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DireitoInternacional Avaliacao4bim ParecerJurídico
DireitoInternacional Avaliacao4bim ParecerJurídico
Consultado: Renan Batista Porciuncula (147633), João Pedro Barros Coch (136067) e
Frederico Terroso Jaeger (150047).
1 - CONSULTA
“1) Quais são as semelhanças e diferenças entre os Casos Maria Prestes e Cesare Battisti,
considerando (i) os institutos de direito internacional envolvidos (extradição, expulsão, etc...)
(ii) o comportamento institucional do Poder Executivo e (iii) o comportamento institucional
do Poder Judiciário?
3) Poderia ser em tese imputada ao Estado brasileiro, tanto no Caso Maria Prestes, como
no Caso Cesare Battisti, em razão da ausência de proteção aos estrangeiros (por força de
expulsão e extradição, respectivamente), violação ao art. 22.7 e 22.8, da Convenção
Americana de Direitos Humanos?
2 - PARECER
1. Acerca dos institutos operados em ambos os casos, tem-se estes como uma das
características que diferem ambos os casos, ao passo que no “Caso Maria Prestes”, estamos
diante do instituto da expulsão, enquanto ao que se alude ao “Caso Cesare Battisti”, o instituto
em tela é o da extradição, os quais – mesmo que, em suma, culminem com a mesma
finalidade de retirada do indivíduo do território que se encontra – possuem distinções, as quais
serão retratadas nos tópicos a seguir.
3. Razão, esta última (nocividade à ordem pública) - mesmo que não fundada no Estatuto
revogado, o qual inexistia ao tempo -, basicamente, a qual Olga Benário ou, conforme
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Lei 13.445, de 24 de maio de 2017. Institui a Lei de Migração. Art. 54, caput.
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MAZZUOLI, Valerio de O. Curso de Direito Internacional Público. Grupo GEN, 2023, p. 701. E-book. ISBN
9786559645886. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559645886/. Acesso em: 11 dez.
2023.
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nomeada, Maria Prestes, militante comunista, teve sua expulsão decretada pelo Estado
brasileiro à época – “ratificada”, inclusive, quando do julgamento do Habeas Corpus 26.155,
em vista de seu não conhecimento - haja vista a não condenação de crimes em face dela,
pautando-se sua não permanência, conforme se extrai do acórdão do processo, ao
comprometimento à ordem pública e aos interesses do país que Olga/Maria causara.
5. No referido caso, tem-se como agravante os fatos de que Olga, alemã, de origem judia,
seria entregue à Alemanha Nazista, onde, de pleno conhecimento das autoridades à época,
seria encaminhada a campos de concentração, sendo, consequentemente, morta em Câmara de
Gás, conforme assim ocorreu. Ademais, salienta-se o fato de que, quando do procedimento,
esta estava grávida de sua filha Anita Leocádia Prestes, fruto de seu relacionamento com Luís
Carlos Prestes, o que não foi suficiente para a relativização de sua expulsão.
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Lei 13.445, de 24 de maio de 2017. Institui a Lei de Migração. Art. 81, caput.
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Segundo Mazzuoli, a extradição passiva “ocorre quando um país estrangeiro solicita ao Brasil a extradição de indivíduo de
lá foragido que se encontra em nosso território[...]”. MAZZUOLI, Valerio de O. Curso de Direito Internacional Público.
Grupo GEN, 2023, p. 711. E-book. ISBN 9786559645886. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559645886/. Acesso em: 12 dez. 2023.
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MAZZUOLI, Valerio de O. Curso de Direito Internacional Público. Grupo GEN, 2023, p. 716. E-book. ISBN
9786559645886. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559645886/. Acesso em: 12 dez.
2023.
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autoriza a entrega ou comunica sua negativa, caso tenha o STF indeferido o pedido -, pelo
qual o Governo da República da Itália requereu a entrega de Battisti para cumprimento de
pena de prisão perpétua decorrente de duas sentenças criminais.
10. Ao passo que no caso Maria Prestes (Olga Benário), existiu ali, forte influência
político ideológica, considerando os atos revolucionários ligados a Olga, tornando evidente a
relação existente entre o espectro político do governo e as decisões do Poder Executivo.
Ademais, aliado a isso, deve-se considerar o contexto histórico jurídico da época, tendo em
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Decreto nº 863, de 9 de julho de 1993. Art. 3. 1. A extradição não será concedida: [...] f) se a Parte requerida tiver razões
ponderáveis para supor que a pessoa reclamada será submetida a atos de perseguição e discriminação por motivo de raça,
religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política, condição social ou pessoal; ou que sua situação possa ser agravada pó
um dos elementos antes mencionados;
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vista a escassa proteção dada ao migrante, favorecendo práticas que afastam-se dos direitos
humanos.
14. No entanto, deve-se aferir que no caso de Olga, o Poder Judiciário agiu estritamente a
favor do que já estava pré-estabelecido pelo Poder Executivo, denotando uma aparente
decisão com viés político ideológico, por suas razões e fundamentos, ao não reconhecimento
do recurso pelos Ministros, bem como de nenhum dos fundamentos elencados pelo advogado
Heitor Lima. Enquanto no caso de Battisti, embora surtam críticas à decisão estabelecida pela
maioria dos Ministros no Acórdão nº 1.085 do STF, ocorreu a aplicação da lei e todo o devido
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processo legal do caso, não usurpando, ainda, a competência “final” do presidente de, no caso,
negar o pedido.
15. Acerca do questionamento que alude o presente tópico, tem-se que há, no âmbito da
expulsão, influência na existência de filho brasileiro, podendo, obstar a expulsão de
determinada pessoa. Tal previsão extrai-se do art. 55, II, alínea a 7 da Lei 13.445 (Lei de
Migração).
16. Contudo, salienta-se, deve-se atentar o não impedimento por si só, conforme se
depreende da leitura do dispositivo mencionado, ao passo que deve ser comprovado os
requisitos da guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob
sua tutela. Portanto, conforme ensina Mazzuoli, “não tendo o expulsando provado que o filho
brasileiro está sob sua guarda e sob sua dependência econômica ou socioafetiva, ou ainda que
exista pessoa brasileira sob sua tutela, a expulsão deve ser efetivada.”8
17. De outra senda, no que se refere à extradição, não há óbice a sua concessão, conforme
já decidiu o Supremo Tribunal Federal, disposto na Súmula 421, pela qual dispõe que: “Não
impede a extradição a circunstância de ser o extraditado casado com brasileira ou ter filho
brasileiro”.
III. Das possíveis violações aos artigos 22.7 e 22.8, da Convenção Americana de Direitos
Humanos, pelo Estado brasileiro
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Lei 13.445, de 24 de maio de 2017. Institui a Lei de Migração. Art. 55. Não se procederá à expulsão quando: [...] II - o
expulsando: a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver
pessoa brasileira sob sua tutela; (grifei)
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MAZZUOLI, Valerio de O. Curso de Direito Internacional Público. Grupo GEN, 2023, p. 705. E-book. ISBN
9786559645886. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559645886/. Acesso em: 12 dez.
2023.
7
[...]
22.7. Toda pessoa tem o direito de buscar e receber asilo em território estrangeiro,
em caso de perseguição por delitos políticos ou comuns conexos com delitos
políticos, de acordo com a legislação de cada Estado e com as Convenções
internacionais.
22.8. Em nenhum caso o estrangeiro pode ser expulso ou entregue a outro país, seja
ou não de origem, onde seu direito à vida ou à liberdade pessoal esteja em risco de
violação em virtude de sua raça, nacionalidade, religião, condição social ou de suas
opiniões políticas.
22. Sob essa ótica, à vista do fundado temor, justificadamente, existente em relação ao
Caso Battisti, fundado em diversos aspectos, como no transcorrer processual, o qual restaram
dúvidas quanto a efetiva verificação das garantias processuais, considerando a revelia e o
juízo probatório fundar-se em depoimento proveniente de delação premiada, assim como a
severa pena aplicada (perpétua), a qual, cogita-se, sua influência aos aspectos políticos
envolvidos, em virtude, inclusive, de seus fundamentos já mencionados acima, tem-se que
sim, entendemos, pode-se falar em violação, neste caso, aos artigos mencionados.
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IV. Da proteção dos direitos humanos e fundamentais da pessoa requerida, por atuação
do Poder Judiciário do Estado requerido, no âmbito da cooperação internacional
24. Nesse contexto, já considerando, previamente, o teor da resposta que gerou o presente
tópico, cumpre demonstrar alguns dos fundamentos/meios de proteção dos direitos humanos e
fundamentais da pessoa requerida, aqui, pelo Estado brasileiro.
Art. 216-P. Não será concedido exequatur à carta rogatória que ofender a soberania
nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública. (grifei)
27. Ainda, de forma mais recente, cumpre mencionar o capítulo dedicado à cooperação
internacional presente no CPC/2015, o qual estabelece, entre outras disposições que:
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ARAUJO, N. In: Ministério da Justiça - Secretaria Nacional de Justiça, DRCI. (Org.). Manual de Cooperação Jurídica
Internacional e Recuperação de Ativos - matéria penal. 4a ed., 2013, v. 1, pp. 39-50.
10
Ibidem
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Art.26 – A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil
faz parte e observará:
I - o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente;
[...]
§ 3º Na cooperação jurídica internacional não será admitida a prática de atos que
contrariem ou que produzam resultados incompatíveis com as normas fundamentais
que regem o Estado brasileiro.
[...]
28. Sem entrar no mérito quanto à possibilidade de cooperação sem tratado entre os
Estados, hipótese do §1º, tem-se que o que é importante aqui aferir, conforme o que se
depreende nas normas esparsas aqui elencadas, considerando demais fundamentos existentes,
são, sim, uma construção que visa resguardar os direitos humanos e fundamentais, em face
dos atos de cooperação que se sobrepujam aos nacionais e migrantes que possam ter seus
direitos básicos violados pelos interesses dos Estados requerentes.
3 - CONCLUSÃO
30. No que se refere ao primeiro questionamento, tem-se que no Caso Maria Prestes, o
Estado brasileiro, sob forte influência ideológico política, utilizou-se do instituto da expulsão.
De modo que o Poder Judiciário, no caso, acabou por “ratificar”, ao passo do não
conhecimento de seu apelo em forma de Habeas Corpus, culminando com o fim trágico de
sua morte pelo nazismo.
31. Já no Caso Cesare Battisti, o instituto utilizado foi o da extradição, requerida pelo
Governo Italiano, com base na cooperação internacional, em vista, inclusive do tratado
existente entre ambos os Estados. De modo que, o Poder Executivo, em um primeiro
momento, nega a extradição, deferida pelo Poder Judiciário, sendo, após oito anos, revista e
deferida pelo então presidente Michel Temer.
34. Por fim, tem-se que há espaço, no âmbito da cooperação internacional, à garantia e
proteção dos direitos humanos e fundamentais da pessoa requerida, por atuação do Poder
Judiciário do Estado requerido, conforme as normas, exemplificadamente, demonstradas.
É o parecer.