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TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO DE MESTRADO EM

GESTÃO DA ECONOMIA CRIATIVA

NATHALIA BARONE LIMA

ENTRE CAPAS E CAPISTAS


Um olhar sobre a prática do design de capas de livros

Rio de Janeiro
2017
NATHALIA BARONE LIMA

ENTRE CAPAS E CAPISTAS


Um olhar sobre a prática do design de capas de livros
Dissertação apresentada como parte dos
requisitos para obtenção do título de
Mestre em Gestão da Economia Criativa
dentro da linha de pesquisa de Design de
Experiência e Estratégias de Inovação
junto ao programa de Mestrado
Profissional da Escola Superior de
Propaganda e Marketing – ESPM.

Orientadora: Eliana Formiga

Rio de Janeiro
2017
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Nathalia Barone Lima

ENTRE CAPAS E CAPISTAS


Um olhar sobre a prática do design de capas de livros

Dissertação apresentada como parte dos


requisitos para obtenção do título de
Mestre em Gestão da Economia Criativa
dentro da linha de pesquisa de Design de
Experiência e Estratégias de Inovação
junto ao programa de Mestrado
Profissional da Escola Superior de
Propaganda e Marketing – ESPM.

Orientadora: Eliana Formiga

Banca Examinadora

Prof.a Dr.a Eliana Formiga


ESPM – Rio de Janeiro
Orientadora

Prof. Dr. Marcus Dohmann


UFRJ – Rio de Janeiro

Prof.a Dr.a Isabella Perrota


ESPM – Rio de Janeiro

Prof. Dr. Eduardo Ariel de Souza Teixeira


ESPM – Rio de Janeiro

Rio de Janeiro
2017
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DEDICO ESTE TRABALHO

Aos meus pais e meus irmãos pelo incentivo constante,


e à minha orientadora Eliana Formiga por sempre
me encorajar mediante aos desafios.
5

AGRADECIMENTOS

Ao olhar para o início dessa jornada e fazer um balanço desses últimos dois
anos, chego à conclusão que o meu maior ganho foram as pessoas que conheci,
reencontrei e com as quais dividi essa caminhada. Graças a eles, volto a ser uma
pessoa mais otimista e resiliente.

Agradeço infinitamente à minha orientadora, Prof.a Dr.a Eliana Formiga, por


estar ao meu lado desde a graduação, me ajudando diretamente no meu crescimento
profissional e pessoal. Durante essa jornada, construímos uma relação praticamente
de mãe e filha.

À minha mãe pelo exemplo de força. Ao meu pai por ter me dado a palavra
“intensa” de presente. De fato, vivi e aproveitei essa experiência com toda a
intensidade e dedicação. À minha madrasta, Estefânia, pelos conselhos sobre as
relações acadêmicas. Aos meus irmãos Ricardinho, Júlia e Daniel por me darem o
amor mais puro dos irmãos mais novos. À minha irmã Biah por nunca passar a mão
na minha cabeça e sempre me lembrar da força que existe dentro e mim.

Aos meus amigos Mustang, Ramez, Cardoso, Daniel e Guilherme, que


sempre me alimentaram à base de muito churrasco e abraços de urso.

Às minhas amigas Fabiana, Juliana, Daniele e Renata por me ensinarem o


real significado da palavra amizade e pelos chopes de quase todo mês.

A todos os meus companheiros de trabalho, em especial: Larissa, Lúcio,


Janaína, Tania, Priscila, Gabi, Felipe, Riveiro, Nathalia, Jaya, Carol e Belkiss, que
dividem as dores e as delícias do dia a dia em uma editora.

À minha amiga e revisora Juliana que fez sua mágica e transformou a leitura
dessa pesquisa mais prazerosa. E a todos os outros revisores que me ajudaram em
algum momento desse processo: Daniel, Giuliana, Alice, Marcela, Thalita.

A todos os meus professores do programa de mestrado, em particular ao


Prof. Dr. Diego Santos e ao Prof Dr. João Luiz de Figueiredo, que sempre me
incentivaram no desenvolvimento do pensamento crítico.

Aos meus amados amigos de turma, com destaque ao grupo do fundão:


Liporace, Betão, Koca e Fernando.
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Ao coordenador do programa de mestrado, Prof. Dr. Eduardo Ariel, que


acreditou no meu potencial quando até eu mesma duvidei.

Aos membros da banca de avaliação: Prof. Dr. Marcus Dohmann e Prof.a Dr.a
Isabella Perrota.

À instituição da ESPM de forma geral por toda infraestrutura e disponibilidade


dos profissionais que nela trabalham. Em especial à diretora Flávia Flamínio e aos
departamentos de audiovisual e biblioteca.

Ao meu psicólogo, Rodrigo Gouvea, que sempre muito atencioso me ajuda


com a busca do meu autoconhecimento.

À Maria Cristina Jeronimo e Elmo Rosa por serem tão generosos no auxílio
do recrutamento dos entrevistados.

E, principalmente, aos capistas entrevistados: Sérgio Campante, Leandro


Dittz, Aline Halluch, Elmo Rosa, Lauro Machado, Túlio Cerquize, Angelo Bottino,
Victor Burton, Leonardo Iaccarino, Igor Campos e Rafael Nobre.
7

“A vida é assim: esquenta e esfria


aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem”
João Guimarães Rosa
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RESUMO

O presente trabalho busca compreender os processos de criação dos capistas


brasileiros atuantes hoje no mercado, além de mapear onde e como estão inseridos
na cadeia produtiva do livro. A coleta de dados foi feita por meio de pesquisa
qualitativa através de entrevistas individuais semi-estruturadas registradas em vídeo.
A análise dos resultados indicou pontos onde estes profissionais podem melhorar na
relação com as editoras e pontos onde novos capistas podem usar como exemplo
de práticas para se alcançar bons resultados. Em consequência foi desenvolvido um
produto que é um livro que contém as entrevistas transcritas.

Palavras-chave: Capa de livro. Capista. Design Editorial.


9

ABSTRACT

The present work seeks to understand the creative process of the Brazilian cover art
designer who are active in the market today, as well as to map where and how they
are inserted in the book production chain. Data collection was done by qualitative
research through semi-structured individual video interviews. The results' analysis
indicated points where these professionals can improve their relationship with the
publishers and points where new cover art designer can use as examples of
practices to achieve good results. As a consequence a product has been developed
which is a book with the transcribed interviews.

Keywords: Book cover. Cover art designer. Editorial Design.


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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Anatomia da capa de livro....................................................................... 30


Figura 2 – Coleção Agatha Christie.......................................................................... 31
Figura 3 – Capa antiga e repack do livro Pecar e Perdoar ...................................... 31
Figura 4 – Capa do livro Lima Barreto triste visionário............................................. 33
Figura 5 – Fluxograma da cadeia produtiva do livro ................................................ 41
Figura 7 – Material de prospecção do capista Elmo Rosa ....................................... 56
Figura 8 – Capa do livro “Entre capas e capistas” ................................................... 60
Figura 9 – Capa em perspectiva do livro “Entre capas e capistas” .......................... 62
Figura 10 – Exemplo de diagramação do miolo do livro “Entre capas e capistas”... 63
Figura 11 – Exemplo de página de abertura de entrevista do livro “Entre capas e
capistas”............................................................................................................. 64
Figura 12 – Algumas capas enviadas pelos entrevistados para o livro “Entre capas e
capistas”............................................................................................................. 64
11

SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO __________________________________________________________ 14
1.1- Delimitação do tema ___________________________________________________________________________________ 15
1.2- Problema _________________________________________________________________________________________________ 15
1.3- Hipótese _________________________________________________________________________________________________ 16
1.4- Justificativas ____________________________________________________________________________________________ 16
1.5- Objetivos ________________________________________________________________________________________________ 17
1.6- Apresentação do produto ____________________________________________________________________________ 17
1.7- Metodologia da pesquisa _____________________________________________________________________________ 18

2- RELAÇÃO ENTRE LIVRO E LEITOR __________________________________________ 18


2.1- A Linguagem e o Livro ________________________________________________________________________________ 18
2.2- A hospitalidade e os sentidos _______________________________________________ 25

3- DESIGN DE CAPA _______________________________________________________ 28


3.1- Estrutura e Elementos da Capa ______________________________________________ 28
3.2- Funções da capa _______________________________________________________________________________________ 34
3.3- Capistas __________________________________________________________________________________________________ 37
3.4- Cadeia produtiva do livro _____________________________________________________________________________ 39
3.5- Direitos Autorais no Mercado Editorial ____________________________________________________________ 44

4- ENTREVISTAS __________________________________________________________ 48
4.1- Detalhamento dos Procedimentos Metodológicos ______________________________________________ 48
4.2 - Resultados Obtidos ___________________________________________________________________________________ 55

5- SOBRE O PRODUTO ____________________________________________________ 60

6- CONCLUSÃO __________________________________________________________ 65

7- DESDOBRAMENTOS DA PESQUISA ________________________________________ 69

8- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ___________________________________________ 70

9- ANEXOS _____________________________________________________________ 73
14

1- INTRODUÇÃO

O livro é um objeto de suma importância por, dentre muitos motivos, ser o


detentor da sabedoria, além de estar presente no cotidiano da maioria das pessoas.
É um bem precioso, e indiferente da sua forma, é insubstituível. Desde sua criação,
é através do livro que o conhecimento é transmitido, e apesar de já ter sido
ameaçado pelos avanços tecnológicos, reinventou-se e afirmou-se. O que o torna
tão especial e o difere de outros impressos, como jornal e revista, é que um livro
além de ser feito para durar, é lido para ser lembrado.

Mas o que seria do livro sem um leitor? Ele perderia completamente seu
propósito. Sendo assim, toda a concepção do livro deve ser projetada pensando no
final dessa cadeia produtiva, no encontro com o usuário.

O contato visual é o primeiro que o leitor tem com o livro, e é feito através da
capa. Este é um dos motivos que justifica sua grande importância, que, com o
tempo, ganhou uma função muito maior do que apenas proteger o miolo. Esse
contato pode acontecer, inclusive, antes do encontro físico, seja através de um
anúncio, algum outro material promocional ou até virtualmente. A capa, por ser a
parte visível do livro, dentre muitas funções, assegura sua publicidade.

Apesar de o livro ser um objeto comum, não é simples descobrir como passou
a adquirir o aspecto que tem. Sendo o design de livro algo tão diferente de todos os
outros tipos de design gráfico, entender como são feitos os projetos através do
processo de criação dos capistas brasileiros contribuirá para um mapeamento dos
métodos, além de ser um registro de cunho histórico, já que os avanços tecnológicos
influenciam diretamente tanto a criação dos layouts – por meio de ferramentas,
softwares e suportes –, como também a produção, impressão e acabamento.

Hendel (2003) inicia sua obra, O design do livro, explicando o quanto o design
de livro é complicado, pois não há uma maneira única de proceder. Busca saber,
através de entrevistas com designers de livros, os processos que cada um deles
aplica para assim entender a tomada de decisões em cada projeto. Isso é
extremamente enriquecedor para aprendizes e alunos de design gráfico. Entretanto,
o autor se atém apenas a falar sobre o que acontece quanto ao conteúdo do livro,
sobre o projeto de miolo, e completa que é necessário um estudo exclusivo para o
projeto de capa por se tratar de um tipo de design bem diferente e demandar
15

competências específicas. Assim, a presente pesquisa se propõe a preencher essa


lacuna: compreender através de entrevistas os processos de criação dos capistas
brasileiros e a relação destes profissionais com o mercado editorial, com o objetivo
de transformar o resultado desse estudo em um livro e buscar incentivo para a
publicação.

Antes de chegar às entrevistas, buscou-se entender um pouco mais a relação


entre o livro e o leitor, fazendo um breve levantamento histórico sobre a linguagem e
a evolução dos suportes da escrita. Além de refletir sobre como através dos sentidos
– visão, tato, olfato e paladar –, abre-se caminho para uma relação de hospitalidade,
na qual o livro é anfitrião e o leitor, hóspede. Com seus artifícios gráficos, o livro
atrai, seduz e acolhe seu leitor, despertando sentimentos e proporcionando
experiências e trocas inigualáveis.

A capa de livro também foi detalhada, com o objetivo de entender sua


anatomia, suas funções e suas possibilidades antes mesmo de saber como chegar
aos resultados. Investigar quem é o profissional responsável por esse trabalho,
quais são suas dificuldades, em que condições trabalham e onde estão inseridos na
cadeia produtiva do livro são algumas das reflexões que a pesquisa também traz. E,
por fim, há o detalhamento do projeto do produto proposto.

1.1- Delimitação do tema

Os processos de criação dos capistas brasileiros da atualidade e as relações


destes profissionais com o mercado editorial.

1.2- Problema

Ao investigar os métodos de trabalho dos capistas brasileiros, é possível


acrescentar aprendizado ao estudo acadêmico de projetos editoriais específicos
para capas de livros?
16

1.3- Hipótese

O entendimento dos processos de criação dos capistas brasileiros que, hoje,


se destacam no mercado editorial, contribuem para um melhor desenvolvimento do
design de capas de livros por novos profissionais, por ser um trabalho autoral e sem
regras definidas.

1.4- Justificativas

Há no mercado muitos referenciais teóricos para a construção de miolo de


livros, mas pouca orientação voltada para o design específico de capas. Sendo
assim, para ter o registro de como é feito o design de capas de livros, se faz
necessário cruzar os poucos estudos existentes sobre o assunto com os conceitos
básicos de design, somados aos relatos dos profissionais atuantes no mercado e
aplicar todos esses pontos à necessidade editorial de capa.

O design de miolo de livros tem suas próprias tradições e regras, que já foram
editadas e estudadas por vários pesquisadores e que geraram bibliografias
consagradas; diferentemente da capa, que se aproxima mais do design de cartaz. É
um tipo de design mais conceitual, sem uma metodologia padrão. Somando a
experiência do capista à observação de como esse objeto se comporta no ponto de
venda e como se relaciona com o usuário, é que a percepção sobre como fazer uma
boa capa aflora.

A grande maioria dos capistas trabalha sozinho, como prestadores de serviço


das editoras, o que torna mais difícil o acesso para saber sobre seus processos de
criação. “Ver por que alguma coisa não funciona é muitas vezes mais revelador do
que ver por que funciona” (HENDEL, 2003, p.4). A pesquisa se propõe a se
aproximar desse profissional, muitas vezes isolado do restante da cadeia produtiva,
e registrar como esses capistas projetam na prática.

Mapear a cadeia produtiva do livro com foco na capa e no capista será um


trabalho relevante, pois o conteúdo ficará como um registro histórico desse cenário
editorial, que hoje é inexistente sob esse recorte. Para o trabalho ficar mais rico, a
amostra escolhida de capistas é a mais diversa possível em relação à formação e à
17

idade. Isso contribuirá para entender como as evoluções das ferramentas de


trabalho e o tempo de experiência interferem ou não no trabalho dos designers.

Posto todos esses tópicos, o presente trabalho justifica sua relevância.

1.5- Objetivos

Essa pesquisa tem como objetivo principal mergulhar no universo do design


de capas de livros e gerar um produto que seja posteriormente publicado em um
livro, reunindo entrevistas com capistas brasileiros da atualidade.

Como objetivos específicos, a pesquisa se propõe a investigar as funções da


capa de livro desde seu aparecimento, assim como as influências da evolução
tecnológica no desenvolvimento do produto; mapear a cadeia produtiva do livro com
foco na capa; discorrer sobre as questões de direitos autorais dos capistas;
identificar a relevância da capa para o livro; averiguar como os capistas conceituam,
executam e tomam decisões.

1.6- Apresentação do produto

A ideia para o produto resultante desta pesquisa é um livro chamado “Entre


capas e capistas”, que tenha como conteúdo central um estudo sobre o design de
capa de livro, incluindo uma compilação teórica acerca do tema, a cadeia produtiva
do livro com foco no capista, questões de direito autoral, transcrição de entrevistas
com os capistas e uma conclusão na visão da pesquisadora.

O livro pode ser de interesse não só de outros designers de capas de livros,


mas de designers de outros tipos de embalagem; escritores que querem entender
mais sobre como seus livros adquirem a forma final; designers que desejam
ingressar no segmento editorial; leitores curiosos interessados em saber mais sobre
o objeto livro; e também para outros profissionais do mercado editorial,
principalmente editores e assistentes editoriais, que são pessoas que, na cadeia
produtiva do livro, estão em contato direto com o capista, com isso, podem enxergar
18

sob outro ponto de vista e, quem sabe, aparar arestas que influenciam no resultado
final do trabalho.

1.7- Metodologia da pesquisa

A partir de uma experiência empírica, foi desenvolvida uma pesquisa


científica aplicada com abordagem qualitativa, uma vez que o interesse desta é
conseguir compreender, por meio dos dados obtidos, a realidade do capista
brasileiro. A pesquisa qualitativa oferece essa perspectiva, uma vez que consegue
uma aproximação com esse universo através de entrevistas semiestruturadas com
profissionais atuantes no ramo.

De acordo com Aaker; Kumar e Day (2001), a entrevista individual


semiestruturada é aquela realizada frente a frente com o entrevistado, em que o
assunto é explorado em detalhes. O propósito do pesquisador é cobrir uma lista
específica de assuntos de forma aberta, de maneira que possibilite o aparecimento
de fatos e atitudes inesperadas. Os autores Godoi; Bandeira-de-Melo e Silva (2010,
p.317) complementam com a ideia de que “a entrevista serve para desvelar
emoções, sentimentos e subjetividades”. Bauer e Gaskell (2015, p.64) acrescentam
que “a compreensão dos mundos da vida dos entrevistados e de grupos sociais
especificados é a condição sine qua non da entrevista qualitativa”.

Sendo assim, esta metodologia é a que melhor atende à presente pesquisa


porque permite a compreensão do assunto pesquisado através da aproximação
individual dos profissionais que atuam diretamente no mercado produzindo capas de
livros. Além de ter uma formatação ideal para o livro resultante desta dissertação.

2- RELAÇÃO ENTRE LIVRO E LEITOR

2.1- A Linguagem e o Livro

Após o desenvolvimento da fala, o homem criou a escrita, primeiramente,


através de desenhos, que combinados sequencialmente representavam uma ideia.
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Posteriormente classificada como pictográfica, essa escrita evoluiu para a fonética,


onde os símbolos são as letras que representam sons. “Até a invenção do telefone,
a escrita foi o único meio de transportar a fala.” (MELOT, 2012, p. 68). Além dessas
duas classificações, ainda existe a escrita ideográfica, usada pelos orientais, na qual
os símbolos representam ideias.

Hall (2016) desenvolve a visão de Saussure sobre a linguagem definindo-a


como um sistema de sinais, enquanto a escrita representa signos dentro de uma
linguagem, pois comunicam ideias e fazem parte de um sistema de convenções.
Lupton e Miller (2011) complementam essa ideia apontando que Saussure
enxergava a escrita como uma cópia da fala, uma tecnologia artificial para reproduzir
os “pensamentos” que tomam forma através do corpo material da linguagem. Assim,
a linguagem é vista como o meio de transporte entre as coisas e os sentidos. É,
portanto, essencial aos processos pelos quais os significados são produzidos e
representados numa cultura.
O objeto livro é de suma importância para a linguagem, assim como gestos,
expressões, roupas, porém não se resume ao que é, mas ao que faz. Ele constrói
significados e os transmite, é, portanto, um veículo de mensagens. “O livro é a casa
mais real e fecunda do alfabeto.” (MEGIDO apud. FERLAUTO; JAHN, 1998, p.85)

“O sentido também é criado sempre que nos expressamos por meio de


“objetos culturais”, os consumimos, deles fazemos uso ou nos apropriamos;
isto é, quando nós os integramos de diferentes maneiras nas práticas e
rituais cotidianos e, assim, investimos tais objetos de valor e significado.”
(HALL, 2016, p. 22)

Deste modo, quando um livro é editado e impresso, resultando em um objeto


físico, além de representar as ideias do autor, se torna uma manifestação cultural de
ideais daquele momento histórico, onde a capa é o registro em imagem dessa
memória de expressão intelectual.

O sistema da escrita pode ser definido como um dos tipos de representação


gráfica da linguagem visual. É fundamental para a área de design da informação
pois influencia na forma como o leitor adquire e percebe o conteúdo. Lupton e Miller
(2011) citam no trecho abaixo essa relação entre o design e o entendimento da
mensagem que é influenciada diretamente pela qualidade da representação gráfica.
20

“O design pode envolver criticamente as mecânicas de representação,


expondo e revisando seus vieses ideológicos; o design também pode recriar
a gramática da comunicação, descobrindo estruturas e padrões dentro da
mídia material da escrita visual e verbal.” (LUPTON; MILLER, 2011, P. 23)

Independentemente do idioma, a escrita se difundiu como forma de


comunicação, registro de acontecimentos e acúmulo de conhecimento e, desde os
primórdios da escrita, texto e imagem se relacionam e se complementam. Dentre os
principais suportes da escrita, em ordem cronológica, temos as plaquetas de barro, o
papiro, o pergaminho, o códice e o papel.
“O livro é tão poderoso que muitas vezes na história foi proibido, queimado,
banido. Ele é o guardião da sabedoria humana. Alicerça revoluções. Cria
líderes. Forma os personagens da humanidade, para o bem e para o mal.”
(MEGIDO apud. FERLAUTO; JAHN, 1998, p.85)

O códice1 surgiu na Roma antiga e é formado por vários pergaminhos


dobrados e costurados e não mais enrolado. Esse formato pode ser considerado o
início do objeto livro como conhecemos hoje. Porém, a migração de um formato para
outro não foi nada rápida, demorou pelo menos quatro séculos para o códice
superar o rolo. Dois motivos contribuíram muito para essa vitória. O primeiro, foi o
vínculo do novo formato ao incentivo da Igreja à leitura do Evangelho: “O amor do
livro sagrado e sobretudo a posição oficial da Igreja precipitaram a evolução da
técnica do livro em pergaminho.” (ARNS, 1921, p. 28). O segundo, é que o formato
abrigou muitas obras de literatura profana.

O que distingue o códice dos outros suportes da escrita é a dobra, apontada


como a primeira grande revolução deste objeto. “O códice impunha uma nova
maneira de distribuição do conjunto dos textos” (MELOT, 2012, p. 54), que
influenciou diretamente o ritmo de leitura. Com o códice, implementou-se o ato de
abrir e fechar o livro, o que instigou mudanças na estrutura dos textos e nos hábitos
de leitura. Foi então que surgiu a pontuação e a divisão por capítulos. Assim, a
leitura pública deu lugar à individual e silenciosa.

“A folha dobrada se torna seu próprio envelope, donde a palavra ‘dobra’


para designar, de modo global, a mensagem assim embalada. O livro se
torna, então, para ele mesmo, sua própria caixa, enquanto é necessário
proteger o rolo por um invólucro especial. Abrir um livro torna-se, através de
um mesmo gesto, o mesmo que abrir uma caixa e ter acesso a seu
conteúdo.” (MELOT, 2012, p. 50)

1
Códice ou codex definido como “o livro feito a partir da dobra do papel fixado em tábuas.” (MELOT,
2012, p.11)
21

O códice possui diversas vantagens sobre o pergaminho: seu formato


compacto, não rasgar, é simples de abrir e fechar sem a necessidade de desenrolar,
fácil de manusear, de guardar, empilhar, identificar, indexar e organizar. Uma vez
costurados os cadernos, o códice se torna um objeto completo, autônomo e
duradouro.

Em 105 d.C., os chineses inventaram o papel de celulose. Porém, foi bem


depois, no século XIV, que a Europa aprimorou as técnicas de fabricação desse
principal suporte da escrita; primeiro na Espanha e depois na Itália. Mas foi na
Holanda, no fim do século XVIII e começo do XIX, período de censura na Europa,
que o livro e o pensamento se abrigaram. E com a demanda de um material barato e
de matéria-prima quase que inesgotável, capaz de substituir o pergaminho, o papel
que possuía as características de ser macio, leve, poroso, uniforme e padronizável
se propagou por toda a Europa: “A ‘democratização’ da cultura é, antes de mais
nada, o resultado dessa substituição” (MARTINS, 2002, p. 115)

Deve-se igualmente à China o crédito de invenção da imprensa. Por volta de


1041-1048 foram desenvolvidos os tipos móveis de barro endurecidos com resinas
e, mais tarde, em 1313, caracteres móveis de madeira. Em seguida, no Ocidente,
Johannes Gutenberg criou tipos móveis de metal e imprimiu, em 1455, a famosa
Bíblia de 42 linhas na cidade de Mogúncia, Alemanha.

Gutenberg, que trabalhava com polimento de pedras e espelhos, é, sem


dúvida, o maior nome nas artes das letras da Renascença. Sua Bíblia é considerada
o primeiro livro impresso, composto em 1282 páginas com o texto diagramado em
duas colunas. Estima-se que, com a ajuda de seus sócios João Fust, um rico
ourives, e Pedro Schoeffer, calígrafo, tenham sido feitas 150 cópias em papel e 30
em pergaminho em um período de 3 a 5 anos.

A impressão em série, de fato, revolucionou o mundo. A palavra, que era algo


restrito, com o tempo se tornou acessível devido à industrialização do processo. O
que era feito de forma artesanal passou a ser produzido em escala industrial, e o
volume de produção aumentou de forma avassaladora de acordo com a crescente
demanda. E isso, sem dúvidas, contribuiu para a democratização cultural, não só
pelo volume produzido, mas também pela redução do custo que o objeto
manufaturado consegue ter.
22

Não se pode negar que, de modo geral, a maioria dos objetos feitos
manualmente tem como características principais a qualidade e a exclusividade;
mas justamente por ser um trabalho manual, o tempo de fabricação é muito mais
demorado, o que influencia diretamente na quantidade produzida e no custo. Por
outro lado, o objeto industrializado ganha no quesito quantidade sem
necessariamente perder a qualidade, além da garantia de uniformidade.
Manualmente é impossível fazer dois objetos idênticos, em contrapartida da
produção industrial, que obedece a um padrão estabelecido.

Com o avanço da industrialização, vem a mudança de função dos


profissionais envolvidos: o artesão passa ser operário. Sendo assim, não podemos
ignorar os problemas ocasionados pela mecanização do homem. O trabalho que
tinha um viés muito mais artístico acaba se resumindo em apertar um botão, o
profissional que antes tinha o foco no produto, agora precisa ser mais especializado
na técnica e nas máquinas. Com isso, o editor passa a ser um gestor de negócios.

Depois de séculos de supremacia da palavra impressa, hoje já contamos com


o livro sem papel2, “a cultura do nosso tempo é dominada e condicionada pelo
avanço tecnológico, escreve Wilbur Schramm (Responsibility in mass
communication).” (MARTINS, 2002, p. 258)

Na sociedade pós-moderna, a tecnologia está ao alcance da grande maioria e


exerce enorme influência nas exigências e nas expectativas individuais e coletivas,
afetando consequentemente o comportamento dos indivíduos e, por sua vez, na
cultura do papel e na cultura da imagem eletrônica. “A combinação papel – imprensa
revolucionou a geração e a difusão da cultura.” (DOCTORS, 1999, p. 25). Além
disso, os conteúdos migraram para as plataformas digitais com uma série de
vantagens e, hoje, existem novas técnicas de veicular informação.

Com o progresso da automatização, chega o “fim da civilização tipográfica,


linear e sucessiva, e aparecimento da civilização eletrônica, instantânea e circular.”
(MARTINS, 2002, p. 258). Hoje, o cenário deixou de ser estático para ser
imprevisível. Não só a forma de consumir conteúdo é diferente, mas também o tipo
de conteúdo. Com o advento da internet, a velocidade da informação é cada vez

2
Referência ao texto de Herbert Mitgang para o The New York Times em 1980 (The paperless book)
ao se referir ao livro digital.
23

maior, o que influencia no tamanho dos textos e na importância das imagens


ganharam.

Apesar de todo esse avanço tecnológico, “o livro, por diversas de suas


características, continua sendo um veículo insubstituível para o estudo sério, e o
texto impresso continua imbatível para mensagens de caráter mais permanente”
(DOCTORS, 1999, p. 28). É por esse motivo que os jornais e as revistas, que
possuem conteúdos mais voláteis, perdem espaço no meio físico e renascem nas
plataformas digitais. Hoje, a velocidade em que as notícias correm na internet faz
com que a notícia impressa se torne rapidamente obsoleta. Durante o tempo em que
o jornal está sendo impresso, todo o seu conteúdo já foi amplamente divulgado e
repercutido on-line. Porém, continuam com espaço em seus portais on-line,
principalmente por serem consideradas fontes confiáveis e transmitirem credibilidade
na informação, o que, no mundo digital, é difícil de manter, já que qualquer um pode
produzir conteúdo.

Muito já se discutiu sobre a tecnologia digital ameaçar o livro e sobre o futuro


desse objeto. José Mindlin, ex-secretário da Cultura do Estado de São Paulo, disse
em uma conferência em 1997, intitulada A cultura do papel, organizada pela
Fundação Eva Klabin Rapaport, que acreditava não só na viabilidade, mas na
provável permanência do livro impresso. Justificou sua ideia com o fato de que o
livro, por séculos, foi de uso de uma minoria que, por mais que passe o tempo,
sempre existirá, mesmo em um mundo onde a comunicação se faça através de
novas tecnologias de informação. Mindilin ainda complementa que não acha que as
novas tecnologias e o livro sejam incompatíveis e que não possam coexistir.

É impossível negar algumas das vantagens do e-book, como, por exemplo, o


preço ser menor do que o do físico, em média 30% menos, e o fato de ser possível
carregar uma biblioteca inteira em apenas um dispositivo, o e-reader. Essas e outras
diferenças são percebidas e exploradas pelas editoras, de forma que o formato
digital é usado como estratégia de marketing para promover e alavancar as vendas
do impresso. No Brasil, as editoras disponibilizam capítulos grátis, normalmente o
primeiro e em formato digital como uma prévia de degustação para seduzir o leitor.
Além do prequel e do sequel, que está começando a ser usado no Brasil, que
consiste em uma história menor, com começo, meio e fim, normalmente com os
mesmos cenário e personagens, e que antecede a história original no caso do
24

prequel e posterior no caso do sequel. No exterior, essa tática já é bastante


empregada. Na maioria das vezes, prequel e sequel são disponibilizados
gratuitamente no formato digital para funcionar como um atrativo para o leitor, assim,
ele ficará instigado a comprar o livro físico e saber mais sobre a história, o que deixa
claro que livro digital e físico não competem e, sim, complementam-se.

Cada plataforma de leitura tem seu formato, função e um contexto melhor de


uso. Sendo assim, é muito difícil acreditar que o livro impresso, que não tem nada de
efêmero, tenha um fim. O que se pode especular é que, com o tempo, ele ganhe
novas conotações. O desenvolvimento tecnológico dá suporte a importantes
transformações na forma de produzir e consumir conteúdo. A tendência é que ocorra
a convergência dos diversos sistemas em um único e que haja a coexistência dos
livros digitais e impressos, além do surgimento de novos nichos de mercado, como a
publicação por demanda e as autopublicações. Interação é a palavra que une a
conversão do impresso para o digital. Os projetos serão pensados para serem
desmembrados em diversas frentes, em distinguir o conteúdo nas diferentes mídias,
acrescentando e explorando suas peculiaridades.
Dentro dessa temática, é importante destacar os conceitos de Tomás
Maldonado (2012) sobre o quanto os avanços da tecnologia digital, principalmente
na produção hipertextual e de multimídia, influenciam nas mudanças notáveis na
linguagem, na escrita e na leitura. Maldonado, em seu livro Cultura, sociedade e
técnica, define a escrita como “um sistema gráfico de notação que, no contexto
específico de uma comunidade linguística, é utilizado como um instrumento de
interação comunicativa, de produção (e criação) cultural e registro da memória
individual e coletiva”. Desta forma, a escrita é compreendida além do que muitos
estudiosos pregam – como sendo unicamente um sistema de sinais fonográficos. E
conclui-se que o empenho em refletir sobre o futuro do falar, escrever e ler assume
uma dramática importância neste mundo cheio de ambiguidades, riscos e insídias. O
que está realmente em jogo é o futuro do pensar neste mundo cada vez mais
digitalizado.

E quanto ao designer nesse meio, o profissional só tem a ganhar. Novas


ferramentas e plataformas de interação necessitam de novos projetos de ergonomia.
Por exemplo, o projeto gráfico para um livro impresso não deveria ser replicado
exatamente para o digital, já que a mudança no suporte influencia diretamente no
25

conforto e na leiturabilidade. De acordo com Jordan (apud TEIXEIRA, 2014, p.94) o


contexto de uso, dentre outros fatores, pode influenciar o tipo de emoção que
floresce no usuário. Outro ponto é que os impressos tendem a ter mais
investimentos em acabamentos, e ficarem mais bonitos, fazendo uso do design e
inovação para diferenciação, além de adquirirem uma conotação de artigo de luxo,
de presente, “um computador não é um objeto de arte. Não ainda. Ele se tornará. O
livro tornou-se um objeto de arte.” (MELOT, 2012, p.160). Além do que, hoje em dia,
muitos leitores compram o livro digital e, quando gostam da história, compram o
físico para guardar em suas estantes.

2.2- A hospitalidade e os sentidos

A troca entre o livro e o leitor vai muito além de apenas aquisição de


conhecimento. Através dos sentidos – visão, tato, olfato e paladar –, abre-se
caminho para uma relação de hospitalidade, na qual o livro é anfitrião e o leitor,
hóspede. Com seus artifícios gráficos, o livro atrai, seduz e acolhe seu leitor,
despertando sentimentos e proporcionando experiências e trocas inigualáveis.
Em um entendimento mais amplo da palavra hospitalidade, podemos associar
o livro ao papel de anfitrião e leitor ao de hóspede, já que “a hospitalidade é útil para
criar/consolidar… relações benfeitor-cliente.” (LASHEY; MORRISON, 2004, p.28)
A hospitalidade, de forma geral, é aguçada pelos sentidos. No caso do livro,
não é diferente.

“A verdade que reluz nos livros deseja se manifestar a todo sentido


impressionável. À visão, quando lida; à audição, quanto ouvida – até
mesmo ao tato ela se confia de certo modo, quando é transcrita, coligida,
corrigida e preservada.” (BURY, 2007, p. 26)

A capa tem extrema importância para essa relação do livro com o leitor
porque é onde, de fato, se inicia, através do contato visual. Ela não só possui
funções próximas da publicidade em sua forma, mas também em seu objetivo. Além
disso, exerce um papel importante no jogo de sedução com o comércio, revelando
uma ambiguidade própria de um produto (o livro) que nunca foi apenas um produto
de consumo. Powers (2001) considera a capa do livro como um “selling device”.
Outro autor, Wilson (1993), advoga que apesar de a capa ser, antes de mais nada,
26

um revestimento à volta do livro que será exposto na livraria, sua fácil legibilidade e
impacto são essenciais. Sublinha ainda a importância da capa devido ao produto
que embala, uma vez que não se trata de cereais ou detergentes, mas sim de
”pensamento humano”. Hochuli e Kinross (1996) estão de acordo sobre as múltiplas
funcionalidades das capas dos livros: fornecem informação, comunicam e protegem
o livro antes de ser vendido.
A função do livro-embalagem é muito importante não só do ponto de vista
estético e funcional, mas também do ponto de vista relacional com o comprador, ou
melhor, o leitor. Hendel (2003) assegura, inclusive, que o livro comunica não só
aquilo que o autor escreve: a forma do livro e o tipo de letra também o definem.
Aliás, todas as escolhas do designer gráfico terão algum efeito sobre o leitor.
“Através da modalidade visual e da capacidade de percepção do indivíduo
são criadas expectativas sobre o que este irá encontrar” (CAMPOS, 2008, p.8). O
leitor na função de hóspede, “não procura a satisfação somente a partir dos
produtos, de sua seleção, aquisição e uso. Na verdade, a satisfação nasce da
expectativa, da procura do prazer, que se situa na imaginação” (CAMPOS, 2008,
p.9) e o objetivo de um bom anfitrião é atingir essas expectativas.
No sentido da visão, um livro pode ser considerado hospitaleiro ou não pelo
seu grau de legibilidade. Como seu conteúdo pode ser visualmente aprendido,
reconhecido, percebido e organizado. David Carson reforça essa ideia quando
afirma que “somente porque uma coisa é legível, isso não quer dizer que ela
comunica; pode ser que esteja comunicando a coisa errada.” (CARSON apud.
PLINIO, 2008, p. 31)
Sobre a relação afetiva do leitor com a capa, muitos compram o livro mesmo
sem saber o conteúdo, apenas pelo que a capa apresenta e pelas sensações que
ela desperta. A capa na função publicitária tem que resumir o livro sem dar spoiler3 e
seduzir o leitor dentro da enorme concorrência que são as livrarias, tanto físicas
quanto virtuais.
Falando sobre o objeto do livro impresso, após o primeiro contato, que é o
visual, se já agrada e atrai o leitor, o segundo sentido explorado é o tato. O contato
físico inicial é feito, em sua maior parte, na capa, por ser o suporte, o envólucro do

3
Spoiler é quando alguma fonte de informação revela dados sobre o conteúdo de algum livro ou filme
sem que a pessoa tenha visto.
27

miolo. O fato de ter artifícios de produção gráfica de texturas, como o verniz, soft
touch, relevo, além das questões de formato, ajuda ainda mais o objeto a se
diferenciar dos demais e aguça o sentido do tato. “Há livros nos quais o mais
importante é a forma, a interação entre imagem e texto, entre impressão,
acabamento e encadernação.” (PLINIO, 2008, p.133)
Outro sentido que tem relação com o objeto livro é o olfato. “Associar os
odores à hospitalidade refere-se diretamente a cheiros que tragam boas lembranças,
bons momentos, que sejam agradáveis” (CAMPOS, 2008, p.14). Para quem é leitor
voraz, abrir um livro e sentir o cheiro da impressão e do papel traz uma sensação
muito boa e, até mesmo, um conforto.
É através da memória olfativa que a hospitalidade é percebida positiva ou
negativamente. “A percepção dos cheiros, associadas às lembranças e sentimentos
ditam o conceito de hospitalidade do ponto de vista do hóspede.” (CAMPOS, 2008,
p.15)
Já o sentido da audiação depende de um agente externo, que é o contador de
histórias, alguém que se dispõe a ler em voz alta para que outro ou outros possam
ouvir. Pode ser por meio de audiolivros, ou quando o autor faz uma leitura de parte
de sua obra para um grupo de pessoas com o intuito de autopromoção, ou até
mesmo quando uma mãe lê para seu filho que ainda não foi albetizado e cria
lembranças inesquecíveis. Além disso, é por meio da audição que muitos deficientes
visuais conseguem acessar os livros, o que é fundamental para a inclusão. Assim
como os demais sentidos, a audição interfere na relação do livro com o leitor que,
nesse caso, é também ouvinte. “A essência da hospitalidade reside na partilha”
(LASHEY; MORRISON, 2004, p. 36)
Até mesmo o paladar pode ser aguçado por um livro. Ao ler a descrição de
um banquete, os detalhes de um prato ou as peculiaridades de uma refeição exótica,
muitas vezes, o leitor fica com “água na boca”, desejando experimentar o que o livro
narra. Também existem os livros de culinária que, quando o leitor faz a receita, o
paladar é de fato usado, extrapolando a imaginação e se concretizando,
diferentemente do exemplo anterior. Sem falar que, em muitos casos, as pessoas
comem e bebem enquanto leem, como um café ou chá com biscoitos.
A importância do livro para a difusão do conhecimento é indiscutível. Mas
esse valor só é gerado na presença de um leitor. Afinal, um livro na estante só serve
para juntar poeira.
28

“O livro como objeto impresso impõe ao leitor sua forma, sua estrutura e seu
espaço embora não suponha de modo algum sua participação.” (DOHMANN, 2012,
p.7). E a possibilidade do leitor de interferir nesse objeto fica restrita a apenas fazer
anotações nas margens e grifar as partes que lhe convém. O que é diferente na
plataforma digital, na qual as possibilidades de interação e hipertextos são enormes.
Independentemente de ser com o livro impresso ou o e-book, essa aliança na
qual um agente depende tanto do outro acaba constituindo uma relação de
hospitalidade entre o objeto livro, no caráter de anfitrião, e do leitor, no papel de
hóspede, “trata-se de uma relação de troca de valores entre visitante e visitado”
(CAMPOS, 2008, p.4).
Os sentidos da visão, tato, olfato e paladar, uma vez despertados no leitor,
realçam a hospitalidade do livro no ato de dar e receber, onde “a hospitalidade é
associada à satisfação de uma necessidade, e o recebimento de convidados
associa-se à concessão de prazer” (LASHEY; MORRISON, 2004, p. 55). Além disso,
o livro transporta o leitor para o seu ambiente, seu mundo, despertando diversos
sentimentos e emoções. Dando conforto, alívio e conhecimento. Sendo um anfitrião
bastante generoso com seu hóspede ao ponto de tornar-se um grande companheiro.

3- DESIGN DE CAPA

3.1- Estrutura e Elementos da Capa

Para iniciar a fala sobre capa de livro é importante destrinchar sua anatomia
(estrutura e elementos que a compõe).

“Por definição, a capa é um plano único que envolve o miolo do livro”


(CARVALHO, 2008, p.17), que pode ser dividida em 1a capa, 4a capa, lombada e
orelhas. A 1a capa é a frente do livro, e costuma possuir as informações principais:
título, subtítulo, autor, selo da editora e, às vezes, alguma chamada com apelo de
vendas (ex.: “do mesmo autor de ...”, “livro que inspirou o filme”, “autor com mais de
XXX livros vendidos”) ou texto informativo, se o livro vem com algum brinde (ex.:
“grátis cartela de adesivos”, “grátis pôster exclusivo”). É a área mais importante da
capa, pois é através dela que o leitor tem o primeiro contato com o produto. Por ter
tamanha importância, a nomenclatura “capa”, dependendo do contexto, pode se
29

referir apenas ao painel frontal, e não ao todo. Devido à enorme concorrência nas
livrarias, a 1a capa tem que se destacar das demais, e, concomitantemente, deixar
claro a qual gênero o livro pertence. Precisa comunicar e seduzir ao mesmo tempo.

“Pode-se dizer de um livro que a capa representa o ‘rosto’ com que se


oferece ao mundo. Tal como acontece entre as pessoas, é através da capa
(ou da face) que dispara a primeira impressão de simpatia, ou não, por
aquilo que depois vamos encontrar nas páginas internas. Quantas vezes
não abrimos uma obra justamente porque a capa nos seduz e convida para
além dela?” (PAIXÃO apud POWERS, 2008, orelha da capa)

A 4a capa ou contracapa é o verso do livro e costuma conter um texto que


pode ser uma sinopse, um trecho instigante do livro e/ou citações de pessoas e
veículos de mídia, como jornais e sites importantes, sobre a obra e o autor.
Normalmente, o leitor, após ser seduzido pela capa, pega o livro em suas mãos e lê
o conteúdo da 4a capa para confirmar se o livro é de seu interesse. Sendo assim, os
textos precisam ter um apelo comercial e vender a ideia do livro. E esse é o motivo
dos endossos de influenciadores serem usados nesse espaço. Além disso, a 4ª
capa também contém o ISBN do livro, o código de barras, o selo da editora e mais
algumas informações, como endereço do site e redes sociais da editora.

“E as lombadas? Apesar de trabalhar sempre a capa como plano, como se


mantivesse em suspensão o caráter tridimensional do livro, João Baptista confere
importância a elas. Tratadas como estreitos planos verticais, funcionam como
índices numa estante.” (LEON, 2006, p.230). A lombada é a parte onde fica a
encadernação e costuma conter informações de título, autor e editora, além de,
quando os livros pertencem a uma coleção, a informação da sequência também
costuma estar na lombada. Depois que o livro vai para a prateleira, a lombada se
torna a parte nobre do livro, pois é como irão identificá-lo dentre os demais. Por isso,
é importante que as informações estejam bem legíveis.

Existem dois tipos de lombada: lombada europeia e lombada americana. Na


europeia, o sentido do texto é de baixo para cima, de forma que, se apoiarem um
livro em uma mesa, o texto fica de cabeça para baixo, em contrapartida, é a forma
mais indicada para visualização na estante. Já a americana é de cima para baixo,
que facilita a leitura quando o livro está deitado, e é indicada para os livros de coffee
table, como livros de arte e decoração, que são projetados para ficarem em cima de
uma mesa quase que como um objeto de decoração. No Brasil, são usados ambos
30

os tipos, na maioria dos casos, a americana é mais encontrada, mas a escolha fica a
critério de cada editora, que normalmente tem um padrão.

Por último, as orelhas, que são uma parte da capa dobrada para dentro. Nem
todos os livros possuem orelhas, até porque uma forma de baratear os custos de
produção e do produto final é cortando essa área. As orelhas têm a função de ajudar
a marcar as páginas e dar mais estrutura à capa pois fica mais encorpada, além de
ser mais um espaço para destacar informações importantes, dentre elas: um texto
curto sobre o autor acompanhado de sua foto, uma sinopse mais detalhada sobre o
livro ou personagem principal e, de forma discreta, o crédito do capista e das
imagens usadas na capa.

Figura 1 – Anatomia da capa de livro

Fonte: FERLAUTO; JAHN, 1998.

O conteúdo textual da capa é definido pelo editor do livro, que envia o


material juntamente com um briefing para o capista que tem o trabalho de traduzir o
conceito do livro em imagem e unir com o texto recebido. A composição do layout
precisa fazer um resumo da história, mas sem dar spoiler.

Nem sempre as capas são tratadas como projetos únicos. Às vezes, como
em casos de coleções e coletâneas de livros editadas pelas editoras, as capas
precisam ter um padrão gráfico para serem identificadas como parte do mesmo
31

projeto. Podem ter em comum o autor, a temática ou edições comemorativas da


editora. Nesses casos, é sempre bom usar o mesmo capista para que a visão
original não se perca e que a identidade se mantenha.

Figura 2 – Coleção Agatha Christie

4
Fonte: Site da Editora HarperCollins Brasil

Muitas capas são refeitas e adaptadas, chamadas no mercado editorial de


repacks. Esse movimento pode ser feito por dois motivos: caso o livro seja um
clássico literário antigo e precise de uma nova roupagem para se adequar ao
mercado atual ou caso a editora acredite que o livro não teve um bom desempenho
de vendas por conta da capa. Sendo assim, é feito um re-design da capa com os
novos valores, que acaba implicando em um relançamento nas livrarias. Essa
estratégia é usada pelo marketing das editoras como forma de levar um livro que
não é lançamento aos pontos de destaque nas livrarias, como a vitrine, e assim
alavancar as vendas.

Figura 3 – Capa antiga e repack do livro Pecar e Perdoar

5
Fonte: Site da Editora HarperCollins Brasil

4
Disponível em: <http://www.harpercollins.com.br/catalogo/>. Acesso em 02 nov. 2017.
32

As capas devem ser projetadas com foco no público-alvo, o leitor precisa se


identificar com o que vê. Esse é um dos principais motivos para os livros que são
lançados mundialmente não necessariamente possuírem a mesma capa em todos
os países, tendo apenas o miolo traduzido. Com a diversidade entre os leitores e
suas culturas, dependendo do projeto, a editora prefere fazer uma capa própria do
que adaptar a original. É interessante ver as diferentes leituras que cada capista no
mundo fez para a mesma obra, pois os estilos, preferências e comportamentos dos
usuários ficam bastante evidentes.

Dentre os elementos que podem compor o layout de capa, existe a


possibilidade dela ser construída com o uso exclusivo tipográfico, classificada como
all type. Essa versão, na maioria dos casos, tem uma maior sofisticação gráfica, pois
a ausência de imagem permite que o leitor imagine a capa. Contudo, a combinação
de texto e imagem, que pode ser fotografia ou ilustração, é a mais usada, pois a
imagem é mais apelativa e seu uso (e o uso da cor) tem raízes muito profundas e
complexas, sempre associadas a práticas culturais muito além dos processos
comunicativos pragmáticos.

Walter Benjamin (1955), em seu tão prospectivo ensaio A obra de arte na era
de sua reprodutibilidade técnica, fala do valor de culto que as imagens únicas
possuíam, substituído pelo valor de exposição trazido pela tecnologia e pelos
caminhos abertos para a reprodutibilidade das imagens. Foi dentro desse longo
processo de ocupação do mundo pelas imagens, em primeiro lugar como culto,
depois como arte e, depois, como objeto de exposição (e, hoje, podemos dizer de
“superexposição”), que Luciano Guimarães (2001) percebeu que as cores se
tornaram uma grande alavanca dos meios de comunicação: o grande fator de apelo
das mensagens imagéticas. Se a comunicação por imagens por si só já possui uma
enorme força apelativa, as imagens de exuberante colorido têm uma força ainda
maior.

Até existem capas sem texto, composta apenas de imagens, mas por conta
do ponto de venda, fazem uso de algum elemento de suporte, como uma cinta ou
sobrecapa, para trazer as informações necessárias. Se formos falar dos tipos de
representação da escrita, na capa encontra-se a união da escrita pictórica, fonética e
ideográfica.
5
Disponível em: <http://www.harpercollins.com.br/catalogo/>. Acesso em 02 nov. 2017.
33

Figura 4 – Capa do livro Lima Barreto triste visionário

6
Fonte: Blog da Editora Companhia das Letras

Para fundamentar uma boa composição de layout é necessário refletir sobre o


grid. Para alguns designers gráficos, ele é parte incontestável do processo de
trabalho, oferecendo precisão, ordem e clareza. Para outros, é símbolo da opressão
estética da velha guarda, uma prisão sufocante que atrapalha a busca da expressão.
Mas não se pode contestar que esse sistema estrutura as relações de escala e
distribuição entre elementos informativos, imagens ou palavra, ajudando o
observador a entender seu significado. Timothy Samara (2002), em seu livro Grid -
construção e desconstrução, prega como a construção e a organização da forma
estão indissociavelmente ligadas à disseminação visual da informação. Primeiro, ele
explica como desenvolver um grid, com os fundamentos que conduzem o leitor pela
mecânica essencial de construção. Depois, explora as alternativas de desconstrução
do grid, com a organização espontânea e métodos orgânicos de composição.

Um bom layout de capa precisa: ser legível; apropriado para o público-alvo;


diferenciado; ter uma paleta de cores interessantes; uma hierarquia de informação

6
Disponível em: <http://www.blogdacompanhia.com.br/conteudos/visualizar/O-retrato-de-Lima-na-
capa-entre-o-silencio-e-o-ruido>. Acesso em 02 nov. 2017.
34

clara, se o autor for famoso, o nome dele tem mais destaque que o título da obra,
caso não seja, o título que tem destaque.

“A qualidade da composição é que determina a aparência do livro. Mesmo


que a tipografia não seja particularmente primorosa, pode-se obter um bom
efeito quando se observam as boas práticas. Por outro lado, até a mais bela
letra será arruinada se o espaçamento for demasiado aberto e se não der
atenção aos pontos mais delicados da boa composição” (TSCHICHOLD,
2007, p.123)

Apesar das preocupações com a legibilidade do texto e clareza das


informações, é muito importante o trabalho de integrar as imagens, cores e outras
mensagens mediante uma estrutura consistente e harmonizar as relações visuais
entre textos e imagens. A experiência é multissensorial, a interação é emocional, e o
trabalho do capista é usar o espaço disponível, que é a capa, para passar uma
mensagem através de um conceito visual.

3.2- Funções da capa

“É espantoso que a importância cultural das capas ainda seja negligenciada


pelos bibliógrafos. A capa é parte integrante da história de qualquer livro, e
a sobrecapa, em particular, nos permite visualizar o que o primeiro
comprador teria levado para casa, dando por sua vez uma pista sobre o
impacto que o editor desejava causar nos leitores.” (POWERS, 2008, p. 6)

As primeiras sobrecapas surgiram por volta de meados do século XIX,


quando a produção de livros se industrializou. A finalidade delas era proteger a
valiosa encadernação e preservá-la pelo menos por algum tempo. A sobrecapa
continha o título do livro e, muitas vezes, outras particularidades em sua parte
frontal, como o nome da editora e algum texto publicitário. Nas primeiras décadas do
século XX, foi a capa que se tornou um instrumento de comercialização, passando a
funcionar como revestimento permanente e a ser a nova portadora da publicidade.
Já a sobrecapa protetora, a cada dia torna-se mais desnecessária por aumentar o
custo do livro e devido à melhoria dos materiais e dos acabamentos gráficos que
trouxeram mais resistência para as capas e encadernações.

Desde o surgimento do livro, a função da capa foi mudando de acordo com os


avanços da impressão e dos materiais, mas, acima de tudo, com a forma como o
35

leitor se relaciona com o objeto. Se, no início, a capa apenas protegia o miolo, ao
longo do tempo acumulou a função de transmitir informações, ao passo que
identifica e distingue um livro do outro.

“A capa do livro consiste na proteção do volume e na identificação do


conteúdo. Entretanto, via de regra, costuma-se atribuir à imagem da capa a
parte principal, em detrimento dos elementos gráfico-tipográficos do texto,
que são justamente os atributos principais do livro.” (WEYNE apud FILHO,
2008, p. 113)

Hoje, uma capa não serve somente para embalar e proteger o miolo do livro
como era nos primórdios do segmento editorial, segundo Niemeyer (2003), também
faz parte de um processo de comunicação. Powers (2001) a considera um
dispositivo de vendas que está além da mera publicidade, promovendo um jogo de
sedução comercial que leva ao fetichismo da mercadoria; Hendel (2003) ressalta a
importância da capa não só do ponto de vista estético e funcional, mas também do
relacional com o comprador/leitor, concluindo que as escolhas do capista terão
efeitos sobre o leitor; e Samara (2011) ainda destaca o fator da capa ser uma ponte
entre o mundo exterior e a experiência interior da publicação.

Muitos designers destacam somente a função de promoção comercial:

“No mercado de ficção popular, onde o impulso de compra é forte, a capa


deve atrair.” (STONE apud HENDEL, 2003, p. 187)

“A sobrecapa pode ser vista como uma propaganda. Pode ser a única coisa
que um comprador em perspectiva vê, especialmente se o livro estiver
lacrado.” (TAN apud HENDEL, 2003, p. 206)

“A sobrecapa era uma propaganda, totalmente efêmera, e deveria induzir o


leitor, por sua extravagância, a hesitar antes de recolocar o livro na
prateleira.” (ECKERSLEY apud HENDEL, 2003, p. 149)

A capa de livro é um dispositivo de venda, similar à publicidade em sua forma


e função. Além disso, as pessoas se conectam com os livros e, mesmo após quase
dois séculos de produção em massa, continuam apegadas a eles. Essa conexão
deve-se ao fato do livro ser um objeto de maior longevidade e, por acompanhar seu
dono quase que por toda sua vida, algumas vezes através de gerações, além de ser
um objeto de transmissão de conhecimento, possui valor sentimental.
36

“A capa, sem dúvida, cumpre um papel no processo de envolvimento físico


com o livro, pois, embora não se possa olhá-la enquanto se lê, ela o define
como objeto a ser apanhado, deixando de lado e talvez conservado ao
7
longo do tempo.” (POWERS, 2008, p. 6, 7)

Outros profissionais reconhecem o livro como um todo, onde capa e miolo


precisam conversar.

“Embora reconheça que a sobrecapa tem uma função comercial, acho que
é possível que ela, ao mesmo tempo, cumpra essa função e apresente uma
pequena relação com o design do miolo... Não dar atenção ao que foi feito
dentro do livro me parece um erro (principalmente se o miolo e a sobrecapa
forem feitos pela mesma pessoa). O design de livros é, em parte, a solução
de problemas. Para mim, relacionar a sobrecapa com o miolo do livro, sem
negar sua função comercial, é parte do problema a resolver.” (MENDELL
apud HENDEL, 2003, p. 170)
“Sou de opinião que o design da capa ou da sobrecapa deveria ser, se
possível, uma extensão do tema gráfico do miolo do livro e repetir seu estilo
e alinhamento tipográficos. Um recurso decorativo usado nas páginas de
texto ou uma peça de arte pode despertar a nossa imaginação e fornecer a
chave para um interessante design de capa.” (SCOTT apud HENDEL, 2003,
p. 184)
“Num mundo ideal, o livro, a capa e a sobrecapa seriam projetados pela
mesma pessoa com a mesma ideia, mas talvez não ocorra.” (TAN apud
HENDEL, 2003, p. 206)
“Um bom design lida com relacionamentos. Cada parte de um livro depende
da outra parte. Nada pode ser ignorado. A moldura unificadora que mantém
integrado um bom design é as vezes bastante complicada e muitas vezes
invisível.” (SCOTT apud HENDEL, 2003, p. 174)

O mais frequente é que o design da capa e o design do miolo sejam feitos por
profissionais distintos por uma questão principal de custo, mas também de prazo.
Capa e miolo são produzidos simultaneamente e, na maioria das vezes, as editoras
já possuem um projeto gráfico de miolo padrão, justamente pensando na economia
tanto de tempo, quanto de dinheiro.

“O descaso pelas capas de livro resulta de uma disputa entre a palavra e a


imagem nos processos de edição e de leitura. A tendência de as crianças
lerem ilustrações, e não texto, implicou a visão de que capas atraentes
demais degradam conteúdos importantes – paradigma que talvez ainda seja
corrente no caso das publicações acadêmicas. As crianças, porém, não
fazem uma separação tão automática entre forma e conteúdo, e podem
estabelecer um vínculo emocional com um livro da mesma forma que fariam
com um brinquedo. A capa pode desempenhar funções diversas nessa
conjunção. No caso de um livro ilustrado, ela pode servir de amostra das
delícias que virão – uma espécie de janela para um mundo interior, mas não

7
“A book jacket or cover is a selling device, close to advertising in its form and purpose, but also
specific to a product that plays a teasing game of hide and seek with commerce.” (POWERS, 2001, p.
6, 7)
37

necessariamente a mais rica delas. Num romance juvenil, ela pode ser a
única parte do livro impressa em cores e, portanto, a mais envolvente.”
(POWERS, 2008, p. 6-7)

Mas não podemos colocar na capa a responsabilidade total em relação a um


livro vender bem ou não. Audrey Niffenegger escreveu no prólogo do livro Classic
Penguin (BUCKLEY, 2016) que a reputação do livro é um elemento de design8. E,
de fato, de acordo com a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, publicada em
Março de 2016 com realização e coordenação do Instituto Pró-livro e executada pelo
IBOPE Inteligência, diz que a capa é terceiro fator influenciador na escolha do livro,
ficando atrás apenas de “tema/assunto”, que está em primeiro, e “autor”, que está
em segundo; e empata com “dicas de outras pessoas” e “título do livro”.

Contudo, vale ressaltar que, apesar da capa poder ser usada como artifício
para aumentar as vendas, não adianta o livro ter um lindo projeto gráfico de capa, o
que independe de ser feito com materiais caros e acabamentos sofisticados, se o
conteúdo não for bom.

3.3- Capistas

Depois do estudo do objeto, mostra-se significativo também falar sobre o


profissional que está por trás de seu desenvolvimento. O nome da função legitimado
pelo mercado é “capista”. De acordo com Carvalho (2008), o termo em português foi
cunhado nos anos 50, e nada mais é do que a atividade profissional que concebe e
executa o design de capas de livros. Engana-se quem pensa que todos os capistas
são profissionais com formação em design gráfico, alguns não chegam a ter
formação acadêmica. São pessoas que têm em comum a paixão pelo objeto livro e
usam o design gráfico como ferramenta para realizar sua função; usam a expressão
gráfica como forma de traduzir a expressão do conteúdo. Contudo, o livro sendo um
objeto tridimensional, o design de livro não pode se limitar apenas ao âmbito do
design gráfico, precisa ser pensado como objeto, é mais estrutural, envolve os
parâmetros de forma, função, sentido e valor, além de memória e registro.

8
“We don`t have to define the book using only design: The book`s reputation is a design element.”
(NIFFENGGER apud BUCLEY, 2106, p. 13)
38

“A designação ‘capista’ tem ainda a vantagem de não fazer uma menção


direta à formação acadêmica do profissional... Daqui se pode pensar que o
trabalho de criação de capas está, em grande parte, mais dependente do
interesse literário dos capistas do que de uma formação acadêmica
especializadas. Segundo Mendelsund, as principais capacidades para
exercer esta profissão são as noções de composição e cor e um elevado
grau de literacia. Para o capista, a primeira é um requisito implícito à
formação em design e pode ser adquirida nesse contexto, ao contrário da
segunda.” (CARVALHO, 2008, p.17)

De acordo com Perrota (2006), essa função no Brasil ganhou destaque por
volta de 1910 com Monteiro Lobato como editor e após a revolução de 1930 a
produção de livros cresce e atinge um pico em 1950. Por se tratar de uma nova
função porque até então as capas eram mais tipográficas, quem desempenhava o
trabalho com capas ilustradas eram cartazistas como Correia Dias e Geraldo Orthof,
ilustradores do meio jornalístico como Alvarus e Raul Pederneiras, artistas plásticos
como Anita Malfatti, Augusto Rodrigues, Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e Victor
Brecheret. Vale destacar o trabalho dos capista: Santa Rosa, a partir de 1934, e
Eugênio Hirsch para a editora Civilização Brasileira e Victor Burton para a Nova
Fronteira. Além de João Baptista da Costa Aguiar, Moema Cavalcanti, Ettore Botino
e Hélio de Almeida.

Muito se discute sobre ser um trabalho de cunho mais artístico ou não.


Todavia, há uma grande diferença entre o artista e o capista. O segundo projeta
mediante a um briefing com foco no usuário. O centro de tudo, o final da cadeia
produtiva, é o leitor. Para o capista, é imprescindível estudar o usuário, seu
comportamento e sua interação com o objeto. Já a arte é apropriada como forma de
linguagem, sendo seus movimentos e estilos usados como referência. Capistas não
fazem arte, eles mostram a arte dos outros.

Todavia, assim como na arte, não existe uma metodologia padrão para a
criação das capas, cada profissional possui um estilo e uma forma de trabalhar
particular. A questão de estilo é contraditória, pois, teoricamente, o profissional
deveria estar apto a desenvolver qualquer tipo e gênero de livro, porém, é
justamente o estilo de cada capista que faz o editor pensar em um nome especifico
para cada obra, em qual profissional tem o perfil mais indicado para cada trabalho.

“O processo de design de livros muda com o tempo e com a tecnologia. Os


designers variam continuamente seu modo de pensar na solução de
problemas e a cada novo projeto aprendem coisas novas. Estão sempre
experimentando, testando as convenções tipográficas. Supreendentemente,
39

as ideias mais valiosas provêm das mínimas revisões da maneira usual de


trabalhar.” (HENDEL apud FILHO, 2008, p.105)

Independentemente das particularidades de trabalho de cada capista, o que


rege todos é um processo de inventividade e experimentação. Os profissionais
traduzem sua percepção simbólica e interpretativa na capa de forma que se
estabeleça uma relação com o conteúdo. E, assim, desenvolvem o processo criativo
até chegarem a algumas soluções de seu agrado para então enviarem para
aprovação do editor. Após essa etapa, em geral, a capa passa por uma série de
aprovações internas que inclui os setores de marketing e comercial. E depois de
emendas e alterações, que fazem parte do processo, os arquivos da capa são
enviados para finalização na editora.

3.4- Cadeia produtiva do livro

“O livro é uma totalidade criada por muitas pessoas em conjunto e não


apenas pelo designer. Só quando todos trabalham em coordenação,
quando todos têm como ponto de partida a mesma ideia do que é a
qualidade é que o trabalho pode ter êxito.” (FILHO, 2008, p.149)

O objeto livro tem sido, por séculos, um produto cuja plataforma possibilita a
disseminação e perpetuação do conhecimento, bem como o exercício do direito à
informação e à cultura. A legitimidade do mercado editorial na indústria criativa é,
portanto, indiscutível.

Ao versar sobre a definição da indústria criativa, o departamento de Cultura,


Mídia e Esporte do Reino Unido justifica a inserção desse mercado:

“(...) atividades que têm a sua origem na criatividade, competências e


talento individual, com potencial para criação de trabalho e riqueza por meio
da geração e exploração de propriedade intelectual.” (DCMS, 2005, p.5
apud REIS FILHO, 2015, p.18)

A cadeia produtiva do livro reúne os setores autoral, editorial, gráfico, produtor


de papel, produtor de máquinas gráficas, distribuidor, livreiro, que se relacionam
entre si e criam um mercado.

É possível observar, portanto, que o motor do mercado editorial e responsável


por sua consolidação na indústria criativa é, indubitavelmente, a figura do autor,
proprietário dos direitos morais e materiais da obra literária, artística ou científica em
40

torno da qual circulará todo o processo de produção e comercialização do objeto


livro. Sem autor, não existe livro. Ao mesmo tempo que “autores não produzem
livros e sim textos.” (DOHMANN, 2012, p. 2)
Em um modelo tradicional, o mercado do livro situa o autor no início da cadeia
de produção. Ele tem uma ideia e prepara um texto na expectativa de que seja
aceito por uma editora e, finalmente, seja publicado. Essa relação entre autor e
editora, às vezes, é intermediada por um agente literário, devido ao fato de ser muito
difícil o acesso de novos autores à editoras. Essa dificuldade abriu espaço para um
mercado editorial paralelo, o de autores autopublicados.
“Ora, não se trata apenas de discorrer sobre a forma do livro como um
elemento a seu favor diante das novas tecnologias, mas de o inserir dentro
de uma cadeia produtiva complexa, a qual demanda, por sua vez, um
sistema não menos engenhoso de circulação. O que torna a figura do autor
tanto mais frágil quanto dependente dos rumos tomados pela economia do
livro, bastando lembrar que ele nasce desse mesmo circuito que não raro o
tem devorado e o relegado a segundo plano. Como escreve Melot, ‘desde
que o texto transborda da capa para expandir sob a forma de tomos, séries,
tiragens, periódicos e bases de dados, vê-se bem que o autor se quebra, se
dispersa, se desfaz e acaba por se evaporar. Seus direitos, adquiridos por
sua residência nesta unidade que é o livro, são dilapidados nas
contestações sem fim. O direito do autor não está ligado às suas ideias,
mas à sua inscrição no espaço. O autor possui suas ideias na mesma
condição de um proprietário fundiário’ (Grandezas e Mistérios do autor,
P.115-116).” (DEAECTO apud MELOT, 2012, p.12-13)

Uma vez o livro sendo aceito pela editora, o problema principal não é colocar
o produto no mercado, mas encontrar o leitor ideal para cada um de seus títulos. Já
para o consumidor, a questão é encontrar os livros que o interessam em meio à
variedade de títulos produzidos. Assim, o desafio é fazer com que os editores e os
compradores de livros se encontrem. O importante não é que um título em especial
chegue a todos os leitores, mas que cada um chegue ao seu público-alvo. Portanto,
a necessidade de conectar oferta e demanda faz surgir os outros elos da cadeia
produtiva do livro.
Após o editor conseguir aprovar a obra em um comitê editorial interno, o livro
passa por vários setores antes de seu projeto ser finalizado: Editorial ou Publisher;
Editorial de aquisições; Editorial de textos; Produção editorial; Consultoria/Revisão
técnico; Design (layout de capa e projeto e diagramação de miolo); Gerenciamento
de licenciamento; Ilustração / Fotografia; Marketing; até chegar ao fechamento do
arquivo para envio para impressão. Acompanhe de forma mais detalhada no
fluxograma a seguir.
41

Figura 5 – Fluxograma da cadeia produtiva do livro

Fonte: Compilação do autor, 2017.


42

No Brasil, existem três formas principais de distribuição: venda para livrarias


de forma direta, venda para livrarias intermediada por empresas distribuidoras e,
especialmente, venda direta aos governos por meio de programas de compra de
exemplares. Um dos casos mais representativos é o Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD), que, dado seu volume de investimentos, impulsiona a participação
que o agrupamento de livros infantis, juvenis e educacionais tem no total de vendas
de livros no Brasil: 27,4% em 2016, atrás apenas do chamado "não ficção
especialista", que teve 31% (NIELSEN; SNEL, 2016).

O governo federal é o maior comprador de livros do Brasil (MINISTÉRIO DA


EDUCAÇÃO, 2016) e, como tal, tem (e exerce) forte poder de barganha,
pressionando e influenciando o preço unitário dos exemplares graças às altas
tiragens que demanda e, assim, conseguindo negociar descontos que variam entre
75% e 80% do valor pago pelos demais compradores do mercado. A fim de atender
demanda tão específica, as editoras não raro dedicam cargos ou áreas inteiras para
cuidar da inscrição nos editais dos programas de compra, da negociação direta com
os órgãos governamentais e da redação dos contratos relacionados a eles. Por outro
lado, tal volume de investimentos concentrado em um único comprador, ainda que
através de uma miríade de políticas, torna-se perigoso para o mercado, que se vê
dependente dos orçamentos e decisões governamentais. Essa dependência se
amplia em tempos de crise, quando a demanda da iniciativa privada se retrai.

[Luís Antônio Torelli, presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL)]


reafirmou a sua preocupação com a formação de novos mercados para a
indústria do livro. “A gente precisa se desvincular disso. Temos que partir
para outras, criar mais leitores para ficarmos menos dependentes das
compras governamentais”, disse, reconhecendo que esse é um projeto em
longo prazo. (LEONARDO NETO, 2016).

No setor gráfico, a maioria das editoras não possui gráfica própria, o que abre
espaço para a impressão no exterior, algo que se tornou viável, principalmente na
China e na Índia, por conta dos preços atrativos para os acabamentos premium
como capa dura. Porém, com o inconveniente do prazo para recebimentos que é,
em média, de 4 meses.

“A distribuição de livros no Brasil é feita, acima de tudo, por meio de vendas


diretas das editoras ao governo e, em seguida, por vendas diretas à livrarias e pela
ação de empresas distribuidoras.” (EARP; KORNIS, 2005, p. 43). A distribuição no
43

território brasileiro é um dos maiores problemas da cadeia do livro, pois, para


conseguir estar bem distribuído e estar presente nos pontos de venda em nível
nacional, o livro precisa de uma tiragem de média a alta. Assim, o que acontece com
os livros de tiragem pequena é serem mais distribuídos regionalmente.

“Uma livraria tem de tomar diversas decisões cruciais: a primeira é a


localização, em um ponto de fácil acesso para o consumidor, o que pode
dar origem ao mais importante dos custos fixos; a segunda é o nicho de
mercado, visto que seria tão absurdo trabalhar com um só título como tentar
fazê-lo com todos, e dessa escolha vai decorrer a seleção dos títulos que
correspondam à demanda esperada daquele grupo de consumidores; e,
finalmente, a terceira é a escolha da quantidade de exemplares de cada
título.” (EARP; KORNIS, 2005, p. 48)

Atualmente, muitos dos livros são feitos com a tiragem mínima, que é, em
média, de 3 mil exemplares. Em contrapartida, um livro tem que vender
aproximadamente esse mesmo número no curto espaço de tempo de uma semana
para alcançar alguma posição nas tão sonhadas listas de mais vendidos.

“(...) mas nem só de baixas tiragens vive o mercado. A atividade gráfica foi
uma das primeiras a sofrer impacto da produção em massa, ... o que leva à
busca de títulos capazes de vender milhões de exemplares... Um só
sucesso pode pagar por centenas de fracassos — daí a tendência ao
crescimento de algumas editoras. Lembrando que, com isso, existe um risco
crônico de superprodução.” (EARP; KORNIS, 2005, p. 15)

Além disso, as livrarias têm como concorrentes as redes e pontos de vendas


não convencionais, como supermercados, lojas de departamentos e lojas on-line.

E como se calcula o preço do livro?

“Existe uma fórmula que consiste em somar os custos de papel, gráfica,


diagramação, composição, revisão, tradução e capa, dividi-los pelo número
de exemplares da tiragem pretendida e assim obter o custo do livro sem os
direitos autorais. Esse valor é multiplicado por 5 ou 6 para se chegar ao
preço de capa. Sempre que aplicada essa fórmula, basta vender 40% da
edição para pagar os custos da editora.” (EARP; KORNIS, 2005, p. 24)

Sendo assim, distribuindo percentualmente em média o preço de capa, 10% é


equivalente a direitos autorais, 25% custos editoriais, 15% lucro da editora, 10%
distribuidor e 40% para o livreiro.

O livro é um objeto importante tanto no âmbito educacional quanto no cultural,


é um bem de experiência. Por isso, seu preço não representa a qualidade do
produto, um livro mais caro não necessariamente é melhor do que um mais barato.
Além disso, muitos fatores contribuem para o sucesso de um livro, dentre eles, a
44

aclamação de críticos e de influenciadores, assim como prêmios literários, como o


Pulitzer.

Em resumo, a cadeia produtiva do livro reúne, portanto, autores (com ou sem


auxílio de um agente), editores, gráficas, distribuidores e comércio físico, on-line
e/ou porta-a-porta. Nesse sistema, o governo age como um importante stakeholder
porque exerce um papel duplo: o de (maior) comprador e o de regulador, criando e
fazendo valer instrumentos legais que visam ordenar o funcionamento do mercado e
fomentar a leitura, a educação e a difusão de cultura. Portanto, se dentro da
economia criativa, a ação do Estado é sempre altamente relevante, conforme
assinala Benhamou (2007), no campo da literatura ele é ainda mais.

3.5- Direitos Autorais no Mercado Editorial

Com a impressão em série, veio à tona a questão de copyright, que é o


direito que o autor concede à editora de reprodução da obra. Pode-se dizer que
durante a Antiguidade, ignorou-se completamente a ideia de direitos autorais. O
autor vendia o texto por um determinado valor ao livreiro para reproduzir a obra,
contudo, não existia o direito exclusivo de reprodução. “Empregando uma
terminologia moderna, a obra publicada caía imediatamente no domínio público”
(MARTINS, 2002, p. 394).

Já no período da Renascença, com a crescente concorrência entre os


livreiros, surge a necessidade de preservação dos projetos e, com isso, institui-se os
chamados “privilégios”. Estes, inicialmente, eram concedidos aos editores e não aos
autores, já que se tratava de um privilégio de venda, não autoral, e, na época,
apenas editores e livreiros tinham o direito da comercialização. Somente em 1777,
na França, que os autores ganharam o direito de vender as próprias obras. Os
privilégios eram territoriais, podiam ser temporários ou perpétuos, e também eram
concedidos para letras tipográficas e formatos de livros. A Inglaterra foi o primeiro
país a reconhecer a propriedade literária e a instituir o sistema de depósito legal, em
1709. Já na França, no período de 1618 a 1777, foram feitas diversas tentativas de
tratados com a intenção de regulamentar os privilégios e de resolver o problema da
45

propriedade intelectual, até conseguirem estipular um regulamento com uma melhor


proteção aos autores, que durou até a Revolução Francesa.

As leis de propriedade evoluíram ao longo dos últimos 150 anos e,


atualmente, pratica-se não mais direitos territoriais, mas mundiais. Hoje, existem três
grupos de uniões referentes à produção de obras literárias e artística: a União de
Berna, as diversas uniões pan-americanas e a Convenção Universal realizada pela
UNESCO.

No Brasil, vigoram a lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, e a Convenção


Universal sobre Direito Autoral. As editoras costumam pagar aos autores 10% do
preço de capa, que é o valor comercial do livro, referente aos direitos autorais. Mas
o que rege o acordo entre as partes é sempre o contrato, que permite infinitas
variações. Cada caso realmente é um caso diferente, principalmente quando se trata
de obras internacionais.

Para registrar uma obra literária no Brasil, é preciso procurar a Biblioteca


Nacional, que, desde 1898, é a unidade responsável pela execução da política
pública de registros e preservação da obra intelectual através do Escritório de
Direitos Autorais (EDA).

“O registro de direitos autorais na Biblioteca Nacional existe desde 1898.


Através do registro de obras intelectuais, de acordo com a Lei nº 9.610/98, o
registro de direitos autorais tem por finalidade dar ao autor segurança
quanto ao direito de criação sobre sua obra.
O registro permite o reconhecimento da autoria, especifica direitos morais e
patrimoniais e estabelece prazos de proteção tanto para o titular quanto
para seus sucessores. Além disso, o EDA também recebe o “depósito legal”
das obras registradas, contribuindo para a guarda e a difusão da produção
intelectual brasileira, missão principal da Fundação Biblioteca Nacional.”
(Disponível em: <www.bn.gov.br/servicos/direitos-autorais>. Acesso em
21/05/2107)

Além de registro de livros, o EDA também oferece o serviço de registro de


desenho, de personagem e de imagens, incluindo, portanto, ilustradores, autores,
fotógrafos, cartunistas, jornalistas, designers, publicitários e todos os que produzem
materiais autorais. Sendo assim, por exemplo, se a capa do livro possuir uma
ilustração ou fotografia original de autoria própria do capista, é possível solicitar e
garantir seus direitos autorais.
46

A EBA (Escola de Belas Artes – UFRJ) também faz o registro de direitos


autorais, mas apenas referente a obras de arte:

Segundo a lei, obras de "desenho (jóias, personagens, logomarcas, etc.),


fotografia, pintura, aquarelas, gravura, escultura e litografia" podem ser
registradas como obras de arte. Arte aplicada também pode ser registrada,
"desde que seu valor artístico possa dissociar-se do caráter industrial do
objeto a que estiverem sobrepostas." Ou seja, aqui não podem ser feitos
registros de propriedade industrial, que são regidas por outras leis, as de
marcas e patentes. (Disponível em: <http://www.eba.ufrj.br/index.php/
servicos/direitos-autorais>. Acesso em 26/01/2108)

Na cadeia produtiva do livro, o capista é, em geral, autônomo, sem vínculo


empregatício com a editora contratante, e presta serviço de acordo com a demanda,
sempre seguindo o briefing passado pelo editor.

Para a contratação do serviço desse capista para um determinado projeto no


mercado editorial, gera-se um Recibo de Cessão dos Direitos Autorais, que deve ser
assinado pelo profissional e que tem os seguintes termos:

“O valor supracitado compreende também a cessão definitiva dos direitos


autorais oriundos do resultado dos serviços acima elencados ficando, desde
já, a Cessionária legitimada a explorar comercialmente tais resultados
também em futuras reedições desta(s) obra(s)e/ou quaisquer outras
publicações desta empresa ou de quaisquer empresas pertencentes ao seu
grupo econômico, no Brasil ou no exterior, pelo prazo de proteção legal
definido na Lei 9.610/98 e nos formatos impresso (livro, livro de bolso e
similares) e eletrônico (audiobook, CdRom, Internet, download, ebook e
similares). Declara, também, que após o recebimento do valor acima citado,
concede total, irrestrita e definitiva quitação da cessão aqui realizada, nada
mais tendo a reclamar.” (ver ANEXO A – Recibo de Cessão de Direitos
Autorais)

Isso significa que, através da assinatura desse termo, a editora se torna


detentora de todo direito autoral cedido pelo capista e que o profissional, uma vez
pago para realizar uma capa, perde todo e qualquer tipo de direito de veiculação
desse material. A editora, por sua vez, pode reimprimir o livro sempre que precisar e
reproduzir a capa em diversas plataformas (digitais ou impressas), inclusive
internacionalmente, quantas vezes for de seu interesse, sem que tenha que
comunicar o capista sobre nada ou remunerá-lo de alguma maneira. O capista
possui o direito moral, tanto que seu nome consta nos créditos do livro, mas cedeu o
direito patrimonial à editora, mediante o pagamento do serviço prestado.

Nesse contexto, é importante distinguir a diferença entre os termos Cessão e


Licenciamento. De forma resumida, cessão de direito significa que o autor cede
47

definitivamente os direitos de propriedade; no licenciamento, os direitos são cedidos


por um prazo e condições de uso bem terminados em contrato.

Outra questão relevante é quanto ao domínio público, ou seja, quando uma


obra pode ser publicada por qualquer editora sem pagamento de direitos autorais.
Isso ocorre porque, pelas leis brasileiras, uma obra é protegida por 70 anos após a
morte do autor. Então, ela entra em domínio público. Nesse caso, a capa só
acompanha o livro quando ela faz parte da obra do autor.

Livros de arte e de fotografia são exemplos em que a capa faz parte da obra
por ser também produção do autor. Um outro exemplo que pode ser citado dentro
desse contexto é o Eu me chamo Antônio, do autor Antônio Pedro Gabriel, publicado
pela editora Intrínseca em 2013, e que fez imenso sucesso. Essa capa foi feita pelo
autor do livro, sendo assim, faz parte da obra.

Figura 6 – Capa do livro Eu me chamo Antônio

9
Fonte: Site da Editora Intrínseca

O que é claro e evidente, no entanto, é que, no mercado editorial, o impacto


dos direitos autorais permeia basicamente os autores dos textos e não incluem os
capistas. Isso se deve ao fato da capa do livro ser um produto mais efêmero, com

9
Disponível em: <http://intrinseca.com.br/eumechamoantonio/>. Acesso em 21 mai. 2017.
48

apelo mais comercial, apesar de ser também um trabalho autoral e de fazer parte do
livro. Mas a capa muda, se adequa ao público, ao tempo, ao idioma. Um exemplo
são os livros traduzidos em vários idiomas, em que o projeto da capa é pensado
diferentemente e adaptado para o consumidor em cada país.

A composição do texto, por sua vez, é feita para ser eterna. Publicado em
diferentes edições, que terão suas capas alteradas para chamar a atenção do leitor,
o livro manterá na íntegra o texto outrora criado, e será para sempre um tipo de
relato único do que o autor quis transmitir para os seus leitores.

4- ENTREVISTAS

4.1- Detalhamento dos Procedimentos Metodológicos

A metodologia que melhor atende às necessidades dessa pesquisa é a de


cunho qualitativo, realizada por meio de entrevistas individuais em profundidade
semiestruturadas. Devido à falta de referencial teórico sobre o tema pesquisado, o
registro das falas de profissionais renomados transforma-se em argumento. Essa
escolha se justifica quando Sierra (1998, p.229) descreve que “a entrevista em
profundidade é um tipo de entrevista na qual o objeto de investigação está
constituído pela vida – experiências, ideias, valores e estrutura simbólica do
entrevistado.” (apud. GODOI; BANDEIRA-DE-MELO; SILVA, 2010, p. 305). Bem
como Bauer e Gaskel reforçam o conceito no trecho abaixo:

“Toda pesquisa com entrevistas é um processo social, uma interação ou um


empreendimento cooperativo, em que as palavras são o meio principal de
troca. Não é apenas um processo de informação de mão única passando de
um (o entrevistado) para outro (o entrevistador). Ao contrário, ela é uma
interação, uma troca de ideias e de significados, em que várias realidades e
percepções são exploradas e desenvolvidas. Com respeito a isso, tanto o(s)
entrevistado(s) como o entrevistador estão, de maneiras diferentes,
envolvidos na produção de conhecimento. Quando nós lidamos com
sentidos e sentimentos sobre o mundo e sobre os acontecimentos, existem
diferentes realidades possíveis, dependendo da situação e da natureza da
interação. Deste modo, a entrevista é uma tarefa comum, uma partilha e
uma negociação de realidades.” (BAUER; GASKELL, 2015, p.73-74)

O método de entrevista individual foi escolhido devido ao fato de o principal


objetivo da pesquisa ser o de explorar em profundidade o mundo do indivíduo, o
49

detalhamento das experiências individuais que irá enriquecer o estudo. Entretanto,


apesar de toda a bibliografia consultada recomendar que o nome do entrevistado
deva ser mantido em sigilo, neste caso será exaltado, justamente porque os nomes
dos próprios entrevistados, que são pessoas conceituadas e atuantes no segmento
em questão, é o que dará credibilidade às respostas.

Com as entrevistas, busca-se as diferentes representações do assunto em


questão e o “significado é construído a partir da interseção da interação do
entrevistador e do respondente.” (GODOI; BANDEIRA-DE-MELO; SILVA, 2010,
p.320)

Além dos conceitos teóricos, foram realizados pilotos de entrevista individual


semiestruturada com três pessoas e um minigrupo de foco exploratório com quatro
pessoas, todos designers experientes em projetos editoriais. O que influenciou
diretamente na escolha dentre os métodos qualitativos, apontando que a entrevista
individual seria mais rica por ter um caráter mais pessoal e mais adequada para o
livro resultante dessa pesquisa; além de ter auxiliado na construção do roteiro final
para as entrevistas definitivas.

Foram realizadas ao todo onze entrevistas no período de 17/03/2017 a


20/09/201710. Os contatos dos entrevistados foram obtidos por meio de pessoas que
já os conheciam, técnica denominada por Sierra (1988, p.312-313) como “bola de
neve”, onde o contato com os participantes da pesquisa se dá através de redes
sociais naturais e funciona como uma facilitação de abertura ao pesquisador (apud.
GODOI; BANDEIRA-DE-MELO; SILVA, 2010, p.309-310). Assim, os convites foram
feitos por telefone, mencionando a pessoa que fez o elo de ligação, e, em seguida,
agendadas por e-mail. Todas as entrevistas foram realizadas no estúdio do setor de
audiovisual da ESPM-RJ11 com gravação em vídeo, com exceção de um
entrevistado, Victor Burton, que a entrevista foi em seu escritório, mas também
contou com registro em vídeo. No início, foram ditas algumas palavras de
agradecimento, com solicitação para gravar a entrevista e um termo de
consentimento foi assinado. Depois, foi explicado o intuito da entrevista. Para evitar
problemas com a gravação, contou-se com uma equipe de audiovisual com 2

10
Tabela com datas, horários e duração ßdas entrevistas em anexo.

11
ESPM-RJ: Rua do Rosário, 90, Centro, Rio de Janeiro, RJ.
50

pessoas, para assegurar a qualidade do áudio e da imagem. A desvantagem em


realizar as entrevistas em estúdio é que inexiste a observação direta do entrevistado
no cenário real em que se desenvolve a ação.

Para estabelecer rapport12, foi usado o fato de a entrevistadora ser do mesmo


meio de trabalho dos entrevistados e, para abrir o canal e se aproximar do
entrevistado, ela citou nome de pessoas e empresas que conhecem em comum e,
de certa forma, compartilham do mesmo universo.

A entrevista se baseia em um roteiro que permite flexibilidade ao


entrevistador em ordenar as perguntas e até acrescentar outras conforme a
necessidade. Foi construída com perguntas claras, pequenas, de caráter aberto,
sequenciais de forma que no início eram simples, amplas, fáceis e superficiais,
evoluindo para tópicos mais específicos para tentar extrair respostas com mais
detalhamento, contudo, avançando sempre de forma aberta e imponderável, fora do
alcance do formalismo técnico, e concluindo com temas que estimulem mais a
reflexão.

A seguir está o roteiro aplicado nas entrevistas:

A - Agradecimento;
B - Explicação do propósito da entrevista;
C - Afirmação de que não existe resposta certa ou errada.
Perguntas:
1- Qual a sua formação?
2- Fale um pouco sobre sua experiência como designer.
3- Há quanto tempo atua como designer / capista?
4- Trabalha sozinho (a)?
5- Como é seu ambiente de trabalho? Escritório ou home office?
6- Quais ferramentas/softwares usa?
7- Hoje você faz outros trabalhos de design ou é especializado (a) em editorial e
capa?
8- Você tem o hábito de ler?
9- Você tem o hábito de visitar livrarias físicas e virtuais?

12
De acordo com BAUER; GASKELL (2015), rapport é a relação de confiança e segurança que o
entrevistador precisa estabelecer com o entrevistado.
51

10- Como faz a captação de job de capa?


11- Como recebe o briefing?
12- Qual o prazo médio praticado pelo mercado? Qual seria o ideal?
13- Como é a relação com a editora?
14- O que funciona bem nessa relação?
15- O que pode melhorar nessa relação?
16- Tem contato com mais alguém na editora além do editor?
17- Você tem acesso ao autor?
18- O editor dá alguma ideia do que quer ou o deixa livre?
19- O quanto você sabe sobre o livro em que está trabalhando?
20- Você lê algum trecho do livro antes de começar a pensar no layout da capa?
21- Quais as principais preocupações ao projetar uma capa?
22- Que influências encontra no seu trabalho?
23- Por onde começa?
24- Faz algum esboço à mão ou trabalha exclusivamente no computador?
25- Faz pesquisa de concorrentes e similares?
26- Você influencia no formato do livro?
27- Você influencia no acabamento da capa?
28- Como define o estilo?
29- Como escolhe as imagens e as fontes?
30- Você pensa em todas as aplicações da capa? E-book, e-commerce, impressa,
PDV, propagandas, catálogos...
31- Quantas propostas envia?
32- Como apresenta as propostas?
33- Como é o processo de aprovação da capa pelo (a) editor (a)?
34- Fale um pouco sobre as capas não aprovadas.
35- Fale sobre a relação do miolo com a capa.
36- O que acha do miolo e a capa serem projetados por designers diferentes?
37- Qual é a função da capa?
38- O que acha das capas nacionais de hoje?
39- Quais capistas brasileiros você destacaria?
52

40- Qual é a sua capa favorita e por quê?

Ao final da entrevista, foi agradecida novamente a participação e a


disponibilidade, e exaltada a importância da participação do entrevistado para a
pesquisa. Por fim, explicou-se sobre o produto resultante da pesquisa e os
entrevistados foram convidados a fazer uma proposta de capa mediante a um
briefing detalhado e um prazo de um mês, para ser usada como abertura para o
texto resultante de sua própria entrevista. Todos aceitaram o convite e se mostraram
interessados em ver o resultado da interpretação de vários capistas diferentes
mediante o mesmo briefing.

A entrevista como técnica e instrumento na tarefa de investigação é realizada


por meio de um processo sistemático de coletar informações, o qual após as etapas
de planejamento, preparação e realização das entrevistas, é concluído com uma
análise reflexiva das produções discursivas, procurando padrões e conexões.
Conceito esse reforçado por Bauer e Gaskell (2015, p.85 - 86) quando falam que “o
objetivo amplo da análise é procurar sentido e compreensão” e que “é vital garantir
que toda interpretação esteja enraizada nas próprias entrevistas, de tal modo que,
quando a análise é feita, o corpus pode ser trazido para justificar as conclusões”.

O número da amostragem foi de 11 pessoas e foi definido a partir do


momento em que as respostas começaram a se repetir. A definição dos
participantes da pesquisa foi feita de forma a cobrir uma boa de diversidade de
capistas, mas todos com um nível alto de experiência no mercado editorial. São
eles:

1- Aline Haluch: é designer e pesquisadora formada pela Universidade


Federal do Paraná, mestre em Design pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro (PUC-Rio) e sócia do Studio Creamcrackers Design. Nasceu em Curitiba, em
1969, e mora no Rio de Janeiro desde 1996. É professora do curso de Comunicação
(Publicidade e Propaganda) do Ibmec; do curso Master em Design Editorial do IED -
Istituto Europeu di Design e ministra o workshop Design Editorial em diversas
instituições. Em 2013, publicou o Guia prático de design editorial: criando livros
completos, pela 2Ab Editora. Lecionou por dois anos na Faculdade Tecnológica
Senac Rio no curso de design gráfico.
53

2- Angelo Bottino: graduou-se pela ESDI em 2000. Integrou a equipe de


Victor Burton até 2013 e, desde então, trabalha em seu próprio estúdio. Atende à
editoras como Bazar do Tempo, Harper Collins Brasil, Intrínseca, LeYa, Nova
Fronteira, Record, Rocco e Sextante. Seu projeto de graduação foi escolhido como o
melhor do ano entre as faculdades de Ciências Exatas da Uerj. Em 2011, ganhou o
Prêmio Jabuti com a capa de Conferências sobre Joaquim Nabuco (Bem-Te-Vi). Em
2015, a capa de Uma História do Mundo (Intrínseca) foi escolhida como uma das 50
melhores do ano pela AIGA / Design Observer. Em 2017, teve quatro projetos
selecionados para a 12ª Bienal Brasileira de Design Gráfico, sendo a capa de
(Bertrand Brasil) apontada como destaque da categoria.

3- Elmo Rosa: Designer gráfico com 14 anos de experiência servindo os


segmentos cultural e esportivo. Por vários anos, trabalhou no departamento de
design do Grupo Editorial Record, onde elaborou projetos para uma vasta gama de
gêneros literários. Também teve a oportunidade de integrar a equipe de design do
Comitê Olímpico Rio 2016. Lá, contribuiu para o desenvolvimento dos elementos
que constituíram a identidade visual dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos.
Atualmente, colabora com clientes diversos, em especial editoras.

4- Igor Campos: empreendedor, UX, designer gráfico e ilustrador. É artista


de capa de livro para algumas das maiores editoras do Brasil e entusiasta gráfico de
cultura pop. Trabalha ao lado de ONGs, pequenos empresários, grandes
corporações e Incubadora. Vencedor da Câmara Municipal do Rio de Janeiro
Hackathon (2013), por desenvolver um aplicativo que permite localizar pontos de
estacionamento nas ruas do Rio de Janeiro.

5- Lauro Machado: Nascido no Rio de Janeiro e formado em Desenho


Industrial pela UFRJ, trabalhou nos escritórios Jair de Souza Design e Ana Couto
Branding antes de criar o Estúdio Insólito, juntamente com Jamil Li Causi.
Desenvolve projetos editoriais e institucionais para diversos clientes como Record,
Companhia das Letras, Zahar, Edições de Janeiro, Editora Globo, Edições SM,
Editora Ática, Editora Senac-Rio, Learning Factory e PUC-Rio. Seus trabalhos já
foram publicados nos sites The Book Design Review, The Dieline, Packaging of the
World e Favourite Design.

6- Leandro Dittz: designer, diretor de arte, ilustrador e fotógrafo. Desde 2015


é coordenador de design da editora LeYa, uma das maiores editoras do país onde
54

criou capas de livros, ilustrações e projetos gráficos. Seus projetos incluem livros de
culto do universo Geek, como livros do universo DC, Alien, Star Wars, Star Trek
Game of Thrones entre outros. Também atua como fotógrafo documental, junto com
o instituto de pesquisa Proprietas e UEMA (Universidade Estadual do Maranhão),
elaborou o projeto “A Peste do Grilo”, que tem como objetivo documentar a memória,
cultura e resistência de populações vulneráveis à grilagem no interior do Maranhão,
Paraná e Bahia. Um primeiro fotolivro sobre as populações ribeirinhas dos lençóis
maranhenses está previsto para 2018.
7- Leonardo Iaccarino: graduado em design gráfico e de produto pela ESDI,
mestre em design de informação pela Universidade de Reading, Reino Unido. Hoje
trabalha como diretor de arte no Grupo Editorial Record. De 2010 a 2012, lecionou a
matéria de projeto gráfico na Unicarioca. Em 2012, ganhou o Prêmio Jabuti de
Melhor Capa com o projeto do livro A anatomia Gray. No mesmo ano, a capa de
Contos de mentira foi finalista no concurso de melhor capa de livro promovido pela
Getty Images. A capa de Saia da sua caixa foi selecionada para a bienal da ADG de
2004, para o anuário internacional de design da HOW, em 2005, e para
GATEWAYS, uma exposição internacional de design de capas que ocorreu em
2008, em Portugal. Também para essa exposição foi selecionada a capa do livro Os
homens que mataram o facínora.

8- Rafael Nobre: designer gráfico e ilustrador com cerca de 10 anos de


experiência no mercado editorial. É formado em design gráfico pela EBA/UFRJ.
Desenvolve em seu estúdio projetos de identidade visual, livros, catálogos,
embalagens, peças promocionais, além projetos autorais e artísticos. Seu trabalho já
foi selecionado na Bienal de Design Gráfico da ADG, foi finalista do Prêmio Jabuti de
melhor capa de livro, foi premiado e finalista no prêmio Melhor Capa de livro Getty
Images Brasil e recebeu o selo Altamente recomendável/FNLIJ. Trabalhou no Grupo
Editorial Record (2006), no setor de design, onde desenvolveu seus primeiros projetos
de capa de livro, peças promocionais e ilustração. Trabalhou como freelancer para
grandes editoras e instituições de 2007-2012. Foi co-fundador e sócio da produtora e
editora Babilônia Cultura Editorial (2012-2017), onde produziu e criou workshops de
capacitação do mercado editorial, projetos autorais de livros e eventos culturais, além
de serviços de branding, design e conteúdo.
55

9- Sérgio Campante: designer voltado para o mercado editorial desde 1998.


Estudou publicidade na escola de comunicação da UFRJ, mas logo no início
demonstrou maior interesse pelas áreas gráficas e ligadas à produção editorial.
Depois de um curto período trabalhando com marketing direto, foi colaborador e
parceiro da designer Carol Sá, com quem montou uma sociedade por 5 anos. É
fotógrafo amador, ilustrador e leitor ávido nas horas vagas.

10- Túlio Cerquize: nasceu no Rio de Janeiro e é designer formado pela


UFRJ. Trabalha desde 2011 com capas de livros e costuma dizer que seus trabalhos
favoritos nunca serão impressos. Atualmente, está no departamento de design do
Grupo Editorial Record.

11- Victor Burton: um dos capistas de maior renome no Brasil, iniciou sua
carreira em 1977, na Itália. No Brasil desde 1979, já criou mais de 3 mil capas e 200
projetos de livros de luxo. Foi destaque nas edições de 1998 e 2000 da Bienal de
Design Gráfico e Ouro ADG em 2002. Foi laureado com o Prêmio Jabuti na
categoria Melhor Capa nos anos de 1993, 1995, 1996, 1999, 2001 e 2005, e na
categoria Projeto Editorial em 1997, 1998, 2000 e 2006. Recebeu também o prêmio
Aloísio Magalhães, da Biblioteca Nacional, de Projeto Gráfico em 1995, 1997 e
2001. Foi um dos “top ten” na exposição Brasil faz design em 2002, em Milão, e o
primeiro colocado no Designers by Designers da revista Design Gráfico em 2002.

4.2 - Resultados Obtidos

Sobre a amostragem, sete entrevistados, num total de onze, têm graduação


em Design Gráfico; um em Publicidade; um em Geografia; um em Design de
Produto; e um não tem formação. Todos são profissionais experientes, a maioria
com mais de 10 anos de atuação no mercado editorial com foco em capa de livro.

Alguns trabalham internamente dentro de editoras, mas a maioria é prestador


de serviço. Trabalham em geral sozinhos em home office, alguns têm ou já tiveram
escritório próprio.

Sobre os que trabalham prestando serviço para as editoras, afirmam que não
fazem trabalho de prospecção. Contam que por já trabalharem há muito tempo como
capistas, já são reconhecidos, então os editores chegam até eles oferecendo
56

trabalho. “Depois de um tempo trabalhando com isso, as pessoas passam a te


reconhecer” (Igor Campos). Com exceção de um entrevistado, Elmo Rosa, que ficou
3 anos fora do mercado editorial trabalhando no Comitê Olímpico e, ao retornar, está
enviando para vários editores um material de promoção com seu portfólio impresso
e um brinde que é um porta-livros de acrílico pelo correio.

Figura 7 – Material de prospecção do capista Elmo Rosa

Fonte: Compilação do autor

Todos usam os softwares da Adobe – Illustrator, Photoshop e InDesign –


como ferramentas de trabalho, “a divina trindade” (Túlio Cerquize).

A relação com os editores se dá mais por e-mail, no máximo por telefone.


Todos contam que o conteúdo dos briefings que recebem dos editores é muito
variado. Não existe um padrão das editoras, cada editor trabalha de uma forma.
Alguns são mais detalhistas e organizados, outros deixam mais em aberto e, nesse
caso, os capistas precisam coletar as informações por conta própria e voltar ao
editor com as dúvidas. “Uma das maiores razões de frustração de um designer
gráfico com o seu trabalho é proveniente de não receber bons briefings. Por uma
57

questão de realização profissional, o designer deve coletar briefings melhores dos


seus clientes, não devem deixar isso de lado” (Elmo Rosa).

Normalmente, em um primeiro momento, os capistas têm contato com


editores e assistentes editoriais. Depois, com a pessoa responsável pela finalização
dos arquivos e, por fim, o responsável por receber a nota e deliberar o pagamento
do serviço. Mas, em alguns trabalhos, é preciso falar também com o autor, o que
pode ser bom quando essa relação é mais aberta. Se o autor for mais restritivo, é
papel do editor fazer a intermediação do que acredita ser melhor para o livro e
passar para o capista. “O contato com o autor pode ser maravilhoso e pode ser
péssimo, muitas vezes é péssimo. Porque a capa nunca vai conseguir registrar
visualmente o que o autor tem em mente. Então você tem uma ansiedade por parte
do autor de ver alguma coisa que corresponda inteiramente ao imaginário dele, e
isso não vai acontecer jamais. Então muitas vezes é complicado” (Victor Burton).

Sobre o prazo praticado pelo mercado, as respostas variaram entre 1 semana


e 1 mês, mas a maioria disse que a média é de 15 dias. Julgam um bom prazo,
menos que isso é até possível, mas influencia diretamente na qualidade do
resultado. Quando se fala nesse tempo, não significa que o capista irá dedicar todos
esses dias a essa capa, estão incluídos também o tempo na fila de trabalhos,
pesquisa, maturação das ideias para então entrar na fase de execução. “Mesmo que
não esteja fazendo a capa, eu acredito muito nessa coisa de estar com aquele
assunto na cabeça e começar a reparar no mundo a sua volta, coisas que têm a ver
com o assunto. Essas informações chegam a todo o momento, você é bombardeado
o tempo inteiro, então, quanto mais cedo o livro entrar em sua cabeça, você vai
absorvendo essas informações, já é uma etapa do trabalho que você faz sem estar
debruçado sobre o computador” (Sérgio Campante).

Todos falam que o ideal é ler o livro para poder fazer a capa, principalmente
se é do gênero de romance. Mas com o grande volume de trabalho, isso se torna
difícil. Ainda assim, é importante ler pelo menos parte do livro, sobretudo o começo e
o final. No entanto, quando conseguem ler o livro inteiro, concluem que faz toda a
diferença, o trabalho fica mais rico de detalhes. Ao fazer a capa somente com a
sinopse, o risco é ter um resultado genérico.

As metodologias de criação não são claras e padronizadas. Cada capista


realiza seu trabalho de uma forma distinta. Pesquisa em bancos de imagens, fontes
58

e referências gráficas fazem parte da rotina. Alguns procuram pelos reviews e por
versões de outros países, nos casos dos livros que são traduzidos. Trabalhos
manuais como ilustrações, texturas ou até mesmo rascunhos de ideias são comuns.

Pesquisa de concorrentes e similares é um fator bem dividido, há quem goste


de fazer e quem não goste, por achar que influenciará tanto suas ideias que acabará
fazendo algo parecido e ficar inibido de fazer algo inovador.

A maioria fala que se preocupa em fazer uma capa que seja uma
representação gráfica do resumo do livro, que ao mesmo tempo que instigue, não
conte a história toda, além de ter algum grau de inovação. Alguns ressaltam a
importância da legibilidade do título.

Projetam primeiro a frente, e só depois de aprovada pela editora é que


fazem as outras partes. Muitos ressaltaram, além da importância da frente da capa,
a lombada, pois é como o livro será visto em um segundo momento, na casa das
pessoas. “As partes mais importantes para mim são a primeira capa e a lombada.
Valorizo muito a lombada porque, na maior parte do tempo, é isso que vai aparecer,
tanto na livraria, como casa do leitor” (Aline Halluch).
O formato do livro é uma coisa definida previamente pelo editor, mas em
relação aos acabamentos, os capistas têm a liberdade de sugerir caso o orçamento
permita. Em geral, são cores especiais e verniz.

Nenhum dos entrevistados leva em consideração as outras aplicações que a


capa possui além do livro físico, como no e-book, visualização nas lojas on-line,
versões em preto e branco, desdobramentos em materiais promocionais, catálogos.
Pensam apenas na disposição na livraria física.

Sobre o número de propostas de capas que enviam para aprovação, a média


é 3. Nenhum deles tem um número fechado, mas normalmente é mais de uma. “Por
mais que eu faça dez, quinze layouts eu nunca apresento todos, porque eu acho que
isto vai confundir mais o editor, então eu faço este trabalho de filtrar” (Túlio
Cerquize). Fazem esse envio por e-mail, na maioria das vezes, somente da frente
nas extensões JPG ou PDF. Alguns mandam um texto no corpo do e-mail
explicando o conceito, mas a maioria acha isso redundante. “Eu já fiz algumas
tentativas: algumas vezes de escrever explicando e outras não. O leitor quando
pega o livro não vai ter ninguém explicando para ele, então o editor tem que olhar e
59

entender se aquilo tem a ver. Só quando é algo muito conceitual ou um acabamento,


você tem que explicar” (Rafael Nobre).

Ter capas reprovadas faz parte do trabalho, alguns têm tanto apego que
ainda assim publicam em seus portfólios. Contudo, entendem que o “não” muitas
vezes faz o trabalho melhorar. “Às vezes eles (os editores) queriam uma capa muito
mais comercial, mas acho que é interessante mostrar, porque outra pessoa pode se
interessar pelo conceito e assim trazer um outro trabalho, fora que tenho certo
apego a elas, guardo todas e coloco junto com a capa aprovada” (Angelo Bottino).

A prática do mercado é que miolo e capa sejam feitos por profissionais


diferentes por uma questão de tempo de produção e custo. Todos os entrevistados
concordam que o ideal é que tudo fosse feito pela mesma pessoa, para não correr o
risco de perder a unidade do produto como um todo, mas entendem e concordam
com as editoras. Complementam ainda que, quando acontece de fazerem o livro
inteiro, sempre começam pelo miolo.

Sobre a função da capa, surgiram muitas explanações. A capa como


interface; embalagem; função de proteção do miolo; chamar a atenção do leitor;
apresentar o conteúdo; comunicar; despertar identificação com o público; gerar
curiosidade; instigar o leitor; fazer o encontro entre texto e leitor; vender o livro;
artifício de marketing; registro cultural e artístico; relação emocional; publicidade.

Victor Burton, com mais de 40 anos de experiência nessa área, é citado por
todos os entrevistados como referência de capista brasileiro e sinônimo de bom
gosto e requinte.

Todos têm o hábito de visitar livrarias físicas para acompanhar os


lançamentos e sempre olham as folhas de créditos dos livros que gostam para saber
quem fez. “Quando eu vejo um livro que acho bonito, gosto de olhar o crédito porque
quero saber quem fez, para ver se chamo para trabalhar comigo. Estou sempre
procurando gente nova para trabalhar na equipe” (Leandro Dittz).

Todos têm em comum o hábito da leitura e a paixão pelos livros. “Nada contra
o mercado de agências, mas de alguma forma eu me sinto melhor trabalhando com
algo que eu acredito” (Leonardo Iaccarino).

A maioria não gosta de admitir que tem um estilo próprio. Gostam de pensar
que podem fazer qualquer estilo. “é algo que a gente tenta evitar mas que existe.
60

Ser reconhecido pelo estilo é ruim, de certa forma, porque o ideal seria não termos
estilo e podermos modular isso e ter soluções próprias para cada livro, mas é
inevitável que a gente tenha certos vícios” (Victor Burton).

Alguns falaram sobre a questão de direito autoral, que não é uma situação
muito favorável, já que a prática do mercado é o capista assinar um contrato
cedendo os direitos patrimoniais e, assim, a editora pode alterar, reproduzir
infinitamente e inclusive vender a capa sem que o capista seja ao menos notificado.
“Eu particularmente acho que é parte inerente de trabalhar com design” (Lauro
Machado).

5- SOBRE O PRODUTO

Como se trata de um livro que fala sobre capas de livros, nada mais
apropriado do que a capa ser algo que tire o leitor de sua zona de conforto e o
instigue a ter a visão de capista. Por isso, a proposta é uma capa DIY13, uma capa
branca na qual o leitor será convidado através do texto de 4a capa a ser o capista e
criar sua própria versão de capa para o livro. Inclusive, na segunda orelha, onde
normalmente vem o crédito do capista, o espaço é em branco para o leitor preencher
com o próprio nome. A personalização de objetos tem sido explorada em
campanhas comerciais principalmente no seguimento da moda, e esse conceito de
capa de livro DIY já fui usado anteriormente em 2006 pela editora inglesa Peguin
Books em uma coleção de livros clássicos intitulada My Penguin, em que o slogan
usado na campanha foi Books by the greats, Covers by you (livros pelos grandes,
capas por você). Neste caso o intuito da capa em branco era se diferenciar dos
concorrentes e destacar a relação de proximidade entre livro e leitor, conceitos
também pretendidos neste projeto.

Figura 8 – Capa do livro “Entre capas e capistas”

13
Sigla em inglês que quer dizer “do it yourself” e significa “faça você mesmo”.
61

Fonte: Compilação do autor

A capa branca não é uma ideia aprovada por todos os designers, Jan
Tschichold (1975) escreveu em A forma do livro, no capítulo 10 erros comuns na
produção de livros, que as “capas brancas são consternadoras”, devido ao fato de
sujarem com facilidade. Contudo, com a modernização dos acabamentos gráficos
que existem hoje, as capas brancas não precisam mais serem temidas. Assim, para
evitar que a capa suje, o projeto conta com acabamento de verniz brilhoso total. De
fato que com esse acabamento não é com qualquer tipo de caneta e tinta que o
usuário poderá interagir com a capa, pois o verniz impermeabiliza o papel, ainda sim
é possível usar canetas com tinta permanente e aplicação de adesivos e colagens.
62

Figura 9 – Capa em perspectiva do livro “Entre capas e capistas”

Fonte: Compilação do autor

Para o projeto gráfico do miolo, as margens são amplas – 27mm – e textos de


miolo compostos em corpo 10pt, entrelinha 15pt, nas fontes Sabon e Clarendon; e
para títulos Gotham e Clarendon. O recuo dos parágrafos é de 10mm e no início dos
capítulos contém uma capitular em Clarendon da primeira letra ocupando quatro
linhas.
63

Figura 10 – Exemplo de diagramação do miolo do livro “Entre capas e capistas”

Fonte: Compilação do autor

Foi solicitado aos capistas entrevistados sua própria versão de capa para o
livro, a fim de ser usada na abertura de suas entrevistas e, ao final, contará com
quatro exemplos de capas selecionadas pelos próprios entrevistados como suas
favoritas. Sendo assim, para cada entrevista existe uma página de abertura com
nome do capista e um pequeno texto sobre o profissional, na página ao lado a capa
feita pela mesma pessoa para abertura de sua entrevista; depois, aproximadamente
cinco páginas com o conteúdo da entrevista e, no fim, quatro capas selecionadas
pelo entrevistado para ilustrar seu estilo de trabalho.
64

Figura 11 – Exemplo de página de abertura de entrevista do livro “Entre capas e capistas”

Fonte: Compilação do autor

Figura 12 – Algumas capas enviadas pelos entrevistados para o livro “Entre capas e capistas”

Fonte: Compilação do autor


65

Sobre o formato, foi projetado em 16x23 cm, que é um formato bem comum
por ter um grande aproveitamento de papel. Para o número de páginas, são 144,
assim fecha 9 cadernos de 16 páginas. A encadernação será no estilo brochura, o
papel para o miolo será Couchê fosco 90g/m2 devido à policromia do miolo, pois
este papel permite uma melhor impressão das imagens, e o papel da capa é papel
cartão supremo 250g/m2, com impressão preto e branco na frente e colorida no
verso com um mosaico com as capas usadas de abertura das entrevistas.

Sobre o conteúdo do livro, o sumário será dividido em:

1- Prefácio: escrito pela orientadora desta pesquisa, Eliana Formiga;


2- Entre capas: resumo referente aos pontos 3.1 (estrutura e elementos da
capa) e 3.2 (funções da capa);
3- Entre capistas: resumo referente aos pontos 3.3 (capistas) e 3.4 (cadeia
produtiva do livro);
4- Entrevistas: transcrição inteligente de cada entrevista separadamente;
5- Conclusão: resumo referente aos pontos 4.2 (resultados obtidos) e 6
(conclusão);
6- Referências e leituras recomendadas: resumo referente ao ponto 8
(referências bibliográficas);

A proposta para o produto completo, capa e miolo, encontra-se digitalmente


em anexo.

Para uma futura publicação, se faz fundamental o trabalho de edição e


preparação dos originais pelo editor. Sobre as editoras no Brasil com o perfil desse
projeto, no momento temos: Ateliê Editorial, Blucher, Taschen, Rio Books, Martins
Fontes. Além da possibilidade da autopublicação.

6- CONCLUSÃO

Ter formação em design gráfico é o caminho mais natural para quem quer
trabalhar como capista, mas não é o caso de todos os profissionais que trabalham
66

fazendo capas de livros. Alguns não possuem formação, o que não desmerece em
nada o trabalho. Inclusive, Victor Burton, um dos melhores capistas brasileiros da
atualidade, é um desses casos. Talvez por isso tenha se popularizado a designação
“capista” para essa função e não designer de capas, já que nem todos são
designers, mas se utilizam do design como ferramenta de trabalho.

Os profissionais que têm a formação em design possuem uma metodologia


de trabalho um pouco mais definida, por mais que seja intuitiva e não proposital. Ou
seja, a formação influencia diretamente na forma de trabalho desses profissionais.

A entrada no mercado é orgânica, ou seja, é feita de forma natural, quase não


existe prospecção. Começam prestando serviço pra uma editora até serem
conhecidos no mercado editorial e os editores requisitam os serviços do capista que
melhor julga adequado para cada livro.

Os briefings que esses profissionais recebem dos editores, em sua maioria,


são muito incipientes e se dão de forma virtual por e-mail. O ideal seria que viessem
com as descrições: público-alvo; sinopse; palavras-chaves; lista de concorrentes e
similares; formato; se tem verba para acabamentos extras; o quanto aquele livro é
aposta da editora; manuscrito; características físicas dos personagens principais.
Um bom briefing evita alterações desnecessárias. Mas, ao mesmo tempo, não deve
restringir o capista limitando suas ideias. Enviar opções é importante porque o editor
se sente fazendo parte do processo criativo também.

O fato da relação com os clientes ser virtual, possibilita que prestem serviço
remotamente para qualquer editora no mundo.

Em algumas editoras existe o cargo de coordenador de design, que é a


pessoa que escolhe o melhor capista para cada trabalho, é alguém que sabe quanto
tempo e trabalho demanda uma alteração, que ao mesmo tempo tem que tem o
olhar de designer, por estar dentro da editora, tem um relacionamento mais próximo
do editor e entende as necessidades deste, e assim faz a ponte entre o editor e o
capista.

As capas normalmente passam por um comitê de aprovação, que inclui os


setores editorial, comercial e marketing. Sendo assim, exige que esses setores
estejam alinhados com relação ao posicionamento dos livros antes mesmo de
67

passarem o briefing para os capistas para evitar que capas sejam completamente
reprovadas e se perca tempo e dinheiro.

Um ponto que esse profissional precisa melhorar é como apresentar e


valorizar seu trabalho. A maioria envia as propostas para aprovação somente em
uma imagem, sendo a frente da capa, em JPG ou PDF, sem nenhuma explicação de
conceito. Acham que o layout tem que se vender sozinho. No entanto, esquecem
que além do editor, a capa passa pela aprovação de outras pessoas dentro da
editora que não sabem do que se trata o livro e, em vez de avaliarem se é adequado
ou não, vira uma questão de gosto. Sendo assim, o ideal seria enviar uma
apresentação com:

1- Uma página de abertura com a identidade visual do capista para


reforçar seu nome enquanto marca.
2- Sinopse do livro, podendo ser a mesma que o editor enviou no briefing;
3- Palavras-chaves que destacou enquanto leu parte do livro;
4- Capas similares e concorrentes;
5- Descrição do público-alvo;
6- Pesquisa de imagens;
7- Pesquisa de fontes;
8- Propostas da capa bidimensional. Uma em cada página com um
pequeno texto explicando o conceito;
9- Visualização das opções uma ao lado da outra de forma tridimensional;
10- Aplicações das capas no ponto de venda físico, virtual, versão em
preto e branco para e-readers, materiais promocionais como marcador de página, e
peças on-line para redes sociais.

Como não existe uma apresentação com uma defesa do trabalho, a


apresentação tem que fazer isso sozinha. Desta forma, o capista valoriza seu
trabalho e conduz as pessoas que vão aprovar a capa mostrando o caminho feito
para chegar naqueles resultados. Assim, pode-se evitar reprovações.

Um dos entrevistados, inclusive, está usando esse modelo de apresentação


de trabalho e já reconheceu seus benefícios.

O design no mercado editorial atual se tornou argumento de venda. Como


exemplo temos o trabalho da Editora DarkSide, que investe muito em design e
68

acabamentos gráficos e faz a pessoa querer o livro antes mesmo de saber do que
ele se trata de tão bonito que são. Se destacam muito no ponto de venda. Contudo,
no cenário atual de crise, investimento em design não pode significar que o produto
vai custar mais.

Cada parte da capa tem seu momento de interação como o leitor. A frente é
considerada a parte mais importante porque é o primeiro contato que o leitor tem
com livro, que se dá de forma visual. O contato físico só vai acontecer se a frente
cumprir seu papel de chamar atenção e fazer com que o leitor se identifique e tenha
vontade de saber mais sobre o livro em questão. Depois de ler o verso e orelhas e
comprar o livro, a lombada passa ser o mais importante, pois é como esse livro vai
passar a ser visto na estante.

O gênero literário influencia na metodologia de trabalho. Por exemplo, para


livros de romance se faz necessária a leitura do livro todo para capturar os detalhes
e, assim, a capa não ficar genérica, em contrapartida, para livros técnicos, os
entrevistados concordam que ler apenas uma parte é suficiente.

Apesar de quase todos os capistas falarem que gostam bastante da


qualidade do design editorial brasileiro, em geral, ainda se vê nas livrarias muita
coisa ruim. Muitos livros sem unidade entre miolo e capa, erros grosseiros de
design, principalmente nos projetos de miolo e capas que são plagiadas de livros
similares que fizeram sucesso.

Por se tratar de um trabalho bastante autoral, os estilos de cada um são bem


singulares. O que é bom porque, de certa forma, apesar de todos serem capistas,
não são concorrentes diretos, ninguém vai ter a mesma interpretação e a mesma
linguagem visual.

Para ser um bom capista é necessário ter um repertório cultural extenso, pois
tudo é referência para seu trabalho. O fato do Brasil ser um país de misturas,
miscigenado e com influências de todo o mundo, faz da cultura plural e muito rica.
Essa é a identidade cultural brasileira.

Diferentemente dos outros tipos de design, esse tem o crédito de autoria no


próprio produto. Normalmente na segunda orelha, de forma discreta entram os
créditos de quem fez a capa e das imagens e/ou ilustração, caso tenha, e às vezes
também junto aos créditos gerais. Outro fator que vale salientar é que o livro é um
69

objeto duradouro, por isso, seu design perpetua enquanto o objeto existir,
diferentemente de outros materiais que não são feitos para durar, como um folder,
por exemplo.

Não existe rotina, apesar de existirem formatos padrões que também podem
ser quebrados, as temáticas e possibilidades são infinitas.

O mais importante ao se projetar uma capa é fazer isso com o foco no


público-alvo específico do livro. Além de pensar no livro como um todo, um objeto
unificado, e, ao mesmo tempo, cada parte tem um momento de interação e uma
função específica.

Podemos concluir que se aproximar dos profissionais de referência no


mercado por meio de relatos sobre suas experiências e processos de criação, nos
traz uma riqueza de detalhes não visíveis no aprendizado ortodoxo.

7- DESDOBRAMENTOS DA PESQUISA

Esta pesquisa se ateve apenas a explorar um ponto dentro da cadeia


produtiva do livro, que foi a atuação do profissional responsável pelo design das
capas de livro. E, como desdobramento, pretende-se ampliar em uma pesquisa de
doutorado para outros setores do mercado editorial, iniciando pelos profissionais que
o capista tem mais contato na editora, que são os editores e assistentes editoriais.
Entender como eles, de fato, escolhem qual capista para cada livro, como fazem a
aquisição dos livros, como planejam a grade e posicionamento editorial da editora,
como provisionam as tiragens e definem orçamentos. Além de mapear o fluxograma
de trabalho dentro de uma editora.

Além da abertura para uma pesquisa quantitativa e qualitativa com foco no


usuário para entender sobre a percepção e escolha dos consumidores quanto à
capa.

Uma outra possibilidade seria o comparativo destes resultados em relação


aos capistas brasileiros com os de outros países como França, Estados Unidos e
China.
70

Sobre o produto do livro resultante desta pesquisa, poderia ser o primeiro de


uma série com entrevistas com outros profissionais do setor editorial. Poderia ter
uma pesquisa com editores, chamado Entre palavras e livros, um com autores
chamado Entre ideias e publicações; um com profissionais gráficos chamado Entre
papeis e tintas.

8- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AAKER, David; KUMAR, V.; DAY, George. Pesquisa de Marketing. São Paulo:
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73

9- ANEXOS

ANEXO A – Recibo de Cessão de Direitos Autorais

Recibo de Cessão de Direitos Autorais

CEDENTE:
Nome
Inscrito no CPF/MF sob o nº
Residente e domiciliado (a)

CESSIONÁRIA:
Dados da Editora: endereço, CNPJ, inscrição estadual e inscrição municipal.

O Cedente declara para ordem dos fins que recebeu do cessionário a quantia de R$
000,00 referente aos serviços de colaborador no (s) produtos abaixo:

Contratante: nome do editor

Livro: título da obra


Descrição do serviço: design de capa
Valor: R$ 000,00
Moeda: Real

Recibo: 000000 – Parcela 1

Observações:
O valor supracitado compreende também a cessão definitiva dos direitos autorais
oriundos do resultado dos serviços acima elencados ficando, desde já, a Cessionária
legitimada a explorar comercialmente tais resultados também em futuras reedições
desta(s) obra(s) e/ou quaisquer outras publicações desta empresa ou de quaisquer
empresas pertencentes ao seu grupo econômico, no Brasil ou no exterior, pelo prazo
de proteção legal definido na Lei 9.610/98 e nos formatos impresso (livro, livro de
bolso e similares) e eletrônico (audiobook, CdRom, Internet, download, e-book e
similares).
Declara, também, que após o recebimento do valor acima citado, concede total,
irrestrita e definitiva quitação da cessão aqui realizada, nada mais tendo a reclamar.

Por ser verdade, firmo o presente.

Rio de janeiro ___ de __________ de 2017.

_________________________
Nome e CPF do cedente

Dados bancários do cedente.


74

ANEXO B – Tabela das Entrevistas

Capista Data da Entrevista Tempo de Entrevista

Sérgio Campante 17/03/2017 36 minutos

Aline Haluch 27/03/2017 52 minutos

Leandro Dittz 03/04/2017 39 minutos

Tulio Cerquise 28/06/2107 54 minutos

Angelo Bottino 29/06/2017 43 minutos

Lauro Machado 06/07/2017 44 minutos

Victor Burton 11/07/2017 84 minutos

Elmo Rosa 13/09/2017 91 minutos

Leonardo Iaccarino 19/09/17 83 minutos

Rafael Nobre 22/09/17 40 minutos

Igor Campos 27/09/17 59 minutos

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