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Ação Anulatoria Icms Antecipado - NE
Ação Anulatoria Icms Antecipado - NE
DOS FATOS
Ocorre que, nos casos em que o sujeito passivo é optante da sistemática de apuração
denominada “Simples Nacional”, o recolhimento do imposto incidente sobre mercadorias adquiridas
fora do Estado de Pernambuco passa a ser realizado de forma antecipada na entrada do produto no
território estadual, nos termos do art. 363 RICMS/PE (Decreto Estadual n. 44.650/2017):
Art. 363. Na aquisição de mercadoria em outra UF por contribuinte optante do Simples
Nacional, inclusive MEI, o imposto previsto no item 2 da alínea “g” e na alínea “h” do
inciso XIII do § 1º do artigo 13 da Lei Complementar Federal nº 123, de 2006, é devido na
entrada da mercadoria neste Estado, nos termos do Título IX deste Livro. (Dec. 44.822/2017
– efeitos a partir de 1º.10.2017)
- LC n. 123/2006:
Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de
arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
(…)
§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos
ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais
será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
(…)
XIII - ICMS devido:
(…)
g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do
recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal:
1. com encerramento da tributação, observado o disposto no inciso IV do § 4º do art. 18
desta Lei Complementar;
2. sem encerramento da tributação, hipótese em que será cobrada a diferença entre a alíquota
interna e a interestadual, sendo vedada a agregação de qualquer valor;
(…)
E justamente nesse momento que se aplica o redutor de alíquota do ICMS previsto no art.
363-A do RICMS/PE:
1
Art. 363-A. Relativamente ao contribuinte regular quanto ao cumprimento das obrigações tributárias principal e acessórias, nos
termos do art. 339-A, a base de cálculo do imposto de que trata o art. 363 fica reduzida de tal forma que o ICMS devido corresponda
ao montante resultante da aplicação dos seguintes percentuais sobre o valor da base de cálculo originalmente estabelecida para a
operação, nos termos do inciso XI do art. 12 e do item 1 da alínea “d” do inciso II do art. 29 da Lei nº 15.730, de 2016 (Convênio
ICMS 190/2017): (Dec. 53.483/2022)
(…)
I - na hipótese de contribuinte situado na Mesorregião do Agreste Pernambucano e inscrito no Cacepe com atividade econômica
principal classificada em um dos códigos da CNAE constantes do Anexo 19: (Dec. 46.871/2018 - efeitos a partir de 1º.01.2019)
a) 3,42% (três vírgula quarenta e dois por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por cento);
b) 3,53% (três vírgula cinquenta e três por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento); ou
c) 3,73% (três vírgula setenta e três por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento); e
II – na hipótese de contribuinte inscrito no Cacepe na condição de Microempresa, nos termos da Lei Complementar Federal nº 123,
de 14 de dezembro de 2006, inclusive Microempreendedor Individual – MEI, que não se enquadre no caso do inciso I: (Dec.
44.852/2017 – efeitos a partir de 01.10.2017)
a) sendo a alíquota interna de 18% (dezoito por cento):
1. 4,27% (quatro vírgula vinte e sete por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por cento);
2. 4,41% (quatro vírgula quarenta e um por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento);
3. 4,66% (quatro vírgula sessenta e seis por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento); e
b) sendo a alíquota interna de 25% (vinte e cinco):
1. 3,91% (três vírgula noventa e um por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por cento);
2. 4,03% (quatro vírgula zero três por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento);
3. 4,26% (quatro vírgula vinte e seis por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento); e
c) sendo a alíquota interna de 27% (vinte e sete por cento):
1. 3,80% (três vírgula oitenta por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por cento);
2. 3,92% (três vírgula noventa e dois por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento);
3. 4,15% (quatro vírgula quinze por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento).
III - nas demais hipóteses: (Dec. 44.852/2017 – efeitos a partir de 01.10.2017)
a) sendo a alíquota interna 18% (dezoito por cento):
1. 11,96 % (onze vírgula noventa e seis por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por cento);
Foi justamente com base nesse redutor de alíquota que o autor contestou, em procedimento
administrativo próprio, o lançamento de ICMS referente a diversas notas fiscais durante o ano de
2022, tendo sido deferida a alteração pela Secretaria da Fazenda na maior parte das oportunidades,
como exemplifica o caso abaixo (doc. XX):
Ocorre que, apesar de o benefício ter sido deferido em diversas outras oportunidades, a
Fazenda Estadual simplesmente optou por mudar o seu entendimento, indeferindo o redutor de
alíquota das notas abaixo relacionadas (doc. XX):
Competência Nota Fiscal Proc. Contestação Valor da Nota ICMS Calculado ICMS Devido
set/22 10050 2022.000007236651-67 R$ 3.960,78 R$ 1.125,40 R$ 198,84
set/22 90807 2022.000007236651-67 R$ 29.456,28 R$ 7.362,92 R$ 2.020,21
out/22 92827 2022.000008809047-70 R$ 131.915,74 R$ 30.476,80 R$ 9.749,15
nov/22 66291 2022.000009662080-39 R$ 2.462,99 R$ 417,16 R$ 112,65
nov/22 13327 2022.000009662080-39 R$ 5.578,08 R$ 260,73 R$ 361,94
jan/23 7227 2023.000001481313-55 R$ 3.000,00 R$ 809,34 R$ 617,49
2. 9,70 % (nove vírgula setenta por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento); e
3. 5,59 % (cinco vírgula cinquenta e nove por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento);
b) sendo a alíquota interna 25% (vinte e cinco por cento):
1. 16,41 % (dezesseis vírgula quarenta e um por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por
cento);
2. 14,52 % (quatorze vírgula cinquenta e dois por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por
cento); e
3. 11,08 % (onze vírgula zero oito por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por cento); e
c) sendo a alíquota interna 27% (vinte e sete por cento):
1. 17,49 % (dezessete vírgula quarenta e nove por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 4% (quatro por
cento);
2. 15,70 % (quinze vírgula setenta por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 7% (sete por cento); e
3. 12,44 % (doze vírgula quarenta e quatro por cento), quando a alíquota aplicável à operação interestadual for 12% (doze por
cento).
Ou seja, após deferir a aplicação do redutor de alíquota previsto no RICMS/PE em diversas
oportunidades, a Fazenda Estadual simplesmente optou por desconsiderar a aplicação da legislação
pertinente e passou a indeferir as contestações, gerando um saldo devedor em aberto em desfavor do
autor atualmente de R$ XXXXXXXXXX.
Saldo este absolutamente indevido, uma vez que não pode a Secretaria da Fazenda
simplesmente deixar de aplicação uma legislação que já era ordinariamente aplicada, como restará
amplamente demonstrado a seguir.
Art. 339. A base de cálculo do imposto antecipado corresponde ao valor obtido nos termos
do item 1 da alínea “d” do inciso II do artigo 29 da Lei nº 15.730, de 2016.
Parágrafo único. Relativamente ao contribuinte regular quanto ao cumprimento das
obrigações tributárias principal e acessórias, nos termos do art. 339-A, a base de
cálculo fica reduzida, de tal forma que o imposto devido corresponda aos montantes
previstos no art. 363-A, nos termos ali estabelecidos. (Dec. 50.040/2020)
Veja que a exigência legal é tão somente que o contribuinte, optante do Simples Nacional,
esteja regular com a Fazenda Estadual. Nos termos dos arts. 339-A e 272, I, “a”, ambos do
RICMS/PE, regular é o contribuinte que, em suma, (i) tenha enviado todos os arquivos relativos aos
livros fiscais eletrônicos; (ii) cujas notas fiscais estejam sendo emitidas regularmente:
Art. 339-A Para efeito da redução de base de cálculo do ICMS de que trata o parágrafo
único do art. 339 e o caput do art. 363-A, considera-se regular o contribuinte que, além de
cumprir o requisito previsto na alínea “a” do inciso I do art. 272, preencha as seguintes
condições: (Dec. 50.040/2020)
I - tenha efetuado o recolhimento do imposto antecipado constante do Extrato de Notas
Fiscais emitido pelo sistema fronteiras; (Dec. 50.040/2020)
II - não esteja omisso relativamente à transmissão de 2 (dois) arquivos relativos à apuração
realizada por meio do Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples
Nacional - Declaratório - PGDAS-D; (Dec. 50.040/2020)
III - relativamente ao contribuinte enquadrado como Microempreendedor Individual - MEI,
efetue aquisições, computadas a partir de 1º de janeiro de cada ano civil, cujo valor total não
ultrapasse o limite de receita bruta anual previsto para o mencionado enquadramento, nos
termos do artigo 18-A da Lei Complementar Federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006;
(Dec. 50.040/2020)
IV - relativamente ao contribuinte enquadrado como Microempresa - ME ou Empresa de
Pequeno Porte - EPP: (Dec. 50.040/2020)
a) tenha recolhido o ICMS na forma do Simples Nacional no ano-calendário anterior e
continue recolhendo o ICMS da mesma forma durante o ano-calendário em curso,
observada a proporcionalidade prevista na legislação nacional para empresas em início de
atividade; e (Dec. 50.040/2020)
b) efetue aquisições no ano-calendário em curso, cujo valor total não ultrapasse o sublimite
estadual de receita bruta anual, nos termos do § 4º do artigo 19 da Lei Complementar
Federal nº 123, de 2006; (Dec. 50.040/2020)
V - esteja adimplente relativamente a débito constante no sistema de débitos fiscais da
Sefaz, observado o disposto no § 1º do artigo 272; e (Dec. 50.040/2020)
VI - não tenha efetuado, por até 2 (dois) períodos fiscais, consecutivos ou não, recolhimento
do ICMS informado no respectivo PGDAS-D. (Dec. 50.040/2020)
§ 1º A verificação do respectivo enquadramento do contribuinte bem como a do
atendimento aos requisitos dispostos neste artigo devem ser realizadas mensalmente,
considerando-se as informações disponíveis até o período fiscal imediatamente anterior ao
do correspondente imposto antecipado. (Dec. 50.040/2020)
§ 2º A condição de regularidade ou irregularidade do contribuinte somente produz efeitos a
partir do primeiro dia do mês subsequente ao da verificação da respectiva condição. (Dec.
50.040/2020)
§ 3º O descumprimento dos requisitos previstos neste artigo sujeita o contribuinte à
utilização da base de cálculo a que se refere o caput do art. 339. (Dec. 50.040/2020)
Vale salientar que, em nenhum momento da decisão que indeferiu o pedido de contestação
restou indicado o descumprimento de qualquer outro requisito, em total afronta ao disposto no art.
97 do CTN:
Veja que, sendo estabelecido um redutor de base de cálculo de ICMS pela lei e pelo
regulamento próprios, não cabe ao auditor da Fazenda Estadual ou mesmo aos sistemas informáticos
daquele órgão vincular o benefício a determinados produtos ao arrepio da legislação aplicável, como
o fez no presente caso.
Nesse contexto, há de ser reconhecido como indevido o ICMS exigido pela Fazenda
Estadual, ante a impossibilidade de serem acrescentados requisitos sem promulgação de lei própria,
para aplicação do redutor de base de cálculo previsto no art. 363-A do RICMS/PE.
Não bastasse criar uma exigência não prevista na legislação para aplicação do redutor de
base de cálculo, deve-se observar que a fazenda estadual em momento anterior aplicava o redutor
sem qualquer problema, sendo uma surpresa para o autor o momento em que as contestações
passaram a ser indeferidas.
Vale salientar que, o Princípio da Segurança Jurídica se desdobra em duas dimensões: (i) a
objetiva; e (ii) a subjetiva, como destacam Egon Bockmann Moreira e Gabriel Jamur Gomes 2, ambos
professores da Universidade Federal do Paraná:
(a) Impõe ao Estado limitações na liberdade de alterar sua conduta e de modificar atos
que produziram vantagens para os destinatários, mesmo quando ilegais; ou (b) atribui-
lhe consequências patrimoniais por essas alterações, sempre em virtude da crença gerada
nos beneficiários, nos administrados ou na sociedade em geral de que aqueles atos eram
legítimos, tudo fazendo razoavelmente supor que seriam mantidos.
2
MOREIRA, Egon Bockmann; GOMES, Gabriel Jamur. A indispensável coisa julgada administrativa. Rev.
Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 277, n. 2, p. 239-277, maio/ago. 2018.
E mais a frente:
Ora, se não houve qualquer alteração na legislação pertinente estabelecendo o NCM como
sendo um dos requisitos necessários para aplicação do redutor de base de cálculo de ICMS
antecipado qual a justificativa da Fazenda para indeferir as referidas contestações?
Simplesmente não há! O fato é que o contribuinte não pode ser submetido as mudanças de
ânimo dos auditores que compõem o quadro funcional da Fazenda Estadual. Assim, há de ser
reconhecida a afronta ao Princípio da Segurança Jurídica, para reconhecer como nulos os débitos de
ICMS ora discutidos.
A Constituição Federal impõe limites ao poder de tributar, estabelecendo regras para essa
invasão ao patrimônio do contribuinte. Tais limitações estão expressas nos
artigos 150, 151 e 152 da Carta Magna. Há também outras limitações não previstas naqueles artigos,
como, para o nosso caso, o que resta estabelecido pelo artigo 155, § 2º, inciso I da Lei Maior
Nacional.
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
A legalidade tributária, por sua vez, agrega à garantia geral da legalidade um conteúdo
adicional, qualificando-o em matéria de instituição e de majoração dos tributos. Vejamos o
enunciado da legalidade tributária constante do art. 150, I, da CRFB:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.
Violaria frontalmente a legalidade tributária uma cláusula geral de tributação que permitisse
ao Executivo instituir tributo. Seria o caso se a lei autorizasse o ente político por exemplo, a cobrar.
Aliás, não há a possibilidade de qualquer delegação de competência legislativa ao Executivo para
que institua tributo, tampouco para que integre a norma tributária impositiva, ressalvadas apenas as
atenuações constitucionais que se limitam a permitir, relativamente a alguns poucos tributos
expressamente indicados, a graduação de alíquotas nas condições e limites de lei (art. 153, § 1º) ou,
simplesmente, sua redução ou restabelecimento (art. 177, § 4º, b). Estas hipóteses reforçam o
entendimento de que, em todos os demais casos, sequer atenuação será possível, restando vedada a
integração da norma tributária impositiva pelo Executivo, que deve se limitar a editar os
regulamentos para a fiel execução da lei.
A conclusão sobre a completude da norma tributária impositiva depende, pois, não de
uma análise simplesmente literal da lei, mas, isto sim, da possibilidade de se determinar os seus
diversos aspectos ainda que mediante análise mais cuidadosa do seu texto e da consideração do
tipo de fato gerador, da competência do ente tributante e dos demais elementos de que se
disponha em lei, desde que seja desnecessário recorrer a atos normativos infralegais. (PAULSEN,
2012, p. 60/61 – E-Book) (grifos e destaques nossos).
O Professor Sacha Calmon ensina-nos que: A demonstrar a íntima relação entre a legalidade
e tipicidade, há que se fazer referência ao art. 97 do CTN:
Portanto, se a lei for omissa, ou obscura, ou antitética em quaisquer desses pontos, descabe
ao administrador (que a lei aplica de ofício) e ao juiz (que aplica a lei contenciosamente) integrarem
a lei, suprindo a lacuna por analogia. É dizer, em Direito Tributário, a tipicidade é cerrada,
oferecendo resistência ao princípio de que o juiz não se furta a dizer o direito ao argumento de
obscuridade na lei ou de dificuldades na sua intelecção. Na área tributária, o juiz deve sentenciar, é
certo, mas para decretar a inaplicabilidade da lei por insuficiência normativa somente suprível
através de ato formal e materialmente legislativo.
Por último, mas não menos importante, tenha-se em mente que o princípio da tipicidade não
torna o juiz mero autômato. Como vimos, a tipicidade da tributação decorreu da necessidade de
tornar a lei fiscal clara contra o subjetivismo que antes penetrava em seu conteúdo, à vontade do rei,
por seus “ministros”. Ora, quando o legislador não faz norma clara, cabe ao juiz reduzir ao possível a
sua abrangência: in dubio pro contribuinte. Quando não há modo de aplicar a lei, por faltar-lhe
elementos essencial, o juiz decreta a sua inaplicabilidade: nullum tributum sine lege. Quando a lei
fere princípio constitucional, como o da igualdade ou da capacidade contributiva (que está no
fundamento do princípio da isonomia tributária), ou o do não-confisco, o juiz anula a lei em arguição
direta ou incidenter tantum.
Quando a lei, apesar de tudo, é válida do ponto de vista formal e material, mas é injusta em
relação a um contribuinte em particular, por faltar-lhe capacidade contributiva, o juiz pode decretar a
prevalência do princípio constitucional sobre a lei e tira a tributação sobre aquele contribuinte em
particular (isenção judicial). Estamos aqui indo ao extremo do afazer jurisdicional. Quando a
Administração aplica a lei à la diable ou dilarga a sua compreensão, o juiz anula o ato administrativo
ou o reduz à sua real dimensão secundum legem. Noutras palavras: o princípio da tipicidade
contemporâneo da tripartição dos Poderes não controla mais o juiz; é o instrumento de controle em
mãos do juiz. Controlados, em verdade, são o Legislativo e o Executivo. Os beneficiários são o
cidadão e a cidadania.
Temos acima uma verdadeira aula de Justiça Tributária, donde as explanações do Dr.
Calmon aplicam-se diretamente ao caso da Autora, na exata medida em que temos normas ferindo
princípios constitucionais, pois, ao mesmo tempo que a ausência de previsão de compensação
tributária do ICMS para Microempresas optantes do Simples Nacional que realizam operações
interestaduais e internas, fere a NÃO-CUMULATIVADADE, também afeta a própria
LEGALIDADE e, por via de reboque, a TIPICIDADE, como se verá a seguir.
Relativamente ao caso ora posto à análise judicial, estamos diante de matéria que demanda
uma apreciação sistêmica do Decreto Estadual 44.650/17 e da Lei Complementar 123/06 em face da
Constituição Federal, sendo certo que tais normas estão subordinadas a esta última e devem-lhe
respeito pleno, como dito alhures.
Art. 3. [...] § 6º Na hipótese da alínea “b” do inciso V do caput, quando o destino final da
mercadoria, bem ou serviço ocorrer em Estado diferente daquele em que estiver domiciliado
ou estabelecido o adquirente ou o tomador, o imposto correspondente à diferença entre a
alíquota interna e a interestadual será devido ao Estado no qual efetivamente ocorrer a
entrada física da mercadoria ou bem ou o fim da prestação do serviço. (Acrescido pelo art.
1º da Lei nº 17.625, de 31 de dezembro de 2021 - vigência de acordo com o que prevê o art.
2º.)
Art. 24. Nas hipóteses previstas nos incisos XIV a XVII do art. 2º, sobre as respectivas
bases de cálculo, aplica-se o percentual resultante da diferença entre a alíquota interna e a
interestadual vigentes para a mercadoria ou serviço. (Redação alterada pelo art. 1º da Lei nº
17.625, de 31 de dezembro de 2021 - vigência de acordo com o que prevê o art. 2º.).
Observemos na sequência o que dispõe o artigo 13, § 1º, inciso XIII, alíneas g e h, da Lei
Complementar 123/2006 (que institui o regime do Simples Nacional) e que prevê o recolhimento
unificado de tributos Estaduais, Federais e Municipais:
Art. 13. O SIMPLES Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único
de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
VII – Imposto sobre Operações Relativas a Circulação de Mercadorias e Sobre
Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação – ICMS;
VIII – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS.
§ 1o O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes
impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em
relação aos quais será observada a legislação aplicável as demais pessoas jurídicas:
XIII – ICMS devido:
a) nas operações ou prestações sujeitas ao regime de substituição tributária;
b) por terceiro, a que o contribuinte se ache obrigado, por forca da legislação estadual
ou distrital vigente;
c) na entrada, no território do Estado ou do Distrito Federal, de petróleo, inclusive
lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, bem como energia
elétrica, quando não destinados a comercialização ou industrialização. (...)
g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do
recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal:
h) nas aquisições em outros Estados e no Distrito Federal de bens ou mercadorias, não
sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, relativo a diferença
entre a alíquota interna e a interestadual;
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(…)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as
prestações se iniciem no exterior;
(..)§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
I – será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à
circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas
anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;
Ressaltasse que é de suma importância, chamar atenção para o fato notório do ICMS, como
se sabe, é regido pelo princípio da não cumulatividade, consagrado no inciso I, do § 2º, do artigo 155
da Carta Suprema, acima transcrito. Tal dispositivo protege o contribuinte (pessoas físicas ou
jurídicas ou empresários individuais) do efeito cumulativo propiciado pela inserção do tributo no
preço final da mercadoria, garantindo, para tanto, um regime de COMPENSAÇÃO DE
CRÉDITOS fiscais devidos a título de ICMS em razão de operações anteriores.
Como previsto na LC 123/06 as atividades empresárias como também a empresa Autora têm
recolhimento UNIFICADO dos Impostos Federais, Estaduais e Municipais, sendo que em caso de
serem devidos quaisquer deles, principalmente os estaduais, por diferenças de alíquotas, dever-se-ia
oportunizar a compensação futura. Até porque, as operações internas subsequentes às aquisições
extraestado, realizadas pela requerente ocorreram, trazendo ampla e analogamente a aplicação ART.
363-A, DEC. 44650/17, em respeito à ISONOMIA TRIBUTÁRIA (art. 150, II da CRFB/88).
No caso dos autos é latente que inexiste qualquer relação obrigacional tributária entre a
Autora e o Réu no que concerne ao artigo ART. 363-A, DEC. 44650/17 e à Lei 123/06 que não
trataram da compensação tributária para as Microempresas optantes do Simples Nacional, tal como
salientado acima.
Podemos e devemos destacar que, sem sombra de dúvidas, esta exação indevida imposta à
Autora também fere o princípio da capacidade contributiva, na exata medida em que gera
implicações em sua saúde financeira, sobretudo, por ser manifestamente ilegal/inconstitucional.
Cujo reconhecimento por meio de sentença é medida que se impõe.
Mediante o já exposto acima, resta clara que deve ser exposta a obrigação de não fazer ao
Estado de Pernambuco, em face a empresa autora quanto às diferenças de alíquota de ICMS
baseadas nas operações interestaduais realizadas.
Ao mesmo tempo em que, deve ser concedida autorização para que este contribuinte não
pague, outras diferenças de operações futuras realizadas a partir da decisão que indeferiu a dedução
de alíquota, infringindo o art. 363-A, Decreto n. 44.650/2017.
Deve-se, portanto, se impor ordem de inexigibilidade, do diferencial de alíquota por
operação realizada, até que esteja previsto a hipótese de compensação tributária, para as empresas do
simples nacional, determinado em legislação estadual.
Enquanto nas obrigações de dar e fazer o devedor compromete-se a realizar algo, nas
obrigações de não fazer o devedor compromete-se a uma abstenção. (VENOSA, 2006, p. 87/88)
(grifos e destaques nossos).
Desta forma, ao Estado de Pernambuco deve ser imposta obrigação de não cobrar da Autora
tributos inerentes às alíneas h e g do inciso XIII, artigo 13 da LC 123/06 e do artigo 363-A, DEC.
44650/17, nos termos do art 497, ss. Código de Processo Civil, no que concerne a operações
passadas (a partir do parcelamento firmado) e futuras (após o ajuizamento da ação até que o Estado
oportunize por norma a compensação tributária que beneficie a Autora).
No mesmo ato há de ser emanada ordem de autorização para que a Autora não pague
qualquer diferencial de alíquota pertinente àquelas normas, a partir do parcelamento que efetuou no
que tange a toda e qualquer operação que já realizou depois deste período e outras que foram
realizadas no futuro e no curso da ação, até que o Decreto mencionado trate de regulamentar e prever
compensação tributária em favor de EPP´s e ME´s optantes do Simples Nacional.
DA NECESSÁRIA CONCESSÃO
DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem
a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
O instituto acima foi inserto na Lei pelo Legislador infraconstitucional com o intuito de
absoluta cautela e prevenção quanto a eventuais abusos de direitos e situações que exijam
provimento jurisdicional de urgência, a fim de evitar que o jurisdicionado seja lesionado.
b) perigo na demora: se mostra evidente uma vez que a sociedade empresária está
impedida de obter crédito no mercado, está impedido de adquirir insumos para o seu negócio
com pagamento parcelado, além do prejuízo financeiro decorrente da suspensão da concessão
do benefício ora pleiteado. A própria exação indevida denota o periculum in mora, porquanto a
Contribuinte Autora, está sendo verdadeiramente furtada pelo Estado ao ter que pagar tributo
manifestamente indevido, sendo certo que é muito mais dificultoso para o jurisdicionado ter que
contar com a futura e “incerta” procedência do pedido para ter o ressarcimento por meio de
precatório de tudo aquilo que pagou indevidamente.
A Autora, como dito alhures, poderia estar cumprindo melhor sua Função Social se não
fosse a exação indevida que lhe tem sido imposta pelo Estado de Pernambuco e, como ela é
cumpridora de seus deveres, tem pago fielmente o parcelamento firmado, cuja exigibilidade há de
ser suspensa por ordem judicial. Mesmo porque, repita-se, a Autora não pode continuar sendo
compelida a pagar o parcelamento de tributo manifestamente indevido, haja vista que a manutenção
desta obrigação lhe causa déficit de capital de giro, o que repercuti, no exercício de sua atividade
empresarial como um todo.
Ora Excelência, deve-se observar que alguns projetos propostos pela empresa e com
negociação em andamento incluem o fornecimento de material, e, consequentemente, da obtenção de
crédito para a efetivação das compras que devem ser imediatas após o fechamento do contrato, trata-
se da fase de mobilização da obra.
Não é demais frisar que, mesmo se a Administração Pública entender que o processo
administrativo fiscal deveria continuar, seria indiscutível a suspensão da exigibilidade do crédito,
nos termos do art. 151 do CTN:
Vale salientar, ainda, que não há que se falar em irreversibilidade da medida, isso
porque caso esse juízo entenda que não deve ser dado cumprimento à decisão administrativa, o
processo administrativo terá seguimento para reanálise da impugnação ao futuro auto de
infração.
DOS PEDIDOS
a) Preliminarmente:
a.1) Que seja concedida a tutela de urgência com a devida suspensão da exigibilidade do
crédito tributário em questão, até o trânsito em julgado deste processo, nos termos do art.
300 do CPC/2015 c/c art. 151 do CTN;
a.2) Impor obrigação de não fazer ao Estado de Pernambuco, para que se abstenha de
realizar qualquer cobrança da requerente a título de diferencial de alíquota, autorizando
em ato contínuo, à requerente ao não pagamento daquele tributo por operações
interestaduais realizadas, modulando os efeitos da decisão à data do deferimento
administrativo, qual seja 18.05.2023, durante o curso desta ação, e até que seja
regulamentado pelo Estado a compensação e/ou restituição tributária (s) prevista (s) na
Constituição Federal de 1.988 (art. 155, § 2º, I).
b) Que seja o réu citado para, querendo, oferecer defesa, sob pena de revelia;
Dá-se à causa o valor de R$ 88.724,71 (oitenta e oito mil setecentos e vinte e quatro reais e
setenta e um centavos).
Em tempo, com base no art. 272, §5 do NCPC, sob pena de nulidade, que sejam todas as
futuras notificações e intimações referente a este feito realizadas exclusivamente em nome de
LOUISE DANTAS DE ANDRADE, advogada inscrita na OAB/PE sob o n. 30.392 e THAYS
MEIRELLY VALENÇA DE PAIVA, advogada inscrita na OAB/PE sob o n. 41.570, ambas com
endereço na Rua Padre Carapuceiro, n. 968, Torre Janete Costa, sl 1805, Boa Viagem, CEP 51020-
280.
Nestes termos,
P. deferimento.
Recife/PE, 23 de novembro de 2023.