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TEMAS EM DEBATE TEXTO, CONTEXTO E SIGNIFICADOS: ALGUMAS QUESTOES NA ANALISE DE DADOS QUALITATIVOS Marli Eliza Daimazo Afonso de André Pesquisadora visitnte ro Center for Instructional Research and Curriculum Evalzation, Universtade de linois A abordager qualitative de que tem recebido atengéo especial na nal recente. O volume de artigos e de publicacdes espe- ciais sobre 0 assunto, assim como o ntimero do trabalhos. apresentados em diversie reuniSee cientificas not Gtlimos {5 anos, 540 sinais evidentes de que o tema vem ganhian- do cretcente populeridade. Tomendo por base apenas uma fonte ~0s trabalhos apresentados no encontro anual da AERA (American Educational Research Association) — no perfodo de 1977 9 1980, Ross e Kyle (1982) con- sequiram reunir 51 estudos, que de acordo com vérios critérios, foram considerados estudos qualitativos. Esse ‘nGmero parece bastante significativo. segundo os auto- as, do intereste geral dot educadorer pelor trabalhor do natureza qualitativa. ‘As vantagens do uso de dados qualitativos na pes quise educacional so muitas. Entre outras, pode-se apontar que eles permitem apreender o cardter complexo @ multidimensional dos fondmenos em sua manifertagso ral (Tikunoff © Ward, 1980). Eles se prestam tam- bam, de acordo com Eisner (1981) 2 capturar os dife- rentes.signiticados das experiéncias vividas no ambient escolar de modo 2 auxiliar a compreensdo das relacdes ‘entre o§ individuos, seu contexto e suas agdes. Além \ 66 disso, 0s dados qualitativos podem contribuir para o estudo de construtos importantes como ‘criatividede’ e ‘Densamento cc{tico” que por serem de dificil quanti- ficago, deixam muitas vazes, do ser mais extensamen. ‘2 investigados (Seriven ¢ Hassizon, 1973). Eimbora os dados qualitativos sejam extremamen- te atrativos, como sugere Miles (1979), sua utilizardo envolve uma série de dificuldades e problemas. A ativi- dade de coleta e andlise da informagio 6 em geral longa ¢ eatafante. © pesquisedor, via de regra, fice sobrecar- regado nos diferentes estdgios do estudo, seja pela varie- dade de aspectos do fendmeno a serem observados, pelo volume de anotacies feitas, pelo tempo necessério a0 registro ou transcriggo da absorvages # pala dificuldade de cedificar @ ineerpretar of dados e aprosentar os recul tados. Mesmo 0s pesquisadores com muita experiéncia ‘em trabalho de campo, afirma Miles (1979), sentem-se assoberbados pela érdua tarefa com que se defrontam & pala eneesia disperdida na realizagSo dessae atividader. Mas 0 problema mais sério no uso de dados qualitatives parece sera quase completa inexisténcia de méodos apropriados de anilise. No existem nem mesmo certas diretrizes que possam dar a0 pesquisador algums con- fianga de que suas interpretacdet @ afirmagdes sfo de Cad. Pesq., So Paulo (45): 66-71, maio 1983 {aio ume representago aproximade da realidade e no ‘mero fruto de suas pré-concepcSes. No presente trabalho pretendo discutir algumas ‘questéne © problemas relacionados 8 andlise de dados quolitativos. Examino primeiramente o método de and- Hise de conteddo 0 tento mostrar que a conotagéo téc- nica usualmente associada a esse método, torra-o pou- co adequado ao estudo de dados qualitativos. Proponho ‘onto uma nova sbordagem — anilize de prosa — como luma forme alternative de examinar material coletado através de observagdo participante, entrevistas nfo-estru- ‘uradas e reviso de documentos. Levanto alguma: ques- 1628 no procesto de andlise do material qualitative & cconcluo apretentando algumss sugestder préticas sobre 2 abordagem. ANALISE DE CONTEODO? No hé divide que anélite de contetide tom sido {2 abordagem mais freqientemente mencionada para a anélise do material volumoso coletado durante estudo de campo. Por exemplo, em seus manuais sobre pes quisa qualitativa Bogdan e Taylor (1975), Bogdan & Biklen (1982) @ Patton (1980) doscrevom diferentes procadimentes de andlise de contetido que eles proprios empregam na andlise de material obtido através de en- trevistes, de observacio participante e de revisio do- cumental. Guba @ Lincoln (1981), Murphy (1980) 0 Caulley (1981) também sugerem a andlise de contedido como uma alterrativa para examina as informapdes ccolhidas durante estudos avaliativos, principalmente aquelas obtidss através do exame de documentos ¢ de instruments néo-reativos de medida Cabe entifo indagar: O que te entende por andi se de conteddo? Como tem sido esta definida? Qual sun utlidade na abordagem de dados qualitativos? ‘Uma breve revisso des definigSes mais comuns de anilise de conteddo. feita por André (1983) com base nat publicapdes espee'ticat sobre o teme, deixa evidente {2 conotaeio técnica usualmente associads a0 termo. Vé- igs autores (Berelson, 1952; George, 1959; Holsti, 1963; Kripoendorff, 1980) concebem 2 anilise de conteddo ‘como uma técnica de reduriio de um grande volume de material num conjunto de estogorias de conteide. Pro: Bern que © material soja examinado e que a informaczo ele comtida seja fragmentada em termes da ocorréncia de contetdos ou categorias, freqdentemente pré-especi ficadas. Recomendam que todo o material seja classifica do de acorde com estas catogoriat © que sojam feitos testes sisteméticos da propriedade do sistema de dassit: ‘capo, em termos de sua objetividade e confiabilidade. Ao fazer tais prescrigdes, esses autores revelam, em pii rmeiro lugar. uma perspectiva intelectual-racional do conhecimento, ou s9ja, de que 6 posstvel cheger 2 uma CcompreensSo abrangente dos fendmenos, basicamente através de uma forma de conhecimento — i6gico, objeti- vo, sistematico. Deixam com isso de considorar a exis ‘téncia de outras formas de conhecer. como as experién- clas, intuitivas, artsticas, ete. Além disso, a0 prozorem © estudo do fendmeno através de sua decomposigéo em partes — as categorias — sugerindo que se force o enqua: dramento de tode @ informando nestas partes, eles de- Texto, contexto e significados -monstram uma viséo limitada da realidade, Isto é, de que (© estudo dat dimensGes isolades do fenémeno pode levar 0 conhecimento do todo. A essa visio da realidade po- ‘de-te contrapor uma outra visSo, a de que 02 fenmenot ‘apresentam uma multiplicidade de perspectivas que irr ‘teragem num todo complexo e que & preciso pois levar em conta essas méitiples dimensGes e sua interagdo, pe- 12 50 poder estender mais completamente os fendmenos. Esses autores revelam sinda, com exceedo de Krippen orff (1980), uma visso quantitativa de fidedignidade, ‘que supe 2 concordancia entre dois ou mais anlistas sobre © contelido de uma comunicaggo. Ignoram por ‘tanto, a variadade de significados que uma simples men sagem pode incluir © dai a nocsssidade de deserwolver coutras formas de estimar 0 confisbilidade das inferér- ‘ias sobre 0 conteddo dos textos. A maloria desses auto- re revela, ainda, uma pérspectiva estreita do conceito de anélise 20 sugerir que se focalize apenas 0 contetido ma fest des mensagons. Dosconhocem pois a variedado de mensagens que podem ester presentes numa simples ‘ragdo do discurso e a impossibilidade de se aprender 2 ‘otalidade do objeto sem investigar as diferentes concep- ‘Bes, pressupostes, implicagées nele envolvidas. UMA PROPOSTA ALTERNATIV. ANALISE DE PROSA J8 que a abordagem de andlise de conteido vem sendo concebida de forma tio restrita, sua sdequardo 2 andlise de dados qualitativos se torna muito questio- rével. Alguns pesquisadores podem contester 0 valor da abordagem por consideré-la muito limitada para a andlise de dados que refleters uma realidade multidi- mentional © paizivel-de envolver uma variedade de significados. Proponho entéo que o sentido do termo “ardlise de conteudo” seja ampliado de forma a poder incluir 0 tipo de informacéo geralmente obtida através de observacio participant, questées abertas em entre- Vistas quostiordrios, anilise de documento, do mate Fial audiovisual e artfstico, etc. Proponho assim que 0 ‘ermo seja substituldo por “andlise de prosa sempre {que assumir esse sentido amplo. Andlise de prosa & aqui considerada uma forma 60 investigaeSo do significado dos dadoe qualitativos. E um meio de levantar questdes sobre 0 contetdo de ‘um determinado material: O que é que este diz? O que significa? Quais suas mensagens? € isso incluiria natu. ralmente, mersagens intencionais e ndo-intenciornis, oxplicitas ou implicitas, vorbais ou nfo verbais, ale rrativas ov contraditérias. O materiel neste caso pode sor tanto o registro de observagbes e entrevistas quanto ‘outros materiais coletados durante o trabalho de campo como documentos, fotos, um quadro, um filme, expres: Bes faciais, mimicas, ete Em lugar de um sistema pré-especificado de cate gorias eu sugiro que topioos e temas vao sendo gerados 1 partir do exame dos dades ¢ de sua contextualizarso no estudo. E preciso também que esses tépicos © temas sajam froqdentomente rovistor, questionados, reformu lados ne medida em que a andlise se desenvolve, tendo fem vista 0s princfpics tedricos e os pressupostos da in- vestigcio. Geralmente a pesquisa tem inicio com uma 67 série de questées ou problemas considerados importan- tes © que servon de guia para a coleta ¢ andliso inicial dot dados. Entratanto, conforme 0 estudo se deservol ve, podem surgir novas idéias, novas direcses, noves ‘quest6es que exigem uma reconsideracio dos problemas iniciais e algumas vezes 0 estabelecimento de novas dreas do invertigariio. E preciso poit que 0 método de andliso permita a identificagio de t6picos € temss principals re situagdo estudada mas que wambém ajude a questionar treqientemente as interpretardes © oferega indicagées para interpretacdes alternativas.. ALGUMAS QUESTOES METODOLOGICAS Varios autores (Glaser Strauss, 1967; Bogdan € Taylor, 1975; Fatto, 1980; Guba e'Lincoin, 1881; Bogdan e Bikier, 1982) sugerom quo o primeira passo na andlise de dados qualitativs & a corstrugio de um sistema de categorias. Para criar tas categorias, atiemam les, deve-se examinar 0 material disponivel prosurando identiticar topicos, temas e padrées releventes. O que nfo fica claro nessas sugestfes & quais os métodos que dover ser usados para a idertticagSo dos temas ¢ tipi- ©05 10s dados. Associade a ess, uma série de questGes odem ser levantadas, tis como: Como se distingue um ‘pico de um tema? Que critéios devem ser usados para detorminar a olevineia do um tépico ot tems @ quando 4 deve transformer um t6pico ou tema em uma cate: goria? Quifo abrangente deve ser uma categoria? Tome- mos caca uma desta questdes separadaments. ‘A primeira cuestio refere-se 8 distineSo entre t6- pcos @ temas. Nills (1959) procura esclarecor adiferen- ‘entre esses dois tormes dizendo que 0 tSpico & um assunto, enguanto que o tome é ume idéia. Segundo ele, 0s temas envolvem um nivel de abstrago maior do aue (0s t6pieos. Esta distingSo pode ser iil do ponto de vs- ta didético, mas nfo ajuda muito a determinar 0 prose: 10 de gerar tépicos ¢ temes. Por exzmplo, no se sobe se 6 mais adequado estabeleceruniades txas de andl- se, como por exemplo um pardgrafo ou te & possivel certa flexibilidade 1a escolha das unidader, dependen- do do tipo do material ou da informagio obtids. Outro Ponto que nfo est claro na meiosla dos manuals sobre pesquisa quolitaiva ou andlise de contedco ¢ 2 relagdo entre topicos e temas. No fica explicto se tépicos ¢ temas so gerados concomitantemente ou se 0s temas surge @ partir da agogeeo de tépicos ov sinds so exstem outros procadimentos alternatives. Acredito que 2 inexistencia de diretrizes espocifcas sobre esses spectos prétices da andlise se dova principalmente 3 dificuldade de estabelecer um rétodo que soja o melhor ou 0 mais sdequado, € razoivel admitir que at cond Ges particulares sob as quais 0 estudo se deserwolve, © tipo de informacio buscada e obtida, 0s antecedentes © 08 acontecimentos resis da pesquisa, assim como 0 teewohimento do investigador na sitvaro, s60 tedes fatoros importantes para explicar porque um corto mé todo © nfo outro foi escalhide. A crientagio tecrica do pesquisador, sua experiéncia anterior, seu grau ce imersfo nos dados, seus valores, suas crencas e perspec: tivas podem orientar 0 foco da investigacSo para aspoc- tot mais coneretos ou conseppScr mals abetratas, para 68 (8 t6picas ou para os temas ou para ambos. Como afi ma Stake (1981), 2 intoragdo do peequisador com 0 objeto pesquisede se torne algo Gnico em cada estudo de natureza qualitativa. E preciso pois levar em conta ‘que 0 processo de categorizago do material qualitati- vo vai eniolver nfo sé conhecimento Iégico, intelec- ‘ual, objetivo, mas tembém conhecimento pessoal, in 1witivo, subjetivo, experiencia. Uma outra questéo, bastante tigaca @ anterior, diz respoito a existéncia de critérios para determinar © grav de importancia ou relevéncia de um t8pico ou ‘toma © portanto destacd-lo como “categoria. Gubs ¢ Lincoln (1981) sugerem que para construir categorias 6 preciso exeminar 0s dados tentando descobrir aspec- 105 regulares e concorrentes. Comentéios, observardes, ‘temas que ooorrem e recorrem em diferentes situacGes, diferentes momentos, advindos de diferentes informan- tes devem ser selecionados pera corstituir 0 conjunto Inicial de catogorias, aficmam eles. Estd implicito nesta regra geral que um critério para determiner a relevincia de um item é a freqiiéncia com que esse ocorre. Este critério pode ser vilido, mas sem divida no 6 suficien- ‘te. E possivel que os dacios contenham aspectos, obser vegies, comentarios, caracterfsticas Gnicas, mas extre- rramente importantes para uma apreensio mais abran- ‘gente do fendmeno estudado. Haverd também mena- ‘gene no intonciomis, implicitas e contraditérias q embora Gnicas revelam dimens6es importantes da si- ‘uagdo. A questo $ pois encontrar maneires de poder detectar informagGes singulares, mas relevantes @ poder distingiif-las de outras também singular inrelevartes. Acredito que subjetividade e intui tum pepel fundamental no processo de localizago desse tipo de dado, além evidentemente do quadro ta6rico no ‘qual o estudo se situa. Cada pesquisador tem perspecti 135, propésitos, experincias anteriores, valores e manei rat de ver 2 realidade e 0 mundo que, 20 interagiram ‘com @ objeto pesquisado, orientam 0 seu foco de ater: ‘G60 pare problemas especftices, mensagens determina- das, aspactos particulares. Se pois por um lado devem existir métodos para tratar dados qualitativos. por outro lado 6 nacessirio 0 resonhecimento do papel da intuigSo da subjetividade no procesto de selecionar, categorizar €¢ interpretar a informaedo. Esse reconhecimento é fun- damental para que se possa buscar procedimentos que tornem os resultados da ardlise menos wulnerdveis a0 excrutinio externo. Entro as téonicas usualmente ompre- ‘gadas pera testor a “validade” das interpretagSes foitas sobre informagoes de natureza qualitativa destacam-se 2 crecibilidade dos dados por parte dos informantes, @ corroboracio das inferncias por outros juizes ea trian gulogo. Cada uma delas card contiderada a saguir. Crecipiticade junto a0s informentes. Como & bas- ‘ante enfatizado por Guba e Lincoln (1981), 38 pessoas que fornecem a informacdo estio provavelmente na me- hor potigSo para atestar ou nfo a relevancia de cortos itens, j6 que esses geralmonte esto mais préximas da situagéo estudada do que 0 pesquiador. & verdade, porém que 20 devolver a informardo 20s pesquisado- res, uma série de problemas pode surair, entre os quais Niles (1079) destaca: um tentimento de vulnerabilidade Cad. Pesq. (45) maio 1983 por parte de alguns informantes, respostas auto-prote- toras e objepes a certas citagGes ou caracter zanses por considerarem-nas depreciativas ou destrutivas. & preci- 50 levar em conta que 0s informantes podem reagir ne- gativamente 36 interpretacSe: porque essa nfo coin dem com seus préprios interesses, com a imagem que fazem de si mesmos ou porque ertram em contlito com sua filosofia e valores. Para tar proveito méximo da ‘téeriica € pois necessirio tornar a processo 0 menos ameacader possivl, 0 que no teré certamente facil. Esta técnica, porém & essencial em estudos que preten- dem centrar no interesse, nos problemas ¢ nas preocu- papées dos participantes, como por exemplo 2 aborde gem resporsiva de avaliaeo (Stake, 1980) ou ot extu- dot voltadot 3 educagfe popular. Corroborario por parte de outro(s) araliste(s). As inferéncias do pesquisador sobre a relevancia de um t6pico ou tems, podem ser checadas através do julge- mento de um outro analista (ou grupo de analistas) Isso. no significa que um segundo juiz deverd repro- (© mesmo sistema de classificacdo eriado pelo pri meiro analista. Uma segunda pessoa soré porém capaz de julgar so of tens selecionados fazer sentido em re- lago aos dados que os originaram, se hd portos impor- tantes que deixaram de ser destacados ¢ se os aspectos julgados relevantes parecem razoiveis en vista das in- formagSe: coletadas. Este procedimento pode sor sistemoticamente repetide em ‘égios do estudo ou pode ocorrer em certos perfodos critions da andlise como no infdo e na fate final da oleta de dados. A interaco do pesquisador com ou- ‘ros analistas serd certamente benéfica pars um apri- moremento do procesto de anilise © para um enrique cimento do estudo como um todo. “Trlangulogéo”. Esta técnica @ considerada fun- damental para verificar a propriedade das interpretacées fundadas em dados qualtativas. Triangulacio significa 2 combinago de miltipias fortes de dados, virios mé- todos de colete © diferentes perspectivas de investiga (40. Comperar e chegar @ convergincia cas informagiies fomecidas por diferentes informantas, diferentes méto- dos e ciferentes investigadores ¢ uma forma de verificar 4 propriedade do etquema de clasificapSo dos dador. Se hi certos aspectos enfatizados por virios informantes, ratifcados por diferentes métodos de coleta @ por dite: rentes investigadores é muito provdvel que eles so rele vantes ne compreensio do fenémeno estudado. Eviden ‘omente, uma série de questéas pode também cor levan- tada em relagfo a0 uso dessa técnica. Se, por exemplo, 05 diferentes investigadores estiverem em éreas de atua- Bo comum, se partilharem dos mesmos pontos de vista ® se tiverom percaprses similares do problema, dificl- mento oferocerfo interpretagSee alternatives para 4 i: tuigho. Além disso, se houver un dnico investigador para a coleca de dados e se este ndo tiver possibilicade de discutir sues observacGes com outros investigadores, 0 Uso de variadas métodos ou instrumentas de coleta ou do variados informantee pode significar apenas uma mul: tiplicaggo dos mesmos pontos de vista. E preciso pois, bastante cautela pare fazer desta técnica um instrumento adequado de ratificagdo das inferéncies ou de confiabi- lidade das interpretaeses Texto, contexto e signiticados Uma questéo acicional sobre 0 processo deanslise da informacio diz respeito 20 nivel de abrangéncia das categorias. Parece também que neste caso é impossivel ‘stabelocer uma rogra Gnica pars todas at situaeSee. O nifvel concsituel das categorias parece depender em pri rmeiro lugar, do tipo de propdsito do estudo. Por exem- plo, quando o objetivo do pesquisador é formular teoria caleada nos dados, Glaser e Strauss (1967) sugerem que’ Na decisfo do nivel conceitual de suas categorias, 0 socidlogo que busca gerar teoria, deve so orientar polo eritério de que a+ catogorias nfio deve ‘Go abstratas @ porto de perderem seu cordter sensitivo, mas deve ser suticientemente abstra- 1as para fazar de sua teoria um guia geral as situa- 62s didrias, multidimensiorais e em constante ‘mutaeSo (p. 242). Quanto sot estudos avaliativos, Gubs « Lincoln (1981) recomendam que “A escolhe de um nivel amplo demats pode levar 0 avaliador a deixar de ver aspectos relevantes porque estes se “perdem” na cetegoria muito ampla, enquanto que a escolha de um nivel muito limi ‘ade pode colocar © foco deatenedo em detalhes om de- ‘trimento da visSo geral" (p. 94) ‘Além do propdsito do estudo, 0 tipo de informa: ‘0 colhida, 2 familiaridade do pesquisador coma situa- fo. a reacio dos informantes. 30 estudo. pendido no wabalho de campo, enfim, 2 interac ‘nica do pesquisedor com o objeto pesquisedo podem ser ele: mentos crucials na determinagso do nivel de discurso de um sistema de categorias. Alguns autores preferirfo 2 focalizaco progressiva (Stake, 1981), defendendo a necescidade de contrar not aspectos mais amplos pera fo perder @ visdo giral e complexa do fendmeno. Ou- ‘ros recomendardo sistemas detalnados de coditicagso andlise (Bogdan e Bikien, 1982) de modo que sejam cap- turados 0s minimos Sngulos do problema. Outros ainda, ppartirSo do sistemas moleculares de codificario, ovo- luindo para métodos mais informais e menos atomizados contorme o estuco se deservoive (Miles, 1979). Parece, pois inreal determirar uma diretriz Gnica pera todas as situagdes j6 que nenhuma pode ser considerada por si 56 2 mais vélida, 2 mais prética ou 2 msie verdadeira CONJECTURAS SOBRE 0 USO DA ANALISE DE PROSA (© procesio do anilise de prosa 6 algo que ainda precise de muita elaborapfo. Se existe um método ou sistema a ser criado, este deverd ter origem numa cons- tante reflexdo sobre a nossa prdtica de anilise, & luz do contexto dos dados analisedos © tendo am vista os pres supostos © conceppées que orientam essa pric, No momento, o que posto tentar 6 esbogar alguns rocedimentes na aborcagem de dados qualitativos, os ‘quais s40 fruto de reflexes que venho fazendo acerca dda minha prépria pritica de pesquiss 1. 0 primero especto que gostaria de enfatizar é que a anilise esté presente nos diferentes estigios da in- vestigacdo e faz parte integrante do processo de coleta de dados. Detde 0 inicio do estude nds jé fazemos uso 69 de procedimentos analiticos quando procuramos verifi- car a pertinéncia dat questée: e problemas solecionades frente 20 contexte do objeto estudedo. Tomemos ento vtlas decisdes sobre pontos a serem enfatizados, areas que merecem maior exploraglo, aspectos que podem ser liminados @ novas direcSes 8 serem trlhadas. Faromos fessae escolhas com base no contacto com a realidade eiquisade € nos pressupostos tedricos que dirigem a nossa agdo. A medida em que a coleta de dados pros- segue, 38 atividades analiticas se orientam para a reviso do conjunto inieial de questéas e para sua reformulagso ou aprimoramento © para a busca de altornativas no in terpretagio das dados. Este processo interligado de co lew @ andlise continua até a tase tinal do wabamno, com a preparapso do relatério. 2. Um outro ponto que gostaria de ressaltar &que tanto quanto possivel, a tarefa de anslise dos dads qua- litativos deve ser um empreendimento conjunto. Se a peiquisa osté sendo realizada por um grupo de pessoas, uma postibilidade 6 2 diccuss8o conjunta das divides « dificuldades na endlise e « procura coletiva de solugGes @ alternativas. Outra possibilidade é a troca de material ante os diversor membros do grupo visando enriquecer as interprotagSes, encontrar explicagSes divergentes para 0 dados e validar © exquems de andlise. Uma terceira ossibilidade 6 o estabelecimento de certos momentos ‘espectficos. no desenvolvimento de pesquiss, quando setdo feitas discussGes sobre a andlise dos dados. Isso po- de ocorrer, por exemplo, nas fases iniciais e firais da coleta quando 4 mais provével que surjam problemas. De qualquer maneira, uma aventura conjunta através do material obtido 6 geraimente extremamente valiosa no 56 para testar a propriedade do esauema de andlise, mas, ‘também para corroborar ou questionar as interpretagSes feitas. Como um resultado dosta tarota conjunta, o sic: tema de categorias pode ser completamente tevisto, no- vas eategorias podem ser criadas, diferentes topicns e temas podem ser identificados e explicagdes alternativas podem ser geradas. Se nio houver um grupo de pesqui- adores, ainds 6 possivel tontar realizar atividades con juntes, procurande 0 auxilio de colegas ou de informan- tes que estejam numa posigdo especial para colaborar na andlise. Comio esta atividade requer.em geral, muito tem- po, 0 peequitador pode selecionar apenas uma amostra do material para ser examinsdo em conjunto. As idéi Cconcepgses Intulgbes que resultam do processo cer: ‘tamente compensam 0 tempo e 0 esforco dispendidos. 3. © tereeiro ponte que gostaria de enfatizer diz mais respeito @ abordagem proposta no presente vaba- Iho. Acregito que examinar os dados com perguntas bem amplas em mente, ajuda-nos a manter o foco de ‘tengo no todo sem perder de vista a multiplicidsde ‘de sentides que podem estar implicitos no material ‘A abordagem dos dados qualitativos orientada por ques ‘t6es do tipo: “O que isso tudo quer dizer? Quais suas mersagens?” postibilita adquirir uma visfo profunda ¢ ‘multidimensional do fenémenoe, principalmente ee orem levades em conta 0 contexto dos dados ¢ 0 qua dro tebrico em que se situa o fendmeno estudado. Em Gitima instdncia 0 que se procura obter num estudo é 2 compreentio ampla @ profunda do objeto focalizado, Para isso so cscolhidos corto tipo de dador que supos tamente levardo a uma representagio aproximada de realidade. Tals dados s30 obtidos por um constante tran sitar do pesauitador entre “realidade” e teoria num pro- essa continuo de inferéncias sobre © que os dados sig nificam, o que implicam, pera onde lovam. Os miltiplos significados se manifestarn ‘em forma de mense: ‘gens explicitas ou implicitas, idéias claras ou obscuras, Fepresertaodes evidentes ou imprecisas que procuramos capturar, traduzit « revelar. Isto 6 0 que fazemas natu: ralmente. E acredito que isso é © que dovomos fazer para entender raturaiments 0 fendmeno focalizado. ‘Qual o proximo passo apes identiticar esses diferentes sentidos nos dados ¢ algo ainda ndo muito claro pare mim, Se dovemes usar esquemas complexos de codifi cago ou no, quai a¢ considerapue que devemos fazer ‘20 construir eategorias © quais os diferentes testes de veriticagio da valldade de nossas inferéncias so éreas abertes 3 investiqago. Espero que outros inwestigadores me acompanhem ra busca de algumas dessas respostas. Agung mo Chea a aja ence proxade pare erase preemerrabalto. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ANDRE, M.E.0.8. (1983) Uso of content anaiysis in educa- tonal evaluation: Doing prove analysis, Discourse, 4,1. BERELSON, & (1852) Content anatysis in communications ‘researen. Now York: Free Prem. BOGDAN, Fit BIKLEN, SK (1902) Qualerie revarch for ‘sdvestion. Bonn: Allyn ated Bacon, In. BOGDAN, fle TAYLOR, 6. (1976) Inrocuction to queliative ‘rseurch methods. 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AS ATUAIS CONDIGOES DE FORMAGAO DO PROFESSOR DE 1° GRAU: ALGUMAS REFLEXOES E HIPOTESES DE INVESTIGACAO Guiomar Namo de Mello Eny Marisa Maia Vera Maria Vedovelo de Britto Pesauizadores de Fundapi Carlos Choges INTRODUGAO, crescimento quantitative da escola bisica trans- formou muito as condigdes de trabalho do professor. O sistema burocratizouse, e as relapdes socials de trabalho dentro da escola mudaram de natureza. Hoje, 0 magi thrio de 1° grau constitui uma prética ordenada er ralizada pelas instincias técnicas e administrativas do sistema de ensino. 0 profestor doixou de ser um arteso autbromo diante das decisGes sobre 0 que ensinar ¢ ‘como transmitir ¢avaliar o que ensina. As vantagens ¢ desvantagens dessa situagio jé fo- ram por nés discutidas em outros trabslhos! . O.que im porta salientar é que resultados de ostudos anterioras permite levantar a hipétese de que os cursos de forme {$60 do magistério em geral, © das séries iniciais do 1° rau em particular, no estéo consequinde preparar ade ‘quadamente 0 professor para atuar na nova realidade da ‘escola basics. Por outro lado, diante de uma escola agi gantade quantitativamente e, por cause disso, burocrat 7zada © tacionalizada por instdncias que the s0 adminis- trativamente superiotes, mais do que nunca o preparo profissional e politico do professor se torna importante. Podese onto supor que a ocupaco de um sepaco @ 3 manutengo de certo greu de eutonomia do professor depende de sua competéncia profissional pare incorpo- rar e selecionar criticamente as orientagdes que procu- ram ordenar sua prética pedapégica. Cad. Pesq., Sé0 Paulo (45): 71-78, maio 1983 A adaptago dos, contetidos, metodologias de en- sino e avaliagSo a realidade da clientele escolar; a cria~ (fo de recursos de ensino adaquados as demandas espe- cficas de cada unidado; a partisipagdo nas decisées m: amplas sobre planejamento, curriculo e avaliagso, © ‘muitas outras atividades que ainda cadem ao professor, requerem preparo e senso eritico. Sem estes, as orienta- ($6es que so implementadas a nivel de sistema correm © ritco de teram aceitas ou nogadas mocanicarrante 0 sem critica, formalizando e ritualizando 8 tarefadocente. Sem discutir a importancia desses ordenapdes & orientagdes mais gerais, 6 fundamental indagar que tipo de formaciio pode levar 0 professor a assumir um papel ‘maiz ativo © menos depondonte dentro ds sala de aula. Daf que um estudo dos cursos a eie destinados cons: tua-se de grande interesse, ndo apenas a nivel de diagnos- tico como em termos de fomecer subsidios para o delineamento de novas alternatives de preparacio profiesional do magietéri * Originaimante publcado em “Em Aberto”, Brasfa, Ano 1, in@'B, Agosto do 1962. Ver itens 10 (o. 538) 0 11 (0. 51-9) de tibloorafis citade, nm

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