Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
As Metamorfoses de Satã
As Metamorfoses de Satã
O objetivo deste artigo é rastrear as pegadas de Satã até descobrir de qual inferno ele
surgiu, utilizando-se para isso de uma abordagem da arqueologia que a considera como
"conhecimento do poder", abordagem esta apresentada no artigo de Pedro Paulo Abreu
Funari: Teoria e Métodos na Arqueologia Contemporânea: O Contexto da Arqueologia
Histórica.
Em outras palavras, este artigo visa interpretar o mito de Satã através de sua
dimensão ideológica intimamente ligada à ideia de poder e sua contestação. Numa
abordagem transdisciplinar com a Psicologia Analítica, Satã foi considerado neste trabalho
como um arquétipo, um símbolo universal presente no espírito humano e que ora foi
interpretado de maneira benéfica e ora de maneira maléfica. Marcos Callia, no artigo
“Terra Brasilis: pré-história e arqueologia da psique” dá uma interessante definição de
arquétipo:
(a)
Licenciado em História / Bacharelando em Arqueologia e Preservação Patrimonial, Universidade Federal
do Vale do São Francisco.
(b)
Bacharel em Medicina Veterinária / Bacharelando em Arqueologia e Preservação Patrimonial,
Universidade Federal do Vale do São Francisco
(c)
Bacharelando em Arqueologia e Preservação Patrimonial, Universidade Federal do Vale do São Francisco.
257
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
Além disso, este artigo também relata (mas sem se aprofundar no assunto) as
supostas ligações filológicas entre o nome Satã e o nome de uma antiga divindade egípcia
(ligação esta defendida por um dos grupos satanistas da atualidade conhecido como
Templo de Set). E retomando o sentido ideológico de Satã, o materialismo histórico serviu
como um excelente instrumento da explicação do porquê das mudanças pendulares que o
"príncipe das trevas" sofreu através das eras. Contudo, este artigo visa somente arranhar a
superfície do tema, atendendo aos conselhos daqueles que nos alertaram sobre os perigos
de nos aprofundarmos nestes "assuntos obscuros".
258
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
Esta visão de Satã como o "mal absoluto" levou à criação de uma “religião”
chamada satanismo gótico, também chamada de satanismo tradicional. Os praticantes desta
vertente do satanismo absorveram todo o estereótipo transmitido pelos filmes de terror,
pregando a existência concreta de Satã como uma divindade que um dia estabelecerá seu
domínio sobre a Terra e recompensará seus seguidores. Contudo, apesar da pretensa
antiguidade, estes cultos só começaram a surgir na década de 1970, inspirados na
publicação, em 1969, da bíblia satânica (livro que não tem o satanismo gótico como
fundamento). Ainda na década de 1970 começam a surgir fragmentos do que seria o "livro
negro de Satã", que também pretensamente tem uma idade secular.
259
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
A "linha" satânica mais praticada em nossos dias é a que foi difundida pela igreja de
Satã que segue o que se convencionou chamar de satanismo moderno. Aqui, Satã não é
mais visto como uma entidade que tem sede de adoração, mas sim como um símbolo de
liberdade. Estes satanistas riem da ideia de Satã como um espírito ou entidade que almeja
estabelecer seu domínio sobre a Terra. Oficialmente, a igreja de Satã surgiu em 1966. Seu
fundador, Anton Szandor La Vey, era um tocador de órgão em um parque de diversões e
também numa igreja evangélica. O que ele presenciou nesta profissão o convenceu a
estabelecer as bases filosóficas do satanismo moderno. Em suma, ele viu os mesmos
homens praticando tanto a abstinência cristã quanto a libertação satânica dos instintos
animalescos humanos. Tal fato foi a prova para ele de que o cristianismo era uma fé falsa
pois negava a natureza carnal do homem (LA VEY, 1969: 2).
Em 1969, três anos após a fundação da igreja de Satã, Anton Szandor La Vey publica
a bíblia satânica, onde expressa toda a filosofia de sua igreja. A partir de então o satanismo
alcança uma enorme popularidade e começa a ser expresso de maneira mais explícita no
cinema e na literatura.
Uma terceira vertente do satanismo (e que ocupa uma posição central neste artigo) é
conhecido como setianismo 1 (www.xeper.org). Surgido em 1975 através de um cisma
dentro da igreja de Satã, o setianismo tem por fundamento uma reinterpretação de Satã
através da figura do deus egípcio Set. Muitas vezes conhecido como o "deus do vento seco
do deserto", tanto suas características comportamentais quanto seu nome ajudaram a
1
Todas as informações sobre o setianismo foram pesquisadas no site do templo de Set.
260
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
formular o que viria a ser chamado de Satã. Set é também chamado de Set Hen, e este
nome foi logo identificado com a palavra Satã, que em hebraico significa "adversário". Tal
identificação foi feita pela comunidade cristã egípcia dos primeiros séculos da era cristã.
Além da semelhança do nome, Set também possui, como Satã, uma história marcada por
inconformismo e revolta. Mais para frente discutiremos o mito Set.
Prometeu, Satã e Set são três símbolos que expressam um mesmo sentimento e uma
mesma vontade de liberdade. Prometeu roubou o "fogo" dos deuses para dar aos homens e,
em consequência de seu crime, foi punido severamente. Satã rebelou-se contra Jeová e
acabou sendo lançado no inferno. Set matou Osíris e foi banido para o deserto. Em todos
esses mitos há a presença de dois fatores essenciais para o entendimento do funcionamento
das sociedades estratificadas: a hierarquia vigente e a rebelião a esta hierarquia.
PROMETEU
261
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
sua vez, nos oferecem diferentes interpretações sobre o mito como um todo e a questão do
“fogo” em particular. Cito abaixo o resumo de uma parte do mito de Prometeu tal segundo
Santos (2010: 2):
O que, afinal de contas, era o “fogo” dado à humanidade por Prometeu? Existem
vários significados possíveis. Podia ser o fogo propriamente dito; poderia ser a inteligência
(tal como na citação acima), as artes e as técnicas, ou mesmo uma “fagulha divina” que nos
deu a faculdade de cometermos crimes contra a lei cósmica promulgada pelos deuses
olímpicos (hybris). As múltiplas interpretações sobre o “fogo”, ao nosso ver, constituem
umas das mais vívidas características do mito de Prometeu. Contudo, apesar das possíveis
diferenças de interpretação, o mito deixa claro que o “fogo” era algo que pertencia aos
deuses e que Prometeu, por amor à humanidade, roubou deles para entregá-lo aos homens
da idade do ferro, isto é, a nós. De qualquer forma, o “fogo” não nos deu apenas luz física.
Com ele, a humanidade adquiriu conhecimentos capazes de ampliar seus horizontes.
262
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
uma armadilha para Epimeteu, irmão de Prometeu e, por fim, à própria humanidade.
Reunindo dons e presentes, os deuses forjam Pandora, a primeira mulher, e a enviam, junto
com uma caixa (ou jarro) para o imprevidente Epimeteu. Este aceita o presente dos deuses,
mesmo tendo sido avisado por Prometeu para que não aceitasse nenhum presente deles.
Por sua vez, Pandora, mesmo tendo recebido avisos para nunca abrir a caixa (ou jarro), a
abre e com isso liberta todos os males que afligem os seres humanos: doença, trabalho,
dores, velhice e muitos outros males se encontravam dentro da caixa de Pandora. Somente
a esperança fica retida na caixa. Prometeu também não escapa impune. Acorrentado numa
montanha , o titã sofre continuadamente o ataque de uma águia que devora seu fígado, que
se reconstrói continuadamente também, para novamente ser devorado.
SATÃ
As origens de Satã são obscuras e tão paradoxais como seu primeiro aparecimento
na Bíblia. Em Gênesis (capítulo 3) Satã aparece sob a forma de serpente, habitando o
paraíso ao lado de Adão e Eva. Sua presença junto à árvore do conhecimento do bem e do
mal é simbolicamente importante e, até certo ponto, esclarecedora. Sua oferta à
humanidade então nascente de fazê-la despertar e tornar-se, por assim dizer, divina,
mostrou-se irresistível. Como diz o versículo 5 do capítulo 3 de Gênesis a respeito do
fruto da árvore do conhecimento: “Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se
abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal” (Tradução do Novo
Mundo das Escrituras Sagradas, 1961). Até este ponto não há na Bíblia uma inimizade
entre a Serpente (símbolo de Satanás) e a humanidade. A inimizade surge depois e é
ordenada pelo próprio Criador, como vemos em Gênesis, capítulo 3, versículo 15, que
assim se expressa à serpente: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e
a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.” (Tradução do Novo
Mundo das Escrituras Sagradas, 1961). A partir deste ponto começa uma história de
acusações, oposições e inimizade entre a figura de Satã e a humanidade. Existem várias
outras aparições da figura de Satã na Bíblia. Entretanto, por motivo de espaço, focaremos
nossa análise deste arquétipo em sua primeira aparição descrita acima a fim de salientar
263
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
seu “pecado original”, isto é, sua afronta “política” contra a ordem divina.
Para que seja possível estudar uma origem arquetípica ou quem sabe “ideológico-
histórica” desse personagem mítico, é preciso compreender as sutilezas contidas em todas
as suas aparições e múltiplos contextos2. Como uma construção discursiva que é, o mito
precisa ser entendido não só em seus contextos históricos, mas como uma manifestação da
sociedade em todas as suas dimensões, aqui, enfatizaremos a questão do inconsciente
coletivo, que por diversas vezes revela a condição essencial para a interpretação moderna
das cosmologias humanas. A história como contexto3, assim, não é razão suficiente para
uma proposta de mitologia comparada.
264
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
Neste artigo, trabalharemos com duas dimensões do mito de Satã. Na primeira delas,
abordaremos o mito através de um viés psicológico pautado na Psicologia Analítica de Carl
Gustav Jung, onde Satã é a expressão de parte importante e vital da psique humana (um
arquétipo), que se liga a própria estruturação da individualidade. Na segunda,
trabalharemos o mito através de um viés marxista, onde a figura de Satã constitui uma
força ideológica de contestação dos poderes estabelecidos e das estruturas sociais impostas
por estes poderes. Assim, mais que uma fusão interpretativa, propomos uma interação
complexa de fenômenos sócio-históricos e psicológicos onde Satã é uma imagem alegórica
do próprio drama existencial tanto de indivíduos quanto de sociedades.
SET
Já a figura de Set ficou conhecida através do mito que narra a traição feita por ele ao
seu irmão Osíris, e de sua batalha contra Hórus, filho de Osíris e divindade ligada ao poder
faraônico. O mito de Set é rico em diferentes interpretações acerca de sua simbologia
“política”. Nesse artigo exploraremos uma destas diversas interpretações.
Set, por inveja, matou seu irmão Osíris e o desmembrou e espalhou os pedaços de
seu corpo por diversas partes do Egito. Osíris era uma divindade ligada às cheias do Nilo e
ao poder de previsão destas cheias e também à obra civilizadora. Uma interpretação que
podemos levantar é que os sacerdotes egípcios se aproveitaram do conhecimento da
previsão das cheias do Nilo através da implantação do calendário solar para impor seu
poder ao povo iletrado. Além disso, agiam como elemento "civilizador" ao atuarem como
265
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
elo entre os deuses e os homens. Portanto, os sacerdotes exerciam seu poder através da
manutenção de uma superestrutura que exaltava a previsibilidade tanto da natureza quanto
das massas humanas por eles dominadas. A previsibilidade permitia seu controle. Já Set
não era ligado às cheias do Nilo e seu ritmo constante. Como "deus do vento seco do
deserto", Set era uma energia imprevisível e indomável e contrária à obra civilizadora.
Hórus, filho de Osíris e Ísis, vinga o pai, vencendo Set numa luta em que lhe corta o
pênis. Com esta vitória, torna-se regente do Egito em substituição a Set. Entretanto, apesar
dessa dualidade e dessa oposição, Set e Hórus aparecem por muitas vezes com papéis
semelhantes nas representações de ritos simbólicos relacionados à cerimônia da “União das
Duas Terras”, o que nos faz interpretar o mito de Set como divindade principal do baixo
Egito que, com a consequente derrota deste diante do Alto Egito, resultando na unificação
do país, Set, por representar a parte derrotada, teve sua simbologia alterada para
representar os aspectos “negativos” para a vida egípcia, como a aridez e a seca.
“Osíris a deidade do Sol, fonte de calor, da vida e da fecundidade, além do que era
também considerado como deus do Nilo, que anualmente visitava sua esposa, Ísis” (a terra,
mas não toda sua totalidade, somente a parte inundada), “por meio de uma inundação.”
(BULFINCH, 2006: 281), e ainda “aquele que construiu os instrumentos de lavoura e
ensinou os homens a usá-los, e deu-lhes as leis, a instituição do matrimônio e uma
organização civil, e também os instruiu no culto dos deuses.” (BULFINCH, 2006: 281).
266
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
também podia ser interpretada como dicotomia política ordem/caos, sendo Osíris e Hórus
representantes da ordem e Set representante do Caos.
Quem trouxe a agricultura para o Egito fora o próprio Osíris (BULFINCH, 2006:
281). Temos esta força personificada no próprio Osíris, que mesmo após sua morte por Set
continua a “exalar” uma força vital relacionada à fertilidade vegetal.
267
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
Assim, Set e sua “instabilidade” das forças do deserto imprevisíveis agia contra a
“estabilidade” da agricultura, da fertilidade e sua previsibilidade. Desse modo, desafiava
Osíris, não apenas pelo comando político, mas também em sua própria perspectiva de
como se manifestaria a estrutura social. Neste sentido, este desafio à “ordem” propõe uma
revolução a tudo que advinha da civilização que fora ensinada por Osíris:
Set, assim, representa o vento “da imprevisibilidade” que atua como elemento
contrário à obra civilizadora de Osíris e Hórus. Set era o inimigo não da “vida” ou do
“homem”, mas do modelo de civilização; poderia representar o modelo tribal antigo,
arcaico, de caça e coleta contra a agricultura e o sedentarismo que permitiram a ascensão
de um regime faraônico, de uma sociedade construída em cima da dominação. Temos
novamente o elemento arquetípico da liberdade individual e da contestação do poder se
manifestando. Nesta perspectiva, Set representa não o “mal” como entendido pelo
dualismo cristão, mas o contrário à ordem estabelecida por Osíris e Hórus. Entretanto, os
arquétipos não permanecem os mesmos por milênios. Os significados são transitórios,
ressignificáveis em sua essência. A interpretação cristã encarou os mesmos arquétipos
simbolizados por Set como o “mal” absoluto. Neste sentido, o deus egípcio Set também
ajudou a moldar a figura maligna de Satã.
Nos três mitos acima, a transgressão aparece com um crime político. A ordem
cósmica foi perturbada e, de alguma forma, tinha que voltar ao seu princípio, em outras
palavras, tinha que ser restabelecida.
268
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
CONSIDERAÇÕES FINAIS
269
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
Nosso ponto de vista se baseia numa posição contrária ao estado de coisas que
negligencia os aspectos simbólicos da cultura material. Entendemos que a cultura material
de uma dada sociedade é produto (e igualmente produtora) de uma concepção social sobre
a vida que é expressa, principalmente, através da mitologia. Os artefatos aqui são mais que
“objetos”, pois possuem significados que transcendem a matéria e o próprio tempo, podem
assim ser estudados de maneira transdisciplinar como propomos neste artigo sobre as
superestruturas inerentes as sociedades abordadas aqui. Em outros termos, tanto a
mitologia quanto a cultura material de uma sociedade refletem uma concepção de vida que
pode ser entendida como “imago mundi” desta sociedade. Seguindo esta linha de
pensamento, a cultura material torna-se parte constitutiva do próprio mito, ou, em outros
termos se “mitologiza” ao mesmo tempo que a mitologia se “materializa” através dos
artefatos, na vida cotidiana das sociedades, formando um todo coeso.
A proposta que desenvolvemos aqui vai além do estudo da própria cultura como
artefato em si. Nem mesmo foca-se no estudo da dimensão do material na cosmologia.
Queremos ir além destas tentativas. Nosso estudo é um estudo do discurso do poder.
Discurso este que se materializa em artefatos assim como se mitologiza, tornando-se
elemento da superestrutura. Enfim, desenvolvemos uma arqueologia que pretende alcançar
as mentalidades por trás dos artefatos.
270
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
A vida, tal como entendida por uma sociedade, é o pano de fundo sobre o qual são
produzidas tanto a mitologia quanto a cultura material. Essas duas esferas da cultura
humana estão interligadas e nós acreditamos que o melhor que temos a fazer é uni-las a fim
de entendermos as culturas pretéritas de uma forma mais abrangente e viva.
271
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAMPBELL, Joseph; BILL, Moyers. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athena. 1990.
http://www.cerescaico.ufrn.br/mneme/pdf/mneme13/124.pdf
JUNG, Carl. Gustav (et al.). O Homem e Seus Símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
2008.
_____, Carl. Gustav. Escritos Diversos (volumes X e XI). Petrópolis: Vozes, 2003.
http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/EST/Revistas_EST/III_Congresso_Et_Cid/
Comunicacao/Gt10/Elaine_C._Prado_dos_Santos.pdf
272
ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I CONRESSO INTERNACIONAL DE RELIGIÃO
MITO E MAGIA NO MUNDO ANTIGO
&
IX FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA
2010
REFERÊNCIAS DIGITAIS
www.xeper.org
273