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Situação de Incêndio Na Sala Operatória
Situação de Incêndio Na Sala Operatória
CIÊNCIAS BÁSICAS
EM ANESTESIA
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Ciências básicas em anestesia, uma obra produzida
CIÊNCIAS
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BÁSICAS EM
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volumes, com os conhecimentos fundamentais da área
para os anestesiologistas. O Volume 1, já disponível,
contempla informações sobre Farmacologia. Este
ANESTESIA
Volume 2 traz informações sobre Fisiologia e ciências
afins e, o Volume 3 abordará Farmacologia, fisiologia e
ciências afins em situações especiais.
Neste volume dedicado à Fisiologia e ciências afins,
as informações são apresentadas em 25 capítulos, Fisiologia e
ciências afins
2
distribuídos em quatro partes: conceitos básicos;
anatomia e fisiologia por sistema orgânico; princípios
de biofísica aplicados à anestesia; equipamentos
de monitorização: princípios de funcionamento,
verificação e dispositivo de alarme. Marcius Vinicius M. Maranhão Jedson dos Santos Nascimento
Eduardo Bianchini Marcos Antonio Costa de Albuquerque
ANESTESIOLOGIA
Adriano Bechara de Souza Hobaika Maria Angela Tardelli
2
Alexandre Guedes Editores
Em produção
Versão impressa
desta obra: 2023
Rio de Janeiro
2023
Ciências básicas em anestesia: fisiologia e ciências afins (Vol. 2)
Copyright © 2023, Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA)
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra,
por qualquer sistema, sem o prévio consentimento da SBA.
CDU 616-089.5
Define-se incêndio na sala de cirurgia o fogo que ocorre ma foi publicado pela Revista da Sociedade Brasileira de
dentro do paciente, sobre o paciente ou no seu entorno. Anestesiologia em 1954, onde os autores já ressaltavam
Tal evento pode causar lesões graves e até levar o pa- o perigo dos elementos que iniciam e desenvolvem um
ciente a óbito, deixar sequelas emocionais. E ainda existe incêndio durante o ato cirúrgico.7
o risco de atingir os membros da equipe cirúrgica.
Conforme o grau da lesão causada, é considerado um
evento sentinela (never event), exigindo análise das suas
COMO ACONTECE UM INCÊNDIO
causas e notificação obrigatória.1,2 NA SALA DE CIRURGIA
A incidência de incêndios na sala de cirurgia descrita
pelo Emergency Care Research Institute (ECRI) caiu de O fogo que ocorre durante o ato cirúrgico tem caracte-
20 a 200 por ano para 20 a 30 por ano, e 1 ou 2 ocorrem rísticas próprias, pois está ligado aos elementos da “tría-
nas vias aéreas, sendo fatais.3-5 Em razão dessa baixa in- de do fogo”, que, quando presentes ao mesmo tempo na
cidência, não gera a devida percepção do risco e da gra- área cirúrgica, podem desencadear um incêndio.
vidade da sua ocorrência durante o ato cirúrgico.
A quase totalidade dos incêndios cirúrgicos não são COMO AGE A TRÍADE DO FOGO
notificados, provavelmente por questões de responsabi- Ao se ativar um dos aparelhos elétricos usados em cirur-
lização, e apenas os casos de maior morbidade ou mor- gia, uma fagulha pode atingir um dos elementos com-
talidade são publicados como relatos de casos em revis- bustíveis presentes e, se envoltos na atmosfera enrique-
tas médicas.3 cida pelo oxigênio utilizado durante a anestesia, poderá
No Brasil, o relatório de notificações do boletim da ocorrer o início do fogo e a sua propagação. Estes even-
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) cita na tos – ignição, combustão e propagação – só acontecem
área de never events a notificação de 40 casos de quei- quando os três elementos da tríade estiverem presentes,
maduras graves abrangendo o período de 2014 até 2022, próximos, e forem ativados para ocorrer a combustão.
embora sem a descrição do local nem da forma como O fogo pode se iniciar dentro ou fora do paciente,
ocorreram, fato que não ajuda a despertar a atenção so- conforme o tipo de cirurgia, e a extensão dos danos pode
bre este tipo de evento.1 ser mínima ou causar lesões graves e até levá-lo a óbito.
Por outro lado, no JUS BRASIL (empresa privada de A intensidade dos efeitos do fogo está ligada à capaci-
acesso a informações jurídicas) existem múltiplas ações ju-
dade de prevenção, de reconhecimento do evento e da res-
diciais envolvendo médicos e hospitais geradas por lesões
posta da equipe cirúrgica, em acordo com o plano de segu-
em pacientes devido a incêndios cirúrgicos, o que mostra
rança de incêndio e conforme o treinamento recebido.
que as notificações oficiais desses eventos adversos não es-
pelham a real incidência dos incêndios na sala de cirurgia.6
Além da sala de cirurgia, é importante estender este
OS COMPONENTES DA TRÍADE DO FOGO
alerta de incêndio para outros setores onde são realiza-
dos procedimentos invasivos, tais como salas de radio-
Gases oxidantes:
logia intervencionista, hemodinâmica, laboratórios de in-
oxigênio – protóxido de nitrogênio
vestigação eletrofisiológica e salas cirúrgicas híbridas. Em razão da utilização universal do oxigênio nas áreas ci-
A descrição deste tipo específico de incêndio não rúrgicas, as características sobre as ações oxidantes dos
é nova: um dos primeiros artigos brasileiros sobre o te- gases são referenciadas ao oxigênio.
342 | INCÊNDIO NA SALA DE CIRURGIA
Os gases oxidantes reagem com a maioria dos ma- A Tabela 23.1 mostra a variação dos tempos de igni-
teriais. Quanto maior a concentração de oxigênio na at- ção e combustão conforme a concentração de oxigênio.
mosfera local, mais intensa será a reação de combustão
e maior a rapidez da propagação do fogo. A temperatu- Combustível
ra de ignição e a energia necessária de ignição para pro-
Diversos tipos de combustíveis são encontrados na sala
mover a combustão são muito menores. A temperatura
de cirurgia, podendo estar presentes na equipe cirúrgica,
da chama é maior e, consequentemente, sua capacidade
no paciente ou próximo a ele. Esses materiais podem en-
destrutiva é mais intensa.
trar em combustão no ar ambiente, mas o risco aumenta
Atenção: cabe ao anestesista gerenciar os gases em atmosferas enriquecidas com oxigênio.
oxidantes administrados ao paciente. Exemplos de materiais combustíveis incluem subs-
tâncias com base alcoólica utilizadas na preparação do
paciente para cirurgia, os cabelos do paciente, pomadas
Atmosfera enriquecida com oxigênio à base de óleo, esparadrapo, assim como os gases intes-
É uma mistura de gases na qual a concentração de oxi- tinais, que são considerados inflamáveis em cirurgias en-
gênio em volume excede 23,5% ao nível do mar ou cuja volvendo os intestinos, na área retal e perianal.11
pressão parcial de oxigênio excede 175 mmHg.8 Outros itens também considerados combustíveis são
Tendo em vista que o oxigênio é incolor, inodoro e in- lençóis, campos cirúrgicos, colchões, travesseiros, gor-
sípido, os sentidos humanos não podem detectar a pre- ros, toucas, compressas, curativos, luvas e aventais.
sença de uma atmosfera enriquecida com oxigênio. Essa
atmosfera permite que os materiais que não queimam no Atenção: cabe à equipe de enfermagem o
ar ambiente, incluindo os materiais resistentes ao fogo, manuseio das substâncias combustíveis.
passem a queimar vigorosamente. Os tecidos de algo-
dão (p. ex., roupas, aventais, gorros, campos cirúrgicos, Fontes de ignição
máscaras cirúrgicas) entrarão em combustão com tem-
peraturas menores, queimarão mais rápido e com maior A principal fonte de ignição na sala de cirurgia é o eletro-
intensidade. Estas mesmas condições são aplicadas aos cautério monopolar, pela geração de calor ou fagulhas,
plásticos e elastômeros. podendo provocar a ignição em uma atmosfera enrique-
O oxigênio liberado pelo uso de cateteres nasais ou cida pelo oxigênio.
máscaras faciais pode enriquecer a atmosfera no entorno Além dos eletrocautérios, os sistemas a laser e os fi-
da máscara, em cavidades corporais e sob os campos ci- broscópios são capazes, mediante geração de calor, de
rúrgicos, propiciando as condições de combustão. promover a ignição de materiais combustíveis.
Barnes e Frantz realizaram um experimento em um
cenário cirúrgico e encontraram elevadas concentrações Atenção: cabe ao cirurgião o manuseio
de oxigênio sob campos cirúrgicos, quando fornecido do equipamento cirúrgico.
por máscara facial. A concentração chegava a 45% com
fluxo de 4 L/min, criando uma atmosfera com alto risco
de incêndio.9
INCIDÊNCIA DA TRÍADE DO FOGO
Em outro experimento, Wolf e Lazard testaram cam- O dispositivo eletrocirúrgico é citado como fonte de igni-
pos cirúrgicos e compressas em ambiente enriquecido ção em 70% dos incêndios cirúrgicos. Aproximadamente
por oxigênio, verificando que, quanto maior era a con- 10% dos incêndios são causados por laser. O calor tam-
centração de oxigênio, mais rápido o tecido entrava em bém pode ser proveniente de fonte de luz da fibra ópti-
combustão, aumentando o risco da rápida propagação ca, do desfibrilador e de fagulhas. A atmosfera enrique-
do fogo.10 cida com oxigênio está envolvida em 75% dos incêndios
Tabela 23.1 – Variação dos tempos de ignição e combustão de acordo com a concentração de
oxigênio (O2)
cirúrgicos. Já as soluções de preparação à base de álcool • Evitar o uso de protóxido de nitrogênio em cirurgia in-
estão envolvidas em 4% deles.10 testinal, pois pode haver a difusão para dentro do in-
testino, o que potencializa os gases intestinais, au-
mentando a possibilidade de combustão.
AVALIAÇÃO DO RISCO DE • Em cirurgias na orofaringe, quando o paciente utilizar
INCÊNDIO NA CIRURGIA tubo sem balonete:
• Aspirar a orofaringe para prevenir o acúmulo de
Um protocolo de avaliação de risco de incêndio na sala
gases oxidantes na orofaringe.
de cirurgia foi desenvolvido pelo Christiana Care Health
• Utilizar gaze ou esponja úmida na orofaringe para
System com o objetivo de identificar qual a possibilidade
bloquear ou reduzir o escape de gases oxidantes.11
de fogo. Os elementos de risco incluem o seguinte:
• Sempre que possível, o eletrocautério deve ser usado TUBOS TRAQUEAIS E BALONETES
na menor potência.
• Quando o bisturi elétrico não estiver sendo usado, • Quando o paciente estiver sob sedação moderada ou
deve ser mantido em lugar seguro fora do paciente. necessitar de suplemento de oxigênio contínuo, de-
O bisturi não deve ser colocado sobre o campo cirúrgico. ve-se considerar o uso da via aérea artificial para for-
necer os gases durante o ato cirúrgico.15
• A ativação do bisturi somente deve ser realizada pelo
cirurgião que for utilizá-lo. • Avaliar a integridade do tubo e do balonete para evi-
tar vazamentos que podem contribuir para o enrique-
• O bisturi só deve ser ativado quando o cirurgião obti-
cimento da atmosfera cirúrgica pelo oxigênio.
ver visão direta do campo cirúrgico.
• Caso o paciente necessite de altas pressões inspira-
• O bisturi deve ser desativado antes de sua ponta dei-
tórias ou de pressão expiratória final positiva (PEEP),
xar o local cirúrgico.
especialmente na traqueostomia em paciente crítico,
• Não utilizar protetores da lâmina do bisturi que não
é necessário assegurar que a pressão intrabalonete
possuam isolamento.
não permita extravasamento da mistura gasosa.12,14,16
• Não utilizar eletrocirurgia para abrir a traqueia.
• Durante o ato cirúrgico, ter cuidado para evitar a per-
• Caso esteja sendo usado pedal para ativar o bisturi, es-
furação do balonete pelo laser ou bisturi.
te deve ser removido da proximidade do cirurgião nos
• Para cirurgias utilizando laser, a escolha deve ser o tu-
períodos sem utilização, para evitar ativação acidental.
bo resistente ao laser, com a opção de possuir duplo
balonete.17
LASER CIRÚRGICO
• Por precaução, o balonete pode ser insuflado com
• Verificar as conexões do cabo do laser antes de ati- solução salina, que pode ser colorizada com azul de
vá-lo. metileno para alertar em caso de perfuração e evitar a
• Testar o laser antes do uso. ignição dos gases.14,16,18,19
• Sempre que possível, utilizar o laser na menor potên- • Não se deve fazer uso de tubos de PVC envolvidos
cia e pulsação. em película refletora devido ao risco de haver falha
• Somente o cirurgião que usará o laser deve ativá-lo. na cobertura e perfuração pelo laser.17
• Não prender o cabo do laser no campo cirúrgico, pois
pode haver roturas na fibra e liberação de laser no AÇÕES COORDENADAS
campo cirúrgico, gerando combustão.
• Colocar bainha no laser e mantê-lo longe do paciente
DA EQUIPE CIRÚRGICA
quando não estiver em uso. • Após o uso de substância degermante com teor al-
• Durante cirurgias nas vias aéreas inferiores, confirmar coólico, a enfermagem informará a equipe sobre a
que a ponta do laser está fora do broncoscópio ou tu- necessidade de aguardar até 3 minutos para a seca-
bo traqueal, antes de ativá-lo. gem completa da área.
• Usar tubos traqueais resistentes ao laser nas cirurgias • O cirurgião informará a toda equipe quando for ati-
de vias aéreas superiores. var o eletrocautério e aguardará a autorização para
• Colocar compressas umedecidas em torno do tubo ativação.
traqueal e mantê-las úmidas para evitar escape de • O anestesista suspenderá ou reduzirá o fluxo dos
oxigênio. gases (via cateter, tubo ou máscara) e avisará que é
• Todas as compressas, toalhas, gazes e esponjas de- necessário esperar até 5 minutos para a redução dos
vem ser mantidas úmidas para evitar a combustão.14 gases a níveis seguros, permitindo o uso da fonte de
ignição.
EQUIPAMENTOS ELÉTRICOS • Ao terminar o tempo, o anestesista informará ao
cirurgião que pode ativar a ignição.
• Todo equipamento deve permanecer em modo espe-
ra (stand-by) quando não estiver sendo usado.14
• Manter o sistema sonoro do equipamento suficien- PLANO DE AÇÃO
temente alto para permitir que seja audível acima do
ruído ambiental, de modo que toda a equipe cirúrgica
PARA INCÊNDIO
saiba que o laser está sendo usado. É de grande importância, seja para prevenção ou na per-
• Seja qual for o equipamento a ser usado na cirurgia, cepção do início do fogo e nas consequentes ações de
a verificação ou suspeita de avaria ou mau funcio- contenção, que a comunicação entre os membros da
namento afastará o equipamento do procedimento equipe cirúrgica seja eficaz, baseada na constante obser-
cirúrgico.12 vação do ato cirúrgico.
CIÊNCIAS BÁSICAS EM ANESTESIOLOGIA | 345