsabilidade, por atentar
contra “o livre exercício do Poder Legislativo”, nos termos do art. 85, inciso II.

A ideia é chamar a atenção para a necessidade de uma medida que gere real equilíbrio
entre os poderes, sem instabilidade política ou paralisia decisória. Além disso, é
necessário que os mecanismos de checks and balances não desvirtuem as naturezas e
funções dos poderes, em especial do Poder Legislativo. Este argumento cará claro
mais adiante.

Não é de hoje que o sistema presidencialista (não o modelo puro, mas o existente
concretamente nos países) é apontado como uma das principais razões para o
fracasso das democracias latino-americanas. Karl Loewenstein já a rmava que o “tipo
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de que o problema seja o presidencialismo em si, tal diagnóstico é a opinião
majoritária.
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De fato, os sistemas presidenciais funcionam mal em países muito divididos e com


sistemas partidários fragmentados, e não oferecem soluções institucionais e cazes
para crises ou remédios para o bloqueio institucional.

No caso do Brasil, os últimos anos mostram que o sistema presidencialista desenhado


na Constituição de 1988 apenas vem encobrindo um parlamentarismo “branco” ou
informal, dado o crescente protagonismo institucional do Congresso Nacional, sem que
isso implique necessariamente perda de governabilidade (pois o presidente que se
rende às negociações junto ao Poder Legislativo consegue se manter no cargo).

Ou seja, os mecanismos constitucionais que sustentariam a preponderância do Poder


Executivo na CF – 1) a extensa lista de matérias de iniciativa legislativa privativa do
presidente da República, 2) o poder de editar medidas provisórias, 3) a faculdade de
solicitar urgência em projetos de lei, e 4) o poder de veto, mesmo com a possibilidade
de ser derrubado – não têm sido su cientes para garantir um Poder Executivo
institucionalmente forte.

Na prática, os poderes do Congresso Nacional são enormes, o dia a dia revela que a
aprovação das leis de interesse do governo requer um tipo especial de acordo, formado
a partir de uma coalizão, resultado de negociações que incluem, não só o conteúdo das
medidas legislativas (que costumam des gurar as propostas de iniciativa do
presidente), mas também uma série de outras questões, como a aprovação de
emendas orçamentárias, distribuição de recursos de forma mais ampla, indicação de
cargos na administração pública, etc.

Nesse toma-lá-dá-cá, a simples ameaça de uma


“morte cruzada” poderia abrir o caminho para
negociações em que o presidente não que refém da
maioria necessária para governar. Não dando certo,
sairia como mártir.

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quando surge uma crise, o impeachment costuma ser apresentado como solução para
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sistema se livrar de um presidente incompetente ou impopular.
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Mas, por ser um processo demorado e depender de amplas articulações, o


impeachment não é (ao menos segundo a experiência mostra até agora) uma
ferramenta adequada para problemas de conjuntura. A convulsão e a tensão precisam
ser persistentes e subir em escalada para formar a atmosfera “propícia” à remoção do
presidente do cargo.

No momento em que este texto é escrito (dia 31 de janeiro de 2021), isso ainda não
vem acontecendo, ao menos segundo o termômetro que é a ferramenta Google Trends:
no Brasil, o ápice de buscas pela palavra impeachment ocorreu entre 17 e 23 de abril de
2016. Embora as pesquisas venham subindo desde o dia 12 de janeiro de 2021, o
número ainda é in nitamente inferior ao da época do último impeachment no país.

Mas já que o impeachment parece estar entrando para a agenda de 2021, convém
recordar que se trata de um julgamento político – ou político-jurídico – mas jamais
estritamente jurídico. E aqui se chega ao que se queria comentar sobre o papel do
Poder Legislativo nesse processo, conforme o desenho institucional que lhe foi
reservado na Constituição de 1988.

Didaticamente, seria possível classi car as funções constitucionais do Poder


Legislativo em: 1) função legislativa: para elaborar leis em geral (art. 48); 2) função
orçamentária: para aprovar o orçamento proposto pelo presidente da República (art.
166); 3) função de scalização contábil, nanceira e orçamentária (art. 70); 4) função de
controle externo: desempenhada com auxílio do Tribunal de Contas (art. 71) e da
comissão mista de orçamento (art. 166, § 1º); 5) função de controle do governo,
incluindo a convocação de ministros e autoridades (art. 50); 6) função de direção
política, com destaque para a competência exclusiva de aprovar o estado de defesa e a
intervenção federal, autorizar o estado de sítio, ou suspender qualquer uma dessas
medidas (art. 49, inciso IV); 7) função de informação (art. 50, § 2º); 8) função de
expressão ou representação: inerente a todo Parlamento composto de representantes
eleitos do povo (arts. 45 e 46); 9) função de investigação: desempenhada pelas
comissões parlamentares de inquérito – CPIs (art. 58, § 3º); e 10) função de
julgamento de crimes de responsabilidade (art. 51, inciso I, art. 52, incisos I e II, e art.
86).

No que interessa à coluna de hoje, as duas últimas atribuições merecem um


Oaprofundamento.
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Da leitura dos dispositivos constitucionais, observa-se que dentro do Poder Legislativo


ESTOU CIENTE
só as CPIs têm poderes de investigação próprios das autoridades judiciais (art. 58, §
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3º), sendo certo que tais poderes não devem ser confundidos com os poderes de pedir
informações (art. 50, § 2º).

Ou seja, ao que parece, o constituinte quis atribuir tais poderes de investigação


somente a uma fração do Legislativo: o grupo dos parlamentares que integrem as CPIs
– para cuja criação é necessário o requerimento de 1/3 dos membros das Casas, em
conjunto ou separadamente –, de modo que os poderes de investigação não são uma
atribuição “difusa” da qual todos os parlamentares possam se valer individualmente ou
fora desse colegiado fracionário.

Outro ponto importante: os poderes de investigação parlamentar exigem, ainda, que a


apuração seja quanto a um “fato determinado”, sendo essa uma das condições
impostas pela Constituição para a instauração da própria CPI. Relatos vagos, fatos
genéricos e meras opiniões não são su cientes para inaugurar o exercício dos poderes
de investigação dentro do Congresso Nacional.

Por seu turno, no julgamento do presidente da República, seu vice-presidente e dos


ministros de Estado por crime de responsabilidade, compete à Câmara dos Deputados
apenas o juízo de “admissibilidade”. O art. 51, inciso I, traz a competência para
“autorizar, por 2/3 de seus membros, a instauração de processo”, não estabelece “poder
para investigar”.

Já o Senado Federal funciona como tribunal de julgamento político, conduzido pelo


presidente do STF. Quanto às autoridades listadas no art. 52, inciso II, o Senado Federal
se encarrega sozinho da admissibilidade, processamento e julgamento.

Explicado tudo isso, o que se extrai de conclusão é que, ao menos à luz da atual CF, é
duvidoso que exista uma atribuição (ou sequer uma autorização) constitucional para o
Poder Legislativo (ou de quaisquer de suas Casas) usar o mecanismo de impeachment
para “investigar” o presidente da República.

Em primeiro lugar, porque, como já dito, o poder de investigar do Congresso Nacional


se concentra nas CPIs. Instrumentalizar o impeachment para investigar o que quer que
seja equivaleria a uma deturpação do instituto, da lógica do sistema acusatório vigente
no país (em que são separadas as funções de acusar e julgar) ou, no mínimo, a uma
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Em segundo lugar, porque, como consequência do anterior, se o objetivo é investigar,


não seria necessário instaurar procedimento de impeachment. Para isso, já existem a
possibilidade de criação de uma CPI ou o próprio art. 50 da CF, pelo qual a Câmara dos
Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas comissões podem convocar
autoridades e pedir informações sobre assunto previamente determinado, importando
crime de responsabilidade a negativa.

Em terceiro lugar, porque, se para instaurar uma CPI é necessário “fato determinado”,
então, a fortiori, para admitir o processamento de uma denúncia de impeachment (que
é muito mais grave), é preciso cumprir requisito semelhante, sob a forma de uma
mínima exposição do fato que con gura crime de responsabilidade e todas as suas
circunstâncias (até mesmo para permitir a defesa), acompanhada, ainda, de “justa
causa” consistente em lastro probatório mínimo que embase a acusação. Portanto,
isso reconduz à impossibilidade de usar o impeachment como meio de investigação,
sob pena de confundir causa e consequência.

Remover do cargo um presidente da República para impedir que, com o poder que o
cargo lhe confere, ele cause mais danos à nação, de fato é uma decisão que cabe ao
Poder Legislativo, mas cada vez mais ca a impressão que o impeachment é uma
ferramenta mal compreendida no Brasil: uns pretendem usá-lo como se fosse uma
moção de censura (sem a prática de crimes de responsabilidade), outros querem
instrumentalizá-lo como “procedimento de investigação”, o que converteria o
Congresso Nacional em uma grande CPI, sem qualquer lastro constitucional.

Daí que a ideia da “morte cruzada”, mesmo com todas as críticas, tem o mérito de
garantir algum skin in the game parlamentar, evitando desvio de nalidade e invocações
temerárias de impeachment.

Ao mesmo tempo em que demandaria o sacrifício dos parlamentares se a destituição


do chefe do Executivo for utilizada, confere ao presidente da República algum tipo de
“efeito persuasivo” para a colaboração do Congresso com o governo. Mas, como diria
Millôr Fernandes: “Grande erro da natureza é a incompetência não doer”, uma máxima
que parece ter aplicação geral nessa discussão.

O episódio 48 do podcast Sem Precedentes faz uma análise sobre a atuação do


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essa Tribunal
prática. Saiba Federal
mais em (STF)deem
nossa Política 2020 e mostra o que esperar em 2021. Ouça:
Privacidade.

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Sem Precedentes, ep. 48: o STF em 2020 e o que…


que…
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[1] TALEB, Nassim Nicholas. Arriscando a própria pele: assimetrias ocultas no cotidiano. Rio de

Janeiro, Objetiva, 2018, p. 66.

ROBERTA SIMÕES NASCIMENTO – Professora adjunta na Universidade de Brasília (UnB). Advogada do


Senado Federal desde 2009. Doutora em Direito pela Universidade de Alicante, Espanha. Doutora e mestre em
Direito pela UnB.

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