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Lembre-Se de Nós - Stupid Wife - Sodré N
Lembre-Se de Nós - Stupid Wife - Sodré N
PREPARAÇÃO DE TEXTO
Nathalia Brandão
Vitória Almeida
REVISÃO
Andréa Santos
Isabella Lazaroni
Ivan Souza
Jéssica Sampaio
DIAGRAMAÇÃO
Lara Design Editorial
[2021]
Todos os direitos reservados à SODRÉ || @horsinha
LEMBRE-SE DE NÓS, 1ª EDIÇÃO, EDITORA EUPHORIA, 2021
CNPJ: 39.317.627/0001-06
Contato: editoraeuphoria@gmail.com
Site: editoraeuphoria.com.br
Rio de Janeiro — RJ
Uma história de ficção que alcançou limites os quais eu nunca imaginei
serem possíveis. Serei eternamente grata a cada um de vocês, carinhas.
Muito obrigada, do fundo do meu coração, da minha mente para os braços
de vocês.
SODRÉ
Prólogo - Passado
05 de novembro, 2016 - DIAS ATUAIS
Capítulo 1 – Sonho Louco
Capítulo 2 – Encarando a realidade
Capítulo 3 - Egoísmo
Capítulo 4 - Carinha
Capítulo 5 - Diários
Capítulo 6 - Família
Capítulo 8 - Desejos
Passado – Camille Cruz
Capítulo 9 – Dor compartilhada
Capítulo 10 - Aniversário
Capítulo 11 - Recomeço
Capítulo 12 - Reconhecer
Capítulo 13 - Conexão
Capítulo 14 – Primeiro beijo
Capítulo 15 – Esperanças
Capítulo 16 – Lugar certo
Capítulo 17 - Familiar
Capítulo 18 – Um pedaço do seu coração
Capítulo 19 – Resposta óbvia
Capítulo 20 – Até quando resistir?
Capítulo 21 – Minha pessoa
Capítulo 22 – Dias melhores
Capítulo 23 – Tudo acontece por um motivo
Capítulo 24 – Cuidar dela
Capítulo 25 – Na alegria e na tristeza
Capítulo 26 – Feliz Natal
Capítulo 27 – O primeiro passo
Capítulo 28 – Ponto de paz
Capítulo 29 – O pedido dela
Capítulo 30 - Tudo
Capítulo 31 - Momentos
Capítulo 32 – Diversas sensações
Capítulo 33 – Uma lembrança
Capítulo 34 - Pronta
Capítulo 35 – Eu sou seu presente
Capítulo 36 – A escolha perfeita
Capítulo 37 – Gravidez dupla?
Capítulo 38 – Finalmente completas
Capítulo 39 – O grande dia
Capítulo 40 – Lembre-se de nós
Capítulo 41 – Esposa idiota
Agradecimentos
Prólogo - Passado
Se fosse possível adicionar ao dicionário uma nova definição para
idiota, eu, sem sombra de dúvidas, colocaria em letras garrafais o nome
daquela idiota: Luna.
Ou pode chamá-la apenas de “meu eterno carma”.
Você provavelmente deve estar se perguntando o motivo, certo?
É bem simples: eu odeio tudo nela e sobre ela. Desde seu jeito
arrogante de falar até o modo de andar como se fosse dona do mundo,
principalmente por achar que as pessoas caem de amores aos seus pés.
Porém, a razão maior é que essa garota sempre consegue encontrar um
jeito de atormentar minha vida. A qualquer lugar que vou, ela está lá. Às
vezes, parece que me persegue, e confesso que não ficaria surpresa se isso
fosse verdade.
Talvez essa idiota seja obcecada por mim.
Ela não deve ter nada da vida para fazer além de me perturbar. Isso
deve diverti-la muito, pois desde que a idiota entrou em minha vida, nunca
mais tive sossego. Todos os dias, na escola, parece um labirinto eterno,
porque sempre tem a maldita Luna no meu caminho.
Infelizmente, morar no mesmo lugar desde o meu nascimento fez
com que eu crescesse praticamente rodeada pelas mesmas pessoas. É como
entrar em um loop infinito: não importa aonde você vá, sempre terá um
conhecido seu.
Meus pais são do México, mas se mudaram para os Estados Unidos
antes mesmo de eu nascer. E para o meu azar, os pais da dita cuja tiveram
a brilhante ideia de fazer o mesmo quando Luna ainda era um bebê.
Diferente de mim, no entanto, ela não nasceu na Inglaterra, cidade natal
dos pais dela, e sim aqui mesmo, em Miami.
Tenho certeza de que, em breve, terei muitos cabelos brancos por
causa dessa pendeja.
— Eu gostaria de saber o que esse pobre taco te fez para ser
amassado com tanto ódio dessa forma — uma voz é ouvida de repente,
sendo seguida por alguns risinhos, mas meus olhos estão focados naquele
ser humano asqueroso rindo escandalosamente, cercado de seus amigos
idiotas. É incrível como ela consegue trazer o meu pior à tona, e não é
necessário muito esforço. Deve ser um dom me deixar irritada com
facilidade.
Solto uma lufada de ar e finalmente desvio meu olhar da idiota. Fito
o ser sentado a minha frente, encontrando minha irmã gêmea, Belinda. Ela
tem uma expressão divertida em seu rosto, tão idêntico ao meu, e parece
focar em algo. Resolvo olhar para o mesmo lugar e faço uma careta ao me
deparar com a bagunça que havia feito. Merda!
— Estragando comida outra vez, Lil[1] ? — dessa vez é a pessoa ao
meu lado, minha melhor amiga, Vanessa, quem diz alguma coisa.
Eu apenas reviro os olhos, ignorando-a, mas a careta em meu rosto
aumenta quando sinto meus dedos colarem. Excelente! Além de ficar sem
meu lanche, estou com as mãos sujas. E tudo isso é culpa de quem?
Daquela idiota dos infernos! Justo no dia que a cantina do colégio resolveu
colocar um pouco da culinária latina no cardápio.
— Luna trancou a Camille no vestiário — minha queridíssima irmã
resolve confidenciar a Vanessa sobre o infeliz incidente de mais cedo,
quando a digníssima resolveu que seria muito divertido me trancar dentro
do vestiário sozinha e com as luzes apagadas. Acabei me atrasando para a
aula de História, porque demorou um bom tempo até que alguém me
encontrasse lá dentro.
Eu seria capaz de matar aquela garota com minhas próprias mãos
lentamente. Da mesma forma que fiz com o meu lanche, poderia fazer no
pescoço dela. Não me importaria de sacrificar meu réu primário com um
homicídio.
— Quantas vezes ela fez isso durante essa semana mesmo?
Eu apenas ouvia as duas zombando e rindo, enquanto tentava tirar
aquela nojeira das minhas mãos e pensava em diversas maneiras de matar
Luna.
— Acho que foram sete.
— Na verdade, contando a de hoje, foram oito.
— Luna está se tornando especialista em prender nossa querida
Camille nos lugares.
— Pobre irmã, sempre na hora e no lugar errado — Belinda
respondeu, e isso fez com que as duas voltassem a gargalhar.
Eu não estava a fim de me irritar ainda mais, tinha estourado toda a
minha cota de estresse com a idiota. Hoje foi só mais um dos tantos dias
que ela infernizou minha vida. Não é algo fora do comum, para dizer a
verdade. Minha única salvação é saber que as férias de julho se aproximam
e, pelo menos durante algum tempo, ficarei longe dessa garota idiota.
— Vocês perceberam como o Noah parece ficar mais lindo a cada
dia?
Meu rosto se contorce automaticamente com o tom de voz adocicado
da minha melhor amiga ao dizer aquilo. Vanessa alimenta uma paixonite
pelo irmão da idiota há alguns anos, acho que uns quatro, para ser mais
exata. Não tenho nada contra o Noah, é um garoto legal, que só deu azar
de ser irmão da Luna. Não sei como ele suporta conviver com aquela
garota, deve ser horrível.
Mas, voltando ao assunto, tenho certeza de que ele desconfia da
paixonite de minha melhor amiga, porque Vanessa não consegue esconder a
cara de idiota toda vez que estamos no mesmo ambiente.
Noah sempre foi muito divertido e simpático, e pelo fato de que
todos se conhecem desde sempre nesse colégio, os dois estão em constante
contato. Ainda assim, minha amiga quase morre quando esse garoto se
aproxima dela.
Quando ele estava comprometido, eu entendia o silêncio de Vanessa,
mas agora que nada a impede, continua sofrendo calada, ao invés de
simplesmente se declarar. É melhor arriscar do que viver imaginando como
teria sido.
Sinceramente, não entendo o porquê de as pessoas ficarem agindo
de maneira tão idiota quando estão apaixonadas, acho uma besteira. Sendo
bem sincera, toda essa coisa de amor é palhaçada.
Por outro lado, minha irmã foi determinada a ir atrás do que queria:
ela namora Rodrigo, o brasileiro recém-chegado. Para dizer a verdade, não é
tão recente assim, faz três anos que se mudou e está aqui, no mesmo
colégio que todo mundo.
Belinda se interessou quase que instantaneamente, assim que o viu,
e não demorou muito para começar a puxar assunto, dizendo que adorava
seu sotaque, entre outras coisas que prefiro nem saber. Foi questão de
poucos meses para eles começarem a se envolver, e agora são um dos
casais mais melosos que conheço. Infelizmente. Eu quero morrer todas as
vezes que eles começam a se agarrar nos lugares. É constrangedor, e não
adianta nada reclamar, porque os dois continuam.
— Eu não entendo...
— Oh, meu Deus! Oh meu, Deus! — Vanessa corta minha fala,
completamente afobada. — Noah está vindo para cá. Ele está vindo mesmo.
Seu rosto estava completamente vermelho, e parecia prestes a entrar
em colapso.
Não pude evitar fazer caretas de desgosto. Como disse antes, as
pessoas agem de forma tão idiota quando estão apaixonadas...
Isso porque os dois cresceram juntos, imagine se ele fosse novo na
cidade, por exemplo. Vanessa é muito besta por esse garoto, não tenho
paciência.
— Pelo amor de Deus, Vanessa. Respire ao menos — peço, agoniada,
ao vê-la daquele jeito, e tudo somente porque o dito cujo está vindo em sua
direção. Será que ela irá morrer, caso ele sorria e a cumprimente como
sempre? Não é como se isso não acontecesse todos os dias.
— Ele é lindo demais, eu não consigo.
Já completamente sem paciência para aquela cena ridícula, apenas
reviro os olhos e a ignoro. Belinda é a única que tem paciência para lidar
com essa criatura surtando por causa de um garoto.
Coloco meus cotovelos sobre a mesa, apoio meu queixo sobre as
mãos, para observar as pessoas, e começo a ficar nervosa quando noto que
não apenas Noah está vindo em nossa direção, mas meu cunhado Rodrigo
também.
Era só o que faltava. Que delícia, estava precisando de uma vela aqui
mesmo!
Querendo me poupar de presenciar momentos constrangedores,
preparei-me para me levantar daquela mesa, mas fui impedida ao notar
uma presença repentina ao meu lado. Não precisava nem me esforçar para
saber quem era.
— Oi, Camies... Eu vim te fazer companhia, você sabe... pra que você
não fique sobrando — ela diz e abre um enorme sorriso, apontando com a
cabeça em direção aos pares ao nosso lado, que parecem bem entretidos
em alguma conversa idiota. — Muita gente gostaria de estar no seu lugar,
mas eu escolhi você. — E como sempre, esse ser precisa mesmo abrir a
maldita boca e cuspir esse monte de lixo sonoro em cima dos outros.
Luna não se conforma em ser desagradável, ela tem sempre que
piorar tudo. São por atitudes como essa que não consigo suportá-la. Queria
fazê-la sumir da face da terra. Ela precisa mesmo agir como se as pessoas
fossem cair aos seus pés, apenas por causa desse maldito sorriso e desses
olhos verdes?
— Ok, primeiramente você não me escolheu, porque eu nem sou
uma opção sua. Shh! — Faço sinal para ela se calar, antes que mais alguma
idiotice saia daquela boca. — Não sou e nunca vou ser, porque eu não
quero.
— Camies, você está muito estressada hoje. Que tal darmos uma
volta e deixarmos esses quatro sozinhos?
— Não vou a lugar algum com você. Nem ao menos te chamei para
vir até aqui. Ninguém chamou. — Cruzo os braços e a encaro com extremo
deboche, antes de completar: — E só para refrescar a sua memória: você
não faz meu tipo, pode tirar esse sorriso ridículo da cara.
Isso poderia abalar qualquer pessoa. Sim, qualquer uma, mas eu
sabia que ela nem daria importância. Não é a primeira vez que lhe dou um
fora, e Luna parece gostar disso.
Tento desviar meu olhar da idiota, mas me arrependo no momento
em que meus olhos pairam sobre minha irmã e meu cunhado aos beijos.
Eles nem se importam de estarmos no colégio ou com todas as pessoas ao
redor. Isso me deixa bem desconfortável, porque é muito constrangedor.
— Você sabe que eu faço o tipo de todo mundo.
— Felizmente, minha mãe sempre disse que não sou todo mundo. E
eu não poderia ser mais grata a ela por isso.
Olho para a idiota, que não parece nem um pouco abalada com os
meus foras e continua sustentando aquele sorriso ridículo em seu rosto.
Será que essa garota caiu de cabeça no chão logo depois que nasceu?
Porque nada pode explicar sua falta de noção para entender que não é
bem-vinda.
— Minha sogra gosta de mim, e você sabe disso — ela diz, com
aquele ar grotesco de arrogância, e, então, sinto um braço sobre meus
ombros.
Meu corpo todo estremece de raiva.
— Você está louca? Não toque em mim com esses dedos nojentos.
Não te dei permissão.
Sei que provavelmente estou fazendo uma cena absurda, mas não
poderia me importar menos. Luna não tem vergonha na cara, inferniza
minha vida em uma hora e na outra quer agir como se fôssemos próximas.
— Dedos nojentos? Você não diria isso se soubesse o que eles são
capazes de fazer.
Meus olhos quase saltam das órbitas e minhas bochechas ficam
doloridas na mesma hora. Com certeza, estou corada, desacreditada que
acabei de ouvir uma merda dessas. Realmente, Luna consegue se superar
todas as vezes.
— Você é asquerosa! — exclamo e rapidamente me levanto para me
afastar daquela criatura, antes que minha razão suma e acabe acontecendo
uma coisa da qual irei me arrepender depois. Provavelmente, eu iria agredi-
la ou algo parecido com isso.
Felizmente, consegui evitar aquela idiota pelo resto do dia, ou teria
cometido um crime de ódio direcionado. Não vejo a hora de estar de férias,
livre disso.
— Senha do quê?
Minha pergunta é respondida quando noto a frase “deslize para
desbloquear” bem no final da tela. Escorrego um dedo sobre o local e uma
caixinha aparece, abrindo também o teclado. Escrevo os números que li na
mensagem e a caixinha desaparece, dando lugar a uma série de aplicativos.
Eu sei que o telefone é meu, pois na tela tem uma foto minha, com Louis ao
meu lado, beijando minha bochecha. Tem um pequeno ícone com um balão
de fala e, em cima dele, o número sete. Eu clico em cima e sou direcionada
para o que parecem ser mensagens. Acho muito curioso e prático esses
novos aparelhos celulares sem teclado. As coisas realmente mudaram nos
últimos anos.
Três mensagens de Mi suerte.
Uma de Big.
E por último, também, tem uma de Cópia malfeita.
— Cópia malfeita? Só pode ser a Belinda.
Tenho certeza de que é ela, lembro-me de que sempre dizia isso
quando nos apresentávamos para alguém. Eu nasci poucos minutos antes
dela, então ela é a cópia malfeita mesmo.
Decido abrir primeiro as mensagens de Mi suerte. Estava curiosa.
Eu sei que é Luna, não apenas pelo conteúdo das mensagens, mas
também porque ninguém nesse mundo, além dela, me chama de Camies.
Parece que as coisas não mudaram tanto assim. Eu sempre odiei esse
apelido, porque ela o usava como deboche. Mas se ela ainda me chama
assim, pode ser que eu tenha aprendido a gostar. Ou talvez ela só esteja me
provocando.
Ela disse algo sobre um estúdio. Será que Luna é cantora ou trabalha
com música? Isso explicaria todo o luxo dessa casa. E claro, também
explicaria aqueles CDs todos. Deixo o celular no mesmo lugar em que o
havia pegado, volto a capturar o CD com o nome dela e vou em direção à
televisão. Não sou muito familiarizada com toda essa nova tecnologia, mas
não deve ser muito difícil. Demorou um tempo e, confesso: foi complicado
descobrir que eu tinha que passar o dedo sobre o botão da televisão para
ligá-la. O aparelho abaixo dela foi menos complicado: eu coloquei o CD e
voltei para a cama. Curiosa e ansiosa, esperei o conteúdo carregar.
Eu esperava que começasse a tocar alguma música, mas quando a
tela escureceu e depois a imagem apareceu, fiquei confusa. O que eu estou
fazendo ali?
— Camies?
Olho em volta, assustada, pensando que ela tinha voltado para casa
mais cedo. Levo alguns segundos para me dar conta de que o chamado de
Luna, na verdade, vem do vídeo. Sinto-me mais tranquila, porque ela ainda
não voltou.
— Eu estou aqui.
No vídeo, estou sentada nessa mesma cama, e a única coisa
diferente é a cor da parede atrás de mim. Faço algumas graças, acenando
para a câmera e fazendo caretas.
— O que está fazendo?
Ouço um som de porta abrindo e, em seguida, Luna aparece na tela.
No vídeo, ela está usando um moletom branco enorme, que vai até o meio
de suas coxas, sem nada por baixo, e quando ela se aproxima, noto o
escudo do Real Madrid estampado na peça. Ela sempre foi mesmo fascinada
por esse time, vivia usando os uniformes dele pela escola. Seu rosto está
completamente livre de qualquer maquiagem, e os cabelos, soltos e úmidos.
Os anos parecem mesmo ter feito bem a ela, não posso negar. Luna até que
é bonita.
— Estava testando a câmera, achei que ela tivesse quebrado na
semana passada — respondo, antes de voltar o foco da câmera para mim.
Luna se aproxima, dando uma pequena risada, senta-se ao meu lado
e olha na mesma direção que eu. De repente, a câmera não estava mais
focada em nós duas, e tudo o que podia ser ouvido eram sons de estalos.
Faço uma careta. Estávamos nos beijando? Eca! Ainda bem que isso
não foi filmado.
Poucos segundos depois, a câmera está de volta, com o foco em nós
duas. Meus lábios estão vermelhos, assim como os dela. Dessa vez é ela
quem segura a câmera, enquanto eu estou agarrada em seu pescoço, com a
cabeça sobre seu ombro. É impossível não ver o brilho intenso em meus
olhos, é inegável que realmente pareço feliz. Eu realmente pareço
apaixonada por ela.
— Vamos continuar nos gravando abraçadas ou posso desligá-la? —
ela pergunta aquilo sem me olhar.
Mal posso acreditar quando me vejo abrindo um sorriso bem
malicioso na tela. Estava na cara que eu queria aprontar.
— Hmm... Eu pensei que talvez pudéssemos fazer uma atividade.
O tom sugestivo em minha voz faz meu estômago embrulhar. Não
acredito que eu estava sugerindo que fizéssemos algo inapropriado. Pior, em
frente à maldita câmera. E pior ainda, com Luna Jacobs.
— Qual tipo de atividade você sugere? — sua voz é pura
sensualidade e provocação. Parecia até mesmo que iríamos iniciar algum
tipo de jogo. Um maldito jogo de sedução.
Eu não quero continuar assistindo a isso, me recuso a ver as coisas
impróprias que protagonizei com essa mulher. Fecho os olhos para não ter
que continuar assistindo, chocada demais para me levantar e desligar a
televisão. Então, ouço o som da minha risada e abro meus olhos.
Arrependo-me na hora.
Estou com um enorme sorriso e os lábios encostados nos dela. Luna
se inclina para a frente e tenta me beijar, mas eu me esquivo. Dou outra
gargalhada, voltando a encostar meus lábios nos dela. Parece que eu estava
me divertindo muito com a provocação. Continuo com essa brincadeira
durante um tempo, até me render quando ela faz uma carinha de cachorro
sem dono, implorando com os olhos para ganhar um beijo.
Eca!
— Eu quero que você faça uma coisa — digo ao me levantar da
cama, aproveitando esse movimento para pegar a câmera dela.
Luna continua no mesmo lugar, o foco é ela. Sentada na cama, com
as pernas cruzadas, ela me observa com curiosidade, como se esperasse
pelos meus comandos. Meu olhar, momentaneamente, desce até suas
coxas, e na hora arrependo-me, pois sua calcinha é de renda branca e
aparece visivelmente.
Ela abre um sorriso malicioso antes de falar:
— O que você quer que eu faça?
Ela fez menção de ir em minha direção, mas minha mão aparece na
tela com um sinal de “pare”, e Luna obedece, continuando na mesma
posição.
— Vai fazer qualquer coisa?
— Sempre — ela responde rapidamente, de forma sensual. O brilho
em seus olhos deixa claro que ela está totalmente à minha mercê,
completamente ao meu dispor. Aproximo-me dela com a câmera, ficando
bem perto.
— Masturbe-se para mim. Eu quero ver você gozando e gemendo
meu nome. Depois eu vou te chupar inteira. Cada parte sua.
Meus ouvidos não podem acreditar no que acabei de ouvir. Não sei
dizer se estou mais chocada em saber que ela faria aquilo mesmo ou com a
confirmação de que eu tinha me tornado uma maldita pervertida.
Luna sorri, desdobrando as pernas.
Joguei-me para trás na cama, desconcertada. Não queria mais
assistir àquilo, gostaria de poder apagar de minha memória também. O
vídeo continua rolando, mas não estou prestando atenção.
Quem era essa Camille?
Eu não me reconheço.
Que tipo de pessoa eu me tornei? Falando de maneira chula,
gravando vídeos indecentes. Me casando com Luna Jacobs.
— Você vai me chupar gostoso? E depois eu vou poder retribuir?
Essa fala faz com que eu volte a olhar para a tela.
Luna está deitada na cama, apoiada em seus cotovelos e encarando-
me com luxúria. O detalhe que mais me choca é o fato dela já estar sem o
moletom, com os peitos totalmente expostos.
Não posso deixar de reparar em como seus mamilos são bonitos,
com um tom bem claro de rosa, contrastando perfeitamente com seu tom
de pele.
Estou paralisada.
— Vou chupar bem gostoso e quero que você me chupe da mesma
forma. Sei que você pode. Eu amo as coisas que essa sua língua gostosa faz
comigo.
— Adoro essa sua boca suja...
— Vou te comer todinha com ela.
Estou chocada.
Luna não responde nada, apenas sorri ainda mais e deita-se
totalmente na cama.
Eu pensei que o vídeo acabaria ali, dessa forma, mas não.
Ela leva as mãos até a barra de sua calcinha, erguendo um pouco o
quadril e depois as pernas para retirá-la. Parecia que tudo estava em
câmera lenta, enquanto eu a observava se despir. Quando ela finalmente
está nua, joga a calcinha em minha direção e abaixa as pernas, separando-
as para que eu possa ter uma visão de sua...
— NÃO! EU ME RECUSO!
Estou quase morrendo. Não posso acreditar que estava vendo Luna
completamente nua outra vez, mas dessa vez com mais detalhes e bem
nitidamente. Meu coração está disparado. A imagem dela na tela com as
pernas afastadas e se alisando de forma sensual é... perturbadora.
Completamente perturbadora.
Quando ela enfia o dedo na boca e depois leva em direção ao meio
das suas pernas, finalmente tenho uma reação e desligo a televisão. Esse
tempo todo, o controle estava ao meu lado e eu não tinha forças para pegar
e desligá-la, mas finalmente consegui. Parece que minha mente ia entrar
em pane, não posso acreditar no que vi.
— Camille? — Ouço a voz de Luna e sei que não é por causa do
vídeo dessa vez. Isso me faz arregalar os olhos.
Levanto-me da cama com um salto digno de uma atleta, corro até o
aparelho e, com as mãos trêmulas, tiro o CD lá de dentro, desligando o
aparelho de qualquer forma. Os passos de Luna ecoam pela casa, logo ela
estará aqui, e eu preciso esconder tudo. Volto a pular na cama, para pegar
a capa, e com certa rapidez, consigo guardar o CD, bem a tempo de ela
finalmente chegar ao quarto. Quando ouço a porta abrir, ensaio minha
melhor expressão de tédio. Espero que ela não note nada de estranho.
— Estou aqui...
Meu coração está disparado no peito, e eu prendo a respiração,
porque não quero que ela perceba como estou ofegante. Toda a descarga
de adrenalina que esse momento me causou está me deixando um pouco
desesperada.
Ela me analisa durante alguns segundos, parecendo desconfiada.
— Você está bem? Ainda não tomou seu café? Não conseguiu
encontrar seu celular? Eu o deixei na cabeceira da cama — ela parece
preocupada, porém, ao mesmo tempo, com receio de se aproximar. Isso é
ótimo.
Desvio meu olhar. Não vou conseguir encará-la sem me lembrar de
que estava vendo-a completamente nua, em um momento bem íntimo,
alguns segundos atrás.
— Estou bem, sim, eu só estava... Hm, vou descer para comer —
respondo rapidamente, arrastando-me para fora da cama. Preciso ficar
longe dela, não quero olhá-la e me lembrar de como ela estava naquele
vídeo.
Saio do quarto de cabeça baixa, mas sinto seu olhar sobre mim. Não
a encaro de volta, quero sair dali o mais rápido possível. Preciso manter
distância dessa mulher.
Quando chego à cozinha, sinto-me um pouco mais tranquila e solto o
ar que estava preso em meus pulmões. A mesa está posta, parece ter
bastante coisa e tudo está devidamente coberto. Ela sabe mesmo como
preparar um banquete.
Sei que meu apetite continua o mesmo, pois quando sinto o cheiro
do café ainda fresco, meu estômago parece acordar e reclamar de fome. Eu
preciso mesmo comer, aquele vídeo me deu fome.
Começo a retirar todas as coisas que protegem a comida. Quero
saber, de uma vez, tudo o que tem ali. Meus olhos encontram os waffles
recheados, e dá para ver chocolate escorrer pelas bordas, mesmo que não
estivessem mais tão frescos. Luna parece mesmo me conhecer, posso
confirmar isso apenas olhando tudo o que ela havia preparado.
Estou tão entretida em tomar meu café e me alimentar que nem
sinto a presença de outra pessoa na cozinha. Somente quando a porta da
geladeira é aberta, percebo que não estou mais sozinha. Olho por baixo dos
cílios em direção à Luna e me arrependo na mesma hora.
Ela tinha mesmo que ficar com essa bunda para cima?
Luna está abaixada, pegando alguma coisa na parte debaixo da
geladeira, e sua bunda parece tão redonda e durinha naquela saia social cor
de giz. A roupa está colada em seu corpo, destacando bem suas curvas. E
preciso dizer: que curvas!
Luna parece uma empresária sexy.
Essa bunda...
Distraio-me do café quando imagens daquele vídeo tomam conta da
minha mente, sem ao menos pedir licença. De repente, eu a visualizo nua
na cama outra vez, gemendo meu nome, enquanto eu a incentivava,
empurrando-a para o orgasmo.
Meus pensamentos parecem não ter fim, mas eles têm. Levo um
susto quando algo passa em frente aos meus olhos. É Luna, e ela está de
pé ao meu lado, encarando-me.
— Está tudo bem? Você parecia estar bem longe daqui, e seu rosto
está vermelho — ela parece mesmo preocupada, mas o tom em sua voz é
de diversão.
Eu rapidamente me recomponho. Preciso aprender a me controlar
quando estiver perto dela. Volto a olhar para a comida, porque só assim vou
conseguir me concentrar em outra coisa.
— Estou bem, sim, só me distraí com algumas coisas sem
importância.
— Ah, sim... — Ela se inclina sobre a mesa em busca de algo. É um
morango. Luna o leva até a boca e morde a fruta com vontade, soltando um
longo gemido. Sim, ela fez isso. — Está delicioso. Você deveria prová-los.
Não satisfeita com todo aquele erotismo anterior, ela leva os dedos
até a boca e suga-os, parecendo saboreá-los com vontade, bem ali, na
minha frente, sem qualquer tipo de pudor. Seus olhos verdes me encaram
fixamente, e os lábios cheios chamam minha atenção com aqueles
movimentos. Talvez pudesse ser algo normal, mas no momento eu não
queria ver essas coisas. Será que ela poderia pegar leve?
Sem poder controlar, minha mente é novamente invadida por
imagens. Dessa vez, visualizo Luna sobre um dos balcões da cozinha. Ela
está com as pernas afastadas e um pote de morangos nas mãos. Quando
ela morde um pedaço da fruta e leva o outro até o meio de suas pernas,
sinto vontade apenas de me inclinar e...
— PARA!
Meu grito repentino a assusta. Ela salta e me olha, sem entender
nada.
— Camille, você...
— Eu estou bem, Luna!
Levanto-me da cadeira, arrastando-a para trás com força. Nem olho
para ela, apenas saio da cozinha. Preciso ficar longe dela para restaurar
minha sanidade.
Estou tendo visões eróticas com a psicopata. Era só isso mesmo que
faltava para minha vida ficar melhor.
Obrigada, vida, você me odeia cada vez mais.
O restante da consulta foi bem tranquilo. Para ser sincera, ela me fez
sentir como se eu estivesse tendo uma conversa normal com outra pessoa
qualquer, e não como se fosse uma análise sobre mim. Se as outras vezes
forem assim, não me sentirei estranha na presença da doutora. Inclusive, eu
a adorei. Lembrarei de agradecer à minha mãe pela indicação.
— Como foi a consulta? — Luna questiona assim que entramos em
seu carro.
Coloco meu cinto e me ajeito no confortável banco. Não a olho,
apenas mantenho meus olhos fixos no pátio do estacionamento à nossa
frente. Ela liga o carro, começando a sair dali gradativamente.
— Foi boa. Ela não me pressionou a nada, foi como conversar com
alguém que só gosta de ouvir.
— Então, irá continuar as consultas com ela? — Faço um som de
concordância. — Tudo bem, podemos marcar todas as segundas, então. É
um dos seus dias livres.
— Eu tenho muitos? — estou curiosa para saber mais sobre minha
rotina, e finalmente parece o momento certo de questioná-la sobre algumas
coisas.
— Segunda, quarta e quinta. Isso sem contar o final de semana, é
claro.
— O que costumo fazer nas terças e sextas?
— Você dá aulas.
— Eu sou professora?
— Sim.
— De qual matéria?
Olho para Luna, que está concentrada na rua e não me olha de volta.
Estou animada para conhecer a minha vida e um pouco mais sobre essa
Camille desconhecida. Confesso que minhas ambições eram outras, mas
devo gostar do que faço. Bem, pelo menos eu prefiro acreditar que sim.
— Não é bem uma matéria...
Eu franzo o cenho, confusa e curiosa. O que ela não está me
contando?
— Você sempre foi apaixonada por dança…
— Sou professora de dança?
Ela concorda com a cabeça, e um sorriso surge em meu rosto ao
saber daquilo. Sempre gostei bastante de dançar, e foi uma das minhas
paixões na adolescência. Estou feliz por ter mantido esse amor a ponto de
viver disso.
— Isso é incrível — eu digo.
— Você adora seu estúdio.
Meus olhos quase saltam das órbitas ao ouvir aquilo.
— Eu sou dona de um estúdio?
Luna solta uma gargalhada e concorda. Devo estar parecendo uma
criança em uma manhã de Natal, mas eu não poderia me importar menos.
Estou feliz de verdade. Parece que minha vida atual não é ruim.
— Caralho! Isso é realmente incrível.
— Se eu soubesse que saber sobre o seu estúdio te deixaria feliz
assim, teria contado antes.
Não respondo nada. Nem sei como responder a isso, para ser
sincera. Luna continua com os olhos fixos na estrada, e eu olho para a
frente também. Um silêncio se instala no carro.
— Temos que melhorar nossa comunicação — ela diz.
Solto um pigarro, sentindo-me desconfortável. É impressão minha ou
parece que o mundo está diminuindo?
— Hm, eu acho que sim...
Luna solta um longo suspiro e não diz nada, permanecendo quieta
durante o restante do caminho. Fico pensando em como poderemos fazer
isso funcionar. Eu não tenho intenção de mantê-la em minha vida. Bem,
talvez manter o contato por causa do filho que temos, mas somente isso.
Estou considerando aceitar o conselho de Belinda e me divorciar dela.
Acredito que será o melhor para nós duas.
Ela liga o som, e as músicas que tocam preenchem o silêncio de
antes. Isso me deixa mais tranquila, e posso finalmente relaxar. É estranho
estar perto dela dessa forma, sabendo agora que estamos casadas e temos
um filho. Parece uma piada de mau gosto. Nunca, em toda a minha bendita
vida, eu imaginaria que um dia sentiria algo por Luna Jacobs. Tudo o que
tinha em relação a ela era meu ódio. A vida pode mesmo ser surpreendente,
né?
— Chegamos — ela avisa e me faz despertar de meus pensamentos.
Inclino-me um pouco para a frente e analiso a fachada do meu
estúdio. Falar isso é maravilhoso, parece mesmo um sonho. Não acredito
que sou dona desse lugar. Uma enorme placa destaca as siglas: ECCJ.
— ECCJ?
— Estúdio Camille Cruz-Jacobs.
— Oh...
Eu estaria mentindo se dissesse que estou surpresa. Pelo pouco que
vi sobre essa minha versão desconhecida, eu realmente gosto do meu
sobrenome e de seu complemento. Perdi as contas de quantas coisas em
nossa casa estão com “Cruz-Jacobs” em destaque. Parece até mesmo que
gostávamos de lembrar que éramos casadas.
Será mesmo que nosso casamento era esse conto de fadas que
parece ter sido?
Ao sair do carro, minha primeira impressão, ao olhar aquele lugar, é
de fascínio. É simplesmente melhor do que eu poderia ter imaginado algum
dia. Sempre quis viver da dança, e fico muito feliz em saber que estou
fazendo isso de alguma forma. Pergunto-me se cheguei a participar de algo
importante em teatros. Espero que sim.
— Vamos entrar?
Concordo com a cabeça. Meu coração dispara em meu peito, a
sensação é ótima. Não tenho como descrever quão feliz estou por saber que
esse lugar me pertence. Eu sou a dona de tudo isso. É maravilhoso, não?
— Tome as chaves, acredito que você queira muito reencontrar seu
estúdio.
Ela me estende um molho de chaves em que a letra do meu nome é
o chaveiro, e sorrio para isso, pegando-o de sua mão. Sinto-me nervosa e
ansiosa, pois era um dos meus sonhos quando mais nova. Ser dona de algo
que me fizesse feliz, onde eu trabalharia sorrindo todos os dias. E mesmo
sem me lembrar dos momentos que passei naquele lugar, algo dentro de
mim tem certeza de que sempre fui feliz.
Ao abrir o espaço, fico surpresa com a beleza do ambiente. É possível
enxergar bem ali dentro, graças às enormes janelas presentes no local.
Simplesmente incrível: é essa a minha definição. Percorro os olhos por todos
os lados, não podendo evitar o enorme sorriso. Uma enorme placa com o
nome do estúdio está bem explícita ali mesmo, na entrada, e nem mesmo a
adição do sobrenome de Luna me incomoda. Sinto-me orgulhosa por saber
que tudo ali dentro é meu.
— Parece mentira.
Luna solta uma risadinha e se faz presente ao meu lado.
— Você ficou dessa mesma forma quando viu o estúdio pronto pela
primeira vez, e alguns anos depois, após a reforma, também. Esse é um dos
seus lugares favoritos.
— Era um dos meus grandes sonhos. Ter algo só meu que me fizesse
feliz. — Uma tristeza cresce aos poucos em meu peito, por não me lembrar
das coisas que conquistei nesses dezesseis anos perdidos em algum lugar
da minha memória. Sinto vontade de chorar, mas me seguro. — Queria
lembrar de ter conseguido tudo isso — acabo pensando alto, engolindo
minha saliva.
Luna, ao meu lado, respira fundo e solta uma longa lufada de ar,
parecendo sentir um enorme peso por minhas palavras. Eu realmente
imagino que ela sinta as coisas da mesma forma que eu, pois somente ela
lembra de tudo o que aconteceu. Não sei se é tão horrível quanto é para
mim, mas agora consigo me colocar um pouco mais no lugar dela.
Eu acho que estou começando a ter um pouco de empatia por ela.
— Quer conhecer tudo?
— Sim! — exclamo, animada, e isso a faz rir. Eu acabo rindo também,
afinal estou muito feliz no momento, tudo parece com mais vida.
Ela me guia através do local e conta um pouco de cada coisa, o que
aconteceu e como tudo foi planejado meticulosamente por mim, com a
ajuda dela.
— Pode entrar.
Respondo às leves batidas à porta, termino de colocar minhas botas
e saio do closet. Luna entra em meu quarto. Está agasalhada com um
sobretudo preto e usa uma touca beanie da mesma cor.
— Vamos?
Concordo com a cabeça, vou em sua direção e termino de abotoar
minha jaqueta de cor verde-escura. É bem quente, o dia está frio lá fora.
Passo por Luna, e seu cheiro toma conta das minhas vias nasais. Ela é
sempre tão bem-perfumada, é impossível não notar isso. Minha consulta
com a psicóloga foi adiada para quinta-feira, pois eu tive que ir ao hospital
saber sobre o meu laudo médico na segunda — fatídico dia que me deu a
certeza de que posso nunca me lembrar de nada. Isso ainda me apavora
bastante.
Essa semana foi mais exaustiva do que a última, e tenho muita coisa
para conversar com a doutora Robertson. Preciso conversar com alguém
que vai apenas me ouvir. Às vezes, tudo o que queremos e necessitamos é
falar sem que alguém se sinta na obrigação de responder algo. Nem sempre
um desabafo precisa de resposta. Na maioria das vezes, só precisa ser
ouvido.
— Vanessa comentou algo com você sobre um jantar hoje à noite? —
pergunto a ela. Estamos a caminho do consultório quando me lembro da
mensagem que minha melhor amiga mandou hoje cedo, logo depois do café
da manhã.
— Sim. Ela me mandou uma mensagem. Nós vamos?
— Uh... sim...
Confirmo, mas soa como uma pergunta retórica. Quero dizer, por que
ela me perguntou isso? Não sou eu quem decido as coisas. Ela é uma
pessoa livre, certo? Não tenho o direito de dizer se ela pode ou não ir a
algum lugar. Luna tem algumas atitudes que me confundem muito.
— Tudo bem. Vou chegar um pouco mais tarde hoje. Estou atolada
com algumas coisas no trabalho. Tudo bem se o Noah te buscar?
Fico curiosa para questioná-la sobre algumas coisas. Nós nunca
conversamos sobre o trabalho dela nem faço ideia de como ela se sustenta,
mas me calo e apenas concordo com a cabeça. Sempre há momentos em
que não sei como agir corretamente com a Luna. Tudo ainda é muito
confuso e estranho.
O caminho até o consultório é tranquilo. Apesar dos momentos
constrangedores e esquisitos, não é mais tão ruim ficar sozinha na presença
dela. Estou começando a acreditar que a rotina de convivência realmente
pode mudar minha opinião sobre Luna. Chegamos rápido e, como de
costume, entramos juntas no prédio. Seu olhar esteve sobre mim algumas
vezes, mas eu apenas ignorei. Ela tem uma coisa que prefiro evitar a todo
momento.
— Boa tarde. A doutora Robertson está esperando por você, Camille.
— Boa tarde, Aurora. Muito obrigada. — Sorrio para a simpática
secretária da minha psicóloga e viro-me para Luna, que, sorridente, acena
para Aurora. Ela desvia o olhar para mim, esperando que eu diga algo. —
Até mais tarde.
— Até... Tem dinheiro para o táxi na sua bolsa. Qualquer coisa, é só
me ligar.
— Tudo bem.
— Tchau, Aurora.
— Tchau, senhora Jacobs.
Elas se despedem e Luna vai embora. Suspiro, virando-me em
direção à porta da sala da minha psicóloga, e aceno mais uma vez para
Aurora, antes de bater à porta e ser recebida pela doutora Robertson. Seu
enorme sorriso de sempre está ali, presenteando-me com sua aura boa.
— Camille! Entre, estava esperando você.
— Oi, doutora Robertson... Obrigada.
— Já disse que você pode me chamar de Annie — ela me repreende,
mas seu tom de voz é divertido. — Sente-se. Aceita alguma bebida? Tenho
suco, água, café...
— Não. Estou bem, obrigada.
Sento-me na minha habitual cadeira, em frente a ela.
— E, então... conte-me sobre a sua semana. Como foi a consulta
com o médico?
— Terrível. — Suspiro longamente. O coração aperta todas as vezes
que me lembro da triste notícia. — Ele disse que minhas chances de não me
lembrar de nada são bem altas. Acho que só um milagre pode me ajudar.
— Você não pode perder as esperanças, Camille. Mesmo que suas
chances de sucesso sejam poucas, ainda assim, você pode acreditar e lutar
por isso.
— Eu sei, mas é muito difícil.
— Tenho certeza que sim. Não posso dizer que sei como é, porque eu
não faço ideia de como seja essa situação, mas você precisa sempre focar
no futuro.
— Estou tentando, mesmo. Só que é tão complicado... — Levo
minhas mãos até meus cabelos e enfio os dedos entre os fios, puxando-os
levemente. A pequena fisgada que sinto em meu couro cabeludo não é
nada, se comparada à dor em meu coração. — Como isso foi acontecer
justo comigo?
— Sabe, Camille, tem coisas na vida que acontecem sem um motivo
certo. De vez em quando, algo ruim é o melhor caminho para algo bom.
Precisamos cair, se quisermos aprender a ficar de pé. Erros sempre são
educativos.
Suas palavras me fazem pensar bastante. Tudo o que acontece na
nossa vida pode não parecer que deveria acontecer, mas, no final, tem uma
razão. Pode ser complicado entender as dificuldades, porém, sem elas,
como aprenderíamos a viver?
Ter tudo com facilidade não nos ensina nada, viver em um mar de
rosas é só enganação. A vida vai muito além de só nascer, crescer e morrer.
Passamos por dificuldades e obstáculos. Temos que enfrentar monstros
diariamente, mas isso é necessário para que possamos evoluir como seres
humanos.
Afinal, só se vive uma vez, e ninguém deveria desperdiçar a única
chance.
O caminho de volta para casa foi divertido. Foi uma noite agradável,
e todos estávamos felizes. Se eu olhasse de um ponto de vista diferente,
diria que nós três ainda somos uma família bem unida. Mas, apesar de tudo,
isso não me deixa desconfortável. Parece reconfortante, na realidade. Eu
gosto de estar me dando bem com ela, e conviver com meu filho tem sido
cada vez melhor. Realmente, ser mãe é algo inexplicável, faz um bem
surreal.
— Filho, se for tomar banho, não esqueça de não molhar os cabelos,
está tarde ― Luna diz, assim que entramos em casa. Só agora noto quão
cansada estou.
— Tudo bem, mamãe. Vou subir ― ele avisa e sobe as escadas. Meu
pequeno também parece cansado, pois quase se arrasta pelos degraus.
Abaixo-me para retirar minhas botas. Preciso de alívio imediato. Um
banho relaxante na banheira será uma ótima escolha.
— Você quer tomar seu banho primeiro?
— Pode ir na frente. Vou usar aquela banheira maravilhosa e
provavelmente vou demorar.
Luna solta uma gargalhada, e acabo rindo por consequência. O som
é agradável, e para ser sincera, a presença dela também. Muitas coisas
realmente mudaram, e essa versão madura de Luna Jacobs é
completamente aceitável e fácil de lidar. Acho que realmente podemos ser
amigas agora.
— Tudo bem, vou tomar um banho. Preciso muito.
— Okay.
— Boa noite, Camies. Quando subir, não se esqueça de apagar as
luzes.
— Boa noite, Luna.
Ela pendura sua jaqueta no cabide, perto da porta de entrada, e vai
em direção à escada.
Termino de tirar o excesso de roupas. Dentro de casa, está um clima
aconchegante, e não é mais necessário ficar agasalhada. O dia realmente foi
bom, desde o momento em que acordei até agora. Parece que me adaptar à
nova rotina não é algo tão difícil assim, afinal.
A consulta com a psicóloga foi ótima. Está sendo muito bom poder
falar sobre tudo o que acontece e que me apavora com uma pessoa que
não está diretamente envolvida em tudo isso. Ela é imparcial e sempre me
dá boas formas de pensar e caminhos interessantes a percorrer. Gosto de
conseguir me abrir com ela, principalmente por não ter um peso colocado
em meus ombros todas as vezes que desabafo.
Quando pego o Uber, sei que não quero ir direto para casa. Não tem
ninguém lá a essa hora, e eu não estou com vontade de ficar sozinha nesse
momento. Quero poder me distrair com algo ou alguém. Minhas opções
estão entre conhecer um pouco mais de Jacksonville, ir até minha escola de
dança ou visitar algum conhecido. Eu escolho visitar alguém, então
direciono o motorista até a casa de Vanessa.
— Lil!
Uma animada e receptiva Vanessa, de braços bem abertos, atende-
me assim que toco a campainha de sua casa. Sorrio abertamente, antes de
abraçá-la com força, e fecho os olhos quando o aperto reconfortante me
envolve. Eu sempre gostei de abraçar minha melhor amiga, por toda paz e
segurança que sua presença sempre me traz. Nós duas nos conhecemos
desde muito pequenas, entramos no colégio juntas praticamente e temos
sido carne e unha desde então. Ela sempre esteve comigo nos bons e piores
momentos. É uma das poucas pessoas que me conhece como ninguém
poderia ser capaz.
— Big... eu estava mesmo precisando desse abraço.
— Hm... Conheço esse tom de voz. — Vanessa se afasta um pouco
de mim e, com as mãos em meus ombros, analisa meu rosto
minuciosamente. Não tem como esconder alguma coisa dela, é
praticamente impossível. — Entre, vamos conversar — ela diz e abre espaço
para que eu adentre sua casa.
Estou mais familiarizada com esse lugar, mas ainda me surpreendo
todas as vezes que venho até aqui. É uma casa realmente bonita, com luxo
na medida certa e sem exageros. Uma sofisticação de dar inveja a qualquer
pessoa interessada em decoração de bom gosto. Caminhamos em direção à
sala de estar e nos sentamos no sofá confortável.
— Acabei de sair da consulta com a psicóloga.
— E como tem sido? Aceita alguma coisa?
— Não, obrigada. Só quero conversar mesmo. E tem sido muito legal,
na verdade...
— Tem alguma coisa te incomodando?
— Eu acho difícil dizer algo que não esteja me incomodando nessa
minha rotina. Não me acostumei totalmente. Há dias que acordo e penso
que estou no passado, com a minha vida de adolescente no colegial, com
grandes sonhos e sem muitas responsabilidades.
— Eram bons tempos, né? Apesar de todo o estresse com a escola e
tudo mais.
— Eram ótimos tempos, comparados a esses, na verdade.
Ela ri e eu a acompanho. Realmente preferia conviver outra vez com
o estresse da vida de colegial a enfrentar, às cegas, uma vida adulta em que
sou mãe e esposa, com responsabilidades enormes e preocupações
gigantescas. É muita coisa para acompanhar.
— Não sei se isso é algo legal de ser dito, mas é bom ver essa
Camille comunicativa de volta. Quero dizer... você está diferente, porém não
é algo ruim.
Franzo o cenho, confusa.
— Como assim é bom me ver sendo comunicativa?
— Uh... — Ela ergue as costas, parecendo tensa ao meu lado. —
Digamos que as coisas mudam com o passar do tempo. Quanto mais velhos
ficamos, menos tempo temos para outras coisas. Quando temos uma família
para cuidar e tudo mais, outras partes das nossas vidas acabam sendo
deixadas de lado.
— Você está querendo me dizer que a nossa amizade tinha mudado?
— Bom, sim — responde sem hesitar.
Surpreendo-me com sua revelação. Não fazia ideia de que, algum
dia, minha amizade com ela poderia mudar de alguma forma. Eu não
consigo imaginar um mundo em que nós duas fiquemos afastadas por mais
do que algumas horas.
— Não foi só culpa sua, e não foi só entre nós duas. Acho que, em
algum momento, todo mundo meio que se afastou, entende? Outras coisas
se tornaram prioridades nas nossas vidas — ela esclarece.
— Não consigo imaginar isso. De verdade.
— Eu me lembro de tudo e ainda não acredito. Era como se eu
estivesse vendo tudo se acabar, mas não podia fazer nada. Também foquei
em outras coisas, sabe? Uma casa, um filho pra cuidar, meu trabalho e tudo
mais. Todos ficamos muito ocupados com nossas questões.
— Ser adulto é ruim — eu digo.
Vanessa gargalha.
— Às vezes. Mas tem seu lado bom... Por exemplo, nós temos filhos
lindos que amamos muito.
— Isso é verdade.
— Temos nossa própria casa e... — Um sorriso estranho surge em
seus lábios. — Somos muito bem-casadas.
— Oh, Vanessa! Cale a boca — resmungo e a empurro. Meu rosto
está um pouco quente, tenho certeza de que minhas bochechas estão
vermelhas. Não sinto raiva de seu comentário e da insinuação explícita,
apenas fico sem jeito.
Ela gargalha de minha visível timidez, e isso me irrita.
— Será que temos um avanço aqui?
— Como assim?
— Você não xingou a Luna de idiota. Eu acho que isso é um bom
sinal.
Reviro os olhos.
— Estamos nos bons termos... digamos assim.
— Sério? — Ela parece realmente surpresa.
— Nós meio que entramos em um acordo de recomeço ontem.
Então, sim, é muito sério.
— Recomeço? Meu Deus! Eu não acredito. Luna deve estar radiante.
— Ela parecia mais tranquila.
— Tenho certeza de que sim. Mas, então... vocês jantaram ontem em
comemoração. O pequeno não estava em casa...
— O que...
— Tiraram o atraso?
— Ficou louca?
— Por que o espanto? Vocês ficaram por meses sem sexo. — Meu
rosto parece estar em chamas, de tão quente. — Droga...
— O que foi?
— Por um momento, me esqueci da sua perda de memória. Isso é
muito confuso pra mim.
— Imagina para mim — murmuro. Meu rosto ainda está queimando
de vergonha. Ficamos em silêncio durante alguns segundos. Sua frase ecoa
pela minha mente e, então, uma parte me vem em destaque, despertando
minha curiosidade. — Big?
— Fala.
— Luna e eu ficamos... você sabe... muito tempo...
— Sem sexo? Sim. Em um dos poucos finais de semanas que
passamos todos juntos, em família, ela acabou comentando que não fazia
sexo por um longo período. E olha, pra vocês duas não estarem fazendo
cosplay de coelhos, era notável que algo estava errado.
— Sabe, eu li, em um dos meus diários, algo sobre não estarmos
bem. Você sabe o que estava acontecendo? Era sobre o sexo? Eu não queria
mais?
— Lil, você devia fazer essas perguntas à sua esposa. É algo entre
vocês, e somente ela saberá te responder com precisão. Além do mais, não
devo me meter nessas questões. Vocês precisam conversar.
— Eu sei que sim.
— Não tenha medo de falar com ela. Luna é uma pessoa excelente,
vai responder a todas as suas perguntas.
Aceno com a cabeça, em concordância. Eu sabia que ela responderia
a tudo o que eu perguntasse, mas estou cheia de perguntas na cabeça
agora. O que, de fato, acontecia entre nós duas, nos últimos meses, para
ficarmos estranhas?
— Me responde apenas uma coisa: meu casamento com Luna estava
muito ruim?
Olho diretamente nos olhos de Vanessa. Ela encolhe os ombros e
suspira longamente, parecendo indecisa sobre quais palavras usar. Posso
dizer isso com certeza, conheço-a o suficiente para reconhecer sua
linguagem corporal.
— Sim, estava muito ruim. Com proporções realmente preocupantes.
Passar o dia em família sempre foi algo especial para mim, mas, nos
últimos dias, desde que acordei sem memória, esses momentos têm
ganhado, cada vez mais, um significado maior. Acho que isso é
consequência das descobertas, de ter tido noção de que a antiga Camille
estava se afastando de todos que amo. Me fez ter vontade de recuperar as
relações com todos à minha volta, porque nossa maior riqueza acaba sendo
isso: o amor, as pessoas. Nada pode substituir isso. Estar aqui, com minha
irmã e a família dela, unidos com a minha, vendo nossos filhos se
divertindo, nada, absolutamente nada substitui isso. Quero sempre
momentos assim.
— Que sorriso é esse, tia?
A voz de minha sobrinha me traz de volta à realidade. Por alguns
segundos, eu estive fora de mim mesma, sendo preenchida pela felicidade
em tê-los comigo.
Olho em sua direção e acaricio seu belo rosto. Ela está cada vez mais
bonita e parecida com minha irmã. Rodrigo e Belinda terão trabalho com
essa garota.
— Estou feliz.
— Por causa da tia Luna?
Solto uma risada. Ela gosta muito de ver nós duas juntas.
— Não, sua engraçadinha. — Minha resposta a entristece
momentaneamente, e arrependo-me de ter me expressado mal. — Quero
dizer, ela também tem sua parcela nessa felicidade, mas digo por estarmos
todos juntos hoje, tendo um dia agradável e alegre. Gosto disso.
— É, eu também gosto muito. Fazia tempo que não vínhamos aqui.
— Desculpe-me por isso, eu...
— Está tudo bem, tia. — Serena segura minhas mãos com a sua e
me olha, oferecendo-me um enorme sorriso sincero, que me aquece o
coração. — O que importa é que a senhora está se sentindo melhor e ainda
nos ama.
— É claro que amo. Todos vocês. — Sorrio e puxo-a para um abraço.
— Ama até a tia Luna?
Minha boca se abre, em choque com a sua pergunta, mas antes que
eu possa responder, o som de algo quebrando chama minha atenção.
Rapidamente, solto minha sobrinha e olho em volta da sala, buscando com
o olhar o motivo daquele barulho. Então, quando encontro, uma certa ira se
apossa de mim.
— Luna Jacobs! Eu não acredito que você estava, de novo, brincando
com esse taco de beisebol dentro de casa.
Ela me olha, horrorizada, sabendo quão irritada estou após vê-la com
aquele negócio na mão, enquanto um de nossos jarros está aos pedaços no
chão. Sua pele parece ficar mais pálida do que o normal, e sua boca se abre
seguidas vezes, como se buscasse alguma desculpa.
— Foi bom te conhecer, cunhadinha. — Minha irmã passa perto dela,
rindo da expressão de horror em seu rosto.
Continuo a encará-la, quero mesmo que ela saiba quão brava estou
agora. Eu avisei diversas vezes que esse taco acabaria quebrando algo
dentro de casa, mas aparentemente o aviso entrou por um ouvido e saiu
pelo outro.
— Crianças, vamos lá fora ver a neve caindo? Deixem as duas
conversarem. — Rodrigo se levanta do sofá e, rapidamente, começa a andar
em direção à porta de correr que leva ao nosso quintal.
— Mas não está nevando, papai — um inocente Harry diz, confuso,
enquanto meu cunhado praticamente o arrasta pela manga do casaco.
— Garotinho, fique quieto e saia rápido, se quiser ver a neve de novo
nessa vida.
Em questão de segundos, todos somem dali, deixando nós duas
sozinhas. Luna engole em seco com tanta força, que, mesmo estando à
certa distância dela, posso ouvir o som que faz.
— Vou limpar tudo.
— É bom mesmo.
Cruzo meus braços e caminho em sua direção. Ela dá um passo para
trás e, por reflexo, coloca o taco de beisebol em sua frente. Isso quase me
faz gargalhar. Uma mulher desse tamanho com medo de mim. Fico bem
perto dela e inclino-me para a frente. Nossa pequena diferença de altura me
faz ter que erguer a cabeça para encará-la diretamente nos olhos.
— Se algum desses cacos de vidro machucar alguma das crianças,
você vai se ver comigo.
— Po-pode deixar. Vou limpa-par direito. — E dito isso, ela sai tão
rapidamente da minha frente, que quase escorrega no chão de madeira
recém-polido.
Uma gargalhada sobe lentamente pela minha garganta, até que não
aguento mais e começo a rir. Ter uma esposa idiota pode ser divertido, né?
Vanessa me trouxe para casa logo depois do almoço e não ficou, por
ter recebido uma ligação de Noah. Tinham que resolver algo sobre a
reforma da casa deles.
Quando entro em casa, a primeira coisa que noto é que tudo está
organizado e tem cheiro de limpeza. Não que estivesse bagunçada antes,
mas estava desorganizada, com coisas espalhadas pela sala, assim como
nossos sapatos. Parece que as duas crianças que eu tenho em casa
conseguem se virar bem na minha ausência.
— Você voltou. Como foi o dia? Divertiram-se? — Luna questiona,
enquanto desce as escadas.
Olho sua roupa e fico curiosa. Está usando calça de moletom bem
justa, uma camisa de mangas longas de cor clara e nos pés, seu par de
coturnos pretos. Parece estar prestes a sair.
— Sim, nos divertimos. Ela precisava de distração, e eu queria sair
um pouco. Vai sair?
— O dia está bonito para fazer algumas fotos. Nayara me ligou,
querendo me tornar sua fotógrafa particular.
— Ah, sim...
— Quer ir? Levarei o carinha. Será divertido.
— Hm, eu acho que não. — Finalmente, sento-me no sofá e suspiro
de alegria por poder me deitar em um lugar confortável e esticar minhas
costas. — Vanessa fez com que eu andasse muito.
— Conheço esse tom de voz. Está sendo manhosa por causa da
preguiça.
Prendo a risada e fecho meus olhos quando ela se aproxima. O sofá
se movimenta um pouco, e sei que ela se sentou ao meu lado, mas continuo
da mesma forma. Quando sinto as mãos de Luna em meus tornozelos,
rapidamente abro meus olhos e a encaro.
— Posso?
— O quê?
— Massagear... — Sua voz não passa de um sussurro, olhando
diretamente em meus olhos.
Na verdade, eu não sei se ela realmente sussurrou, minha mente tem
sido meio traiçoeira ultimamente. Mas como poderia ser diferente? Suas
mãos começam a apertar meus tornozelos de forma tão deliciosa, que meus
sentidos ficam nublados. Volto a fechar os olhos, e dessa vez um gemido
prazeroso me escapa. Que habilidosa essa mulher é com as mãos!
— Pode — respondo, mesmo que já tenha lhe dado permissão.
Luna solta uma risadinha, mas continua me massageando com
extrema cautela e precisão. Seus movimentos certeiros me deixam tão fora
de mim que nem me dou conta do momento exato em que simplesmente
adormeci.
— Mommy... — Ouço uma voz me chamar repetidas vezes. Pequenas
mãos me tocam, e beijos são dados em todo o meu rosto. Os meus olhos se
abrem, por instinto, e dou um sorriso ao me deparar com meu pequeno
filho, parado ao meu lado. — Ela acordou, mamãe. — Ele se afasta, quando
nota meus olhos abertos, e dá um passo para trás.
— Vem aqui, garotinho. — Tento pegá-lo, mas meu filho tem um
ótimo reflexo e acaba se esquivando. Meu movimento faz com que eu caia
do sofá, e Louis ri, enquanto sai pela casa.
— Finalmente, bela adormecida. — Olho, por cima do meu ombro,
para trás. Luna está parada de pé, encarando-me, confusa. — Como você
foi parar no chão?
— Estava testando a gravidade, não percebeu?
— Aparentemente ela venceu.
— Idiota — resmungo, mas isso parece diverti-la ainda mais.
Luna continua rindo das minhas falhas tentativas de me soltar do
cobertor grosso que me cobre. Nem sei quando o colocaram sobre mim,
mas sei que, no momento, eu o odeio por não estar me permitindo sair.
Finalmente, minutos depois, a idiota para de rir de mim e vem me ajudar.
— Que mulher brava!
— Sua sorte é que sou contra a violência.
Luna me segura pelas duas mãos e puxa-me para cima, fazendo meu
corpo colidir contra o seu com força. Seguro um gemido surpreso, que me
escaparia, e engulo a saliva.
— Você só é contra a violência em determinados momentos, porque
existem alguns em que a ama.
Minha boca se abre, em choque. A insinuação em sua voz é tão
intensa que me arrepia. Estou prestes a dizer alguma coisa, mas os sons de
passos na escada me fazem soltá-la. Essa mulher é um perigo, e eu preciso
tomar muito cuidado.
— Dia de brincar na neve! — Louis exclama assim que surge na sala,
com as mãos levantadas, saltitando, com um enorme sorriso que me faz
sorrir apenas por vê-lo. Seguro suas mãos e junto-me à sua animação.
— Você vai conosco, certo?
— Por favor, mommy! Por favorzinho!
Divido meu olhar entre eles dois. Não sei dizer qual olhar é mais forte
e chantageador. Tem como resistir? É praticamente impossível.
— Tudo bem, vocês dois estão fazendo um complô contra mim.
Os dois trocam breves olhares e pressionam os lábios. Cerro um
pouco meus olhos.
— Eu sabia!
— Somos inocentes!
— Sim! — Os dois se defendem, mas suas expressões corporais
dizem o contrário.
Não sei lidar com essas duas crianças.
— Eu vou.
Meu filho e Luna comemoram e rapidamente fazem um toque de
mãos.
— E você, Jacobs, agasalhe-se direito, porque está muito frio lá fora
— mando, depois de analisar sua roupa, pois o seu casaco parece não
esquentar muito, e como está nevando, provavelmente deve estar bastante
frio.
— Você quem manda, patroa — ela concorda e bate continência para
mim, virando-se para ir em direção à escada.
Reviro meus olhos e vou para o sofá, fazendo sinal para que Louis
me acompanhe, enquanto esperamos que ela volte. Mesmo que eu
realmente esteja cansada, não será difícil acompanhar a minha família.
Capítulo 16 – Lugar certo
Durante o caminho, observo, empolgada, a animação do meu filho
por estar indo brincar na neve. Não demora muito a chegarmos ao parque.
Louis realmente ama quando está nevando.
Luna parece alegre ao meu lado, e sinto-me feliz por vê-la assim. São
momentos como esse que me fazem ter cada vez mais certeza de que
deixá-la entrar na minha vida, outra vez, é mesmo o certo a ser feito.
Mesmo que nossa história tenha se perdido dentro de mim, em algum lugar,
sinto algo profundo em meu ser, que chama e implora por ela, como uma
força sobrenatural, que mesmo tentando me afastar, puxa-me para perto
outra vez. Não tem como fugir, mas eu nem estou mais fugindo, não é?
— Estaciona o carro, mamãe. Eu quero brincar.
Impossível não sorrir para seu pedido extremamente animado. Louis
está saltitando sobre o banco de trás, olhando ansiosamente através da
janela. Olho para Luna e a vejo sorrindo também, enquanto o encara pelo
espelho. Isso faz com que eu me alegre ainda mais. Finalmente,
encontramos uma vaga para estacionar e libertar meu pequeno filho.
— Não saia correndo, ok? Espere por nós.
Louis concorda, com a cabeça, com o aviso de Luna, e espera,
impaciente, sua mãe sair do carro e abrir o porta-malas para pegar suas
coisas. Quando saio, meu corpo estremece levemente com a brisa gelada
que bate contra mim.
— Vamos fazer anjos na neve, mommy?
— O que você quiser, meu amor. — Bagunço seus cabelos e depois
seguro em seus ombros, mantendo-o perto de mim, enquanto esperamos
por Luna, que não demora muito a surgir com uma maleta.
— Podemos ir, crianças.
— Eu quem deveria dizer isso — rebato sua provocação, e Luna solta
uma risadinha. Caminhamos até o parque, e logo é possível notar diversas
famílias com seus filhos. A vista é realmente linda. Espero que Luna tire
fotos minhas nessa paisagem, as guardarei para sempre.
— Nayara está chegando. Farei algumas fotos dela. Depois podemos
fazer alguma coisa?
— Uma disputa de bolas de neve?
— Por favor, mamães!
Luna e eu nos encaramos. Um sorriso convencido surge em seu
rosto, e eu arqueio uma sobrancelha para ela.
— Eu topo.
— Eu também. Espero que esteja pronta para ser acertada —
provoco, fazendo-a rir e negar com a cabeça. Nosso filho está entre nós
duas, olhando-nos, sem entender direito, mas animado demais para se
importar.
— É o que veremos.
— Essa, sim, é a verdadeira família propaganda da comunidade
lésbica — uma terceira e conhecida voz faz com que Luna e eu olhemos
naquela direção.
Meu queixo quase cai ao ter meus olhos sobre aquela mulher.
Sempre a achei muito bonita quando éramos mais novas, mas ela conseguiu
alcançar um patamar ainda mais alto. Seu jeito confiante enquanto anda e
os cabelos curtos e cacheados deixam-na com um ar de mulher fenomenal,
sem palavras suficientes para descrevê-la.
— Somos a família propaganda perfeita até mesmo para a
comunidade heterossexual — Luna responde a brincadeira antes de abraçá-
la. — Cadê o Keith?
— Foi estacionar o carro. Camille, finalmente revendo você.
— Como você está linda!
Nayara ri de minha fala, e Luna a acompanha. Balanço minha cabeça
e a abraço, inalando o gostoso cheiro de seu perfume.
— É bom rever você também — declaro.
— Você também está linda. Que corpo! — Minhas bochechas ficam
vermelhas, sorrio, sem jeito, e desvio meu olhar. — E você, pequeno? Toca
aqui. — Ela o cumprimenta, e os dois fazem um high five.
— Três mulheres lindas reunidas. O mundo não tem suporte para
tanta beleza assim. — Um homem surge com uma criança no colo. Ele tem
um belo sorriso, e o pequeno em seu colo parece uma cópia fiel sua com
Nayara. Reconheço que é o marido dela, pois Luna tinha me mostrado
algumas fotos. Muito bom o gosto dos dois.
— K!
— Lu! — Os dois se cumprimentam e fazem um toque estranho de
mãos, gargalhando depois, ao trocarem um forte abraço.
— E você, pulguinha? — Luna pega o pequeno no colo, fazendo
cócegas e ganhando uma risada.
Sorrio para a cena. Ela é maravilhosa com crianças.
— Camille, eu sou o Keith, marido da Nayara. — Ele se aproxima e
nos abraçamos. O fato de ele ter se apresentado me faz deduzir que Luna
provavelmente informou aos dois sobre meu atual estado desmemoriado.
— Um prazer reconhecer você — brinco, fazendo-o gargalhar.
Luna se aproxima de mim com o pequeno, que está com o rosto
deitado sobre o ombro dela e com uma das mãos na própria boca.
— Esse é o James. Fala com a titia Camille, pulguinha.
— Xixia... — Ele se afasta de Luna e praticamente se joga em minha
direção. Eu rapidamente o seguro, tendo meu pescoço agarrado pelo
pequeno.
— Ele adora você — Nayara esclarece sua reação ao me ver.
Sorrio e abraço o pequeno, fechando os olhos para apreciar o
contato. Luna e Keith começam uma conversa sobre futebol, enquanto eu
incentivo meu filho a brincar com as outras crianças. Ele não pensa duas
vezes antes de sair correndo. Brinco com o pequeno James e puxo assunto
com Nayara. O dia tem tudo para ser perfeito.
Um sorriso está em meu rosto, enquanto observo uma concentrada
Luna, com uma de suas tantas câmeras fotográficas na mão, tirando
diversas fotos de Nayara. Meu pequeno filho está se divertindo com as
outras crianças no parque, e eu me encontro sentada na neve, com James
em meu colo, entretido em morder a própria mão.
— Que fome é essa, garotinho? — Keith, que tinha saído para fazer
algumas ligações, cuidando dos compromissos da esposa, aproxima-se de
nós outra vez. Luna me contou que Nayara e ele são modelos
internacionais, o que faz total sentido, pela beleza dos dois. Obviamente, os
filhos saíram lindos.
— Ele gosta mesmo de morder a mão. Não é, pequeno?
— São os dentes nascendo. Esqueci de trazer o mordedor dele, por
isso ele substituiu pela mãozinha.
James encara o próprio pai e tira a mão da boca, abrindo um enorme
sorriso, mostrando seus dois únicos dentinhos. Essa imagem me faz sorrir.
Eu acho crianças pequenas extremamente adoráveis.
— Ele é bem esperto, acompanha tudo com os olhos.
— Sim, ele é mesmo. Puxou à mãe. Nessa idade, eu era um pouco
atrasado. E Nayara, bem… ela nasceu no ritmo mais acelerado possível.
— Isso é verdade.
— Luna me contou o que aconteceu. Pensei que coisas assim só
acontecessem em filmes e livros.
— Nem me fale. Foi aterrorizante acordar, um dia, sem me lembrar
de nada.
— Todas as lembranças recentes sumiram? — Concordo com a
cabeça, e Keith faz uma careta, como se sentisse a minha dor. — Nem
consigo me imaginar nessa situação, deve ser horrível.
— É horrível. Parece ter um buraco na minha história. Às vezes,
minhas lembranças entram em conflito. No início, era pior, mas já estou me
acostumando a essa vida.
— Isso é bom… — Ficamos em silêncio durante alguns segundos.
James se inclina em direção ao Keith, e eu o passo para seu colo. — Vocês
duas estão bem?
Instintivamente, olho para Luna, e como se ela soubesse o que eu
faria, olha para mim na mesma hora e sorri. Retribuo o sorriso. Meu rosto
esquenta quando, mesmo de longe, percebo que Nayara implicou com ela e
a fez corar. Keith solta uma risadinha ao meu lado, divertindo-se com a
nossa pequena interação.
— Estamos melhorando.
— Percebi. Parecem duas adolescentes.
— Sinto-me mesmo como uma. Está tudo certo.
— Isso foi tristemente engraçado.
Sorrio para ele, mesmo que por dentro esse tipo de piada
melancólica mexa bastante comigo. O que posso fazer? Tenho que lidar com
a dor que a amnésia causa, vida que segue.
Continuamos conversando, mas sobre outros assuntos, e noto que
ele quer me distrair. Keith é um cara muito simpático, bom marido,
extremamente apaixonado pela esposa e um ótimo pai.
— Pulguinha, ataque de cócegas! — Luna surge do nada e pega o
pequeno James, rodopiando-o no ar, e ambos riem alto. Essa cena enche
meu coração de um sentimento maravilhoso. Mesmo de longe, é possível
ver os olhos dela brilharem olhando para o pequeno. Por alguns segundos,
tenho a sensação de me lembrar do Louis quando pequeno, e ela tinha a
mesma atitude.
— Ela não pode ver uma criança que fica assim, toda boba.
— Verdade — concordo com Nayara, que também chega até nós,
trazendo as coisas de Luna consigo.
Keith dá um beijo em sua esposa, e os dois conversam algo que não
ouço, pois não quero ser intrometida. Foco meu olhar na mulher com quem
me casei há anos e não lembro, mas que, cada vez mais, ganha espaço
dentro do meu coração.
— Vocês deveriam ter mais filhos.
— O quê? — Olho, assustada, para Keith, que está atrás de Nayara,
com os braços em volta dela, e os dois têm o mesmo sorriso no rosto.
Pensando ter ouvido errado, franzo o cenho, curiosa.
— Vocês duas… — ele repete e aponta com a cabeça em direção a
Luna. — Deveriam ter mais filhos.
— Ah… Eu…
— Não coloque tanta pressão, amor — Nayara o repreende, dando
uma leve cotovelada em seu estômago, mantendo o sorriso. — Sabemos
que, no momento, você certamente não pensa nisso, mas olhe sua esposa…
Vocês sempre falaram em ter uma família enorme.
— Eu nem me lembro de ter desejado o Louis. Não tenho como
concordar ou discordar.
— Isso é verdade, mas você acha possível vir a desejar outros filhos?
Não respondo imediatamente à pergunta de Nayara, apenas olho
para Luna e começo a pensar. Sei que, se nós duas conseguirmos ficar bem
em nosso casamento, provavelmente seguiremos a nossa vida, mas não
faço ideia se vamos ter mais filhos — nem sei se ela deseja isso, talvez sim.
E eu? Também não faço ideia se quero ter outros filhos.
— O jeito é esperar, para ver como as coisas serão daqui para a
frente.
— Sobre o que estão falando com a minha esposa? São um perigo
para a sociedade — Luna brinca ao voltar para perto de onde estamos.
James está sobre seus ombros, agarrado à sua touca, e sorrio para a cena.
— Estávamos falando sobre a nossa guerra de neve, da qual você
está fugindo. Ficou frouxa agora, Cruz-Jacobs?
— Oh, você não disse isso, Keith Hamilton. Segure o pulguinha,
Nayara. Acabarei com esse homem que você chama de marido.
Ela entrega o pequeno a Nayara, e os dois rapidamente se afastam,
enquanto brincam de empurrar um ao outro.
— Eles sempre agem como adolescentes?
— Sempre. Isso não é nada perto do que esses dois já fizeram. Luna
e Keith se gostaram desde o momento em que os apresentei. São oito anos
de amizade entre os dois, que só se fortalece, mesmo com o nosso trabalho
atrapalhando o convívio.
Fico feliz de saber que Luna tem pessoas que a amam e cuidam
muito bem dela. Vendo os dois interagindo, é perceptível que são amigos
genuínos, e isso aquece meu coração. Gosto de vê-la feliz.
Imagino que coisas assim devam ser normais e não fico tão
assustada quanto no início de tudo, mas, ainda assim, é impossível não
sentir vergonha. Luna parece despertar o meu lado mais safado, e isso, de
certa forma, mexe com minha autoestima. Pelas respostas dela, parece que
sempre me colocava para cima, mesmo que com pouco.
— Mãe! Não!
Gritos e gargalhadas me despertam na manhã. Solto um resmungo,
piscando algumas vezes, para focalizar minha visão. Com grunhidos e mais
resmungos, levanto-me da cama para descobrir o motivo dessa zona, e logo
tenho minha resposta, ao entrar no quarto do meu filho e ver a seguinte
cena: Luna de pé, com ele preso entre suas pernas.
— O que vocês estão fazendo?
Recosto-me no batente da porta, bocejando brevemente, antes de
focar minha atenção nas duas crianças que moram comigo. Eles
rapidamente viram em minha direção ao ouvirem minha voz, e quase solto
uma gargalhada ao ver Louis com os cabelos totalmente bagunçados e com
o rosto vermelho.
— Mommy, me salva!
— Ela não vai te salvar, carinha.
Ele me olha com o olhar suplicante, e Luna bagunça ainda mais seus
cabelos e se abaixa, enchendo-o de cócegas. Louis se debate inutilmente,
tentando se soltar do aperto da mãe.
— Por favor, mommy, me salva!
Aproximo-me dos dois, rindo dos pedidos de socorro de Louis, e
Luna, não o perdoando, continua com cócegas.
— Chega, Lu, deixa ele.
Coloco minhas mãos na sua cintura e dou um leve aperto, fazendo-a
instantaneamente soltar o pequeno. Louis cai para a frente, no chão, e rola
para longe dela. Eu rio dele quando se ergue, pois seus cabelos estão como
um ninho de pássaros.
— Sorte sua que ela te salvou.
— Pare de implicar com ele.
As minhas mãos ainda estão na sua cintura de Luna, que se vira para
mim e sorri, erguendo as suas, em forma de rendição.
— Eu já arrumei as nossas malas. Olhe para ver se quer levar algo
diferente. O carinha também arrumou as coisas dele. Tomamos café e
saímos logo em seguida, ok?
— Tudo bem. Cariño, voy a darme una ducha.
— Sí, señora, mommy. — Seu espanhol carregado de sotaque me faz
rir, mas tem evoluído bastante com minha ajuda. Eu sugeri a Luna que o
colocássemos em um curso, mas ela disse que seria bom que aprendesse
comigo, pois aumentaria nossa ligação. Estou gostando muito de dividir isso
com meu filho. Desde pequena, meus pais nunca deixaram minhas irmãs e
eu nos esquecermos de nossas raízes. Mesmo que tenhamos crescido longe
de nosso país, sempre seremos mexicanas e temos orgulho disso. Nada
apaga nossa história.
Terminamos de arrumar tudo e descemos para tomar café. Aproveito
para avisar a Belinda que estou prestes a sair. Ela parece animada com essa
viagem, e não faço ideia do motivo, ou talvez faça. Minha irmã gêmea
certamente é uma das que mais apoia Luna e eu, e parece genuinamente
feliz ao nos ver cada vez mais juntas.
Enfim, saímos de casa, rumo ao aeroporto, depois de Luna
pedir um carro pelo aplicativo, pois não viajaríamos em um dos nossos, por
motivos óbvios.
Louis é o mais animado entre nós, parece realmente amar os Jacobs.
— Carinha, se lembrou de trazer seu switch?
— Sim, mamãe, eu nunca esqueço.
Não faço ideia do que estão conversando, mas nem presto muita
atenção, porque agora estamos dentro do avião, e eu sempre tive pavor de
voar. Louis está sentado na última poltrona, Luna, ao seu lado, e eu, na
poltrona do corredor. Minhas mãos estão suando, só quero conseguir dormir
e acordar quando estivermos em Miami.
— Quer tomar um remédio pra dormir? — Luna me questiona,
parecendo ler meus pensamentos. É claro que ela sabe do meu pavor de
aviões, conhece-me de forma absurda.
— Eu aceito, nunca fui fã de aviões.
— Eu sei. Louis também tem medo, mas o videogame portátil o
distrai sempre. — Ela aponta com a cabeça para o lado, enquanto busca o
remédio para mim dentro de sua bagagem de mão. Inclino-me para a frente
e vejo o pequeno com headphones, vidrado na tela de um aparelho
eletrônico. — Por um segundo, pensei ter esquecido, mas aqui está. Ele te
faz dormir rápido.
— Não vai se importar se eu dormir e te deixar sozinha?
— Sempre que viajamos de avião é assim, estou acostumada.
Inclusive, sinto-me melhor se você dormir, porque assim sei que estará
bem. — Ela faz sinal para uma aeromoça e pede um copo de água. — Além
do mais, tenho algumas coisas do trabalho para resolver.
— Tem certeza?
— Aqui está a água, senhora.
— Obrigada — agradeço, pego o copo e tomo o comprimido, antes
de virar todo o líquido em minha boca. Satisfeita, entrego o copo vazio à
moça e encosto em minha poltrona.
— Absoluta, pode dormir tranquila. Logo, estaremos em Miami.
Luna sorri para mim, e eu concordo com a cabeça, fechando os meus
olhos para esperar o sono vir. Não sei em quanto tempo exatamente eu
adormeci, mas tenho certeza de que não demorou muito. Quando torno a
abrir os olhos, acabamos de pousar.
— Parece que eu acabei de dormir — murmuro, sentindo-me
sonolenta ao me levantar da poltrona. Luna acorda Louis que, em algum
momento, dormiu sobre o colo dela. Nós três terminamos de arrumar tudo,
antes de desembarcarmos para buscar nossa bagagem. Levamos pouca
coisa, porque será apenas um final de semana. Só espero que seja um final
de semana tranquilo.
— A previsão garantiu um tempo firme, mas você conhece bem
Miami, sabe como é.
— O tempo é louco aqui... e abafado.
— Quer me dar o casaco?
— Eu o levo, obrigada. — Retiro a peça quente e o seguro em meu
braço. Louis vai à frente, agitado demais para andar ao nosso lado. — Seus
pais sabem sobre a minha amnésia?
— Sim. Justamente por isso, pediram que eu a trouxesse aqui. Era
para termos vindo antes, mas é difícil conseguir um espaço na agenda dos
dois.
— Ainda trabalham?
— Os Jacobs nunca descansam. Isso fica para depois da morte.
— Vovô!
O grito de Louis chama a minha atenção, e não demoro a encontrar o
motivo de sua animação. Mark Jacobs está vestido informalmente, com uma
bermuda de tecido fino na cor azul e uma camisa de botões branca.
Simples, mas, como sempre, elegante. Lembro-me de tê-lo visto poucas
vezes. Usava ternos de grife, e seus cabelos, antes escuros, estão grisalhos
hoje. Luna se parece muito com ele, sempre achei os dois semelhantes.
— Meu garotinho, que saudade!
Ele se agacha no chão, sem se importar com nada além de poder
abraçar o neto. É perceptível que eles se adoram, e isso me agrada. Mark
conversa brevemente com o pequeno e logo se levanta, para nos dar as
boas-vindas.
— Olá, papai, a sua benção — Luna diz de maneira formal, mas com
todo o afeto que eu sei que tem. Mark sorri e a puxa para um forte abraço.
— Deus te abençoe, filha. Senti sua falta. — Os dois se afastam, e
então, a atenção dele é para mim. Sorrio, meio sem jeito, estendendo
minha mão para cumprimentá-lo. — Camille Jacobs, é um prazer rever você.
O nome me causa uma estranheza momentânea, mas continuo com
meu pequeno sorriso. Ele nos ajuda a carregar as nossas coisas, e seguimos
em direção à luxuosa SUV prata dele. Louis está radiante e monopoliza toda
a atenção do avô, enquanto Luna e eu ficamos lado a lado. Sinto-me melhor
assim, com a presença dela.
— Você está bem? — questiono à Luna quando já estamos dentro do
carro, indo em direção à casa dos Jacobs. Louis está na frente com o avô, e
não param de falar nem um segundo sequer. Isso me dá a chance de
conversar com Luna em particular.
— Sim, sim. Você está?
— Um pouco nervosa, confesso.
Ela sorri de lado e segura minha mão, puxando-a para seu colo, o
que me faz me sentir melhor.
— Fique tranquila, meus pais adoram você. Falo sinceramente.
Quando, enfim, chegamos à casa dos Jacobs, minha primeira
impressão é de choque, e a segunda é de curiosidade. Como conseguem
viver, apenas os dois, em uma casa tão grande?
Descemos do carro, e logo um rapaz alto e loiro se aproxima para
nos cumprimentar e pegar nossas coisas. Luna se coloca ao meu lado, e
juntas caminhamos em direção à porta, que logo é aberta, e por ela, a
elegante e radiante Ana Jacobs aparece. Diferente de Mark, eu vi a senhora
Jacobs muito mais vezes em minha antiga escola, pois ela costumava ser
mais presente.
— Meu amor!
— Vovó!
Louis corre em direção à avó, que se abaixa para abraçá-lo com
força. Esse carinho dos pais de Luna com meu filho me deixa muito feliz. Eu
o amo tanto, que vê-lo receber carinho de pessoas que também o amam
me aquece o coração.
— Benção, mãe.
— Deus te abençoe, minha filha. — Ana sorri largamente para Luna e
abre os braços, recebendo-a em um aconchegante abraço. Quando se
afastam, a matriarca Jacobs olha em minha direção, abrindo o mesmo
sorriso fraternal. — Camille Jacobs, que prazer revê-la!
Aparentemente, o meu sobrenome adicional realmente é muito bom
de ser pronunciado. Mas conhecendo um pouco mais sobre os pais de Luna,
sei bem que o Jacobs é motivo de muito orgulho entre todos. E a julgar pela
quantidade de coisas minhas que levam esse nome, acredito que eu
também tenha sido envolvida por esse sentimento com o passar dos anos.
— Mommy, vamos ver o Duke, vamos! — Louis pede
desesperadamente, logo que adentramos a casa.
Mal tenho tempo de olhar em volta, porque meu filho sai me
puxando para longe de todos. Ouço Luna pedir a ele que tome cuidado,
enquanto o acompanho, sem saber quem exatamente é esse Duke. Por fim,
descubro que Duke é um enorme e brincalhão cachorro peludo. Louis gosta
muito do animal, pois corre pelo gramado com um enorme sorriso, sendo
seguido pelo carinhoso cão. Eu observo a cena, extremamente encantada
com o meu pequeno.
— Ele é apaixonado por bichos. — Mark surge, de repente, ao meu
lado, trazendo consigo um copo que deve ser de uísque, enquanto olha,
visivelmente apaixonado, para seu neto. Ele realmente ama o carinha.
— Estou vendo que sim. Filho, cuidado para não se machucar.
— Eles sempre brincam assim, fique tranquila. Duke é muito dócil e
ama o rapazinho ali — Mark me tranquiliza ao perceber minha preocupação,
e sinto-me aliviada, pois não quero que meu filho acabe se machucando. —
Como estão as coisas entre vocês?
— Quem?
— Minha filha e você. A Luna me contou o que aconteceu. Eu
lamento estarmos tão longe e não termos feito uma visita antes. Os dias
estão muito corridos.
— Sem problemas, senhor...
— Você é da família, Camille. Não precisa dessa formalidade, sempre
nos tratamos informalmente. Pode me chamar de Mark, à vontade.
— Desculpe, Mark. É muito estranho tudo isso, estou me adaptando
aos poucos. A Luna e eu estamos nos dando bem, para ser sincera. No
início, foi complicado, mas agora acredito que estamos no caminho certo.
— Isso é ótimo. Minha filha te ama muito, sabe disso?
— Sei...
Meu estômago embrulha levemente, e não sei dizer se é nervosismo,
por causa do olhar dele sobre mim, ou por ter noção do amor que Luna
sente por mim. É confuso, na verdade, são tantas coisas acontecendo ao
mesmo tempo. Por vezes, sinto como se estivesse familiarizada com a
minha rotina, e então, do nada, tudo fica estranho outra vez.
— Luna pediu que eu não a pressionasse, e espero não estar fazendo
isso. Eu me preocupo com ela, sabe? Minha filha acha que o fato de ser
ocupado, desde sempre, influenciou o meu sentimento por ela, mas a amo
muito, assim como amo o Noah. Meus filhos são tudo para mim, não
suportaria vê-los sofrer.
— Eu jamais faria a Luna sofrer. Gosto dela cada vez mais.
Mark sorri, terminando de beber o uísque logo em seguida. Ele olha
para Louis, outra vez, e fica em silêncio durantes alguns segundos, antes de
voltar a falar:
— Vejo, em seu olhar, o sentimento que tem por ela. Não tente
reprimi-lo, porque as coisas vão se acertar.
— Camies, quer tomar um banho e descansar? — Luna surge de
repente, como um anjo enviado para me salvar daquela conversa
desconcertante. Ela ainda está usando as mesmas roupas, apenas tirou a
camisa de mangas longas e ficou com uma de mangas curtas.
— Sim, isso seria ótimo. Com licença, Mark.
— Fique à vontade, Camille. Você está em casa.
Somente aceno com a cabeça, acompanhando Luna até dentro de
casa outra vez. Finalmente, tenho a oportunidade de olhar em volta e
analisar o ambiente, extremamente elegante e luxuoso. Parecem adorar
coisas caras, de boa qualidade, e não parecem ter medo de gastar.
— Meu pai ficou enchendo você de perguntas?
— Um pouco, mas não foi nada demais.
— Tem certeza? — Ela parece preocupada, e isso me faz sorrir,
porque gosto desse jeito protetor dela.
— Sim.
— Ótimo! Eu conversei com os dois para que não a sobrecarreguem.
Esse é o seu quarto, coloquei suas coisas aqui.
— Como assim o meu quarto? Não vamos ficar juntas?
— Ah... eu pensei que, sei lá, você queria ficar sozinha.
— Luna, estamos dividindo a mesma cama todos os dias, quando
estamos em casa. Por que eu faria isso aqui? Existe alguma regra na casa
dos seus pais? — Reviro os olhos e solto uma risadinha, empurrando-a pelos
ombros. Luna também ri, divertindo-se com meu comentário. Vou até a
minha mala para pegar uma trouxa de roupas, pois preciso urgentemente
de um banho e me deitar.
— Você quer que eu traga minhas coisas para cá?
— Pensei que tivesse deixado isso claro. — Sorrio e pisco para ela,
antes de fechar a porta do banheiro. Recosto-me nela e suspiro, lembrando-
me dos acontecimentos desta manhã e do quão familiar é conviver com
Luna. Chega a ser engraçado ter essa noção, pois nunca imaginei que
poderíamos ficar assim, mas eu gosto da sensação.
Não demora muito a chegar uma resposta que, na verdade, não era
dela, mas, sim, um áudio do meu cunhado Rodrigo:
— Está tudo bem, o garotinho está se divertindo muito. Deixe de ser
mãe coruja. Aproveitem a tarde de vocês, porque estamos aproveitando a
nossa.
Eu rio do áudio e respondo que está tudo bem, para eles
aproveitarem bastante e tomarem cuidado. Resolvo largar o celular sobre o
sofá e ir atrás da minha irmã. Logo a encontro na cozinha, curvada na
geladeira, em busca de coisas para comermos. Previsível demais.
— Será que a Luna não acha estranho estarmos juntas aqui, e ela
com eles, como se fosse o meu “marido”? — questiono, preocupada, ao me
sentar em um dos bancos da ilha no centro da cozinha. Belinda se ergue e
me olha, como se eu fosse louca.
— Por que ela se sentiria assim? Ela adora fazer esses programas
com eles e as crianças. Você sabe que eles sempre foram muito unidos.
Além do mais, às vezes, ela também participa de momentos nossos.
— Não quero que ela se sinta estranha ou colocada de escanteio.
Belinda solta uma risadinha.
— É engraçado… você perdeu a memória, mas parece a mesma
Camille de sempre. Extremamente preocupada em deixar a Luna confortável
em relação ao relacionamento de vocês. Fique tranquila, nada entre vocês
duas é estereotipado.
— Fico mais tranquila, então.
— Deve ficar mesmo. Vocês são mulheres incríveis juntas e não
precisam de representação masculina de forma alguma no relacionamento.
Relaxe! Somente eu tive a má sorte de gostar de homens.
— Isso é verdade! Esse desgosto só você e Sofia deram aos nossos
pais.
A minha irmã e eu acabamos rindo.
— Por falar nela, conversamos ontem. Ela me garantiu que vem para
as festas de fim de ano.
— Nossa, nem consigo imaginar vê-la adulta. Só me lembro daquele
pedaço de gente, cheia de atitude quando mais nova.
— Pois se prepare, porque esse jeito se multiplicou, e ela está
terrível.
Concordo, apoiando meus cotovelos sobre a mesa e levando as mãos
até a minha cabeça, sabendo que provavelmente morrerei de ciúme, caso
ela conte o que está fazendo na faculdade. É difícil me acostumar
totalmente a uma vida de que não me lembro da metade, mas sei que sou
capaz de me encontrar de novo, e tudo se acertará.
Eu confio em dias melhores.
Capítulo 23 – Tudo acontece por um motivo
Eu não sei explicar o motivo, mas o meu incômodo, depois de ter
beijado Jennifer na frente de todo mundo, me fez sentir tão mal que não
aguentei continuar ali. Deveria ser diferente, não deveria? Eu tinha que
estar feliz, foi o meu primeiro beijo, com a garota que tenho desejado há
muito tempo. Mas por que parece que foi tão errado?
— Será que eu posso saber o motivo de você ter saído daquela
forma?
Como sempre, Belinda surge do nada, entrando no meu quarto, sem
ser convidada. Reviro os meus olhos e me mantenho jogada na cama,
olhando o teto e refletindo sobre o que aconteceu na festa e no que está
acontecendo dentro da minha cabeça neste momento.
— Não estava me sentindo bem.
— Esse mal-estar tem nome, e você sabe disso. — Os meus olhos se
fixam na minha irmã, que agora está sentada ao meu lado, com os braços
cruzados e encarando-me com sua famosa expressão de deboche. Porém,
tem algo a mais, ela parece irritada com alguma coisa. — E nem pense em
dizer que estou ficando maluca ou algo assim. Você pode enganar o quanto
quiser a si mesma, mas não tem como enganar a mim.
— Do que está falando?
— Luna. — Solto uma bufada e me sento na cama, preparada para
me levantar e sair do quarto, se for preciso. Tudo que menos quero, no
momento, é falar sobre aquela garota idiota. — Nem pense em sair daqui,
estou falando sério.
— Belinda, por favor, eu estou cansada, quero tomar um banho e
dormir.
— Pare de dar desculpas, seja a mulher que nossa mãe criou você
para ser e converse comigo. — Respiro fundo e abaixo a cabeça,
permanecendo ali, ao lado dela. A Belinda sabe em que ponto atingir para
me convencer de algo. — Por que a Luna te incomoda tanto? Nem é mais
sobre as coisas que ela fazia com você, porque eu vejo como ela tem te
tratado bem desde que começou a cuidar do nosso jardim.
— Eu não gosto dela.
— Não gosta ou tem medo de estar gostando? Por que age dessa
forma tão idiota, se fica assim, se sentindo culpada, depois?
— Não me sinto culpada. — Reviro os olhos e cruzo os braços.
Belinda solta uma lufada de ar e se aproxima de mim, segurando em
meu queixo para que eu a encare.
— Quer mentir logo para mim, Camille? Poupe-me.
— O que você quer de mim? Quer que eu fale que finalmente beijei a
garota dos meus sonhos e me dei conta de que não foi nada do que pensei?
Que ver a Jacobs sair, sem nem dizer nada, está me deixando maluca? É
isso que você quer ouvir?
Ao contrário do que eu pensei que faria, Belinda abre um sorriso de
lado e acaricia o meu rosto.
— Você realmente não consegue enxergar as coisas, né? Felizmente,
a esperteza ficou toda comigo.
— Do que está falando?
Belinda se levanta da cama e se encaminha para fora do quarto,
enquanto prende os seus longos cabelos. Vira-se uma última vez, antes de
sair, apenas para dizer:
— Você descobrirá dentro de alguns dias — é tudo o que ela diz e,
em seguida, sai, deixando-me mais confusa do que tudo.
Mal sabia eu que, dias depois, realmente descobriria o que era: Luna
Jacobs chegaria se declarando para mim, pegando-me totalmente
desprevenida. No dia que a chamei para conversar e tentar me acertar com
ela, jamais imaginaria que as coisas acabariam com Luna dizendo que
estava apaixonada por mim.
— Eu queria me desculpar por aquele dia. Fui totalmente infantil e
sem noção.
Luna me fita, confusa, parando de regar as plantas para me olhar.
— Do que está falando?
Engulo a saliva em minha boca e olho de relance para a minha casa,
apenas para me certificar de que Belinda não está nos vigiando. Mas tenho
certeza de que ela está, sim.
Aproximo-me mais da Jacobs para conversarmos melhor. Falávamos
sobre flores, e eu encontrei o momento perfeito para acertar tudo entre nós
duas. Porque, sim, ainda estou incomodada com o dia da festa e como ela
saiu.
— Sobre a festa, o beijo na Jennifer... foi idiotice.
— Ah, isso... — Ela desvia o olhar do meu e olha para baixo. O meu
coração está apertado, porque quando a Belinda disse que a Luna poderia
ter ficado magoada, eu não acreditei, mas agora vejo que era verdade. —
Está tudo bem. Você nem deve se desculpar, é dela que você gosta, e eu sei
disso. Além do mais, você é solteira, totalmente livre para fazer o que bem
entender.
— Eu não...
— Camies, não precisa se explicar, é sério. Já passou.
— Eu não queria te magoar. Se fiz, de alguma forma, me perdoe. Não
estou aguentando esse sentimento ruim dentro de mim, e não me pergunte
o motivo, porque não sei explicar.
— Você...
— Só quero que saiba que eu não a beijaria daquela forma se
soubesse que magoaria você. Nunca fui esse tipo de pessoa e sempre
abominei gente assim. Não sei por que eu...
— Eu sempre fui apaixonada por você, Camille, desde a primeira vez
que nos esbarramos no corredor da escola.
Os meus olhos quase saltaram das órbitas ao ouvir isso. Quando
Vanessa jogou piadinhas sobre os sentimentos da Jacobs por mim, eu não
levei a sério, mas aqui está ela, a própria, declarando-se para mim.
— Lembro-me de que não conseguia parar de pensar em como o seu
rosto era bonito, e a sua voz, mesmo irritada, era adorável. Eu
simplesmente...
Um enorme sorriso surge em seus lábios. Estou horrorizada, olhando-
a com os meus olhos tão arregalados, que quase saltam de minhas órbitas.
O último mês foi muito confuso e cheio de reviravoltas, mas nunca imaginei
algo desse tipo. Nem em outra vida. Primeiro, eu me culpo por beijar outra
pessoa na frente dela, e agora isso?
— Não. Você não...
— Sim. — Luna abre outro pequeno sorriso. O ambiente está
esquentando não de uma forma sexual, mas sufocante. O meu coração
parece uma metralhadora, de tão rápido que bate. — Você é a minha garota
dos sonhos. Nunca tive a chance de me aproximar do jeito certo. Peço
perdão por tudo, todos esses anos.
— Meu Deus...
— Se eu pudesse voltar no tempo, nunca seria tão babaca com você.
Irritaria você algumas vezes, confesso, mas apenas porque fica linda até
mesmo com raiva. Eu…
Cubro a sua boca, antes que ela continue se declarando. Estamos
muito próximas, e isso me deixa nervosa. Os olhos verdes dela estão fixos
em meu rosto, intensos como uma mata fechada. Engulo saliva e,
hesitando, dou um passo para trás, tirando as mãos do rosto dela. Ela não
desvia o olhar, esperando outra reação minha. Porém, como a boa covarde e
confusa que sou, não respondo e apenas me viro para sair daquela estufa,
deixando-a sozinha. O mundo está se fechando ao meu redor, nada parece
no mesmo lugar.
O que acabou de acontecer?
Vazia e quebrada.
Essas duas são as definições perfeitas para definir como os meus dias
têm sido. Para ser sincera, eu nem sei se comecei a me sentir assim agora
ou há mais tempo. Tudo começou a se perder em algum momento que não
faço ideia de quando foi.
Eu estava perdendo-a. Tínhamos tantos problemas acumulados, não
sabia como poderia salvar o nosso casamento. Tentei de todas as formas
que pude, mas Camille se fechava e ficava na defensiva sempre que eu
parecia chegar perto do centro do problema. Desejei tantas noites que tudo
pudesse voltar ao normal, só não imaginava que ela acabaria perdendo a
memória.
Por que isso aconteceu justo agora? Não que eu esteja reclamando,
pois estamos conseguindo reconstruir algo que tínhamos perdido. Mas
acontece que eu me lembro de tudo o que aconteceu. Ela pode ter
esquecido dentro dela, em algum lugar, mas aqui, na minha mente, tudo
continua vivo e dói. Dói como o inferno, porque sei que a perderia se não
tivesse acontecido o que aconteceu. Dói, porque sei que talvez nunca possa
alegrá-la da mesma forma que ela me alegrou quando gerou o nosso filho.
Não consigo dar um filho à minha esposa, o que faz eu me sentir
uma merda de mulher. É o meu sonho, sempre foi, e mesmo que no
passado coisas tenham me feito duvidar disso, eu ainda mantenho o desejo
de ser mãe dentro de mim. Era o sonho dela me ver grávida também,
sempre foi.
Sinto uma vontade absurda ao me lembrar da primeira vez que
tentamos ter um filho. Camille parecia tão animada e ansiosa no início, mas
com o tempo, as coisas começaram a ficar estranhas. Não parecia mais uma
vontade, e sim uma obrigação. Fui perdendo, aos poucos, a vontade de
gerar aquela criança, e quando a inseminação deu errada, eu fiquei, de
certa forma, aliviada. Mas então, meses depois, resolvemos tentar de novo.
Deu certo, até certo ponto. Eu desejei tantas vezes que desse errado, para
que ela pudesse parar de me cobrar como estava cobrando. Eu o perdi
antes de completar um mês, foi um aborto espontâneo, da mesma forma
que os dois seguintes também foram, contando com esse último.
Penso que estou sendo castigada por ter desejado tanto que o
primeiro não viesse. Estou apavorada agora, não sei se tenho forças para
tentar novamente. Nem sei se sou capaz de conseguir gerar uma criança, e
não faço ideia de como as coisas com a Camille vão ser, porque tudo está
bem agora, mas, de repente, algo pode mudar e nós voltarmos ao início de
tudo.
— Podemos conversar?
Eu volto a minha atenção para ela, que está entrando no quarto,
depois de tomar o seu banho. O cheiro dela toma conta do ambiente e me
conforta. Tudo nela sempre me acalmou com facilidade.
— O que quer conversar?
— Quero saber como está se sentindo. De verdade. — Ela sobe na
cama, aproximando-se de mim. Camille pega uma de minhas mãos que
estava sobre o meu colo, segurando-a com as dela. — Estou respeitando o
seu espaço, mas não aguento ver você sofrendo em silêncio. Compartilhe
comigo.
Eu encaro o seu rosto e vejo o brilho de afeto refletido nele. O
mesmo brilho que ela sempre carregou ao olhar para mim. Sei que a sua
mente ainda se lembra de mim, mesmo que esteja no subconsciente,
escondido.
— A cada dia, me sinto um pouco melhor, mas ainda estou quebrada.
Queria tanto que tivesse dado certo dessa vez.
— Eu sabia da sua gravidez? Digo, antes de tudo que aconteceu
comigo.
Respiro fundo antes de responder. Eu tinha tomado a decisão sozinha
quando pensei que as coisas poderiam se acertar, mas não fazia ideia de
tudo que ainda aconteceria.
— Não. Eu tomei essa atitude sozinha, era para ser uma surpresa.
— Por quê? Hm, olhe, não me leve a mal, mas preciso entender. Sei
que não estávamos bem.
— Sim, não estávamos, mas tudo parecia, aos poucos, voltar ao
normal. Sei que tomei uma atitude precipitada, tenho total consciência disso
agora. Somos casadas, ter um filho requer muita responsabilidade, e
principalmente por sermos um casal de mulheres. Podemos tomar todas as
prevenções e decidirmos o momento certo de ter mais uma criança.
— Isso é verdade.
— Mas queria tanto te provar e provar para mim mesma que eu
podia, sabe? Os primeiros testes, feitos há dois meses, deram errado. Já
tinha desistido quando comecei a sentir enjoos no final do mês passado.
Resolvi fazer um teste de sangue para ter certeza, e então, veio o resultado:
positivo. — Pauso quando lembranças antigas me invadem. Lembro-me do
primeiro aborto, quando Camille chorou tanto a ponto de perder o fôlego.
Ela me viu quebrada e mudou aos poucos suas atitudes. Eu a vi sofrer
comigo, entendendo, da melhor forma, que ela sentia a minha dor. Então,
ela decidiu que teríamos uma família, mesmo que para isso fosse preciso
mudar os seus planos. — Tudo deu errado outra vez por minha culpa. Eu
devo ter algum problema.
— Luna, pare com isso. Estou implorando, pare de se culpar. Às
vezes, coisas acontecem e deixam de acontecer. Assim é a vida. — Ela
segura o meu rosto com as mãos, fazendo-me encará-la. Uma lágrima
escorre, e o seu dedo polegar rapidamente a seca. — Talvez não fosse o
melhor momento para termos outro filho. Olhe tudo o que aconteceu.
Consegue imaginar como seria, para mim, ter mais essa responsabilidade,
sem nem ter consciência sobre?
Suas palavras me fazem refletir muito sobre a atitude que tomei.
Realmente, eu não pensei direito nas consequências, principalmente com
toda essa confusão da amnésia. Eu deveria ter esperado e conversado com
ela. E se tivéssemos nos separado? Como seria para outra criança entender
o que estava acontecendo?
— Eu fui muito irresponsável ao tomar essa atitude.
— Um pouco, mas porque tomou essa decisão sozinha, sem me
deixar ciente. Não faço ideia de como funciona um casamento, estou
aprendendo algo novo todos os dias, mas acredito que tudo deva ser
compartilhado, principalmente algo tão importante.
É incrivelmente assustador como essa mulher é sensata e inteligente.
A forma que ela consegue me fazer enxergar as coisas sempre me deixa
fascinada. Eu tive uma atitude irresponsável, porque a amo muito, tanto que
sou incapaz de medir o quanto.
Como posso explicar o que Camille significa para mim? Eu sempre a
amei, e depois que ela me deu o nosso filho, passei a amá-la ainda mais. O
que sinto pode ser considerado, por alguns, uma dependência, talvez uma
obsessão, e para outros, uma doença que precisa ser curada. Como explicar
um sentimento tão gigantesco em palavras, que nem sentindo sou capaz de
entender? Eu arranco o meu coração do peito por ela, se for preciso.
Todas as vezes que pensei em desistir dela, algo maior me mantinha,
porque eu sabia, sempre soube que estaríamos juntas no final. Imaginar
uma vida sem ela me quebra por dentro.
Eu nunca quis ser a esposa idiota dela, então, por mais que me
doesse, eu desistiria dela. Se para ser feliz ela precisasse estar longe de
mim, eu a deixaria livre. Sempre prezei o seu bem e sempre hei de prezar.
Camille é um dos meus maiores bens. Tudo o que conquistamos juntas não
seria nada se eu a perdesse. O nosso filho e ela são o meu lar, sempre vou
desejar estar com eles, não importa onde, e vou querer o que for melhor
para os dois.
— Eu deveria ter considerado todo o nosso cenário antes de tomar
aquela decisão. Mas queria tanto, quero tanto. Quero dizer, não sei mais. —
Ela suspira e acaricia o meu rosto, abrindo um sorriso tão bonito que acabo
retribuindo. É incrível a capacidade que essa mulher tem de acalmar o meu
coração.
— Não pense no futuro, vamos viver o presente e deixar as coisas
acontecerem. Eu prometi que não vou sair do seu lado, apenas peço que
não me afaste. Mesmo que as coisas fiquem ruins, quero estar com você,
como sempre esteve comigo. Não faço isso como tentativa de pagar tudo o
que já fez por mim, mas como a sua esposa, que deve agir como tal.
— Na alegria e na tristeza — sussurro, abaixando a cabeça, e ela se
inclina e beija a minha testa. Fecho os olhos para apreciar o contato. Beijos
na testa devem ser considerados os mais puros, a maior demonstração de
respeito e cuidado que existe nesse mundo. Amo beijos na testa.
— Eu estou com você e permanecerei aqui.
Sei que, independentemente de qualquer coisa, Camille e eu sempre
estaremos juntas na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, até que a
morte nos separe.
Capítulo 26 – Feliz Natal
O dia amanheceu bonito, mas não pelo tempo em si: está nevando
um pouco e bastante frio. Existem outros motivos para ele ter nascido
assim. Todos parecem animados, fizeram um grupo no aplicativo de
mensagens e estão, desde cedo, combinando como será a nossa ceia.
Estarão presentes literalmente todos, até mesmo os meus pais e os de Luna
virão. Natal sempre é momento de passar com a família, não importa se são
seus parentes ou amigos que te acolhem.
— Meu bem, conseguiu encontrar o resto dos enfeites? — Luna entra
em nosso quarto de repente. Continuo olhando através da janela e apenas a
olho por cima do meu ombro. Sorrio em sua direção, chamando-a com as
mãos. — O que está fazendo? Pensei que quisesse terminar de arrumar
tudo logo. — Ela brinca e solta uma gargalhada; eu fecho os olhos para
apreciar o som.
Está sendo maravilhoso vê-la cada vez melhor. Temos conversado
todos os dias, o que está ajudando bastante na recuperação. Luna
confidenciou que sentia muita falta de dialogar comigo. Estou me
esforçando para deixá-la o mais confortável possível, e tem funcionado. O
brilho no olhar dela confirma isso.
— Seus olhos estão lindos esta manhã — comento, encantada. O
habitual verde deu lugar a um azul bem claro e cristalino.
Luna franze o cenho, fazendo suas bochechas ficarem ainda mais
evidentes.
— Eu pensei que eles fossem lindos todos os dias.
— São, idiota arrogante. — Reviro os olhos e tento me afastar, mas
Luna me impede, segurando em minha cintura com força. Ela me olha, e eu
sei que vai me beijar, mas não faço nada para impedi-la. — Continua sendo
idiota.
— Vou precisar te dar mais beijos, então — ela murmura, antes de
voltar a grudar as nossas bocas, e eu suspiro, derretendo-me em seus
braços.
Luna afunda os dedos em minha lombar ao sugar a minha língua
para dentro de sua boca, e eu movimento os meus lábios lentamente. Sou
viciada nesses beijos lentos e intensos, parece que sinto tudo o que ela
sente.
— Pode dar quantos beijos quiser — murmuro, perdida e totalmente
rendida em seus braços. Ela sorri e volta a me beijar na mesma intensidade,
só que menos lentamente.
— Parece que o nosso casal favorito resolveu aproveitar a véspera de
Natal de uma forma profana.
— Será que podemos gravar e colocar em algum site de beijos
pornográficos?
— Eu acho que deveríamos criar um exclusivo para elas.
— Concordo totalmente.
Quatro vozes diferentes são ouvidas de repente. Minha primeira
reação é afundar o rosto no pescoço de Luna, que rapidamente me envolve
em um abraço protetor, mesmo que esteja rindo. Eu me afasto ao ouvir as
risadas, e estou prestes a soltar algum xingamento, mas o meu queixo
quase despenca ao ver não apenas Vanessa, Nayara e Belinda, mas a minha
irmã mais nova também.
— Sofia! — exclamo rapidamente, afastando-me de Luna para chegar
a ela. Minha irmã, de quem eu ainda mantinha uma imagem pequena e
infantil, abre um enorme sorriso para me receber em um abraço. Nossos
corpos se colidem, e eu fecho os olhos, apreciando o carinho e o calor que o
seu abraço tem. — Meu Deus, como você está grande!
— Grande, linda e muito gostosa — ela se gaba e balança os seus
longos cabelos, que são tão compridos que batem na cintura.
Sem a largar, eu a analiso o máximo que posso. Sofia ficou bem mais
alta que Belinda e eu, herdou a altura do nosso pai, e os seus traços são
mais fortes que os nossos também.
— Senti sua falta — ela diz.
— Eu... Nossa, estou sem palavras. Você se tornou um verdadeiro
mulherão.
Finalmente nos afastamos, e eu posso, enfim, terminar de analisá-la.
Realmente, o sangue mexicano é milagroso. O corpo dela está
simplesmente impecável, sem falar de sua beleza completa, um verdadeiro
mulherão. Não sei se consigo me acostumar a vê-la assim, ao invés do
habitual, quando era apenas uma garotinha inocente.
— Você sempre reage dessa forma quando a encontra depois de
muito tempo — Belinda se intromete e sai levando Sofia em direção à porta.
Faço um bico, desolada, mas nenhuma das duas se importa. Duas
ingratas.
— Vamos, Vanessa, deixe as duas aproveitarem um pouco mais —
Nayara diz, levando consigo a minha melhor amiga, mas, antes de sair,
Vanessa para na porta e faz um sinal obsceno com os dedos e a língua. Eu
abro a boca, espantada, porém nem deveria estar surpresa.
— Ficou chocada com o tamanho da sua caçula?
— Demais. Acho que a bunda dela é maior do que a minha. — Olho
para a minha esposa, mas a pervertida não me olha de volta, o seu olhar
está de encontro à minha parte traseira. — Luna!
— O quê?
— Você é sonsa.
— Só você pode encarar a minha bunda agora?
Os meus olhos quase saltam das órbitas, e rapidamente eu abaixo a
cabeça, sem graça e com o rosto corado. Ela nunca perde a oportunidade
de citar as vezes que eu seco o seu corpo.
— Já disse que é tudo seu, sinta-se à vontade — adiciona.
— Muito sonsa! — devolvo.
Ela sorri e cola o seu corpo ao meu, segurando em minha cintura
primeiramente, mas logo as suas mãos deslizam para trás.
— Luna...
— Eu gosto quando você fala o meu nome assim. — Ela sorri de
forma cafajeste e se inclina, levando a boca até o meu ouvido. — Adoro
mulher brava. — O sussurro gostoso, ao pé do meu ouvido, me causa
arrepios, e eu fecho os olhos por reflexo. É incrível como ela consegue
mexer comigo de maneira tão fácil. Demoro alguns minutos a reagir, mas
finalmente tomo uma atitude ao me afastar. Preciso raciocinar, fica difícil
com ela tão próxima a mim.
— Vamos descer e terminar de arrumar tudo, as pessoas já estão
chegando.
— Você quem manda, patroa. — Ela bate continência para mim, e eu
reviro os olhos, antes de me virar para sair do quarto. Mantenho um sorriso
no rosto, porque as idiotices dela me deixam assim.
O que posso fazer se tenho uma esposa idiotamente adorável?
O meu plano inicial era arrumar tudo, antes que todo mundo
chegasse, para ter um momento divertido com a minha família, mas foi
muito bem-vinda a ajuda das meninas. Afinal, continuou sendo um
momento familiar, mas com mais pessoas que o comum. Elas são família de
qualquer forma.
— Vamos subir para tomar banho?
Estou analisando a árvore de Natal quando a Luna chega à sala,
abraçando-me por trás e colocando seu queixo sobre o meu ombro. Sorrio,
colocando as minhas mãos por cima das dela, em minha barriga, e inclino a
cabeça um pouco para trás.
— Vamos. Elas foram se arrumar?
— Sim. Precisamos ir logo, porque até o carinha perdeu o próprio
banheiro.
— Mas ele tomou banho? Podemos colocá-lo em nosso quarto.
— É uma boa ideia. Vá na frente que vou buscá-lo, antes que as suas
irmãs mudem a roupa dele.
Subimos as escadas, rindo, e cada uma vai para um lado.
Rapidamente, eu tomo o meu banho. O meu vestido está separado no
closet, com os acessórios e as sandálias. Luna fez questão de deixar tudo
nosso arrumado, para que apenas precisássemos tomar banho e nos vestir.
Ela realmente pensa em tudo. Depois do meu banho, Louis toma o dele e se
arruma no banheiro mesmo.
— Você acha que eu fico bem com essa cor? — questiono Luna, que
está pegando roupas íntimas para tomar banho, depois que Louis terminar o
dele. Ela para, por um segundo, e me olha de cima a baixo. Seu olhar
queima a minha pele.
— A minha garota favorita na minha cor favorita.
— Sua cor favorita não é a preta? — Ergo uma sobrancelha,
encarando-a, sem entender. Luna sempre foi a maior fã da cor preta que
existe neste mundo. Lembro-me de que ela parecia viver em um eterno luto
quando estudávamos na mesma escola.
— Vermelha é a minha nova cor favorita, mas somente se você
estiver usando.
O meu rosto esquenta um pouco, e desvio o meu olhar, ouvindo a
sua risada divertida. Ela simplesmente adora me deixar sem jeito, seja com
elogios ou com flertes repentinos.
— Você não perde a oportunidade, não é?
— Com você? Nunca. — Ela para atrás de mim e apoia uma das mãos
em minha cintura, inclinando-se para deixar um beijo na minha bochecha.
— Vou tomar meu banho e conferir se elas não se mataram.
Concordo com a cabeça e a observo sair do closet. Depois que ela
sai, eu termino de me arrumar. Estou terminando a minha maquiagem
quando o reflexo da aliança em meu dedo chama a minha atenção.
Geralmente eu não a reparo, estou tão acostumada com esse acessório que
até me esqueço. É uma aliança fina, com uma listra repleta de diamantes,
muito bonita por sinal, e deve ter sido cara.
Não me dou conta de que estou sorrindo, até ouvir outras vozes me
provocando:
— Você não foi capaz de evitar, mesmo depois de se esquecer dela.
— Como ela poderia? A Luna é a mulher dos sonhos de qualquer um.
Viro-me para Belinda e Sofia, e as duas me encaram, com sorrisos
em seus rostos. Mesmo que sejam provocações, sei que elas estão felizes
por mim, pois conheço esses olhares. Eu as olho de cima a baixo, admirada
com a beleza das mulheres que tanto amo.
Eu ainda estou chocada com o tamanho da minha irmã mais nova.
— Estou bonita?
— Essa é uma resposta óbvia — Sofia responde de imediato e revira
os olhos. O meu queixo quase cai com o seu jeito atrevido, lembrando
bastante a minha melhor amiga. O que Vanessa fez com a minha pequena
irmã?
— Eu disse que você iria se surpreender com essa cobrinha —
Belinda diz e solta uma gargalhada, divertindo-se com a minha expressão
de espanto. — Mas, sim, você está linda. Tenho certeza de que, nesta noite,
a Luna não escapa.
— Belinda...
— Vocês ainda... — Sofia começa a falar, mas se cala e olha para o
lado de fora, voltando a olhar para mim e fechando a porta do closet atrás
de si. — Vocês duas ainda não foderam?
— Sofia?! Que tipo de linguajar é esse?
Minha irmã mais nova revira os olhos outra vez, cruzando os braços
ao recostar-se nas prateleiras da esquerda.
— Desculpe, eu deveria dizer fazer amor? Ou fizeram sexo
gostosinho, ou...
— Chega! Chega! — peço desesperadamente, colocando as mãos
sobre os meus ouvidos. — Quando foi que você se tornou isso?
— Me tornei o quê? Uma adulta que faz sexo?
— Pra mim, chega. Isso é demais! — Ergo as minhas mãos e
rapidamente saio do closet, ouvindo as risadas das minhas irmãs atrás de
mim. Não sei quanto tempo levarei para me acostumar com a caçula sendo
tão... desse jeito. Meu Deus! Ela disse que faz sexo. Eu não acredito que
alguma pessoa safada tenha tirado a pureza da minha pequena.
— Por que você está com essa expressão? — Luna sai do banho com
seu roupão branco, enquanto desembaraça os cabelos com a escova. Eu a
olho, apavorada, e caminho em sua direção para esconder o rosto em seu
pescoço.
— Minha irmã faz sexo.
Luna solta uma risadinha, alisando as minhas costas com uma das
mãos.
— Bom, ela é casada e tem filhos. Você acha que eles foram feitos
como?
Afasto-me de Luna e a fuzilo com o olhar.
— Não estou falando da Belinda.
Ela olha para trás e depois para mim, finalmente entendendo o
motivo de todo o meu pavor. A sua expressão se retorce, e sei que está
prestes a rir, mas se contém.
— Bom, ela é uma mulher adulta agora, amor. É comum.
— Obrigada, cunhada. Eu acho que a minha amada irmã precisa de
um choque de realidade. Sexo é maravilhoso.
— Pare de falar isso, pelo amor de Deus! — exclamo, sem nem a
encarar. Todas estão rindo, divertindo-se com o meu pequeno surto, mas
não consigo achar graça nenhuma. Eu dormi com a imagem pura da minha
pequena e acordei com essa versão adulta, sem escrúpulos. O mundo não é
mais o mesmo.
Elas finalmente me dão trégua quando Luna diz que terminará de se
arrumar. Ouvimos a campainha tocar e saímos, as três, do quarto para
receber os convidados.
De pouco a pouco, todos vão chegando.
Ver os meus pais fez eu me sentir ainda mais feliz. Sinto saudade de
conviver com eles, mas estou entendendo que a vida adulta é assim
mesmo. Os pais de Luna chegaram animados. Noah os trouxe, pois ficarão
hospedados na casa dele. Ficariam aqui, mas o quarto de hóspedes será
dos meus pais. Eu prefiro assim, odiaria que a Ana e a Luna acabassem se
desentendendo.
E por falar na minha sogra.
— Camille.
— Ana — eu a cumprimento com um aceno de cabeça. Estou com
uma taça de vinho na mão, enquanto observo todos andando pela sala,
divertindo-se e contando histórias engraçadas. O Natal sempre foi uma das
minhas festas favoritas de fim de ano, e agora não está sendo diferente.
— Será que podemos conversar um pouco, longe de todo esse
barulho?
Penso em arrumar uma desculpa para escapar dessa conversa, mas
algo me diz para acompanhá-la. Concordo com a cabeça e indico a escada,
para irmos até o meu quarto.
— Eu acredito que ninguém vai nos atrapalhar aqui. — Fecho a porta
atrás de nós e caminho até a cama, sentando-me na beirada. — Sente-se
comigo.
Ana sorri e senta-se de frente para mim.
— Como ela está? — Franzo o cenho, e Ana suspira, nervosa,
passando as mãos pelos cabelos perfeitamente arrumados. — Luna.
Conversamos esses dias, mas ela não está se abrindo totalmente para mim.
Eu acompanhei os abortos anteriores e sei quão abalada a minha filha ficou.
Quero saber a verdade: você acha que ela está melhor?
— Sim. A cada dia, mais ela volta ao normal. — Respiro fundo e abro
um pequeno sorriso. Ana não parece muito confiante, eu conheço a aflição
no olhar de uma mãe preocupada. Sei que mesmo com seu jeito difícil, ela
ama muito a filha que tem. — Estamos tentando continuar a nossa vida.
Tivemos diversas conversas, e eu sugeri que ela buscasse uma ajuda
profissional, para ter um acompanhamento melhor.
— De verdade? Nossa, isso é ótimo! O Mark tentou convencê-la
algumas vezes a buscar ajuda de um profissional, mas a Luna sempre foi
muito teimosa e tem essa coisa de querer segurar o mundo todo com as
mãos.
— É realmente teimosa, mas sabe ouvir quando eu converso com ela.
Tenho um jeito especial de fazê-la entender as coisas.
— Você sempre soube lidar melhor com ela do que eu, que sou a
mãe dela. — Ana desvia o olhar, encarando um ponto fixo qualquer, perdida
em pensamentos. Eu a deixo pensar um pouco, pois sinto que ela quer
contar alguma coisa ou desabafar. — Sempre tentei ser uma boa mãe para
os meus dois filhos, dando de tudo do bom e do melhor, trabalhando dia e
noite, quase sem parar, para que nada faltasse em casa.
— Você é uma ótima mãe, Ana.
Ela solta um riso sem qualquer resquício de humor, negando com a
cabeça. Quando volta a me olhar, os seus olhos refletem uma dor profunda.
— Tenho sido uma boa mãe para o Noah, porque ele nunca me
contrariou. Sempre foi um bom menino, obedecendo, sem questionar,
seguindo todos os passos que desejei. Mas Luna nunca abaixou a cabeça,
nem para mim nem para o pai dela, sempre impondo as próprias opiniões.
— Ela tem gênio forte.
— Muito. Esse sempre foi um dos impasses que tivemos durante o
crescimento dela. Nunca consegui entender como pôde largar um bom
futuro para seguir um devaneio. Um hobby.
— Desculpe-me, Ana, mas estou convivendo com a sua filha todos os
dias, eu vejo como ela é feliz fazendo o que gosta. Não é um hobby, é o
trabalho dela, é a vida dela. A Luna está seguindo um sonho de infância.
Pensei que estava exagerando, interrompendo-a, mas ao vê-la sorrir,
fico um pouco confusa. Ela está feliz ou vai me bater?
— Gosto de saber que você a defende. Sempre me perguntei se
minha filha conseguiria encontrar uma boa pessoa. Confesso que tive
muitos preconceitos quando ela nos contou que gostava de mulheres.
Tivemos uma briga horrível, foi a primeira vez que a vi chorar tanto. Luna
sempre guardou tudo para si, e vê-la tão quebrada mexeu comigo, mas eu
não fiz nada. Estava com tanta raiva, pensando no que tinha feito de errado
na criação dela, cega por pensamentos arcaicos e atitudes que herdei do
meu pai...
Ana pausa durante alguns segundos, com os olhos fechados,
aparentemente com uma luta interna.
— Comecei a aceitá-la depois que ela nos apresentou a você. Um dos
meus maiores medos sempre foi que alguém a machucasse por gostar de
mulheres. Eu me preocupava, imaginando se ela encontraria uma pessoa
boa, com visão de futuro e capaz de aguentar tudo o que a sociedade joga
em cima de pessoas homossexuais.
— Confesso ter pensado que você não gostava de mim. Digo, agora,
quando encontrei vocês em Miami.
Ana nega com a cabeça e sorri.
— Tivemos muitas conversas, Camille. Você me encontrou uma vez
chorando, por causa dela, e iniciamos ali um tipo de amizade à parte, além
de você ser a minha nora. Comecei a enxergar o relacionamento de vocês
como um relacionamento qualquer, sem diferenças. Eu sentia que você
cuidava bem da minha filha.
— Eu nunca seria capaz de destruir a felicidade dela.
— Sabe de uma coisa engraçada? Você sempre dizia algo parecido
com isso todas as vezes que eu falava sobre. Mas o intuito dessa conversa é
que sinto que estou me afastando demais da minha filha, preciso recuperar
a nossa relação.
— Você quer ajuda para entendê-la?
— Muita. — Respiro fundo, inclino-me para deixar a taça vazia no
chão, volto a ficar sentada e me aproximo para segurar as suas mãos.
— Depois que tudo isso se normalizar, converse com ela, mas esteja
disposta a ouvi-la. Você, melhor do que ninguém, sabe que a Luna precisa
se expressar. Eu acredito que essa conversa fará muito bem a vocês duas.
Ana concorda com a cabeça, puxando-me para um forte abraço
repentino. Tenho certeza de que essa conversa entre as duas resolverá
muitas questões que não estão ao meu alcance. Espero mesmo que elas
possam resolver as diferenças de uma vez por todas.
— Luna aprontava demais quando era mais nova. Lembro-me de uma
vez que cheguei em nossa casa e a encontrei enrolada com ataduras.
— Como assim? Por quê?
Ana começa a me contar coisas do passado de Luna, muitas histórias
divertidas. É perceptível que, apesar dos problemas, ela ama muito a filha
que tem. E mesmo que não diga em voz alta, tem orgulho da mulher que
ela se tornou.
— Disse que queria se tornar uma múmia, que estava cansada dos
seres humanos e não queria mais ser um deles.
Eu gargalho, imaginando a cena da Luna pequena, com cara de
brava, toda enrolada em ataduras, dizendo isso. Não é muito difícil criar
essa imagem.
— Oi? Está tudo bem por aqui?
E por falar nela, olhamos para trás, apenas para ver a curiosa Luna
entrar lentamente no quarto, sem entender o que está acontecendo. Ana
rapidamente se levanta da cama, indo em direção à filha. Um sorriso nasce
em meu rosto com a cena.
— Eu amo você, minha filha. Lembre-se sempre disso. — Ana segura
o rosto de Luna e beija a sua testa. A minha esposa tem uma expressão
confusa e me olha como se perguntasse o que está acontecendo. Eu apenas
faço um sinal com as mãos.
— Eu também amo a senhora, mãe — ela diz, ainda meio confusa,
mas o brilho no olhar é intenso, mesmo de longe, o que me deixa muito
feliz.
— Vou deixá-las sozinhas e ir atrás do meu marido, antes que ele
acabe com todo o vinho. — Ela se afasta de Luna e olha para mim. —
Obrigada.
— Disponha.
Ana acena mais uma vez para nós, antes de finalmente se retirar do
quarto. Eu sorrio e me ponho de pé, indo até a Luna, que está mais confusa
do que tudo. Coloco os meus braços em volta de seu pescoço, chegando
perto o suficiente de sua boca para beijá-la.
— O que eu perdi?
— Segredos entre sogra e nora. — Ela faz um bico tão adorável, com
o cenho franzido, que não resisto e a encho de beijos. Luna não me rejeita,
mas ainda está confusa e curiosa. — Deixe de ser fofoqueira. Logo você
saberá do que se trata.
— Por que não posso saber agora?
Encosto os meus lábios nos dela para sussurrar, com os meus olhos
abertos, encarando os dela:
— Porque eu não quero. — Balanço as minhas sobrancelhas várias
vezes ao me afastar. Luna revira os olhos e solta uma lufada de ar,
demonstrando toda a sua derrota. — Vamos voltar lá pra baixo, nossa
família deve estar procurando por nós.
Entrelaço os nossos dedos e a levo para fora do quarto. Estamos
quase na chegada quando ela para de repente. Viro-me, curiosa, para
questioná-la, mas antes que possa, tudo que sinto é o meu corpo sendo
empurrado contra uma das paredes e as suas mãos em meu rosto, e logo
em seguida, a sua boca toma a minha. Fecho os olhos, apreciando o toque
macio de sua boca na minha. Os seus lábios acariciam os meus devagar,
enquanto ela usa a língua, para entrelaçar a minha, e as mãos para acariciar
o meu rosto. Estou entregue, totalmente nas mãos dela, como tenho estado
desde que voltamos aos bons termos.
— Você continua sendo a minha sorte.
O meu sorriso é tão largo, ao ouvir isso, que minhas bochechas
doem. Ela sorri da mesma forma, e o meu coração está acelerado. Ouço as
vozes das pessoas no andar de baixo, mas nada poderia atrair tanto a
minha atenção quanto a mulher que está na minha frente. Como posso
explicar todas as sensações que ela me causa?
Retiro as mãos dela do meu rosto, para que eu possa segurar o dela.
Luna fecha as pálpebras para apreciar o carinho que faço com os meus
polegares, então fico nas pontas dos pés para beijar-lhe a testa.
— Eu estou cada vez mais apaixonada por você — confesso.
Luna paralisa durante alguns segundos, mas a sua reação seguinte
me faz gargalhar, quando ela me abraça com tanta força que chega a me
erguer um pouco do chão. Evito que ela me pegue no colo, porque não
pode pegar peso ainda, mas ela não se importa. Se não sou eu para tomar
conta dessa mulher, nem sei.
Poderíamos ter ficado horas e horas ali, nesse momento só nosso.
Não foi a primeira vez que eu disse estar apaixonada por ela, mas todas
parecem a primeira. Gosto de poder aproveitar os carinhos que trocamos,
mas infelizmente temos muitas visitas, e elas estão nos chamando, ou
melhor, gritando os nossos nomes, para descermos. Com sorrisos nos rostos
e as mãos juntas, voltamos para o andar de baixo, voltando a fazer
companhia à nossa família.
O resto da noite e a ceia foram perfeitos. Por mim, eles ficariam
conosco a noite toda, mas, aos poucos, cada um foi sentindo sono e se
despedindo, com a promessa de que voltariam, no dia seguinte, para
trocarmos os presentes.
Os meus pais subiram. Eu imaginei que Sofia fosse dormir aqui, mas
ela preferiu ir com a nossa irmã. Tenho uma leve impressão de que ela está
fugindo de mim, mas não sei o motivo. Será que sou tão superprotetora e
chata?
— Deita um pouco aqui comigo, mamá? — Louis pede, assim que se
deita na cama, erguendo o cobertor e me dando um espaço em sua cama,
para que eu possa me deitar ao seu lado. Luna foi tomar banho e verificar
se os meus pais estão confortáveis, e eu fiquei encarregada de botar o
nosso filho para dormir.
— Gostou de hoje?
— Muito! Foi incrível todo mundo junto. Eu amo quando os meus
primos vêm brincar comigo.
Eu sorrio para meu pequeno, beijando os seus cabelos, ao
aconchegá-lo em meus braços. Ele deita a cabeça em meu peito e suspira.
— E amanhã tem muito mais. Se quiser, podemos chamar o Toni e o
Harry para passarem a semana aqui, que tal?
— Sim! Sim! Sim! — Ele se agita e balança a cabeça freneticamente,
e eu acabo rindo de sua animação. Louis realmente gosta dos primos.
— Tudo bem, mas agora você precisa dormir, para ter energia
amanhã.
Ele concorda, com um som nasal, e volta a se aconchegar em mim.
Alguns minutos se passam, eu espero ter certeza de que ele dormiu, e
quando penso que sim, o movimento de sua cabeça chama a minha
atenção. Louis se afasta e olha para mim.
— Mommy? Um dia, eu vou ganhar um irmãozinho? Todo mundo
tem, até o Toni vai ganhar um irmão novo.
A sua pergunta quase me faz perder o ar, e paro durante alguns
segundos. Luna e eu ainda não conversamos com ele sobre quais serão os
nossos passos, mas contamos que ela acabou perdendo um bebê. Louis é
uma criança sentimental, é notável que ele deseje ter um irmão, e eu
entendo isso.
— Filho, as coisas são complicadas. Ter uma nova criança traz muita
responsabilidade, e a sua mãe e eu estamos reconstruindo o que temos.
Você sabe, não é?
— Sim, mommy. Mas...
— Eu entendo o seu desejo, sei que um irmão faz falta para você,
mas promete que não falará isso na frente da sua mãe?
— Não vou falar isso na frente da mamãe, mas vocês podem pensar
com carinho? Eu prometo que serei o melhor irmãozinho do mundo. — Louis
junta as mãos e me encara com os olhos de pidão. O meu coração se
aperta, e o puxo para mim, envolvendo-o em meus braços.
— Vai dar tudo certo, carinha. Eu sei que vai ser um ótimo irmão,
porque você é um bom garoto. Boa noite, meu amor.
— Boa noite, mommy.
O assunto se encerra, e em alguns minutos, ele acaba realmente
pegando no sono. Levanto-me com cuidado, para não o acordar, e apago as
luzes antes de sair de seu quarto. O silêncio em casa me dá a garantia de
que todos foram se deitar, inclusive a Luna. Preciso de um banho urgente.
Entro no quarto com cautela e a vejo deitada na cama, de costas
para a porta. Não sei se está dormindo, mas parece que sim. Tomo todo o
cuidado para entrar no closet e pegar um pijama, para vestir depois do
banho. Quando saio do banheiro outra vez, visualizo Luna, aparentemente
pensativa, sobre a cama.
— Acordou?
— Nunca vou poder dar um irmão para o meu filho. Sempre fiz de
tudo para que nada faltasse a ele, mas infelizmente uma das coisas que ele
mais quer sou incapaz de dar.
— Você...
Rapidamente, me aproximo da cama, espantada por ela saber o que
conversei, há pouco, com o nosso filho. Sua expressão me quebra o
coração, porque sinto, apenas olhando para ela, a dor que está cravada em
seu peito. Queria poder arrancar tudo de ruim que ela possa estar sentindo.
— Eu acabei ouvindo, sem querer, quando fui procurar você. Sinto-
me tão incapacitada. Tão...
— Luna, pare com isso. Fique tranquila, nós conversamos sobre isso.
Ela puxa os cobertores com certa violência e se põe de pé,
surpreendendo-me ao ficar cara a cara comigo. O seu olhar raivoso me
deixa nervosa, mas sei que tudo isso é apenas reação automática à dor que
está dentro dela.
— Ficar calma? Como eu posso ficar calma quando o meu filho quer
ter um irmão e pensa que não tivemos ainda por escolha, e não por que eu
sou inútil e incapaz de manter uma criança dentro de mim? — Luna está
exaltada e subindo o tom de voz. Eu sei que ela está descontrolada e
machucada, mas não quero que ninguém acorde por causa dessa discussão
sem cabimento.
— Ok, abaixe esse tom de voz e vamos conversar com calma.
— Para o inferno você com essa calma. Será que não consegue
entender como me sinto? Estou quebrada, destruída, e saber que o meu
filho deseja tanto isso quanto eu faz com que me sinta ainda pior. Eu sou
inútil de verdade.
— Você não é e sabe disso. Vou pedir de novo para abaixar o tom de
voz, não precisa se exaltar. Os meus pais estão aqui, o nosso filho está aqui,
e eles não precisam ouvi-la. Não há necessidade de um momento
constrangedor.
— Você não entende, Camille. Não faz ideia de como isso está sendo
pra mim. — Ela vira de costas, com as mãos nos cabelos, puxando alguns
fios, como se isso pudesse acalmá-la.
— Meu amor...
— Não me chame assim, por favor! Eu não mereço isso. Não mereço
você, só sirvo para destruir tudo em que toco.
— Pare de falar besteira.
Ela se vira para mim outra vez, com suas narinas infladas e a
respiração acelerada. Ergo a minha postura, para mostrar-lhe que nenhuma
grosseria será capaz de impedir que conversemos tranquilamente.
— Não é besteira, Camille, é a maldita verdade!
— Cale a boca.
— Não me mande calar a boca, escute a porra da verdade que está
na sua frente. Eu sou... — Cubro a sua boca com as minhas mãos, para
impedi-la de continuar falando tanta coisa idiota sem motivo. Ela tenta
retirá-las, mas a encaro de maneira firme.
— Cale essa maldita boca. Pare de falar tanta besteira, sua idiota.
Luna finalmente retira minhas mãos de sua boca e me encara com a
mesma expressão que a minha.
— Não vou calar nada. É melhor que você ouça tudo.
Com a minha paciência quase se esgotando, por conta da teimosia
dela, resolvo fazer a única coisa possível capaz de fazê-la realmente calar a
boca: seguro a sua nuca com ambas as mãos e a puxo. Ela até tenta lutar
contra, mas nossos lábios entram em contato, e isso parece acalmá-la
instantaneamente. Em outra ocasião, essa seria a pior forma de acabar com
uma discussão, mas, neste momento, é a única maneira possível.
Forço a língua contra a sua boca e a invado, tomando os seus lábios
para mim como se me pertencessem de forma literal. Estou marcando meu
território, mostrando, com atitude, que não desejo deixá-la se rebaixar e
que não desistirei, mesmo que ela tente me obrigar a isso. Luna finalmente
se rende e agarra a minha cintura, puxando-me contra o seu corpo.
— Idiota — eu murmuro, depois de um tempo, e ela sorri e volta a
me beijar. Luna anda para trás, levando nós duas à cama.
— Sua idiota. — A voz rouca me faz arrepiar.
Ela se senta na cama e me puxa para o seu colo, colocando as mãos
em minha cintura. Faço força para que ela se deite e me ajeito em cima
dela, sorrindo ao me abaixar e grudar os nossos corpos outra vez. Luna
suspira, alisando as minhas costas até chegar à minha bunda, que ela
aperta com força, arrancando-me um gemido baixo. Meu corpo está
esquentando, a respiração dela batendo contra a minha pele, tudo se
unindo para mexer com o meu psicológico.
— Você me deixa maluca — murmuro. — Precisamos dormir.
Ela abre os olhos na hora e me encara como se eu fosse louca.
— Dormir agora?
Respiro fundo antes de me levantar de cima dela. Preciso me afastar,
preciso voltar a raciocinar e me controlar. Ela não pode fazer esforço, e eu
não quero machucá-la sem querer. Deito-me ao seu lado, evitando olhar
para ela.
— Deita aqui, venha.
Luna bufa e se enfia debaixo das cobertas, aproximando-se de mim.
— Você me deixou toda molhada e vai dormir. Eu não acredito.
Todo o meu corpo reage à sua frase, e imagens começam a surgir.
Seguro a respiração, porque sei que acabarei arfando, e pode ser que isso
faça algo despertar dentro dela. Então, com todo o resto de controle que
me resta, eu apenas me viro de costas para ela e apago a luz do meu
abajur. Luna faz o mesmo e me puxa para ela. Temos dormido assim,
juntinhas, sempre.
Estou tentando pegar no sono, mas sinto a respiração dela bater de
leve em minha nuca. Luna afasta os meus cabelos para encostar o rosto ali.
Não que seja algo fora do comum, porque ela tem feito isso todos os dias,
mas agora parece que um incêndio foi iniciado dentro de mim, por causa
desse contato. Fecho os meus olhos com força, engolindo saliva.
O silêncio do quarto é rompido apenas pelas nossas respirações: a
dela, calma; a minha, cada vez mais agitada. Fecho os olhos e até balanço a
cabeça, para tentar acabar com os meus pensamentos, mas tudo conspira
contra mim.
Luna enfia a mão por debaixo da blusa do meu pijama e acaricia o
meu abdômen devagar. Sua palma quente quase me faz gemer, e quando
ela aperta nos pontos certos, todo o meu corpo se arrepia.
Isso deveria ser comum, como tem sido nos últimos dias. Luna é
muito carinhosa, principalmente quando vamos dormir, porque é o momento
em que estamos a sós, e ela pode me dar toda a atenção. Mas cada toque e
aperto dela em minha pele fazem uma pulsação dolorosa aumentar entre as
minhas pernas. Alguma coisa toma conta do meu corpo, porque nem
percebo o momento exato em que seguro a mão dela e lentamente arrasto
para baixo, ultrapassando a barreira do meu short e da calcinha de algodão
que estou usando.
O corpo dela fica tenso atrás de mim, mas não demora a tomar uma
atitude e mexer os dedos devagar, para cima e para baixo, fazendo círculos
lentos sobre o meu clitóris enrijecido.
Levo uma das mãos para trás, segurando os seus cabelos, puxando-
os, ao senti-la lamber e beijar a minha nuca, enquanto continua me
masturbando de uma maneira tão deliciosa. Por que eu demorei tanto a
deixá-la fazer isso?
— Ah... Hm… — Gemidos incoerentes me escapam, e tudo aumenta
quando ela separa as minhas pernas e desliza os dedos até a minha
entrada, recolhendo a minha lubrificação natural e voltando ao clitóris.
Tenho que enfiar o rosto no meu travesseiro para não gemer alto.
— Caralho, tão molhada — ela murmura, arfando, ao girar os dedos
em meu clitóris. Eu ofego e me surpreendo quando, de repente, sinto um
tapa certeiro no ponto rígido e pulsante.
— AH!
Dessa vez, é impossível segurar o gemido alto, e eu só espero que
ninguém tenha escutado nada. Acontece que é uma sensação de dor e
prazer tão gostosa, que simplesmente não me controlo. Luna usa seu joelho
para separar as minhas pernas e erguer uma delas, deixando o caminho
livre para me tocar da melhor forma.
Sinto uma sensação gostosa subir pelas minhas coxas e parar no pé
da barriga. Fecho os olhos com força e agarro os cabelos dela, no momento
que estremeço e sinto as minhas paredes internas pulsarem freneticamente.
Luna não para ao ver que estou gozando, continua me masturbando com
rapidez e me dá outro tapa quando eu falo seu nome baixinho.
— Você gozando é uma delícia — ela murmura e retira a mão do
meio das minhas pernas. Eu estou mole e fraca, sentindo-me um pouco
sonolenta. Ouço sons de estalos no ouvido e tenho consciência de que ela
está provando o meu gosto, o que quase me faz gemer outra vez. Que
mulher é essa?
— O que acabou de acontecer? Nossa!
Luna solta uma risadinha e volta a me abraçar, colocando o queixo
em meu ombro.
— Eu acho que te dei um orgasmo delicioso.
— Muito delicioso. — Volto a levar a mão para trás e acaricio os
cabelos dela. Luna beija a minha bochecha e se aconchega em mim. — Eu
tinha razão quanto à sua habilidade com as mãos.
— Isso porque você ainda nem viu tudo que eu posso fazer com elas.
Abro os olhos na mesma hora e viro o rosto o máximo que posso,
para encará-la. Ela sorri e se estica para me beijar.
— Mal posso esperar para ver tudo que elas podem fazer.
Ela não diz mais nada e voltamos à posição inicial. Ficamos em
silêncio, e acredito que dentro de alguns minutos vamos dormir. Ao menos
eu sei que vou.
— Feliz Natal, minha princesa.
Sorrio com o jeito carinhoso pelo qual me chama e seguro a sua mão
em minha barriga, trazendo-a para que eu possa beijá-la.
— Feliz Natal, meu amor.
Capítulo 27 – O primeiro passo
Estou na cozinha com os meus pais, e estamos preparando um café
da manhã reforçado, pois a minha irmã e a família dela estão vindo tomar o
desjejum conosco. Minha mãe ficou encarregada de fazer as melhores
panquecas que existem em todo o mundo — somente as da minha avó
ganham delas. Papai está ajudando e, ao mesmo tempo, preparando outras
coisas. Para ser sincera, eu estou, boa parte do tempo, apenas observando
os dois. Eles são adoráveis quando cozinham juntos.
— Bom dia, família linda — uma voz rouca, de quem acaba de
acordar, toma conta da cozinha. Olho para ela e sorrio, sendo rapidamente
correspondida. Luna vai em direção à minha mãe e segura em sua cintura,
beijando-lhe o topo da cabeça.
— Bom dia, nora maravilhosa.
— Bom dia, minha sogra favorita.
— Mas você só tem uma, que eu saiba — resmungo, e as duas
acabam rindo, ignorando a minha leve revolta totalmente.
Luna se direciona, dessa vez, ao meu pai, e eles trocam um caloroso
abraço. É impossível manter a minha postura de quem está com raiva,
porque ela parece tão bem e alegre.
— Bom dia, sogro perfeito.
— Veja só quem acordou bem-humorada hoje. Bom dia, nora.
— Realmente, acordou muito animada. — Viro-me um pouco sobre o
banco e abro os braços para ela. — Bom dia, meu amor.
O sorriso dela fica maior ainda ao me ouvir. Ela se abaixa, e trocamos
um rápido beijo, finalizado com muitos selinhos.
— Bom dia, rainha da minha vida.
— E essa felicidade toda? — sussurro, impedindo-a de se afastar de
mim quando entrelaço as minhas pernas em sua cintura. Luna sorri, sem
jeito, e espia atrás dela, onde meus pais estão. Provavelmente, para conferir
se eles estão prestando atenção. — Isso tudo é por causa do Natal? —
Sorrio de forma cínica, envolvendo o seu pescoço com os meus braços.
— Você sabe muito bem o motivo, sonsa — ela fala baixo,
preocupada com a possibilidade de meus pais a ouvirem, o que me faz rir
um pouco, mesmo estando sem jeito por me lembrar do que fizemos de
madrugada. — A madrugada foi maravilhosa!
Os meus olhos descem para a sua boca, e eu sinto como se toda a
água do meu corpo fosse drenada. Inclino-me para beijá-la, mas algo, ou
melhor, alguém, me impede.
— Fazendo safadezas na frente dos nossos pais agora, Camille? — a
minha irmã gêmea idiota diz, fazendo-me automaticamente corar e me
lembrar de que estamos realmente exagerando. Luna dá uma risadinha
nervosa e se solta de mim.
— Depois, ela dá chiliques por saber que eu faço certas coisas. Bom
dia, família — Sofia completa o comentário de nossa irmã, passando direto
por mim para ir até os nossos pais. Reviro os meus olhos e fico de pé para
cumprimentar os meus sobrinhos.
— Oi tia, bom dia — Serena é a primeira a me cumprimentar,
extremamente animada.
— Bom dia, pequena. Cadê o Harry?
— Subiu para o quarto do Louis. Esse garoto está ficando mal-
educado agora — Rodrigo diz com ar de riso, ao também chegar à cozinha.
— Bom dia, cunhada. Bom dia, sogros lindos.
Todos se cumprimentam e ajudam na arrumação da mesa para o
café da manhã. Belinda preparou um bolo de laranja em casa e o trouxe.
Isso me deixa preocupada, porque quando éramos mais novas, ela mal
sabia fritar um ovo.
Olhando para eles, animados e rindo, enquanto conversam, não
existe algo melhor que eu possa escolher, além de um momento como este.
A minha família sempre foi tudo para mim, estou feliz por estar recuperando
o contato com todos, pois sei que a Camille de antes andava bastante
afastada. Recuperar os laços tem sido uma das coisas mais importantes
para mim nos últimos dias. Isso me ajuda muito a lidar com a minha falta
de memória. Ter pessoas que eu amo ao meu lado sempre foi gratificante, e
agora ainda mais. Observando-os espalhados pela sala de casa, enquanto
conversam, brincam e esperam para trocar os presentes... O meu coração
está em festa. É muito bom estar cercada de quem só quer o nosso bem,
não é?
— Eu quero pedir um minuto de atenção a todos vocês. Por favor! —
Vanessa se pronuncia de repente, levantando-se do sofá e abrindo o
sobretudo que está usando. Um sorriso nasce em meu rosto, pois tenho a
noção do que dirá. — Acredito que não seja surpresa para alguns, mas será
principalmente para os meus sogros e para o meu marido, que está meio
desconfiado nos últimos dias, mas não chegou em mim para perguntar.
— Amor, você...? — Noah se levanta do chão, onde estava sentado,
brincando de UNO com as crianças. O seu rosto está estampado de
incredulidade, e os olhos claros brilham de longe. O meu olhar é desviado
para Luna ao meu lado, que está tensa, apesar do sorriso em seu rosto.
— Sim, amor. E sim, família. O clã Hansen-Jacobs vai ganhar um
novo ou uma nova integrante, porque eu estou grávida
Todos comemoram ao mesmo tempo, ficando de pé para cercar os
mais novos pais da família. Noah segura Vanessa no ar e a enche de beijos.
Volto a olhar para Luna, que derrama lágrimas silenciosas. Parte o meu
coração vê-la desse jeito, embora eu saiba que está feliz por eles.
Aproximo-me rapidamente dela e a puxo para os meus braços, envolvendo-
a com firmeza. Ouço-a fungar em meu pescoço, apertando a minha cintura
com as mãos.
— Esse deveria ser o seu presente também. Eu tinha tanta, tanta
coisa planejada para dizer.
— Meu amor… — Enfio as mãos em seus cabelos, acariciando o couro
cabeludo com carinho. Sei que não podemos evitar que os nossos familiares
façam anúncios como esse, mas entendo a dor que está sentindo. Luna é
muito cautelosa ao planejar qualquer coisa e sempre se abala quando algo
dá errado, principalmente nesse caso, em que ela fez de tudo para dar
certo. Infelizmente, não era o momento.
— Eu sinto tanto. Tanto. Quebra meu o coração. — Seu tom de voz
embargado me quebra o coração da mesma forma.
Fecho os olhos e respiro profundamente, apertando-a contra mim.
Olho em volta para ter certeza de que ninguém esteja nos vendo, e
realmente não estão, apesar de notar o olhar cauteloso e preocupado de
Ana sobre nós duas. Eu faço um sinal para ela e depois volto a atenção para
a mulher em meus braços, que continua com o rosto em meu pescoço,
fungando baixinho e sussurrando coisas que não sou capaz de compreender.
— Vamos dar uma volta. Venha.
Ela não hesita em atender meu pedido, e de mãos dadas, saímos da
sala, passando pela cozinha para irmos até a porta que nos leva ao quintal.
Luna olha para o céu, assim que chegamos ao lado de fora. Está
começando a chover, uma chuva congelada que, em breve, formará mais
neve no chão.
— Desculpe-me por tirar você de lá. É tudo tão difícil!
— Não fique se desculpando, eu a entendo totalmente, assim como
todos.
— Não quero estragar o momento feliz de ninguém.
— Você jamais faria isso. — Vou para a frente dela e seguro o seu
rosto, fazendo-a me encarar. Os olhos estão avermelhados, assim como a
ponta de seu nariz. — Entendeu? O seu irmão sabe que está feliz, e eu
tenho certeza de que ele também entende a sua dor neste momento.
— Entendo mesmo — uma terceira voz surge de repente. Luna olha
para trás, e eu faço igual, ao soltar o seu rosto. Deparamo-nos com o Noah
chegando até nós. — Quero me desculpar por ter ativado algum gatilho
relacionado a isso. Você, melhor do que ninguém, sabe o quanto eu a amo
e a protejo de qualquer coisa neste mundo.
— Não se desculpe, meu irmão. Eu sabia que seria assim no começo,
só preciso aprender a lidar.
— Estou aqui com você, minha princesa. Ouviu bem? — Ele para na
frente dela e segura o seu rosto, encarando-a firmemente. — Sua dor dói
em mim também, sempre fomos assim. Se eu pudesse arrancá-la de dentro
de você e pegá-la para mim, eu o faria.
— Eu sei disso, Tico.
Noah abre um sorriso ao ser chamado pelo apelido íntimo dos dois.
Eles se chamavam de Tico e Teco quando eram mais novos. Eu achei fofo,
como o meu BigBig e Lil com a Vanessa.
— Não era para ser agora. Você já teve informações suficientes para
saber que tudo acontece no momento certo. — Noah olha para mim durante
alguns segundos, e eu imagino que ele esteja se referindo a coisas
relacionadas a mim, a ela e ao nosso relacionamento também. — Eu mesmo
não imaginava ser pai de novo. Vanessa nunca quis outro filho. Eu estava
desconfiado, mas ela sempre foi tão cuidadosa que eu nem cogitei ser
verdade.
— Ela estava apavorada quando me contou — comento, lembrando-
me do dia em que conversamos, e ela me falou da gravidez. Ele sorri e
concorda com a cabeça, então volta a olhar para a irmã.
— Eu estou aqui com você, sempre estarei. Nunca, em hipótese
alguma, se esqueça disso.
Eles se abraçam com força, Noah a ergue do chão e a mantém em
seus braços. Ficam assim durante algum tempo, até que ele a coloque no
chão.
— Obrigada.
— Não precisa agradecer, é para isso que os irmãos servem. — Eles
fazem um toque de mão divertido, e me dou conta de que é o mesmo que
Louis e ela fazem. Deve ser algo entre eles. — Vou deixar as duas sozinhas
e garantir que ninguém atrapalhe.
Eu sorrio em agradecimento, e ele me retribui e acena, antes de se
virar e sair, entrando na sala, onde todos estão. Luna passa as mãos em seu
rosto, antes de se virar. Ela já não está mais triste, e eu fico grata por meu
cunhado ter vindo animá-la.
— Venha aqui me dar um beijo — ela me chama, e eu não me faço
de rogada, indo rapidamente em sua direção para beijá-la. Luna segura em
minha cintura, e eu passo os braços por trás de seu pescoço, colando a
minha boca à sua, dando início a um lento beijo. Sinto as suas mãos
tocarem as minhas costas, apertando o ponto certo. Esse beijo está
carregado de sentimentos, e eu consigo sentir todos ao mesmo tempo,
mesmo sem saber explicá-los.
Estamos perdidas em uma bola particular, trocando olhares e sorrisos
apaixonados. O tempo frio deixa os olhos de Luna com um tom azul lindo
demais. Eu acho incrível como eles mudam conforme a iluminação ou a
temperatura do ambiente. Confesso que estou cada vez mais apaixonada
por cada detalhe dessa mulher.
Ela mantém as mãos em minha cintura, com uma pegada firme que
me faz quase derreter em seus braços. Ela sabe como me pegar. Eu acaricio
seu rosto, retirando alguns fios teimosos de cabelo, que insistem em cair
sobre os seus olhos e quase me impedem de apreciar o rosto da mulher
mais linda que tenho o prazer de admirar.
— Filha? Posso falar com você um instante? — Dessa vez, quem
surge onde estamos é a Ana, fazendo com que a gente se afaste e olhe em
sua direção. A minha sogra caminha até nós, com as mãos dentro dos
bolsos de seu grosso sobretudo.
— Claro que pode, mamãe.
— Eu vou deixá-las a sós. — Faço menção de sair para dar-lhes
privacidade, mas sou impedida por Luna, que segura os meus punhos, e por
Ana, que faz um sinal com as mãos para que eu permaneça.
— Você é família, não tem motivo para sair e não ouvir o que direi.
Inclusive, acho que também pode ser bom para você o que vou falar.
Luna entrelaça nossos dedos e me puxa um pouco mais para perto
de si.
— Pode falar, mamãe.
Ana toma uma respiração profunda, antes de relaxar a postura,
abaixando os seus ombros, como se estivesse retirando peso de cima deles
e derrubando alguma barreira dentro de si mesma.
— Filha, eu sei que nunca fui uma mãe tão boa quanto deveria ser e
que você merece. — Luna faz menção de interrompê-la, mas Ana a impede,
cobrindo a boca da minha esposa. — Eu não sou hipócrita, sei do que estou
falando. Sempre tentei dar o meu melhor, até mesmo ao Noah, porque nem
com ele consegui ser perfeita. Sei também que sempre peguei mais leve
com seu irmão, porque ele nunca me contrariou, e nós raramente
discutimos. O que quero que você saiba é que, apesar de não ter sido a
mãe mais carinhosa e atenciosa do mundo, meu coração sempre quebrou
quando o seu foi quebrado. Eu te coloquei no mundo, então mesmo que eu
nunca... Mesmo com esse jeito torto de demonstrar, sempre desejei que só
acontecessem coisas boas na sua vida.
Luna está tensa ao meu lado, provavelmente ouvindo coisas nunca
ditas pela própria mãe, que é muito fechada.
— Todos os anos que trabalhei, por dias e noites, quase sem
descanso, foram apenas para dar tudo de bom e de melhor a você e ao seu
irmão. Sei que coisas materiais não substituem um abraço, uma
demonstração de afeto ou de preocupação. Hoje sei disso. Falhei ao
priorizar outras coisas antes de vocês, achando ser suficiente o que eu já
dava.
Ela se aproxima de Luna e toca o rosto da filha, olhando de maneira
carinhosa. Lembro-me de ter visto esse olhar afetuoso apenas direcionado
aos netos e ao Mark.
— Agora, eu a olho e vejo uma mulher quebrada, tentando consertar
os trincados que todos esses anos causaram ao seu coração, o que me
parte ao meio, porque não posso proteger você dessa dor. Eu nunca soube
ser carinhosa, porque fui criada assim, diferente do seu pai, que sempre foi
mais aberto, mas eu amo vocês dois com todo o meu coração. Você, Luna,
sempre foi e sempre será a minha princesinha. Posso não entender algumas
das suas escolhas, mas tenho orgulho da mulher que você se tornou. Uma
mulher forte, com uma família linda, que luta pelo que quer e não tem
medo de errar e recomeçar.
A minha esposa chora sem qualquer tipo de vergonha, assim como a
Ana. Acredito que este seja o momento mais emotivo que as duas já
tiveram. Confesso que eu mesma estou mexida, e a conversa nem é
comigo.
— Eu quero que saiba que estou aqui, de verdade, minha filha. O
meu colo está aqui para você se refugiar, se for preciso. — Ela desvia o
olhar para mim e sorri de maneira amável. — Vocês duas. Porque, apesar de
ser a minha nora, Camille, eu a considero como uma filha. Você sempre
cuidou e continua cuidando tão bem da minha menina, não tem como ser
diferente. Sou grata por ela ter encontrado alguém tão especial. Você, filha,
saiba que, a partir de agora, farei de tudo para ser melhor. Prometo ouvi-la
mais e tentar entendê-la, sem julgamentos. Isso é uma promessa.
Ana mal termina de falar e sente a colisão do corpo de Luna contra o
seu. Ela solta a minha mão para abraçá-la. Presenciar esse momento de
mãe e filha me faz tão feliz, como se a minha alma estivesse sendo lavada.
Eu sei o quanto elas precisavam dessa conversa, e mesmo que ainda tenha
muita coisa para ser resolvida entre as duas, esse foi o primeiro passo. Eu
realmente acredito que tudo tem alguma razão para acontecer. Todos estão
se acertando de alguma forma.
O restante da noite não poderia ser melhor. Todos ficam ainda mais
alegres quando voltamos para dentro, e Luna está radiante, brincando e se
divertindo, sem ficar nem um minuto sequer em algum canto. Isso me deixa
alegre e muito satisfeita, porque me parte o coração vê-la reclusa.
Aos poucos, eles começam a ir embora. Os meus pais vão dormir na
casa de Belinda desta vez, restando apenas os pais de Luna, que ficam um
pouco mais, até irem para a casa de Noah, mesmo que tenhamos insistido
para que dormissem aqui. Pelo visto, todos se juntaram para nos deixar
sozinhas, pois Nayara levou o nosso filho com ela.
— Você também teve a sensação de que eles queriam nos deixar a
sós? — pergunto, assim que Luna entra no banheiro, onde estou de pé em
frente à pia, retirando os meus acessórios. Estou usando apenas lingerie,
como ela.
— Que bom que não fui a única a ter essa sensação. — Ela solta uma
risada, e eu acabo rindo também. — Sabia que você também tinha
percebido que estavam armando algo para nós duas, mas confesso que
gostei da ideia de ficar sozinha com a minha mulher. Vai tomar banho
primeiro?
Mordo o lábio inferior, ao ouvir a sua pergunta, olho para o meu
reflexo no espelho e, depois, de rabo de olho, visualizo o box. Abaixo a
minha cabeça durante poucos segundos, e um pequeno sorriso surge em
meus lábios ao ter uma ideia. Sei que provavelmente ficarei bastante tímida,
mas não existe nada que me impeça de sugerir isto a ela.
— Por que não tomamos juntas?
Luna olha, na mesma hora, para mim, e eu não a estou encarando, a
vejo pelo reflexo do espelho. Quase sorrio com a reação dela, acho adorável
o modo como ela reage a mim. Isso faz com que a minha autoestima fique
nas alturas.
— Eu acho perfeito — sua voz não passa de um sussurro rouco e
provocante. Sabia que ela não perderia a chance de reverter a situação.
Luna se aproxima de mim e para atrás do meu corpo, com as mãos em
meus ombros. Ela alisa os meus braços lentamente para baixo e, depois,
sobe até as minhas costas, parando no fecho do sutiã. — Posso?
— Sim — respondo de imediato, hipnotizada pelo olhar dela no
reflexo do espelho. Luna rapidamente abre o meu sutiã, deixando-o solto
em meu corpo, e sem desviar o olhar do meu, começa a tirar a peça
lentamente. Engulo saliva, sentindo um arrepio gostoso quando os seus
dedos tocam o meu corpo.
— Sempre ficarei fascinada com a sua beleza — ela murmura,
enquanto se ajoelha aos meus pés, segurando a barra da minha calcinha.
Fecho os olhos momentaneamente e sinto uma insegurança que não me
impede de sentir confiança. Não somente nela, mas em mim mesma. —
Você é a mulher mais linda do mundo.
Luna sobe lentamente, arrastando as mãos pelo meu corpo. Fecho os
olhos quando ela gruda em mim, acariciando a minha barriga dessa vez. Eu
sei que os seus toques são a forma silenciosa dela de me elogiar e me dar
confiança. Está funcionando, porque sinto crescer, dentro de mim, algo
parecido com poder, e a certeza de que posso fazer o que eu quero e que
não preciso me envergonhar. Não é qualquer pessoa aqui comigo, é a minha
esposa, a mulher com quem escolhi passar o resto dos meus dias.
— Você nem deixou eu te despir.
— Novas oportunidades surgirão, princesa. Venha! — Ela estende a
mão, levando-me para o box, abre a porta e me deixa passar, para entrar
logo em seguida. Luna liga o chuveiro e mexe nos registros para deixar a
temperatura no ponto certo.
— Eu acho que você podia me fazer uma massagem, sabe? Estou me
sentindo dolorida — comento casualmente, enquanto entro, aos poucos,
debaixo da grande cortina de água. Luna solta uma risadinha,
acompanhando-me debaixo da ducha.
— Será um prazer. O que você me pede que eu não faça?
Como de costume, coloco os meus braços em cima de seus ombros
para abraçar o seu pescoço.
— Posso pedir qualquer coisa?
— Qualquer coisa — ela responde e se inclina, beijando o meu queixo
lentamente, e eu fecho os olhos para apreciar o contato. Adoro quando a
sua boca está em mim.
— Quero um beijo, então.
Luna nem diz mais nada, somente encosta a boca na minha e me
beija. Lentamente, como sempre é o início dos nossos beijos, para, então,
acelerar gradativamente. Suas mãos apertam a minha cintura com força,
puxando-me contra ela. Este contato dos nossos corpos nus me faz gemer e
estremecer ao mesmo tempo. Sei que deveria ser rotineiro, mas para mim é
mais uma coisa nova. E eu gosto da sensação.
Ficamos nos beijando, até que, enfim, decidimos tomar nossos
banhos. Não deveríamos ter molhado os cabelos, mas foi impossível. Luna
fez questão de me ensaboar, dizendo estar recompensando-me pelos dias
que a tive de banhar. Eu, obviamente, não perdi a chance de fazer o mesmo
com ela, e assim foi o resto do banho. Saímos juntas, trocando sorrisos e
beijos, enquanto nos enxugávamos. Voltamos ao quarto, e a primeira coisa
que ela faz é ligar e aumentar a lareira, deixando o clima mais agradável.
— Não coloque a blusa, apenas o short. Vai ser melhor para a
massagem — ela pede, e eu concordo com a cabeça, deixando a blusa
sobre a cama, antes de me deitar de bruços. Suspiro ao sentir o cheiro do
creme que ela usa, e Luna sobe na cama e se senta sobre as minhas coxas.
— Eu acho que você sabe como eu gosto, então só vai com tudo.
Enfio as minhas mãos debaixo do travesseiro e deito a cabeça de
lado, com um sorriso no rosto, esperando a massagem começar, pois sei
que será incrível. Luna se movimenta sobre mim, e quase salto de susto ao
sentir a sua respiração em meu ouvido.
— Eu sei fazer tudo o que você gosta mesmo — seu sussurro me faz
fechar os olhos com força e pressionar as coxas uma contra a outra. Maldita
mulher que sabe mexer comigo. Ela realmente me conhece e sabe que pode
tocar nos meus pontos fracos sem pena.
Luna se afasta de novo e espalha o creme sobre as minhas costas,
dando início à massagem em seguida. Como eu já esperava, ela realmente
sabe como eu gosto. Não demoro muito a me sentir relaxada e sonolenta.
— Não tenho forças nem para vestir a minha blusa — murmuro, meio
grogue, quando a massagem chega ao fim, e permaneço imóvel na mesma
posição, tendo a sensação de que dormirei a qualquer momento. Luna solta
uma risadinha, e não faço ideia do que ela está fazendo, só ouço seus
passos pelo quarto e percebo as luzes sendo apagadas.
— Durma assim, eu prefiro — ela diz ao finalmente voltar para a
cama, deitando-se ao meu lado. — Venha, eu faço você dormir rapidinho.
Sinto as suas mãos em minha cintura e deixo que ela me vire na
cama, puxando-me contra o seu corpo. Viro a minha cabeça um pouco para
trás e questiono baixinho:
— Vai me fazer dormir rápido, fazendo-me gozar de novo? — A
minha pergunta parece pegá-la desprevenida, pois sinto que as suas mãos
perdem a firmeza no meu corpo durante alguns segundos, mas então, ela
volta a me segurar com força, grudando o corpo no meu rapidamente e
levando a boca até a minha orelha.
— Você quer?
Minha resposta para a sua pergunta é somente um aceno de cabeça.
Mesmo estando realmente sonolenta, sei que vai ser gostoso da mesma
forma.
Luna não perde tempo dessa vez, vai direto ao ponto, ultrapassando
a barreira do meu short, sentindo-me, sem qualquer barreira, pois não
coloquei calcinha quando me vesti.
— Já está toda molhada — sussurra em meu ouvido, enquanto rodeia
a minha entrada, recolhendo a minha lubrificação natural. Mordo o lábio e
pressiono os olhos, afastando bem as minhas pernas, para que ela consiga
me tocar livremente. Luna passa a outra mão por debaixo do meu corpo e
aperta os meus seios da melhor forma que consegue, e isso dobra o tesão
que estou sentindo.
— Você realmente sabe do que eu gosto — minha voz grogue
denuncia o meu estado catatônico. Seguro os seus cabelos e, dessa vez,
não contenho os gemidos quando ela começa a me masturbar com tanta
maestria, tocando os lugares certos que me deixam louca. Ela gira os dedos
sobre o meu clitóris, pressionando-o algumas vezes, e deixa aqueles tapas
deliciosos sobre ele, que o fazem pulsar rapidamente. Estou enlouquecendo.
Ela desliza os dedos para baixo, recolhe mais do meu líquido, volta a subir e
continua os movimentos perfeitos.
Eu perco o controle do meu quadril quando inconscientemente
começo a rebolar em seus dedos, agarrando os seus cabelos com ainda
mais força, enlouquecendo com a forma como ela me toca e com a sua voz
rouca dizendo coisas sujas ao pé do meu ouvido. Não sabia que eu gostava
de ouvir sacanagem nessas horas até ouvi-la me dizer.
Um alto gemido escapa de mim quando chego ao ápice,
estremecendo contra o seu corpo, gozando tão gostoso que me sinto
escorrer abundantemente. Luna dá um último tapa em minha boceta, antes
de virar o meu corpo e beijar a minha boca.
O beijo está delicioso e fica ainda melhor quando ela se afasta um
pouco e coloca os dedos molhados, com meu prazer, em minha boca. Não
recuso, os chupo e os lambo, retirando cada resquício meu deles. Luna
ofega contra mim e volta a me beijar outra vez, segurando o meu queixo
com força.
— Preciso limpar você — ela diz rapidamente, e eu imagino que se
levantará da cama, mas, ao contrário, tira as cobertas e desce pelo meu
corpo, puxando o meu short para o lado. Neste momento, o meu corpo se
retrai um pouco. Talvez seja vergonha, mas, ao mesmo tempo, estou tão
excitada ainda que faço qualquer coisa que ela queira.
Luna finalmente encosta a sua boca na minha área mais sensível, e
quase solto fogos de artifício internos. Se com os dedos ela é boa, com a
boca é impecável.
A sua primeira lambida me faz curvar as costas sobre a cama, então
a sinto puxar mais o tecido do meu short para ter acesso à minha entrada,
que está com uma grande concentração do que foi o meu orgasmo. As
minhas mãos automaticamente vão para os seus cabelos, a pressiono contra
mim e, gemendo, digo o seu nome alto e em bom tom.
Luna ergue uma perna minha para ter um acesso melhor, me lambe
inteira e, então, chega ao clitóris, movimentando a língua de um jeito que
eu nem imaginava ser possível alguém fazer tão rápido quanto ela.
Mesmo que tenha acabado de gozar, sinto que terei outro orgasmo.
Os gemidos saem livremente, e eu a pressiono contra mim, sem me
importar com a força usada. Ela mexe a língua em toda a minha boceta,
chupando e lambendo cada parte, deixando-me ainda mais louca.
— Nossa! — murmuro, quase sem voz, sentindo a boca seca. Ela
finalmente se dá por satisfeita e, com um último beijo sobre o meu clitóris
sensível, se afasta e coloca o meu short no lugar. Estou mole e satisfeita.
— Essa boceta é gostosa demais. Senti falta de provar você.
O fogo da lareira me permite ver o seu rosto quando a encaro. Luna
está ao meu lado, olhando para o meu rosto, com um enorme sorriso. Eu
sorrio da mesma forma, puxando-a para um beijo apaixonado.
— Vou dormir como uma verdadeira princesa, a Bela Adormecida.
Luna gargalha da minha fala, cobrindo as duas, antes de me puxar
para os seus braços.
— Durma, minha princesa. Eu estarei aqui amanhã de manhã,
quando acordar.
Que sorte a minha, não é?
Capítulo 28 – Ponto de paz
O dia seguinte não poderia ter amanhecido melhor. Quando olho
através da janela, vejo que a neve diminuiu consideravelmente e acredito
ser possível ir à rua. Quero dar uma volta, estou cansada de ficar em casa.
A minha esposa continua dormindo, então tenho muito cuidado ao sair da
cama para fazer a higiene matinal, antes de sair do quarto e preparar o
nosso café da manhã, que será levado à cama para ela. Minha mulher
merece ser mimada.
— Não acredito que você se levantou antes de eu acordar você —
resmungo ao voltar ao quarto e me deparar com a cama vazia e a porta do
banheiro aberta. Ouço o som da descarga e, então, da torneira da pia. Em
seguida, ela sai do banheiro, com o rosto amassado e os cabelos levemente
bagunçados. Como consegue ser linda até mesmo assim?
— Inclusive, precisamos conversar sobre o fato de você se levantar
da cama e me deixar sozinha — ela também resmunga, ainda meio grogue,
caminhando de volta à cama e jogando-se nela.
Rio do seu jeito rabugento. Antes ela nem reclamava, mas agora, que
estamos cada vez mais próximas de novo, a sua liberdade para fazer
reclamações voltou. Deixo a bandeja com o café sobre a mesinha de canto,
subindo no colchão e chegando mais perto.
— Eu fui preparar o nosso café da manhã, ranzinza.
— Pois você acabou de ser perdoada. — Ela rapidamente ergue a
cabeça, com um enorme sorriso em seu rosto, e como se fosse ativado, o
seu estômago faz um barulho alto. — Viu? O Junior também concorda
comigo.
— Melhor alimentarmos esse monstrinho, antes que ele nos coma —
brinco e solto uma gargalhada. Em seguida, viro-me para pegar a bandeja,
a coloco entre nós duas e, quando olho para ela, a vejo com uma expressão
sem-vergonha no rosto. — O que foi?
— Ele não pode te comer, mas eu posso.
— Luna! — exclamo, horrorizada com o seu comentário, e ela cai
sobre a cama, gargalhando, divertindo-se.
— Desculpe, eu estou brincando, mas não podia perder a piada.
— Tome aqui. Coma e pare de falar besteira. — Pego uma torrada e
passo um pouco de geleia de morango, levando até ela, que rapidamente
abre a boca para recebê-la. — Ocupe sua boca com isso, e chega de piadas.
Ela faz o sinal de rendição, enquanto mastiga, soltando um gemido,
aprovando o sabor que está em sua boca. Fico satisfeita por ela ter gostado
da geleia que eu mesma tive o trabalho de fazer.
— Eu amo essa sua geleia. Camies?
— Hm?
Como uma torrada também, deliciando-me com essa maravilha. Eu
sou uma ótima cozinheira mesmo, tenho orgulho dos meus dons culinários.
E se eu não amasse tanto a dança, com certeza seria uma chef de cozinha.
— Quero mais, por favor.
Olho para ela, que está fazendo cara de cachorro pidão, e reviro os
olhos.
— Vou ter que dar comida a você na boca agora?
— Sim.
— Está muito folgada.
— Você é a minha esposa, um dos seus trabalhos é me mimar.
Mesmo tendo reclamado, eu não deixo de alimentá-la, porque a
minha intenção é mimá-la mesmo, e que ela se aproveite disso. Luna
realmente merece todo esse tratamento, pela mulher incrível que mostra ser
cada vez mais.
— Folgada.
— Linda.
— Não fale de boca cheia.
Embora eu quisesse mimá-la, ela fez questão de retribuir o cuidado,
dando-me coisas na boca e enchendo-me de beijos. Sou apaixonada demais
por esse jeito carinhoso dela. Nunca imaginei que Luna pudesse ser assim,
e entendo a Camille do passado ter se apaixonado por ela. A cada dia, mais
eu descubro quão companheira e protetora ela é, além de ser boa mãe
também.
— Podemos aproveitar o dia para sair. O que acha? Estou cansada de
ficar reclusa em casa.
— Você leu a minha mente, ia perguntar agora mesmo se quer
passear. Preciso sair um pouco dessa casa.
— Então, vamos tomar um banho e nos arrumar. Vou levar você a um
lugar especial.
— Outro cantinho nosso? — questiono, começando a tirar as minhas
roupas para tomar o meu banho. Ela me segue de perto, e um sorriso
travesso surge no meu rosto quando penso em um plano maldoso.
— Sim, senhora.
Fecho a porta atrás de mim e a ouço mexer na maçaneta para abri-
la. Seguro a risada, terminando de tirar as minhas roupas.
— Camille?
Não respondo, entro no box para tomar o meu banho. Do lado de
fora, ela resmunga algumas coisas, e acabo rindo ao imaginar a sua
expressão contrariada, pois sei que o desejo dela é tomar banho comigo de
novo. Mas a vida não é fácil, certo? Eu não vou facilitar tanto para ela.
Tudo bem, talvez um pouco.
— Nayara mandou alguma mensagem para você? Ela nem respondeu
a minha — pergunto-lhe, depois de verificar as mensagens no meu celular.
Para ser sincera, nenhuma outra pessoa me respondeu, nem mesmo no
grupo que fizeram. Isso é estranho.
— Sim, mais cedo. — Olho para Luna, que está atenta ao retrovisor,
enquanto tira o carro da garagem. Estou incrédula por saber que estou
sendo ignorada. — Não fique com essa cara. Ela apenas avisou que hoje
teremos o dia só nosso e que ninguém falará conosco.
— Eles sabem que estamos bem agora, certo?
— Sim.
— Qual a finalidade disso tudo, então?
Luna solta uma risadinha, deixando-me confusa.
— Eu tenho certeza de que as nossas amigas e as minhas cunhadas
esperam que a gente tenha feito amor.
— Que fofo, você falando que fazemos amor. — Sorrio, toda rendida,
colocando a minha mão sobre a perna dela. Luna sorri, olha para mim,
durante alguns segundos, e em seguida, retira a mão do volante para
segurar a minha, levando-a até a sua boca para beijar o dorso dela.
— Sempre fizemos amor. Desde o início, e até quando o fazemos com
força, cheias de vontade, com muitos tapas e xingamentos.
— Ok, não se empolgue, sua safada.
Ela ri quando dou um tapinha em seu ombro.
— Você gosta de mim assim ou esqueceu que ontem quem veio para
cima de mim foi a senhorita?
— Luna Jacobs.
— Nossa, fazia tempo que você não me chamava assim. Eu até me
arrepiei, olhe aqui os meus braços. Deu tesão.
— Puta merda, desisto de você. Fique quieta, antes que eu saia
desse carro e volte para casa.
Ela não diz mais nada, mantendo a atenção na estrada. Não tem
como me estressar com essa mulher, não sei como a minha versão do
passado conseguia. Talvez seja o fato de que estou “convivendo” pela
primeira vez.
O caminho demora um pouco, mas logo chegamos a um lugar muito
bonito.
— Só para você saber: todas as vezes que viemos aqui, essa sempre
foi a sua reação. É bonito, não é?
— Demais! Posso descer?
— Claro, meu amor — ela responde, e eu não espero outro
comentário dela para sair do carro, sentindo a brisa gelada bater contra o
meu corpo, bagunçando os fios soltos do meu cabelo. Estou encantada com
a vegetação, que, mesmo coberta por uma camada de neve, continua linda.
O lago congelado deve ser muito bonito no verão.
— Estou apaixonada — murmuro quando sinto a presença dela atrás
de mim. Luna me envolve com uma manta grossa e abraça o meu corpo.
Impossível não sorrir e olhar para trás, selando os nossos lábios. Ela cuida
tão bem de mim, sou muito grata por isso.
— Venha, tem um lugar onde sempre ficamos. — Ela nos guia por
uma ponte de madeira que passa sobre o lago congelado. Eu olho tudo à
minha volta, apaixonada pelo ambiente. É simplesmente de tirar o fôlego,
estou encantada. Demora um pouco, mas chegamos a uma árvore enorme,
que fica no alto de um pequeno morro. Luna indica onde precisamos subir e
cobre o chão com o cobertor que havia trazido.
— Que vista maravilhosa! — comento, admirada, sentando-me sobre
o cobertor e apreciando a vista privilegiada que temos do enorme lago.
Luna coloca as coisas que trouxemos no chão e se senta ao meu lado,
fazendo-me erguer um lado da manta para que ela fique aquecida comigo.
— Muito bonito aqui. Quando descobri esse lugar, durante uma
sessão de fotos, sabia que você ficaria tão apaixonada quanto eu.
— Espero que o tempo não esfrie tanto, quero ficar o resto do dia
aqui. Nós podemos?
— Claro, meu amor. Trouxemos coisas para comer e estamos
quentinhas, podemos ficar o quanto quiser.
Luna passa uma perna por trás de mim e me puxa para o seu peito,
envolvendo-me em seus braços. Deito a minha cabeça em seu ombro e
continuo admirando tudo à nossa volta, encantada e agradecida por estar
aqui, vivendo isso com ela. Não acho que posso pedir alguém melhor.
— Você sempre diz que eu sou a sua sorte, mas acredito que a minha
sorte é ter você comigo. Não sei se outra pessoa faria tudo o que faz por
mim, se estivesse em seu lugar, pelo menos não com tanta dedicação.
— Não tenho como explicar o bem que você sempre me fez. Se
nunca desisti de nós, foi porque, no início de tudo, você acreditou em mim
como ninguém, apoiando-me sempre, erguendo-me a todo o momento,
para que eu nunca desistisse.
— Isso é com relação às suas escolhas de trabalho e faculdade? —
Viro-me em seus braços para conseguir encará-la. Eu gosto de conversar
olhando nos olhos da pessoa, é estranho não ter esse contato.
— Boa parte, sim. Foi complicado quando eu decidi mudar de curso,
sabe? Minha mãe surtou. Não me lembro de outro período em que tivemos
tantas discussões quanto naquela época.
— Foi assim que terminamos a escola?
— Sim. Eu fiz meio período de Direito e não quis mais, parecia que
outra pessoa estava vivendo a minha vida. Era tão errado, sabe? — Ela
suspira, fechando os olhos momentaneamente. Provavelmente está se
lembrando desse período complicado. — Você sempre me defendeu como
pôde, mas teve um momento que nunca vou esquecer: a minha mãe, como
sempre, nunca mediu as palavras para me desanimar a seguir outro rumo
que não fosse o seu desejado; essa foi uma das brigas mais estressantes
que tivemos, e você não aguentou presenciar sem dizer nada.
— Eu sempre defendi você dela?
Luna solta uma risadinha, inclinando-se para beijar a minha testa
rapidamente, e eu sorrio, acariciando a sua barriga por cima do casaco que
ela está usando.
— Sempre. Naquele dia, eu senti que podia contar com você para
tudo, porque disse que teria orgulho de se casar com uma mulher como eu,
futura fotógrafa de renome e esposa exemplar, e ainda que seríamos felizes.
Você pode imaginar que a minha mãe ficou tão chocada que nem teve
palavras para responder. Eu acho que ela não imaginou que você seria
capaz de enfrentá-la, porque geralmente as pessoas têm medo de fazer
isso.
— Confesso que estou feliz por saber disso. Não me alegraria nem
um pouco saber que estava presente, ouvindo absurdos sobre você, e não a
defendi. Sempre vi o relacionamento dos meus pais como um espelho,
sempre soube o quanto o meu bisavô não suportava o meu pai, por ele
defender a minha mãe das suas reclamações. Acho que companheirismo é
isso também, sabe? Estar ao lado da pessoa e se levantar por ela. Ninguém
vai abrir a boca para dizer algo de ruim sobre você e não me escutará de
volta.
— Você fica linda me defendendo, sabia? — Luna segura o meu rosto
e sela os nossos lábios várias vezes, e eu sorrio, adorando o ato carinhoso.
— Sempre gostei desse seu jeito protetor, comigo e com o Louis,
defendendo-nos de qualquer coisa. Eu sabia que você era a mulher certa
desde o início.
O tom azulado de seus olhos está parecendo mais vívido com o brilho
de admiração refletindo neles. Neste momento, tenho uma sensação, dentro
de mim, muito natural e familiar. Eu tenho certeza de que é o meu
subconsciente lembrando que, à minha frente, está a mulher com quem
decidi passar o resto da minha vida.
— O que será que a Camille adolescente pensaria da Camille adulta,
que é cada vez mais apaixonada por você e tem orgulho de ser casada
também?
— Ela, com certeza, surtaria — Luna brinca, fazendo-nos rir,
imaginando uma cena como essa. Tenho certeza de que a minha eu
adolescente ficaria maluca ao saber disso, porque não suportava nem
conviver no mesmo ambiente, imagine pensar em passar a vida toda ao seu
lado.
— Nunca pensei que me casaria e desejaria viver um romance.
Apesar de admirar o relacionamento dos meus pais, eu jamais imaginei ser
capaz de passar o resto dos meus dias ao lado de uma pessoa.
— Eu sei disso. Foi muito difícil conquistar o seu coração.
— Hoje, só tenho uma coisa em mente.
— O quê?
Levo minha mão até a sua nuca, segurando-a com as pontas dos
dedos e o polegar, pressionando o seu queixo. Luna olha para a minha boca
automaticamente, não consegue se controlar muito mesmo.
— Ainda bem que você insistiu em mim. Por isso, eu nunca deixarei
de estar ao seu lado. Sei que não podemos prever o que vai acontecer, mas
quando penso no futuro, hoje só o imagino ao seu lado.
Minhas palavras parecem emocioná-la, fazendo lágrimas brilharem
em seus olhos. Luna permanece paralisada, surpresa e emocionada demais
com a minha confissão. Eu sorrio antes de me inclinar, unindo as nossas
bocas em um beijo repleto de carinho e paixão.
Eu realmente não desejo mais ninguém.
Quando era mais nova, o meu pai disse algo sobre os príncipes
encantados. Lembro-me até hoje de suas palavras: “Príncipes encantados
não existem na vida real. Os garotos não vão abrir a porta do carro para
você, não vão comprar flores nem respeitar os seus sentimentos. O que a
maioria deles quer, hoje em dia, é qualquer oportunidade de tirar a sua
virgindade.” Lembro-me de passar a odiar os contos de fadas desde então,
apesar de nunca ter tido interesse por homens; o meu interesse maior
sempre foi por mulheres. Não entendia, no início, e levei anos para aceitar
isso. O período de aceitação é complicado e confuso, você fica dividida entre
o certo e o errado, imaginando o que os outros vão pensar e como vão
reagir.
Por um tempo, eu tive tanto medo disso que, apesar de não me
interessar por garotos, via a minha irmã e esperava pelo meu príncipe
encantado. Além de querer provar ao meu pai que eles existiam, sim, e que
era possível encontrar uma pessoa decente. Eu não esperava que ele
estivesse tão certo: os príncipes encantados não existem, mas as princesas
encantadas, sim. Eu encontrei a minha, que, mesmo não sendo perfeita,
está ao meu lado em todos os momentos e sabe cuidar de mim e do nosso
filho. Estou me descobrindo cada vez mais apaixonada por ela, não existe
nada melhor do que isso. Além do mais, por que eu iria querer outra
pessoa, se minha esposa é tão carinhosa e cuidadosa? Quem precisa de
príncipe encantando, tendo a Luna como companheira de vida? Ela tem
conseguido despertar o meu lado bom, e é uma sensação tão incrível como
ela me faz sentir. Gosto da pessoa que estou me tornando ao lado dela. Eu
não preciso de pessoas perfeitas, só preciso dela, com todas as suas
imperfeições. É a única pessoa com quem quero passar o resto dos meus
dias. Luna é muito mais do que apenas minha esposa, ela é o meu ponto de
paz.
Não me lembro se algum dia fui tão mimada na minha vida. Nas
últimas semanas, tenho me sentido em um verdadeiro paraíso. Luna e Louis
estão me tratando como uma princesa real, fazem tudo o que eu quero, e,
às vezes, nem preciso me dar o trabalho de dizer, porque os dois conhecem
bem o meu gosto. Jamais reclamarei disso, porque adoro ser tratada dessa
forma. É bom demais ver as pessoas que eu amo ansiosas e alegres por
causa do novo bebê que vai chegar.
Nós descobriremos o sexo essa semana. Eu pretendia esperar, para
ser surpresa, mas o nosso pequeno está animado demais para saber se terá
um irmão ou uma irmã, então não prolongaremos a sua ansiedade e vamos
levá-lo à consulta conosco.
Os meus dias têm sido tranquilos, mas apenas os dias, porque as
noites são um pouco complicadas. Com dificuldade para dormir, fico agitada
e remexendo-me na cama, o que faz minha esposa acordar diversas vezes.
O fato de ficar presa no quarto me deixa ainda mais ansiosa quando estou
com insônia, por isso tenho descido para a sala e ficado um tempo
relaxando, sozinha, esperando o desconforto passar, para, só então, dormir.
Olho para o lado e sorrio com a imagem da Luna toda torta no sofá,
quase caindo para a frente, por estar cochilando. Mesmo eu zelando pelo
seu conforto, ela não desgruda de mim nunca. Confesso que gosto demais
de todo esse carinho, ainda mais agora que tenho estado tão necessitada da
atenção dela. Tenho tentado deixá-la descansada, porque estou em casa,
mas ela continua trabalhando e recebendo diversas propostas de trabalho.
Fico orgulhosa por vê-la tão bem em sua carreira, ainda mais agora que
seus pais têm dado todo o apoio que ela sempre desejou. Ana e ela estão
cada vez mais unidas, se dando melhor, e se entender com a própria mãe
sempre foi um dos desejos da vida dela. Aos poucos, tudo está se
encaixando no lugar.
— Meu amor, vá se deitar na cama. Eu vou subir também.
Ao ouvir a minha voz, ela rapidamente desperta, ainda confusa,
limpando o canto da boca, um pouco ofegante. Acho que a assustei sem
querer. Os seus sentidos estão muito mais aguçados ultimamente, e eu
acredito que seja pelo fato de a gravidez estar me deixando meio instável.
Mas tudo está bem com o bebê, que está crescendo como deve e não
apresenta problema clínico algum até o momento. Provavelmente, são
apenas consequências de estar gerando uma criança, mas vocês conhecem
a esposa protetora que eu tenho, certo?
— Tudo bem? Precisa de alguma coisa? Água? Desejo? Fome? — De
maneira afobada, ela pergunta e se arrasta para perto de mim, erguendo as
minhas pernas para ficar o mais próximo possível. Eu estou deitada de lado,
com as pernas sobre ela, que está sentada no canto do sofá. Luna faz uma
massagem deliciosa nos meus pés, depois acaba dormindo.
— Eu quero subir e colocar você na cama.
Ela suspira, parecendo aliviada.
— Está melhor?
— Sim — respondo com sinceridade, virando-me para ficar de pé, e
ela não demora muito a fazer o mesmo, apoiando as mãos em minha
lombar, como se fosse o meu suporte para não cair. Eu acho que Luna
confunde gravidez com invalidez às vezes. — Quero subir e colocar você na
cama. Vamos?
Ela somente concorda com a cabeça, bocejando, antes de me
acompanhar. Sinto muita pena por tê-la tirado de nossa confortável e
espaçosa cama para deixá-la ficar no sofá, em uma posição nada
confortável. Não tenho culpa totalmente, eu tentei fazê-la se deitar no
quarto, mas não existe pessoa mais teimosa que a minha esposa.
Luna me ajuda a subir na cama e rapidamente dá a volta, deitando-
se sob as cobertas e arrastando-se para perto de mim. Quando me deito, de
costas para ela, as suas mãos tomam conta do novo local favorito: a minha
barriga de grávida. Só dorme fazendo carinho nela, todo dia é assim.
Acredito que também serei assim quando for a sua vez de ser a grávida.
Estou ansiosa pelo momento em que a ouvirei dizer que está pronta para
iniciar o tratamento.
— Está tudo bem? — sua voz rouca ressoa, e é nítido quão cansada
ela está. Isso me deixa angustiada, porque amanhã ela trabalhará exausta
outra vez. Seguro a sua mão, que está em minha barriga, acariciando-a
lentamente.
— Vou ficar melhor se você dormir.
Ela resmunga alguma coisa que não entendo, e em pouco tempo, o
sono a vence. Dessa vez, nem eu mesma consigo evitar e acabo dormindo,
sentindo os seus carinhos lentos em minha barriga.
Mal posso esperar pelo momento em que teremos o nosso pequeno
ou nossa pequena em nossos braços.
É um menino.
Outro menino na nossa casa. Quando a doutora Gomes nos diz que
teremos mais um homem, o nosso filho fica extremamente animado,
imaginando vários momentos com o seu irmão. Luna e eu estamos felizes
também, embora eu achasse que dessa vez seria uma menina, mas estou
feliz de qualquer forma. Ele será muito amado.
— Mamães! — Louis nos chama de repente, quando já estamos no
carro, voltando para casa, depois da consulta. Tudo está bem com o nosso
garoto, e em alguns meses, ele estará conosco, enchendo-nos de alegria.
— Sim, pequeno — eu lhe respondo e olho para trás, enquanto
minha esposa foca a estrada e apenas lança um olhar, através do retrovisor,
em direção a ele. Meu filho mexe em seus cabelos longos de forma nervosa,
ansioso. Isso me desperta a curiosidade.
— Já escolheram um nome para o meu irmãozinho?
Um pequeno sorriso surge em minha boca, então olho para Luna e a
vejo abrir o mesmo sorriso.
— Você tem alguma sugestão, carinha?
Louis alisa uma mão na outra e confirma com a cabeça. Estou ainda
mais curiosa para saber por que ele está tão nervoso.
— O que as senhoras acham de Gabriel? — ele questiona, receoso,
sem saber se daremos uma resposta positiva. O carro dá uma leve travada,
e eu desvio o olhar para a minha esposa, notando que ela ficou surpresa, a
ponto de quase frear o carro. Minha mente rapidamente busca e encontra o
motivo daquele pedido, e o meu coração se enche de amor por saber que
Louis quer homenagear o seu melhor amigo, que hoje está no céu.
— Eu acho perfeito, meu amor.
— Sério? — Sua surpresa nítida me faz abrir um sorriso, e eu me
estico para pegar uma de suas mãos e fazer um carinho.
— Claro, meu amor. Não é, Luna? — Olho para a minha esposa e
noto que está emocionada, mas abre um enorme sorriso e concorda com a
cabeça.
— Eu acho Gabriel um nome perfeito.
Hoje é um dia triste. Mas calma, não aconteceu nada de ruim, quer
dizer, depende do ponto de vista. Estou aqui, ajudando a minha esposa a
arrumar a mala, pois ela passará duas semanas fora. Desde que perdi a
minha memória, nunca passamos tanto tempo longe, e estou me sentindo
extremamente afetada, antes mesmo de Luna viajar. Sei que antes, no
passado, minha esposa sempre fez viagens longas a trabalho, e mesmo que
dessa vez não seja por causa disso, não me sinto entristecida. Sentirei muita
falta.
— Meu amor, não fique assim. Os dias passarão rápido — ela repete,
ao voltar para o quarto. Tinha saído para buscar o nosso pequeno Gabriel,
que havia acabado de acordar; ouvimos o choro por meio da babá
eletrônica.
Suspiro, colocando as últimas peças de roupa na mala, e verifico se
há tudo o que precisa. Olho em sua direção, vendo-a segurar o nosso filho
de lado, meio sentado sobre as suas costelas. Essa é a nova mania: agora,
todas as vezes que alguém o pega no colo, ele rapidamente se encaminha
para essa região da pessoa.
— Vou sentir a sua falta.
— Eu também, meu amor. — Ela se aproxima de mim e segura o meu
queixo, puxando-me para um beijo. Não podemos intensificá-lo, porque
Gabriel tenta desesperadamente enfiar a pequena mão entre nós. Antes que
pensem, o ciúme dele não é comigo, é com a minha esposa. — Eu sou
mulher dela também, viu, pitico?
Pitico: essa é a forma carinhosa que ela arrumou para chamar o
nosso filho mais novo. Carinha é como ela chama o Louis, então decidiu que
precisaria de um apelido diferente para o Gabriel.
— Exatamente, ela é minha também.
Olho para ele e acabo gargalhando por ver a sua carinha de sapeca,
tentando sorrir da mesma maneira que eu, com a língua entre os dentes,
mas não consegue por não ter os dentinhos da frente ainda. Acho que ele
tem visto tanto o Louis e eu sorrirmos dessa maneira, que quer imitar. A
minha esposa tinha razão quando disse que o nosso filho herdaria as
minhas manias, conforme fosse crescendo.
— Rodrigo mandou mensagem, disse que logo estará aqui.
— Não acredito que o meu cunhado vai tirá-la de mim.
— Pelo menos Belinda e as crianças ficarão aqui para fazer
companhia.
— Mas eu quero você — resmungo, quase me virando para sair do
quarto, quando sou surpreendida. — Luna! — Olho de maneira raivosa para
ela, que está sorrindo descaradamente, enquanto os seus olhos estão fixos
em minha bunda, que acaba de ser atingida por um tapa.
— Impossível evitar quando você vira esse rabo para mim.
Rebateria, mas o som da campainha ressoando me impede de fazê-
lo. Minha esposa rapidamente passa o pequeno Gabriel para mim, voltando
para o quarto para buscar a mala.
— Eles chegaram — avisa.
O meu coração diminui dentro do peito, sabendo que agora só a
verei daqui a duas semanas. Rodrigo a acompanhará na viagem, e os dois
vão sozinhos para o aeroporto, porque não queremos levar Gabriel, que
ainda é muito novo, para ficar em aglomerações desnecessárias. Nunca se
sabe quando se pode pegar uma doença no ar.
Eu desço as escadas e rapidamente chego à porta da frente, abrindo-
a para recepcionar a minha irmã e o meu cunhado, que não está mais
usando os cachinhos de sempre, agora adotou um corte de cabelo diferente.
Ele me cumprimenta, e eu dou espaço para que entre com as malas de
minha irmã e meus sobrinhos.
— Que cara é essa, irmã? Devia comemorar, teremos duas semanas
longe desses dois. Festejaremos bastante. Uma pena não poder mandar os
meus filhos junto — diz Belinda, depois de me abraçar e beijar o meu rosto.
Rodrigo ri, acompanhado por minha esposa, que o abraça brevemente e
depois se encaminha para minha irmã, fazendo o mesmo.
— Não estou feliz, quero a minha mulher comigo o tempo todo.
— Pelo amor de Deus! Você ainda está vivendo a fase gostosa de
viver com ela. Daqui a alguns anos, vai agradecer quando existirem viagens
assim.
— Relaxa, cunhada. Ela diz isso, mas morre de saudade de mim. —
Rodrigo, brincalhão e sorridente como sempre, se aproxima de mim para me
abraçar.
— Você é um traidor, levando a minha mulher para longe de mim.
Não é mais o meu cunhado número um. — Tento afastá-lo de mim, mas não
sou capaz de movê-lo nem um milímetro sequer, devido à sua altura e à
massa corporal, infinitamente maiores do que as minhas.
— Ficarei longe da minha também, estamos quites.
— Eu sou a única feliz com essa viagem por aqui? — minha irmã diz,
ao reaparecer na sala; eu nem tinha notado sua saída. Ela está com uma
taça de vinho em uma das mãos e um pote com morangos na outra. Nego
com a cabeça. Essa garota não existe. Rodrigo vai até ela para beijá-la, e
minha mulher chega até mim, impedindo-me de acompanhar a interação
dos dois.
— Prometa que vai se cuidar.
— Você que deve me prometer isso, tenho mais juízo que vocês dois
juntos. — Ela abre um sorriso para a minha resposta, segurando a minha
cintura quando passo os meus braços por trás de seu pescoço. — Amo você.
— Amo você, marrenta. Vou sentir saudade.
— Eu também. — Luna me aperta e me puxa contra o seu corpo,
juntando nossas bocas com intensidade desde o primeiro toque. Ela
pressiona a mão contra a minha lombar, deixando-me grudada ao seu
corpo. Sua boca parece dançar sobre a minha, sua língua experiente
envolve a minha e a suga algumas vezes, fazendo-me suspirar de amor e
desejo. Sempre é gostoso beijá-la dessa forma. Não acredito que ficarei sem
essa mulher por tantos dias.
Um pigarro faz nos afastarmos, levemente ofegantes. Minha esposa
me olha e sorri, selando os nossos lábios uma última vez, antes de me
soltar. Tenho que me recompor, antes de olhar em direção ao agitado
Gabriel sobre o colo da minha irmã. Luna vai em direção ao caçula,
pegando-o e recebendo um forte abraço.
— Ele está na fase de ciumento ainda? — Belinda questiona, e eu
concordo com a cabeça, observando minha esposa conversar baixinho com
o nosso filho.
Rodrigo se aproxima de mim, abraçando-me pelos meus ombros.
— Boa sorte. Eu tive muitas noites de bolas azuis, por causa do
ciúme do Harry com a Belinda. Foi difícil.
— Pelo menos nessa parte não temos problemas, Gabriel dorme
como um verdadeiro anjo.
— E eu nunca durmo com bolas azuis — Luna brinca, provocando
Rodrigo e ganhando uma língua em resposta. Eu acabo rindo da brincadeira
dos dois. Acho fofo como ela consegue ser brincalhona e, ao mesmo tempo,
tão responsável.
— Vocês deviam ir logo, o voo será daqui a pouco — minha irmã
lembra, apontando para o relógio dourado em seu pulso.
O meu cunhado e a minha esposa despertam e começam a pegar as
coisas. Belinda se despede de Rodrigo, e eu também o faço,
acompanhando-os até a porta. Luna me beija com extrema paixão,
deixando um gosto de saudade antecipada em minha boca. Eu arrumo as
suas roupas, que ficaram levemente amassadas, e os fios de cabelo
desalinhados em sua cabeça.
— Vai dar tudo certo, amor — ela diz, e eu concordo com a cabeça.
— Vou sentir saudades. Não demore.
— Logo eu volto pra você.
Nós nos beijamos uma última vez, antes de Luna se afastar e acenar
para mim, entrando no carro do meu cunhado em seguida. Minha irmã para
ao meu lado, e observamos o veículo até onde nos é possível.
— Finalmente um pouco de sossego.
— Falando dessa forma parece que nem sentirá falta dele. Vocês
estão brigados? — questiono quando entramos em casa, fechando a porta e
caminhando rumo à sala.
— Óbvio que não, mas, de vez em quando, é ótimo ter um tempo só
pra mim. Mês passado, as crianças e ele foram passar um fim de semana na
casa de praia dos meus sogros. Não pude ir, por causa do trabalho, e foi
perfeito, mesmo que eu tenha trabalhado. Tantos anos convivendo com
alguém, de vez em quando é bom ficar longe.
— Entendo. — Gabriel se inclina em minha direção, eu o pego, e
rapidamente ele agarra o meu pescoço. — Mas eu ainda estou na fase
gostosa de querer estar perto sempre, mesmo que tenha se passado tanto
tempo desde que tudo aconteceu.
— Por falar nisso, como estão as suas lembranças?
— Tenho me lembrado mesmo das coisas mais antigas, pouquíssimas
vezes das recentes.
Minha irmã abre um sorriso entristecido, levando a mão para o meu
rosto e fazendo um carinho reconfortante. Faz tempo que não me sinto mais
profundamente afetada por causa disso, as novas lembranças que tenho
vivido têm tomado o espaço que as perdidas deixaram.
— Pelo menos você se lembrou de coisas importantes.
Belinda se inclina para a frente, pegando a garrafa de vinho para se
servir de mais.
— Falta uma das mais importantes.
— Qual?
— Quando unifiquei minha vida com a da Luna para sempre. O dia do
meu casamento.
O primeiro dia foi tranquilo, o segundo também, e se seguiu dessa
forma até o sexto dia. Depois disso, começa a ficar complicado. O motivo?
Simples, cuidar da casa com a minha esposa é muito mais fácil do que
sozinha. Minha irmã voltou para a casa dela. O plano era que ela passasse
as duas semanas aqui, mas se tem uma coisa que aprendemos nessa vida é
que, depois que saímos da casa da família, conviver com eles de novo,
sobre o mesmo teto, é a pior coisa do mundo. Sendo assim, aqui estou eu,
sozinha com os meus dois filhos.
Há quase dois anos que acordei sem memória e posso confirmar, com
toda a certeza, que de todos esses meses, esta é a pior semana. Além do
estresse de ter que cuidar da casa e dos meus filhos sozinha, tem também a
saudade da Luna, e ainda faltam sete dias.
Sentir saudade de alguém é sempre pior quando você não pode ver a
pessoa no momento desejado. Lembrar-se do toque, do calor, do cheiro
dela, tudo, de alguma forma, traz lembranças, e o seu subconsciente não dá
alternativas que não sejam visualizações de tudo o que viveu com esse
alguém. Tornei-me dependente da Luna, mas não de uma forma doentia.
Gosto de compartilhar a minha rotina com ela. Mesmo quando brigamos, sei
que posso chegar e conversar sobre qualquer coisa. Às vezes, o que preciso
é vê-la, mesmo que seja enfurnada em seu videogame, esquecida de mim.
Com ela longe, sinto-me longe do meu lar, porque minha casa é ela.
— Você não tem dormido direito? — ela questiona, fazendo-me voltar
à realidade, em uma chamada de vídeo. Temos feito chamadas assim desde
que ela viajou.
Suspiro, arrumando Gabriel em meu colo. Nosso pequeno está meio
adoecido, a pediatra disse que é emocional, pela falta que ele sente da
outra mãe. Desde que o nosso filho nasceu, os dois sempre estiveram
grudados, então é normal que ele se sinta assim.
— Apenas o suficiente.
— Camille, prometeu que iria se cuidar.
— Eu sei, amor. Não tenho me descuidado, apenas fico preocupada
com o Gabriel durante a noite, e o Louis também tem exigido mais da minha
atenção. Esta semana ele teve alguns trabalhos, ainda bem que Belinda
estava aqui.
— Devia chamar a sua irmã de volta. Tenho certeza de que ela não
negaria.
— Prefiro dormir pouco a conviver mais uma semana com ela.
Belinda me deixa louca. Ela está pior do que quando éramos adolescentes.
Luna solta uma gargalhada, e no mesmo instante, o meu coração
acelera. Esse som sempre me causa paz, estou morrendo de saudade de tê-
la perto. Suspiro, admirando o seu rosto através da tela do notebook. Como
uma pessoa pode ser tão bonita quanto essa mulher, mesmo sem muita
qualidade gráfica?
— O que foi, meu amor? Conheço essa carinha.
— Quero você em casa logo. — Minha atenção é desviada quando o
pequeno se revira no meu colo, abrindo os olhos extremamente castanhos,
fixando-os em meu rosto. — Olá, meu amor. Veja quem está ali. — Coloco-o
de pé para que ele possa ver a mãe, e quando os seus olhos se fixam na
tela, Gabriel se mexe, agitado, tocando a tela do notebook, com a
esperança de senti-la. Luna fica emocionada, posso ver o brilho de saudade
aumentando em seu olhar.
— Que saudade, pitico.
Então, os dois começam a se comunicar por uma linguagem própria,
entrando em uma bolha linda de ser observada. Luna faz perguntas ao
pequeno, e ele responde como quem entende tudo, e eu não duvido disso.
Louis sempre foi muito inteligente, tenho certeza de que Gabriel não é
diferente.
Tudo o que eu espero é que esses dias passem voando e que
tenhamos a nossa mulher em casa outra vez. Estou cheia de saudade.
Faz tempo que eu não me sinto tão ansiosa para chegar à minha
casa. Os dias se arrastam, parece que, ao invés de duas semanas, estou
fora há meses. Só poder falar com a minha esposa através de webcam é
torturante; estar longe dos meus filhos, sabendo que Camille está cuidando
deles sozinha, é muito difícil pra mim. Quase desisto e volto antes, mas era
necessário que eu completasse tudo o que fui fazer.
— Finalmente, cunhadinha. Confesso que estou com saudade de
ouvir a minha esposa reclamando o dia todo — Rodrigo brinca, ao
entrarmos em seu carro, e eu acabo rindo em resposta, pois conheço bem
como é o humor de Belinda. Meu cunhado é guerreiro por conseguir lidar
com ela.
— Latinas são difíceis de lidar mesmo, meu amigo. Sei muito bem.
— Nem me fale. Pelo menos sei que hoje farei sexo. Belinda me
encheu de mensagens durante o dia, foi preciso ter muita compostura para
não dar bandeira de nada.
— Bem que notei como você ficou se mexendo desconfortavelmente
do meu lado. Que horror! E eu, toda inocente, recebendo fotos dos meus
filhos, que a minha esposa mandava.
— Belinda me mandou uma foto do Harry vomitando por ter passado
mal, enquanto brincava no balanço. — Faço uma careta para aquela
informação. — Pois é, foi bem nojento. O casamento é isso, você sabe. No
começo, as mensagens são de carinho e conteúdo sexual, então vêm os
filhos, e as mensagens passam a ser sobre contas, reclamações das crianças
e ordens para preparar o jantar.
— Nem me fale. Camille sempre foi mandona, mas ela também
ameniza, dizendo que sente a minha falta em casa.
— Vocês merecem estar assim, depois de tudo o que aconteceu.
Continuamos conversando, enquanto ele dirige rumo à minha casa.
Meu celular apita com diversas mensagens da Camille, perguntando se vou
demorar. Não lhe respondo, prefiro chegar de surpresa.
Quando entramos na minha rua, sinto-me uma adolescente prestes a
ver a namorada pela primeira vez. Incrível como, mesmo depois de todos
esses anos, eu continuo sentindo tudo da mesma forma.
— Se quiser, posso levar o garotinho comigo e deixar vocês sozinhas
— ele diz e, ao sairmos do carro, me ajuda com a mala e me dá um abraço.
— Fica tranquilo, outro dia cobro esse favor a você. Hoje, eu quero
ficar em família.
— Tudo bem, gatinha. Acho que tem alguém muito ansioso pra te
ver. — Ele mal termina de falar e sinto um impacto em minhas pernas. O
meu sorriso rapidamente se abre, ao olhar para baixo e ver o meu filho
agarrado à minha cintura. Passo a mão nos seus longos cabelos, que estão
batendo um pouco abaixo de seus ombros.
— Que saudade, carinha! — falo e me abaixo para poder abraçá-lo.
Meu filho agarra o meu pescoço com força, enchendo o meu rosto de beijos
carinhosos, e isso me faz rir, sentindo o coração acelerado em meu peito.
— Senti tanta saudade, mamãe — ele murmura contra o meu
pescoço. Ficamos assim durante um bom tempo, e eu demoro a notar a
minha esposa parada na porta. Camille dá um passo para o lado, e os meus
olhos focam a pequena criatura se movendo de maneira afobada: Gabriel
está em seu andador e traz com ele um buquê lindo de rosas vermelhas. Os
meus olhos se enchem de lágrimas de emoção. Que gostoso é chegar à
nossa casa e ser recebida assim!
— Pitico. — Caminho a passos largos em sua direção, sem esperar
que chegue até mim, tiro-o do andador, e rapidamente sou abraçada por
ele. Encho o meu pequeno de beijos, sentindo o cheiro gostoso de bebê que
ele exala. — Você está enorme, meu amor. Sentiu saudade da mamãe?
Como se estivesse me respondendo, o meu filho tenta colocar a
língua presa quando abre um sorriso e se balança todo. Sorrio para ele,
volto a minha atenção para as flores e as pego.
— São de plástico, você sabe que eu não gosto de matá-las —
Camille diz, antes mesmo que eu possa levá-las ao nariz e cheirá-las. Sorrio,
notando que ela se aproxima de mim. Está linda, com um vestido solto,
rendado nas pontas. Tão linda e tão minha. Como sou capaz de me
apaixonar toda vez que a vejo?
— Tira toda a beleza delas quando cortam. — Ela concorda com a
cabeça. — Senti a sua falta.
— Eu também. — Seu sussurro me faz engolir saliva, e então, ela se
inclina para a frente, tomando os meus lábios nos seus. Dessa vez, nem
mesmo Gabriel nos interrompe, parece saber que é um momento de
reencontro que não deve ter interrupção. Com esse beijo, tudo ganha mais
vida ao meu redor.
Ela se afasta de mim, segura o meu rosto, analisando cada parte, e
então, abre um sorriso e volta a se inclinar, mas dessa vez, não beija a
minha boca, distribui milhares de beijos por toda a minha face. Isso me faz
gargalhar, e ouço os nossos filhos acharem divertido também. Então, Gabriel
faz o mesmo, tentando segurar o meu rosto com as pequenas mãos, e Louis
agarra a minha cintura para se juntar. Eu me sinto finalmente em casa. Lar
é onde eles estão. Casa é onde a minha Camille está.
Ganhei um jantar especial. Minha esposa fez o prato que mais adoro
e a minha sobremesa favorita. Desde o momento em que cheguei, tenho
sido mimada por todos. Eu gosto disso, faz tempo que não sou tratada
assim. Digo, quando tudo estava ruim entre nós, as coisas esfriaram; agora,
parece que todo dia ela tenta ser melhor do que no anterior. Eu amo demais
tudo o que vem acontecendo, sou grata por estarmos cada vez melhor.
Depois de comermos, ela me conta sobre os dias que se passaram, e
eu comento sobre tudo o que aconteceu nos exames e na clínica, além de
todas as conversas com os especialistas, deixo a minha esposa ciente de
tudo. Nossos filhos dormem, deixando-nos a sós, ali mesmo, no sofá da
sala. Não contamos ao Louis ainda que teremos outro filho, mas assim que
tudo der certo, ele saberá. Tenho certeza de que o carinha vai gostar.
— Tudo isso quer dizer… — ela diz, ao terminar de ler os resultados
dos exames. A sua testa está franzida, e eu posso sentir o tamanho de sua
ansiedade para a resposta. Abro um enorme sorriso, e o meu coração
parece que vai saltar do meu peito.
— Quer dizer que sim, eu posso. Nossas chances de engravidar de
novo são altíssimas. Eles disseram que o tratamento está dando resultado,
que se o procedimento funcionar, só tenho que seguir as recomendações, e
seremos mães de novo.
Camille paralisa no lugar, absorvendo aos poucos toda a informação,
e não demora muito a se jogar sobre mim, tomando cuidado para não
cairmos sobre os nossos filhos. Eu a seguro firme em meus braços, tendo
uma perna dela de cada lado do meu corpo, enquanto está sentada em meu
colo.
— Vamos ser mães novamente? — ela questiona, desacreditada, e eu
concordo com a cabeça, com a sua boca grudada na minha em seguida.
Então, apenas confirmo que a minha decisão foi correta. Eu posso e vou
tentar outra vez, certa de que tudo será diferente.
Vai dar certo, eu confio.
Os meses seguintes pareceram voar. Nossa rotina voltou aos poucos,
até ser mudada de novo, por causa de todo o procedimento. Na primeira,
quase deu certo; na segunda, da mesma forma. Fico desanimada na
terceira, mas Camille está ao meu lado, apoiando-me sempre, assim como
outras pessoas que eu amo. Não importa o quanto demore, eu terei um
bebê nosso. Sei que sou muito capaz.
— Dá para acreditar que é Natal outra vez? — Estou parada no
quintal, com uma caneca de chocolate quente em minhas mãos, e Noah
está ao meu lado. Paramos aqui para conversar e acabamos perdendo a
noção do tempo. — Está nevando. Quão clichê isso tudo pode ser? — Solto
uma risada por sua fala, recostando-me à lateral de seu corpo. Meu irmão
passa um braço sobre os meus ombros, puxando-me contra si, e suspiro
longamente, sentindo-me muito confortável naquele abraço.
— Estou grávida.
Noah, que estava me fazendo carinho, fica rígido instantaneamente,
sem acreditar no que acaba de ouvir. Solto uma risada ao me afastar dele e
olhar para trás, vendo-o boquiaberto.
— Eu escutei certo? — ele questiona lentamente, ainda
desacreditado, e eu abro um enorme sorriso, concordando com a cabeça.
Noah retira a caneca da minha mão na mesma hora e a deixa em qualquer
lugar, antes de segurar minha cintura e me abraçar com força. — Meu Deus!
Meu Deus!
Solto uma gargalhada por sua emoção e verifico se ninguém está nos
observando. Felizmente, todos parecem entretidos dentro de casa.
— Não conte a ninguém.
— Camille sabe?
— Ninguém sabe.
— Meu Deus, eu estou... Parabéns, pequena. Sabia que daria certo.
Tinha notado algumas mudanças em você, mas como os médicos disseram
que a medicação poderia alterar muitas coisas, não imaginei que...
Caramba! Vou ser tio de novo.
— Sim! E eu vou ser mãe de novo.
Ele abre a boca no mesmo instante que eu. Unimos as nossas mãos e
comemoramos em silêncio, para não criar alarde algum. Meu irmão sempre
foi o meu porto seguro, desde que nasci, sempre esteve ali por mim. Mesmo
nunca contrariando a minha mãe nas decisões que ela tomava por ele,
quando era comigo sempre era defendida por ele. Noah nunca deixou que
alguém fizesse algo contra mim e sempre me encorajou em tudo na minha
vida.
— O que está acontecendo? — Uma terceira voz é ouvida, e então,
nos separamos, para vermos a nossa mãe caminhar em nossa direção, com
um sorriso em seu rosto, olhando-nos com curiosidade. — É o espírito
natalino tomando conta de vocês dois? — ela brinca, fazendo-nos gargalhar.
— Com certeza, mamãe. E vai tomar conta de todo mundo — Noah
diz, e minha mãe o olha sem entender. Sinto vontade de chutá-lo, porque
tenho certeza de que ele não conseguirá manter a língua dentro da boca.
— Por quê?
— É hora dos presentes, mamãe, por isso — eu respondo
rapidamente, não dando mais espaço para nada, e vou até a minha mãe,
entrelaçando o meu braço ao dela, levando-a de volta para dentro de casa.
Todos estão ao redor da árvore, esperando para começar a troca dos
presentes. Rapidamente, eu me aproximo da minha esposa, que está
entretida em uma conversa com Sofia e o novo namorado dela. Sim, minha
cunhada mais nova está namorando, e como podem imaginar, minha esposa
surtou quando soube. Porém, parece finalmente estar aceitando o pobre
rapaz. Camille consegue ser mais ciumenta que Javier.
— Não estava intimidando o Richard outra vez, estava? — Camille
leva as mãos ao peito e faz uma expressão ofendida. Muito cínica essa
mulher.
— Só estava dizendo que eles ficariam mais confortáveis dormindo no
quarto do nosso filho do que aqui na sala.
— Isso não tem nada a ver com o fato de você não querer deixar os
dois sozinhos? — Camille nega rapidamente com a cabeça, fazendo-me rir,
antes de beijar rapidamente a sua boca. — Imagina, você sabe que eles
dormem juntos na faculdade.
— Luna, esqueça isso.
Eu rebateria, mas sou interrompida pelas palmas dos nossos
familiares. É o momento de trocarmos os presentes. Meu estômago parece
que vai fugir do meu corpo, sinto-me nervosa e ansiosa. Olho para a minha
esposa ao meu lado, então para os nossos filhos, que estão no canto com o
resto das crianças: Gabriel, em pé, fazendo graças — desde que aprendeu a
andar, dificilmente para quieto —, e Louis, divertindo-se com Harry e Toni.
Então, o meu olhar foca o meu irmão, que olha para mim, no mesmo
instante, e faz um sinal positivo com o polegar. Não preciso de mais nada
para saber que este é o momento certo.
— Família, família! Quero um minuto de atenção de vocês, ok?
— Sapatão não se controla nem no Natal mesmo, sempre quer
aparecer.
Quem diria isso, se não a minha amada cunhada Vanessa? É óbvio
que algo assim só poderia ter vindo dela. Todos acabam rindo, e eu reviro
os meus olhos, mostrando a minha língua a ela.
— Quero agradecer a presença de todos, mais uma vez, aqui.
Sempre é importante para mim e para a minha família termos vocês
conosco em nossa casa.
— Nós viemos pela comida de graça — dessa vez, quem fala é Theo,
sendo seguido por todos os outros, concordando animadamente.
— Pela cerveja grátis também — Rodrigo concorda, erguendo a long
neck que está em sua mão.
— Claro, sempre é um prazer abastecer vocês — quem diz é a minha
esposa, arrancando risadas de todos ao nosso redor.
— Concordo com o meu amor, é sempre um prazer mesmo. Como em
todo Natal, temos o ritual de trocas de presentes, e este ano, eu quero ser a
primeira. Vou começar agradecendo pela família enorme que tenho, pelos
amigos fiéis, pelos meus filhos e pela minha esposa, que está sempre ao
meu lado. — Conforme falo, olho para cada um, ganhando sorrisos de volta.
— Nesses dois últimos anos, aconteceram muitas coisas. Momentos difíceis,
mas que passamos unidos, com a força de todos nós. Eu não sei se seria
capaz de alcançar tanta coisa boa sem a minha mulher comigo. Camille,
você sabe o quanto eu a amo, o quanto amo os nossos filhos, o quanto sou
feliz pela vida que construímos. Agradeço, todos os dias, por ter tido uma
segunda chance de fazer você feliz.
— Sempre darei todas as chances que você precisar, meu amor — ela
responde, emocionada, arrancando suspiros, assobios, aplausos e
brincadeiras dos outros. Meu coração está acelerado em meu peito.
Caminho em direção às duas caixas que contém os presentes dela, uma
pequena e outra maior, e vou em sua direção, sentindo as minhas mãos
suarem. Camille está tão ansiosa quanto eu.
— Este é o seu primeiro presente, mas ele não é sozinho, só faz
sentido quando abrir o segundo. — Camille pega a caixa pequena,
começando a abri-la de maneira ansiosa.
— Muito obrigada, meu amor — ela agradece, antes mesmo de ver o
que é, e não demora muito a encontrar e a retirar de dentro, com o cenho
franzido, erguendo o objeto, sem entender. — Comprou um carro novo pra
mim? — ela pergunta, incrédula, e eu apenas sorrio e nego com a cabeça.
— Essa chave é do nosso novo lar. — Camille fica boquiaberta, com
os olhos arregalados, não acreditando no que acaba de ouvir. — Sim, meu
amor, é a chave daquela casa linda pela qual você se apaixonou.
— Luna, como? Como conseguiu? Ela estava prestes a ser vendida e
não cabia no nosso orçamento. Meu amor, você...
— Calma, eu não fiz loucuras. Os nossos pais me ajudaram, é um
presente deles também.
Camille rapidamente olha para os pais dela e, então, para os meus,
ainda boquiaberta. Eles sorriem para ela, concordando, como se dissessem
que merecíamos.
— Obrigada, vocês são inacreditáveis. Eu estou sem saber o que
dizer.
— Ainda não acabou, falta o outro.
— Eu estou com medo de saber o que é. Se na caixa pequena
continha a chave de uma casa, nesta maior deve ser uma passagem para
fora da Terra — ela brinca, fazendo com que todos gargalhem, e eu entrego
a caixa a ela, que não demora a abrir.
— Sei que o nosso plano para a casa nova era um pouco mais
distante, mas foi extremamente necessário.
Quando Camille retira o conteúdo de dentro da caixa, fico
preocupada se ela desmaiará, então me aproximo mais. A minha esposa
está com as mãos tremendo, os seus olhos começam a lacrimejar, e não
acredita no que está vendo. Emocionada da mesma forma, me aproximo
dela.
— Você está...? — Ela olha para mim, e mesmo sabendo a resposta,
aguarda, desesperada, por uma confirmação direta minha.
— Sim, meu amor. Estou grávida, precisaremos de muito espaço. —
Olho rapidamente ao meu redor, e todos estão surpresos e curiosos. Eu abro
um enorme sorriso e não controlo as lágrimas, ao dizer: — São gêmeas.
Seremos mães de gêmeas.
No instante seguinte, todos comemoram, e a minha esposa me
agarra com força, puxando-me para um beijo apaixonado.
Finalmente, nossa vida ficará completa de vez.
Capítulo 39 – O grande dia
Estou parada em frente a um enorme e confortável sofá, com um
sorriso no rosto, criando em minha mente uma visualização dessa peça
belíssima na sala de casa. Vai ficar simplesmente perfeito. Nunca pensei
que, apesar de ser estressante, também fosse reconfortante comprar coisas
para casa, principalmente sendo um imóvel novo, recém-reformado. Toda
ajuda que tivemos da nossa família foi essencial, sem eles provavelmente
demoraríamos alguns anos para termos um lar como esse.
— Esse é o escolhido? — Ouço a voz da minha esposa ao meu lado e
rapidamente olho em sua direção. Luna está com a mão apoiada em sua
lombar. Tem sentido algumas dores, conforme a barriga cresce, completará
o quinto mês de gestação em breve, e sua mudança física é notável. Não
pensei que poderia me apaixonar ainda mais por essa mulher, mas essas
bochechas gordinhas e a barriga cada vez mais visível me deixam ainda
mais rendida. — O sofá, amor. Escolheu esse?
— Ah, sim, sim. — Sorrio sem jeito. Não me dei conta de que tinha
ficado parada, encarando-a, enquanto divagava comigo mesma. Meus olhos
se fixam em Gabriel, que está com as pequenas mãos nas pernas de minha
esposa, mas nota o meu olhar e rapidamente caminha até mim, com os
braços erguidos. Um sinal claro de quem diz querer colo. — Você gostou?
— Xim! — quem responde é ele, com a sua adorável língua ainda
enrolada. Nós duas rimos, e eu beijo os cabelos dele, que estão cada vez
mais enrolados. Por alguma razão, ele nasceu com belos cachos nas pontas,
é simplesmente a coisa mais linda do mundo todo. Minha esposa leva a mão
até a cabeça do nosso pequeno, bagunçando levemente os cabelos dele.
— Eu amei. Tenho certeza de que o carinha também vai gostar.
Louis está passando o final de semana em Miami, com os pais de
Luna. Não consigo me acostumar com o fato de ele estar crescendo cada
vez mais. É a primeira viagem que faz sozinho, e eu não consigo ficar
tranquila, até ter certeza de que tudo esteja bem e o meu filho esteja a
salvo. Luna fica preocupada na mesma intensidade, nunca o deixamos ir
sozinho para tão longe. Somos mães muito protetoras, tenho total
consciência disso. Sei que não devo sufocar os meus filhos, mas como não
me preocupar? Acho que nunca cortarei totalmente o cordão umbilical com
nenhum deles.
— Tenho certeza de que ele vai gostar, mas não tanto quanto você e
esse garotinho aqui, não é, bebê?
Gabriel olha para mim, sabendo que estou falando dele, abre um
sorriso sapeca e coloca a ponta da língua para fora. De tanto ver o irmão
sorrindo dessa forma, acabou adotando a mesma mania. Gosto da maneira
como os meus filhos se dão bem, mesmo com a diferença de idade, e o
Louis está animado para a chegada de suas irmãs também. O meu pequeno
realmente ama ser o irmão mais velho. Lembro-me de ouvi-lo conversar
várias vezes com a barriga de Luna, mesmo quando ela mal aparecia,
dizendo que protegerá Gabriel e as duas de tudo nesse mundo. Tenho
certeza de que Luna e eu nunca precisaremos nos preocupar com nosso
filho. Ele será um grande homem, o criamos para ser assim, e acredito que
estamos conseguindo com maestria.
— Faltam poucas coisas agora. Está animada? — Luna questiona ao
voltarmos para o carro. Coloco o cinto de segurança e olho através do
retrovisor, para sair do estacionamento com cuidado. Não nos mudamos
ainda, optamos por terminar de mobiliar a casa nova toda antes. Será mais
fácil, não quero bagunça e a minha esposa grávida no meio. Vamos alugar a
casa em que estamos atualmente, com todos os móveis dentro. Além de
mais fácil, mais lucraremos.
— Muito. Finalmente estou vivendo esse momento. Estar aqui agora,
capaz de escolher tudo e me lembrar disso, é simplesmente maravilhoso.
Minha esposa coloca uma mão sobre a minha coxa e a aperta, e nem
preciso olhá-la para saber que está sorrindo. Luna fica feliz demais por me
ver tão animada. É ótima a sensação de poder mobiliar a nossa nova casa e
ter consciência disso. Na atual, é estranho, porque não tenho lembranças de
quase nada, como se eu simplesmente tivesse sido colocada ali dentro e
estivesse vivendo, porque as circunstâncias me fizeram ter que viver assim.
— Estamos vivendo a vida que queríamos há muito tempo, sabia?
Quando nos casamos, o nosso desejo sempre era ter uma família grande e
uma casa espaçosa, com um quintal enorme. Pode ter demorado um pouco,
mas estamos realizando o nosso sonho.
Seguro a mão dela em minha coxa e a trago até a minha boca,
beijando o dorso e os dedos entrelaçados aos meus. Uma enorme felicidade
está concentrada dentro de mim. Os últimos meses têm sido simplesmente
incríveis. Eu pude reviver uma gravidez toda, e agora tenho a oportunidade
de ver a minha esposa grávida pela primeira vez. Além disso, é claro, tem o
fato de termos sido presenteadas com a casa nova. Sempre serei grata por
todos que nos permitiram viver esse momento. O dinheiro que
economizamos na compra foi todo usado na mobília e decoração da casa
nova. Posso dizer que agora estou vivendo a minha vida perfeita. Talvez
falte apenas um pequeno detalhe, para que ela esteja realmente completa.
Sinto a água cada vez mais fria e decido que está na hora de
sairmos.
Os dias têm sido corridos. Ninguém nunca disse que a vida adulta
seria fácil. Quando se é jovem, pode ser que você fantasie como será esse
período: uma casa enorme, carro do ano, muito dinheiro no banco e talvez
uma pessoa ao seu lado para amá-la. Eu conquistei a casa e a minha
esposa, mas a conta bancária recheada, nem pensar, são tantas contas a
pagar. Ter um novo lar traz muitas consequências, e além disso, tenho
quatro crianças para cuidar — cinco, se for para contar com a minha querida
mulher. Posso garantir que a minha quinta criança me dá muito mais
trabalho do que as outras.
— Cheguei, família. — Eu tenho um sorriso na face ao adentrar
minha casa, mas ele vai morrendo aos poucos e dá lugar a uma expressão
de confusão, ao presenciar a cena no meio da sala de estar. — O que está
acontecendo aqui?
A cena é a seguinte: o meu pequeno Gabriel está sobre os ombros de
Vanessa, que está com o rosto todo marcado de tinta. Minha esposa está
sentada sobre o tapete, com as gêmeas, agitadas, em seus braços,
enquanto Louis tenta puxar o irmão dos braços de minha melhor amiga.
Todos estão se divertindo bastante com a bagunça.
— Esses pentelhos se uniram contra mim, enquanto eu estava
impossibilitada de me defender. Agora, o mandante vai pagar.
Ao dizer aquilo, Vanessa começa a subir e descer com o pequeno
Gabriel em seus braços, fazendo-o gargalhar em meio a gritos, que são
acompanhados pelos das gêmeas e de Louis, que continua tentando, sem
sucesso algum, tirar o irmão das garras da tia. Eu rio de tudo aquilo,
retirando os meus sapatos e colocando-os na sapateira ao lado da porta,
livrando-me também, logo em seguida, da minha bolsa, pendurando-a no
tripé.
— Como estão as minhas preciosidades?
Minhas pequenas se agitam no colo de Luna, inclinando-se para a
frente, para que eu possa segurá-las. Com certo esforço e auxílio de minha
esposa, eu as pego em meus braços, ganhando beijos molhados por todo o
rosto. É simplesmente indescritível chegar à minha casa e ser recebida
assim.
— Você deve estar cansada. Como foi o trabalho? — Luna questiona,
logo depois de selar os nossos lábios e pegar Destiny de mim, para que eu
não segure as duas ao mesmo tempo e me canse. Hope deita sua pequena
cabeça em meu colo e envolve o meu pescoço com as mãos. Isso sempre
me faz ficar completamente rendida. Eu amo tanto os meus filhos. Não acho
que possa existir amor mais lindo e puro.
Depois de tanto tempo falando sobre destino, sobre ter
esperanças relacionadas ao nosso futuro juntas, não tive como nomear as
gêmeas de outra forma. Minha esposa foi a primeira a concordar quando
sugeri tais nomes. Sei que talvez possam achar brega ou mesmo sem
sentido, mas para nós duas eles traduzem um pouco de tudo o que
passamos. Cada caminho que nos trouxe até aqui, todas as barreiras que
enfrentamos, todas as vezes que quase nos separamos e conseguimos
reverter a situação para permanecermos juntas. Sempre mantivemos
esperança de que o destino unisse os nossos caminhos.
Por essas e outras questões, resolvi fazer uma tatuagem, minha
primeira em todos esses anos. Precisava de algo para me fortalecer quando
estivesse longe dos meus tesouros. Resolvi fazer um triângulo com cinco
bases, que representa a letra delta na cultura grega e significa mudança e
fluidez ou um circuito que volta ao princípio. Essa é a minha história com
Luna. Quando quase estávamos no fim, algo nos fez voltar ao começo para
reescrevermos tudo. As cinco bases representam a minha mulher e os
nossos filhos, porque são eles que me mantêm de pé todos os dias, que me
sustentam. Não sei o que seria de mim sem eles.
— Cansativo, realmente. Temos recebido mais inscrições de jovens, e
essas crianças têm muita energia.
Minha esposa solta uma gargalhada.
— É sério, eles exigem muito de mim. Estou ficando velha para isso.
— Mas continua uma gostosa.
Uma terceira voz interrompe a conversa com a minha esposa, e eu
abro um sorriso, sendo envolvida pelos braços de minha melhor amiga em
seguida. Eu olho para o seu rosto todo marcado e sinto vontade de rir.
— Você pegou no sono, e eles pintaram o seu rosto outra vez, não
foi? Isso é castigo por todas as vezes que você fez o mesmo com os dois.
Pensou que nunca haveria vingança.
— Vocês estão criando cobras — ela rebate e olha para os meus
pequenos garotos, que a observam com sorrisos travessos no rosto. Esses
três juntos são terríveis. — Eu voltarei, podem esperar.
Reviro os olhos e nego com a cabeça. Não há o que fazer para que
essa mulher cresça, da mesma forma que a minha esposa continua uma
moleca. Estou cercada de crianças, como vocês podem ver.
— Vai ficar para o jantar? — pergunto-lhe, depois de finalmente
cumprimentar os meus pequenos. Hope ainda está em meus braços,
completamente agarrada a mim e resmungando toda vez que a tento
colocar no chão para poder subir e tomar um banho.
— Não. Estava apenas esperando você. O Noah me mandou
mensagem, dizendo que está fazendo pizzas agora à noite.
— Nunca pensei que veria aquele moleque sendo um belo dono de
casa — minha esposa brinca, aproximando-se de nós, com Destiny ainda em
seu colo.
— Sempre avisei que eu nunca seria, nem sou, a mãe de vocês. Ou
ele aprendia a fazer as coisas ou ficaria sem poder me...
— Vanessa! — Luna e eu falamos juntas, ao perceber o que ela
falaria. Minha melhor amiga faz um sinal de rendição e solta risadas. Não
aguento essa mulher. Ela não demora muito a se despedir e ir embora,
deixando-nos sozinhos.
Hope acaba pegando no sono em meu colo, e a minha esposa
comenta que ela não dormiu durante a tarde, porque estava agitada,
provavelmente com saudade de mim. Engraçado como cada gêmea
escolheu uma de nós para se apegar.
O jantar, como sempre, foi caótico. Não que isso seja uma coisa ruim,
mas ter quatro crianças, ou melhor, cinco, se contarmos com a minha
digníssima esposa, não é nada fácil. Muito falatório e brincadeiras à mesa.
Eu nunca reclamo disso, ao contrário, amo esses momentos.
— Elas estão cada vez maiores. O tempo passa muito rápido —
cabisbaixa, Luna comenta, ao voltar para o quarto. Ela tinha colocado
nossas pequenas para dormir, assim como eu fiz com os meninos.
Termino de passar o creme hidratante nas pernas e dou um pequeno
sorriso, aproximando-me de minha esposa. Seguro-lhe o queixo, para selar
os nossos lábios, suspirando de amor por sentir a sua boca na minha.
— Realmente.
— O tempo voa — ela diz, me beija lentamente e, em seguida, volta
a falar, sem desgrudar a boca da minha. — Logo estaremos apenas nós
duas aqui, nesta casa enorme.
Depois de dizer isso, ela inicia um beijo gostoso e apaixonado. Suas
mãos seguram a minha cintura, e os nossos quadris se juntam. Eu suspiro,
completamente rendida em seus braços. Meus olhos se abrem apenas para
me deparar com aquela imensidão verde de pupilas dilatadas. Sorrio,
agarrando-lhe o pescoço e puxando-a para trás. Minha mulher não se faz de
rogada, coloca-me de costas sobre a cama e deita-se por cima de mim.
Voltamos a nos beijar, enquanto as suas mãos exploram as curvas do meu
corpo, e eu aproveito para fazer o mesmo com ela.
Luna desce os beijos para o meu pescoço, usando as suas pernas
para afastar as minhas e se encaixar melhor. Um de seus joelhos pressiona
a minha intimidade, e um gemido me escapa quando aperto os seus ombros
ao mesmo tempo. Ela segura por trás do meu joelho esquerdo e ergue a
minha perna, para ganhar ainda mais liberdade. Grudo a minha boca na
dela outra vez, não sendo nada cuidadosa, mordo e chupo os seus lábios
com força. Não temos tido muito tempo para fazer amor. Um dos nossos
filhos sempre aparece, precisando de nós, então vamos aproveitar este
momento a sós.
— Tira — eu praticamente imploro quando ela começa a me provocar
por cima do short. Sinto o tecido cada vez mais molhado, conforme as
provocações aumentam. Minha esposa não demora a se afastar para tirar a
peça de roupa desnecessária, e aproveito o momento para tirar a sua blusa
também. — Maravilhosos — comento, com água na boca, ao ver os seus
seios bem maiores, a poucos metros do meu rosto. Não resisto, erguendo-
me na cama para colocar o lado esquerdo na boca primeiro, sugando o
mamilo com força e arrancando-lhe um gostoso gemido.
Luna se abaixa mais, para aumentar o contato, e então, eu sinto os
seus dedos começarem a alisar os meus pequenos lábios, toda a extensão
de minha boceta. Provocando-me, ela coloca apenas a ponta de um dos
seus dedos, e quando eu faço força com o quadril para engoli-lo por inteiro,
ela o retira e sorri. Maldita! Essa mulher é perigosa.
Em resposta, eu mordo um de seus seios, não muito forte, mas o
suficiente para fazê-la gemer de dor. Luna gosta disso, pois me olha com
fome, ainda me provocando, e então, a mordo outra vez. Outro gemido lhe
escapa, mas dessa vez não tenho dúvidas de que foi de prazer. Ela está
adorando sentir essa dor que minha mordida está causando. Safada.
— Toda molhada por minha causa — ela murmura e dá um tapa
certeiro em meu clitóris, fazendo-me tirar a boca de seus seios para gemer
alto. Nosso quarto fica distante do dos nossos filhos, por isso não existe a
possibilidade de eles nos ouvirem. Foi a primeira coisa que procuramos
saber quando estávamos reformando a casa.
— Mete. Para de provocar e me fode logo. — Eu envolvo sua cintura
com as minhas pernas e seguro o seu rosto com as mãos, encarando-a,
para que ela saiba o quanto a desejo dentro de mim. — Me faz gozar pra
você.
Ela obedece, deslizando um dedo lentamente e movimentando-o
algumas vezes, para, então, retirá-lo e voltar com dois. Dessa vez, minha
esposa não tem dó alguma de mim, metendo os seus dedos de uma vez só,
até o fundo. Eu me curvo sobre a cama e faço um movimento para a frente
com o quadril, para senti-la ainda mais fundo. Luna começa a foder a minha
boceta da melhor maneira que sabe e da forma mais gostosa que o
momento pede.
Fazer amor é uma coisa deliciosa, mas foder com ela é simplesmente
indescritível. Quando ela mete sem pena, sem medir forças, quando dá
tapas na minha boceta e volta a enfiar os dedos até o fundo, fazendo-me
gritar e ficar extremamente agitada sobre a cama, eu fico louca. Luna sabe
me tocar de uma maneira que nem eu mesma sou capaz. Todos esses anos
nos tornaram especialistas no corpo uma da outra. Eu amo isso.
Sem resistir, ela desce e fica de joelhos no chão, na beira da cama,
curvada para colocar a boca em mim. Agora, sim, estou indo ao paraíso e
ao inferno. Quando os seus dedos estão me fodendo, ela dá sugadas firmes
em meu clitóris, para tremer a língua rapidamente, em seguida, e colocar
devagar os dedos. Ela repete esses movimentos durante um longo tempo,
para se afastar e me dar um forte tapa, que me faz gritar de prazer.
Minhas coxas prendem a sua cabeça, e começo a esfregar a minha
boceta por todo o seu rosto, molhando até mesmo o seu nariz com os meus
movimentos. Luna não me impede, inclusive me auxilia, com as mãos em
minha bunda, segurando-a com firmeza para me dar mais apoio e me
esfregar nela. Quando anuncio que vou gozar, ela se afasta, para me dar
outro tapa firme, dessa vez pegando toda a minha boceta, e fecha a boca
em meu clitóris, sugando-o até que as suas bochechas fiquem côncavas,
para, em seguida, tremer a língua nele, sem tirar a boca.
O orgasmo vem de maneira deliciosa. Eu demoro alguns minutos a
me recuperar e, então, faço tudo com ela também. É delicioso ser explorada
e explorar. Eu amo cada curva do corpo dela, amo poder tocá-la e ser
tocada, poder senti-la e sentir. Eu simplesmente amo cada momento ao seu
lado.
Não existe nada, em todo o mundo, que eu possa pedir, além dessa
mulher. Tudo o que conquistamos — nossa casa, nossa família, nossos
empregos, nossa vida —, nada disso seria tão perfeito sem ela. Nada faria
sentido. Porque não existe uma Camille sem Luna.
Capítulo 41 – Esposa idiota
Realmente, o tempo passa rápido demais, penso comigo mesma,
enquanto folheio algumas fotos de um dos muitos álbuns de família que
temos. Engraçado ver os álbuns mais antigos, sabendo que pensávamos em
ter apenas o Louis, que a nossa família estava completa daquela forma. E
então, tudo mudou com a chegada do Gabriel, e depois com as gêmeas. Só
então, pudemos entender o significado de estarmos completas.
— Outra?