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FEM) Regina Araujo Raul Borges Guimaraes Conex6es Estudos de Geografia do Brasil Capitulo Formacao étnica e diversidade cultural fey O Linguagem MEIRELLES, V Visao do mundo “0s indios perceberam a chegada do europeu como um acontecimento espantoso, s6 ‘ssmilavel em sua visio mitica do mundo. Seria gente de seu deus So, o criador — Maira — ue vinha milagrosamente sobre as ondas do mar grosso.[..] Provavelmente seriam pessoas generosas, achavam os indios. Mesmo porque, no seu ‘mundo, mais belo era dar que receber. Ali, ninguém jamais espoliara ninguém e a pessoa alguma se negava louvor por sua bravura e criatividade, (..] Pouico mais tarde, essa visio idilica se dissipa, Nos anos seguintes, se an 40 seu contrario: 0s indios comecam a ver a hecatombe que caira sobre ele PORTINARI, Candido, Ode imento do Brasl, 1956, oo a) Quais fatos historicos sao apresentados nas duas telas? Det ue eee rd Oe de ee ee eee) ma cena, em cada uma das obras? 4) A partir da leitura do texto e de acordo com seus conhecimentos, & correto afirmar que o encontro entre portugueses e indigenas nao ones eeu cd BA nacido brasileira Anacio surge quando existe um sentimento de iden- tidade ede pertencimento entre seus integrantes. No caso. dos brasileiro, apesar das diferentes matrizes formadoras eda diversidade cultural, existe um forte sentimento de identidade, que se manifesta no compartilhamento de tradig6es, da lingua falada e de uma histéria em comurm. Nesse sentido, podemos falar em povo brasileiro, palavra que assume o mesmo significado que nacio. ° brasileiro nasceu em 1822, com a Procla- mago da Independéncia. A formacao da identidade nacional brasileira, contudo, € fruto de um processo histérico de longa duracao. Em parte viabilizado pela integragao entre as diversas partes do territ6rio, esse processo foi, no entanto, marcado pela violenta supres- so de direitos e pela negacao da culturae da identidade étnica de muitos povos, principalmente de indigenas e africanos escravizados. Saiba mais sobre isso no quadro Conexées: Linguagem Contudo, diante da reptessao, diversos povos e etnias subjugadas organizaram movimentos de resis- téncia, refugiando-se em comunidades libertas onde lutaram — e ainda lutam — pela preservacao de sua cultura e de seus valores, Gracas a essa confluéncia de povos diferentes, o Brasil se transformou em uma na- 80 etnicamente diversa e multicultural (figura 5.1) Conexdes O povo-nacao “O povo-nagio nio surge no Brasil da evolugio de formas anteriores de sociabilidade, em que grupos humanos se estruturaram em classes opostas, mas se conjugam para atender as suas necessidades de sobre vivencia e de progresso. Surge, isto, sim, da concentra: Gio de uma forca de trabalho escrava, recrutada para servir a propésitos mercantis alheios a ela, através de processos tio violentos de ordenacio e repressio que constituiram, de fato, um continuado genocidio e um etnocidio implacével.” RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro Sto Paulo: Circulo do Livro, 1995. p. 23 Genocidio. Assassinato em massa de um povo devido a problemas étnicos,religiosos ou politicos. Etnocidio. Destruicéo da cultura de um povo. Observe as imagens. Vocé consegue identificar alguma tentativa de preservacao da cultura original desses povos? Figura 5.1 Elementos affo-brasileiros e catdlicos se misturam numa associacdo de crencas. Foto tirada na Bahia em 2003 — oe Embora mantenha apenas uma lingua oficial, 0 pals conserva a riqueza das culturas originais, da fusio entre elas e de outras que a elas se somaram. fssa riqueza se manifesta, por exemplo, nas artes plisticas, na musica, naliteratura, nos costumes, no modo de falar, na culinaria e na religiéo. O povo brasileiro Com 0 atual desenvolvimento das pesquisas no ramo da ancestralidade gendmica, foi possi- vel estabelecer a contribuicdo das trés matrizes bisicas para a formacao do povo brasileiro — indigena, europeia e africana. Esses estudos comprovam a riqueza genética da populacdo ea Intensa miscigenacdo, que desde o periodo colo: nial tem caracterizado o processo de formacao da populacao brasileira: ainda nio foi encontrado um $6 brasileiro 100% europeu ou 100% africano. A maioria dos chamados brancos brasileitos possui tracos de indigenas e de africanos em seu DNA, ou Seja, a maior parte da populacao brasileira é constitulda de mesticos (figura 5.2) Ancestralidade genémica. Anilise dos genes Embora sejam classificadas como tendo pele vermelha, distribuldos pelo genoma para medir de onde amarela, branca ou preta, nenhuma pessoa no mundo tem na pele \vém os ancestrais de uma pessoa exatamente essas cores. & 5 E Jogar capoeira e Indios em suas cabanas s80 gravuras feitas pelo artista alemso Johann Moritz Rugendas em sua viagem a0 Brasil, no inicio do século XIX 6 Dentre os mesticos, também chamados de pardos, ‘grupo mais numeroso 60 mulato (mestio de europeu e africano), devido a elevada miscigenacao entre portu- gueses ¢ africanos, desde o periodo colonial. Também temos 0 caboclo ou mameluico (mestico de europeu e indigena) e 0 cafuzo (africano e indigena). 0 IBGE utiliza as denominacées preta, branca e amarela para classificar as pessoas de acordo com a cor de pele. Utiliza, também, as denominacées parda e indigena. A denominaao"parda"terminou sintetizando aintensa mesti¢agem ocorrida no Brasil, englobando as expressdes cafuzo, caboclo e mulato. Atualmente, porém, prefere-se utilizar as denomi- nacées afro-brasileiros e euro-biasileiros para os des- cendentes de povos africanos e de europeus, respectiva- mente, Também podem ser utilizadas as denominacées euramerindios (mesticos dé europeus e indigenas) € eurafricanos (europeus e africanos). Devido a grande entrada de escravizados africanos durante 0 petiodo colonial, em 1800 a populacao afro- -brasileira correspondia 4 quase metade da populacao (4796);0s mesticos representavam 30% eos euro-brasilei- ros, 23%. Em 1880, a populacdo afro-brasileira jé estava reduzida a 20%, 0s euro-brasileiros contavam com 42% € 05 mesticos, 38% da populacao total. A diminuigao da populacao afro-brasileira no final do século XIX e 0 aumento progressivo da populagao euro-brasileira se devem, entre outros fatores, & miscigenagao e a chegada de imigrantes europeus as lavouras de café, apés a abolicéo da escravidao (1888), com destaque para italianos, ale- maes, japoneses outros, como veremos no capitulo, 6. Observe a figura 5.3. BD Povos indigenas no Brasil Osindigenas habitavamas terras que hoje pertencem ao Brasil antes da chegada dos europeus. A populacéo indigena, estimada entre 2 € 10 milhdes no comego do século XVI, atualmente esta reduzida a cerca de 460 mil, Como nao ha um censo indigena, esses célculos aprox- mados so da Funda¢ao Nacional do Indio (Funai). Esse numero corresponde a cerca de 0,3% da populacao brasileira e refere-se apenas aos indigenas que vivem em aldeias e terras demarcadas. Estima-se que existam mais de 100 mil individuos fora dos territérios demarcados. Segundo dados do Conselho Indigenista Mission: rio (Cimi), até 2000, jé haviam sido extintos mais de 1.470 povos indigenas nativos das terras que hoje formam o Brasil. Observe a figura 5.4. Entre 0 século XVI e 0 final do século XX, a popula- 0 indigena sofreu drastica reducao, caracterizando. um processo de genocidio desses povos, iniciado com a colonizacao, movida por interesses mercantis, pela busca de riquezas e pelo lucto. Entre as causas dessa reducdo, podemos citar: + a expansdo da ocupagao territorial pelos nao indige- nas ea diminui¢o do territério indigena. £ necessério compreender que 0 territério é a fonte de recursos de sobrevivéncia dos indigenas e se constitui por meio das relacées desses povos com a natureza. Eles necessitam do territorio para se deslocar, cacar, pescar e desenvolver suas atividades culturais; + as guerras de exterminio. Apesar das leis que vigora- ram nos séculos XVI e XVII proibindo a escravizacao de indigenas, permitia-se a“querra justa" contra grupos que reagissem aos portugueses ou os atacassem, Na realidade, os indigenas reagiam contra a escravi- Za¢ao e em defesa de seu territério; Figura5.3 Brasil: distribuigio da populacio por cor (% da populacao total) 1880 1940 Mi cvrobrasires (NN Mestios MM Arobasievos Bl Amarcioseindigenas Ce Fontes: Anuar esttistico do Brasil 1998, Rio de Janeiro: IBGE, 1999; Estatstcas do século XX, Rio de Janeico: IBGE, 2006. p. 50; Sintese dos indicadores socais 2006. Rio de Janeiro: IBGE, 2006. 248. __) [-* Com base nos graficos analise a evolucao da distribuicao Y da populacao brasileira por cor. Aegio Sul 33 poves Reid Sudeste 143 povos FesitoNordeste 344 pows FealioCentro-Oeste 137 pows AegiioNonte 820 povos Fontes: elaborado com base em IBGE; Cimi. Disponivel em wowibge goubbr; www.clmiorgbr. ‘Acesso em 10 jun, 2009, Grupos indigenas extintos - populacao estimada no século XVI Revore 2 Populacdo original 20000 | Tamoio 2am, Populacto original 25.000 e | Identifique no mapa os grupos indigenas que contavam com 30 mil ‘ou mais habitantes no século XVI situagao de seu estado regio quanto ao niimero de povos indigenas extintos. + aescravizacdo e a intensa exploraco da mao de obra indigena. Acostumados a uma organizacio social solid riae ao trabalho para si préprios e para obem do grupo, muitos resistiram até a morte ao trabalho escravizado; + adisseminacao de doencas trazidas pelo colonizador (varlola, gripe, sarampo) perante as quais eles nao ti- nham imunidade causou muitas epidemias. Os povos europeus, apés séculos de contato, j4 contavam com certa resisténcia a essas doencas. © contato com os ndo indigenas (consentido ou por meio do cativeiro) e a politica de assimilacao (integragao a sociedade nacional) ainda obrigaram os indigenas a abandonar seus valores e sua religio, ado- tando na maior parte das vezes o cristianismo. Diante da opressao, porém, diversos grupos fugiram para areas interioranas, com 0 intuito de defender a integridade indigena e preservar a cultura da tribo ~ tentativas muitas vezes frustradas. Desde a década de 1980, porém, tem havido certa recuperacéo das taxas de crescimento da maior parte dos povos indigenas. Apesar de lento, esse crescimento esté revertendo o processo de extingio de alguns desses povos. Atualmente, porém, a maior parte dos indigenas brasileiros esta aculturada, ou seja, adaptou-se aos cos- tumes da sociedade dominante. Muitos andam vestidos com roupas como as nossas, frequentam as “escolas dos brancos’ utilizam tecnologias modernas (televisao, videos, telefones), falam portugues etc. No entanto,, ainda se consideram indigenas e tentam preservar suas tradicdes. 0 critério utilizado parao reconhecimento de um individuo como pertencente a uma etnia é a auto- identificagao, ou seja, €0 fato de a pessoa se considerar indigena, conservar costumes, hébitos ou ser leal 3s tradigdes de seus ancestrais. Entretanto, se a maioria da populacao indigena no Brasil ja se adaptou aos costumes da sociedade domi- nante, existe uma minoria que se mantém praticamente Sonexies JYFTY “O grupo, que nunca manteve contato com branco: esti cercado: a menos de quatro quilémetros da regido onde vive hé madeireiros e posseiros armados. Mais adiante existem quatro aldeias dos ferozes urueuauaus, | uma das iltimas etnias guerreiras da Amaz6nia, Os jurureris sio inimigos mortais dos 200 guerreiros urueuauaus distribuidos por quatro aldeias. Eles néo Responda. a) Somente a Funai pode autori- zar 0 contato com os indigenas isolados, mas a politica atual desse drgio é ndo buscar in- tegracdo ou aproximacdo de qualquer tipo com eles. Apre- sente pelo menos uma razio que justifique essa politica da Funai. : 1) Quando alguém entra em terri- i tério que os indigenas isolados consideram deles, eles reagem. = Em sua opinio, por que os in- digenas tomam essa atitude? Indigenas da aldeia Rouxinol peneiram a fatinha do belju, feita a partir da mandioca » (Manaus, AM, 2008). Comunidade indigena desconhecida, de apenas 8 ou 10 individuos, esta prestes a se extinguir na Floresta Amazénica q isolada e evita 0 contato com “o homem branco": os chamados indigenas isolados. Vivendo em lugares distantes e de dificil acesso para evitar 0 contato com 05 nao indigenas, esses povos procuram preservar sua cultura e sobrevivem ainda da caga, da pesca, da coleta eda agricultura incipiente. Saiba mais sobre o assunto no quadro Conexées: Escala, Povos tutelados Em 1973 foi promulgadoo Estatuto do Indio, segur- do 0 qual os indigenas seriam relativamente capazes 0u seja, nao estariam aptos a exercer plenamente seus direitos civis, devendo por isso serem tutelados por um, {61g30 indigenista estatal, até que estivessem integrados a sociedade nacional (o que na pratica significaria asst milagio da cultura dominante). De acordo ainda com, © Estatuto do Indio, caberia ao Estado proteger esses, povos e prové-los de educacao e satide. permitem aproximacao de outras tribos. Enquanto isso, madeireiros e colonos avancam nas terras do Parque Nacional do Pacads Novos, Rondénia, a cerca de 550 4quilémetros de Porto Velho. [..]” | SALINA, Nilton. Jurureri, uma tribo isolada do mundo ¢ perto da extingao. O Estado de S. Paulo, '5 maio 2005. Nacional, p. Al — A Funai, criada em 1967, substituiu o Servico de Protegao ao Indio (criado em 1910) e é atualmente o 61980 responsdvel pela tutela dos indigenas. AConstituigao brasileira de 1988 reconheceu direitos permanentes aos indigenas, entre eles oditeito a terrae Amanutengao de suas organizagdes social e cultural. Indigenas no século XXI Fazendo parte néo s6 do passado, mas também do presente da sociedade brasileira, os indigenas que chegaram ao século XI enfrentam inimeros problemas para manter seus recursos ambientais, sua cultura e seu modo de vida, De acordo com entidades indigenistas, existem atualmente no Brasil 241 povos indigenas, que, a0 todo, falam 180 linguas diferentes. Seja morando em aldeias, sejaem agrupamentos mistos ou em reservas indigenas, esses povos vivem em constante disputa por terras com fazendeiros, construtores de estradas, madeireiras, em- presas mineradoras e grileiros. Embora muito tenha sido feito para a preservacio dessas etnias, ainda persistem indicadores sociais preo- cupantes. Segundo a ONU (Relatério do desenvolvimento humano 2004), os povos indigenas recebem, muitas vezes, menos cuidados de satide que o restante da popu- lacdo.Em 2003, 0 governo brasileiro gastou 7 délares per capita em cuidados de satide para a populacao indigena, contra 33 délares em média para 0 pais. Em algumas tribos, detectou-se um elevado nivel de desnutricéo infantil figura 5.5). 0 caso, por exemplo, dos indigenas quarani-kalowd, em Dourados, no Mato Grosso do Sul. A reduco de suas terras diffcultou a agricultura, obrigando-os a trabalhar em usinas e fazendas da regio, Muitos sofrem com 0 alcoolismo ou se tornaram mendi- gos em reas urbanas; no conjunto, os guarani-kaiowd ainda apresentam elevada taxa de suicidio. Todos esses problemas favoreceram a consclentiza- {¢40 e organizacao dos indigenas. Nas décadas de 1970e 1980 surgiram varios movimentos e entidades nacionais e internacionais de apoio a causa indigena Um exemplo é 0 Consetho Indigenista Missionario (Cimi), criado em 1972, Esse organismo, vinculado & igreja catdlica, busca favorecer a integracao entre aldeias @ povos dispersos, promover assembleias indigenas e garantir a diversidade cultural. Em 1992 foi fundada 0 Capoib (Conselho de Articu- lagdo dos Povos e Organizacées Indigenas do Brasil), de pois da curta experiéncia de representacao nacional da LUNI (Unio das Nagées Indigenas), formada em 1980. No entanto, devide & dispersio territorial das socie~ dades indigenas, a maioria de suas organizagoes tem um cardter étnico ou uma base locat. So exemplos a CGT (Conselho Geral da Tribo Ticuna) ou o CIR (Conselho Indigena de Roraima). Depois de muito utarem por seus direitos, liderancas indigenas ingressaram em diversas instituicdes da socie- dade brasileira e passaram a participar dos mecanismos politicos nacionais. Atualmente, diversos indigenas exer- cem cargos publicos, pois ndo hé qualquer restrico a0, indigena em votar e ser candidato, desde que ele seja capaz de se expressar em portugues. Tutelados. Que estdo sob protegéo e cujos bens devem ser administrados por outra pessoa ou érgao nomeado judicialmente Grileiros. Pessoas que se apropriam ilegalmente de terras utilizando escrituras falsas e expulsando seus ocupantes Alem da extingao de tribos inteiras,a tutela exercida pelo Estado sobre os povos Iindigenas 1ndo tem sido suficiente para resguardar 0 direito desses povos. Criancas da tribo guarani na aldeia Jaragus, localizada no ‘municipio de S80 Paulo (SP, 2006) 19 Conflitos pela posse da terra Em 2007, a Funai reconheceu 611 terras indigenas. Desse total, 398 estdo demarcadas e o restante, em processo de demarcagio. Embora os povos indigenas representem por volta de 0,3% da populagao brasileira, suas terras ocupam 12,4% do tertitério nacional, sendo ‘que a maior parte se concentra na Amazénia. ‘Muitos afirmam que os povos indigenas soa melhor resistencia contra a destruigo da floresta amazénica, uma vez que utilizam 0s recursos naturais apenas para subsisténcia, No entanto, mesmo com terras demarca- das, odesmatamento aumenta nosllimites das reservase avanca para dentro delas. Em Mato Grosso, por exemplo, tem aumentado o cercoas terras indigenas coma expan- sao da soja mecanizada. Além disso, a demarcacao de terras indigenas contraria interesses de grandes madel- reiras, mineradoras, entre outras empresas, atraidas pelas ‘enormes reservas minerais que se concentram nessas terras; dai os intimeros conflitos. Observe a figura 5.6. A demarcagao das terras ianomamis, ocorrida em 1991, por exemplo, gerou criticas de setores militares, que veem nessa nova situacao uma "abdicacao da so- Figura5.6 Terras indigenas iH Demarcadas mdemarcacao berania” sobre a faixa de fronteiras. Com 9,4 milhdes de hectares — aproximadamente o tamanho do territid de Portugal — e cerca de 10 mil pessoas, os indigenas dessa reserva habitam o Brasil e a Venezuela, com tri sito livre entre as fronteiras. Os militares temem que essa regio, rica em biod versidade, madeira, minérios (ouro, cassiterta, diamante estanho, zinco, cobre) e agua possa suscitar interesses dl outros paises. Também é motivode preocupacies a grande uantidade de ONGs estrangeiras com interesse na regia ujos integrantes circulam livremente por essas areas. Mais recentemente, 0 debate girou em torno do ‘cumprimento da lei que demarcou definitivamentea Terra Indigena Raposa-Serra do Sol, uma drea conti gua de 1,6 milhao de hectares no nordeste de Roraima na qual vivem cerca de 15 mil indigenas. O govern estadual e setores das Forcas Armadas lutaram e ainds lutam para que a reserva seja ffacionada, de formaa garantir a presenca dos agricultores e do Exército na regido. Para cumprir 0 que esta previsto em lel, a po- pulacao de ndo indigenas deve ser retirada das terras, (© que foi objeto de muita resistencia (figura 5.7) Fonte: GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposigo tebrico- ‘metodolégica de uma cartografa geogrifica critica e sua aplicagao no desenvolvimento do atlas da questdo agréria brasileira, Presidente Prudente: Unesp, 2008 [* Em qual regio | do Brasil estéo concentradas as Terras indigenas? Explique por qué. I Outras Tera Indigenase Unidades de Conserv rque Nacional do Monte Roraima — Wrogratia| — odouia pavimentade = odoua sem pavimentacso (anté municipio BA presenca africana no Bras’ 0s primeiros grupos de africanos escravizados de- sembarcaram no Brasil por volta de 1550. A captura de pessoasna Africa e sua venda nas Américas eram essen- iis para o aumento da producao colonial, permitindo aintensificagao das trocas de matétias-primas tropicais por manufaturados entre a América e a Europa Se por um lado a mao de obra escravizada foi es- sencial para garantir os empreendimentos econdmicos cloniais, por outro, 0 préprio trafico de escravizados s2tornou um negécio rentdvel, mantendo-se ativo por séculos. Apenas em 1850, com a promulgacao da Lei Eusébio de Queirds, essa atividade foi proibida. No entanto, 0 escravismo perdurou até 1888, quando a Lei Aurea aboliu a pratica. {As péssimas condig6es de transporte dos africanos emnavios negreiros,a exploragao intensa do seu traba- Iho, os castigos impostos e as condigdes precarias de vida faziamos indices de mortalidade superar os nascimentos desse grupo. Além do impacto demografico causado na Africa, esse quadro acabava alimentando ainda mais 0 Fonte; Amazdnia, Disponivel em wwwamazoniaorgibr. Acesso em 15 abr, 2008, wa57_ Roraima: Terras Indigenas e Unidades de Conservagao | ‘Area da Reserva Raposa- Serra do Sol ¢ de 17 mil km. ( total de érea indigena em Roraima é de 104 mil km? ea tea do estado ¢ de 224 milk’. Estabeleca a relacdo de proporcionalidade entre a érea da Reserva Raposa-Serra do Sol, a drea total das reservas indigenas e a area do estado. tréfico de pessoas, tdo baixa era a expectativa de vida do negro escravizado. De acordo com o Relatério do desenvolvimenio hu- ‘mano - Brasil, 2005, foi por meio do comércio de cativos ‘e da exploracdo de seu trabalho que se acumularam as maiores fortunas do Brasil, na virada do século XVIll para oXIX":Odesempenho da economia dependia da mao de obra africana, utilizada em diversas atividades produtivas fundamentais. Essenciais nas plantacdes de cana-de-act- ar,na mineragao e inicio do cultivo do café, 0s aricanos escravizados também eram responsaveis pelo cultivo de subsisténcia, tal como as lavouras de mandioca, milho, feljd0, parao seu préprio sustento e odo senhor, além de participarem nos trabalhos domésticos e urbanos. Diversidade étnica, resisténcia e heranca cultural africana Do século XVI ao XIX desembarcaram no Brasilentre 3.6 milhOes de cativos da Africa, pertencentes a diver- sas etnias, com dialetos, linguas e costumes diferentes, Observe a figura 5.8, na pagina seguinte. ATLANTICO ~~ Tratico de escravos para as Américas 1. Trfico de escravos para o Oriente eo Mediterraneo Fonte: CAMPOS, Flavio de; DOLHNIKOFE, Miriam. Atlas: ‘io Paulo: Scipione, 1993. p. 9. icanos que vi storia do Brasil ram para o Brasil? De acordo com 0 mapa, quais foram os dois principais grupos étnicos de O grupo étnico banto proveniente da regido sudeste © sudoeste da Africa (Angola, Congo e Mocambique) desembarcou preferencialmente no Rio de Janeiro. J sudaneses trazidos da costa ocidental da Africa, de regides préximas a0 golfo da Guiné, desembarcaram principalmente na costa nordeste do Brasil, Representa- dos por grupos islamizacos (que praticavam a religido mulcumana ou islémica), como os haticas ou males, do norte da atual Nigéria, € os mandingas, e por grupos 1ndo islamizados, como os iorubas ou nag6s, também da atual Nigétia, daomés ou gegés, de Benin, e pelos fanti-ashanti dos atuais Costa do Marfim, Libéria, Sera Leoa e Gambia, Para evitar insurgéncias e rebelides, os senhores de escravos adotavam a politica da dispersdo, ou seja, espa thavam o maximo posstvel os grupos étnicos; assim, ele 1ndo podiam se comunicar,instalando ainda um clima de hostilidade entre as diversas etnias. No entanto, o anseio de liberdade estava present e se manifestava das mais variadas formas. Os movi- mentos de resisténcia a escravidao se revelavam no cotidiano, na forma de trabalhos malfeitos, brigas ¢ desobediéncias, em fugas constantes ena organizagio de irmandades religiosas. Muitos escravizados que escapavam buscavam os , geralmente estabelecidos em regiées de dificil acesso, onde a populacao se refugiava do trabalho escravo e dos maus-tratos, a fim de viver em liberdade. Nio s6 africanos se escondiam nos quilombos, mas também indigenas e trabalhadores livres, porém mar- ginalizados, No Brasil, estavam certificados, em 2008, 1.170 ocupados por comunidades remanescentes de populagdo escravizada (figura 5.9). Apesar de a Constituicéo Federal de 1988 garantir aessas comunidades o direito a terra por elas ocupada, aregularizacao e a entrega de titulos tem demorado a acontecer, o que leva grande parte desses povos a en: frentar conflitos, dificuldades e ameacas de despejo. Participagao afro-brasileira na politica eno mercado de trabalho Aabolicao da escravatura nao significoua integragao dosex-escravizados ao conjunto da sociedade. A falta de polticas capazes de assegurar direitos e oportunidades paras afro-brasileiros acabou por impelir uma multidao, deex-escravizados, sem qualificagao para o trabalho, a ‘cupar postos menos valorizados e habitar dreas degra dadas nas cidades ou no meio rural. Figura 5.9 Os remanescentes de quilombos enfientam diversos problemas, comoa destruigao das rmatas, de sua cultura e tradicGes. Na foto abaixo, a ‘camunidade quilombola Pedro Cubas, no municipio Ge Eldorado (SP, 2008), Desde a época colonial, a situacdo de excluso e de preconceito vivida pelos afro-brasileiros, pelos indigenas e pelos pardos funciona como uma barreira que impede a ascensao social e econémica. Podemos supor que esse é um dos motivos que levou grande niimero de pessoas a néo se autodeclararem negras, nos recenseamentos, mesmo apresentando caracte- risticas africanas. Aintensa mesticagem ocorrida no Brasil aumentou © numero de pardos na populagdo. Muitos mesticos ocuparam cargos de confianca desde a época colonial. No entanto, cargos de maior importancia sempre foram atribuides 8 populagao de descendéncia europeia A representacao politica de um grupo facilita suas reivindicagées e negociacées. A populacdo afrodescen- dente atualmente ainda se encontra sub-representada, desempenhando, por exemplo, poucas fungdes de destaque no legislativo e no judiciario. Veja a figura 5.10, na pagina seguinte. Essa-sub-representagao da populacao afrodescendente no ambito federal acarreta (graves consequencias, pois é nessa esfera que se tomam ‘as maiores decisoes de um pals Embora 0 Brasil seja 0 pais com a segunda maior populacao negra no mundo, dados do Relatério de desenvolvimento humano ~ Brasil, 2005 indica que nas duas ultimas décadas do século XX a renda per capita média dos negros representou apenas 40% da obtida pelos brancos. Inumeras pesquisas mostram aexisténcia de desigualdades em diversos niveis: satide, educacao, emprego, habitacao e renda ( Figura 5.10 Cargos do judiciario ocupados segundo a cor - 2000" Brasil, 2005: racismo, pobreza e violéncia, Slo Paulo; PrimaPagina, 2005 envolvimento humano |-® De acordo com o grafico, qual populacao apresenta maior porcentagem de pessoas com 16 anos ou mais de estudo? E qual apresenta a menor porcentagem? Qual delas ocupa mais cargos no judiciério? E qual tem menos espaco nesse tipo de carreira? Segundo a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, em setembro de 2006 a populacao declaradamente preta ou parda representava 42,8% das 39,8 milhdes de pessoas com 10 anos ou mais de idade em seis regides metropolitanas (Sao Paulo, Rio de Janeiro, Belo Hori- zonte, Salvador, Recife e Porto Alegre). Essa populacdo apresentava menos escolaridade e um rendimento mé- dio equivalente & metade do recebido pela populacio branca, Jd a taxa de desocupacao de pretos e pardos (11,8%) era superior & dos brancos (8,6%). Movimentos afro-brasileiros 5 ‘Aclongo dos séculos os afro-brasileiros tém organize | do movimentos de resistencia contra o preconceito racial} epela defesa dos seus direitos politicos e civis, Atualmente existem centenas de entidades negrasno Brasil quese mo bilizam na defesa e ampliacao das conquistas obtidas. Na Constituicdo de 1988, foi tipificado o crime de racismo, entendido como ato ofensivo a dignidade de uma classe, Desde entéo tém crescido as dentincias de discriminagéo racial, No entanto, apesar das leis e das me- didas de punicao ao racismo, ele persiste na sociedadee abrange muitas vezes ndos6.corda pessoa, mas também acondicaosocial. A exclusdo social se associa ao processo de discriminagao. No Brasil mais da metade da populacéo, debaixa renda é affodescendente.E, emboraaclassemé- dia brasileira conte hoje com uma parcela significativa de afrodescendentes, em geral eles também experimentam maiores dificuldades do que os brancos para transfor. mar escolaridade em ascensao econdmica e convertera educagio em renda, comprovando-se que a mobilidade social —capacidade de se movimentar entreas diferentes camadas ou estratos da sociedade — ascendente dos afro-brasileiros continua limitada (figura 5.11). A populacao afto-brasileira enfrenta, ha séculos, inumeras desvantagens para alcancar a chamada mobilidade ocupacional — ou seja, a capacidade de acesso ao mercado de trabalho e a uma carreira. Com © objetivo de reparar essa falha social e minimizar as consequéncias dos efeitos perversos dessa situacao é que se tem elaborado politicas de nao discriminacio ativa, voltadas a promocao de grupos minoritérios, Vale dizer, porém, que a populagao negra e parda, segundo © IBGE, somava 44,7% da populagao brasileira em 2000. Ou seja, nao séo exatamente minorias. Figura 5.11 Apesar das indmeras dificuldades, muitos afrodescendentes se destacam na vida econdmicae cultural de nosso pais. Gilberto Gil, Daiane dos Santos, Pelé e Lazaro Ramos exemplificam a significative atuacao da comunidade afrodescendente nas atividades culturais, politicas e esportivas brasieiras. - No entanto, por meio dessas politicas pretende- ‘se garantir a presenca desses grupos em empresas, escolas, instituicées publicas e universidades, com 0 objetivo de diminuir as desigualdades étnicas. A lei de cotas, por exemplo, instituida em 1999, reserva uma porcentagem de vagas do ensino e do mercado de trabalho para grupos historicamente marginalizados (afrodescendentes, mulheres, deficientes, populagso, de baixa renda etc.). Muitas universidades j4 adotaram o sistema de cotas no que se refere aos afro-brasileiros, indigenas e alunos provenientes da rede publica de ensino fundamental e médio. No entanto, essa politica & objeto de acirradas polémicas. Leia mais sobre isso no quadro Conexdes: Pollticas.

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