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A VIDA DEPOIS DA VIDA

Raymond A. Moody Jr.

Prefácio

Vinte e nove anos atrás o livro A Vida depois da Vida de Raymond Moody levou a uma
mudança mundial em nossa compreensão da morte. A pesquisa do doutor Moody se
espalhou pelo mundo e ajudou muito na formação de modernas expectativas
relacionadas ao que vamos vivenciar depois da morte _ o túnel, a luz branca, a
presença de entes queridos falecidos há muito tempo esperando por nós do outro
lado. Tenha em mente que há vinte e nove anos essa não era uma imagem
comumente associada com a experiência de morrer. O doutor Moody inspirou uma
primeira geração de pesquisadores dedicados à compreensão científica da consciência
e da morte humanas _ pesquisadores que, por sua vez, criaram uma nova ciência de
estudos de quase-morte. Bruce Greyson, professor de psiquiatria na Universidade de
Virgínia, disse que “todo um novo mundo” abriu-se após a publicação da pesquisa de
Moody. Essa mudança em nossa visão coletiva foi tão profunda que é difícil lembrar
das condições culturais que existiam antes de 1975, quando o livro foi publicado pela
primeira vez.

Antes da publicação de A Vida depois da Vida, o termo experiência de quase-morte


nem existia. Os médicos chamavam o fenômeno de “síndrome de Lázaro”, implicando
que se tratava do resultado de uma patologia médica. Os pacientes não se referiam
às experiências de quase-morte, pois com freqüência pensavam que estavam
mentalmente doentes e haviam sofrido alucinações devido aos medicamentos e à
falta de oxigênio no cérebro. Certa vez, o doutor Moody aproveitou o tempo para
ouvir as pessoas que sobreviveram a ataques cardíacos e assim aprendeu sobre suas
experiências de quase-morte. Nossa sociedade suspirou um tipo de “ahá” coletivo e
começou a perceber que algo muito especial acontece conosco quando morremos.
Embora George Gallup1 tenha estimado que 5% da população geral passou por uma
experiência de quase-morte, as pessoas temiam conversar sobre isso por medo do
ridículo. Com muita freqüência, elas próprias duvidavam da validade daquilo que
acontecera com elas.

A Vida depois da Vida fez enorme sucesso porque abordou dois dos maiores
problemas da civilização ocidental do século vinte: primeiro, a perda dos mitos sociais
coletivos relacionados à morte e, segundo, a desvalorização sistemática de qualquer
coisa relacionada com o lado espiritual dos humanos. O trabalho do doutor Moody nos
lembrou que, em essência, somos seres espirituais, e o fato de que uma luz amorosa
nos encontra quando morremos é a prova disso. Quando morremos, nossa própria
vida é avaliada e interpretada, não de acordo com o quanto de dinheiro ganhamos ou
o quanto temos de status e prestígio, mas sim de acordo com o amor que
compartilhamos com os outros durante nossa vida. Num momento em que a
freqüência à igreja e a participação em religiões organizadas e tradicionais estavam
em sua maior baixa, A Vida depois da Vida reacendeu a compreensão da importância
da espiritualidade em nossa vida cotidiana.

É apropriado que A Vida depois da Vida tenha sido originalmente apresentada por
Elisabeth Kubler-Ross, a pioneira nas pesquisas sobre morte. Embora por dezenas de
milhares de anos os humanos tenham aceitado a morte como parte natural da vida,
uma revolução brutal em nossas atitudes com relação à morte ocorreu na virada do
século dezenove. A morte deixou de ser natural, passou a ser suja, um fato médico, e
foi escondida da visão pública. Enquanto a maioria das pessoas morria em casa no
século dezenove, na metade do século vinte, a maioria das pessoas morria nos
hospitais. As intervenções médicas agressivas no final da vida, possibilitadas pela
ciência, resultaram numa perda de dignidade e de controle sobre a própria vida por
parte da pessoa diante da morte. No final do século vinte, até mesmo a Associação
Americana de Medicina concluiu que pacientes moribundos eram submetidos a
intervenções médicas humilhantes e desnecessárias, que extirpavam qualquer
dignidade do processo de morte.

Em 1965, quando Elisabeth Kubler-Ross escreveu seu livro Sobre a morte e o morrer2,
a morte era algo que não era discutido. Pacientes à beira da morte eram submetidos à
“doce mentira”. Eles não eram informados da verdade sobre sua situação clínica, já
que os outros sentiam que a verdade era traumática demais e destruiria suas
esperanças. A doce mentira só servia para isolar a profissão médica e a sociedade dos
fatos da morte.

A doutora Kubler-Ross ousou realmente conversar com pacientes à beira da morte


sobre seus sentimentos. Isso gerou enorme hostilidade da equipe médica em seu
hospital em Chicago. Por exemplo, uma enfermeira perguntou com raiva se ela sentia
prazer em contar aos pacientes que eles tinham apenas algumas semanas de vida. A
doutora Kubler-Ross descobriu que tais pacientes já sabiam que tinham apenas
poucas semanas de vida e estavam sofrendo com a solidão e o isolamento que o
medo da morte lhes causava. Embora a doutora Kubler-Ross tivesse seguido em
frente para dar suas próprias contribuições à compreensão espiritual do que acontece
quando morremos, em seu primeiro livro, ela discutiu apenas os estágios emocionais
da morte. Esses estágios incluíam negação, isolamento, raiva, negociação, depressão
e aceitação. Nossa sociedade ficou perplexa ao descobrir até mesmo essas
observações de senso comum. Afirmar que pessoas à beira da morte tinham
sentimentos em relação à morte parecia enfurecer e escandalizar um estabelecimento
de saúde dedicado a salvar vidas, não a facilitar a morte. Em meados da década de
1960, embora houvesse uma revolução sexual e política nos Estados Unidos, a morte,
como um tópico, não era discutida, e visões da morte bem como a espiritualidade do
leito de morte eram temas proibidos.

Foi preciso outra década antes que o clima estivesse pronto para A Vida depois da
Vida. A doutora Kubler-Ross introduziu o conceito chocante de que pessoas
moribundas tinham sentimentos previsíveis em relação à morte e, com frequência,
até a aceitavam. Dez anos depois, o doutor Moody explicou o porquê. Em vez de a
morte ser simplesmente a extinção da vida, ele documentou que se trata de um
momento espiritualmente dinâmico, com revelações que transformam a vida. Essas
mesmas revelações transformaram nossa sociedade também. Um indicador do
impacto de A Vida depois da Vida é o número enorme de livros com títulos similares
que o seguiram. Esses títulos incluem Life before life3, Life at death4, Life between life,
e meu favorito, Elvis after death. A Vida depois da Vida se tornou um ícone cultural
porque respondeu ao empobrecimento espiritual da nossa sociedade na época.

É irônico que a mesma tecnologia médica que contribuiu para degradar e humilhar as
condições de pacientes à beira da morte nos permitiu ressuscitar as pessoas com
sucesso para que elas pudessem relatar suas experiências de quase-morte. No início
da década de 1970, a tecnologia médica tinha avançado até o ponto em que a
ressurreição bem-sucedida de paradas cardíacas era algo comum. Embora sempre
tivesse havido histórias que descrevem a vida depois da morte, antes da Era Moderna
era raro sobreviver à morte clínica. A medicina moderna de cuidados intensivos e a
reação rápida das equipes médicas tornaram rotina driblar a morte. O doutor Moody
foi o primeiro a reconhecer que esses mesmos pacientes poderiam contribuir para
nossa compreensão dos últimos minutos de vida.

A influência do doutor Moody numa primeira, e agora numa segunda geração de


cientistas foi tão importante quanto o próprio livro. Anos atrás, um livro como A Vida
depois da Vida não teria sido necessário, já que todos estavam familiarizados com os
aspectos espirituais de morrer. Em 1975, não foi suficiente documentar que as
pessoas, ao morrer, tinham visões de outra vida; também foi necessário provar que
essas visões eram verdadeiras e não simplesmente alucinações da mente moribunda.
Vinte em nove anos depois, basicamente, todo pesquisador e cientista consciente
dessa área concorda que essas experiências são uma parte real e natural do processo
de morrer.

A primeira geração de pesquisadores da quase-morte inclui o doutor Ken King,


professor de psicologia na Universidade de Conecticut; o doutor Bruce Greyson,
professor de psiquiatria da Universidade de Virgínia e o neuropsiquiatra Peter Fenwick
da Faculdade de Psiquiatria British Royal. Eles usaram técnicas formais de
investigação científica e essencialmente chegaram às mesmas conclusões que o
doutor Moody. Esses e numerosos outros pesquisadores documentaram que as
experiências são verdadeiras, não o resultado de alucinações ou patologia cerebral.
Seu trabalho levou, por sua vez, a uma segunda geração de cientistas como eu.
Fizemos um estudo clínico controlado de experiências de quase-morte em crianças no
Hospital Infantil de Seattle e novamente documentamos que essas experiências são
uma parte real do processo de morrer e não causadas por medicações ou falta de
oxigênio no cérebro. Essas crianças, jovens demais para temer a morte ou saber o
que é uma experiência de quase-morte, contaram as mesmas histórias que os adultos
contam em A Vida depois da Vida.

Mais significativa ainda foi a técnica experimental desenvolvida pelo doutor James
Whinnery, do National Warfare Institute, com a qual experiências de quase-morte
podem ser induzidas num ambiente controlado. Ele estudou pilotos de combate que
eram levados a ponto de quase-morte quando colocados numa centrífuga gigante. O
propósito desse estudo era entender as forças gravitacionais às quais os pilotos de
combate eram submetidos enquanto voavam em aeronaves de alta velocidade. Ele
também descobriu que esses mesmos pilotos de combate passavam por experiências
de quase-morte quando submetidos às pressões da centrífuga. É fascinante perceber
que o doutor Moody, um psiquiatra da Geórgia; o doutor Whinnery, cirurgião de
combate da força aérea; e eu, pediatra em Seattle, cada qual trabalhando de maneira
independente, chegamos às mesmas conclusões sobre experiência de quase-morte.

Quando o livro do doutor Moody foi publicado pela primeira vez, os cientistas médicos
riram e descartaram as experiências de quase-morte, rotulando-as como alucinações.
Vinte e nove anos depois, a ciência está agora do lado do doutor Moody. Não conheço
um único pesquisador científico importante que não tenha chegado a conclusões
similares. Foram feitas três principais revisões das experiências de quase-morte na
literatura científica dos últimos onze anos e todas concordam com as descobertas
iniciais do doutor Moody. O ceticismo e o clima intelectual hostil que pioneiros como
Elisabeth Kubler-Ross e Raymond Moody tiveram de enfrentar levaram à situação
atual, na qual existem dúzias de artigos em importantes jornais científicos sobre
experiências de quase-morte. O doutor Moody criou o clima atual em que centenas de
alunos de pós-graduação estão obtendo seus certificados em estudos avançados de
experiências de quase-morte. Mais da metade das faculdades de medicina dos
Estados Unidos ministram cursos sobre os aspectos espirituais da morte.

Atualmente, ninguém precisa se sentir ridicularizado ou mentalmente doente


simplesmente porque teve a sorte de vivenciar uma experiência de quase-morte. A
Vida depois da Vida documentou que experiências de quase-morte podem
transformar positivamente aqueles que as vivenciaram. A raiva interna e alguns tipos
de personalidade levam em primeiro lugar aos ataques cardíacos, e parecem derreter
ao se expor à luz espiritual que vêem na morte.

A Associação Internacional de Estudos de Quase-Morte (IANDS, em inglês), uma


organização dedicada ao aconselhamento e apoio a pessoas que vivenciaram a
experiência, pegaram tais experiências e mensagens e construíram uma organização
internacional que contribui para a transformação da nossa sociedade. A IANDS
contribui ativamente e encoraja a pesquisa científica. Existem centenas de filiais
IANDS nos Estados Unidos e outras centenas em todo o mundo. Novamente, foi
Raymond Moody e A Vida depois da Vida que diretamente influenciaram na formação
dessa organização.

O próprio Raymond Moody permaneceu como pioneiro nos últimos vinte e nove anos.
Geralmente, cientistas que fazem o tipo de contribuição extraordinária que ele fez
com A Vida depois da Vida descansam sobre seus louros, passando o resto da carreira
refinando e promovendo suas descobertas originais. E, embora o doutor Moody tenha
sido merecidamente premiado com o Bigelow Chair of Consciousness Studies na
Universidade de Nevada, Las Vegas, ele também ministra cursos sobre a vida depois
da morte para alunos de pós-graduação e novatos em experiências de quase-morte.

Mas a carreira do doutor Moody desde o lançamento de A Vida depois da Vida foi
principalmente marcada por explorações contínuas da pesquisa da consciência. Ele
permanece no auge da pesquisa científica e sempre estará cerca de vinte e nove anos
à nossa frente.

Em 1975, por exemplo, desenvolveu uma técnica para induzir a experiência de


quase-morte sem realmente ter de chegar perto da morte, e usa-a para facilitar a
capacidade de contatar parentes mortos e entes queridos que já se foram. Enquanto
pesquisava as origens da experiência de quase-morte na antiga Grécia, o doutor
Moody redescobriu o uso de uma câmara meditativa chamada de psicomanteum, que
os médicos gregos usavam com sucesso em seus rituais de cura, e construiu seu
próprio “Teatro da Mente”, como chamou seu psicomanteums em operação nos
Estados Unidos. O psicomanteum chegou a ser descoberto de maneira independente
pelo médico russo Ivan Dmitriev e é usado com sucesso pela psiquiatra russa Olga
Kharitidi para induzir percepções extracorpóreas e experiências de vidas passadas.

Desde sua redescoberta o psicomanteum, o doutor Moody continuou explorando


meios de aproveitar o poder da experiência de quase-morte em nossa vida cotidiana.
Certa vez, ele me perguntou: “Por que devemos esperar até morrer para ter essa
experiência de transformação tão marcante?”

Atualmente, ele está trabalhando em métodos de indução da experiência por meio de


técnicas específicas de meditação que não exigem o equipamento especializado do
psicomanteum. Suficientemente intrigante, o humor é frequentemente uma parte
importante de sua pesquisa atual para entender e induzir experiências espirituais.

Do ponto de vista pessoal, o doutor Moody é diretamente responsável por quaisquer


contribuições que eu tenha feito na pesquisa de quase-morte. Conheci o doutor
Moody quando participava de um grupo de pesquisa cerebral na Universidade de
Washington, em que meu interesse estava principalmente nos efeitos da radiação e
das drogas contra o câncer no cérebro. Acabara de publicar um artigo sobre
experiências de quase-morte em crianças, baseado nos casos que encontrei, quando
estava fazendo um trabalho como médico no Centro de Tratamento Intensivo.

Nossa equipe de pesquisadores do hospital Infantil de Seattle via a pesquisa de


quase-morte como um trabalho paralelo interessante para nossas carreiras médicas
muito atribuladas. Eu não tinha interesse algum de longo prazo na área, e
basicamente publiquei meus primeiros trabalhos com os estudos de quase-morte no
meu currículo. Considerei as experiências interessantes, mas sem nenhuma
importância.

Meu encontro com o doutor Moody mudou tudo isso. Ele havia lido meus trabalhos
iniciais sobre as experiências de quase-morte das crianças e queria me conhecer.
Passamos três dias inteiros conversando sem parar sobre essas experiências.
Lembro-me vividamente de ser chamado ao hospital para ressuscitar um paciente em
estado grave durante esse mesmo período. O doutor Moody acompanhou-me até lá e
continuamos nossa discussão em todos os intervalos que surgiam, enquanto eu
atendia o paciente, e depois durante todo o caminho de volta para casa.

Ele me inspirou a pensar criticamente sobre as experiências e suas implicações na


compreensão da natureza da consciência humana. O fato de que cérebros em coma
podem estar conscientes e cientes do ambiente ao seu redor, além de interagir com
outra realidade espiritual, tem implicações profundas em nossa compreensão de como
o cérebro humano funciona. O doutor Moody previu que minha pesquisa de
quase-morte iria me trazer a reputação como neurocientista, e não a promissora
pesquisa de câncer com a qual eu estava tão envolvido na época.

Joseph Campbell escreveu que a imagem da morte é o começo da mitologia. Por sua
vez, são nossos mitos que nos fazem sentir como parte da sociedade dos vivos, bem
como herdeiros do legado da morte que veio muito tempo antes de chegarmos aqui e
permanecerá muito tempo depois de partirmos. Os mitos da raça humana dão sentido
à vida individual e nos ajudam a interpretar eventos, tais como a morte, que não
podem ser prontamente entendidos por meios “normais”.

A sociedade moderna abandonou a relação tradicional entre morte e sociedade que


existiu por dezenas de milhares de anos. Até mesmo práticas funerárias modernas
refletem isso, como o advento do embalsamamento irracional dos mortos, que só teve
início cerca de cem anos atrás. Nossa sociedade sofre com nossa falta de conexão uns
com os outros e com nossa falta coletiva de sentido em nossa vida. A ausência de lar,
a depressão, o uso de drogas, o alcoolismo, a violência no trânsito e as armas de fogo
– tudo tem suas raízes na falta de sabedoria espiritual.
O livro A VIDA DEPOIS DA VIDA, de Raymond Moody nos reconectou com uma
sabedoria atemporal sobre a morte. Nós não morremos simplesmente; a morte é
muito mais complicada do que isso. Morremos cientes, como uma consciência
expandida dessa realidade unida a uma maior compreensão de nossa vida. Ao
entender experiências de quase-morte, conectamo-nos com a sabedoria dos xamãs5,
as revelações de O Livro dos mortos tibetano e as origens das grandes religiões do
mundo. A Vida depois da vida nos religa à nossa própria espiritualidade dormente
dentro de nós. Este livro nos dá ferramentas espirituais para entender nossa própria
vida. Trata-se de uma obra eterna, que será tão vital daqui a vinte e nove anos assim
como o foi vinte e nove anos atrás.

Melvin Morse, M.D. (doutor em medicina)6

PRÓLOGO

Tive o privilégio de ler um exemplar da pré-publicação do livro A Vida depois da vida,


do doutor Moody, e estou fascinada pelo fato de esse jovem acadêmico ter a coragem
de reunir suas descobertas e colocar à disposição do público em geral um novo tipo
de pesquisa.

Como venho trabalhando com pacientes terminais nas últimas décadas, fiquei cada
vez mais preocupada com a observação do fenômeno da morte em si. Aprendemos
muito sobre o processo da morte, mas ainda temos muitas perguntas em relação ao
momento da morte e à experiência de nossos pacientes quando são declarados
clinicamente mortos.

São pesquisas como as que o doutor Moody apresenta neste livro que trazem uma
nova luz e confirmam o que nos foi ensinado por mil anos – que existe vida depois da
morte. Embora não declare ter estudado a morte propriamente, é evidente, a partir
de suas descobertas, que os pacientes, ao morrer, seguem tendo consciência do
ambiente ao seu redor depois de serem declarados clinicamente mortos. Isso em
muito coincide com minha própria pesquisa, que usou relatos de pacientes que
morreram e retornaram, apesar das nossas expectativas desfavoráveis, e,
frequentemente, para a surpresa de alguns médicos altamente qualificados,
renomados e certamente realizados.

Todos esses pacientes vivenciaram uma flutuação para fora de seu corpo físico,
associada a uma grande sensação de paz e completude. A maioria estava ciente da
presença de outra pessoa que os ajudou na transição para o outro plano da vida. A
maioria foi recebida por entes queridos que haviam desencarnado antes deles, ou por
uma figura religiosa que foi significante em sua vida e que coincidia, naturalmente,
com sua própria crença religiosa. É alentador ler o livro do doutor Moody no momento
em que eu estava pronta para colocar minhas próprias descobertas no papel.

O doutor Moody terá de estar preparado para muitas críticas, principalmente vindas
de duas áreas distintas. Haverá membros do clero que ficarão irritados com ele, por
ousar fazer pesquisas numa área que é supostamente um tabu. Alguns
representantes religiosos de determinadas igrejas já expressaram suas críticas contra
estudos desse tipo. Um padre referiu-se a eles como “venda de graça barata”. Outros
simplesmente sentiram que a questão da vida depois da morte deveria permanecer
como uma questão de fé cega e não deveria ser questionada por ninguém. O segundo
grupo de pessoas de quem o doutor Moody pode esperar uma reação de preocupação
perante este livro são cientistas e médicos que enxergam este tipo de estudo como
“não-científico”.

Creio que chegamos a uma era de transição em nossa sociedade. Precisamos ter a
coragem de abrir novas portas e admitir que nossas ferramentas científicas atuais são
inadequadas para muitas dessas recentes investigações. Acredito que este livro abrirá
essas portas para as pessoas que têm a mente aberta e lhes dará esperança e
coragem para avaliar novas áreas de pesquisa. Elas saberão que essa compilação das
descobertas do doutor Moody é verdadeira, porque foi escrita por um pesquisador
genuíno e honesto. Também é reforçado por minha própria pesquisa e pelas
descobertas de alguns cientistas, acadêmicos e membros do clero que têm a mente
bastante séria e que tiveram a coragem de investigar este novo campo na esperança
de ajudar aqueles que precisam saber, em vez de acreditar.

Recomendo este livro para qualquer pessoa que tenha a mente aberta e congratulo o
doutor Moody pela coragem de publicar suas descobertas.

Elisabeth Kubler-Ross, M.D.

Flossmoor, Illinois

INTRODUÇÃO

Este livro, escrito por um ser humano, naturalmente reflete a vivência, as opiniões e
os preconceitos de seu autor. Assim, embora tenha tentado ser o mais objetivo e
direto possível, certos fatos sobre mim podem ser úteis na avaliação de algumas
declarações extraordinárias que são feitas no decorrer da obra.

Primeiramente, eu mesmo nunca estive perto da morte, portanto não estou


oferecendo um relato em primeira pessoa das experiências pelas quais passei. Ao
mesmo tempo, não posso declarar total objetividade nesse sentido, já que minhas
emoções se envolveram nesse processo. Ao ouvir tantas pessoas relatarem as
experiências fascinantes com as quais este livro lida, passei a sentir quase como se as
tivesse vivenciado. Posso apenas esperar que essa atitude não comprometa a
racionalidade e o equilíbrio da minha abordagem.

Em segundo lugar, escrevo como uma pessoa que não está amplamente familiarizada
com a vasta literatura dos fenômenos paranormais e ocultos. Não digo isso para
menosprezar o assunto, e estou certo de que um maior conhecimento da área poderia
ter ampliado minha compreensão dos eventos que estudei. De fato, agora pretendo
olhar mais de perto alguns desses livros para ver até que ponto as investigações dos
outros são sustentadas pelas minhas descobertas.

Em terceiro lugar, minha formação religiosa merece algum comentário. Minha família
frequentava a igreja presbiteriana, mesmo assim meus pais nunca tentaram impor
suas crenças e conceitos religiosos a nós, seus filhos. De maneira geral, eles
tentaram, conforme crescíamos, encorajar quaisquer interesses para que
desenvolvêssemos sozinhos e fornecer oportunidades para que as seguíssemos.
Assim, cresci tendo uma “religião”, não um conjunto fixo de doutrinas, mas uma
preocupação com doutrinas, ensinamentos e questões espirituais e religiosas.
Acredito que todas as grandes religiões dos homens têm muitas verdades para nos
contar, e que nenhum de nós tem todas as respostas para as verdades profundas e
fundamentais com as quais a religião lida. Atualmente sou um membro da igreja
metodista.

Em quarto lugar, meus antecedentes acadêmicos e profissionais são de certa forma


diversos – eu diria fragmentados. Cursei a pós-graduação em filosofia na Universidade
de Virgínia e recebi meu Ph.D nessa área em 1969. Minhas áreas de interesse
especial em filosofia são ética, lógica e filosofia da linguagem. Depois de lecionar
filosofia por três anos numa universidade no leste da Carolina do Norte, decidi entrar
na faculdade de medicina, tornar-me psiquiatra e ensinar filosofia da medicina numa
faculdade. Todos esses interesses e experiências necessariamente ajudaram a moldar
a abordagem que assumi neste estudo.

Minha esperança é que este livro atraia a atenção para um fenômeno amplamente
difundido e muito bem ocultado, e, ao mesmo tempo, ajude a criar uma atitude
pública mais receptiva para o assunto. Tenho plena convicção de que esse fenômeno
tenha grande significância, não apenas para muitos campos acadêmicos e práticos –
especialmente psicologia, medicina, filosofia e teologia e ministério – mas também
para a maneira como lidamos com nossa vida cotidiana.

Deixe-me dizer logo de início que, em termos que explicarei muito depois, não estou
tentando provar que existe vida depois da morte nem acredito que uma “prova” disso
seja possível neste momento. Parcialmente, por essa razão evitei o uso de nomes
reais e ocultei certos detalhes de identificação nas histórias, enquanto deixava seu
conteúdo inalterado. Isso foi necessário tanto para proteger a privacidade dos
indivíduos em questão e, em muitos casos, para receber permissão para publicar a
experiência relatada a mim em primeiro lugar.

Muitos acharão incríveis as declarações feitas neste livro e outros cuja primeira reação
será descartá-las. Não tenho direito nenhum de culpar pessoa alguma que se encaixe
nessa categoria; eu teria precisamente a mesma reação a poucos anos atrás. Não
estou pedindo que ninguém aceite os conteúdos deste livro ou acredite neles
simplesmente por minha autoridade. Na verdade, como um lógico que repudia a
estrada para a crença que se segue por meio de apelos inválidos de autoridade,
especificamente não peço a ninguém que faça isso. Tudo o que peço é que a pessoa
que não acreditar no que ler aqui, pense um pouco. Venho lançando esse desafio
repetidas vezes há algum tempo. Daqueles que vieram a aceitar, houve muitos que,
céticos a princípio, passaram a compartilhar minha opinião a respeito.

Por outro lado, não há dúvida de que haverá muitos que lerão o livro e encontrarão
um grande alívio, pois descobrirão que não foram os únicos a passar por tal
experiência. Para eles – especialmente se, como a maioria, esconderam sua história
de todos, revelando-a a poucas pessoas de confiança – só posso dizer isto: È minha
esperança que este livro possa encorajá-los a falar com um pouco mais de liberdade,
para que uma faceta mais intrigante da alma humana possa ser elucidada com maior
clareza.

O FENÔMENO DA MORTE

Como é morrer?

Essa é uma pergunta que a humanidade vem fazendo a si mesma desde que os
humanos passaram a existir. Nos últimos anos, tive a oportunidade de levantar essa
questão com uma série de plateias de número considerável. Esses grupos variaram
desde turmas de psicologia, filosofia e sociologia passando por organizações da igreja,
auditório de televisão e clubes cívicos até sociedades de profissionais de medicina.
Com base nessa exposição, posso dizer com segurança que este tópico excita os
sentimentos mais poderosos de pessoas dos mais variados tipos emocionais e estilos
de vida.

Mesmo assim, apesar de todo esse interesse, permanece verdadeira a afirmação de


que é muito difícil para a maioria de nós conversar sobre a morte. Há pelo menos
duas razões para isso. Uma delas é primariamente psicológica e cultural: o assunto da
morte é um tabu. Sentimos, talvez apenas no subconsciente, que estar em contato
com a morte de qualquer maneira, ainda que indireta, de alguma forma nos confronta
com a possibilidade de nossa própria morte, atrai nossa própria morte para mais
perto, tornando-a mais real e imaginável. Por exemplo, a maioria dos alunos de
medicina, incluindo a mim, em nossa primeira visita aos laboratórios de anatomia
quando entramos na faculdade de medicina pode evocar sentimentos fortes de
incômodo. No meu caso, em retrospectiva, que não se tratava de uma preocupação
inteiramente com a pessoa cujos restos mortais estava observando, embora esse
sentimento certamente estivesse presente também. O que via sobre a mesa era um
símbolo da minha própria mortalidade. De algum modo, ainda que apenas
semiconsciente, o pensamento deve ter percorrido minha mente: “Isso vai acontecer
comigo também”.

Do mesmo modo, conversar sobre a morte pode ser visto no nível psicológico como
outra maneira de abordá-la indiretamente. Não há dúvida de que muitas pessoas têm
a sensação de que conversar sobre a morte é, de fato, chamá-la mentalmente,
trazendo-a para mais perto, fazendo com que se tenha de enfrentar a inevitabilidade
de sua própria morte. Assim, para nos pouparmos desse trauma psicológico,
decidimos simplesmente tentar evitar o assunto o máximo possível.

A segunda razão pela qual é difícil discutir a morte é mais complicada, como se
estivesse enraizada na própria natureza da linguagem em si. Em sua maioria, as
palavras da linguagem humana aludem a coisas que vivenciamos segundo nosso
sentido físico. A morte, no entanto, é algo que reside além da experiência consciente
da maioria de nós porque conscientemente nunca passamos por isso.

Então, se estivermos dispostos a conversar sobre a morte, devemos evitar tanto os


tabus sociais quanto os profundos dilemas linguísticos que derivam de nossa própria
inexperiência. Frequentemente, o que acabamos fazendo é conversar por meio de
analogias e eufemismos. Comparamos a morte ou o morrer com coisas mais
agradáveis da nossa experiência, coisas com as quais estamos familiarizados.

Talvez a analogia mais comum desse tipo seja a comparação da morte com o sono.
Morrer, dizemos a nós mesmos, é como dormir. Essa figura de linguagem ocorre de
maneira muito comum no pensamento e na linguagem do dia-a-dia, além de estar
presente na literatura de muitas culturas e de muitas épocas. Aparentemente, era
algo bastante comum até mesmo na época dos gregos antigos. Na Ilíada, por
exemplo, Homero chama o sono de ”irmã da morte”, e Platão, em seu diálogo
Apologia de Sócrates, coloca as seguintes palavras na boca de seu professor,
Sócrates, que acabara de ser sentenciado à morte por um tribunal ateniense:

[Agora, se a morte é apenas um sono sem sonhos], deve ser um ganho maravilhoso.
Suponho que se qualquer um tivesse de escolher a noite na qual dormiu tão
profundamente que nem chegou a sonhar, e então compará-la com todas as outras
noites e dias de sua vida, e então tivesse de dizer, depois de certa consideração,
quantos dias e noites melhores e mais felizes do que esta ele passou durante a vida
bem, acho que... [essa pessoa] acharia fácil contar esses dias e noites em
comparação com o resto. Se a morte é assim, então, chamou-a de ganho, porque o
tempo como um todo, se visto dessa maneira, pode ser encarado como nada mais
que uma única noite.9

Essa mesma analogia está incorporada em nossa própria linguagem contemporânea.


Considere a frase “pôr para dormir”10. Se você levar seu cachorro a um veterinário e
der instruções de colocá-lo para dormir, normalmente sua intenção seria muito
diferente do que se a mesma expressão fosse usada ao levar seu marido ou esposa
até um anestesista. Outros preferem uma analogia diferente, mais correlata. Eles
dizem que morrer é como esquecer. Quando se morre, a pessoa esquece todos os
inimigos; todas as memórias dolorosas e perturbadoras são apagadas.

Por mais antigas e difundidas que possam ser, no entanto, as analogias com “dormir”
e “esquecer” são extremamente inadequadas quando a preocupação é confortar. Cada
uma delas é uma maneira diferente de fazer a mesma afirmação. Embora nos digam
de modo um pouco mais aceitável, na verdade, ambas dizem que a morte é
simplesmente a aniquilação da experiência consciente, para sempre. Se isso for
verdade, então a morte realmente não tem nenhuma característica desejável do sono
e do esquecimento. Dormir é uma experiência positiva e desejável na vida porque é
seguida do despertar. Uma boa noite de sono torna as horas que vêm a seguir mais
agradáveis e produtivas. Se o despertar não viesse depois, os benefícios do nosso
sono não seriam possíveis. De modo similar, a aniquilação de todas as memórias
dolorosas, mas também de todas as memórias agradáveis. Assim, por análise,
nenhuma das duas analogias está próxima o suficiente de nos dar qualquer conforto
real ou esperança diante da morte.

Contudo, existe outro ponto de vista que nega a noção de que a morte é a aniquilação
da consciência. De acordo com essa outra perspectiva, talvez mais antiga, algum
aspecto do ser humano sobrevive até mesmo depois que o corpo físico pára de
funcionar e é destruído. Esse aspecto persistente foi chamado de muitos nomes, entre
eles psique, alma, mente, espírito, ser e consciência. Seja qual for o nome designado,
a noção de que a pessoa passa para outra realidade de existência depois da morte
física está entre as crenças mais veneráveis dos humanos. Existe um cemitério na
Turquia que foi usado pelos homens de Neanderthal aproximadamente cem mil anos
atrás. Ali, marcas fossilizadas permitiram que os arqueólogos descobrissem que esses
homens ancestrais enterravam seus mortos em esquifes de flores, indicando que
talvez vissem a morte como uma ocasião de celebração – como uma transição do
morto deste mundo para o próximo. Na verdade, nos túmulos de cemitérios muito
antigos há evidências da crença na sobrevivência humana depois da morte do corpo
em toda a Terra.

Em resumo, são apresentadas duas respostas contraditórias à nossa pergunta original


sobre a natureza da morte, ambas da derivação ancestral, ainda que amplamente
mantidas até hoje. Alguns dizem que a morte é a aniquilação da consciência; outros
dizem com igual confiança que a morte é a passagem do espírito ou mente para outra
dimensão de realidade. No que se segue, não desejo descartar nenhuma das duas
respostas. Simplesmente desejo relatar uma pesquisa que realizei pessoalmente.

Durante os últimos anos, encontrei um grande número de pessoas que estiveram


envolvidas no que vou chamar de “experiência de quase-morte”. Encontrei essas
pessoas de muitas formas. A princípio, por coincidência. Em 1965, quando era aluno
de pós-graduação de filosofia na Universidade da Virgínia, conheci um professor de
psiquiatria clínica na Faculdade de Medicina. Desde o começo, fui arrebatado por seu
entusiasmo, bom coração e sendo de humor. Foi uma grande surpresa quando, mais
tarde, fiquei sabendo de um fato muito interessante sobre ele, em outras palavras,
que estivera morto – não apenas uma, mas em duas ocasiões, com um intervalo de
cerca de dez minutos – e que descreveu um relato fantástico do que aconteceu
enquanto estava “morto”. Mais tarde, pude ouvi-lo relatar sua história para um
pequeno grupo de alunos interessados. Na época, fiquei muito impressionado, mas
como tinha pouca vivência para julgar tais experiências, “deixei de lado”, tanto na
minha mente como na forma de uma fita gravada com sua palestra.

Alguns anos mais tarde, depois de receber meu Ph.D em filosofia, fui lecionar em uma
universidade no leste da Carolina do Norte. Em um dos cursos, pedi que meus alunos
lessem Fédon, de Platão, um trabalho no qual a imortalidade está entre os assuntos
discutidos. Em minhas palestras, enfatizava as outras doutrinas que Platão apresenta
e não havia enfatizado a discussão sobre a vida depois da morte. Certo dia, depois da
aula, um aluno me procurou e perguntou se poderíamos discutir o assunto da
imortalidade. Ele tinha certo interesse no assunto porque sua avó “morrera” durante
uma operação e contara uma experiência muito fantástica. Pedi que me falasse a
respeito, e, para minha surpresa, contou-me quase a mesma série de eventos que o
professor de psiquiatria descrevera.

Nesse momento, minha busca por casos ficou um pouco mais ativa e comecei a incluir
leituras sobre o assunto da sobrevivência humana diante da morte biológica nos meus
cursos de filosofia. Entretanto, tomei o cuidado de não mencionar as duas
experiências de morte nos meus cursos. Adotei, de fato, uma atitude de “esperar pra
ver”. Se tais relatos eram bastante comuns, pensei, provavelmente ouviria mais se
apenas levantasse o assunto geral da sobrevivência nas discussões filosóficas,
expressasse uma atitude simpática à questão e esperasse. Para meu espanto, em
quase todas as classes, que tinham cerca de trinta alunos, pelo menos um
procurava-me depois da aula para relatar uma experiência pessoal de quase-morte.

O que me espantou desde o começo de meu estudo foram as grandes semelhanças


nos relatos, apesar do fato de virem pessoas das mais variadas posições religiosas,
sociais e educacionais. Quando entrei na faculdade de medicina em 1972, reuni um
número considerável de experiências desse tipo e comecei a mencionar o estudo
informal que vinha realizando com alguns dos meus colegas de medicina. Finalmente,
um amigo acabou me convencendo a fazer um relatório para uma sociedade de
medicina e outras palestras públicas na sequência. Novamente, descobri que depois
de cada palestra alguém me procurava para contar sobre uma experiência própria.

Co9nforme me tornei mais amplamente conhecido por esse interesse, doutores


começaram a me indicar pessoas que eles haviam ressuscitado e que relatavam
experiências incomuns. Outros ainda me escreviam seus relatos após lerem artigos de
jornais onde meus estudos apareciam.

Atualmente, conheço aproximadamente 150 casos a esse respeito. As experiências


que estudei se encaixam em três categorias distintas:

1. Pessoas que foram ressuscitadas depois de terem sido consideradas, julgadas


ou declaradas clinicamente mortas por seus médicos.
2. Pessoas que, no decorrer de doenças, acidentes ou ferimentos graves,
chegaram muito perto da morte física.
3. E pessoas que, ao morrer, contaram o que se passava a outras pessoas que
estavam presentes. Mais tarde, essas outras pessoas relataram para mim o
conteúdo da experiência da morte.

Da vasta quantidade de material que poderia ter derivado de 150 casos, houve uma
seleção óbvia. Parte disso foi proposital. Por exemplo, embora tenha encontrado
relatos do terceiro tipo, que complementam e estão bem de acordo com as
experiências dos dois primeiros tipos, em grande parte desconsiderei-os por duas
razões. Primeiro, porque isso ajudou a reduzir o número de casos estudados para um
nível mais manejável, e, segundo, permitiu-me estar o mais perto possível de relatos
em primeira pessoa. Assim, entrevistei com grande nível de detalhe cerca de
cinquenta pessoas, das quais sou capaz de relatar as experiências. Dessas, os casos
do primeiro tipo (aqueles na qual uma morte clínica aparente realmente ocorre) são
certamente mais dramáticos do que aqueles do segundo tipo (em que apenas uma
proximidade da morte ocorre). Na verdade, sempre que fazia palestras públicas sobre
o fenômeno, os episódios de “morte” invariavelmente atraíam o maior interesse.
Artigos na imprensa foram escritos em certos momentos de forma a sugerir que esses
eram os únicos tipos de caso com os quais eu trabalhava.

Contudo, ao selecionar os casos que serão apresentados neste livro, fugi da tentação
de lidar apenas com aqueles em que o evento da “morte” ocorreu, pois, como ficará
óbvio, os casos do segundo tipo não são diferentes, mas sim formam uma linha
contínua com os casos do primeiro tipo. Ademais, ainda que as experiências de
quase-morte sejam marcantemente semelhantes, tanto as circunstâncias que as
cercam, quanto as pessoas que as descrevem variam amplamente.
Consequentemente, tentei fornecer uma amostra de experiências que adequadamente
reflete essa variação. Com essas qualificações em mente, passemos agora para a
consideração do que pode acontecer até onde fui capaz de descobrir, durante a
experiência de morrer.

A EXPERIÊNCIA DE MORRER

Apesar da ampla variação nas circunstâncias em torno de contatos próximos com a


morte e dos tipos de pessoas que passam por isso, permanece a verdade de que
existe uma semelhança marcante entre os relatos das experiências em si. Na
verdade, as semelhanças entre os vários relatos são tão grandes que é fácil obter
cerca de quinze elementos separados que são recorrentes na massa das narrativas.
Com base nesses pontos de semelhança, deixe-me agora construir uma experiência
prévia, teoricamente “ideal” ou “completa”, que incorpora todos os elementos
comuns, na ordem em que tipicamente ocorrem.

Um homem está morrendo e, conforme chega ao grande desgaste físico, ouve


uma declaração de morte pelo médico. Ele começa a ouvir um barulho irritante de
chiados agudos e ao mesmo tempo sente que está se movendo rapidamente através
de um túnel longo e escuro. Depois disso, de repente, encontra-se fora de seu próprio
corpo físico, mas ainda no ambiente físico imediato, e vê o próprio corpo a certa
distância, como se fosse um espectador. Observa a tentativa de ressuscitá-lo a partir
desse ponto de vista incomum e encontra-se num estado de revolta emocional.

Após certo tempo, se acalma e fica mais acostumado com essa condição ímpar.
Percebe que ainda tem um “corpo”, mas de uma natureza muito diferente e com
poderes muito diferentes do corpo físico que deixou para trás. Logo outras coisas
começam a acontecer. Outras pessoas vêm ao seu encontro para ajudá-lo. Vislumbra
os espíritos de parentes e de amigos que já faleceram, e um espírito doce e caloroso
de um tipo que ele nunca encontrou antes – um ser de luz – aparece à sua frente.
Esse ser faz uma pergunta para fazê-lo avaliar a própria vida e o ajuda no processo,
mostrando uma retrospectiva panorâmica e instantânea dos principais eventos de sua
vida. Em determinado momento, ele se vê se aproximando de algum tipo de barreira
ou fronteira, aparentemente representando o limite entre a vida terrena e a próxima
vida. Ainda assim, sente que deve voltar para a terra, que o momento de sua morte
ainda não chegou. Nesse ponto, resiste, pois agora foi envolvido por suas
experiências na vida depois da morte e não quer retornar. Sente-se repleto de
sentimentos intensos de alegria, amor e paz. No entanto, apesar de sua atitude, de
algum modo religa-se ao corpo físico e volta a viver.
Mais tarde, ao tentar contar o que se passara os outros, sente dificuldades. Em
primeiro lugar, não é possível encontrar palavras humanas adequadas para descrever
esses episódios sobrenaturais. Também percebe que os outros zombam da história,
então para de contá-la. Mesmo assim, a experiência afeta sua vida profundamente,
especialmente sua visão acerca da morte e seu relacionamento com a vida.

É importante ter em mente que essa narrativa não tem a intenção de ser a
representação da experiência de uma determinada pessoa. Em vez disso, é um
“modelo”, uma composição dos elementos comuns encontrados em várias histórias.
Introduzo-a aqui apenas para dar uma ideia preliminar e geral do que uma pessoa
que está morrendo pode vivenciar. Como se trata de uma abstração em vez de um
relato real, neste capítulo, discutirei em detalhes cada elemento comum, citando
muitos exemplos.

Entretanto, antes de fazer isso, alguns fatos precisam ser expostos para colocar o
resto de minha exposição da experiência de morrer num parâmetro adequado.

1. Apesar das semelhanças marcantes entre vários relatos, não há nenhum que
seja precisamente idêntico (embora alguns estivessem marcantemente
próximos).
2. Não encontrei nenhuma pessoa que relatasse todos os componentes da
experiência citada anteriormente. Muitos relataram a maioria deles, isto é, oito
ou mais, dentre os quinze.
3. Não existe nenhum elemento citado anteriormente, que todas as pessoas
tenham relatado, que apareça em todas as narrativas. No entanto, alguns
desses elementos chegam bem próximos de serem universais.
4. Não existe um único componente do meu modelo abstrato que apareça em
apenas um relato. Cada elemento apareceu em várias histórias separadas.
5. A ordem pela qual a pessoa em via de morrer atravessa os vários estágios
brevemente delineados anteriormente pode variar da ordem dada no ”meu
modelo teórico”. Para citar um exemplo, várias pessoas contaram ter visto o
“ser de luz” antes, ou ao mesmo tempo em que deixaram o corpo físico, e não
como no “modelo”, algum tempo depois. Entretanto, a ordem na qual os
estágios ocorrem no modelo é bastante típica, e grandes variações não são
comuns.
6. Quão profundamente a pessoa vivencia essa experiência hipotética completa
parece depender do fato de ela ter realmente passado por uma morte clínica
aparente, e se esse for o caso, por quanto tempo esteve nesse estado. Em
geral, as pessoas que foram declaradas “mortas” parecem relatar experiências
mais completas e detalhadas do que aquelas que apenas chegaram perto da
morte, e aquelas que estiveram “mortas” por um período mais longo vão mais a
fundo do que aquelas que estiveram “mortas” por um período mais curto.
7. Conversei com algumas pessoas que foram declaradas mortas, ressuscitadas e
que voltaram sem relatar nenhum desses elementos comuns. Na verdade, elas
dizem que não lembram nada sobre sua “morte”. De forma bastante
interessante, conversei com diversas pessoas que foram realmente declaradas
clinicamente mortas em ocasiões diferentes e com anos de distância, e elas
contam não ter vivenciado nada numa das ocasiões, mas que foram bastante
envolvidas pelas experiências da outra.
8. Deve ser enfatizado que estou contando relatos, experiências ou narrativas de
primeiro grau, que outras pessoas me passaram verbalmente durante as
entrevistas. Assim, quando ocorre num determinado relato, não implica
necessariamente que não aconteceu com a pessoa envolvida. Apenas quero
dizer que essa pessoa não me contou que isso tenha ocorrido, ou
definitivamente não fica claro em seu relato que tenha vivenciado isso. A partir
desse parâmetro, então, vamos observar alguns dos estágios e eventos comuns
das experiências de morrer.

INEFABILIDADE

A compreensão geral que temos do nosso idioma depende da existência de um


conjunto amplo de experiências comuns das quais quase todos nós participamos. Esse
fato gera uma dificuldade importante que complica toda a discussão do que vem a
seguir. Os eventos vividos por aqueles que passaram por uma quase-morte estão fora
do nosso conjunto de experiências, então pode-se esperar que essas pessoas tenham
algumas dificuldades linguísticas para expressar o que aconteceu com elas. Na
verdade, é precisamente isso o que acontece. As pessoas envolvidas caracterizam
uniformemente suas experiências como inexplicáveis, isto é, “inexprimíveis”.

Muitas pessoas fizeram comentários do tipo: “Simplesmente não há palavras para


expressar o que estou tentando dizer” ou: “Não há adjetivos e superlativos para
descrever isso”. Uma mulher expressou essa condição de maneira muito sucinta
quando disse:

Certo, tenho um problema verdadeiro ao tentar lhe contar isso, porque todas as
palavras que conheço são tridimensionais. Enquanto passava pela experiência, eu não
parava de pensar: “Bem, quando estava aprendendo geometria, sempre me disseram
que existiam apenas três dimensões, e simplesmente aceitei o fato. Mas os
professores estavam errados. Existem mais”. Claro que nosso mundo _ aquele em
que viemos agora _ é tridimensional, mas o próximo definitivamente não é. E é por
isso que é tão difícil falar sobre ele. Tenho que descrevê-lo com suas palavras, que
são tridimensionais. É o mais próximo que posso chegar disso, mas não é realmente
adequado. Não posso lhe dar um panorama completo.

OUVINDO AS NOTÍCIAS

Várias pessoas relatam ter ouvido seus médicos ou outros espectadores anunciar sua
morte. Uma mulher me contou o seguinte:

Eu estava no hospital, mas não sabiam o que havia de errado comigo. Então o
doutor James, meu médico, mandou-me para o andar de baixo, na radiologia, para
fazer uma tomografia do fígado a fim de que pudessem ter um diagnóstico. Primeiro,
testaram no meu braço a droga que usariam, já que eu tinha alergia a muitos
medicamentos. Mas, como não houve nenhuma reação, seguiram em frente. Quando
a usaram novamente, apaguei. Ouvi o radiologista que cuidava de mim ir até o
telefone e discar. Ele disse: “doutor James, matei sua paciente, a senhora Martin”. E
eu sabia que não estava morta. Tentei me mover e avisá-lo, mas não consegui.
Enquanto tentavam me ressuscitar, eu podia ouvi-los dizer quantos centímetros
cúbicos de sei lá o que precisavam me aplicar, mas não sentia a agulha da injeção.
Não sentia nada quando me tocavam.

Em outro caso, uma mulher que previamente sofrera vários episódios de problemas
cardíacos, foi acometida de uma parada cardíaca durante a qual quase perdeu a vida.
Ela diz:

De repente, contrai-me com terríveis dores no peito, como se uma faixa de


ferro tivesse sido presa rapidamente no meio do meu peito e se apertado em torno
dele. Meu marido e um amigo nosso ouviram quando caí e vieram correndo em meu
socorro. Encontrei-me numa escuridão profunda, e através dela pude ouvir meu
marido, como se estivesse muito distante dizer: “Desta vez não tem volta!” E meus
pensamentos eram: “É, não tem volta”.

Um rapaz que foi considerado morto após um acidente automobilístico diz:

Ouvi uma mulher que estava lá dizer: “Ele está morto?” e outra respondeu:
“Sim, está morto”.

Relatos desse tipo estão bem de acordo com o que os médicos e as demais pessoas
presentes lembram. Por exemplo, um médico me disse:

Uma paciente minha teve uma parada cardíaca pouco tempo antes de outro
cirurgião e eu começarmos a operá-la. Eu estava lá e vi suas pupilas dilatarem.
Durante algum tempo, tentamos ressuscitá-la, mas não obtivemos nenhum sucesso,
foi quando pensei que a tínhamos perdido. Disse ao outro médico que trabalhava
comigo: “Vamos tentar mais uma vez e então vamos desistir”. Dessa vez, fizemos o
coração voltar a bater e ela se recuperou. Mais tarde perguntei do que ela se
lembrava de sua “morte”. Ela disse que não lembrava muita coisa, exceto que me
ouviu dizer: “Vamos tentar mais uma vez e então vamos desistir”.

SENTINDO PAZ E TRANQUILIDADE

Muitas pessoas descrevem sentimento e sensações extremamente agradáveis durante


os primeiros estágios de suas experiências. Após um ferimento na cabeça, os sinais
vitais de um homem não eram possíveis de serem detectados. Conforme ele diz:

No local do ferimento, houve um golpe momentâneo de dor, mas depois toda


dor desapareceu. Tive a sensação de flutuar num espaço escuro. O dia estava
extremamente frio, mas mesmo assim, enquanto estava nessa escuridão, tudo o que
senti foi calor e um extremo conforto que nunca tinha vivenciado antes... Lembro-me
de ter pensado: “Devo estar morto”.

Uma mulher que foi ressuscitada depois de um ataque cardíaco comenta:

Comecei a experimentar os sentimentos mais maravilhosos. Não conseguia


sentir nada, exceto paz, conforto, calma – apenas tranquilidade. Sentia que todos os
meus problemas haviam desaparecido, e pensei comigo mesma: “Nossa, que paz e
tranquilidade! E não sinto mais dor”.

Outro homem lembra-se:

Eu tinha apenas um grande sentimento de solidão e paz... Foi lindo, minha


mente estava tão em paz!

Um homem que “morreu” em consequência de ferimentos sofridos no Vietnã diz


que quando foi atingido sentiu...

Uma imensa sensação de alívio. Não havia dor e nunca me sentira tão relaxado.
Eu estava confortável e tudo estava bom.

O RUÍDO

Em muitos casos, relata-se que várias sensações incomuns da audição ocorrem


durante ou próximo à morte. Às veze são sensações extremamente desagradáveis.
Um homem que “morreu” por vinte minutos durante uma operação no abdomem
descreve “um ruído realmente ruim vindo de dentro da cabeça. E isso me irritou
muito... nunca vou me esquecer daquele ruído”.

Em outros casos, os efeitos auditivos parecem assumir uma forma musical mais
agradável. Por exemplo, um homem que foi reavivado após ter sido declarado morto
ao chegar ao hospital conta que durante sua experiência de morte...
Eu ouvia o que pareciam ser sinos tocando, bem distante, enquanto flutuava ao
vento. Pareciam sinos de vento japoneses... esse era o único som que podia ouvir às
vezes.

Uma jovem que quase morreu com hemorragia interna associada a um distúrbio na
coagulação do sangue disse sobre o momento em que entrou em colapso:

“Comecei a ouvir um tipo de música realmente linda e majestosa”.

O TÚNEL ESCURO

Frequentemente, ao mesmo tempo em que ocorre o ruído, as pessoas tem a sensação


de serem puxadas muito rapidamente por um espaço escuro de algum tipo. Muitas
palavras diferentes são usadas para descrever esse espaço. Já ouvi a descrição desse
lugar como uma caverna, um poço, um canal, uma clausura, um túnel, um funil, um
vácuo, um vazio, um cano, um vale e um cilindro. Embora as pessoas usem
terminologias diferentes aqui, fica claro que todas estão tentando expressar a mesma
ideia. Vamos dar uma olhada em dois relatos em que a imagem do “túnel” aparece
excessivamente.

Isso aconteceu comigo quando eu tinha nove anos de idade. Já faz vinte e sete
anos, mas foi tão marcante que nunca esqueci. Numa certa tarde, fiquei muito doente
e fui levado às pressas para o hospital mais próximo. Quando cheguei, os médicos
decidiram que precisavam me colocar em coma induzido, mas não sei por quê.
Naquela época, usavam éter. Administraram aquilo colocando um pedaço de pano
sobre meu nariz, e quando fizeram isso, meu coração parou de bater, como me
contaram depois. Naquele momento, eu não sabia exatamente que era isso o que
tinha acontecido comigo, mas, de qualquer forma, quando aconteceu, passei por uma
experiência singular. Bem, a primeira coisa que aconteceu – agora vou descrever
como senti – foi ouvir um barulho de campainha muito ritmado brrrriiiimmm
bbbrrrriiiimmmm. A seguir, movi-me através de um – você vai achar isso estranho –
através de um lugar longo e escuro. Parecia um cano ou coisa parecida.
Simplesmente não dá para descrever. Estava me movendo, vibrando o tempo todo
com esse som de campainha.

Outro informante declara:

Tive uma reação alérgica muito séria com uma anestesia local e parei de
respirar – sofri uma parada respiratória. A primeira coisa que aconteceu – muito
rapidamente- foi atravessar um vácuo escuro, negro, numa velocidade
surpreendente. Acho que daria para comparar a um túnel. Parecia que eu estava
andando no carrinho de uma montanha russa num parque de diversões, atravessando
o túnel numa velocidade absurda.
Durante uma grave doença, um homem chegou tão próximo da morte que suas
pupilas dilataram e seu corpo começou a esfriar. Ele conta:

Eu estava num vazio completamente escuro. É muito difícil explicar, senti como
se estivesse me movimentando num vácuo, através da escuridão. Mesmo assim,
encontrava-me bastante consciente. Era como estar num cilindro sem ar dentro. Era a
sensação de estar no meio do caminho, com um pé aqui e outro em algum outro
lugar.

Um homem que “morreu” várias vezes após queimaduras graves e ferimentos


causados por uma queda diz:

Fiquei em choque por uma semana, e durante esse tempo, de repente,


simplesmente escapei para um vazio escuro. Parece que fiquei lá por um tempo longo
apenas flutuando e me movendo no espaço... Fiquei tão envolvido por esse vazio que
simplesmente não pensei em mais nada.

Antes do momento de sua experiência, que aconteceu quando ele era criança, um
homem sempre tinha tido medo da escuridão. Mesmo assim, quando seu coração
parou de bater por causa de ferimentos internos ocorridos num acidente de bicicleta,
ele conta que:

Tive a sensação de estar me movendo num vale profundo e muito escuro. A


escuridão era tão profunda, impenetrável, que não dava para ver absolutamente
nada, mas essa foi a experiência mais maravilhosa e despreocupada que se pode
imaginar.

Em outro caso, uma mulher que sofrera uma peritonite relata:

Meu médico já havia chamado meu irmão e minha irmã para me ver pela última
vez. Uma enfermeira me deu uma injeção para me ajudar a morrer mais facilmente.
As coisas à minha volta no hospital começaram a ficar cada vez mais distantes.
Enquanto recuavam, entrei de cabeça numa passagem estreita e muito, muito escura.
Parecia ter o tamanho suficiente para que eu passasse. Comecei a escorregar para
baixo, para baixo, para baixo...

Uma mulher, que esteve próxima da morte após um acidente de trânsito, fez um
paralelo com um seriado de televisão:

Houve uma sensação de paz e tranquilidade profundas, nenhum medo, e


encontrei-me num túnel – um túnel de círculos concêntricos. Pouco depois disso, vi o
seriado de TV chamado O Túnel do Tempo, no qual as pessoas voltam no tempo
através de um túnel em forma de espiral. Bem, acho que essa é a coisa mais parecida
que me aconteceu, não consigo pensar em mais nada.
Um homem que chegou muito próximo da morte traçou um paralelo um pouco
diferente, um paralelo com sua formação religiosa. Ele diz:

De repente, eu estava num vale muito escuro e muito profundo. Foi como se
houvesse uma trilha, quase uma estrada, através do vale, e eu caminhava por essa
passagem... Mais tarde, depois de estar bem, um pensamento veio à mente: “Bem,
agora sei o que a Bíblia quer dizer com “o vale da sombra da morte”, porque estive
lá...

FORA DO CORPO

É evidente que a maioria de nós, na maior parte do tempo, identifica-se com o corpo
físico. Claro que sabemos que temos ”mente” também. Mas para a maioria das
pessoas nossa “mente” parece muito mais efêmera do que nosso corpo. Afinal de
contas, talvez a “mente” não seja nada além do efeito da atividade elétrica e química
que ocorre no cérebro, que é parte do corpo físico. Para muitas pessoas, é uma tarefa
impossível até mesmo conceber como seria a existência de outra forma que não no
corpo físico, com o qual estão acostumados.

Antes de suas experiências, as pessoas que entrevistamos não eram, como grupo,
diferentes das pessoas comuns em relação a essa atitude. É por isso que, depois da
rápida passagem pelo túnel escuro, uma pessoa que está morrendo frequentemente
tem uma grande surpresa. Nesse momento, a pessoa pode se ver olhando para o
próprio corpo físico de um ponto de vista exterior a ele, como se fosse “um
expectador” ou “uma terceira pessoa no quarto” ou estivesse observando as imagens
e os eventos numa “peça de teatro” ou num “filme”. Agora vamos ver partes de
alguns relatos em que esses episódios extracorpóreos tão misteriosos são descritos.

Eu tinha dezessete anos. Meu irmão e eu estávamos trabalhando num parque


de diversões. Certa tarde decidimos nadar e alguns outros jovens decidiram ir
conosco. Alguém disse: “Vamos cruzar o lago”. Eu já havia feito isso em numerosas
ocasiões, mas naquele dia, por algum motivo, afundei quase no meio do lago...
Continuei me debatendo e, de repente senti como se estivesse distante do meu corpo,
distante de todos, no espaço, sozinho. Embora estivesse firme e permanecesse no
mesmo nível, vi meu corpo na água a um metro de distância, debatendo-se. Via meu
corpo por trás, um pouquinho para a direita. Ainda sentia como se tivesse uma forma
corporal inteira, mesmo enquanto estava fora do meu corpo. Era uma sensação de
leveza quase indescritível. Sentia-me como uma pluma.

Uma mulher recorda:

Cerca de um ano atrás, fui internada no hospital com problemas cardíacos e, na


manhã seguinte, deitada na cama do hospital, comecei a sentir uma forte dor no
peito. Apertei o botão ao lado da cama para chamar as enfermeiras, e elas entraram
e começaram a cuidar de mim. Era muito desconfortável ficar deitada sobre as costas,
então me virei, e ao fazê-lo parei de respirar e meu coração parou de bater. Foi
quando ouvi as enfermeiras gritarem. Enquanto elas gritavam, pude sentir que saía
do meu corpo e escorregava entre o colchão e a proteção lateral da cama – na
verdade, parece que passei pela proteção – até chegar ao chão. Logo, comecei a ficar
de pé, lentamente. Enquanto levantava, vi mais enfermeiras entrarem correndo no
quarto – devia haver uma dúzia delas. Coincidentemente, meu médico estava fazendo
visitas aos pacientes do hospital e foi chamado. Pensei: “O que será que ele está
fazendo aqui?” Flutuei até ficar acima do lustre e pude vê-lo logo abaixo do teto e
olhando para baixo. Então parei, flutuando logo abaixo do teto e olhando para baixo.
Sentia como se fosse um pedaço de papel que alguém soprara até o teto.

De lá de cima, pude observá-los no trabalho de ressuscitamento! Meu corpo estava


deitado ali, estendido sobre a cama, bem embaixo de mim, e todos estavam de pé em
volta dele. Ouvi uma enfermeira dizer: “Oh meu Deus” Ela morreu!”, enquanto outra
se inclinava para fazer respiração boca a boca. Eu estava olhando para a parte de trás
da sua cabeça enquanto ela fazia o procedimento. Nunca vou me esquecer de como
era o seu cabelo. Estava com um corte curto. Nesse momento, vi quando ligaram
uma máquina que estava lá e deram choques no meu peito. Quando disseram isso, vi
todo o meu corpo pular da cama e ouvi cada osso do meu corpo estalar. Foi a coisa
mais horrível que já presenciei!

Enquanto os via lá embaixo batendo no meu peito e esfregando meus braços e


pernas, eu pensava: “Para que tanto trabalho? Estou bem agora”.

Uma jovem informante declara:

Foi cerca de dois anos atrás, e eu tinha acabado de completar dezenove anos.
Estava levando uma amiga para casa no meu carro e, ao chegar num determinado
cruzamento, no centro da cidade, parei e olhei para dos dois lados, mas não vi
nenhum carro vindo. Comecei a atravessar o cruzamento e ouvi minha amiga gritar a
plenos pulmões. Quando olhei vi uma luz que me cegava, os faróis de um carro que
vinha em alta velocidade em nossa direção. Pude ouvir um som horrível - lateral do
meu carro sendo amassada – e houve um único instante durante o qual eu parecia
estar atravessando um espaço fechado e escuro. Foi muito rápido. Depois, era como
se eu estivesse flutuando a um metro e meio do chão, a uns quatro metros do carro,
eu diria, e pude ouvir o eco da batida esvaecer. Vi pessoas virem correndo e se
aglomerarem em volta do veículo e minha amiga sair do carro, obviamente em
choque. Pude ver meu próprio corpo nos destroços entre todas aquelas pessoas e
pude vê-las tentando retirá-lo, Minhas pernas estavam retorcidas e havia sangue por
toda parte.
Como se pode imaginar muito bem, alguns pensamentos e sentimentos sem paralelo
percorrem a mente das pessoas que se encontram nessa situação. Muitas delas
acham a ideia de estar fora do corpo tão inimaginável que, mesmo ao vivenciá-la,
sentem-se totalmente confusas em relação aos conceitos da coisa toda e não fazem a
ligação com a morte por um tempo considerável. Elas ficam imaginando o que está
acontecendo; porque de repente, podem se ver a distância, como um expectador?

As reações emocionais para esse estado estranho variam amplamente. A maioria das
pessoas relata, a princípio, um desejo desesperado de voltar ao corpo, mas não têm a
menor ideia de como proceder. Outros se lembram de ter sentido tanto medo que
beirava o pânico. Entretanto, alguns relatam reações mais positivas, como na
descrição a seguir:

Fiquei muito doente, e o médico me internou no hospital. Numa certa manhã,


uma névoa cinza e sólida se formou à minha volta, e saí do corpo. Tive a sensação de
estar flutuando enquanto saía do corpo, e olhei para trás para me ver na cama,
abaixo de mim; não senti medo. Foi calmo – havia muita paz e serenidade. Não
estava nem um pouco triste ou assustada. Era apenas uma sensação tranquila, e algo
que não temia. Senti que talvez estivesse morrendo, e que se não voltasse para o
meu corpo, estaria morta, falecida.

A mesma variação surpreendente se dá nas atitudes que pessoas diferentes têm em


relação ao corpo que deixaram para trás. É comum que a pessoa conte sobre
sentimentos de preocupação pelo corpo. Uma jovem, que era estudante de
enfermagem na época de sua experiência, expressa um medo compreensível:

Isso é meio engraçado, eu sei, mas na faculdade de enfermagem tentaram nos


convencer de que depois de morrermos, deveríamos doar nosso corpo para a ciência.
Bem, durante toda a experiência, observei-os tentando retomar minha respiração, e
fiquei pensando: “Não quero que usem esse corpo como um cadáver”.

Ouvi outras duas pessoas expressarem exatamente essa mesma preocupação quando
se viram fora do corpo. De maneira bastante interessante, as duas também estavam
na área da saúde – uma era médica e a outra, enfermeira.

Em outro caso, essa preocupação assumiu a forma de arrependimento. O coração de


um homem parou de bater após uma queda na qual seu corpo foi seriamente
estropiado, e ele recorda:

Em dado momento – agora sei que estava deitado na cama -, realmente, podia
ver-me na cama e o médico cuidando de mim. Não dava para entender aquilo, mas
eu olhava meu próprio corpo deitado ali. E me senti muito mal quando vi meu corpo e
tive consciência de como ele estava todo quebrado.
Várias pessoas me disseram ter sentimentos de estranheza em relação ao corpo,
como nesta passagem surpreendente:

Nossa, na certa, eu não tinha ideia de que era daquele jeito. Sabe, só costumo
me ver em fotos ou na frente do espelho, e dessas duas formas a aparência é plana.
Mas de repente lá estava eu – ou meu corpo – e pude ver-me. Definitivamente pude
ver-me, tive uma visão completa, a uma distância de um metro e meio. Foram
precisos alguns instantes para me reconhecer.

Em uma descrição, essa sensação de estranheza assumiu uma forma mais extrema e
engraçada. Um médico conta como durante sua morte clínica esteve ao lado da cama
observando seu próprio cadáver, que tinha a cor acinzentada que o corpo assume
depois da morte. Desesperado e confuso, ele estava tentando decidir o que fazer.
Temporariamente, decidiu simplesmente ir embora, já que se sentia muito
incomodado. Quando mais jovem, ele ouvira histórias de fantasmas contadas pelo avô
e, paradoxalmente, “não gostava de estar perto dessa coisa que parecia um corpo
morto – mesmo que fosse o meu!”

Em outro extremo, alguns me disseram que não tinham quaisquer sentimentos


especiais em relação ao corpo. Uma mulher, por exemplo, sofreu um ataque cardíaco
e estava certa de que estava morrendo. Sentiu que estava sendo puxada para fora do
corpo através da escuridão e que se afastava rapidamente. Ela diz:

Nem olhei para o meu corpo. Oh, claro que sabia que ele estava lá, e poderia
tê-lo visto se tivesse olhado. Mas não queria vê-lo, nem um pouquinho, porque sabia
que tinha feito o melhor na minha vida, e estava voltando minha atenção agora para
essa nova realidade. Eu sentia que olhar para trás e ver meu corpo seria olhar para o
passado, e eu estava determinada a não fazer isso.

De modo similar, a garota cuja experiência extracorpórea aconteceu depois de um


acidente em que sofreu ferimentos sérios diz:

Pude ver meu próprio corpo preso às ferragens entre todas as pessoas que se
aglomeraram, mas, sabe, eu não tinha nenhum sentimento por ele. Era como se fosse
um ser humano completamente diferente, ou talvez até mesmo um simples objeto...
sabia que era meu corpo, mas não sentia nada por ele.

Apesar do mistério do estado de desencarnação, a situação cai sobre a pessoa à beira


da morte tão de repente que pode levar algum tempo antes que o significado daquilo
que está sendo vivenciado seja completamente compreendido. Talvez a pessoa fique
fora do corpo por algum tempo, tentando entender desesperadamente todas as coisas
que estão acontecendo e as que estão passando pela sai cabeça, antes de perceber
que está morrendo, ou até mesmo que já esteja morto.
Quando a pessoa se dá conta disso, essa percepção pode vir com uma força
emocional poderosa e provocar pensamentos impressionantes. Uma mulher lembra-se
de ter pensado:”Oh, estou morta! Que adorável!”

Um homem disse que o pensamento que veio à sua cabeça foi: “Deve ser isso que as
pessoas chamam de morte”. Mesmo quando essa percepção se dá, ela pode ser
acompanhada por um sentimento de confusão e até mesmo por uma certa recusa em
aceitar o próprio estado. Um rapaz, por exemplo, lembra-se de ter refletido sobre a
promessa bíblica de viver “setenta anos”, e protestado que mal chegara aos vinte.
Uma jovem forneceu uma descrição impressionante de tais sentimentos quando
contou que:

Pensei que estivesse morta, e não estava preocupada por estar morta, mas
simplesmente por não conseguir entender para onde deveria ir. Meus pensamentos e
minha consciência eram exatamente como em vida, e eu simplesmente não conseguia
entender nada. Ficava pensando: “Para onde vou? O que vou fazer? E “Meu Deus,
estou morta! Não dá para acreditar, porque ninguém realmente acha que vai morrer
de verdade”. Sempre é algo que vai acontecer com outra pessoa; embora você saiba
disso, no fundo ninguém acredita de verdade... Foi então que decidi que ia esperar
até que toda a comoção se acalmasse e eles carregassem meu corpo dali, para depois
resolver aonde ir.

Em um ou dois casos que estudei, as pessoas à beira da morte, cujo espírito, mente,
consciência... (ou seja lá o nome que você queira dar) foi desprendida de seu corpo
dizem que, após o desprendimento não sentiam que estavam em nenhum outro tipo
de “corpo”. Sentiram como se fossem “pura” consciência. Um homem relata que
durante sua experiência ele sentiu como se fosse “capaz de ver tudo à minha volta –
incluindo meu corpo todo deitado na cama – sem ocupar nenhum espaço”, isto é,
como se ele fosse um ponto de consciência. Alguns outros dizem que realmente não
conseguem lembrar se estavam em algum tipo de “corpo” ou não depois de sair do
corpo físico, porque estavam envolvidos demais pelos eventos à sua volta.

Entretanto, a grande maioria dos meus entrevistados relata que se encontraram em


um outro corpo após o desprendimento do corpo físico. Imediatamente, no entanto,
estávamos numa área com a qual é extremamente difícil de lidar. Esse “novo corpo” é
um dos dois ou três aspectos das experiências de morte em que a inadequação da
linguagem humana representa o maior obstáculo. Quase todas as pessoas que me
contaram sobre esse ”corpo” ficaram frustradas em algum momento e disseram: “Não
dá para descrever”, ou fizeram algum comentário no mesmo sentido.

Contudo, as descrições desse corpo trazem uma forte semelhança com o antigo.
Assim, embora indivíduos diferentes usem palavras diferentes e façam analogias
diferentes, esses modos variantes de expressão parecem estar sempre dentro da
mesma arena. Os vários relatos também estão em muita concordância com as
propriedades e características gerais do novo corpo. Portanto, para adotar um termo
bastante bom, que resume sua propriedade, e que foi usado por alguns dos meus
entrevistados, de agora em diante vou chamá-lo de “corpo espiritual”.

É mais provável que as pessoas próximas da morte tomem consciência de seu corpo
espiritual no contexto de suas limitações. Quando estão fora de seu corpo físico,
descobrem que, embora tentem desesperadamente contar sua situação aos outros,
ninguém parece ouvi-los. Isso é ilustrado muito bem no trecho da história de uma
mulher que sofreu uma parada respiratória e foi carregada para a sala de emergência,
onde a tentativa de ressuscitá-la foi feita:

Eu os vi tentando me ressuscitar. Foi realmente estranho. Não estava muito no


alto; era quase como se estivesse num pedestal, mas não muito acima deles, talvez
apenas olhando sobre eles. Tentei conversar, mas ninguém podia me ouvir, ninguém
me escutava.

Para complicar o fato de aparentemente ser inaudível para as pessoas à sua volta, a
pessoa num corpo espiritual logo percebe que também é invisível. A equipe médica e
os outros que estão em volta do corpo físico podem olhar diretamente para onde a
pessoa está em seu corpo espiritual, sem dar o menor sinal de que a estão
enxergando. No corpo espiritual, também falta solidez; parece que podem atravessar
com facilidade os objetos físicos do ambiente, e esse corpo não é capaz de agarrar
nenhum objeto ou pessoa, nem tocá-los.

Os médicos e enfermeiras batiam em meu corpo tentando iniciar a transfusão e


me fazer voltar, e eu ficava tentando dizer: “Deixe-me em paz, só quero que me
larguem. Parem de bater em mim”. Mas eles não ouviam. Então tentei tirar as mãos
deles e evitar que batessem no meu corpo, mas nada aconteceu. Não dava para fazer
nada. Era como se... realmente não sei o que aconteceu, mas não dava para tocá-los.
Aparentemente eu estava pegando suas mãos e tentando movê-las. Mesmo assim,
quando eu fazia o movimento, as mãos ainda estavam lá. Não sei se a minha mão
atravessava as coisas, rodeava ou sei lá o que, não sentia pressão alguma contra
minhas mãos quando tentava mover as mãos deles.

Ou,

As pessoas vinham de todas as direções para chegar até o local do acidente. Eu


podia vê-las, eu estava no meio de uma passagem muito estreita. De qualquer forma,
enquanto se aproximavam, pareciam não me notar. Simplesmente continuavam
andando com seu olhar para frente. Quando chegavam realmente perto, eu tentava
me virar para sair do caminho, mas eles simplesmente passavam através de mim.
Ademais, é invariavelmente relatado que esse corpo espiritual também não tem peso.
A maioria se dá conta disso quando, assim como em algum dos trechos citados
anteriormente, encontram-se flutuando no teto de algum cômodo, no ar. Muitos
descrevem como uma “sensação de flutuar”, ou “sensação de falta de peso”, ou de
“estar à deriva” em associação com seu novo corpo.

Normalmente, enquanto em nosso corpo físico, temos muitos modos de percepção


que nos informam onde nosso corpo e suas várias partes estão no espaço em um
determinado momento e se elas estão se movendo. Claro que a visão e o senso de
equilíbrio são importantes, mas existe outro sentido relacionado. A cinestesia é nosso
sentido do movimento e tensão em nossos tendões, articulações e músculos.
Geralmente não estamos cientes das sensações que chegam até nós por meio do
nosso sentido cinestésico, porque nossa percepção foi entorpecida pelo uso quase
constante desse sentido. Entretanto, suspeito que se esse sentido fosse retirado
repentinamente, imediatamente perceberíamos sua ausência. E, de fato, várias
pessoas comentaram que estavam cientes da falta de sensação física do peso,
movimento e posição corporal quando estavam em seu corpo espiritual.

Essas características de corpo espiritual, que a princípio parecem ser limitações,


podem, com igual validade, ser vistas como ausência de limitações. Pense desta
forma: uma pessoa no corpo espiritual está numa posição privilegiada em relação ás
outras pessoas à sua volta. Ela pode ver e ouvi-los, mas não pode ser vista nem
ouvida. Muitos espiões considerariam isso uma condição invejável. Do mesmo modo,
embora a maçaneta pareça atravessar a mão quando tocada, isso realmente não
importa, porque a pessoa logo percebe que pode simplesmente atravessar a porta.
Viajar, depois que se pega o jeito, parece ser excepcionalmente fácil nesse estado. Os
objetos físicos não apresentam nenhuma barreira, e o movimento de um lugar para
outro pode ser extremamente rápido, quase instantâneo.

Além disso, apesar da falta de percepção para as pessoas em corpo físico, todos os
que vivenciaram essa realidade concordam que o corpo espiritual ainda é algo
impossível de descrever. Concorda-se que o corpo espiritual tem uma forma ou
aspecto (às vezes como uma nuvem redonda ou amorfa, outras essencialmente a
mesma forma do corpo físico) e até mesmo partes (projeções ou superfícies
semelhantes aos braços, pernas, cabeça, etc). Mesmo quando sua forma é relatada
como uma configuração arredondada, frequentemente se diz que ela apresenta
extremidades definidas, uma parte superior e outra inferior, e até mesmo as partes já
mencionadas.

Já ouvi esse novo corpo ser descrito em termos muito diferentes, mas se pode
prontamente notar que muito da mesma ideia está sendo formulada em cada caso. As
palavras e frases que foram usadas por várias pessoas incluem uma névoa, uma
nuvem, uma fumaça, um vapor, uma transparência, uma nuvem de cores, uma
insubstancialidade, uma forma de energia e outras que expressam significados
similares.

Finalmente, quase todos comentam sobre a ausência de tempo nesse estado


extracorpóreo. Muitos dizem que, embora devam descrever seu interlúdio no corpo
espiritual em termos temporais (já que a linguagem humana é temporal), o tempo
não era exatamente um elemento de sua experiência como é na vida física. Aqui
estão as passagens de cinco entrevistas em que alguns desses aspectos fantásticos
da existência no corpo espiritual são relatados em primeira pessoa:

1. Perdi o controle do carro numa curva, o carro saiu da estrada e voou no ar.
Lembro-me de ver o céu azul e que o carro ia cair numa vala. Na hora em
que o carro saiu da estrada, disse para mim mesma: “Vou sofrer um
acidente”. Nesse momento, meio que perdi minha noção de tempo e minha
realidade física no que dizia respeito ao meu corpo e perdi o contato com o
meu corpo. Senti meu ser, ou minha existência, ou meu espírito – ou seja lá
o nome que você queira dar – saindo de mim, subindo pela cabeça. E não era
nada que machucasse, era como levitar e estar sobre mim...
[Meu “ser”] parecia ter uma densidade, quase isso, mas não uma densidade
física – meio tipo, sei lá, ondas ou coisa parecida, eu acho. Nada realmente
físico, quase como se estivesse eletrizado. Mas parecia haver alguma coisa ...
era pequeno, e parecia ser circular, sem contornos rígidos. Dá para comparar
com uma nuvem ... parecia quase como se fosse seu próprio invólucro...
Ao sair do meu corpo, pareceu que a extremidade maior saiu primeiro e a
pequena, por último... Foi uma sensação muito leve, muito mesmo. Não
havia nenhuma tensão no meu corpo [físico]; a sensação era totalmente
separada. Meu corpo não tinha peso...
O ponto mais impressionante de toda a experiência foi o momento em que
meu ser foi suspenso acima da parte frontal da minha cabeça. Foi quase
como se tentasse decidir se queria partir ou ficar. Foi aí que pareceu que o
tempo tinha parado. No começo e no fim do acidente, tudo se moveu muito
rápido, mas, nesse momento em especial, mais ou menos no meio, enquanto
o meu ser era suspenso acima de mim e o carro ia em direção à vala, parece
que o carro demorou muito para chegar lá, e durante esse tempo eu não
estava realmente muito envolvida com o carro, ou com o acidente, ou com
meu próprio corpo – apenas com minha mente...
Meu ser não tinha características físicas, mas preciso descrevê-lo em termos
físicos... poderia descrevê-lo de tantas maneiras, com tantas palavras, mas
nenhuma delas seria precisa, exata. É tão difícil descrever!
Finalmente, o carro se chocou contra o chão e capotou, mas meus únicos
ferimentos foram uma torção no pescoço e um pé inchado.
2. [Quando saí do corpo físico] foi como se saísse do meu corpo e entrasse em
outra coisa. Não achei que fosse simplesmente nada. Era outro corpo... mas
não outro corpo humano regular. Era um pouco diferente. Não exatamente
como um corpo humano, mas também não era como uma grande massa de
substância. Havia uma forma, mas nenhuma cor. E sei que ainda tinha
alguma coisa que se pode chamar de mão.
Não dá para descrever. Eu estava mais fascinado com tudo à minha volta _
ver meu próprio corpo ali, e tudo mais – então não pensei no tipo de corpo
em que estava. E tudo isso pareceu passar muito depressa. O tempo não era
exatamente importante, mas ao mesmo tempo era. As coisas parecem
acontecer mais rápido depois que você sai do corpo.
3. Lembro-me de ser carregado para a sala de cirurgia e as horas seguintes
foram um período crítico. Durante esse tempo, eu não parava de sair e entrar
no meu corpo físico, e podia vê-lo diretamente de cima. Mas, enquanto isso
acontecia, eu ainda estava num corpo – não um corpo físico, mas algo que
posso descrever melhor como uma forma de energia. Se tivesse de colocar
em palavras, diria que era um ser transparente e espiritual em oposição a
um ser material. Mesmo assim, ele tinha partes definitivamente diferentes.
4. Quando meu coração parou de bater, senti como se estivesse numa bola e
quase como se eu fosse uma pequena esfera – como as bolinhas de plástico
das armas de brinquedo airsoft – dentro dessa bola maior. Simplesmente não
tenho como descrever isso para você.
5. Eu estava fora do meu corpo olhando para ele a cerca de cem metros de
distância, mas ainda estava pensando, exatamente como na vida física. E
onde eu estava pensando era aproximadamente na minha altura corpórea
normal. Não estava num corpo, como tal. Dava para sentir alguma coisa –
como se fosse uma capsula, ou algo com uma forma clara. Não dava
realmente para ver; era como se fosse transparente, mas não exatamente.
Era como se eu estivesse simplesmente ali – uma energia, talvez como uma
pequena bola de energia. E na verdade eu não estava ciente de sensação
corpórea alguma – temperatura, ou qualquer coisa assim.

Em suas decisões, outras pessoas mencionaram brevemente a semelhança


de forma entre o corpo físico e o corpo novo. Uma mulher me disse como se
sentiu quando estava fora do corpo: ”Ainda sentia a forma corporal inteira,
pernas, braços, tudo – mesmo quando não tinha peso”. Uma outra senhora
que observou a tentativa de reavivar seu corpo a partir de um ponto um
pouco abaixo do teto diz: “Eu ainda estava num corpo. Estava estendida e
olhando para baixo. Mexi minhas pernas e percebi que uma delas estava
mais quente do que a outra”.
Assim como o movimento é desimpedido nesse estado espiritual, o mesmo
acontece com o pensamento, como alguns recordam. Várias vezes, recebi
informações de que uma vez que se acostumam com sua nova situação, as
pessoas que passam por essa experiência começam a pensar com mais
lucidez e rapidez do que na existência física. Por exemplo, um homem
relatou-me o que aconteceu enquanto estava “morto”:
Coisas que não eram possíveis, são nesse momento. Sua mente fica
muito clara. É muito legal. Minha mente pegou tudo de primeira, depois de
um tempo, tudo o que eu estava vivenciando chegou a ponto de significar
algo para mim de alguma forma.

A percepção no novo corpo é, ao mesmo tempo, parecida e diferente da percepção no


corpo físico. De certa maneira, a forma espiritual é mais limitada. Como vimos, a
cinestesia como tal está ausente. Em cerca de duas situações, as pessoas me
disseram que não tinham sensação da temperatura, enquanto na maioria dos casos as
sensações de um “calor” confortável são relatadas. Ninguém em todos os casos
estudados relatou quaisquer odores ou sabores enquanto estavam fora do corpo
físico.

Por outro lado, os sentidos que correspondem aos sentidos físicos da visão e da
audição permanecem intactos no corpo espiritual e parecem realmente ampliados e
mais perfeitos do que quando na vida física. Um homem disse que enquanto estava
“morto”, sua visão parecia incrivelmente mais poderosa e, em suas palavras: “Não dá
para entender como eu conseguia ver tão longe”. Uma mulher que recorda essa
experiência nota que “parecia como se esse sentido espiritual não tivesse limitações,
como se eu pudesse olhar para qualquer lugar, para todos os lugares”. Esse fenômeno
é descrito em termos gráficos, no próximo trecho, em uma entrevista com uma
mulher que esteve fora do corpo após um acidente:

Havia muita ação acontecendo, e pessoas correndo em volta da ambulância. E


sempre que eu olhava para as pessoas, imaginando o que elas estavam pensando,
via-me perto delas, como se fosse um zoom – exatamente como a lente de zoom, e
eu estava lá. Mas parecia que parte de mim – vou chamar de mente – ainda estava
no lugar de antes, a vários metros do meu corpo. Quando eu queria ver alguém
distante, parecia que parte de mim, como um rastreador, ia até lá. E me deu a
impressão naquele momento de que se alguma coisa acontecesse em qualquer lugar
do mundo eu poderia ir para lá.

A “audição” no estado espiritual pode aparentemente ser chamada assim apenas por
analogia, e a maioria diz que não ouve realmente vozes e sons físicos. Em vez disso,
parecem captar os pensamentos das pessoas à sua volta, e, como veremos mais
tarde, esse tipo de transferência direta de pensamentos pode ter um papel importante
nos últimos estágios das experiências de morte.
Como uma senhora diz:

Eu podia ver as pessoas à minha volta, podia entender o que estavam dizendo,
mas não ouvia os sons, como estou ouvindo você. Era mais como saber o que
estavam pensando, exatamente o que estavam pensando, mas apenas na minha
mente, não em seu vocabulário real. Eu já sabia um segundo antes de abrirem a
boca para falar.

Finalmente, com base num relatório único e muito interessante, dá a impressão de


que mesmo danos severos no corpo físico não afetam de maneira nenhuma o corpo
espiritual. Nesse caso, um homem perdeu a maior parte da perna no acidente que
resultou em sua morte clínica. Ele sabia disso porque via o corpo danificado
claramente, a distância, enquanto o médico cuidava dele. Mesmo assim, ele nos conta
o que sentiu quando estava fora do corpo.

Eu podia sentir o meu corpo e ele estava inteiro. Eu sabia disso. Sentia-me
inteiro e sentia que tudo estava ali, embora não estivesse.

Nesse estado desencarnado, então, a pessoa fica afastada dos outros. Ela pode ouvir
as outras pessoas e entender seus pensamentos completamente, mas os outros não
são capazes de vê-la nem de ouvi-la. A comunicação com outros seres humanos é
efetivamente rompida, até mesmo pelo sentido do tato, já que o corpo espiritual não
tem solidez. Portanto, não é de se surpreender que, depois de um tempo nesse
estado, sentimentos profundos de isolamento e solidão se instalem. Como um homem
colocou, ele podia ver tudo à sua volta no hospital – todos os médicos, enfermeiros e
outros membros da equipe desempenhando suas tarefas. Mesmo assim, não podia se
comunicar com ele de maneira nenhuma, então “estava desesperadamente sozinho”.

Muitos outros descreveram os sentimentos intensos de solidão que os dominaram


nesse momento.

Minha experiência e todas as coisas que estava vivenciando eram muito bonitas,
mas indescritíveis, queria que os outros estivessem lá comigo para ver também e
tinha a sensação de que nunca seria capaz de descrever para ninguém o que eu
estava vendo. Tinha a sensação de estar sozinho porque queria alguém ali para
vivenciar tudo comigo. Mas eu sabia que mais ninguém poderia estar ali. Sentia que
estava num mundo particular naquele momento. Realmente senti um pouco de
depressão nessa hora.

Ou,

Eu não era capaz de tocar em nada, não era capaz de me comunicar com
nenhuma pessoa à minha volta. Era uma sensação maravilhosa e solitária, um
sentimento de isolamento completo, sabia que estava completamente sozinho,
solitário.
E novamente,

Eu estava perplexa, não podia acreditar que aquilo estivesse acontecendo. Nem
tampouco estava preocupada ou inquieta do tipo: “Oh, não, morri e meus pais foram
deixados pra trás e ficarão tristes, e nunca os verei de novo”. Nada disso passou pela
minha cabeça.

O tempo todo eu estava ciente de que estava sozinha, muito sozinha – quase
como se fosse uma visitante em outro lugar. Era como se todas as relações tivessem
sido rompidas. Sei – era como se não houvesse amor ou nenhuma outra coisa. Tudo
era muito técnico. Não entendo, na verdade.

Entretanto, os sentimentos de solidão da pessoa à beira da morte logo são dissolvidos


conforme a pessoa se aprofunda em sua experiência de quase-morte. Em certo
momento, outras pessoas se aproximam dela para oferecer ajuda na transição que
está vivenciando. Essas pessoas podem assumir a forma de outros espíritos,
frequentemente parentes ou amigos falecidos que o indivíduo conhecera enquanto
estava vivo. Num número maior de casos, entre aqueles que entrevistei, um ser
spiritual de uma natureza muito diferente aparece. Nas próximas poucas exceções
vamos observar tais encontros.

ENCONTRANDO OUTRAS PESSOAS

Várias pessoas me contaram que em certo momento enquanto ”morriam” – às vezes,


logo no início da experiência; outras , somente depois de outros eventos – deram-se
conta da presença de outros seres espirituais nas proximidades, que aparentemente
estavam ali para acamá-las na transição para a morte, ou para avisar que o momento
da morte não tinha chegado ainda e que deveriam retornar ao corpo físico.

Passei por essa experiência quando estava dando à luz uma criança. O parto foi
muito difícil e perdi muito sangue. O médico desistiu e avisou meus parentes que eu
estava morrendo. Entretanto, eu estava bastante alerta durante tudo isso, enquanto o
ouvia dizer isso, senti que estava voltando. Quando voltei, percebi que todas essas
pessoas estavam ali, pareciam quase multidões, flutuando no teto da sala. Eram
todas pessoas conhecidas minhas, mas que haviam falecido. Reconheci minha avó e
uma garota que conhecera quando estava na escola e muitos outros parentes e
amigos. Parecia que eu via o rosto e sentia a presença deles. Todos pareciam felizes.
Foi uma ocasião muito feliz, e senti que eles tinham vindo para me proteger e
orientar. Era quase como se estivesse indo para casa, e eles estavam ali para me
receber ou acolher. Durante todo esse tempo, tive a sensação de que tudo era leve e
lindo. Foi um momento lindo e glorioso.

Um homem recorda:
Várias semanas antes de quase morrer, um grande amigo meu, Bob, tinha sido
assassinado. No instante em que saí do corpo, tive a sensação de que Bob estava ali
parado, ao meu lado, pois podia vê-lo na minha mente e senti que ele estava ali, mas
era estranho. Eu não o via como um corpo físico, podia ver coisas, mas não na forma
física, mas mesmo assim tudo estava muito claro, suas feições e todo o resto. Isso faz
sentido? Ele estava lá, mas não tinha um corpo físico. Era como um tipo de corpo
transparente, e eu podia sentir cada parte dele – braços, pernas, e assim por diante –
mas não o estava vendo fisicamente. Não pensei que era estranho no momento
porque eu não precisava realmente vê-lo com meus olhos. De qualquer forma, eu não
tinha olhos.

Perguntei: “Bob, para onde vou agora? O que aconteceu? Estou morto ou não?” E ele
não respondeu, não disse uma só palavra. Mas, com frequência, enquanto eu estava
no hospital, ele ficou ali, e perguntei novamente: “O que está acontecendo?”, mas
nunca houve resposta. Então, no dia em que os médicos disseram “ele vai
sobreviver”, ele partiu. Não o vi mais nem senti sua presença. Foi quase como se ele
estivesse esperando até que eu passasse aquela última fronteira para me contar e
dizer os detalhes sobre o que estava acontecendo.

Em outros casos, os espíritos que as pessoas encontram não são pessoas que
conheciam na vida física. Uma mulher disse ter visto, durante sua experiência
extracorpórea, não apenas seu próprio corpo espiritual transparente, mas também
outro corpo, de outra pessoa que havia morrido muito recentemente. Ela não sabia
quem era essa pessoa, e fez o seguinte comentário: “Eu não via essa pessoa, esse
espírito, como tendo uma idade específica, não mesmo. Eu nem ao menos tinha
sensação de tempo”.

Em alguns casos, as pessoas acreditaram que os seres que encontraram eram seus
“espíritos guardiães”. Um homem ouviu de tal espírito: “Ajudei-o neste estágio da sua
existência, mas agora vou entregá-lo aos outros”. Uma mulher me disse que enquanto
saía do corpo, detectou a presença de dois outros seres espirituais, e eles se
identificaram como seus ‘auxiliares espirituais”

Em dois casos muito similares, as pessoas contaram ter ouvido uma voz que dizia que
ainda não estavam mortos, e que deveriam voltar. Como uma dessas pessoas conta:

Ouvi uma voz, não uma voz de homem, mas uma audição além dos sentidos
físicos, dizendo o que eu deveria fazer para retornar, e não senti medo de voltar ao
meu corpo físico.

Finalmente, os seres espirituais podem assumir uma figura mais amorfa:

Enquanto estive morta, nesse vazio, conversei com as pessoas – e mesmo


assim, não posso dizer que conversei com alguma pessoa material. Todavia, eu tinha
a impressão de que havia pessoas à minha volta, podia sentir a presença delas e
sentir seus movimentos. Às vezes, conversava com uma delas, mas não podia vê-las.
E sempre que imaginava o que estava acontecendo, de que tudo estava bem, de que
eu estava quase morrendo, mas que tudo ficaria bem. Portanto, minha condição
nunca me preocupou, pois sempre recebia uma resposta para toda pergunta que
fazia. Eles não deixaram minha mente vazia.

O SER DE LUZ

Talvez, o elemento comum mais incrível nos relatos que estudei, e certamente o que
tem um efeito mais profundo no indivíduo, é o encontro com uma luz muito brilhante.
Tipicamente, na sua primeira aparição, essa luz é turva, mas rapidamente fica mais
brilhante, até que alcança um brilho de outro mundo. No entanto, embora essa luz
(geralmente descrita como branca ou “clara”) seja de um brilho indescritível, muitos
chegam ao detalhe específico de que ela não agride os olhos de maneira nenhuma,
nem ofusca, nem os impede de ver outras coisas à sua volta (talvez porque nesse
momento eles não tenham “olhos” físicos para serem ofuscados).

Entretanto, apesar da manifestação incomum dessa luz, nenhuma pessoa expressou


dúvida de que fosse um ser, um “ser de luz”. Não apenas isso, trata-se de um ser
pessoal. Ele tem uma personalidade muito definida. O amor e carinho que emanam
desse ser para a pessoa que está morrendo vão além das palavras, e o doente se
sente completamente cercado e envolvido por isso, completamente confortável e
aceito na presença desse ser. Ele sente uma atração magnética por essa luz, sendo
irresistivelmente atraído por ela.

De maneira interessante, embora a descrição acima do ser de luz seja invariável, a


identificação do ser varia de indivíduo para indivíduo e parece ser amplamente uma
função da formação religiosa, estudos ou crenças da pessoa envolvida. Assim, a
maioria dos cristãos identifica a luz com Cristo, e às vezes, traçam paralelos bíblicos
para apoiar sua interpretação. Uma mulher e um homem judeus identificaram a luz
como um “anjo”. No entanto, ficou claro, em ambos os casos, que os indivíduos não
queriam dizer que o ser tinha asas, tocava harpa ou até mesmo que tinha uma forma
ou aparência humana. Havia apenas a luz. O que cada um estava tentando explicar é
que receberam o ser como um emissário, ou um guia. Um homem sem crenças ou
estudos religiosos antes de sua experiência simplesmente identificou o que viu como
um “ser de luz”. O mesmo rótulo foi usado por uma senhora de fé cristã, que
aparentemente não sentiu compulsão alguma para chamar a luz de Cristo.

Logo depois de sua aparição, o ser começa a se comunicar com a pessoa que está
fazendo a transição. Notavelmente, essa comunicação é do mesmo tipo direto que
vimos anteriormente na descrição de como uma pessoa no corpo espiritual pode
“captar os pensamentos” daqueles à sua volta. Pois, aqui novamente, as pessoas
declaram que não ouviram nenhuma voz ou som físico algum vindos do ser, nem
responderam a ele por meio de sons audíveis. Em vez disso, narram que a
transferência direta e desimpedida de pensamentos ocorre de forma tão clara que não
há possibilidade de não entender ou mentir para a luz.

Ademais, essa troca desimpedida nem ao menos acontece na língua materna da


pessoa. Mesmo assim, é possível entender perfeitamente o seu teor e tomar
consciência dele instantaneamente. Não é possível traduzir os pensamentos e trocas
que ocorreram enquanto a pessoa estava perto da morte para a linguagem humana
que agora deve utilizar, depois de ter voltada à vida.

O próximo passo da experiência ilustra claramente a dificuldade de traduzir essa


linguagem não falada. Geralmente as pessoas com quem conversei tentam formular o
pensamento numa questão. Entre as traduções que escutei estão: “Você está
preparado para morrer?”, “Você está pronto para morrer?”, “O que você fez com a sua
vida para me mostrar?, e “O que você fez com a sua vida é suficiente?. As duas
primeiras formulações que enfatizam a “preparação” podem, a princípio, parecer ter
um sentido diferente do segundo par, que enfatiza a “realização”. Entretanto, algum
apoio para o meu próprio pensamento de que todos estão tentando expressar a
mesma ideia vem da narrativa de uma mulher que disse o seguinte:

A primeira coisa que ele me falou foi: ele perguntou se eu estava pronta para
morrer, ou o que eu tinha feito com minha vida que quisesse lhe mostrar.

Além disso, até mesmo no caso de formas mais incomuns para formular a “questão”,
após elucidação, tudo acaba tendo a mesma força. Por exemplo, um homem prestes a
morrer me disse:

A voz me perguntou: “Vale a pena?” E isso queria dizer se o tipo de vida que
andara levando até aquele momento parecia valer a pena, com tudo o que eu sabia
agora.

Todos afirmam que essa pergunta, por mais fundamental e profunda que possa ser
em seu impacto emocional, não é feita de maneira nenhuma em tom de condenação.
Todos parecem concordar que o ser não dirige a pergunta para acusá-los ou
ameaçá-los, pois ainda sentem total amor e aceitação vindos da luz, não importa qual
possa ser a resposta. Em vez disso, a questão parece ser formulada para fazê-los
pensar sobre a vida. Se você quiser, pode-se dizer que é uma questão socrática, uma
pergunta feita não para obter informações, mas para ajudar a pessoa que está sendo
questionada a prosseguir pelo caminho da verdade sozinha. A seguir, vamos ver
algumas descrições desse ser fantástico em primeira mão.
1. Ouvi os médicos dizerem que eu estava morto e foi quando comecei a sentir
como se estivesse cambaleando, mais ou menos como se flutuasse pela
escuridão, que era um tipo de cela. Não há palavras para descrever. Tudo estava
muito escuro, exceto que, muito distante de mim, podia ver uma luz. Era uma
luz muito brilhante, mas não muito grande a princípio. Ela ficou maior, conforme
eu chegava mais perto. Eu estava tentando chegar à luz na outra extremidade,
porque sentia que era Cristo, e estava tentando chegar àquele ponto. Não foi
uma experiência assustadora. Foi algo mais ou menos agradável, pois, sendo
um cristão, relacionei a luz com Cristo. Então ouvi: “Eu sou a luz do mundo”. E
eu disse a mim mesmo: “Se for isso, se devo morrer, então sei quem espera por
mim no final, ali naquela luz”.
2. Levantei-me e caminhei até o corredor para pegar água, e foi nesse momento,
como descobriram mais tarde, que meu apêndice se rompeu. Fiquei muito fraco
e caí. Senti como se estivesse à deriva, um movimento do meu ser real para
dentro e para fora do meu corpo, e comecei a ouvir uma linda música. Flutuei
pelo corredor e saí pela porta na varanda coberta. Ali, tive a impressão de que
nuvens, uma névoa cor-de-rosa na verdade, começaram a se reunir à minha
volta, então flutuei até atravessar o toldo, como se ele não estivesse lá, e acima
havia uma luz clara, pura e cristalina, uma luz branca que me iluminava. Era
linda, muito brilhante e radiante, mas não machucava meus olhos. Não era
nenhum tipo de luz que se pode descrever na terra. Na verdade, eu não via
uma pessoa na luz, mas ainda assim essa luz tinha uma identidade especial,
definitivamente tinha. Era uma luz de compreensão e amor perfeitos. O
pensamento que veio à minha mente foi: “Você me ama?” Mas não era
exatamente na forma de uma pergunta, acho que a conotação daquilo que a luz
dizia era: “Se você me ama, volte e conclua o que começou na vida”. E durante
todo esse tempo, senti como se estivesse cercado por amor e compaixão
arrebatadores.
3. Eu sabia que estava morrendo e não havia nada que pudesse fazer a respeito,
porque ninguém podia me ouvir... estava fora do corpo, não havia dúvida
quanto a isso, porque podia ver meu próprio corpo ali na mesa de cirurgia.
Minha alma estava fora! Tudo isso me fez sentir triste a princípio, mas então
surgiu uma luz realmente brilhante. Parecia que era um pouco fraca no começo,
mas logo ficou como um enorme holofote. Era uma quantidade tão grande de
luz, nada parecida com um grande flash de luz, era luz demais. E me transmitia
calor, tive a sensação de calor agradável. A luz era branca, um pouco amarelada
e brilhante. Era extremamente brilhante, não dá para descrever. Parecia cobrir
tudo, mesmo assim não me impedia de ver tudo à minha volta _ a sala de
cirurgia, os médicos e enfermeiras, tudo. Dava para ver claramente, e ela não
me cegava. A princípio, quando vi a luz, não tinha certeza do que estava
acontecendo, mas então ela me perguntou se eu estava pronto para morrer. Era
como conversar com uma pessoa, mas não havia uma pessoa ali. A luz estava
conversando comigo, mas na forma de uma voz.
Agora, acho que a voz que realmente conversava comigo percebeu que eu não
estava pronto para morrer. Sabe, ela estava simplesmente me testando mais do
que qualquer outra coisa. No entanto, desde o momento em que a luz falou
comigo, me senti muito bem – seguro e amado. O amor que vinha dela era
inimaginável, indescritível. Era uma companhia agradável. E tinha senso de
humor também – definitivamente!

A REVISÃO
A aparência inicial do ser de luz e suas perguntas não verbais e investigativas
são o prelúdio para um momento de intensidade impressionante durante o qual
o ser apresenta uma revisão panorâmica da vida da pessoa. Frequentemente, é
óbvio que o ser pode ver a exibição de toda a vida do indivíduo e não precisa de
informações para si. Sua única intenção é provocar a reflexão.
Essa revisão só pode ser descrita em termos de memória, já que esse é o
fenômeno familiar mais próximo disso, mas tem características que a
distinguem de qualquer tipo de lembrança normal. Em princípio, é
extraordinariamente rápida. As memórias, quando descritas em termos
temporais, parecem vir uma após outra, suavemente, em ordem cronológica.
Algumas pessoas recordam que não tinham consciência nenhuma de ordem
temporal alguma. A lembrança era instantânea; tudo aparecia de uma só vez e
era possível ver com apenas um olhar. Embora haja diferenças na maneira de se
expressar, todos parecem concordar que a experiência terminou em apenas um
instante no tempo terreno.
Mesmo assim, apesar da velocidade, meus informantes concordam que a
revisão, quase sempre descrita como uma exibição de imagens visuais, é
incrivelmente vívida e real. Em alguns casos, as imagens são relatadas como
dotadas de cores vibrantes, formas tridimensionais e até mesmo de movimento.
E ainda que passem rapidamente, cada imagem é percebida e reconhecida.
Mesmo as emoções e os sentimentos associados com as imagens podem ser
revividos enquanto a pessoa as vê.
Alguns entrevistados dizem que, embora não possam explicar adequadamente,
tudo o que já haviam feito estava presente na revisão – desde as coisas mais
insignificantes até as mais significativas. Outros explicaram que viram os
principais momentos de sua vida. Alguns declararam que, ainda por um período
após a experiência de revisão, eles podiam lembrar de eventos ocorridos em
sua vida com riqueza de detalhes.
Algumas pessoas caracterizam isso como um esforço educacional por parte do
ser de luz. Enquanto presenciam a exibição, o ser parece enfatizar a
importância de duas coisas na vida: aprender a amar as outras pessoas e
adquirir conhecimento. Vejamos um relato representativo:
Quando o ser de luz apareceu, a primeira coisa que disse foi: “O que você
tem para me mostrar daquilo que fez com sua vida?”, ou algo parecido. Foi aí
que os flashbacks começaram. Pensei: “Nossa, o que está acontecendo?”,
porque de repente eu tinha voltado à minha infância. E daquele momento em
diante, foi como se estivesse caminhando desde o começo da minha vida,
passando por todos os anos, até chegar ao presente.
Também foi muito estranho onde isso começou, na época em que eu era
uma garotinha brincando perto do riacho existente na nossa vizinhança, e havia
outras cenas daquela época – experiências que vivenciei com minha irmã,
coisas sobre os vizinhos e lugares reais onde estive. Depois, no
jardim-de-infância, lembrei-me de quando tive um brinquedo especial do qual
gostava muito, mas o quebrei e chorei por muito tempo. Essa foi uma
experiência realmente traumática para mim. As imagens continuaram pela
minha vida e lembrei-me de quando estava no grupo de escoteiras e fomos
acampar. Recordei-me de muitas coisas vividas no tempo do colégio. Depois,
enquanto cursava as quatro últimas séries do ensino fundamental, foi uma
grande honra ser escolhida para a sociedade de conquistas acadêmicas e me
lembrei desse acontecimento. E assim continuei relembrando o ensino
fundamental, o ensino médio, a formatura e meus primeiros anos de faculdade,
até onde eu estava naquele momento.
Os eventos que passaram em flashback vieram na ordem da minha vida e
eram muito vívidos. As cenas eram como se você saísse e as visse acontecendo,
completamente tridimensionais e coloridas. E tinham movimento. Por exemplo,
quando me vi quebrando aquele brinquedo, pude ver todos os movimentos. Não
era como se estivesse assistindo do meu ponto de vista naquela época. Era
como se a garotinha que eu via fosse outra pessoa, num filme, uma garotinha
entre todas as outras crianças, brincando no parquinho. No entanto, era eu.
Vi-me fazendo todas essas coisas enquanto criança, e eram exatamente as
mesmas coisas que eu havia feito, porque me lembrava delas.
Mas eu não via a luz enquanto passava por essas memórias. Ela
desapareceu assim que me perguntou o que eu havia feito, e as lembranças
começaram, mas eu sabia que ela estava ali comigo o tempo todo, que me
carregava através dos flashbacks, porque podia sentir sua presença e porque
ela fazia comentários aqui e ali. Estava tentando me mostrar algo em cada uma
dessas memórias. Não é como se tentasse ver o que eu tinha feito – pois já
sabia – mas estava selecionando esses momentos especiais da minha vida e
colocando-os na minha frente para que me lembrasse.
Durante tudo isso, o ser de luz seguiu reforçando a importância do amor.
Os lugares que me mostrou melhor envolviam minha irmã; sempre fui muito
próxima dela.

Mostrou-me alguns instantes em que fui egoísta com ela, e também o


mesmo número de ocasiões em que realmente mostrei amor e compartilhei com ela.
Mostrou-me que eu deveria tentar fazer coisas pelas outras pessoas, esforçando-me
ao máximo. No entanto, não havia nenhuma acusação em tudo isso. Quando
atravessava momentos em que eu havia sido egoísta, sua atitude era apenas de que
eu havia aprendido com eles também.

O ser parecia muito interessado em coisas relacionadas com conhecimento


também. E seguia apontando coisas que tinham a ver com aprendizado, chegando a
dizer que eu continuaria aprendendo, e que quando voltasse para me pegar (porque
dessa vez ele havia dito que eu voltaria à vida) haveria uma busca por conhecimento.
Disse que se tratava de um processo contínuo, então tive a sensação de que isso
continua depois da morte. Acho que ele estava tentando me ensinar, enquanto
passávamos por todas aquelas memórias.

A coisa toda foi muito estranha. Eu estava ali, estava realmente vivendo esses
flashbacks, estava realmente caminhando através deles e foi tudo muito rápido.
Contudo, foi lento o suficiente para que eu pudesse absorver tudo. Mesmo assim, o
período de tempo não foi muito grande, acho que não. Parecia que o ser de luz veio,
então passei por todas essas memórias, e a luz voltou. Parece que foi menos do que
cinco minutos e provavelmente mais do que trinta segundos, mas não posso afirmar.

O único momento em que senti medo foi quando fiquei preocupada que não
fosse capaz de terminar minha vida aqui. Mas gostei de passar por essas memórias.
Foi divertido. Foi gostoso voltar para minha infância, foi quase como revivê-la. Foi
uma maneira de voltar e ver tudo, o que normalmente não temos chance de fazer.

Também devemos apontar que existem relatos em que a revisão é vivenciada, muito
embora o ser de luz não apareça. Como regra, nas experiências em que o ser
aparentemente a “dirige”, essa revisão é uma experiência mais arrebatadora.
Entretanto, é geralmente caracterizada como muito vívida e rápida, além de exata,
independente do fato de o ser de luz aparecer ou não, e independente de ocorrer no
curso de uma morte “real” ou apenas durante a proximidade da morte.

Depois de todo o barulho e depois de atravessar esse lugar longo e escuro,


todos os meus pensamentos da infância, toda a minha vida estavam ali no final desse
túnel, brilhando na minha frente. Não era exatamente em termos de imagens, mas na
forma de pensamentos, acho. Não sei exatamente como descrever, mas estava tudo
ali ao mesmo tempo, quero dizer, não uma coisa por vez, surgindo e desaparecendo,
mas era tudo, tudo ao mesmo tempo. Pensei na minha mãe, nas coisas que fiz de
errado. Depois pude ver as maldades que fizera quando criança, e pensar na minha
mãe e no meu pai, desejando não tê-las feito; queria poder voltar e desfazê-las.

Nos dois exemplos a seguir, embora não houvesse acontecido a morte clínica no
momento da experiência, desgastes ou ferimentos fisiológicos reais estavam
ocorrendo.

Toda a situação se desenvolveu muito de repente. Eu havia tido uma febre


baixa e não me sentia muito bem havia duas semanas, mas nessa noite fiquei muito
doente na cama e me lembro de tentar chamar minha esposa para lhe dizer que
estava muito doente, mas foi impossível me mover. Além disso, encontrava-me num
vazio completamente escuro e toda a minha vida parecia passar na minha frente.
Tudo começou quando eu tinha seis anos; lembrei-me de um bom amigo que tive no
ensino fundamental. Recordei-me desde essa época até o ensino médio, a faculdade
de odontologia e o meu trabalho no consultório.

Sabia que estava morrendo e me lembro de ter pensado que queria sustentar
minha família. Estava perturbado por estar morrendo e ainda ver certas coisas que eu
tinha feito na minha vida e de que me arrependia, e outras de que me arrependia por
não ter feito.

Esse flashback vinha na forma de imagens mentais, eu diria, mas eram muito
mais vívidas que as imagens normais. Vi apenas os pontos altos, mas foi tão rápido
que foi como ver a minha vida inteira, sendo capaz de fazer isso em poucos
segundos. Tudo passava na minha frente como um filme projetado numa velocidade
tremenda, mas mesmo assim eu era completamente capaz de ver tudo, e de
compreender. No entanto, as emoções não voltaram com as imagens, porque não
havia tempo suficiente.

Eu não via mais nada durante essa experiência. Havia apenas escuridão, exceto
pelas imagens a que assistia. No entanto, dava para sentir a presença de um ser
muito poderoso, e completamente amoroso, ali comigo durante toda a experiência.

É realmente interessante. Quando recobrei os sentidos, pude contar para todos


sobre cada parte da minha vida em riqueza de detalhes, por causa daquilo que se
passava comigo. É uma experiência e tanto, mas é difícil colocá-la em palavras,
porque acontece tão rápido e ao mesmo tempo é tão clara.

Um jovem veterano de guerra descreve sua revisão:

Enquanto estava servindo no Vietnã, fui ferido e mais tarde “morri” por causa
dos ferimentos, embora durante todo o tempo soubesse exatamente o que estava
acontecendo. Fui atingido por seis balas de metralhadora e quando isso aconteceu
não fiquei nem um pouco triste. Em minha mente, realmente me senti aliviado
quando fui atingido. Estava completamente à vontade e não sentia medo.
No momento do impacto, minha vida se tornou uma imagem na minha frente, e
deu-me a impressão de que eu poderia voltar no tempo em que ainda era bebê; as
imagens pareciam progredir através da minha vida toda.

Lembrei-me de tudo: tudo era muito vívido. Os primeiros acontecimentos da


minha vida passaram na minha frente até chegar ao presente, e tudo aconteceu num
curto período de tempo. E não foi nada ruim; passei por tudo sem arrependimentos,
nem sentimentos depreciativos sobre mim.

A melhor coisa em que posso pensar para comparar é uma série de imagens,
tipo slides. Era como se alguém estivesse passando slides na minha frente, muito
rapidamente.

Finalmente, aqui está um caso de uma necessidade emocional extrema em que a


morte era iminente, embora não houvesse nenhum ferimento real:

No verão, depois de cursar meu primeiro ano de faculdade, arrumei um


emprego para dirigir um grande caminhão que era meio trator, meio trailer. Tive um
problema naquele verão ao adormecer atrás da direção. Numa manhã bem cedo
estava dirigindo numa longa viagem e cochilei. A última coisa de que me lembro foi
ver uma placa na estrada e então cair no sono; depois disso, a coisa seguinte de que
me recordo foi ouvir um barulho horrível e ver que o pneu externo do lado direito
havia furado. Depois, por causa do peso e do balanço do caminhão, o pneu esquerdo
também furou, e o caminhão capotou e se arrastou pela estrada em direção a uma
ponte. Eu estava apavorado porque sabia o que estava acontecendo, sabia que o
caminhão ia se chocar contra a ponte.

Então, enquanto o caminhão se arrastava, pensei em todas as coisas que tinha


feito. Vi apenas certas coisas, os pontos altos, e foi algo muito real. A primeira coisa
de que me lembrei foi seguir meu pai enquanto ele caminhava pela praia; isso foi
quando eu tinha dois anos de idade. E havia algumas outras coisas, em ordem, desde
minha infância. Depois disso lembrei-me de ter quebrado o carrinho vermelho que
tinha ganhado no Natal aos cinco anos de idade. Recordei-me de ter chorado quando
fui para a escola na primeira série, usando aquele casaco de chuva, amarelo berrante,
que minha mãe comprara para mim. Lembrei-me de pequenas coisas sobre cada ano
do ensino fundamental. Os professores e as pequenas coisas que se destacaram em
cada ano. Nas quatro últimas séries, eu já entregava jornais pela manhã e trabalhava
à tarde numa mercearia. E foi assim até o começo do meu segundo ano de faculdade.

Todas essas coisas, e muitas mais, simplesmente passaram pela minha cabeça
e foi muito rápido. Provavelmente não durou meio segundo. E então tudo acabou e lá
estava eu de pé olhando para o caminhão. Pensei que estava morto, pensei que era
um anjo. Comecei a me beliscar para ver se estava vivo, ou se era um fantasma ou
coisa parecida.
O caminhão deu perda total, mas não sofri um só arranhão. De algum modo,
voei pelo pára-brisa pois o vidro estava arrebentado. Depois que as coisas se
acalmaram, achei estranho que todos esses acontecimentos tivessem ocorrido em
minha vida, que tivessem causado algum tipo de impressão duradoura em mim e que
tivessem passado pela minha mente durante esse momento de crise. Eu
provavelmente seria capaz de pensar em todas essas coisas, lembrar e descrever
cada uma elas agora, mas levaria pelo menos quinze minutos. No entanto, tudo
aconteceu de uma vez, automaticamente, e, em menos de um segundo. Foi incrível.

A FRONTEIRA OU O LIMITE

Em alguns exemplos, as pessoas descreveram para mim como, durante sua


experiência de quase-morte, elas pareciam estar se aproximando do que pode ser
chamado de algum tipo de fronteira ou limite. Em vários relatos, isso assumiu a forma
de uma represa, uma névoa cinza, uma porta, uma cerca num campo ou
simplesmente uma linha. Embora isso seja altamente especulativo, pode-se levantar a
questão sobre se não há uma experiência básica ou ideia na raiz de tudo isso. Se for
verdade, então as diferentes versões meramente apresentam formas individuais
variáveis de interpretar, pôr em palavras ou lembrar da experiência-raiz. Vamos
analisar alguns relatos em que a ideia de uma fronteira ou de um limite tem papel de
destaque.

1. “Morri” de uma parada cardíaca, e quando isso aconteceu, de repente eu


estava num grande gramado. Tudo era lindo e de um verde intenso. Havia luz
– linda e revigorante – em toda a minha volta. Olhei para a frente, do outro
lado do campo e vi uma cerca. Comecei a caminhar em direção da cerca e vi
um homem do outro lado, movendo-se em minha direção como se quisesse
me encontrar. Queria alcançá-lo, mas sentia estar sendo puxado para trás,
irresistivelmente. Quando me voltei, vi que o homem também se virou na
outra direção e se afastou da cerca.
2. Essa experiência aconteceu durante o nascimento do meu primeiro filho. Por
volta do oitavo mês de gravidez, desenvolvi o que o médico descreveu como
uma condição tóxica. Fui aconselhada a me internar num hospital onde o
médico forçaria o trabalho de parto. Foi imediatamente depois do parto que
tive uma hemorragia grave, e o médico teve dificuldade para controlá-la. Eu
estava ciente de que estava acontecendo quando, por ter sido enfermeira,
percebi o perigo. Naquele momento, perdi a consciência e ouvi um zunido
irritante. A seguir, parecia como se eu estivesse num navio ou num pequeno
barco velejando para o outro lado de uma grande represa. Na margem
distante, podia ver todos os meus entes queridos que haviam morrido –
minha mãe, meu pai, minha irmã e outros. Podia vê-los, podia ver o rosto
deles, exatamente como eram quando os conheci na Terra. Eles pareciam
estar acenando para que me aproximasse, e o tempo todo eu dizia: “Não,
não, não estou pronta para me unir a vocês. Não quero morrer. Não estou
pronta para partir”. Ao mesmo tempo, tive uma experiência mais esquisita.
Pude ver os médicos e as enfermeiras também, enquanto cuidavam do meu
corpo, mas parecia que eu era uma espectadora em vez daquela pessoa –
daquele corpo - do qual eles cuidavam. Esforçava-me muito para me
comunicar com meu médico: “Não vou morrer”, mas ninguém podia me
ouvir. Tudo – os médicos, as enfermeiras, a sala de parto, o navio, a água e a
margem distante – era apenas um tipo de conglomerado. Tudo estava junto,
como se uma cena fosse amontoada em cima da outra.
Finalmente, o navio quase chegou à margem distante, mas antes que
chegasse, deu meia-volta e retornou. Finalmente consegui conversar com
meu médico e eu estava dizendo: “Não vou morrer”. Acho que foi nesse
momento que recobrei os sentidos e o médico explicou o que havia
acontecido: eu havia sofrido uma hemorragia pós-parto e quase havia
morrido, mas ficaria bem.
3. Fui hospitalizada com um problema sério no rim, e estive em coma por
aproximadamente uma semana. Meus médicos tinham muitas dúvidas
quanto ao fato de eu sobreviver. Durante esse período em que estive
inconsciente, senti como se fosse erguida, como se não tivesse nenhum
corpo físico. Uma luz branca e brilhante apareceu para mim. A luz era tão
brilhante que eu não podia ver através dela, mas ir até sua presença era algo
muito calmo e maravilhoso. Simplesmente não existe experiência parecida na
Terra. Na presença da luz, os pensamentos e palavras que vinham à minha
mente eram: “Você quer morrer?” E eu respondia que não sabia, já que não
sabia nada sobre a morte. Então a luz branca dizia: “Atravesse essa linha e
você aprenderá”. Senti que sabia que a linha estava na minha frente, embora
não pudesse vê-la de verdade. Conforme cruzei a linha, os sentimentos mais
maravilhosos tomaram conta de mim – sentimentos de paz, tranquilidade e o
desaparecimento de todas as preocupações.
4. Sofri um ataque cardíaco e me encontrei num vazio escuro; sabia que havia
abandonado meu corpo físico. Sabia que estava morrendo e pensei: “Deus,
fiz o melhor que pude com o conhecimento que tinha. Por favor, ajude-me”.
Imediatamente, saí dessa escuridão e, seguindo em frente, deslizei e me
movi suavemente; na minha frente, a distância, pude ver uma névoa cinza,
corri em sua direção. Tive a sensação de que não conseguia chegar lá rápido
o suficiente para me satisfazer, e conforme me aproximava, pude ver através
dessa névoa. Além da névoa, podia ver pessoas cujas formas eram iguais às
que tiveram na Terra, e também pude ver algo que poderia ser interpretado
como prédios. A coisa toda era permeada pela luz mais maravilhosa – um
brilho dourado e vivo, uma cor pálida, não como o dourado berrante que
conhecemos.
Conforme me aproximei mais, tive a certeza de que atravessaria essa névoa.
Era um sentimento maravilhoso e alegre; não existem palavras na linguagem
humana para descrever. Entretanto, não era minha hora de cruzar a névoa,
porque imediatamente do outro lado apareceu meu tio Carl, que havia
morrido muitos anos antes. Ele bloqueou meu caminho dizendo: “Volte. Seu
trabalho na Terra ainda não foi concluído. Volte agora”. Eu não queria voltar,
mas não tive escolha, e imediatamente estava de volta ao meu corpo. Eu
sentia aquela dor horrível no meu peito e ouvi meu filho chorando: “Deus,
traga minha mãe de volta para mim”.
5. Fui levado ao hospital em estado crítico devido a uma “inflamação”, segundo
disseram, e meu médico confirmara, eu não sobreviveria. Ele mandou meus
parentes voltarem para casa, porque eu não viveria por muito tempo. Antes
de partir, voltaram e se reuniram em volta da minha cama. Quando o médico
achou que eu estava morrendo, pareceu-me que meus parentes estavam se
afastando de mim. Parecia-me que estavam se afastando em vez de eu estar
me afastando deles. Ficou cada vez mais escuro, mas ainda podia vê-los.
Perdi a consciência e não sabia mais nada do que estava acontecendo na sala
de hospital, mas estava numa passagem estreita e em forma de V, como um
canal, mais ou menos da largura de uma cadeira. Era o suficiente para caber
meu corpo; minhas mãos e braços pareciam estar ao lado do meu corpo. Fui
com a cabeça primeiro, e estava escuro, o mais escuro possível. Movi-me
pela passagem, descendo, e, ao olhar para cima, vi uma porta linda e polida
sem maçaneta. Nos contornos da porta pude ver uma luz realmente
brilhante, com raios iluminando tudo como se todos ali estivessem felizes,
rodando e se movendo. Parecia haver muita agitação lá. Olhei para cima e
disse: “Senhor, aqui estou. Se o Senhor quiser, leve-me” Nossa, ele me
mandou de volta tão rápido que quase perdi a respiração.

A VOLTA

É óbvio que todas as pessoas com quem conversei tiveram de “voltar” em algum
momento de sua experiência. No entanto, até chegar esse momento, geralmente
houve uma mudança interessante de atitude. Lembre-se de que os sentimentos mais
comuns relatados nos primeiros momentos que seguem a morte são um desejo
desesperado de voltar ao corpo e um intenso arrependimento sobre a própria morte.
Entretanto, depois que a pessoa que está morrendo chega a certa profundidade em
sua experiência, não quer retornar e pode até mesmo resistir à volta ao corpo. Esse é
o caso especialmente das pessoas que foram até o ponto de encontrar o ser de luz.
Como um homem disse, de maneira mais enfática: “Eu não queria sair de perto
daquele ser”.

As exceções para essa generalização são frequentemente apenas aparentes, não


verdadeiras. Várias mulheres que eram mães de crianças pequenas na época da
experiência me contaram que, apesar de elas preferirem ficar onde estavam, sentiram
uma obrigação de tentar voltar e educar os filhos.

Fiquei pensando se deveria ficar ali, mas me lembrava da minha família, dos
meus três filhos e do meu marido. Agora, essa é a parte mais difícil de explicar.
Quando tive essa sensação maravilhosa ali, na presença daquela luz, realmente não
queria voltar. Mas levo minhas responsabilidades muito a sério, e sabia que tinha
obrigações para com a minha família. Então decidi tentar voltar.

Em vários outros casos, as pessoas me disseram que embora estivessem confortáveis


e seguras nessa nova existência de desencarnado e estivessem até mesmo gostando,
ficaram felizes ao poder retornar à vida física, já que haviam deixado coisas
importantes por fazer. Em alguns casos, isso assumiu a forma de um desejo de
completar um estudo inacabado.

Eu havia feito três anos de faculdade e ainda tinha um pela frente. Ficava
pensando: “Não quero morrer agora”. Mas acho que se isso tivesse durando mais
alguns minutos, se tivesse ficado com a luz um pouco mais de tempo, não teria mais
pensado nos meus estudos, seria arrebatado pelas outras coisas que estava
vivenciando.

As descrições que reuni apresentam uma imagem extremamente variada quando se


trata da questão do modo de retornar à vida física e por que tal retorno aconteceu. A
maioria diz simplesmente que não sabe como, nem por que, e que só podem dar
alguns palpites. Alguns definitivamente sentem que suas próprias decisões de voltar
ao corpo e retornar à vida terrena foram os fatores operantes.

Eu estava fora do meu corpo e percebi que tinha de tomar uma decisão. Sabia
que não poderia ficar fora do corpo físico por muito tempo, então – bem, para os
outros isso é muito difícil de entender, mas para mim era perfeitamente claro – sabia
que tinha de decidir entre seguir em frente ou voltar.

Era maravilhoso ali, do outro lado, e eu até queria ficar. Mas saber que tinha
algo bom para fazer na Terra também era maravilhoso. Logo estava pensando: “Sim,
devo voltar e viver”, e voltei para o meu corpo físico. Sinto como se a hemorragia
tivesse parado sozinha. Seja como for, comecei a me recuperar depois disso.

Outros sentem que realmente receberam uma permissão para viver dada por “Deus”,
ou pelo ser de luz, fosse em resposta a um pedido próprio de poder viver (geralmente
porque o pedido foi feito sem egoísmo) ou porque Deus ou o ser aparentemente
tinham alguma missão em mente para eles realizarem.

Eu estava acima da mesa e podia ver tudo o que faziam. Sabia que estava
morrendo, que esse era o final. Mesmo assim, estava preocupada com meus filhos e
quem tomaria conta deles. Portanto, não estava pronta para partir. O Senhor permitiu
que eu vivesse.

Um homem recorda:

Digo que Deus certamente foi bom comigo, porque eu estava morto e Ele
deixou que os médicos me trouxessem de volta, por um propósito: ajudar minha
esposa, que tinha um problema com alcoolismo, e sei que ela não teria conseguido
sem mim. Mas agora ela está melhor e realmente acho que isso teve muito a ver com
o que passei.

Uma jovem mãe relata:

O Senhor me mandou de volta, mas não sei o porquê. Definitivamente senti-O


ali, e sei que Ele me reconheceu e sabia quem eu era. Mesmo assim, Ele não achou
certo me deixar entrar no paraíso, mas não sei o porquê. Pensei nisso muitas vezes e
acredito que foi porque eu tinha duas crianças pequenas para cuidar ou porque
pessoalmente não estava pronta para estar ali. Ainda estou procurando a resposta e
não consigo encontrá-la.

Em alguns exemplos, as pessoas expressaram a sensação de que o amor ou as


orações das outras pessoas, efetivamente, puxaram-me de volta da morte,
independentemente de seus próprios desejos.

Estava com minha tia idosa durante sua última doença, o que nos esgotou
muito. Eu ajudava a cuidar dela, e durante todo esse tempo, todos da família
rezavam para que ela recuperasse a saúde. Ela parou de respirar várias vezes, mas
eles a trouxeram de volta. Finalmente, um dia ela olhou para mim e disse: “Joan, já
estive lá, no Além, e é lindo. Quero ficar lá, mas não posso enquanto vocês
continuarem rezando para que eu fique. Suas orações estão me segurando aqui. Por
favor, não rezem mais”. Todos nós paramos e pouco tempo depois ela morreu.

Uma mulher me contou:

O médico já havia dito que eu morrera, mas sobrevivi. Mesmo assim, a


experiência por que passei foi tão alegre que eu não tinha quaisquer sentimentos
ruins. Quando voltei e abri os olhos, minha irmã e meu marido olhavam-me. Pude ver
o alívio deles e as lágrimas escorrendo de seus olhos. Pude ver que era um alívio para
eles eu ter sobrevivido. Senti como se tivessem chamado de volta – me trazido como
um imã – através do amor deles. Desde esse dia, passei a acreditar que as outras
pessoas podem nos trazer de volta.

Em vários relatos, as pessoas se lembram de terem sido arrastadas rapidamente de


volta pelo túnel escuro através do qual se foram nos momentos iniciais da
experiência. Por exemplo, um homem que morreu relata como foi propulsionado por
um vale escuro. Sentiu que estava se aproximando do fim do túnel, mas nesse
momento ouviu seu nome sendo chamado. Então foi arrastado de volta pelo mesmo
espaço.

Poucos vivenciam a reentrada real no corpo físico. A maioria relata que simplesmente
sentiu que no fim da experiência ”foi dormir” ou ficou inconsciente, para mais tarde
acordar no corpo físico.

Não me lembro de voltar ao corpo. Foi como se eu simplesmente apagasse,


dormisse e então, de repente, acordasse de volta e estivesse deitado na cama. As
pessoas na sala estavam, em comparação, no mesmo lugar em que estiveram
enquanto eu estafa fora do corpo, olhando para elas.

Por outro lado, alguns se lembram de terem sido arrastados rapidamente para o corpo
físico, frequentemente como uma sacudida.

Eu estava lá em cima no teto, observando-os cuidar de mim. Quando deram


choques em meu peito, e meu corpo pulou, simplesmente caí de volta no meu corpo,
como um peso morto. Quando menos esperava já estava no meu corpo novamente.

E,

Decidi que voltaria, e quando decidi, foi como um solavanco, um solavanco de


volta ao meu corpo, e senti isso no exato momento em que voltei à vida.

Nas poucas descrições em que o evento é recordado com riqueza de detalhes, as


pessoas dizem que a reentrada ocorre “através da cabeça”.

Meu “ser” parecia ter uma extremidade pequena e outra grande, e no final do
meu acidente, após ter ficado suspenso sobre minha cabeça, ele voltou. Quando saiu
do meu corpo, deu-me a impressão de que a extremidade maior saiu primeiro, mas
ao retornar, a extremidade menor parece ter voltado primeiro.

Uma pessoa narra:

Quando ouvi pegarem meu corpo e retirá-lo debaixo da direção, foi como um
zuuum e senti como se fosse arrastada por uma área limitada, um tipo de túnel,
acho. Estava escuro ali, e me movia rapidamente, de volta ao corpo. Enquanto era
sugada de volta, parecia que a sucção começara na cabeça, como se eu estivesse
entrando pela cabeça. Não senti como se tivesse poder algum de decisão em tudo
isso, nem ao menos tempo para pensar a respeito. Estava ali, a metros de distância
do meu corpo, e de repente tudo havia terminado. Nem tive tempo de pensar: “Estou
sendo sugada de volta ao meu corpo”.

Tipicamente, as sensações e os sentimentos que são associados com a experiência


permanecem por algum tempo depois de a crise médica ter sido resolvida.

1. Depois de voltar, não parei de chorar por uma semana porque tinha de viver
neste mundo após ter visto o outro. Não queria voltar.
2. Quando voltei, trouxe comigo alguns dos sentimentos maravilhosos que tive ali.
Eles duraram por vários dias. Mesmo agora, ainda os sinto de vez em quando.
3. A sensação foi tão indescritível que permaneceu comigo de alguma forma.
Nunca me esquecerei. Ainda penso nela com muita frequência.

CONTANDO AOS DEMAIS

Deve ser enfatizado que uma pessoa que passou por uma experiência desse tipo não
tem dúvida alguma sobre sua realidade e importância. As entrevistas que fiz são
geralmente repletas de comentários precisamente nesse sentido. Por exemplo:

Enquanto estive fora do corpo, fiquei muito surpreso com o que estava
acontecendo comigo. Não entendia, mas não estava fabricando ideias. Eu
simplesmente não estava com esse estado de espírito.

E,

Não foi nenhum tipo de alucinação. Já tive alucinações uma vez, quando me
deram codeína no hospital. Mas isso aconteceu muito antes do acidente. E essa
experiência não foi nada parecida com alucinação, nada parecida mesmo.

Tais comentários vêm de pessoas que são bastante capazes de distinguir sonho e
fantasia da realidade. As pessoas entrevistadas têm personalidades funcionais e bem
equilibradas. Entretanto, elas não contam suas experiências como contariam seus
sonhos, mas sim como eventos reais que realmente aconteceram com elas.

Apesar da própria certeza da realidade e da importância do que aconteceu, essas


pessoas percebem que nossa sociedade contemporânea não é o tipo de lugar onde
relatos dessa natureza seriam recebidos com simpatia e compreensão. De fato,
muitos comentaram que perceberam desde o princípio que os outros os considerariam
mentalmente instáveis se fossem relatar suas experiências. Assim, decidiram
permanecer em silêncio com relação ao assunto ou apenas revelar as experiências
para algum parente muito próximo.
Foi muito interessante. Só que não gosto de contar isso às pessoas. Elas me
olham como se eu estivesse louco.

Outro recorda:

Não contei para ninguém durante muito tempo. Simplesmente não disse nada.
Eu não estava muito à vontade porque tinha medo de que não acreditassem que eu
estava falando a verdade e que dissessem: “Ah, você está inventando essas coisas”.

Um dia, decidi: “Bem, vamos ver como minha família reage”, e contei, mas não
contei para mais ninguém até agora. No entanto, acredito que minha família entendeu
que passei por tudo isso.

Outros, a princípio, tentaram contar para outra pessoa, mas foram mal recebidos e
dali em diante decidiram permanecer em silêncio.

1. A única pessoa para quem tentei contar foi minha mãe. Pouco tempo depois
mencionei como havia me sentido. Mas eu era apenas um garotinho e ela não
prestou atenção em mim. Então nunca mais contei a ninguém.
2. Tentei contar para o padre da minha paróquia, mas ele disse que eu estivera
alucinado, então me calei.
3. Eu era bastante popular no ensino fundamental e médio, e apenas seguia a
multidão, não fazia nada de novo. Era uma seguidora, não uma líder. E depois
que isso aconteceu comigo e tentei contar para as pessoas, acho que
automaticamente me rotularam como louca. Eu tentava contar para as pessoas
e elas ouviam com interesse, mas depois comentavam: “Ela pirou de vez?”.
Quando vi que isso não passava de uma grande piada, deixei de falar sobre o
assunto. Estive tentando transmitir a ideia de que: “Nossa, essa experiência
estranha aconteceu comigo”. O que estava tentando dizer é que havia mais
coisas de que precisávamos saber sobre a vida do que eu havia pensado, e
tenho certeza de que eles também não sabiam.
4. Tentei contar para as enfermeiras o que acontecera, quando acordei, mas me
disseram para não falar sobre o assunto, pois eu estava apenas imaginando
coisas.

Portanto, nas palavras de outra pessoa:

Você aprende rapidamente que as pessoas não aceitam esses acontecimentos


tão facilmente quanto você gostaria. Você simplesmente não sobe num palanque e sai
por aí contando para todos.

De forma bastante interessante, em apenas um dos casos que estudei, um médico


revelou familiaridade com experiências de quase-morte ou expressou simpatia por
elas. Depois de sua experiência extracorpórea, uma garota me disse:
Minha família e eu perguntamos ao médico o que havia acontecido comigo, e
ele disse que isso geralmente acontecia quando uma pessoa tem muita dor ou
ferimentos graves; nesse momento a alma deixa o corpo.

Considerando o ceticismo e a falta de compreensão que uma pessoa enfrenta ao


discutir sua experiência de quase-morte, não é de se surpreender que quase todas as
pessoas nessa situação passem a sentir que são únicas, que ninguém mais passou
pelo que elas passaram. Por exemplo, um homem me disse: “Estive em um lugar
onde ninguém mais esteve”.

Aconteceu também, com frequência que, após entrevistar as pessoas pela primeira
vez sobre os detalhes de sua própria experiência, contei que outros entrevistados
relataram exatamente os mesmos eventos e percepções. Essas pessoas expressaram
profundo sentimento de alívio:

É muito interessante descobrir que outras pessoas tiveram a mesma


experiência, porque eu não tinha me dado conta... Estou realmente feliz por ouvir
isso, ao saber que obviamente mais alguém passou por isso também. Agora sei que
não sou louco.

Sempre foi algo muito real para mim, mas jamais contei a alguém porque tinha medo
de que me olhassem e pensassem: “Quando você apagou, sua mente ficou ruim na
mesma hora!”.

Eu imaginava que outras pessoas teriam passado pela mesma experiência, mas
que eu provavelmente nunca encontraria alguém que tivesse conhecimento dessa
pessoa, porque não acho que as pessoas querem falar sobre esse assunto. Se alguém
viesse me contar, sem eu ter passado por isso, provavelmente olharia e ficaria
imaginando que tipo de pegadinha estariam tentando fazer comigo, porque é assim
que é a nossa sociedade.

Ainda existe outra razão pela qual alguns são tão reticentes ao relatar suas
experiências aos outros. Eles sentem que a experiência é tão indescritível, tão além
da linguagem humana e dos modos de percepção e de existência, que é inútil até
mesmo tentar.

EFEITOS SOBRE A VIDA

Pelas razões explicadas anteriormente, ninguém da minha pesquisa montou uma


biblioteca portátil e saiu por aí pregando sobre sua experiência em período integral.
Ninguém achou adequado converter ou tentar convencer os outros das realidades
vividas. Na verdade, descobri que a dificuldade é exatamente o oposto: as pessoas
são naturalmente muito reticentes ao contar aos demais sobre o que aconteceu.
Os efeitos que as experiências tiveram em sua vida pareceram ter assumido formas
mais sutis e tranquilas. Muitos me disseram que sentiram sua vida ampliada e
aprofundada pela experiência, e por causa disso ficaram mais refletivos e
preocupados com questões filosóficas profundas.

Naquela época – antes de entrar na faculdade – eu, que havia sido criado numa
cidade muito pequena, com pessoas de mente fechada – mas, de qualquer modo,
pessoas que andavam comigo – era um cara típico da panelinha do ensino médio.

Depois do que aconteceu comigo, eu queria saber mais. Entretanto, naquele


tempo não achava que haveria uma pessoa que saberia qualquer coisa a respeito do
assunto, porque eu nunca havia saído desse pequeno mundo em que estava; não
sabia nada de psicologia ou de qualquer coisa parecida. Tudo o que sabia é que senti
como se tivesse amadurecido da noite para o dia, porque a experiência abriu um novo
caminho para mim, um mundo que eu nunca tinha achado possível existir e ficava
pensando: “Há tanta coisa que preciso descobrir”. Em outras palavras, a vida é
melhor do que cinema na sexta-feira à noite e jogos de futebol. E há mais coisas em
mim do que jamais imaginei. E então comecei a refletir sobre qual seria o limite do
ser humano e da mente. Isso simplesmente me abriu para o um mundo
completamente novo.

Outro entrevistado declara:

Desde aquele dia, minha mente está constantemente pensando no que fiz com
minha vida, e o que farei daqui em diante. Meu passado – estou satisfeito com ele.
Não acho que o mundo me deva algo, porque realmente Fiz tudo o que queria e da
maneira como queria, e ainda estou vivo e posso fazer muito mais. Mas, desde o dia
em que “morri” de repente, logo após minha experiência, passei a me perguntar se
havia feito as coisas porque elas eram boas ou simplesmente porque era boas para
mim. Antes, eu simplesmente agia por impulso, agora, primeiro analiso as coisas na
minha mente, bem devagar. Parece que tudo precisa passar pela minha mente para
ser digerido.

Tento fazer coisas que tenham mais significado, e que façam minha mente e
alma se sentirem melhor. E tento não ser preconceituoso, tento não julgar as
pessoas. Quero fazer as coisas porque elas são boas, não porque são boas para mim.
E parece que a compreensão que tenho das coisas agora é muito melhor. Sinto que
isso se deve ao que aconteceu comigo, aos lugares em que estive e às coisas que vi
nessa experiência.

Outros relatam uma mudança de atitude ou abordagem em relação à vida física à


qual retornaram. Por exemplo, uma mulher diz simplesmente que “isso fez a vida ser
mais preciosa para mim”.
Outra pessoa relata:

Fui abençoada de certa forma, porque antes do ataque do coração eu estava


tão ocupada planejando o futuro dos meus filhos e me preocupando com o ontem,
que estava perdendo as alegrias do presente. Tenho uma atitude muito diferente
atualmente.

Alguns mencionaram que passaram por mudanças em seus conceitos de mente e da


importância relativa do corpo físico em oposição à mente. Isso é bem ilustrado,
principalmente nas palavras de uma mulher que teve uma experiência extracorpórea
enquanto beirava a morte:

Naquele momento, eu estava mais consciente da minha mente do que do corpo


físico. A mente era a parte mais importante, em vez da forma do corpo. E antes desse
acontecimento, durante toda minha vida, foi exatamente o contrário. O corpo era meu
interesse principal, e o que estava acontecendo em minha mente, bem, simplesmente
acontecia e ponto final. Mas, depois do corrido, minha mente passou a ser a principal
atração, e o corpo passou para segundo lugar – era apenas algo para guardar minha
mente. Não me importava se tinha um corpo ou não. Não me importava porque tudo
o que valia era que minha mente era importante.

Num número bastante pequeno de casos, as pessoas me contaram que, depois de


suas experiências, parece que elas adquiriram ou notaram faculdades de intuição
beirando a poderes psíquicos:

1. Depois dessa experiência, foi quase como se eu fosse preenchida com um novo
espírito. Desde essa época, muitos comentaram que pareço passar por um
efeito calmante sobre eles, instantaneamente, quando estão agitados. E parece
que estou mais conectada com as pessoas, que consigo sentir coisas a respeito
delas mais rapidamente.
2. Algo que acredito ter sido dado a mim, por causa da minha experiência de
morte, é que posso sentir as necessidades na vida dos outros indivíduos. Com
frequência, por exemplo, quando estou com pessoas no elevador do prédio onde
trabalho, tenho a impressão de que posso ler o rosto delas e dizer se precisam
de ajuda, e de que tipo. Várias vezes conversei com pessoas que estavam com
problemas e levei-as até o meu escritório para lhes dar conselhos.
3. Desde que me feri, tenho a sensação de adivinhar o pensamento e a vibração
das pessoas e sentir o ressentimento vindo dos outros. Algumas vezes fui capaz
de saber o que as pessoas iam dizer antes que dissessem. Poucas pessoas vão
acreditar, mas passei por algumas experiências extremamente estranhas. Certa
vez, eu estava numa festa adivinhando o pensamento das outras pessoas, e
algumas que não me conheciam se levantaram e foram embora. Elas ficaram
apavoradas, achando que eu era uma bruxa ou coisa assim. Não sei se é algo
que ganhei enquanto estava morta, ou se eu estava dormente em mim e nunca
tinha usado até acontecer minha quase-morte.

Há uma concordância notável nas “lições”, por assim dizer, que foram trazidas de
volta por aqueles que estiveram próximos da morte. Quase todos enfatizaram a
importância de tentar cultivar o amor pelos outros, um amor único e profundo. Um
homem que encontrou o ser de luz sentiu-se totalmente amado e aceito, mesmo
enquanto toda sua vida era exibida num panorama para que o ser pudesse ver. Ele
sentiu que a “pergunta” que o ser estava fazendo era se ele seria capaz de amar os
outros da mesma forma que amava a si próprio. Agora sente que é sua obrigação
tentar aprender enquanto estiver na terra.

Ademais, muitos outros enfatizaram a importância de buscar o conhecimento.


Durante suas experiências, sentiram intimamente que a aquisição de conhecimento
continua até mesmo na vida depois da morte. Uma mulher, por exemplo, tem
aproveitado cada oportunidade educacional que teve desde sua experiência de
“morte”. Outro homem oferece o seguinte conselho: ”Não importa sua idade, não pare
de aprender, pois se trata de um processo que acredito seguir pela eternidade”.

Nenhum dos entrevistados relatou ter voltado dessa experiência sentindo-se


moralmente purificado ou aperfeiçoado. Nenhum deles evidencia, de qualquer
maneira, uma atitude mais santificada. Na verdade, muitos levantaram a questão de
que sentem que ainda estão tentando, ainda estão buscando alguma coisa. A visão
deles os deixou com novos objetivos, novos princípios morais e uma determinação
renovada de tentar viver de acordo com essas normas, mas sem sentimentos de
instantânea salvação ou de infalibilidade moral.

NOVAS VISÕES DA MORTE

Razoavelmente, como se pode esperar, essa experiência tem um efeito profundo na


atitude da pessoa em relação à morte física, especialmente para aqueles que não
esperavam previamente que qualquer coisa acontecesse depois da morte. De uma
forma ou de outra, quase todos expressaram o pensamento de que não tem mais
medo da morte. No entanto, isso exige esclarecimento. Em primeiro lugar, certos
modos de morte são obviamente indesejáveis, e, em segundo lugar, nenhuma dessas
pessoas está ativamente buscando a morte. Todos sentem que tem tarefas a cumprir
enquanto estiverem fisicamente vivos e concordam com as palavras de um homem
que diz: “Tenho de mudar muitas coisas antes de partir”.

Do mesmo modo, todos desaprovam o suicídio como meio de retornar à realidade que
vivenciaram durante suas experiências. É que agora o estado da morte em si não é
mais sombrio para eles. Vamos analisar algumas passagens nas quais tais atitudes
são explicadas:

1. Suponho que essa experiência moldou algo em minha vida. Eu era apenas uma
criança quando tudo aconteceu, tinha apenas dez anos, mas agora, durante
toda minha vida, estou completamente convencida de que existe vida depois da
morte, sem sombra de dúvida, e não tenho medo de morrer. Não tenho.
Algumas pessoas que conheci sentem muito medo e ficam bem assustadas.
Sempre sorrio quando ouço as pessoas duvidarem da existência da vida depois
da morte, ou dizer: “Quando a gente morre, acaba”. Eu penso: “Eles não sabem
nada”.
Muitas coisas aconteceram comigo na minha vida. No trabalho, apontaram uma
arma para mim, para a minha têmpora. Isso não me assustou muito porque
pensei: Bem, se eu realmente morrer, se realmente me matarem, sei que ainda
viverei em outro lugar”.

2. Quando era garoto, morria de medo de morrer. Acordava de noite chorando e


esperneando. Meus pais corriam até o meu quarto e perguntavam qual era o
problema. Eu dizia que não queria morrer, mas que sabia que teria de morrer e
perguntava se eles poderiam evitar. Minha mãe conversava comigo e dizia:
“Não. As coisas são assim e todos nós teremos de passar por isso sozinhos e
que, quando chegasse o momento, faríamos tudo certo. E, anos mais tarde,
depois que minha mãe morreu, conversava sobre a morte com minha esposa.
Eu ainda tinha medo, não queria morrer.
Mas, desde minha experiência, não a temo mais. Esses sentimentos
desapareceram. Já não me sinto mal nos funerais. Chego até a ficar alegre,
porque sei pelo que o falecido está passando.
Acredito que o Senhor pode ter enviado essa experiência para mim por causa da
maneira como me sentia em relação à morte. Claro que meus pais me
confortavam, mas o Senhor me mostrou, enquanto eles não podiam fazer isso.
Agora, não converso sobre tudo isso, mas sei como é e estou perfeitamente
satisfeito.
3. Agora, não tenho medo de morrer. Também não se trata de desejar a morte ou
querer morrer agora mesmo. Não quero viver do lado de lá agora, porque devo
viver aqui. Entretanto, a razão pela qual não tenho medo da morte é que sei
para onde vou quando partir daqui, porque já estive lá.
4. A última coisa que o ser de luz me disse, antes de eu voltar para o meu corpo,
voltar para a vida, foi que ele voltaria. Ele estava dizendo que eu seguiria em
frente e viveria dessa vez, mas que haveria um momento em que ele entraria
em contato comigo novamente, e que eu morreria de verdade. Portanto sei que
a luz voltará e a voz também, mas não tenho certeza do momento. Acho que
será uma experiência muito similar, mas creio que será melhor, na verdade, já
que agora sei o que esperar e não estarei tão confuso. No entanto, acho que
não quero voltar. Ainda quero fazer algumas coisas por aqui.

A razão pela qual a morte não é mais assustadora, como todas as passagens citadas
expressam, é que depois dessa experiência a pessoa não nutre mais dúvidas sobre
sua sobrevivência à morte física. Não se trata mais de uma mera possibilidade
abstrata, mas de um fato de sua experiência.

Lembre-se de que anteriormente discuti o conceito de ”aniquilação”, que usa o “sono”


e o “esquecimento” como modelos de morte. As pessoas que “morreram” descartam
modelos como esses e escolhem analogias que descrevem a morte como uma
transição de um estado para outro, ou como uma entrada num estado mais elevado
de consciência ou ser. Uma mulher, cujos parentes falecidos estavam ali para
recepcioná-la no momento de sua morte, comparou a morte com uma “festa de
boas-vindas”. Outros compararam com estados psicologicamente positivos, como por
exemplo, o despertar, a formatura, ou a fuga da prisão.

1. Alguns dizem que não estamos usando a palavra morte porque estamos
tentando escapar dela. Isso não é verdade no meu caso. Depois de passar pela
experiência que passei, sabe-se no fundo do coração que não existe essa tal
“morte”. Simplesmente nos formamos e passamos para outra coisa – como do
ensino fundamental para o médio e para a faculdade.
2. A vida é como uma prisão. Nesse estado, simplesmente não entendemos como
esses corpos são prisões. A morte é como ser solto – como fugir da prisão. Essa
é a melhor coisa em que consigo pensar para comparar.

Até mesmo aqueles que previamente tinham alguma convicção tradicional sobre a
natureza do mundo depois da morte parecem ter se afastado de tal convicção após
seu próprio encontro com a morte. De fato, em todos os relatos que reuni, ninguém
pintou a imagem mitológica do que reside no Além. Ninguém descreveu o paraíso dos
cartunistas com portões de pérola, ruas de ouro e anjos alados tocando harpa, nem
um inferno de chamas e demônios com tridentes.

Portanto, na maioria dos casos, o modelo de recompensa e punição para a vida depois
da morte é abandonado e descartado, mesmo por muitos que eram acostumados a
pensar nesses termos. Para sua surpresa, descobriram que mesmo quando seus atos
aparentemente mais terríveis e pecaminosos foram manifestados perante o ser de
luz, este não reagiu com raiva e fúria, mas apenas com compreensão e até mesmo
com humor. Enquanto uma mulher revisava sua vida com esse ser, ela viu algumas
cenas nas quais deixou de mostrar amor para demonstrar egoísmo. Mesmo assim,
disse que as atitudes dele quando essas cenas apareceram foi de que ela estava
aprendendo, mesmo naquele momento. No lugar desse antigo padrão, muitos
parecem ter retornado com um novo modelo e uma nova compreensão do mundo do
Além _ uma visão que não traz o julgamento unilateral, mas um desenvolvimento
cooperativo em relação ao objetivo final de autorrealização. De acordo com essas
novas visões, o desenvolvimento da alma, especialmente das faculdades espirituais de
amor e de conhecimento, não cessa depois da morte. Em vez disso, continua do outro
lado, talvez eternamente, mas certamente por um período de tempo e numa
profundidade que podem apenas ser vislumbrados, enquanto ainda estivermos no
corpo físico, “através de um vidro, obscuramente”.

CORROBORAÇÃO

Naturalmente, surge a questão de que qualquer evidência da realidade das


experiências de quase-morte pode ser conseguida independentemente das descrições
das experiências em si. Muitas pessoas relatam que estiveram fora do seu corpo por
longos períodos e presenciaram muitos eventos no mundo físico durante o interlúdio.
Esses relatos podem ser verificados com outras testemunhas que estavam presentes,
ou com eventos posteriores que confirmem, para assim serem comprovados?

Em vários casos, a resposta de certa forma surpreende para essa questão é “sim”.
Além disso, a descrição dos eventos testemunhados enquanto fora do corpo confere
muito bem com o que de fato ocorreu. Vários médicos me disseram, por exemplo, que
ficam desconcertados ao ver como pacientes sem conhecimento médico podem
descrever, em detalhes e tão corretamente, o procedimento usado nas tentativas de
ressuscitá-los, muito embora esses eventos tenham acontecido enquanto os médicos
sabiam que os pacientes envolvidos estavam “mortos”.

Em vários casos, as pessoas me contaram como surpreenderam seus médicos ou


outras pessoas com relatos dos eventos que presenciaram enquanto estavam fora do
corpo. Enquanto morria, por exemplo, uma garota saiu do corpo e entrou em outra
sala do hospital onde encontrou a irmã mais velha chorando e dizendo: “Oh, Kathy,
por favor, não morra, por favor, não morra”. A irmã mais velha perdeu a fala quando,
mais tarde, Kathy contou exatamente onde ela estava e o que estava dizendo,
naquele momento. Nas duas passagens que se seguem, eventos similares são
descritos.

1. Depois que tudo acabou, o médico me disse que eu havia passado por um
momento difícil, com o que concordei: “É, eu sei” Então perguntou: “Bem,
como você sabe?” e respondi: “Posso dizer tudo o que aconteceu”. Ele não
acreditou. Daí contei a história toda, desde o momento em que parei de
respirar até a hora em que voltei.
2. Quando acordei depois do acidente, meu pai estava lá. Eu nem queria saber
como meu corpo estava, ou como os médicos achavam que eu estava. Tudo
o que queria era conversar sobre a experiência por que tinha passado. Contei
ao meu pai quem me arrastou para fora do prédio e qual era a cor das
roupas que a pessoa estava vestindo, e como me tiraram e até mesmo toda
a conversa que estava acontecendo à minha volta. E meu pai disse: “Bem,
sim, essas coisas são verdade”. Entretanto, meu corpo estava fisicamente
fora naquele momento, e não havia como eu ter visto ou ouvido essas coisas
sem estar fora do meu corpo.

Finalmente, em alguns casos, fui capaz de obter o depoimento independente dos


outros para confirmar os eventos. Ao estimar o valor evidente de tais relatos
independentes, no entanto, vários fatores surgiram para complicar. Primeiro, na
maioria dos casos, o fato a ser comprovado em si é atestado apenas pela própria
pessoa que estava morrendo e no máximo por dois amigos próximos e conhecidos.
Segundo, até mesmo nos exemplos excepcionalmente dramáticos e altamente
confirmados que reuni, prometi não revelar os verdadeiros nomes. Entretanto,
embora pudesse, não acredito que tais histórias comprovadas e reunidas após o fato
constituiriam provas, por razões que explicarei no último capítulo.

Chegamos ao fim de nossa pesquisa sobre os vários estágios e eventos comumente


relatados na experiência da morte. Ao fechar este capítulo, quero fazer uma citação
mais longa de uma descrição bastante excepcional que incorpora muitos dos
elementos que discuti. Além disso, no entanto, ela contém um único fato que não foi
mencionado antes: o ser de luz logo avisa ao homem envolvido sobre sua morte
iminente, e depois decide deixá-lo viver.

Quando isso aconteceu, sofri, como ainda sofro, de um episódio sério de asma
brônquica e enfisema. Certo dia, tive um acesso de tosse e aparentemente rompi um
disco na parte inferior da minha espinha. Por dois meses consultei uma série de
médicos devido à dor agonizante, e finalmente um deles me indicou um
neurocirurgião, o doutor Wyatt. Ele me examinou e disse que eu precisava ser
internado imediatamente, e assim fazendo, colocou-me na tração em seguida.

O doutor Wyatt sabia que eu tinha uma doença respiratória séria, então chamou
um pneumologista, que informou que o anestesista, doutor Coleman, deveria ser
consultado para ver se poderiam me anestesiar. Assim, o pneumologista cuidou de
mim por quase três semanas até que finalmente me levou a um ponto em que o
doutor Coleman pudesse me anestesiar. Um dia, ele finalmente concordou, embora
ainda estivesse muito preocupado. Eles marcaram a cirurgia.

Uma noite, já no hospital, fui dormir e tive um sono agitado até algum
momento da madrugada, quando acordei com uma dor aguda. Virei-me na cama e
tentei encontrar uma posição mais confortável, mas nesse momento uma luz
apareceu num canto do quarto, pouco abaixo do teto. Apenas uma bola de luz, quase
como um globo, e não era muito grande, tinha cerca de trinta ou quarenta
centímetros de diâmetro; e quando a luz surgiu, uma sensação tomou conta de mim.
Não posso dizer que era uma sensação estranha, porque não era. Era um sentimento
de completa paz e extremo relaxamento. Pude ver a mão que se estendia da luz até
mim, e a luz disse: “Venha comigo. Quero mostrar-lhe algo”. Então, imediatamente,
sem hesitação alguma, estiquei minha mão. Ao fazer isso, tive a sensação de ser
erguido e de ter deixado meu corpo. Quando olhei para trás vi que ainda estava
deitado na cama enquanto subia até o teto do quarto.

Nesse momento, quando saí do corpo, assumi a mesma forma da luz. Tive a
sensação, e terei de usar minhas próprias palavras para descrever, uma vez que
nunca ouvi ninguém falar sobre nada parecido, que essa forma era definitivamente
um espírito. Não era um corpo, apenas uma nuvem de fumaça ou vapor. No entanto,
a forma que assumi tinha cores. Havia laranja, amarelo e uma cor que não sei
distinguir _ parecia um azul índigo, um tom de azul.

Esse ser espiritual não tinha a forma de um corpo. Era mais ou menos circular,
mas tinha o que posso chamar de mão. Sei disso porque quando a luz veio até mim,
estendi minha mão. Mesmo assim, o braço e a mão do meu corpo estavam parados,
pois podia vê-los deitados na cama, ao lado do meu corpo, enquanto me elevava até
a luz. Mas quando eu não estava usando essa mão espiritual, o espírito voltava ao
formato circular.

Assim, fui atraído para a mesma posição em que a luz estava, e começamos a
nos mover até o corredor, atravessando os andares, ao que me parece, até chegar ao
térreo. Não tínhamos nenhuma dificuldade para atravessar portas ou paredes. Elas
simplesmente se desfaziam conforme nos aproximávamos delas.

Durante esse período, era como se estivéssemos viajando. Eu sabia que


estávamos nos movendo, mas não havia a sensação de velocidade. Em dado
momento, quase instantaneamente, para dizer a verdade, percebi que tínhamos
chegado no CTI do hospital. E eu nem sabia onde ficava aquela sala, mas chegamos
lá, e novamente estávamos no canto, perto do teto, acima de tudo o mais. Vi os
médicos e as enfermeiras caminhando com seus jalecos verdes e as camas colocadas
ali.

Então esse ser me disse _ mostrou-me _ “Você ficará aqui. Quando trouxerem
você da mesa de operação, vão colocá-lo naquela cama, mas você nunca acordará
daquela posição. Você não saberá de nada depois de ir para a sala de cirurgia até que
eu volte para buscá-lo algum tempo depois disso”. Agora, não quero dizer que isso
tenha vindo em palavras. Não era como uma voz audível, porque se fosse eu
esperaria que os outros na sala tivessem ouvido a voz, mas eles não ouviram. Foi
mais como uma impressão que veio até mim. Mas veio de forma tão vívida que não
havia como dizer que não ouvi ou não senti. Era definitivamente para mim.

E o que eu via _ bem, era tão mais fácil reconhecer as coisas enquanto estava
nessa forma espiritual. Perguntava-me: “O que é que ele está tentando me mostrar?”
Eu sabia imediatamente o que era, o que ele tinha em mente. Não havia dúvida. Era
que aquela cama _ a cama à direita assim que se entra do corredor _ seria onde eu
ficaria, e ele me trouxera aqui com um propósito. Então, disse-me por que.
Ocorreu-me que o motivo para isso é que ele não queria que eu sentisse nenhum
medo quando chegasse o momento de meu espírito deixar o corpo, mas que ele
queria que eu soubesse qual era a sensação nessa hora de transição. Ele queria me
confortar para que eu não tivesse medo, pois ele estava dizendo que não estaria ali
imediatamente, que eu passaria por outras coisas antes, mas que tudo o mais
perderia a importância porque ele estaria comigo no final.

Quando me uni a ele nesse passeio até o CTI, eu próprio me tornei um espírito,
de alguma forma fomos fundidos em um. Claro que ainda éramos dois separados.
Mesmo assim, ele tinha total controle sobre tudo o que se passava no que dizia
respeito a mim. E mesmo que estivéssemos viajando pelas paredes e tetos, e assim
por diante, bem, parecia que estávamos numa comunhão tão próxima que nada
poderia ter nos incomodado. Novamente, era apenas uma paz, calma e serenidade
que nunca tinham sido encontradas em nenhum outro lugar.

Então, depois de me dizer isso, ele me levou de volta ao quarto do hospital, e


quando voltei vi meu corpo novamente, ainda deitado na mesma posição em que o
tínhamos deixado, e instantaneamente estava de volta ao meu corpo. Diria que estive
fora do corpo por cinco ou dez minutos, mas a passagem de tempo não tinha nada a
ver com essa experiência. De fato, nem me lembro se já pensei nisso como um
momento específico.

Bem, a coisa toda me surpreendeu, pegou-me completamente desprevenido.


Foi tão vívido e real - mais do que uma experiência comum. E, na manhã seguinte,
eu não tinha nem um pouco de medo. Quando fiz a barba, percebi que minha mão
não estava tremendo como nas seis ou oito semanas anteriores, sabia que morreria, e
não havia arrependimento nem medo. Não havia nenhum pensamento do tipo: “O
que posso fazer para evitar isso?”. Eu estava pronto.

Um dia antes da cirurgia, que aconteceria pela manhã, eu estava no quarto do


hospital preocupado. Minha esposa e eu temos um garoto, um sobrinho adotado, e
passávamos por algumas dificuldades com ele. Então decidi escrever uma carta para
minha esposa e outra para o meu sobrinho, colocando algumas de minhas
preocupações em palavras, e decidi esconder as cartas onde encontrariam apenas
depois da cirurgia. Após escrever cerca de duas páginas para minha esposa, foi como
se as comportas tivessem sido abertas. De repente, debulhei-me em lágrimas,
soluçando. Senti uma presença, e a princípio pensei que talvez tivesse chorado tão
alto que incomodara uma das enfermeiras, e que elas tinham vindo ver qual era o
problema comigo. Mas não ouvi a porta abrir. Novamente senti essa presença, mas
não vi nenhuma luz dessa vez, e os pensamentos ou palavras vieram até mim, assim
como acontecera antes, e ele disse: “Jack, por que você está chorando? Achei que
você ficaria feliz de vir comigo” E pensei: “Sim, eu estou feliz. Quero muito ir” E a voz
respondeu: “Então, por que você está chorando?” Respondi: “Estamos com problemas
com nosso sobrinho, você sabe, e tenho medo de que minha esposa não vá saber
criá-lo. Estou tentando colocar em palavras como me sinto, e o que quero que ela
tente fazer por ele. Também estou preocupado porque sinto que talvez minha
presença pudesse colocar os pés dele no chão”.

Foi quando os seguintes pensamentos dessa presença vieram até mim: “Como
você está pedindo por outra pessoa, e pensando nos outros, não em si, concederei
aquilo que me pede. Você viverá até ver seu sobrinho se tornar um homem”. E, de
repente, ele se foi. Parei de chorar e rasguei a carta para que minha esposa não a
encontrasse acidentalmente.

Naquela noite, o doutor Coleman veio me dizer que esperava muita dificuldade
para me anestesiar, e que eu não deveria ficar surpreso se ao acordar encontrasse
vários fios, tubos e máquinas à minha volta. Não contei e rasguei o que havia
vivenciado, apenas concordei e disse que iria cooperar.

Na manhã seguinte, a cirurgia demorou muito, mas tudo correu bem, e eu


estava recobrando a consciência quando vi o doutor Coleman, que estava comigo, e
disse-lhe: “Em qual cama você está?” Respondi: “Estou na primeira cama à direita
quando se entra do corredor”. Ele deu risada e certamente pensou que eu estava
falando essas coisas estranhas por causa da anestesia.

Eu queria contar o que havia acontecido, mas no mesmo instante o doutor


Wyatt entrou e disse: “Ele está acordado agora. O que você quer fazer?” E o doutor
Coleman disse: “Não há nada que eu possa fazer. Nunca fiquei tão perplexo na minha
vida. Estou aqui com todo esse equipamento montado e ele não precisa de nada”. O
doutor Wyatt disse: “Surpresas ainda acontecem, sabia?” Assim, quando pude me
levantar da cama e olhar em volta do quarto, vi que estava na mesma cama que a luz
havia me mostrado vários dias atrás.

Tudo isso aconteceu três anos atrás, mas as imagens ainda são tão vívidas
quanto naquela época. Foi a coisa mais fantástica que já aconteceu comigo, e fez uma
grande diferença. Mas não converso sobre esse assunto. Contei apenas pata minha
esposa, meu irmão, o padre, e agora para você. Não sei como dizer, mas isso é muito
difícil de explicar. Não estou tentando causar um grande abalo na sua vida, e não
estou tentando me vangloriar. É que só depois disso não tenho mais quaisquer
dúvidas. Sei que existe vida depois da morte.

PARALELOS

Os eventos dos vários estágios da experiência de morrer são, para dizer o mínimo,
incomuns. Portanto, minha surpresa foi aumentando com o passar dos anos conforme
encontrava um número impressionante de paralelos a esses estágios. Esses paralelos
ocorrem em escritos ancestrais e/ou altamente esotéricos na literatura de diversas
civilizações, culturas e eras.

A BÍBLIA

Na nossa sociedade, a Bíblia é o livro mais amplamente lido e discutido que lida com
assuntos relacionados à natureza do aspecto espiritual do homem e da vida depois da
morte. Como um todo, no entanto, a Bíblia tem relativamente pouco a dizer sobre os
eventos que ocorrem depois da morte, ou sobre a natureza precisa do mundo
pós-morte. Isso é especialmente verdade no Velho Testamento. De acordo com alguns
estudiosos da Bíblia, apenas duas passagens em todo o Velho Testamento falam sobre
a vida depois da morte sem deixar dúvidas:

Os teus mortos e também o meu cadáver viverão e ressuscitarão; despertai e


exultai, os que habitais no pó, porque... a terra lançará de si os mortos13.

E muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida eterna,
e outros para vergonha e desprezo eterno14.

Perceba que em ambas as passagens existe a forte sugestão de que uma ressurreição
do corpo físico vai ocorrer e que o estado de morte física é comparada aqui,
novamente, com o sono.

Entretanto, assim como ficou evidente no capítulo anterior, poucas pessoas


recorreram a conceitos bíblicos enquanto tentavam elucidar ou explicar o que
acontecera com eles. Por exemplo, você se lembrará de um homem que identificou a
passagem escura que atravessou no momento da morte como “o vale da sombra da
morte” presente na Bíblia. Uma pessoa mencionou a declaração de Jesus que dizia:
“Eu sou a luz do mundo”. Aparentemente, foi, pelo menos parcialmente, com base
nessa frase, que identificou a luz com que deparou com Cristo. E essa pessoa falou:
“Nem cheguei a ver alguém na luz, mas para mim a luz era a consciência de Cristo, a
unidade de todas as coisas, o amor perfeito. Acho que Jesus foi muito literal quando
disse que era a luz do mundo”.

Além disso, em minhas próprias leituras deparei com alguns paralelos similares que
nenhum dos meus entrevistados mencionou. Os paralelos mais interessantes
aparecem nas escrituras do apóstolo Paulo. Ele perseguia os cristãos até ter sua
famosa visão e conversão na estrada de Damasco. Ele diz:

Ao meio-dia, ó rei, vi no caminho uma luz do céu, que excedia o esplendor do


sol, cuja claridade me envolveu a mim e aos que iam comigo. E, caindo nós todos por
terra, ouvi uma voz que me falava, e em língua hebraica dizia: Saulo, Saulo, por que
me persegues? Dura coisa te é recalcitrar contra os aguilhões.

E disse eu: Quem és, Senhor? E ele respondeu: Eu sou Jesus, a quem tu
persegues; mas levanta-te e põe-te sobre teus pés, porque te apareci por isto, para
te pôr ministro e testemunha tanto das coisas que tens visto como daquelas pelas
quais te aparecerei ainda.

Por isso, ó rei Agripa, não fui desobediente à visão celestial... E, dizendo ele isto
em sua defesa, disse Festo em alta voz: Estás louco, Paulo; as muitas letras te fazem
delirar. Mas ele disse: Não deliro, ó potentíssimo Festo; antes digo palavras de
verdade e de um são juízo15.

Esse episódio obviamente traz certa semelhança do encontro com o ser de luz nas
experiências de quase-morte. Em primeiro lugar, o ser é dotado de personalidade,
embora nenhuma forma física seja vista, e uma “voz” que faz uma pergunta e
transmite instruções emana do ser. Quando Paulo tenta contar aos demais, sofre
zombaria, e é rotulado de ”insano”. Contudo, a visão mudou o curso de sua vida: a
partir daquele momento, ele se tornou o líder devoto do Cristianismo como forma de
vida de amor ao próximo.

Claro que também existem diferenças. Paulo não esteve próximo da morte no curso
de sua visão. Ademais, de forma bastante interessante, Paulo relata que foi cegado
pela luz e incapaz de enxergar por três dias após o acontecido. Isso entra em
contradição com os relatos daqueles que dizem que embora a luz fosse
indescritivelmente brilhante, de forma nenhuma os cegava, ou impedia que vissem as
coisas à sua volta.

Em suas discussões acerca da natureza da vida depois da morte, Paulo diz que alguns
desafiam o conceito cristão da vida depois da morte perguntando que tipo de corpo o
morto terá.

Mas alguém dirá: Como ressuscitarão os mortos? E com que corpo virão?
Insensato!... quando semeias, não semeias o corpo que há de nascer, mas o simples
grão, como de trigo... Mas Deus dá-lhe o corpo como quer, e a cada semente o seu
próprio corpo... E há corpos celestes e corpos terrestres... mas uma é a glória dos
celestes e outra a dos terrestres... Assim também a ressurreição dentre os mortos.
Semeia-se o corpo em corrupção; ressuscitarão em incorrupção. Semeia-se em
ignomínia, ressuscitará em glória. Semeia-se em fraqueza, ressuscitará com vigor.
Semeia-se corpo natural, ressuscitará corpo espiritual. Se há corpo natural, há
também corpo espiritual... Eis aqui vos digo um mistério: Na verdade, nem todos
dormiremos, mas todos seremos transformados; num momento, num abrir e fechar
de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão
incorruptíveis, e nós seremos transformados16.

De forma interessante, o breve esboço de Paulo sobre a natureza do “corpo espiritual”


corresponde muito bem às descrições daqueles que se encontram fora do corpo. Em
todos os casos, a natureza imaterial do corpo espiritual _ sua falta de substância física
– é enfatizada, assim como sua falta de limitações. Por exemplo, Paulo diz que apesar
de o corpo físico ser fraco e feio, o corpo espiritual será forte e belo. Isso faz recordar
uma das descrições de uma experiência de quase-morte em que o corpo espiritual
parecia inteiro e completo muito embora o corpo físico pudesse ser visto mutilado, e
de outra descrição em que o corpo espiritual parecia não ter uma idade específica,
isto é, não era limitado pelo tempo.

PLATÃO

O filósofo Platão, que foi um dos maiores pensadores de todos os tempos, viveu em
Atenas de 428 a 348 a.C. Ele nos deixou uma série de pensamentos na forma de
cerca de vinte e duas peças e diálogos filosóficos, muitos dos quais incluem seu
professor Sócrates como interlocutor-chefe, além de um pequeno número de cartas.

Platão acreditava piamente no uso da razão, lógica e argumentação para se chegar à


verdade e à sabedoria, mas apenas até certo ponto, porque ademais ele era um
grande visionário que sugeriu que a verdade final só pode ser alcançada numa
experiência quase mística de iluminação e descoberta. Ele aceitava que havia planos e
dimensões da realidade além do mundo sensível e físico e acreditava que a realidade
física podia ser compreendida apenas por referência a esses outros planos “mais
elevados” de realidade. Do mesmo modo, estava interessado principalmente no
componente não corpóreo e consciente do homem - a alma - e via o corpo físico
apenas como o veículo temporário da alma. Assim, não é de se surpreender que
tenha estado interessado no destino da alma depois da morte física e que vários de
seus diálogos - especialmente Fédon, Górgias e A República - tratem em parte desse
mesmo tópico.

Os escritos de Platão estão repletos de descrições da morte, que são precisamente


como aquelas discutidas no capítulo anterior. Por exemplo, Platão define a morte
como a separação da parte não corpórea de um ser vivente, a alma, da parte física, o
corpo. Indo além, essa parte não corpórea do homem é sujeita a um número muito
menor de limitações. Por conseguinte, Platão especificamente aponta que o tempo
não é um elemento das realidades além do mundo físico e sensível. As outras
realidades são eternas, e, numa frase marcante de Platão, aquilo que chamamos de
tempo não é nada além do que “reflexo móvel e irreal da eternidade”.

Platão discute em várias passagens como a alma que foi separada de seu corpo pode
encontrar e conversar com espíritos de pessoas que partiram e ser orientada por
espíritos guardiães durante a transmissão da vida física para a próxima realidade. Ele
menciona como algumas pessoas esperam ser recepcionadas no momento da morte
por um barco que as leve através de uma represa até “a outra margem” de sua
experiência de pós-morte. Em Fédon, o cenário dramático e o golpe de argumentos e
palavras usadas transmitem a ideia de que o corpo é a prisão da alma e que, por
correspondência, a morte é como uma fuga ou libertação dessa prisão. Embora, como
visão antiga da morte como sono e esquecimento, ele faz isso apenas para descartar
a ideia, e na verdade, dar uma girada de 180º. De acordo com Platão, o espírito entra
no corpo físico, ao nascer o corpo, passa de um estado de grande consciência para
um de menor consciência, esquecendo as verdades que conhecia enquanto estava em
seu estado extracorpóreo anterior. Por implicação, a morte é despertar e acordar.
Platão observa que o espírito que foi separado do corpo depois da morte pode pensar
e raciocinar de forma ainda mais clara do que antes, de reconhecer as coisas em sua
verdadeira natureza muito mais prontamente. Além disso, logo depois da morte, o
espírito enfrenta um “julgamento” no qual um ser divino exibe perante ele todas as
coisas - boas e ruins - que ele fez durante a vida e faz com que o espírito as encare.

No livro X de A república, talvez ocorra a semelhança mais marcante de todas. Platão


conta o mito de Er, um soldado grego. Er partiu para uma batalha na qual muitos
gregos foram mortos, e quando seus conterrâneos foram recolher os corpos, seu
cadáver estava entre eles. Estava disposto, junto com todos os outros, numa pira
funeral. Após algum tempo, seu corpo reviveu, e Er descreveu o que havia visto em
sua jornada pelo Além. Em primeiro lugar, Er disse que sua alma saiu do corpo,
uniu-se a um grupo de outros espíritos e foi para um lugar onde havia “aberturas” ou
“passagens” que aparentemente levavam da terra para os domínios da vida depois da
morte. Aqui os outros espíritos foram brecados e julgados por seres divinos, que
podiam ver de uma só vez, em algum tipo de tela, todas as coisas que o espírito
fizera durante sua vida terrena. Er, no entanto, não foi julgado. Em vez disso, os seres
disseram que ele deveria voltar para informar aos homens no mundo físico do que se
tratava esse outro mundo. Após ver muitas outras coisas, Er foi mandado de volta,
mas disse não saber como fora levado ao corpo físico. Ele simplesmente acordou e
encontrou-se na pira funeral.
É importante ter em mente que o próprio Platão nos avisa sobre suas intenções de
que suas descrições dos detalhes precisos do mundo em que a alma entrará depois da
morte sejam “probabilidades, no máximo”. Embora não duvide de que a sobrevivência
da morte corporal ocorra, ele diz que, ao tentar explicar o pós-morte enquanto ainda
se está na vida física, enfrentamos duas desvantagens muito fortes. Primeiro, nosso
espírito está aprisionado no corpo físico e, portanto, limitado no que pode vivenciar e
aprender através do nosso sentido físico. A visão, a audição, o tato, o paladar e o
olfato podem nos enganar à sua própria maneira. Nossos olhos podem fazer com que
um objeto enorme pareça pequeno se estiver distante, podemos ouvir mal o que
alguém nos diz, e assim por diante. Tudo isso pode resultar em opiniões ou
impressões falsas da natureza das coisas. Assim, nossos espíritos não podem ver a
realidade em si até que estejam libertos das distrações e imperfeições dos sentidos
físicos.

Segundo, Platão diz que a linguagem humana é inadequada para expressar as


realidades finais diretamente. As palavras ocultam em vez de revelar a natureza
interior das coisas. Assim, nenhuma palavra humana pode fazer nada mais além de
indicar – por analogia, através do mito ou em outras formas indiretas – o verdadeiro
caráter daquilo que reside além da realidade física.

O LIVRO DOS MORTOS TIBETANO

Esse trabalho notável foi compilado dos ensinamentos de sábios durante muitos
séculos no Tibete pré-histórico, e transmitido oralmente através das gerações.
Aparentemente, ele foi finalmente escrito no século oito d.C., mas imediatamente
escondido para mantê-lo em segredo dos forasteiros.

A forma que esse livro incomum assume é moldada pelos vários usos
inter-relacionados em que é empregado. Em primeiro lugar, os sábios que viam a
morte, de fato, como uma habilidade – dependendo do fato de a pessoa ter o
conhecimento requerido para fazê-lo bem. Assim, o livro era lido como parte da
cerimônia funeral, ou para pessoas à beira da morte durante os momentos finais de
sua vida. Desse modo, acreditava-se que servia para duas coisas. A primeira era
ajudar a pessoa que morria a ter em mente a natureza de cada fenômeno novo e
maravilhoso que vivenciaria. A segunda era ajudar aqueles que seguiam vivos a ter
pensamentos positivos e não prender o morto com seu amor e preocupação
emocional, para que ele pudesse entrar nos planos de pós-morte com um estado
mental apropriado, livre de todas as preocupações do corpo.

Para cumprir tais finalidades, o livro contém uma longa descrição dos vários estágios
pelos quais o espírito passa depois da morte física. A correspondência entre os
primeiros estágios da morte que o livro relata e aqueles recontados a mim por
aqueles que estiveram perto da morte é bastante fantástica.
Na descrição tibetana, a mente ou alma do falecido abandona o corpo. Algum tempo
depois, a alma entra num “desmaio” e se encontra num vazio – não um vazio físico,
mas um que é, de fato, sujeito ao seu próprio tipo de limites, em que sua consciência
ainda existe. Ela pode ouvir sons e barulhos alarmantes e perturbadores descrito
como rugidos, trovões e assobios, como o vento, e geralmente se encontra, bem
como tudo à sua volta, envolto em uma iluminação cinza e nebulosa.

Ela fica surpresa ao encontrar-se fora do corpo físico. Vê e ouve seus parentes e
amigos velando seu corpo e preparando-o para o funeral. Mesmo assim, quando tenta
conversar, ninguém pode vê-la ou ouvi-la; ainda não percebe que está morta e fica
confusa. Pergunta a si mesma se está morta e, quando percebe que está, fica
imaginando para onde deve ir ou o que deve fazer. Um grande arrependimento se
instala e ela fica deprimida com sua condição. Por um tempo, continua perto dos
lugares com os quais estava familiarizada na vida física.

Percebe que ainda está num corpo – chamado de corpo “brilhante” – que não parece
consistir de substância material. Portanto, pode atravessar rochas, paredes, e até
mesmo, montanhas, sem encontrar resistência alguma. Viajar é quase instantâneo.
Para onde desejar ir, chega em apenas um instante. Seu pensamento e percepção
estão menos limitados; a mente fica mais lúcida, e os sentidos parecem estar mais
apurados, perfeitos e próximos da natureza do divino. Se na vida física foi cega, surda
ou aleijada, fica surpresa ao descobrir que em seu corpo “brilhante” todos esses
sentidos, bem como todos os poderes do corpo físico, foram restaurados e
intensificados. Talvez encontre outros seres no mesmo tipo de corpo, e talvez
encontre o que é chamado de uma luz clara ou pura. Os tibetanos aconselham a
pessoa que está perto da morte a aproximar-se dessa luz e tentar sentir apenas amor
e compaixão pelos demais.

O livro também descreve os sentimentos de imensa paz e contentamento que aquele


que vai morrer vivencia, e também um tipo de “espelho” onde toda a sua vida, todas
as ações, boas e ruins, são refletidas para que ele e os seres que vão julgá-lo possam
ver vividamente. Nessa situação, não pode haver adulteração dos fatos; mentir sobre
a própria vida é impossível.

Em resumo, muito embora O livro dos mortos tibetano inclua muitos estágios
posteriores à morte, nenhum dos meus entrevistados chegou a vivenciá-los. É
bastante óbvio que há uma semelhança marcante entre a descrição desse manuscrito
ancestral e os eventos que foram relatados a mim por norte-americanos do século
vinte.

EMANUEL SWEDENBORG

Swedenborg, que viveu de 1688 a 1772, nasceu em Estocolmo. Foi bastante


renomado em seu tempo e fez contribuições respeitáveis em vários campos da ciência
natural. Seus escritos, a princípio voltados para anatomia, fisiologia e psicologia,
obtiveram bastante reconhecimento. Mais tarde, no entanto, ele passou por uma crise
religiosa e começou a contar sobre experiências em que esteve aparentemente em
comunicação com entidades espirituais do Além.

Seus últimos trabalhos estão repletos de descrições vívidas de como é a vida depois
da morte. Novamente, a correlação entre o que ele escreve acerca de algumas de
suas experiências espirituais e aquilo que as pessoas que voltaram de seu contato
com a morte relatam é surpreendente. Por exemplo, Swedenborg descreve como é
quando as funções corporais de respiração e circulação cessam:

O homem ainda não morre, mas é apenas separado da parte corpórea que era
útil para ele no mundo... O homem, quando morre, apenas passa de um mundo para
outro17.

Swedenborg declara que ele próprio passou pelos eventos iniciais da morte e que teve
experiências fora do corpo.

Fui trazido a um estado de insensibilidade quanto aos sentidos corporais, quase


no estado de morte; contudo, a vida interior com pensamento permanecia intacta, de
modo que eu podia perceber e reter na memória as coisas que se passaram, e que se
passam com aqueles que são ressuscitados dos mortos... Especialmente me foi
permitido perceber... que havia uma sensação de ter a mente ... arrastada... puxada
do mesmo modo meu espírito, do corpo.

Durante essa experiência, ele encontra seres que identifica como “anjos”, que lhe
perguntam se está preparado para morrer.

Os anjos primeiro indagaram qual era meu pensamento, se era como o


daqueles que morrem, geralmente acerca da vida eterna, e que desejavam manter
minha mente nesse pensamento.

Entretanto, a comunicação que ocorre entre Swedenborg e os espíritos não é de uma


natureza terrena e humana. Dessa forma, não existe possibilidade de equívoco.

Enquanto os espíritos conversam entre si por meio de uma linguagem


universal... Cada homem, imediatamente depois da morte, entra nessa linguagem
universal... que é própria do espírito...

A fala de um espírito com o homem é ouvida tão sonoramente quanto a fala de


um homem com um homem; no entanto, não é ouvida pelos outros que estiverem
perto, mas apenas por ele mesmo; a razão para isso é que a fala de um anjo ou
espírito flui primeiro para o pensamento do homem...
O recém-falecido não percebe que está morto, pois ainda está em um “corpo” que se
assemelha com seu corpo físico em vários aspectos.

O primeiro estado do homem depois da morte é similar ao seu estado no


mundo, porque nesse momento ele tem a mesma semelhança externa... Desse modo,
não duvida que ainda está no mundo... Portanto, após ficar maravilhado com o fato
de que está em um corpo, e com todos os sentidos que teve no mundo... vêm o
desejo de saber como é o paraíso e como é o inferno.

Contudo, o estado espiritual é menos limitado. A percepção, o pensamento e a


memória são mais perfeitos, e o tempo e o espaço não são mais os obstáculos que
eram na vida física.

Todas as faculdades dos espíritos... estão num estado mais perfeito, bem como
suas sensações, pensamentos e percepções.

O homem que enfrenta a morte pode encontrar outros espíritos falecidos que
conhecia enquanto vivo. Eles estão ali para ajudá-lo durante sua passagem para o
Além.

O espírito do homem que recentemente deixou o mundo é... reconhecido por


seus amigos e por aqueles que conhecera no mundo... e, por conseguinte é instruído
por seus amigos em relação ao estado da vida eterna...

Sua vida pregressa pode ser mostrada a ele numa visão. Ele recorda cada detalhe e
não há possibilidade de mentir ou ocultar nada.

A memória interior... é de tal forma que nela estão inscritas todas as coisas
particulares... que a qualquer momento o homem pensou, disse e fez... desde o
começo de sua infância até a extrema velhice. O homem traz consigo a memória de
todas as coisas quando entra na outra vida, e é sucessivamente levado a recordar de
tudo... Tudo o que disse e fez... é manifestado perante os espíritos, numa luz tão
clara quanto o dia... e... não há nada tão escondido no mundo que não seja
manifestado depois da morte... como se fosse visto num retrato, quando o espírito é
visto sob a luz do paraíso.

Swedenborg também descreve a “luz do Senhor” que permeia o Além; uma luz de
brilho inefável que ele próprio viu. E uma luz de verdade e compreensão.

Assim, novamente nos escritos de Swedenborg, do mesmo modo como na Bíblia, nos
trabalhos de Platão e em O livro dos mortos tibetano, encontramos paralelos
marcantes com os eventos encontrados nas experiências contemporâneas de
quase-morte. No entanto, surge naturalmente a questão se esse paralelismo é
realmente tão surpreendente. Por exemplo, alguns podem sugerir que os autores
desses vários trabalhos podem ter influenciado um ao outro. Tal assertiva pode ser
sustentada em alguns casos, mas não em outros. Platão admite que derivou alguns
de seus insights parcialmente do misticismo religioso oriental, então ele pode ter sido
influenciado pela mesma tradição que produziu O livro dos mortos tibetano. As ideias
da filosofia grega, por sua vez, influenciaram certos escritores do Novo Testamento e
pode-se argumentar que a discussão de Paulo sobre o corpo espiritual tem algumas
de suas raízes em Platão.

Por outro lado, na maioria dos casos, não é fácil estabelecer que tal influência possa
ter ocorrido. Cada escritor parece revelar alguns detalhes interessantes que também
são recorrentes nas minhas entrevistas, mas que não poderiam ser obtidos de autores
anteriores. Swedenborg leu a Bíblia e estava familiarizado com Platão. Entretanto, ele
alude, várias vezes, ao fato de que alguém que acabou de morrer pode não perceber
que está morto por algum tempo. Esse fato, que surge várias vezes nas narrativas
daqueles que estiveram perto da morte, aparentemente não é mencionado nem na
Bíblia nem por Platão. Entretanto, é enfatizado em O livro dos mortos tibetano, um
trabalho que Swedenborg não poderia ter lido. Na verdade, o livro não havia sido
traduzido até 1927.

É possível que as experiências de quase-morte que reuni foram influenciadas pelo tipo
de trabalhos aqui expostos? Todas as pessoas com quem conversei tiveram alguma
exposição à Bíblia, antes de suas experiências, e duas ou três sabiam alguma coisa
sobre as ideias de Platão. Por outro lado, ninguém estava ciente da existência de tal
esoterismo como os trabalhos de Swedenborg ou O livro dos mortos tibetano. Mesmo
assim, muitos detalhes que não aparecem na Bíblia, ou até mesmo em Platão,
constantemente surgem nas descrições que reuni, e essas correspondem exatamente
aos fenômenos e eventos mencionados nas fontes mais incomuns.

Deve-se reconhecer que a existência de similaridades e paralelos entre os escritos dos


antigos pensadores e os relatos dos modernos americanos que sobreviveram aos
contatos próximos com a morte permanece como um fato marcante, e até agora sem
explicação definitiva. Podemos nos perguntar como é que a sabedoria dos tibetanos, a
teologia e as visões de Paulo, os estranhos insights e mitos de Platão e as revelações
espirituais de Swedenborg estão tão de acordo, tanto entre si como com as narrativas
dos indivíduos contemporâneos que estiveram o mais próximo possível do estado da
morte e permaneceram vivos.

PERGUNTAS

Neste momento, muitas dúvidas e objeções terão ocorrido ao leitor. Nesses anos que
venho ministrando palestras, fechadas e públicas, sobre o assunto, muitas perguntas
foram feitas. Em geral, costumo receber perguntas sobre as mesmas coisas na
maioria das ocasiões, então pude compilar uma lista dessas perguntas feitas com
mais frequência. Neste capítulo e no próximo vou abordar essas questões.

Você está inventando tudo isso?

Não, não estou. Gostaria muito de seguir uma carreira no ensino da psiquiatria e da
filosofia da medicina, e tentar perpetrar uma mentira não me levaria de maneira
nenhuma a esse caminho.

Ademais, minha experiência mostra que qualquer pessoa que fizer perguntas
compassivas e atenciosas entre seus conhecidos, amigos e parentes sobre a
ocorrência de tais experiências logo verá que suas dúvidas se dissiparão.

Mas você não está sendo irrealista? Afinal, essas experiências não são tão
comuns.

Sou o primeiro a admitir que, devido à natureza necessariamente limitadas das


minhas amostras de casos, sou incapaz de dar uma estimativa numérica significativa
da incidência ou relevância desse fenômeno. Entretanto, estou bastante disposto a
dizer que a ocorrência de tais experiências é muito mais comum do que qualquer
pessoa que não as estudou poderia imaginar. Tenho feito palestras públicas sobre o
assunto, para grupos de vários tipos e tamanhos, e nunca houve um só momento em
que alguém presente não me procurasse depois com uma história própria, ou até
mesmo, em alguns casos, contasse a história publicamente. Claro que sempre se
pode dizer (e com razão!) que uma pessoa que tivesse passado por tal experiência
teria maior tendência a participar de uma palestra sobre o assunto. No entanto, na
maioria dos casos, a pessoa envolvida não veio até a palestra por causa do assunto.
Por exemplo, recentemente me apresentei para um grupo de trinta pessoas. Duas
haviam passado por experiências de quase-morte e duas estavam ali simplesmente
porque eram membros do grupo. Nenhuma delas conhecia o assunto das palestras.

Se as experiências de quase-morte são tão comuns como você diz, por que
não é um fato, em geral, mais conhecido?

Parece haver várias razões para isso. Em primeiro lugar, acredito que está o fato de
que o nosso tempo, em geral, é decididamente contra discussões sobre a
possibilidade de sobrevivência à morte corporal. Vivemos numa época em que a
ciência e a tecnologia deram passos enormes rumo à compreensão e conquista da
natureza. Conversar sobre a vida depois da morte parece, de algum modo, atávico
para muitas pessoas que talvez sintam que a ideia pertence mais ao nosso passado
“supersticioso” do que ao nosso presente “científico”. Do mesmo modo, as pessoas
que passaram por experiências que estão fora do domínio da ciência, como as que
citamos, são ridicularizadas. Cientes dessas atitudes, é compreensível que as pessoas
que passaram por experiências transcendentais geralmente fiquem relutantes em
contá-las abertamente. Na verdade, estou convencido de que uma grande massa de
material está escondida na mente dessas pessoas, que, por medo de serem rotuladas
de ”loucas” ou “superimaginativas”, nunca contaram para mais de um ou dois amigos
ou parentes.

Além disso, a obscuridade pública e geral do assunto de proximidade com a morte


parecem derivar em parte de um fenômeno psicológico comum que envolve a
atenção. Muito daquilo que ouvimos e vemos todos os dias entra sem ser registrado
em nossa mente consciente. Contudo, se nossa atenção é atraída por algo de forma
dramática, tendemos a perceber isso dali em diante. Muitas pessoas passam pela
experiência de aprender o significado de uma nova palavra, e então, veem a palavra
em tudo o que pegam para ler. Geralmente, a explicação não é que a palavra
simplesmente assumiu o controle da linguagem e está aparecendo em todo o lugar. A
palavra sempre esteve ali, em todas as coisas que a pessoa lia, o tempo todo, mas,
por não conhecer o seu significado, ela simplesmente saltava a palavra sem tomar
consciência disso.

De maneira similar, depois de uma palestra que fiz recentemente, abri espaço para
discussão, e um médico fez a primeira pergunta: ”Sou médico há muito tempo. Se
essas experiências são tão comuns como você diz, por que ainda não ouvi nada sobre
elas?” Sabendo que provavelmente haveria alguém ali que deparara com um caso ou
dois, imediatamente voltei a questão para a plateia. Perguntei: “Mais alguém aqui já
ouviu alguma coisa desse tipo?” Nesse momento, a esposa do médico ergueu a mão e
relatou a história de um amigo muito próximo deles.

Para dar outro exemplo, um médico que conheço tomou contato com experiências
desse tipo ao ler um velho artigo de jornal sobre uma palestra que dei. No dia
seguinte, sem ser solicitado, um paciente fez uma descrição de uma experiência
bastante similar. O médico disse que o paciente não poderia ter ouvido ou lido sobre
meus estudos. De fato, o paciente contou sua história apenas porque estava confuso
e de alguma forma alarmado pelo que havia acontecido com ele e estava buscando
uma opinião médica. Pode muito bem ter acontecido que, em ambos os casos, os
médicos envolvidos ouviram alguns casos como esses antes, mas os consideraram
como uma “loucura” individual em vez de um fenômeno amplo e não deram total
atenção ao fato.

Finalmente, existe um fato adicional, no caso dos médicos, que pode ajudar a explicar
por que tantos deles parecem ter ciência dos fenômenos de quase-morte, muito
embora seja normal suspeitar que os médicos, de todas as pessoas, teriam de ter
deparado com eles. No decorrer dos estudos de medicina, é ensinado aos futuros
médicos que eles devem tomar cuidado com o que o paciente diz sobre como se
sente. Um médico aprende que deve prestar atenção aos “sinais” objetivos dos
processos de enfermidades, mas que deve desconsiderar boa parte do relatório
subjetivo (“sintomas”) do paciente. É muito razoável que se aja dessa maneira,
porque é possível lidar mais prontamente com o que é objetivo. Entretanto, essa
atitude também tem o efeito de ocultar experiências de quase-morte, já que poucos
médicos têm a prática de perguntar sobre os sentimentos e percepções dos pacientes
que foram ressuscitados da morte clínica. Por causa dessa atitude, eu diria que os
médicos - que na teoria deveriam formar o grupo mais propenso a revelar
experiências de quase-morte – na verdade tem a mesma chance de ouvir sobre
experiências de quase-morte que as outras pessoas.

Você detectou quaisquer diferenças entre homens e mulheres com relação a


esse fenômeno?

Parece não haver nenhuma diferença nos conteúdos ou tipos de experiências


relatadas por homens e mulheres. Encontrei tanto homens como mulheres que
descreveram cada um dos aspectos comuns dos encontros com a morte que
discutimos até aqui, e não existe elemento algum que pareça pesar mais, ou menos,
nos relatórios masculinos versus femininos.

Mesmo assim, existem diferenças entre homens e mulheres. Geralmente, os homens


que passaram por experiências de morte são muito mais relutantes em falar sobre
isso do que as mulheres. Muito mais homens do que mulheres falaram brevemente
sobre as experiências, evitando responder às minhas cartas ou às minhas ligações
quando eu tentava seguir em frente numa entrevista mais detalhada. Mais homens do
que mulheres disseram comentários como “tentei esquecer, suprimir”, sempre fazendo
as alusões ao medo do ridículo, indicando que as emoções envolvidas na experiência
eram impressionantes demais para serem contadas.

Embora não possa oferecer nenhuma explicação para isso, aparentemente não sou o
único a notar o fato. O doutor Russel Moores, notável pesquisador, disse-me que ele e
muitos outros observaram a mesma copisa. Os homens, em cerca de um terço do
número de mulheres, vêm até ele relatando uma experiência física.

Outro fato interessante é que um número maior dessas experiências, em relação


àquilo que podíamos esperar, acontece durante a gravidez. Novamente, não posso
explicar porquê. Talvez seja simplesmente porque a gravidez em si é um estado
fisiológico bastante arriscado de várias maneiras, acompanhado de muitas
complicações médica em potencial. Somado ao fato de que apenas as mulheres
engravidam, e que as mulheres relutam menos em conversar, isso pode ajudar a
explicar a frequência das experiências que ocorrem durante a gravidez.

Como você sabe que todas essas pessoas não estão mentindo para você?

É intelectualmente muito fácil para as pessoas que não ouviram nem observaram
outras relatando suas experiências de quase-morte admitir a hipótese de que essas
histórias são mentiras. Entretanto, encontro-me numa posição bastante única.
Testemunhei adultos maduros e emocionalmente estáveis – tanto homens como
mulheres – cair no choro enquanto contavam os eventos que aconteceram até três
décadas atrás. Detectei a sinceridade, o calor e o sentimento da voz deles, o que não
pode ser transmitido num relato por escrito. Assim, para mim, de uma maneira que é
infelizmente impossível de ser compartilhada com muitos outros, a noção de que
essas descrições possam ser invenções é inconcebível.

Além do peso da minha própria opinião, existem algumas fortes considerações que
devem descartar a hipótese de invenção. O mais óbvio é a dificuldade de explicar a
semelhança de tantas descrições. Como tantas pessoas poderiam ter inventado a
mesma mentira para me contar num período de oito anos? A conspiração permanece
como uma possibilidade teórica aqui. É certamente concebível que uma doce senhora
do leste da Carolina do Norte, uma estudante de medicina de Nova Jersey, um
veterinário da Geórgia e muitos outros tenham se reunido vários anos atrás e
conspirado para pregar uma peça bastante elaborada em mim. Entretanto, não
imagino que essa seja uma possibilidade muito grande!

Se não é evidente que estejam mentindo, talvez estejam enganando de uma


maneira mais sutil. Não é possível que com o passar dos anos eles tenham
elaborado suas histórias?

Essa pergunta aponta para o fenômeno psicológico bastante conhecido em que uma
pessoa pode começar com um relato bastante simples de uma experiência ou evento
e, com o passar do tempo, desenvolvê-lo numa narrativa mais elaborada. A cada vez
que se conta, um detalhe sutil é acrescentado, e a pessoa passa a acreditar naquilo
até que, por fim, a história está tão elaborada que guarda pouca semelhança com a
original.

Contudo, não acredito que esse mecanismo estivesse operante num grau significativo
nos casos que estudei. Em primeiro lugar, as descrições das pessoas que entrevistei
logo após sua experiência – em alguns casos, enquanto ainda estavam em
recuperação no hospital – são bastante iguais às descrições das pessoas que
relataram experiências que ocorreram há décadas. Ademais, em alguns casos, as
pessoas que entrevistei escreveram as descrições de suas experiências logo após
terem acontecido e leram para mim suas anotações durante a entrevista. Novamente,
essas descrições de suas experiências que foram recontadas de memória após alguns
anos. Além disso, existe o fato de que com frequência fui a primeira ou a segunda
pessoa a ouvir o relato, e ainda nesse momento com grande relutância, mesmo nos
casos em que a experiência havia ocorrido anos antes. Embora houvesse pouca ou
nenhuma oportunidade para elaborar em tais casos, essas descrições também não
são diferentes daquelas que foram recontadas com maior frequência com o passar
dos anos. Finalmente, é bastante possível que em muitos casos tenha ocorrido
exatamente o oposto. Aquilo que os psiquiatras chamam de “supressão” é um
mecanismo mental em que um esforço consciente é feito para controlar lembranças,
sentimentos ou pensamentos indesejados ou ocultá-los da consciência. Em
numerosas ocasiões, no curso das entrevistas, as pessoas fizeram comentários que
indicam fortemente que houve opressão. Por exemplo, uma mulher que me contou
uma experiência bastante elaborada que ocorreu durante sua “morte” disse: “Sinto
que havia mais coisas, mas não me lembro de tudo. Tentei suprimir isso porque sabia
que as pessoas não iam acreditar de jeito nenhum”. Um homem com ferimentos
graves recebidos no Vietnã sofreu uma parada cardíaca durante uma cirurgia e contou
sobre sua dificuldade de lidar emocionalmente com essas experiências
extracorpóreas. “Engasgo só de tentar falar sobre isso agora... Sinto que há muita
coisa de que não me lembro. Tentei esquecer” Resumindo, parece que podemos
afirmar que a elaboração não foi um fator muito significativo no desenvolvimento
dessas histórias.

Todas essas pessoas manifestavam uma religião antes de sua experiência?


Nesse caso, a experiência não foi moldada pela criação e crença religiosa
delas?

Parece que isso aconteceu até certo ponto. Como mencionado anteriormente, embora
a descrição do ser de luz seja invariável, a identidade associada a ele varia,
aparentemente, como uma função da crença religiosa do indivíduo. Entretanto,
durante toda a minha pesquisa, não ouvi uma única referência ao paraíso ou ao
inferno como a imagem costumeira a que somos expostos nessa sociedade. Na
verdade, muitas pessoas enfatizaram como suas experiências eram diferentes daquilo
que foram levadas a esperar no curso de seu aprendizado religioso. Uma mulher que
“morreu” disse: “Sempre ouvi que quando se morre vemos tanto o céu quanto o
inferno, mas não vi nenhum dos dois”. Outra senhora que teve uma experiência fora
do corpo após ferimentos graves disse: “O estranho foi que sempre me ensinaram, na
minha religião, que no minuto em que morremos, logo estaríamos diante de lindos
portões de pérola. Mas eu estava flutuando em volta do meu próprio corpo físico, isso
era tudo! Fiquei confusa”. Além do mais, em várias situações ouvi relatos de pessoas
que não tinham nenhuma crença ou aprendizado religiosos antes de suas
experiências, e suas descrições não pareceram diferenciar em conteúdo das pessoas
com fortes crenças religiosas. Em alguns casos, alguém que tivesse sido exposto a
doutrinas religiosas, mas as houvesse rejeitado anteriormente na vida, foram dotados
de sentimentos religiosos com nova profundidade após a experiência. Outros dizem
que, embora tivessem lido livros religiosos, como a Bíblia, nunca haviam entendido
certas coisas que leram até passar pelas experiências de quase-morte.

Que relação, se é que existe alguma, as experiências que você estudou têm
com a possibilidade de reencarnação?
Nenhum dos casos que observei é, de qualquer forma, indicativo da existência da
reencarnação. Entretanto, é importante ter em mente que nenhum deles descarta a
reencarnação também. Se a reencarnação ocorre, parece provável que haja um
interlúdio em alguma outra dimensão entre o momento da separação do corpo velho e
a entrada num corpo novo. De qualquer modo, a técnica de entrevistar pessoas que
voltaram de encontros próximos com a morte não seria o modo adequado de estudar
a reencarnação.

Outros métodos podem e foram usados na investigação da reencarnação. Por


exemplo, algumas pessoas experimentaram a técnica da “regressão para uma idade
antiga”. O sujeito é hipnotizado e é feita a sugestão para que volte mentalmente para
épocas cada vez mais antigas em sua vida. Quando a pessoa chega na época das
experiências mais antigas em sua vida resente, é avisada para tentar voltar mais
além disso! Nesse momento, muitas pessoas começam a contar histórias elaboradas
sobre vidas prévias em tempos antigos e lugares distantes. Em alguns casos, tais
histórias podem ser verificadas com uma exatidão marcante. Isso aconteceu mesmo
quando ficou claro que o indivíduo não poderia ter conhecido de maneira normal os
eventos, pessoas e lugares que ele descreveu com tanta exatidão. O caso de Bridey
Murphy é o mais famoso, mas existem muitos outros, alguns ainda mais
impressionantes e bem documentados, que não são tão conhecidos. Para os leitores
que desejarem ir mais a fundo nessa questão, sugiro que leiam o excelente estudo de
Ian Stevenson, M.D., Twenty cases suggestive os reincarnation (Vinte casos
sugestivos de reencarnação). Também vale notar que O livro dos mortos tibetanos,
que conta com exatidão os estágios dos encontros de quase-morte, diz que a
reencarnação ocorre em algum momento posterior, após os eventos que foram
relatados pelos meus entrevistados.

Você já entrevistou alguém que passou por uma experiência de quase-morte


em associação com uma tentativa de suicídio? Nesse caso, a experiência foi
diferente?

Conheço alguns casos em que a tentativa de suicídio foi a causa da aparente “morte”.
Essas experiências foram uniformemente caracterizadas como algo desagradável.

Como disse uma mulher: “Se você partir daqui como uma alma atormentada, você
também será uma alma atormentada lá”. Em resumo, todos contam que os conflitos
que os levaram a tentar o suicídio como forma de fuga ainda estavam presentes
quando morreram, mas com complicações a mais. No estado de desencarnado, eles
eram capazes de fazer qualquer coisa acerca de seus problemas, e também tinham de
arcar com as infelizes consequências que resultavam de seus atos.

Um homem deprimido com a morte da esposa atirou em si mesmo, “morreu” como


consequência, e foi ressuscitado. Ele declara:
Não fui para onde minha esposa estava. Fui para um lugar horrível... Pude
enxergar o erro que cometi imediatamente... E pensei: “Queria não ter feito isso”.

Outras pessoas que vivenciaram esse estado desagradável de “limbo” comentam que
tiveram a sensação de ter estado ali por um longo período. Essa era sua punição por
“quebrar as regras” ao tentar se libertar prematuramente do que era, em efeito, uma
“tarefa” – para cumprir um certo propósito na vida.

Tais comentários coincidem com o que vem sendo relatado a mim por várias pessoas
que “morreram” de outras coisas, mas disseram que, enquanto estavam nesse
estado, alguém lhes havia confidenciado que o suicídio era um ato muito infeliz e
digno de punição severa. Um homem que passou por uma experiência de
quase-morte após um acidente disse:

[Enquanto estive ali] tinha a sensação de que havia duas coisas completamente
proibidas de se fazer: matar-me ou matar outra pessoa... Caso eu cometesse suicídio,
estaria jogando o dom que Deus me deu na cara dele... Matar alguém seria interferir
no propósito de Deus para aquele indivíduo.

Sentimentos como esses, que já ouvi em vários relatos separados, são idênticos
àqueles incorporados na maioria das discussões teológicas e morais contra o
suicídio... uma discussão que ocorre sob várias formas nos escritos de pensadores tão
diversos quanto São Tomás de Aquino, Locke e Kant. Um suicida, na visão de Kant,
está agindo em oposição aos propósitos de Deus e chega ao outro lado visto como um
rebelde contra seu criador. São Tomás de Aquino argumenta que a vida é um dom de
Deus e que é prerrogativa Dele, e não dos homens, retirá-la.

Ao discutir isso, no entanto, não quero transmitir um julgamento moral contra o


suicídio. Estou apenas contando o que outras pessoas que passaram por essa
experiência me disseram.

Você tem casos envolvendo culturas diferentes?

Não, não tenho. Na verdade, uma das muitas razões pelas quais digo que meu estudo
não é “científico”, é que o grupo de indivíduos com quem conversei não é uma
amostra aleatória de seres humanos. Eu estaria muito interessado em ouvir sobre
experiências de quase-morte de esquimós, índios Kwakiutl, Navahos, Watusi e assim
por diante. Entretanto, devido às limitações geográficas e de outra natureza, não fui
capaz de localizar caso algum.

Existem exemplos históricos de fenômenos de quase-morte?


Pelo que sei, não há. Contudo, como estive completamente ocupado com exemplos
contemporâneos, simplesmente não tive tempo para pesquisar adequadamente essa
questão. Assim, eu não ficaria surpreso ao descobrir que tais experiências já foram
relatadas no passado. Por outro lado, tenho fortes suspeitas de que as experiências
de quase-morte têm sido muito mais comuns nas últimas décadas do que em
períodos anteriores. A razão para isso é simples, foi desenvolvida a tecnologia do
ressuscitamento. Muitas das pessoas que foram trazidas de volta em nossa era não
teriam sobrevivido em anos anteriores. As injeções de adrenalina no coração; o
desfibrilador, a máquina que administra choques no coração; e as máquinas artificiais
para substituir o coração e os pulmões são exemplos de tais avanços na medicina.

Você investigou os relatórios médicos de seus entrevistados?

Sempre que possível, sim. Nos casos em que fui convidado a investigar, os relatórios
sustentaram as declarações da pessoa envolvida. Em alguns casos, devido à
passagem do tempo e/ou à morte das pessoas que realizaram o ressuscitamento, os
relatórios não estavam disponíveis. Os relatos em que não havia relatórios que
sustentassem os fatos não eram diferentes daqueles em que os relatórios estavam
disponíveis. Em muitos dos momentos em que os relatórios médicos eram
inacessíveis, busquei o testemunho de outras pessoas – amigos, médicos ou parentes
do informante – para assegurar que o evento de quase-morte realmente aconteceu.

Ouvi que, depois de cinco minutos, é impossível ressuscitar o paciente,


mesmo assim você diz que alguns dos entrevistados estiverem “mortos” por
até vinte minutos. Como isso é possível?

Grande parte dos números e quantidades citadas na prática médica são números
aproximados, médios, e não devem ser vistos como absolutos. Cinco minutos é uma
média. É um método clínico baseado na prática de não tentar ressuscitar o paciente
após cinco minutos porque, na maioria dos casos, os prejuízos causados ao cérebro
pela falta de oxigênio já teriam ocorrido após esse tempo. Entretanto, como se trata
apenas de uma média, é de se esperar que casos individuais provem o contrário tanto
para um lado como para o outro. Na verdade, encontrei casos em que o
ressuscitamento ocorreu após vinte minutos, sem evidência alguma de danos ao
cérebro.

Alguém dentre essas pessoas esteve realmente morto?

Uma das razões principais por que essa pergunta é tão confusa e difícil de responder
é que se trata de uma questão parcialmente semântica envolvendo o significado da
palavra “morto”. Como a controvérsia recente e acalorada em torno do transplante de
órgãos revela, a definição de morte não está, de maneira alguma, estabelecida,
mesmo entre os profissionais da área médica. Os critérios de morte variam não
apenas entre leigos e os médicos, mas também entre os próprios médicos e de
hospital para hospital. Assim, a resposta para essa pergunta vai depender do que
significa estar “morto”. Parece proveitoso aqui observar três definições e comentar
sobre elas.

1. “Morte” como ausência de sinais vitais detectáveis clinicamente.

Alguns estarão dispostos a dizer que uma pessoa está “morta” se o coração
parar de bater e a respiração cessar por um longo tempo, a pressão
sanguínea cair abaixo do nível detectável, as pupilas dilatarem, a
temperatura do corpo começar a cair etc. Essa é a definição clínica que vem
sendo empregada há séculos por médicos e leigos. De fato, a maioria das
pessoas que foram declaradas mortas foi julgada assim, com base nesses
critérios. Não há dúvida de que esse padrão clínico foi encontrado em muitos
dos casos que estudei. Tanto o testemunho dos médicos quanto a evidência
dos relatórios sustentam adequadamente a alegação de que “mortes” nesse
sentido ocorreram.

2. “Morte” como ausência de atividade de ondas cerebrais. O avanço da


tecnologia trouxe o desenvolvimento de técnicas mais sensíveis para detectar
processos biológicos, até mesmo aqueles que não podem ser observados
evidentemente. O eletroencefalograma (EEG) é uma máquina que amplifica e
registra os potenciais elétricos mínimos do cérebro. Recentemente, tem sido
tendência basear a avaliação de morte “real” na ausência de atividade
elétrica no cérebro, como determinado por traços “planos” no EEG. Em todos
os casos de ressuscitamento com os quais lidei, fica óbvio que houve uma
emergência clínica extrema. Não houve tempo para ligar o EEG; com razão,
os médicos estavam preocupados em fazer o possível para trazer o paciente
de volta. Assim, pode-se argumentar que é impossível declarar que qualquer
uma dessas pessoas esteve “morta”.

No entanto, suponha por um momento que a leitura de linhas “planas” no


EEG tenha sido obtida em uma grande porcentagem das pessoas que foram
consideradas mortas e então ressuscitadas. Esse fato necessariamente
acrescentaria muito aqui? Acredito que não, por três razões. Primeiro, as
tentativas de ressuscitamento são sempre emergenciais, que duram no
máximo trinta minutos mais ou menos. Montar uma máquina de EEG é uma
tarefa bastante técnica e complicada, e é muito comum que até mesmo um
técnico experiente tenha de trabalhar com o aparelho por algum tempo para
obter leituras corretas, até mesmo sob condições ótimas. Numa emergência,
com a confusão que a caracteriza, provavelmente haveria maior
probabilidade de erros. Portanto, mesmo que fosse possível apresentar uma
leitura plana no EEG para uma pessoa que contasse sobre uma experiência
de quase-morte, seria possível que um crítico dissesse – com justiça – que a
leitura poderia não ser exata.

Segundo, até mesmo a maravilhosa máquina para medir a atividade elétrica


do cérebro, adequadamente montada, não nos permite determinar
infalivelmente se o ressuscitamento é possível num dado caso. Traços planos
no EEG foram obtidos em pessoas que foram ressuscitadas posteriormente.
Overdoses de medicamentos que deprimem o sistema nervoso central, além
de hipotermia (Baixa temperatura corporal) resultaram nesse fenômeno.

Terceiro, mesmo que eu pudesse produzir um caso em que ficasse claro que
a máquina estava montada adequadamente, ainda haveria um problema.
Alguém poderia dizer que não evidências de que a experiência de
quase-morte realmente ocorreu durante o momento em que o EEG esteve
plano, mas sim antes ou depois. Dessa forma, concluo que o EEG não é de
grande valia no estágio presente das investigações.

3. “Morte” como uma perda irreversível das funções vitais. Outros adotarão
uma definição ainda mais restrita, acreditando que nunca se pode dizer que
uma pessoa esteve “morta”, sem importar o tempo em que os sinais vitais
não puderam ser detectados clinicamente e sem importar o tempo em que
seu EEG esteve plano, se a pessoa foi ressuscitada a seguir. Em outras
palavras, a morte é definida como um estado do corpo do qual é impossível
ser revivido. Por essa definição, fica claro que nenhum dos meus casos se
qualificaria, já que todos eles envolvem uma ressurreição.

Desse modo, percebi que a resposta para a questão depende do que significa
estar “morto”. Deve-se lembrar que, embora se trata de uma discussão
parcialmente semântica, não deixa de ser uma questão importante, porque
todas as três definições incorporam revelações importantes. De fato, eu
concordaria com a terceira e mais rigorosa definição até certo ponto. Até
mesmo nos casos em que o coração parou de bater por longos períodos, os
tecidos do corpo, especialmente do cérebro, devem de alguma forma ter sido
aspergidos (fornecidos com oxigênio e nutrientes) na maior parte do tempo.
Não é necessário que se presuma, nesses casos, que qualquer lei da biologia
ou fisiologia foi violada. Para ocorrer o ressuscitamento, algum grau de
atividade biológica residual deve estar em andamento nas células do corpo,
muito embora os sinais evidentes desses processos não sejam detectáveis
clinicamente pelos métodos empregados. Entretanto, atualmente parece ser
impossível determinar exatamente qual é o ponto de onde não há volta. Pode
variar de acordo com o indivíduo, e possivelmente não é um ponto fixo, mas
uma gama numa linha contínua. Na verdade, há algumas décadas a maioria
das pessoas com quem conversei não poderia ter sido trazida de volta. No
futuro, talvez, novas técnicas nos permitam reavivar pessoas que não podem
ser salvas atualmente.

Portanto, pensamos na hipótese de que a morte é uma separação entre a


mente e o corpo, e que a mente realmente entra em outra realidade de
existência nesse momento. Por consequência, existe algum mecanismo
através do qual o espírito ou a mente é libertada depois da morte. Não há
base para supor, no entanto, que esse mecanismo funcione exatamente de
acordo com aquilo que, na nossa própria época, supomos arbitrariamente
como o ponto de onde não há volta. Tampouco podemos presumir que
funcione perfeitamente em cada caso, do mesmo modo que não podemos
supor que qualquer sistema corporal sempre funciona perfeitamente. Talvez
esse mecanismo possa entrar em cena até mesmo antes de qualquer crise
fisiológica, concedendo a poucas pessoas um breve vislumbre de outras
realidades. Isso ajudaria a explicar os relatos dessas pessoas que tiveram
flashbacks de sua vida, experiências extracorpóreas, etc., quando estavam
certos de que seriam mortos, antes mesmo que qualquer ferimento físico
ocorresse.

Por fim, tudo o que desejo dizer é isso: seja qual foi a definição dada para
esse ponto de morte irreversível – seja no passado, presente ou futuro – as
pessoas com quem conversei estiveram muito mais próximas disso do que a
grande maioria dos seres humanos. Simplesmente por essa razão, estou
bastante disposto a ouvir o que eles têm a dizer.

Entretanto, na análise final, é inútil criticar a definição precisa de “morte” –


irreversível ou não – no contexto dessa discussão. Aquilo que a pessoa que
levanta tais objeções quanto às experiências de quase-morte parece ter em
mente é algo mais básico. Tal pessoa argumenta que, contanto que exista
uma possibilidade de haver qualquer atividade biológica residual no corpo,
então essa atividade pode ter causado, e, portanto explica, a experiência.

Agora, eu concordei anteriormente que deve ter havido alguma função


biológica residual no corpo em todos os casos. Assim, a questão sobre a
ocorrência de uma morte “verdadeira” realmente se reduz ao problema mais
básico de que tal função biológica residual pode explicar a ocorrência das
experiências. Em outras palavras:

Outras explicações (isto é, diferente da sobrevivência à morte do


corpo) não são possíveis?

Isso nos leva ao tópico do próximo capítulo.


EXPLICAÇÕES

Claro que existem “explicações” alternativas para o fenômeno de quase-morte. Na


verdade, do ponto de vista puramente filosófico, uma infinidade de hipóteses podem
ser construídas para explicar qualquer experiência, observação ou fato, isto é, seria
possível seguir infinitamente construindo explicações teóricas cada vez mais possíveis
para qualquer coisa que se deseje explicar. A mesma coisa acontece no caso das
experiências de quase-morte; todos os tipos de explicações possíveis se apresentam.

Dentre os vários tipos de explicações que podem ser propostas teoricamente, existem
algumas que foram sugeridas com bastante frequência pelos espectadores das minhas
palestras. Do mesmo modo, lidarei agora com essas explicações mais comuns, e com
outra que, embora nunca tenha sido proposta a mim, poderia muito bem ter sido.
Dividi-las arbitrariamente em três tipos: Sobrenaturais, Naturais (científicas) e
Psicológicas.

EXPLICAÇÕES SOBRENATURAIS

Raramente, alguém em uma de minhas palestras propôs explicações demoníacas para


as experiências de quase-morte, sugerindo que as experiências eram sem dúvida
dirigidas por forças inimigas. Como resposta para tais explicações, posso dizer apenas
o seguinte: parece-me que a melhor maneira de distinguir as experiências dirigidas
por Deus e as dirigidas por Satã seria ver aquilo que a pessoa envolvida faz e diz após
o evento. Suponho que Deus tentaria fazer com que aqueles para quem ele aparece
fossem amáveis e clementes. Presumidamente, Satã diria aos seus servos que
seguissem um curso de ódio e destruição. Claramente, meus entrevistados voltaram
com um compromisso renovado de seguir a primeira opção em detrimento da
segunda. À luz de todas as armações que um demônio hipotético teria de elaborar
para iludir sua vítima azarada (e com que propósito?), ele certamente não foi nem um
pouco capaz – até onde sei – de enviar emissários persuasivos para divulgar seu
programa!

EXPLICAÇÕES NATURAIS (CIENTÍFICAS)

1. A explicação farmacológica

Algumas pessoas sugerem que as experiências de quase-morte são causadas por


drogas terapêuticas administradas à pessoa no momento da crise. A plausibilidade
superficial dessa visão deriva de vários fatos. Por exemplo, em geral, a maioria dos
médicos, cientistas e leigos concordam que certas drogas causam estados e
experiências mentais de ilusão e alucinação. Além disso, agora estamos passando por
uma era em que existe um grande interesse no problema de dependência de drogas,
e muita atenção pública foi devotada ao uso ilícito de drogas como o LSD, a maconha
e assim por diante, que realmente parecem causar tais episódios de alucinação.
Finalmente, existe o fato de que até mesmo muitas drogas aceitas pela medicina são
associadas a vários efeitos na mente que podem se assemelhar aos eventos da
experiência de morte. Por exemplo, a droga quetamina (ou ciclo-hexanona) é um
anestésico de aplicação intravenosa com efeitos colaterais similares em alguns
aspectos com as experiências extracorpóreas. É classificada como um anestésico
“dissociativo” porque durante a indução o paciente pode deixar de reagir não apenas
à dor, mas também ao ambiente como um todo. Ele se sente “dissociado” do
ambiente, incluindo as partes do próprio corpo – pernas, braços, e assim por diante.
Durante certo tempo, após a recuperação, ele pode sofrer distúrbios psicológicos,
incluindo alucinações e sonhos muito vívidos.

Ademais, reuni alguns relatos de pessoas que, enquanto estavam anestesiadas,


tiveram o que plenamente identificaram como visões de morte do tipo alucinatório.
Deixe-me citar um exemplo:

Foi em algum momento no começo da adolescência, eu estava no consultório do


dentista para fazer uma obturação e ele aplicou óxido nitroso. Fiquei nervosa porque
temia não acordar de novo. Conforme a anestesia começou a surtir efeito, senti como
se estivesse subindo numa espiral. Não era como se estivesse girando, mas como se a
cadeira do dentista estivesse se movendo numa espiral ascendente, e eu estivesse
subindo cada vez mais.

Tudo era muito brilhante e branco, e quando cheguei ao topo da espiral, os


anjos desceram para me encontrar e me levar para o céu. Eu uso o plural “anjos”,
porque é muito vago, mas tenho certeza de que havia mais de um. Embora não possa
dizer quantos.

Num momento, o dentista e a enfermeira estavam conversando sobre outra


pessoa, e eu podia ouvi-los, mas no momento em que terminavam a frase eu mal
podia me lembrar qual havia sido a primeira frase. No entanto, eu sabia que eles
estavam conversando, e ao fazê-lo suas palavras ecoavam ao redor. Era um eco que
parecia ir muito longe, como nas montanhas. Lembro-me que parecia ouvi-los de
cima, porque sentia como se estivesse muito alto, indo para o céu.

Isso é tudo o que me lembro. Não tive medo nem pânico diante da ideia de
morrer. Naquele momento da minha vida, eu tinha medo de ir para o inferno, mas
quando aconteceu o que relatei, não havia dúvida em minha mente de que estava
indo para o céu. Fiquei muito surpresa mais tarde ao me dar contra de que o
pensamento da morte não me incomodou, mas finalmente percebi que no meu estado
de anestesia nada ma incomodava.
Perceba que existem alguns pontos de semelhança entre essa experiência e algumas
outras presumidas como reais por aqueles que as vivenciaram. Uma mulher
descreveu uma luz branca e brilhante, o encontro com outras pessoas que estavam ali
para levá-la para o outro lado e a falta de preocupação com o fato de estar morta.
Também existem dois aspectos que sugerem uma experiência fora do corpo: sua
impressão de ouvir as vozes do dentista e da enfermeira de uma posição acima deles
e a sensação de estar “flutuando”.

Por outro lado, outros detalhes dessa história são muito atípicos das experiências de
quase-morte relatadas como algo que efetivamente aconteceu. A luz brilhante não é
personificada e não há sentimentos inegáveis de paz e felicidade. A descrição do
mundo depois da morte é muito literal, e a mulher diz que tudo o que vê concorda
com sua crença religiosa. Os seres que a encontraram são identificados como “anjos”,
e ela fala sobre ir para o “céu”, que está localizado numa posição “acima”, para onde
ela irá. Ela nega ter visto seu corpo ou estar em qualquer outro tipo de corpo, e sente
plenamente o movimento de rotação da cadeira do dentista, e não do seu próprio
corpo. Ela enfatiza várias vezes a imprecisão de sua experiência, que aparentemente
não teve efeito algum em sua crença numa vida depois da morte. (Na verdade, ela
tem dúvidas da sobrevivência à morte do corpo).

Ao comparar relatos em que a experiência é plenamente atribuída a uma droga com


aquelas experiências de quase-morte tidas como reais, vários pontos precisam ser
mencionados. Em primeiro lugar, as poucas pessoas que descreveram tais
experiências com ‘drogas” não são nem mais nem menos românticas, imaginativas,
inteligentes ou equilibradas do que as pessoas que contam experiências “reais” de
quase-morte. Em segundo lugar, essas experiências induzidas por drogas são
extremamente vagas. Em terceiro lugar, as histórias variam entre si, e também
variam marcantemente das visões de quase-morte reais. Devo dizer que ao escolher
o caso específico da experiência com “anestesia”, escolhi de propósito aquela que
mais se assemelha ao grupo das experiências “reais”. Assim, eu poderia sugerir que
existem, em geral, grandes diferenças entre esses dois tipos de experiências.

Além do mais, existem vários fatores adicionais que descartam a explicação


farmacológica para o fenômeno de quase-morte. O fator mais significativo e o simples
fato de que em muitos casos nenhuma droga foi administrada antes da experiência,
tampouco, em alguns casos, drogas foram administradas após o evento. Na verdade,
muitas pessoas fizeram questão de afirmar que a experiência ocorreu claramente
antes que qualquer tipo de medicação fosse administrada, em alguns casos muito
antes de terem conseguido qualquer tipo de atenção médica. Até mesmo nesses
casos em que drogas terapêuticas foram administradas por volta do momento da
experiência, a variedade das drogas empregadas para pacientes diferentes é enorme.
Elas variam desde substâncias como a aspirina, passando por antibióticos e a
adrenalina hormonal, até anestesias locais e inalatórias. A maioria dessas drogas não
é associada ao sistema nervoso ou aos efeitos psíquicos. Também se deve notar que
não há diferenças entre as experiências relatadas por aqueles que não receberam
nenhum medicamento e aqueles que estavam sob medicações de vários tipos.
Finalmente, devo comentar que uma mulher que “morreu” duas vezes em ocasiões
diferentes e separadas por alguns anos atribuiu sua falta de experiência da primeira
vez a uma condição em que estava anestesiada. Da segunda vez, quando não estava
sob efeito da droga, ela teve uma experiência bastante complexa.

Uma das suposições da farmacologia médica moderna é a noção, que também parece
ter ganhado aceitação entre a grande massa de leigos na nossa sociedade, de que
drogas psicoativas causam episódios psíquicos quando seu uso é associado. Esses
eventos psíquicos são, portanto, considerados “irreais”, “alucinatórios, “ilusórios” ou
que acontecem “só na mente”. Deve-se lembrar, no entanto, que essa visão não é de
forma alguma aceita universalmente; existe outra visão do relacionamento entre
drogas e experiências associados ao seu uso. Refiro-me ao uso inicial e exploratório
do que podemos chamar de drogas “alucinógenas”. Através das eras, os homens
buscaram compostos psicoativos numa tentativa de alcançar outros estados de
consciência e planos de realidade18. Portanto, o uso de drogas é historicamente
associado não apenas a religião e a busca por iluminação. Por exemplo, nos rituais
bastante divulgados do culto ao peiote encontrado entre os índios (planta da família
das cactáceas, que contém a substância mescalina) é ingerido para se chegar a visões
e à iluminação religiosa. Existem cultos similares em todo o mundo, e seus membros
compartilham a crença de que a droga que utilizam fornece meios de se passar para
outras dimensões de realidade. Supondo que esse ponto de vista seja válido, poderia
se chegar à hipótese de que o uso de drogas seria apenas um caminho dentre vários
que levam à iluminação e à descoberta de outros planos de existência. Desse modo, a
experiência de morrer poderia ser outro caminho, e tudo isso ajudaria a explicar a
semelhança entre as experiências induzidas por drogas, como a citada anteriormente,
e as experiências de quase-morte.

A EXPLICAÇÃO FISIOLÓGICA

A fisiologia é o ramo da biologia que lida com as funções das células, dos órgãos, e o
corpo inteiro dos seres humanos, além das inter-relações entre essas funções. Uma
explicação fisiológica para o fenômeno de quase-morte que ouvi com frequência é
que, como o suprimento de oxigênio para o cérebro é interrompido durante a morte
clínica e alguns outros tipos de estresse corporal severo, o fenômeno presenciado
deve representar algum tipo de último suspiro compensatório do cérebro que está
morrendo.

O erro principal nessa hipótese é simplesmente o seguinte: como pode ser facilmente
visto na pesquisa de experiências de morte relatadas anteriormente, muitas dessas
experiências aconteceram muito antes que qualquer tipo de estresse fisiológico
ocorresse. Na verdade, em alguns casos não houve nenhum tipo de ferimento
corporal durante o encontro. Mesmo assim, todos os elementos que aprecem nos
casos de ferimentos graves também podem ser vistos em outros casos em que não
houve ferimento envolvido.

A EXPLICAÇÃO NEUROLÓGICA

A neurologia é a especialidade médica que lida com a causa, o diagnóstico e o


tratamento de doenças do sistema nervoso (ou seja, o cérebro, a medula e os
nervos). Fenômenos similares àqueles contados por pessoas que quase morreram
aparecem também em certas condições neurológicas. Assim, pode-se propor
explicações neurológicas para as experiências de quase-morte em termos de um
suposto mau funcionamento do sistema nervoso da pessoa à beira da morte. Vamos
considerar paralelos neurológicos para dois dos eventos mais marcantes da
experiência de morte: a “revisão” instantânea dos eventos na vida da pessoa e o
fenômeno extracorpóreo.

Encontrei um paciente na ala da neurologia de um hospital que descreveu uma forma


peculiar de epilepsia em que via flashbacks dos eventos anteriores em sua vida.

Na primeira vez em que isso aconteceu, eu estava olhando para um amigo do


outro lado da sala. O lado direito de seu rosto simplesmente ficou distorcido. De
repente, houve uma invasão na minha consciência de cenas e coisas que aconteceram
no passado. Eram exatamente iguais, como quando aconteceram – vívidas,
completamente coloridas e tridimensionais. Senti náuseas e fiquei tão assustado que
tentei evitar as imagens. Desde esse dia, sofri outros ataques como esse, e aprendi a
simplesmente deixar que sigam seu curso. O paralelo mais próximo que posso traçar
são os filmes que passam na televisão na época do Ano-Novo. Cenas de coisas que
aconteceram no ano são exibidas na tela e quando você vê uma, ela já desapareceu
antes que você realmente pudesse pensar nela. É assim que acontece nesses
ataques. Vejo algo e penso: “Oh, me lembro disso”. E tento manter isso em mente,
mas outra imagem aparece antes que eu possa fazer qualquer coisa.

As imagens são coisas que realmente aconteceram. Nada é modificado.


Entretanto, quando tudo termina, é muito difícil recordar as imagens que vi. Às vezes
são as mesmas imagens e outras vezes, não. Conforme aparecem, me lembro: “Oh,
essas são as mesmas que vi da outra vez”, mas quando tudo termina é quase
impossível lembrar quais eram. Não parecem eventos especialmente significativos na
minha vida. De fato, nenhum deles o é. Todos parecem bastante triviais. Não
acontecem em qualquer tipo de ordem, nem mesmo na ordem em que ocorreram na
minha vida. Simplesmente aparecem aleatoriamente.

Quando as imagens surgem, ainda posso ver o que está acontecendo à minha
volta, mas minha consciência é diminuída. Não fico tão alerta. É quase como se
metade da minha mente estivesse ocupada com as imagens, e a outra metade
ocupada com que está acontecendo. As pessoas que me viram durante um ataque
dizem que dura apenas cerca de uns minutos, mas para mim parece durar décadas.

Existem certas semelhanças óbvias entre esses ataques, que sem dúvida foram
ocasionados por um foco de irritação no cérebro, e a memória panorâmica relatada
por algumas pessoas que entrevistei. Por exemplo, a epilepsia desse homem assumiu
a forma de imagens visuais que eram incrivelmente vívidas e realmente
tridimensionais. Além disso, as imagens pareciam simplesmente surgir, livres de
qualquer intenção da parte dele. Ele também conta que as imagens apareciam com
grande rapidez e enfatiza a distorção de sua noção de tempo que se passou durante o
ataque.

Por outro lado, existem diferenças marcantes também. Diferentes das imagens vistas
nas experiências de quase-morte, as memórias não vieram na ordem de sua vida,
nem foram vistas todas de uma vez, numa visão unificada. Não eram ênfases nem
eventos significativos de sua vida; ele enfatiza sua trivialidade. Portanto, não
pareciam ser apresentadas a ele com propósitos educacionais ou de julgamento.
Embora muitos que passaram pela quase-morte digam que depois da revisão podiam
lembrar dos eventos de sua vida com muito mais clareza e riqueza de detalhes do que
antes, esse homem declara que não podia lembrar quais eram as imagens específicas
após o ataque.

As experiências fora do corpo têm uma analogia neurológica chamada de “alucinações


autoscópicas19”, que são o assunto de um excelente artigo do doutor N.Lukianowicz no
jornal médico Archives of Neurology and Psychiatry. Nessas estranhas visões, o
indivíduo vê uma projeção de si em seu próprio campo visual. Essa estranha “cópia”
imita as expressões faciais e outros movimentos corporais de seu original, que fica
completamente confuso e desconcertado quando vê, de repente, uma imagem de si a
distância, geralmente à sua frente.

Embora essa experiência seja de alguma forma análoga às visões fora do corpo
descritas anteriormente, as diferenças são muito superiores às semelhanças. O
fantasma autoscópico sempre é percebido como alguém, vivo – às vezes é visto pelo
sujeito como ainda mais vivo e consciente de que ele próprio – enquanto nas
experiências fora do corpo, o corpo é visto como algo sem vida, apenas uma casca. A
pessoa autoscópica pode “ouvir” sua cópia conversar com ela, dar-lhe instruções,
assombrá-la, e assim por diante. Embora, na maioria das vezes, todo o corpo é visto
nas experiências extracorpóreas, cópia autoscópica é vista com muito mais
frequência apenas do tórax ou do pescoço para cima.

Na verdade, as cópias autoscópicas têm muito mais características em comum com o


que chamei de corpo espiritual do que com o corpo físico que é visto pela pessoa que
está morrendo. As cópias autoscópicas, embora sejam vistas em cores algumas
vezes, frequentemente são descritas como finas, transparentes e incolores. O
indivíduo pode, de fato, ver sua imagem atravessar portas e outros obstáculos físicos
sem problema aparente. Apresento aqui um relato de uma alucinação autoscópica
aparente que me foi descrita. Trata-se de um relato único por envolver duas pessoas
simultaneamente.

Por volta de onze horas de uma noite de verão, cerca de dois anos antes de
minha esposa e eu nos casarmos, eu a estava levando para casa no meu carro
conversível. Estacionei o carro numa rua pouco iluminada na frente da casa dela, e
ambos ficamos surpresos ao erguer os olhos ao mesmo tempo e ver imagens
enormes de nós mesmos, da cintura para cima e sentados lado a lado, nas grandes
árvores que cobriam a rua, cerca de três metros à nossa frente. As imagens eram
escuras, quase como silhuetas, e eram réplicas exatas. Nenhum de nós teve
dificuldade alguma em reconhecê-los na mesma hora. Elas se moviam, mas não
imitando nossos movimentos, já que estávamos apenas sentados observando. Elas
faziam coisas do tipo: minha imagem pegou um livro e mostrou algo nele para a
imagem da minha esposa, e ela se debruçou para olhar o livro mais de perto.

Enquanto estávamos sentados ali, narrei a cena por algum tempo – dizia à
minha esposa o que via as imagens fazendo – e o que dizia era exatamente o que ele
havia visto também. Depois trocamos. Ela passou a dizer o que estava vendo e era
exatamente o que eu havia visto.

Ficamos ali sentados e conversando sobre isso. Acho que poderíamos ter
continuado assim pelo resto da noite. Mas minha esposa precisava entrar, então
finalmente subimos os degraus juntos até a porta da casa dela. Quando voltei, vi as
imagens novamente, e elas ainda estavam ali quando me afastei.

Não havia chance de ser nenhum tipo de reflexo no pára-brisa porque o topo do
carro estava abaixado e estávamos olhando por cima do vidro o tempo todo. Nenhum
de nós bebia – e ainda não bebemos – e isso foi três anos antes de termos ouvido
qualquer coisa sobre LSD ou drogas do gênero. Também não estávamos cansados,
embora fosse tarde da noite, então não estávamos dormindo e sonhando com isso.
Estávamos bastante despertos, alertas, surpresos e excitados ao observar as imagens
e conversar sobre elas.
É preciso concordar que as alucinações autoscópicas são, de muitas formas, como o
fenômeno extracorporal associado com a experiência de quase-morte. Entretanto,
mesmo que quiséssemos nos concentrar em todos os pontos de similaridades e
negligenciar as diferenças completamente, a existência das alucinações autoscópicas
não nos daria uma explicação para a ocorrência de experiências fora do corpo. Muitas
explicações conflituosas foram propostas, e por diferentes neurologistas e psiquiatras,
mas isso ainda está em debate, e nenhuma teoria ganhou aceitação geral. Assim,
tentar explicar todas as experiências extracorpóreas como alucinações autoscópicas
seria simplesmente substituir uma frustração por um enigma.

Finalmente, existe outro ponto relevante para a discussão das explicações


neurológicas nas experiências de quase-morte. Em um caso, encontrei um indivíduo
que permaneceu com um problema neurológico residual que derivou de um encontro
próximo com a morte. O problema era um déficit brando que consistia de paralisia
parcial de um pequeno grupo de músculos em um lado do corpo. Embora, muitas
vezes tivesse sido questionado sobre a existência de déficits residuais, esse foi o
único exemplo que encontrei de danos neurológicos após uma experiência de
quase-morte.

EXPLICAÇÕES PSICOLÓGICAS

A psicologia ainda não conquistou nada próximo do grau de rigor e precisão que
outras ciências atingiram na era moderna. Os psicólogos ainda estão divididos entre
escolas de pensamentos com pontos de vista, métodos investigativos e compreensões
fundamentais conflituosas sobre a existência e a natureza da mente. As explicações
psicológicas para experiências de quase-morte, portanto, variam amplamente de
acordo com a escola de pensamento a que pertence o explanador. Em vez de
considerar cada tipo de explicação psicológica que poderia ser proposta, vou me
prender às poucas que ouvi com mais frequência dos membros das minhas plateias, e
a uma que chamou minha atenção como a mais atraente.

Toquei anteriormente em dois tipos de explicações psicológicas comumente propostas


– aquelas que têm como hipótese a ocorrência de uma mentira consciente ou
elaboração do inconsciente. Neste capítulo quero considerar duas outras.

1. PESQUISA DE ISOLAMENTO

Em todas as palestras públicas que ministrei sobre meus estudos, ninguém


apresentou uma explicação para experiências de quase-morte em termos dos
resultados de pesquisa de isolamento. Mesmo assim, é exatamente nessa área
relativamente recente e de crescimento rápido da ciência comportamental que
os fenômenos mais próximos dos estágios da experiência de morte foram
estudados e produzidos em condições de laboratório.
A pesquisa de isolamento é o estudo do que acontece com a mente e o corpo de
uma pessoa que fica isolada de uma maneira ou outra; por exemplo, ao ser
removida de todo contato social com outros seres humanos, ou ao ser
submetida a uma tarefa monótona e repetitiva por longos períodos.

Os dados sobre situações desse tipo foram reunidos de diversas formas. Relatos
escritos das experiências de exploradores solitários nos polos ou de únicos
sobreviventes de naufrágios trazem muitas informações. Durante as últimas
décadas, os pesquisadores tentaram investigar fenômenos similares em
condições de laboratório. Uma técnica amplamente usada tem sido suspender
um voluntário num tanque de água que esteja na mesma temperatura do seu
corpo. Isso minimiza as sensações de peso e temperatura. Ele fica vendado e
com os ouvidos tapados para intensificar os efeitos do tanque escuro e à prova
de som. Os braços são presos em tubos para que ele não possa movê-los, e
assim fica privado de muitas sensações normais do movimento das juntas e do
posicionamento.

Sob essas e outras condições de solidão, algumas pessoas vivenciaram


fenômenos psicológicos incomuns, muitos dos quais se assemelham bastante
com aqueles descritos no capítulo dois. Uma mulher que passou longos períodos
sozinha nas condições de isolamento do Polo Norte conta que teve uma visão
panorâmica dos eventos de sua vida. Marujos que naufragaram e vagaram
sozinhos em pequenos botes por várias semanas descreveram alucinações de
ser salvos, às vezes, por seres paranormais, quase como fantasmas ou
espíritos. Isso traz analogias vagas com o ser de luz ou os espíritos de pessoas
que já partiram e foram encontradas por muitos dos meus entrevistados. Outro
tipo de fenômeno de quase-morte que ocorre nos relatos de experiências de
isolamento inclui: distorções da noção de tempo, sensação de estar
parcialmente dissociado do corpo, resistência a voltar à civilização ou a deixar o
isolamento e sensações de ser “um” com o universo. Além disso, muitos dos
que estiveram isolados em naufrágios ou eventos desse tipo dizem que após
algumas semanas nessas condições, voltaram para a civilização com uma
profunda mudança de valores. Eles podem relatar que depois disso se sentiram
mais seguros interiormente. Está claro que essa reintegração de personalidades
é similar ao que declararam muitos que voltaram da morte.

Do mesmo modo, existem certos aspectos das situações de morte que são
muito parecidas com as características encontradas nas experiências e estudos
de isolamento. Os pacientes que estiveram próximos da morte são
frequentemente em condições e imobilizados nas UTIs dos hospitais,
frequentemente em condições de som e luz reduzidos e nenhuma visita.
Pode-se até mesmo questionar se as mudanças fisiológicas associadas com a
morte do corpo poderiam produzir um tipo extremo de isolamento que
resultasse num corte quase total dos estímulos sensoriais no cérebro. Além
disso, como longamente discutido anteriormente, muitos pacientes que
estiveram próximos da morte me contaram sobre as sensações aflitivas de
isolamento, solidão e privação do contato humano que se abateram sobre eles
quando estavam fora do corpo.

De fato, não há dúvida de que é possível encontrar casos-limites que não


poderiam ser classificados claramente como experiências de quase-morte ou de
isolamento. Por exemplo, um homem me contou a seguinte história de sua
estada no hospital durante uma doença grave:

Eu estava extremamente doente no hospital, e enquanto ficava ali deitado não


parei de ver imagens que vinham até mim, como se fossem a tela de uma
televisão. As imagens eram de pessoas, e eu podia ver uma pessoa, embora
estivesse no espaço a certa distância, e ela vinha em minha direção para logo
se afastar, e outra aparecia. Eu estava perfeitamente ciente de que estava
doente no quarto de um hospital, mas comecei a imaginar o que estava
acontecendo. Algumas dessas pessoas eu reconheci – eram amigos e parentes
meus – mas as outras não reconhecia. De repente, percebi que todas aquelas
que eu conhecia eram pessoas que já haviam morrido.

Pode-se muito bem perguntar como classificar essa experiência, já que ela tem
pontos de semelhança tanto com as experiências de quase-morte como com as de
isolamento. Parece bastante análoga às experiências de quase-morte em que houve
encontro com os espíritos de indivíduos que já haviam partido, e ao mesmo tempo
diferente pelo fato de nenhum outro fenômeno ter ocorrido. De maneira interessante,
num estudo de isolamento, um sujeito que esteve sozinho num cubículo por algum
tempo descreveu alucinações em que via imagens de homens famosos flutuando
perto dele. Assim, a experiência citada deve ser classificada como experiência de
quase-morte ocasionada pela doença grave do paciente, ou como experiência de
isolamento devido às condições de confinamento necessárias em razão de seu estado
de saúde? Pode até mesmo ser o caso de não haver critério absoluto que nos permita
classificar tal experiência em duas categorias distintas. Talvez sempre haverá
casos-limites.

Entretanto, apesar dessas sobreposições, os resultados da pesquisa de isolamento


não fornecem uma explicação satisfatória para as experiências de quase-morte. Em
primeiro lugar, os diversos fenômenos mentais que ocorrem em condições de
isolamento não podem em si, ser explicados por nenhuma teoria atual. Apelar para
estudos de isolamento para explicar experiências de quase-morte seria, como no caso
da “explicação” de experiências fora do corpo por referência a alucinações
autoscópicas, meramente substituir um mistério por outro. Há duas correntes de
pensamento conflitantes sobre a natureza das visões que ocorrem nas condições de
isolamento. Algumas pessoas, sem dúvida, consideram-nas “irreais” e “alucinatórias”,
mesmo assim, durante toda a história, místicos e xamãs buscaram a solidão das
florestas para encontrar iluminação e revelação. A noção de que o renascimento
espiritual pode ser encontrado pelo isolamento é uma parte integral do sistema de
crenças de muitas culturas e é refletido em vários escritos religiosos, incluindo a
Bíblia.

Embora essa ideia seja um pouco estranha à nossa estrutura de crenças ocidental e
contemporânea, ainda existem numerosos proponentes, até mesmo na nossa
sociedade. Um dos pesquisadores de isolamento mais antigos e influentes, John Lilly,
M.D., escreveu um livro, uma autobiografia espiritual, intitulado The Center of the
Cyclone (O centro do ciclone). Nesse livro, ele deixa claro que enxerga as
experiências que viveu em condições de isolamento como experiências reais de
iluminação e descoberta, e não algo “irreal” ou “ilusório”. Também é interessante
notar que ele conta uma experiência própria de quase-morte que é bastante similar
àquelas com que lidei, e que ele coloca as experiências de quase-morte, na mesma
categoria que suas experiências de isolamento. Portanto, o isolamento pode ser, junto
com as drogas alucinógenas e a proximidade da morte, uma das várias maneiras de
entrar em novas realidades de consciência.

2. SONHOS, ALUCINAÇÕES E ILUSÕES

Talvez alguns possam dizer que as experiências de quase-morte são apenas sonhos,
fantasias ou alucinações que preenchem desejos e que são trazidos à cena por
diferentes fatores – drogas em um caso, hipoxia cerebral em outro, isolamento em
outro, e assim por diante. Desse modo, isso explicaria as experiências de
quase-morte como ilusões.

Acredito que diversos fatores pesam contra isso. Primeiro, considere a grande
semelhança em conteúdo e progressão que encontramos entre as descrições, apesar
do fato de que aquilo que é mais comumente relatado não ser aquilo que mais
frequentemente se imagina, em nosso ambiente cultural, que acontecerá com os
mortos. Além disso, vemos que a imagem dos eventos de morte que emergem desses
relatos corresponde de maneira marcante com aquilo descrito em literatura bastante
antiga e esotérica, que é totalmente desconhecida dos meus entrevistados.

Em segundo lugar, permanece o fato de que as pessoas com quem conversei não
serem vítimas de psicoses. Pareceram-me pessoas emocionalmente equilibradas e
normais, com posições funcionais na sociedade. Elas têm trabalhos e posições de
importância e desenvolvem seu trabalho de maneira responsável. Têm casamentos
estáveis e estão envolvidas com seus familiares e amigos. Quase ninguém com quem
conversei teve mais do que uma experiência estranha no curso de sua vida. E, ainda
mais significativo, esses informantes são pessoas que sabem distinguir sonhos de
experiências quando acordados.

Ainda, são pessoas que contam pelo que passaram ao chegar próximos da morte, não
como sonhos, mas como eventos que aconteceram com eles. Quase, invariavelmente,
garantem-me no curso da narrativa que as experiências não foram sonhos, mas
definitiva e enfaticamente reais.

Finalmente, existe algum tipo de colaboração independente para certificar os


relatórios de episódios fora do corpo. Embora o compromisso com outras pessoas me
impeça de dar nome e identificar detalhes, vi e ouvi o suficiente para dizer que
continuo perplexo e surpreso. É minha opinião que qualquer pessoa que observe as
experiências de quase-morte de maneira organizada provavelmente também
descobrirá tais corroborações estranhas e evidentes. Pelo menos, acredito que
encontrará fatos suficientes para imaginar que as experiências de quase-morte, longe
de ser sonhos, não podem pertencer a uma categoria realmente diferente.

Como nota final, deixe-me expor que as “explicações” não são apenas sistemas
intelectuais abstratos. São também, em alguns aspectos, projeções dos egos das
pessoas envolvidas com elas. As pessoas ficam presas emocionalmente, por assim
dizer, aos cânones da explicação científica que elas desenvolvem ou adotam.

Nas numerosas palestras a respeito das narrativas sobre os eventos de quase-morte,


encontrei pessoas que propuseram muitos tipos de explicações. As pessoas cuja
mente está fixada na fisiologia, farmacologia ou neurologia verão suas próprias
orientações como fontes de explicação que são intuitivamente óbvias, mesmo quando
surgem casos que parecem ir de encontro a essa determinada explicação. Aqueles
que compartilham da teoria de Freud rejubilam-se ao ver o ser de luz como uma
projeção do pai da pessoa em questão, enquanto os adeptos da teoria de Jung veem
os arquétipos da inconsciência coletiva, e assim por diante ad infinitum.

Embora eu queira enfatizar novamente que não estou propondo uma nova explicação
minha sobre tudo isso, tentei dar algumas razões pelas quais as explicações
frequentemente propostas me parecem, no mínimo, questionáveis. Na verdade, tudo
o que realmente quero sugerir é isso: vamos ao menos abrir a possibilidade de que as
experiências de quase-morte representam um novo fenômeno para o qual pode ser
necessário desenvolver novos modos de explicação e interpretação.

IMPRESSÕES

Ao escrever este livro, eu estava bem consciente de que meu propósito e perspectivas
poderiam ser facilmente incompreendidos. Em especial, gostaria de dizer aos leitores,
que se preocupam com a ciência, que estou completamente ciente de que aquilo que
fiz aqui não constitui um estudo científico. E, aos meus colegas filósofos, insisto em
que não estou sob a ilusão de que provei aqui que existe vida depois da morte. Lidar
com essas questões cuidadosamente envolveria a discussão de detalhes técnicos que
estão além do escopo deste livro, então irei me limitar aos breves comentários a
seguir.

Em estudos tão especializados quanto a lógica, a lei e a ciência, as palavras


“conclusão”, “evidência” e “prova” são termos técnicos que apresentam significados
mais sofisticados do que em seu uso comum. Na linguagem cotidiana, essas mesmas
palavras são usadas de maneira muito mais relaxada. Uma olhada em qualquer das
revistas populares mais sensacionalistas nos permitirá ver que quase qualquer relato
improvável será dado como “prova” de alguma declaração duvidosa.

Na lógica, aquilo que se pode ou não dizer que segue de um dado conjunto de
premissas não é de maneira alguma uma questão casual. Trata-se de algo definido
vigorosa e precisamente por regras, convenções e leis. Quando alguém diz que
chegou a uma determinada “conclusão”, essa pessoa está implicitamente declarando
que qualquer um que comece com as mesmas premissas deve chegar à mesma
conclusão, a menos que cometa um erro de lógica.

Esses comentários indicam por que me recuso a chegar a quaisquer “conclusões” a


partir dos meus estudos e por que digo que não estou tentando construir provas da
doutrina ancestral de sobrevivência à morte do corpo. Entretanto, acredito que esses
relatos das experiências de quase-morte são bastante significativos. O que quero
fazer é encontrar uma maneira intermediária de interpretá-los – uma forma de não
rejeitar essas experiências com base no fato de que não constituem prova científica
ou lógica, nem fazer sensacionalismo ao lançar mão de declarações emocionais vagas
que dizem que elas “provam” que existe vida depois da morte.

Ao mesmo tempo, parece-me estar aberta a possibilidade de que nossa incapacidade


atual de construir “provas” pode não representar uma limitação imposta pela natureza
das experiências de quase-morte em si. Em vez disso, talvez seja uma limitação dos
modos de pensamento científico e lógico atualmente aceitos. Talvez a perspectiva dos
cientistas e lógicos do futuro será muito diferente – deve-se lembrar que
historicamente a metodologia lógica e a científica não são sistemas fixos e estáticos,
mas sim processos dinâmicos e crescentes.

Então fico sem conclusões, evidências ou provas, mas com algo bem menos definido –
sentimentos, questões, analogias, fatos incompreensíveis a serem explicados. Na
verdade, pode ser mais apropriado perguntar, não a quais conclusões cheguei com
base nos meus estudos, mas como esse estudo me afetou pessoalmente. Em
resposta, só posso dizer que existe algo bastante persuasivo em ver uma pessoa
descrever sua experiência que não pode ser facilmente transmitida por escrito. Suas
experiências de quase-morte são eventos bastante reais para essas pessoas, e
através de minha associação com elas, as experiências se tornaram eventos reais
para mim.

Contudo, percebo que se trata de uma consideração psicológica e não lógica. A lógica
é uma questão pública, e as considerações psicológicas não são públicas da mesma
forma. Uma pessoa pode ser afetada ou mudar de certa forma enquanto outra muda
de maneira diferente devido ao mesmo conjunto de circunstâncias. É uma questão de
disposição e temperamento, e não desejo sugerir que minha própria reação a esse
estudo deva ser uma lei para o raciocínio de qualquer outra pessoa. Em vista disso,
pode-se perguntar: “Se a interpretação dessas experiências é, por fim, uma questão
tão subjetiva, por que estudá-las? Não consigo pensar em outra forma de responder a
não ser apontando novamente para a preocupação humana universal com a natureza
da morte. Acredito que qualquer tipo de luz que possa ser lançada sobre a natureza
da morte vem para o bem.

Membros de várias profissões e áreas acadêmicas precisam de esclarecimento sobre


esse assunto. Esse esclarecimento é necessário para o médico que precisa lidar com
os medos e as esperanças do paciente à beira da morte e para o padre que ajuda os
demais a enfrentar a morte. É necessário também para os psicólogos e psiquiatras,
porque para desenvolver um método confiável e funcional para a terapia de distúrbios
emocionais, eles precisam saber o que é a mente e se ela pode existir separada do
corpo. Se não puder, então a ênfase da terapia psicológica mudaria radicalmente para
métodos físicos – drogas, terapia de choque elétrico, cirurgia cerebral e coisas do
gênero. Por outro lado, se houver indicações de que a mente pode existir separada do
corpo e que é algo em si própria, então a terapia para distúrbios mentais deve
finalmente ser muito diferente.

Entretanto, estão envolvidas mais do que questões acadêmicas e profissionais. Isso


envolve questões pessoais profundas, pois aquilo que aprendemos sobre a morte
pode fazer uma importante diferença na maneira como vivemos nossa vida. Se as
experiências do tipo que discuti aqui são reais, elas têm implicações profundas
naquilo que cada um de nós vai fazer com sua vida. Então seria verdade afirmar
que não podemos entender essa vida completamente até ter um vislumbre do que
acontece além dela.

EPÍLOGO

EXPERIÊNCIAS DE QUASE-MORTE NO SÉCULO VINTE E UM

O que vem a seguir na investigação dos fenômenos extraordinários da consciência


humana que ocorrem na passagem da morte? Esta nova edição de A Vida depois da
Vida parece uma boa ocasião para contar resumidamente três desenvolvimentos mais
avançados da minha pesquisa.
Primeiro, fica claro que a experiência familiar de quase-morte é parte de um espectro
muito maior de estados alternados de consciência relacionados com a morte e o
morrer. Esse espectro inclui, de forma mais interessante, um fenômeno
impressionante que apelidei de “experiência empática de morte”.

É muito comum que alguém na cabeceira de uma pessoa que está morrendo
participe, por empatia, da experiência de morte dessa outra pessoa. Centenas de
pessoas maravilhosas de todas as posições sociais me contaram que, conforme um
ente querido morria, eles próprios saíram do corpo e acompanharam o ser amado em
direção a uma luz linda e amorosa. Também descreveram ter visto parentes
desencarnados que vinham recepcionar aquele que acabara de fazer a passagem. Na
verdade, todos os elementos que comumente se acredita fazer parte da definição de
experiência de quase-morte também são mencionados por aqueles que contam
experiências de morte empática.

Fatores demográficos inter-relacionados estão fazendo onda de experiências de morte


empáticas. Tomei conhecimento do fenômeno em 1973 por meio de um dos meus
professores de medicina, que me contou sua própria experiência durante uma
tentativa malsucedida de ressuscitar um parente próximo que sofrera um colapso
repentino e viera a falecer. Desde essa época, dezenas de milhares de baby boomers20
chegaram à meia-idade, um estágio da vida durante o qual é muito comum perder um
dos pais e outros entes queridos. Ao mesmo tempo, as práticas hospitalares em
relação a doenças terminais mudaram significativamente. Enquanto eu estava na
faculdade de medicina, geralmente eram os médicos e enfermeiras que estavam
presentes quando um paciente morria. A equipe médica intervinha para retirar os
familiares do quarto, devido à teoria de que a morte de fato seria avassaladora
demais para que eles pudessem suportar. Hoje em dia, é prática comum que médicos
e enfermeiras encorajem as famílias dos pacientes a estar junto deles até o final.
Isso, e o fato de um segmento tão grande da população agora estar enfrentando a
questão da mortalidade, garante que experiências de morte empática sejam um
assunto maior de pesquisa nas próximas décadas.

Segundo, desenvolvi e testei um sistema que permite seguramente que as pessoas


vejam em primeira mão como é um componente essencial da experiência de
quase-morte. Especificamente, muitos que retornam de um encontro próximo com a
morte dizem que durante o interlúdio viram e conversaram com os espíritos de entes
queridos que já haviam desencarnado. Os estudos médicos também mostraram que
uma alta porcentagem de indivíduos psicologicamente normais têm encontros
visionários, durante o velório, com entes queridos que partiram.

Quer essas aparições dos falecidos ocorram dentro do contexto de uma experiência de
quase-morte, ou de luto, elas ajudam as pessoas a seguir em frente no processo de
pesar com maior sucesso. Portanto, é muito interessante saber que, no mundo antigo,
existiam procedimentos que permitiam que as pessoas em estado de consciência
desperta vissem e conversassem com aparições em três dimensões, em tamanho real
e dotadas de movimento daqueles que haviam perdido para a morte.

Ao estudar os escritos antigos bem como os locais arqueológicos na Grécia, onde a


evocação dos mortos já era praticada, fui capaz de reproduzir esse método. Orientei
centenas de pessoas por meio desse procedimento, que resultou em um contato em
primeira mão com aparições “vivas” de entes queridos que já haviam desencarnado.

Para minha grande surpresa, aqueles que participaram desse procedimento tomaram
a experiência como um contato real com o desencarnado e não têm dúvida de sua
realidade. Talvez o mais importante é que os participantes dizem que esses encontros
trazem uma cura para seu pesar não resolvido. Desde que relatei essas descobertas
em 1992, tenho recebido confirmações independentes de muitos outros psicólogos em
todo o mundo. Mais recentemente, meu método de evocar os desencarnados foi
reproduzido por investigadores num grande instituto de formação de psicoterapeutas.
Membros da faculdade e estudantes do Instituto de Psicologia Transpessoal na
Califórnia replicaram minha pesquisa inicial com resultados idênticos. O espaço não
permite uma descrição cuidadosa desse método, mas os leitores interessados
encontrarão um relato completo em meu livro Reunions: visionary encounters with
departed loved ones (Reencontros: contatos espirituais com amigos e parentes
desencarnados).

Resumindo, atualmente existe um método confiável que permite que as pessoas


vejam e se comuniquem com os espíritos dos entes queridos que já fizeram a
passagem para o outro lado. Durante toda uma carreira aconselhando pessoas em
luto, ouvi muitos dizerem, quase como um mantra: ”Se ao menos eu tivesse mais
cinco minutos para dizer todos os “adeus” e “eu te amo” que ficaram sem ser ditos”.
Posso garantir com total confiança que temos um meio de conceder esses cinco
minutos a mais.

Terceiro, as observações que relato em A vida depois da vida são apenas uma
pequena parte de um projeto de pesquisa muito maior que venho conduzindo desde
1963. Esse projeto culminou na produção de um programa multimídia de
auto-instrução que inicialmente orientará apenas poucos participantes até o outro
lado. O programa também nos prepara para colocar o que vivenciamos do outro lado
em palavras. O resultado dessa pesquisa é criar um círculo de indivíduos que estará
numa posição privilegiada e única para formular um conceito literal da vida depois da
morte com propósito de investigação racional.

Estou certo de que o trabalho que estou anunciando aqui vai gerar discussão entre
entusiastas cuidadosos dos fenômenos paranormais. Certamente parece inacreditável
que possa haver um procedimento para chegar ao outro lado para uma visita curta e
retornar em segurança. Entretanto, descobri como pode ser feito e estou pronto para
defender minha afirmação.

Isso significa que finalmente existe prova científica de uma vida depois da morte?
Não, mas significa que um grande passo foi dado para colocar a ideia da vida depois
da morte numa posição mais segura. E a nova abordagem desse trabalho anuncia um
avanço significativo na compreensão das experiências de quase-morte e muitas outras
manifestações incomuns da consciência humana, incluindo fenômenos paranormais21.

Prevejo que o século vinte e um trará os maiores avanços na compreensão racional da


vida depois da morte desde que Platão escreveu sobre o assunto vinte e três séculos
atrás. Contudo, essa predileção deve ser temperada com um aviso de alerta. A
fascinação inerente que as experiências de quase-morte despertam em quase todas
as pessoas faz delas o assunto ideal para o sensacionalismo da mídia. Infelizmente, a
avalanche de livros sobre o assunto inclui muitos que, pelo que sei, foram fabricados
por pessoas inescrupulosas em busca de autopromoção, notoriedade ou ganho
financeiro em vez do verdadeiro avanço no conhecimento.

Para mim, o mercantilismo cruel que explorou o interesse público pelas experiências
de quase-morte é uma tragédia pessoal. Numa típica semana de trabalho vejo uma
série de pessoas que estão passando pelas agonias do luto pela perda de um em te
querido. Sei que muitas dessas pessoas buscam desesperadamente livros sobre a vida
depois da morte na esperança de encontrar consolo. Fico profundamente abalado ao
ver pessoas sofrendo abuso por parte daqueles cujo interesse no assunto não é a
verdade, mas o ganho financeiro.

Um livro importante sobre este assunto é Ordered return: my life after dying22
(Chamado para retornar: minha vida depois de morrer). Esse relato é exatamente
como ouvi do próprio doutor Ritchie em 1965, o que me inspirou a realizar a pesquisa
relatada em A vida depois da vida. Na década de 1950, ele falou publicamente sobre
sua própria experiência de quase-morte. Foi preciso muita coragem para falar sobre o
assunto naquela época. Quando o fez, ele ficou exposto ao ridículo e à rejeição. No
processo, ele inspirou a mim e a milhares de outras pessoas a quem ajudou no curso
de sua longa carreira em medicina.

Outra boa fonte é o trabalho do doutor Kenneth Ring, professor emérito de psicologia
da Universidade de Connecticut, em Storrs. Seu livro Life at death (Vida na morte),
publicado em l980, foi o primeiro estudo sistemático e estatístico das experiências de
quase-morte. Mais recentemente, seu livro, escrito com Sharon Cooper, Mindsight:
near-death and out-of-body experiences in the blind, (visões mentais: quase-morte e
fora-do-corpo, experiências com cegos), conta casos impressionantes de pessoas que,
embora cegas, aparentemente tiveram percepções visuais à sua volta enquanto
estiveram fora do corpo durante seus encontros próximos com a morte.
Bruce Greyson, M.D., do Centro Médico da Universidade da Virgínia, provavelmente
contribuiu mais para o estudo desse fenômeno do que qualquer outro indivíduo
sozinho. Por quinze anos, o doutor Greyson editou a influente publicação Journal of
Near-Death Studies23. O Journal é o filão principal dos estudos racionais sobre esse
assunto, escrito por profissionais de cada campo clínico ou acadêmico relevante.

Melvin Morse, M.D., um pediatra com consultório particular em Seatle, Washington,


contribuiu com uma série de livros e artigos excelentes para jornais de medicina sobre
as experiências de quase-morte em crianças. Seu livro Transformados pela luz24 e
Closer to the light: learning from the near-death experiences of children25 (mais perto
da Luz: aprendendo com as experiências de quase-morte das crianças), ambos com
Paul Perry, são altamente recomendados.

Para aqueles que estão seriamente preocupados com as questões do paranormal e da


vida depois da morte, também quero recomendar meu livro The last laugh: a new
philosophy of near-death experiences, apparitions, and the paranormal26 (O último
riso: a nova filosofia de experiências de quase-morte, aparições, e paranormalidade).
Ele apresenta uma abordagem inteiramente nova para a investigação desses
fenômenos extraordinários e recebeu bastante apoio e encorajamento de muitos dos
meus colegas de área.

Finalmente, quero expressar minha gratidão para com as multidões de leitores de A


vida depois da vida em todo o mundo que me escreveram descrevendo as próprias
visões que aconteceram à beira da morte e que mudaram sua vida. Também agradeço
às milhares de pessoas que me escreveram para dizer que o livro as inspirou e
confortou num momento de perda.

Estou feliz por ser capaz de dizer que a pesquisa que originalmente relatei neste livro
mal arranhou a superfície. O futuro próximo trará desenvolvimento no estudo racional
da vida depois da morte que será ainda mais surpreendentes do que os que
apresentei até agora.

Raymond A. Moody Jr., PH.D., M.D.

Nota do Autor

1- Suíço, foi fundador do Instituto e Pesquisa e Audiência Gallup, em Princeton.

2- Kubler-Ross, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer. São Paulop: Martins Fontes,


1996 (N.E.)

3- Wambach, Helen. Life before life. Bantam; Reissue edition, 1984 (N.E.)
4- Ring, Keneth. Life at death: a scientific investigation of the near-death
experience. Nova York: Quill, 1982

5- Entre certos povos asiáticos (Sibéria), espécie de sacerdote ou médico feiticeiro,


que atua como curandeiro e adivinho. Para diversos povos e sociedades,
especialista a quem se atribui a função e o poder, de natureza ritual
mágico-religiosa, de recorrer a forças ou a entidades sobrenaturais para realizar
curas, adivinhação, exorcismo, encantamento, etc., e cuja atuação pode ou não
envolver um estado de transe.

6- M.D.: abreviatura de doutor em medicina

7- Ph.D.> abreviatura de doutor em filosofia (grau de doutorado universitário).

8- Homero- Ilíada. Trad. Haroldo de Campos. São Paulo: Arx

9- Platão, Apologia de Sócrates, tradução livre

10- A expressão “put to sleep”, em inglês, equivale a uma alternativa mais


branda para nossa expressão “sacrificar”

11- Salmo 90:10

12- Codeína: medicamento derivado da morfina; cristalino, incolor, sedativo,


hipnótico

13- Todas as citações da Bíblia foram extraídas da versão da Edição Corrigida


Fiel, tradução de João Ferreira de Almeida (Is.26:19)

14- Dan 12:2

15- At. 26:13-26

16- 1 Cor 15:35-52

17- Todas as citações de Swedenborg são traduções livres dos trechos


encontrados no Compendium of the theological and spiritual writings of Emanuel
Swedenborg. Boston: Crosby and Nichols, 1853 pp.160-197

18- Para uma exposição contemporânea vivaz e fascinante desse lado do uso de
drogas, veja o livro de Andrew Weil, M.D. Drogas e estados superiores da
consciência

19- Alucinações autodcópicas: ver a si mesmo

20- Baby boomers: pessoa nascida durante um período de alta taxa de


natalidade, especificamente, na Inglaterra e nos EUA, de 1945 a 1952
21- O autor refere-se a seu novo trabalho intitulado The wisdom of nonsense:
how to prepare for your near-death experience (A sabedoria do contra senso:
como se preparar para sua experiência de quase-morte.

22- Ritchie, George, NM.D. Ordered to return: my life after dying. Hampton
Roads Publishers

23- Greyson, Bruce, M.D. Journal of NeaDeath Studies. Nova York: Human
Sciences Press

24- Morse, Melvin. Transformados pela Luz. Rio de Janeiro. Nova Era

25- Closer to the light: learning from the near-death experiences of children.
Paperback

26- Moody, Raymond A., Jr. The last laugh: a new philosophy of near-death
experiences, apparitions, and the paranormal. Hampton Roads Publishers

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